Os Santos Mártires: Lendas Da História de Portugal

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Os Santos Mártires

U
ma das lendas mais interessantes acerca de Lisboa diz respeito aos
Santos Mártires: Veríssimo, Máxima e Júlia. Eram três irmãos, filhos
de um importante dirigente romano que, às escondidas das autori-
dades locais, divulgavam a fé cristã e auxiliavam todos aqueles que deles
necessitavam.

Um dia, já no final do governo do imperador Diocleciano (284 a 305),


quando aumentavam as perseguições aos Cristãos, decidiram apresentar-se
de livre vontade às autoridades romanas. Mas, quando se preparavam para
o fazer, apareceu-lhes um anjo que os mandou desistir daquela intenção,
manifestando-lhes o desejo de que fossem à Lusitânia divulgar a palavra de
Cristo. Os três irmãos assim fizeram, vindo a desembarcar em Lisboa. Com
a sua evangelização, a conversão das populações ao Cristianismo fez-se de
forma tão rápida que as autoridades locais logo ficaram de sobressalto. E
de novo aumentaram as perseguições.

Os três irmãos, embora tivessem a vida cada vez mais ameaçada,


não só não desanimaram como redobraram a sua fé e entusiasmo. Não
tardaram por isso a ser presos e julgados. Acusados de atentarem contra o
Estado, foram condenados à morte. Os torturadores bem tentaram demo-
vê-los da fé que tinham, mas sem qualquer êxito. Ligados de pés e mãos,
foram atados às caudas de três cavalos que os arrastaram pela cidade,
sendo os corpos lançados aos animais. Ainda assim, estes respeitaram os
cadáveres pelo que os corpos, intactos, foram lançados ao mar, amarrados
a pesados blocos de pedra.

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Quando os barcos que os levaram regressaram à praia já lá se encon-
travam os corpos pouco antes deixados no mar. Frente a essa praia, os Cris-
tãos, secretamente, mandaram dar-lhes sepultura condigna. Mais tarde foi
aí construído um altar, e depois um templo, em memória dos Santos Már-
tires. Esta é a origem do nome de Santos, ainda hoje atribuído à zona de
Lisboa onde teriam, segundo a lenda, dado à costa os seus corpos.

De acordo ainda com a tradição, passados muitos séculos, quando


D. Afonso Henriques conquistou Lisboa aos Mouros, em 1147, logo procurou
averiguar onde estariam as relíquias dos Santos Mártires que os Cristãos
tinham escondido durante o período de domínio muçulmano. Como não as
encontrasse, mandou construir no lugar de Santos um mosteiro para os cava-
leiros da ordem militar de Santiago. Esse mosteiro viria depois a ser habitado
pelas viúvas dos cavaleiros, que ficaram conhecidas por Comendadeiras de
Santos. Mais tarde, foi construído um novo edifício noutro local da cidade,
ainda hoje, por isso, designado como mosteiro de Santos-o-Novo.
A Moura Salúquia

A
cidade de Moura é uma das muitas po-
voações do sul de Portugal cuja história
está profundamente ligada à presença
muçulmana entre nós. O próprio nome da locali-
dade teria justamente origem neste facto.

Segundo a lenda, diz-se que no tempo de


D. Afonso Henriques, vivia no Alentejo uma moura muito
bela, de seu nome Salúquia. Era filha de um famoso chefe muçul-
mano, Abu-Assan, senhor do mais importante castelo das redondezas, que
os Cristãos queriam conquistar.

Nas noites bonitas de luar, a jovem Salúquia ia para a janela cantar,


o que deixava os homens que a ouviam completamente enamorados. Tam-
bém os cavaleiros cristãos escutavam os seus cantos e o que mais deseja-
vam era conquistar o seu coração. No entanto, a jovem Salúquia nunca saía
da sua torre e já estava prometida em casamento a um mouro chamado
Brafama, governador do castelo da vizinha cidade de Aroche.

Estando a par destes factos, os Cristãos decidiram então planear uma


emboscada. Assim, quando no dia aprazado Brafama se dirigia para o local
do casamento, cruzou-se com uma comitiva chefiada por dois nobres cris-
tãos, Álvaro e Pedro Rodrigues. Logo ali se travou uma violenta batalha, que
terminou com a derrota e morte de todos os Muçulmanos. Uma vez sozi-
nhos, decidiram os Cristãos vestir os trajes dos vencidos e, desta maneira,
sem causarem suspeitas, seguiram para Moura, a fim de tomarem a cidade.

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Quando Salúquia os avistou ao longe pensou tratar-se do noivo e da
restante comitiva. Mandou então baixar a ponte levadiça que dava acesso
ao castelo e abrir as suas portas de par em par. Quando se apercebeu do
engano era, no entanto, demasiado tarde. Muitos cavaleiros estavam já
dentro do recinto amuralhado e não permitiram que as portas fossem de
novo fechadas. Apanhados de surpresa, os Muçulmanos foram facilmente
destroçados.

O jovem cavaleiro
Álvaro Rodrigues, que vinha
disfarçado com as roupas de
Brafama, ainda correu para
a torre. Lá do alto, Salúquia
compreendeu o destino que
a esperava mas, fiel ao seu
amor, tomou as chaves do
castelo e atirou-se do alto
da torre.

Segundo a lenda, foi


a partir de então que a ci-
dade (Maura) passou a cha-
mar-se Moura, em homena-
gem à corajosa muçulma-
na, e que os reconquis-
tadores cristãos, Álvaro
e Pedro Rodrigues, pas-
saram também a usar
o novo apelido.

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A Moura Salúquia
A Lenda de Cárquere

S
egundo a tradição, Guimarães teria sido o berço do primeiro rei de
Portugal, D. Afonso Henriques. Nessa altura, a cidade era já uma im-
portante praça-forte do Condado Portucalense, cujas terras abran-
giam o território desde o Minho e Trás-os-Montes até à região a sul do Douro.
Embora existissem outras vilas mais importantes, como Braga e Porto, era
ali que a Corte permanecia mais tempo dada a sua situação central e as
limitações que as outras localidades apresentavam. A primeira, porque per-
tencia ao arcebispo, e estava num local plano que favorecia um ataque
inimigo; a segunda, porque, além de ser governada pelo bispo, os fidalgos
também não eram bem-vindos e estavam até proibidos de ali possuir qual-
quer residência.

É neste quadro histórico que surge a lenda de Cárquere. De acordo


com ela, D. Afonso Henriques teria nascido corcunda e com graves defeitos
físicos numa perna, o que o impedia de aspirar à sucessão do Condado e
tornar-se um destacado chefe mili-
tar como o seu pai.

Ainda muito novo, foi o jovem


confiado aos cuidados de um dos
mais ricos fidalgos de Entre Douro,
D. Egas Moniz, que se encarregou de
exercitar o físico e formar o espírito
de Afonso Henriques. Algum tempo
depois morria o conde D. Henrique
sem deixar mais descendência, mas,

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apesar do empenho do aio
Egas Moniz, poucas melho-
ras se verificaram no estado
de saúde do jovem Afonso.

Naquela época, ainda


as lutas contra os Muçul-
manos eram frequentes na
região, pelo que os Cristãos
escondiam as imagens sagradas para não serem vandalizadas pelos seus
inimigos. Foi o que aconteceu à imagem de Nossa Senhora de Cárquere,
que ficou durante longo tempo escondida no tronco oco de uma árvore.
Certo dia, porém, em que Egas Moniz regressava do sul, de uma das suas
incursões contra os Mouros, apareceu-lhe em sonhos Nossa Senhora. Esta
revelou-lhe o sítio exacto onde se encontrava a imagem e pediu-lhe para
ali construir uma nova igreja em cujo altar devia colocar, por uma noite, o
jovem Afonso Henriques. Egas Moniz tratou logo de iniciar a cons-
trução, de modo a cumprir o pedido que lhe tinha sido feito.
Concluída a obra e depois de uma noite passada em vigília,
Afonso Henriques apareceu finalmente curado. Em agra-
decimento pelo milagre realizado, Egas Moniz mandou
ampliar a construção inicial e concedeu avultados bens ao
Mosteiro.

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A Lenda de Cárquere
D. Fuas Roupinho

D
urante os reinados de
D. Afonso Henriques e
do seu filho D. Sancho I
distinguiu-se um nobre cavaleiro
chamado Fuas Roupinho. Valente homem de armas, conseguiu por diversas
vezes levar de vencida os exércitos muçulmanos. Numa das batalhas em
que participou, em 1180, junto a Porto de Mós, tomou como prisioneiros
um importante rei mouro e a sua filha.

Este D. Fuas Roupinho, para além de cristão devoto e generoso para


com os seus trabalhadores, tinha o prazer da caça e uma particular venera-
ção por Nossa Senhora da Nazaré. Assim, sempre que o rei atravessava as
suas terras era certo e sabido que durante vários dias permanecia longe de
casa, perseguindo todo o tipo de animais, sobretudo os de grande porte,
como o javali, o urso e o veado. No final das caçadas, organizavam-se grandes
banquetes, acompanhados de música, que se prolongavam muitas vezes
até ao despontar do Sol.

Um dia em que se encontrava sozinho a caçar chegou-lhe a notícia


de que o rei mouro que havia aprisionado tinha morrido. A princesa, sua
filha, muito desgostosa, manifestava o desejo de conhecer o Deus do nobre
cavaleiro e, sobretudo, a mãe desse Deus.

Como bom cristão e desejoso de satisfazer a vontade da princesa,


D. Fuas Roupinho decidiu levá-la até à Nazaré. Quando já estava perto do
local de destino surgiu-lhe pela frente um belo veado. Entusiasmado com
aquela visão, largou de imediato a comitiva e foi em sua perseguição. Habi-

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tuado como estava a caçar e montado no seu melhor cavalo, não duvidou
que rapidamente alcançaria o veado. No entanto, o animal parecia possuído
do demónio, correndo desenfreadamente e dando grandes saltos sem mos-
trar qualquer tipo de cansaço. D. Fuas, fixado exclusivamente naquela ima-
gem, nem se apercebeu do nevoeiro que se tinha começado a formar.
A perseguição continuou já sem ver os sítios por onde se metia.

No momento em que deu conta onde se encon-


trava era já demasiado tarde. À sua frente estava
uma enorme falésia cavada a pique sobre o
mar e o cavalo, com as duas patas dian-
teiras no ar, preparava-se para se lan-
çar no abismo.

Foi nesse momento que pediu aju-


da a Nossa Senhora da Nazaré, que
veio em seu socorro equilibrando
o cavalo e salvando-o assim de
uma morte certa. Para assi-
nalar este milagre foi
construída no local a
ermida da Memória. Di-
zem que ainda hoje se
podem ver aí grava-
das na rocha as patas
do cavalo de D. Fuas.

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