TCC Sandra Mara

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UNIVERSIDADE FEDERAL FLUMINENSE

INSTITUTO DE HUMANIDADES E SAÚDE


FACULDADE FEDERAL DE RIODAS OSTRAS
CURSO DE GRADUAÇÃO EM SERVIÇO SOCIAL
TRABALHO DE CONCLUSÃO DE CURSO
ORIENTADOR: Dr. Wanderson Fábio de Melo

SALTOS ALTOS, MEIAS FINAS,


MACACÕES E BOOTS
MULHERES NO TRABALHO OFFSHORE DAS
INDÚSTRIAS PETROLÍFERAS: EMANCIPAÇÃO OU
EXPLORAÇÃO?

Sandra Mara de Almeida


Mat. 10964031

Rio das Ostras


2013.1
2013.1
SANDRA MARA DE ALMEIDA

SALTOS ALTOS, MEIAS FINAS, MACACÕES E BOOTS


MULHERES NO TRABALHO OFFSHORE DAS INDÚSTRIAS PETROLÍFERAS:
EMANCIPAÇÃO OU EXPLORAÇÃO?

Monografia apresentada em cumprimento à exigência do Curso


de graduação em serviço social da Universidade Federal
Fluminense – Polo Universitário de Rio das Ostras, como parte
dos requisitos para conclusão do curso.

Orientador: Profº Dr. Wanderson Fábio de Melo

Rio das Ostras


2013.01
SANDRA MARA DE ALMEIDA

SALTOS ALTO, MEIAS FINAS, MACACÕES E BOOTS


MULHERES NO TRABALHO OFFSHORE DAS INDÚSTRIAS PETROLÍFERAS:
EMANCIPAÇÀO OU EXPLORAÇÃO?

Trabalho de Conclusão de Curso e aprovado como requisito


parcial para obtenção do Título de Bacharel em Serviço Social
pela Universidade Federal Fluminense – Faculdade Federal de
Rio das Ostras.

Aprovada em ____/____/_______

BANCA EXAMINADORA

Profº Dr. Wanderson Fábio de Melo


Professor Orientador
Universidade Federal Fluminense

Profª Drª Maria Raimunda Penha Soares


1º Examinador
Universidade Federal Fluminense

Profº Dr. Edson Teixeira da Silva Júnior


2º Examinador
Universidade Federal Fluminense
DEDICATÓRIA
Dedico este trabalho à minha mãe Estelita Maria Gomes
da Silva (in memorian) e minha bisavó Maria Estelita de Araújo
(in memorian). Minha eterna gratidão pela sublimidade do amor
dessas mulheres por mim.
Durante o tempo em que estive elaborando este trabalho,
sobre as mulheres trabalhadoras, principalmente as do meado
do século XX, tinha viva em minha memória fatos sobre a vida
dessas duas mulheres também trabalhadoras, operárias,
oprimidas e exploradas. Em suas muitas jornadas de trabalho,
ainda que tenham sido banhadas com lágrimas ou risos, elas
nunca desistiram. A música Maria, Maria, de Milton nascimento
é um tributo que presto a essas duas Marias: “mas é preciso ter
força, é preciso ter raça, é preciso ter gana, [...] é preciso ter
sonho sempre. Quem traz na pele essa marca possui a mania
de ter fé na vida”. Por isso não as esqueci, por isso não desisti.
Hoje dormem nos braços do Pai Celestial que assim diz: “pois
que com amor eterno te amei e com amorável benignidade te
atraí”. (Jeremias 31:3)
Obrigada, Mães!...
AGRADECIMENTO
AGRADECIMENTOS

À DEUS, Único, Santo e Verdadeiro, a ELE toda a glória, louvor e honra.


Ao meu pai, Águino, com quem tenho aprendido que em meio a qualquer situação,
em tudo dar graças a Deus. Obrigada, pai!
Ao Celso, esposo, pelo valioso apoio manifestado para que eu pudesse concretizar
este sonho. Deus o abençoe!
À minha irmã Sônia e meu sobrinho Igor com quem sempre pude contar, em todos
os momentos e tenho a alegria de estar junto.
Às amigas e amigos da Igreja de Nova Vida Campo Grande, que oraram por mim e
pela alegria com que sempre me recebem quando estou no Rio. “Há amigos mais
chegados que irmãos”. (Prov. 18:24)
As amigas, Valéria pela paciência e orientação; Ana Quele, amiga da longa jornada,
(sala de aula, seminários, prova em dupla, campo de estágio, trabalhos extras e
outras coisinhas mais, ufa!...); Ester, amiga socorrista, amiga de passeatas e
manifestações, amiga de bate-papo Ao amigo Rafael de longas conversas e risadas.
Obrigada por “co-laborarem” nas entrevistas na Infraero. Ao Rodrigo, colega de
curso. Obrigada pelo empenho nos contatos na plataforma.
Às amizades verdadeiras, construídas ao longo do curso. Estas permanecem, com
certeza. “Qualquer dia [...] a gente vai se encontrar...” (Milton Nascimento)
Ao Assistente Social, Lenon A. de Matos, meu supervisor de campo de estágio.
Obrigada pela oportunidade de conviver com um profissional competente, íntegro e
amigo. A sua supervisão foi importante para a minha formação profissional.
Ao Mestre, Profº Dr. Wanderson Fábio de Melo, orientador deste Trabalho de
Conclusão de Curso e mentor da temática desta monografia. Pelo carinho,
compreensão e incentivo, minha gratidão.
Aos docentes da Banca Examinadora, Maria Raimunda P. Soares e Edson T. S.
Júnior e em especial à docente Fábia Mônica Souza.
E, finalmente, uma homenagem muito especial aos meus queridos filhos Alexsandro
e Celso Jr., aos meus queridos netos Gabriel, Lucas, Júlia e Beatriz (tá chegando) e
às minhas noras Vanessa e Monique. Com amor e carinho dedico esta página da
minha história, que vai além do diploma de bacharel. A certeza de que, na vida, os
pequenos começos sempre nos levam a grandes realizações.
“Quero um dia dizer às pessoas que nada foi em vão. Que o amor
existe e que vale a pena se dar às amizades e às pessoas. Que a
vida é bela sim, que eu sempre dei o melhor de mim e que valeu a
pena!”
(Mário Quintana)
RESUMO
RESUMO

O presente Trabalho de Conclusão de Curso tem como principal objetivo traçar


um panorama geral da trajetória histórica das mulheres nos espaços operacionais
masculinos das plataformas petrolíferas offshore.
Dessa forma, buscou-se discorrer sobre o acesso das mulheres nos postos
avançados de trabalhos em tecnologias de ponta nas indústrias petrolíferas e
como esses novos arranjos na relação capital/trabalho, a partir da modernização
tecnológicas do processo produtivo, tem afetado a vida dessas profissionais que,
de certa forma, tem alterado o rumo das práticas discursivas sobre a separação
de espaços laborais exclusivos denominados “masculinos e femininos”, que
prevalece desde o princípio da industrialização no mundo do trabalho.

Palavras-chaves: Feminização no sistema offshore, Trabalho, Gênero.


ABSTRACT

This Labor Completion of course has as main objective to trace an overview of the
historical trajectory of women in positions of male operating offshore oil platforms.
Thus, we sought to discuss women's access to the outposts of work on cutting
edge technologies in the oil and how these new arrangements in the capital / labor
ratio, from the technological modernization of the production process, has affected
the lives of these professionals that, somehow, have changed the course of
discursive practices on the separation of labor exclusive spaces called "male and
female", which has prevailed since the beginning of industrialization in the working
world.

Keywords: Feminization in offshore system, Labor, Gender.


SUMÁRIO

SUMÁRIO

INTRODUÇÃO......................................................................................................10

CAPÍTULO I: ABORDAGEM DE GÊNERO – A consideração da historicidade na


produção das relações sociais............................................................ 14
1.1 Conceito de gênero: Debates acerca das diferentes perspectivas........14
1.2 Relações de gênero e suas representações...........................................16
1.3 Esfera pública versus Esfera privada......................................................17

CAPÍTULO II: O TRABALHO, SUAS DETERMINAÇÕES E AS CONDIÇÕES DO


TRABALHO FEMININO.................................................................................... 19
2.1 As novas configurações no mundo do trabalho......................................19
2.2 Mulher e Trabalho..................................................................................22
2.3 A permanência da desvalorização do trabalho feminino e a precariedade
das condições.......................................................................................................29

CAPÍTULO III: A FEMINIZAÇÃO DO TRABALHO NO CENÁRIO OFFSHORE DE


PETRÓLEO............................................................................................................5
3.1 Offshore: o petróleo no Brasil e a tecnologia de ponta sobre cidades
flutuantes................................................................................................................35
3.1.1 Relevância e impactos sobre a região de Macaé, “O El dourado
brasileiro”........................................................................................................ 38
3.2 A inserção feminina nas plataformas petrolíferas...................................40

CONCLUSÃO........................................................................................................52

REFERÊNCIAS......................................................................................................7

ANEXO I................................................................................................................60
ANEXO II..............................................................................................................62
ANEXO III.............................................................................................................70

INTRODUÇÃO
10

INTRODUÇÃO

Este trabalho tem como objetivo traçar um plano geral sobre a inserção
feminina nos espaços de trabalho, das indústrias de petróleo, nas plataformas
offshore (designação para atividade petrolífera em alto mar). Nesse aspecto
pretende-se também elencar a questão da emancipação e exploração das mulheres
nos campos de trabalho das empresas de prospecção e produção de petróleo. Uma
pergunta que não quer calar. De fato houve a emancipação das mulheres através do
trabalho ou ainda permanecem debaixo do jugo da dominação e exploração? Para
buscar entender essa temática foi necessário fazer uma trajetória, ainda que curta,
pelo início da história da divisão social e sexual do trabalho.
A mulher tem sua participação na esfera do trabalho desde a primeira
formação social. O trabalho feminino já se fazia presente na esfera reprodutiva,
contribuindo para o desenvolvimento do trabalho produtivo. O advento da
maquinaria nas indústrias marcou, ainda que de forma tímida, o êxodo das mulheres
do trabalho restrito, do âmbito doméstico, para dentro das fábricas.
Historicamente, a participação feminina no mercado de trabalho, no início da
industrialização, foi influenciada tanto pela sua condição social como também pela
condição de seu gênero e, portanto, pautado, na maioria das vezes, pela
invisibilidade. No entanto, as novas configurações no mundo do trabalho, a partir dos
grandes avanços tecnológicos, decorrentes da reestruturação produtiva, intensificou
de modo significativo, o ingresso da mulher no mercado de trabalho.
Nesse sentido as mulheres estão tomando assento e ressaltando seus
lugares no cenário econômico em curso, adentrando em diversos setores
organizacionais, inclusive nos espaços masculinos, recortados por resistências e
antagonismos contra a presença feminina, como no caso do trabalho offshore.
O mundo do trabalho offshore é, por suas características, um tema instigante,
dado o sistema de trabalho que se processa num regime de enclausuramento e de
alto risco. Muito mais instigante quando as mulheres, desde o final da década de
1980, começaram a buscar sua ascensão profissional e igualdade de oportunidades,
nesse espaço, até então majoritariamente masculino.
Dentro da perspectiva do trabalho nas plataformas de petróleo, a pesquisa
voltou-se para um grupo específico de trabalhadores offshore, as mulheres. Assim,
11

para adentrar nesse mundo buscou-se conhecer a história de algumas dessas


mulheres através de seus próprios relatos.
O processo de elaboração deste trabalho evidenciou-se de maneira difícil,
dada a escassez de material bibliográfico a respeito do assunto. A metodologia
aplicada para a pesquisa baseou-se nas técnicas e instrumentos operativos
articulados às teorias e métodos no intuito de investigar a realidade a ser
pesquisada. Portanto, para orientar este trabalho, foram utilizados trabalhos
bibliográficos, como: livros, artigos e documentos extraídos de fontes eletrônicas,
como aportes teóricos para os Capítulos I e II. Para o Capítulo III foi utilizado como
instrumento de pesquisa as entrevistas individuais, semiestruturadas, que servem de
material empírico para fundamentar a análise, de modo a propiciar maior
aproximação do pesquisador com o tema proposto.
O Trabalho de Conclusão do Curso, portanto, está estruturado em três
capítulos, da seguinte forma.
O Capítulo I trata, de forma sucinta, da abordagem de gênero sob uma
perspectiva sócio-histórica. A leitura do conceito de gênero é um pano de fundo para
se descortinar as desigualdades históricas, postas nas relações que envolvem a
diferença biológica entre o masculino e o feminino nas esferas públicas e privadas.
Posteriormente, no Capítulo II, busca-se fazer um breve resgate acerca do
trabalho e seu desenvolvimento ao longo da história, abarcando os seguintes itens:
As novas configurações no mundo do trabalho, que trata da complexidade do
sistema capitalista provocando profundas transformações na estrutura econômica,
política e social, implicando na formação de uma sociedade global; Mulher e
Trabalho, a forma como se deu o acesso da mulher nos espaços produtivos e
acesso aos direitos trabalhistas; Gráficos demonstrativos dos ganhos diferenciados
entre homens e mulheres e da ocupação da mulher no mercado de trabalho no
presente século.
Com o Capítulo III finaliza-se o teor de pesquisa monográfica deste trabalho,
em que se procura apontar as especificidades do trabalho das mulheres em regime
de confinamento a bordo, mais especificamente em plataformas de petróleo
offshore. Neste capítulo busca-se averiguar a trajetória da crescente presença das
mulheres nos espaços operacionais de trabalho masculino offshore bem como
entender as configurações de relação de gênero e poder existentes nesse ambiente.
12

Para a compreensão desse rico universo foi necessário utilizar-se dos


recursos de entrevistas individuais, gravadas e transcritas na íntegra. O enfoque
dado para as entrevistas pautou-se no aspecto qualitativo como o mais adequado.
O local proposto para a realização das entrevistas foi o aeroporto da
Infraero, em Macaé, com abordagens diretas às mulheres, nos pequenos intervalos
de tempo entre o check in e o embarque. Participaram das entrevistas 15 (quinze)
profissionais do regime offshore em plataformas, 12 (doze) dos quais são mulheres
e 03 (três) homens. Como forma de preservar suas identidades, todos foram
nomeados pelas iniciais do nome e função que exerce na empresa. Para as
entrevistas foi utilizado um roteiro de questionários, pré-elaborado, com 27 (vinte e
sete) perguntas, abrangendo a identificação pessoal e identificação profissional .
No primeiro momento da abordagem a entrevistadora identifica-se e esclarece
o motivo da abordagem. Como não poderia deixar de ser, o local onde foram
realizadas as entrevistas, o saguão do aeroporto, dado a atividade de trabalho
contínuo nas plataformas, constitui-se em um espaço de circulação constante e
intenso para embarque e desembarque dos trabalhadores. Contabiliza-se uma
média constante, de entradas e saídas, de duzentos homens/dia para um percentual
de menos de 10% de mulheres. Algumas das entrevistadas, por falta de tempo,
responderam o roteiro de entrevista via e-mail. Como complemento das entrevistas,
três homens, de empresas distintas, contribuíram com depoimentos, através de suas
lentes de percepção masculina, sobre a relação de trabalho das mulheres e com as
mulheres.
Como todo o trabalho, de início se apresenta como prescrito com condições
determinadas da tarefa. No desenrolar da atividade real do trabalho, posto pela
ergonomia, é que mediante os eventos aleatórios da variabilidade do acontecendo
da vida, onde o humano se engaja com sua inteligência, psiquismo, afetividade e
outros elementos intrínsecos da atividade humana, mudam-se os rumos do prescrito
e o que poderia ser já não é mais. (Borges, 2004)
A princípio, como definição de trabalho, previamente estabelecido, a pesquisa
abarcava apenas as entrevistas com mulheres que trabalham embarcadas mas foi
no acontecendo da atividade humana que surgiu, de modo espontâneo e dinâmico,
a participação dos entrevistados, homens, contribuindo com um rico material para a
realização deste trabalho monográfico.
13

CAPÍTULOS
I, II, III
14

CAPÍTULO I: ABORDAGEM DE GÊNERO – A consideração da historicidade na


produção das relações sociais.

A partir dos anos 70 estudiosos e pesquisadores, identificados com o campo


das ciências sociais, se debruçaram, de forma mais aprofundada, nos estudos sobre
as configurações de gênero a fim de averiguar as novas problemáticas relativas às
relações sociais no âmbito organizacional na fase da reestruturação produtiva e da
globalização.
Neste primeiro capítulo tem-se por pretensão tratar das questões referentes à
situação da mulher, baseadas nas diferenças sexuais, no contexto privado e público
e utilizá-lo como parte introdutória do trabalho monográfico sobre a inserção
feminina na esfera de trabalho offshore, considerado, ainda nos dias atuais, como
um espaço majoritariamente masculino. Para tanto é necessário trazer à baila, neste
primeiro momento, a discussão sobre a relação de gênero, uma vez que ainda se
verifica nos espaços produtivos, a despeito das evoluções no campo de estudos e
dos avanços emancipatórios dos movimentos feministas, um ranço preconceituoso
contra o trabalho feminino fora da esfera doméstica.

1.1 O CONCEITO DE GÊNERO: DEBATES ACERCA DE DIFERENTES


PERSPECTIVAS

Embora não se possa conceber uma época certa para a definição do termo
gênero, fato é que para se definir gênero e sua relação, desde as primeiras
formações sociais, é necessário buscar nas suas origens as principais tendências e
enfoques de estudos sobre essa categoria, a partir de abordagens apresentadas por
alguns estudiosos que debatem acerca do termo. Dentre vários autores do campo
da sociologia e do campo da antropologia que se debruçam sobre a tematização, no
que diz respeito à categoria gênero, pode-se constatar um desdobramento de
prismas variados de análise.
As primeiras abordagens sobre o termo “gênero” se referiam às
características biológicas baseadas, principalmente, nas diferenças perceptivas
entre os sexos, conceito este que será muito debatido, séculos mais tarde, pelas
feministas na década de 1970. Com a evolução dos vários enfoques e debates
15

sobre o termo gênero surgem outros significados com ênfase no caráter social e
relacional da categoria que Almeida define como uma categoria social e
historicamente construída. (ALMEIDA, 2007)
Dentre as várias discussões sobre gênero Puppin (2001) relata que é na
tradição sociológica que se travou um profundo debate sobre a tematização das
diferenças entre homens e mulheres, resultando daí o conceito de gênero. Segundo
a autora tal tradição se constituiu de forma histórico-cronológica, que remonta ao
século XV, conforme configuração do que se convencionou chamar de “Querelle des
Femmes” (movimento pela paridade de representação igualitária entre homens e
mulheres nas instâncias decisórias das assembléias). Esse fato viria culminar na
conjuntura revolucionária, cujos valores políticos de “liberdade, igualdade e
fraternidade” se explicitaram na França do século XVIII. (PUPPIN, 2001)
Baseada no processo histórico das naturezas homem e mulher, Marianne
Weber (1991), é veemente na sua abordagem crítica da perspectiva essencialista
quanto às características que adjetivam os papéis embutidos nas diferenças da
separação entre masculino e feminino. Segunda essa perspectiva tais diferenças
expressariam uma separação entre cultura masculina e cultura feminina, estando a
primeira associada à cultura objetiva enquanto a segunda à cultura subjetiva. Para
Weber nem a objetividade e a racionalidade são específicas dos homens como
também a intuição, espontaneidade e capacidade de comunicação são
exclusivamente femininas e acrescenta que tanto o homem pode carregar em si uma
cultura subjetiva quanto à mulher trazer uma participação feminina na cultura
objetiva. (WEBER, 1991 apud PUPPIN, 2001).
De acordo com Almeida, duas grandes tendências teóricas de estudos de
gênero contribuíram para a ramificação do debate nesse campo: a concepção
francesa e a concepção anglo-saxônica. Para as autoras francesas a categoria
gênero não se enquadra no seu quadro teórico uma vez que discordam do debate
das feministas anglo-saxãs quando concebem gênero nas características biológicas
de cada sexo, logo, natural e invariante. Dessa forma, na crítica das feministas
francesas, justifica-se “a ausência de poder das mulheres por suas diferenças
anatômicas e fisiológicas” submetidas às “regras do jogo patriarcal”. (ALMEIDA,
2007, p.230).
No Brasil, o campo de estudos de gênero, desde a década de 1990, passou
a ser influenciado pelas tendências teóricas de origem anglo-saxônica, que
16

contribuíram com debates importantes sobre as tendências conceituais de gênero


enquanto categoria social fundada sobre as diferenças percebidas entre os sexos.
(ALMEIDA, 2007)

1.2 RELAÇÕES DE GÊNERO E SUAS REPRESENTAÇÕES

A concepção de gênero, na construção da identidade do sujeito, é formada,


historicamente, desde a sua infância, uma vez que é nesta fase que lhe são
ensinadas e reforçadas noções de comportamentos no dinâmico processo de
socialização. Cabe ressaltar que a inserção de gênero no conjunto das relações
sociais são fundantes e estruturadoras da vida social uma vez que, para toda a
produção e reprodução social da existência implicou, e implica, na intervenção
conjunta de dois gêneros: masculino e feminino. Nas suas várias representações,
quer sejam de classes, gênero ou etno-raciais são permeadas de lutas e embates,
onde se observa componentes que ao mesmo tempo são competitivos e
complementares, ou seja, o conjunto de imagens e lugares constituídos será
disputado por homens e mulheres, em cada contexto histórico, de acordo com a
diferenciação cultural, política, ideológica e econômica. (ALMEIDA, 2007)
Para Almeida, no campo de forças, os sujeitos nas relações sociais
determinam e sofrem ações dos sujeitos, individuais e/ou coletivos, possibilitando-os
a construção de identidades sociais e o desenvolvimento de formas de sociabilidade
que serão traduzidas em práticas materiais, dentro dos espaços institucionais
(família, escola, igreja, etc.) e simbólicas, dimensão que favorece o exercício da
dominação e da exploração como também favorece a construção de novas
referências e alianças. A partir desses determinantes que, segundo a autora, se
forma um novo sujeito, criado como ser histórico e social dotado de sentidos e
potencialidades humanas e, portanto, um produto da ação recíproca das
combinações e estruturas autônomas. (ALMEIDA, 2007)
Saffioti esclarece que é através da dinâmica das relações sociais que se dá a
construção dos gêneros, pois que é nessa dinâmica de interação de uns com os
outros que se percebe a totalidade do ser humano, formada pelo conjunto de corpo,
intelecto, emoção e outros aspectos atribuídos ao sujeito e que, embora, na dada
relação social são perpassadas por antagonismos e contradições não retira do
indivíduo a sua identidade pessoal. (SAFFIOTI, 1992)
17

Segundo Kergoat, não podemos, entretanto, dissociar as relações de gênero


das relações de classe, uma vez que são extensivas e que, portanto, devem ser
analisadas em conjunto, pois todos os indivíduos, dentro dessa relação, são homens
e mulheres. Dessa forma, conforme Saffioti afirma: a complexitude e o paralelelismo
dos três ordenamentos sociais, classe; gênero e etno/racial, embora antagônicos, se
entrelaçam de “modo a formar um nó”, dentro de uma lógica contraditória que estão
postas na sociedade. (KERGOAT, 1996; SAFFIOTI, 1997).
Para Scott “gênero deve ser estudado em todos os domínios da vida social
dada as suas imbricações com o poder” e dessa forma, portanto, “torna-se envolvido
na concepção e na construção do poder em si mesmo”, ou seja, se constrói e se
reconstrói, reafirmando a autora que gênero é um crivo que possibilita a
decodificação do sentido e da complexidade das relações sociais. (SCOTT, 1990,
p.16).
Em suma, as relações de gênero se estabelecem dentro de um sistema
hierárquico que dá lugar a relações de poder, hegemonicamente traduzido em um
consenso generalizado, que visa a favorecer as decisões masculinas em função dos
interesses subjacentes nas esferas públicas.

1.3 ESFERA PÚBLICA VERSUS ESFERA PRIVADA

De acordo com Almeida, os valores, determinados culturalmente, são (im)


postos ao indivíduo para que este cumpra com o seu papel no lugar pré-definido que
lhe cabe na sociedade. Tais valores tem como base a divisão sexista na sociedade
patriarcal em que se estabeleceu que a figura masculina é mais importante e estava
na centralidade dos estames familiares, do Estado, do trabalho, etc.(ALMEIDA,
2007)
Nessa perspectiva Almeida afirma que embora gênero não constitua um
campo específico de estudo ainda assim é “uma categoria que potencializa a
apreensão da complexidade das relações sociais” que fundamentam a organização
da vida social e que, ao longo da história, observa-se a estruturação de lugares
sociais sexuados contribuindo, dessa forma, para as dicotomias, público x privado,
produção x reprodução, político x pessoal, podendo verificar essa dicotomia “na
base da dissimulação ou ocultamento da divisão do trabalho”. (idem, p.232). Almeida
esclarece, ainda que os lugares definidos para público/produção são relacionados
18

aos homens e privado/reprodução assegurados como o lugar destinado à mulher


para a realização do trabalho gratuito e invisível, no âmbito doméstico definindo
como “trabalho para si, sobretudo para os outros, em nome de uma ordem natural ou
de uma ordem de registro afetivo”. (KERGOAT, 2004 apud ALMEIDA, 2007, p.234).
Tais atividades revelam a existência de espaços sociais distintos, de
circulação, de cada um dos gêneros, mas que se imbricam de tal forma que resultam
em duas esferas: esfera de sobrevivência (doméstica) e esfera de transcendência
(pública). Segundo Kergoat, estas esferas acabam por se apoiar nos princípios da
separação (trabalho feminino e trabalho masculino) e da hierarquização (maior
valorização do trabalho masculino), e que cada uma delas recebe sua escala de
valor. Observa-se, dessa forma que, quando uma atividade é mais valorizada
socialmente, logo é o homem quem a exerce, sendo priorizado nas esferas políticas,
econômicas, tecnológicas e científicas, tendo como apoio a lógica discriminatória da
separação e da hierarquização nas esferas, masculinas e femininas. (KERGOAT,
2004 apud ALMEIDA, 2007)
19

CAPÍTULO II: O TRABALHO, SUAS DETERMINAÇÕES E CONSIDERAÇÃO DA


HISTORICIDADE NA PRODUÇÃO DAS RELAÇÕES SOCIAIS.

A categoria trabalho sempre teve seu lugar na história do desenvolvimento da


humanidade, pois como tal, é tida como aspecto ontológico que distingue o ser
social da natureza. Segundo Marx, em “O capital” (1983), o trabalho é uma categoria
fundante, pressuposto para a existência do homem, uma vez que é através dele, do
trabalho, que o homem se realiza e satisfaz suas necessidades. No processo de
dupla transformação, na relação entre homem e natureza, o homem se humaniza,
tornando-se um ser social, cuja concepção de sociabilidade só se dá através do
trabalho. Por causa de sua capacidade teleológica, de prever resultados antes de
executar sua ação, é que o homem pode se diferenciar dos outros seres vivos. Tal
processo é o que, segundo Marx, o diferencia das atividades engendradas pela
melhor abelha quando comparada às atividades do pior arquiteto. (MARX, 1983)
Portanto, o trabalho é uma atividade fundamental para o homem, pois é
através do trabalho que o homem não só se afirma como ser social como também
dá resposta prática - consciente às suas necessidades. (idem)
Neste capítulo pretende-se trazer à pauta aspectos principais das novas
configurações no mundo do trabalho, mais especificamente nos séculos XX e XXI.
Como locus privilegiado deste trabalho busca-se elencar a trajetória do trabalho da
mulher e a sua inserção no contexto da esfera pública a partir da industrialização
bem como as contingências a que eram expostas no ambiente interno e externo das
fábricas, dos estigmas e explorações a que eram sujeitas. Este capítulo, enquanto
panorama geral do mundo do trabalho é a “entrée” (entrada) do cardápio para o
prato principal, cujo tema versa sobre a “feminização” na esfera de trabalho offshore
em plataformas petrolíferas, tema este que será aprofundado no capítulo III.

2.1 AS NOVAS CONFIGURAÇÕES NO MUNDO DO TRABALHO

Dentre todas as organizações sociais, desde o início da sua formação, a


sociedade capitalista é a mais complexificada, uma vez que as suas relações são
mais abrangentes.
O modo de produção capitalista foi, sem dúvida, um marco na história da
humanidade. Teve sua origem no século XV, mas foi com a Primeira Revolução
20

Industrial, com o advento da maquinaria, que ocorreu uma verdadeira revolução na


produção. O principal palco dessas transformações foi na Inglaterra do século XVIII,
onde predominava a ideologia liberal. Segundo Hobsbawm, a Revolução Industrial
não foi “uma mera aceleração do crescimento econômico, mas uma aceleração de
crescimento em virtude das transformações econômicas e sociais” cuja ocorrência
se dá dentro de uma economia voltada para e através do capital. (HOBSBAWN,
1979 apud NOGUEIRA, 2004, p.9)
Diferente das sociedades anteriores, a sociedade capitalista trouxe, desde a
sua gênese, grandes mudanças no mundo, a começar pela Europa. No que diz
respeito à noção do trabalho o capitalismo fez emergir modelos sociais distintos na
sociedade: classe burguesa e classe trabalhadora, configurando-se, desde então,
numa divisão de classes antagônicas, prevalentes desse modo de produção.
No marco das mudanças nas esferas de produção, ao longo da história do
capitalismo, o modelo de produção toyotista, a partir das décadas de 1970/1980, foi
o divisor de águas para o capital, uma vez que trouxe profundas transformações na
estrutura econômica, política e social, implicando na formação de uma sociedade
global. Como forma de superar a crise estrutural e recuperar sua hegemonia no
cenário mundial, nos anos de 1970 o capital precisou implementar estratégias
visando restabelecer o seu crescimento. (SILVA, 2009)
De acordo com Ianni, essa nova estrutura social rompeu as fronteiras
geográficas, ocasionando um processo de externalização nos dois principais blocos
do trabalho: o da esfera produtiva e o da transferência de responsabilidades com os
encargos sociais e trabalhistas. Pautado pela desterritorialização dos espaços de
origem e uma reterritorialização de novos espaços e horizontes, de fato, com a
reestruturação produtiva, houve um deslocamento do trabalho interno, do chão da
fábrica, para outros espaços externos, fragmentando-se, desse modo, o trabalho
coletivo. Esse processo de produção globalizado, presente na orientação social e
econômica, segundo Ianni, fez com que as relações entre capital e trabalho fossem
entendidas como um modelo funcional e eficaz. (IANNI, 1988)
Com a introdução de novas tecnologias e inovações no processo produtivo
estabeleceu-se novos arranjos na relação capital/trabalho, exigindo-se uma nova
ética, necessária nessa relação. A filosofia passa a ser determinada “pelas novas
formas de domínio do capital sobre o trabalho, realizando uma reforma intelectual e
moral, visando à construção de outra cultura do trabalho [...]”. No âmbito interno da
21

fábrica, a exigência por trabalhadores mais qualificados e flexíveis contribuiu para a


concorrência, desestabilizando o coletivo em prol do individualismo. (MOTA, 2006, p.
29)
Nesse aspecto observa-se que, a partir desse modelo de produção, a
subjetividade do trabalhador tem sido construída numa perspectiva ideológica, pré-
estabelecida, voltada para atender às determinações (im)postas pelo capital. Essa
subjetividade do indivíduo tende a construir um trabalhador dinâmico, ativo, executor
das atividades técnicas e empreendedora o que, primordialmente, ajuda a criar e
alavancar o potencial da empresa. Como ideologia da empresa o trabalhador que
lhe interessa deve ser multifuncional e polivalente.
A captura, nesses moldes, da subjetividade do trabalhador se dá de tal forma
que ele não se dá conta das reais condições de trabalho a que está submetido.
As mudanças estruturais no mundo do trabalho pautaram pela reorganização
das relações de trabalho e pela possibilidade do seu desaparecimento na forma
como o foi concebido desde a primeira revolução industrial. Toda a tecnologia e
informatização, exponenciada com a reestruturação produtiva, foi substituindo o
lugar do trabalhador no chão da fábrica e eliminando os postos de trabalho que a
robotização “apareceu ao capital como o sonho de uma fábrica sem operários”.
(REVELLI, 1989 apud COCCO, 2012).
Como não podia deixar de ser, a reestruturação produtiva aportou no cenário
brasileiro nas décadas de 1980/1990, redefinindo, ainda que tardiamente, o
processo de produção nas indústrias por meio da automação e informatização. À
exemplo dos outros países que adotaram o modo de produção flexível, o
desemprego no Brasil acabou por afetar um grande contingente de trabalhadores.
Para Mota afirma que:

A marca da reestruturação produtiva no Brasil é a redução de postos


de trabalho, o desemprego dos trabalhadores do núcleo organizado
da economia e a sua transformação em trabalhadores por conta
própria, trabalhadores sem carteira assinada, desempregados
abertos, desempregados ocultos por trabalhos precários, desalento,
etc.(Mota, 2006, p.35)

E ainda acrescenta,
22

Expressão particular de um movimento internacional, marcado pela


globalização e pela difusão do pensamento neoliberal, esta
estratégia consolida-se no Brasil como estruturadora de uma cultura
moderna, tendo como principais vetores a competência e a eficiência
do setor privado, a (des)responsabilização do Estado com a proteção
do trabalho, a empregabilidade e as parcerias do capital com o
trabalho, concretizando a difusão massiva de ideias e valores que
reconceituam as reivindicações e conquistas históricas das classes
trabalhadoras. (idem)

É importante esclarecer que o Brasil, nesse contexto, sofre impactos


significativos com a desregulamentação e as novas formas de gestão da força de
trabalho e precisa se adequar às exigências do capital internacional. Para isso busca
o caminho mais curto e viável para o capital através das políticas monetárias
neoliberais de privatizações, muito bem articulado com os órgãos multilaterais
internacionais como: FMI (Fundo Monetário Internacional) e Banco Mundial. Estas
articulações feitas primeiramente no governo do então presidente Fernando Affonso
Color de Melo e a posteriori, Fernando Henrique Cardoso, acabaram por refletir nos
processos de trabalho, nas relações de trabalho e na subjetividade dos
trabalhadores, ou seja, aprofundou de modo mais árduo, o caminho para a
terceirização e, consequentemente, para a precarização do trabalho.

2.2 MULHER E TRABALHO

Os períodos que antecederam as revoluções industriais se caracterizaram


pela escassez de relatos sobre a condição do trabalho feminino. Porém, de acordo
com Nogueira, a divisão sexual e social do trabalho já se fazia presente muitos antes
da Era Cristã. Tanto o trabalho da mulher livre quanto da escrava se restringia à
esfera doméstica, responsável pela manutenção da subsistência de toda a família.
Dessa forma as mulheres estavam destinadas pelo seu lugar e deveres na
sociedade. (NOGUEIRA, 2004)
Da mesma forma, sobre os papéis destinados aos homens e mulheres,
Lutero demonstra a visão sobre a mulher no início da modernidade, quando disse:

Os homens tem tórax grande e largo, quadris estreitos e mais


entendimento que as mulheres, que tem tórax pequeno e estreito e
quadris largos. Isto significa que elas devem ficar em casa,
sentarem-se quietas, cuidar do lar e gerar e criar crianças. (Lutero,
1531 apud Thomas, 2010, p.4)
23

De acordo com a citação acima, opiniões como essas serviam para designar
as funções laborativas as quais, obrigatoriamente, eram adequadas a cada um,
segundo o pensamento sexista e patriarcal.
Mediante esse relato pode-se compreender que é no seio da família onde se
manifesta a primeira divisão social do trabalho, delegando funções distintas,
femininas e masculinas, que dessa forma deu início à divisão sexual do trabalho.
Engels enfatiza que o primeiro antagonismo de classes surgiu na história a partir do
antagonismo entre o homem e a mulher na concepção monogâmica do casamento.
Para ele, se por um lado a monogamia contribuiu para o progresso histórico por
outro lado fez com que se iniciasse a escravidão e as riquezas privadas, fatos que
perduram até os dias atuais, o que significa, segundo Engels, que o progresso
simultaneamente traz consigo um relativo retrocesso. (ENGELS, 1980)
Para Hirata & Kergoat, “a divisão sexual do trabalho deve ser compreendida
como uma conceitualização na qual as situações dos homens e das mulheres não
são o produto de um destino biológico, mas antes construções sociais”. Segundo as
autoras esses dois grupos estão engajados nas relações sociais de sexo e como tal
“tem uma base material dada pelo trabalho e se expressam através da divisão social
do trabalho entre os sexos”. A autora ainda acrescenta que “a divisão sexual do
trabalho é a forma de divisão do trabalho social que decorre das relações sociais de
sexo, sendo modulada histórica e socialmente”. Portanto, essa modulação “confere
uma designação prioritária dos homens à esfera produtiva e das mulheres à esfera
reprodutiva, e simultaneamente, a apropriação pelos homens das funções com valor
social adicionado”. (HIRATA & KERGOAT, 2007, p.599)
Kergoat relata que de forma particular a divisão social do trabalho tem dois
princípios organizadores: o princípio de separação (trabalhos de homens e trabalhos
de mulheres) e o princípio hierárquico (um trabalho de homem vale mais que um
trabalho de mulher). Segundo a autora, esses princípios dizem respeito à ideologia
naturalista que “rebaixa o gênero ao sexo biológico, reduz as práticas sociais a
“papéis sociais” sexuados que remetem ao destino natural da espécie”. ((HIRATA &
KERGOAT, 2007, p.599)
Tais princípios reforçam o modelo de patriarcado e da discriminação, do início
da humanidade, ainda verificada nas relações sociais de trabalho.
Segundo Scott, a Idade Moderna, entre os séculos XVI e XVIII, traz em seu
bojo a expansão do trabalho feminino. As mulheres buscavam fora do domicílio
24

doméstico atividades remuneradas como vendedoras nos mercados, ambulantes ou


em atividades temporárias, como domésticas em outras casas e até mesmo no setor
fabril e outros. A duplicidade dos papéis da mulher, como a feminilidade e a
produtividade gerou vários questionamentos e também provocou modificações de tal
forma que acentuou as desigualdades sociais. (SCOTT, 1994)
No século XIX, com o desenvolvimento da Revolução Industrial abre-se
caminho para as mulheres que quisessem participar como trabalhadoras
assalariadas, na indústria. Como imposição dos empregadores, teriam que abdicar-
se das suas obrigações domésticas. Ainda assim, de acordo com Nogueira, “foi com
o desenvolvimento industrial, que ocorreu uma ênfase na transferência da produção
da mulher no espaço do lar para a fábrica”. Assim se verifica a inserção de um
grande contingente feminino no trabalho industrial, uma vez que a maquinaria
dispensava o uso da força muscular. (NOGUEIRA, 2004, p. 23)
Ainda que se vislumbrasse, no final do século XIX novos espaços de trabalho
para as mulheres, as diferenças salariais entre trabalhador e trabalhadora se
mostravam uma realidade. As mulheres continuavam a serem menos remuneradas
por seus trabalhos em relação aos homens. A inferioridade determinada para o
trabalho da mulher, de forma generalizada, tinha influência sobre o seu salário. Rago
se reporta aos aspectos culturais dessa época, em que o trabalho das mulheres
executado na esfera doméstica era considerado como um trabalho de papel
secundário e, portanto, menos valorizado. Dessa forma os empregadores se
utilizavam dessa primicia para justificar o pagamento de salários mais baixo do que
os dos homens, mesmo as mulheres exercendo, muitas vezes, dentro das fábricas,
a mesma função dos homens. Observa-se, nesses moldes, a exploração a que as
mulheres eram sujeitas. (RAGO, 2007)
Nogueira relata que nessa época havia uma forte indicação de que a força de
trabalho era “sexualmente segregada”, constatando-se a existência prévia de uma
“natural divisão sexual do trabalho”. Por outro lado, segundo a autora, os sindicatos
procuravam proteger os empregos e os salários dos trabalhadores e em
contrapartida mantinham as mulheres afastadas do mercado de trabalho por longo
período. As pautas de discussões dos sindicatos não levavam em conta as
reivindicações das mulheres trabalhadoras a ponto de considerá-las como uma
ameaça, o que levou as mulheres, muitas vezes, a se organizarem entre elas. A
autora ao refletir sobre o papel da mulher no decorrer da história, no seu modo de
25

entender diz que: “autores que discutem o tema sobre a inserção da mulher no
mundo do trabalho reduzem a problemática da mulher trabalhadora a uma relação
polarizada entre homens e mulheres” (NOGUEIRA, 2004, p.16)
Dentro dessa mesma lógica de pensamento, Saffioti afirma que a própria
organização da sociedade obstrui a plena emancipação da mulher e ainda
acrescenta,

As barreiras que a sociedade de classes coloca à integração social


da mulher, todavia, não apresenta, no seu aparecimento e vigência,
muita uniformidade. Na medida em que esses obstáculos são
regulados pelas necessidades da ordem imperante na sociedade
competitiva e não pela necessidade que porventura tenham as
mulheres de se realizar através do trabalho, as oportunidades sociais
oferecidas aos contingentes femininos variam em função da fase de
desenvolvimento do tipo social em questão ou, em outros termos, do
estádio de desenvolvimento atingido por suas forças produtivas.
(Saffioti, 1976, p.35-36)

Nesse aspecto, Thomas é veemente quando critica as desigualdades e


discriminações sofridas pelas mulheres, nas esferas produtivas. Para ela as críticas
revelavam e ainda revelam um discurso intolerante da sociedade burguesa contra as
mulheres quando estas perceberam a necessidade de sair do âmbito do trabalho
reprodutivo e gratuito para o âmbito do trabalho produtivo e assalariado. Quanto a
esse aspecto a autora diz que, “se arranharmos a superfície das relações pessoais,
vamos nos deparar com as mesmas “velhas desigualdades e discriminações”, pois
estas, em pleno século XXI, permanecem embutidas e não desapareceram”.
(THOMAS, 2010. p.3)
Desde o início do século XX pode-se observar um grande movimento de
mudanças no processo de produção capitalista e consequentemente de alteração na
economia mundial. Nesse período pode-se assistir o aumento gradativo das
mulheres adentrando no mercado de trabalho dado a expansão do mesmo nos
espaços produtivos e de serviços. Nesse cenário o trabalho feminino, fora das
esferas reprodutivas, deu um salto quando as mulheres, que exerciam atividades
nas indústrias, principalmente no setor têxtil, passam a desenvolver outras funções,
voltadas para a prestação de serviços, tais como: secretárias, escriturárias,
datilógrafas, telefonistas, etc. nas empresas privadas ou nas repartições públicas.
Estas, por sua vez, ainda admitiram em seus espaços mulheres como enfermeiras
em hospitais, professoras em escolas e outras atividades em setores de serviços, de
26

forma que a força de trabalho feminina não estava mais restrita apenas a empregos
nas esferas de produção de bens. (NOGUEIRA, 2004)
No entanto, sem o reconhecimento do trabalho da mulher como atividade
produtiva de valor econômico e numa situação de invisibilidade, esse novo processo
continuava gerando péssimas condições de trabalho, uma vez que grande parte do
trabalho feminino era ignorado pelas estatísticas oficiais do governo.
No Brasil, conforme na Europa, o processo de industrialização e de
urbanização contribuiu para a crescente participação da mulher no mercado de
trabalho. Esse processo teve início no Nordeste, com a indústria de fiação e
tecelagem, deslocando-se progressivamente para o sudeste até reunir a maior
concentração no Rio de janeiro e posteriormente em São Paulo na década de 1920.
Grande parte do proletariado das primeiras fábricas, instaladas no Brasil, era
constituído por mulheres imigrantes da Europa, cujos maridos foram atraídos pelo
governo brasileiro para trabalharem na lavoura, por considerá-los uma força de
trabalho abundante e barata. (RAGO, 2007)
A presença feminina, portanto, já era significativa entre o operariado. No
entanto, os aspectos que diziam respeito ao trabalho feminino nas esferas
produtivas eram degradantes para as mulheres. Estas eram expostas a longas
jornadas de trabalho, variando entre 10hs à 14hs diárias, ficando com as tarefas
menos especializadas. Os baixos salários, maus-tratos de patrões, péssimas
condições de trabalho e ainda as investidas sexuais dos contramestres se somavam
à falta de uma legislação que as protegessem de todas essas humilhações. (RAGO,
2007)
Às mulheres trabalhadoras eram impostas diversas identidades. Para cada
segmento da sociedade aparecem com uma determinada imagem. Se para os
jornalistas eram frágeis e infelizes, para os patrões, perigosas e indesejáveis,
passivas e inconscientes para os militantes políticos e perdidas e degeneradas para
os médicos e jurista. De acordo com Rago, nos diversos segmentos da sociedade
se faziam frequentes “associações entre a mulher no trabalho e a questão da
moralidade social” em que a fábrica, tida com “antro de perdição” acabaria por levá-
las para o submundo da prostituição, seduzidas pelas facilidades do mundo
moderno e consequentemente as afastando do seu papel, de “rainha do lar”. Tal
estigma estava, sobretudo, posto sobre as camadas sociais inferiores cujas
profissões femininas eram consideradas menos elitizadas, como: costureiras,
27

operárias, empregadas domésticas e outras, que só poderiam ser exercidas por


mulheres trabalhadoras tidas como ignorantes e incapazes. (RAGO, 2007)
Embora muito se discutisse sobre o trabalho feminino nas esferas produtivas
e da classificação moral rebaixada a que estavam sujeitas essas trabalhadoras, as
feministas apontavam favoravelmente para os benefícios do trabalho feminino fora
do lar. Para elas “uma mulher profissionalmente ativa e politicamente participante [...]
certamente teria melhores condições de desenvolver seu lado materno”. (RAGO,
2007, p. 591)
Concomitantemente a essas inserções, verifica-se que as formas de trabalho
e os salários das mulheres ainda permaneciam num patamar inferior aos dos
homens. Esses aspectos contribuíam para a queda da qualidade de vida de toda a
classe uma vez que segundo a sua lógica “o capitalismo aproveita o estatuto
socialmente rebaixado da mulher e o alia com novas formas de exploração,
encontrando [...] uma força de trabalho versátil, submissa e barata”. (JARDIM, 2011,
p.16)
No meado do século XX, as mulheres trabalhadoras começam a vislumbrar
mudanças nos âmbitos trabalhistas, ainda que insuficientes, tanto nas condições de
trabalho menos degradantes a que eram submetidas quanto ao que se refere aos
direitos trabalhistas. O Estado toma para si a responsabilidade de legislar sobre
algumas questões referentes aos direitos dos trabalhadores por dois motivos:
primeiro, em resposta às reivindicações do operariado que estavam se organizando
de forma coletiva e segundo pela observância das exigências postas com as
mudanças socioeconômicas que estavam ocorrendo, no país, com o
desenvolvimento do processo produtivo nas indústrias. Além do mais o Estado
passou a reconhecer as normas e convenções sobre a perspectiva social do direito,
orientadas pela OIT (Organização Internacional do Trabalho).
Dessa forma um dos méritos recai sobre o trabalho feminino na esfera
produtiva, regulamentado em 1932 proibindo, inclusive, a discriminação das
mulheres quanto ao salário, sendo definido o salário mínimo para as mulheres com
redução da jornada de trabalho para 8 horas diárias, descanso semanal e igualdade
salarial entre os homens e as mulheres em 1936. Entretanto foi com a CLT
(Consolidação das Leis Trabalhistas) em 1943, tendo como obrigatoriedade o
registro na carteira profissional, a sistematização da legislação anterior como código
e a regulamentação das relações de trabalho, podendo-se considerar como o marco
28

do reconhecimento dos direitos trabalhistas. Tais direitos são aos poucos


conquistados e a cada alteração subsequente na Constituição Federal, às mulheres
veem assegurados seus direitos, como na Constituição Federal de 1967, conquistam
o direito à aposentadoria após 30 anos de trabalho. A Constituição Federal de 1988
amplia ainda mais os direitos da mulher trabalhadora, onde consolidou as bases dos
direitos individuais e sociais, expresso no Art. 7º... XXX – “proibição de diferença de
salários, de exercício de funções e de critério de admissão por motivo de sexo,
idade, cor ou estado civil”.
Mesmo com todo esse caráter de amparo legal à mulher, com destaques nas
leis trabalhistas, as mulheres ainda convivem com as relações de poder desiguais,
observadas desde o início do acesso das mulheres no trabalho produtivo,
principalmente ao que se refere às diferenças salariais e a ocupação profissional
entre homens e mulheres, na esfera pública.
Segundo Kergoat há ainda um acúmulo de somas dessas desigualdades,
que circunscreve na herança patriarcal, da divisão sexual do trabalho, em nossas
sociedades. Numa constatação a autora diz: “nessa matéria, tudo muda, mas nada
muda”. (HIRATA & KERGOAT, 2007, p.600)
Toda legislação só funciona a partir da sua efetivação. Muito do que se
conquistou no marco constitucional na esfera federal no Brasil, em 1988, ainda está
muito aquém da real necessidade de neutralizar as profundas desigualdades sociais,
especialmente no que diz respeito aos direitos trabalhistas das mulheres na esfera
pública.
Embora já houvesse uma legislação de proteção ao trabalho feminino nos
espaços públicos, segundo Araújo, as mulheres ainda continuavam a ser submetidas
às ocupações não qualificadas, com vínculos empregatícios e condições de
trabalhos precários, mal remunerado e sem total proteção social, caracterizando
dessa forma a exploração do trabalho no âmbito produtivo. (ARAÚJO, 2001 apud
NOGUEIRA 2004).
Bruschini corrobora tais afirmações com a apresentação de indicadores
extraído da Fundação Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (FIBGE) e da
Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios (PNAD), entre as décadas de
1980/1990. Para a autora, no que confere as taxas de atividades no mercado de
trabalho nas referidas décadas, as mulheres ampliaram sua participação chegando a
atingir a meta de 47,5% em 1998. Por outro lado, a crescente participação da mulher
29

no mercado de trabalho não lhe confere um rendimento no mesmo patamar que o


homem, ao contrário, constata-se, nesse período, a diferença dos rendimentos
salariais, entre homens e mulheres. Se ao término do século XX as mulheres tinham
sua faixa de rendimentos bem abaixo que o do homem, no século XXI não se
observa uma virada nessas condições. Ou seja, em 2011, nas relações trabalhistas,
a diferença salarial se mantem numa proporção de 72,3% em relação aos
rendimentos médios do homem, de acordo com a fonte extraída do IBGE.
(BRUSCHINI, 2001)
Os indicadores são uma amostra dessa realidade a partir da comparação
entre os sexos nos quadros relacionados abaixo.

2.3 A PERMANÊNCIA DA DESVALORIZAÇÃO DO TRABALHO FEMININO E A


PRECARIEDADE DAS CONDIÇÕES

Neste tópico pretende-se apontar os principais dados estatísticos sobre a


situação da força de trabalho feminina em comparação com a força de trabalho
masculina, quanto a rendimentos mensais por sexo, ocupações no mercado de
trabalho com vínculo trabalhista (CLT) por sexo e postos de trabalho formal e
informal das mulheres por idade.
Cabe ressaltar que fatores significativos têm contribuído com a
desvalorização e precarização do trabalho feminino no mundo do trabalho,
encontram-se nas diferenças existentes nas relações de gênero dentro dos espaços
produtivos e com ênfase na flexibilização do trabalho.
Pode-se constatar mediante as apresentações das pesquisas, do IBGE
(Instituto Brasileiro de Geografia e Estatísticas) que o sistema socioeconômico
vigente, que dita as regras do mercado consequentemente determina os salários
daquelas que compõem o quadro de trabalhadoras no país, está não só estruturado
em instituições e centros de poder, majoritariamente masculinos, mas também
internalizados em boa parte da população como ideologia e/ou servidão voluntária

GRÁFICO 1 – RENDIMENTO MÉDIO REAL DO TRABALHO DAS PESSOAS


OCUPADAS POR SEXO EM R$ / 2003
30

RENDIMENTO MÉDIO REAL DO TRABALHO DAS PESSOAS OCUPADAS POR SEXO 2003

HOMENS MULHERES
R$1.519,07

R$1.076,04

HOMENS
MULHERES

FONTE: IBGE, Diretoria de Pesquisas, Coordenação de Trabalho e Rendimento, Pesquisa Mensal


de Emprego 2003-2011.

GRÁFICO 2 – RENDIMENTO MÉDIO REAL DO TRABALHO DAS PESSOAS


OCUPADAS POR SEXO EM R$ / 2011

RENDIMENTO MÉDIO REAL DO TRABALHO DAS PESSOAS OCUPADAS POR SEXO 2011

HOMENS MULHERES

R$1.857,63
R$1.343,81

HOMENS
MULHERES

FONTE: IBGE, Diretoria de Pesquisas, Coordenação de Trabalho e Rendimento, Pesquisa Mensal


de Emprego 2003-2011.
Como se pode verificar nas comparações dos gráficos 1 e 2, sobre o
rendimentos mensais de 2003, o valor médio dos salários dos homens se
encontravam, nesse período, em um patamar mais elevado do que as mulheres, não
ocorrendo alterações até o final de 2011, segundo os dados do IBGE.
31

GRÁFICO 3 – PROPORÇÃO DE PESSOAS OCUPADAS COM CARTEIRAS DE


TRABALHO ASSINADAS SEGUNDO O SEXO (%) - 2003
Proporção de pessoas ocupadas com carteira de trabalho assianada
(segundo o sexo)
2003
Homens com carteira assinada Mulher Com Carteira Assinada

43,6 44,9

Homens com carteira


assinada Mulher Com Carteira
.
Assinada

FONTE: IBGE, Diretoria de Pesquisas, Coordenação de Trabalho e Rendimento, Pesquisa Mensal


de Emprego 2003-2011.

GRÁFICO 4 - – PROPORÇÃO DE PESSOAS OCUPADAS COM CARTEIRAS DE


TRABALHO ASSINADAS SEGUNDO O SEXO (%) – 2011

Proporção de pessoas ocupadas com carteira de trabalho assianada (segundo o sexo)


2011

Homens com carteira assinada Mulher Com Carteira Assinada

51,5
50,8

Homens com carteira


assinada
Mulher Com Carteira Assinada

FONTE: IBGE, Diretoria de Pesquisas, Coordenação de Trabalho e Rendimento, Pesquisa Mensal


de Emprego 2003-2011.

O final do século XX, com o desenvolvimento da industrialização, o Brasil já


aponta para uma acentuada projeção da mulher no mercado de trabalho. A CLT
32

(Consolidação das Leis trabalhistas) respalda o trabalhador concedendo-lhe o direito


de vinculação ao trabalho através da carteira profissional, extensivo também às
mulheres.
Observa-se nos gráficos 3 e 4 que a presença da mulher no mercado de
trabalho com carteira assinada, na presente década, ultrapassa o homem. Em 2003
o percentual de diferença entre o homem e a mulher era de 1.3% favorável para a
mulher mas se fizer uma comparação entre os dados relativos ao homem verifica-se
que em 2011 o patamar elevou a taxa dos homens para 7.2% e para a mulher no
mesmo período para 6.6% embora a mulher ainda ocupa a taxa de 0,7% acima do
homem. Nesse período significa que o homem conseguiu elevar mais a sua taxa de
vínculo empregatício do que a mulher, segundo dados do IBGE.

GRÁFICO 5 - TRABALHO DA MULHER NO MERCADO INFORMAL POR FAIXA


ETÁRIA BRASIL

Participação do trabalho no mercado informal


ano de 2009
16 a 24 anos Mais de 60 anos

82,20%
69,20%

16 a 24 anos
Mais de 60 anos

Fonte IBGE/2009 – Acesso em Julho de 2013

GRÁFICO 6 - TRABALHO DA MULHER NO MERCADO FORMAL POR FAIXA


ETÁRIA BRASIL
33

POSTOS DE TRABALHO DA MULHER NO MERCADO FORMAL


ANO 2009

48,80%
42,50%

1
2

Fonte IBGE/2009 – Acesso em Julho de 2013

De acordo com os dados mencionados no gráfico 5, este demonstra que em


2009 as mulheres acima de 60 anos ocuparam o mercado informal de trabalho em
13% acima das jovens entre 16 a 24 anos. Ainda no mesmo período, houve uma
queda nas taxas de ocupação no mercado formal de trabalho tanto para as mulheres
mais jovens quanto para as mulheres acima dos 60 anos.
A alta de ocupação no segmento informal pelas mulheres apresentam dois
motivos. Entre as mais jovens dá-se pela dificuldade de inserção, do primeiro
emprego, no mercado formal de trabalho. Entre as mulheres de idade acima dos 60
anos, constata-se que estas se encontram economicamente ativas e pelas
dificuldades de se inserirem no mercado formal de trabalho buscam uma atividade
no ramo da informalidade, como forma de complementar a renda.
Como podemos observar nos gráficos acima os dados revelam que as
diferenças sobre os rendimentos salariais das mulheres estão abaixo do que suas
contrapartes masculinas. Outro dado comparativo, de extrema importância, em
relação ao trabalho da mulher, na primeira década do século XXI, tem a ver com o
vínculo empregatício no mercado formal, de acordo com a CLT, como
regulamentação dos direitos adquiridos.
Dados importantes como a participação da mulher no mercado de trabalho,
revelam uma comparação direta entre os dois gêneros com o mesmo nível
educacional. O IBGE constatou que mulheres com 12 ou mais anos de estudo, em
34

média, recebiam 58% do rendimento concedido aos homens. Em outras faixas de


escolaridade, a diferença é de 61%. Isto vem demonstrar e reafirmar que nas
relações de trabalho assalariado a divisão sexual e social do trabalho ainda está
pendendo, favoravelmente, para o gênero masculino.
.
35

CAPÍTULO III: A FEMINIZAÇÃO NO TRABALHO NO CENÁRIO OFFSHORE DE


PETRÓLEO E GÁS

A inserção da mulher no espaço laboral de produção tem sido amplamente


discutida por vários estudiosos voltados para os debates das questões que
envolvem os interesses das mulheres e particularmente nos aspectos que se
referem à emancipação e exploração e nas esferas de trabalhos produtivos. Ao
adentrar no terceiro e último capítulo deste trabalho monográfico a proposta é traçar
um panorama geral acerca do tema acima descrito, ainda que trabalhos
bibliográficos específicos, sobre a tematização abordada, não tenham sido
encontrados. Neste capítulo pretende-se trazer à pauta uma pequena amostra do
cenário tecnológico que envolve as plataformas petrolíferas dentro do contexto da
reestruturação produtiva e inseridas neste contexto as condições de trabalho das
mulheres à bordo, em regime de confinamento e isolamento e como convivem com
as ocorrências cotidianas nesse ambiente, majoritariamente, masculino.

3.1 OFFSHORE: O PETRÓLEO NO BRASIL E A TECNOLOGIA DE PONTA


SOBRE CIDADES FLUTUANTES

O petróleo surge no cenário mundial pouco antes do final do século XIX como
consumo de massas através de seu derivado, o querosene, usado principalmente
para a iluminação domiciliar e pública. Mas é no século XX que o petróleo passa a
ser a principal fonte energética, quando se torna o combustível para os primeiros
veículos dotados de motores à combustão, A Primeira Guerra Mundial elevou a
importância do petróleo adquirindo este um valor primordial para o transporte
motorizado, favorecendo o deslocamento dos militares franceses para a decisiva
defesa da França. Da mesma forma outros eventos de grandes relevâncias, que se
seguiram após a Primeira Grande Guerra, tiveram relação com o uso do petróleo no
cenário internacional. (FIGUEIREDO, 2012)
Nos meados do século XX, (pós-Segunda Guerra Mundial), segundo
Figueiredo, “o petróleo consolidou seu papel de centralidade na economia mundial”.
Para o referido autor, o capitalismo foi uma fase áurea, uma vez que a expansão
industrial se tornou uma realidade com a demanda energética em escala global,
onde o petróleo e seus derivados (diesel, gasolina, querosene) viabilizou a
36

reprodução de forma ampliada do capital em vários segmentos dos setores de


transportes bem como na fabricação de tantos outros bens de consumo e produtos
industriais gerados pela cadeia petroquímica. (FIGUEIREDO, 2012, p.43)
Sendo considerada uma fonte principal de energia global, Torres Filho,
salienta que, essa condição “foi um feito possibilitado pela existência de enormes
reservas a serem exploradas, aliadas a seu baixo custo de extração e às vantagens
econômicas de sua utilização”. (Figueiredo, 2012, p.43). A partir dessa expansão
surgem as primeiras grandes petroleiras, chamadas de “Big Oil”, no circuito mundial,
mobilizando grandes investimentos e retornos na casa de bilhões de dólares. A partir
dessas considerações Figueiredo, com base em Yergin, resume os três tópicos que
fundamentam a história do petróleo até o período final do século XX. São eles,
segundo Yergin,

i)a ascensão e o desenvolvimento pujante do capitalismo e


dos negócios modernos; ii) o petróleo como um produto
fortemente enraizado nas estratégias nacionais, no poder e
nas políticas globais; iii) a história do petróleo mostrando
como a nossa sociedade se tornou visceralmente dependente
desse mineral que, suplementado pelo gás natural, alijou o
carvão da condição de fonte principal de energia para o
mundo industrial. (Yergin, 2007 apud Figueiredo, 2012, p.44)

Embora a descoberta do petróleo tenha sido um grande passo para o


desenvolvimento industrial é valido dizer que as explorações nos campos
petrolíferos eram bastante rudimentares, cujo trabalho era feito de maneira empírica
e pouco científica, baseado em P&D (Pesquisa e Desenvolvimento) para se alcançar
poucos resultados. Não obstante, no final do século XIX, deu-se início ao sistema
offshore em águas ultrarrasas, de até 30m de profundidade, cujo padrão de
exploração era o mesmo utilizado no sistema onshore (em terra). Os procedimentos
tecnológicos seguintes, de exploração em águas rasas de até 400m de
profundidade, distante da costa, contribuiu para o avanço da P&D em diversas áreas
do conhecimento até se chegar aos campos ultraprofundos, atingindo mais de 1500
m de profundidade, na década de 1990, ocorrendo tais avanços em três grandes
áreas tecnológicas, as chamadas “big tree”: sísmica; perfuração e plataformas com
seus equipamentos. Com base em Neto e Shima “foi a partir do offshore que a
indústria do petróleo buscou uma aproximação mais sistemática e intensa com
37

instituições de pesquisa [...], para facilitar a comunicação”, sendo assim optaram por
criar laboratórios de pesquisas e contratar ex-militares, especializados em previsão
do tempo. (NETO & SHIMA, 2007)
Nessa trajetória os segmentos de offshore da indústria petrolífera que mais se
destacaram foi o do Golfo do México (EUA), no período de 1947 – 1959, no Mar do
Norte (Europa), no período de 1959 – 1973 e a grande expansão viabilizada pelas
crises do petróleo de 1973 -1979, não ficando à deriva a Bacia de Campos, no
Brasil, onde a exploração offshore se apresentou como uma alternativa econômica
viável para a Petrobrás. Nessa conjuntura de desenvolvimento, com bases no
conhecimento tecnológico, permitiu à Petrobrás dar início às suas atividades
offshore nas décadas de 1960-1970. Destaque-se que todas as três indústrias acima
mencionadas foram consideradas as mais produtivas e ricas de todo o planeta.
(FIGUEIREDO, 2012)
Ainda no século XX, na área de plataformas e equipamentos foram
desenvolvidas as três trajetórias tecnológicas: Sistema Rígido (ou fixo) de Produção
(SRP); Sistema Flexível (ou híbrido) de Produção (SFP) e Sistema de Produção
Flutuante (SPF). Estes sistemas de plataformas construídas sobre uma estrutura de
ancoragem são: plataformas semi-submersíveis e navios, os quais, no Brasil, se
encontram, em sua grande maioria, na Bacia de Campos, maior região em produção
de petróleo de todo o continente sul-americano.
No Brasil a indústria de petróleo nacional alicerçou-se e consolidou-se com a
criação da Petrobrás (Petróleo Brasileiro), a maior empresa no ramo de extração e
produção de petróleo no solo brasileiro. Foi criada em outubro de 1953, pelo então
Presidente da República Getúlio Vargas, sob a Lei 2.004, em meio a um intenso
movimento de nacionalismo tendo como pressuposto uma forma de proteção contra
a tentativa de exploração do produto nacional por empresas estrangeiras, sendo
esse monopólio quebrado no ano de 1997 pela Lei 9.478.
Nas décadas de 1960 a 1970, principalmente sob a gestão de Geisel, a
Petrobrás passou por profundas mudanças. Dada à crise do petróleo no mercado
internacional na década de 1970, Geisel estabeleceu novos critérios para a empresa
priorizando investimentos na elevação da capacidade interna do refino do petróleo
em detrimento da exploração, com vistas à expansão das atividades de
comercialização e implantação do parque petroquímico e de fertilizantes. A redução
da produção de petróleo propiciou a expansão do raio de ação pretendido por
38

Geisel, que deixou como substitutos na empresa o grupo “emblemático de formação,


de uma tecnoburocracia nacional, denominado de “Grupo Geisel”, de legado
militarista e de autoritarismo gerencial” que respinga até os dias atuais nas áreas
operacionais das plataformas. (Figueiredo, 2007)
Na década de 1970 a Petrobrás passa a investir no litoral Norte Fluminense
com a construção de um terminal marítimo a partir das descobertas de uma grande
extensão de área para a exploração de petróleo.
Atualmente a Petrobrás conta atualmente com 54 plataformas offshore que
operam na Bacia de Campos, que por sua vez é responsável pela produção de 82%
da produção de petróleo e 47% da produção de gás natural de todo o país.
Espalhadas em todo o Brasil a Petrobrás opera com 120 plataformas onshore e
offshore, gerando uma média de 52.000 empregos diretos, sendo 1/3 desses
efetivos da Petrobrás e o restante de empresas terceirizadas.

3.1.1 RELEVÂNCIA E IMPACTOS DO PETRÓLEO SOBRE A REGIÃO DE


MACAÉ, “O EL DOURADO BRASILEIRO”.

Dentre as várias regiões de produção offshore espalhadas pelo mundo, o


Brasil, mais precisamente a cidade de Macaé se destaca como um dos principais
sítios industriais cuja exploração da Bacia de Campos acarretou um amplo processo
de transformação em toda a região do Norte Fluminense, segundo Figueiredo. No
entanto, como observa Crespo, ao se comparar o desenvolvimento industrial de
Macaé com o restante da região se verifica uma assimetria singular uma vez que a
região em todo o seu entorno permaneceu estagnada. (CRESPO, 2003 apud
FIGUEIREDO, 2012)
Ao comparar a análise de Crespo (2003), feita a uma década atrás, com uma
análise mais atualizada feita por Tavares, verifica-se uma mudança radical no perfil
das regiões situadas na área de abrangência de Macaé. Os municípios do entorno
de Macaé não deixaram de experimentar o crescimento tanto na questão da
urbanização quanto na economia, uma vez que se constatou um crescimento médio
populacional, nas cidades circunvizinhas, de 12,23% (IBGE, 2000/2010) por período.
(TAVARES, 2012)
Na última década, após a quebra do monopólio estatal da Petrobrás, em
1997, e o desenvolvimento da indústria de petróleo e gás, Macaé apresentou um
39

crescimento de 600%. Esse desenvolvimento industrial provocou a migração de um


grande contingente populacional, oriundo de várias regiões do Brasil e de países
estrangeiros, em busca de trabalho nas empresas instaladas na região, fato que fez
triplicar para 206.748 mil habitantes. (Fontes do IBGE).
Segundo o cálculo do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatísticas (IBGE),
do Índice Firjan de Desenvolvimento Municipal (IFDM) e da Fundação Centro de
Informação e Dados do Rio de Janeiro (Cide), Macaé representou 48,4% do Produto
Interno Bruto (PIB) industrial do Estado do Rio de Janeiro em 2006, divididos da
seguinte forma: 23,3% do setor de petróleo e gás; 16,7% na indústria de
transformação; 5,9% na construção civil e 3,7% nos demais setores da economia
local.
A “corrida do petróleo”, desde que Macaé se tornou a principal base de apoio
da Bacia de Campos, proporcionou à região, em uma década, um crescimento
urbano, fomentando a especulação imobiliária. Dois aspectos ocorreram a partir
dessa urbanização: um aspecto positivo, para os cofres públicos, é o aumento da
arrecadação do IPTU. Segundo os dados da Prefeitura de Macaé, em 2004 de 2,7
milhões a arrecadação desse imposto saltou para 11.020.849,83 bilhões em 2010,
após o recadastramento imobiliário. A urbanização contribuiu, também, para o
crescimento de arrecadação de outros impostos como o de serviços (ISS) e o de
circulação de mercadorias (ICMS) próximo à R$ 600 milhões em 2010 e ainda
alavancou o chamado “turismo corporativo”, em que as pessoas atraídas pelos
negócios aliam as atividades econômicas com o ecoturismo e o turismo alternativo
que tem sido um atrativo econômico para a região. Os aspectos negativos
provocados pela mobilidade espacial da população dando origem à proliferação
desordenada, sem infraestrutura, de bairros periféricos que passaram a ocupar
áreas de preservação ambiental. Na praia de Imbetiba foi instalado o porto como
base de operação, fechando o acesso à população local, a bacia hidrográfica do rio
Imboassica, principal contribuinte da Lagoa, sofre intenso processo de degradação
desde que passou a ser ocupada de forma desordenada por condomínios e
empresas; aumento das demandas por serviços públicos; aumento do tráfico de
drogas e violência; aumento do custo de vida, atingindo, inclusive, os municípios
situados nas áreas de abrangência como Rio das Ostras, que teve um aumento
populacional saltado para 190% nessa última década, sofrendo já os mesmos
impactos negativos. (TAVARES, 2012)
40

Pode-se observar que a pujança econômica desencadeada a partir das


instalações das plataformas de petróleo offshore, na Bacia de Campos, propiciou as
instalações de muitas outras empresas do setor de serviços no ramo de petróleo
como também no ramo de hotelaria abrindo oportunidades não só de negócios como
de empregos. Se por um lado houve um saldo positivo por outro houve uma queda
nas principais atividades agrícolas e de pesca, fazendo com que o trabalhador nativo
perdesse seu principal meio de subsistência, um remake do advento da primeira
revolução industrial quando os artesões viram-se desapropriados de seus trabalhos
autônomos e fragmentados da totalidade da lógica produtiva realizada
anteriormente. O projeto de construção de um aeroporto internacional em Macaé,
dada à expansão da indústria petrolífera, com a recente descoberta do pré-sal, a
abertura de novos empreendimentos vai gerar novos impactos ambientais numa
evolução de problemas, inerentes aos efeitos da modernização tecnológica dos
parques industriais, voltados para a lógica do capital.

3.2 A INSERÇÃO FEMININA NAS PLATAFORMAS PETRÓLEO OFFSHORE

A participação atual das mulheres nos espaços de produção é inquestionável.


Historicamente se deu no início do capitalismo marcado pela industrialização e
séculos depois, com o movimento feminista, a expansão feminina no mercado de
trabalho tem sido uma realidade. A legislação de Ação Afirmativa e Gênero da
Constituição Federal de 1988, que obriga as empresas com mais de 50 empregados
a ter no seu quadro 30% de mulheres, foi um avanço memorável privilegiando as
mulheres com a abertura de novos espaços de trabalho. e dentre eles se situam a
área de petróleo e gás. .
Voltando ao final do século passado, mais precisamente na década de 1970 o
quadro de funcionários da área de petróleo, em sua totalidade, contava apenas com
duas mulheres. Considerava-se que as plataformas eram lugares privilegiados de
trabalho marcadamente masculino onde não era permitido o ingresso de mulheres.
As primeiras mulheres a embarcarem em plataformas de petróleo foram
profissionais, geólogas, admitidas pela Petrobrás nos anos de 1970, para atuarem
no campo da pesquisa e desenvolvimento (P&D). Foi necessário que essas
mulheres exercessem pressão para que tivessem oportunidades de ingressarem
nesse novo mercado de trabalho, que se mostrava promissor também para as
41

mulheres. Contudo, essa inserção, não significou uma automática aceitação da


presença dessas mulheres pela maioria dos homens acostumados com esse
universo masculino restrito. (DANIEL, 2006)
Até então as mulheres que embarcavam não poderiam pernoitar por falta de
estruturas de acomodações femininas que comportasse a estadia da mulher no
regime de confinamento e isolamento.
Segundo os dados da Sindipetro-NF(Sindicato dos petroleiros – Norte
Fluminense), em 2010 o número de mulheres que trabalham embarcadas é de 1961
mulheres, sendo que 254 delas são efetivas da Petrobrás e 1707 são de empresas
terceirizadas, contratadas da estatal. Mediante tais considerações, questiona-se o
seguinte: o que tem levado as mulheres a se inserirem num campo de trabalho
majoritariamente masculino, suportando períodos extensos de confinamento e
isolamento que, a caráter, se apresenta como trabalho pesado, criado para o
homem?
Antes de buscar fazer uma análise sobre esse questionamento é valido
lembrar alguns pontos importantes sobre o ambiente interno do trabalho offshore em
plataformas.
Sabe-se que o trabalho embarcado se caracteriza pelo afastamento do
mundo exterior por um período de 15 dias consecutivos, ou até mais quando as
circunstâncias exigem, tendo como contato, por breve espaço de tempo, a internet,
televisão e telefone, durante o período de descanso. Tal confinamento delimita o
espaço de convivência entre as fronteiras da jornada de trabalho e o período de
descanso, uma vez que a pessoa permanece no local de trabalho. (DANIEL, 2012)
Nesse caso o trabalho nas plataformas offshore concentra todo o tempo da
pessoa dado o tipo de trabalho que executa. Ou seja, a convivência com colegas de
trabalho se dá no período integral de 24hs, ora no setor de trabalho, ora no
refeitório, salas de convivência para lazer ou nos camarotes. Este novo arranjo de
trabalho compartilhado no sistema offshore de confinamento não exclui, portanto, as
mulheres.
É importante ressaltar que embora seja um campo de trabalho ainda restrito
à atuação feminina, o ingresso das mulheres nas plataformas de petróleo offshore
traça aspectos relevantes sobre o início de rompimento com um ciclo de concepções
culturais de segregação e discriminação, que dificultavam o acesso das mulheres
nos setores de clivagem entre tarefas classificadas como masculinas e femininas.
42

Segundo Lombardi, as áreas de prospecção de petróleo, engenharia e mineração


são ainda de difícil acesso para as mulheres. Para a autora, tal fenômeno se dá em
razão das condições de trabalho considerado agressivo e perigoso. (BRUSCHINI &
LOMBARDI, 2006)
Ainda que não tenha sido a intenção da autora, fica implícito que a
segregação e a discriminação ao que diz respeito ao trabalho da mulher em
determinadas áreas, permanecem cristalizadas no pensamento da grande maioria
masculina, seguindo os moldes do velho patriarcado. Portanto, é uma realidade que
se constata dentro das esferas de trabalho produtivo e que se apoiam nas
habilidades destinadas às “atividades masculinas” e “atividades femininas”.
Esta realidade é percebível na fala das 12 (doze) mulheres e dos 03 (três)
homens, nas entrevistas realizadas através de abordagens no saguão do aeroporto
antes do embarque para as plataformas. Através desta metodologia buscou-se
formas de delinear os aspectos particulares do universo feminino frente ao trabalho
embarcado nas plataformas de petróleo.
Durante as entrevistas algumas perguntas pertinentes sobre a vida pessoal e
a vida profissional foram feitas com o intuito de traçar um perfil, mais aproximado
possível, das mulheres que optaram por trabalharem em regime offshore, num
cenário de exclusão do mundo exterior.
A partir das respostas ao questionário pode-se perceber um consenso nas
respostas de diferentes profissionais, de diferentes empresas e funções.

A questão de turnos e alternâncias

Os turnos nas plataformas são de 12hs diárias de trabalho sem intervalos de


descanso para o almoço, ocorrendo na maioria das funções alternâncias de turnos.
Após os 07 (sete) primeiros dias de embarques inverte-se o turno para os próximos
07 (setes) dias, até o desembarque, o que para a maioria das mulheres é de
sofrimento uma vez que tem que fazer uma readaptação do horário de dormir e
consequentemente acaba por afetar o humor. Aliados aos problemas decorrentes
dos turnos estão os problemas de opções de lazer.

Após 12 hs de trabalho o maior problema é o isolamento porque


todas as opções de lazer é mais voltada para o público masculino.
43

Muitas vezes no final da jornada de trabalho dá vontade de sair para


se distrair, principalmente se teve um dia estressante [...], para quem
trabalha offshore é impossível, se torna um evento de difícil espera
pelo dia do desembarque. (A, técnica em instrumentação)

Minha função é cuidar dos camarotes do 1º ao 3º andar. Quando


termina o meu trabalho ajudo os outros colegas. Começo a trabalhar
das sete até as 19hs. Ai eu vou para o camarote descansar [...],não
tenho muito convívio pelo fato da maioria ser homens e a escolha
dos programas é só esse mesmo, futebol. (O, taifeira)

Não tenho hora de almoço, pois recebo HRA (horas remuneradas de


almoço) e descanso de 12 horas. Trabalho no Laboratório, que
funciona 24 horas, eu trabalho 12 horas sozinha, sou responsável
pela realização de análises do petróleo e gás que é produzido na
plataforma, Já trabalho há quase 06 anos e até hoje não acostumei
trabalhar à noite, a dificuldade está em dormir pelo dia, pois o meu
relógio biológico não entende isso, fico irritada, sensível, um pouco
deprimida, chorona e quando estamos perto de desembarcar já estou
cansada, pois foram dias de trabalho e com pouco sono, as vezes
desembarco sem dormir, pra mim trabalhar a noite não faz bem. (S,
Técnica em Química)

As condições de vida e trabalho a bordo acarretam diversos problemas na


saúde do trabalhador. No tempo de descanso ocorrem vários fatores externos que,
pelo fato do trabalho na plataforma está em constante funcionamento, são
desencadeantes de futuros problemas mentais e/ou até físico. A questão da
alternância de turnos, como pode ser constatada nas entrevistas acima acaba por
conduzir estas mulheres a um nível de stress e fadiga por conta do alto grau de
cansaço da longa jornada de trabalho.

Da discriminação

Muito tem se falado sobre o avanço das mulheres no mercado de trabalho e


tal coisa não se discute. Mas ainda se verifica uma ocultação na questão do
antagonismo presente revelando uma cultura refratária à entrada da mulher em
determinados campos de atuação, principalmente se for um espaço masculino como
no caso das plataformas offshore. Verifica-se o mal-estar da ala masculina com a
presença da mulher nesses espaços através do depoimento de R, efetivo da estatal.
Diz ele:
- já presenciei instabilidade de uma mulher no cargo de supervisão
frente a uma ocorrência de um incidente operacional. Diante da
44

situação ela demonstrou instabilidade e insegurança. A mulher


muitas vezes não sabe lidar com a resiliência que está mais ligada
ao homem [...] foi introduzindo nele lidar mais naturalmente com as
situações adversas. A mulher nos momentos cruciais de risco,
visualmente, há um desconforto maior sem conseguir, muitas vezes,
saber o que fazer, a resiliência frente à uma adversidade penso que
a mulher não consegue superar.

- eu particularmente tenho algumas questões com mulheres no cargo


de chefia. Hoje minha gerente é mulher e até agora tudo bem. Eu
pessoalmente tenho algumas observações no lugar de chefia. A
questão da mulher no mercado offshore é recente

- Algumas áreas ainda são majoritariamente masculina. A diferença


de gênero gera essa competição onde o homem querendo sobrepor
à mulher e por outro lado a mulher querer ganhar o espaço que
nunca foi dela Essa coisa da mulher querer ganhar um espaço que
nunca foi dela... na prática ainda se vê resistência masculina quanto
à esse fato ....a mulher tem conseguido penetrar nos espaços
masculinos mas é um relacionamento menos flexível.

- tem havido avanço da inserção da mulher em vários espaços que


até então eram tidas como majoritariamente masculino Ela penetra
nessas esferas mas tem que fazer concessões ou ser muito dura,
dependendo da situação há disputa muitas vezes é ruim para ambos
os lados

A discriminação está enrustida na não aceitação da mulher no espaço


determinado pelos homens como reduto deles e não delas. Se observar o discurso
de R, comissário de bordo, o modo como ele fala da profissional que está
acompanhando denota uma discriminação, ainda que velada, quanto à capacidade
da colega. As próprias mulheres não se percebem dentro desse contexto de ações
discriminadoras.
A empresa trata a mulher como qualquer outro homem. Só que não é
ainda um ambiente preparado para receber mulher.
A gente busca muito isso, querer provar que é capaz de fazer tudo.
Está muito internalizado no mundo do petróleo que ali é lugar para
homem e aí está internalizado tanto para o homem e até para a
mulher que ela é igual ao homem ali, não tem essa de diferença.(M,
fiscal de instrumentação)

Na plataforma a mulher é tratada como qualquer homem. Ainda não


é um ambiente preparado para receber a mulher [...] eu preciso me
adaptar ao universo masculino e eles tem que se adaptar à inserção
da mulher no trabalho offshore. Já embarquei numa plataforma que
só tinha eu de mulher [...] para as meninas é um desafio.(M, técnica
de automação)
45

De acordo com Puppin, essa discriminação se configura numa tradição


cultural e se faz presente num sentimento difuso e estranhado de “usurpação que os
homens tem com relação à entrada desses “novos” atores na arena do mercado,
(p.155) e acrescenta que, o fato das mulheres estarem sendo alocadas em áreas ou
funções que tradicionalmente são reservadas aos homens não configura uma
ruptura com os modelos de divisão sexual do trabalho. (PUPPIN, 2001)

Do assédio sexual

A abordagem desse tema parece não ter muita relevância para as mulheres,
porque passa por elas de maneira despercebida. Onze das doze mulheres
entrevistadas responderam que nunca sofreram assédio. Para elas todos são iguais
e procuram tratar todos da mesma forma como são tratadas. No entanto as
respostas dos homens sobre este tema contradizem as respostas das mulheres.

Nunca tive problemas com o assédio sexual mas já sofri no aspecto


profissional por parte de chefes. Eles demonstraram não acreditar na
minha capacidade profissional por ser mulher mas tiveram que
aceitar.(A, Técnica em Instrumentação)

Não é questão de discriminação e sim questão de surpresa deles


quando veem mulher embarcando, pegando ferramentas, eles ficam
surpresos [...], hoje em dia já não tem mais essa questão porque
qualquer problema relacionado a isto a bordo compromete o trabalho
deles (M, Técnica em automação)

O problema maior é o assédio. Ocorre sim mas eu tenho que ter


segurança e atitude. Muitas vezes é externo. Quando, por exemplo,
chegam de fora e dão de cara com uma mulher como acompanhante
eles ficam surpresos e tentam umas gracinhas. (M, Preposto)

Sei de vários casos de assédio tanto assédio indireto, subjetivo ou


como assédio real inclusive de pessoas da gerência e de cargo
superior. Acontece em diversas unidades operacionais. A mulher
sente-se muitas vezes acuada por ser minoria e por estar ali
ocupando “uma vaga que é do homem” [...], se é uma profissional
terceirizada pode sofrer retaliação e até ser mandada embora e pode
ser por causa do grau de necessidade que ela tem determina se ela
aceita ou não. Existe o assédio moral e sexual e é uma realidade. (R,
Efetivo da Estatal)
46

A questão do assédio à mulher demonstra um comportamento agressivo e


abusivo da parte do homem, muitas vezes tolerado pela mulher por causa das
condições de trabalho a que está submetida. Se atentarmos para a entrevista de R,
efetivo da estatal, ele afirma que os assédios nas plataformas ocorrem algumas
vezes de forma velada e outras vezes de forma objetiva e direta por pessoas do staff
superior.
Muitas vezes a mulher, quando está embarcada e é abordada, sutilmente,
pelos colegas ou pelo chefe, não percebe que está sofrendo um assédio. Conforme
declara C, cozinheira:

Lá na plataforma todos me chamam pelo diminutivo. Às vezes eles


pedem para levar um chazinho no camarote para poder conversar e
descontrair... mas eu levo na brincadeira [...] agora já estou até
acostumada.

A forma, muitas vezes, despretensiosa e “carinhosa” como a mulher é tratada


pelos colegas, no ambiente de trabalho, acaba por encobrir as verdadeiras intenções
que estão por detrás do ato da cantada.

Achavam que quando as mulheres começaram a embarcar aquilo lá


era uma bagunça [...] elas eram vistas como prostitutas e não era
nada disso [...], essa questão do assédio existir sempre existiu mas
hoje nem tanto mas há uns anos atrás era pior, com essa questão de
lei é mais complicado [...}, realmente, mulher trabalhando embarcada
você tem de lidar diferente de como você lida com outro homem. Ela
é mais emotiva mas facilita o diálogo. Por exemplo, estou
acompanhando a colega para implantar a unidade porque é um navio
e estou dando um suporte a ela... (a colega é nutricionista e embarca
a dois anos em plataformas) (R, Comissário de bordo)

Nesse depoimento observa-se que, certas atitudes trazem dimensões


recuperadas pela pesquisa de Rago (2007), nos moldes das investidas sexuais dos
contramestres, contra as operárias, prática usual nas fábricas nas primeiras décadas
do século passado, este tipo de comportamento, tratado de forma comum por eles,
ainda permanece. Tal como aquelas mulheres eram tratadas como degeneradas,
fato parecido presenciou por diversas vezes, segundo relatado por R, comissário de
bordo, com as primeiras mulheres que embarcavam nas plataformas, que eram
tratadas como prostitutas (palavras dele). Ao que tudo indica ainda é impingido às
mulheres quando estas dividem um mesmo espaço de trabalho confinado, com os
47

homens. Atualmente o assédio e a discriminação passaram a ser tratados como uma


questão jurídica, passível de punição, se comprovados. Sendo assim os homens
utilizam abordagens sutis para não denotarem explicitamente um assédio ou
discriminação.

Da privacidade

A fronteira entre o que é coletivo e o que é individual dentro do território


offshore é uma linha tênue que na maioria das vezes é ultrapassada criando, muitas
vezes, fonte de tensão entre os sujeitos inseridos no espaço de trabalho. A questão
de privacidade nas plataformas offshore, tem gerado constrangimentos às mulheres,
uma vez que não tem sido levado em consideração o universo particular feminino,
que devido às suas peculiaridades biológicas necessitam de um espaço privado. Os
depoimentos a seguir são exemplos do que ocorrem nas plataformas.

Sobre a questão de camarotes. “quando ocorre de embarcar em


plataformas em que tenho que ficar em camarotes misto, com outros
homens, exijo que seja com um colega da empresa onde trabalho,
porque qualquer problema, eu sei que vou ser ouvida”. (M, técnica
em manutenção)

Na plataforma a mulher é tratada como qualquer homem. Ainda não


é um ambiente preparado para receber a mulher [...], aí as próprias
estruturas das sondas não estão preparadas para receber mulher
como quartos e banheiros individuais [...] ainda é muito complicado.
(M, fiscal de instrumentação)

O percentual de mulheres trabalhando não chega a 5% do total de


homens e então só tem 01camarote [...] se tiver mais que 05
mulheres tem que dividir [...] sei porque embarco em várias
plataformas. (R, comissário de bordo)

A questão dos camarotes. São ocorrências reais e já aconteceu,


inclusive com pessoas da minha família ficar junto com outros
homens. Não é uma normalidade mas acontece com anuência e o
conhecimento da gerência. A questão da higienização, por exemplo,
dos banheiros dos homens é muito complicado para a mulher porque
são necessidades diferentes, oriundas da diferença de gênero e a
privacidade é uma questão de saúde e liberdade para a mulher.
Verifica aí uma questão de falta de organização que não é priorizado
talvez porque a maioria seja masculina e seja difícil para a gerência
administrar. Tem sido uma reclamação constante das mulheres e
pelo fato de serem minoria acabam não sendo ouvidas. (R, efetivo da
estatal)
48

R, efetivo da estatal explicita a real necessidade das mulheres quanto à


privacidade de determinados ambientes. Como relatado por ele, a questão de
higiene, saúde e a falta de liberdade, para as mulheres, por ter dividir o banheiro ou
o vestuário coletivo, denota a precarização das condições do trabalho feminino,
característica da flexibilização, em curso, no mundo do trabalho.
Para Fischer a despeito das dificuldades, o espaço é um lugar de
enraizamento. Para o autor, o espaço está ligado, ao mesmo tempo, à sobrevivência
biológica e de existência psicológica, dessa forma o sujeito busca meios de se
apropriar desse espaço pelo jogo da territorialidade que envolve relações de poder.
(FISCHER, 1990 apud CHANLAT, 2002)
Nesse caso observa-se visivelmente a legitimação, pelos homens, das
concepções de poder relacional, que reforçam as assimetrias de gênero nos
espaços de trabalho das plataformas offshore.

Das relações familiares

Um dos aspectos colocados pelas entrevistadas foi a condição simultânea da


duplicidade de papéis. De todas as entrevistadas apenas 03 (três) delas tem filhos,
que precisam ficar com uma pessoa próxima da família, no período em que estão
embarcadas.

Na minha ausência a responsabilidade da casa e dos filhos fica com


o meu marido e a minha mãe. O sentimento que tenho é que parece
que é o último dia que tenho, quero aproveitar os filhos, o marido e
bate aquela tristeza do isolamento, confinamento, onde deixamos em
casa tudo o que gostamos, no ônibus também é ruim é quando estou
sozinha no caminho para ficar 14 dias sem a família, nos primeiros
embarques foram muuuuuuito difíceis, pois eu era uma mãe super
presente, todos os meus programas eram com os meus filhos e de
uma hora para outra sumir, foi bem sofrido para mim e para eles, eu
chorava o tempo todo, ninguém acreditava que eu agüentaria, mas
graças a Deus estou até hoje. Na época, foi um sonho que virou
pesadelo, no segundo embarque cheguei a pedir demissão na
empresa, mas superei e eles também. Quando comecei a embarcar
a menina tinha 08 anos (hoje com treze) e o menino 12 anos (hoje 17
anos ). (S, Técnica)

As filhas tem que ficar coma mãe [...], o tempo livre é para ficar com
as filhas, ver minhas dívidas minhas responsabilidades trabalho e
49

contas. Não dá tempo para o tempo livre. Sou a chefe de família [...]
não tenho ajuda financeira do pai delas. (O, Taifeira)

Durante o tempo de trabalho minha filha fica com a minha mãe que
cuida, leva e busca no colégio (M, preposto)

Dois modelos estão inseridos nas problemáticas apresentadas pelas


entrevistadas e que Hirata & Kergoat (2007) analisam como uma conceitualização
de vínculo social entre as esferas doméstica e profissional. O modelo de delegação
de tarefas é uma forma usada pelas três mulheres, durante a sua ausência. Todas
delegam os cuidados dos filhos e da casa para a suas mães. Paradoxalmente essas
mulheres precisam conciliar a vida pessoal, que inclui a esfera doméstica, com a
vida profissional. Esse modelo de conciliação aparece como questão eminentemente
assimétrica pendendo para o lado da mulher que precisa trabalhar mas que no
tempo “livre” está absorvida com as tarefas voltadas para o cuidado com o lar, a
família, etc. Como forma de suprir a ausência elas se desdobram para dar conta de
uma série de compromissos no período em que estão desembarcadas e com isso
elas acabam por exercer uma dupla jornada de trabalho.
Dentre as 12 (doze) mulheres entrevistadas 09 (nove) são solteiras. De
acordo com elas, na ordem de prioridades, o relacionamento pessoal, no momento,
não está nos seus planos. Os projetos pessoais relacionados a vida à dois, como
casamento e maternidade são adiados com mais frequência.

Manter um relacionamento amoroso é ainda mais difícil também pelo


longo período de ausência. Observo na plataforma que este tipo de
trabalho, na maioria das vezes leva a um declínio no relacionamento
[...], conheço casos de colegas que já estão no segundo e até
terceiro casamento. (A, Técnica)

Família, trabalho, estudo...relacionamento pessoal vem em último


lugar.(M, Técnica)

No quadro de mulheres que trabalham embarcadas, na grande


maioria são de solteiras. Algumas solteiras já revelaram a dificuldade
de se relacionar, de ter um relacionamento afetivo que implica na
continuidade... O tipo de trabalho offshore é um limite para o
relacionamento afetivo. No tempo livre, no caso da mulher solteira,
ela foca mais nos estudos. (R, efetivo)

Com base em Bruschini (2007), as mulheres atualmente estão cada vez mais
voltadas para o trabalho remunerado e expansão da escolaridade com ingressos,
cada vez mais, em universidades, que viabilizem acesso a novas oportunidades de
50

trabalho. O acesso a carreiras e a profissões de prestígio tem revelado uma nova


identidade feminina com novos padrões culturais. Dessa forma as mulheres com
idades entre 25 a 35 anos, inseridas nas indústrias de petróleo, tem suas prioridades
mais voltadas para a concretização de conquistas de postos mais elevados de
trabalho e realização profissional do que para um compromisso voltado para a
realização pessoal.
Retomando o questionamento anterior sobre o porquê da escolha das
mulheres pelo campo de trabalho, onde a concentração masculina é majoritária, o
trabalho considerado perigoso e pesado, verifica-se uma identificação nas respostas
das próprias entrevistadas, embora as entrevistas tenham sido feitas
individualmente, em caráter reservado e em dias alternados.

Embora eu goste da profissão embarco porque acho financeiramente


compensador. (A, técnica em instrumentação)

No período não passei no vestibular do curso que pretendia fazer e


estava precisando de dinheiro então escolhi trabalhar no mercado
offshore de petróleo e gás por causa do boom de que vai dar
dinheiro. (M, fiscal de instrumentação)

A ordem financeira contribuiu, foi prioridade na escolha. (M, técnica


em solo marinho)
O salário não é ruím, financeiramente é bom e se iguala com os dos
homens mas ainda não é ideal [...] pretendo trabalhar embarcada,
estou me preparando para isso. O trabalho em plataformas você fica
isolado sim mas financeiramente é mais compensador (M, preposto)

O ramo petrolífero é de alto risco, de confinamento, alta


periculosidade então as empresas procuram oferecer como atrativos
para o trabalho offshore salários ”compensadores” somados a
benefícios como 14º salário, participação nos resultados, planos de
saúde de 1ª linha. (R, efetivo da estatal)

Como se pode observar, o fator preponderante para o trabalho offshore está


condicionado à ordem financeira e é o que faz o trabalho offshore ser tão atraente.
Durante as entrevistas, com as mulheres, ficou muito evidente essa preocupação.
De fato a questão financeira está na ordem das prioridades para suas vidas. Nesse
caso, para as mulheres, o status de uma independência econômica está aliado ao
seu desejo de perseguir a sua emancipação na esfera profissional e pessoal.
51

CONCLUSÃO
52

CONCLUSÃO

O parque industrial de petróleo e gás foi um dos setores onde mais se


verificou, na década de 1980, a intensificação do processo de modernização no
Brasil. Há de se registrar que esse processo de modernização se caracterizou pela
implantação de inovações tecnológicas no setor petrolífero.
As plataformas de petróleo abarcam dois polos de trabalho dentro de uma
estrutura complexa, cada um com suas exigências. Um desses polos é o de
hotelaria e saúde, com profissionais de diversas áreas de apoio de serviços a bordo.
Para os profissionais da área de saúde e nutrição, estes devem ter curso superior ou
no caso da enfermagem, comissariado e chefes de cozinha o curso técnico. Para os
serviços de base é exigido o curso médio e em alguns casos o ensino fundamental.
O outro polo é todo o sistema sociotécnico operacional com seus sub-sistemas.
Nesses sistemas o profissional requisitado para compor esse nicho, considerado de
excelência, deve ser altamente qualificado e multifuncional Nesse sentido o campo
de trabalho na indústria de petróleo passou a ser considerado um mercado aquecido
e de alta demanda para profissionais de diversos setores voltados para o campo
petrolífero.
No caso das mulheres, muitas vezes, o nível de exigência é bem maior para a
sua inserção, que devem ser extremamente qualificadas para as áreas operacionais
das plataformas offshore, de maneira que possam competir de igual nível com os
homens num espaço dominado por mais de 90% deles. É nesse espaço,
considerado campo privilegiado de trabalho masculino, que as mulheres passaram a
marcar presença nas últimas três décadas.
Após as entrevistas, ao se fazer o cruzamento das respostas encontra-se
sinalizadas questões similares, expostas pela maioria das entrevistadas, dentre elas:
a necessidade de mostrar um trabalho eficiente tendo como parâmetro o trabalho
masculino; adaptação às estruturas dos espaços de atividades extra-laborais,
voltadas mais para o gueto masculino; dificuldades de continuidade nos cursos de
especializações e graduações, devido ao tempo de confinamento na plataforma e a
famosa TPE (tensão pré-embarque), que acomete o profissional dois dias antes de
embarcar e desembarcar. No caso da mulher esta síndrome aliada a outros fatores,
característicos da função hormonal feminina e o acúmulo da carga horária de
53

trabalho offshore, acaba por levar ao extremo cansaço já no décimo dia de trabalho,
antes do desembarque.
Evidentemente todas as questões elencadas neste trabalho, desde o primeiro
capítulo até o terceiro, são pertinentes para se compreender a relevância das
mulheres sob a perspectiva de que podem, de certa forma, interferir na realidade de
um dado ambiente de trabalho onde, há bem poucas décadas atrás, se contava
como uma história única “o clube do bolinha”.
Entretanto o que mais é instigante, nesse marco histórico, está oculto nas
falas de todas as entrevistadas. Percebe-se que o que mais atrai as mulheres para
esse reduto de trabalho masculino é a emancipação através do poder aquisitivo mais
elevado, comparado com o trabalho onshore (designação para atividade petrolífera,
em terra).
Aqui, deste ponto, retorna-se ao título do tema: “mulheres no trabalho offshore
das indústrias petrolíferas: emancipação ou exploração”?
De fato as mulheres foram emancipadas através do trabalho? Ou seja,
realmente o trabalho, na esfera produtiva, contribuiu para a emancipação feminina?
E quanto a exploração? Podemos afirmar que faz parte do passado remoto do início
da industrialização ou ainda se faz presente nas relações sociais de trabalho?
De acordo com a mais recente história do capitalismo, do atual contexto da
hegemonia do capital financeiro, o processo de modernização das indústrias
apontou para notáveis avanços relativos à inserção das mulheres no campo
profissional. Porém é notório que tais avanços no campo de trabalho remunerado
não conseguiram retrair as condições de desigualdades nos espaços públicos de
trabalho, como podemos observar nos gráficos acimas, apresentados pelo IBGE
(INSTITUTO BRASILEIRO DE GEOGRAFIA E ESTATÍSTICAS), Segundo Puppin,
tais relações de trabalho, no que se refere ao trabalho feminino se mantém no
mesmo patamar, no mínimo, do século passado.

À ampliação no grau de formalização das relações do trabalho


feminino, atestam-se modificações que não deixam de ocultar,
porém, a permanência de desvantagens em termos das condições
de emprego da mulher frente ao homem, dadas pela segregação
ocupacional, diferenciação salarial e pela entrada minoritária de
mulheres [...] nas organizações brasileiras [...] as quais configuram o
fenômeno de exclusão e social closure. (PUPPIN, 2001, p.183)
54

Observa-se que na esfera de produção, especialmente se for um espaço


majoritariamente masculino, as mulheres se defrontam com uma tendência restritiva
à sua presença, como estereótipos consagrados pelo senso comum que, segundo
Scott, “pode levar ao acirramento das desigualdades sociais prevalentes entre os
gêneros”. (SCOTT, 1988 apud PUPPIN, 2001, p.184)
Da mesma forma ocorre com a mulher na esfera privada. É histórica a
questão de dominação/exploração verificada nas relações de gênero na esfera
reprodutiva. As mulheres ao absorver atividades produtivas fora do lar duplicaram a
sua jornada de trabalho articulando as responsabilidades com a manutenção das
tarefas domésticas, antes e depois do trabalho remunerado. Desta forma, recai
sobre ela os sacrifícios de conciliar ambas as tarefas porque, de igual modo na
esfera pública, as desigualdades pela diferenciação física/biológica,
assimetricamente, tende para a mulher.
Nogueira colabora com um questionamento sobre o fenômeno da feminização
do mundo do trabalho. “O fenômeno constituiria um novo e importante passo rumo à
emancipação da mulher através do trabalho [...]”? (p.88). De acordo com a autora,
dada as metamorfoses no mundo do trabalho, tal fenômeno, por um lado é positivo
porque permite avançar no difícil processo de emancipação feminina podendo
minimizar a dominação patriarcal no espaço doméstico. Por outro lado, afirma ainda
Nogueira, ocorre um processo inverso, negativo, pois através das atividades no
espaço reprodutivo o capital acaba incorporando o trabalho feminino, tornando-o
mais apropriado às novas formas de exploração pelo capital produtivo.
(NOGUEIRA, 2004)
Portanto, segundo Nogueira, o capitalismo transita na dimensão do duplo
sentido. No movimento contraditório ele cria condições de emancipação feminina ao
mesmo tempo em que acentua a sua exploração dentro de uma relação
aparentemente “harmônica”.(NOGUEIRA, 2004)
Diante das exposições das autoras, fica patente que o capital se opõe ao
processo de emancipação feminina. A lei do capital que incita o jogo de poder
masculino versus feminino é a mesma que para subordinar a mulher necessita de
preservar seu sistema de dominação do trabalho feminino.
Para concluir. De que emancipação as mulheres buscam mesmo?
O trabalho offshore nas plataformas de petróleo, através das lentes cor de
rosa das entrevistadas, reúne as virtudes de um cenário que possibilite a conquista
55

da emancipação pessoal e profissional através da ordem financeira. Em parte pode


ser verdadeira, uma vez que parte da conquista do trabalho feminino é e sempre
será funcional para o processo produtivo, como vimos nos parágrafos anteriores. Se
emancipação feminina é uma realidade no contexto atual do mundo do trabalho,
então não faz sentido as desigualdades, as explorações, as dominações, as
discriminações, as delegações e conciliações que recaem sobre as mulheres tanto
nas esferas privadas quanto nas esferas públicas.
No caso do trabalho offshore, o fato de uma pequena fatia de mulheres se
inserirem no espaço majoritariamente masculino é um avanço histórico, mas,
comprovadamente, não se pode considerar como uma conquista emancipatória nos
marcos dos direitos da igualdade.
Bem lembrado por Mészáros, “as promessas não cumpridas e impossíveis de
serem realizadas pelo sistema do capital transformam a grandiosa causa da
emancipação feminina numa impossibilidade dentro do domínio do capital”.
(MÉSZÁROS, 2002, p.223).
56

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IBGE/2009
WWW.Jurisway.org.br/v2/dhal.asp?id_dh=6254 – LEGISLAÇÃO DOS DIREITOS DO
TRABALHO DA MULHER: uma perspectiva de sua evolução. Acesso em julho/2013
59
60

ANEXOS
61

ANEXO I

ROTEIRO DE ENTREVISTA

IDENTIFICAÇÃO PESSOAL
1. Sexo, idade, estado civil, nº de filhos.
2. Nível de instrução.
3. Gostaria de estudar mais?
4. Existe algum curso que deseja fazer?
5. Em que ordem de importância você poria as seguintes coisas na sua vida?
- Trabalho
- Estudo
- Família
- Amigos
- Relacionamento pessoal

IDENTIFICAÇÀO PROFISSIONAL
1. Qual é a sua profissão?
2. Qual o ramo da empresa em que trabalha?
3. Qual função ocupa e há quantos anos trabalha na empresa?
4. Você fez algum curso ou treinamento de qualificação para ocupar a função que
atualmente exerce na empresa?
5. Como você chegou à escolha de sua atividade profissional?
6. Como é o seu contrato de trabalho? (CLT, formal com todos os direitos ou
contrato)
7. Em relação aos chamados “benefícios sociais”, quais os que você recebe da
empresa e se são extensivo à sua família.
8. Qual é a sua jornada diária de trabalho?
9. Como são os seus intervalos? (almoço, descanso, etc.)
10. Durante a sua jornada de trabalho você realiza tarefas para as quais não foi
contratada?
11. Você acha que seu salário é compatível com a função que você exerce na
empresa?
62

12. O seu salário é fundamental para a manutenção da sua família ou é


complemento do orçamento doméstico?
13. Na sua ausência quem se responsabiliza pela casa?
14. No seu tempo livre o que faz?
15. Descreva o cotidiano do seu trabalho (ambiente, relação com outros
profissionais, subordinados e chefes).
16. Qual o significado do trabalho offshore para você? Tem a ver mais com a
satisfação de ordem financeira ou com realização profissional?
17. Fale sobre a questão da diferença entre os períodos de trabalho de 14 x 14 dias
para os terceirizados e 14 x 21 dias para os efetivos da Petrobrás. Isso implica na
relação de trabalho entre os colegas que exercem a mesma função?
18. Sabe-se que durante o período de confinamento a carga horária diária é de 12 /
12hs e no final de cada 7 dias a inversão de turno. Que rebatimentos essa
alternância acarretam na sua vida?
19. TPE (Tensão Pré-embarque). Como você enfrenta a antecipação de embarcar e
quantos dias antes isto começa a te incomodar?
20. Você acredita que o tipo de trabalho, que atualmente desempenha, tem afetado
de alguma forma, suas condições de saúde e as de seus colegas de trabalho?
21. Você acha que sua identidade feminina afeta sua situação profissional na
empresa, em termos de uma maior ou menor dificuldade de acesso a posições ou de
melhor ou pior recepção por parte dos colegas/subordinados/chefes?
22. Para você, existem padrões diferenciados de tratamento, em relação ao trabalho,
para as mulheres e homens na empresa em que trabalha?
23. Já sofreu algum tipo de preconceito, discriminação ou assédio moral/sexual, por
ser mulher que trabalha num espaço determinado como masculino?
24. O trabalho offshore, de confinamento por 14 dias, tem afetado sua relação
pessoal com os outros membros de sua família, amigos?
25. Acredita que profissionalmente já alcançou as metas programadas ou ainda tem
vontade de realizar mais alguma coisa?
26. Você gostaria de falar mais alguma coisa? (trabalho, profissão ou vida pessoal)
27. Autoriza o uso dos dados acima, sem mencionar nome pessoal e da empresa, no
Trabalho de Conclusão do Curso de Serviço Social da UFF
63

ANEXO II

LEGISLAÇÃO BRASILEIRA SOBRE OS DIREITOS DA MULHER

Código de trabalho - 1912. Primeiro passo na criação da norma de proteção ao


trabalho da mulher. Criação do projeto do código de trabalho que apresentava uma
legislação específica do trabalho da mulher, tais como: liberdade para obtenção de
emprego, independentemente de autorização do marido, jornada diária limitada a 8
horas, licença de 15 a 25 dias antes do parto e até 25 dias após e percepção de 1/3
do salário no primeiro período e metade do segundo.
Decreto 21.417 – 1932. Instituiu a proibição do trabalho da mulher no período
noturno, compreendido das 22 horas às 5 horas do dia seguinte e proibindo a
remoção de pesos. Concedia à mulher 2 descansos diários de meia hora cada um
para amamentação dos filhos, durante os 6 primeiros meses de vida.

As Constituições Federais

A Constituição de 1932
A primeira Constituição a tratar sobre o tema dos direitos do trabalho da
mulher foi a que foi promulgada em 1932. Em seu artigo 121, ela proibiu a
discriminação das mulheres quanto aos salários, além de estabelecer outras
garantias, tais como a proibição do trabalho da mulher em locais insalubres,
o direito ao gozo de repouso antes e após o parto sem prejuízo do salário e do
emprego e alguns serviços que deveriam ser disponibilizados em amparo à
maternidade, tais como a instituição da previdência em favor da mesma.

A Constituição de 1934
A Constituição de 1934 abandonou os ideais do pensamento liberal do tempo
de início da república. Seu texto já continha muitos direitos protetivos do trabalhador.
Direitos esses, muitos já conquistados por diferentes categorias profissionais, dentre
eles, a jornada diária de 8 horas, o descanso semanal, as férias anuais
remuneradas, a igualdade de salário entre homens e mulheres, a proibição do
64

trabalho feminino em ambientes insalubres, a assistência médica e sanitária à


gestante, o salário maternidade e a licença maternidade.

A Constituição de 1937
Frutificada por um golpe de Estado promovido pelo presidente Getúlio
Vargas, a Constituição de 1937 garantiu assistência médica e higiênica à gestante,
antes e depois do parto, sem prejuízo do emprego e do salário da empregada.
Entretanto, omitiu de seu texto questões relativas à garantia de emprego à gestante
e à isonomia salarial entre homens e mulheres. Em decorrência disso, o Decreto-lei
n. 2.548 abriu a possibilidade de as mulheres perceberem salários até dez por cento
menores do que os pagos aos homens.

A Constituição de 1946
Surgida em substituição à que foi imposta em 1937, a Constituição de 1946
trouxe de novidade, além dos direitos já existentes dos trabalhadores do Brasil, a
assistência aos desempregados, garantia do direito de greve e participação
obrigatória e direta no lucro das empresas.

A Constituição de 1967
Com as restruturação política oriunda do golpe militar de 1964, a
Constituição de 1967 foi promulgada em substituição à de 1946 e trouxe consigo
grandes alterações no seu texto através da Emenda Constitucional n.1 de 17 de
outubro de 1969. Trouxe inovações com a proibição de critérios de admissão
diferentes por motivo de sexo, cor ou estado civil, além de assegurar aposentadoria
à mulher aos 30 anos e com salário integral.

A Constituição de 1988
Direito à licença gestante de 120 dias, sem prejuízo do emprego ou salário,
realização de ações que visassem a proteção do trabalho da mulher, proibição de
diferenças de salários, estabelecimento de critérios de admissão e exercício de
função em função do gênero e igualdade de direitos e obrigações entre homens e
mulheres. Estas foram as principais conquistas que a Constituição de 1988 veio
assegurar para as mulheres, dentre outros direitos, embora se saiba que,
infelizmente, ainda hoje há muita diferenciação no mercado de trabalho.
65

A Consolidação das Leis do Trabalho


1943 - avanço na edição de normas protetivas à mulher, que foi a promulgação da
CLT (Consolidação das Leis Trabalhistas), consolidando todas as matérias relativas
ao trabalho, dentre elas o da mulher.
1944 – primeira alteração, quando foi admitido o trabalho noturno da mulher em
algumas atividades, desde que ela seja maior de 18 anos.
Capítulo III do Título III - destinado exclusivamente ao trabalho da mulher, dispostos
nas seguintes seções:
I. Da duração,condições do trabalho e da discriminação contra a mulher;
II. Do trabalho noturno;
III. Dos períodos de descanso;
IV. Dos métodos e locais de trabalho;
V. Da proteção à maternidade
VI. Das penalidades

Os direitos do trabalho da mulher na atualidade

O salário da mulher
No Art. 7º da Constituição Federal, assim como no Art. 5º da CLT está
expressa a proibição de diferença de salarial, de exercício de funções e de critério
de admissão por motivo de sexo, idade, cor ou estado civil.

A duração do trabalho da mulher


A jornada de trabalho da mulher é igual à dos homens. Ou seja, 8 horas
diárias e 44 horas semanais, exceto nos casos para os quais for fixada duração
inferior, conforme preceitua o Art. 373 da CLT e o Art. 7º, inciso XIII da CF.

As horas extras
Em relação à prorrogação e compensação de jornada de trabalho, aplicam-
se as mesmas regras pertinentes ao trabalho do homem.
O fato é que os artigos 374 e 375 que tratavam desta questão foram
revogados pela Lei 7.855/89 e, ainda, o artigo 376, que limitava o direito à realização
de horas extras pela mulher, foi revogado pela Lei 10.244/01.
66

Os períodos de descanso
Com relação aos intervalos para descanso, há diferenças entre a legislação
voltada para as mulheres e a dos homens.

O Art. 384 da CLT diz que nos casos de prorrogação do horário normal, será
obrigatório um descanso de 15 minutos no mínimo, antes do início do período
extraordinário do trabalho.

Assim como no caso do trabalho masculino, o ideal é que o repouso semanal


remunerado seja preferencialmente aos domingos, o que pode não necessariamente
ocorrer. Entretanto, no caso das mulheres, se elas optarem por qualquer outro dia
que não seja o domingo, é obrigatória a criação de uma escala de revezamento
quinzenal, para que, pelo menos de quinze em quinze dias, o repouso semanal
remunerado coincida com o domingo.
Tal determinação de criação da escala de revezamento está expressa no Art.
386 da CLT:

Para os casos de períodos de descanso, prevalecem as mesmas normas


aplicáveis ao trabalho do homem. O Art. 382 da CLT diz que Entre 2 jornadas de
trabalho, haverá um intervalo de 11 horas consecutivas, no mínimo, que deverão ser
destinadas ao repouso.
No caso do intervalo dentro da jornada diária, o Art. 383 também não reserva
diferenciações e privilégios com relação ao trabalho das mulheres. O tempo do
intervalo para homens e mulheres é o mesmo, ou seja, um período não inferior a
1 hora nem superior a 2 horas.

O trabalho noturno
Atualmente, não há mais proibição do trabalho noturno pela mulher. A Lei
7.855 de 1989 revogou os artigos 379 e 380 da CLT que tratavam desta questão. As
regras são as mesmas para os homens e mulheres, ou seja:
-Período noturno compreendido das 22 horas até as 5 horas do dia seguinte;
- Adicional noturno de no mínimo 20% superior à hora diurna, no caso dos
trabalhadores urbanos;
67

- Hora noturna reduzida de 52 minutos e 30 segundos;

Os trabalhos perigosos ou insalubres


A proibição constante na alínea "b" do artigo 387 da CLT que vedava a
possibilidade da realização de trabalhos perigosos ou insalubres pelas mulheres foi
revogada pela Lei 7.855/89 .
Desta forma, em se tratando de atividades perigosas, insalubres ou penosas,
valem as mesmas regras referentes ao trabalho masculino.

O trabalho em minas
A mesma lei aludida acima (Lei 7.855/89) também revogou o artigo 387 da
CLT que vedava a possibilidade de realização de trabalho nas minerações em
subsolo, nas pedreiras e obras de construção pública e particular pelas mulheres.
Assim sendo, também não há mais diferenciação entre o trabalho dos
homens e mulheres nas minas.

O trabalho com benzeno


A convenção 136 da OIT que trata da proteção contras os riscos de
intoxicação provocados por benzeno foi ratificada pelo Brasil em 1992, através do
Decreto nº 76.
Portanto, é proibido que mulheres grávidas ou em período de amamentação
trabalhem em locais em que haja a exposição ao benzeno.
Os limites de peso
O Art. 390 da CLT limita o emprego da força física das mulheres na
prestação dos serviços, tendo em vista suas peculiaridades físicas que as impedem
de obter uma força maior para tal. O limite máximo é de 20 quilos para o trabalho
contínuo ou 25 quilos para o trabalho ocasional.
Há uma exceção neste Artigo, que deve ocorrer sempre que o trabalho trate-
se de remoção realizada por impulso ou tração de vagonetes sobre trilhos, de carros
de mão ou quaisquer aparelhos mecânicos.

As condições de trabalho
O Art. 389 da CLT determina as condições básicas para prestação do serviço
nas mínimas condições exigidas para as mulheres.
68

A existência de um local de trabalho em condições mínimas de existência


com higiene, limpeza, iluminação, recursos de proteção individual e estrutura física
adequada é condição sine qua non para o efetivo exercício da prestação laboral,
independente do gênero da pessoa.

O casamento da empregada
No Art. 391 da CLT está determinada a proibição de qualquer conduta de
discriminação constituindo justo motivo para rescisão do contrato de trabalho, o fato
da mulher ter contraído matrimônio ou encontrar-se em estado de gravidez. A
mesma proibição prevalece nos casos do empregador utilizar-se desses argumentos
como critério para não contratação das mulheres.

A proibição de práticas discriminatórias


É proibida a exigência de atestado de gravidez ou de atestado de
esterilização para fins de contratação, bem como qualquer prática discriminatória
que se utilize deste argumento para não contratar, não promover, dispensar do
trabalho, remunerar e oferecer oportunidades de ascensão profissional de forma
diferenciada e/ou impedir o acesso para inscrição ou aprovação em concursos. É
proibido também proceder o empregador ou preposto a revistas íntimas nas
empregadas ou funcionárias.
Tais proibições estão explicitadas no Art. 373-A da CLT.

A empregada gestante
Licença maternidade
Considerou a Constituição Federal de 1988, em seu Art. 7º, XVIII, bem como
a CLT, eu seu Art. 392, como direito fundamental, o afastamento de cento e vinte
dias da gestante, com garantia de seu emprego e do salário correspondente.
Nesse período, cujo afastamento é compulsório, interrompe-se o contrato de
trabalho e a remuneração devida à empregada (salários integrais), constitui o que se
denomina salário-maternidade, benefício de natureza previdenciária, regulamentado
pela Lei n.º 8.213/91 e pelos Decretos n.º 611/92 e n.º 2.172/97.

A Lei 11.770, de 9 de setembro de 2008, instituiu a prorrogação da duração


da licença maternidade por mais 60 dias, que também será garantida, na mesma
69

proporção, à empregada que adotar ou obtiver guarda judicial para fins de adoção
de criança.
O beneficio da prorrogação da licença maternidade para 180 dias também é
extensível às mulheres que adotarem ou obtiverem guarda judicial para fins de
adoção de criança.
O prazo para afastamento
No inciso 1º do Art. 392 da CLT, a legislação estabelece que seja certificado
o início do afastamento através de atestado médico e que o início de tal período
poderá ocorrer entre o 28º dia
antes do parto e a ocorrência deste.
No inciso 2º do mesmo Artigo, a Lei permite a prorrogação tanto do período
anterior ao parto quanto do período posterior, desde que atenda ao limite máximo de
2 semanas.
Em caso de antecipação do parto, o prazo de licença continua sendo de 120
dias(180 dias no caso da prorrogação), e contará a partir do dia em que ela tenha
“entrado em trabalho de parto”. Isso está previsto no Art.392, inciso 3º.
O salário da mulher durante a licença maternidade
Está explícito no Art. 393 da CLT que salário da mulher, durante seu
afastamento, será pago de forma integral e quanto for variável, será calculado com
base na média dos 6 últimos meses de trabalho. Também lhe é assegurada os
direitos e vantagens adquiridas, inclusive o retorno à mesma função que ocupava.
Atividade prejudicial à gestação
O Art. 394 da CLT fala que, nos casos em que o trabalho é prejudicial à
gestação, a mulher pode pedir a rescisão do contrato de trabalho, com dispensa do
aviso prévio.
A licença maternidade na adoção
A mulher que adotar ou obtiver guarda judicial de criança também terá direito
à licença maternidade, sendo obrigatório para usufruir de tal benefício, a
apresentação do termo judicial de guarda à adotante ou guardiã. Isso está
determinado no Art. 392-A da CLT.

O Aborto
O Art. 395 da CLT trata especificamente do aborto e diz que nos casos em
que o aborto não é criminoso, a mulher tem direito a um repouso remunerado de 2
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semanas, ficando-lhe assegurado o direito de retornar à função que ocupava antes


de seu afastamento.

O período de amamentação
O Art. 396 da CLT concede à mulher a dois descansos especiais, de meia
hora cada um, para amamentar o filho, até que ele complete seis meses de vida. A
Lei concede também uma dilatação desse prazo de 6 meses, caso a saúde do filho
exigir.
Há ainda a obrigação dos estabelecimentos com no mínimo 30 mulheres e
todas com idade acima de 16 anos, de propiciarem um local adequado onde as
empregadas poderão deixar seus filhos durante o período de amamentação.
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Anexo III
Fotos de Plataformas Offshore- Brasil.

Fonte:http:/ http://www.google.com.br acesso em 25 de Julho de 2013

Fonte:http:/ http://www.google.com.br acesso em 25 de Julho de 2013


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RIO DAS OSTRAS


2013.1

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