Pedagogias Brasileiras em Educação Musical

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Heitor Villa-Lobos
Antônio de Sá Pereira
Liddy Chiaffarelli Mignone
Gazzi Galvão de Sá
Hans-Ioachim Koellreutter
Esther Scliar
Iosé Eduardo Gramani
Lucas Ciavatta

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Av. Vicente Machado, 317. 14° andar
Centro . CEP 80420-010 _ Curitiba. PR. Brasil
Fone: (41) 2103-7306
www.editoraintersaberes.com.br
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Conselho editorial Dr. Ivo Iosé Both (presidente); Dr? Elena Godoy;
Dr. Nelson Luís Dias; Dr. Neri dos Santos;
Dr. Ulf Gregor Baranow
Editor-chefe Lindsay Azambuja
Editor-assistente Ariadne Nunes Wenger
Preparação do originais Tiago Marinaska
Capa e projeto grâfico Sílvio Gabriel Spannenberg
Imagens do capa Fotolia
Iconografia Vanessa Plugiti Pereira
ilustrações Vinicius Buzzatto

Dados Internacionais de Catalogação na Publicação (CIP)


[Camara Brasileira do Livro, SP, Brasil)

Pedagogias brasileiras em educação musical/Teresa Mateiro. Beatriz Ilari


{0rg.). Curitiba: Interãaberes, 2016. (Série Educação Musical).

Vários autores.
Bibliografia.
ISBN 978-85-443-0230-9

1. Música - Estudo e ensino 2. Música na educação 3. Música na educação -


Aspectos psicológicos 4. Pedagogia I. Mateiro, Teresa. Il. Ilari, Beatriz. III. Série.

15-05585 CDD-371.9

Índices para catálogo sistemático:


1. Música: Educação 371.9

1* edição, 2016.
Foi feito o depósito legal.

Informamos que é de inteira responsabilidade das organizadoras a emissão de conceitos.


Nenhuma parte desta publicação podera ser reproduzida por qualquer meio ou forma sem
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a prévia autorização da Editora Interfšaberes.
A violação dos direitos autorais é crime estabelecido na Lei 11. 9.610/1998 e punido pelo
art. 184 do Codigo Penal.
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Agradecimentos, 7 Sala de aula, '79


Prefácio, 9 2.4 Aplicação do método de Sá Pereira em sala de aula, 79
Apresentação, 23
Capítulo 3 - Liddy Chiaffarelli Mignone:
Capítulo 1 - Heitor Villa-Lobos e o canto orfeônico: sensibilidade e renovação no estudo de música, 97
o nacionalismo na educação musical, 27 Inês de Almeida Rocha
Gabriel Ferraz Ideias, 99
Ideias, 29 3.1 Educação musical como experiência estética, 99
1.1 O canto orfeõnico de Villa-Lobos: educação musical e Vida e obra, 105
ideologia politica, 29 3.2 De cantora a professora: uma mulher múltipla, 105
Vida e obra, 34 Proposta pedagógica, 111
1.2 Infância e adolescência, 34 3.3 Iniciação Musical e formação de professores, 111
Proposta pedagogica, 49 Sala de aula, 116
1.3 Os ensaios didático-explicativos e as funções do canto 3.4 Brinquedo, jogo e trabalho, 116
orfeñnico: disciplina, civismo, nacionalismo e educação
artística, 49 Capítulo 4 - Gazzi Galvão de Sá: educador musical
Sala de aula, 55 e inovador do movimento de musicalização
1.4 adaptando a Melodia das montanhas, 55 na Paraíba, 121
Maria Cecilia de Araujo Rodrigues Torres
Capítulo 2 - Antônio de Sá Pereira: o ensino Ideias, 123
racionalizado da música, 61 4.1 Fragmentos do contexto historico-social, 123
ƒose' Nunes Fernandes Vida e obra, 126
Ideias, 63 4.2 História de vida musical, 126
2.1 Antônio de Sá Pereira: princípios da nova pedagogia da Proposta pedagogica, 129
música no Brasil na primeira metade do século XX, 63 4.3 Ideias inovadoras e o movimento de canto
Vida e obra, 66 orfefinico, 129
2.2 Origem, formação e carreira artística, 66 4.4 O método e algumas aplicações práticas, 132
Proposta pedagógica, 73 Sala de aula, 135
2.3 O ensino racionalizado da música, 73 4.5 Possibilidades de trabalho na aula de música da escola
regular, 135
Capítulo 5 - Hans-Joachim Koellreutter: a música Proposta pedagógica, 194
e a educaçao em um novo mundo, 139
7.3 O tecer nao tem um porque enquanto ato de
Teca Alencar de Brito
entrelaçar”, 194
Ideias, 141 Sala de aula, 199
5.1 Música e consciência, 141 7.4 “Abrande esta mania de saber, aguce essa maneira de
Vida e obra, 143 sentir, que muito mais gostoso é descobrir”, 199
5.2 Trajetörias koellreutterianas, 143
Proposta pedagógica, 148 Capítulo 8 - Lucas Ciavatta: O Passo - corpo
5.3 Educação e conscientização, 148 e mente no mesmo andamento, 207
Sala de aula, 152 Lucas Ciavarta, Daniela Ferreira e Iodo Santos
5.4 Acerca das propostas, 152
Ideias, 209
8.1 Introdução, 209
Capítulo 6 - Esther Scliar: uma vida para
Vida e obra, 213
a musica, 161
' A

8.2 Origens e infancia, 213


Elba Braga Ramalho
Proposta pedagógica, 217
Ideias, 163 8.3 As quatro atividades do trabalho com O Passo, 217
6.1 Esther Scliar no mundo em movimento, 163 Sala de aula, 228
Vida e obra, 165 8.4 Agrupando os tempos: Compassos Alternados, 228
6.2 A saga de Esther Scliar, 165
Proposta pedagogica, 170
J

Glossario de termos, 231


Í

6.3 Em direção ao pensamento musical, 170 Glossário biográfico, 235


Sala de aula, 173 Anexo A, 239
6.4 Tempo, espaço, ação conjunta, 173 Anexo B, 243
Anexo C, 247
Capítulo 7 - Iosé Eduardo Gramani: rítmica do 501”re “S °"9“"fz“d'”'“S' 253
Gramani - a consciência musical do ritmo, 183
Daniella Gramani e Glória Pereira da Cunha

Ideias, 185
7.1 “O entrelaçar significa”, 185
Vida e obra, 187
7.2 “Além de Olinda ainda se encontra quem renda tece
uma formação não convencional, 187
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Agradecemos imensamente a dedicação de Regina Márcia Simão


Santos, Carlos Kater e Iusamara Souza, que leram o manuscrito e
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compartilharam conosco suas opiniões sobre as pedagogias reuni _

das neste livro. Suas contribuições resultaram nos três comentários


sobre esta coletânea, que podem ser encontrados no final do volume.
Os nossos agradecimentos são também, e principalmente, para os
autores dos capítulos desta obra, que se dedicaram desde o dia 21 de
fevereiro de 2012, quando lhes enviamos a carta-convite. Por fim,
queremos agradecer a atenção e competência da equipe da Editora
lnterSaberes, que, com muito zelo e competência, trabalhou em cada
uma das etapas, tornando possível esta publicação.

Pedagogias brasileiras em educação musical 7


Cecilia Fernandez Conde (Rio de Ianeiro, RI, 1934) é compositora, diretora musical, cantora e educadora musical.
Foi diretora-geral do Conservatório Brasileiro de Música - Centro Universitário (CBM-CEU) até 2014, bem como
criadora e diretora do primeiro curso de Musicoterapia da instituição. Entre 1999 e 2002, fez parte da Equipe de
Coordenação do Projeto Música na Escola, em parceria com a Secretaria Municipal de Educação do Rio de Janeiro
Juntamente com o Professor Darcy Ribeiro,foi coordenadora da Ação Cultural do Programa Especial de Educação da
Secretaria Extraordinária e Programas Especiais do Estado do Rio de Ianeiro na implantação dos Centros Integrados
de Educação Pública (Cieps). Desempenhou aƒunção de subsecretário de Ação Cultural da Secretaria de Estado de
Cultura do Rio de Ianeiro entre 2003 e 2006. Foi coordenadora, em parceria com a Universidade Federal do Estado
do Rio de Ianeiro (Unirio), do XIII Encontro Nacional de Educação Musical da Associação Brasileira de Educação
Musical (Abem) (2004). Compôs músicas para inúmeras peças teatrais e de cinema nas décadas de 1960, 1970 e 1980,
ganhando o Prêmio Molière de Música para Teatro (1970) e o de Música para Teatro Infantil (1972) da Secretaria
de Educação do Estado da Guanabara. É conselheira da Fundação Darcy Ribeiro e da Associação de Amigos do
Museu Nacional de Belas Artes e membro da Academia Brasileira de Música - eleita para a vaga de Bidu Sayão.
Foi agraciada com o Prêmio Nacional de Música - Categoria: Educador - Funarte/Ministério da Cultura (1996).
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Fiquei muito emocionada com o convite das educa- Teresa e Beatriz por realizarem este livro, convidando
doras Teresa Mateiro e Beatriz Ilari para escrever o estudiosos da área a escreverem sobre as pedagogias
prefácio do livro Pedagogias brasileiras em educação brasileiras em educação musical e as influências dos
musical. Não sendo mestra nem doutora na área de pioneiros que criaram metodologias e propostas para
educação musical, imaginei qual seria a razão do a formação dos educadores musicais no país.
convite. Talvez eu tenha sido chamada por ser uma Gostaria de frisar que este prefácio ê, acima de
educadora musical que não escolheu a escrita como tudo, uma conversa - como se estivesse contando
forma de expressão, mas que esteve sempre ansiosa histórias, fatos e comentários da vivência que o
no fazer, no realizar, no criar e no improvisar em tempo de minha existência permite passar para os
vários caminhos em que a música pudesse permitir educadores. Ao ler Pedagogias brasileiras em educação
alguma colaboração para a sociedade e a educação. musical, tão rico e necessário para a compreensão
Apesar de não ter o hábito de escrever, sempre incen- do processo histórico de formação dos educadores
tivei meus alunos a fazê-lo. Parabéns ãs educadoras musicais brasileiros, ousei propor um diálogo ou um

Pedagogias brasileiras em educação musical 9


contraponto com os autores dos capítulos e com os e Liddy Chiaffarelli Mignone. Esse primeiro curso
leitores. Conto com quase 60 anos de trabalho com atendia crianças a partir de 5 anos e abriu as portas do
a música, a educação e a cultura e, por essa razão, CBM, propondo uma visão de um novo fazer musical
pensei em relatar parte de minha trajetória na edu- para todas as crianças. Era um curso básico de vivên-
cação musical - os encontros com quase todos os cias musicais por meio do corpo (ritmo, movimento
pedagogos brasileiros citados no livro e com outros e dança), da audição (desenvolvimento do ouvido
nomes que apresentaram novos olhares e escutas musical), da voz (o canto a uma voz e a várias vozes)
para a referida área do conhecimento. e do tocar (os instrumentos de percussão). A brasili-
Nasci numa família musical: minha mãe, Amália dade de Sá Pereira e Liddy Mignone acolheu os novos
Fernandez Conde, musicista, formada em piano na métodos da época, como os de Maurice Chevais, Emile
Escola Nacional de Música, hoje Escola de Música Iaques-Dalcroze e Carl Orff, educadores com os quais
da UFRI, e ganhadora de medalha de ouro em canto os pedagogos brasileiros tiveram contato em visitas
na mesma instituição; meu tio, o compositor Oscar à Suiça e ã Alemanha. Nas suas práticas pedagógicas,
Lorenzo Fernández, irmão de minha mãe, resolveu incorporaram o folclore brasileiro e a música do
fundar, em 1936, sob sua direção, juntamente com movimento de compositores nacionalistas, como
mais quatro músicosl, todos também medalhista da Villa-Lobos, Lorenzo Fernández, Francisco Mignone
referida escola, o Conservatório Brasileiro de Música e Radamés Gnattali, as pesquisas dos livros de Mário
(CBM). Esta era uma escola de música mais livre, um de Andrade, Luiz Heitor Correia de Azevedo e Renato
local em que seria possível ter autonomia na criação de Almeida, e a leitura dos estudos dos pedagogos e
de novos cursos, conviver com harmonias dissonan- I

filosofos que preconizavam uma nova escola. E impor


ii

tes, sonoridades diversas e muitas discussões, des- tante lembrar que, nessa época, o conhecimento se
pertar diferentes pensamentos nos músicos e sonhar dava por meio da leitura e da escuta.
com um ensino de música de qualidade. Os debates Na década de 1930, havia no país o anseio por
eram um hábito da epoca, dinâmica que provocava o uma educação pública de excelência. Anísio Teixeira,
pensamento dialético, fez surgir então uma proposta grande pedagogo preocupado com a população mais
mais interdisciplinar de educação musical. pobre, criou as escolas-parque, que funcionavam em
Em 1937, com 5 anos de idade, iniciei as aulas do horário integral - na parte da manhã, eram ofere-
curso de Iniciação Musical com Antônio de Sá Pereira cidas as disciplinas normais da educação básica e,
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à tarde, as atividades artísticas. Infelizmente, a partir
1 Us outros quatro fundadores foram Roberta Gonçalves, professora de piano e
Teoria Musical; Rossini de Freitas, pianista e professor de piano; Antonieta de Souza, do final da década de 1960, essas instituições foram
cantora e professora de Canto; e o musicoiogo Aires de Andrade. fechadas. Com a ditadura que teve início em 1964,

10 Teresa Mateiro - Beatriz Ilari ifürg.)


'__' I IIG-âll Públlca viveu anos de tristeza, às vezes com Vargas, imerso em um contexto histórico no qual
_) %Bfl'Iria de apenas três horas em muitas escolas o civismo impunha determinados valores. Apesar
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Eli janeiro. Um escândalo! Muitos anos se pas- disso, o fascínio pela música por parte dos dirigentes
até que Darcy Ribeiro retomasse o estabeleci- da ditadura brasileira permitiu que vários músicos,
mlnto escolar de horário integral, criando o Centro incluindo aqueles com posições políticas contrárias
Integrado de Educação Pública (Ciep) [1982-1986], cujo ao regime, continuassem trabalhando sem maiores
funcionamento foi interrompido de 1990 a 1994. perseguições.

Í' Mas voltemos à década de 1930: foi nessa época que, É bom frisar que o pesquisador e educador Gabriel
em certa ocasião, quando estudava no Instituto de Ferraz cita: “Villa-Lobos não desejava formar crian-
Educação, ensaiei para uma apresentação do grupo ças que se tornassem músicos, mas que soubessem
Batel no campo do Vasco da Gama. Lembro que nos apreciar e reconhecer a importância da música [...] e
Imalos achava linda a figura do maestro Villa-Lobos, respeitar a profissão do músico”. Essa frase deveria
com seus longos cabelos esvoaçantes... Nessa mesma alertar nossas secretarias e o Ministério de Educação
Ilicada, o maestro propôs a educação musical com (MEC) sobre a importância da música na vida do ser
of base no canto orfeõnico, sendo apoiado pelo compo- humano, pois essa postura do referido maestro já
sitor maestro Lorenzo Fernández quando da funda- revelava a consciência da importância do ensino da
ção do Conservatório Nacional de Canto Orfeônico música para as escolas públicas. Todos deveriam ter
(CNCO). Meu tio trabalhou ali até morrer, em 1948, a possibilidade de usufruir das mais variadas mani-
estando na ocasião na direção da instituição subs- festações musicais produzidas na trajetória cultural
tituindo o maestro Villa-Lobos, que se encontrava de nosso país. Parabéns, Gabriel Ferraz, pelo exce-
enfermo nos Estados Unidos. Convém ressaltar que a lente capítulo e intensa pesquisa sobre Villa-Lobos.
presença de compositores e professores como Vieira Nas décadas de 1930, 1940 e 1950, foram marcantes
Brandão e Esther Scliar e de outros educadores da os trabalhos do já citado Villa-Lobos, bem como os
época na instituição demonstra a preocupação com de Sá Pereira e Liddy Mignone. Estes dois últimos
a boa formação de professores. realizaram cursos de formação de educadores musi-
Sobre os aspectos da personalidade de Villa-Lobos cais, escolhendo caminhos diversos. Na diferença de
e da genialidade do grande criador e compositor, ideais para a educação da criança, Liddy Mignone,
talvez um dos maiores do século XX, são muito socialista, opositora da ditadura de Vargas, acredi-
significativas as considerações apresentadas por tava que as experiências e as atividades da criança
Gabriel Ferraz, autor do primeiro capítulo desta deveriam ser ampliadas com trabalhos focados nas
obra, sobre o grande músico ligado à ditadura de brincadeiras de roda, nos movimentos, nas danças,

Pedagogias brasileiras em educação musical 11


nos instrumentos musicais além do canto. Nessa pers- A maioria das professoras de Iniciação Musical já
pectiva, a estudíosa criou o curso de especialização tinha o diploma de piano ou já estava terminando o
em Iniciação Musical, em 1948, para a formação de curso. Sinto a necessidade de aproveitar este ponto
professores, com o currículo que, tenho certeza, pode do prefácio e falar da influência de Mignone no meu
ter sido o embrião do futuro curso de Licenciatura trabalho. Os rompimentos e provocações que fiz em
em Música, criado na década de 1980. muitas aulas, trabalhos e pesquisas foram todos
Neste ponto do texto, gostaria de apresentar uma adquiridos e inspirados na grande mulher educa-
pequena curiosidade: a partir de 1940, o CBM insta- dora, pensadora, corajosa e humanista Liddv. Há
lou-se num prédio em frente ao antigo Ministério pouco tempo percebi um fato e tive um choque: ela
de Educação e Cultura (MEC), hoje Palácio Gustavo vivia por meio do meu fazer e muitas vezes eu não
Capanema. É bom lembrar que, nessa época, Gustavo a citava. Achava que ela já tinha realizado tudo a
Capanema era o ministro da Educação e Cultura, seu alcance e que eu estava apenas dando continui-
tendo como parceiros de trabalho nomes como Anísio dade ao seu trabalho. Mas Liddy não só deu aulas.
Teixeira e Carlos Drummond de Andrade. A qua- A educadora criou, em 1956, o Centro de Estudos em
dra em que se encontram o CBM e o MEC é cha- Iniciação Musical, instituição em que as professo-
mada de “quadrilátero da cultura no Rio de janeiro” ras de música formadas por ela compravam livros,
pela presença da Associação Brasileira de Imprensa realizavam audições e debates, iniciavam cursos de
(ABI), da Biblioteca Nacional, do Museu Nacional de extensão, suprindo as necessidades sentidas por elas,
Belas Artes e do Theatro Municipal e, nas proximi- e produziam vários Festivais de Iniciação Musical,
dades, da então Escolinha de Arte do Brasil, criada que duravam cinco dias, reunindo mais de 3 mil pes-
em 1948 pelo artista plástico Augusto Rodrigues, da soas em cada festival. As aulas para as crianças e os
Universidade Federal do Rio de janeiro (UFRj), da Sala jovens eram sempre dadas por duplas de professoras,
Cecília Meireles e também, no Centro, um pouco mais influência do método de Émile jaques-Dalcroze, fora
distante, da Escola Estadual de Música Villa-Lobos. da realidade das escolas públicas do Rio de janeiro
E é justamente para o CBM que direciono meu foco no final da década de 1960. Refiro-me às professo-
neste ponto do texto, mais especificamente ao tra- ras porque, nessa época, só mulheres estudavam
balho de Liddy Mignone no curso de especialização para atuar na área da educação. Hoje, a situação se
em Iniciação Musicalz. inverteu. Atualmente, 70% dos alunos do curso de
Licenciatura em Música do CBM são homens.
2 Esse enfoque é motivado pelo meu convivio com Liddv Mignone, desde o inicio
da minha formação até a morte da educadora em 1962. Tenho consciência de que As professoras convidavam músicos, artis-
hà excelentes trabalhos da educadora Inês Rocha na área analisada. tas, atores, bailarinos, psicólogos, educadores e

12 Teresa Mateiro -‹ Beatriz llari (Org.)


arte-educadores para a realização de palestras no Com a organização de seu método, Sá Pereira,
Centro de Iniciação Musical. Surgiram assim os também conhecedor do pensamento sobre educação
cursos de extensão: em 1958 - Psicologia; em 1959 - preconizado pelo movimento da Escola Nova, deu
Percussão; em 1960 - Dança Moderna; em 1961 - sua contribuição à compreensão da música para
Teatro de Fantoche; em 1962 - Flauta Doce, entre crianças, jovens e professores. Esse método deve-
outros. Liddy Mignone direcionou seu trabalho mais ria ser lido e estudado pelos educadores musicais
especificamente às escolas, propondo uma educação atuais, que viriam, por sua vez, a compreender as
inclusiva, nas quais crianças com diferentes defi- propostas do pedagogo, que já previam uma forma-
ciências frequentavam as aulas de Iniciação Musical. ção de pós-graduação em Educação Musical nas uni-
Também indicou professores de Música, a convite de versidades e conservatórios. Entre seus numerosos
Nise da Silveira, para trabalhos na área de psiquia- alunos, podemos citar Nayde Sá Pereira, educadora
tria, e de Helena Antipoff para a área de crianças musical da UFRI que manteve a utilização do método
e adultos com necessidades especiais em escolas 'durante anos.
como Pestalozzi e Associação de Pais e Amigos de Inês de Almeida Rocha, no terceiro capítulo deste
Excepcionais (Apae). Esse movimento de inclusão livro, demonstra seu interesse pela figura da edu-
levou ã criação do curso de Musicoterapia, em 1972, cadora Liddv Mignone por meio de sua pesquisa,
por parte de três educadoras musicais: Grabriela que resultou em sua dissertação de mestrado. Liddy
Souza e Silva, Doris Hoyer de Carvalho e eu. era uma mulher de cultura muito rica, porém de
O educador José Nunes Fernandes, excelente pes- formação não acadêmica. Ela lidou com grandes
quisador da educação musical nas escolas do muni- músicos e com artistas responsáveis pelo movimento
cípio do Rio de janeiro, nos traz em seu capitulo a da Semana de Arte Moderna de 1922. Em seu livro
figura de Antônio Leal de Sá Pereira, grande educador Canções de amigo: redes de sociabilidade na correspon-
musical e pioneiro da pedagogia brasileira. Em seu dência de Liddy Chiafiarelli Mignone, Inês Rocha reuniu
artigo, josé Nunes destaca a educação acadêmica cartas curtas, mas com comentários que pontuam
na formação de Sá Pereira, sua didática inspirada a vida da pensadora, Inês tem despertado a curiosi-
em Dalcroze e o enfoque que deu à compreensão do dade de seus alunos e colegas para um contato maior
significado da escrita e leitura musicais, formando com as propostas de Liddy, cuja visão da prática de
inúmeros professores na Universidade Federal do Iniciação Musical no Brasil das décadas de 1930, 1940 e
Rio de janeiro (UFRI), que, entre suas unidades, conta 1950 se estendeu a países europeus.
com a mais antiga faculdade de música no Brasil. É importante frisar que o surgimento da televi-
são, em 1954, no Rio da janeiro, causou um grande

Pedagogias brasileiras em educação musical 13


impacto na cultura e na educação brasileiras. Inês dois educadores marcaram a educação musical bra-
Rocha menciona a influência que esse meio de comu- sileira no Rio de janeiro, posto que muitos dos edu-
nicação causou à educadora Liddy Mignone, que, cadores e pedagogos musicais iniciaram pesquisas
no dia da inauguração da TV Tupi, levou crianças e sobre a escuta. Alguns trabalhos foram propostos e
professoras do curso de Iniciação Musical a se apre- realizados sobre os sons da cidade do Rio de janeiro,
sentarem na rede televisiva. culminando na produção de um cartilha, cujo nome
De 1950 até 1964, o país viveu um momento de era Escuta! A paisagem sonora da cidadei.
redemocratização cuja perspectiva era de um exce- Os Encontros Brasileiros de Educação Musical
lente futuro. Em 1964 veio o golpe militar. Em 1968, foram coordenados em conjunto com josé Maria
o regime tornou-se mais violento e cruel que o de Neves, grande musicólogo mineiro com quem traba-
Vargas. No mesmo ano, a obrigatoriedade da música lhei em algumas pesquisas na educação musical não
na escola já não existia. No entanto, há uma contribui- formal em favelas (hoje chamadas de comunidades
ção que não se pode olvidar: nessa década, a música paciƒicadas), em blocos de samba, na periferia do Rio de
eletroacústica do compositor Pierre Schaeffer e as janeiro, e com a Folia de Reis, em Botafogo, no Morro
propostas de john Cage marcaram uma virada em Santa Marta. Em 1982, a convite do compositor Edino
meu próprio trabalho, quando passei a utilizar os Krieger, na ocasião presidente da Fundação Nacional
parâmetros do som no curso de especialização em de Artes (Funarte), viajamos com o projeto Música e
Iniciação Musical, após a morte de Liddy Mignone. Interação entre Educação Básica às cidades de Manaus,
Somente ao escrever este texto é que percebi que eu Belém, Teresina, Salvador, Goiás Velho e Ijuí.
havia modificado o curso de Iniciação Musical. Foi Dos periodos mais significativos da educação
um novo rumo no curso, que terminaria em meados musical, certamente figura entre eles a implanta-
da década de 1970. E, para mim, eu estava conti- ção da Lei n. 11.769, de 18 de agosto de 20084, que
nuando o trabalho da Liddy. determinou a inserção da música como conteúdo
Mas não houve apenas tragédia nesse período. obrigatório no currículo das escolas. Uma decisão
Dois Encontros Brasileiros de Educação Musical mais que acertada, pois, como é possível perceber
foram realizados em 1972 e 1973, com professores por meio da leitura deste livro, vivemos em um dos
de todo o Brasil, tendo sido convidada a grande edu-
cadora musical argentina Violeta de Gainza, autora fu mí L ,ñ _ mn *ml 4;

3 Para saber mais, acesse o link: <https://www.academia.edu/2399107/Escuta_A_


de excelentes livros e responsável pela tradução em Paisagem_Sonora_da_Cidade>. Acesso em: 16 abr. 2015.
espanhol dos livros de john Paynter e Murray Schafer, 4 BRASIL. Lei n. 11.769, de 18 de agosto de 2008. Diário Oficial da União, Brasília,
Poder Legislativo, 19 ago. 2008. Disponível em: ‹:http://www.pIanalto.gov.brr'
traduzido em português por Marisa Fonterrada. Esses cciviI_03/_ato200?-2010r'2008r'Iei/I11769.htm>. Acesso em: 24 fev. 2015.

14
Teresa Mateiro - Beatriz llari (Org.)
países mais musicais do mundo, tendo cada região e seguem a carreira de musicistas. A aplicação do
uma fonte inesgotável de sonoridades musicais, com método Gazzi de Sá por parte de Theresia, no Rio
várias pedagogias musicais tão significativas reali- de janeiro e na Paraíba, sua terra natal, mereceria
zadas nos conservatórios, faculdades e escolas de estudo e pesquisa. A pedagogia do citado mestre é
música. Graças a esses lutadores em prol da música, o bem divulgada no Centro Educacional de Niterói,
Governo Federal pôde criar as universidades federais por parte do professor Luiz Carlos Pessanha, que
de Música. É difícil pensar que o Estado brasileiro também leciona no CBM. Além disso, Ermano Sá
levou 60 anos para dar prosseguimento à proposta vem formando há anos inúmeros corais no Centro
de Villa-Lobos de 1932. Educacional de Niterói e apresentando programas
Ainda nas décadas de 1950 e 1960, influenciado por em várias salas de concerto.
A I

Villa-Lobos, o método do compositor e educador Gazzi A convivencia com as diferenças e o fator que pro
-›

Galvão de Sá, cujo trabalho e trajetória são analisados picia a riqueza de propostas pedagógicas brasileiras
no quarto capítulo desta obra por Maria Cecília de na educação musical. O excelente texto com o qual
Araujo Rodrigues Torres, foi de grande importância Teca Alencar de Brito nos brinda no quinto capítulo
na Paraíba e no Rio de janeiro em virtude do movi- desta obra propõe uma reflexão sobre um compositor
mento coral e da qualidade dos alunos participantes da vanguarda no Brasil desde 1939: Hans-joachim
do Coro da Escola Centro Educacional de Niterói. No Koellreutter, que iniciou, no mesmo ano, no CBM,
trabalho de Gazzi de Sá, destaca-se a presença de o curso de Composição sobre o Dodecafonismo de
Theresia de Oliveira, excepcional educadora musical, Schoenberg. Estudaram no seu curso os então futuros
que também tinha especial cuidado com a estética famosos compositores: Edino Krieger, Guerra-Peixe,
musical; era divulgadora do método do compositor, Claudio Santoro e a educadora Marina Lorenzo
com quem estudou. Concursada pelo Estado, minis- Fernández, entre outros. No mesmo ano, Koellreutter
trou aulas na Escola de Música Villa-Lobos e no CBM, criou, com os compositores citados, o famoso grupo
utilizando o método, as obras e os arranjos para corais Música Viva. Em 1941, em virtude de uma desavença
do educador paraibano. Foi criadora do grupo vocal com Lorenzo Fernández, o educador se afastou do
Tandaradei com os músicos Adriana Rodrigues Didier, CBM, porém voltou algumas vezes para realizar
Mario Orlando, Fernando Moura, Mario Victor, Sula pequenos cursos e palestras - época em que convivi
Kossatz, todos seus alunos, que viajaram pela Suíça, com o compositor.
França, Alemanha e Ucrânia, cantando as obras A proposta de Koellreutter não abrange um
de Gazzi de Sá e músicas ucranianas. Esses cinco método propriamente dito, mas propõe reflexões
alunos de Theresia estão trabalhando na educação para o mundo brasileiro-latino-americano, cujas

Pedagogias brasileiras em educação musical 15


influências étnicas geraram um país continental O sexto capítulo desta obra, elaborado por Elba
que ainda luta “para saber a sua cara”. A proposta Braga Ramalho e dedicado a Esther Scliar, é também
de Koellreutter, para mim, é a mais coerente na muito significativo. Esther foi uma das educadoras
educação musical no século XXI. Em todas as suas mais musicais que conheci. Segundo depoimentos de
ideias sobre a prática musical para crianças e jovens, músicos, ela tinha verdadeira paixão por ensinar a
o músico alemão provoca o ser criativo do educador base de uma disciplina de Música que era detestada
e do educando e não dá propostas fechadas. Acredito pela maioria dos alunos (percepção e teoria musical)
que todo ser humano vivo tem um potencial musical. e era procurada por músicos populares urbanos que
Se a criança fala, brinca, anda, corre, expressa seus necessitavam de maior conhecimento de harmonia de
sentimentos de alegria, raiva, entre outros, ela tam- arranjo para suas obras. Os músicos eruditos também
bém é capaz de criar expressões artísticas e musicais. a procuravam por precisarem entender a importân-
A questão de tempo é muito relativa. Koellreutter cia de um aprofundamento na escuta e no significado
foi um compositor de vanguarda presente na educa- musical. Infelizmente, nas décadas de 1950 e 1960, eu
ção musical durante quase 70 anos, a partir da década estava envolvida com minha carreira de educadora
de 1930 até 2005, permanecendo atual. e não tive tempo de ter uma relação mais próxima
Em 2006, realizou-se uma homenagem a com Esther Scliar - nossos contatos foram realizados
Koellreutter, o projeto Cenas da Música Contem- apenas por vários encontros e telefonemas e leitura
porânea, no qual foram executadas as obras do pen- de alguns de seus textos. Sua morte foi muito sentida
sador alemão por compositores contemporâneos e por todo o meio musical e frustrante para mim, por
educadores, como Tim Rescala e Carole Gubernikof. não ter frequentado um curso ministrado por ela.
É de grande relevância lembrar que a educadora Com base na metodologia de Esther Scliar, a per-
Marina Lorenzo Fernandez realizou, em 1961, um cepção musical e a teoria da música passaram a ter
grande projeto de educação musical na criação do maior importância na formação do educador musical.
Conservatório Estadual de Música Lorenzo Fernandez, Os textos do compositor Aílton Escobar escolhidos
em Montes Claros, Minas Gerais, hoje com mais de por Elba Braga Ramalho são excelentes, assim como
3 mil alunos. Em 1988, a estudíosa mineira voltou para o de Aluisio Didier. Graças ao trabalho da educadora,
o Rio de janeiro e dirigiu o CBM até 2008. Suas filhas, voltei a pensar em Esther Scliar e em sua importância
Irene Tourinho e Antonieta Silva e Silvério, são per- na trajetória da educação musical.
sonalidades importantes na formação de educadores Preciso também dizer que fui surpreendida ao ler
musicais no Brasil. Os textos de Irene estimularam a o sétimo capítulo, sobre josé Eduardo Gramani. Ouvi
ousadia nas pesquisas de educação musical. falar pouco sobre ele, por meio de uma leitura rápida

16 Teresa Mateiro - Beatriz llari (Org.)


hi anos do livro Pedagogia musical, de Ermelinda Paz. em vários estados do Brasil. Na década de 1970, parte
' trabalho de Daniella Gramani e Glória Pereira da da intelectualidade brasileira foi afastada do Brasil,
hoinicia com a poesia de josé Gramani na letra dando origem a uma fase de esquecimento. Essa
A m de O1inda”: “Além de Olinda, ainda se encontra fase foi combatida pelo movimento de contracultura
_-of em renda tece [...]”. Na canção de Gramani, já se promovido pelo teatro, pela música popular urbana
-‹= lrcebe um educador musical e sensível, com ligação e por alguns projetos educacionais musicais influen-
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com a cultura brasileira. Nota-se que sua formaçao ciados pela pedagogia de Paulo Freire, utilizando
musical teve um seguimento diferenciado. É muito metáforas, tanto nas falas como nas sonoridades
ilgnificativa, na realidade brasileira, a construção e o musicais. Hoje, sinto e percebo a acomodação para
preparo não formal, através da procura por mestres a repetição de modelos.
o da descoberta de caminhos possíveis para uma boa A partir da Lei n. 5.692, de 11 de agosto de 19715, tor-
~ rmação musical. Em nosso país, repleto de cidades nou-se obrigatória a disciplina de Educação Artística
fum conservatórios ou escolas de música, Gramani no ensino de 1° e 2° graus (hoje denominados, res-
uscavaeducadores que tivessem maior saber e pectivamente, ensino fundamental e ensino médio).
pudessem abrir caminhos para outros contatos. Ã época, surgiu um movimento para que a música
Essa procura levou o mestre paulista a Amalinha fosse inserida na educação. A Secretaria de Educação
(Maria Amália Martins), excelente educadora musi- do Rio de janeiro, nesse período, já tinha em sua
cal mineira, que, por sua vez, o levou a Koellreutter, rede os professores de Música. Nos anos seguintes,
que fez a ligação da contemporaneidade e da criação. os concursos já propunham a separação das áreas
Hoje, Gramani é um exemplo para os educandos que das artes: Música, Artes Cênicas e Artes Visuais.
já possuem, na sua grande maioria, um computador à época, o Estado do Rio de janeiro realizava os con-
__.. A ue não o utilizam como um 8 rande P otencializa- cursos P ara ma8 istério da educa Ç ão básica ainda em
de pesquisas. Lastimo pela sua vida tão breve, a Educação Artística. Somente a partir de 2012, quando
despeito de sua extensa produção de livros, artigos, o Currículo Mínimo para as áreas de Artes (Música,
I propostas que levaram seus alunos a conhecer e Artes Cênicas [Teatro e Dança] e Artes Visuais) foi
tocar obras de Stravinsky. proposto, foram abertos concursos para as diferen-
Nos anos de 1970, 1980 e 1990, conviveram a dita- tes áreas. Adriana Rodrigues e eu participamos das
dura e vários trabalhos de educação musical esqueci-
-dos, as vivências musicais em oficinas, a criação do ---- - ~ -ff"*- - - -z f ¬
5 BRASIL. Lei n. 5.692, de 11 de agosto de 1971. Diário Oficlal da União, Brasília, Poder
'roflrso de Licenciatura em Educação Artística e, logo Executivo, 12 ago. 1971. Disponível em: <http://www.pIanaltagov.brr'cc¡viI_03r'Ieis!
Im seguida, dos cursos de mestrado na área musical |só9z.mm>. Acesso zmzz4fzv.zo1s.

ildlgofilas brasileiras em educação musical 17


propostas do Currículo Mínimo para a área de Música universitária, oferecidos nas férias de janeiro e julho.
juntamente com dois educadores musicais do Estado Para esses cursos, Adriana convidou inúmeros edu-
do Rio de janeiro: Ednardo Monti e Celso Santos. cadores do Brasil, Suíça, África, Chile, Argentina,
A década de 1980 foi um marco significativo em ampliando uma formação mais interdisciplinar,
virtude da criação dos cursos de mestrado em dife- abrangendo metodologias como aquelas elabora-
rentes áreas da música no Brasil. A partir dos temas das por Gazzi de Sá, Emile jaques-Dalcroze e Zoltan
escolhidos das dissertações, tiveram início as publi- Kodaly, além de propostas de Música para Bebês e
cações em artigos de revistas e a elaboração de livros Canto Coral, entre outros.
dos futuros doutores. Em 1983, josé Maria Neves e eu Adriana Didier também retomou o Centro de
criamos o primeiro mestrado em Educação Musical, Estudos de Iniciação Musical Liddy Mignone. Há
Musicologia e Etnomusicologia no CBM. Esse curso mais de 3 anos, o músico Tim Rescala coordena, com o
era realizado em módulos e atendeu a inúmeros grupo Musimagem, o curso de extensão universitária
educadores no Brasil, dando a chance de se tornarem, Música e Imagem, com duração de 120 horas, no qual
mais tarde, doutores. os alunos compõem músicas para teatro, cinema e TV,
Na mesma década, o CBM abriu o curso de licen- resultando no interesse dos jovens pela composição.
ciatura em Educação Artística, com habilitação em Há um projeto no CBM para a abertura do próximo
Música. Convidei a educadora Regina Simões Santos mestrado em Música e Imagem.
para lecionar as disciplinas de Pedagogia Musical. Na década de 1990, criou-se a Associação Brasileira
Quando assumiu a cadeira na Universidade Federal de Educação Musical (Abem), o que causou grande
do Rio de janeiro (Unirio), foi substituída pela educa- mobilização entre os professores de Música, ofere-
dora Helena Trope, até 2007. Em 2008, assumiu a coor- cendo continuamente encontros nacionais sobre
denação do curso a professora Adriana Rodrigues educação musical. A citada instituição exerceu uma
Didier, que realizou desde o início da sua gestão uma função politica na luta pela volta da Música na escola.
renovação no curso - hoje, com mais de 120 alunos. Em 1997, Carlos Kater e josé Adolfo de Moura me
Além da excelente qualidade da educadora Adriana, convidaram para um trabalho com 300 professo-
a perspectiva de trabalho com a volta da música nas res no projeto de Música na Escola na Secretaria de
escolas gera interesse para os futuros licenciados. Educação de Belo Horizonte. Percebi que o material
No primeiro concurso público realizado em didático era excelente e acreditei que poderia ser
2012 no Município do Rio de janeiro, 18 alunos foram aplicado no Rio de janeiro.
aprovados. Adriana também retomou a tradição Ao voltar ã capital carioca, convidei os educado-
do CBM no oferecimento dos cursos de extensão res Helena Trope e Marco Antonio dos Santos para

18 Teresa Mateiro - Beatriz llari (Org.)


elaborar um projeto e apresentá-lo à Secretaria de surgida na década de 1990. Fiquei feliz em ler todos
Educação do Rio de janeiro. Iniciado em agosto de os trabalhos que representam o vigor dos 60 anos de
1999, o projeto envolveu a participação de 120 profes- vida dos pedagogos brasileiros de educação musical.
sores do ensino regular e 15 professores de Música, Neste ponto do texto, falaremos sobre o oitavo capí-
abrangendo 25 escolas, além dos diretores e coorde- tulo desta obra, escrito por Lucas Ciavatta, Daniela
nadores dessas instituições. A equipe de coordenação Ferreira e João Santos, que trata do trabalho do educa-
do projeto organizou três diferentes equipes: Oficinas, dor musical Lucas Ciavatta, com quem travei conhe-
Materiais Didáticos e Pesquisa das Manifestações cimento numa apresentação no Auditório Lorenzo
Culturais das Comunidades Envolvidas. A equipe das Fernández, no CBM, do bloco O Passo, formado por
Oficinas trabalhou com quatro temas considerados seus alunos da Escola Oga Mitá, no Rio de janeiro.
básicos para o desenvolvimento musical: oficina Admirei a musicalidade do grupo e o desemba-
Cultura Popular, com a professora Maria Lucy Abelin; raço de todos tocando os instrumentos de percussão,
oficina O Uso da Voz, encabeçada pela professora marcando o passo com desenvoltura e liberdade
jael Tatagiba; e oficina Ritmo e Movimento, liderada no “gingado” da música brasileira. Eles transmi-
pelo professor Helder Parente; oficina Instrumentos tiam muita segurança rítmica nos deslocamentos
e Expressões Sonoras, administrada pelo professor no espaço. Em 1999, houve outra apresentação no
Luiz Paulo Castro Santos. encerramento do projeto Música na Escola, realizado
A equipe de Materiais Didáticos foi respon- no Paço Imperial, em parceria com a Secretaria de
sável pela elaboração dos textos dos cinco livros Educação do Município do Rio de janeiro e o CBM. Em
publicados das referidas oficinas, sendo responsá- 2003, fui convidada para participar da banca de mes-
veis os educadores Adriana Rodrigues, josé Nunes trado de Lucas Ciavatta em Educação na Universidade
Fernandes e Marcos Nogueira. A equipe da Pesquisa Federal Fluminense. Ao ler a dissertação do educador
das Manifestações Culturais das Comunidades e assistir a sua apresentação, admirei sua capacidade
Envolvidas, por sua vez, responsabilizou-se pelo e segurança na defesa de seu trabalho.
levantamento das pesquisas de campo dos bairros Lucas Ciavatta, com base na prática com seus
onde as escolas estavam situadas, trabalho realizado alunos, elaborou uma teoria fundamentada para
pelas educadoras Elza Greif e Rosa Fuks. Todos os sua dissertação de mestrado. Sua exposição clara
materiais didáticos resultantes dessas oficinas con- sobre O Passo afirmou a necessidade da publicação
tinham CDs e DVDs incluídos. do seu primeiro livro. Em 2004, o músico passou
As educadoras musicais Teresa Mateiro e Beatriz a ministrar aulas sobre seu método em um curso
llari escolheram para este livro uma metodologia de Musicoterapia e realizar cursos de férias nestes

Pedagogias brasileiras em educação musical 19


últimos 10 anos, recebendo alunos de todos os esta- Na atualidade, nosso papel de educadores e de
dos brasileiros. Atualmente, também organiza um pedagogos musicais é o de incentivar os alunos de
curso de pós-graduação (lato sensu) para o método licenciatura a pesquisar as músicas de seus luga-
O Passo, que tem muita importância para a educação res de moradia, a cultura de periferia dos grandes
musical brasileira por resgatar os ritmos do nosso centros urbanos, nossa música de raiz, bem como a
país: samba, xote, maracatu etc. O método oferece, ouvir os jovens compositores. Também se faz neces-
além da movimentação corporal, a execução de ins- sária a ampliação na escuta dos educadores musicais
trumentos de percussão e trabalho vocal. para a música contemporânea dos séculos XX e XXI.
Nesta altura do prefácio da obra, proponho-me Nessa senda, cito o exemplo do educador e composi-
a tecer algumas reflexões após a leitura do livro tor Luiz Carlos Csekö, que vem realizando oficinas
Pedagogias brasileiras em educação musical. já há alguns para crianças e para alunos de graduação que vêm
anos, temos computadores, celulares, smartphones, apresentando excelentes resultados. Seu trabalho
tablets, aplicativos, enfim, toda uma variedade de educacional na Pró-Arte? com crianças concentra-se
tecnologias que, por meio do acionamento de alguns na música contemporânea, experimental e no “som
botões ou até do deslize da mão, podem oferecer o expandido”. Seu trabalho de mais de 30 anos no Rio
acesso ã música. A cravista Rosana Lanzelotte, por de janeiro merece ser pesquisado.
exemplo, criou um portal chamado Musica Brasilisõ, A leitura de Pedagogias brasileiras em educação
que propõe jogos e atividades musicais para crianças, musical mexeu e continuará a mexer com minha
jovens e adultos. A musicista realizou uma instalação cabeça graças aos pedagogos maravilhosos de nosso
no Centro Municipal de Referência da Música Artur país apresentados nos capítulos deste livro, principal-
da Távola, patrocinado pela Secretaria de Educação mente em virtude dos vários educadores mais jovens
do Rio de janeiro, com instalações de novas mídias que trazem propostas tão importantes da história
instaladas em mesas nas quais, com alguns toques, para a educação musical no Brasil.
qualquer pessoa poderia construir células musicais. Apesar da repressão da ditadura das décadas
O educador e compositor Tim Rescala foi parceiro de 1960, 1970 e 1980, alguns movimentos de resis-
de Rosana, instalando o piano preparado, com o tência fizeram surgir propostas importantes nas
qual qualquer pessoa poderia tocar e criar novas atividades artísticas. A música e o teatro tiveram
estruturas sonoras.
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7 Os Seminários de Música Pró-Arte foram criados em 1957 por um grupo de m úsicos


p J. 17 1 Q
liderados por H. J. Koellreutter, seguindo ideias musicais e uma pedagogia própria.
6 Para saber mais, acesse o link: <http://www.musicabrasiIis.org.br/pt-br>. Para maiores informações, consulte: <:http://www.proarte.org.br/proarte>.

20 Teresa Mateiro - Beatriz llari (Org.)


grande importância. Nessa mesma época, o compo- momentos de ruptura, de ousadia e de reflexões,
sitor Reginaldo de Carvalho, na direção do Instituto unindo a tradição e a inovação. Este livro provocou
em mim a necessidade de propor debates, discussoes,
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Villa Lobos, antigo CNCO, e atual Unirio, sabiamente


_

convidou professoras com curso técnico em Música, planejamentos que nos alimentem musicalmente
com especialização em Iniciação Musical, para faze- com propostas necessárias aos futuros pedagogos
rem parte de sua equipe. Assim puderam receber brasileiros da educação musical.
o registro do MEC como professoras de Música no Gostaria de prestar a minha homenagem a todos
Estado do Rio de janeiro. os pedagogos brasileiros de educação musical espa
Essa iniciativa favoreceu a continuação da música lhados em quase todos os estados do Brasil que aju-
em algumas escolas públicas municipais e estaduais. daram a mantê-la viva. Obrigada, Teresa Mateiro e
Reginaldo de Carvalho, residente em Teresina, foi um Beatriz Ilari, pela oportunidade deste meu desabafo
dos pioneiros da produção de obras de música eletroa- neste prefácio. Vocês acenderam uma chama que
cústica em peças de teatro e em suas aulas. Também estava um tanto apagada em mim.
gostaria de lembrar do educador Roberto Gnattali,
J

que, ao criar a Orquestra de Musica Brasileira, em Cecilia Conde


É

1984, demonstrou novas possibilidades de organiza- Rio de janeiro, fevereiro de 2014


ção de uma nova orquestra, com um sabor da cultura
brasileira. Em 1997, criou a primeira Escola de Música
Popular, na Unirio, que influenciou uma juventude
que está fazendo excelentes grupos de samba, com
ótimos arranjos, reformulando a música popular
urbana. Sua pesquisa sobre Radamés Gnattali, quase
uma tese de doutorado, resultou na produção de um
CD e um DVD, importantes para os pedagogos bra-
sileiros da educação musical.
Tenho me sentido culpada por não escrever sobre
as experiências e oportunidades que tive nos 60 anos
de trabalho em favor da música, da educação e da
cultura na minha vida e das pessoas que conheci
e que mostraram infinitas possibilidades de desco-
brir novos caminhos, novos ciclos de pensamento,

Pedagogias brasileiras em educação musical 21


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Há alguns anos atrás, numa noite fria de inverno, ao conversarmos


sobre nossas experiências de ensino na graduação e sobre a falta de
recursos didáticos em lingua portuguesa sobre os métodos, educadores e
propostas da área da educação musical, tivemos a ideia de organizar um
livro sobre pedagogias do ensino musical. Foi assim que surgiu a obra
Pedagogias em educação musicali. Nossa preocupação, naquele momento,
era a de encontrar educadores musicais que estivessem dispostos a
escrever sobre algumas das pedagogias musicais mais conhecidas, a fim
de suprir uma lacuna importante na literatura em língua portuguesa
referente ã educação musical. Optamos, na época, por incluir pedagogias
que tinham/têm alguma relação com a prática da educação musical que
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1 MATEIHO, T.; ILAHI, B. [0rg.}. Pedagogias em educação musical. Curitiba: lnterãaberes, 2012.

dliogias brasileiras em educaçao musical 23


ocorre em inúmeras escolas, conservatórios e programas brasileiros de
formação docente, e tínhamos plena consciência de que não seria pos-
sível contemplarmos todas as ideias e pedagogos existentes. Nenhum
volume seria capaz de abarcar tantas propostas, e nós sabíamos que
algumas pedagogias importantes seriam deixadas de fora.
Nesta obra”, optamos por reunir algumas pedagogias brasileiras
em educação musical que marcaram época no Brasil. Após inúmeras
conversas, entre nós e com diversos colegas, chegamos a uma lista com
20 nomes de pedagogos e suas respectivas propostas pedagógicas que,
por sua relevância histórica e cultural, mereceriam ser documenta-
das. O próximo passo foi, como no livro anterior, localizar educadores
musicais que estivessem dispostos a desenvolver análises sobre as
pedagogias em questão. Em alguns casos, pudemos contar com educa-
dores que participaram da criação e do desenvolvimento de métodos e/
ou pedagogias ou que estiveram diretamente relacionados a eles. Em
outros, contamos com profissionais que, com entusiasmo e dedicação,
debruçaram-se sobre a vida e obra de pedagogos musicais específicos,
passando inúmeras horas analisando arquivos e realizando entrevistas.
O resultado é a coletânea que lhe apresentamos. Cabe ressaltarmos que
nossa intenção não foi a de esgotar o tema com uma visão panorâmica
de todas as pedagogias existentes no país - mesmo porque seria este um
trabalho hercúleo e impossível de ser realizado em um único volume -,
mas sim a de apresentar alguns trabalhos que ajudaram ou têm ajudado
a compor a história da educação musical brasileira.
Sendo assim, o presente volume inclui oito capítulos escritos por
alguns dos maiores educadores musicais de nossa terra na atualidade.
Enquanto os sete primeiros capítulos tratam de pedagogias propostas por
mestres que já se foram, o último versa sobre um trabalho sedimentado,

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2 Projeto do Grupo de Pesquisa Educação Musical e Formação Docente. Consulte o Diretório dos Grupos de Pesquisa
no Brasil- Plataforma Lattes/CNPq, no seguinte link: <httpu'/lattes.cnpq.br¡web¡dgp:›.

24
Teresa Mateiro Beatriz llari (Org l
porém em continuo desenvolvimento. Apesar de cada capítulo ressal-
tar um recorte específico da história da música e da educação musical
no Brasil, pode-se verificar uma tendência mundial- a da ampliação
da definição de educação musical. Historicamente falando, essa área do
saber esteve predominantemente ligada à música dita “erudita” e aos
seus princípios e ideias, sobretudo em relação ao ensino da notação
musical (ou do sistema de escrita musical com notas e pausas) e de seus
aspectos performáticos, como a técnica instrumental e a execução musi-
cal. Os capítulos aqui contidos mostram como as preocupações com a
música popular, o folclore e a diversidade cultural, a música de vanguarda,
entre outros elementos, também estiveram presentes no trabalho dos
educadores privilegiados nesta obra. Outra tendência mundial atual é
a expansão da educação musical para além do ambiente escolar e do
conservatório, com a música comunitária em projetos sociais diversos
e a inclusão de novas mídias e tecnologias no ensino de música. Esses
temas são demasiado abrangentes e foram propositalmente deixados
de lado, possivelmente para serem contemplados em trabalhos futuros.
É com imensa alegria que compartilhamos as ideias de Heitor
Villa-Lobos, Antônio de Sá Pereira, Liddy Chiaffarelli Mignone, Gazzi
de Sá, Hans-joachim Koellreutter, Esther Scliar, josé Eduardo Gramani
e Lucas Ciavatta. É nosso desejo que colegas, educadores musicais, des-
cubram as ideias deixadas por esses grandes mestres e as divulguem
e ampliem.

Teresa Mateiro e Beatriz llari


julho de 2015

Pldagogias brasileiras em educação musical


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Gabri-'el Ferraz é doutor em Musicologia pela Universidade da Flórida, onde lecionou como instrutor assistente
durante os cinco anos de seu doutorado e como professor adjunto por um ano após sua graduação. É mestre em
Performance Pianíst-ica pela Universidade de Miami (Ohio) e em Musicologia pela Universidade de São Paulo (USP)
Foi o vencedor do concurso internacional de masicologia/etnomusicologia Otto Mayer-Serra em 2011, tendo seu
artigo publicado no Latin American Music Review em 2013. Apresentou-se no prestigioso Encontro Nacional da
Sociedade Americana de Musicologia em 2011 e no Encontro Regional do Sudeste promovido por essa mesma ins-
fituiçâão em 2008. Apresentou-se ainda em conferências na Italia, no Brasil, na França e em Portugal.

m
1.1 O canto orfeônico de Villa-Lobos: Em 1932, o governo criou no Rio de Janeiro a
educação musical e ideologia política Secretaria de Educação Musical e Artística (Semalz)
e convidou Villa-Lobos para ser o diretor da institui-
Heitor Villa-Lobos (1887-1959) é reconhecido por ção. Nesse mesmo ano, o maestro iniciou a imple-
músicos e pesquisadores brasileiros e estrangeiros mentação de sua orientação nacionalista na peda-
como o maior compositor brasileiro que já existiu. gogia do canto orfeônico. O compositor não visava
Importantes pesquisas já foram realizadas sobre à formação de músicos, mas de indivíduos que sou-
diversos aspectos de sua produção musical, bem como bessem apreciar música e que tivessem no âmago de
de sua vida pessoal. Existe, entretanto, um aspecto suas identidades o sentido de cooperação coletiva,
do legado do compositor que, apesar de crucial para patriotismo, civismo e disciplina. Além disso, o maes-
o amplo entendimento de sua personalidade e da tro tinha como objetivo socializar as crianças e “ele-
importância do seu trabalho, tanto para a música var” seu nível intelectual e cultural (de 0 compositor nao vrsava
quanto para a própria formação de uma identidade acordo com discussões da época, na à formação de músicos,
brasileira, ainda carece de uma análise mais deta- qual a chamada alta cultura, ou a cul- mas de indivíduos que
lhada: seu programa de educação musical, conhecido tura cultivada pela elite, era vista como soubessem apreciar
como canto orfeônico. cultura elevada). Como parte dessa música e que tivessem
O canto orfeônico existe no Brasil desde 1912 e foi “missão”,Vi1la-Lobos buscava, por meio no âmago de suas

l implementado principalmente em escolas do Estado das letras e dos elementos musicais identidades o sentido
de São Paulo pelo compositor e educador Ioão Gomes das canções escolares, conscientizar a de cooperação coletiva,
Iúnior (c. a. 1871-1963). Em 18 de abril de 1931, por meio mocidade sobre aspectos essenciais da patriotismo, civismo e
do Decreto n. 19.8901, o então presidente Getúlio formação cultural do pais, como a disciplina.
Vargas tornou o canto orfeônico obrigatório nas esco- importância das heranças culturais
las primárias, secundárias e de formação profissional europeia, africana e ameríndia.
no Rio de Ianeiro, que era, à época, Capital Federal.
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1 BRASIL. Decreto n. 19.890, de 18 de abril de 1931. Coleção das Leis do Brasil, Rio
:dh de-Janeiro, GB, Poder Executivo, 31 dez. 1931. Disponível em: <http://www.pIanaIto. 2 A Clave de Sol se refere a termos e expressões cujos sign ificados você pode encontrar
gov.br/cciviI_03/decreto/1930-1949/D19890.htm>. Acesso em: 25 fev. 2015. na seção “Glossário de termos”, ao final desta obra.

Heitor Villa-Lobos e o canto orfeônico: o nacionalismo na educação musical 29


Um importante passo para essa busca de cons- construção) de uma identidade nacional. Para homo-
cientização do brasileiro para o que era o Brasil geneizar valores “brasileiros” (ou que pelo menos
(ou, pelo menos, a nação que os intelectuais bra- seriam difundidos como tais) entre a população e
sileiros estavam construindo) foi dado pela cha- criar um sentido de unidade nacional, Vargas utili-
mada geração de 18z0§, à qual pertenceram, entre zou-se do chamado nacionalismo cultural, que dissemi-
outros, nomes como Machado de Assis e josé de nou a ideologia nacionalista disfarçada sob o aspecto
Alencar. Os intelectuais desse grupo tinham como lúdico e de entretenimento da cultura, suavizando
objetivo “elevar o nível cultural e intelectual” do seu caráter politico.
povo e, para tanto, utilizaram a Europa como seu Como parte dessa orientação política, Vargas
maior modelo. No campo educacional, por exem- percebeu que o programa de educação musical de
plo, foram adotados os métodos do suíço Iohann Villa-Lobos poderia ter um papel estratégico na for-
Heinrich Pestalozzi (1746-1827) e de seu pupilo ale- mação da identidade das crianças, já que abordaria
mão Friedrich Wilhelm August Fróbel (1782-1852), diversos aspectos históricos e culturais do Brasil,
que acreditavam que a educação era crucial para reforçando também os sentidos de disciplina, civismo
aquilo que denominavamƒormação integral do indi- e unidade de grupo na prática orfeônica. No campo
viduo. O chamado método intuitivo de Pestalozzi e da cultura popular, o político gaúcho utilizou-se,
o conceito de lcindergartcn de Fröbel tornaram-se o por exemplo, do samba para disseminar sua política
alicerce da educação brasileira da época (é também nacionalista. Naquela época, o citado gênero musical
importante observarmos que, para esses educa- estava se tornando um símbolo de identidade nacio-
dores, a música era parte essencial da educação nal e, de certa forma, estava dissolvendo barreiras
infantil). Apesar de utilizarem modelos europeus, culturais entre as classes altas e baixas e entre as
os intelectuais brasileiros da geração de 1870 tam- diversas etnias brasileiras, funcionando como o que
bém refletiam sobre a posição do país no contexto denominamos um identificador comum de brasilidade.
internacional e sobre o que realmente significava Vargas aproveitou-se dessa “aura” brasileira que o
“ser brasileiro”. Essa reflexão perdurou por muitas samba disseminava e incentivou a composição dos
décadas e, de certa forma, deu origem ao movi- chamados sambas de exaltação, que, como o nome
mento modernista brasileiro, que surgiu no início sugere, exaltavam o país, a política do então presi-
da década de 1920. dente e de sua persona politica? Dessa forma, o canto

Ç _ _ v ñ ' _ Q
O governo de Vargas tinha forte orientação
3 Para mais informações, veja: SEVERIANO, J. Getúlio Vargas o a música popular.
nacionalista e buscava o fortalecimento (ou mesmo Rio de Janeiro: FGV, 1983.

30 Gabriel Ferraz
feônico naturalmente prepararia a criança para a vida social no
*Brasil planejada pelo político gaúcho. O presidente então abraçou o
programa educacional de Villa-Lobos e deu suporte para que o com-
positor o implementasse no Rio de janeiro.

1.1.1 Desdobramentos políticos: os aspectos práticos


e teóricos do canto orfeônico e o comprometimento
moral de Villa-Lobos com o regime de Vargas

Apesar de Villa-Lobos ter planejado seu programa de educação musi-


cal nos anos de 1920 com intenções puramente educacionais, visando
à “elevação” do nível intelectual e cultural das crianças brasileiras,
Vargas apropriou-se desse programa para disseminar sua ideologia
política. Durante seu governo, o canto orfeônico tornou-se, inquestio-
navelmente, uma ferramenta de doutrinação ideológica, pois impunha
valores nacionalistas e patrióticos aos escolares, dando-lhes pouca
liberdade de escolha. Isso não significa que o canto orfeônico não teve
um papel importante na formação cultural das crianças (certamente
o teve), mas que também serviu a propósitos políticos.
Independentemente da vontade de Villa-Lobos, o canto orfeônico
Durante o governo de
teve um papel político que estava fora do controle do compositor. Não
Vargas, o canto orfeô-
menos importante é o fato de que o maestro tinha plena ciência disso,
nico tornou-se, inques-
mas nunca se opôs. É verdade que, em 1932, quando o músico começou
tionavelmente, uma
suas atividades pedagógicas em parceria com o governo, Vargas ainda
ferramenta de doutri-
não era ditador. Entretanto, durante a década de 1930, o regime político
nação ideológica, pois
tornou-se paulatinamente autoritário, até culminar na ditadura do
impunha valores nacio-
Estado Novo, em 1937.
nalistas e patrióticos aos
Independentemente de como começou a relação de Villa-Lobos com
escolares, dando-lhes
o governo, o compositor alinhou seu discurso sobre as funções da edu-
pouca liberdade de
cação musical ao discurso político de Vargas, especialmente depois do
escolha.
advento do novo regime político. Essa conciliação ficou patente não

Heitor Villa-Lobos e o canto orfeônico: o nacionalismo na educação musical


apenas nos aspectos práticos do ensino do canto orfeõ- do canto orfeônico no Brasil. Uma das maiores con-
nico na escola, já mencionados anteriormente, mas tribuições de Lozano foi a organização e direção do
também nas grandes concentrações orfeõnicas - mas- Orfeão Piracicabano, que cantou em diversas cidades
sivos eventos cívico-artísticos organizados em espaços do pais e arrancou elogios até de Mário de Andrade?
públicos abertos, como estádios de futebol, para cele- Apesar de Villa-Lobos ter dado um ar de origina-
brar a nação em dias comemorativos da pátria ou em lidade ao seu programa de ensino, muitas das orien-
outras datas importantes para o país - e nos textos tações pedagógicas de seu método já haviam sido
didático-explicativos nos quais Villa-Lobos discorreu estabelecidas no Brasil durante as décadas de 1910 e
acerca dos objetivos do canto orfeônico e seu papel na 1920, principalmente, como vimos, por Gomes júnior
formação moral e cívica da criança brasileira, para as e Lozano, no Estado de São Paulo, mas também por
quais entendia-se que o nacionalismo tinha impor- educadores de outros estados, como Minas Geraisfi
tância fundamental.
Villa-Lobos seguiu a premissa educacional estabe-
1.1.2 Antecedentes: o início do canto lecida antes dele, que se fundamentava no “método
orfeônico no Brasil intuitivo”, o qual propunha uma educação na qual
o aprendizado da criança se dava primeiramente
O canto orfeônico teve sua origem na França, com pelo que é conhecido, movendo-se posteriormente
Guillaume Louis Bocquillon Wilhem” (1781-1842), na para o que é desconhecido, ou seja, partindo da
década de 1820, e foi introduzido no Brasil, por volta prática e das impressões sensoriais para a teoria
de 1912, pelo educador joão Gomes júnior”, que exer- e as regras relacionadas às ideias previamente
ceu papel fundamental como professor de música e experimentados. O maestro utilizou, por exemplo,
organizador de orfeões escolares na Escola Modelo o manossolfa, um método de solfejo manual fun-
Caetano de Campos, na cidade de São Paulo, onde damentado no main musicale, do método francês
trabalhou por diversos anos (Marcondes, 1998, p. 336). conhecido como Galin-Paris-Chevétã.
Ao lado de Gomes júnior, Fabiano.I;ozano9i (1886-1965),
professor de música em diversas escolas na cidade
paulista de Piracicaba, inclusive na Escola Normal,
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foi também muito importante para o estabelecimento
5 Para conhecera opinião de Mário de Andrade sobre o orfeão, veroartigo “O Orfeão
Piracicabano", escrito para o Diário Nacionaiem 15 dejunho de 1928.
6 Ver OLIVEIRA, F. ürpheonic Chant and the Construction of Childhood in Brazilian
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4 A Clave de Fã se refere a grandes personalidades cujas pequenas biografias podem Elementarv Education. In:A'v'ELAR, I.: DUN, C. (Eri). Brazilian Popuiarllllusic and
ser encontradas na seção “Glossário biográfico", ao final deste livro Citizenshlp. Durha m: Duke Universitv Press, 2011. p. 45-63.

32 Gabriel Ferraz
Gomes júnior já havia introduzido o manossolfa no
Brasil, com algumas adaptações, por volta de 1912. A citada
técnica, que era utilizada para ensinar crianças a cantar,
sem que para isso elas precisassem saber regras musicais
(nem mesmo ler notas), é um bom exemplo do “método
intuitivo”: apenas depois que soubessem cantar as melo-
dias, aprendidas primeiramente pela prática, as crianças
eram introduzidas ã leitura musical.

A maior diferença entre diretrizes do canto orfeônico


de Villa-Lobos e o de seus antecessores foi o caráter
nacionalista e de um patriotismo quase militar que
Villa-Lobos impôs por meio da estrita disciplina que
ele requeria dos grupos orfeônicos. Foi justamente
nesses aspectos que o canto orfeônico do compositor
brasileiro serviu à ideologia de Vargas, pois inculcou
nacionalismo e patriotismo na mente das crianças,
tornando esses valores parte intrínseca de suas iden-
tidades pessoais e coletivas.

O canto orfeônico continuou existindo nas escolas


mesmo depois que Villa-Lobos foi desligado de suas ativi-
dades educacionais junto ao governo em 1945, e fez parte
da educação escolar até 1971, quando foi então abolido do
currículo.

' ltor Villa-Lobos e o canto orfeônico: o nacionalismo na educação musical


1.2 Infância e adolescência Após o falecimento do pai, “Tuhú” teve aulas
de violoncelo com o renomado professor Benno
as tê
H ri*

Niederberger, que lecionava no Instituto Nacional


de Música do Rio de janeiro (hoje Escola de Música
Apesar de não ter frequentado o conservatório de da Universidade Federal do Rio de janeiro - UFRI).
maneira sistemática, como a maioria dos compo- Ainda adolescente, passou a tocar cello em bailes e
sitores eruditos de sua época, Villa-Lobos cresceu cafés para conseguir sobreviver. jovem adulto, em
em um ambiente repleto de música. Seu pai, Raul 1907, Villa-Lobos matriculou-se no curso de Harmonia
Villa-Lobos, era um violoncelista amador e promovia de Frederico Nascimento, no Instituto Nacional de
saraus com amigos em sua casa. Desde cedo, “Tuhú”, Música do Rio de janeiro, mas, devido à rigidez
como o menino Heitor era carinhosamente chamado imposta pelo professor, desistiu três meses depois
pela família, teve contato com diversos instrumentos e, dali em diante, foi um autodidata, absorvendo
musicais e com a música de câmara. elementos musicais diversos, do Brasil e de outros
O compositor teve contato com a música eru- países, e formando sua linguagem musical.
dita europeia principalmente por meio da educação
musical que seu pai lhe deu. Quando “Tuhú” tinha O ano de 1913 foi, como observa a pesquisadora
5 anos, ganhou de seu pai uma viola adaptada como Lisa Maria Peppercorn (1989), muito importante
violoncelo, e mais tarde aprendeu a tocar clarinete e artisticamente para Villa-Lobos, pois, em setem-
violão. O pai do músico foi muito severo na educação bro daquele ano, os Balés Russos? vieram ao Rio
musical de seu filho e foi seu professor até falecer, de janeiro pela primeira vez e apresentaram
quando “Tuhú” tinha apenas 12 anos. Além disso, obras desconhecidas do público brasileiro, cer-
a irmã de Raul, Leopoldina Villa-Lobos do Amaral, tamente deixando uma grande marca no maes-
conhecida como “Tia Zizinha”, era uma pianista tro brasileiro. Como lembra Peppercorn (1989),
amadora e introduziu o menino às obras de johann a companhia russa executou, além do poema
Sebastian Bach. Villa-Lobos confessou mais tarde
que o mestre alemão era, para ele, o maior compo- F _ _ _ “ _ _ _ E

7 Os Balés Russos eram uma companhia de ballet muito importante do começo do


sitor que já existiu. século lili.

34 Gabriel Ferraz
IIÍ

*I sinfônico “Prélude à l'après-midi d'un Fauna”, do do Brasil também foram importantes na formaçao
francês Claude Debussy, obras de diversos com- de sua linguagem. Entre esses elementos, destaca-se
positores russos, como partes da ópera “Príncipe a utilização de melodias originais, como “Nozani-ná
Igor”, de Alexander Borodin, a suíte sinfônica Orekuá”, recolhida por Roquette-Pinto na tribo dos
"Scheherazade”, de Nikolay Rimsky-Korsakov, e o parecis, em Mato Grosso, e utilizada por Villa-Lobos
poema sinfônico “Tamar”, de Milv Balakirev. Ainda nos “Choros n. 3” e “Choros n. 7”.
'- de acordo com Peppercorn (1989), tanto o poema
lsinfônico de Debussy quanto as obras russas dei- Sempre buscando a síntese musical, Villa-Lobos
xaram uma poderosa impressão em Villa-Lobos, não utilizou as melodias como elemento agregado
que absorveu muitos dos elementos estilísticos das obras, mas como elemento gerador de toda a
dessas composições e os incorporou à sua lingua- estética das composições. No “Choros n. 3”, por
gem musical. exemplo, a melodia ameríndia é parte intrínseca
da estrutura das diversas seções da obra. Nessa
Além da música europeia, foram também essen- composição, para coro masculino e instrumentos
ciais na formação musical de Villa-Lobos os elemen- de sopro, Villa-Lobos claramente emula a exe-
tos musicais da cultura popular brasileira, particular- cução musical de uma tribo indígena, mas lhe
mente o choroi, gênero popular urbano em voga nos confere uma estética cosmopolita, tornando o
círculos boêmios daquela época. O contato do compo- elemento musical local acessível aos círculos musi-
sitor com o citado gênero veio principalmente após cais urbanos.
o falecimento de seu pai. Contra o gosto de sua mãe, Além dos aspectos composicionais menciona-
Villa-Lobos passou a frequentar as chamadas rodas de dos anteriormente, o folclore também fez parte
choro, nas quais conheceu os maiores “chorões” de sua dos elementos identificados como nacionais que
época, como Sátiro Bilhar” e Anacleto de Medeiros”. Villa-Lobos amalgamou em sua linguagem musical.
Diversos elementos do citado gênero musical, como Na série de 16 Cirandas para piano solo, por exemplo,
síncopas, improvisação e texturas musicais que emu- o compositor “ambientou” canções folclóricas em
lam um grupo de choro estão presentes em várias harmonias sofisticadas, que podem transmitir, em
obras do compositor, especialmente na famosa série um primeiro momento, uma sensação simultânea
dos 14 Choros, composta na década de 1920. de familiaridade, vinda da melodia, e de estranha-
Apesar de não serem parte central dos elementos mento, vinda da harmonia.
musicais encontrados na gênese composicional de
Villa-Lobos, os elementos musicais dos ameríndios

'fliltor Villa-Lobos e o canto orfeônico: o nacionalismo na educação musical 35


Figure Hi - Getúlio Vargas e Heitor Villa-Lobos no centro da foto

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l
Crédito: Museu Villa-Lobos

O mesmo acontece em muitas outras obras, como ganha um colorido novo e inesperado, apesar de a
nas peças da suíte “A prole do bebê vol. 1”, também peça estar na tonalidade de Dó Maior. Essa obra é
para piano. No famoso “Polichinello”, por exemplo, um bom exemplo de como o elemento nacional se
cujo tema é a melodia folclórica “O Cravo brigou funde com técnicas cosmopolitas, pois Villa-Lobos
com a Rosa”, Villa-Lobos utilizou uma técnica muito trabalhou com aquilo que se chama coleções de sons,
interessante, na qual contrapõe as teclas brancas técnica composicional utilizada por muitos composi-
e pretas do piano, gerando uma sonoridade disso- tores da vanguarda europeia daquela época. No caso
nante. Entretanto, como as teclas brancas e pretas dessa peça, as coleções de sons são a escala diatõnica
são alternadas (ou seja, não são tocadas simulta- de Dó Maior e a escala pentatõnica formada pelas
neamente), a dissonância é suavizada e gera uma teclas pretas do piano.
“atmosfera” musical na qual a melodia folclórica

36 G abriel Ferraz
Idade adulta, contexto cultural Iuntamente com os artistas e intelectuais do
lmcio da pro)eçao internacional modernismo (e de tempos anteriores), Villa-Lobos
percebeu que existia uma necessidade de “acordar”
2 Villa Lobos, nacionalismo a nação para sua herança cultural, especialmente
modernismo no que diz respeito à burguesia, cujas práticas cul-
turais e sociais ainda tinham uma forte ligação com
modo geral, Villa Lobos elaborou uma linguagem a cultura europeia e com 0 modo de vida do Velho
hibrlda , que refletna a própria natur Continente. Naquela época, os burgueses descenden-
sta do povo brasileiro, cujas heranças cultu tes de europeus ainda acreditavam ser superiores
contravam nos P ovos euro P eus, africanos e aos negros, ameríndios e mestiços, cujas raças e
D do Brasil Villa Lobos utilizou temas folclo etnias eram consideradas inerentemente inferio-
ierindios, ritmos caracteristicos de praticas res. Consequentemente, a parcela mais abastada da
afro brasileiras e instrumentos “típicos sociedade brasileira também considerava inferior
(como o ganza, 0 reco reco e o pandeiro na qualquer prática social e cultural que tivesse traços
as Brasileiras n 2 ), e os amalgamou com das heranças culturais de negros e ameríndios e
›s que absorveu da musica de vanguarda que buscava distinguir-se culturalmente de tais grupos
a Europa, caracterizada por dissonancias e sociais, cultivando a arte europeia e atribuindo-lhe
is abruptas de acentuaçao ritmica maior valor artístico.
Jroduçao musical, bem como o repertorio Se, por um lado, as elites burguesas rejeitavam
-Lobos selecionou para a educaçao musical, tudo que tivesse características culturais “brasileiras”,
tavam muito bem a busca por uma “brasi a parcela menos favorecida da população (formada
1ue fazia parte das discussoes nos circulos especialmente por negros e mulatos), por outro lado,
5 e intelectuais de sua e oca O modernismo sequer tinha ferramentas intelectuais para refletir
3, por exemplo, que se estendeu do principio sobre seu próprio lugar na sociedade ou a respeito da
a de 1920 ate meados da decada de 1940 foi importância de sua herança cultural para a busca de
mento nacionalista das artes no qual artis- “brasilidade”, em virtude de sua precária (ou mesmo
I
lectuais como Mário de Andrade, Oswald inexistente) formação educacional. Obviamente, essa
de, Tarsila do Amaral, Anita Malfatti, entre carência era um problema para o programa modernista
uscaram expressar o “espírito do povo bra- e paraVilla-Lobos - em razão da educação deficiente das
m suas obras massas, estas não conseguiam compreender o valor da
arte nacionalista. Devido a essa formação rudimentar,

Lobos e o canto orfeonico o nacionalismo na educaçao musical 37


portanto, os segmentos mais pobres da sociedade tam- pianista polonês Arthur Rubinstein, tornou possivel
bém não tinham acesso intelectual à música de concerto as temporadas do compositor brasileiro na França?
(ou, como se diz comumente, “não a entendiam”), fosse O artista polaco havia conhecido o músico carioca em
ela brasileira ou europeia, e nesse gênero musical estava uma de suas turnês pelo Brasil, em 1918, oportunidade
incluída a obra do próprio Villa-Lobos. em que ouviu a música do maestro e reconheceu nele
um grande talento. Apesar de um primeiro contato
1923-ii 92;-sfi ii 'imã“sã- Êäiiëvz ãêi iíššãa- ienes conturbado, no qual Villa-Lobos se recusou a tocar sua
Pa rã s música para aquele pianista por achar que, como um
grande virtuose internacional que era, não a enten-
Na década de 1920, Villa-Lobos viveu em Paris em deria, Rubinstein e Villa-Lobos tornaram-se grandes
duas temporadas distintas: de 1923 a 1924 e de 1927 a amigos. Além de ter incentivado o patrocínio para
1930. Esses dois períodos na Cidade-Luz foram de a viagem do maestro brasileiro à capital francesa,
extrema importancia para o composi- Rubinstein também foi fundamental para os primeiros
Villa-lobos percebeu __ _
_ _ tor, nao apenas porque ele se projetou contatos artísticos de Villa-Lobos em Paris.
que existia uma neces
__ internacionalmente, mas também por- Apesar de terem desdobramentos distintos, ambos
siilade de acordar" a _ _
_ que o ambiente cultural da capital fran- os períodos em que Villa-Lobos viveu em Paris foram
naçao para sua herança _ _
_ cesa, onde os maiores expoentes artis- decisivos na vida do compositor. Na capital francesa,
cultural, especialmente _
_ ticos se encontravam, favoreceu a o músico pôde experimentar uma atmosfera artística
a burguesia, cujas _ _ __ _ _
_ _ cristalizaçao de sua linguagem musical, que fervilhava com novas ideias. Importantes compo-
práticas culturais e _ _ _
_ _ _ considerada muito dissonante pelo sitores da vanguarda europeia, como Igor Stravinsky,
sociais ainda tinham _, _ _ _ _ _
publico brasileiro e pela maioria dos Sergei Prokofiev, Edgard Varèse, entre outros, com-
uma forte ligação com a
críticos da música de concerto no punham a cena musical parisiense. Esse ambiente foi
cultura europeia e com
Brasil. Para esse público, que se iden- decisivo para que Villa-Lobos experimentasse suas
o modo de vida do Velho
tificava com as tradições musicais do próprias ideias. Foi também na capital da França que,
Continente.
barroco, do classicismo e do roman- por meio de Rubinstein, o maestro entrou em contato
tismo europeu, a música de Villa-Lobos, que, além
de dissonante, apresentava traços das tradições musi- pm giz- 7 f"'._-`§ Í _1i _ 'Q

cais de negros e ameríndios brasileiros, não 8 De acordo com Manuel Negwer, também contribuiram financeiramente para a
primeira viagem de Villa-Lobos o Deputado Arthur Lemos, 0 critico Rodrigues
agradava. Barbosa, os compositores Francisco Braga e Henrique Oswald, o poeta Ronald de
Villa-Lobos foi a Paris com 0 patrocínio do indus- Carvalho, e alguns mecenas das artes, como Antonio Prado, Olívia Guedes Penteado
e Laurinda Santos Lobo. "-.ler NEGWER, M. Villa-Lobos: o florescimento da música
trial Arnaldo Guinle, que, aconselhado pelo grande brasileira. Tradução de Stefano Paschoal. São Paulo: M. Fontes, 2009. p. 144.

38
Gabriel Ferraz
a Editora Max Eschig, que publicou diversas a realidade musical europeia e a brasileira. Manuel
luas obras. Negwer (2009) reconta, por exemplo, a anedota de
quando Villa-Lobos encontrou jean Cocteu* em Paris
-aceitação de Villa-Lobos em Paris foi grande, e improvisou ao piano para o intelectual francês -
is o público e a crítica parisienses viam em o poeta reprovou a execução do músico, condenan-
-a música uma representação dos trópicos e do-a, segundo Negwer, como “uma infusão estilística
interpretavam sob a perspectiva do exotismo, à moda de Debussy e Ravel” (Negwer, 2009, p. 146).
'ibuindo interesse a obras artísticas de países Como afirma o autor,
as culturas eram desconhecidas dos europeus.
Villa-Lobos vinha de um milieu musical fixado do
fato, entre 1923 e 1929, Villa-Lobos compôs
forma dogmática da “ópera lírico” italiana, em que
iis de 100 obras novas, profusão criativa que
Ravel, Debussg e Wagner eram considerados repre-
idencia o estabelecimento de uma linguagem
sentantes da nova música que constituía um enclave
isical na qual o elemento “brasileiro” se faz
marcadamente europeu, muito afastado no centro de
iis presente. A série dos Choros, por exemplo,
um âmbito exótico. O âmbito de Cocteau, ao contrário,
composta entre esses anos, com excessão do
encontrava-se pura e simplesmente na metrópole cultu-
ioros n. 1”, composto em 1920. De qualquer
ral europeia, onde as tendências e os parâmetros para
una, seria injusto dizer que o artista exagerou
os artes eram ditados [...]. Na Paris ii que Villa-Lobos
s elementos identificados como brasileiros
havia chegado, Ravel e Debussy eram considerados,
ra ganhar reconhecimento e fama em Paris
contudo, clássicos.
«mo afirmam alguns autores). Averdade é que
imbiente francês possibilitou que ele experi- De fato, Debussy e Ravel ainda eram considerados,
mtasse mais em sua música, sem as amarras no Brasil, expoentes daquilo que era mais moderno em
:abelecidas pelo conservadorismo da crítica e música erudita, ao passo que em Paris eles já perten-
la ignorância do público no Brasil. ciam ao passado musical. Essa anedota mostra como
o ambiente musical do Brasil ainda estava preso a uma
Diversos outros fatos importantes permearam tradição que já havia sido ultrapassada na Europa.
da de Villa-Lobos em Paris e estão fartamente Em 1930, Villa-Lobos voltou ao Brasil para reger
umentados nas biografias do compositor. Para uma série de concertos e, após sua estada em Paris,
so estudo, é importante frisar que foi nessas a triste realidade da arte em geral em seu pais, da
iporadas no exterior que Villa-Lobos cons- música artística em especial, passaram a incomo-
itizou-se definitivamente da diferença entre dá-lo ainda mais. Sua música, na qual as articulações

ir Villa-Lobos e o canto orfeônico: o nacionalismo na educação musical 39


rítmicas e dissonâncias tinham papel fundamental, Não se pode desejar que um país adolescente, em estudo
era vista como ultramoderna no Brasil e criticada de formação historico, se apresente, desde logo, com
por tais elementos, que, na Europa, já faziam parte todos os seus aspectos étnicos e culturais perfeitamente
de uma linguagem há muito aceita (e inclusive espe- unidos. Entretanto, o punorumo geral da músico bro-
rada) pelo público e pela crítica. Dentro do panorama sileiro, hd dez unos utrds, era deveras entristecedor.
artístico conservador que encontrou no Brasil, era Por esse época, de volto de uma dos minhas viagens
natural que Villa-Lobos se desapontasse profunda- no Velho Mundo, onde estive em contacto com os grun-
mente com o público e a crítica nacional. des meios musicais e onde rive a oportunidade de
estudar os organizações orƒeânicus de vários paises,
1.2.2 O nacionalismo e o projeto volvi o olhar em torno e percebi ii desolodoru realidade.
educacional (Villa-Lobos, 1942, p. 17)

rã ao às para fo em iisššiš:
rever lmid? a reaiicia-de â'vl&'il ñli' :t
use ir rôàafi ili ilididli
E
p_ üW-i ,-5 fimWe* educaçao
F
of mais ditàsdiasem
` .E&l8%(ä
'äflñäfl___

Figura 1.2 -- Quinze mil estudantes uni forrnizados


movimentam bancleiriniias na concentração orfeônico que
orreu no Estádio São Ianuário no dia 7 de setembro de 1943
Em meados de 1930, Villa-Lobos foi para São Paulo
reger uma série de oito concertos sob os auspícios
da Sociedade Sinfônica São Paulo e da Sociedade de
Cultura Artística? Desolado com a realidade musical
do país, expressou sua profunda frustração com a
indiferença da população à música erudita nacio-
nalista brasileira:

¡- __ _ T mf
z zz 4

9 Apesar de haver iniciativas para promover a música de concerto, São Paulo “sofria”
're
do que Mario de Andrade chamou de "pianolatria", ou seja, a idolatria pela música
para piano. Esse fator também revela o ambiente provinciano da prática da música §Y`-- as.
de concerto em São Paulo, que, naquela epoca,já era uma das cidades mais impor- Crédito: Foto coletada nos arquivos do Museu Villa-Lobos (número de
tantes do pais. arquivo 19??-16-05?)

40
Gabriel Ferraz
Certamente, além de grande parte do público não ter compreen-
o as obras apresentadas nos concertos”, a decepção de Villas-Lobos
eu-se também ao fato de que, apesar de o compositor ter alcançado
nsiderável sucesso em Paris, o povo brasileiro ainda não com-
* “idia sua música, e a série de concertos que ele regeu não foi bem
.ida. O regente sabia que, naquelas condições, não conseguiria
como músico no Brasil.
:pois da Revolução de Outubro de 1930 (golpe pelo qual Vargas
lu ao poder), que tinha uma proposta nacionalista de renovar o
é fortalecer os laços de união entre os brasileiros, criando maior
dade nacional, Villa-Lobos percebeu que aquele era um momento
régico também para a renovação nas artes. Como afirmou em
rica nacionalista no governo Getúlio Vargas, em tom heroico e cla-
nte demagógico,

ieio deƒé naforça poderosa da música, sent-i que com o advento desse
asil Novo era chegado o momento de realizar uma alta e nobre missão
iioadora dentro da minha Patria I J Era preciso por toda a minha
.orgia a serviço da Patria c da coletividade, utilizando a musica como
n meio deformação e de renovação moral, cívica e artística de um povo.
'illa-Lobos, 1942, p. 18)

pesar da demagogia, Villa-Lobos foi, de fato, perspicaz, pois


:beu que, dentro de uma proposta política com forte orientação
inalista, um programa de educação musical que “elevasse” o
cultural geral do povo e disseminasse o nacionalismo ganharia
-- fl""__¶.

im parte dos concertos obras que o público brasileiro certamente identificou como de vanguarda, como
ema sinfônico "Amazonas", de Villa-Lobos, “Pacific 231", de Arthur Honegger (que fez parte do Gru po dos
, "Saudades do Brasil”, de Darius Milhaud (que também fez parte do Grupo dos Seis), "Curuça: choro para
.estra n. 5", de Mozart Camargo Guarnieri, e um programa inteiro com composições de Florent Schmitt,
:ompositor pouco lembrado na atualidade, mas que foi muito influente naquele tempo. Para mais infor-
ões sobre os concertos, veja: AN DRADE, M. de. Música doce música. São Paulo: Livraria Martins Editora.
. p. 145-164.

Villa-Lobos e o canto orfeônico: o nacionalismo na educação musical


a simpatia do governo. Para o compositor, esse pro- escreveu em 27 de dezembro de 1930 e endereçou a seu
grama seria a ferramenta perfeita para educar as mecenas Arnaldo Guinle, pouco antes de tornar-se
crianças a apreciarem música de concerto, educan- educador musical:
do-as também sobre a importância da arte nacional.
O maestro também entendeu que a disciplina era O que eu posso dizer, apenas, é que tenho calos nos
um fator fundamental nessa educaçao, uma vez que dedos de tanto me exercitar ao violoncelo, a ƒim de
considerava o povo brasileiro muito indisciplinado, levantar recursos para minha subsistência. Ninguém
característica que não contribuía para a apreciação imagina que hoƒe em dia tem alguém mais parecido do
da música de concerto, que requer silêncio e atenção. que eu com um pobre diabo, que pede esmolas e dinheiro
Além disso, naquela época, Villa-Lobos já tinha para poder viver em ser próprio pais. Sinto-me doente
43 anos e nunca havia tido um emprego fixo. Nessa e cansado e não recebo a recompensa justa e merecida.
situação, uma posição estável no governo brasileiro (Villa-Lobos, citado por Peppercorn, 1994, p. 38)
lhe daria estabilidade financeira e, naturalmente, Nesse momento, claramente triste com a dura
promoveria seu nome, o que também realidade que enfrentava no Brasil, Villa-Lobos tinha
Villa-lobos tornou-se
era de seu interesse. Como se diz na intenção de voltar para a França e, por isso, pre-
um eloquente defensor
linguagem popular, com sua proposta cisava mais uma vez do patrocínio de Guinle, que
da educação musical,
de canto orfeônico, Villa-Lobos pôde nunca veio. Apesar de o compositor provavelmente
não só porque via na
“unir o útil ao agradável”. ter exagerado o sentimentalismo em sua carta, fica
educação uma maneira
Villa-Lobos tornou-se um eloquente claro que a situação que enfrentava no Brasil não
de renovação da cultura
defensor da educação musical, não só era aquela que esperava e de que se achava digno,
no Brasil, mas também
porque via na educação uma maneira especialmente depois de ter disseminado a música
porque essa transfor-
de renovação da cultura no Brasil, mas brasileira em Paris e ter adquirido o status interna-
mação Ihe era de grande
também porque essa transformação cional que adquiriu.
valia pessoal, já que
lhe era de grande valia pessoal, já que Com a queda do Primeiro Governo de Vargas,
o estado Ietárgico da
o estado letárgico da arte no Brasil, em 1945”, Villa-Lobos também se desligou das suas
arte no Brasil, somado à
somado à forte crítica que recebia, atividades educacionais no governo. No período em
forte crítica que recebia,
não permitiria que o maestro desen- que trabalhou como educador musical, Villa-Lobos
não permitiria que o
volvesse uma carreira digna em seu
maestro desenvolvesse ¡ n :r"'iE} J _ _ 5

país. Um bom exemplo do desgosto de 11 Vargas tornou-se presidente por meio de um golpe de estado em 1930 e governou
uma carreira digna em
Villa-Lobos com o meio musical brasi- até 1945. Esse periodo é chamado “Primeiro Governo”. Em 1951, foi eleito presidente
seu país. _ democraticamente e governou até 1954, quando cometeu suicidio. Esse periodo é
leiro fica evidente em uma carta que conhecido como seu "Segunclo Governo".

42
Gabriel Forros
diminuiu sua produção musical consideravelmente 1.2.3 Últimos anos
e escreveu fervorosamente sobre educaçao musi-
cal, dando um tom quase político aos seus textos. 1945 a 1957: a carreira internacional
Curiosamente, de 1945 até o fim de sua vida, o maestro
pouco falou sobre esse tema, que havia sido parte cen- No período em que desenvolveu suas atividades
tral de suas atividades como músico durante quase educacionais, Villa-Lobos também promoveu sua
15 anos. Isso nos leva a concluir que, apesar de ter tido carreira como regente e compositor. Em razão dos
uma genuína preocupação com a educação musical contatos profissionais que fez enquanto ocupava a
e artística do povo, Villa-Lobos foi oportunista e ela- importante posição de educador musical no Governo
borou um discurso que agradou Vargas, ganhando, Vargas, sua agenda internacional na regência intensi-
dessa forma, a simpatia e o apoio do então presidente. ficou-se consideravelmente após seu afastamento do
Após 1945, o maestro focou-se em promover sua car- Estado. Naquela época, Villa-Lobos, que já dispunha
reira como regente e compositor por meio da forte de grande abertura em Paris, onde o público o conhe-
influência que passou a ter como educador musical. cia, explorou novos horizontes, como Grã-Bretanha,
Israel e Estados Unidos, país onde sua carreira como
De qualquer forma, a demagogia (parcial) do maes- regente floresceu como em nenhum outro.
tro durante o período que trabalhou como educa- Como regente, Villa-Lobos incluía sua própria
dor não diminui a importância de seu trabalho música nos programas e, como compositor, recebeu
no campo da educação musical no Brasil naquele encomendas de várias orquestras e instrumentis-
momento, mas nos dá uma dimensao mais humana tas. Segundo Simon Wright (1992), entre algumas
e, portanto, mais precisa, e menos heroica, de quem das maiores encomendas dessa época constam:
1
foi Villa-Lobos. Naquele momento, ele foi um com- o Concerto para Piano n. 1 , para Ellen Ballon;
G6 30

* ii
positor que lutou para sobreviver em seu proprio O Concerto para Violão”, para Andrés Segovia;
país e que se utilizou de suas habilidades para a “Sinfonia n. 11”, para a Orquestra Sinfônica de
criar oportunidades que lhe permitissem traba- Boston; o balé “Ruda”, para o La Scala de Milão; e a
lhar naquilo em que acreditava. trilha do filme Green Mansions, para o estúdio nor-
te-americano MGM (Wright, 1992).
Nos seus últimos anos, portanto, Villa-Lobos
enfim alcançou a plena consagração internacio-
nal que tanto merecia, e seu cargo de educador
musical certamente abriu caminhos para que essa

itor Villa-Lobos e o canto orfeônico: o nacionalismo na educação musical 43


consagração acontecesse. O compositor faleceu no Sua predileção pela utilização de dissonâncias foi
Rio de janeiro, no dia 17 de novembro de 1959, aos aparentemente inspirada não só pela tendência da
72 anos, vítima de um câncer contra o qual já lutava música europeia de seu tempo, mas também pelo
há muitos anos. fato de as dissonâncias serem parte intrínseca de
manifestações da música tradicional brasileira. Ao
1.2.4 PI'0dI1çã0 musical e pedagógica: ouvir cantadores no Nordeste do Brasil, por exemplo
formação do estilo, busca da “brasilidade” Villa-Lobos afirmou:
e ideal educador
Nós estamos no Cearã. [Aqui] as pessoas cantam de
= ;="- .. - _ z _; :r ii 'zää zw
59* r =~ .›==~. _----a 'T1
i“iÊà"iti'ic'š4s-ešiiifâ
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;à-t..â-ias.fi,-i.ê..si ifi..t.i::_:›iiÍizar
j1'z=** _-'-¬'*-›~ = ía . _-.°* sf . '=› '
uma maneira especial, sempre utilizando um quarto
de tom especial. O canto sempre parece estar desafi-
Villa-Lobos começou a formar sua linguagem musical nado. Se nós tocarmos um acorde perfeito para um
ainda na infância e adolescência. Nessa formação, cantador; ele não vai perceber essa “perfeição”. E ele
os elementos que tiveram especial importância não vai gostar do acorde. Mas se nós aƒrouxarmos um
foram: a música de concerto europeia, o gênero popu pouco a afinação então ele vaificarƒeliz. Isso significa
lar urbano choro, o folclore e elementos que essas pessoas estão mais próximas da natureza
A predileção de
das músicas afro-brasileira e amerín- do mundofísico do que as convenções musicais. Tudo
Villa-lobos pela utili-
dia, os quais se amalgamaram em sua isso, todas essas observações, me inspiraram a fazer
zação de dissonâncias
identidade composicional. profundas reflexões. É por esse motivo que eu escrevo
foi aparentemente
Além disso, Villa-Lobos certamente música dissonante. Eu certamente não escrevo música
inspirada não só pela
inspirou-se em uma variedade de gêne dissonante para parecer moderno. O que eu escrevo é
tendência da música
ros musicais tradicionais do Brasil, a consequência cósmica dos estudos quefiz, da síntese
europeia de seu tempo,
como a embolada, cujas caracteristicas pela qual eu posso retratar uma natureza como a do
mas também pelo fato
estão presentes, por exemplo, no pri Brasil. (Villa-Lobos, citado por Carvalho, 1988, p. 84)
de as dissonâncias
meiro movimento de sua “Bachianas Nesse contexto, Villa-Lobos tentou criar uma
serem parte intrínseca
n. 1” para orquestra de violoncelos, inti- conexão quase mística entre sua filosofia composi
de manifestações da
tulada “Introdução (embolada)”, e na cional e aquilo que entendia como raízes de prati
música tradicional
obra “As costureiras” (parte do Canto cas musicais brasileiras, que supostamente repre-
brasileira. A K A ,,
orƒeonico v. II, que Villa-Lobos utilizou sentariam uma cultura autentica e original, livre
em seu programa de educação musical nas escolas), de influências estrangeiras. O texto revela como
para coro feminino a quatro vozes, entre outras. o artista buscava conectar-se com elementos que

44
Gabriel Ferraz
acreditava residirem na “essência” cultural do povo compositores nacionalistas que vieram antes dele,
brasileiro, conferindo, dessa forma, uma aura ine- como Alexandre Levy e Alberto Nepomuceno, cujas
rentemente nacional ã sua música. composições não apresentam o mesmo poder de
É verdade que Villa-Lobos tinha como objetivo síntese na linguagem musical. Em muitas das com-
elaborar uma linguagem musical que refletisse a posições dos artistas citados (como nas de outros
natureza de seu povo, mas é necessário atentarmos compositores da mesma época), o elemento brasileiro
à maneira como isso ocorreu. Não há dúvidas de que torna-se um agregado da estrutura musical europeia
os elementos musicais identificados como “autênti- e não se amálgama na gênese composicional.
cos” da música brasileira foram essenciais para essa A linguagem musical “híbrida” que Villa-Lobos
elaboração, mas não podemos pensar ingenuamente desenvolveu foi uma característica comum a com-
que o maestro utilizou dissonâncias em sua música positores nacionalistas europeus da segunda metade
simplesmente porque fez “reflexões cósmicas” sobre do século XIX e da primeira metade do século XX,
a natureza do Brasil, especialmente por sabermos como o húngaro Béla Bartók (1881-1945), e tornou-se
que o compositor viveu em um período histórico no uma tendência também nas Américas, tendo como
qual compositores de diversas partes da Europa e das seus grandes expoentes o próprio Villa-Lobos, o nor-
Américas exploravam novas sonoridades. te-americano Aaron Copland (1900-1990), o argentino
A dissonância tornou-se um elemento comum Alberto Ginastera (1916-1983) e o mexicano Carlos
nas obras de vanguarda de meados do século XX, ou, Chávez (1899-1978), entre outros.
como se diz comumente, a dissonância foi “emanci-
pada”, passou a ser um elemento estrutural na elabo- Essa linguagem musical tinha uma dupla impor-
ração harmônica de uma obra musical. Além disso, tãncia: em razão da simultaneidade dos elementos
Villa-Lobos era um admirador confesso de Stravinsky, europeus - considerados cosmopolitas - e locais,
em cujas composições do chamado período russo a música nacionalista representava musicalmente
(1908 a 1919), como os balés “Petrouchka” e a “Sagração os países tanto em contextos internacionais quanto
da Primavera”, a dissonância é elemento intrínseco dentro da própria nação. Os elementos europeus
da linguagem harmônica. criavam semelhança icônica com a música pro-
Como sugerimos aqui, o que Villa-Lobos realmente duzida no Velho Continente, tornando a música
foi elaborar uma linguagem musical na qual sin- nacionalista das Américas acessível no exterior e
elementos musicais locais com elementos introduzindo, ao mesmo tempo, aspectos da música
cosmopolitas da vanguarda europeia. Essa local americana na vida cultural europeia.
uma das maiores diferenças entre o músico e

Villa-Lobos e o canto orfeônico: o nacionalismo na educação musical 45


No âmbito interno, apesar de utilizar técnicas de vanguarda, a
música nacionalista desses compositores apresentava sonoridades
que os “cidadãos nacionais” podiam reconhecer como “suas”. Essas
sonoridades funcionavam como um canal para que o público criasse
identidade com a música, apesar de os elementos “nacionais” serem
apresentados em um contexto harmônico e rítmico que provocava
estranhamento. Na prática, entretanto, essa escolha estética não fun-
cionou perfeitamente como na teoria e várias músicas nacionalistas
americanas não foram necessariamente apreciadas dentro da nação
em um primeiro momento. De qualquer forma, essa estética musical
híbrida estava no cerne da filosofia composicional dos nacionalistas.

No caso de Villa-Lobos, ainda que, naquela época, os europeus exo-


tizassem sua música como um produto dos trópicos, sua produção pos-
sibilitou a introdução de elementos “autênticos” da música nacional
na Europa. A respeito dessa exotização, Mário de Andrade afirmou no
Ensaio sobre a música brasileira:

Como a gente não tem grandeza social nenhuma que nos imponha ao Velho
Mundo, nemfilosofia que nem a Ásia, nem economia que nem a América do
Norte, o que a Europa tira da gente são elementos de exposição universal:
exotismo divertido. Na música, mesmo os europeus que visitam a gente
perseveram nessa procura do exquisito apimentado. (Andrade, 1972, p. 15)

Se esse “exquisito apimentado” - como definiu Andrade - não garan-


tia um bom entendimento da cultura brasileira na Europa, ao menos
tornava os europeus cientes de seus elementos mais importantes.
Dentro do Brasil (como também ocorreu em outros países america-
nos), a música nacionalista se destinava a cumprir duas funções: seus
elementos locais poderiam atrair as massas para a música de concerto, já
que criavam semelhança icônica com tradições musicais populares prati-
cadas no Brasil, e introduzia tradições musicais populares, afro-brasileiras

46 Gabriel Ferraz
ameríndios à burguesia e às classes conservado- a já mencionada série dos 14 Choros (dos quais os
s, que, por sua vez, rejeitavam tais manifestações. dois últimos estão perdidos) e a série das 9 Bachianas
__e . _. . . . brasileiras, composta durante a década de 1930 e
" * tanto, isso nao foi suficiente para atrair parcelas
.ltas da sociedade para a sala de concerto nem primeira metadade da década de 1940. Os Choros,
1 fazer com que as elites dessem o devido valor para diversas formações instrumentais, voz e ins-
Iisica de concerto brasileira, que perdia larga- trumentos solistas são considerados as obras mais
.te em popularidade para a europeia (de resto vanguardistas do compositor, apresentando um
.situação não muito diferente da atual). nacionalismo musical considerado “agressivo” por
J . . _ alguns autores, pela constante dissonância, pelos
essa realidade, Villa Lobos percebeu na educa-
iiusical um meio eficiente para lutar contra essa fortes acentos rítmicos e pelas mudanças nas fór-
:gia intelectual. O maestro entendeu que deveria mulas de compasso. já nas Bachianas brasileiras,
alhar na formação do gosto musical das crianças, Villa-Lobos expressou sua admiração por Bach,
ie mudar o gosto do público adulto era um pro- criando uma linguagem musical menos dissonante
o muito complicado. Portanto, como já dissemos e com ritmos mais estáveis. Segundo o próprio
zriormente, o programa de educação musical do maestro, essas obras são resultado da síntese de ele-
.positor foi construído em cima de uma orienta- mentos da música de Bach e da música brasileira.”
n . . Dentro desse enorme catálogo, ainda vale ressal-
acionalista.
tarmos as seguintes obras: os 17 quartetos de corda,
ras mais importantes as 12 sinfonias, uma vasta obra para piano, que
inclui 5 concertos e diversas suítes, entre as quais
tética de síntese de Villa-Lobos se faz presente a Suíteƒloral, o Ciclo brasileiro, e os dois cadernos da
grande maioria das obras do compositor, que Prole do bebê. Villa-Lobos também escreveu óperas,
ra com um catálogo de mais de mil composições como Izaht e Magdalena, e música para cinema,
praticamente todos os gêneros musicais e para como as quatro suítes orquestrais Descobrimento do
_ , . . Brasil, para o filme homônimo de Humberto Mauro,
.rsas formaçoes cameristicas e instrumentos
atas.” As obras mais célebres de Villa-Lobos são e a já citada trilha para o filme Green Mansions.
mí* ' " ^ f í I Q Devemos ainda frisar a importância das obras
1 estudo mais aprofundado das obras de Villa-Lobos foge ao escopo do presente que Villa-Lobos compôs para violão, como os
M _ . . . . _
ulo Existe um numero vasto de materiais que dlscorrem sobre o repertório
' . . . _ : I
s processos composicionais do maestro, entre as quais destacamos BÉHAGUE .§ I_ í_ 7 ñ fm ml*

H oltor Villa-Lobos: the Search for Brazil's Musical Soul. Austin: University of 13 Um estudo detalhado de como (e se realmente) Villa-Lobos fez uso do elemento
ia s, 1994; e SALLES, P. de T. Villa-Lobos: processos composicionais. Campinas: bachiano nessas obras e de como ocorre a fusão com elementos musicais brasi-
.da Unicamp, 2009. leiros ainda precisa ser realizado.

1'Villa-Lobos e o canto orfeônico: o nacionalismo na educação musical 47


12 Estudos, que apresentam os mais diversos desafios técnicos e inter-
pretativos, os 5 Preludios, a Suite popular brasileira, e 0 Concerto para
violão e orquestra. Graças às suas composições para o violão, instru-
mento que, comparado ao piano, o violino, o violoncelo, e outros, tem
um repertório de concerto escasso, esse instrumento foi ganhando
paulatinamente mais adeptos e mais espaço nas salas de concerto.
Hoje, as obras para violão de Villa-Lobos são parte fundamental do
repertório violonístico mundial.”

Obras edaucacionais

O nacionalismo de Villa-Lobos fica patente em sua produção peda-


gógica, da qual os cadernos mais importantes são o Guia prãt-ico,
contendo 137 canções folclóricas recolhidas em diversas partes do
país, e os dois volumes de Canto orfeônico, que contém marchas, hinos
patrióticos, canções cívicas, canções sobre as diferentes etnias bra-
sileiras e cançóes sobre trabalhos laborais importantes no Brasil de
Vargas. Villa-Lobos ainda usou os dois volumes de Solƒejo para a edu-
cação musical, os quais contêm diversos exercícios cujas melodias
têm caracteristicas folclóricas.
Apesar de Villa-Lobos não ter composto grande parte das obras que
usou no seu programa de educação musical, o maestro fez arranjos
das peças e as organizou em coletâneas. Entendemos que, com esse
repertório, o compositor tinha a intenção de mapear a diversidade
cultural do Brasil na mente das crianças, imbuindo-lhes de “brasili-
dade”, ou seja, do “espírito brasileiro”, de uma maneira lúdica.

'_ _ _ , ii; ~¡

14 Para a lista completa das obras de Villa-Lobos, ver Villa-Lobos: sua obra, o catálogo de obras do compositor
editado pelo MinC, lbram e Museu Villa-Lobos em 2009.

48
Gabriel Ferraz
1.3 OS €I1SaÍOS dÍdálIÍCO-BXPIÍCMIÍVOS importância para a elevação do nível cultural do povo
E EIS fl1I1ÇÕES dO CHIIÍO 0I'f€ÕI1ÍC02 (Villa-Lobos,1937b, VIII). Dentre os aspectos discipli-
IÍÍSCÍPIÍHEI, CÍVÍSII10, IIEICÍOIIEIIÍSIIIO B nares, vale a pena destacarmos a “exortação”, que,
EIÍIICHÇHO J' ElI'Í1StlCa
“ ° segun d o o musico,
' era a par t e “ mai sim
' p ortante da
pedagogia orfeônica” e que tinha por finalidade “inci-
Os principais objetivos da educação musical proposta tar o aluno pelo amor à Pátria, à Mocidade Estudiosa,
porVilla-Lobos podem ser observados em três ensaios enfim, ã nossa Gente. Explicar que o canto orfeô-
com fins didático-explicativos: Programa do ensino de nico é a educação do canto, cívica moral e artística”
música, O ensino popular da música no Brasil, ambos de (Villa-Lobos, 1937b, p. 14).
1937, e A música nacionalista no governo Getúlio Vargas,
de 1942, nos quais Villa-Lobos apresentou, de maneira Nessa mesma passagem, Villa-Lobos ainda afirmou
sistemática, os diversos aspectos do canto orfeônico que a “exortação” deveria instruir os alunos a can-
relacionados aos benefícios culturais, musicais e tarem os hinos patrióticos com respeito e convícçao,
sociais promovidos por meio da educação musical.” pois representavam uma “prece ao Brasil”. Nesse
No Programa do ensino da música, Villa-Lobos texto, o músico funde um dos atos mais simbóli-
definiu a disciplina, o civismo e a educação artística cos de devoção e fé (a prece) com a prática musical
como finaliclades da educação musical e afirmou dos escolares, transmitindo a ideia de que, como
que o ensino de música nas escolas era de extrema membros de uma doutrina religiosa, as crianças
Í ___ ñ í 1 _ Í deveriam mostrar sua devoção ao Brasil por meio
Para conhecer os pormenores do programa de educação musical de Villa-Lobos, do canto.”
consulte os seguintes ensaios: VILLA-LOBOS, H. 0 ensino popular da música no
¡ í _ f fl“"-_'¶- - ___ 7- 1
Brasil. Rio de Janeiro: Secretaria Geral da Educação e Cultura, 1937; VILLA-LOBOS, H.
Programa do ensino de música. Rio de Janeiro: Secretaria Geral da Educação e A ideia do que uma parcela dos intelectuais brasileiros entendia como elevação
Cultura, 1937;eVILLA-LOBOS, H. Amúsica nacionalista no governo Getúlio Vargas. do gosto cultural fazia parte das discussões da época, como vimos anteriormente.
Rio delaneiro: DIP (Departamento de Imprensae Propaganda), 1942. Os três ensaios No campo musical, essa questãojá havia sido abordada, por exemplo, por Alexandre
foram publicados oficialmente pelo governo de Vargas. O último foi publicado pela Levy. Sob o pseudônimo Figarote, o compositor paulista escreveu vários artigos que
DIP, órgão mais importante de controle de imprensa e manifestações culturais da tratam da elevação do gosto por meio da música para ojornal Correio Paulistano.
ditadura do político gaúcho. Como a grande maioria dos volumes publicados pela Para mais informações sobre o nacionalismo musical de Levy e as ideias que o
Instituição, A música nacionalista no governo Vargas também exaltava a gestão compositor propagava, veja TUMA, S. O nacional e o popular na música de
do politico gaúcho e o nacionalismo no Brasil. Em diversos momentos do ensaio, Alexandre Levy: um projeto de modernidade. 202f. Dissertação (Mestrado em
Villa-Lobos parece emulara retórica queo próprio Vargas utilizava em seus discursos. Musicologia) - São Paulo, Universidade de São Paulo, 2008.

Villa-Lobos e o canto orfeônico: o nacionalismo na educação musical 49


O ensino popular da música no Brasil tem diver- naturais, desenvolve-las, abrindo-lhes horizontes
sos pontos em comum com o Programa do ensino da novos e apontando-lhes os institutos superiores da
música. Em O ensino popular... Villa-Lobos também arte onde é especializada a cultura” (Villa-Lobos,
discorre sobre os objetivos e aspectos práticos do 193721, p. 23). Em outras palavras, Villa-Lobos não
canto orfeônico. O compositor deixa claro o caráter desejava formar crianças que se tornassem músi-
de educação social do canto orfeônico quando afirma: cos, mas que soubessem apreciar e reconhecer a
“ A I

o canto orfeonico e o propulsor da elevação do gosto importância da música de concerto - principalmente


e da cultura das artes; é um fator poderoso para o a brasileira - e respeitar a profissão do músico.
despertar de bons sentimentos humanos, não só os
de ordem estética como os de ordem moral e sobre- EmA música nacionalista no governo Getúlio Vargas,
tudo cívica” (Villa-Lobos, 193751, p. 23). um ensaio de 1942 cujo caráter ideológico é mais
patente que nos outros dois de 1937, Villa-Lobos
“Elevar” o gosto cultural, nesse contexto, significava discorre sobre o caráter socializador da educação
formar crianças que apreciassem música de con- musical afirmando que o canto orfeônico, “com seu
certo, incluindo a do próprio Villa-Lobos.” Nesse enorme poder de coesão, criando um poderoso orga-
mesmo ensaio, o compositor também afirmou que nismo coletivo, ele integra o indivíduo no patrimô-
o canto orfeônico não se propunha a formar músi- nio social da Pátria” (Villa-Lobos, 1942, p. 10). Nesse
cos, “mas [a] despertar nos educandos as aptidões mesmo volume, o compositor também evidencia o
ç~ Ú- f f |_r -Q
aspecto nacionalista da educação musical, quando
17 O chamado nacionalismo reiigioso, por meio do qual o Estado se associava à Igreja,
buscando ”sacralizar" seu poder, fazia parte da politica de Vargas. Por meio dessa afirma que,
associação, o politico gaúcho procurava projetar valores religiosos na própria pátria,
de modo que esta também fosse vista como um simbolo religioso, cuja devoção seria Entoando as canções e os hinos comemorativos da
expressa por meio do patriotismo. Alem de utilizar frequentemente uma retórica
composta de palavras com forte simbolismo religioso, Vargas foi responsável pela Pátria, na celebração dos heróis nacionais, a infância
implementação do ensino religioso nas escolas primárias, secundárias e normais brasileira vai se impregnando aos poucos desse espírito
em abril de 1931 por meio do Decreto n. 19.941. A educação por ele estruturada tinha
como objetivo transmitir valores patrióticos e religiosos, preparando a mocidade de brasilidade que nofuturo deverá marcar todas as
para abraçar o nacionalismo religioso. Vargas também promoveu as chamadas suas ações e todos os seus pensamentos, e adquire, sem
missas campais, nas quais aparecia lado a lado com um representante do clero,
projetando a união do Estado e da Igreja. Alem disso, as missas campais também dúvida, uma consciência musical autenricamente
tinham a participação de grupos de canto orfeünicoiveja uma análise mais apro- brasileira. (Villa~Lobos, 1942, p. 11, grifo do original)
fundada em: FERRAZ, G. Heitor Villa-Lobos and Getúlio Vargas: Constructing
the “New Brazilian Nation" through a Nationalistic System of Music Education. Nesses três ensaios, fica evidente que Villa-Lobos
251 p. Dissertation (Doctorate in Philosofy] - University of Florida, Galnesvllle, USA,
2012. p. 91-134. Disponivel em: <:ufdc.ufl.eduiUFEüü44008/0ü00'l>. Acesso em: 5 mar. tinha como maior meta a formação cultural, inte-
2014. lectual e social das crianças e que o desenvolvimento

50 Gabriel Ferraz
um aparato técnico-musical não estava em suas de sincretismo (nesse contexto, refere-se à fusão da
loridades. Como parte fundamental dessa forma- música de diversas culturas) musical que geraram
› músico primou por socializar as crianças na a música folclórica brasileira, e um quadro sinótico,
a, enfatizando a importância da coletividade no qual o autor ilustrou, por meio de um mapa, as
o canto em grupo e imbuindo nas crianças valo- partes do mundo de onde vieram os elementos musi-
1 . . . cais encontrados no Brasil.
e as preparassem para a vida social no Bras1l
, um pa1s almejado tanto por ele, que buscava Os dois volumes do Canto orfeônico contêm prin-
r enovação no gosto artístico brasileiro, quanto cipalmente marchas, hinos patrióticos e canções
'argas, que visava criar um sentido de coletivi- cívicas e escolares. Em menor escala, também se
na qual o ideal nacionalista uniria as pessoas encontram nesses volumes cançoes que evocam
Jrno de um bem comum, e, mais importante diversos outros elementos que foram imbuídos nas
I-5

ls individualidades, a nação. crianças como identificadores comuns de brasili


dade”, entre os quais: a herança cultural dos afro-bra-
epertório: o Guia prático e os dois sileiros, como na canção “Um canto que saiu das
lmes do Canto orfeônico senzalas” (v. 2); a herança cultural dos ameríndios
do Brasil, como em “Nozani-nã”, canto dos índios
-Lobos acreditava que a música folclórica era parecis (v. 1); exaltação ao Brasil, como na canção
I |'.¡ .r H e I
llhor forma de iniciar a educação musical da clvica Verde patria (v. 1); figuras hlstoricas brasi
-

iça, pois como as melodias faziam parte do dia leiras, como no canto patriótico “Tiradentes” (v. 1) e
dos pequenos, elas seriam mais facilmente assi- “Santos Dumont” (v. 2); canções que evocam militares
das. Além disso, o compositor acreditava que a brasileiros, como a canção militar “Deodoro”, em
.ca folclórica conscientizaria os jovens sobre as homenagem ao Marechal Deodoro da Fonseca (v. 1);
nças culturais do Brasil. Para introduzir a música Vargas e seu regime, como na “Saudação a Getúlio
da infantil, Villa-Lobos organizou o Guia prático, Vargas” e na “Marcha para o Oeste”, que faz referên-
subtítulo é estudo ƒolclórico musical”. Essa cole- cia às iniciativas do então presidente para incentivar
além das canções folclóricas, inclui explicações a ocupação e progresso do Centro-Oeste brasileiro
e o folclore brasileiro, que versam sobre os tipos (v. 1); e trabalhos laborais que eram importantes para
I' lí U
a polltica trabalhista de Vargas, como As costureiras
(v. 2) e “Canto do operário” (v.1).
I-Lobos planejou uma série de seis guias práticos para o uso no canto orfeônico,
l apenas o primeiro volume foi publicado. Existem, entretanto, onze volumes
Sula prático para piano solo.

'Villa-Lobos e o canto orfeônico: o nacionalismo na educação musical 51


_

Nessas canÇ ões, os elementos musicais muitas “brasileiros” e colocassem a na Ç ão como rioridade
vezes emulavam as ideias contidas nos textos. Nas em suas vidas, mesmo que para isso fosse necessário
canções que evocam tradições afro-brasileiras, por sacrificar vontades individuais em prol do grupo.
exemplo, Villa-Lobos fez uso de síncopas, entendi-
das como uma característica marcante da música 1.3.2 Concentrações orfeõnicas: cantando
africana. Nas canções que evocam os ameríndios em prol da naçao e do reglme
1 .

brasileiros, harmonizou melodias originais de


diversos grupos ameríndios, tornando-as mais O canto orfeônico ocupava lugar central nas gigantes-
acessíveis às crianças da capital urbana. Nas can- cas concentrações orfeônicas, que ocorriam durante
ções patrióticas, como “Soldadinhos” (v. 1), existem todo o ano e celebravam diversas datas importantes
efeitos musicais que emulam o toque de trompete para o país, além de homenagear personalidades
e o rufo de tambores. Muitas das canções também e nações amigas, entre outros temas. As concen-
contam com elementos musicais de gêneros reco- trações mais importantes e colossais foram, sem
nhecidos como “autenticamente” brasileiros, como dúvida, as de Sete de Setembro - chamadas de Hora
o samba e a embalada. da Independência - normalmente comemoradas no
Estádio São Ianuário, no Rio de janeiro. O evento de
Portanto, o repertório do canto orfeônico foi uti- 1940, por exemplo, reuniu 40 mil estudantes para
lizado para incutir diversos aspectos cantar hinos patrióticos, acompanhados de 500 músi-
Vargas estava sempre , _ _ _
da naçao bras1le1ra de uma maneira cos de banda.
presente nas concen
lúdica na identidade da mocidade, Nesses eventos, Villa-Lobos era figura central e,
trações do Sete de
criando um “mapa” da diversidade cul- além de reger o enorme coro infantil, era responsável
Setembro e fazia
tural, social e musical do Brasil em suas pela orquestra ou banda que normalmente acom-
discursos nos quais
mentes. Dessa forma, esse repertório panhava o coro. Além disso, tinha pleno controle
conectava sua imagem
foi um fator educacional muito impor- sobre diversos outros funcionários e professores de
à imagem da própria
tante, pois contribuía para a formação canto orfeônico que participavam da organização das
pátria, construindo uma
integral dos escolares, educando-os concentrações. Os participantes vestiam uniformes
persona politica cuja
musicalmente e enriquecendo seu obrigatórios e a organização distribuía bandeirinhas
aura estava intrinseca-
conhecimento sobre a cultura e socie- com as cores da bandeira do Brasil, que eram movi-
mente Iigada à nação,
dade do Brasil. Isso foi muito impor- mentadas ao comando de Villa-Lobos. Muitas vezes,
projetando-se, dessa
tante para Vargas, que buscava formar as crianças também soltavam balões de ar com as
forma, como um simbolo
crianças que cultivassem valores cores da bandeira nacional, o que contribuía para
nacional.

52
Gabriel Ferraz
iquecer a atmosfera nacionalista patriotica e uma declaração de Teixeira, anos mais tarde, “De tudo
bratoria desses eventos que estávamos tentando, no antigo Distrito Federal,
Em virtude do forte apelo emocional, as concen nada me parecia mais importante do que essa inte-
çoes orfeonicas cristalizaram o mesmo ideario gração da arte na educação popular” (Teixeira, citado
in ta -largamente disseminado na escola e por Menegale, 1969, p. 124).
a sociedade - na mente dos articipantes A Sema tinha diversas funções, entre as quais
ava sempre presente nas concentraçoes organizar e supervisionar o programa de educação
Setembro e fazia discursos nos uais musical nas escolas, para garantir que elas tivessem
sua imagem a imagem da propria pátria, número suficiente de professores de canto orfeônico
do uma ersona politica cuja aura estava e que a disciplina fosse ministrada corretamente,
imente ligada a nação, projetando-se, dessa e verificar os efeitos práticos do canto orfeônico na
rno um simbolo nacional Portanto, as con formação musical, moral e cívica da criança. Por
s foram antes de qualquer coisa, uma arena meio de seus supervisores, que faziam dezenas de
anda politica para o governo visitas às escolas durante o ano letivo, a Sema con-
seguiu mapear a situação do canto orfeônico no Rio
rutura institucional do canto de janeiro, verificando a quantidade e qualidade
o a Superintendencia de dos professores, avaliando o progresso musical e
io Musical e Artistica disciplinar dos alunos e atuando onde se percebia
ser necessário, para tornar o ensino da música na
~ tornar o canto orfeonico obrigatorio no Capital Federal mais eficiente. Além disso, a institui-
leiro, era preciso criar uma estrutura ins ção também organizou diversos cursos de formação
l que desse suporte a implementação da de professores para suprir a demanda das escolas no
iplina Dessa forma, em 1932 o governo então Distrito Federal e promoveu concertos para a
uperintendencia de Educaçao Musical e sociedade do Rio de janeiro como um todo.
(Sema ), um ramo do Departamento de
I e nomeou Villa Lobos seu diretor (como 1.3.4 O Conservatório Nacional de Canto
I nado) A Sema foi criada sob os auspicios Orfeõnico e o fim das atividades
Teixeira, entao secretario de Educaçao da pedagógicas de Villa-Lobos
I
deral, ue realizava uma grande reforma
1 al na uela cidade A educaçao musical nas Com o crescimento das atividades da Sema e a expan-
1 tao imP ortante P araVar8 as Clue, se 8 undo são do canto orfeônico para outras regiões do país, o

obos e o canto orfeonico o nacionalismo na educaçao musical 53


0 CNC!! tinha como governo criou o Conservatório Nacional de Canto Orfeônico (CNCO)
função dar orientação em 1942, do qual Villa-Lobos também foi diretor. O CNCO tinha como
unificada aos profes- função dar orientação unificada aos professores do Brasil inteiro, os
sores do Brasil inteiro, quais, como afirmou Villa-Lobos, trabalhariam como sentinelas do
os quais, como afirmou nacionalismo musical (Villa-Lobos, 1991, p. 20). Consequentemente,
Villa-lobos, trabalha- além de educadores musicais, eles também seriam disseminadores
riam como sentinelas do ideológicos.
nacionalismo musical Com a deposição de Vargas da presidência em 1945, Villa-Lobos
(\lilIa~I.obos, 1991, p. 20). também foi desligado de suas atividades pedagógicas no CNCO.
Entretanto, como afirma Negwer (2009), o compositor já havia
assumido uma nova funçao, que o autor citado chama de embai
H' II
-

xador cultural do Brasil”, em referência às diversas atividades


musicais que passou a realizar depois do final da Segunda Guerra
Mundial, principalmente nos Estados Unidos, mas também na
Europa (Negwer, 2009). Essa projeção profissional foi construída
ao longo de seus anos como educador musical e teve um papel muito
importante na sacralização de Villa-Lobos como cânone da música
erudita no Brasil. De compositor pouco tolerado antes do governo
Vargas, passou à estrela internacional da música erudita brasileira
15 anos depois. Essa trajetória foi boa para o maestro, para a música
brasileira e para o Brasil como um todo, mas ocorreu ao custo do
comprometimento moral do artista com a ditadura de Vargas.

Gabriel Ferraz
1.4 Adaptando a Melodia das a) Antes de iniciar a atividade, você deve saber
montanhas qual melodia será utilizada. Recomendamos
melodias simples nas tonalidades de Dó
Uma das atividades pedagógicas que Villa-Lobos Maior, Sol Maior e Fá Maior, e que não
desenvolveu para incitar o espírito criativo nas crian- ultrapassem o intervalo de uma oitava.
ças foi a Melodia das montanhas. Em resumo, a ati- Conforme os alunos progredirem, utilize
vidade consistia em traçar em uma folha de papel melodias em tonalidades com mais suste-
quadriculado o contorno de uma montanha ou de nidos e bemóis e que ultrapassem a oitava.
outras formações geográficas e, por meio de um pro- Primeiramente, escreva de baixo para cima,
cesso preestabelecido, que definia valores rítmicos à margem esquerda da folha branca, todas
para os quadrículos no sentido horizontal e de altura as notas de uma oitava da escala da melodia
para quadrículos no sentido vertical, transformar escolhida (ex: se a melodia está em Dó Maior,
esse contorno em uma melodia. Ao professor caberia escreva as notas da escala de Dó Maior).
harmonizar a melodia de seus alunos. O tamanho dos quadrículos depende do
Propornos aqui uma adaptação da atividade, que tamanho da folha de papel a ser utilizada
visa tanto despertar o espírito criativo nos escola- (para alunos mais novos, recomendamos
res quanto ajudá-los a traduzir seus pensamentos folhas de papel maiores) e da extensão da
musicais em música grafada. A seguir são descritos melodia a ser executada (extensões maio-
08 passos necessários: res requerem quadrículos menores, para
poderem ser acomodadas na folha de papel).
Material: folhas de papel em branco, lápis e O número de quadrículos na posição hori-
_i'\:
borracha. zontal depende da duração da melodia. Para
Preparação do papel quadriculado: oriente os melodias mais longas, a folha deve ter mais
alunos, que devem preparar o papel individual- quadrículos horizontais.
mente. Se for muito difícil coordenar todas d) No caso de melodias que ultrapassem o
as crianças para prepararem o papel, faça-o intervalo de uma oitava, o aluno deve colo-
sozinho: car, à esquerda de cada nota, a numeração da

Villa-Lobos e o canto orfeônico: o nacionalismo na educação musical


55
escala à qual ela pertence. Süfllfimfll do teclado de
um piano para explicar a numerüçlo dll llcllll para as crian-
ças. O primeiro Dó grave do teclado será O Dói. O todos as notas
entre esse Dó e o próximo estarão na escala de número 1 (Rél,
Mil, Fá1 etc). O Dó uma oitava acima do Dó1 será o Dó2, e assim
sucessivamente. Veja, no exemplo a seguir, como as notas no
registro da primeira oitava devem ser colocadas no papel
quadriculado.

Exemplo da preparação do papel quadriculado para uma melodia em Dó Maior


1 Í ' _ i ' ' "C C *B
2 Dó .
J
1 si " _
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i J _ _
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L t ,

3. Parto prática: os itens a seguir contêm os passos para a realização


da atividade e sugestões sobre como orientar os alunos a realizá-la.
Outras atividades podem ser adicionadas às descritas a seguir,
bem como os passos e/ou a atividade como um todo podem ser
livremente adaptados:
a) A atividade se inicia com o professor distribuindo folhas de
papel em branco, lápis, borracha e uma prancheta para os alu-
nos (as folhas quadriculadas serão utilizadas em um momento
posterior da atividade). Os alunos utilizarão primeiramente
as folhas em branco para grafar livremente a melodia a ser
executada pelo professor.

56
Gabriel Ferraz
fll

Assim que os alunos estiverem com seu material em maos, cante,


toque ou entoe quatro vezes (ou mais, se achar necessário) uma
melodia curta para seus alunos. Sugerimos que a melodia não
dure mais de 10 segundos, tenha notas de longa duração e, como
já mencionado, não ultrapasse o intervalo de uma oitava (pelo
menos quando a atividade for realizada com alunos principian
tes). Lembre os alunos de que se uma nota tem duração longa,
ela deve ser representada por um traço horizontal (já que a
altura da nota não muda). Nas duas primeiras reproduções da
melodia, as crianças devem apenas ouvir e, nas outras duas,
traçar, na folha de papel em branco, um gráfico que acreditem
corresponder ã melodia tocada.
l Oriente os alunos a prestarem atenção ã altura e duração das
notas executadas: notas mais agudas devem ser traçadas para
cima do ponto de partida (a ser definido pelo professor) e notas
mais graves, para baixo. Recomendamos que, nos primeiros
exercícios, as notas tenham apenas três durações diferentes
(representando, por exemplo, a semibreve, a mínima e a semi-
nima). Antes de começar a atividade, toque ou cante notas
com as três durações diferentes, para que os alunos tenham
uma clara referência das durações e possam representa-las de
acordo em seus gráficos.
Ao final das quatro execuções da melodia, prepare os alunos
para começar a transposição para a folha de papel quadriculado.
Revele a nota incial e instrua-os a transpor cuidadosamente
É'lí'

1.
seus gráficos. Para auxiliar os alunos, estabeleça previamente
o número mínimo e máximo de quadrículos horizontais que
as notas ocuparão. Por exemplo: a nota mais curta deve ocupar
um quadrículo, a nota intermediária, dois quadrículos, e a nota
mais longa, quatro quadrículos.

ltor Villa-Lobos e o canto orfeônico: o nacionalismo na educação musical


Verifique se as transcrições dos gráficos da tllvlm Ilr feitas nas versões ouvidas para
folha em branco para a folha quadriculada que altas se aproximem da melodia original.
condizem com a melodia produzida (ou se h) Toque a melodia original harmonizada para
se aproximam dela). Se houver muita dis- as crianças perceberem a importância da
crepância (por exemplo, se determinada harmonia na composição.
nota deve ser mais grave que a nota ante- i) Para concluir a atividade, utilize exemplos
rior, mas o aluno a grafa como uma nota de seus alunos e explique de forma clara
mais aguda), repita o exercício e peça para e pedagógica como você realizou a trans-
os alunos refazerem aquilo que você achar posição do gráfico da folha quadriculada
necessário (de acordo com o tempo dispo- para a partitura, iniciando as crianças na
nível para atividade). leitura musical.
Transcreva os gráficos das folhas quadri-
culadas em um momento posterior à reali- Referências
zação da atividade e, na aula seguinte, traga
as partituras com as melodias harmoni- ANDERSON, B. Imagined Communities: Reflections on the
zadas e a fórmula de compasso definida (a Origin and Spread of Nationalism. London: Verso, 1991.
Disponivel em: <http://www.personal.psu.edu/sam50¡
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Toque a melodia original algumas vezes 1989.

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(sem mencionar nomes), para que perce-
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60 Gabriel Ferraz
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José Nunes Fernandes é doutor em Educação pela Universidade Federal do Rio de Ianeiro (UFRJ), mestre em Música e
especialista em Educação Musical, ambos pelo Conservatório Brasileiro de Música, Centro Universitário (CBM-CEU)
I'

licenciado em Música pela Universidade Federal do Piaui (UFPI) e graduado em Psicologia pela Universidade Estácio
de Sd. É professor associado IVda Unirio, no Instituto Villa-Lobos, e no Programa de Pós-Graduação em Música da
instituição. E professor da disciplina Psicologia da Música no curso de especialização em Musicoterapia do CBM/
RI e professor do curso de licenciatura em Pedagogia Lipead/Cederj/Unirio,

í
2.1 Antônio de Sá Pereira: princípios Na primeira metade do século XX, o modernismo
da nova pedagogia da música no transformou os grandes centros urbanos em palco
Brasil na primeira metade do de acirradas discussões ideológicas, educacionais e
século XX estético-pedagógicas, acompanhadas das transfor-
mações políticas, econômicas e sociais trazidas pela
Antônio Leal de Sá Pereira, conhecido como Sá crescente urbanização e seu consequente processo
Pereira, foi pioneiro no Brasil na área do ensino da de industrialização. A essa nova realidade, os moder-
música e no contato com as ideias da chamada educa- nistas responderam com um exemplar engajamento
ção renovada, ou seja, dos princípios da Escola Nova e na luta pela escola pública ampla e irrestrita, de forte
das bases psicológicas do ensino da música, e em sua base popular e com compromisso com essa moder-
respectiva divulgação. Foi um professor preocupado nização e o capitalismo vigente.
prioritariamente com os problemas da aprendizagem
da música apresentados pelas crianças e especial- O pensamento de Sá Pereira, nesse contexto,
mente conhecido pela sua valiosa contribuição para se identificou profundamente com os chamados
o desenvolvimento da educação musical brasileira. profissionais da educação, preocupando-se com
Pedagogo nato, mostrou-se veementemente contra a melhoria da qualidade do ensino, sua psicolo-
o amadorismo e o despreparo dos profissionais do gização, sua adequada administração e o apri-
ensino de música no Brasil (Sá Pereira, 1934a, 1937). moramento da formação docente. O aspecto da
Apontava soluções, em vez de simplesmente criticar psicologia associada ao ensino da música era,
os processos de ensino praticados na época (décadas naquela época e ainda hoje, para muitos autores,
de 1930 e 1940), sempre abordando as ideias atuais um aspecto benéfico à pedagogia musical, uma vez
sobre o assunto, escrevendo de maneira simples, que torna o professor conhecedor do desenvolvi-
objetiva e didática. mento cognitivo dos alunos. O educador soteropo-
É importante relacionarmos aqui seu trabalho, litano esteve inserido num otimismo pedagógico,
sua ação pedagógica e sua obra escrita com o contexto reflexo dos movimento dos “pioneiros na edu-
sociocultural e os fatores histórico-sociais, musicais cação”, entre eles Anísio Teixeiray, pessoa-chave
e educacionais do periodo histórico em que atuou. para os acontecimentos escolanovistas no Brasil.

63
Antônio de Sã Pereira: o ensino racionalizado da música
Essa nova vertente pedagógico-educacional tinha de um esforço cientificamente apoiado de acesso aos
como princípio a crença inabalável' nos benefícios mecanismos de facilitação da aprendizagem, mas
dos novos modelos educacionais e no pensamento com pleno conhecimento psicológico e biológico da
educativo baseado na ciência, sobretudo na psico- criança. Essa preocupação levou o estudioso a lançar
logia. Portanto, não podemos entender as ideias mão do termo psicotécnico em vez de metodologia: o
de Sá Pereira fora do movimento de renovação primeiro expressa de maneira completa a aplica-
pedagógica que foi a Escola Nova, tampouco fora ção de princípios psicológicos ao ensino da música,
do movimento de renovação estética que foi o respeitando as possibilidades da realidade psíquica
modernismo. infantil no processo de ensino e tendo como objetivo
o interesse da criança e um maior aproveitamento de
A Escola Nova tinha como uma de suas bases o suas capacidades intelectuais. O professor dizia que
pensamento de William Iamesõi e Iohn Devteyfl” e, a metodologia organizada de maneira lógica e não
portanto, a preocupação com a qualidade do ensino, psicológica estava ligada ao aprendizado do adulto,
o caráter objetivo, o controle didático, o uso de conhe- e não da criança (Sá Pereira, 1937).
cimentos novos e a fundamentação biológica e psi- A fundamentação de Sá Pereira para a psico-
cológica do ensino (Lourenço Filho, 1972). Todos esses técnica residia nas teorias dos pensadores atuais
fatores contribuíram para que Sá Pereira pensasse da época, ou seja, o que havia de novo nos estudos
sua prática em termos de ensino ativo, fundamentado da educação e da pedagogia musical. Assim, o edu-
i em jogos e em práticas corporais que cador buscou a legitimação de suas ideias no pen-
6 ensino músieahfaícin-
E o e tinham como objetivo colocar a criança samento dos principais representantes da Escola
nairzado venta senemç
E e 9 como centro do processo de ensino e Nova e no pensamento pedagógico-musical de Émile
Sá Pereirairo-idas-d.nbra~ ;
r E e v dinamizara relação professor-aluno. jaques-Dalcroze.
ente nzetodolíâgçitadieii
. r r Sá Pereira tinha como alicerce de
"Ivfififiitsfi E seu trabalho o ensino musical racio- Com essa fundamentação(escola ativa e Dalcroze),
mmsHnflihderãeeacécsšàeso nal1zado, . . .
que cons1st1a em uma for-
aos mecanismies'de faoci- i __ Sá Pereira formulou suas ideias da psicotécnica,
; mulaçao didática fundamentada em afirmando que o objetivo consiste em colocar a
lftaçao da apren:jg;agepn,ç,.
outras áreas do conhecimento humano, criança em condições favoráveis de aprendizagem,
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especialmente na psicologia. O ensino ou seja, observá-la atentamente a fim de desco-
z E musical racionalizado vem a ser, em Sá brir as tendências e inclinações que- possam ser
z Pereira,odesdobramento metodológico aproveitadas no estudo. Sá Pereiradesenvolve

64
Iosé Nunes Fernandes
tos É-ssaafirmação quando explica que: (1) convém De acordo com Sá Pereira, o professorltem-de. colo-
Las -observar que-“não há criança preguiçoso e avessa car o alunoiem situação ativa, para que ele descubra
da E 'ao=-estudo;
= _ (2) qualquer criança é ativa e curiosa; por si. sóa solução de um problema. O professor
;ar ='(3)“essas qualidades são inatas. ,deveiser um es-timulador para que o estudante
.: o pense por conta própria, não um apresentador de
ca- Na crítica feita pelo autor ã chamada pedagogia soluções eo respostas prontas. Assim, Sá Pereira
ca, antiga, uma série de erros são apontados, relaciona- propõe acabar com o que chamava de empirismo,
.ca dos à educação geral e também ã própria técnica da ou seja, o ensino pelo palpite, o experimentar sem
vo aprendizagem (Sá Pereira, 1937): (1) desconhecimento controle nem plano de racionalidade concebido
de da criança; (2) isolamento diante da vida; (3) falta de (Sá Pereira, 1937). O autor chama atenção para o
ue motivação intrínseca e (4) desconhecimento das rea- desperdício do ensino inicial de música nas mãos
ão ções emocionais que acompanham a aprendizagem. de amadores e não especialistas que fazem um
120, Com isso, o autor afirma que, aos poucos, as novas trabalho não racionalizado.
ideias vão sendo conhecidas pelos professores, refe-
:o- rindo-se ao ensino intuitivo.
.is Fundamentando-se no pensamento escolanovista,
Porrqúeitprender-
os Sá Pereira era contra o ensino expositivo e Iivresco e
lu- afirmava que se devia copiar a natureza, ou seja, dar
hfltõeêêtsfiarisflfifilëiãz
ou i
rn- à criança um ensino de acordo com suas tendências e
la capacidades. “A intuição é pois o conhecimento ime-
le diato das coisas e dos fenômenos que nos é fornecido
pelas sensações (...) até chegar à elaboração do con-
ceito, da ideia abstrata” (Sá Pereira, 1937, p. 33). Essa
L afirmação do educador é um princípio fundamental
-1 da Escola Nova, trazido também no pensamento
L de Dalcroze, que afirmava que, no aprendizado da
-1 língua, deveríamos, antes de aprender a gramática,
aprender a falar. Por extensão, por que aprender
i
noções teóricas e leis da harmonia antes de aprender
a tocar e cantar?

Antônio de Sá Pereira: o ensino racionalizado da música 65


ES
2.2 Origem, formaçao e carreira novas na área do ensino da música, da psicologia
artística aplicada ã música e da execução instrumental.
Sá Pereira estudou no Ginásio Theodoriano
às (Paderborn, Westfália, Alemanha). No ginasial,
segundo ele, o curso era “carregado de grego e latim
e muitas outras coisas”, sendo um dos “mais severos il

António Leal de Sá Pereira nasceu em Salvador, (Sá Pereira, 1933, p. 15). Estudou também piano, “com o
Bahia, em 16 de agosto de 1888. Descendente de por- melhor professor da cidade”, fazia parte do coro gina-
tugueses, de família abastada, Sá Pereira era filho sial e participou da orquestra de alunos (Sá Pereira,
do comerciante Lino de Sá Pereira. Em 1900, com 1933, p. 16). Também foi aluno na Escola Politécnica
apenas 12 anos, foi estudar na Europa (Alemanha, (Munique), em 1917, e, em 1918, na Escola Politécnica
França e Suíça), onde permaneceu até 1917. Foi uma de Berlim-Charlottenburg. Mesmo tendo estudado
figura marcante na história de muitos músicos e usinagem e química, a música acabou permanecendo
educadores musicais brasileiros. No Brasil, morou e como seu objetivo.
atuou em Pelotas, São Paulo e no Rio de janeiro, onde
foi professor catedrático no Instituto Nacional de Em 1910, mudou-se para Paris, onde matricu-
Música (hoje Escola de Música da UFRI), entre 1932 e lou-se na Schola Cantorum, na classe do pianista
1955. O Governo Vargas, na década de 1930, solicitou Ferdinand Motte-Lacroix. A Schola Cantorum
que o estudioso viajasse mais uma vez para a Europa tinha uma filosofia pedagógica diferente da do
para conhecer abordagens metodológicas de ensino Conservatório de Paris, pois buscava formar o
da música utilizadas no Velho Mundo. Ao voltar músico completo, com sólida formação histórica,
para o Brasil, fundou (1937) o primeiro curso brasi- analítica e harmônica e não somente o instrumen-
leiro a utilizar o método Dalcroze no Conservatório tista, escolha que influenciou o pensamento peda-
Brasileiro de Música (CBM) (Sá Pereira, N. I. A. de, gógico de Sá Pereira. Assim, as ideias do “músico
1949). O educador não só atuou como professor, mas completo” da Schola Cantorum nortearam seus
também como importante disserninador de ideias princípios pedagógicos, pois, já no Brasil, anos
depois, quando participou da reforma do ensino

66
josé Nunes Fernandes
iiisica no Instituto Nacional de Musica do Rio 9 98%: ao t aiara arao
need má

ineiro (1931), criticava a fama de o estabelec 1 ras ÉM1! mzwä

to enfatizar somente o virtuosismo em vez de


formaçao completa do musico, anunciando No final de 1917, Sá Pereira retornou ao Brasil e, em
sem a ideia de não fragmentação entre as disci 1918, a convite de Guilherme Fontainha, na época
as, mas sim de sua articulação, como uma das diretor artistico do Instituto de Belas Artes de
s fundamentais para a formaçao do musicista Porto Alegre, tornou-se diretor do recém-fundado
Conservatório de Música de Pelotas. Lá exerceu o
a Alemanha, Sa Pereira co nheceu o sistema cargo de primeiro professor de piano. A atuação de
I ogico Dalcroze, quando assistiu apresentaçoes Sá Pereira em Pelotas deixou profundas marcas nos
1 nos da ginastica ritmicai (1912 1914), epoca em padrões musicais da cidade (Nogueira, 2005), uma
o meçou a aperfeiçoar e consolidar seus estudos vez que não se limitou a ministrar aulas de piano
L l metodo (Academia Brasileira de Musica, 2015 e dirigir a instituição. O educador incluía composi-
a Sa Pereira, 2015 Sa Pereira, N I A de, 1949) tores modernos e contemporãneos, estrangeiros e
i Pereira morou na Europa em uma epoca de brasileiros nos recitais, e escrevia notas explicativas
is a atividade musical em rela ao aos outros sobre as peças, sobre seus autores e sua vinculação
L nentes do Ocidente O educador residiu em estética. Tal ação era inteiramente nova em Pelotas.
somente por um ano tendo se mudado nova-
e para Berlimi, onde teve aulas de harmonia e Além de sua atuação no conservatório, foi crítico musi-
aponto com George Langheinrich e de piano cal, contribuindo -para aformação musical do-povo da
Bruno Eisner e Ernest I-Iutcheson De 1915 a 1917 cidade. SegundoNogueira (2005), o Conservatório de
lou em Lausanne (Suiça) Paris e Berlim, naquela Pelotas, ã época da direção de Sá Pereira, tornou-se
i, eram dois randes centros musicais, o que dei um centro irradiador de cultura por meio da música
narcas rofundas na sua formaçao de musico e com a promoção de concertos e recitais e sua divul-
~ssor, pois o professor baiano teve contato com gação para grande parte da sociedade gaúcha. Foi
aiores artistas e os trabalhos mais importante diretor do Centro de Cultura Artística de Pelotas
i mpo da musica, do ensino instrumental e da entre os anos de 1921 e 1922 e, em 1923, transferiu-se
gogia da musica para São Paulo. Nessa cidade, associou-se a nomes
z _ -nl-""'**\ importantes do movimento modernista brasileiro,
le r||m Sá Pereira conheceu Guilherme Fontainha, e dessa reiaçao gerou-se um mais especificainente a Mário de Andrade, com o qual
ulo profissional fundamental no desenvolvimento musical dedols importantes
15 de disseminação cultural do Brasil o Rio Grande do Sul e o Rio de Janeiro cultivou uma amizade que duraria toda a sua vida.

o de Sa Pereira o ensino racionalizado da musica


67
Com Mário de Andrade, Sá Pereira manteve corres- da Universidade do Rio de janeiro (hoje Universidade
pondências que identificariam ideias novas, questões Federal do Rio de janeiro - UFRj), que incorporou o
e desejos sobre vários pontos da música brasileira. Sua Instituto Nacional de Música, cujo diretor na época
clara e forte ligação com o poeta paulista e a impor- era Luciano Gallet.
tãncia desse vínculo na concepção do seu ideário esté-
tico são demonstrados no artigo publicado na Revista -Sá Pereira (1946) comenta que a incorporação do
Brasileira de Música, em 1943, “A grande luz” (Sá Pereira, instituto por parte da universidade era intenção de
1943). Em São Paulo, Sá Pereira inaugurou a revistaAriel, Gallet, que visava à elevação do nível educacional
dedicada à cultura musical. Tal revista esteve sob sua do instituto. Gallet criou, assim, uma comissão com-
direção nos dois primeiros anos de edição (1923-1924), posta porAntônio de Sá Pereira e Mário de Andrade
publicando importantes textos sobre a divulgação de para o desenvolvimento-da reforma, que tinhacomo
ideias da época nos campos da perfomance instrumen- meta dividir o ensino de música ein três niveis.
tale da pedagogia da música e a difusão da cultura por O primeiro era o nivel fundamental, preparatório
meio da música. Além disso, Sá Pereira ministrou cur- para os níveis seguintes, que seria ministrado em
sos de piano em São Paulo e em Santos, de 1923 a 1931. cinco anos. O nivel geral, que formaria instrumen-
tistas e coristas, seria ministrado em dois anos, e
- o nivel superior, que objetivava formar professores
ins*tã*tute tract-zoâiisiai â iii;m" PPse de instrumento e de canto, compositores, regentes
e virtuoses, seria ministrado em cinco anos.
No Rio de janeiro, em 1930, início do período lide-
rado por Getúlio Vargas, o governo comprometeu-se Com essa iniciativa, o nível cultural do músico ali
com a difusão (ampliação e melhoria) do ensino formado seria elevado, objetivo que realmente logrou
público por meio de uma ampla reforma no sistema sucesso, já que um vestibular seria instalado, com
educacional. Criou-se o Ministério da Educação e provas de português e matemática para o ingresso
Saúde Pública, cujo ministro era Francisco Campos, no curso fundamental e o certificado de conclusão
que tinha o seguinte lema: “Sanear e educar é o pri- do segundo nível, do fundamental e de aprovação
meiro dever da revolução”. Estabeleceu-se no ensino no 3” ou 5” ano ginasial para a aceitação nos cursos
superior o Estatuto das Universidades Brasileiras geral e superior. Os horários das aulas de música
por meio do Decreto n. 19.851, de 11 de abril de deveriam permitir aos alunos cursar as escolas pri-
1931 (Brasil, 1931a), e editou-se o Decreto n. 19.852, de mária e ginasial, fundamentais para a formação do
11 de abril de 1931 (Brasil, 1931b), sobre a organização estudante e “para o prestígio social da classe dos

68 josé Nunes Fernandes


músicos” (Sá Pereira, 1934b, p. 340). O fundamento da reforma era a
democratização do ensino da música por meio de uma nova orientação
pedagógica, pois tal ensino no instituto objetivava, até então, unicamente
a formação instrumental, em vez de uma educação mais completa.
A transformação não teve sucesso, ou seja, o programa foi recusado
pelo então Instituto Nacional de Música devido a uma grande resistência
dos membros dessa instituição, já que havia um caráter muito inova-
dor na proposta, contrária ã prática conservadora do instituto. “Ê que a
reforma implicava não apenas a modificação do estado de cultura geral
dos alunos, mas, sobretudo, subentendia uma transformação radical do
corpo docente” (Andrade, 1991, p. 28).

grande crítico de Sá Pereira, Oscar Guanabarino, veio também


a -contribuir para a não aceitação da reforma pelo instituto por
meio de suas constantes críticas publicadas no jornal-do Commercio.
Guanabarino criticava, inclusive, por seu desprezo e desconhecimento,
o método Dalcroze e sua ginástica rítmica, constantes no programa da
proposta de reformulação, que o jornalista imaginava ser uma aula
para dar cambalhotas. Guanabarinoz, “conhecido por sua aversão ao
instituto Nacional de Música, [.¿..] não poupou esforços para desniorali-
zar a reforma e seus idealizadores. Mário de Andrade também indica
como causas do malogro da reforma, a passividade do governo e sua
ingenuidade, assim como a de Sá Pereira e Luciano” (Corvisier, 2009,
p. 55).. Alguns anos depois haveria, então, o reconhecimento e a valo-
rização dessa reforma, suas mudanças pedagógicas e seu programa.
- _ - -- _ 1 _ - -¡

2 Avelino Romero Pereira (1995) diz que o fato de Guanabarino ter sido recusado como professor de piano do Instituto
Nacional de Música foi um dos motivos de suas constantes críticas a tudo e todos que se vinculavam à instituição.
Em resposta, Sá Pereira publicou um artigo intitulado Úperiil de um critico (1933), no qual respondeu a todas as
criticas feitas por Gua nabarino. Caso queira aprofundar-se no asssunto, veja: CORUISIER, F. G. lvl. A recepção ao ensino
moderno de piano (1993) de António de Sá Pereira frente a visão conservadora e polêmica de Oscar Guanabarino
Música em Contexto, Brasíiia, n. 1, p. 193-233, 2014. Disponível em: <http:iz'perIodlcos.unb.br.finde›i.phpiI*v1usicai'
articleivievvi12üü8.ipdf_188>.

António de Sá Pereira: o ensino racionalizado da música


iigiara 2.1 - Sã Pereira e Lidäy Mignone no curso de Iniciação Musical no CHM
apiicande teste com criança em 193?

--.J

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Crédito: Acervo Escola Sá Pereira

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aaa às Íaaš

Em1932, Guilherme Fontainha convidou Sá Pereira para ocupar um cargo


de destaque no Instituto Nacional de Música. Por decisão do Conselho
Técnico da instituição, Sá Pereira foi nomeado professor interino para
criar e desenvolver a cadeira de Pedagogia Musical. O educador só
ingressou por concurso na instituição em 1938, sendo nomeado professor
catedrático da disciplina citada. Em 1933, publicou uma de suas mais
conhecidas obras didáticas, o livro Ensino moderno de pianofi, ainda hoje
considerado um trabalho pioneiro no ensino de piano no Brasil.
¡- 7 _ -d""~_`§- f f - 7

3 Sifi PEREIRA, A. Ensino moderno de piano: para uso de alunos adiantados ejovens professores. São Paulo:
Ricordi, 1933.

70
Iose Nunes Fernandes
Em 1935, Sá Pereira foi convidado por Gustavo por Oscar Lorenzo Fernández, o curso de Iniciação
i-iapanema, então ministro da Educação e Saúde Musical, primeiro do gênero no Brasil, que contava
iüblica, para integrar a comissão que elaboraria com a colaboração de Liddy Mignone (Mignone, 1961).
.s novos planos da Universidade do Brasili. Essa Em outubro do mesmo ano, quando assumiu o cargo
iciativa se deu pelos méritos do musicista, já reco- de professor da Escola Nacional de Música5, Sá Pereira
`-hecidos por seu trabalho no Instituto Nacional de fundou um curso idêntico, que se manteve como
C fisica. A pedido de Capanema, o professor viajou extensão até ser incorporado definitivamente ao cur-
r _

'a vários paises da Europa para conhecer o traba- rículo da instituição em 1946 sob a direção de Nayde
de alguns profissionais da educação - o educa- de Sá Pereira (Sá Pereira, N. I. A. de, 1949; Pereira, 1981).
' foi a Paris, Hamburgo, Munique e Berlim, como As classes de iniciação musical foram laboratório
iresentante do Instituto Nacional de Música no para os alunos do curso de Pedagogia Musical da
igresso Internacional de Educação Musical reali- Escola Nacional de Música e, a partir de 1938, passa-
lo em Praga, atual capital da República Tcheca, em ram a ser coordenadas por Nayde de Sá Pereira, uma
fil de 1936 (Corvisier, 2009). Foi nesse evento que vez que António Sá Pereira se dedicava à cátedra de
Pereira encontrou-se pessoalmente com Dalcroze, Pedagogia Musical, ao ensino do piano e, principal-
3 que o incentivou a realizar uma visita a Genebra mente, às funções administrativas do estabeleci-
.tes de retornar ao Brasil), na qual revelou inte- mento. Depois disso, os cursos de iniciação musical do
se em implantar no Brasil um curso de ensino CBM e da Escola Nacional se tornaram independentes.
cial de música nos moldes da ginástica rítmica
icebida pelo pedagogo suíço (Sá Pereira, N. I. A. de, ~ Para Pereira (1981), o método Sá Pereira tem
z9; Pereira, 1981). A expressão iniciação musical foi caracteristicas novas para a época de sua criação:
ada por Sá Pereira para substituir ginástica rít- If aulas ativas, atividades variadas, sempre-
a - empregada por Iaques-Dalcroze, que detinha levando em conta as caracteristicas psicológi-
a , . . . , . cas da criança, sem a utilização de definições
tente do metodo (Academia Brasileira de Musica,
15, Sa Pereira, N. I. A. de, 1949). teóricas nem regras a decorar;
De volta ao Brasil, Sá Pereira criou e implemen- Il uso em abundância de exercícios corporais e do
1 , em março de 1937, no Conservatório Brasileiro processo de leitura síncrético-analítico-sintético;
Música do Rio de Ianeiro (CBM), dirigido a época J* utilização do piano como instrumento didático;

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Em 193?',a Universidade do Rio delaneiro teve seu nome mudado para Universidade 5 Em 1513?, o Instituto Nacional de Música passou a se chamar Escola Nacional de
lo Brasil. Música.

T1
ñnio de Sá Pereira: o ensino racionalizado da música
J) estímulo à atividade criadora da criança por Música, fundada em 1967 no Rio de janeiro (Academia
meio de jogos rítmicos e melódicos; Brasileira de Música, 2015).
J) educação do gosto estético da criança, incenti- Por motivos de saúde, em 1955, Sá Pereira afas-
vando-a a ouvir e cantar músicas do repertório tou-se da cadeira de Pedagogia Musical, reduzindo
erudito, folclórico e popular; suas atividades pedagógicas. Em 21 de fevereiro de
J* uso de atividadesde conjunto (coro, dança, con- 1966, faleceu no Rio de janeiro, tendo seu trabalho
junto de percussão, dramatização), tendo como continuado por sua esposa, Nayde jaguaríbe de
objetivo o estímulo ao senso de cooperação, Alencar Sá Pereirafi.
responsabilidade e atenção da criança;
J) ensino de grafia realizado somente após a prá- 2.2.1 Produção musical e pedagógica
tica intuitiva da música.
A produção intelectual de Sá Pereira foi publicada
Sá Pereira foi diretor da Escola Nacional de em livros, artigos em revistas e jornais, críticas, bole-
Música de junho de 1938 até janeiro de 1946. Sua tins, resenhas, discursos, comunicações de pesquisa,
atividade profissional era intensa, pois acumulava entre outros. Os textos do educador mais represen-
os cargos de diretor da instituição e catedrático da tativos e divulgados na área da pedagogia da música
cadeira de Pedagogia Musical, mas sempre em con- são: Um teste de apreciação musical (Rio de janeiro:
tato com tudo que havia de novo na área da música Universidade do Brasil, 1937), Ensino moderno de piano
e seu ensino. Em 1942, Sá Pereira foi convidado pela (São Paulo: Ricordi, 1933), Psicotécnica do ensino ele-
Music Educators National Conference (Menc) e pela mentar da música (Rio de janeiro: josé Olympio, 1937)
Divisão de Música da Universidade Pan-Americana e O pedal na técnica do piano (Rio de janeiro: Carlos
para viajar para os Estados Unidos e ali permane- Wehrs e Cia Ltda., 1954).?
cer durante três meses. Conheceu a organização A produção musical de Sá Pereira consta de peças
e a programação do ensino de música nas escolas, para piano (“Berceuse”, “Tango brasileiro”, “Oferenda
visitou escolas infantis e universidades e fez um mística” e “A chuva plangé”), para coro (“As quatro
levantamento detalhado do ensino da música no país. estações”, “Louvado seja o Sol” e “La paix”, de Reynaldo
Nessa ocasião, tornou-se membro da International Hahn) e para canto (“Ave Marias” e “Casinha nas
Society for Music Education. Foi membro fundador da nuvens” - canção infantil, letra do compositor).
Academia Brasileira de Música, sendo atual patrono ,f 2-- A ---'-'¬-fz» f _.

da cadeira número 13 da Academia Nacional de 6 SA PEREIRA, N. J. de A. Bandinha rítmica: organização e prática. Rio de Janeiro,
Eulenstein Música, 1963.
? A lista de publicações de Sá Pereira encontra-se no final deste capítulo.

'F2
josé Nunes Fernandes
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Figaro 2 2 - Capa e contracapa aatografada do iivro
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O enslno raclonallzado da Inuslca Psicoiécnica do ensino elementar da música (1937). Úiira
ho deposita-da na Biblioteca da Unirio
de metodologia de Sá Pereira - a iniciação musical, _ _
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fe- A recomendação pratica e feita por meio das nor
Credito: Reprodução
7) tnas de um ensino racionalizado da música:
is ,(1 1° - exercicios de audição;
Â? 2° - exercícios de localização; e
S J) 3” - exercícios de leitura.
B. Sá Pereira é categórico: “Não ensinar símbolos
D Í es de conhecidas e experimentados as realida ' _ _z-¡¡z-
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I] des Cl ue os símbolos representaml” (Sá Pereira, 19371 ;â
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S 138). O autor detalha esse argumento ao afirmar
antes de ensinar as notas e os valores, antes de
em intervalos e em compassos, deverá o mestre
IL
o aluno ouvir e sentir a música, experimentar o
no musical” (Sá Pereira, 1937, p. 139, grifo do

_ _ 73
i de Sa Pereira: o ensino racionalizado da musica
original). O primeiro passo é auxiliar a criança no Outro ponto que devemos comentar é a adjetiiração
aprendizado intuitivo das notas, dos intervalos, do dos intervalos como forma de auxiliar para o seu
ritmo, do compasso, sentindo-os e vivendo-os intensa- reconhecimento e fixação. Por exemplo: é possível
mente. Os exercícios devem ser feitos na faixa etária afirmar que a 6* é um intervalo “doce, lãnguído-
dos 5 aos 8 anos, período em que a “impressionalidade e repousante”_ Meyer (1956) afirma em seu estudo
e a plasticidade do sistema nervoso” são extremas. que na música existem significados incorporados,
Segundo Sá Pereira (1937, p. 140), “Afirma Dalcroze que como no caso em que uma professora diz ao aluno _
depois desta idade já não é possível corrigir o ouvido que “todo tom menor é triste” -~ muitas vezes, os
do aluno (...) vamos, pois, orientar o nosso ensino no professores impõem significados ã música incor-
sentido de bem cedo se tentar desenvolver a criança”. retamente. Hoje, a educação musical já conta com
O método apresenta muitos exercícios para a sala pesquisas que discutem esse aspecto e muitos estu-
de aula com crianças (alguns podem ser usados com diosos desenvolveram trabalhos sobre aspectos
adultos) que devem ser consultados, desdobrados, emocionais da música. O por
modificados, associados a outros e colocados em exemplo, é um dos mais conhecidos modelos de
prática em sala de aula. adjetivação de trechos, intervalos, músicas, sequên-
cias etc. Muitos outros autores desenvolveram
2.3.1 Normas para o ensino inicial pesquisas com esse tema, entre eles Sloboda (1985),
que trata das lembranças musicais, ligadas aos
ãiâercšcies de adição: a escassas sentimentos. Isso nos leva a concluir que as ideias
da šnteeeaša de Sá Pereira avançavam no tempo. São ideias que
vieram a interessar os pesquisadores somente
Os exercícios de audição, com ênfase no aprendizado muitos anos depois.
dos intervalos, bem como outros aspectos das normas
para o ensino, se justificam pelo fato de Sá Pereira
vislumbrar um estudo sistemático da música por áãater as è flãtliâfiii- mi-_ É sãtê _ _,_ ,_,§ na daspoe
mi_,
parte aluno, que deveria continuar seus estudos na ás arena
escola de música em níveis técnicos e superiores. Essa
postura difere da proposta de iniciação musical de Sá Pereira criou uma série de materiais didáticos
Liddy Mignone, pois Sá Pereira desejava musicalízar para a psícotécnica (iniciação musical), entre eles
em direção a uma formação de músico. escadas (de notas/intervalos) de chão e de mesa, blo-
cos proporcionais com figuras, sinaleíros, toalhas

74 josé Nunes Fernandes


'autadas e figuras recortadas de madeira, cartelas Midi
fã masfis s eeitura
fltmfii-'i-'i

autadas, cartelas com ritmos, cartões-relâmpago,


1 J I-

dernos de musica com pauta grande e instrumentos


I
C omo exp osto anteríorment e, Sá Pereira afirma q ue
abandinha. Os blocos proporcionais, objetos ocos de os símbolos devem ser ensinados após se conhe-
iadeira com tamanho proporcional ao da duração cer e experimentar, de forma intuitiva, o fenómeno
:is valores, com o valor desenhado e seu nome (semi- sonoro. Somente depois de “musicalizadas”, ou seja,
reve = 80 cm, mínima = 40 cm, semínima = 20 cm, solidamente exercitadas auditiva e cinestesicamente,
ilcheia = 10 cm 1 semicolcheia = 5 cm) › são usados é fl ue as crian Ç as podem iniciar o estudo da leitura
ra o treino da relaçao proporcional dos valores. musical. Essa e uma caracteristica de todos os meto-
a i ni I I I I 'I I'

dos criados na primeiramente metade do século XX


xer táÊ o s eata
H
iai ni estanas chamados de escolanovistas, tanto os estrangeiros
como os brasileiros (Fernandes, 1998).
ara evitar que as crianças tomem somente como
ase a orientação visual, Sá Pereira (1937) indica que Sá Pereira compara o aprendizado da escrita da
xercícios de “orientação cinestésica” e de “locali- língua com o aprendizado da notação musical e
__ ._ ., . _ afirma que desde a Antiguidade se ensinava a ler
çao cega sejam praticados pelos alunos somente
__ _ _ ._ _ por meio do processo de Soletração, quepartia de
m a utilizaçao do ouvido, sem se fundamentar na
r ientação visual. O autor explica que tais exercícios elementos simples até os mais complexos - letras,
r eparam, inclusive, para o desenvolvimento da sílabas, até uma palavra completa. Esse método foi
eitura, pois a criança deixa de olhar para o instru- substituído pelo processo analítico ou global, no
iento e olha para a partitura. Citando o teclado do qual se parte do todo para se .chegar aos elemen-
iano, o educador mostra como pode ser exercitada tos fundamentais. Com base em Herbart, Decroly,
localização com base no conhecimento da distân- Claparède e outros, Fernandes (1998) afirmaque a
i

a e não na visão. Os exercicios com essa finalidade


- I Í I I I

percepção da criança é global e dominada pelos


izem com que os estudantes adquiram facilmente interesses do momento. Portanto, no estudo da
`
conhecimento ” ' do instrumento
topografico ' e p er - música, o caminho a seguir é “partir da síntese vaga,
__. .. _ _ _ do sincretismo confuso, mas cheio de interesse
_ item ler facilmente, orientar se com segurança,
scutar atentamente e criticar a própria realização (melodias inteiras), passar pela análise discrimina-
iusical” (Sá Pereira, 1937, p. 158). tória, para voltar a uma nova síntese, exata, cons-
ciente, passível de ser automatizada” (Fernandes,
1998, p. 165)-

ntõnio de Sá Pereira: o ensino racionalizado da música T5


Figura 3.3 - Uso da escada (de mesa e grandeš para a
compreensao dos intervalos da escala curso de iniciaçao Como encaminhar essa dinâmica? Tocando ao
Musicai da Escola Nacional de Musica decada de 1 eu piano melodias simples e conhecidas, os alunos
devem ouvi-las acompanhando com a vista o con-
torno do desenho musical, para começar, sem acom-
panhamento. Com a mão esquerda, aponte na pauta
as figuras correspondentes, cantando também o
nome das notas. Em seguida, os alunos mesmos apon-
tam e cantam o nome das notas.
Quando já reconheceram em síntese vaga mais
de uma melodia pelo processo global, as crianças
devem ser questionados sobre qual melodia está
sendo tocada. Outra técnica consiste em parar de
tocar, continuar dois compassos adiante e pedir aos
alunos que indiquem o ponto em que a música conti-
nuou. Essa atividade também é feita com a clave de Fá.
Pelo processo sincrético, os alunos se acostumam
a ver grupos de notas que representam melodias que
estão ouvindo, já se mostrando capazes de realizarem
ditados. O ditado consiste em você tocar uma pequena
melodia (que pode até ser uma inventada pelos alu-
nos) e mostrar como registrar a melodia, despertando
o interesse das crianças por essa atividade. Com o
ditado, os alunos se familiarizam com a notação de
cada nota da melodia. O ritmo deve ser simples para
que as crianças possam se concentrar nas notas, sem
esforço, de forma ativa e em seu próprio tempo.
Os alunos devem, com o treino, reduzir o tempo
de seleção na leitura de notas. Para isso, Sá Pereira
apresenta os “cartões-relâmpago”, que são cartões
Credito Acervo Escola Sa Pereira
feitos de cartolina, com uma nota desenhada numa
pauta, abrangendo todos os registros (agudo, médio e

josé Nunes Fernandes


LU . ve).Apresente os cartões acompanhados de frases sugestivas: “Atenção,
IS - os ver se você É capaz de ler depressa as notas que vou mostrarl”,
n-
frapreparar o estado de prontidão. Com um cronômetro, verifique o
n-
1 mpo de reação, o “tempo que medeia entre a percepção visual do sinal
fa ráficoe o momento em que o aluno reage dizendo o nome da nota”. Sá
O reira sugere a utilização de uma ficha de acompanhamento indivi-
[-1-
lualpara registro do tempo de reação e comparação na aula seguinte
fi; verificação do resultado do andamento mensal. Para o educador, o
.s idealé que as crianças tenham tempos de reação cada vez mais baixos.
s
á
íiguraZA -- Atividades inspiradas no método Dalcroze. Curso de Iniciação Musical da
e
.IBcola Nacional de Música (década de 1940)
s
1-
i.
1
2
1
1
[_
1:
i

L
Figura 2.5 - Treino de Zeitura rápida: ficha de registro do
tempo de reação do aluno no treino de leitora rápida com a
utilização de cartões-relâmpago

.Fi':ha__do a'I'uno _- '_ '


.ih-

_ Horas na :levefde Solë .âê Z |‹Iotas_=|ia clave de Fná-_ =


. Âtíma Sobre ñhnaixo 'Ê illiciniãš Sobre- 'fd-Ílibalixo
“free srrsflffl z JaP="*s .1.es.=.flas*fi 3 flzrfiflv 1 iflfl Peles gi

6 3 5 5 4 6
L
' 5 3 4 4 3 5

4 2 ! 4 3 2 5
l H W If '1 '
3 1 3 I 3 1 4

3 1 2 2 1 3

I' 7 Í Í É Í

_ I _

1l111H1L1 ¬* Credito: Acervo Escola Sá Pereira

Fonte: Sá Pereira, 1932 p. 189.

A ficha É dividida em duas seções (clave de Sol e


de Fá), com três colunas cada, contendo linhas para
a média do tempo de cada lição prevista para o mês.
O treino deve ser feito até que o aluno alcance médias
1 para cada coluna das seções (última linha).

78 Iosé Nunes Fernandes


2.4 Aplicação do método de Sá Pereira mais baixos para o de semitom, representando
em sala de aula a escala de Do. O desenho pode ser.feito no chão
ou no modelo de cartolina ou madeira (veja a
Sugerimos a seguir algumas atividades fundamen- Figura 23). Cante as notas para que as crianças
tadas na psicotécnica de Sá Pereira para iniciantes se desloquem para o degrau correspondente
ou estudantes com pouco tempo de iniciação musical até elas percorrerem todos. Sá Pereira acredita
escolar sistemática. As atividades podem ser reali- que o uso do deslocamento corporal e da visão
zadas com crianças de 5 a 8 anos, em turmas coleti- associados à audição facilita a compreensão.
vas, com pequeno número de alunos (8 a 12 alunos). O educador afirma: “a criança associa sensações
O importante é que as atividades despertem o inte- locomotoras, visuais e auditivas, o que contri-
resse e sejam ativas e intuitivas. bui enormemente para reforçar a impressão
auditiva”, ou seja, “a criança, sente, vê e ouve
2.4.1 Exercícios de audição o intervalo” (Sá Pereira, 1937, p. 142).
As segundas (os intervalos de segunda): na
Veja a seguir uma relação de 14 atividades propostas escala no chão, as crianças percebem o passo
por Sá Pereira: grande e os passo pequeno. Sá Pereira usava
também a escala em forma de escada (degraus)
1. Entoação de canções: reproduza uma pequena de madeira para as crianças subirem e desce-
melodia, uma canção folclórica, por exemplo, rem, bem como uma escada pequena, para que
para que os alunos cantem com afinação e ritmo elas usassem os dedos e se posicionassern nas
definidos. notas da escala.
2.. Escala de Do Maior: toque a escala de Dó Maior, Segundas maiores e menores: utilize a escada
andamento lento, mostrando as teclas do piano para que as crianças aprendam, por meio do
(atenção para os intervalos Mi-Fá e ,Si-Dó) para corpo, o passo grande e o passo pequeno para
que as crianças cantem. os intervalos de 2” menor e maior.
3. Escala de Do Maior: desenhe uma escada com Exercícios de reconhecimento do som: toque
degraus mais altos para os intervalos de tom e (Sá Pereira sugere o uso do piano) 2” (notação

Pântõnio de Sã Pereira: o ensino racionalizado da música 79


utilizada na música e por Sá Pereira) maiores e 9. Exercícios de reconhecimento: toque alternada-
menores para que as crianças, que devem ficar mente ao piano 3” maiores e menores para que
de costas para o piano, reconheçam. Reproduza as crianças indiquem de que 3“ se trata. Associe
alternadamente as maiores e menores (passo “ideias” (adjetivos) para cada tipo (3”' -maior: clara,
grande, passo pequeno). L alegre; pe 3* menor: escura, triste). Para o autor,
Exercício de imaginação- do som: toque uma essa associação facilita o reconhecimento do
nota no registro de voz de cada criança para tipo da 3* (maior ou menor).
que elas cantem uma 2* maior ou menor acima 10. Exercício de imaginação do som: toque uma nota
ou abaixo (o professor indicará). Esse exercício para que as crianças a entoern e, em seguida,
pode ser feito por meio da entoação e utilização entoe a 3“ maior (clara, alegre) e menor (escura,
da escada desenhada no chão ou da escada de triste), acima ou abaixo.
madeira com degraus (de chão ou de mesa). 11. Os outros intervalos: com o mesmo processo,
Terças: toque lentamente as notas do primeiro apresente outros intervalos às crianças para
compasso da Figura 2.7 para que as crianças que elas os conheçam e os exercitem, sempre
completem os trecho entoando os dois compas- associando a uma característica verbal (4a -
sos restantes (Bis). Nesse exercicio, as crianças enérgico ea positiva; 5” - vaga e interrogativa). S Qjx.

devem se posicionar nos degraus da escada de Pereira afirma que é importante que o professor
chão (tridimensional ou linear - desenhada no questiono sempre o que as notas “estão dizendo”.
chão), e você deve sempre questionar: Quantos A Figura 2.8 mostra o caráter interrogativo da
degraus o aluno andou no final? Onde andou e 5“ e o afirmativo da 4“.
onde saltou? Aos poucos, a palavra terça deve
ser introduzida. Sá Pereira enfatiza que nada šigura 2.8 - .associação veraai com os intervaios

deve ser decorado - tudo deve ser feito da forma


intuitiva, ou seja, de ouvido. Inclua em seguida
a 3” menor.
1;.-z dg D 1
Quem vae lá? Sou. eu!
Figura 23'- Exercicio de 3”
Fonte: Sá Pereira, 1932. p. 144.

c t 1 J É t É A 6” É um intervalo “doce, lânguido e repou-


* 1 -É: c ,Sl L - 9 sante,sendo uea6 ma1oré“rad1os-a,etoda
'51
Fonte: Sá Pereira, 1937, p. 143. felicidade” e a 6” menor é mais “sombria e triste”.

Iosé Nunes Fernandes


A 7* ti-um “intervalo insatisfeito, sugere a ideia rítinica -- o objetivo .nesse exercícioê a percep-
de in:quietação”.3A 7“ menor é branda E suave, e ção do.sintervalos que as crianças demonstra-
a maior, aspera e irritante (“parece quase uma rão-.indo de um degrau a outro. F .
oitava desafinada”). Sá Pereira afirma que esse 14. A escada desenhada emrelevo: utilize-a escada
modo de aprender os intervalos É mais inte- de mesa repetindo o exercício anterior, com
ressante do que decorar, por exemplo, que a 6* uma diferença:nesse. exercício específico, as
maiortem 4 tons e 1 semitom. O autor questiona: crianças devem apontar os degraus (notas)
“que fará ela [a criançal com esse saber inútil?” com um lápis, pois assim não há sacrifício da
(SáPereira, 1937, p. 144); exatidão rítmica, visto que não há locomoção,
Exercicio de imaginação do som: reproduza a e os alunos podem saltar de um degrau para
nota Dó e peça para que as crianças se posicio- outro facilmente.
nem no degrau correto da escada. Em. seguida,
em vez de tocar outra nota, aponte oc degrau no tiarinte dos east É Ê. s anteriores
ä.

qual a outra nota está e solicite que cada criança


1

1 seposicione nele e entoe a nota respectiva (se .li .logo dos barquinhos: faça oito barquinhos de
a nota não for conjunta, elas não precisam papel, um para cada nota. Os barquinhos devem
saltar; elas podem caminhar- subir ou descer ser distribuídos de acordo com o número de alu-
até o degrau respectivo). Depois de as crianças nos. Toque uma melodia simples dentro de uma
F
entoarem a nota, toque para que elas saibam oitava - cada criança deve reconhecer a nota
de seu respectivo barquinho e avançar. Ganha
nt

se acertaram a afinação ou nao.


l 13. Realização motriz de uma melodia: toque uma a criança que conseguir fazê-lo mais vezes.
pequena melodia e peça para que as crian- J) Escala viva: em vez de barcos, as proprias crian-
ças a escutem. Primeiramente, reproduza a ças, posicionadas lado a lado, devem “ser as
melodia inteira. Em seguida, toque só a pri- notas” e avançar um passo quando sua nota
meira nota, indique o degrau no qual esta se for tocada. Sá Pereira utilizava cartões corn
encontra e solicite a cada. criança que se posi- os nomes das notas para cada criança. “Perde
cione nesse degrau. Na sequência, recomece aquela que fizer maior número de erros, ou
.Ill

e toque lentamente a cançao inteira para que por ter avançado quando não devia, ou por
as crianças se posicionem nos degraus de cada ter ficado parada quando devia avançar” (Sá
nota da melodia. Não é necessária a exatidão Pereira, 1937, p. 146).
I

âãtttõnio de Sá Pereira: o ensino racionalizado da música 81


Figura ao -- Exercicio com a escala-de Bo Maior: curso de iniciação
Musical da Escoia Nacional de Música (década de 1940) `

Credito: Acervo Escola Sá Pereira

Exercício de imaginação do som: lado a lado, as crianças devem


se responsabilizar por cada nota da escala, na sua ordem (de Dó
a Do). Aponte para cada uma das crianças, que, por sua vez, deve
cantar sua nota, até que se forme a melodia completa (e com boa
afinação). Sá Pereira diz que, com a prática, pode-se realizar can-
ções a duas vozes.
Realização de melodias ao piano: as crianças que já tiverem maior
familiaridade com teclado têm condição de tocar uma melodia sõ
com um dedo, enquanto o professor solfeja ao mesmo tempo. Com
a prática, as crianças podem ser solicitadas a completarem uma
melodia, da seguinte maneira: inicie uma melodia, toque-a até a
metade e peça para que as crianças continuem a melodia tocando
nas teclas as notas e solfejando. Com a prática, é possível também
incluir as teclas pretas, pois as crianças já conhecem os intervalos
detom e sernítom. Sá Pereira (1937) explica que essa atividade não
implica iniciar o estudo do iinstrumentotmas sim trabalhar as
notas, os intervalos, a escala, tudo por meio da audição.

lose Nunes Fernandes


ExeridaÉ.. É Wi sit: cotação orito

De acordo com Sá Pereira, o professor deve utilizar o método Dalcroze


para iniciar o estudo do ritmo. “Pelo engenhoso processo de Dalcroze a
criança sente e realiza combinações rítmicas já bem difíceis, antes de
4* Q] I

saber dizer o que e uma semibreve (Sa Pereira, 1937, p. 148). Assim, o edu
cador sugere que seja utilizada inicialmente a semínima como unidade
inicial, que corresponde no método Dalcroze ao “passo de marcha”, e, com
base nela, que sejam estabelecidos os valores de duração maior e menor.

0 compasso binário: como preparação da marcha, peça para que os


alunos “marquem o passo” (sem sair do lugar), levantem o pé direito
e abaixem, depois o esquerdo e abaixem, sempre contando: um, um,
um etc. Em cada “um”, os alunos devem pisar forte e imediatamente
levantar o pé, com movimento de duração exatamente igual. Em
seguida, inicie a atividade com os dois pés alternadamente - pri-
meiro sem sair do lugar e, em seguida, se locomovendo (marchando).
Explique que um dos pés deve ser batido com mais força que o
outro. Você pode, no início, falar “forte-fraco, forte-fraco” durante
o exercício. Com isso, você mostra o desenho da semínima e diz
o nome desta, indicando que ela representa cada passo.Desenhe
uma série de semínimas, com o acento na 1* de cada compasso ea
peça para que as crianças executem marchando, batendo forte
com um dos pés e fraco com o outro (veja a Figura 2.10).

Figura 2.18 - Série de semínimas, compasso binário

a 1 ai té.1 il 1 tt 1
Fonte: Sá Pereira, 1931 p.149.

Antônio de Sá Pereira: o ensino racionalizado da música


Para que as crianças saibam com qual pé devem começar, Sá Pereira
institui os seguintes sinais:

Para iniciar com o pé esquerdo Para iniciar com o pé direito

2. Batero compasso: peça para que as crianças batam palmas, levantando a


mão para bater na outra, com movimentos exatamente iguais e dizendo
“forte” ao bater e “fraco” ao levantar a mão. O autor indica os sinais:
Bater com a mão direita na esquerda Bater com a mão esquerda na direita

Figura 2.11 - Série de seminimas com palmas diferenciadas

annuplnlwnuwmlpl
Fonte: Sá Pereira, 1951?, p.15D.

3. Bater e lnarchar em compasso binário: essa atividade deve ser inicialmente


realizada de ouvido e, em seguida, por meio da leitura dos sinais espe-
cificos. Atente para a simetria e exatidão do movimento entre palmas e
passos, além da acentuação no 1° tempo do compasso.

Figura 2.12 -›- Séries da semininzias com palmas e passas- diferenciados, compasso binário

z) JJ J ]J JP J ]J l fz) JKJ .li J, ill J ill


iiilljli/pllill.siiaeplifllriar
,, cc

84
ƒosé Nunes Fernandes
Exercício de realização rápida: nesse exercício, a indicaçãi) vocal “vá" indica
a mudança de mão, ou seja, ao ouvirem o 'f'v:ç§i", as? crianças que iniciaram
batendo a mão direita na esquerda passam a bater, a esquerda na direita.
Sá Pereira diz qt1e.Dalcroze usa “hop”"para tal exercicio. P P

Figuraaiiä -- Sériesde seminimas com paimasetpassos diferenciados, eompassehináriof

41 lr J ,tp J 11 1 r J J 11 J 1 ll
' vá vá vá
Fonte: Sá Pereira, 1931 p.151.

Exercício de reação instantânea: peça para que as crianças andem ao som


de um trecho musical e que, ao ouvirem o comando “vá”, pisem forte no
tempo forte seguinte com o mesmo pé com o qual acabaram de pisar
(veja a Figura 2.14).

Figura 2.14 - Exercicio de reação instantânea, compasso binário

1» Jr 1 lg 1 rf 3 11, M1 1 i
vá dir.
Fonte: Sá Pereira, 193?, p. 151.
'. q. es .

7 Exercicios de avaliação do tempo: em marcha, as crianças devem dar um


passo às frente ao ouvirem “vá” e, em seguida, permanecer parada durante
um compasso (dois tempos) e continuar a andar no compasso seguinte.

gura 235: -- Exercícia de avaiiaçäezdo *tempo-, compasso binário

H 1 ali HM H J
antonio de Sa Pereira: o ensino racionalizado da música
8. Exercício de ruptura de aotomati-smo: em marcha, as crianças devem dar
dois passos para frente e dois paraatrás ao ouvirem o comandofvá”, vol~
tando logo em seguida a andar para frente, sempre batendo o compasso
CÚIII ES' IIIEROS.

Figura 2.16 - Exercicio de ruptura de autoaiatismo

(J J (J JJ J J JJ J [J J
vá para trás para a
J frente
Fonte: Sá Pereira, 1931 13.151. '

9. Compasso ternário: peça às crianças para que marchem ao som de um


trecho musical com compasso ternário, contando “1, 2, 3”, pisando forte
no 1° tempo e revezando o 1° tempo (forte) com os pés.

Figura 2.?? - Exercicio com compasso ternãrio

,J J J ,J J J ,J J J ,J J J
Fonte: Sá Pereira, i93?, p. 152.

Em seguida, os alunos devem bater o compasso, ora batendo o 1° tempo com


a mão esquerda, ora com a direita (veja a Figura 2.18).

Figura 2.18 -r Marcação de compasso tornaria

Ê /Í'
Fonte: Sá Pereira, 1931 p. 152. -

86
lose Nunes Fernandes
Oriente, as cria-nças annarcarem o compasso ternãrio cornrosspésa e as
mãos. ao escutaram o trecho ternário, elas devem andar e bater palmas,
com revezamento de mãos epé inicial (veja a Figura 2.19). .r P

Fi=gara~2.“i9 -- Marcação decompasso tornaria, andando e batendo palmas

J JJ 1JJ JjJJ 1JJ (JJ J (J JJ [J J J JJ J J


Forite:-Sá Pereira, 1931 p.-152".

10., Exercício de rápida reação motriz: ao escutarem o comando “vá” (2° tempo
P de um compasso), as crianças devem mudar a mão que bate no 1° tempo
do compasso seguinte. Esse revezamento deve ser feito tambem entre os
i pés esquerdo e direito do 1° tempo do compasso seguinte do “vá”.

Figura 2.29 -- Revezamento motriz de batida de-mãos

1JJ J 1 JJ J 1JJJ 1JJJ1JJJ 1


.1J JJ 1J
. I
f
J1J J J 1J¿J J1J JJ 1
.

Fonte: Sá Pereira, 1931 p. 152.

11. Exercicios combinados: peça para que os alunos marquem o passo e, ao


mesmo tempo, marquem o compasso ternário. Explique que o primeiro
comando “vá” se refere aos movimentos de mãos, o segundo aos de pés
ç e o terceiros aos dois juntos, de forma combinada.

antônio de Sá Pereira: o ensino racionalizado da música


Figura Esäi -- Exercícioscombinadoa ípalrnas e andar)

JJ JJ [J ,J J[J J J [J JJ ]J J J [
vá ' vá -

[JJ J [J JJ [J JJ [J J J[J J J [J J J
vá u ' vá

[JJ J [J J J [J J J [J JJ z[ JJ J[J J J [J JJ }
2 J'

Vã- VH - V3

Fonte: Sá Pereira, 1931 p. 152.

12. Marcha a ré (ruptura de automatismosl: ao ouvirem o comando


“vá”, as crianças devem dar dois passos à frente e depois cami-
nharem para trás dois compassos (seis passos), voltando então L
a marchar para frente.

2.4.2 logos musicais

Sá Pereira criou uma série de jogos para o ensino da música a fim de


tornar a aprendizagem mais ativa. O educador os chamava de “jogos
instrutivos”. Como exemplo, citaremos o “Iogo de Mosaicos” e a “Loto
Musical”.

šoo a asašsos

No seu livro Psícotécnica de ensino elemenrear da música, Sá Pereira (1937)


apresenta, em folha destacável (pontilhada), o molde para fazer o “tabu-
leiro” do logo de Mosaicos, que deve ser desenhado no chão ou em outra

88
Iosë Nunes Fernandes
superfície (acreditamos que a opção de uma folha destacável É uma ideia
muito nova para a época). Na página frontal, tem-se uma gravura que
descreve como ficará o jogo quando for completado (veja a Figura 2.22)
e, no verso, uma tabela (formando quadras) com as respostas (veia a
Figura 2.23).

Com os “quadros (que ficam na forma de cartões) emf1nãos,Iast crianças


devem ouvir a reprodução de uma sequência de notas; ia cada nota
tocada, os alunos devem colocar no chão seus cartões em sequência
até terminaram todas e formarem a figura que se encontra na folha
descartável (um tipo de quebra-cabeça). “A criança terá ao mesmo
tempo a satisfação dever surgir a bela gravura que ela reconstituiu“
(Sá Pereira, 1937, p. 182).

Figura 2.22 - logo de Mosaicos ‹- frente: figura que ilustra o jogo quando concluído

fossa:

z. -.,=a.zE-"5 " ' '¬` .1“'-' -III=_5- -

Fonte: Sá Perelra,193?1 s.p.

Antônio de Sá Pereira: o ensino racionalizado da música


Figura 2.23 - logo de Mosaicos -- verso: cartões a serem colocados pelas crianças ao
ouvirem uma nota, para, ao final da atividade, formarem uma figura
_ üãáradeša - Éiaradešat Qaiwäflñ Clafnaduãrí (Hora-‹JezSal išiararlsãsísl

_ safari os assis na mk «riam pista “.'“_, sintra os put: z com rh. puts “ saoaaill.
.._____-_-_.. ..___,¿_¡¡¡.¡.¡¡¡¡%-_-_-_._ __ _ .zz_ ¬¿.¡.._|----r- ,------g---Í' ' ` _ ---- › z----- ›~~~ ' - ----,.,,¡¡'ü~¿e--›=‹>-›=~~ -- rm z'~z'~4¡¡-----

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czaaazsa câmeras crasazsa uaazzasózr orasaesssr üeeaaapclpz

na asgoais mm às puts na praia na pain; ohms: fins


w#w fÍÍ:;z;zz¬..z¬‹:*':'1::1"1ízílí;.,..,zl[if.._.LJ.'.'.'.;‹l. 1' 11111; ' ' ' ' V z z::-1fí'. . z z
Ç' ¬'ff-1f¬;'¡;.'#"1+-¡!I_I}-_-.-..2.EF7°'°I9'â-'!fl9!" _

c1.zsess_a amasse , omega camasn J oawsaza Í ozmzasa

,__-___--symalpso
sc--..-1 -:
_;
l|
mmasmu asgmz :›à¡›zeo_z_ asus-raspar: 9 -' '
_
Fonte: Sá Pereira, 193?, s.p.

it É fã,as Für

Distribua às crianças várias cartelas (como as de um bingo), que são


divididas em algumas quadras nas quais se encontram desenhos
melodicos ou rítmicos (veja a Figura 2.24). Com uma cópia de todos
os trechos, execute cada um para que os alunos descubram qual está
sendo tocado. Ao descobrirem, cada um cobre da quadra do trecho
correto com-uma ficl1a,corno sefaz em um bingo. Vence o que com-
pletar primeiro (corretamente) a cartela com as quadras que contêm
os trechos musicais. . ' a

90
lose Nunes Fernandes
Figura 2.2ñ ~‹› flartela com exemplos de trechos musicais (Loto Musical)

z§»t~1.W U ,lan ,i a%”wI'»5vf¬


air .l 1 mim ifÉ | as â 15,5-§{_[~s
Õigr-ri tvl 'rj
' Z [Í J
Fonte Sá Pereira, 19311. p. 183.

2 4 3 Outras atividades

íapreausão da ritmo

Convide as crianças a andarem livremente durante a execução de


uma música e, em determinada altura da atividade, instrua-as a
passarem as andar no pulsoä. Peça para que os alunos formem um
círculo e passem uma bola de mão em mão de acordo com o ritmo
determinado. Inicie, com essa atividade, a ligação com a escrita do
pulso (tempo inteiro). Em seguida, solicite que os alunos, sentados,
repitam ostinatos rítmicos simples (tempo inteiro eo tempo dividido
por dois) durante a execução da música e, na sequência, repitam
a atividade andando no pulso. Paraconcluir, indique a escrita do
tempo dividido por dois. . P 2 __
Peça para que as crianças andem no pulso de uma música, mar-
cando o compasso, primeiramente com batidas fortes no pé no
1° tempo e, em seguida, marcando o compasso com a mão direita;

Antonio de Sá Pereira: o ensino racionalizado da música


na sequência, peça que os alunos invertam para dos intervalos da escala (veja as seções 2.3.1 e
a mão esquerda para, depois, fazerem a ativi- 2.4.1 deste capítulo).
dade com as duas mãos. Utilize esse exercício Crie trechos melodicos para os nomes dos alu-
para treinamento com compassos binários, nos com os intervalos conhecidos. Faça ditados
ternários e quaternários. ou, ainda, realize a chamada usando os interva-
Faça o Iogo da Loto Musical (descrito anterior- los em vez dos nomes, ou seja, chamando cada
mente) usando na cartela quadra os ritmos dos um pelo seu “nome musical” e fazendo com que
nomes dos bairros da cidade ou com nomes os outros alunos aprendam os nomes musicais
dos alunos. dos seus companheiros de turma. Convide as
Escolha um compasso (binário ou ternário) e crianças a escreverem os nomes na pauta e a
proponha um jogo de perguntas e respostas. fazerem a leitura.
Faça dois compassos, aos quais cada aluno deve Crie trechos melódicos simples e convide os
“responder” com mais dois compassos. alunos a escutarem. Em seguida, peça para que
Convide os alunos a criarem ostinatos rítmicos as crianças entoem várias vezes cada trecho.
para acompanhar canções para cada instru- Na sequência, toque somente a metade de cada
mento disponível. Em seguida, peça para que trecho para que elas cantem completando.
as crianças passem por cada um dos instru- 4. Proponha um jogo de perguntas e respostas
mentos/ostinatos. Na sequência, escreva os melódicas. Cante um trecho da música para
valores e compassos referentes a eles e depois que cada aluno entoe a resposta. Em seguida,
monte a partitura integral (grade). ele pode escrever suas respostas ou o trecho
fã-J
inteiro. Você também pode solicitar que cada
rs t-¬::«=g t. gift _? ¿ ii
atá? ig -.| ¬¿'-“-*| ¬‹.d. -:-. Q:
-.›. gli...
:°'I._, 3
*F3__*___: " rz
ol
criança cante o trecho (pergunta e resposta
dos outros alunos).
Convide as crianças a ouvirem a escala de Do Proponha o jogo Mosaico com trechos de melo-
e a cantarem na escala, indicando as notas dias conhecidas (veja Seção 2.4.2).
para que se familiarizam com o teclado do
piano. Toque as teclas pretas para que os alu- trarsás-zz, às sie szassjassta
nos as ouçam e iniciem o conhecimento dos
tons e semitons. Utilize a escada desenhada 1. Convide os alunos a experimentaram os -ins-
no chão, com degraus menores para os semi- trumentos disponíveis, tentando tocá-los de
tons, e exercite o reconhecimento e a prática várias formas, e, em seguida, a conhecerem

josé Nunes Fernandes


suas respectivas técnicas convencionais. Em Pam saber `
seguida, proponha um ditado para que reco-
nheçam os instrumentos. SÁ PERs1.aa,..s. rt ¢àsts;=,s |ràvista.a.rsts¡lLsira,;sg
assita,
Usando os ritmos brasileiros: toque cada ins- F F L
trumento disponivel e peça para que os alunos L É L. 251.aulturaâralëdozmusicoíproblüiiäila i*edolver..B`oI:etiml
.c llfatiinco-Jimaricaltada Iliiišica, tomo VI, p. 595-599, abr; 1946.
escutem e depois repitam de ouvido os clichês L L Í
rítmicos de cada ritmo brasileiro conhecido. Em
.SÃ PEREIRA, À. grande luz.ííllolíista-_Brasi'iäaIraz de .Mt'isic'a,
seguida, forme em conjunto com todos os ins- B . LRiod1e=j aneiro,v.t 9=,-nt1,p.19s-24.1943..L L
trumentos, obedecendo a regência, já incluindo
of L. Ã peçazdeâ confronto. Revista Brasileirade Músicaz, Rio
sinais de dinâmica. , dejaneiro, v. 1, n. 4,1934... L
Apreciaçãomusical de músicas brasileiras a
. Àproposito de críticos. Ravista`BrasiIaiira da Hlúsica, Rio
estrangeiras: inicie a atividade com a audição ` de; janeiro, v. 1, n. 2., p. 162-166, 1934. .-
e. proponha que osalunos teçam comentários
, . nervosismo do artista. Revista Brasileira da I'|'I`t'tsica-,
sobre as obras escolhidas. Em seguida, dis- Rio de janeiro, v. 7, n. 4, p. 313-319, 19`4ü¡1941.
tribua os instrumentos para que cada aluno
c L L . O pedal na técnica do piano. Rio de janeiro: Carlos Wehrs
acompanhe a música ouvida criando ostina- e-Cia Ltda., 1954-.
tos. Na sequência, peça para que procedam à
. O-parfil da um crítico. Rio de janeiro: Instituto Nacional
sistematização e escritura das músicas. Nesse - de Música, 1933. E
momento, proponha a realização da leitura.
' L .O problema da educação musical infantil: orquestra de
Esse pode ser um exercício diário, aprofundado i alunos. Revista Brasileira da Hltisicaz, Rio de janeiro, v. 7,
a cada dia; ê uma atividade muito ativa eque C n.1, p. 413-43, 19413. ` c FF F
desperta o interesse das crianças. E F .LO “rythmo variado” no- -estudo da technica pianística:
' L crítica desse processo de apesrfeiçoamento eensaio sobre a
pÍvs:icholo_gialda aprendizagem technica. Revista Brasileira
i É i idafliúsica, Rio de janeiro, v. 1,11. 4, p. 271-284, 1934.

Ê* ¿ .L O solfejo-na berlinda. Revista Brasileira da Música, Rio


de 'janeiro, v. 10, .75-88, 1944. L

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separa. as nossas orchestras. Revista Brasileira do Música,
=i Rio -de janeiro, v. I, n.:4,1.934L. F

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Antônio de Sã Pereira: o ensino racionalizado da música 95


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inês de Almeida Rocha é professora de Educação Musical do Colégio Pedro II, docente permanente do Programa
de Pós-Graduação em Musica da Universidade Federal do Estado do Rio de Ianeiro (PPGM). É pos-doutora pela
Universidad Valladolid (Espanha), doutora em Educação pela Universidade do Estado do Rio de Ianeiro (Uerj), com
período sanduiche na Universidad de Alcalá de Henares (Espanha), e mestre em Musica pelo Conservatório Brasileiro
de Música - Centro Universitário (CBM~CEU). É lider do Grupo de Pesquisa Praticas de Ensino e Aprendizagem em
Musica (Gepeamus) Caliope. Vem desenvolvendo pesquisas nas áreas de artes e educação, com ênfase em música,
educação musical, musicologia, história da educação musical e história da educação. Conta com textos publicados
no Brasil, em Portugal e na Espanha. O livro Canções de amigo: redes de sociabilidade na correspondência
de Liddy Chiaffarelli Mignone para Mário de Andrade, publicado em 2012, éƒruto de sua tese de doutorado.
Atualmente integra o naipe de sopranos do Coro de Câmera da Pro-Arte (BR).
3.1 Educação musical como As propostas de musicalização. e de formação de
experiencia estética professores desenvolvidas por Liddy Mignone per-
manecem atuais e relevantes em muitos pontos,
Liddy Chiaffarelli Mignone desenvolveu relevantes como em sua concepção pedagogica musical, na
trabalhos no ensino de música para crianças, adoles- qual o ponto central consiste em desenvolver o
centes e adultos, criando diversos cursos e promo- potencial musical de cada individuo e proporcio-
vendo ações significativas para a educação musical nar condições para que as pessoas se relacionem
no Brasil. Em sua trajetória, a educadora revelou melhor com a música - ouvindo, tocando, com-
ser uma mulher sensível, com atuações múltiplas e pondo, sentindo a música pelo corpo, pelo movi-
grande capacidade de inovação. mento -, enfim, que todos possam ter acesso a
Seus projetos demonstram o envolvimento em um uma vivência estética musical de diversas formas.
constante processo de renovação. Destacam-se como Como você verá no decorrer do texto, aprender
suas principais contribuições a produtiva atuação música, para essa educadora, não se reduz a saber
no âmbito do ensino de música e piano para crian- ler alguns símbolos musicais ou executar peças em
ças, a publicação de livros e a formação de profes- um instrumento musical. É muito mais que isso.
sores especializados na metodologia de Iniciação
Musical e no ensino de canto e piano. A educadora Para que você tenha uma dimensão do que os
tornou-se mais conhecida, entretanto, pelo trabalho trabalhos de Liddy Mignone representaram para a
frente ao curso de Iniciação Musical ministrado no educação musical no país, devemos, contudo, con-
Conservatório Brasileiro de Música* (CBM). textualizar as ideías da musicista de acordo com as
propostas pedagogicas vigentes durante o período
no qual atuou.

'- _Y - ñm ., rc* ._. 1

1 A partir de 2002, o Conservatório Brasileiro de Música iCBM} tornou-se o primeiro


centro universitário especializado em Música no país e passou a ser denominado
Conservatório Brasileiro de Música - Centro Universitário (CBM-CEU).

Lidclv Chiaffarelli Mignone: sensibilidade e renovação no estudo de música 99


3.1.1 Uma pedagogia musical sintonizada Lourenço Filho, educador que divulgou e anali-
com os alicerces da Escola Nova sou as ideias do movimento da Escola Nova no
Brasil, destaca que a democratização da escola,
A Iniciação Musical representou uma grande ino- graças ã maior oferta de vagas, atraiu alunos de
vação para as práticas de ensino e aprendizagem diversas camadas sociais, criando a necessidade
adotadas nas escolas de música e na educação básica de elaboração de procedimentos diferenciados
da primeira metade do século XX-2. Os processos edu- e mais eficazes para lidar com a nova realidade.
cativos valorizavam até então a ação do professor e Algumas áreas expandiram seus conhecimentos
sua função de transmitir conhecimentos aos alunos. sobre a infância, influenciando decisivamente a
No ensino da música, por exemplo, priorizava-se a educação, que, por sua vez, incorporou novos sabe-
memorização de regras e símbolos, negligenciando res oriundos da biologia, psicologia, antropologia
aspectos de uma prática educativa que estimulasse e sociologia (Lourenço Filho,_1963, p. 20-21). Sob a
o aluno a estabelecer relações entre o fazer musical égide dessas novas ideias, mudou-se a forma de
e os elementos estruturais e notacionais da lingua- professor e aluno se relacionarem, assim como
gem musical. Por esses e outros aspectos, é possível os métodos, as disciplinas, os espaços físicos na
constatar que o curso de Iniciação Musical apresen- escola, enfim, todo um sistema de educação legi-
tou reflexos de ideias renovadoras do movimento timando as reformas educacionais desse período
educacional conhecido como ú. (Nagle, 1985, p. 264).
Ao final do século XIX, na Europa e nos Estados
Unidos, diversas ações buscaram atender às deman-
das sociais de educação, opondo-se ao sistema esta- 3.1.2 Fundamentos de psicologia na
belecido. Essa oposição caracterizou o nome adotado Iniciação Musical
pela corrente pedagógica escolanovista, posto que
objetivava ser nova, enfatizando a necessidade de Um aspecto relevante a ser destacado no curso de
reformas no ensino (Lourenço Filho, 1963, p. 17). Iniciaçao Musical e a importancia de fundamen
P-I I' Q A I
I

¡- _ Í Il"Í'-"'h- , ~ |¡ tos da psicologia aplicados ao processo educativo


2 A historiografia da educação musical no Brasil e as pesquisas realizadas até o As descobertas realizadas por estudos de biologia no
momento presente indicam a Iniciação Musical como uma proposta pioneira no
ensino de música para crianças, em que pese as características de sua metodologia século XIX proporcionaram avanços quanto ao que
eprática pedagogica. Há, contudo, uma grande concentração de pesquisas no eixo se conhecia sobre a natureza da criança: a estrutura
Rio de Janeiro-São Paulo, sendo possivel que outras propostas similares tenham
acontecido em outras partes no país que ainda não foram registradas ou analisadas e funcionalidade de seu organismo, as fases de seu
em pesquisas e textos historiográficos.

100
Inês de Almeida Rocha
crescimento fisico, os níveis de maturidade, o pro- O curso de Iniciação Musical não é e nunca deve ser
pzr

cesso de adaptaçao do organismo ao meio, o contin- um curso de teoria musical, mesmo quando aliviado
gente hereditário e o condicionamento endócrino. por processos modernizantes, mas sim uma atividade
Esses conhecimentos embasaram pesquisas expe- musical baseada no interesse e nas necessidades da
rimentais na área da psicologia e foram incorpora- crianca, desenvolvendo a par da sua musicalidade a
dos ãs novas pedagogias que surgiram na virada do sua atenção, a disciplina espontânea, servindo como
século XIX para o século XX. meio de afirmação de sua personalidade.
Lourenço Filho, Anísio Teixeira e muitos peda- Muito embora Mignone também destacasse o
gogos brasileiros contemporâneos da época tiveram valor da música para o desenvolvimento de aspectos
como grandes referências os autores john Dewey e extramusicais, a musicalidade era privilegiada. Para
Êdouard Claparede. A apropriação dessas ideias pode tal, não bastava que a criança fosse exposta a qual-
ser identificadaem diversos textos e ações pedagógi- quer tipo de atividade musical, mas sim que as ati-
cas da época. Retornamos, uma vez mais, aos escritos vidades estivessem adequadas a cada fase de desen-
de Lourenço Filho (1963, p. 53) como exemplo: o autor volvimento infantil e que atendessem ãs suas
afirma que o desenvolvimento humano processa-se necessidades naturais da vida. De acordo com
com base em um modelo evolutivo, cujas etapas são Claparède (1940), o interesse da criança deve estar
caracterizadas por diversas transformações. Outro fundamentado em uma necessidade, pois é isso que
aspecto importante é o da continuidade do processo, impulsiona o indivíduo a agir. Daí a importância do
pois as etapas se interligam e se sucedem umas às movimento, do lúdico, do jogo, pois são essenciais
outras. O corpo participa na totalidade de suas capa- na vida, principalmente durante a infância.
cidades, sejam elas orgânicas ou psíquicas. justifica-se,assim,opapelqueoritmo B B
Nesse sentido, também identificamos na metodo- adquiriu na metodologia de Iniciaça,. O s e C À 1
. na
-Çhasgtavaíqite ajcrlança
logia de Iniciação Musical a valorização de conheci- Musical. O brinquedo e o lúdico são 1
gfesseiexliflstaa qual
mentos sobre psicologia infantil para o aprendizado essenciais â educação da criança e ã ea e . e se
,
musical, entre eles os relacionados à motivação, aten- sua v1da.A , , ,, _ ç uerifife-.de atividade
musica, vida coordenada ,gp fí,_
. iir|tu$1r:,a.l,anas-sun que a
ção, memorização, inteligéncia, percepção, emo- pelo ritmo, podia ser considerada de I ~ -
aos-íariiridadíeis estivessem
ção, sensação e adequação das atividades às fases de suma importância no ambiente educa- 9
*iádeqvadašcada fase
desenvolvimento de cada indivíduo. Nas palavras de tivo dacriança” (Mignone, 1961,p. 7). Em
iiesenveivíhiento
Mignone (s. d. (b), p. 1): síntese, Mignone afirma que o processo
21- iiâfantz¡i é-que-ateu
de ensino e aprendizagem da música 1 í-
is .ds«ssetrii-iäšslias necessl
da vida
101
Liddv Chiaffarelli Mignone: sensíbl lldada E renovação no estudo de música
deveria estar focado na percepção sensorial, com e Maurice Martenoti, por exemplo. Cabe aqui res-
À P' *If I
enfase em audiçao, e na açao da criança, expressa pelo saltarmos esse aspecto como mais uma contribui-
movimento relacionado à música e pela performance - ção renovadora da prática educativa de Mignone no
cantando e tocando instrumentos de percussao. Para 1-ur

Brasil, demonstrando como ela estava sintonizada


a educadora musical, a criança sente, vive e aprende: com as mais modernas propostas da épocai. ›

A criança movimenta-se ao som de uma ciranda, com


3.1.3 Iniciação musical na educação básica
os seus gestos pessoais. Executa estes gestos natural-
mente, e que vão expressar o que sente. É solicitada a
Para Mignone, a Iniciação Musical deveria fazer
executar um passo de marcha ou de dança, emƒunção
parte das atividades escolares, pois a educadora acre-
do ritmo que ouve, desenvolvendo-se assim, esponta-
ditava que as aulas de música deveriam ter como
neamente, dentro de sua personalidade individual.
premissa aproximar a criança da expressão sonora,
Aprende aquilo que esta sentindo e age em função
“dando-lhe a alegria de fazer e criar música, dentro
daquilo que está sentindo, aproveitando dessa maneira
de um ambiente favorável, um interesse sempre
ao máximo, os seus dons inatos. (Mignone, 1957a, p. 9)
crescente e uma expansao espontânea e benéfica
Outro aspecto que é pouco destacado nos traba- ao seu futuro como cidadão” (Mignone, 1955. p. 69).
lhos de Mignone é o da criação musical em sua meto- A Iniciação Musical foi oferecida na educação
dologia. Nos manuscritos e materiais datilografados infantil e na educação básica em muitas instituições,
escritos pela professora, muitas são as passagens nas contribuindo para o desenvolvimento da musicali-
quais se refere a tais atividades: dade das crianças. A grande ênfase dada em algumas
instituições escolares aos aspectos lúdicos, â livre
(...) associamos a prática ã teoria, sempre, porém, por
expressão sonora, â conscientização corporal do
processos intuitivos. Nunca descuidando da livre cria-
Q- , t É f Í -mr 1 t _ y
ção, dando ensejo para que as crianças, sentindo a
3 Sobre Émile Jacques-Dalcroze e Maurice Martenot, veja: MATEIHU, T.; ILAHI, B.
música, possam transmitir esses sentimentos com iürg.]. Pedagogias em educação musical. Curitiba: InterSaberes, 2012. [Série
expressão propria. (Mignone, 1957a, p. 7) Educação Musicall.
4 Sobre composição musical infantil na educação básica, veja a pesquisa que inves-
Sabe-se que outras metodologias de pedagogia tiga como as dimensões da aprendizagem criativa se articulam nas atividades de
composição musical em contexto do ensino de música: BEINEKE, U. Processos
musical, durante a primeira metade do século XX, intersubjetivos na composição musical de crianças: um estudo sobre a
também valorizavam atividades de improvisação e aprendizagem criativa. 290 f. Tese [Doutorado em Música] - Universidade Federal
do Rio Grande do Sul, Porto Alegre, 21109.
criação musical, como as de Émile jaques-Dalcroze

102 Inês de Almeida Rocha


ritmo musical, aos brinquedos e jogos musicais levou o curso, oferecido
nesses espaços, a ser denominado de Recreação.
O que importava era que a criança fosse observada e atendida em
sua individualidade, apesar de o trabalho ser sempre coletivo, pois,
segundo Mignone (1957c, p. 7), “cada criança representa um mundo e
não é possível aplicar uma regra geral a todas”, ou seja, a individualidade
deveria ser trabalhada na coletividade.

POÉ professor precisaria identificar as dificuldades e facilidades dos


alunos para estimula-los a continuar desenvolvendo sua musicalidade.
método deveria ser aplicado de maneira flexível, proporcionando
aos estudantes meios paraadquirirem novos conhecimentos pela pró-
pria experiência musical (Mignone, 19570, p. 3).“O método, a técnica de
ensino são necessários, porém enveredando estes pela rotina inflexí-
vel, tornam-se desinteressantes para professores e alunos e, portanto,
ineficientes” (Mignone, 1956, p. 55).
-Sfegçundo iiilgnoitšê-eI?l957c,
De acordo com Mignone, a Iniciação Musical oferece condições para que
o aluno compreenda princípios básicos da música e siga estudos musicais,
E157); fíäüë
U!
caso faça essa opção. Em carta escrita para seu amigo Mário de Andrade,
a musicista expressa seu pensamento sobre a tarefa que desempenhava
como professora:

Temos que viver; então vivamosƒazendo alguma coisa de bom: ensinar a amar
a música para termos ou melhor, para que estas crianças [tenham] também
um dia um refúgio de doçura na vida! E juro que não estoufingindo isto, estou

Liddv Chiaffarelli Mignone: sensibilidade e renovação no estudo de música


msmanda
I de verdade, mw
~ H [que elas saíam]
- rrmrmflses
f n Figura 31 "" Liddy Chiaffareili Mignone s Francisco M ignone ›
Í, 33 " Cecilia Conde e professoras de Iniciação Musicai (decada de
mas cultores da musicas” 195o

Compreendemos o destaque das palavras sub


linliadas pela propria educadora em sua escrita de
uma carta pessoal, pois a Iniciação Musical objetivava
estimular a sensibilidade para a experiência estética
Em outras palavras, as atividades realizadas propor
cionavam melhores condições psíquicas e sensoriais
para a expressão artística, em especial para a música,
despertando na criança o prazer de ouvir, sentir, tocar,
cantar, criar, enfim, de se relacionar com a música.

Fonte Acervo fotografico do CBM-CEU

-í' ,Í - _ í ___
-I

Carta escrita por Liddv Chiaffarelli no Rio de Janeiro, em 29 dejulho de 15142 - Instituto
de Estudos Brasileiros iIEB) da Universidade de São Paulo (USP), Fundo Pessoal
Mário de Andrade (FPMAL catalogação: MA-C-CPL, n. 2044. O grifo é da propria
autora da carta manuscrita. Como critérios de transcrição do manuscrito, utilizei
um tipo cle transcrição denominada transcrição atualizado (Sierra Bias, 2009), na
qual o objetivo principal é facilitaro acesso do leitor ao conteúdo do texto escrito
e permitir a análise do pesquisador. Nesse sentido, informo que realizei atualiza-
ção gramatical e ortogrãfica, mantive marcas de escrita como sublinhados e uso
de aspas e acrescentei termos entre colchetes, pois julguei necessário para que o
leitor pudesse compreender o trecho citado na impossibilidade de ter acesso ao
manuscrito original na Íntegra.

104 Ines de Almeida Rocha


sz De cantora a professora: e comercializadora de partituras), revisor de diversos
uma mulher múltipla métodos para piano e de partituras editadas no país.
Com o pai, Liddy consolidou sua formação intelectual
1Bi-iãšãâf. tir ãiiiaare ää'%i Rãifi-WW' ãätiflä MB ganas e pôde ter acesso ao que havia de mais inovador no
e a cidade aSã aula campo das artes no Brasil e no exterior. As atividades
profissionais que seu pai desenvolveu, as viagens que
Eliza Hedvviges Carolina Mankel Chiaffarellif, desde realizou e a vida social da qual participou proporcio-
criança chamada carinhosamente de “Liddy”, nasceu naram um fecundo ambiente cultural para sua filha.
em 9 de maio de 1891, na cidade de São Paulo. Seu pai, Luigi Chiaffarelli também organizava muitos
Luigi Chiaffarelli, pianista italiano, ao se estabelecer concertos nos salões das casas em que morou e os
no Brasil, desenvolveu uma importante escola de denominava em séries conforme suas características:
piano, formando diversos concertistas brasileiros saraus musicais, vesperais e concertos históricos.
de renome internacional, como Guiomar Novaes, Essas séries estimulavam os alunos a tocar e a ouvir
Antonieta Rudge, Souza Lima, entre outros. e cultivavam um ambiente de sociabilidade na capi-
O mestre Chiaffarelli foi professor de línguas tal paulista, gerando mudanças no gosto musical do
estrangeiras e piano, sócio da Casa Beethoven (editora público e no repertório executado.

.- -f1'f_'-'Hr 7 _ 1

Pela casa dos Chiaffarelli passaram importan-


6 Como é próprio a muitas mulheres, Liddv também usou vários nomes ao longo
de sua vida. O apelido, adquirido em sua infância porfamiliares para o nome de tes músicos que, quando realizavam turnês pela
batismo Eliza Hedwiges Carolina, se manteve tanto em sua vida pessoal quanto América Latina, ao chegarem à cidade de São Paulo,
em sua carreira profissional. Poucos documentos podem ser encontrados com seu
nome de batismo. Em São Paulo, ficou conhecida como Liddv Chiaffarelli; diversos faziam uma parada obrigatória para se encontra-
documentos arquivados e publicados na capital paulista tem registros relacionados rem na mansão, situada na Rua Padre Manuel.
ii educadora com essa denominação. Hã também alguns registros com o sobrenome
de seu primeiro casamento: LiddvChiaffarelli Cantú ou Llddv Cantú. No Rio delaneiro, Frequentaram esses salões músicos como: Pablo
'ficou conhecida porLiddyMignone, embora muitos de seus alunos ainda se refiram Casals, josé Viana da Motta, Darius Milhaud,
a ela hoje em dia como"D. Liddv". Em sua última publicação, pouco antes de falecer,
ela própria utilizou o nome LiddvChiaffareIli Mignone. Dentre várias opções, decidi Arthur Rubinstein, Alexander Brailowsky,
por adotar a mesma forma que ela escolheu em seu livro mais recente. Creio que Alexander Borovsky, Miercio Horzowsky, Ignacy
tenha sido essa a forma como ela mesma escolheu ser conhecida na última fase
de sua vida. Paclerevrslcy, o bailarino Vaslav Nijinski e os

Liddv Chiaffarelli Mignone: sensibilidade e renovação no estudo de música 105


músicos brasileiros Henrique Oswald, Francisco i9;šä--fiaáiiíâ .Is ãšsšaare
i fifilfi 21%* -Wmi WWE mw suae
Braga, Magdalena Tagliaferro, Francisco Mignone, a cidade de iade .šaaešr
Heitor Villa-Lobos, entre muitos outros.
Em 1933, Mignone transferiu-se para o Rio de Janeiro
Nessa mesma casa, Mignone atuou como cantora, e passou a viver com Francisco Mignone, compositor
pianista e professora-assistente de seu pai. Ali morou e, como ela se refere a ele nas cartas escritas para
com seu primeiro marido, Agostino Cantu, um ita- Mário de Andrade, seu companheiro de vida (Rocha,
liano radicado no Brasil que desenvolveu relevante 2012). Iniciou, então, uma profícua carreira como
carreira na formação de pianistas e de organistas, professora de música.
promoveu concertos e saraus musicais e também Além das aulas de canto e piano, que sempre
atuou como compositor. Nos cômodos do andar térreo, ministrou ao longo de sua vida, um primeiro traba-
aconteciam aulas de piano, órgão e outros instrumen- lho se destacou em sua carreira profissional: o curso
tos musicais. No salão principal da casa haviam dois de Iniciação Musical. Ao falarmos dessa fase, é impos-
pianos de cauda e um órgão, o espaço acomodava sível não mencionarmos a parceria com seu amigo,
cerca de 150 pessoas durante os recitais de música. o professor de piano Antônio Leal de Sá Pereira.
Há também registros da passagem de Liddy por Mignone frequentou as aulas de Pedagogia Musical
espaços paulistanos como o Conservatório Dramático ministradas pelo educador bahiano e, quando Oscar
e Musical de São Paulo e a Sociedade Symphonica Lorenzo Fernãndez ofereceu espaço no Conservatório
de São Paulo? Além desse ambiente de sociabili- Brasileiro de Música (CBM) para a criação do curso,
dade, música e arte, Mignone viajou muitas vezes os dois inseriram a novidade com grande sucesso.
ã Europa para visitar parentes e acompanhar seus
familiares. Circulava com desenvoltura por diversos Em 1937, o curso de Iniciação Musical foi criado
países, benefício que lhe possibilitou o domínio de no CBM como uma metodologia de ensino fun-
cinco idiomas, por meio dos quais se comunicava, damentada na proposta do músico e professor
lia e escrevia. suíço Émile Iaques-Dalcroze. Alguns fundamentos
pedagógicos musicais do método do músico suíço
se mantiveram, tais como:
¡- _ fi'¢%- ___ - ¡
Ji um apurado trabalho de acuidade auditiva e
? Participaram da Sociedade Symphonica de São Paulo Olivia Guedes Penteado,
Isabel von ihering, Antonieta Rudge, Agostino Cantu, Fúrio Franceschini, Mário consciência sonora;
de Andrade e António Leal de Sã Pereira.

106 Inês de Almeida Rocha


Ji atividades liidicas, com movimentação, ofere- os cursos de Iniciação Musical ministrados pelas
cendo ao aluno. a possibilidade de realizar uma duas educadoras, Liddy Mignone e Nayde Sã Pereira,
P representação corporal dos elementosanusicais; foram ganhando características diferentes, pois elas
Ji . a improvisação como processo criativo.. P imprimiram marcas pessoais a seus trabalhos.
O curso de Iniciação Musical desenvolvido por
A -Os eicerzciciois propostos por Dalcroze e oi
Mignone foi incorporando, no decorrer de sua tra-
repertório utilizado foram adaptados, 'principal-
jetória, contribuiçóes de diversos autores que eram
mente no que se refere ã utilização de canções
contemporâneos da educadora, como Edgar Wíllems,
folclóricas e brinquedos cantados brasileiros e de
Carl Orffm, Maurice Chevais, e se adaptando ã clien-
músicas compostas para crianças por composito-
tela que vínha para as aulas e aos espaços que ofere-
res modernistas, tais como Lorenzo Fernandez,
ciam o curso. Havia jovens com deficiênciasfl entre os
Heitor Villa-Lobos, Francisco Mignone, Camargo
alunos matriculados nas turmas, ou seja, na década
Guarnieri, entre outros.
de 1930, a educadora já realizava açóes de integra-
ção de tais crianças ã escola, uma atuação que hoje
Sá Pereira trabalhou junto com Mignone por
denominamos de educação inclusiva. Criava-se, assim,
apenas um ano. Em 1938, o educador assumiu, por
uma demanda para a formação de professores que
meio de concurso público, o cargo de professor na
pudessem atender a esses alunos.
Escola Nacional de Música, atual Escola de Música
da Universidade Federal do Rio de janeiro (UFRI). Em
ie- zaraä Ê:
icidtip ãisšafiarelli Mignone
1939, o compositor, já como diretor da Escola Nacional
de Músicas, implantou a Iniciação Musical na moda-
aire i e.iaaeire e šãe Paulo
lidade de curso de extensão, com a assistência de
Muitos músicos passam pela experiência de conci-
Nayde jaguaribe de Alencar Sá Pereira, que também
liar a atividade de intérprete, compositor ou regente
desenvolveu importante trabalho na musicalização
com atividades pedagógicas, transmitindo seus
de crianças e formação de professores”. Com o tempo,
I Í Í ñ_ Í Í Í *

r 1 z f .f"""'*¬.- z z f›- A 10 Sobre os músicos-pedagogos Edgar Willems e Carl Orff, veja: MATElHD, T.; ILARI, B.
8 O Instituto Nacional de Música foi criado em 1840 com a denominação de (Org.). Pedagogias em educação musical. Curitiba: lnterãaberes, 2012. (Série
Conservatório de Música. Em 189111, passou a ser chamado de Instituto Nacional de Educação Musicaii.
Música; em 1931 de Escola Nacional de Música, e, em 1956, recebeu a atual deno- 11 Faço aqui a opção pela terminologia pessoas com deñciëncia, embasada na
minação de Escola de Música da Universidade Federal do Fiio de Janeiro. Resolução do Conselho Nacional dos Direitos da Pessoa com Deficiéncia iConade)
9 Veja a análise sobre a iniciação Musical criada por António Leal de Sã Pereira na n.1, de15 de outubro de 2ú1ü. Disponivel em: chttpziivvww.pessoacomdeficiencia.
Escola Nacional de Música no Capitulo 2 deste mesmo livro. gov.brrappfconadeƒsobre-o-conadeƒregimento-interno:.=›. Acesso em: 1° abr. 2015.

Liddy Chiaffarelli Mignone: sensibilidade e renovação no estudo de música 107


conhecimentos e contribuindo para a formaçao de:Y I ii

A diversidade de atuaçoes- criou demandas diferen II

outros profissionais. A vivência em um lar de músi- cíadas e um ambientepropício para a implantação,


cos proporcionou sólida formação a Mignone, que anos após da morte de Mignone, em 1962, do curso
acumulou conhecimentos e pôde aplicá-los nos pro- de Musicoterapia no CBM”. Muitas de suas alunas
jetos que desenvolveu. Além dos estudos que reali- seguiram carreiras como musicoterapeutas em
zou com seu pai, a educadora o observou ensinando, diferentes instituições. A amizade com a médica
conheceu seu método, bem como estratégias, recur- psiquiatra Nise da Silveira, que desenvolveu rele-
sos, atitudes e técnicas do formador musical. A musi- vante trabalho na recuperação de pacientes pela
cista pôde compará-los com os de outros professores expressão artística, foi importante para os traba-
que frequentaram sua casa e teve oportunidade de lhos que Mignone produziu nessa área. Ela orientou
experimentar suas próprias ideias como assistente a fase inicial das atividades musicais com pacientes
de Luigi Chiaffarelli. Por meio da ação de observação, do Centro Psiquiátrico Pedro II, hoje denominado
do estudo, da comparação, da reflexão e da própria Instituto Municipal Nise da Silveira.
prática, tornou-se professora. Da mesma forma, empe-
nhou-se em formar muitos professores. Nesse mesmo período, Mignone conheceu Augusto
No CBM, o sucesso do curso de Iniciação Musical Rodrigues, divulgador do pensamento de Herbert
e a grande frequência de alunos gerou a necessidade Read, fundador da Escolinha de Artes do Brasil. Com
de especialização de professores. Em 1948, Mignone ele, ampliou sua atuação, incorporando aos cursos
criou na instituição o curso de Especialização para que ministrava outras ideias sobre a criação artística
Professores de Iniciação Musical e o de Especialização e a arte-educação. No ano de 1950, motivada por ques-
para Professores de Piano. O modelo de formação de tionamentos que o trabalho desenvolvido pelo artista
professores adotado nesses cursos muito se diferen- plástico lhe provocou, a educadora criou o Centro
ciava de outros métodos da época, inclusive no que se para o Estudo da Iniciação Musical da Criança com
refere à formação continuada dos profissionais, como um grupo de professoras recém-formadas, que con-
você poderá ver adiante. Os professores egressos tinuaram os trabalhos da educadora sob sua orienta-
foram requisitados por diferentes instituições, tais ção. As profissionais organizavam cursos, palestras,
como jardins de infância, escolas primárias, escolas biblioteca e festivais e se reuniam sempre na primeira
de música, assim como por espaços que atendiam a sexta-feira de cada mês. Estudavam psicologia com
pessoas com necessidades específicas (hospitais para
tuberculosos, hospitais psiquiátricos, entre outros). ¡_ -_ - _ -t'.¿"?"'u- z- _ _,

12 Ci primeiro curso de Musicoterapia do Brasil foi criado no CBM por Cecilia Conde,
em 19?2.

108 Inês de Almeida Rocha


Figura 3 2 - Liddy Chiaffarelli Mignone e Heitor Milla Lobos
Noemy Silveira Rudolfer e Cinira Menezes, além de (danada ée 1959)
fundamentos das diferentes manifestações artisti-
cas. Com os estudos realizados, elaboraram novos
programas de curso adequando a Iniciação Musical
para aplicação em jardins de infãncia, em parques
infantis, em estabelecimentos que atendiam crianças
com necessidades específicas e em escolas primárias
(Mignone, 1955, p. 69).
Na década de 1950, o curso de formação de profes-
sores de Inicíação Musical foi levado para a cidade de
São Paulo e oferecido pelo Conservatório do jardim
América, sob a direção de Lázara Leão Wey. As aulas
Credito Acervo fotografico do CBM-CEU
aconteciam na Sala Schvvartzmam e na Faculdade
de Artes Santa Marcelina. Esse curso foi responsável
pela formação de muitos professores de música do
Estado de São Paulo, fato que representou um fator
multiplicador de divulgação das ideias propostas
pela educadora.
Mignone viajava frequentemente para a cidade
de São Paulo, a fim de ministrar aulas e rever seus
familiares. Na manhã de 26 de novembro de 1962,
o avião em que viajava, retornando da capital paulis-
tana para o Rio de janeiro, se chocou no ar com outro
avião, comovendo o meio musical paulista e carioca.

3.2.1 Produção musical e pedagógica

A atuação de Mignone como cantora e pianista está


documentada nos programas dos concertos organiza-
dos por Luigi Chiaffarelli e Agostinho Cantu em diver-
sos espaços da cidade de São Paulo. No repertório

Liddy Chiaffarelli Mignone: sensibilidade e renovação no estudo de música


cantado, há estreias de músicas compostas especial- "Neco, o portuguezinho”, “Zequinha, o dançarino”,
mente para ela por músicos brasileiros como Carlos “]oãozinho, o forçudo”, “Toninho, o gozado”, “Zico
Gomes, Agostino Cantu, Franclsco Mignone, Alberto e Pedro, os dois teimosos e Quinzinho valsando .
'* * J! lí .H

Nepomuceno, Francisco Braga, Henrique Osvvald, Em 1951, Mignone compôs uma suíte, também para
nas línguas francesa, italiana e alemã. piano, constituída por quatro peças (I - Pierrozinho
Mignone publicou dois livros destinados a profes- triste, II- As costureirinhas, III - Acalanto do indio-
sores de música. Em 1947, pela Edições Tupy, escre- zínho e IV - Dia de férias). Além dessas composições,
veu Iniciação Musical: treinos de ouvido, ritmo e leitura, realizou revisões em partituras para piano, também
em coautoria com Marina Lorenzo Fernández, filha destinadas ao ensino inicial de piano.
do compositor Lorenzo Fernández e aluna de piano
e assistente da educadora paulista nas turmas de Outras produções importantes foram os programas
Iniciação Musical. O segundo livro, Guia para profes- de rádio e televisão apresentados por Mignone. Na
sores de recreação musical, foi publicado pela Editora década de 1950, à convite de Guilherme Figueiredo,
Ricordi Brasileira, em 1961, com a colaboração de diretor da TV Tupi, a educadora apresentou um
Anamaria Pinto Fonseca, Cecília Conde, Elizah Penna programa para crianças que era levado ao ar pela
Augusto da Silva, Marina Neves Espanha, suas alu- manhã, com duração de meia hora. O programa,
nas e participantes do Centro de Estudos. Ambos as denominado Escolinha Dó - Ré - Mi, exibia ativida-
obras foram estruturadas em torno da descrição das des do curso de Iniciação Musical realizadas com
atividades realizadas com as crianças, de prescrições crianças e apresentações musicais de grupos esco-
para uma boa atuação dos professores, de pressupos- lares. Durante a década de1960, a Iniciação Musical
tos teóricos que embasam a metodologia e reflexões ainda participava da programação com suas alu-
sobre diversos temas relacionados ao ensino de música nas Cecília Conde e Elizah Penna na TV Tupi, e,
para crianças. Além desses materiais mais divulga- na TV Globo, com Cecília Conde e Leatrice Paiva.
das, Mignone também escreveu em periódicos como Cecilia Conde também foi parceira de Mignone
a Revista do CBM e o Boletim da Associação Brasileira em programas de rádio que tinham um cunho
de Recreação. mais pedagógico eeram dirigidos a educadores e
A educadora compôs músicas dedicadas às a pessoas que trabalhassem com crianças.
crianças e iniciantes no aprendizado do piano
com temática infantil. As primeiras são datadas
de 1942, com os titulos “Chiquínho, o implicante”,

110 Inês de Almeida Rocha


as Iniciação Musical e formação de especificidades que o aprendizado :-:-. :.-:.,. . _ _ . .. .. .

professores da música nessa fase da infância


demanda. Mignone enfatizava alguns }¿Sá.Íiëre°iÍiiii§.b.rinca i*zs * T;
“Quanto mais seguras estivermos, mais saberemos pontos importantes em sua proposta _ esi|i¡iifüäÍIi¿if::amente.clilI!
brincar espontaneamente com as crianças e nos no que se refere ao desenvolvimento asícri az1çasethos-:diverti
divertir tanto quanto elas” (Mignone, 1957b, p. 12). de saberes apreendidos pelo sentido tanÍtoíqua'nto elas”
Essas não foram meras palavras de efeito, pois sin- da audição, pela percepção do ritmo 7(Mignone,i195?b;pz.12).O
tetizam a forma como a própria Liddy Mignone con- musical e pela consciência de relações
duziu sua prática pedagógica, seu relacionamento sonoras na música, por considerar básicos tais fato-
com crianças e com as futuras professoras para as res para a formação do músico e de qualquer um
quais lecionou. que estivesse em contato com a música (Mignone,
No curso de Iniciação Musical, “o professor ensina s.d. (a), p. 2).
menos e o aluno aprende mais, porque aprende pelo O curso tinha duração de dois anos, com um
interesse despertado, que traz consigo a observação, encontro semanal. As aulas eram ministradas por
0 desejo de conhecer, de descobrir, de agir”13. Tendo dois professores que se revezavam no instrumento
.rfl

tal afirmação em mente, Mignone estava convencida acompanhador, em geral o piano, e na orientaçao
de que o professor necessitava de uma boa formação dos alunos na aula. O professor conduzia as ativida-
profissional para desempenhar suas funções. des tocando músicas e fazendo inter- ç 1 ..
ferências com melodias, improvisações P Nfirfiuiíiidfiilfllfilašzãfl
3.3.1 O curso de Iniciação Musical musicais, músicas com variações de s M"5¡f¡l¿”° P1'°fE$5°fe
andamento, dinâmica, estimulando o s Éfifififi-ifl-*PPS E 'Í' afim"
A Iniciação Musical era um curso destinado a crian- aluno a participar da aula de forma ÍÍÍP-FÉ-flêfl fii3¡5f lÍ°1'll.¡1&
ças entre 5 e 6 anos, que começavam seus estudos espontânea. Assim, a criança poderia í afã”-H-ÚGSSP-°li° Wfiffifsei
musicais. Surgiu como alternativa para atender a expressar sua musicalidade e adquirir dêiflfiffêidfirfflufi-íÍfêI
novos conhecimentos. tr consigo-.ašubservação, s
,_ z- z fr-"_”-¬.-m _ Q

13 Man uscrito, sem tituloe não datado, arquivado no Acervo Liddy Chiaffarelli Mignone
zrdsfifliflimfirêhsfsfzfls
{C|3|i,1-[EU]_ _ _ag_i
_zz

Liddy Chiaffarelli Mignone: sensibilidade e renovação no estudo de música 111


As atividades do curso de Iniciação Musical deve- Os recursos dos quais o curso dispunha eram
riam ser desenvolvidas partindo “do conhecido os seguintes:
para o desconhecido” (Mignone, 1957a, p. ?). Para .li um instrumento harmônico-melódio para acom-
tanto, as professoras contavam com os seguin- panhamento das aulas;
tes recursos: repertório do cancioneiro infantil, Ii instrumentos de percussão para compor uma
marchas, cirandas e danças. O uso de repertório bandinha rítmica;
conhecido pelo aluno era considerado um facili- .D cartões de papelão em tamanho proporcional
tador para o bom início de atividades, pois assim com figuras de ritmo;
o estudante se identificava e o professor poderia D cartões com notas musicais escritas em
acrescentar desafios, fosse em relação à movimen- pentagrama;
tação corporal ou ao uso dos instrumentos que É quadro negro com pentagrama;
acompanhavam o canto. J) “Escada do Pintor”, que facilitava o trabalho com
O tempo de duração de cada atividade deve- as relações intervalares entre sons e as escalas
ria ser adequado ao nivel dos alunos, enquanto maiores e menores.
a variedade garantiria a atenção e o interesse. Como continuidade dos dois anos de Iniciação
O importante era que as atividades fossem plane- Musical, o CBM oferecia o curso Pré-Teórico, que tam-
jadas de maneira gradativa, partindo do conceito bém objetivava ensinar a leitura e a escrita musical
mais simples para o mais complexo, trabalhando a de forma lúdica e criativa para a criança.
precisão e representação corporal rítmica, a afina-
ção do canto e do instrumento, o reconhecimento 3.3.2 O método de Iniciação Musical
auditivo de elementos musicais, a improvisação e
a criação musical, para só então trabalhar a repre- O método de Iniciação Musical é constituído por
sentação gráfica. três tipos de atividades: o brinquedo, o jogo e o tra-
balho, concebidos com uma gradação crescente de
Mignone expressa com objetividade e com um complexidadeno trabalho com parâmetros do som,
vocabulário próprio de seu tempo os fundamen- duração proporcional de sons e silêncios, diferentes
tos da Iniciação Musical: “do fácil para o difícil; do andamentos, dinâmica musical, gêneros musicais,
conhecido para o desconhecido; do concreto para o escalas e tonalidades maiores e menores, entre outros
abstrato; do exemplo para a regra; do principio para conteúdos.
a conclusão” (Mignone; Fernândez, 194?, p. 3).

112
Inês de Almeida Rocha
Na visão adotadap-or Mignone, o' brinquedo é do jogo. Para essa fase, não se f_a-zuso de folhas para
uma atividade lúdica e oz movimento é base' para escrita e leitura, -cadernos--ou métodos. Utiliza-se
uma experiência da qual osalunos participam de o que Mignone denominava de “caixinha”1i, ou
forma espontânea e livre". Assim, o conhecimento seja, uma -caixa de qualquer tipo (papelão-, plás-
é apreendido pela percepção das sensações provo- tico, metal) que possibilite armazenar o material
cadas por ações. As atividades têm como objetivo aser manipulado pelas crianças com registro das
estimular a fantasia e a expressão por meio dos figuras de ritmo. Nela ficam guardados diversos
recursos de que cada um dispõe naturalmente, ou cartões de papelão”, cada um com desenhos das
seja, os alunos devem brincar com a música. figuras de ritmo ou de notas musicais.
Nessa fase inicial, denominada recreação,
as crianças devem participar de cirandas, danças, Os cartões que contêm as figuras de ritmo têm a
marchas, dramatizações e atividades com brin- função de estimular a criança a relacio-
quedos cantados. O brinquedo pode ser planejado nar o tamanho e a forma geométrica do
íibjetivli fdašl,¿e -eçcoriišiiiit
para intercalar uma atividade que exija mais aten- cartão, bem como o registro da figura
.. PiG<Íäfiüi|ãfi.0 Pfófñfiiãsíeëfi
ção e esforço, de modo que os alunos experimentam de ritmo/silêncio e a duraçao propor-
iseíuztempo.os:fundiif.,
um momento de recreação e, assim, fiquem mais cional de tempo do som/silêncio repre- se se se _ Í _
Íirieittosda-iflmuaçeo _
relaxados e facilmente motivados para retomar sentado por cada símbolo. Os cartões
uma atividade de maior complexidade. com o desenho das figuras de ritmo de
O jogo é uma atividade que envolve certo som (semibreve, mínima, semínima
grau de elaboração e representação mental dos etc., no anverso do cartão) e de silêncio
elementos trabalhados no brinquedo. As regras (respectivas pausas no verso do cartão)
a serem seguidas têm uma complexidade maior devem ser confeccionados com tama-
que a verificada no brinquedo. Mignone propõe nhos proporcionais. Por exemplo: se os
*íizípiorpairäíàrcorrdussãío”
alguns jogos de ritmo e som com movimentos do cartões com o desenho da semibreve
i!iii9..n°1ie::F§fi1Iflã1ids=;
corpo, uso de instrumentos de percussão e outros e sua pausa forem confeccionados em
u H _ . " Z'
materiais, como uma bola que é passada de criança forma de um quadrado com 20 cm
'r z -\
para criança em determinado tempo e ritmo ou *ff _ » -I"""_¶- f

14 Infelizmente, até as últimas pesquisas realizadas, não foi encontrado nenhum


de forma que cada aluno cante uma melodia ou material desse tipo utilizado por Mignone e suas alunas nas aulas das décadas de
um som ao receber a bola. 193ü,194ú e 1950; dispomos apenas de descrições e desenhos em suas pu blicaçóes,
manuscritos e em depoimentos orais.
O trabalho é a fase de representação simbólica 15 Esse material, com desenho das figuras de ritmo, também era confeccionado com
dos elementos conhecidos por meio do brinquedo e madeira, sempre guardando as mesmas caracteristicas quantoaforma e ao tamanho.

Liddv Chiaffarelli Mignone: sensibilidade e renovação no estudo de música 113


cada lado, o cartao que contiver a representação sintonia rítmica de cada performance com a música
da mínima deve ser confeccionado em formato de proposta, de forma que as crianças pudessem esta-
retângulo (20 cm ›‹ 10 cm), como se cortasse ao meio belecer relações entre seu instrumento, o instru-
um cartão correspondente â semibreve. Iuntando, mento de seu colega, a música tocada pelo piano, o
lado a lado, dois cartões com o desenho de mínima, instrumento acompanhador ou o canto do grupo.
eles teriam exatamente o mesmo formato e tamanho É importante estimular os alunos a ouvir com atenção
que um cartão com a semibreve. Os demais cartões direcionada ao grupo, a si mesmos e ao colega ao lado.
são confeccionados seguindo o mesmo raciocínio. Em uma segunda etapa, o professor propõe jogos
Esse material possibilita diversas atividades de com um grau maior de complexidade para o uso dos
leitura e representação de melodias e sequências instrumentos e os ritmos a serem tocados. No está-
rítmicas. Ao ouvir uma sequência rítmica executada gio de trabalho, a bandinha executa arranjos mais
por um colega ou pelo professor, as crianças da turma complexos e utiliza diferentes tipos de partituras.
alinham os cartões para representar o que foi tocado Mignone sugere uma partitura com as palavras da
com as figuras de ritmo adequadas. canção e símbolos que representam os ritmos de cada
instrumento, partituras apenas com os símbolos
O curso de Iniciação Musical também propõe a musicais dos ritmos e partituras contendo também
prática musical com canto e performance de ins- a grafia da melodia a ser cantada ou tocada por ins-
trumentos de percussão no que é denominado trumento melódico.
bandinha rítmica. Essa atividade atende aos mes-
mos critérios das demais atividades musicais, ou 3.3.3 Curso de especialização para
seja, deve ser trabalhada como um brinquedo, um professores de Iniciação Musical
jogo eum trabalho, utilizando diferentes formas
de registro escrito. O curso de especialização para professores de
Iniciação Musical” tinha duração de dois anos e
Primeiramente, essa atividade deve ser realizada contava com aulas teóricas, estágio supervisionado
em caráter de recreação, sem um arranjo fixo, de
forma que as crianças possam expressar livremente g- _ ' 7 _ ' ífl- Í __ lí _;

como sentem a música. Ao professor, cabe observar e 15 Mignone criou também um curso de especialização para professores de piano com
caracteristicas muito parecidas, no que concerne à duração do curso, as aulas teóri-
motivar variadas escolhas de instrumentos musicais cas sobre psicoioqia do aprendizado, psicologia da criança, técnicas e métodos de
para cada aluno. Mignone recomendava que o pro- ensino do piano, estágio supervisionado, redação e defesa de tese. Na Biblioteca
do Centro Cultural Amália Conde, no CBM-CEU, é possivel ter acesso aos trabalhos
fessor deveria estar atento para poder estimular a defendidos pelos alunos desse curso.

114 Inês de Almeida Rocha


nas turmas desde o primeiro ano, uma aula pública e ano, o futuro professor deveria redigir uma tese”,
a defesa de uma tese para banca de cinco professores. que era apresentada e defendida para uma banca de
As aulas teóricas versavam sobre pedagogia geral, cinco professores. Ao final do curso, eram utilizados
psicologia, iniciação musical e história da educação, diferentes instrumentos de avaliação, como uma
que incluía o histórico sobre a iniciação musical. prova escrita sobre as matérias teóricas e uma aula
Eram abordados aspectos relativos a conceituações, pública de Iniciação Musical, da qual participavam
metodologias, etapas do desenvolvimento psicológico as crianças que estudavam no CBM.
da criança, psicologia do ensino e aprendizagem, Outro aspecto valorizado pela educadora musi-
além do estudo específico da metodologia de ensino cal era a atitude do professor. Ao profissional cabia
da música. acolher a manifestação dos alunos, observa-los aten-
Era importante fornecer condições para que o tamente para perceber suas potencialidades, dificul-
professor soubesse estimular, orientar, propor ativi- dades e oferecer alternativas para o avanço do seu
dades nas quais os alunos pudessem participar com desempenho e de suas descobertas. Esse era, inclusive,
“interesse e alegria” (Mignone, 1957c, p. 7). O aluno era um dos temas abordados nas provas escritas, nas
o foco do processo educativo, inclusive na formação quais sempre constavam questões sobre a atitude, a
do educador. função e a responsabilidade da atuação do professor
Os estágios eram obrigatórios desde o início do para a formação musical e psicológica dos alunos.
curso e os futuros professores eram orientados a Essa preocupação revela um modelo de profissio-
observar a conduta das professoras e o envolvimento nal que se delíneava no período e um novo perfil de
e desempenho dos alunos. Desenvolver a habilidade professor que tivesse o aluno como principal agente
de observação era um fator considerado um fator do processo educativo e não minimizasse a impor-
importante para a prática pedagógica. tância da atuação no processo pedagógico. Muito
Como as aulas de Iniciação Musical eram ofe- pelo contrário, esse profissional deveria ser muito
recidas tendo uma dupla de professores, Mignone bem qualificado para o desempenho adequado de
estimulava o aprendizado de trabalho em equipe, sua função, estimulando os alunos no aprendizado
pois o bom entrosamento era fundamental para o e no fazer musical.
desenvolvimento dos alunos. Durante o segundo
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1? Na época, esse trabalho acadêmico era denominado tese, mas, apesar da defesa
para uma banca de cinco professores, nos moldes dos trabalhos cientificas atuais,
hoje seria denominado trabalho monogrdfico, principalmente pela sua extensão
e menor grau de aprofundamento, o que, em minha opinião, não minimiza a qua-
lidade e importãncia desse tipo de trabalho na formação do professor da época.

Liddy Chiaffarelli Mignone: sensibilidade a renovação no estudo de música 115


3.4 Brinquedo, jogo e trabalho ouvir sua respectiva música. Enquanto isso
os outros alunos devem aguardar e ouvir a
Muitas são as atividades descritas por Mignone sua música para, então, executar movimentos
em seus manuscritos e impressos para as aulas de 3. Trenzinho: brinquedo por meio do qual os alu-
Iniciação Musical em turmas de crianças com média nos devem imitar os movimentos e sonoridades
de idade entre 5 e 6 anos. Trazemos aqui alguns exem- desse meio de transporte com sons emitidos pelo
plos a serem utilizados em sala de aula e adaptados corpo, acelerando e diminuindo o andamento,
pelos professores em suas práticas educativas, depen- por exemplo, movendo-se livremente de acordo
dendo das situações em que se encontrem. com os efeitos sonoros executados ao piano.

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1. Toque músicas do repertório do cancioneiro 1. .logo com os Pezinhos: peça para que os alunos
infantil variando em andamento, intensidade, formem uma roda, sentados ou em pé, com as
altura, dinâmica e agógica. Os alunos devem mãos na cintura ou apoiadas no chão. Toque
movimentar-se livremente, expressando o uma sequência rítmica ou uma música ao
que ouvem com o corpo. A música pode ser piano; as crianças devem ouvir e identificar
tocada com variações apenas de um elemento os compassos, fazendo movimentos com os
ou andamento, ou pela combinação de vários pés. Por exemplo: em uma música de compasso
elementos, intensidade e região aguda ou grave, binário, a criança deve bater com a ponta do pé
por exemplo. no chão junto com o tempo 1 e voltar tocando
2. Outra atividade pode ser realizada em grupos. o calcanhar no chão no tempo 2. Para músicas
Peça para que a turma se divida em um ou em compasso ternário, deve bater a ponta do pé
mais grupos, cada um identificado com uma à frente no tempo 1, ao lado no tempo 2 e voltar
música ou sequência rítmica tocada em um para a mesma posição tocando o calcanhar
instrumento de percussão. Instrua cada grupo no chão no tempo 3. Para musicas em com
f ir

nn.

a se movimentar apenas no momento em que passo quaternário, deve bater a ponta do pé ã

116
Inês de Almeida Rocha
frente no tempo 1, um pouco ao lado no tempo 2, 'Ein uma segundaetapa, a atividade deve
mais ao lado no tempo 3 e voltar ã posição iní- ser realizada, preferencialmente, em grupos
ci-al tocando os calcanhar no chão no tempo 4. de quatro alunos. Batapall-nas ou toque notas
Os alunos podem alternar um compasso com o em.instrumento melódico que prolongue o som
:pé esquerdo e outro compasso com o pé direito (piano ou flauta), alternando a representação
ou criar um movimento que expresse o peso do das diferentes figuras de ritmo trabalhadas
tempo 1. e as diferenças em relação aos demais (semínima, mínima e semibreve). Os alunos, ao
tempos dos compassos. ouvirem quatro palmas seguidas na duração
Jogo das Quatro Meninas(os): instrua os alunos da pulsação, devem se posicionar lado a lado
a darem quatros passos curtos quando você (representação da semínima). Ao ouvirem pal-
tocar quatro notas ao piano com duração da mas no primeiro e terceiro tempo (representa-
pulsação (representando a duração de quatro ção da mínima), devem se posicionar em grupos
seminimas). Quando soarem duas notas, cada de dois, um na frente do outro. Ao ouvirem
uma com duração de duas pulsações (represen- palmas no primeiro tempo, os quatro alunos
tando a duração de duas mínimas), as crianças devem se posicionar em uma fila, um atrás do
devem dar dois passos mais longos com a dura- OlllII'O.

ção adequada. Quando as crianças ouvirem 3. “Escada do Pintor": jogo que utiliza uma escada
uma nota com duração de quatro pulsações colocada no chão, de forma plana, para que a
(representando a duração de uma semibreve), criança possa caminhar colocando o pé em
elas devem dar um passo bem longo com dura- cada um dos degraus, que podem ser de-madeira
ção adequada ã nota tocada. Podem ser feitas ou papel-cartão. Cada degrau representa um
diversas combinações com variadas durações grau da escala. O espaçamento entre cada um
de som e silêncio. As pausas podem ser repre- deles equivale às distâncias de tom e semitom
sentadas corporalmente com o dobrar de um da escala (o espaço entre os degraus que corres-
joelho para cada intervalo. A atividade pode ser ponde ao Mi-Pá e ao Si-Dó devem ser proporcio-
feita simultaneamente junto com o piano - as nalmente menores). Toque cada nota da escala
crianças-podem reagir às variações que você de Dó Maior- os alunos devem caminhar pela
reproduzir, ou de forma que os alunos ouçam escala andando no degrau correspondente a
primeiro toda a sequência e se Inovimentem cada grau. Inicialmente, combine fragmentos
em seguida. em graus conjuntos e depois utilize melodias
comçgraus dijuntos.

Liddv Chiaffarelli Mignone: sensibilidade e renovação no estudo de música 117


tras um

É na fase do trabalho que a criança passa a realizar diversas atividades de


associação entre os elementos musicais já trabalhados e a representação
com os símbolos musicais respectivos ã escrita das durações e alturas
dos sons. Para tanto, utiliza-se o material da caixinha, conforme descrito
anteriormente na Seção 3.3.2, com os cartões de tamanho proporcional
para as figuras de ritmo e som e cartões com notas musicais. Quando os
alunos ouvirem determinado som, devem selecionar o cartão adequado.

Execute sequências rítmicas com valores iguais e combinações varia-


das. Após os alunos comporem a sequência de cartões registrando
o ritmo tocado, registre no quadro a frase rítmica. Em continuação,
toque para que, em seguida, os alunos ouçam e identifiquem qual
frase está registrada.
1. .logo das Quatro Nleninaslosl: depois de efetuada a atividade descrita
na fase de jogo, os alunos podem realizar essa etapa. Enquanto as
crianças estão alinhadas conforme as figuras de ritmo executa-
das, outro aluno da turma deve pegar os cartões com as figuras
desenhadas e entrega-las para as respectivas crianças alinhadas.
2. "Escada do Pintor": peça para que uma criança ande sobre a escada
ao ouvir o som de cada nota da escala e outra criança a acompanhe,
apontando a nota correspondente à que está escrita no quadro. A ati-
vidade deve ser iniciada pelos graus conjuntos, para depois variar
com graus dijuntos. Para manter o interesse da turma, varie as
duplas de alunos e peça para que a turma acompanhe, verificando
se a dupla está realizando a atividade adequadamente. A mesma
atividade pode ser realizada por meio da utilização dos cartões
da caixinha. Quando o piano soar anota correspondente ao grau
da escala musical, a criança deve levar o cartão da nota corres-
pondente para a criança que está se posicionando sobre o degrau.

118 "
Ines de Almeida Rocha
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120
Inês de Almeida Rocha
Capítulo 4

Gazzi Galvão
de Sá: educador
musical e
inovador do
(movimento de
musicalização
na Paraíba

Maria Cecília de Araujo Rodrigues Torres


Dedico este artigo aos meus queridos professores do Centro Educacionai de Niterói e educa-
dores musicais Ermano Soares de Sa e Theresia de Oiiveira (in memo ria m), que, de maneira
exempiar. trabalharam, ensinaram e divuigaram o metodo Gazzi de Sa' no ambiente escoiar.
Agradeço de modo especiai aos professores luiz Carios Peçanha (Ri) e Lu-:eni Caetano da Silva
(PB), educadores musicais e pesquisadores do referido metodo, peio disponibiiidade para
compartilhar informações por meio das entrevistas por e-ma il, pelas leituras cuidadosos e
aten tas, pela troca de ideias, peio en vio de materiais e peias sugestões fundamentais para
a construçao do capituio. Agradeço também a Proffliusamara Souza peio empréstimo de
materiais e partituras de Gazzi de Sd, e o carinho dos familiares do Professor Gazzi de Sd,
na pessoa de sua nora, Profflianete ioredo de Sa' e de seu neto Cioudio ioredo de Sd, pela
autorização para que eu utiiizasse as fotos do acervo de famiiia neste artigo e peio acolhida
aos meus pedidos.

Maria Cecilia de Araujo Rodrigues Torres é doutora em Educação pela Universidade Federal do Rio Grande do Sul
(UFRGS) e mestre em Educação pela Ponrijicia Universidade Católica do Rio Grande do Sul (PUCRS). Trabalhou
durante 12 anos com o método Gazzi de Sa em aulas de musica, primeiro como aluna da escola basica do professor
Ermano Soares de Sa' e, em seguida, como professora de musica de turmas dos anos iniciais no Centro Educacional
de Niteroi. Desde 2008, .é professora do curso de Licenciatura em Musica do Centro Universitario Metodista-IPA
(Porto Alegre).
Figura 4 1 - Uilla Lobos e Arminda sentados a mesa Da direita
4.1 _Fra_, g,mentos_ do contexto para a esquerda, Iberê Gomes Grosso, Ruth Vaiiadares,
h1StÚI'ICÚ"SÚC1al Arnaldo Estreia, Gazzi de Sa, lose Vieira Brandao e Oscar
Bor etit

É importante situarmos o contexto histórico e social


no qual emergiram as ideias e propostas de Gazzi
Galvão de Sá, educador musical engajado, cujo pro-
pósito era o de trabalhar com música na escola ecom
o canto coral. Dentre as pesquisas que trazem cenas
da epoca em que o educador atuou, estão os trabalhos
de Luceni Caetano da Silva (2006, 2007), nos quais a
autora se concentra nas manifestações musicais da
primeira metade do século XX na Paraíba, nas quais
Gazzi de Sá teve papel importantíssimo, sendo, dessa
maneira, responsável “pelo intenso movimento de
canto orfeõnico na Paraíba, entre 1930 e 1940 - um Fonte Acervo particular da famllla Foto disponibilizada por meio do
Prof Luiz Carlos Peçanha (Niterói) Esta foto tambem consta da obra de
projeto criado por Villa Lobos, implantado no país Silva (2013b p 101 foto 33) com uma legenda com informaçoes sobre os
pelo presidente Getúlio Vargas” (Silva, 2007, p. 43), mas mtegrantes da Embaixada Artística Eclucaclonal em 1940 que esteve no
Uruguai e Argentina
pouco conhecido fora dos domínios do Rio de janeiro.
No mesmo sentido de abordar as contribuições
do método de Gazzi de Sá para o movimento de canto
orfeõnico do Brasil, especificamente durante as déca-
das na Paraíba citadas no parágrafo anterior, e as
suas contribuições para o campo da educação musical
no país, compactuamos com as ideias de Silva (2007)
quando a autora chama a atenção para o fato de que:

Gazzi Galvão de Sá: educador musical e inovador do movimento de musicalizaçao na Paraiba


O Brasil desconhece que houve na Paraiba um forte ¡ I I

4.1.1 Materiais e apontamentos


movimento do canto orfeônico, semelhante ao do Rio
de janeiro. Em nosso Estado, quando sefala no termo' O livro Musicalizaçdo: método Gazzi de Sa e a
“canto orfé`onico” pensa-se em Gazzi de Sá, que, infe- obra Apontamentos para alunos extraídos do livro
-| ,nr ..-1.11 .| [I I O H-I' jj d ._ 'I Ç
ltzmente, e apenas lembrado por uma geraçao mais Mustcaltzaçao (s. ) foram os materials que su
antiga. (Silva, 2007, p. 41) O
diaram a elaboração deste capítulo pelo olhar de
Dessa maneira, destacamos a importância da uma aluna e posteriormente professora de música
apresentação de alguns dos aspectos pedagógico-mw da escola de ensino fundamental, que conheceu,
sicais desse processo de musicalização na escola, pois, aprendeu e trabalhou, entre os anos de 1962 e 1978,
de acordo com Gazzi de Sá (1990, p. 18), ela “caminha na cidade de Niterói (RI), a pedagogia e o método de
sempre da experiência com o fato sonoro para a educaçao musical do professor, pianista e composi-
consciência desse fato”. tor Gazzi de Sá.
Em sua pesquisa de doutorado sobre as contri- Destaco ainda a obra Gazzi de Sa e o prelúdio da
buições de Gazzi de Sá no cenário cultural de joão educação musical na Paraíba (1930-1950), de autoria de
Pessoa, Silva (2007) também ressalta que “a , Luceni Caetano da Silva (2013b) como uma leitura
na Paraíba, funciona nos moldes do órgão Sema, exemplar que me possibilitou conhecer fatos e rever
no Rio de janeiro. Os professores na Paraíba eram outros da vida de Gazzi de Sá e da história da música
orientandos por Gazzi de Sá, que também preparava e da expansão musical na Paraíba nas décadas de
os alunos nas escolas e os ajudava nas concentrações 1930 a 1950. Silva (2013b, p. 27) chama a atenção em
orfeõnicas [...]” (Silva, 2007, p. 44). seu livro para o fato de que
Na revisão de literatura da educação musical no
Essa expansão musical éfruto de um trabalho muito
Brasil, encontramos outros trabalhos que fazem refe-
bem estruturado por um professor que se responsabi-
rência ao método do educador paraibano, tais como o
lizou, em nosso estado, pelo movimento nacional de
livro de Ermelinda Paz (20001), Thiago Vaz Cruvinel
musica estabelecido no pais, inclusive com o ensino
e Flávio Cardoso Carvalho (20102), entre outros.
obrigatorio de musica nas escolas, preparando exce-
lentes alunos para ajuda-lo nessa tarefa afim de dar
Q : ~: ñ : f- 1
continuidade aos seus ensinamentos.
1 Para saber mais sobre a obra: PAZ, E. A. Pedagogia musical brasileira no sec. III:
metodologias e tendências. Brasilia: Musimed, 2000.
Entre os fundamentos educacionais que embasa-
2 CRUVINEL, T. li.: CARVALHO, F. C. Canto brasileiro: sua presença em periódicos de ram o trabalho do autor nascido em joao Pessoa estão .Ff

música. Horizonte Cientifico, Uberlândia, v. 4, n. 1, 2010.


a didática e a clareza na organização de propostas

124
Maria Cecília de Araujo Rodrigues Torres
musicais para a sala de aula. Gazzi de Sã afirma que 4.1.2 Desenvolvimento do método
ii A
o sentimento despertado pela vivencia do escolar
com a música o conduz por etapas à consciência dos Quanto ao desenvolvimento do método de Gazzi de
elementos nela contidos” (Sá, 1990, p. 18). Sá e do canto orfeônico na Paraiba, as pesquisas de
Cabe ressaltarmos a importância desse método Silva (2006, 2007) desvelam que esse movimento foi
para o ensino do canto orfeônico em colégios e gru- idealizado em 1932, “ficando sob a responsabilidade
pos corais. Iosé Vieira Brandão, pianista, compositor do professor Gazzi de Sã elaborar a programação das
e professor catedrático do Conservatório Brasileiro atividades e encaminha-las ao setor competente para
de Música (CBM), afirmou que: “De fato, sua técnica as providências necessarias” (Silva, 2007, p. 43). Coube,
de ensino surpreende pela lógica com que explica os portanto, também ao professor Gazzi de Sá “a criação
fenômenos da formação da consciência de som, ritmo, da SEA, concretizada pela Lei n° 16, de 13 de dezembro
harmonia, fraseologia etc.” (Brandão, citado por Sá, de 1935, E mais tarde reorganizada pelo Decreto-Lei
1990, p. 10). Nesse ponto de nossas considerações, é n” 961, de 11 de fevereiro de 1938” (Silva, 2007, p. 43).
importante enfatizar que Gazzi de Sá comenta que
não tem a pretensão de dar receitas de como lecionar,
mas sim de trazer a experiência e, com isso, possibi-
litar outras formas de “iniciação à leitura e escrita
musical” (Sá, 1990, p. 11).

S Uma outra contribuição da proposta de Gazzitde


Sá É o foco no uso da voz, no cantoe no processo
de musicalização, que proporciona aos alunos um
conhecimento de diversos aspectos da música,
prescindindo do uso de armadura de clave, clave
ou compasso, escolha que possibilita uma indepen-
dência do fazer musical. O método utiliza a pauta
como elemento paraa visualização da altura do
som, não utilizando clave especifica para a fixação
dos sons; o educador optou por esse tipo de leitura
justamente para facilitar o estudo, com a pauta
progressiva até o estabelecimento do pentagrama.

Gazzi Galvão de Sã: educador musical e inovador do movimento de musicalização na Paraíba 125
4.2 História de vida musical piano, sem a aprovação da família. Após Gazzi de
.gš re
Sá ter iniciado sua carreira nas aulas de piano, o
ist* rsQi anita
5 ini-
-Ei .`“'
ensino desse instrumento assumiu um caráter de
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as ra äitxiã-"_W :rc-,rà
seriedade profissional na Paraíba. Com isso, uma
mudança pedagógica e musical ocorreu e logo se
Em 13 de dezembro de 1901, na antiga Paraíba do
divulgou “a novidade”, que incluía as obras de Bach
Norte, hoje joão Pessoa, nasceu Gazzi Galvão de Sá.
no ensino de piano do estado, como ressalta o musi-
Estudou violino no Colégio das Neves e, em certa
cólogo e professor de História da Música e Prosódia
ocasião, pediu a sua irmã, que tocava piano, que
Musical Adhemar Alves da Nóbregai, no Prefácio da
lhe ensinasse os fundamentos da clave de Fá e da
obra Musicalização: método Gazzi de Sá (1990, p. 5). Em
leitura musical. Ao terminar seus estudos secun-
1926, casou-se com Ambrosina Soares, carinhosa-
dários no Colégio Pio X, na Paraíba, transferiu-se
mente chamada de “Santinha”, com quem o educador
para Salvador, onde se matriculou na Faculdade
fundou, em 1931, uma escola de música que viria a
de Medicina, fazendo uma escolha associada a sua
se tornar a Escola de Música Anthenor Navarro, que
vocação, para assim garantir sua ida ao Rio de janeiro
existe até os dias de hoje na cidade de joão Pessoa
e poder desenvolver seus estudos musicais. Entre
(Silva, 2007, p. 47).
os professores com quem estudou quando então se
instalou na capital fluminense, estão o professor
Destacamos aqui a relação de Gazzi de Sá com a
Oscar Guanabarino.
prática do canto coral ea promoção da primeira
"'r v-E
audição com os alunos de sua escola em agosto de
".:z-‹. -z1,.z ,»- i“iâš`i ;i*'“'iâ ” Í.`._¿.' .-:i*'¿_ê¡ .. as_- z ifi äà- ti
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1931. A partir dessa data, o educador começou a
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Ea-‹s~‹,~.,.r 'as
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escrever arranjos sobre motivos nordestinos que
tinham uma função didática como repertório coral.
Gazzi de Sá retornou ã Paraíba a chamado de seu
r ~ z ¬""_'¬u- z E _ ¬
pai para trabalhar na companhia telefónica da qual
3 Transcrevo nota explicativa do livro Musicolizoção... [1990, p. 9): "Adhemar Alves
era dono e presidente. Meses depois, demitiu-se do da Nóbrega, admirador e ez-aluno de Gazzi de Sá, antes de seu falecimento em
ii 5! 1929 elaborou um prefácio para as übras Completas de Gazzi de Sá, estrutu ra ndo-as
ingrato labor e assumiu o cargo de professor de
em seis volumes com a colaboração do amigo Gerardo Parente".

126
Maria Cecilia de Araujo Rodrigues Torres
isa-193: ara
teorafria para o Rio de
iaaešro e o vieste
coral com Villa-~Loloos

Gazzi de Sá foi para Rio de janeiro fazer o curso de Pedagogia


“Aperfeiçoamento do Ensino de Canto Orfeónico” dirigido
por Villa-Lobos, e ali fixou residência temporariamente,
integrando o Coral de Professores da Superintendência de
Educação Musical e Artística (Sema). Em abril de 1936, o músico
paraibano criou em sua cidade natal o Coral Villa-Lobos no
intento de difundir o canto coral na Paraiba. Esse evento, de
acordo com Silva (2007, p. 47), foi um marco fundamental
para o desenvolvimento musical da região.

1ãa?--“i me:aura de tdi % a para ri š e


.ianeirn

Gazzi de Sá mudou-se definitivamente com a família para


o Rio de janeiro em 1947 e passou a lecionar aulas de piano,
tornando-se, assim, professor da Escola Nacional de Teatro e
do Conservatório Nacional de Canto Orfeôníco (CNCO), onde
lecionou Apreciação Musical até o ano de 1964. Durante sete
anos, atuou como diretor da Escola Maria josé Imperial da
União das Operárias de jesus, quando trabalhou com seu
método, estimulando seus alunos a reger coros e a realizar
atividades musicais. Em 1952, a Escola de Música Anthenor
Navarro foi inaugurada, bem como o Conservatório de Canto
Orfeónico da Paraíba. Esses anos no Rio de janeiro, de acordo
com a pesquisa de Silva (2007), foram “totalmente dedicados
ã música, onde desenvolveu seu método de musicalização,
Il'

foi reconhecido como grande professor e fez muitos amigos


(Silva, 2007, p, 43), Credito Acervo pessoal da fam|l1a

Gazzi Galvão de Sá: educador musical e inovador do movimento de musicalização na Paralba 12


Em entrevista* realizada on'-lina em janeiro de de passar de geração a geração, deve ter havido
2013, Luceni Silva5 (2013a) comenta sobre a par- modificações em seu conteúdo” (Silva, 2013b, p. 1).
tida do maestro e professor para o Rio de janeiro:
“a Paraiba ficou sem Gazzi de Sá muito cedo, antes 4.2.1 Produção musical e pedagógica
que ele pudesse aprimorar seu método e fixá-lo na
Paraíba”. Silva complementa em suas reflexões Gazzi de Sá, no decorrer de sua trajetória como pro-
que, com seu falecimento, Gazzi de Sa deixou na /*Ii
fessor, regente e compositor, deixou um rico acervo
Paraiba seus alunos(as), principalmente na Escola musical com composições próprias, como a melodia
de Música Anthenor Navarro, que apesar do esforço de “Corre, corre lacoxía” (2a versão, Rio de janeiro,
1975), feita com base em uma letra de brincadeira
falada do folclore do Nordeste e dedicada a seu filho
4 Roteiro da entrevista com as perguntas enviadas e respondidas por e-moilpara Ermano Soares de Sá, ou a música “Trem de ferro”
os professores Luiz Carlos Peçanha (Hll e Luceni Caetano da Silva (PB), conforme
(2“ versão, Rio de janeiro, 1970), que tem como base
informações no texto:
1- Quais aspectos pedagógicos e musicais destacaria no Método de Musicalização a letra da poesia homõnima de Manuel Bandeira.
de Gazzi de Sã?
Essa segunda obra foi dedicada ã Professora Theresia
2 ~ Quando teve conhecimento e contato com a Metodologia dele?
3- Quais foram as contribuições do Método Gazzi de Sá na sua formação musi- Oliveira, educadora musical paraibana e também
cal como professor/a de música e pesquísadorfa?
ex-aluna do professor Gazzi de Sá, que trabalhou
4- 0 que comentaria sobre o Método em termos de trabalhar com a educação
musical na escola regular? e divulgou seu método durante décadas no Centro
5 - Que outros comentários gostaria de fazer sobre o Método Gazzi de Sã a partir
Educacional de Niterói.
das suas pesquisas?
Luiz Carlos Franco Peçanha iniciou-se na música como cantor no Coral do Centro Entre os inúmeros arranjos para corais e grupos
Educacional de Niterói (CENj, sob a direção do professore maestro Erma no Soares
vocais com base em melodias do folclore e, principal-
de Sá. Formado em licenciatura em Educação Artística, com habilitação em Música,
pela Universidade Federal do Flio -de Janeiro [Llniiiiol e mestre em Musicologia pela mente, do folclore nordestino, destacamos algumas
mesma instituição. É professor de Educação Musical e regente coral do Centro
peças como “A maré encheu” (dedicada a sua esposa
Educacional de Niterói, atuando em cursos sobre o Método Gazzi de Sã.
5 Luceni Caetano da Silva égraduada em bacharelado em Música -flauta transversal Santinha), “Ó mana deix'eu í, Glória da Lapinha” e
(1905), especialista em ãrtes{1997j e doutora em Letras, na area de Literatura e Cultura
“Rosa Amarela”, entre outras, e composições como
(2006), todos os titulos obtidos pela Universidade Federal da Paraiba, instituição
em que é professora adjunta do Departamento de Música desde 1985. Ensina na “O meu engenho é de Humaita .
extensão, graduação e pós-graduação de Música, é coordenadora do projeto de
extensão da Orquestra Sinfónica Jovem da UFPB desde 2000, coordena o grupo
de pesquisa Leitura Musical na Paraíba {Lemupa], que desenvolve estudos sobre
a história da música e da educação musical da Paraiba das décadas de 1960 a 1990.
Tem experiencia na área de artes em projeto social, com énfase em instrumentação
musical. Atua principalmente nos seguintes temas: educação musical e história da
música da Paraiba com Gazzi de Sã e o canto orfeónico das décadas de 1930 a 1950.

128
Maria Cecilia de Araujo Rodrigues Torres
Figura 4.3 -« Gazzi de Sã com alunos do
4.3 Ideias inovadoras e o movimento de canto Seminario Arquidiocesano na Paraíba
orfeõnico (Edu)

Entre as ideias inovadoras do método criado por Gazzi de Sá, chama


a atenção, no que se refere ao trabalho de musicalização em escolas
regulares e ao trabalho em grupos corais, a organização do índice
apresentado no material utilizado com uma sequência bem detalhada
de cada conteúdo e dos conceitos musicais. Nesse material, os termos
são apresentados com uma respectiva explicação e um exemplo de
exercício prático musical correspondente a ser desenvolvido com os
alunos. Entre os materiais sobre o método, apresentamos também Crédito: Acervo pessoal da familia
a Coletânea de solƒejos, hinos, canções e cânones, com exercícios para Figura 4.4 - Capa da obra Musiealização
subsidiar as práticas musicais durante as aulas. método Gazzi de Sri
Sobre as considerações do material Apontamentos para o aluno
extraídos do Livro “Musiealízaçdo”, selecionamos a seguinte passagem:
“Toda música possui dois elementos principais: som e ritmo” (Gazzi de
Sá, s.d., p. 1, grifo nosso). já na introdução do seu livro Musicalizaçdo:
método Gazzi de Sd (1990, p. 18), o autor destaca que, “na grafia apre-
sentada ao escolar, os dois elementos formadores da música - som e
ritmo - são justapostos para efeito da leitura em separado, de início,
fazendo-se a associação posterior ã assimilação dos dois elementos”.
Entre as muitas contribuições do método, Paz (2013, p. 45) pontua que
.z
os exercicios e procedimentos pedagógicos propostos por Gazzi são
mecanismos que visam a facilitar e acelerar a aprendizagem musical
de modo interessante”.

Fonte: Acervo pessoal da autora.

Gazzi Galvão de Sá: educador musical e inovador do movimento de musicalização na Paraiba


Em consonância com esses aspectos do método, já na obra Musicalização: metodo Gazzi de Sri (Sá,
apresentamos um excerto da entrevista realizada com 1990), o autor apresenta uma sugestão de organização
Silva (2013a), no qual a autora pontua que, dando conti- e definição da unidade de movimento, que “é alguma
nuidade a sua pesquisa sobre a história de Gazzi de Sá: coisa semelhante ã regularidade do pulsar dos nossos
corações, assegurando-nos a vida e também como ela
En trevistei algumas alunas dele e elas sempre mefala-
deve ser representada graficamente registrando as
vam que ele tinha um método de ensinoƒantdst-ico, que
nossas emoções” (Sá, 1990, p. 22-23). Essa unidade é
não tinha como não aprender música com ele. Tanto
representada por uma haste pontuada ou sem ponto,
é que uma delasficou tdo empolgada contando como
que corresponde ã sílaba “tá”. Na obra citada, Gazzi
ele ensinava que me deu uma aula sobre o ciclo das
de Sá também aborda diferenças de andamento na
quintas, demonstrando como ele explicava (no ano da
unidade de movimento, que poderá ser lento, mode-
entrevista, ela estava com 76 anos).
rado ou rápido. O assunto é complementado com as
A seguir, trataremos do tema método de questões de acentuação das sílabas, com as unidades
musicalização. leves associadas a um “tá” agudo, e as pesadas, que
são representadas por um “tá” grave.
4.3.1 Organização do método: conteúdos As primeiras páginas do material contêm expli-
musicais cações e exercicios práticos para o aluno fazer logo
após a leitura dos trechos e possibilita que a noção
Um dos materiais organizados com o método de Gazzi de tõnica e dominante possa ser trabalhada.
de Sá consiste no já citado Apontamentos para o aluno
extraídos do Livro “Musicalização”, tendo sido utilizado 4.3.2 Uma breve visão do material
nas aulas de música de uma escola de educação básica
na cidade de Niterói. O livro Musicalizaçdo: método Gazzi de Sd (Sá, 1990)
O referido material era composto de um índice está organizado em capítulos com conteúdos musi-
organizado por 36 tópicos, com vários assuntos, ini- cais, exercícios práticos, gráficos e desenhos explica-
ciando com o ritmo e a tõnica, passando pelos temas tivos. Seguem alguns exemplos a seguir, cujo objetivo
da divisão da unidade, da prosódia musical, até fina- consiste em apresentar alguns tópicos desse material,
lizar com o ritmo, o ponto de aumento e o modo como os conceitos e o uso dos gestos pendulares e
maior - como na série “5_ 6_ 7__ (graus com um traço circulares:
subscrito pertencem ã série grave) 1 2 3 4”.

130 Maria Cecilia de Araujo Rodrigues Torres


Quadro ea - Exemplos de conteúdos do método Gazzi de Sã
------ z;-; _ ---r-:--¬--:-- ;- -- -. 7 ---¬‹--¬‹-z---zz-;_ _ _ --:--: ---- -:-:;z___- ,¡ _ -¬----¡-›------_ __ .

- :. -: _ ___ :: za-t-..z_ _; ,L z____-' - . __ =.


4 __ . : :I: ______
. J
Ritmo Os gestos: pendular e circular Dois gestos pendulares e dois gestos
I (p. 20 e21) circulares
¡ Unidade de movimento ¡ Lento, moderado ou rápido
(semelhante ã regularidade do i
pulsar dos corações) (p. 22)
~ *E " " rI
Unidade sempre representada Noção de agudo e grave I

pela sílaba “tá” e por uma figura de


haste vertical ou de haste vertical
pontuada
Figura da haste vertical e da haste Apresentação da regularidade, que é .
vertical pontuada I. (tdi uma das condições para a execução
Noção de drsis (como os gregos das unidades.
chamavam a elevação da voz) e tésis Uso de sílabas gramaticais.
' (abaixamento da voz). A diferenciação entre td agudo ou
grave, cujo objetivo consiste em fazer
com que o aluno, desde o inicio do
processo de musicalização, articule
os compassos fazendo o primeiro
tempo pesado, em vez de forte;
eleve, em vez de fraco.
A função Conceito de tônico 1
dos sons Graus da escala
Escala padrão
Fermata sons disjuntos e conjuntos
Fonte: 5é,1990, p. 22-23.

No rol dos vários outros aspectos que merecem ser destacados


sob o ponto de vista da pedagogia musical desse método e das suas
contribuições para o processo de musicalização de alunos na escola
regular, Paz (2013) destaca que “o método do paraibano Gazzi de Sá foi
por algum tempo o único no Brasil, que se baseia no sistema relativo”
(Paz, 2013, p. 26, grifo nosso), propiciando, assim, um trabalho sem
fixação de notas na clave e trabalhando com graus.

Gazzi Galvão de Sá: educador musical e inovador do movlmetlta de musicalização na Paraíba


4.4 O método e algumas aplicações práticas

No amplo conjunto das aplicações práticas e na perspectiva de traba-


lho com o método na escola de educação básica e em aulas de música,
ressaltamos aspectos elencados por Luiz Carlosš -Franco-_Petç anha”,
educador musical e maestro que teve contato com o método na escola,
ao pontuar que, “com dinamismo, eficiência e extrema profundidade,
o desenvolvimento da escrita e leitura musical acontece [...]” para o
aluno e possibilita que este seja um “participante ativo em todo o pro-
cesso de aprendizagem” (Peçanha, 2012).
Em entrevista realizada por e-mail, Peçanha (2012) enfatiza que
esse trabalho foi “idealizado com o objetivo de facilitar o aprendizado
da linguagem musical”. Assim sendo, “o Método de Musicalízação
Gazzi de Sá, calcado na prática do canto coral, tem como base a sim-
plificação gráfica”.
Sobre a abordagem dos conteúdos no método, Peçanha (2012)
enfatiza que “é feita de maneira que a interação professor-aluno se
dá de forma natural, fazendo do aluno um participante ativo em
todo o processo de aprendizagem”. Destaca ainda que, nesse sentido,
o método de Gazzi de Sá foi elaborado com a intenção de viabilizar
um trabalho musical “conjunto e integrado ã alfabetização, na medida
em que os nomes das notas tradicionais são substituídos por núme-
ros” (Peçanha, 2012), escolha que facilita o aprendizado das crianças
que estão em fase de alfabetização, pois os alunos têm de lidar com
números que “correspondem aos diferentes graus da escala, e as
figuras do ritmo (semínima, breve, colcheía etc.)” (Peçanha, 2012).

132 Maria Cecilia de Araujo Rodrigues Torres


4.4.1 Especificidades do método para a prática musical
em sala de aula

Destacamos que a prática de cada pequeno exercício com uma série


de unidades, ora com o gesto pendular, ora com o circular, já possi-
bilita a fixação dos conceitos teóricos apresentados em Apontamentos Figura e..5 - Capa da partitura de “Corre,
corre lacoxia”
para o aluno extraídos do livro “Musicalizaçdo”, compilados num total i' "C llll I
de 76 páginas em tamanho de um caderno de música, preenchidas serra serra Issaxis
I

'
frente e verso, numa mescla de exercicios rítmicos com as sílabas
“tá”, para unidades e para a primeira parte dos múltiplos, como os I

da
quartos de tempo das unidades, e “ti”, usadas para representar as
metades das unidades, por exemplo.

A proposta de usar números para indicar os graus da escala é um IIIIGÉ il 'IIIII ll II.

5!

dos aspectos principais desse método, pois, dessa maneira, Gazzi


Fonte: Partitura impressa da música “Corre, corre
de Sá já apresenta o conceito de tônica logo nas primeiras páginas lacoxia", do acervo da Prof? Jusamara Souza.
e ressalta que os nomes das notas poderiam “ser substituídos por
números”, passando, assim, a serem chamadosde graus da escala e Figura 4.6 - Capa da partitura “O mana
a possibilitar que os alunos tenham a liberdade de trabalhar com deix`eu í”
`\_ lz

diferentes tonalidades. Um dos grandes achados de Gazzi de Sá /?JIú:'ãl'_-'¿_fJ-“É."l'7 ;fsÂ=‹1.¢.ø¢-5:75,-zur

foi a maneira com a qual as funções tonais são abordadas. Nesse


9. _ __, . '/.f I' __ _..
'_-'_'_-_-4. 'I - _.-I ' 1"' ._
‹-'“'_;4¡T.I_7'-_. ' ¡f .'- '_ __.- -- ___
I _Í:_.z: -

sentido, os termos apelante (para os sons de função dominante) e l:


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l __r”-'r_`=¡" __.`:z¬:
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resolut-ivo (para os de função tõnica) são bons exemplos. fi " ff. 1” _ “':

j cf zrrzzrztoe _
Para Peçanha (2012): 1
I
peca” ser a
___ _.1;§____:f. ICE.-!'¿"'.2"z' .¿7.¢' Efif

A estruturação dos capitulos do Metodo, alternando o estudo do “ritmo” e


' -.-f_-.-.-.-.- -_-_-_--_-_ -------------------- - -_-.-_;
- - -z-_-.-:;z-.-.-:.-:.-.-.-.- -.-.-.-_-.-.-.- -.-.-_-_-.-.-.-.-.-_-_- -¬.- ._ ¬.- _- - _- _- _- _- - __ _- _ _-_-4.-_-az-uz-H-H ... sz..-v-1.-...M u _. ....111

do “som”, aliada a uma grafia musical simplificada,ƒaz com que -depen- Fonte: Partitura impressa da música “Ó Mana
dendo da habilidade e competência do professor; obviamente - o estudo se deix'eu Í", do Folclore do Nordeste, com
harmonização de Gazzi de Sã, João Pessoa (1941),
torne cada vez mais prazeroso, lúdico e, ao mesmo tempo, absolutamente do Acervo pessoal da Prof? lusamara Souza.
consistente, detalhado e profundo.

Gazzi Galvão de Sá: educador musical e inovador do movimento de musicalização na Paraíba 133
Peçanha (2012) explica que conheceu o material quando entrou
“para o Coral do Centro Educacional de Niterói (CEN)”, complemen-
tando que “o prof. Ermano, meu grande e querido mestre, sempre o
utilizava, não só nas aulas de Educação Musical [...], como também
nos ensaios do Coral”. Essa afirmação reforça a questão do método
para o trabalho com o Hino Nacional Brasileiro, por exemplo, que
era solfejado nas aulas com os graus da escala, cantado com a letra
e com os nomes das notas, em um exercício musical de precisão
rítmica e melódica.
Em outra reflexão, Peçanha (2012), a respeito do método de Gazzi
de Sá, traz um comentário da educadora musical paraibana Theresia
de Oliveira (1924-2004), ex-aluna do professor, que enfatiza que, “sem
alterar nada do rico conteúdo musical (...), lo método de Gazzi de Sá
oferecia] ao aluno conhecimento amplo dos mais diversos aspectos da
música: ritmo, melodia e harmonia, sem precisar de compasso, clave
e armadura” (Peçanha, 2012). Peçanha também ressalta o comentário
de Theresia de Oliveira ao pontuar que o repertório utilizado pelo
educador paraibano engloba “solfejos de canções folclóricas, cânones
e hinos, passando gradativamente às músicas corais de diferentes
épocas e estilos” (Peçanha, 2012).
Ainda em relação ao trabalho de Gazzi de Sá, Silva (2007), em artigo
sobre o método Gazzi de Sá, ressalta que, “indiscutivelmente, Gazzi
de Sá foi um grande educador musical. Infelizmente, a Paraíba não
soube compreender a grandiosidade do seu trabalho, deixando que
fosse embora um filho da terra que tanto lutou em favor da música
no Estado” (Silva, 2007, p. 52).

134 Maria Cecília de Araujo Rodrigues Torres


4.5 Possibilidades de trabalho na aula 1. Marque o- ritmo e pronuncia as palavras ao
de música da escola regular mesmo tempo e em seguida trabalhe em duplas;
um colega marca o ritmo e o outro fala. Substitua
De que maneira podemos organizar e propor um E as palavras por outras escolhidas pela dupla:
plano de aula de música para uma turma de escola de i`1.II-'LI 'L`I.
ensino fundamental que conta com aulas regulares A-má]-ga-ma Tro-va vi-são
de música? Com base nessa pergunta, apresentare- 2. Coioque ritmos contendo dobro nas seguintes
mos algumas ideias e possibilidades de atividades palavras:
musicais que podem subsidiar uma aula de música
fundamentada no método Gazzi de Sá. Realmente principal tulipa flor
3. Coloque os ritmos, contendo dobro, que corres-
artists asda
1.-ii*
'_ aíaarsssem riscas
Jl¡1¡l1'ú1i.\ ífl
pondam às expressoes a seguir:
.nu

cria-são rausisai
Troféu de glória O sibilar dos ventos

.Ii Contextualizaçãoz trabalhe com uma turma a) Após essa etapa de associação de palavras e
2 escolar do ensino fundamental que já tenha ritmos, realize uma conversa rítmica, um
aulas de música, na faixa etária entre 7 e 11 anos. diálogo com ritmos que explorem diferentes
,D Metodologia e atividade: organize uma sequên- sons como os de canetas, palmas abertas,
cia de diversas palavras com duas, três e qua- palmas fechadas em concha e palmas com
tro sílabas. Reúna as palavras formando frases a ponta dos dedos.
e associe a figuras rítmicas que representem b) Crie um trecho rítmico para trabalhar com
unidades e dobros. A seguir, apresentaremos os alunos a criação de 8 compassos com
alguns exemplos retirados e adaptados do livro 4 tempos cada um (quaternário), explorando
Musicalízação: método Gazzi de Sd (Sá, 1990, p. 38- as figuras rítmicas de unidades, metades e
39) para trabalhar com a unidade (I) e dobro (L). dobros. Ao terminaram, os alunos podem
Exercicios de adaptação de palavras e de expres- criar uma letra para esse trecho e dar um
sões aos ritmos contendo dobros.: titulo a essa criação, apresentando-a em
seguida para os demais colegas da sala.
Gazzi Galvão de Sá: educador musical e inovador do movimento de musicalização na Paraiba 135
Enumere os compassos e, após repeti-los movimentos e associando as sílabas junta-
várias vezes na sequência, explore a forma mente com a realizaçao dos gestos.
canónica com dois grupos de alunos, que Quando fizer o gesto pendular, pronuncie
devem executá-la, cada equipe começando as sílabas “tá” (dentro) “ti” (fora) algumas
em momentos diferentes. Enumere as entra- vezes para os alunos. r
das dos grupos e, aproveitando o ensejo, Faça o mesmo para o movimento circular,
explique o que é um cãnone e pergunte se desenhando um círculo no ar e repetindo as
algum aluno lembra de algum exemplo para sílabas “tá-tê-tê”, várias vezes. Conte quan-
cantar.. tas sílabas os alunos falaram atê completa-
Explore um exercício com solfejo musical. rem um círculo completo e explique que a
Nesse caso, você deve se perguntar: Qual sílaba “tá” deve ser dita sempre que a mão
será o repertório a ser utilizado? Que música estiver na parte baixa do circulo er que o
e estilos escolher? Uma sugestão: opte por “tê” e o outro “tê” devem ser ditos durante
uma melodia conhecida dos alunos e traba- o restante do círculo. Os gestos pendular
lhe com a canção, com os graus e o solfejo. e circular têm a função de fazer com que
Ao final dessa aula, destaque quais princí- o aluno, desde o início e de forma lúdica,
pios pedagógico musicais do método Gazzi tenha consciência das divisóes binária e
de Sá foram trabalhados nessas atividades ternária, que serão posteriormente cha-
musicais. Analise o tipo de avaliação de madas de compassos simples e compostos,
aprendizado mais adequado para sua turma, respectivamente. -
ressaltando aspectos como a leitura musi- Em uma etapa seguinte, peça para que as
cal e os exercícios que envolveram ritmo, crianças se locomovam pela sala enquanto
divisão de tempo e harmonia. fazem o gesto circular ou pendular e acompa-
nham diferentes melodias. Você pode usar
irsissšisar os na É
ä
es- ce-'*s iii* um repertório variado de músicas folcló-
e aârtnš itii ricas ou populares, assim como trabalhar
com as sugestões de um repertório trazido
,D Turma: 1° ou 2° ano do ensino fundamental. pelos alunos para essa atividade, viabili-
Ji Metodologia e atividade: trabalhar com os zando o trabalho com as divisóes binárias
gestos pend-ular e circuiar, executando os e ternárias. s ç t

Maria Cecilia de Araujo Rodrigues Torres


Finalizamos destacando que o método Gazzi de
Sá traz importantes contribuições para o campo da
educação musical, tanto no que se refere ao fazer
musical em aulas de música na escola de educação santas; casofilcêfqueirarnn
básica como no campo das graduações em música, 0
seja para as licenciaturas, seja para bacharelados,
as zàrfisfl dcvssraufi
pois trabalha com conceitos musicais fundamentais, das -melodias-eâiíor ouvi`do zabsolutoi-e-faz refertência.
englobando a leitura e escrita musical, o trabalho ao mêtodof'Ga.zzidesiSiá:. 0 s ' F s
com um repertório do folclore e a compreensão dos eoMas,j.ra; Baratas, az rsausnnssmu.abczúniufzmzmzé
diversos fenômenos musicais. Certamente este capí- i relativo? Relativamente absoluta? Enrendiendusas notas
t ç da Irleioclfail Dis-ponivelzem: <http:/fÍvvww.seer.unirio.
tulo não teve a pretensão de esgotar as abordagens br[index~.phpfcoloquiofarticle/viewf5-6>-. Acesso em:
musicais e a riqueza de propostas desse método e, r . 14 abr. 2015. ' r
dessa maneira, convida os leitores a buscar outras t ~ Para saber mais sobre -as divulgação do método
pesquisas e leituras a respeito do método Gazzi ÍGazzi de Sá no Rio deiIia11eiro:s 0 r
de Sá. INFORMATIVO ELETRÔNICO MENSAL [da] Associação
-B.:ra_sileira de educação Musical, tn. 53, out. 20-09.
i Disponível em: <-http;//iwww.abem:educacaomusical.
s sorrgfbr/Mas~tersƒinformativos___2009/informativo_53_
-ii â .outubro.pdf>. acesso em.:-14 abr. 2015.

Para conhecer um plano de aula que faz refe-


rência ao método Gazzi de Sã para trabalhos em
sala de aula na escola regular: r ç t
1viASQUIO,iiL. E. Música: introdução à notação gráfica-
duraçõesf e dinâmicas. 30 ago. 2010. Disponível em:
kzhttp://portaldoprofessor.mec.govbr/fichaTecnicaAula.
ç html?aul1a:22094›. Acesso em: 14 abr. 2015.

Gazzi Galvão de Sá: educador musical e inovador do movimento de musical`iaaç,ão na Í*'aÍi*a.i.b.a . _ 5' 1'_3‹.'_,`¢'_
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138 ' Maria Cecilia de Araujo Rodrigues Torres


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Teca Alencar de Brito é doutora e mestre em Comunicação e Semiótica pela Pontifícia Universidade de São Paulo
(PUC-SP), bacharel em Piano e licenciada em Educação Artística, com habilitação em Música, ambos pela Faculdade
Paulista de Musica. Estudou e conviveu com Hans-Ioacbim Koellreutter ao longo de mais de 20 anos. Professora e
pesquisadora no Departamento de Música da Universidade de São Paulo (USP),fundou, hd 31 anos, a Teca Oficina
de Música, nucleo de educação musical, em São Paulo, voltado aƒormação de crianças, adolescentes, adultos e
educadores. Autora de livros e artigos na area, produziu sete CDs apresentando a produção musical de crianças
e adolescentes da Teca Oficina de Musica. É vice-presidente do Fórum Latino-americano de Educação Musical
(Fladem - 20152017).
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5.1 Música e consciencia conscientização do novo. Nesse sentido, o novo


conceito de tempo anunciado anunciado pela física
Para Hans-Ioachim Koellreutter (1915-2005), compo- moderna foi um dos aspectos priorizados em suas
sitor e educador musical alemão naturalizado bra- propostas.
sileiro, a música, como uma manifestação da cons-
ciência, comunica ideias, pensamentos, conquistas 5.1.1 A interdependência entre a música,
e invenções humanas, sempre em um contínuo e as ciências e as demais artes
dinâmico movimento. Assim sendo, contribui para
o “alargamento da consciência e para a modificação Valorizando a interdependência entre as diversas
do homem e da sociedade” (Koellreutter, 1999). áreas do conhecimento humano, Koellreutter afir-
Vivendo em uma epoca marcada por transforma- mava que aprendera música em livros de filosofia,
ções decorrentes das descobertas da física moderna, física, história da arte, sociologia etc. A fenomeno-
do célere desenvolvimento científico e de proces- logia, especialmente sob o ponto de vista do filõsofo
sos que, de modo geral, provocaram mudanças nos francês Merleau-Ponty (1908-1961), foi, fiçl¡§üs¡¿apçmntr¡bu¡ para
modos de viver e conviver, Koellreutter dedicou-se à arao educador alemão uma impor- ,, 9
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composição musical por acreditar que novas escutas, tante referência, assim como os estu- Qt .m=:s .eta-e paras z - lundi
de novas músicas, contribuiriam para a atualização dos acerca da teoria da gestalt, da física e rfifiaçaoe
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da consciência dos seres humanos dessa nova era, moderna (a teoria da relatividade e a .¿à§¿ç,, £Éñe|¡r
marcada, de acordo com ele, por novos modos de mecânica quântica), dateoría da infor- * c
pensar e conscientizar o mundo. mação e, obviamente, do amplo uni- e
verso de conhecimentos musicais.
Se as composições musicais de Koellreutter busca- Com uma atitude curiosa e investigativa, o músico
vam traduzir sonoramente o mundo que ele per- alemão atualizou ideias e concepções, contínua e
cebia e sobre o qual refletia continuamente, suas dinamicamente, e sugeria o mesmo a seus alunos,
proposições pedagógicas, especialmente aquelas acreditando que a formação intelectual e artística
desenvolvidas nas últimas décadas do século XX, deveria ocorrer em contextos multidisciplinares.
também visavam contribuir para os processos de Nesse sentido, os cursos e projetos que o educador

Hans-Ioachim Koellreutter: a música o a educação em um novo mundo 141


orientou ou coordenou, em diversas épocas e locais, Koellreutter veio para o Brasil porque precisou
procuravam estimular o desenvolvimento de pes- deixar seu país em virtude de problemas advindos
quisas, análises e reflexões em torno de assuntos de seu envolvimento em atividades antinazistas.
diversos, mas sempre os relacionando a questões O educador contava que, depois de aqui chegar, refle-
musicais e/ou pedagógicas. tindo a respeito do que poderia fazer para retribuir a
generosidade com a qual fora recebido, concluiu que
5.1.2 O humano como objetivo da educação o mais importante seria dedicar-se a projetos cultu-
musical rais e educacionais, em razão da grande necessidade
de ações dessa natureza em nosso país. E foi o que
Koellreutter refletiu continuamente sobre os objeti- fez, deixando em segundo plano sua carreira como
vos da educação musical em suas muitas instâncias. flautista para se dedicar ã composição, ã educação
Textos produzidos entre as décadas de 1940 e 1950 já musical e ã realização de projetos diversos.
sinalizavam os fundamentos da proposta pedagogica Várias gerações de músicos, compositores e educa-
do educador amadurecida anos mais tarde, na qual dores estudaram com Koellreutter ou foram afetados
enfatizou a transformação de critérios e ideias artís- por suas ideias e realizações. O músico introduziu
ticas em uma nova realidade, resultante de mudan- no país os cursos de férias, trouxe o jazz e a música
ças sociais. popular para as escolas de música e ampliou o contato
dos músicos e estudantes com produções musicais
No que tange à formação de musicistas profissio- de diversas épocas e culturas, só para lembrarmos
nais, Koellreutter afirmou a necessidade de prepa- algumas das importantes ações propostas pelo com-
rá-los para encarar a arte como complemento esté- positor, as quais transformaram qualitativamente
tico de vários setores da vida moderna, bem como os ambientes musicais e seu ensino.
para colocar suas atividades a serviço da sociedade
(Koellreutter, 1998). O compositor alemão almejava
que a vivência da dimensão estética fosse um direito
de todos e que a experiência musical nos territó-
rios da educação também favorecesse a vivência
de questões imbricadas nas transformações do
novo mundo que ele sonhava viverse compartilhar.

142
Teca alencar de Brito
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5.2 Tfrajetórias koellreutterianas fecundo e positivo o modo de ser, de pensar e de fazer


música do jovem Koellreutter.

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Hans-Ioachim Koellreutter nasceu em Freiburg,
Alemanha, em 2 de setembro de 1915. Era filho de Logo depois de se estabelecer no Rio de janeiro, em
Emma Maria Koellreutter, que faleceu quando ele dezembro de 1937, Koellreutter começou a atuar pro-
tinha apenas 2 anos de idade, e do médico Wilheim fissionalmente como compositor, flautista e professor,
Heinrich Koellreutter, que se casou novamente dando aulas particulares e, dentre outras instituições,
alguns anos depois. no Conservatório Brasileiro de Música. Lá o educador
Em 1934, Koellreutter foi estudar na Staatliche formou, em 1939, o Grupo Música Viva, inspirado no
Akademische Hochschule für Musik. Em Berlim, cur- movimento com mesmo nome criado por Hermann
sou flauta transversal, composição e direção de coro. Scherchen na Alemanha. Em 1944, o movimento
Na mesma cidade, na Volkshochschule, participou chegou a São Paulo, estendendo-se até 1950, quando
de cursos e conferências sobre composição moderna se extinguiu.
ministrados pelo compositor Paul Hindemith (Kater, O Música Viva foi uma iniciativa significativa que
2001, p. 41). O então futuro compositor teve contato gerou desdobramentos diversos, inclusive a reação
com importantes músicos e professores, destacan- adversa de compositores nacionalistas liderados
do-se o regente alemão Hermann Scherchen (1891- pelo compositor paulista Mozart Camargo Guarnieri
1966), com quem estudou em cursos extracurriculares, (1907-1993). Estruturado em torno de três pontos bási-
cuja convivência marcou significativamente sua cos (a formação, a criação e a divulgação de músicas
formação musical e humana. Dotado de forte per- de pouca difusão e boa qualidade, contemporâneas
sonalidade, Scherchen desenvolveu grande número ou não) o movimento criado por Koellreutter iniciou
de iniciativas e atividades, das quais se sobressai suas atividades no dia 11 de junho de 1939, com o
sua intensa dedicação ã divulgação da música nova. evento intitulado Audição Música Viva, reunindo com-
A convivência com o regente influenciou de um modo posítores e alunos do músico alemão. Organizando

Hans-joachim Koellreutter: a música e a educação em um novo mundo 143


audi Õ E S E cünc
ç er t os comenta d os, pu bl-tcan d orevts-
- figura 5.1-~ Hans-joachim Koeiireutter

tas e periódicos, produzindo programas de rádio


e oferecendo cursos e conferências, o movimento
influenciou também as gerações posteriores.

A organização dos cursos internacionais de férias


Pré-Arte (1950-1960/Teresópolis-Rj) e a estrutura-
ção da Escola Livre de Música Prõ-Arte (1952/São
Paulo-SP e 1953/ Piracicaba-SP) e dos Seminários
Internacionais de Música (1954-1962) realiza-
dos na futura Escola de Música e Artes Cênicas,
Universidade Federal da Bahia (UFBA), dirigida Crédito: Cléo 'v'eIIeda.='FoIhapress
por Koellreutter entre 1954 e 1962, também foram
projetos importantes desenvolvidos nessa sua pri-
meira fase em nosso país.

Na década de 1950, Koellreutter foi ao japão pela


primeira vez e, segundo o educador, o contato com
a música da corte japonesa confirmou a opção pelos referida fundação. Também nessa época, o composi-
ideais estéticos que ele já assumira desde a juventude tor realizou sua primeira grande viagem ao.Oriente.
(Koellreutter, 1983, p. 17). Entre 1965 e 1974, a convite do Instituto Goethe,
o músico alemão viveu e trabalhou na Índia e tam-
esta ._ as te saúda; bém no japão, retornando definitivamente ao Brasil
eia site em 1975. A convivência com o Oriente motivou-o a
buscar a complementaridade que a integração entre
Premiado pela Fundação Ford pelos 25 anos de servi- os distintos modos de conscientizar proporcionaria,
ços prestados ao Brasil, Koellreutter esteve em Berlim como suas palavras atestam: “a integração entre o
como artista-residente, durante o ano de 1962. Nesse pensamento oriental e ocidental será a pedra angular
período, conviveu com Yannis Xenakis (1922-2001), de uma nova cultura de integração, uma cultura que
Elliott Carter (1908-2012) e Igor Stravinslcy (1882- traz a promessa de união da humanidade e de um
1971), entre outros artistas-residentes agraciados pela novo humanismo” (Koellreutter, 1968, p. 7).

144
Teca Alencar de Brito
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Koellreutter desenvolveu intensa atividade como professor, com- É


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quetambém ocupava lugar de destaque na proposta pedagógica


Créclito: Arquivo pessoal da autora
que o educador estruturou visando colaborar para uma formação
humanista, além de musical.
Koellreutter faleceu em 13 de setembro de 2005, aos 90 anos. Até
o final de sua vida, o músico seguiu defendendo princípios sobre os
quais refletiu intensamente - como compositor, educador e ensaísta -,
buscando criar e comunicar um mundo aberto, que, segundo suas
palavras, implicaria “um processo indivídualizante e ao mesmo
tempo integrador em um todo. Um processo de desenvolvimento do
individual, pessoal, nacional, visando ã integração em um todo
supranacional, em um mundo sem vis-ã-vis” (Koellreutter, 1997c,
p. 63).

5.2.1 Produção musical e pedagógica - ___-z.z_-=-_,¿za'_z:'-§;:_;z.;-';'='.-r=---' z _ zz _ _; _-;

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Koellreutter compôs um número significativo de obras, as quais reve- ~. _-.-_ ._ - _ =. ..._::E::..:-:..::.:::.::::-::::.-:::=›_::.::

lavam seu modo de pensar o mundo percebido. Com isso, da etapa

Hans-joachim Koellreutter: a música e a educação em um novo mundo 145


inicial de sua produção, marcada pelo o vice-versa. A relação da obra com o futebol, por sua
educador passou ao serialismoi e ao dodecafonismoi. vez, reside no fato de que, assim como no jogo de bola,
A partir da década de 1960, o músico passou a com- ã estruturação da composição se alia uma grande
por ensaios planimétricos norteados pel 3 _ estética
_ liberdade de improvisação (Amadio, 1999).
ideolflsia Vale lembrarmos também que o titulo da obra
composicional que adotou nos anos de 1940. faz referência ao livro A dança dos mestres Wu Li, de
Gary Zukav, que, humanizando a física moderna, foi
A obraAcronon, escrita entre 1978 e 1979. sintetiza, um dos norteadores do pensamento de Koellreutter.
em nosso entendimento, o pensamento koellreut-
teriano. A palavra acronon (do grego, alerónylehos)- Figura 5.3 - Parte da composição Wu ii

relaciona-se a um conceito de tempo de categoria


qualitativa, como forma de percepção, realizado
fora do tempo medido racionalmente, da métrica
1
racional e da duração definida. Sons e silêncios se Q 1
relacionam num espaço multidirecional, movi-
dos por um alto grau de imprevisibilidade e de
I ›
acaso. Uma notação própria, registrada em uma
esfera transparente, indica, com diferentes figuras,
os andamentos e as durações dos sons. O solista
movimenta livremente a esfera, provocando novas
possibilidades sonoras.

¬ O
A composição Wu Li, composta entre os anos de .
1988 e1990, teve como inspiraçoes as rendas cearen-
ses e o futebol. Como numa renda, na qual o dose- I
nho formado por sua trama contrasta com os espa-
UT = unidade de tempo a critério do intérprete
ços vazios, a obra, grafada em diagramas, permite
(representados nesta figura pelos números]
diversas realizações que ora podem ter como foco a
O: som ou pausa de duração de 1-2 unidades de tempo
trama, ora o espaço: as figuras podem representar os A = som, pausa ou silêncio de 4-8 unidades de tempo
sons, enquanto os espaços significam os silêncios, e l:l= som ou silêncio de 10-20 unidades de tempo
Fonte: Adaptado de Koellreutter, 199011

146
Teca Alencar de Brito
tiara. artigos rorarnasde rádio

Koellreutter escreveu alguns livros, dentre os quais se destaca a obra


intitulada Terminologia de uma nova estética da musica, publicada em
1990. Nesse livro, o autor dedica-se a criar e atualizar conceitos e termos
É

musicais, adequando-os às exigências do pensamento e da criaçao musi


cal contemporâneas, segundo suas considerações. Destaca-se também o
livro Estética: ã procura de um mundo sem vis-ã-vis, de 1984, que traz cartas
trocadas com o Professor Tanaka Satoshi, com o intuito de aproximar
os modos de perceber e pensar característicos das estéticas ocidental e
oriental. Harmonia funcional, harmonia de jazz e contraponto também
foram temas de publicações do educador.
A produção de artigos e ensaios é extensa, muitos deles tendo como
tema a educação musical. Nesse sentido, vale lembrarmos o trabalho
desenvolvido pelo musicólogo e educador musical Carlos Kater, que
reuniu, nos Cadernos de Estudo: Educação Musical n° 6, de 1997, artigos
escritos pelo compositor alemão em épocas diversas.
O músico alemão produziu programas radiofõnicos para a Rádio
Cultura FM (SP), abordando as relações entre Oriente e Ocidente, assim
J

como a estetica musical sob o ponto de vista dos distintos estilos musi -1

cais, relacionando-os com as transformações da consciência no mundo


ocidental. Seu pensamento e sua obra também podem ser conhecidos
JH

por intermédio de livros, dissertaçoes e teses produzidos por ex alunos e


_

pesquisadores. Nesse sentido, o livro Koellreutter educador: o humano como


objetivo da educação musical (Peirópolis, 2011), desta autora, apresenta o
pensamento e a proposta pedagógica koellreutteriana, com ênfase no
projeto desenvolvido visando ã formação musical e humana de todos,
e não apenas dos músicos, também seus alunos.
Na Universidade Federal de São joão Del-Rei (UFSj), em Minas Gerais,
existe, desde 2006, a Fundação Koellreutter, que reúne parte do acervo do
compositor: partituras, grande número de livros, manuscritos e objetos.

Hans-joachim Koellreutter: a música e a educação em um novo mundo


se Educaçao e conscientização
1 À

5.3.1 O ensino pré-figurativo

Como já apontamos anteriormente, Koellreutter Como parte de sua proposta, Koellreutter sugere o
conferiu especial importância à educação, atuando ensino pré-figurativo das artes, definindo-o como
como professor de música e animador cultural desde “parte de um sistema de educação que incita o homem
sua chegada ao país. Deu aulas de composição, regên- a se comportar perante o mundo, não como diante de
cia, harmonia, contraponto, estética, análise, história um objeto, mas como o artista diante de uma obra a
da música e atualização pedagógica, atuando tam- criar” (Koellreutter, 1997b, p. 55). Tal proposta tinha
bém de modo incansável como conferencista como objetivo conscientizar e orientar os alunos por
e palestrante. meio do diálogo e do debate, valendo-se do espírito
Educar, para Koellreutter, era parte complemen- criativo como mola propulsora de tais processos.
tar - e fundamental- de um todo, implicando, acima O educador radicado no Brasil, por sua vez, clas-
de tudo, conscientizar. “O professor não ensina nada; sificava as abordagens tradicionalistas de ensino
ele sempre conscientiza”, ele repetia muitas vezes como pós-figurativas, conforme a citação a seguir:
em seus cursos. O processo de conscientização, em
sua abordagem, se realiza pela integração entre fazer Ensinar o que o aluno pode ler em livros ou enciclope-
e pensar, entre a vivência e o processo intelectual. dias e pós-figurativo. Levantarsempre novos problemas
Questões musicais e humanas deveriam ser tra- e levaro aluno ã controvérsia e ao questionamento de
balhadas dessa maneira, em ambientes marcados tudo o que se ensina é pré-figurativo.
pela pesquisa, pela experiência, pela reflexão e pela Ensinar a história da musica como consequência de
criatividade. fatos notãveis e obras-primas do passado e pós-figu-
rat-ivo. Ensinã-la interpretando e relacionando as
“U professornãoeasinal
obras-primas do passado com o presente e com o desen-
nadäi,:ele_sémrts__.
volvimento da sociedade e pré-figurat-ivo. (Koellreutter,
conscierntiza-'ii
1997c, P- 42)

Í48
Teca Alencar de Brito
5.3.2 A questao do metodo
III' J
5.3.3 Curriculo e conteudos: ensinar aquilo
J' I I Ú

que o aluno quer saber


'Meu método é não ter método”, dizia Koellreutter,
completando: “O método fecha, limita, impõe... E é Em consonância com os aspectos expostos anterior-
preciso abrir, transcender, transgredir, ir além...”. mente, Koellreutter propôs a organização de currí-
No entanto, tais afirmações não devem ser confun- culos abertos e singulares. O educador deveria atuar
didas com a ausência de princípios metodológicos, como um facilitador de situações favoráveis ao desen-
de projetos e de planos de trabalho. indicam, isso volvimento de planos de aprendizagem autodirigida,
sim, que o trabalho a ser realizado deve guiar-se pela enfatizando a criatividade, e não a padronização.
observação de cada aluno e de cada grupo, pelo res- “A melhor hora para apresentar um conceito, ou
peito ã singularidade, aos interesses e ao contexto ensinar algo novo, é aquela em que os alunos querem
social, entre outros aspectos significativos, sempre saber. Sendo assim, o professor deve estar sempre
estimulando a criação, a pesquisa, o debate, a atento e preparado para perceber e _ .y -H - _ ._
_ ,, Nao htá-normas nem
reflexão... atender as necessidades de seus alunos , i _ 5 sei'
_ ormu as-.nem re ras
já em 1954, na abertura dos Seminários Inter- repetta Koellreutter em suas aulas. j *_ :_ 9
i iruefossamssa var uma
nacionais de Música, em Salvador, o educador ale- “Aprender a apreender do aluno o que _ _ i _
_ ,, _ o_br_ade arte na qua na
mão apontou a necessidade de libertar a educação e enslnar era, por consegutnte, uma _ _ 5
E vive-o poder-de inveoça
o ensino artísticos de métodos obtusos e opressores, de suas máximas essenciais, funda- * _
1””(I(oe:llreuttei,.1999)
criticando a mecanização resultante de estruturas mentada nafenomenologia de Maurice E as
metódicas e repetitivas - as quais, segundo ele, des- Merleau-Ponty.
motivariam alunos e professores, posto que “não
há normas, nem fórmulas, nem regras que possam Dizendo que não era preciso ensinar aquilo que
salvar uma obra de arte na qual não vive o poder de os alunos podiam aprender nos livros ou resolver
invenção” (Koellreutter, 1999). sozinhos, Koellreutter ressaltava que o mais impor-
tante era aproveitar o tempo para fazer música,
para discutir, refletir e questionar. “Eu só respondo
como professor quando o aluno pergunta. Eu faço
música com ele. A gente se autoeduca pelo diálogo
e pelo debate”, completava.
*=.ês-;_= za _ z- _-;¡¡__¡, - 5: .=-
gisiizi zi '55--'=-.z . ' _ =_ _; aiz--55.-zz-z :

Hans-joachim Koellreutter: a música e a educação em um novo mundo 149


A dúvida sempre foi a mola-mestra do modo de ser e de pensar.
Sendo assim, Koellreutter aconselhava:

Não acreditem em nada do que dizem os livros. Não acreditem em nada


do que dizem seus professores. Não acreditem em nada do que vocês
veem ou mesmo pensam, e também não acreditem em nada do que eu
digo. Perguntem sempre “por que” a tudo e a todos. (Koellreutter, citado
por Brito, 2011, p. 34)

Koellreutter propôs um modelo curricular circular. Um “currí-


culo pizza”, como ele costumava dizer, no qual os conteúdos, dispos-
E O ”A!Irie_lhorthoraparat tos circularmente, poderiam ser trabalhados em ordens diversas,
_apresentar.uam-co_nte“itiI.t “como acontece quando comemos pizza: não importa que pedaço
E ou ensioaraI got_oovo,__ escolhemos primeiro. Importa comerl”, completava.
_ r ¬ é:a“q_ueIaein que*os Considerados em sua condição de interdependência, os conteú-
_ íalunosqeerem saltar.. dos devem ser trabalhados em planos que superam hierarquias e
Se_nd¡t essiin. o_profÍessor organizações sequenciais lineares. O espaço educacional, em tal
r _deve-esta-ri-šemtifer concepção, se converte em um espaço aberto que permite adequa-
atento-:.e: é”preparado para ções, reorganizações, sobreposições etc. Tal proposta exige, no
_ p~erreibere at_e_nder as entanto, a presença de um educador que não só prepara a aula do
-neicessidadesde seus dia - prepara-se para dar aulas, convivendo e interagindo com os
alunos como um companheiro, como um animador, como alguém
que caminha junto.

Êiã*e mass nine-osiseção com iarrea “Ému: me fãii Wi*a petiegei -É äi

A improvisação é a ferramenta pedagógica fundamental da pro-


posta koellreutteriana, posto que sua prática “permite vivenciar
e conscientizar importantes questões musicais, que são trabalha-
das ao lado de aspectos como autodisciplina, tolerância, respeito,
capacidade de compartilhar, criar, refletir etc.” (Brito, 2011, p. 47).

Teca Alencar de Brito


No jogo da improvisação, prática e teoria se integram, superando o
dualismo excludente que ainda marca nossos modos de pensar e, conse-
quentemente, de ensinar. Por isso, Koellreutter criou uma série de jogos
de comunicação e modelos de improvisação: propostas entendidas como
estruturas abertas, como pontos de partida para o desenvolvimento de
variações e transformações; como estímulos ã análise, ã reflexão e à
criação de outros jogos, favorecendo a conscientização de conceitos de
naturezas diversas.
Koellreutter costumava dizer que, nos territórios da educação, nada
precisa ser mais planejado do que uma improvisação, dada a necessidade
de definir os objetivos a atingir, bem como os critérios de realização de
cada proposta. Com isso, então, deve-se experimentar, refazer, avaliar,
escutar, criticar, recriar junto aos alunos etc.
Um ponto importante refere-se ao fato de que a proposta pedagógica
de Koellreutter valoriza a vivência de aspectos musicais qualitativos,
imprecisos, como a intensidade e a agógica, por exemplo, em lugar de
priorizar o conhecimento e a experiência musical sob o ponto de vista
dos aspectos quantitativos, precisos, como os parâmetros altura e dura-
ção (Brito, 2011, p. 94).
Propondo a criação de ambientes de ensino nos quais o professor
“apreende do aluno o que ensinar”, com estruturas curriculares abertas,
flexíveis e dinâmicas nas quais a música dialoga com outras áreas do
conhecimento; valendo-se da análise comparativa e de questionamentos
como recursos para o pensar e considerando a escuta e a criação como
condições essenciais, Koellreutter fundava territórios para o exercício
de valores essenciais ã construção da “nova imagem de mundo” que ele
apregoava, bem como para a realização da música desse novo mundo.

Hans-joachim Koellreutter: a música e a educação em um novo mu ndo


5.4 Acerca das propostas 5.4.1 Propostas preliminares aos jogos de
improvisação (adequadas ao trabalho com
Koellreutter propõs a realização de jogos de comuni- Crianças da etapa da odllflação infantil ou
cação e de improvisação com níveis diversos de com- ensino fundamental)
plexidade. Alguns podem ser desenvolvidos em salas
de aula de educação infantil ou ensino fundamental, Para introduzir o conceito de relacionamento dialo-
sem a exigência de conhecimentos musicais especí- gal logo nas primeiras aulas, Koellreutter propõe a
ficos ou o domínio técnico de instrumentos. Outros, realização de pequenos jogos sonoros pela vivência
por sua vez, focam em estágios mais complexos da de situações diversas, os quais podem e devem ser
formação musical. propostos pelo professor e/ou criados com os alunos.
Importa salientarmos o fato de que todas as A título de exemplo, apresentamos alguns deles:
propostas devem ser trabalhadas em ambientes que
valorizem a integração entre a prática e a reflexão_ 1. Provaro prato predileto: Qual é a comida? Qual
Assim sendo, é essencial compartilhar ideias, proce- é a reação gestual ao ver o prato? Esfregar o
dimentos e processos com os alunos; realizar cada estômago com expressões faciais que suge-
proposta várias vezes; criticar; analisar; nomear os rem saborear, por exemplo. Que manifestações.
aspectos trabalhados, os conceitos musicais presen- vocais podem acompanhar os gestos?
tes e, enfim, promovera efetiva conscientização que, 2. Provocar uma experiência que cause medo:
para Koellreutter, como já sinalizamos neste traba- O que poderia ser? Criar gestos e ações como
lho, implica a efetiva integração entre a vivência e tapar os olhos, por exemplo. Que sons poderiam
a reflexão intelectual. acompanhar tal comportamento?
Apresentamos, então, algumas propostas sugeri- 3. Passear pela cidade e se deparar com algo estra-
das pelo educador alemão, com o intuito de apontar nho ou singular: O que é ou poderia ser? Os ges-
a diversidade de possíveis. tos corporais podem ser acompanhados de sons
vocals.

152 Teca Alencar de Brito


desenvolvimento formal, o jogo permite diversos
fu

s Diante dessas e outras situaçoes, é interessante


estimular manifes.taç~óes vocais, corporais e modos de realização, podendo abarcar níveis diver-
instrumentais.. - sos de complexidade. Apresentamos, nesse contexto
i Koellreuttfer .sugere que, em uma primeira a proposta de Koellreutter, calcada em três possibi
etapa, o trabalho seja realizado com sons vocais lidades de atuação.
À se depois com instrumentos musicais, procurando
sonorizar semelhanças e possibilidades deefeito, J) L Temática: diferentes pulsos, tempo não métrico,
ou seja, comparando as manifestações vocais (ih, pesquisa de timbres, desenvolvimento formal.
ah, uh, entre outras) com a sonoridade dos instru- L J) Instrumentos utilizados: baquetas finas, bas-
mentos, tomando como referência os parâmetros ) tóes de metal, arame limpador de flauta doce,
timbre e altura (ih =- agudo; ah = médio; uh = grave), clavas, wood-blocks, xilofones e metalofones
por exemplo. etc. O tique-taque pode ser feito com uma ou
duas mãos.
J) Organização: nove pessoas, no mínimo.
toša e eÉfã. o s: cršaeçes, šoreas a J) Formação: preferencialmente dispostos em
adeus círculo.
J) Preparação:
Ainda que, atualmente, muitas crianças desconheçam .lã 1' fase: visita à loja de relógios e levantamento
a existência de relógios de corda, a Loja de Relógios dos tipos de relógio conhecidos.. Escolha
segue encantando os menores, bem como jovens e aquele que cada participante sonorízará. t
adultos. Além do aspecto musical, é possível confec- J) 2! faso: descrição dos relógios escolhidos, bem
cionar os relógios com materiais diversos, inventar como de sua atmosfera sonora.
histórias com base em roteiros determinados, ínte- Ji 3* fase: determinação da forma. Exemplo:
grar o jogo a canções com temática similar, criar pode haver um horario importante para a
audiopartituras, trabalhar com movimento corpo- realização do trabalho, como 8 segundos
ral etc. antes do meio-dia. Nesse caso, oque poderia
Favorecendo a vivência dos tempos métrico acontecer sonoramente?
(representado pelos distintos pulsos regulares do .H 4* fase: apresentação do elemento não
tique-taque) e não métrico (representado pela sono- métrico no ato de dar corda nos relógios
ridade das cordas, bem como pelo relógio quebrado), (com pente, espiral, reco-reco).
a pesquisa de timbres em distintos materiais e o

Hans-joachim Koellreutter: a música e a educação em um novo mundo 153


Í) 5* fase: tique-taquez em tempos diferentes caso, o jogo de comunicação se estabele-
(polimetria) e com timbres diversos. cerá entre cada dupla relógio-corda.
J) Realizações: para a Loja de Relógios, Koellreutter .Ê As cordas dão início ao jogo. Quando
sugere três atuações: todos os relógios estiverem funcionando,
1* atuação: cada aluno deve escolher o relógio estabelece-se o jogo entre tíque-taque e
que deseja sonorizar (cuco, despertador, reló- corda: oi relógio deve parar quando julgar
gio de ponto, carrilhão, relógio quebrado etc.) conveniente e a corda, por sua vez, deter-
para, então, buscar o timbre mais adequado mina quando ele deve voltar a funcionar.
para sonorizá-lo. De acordo com Koellreutter, 3* atuação: alguns relógios anunciam a hora
a maioria dos relógios deve ter timbre claro e (a exemplo dos cucos e despertadores) com sono-
suave. A escolha dos instrumentos ou objetos ridade, timbre e tempos diferentes. Koellreutter
deve ser discutida por todos - alunos e profes- sugere, por exemplo, o emprego de canções
sor. A primeira atuação integra os diversos populares que poderiam ser cantadas em um
tique-taques (métricos e não métricos), não ambiente de mistura de tonalidades, alterações
introduzindo ainda a corda. do ritmo ou do andamento etc.
2* atuação: após a escolha e a sonorização dos ,li Opções: uma turma dá corda; outra faz os
vários relógios, o grupo deve decidir quem tique-taques; outra marca a hora.
vai dar corda e, para tanto, seguem algumas ,Fl Observações:
opções: Ê Realize uma espécie de diálogo entre os
.li Alguns participantes serão as cordas. relógios, uns influenciando os outros,
Os “músicos relógios” param quando deci- de modo a não haver monotonia.
dem que “a corda acabou”, escolhendo, .Ê É importante estabelecer contrastes
pelo olhar, quem “dará corda” e estabele- (quanto ao timbre) entre os diferentes
cendo, dessa maneira, um jogo de comu- tipos de relógios.
nicação com cada colega. .Ê Não esqueça os relógios velhos, mancos
,Ê Cada “relógio” tem sua “corda” correspon- (que representarão o tempo não métrico).
dente' e, para tanto, será preciso pesquisar .Ê . Não esqueça o silêncio.
o material adequado, ou seja: Que tipo de Ji Critérios para crítica e avaliação:
material sonoro sonorizará adequada- .Ê Questionar e discutir se os ruídos dos
. mente a corda de umrelógio de pulso? E a tique-taques e cordas foram interessantes
de um cuco? E a de um carrilhão? Nesse esteticamente.

Teca Alencar de Brito


_ Os _ ruídos não devem começar (de diversas qualidades, a serem pesquisados) em
_simultaneamente. matéria-prima para o fazer musical. Por meio dessa
d É o Observe se os tique-taques são muito pare- atividade, é possível introduzir conceitos relativos
. i cidos, ou seum éƒorte ou piano demais. aos parâmetros do som (altura, duração, intensidade
d É Observe seo grupo que dá corda assimila e timbre), ã exploração de gestos e de modos de ação
o tique-taqueàanterior. para a produção de sonoridades, além do conceito
s Ji Variações õ s ~ deforma.
É Crie variaÇõ.es do jogo de improvisação i É um projeto especialmente interessante por redi-
o levando o grupo a observar aeroportos, mensionar a relação que comumente se estabelece
jogos de futebol, feiras, ou mesmo rea- com os materiais sonoros, ampliando os recursos e
lizando o trabalho como umapeça de também a própria concepção de música.
teatro. r
É Ressaltamosa importância de focar ao J) Temática: exploração de gestos e modos de
escuta em todas as etapas do trabalho. ação para produzir sons em diferentes tipos
Escutando, o grupo mantém interação já de papéis. Desenvolvimento da sensibilidade
musical e pessoal, obviamente, enquanto formal.
favorece a conscientização de aspectos J) Materiais utilizados: papéis de diferentes qua-
diversos. s lidades (seda, jornal, alumínio, embrulho, lixa,
É A realização desse projeto em diferentes espelho, cartão, papelão, caixas de papelão,
grupos, com faixas etárias eformações rolos de papelão [come sem tampal, papel cane-
musicais distintas, resultará em “Lojas lado, prateado, de estanho etc.).
de Relógios” singulares, sempre muito D Organização: seleção dos diferentes papéis.
especiais. .lj Arranjo(possibilidades):
li distribuir os papéis pela sala;
,li acumular papel;
ãr ato aiãã :aatãre street
mea»
iii Hfiãiõ É ordenar, organizar de acordo com o som
c šverssiaiaas etãris característico;
É pendurar (por exemplo, em estantes);
Esse projeto aponta para a ampliação de recursos Ê: fixar em cordas ou no corpo dos partici-
materiais que podem ser utilizados no trabalho de pantes etc.
educação musical, pela transformação de papéis Ê criar, enfim, um ambiente de papel.

Hans-joachim Koellreutter: a música e a educação em um novo mundo 155


, if* Técnicas para produção de sons: amarrotar, anarquista (ou palhaço), que contesta e contraria as
amassar, esfregar, esfregar com lixa, bater, leis. Transportando esse sistema para o plano musi-
rasgar, sacudir, estourar sacos, tambori- cal, o modelo de improvisação criado por ele permite
lar, soprar, tratar com arco ou bastão etc. integrar três forças diferentes:
Misturar os sons produzidos por papéis com
wood-blocks, pratos, vozes, ou seja, com ins- 1. Metro rigoroso: não muda oi andamento. Ex.:
trumentos que se distingam bem do papel. metrõnomo, relógio. Representa a presença
A elaboração da forma, que resulta do modo de da lei que, inflexível, não se altera, marcando
estruturar o trabalho, pode ser trabalhada após
sempre o mesmo pulso. Deve ser executada por
a etapa inicial de pesquisa dos materiais sonoros um par de clavas ou wood-blocks.
disponiveis: Como fazer? Como iniciar? Será pos- 2. Ritmos ostinati: os ritmos representam os cida-
sível determinar partes diferentes? O trabalho dãos, que obedecem à lei. Cada um deles cria seu
seguirá em um contínuo? Muitas possibilidades se próprio ritmo (sua individualidade), orientados,
abrirão, com certeza, e aproveitá-las é uma ques- no entanto, pelo metro (a lei), que é comum a
tão essencial. todos.
Força oposta: sem se orientar pelo metro, indica
a força não métrica, criando um modo amétrico
aiii s;”§'ã MW*-iz z uz iii “iiWi*izrt sua wiai Wrtmw
quando se relaciona com o métrico. Representa
a presença do palhaço, do anarquista, daquele
Assim como a Loja de Relógios, o jogo O Palhaço é um
que transcende um sistema qualquer.
modelo de improvisação que, dentre muitos aspectos, Instrumentos utilizados: membranofones, xilo-
conscientiza os alunos sobre a transformação do con- fones, instrumentos de madeira e percussão
ceito do tempo - no mundo e na música. Na mesma
com timbres agudos e penetrantes.
proposta, trabalha-se com os tempos métrico, não Organização: é interessante contar com um
métrico e amétrico. Numa espécie de jogo simbólico número máximo de 16 improvisadores, divi-
infantil, os cidadãos, a lei e o palhaço produzem a
didos da seguinte maneira:
realização musical, criando, num ambiente lúdico,
.li Três para o metro (lei), mas é aconselhável
o cruzamento de forças diversas. Koellreutter tomou
começar com apenas um.
de empréstimo aspectos característicos da estrutura
.Fi Um ou dois participantes para representa-
social: a presença da lei, que orienta comportamentos
rem os palhaços (ou oposição), que deverão
e atitudes; dos cidadãos, que se orientam pela lei; e do
atuar de modo nao métrico.
fu

156
Teca Alencar de Brito
Cidadãos (cada um realizando um ritmo z Ídiflcultaria az compreensão do todo da
improvisação; t . L
O . I- - FI'

orientado"pelo metro).
Convém contar, também, com um grupo de .Hz i-scutacom o grupo a. escolha dos instru-
observadores eo-comentadores do processo; mentos. A madeira, por exemplo,. poderia
Posição: forma de círculo, com a(s) lei(s) no ficarpara a “lei*i, porque é mais precisa, com
centro. Ofs) palhaço(s) fica(m) fora. P pouca capacidade deressonância. Mas esse
Realização: aspecto, como todos os outros, deve ser ana-
Ji Comece com o metro = 60 (lei), executado lisado por todos os participantes.
por clavas. ou wood-blocks (lei). ç .li Discuta previamente o decurso da improvi-
Ji Membranofones entram. um a um(cida- sação com os alunos, que devem participar
dãos), cuidando para que escuteminão sóo ativamente de todo o processo.
precedente, mas o todo que aos poucos vai Ji É importante que o chefe da improvisação
se formando. Os osrinarí criados devem ser observe os improvisadores fazendocomen-
diferentes, podendo mudar ocasionalmente tários engraçados, inspirando e estimu-
ou depois de uma pausa. Essas mudanças lando a atuação de todos e, notadamente,
não devem ser introduzidas de uma hora do palhaço, que, sem dúvida, és a mais dificil.
para outra, mas ea partir de estímulos, com Ji O palhaço deve comentar (musicalmente)
uma finalidade. Uma mudança deintensi-- o trabalho dos cidadãos, utilizando o
dade vinda das clavas pode, por exemplo, recurso do espanto e do susto. Deve negar
sinalizar at mudança de ostinato. o metro (representado pela lei) e a repe-
O opositor (palhaço) aparece após a forma- tição, agindo e improvisando sem inter-
ção da faixa rítmica doscidadãos. Deve rupção. Tem de “caçoar” ou assustar a lei
usar toda sua fantasia, independência e ou os cidadãos. Segundo Koellreutter, essa
personalidades atuar de modo não métrico. atitude é a preparação para um fenómeno
Torna-se amétrico conforme “ataca” eo “con- estético muito importante, que é o elemento
tra-ataca” o metro, ou seja, quando se rela- surpresa.
ciona com o metro. t Ji Outro importante objetivo da realização
J) Observações: musical não métrica (própria do palhaço)
,li Trabalhe com um grupo de no máximo a' ser observado é o desenvolvimento da
16- participantes, pois um grupo maior capacidade de manifestar-se de. modo

Hans-joachim Koellreutter: a música e a educação em um novo mundo 157


concentrado e conciso, pois “o problema Ji Ritmo: em relação aos “cidadãos”, é impor- .
estético de todo artista é limitar-se”, dizia tante que haja muito contraste entre os osti-
Koellreutter. s nati. Observar, também, se o grupo sustenta
Ji Quando o grupo de improvisadores con- realmente o metro.
tar com dois palhaços, deve-se criar um
inter-relacionamento entre eles, para gerar Muitas outras variações podem ser criadas com
unidade. base na P ro P osta a resentada or Koellreutter,
Critérios para crítica a avaliação do trabalho: gerando novos e interessantes jogos de improvisação.
a avaliação ou crítica será realizada pelos apre-
cladores, bem como pelo professor, que dialoga- Para saber mais
rao com os músicos, observando os seguintes
critérios: Ãrrigoss livros L to t r
Dinâmica: desperte a consciência do valor BRITO T. A. de. Cria rocomunicaf um novo mundo: as ideias de
expressivo da dinâmica no discurso musi- música de H-I Koellreutter.154 f. Dissertação (Mestrado
emflomunicação e Semiótica) -* Pontifícia Universidade
cal, estimulando variações e estabelecendo Catolica, São Paulo, 2004. t . i
diferenciações. Exemplo: o crescendo pode
BRITO, T. (A. de. I-lans-Joachim Koellreutter: ideias de mundo,
partir do metro (lei), passando, ou não, para de música, de educação. São Paulo: Peirõpolis; Edusp, 2015.
os ritmos (cidadãos) e, dependendo do resul-
. Hans-Joachim Koellreutter: musico e educador mus1cal
tado, para o palhaço. Estimule a produção menor. Revista da ãBEM,`v. 23:, r1.3¡5, p. 11-23, 2015. ''
de sons suaves, introduzindo, na sequência,
. KoolIrauttar educador: o humano como obietivo da edu-
diferenciações dinâmicas de intensidade. cação musícal. 2. ed. São Paulo: Peirõpolis, 2ü11.
Metro: um efeito interessante consiste em
KATER, C. E. (Org.). Catálogoucla-oibras da H. J. Koellreutter.
propor que os responsáveis pela lei (metro) Belo Horizonte: Fundação de Educação Artística/Fapemig,
troquem de papel com alguns cidadãos (rit- 1997a. s ç ' c
mos osrineri), sem que o grupo de observa- _ .A nova imagem-.dio mundo: estética,:estru-tu-ralismo espla-
dores perceba. Esse exercício desenvolve nimetria. RevistaMúsica,. São ,PauIo,.v. 2, n. 2, p. 85-9U,199i1.
a autodisciplina e a concentração, cria i. Cadernos do Estudo: Educação Musical não 6. S-P/BI-1_L:
um melhor relacionamento com os outro eo travez/EMUFMG/FEAÍÍ-iAPEM:IG, 1995?... L
desenvolve a sensibilidade necessária para s 'e .c Educação musical, hoje e, quiçá. amanhã. In: LIMA, S.
passar de uma frase musical. a outra sem . c Pi. ({Í}rg_.}. .Edu,c,adora.s-.niusicais de Sãoflaitloã encontro- e
reflexões. São Paolo: Nacional, 19-98._pâ.39-45. i . Í
que fique perceptível aos ouvintes.

' Taca .alencar de Briteë



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160
Teca Alencar de Brito
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Elba Braga Ramalho é PhD em Musicologia pela Universidade de Liverpool, pós-doutora em Linguistica pela
Universidade Federal de Santa Catarina (UFSC), mestre em Sociologia pela Universidade Federal do Ceara (UFC),
graduada em Educação Musical pelo Conservatório Nacional de Canto Orƒeônico (CNCO), hoje Instituto Villa-Lobos
(Unirio), e bacharel em Piano pelo Conservatório de Música Alberto Nepomuceno (CE). É professora titular aposen-
tada do curso de Musica da Universidade Estadual do Ceara (Uece). Em sua atividade profissional na Uece, orien-
tou alunos e dedicou-se ao ensino da Teoria da Música, concentrando-se nas areas de analise musical, harmonia e
contraponto. introduziu o ensino da Flauta Doce nos cursos de Musica da Uece efoi regentefundadora do Grupo
de Flautas Doce da mesma instituição durante cerca de IO anos. Atualmente, dedica-se inteiramente a atividade
de pesquisa, tendo como tema central o estudo da cultura de tradição oral.

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' ' Figura ãfil - Esther äcliar em curso internacional de
ó.1 Esther Scliar no mundo em movimento mas _TErmPG,is (1950)

Esther Scliar viveu em um contexto histórico-social muito rico.


Integrou uma geração de intelectuais que vivenciou mudan-
ças profundas nos posicionamentos político-sociais do Brasil:
lutas contra o nazismo, pela Constituinte após a ditadura de
Vargas, contra a ditadura militar, a partir de 1964, e contra o
Ato Institucional n. 5 (AI 5). Em 1951, filiou-se ao Movimento da
Iuventude Comunista do Partido Comunista Brasileiro (PCB)
No campo profissional, a educadora experimentou a efer-
vescência de novas tendências estéticas do mundo ocidental,
que punham em relevo várias correntes musicais. No Brasil,
por exemplo, destaca-se a grande polêmica entre o nacio- C'Éd"°*'°“:E""° "e°"°'5°"a"Cab'a[
nalismo neoclássico (liderado por Camargo Guarnieri) e o
movimento em direção ã renovação técnica e estética sob a
tutela de Hans-Ioachim Koellreutter.

Camargo Guarnieri (190?-1993), um dos principais repre-


sentantes da segunda geração nacionalista, desenvolveu
sua formação musical sob orientação de professores que
defendiam esse ideário. A. aproximação com Mário de
Andrade, aos 21 anos de idade, contribuiu para sua com-
pleta adesão ao nacionalismo modernista. Na década de
1940, incorporou em sua obras as principais tendências
estéticas do neoclassicismo internacional, com ênfase na
coerência da obra, no formalismo e na elaboraçãomotívica.
A “Escola Guarnieri” tornou-se um marco do século XX.

Esther Scliar: uma vida para a música


O embate dessas correntes antagônicas gerou Em meados de 1950, o clima de euforia do desen-
a divulgação de dois manifestos do grupo Música volvimentismo, proclamado pelo Presidente Iuscelino
Viva (1944 e 1946)i. Para acirrar os debates, a parti- Kubitschek, foi interrompido por mais um período
cipação de compositores brasileiros no 2° Congresso negro da história: o golpe militar de 1964, que durou
Internacional de Compositores e Críticos Musicais em 20 anos.
Praga (1948) deixou-os impregnados dos princípios Em meio a tantos acontecimentos, Scliar per-
norteadores do realismo socialista, fato que contri- correu uma trajetória pessoal conflituosa e fez suas
buiu para a dissidência de alguns dos integrantes escolhas de modo a valorizar a cultura de seu país,
do Música Viva, entre eles Claudio Santoro. Em 1950, sem abrir mão dos ideais das correntes vanguardis-
Camargo Guarnieri publicou a Carta aberta aos musi- tas. Politicamente atuante, participou ativamente do
cos e criticos do Brasilg. Todos esse fatos evidenciam, movimento de resistência à ditadura militar, incen-
nitidamente, as posições defendidas por ambas as tivando manifestos contra a prisão de intelectuais,
posturas estéticas. o que lhe resultou, em 1968, a exoneração da cátedra
no Instituto Villa-Lobosi.
No campo político do Pós-Segunda Guerra Mundial,
o Brasil respirava o final da ditadura getulista.
Entretanto, sua ideologia de coesão social e disci-
plina se revelava fortalecida no projeto educacio-
nal implantado por Villa-Lobos no Conservatório
Nacional de Canto Orfeõnico (CNCO). Nessa insti-
tuição, formavam-se professores especializados em
disseminar corais pelas escolas, para por em prá-
tica esses princípios disciplinadores. Villa-Lobos
compôs um amplo repertório para coro orfeô-
nico, com canções ufanistas, hinos exaltando as
mais variadas profissões e arranjos de canções
tradicionais.
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1 Caso você queira ter acesso aos textos desses manifestos, acesse: chttpztƒwww. ,_ _ z _ Í -¡-"""“~z- _ _ _4

Iatinoamerica-musica.net!historiafmanifestosii-po.htmI>. 3 Instituição de ensino oriunda do Conservatório Nacional de Canto Urfeünico {CNCü),


2 Caso você queira teracesso ao texto da carta na íntegra, acesse: <http:.u'wvrw.fap. fundado porvilla-Lobos em 1942; atualmente integra o Centro de Letras eiftrtes da
p-r.gov.brtarc|uivosƒfile¡RevistaCientifica1tANDRE_EGG.PDF:›. Universidade Federal do Rio da Janeiro (Unirio].

164 Elba Braga Ramalho


ó.z A saga de Esther Scliar meninas voltaram a residir em Porto Alegre. Na
capital gaúcha, a convivência com a família do
É via “Li da
dvfi .% iä mas etapas mas êm
= pintor e lider intelectual Carlos Scliar foi signi-
ficativa, pois na casa do artista se reuniam inte-
Avida pessoal de Esther Scliar foi pautada pela saga lectuais de vanguarda, muitos deles membros ou
da família paterna, oriunda da Bessarábia, que esco- simpatizantes do Partido Comunista. Desde cedo,
lheu o Brasil como nova pátria, no inicio do século XX. as irmãs Scliar foram estimuladas ao desenvol-
Nasceu em Porto Alegre, em 28 de setembro de 1926, vimento cultural dírecionado para as artes e a
de pais imigrantes judeus, Isaac e Rosa Scliar, que política. Esther ingressou no Colégio Americano e
também conceberam sua irmã, Leonor (1929). Desde se destacou como melhor aluna, com participação
cedo, conviveu com mudanças, uma vez que aos efetiva nas atividades culturais da escola.
4 anos de idade a familia fixou residência em Rivera
(Uruguai), quando, ainda menina, Scliar experimen- Os estudos musicais apresentavam-se como seu
tou a primeira perda: o abandono da mãe, deportada principal interesse. Em 1945, diplomou-se Bacharel
por razões políticas. em piano, no curso superior de Música do Instituto de
De volta ao Brasil, em 1932, Isaac Scliar fixou Belas Artes de Porto Alegrei. Em seguida, na mesma
residência em Passo Fundo (RS) e suas filhas foram instituição, inseriu-se no curso de Composição e, con-
confiadas aos tios paternos, Iayme Kruter e Rosa juntamente, iniciou suas atividades como professora,
Scliar Kruter. Nessa cidade, Scliar adentrou o mundo lecionando piano.
da música, aos 8 anos de idade, pelas mãos da prima Como podemos observar, Scliar viveu num
Eva Kruter, então professora de piano, e por meio do ambiente familiar fortemente marcado pelos trau-
estudo com judíth Pacheco. Paralelamente, ingressou mas experimentados com a nostalgia e os sofrimentos
no Colégio Notre Dame. advindos da Segunda Guerra Mundial, mas agraciado
com o cultivo dos ideais políticos de liberdade e pela
A comunidade de familiares e vizinhos cultivava convivência com o mundo das artes e da cultura
intensamente a música, a literatura pe o cinema. como bens espirituais.
Em 1938, Isaac Scliar casou-se novamente, e as ¡- Í A Í -f"'-'i*'i- _-_____ _ - __ -¡

4 Atualmente, Instituto de Artes da Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRS).

Esther Scliar: uma vida para a música 165


Figura 6.2 - Concludentes do CNQQ, 1960
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Scliar mudou-se para o Rio de janeiro, em 1948, para


estudar com Hans-joachim Koellreutter. Certamente
que a inserção no Grupo Música Viva, criado pelo
mestre alemão, contribuiu significativamente
para moldar sua formação musical em direção a
um horizonte cosmopolita. Ainda em 1948, reali-
zou uma viagem a Veneza, sob orientação do com-
positor, para o Curso Internacional de Regência,
com Hermann Scherchenl. Também participou do
Fonte: Acervo Elba Braga Ramalho (1968). 1° Curso Internacional de Composição Dodecafõnica,
Esther de pé, ao fundo. Elba, a primeira da esquerda para a direita, em
primeiro plano. realizado em Milão, ministrado por Koellreutter.
Recebeu ainda ensinamentos de outros precepto-
res, entre eles Bruno Kieferã, Claudio Santorofll, Iosé
Kliass”, Eunice Katunday. Discípula de Koellreutter
na classe de Composição, durante o 1° Curso e Férias
de Teresópolis (1950), tornou-se sua assistente como
professora de percepção.

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Com a saúde fragilizada, Scliar volta a residir em
Porto Alegre, na companhia de sua irmã Leonor.
Nesse periodo, dedicou-se ao ensino de piano, teo-
ria e harmonia; atuou como pianista da Orquestra
Sinfônica de Porto Alegre (Ospa) e de intérpretes
em tournée nessa cidade; colaborou na formação
musical de futuros bailarinos das classes da coreó-
grafa Tony Seitz Petsold; foi fundadora e primeira

166 Elba Braga Ramalho


regente do Coro da Associação juvenil Musical de Porto Alegre; em 1953,
apresentou o grupo em Praga. Nesse período, compôs um repertório de
canções, na maioria inspiradas em temas tradicionais, além da série
No parque, para coro infantil. Ainda criou peças para voz e piano, com
textos de vários poetas.
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W: o eianeiro, terr z eoutras viveu


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Radicada definitivamente no Rio de janeiro, seus preceptores na arte de


compor foram Claudio Santoro (1958) e Edino Krieger (1960). Buscou ainda
o CNCO para formalizar o exercicio do magistério na área da música
(1959-1960)5. Lá teve, entre seus preceptores, Andrade Muricy, Adhemar
Nóbrega, Brasílio Itiberê Sobrinho, Gazzi de Sá, Iberê Gomes Grosso e
josé Vieira Brandão. Obviamente, a musicista se revelou uma discípula
diferente dos padrões vigentes daquela instituição. Sua maneira incisiva
de interagir com colegas e professores provocava uma verdadeira revo-
lução na sala de aula. Com o intuito de melhorar o nível de informação
dos colegas, a educadora criou grupos de estudos de aprofundamento
para os interessados. Inconformada com a postura conservadora de
grande parte das práticas de ensino musical, não se cansava de interfe-
rir e questionar. A propósito, devemos ressaltar uma citação de Aylton
Escobar, bastante elucidativa sobre seu espirito combativo:

Esther chegava a ser por vezes intransigente, polêmica e aƒogueadaƒeiticeira


que se comprazia com a luta, o movimento que transƒormasse o lago sereno
das certezas no mar encapelado das inquietações espirituais. Um simples
conceito emitido provocava-a intensamente. Olhava seu interlocutor com
dois grandes olhos azuis, que pareciam aquarios onde nadavam douradas
sabedorias, e esboçava um leve sorriso, sinal de que havia aceitado o convite,

az- * Ulf-_-_"" - "N

5 No CNCO, Esther e eu fomos colegas de classe.

Esther Scliar: uma vida para a música


nascido incauto e despercebido, d e u ma gulosa batalha e profissional, seu posicionamento critico aos mode
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entre cabeças pensantes. (Escobar, citado por Scliar, los tradicionais do ensino da música se revelou pela
1935.13. IX) ação pedagógica. É ainda de Aylton Escobar o melhor
Esther foi professora por vocação. Sua passagem suporte para esse argumento:
pelo CNCO certamente refletiu-se no direcionamento
Preocupada com a educação dos jovens musicos,
que deu à postura profissional. Sua atividade peda-
[Esther] afligia-se ao constatar deficiências lamenta-
gógica no Rio de janeiro desenvolveu-se em várias
veis em todo o sistema de ensino, ocasionando insu-
instituições de ensino musical, tais como a Escola da
portável superficialidade no conhecimento oferecido
Associação dos Servidores Públicos do Rio de janeiro
as gerações de artistas que compareciam as salas
(ensino médio, 1956-1958); os Seminários de Música
de aula dos conservatórios e escolas de música. [...]
da Pró-Arte (1962-1976); o Instituto Villa-Lobos (atual
lrritava-se e não policiava nenhuma de suas criticas
Unirio, 1967-1968); e a Escola de Música Villa-Lobos
chispantes, profunda e pessoalmente ofendida com
(1975-1977). Além disso, acolheu em sua residência
o destrato oferecido ci Musica. (Escobar, citado por
alunos das mais variadas vertentes musicais, mui-
Scliar, 1985, p. VIII)
tos deles hoje atuando como professores, intérpretes,
compositores e arranjadores.
das a
A experiência da mestra no ensino escolar expan-
diu-se, pois ela orientava e acompanhava seus Esther Scliar faleceu. Como um sopro perfumado,
jovens colegas do CNCO nos primeiros passos da a educadora deixou sua marca avivada na mente
prática didática com alunos de nivel médio. Nessa daqueles que receberam seus ensinamentos, seja
direção, preparava-os com aulas de Contraponto, como alunos, seja como amigos. Sua expressão cria-
Harmonia e Composição, induzindo-os ã prática dora, no repertório de composiçoes e arranjos, revita-
de arranjos para coral do rico repertório musical liza essa memória. O acervo de partituras analisadas,
de tradição oral. Ela própria já acumulava um repletas de observações manuscritas, e os escritos
repertório de peças didáticas, que disponibilizava em forma de apostilas guardam a presença dessa
aos mestres iniciantes. 5 guerreira que não mediu esforços em seu projeto de
humanização por meio da música.
De sua vivência e atuação num contexto histórico Ninguém melhor do que Aylton Escobar para nos
de tantas mudanças politico-culturais, como aluna mostrar o imbricamento entre criatura e criação
revelados na sua persona:

168
Elba Braga Ramalho
Esther transformou a vida no ato mobtltzante e mobili- da premissa de que música é linguagem por si, que
zador de criar música, sem jamais sujeitar-se ao alheia- não depende de “mulatas” para ser decodificada, a
mento das prerrogativasfundamentais socioculturais mestra deixou uma obra na sua maioria inédita,
que, ao contrário, a inspiravam e energizavam em abrangendo teoria da música, composições, arranjos
direção a esta atividade vital. Desde oƒolclore nacio- e análise de peças significativas.
nal, para o qual atirava sua preocupação ampliada
de não abandonar as tecnicas cultivadas de composi- No campo da teoria elementar, foram publicados
ção, no que o utilizasse e brandisse, até as mais ousa- tpostumamentet Elementos de teoria musical, em
das tendências estéticas da vanguarda musical, sem dois volumes: o teórico (1985) e o caderno de exer-
qualquer lacuna possivel ou suportável, era dominio cícios (1987): além de Solfejos progressivas (2003),
vlasto efirme de Esther, sempre reavivado no trabalho que complementa, pela prática da leitura, os con-
de compositora, de mestra incomparavelmente capaz, teúdo do ensino teórico. Quando de sua atuação no
de analista imparcial e sábia, conselheira enluarada, Instituto Villa-Lobos e na Pró-Arte, desenvolveu
amiga de inadiável lealdade, pensadora libertada de apostilas reunidas sob o título de Curso Análise da E
quaisquer preconceitos burgueses e encarceirantes, Linguagem Musical.
provocadora de arrepios e delicias intelectuais e mulher
de agridoce poesia. [...] Mas não há de morrer quem Suas atividades como regente, professora e cora-
semeou a Vida nem há de esconder-se quem inventou lista refletem-se no acervo de obras que produziu
a claridade. (Escobar, citado por Scliar, 1985, p. V, X) para as várias formações corais: infantil, adulto de
vozes iguais e mistas. Essa produção i A ¿ , ea
. ,. -Música éilin lia. em-z
se caracteriza pela enfase dada a temas e ~ l ea
6.2.1 Produção musical e pedagógica por-si, nãordepe-:ide de
folclóricos, concebidos numa lingua- ; 51 ,
.. e muletasz.. t ,
.llf-' -` -'If'
ç
gem contemporanea, que tem por pres- à l ea
tias araesressar-s
suposto a comunicabilidade.
No âmbito da música instrumental, seu percurso
A precariedade de bibliografia acessível no país levou
criativo concentrou-se em um número reduzido de
Scliar a acumular um rico acervo que “digeriu" e mul
Composições, algumas delas incompletas ou abando-
tiplicou, generosamente, entre seus alunos. Imbuícla -Hi

nadas, possivelmente em razao de seu rigor crítico.

Esther Scliar: uma vida para a música 169


as Em direção ao pensamento musical

Não podemos afirmar que Scliar deixou um método propriamente


dito, nos padrões dos métodos que adestram o indivíduo a desenvolver
habilidades. A educadora procedeu ã criação de um vasto material
para uso dos discípulos, construído muito mais como aprofundados
roteiros de aulas.
Observamos que sua meta principal era a formação do músico
integral. A atividade pedagógica fluia ã medida que o encontro com
os alunos lhe inspirava o caminho a seguir. Por isso, na aproximação
com estudantes, Scliar sempre levou em conta o background de cada
um e seus principais interesses. Ministrou aulas a jovens e adultos
das mais variadas formações, sem distinção entre músicos popu-
lares e eruditos. Soube beber com entusiasmo das mais diferentes
fontes, a exemplo do relato de Paulinho da Violas, que a introduziu
no ambiente das rodas de choro carioca.
Seu estilo pessoal desenvolvia-se num discurso fluente, claro,
abrangente e sempre ilustrado com a audição comentada dos exemplos.

I- - 7 - ¡¡""'-í¡¡--
-fz zz f 1

6 "A Esther tinha um trânsito muito grande na área da música popular porque muitos artistas [...] começaram a
estudas com ela. [_ . _] Uma das coisas que eu Iem bro é de ter conversado com a Esther e descoberto nela não
um ressentimento, mas uma certa frustação por ter tido uma formação que ela teve, que não incluía a música
popular. [. . .] Ela [_ . .] queria ter uma experiência maiorjunto à música popular. [.. _] Eu gostaria de falar mais
um pouco daquela coisa da Esther ouvindo o choro, as rodas de choro. Não foi só uma vez na casa dolacó [do
Bandolim), nos fomos a outras reuniões de choro; e ela estava muito ligada naquilo. Estava assim, como se
tivesse descoberto um universo novo. [_ __] Eu tenho a impressão de que essa aproximação com o pessoal do
choro, aquela coisa da irreverência do choro, variações que o pessoal ficava fazendo sobre o tema; tudo isso
despertou na Esther alguma coisa, porque ela ficava muito entusiasmada depois de um certo tempo ouvindo
essa música" (Machado, 2002, p. 192; l9?).

1170 Elba Braga Ramalho


Sem perder de vista as principais tendências da ou seja, à aplicação cotijnnta de tempo e espaço na
música de seu tempo, Scliar desenvolveu uma pro- prática musical.
posta pedagógica voltada para o percurso da história
da música ocidental, preparando os alunos em direção Na atividade pedagógica, a educadora estimulava
ao futuro sem abrir mão das matrizes do passado. os alunos ã criação em sala da aula, com base nos
Sua “biblia” sempre foi a produção dos grandes mes- conteúdos trabalhados, os quais denominava inven-
tres da música, sem distinção de escolas. Na ávída çao. Tambem privilegiava o recurso da associaçao
leitura das partituras, encontrava respostas às suas ao repertório de músicas já familiarizadas pelos
indagações teóricas. alunos, como elemento facilitador da memorização
Os conservatórios brasileiros, na década de 1950, de intervalos ascendentes e descendentes.
iniciavam a aprendizagem da teoria elementar
por meio do livro de Paul Hindemith - Elementary Observamosque a finalidade das três obras con»
Trainingfor Musicians (1946) -, que preparava o aluno juntas é proporcionar ao aluno, razoavelmente
para solfejar a música do século XX liberta do tona- letrado, o conhecimento teórico-prático de todas as
lismo. Scliar fez uso dessa obra, como assim revela convenções básicas da teoria elementar. Na distri-
Paulinho da Viola: “Eu conheci o Hindemith através buição do conteúdo, destaca-se o conjunto de temas
da Esther porque ela usava o método dele, que ainda inseridos em bloco. Por exemplo: quando trata
estava em espanhol” (Machado, 2002, p. 192). das figuras representativas da duração, a autora
inclui noções de pulsação, impulso/apoio, síncope
É provável quea mestra tenha se inspirado no pro- e contratempo. No trato das alturas, privilegia a
jeto metodológico de Hindemith como roteiro da percepção e emissão das relações tom/semitom,
criação de material didático próprio. Apoiada nas para progressivamente alcançar sequências de
premissas sobre “açao no tempo” (ritmo e metro trítono (Fá-Si) e de sextas (Mi-Dó), até chegar às
em suas formas básicas), “ação no espaço” (alturas, distintas séries de escalas.
intervalos e escalas) e “ação coordenada” (combi-
nação dos dois itens assinalados), Scliar sintetiza Cumprida essa etapa, Scliar prosseguiu com a ela-
os principais conceitos da teoria elementar no boração de apostilas para seus cursos de Análise da
livro teórico já referido, os quais devem ser melhor Linguagem Musical. Compõem esse material tópicos
apreendidos com a realização das tarefas contidas sobre som, linguagem, melodia, ritmo, sistemas, poli-
no caderno de exercícios. Os solfejos progressivas fonia, harmonia funcional, fraseologia (publicado)
correspondem à dimensão da “ação coordenada”, e forma (canção, lied, rondó, fuga, variação, suíte,

Esther Scliar: uma vida para a música 1?1


sonata). Ainda hoje, esses materiais constituem fonte de consulta daqueles
que tiveram o privilégio de ser contemplados com as referidas apostilas.
Em sua postura pedagógica, Scliar sempre demonstrou cuidado
especial com o processo de crescimento individual de cada aluno. Esse
procedimento é visível nas observações críticas que a musicista redigia
de próprio punho, comentando o desempenho de cada aluno por ocasião
das avaliações.

172 Elba Braga Ramalho


õ.-4 Tempo, espaço, açao conjunta afirmativa pelo depoimento de um de seus discípulos,
o compositor Aluísio Didier:
Esther Scliar precedia seu curso de Análise da
Foi mesmo difícil a passagem de uma postura intui-
Linguagem Musical com a preparação dos jovens
tiva (talento para compor, harmonizar, bom ouvido)
para o conhecimento e a prática dos elementos da
ou mecãnica (prática diária em um instrumento, por
teoria musical. Esmerou-se em preencher as lacunas
exemplo) para uma outra, cheia de porquês para tudo.
remanescentes do ensino tradicional, preparando
Para quê, perguntávamos. Havia a mesma descon-
todo o percurso a ser percorrido por seus alunos,
fiança em relação ao estudo da Harmonia Tradicional
com textos abrangentes sobre a gramática da escrita
e Contraponto, matérias outrora obrigatórias, e que
musical. Não se trata da teoria pela teoria: cada item
vários compositores desprezavam ãquela altura. Será
tem sua aplicação na prática de exercicios que esti-
que Análise erá importante mesmol* [...] A tarefa de
mulam o estudante a enfrentar, com autonomia,
Esther era estruturar, passar para o plano intelectual,
o repertório de todos os períodos da história da lin-
mental, o que tinhamos de ouvido, o que já sentiamos
guagem musical. E preciso destacar que o universo
ou pensávamos saber sem uma organização, para
dos participantes é de jovens já iniciados.
então voltarmos para uma experiência mais completa
da música. (Machado, 2002, p. 124-125)
De certo modo, a mestra busca superar as limi-s
tações do ensino da teoria elementar tradicional O processo parte da iniciação ã terminologia para
que supervaloriza a ideia de compasso, limitando l sua aplicação. As atividades com durações e alturas
o aluno ao enfrentamento de variados agrupa- devem ocorrer separadamente, prosseguindo com
mentos de valores da música moderna e também a ação conjunta de ambas. Uma particularidade é
da música antiga. que, no estudo das durações, a figura da “mínima” é
ponto de partida como “pulsação” e a soma de valores
A experiência de sala de aula com Scliar é algo que tem prevalência sobre a divisão. Uma mostra dessa
revela um intenso processo de amadurecimento por sequência será apresentada na atividade a seguir, cujo
parte dos alunos participantes. Pode-se avaliar essa objetivo é discernir, treinar, interiorizar e expressar
os sinais representativos de duração e altura.

Esther Scliar: uma vida para a música 173


No que concerne a valores de duração, optou-se pelo conteúdo dos
capítulos I e II do livro teórico Elementos de teoria musical (Scliar, 1985,
p. 2-7): Figuras - Valores - Semínima - Pausas de semínima - Pulsação -
Unidade - Lígadura - Mínima - Ponto de aumento - Semibreve - Novo
ponto de Aumento - Breve - Longa - Mínima dividida em duas par-
tes - Contratempo - Síncope - Acentos propostos.
De Elementos de teoria musical: caderno de exercicios (1987), foram
selecionados e transcritos, a seguir, alguns dos exercícios que cor-
respondem aos itens tratados na obra mencionada anteriormente,
conservada a numeração original.

6.4.1 Sinais representativos das durações (elementos)'f'

esses lt_ Eme to se, fia

1. Quando a mínima é a unidade, qual a duração das seguintes


figuras?

J. ,,. .,. J pl. 0..


2. No espaço ao lado, escreva o exemplo anterior, substituindo .
as figuras positivas ou negativas que possam ser trocadas por
Í uma figura simples ou pontuada que corresponda à mesma
l
1
duração. A seguir, com um traço vertical, assinale o início de
cada pulsação. Leia:

I'
JJJJ É-_...-›"`
.JH
"'¬-q.-,,.H.¡..›-P"
sJJJJ.l,l
“*-‹...,_,...v-'*-...¡.,,...«-v""'¬í..r'
Jul
,_ _ -r"""¬'¬-:-

? 5cIiar,1985 p.2-?.
8 ScIiar,198?,p.1D-11.

1?4 Elba Braga Ramalho


.1-

3; Assinale os momentos de apoio e impu.lso.de-,cada pulsação. Leia:

J à J J. J J J J. J
Indique os contratempos ÉC); as sílricopes regulares (SR) e irre-
L gulares (SI). Leia: À E . L

.J à J J. J JJ J J J - z
5. Abaixo, com um traçovertical, assinale o início de cada pulsa-
ção. Leia:

J. J z J z J J.___.l.___,.JJ--.
6. lnventeexercícios com a mínima em duas partes, contendo con-
tratempos, síncopes regulares e irregulares. Assinale-os. Leia.

6.4.2 Sinais representativos das alturas

No que diz respeito às alturas, o ponto de partida será o reconheci-


mento distinto entre tom e semitom. A seguir, o aluno é treinado para
a leitura de sequências de notas que constituem o trítono. O conteúdo
que se segue está contido nos capítulos III, V e VI da obra Elementos
de teoria musical (Scliar, 1985, p. 8; 10-17):
Tom - Semitom - Notas - Pauta - Pentagrama - Linhas - Claves:
leitura de notas - Tritono - Conjunção - Disjunção.

Esther Scliar: uma vida para a música


oexercicio is. 9

a) Execute um som no instrumento.


b) A partir do som executado, emita:

2 semitons ascendentes
2 tons ascendentes
1 semitom e um tom ascendente
1 tom e um semitom ascendente

2 semitons descendentes
2 tons descendentes
1 semitom e 1 tom descendentes
1 tom e 1 semitom descendentes

ísemitom ascendente e 1 tom descendente


1 tomascendente e 1 semitom descendente
1 semitom descendente e 1 tom ascendente
1 tom descendente e 1 semitom ascendente
c) Confira no instrumento.

7 Faça uma pesquisa de melodias que iniciam com as aruculaçoes A e B

“E eu
oeast äiÉ ea n. 1°

a) Execute um som no instrumento.

' , - fl"¿'-lJ""'i-

9 Scliar 198?, p. 12.


111 Adaptado de Scliar, 1981 p. 13-14.

Elba Braga Ramalho


:L A-'partir do som executado, emita:
2 tons ascendentes-e 1 se.mitom descendente
_ 2 tons e Tsemítorn ascendentes
3 tonszascendentes.

L 1 tem,1 semitom e 1 tomascendentes 3 semitons ascendentes-


;- zzzzz _ -
1 semitom ascendente,1 tom e 1 semitom
1 semitom descendente e2ítons descendentes ' ;z descendentes _
Vice-versa no
1 1 tem ascendente, 1 semitom e-1?-torn descendentes movimento 1 semitom e 2 tons ascendentes.
- fz- ~ 5 direcional
1 semitom e 1 tom ascendentes, 1 semitom
1 tom e 2 semitons ascen'de'n'tes descendente

1 semltom,1`tom e tsemitom ascendentes

2 semitons e 1~tom ascendentes 1 tom e Í semitom ascendentes, 1 tom descendente

lÍOlTI El5CEI'IdEI"lIE,l Semltüm ÓESCEITÓEHÍE, l Íüm


' ascendente

c) Confira no instrumento.

oexe? Wa www iii.. z tê. S"

1. Qual a diferença entre conjunção e disjunção?


Como é denominado ofespaço sonoro formado por 3 tons?
3. Ar-ticule as notas Fã, Sol, Lá e Si formando: tom, 2 tons, 3 tons, nas
claves de Sql (Zi Linha) e Fã (4? Linha). 1
4. sa .
4.I. .
a) Execute a nota Sol no instrumento. .
b) Cante a nota executada e a nota Lá.
1 c) Confira no instrumento.
V ff '*¬~-l LY __ . ff _\

11 5‹:1iar,1es?, p.1õ.

Esther Scliar: uma vida para a mú alas


4.11. Realize o mesmo exercicio executando Lã e, d`epo1`.s de repeti-la
cantando, cante o Sol. Idem com Fã)-Sol, Sol-Fã,. Lá.-Si, Si-Lá.
5. E E
5.1.
a) Execute a nota Fã no instrumento. L
bl Cante a nota executada e prossiga com Sol e Lá..
c) Idem a-b, cantando o Sol com menor intensidade.
d) Cante Fá-Lá (2 tons).
5.II. Idem com Lã-Fã, Sol-Si, Si-Sol.
6. O que ëfermata?
7. Realize a leitura entoada. (As notas entreparênteses deverão ser
ouvidas internamente). Não -esqueça de executar a primeira nota
no instrumento e confirmar as outras esporadicamente.

Í' V ' ''''* ` __ __ "J V H H '


,-1-ti /'I\

8.
8.1.
) Execute a nota Pá no instrumento.
SU

b) Depois de reproduzi-la cantando, cante Sol-Lá-Si.


- c) Cante Fá-Si (três tons).
8.11. Idem, com Si-Fã (descendente).
9. Realize a leitura:

_ _____ W , r-'IN
______0, AN-
-___ J -V J ' _ _ ml _ U A `````" V 1

IU. Invente melodias com essas notas.

17s Elba Braga Ramalho


Eaepios É tepertorio tradicionalllz

Come-Hom o 1/z, e 2 tons: 1 _. . - -


H' -ii
1 tom e irá ascendente: “Senhora Dona Sancha Í. Ole mulher
rençdeira”/“Peixe vivo”/“Greenleaves”/“Bambuí E -
1 tem e ii descendente: “Marinheiro chora”/"Cai chuva“f”A pom-
bínha voou”. - a
2 tons ascendentes: “Eu sou pobre”/“A maré encheu”/“Piai
Francisco” 1 ,_
Hií
2 tons descendentes: “O meu belo castelo/ Manda tiro”.
1 tom e *rã e 2 tons ascendentes: “G -b“om.pinto1;'*.
Com 2 tons o 112: ` 1
2 tons e *A ascendentes: “Havia um pastorzinho”/“A moda da
carranquinha” (ou “A moda das tais anquinhas”)/“Candieiro,
entrai na roda”/“Acordei de madrugada”.
2 tons e meio descendentes: “Bão-ba-la-lão”.
Comi tons o Vz e 4 tons:
Btons e aê ascendentes: “Lá vem a Sinhá Marreca”/“Travessia“.
4 tons descendentes: “Siciliana” (Álbum da Inventude, Schumann).

Soiiefis tre-ssiescotresenentes a itens


aotaadas

Observamos na obra Solƒejos progressivas (Scliar, 2003, p. 1-5) a inten-


çao da autora de apresentar as dificuldades gradativamente, com uso
de muitas variantes. A seguir, alguns dos solfejos selecionados, em
¡_-

que foram mantidas a mesma numeraçao e sequência do original:

Í - -l""'-_-¶- *_Í_¡_ ¡ -¡

12 ScI|ar,1985, $11.22.

Esther Scliar: uma vida para a música


1
'P1

1
'|

Cap Í, Éuujunçäes e Iliisjunçães [Fã-Si] (trechos), Išiathet Stiller


- ` ¿ Solfejos Ptogi'es`sivos-
1).' . " 2.1-J
ea-teaaâaaaanzeaea-lJfJ
nl 1 41.1
estaeseeaeeeaeaeeateesaesssaseàte tfitaJâ
emnneanaeeaeaneneaeasâae ›

5›J na e
fiL_.
G-@‹:›
13) J)

ssiwceattstnaíãutitraešw

Cap 2, Intervalos Ascendentes e Descendentes (trechos) Esthm. guga..


1 tem aäcjdeäci Fragmentos lvieiodmos Solfqos Progressn-'os
nl na ç

ieunãntfnnínsnseavseanue
` 51-gen 111o-leem pe-dra du- ra- nm-to ba-tea-ti: que l'11- ra ln - a lu' - a 'te'-_l11_ .de pra - ta
' 1 in tem ascjdasc. J =
_ _ 1) J - Bambu (fole. brasi_!-::iro___) 4) .J - Eu fi.zi_c.?1amado pra cantar {t`ol`c. 'orasil`eíro)

-'
uam-.bu ti-ra-hu a-nz - ci-ra man-tcsgaci-ra ' eu fui cha ›- ma-da pra can - tar no li-me - - rn

180
Elba Braga Ramalho
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_1B_R.a1N.CO,Í Cí. -6z:nét1od1o. Esther Scliar de teoria musica-Igutn. contrii›uiçãoz.paa:a¿


Í 1ii1üszic;a do Século Dis-punível em: <http://wwvtÇalšiëine1ducacaoníusical.

.acesso1 1e rn1:'1i5 abr. 2015. 1 " a1 . ` E a. .

trajetóri.a1en1_ do sabe=r:1 na histó-


ria das itii=.;ias..1ing1uísticas no1`RS.."Eiagm.entt.um,_.Sap1ta1 Maria..
Í 1 Íitittfesfista.. Dispçoitiivel 21. 2,/index.
1 2015.-F' 1 1 1

Funaera.. esmzgszliar. Disp-seiva-11.1em;.‹â1u.1p:.//v.¬vw.fúnar1ze.


gov.brfpjiasiíhfitiemoriadasartesfacervo/diiscos-pro-memus/ho1nenagem¬a-es-
1tl'1er--sclíar-19814 >. AeeSS€1.BII1;.1.8 mar. 201.5. A a E

notamos, 1. c. ae; cc. s s‹z.i¬.6.1à para Piàn61 de Esther s‹;11z.r(19ze-


19'}f'8): lingzu-agemharlnônica e es1q1.1'em1a formal. C0NG_RESS`O1DPi ANPPOÍVI -
E .átssíocraçao Ba.á.s1LE1ss..“oeiPssoutss.E1Posí;GeaoUs.çç.ã.o em Musica,
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0bras.essenciais11 1 1 _ 1 1
“LS-`C;LI;e.R, E. Análise=-ide-'zBoÍ1nsity.21.5 1do Váriso. FÍoriari1';'.ipoli1s: Athanor, 1985..

' .Eleinontos do1tooriaínu1sicaI. São Paulo: Novas M`etas1,119815. ç

H . Elementos do teoria `n1¡usica!:.caderno de exercícios.'São1.Paulo: Novas


1 Metas,Íi98“?;11 1 1 2 1 ' - . 1

1. . Erçafseoiogian1usicaI.São1Paulo: Nova Metas,-11982. 1 1 1 M ç ' '

“ 1 1 .¿S.olfej1os p_rogjressivos.;:RÍoáGrande do Sulflãoidberg

' 1““C.atâ1egnde.0b.ras de Esther1Sciia¿r”. In: MACHALDG, Es.tlto11.$1:iiar: um olhar


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Santa Maria-RS, n. 6, p. 11-33, 2001.

182
Elba Braga Ramalho
Capítulo 7

*s

-.-,_;:-
,. . _
_ Iosé Eduardo
‹.,,,
Gramani:
rítmica do
Gramani -
MLM-l'-
la a consciência
.,. . .z . ¡__,
musical
tw-
«. .».fi"Ê'›«'°"w

ãt _
4.
9'
do ritmo

* El:

,fm Wa:
Daniella Gramani e Glória Pereira da Cunha
Além de Olinda ainda se encontra quem rendas tece [. . .J

Se alguém pergunta o porquê do se fazer

Responde-se o porquê do perguntar

O tecer não tem um porquê

Enquanto ato de entrelaçar

Alem.. além

O entrelaçar significa

(Trecho da canção 'falem de Olinda”, de José Eduardo Gramani)

Daniella Gramani e mestre em musica pela Universidade Federal do Parana (UFPR), especialista em Fundamentos
da Música Popular Brasileira e graduada em Educação Artist-ica pela Faculdade de Artes do Parana (FAP). Atuou,
cantando e tocando, durante II anos no grupo Mundaréu. Atualmente é professora de Canto Popular e de Percepção
Musical da Universidade Federal da Paraiba (UFPB).
Glória Pereira da Cunha é mestre em Educaçäo pela Universidade Estadual de Campinas (Unicamp). Atuou por
22 anos como percussionista na Orquestra Sinfônica Municipal de Campinas e como professora de musica em
cursos e oficinas deformação continuada para professores. Trabalhou na Unicamp, atuando na Unibanda e no
Departamento de Musica, como professora de Rítmica, substituindo o Professor Iosé Eduardo Gramani.

í
z1 “O entrelaçar significa”1

lose Eduardo Ciocchi Gramani foi violinista, rabequeiro, compositor,


professor, pesquisador e criador de uma nova maneira de pensar o
discurso rítmico e o ensino desse tema. O material escrito pelo edu-
cador, que consiste em estímulos musicaís voltados para o trabalho
de desenvolvimento da sensibilidade rítmica, se encontra basica-
mente em três publicações editadas e em um livro inédito. Essa nova
perspectiva, chamada informalmente de rítmica do Gramani, é hoie
objeto de pesquisas acadêmicas e artísticas com forte aceitação por
parte de professores de Teoria Musical e Linguagem, percepção e
r-f I

estruturação musical. Varias universidades acrescentaram a disci -|

plina Rítmica aos seus currículos graças à divulgação desse trabalho


realizado por Gramani e seus discípulos.
Gramani propôs um novo caminho na busca de um aprimora-
mento da sensibilidade rítmica e, por consequência, da sensibilidade
musical, “para que o músico conte menos e sinta mais” (Gramani,
2008. p. 15).

7.1.1 “Método, receita rápida, sem dor”2

Gramani entendia a música e a arte como uma forma de expressão do


indivíduo e sua atuação como artista e professor teve essa premissa
como guia. Sua história de vida é marcada por um percurso de busca

¡- *_ -i""-_À'h- _`

1 Trecho de letra da canção “Além de Olinda", de José Eduardo Gramani.


2 Trecho de letra da canção "Que rernëtodo", de Jose Eduardo Gramani.

Iosé Eduardo Gramani: rítmica do Gramani - a consciência musical do ritmo 18


de caminhos próprios para se expressar por meio de o compositor faz uma crítica a esse direcionamento
sua arte, seja em um quadro, um jogo de palavras, um metodológico: ”Mé'I:odo, que método? Pra que pensar?
arranjo, um projeto, uma nova composição... O com- Pra que sentir? A verdade já está escrita. E viva a
positor utilizava de todos os meios disponíveis para mediocridadel”.
criar e assim se sentia pleno. A técnica era vista por Gramani não como fim,
mas como parte de um processo. É “logico que um
Quem conviveu com Gramani há de concordar desenvolvimento técnico é necessário; é preciso saber
que ele era inquieto, sempre inventando. Gostava falar para que o que se fala tenha significado; porém,
de criar e de compartilhar suas criações. Para o deixar que esse desenvolvimento técnico seja o ponto
músico, o artista devia falar por meio de sua arte e, de chegada - transformar um caminho em um tri-
como ele entendia que cada pessoa é um ser único, lho - é muita falta de imaginação, é inanição em alto
o processo artístico devia refletir e respeitar as grau” (Gramani, 2008, p. 173).
peculiaridades individuais. No entanto, o mestre A questão do mercado e sua relação com a arte
constatou que a forma como a arte é muitas vezes também foi alvo de suas criticas. “O advento do
entendida e ensinada vai na direção contrária a homo praticus encerra quaisquer possibilidades de
essa ideia. Para o professor paulista, a padroniza- o sapiens se tornar sensibilis; a sensibilidade até
ção, a técnica, a praticidade e o mercado são fatores existe, mas é travada o tempo todo pelos parâmetros
que influenciam de maneira negativa na formação de arte, que na maioria das vezes são parâmetros do
do artista, pois impedem a expressão pessoal em comércio de arte” (Gramani, 2008, p. 28).
prol de regras preestabelecidas e que não levam As críticas de Gramani eram fundamentadas
em consideração o indivíduo e suas características. na busca da sensibilidade e no desenvolvimento do
artista como ser único, criativo, com uma persona-
A padronização era percebida e criticada por lidade própria que poderia ser expressa via arte sem
s t t . Gramani em várias áreas das artes, o empobrecimento de um estudo fundamentado
.-Os-métodos.-;dee:1sirre ~
mas principalmente no ensino. Para o na repetição, na rotina. “Porque a arte exige um
rreøcvnënsemfliffl educador, “os métodos de ensino preo- entregar-se total. Exige descobertas, exige riscos”
i .m.ais“ccm.-amatéria
cupam-se muito mais com a matéria a (Gramani, 20 O8, p. 27).
ser ensinada e quase nada com o sujeito
que se dispõe a aprendê-la” (Gramani,
se 2008, p. 85). Na composição para coral
«z Que remetodol”,
z por meio da ironia,

186 Daniella Gramani - Glõria Pereira da Cunha


zz “Além de Olinda ainda se encontra quem renda
tece”3: uma formação não convencional

Gramani foi fundamentalmente um autodidata, com um prazer quase


infantil por aprender. Das primeiras aulas de violino à transformação em
professor de Rítmica da Universidade Estadual de Campinas (Unicamp),
o músico percorreu um longo e inusitado caminho, passeando sem pre-
conceito pela música erudita clássica e antiga e pela música popular,
brasileira ou de outros países.

iãšieieiišãšz de inteira a šão Panis M rien aos esiuus


.ifl ñdiã tl tlãfild'

Iosé Eduardo Cíocchi Gramani nasceu na cidade de São Paulo em 1944,


mas passou sua infância em Itapira. O Brasil do canto orfeõnico e dos
conservatórios não fazia parte da paisagem da cidadezinha do interior
paulista, onde Gramani viveu seus primeiros anos de vida. Em Itapira,
Gramani alimentou seu gosto pelas cordas entre congadas e programas
de rádio de música orquestral, como a Orquestra Mantovani; aos 7 anos,
escolheu como presente um violino. Durante dois anos estudou com Pedro
Ramonda, relojoeiro e trombonista; depois estudou mais cinco anos de
violino com Alice Ramonda, pianista e acordeonista, que, curiosamente,
nunca havia tocado violino na vida. Em 1961, com a mudança da família
para a cidade de São Paulo, passou a estudar violino com violinistas e,
em 1965, passou a atuar em orquestras profissionais.

'_ r . - -I"""*_"'i- _ _*

3 Trecho de letra da canção "Além de Olinda”, de José Eduardo Grama ni.

josé Eduardo Gramani: rítmica do Gramani - a consciência musical do ritmo


1966»-19'?.§: âã Paul a Sã arenaašuã -«
primeiros assasea riessar

E1111966, Gramani começou a estudar violino com Moacyr Del Picchia,


por meio de quem conheceu, juntamente com Maria Amália Martins
(Malinha), pianista, professora de musicalização e rítmica, as ideias
e estéticas da vanguarda musical implantadas por Koellreutter nos
Seminários Internacionais de Música da Bahia. Del Picchia assumiu
as funções de coordenador pedagógico da Fundação das Artes de São
Caetano do Sul (FASCS), criando uma escola na qual a valorização da
estética musical contemporânea era parte fundamental do ensino.

O ensino dos conservatórios minguava pela falta de renovação e


o das universidades engatinhava e não se constituía como opção
real para a formação de músicos. Gramani encontrou, na FASCS,
uma escola livre das amarras da tradição e da burocracia oficial,
o local ideal para prosseguir com sua formação.

De 1969 a 1976, Gramani atuou na FASCS, onde estudos e trabalho


se misturavam em seus afazeres diários. Completou o curso livre
de Formação Musical, continuou os estudos de violino e começou a
estudar violão, percussão e bateria. Estudou por conta própria flauta
doce, bandolim, viola da gamba, rabecas medievais e lerumhorns.
Também participou de um grupo de pesquisa sobre composição
vocal contemporânea orientado por Rufo Herrera; tocou em grupos
de música popular, jazz e música antiga. Foi professor de violino e
música de câmara.
Na FASCS, Gramani estabeleceu contato com rítmica pelas mãos da
Professora Maria Amália Martins, tornando-se seu assistente e pos-
teriormente professor da cadeira ocupada pela educadora. Ainda na
citada instituição, participou da Oficina de Rítmica de Rolf Gelev-.rsky

Daniella Gramani -~ Glória Pereira da Cunha


(Alemanha e Bahia) e estudou aspectos da obra pedagogica de Carl
Orffí* e Edgar Willemsi. O educador pesquisou vários livros especí-
ficos de solfejo rítmico, como Treinamento elementar para musicos, de
Paul Hindemith, e teóricos, como El ritmo musical, de Mathis Lussy,
e Elementos de rítmica musical, de Iúlio Bernaldo de Quirõs.
A partir de 1973, Gramani começou a levar o trabalho de rítmica
para outras escolas de São Paulo - Faculdade Paulista de Música,
Colégio Técnico Paulista e Coral da Universidade de São Paulo
(Coralusp) - e compilou seus exercicios em uma apostila, chamada
Rítmica, editada pela FASCS e Coralusp em 1974.

°l§?5-ii: da šiníõnica unícipaiaàs I fii Ui Q;

Unica -- reencnir se a rítšca

A partir de 1976, Gramani passou a morar em Campinas (SP). Foi con-


tratado pela então recém-criada Orquestra Sinfônica Municipal de
Campinas (OSMC) como violinista, também atuando como professor
e integrando o quarteto de cordas da instituição.
A cadeira de Rítmica na FASCS passou a ser ministrada por Gloria
Pereira da Cunha, que organizou o trabalho de rítmica construído
na escola por Gramani e por “Malinha”, completando-o com novos
exercicios e adequando-o para seus alunos, jovens profissionais liga-
dos à música popular, com pouco conhecimento de leitura musical.
Em 1977, a FASCS editou a apostila Rítmica: níveis 1, 2, 3 e 4, assinada
por Gramani e Glória Cunha.

¡- _, Í -l""'-__"'I- ~ - -`

4 Ver Capítulo 4 da seguinte obra: MATEIHO, T.; ILARI, B. Pedagogias em educação musical. Curitiba:
InterSaberes, 2912.
5 Ver Capítulo 3 da seguinte obra: MATEIRU, T.; ILARI, B. Pedagogias em educação musical. Curitiba:
I nterSaberes, 21112.

josé Eduardo Gramani: rítmica do Gramani - a consciência musical do ritmo


Em 1980, trabalhando um semestre como pro- Das transcrições de Stravinslcy, o educador pau-
fessor visitante na Universidade Federal da Paraíba listano passou a compor sistematicamente seus exer-
(UFPB), Gramani se reencontrou com a rítmica. Foi cícios e praticamente terminou o repertório do seu
também nesse momento que ele conheceu as ideias primeiro livro de rítmica em dezembro de 1981.
pedagógicas de Paulo Freire, de quem passou a ser
um leitor voraz. Trabalhar na Unicamp aumentou ainda mais a
diversidade cultural de que Gramani tanto gos-
iãišieiããaâ a *Í-É Etna É lts se ünieanâp W
Wa? tava. Foi convidado para reger um coral cênico
da.sensnivimentn das älíã ias tittnicas de jovens universitários, o Coralatex, e tornou-se
também arranjador, compositor e poeta, incor-
De volta a Campinas, foi contratado em 1981 como porando em seu trabalho uma estética urbana,
professor de Rítmica pela Unicamp, que iniciava seus popular e contestadora.
cursos oficiais de música. Com um grupo de amigos
músicos, passou a estudar a “História do Soldado”, Durante esse período, também tocou e regeu em
de Igor Stravinsky. A proposta não era apenas tocar, outras orquestras e corais; formou grupos, compôs
mas entender a obra. Os ensaios semanais se esten- e fez arranjos. Seu trabalho de rítmica tornou-se
deram ao longo do ano e os contrapontos rítmicos cada vez mais conhecido, fato que o fez ser convi-
de Stravinslcy foram um estímulo para Gramani: dado para ministrar aulas em diversos festivais e
cursos de férias.
estava estudando a parte de violino da “História do
Soldado” de Stravinslcy e, tendo dificuldades em alguns i
iâãâflf asentre iííamíaas e iandtirsa «-
Silñitltfl

trechos, comecei a estudar os contrapontos rítmicos


aiau gana as “rítmica da ãraani”
Mid

fantásticos que ele escreveu. Aí montei alguns trechos


a duas vozes rítmicas e estudei, resolvendo assim os
Em 1984, Gramani se desligou da Orquestra de
problemas. Então levei os exercicios para os meus alu-
Campinas e pode se dedicar mais as suas outras
nos na Universidade de Campinas, eles estudaram e o
atividades. Como regente coral e orquestral, passou
resultado foi muito bom. Isso me animou a pensar o
a atuar em Campinas e Londrina (PR). Grande parte
porquê não estudar ritmo com aquelas características.
de suas composições dessa época foram para coral e
(Gramani, citado por Paz, 2000, p. 148)
dedicadas aos grupos com que mantinha contato ou
nos quais regia. Em 1985, gravou como solista os con-
certos de Bach com a Camerata Barroca de Campinas.

190 Daniella Gramani - Glória Pereira da Cunha


Em 1986, lançou, pela Editora Minaz, seu primeiro desenvolveu uma relação que foi além dos currículos
livro, Rítmica, em edição bilingue. Em 1988, o livro da universidade, fato que demonstra que Gramani
foi ampliado e reimpresso pela Editora Perspectiva. era um grande exemplo de professor, músico e pessoa.
Parte desses novos exercícios foram organizados por
na aaa aa: ritmiea raaca - aaa ele no livro Rítmica viva, impresso pela Editora da
c 1*alaÉ ä9 seuía, nauas saisas Unicamp em 1996 e reeditado em 2008.
Além de sua atuação na Unicamp e da publicação
Na década de 1990, Gramani atuou principalmente dos livros, uma das maiores formas de divulgação de
com grupos de câmara, bem como em gravações e seu trabalho de rítmica foi a participação em eventos
composições, continuando o trabalho de rítmica de música como o “Festival de Música de Londrina”,
por meio das aulas em cursos de férias. Encantado as “Oficinas de Música de Curitiba” ou “Encontro
pelas rabecas, elaborou várias composições para esse Direção Orquestral” em Assunção, no Paraguai.
instrumento, inserindo-o nos grupos e divulgando-o Em 1998, Gramani faleceu, deixando um vasto mate-
no meio musical que mais frequentou nessa época: rial produzido ainda a ser conhecido. São muitas com-
Campinas e Curitiba. Esse trabalho, sua segunda posições inéditas e não editadas, mais de 50 poesias não
grande pesquisa, também se tornou uma referência. publicadas, um compilado de exercícios para estudo
do violino e mais um livro de rítmica não publicado.
Somente nós, do Movimento Armorial, tínhamos olhos
e ouvidos receptivos para a importância da rabeca e 7.2.1 Produção musical e pedagógica: “E tece
da viola. Hoje, compositores e intérpretes do quilate fendas, emendas, emblemas e gemas”6
de lose Eduardo Gramani e Roberto Corrêa percebem
o que tais instrumentos significam para a música Gramani era um artista inquieto e, por isso, sua pro-
brasileira. (Suassuna, 2000) dução foi extensa e diversa, abrangendo obviamente
Gramani fundou os grupos Trem de Corda, Anima, a área musical, mas também passando pelas artes
Trio Bem Temperado e Oficina de Cordas, cada qual plásticas, pela fotografia e literatura, tendo inclusive
com sua especificidade, atuando como instrumen- publicado em 1986 um livro de poemas em parceria
tista, arranjador, compositor ou diretor musical. com Gisele Ganade: Contraponto.
Continuou como professor de Rítmica da Unicamp,
produzindo novos estímulos Inualealã para seus alu-
nos, que podemos chamar mesmo dedisaípulos, pois, .p Í A T A- -Í -r""'**-u- - z _,

com grande parte desses jovetlã âli-J-tizfli, o educador 6 Trecho de letra da canção "Além de Olinda”, de José Eduardo Gramani.

josé Eduardo Gramani: rítmica da Êrarfiããl r â eããããlênaia musical do ritmo 191


astraeatista

Como violinista solista, Gramani gravou, em 1985, o LP johann Sebastian


Bach, Concertos para violino (BWV 1041, 1042 e 1043) com a Camerata
Barroca de Campinas.
Divulgou as rabecas e suas criações nos CDs de grupos que partici-
pou - Trilhas (1994) e Espiral do tempo (1997) - e no Mexerícos da rabeca
(1997), um trabalho autoral. Participou, entre outros, do CD Crisdlída
(1996), do violeiro Roberto Corrêa, e, como diretor musical, no CD Terra
sonora (1997), do grupo homônimo de Curitiba.

Asraaiaar a catnsitar

Arranjador de mais de 70 músicas, Gramani escreveu para coral, orques-


tra de cordas e para diversas formações instrumentais. Como compositor,
destacou-se pelas músicas que escreveu para suas rabecas. Ao final de
sua vida, já havia criado mais de 100 composições - algumas são canções
e têm letras suas; outras foram compostas em parceria, mas a maioria
é instrumental. Muitas delas são inéditas até hoje, porém outras foram
interpretadas e gravadas pelos grupos Anima, Carcoarco, Terra Sonora,
Mundaréu, Rosa Flô, Orquestra Sinfônica de Campinas, Madrigal in casa e
Mavvaca, bem como pelos artistas Ana Salvagni, Isa Taube, Zé Esmerindo,
Daniella Gramani, Denise Gonzaga, Mario Silva, Indioney Rodrigues,
Luiz Henrique Beduschi, Ricardo Matsuda e Patrícia Gatti, entre outros.
Em 1974, publicou a apostila Rítmica, uma coletânea de exercícios rítmi-
cos a duas vozes, pelo CoralUSP e pela FASCS, instituições em que atuava
como professor. Esse trabalho foi uma ferramenta auxiliar nas suas aulas,
nas quais os exercícios apresentados eram abordados de formas diversas
e em conjunto com outras atividades de coordenação, de ditados e leituras.
Em 1977, a Fundação das Artes de São Caetano do Sul publicou outra
apostila do autor chamada Rítmica: níveis 1, 2, 3 e 4, organizada por Glória

192 Daniella Gramani - Glória Pereira da Cunha


Pereira da Cunha, com sua supervisão. Nessa publicação, houve uma
preocupação em obedecer uma ordem crescente de dificuldade, cada
nível correspondendo a um semestre do curso de formação da FASCS.
Todos os exercícios da primeira apostila de Gramani estão presentes,
acrescidos de outros. A maioria deles explora a leitura a duas vozes
realizadas de várias formas por meio do corpo.

Apesar de ter o mesmo nome das apostilas, o livro Rítmica, publicado


em 1996 e reeditado em 1988, traz. outros exercícios e aprofunda os
trabalho com concepção contrapontística de ritmo por meio da con-
traposição de elementos rítrnicosirregulares com sequências rítmicas
regulares. Essa é a publicação de maior divulgação do trabalho de
Gramani e sem dúvida a mais utilizada pelos professores de música,
sendo adotada em várias escolas de música e universidades.

já o livro Rítmica viva segue a mesma linha de exercícios da obra


anterior, mas com textos do autor que explicitam suas concepções de
música e ensino. “A arte ou artista?”, “A compartimentalização, um
problemão”, “Metrõnomo” são alguns dos titulos desses textos em que o
autor explica de forma clara as inquietações que o levaram a construir
o trabalho com rítmica.
.III

Como publicaçao do trabalho desse artista, podemos ainda acres-


centar o livro Rabeca: o som inesperado (2003), organizado por Daniella
Gramani. Fundamentado na sua pesquisa - registros e entrevistas sobre
o modo de construção de rabecas de quatro construtores diferentes,
coletados pelo educador entre 1996 e 1997 -, o livro descreve o estudo
realizado, o modo de ele de pensar a rabeca, bem como contém algumas
de suas composições para esse instrumento. Além de textos do próprio
Gramani, o livro conta com textos de Daniella Gramani, Ana Salvagni,
Glória Cunha, Esdras Rodrigues e Luiz I-Ienrique Fiamimghi, escritos
com o olhar de cada um sobre o material coletado na pesquisa.

josé Eduardo Gramani: rítmica do Gramani - a consciência musical do ritmo


za “O tecer não tem um porquê enquanto ato de
entrelaçar”7

O objetivo maior de Gramani em seu trabalho era o seguinte:

A busca do significado musical do ritmo através de exercícios envolvendo


voz, percussão corporal e regência. A busca de novas relações que permitam
uma realização MUSICAL do ritmo e o afloramento da SENSIBILIDADE
em equilíbrio com o racional. (Gramani, material pessoal de divulgação
de curso, arquivo de família, grifo do original) ll

Gramani observou a precariedade do ensino de música com rela-


ção ao discurso rítmico, chegando à constatação de que, na maioria
dos casos, o ensino do ritmo é limitado ao ensino da leitura e, para
isso, a questão puramente aritmética é evidenciada e desenvolvida,
sem o envolvimento de fatores como a sensibilidade, interpretação
pessoal etc. O ritmo fica ligado ã matemática, e não à música. Nas
palavras do compositor:

quando se cantam quatro semicolcheias, não se está cantando uma medida,


e sim uma ideia musical. Qualquer ideia, quando expressa por pessoas
diferentes, tem “cara” diferente, individual caracterísrica._(Gramani,
zoos, p. 67)
A “rítmica do Gramani” alarga a visão de ritmo como medida, sai
do terreno da matemática para o da arte, para assim “desenvolver
uma visão polifônica do discurso rítmico, colocando-o em pé de
,_ _ _ -nfi"“:.-

7 Trecho da letra da canção "Além de Olinda”, de José Eduardo Gramani.

194 Daniella Gramani - Glória Pereira da Cunha


Figura ?.'l -- Gramani e uma da suas rabecas
igualdade com os discursos melódico e harmônico” (Gramani, mate-
rial de divulgação de curso).
Os exercícios de Gramani são realizados pelo uso da voz, da
percussão corporal e da regência, não é preciso um instrumento.
No entanto, o educador sempre estimulava seus alunos a criarem
situações semelhantes às apresentadas nos exercícios em seus ins-
trumentos. “Estes exercícios não são um fim e sim um meio através
do qual muito pode se desenvolver, principalmente os aspectos de
PI'

disciplina interior e flexibilidade de adaptação a novos tipos de asso-


ciações ou relações” (Gramani, 1988, p. 12).
De um modo geral, Gramani compôs seus exercícios com base
em uma contraposição de vozes o que faz com que o músico tenha
de dividir sua atençao e buscar novas formas de relações musicais
que não somente a aritmética.

A maioria dos exercícios foi construída explorando a contraposição de Crédito: Acervo da familia
elementos rítmicos irregulares a sequências rítmicas regulares. Portanto
fica difícil medir as durações utilizando-se somente de medidas aritmé-
1-icas.É necessário lançar-se mão da sensibilidade musical para que esta,
agregada ao raciocínio aritmética possibilite a realização musical dos
“Gs exefcíciosfneäussãa” P 9
exercícios. (Gramani, 1988, p. 12)
si1a u-m..-meicé1
Os exercícios são complexos se o músico tenta realizá-los con- rãattavéísêde-csuslçmflitfl e
tando tudo; é uma tarefa quase impossível. Quando a sensibilidade fipadetsee¢les.envaIver, .
é requisitada e utilizada, o músico passa a sentir as vozes em sua 1n=.ie¢i.sa.Imefl*%s,
independência e descobre que os exercícios, mais do que complexos, aspectos.dierlistipilinafi r
sao mu1to muslcals. 0iiiteritifefieiriliiliitliatie s
Em um material de divulgação de um de seus cursos, Gramani
2 fi°.“°#e
4Cc
esclarece que ,ÍEtigiešídeassútlatçãçetss*euc 9 sí
-ft-rëlaçãsSí'tlGra1aani¿1988;, ,
RÍTMICA e RÍTMICA VIVA não são livros de leitura rítmica; RÍTMICA
f -:-.'1Íi:f.::. Í
e RÍTMICA VIVA nao sao métodos e sim uma coleção de estímulos ã qual

josé Eduardo Gramani: rítmica do Gramani - a consciência musical do ritmo 195


o musico deverã responder através de sua sensibilidade, fazendo intervir o
racional apenas nas situações em que se apresentam duvidas sobre a referência
métrica. (Gramani, material de divulgação de curso, grifos do original)

Gramani não sugere uma ordem fixa de execução dos exercícios ou


uma sequência; cada um deve procurar seu caminho entre os vários estí-
mulos que os livros de rítmica de Gramani trazem. Porém, o educador
organizou alguns blocos de exercícios que podem ser reconhecidos pelo
título em comum (série, estrutura de pulsação, leituras, divertimentos
etc.). Esses blocos constam nos dois livros e são formados por ativida-
des que apresentam uma estrutura próxima, uma forma de execução
semelhante. Normalmente, o primeiro exercício de cada um desses blo-
cos, apresentado no livro Rítmica, é o de execução mais simples, e vale
começar por eles.
Para apontar algumas das questões que embasam o trabalho de
Gramani, vamos tomar como exemplo o exercício chamado série 2-1,
cujas indicações servem para a execução de qualquer um dos exercí-
cios propostos pelo autor. A série 2-1 é um dos primeiros exercícios que
Gramani trabalhava com seus alunos.

Figura 7.2 -- Série 2-1

í¬,Ífn,í¬aa,í-.fijlfi > DÊ ” ,
jm-na”
I' jim)-.eaa,1'1"J-ai
M ,1¬¬¬a>
i fi ,
:r=- :› :-=- :› 2:- ':-

Fonte: Gramani, 1992, p. 19.

196 Daniella Gramani - Glória Pereira da Cunha


éigora 1.3 - Professor e pesquisador
Cada série tem, em seu nome, números que indi-
cam a relação de valores entre as figuras rítmicas
utilizadas.” Assim, a série 2-1 é composta apenas
de-colcheias (2) e semicolcheias (1), enquanto a
série. 3-1 é formada por concheias pontuadas (3)
e semicolcheias (1), es assim por diante. Não há
fórmula de compasso - são três períodos com qua-
tro estruturas rítmicas diferentes, quantitativa. e
qualitativamente diferentes entre si. Os apoios e
acentos estão sempre nas notas longas e, para que
a ideia musical da série seja atingida, é importante
respeitar essa acentuação.
As séries sao estudadas com ostinatos contra-
postos a elas. Por exemplo: ao mesmo tempo que Crédito: Acervo da família
a série 2-1 é cantada, Gramani sugere um osti-
nato de colcheias sendo executado por batidas na
mão esquerda enquanto a mão direita marca na
Antes de cada exercício apresentado nos livros,
regência os acentos da série. É importante cuidar
existem textos com explicações e sugestões de prá-
para que uma voz não influencie a outra -. não
ticas preparatórias, que isolam alguma dificuldade
pode haver subordinação da série pelo ostinato
que pode ser encontrada pelo aluno na execução
e vice-versa. Elas devem acontecer como em um
do exercício em si. Em outros pontos, são sugeridos
contraponto, como linhas melódicas caminhando *-" il li
caminhos para a realizaçao indicando como montar
juntas, mascada qual com sua autonomia. Cada
o exercício. Esses pequenos textos também explicam
estrutura, a frase e o ostinato, deve ter sua ideia
a estrutura musical de cada atividade e realmente
musical preservada, sua “personalidade”. Essa ques-
auxiliam em sua compreensão e realização.
tão é um dos pontos mais trabalhados por Gramani,
Em suas aulas, Gramani sempre indicava algu-
tanto em seus livros como em seus cursos: ao con-
mas formas de criar outros exercícios baseados nos
trapor duas ideias musicais, observar para que elas
que ele propunha, bem como de compor melodias
não se modifiquem por estarem sendo executadas
utilizando os exercícios ou buscar outras maneiras
conjuntamente.
de realização das atividades (corpo, instrumentos).

Iosé Eduardo Gramani: rítmica do Gramani - a consciência musical do ritmo 19?


Também encontramos em seus livros pequenos conselhos que aju-
dam a encarar os desafios propostos pelo autor:

Procure não estudar o mesmo exercício o tempo todo. Mesmo que ainda não
se esteja se saindo bem, estude outro, volte depois para aquele ou para outro.
(Gramani, 2008, p. 106)

Colocar músicas conhecidas, estudar com gravações. (Gramani, 2008, p. 106)

É bom estudar sem ler. A leitura pode dar a impressão de que o exercício é
mais difícil do que realmente é. (Gramani, 2008, p. 143)

Veja a célula ou motivo rítmico que vai ser trabalhado,feche os olhos e sinta
o balanço do contraponto rítmico. Dançar também é bom. Para assimilar
bem a ideia rítmica do ostinato. (Gramani, 2008, p. 143)

Devem-se trabalhar exaustivamente as inversões das vozes para que se possa


criar oportunidades de novas associações acontecerem, ao mesmo tempo que
a sensibilidade MUSICAL é cada vez mais solicitada. (Gramani, 1988, p. 12,
grifo do original)

__ _ _ L . O ditado rítmico frequentemente era usado no início


“Procure naoeeestiudari
s e de suas aulas e era uma forma de colocar em pauta um
e mesmo ettertítiuza , . . . .
s As e aspecto r1tm1co a ser trabalhado em segu1da nos exerc1c1os,
tempo tndsszflesnio. . ,
se _,¿ como terc1nas, s1ncopes etc.
que ainda nas-seiesteja,
se sarmle
outro, volte
aquela ou
lfitauranr,

Daniella Gramani - Glória Pereira da Cunha


14 “Abrande esta mania de saber, aguce essa
maneira de sentir, que muito mais gostoso é
descobrir”8

O material didático de Gramani está escrito em partitura, mas isso


não significa que seja necessário um conhecimento de leitura de
partituras por parte dos alunos. Podemos (e devemosl) utilizar suas
ideias pedagógicas e musicais para o trabalho com ritmo e com música
em seu aspecto mais amplo, não deixando que o exercício da leitura
seja um empecilho.
É preciso uma grande atenção por parte do professor para perceber
o tempo que cada aluno necessita para afinar sua sensibilidade. Não
dê muito tempo para seu aluno “entender", nem dê muitas explica-
ções durante a atividade - faça-o sentir: sentir a pulsação-base, sen-
tir cada voz, sentir as duas acontecendo ao mesmo tempo, mas com
consciência de cada uma delas em separado. Os comandos devem
ser simples, e não há problemas se o aluno lhe imitar, isto é, se ele
usar seu ouvido musical para sentir o exercício.
Todo o trabalho de rítmica deve ser feito de forma lúdica. Gramani
era reconhecidamente uma pessoa com humor e que levava essa
sua característica para a sala de aula, fazendo os alunos encararem
cada exercício como uma brincadeira e cada dificuldade como um
desafio prazeroso. A atenção do professor precisa estar focada no
relaxamento de todos e nas descobertas de cada um.

i _¡""¿_:-li' 1:

8 Poesia de-José Eduardo Gramani, não publicada.

Iosê Eduardo Gramani: rítmica do Gramani - a consciência musical do ritmo


A quantidade de tempo - aulas e horas - para Trabalhe o primeiro período: cante e peça para
esse trabalho depende da idade, da experiência e que os alunos repitam, cantem junto, como se
da quantidade de alunos. Muitas vezes, os alunos fosse uma canção. Repita de formas diversas
inicialmente irão lhe imitar, e, como afirmamos com mãos, pés ou instrumentos.
anteriormente, não há problemas em relação a isso. a) Os alunos devem observar que há notas cur-
Cada passo do trabalho pode ser feito em sequência, tas e longas eque as longas são acentuadas.
todos na mesma aula, ou ser uma das atividades da b) Peça para que cada aluno cante toda a
aula de música. Nesse caso, é importante sempre canção batendo palma só nas longas, e em
retomar a etapa vivenciada nas aulas anteriores seguida que bata palmas em toda a música
antes de iniciar a nova. e com os pés nas longas. Inverta as vozes.
As duas atividades descritas a seguir foram fun- c) Peça para que os alunos, em duplas, um em
damentadas nos princípios defendidos por Gramani, frente do outro, batam palmas nas curtas e
mas não estão em seus livros. A condução dessas batam na palma do colega nas longas.
atividades foi construída com base em aulas minis- d) Idem com grupos maiores ou em rodas.
tradas pelo educador e na experiência destas autoras 2. Trabalhe deforma similar os outros dois perío-
em sala de aula com o trabalho de rítmica. Como as dos; observe com os alunos a diferença entre
atividades publicadas por Gramani sempre contam eles, o que mudou de um para o outro.
com um texto que sugere um modo de fazer, resol- 3. Iunte os períodos completando a série.
vemos propor aqui atividades diferentes que podem Esse trabalho inicial é apenas para assimilar
ser realizadas independentemente do nivel de leitura a ideia musical, respeitando a acentuação das
rítmica e podem ser trabalhadas em aulas coletivas longas e para memorizar a série para as etapas
ou individuais. seguintes.
Marque a colcheia com notas na região grave
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do piano e peça para que alunos andem pela
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tšä re*ä para ãerie É»-i sala-com essa medida; no agudo, toque a série.
a) Conte quatro colcheias e, sem parar o passo,
É muito importante que você leia as observações peça para que os alunos cantem a série
escritas por Gramani sobre as séries antes de iniciar inteira. i A
o trabalho. A série é composta de três períodos, com b) Realize a atividade várias vezes, com anda-
quatro compassos cada um. mentos diferentes.

200 Daniella Gramani - Glória Pereira da Cunh E1


5.
Façavariações: É _ _,
a) Toque as colcheias num tambor e cante a série junto com os
alunos. t s A A _
b) Os alunos. podem bater palma ou tocar em algum instrumento,
em vez de cantar; “ ' se s
C6. Repita os passos 4 e 5, mas marcando a colcheia pontuada em vez
da colcheia. t t . t

Para continuar o trabalho

J) Decodificando: depois de perceberem e realizarem a série, peça


para que os -alunos montem a série com canudinhos cortados em
tamanhos diferentes ou escrevam com sinais convencionados com
ea turma, como bolinhas e tracinhos ou “pés gregos” (______v _____v v
__v v v ___v v v v).
.D Compondo: em duplas ou grupos, apresente a série e invente com
os alunos outras formas de execução com percussão corporal ou
com instrumentos, por exemplo.
J) Divida as sala em dois. grupos: um aluno deve marcar a colcheia
pontuada e o outro, a colcheia. Realize a atividade algumas vezes
com cada um dosfgrupos separadamente. Em seguida, o grupo
da colcheia pontuada e os da colcheia devem realizar a série
simultaneamente.

w tisia 2: trans han sand Ê.


i Wi me ü É É fišn É.. W
e tarnri ote

Essa atividade ê concebida tendo como principal objetivo o trabalho com


a contraposição da subdivisão binária e ternária de um tempo, trans-
formando a execução dessa polirritmia em uma execução polifõnica

josê Eduardo Gramani: rítmica do Gramani - a consciência musical do ritmo


Nessa situação, o chamado 2 contra 3 aparece muitas vezes nos exercí-
cios de Gramani.

Estabeleça uma pulsação regular marcada por palmas.


Subdivida essa pulsação em duas partes iguais, contando 1, 2, 1,2,1, 2.
Fique atento para que a pulsação-base continue regular e no mesmo
andamento. Prossiga por um tempo até sentir que a execução tor-
nou-se fácil. Você pode dar esse comando e deixar que os alunos
realizem a atividade sozinhos ou demonstrar como os alunos
poderão lhe imitar.
Pare a subdivisão com avoz e continue executando a pulsação-base
na palma.
Nesse momento, subdivida a pulsação em três partes iguais, con-
tando 1, 2,3,1, 2, 3.
Atente para que essa subdivisão seja realmente em três partes
iguais e para que a mudança de subdivisão não altere o andamento
da pulsação-base.
Pare a subdivisão com a voz e continue executando a pulsação-base
na palma.
Alterne essas duas subdivisões, em dois e em três, por um tempo,
até você perceber que seus alunos já estão fazendo essa mudança
sem precisar lhe imitar.
Passe a pulsação-base para os pés e treine com os alunos a mudança
de subdivisão nas palmas. Se necessário, mantenha a contagem
na voz. Também é interessante que os alunos caminhem pela
sala ou façam um “balancinho” com o corpo, internalizando a
pulsação-base.
Se você estiver em uma turma, divida-a em dois grupos, cada um
de um lado da sala. O primeiro marcará nas palmas a subdivisão
em dois, e o segundo, a subdivisão em três. Inicialmente, haverá
uma espécie de conflito, cada grupo querendo se destacar do outro

Daniella Gramani - Gloria Pereira da Cunha


para não se confundir. Peça que eles realizem É comum oç aluno dizer- que- não conseguiu
a atividade em um volume mais baixo e enfa- repetirem casao que ele realizou em sala de aula.
= tize que todos devem executar a pulsação-base É assim mesmo: repita a construção do 2 contra3 E
i juntos. Alterne os grupos. Nao interrompa a em algumas aulas o aluno conseguirá fazer a ati-
'pulsação-base nem corte o fluxo. Quando eles vidade em casa, sozinho. Também é comum que o
já estiverem mais tranquilos, peça para que aluno realize plenamente a atividade; no entanto, é
andempela sala. possível que você-perceba que ele encaixou as vozes
9. O próximo passo requer bastante concentração.. pela forma de execução. Nessa situação, é impor-
Os alunos devem continuar marcando a pulsa- tante que você explique para o estudante que essa
ção-base no pé; peça para que ieles marquem a não é a proposta, que essa forma de pensar pode
subdivisao emdois nas palmas e depois para prejudicar o resultado musical. Na sequência, pro-
É

que contenta subdivisão em três com a voz. ponha outras formas de realização, como cantar
Preste muita atenção, pois muitas vezes a subdi- uma música binária e depois uma ternária, ou
visão ternária é alterada em função da binária invertendo as mãos, ou com a pulsação-base na
e vice-versa. Alterne as vozes, subdividindo em voz e as subdivisões no pé e na palma. Em resumo,
três nas palmas e contando em dois. crie uma forma que faça com que ele não possa
10. Em seguida, tente fazer com que a pulsação-base racionalizar excessivamente e consiga sentir as
fique no pé, a subdivisão binária em uma das ideias musicais.
mãos (batendo na carteira, por exemplo), e a
ternária na outra mão. Deve haver alternân- Gramani nos avisa que “o caminho que nos tenta
cia de voz entre uma subdivisão et outra, como levar a uma realização artística frequentemente nos
forma de verificar se cada ideia musical está conduz a uma capacitação de habilidade técnica,
preservada. Lembre-se de inverter as vozes, e ficamos por aí. E não percebemos. E acreditamos
alternando as subdivisões entre as mãos. estar fazendo arte” (Gramani, 2008, p. 68). Para além
e Em nenhum momento encaixe uma voz na da mera execução de exercícios, o educador estava
outra - tente sentir o tempo todo o “dois” eo preocupado com o fazer artístico pleno, com o desen-
' A sl --
“tres ; por isso, é importante não parar entre um volvimento do músico, de sua sensibilidade, de sua
passo e outro, priorizando a não interrupçao da intuição, de sua música.
É

pulsação-base.

josé Eduardo Gramani: rítmica do Gramani - a consciência musical do ritmo 203


Para sabermaƒis A -Livros já A'
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O site indicado contém informações, pesquisa
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:Ant Daniella Gramani - Gloriaifere-irada Cunha


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josé Eduardo Gramani: rítmica do Gramani - a consciência musical do ritmo 2


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Lucas Ciavatta é mestre em Educação pela Universidade Federal Fluminense (UFF), músico licenciado pela
Universidade Federal do Estado do Rio de janeiro (Unirio), criador do método de educação musical O Passo, diretor
do Instituto d'O Passo e do grupo de percussão e canto Bloco d'O Passo. Desde 1996, época em que criou o método,
tem viajado pelo Brasil, EUA, França, Alemanha, Áustria, Chile e Uruguai, realizando oficinas e cursos para divul-
gação e ampliação de seu trabalho.
Daniela Ferreira Nunes tem MBA em Gestão Cultural pela Universidade Candido Mendes (Ucam), além de bacha-
relado e licenciatura em História pela UFF. É uma dasfundadoras da empresa O Passo Produções Artísticas e
Culturais (2001) e do Instituto d'O Passo (2015), atuando na elaboração e gestão de projetos socioculturais. Desde
2013, atua na gestão de projetos para a organização social de interesse publico (Oscip) Redes da Maré.
João I.u¡zSantos e' musico e professor de musica, licenciado pelo Conservatório Brasileiro de Música (CBM). Atualmente
e professor do Instituto d*O Passo e da Escola Sã Pereira (RI). Como musico, jã se apresentou em diversos espaços no
pais e no exterior e participa de conjuntos como o Bloco d'O Passo e emformações variadas cantando ou tocando
flauta doce e transversa ou percussão.

-
5.1 Introduçãoi

Criado por Lucas Ciavatta em 1996 e atualmente utilizado no Brasil e no


Exterior, O Passo ê, acima de tudo, uma ferramenta para construção de
conhecimento. É um método, se recuperarmos o sentido grego original
da palavra, como algo que constrói um caminho possivel para se chegar
a um fímz. Por outro lado, há um sentido amplo nos conceitos, ferramen-
tas, habilidades e compreensões propostos pelo educador. N'O Passo,
os canais utilizados para construir o conhecimento musical são os mais
diversos possiveis, e, nesse sentido, o método pode ser também definido
como uma abordagem multissensorial do fazer musical, como sugeriu
o professor Dr. Frank Abrahamsi.
O Passo tem como objetivo principal a construção de uma base,
o desenvolvimento da “musicalidade”. Como pressupõe sempre a tomada
de consciência, o processo equilibra dois importantes recursos didáti-
cos: imitação e escrita - sendo este último entendido de forma ampla
e significando utilização e articulação de três tipos de notação: a oral,
a corporal e a gráfico.
Ainda que o próprio nome do método revele a presença de um movi-
mento corporal, O Passo não é uma dança e também não é um simples
andar. Trata-se de um modelo de regência com os pés, centrado nas
características naturais, ou seja, não nas culturais de andar, motivo
pelo qual pode ser utilizado independentemente do tipo de realização
que se queira e das escolhas estéticas que se faça.
¡- ~ -» Í _ _ _ -I"""'_`_'*I- 4 z_:¡

1 Este capitulo foi elaborado com base em Ciavatta (2012).


2 FERREIRA, A. B. H. Aurélio século XII: o dicionário eletronico da língua portuguesa. 'v'ersão3.D. Rio de Janeiro: Nova
Ftonteira,l999. ”[Dogr. Mêthodos, caminho para se chegara um fim] S.m.1.Caminho pelo qual se atinge um objetivo".
3 vice-reitor do Westminster Choir College {Princeton-NJ, EUR)

Lucas Ciavatta: O Passo - corpo e mente no mesmo andamento


si.1 Dois princípios: inclusão e autonomia

Ninguém está de fato incluído em um grupo se não interfere positiva ou


negativamente nele. Estar presente não significa estar incluído. O ideal
é que essa interferência seja positiva, mas, mesmo quando negativa, ela
é fundamental no processo de inclusão. Ao “incomodarmos”, somos
notados e nesse momento se abre a possibilidade de sermos ajudados e
começarmos a interferir positivamente.

O Passo parte do andar, algo que todo ser humano, em condições nor-
mais, já chega à aula de música sabendoi. Por mais dificuldade rítmica
que uma pessoa apresente, seu andar é necessariamente regular - a
base para o aprendizado da pulsação já está lá. Por mais dificuldade
que ela apresente, seus braços invariavelmente passam ao lado do
corpo exatamente entre um passo e outro, marcando, assim, o con-
tratempo. Trazer essas habilidades para dentro do âmbito musical ê
o desafio d”O Passo.

No trabalho com O Passo, a perspectiva ê a de que os únicos recursos


necessários para se construir uma sólida base musical são: batidas de
palmas de mão para dar conta das questões rítmicas e voz para dar conta
das questões de afinaçäo. A ausência de meios é, no mundo inteiro, um
fator de exclusão importante a ser considerado.
Na perspectiva d'O Passo, contar com alguém é algo inteiramente dife-
rente de depender de alguém. A dependência deve ser evitada e ninguém
que veja uma alternativa a deseja. No entanto, depender de alguém ou
de algo é bem mais comum do que gostaríamos de admitir, pois tanto
é possivel passar a vida inteira dentro de um grupo de percussão e não
|__r_ , , H 1 _- 7-Q

4 Temos tido experiências muito significativas com pessoas com clificuldade ou impossibilidade de locomoção
autônoma. É fundamental ter em mente que todo mundo, sem exceção,já esteve no colo de alguem e vivenciou
a sensação de pulso que a transferência de peso de uma perna à outra proporciona.

21o _ Lucas Ciavatta - Daniela Ferreira ~ joão Santos


ter referências rítmicas precisas quanto é possível cantar a vida inteira
num coro e desafinar com preocupante recorrência.
N*O Passo, o caminho para a construçao da autonomia passa neces-
sariamente pelo rigor de quem avalia ou, mais importante ainda, se
autoavalia. Não há possibilidade de confundir rigor com rigidez: “Ser
rígido é estar insensível à diversidade. Ser rigoroso é não proteger nin-
guém de sua propria ignorância” (Ciavatta, 2012, p. 23).

s.1.2 Quatro pilares: corpo, representação, grupo e cultura

No trabalho com O Passo, o corpo passa a ser visto não apenas como algo
que acompanha de longe os processos cognitivos realizados pela mente,
mas principalmente como uma unidade autônoma de construção de isiveliãtdiversidadegiSor
conhecimento. O método de Lucas Ciavatta sustenta que, sem a participa-
ção ativa e efetiva do corpo, processos, normalmente associados apenas à ífli.ns1:éin:dz sua erfisflfi
mente, tais como a leitura e a escrita, simplesmente não podem acontecer. ziàflísfâncifatêíàâatffiz
No que se refere à notação gráfica, trata-se apenas de uma das formas f2ü12i» l1¬23)¿. t ç
de exteriorizar as representações construídas pela mente. N'O Passo há
o trabalho com a notação gráfica, mas também com as notações oral e
corporal. Estas duas últimas são largamente utilizadas em espaços de
cultura popular; no entanto, a Academia tendeu a hipertrofiar o papel
da notação gráfica e menosprezar as outras formas de notação. O Passo
utiliza, de maneira equilibrada, essas três formas de expressão e, assim,
através dos diálogos que se estabelecem, torna o próprio ato de escrever
mais significativo para o aluno.
O Passo entende a música como um instrumento de socialização,
como um espaço para a troca, a negociação, como uma oportunidade de
equilibrar grupo e indivíduo fortalecendo o primeiro a partir do fortale-
cimento do segundo e vice-versa. O aluno então “obedece” as regras não
para atender uma demanda externa a ele, e sim porque percebe que sua
atitude é fundamental para que ele e seu grupo alcancem seus objetivos.

Lucas Ciavatta: O Passo - corpo e mento no mesmo andamento


O Passo propõe encaminhamentos que impliquem tos da música que estamos ouvindo ou fazendo. Nas
uma apropriação real dos elementos apresentados. palavras do educador:
Saber, efetivamente, tocar e cantar um xote, um
afoxé, um maracatu, é uma forma de se aproximar O conceito de posição, que desenvolvi no trabalho com
definitivamente de qualquer manifestação na qual O Passo, vê o espaço musical como sendo tridimensio-
esses gêneros estejam envolvidos. A diversidade cul- nal, como tendo um relevo, e se dedica a identificar as
tural deixa de ser apenas mais um conceito a ser caracteristicas de cada um destes lugares dentro deste
trabalhado para se tornar uma realidade que o aluno relevo. Seguindo o caminho proposto pelos Gregos, o
experimenta, maneja e, mais facilmente, entende e conceito de posição relaciona espaço musical e movi-
respeita. mento corporal e assim revela lugares que estão “no
alto” ou “em suspensão” e lugares que estão “embaixo”
a.1.s O conceito de posição ou “em repouso"Í e que por isso geram movimentos
musicais distintos. Assim, é possível entender porque
Para cada som, definimos quatro parâmetros: altura, a expressão “deslocarifl apesar de largamente utilizada,
intensidade, duração e timbre. Acontece que nenhum não consegue explicar e, pior, não consegue ensinar
desses parâmetros é musical por natureza. Todos os a ninguém a diferença entre tempo e contratempo.
quatro nasceram em um laboratório de acústica. Segundo o conceito de posição, se o som e' “deslocado”,
Todos os quatro podem ser medidos: altura em hertz, ele não vai simplesmente mais para frente ou mais
intensidade em decibéis, duração em segundos e o para trãs, ele vai mais para cima ou mais para baixo,
timbre através do formato de onda. No entanto, e, desse modo, ele mantém suas caracteristicas sonoras,
t I t nenhum deles explica a diferença mas muda inteiramente suas caracteristicas musi-
Para cada som, defi-. cais. Uma posição diferente significa necessariamente
~ s w t entre tempo e contratempo. Com
nimos quatro parâme- um movimento musical
P O Passo, Ciavatta elaborou o con- . diferente,
_ um som
t diferente.
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trosiiialtura, intensi-¿ (Ciavatta, 2012, p. 47)
- P - e P ceito de posição, proposto como o
dade, duraçãotle-itiniçbret ç
s c quinto parâmetro sonoro, exclusi-
Acontece
- z A ~ vamente musical e inteiramente
daisses-patänu.tros--
ligado ao movimento corporalesua
é¶lflusi'cã¡i,pen=-aeee*
' -~ as possibilidade de desenhar em nossas
fi” mentes um espaço musical onde ire-
' ' *t mos localizar cada um dos elemen-

212 Lucas Ciavatta - Daniela Ferreira - joão Santos


az Origens e infância

as ecadesee tão a to

Nas décadas de 1950 e 1960, o Rio de janeiro era o principal destino para
uma juventude que buscava formação acadêmica. Entretanto, além dos
estudos, esses jovens encontravam na capital carioca um novo universo
cultural e político. A mãe de Lucas Ciavatta, Maria Ciavatta, de família
de imigrantes italianos, nascida em Ribeirão Preto (SP), chegou ao Rio
de janeiro para estudar Filosofia e Letras Clássicas, enquanto seu pai
1
Antônio Carlos Pantoja Franco, de São Luís do Maranhão, veio mais cedo,
ao ingressar no internato do Colégio Pedro II. Quando o pai de Ciavatta
já cursava a Escola Nacional de Engenharia, os dois se conheceram na
IUC (juventude Universitária Católica), onde foram colegas de figuras
como Betinho e Frei Beto. Marx e a teologia da libertação, pensadores
brasileiros como Paulo Freire e Alceu de Amoroso Lima eram referên-
cias fundamentais para esses jovens.
Filho dessa geração politicamente engajada e surpreendida pelo golpe
de 1964, Lucas Ciavatta Pantoja Franco nasceu no dia 4 de agosto de 1965,
em Ribeirão Preto. Entre 1966 e 1967, antes de voltar a morar no Rio de
janeiro, a família passou alguns meses nos Estados Unidos para que o
pai de Ciavatta fizesse um curso com engenheiros de Furnas. Foi nesse
país que sua mãe começou a estudar a pedagogia de Maria Montessorii.

,_ _ -nH"_**-._ __ az z _ Í :,

5 Maria Montessori (lEi?D-1952) foi educadora, médica e feminista italiana cuja metodologia é ainda adotada por
escolas públicas e privadas em todo o mundo.

Lucas Ciavatta: O Passo ¬ corpo e mente no mesmo andamento


Num primeiro momento, em uma igreja do subúr- As fichas de Montessori e as folhas d'O Passo,
bio de Higienópolis, Maria Ciavatta criou, com duas como trabalho diversificado, têm sem dúvida paren-
amigas pedagogas, uma escola montessoriana: a tesco direto: o trabalho em grupo feito em roda e o
Escola Experimental joão XXIII, que posteriormente corpo - o corpo presente de maneira diferenciada
se tornou o Centro Educacional joão XXIII. no processo do aprendizado montessoríano, como
Lucas e seus irmãos (Mariana Ciavatta Pantoja na memória tátil das letras de lixa, no “manuseio”
Franco, antropóloga, nascida em 1963, e Estevão da matemática com o material dourado da pedagoga
Ciavatta Pantoja Franco, cineasta, nascido em 1968), italiana, assim como no aprendizado espontâneo nas
assim como amigos que passaram pelo C. E. joão danças e jogos experimentados em casa, na escola
XXIII, lembram dessa época como um período de e na liberdade das brincadeiras de rua do subúrbio
muita liberdade e alegria: sentar em roda, fazer carioca. Em sua vida, a “escola” e “o mundo lá fora”
trabalhos individuais com cada um seguindo suas permaneciam em constante troca e diálogo.
fichasf, em seu próprio ritmo e, ao mesmo tempo,
participando de projetos coletivos com turmas com fios aa-os ae “fãããš aos ele iíãã: as
idades misturadas, com crianças com necessidade vivenciar da juv-e ¬ e a chegaria a mz il bl lëfl'

especiais integradas, com muita arte, música e fes- šüggitÉeifl e t”-°“"sW

tas comunitárias. Sem dúvida, foram experiências


muito marcantes e diferenciadas no processo de Ciavatta seguiu seus estudos no Colégio São Vicente
ensino-aprendizagem dentro do espaço escolar, prin- de Paulo, onde começou a fazer teatro e desenho. Por
cipalmente se atentarmos para o fato de que estamos outro lado, pela influência do pai engenheiro, cursou
falando das décadas de 1960 e 1970. o científico profissionalizante em Eletricidade. Em
Portanto, não há como não relacionar as origens e 1983, entrou para a graduação em Desenho Industrial
a infância de Lucas Ciavatta a'O Passo. A importância na Escola Superior de Desenho Industrial (Esdi).
dada â educação, ã inclusão, ãautonomia e â diver- Sem dúvida, todas essas experiências contribuí-
sidade presentes, por exemplo, nos pensamentos de ram para a criação d”O Passo anos mais tarde, mas
Paulo Freire e de Maria Montessori, foi vivida pelo Ciavatta atribui um lugar especial â contribuição
educador, desde a primeira infância, pela educa- do tai chi chuan, arte marcial chinesa da qual é pra-
ção que recebeu em casa e na escola, que, inclusive, ticante desde 1981.
durante um período, estavam num único lugar.
¡- _ -i""-'__'¬ln- - 4

6 As fichas montessorianas são materiais organizados em sequências de dificuldacle


crescente, contendo listas de exercicios a serem realizados individualmente pelo
aluno.

214 Lucas Ciavatta - Daniela Ferreira - joão Santos


Amigo dos tempos do Colégio São Vicente, o pia- musical como ferramentas essenciais para o apren-
nista Claudio Dauelsberg foi o seu primeiro professor. dizado rítmico.
Depois dele, as aulas de Percepção com Bia Paes Leme
foram fundamentais para o ingresso na licenciatura Em 1996-, começou a dar aulas no CAp Uerj (Colégio
em Música da Universidade Federal do Estado do Rio de Aplicação da Universidade do Estado do Rio
de janeiro (Unirio), em 1989. de janeiro), onde retomou as propostas que tinha
Na Unirio, Ciavatta foi um aluno muito dedicado começado: a desenhar com os alunos da Escola
e, fora da universidade, estudava piano e trompete. Colmeia, e resolveu aprofundar seu conhecimento
Mesmo não sendo pianista, seu empenho, criando de percussão e de ritmos brasileiros, passando at
formas de estudo, fez com que fosse convidado pelo frequentar as aulas de Celso Alvim nos Seminários
Professor Sílvio Merhy para ser seu monitor em de Música Pró-Arte. Nesse curso, ele utilizou para
Harmonia de Teclado. Além de Merhy, outros pro- si e mostrou para o seu professor de percussão
fessores foram marcantes na passagem pela citada o movimento corporal e a partitura que estava
instituiçao de ensino: Stela Caldi foi importantíssima
na

criando para seus alunos de 9 anos do CAp Uerj.


na sua formação de piano; com Regina Márcia Simão Ao final do ano, batizou sua proposta: O Passo.
Santos e Ermelinda Azevedo Paz, o educador pôde ter
uma visão mais ampla da educação musical. Por ter acompanhado o desenvolvimento inicial
d'O Passo, Celso Alvim, diretor do grupo de percussão
eiãâš ã atas idas: eašs s
WWHM Monobloco, foi o primeiro professor de percussão a
“W two aires seus adotar o método para formar uma bateria de bloco de
Carnaval. A primeira apostila d'O Passo registrada
Em 1993, Maria Thereza jorand propôs a Ciavatta o na Biblioteca Nacional, ainda em 1996, foi escrita por
desafio de dar aulas de Música para uma turma de Ciavatta, a pedido de Celso Alvim, para ser utilizada
crianças surdas em sua escola, a Colmeia, no bairro pelo percussionista num curso para professores da
da Urca, Rio de janeiro. O projeto durou apenas um rede municipal de ensino do Rio de janeiro.
ano, mas foi o suficiente para que a semente d'0 Passo
fosse lançada. Depois dessa experiência, Ciavatta Em 1998, após o término do seu contrato de pro-
começou a desenhar alguns elementos fundamen- fessor substituto no CAp Uerj, Ciavatta viu a pos-
tais de sua pedagogia: a importância do corpo e do sibilidade de todo um trabalho, que ele já percebia
andar para a percepção rítmica, o uso de palmas e como especial em sua trajetória, ser descontinuado.
de percussão e a valorização da diversidade rítmica Nesse momento, surgiram três convites seguidos:

Lucas Ciavatta: U Passo ~ corpo e mente no mesmo andamento 215


Mônica Vilaça, sua colega de faculdade, pediu a As sucessivas viagens de Ciavatta pelo Brasil e
ele que preparasse uma pequena apresentação para o Exterior - destacando-se os cursos minis-
com seus ex-alunos para um evento, evento que trados nos EUA e, consequentemente, o contato e
deu origem ao Bloco d'O Passo, que, por sua vez, aprendizado com Dr. Frank Abrahams - começaram
foi logo convidado para fazer outra apresentação a trazer para O Passo novos elementos e perspectivas.
na Escola Oga Mitá, onde o educador recebeu a Hoje, alimentado principalmente pelas reflexões
proposta de Márcia Leite, diretora-fundadora da dos demais Formadores d'O Passo e dos Professores
escola, para dar aulas de Música para o segundo d'O Passo, o método segue em movimento, atualizan-
segmento do ensino fundamental. do-se, enriquecendo-se e multiplicando suas possibili-
dades de utilização e de diálogo com outros métodos.
Ciavatta permaneceu na Escola Oga Mitá de 1999 a
2008, onde o método foi sendo aprimorado em virtude s.2.1 Produção musical e pedagógica
de muitos desafios. O Bloco d'O Passo segue até hoje
como espaço privilegiado para novas investigações, Ciavatta publicou três livros que têm sido funda-
desenvolvendo as ferramentas do método e revelando mentais para qualquer um que queira se aproxi-
novos caminhos a serem trilhados. mar d'O Passo: em 2003, O Passo: a pulsação e o ensi-
Durante esse periodo de aprimoramento prá- no-aprendizagem de ritmos; em 2009, O Passo: um passo
tico, Ciavatta ingressou, em 2001, no Programa de sobre as bases de ritmo e som; em 2012, O Passo: música
Mestrado em Educação na Universidade Federal e educação. O primeiro traz sua dissertação de mes-
Fluminense (UFF), sob a orientação de Dominique trado, concluída em 2003 na UFF, sob a orientação
Colinvaux. O Passo cresceu imensamente com essa da Prof? Dri Dominique Colinvaux. O terceiro é uma
experiência. Nesse momento foram identificados atualização do segundo; contudo, como trouxe um
os quatro pilares d'0 Passo, e o conceito de posição material inteiramente novo, fruto do desenvolvi-
ganhou sua primeira definição. A publicação de sua mento do método, a mudança do nome foi justificada.
dissertação de mestrado interrompeu a edição das Outro material que tem servido de fonte de ins-
apostilas de curso, necessariamente superficiais, piração para inúmeros professores está nas criaçoes
criando uma nova referência para qualquer pessoa e os arranjos feitos por Lucas com o Bloco d'O Passo.
que queira se aproximar do método. Antes presente em um DVD, esse material está dispo-
nível através do canal d'O Passo no You Tube@.

216 Lucas Ciavatta - Daniela Ferreira - joão Santos


Ê C Õ _.

se As quatro atividades do trabalho os caminhos para se alcançar essa qualidade e, em


COII1 O PEISSO seguida, detalharemos as quatro atividades.

Lucas Ciavatta contempla as seguintes diretrizes em Independentemente do caminho escolhido pelo


seu trabalho com o método d'O Passo: professor (e existem várias possibilidades), a fase
1. O estudo individual das Folhas d'O Passo, que tem inicial, de aprender a dar o passo, é a fase de acos-
papel central na organização e na estruturação tumar o corpo a um novo andar. Começamos nor-
dos conceitos musicais trabalhados nas outras malmente pelo passo quaternário, pois ele surge
atividades. naturalmente de um andar ã frente alternado com
2. A realização dos Exercícios d'O Passo, que, sempre um andar para trás e porque, no Brasil, a grande
em grupo, introduzem ou aprofundam ferramen- maioria dos exemplos musicais está organizada
tas, habilidades e compreensões relacionadas a em compassos quaternários. Nesse momento em
ritmo e afinação. especial, é fundamental que as posições dos pés
3. A prática de conjunto com instrumentos de per- sejam respeitadas, pois o objetivo é construir um
cussão, que permite ao aluno experimentar e “mapa mental”, cuja clareza depende inteiramente
testar seus conhecimentos rítmicos. da precisão da posição dos pés. A identificação da
4. O trabalho de canto, que pode introduzir ou apro- posição de cada passo dado é uma notação corporal
fundar tanto o universo melódico quanto o estudo (pé direito â frente, pé esquerdo à frente, pé direito
da harmonia. atrás, pé esquerdo atrás)l. Cada passo é associado
Uma ou outra atividade pode ganhar maior desta- a um “número” que constitui uma notação oral
que em determinado momento do trabalho de acordo dos tempos. As duas formas de notação estão arti-
com as necessidades de cada turma e com o planeja- culadas entre sie se articulam com a Partitura
mento de cada professor. Sendo a presença constante d'O Passo, gerada a partir de símbolos que uma
de um movimento (o “modelo de regência com os pés”) criança de 7 anos já domina. A articulação cons-
o principal diferencial d'O Passo, grande parte do tante entre esses três típos de notação é uma das
trabalho está associada ã construção da qualidade grandes forças d'0 Passo.
desse movimento. Os parágrafos a seguir indicam _ -~ __ -mz -‹-:T'*'*'-u- Í -.

? Os canhotos começam o movimento com o pé esquerdo.

Lucas Ciavatta: O Passo - corpo e mente no mesmo andamento 217


Num segundo momento, o passo ganha em Até aqui falamos da divisão simples do tempo.
complexidade ao manter as referências anteriores Na divisão composta, o “o” dá um nome à posição
e acrescentar outras duas: a flexão simultânea das de cada uma das divisões em três da pulsação. Caso
duas pernas e o tapa na perna que sobe. A ação de se utilize um passo que marque apenas os tempos,
flexionar as pernas é talvez o grande diferencial como vínhamos fazendo, a construção de referên-
d'O Passo com relação a outros métodos que se uti- cias corporais claras para o trabalho com a divisão
lizam de um deslocamento. Normalmente, quando composta pode se tornar excessivamente difícil para
a flexão já está no movimento de um aluno, ótimo, algumas pessoas. Basicamente, esse problema ocorre
mas quando não está, não existe uma preocupação porque o movimento sugerido pela divisão composta
com isso. Mas é justamente essa ação, que abaixa o (e isso é bastante subjetivo) é circular, não tem um
centro de gravidade no momento exato entre um “meio”, não conta com nenhum marco definido no seu
passo e outro, que traz para o corpo o contratempo. percurso. O corpo reconhece quando há uma metade
É essa flexão que nota corporalmente o contra- para um movimento, pois, de inúmeras formas, como
tempo. O tapa, dado em apenas uma ou nas duas quando aplaudimos, ele vai e volta, chega a um limite
pernas, ao produzir um som que se “contrapõe” ao e retorna. No entanto, a divisão composta pressupoe
som dos pés no chão, ajuda a definir musicalmente uma trajetória circular e que, por isso, funciona de
o contratempo. O “e”, pronunciado no momento do forma diferente. A saída é transformar, num pri-
tapa, é uma notação oral que reforça a consciência meiro momento, a principal característica desse
sobre o movimento ao dar nome à sensação de passo e marcar, nos pés, não a pulsação, mas as suas
metade da pulsação. divisões, fazendo o Passo Composto Intermediário.
O “i” (divisão em 4) não apresenta referência Esse é um movimento pensado para uma fase inicial,
corporal clara e sua realização depende inteira- de construção das referências necessárias para a
mente de que os “números” e os “e”s estejam, estes tranquila realização dessa divisão e, logo em seguida,
sim, corporalmente claros. A clareza com relação ã deve ser abandonado para que se volte a marcar nos
posição do “i” multiplica as possibilidades de reali- pés apenas os tempos.
zação. Ele está localizado entre um “número” e um O movimento do Passo Ternário, assim como
Íi H' ' * Ill!!
e (o primeiro 1 , que sai de um “número”) e entre todos aqueles gerados por ciclos de tempos ímpares,
um “e” e um “número” (o segundo “i”, que chega leva a uma alternância dos pés que vão â frente para
a um número). O “i” é uma notação oral que dá marcar o primeiro tempo. Não é essencial que se
nome à posição de metade da metade da pulsação. gire o corpo para realízá-lo, mas o giro marca uma

218 Lucas Ciavatta - Daniela Ferreira - joão Santos


importante diferença entre o Passo Quaternário e o Para cada folha, há sempre uma outra contendo
ternário no que diz respeito ã sensação corporal que instruções para o estudo. E importante lembrarmos
provocam, e assim podemos conjugá-los e realizar que essas instruções devem sempre ser vistas como
facilmente compassos alternados ou compassos em uma guia e que adaptações podem sem dúvida ser
cinco ou sete tempos. feitas. No entanto, como essas instruções têm sido
estabelecidas a partir de práticas e reflexões inten-
sai Folhas d'O Passo (passagem para a sas, é preciso ter mente que qualquer alteração pode
partitura tradicional) significar alguns ganhos, mas também, em alguns
casos, perdas consideráveis.
A Folha dos Números, a Folha do E, a Folha do I e a Apesar de hoje em dia ser utilizada por algumas
Folha do O apresentam respectivamente a notação pessoas de forma independente do sistema tradi-
gráfica dos tempos, contratempos, da divisão em 4 e cional, a Partitura d'O Passo foi criada por Ciavatta
da divisão em 3. Estas folhas, junto com as folhas de com base nesse sistema exatamente para facilitar
Tocar e Cantar com E, Tocar e Cantar com I e Tocar seu aprendizado. Qualquer dificuldade encontrada
e Cantar com O (esta última idealizada por Lucas para ensinar ou aprender o sistema de notação tra-
Ciavatta, Felipe Reznik e Mateus Xavier) constituem dicional não se deve ao sistema em si, mas sim ã
o conjunto de folhas básicas d'O Passo e estão dispo- forma como nos aproximamos dele. Quem chega
níveis para download no site* d'O Passo. Na sequência, ao sistema tradicional já conhecendo a Partitura
no conjunto de folhas avançadas, há atualmente a d'O Passo necessariamente entende musicalmente
Folha do I do O (divisão em 6), Tocar e Cantar com o que está tentando ler e escrever.
I do O (idealizada por jerome Viollet), Folha do A
(divisão em 8), Quiálteras (de 2 e 3, idealizada por
Mateus Xavier), Tocar e Cantar com E e O (baseada
nos sotaques de Bumba-Meu-Boi do Maranhão, ideali-
zada por Felipe Reznik), Shuffle, O Passo Ternário, os
Passos Quinário e Setenário, e Compassos Quebrados
(compassos de 3 1/i e 2 1/2, idealizada por Felipe Reznik).

8 Diponivel em: -chttpdƒwww.opasso.com.br:=›.

Lucas Ciavatta: O Passo - corpo e mente no mesmo andamento 219


Figura 8.1» Folha dos Numeros Figura 8.2 - Folha do E

i .'i=r:- ifmruiin f Jari- (Er.-rua:

Números (tempo) l Ê (conttatempo)


I A 1 2 (3) ts) 1
A || 1 (2) ts) (4) jj .
B l e 2 (3) (il) |

B II (1) (2) õ no || l fi 1 e 2 3 4

ii I c. 2 3 e -“lí
ii: ]|( 1 ) 2 (3) <-1) II l
1
l.
I e 2 e 3 c 4

D II (1) (2) (3) 4 l l F E. c. 2. e 3 c 4 c. |

tt j 1 (2)
G (1) c (2) c (3) e (4) E
3 (4)
llfil l c (2) e e (4) e
(1) 2. (zé) 4 , (2) c 3 c (4) e

1 (21 3 si l (1) E É (3) 4 f


|
J já 1 (2) E (3) c (4)
(Í) 2 (3) (4)
` (Í) c 2 3 4 e
vn 'it pq orn J.: r
v.'v.¬. p -to n1.ii|'

Fonte: Ciavatta, 2013, p. I Fonte: Ciavatta, 2013, p. 9.

220 Lucas Ciavatta - Daniela Ferreira - joão Santos


Figura 3.3 - Folha cio I Figo ra 8.4 - Foiha do 0

l-“Hi 'tv 'i' Í c¬»fz..1.u.i...‹

1 (divisão em 4)
O (divisão em 3)
A lel2 clã ei=l eif
1
Bliiie Eis Íãiesltlc ||1ae2eas<›u4oe||
C (1) tz it-2) ei(3;= ‹.›.i(4) ei
D
F .
(Elie (2)ie (3)ie (4)ie
|| 1 tz 2 fz 3 tz «4 tz lj

li. j§Í¡1iei2ie1.Í^'›1e141ei,
|| 1 tz. 2 zz 5 zz. 4 e ||
ii =(i)ie i(2)ie i(3)ie.i(-'l)iei!

ci -1 1 2 is is i || (1) o o (2) o e (3) o o (.4)<:- o


|
si -1 i 2 1 5 zé 4 ti
z (ez) ia) io) io) H (1) o (2) 0 (3) o (4) o
|
_; (ni (2)i (toi (zm
Uma me me me H
i2i ist .tati
1 fz. (2)z.-. s a 4 a

l
lf.. (i)i i(2)i i.(3)i i(-i)i ii:

se izi(2)â.‹.-z sé 14 .zzt
o 2 o (3) o (4) o
lí 2 i(3) e (4)í '
v."¬.v'v ¡ n- m:om.l.1r
v.nvt1:u[.uu.-.|.=.z::rm.hr

Fonte: Ciavatta,20l, p. 11. Fonte: Ciavatta, 2013, p. 13.

Lucas Ciavatta: O Passo - corpo e mente no mesmo andamento


ssa Exercícios d'0 Passo Frase ãemar base M sauna amam

íopassas A tentados
ããfiirlfli
A atividade Frase Compartilhada, cada um contribui
com uma célula ou um evento, para que, ao final, um
A ideia principal aqui é trabalhar com diversas métri-padrão rítmico qualquer seja construído. É preciso
cas, bem como íntroduzir e aprofundar a irregula- ser flexível, pois ninguém está absolutamente certo,
ridade métrica. Combinando-se compassos binários, mas não se pode perder uma referência mínima,
ternários e quaternários, obtém-se uma primeira sob o risco de comprometer a execução. Talvez esse
frase. São marcados com palmas agudas os primeiros seja o exercício que mais trabalhe a noção de tocar
tempos de todos os compassos, com exceção do início junto, pois ao escolhermos uma frase que tem cul-
do ciclo que é marcado com uma palma grave. Uma turalmente um suingue estabelecido, é preciso que
segunda frase, com a mesma quantidade de tempos todos o busquem para que quem estiver de fora possa
da frase anterior, também composta por compassos escutar o conjunto como se esse fosse tocado por
de diferentes métricas, é criada e apenas o início douma única pessoa.
ciclo das duas frases deve coincidir. Uma terceira
frase, com as mesmas caracteristicas, deve preen- revisaiate õim mut
cher todos os tempos que não foram tocados nas
outras duas frases. O resultado é uma coexistência Em uma única roda, as três vozes são distribuídas
de métricas diferentes que são expressas tanto em entre os participantes. As vozes devem ser básicas
termos de música quanto em termos de movimento. em termos harmônicos e simples em termos rítmi-
cos. A primeira dessas duas qualidades favorece a
tra a nasidéias sensação de familiaridade dos participantes com a
música cantada e cria assim um ambiente de tranqui-
Dois grupos se posicionam um de frente para o outro. lidade. A segunda fornece uma base sólida e cheia de
Um grupo será regido pela mão direita do professor e espaços para que a liberdade rítmica possa ser exer-
o outro pela mão esquerda. O professor se posiciona citada. Assim que a base harmônica estiver soando,
entre os dois grupos e indica com as mãos que graus o professor convida um dos alunos a entrar no meio
devem ser cantados por cada um dos grupos. Todos da roda e apenas ficar ali escutando. A maioria dos
fazem o passo quaternário e a cada primeiro tempo estudantes terá dificuldade de se soltar e emitir um
há uma mudança do grau cantado ou um novo ata- único som. Os alunos podem, aos poucos, e apenas se
que do mesmo grau, dependendo do que foi indicado. se sentirem seguros, experimentar cantar a mesma

222 Lucas Ciavatta ~ Daniela Ferreira - joão Santos


voz que estavam fazendo quando na roda. Não é ä ias
e caixa
necessário que a voz de quem está no meio soe forte.
Mesmo que ninguém a ouça além do próprio aluno O exercicio Melodias em Encaixe foi criado por
e do professor, a experiência desse aluno pode ser Ciavatta para aproximar os instrumentistas e os
profunda. É possível sugerir que mais de um aluno cantores da necessidade de trabalhar profundamente
entre na roda ao mesmo tempo. Um pode dar ideias o ritmo para tocar ou cantar. O “levare”, muitas vezes
3.0 Ol1lÍI'O E ESSE ÊTOC3., ESSE ESCUÍ3., pOClE SEI' 111113 EXPE- apresentado como uma solução para fazer com que
riência muito gratificante. um grupo inicie junto determinada frase, pode tran-
quilamente dar conta das frases que começam no
pretasitm ãã . tempo, assim como, embora não tão facilmente, das
frases que se iniciam no contratempo. No entanto,
Improvisar sim, mas sem perder O Passo. Improvisar frases iniciadas no primeiro “i”, na segunda semi-
não é fazer qualquer coisa, improvisar é brincar em colcheia, normalmente revelam o equívoco de se
cima de uma estrutura. Bem pouco do que faremos considerar um gesto feito pelo maestro como algo
poderemos nomear, mas, nesse momento, o que mais capaz de promover a autonomia dos músicos.
conta não é entender tudo o que se faz, e sim con- Dentro do caminho d'O Passo, esse exercício só
seguir entrar num fluxo que vai trazendo à tona o acontece após um trabalho com a Folha do I, caso
repertório de que dispomos. E preciso aprender a as melodias estejam em compassos simples, e com a
correr o risco que o improviso envolve. Folha do O, caso as melodias estejam em compassos
compostos.
teve e amas %%¿

Protessões alternadas
Partindo de uma frase rítmica qualquer com graves
e agudos, é possível separar o grupo em dois e propor Esse exercício nasceu do exercício Compassos
que um grupo faça a linha aguda, e o outro, a linha Alternados. O desafio é realizar uma polifonia meló-
grave. Sendo o resultado da polifonia a frase rítmica dica com métricas diversas superpostas, que pode
original, ele é um resultado conhecido; no entanto, ser bastante simplificado caso haja um trabalho
dessa forma - soando através da articulação entre anterior apenas sobre as métricas. O princípio é o
dois grupos - tem outra força. mesmo que o do exercício Compassos Alternados:
apenas no início de cada ciclo há um ataque simul-
tâneo das três vozes.

Lucas Ciavatta: O Passo - carpa e ateste as mesmo andamento 223


štesPass a Passe de que vários alunos pulem juntos, ocupando os
quadrados alternadamente sem que se esbarrem ou
A simples realização d”O Passo já inicia um processo percam o ritmo é impressionante. O resultado dese-
de representação do intervalo de tempo onde ele jado só é alcançado se todos se comprometem com o
ocorre. Ao ser representado, esse intervalo ganha trabalho e se ajudam mutuamente, já que qualquer
uma forma, se torna espaço, e pode assim ser musi- erro potencialmente afetará a todos.
calmente explorado. O exercício aqui proposto se
utiliza inteiramente dessa possibilidade. Depois de Sosa ãssço
criado o espaço musical, podemos “montar” progres-
sivamente o ritmo a ser trabalhado, ou célula a célula, A característica básica do Som no Espaço é a explo-
ou evento a evento. Nesse processo, ao acrescentar ração de possibilidades de espacialização do som.
evento por evento, cada um com seu movimento Normalmente é feito numa roda, onde cada partici-
musical, que lhe dá vida própria, realizamos diver- pante toca, com palmas ou instrumentos, uma divi-
sos ritmos diferentes daquele inicialmente pensado são do tempo seguindo a ordem da roda. As batidas
e conhecemos profundamente a estrutura rítmica em sequência fazem parecer, para quem está no cen-
que subjaz a todos. tro da roda, que o som se desloca ao seu redor. Para
que a experiência de especialização se intensifique, a
šaitos os “femea precisão dos que estão na roda é fundamental e está
diretamente relacionada à clareza quanto à posição
Talvez o exercício mais lúdico d'O Passo, o Saltos de cada batida.
no Tempo pode ser praticado por alunos iniciantes.
Essa atividade é realizada com o auxílio de uma rede “irão em ãaca § fã
colocada no chão, mas pode ser feita com qualquer
marcação que divida o chão em quadrados de mesmo Este exercício trabalha, talvez como nenhum outro,
tamanho com linhas claras e visíveis. Pulando sem- a clareza quanto ã posição de cada batida executada.
pre no primeiro tempo de cada compasso e batendo Partindo de uma frase com batidas espalhadas num
palmas nos tempos seguintes, várias sequências compasso. Cada participante cria sua frase, ocupando
coreográficas podem ser trabalhadas dentro da rede apenas as posições ainda vagas. Quando o último par-
enquanto a regularidade de pulso e a compreensão ticipante cria sua frase, o compasso está completo e é
dos ciclos de tempo são exercitadas. A possibilidade possível ouvir todas as suas divisões sendo tocadas.

224 Lucas Ciavatta -‹ Daniela Ferreira - joão Santos


ter atas Tocas e íetr

Não há como garantir que duas pessoas que tocam O exercício Tocar e Contar nasceu como um simples
juntas estejam de fato se escutando a menos que cada procedimento para a preparação do momento de
uma delas consiga tocar sua própria frase e cantar a tocar e cantar. Cada vez mais ele tem sido utilizado
frase da outra pessoa. Essa exigência, dita dessa forma, independentemente do fim para o qual foi pensado.
pode parecer um exagero, até por demandar algo de Mesmo quando não há uma melodia para cantar
extrema complexidade, inclusive para músicos pro- enquanto se toca, a habilidade de tocar e contar, por
fissionais. Contudo, o que O Passo propoe é que pelo desafiar e aumentar a compreensão, invariavelmente
Iii'

menos as bases desse tipo de procedimento devem ser melhora a precisão.


lançadas, e que, dependendo das necessidades e possi-
bilidades individuais, haja ou não um aprofundamento. sas Percussão com O Passo
Definidas as duas frases, umapara sertocada e outra
para ser cantada, o momento inicial é de escrevê-las Todos nós, independentemente do instrumento que
corporal e oralmente, e graficamente se for necessário. tocamos, precisamos ser ritmístas, pessoas que estão
Aqui já é possível antever os momentos mais delicados, familiarizadas com a rítmica. Mas por que aprender-
por exemplo, quando é preciso tocar um “e” e cantar mos ritmo sentados, batendo com o lápis na cadeira,
um “primeiro i”. O momento seguinte, o de unir as se podemos ter toda uma experiência extremamente
duas frases, é em geral tentado sem uma estratégia rica e complexa numa aula de percussão? No entanto,
definida. Com O Passo é possível mapear as dificuldades há aí um pequeno e definidor detalhe: enquanto o
e aborda-las isoladamente. É possível trabalhar apenas aprendizado de percussão for feito exclusivamente
o encaixe de uma sílaba com uma única palma e ter sobre a imitação, essa atividade servirá muito pouco
a garantia de que elas estão soando exatamente como ao músico que quer aprender samba - não para “tocar
soarão quando acompanhadas das outras sílabas e das samba”, e sim para “entender como o samba pode
outras batidas. É muito importante ter em mente que ajudá-lo a tocar melhor outras coisas”.
o encaixe não é o foco principal, o encaixe acontece N'O Passo, a percussão não é vista como um fim
porque a articulação das palmas com a pulsação está em si, mas como um inigualável meio para uma pro-
perfeita e a articulação do canto com a pulsação está funda experimentação rítmica, na qual podemos iso-
perfeita. E assim, através da pulsação, que conseguimos lar a questão rítmica sem desconectá-la do processo
encaixar uma realização com a outra, sem perder a de aprendizagem musical como um todo. Além desse
noção de que elas são duas frases com “vida própria”. aspecto, a prática de percussão com O Passo inclui um

Lucas Ciavatta: O Passo - corpo e mente no mesmo andamento 225


profundo conhecimento dos padrões rítmicos que a Partimos da premissa de que ninguém é irreme-
diversidade cultural brasileira criou, transformou ou diavelmente desafinado. A afinação é um processo
assimilou ao longo do tempo, tais como samba, baião, complexo e, muitas vezes, a percepção musical é
alujá, ciranda, maracatu, congo, xote, entre vários apenas um dos fatores envolvidos. Há, por exemplo,
outros (que aqui não cabe descrevermos, visto que o a dificuldade de emitir em determinado registro
objetivo deste texto não é o de uma análise a partir ou mesmo a dificuldade de sustentar uma nota
da etnomusicologia). Dessa forma, a força inigualável por absoluta falta de preparo respiratório. Todos
dessa diversidade cultural assume um papel central cantam pelo menos um trecho de alguma música,
desde o início do trabalho. No entanto, é importante o que nos leva a encarar a desafinação como algo
frisar que, principalmente em experiências em outros circunstancial, e não estrutural. Cantar sozinho
países como os Estados Unidos, Austria ou França, não parece ser a maior dificuldade; difícil é ter
além de apresentarmos os ritmos brasileiros, sem- todos os componentes de um grupo numa mesma
pre buscamos trabalhar com padrões reconhecidos tonalidade.
pela cultura local.
O solfejo por graus, utilizado n'O Passo, é uma
s.3.4 Canto com O Passo técnica bem anterior a'O Passo e já bastante conhe-
cida. Ela se resume em associar números a notas de
Toda a dificuldade no desenvolvimento da noção de uma escala qualquer e, dessa forma, utilizar a noção
afinação está associada ã dificuldade de materiali- de subir ou descer numa contagem, relacionando-a
zar as frequências de um som. No que diz respeito com o aumento ou diminuição da frequência de um
ao ritmo, através d'O Passo, é possível “ver” onde som. Assim, caminhamos do 1 ao 7 relacionando cada
tocar e onde não tocar, o que torna tudo mais sim- um dos números a cada um dos sete graus que nor-
ples. Poderíamos argumentar que, assim como há malmente compõem uma escala diatônica. Esse tipo
corpo no estudo do ritmo, e por isso é possível “ver”, de solfejo tem a vantagem de facilitar a compreensão
também há corpo na afinação, pois há pressão do do sistema tonal e suas funções harmônicas - cuja
ar, posição da lingua etc. Entretanto, tudo que diz análise não por acaso envolve a utilização de alga-
respeito ã afinação é mais sutil, é bem mais difícil de rismos romanos.
“ver”. Assim, a questao sempre foi esta: como tornar
HJ

A Folha de Sequências de Graus introduz algumas


“palpável” o desafio envolvido e, desse modo, criar um sequências básicas para iniciar a familiaridade com
estudo autônomo para o desenvolvimento da afinação. o modo maior de uma escala diatônica e encaminha
a habilidade de entoar isoladamente cada um dos

226 Lucas Ciavatta - Daniela Ferreira - joão Santos


graus desse modo. A ideia é com o estudo dessa folha
construir uma base a partir da qual se possa seguir
com tranquilidade qualquer método de solfejo que
se deseje.

Figura 8.5 - Folha de Sequências de -Graus

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Sequências de Graus

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Fonte: Ciavatta, 2013, p. 16.

Lucas Ciavatta: O Passo - corpo e mente no mesmo andamento


8.4 Agrupando os tempos: Compassos 3. Explique que o início da frase, o primeiro “um” do
Alternados primeiro compasso, é sempre marcado por uma
palma grave, e que os outros primeiros tempos
Ressaltamos anteriormente a importância do exer- dos outros compassos são marcados por palmas
cício de Compassos Alternados para introduzir e/ou agudas. Explique que as três frases têm 12 tempos
aprofundar a irregularidade métrica. Inúmeras fra- e, quando começadas juntas, fazendo coincidir
ses podem ser compostas e o exemplo a seguir pode as palmas graves do início de cada frase, apenas
ser considerado a forma mais simples da atividade essas palmas irão coincidir. Esclareça que o desen-
e tem nos servido para apresentá-la. contro das três frases provoca invariavelmente
1. Divida a turma em três grupos, de forma aleató- uma sensação de desconforto, mas que essa sen-
ria ou organizados seguindo o nível crescente de sação é rapidamente substituída por uma outra,
complexidade de cada frase. agradável, quando a cada 12 tempos as três frases
2. Peça ao primeiro grupo que elabore uma frase se encontram.
com três batidas, uma em cada primeiro tempo Uma sequência possível para esse exercicio é
de três compassos quaternários, e solicite ao propor que o primeiro grupo faça a segunda frase,
segundo grupo que faça uma frase com quatro o segundo faça a terceira, e o terceiro, a primeira.
batidas, uma em cada primeiro tempo de quatro Após uma nova mudança, todos os grupos terão feito
compassos ternários e, ao terceiro grupo, uma todas as frases. Caso o julgue possível, proponha
frase composta por cinco batidas, uma em cada que os grupos mudem de frase a cada quatro ciclos
primeiro tempo de um compasso binário, um (marcados pela palma grave), como em um cânon.
ternário, um binário, um ternário e um binário.

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|I3|.°›|3I3l|
||2I3I2I3I2I
228 Lucas Ciavatta ~ Daniela Ferreira - Ioão Santos
s.-4.1 Dividindo os tempos: Trio em Encaixe Para_ .› . .
t tt
- :.::

Em uma viagem a Bali, na Indonésia, Ciavatta ficou


fortemente impressionado pela recorrência e perfei- çLista,_de”documentos.iqueíçmencionam O Passos: e
ção com que a música nessa ilha se utiliza do recurso Luctasfliitavatjta, co.m.ciI&çoes. ou mençao em bilio
45! If
nn

de imbricar frases. Desde então, o educador tem grafiasz,;*bem como e-ntreçvistas concedidas pelo
trabalhado esse recurso, não necessariamente por criador do método: e i E i i
razões composicionais (como acontece na música “Lucas tfliavattaf. Bibleioteca digital. Disponivel
balinesa), mas principalmente pedagogicas. Quando E em: r <http:'/,¡s:choIar.google.com.br/s'cholar?as__q=
e Ú-.I-Passo&as__epq¿=Lucas+,Ciavatta&as_o.q=&as_eq=&as¿__
as frases estão imbricadas, encaixadas, as impreci- occtzanyffitasigsauthors=Sras___publicatior1=&as__vlo=&as__
sões são facilmente percebidas pelo grupo. Quando - - yhi=&btnG=&hl=pt-P'I'&as_sdt=ü>. Acesso e1n:24 out.
2o14.
alguém toca uma nota e, tanto imediatamente antes
quanto imediatamente depois, outro alguém está Reportagem sobre O Passo no jornal Nacional
tocando outra nota, a precisão é a única garantia de (Rede Globo de Televisão), em 3 de novembro de 2011:
poder tocar junto. ESCOLAS investem na formação de professores de música.
.turnal Nacional. Rio de janeiro: Rede Globo, 3 nov. 2011.
O exemplo a seguir apresenta uma primeira frase, Disponível em: <http:/¡g1.globo.com/jo-rnal-nacional/
muito conhecida no Brasil por ser a clave do coco; noticia/'2U11/11/escolas-investem-na-forinacaoí-de»
professoras-de-musica.html>. Acesso em: 24 out..,2,.01.éz;,
a segunda frase é exatamente igual ã primeira em
termos de duração, mas inteiramente diferente em Sites
termos de posição; e a terceira completa os espaços Os PASSO: música e educação. Disponível em: <vvww.opasso.
com.br>. Acesso em: BD out. 2014.
vagos deixados.
Trabalhe a primeira frase até que ela esteja soando OPÀSSO. Disponivel em: <http://vvvvvayoutube.com/user/
opasso›. Acesso em: 24 out. 2014.
minimamente familiar:

'1 ¡(2› e 3 it-4) e |


Í(1)i 2 i(3)i 4 ¡||
:(1) e (2)i (3) e (4)¡ |

Lucas Ciavatta: O Passo - corpo e mente no mesmo andamento pç L. ass


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230 Lucas Ciavatta -« Daniela Ferreira -~ joao Santos


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Choro genero musical popular urbano que se popula- que tocava a melodia, um catiíínho, -‹
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rizou no final do seculo XIX Nasceu da hibridizaçao acordes, e um violão, que dos Cop
(amalgamaçao) de musica de salao europeia, como passar do tempo, outros instrtggntos m adicçi I

'-:L~3.3 vi' _.:"


polcas, schotrisches ( chotes , em portugues) e val- nados, e, na atualidade, os chorãêggo mais Pw"iI

2-s _ z ¿.| .¬,_, Q,-É

sas, com ritmos caracteristicos de danças africanas amplos e podem contar com --s
_,
praticadas no Brasil, como o lundu e o batuque. Essa fone, trombone, clarinete, acordeao e
hibridizaçao revela um aspecto social importante
E3 É .É Ê' É

mentos típicos da música clássica, como o violbfíclello


da epoca a busca por uma identidade brasileira, e o violino. O choro ainda É muito executado nos dias
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na qual o elemento negro se tornou imprescindi de hoje, nas rodas de choro, nas quais os,i_e,fwxa¡g-.titantes .cê *š
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. . z . -¡:.(_ .Ê

vel, sendo observado fortemente nas praticas cultu- E1II18.ClDI'ES E pI'0fiSS101'1EI.1S SE I`EI.11'1EII1 ]¿ë;EI1l§E
, .i ea;-: _..L¬,__,.
§F55!.ä§.!Ê
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rais. Os musicos que tocam choro sao popularmente para tocar, e tambem nos clubes detifšfie os WW

conhecidos como choroes No inicio de sua mani aficionados do genero podem ouvir cos
pros
festaçao, o grupo de choro consistia em um flautista, sionais. Normalmente, o genero e estrufufiiêrn

Pedagogias brasileiras em educaçao musical 231


forma de rondo em três partes (AABBACCA), e têm no Brasil. Petropolis: Vozes, 1983. Um trabalho mais
uma proeminente linha melodica, na qual floreios recente apresenta uma análise mais atualizada da
improvisados são característicos e os contrapontos, educação no Brasil durante o século XX: VEIGA, C. G.
bem elaborados. Para mais informações, consulte: República e educação no Brasil (1889-1971) In: ___.
MARCONDES, M. A. (Ed.). Enciclopédia da música História da educação. São Paulo: Ática, 2007. p. 237-322.
brasileira: popular, erudita e folclórica. São Paulo:
Estética relativista do impreciso e do paradoxal:
Art Editora/Publifolha, 1998. p. 200-201; e WISNIK,
a estética relativista parte da premissa de que os
j. M. Machado Maxixe: o caso Pestana, sem receitas -
componentes da composição musical não podem ser
ensaios e canções. São Paulo: Publifolha, 2004. p. 14-79.
considerados independentemente uns dos outros,
Circulo de Hevner: veja artigo de MILLER, R. F. fundamentado-se no conceito da física de que tempo
Resposta afetiva. In: Colvvell, R. Handbook of Research e espaço são grandezas inter-relativas. Por impreciso
on Music Teaching and Learning. New York: Schirmer considera-se que tendências substituem ocorrências
Books, 1992. p. 414-424. definidas, enquanto paradoxal diz respeito a um modo
Dodecafonismo: técnica de estruturação musical de pensar que visa à complementaridade de conceitos
que utiliza como elemento unificador uma série de aparentemente opostos.
12 sons de alturas diferentes, ou seja, uma permuta- Fichas montessorianas: materiais organizados em
ção da escala cromática. sequências de dificuldade crescente, contendo listas
Ensaio planimétrico: um ensaio é um produto estético de exercícios a serem realizados individualmente
com estrutura aberta, que nunca se fecha e é diferente pelo aluno.
a cada repetição. A planimetria corresponde uma Golin-Paris-Chevét, ou manossolfa: veja mais sobre
técnica de composiçao própria à música estrutura-
na

esse método francês em: CARDIM, C. A. G.; GOMES


lista. O plano em forma de diagrama é o espaço onde IÚNIOR, j. O ensino da música pelo methodo analy-
acontecem as ocorrências musicais, que contam com tico. 6. ed. São Paulo: Typographia Siqueira, 1929.
um índice alto de improvisação, já que a escolha das O método analítico se tornou conhecido na Europa
estruturas sonoras ocorre aleatoriamente, isenta de no século XIX por meio do Guide de la methods elé-
contrastes no sentido dualista da oposição. rneritaire et arialyi-ique de musique et de chant, diuisé
Escola Nova: há alguns estudos interessantes sobre eri deux parties (1821), de Guillaume-Louis Bocquillon
a Escola Nova no Brasil. Dentre eles, destacamos o Wilhem. Consulte também o livro: MATEIRO, T.;
clássico ROMANELLI, O. de O. História da educação ILARI, B. Pedagogias em educação musical. Curitiba:
InterSaberes, 2012.

232
Teresa Mateiro -~ Beatriz Ilari (Org.)
Geração de1870: para maiores informações sobre esse a música popular brasileira: uma visão sem preconceito,
grupo de intelectuais, consulte ALONSO, A. Crítica e a Sema orientava seu trabalho a partir de aspectos da
contestação: o movimento reformista da geração 1870. disciplina, do civismo e da educação artística, e foi
Revista Brasileira de Ciências Sociais, Rio de janeiro, dessa maneira que “a Superintendência de Educação
v. 15, n. 44, p. 35-55, out. 2000. Para um maior enten- Musical e Artística na Sema desenvolveu sua atua-
dimento das questões que envolviam a educação na ção sobre todos os setores educacionais do Distrito
Primeira República (1889-1930), consulte FREITAS, M. Federal” (Paz, 2004, p. 7). Caso queira saber mais sobre
C. de; BICCAS, M. de S. História da educação social no a Sema, sugerimos que veja o Capítulo 1 deste livro,
Brasil (1926-1996). São Paulo: Cortez, 2009. dedicado ã vida e obra de Heitor Villa-Lobos. Ainda
Ginástica rítmica, ou eurritmia: método de ensino da sobre a Sema, trazemos as considerações de Parada
música desenvolvido por jacques-Dalcroze. (2009, p. 177), que afirma que a Sema “tinha como
atribuição planejar, orientar e desenvolver o estudo
Identificador comum de brasilidade: remetiam a uma
da música nas escolas primárias, no ensino secundá-
ideia de um “passado imemorial” do Brasil, no qual
rio e nos demais departamentos da municipalidade”.
residia a propria “essência” do povo brasileiro. Uma
ln: PARADA, M. Som da nação: educação musical e
vez imbuídas dessa ideia, seria mais fácil que as
civismo no Estado Novo (1937-1945). Alceu, v. 9, n. 18,
crianças se imaginassem como parte de um grupo
p. 174-185, jan. 2009. Disponível em: <http://revista
coeso e unido por essas raízes supostamente comuns, alceu com puc_I_í0 br/medía¡A1ceu%2018 aI_tigo%2O
independentemente de suas diferenças sociais, étni- 13%20(pp174%20a%2O185) Pdb Acesso emfló jul 2015
cas e raciais.
Serialismo: técnica de estruturação musical funda-
Pulso ou pulsação: batida constante que orienta a
mentada na ordenaçao serial de um ou mais parâ-
velocidade do tempo em música. O pulso equivale
metros musicais utilizados na obra.
a um tempo.
Suingue: suingue, ou balanço (swing, em inglês) é um
SEA: Superintendência de Educação Artística.
conceito impreciso, mas cuja existência é impossível
Sema: Superintendência de Educação Musical e negar. A falta dele indica que não há vida em determi-
Artística. Idealizada por Villa-Lobos, essa institui- nada realização musical; indica que ela não é capaz
çao tinha a atribuição de introduzir o ensino da
.IU

de criar movimento, externo ou interno, em quem


música e o canto coral nas escolas, com apoio do então quer que seja, em quem ouve e mesmo em quem toca.
presidente da República, Getúlio Vargas. Segundo a N”O Passo, essa questão é abordada desde o início
obra de Ermelinda Paz (2004) intitulada Villa-Lobos e por meio de três habilidades para o fazer musical,

Pedagogias brasileiras em educação musical


233
que se apresentam inteiramente imbricadas: preci-
são - clareza em termos corporais e em termos de
representação a respeito da articulação de um ritmo
com sua pulsação (qualquer realização musical, por
mais livre que possa parecer, vive de sua precisão);
fluência - familiaridade com a articulação de um
ritmo com sua pulsação (a precisão possibilita, mas
não garante a fluência, e é grande o risco de meca-
nizar uma realização onde tudo parece estar no seu
devido lugar); e intenção - conhecimento da cultura
que originou determinada música (uma realização
só se completa quando o realizador sabe de onde vem
e para onde vai sua música).
Tonalismo: princípio de estruturação musical que
relaciona os signos musicais com um centro de con
Í'

no

vergência denominado tônica.

234 Teresa Mateiro - Beatriz Ilari (Org}


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Anacleto de Medeiros: nasceu em 1866, no Rio de Anísio Teixeira: natural da Bahia, um


janeiro, e faleceu na mesma cidade, em 1907. Tocava do movimento da Escola Nova, atuou ,ë __

diversos instrumentos de sopro, dos quais seu favo- rio da Educação da Bahia e
rito era o sax-soprano. Foi também conhecido como e Cultura (Distrito Federal).
compositor e regente. Uma de suas obras mais conhe- de Brasília e foi diretor da Cšêšäiordençao de
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cidas é o chote “Iara”, que recebeu versos de Catulo da Aper eiçoamento de Superior) e
Paixão Cearense e foi editado em 1912 sob o título de do Inep (Instituto e Pesquisas
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“Rasga o coração”, composição que Villa-Lobos usou Educacionais An¿ggçÍEêi'xeira). 33,2 waã
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como tema do seu “Choros n. 10”. Para mais informa- Bruno Kiefer:
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nascido na Alemanha (1923)


ções, consulte: MARCONDES, M. A. (Ed). Enciclopédia e radicado no Brasil desde 1934, destacou-se por aliar,
da música brasileira: popular, erudita e folclórica. São em suas obras, elementos da música tradicional gaú-
Paulo: Art Editora/ Publifolha, 1998. p. 496. cha a técnicas de vanguarda. Faleceu em 1987.

Pedagogias brasileiras em educação musical 235


Cláudio Santoro: compositor amazonense (1914-1989), 222 f. Dissertação (Mestrado em Artes). Campinas:
com obras que abrangem experimentos com o dode- Universidade Estadual de Campinas, 1995.
cafonismo e tendências nacionalistas.
Guillaume Louis Bocquillon Wilhem: francês respon-
Edgar Roquette-Pinto: etnógrafo, antropólogo, sável pelo desenvolvimento do método de canto
médico, escritor, e professor. Fez parte da chamada orfeõnico por volta de 1820. Seu objetivo era insti-
Missão Rondon, cujo chefe foi o Marechal Cândido tuir a educação musical nas escolas primárias; no
Mariano da Silva Rondon. O objetivo dessa missão entanto, anos mais tarde, Wilhem também utilizou
era expandir a linha telegráfica no Mato Grosso seu método educacional para ensinar música a uma
e levá-la para estados vizinhos. Durante a missão, sociedade coral, que eventualmente cresceu e se tor-
Roquette-Pinto entrou em contato com diferentes nou o instituto nacional de música conhecido como
tribos ameríndias da região, como os parecis e os L'Orphéon, uma clara homenagem ao mito grego
inhambiquaras, e coletou material etnográfico que de Orfeu, músico e poeta de talento incomparável.
gerou o importante livro Rondonia: antropologia etno- Orfeu era filho de Apolo, o deus da música, e Caliope,
grdfiea, de 1917. Entre os materiais que Roquette-Pinto musa da poesia épica. Veja mais em: RAINBOW, B.;
coletou, constam melodias ameríndias, algumas das WILHEM, G. L. B. Grove Music Online. Oxford Music
quais Villa-Lobos utilizou em suas composições e nas Online. Disponivel em: <http://wvvvaoxfordmusic
coleções de canções do seu programa de educação online.com.lp.hscl.uil.edu/subscriber/article/grove/
musical (como a melodia “Nozani-ná Orekuá”, dos music/30320>. Acesso em: 25 set. 2012.
parecis). Roquette-Pinto foi também figura impor-
Hermann Scherchen: maestro alemão (1891-1966), um
tante na implementação da transmissão radiofõnica
dos pioneiros na interpretação da música contempo-
no Brasil. Ele persuadiu o governo a investir em equi-
rânea de sua época.
pamento radiofõnico, o que eventualmente levou ã
organização da Radio Sociedade do Rio de janeiro Jean Cocteau: escritor, poeta, dramaturgo e cineasta
em 1922, da qual ele se tornou diretor. francês muito influente nos círculos intelectuais e
artísticos da França na primeira metade do século XX.
Eunice Katunda: compositora carioca (1915-1990) que
reflete em sua obra a conjunção da técnica dodeca- João Gomes Júnior: compositor de ópera e um dos
fõiiica com elementos do folclore brasileiro. mais importantes educadores musicais da Primeira
República (1889-1930). Gomes júnior nasceu no Brasil,
Fabiano Lozano: para conhecer a vida e a obra dessa
mas recebeu parte de sua educação musical no
personalidade da música, consulte PAIARES, V. S.
Conservatório Real de Milão, na Itália, para onde
Fabiano Lozano e o inicio da pedagogia vocal no Brasil.

236 Teresa Mateiro - Beatriz Ilari (Org.)


havia se mudado em 1884. Retornou ao Brasil em Maria Montessori: educadora, médica e feminista ita-
1888 e iniciou então sua carreira pedagógica, ensi- liana cuja metodologia é ainda adotada por escolas
nando nas conhecídas Escolas Modelo. Sua carreira públicas e privadas em todo o mundo.
floresceu na Escola Modelo Caetano de Campos, Sátiro Bilhar: violonista e compositor de choro. Nasceu
na cidade de São Paulo, onde ensinou por diversos no Ceará, em 1869, e faleceu no Rio de janeiro, em
anos. Para mais informações, consulte MARCONDES, 1927. Foi um importante “chorão” e tinha fama de
M. A. (Ed.). Enciclopédia da música brasileira popular,
grande improvisador. Para mais informações, con-
erudita e folclórica. São Paulo: Art Editora; Publifolha, sulte: MARCONDES, M. A. (Ed). Enciclopédia da música
1998.
brasileira: popular, erudita e folclórica. São Paulo:
John Devvey: filósofo americano e um dos fundado- Art Editora/ Publifolha, 1998. p. 97.
res da escola filosófica do pragmatismo, é conside- William James: renomado filósofo dedicado ao
rado pioneiro da psicologia funcional. Foi o principal pragmatismo. Foi considerado um dos fundadores
representante da chamada educação progressiva na da psicologia moderna.
primeira metade do século XX nos Estados Unidos.
José Kliass: pianista russo (1895-1970), radicado em
São Paulo após a Primeira Guerra Mundial, formou
várias gerações de pianistas em nosso país.
Luiz Carlos Franco Peçanha: iniciou-se na música
como cantor no Coral do Centro Educacional de
Niterói (CEN) sob a direção do professor e maestro
Ermano Soares de Sá. Formado em Licenciatura em
Educação Artística, com habilitação em Música pela
Universidade Federal do Estado do Rio de janeiro e
mestre em Musicologia pela Universidade Federal
do Rio de janeiro; professor de Educação Musical e
regente coral do CEN. Atua em cursos sobre o Método
Gazzi de Sá.

Pedagogias brasileiras em educação musical 2.37


lieginollflorcio Simão Santos é doutora em Comunicação, mestre em Educação, bacharel em Piano pela Universidade
Federal do Rio de janeiro (UFRj) e licenciada em Musica pela Universidade Federal do Estado do Rio de janeiro
(Unirio), tendo realizado estudos sistemáticos com Koellreutten Foi docente da Unirio, atuando nos cursos de gra-
duação, mestrado e doutorado em Miísica, e professora de Musica na educação basica por mais de 20 anos. integrou
o Departamento Pedagógico da Secretaria Municipal de Educação do Rio de janeiro (SME-Rj), coordenando cur-
sos deformação continuada para professores de Música e das series iniciais e educação infantil. É conferencista,
consultora e assessora de instituições de ensino superior, SMEs e Serviços Sociais do Comércio (Sescs) na area de
educação musical,ƒormação de professores, música e curriculo, e assessora no preparo de publicações e documentos
curriculares. Também presta assessoria pedagógico-musical para o projeto social Centro de Convivência Musical
(Cecom-Rj). Pensa uma epistemologia das praticas pedagógico-curriculares em musica a part-ir da relação “rizoma e
educação”, aproximada dos estudos etnomusicologicos e do debate contemporâneo sobre educação. Organizou o livro
Música, cultura e educação: os múltiplos espaços de educação musical e coorganizou a obra Música na escola:
caminhos e possibilidades para a educação básica, publicada em 2015 pelo Sesc Departamento Nacional. É uma
das líderes do Grupo de Pesquisa do CNPq “Música e educação brasileira” e integrante da Comissão Acadêmica do
Fórum Latino-Americano de Educação Musical, sediado em 2015 no Brasil (Fladem Brasil/2015).

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A tradiçao de inovação caracteriza as pedagogias um ideal estético, ou das emergências de um “novo


musicais trazidas nos capitulos deste livro. Com bre- mundo”, passaria a justificar um novo discurso e
ves considerações, respaldo a indicação de leitura prática em educação musical.
desta publicação que reflete brevemente sobre alguns Segundo, essa produção pedagógica brasileira
marcos da pedagogia da música no Brasil. surgiu sempre na imbricação com um coletivo. Sem
Primeiro, trata-se de que, em diferentes momen- buscar fundadores, sem buscar um discurso autoral,
tos históricos da educação musical no Brasil, cada estamos diante de sujeitos com sua produçao peda
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músico-educador realizou um diagnóstico, construiu gógica, num contexto constituído por uma trama
uma fundamentação teórico-conceitual e produziu (condições políticas, econômicas, sociais), por uma
um marco operativo (um modus operandi) para o rede de pensamentos e práticas dos que lhes são
ensino de música. Uma lacuna, ou incõmodo nesse contemporâneos e lhes antecederam.
processo, ou uma possibilidade radicalmente dife- Uma pedagogia villalobiana se ergueu num
rente de compreensão do projeto pedagógico, ou de conjunto de condições dadas pelo ideal de um

Pedagogias brasileiras em educação musical 239


nacionalismo cultural, configurando um canto orfeõnico para o caso
brasileiro, começando pelo Distrito Federal, ã luz do orfeonismo obser-
vado em outros países, e não obstante as contribuições internas ao canto
orfeõnico que lhe antecedia em território nacional. Gazzi de Sá, inovador
de um movimento de musicalização na escola, representa o movimento
do canto orfeõnico na Paraíba. Uma psicotécnica do ensino da música
se faz com Sá Pereira, no contexto da Escola Nova: enfatizando as bases
psicológicas do ensino da música, o educador pensou a administração
desse ensino, seu controle, seu “ensino racionalizado”, e não o fez sem o
legado dalcroziano e do método ativo. A ginástica rítmica dalcroziana
produz no Brasil a “Iniciação Musical” e um profícuo debate sobre peda-
gogia musical.
De igual forma, não é possivel falar dos jogos musicais de Sá Pereira
ou de Liddy Mignone sem conecta-los aos de Martenot ou à conscientiza-
ção corporal do ritmo musical já defendida por Dalcroze. Com inovações
ou adaptações, as pedagogias musicais vão ganhando traços singulares
na sua reinvenção brasileira. Liddy Mignone, também representando
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renovação” nesse projeto de educação musical, é um nome relevante
não só na história da Iniciação Musical, mas especialmente na musico-
terapia que viria a ser implantada no Brasil.
Visando a uma educação musical para um “novo mundo”, “um mundo
sem vis-ã-vis”, Koellreutter prioriza a relação música e a consciência,
o humano como objetivo da educação musical, e propõe o método pre-
figurativo (uma aprendizagem autodirigida, com currículos abertos e
singulares, organizações não lineares). Esse projeto ainda hoje desafia
e estimula a formação de um outro perfil profissional, não mais dado
pela transmissão da matéria (dar aquilo que o aluno pode ler em livros,
enciclopédias, nas ferramentas digitais, com auxilio das tecnologias).
No centro de um ensino prefigurativo está o fazer música, refletir,
questionar; estão os modelos (jogos) de improvisação, tomados como

240 Teresa Mateiro - Beatriz Ilari (Org.)


atividades nucleadoras de múltiplas direções de ensino, traçados obje-
tivos e critérios para sua realização. Uma preocupação com “uma vida
para a música”, em Esther Scliar, soa semelhante ao apelo em torno de
um “ensino musical da música”, que ainda hoje tem lugar no discurso
sobre uma educação musical para o nosso tempo. Além disso, Gramani é
apresentado, sendo mais um a reforçar a necessidade de “consciência” -
dessa vez, “consciência musical do ritmo”, presente de forma singular no
método de Lucas - O Passo -, com os pilares do corpo, da representação,
do grupo e da cultura. Ao promover uma vivência sistematizada do
“suingue”, com a representação mental do espaço musical, e considerando
eventos musicais no fluxo que lhes dá vida, O Passo é, simultaneamente,
percepção e análise, prática de conjunto, contextualização histórica dos
ritmos brasileiros e de padrões musicais de várias culturas.
Todas essas pedagogias brasileiras em educação musical instauram
seus centros de formação de professores ou investem em estratégias para
o preparo de profissionais para a realização do seu projeto, e produzem
seus materiais didáticos e outras publicações.
A influência desses trabalhos na educação musical de hoje, além de
servir às práticas pedagógicas nos mais diversos cenários educacionais,
há de impulsionar o pensamento e a prática dos educadores ã produção
de soluções locais. Não se trata de incorporar cada pedagogia musical
para aplicá-la, pois este livro documenta a atitude inquieta de sujeitos
pesquisadores que, mais que críticos da história e da prática da peda-
gogia musical do seu tempo, são criadores de soluções fundamentadas,
contextualizadas, atuais e atualizantes. Encaminhamentos futuros
para a educação musical no Brasil podem ter nessas pedagogias ele-
mentos impulsionadores para a produção permanente de soluções que
respondam a outros diagnósticos, a outras construções teóricas que as
investigações não cessarão de produzir.

Pedagogias brasileiras em educação musical


Carlos Kater é educador; musicólogo e compositor, doutor em Música pela Universidade de Paris IV - Sorbonne
e professor titular pela Escola de Música da Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG). É autor de diversos
livros e artigos, entre eles: Música viva e H. j. Koellreutter: movimentos em direção ã modernidade; Eunice
Katunda, musicista brasileira; Musicantes e o boi brasileiro; Erumavez... umapessoaqueouviamuitobem.
Editou os Cadernos de Estudo de Educação Musical e Análise Musical, que se tornaram referências na vida
acadêmica brasileira. Coordenou o Centro de Pesquisas em Música Contemporânea da UFMG;foi vice-presidente
da Associação Brasileira de Educação Musical (Abem) por dois mandatos e membro do Conselho Editorial da ins-
tituição. É professor colaborador do programa de pós-graduação em Música da Escola de Comunicações e Artes da
Universidade de São Paulo (USP) e curador da Fundação Koellreutter da Universidade Federal de São joão del-Rei
(UFSI). Desenvolve o projeto '14 Musica da Gente” com 340 crianças do Centro Educacional Unificado Celso Daniel
e atua regularmente como conferencista, consultor e professor; com temas associados ã musicologia brasileira e ã
“formação musical inveni-iva”, comfoco no desenvolvimento humano.

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Villa-Lobos, Sá Pereira, Liddy Mignone, Gazzi de Sá, pouco tempo, o conhecimento mais aprofundado
Koellreutter, Esther Scliar, josé Gramani e Lucas sobre os educadores musicais brasileiros demandou
Ciavatta são alguns dos protagonistas da educação certo empenho de pesquisa nas bibliotecas públicas,
musical postos em evidência neste livro. Apesar das senão em acervos particulares locais, contatos de
enormes diferenças existentes entre eles, seus nomes variadas naturezas, ao lado de um esforço de reunião
nos soam igualmente familiares, habitando muitos de bibliografia geralmente esparsa. Nesse sentido,
dos discursos formais e das falas corriqueiras de ganha-se hoje aqui acesso facilitado a um painel
nossa área. de informações significativas, contendo propostas
Porém, seus pensamentos, trajetórias pessoais, educativo-musicais de relevância em nosso meio.
visões de mundo, propostas e abordagens educati- A iniciativa de reunir tal conjunto de textos é
vas, além de muito particulares, nao parecem ainda muito oportuna também em decorrência das deman-
assimilados na mesma proporção. Isso porque, até das que começam a emergir como resultado da

Pedagogias brasileiras em educação musical 243


aplicação da Lei n. 11.769, de 18 de agosto de 20081. harmonia (e, com grande probabilidade, em nosso
Por outro lado, vale notarmos que vem de encontro próprio trabalho também). Encontramos, por exem-
ainda a uma necessidade já antiga de maior conhe- plo, tanto abordagens fundadas na representação
cimento e fundamento de ação, reivindicada por um de crianças livres e sonoras, radiantes de criação
contingente cada dia maior de educadores musicais espontânea, quanto aquelas nas quais suas vozes
do país. e expressões permanecem ainda encarceradas no
Para estes que chegam, dirijo a breve reflexão significado do antigo termo original infância, isto é,
que faço a seguir. Quando conhecemos o trabalho infans, do latim “aquele que não fala”.
musical e realizações de vários dos educadores tra- Entre outras transformações marcantes obser-
tados nesta publicação, é possível perceber o sentido vadas nessas abordagens ao longo dos anos, embora
que a música ocupa e/ou ocupou em suas vidas. Eles de maneira não linear, verificamos a ampliação de
construíram nela não um espaço de artificialidades, seu espectro ao deixarem de ser o espelho preponde-
mas sim, cada qual ã sua maneira, um caminho con- rante de uma classe social particular para se fazerem
sequente de desenvolvimento profissional e pessoal. ponte arrojada entre territórios de representação
Nessa ótica, seria interessante esperar que alei- múltiplos, diferenciados, includentes. As conquistas
tura desses capitulos provocasse o convite para nos de consciência e proposições, com impacto social
interrogarmos sobre o percurso de aquisições refle- expressivo, fundadas na diferenciação entre o tra-
tidas nas práticas educativo-musicais que utilizamos dicional “ensinar música” e o atual “dar meios para”
hoje. Desde aí, então, reavaliá-las em vista da impor- o aprendizado e a expressão, possibilitou conceber
tãncia que guardam, seja na formação musical, seja um fazer musical em diferentes modalidades para
no desenvolvimento humano mais amplo, sobretudo além do artístico, do luxo ou do lazer apenas. Com
junto a jovens e crianças. isso, contribuiu para que a educação musical seja
A distância entre as características dessas pro- hoje profissão de reconhecimento, reivindicada por
postas educativas se reflete igualmente em nosso muitos segmentos da sociedade.
momento, onde convivem diversas temporalidades, Esses são indicativos inequívocos, entre tantos
mesmo aquelas de sentido e filosofia contraditórios outros, dos patamares conceituais alcançados pela
ocorrendo ombro a ombro, em estranha e mutável educação musical desde há muito até o presente, que,
como se pode perceber nos textos publicados, carre-
F _...-|-¬-...'_ _ I II

gam junto marcas históricas de diferentes significa-


1 BRASIL. Lei n. 11.769, de 18 de agosto de 2008. Diário Oficial da União, Brasília,
Poder Legislativo, 19 ago. 2008. Disponível em: <:http:tYivww_pIanaIto_gov.bri' dos, sentidos, valores, intenções e aspiraçoes. .fer

cciviI_03¡_ato2ü07-201 0t'2008.1'lei¡l11769.htm:›.

244 Teresa Mateiro - Beatriz Ilari (Org.)


Nesse inicio de século, em que ainda engatinha- condições para dimensionarmos as problemáticas
mos em observar sem pré-julgamentos e projeções, caracteristicas do hoje e o papel que cada um de nós
integrar o fazer e o pensar com coerência, produzir é realmente chamado a desempenhar.
sinteses criativas pertinentes, acalentar uma ética Este livro pode ser, assim, mais um esperado tram-
da estética, por exemplo, o conhecimento das cons- polim para o conhecimento da educação musical e
truções pedagógicas que nos são oferecidas, podem para o desenvolvimento dos educadores musicais,
também favorecer, a quem desejar, questionamen- integrando-se ao conjunto ainda pouco numeroso
tos e reflexões úteis, valiosos e, sobretudo, muito das valiosas contribuições que possuímos na área.
oportunos. A esperança agora é a de que se sigam a ele novos
Entre eles, como promover, junto àquele que não volumes, aos educadores nomeados aqui os ainda não
se expressa (considerado ou vivenciado como ínfans), suficientemente percebidos, a estes leitores e educa-
o canto, o som, a expressão autêntica? Como propiciar dores de hoje os muitos outros de amanhã.
a um aluno que escute além do que ouve? Ou, ainda,
que exprima além do que sua sensibilidade, voz ou
mãos permitem, segundo limites autoimpostos?
O que tanto se precisa hoje, sobretudo nos gran-
des centros urbanos, é de profissionais atentos para
fazer acompanhar o ser músico pelo ser educador,
pelo ser musicólogo, crítico, criador. Profissionais
que não abdicaram de sua própria pessoa e que nesse
território maior têm a escolha de aceitar, rever ou
transgredir o que lhes é disposto no tempo presente
(superar ou transgredir sempre que necessário por
compreender que, em alguns casos, permanecer fiel
ã norma é justamente trair a forma que se precisa
novamente criar para resgatar o sentido original de
determinados fatos, fenómenos e fazeres).
E nada disso é possível se não houver um traba-
lho dedicado de estudo, de leitura, de formação que
considere o conhecimento do passado, do já feito
e construido, concebido e experimentado, que dê

245
Pedagogias brasileiras em educação musical
.lusomoro Souza e doutora em Educação Musical pela Universidade de Bremen, Alemanha Atua como professora
_
do curso de graduação e do Programa de Pos Graduaçao em Musica da Universidade Federal do Rio Grande do Sul
L
(UFRGS) E pesquisadora do CNPq, com experiência na area de musica, com enfase em educação musical, atuando -.-
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principalmente nos seguintes temas* aprendizagem e ensino de musica no cotidiano, sociologia da educaçao musi-
cal e epistemologia da musica i
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1 É coordenadora do Grupo de Pesquisa Educação Musical e Cotidiano (CNPqi' UFRGS)
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Em 2011, Teresa Mateiro e Beatriz Ilari organizaram o livro Pedagogias


em educação musical, que trazia propostas pedagogicas de dez autores
dos séculos XX e XXI, considerados já “clássicos” do ensino de músicai.
Dessa coletânea participaram pesquisadores especialistas e interessados
na obra de cada um dos autores representados na referida obra.
O livro se tornou rapidamente uma referência para os cursos de
licenciatura em Música e concursos públicos para professores na área
de educação musical no país. O sucesso obtido com a primeira tiragem
revelou-se no fato de que a edição se esgotou em menos de um ano. Esse
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e um forte indicatnro para refletirmos sobre a importancia e a necessi nu

dade deuma biblioteca básica para a formação de professores de música.


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1 Para maiores detalhes, consuite o livro original organizado por Mateiro e Ilari [2011] e a resenha feita por Macedo {2i3~12].

Pedagogias brasileirafi Em Educação musical 24?


Agora, em 2015, chega às nossas mãos um segundo trabalho orga-
nizado pelas mesmas autoras. Com um fôlego semelhante, o trabalho
coletivo de oito pesquisadores se volta para a análise de propostas peda-
gógicas feitas por professores e compositores no Brasil, a saber: Heitor
Villa-Lobos, Antônio Sá Pereira, Liddy Chiaffarelli Mignone, Gazzi de
Sá, Hans-Ioachim Koellreutter, Esther Scliar, Iosé Eduardo Gramani e
Lucas Ciavatta.
Podemos entender a publicação desta obra como um esforço de dar
continuídade e aprofundar o trabalho anterior, ao trazer pedagogias
menos conhecidas do grande público, assumindo, ao mesmo tempo,
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a tarefa de reconstituir a história das ideias pedagógico-musicais no
Brasil. É um exercício de grande envergadura, já que os modos de aná-
lise seguem a mesma estrutura daquele volume anterior: “Ideias”, “Vida
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e obra”, “Proposta pedagogica” e “Sala de aula”.
Essa estrutura traz o desafio de equalizar as produções pedagógi-
co-musicais de autores tão heterogêneos e propostas feitas em tempos
e espaços distintos. Em outras palavras, para os pesquisadores-autores
dos capítulos, o inventário das produções bibliográficas primárias (os
documentos e escritos originais) e das produções secundárias (aquelas
que outras pessoas já escreveram) se torna bastante particular e com-
plexo para ser elaborado. No conjunto de textos apresentados, há uma
gama de detalhamentos indicativos da qualidade do material encontrado
e inserido nas análises de cada pedagogia. Também há de se notar a
especificidade da escrita imposta pelo material utilizado na compo-
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sição de cada capítulo. Em suma, os textos apresentados referem-se a
“pedagogias brasileiras em educação musical”, mas que não se deixam
compor uma unidade e que, pelas suas singularidades, não permitem
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uma generalização ou identificação de pontos em comum.


Reconhecer essa variedade de propostas ou modelos para a educação
musical abre espaço para pelo menos para duas questões:

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248
Teresa Mateiro - Beatriz Ilari [0rg_}
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1. Como podemos construir bases teóricas mais sólidas para a formação
e atuação dos profissionais de educação musical a partir do conhe-
cimento histórico acumulado?
2. Como avançar no conhecimento da didática da música, entendida
como ramo da educação musical que se ocupa dos diferentes proces-
sos de ensino e aprendizagem de música?
A didática estuda e considera os aspectos técnicos, práticos e opera-
cionais destinados ã formação. Um estudo mais sistemático sobre cada
pedagogia pode colaborar para o entendimento de que as teorias, mesmo
quando não são explicitadas pelos autores, são subjacentes aos modelos
e atividades propostas para a prática da aula de música. Assim também
são os valores e visões de mundo que embasam qualquer proposição
didática. Dessa forma, pode ser útil o conhecimento sobre pensamen-
tos e ideias que compõem o campo teórico da educação musical: Que
teorias temos ã nossa disposição? Que relações fazemos entre o campo
da didática específica com aquele da didática geral?
A teoria do pensamento pedagógico geralmente é oferecida para os
licenciandos no formato de disciplinas avulsas oferecidas pelos cursos
de Pedagogia e institutos de educação. No entanto, nem sempre há uma
integração dessas disciplinas com as questões especificas da didática da
música, mesmo naqueles cursos que oferecem disciplinas como funda-
mentos da educação musical ou sobre os “métodos ativos”.
Nessa direção, é possível considerar que a didática geral não consegue
explicar todas as dimensões e critérios de planejamento e condução de
uma aula de música. Como lembra Kraemer (2000, p. 53),

A pedagogia da música tem perguntas sensíveis sobre a percepção e sobre


o conhecimento, sobre julgamentos estéticos, sobre o pensamento, sobre a
maneira de agir e sentir, sobre o conhecimento do carater linguístico e icônica
da música, sobre a experiência e corporal e estética, sobre a erica e cultura
com vistas a abarcar os problemas de apropriação e transmissão da música.

Pedagogias brasileiras em educação musical


Entre suas tarefas esta a reflexão sobre os problemas de normas e valores,
assim como sobre os respectivos conceitos musicais utilizados na pratica.

Por outro lado, a didática específica da educação musical deve dia-


logar com os princípios gerais da didática que possam contribuir para
a constituição de teorias e modelos próprios para a área. Para Kraemer
(2000, p. 61), a pedagogia da músicai “está entrelaçada com outras disci-
plinas”, como sociologia, antropologia, história e filosofia. No que tange
ã pedagogia, a educação musical divide “a consideração do homem sob
os aspectos da educação e formação, do ensino e aprendizagem, de ins-
trução e didáticos” (Kraemer, 2000, p. 61).
Convém reforçarmos que os dois movimentos - tanto a apreensão
dos aspectos teóricos especificos quanto o entrelaçamento com outras
disciplinas - exige um pensar e agir crítico para que a concepção didática
do ensino de música não fique superficial e inconsistente pela mistura
de paradigmas muitas vezes incompatíveis.
Cremos que um dos objetivos do inventário das pedagogias brasileiras
em educação musical (e mesmo das pedagogias em educação musical no
Brasil) é colocar ã disposição dos estudantes e professores de música um
instrumento com o qual as pessoas possam analisar e planejar suas ativi-
dades para o ensino de música. A legitimação de cada pedagogia está na
possibilidade de levá-la para a sala de aula, com a função de um modelo
a ser experimentado em cada situação e contexto. Isso certamente con-
tribui para uma pedagogia do lugar onde cada atividade será proposta.
Ler detalhadamente as ideias e a vida e obra de cada pedagogo musical
pode ajudar na aquisição de argumentos didáticos mais sólidos - Por que
utilizar esse modelo ainda hoje? - e evitar a mistura de estilos e concep-
ções didático-musicais, de fundamentos epistemológicos distintos. Cada
modelo foi construído de uma forma, pensado com objetivos e materiais
diferentes. Assim, reunir o “mais importante”, o “principal” o “típico H

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2 No original em alemão - musikpãdagogik, conceito que pode ser traduzido como "educação musical”.

250 Teresa Mateiro z- Beatriz Ilari (Org)


e os aspectos “mais importantes” ou as atividades Referências

mais relevantes de cada proposta nao levara a um
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enriquecimento dos planos e currículos para a aula KRAEMER, R. D. Dimensões e funções do conhecimento
pedagógico-musical. Tradução de Iusamara Souza. Em
de música. Procedimentos desse tipo podem levar, Pauta, v. 11, n. 16/1'.?, p. 49-?3, abr./nov. 2000. Disponivel
mesmo, a uma visão simplificada dos fundamentos em: <http:K/seer.ufrgs.br/'EmPauta/articleƒvievv/9378>.
Acesso em: 3 set. 2014.
teóricos da educação musical.
Quando o livro apresenta oito propostas, obvia- MACEDO, V. L. F. de M.: MATEIRO, T.; ILARI, B. (Org.).
Pedagogias em educação musical. Curitiba: Ibpex, 2011.
mente não há a intenção de fazer um balanço de toda 352 p. (Série Educação Musical). Revista da Abem, Londrina,
a produção na área. A representatividade dos mode- v. 20, n. 27, p. 163-165, jan./jun. 2012. Resenha. Disponivel
em: <http:/lwww.abemeducacaomusical.org.br/Masters/
los de certa forma sempre é arbitrária e possivel de revista27/revista27___artigo14.pdf›. Acesso em:3 set. 2014.
ser justificada, quer pela sua ressonância, quer pelo
MATEIRO, T.; ILARI, B. (Org.). Pedagogias em educação musical.
desconhecimento. A apresentação de cada vida e cada Curitiba: Ibpex, 2011. (Série Educação Musical).
obra também pode ser vista com uma construção
da realidade: Que aspectos foram escolhidos para
descrever essas realidades? O que não foi conside-
rado? O que parece apropriado para a época em que
a proposta foi pensada e o que já estaria em desuso
ou inadequado? Que questões foram lançadas e com
que teorias estão relacionadas?
Por fim, resta esperar que a obra contribua para
outras reflexões e que estas, por sua vez, desestabi-
lizem a ideia de “métodos”, tão arraigada na nossa
área. Mas isso seria um tema para tantos outros
comentários.

Pedagogias brasileiras em educação musical 251


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Teresa Mateiro é PhD em Filosofia e Ciências da Beatriz Ilari é PhD em educação musical pela
Educação - Educação Musical pela Universidad Universidade McGill, Canadá. Entre 2003 e 2010,
del País Vasco (Espanha), e pós-doutora pela Lund atuou como professora adjunta da Universidade
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University (Suécia). É professora do Departamento de Federal do Parana (UFPR) e, em 2011, como profes -1

Música e do Programa de Pós-Graduação em Música sora visitante da Universidade do Texas, em Austin.


da Universidade do Estado de Santa Catarina (Udesc). Atualmente, é professora de Educação Musical da
Entre 2008 e 2011, atuou como professora associada na Universidade do Sul da Califórnia, EUA, e editora
Escola de Música, Arte e Teatro da Õrebro University do periódico Perspectives in Early Childhood Music
(Suécia). Como pesquisadora, tem desenvolvido pes- e*Movement.
quisas na área de formação docente, privilegiando
temas como prática pedagógica, construção do conhe-
cimento profissional, práticas musicais escolares e
estudos transculturais em educação musical.

Pedagogias brasileiras em educação musical 253


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da música e da educação musical no país. Entre .I
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