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Notas de Apoio

à disciplina de Matemática
do Mestrado Integrado em Ciências Farmacêuticas

Gonçalo Gutierres

Departamento de Matemática
Faculdade de Ciências e Tecnologia
Universidade de Coimbra
2023
Este texto contém um resumo da matéria da disciplina de
Matemática do Mestrado Integrado em Ciências Farmacêu-
ticas da Universidade de Coimbra. Ele é uma expansão dos
diapositivos apresentados nas aula teóricas e contém, entre
outras coisas, explicações mais detalhadas e a resolução de
alguns dos exercícios propostos. Alguns dos assuntos po-
derão não estar apresentados pela mesma ordem que foram
lecionados nas aulas.
Esta é a versão disponibilizada para os alunos do ano lectivo
de 2023/2024.
Indíce
1 Funções Elementares 1
1.1 Funções Invertíveis . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 1

2 Cálculo Diferencial 5
2.0 Limites e Continuidade de funções reais de variável real . . . . . . . . . . . . 5
2.1 Derivadas . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 8
2.2 Funções de Várias variáveis reais . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 12
2.3 Derivadas Parciais . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 13
2.4 Derivada Direcional . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 17
2.5 Aproximação Linear . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 20
2.6 Derivada da Função Composta (regra da cadeia) . . . . . . . . . . . . . . . . 23
2.7 Extremos de Funções de 2 Variáveis . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 26

3 Cálculo Integral 29
3.1 Primitivas, Anti-Derivadas ou Integral Indefinido . . . . . . . . . . . . . . . 29
3.2 Integral Definido . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 33
3.3 Aplicações do Cálculo Integral . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 38
3.4 Integrais Impróprios . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 42

4 Equações Diferenciais 46
4.1 Equações Diferenciais de Primeira Ordem . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 47
4.2 Equações Diferenciais como Modelos Matemáticos . . . . . . . . . . . . . . . 54

5 Álgebra Linear 61
5.1 Matrizes . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 61
5.2 Método dos Mínimos Quadrados . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 69

Referências 73
Funções elementares

1 Funções Elementares
Genericamente vamos classificar como funções elementares todas as funções reais que nos
são familiares, ou construídas a partir destas. Estas são as funções que têm as propriedades
mais “agradáveis”. Vamos portanto excluir todas as funções que precisam de ser definidas
por ramos.

Definição 1.1. Uma função real diz-se uma função elementar se for uma função constante,
polinomial, exponencial, logarítmica, trigonométrica, ou se resultar destas através de adi-
ções, produtos, quocientes ou radiciações. A composição e a inversa de funções elementares
também são funções elementares. Vamos considerar como domínio de uma função elementar
o conjunto dos pontos onde ela tem derivada finita.

Exemplos 1.2.

1. f (x) = x3 − 5x + 7; (função polinomial)

3x − 2
2. g(x) = ;
cos x
p
3. h(x) = sin2 x − x, no conjunto D = {x ∈ R : sin2 x − x > 0}.

Advém diretamente da definição que todas as funções elementares são continuamente


deriváveis. Aliás, mesmo sem a restrição adicional de que a derivada tem que ser finita
todas as funções elementares são contínuas. Esta restrição adicional serve apenas para

excluir casos patológicos como a função módulo, f : R → R com f (x) = |x| = x2 , de
serem funções elementares.

1.1 Funções Invertíveis


Nem todas as funções são invertíveis, para isso é preciso haver uma correspondência unívoca
entre o domínio e o conjunto de chegada. Quando isso não acontece, podemos considerar
restrições desses conjuntos.

Definições 1.3.

1. Uma função f : A → B é injetiva se ∀x, y ∈ A, f (x) = f (y) ⇒ x = y.

2. Uma função f : A → B é sobrejetiva ∀y ∈ B, ∃x ∈ A : f (x) = y.

3. Uma função é bijetiva se é injetiva e sobrejetiva.

1
Funções elementares

Se f : A → B é bijetiva, então existe uma função g : B → A tal que

∀x ∈ A, g(f (x)) = x e ∀y ∈ B, f (g(y)) = y.

A função g é a função inversa de f , e representa-se por f −1 .


A função inversa, se existir, é única e pode igualmente ser definida pela condição
f (x) = y ⇔ x = f −1 (y), para todo x ∈ A e para todo y ∈ B. Esta é a condição que
habitualmente usamos para definir a inversa de funções injetivas, considerando como domínio
da função inversa o contradomínio da função

Exemplo 1.4. A função exponencial é bijetiva se considerarmos como conjunto de chegada,


o conjunto ]0, +∞[. A função logaritmo (de base e) é definida precisamente como sendo a
função inversa da exponencial, ou seja ex = y ⇔ x = ln y.

f : R → ]0, +∞[ f −1 : ]0, +∞[ → R


x 7→ ex y 7→ ln y

Todas as funções injetivas podem ser facilmente transformadas em funções bijetivas,


restringindo o conjunto de chegada. Se uma função não é injetiva, por vezes considera-se
uma restrição injetiva da função. Ou seja, uma restrição do domínio a um conjunto onde a
função é injetiva.
Provavelmente o exemplo mais conhecido desta situação é a função quadrado f (x) = x2 .
Esta função não é injetiva em R, mas é injetiva em [0, +∞[. A função raiz quadrada é
definida como a função inversa da restrição de f aos reais não negativos.

g : [0, +∞[ → [0, +∞[



y 7→ y


Temos então que x2 = y ∧ x ≥ 0 ⇔ x = y. Em linguagem corrente, dizemos que a raiz
quadrada de y é o número não negativo x que elevado ao quadrado dá y.

Funções trigonométricas inversas


As funções trigonométricas seno, cosseno, tangente e cotangente não são injetivas. No
entanto, como vimos anteriormente, podemos considerar a função inversa de restrições destas
funções. As restrições principais das funções seno, cosseno, tangente e cotangente têm
domínio [− π2 , π2 ], [0, π], ] − π2 , π2 [ e ]0, π[, respectivamente. As suas inversas são designadas
por arco seno, arco cosseno, arco tangente e arco cotangente.

2
Funções elementares

Definições 1.5. As funções arco seno, arco cosseno, arco tangente e arco cotangente são de-
finidas como as funções inversas das restrições principais das funções seno, cosseno, tangente
e cotangente.

• x = arcsin y ⇔ y = sin x ∧ x ∈ [− π2 , π2 ]

sin : [− π2 , π2 ] → [−1, 1] arcsin : [−1, 1] → [− π2 , π2 ]


x 7→ sin x y 7→ arcsin y

• x = arccos y ⇔ y = cos x ∧ x ∈ [0, π]

cos : [0, π] → [−1, 1] arccos : [−1, 1] → [0, π]


x 7→ cos x y 7→ arccos y

• x = arctan y ⇔ y = tan x ∧ x ∈] − π2 , π2 [

tan : ] − π2 , π2 [ → R arctan : R → ] − π2 , π2 [
x 7→ tan x y 7→ arctan y

• x = arccot y ⇔ y = cot x ∧ x ∈]0, π[

cot : ]0, π[ → R arccot : R → ]0, π[


x 7→ cot x y 7→ arccot y

Nota. Temos que sin(arcsin y) = y, uma vez que esta expressão só tem significado para
y ∈ [−1, 1], mas em geral não podemos escrever que arcsin(sin x) = x, uma vez que esta
igualdade só é válida para x ∈ [− π2 , π2 ]. Por exemplo arcsin(sin π) = arcsin(0) = 0 6= π.

Funções hiperbólicas
As funções hiperbólicas têm algumas propriedades semelhantes às funções trigonomé-
tricas, e por isso “herdaram” o nome das funções trigonométricas. Vamos então definir
as funções seno hiperbólico, cosseno hiperbólico, tangente hiperbólica e cotangente hiper-
bólica. Esta família de funções pode ser definida, de modo equivalente, geométrica ou
algebricamente. Neste texto vamos apenas usar a definição algébrica. Fazemos apenas uma
pequena observação geométrica, o nome de funções hiperbólicas advém do facto da hipérbole
x2 − y 2 = 1 representar para estas funções um papel similar ao do círculo trigonométrico
x2 + y 2 = 1 para as funções trigonométricas.

Definições 1.6. As funções seno hiperbólico, cosseno hiperbólico, tangente hiperbólica e


cotangente hiperbólica são definidas pelas expressões:

1. sinh x = 12 (ex − e−x ) , [seno hiperbólico]

3
Funções elementares

2. cosh x = 12 (ex + e−x ) , [cosseno hiperbólico]

sinh x ex − e−x
3. tanh x = = x , [tangente hiperbólica]
cosh h e + e−x
cosh x ex + e−x
4. coth x = = x . [cotangente hiperbólica]
sinh h e − e−x
As funções sinh, cosh, tanh têm domínio R e a função coth tem domínio R \ {0}.

As principais fórmulas envolvendo funções trigonométricas têm fórmulas correspondentes


para as funções hiperbólicas. Vamos enunciar apenas algumas das mais importantes. A sua
demonstração não é muito difícil uma vez que pode ser feita a partir das propriedades da
função exponencial.

1. cosh2 x − sinh2 x = 1 [fórmula fundamental]

2. cosh(2x) = cosh2 x + sinh2 x

3. sinh(2x) = 2 sinh x cosh x

4. (sinh x)0 = cosh x

5. (cosh x)0 = sinh x

As funções seno, tangente e cotangente hiperbólicas são injetivas, e portanto invertíveis.


Por isso apenas é preciso considerar uma restrição de domínio para definir a inversa de cos-
seno hiperbólico. As inversas destas funções são designadas por argumento seno hiperbólico,
argumento cosseno hiperbólico, argumento tangente hiperbólica e argumento cotangente hi-
perbólica.

Definições 1.7. As funções argumento seno hiperbólico, argumento cosseno hiperbólico,


argumento tangente hiperbólica e argumento cotangente hiperbólica são definidas como as
funções inversas das funções seno, tangente e cotangente hiperbólicas e da restrição principal
do cosseno hiperbólico.

• x = arg sinh y ⇔ y = sinh x

sinh : R → R arg sinh : R → R


x 7→ sinh x y 7→ arg sinh y

• x = arg cosh y ⇔ y = cosh x ∧ x ≥ 0

cosh : [0, +∞] → [1, +∞] arg cosh : [1, +∞] → [0, +∞]
x 7→ cosh x y 7→ arg cosh y

4
Cálculo Diferencial

• x = arg tanh y ⇔ y = tanh x

tanh : R → ] − 1, 1[ arg tanh : ] − 1, 1[ → R


x 7→ tanh x y 7→ arg tanh y

• x = arg coth y ⇔ y = coth x

coth : R \ {0} → R \ [−1, 1]


arg coth : R \ [−1, 1] → R \ {0}
x 7→ coth x
y 7→ arg coth y

Nota. A única destas funções hiperbólicas que não é injetiva é o cosseno hiperbólico. Por
esse motivo temos que considerar um restrição no domínio para que seja invertível.

2 Cálculo Diferencial
O Cálculo Diferencial é a área da Matemática onde se estudam taxas de variação, nomea-
damente o declive de retas ao gráfico de funções de uma ou mais variáveis. Nesta disciplina
vamos fazer uma breve revisão de alguns dos conceitos conhecidos para funções reais de uma
variável, e generalizá-los para funções de duas ou mais variáveis.

2.0 Limites e Continuidade de funções reais de variável real


A noção de limite de uma função dá-nos informação sobre o que acontece a essa função na
proximidade de um ponto dado.
Intuitivamente, dizemos que o limite da função f , quando x tende para a é o valor L se
f puder tomar valores tão próximos de L quanto queiramos, escolhendo x numa vizinhança
do ponto a, mas diferente de a. Vamos agora definir limite em linguagem matemática.

Definição 2.1. Seja f : D → R e a um ponto de acumulação1 de D.


lim f (x) = L se ∀ > 0 ∃δ > 0, 0 < |x − a| < δ ⇒ |f (x) − L| < .
x→a

Exemplos 2.2.

1. lim 2x + 3 = 5 [regra da substituição]


x→1
(
x3 − 3 se x 6= 0
2. f (x) = lim f (x) = −3 6= 1 = f (0)
1 se x = 0 x→0

1
a é um ponto de acumulação de D se ∀δ > 0, ]a − δ, a + δ[\{a} ∩ D 6= ∅.

5
Cálculo Diferencial

3. Vamos verificar que lim sin πx não existe. Para tal vamos usar um resultado que nos
x→0
diz que se o limite existe, então a imagem de qualquer sucessão que tenda para 0, tem
que tender para esse limite.
Consideremos as sucessões, convergentes para 0, de termo geral un = n1 e vn = 4n+1 2
.
Se os limites das sucessões f (un ) e f (vn ) forem diferentes ou um deles não existir,
então lim sin πx não existe.
x→0
π
lim f (un ) = lim sin 1/n = lim sin nπ = 0
π
lim f (vn ) = lim sin 2/(4n+1) = lim sin( π2 + 2nπ) = 1
Podemos então concluir que o limite não existe.

Limites laterais
Se na definição de limite considerarmos que os valores de x, pelos quais nos aproximamos
de a, são sempre maiores (menores) do que a, chamamos a esse limite limite à direita
(esquerda).

• lim+ f (x) = L se ∀ > 0 ∃δ > 0, 0 < x − a < δ ⇒ |f (x) − L| < . [limite à direita]
x→a

• lim− f (x) = L se ∀ > 0 ∃δ > 0, 0 < a − x < δ ⇒ |f (x) − L| < . [limite à esquerda]
x→a

O limite existe se ambos os limites laterais existirem e forem iguais. Os limites laterais
só estão definidos se a for um ponto de acumulação do domínio à direita ou à esquerda,
respectivamente.

Exemplo 2.3.
(
x+2 se x < 0
f (x) = lim f (x) = 2 6= −5 = lim+ f (x)
−5 se x ≥ 0 x→0− x→0

Limites no infinito
Tal como no caso finito, o limite de uma função quando esta se aproxima de um dado
ponto é infinito se puder tomar valores tão grandes quanto queiramos, escolhendo x numa
vizinhança do ponto a.
Por outro lado dizemos que o limite de uma função no infinito existe, se à medida que
tomarmos valores cada vez maiores nos aproximamos tanto quanto queiramos do valor limite.
Estes dois tipos de limites podem ser escritos rigorosamente em linguagem matemática
do seguinte modo.

• lim f (x) = +∞ se ∀M > 0 ∃δ > 0, 0 < |x − a| < δ ⇒ f (x) > M .


x→a

• lim f (x) = −∞ se ∀M < 0 ∃δ > 0, 0 < |x − a| < δ ⇒ f (x) < M .


x→a

6
Cálculo Diferencial

• lim f (x) = L se ∀ > 0 ∃N > 0, x > N ⇒ |f (x) − L| < .


x→+∞

• lim f (x) = L se ∀ > 0 ∃N < 0, x < N ⇒ |f (x) − L| < .


x→−∞

Além destes casos, podemos facilmente definir quando é que um limite no infinito é
infinito, assim como os casos em que os limites laterais são infinitos.
O limite da soma, diferença, produto, quociente e potência de duas funções, no mesmo
ponto, é a soma, diferença, produto e quociente dos limites, sempre que ambos estiverem
definidos e o seu resultado não for uma indeterminação. As indeterminações serão estudadas
mais à frente.

Continuidade

Definição 2.4. Uma função f : D → R é contínua em a ∈ D se lim f (x) = f (a). Caso con-
x→a
trário, diz-se que a função é descontínua em a. Da mesma forma se pode definir continuidade
lateral.
Uma função é contínua no conjunto D se é contínua em todos os pontos do seu domínio.
2

5
o 1

-2 2 4
-3 -2 -1 1 2 3

-5 -1 o

-2 o
-10

-3

Função contínua no intervalo [−3, 5]. Função descontínua em -2 e 1. No entanto, é contínua à esquerda em -2.

Uma continuidade diz-se removível se lim f (x) existe e é finito. Isto significa que se
x→a
existe uma função g tal que f (x) = g(x), para x 6= a, mas que é contínua em a. Ou seja, a
descontinuidade de f em a foi removida.

Exemplo 2.5.
(
x sin πx se x 6= 0 π
f (x) = lim x sin = 0 (infinitésimo × f.limitada)
1 se x = 0 x→0 x
A descontinuidade de f é removível. Se removermos essa descontinuidade, obtemos a
função g.
(
x sin πx se x 6= 0
g(x) =
0 se x = 0
A função g : R → R é um exemplo de uma função contínua em R, mas que não pode ser
escrita numa única “expressão”.

7
Cálculo Diferencial

Tal como para os limites, a soma, diferença, produto, quociente e potência de duas
funções contínuas é uma função contínua no seu domínio. Também a composição de duas
funções contínuas e a inversa de uma função contínua são funções contínuas, nos respectivos
domínios.
Podemos assim afirmar que todas as funções elementares são funções contínuas. As fun-
ções elementares são as que resultam das funções polinomiais, logarítmicas, trigonométricas
e trigonométricas inversas através de um número finito de somas, diferenças, produtos, quo-
3 √
cientes e potências. Por exemplo as funções de expressão analítica ex , 2xcos+1
x
e ln x + 5 são
funções elementares. De facto, com excepção da função módulo, todas as funções estudadas
até aqui, que se possam escrever numa expressão única, são funções elementares.

2.1 Derivadas
Definição 2.6. Seja f uma função definida no intervalo ]a − , a + [, com  > 0. A derivada
da função f no ponto a ∈ R é
df f (x) − f (a) f (a + h) − f (a)
f 0 (a) = (a) := lim = lim , se este limite existir.
dx x→a x−a h→0 h
A última igualdade resulta simplesmente da mudança de variável x − a = h.
Notas.

1. Se só existir limite à esquerda ou à direita (ou forem diferentes), chamam-se derivada


à direita fd0 (a) e derivada à esquerda fe0 (a), respectivamente, de f no ponto a.

2. Geometricamente, a derivada no ponto x re-


presenta o declive da reta tangente nesse
ponto, como indicado na figura.
3. Em geral, f 0 (a) representa a taxa de variação
instantânea de y em função de x.

df
4. À notação de derivada do tipo chama-se notação de Leibniz, por ter isso introduzida
dx
pelo matemático alemão Gottfried W. Leibniz.

Derivada da função composta


Se f é diferenciável em x e g é diferenciável em g(x), então g · f é diferenciável em x e

(g · f )0 (x) = g 0 (f (x)) f 0 (x) .

8
Cálculo Diferencial

Se escrevermos y = g · f (x) e u = f (x), então a derivada da função composta pode ser


escrita em termos simbólicos da seguinte maneira.
dy dy du
= × [regra da cadeia]
dx du dx
Exemplo 2.7. Muitas das regras de derivadas mais usadas baseiam-se na regra da derivada
da função composta, ou regra da cadeia.
Sejam u = f (x) = 3x e y = g(u) = sin u. Vamos agora ver qual é a derivada da função
g · f.
(g · f )0 (x) = g 0 (f (x)) f 0 (x) = g 0 (u) f 0 (x) = cos u × 3 = cos(3x) × 3.
dy dy du
Usando a notação de Leibniz = × = cos u × 3 = cos(3x) × 3.
dx du dx
Claro que normalmente usamos esta regra diretamente, sem detalhar os passos intermé-
dios, ou seja (g · f )0 (x) = (sin(3x))0 = cos(3x) × 3.

Exercício
Num recipiente cónico com raio igual a 2dm e altura igual a 4dm é colocada água à
taxa constante de 2dm3 /min. A que velocidade está a subir a água, quando está a 3dm de
altura?
Designemos por V o volume de água num dado instante, por h a altura da água e por r
o raio da superfície de água. Como a altura do cone é de 4dm e o raio do cone é de 2dm,
usando uma regra de três simples temos que r = h2 .
Usando a fórmula do volume do cone deduzimos que o volume de água no recipiente
quando a água está à altura h é
 2
1 2 1 h π
V = πhr = πh = h3 .
3 3 2 12
dV
Por outro lado, do enunciado, sabemos que = 2.
dt
Finalmente vamos usar a regra da derivada da composta para calcular o valor de h0 (t).

dV dV dh π  8
= × ⇔2= h2 × h0 (t) ⇔ h0 (t) =
dt dt dt 4 πh2
8
Quando h = 3, a água está a subir à velocidade à velocidade de h0 (t) = dm/min.

Derivada da função inversa
A partir da derivada da função composta, deduz-se uma regra para a derivada da função
inversa.
Seja g a função inversa de f , ou seja f · g(x) = x. Vamos supor que f 0 (g(x)) existe e é
diferente de zero. Usando a regra da função composta.
1
(f · g)0 (x) = x0 ⇔ f 0 (g(x)) g 0 (x) = 1 ⇔ g 0 (x) = 0
f (g(x))

9
Cálculo Diferencial

Teorema 2.8. Se f é diferenciável e invertível em x, com f 0 (x) 6= 0, então a sua função


inversa f −1 é diferenciável em y = f (x) e
0 1 1
f −1 (y) = 0 = 0 −1 .
f (x) f (f (y))
Exemplo 2.9. Vamos aproveitar a regra da derivada da função inversa, para deduzir a
derivar da função arcsin.
Sejam f (x) = sin x = y e f −1 (y) = arcsin y = x, com x ∈] − π2 , π2 [ e y ∈] − 1, 1[. Os
intervalos são abertos para que f 0 (x) = cos x seja diferente de zero. Então
1 1 1 1
(arcsin y)0 = 0
= = =p .
(sin x) cos x cos(arcsin y) 1 − y2
De maneira idêntica podemos deduzir as derivadas das outras funções trigonométricas
inversas.
Seja u uma função real derivável, então:
u0
1. (arcsin u)0 = √ ;
1 − u2
u0
2. (arccos u)0 = − √ ;
1 − u2
0 u0
3. (arctan u) = ;
1 + u2
u0
4. ( arccot u)0 = − .
1 + u2
Regra de l’Hôpital
A regra de l’Hôpital é uma regra muito prática que serve para levantar indeterminações
0 ∞
do tipo ou . No entanto, qualquer outro tipo de indeterminação pode ser transformada
0 ∞
numa indeterminação deste tipo, e portanto a regra pode ser aplicada.
Teorema 2.10. Sejam f e g funções diferenciáveis num intervalo que contém a (a pode ser
igual a ±∞).
f 0 (x)
Se lim f (x) = 0 = lim g(x) ou lim f (x) = ±∞ = lim g(x), e lim 0 existe, então
x→a x→a x→a x→a x→a g (x)

f (x) f 0 (x)
lim = lim 0 .
x→a g(x) x→a g (x)

Demonstração. (caso particular) Vamos provar apenas o caso da indeterminação 00 em que


as funções f 0 e g 0 são contínuas em a ∈ R, o que implica que f e g também sejam contínuas
em a e portanto f (a) = g(a) = 0. Consideramos ainda g 0 (a) 6= 0.
f 0 (x) f 0 (a) limx→a f (x)−f
x−a
(a)
f (x) − f (a) f (x)
lim 0 = 0 = g(x)−g(a)
= lim = lim
x→a g (x) g (a) limx→a x−a x→a g(x) − g(a) x→a g(x)

10
Cálculo Diferencial

Exemplos 2.11.
 
ln x 0 1/x
1. lim = lim =1
x→1 x − 1 0 x→1 1

ex  ∞  ex  ∞  ex
2. lim = lim = lim = +∞
x→+∞ x2 ∞ x→+∞ 2x ∞ x→+∞ 2

cos x − sin x
3. lim+ 6 lim+
= +∞ = =0
x→0 sin x x→0 cos x
Neste caso não podemos aplicar a regra de l’Hôpital porque este limite não é uma
indeterminação.

x + cos x  ∞  1 − sin x
4. lim 6= lim
x→+∞ x ∞ x→+∞ 1
x sin x + cos x cos x
O limite da direita não existe, no entanto lim = lim 1 + = 1.
x→+∞ x2 x→+∞ x

Nota. Uma consequência importante da regra de l’Hôpital é o seguinte resultado:


se uma função f está definida no intervalo ]a−δ, a+δ[ e tem derivada em ]a−δ, a+δ[\{a}
tal que lim f 0 (x) existe, então f 0 (a) também existe e é igual a lim f 0 (x).
x→a x→a

Indeterminações do tipo 00 , ∞0 e 1∞
Estas indeterminações transformam-se numa indeterminação do tipo 0 × ∞ usando as
propriedades dos limites e do logaritmo. A partir daí podemos usar um dos métodos dispo-
níveis para levantar esta indeterminação, como a regra de l’Hôpital por exemplo. De seguida
vamos ver como se faz essa transformação.

lim f (x)g(x) = (f (x) > 0 numa vizinhança de a)


x→a

eln(limx→a f (x) ) = elimx→a ln(f (x)g(x) ) =


g(x)
(ln é contínua)

elimx→a g(x)×ln f (x) (propriedade do logaritmo)

O limite lim g(x) × ln f (x) é uma indeterminação do tipo 0 × ∞ (ou ∞ × 0 conforme o


x→a
caso).

Exemplo 2.12. lim+ xx 00 = eln(limx→0+ x ) = elimx→0+ ln(x ) = elimx→0+ (x×ln x) e0×(−∞)


 x x 
x→0

Cálculo Auxiliar:
ln x (ln x)0 1/x
lim+ x × ln x (0 × ∞) = lim+ = lim+ 0
= lim+ = lim+ −x = 0
x→0 x→0 1/x x→0 (1/x) x→0 −1/x2 x→0

Finalmente concluímos que: lim+ xx = e0 = 1


x→0

11
Cálculo Diferencial

2.2 Funções de Várias variáveis reais


No nosso dia a dia deparamo-nos frequentemente com situações em que precisamos de fazer
cálculos com mais do que uma variável. Na prática estamos a calcular o valor de uma função
com mais do que uma variável num determinado ponto. Comecemos por ver um exemplo
simples de uma função de três variáveis que talvez já tenham usado.
Exemplo 2.13. Quantos custa o combustível gasto, em média, num quilómetro por um
automóvel, sabendo que gastou x litros de combustível para percorrer y quilómetros, e o
preço do combustível é de z euros por litro? Não é difícil descobrir que o custo por quilómetro
é dada pela função
xz
C(x, y, z) = euro/km .
y
Ou seja, o custo médio depende de três variáveis, x, y e z.
De seguida vamos generalizar alguns dos conceitos conhecidos para funções reais de uma
variável a funções reais de várias variáveis. As definições serão feitas, quase sempre, para
funções de duas variáveis, ou seja em R2 = {(x, y) : x ∈ R e y ∈ R}, ainda que na maioria
dos casos seja fácil generalizá-las.
Definição 2.14. Uma função real de duas variáveis reais é uma função
f : D ⊆ R2 → R
,
(x, y) 7→ f (x, y)
onde o domínio é um subconjunto de R2 (o conjunto dos pontos do plano) e o contradomínio
está contido em R.
Definição 2.15. O gráfico de uma função real de duas variáveis reais é uma superfície no
espaço, ou seja em R3 ,

Gráfico de f = {(x, y, z) ∈ R3 : z = f (x, y) e (x, y) ∈ Df } .

O gráfico de uma função de duas variáveis pode ser representado geometricamente, no


entanto neste caso não é possível generalizar o conceito a funções de mais variáveis.
Exemplo 2.16. Consideremos a função de duas variáveis com expressão analítica f (x, y) =
9 − x2 − y 2 . Para calcular o domínio desta função procedemos como habitualmente cal-
p

culando o conjunto de pontos do plano onde a expressão f (x, y) está definida. O domínio é
então
Df = {(x, y) : 9 − x2 − y 2 ≥ 0} = {(x, y) : x2 + y 2 ≤ 9},
ou seja o domíno desta função é o círculo de raio 3 e centro na origem.
Para calcular o contradomínio de f basta observar que

0 ≤ x2 + y 2 ≤ 9 ⇔ 9 − 0 ≥ 9 − (x2 + y 2 ) ≥ 9 − 9 ⇒ 9 ≥ 9 − x2 − y 2 ≥ 0. Temos então
p

que o contradomínio é o conjunto:


p
Df0 = {f (x, y) : (x, y) ∈ Df } = { 9 − x2 − y 2 : x2 + y 2 ≤ 9} = [0, 3] .

12
Cálculo Diferencial

O gráfico de f é o conjunto dos pontos do espaço


que verificam a equação z = 9 − x2 − y 2 o que
p

implica que z 2 = 9 − x2 − y 2 ⇔ x2 + y 2 + z 2 = 9.
Como z = 9 − x2 − y 2 ≥ 0, o gráfico de f é a
p

semi-esfera superior da esfera de centro na origem X


Y

e raio 3.
O gráfico de f é a parte superior da esfera
x2 + y 2 + z 2 = 9.

2.3 Derivadas Parciais


Generalizar o conceito de derivada é um dos assuntos mais sensíveis no estudo de funções
de várias variáveis. Algumas propriedades de função derivável em R só são obtidas em Rn
com a noção de diferenciabilidade (da qual vamos falar apenas muito levemente), no entanto
existe uma noção mais fraca mas mais fácil de utilizar e à qual podemos aplicar muitos dos
conhecimentos adquiridos para funções de uma variável, a derivada parcial.
Antes da definição formal de derivada parcial, vamos ver como é que podemos usar as
regras de derivação para calcular as derivadas parciais de funções elementares. Uma função
de duas variáveis tem duas derivadas parciais, uma em ordem a cada uma das duas variáveis
– usualmente x e y. A derivada parcial tem duas notações diferentes, que aproveitamos para
introduzir.

Exemplos 2.17.

1. f (x, y) = 3x + xy
∂f
A derivada parcial de f em ordem a x é (x, y) = fx (x, y) = 3 + y
∂x
[y funciona como uma constante.]

∂f
A derivada parcial de f em ordem a y é (x, y) = fy (x, y) = x
∂y
[x funciona como uma constante.]

2. f (x, y) = sin(x2 y) + ex − y 2

∂f
(x, y) = fx (x, y) = 2xy cos(x2 y) + ex
∂x
∂f
(x, y) = fy (x, y) = x2 cos(x2 y) − 2y
∂y

13
Cálculo Diferencial

Vamos de seguida apresentar a definição de derivada parcial num ponto (a, b), para
funções de duas variáveis. Para funções de três ou mais variáveis a definição é em tudo
semelhante. Esta definição é feita a partir da definição de derivada para funções de uma
variável, fixando uma variável de cada vez.
Consideremos uma função f de duas variáveis e (a, b) um ponto do seu domínio. Define-se
a função, de uma variável, g(x) = f (x, b), ou seja, fixa-se a segunda variável y = b.
Se g 0 (a) existe, então a esse valor chama-se derivada parcial de f em ordem a x no ponto
(a, b). De igual modo podemos definir derivada parcial de f em ordem a y no ponto (a, b).

Definição 2.18. Sejam f uma função de duas variáveis e (a, b) ∈ Df .

1. A derivada parcial de f em ordem a x no ponto (a, b) é o valor do limite

∂f f (a+h, b) − f (a, b)
(a, b) := lim (= g 0 (a)) .
∂x h→0 h

2. A derivada parcial de f em ordem a y no ponto (a, b) é o valor do limite

∂f f (a, b+h) − f (a, b)


(a, b) := lim .
∂y h→0 h

Naturalmente as derivadas parciais podem não existir em todos os pontos. De seguida


vamos ver um exemplo onde num dos pontos existe uma derivada parcial, mas não a outra.

Exemplo 2.19. (
x3 +y 2
se (x, y) 6= (0, 0)
Consideremos a função de expressão analítica f (x, y) = x2 +y 2
.
0 se (x, y) = 0
Nos pontos que não estão na fronteira entre os dois ramos, neste caso todos excepto
o ponto (0, 0), podemos usar as regras de derivação para calcular as derivadas parciais.
Ou seja, o único ponto “anguloso"é o ponto (0, 0). Vamos então verificar se a função tem
derivadas parciais neste ponto.

∂f f (h, 0) − f (0, 0) h3 /h2 h3


(0, 0) := lim = lim = lim 3 = 1
∂x h→0 h h→0 h h→0 h

∂f f (0, h) − f (0, 0) h2 /h2 1


(0, 0) := lim = lim = lim 3
∂y h→0 h h→0 h h→0 h

Ou seja ∂f
∂x
(0, 0) = 1, mas ∂f
∂y
(0, 0) não existe.

A derivada parcial, sendo definida à custa da derivada de uma função de uma variável,
tem essencialmente o mesmo significado que esta. A derivada parcial representa assim uma
taxa de variação. Voltando ao Exemplo 2.13 do início da secção 2.2, se calcularmos a derivada
de C em ordem a z, estamos a calcular a variação de C (e/km) em relação à variação de z

14
Cálculo Diferencial

e/km
(e/litro), ou seja o resultado será dado em = litros/km . Se derivarmos em ordem
e/litro
a y, por exemplo, o resultado será em e/km2 .

Interpretação Geométrica
Para as funções de duas variáveis as derivadas parciais representam o declive de uma
reta tangente. Neste caso a reta tangente ao gráfico de uma função num ponto não é única,
existem uma infinidade delas. As derivadas parciais representam os declives de duas dessas
retas, as retas paralelas ao plano XOZ e ao plano Y OZ, respectivamente.
Sejam z = f (x, y) o gráfico de uma função f : R2 → R com f (a, b) = c, T1 a reta
tangente ao gráfico em P = (a, b, c) e paralela ao plano XOZ; e T2 a reta tangente ao
gráfico em P e paralela ao plano Y OZ. Temos que:
∂f ∂f
declive de T1 = (a, b) e declive de T2 = (a, b) .
∂x ∂y

Por exemplo, a equação z = 8 − x2 − y 2 define o gráfico da função f (x, y) = 8 − x2 − y 2 .


Como f (1, 1) = 6, a reta tangente ao gráfico em P = (1, 1, 6) que é paralela ao plano XOZ
∂f
é a reta T1 que tem declive igual a (1, 1) = 6.
∂x

A sua equação vetorial é (x, y, z) = (1, 1, 6) + t(1, 0, −2), t ∈ R.

Reta tangente ao gráfico na direção do eixo dos XX.

15
Cálculo Diferencial

Derivadas Parciais de Segunda Ordem


Tal como nas funções de uma variável, é possível derivar a mesma função várias vezes.
Neste caso é preciso ter em atenção que tal como podemos derivar a primeira vez em relação
em cada uma das variáveis, o mesmo acontece quando derivamos pela segunda vez. Por
exemplo, para uma função de três variáveis existem três derivadas parciais (de primeira
ordem) e 3 × 3 = 9 derivadas parciais de segunda ordem, 33 de terceira ordem e assim
sucessivamente. Por facilidade vamos definir as derivadas de segunda ordem de uma função
de duas variáveis, sendo que é imediato perceber como se procede para funções de mais
variáveis.

Definição 2.20. Seja f : D ⊆ R2 → R, então as (quatro) derivadas parciais de segunda


ordem de f são:

∂ 2f
 
∂ ∂f
• = = fxx ;
∂x ∂x ∂x2

∂ 2f
 
∂ ∂f
• = = fyx ; [deriva-se primeiro em ordem a y e depois em ordem a x]
∂x ∂y ∂x∂y

∂ 2f
 
∂ ∂f
• = = fxy ; [deriva-se primeiro em ordem a x e depois em ordem a y]
∂y ∂x ∂y∂x

∂ 2f
 
∂ ∂f
• = 2 = fyy .
∂y ∂y ∂ y
Por iteração deste processo definem-se as derivadas parciais de ordens superiores.
O próximo teorema diz-nos que, em geral, não é preciso calcular fyx se já conhecermos
o valor de fxy .

Teorema 2.21 (de Clairaut). Todas as funções elementares satisfazem a igualdade fyx (a, b) =
fxy (a, b).

De modo prático esta igualdade aplica-se sempre que pudermos usar as regras de deri-
vação, ou seja sempre que a função não estiver definida por ramos, que é o caso de quase
todas as funções que iremos usar nesta disciplina.
O Teorema de Clairaut também se aplica a derivadas de ordem superior, por exemplo
para todas as funções elementares temos que fxxy = fxyx = fyxx .

Exemplo 2.22. Seja f (x, y) = x2 y − 3y. As derivadas parciais de primeira ordem são
∂f ∂f
= 2xy e = x2 − 3. As derivadas de segunda ordem são:
∂x ∂y

∂ 2f
 
∂ ∂f ∂
• 2
= = (2xy) = 2y;
∂x ∂x ∂x ∂x

16
Cálculo Diferencial

∂ 2f
 
∂ ∂f ∂
• x2 − 3 = 2x;

= =
∂x∂y ∂x ∂y ∂x

∂ 2f ∂
• = (2xy) = 2x;
∂y∂x ∂y

∂ 2f ∂
• x2 − 3 = 0 .

2
=
∂ y ∂y

Vetor Gradiente
O vetor gradiente é um vetor que condensa a informação sobre as derivadas parciais num
vetor, assim o vetor gradiente de uma função de n variáveis f : D ⊆ Rn → R é
 
∂f ∂f ∂f
∇f (x1 , x2 , . . . , xn ) = , ,..., ;
∂x1 ∂x2 ∂xn

onde as derivadas parciais são calculadas no ponto (x1 , x2 , . . . , xn ). O cálculo das derivadas
parciais pode ser feito por definição ou usando as regras de derivação quando tal for possível.
O vetor gradiente num ponto só está definido quando existem todas as derivadas parciais
nesse ponto.

Exemplo 2.23. Para f (x, y, z) = x2 y + 2yz, o vetor gradiente em (x, y, z) é


 
∂f ∂f ∂f
= 2xy, x2 + 2z, 2y .

∇f (x, y, z) = , ,
∂x ∂y ∂z

Se considerarmos um ponto concreto do domínio, o vetor gradiente é um vetor concreto


(neste caso no espaço). Por exemplo,

∇f (1, 2, 0) = (4, 1, 4) .

2.4 Derivada Direcional


Como já foi referido anteriormente, as derivadas parciais representam apenas o declive de
duas das retas tangentes ao gráfico de uma função de duas variáveis (ou mais geralmente
a taxa de variação da função em n direções distintas para funções de n variáveis). Mas
não há nenhum motivo para considerarmos apenas duas retas tangentes e não todas as
outras. Acontece que, para funções “bem comportadas”, conhecer as derivadas parciais é
suficiente para calcular o declive de todas as retas tangentes ao gráfico de uma função de
duas variáveis. Ao declive dessas retas chama-se derivada direcional. Ao contrário do que
fizemos para as derivadas parciais, vamos começar por ver a definição formal de derivada
direcional.

17
Cálculo Diferencial

Definição 2.24. A derivada direcional de f : D ⊆ R2 → R no ponto (a, b) na direção, e


sentido, do vetor unitário û = (u1 , u2 ), isto é, ||û|| = 1, é

f (a+h u1 , b+h u2 ) − f (a, b)


Dû f (a, b) := lim .
h→0 h
Notas.

1. Dû f (a, b) mede a variação de f na direção, e sentido, de û. Se o vetor não for unitário,
considerarmos o vetor unitário com a mesma direção e sentido. Ou seja, para ~u 6= ~0,
~u
considera-se o vetor û = .
||~u||

2. As derivadas parciais são casos particulares das derivadas direcionais. Considerando


os versores ı̂ = (1, 0) e ̂ = (0, 1),

Dı̂ f (a, b) = fx (a, b) e D̂ f (a, b) = fy (a, b) .

3. Se definirmos g(h) = f (a + h u1 , b + h u2 ), então Dû f (a, b) = g 0 (0), o que mostra que


a derivada direcional representa uma taxa de variação. Neste caso a taxa de variação
na direção e sentido do versor û.

4. O sentido é importante, uma vez que se consideramos dois vetores simétricos, as


respetivas derivadas direcionais também são simétricas, D−û f (a, b) = −Dû f (a, b).

5. De modo semelhante se definem as derivadas direcionais de funções com mais variáveis.

A noção de função diferenciável é uma noção complexa e que não temos tempo para
abordar com detalhe neste curso. Intuitivamente dizemos que uma função de duas variáveis
é diferenciável num ponto se o gráfico da função tem um único plano tangente (não vertical)
ao gráfico nesse ponto. As funções diferenciáveis (de duas ou mais variáveis) num ponto
têm todas as derivadas parciais nesse ponto, mas o contrário pode não se verificar.
É de notar que para funções de uma variável o conceito de diferenciabilidade coincide
com o de derivabilidade. Intuitivamente podemos igualmente dizer que uma função de uma
variável é diferenciável num ponto, se o gráfico da função tem uma única reta tangente (não
vertical) ao gráfico nesse ponto.
As funções que vamos usar são usualmente diferenciáveis, uma que todas as funções
elementares são diferenciáveis no interior do seu domínio. Sempre que tivermos uma função
elementar, vamos usar o teorema que se segue para calcular a derivada direcional. Este re-
sultado, na prática, generaliza o uso das regras de derivação a todas as derivadas direcionais.
O teorema e a proposição seguintes são válidos para funções de n variáveis.

18
Cálculo Diferencial

Teorema 2.25. Se f é diferenciável em (a, b) ∈ Df , então

Dû f (a, b) = ∇f (a, b) · û = fx (a, b)u1 + fy (a, b)u2 .

Sempre que estamos nas condições deste teorema é fácil descobrir qual é a direção em
que derivada a direcional toma o maior (ou o menor) valor possível.

Proposição 2.26. Se f é diferenciável em (a, b) ∈ Df , então:

1. A derivada direcional de f em (a, b) é máxima na direção e sentido do vetor gradiente,


∇f (a, b)
ou seja para û = .
||∇f (a, b)||
2. A derivada direcional de f em (a, b) é mínima na direção do vetor gradiente, mas no
∇f (a, b)
sentido oposto, ou seja para û = − .
||∇f (a, b)||
3. A derivada direcional de f em (a, b) é nula na direção perpendicular ao vetor gradi-
ente.

Demonstração. Como f é diferenciável,


Dû f (a, b) = ∇f (a, b) · û = ||∇f (a, b)|| ||û|| cos θ = ||∇f (a, b)|| cos θ, onde θ é o ângulo
formado pelos vetores ∇f (a, b) e û.
A função f e o ponto (a, b) são fixos, portanto este valor depende apenas do cosseno do
ângulo formado pelos dois vetores. Portanto, o valor é máximo quando cos θ = 1 ⇔ θ = 0,
ou seja quando os vetores ∇f (a, b) e û têm a mesma direção e sentido. Neste caso o valor
da derivada direcional é igual a ||∇f (a, b)||. De igual modo, o valor da derivada direcional
é mínimo quando cos θ = −1 ⇔ θ = π, ou seja quando os vetores ∇f (a, b) e û têm a
mesma direção mas sentidos opostos; e neste caso o valor da derivada direcional é igual a
−||∇f (a, b)||.
A derivada direcional é nula quando cos θ = 0 ⇔ θ = π2 , ou seja quando os vetores
∇f (a, b) e û são perpendiculares.

Exercício
Suponhamos que h(x, y) = 2 − xy + x2 + y representa a altitude, medida em km, numa
dada região. Uma pessoa na origem do referencial caminha na direção SO. Está a subir ou
a descer? Em que direção é que o declive é maior?
A função h indica a altitude de um determinado ponto, quando são conhecidas as suas
coordenadas. (As coordenadas usualmente são a latitude e a longitude.) Consideremos o
eixo dos XX no sentido Oeste − Este e o eixo dos Y Y no sentido Sul − N orte.
√ √
Portanto a direção SO corresponde ao versor û = − 22 , − 22 . Queremos descobrir se
o valor Dû h(0, 0) é positivo ou negativo.

19
Cálculo Diferencial

O gradiente de h é ∇h(x, y) = (−y + 2x, −x + 1) e


√ √ ! √
2 2 2
Dû h(0, 0) = ∇h(0, 0) · û = (0, 1) · − ,− =− < 0.
2 2 2

O declive é máximo na direção do vetor ∇h(0, 0) = (0, 1), ou seja na direção Sul −N orte
e o seu valor é igual a ||(0, 1)|| = 1. Se todas os valores forem na mesma unidade de medida
(km), então este declive corresponderia a uma inclinação de 45o .

2.5 Aproximação Linear


Nem sempre é possível conhecer a maneira como uma função se comporta em todo o seu do-
mínio, por isso por vezes é necessário recorrer a resultados aproximados. Uma das maneiras
mais simples de obter a aproximação a uma função é usando uma aproximação linear. Para
funções reais de uma variável, a aproximação linear de uma função f é a função de expressão
mx + b tal que y = mx + b é a reta tangente ao gráfico da função f num determinado ponto.
Portanto para calcularmos uma aproximação linear basta conhecer o valor da função e da(s)
sua(s) derivada(s) num ponto.
Sejam f : D ⊆ R → R uma função real de variável real e a um ponto interior do domínio.
A aproximação linear de f em torno de a ∈ D é a função:

L(x) = f (a) + f 0 (a) (x − a) .

Quando |x − a| é um valor muito pequeno, e f tem derivada contínua num intervalo que
contém a e x, então L(x) é uma boa aproximação de f (x), ou seja

f (x) ≈ L(x) = f (a) + f 0 (a) (x − a) .

Notas.

1. A aproximação linear serve para estimar o valor de uma função, quando apenas sabe-
mos como se comporta num ponto.

2. Cada função tem várias aproximações lineares, dependendo do ponto a escolhido.

3. O gráfico da aproximação linear y = L(x) é a


reta tangente ao gráfico da função y = f (x)
no ponto (a, f (a)).
4. A aproximação linear consiste em substituir
uma função, pela função afim que tem por
gráfico uma reta tangente ao gráfico da fun-
ção.

20
Cálculo Diferencial

Exercício

Calcule o valor aproximado de 4.01?

Considera-se a função real de expressão analítica f (x) = x. Uma vez conhecida a
1
função deduzimos que f 0 (x) = √ .
2 x
Neste caso vamos usar a aproximação linear da função f em torno do ponto a = 4

para calcular um valor aproximado para f (4.01) = 4.01, ou seja vamos usar x = 4.01 e
∆x := x − a = 0.01:

1
L(x) = f (4) + f 0 (4) (x − a) = 2 + (x − 4) .
4
1
Finalmente, concluímos que f (4.01) ≈ L(4.01) = f (4) + f 0 (4) × 0.01 = 2 + × 0.01 =
√ 4
2.0025 . Note-se que o valor real de 4.01 é 2.0024984 . . ., o que significa que obtive-
mos uma aproximação com um erro inferior 2 × 10−6 quando o valor do erro inicial era
∆x = 0.01 = 10−2 mostrando que neste caso a aproximação linear é uma boa ferramenta.

A aproximação linear pode também ser útil quando sabemos como a função se comporta
num ponto, ou num intervalo pequeno, e queremos deduzir qual o seu comportamento em
zonas próximas.

De seguida vamos generalizar este processo para funções de duas variáveis. Tudo o vai
ser feito para funções de duas variáveis pode facilmente ser adaptado para funções de mais
variáveis. Em toda a construção que faremos a seguir vamos considerar que as funções são
funções elementares, e que os pontos considerados são pontos interiores do seu domínio.
Aproximação Linear - funções de duas variáveis
Sejam f : D ⊆ R2 → R uma função real de duas variáveis e (a, b) um ponto interior do
domínio D.
A aproximação linear de f em torno de (a, b) ∈ R2 é a função linear

L(x, y) = f (a, b) + fx (a, b) (x − a) + fy (a, b) (y − b) .

Tal como no caso de uma variável, quando os valores |x − a| e |y − b| são muito pequenos,
e f é diferenciável numa vizinhança de (a, b) que contém (x, y), então L(x, y) é uma boa
aproximação de f (x, y), ou seja

f (x, y) ≈ L(x, y) = f (a, b) + fx (a, b) (x − a) + fy (a, b) (y − b) .

O gráfico da aproximação linear z = L(x, y) é o plano tangente ao gráfico da função


z = f (x, y) no ponto P = (a, b, f (a, b)). Ou seja, a aproximação linear consiste em substituir
uma função, pela função linear que tem por gráfico um plano tangente ao gráfico da função.

21
Cálculo Diferencial

Deste modo concluímos ainda que a equação do plano tangente ao gráfico da função
z = f (x, y) no ponto P = (a, b, f (a, b)) é o plano de equação

z = L(x, y) ⇔ z − f (a, b) = fx (a, b) (x − a) + fy (a, b) (y − b) .

Diferencial
A noção de diferencial está intimamente ligada com a noção de aproximação linear e
as duas podem ser facilmente confundidas. Em alguns dos exercícios será indiferente usar
qualquer uma das notações, podendo no entanto existir vantagens de cálculo que tornem
preferível usar uma delas. Optámos por introduzir a noção formal de diferencial, uma vez
que será útil nos capítulos seguintes.

Definição 2.27.

1. Para uma função de uma variável y = f (x), o diferencial de y é

dy
dy = f 0 (x) dx = dx .
dx

2. Para uma função de duas variáveis z = f (x, y), o diferencial de z ou diferencial total é

∂z ∂z
dz = fx (a, b) dx + fy (a, b) dy = dx + dy .
∂x ∂y

A noção de diferencial é uma noção simbólica e na definição de diferencial total, dx e dy


representam variáveis independentes.
Lendo dx e dy como variáveis independentes, podemos fazer as substituições
dx = ∆x = x − a, dy = ∆y = y − b e definindo ∆z = f (x, y) − f (a, b), temos que

∆z ≈ dz , para valores pequenos de dx e dy.

Na notação dos diferenciais, a aproximação linear pode assim ser escrita

f (x, y) ≈ f (a, b) + dz .

De igual modo para funções de uma variável podemos escrever f (x) ≈ f (a) + dy .

Exercício
A função T (x, y) mede a temperatura em graus Celsius no ponto (x, y) de uma superfície
plana. Um rato é largado na superfície e encontra-se na posição P = (2, 1), medida em cm.
Sabendo que Tx (2, 1) = 3, Ty (2, 1) = 5 e a posição do rato foi determinada com um erro
inferior a 1mm, indique um valor aproximado para o erro cometido na temperatura a que
está o local onde se encontra o rato.

22
Cálculo Diferencial

O valor que queremos calcular é o valor absoluto de ∆T = T (2 + dx, 1 + dy) − T (2, 1),
com |dx| ≤ 0.1 e |dy| ≤ 0.1.
Vamos usar a abordagem dos diferenciais, ou seja:

|∆T | ≈ |dT | = |Tx (2, 1) dx + Ty (2, 1) dy| ≤ |Tx (2, 1) dx| + |Ty (2, 1) dy|

= |Tx (2, 1)| |dx| + |Ty (2, 1)| |dy| ≤ 3 × 0.1 + 5 × 0.1 = 0.8 .
O erro cometido é inferior a 0.8 graus Celsius.

De modo semelhante às aproximações lineares se definem as aproximações quadráticas,


que consistem em aproximar funções através de funções de segundo grau.
f 00 (a)
• Q(x) = L(x) + (x − a)2 [Função de um variável.]
2
fxx (a, b) fyy (a, b)
• Q(x, y) = L(x, y) + (x − a)2 + fxy (a, b) (x − a)(y − b) + (y − a)2
2 2
[Função de duas variáveis.]

2.6 Derivada da Função Composta (regra da cadeia)


Tal como nos caso das funções de uma variável, é possível determinar a derivada (parcial) de
uma função composta a partir das derivadas de cada uma das funções. Antes de enunciarmos
o teorema para um caso mais geral, começamos por o caso mais elementar considerando uma
função composta: R → R2 → R.

Teorema 2.28 (caso 1). Sejam z = f (x, y) uma função com derivadas parciais e x(t), y(t)
funções deriváveis, então
dz ∂f dx ∂f dy
= × + × .
dt ∂x dt ∂y dt

De notar que as variáveis x e y funcionam simultane- z


amente com variáveis independentes em relação a z e
variáveis dependentes em a relação a t. Esta relações x y
de dependência podem ser traduzidas mum diagrama a
que costuma chamar diagrama de árvore.
t t

Exemplos 2.29.

1. Consideremos z = sin(2x + y), com x(t) = t2 e y(t) = et . A derivada de z em ordem


a t é:
dz ∂z dx ∂z dy
(t) = (x, y) × (t) + (x, y) × (t) =
dt ∂x dt ∂y dt

23
Cálculo Diferencial

= 2 cos(2x + y) × 2t + cos(2x + y) × et .

Para valores concretos de t podemos calcular a derivada desta função. Por exemplo
quando t = 1, os valores de x e y são x = 12 = 1 e y = e1 = e, e assim temos que:
dz
(1) = 4 cos(e + 2) + e cos(e + 2) = (4 + e) cos(e + 2) .
dt
2. A regra da derivada da composta para funções de duas variáveis serve também para
deduzir regras de derivação que utilizamos habitualmente. Fazendo z = uv com u(x) e
v(x) funções de uma variável podemos deduzir uma regra de derivação para potências
com variável tanto na base com no expoente.
dz ∂z du ∂z dv
(uv )0 = = × + × = uv−1 u0 + uv (ln u) v 0
dx ∂u dx ∂v dx

Exercício
Num determinado gás existe a relação P V = 8.31T . Determine a taxa de variação
da pressão(P), quando a temperatura(T) é 300k e está a aumentar à taxa de 0.1k/s; e o
volume(V) é de 100l e aumenta 0.2l/s.
Vamos resolver este exercício usando a derivada da composta. Vamos primeiro analisar
os dados do problema. Consideramos t0 o instante em que o problema é colocado. Nesse
dT dV
instante é-nos dito que T0 = 300, V0 = 100, (t0 ) = 0.1 e (t0 ) = 0.2.
dt dt
T ∂P 8.31
Por outro lado P V = 8.31T ⇔ P = 8.31 e consequentemente = e
V ∂T V
∂P 8.31T
=− .
∂V V2
Finalmente estamos em condições de determinar a taxa de variação.
dP ∂P dV ∂P dT
= × + ×
dt ∂V dt ∂T dt

dP 8.31 8.31 × 300


(t0 ) = × 0.1 − × 0.2 = −0.04155 KP a/s
dt 100 1002
O Teorema 2.28 é o caso mais elementar possível com z = f (x, y) uma função de duas
ou mais variáveis. De seguida vamos expor uma situação um pouco mais geral de onde
facilmente se deduzem os restantes casos.

Teorema 2.30 (caso 2). Sejam w = f (x, y, z), x(s, t), y(s, t) e z(s, t) funções com derivadas
parciais, então
∂w ∂w ∂x ∂w ∂y ∂w ∂z
= × + × + × ;
∂s ∂x ∂s ∂y ∂s ∂z ∂s
∂w ∂w ∂x ∂w ∂y ∂w ∂z
= × + × + × .
∂t ∂x ∂t ∂y ∂t ∂z ∂t

24
Cálculo Diferencial

Diagrama de árvore

x y z

s t s t s t

Exemplo 2.31. Consideremos u = 3x2 y − xz, como x = s2 + t2 , y = 2s e z = t + 2.


As derivadas parciais de w em ordem a s e a t são, respeticamente:

∂u ∂u ∂x ∂u dy
= × + × = (6xy − z) × 2s + 3x2 × 2 ;
∂s ∂x ∂s ∂y ds

∂u ∂u ∂x ∂u dz
= × + × = (6xy − z) × 2t − x × 1 ;
∂t ∂x ∂t ∂z dt

Quando (s, t) = (1, 2), temos que (x, y, z) = (5, 2, 4) e portanto:

∂u
(1, 2) = 56 × 2 + 75 × 2 = 262 ;
∂s

∂u
(1, 2) = 56 × 4 − 5 × 1 = 219 .
∂t
Neste exemplo o diagrama de árvore toma um aspeto um pouco diferente, uma vez que
a variável x depende das duas variáveis s e t, enquanto y e z são funções de apenas uma
variável. Esta diferença justifica também a diferença de notação, visto que as derivadas de
y e de z são derivadas totais e não derivadas parciais.

x y z

s t s t

Uma iteração deste processo permite usar a regra da cadeia para as derivadas da com-
posta de três ou mais funções.

25
Cálculo Diferencial

2.7 Extremos de Funções de 2 Variáveis


As funções que temos estado a estudar têm R como conjunto de chegada, e por isso é
possível definir os extremos absolutos, e locais, de modo idêntico ao que é feito para funções
de uma variável. Estas definições são válidas para funções de duas ou mais variáveis. Por
simplicidade elas são enunciadas para funções de duas variáveis.

Definições 2.32. Sejam f : D ⊆ R2 → R e (a, b) ∈ D.

1. f (a, b) é um máximo (mínimo) absoluto de f se

(∀(x, y) ∈ D) f (a, b) ≥ f (x, y) (f (a, b) ≤ f (x, y)).

2. A função f tem um máximo (mínimo) local em (a, b) se

(∃ > 0) ||(x, y) − (a, b)|| <  ⇒ f (a, b) ≥ f (x, y) (f (a, b) ≤ f (x, y)).

Ao ponto (a, b) chama-se ponto maximizante (minimizante) local, ou absoluto, conforme


o caso.

Para funções deriváveis de uma variável temos como condição necessária, para um ponto
ser extremante local, a derivada ser nula nesse ponto. Esse resultado é facilmente generali-
zável para funções com mais variáveis.

Proposição 2.33. Sejam f : D ⊆ R2 → R e (a, b) ∈ D. Se f tem um extremo local em


(a, b), e as derivadas parciais existem nesse ponto, então fx (a, b) = 0 = fy (a, b).

Geometricamente isto significa que o plano tangente ao gráfico da função é horizontal.


(Ver descrição do plano tangente na secção Aproximação Linear).
Aos pontos (a, b) tais que fx (a, b) = 0 = fy (a, b) chamam-se pontos críticos de f .

Depois de calcularmos os pontos críticos, temos que identificar quais deles são pontos
extremantes. Para funções de duas variáveis não é possível fazer um quadro de sinal. No
entanto existe um resultado, semelhante ao que a seguir se enuncia para funções reais de
variável real, que pode ser usado determinar se um ponto crítico é ou não extremante.

Teorema 2.34. Sejam f : D ⊆ R → R e a ∈ D tais que f tem derivadas de segunda ordem,


e f 0 (a) = 0.

1. Se f 00 (a) > 0, então f (a) é um mínimo local.

2. Se f 00 (a) < 0, então f (a) é um máximo local.

26
Cálculo Diferencial

Teorema 2.35. Sejam f : D ⊆ R2 → R e (a, b) ∈ D tais que f tem derivadas parciais de


segunda ordem e (a, b) é um ponto crítico de f .
Define-se D(a, b) = fxx (a, b) fyy (a, b) − (fxy (a, b))2 .

1. Se D(a, b) > 0 e fxx (a, b) > 0, então f (a, b) é um mínimo local.

2. Se D(a, b) > 0 e fxx (a, b) < 0, então f (a, b) é um máximo local.

3. Se D(a, b) < 0, então f (a, b) não é um extremo local.


[(a, b) é um ponto sela].

Se D(a, b) = 0, então seria necessário estudar as derivadas (parciais) de ordem superior


para saber se um ponto é extremante local. Por vezes é possível analisar esses casos usando
diretamente a definição, como veremos mais à frente no Exemplo 2.38.

Exemplo 2.36. Consideremos a função f (x, y) = x4 + y 4 − 4xy.

1. Determinar os pontos críticos de f .


( ( ( (
fx = 0 4x3 − 4y = 0 y = x3 −−
⇔ 3
⇔ 3
⇔ 9

fy = 0 4y − 4x = 0 x=y x =x

⇔ (x, y) = (0, 0) ∨ (x, y) = (−1, −1) ∨ (x, y) = (1, 1)

2. Verificar se os pontos críticos são extremos locais.


D(x, y) = fxx (x, y) fyy (x, y) − (fxy (x, y))2 = (12x2 )(12y 2 ) − (−4)2 = 144x2 y 2 − 16 =
16(9x2 y 2 − 1).
Como D(0, 0) = −16 < 0, concluímos que (0, 0) é um ponto sela.
Como D(1, 1) = D(−1, −1) = 16 × 8 > 0 e fxx (1, 1) = fxx (−1, −1) = 12 > 0,
concluímos que f tem dois mínimos locais f (1, 1) = −2 e f (−1, −1) = −2.

Este exemplo mostra que é possível uma função de duas variáveis ter dois mínimos locais,
e nenhum máximo local.
Neste caso é possível provar que −2 é também o mínimo absoluto. Para tal reescreve-se
2 2
a função f (x) = (x2 − 1) + (y 2 − 1) + 2 (x − y)2 − 2 ≥ −2, provando assim que −2 é um
minorante da função.

27
Cálculo Diferencial

Exemplo 2.37. Ponto Sela


Z

A função f (x, y) = x − y não tem nenhum


2 2

extremo local, mas tem um ponto sela (0, 0).


(Verificar!)
O gráfico desta função deu origem à utiliza-
ção do nome ponto sela para um ponto crítico X Y

não extremante.

Exemplo 2.38. Consideremos a função f (x, y) = x2 − 2xy 2 + y 4 − y 5 . O único ponto crítico


desta função é P = (0, 0) com D(0, 0) = 0. Portanto não podemos usar o Teorema 2.35
para verificar se P é extremante. Para isso vamos usar a definição. Sejam P1 = (a2 , a) e
P2 = (a2 , −a), com a > 0, dois pontos infinitamente próximos de P , é fácil verificar que
f (P1 ) = −a5 < 0 = f (0, 0) < a5 = f (P2 ). Ou seja P é um ponto sela. (A escolha dos pontos
P1 e P2 não foi aleatória, ela surge naturalmente dos cálculos efetuados para determinar os
pontos críticos. Devem verificar.)

28
Cálculo Integral

3 Cálculo Integral
O Cálculo Integral, de modo genérico, é área da Matemática onde se estudam as Anti-
Derivadas ou Primitivas e a utilização que se faz delas. Os integrais podem estar definidos
para uma ou mais variáveis, ainda que nesta disciplina apenas abordaremos o caso de uma
variável.

3.1 Primitivas, Anti-Derivadas ou Integral Indefinido


Na primeira secção deste capítulo começamos por ver a definição de primitiva, ou anti-
derivada. O nome anti-derivada indica-nos claramente o que estamos a calcular, embora a
primitiva seja de utilização mais comum. De seguida estudaremos algumas das principais
técnicas de primitivação

Definição 3.1. Uma função F é uma primitiva de f se F 0 = f .

A primitiva de uma função não é única. A mesma função pode ter várias primitivas.
Vamos ver alguns exemplos desse facto.

Exemplos 3.2.

1. F1 (x) = x e F2 (x) = x+3 são duas primitivas da função f (x) = 1. (F10 (x) = F20 (x) = 1)

2. G1 (x) = sin2 x e G2 (x) = − cos2 x são duas primitivas da função g(x) = 2 sin x cos x.
(G01 (x) = G02 (x) = 2 sin x cos x)
As funções G1 e G2 estão relacionadas da seguinte forma G1 (x) = G2 (x) + 1, ou seja
sin2 x = − cos2 x + 1. Este é um resultado geral, como veremos a seguir.

Teorema 3.3.

1. Se F é uma primitiva de f , então F + C, com C ∈ R, é uma primitiva de f .

2. Se F1 e F2 são duas primitivas da mesma função, num determinado intervalo, então


existe C ∈ R tal que F1 = F2 + C.

Z
Notação: O conjunto de todas as primitivas de uma função representa-se por f (x) dx:
Z
f (x) dx = F (x) + C, onde F 0 = f e C ∈ R.

29
Cálculo Integral

• F é uma primitiva de f .
Z
• f (x) dx é a família de (todas as) primitivas de f , ou integral indefinido.

Os integrais herdam algumas propriedades das derivadas. Os resultados do próximo


teorema são imediatos a partir dos resultados análogos para as derivadas.

Teorema 3.4. Sejam α ∈ R, f e g funções primitiváveis.


Z Z
1. α f (x) dx = α f (x) dx
Z Z Z
2. f (x) + g(x) dx = f (x) dx + g(x) dx

Ao contrário das derivadas, não existe uma fórmula para calcular primitivas. A primi-
tivação é simplesmente definida como o “inverso” da derivação. Assim, se invertermos uma
tabela de derivadas obtemos uma tabela de primitivas. As primitivas que se obtêm através
da inversão das derivadas conhecidas designam-se por primitivas imediatas.
A seguir vamos ver exemplos de primitivas imediatas, fórmulas mais gerais que aparecem
na tabela de primitivas e de aplicação do Teorema 3.4.

Exemplos 3.5.
Z
1. 2x dx = x2 + C, C ∈ R

xn+1
Z
2. n
x dx = + C, n 6= −1
n+1
Z
3. f 0 (x) cos (f (x)) dx = sin (f (x)) + C

x4 x3
Z Z Z Z
4. 3 2
x − 2x + 7 dx = 3
x dx − 2 2
x dx + 7 dx = − 2 + 7x + C
4 3
−1
Z Z Z
10 1 1 1
5. dx = + dx = − dx = ln x − ln(10 − x) + C
x(10 − x) x 10 − x x 10 − x
x
= ln + C, x ∈]0, 10[
10 − x
Esta primitiva foi resolvida apenas no intervalo ]0, 10[. De modo idêntico podemos
calcular a primitiva no intervalo ] − ∞, 0[ ou no intervalo ]10, +∞[.

30
Cálculo Integral

Primitivação por Partes


A regra da primitivação por partes é deduzida a partir da regra da derivada do produto.
Esta regra é o mais parecido que temos de uma regra de primitivação do produto. Na
bibliografia, por vezes, ela surge descrita usando a notação dos diferenciais.

Sejam g e h duas funções deriváveis num determinado intervalo. A regra da derivada do


produto diz-nos que
(h g)0 = h0 g + h g 0 .
Primitivando ambos os membros da igualdade, e isolando uma das parcelas do segundo
membro, obtemos a igualdade pretendida.
Z Z Z
0
(h g) (x) dx = h (x) g(x) dx + h(x) g 0 (x) dx ⇔
0

Z Z Z
0 0
h (x) g(x) dx = (h g) (x) dx − h(x) g 0 (x) dx .

Como a primitiva da derivada é, a menos de constante, a própria função.


Z Z
h (x) g(x) dx = h(x) g(x) − h(x) g 0 (x) dx
0

Finalmente, fazendo h0 = f e h = F , obtemos a fórmula da primitivação por partes.


Z Z
f (x) g(x) dx = F (x) g(x) − F (x) g 0 (x) dx,

onde F é uma primitiva de f .


Nos próximos exemplos identificaremos em cada caso qual a função por onde devemos
começar a primitivar (f ) e qual a função que começamos por derivar (g).

Exemplos 3.6.
Z Z
1. x
x |{z}
|{z} e − ex × |{z}
x
e dx = x |{z} 1 dx = x ex − ex + C
g f F g0
Z Z Z
1
2. ln x dx = ln x × |{z}
1 = (ln x) × x − x = x ln x − x + C
|{z} x
g f

x2 x2 1 x2 x2 + 1 − 1
Z Z
1
3. |{z}
x arctan x dx = arctan x − 2
dx = arctan x − dx
| {z } 2 2 x +1 2 2 x2 + 1
f g

x2 x2
Z
1 1 1
= arctan x − 1− 2 dx = arctan x − (x − arctan x) + C
2 2 x +1 2 2
1
arctan x(x2 + 1) − x + C

=
2

31
Cálculo Integral

Primitivas por Substituição


Tal como a regra da primitivação por partes, a regra das primitivas por substituição é
deduzida a partir de uma regra conhecida para as derivadas. Neste caso a regra da derivada
da composta ou regra da cadeia (para funções de uma variável). Ela também pode ser vista
como uma mudança de variável. Comecemos por um exemplo que já conhecemos, e que
nos indica que uma grande quantidade de regras de primitivação imediata faz uso de uma
mudança de variável. Z
É fácil verificar que cos(t2 ) 2t dt = sin(t2 ) + C. Por outro lado se fizermos x = t2 , e
usando que dx = dx
dt
dt = 2t dt, chegamos à igualdade
Z Z
2
cos(t ) 2t dt =
|{z} cos(x) dx = sin x + C = sin(t2 ) + C .
dx

Claro que vamos continuar a calcular esta primitiva diretamente, sem escrever a substi-
tuição explicitamente. Este exemplo serve apenas para ilustrar como funciona a substituição
para o cálculo de primitivas.
Sejam g e h duas funções deriváveis. A regra da derivada da composta diz-nos que

(h ◦ g)0 (t) = h0 (g(t)) g 0 (t) .

Mais uma vez, primitivando ambos os membros da igualdade obtemos a fórmula pretendida.
Z
h0 (g(t)) g 0 (t) dt = h(g(t)) + C

Fazendo h0 = f e h = F , temos que


Z
f (g(t)) g 0 (t) dt = F (g(t)) + C, onde F é uma primitiva de f .

Tal como vimos no exemplo anterior se x = g(t), então dx = g 0 (t) dt e a mudança de


variável, ou substituição x = g(t) implica que,
Z Z
0
f (g(t)) g (t) dt = f (x) dx = F (x) + C = F (g(t)) + C.

dx
A notação dos diferenciais x = g(t) ⇒ dx = g 0 (t)dt = dt , torna mais fácil recordar a
dt
regra da substituição.
A fórmula tal como a deduzimos, e vimos no exemplo, é lida da “esquerda para a direita”.
Ela pode, no entanto, ser usada no sentido inverso. Nesse caso temos de procurar qual a
substituição mais adequada em cada caso. A tabela de primitivas dá-nos algumas sugestões
de mudanças de variável.

32
Cálculo Integral

Teorema 3.7 (Primitiva por substituição). Seja f contínua num intervalo I. Se x = g(t) é
uma função diferenciável em I tal que g 0 (t) 6= 0 no interior do intervalo, então g é invertível,
t = g −1 (x), e Z Z 
f (x) dx = f (g(t)) g 0 (t) dt .
t=g −1 (x)

Veremos de seguida mais um exemplo de primitiva calculada por substituição. Para


melhor compreensão usaremos a notação dos diferenciais. É preciso notar que o resultado
final deverá ser uma função na mesma variável que a função dada inicialmente.

Exemplo 3.8.
Z √
1 − x2 dx

Faz-se a substituição x = sin t ⇒ dx = (sin t)0 dt = cos t dt.


Para x ∈ [−1, 1] (o domínio da função) e t ∈ − π2 , π2 , x é uma função bijetiva.
 
Z √ Z p Z √
2
1 − x2 dx = 1 − sin t cos t dt = cos2 t cos t dt
Z Z
= | cos t| cos t dt = cos2 t dt cos t ≥ 0 para t ∈ − π2 , π2 .
 

Z  
1 1 sin 2t
(∗) = (1 + cos 2t) dt = t+ +C
2 2 2
1 2 sin t cos t 1 √ 
= (t + )+C = arcsin x + x 1 − x2 + C
2 2 2

Notas: cos t = 1 − x2 , uma vez que cos2 t + sin2 t = 1, sin t = x e cos t ≥ 0.
(*) Na tabela de primitivas existe uma secção sobre como primitivar potências de funções
1
trigonométricas. Neste caso usámos a igualdade cos2 t = (1 + cos 2t)
2

Pode ser necessário usar uma combinação destas técnicas de primitivação e/ou usar
repetidamente a mesma técnica para calcular a primitiva desejada.
Frequentemente é mais fácil calcular uma derivada do que calcular a respetiva primitiva.
Por isso, uma maneira eficiente de verificar que uma primitiva está bem calculada é calcular
a derivada do resultado obtido.
Como vimos atrás é preciso ter ainda em atenção que a primitiva não é única, e que
algumas funções podem ser escritas de várias maneiras.

3.2 Integral Definido


Antes de passarmos à definição formal de integral definido, e posteriormente à maneira como
se calcula, começamos com um exemplo muito simples que já estudaram em Física e que
serve para ilustrar a relação entre primitiva e integral definido, que veremos a seguir.

33
Cálculo Integral

Problema
Uma mota vai dos 0 aos 180km/h = 50m/s em 10s com aceleração uniforme. Quantos
m percorre nos últimos 4s?

Resolver este problema consiste em saber qual é a velocidade média da mota no intervalo
[6, 10] e multiplicar pelo tempo. Como o movimento é uniforme a distância percorrida é:

50 + 30
dist = vmédia × (10 − 6) = × 4 = 160m.
2
Geometricamente, calculámos a área dum trapézio com bases 50 e 30, e altura 4.
E se o movimento não for uniforme? Se a velocidade for modelada por uma qualquer
função contínua v(t)? O problema contínua a consistir em calcular a área da região limitada
pelo eixo dos XX (onde é medido o tempo) e pelo gráfico da função v(t). Podemos calcular
essa área usando aproximações sucessivas.

Definição 3.9. Seja f uma função contínua no intervalo fechado [a, b] (e portanto limitada).
O integral definido de f no intervalo [a, b] é:
b n  
b−a b−a
Z X
f (x) dx = lim f a+ i × .
a n→∞
i=1
n n

Iterações quando n = 10, 30, 50 para a função f (x) = x2 .

Voltando aoZproblema anterior, a distância percorrida pela mota é escrita em termos de


10
integrais como 5t dt, ou em geral a distância percorrida pela mota entre os instantes
6
t = a e t = b quando a velocidade instantânea em cada momento t é v(t) vai ser calculada
pelo integral:
Z b
v(t) dt .
a

Notas.

1. À função f chamamos função integranda e aos valores a e b extremos de integração.


Z b Z c Z b
2. Sejam a < c < b, f (x) dx = f (x) dx + f (x) dx.
a a c

34
Cálculo Integral

3. A definição de integral definido pode ser generalizada para funções limitadas com um
número finito de descontinuidades.

4. O Valor Médio de f no intervalo [a, b] é calculado usando a fórmula


Z b
1
Média(f ) = f (x) dx .
b−a a

Z b
Proposição 3.10. Se f (x) ≥ 0, para x ∈ [a, b], então f (x) dx é o valor da área da
a
região limitada pelas retas x = a, x = b, y = 0 e y = f (x).
Z 10
(50 + 30) × (10 − 6)
Como vimos anteriormente 5x dx = = 160 é área dum trapézio
6 2
com bases 50 e 30, e altura 4.

Teorema 3.11 (Teorema Fundamental do Cálculo Integral).

1. Seja f contínua em [a, b].


Z x
A função F (x) = f (t) dt é uma primitiva de f (x) no intervalo [a, b]. Ou seja,
a
todas as funções contínuas são primitiváveis.

2. Se f é contínua em [a, b] e F uma primitiva de f , então:


Z b
f (x) dx = F (b) − F (a) .
a

Apesar de todas as funções contínuas serem primitiváveis, nem todas são primitiváveis
como uma soma finita de funções elementares.
O ponto 2. do Teorema Fundamental do Cálculo Integral dá-nos uma maneira prática
de calcular um integral definido. Voltando ao problema que nos tem servido de guia, ele diz
que para calcular o deslocamento basta conhecer a posição final e a posição inicial.

Exemplos 3.12.
Z 10
5 5
1. 5x dx = F (10) − F (6) = 102 − 62 = 250 − 90 = 160,
6 2 2
onde F (x) = 25 x2 é uma das primitivas de F .
Em geral não vamos escrever a primitiva F separadamente. Nos próximos exemplos
vamos introduzir a notação que vai evitar fazê-lo.

35
Cálculo Integral

1 1
x3 13 03
Z 
1
2. 2
x dx = = − =
0 3 0 3 3 3
Este é o exemplo da figura que acompanha a Definição 3.9 (definição de Integral
Definido).
(
cos x se x > 0
3. Consideremos a função definida por ramos f (x) = .
x se x ≤ 0
Z π/2 Z 0 Z π/2
f (x) dx = x dx + cos x dx =
−2 −2 0
2 0
 
x π
+ [sin x]π/2
0 = (0 − 2) + sin − sin 0 = −1.
2 −2 2
A função deste exemplo tem uma descontinuidade no ponto 0, no entanto a integração
em cada dos dois ramos da função pode ser feita usando o Teorema Fundamental do
Cálculo Integral como habitualmente (ver Nota 2. atrás). Reparemos que neste caso
existem os dois limites laterais em 0, ainda que sejam diferentes.
Z 1  1
1 1
4. − 2 6=
−2 x x −2
A função f (x) = − x12 é ilimitada no intervalo [−2, 1] (e não está definida em 0), o que
torna este exemplo diferente do anterior. Esta função não é integrável no intervalo
[−2, 1] mas é integrável em qualquer intervalo que não contenha o 0.

De seguida vamos ver como é que a primitivação por partes e por substituição podem ser
usadas para calcular integrais definidos. As regras que enunciamos a seguir são apenas uma
reescrita adaptada a este novo contexto. Os integrais podem ser sempre calculados usando
o caso geral.

Integração por Partes


Seja F uma primitiva de f .
Z b Z b
f (x) g(x) dx = F (b)g(b) − F (a)g(a) − F (x) g 0 (x) dx
a a

A vantagem de usar esta fórmula diretamente, em vez de calcular a primitiva de f (x) g(x)
primeiro e fazer as substituições depois, é principalmente porque nos permite simplificar a
escrita.

Exemplo
Z 2 3.13. Z 2
x 2
x
xe dx = [e x]0 − ex 1 dx = (2e2 − 0) − [ex ]20 = 2e2 − (e2 − e0 ) = e2 + 1.
0 0

36
Cálculo Integral

Integração por Substituição


Sejam f uma função contínua em [a, b] e g : [c, d] → [a, b] uma função bijetiva e com
derivada contínua, então
Z b Z d
f (x) dx = f (g(t)) |g 0 (t)| dt.
a c

Usar esta fórmula diretamente tem a grande de vantagem de não ser preciso voltar à
variável inicial x para calcular o valor do integral. (Comparar com o Teorema 3.7.)

Exemplos 3.14.

1. Neste exemplo vamos usar as mesmas função e substituição do que no Exemplo 3.8, e
por isso vamos omitir alguns passos que já foram feitos.

Usámos a substituição x = sin t, e portanto


π π
−1 ≤ x ≤ 1 ⇔ −1 ≤ sin t ≤ 1 ⇒ − ≤t≤ .
2 2
Explicitamente a função mudança de variável é g : − π2 , π2 → [−1, 1] com g(t) = sin t.
 

Já tínhamos calculado que dx = sin t dt.


Z 1√ Z π p Z π
2 2
2
1 − x dx = 2
1 − sin t| cos t| dt = cos2 t dt = . . . =
−1 − π2 − π2
 π/2  
1 sin 2t 1 π sin π  π  sin(−π) π
= t+ = + − − − =
2 2 −π/2 2 2 2 2 2 2

Nota: O que acabámos de calcular foi a área da metade superior do círculo de raio
igual a 1 e centro na origem.
Z √3
2

x3 − 1
2. Calcular dx, fazendo a mudança de variável u2 = x3 − 1.
1 x
√ 1/3
Faz-se a substituição u2 = x3 − 1 ⇔ x = 3 u2 + 1 = (u2 + 1) .
dx 1 −2/3 2 u 2u
= (2u) u2 + 1 ⇒ dx = p du = 2 du
du 3 3 (u2 + 1)2
3 3x

1 ≤ x ≤ 3 2 ⇔ 1 ≤ x3 ≤ 2 ⇔ 0 ≤ x3 − 1 ≤ 1 ⇒ 0 ≤ u ≤ 1

Temos assim que


Z √3
2
√ Z 1 Z 1 Z 1
x3 − 1 u 2u 2 u2 2 u2
dx = 2
du = 3
du = 2
du =
1 x 0 x 3x 0 3x 0 3u +1

2 1
Z
1 2 2 2 π
1− 2 du = [u − arctan u]10 = (1 − 0 − arctan 1 + arctan 0) = 1− .
3 0 u +1 3 3 3 4

37
Cálculo Integral

Quando fazemos uma substituição temos que mudar a função integranda, mas também
os extremos de integração.

3.3 Aplicações do Cálculo Integral


As aplicações do cálculo integral definido resultam todas, direta ou indiretamente, da fór-
mula que vimos anteriormente para o cálculo de média de uma função:
Z b
1
Média(f ) = f (x) dx .
b−a a
De modo análogo se a funçãoZa integrar representar uma taxa de variação, ou seja a
b
função é uma derivada g 0 , então g 0 (x) dx é o acréscimo total da função g no intervalo
a
[a, b]. Este é a situação que descrevemos no problema inicial da Secção 3.2.
De seguida veremos algumas aplicações geométricas do cálculo integral.

Áreas
O integral definido de funções não negativas foi introduzido como o cálculo de uma área.
O resultado que enunciamos a seguir generaliza esse facto.
Proposição 3.15. Sejam f e g funções contínuas em [a, b], com g(x) ≤ f (x) para x ∈ [a, b].
A área da região S limitada pelos gráficos de f e g e pelas retas verticais x = a e x = b é
Z b
Área(S) = f (x) − g(x) dx [=(altura média) ×(b − a)] .
a

Exemplos 3.16.

1. Calcular a área da região A = {(x, y) : x2 ≤ y ≤ x}.

Neste exemplo os valores dos extremos de integração não 1.0

são dados explicitamente, por isso temos que os deduzir.


0.8

0.6

As curvas y = x e y = x2 intersectam-se quando x = 0 0.4

ou x = 1. Portanto os extremos de integração são 0 e 1. 0.2

A figura ajuda a compreender melhor o que fizemos. 0.2 0.4 0.6 0.8 1.0

38
Cálculo Integral

1 1
x2 x3
Z 
2 1
Área(A) = x − x dx = − =
0 2 3 0 6

2. No Exemplo 3.14(1) calculámos a área do semi-círculo:



{(x, y) : 0 ≤ y ≤ 1 − x2 } = {(x, y) : x2 + y 2 ≤ 1 ∧ y ≥ 0} .

Sólidos de Revolução
Os integrais definidos podem também ser usados para calcular o volume de certo tipo
de sólidos, os sólidos de revolução.

Definição 3.17. Um sólido de revolução é um sólido que resulta da rotação de uma figura
plana em torno de um eixo, chamado eixo de revolução.

O cilindro, o cone e a esfera são exemplos de sólidos de revolução que resultam da rotação
de um retângulo, de um triângulo e de um semi-círculo, respectivamente.
Vamos usar o exemplo do cone (do qual já sabemos calcular o volume) para ilustrar
como podemos, em geral, calcular o volume de um sólido de resolução se conheceremos a
região e o eixo de revolução.
Consideremos um cone de raio r e altura h. O volume do cone é igual ao produto da
altura pelo valor médio da área de cada secção circular do cone. Seja x a distância do centro
desse círculo ao vértice do cone (representado na figura). Então o raio do círculo é igual
2
a rx
h
e portanto a área desse círculo é A(x) = π rx h
. O volume do cone é então igual ao
produto de h pelo valor médio de A(x) e portanto:
Z h Z h  2
rx 1
Volume(cone) = média de A(x) × h = A(x) dx = π dx = πr2 h .
0 0 h 3

x
A(x) é a área da região
sombreada.

39
Cálculo Integral

Rotação em torno do eixo dos XX


No caso geral podemos considerar que o raio de cada círculo é dado por uma função
f (x). Neste caso a função que nos dá a área é A(x) = πf (x)2 .

Proposição 3.18. Seja f contínua em [a, b]. O volume do sólido de revolução gerado pela
rotação em torno do eixo dos XX da figura limitada pelo gráfico de f , pelo eixo dos XX e
pelas retas x = a e x = b é Z b
volume = π f (x)2 dx .
a

Mais geralmente, se fizermos a rotação em torno de uma reta horizontal y = k, então o


volume é calculado pela expressão
Z b
volume = π (f (x) − k)2 dx .
a

Exemplo 3.19. Calcular o volume do sólido de revolução gerado pela rotação em torno do

eixo dos XX da região {(x, y) : 0 ≤ y ≤ x, 1 ≤ x ≤ 4}.

4 4 4
√ x2
Z Z 
2 15π
volume = π x dx = π x dx = π =
1 1 2 1 2


Sólido de revolução gerado pela rotação da região limitada por f (x) = x.

Rotação em Torno do Eixo dos Y Y


Se a rotação da figura for feita em torno do eixo dos Y Y , ou de qualquer outra reta
vertical, o cálculo do volume é feito usando uma outra fórmula. É preciso ter em atenção
que trocando o papel das variáveis x e y podemos sempre transformar esta “situção” na
anterior, e usar a respetiva fórmula.

Proposição 3.20. Sejam 0 ≤ a ≤ b, f contínua em [a, b] tal que f (x) ≥ 0. O volume do


sólido de revolução gerado pela rotação em torno do eixo dos Y Y da figura limitada pelo
gráfico de f , pelo eixo dos XX e pelas retas x = a e x = b é
Z b
volume = 2π x f (x) dx .
a

40
Cálculo Integral

Neste caso f (x) representa a altura de um cilindro de raio x. A área da superfície desse
cilindro é S(x) = 2πx f (x), e o volume do sólido pode ser visto como:

(média de S(x)) × (b − a).

Exemplo 3.21. Consideremos a região do plano A = {(x, y) | 0 ≤ y ≤ x2 , x ≤ 1}.

1. Calcular o volume do sólido de revolução gerado pela rotação em torno do eixo dos
XX da região A.

1 1
x5
Z 
2 2
 π
VolumeX = π x dx = π =
0 5 0 5

2. Calcular o volume do sólido de revolução gerado pela rotação em torno do eixo dos
Y Y da região A.

1 1
x4
Z 
2 π
VolumeY = 2π x x dx = 2π =
0 4 0 2

Comprimento de Curvas
Uma outra aplicação geométrica do cálculo integral é o cálculo do comprimento do gráfico
de uma função derivável num intervalo limitado.

Proposição 3.22. Seja f uma função com derivada contínua em [a, b]. O comprimento do
gráfico de f entre os pontos (a, f (a)) e (b, f (b)) é
Z bp
Cab (f ) = 1 + f 0 (x)2 dx .
a

41
Cálculo Integral

Exemplo 3.23. Calcular o perímetro de uma circunferência de raio r.


x2 + y 2 = r 2 ⇔ y = ± r 2 − x2

Para calcular o perímetro de meia circunferência, faz-se f (x) = r2 − x2 e
−x
f 0 (x) = √ e portanto o perímetro da circunferência é:
r 2 − x2
Z rr Z r 1
x2 r
Perímetro = 2 1+ 2 2
dx = 2r q dx =
−r r − x −r 1− x
2
r2
h  x ir
2r arcsin = 2r (arcsin 1 − arcsin(−1)) = 2πr .
r −r

3.4 Integrais Impróprios


Os integrais impróprios são uma generalização dos integrais definidos, e resultam de consi-
derarmos as hipóteses de o intervalo de integração ou a função integranda serem ilimitados
(ou eventualmente ambos). Como exemplo básico podemos pensar que é possível uma região
ilimitada ter uma área finita. Apesar de ser um pouco contra-intuitivo, este caso não é muito
diferente do que acontece quando somamos todos os termos de uma progressão geométrica.
Claro que já sabemos que nem todas as somas com um número infinito de parcelas têm um
valor finito, e também nem todos os integrais impróprios têm um valor finito. Aos integrais
impróprios que realmente representam um valor finito chamaremos convergentes. Tal como
referido anteriormente, os integrais impróprios podem ser de dois tipos.

Intervalos Ilimitados
Seja f uma função contínua e não negativa em [a, +∞) tal que lim f (x) = 0.
x→+∞
Se t > a, então a área A(t) da região limitada pelo gráfico de f (t), o eixo dos XX e as
retas verticais x = a e x = t é dada por:

Z t
A(t) = f (x)dx
a
a t

Se lim A(t) existe (e é finito), então este limite pode ser interpretado como a área da
t→+∞
região limitada pelo gráfico de f , pelo eixo dos XX e pela reta x = a.

Definições 3.24.
Z t
(a) Se f (x) dx existe para t ≥ a, então
a
Z +∞ Z t
f (x) dx = lim f (x) dx, se este limite existir.
a t→+∞ a

42
Cálculo Integral

Z b
(b) Se f (x) dx existe para t ≤ b, então
t
Z b Z b
f (x) dx = lim f (x) dx, se este limite existir.
−∞ t→−∞ t

(c) Z +∞ Z c Z +∞
f (x) dx = f (x) dx + f (x) dx, para qualquer c ∈ R
−∞ −∞ c

Exemplos 3.25.
Z +∞ Z t
1 1
1. dx = lim dx = lim [ln x]t1 = lim ln t − ln 1 = +∞
1 x t→+∞ 1 x t→+∞ t→+∞

Z 0 Z 0
2. x
e dx = lim ex dx = [ex ]0t = lim e0 − et = 1
−∞ t→−∞ t t→−∞

Z +∞ Z 0 Z +∞
3. x dx = x dx + x dx = ∞ − ∞
−∞ −∞ 0

Este integral não está definido. Este tipo de indeterminações não pode ser levantada.

Funções Ilimitadas

Definição 3.26.

(a) Seja f contínua no intervalo [a, b[. Se lim− f (x) for infinito, então
x→b

Z b Z t
f (x) dx = lim− f (x) dx, se este limite existir.
a t→b a

(b) Seja f contínua no intervalo ]a, b]. Se lim+ f (x) for infinito, então
x→a

Z b Z b
f (x) dx = lim+ f (x) dx, se este limite existir.
a t→a t

Z 1    
1 1
Nota. x sin dx não é um integral impróprio, pois lim+ x sin = 0.
0 x x→0 x

Exemplos 3.27.

1 1 1
x2/3 t2/3
Z Z 
1 1 3
1. √ dx = lim+ x −1/3
dx = lim+ = lim+ − =
0
3
x t→0 t t→0 2/3 t t→0 2/3 2/3 2

43
Cálculo Integral

1 t t
−1
Z Z Z
1 1
2. dx = lim− dx = lim− dx = lim− [ln(1 − x)]t0 =
0 x−1 t→1 0 x−1 t→1 0 1−x t→1

lim ln(1 − t) − ln 1 = −∞
t→1−

Definição 3.28. Se o limite de um integral impróprio existe, e é finto, o integral diz-se


convergente. Se um integral impróprio não é convergente, diz-se divergente.

Critério de Comparação
Como vimos anteriormente nem sempre é possível calcular com exatidão o valor dum
integral, mas por vezes é possível calcular um valor aproximado ou um intervalo de possíveis
resultados. Para os integrais impróprios vamos usar um critério simples de comparação que
nos vais ajudar a verificar se um integral impróprio é convergente ou divergente.

Proposição 3.29 (Critério de Comparação). Sejam f e g contínuas no intervalo ]a, b[, com
0 ≤ f (x) ≤ g(x) para x nesse intervalo.
Z b Z b
1. Se g(x) dx é convergente, então f (x) dx também é convergente.
a a
Z b Z b
2. Se f (x) dx é divergente, então g(x) dx também é divergente.
a a

Os valores a e b podem ser ±∞.


A proposição anterior é uma consequência do Teorema do Enquadramento, que é válido
para todo o tipo de integrais e que vamos enunciar de seguida.

Teorema 3.30 (Teorema do Enquadramento). Sejam f , g e h funções contínuas no inter-


valo ]a, b[, com f (x) ≤ g(x) ≤ h(x) para x nesse intervalo.
Z b Z b Z b
Se f (x) dx e h(x) dx são convergentes, então g(x) dx também é convergente,
a a a
e
Z b Z b Z b
f (x) dx ≤ g(x) dx ≤ h(x) dx.
a a a

Exemplo 3.31. Um tipo de funções importante em Estatística são as funções de distribuição


normal ou Gaussiana. A menos de parâmetros constantes, elas resultam de modificações
da função f (x) = e−x . Apesar da função f (x) não ser integrável como soma de funções
2

Z +∞
2
elementares, é possível determinar a natureza do integral e−x dx.
−∞

44
Cálculo Integral

Z +∞ Z +∞
−x2 2
(e−x é uma função par.)
2
e dx = 2 e−x dx
Z−∞+∞ Z 1 0 Z +∞
−x2 −x2 2
e = e dx + e−x dx
0
| 0 {z } 1
finito

Para x ≥ 1, Z +∞ Z +∞
−x2 −x2 1
0≤e ≤e −x
⇒0≤ e dx ≤ e−x dx = .
1 1 e
Z +∞
2
Conclui-se então que o integral e−x dx é convergente.
−∞

45
Equações Diferenciais

4 Equações Diferenciais
Uma equação diferencial é uma equação que envolve uma ou mais derivadas de uma função
incógnita y = f (x) (y 0 , y 00 , ...). A equação pode conter a própria função y, outras funções
conhecidas de x e constantes. A solução de uma equação diferencial é uma função, ou mais
geralmente uma família de funções, tal como a solução de uma equação algébrica é um valor
real ou um conjunto de valores. Tal como acontece com as equações algébricas, existem
equações diferenciais que não têm solução.
Não existe uma regra geral para resolver equações diferenciais, apenas algumas regras
parciais para resolver certos tipos de equações. Neste curso vamos aprender a resolver dois
tipos de equações diferenciais: equações de variáveis separáveis e equações lineares de pri-
meira ordem, mas antes disso vamos introduzir alguns conceitos sobre equações diferenciais
um pouco mais globais.
De referir que nesta área da Matemática existe muita investigação feita atualmente,
tanto teórica como aplicada.

• A variável da função incógnita, normalmente x, é a variável independente e a função


incógnita, normalmente y, é a variável dependente.

• A ordem de uma equação é a ordem da derivada de maior grau que aparece na equação.

Exemplos de Equações Diferenciais

1. y 0 = x ordem 1

2. y 00 + y 0 y = x2 + 1 ordem 2

3. y 000 x + sin x = y 0 ordem 3

Definições 4.1.

1. Ao conjunto de todas as soluções de uma equação diferencial chama-se Solução Geral


ou Integral Geral.

2. A uma solução da equação diferencial chama-se Solução Particular.

Nota. As equações diferenciais estão definidas num intervalo de R, e cada uma das suas
soluções deve ser considerada apenas num intervalo determinado.

46
Equações Diferenciais

x2
Exemplo 4.2. A equação y 0 = x tem como solução geral y(x) = + C, onde C é uma
2
constante pertencente a R.
x2 x2
As funções y1 = 2
ou y2 = 2
+5 são soluções particulares da equação diferencial y 0 = x.

Exercício

(a) Mostre que y = C1 e5x + C2 e−3x , C1 , C2 ∈ R é a solução geral da equação diferencial


y 00 − 2y 0 − 15y = 0.

Começamos por calcular as duas primeiras derivadas da função dada, e substituímos na


equação para verificar se a igualdade é válida.
y = C1 e5x + C2 e−3x
y 0 = 5C1 e5x − 3C2 e−3x
y 00 = 25C1 e5x + 9C2 e−3x

y 00 − 2y 0 − 15y = 25C1 e5x + 9C2 e−3x − 2 (5C1 e5x − 3C2 e−3x ) − 15 (C1 e5x + C2 e−3x ) =

(25C1 − 10C1 − 15C1 )e5x + (9C2 + 6C2 − 15C2 )e−3x = 0

(b) Determinar a solução particular que verifica as condições y(0) = 0 e y 0 (0) = 1.

Vamos usar as duas condições iniciais que nos são dadas para determinar o valor das
constantes C1 e C2 .
( ( (
y(0) = 0 C1 + C2 = 0 C1 = 81
⇔ ⇔
y 0 (0) = 1 5C1 − 3C2 = 1 C2 = − 18
1 1
y = e5x − e−3x é a solução particular pretendida.
8 8

4.1 Equações Diferenciais de Primeira Ordem


Nesta secção vamos aprender a resolver dois tipos específicos de equações diferenciais, mas
antes disso vamos enunciar um resultado que nos garante que todas as equações de 1a ordem
têm solução.

Teorema 4.3 (Teorema de Existência e Unicidade de soluções). Sejam ϕ(x, y) e ∂ϕ


∂y
(x, y)
funções contínuas e (a, b) um ponto do domínio de ϕ.
Então existe uma única solução da equação y 0 = ϕ(x, y) que satisfaz a condição y(a) = b.

47
Equações Diferenciais

Todas as equações de primeira ordem se podem escrever na forma y 0 = ϕ(x, y), para
alguma função ϕ. Portanto, este teorema diz-nos que qualquer equação diferencial de pri-
meira ordem tem uma solução única que verifica a condição y(a) = b, quaisquer que sejam
os valores a e b (desde que a condição esteja bem definida). Tal como já foi referido anteri-
ormente, essa solução pode não estar definida em R mas apenas num intervalo que contenha
a. De notar que este resultado apenas indica que tal solução existe, ainda que nem sempre
exista uma maneira “fácil” de a calcular.

Equações de Variáveis Separáveis


Uma equação diferencial é de variáveis separadas se puder ser escrita de forma a que os
termos que envolvem a variável independente fiquem num lado da equação, e os termos que
envolvem a variável dependente fiquem do outro lado. Ou seja, pode escrita na forma:

M (x) = N (y)y 0 ,

onde M é função de x e N é função de y.


Uma equação pode não ser de variáveis separadas, mas ser equivalente a uma equação
de variáveis separadas. A uma dessas equações chamamos equação diferencial de variáveis
separáveis. A seguinte equação é um desses exemplos.

y x
(4y + yx2 )y 0 = (2x + xy 2 ) ⇔ 2
y0 = .
2+y 4 + x2

Solução das equações de variáveis separáveis

dy
M (x) = N (y)y 0 ⇔ M (x) = N (y)
dx

Integra-se ambos os membros da equação.


Z Z Z Z
dy
M (x) dx = N (y) dx ⇔ M (x) dx = N (y) dy
dx
A última equivalência é obtida usando a relação existente entre dy e dx tal como referido
aquando da integração por substituição.
Desta maneira obtemos a solução implícita da equação de variáveis separáveis.
Para se obter a solução explícita é, por vezes, necessário fazer uma restrição do domínio
da função y(x).
Nota. A solução implícita de uma equação diferencial é uma relação entre as variáveis de-
pendente e independente (y e x), enquanto a solução explícita resulta de isolar a variável
dependente num dos membros da igualdade. Nem sempre é necessário, ou sequer possível,
calcular a solução explícita de uma equação diferencial.

48
Equações Diferenciais

Exemplos 4.4.
y 0
1. Determine a solução geral da equação diferencial y = −1.
x
y 0 x6=0 dy
y = −1 =⇒ yy 0 = −x ⇔ y = −x =⇒
x dx
y2 x2
Z Z
2k=c
y dy = −x dx ⇔ = − + k ⇐⇒ x2 + y 2 = c
2 2
A solução implícita da equação é x2 + y 2 = c, com c > 0 e x 6= 0.
√ √
Para y > 0 e x ∈]0, c[, a solução explícita é y(x) = c − x2 .

2. Determine a solução particular da equação diferencial y 2 ex + y 0 = 0, que verifica a


condição inicial y(0) = 1.

y6=0 y0 1 dy
y 2 ex + y 0 = 0 =⇒ ex + = 0 ⇔ = −ex ⇔
y2 y 2 dx
Z Z
1 1
− 2 dy = ex dx ⇔ = ex + k, k ∈ R.
y y
Para determinar a solução particular que verifica y(0) = 1 faz-se na solução geral
x = 0 e y = 1.
1
1
= e0 + k ⇔ k = 0

A solução pretendida obtém-se substituindo k por 0 na solução geral, ou seja y = e−x .

Problema de Misturas
Um contentor contém 20Kg de sal dissolvidos em 5000l de água. Uma solução de água
salgada com 0.03Kg de sal por litro entra no contentor a uma velocidade de 25l/min. A
solução é misturada completamente e sai do contentor à mesma velocidade. Que quantidade
de sal existe no contentor ao fim de meia hora?

Considerações iniciais:

• Considera-se para efeitos formulação do problema que a mistura da água que entra
com a que está no contentor é feita instantaneamente.
20
• A concentração inicial é de = 0.004Kg/l.
5000
• A quantidade máxima de sal que o contentor poderá ter é de 5000 × 0.03 = 150Kg.

49
Equações Diferenciais

Notação:

• y(t) - quantidade de sal em Kg.

• y(0) = 20Kg.

• y 0 (t) =taxa de entrada - taxa de saída= E(t) − S(t) (medido em Kg/min)

• E(t) = 0.03Kg/l × 25l/min = 0.75Kg/min


| {z } | {z }
concentração velocidade

y(t) y(t)
• S(t) = × 25 =
5000 200
150 − y
• y 0 (t) = E(t) − S(t) =
200

Resolução da Equação Diferencial


dy 150 − y 1 dy 1
= ⇔ = ⇔
dt 200 150 − y dt 200
−1
Z Z
1 y<150 t
− dy = dt ⇐⇒ − ln(150 − y) = + c, c ∈ R ⇔
150 − y 200 200
t t k=e−c
ln(150 − y) = − − c ⇔ 150 − y = e− 200 e−c ⇐⇒
200
[Quando c é uma constante real, e−c é uma constante real positiva.]
t t
150 − y = ke− 200 ⇔ y = 150 − ke− 200 , k > 0
Falta determinar a solução que verifica y(0) = 20.
y(0) = 20 ⇔ 20 = 150 − k ⇔ k = 130
t
A solução é y(t) = 150 − 130e− 200 e portanto
3
y(30) = 150 − 130e− 20 ≈ 38, 1Kg.

140

120

100

80

60

40

20

200 400 600 800 1000 1200 1400

t ∈ [0, 1440] 1440min = 24h

50
Equações Diferenciais

O gráfico mostra a evolução da quantidade de sal segundo este modelo, durante as


primeiras 24h. É fácil verificar, analítica e graficamente, que lim y(t) = 150, ou seja a
t→+∞
concentração tende para 0.03Kg/l.

Equações Diferenciais Lineares


As equações diferenciais lineares são um tipo particular de equações diferenciais, geral-
mente mais fáceis de resolver. Antes de vermos como se resolvem as equações lineares de
1a ordem, vamos definir equações diferenciais lineares e dar alguns exemplos. No que segue
y (n) representa a derivada de ordem n de y.
Uma equação diferencial linear de ordem n é uma equação diferencial que pode ser escrita
na seguinte forma:

an (x)y (n) + an−1 (x)y (n−1) + · · · + a1 (x)y 0 + a0 (x)y = f (x) ,

onde a0 (x), a1 (x), · · · , an (x), f (x) são funções reais com an (x) 6= 0. Supondo que an (x)
não se anula num determinado intervalo, podemos dividir toda a expressão por an (x) e
considerar sempre an (x) = 1.
Alguns exemplos de equações diferenciais lineares, e a respetiva ordem.

1. y 0 + 2y = x 1a ordem

2. y 000 + x1 y 0 − y = sin x 3a ordem

3. xy 00 − y 0 = 0 2a ordem

x6=0
4. x2 y 0 + y = x2 ⇐⇒ y 0 + 1
x2
y =1 1a ordem

Uma equação diferencial linear de primeira ordem é uma equação que pode ser escrita
na forma
y 0 + p(x)y = q(x) ,
onde p(x) e q(x) são funções contínuas num dado intervalo. Uma equação escrita nesta
forma diz-se escrita na forma canónica.

Se q(x) = 0, então y 0 + p(x)y = 0 é uma equação


Z de variáveis separáveis
2
, e portanto
0
y6=0 y y>0
R
y 0 + p(x)y = 0 ⇐⇒ = −p(x) ⇐⇒ ln y = − p(x) dx ⇔ y = e− p(x) dx .
y
Motivado pela solução deste caso particular, no caso geral vamos usar o fator integrante
µ(x) = e p(x) dx . Um fator integrante é uma função que multiplicada pela equação permite
R

2
Uma equação diferencial pode ser simultaneamente de variáveis separáveis e linear de primeira ordem.

51
Equações Diferenciais

transformá-la numa equação de solução conhecida, ou mais facilmente resolúvel. O objetivo


de usar um fator integrante é semelhante ao que temos quando usamos uma mudança de
variável noutros contextos (limites, integração, ...).

Solução Geral das Equações Lineares de Primeira Ordem


A partir da equação escrita na forma canónica y 0 + p(x)y = q(x), multiplica-se ambos os
membros da equação pelo fator integrante µ(x) = e p(x) dx .
R

µ0 (x)
z }| {
y 0 + p(x)y = q(x) ⇒ µ(x)y 0 + p(x)µ(x) y = µ(x)q(x)
Depois de multiplicarmos pelo fator integrante, obtemos do lado esquerdo da equação a
derivada do produto das funções y(x) e µ(x).
Z
d
(µ(x)y(x)) = µ(x)q(x) ⇔ µ(x)y(x) = µ(x)q(x) dx ⇔
dx
Z
1
y(x) = µ(x)q(x) dx
µ(x)
R
Z R 
− p(x) dx p(x) dx
y=e e q(x) dx + c

Deduzimos assim uma fórmula resolvente para as equações lineares de 1a ordem. Apesar
disso, nos exemplos que apresentamos a seguir as equações diferenciais vão ser resolvidas
usando o fator integrante em cada caso.

Exemplo 4.5.

1. Determinar a solução geral da equação diferencial y 0 + y = ex .


R
O fator integrante desta equação é µ(x) = e 1dx
= ex .
d x
y 0 + y = ex ⇔ ex y 0 + ex y = e2x ⇔ (e y) = e2x ⇔
dx
e2x
Z  
x 2x −x
e y= e dx ⇔ y = e +c ⇔
2
1
y = ex + c e−x , c∈R
2
2. Determinar a solução da equação diferencial x2 y 0 + xy = 1, para x > 0.

1 1
x2 y 0 + xy = 1 ⇔ y 0 + y = 2
x x
1
R
O fator integrante é µ(x) = e x
dx
= eln x = x.

52
Equações Diferenciais

(Para x < 0, o fator integrante seria −x. Esta diferença de sinal não teria nenhuma
implicação prática.)

Multiplica-se ambos os membros da equação pelo fator integrante.


1 1 1 d 1
y 0 + y = 2 ⇔ xy 0 + y = ⇔ (xy) = ⇔
x x x dx x
Z
1 1 ln x c
xy = dx ⇔ y = (ln x + c) ⇔ y = + , c∈R
x x x x
Note-se que não existe nenhuma solução desta equação cujo o domínio contenha o
valor x = 0.

Problema de Misturas – segunda versão


Um contentor contém 20Kg de sal dissolvidos em 5000l de água. Uma solução de água
salgada com 0.03Kg de sal por litro entra no contentor a uma velocidade de 25l/min. A
solução é misturada completamente e sai do contentor à velocidade de 50l/min.
A principal alteração nesta versão em relação à anterior é que a velocidade de saída é
5000
superior à velocidade de entrada da água. Isso resulta no facto de passados = 200
50 − 25
minutos o tanque ficará vazio. A equação resultante desta modelação é uma equação linear
de 1a ordem.

• y 0 (t) =taxa de entrada - taxa de saída= E(t) − S(t) (medido em Kg/min)

• E(t) = 0.03Kg/l × 25l/min = 0.75Kg/min


y(t) 2y(t)
• S(t) = × 50 =
5000−25t 200 − t

Resolução da Equação Diferencial


3 2y
y0 = − , t ∈ [0, 200[
4 200 − t
3 2y 2y 3
y0 = − ⇔ y0 + =
4 200 − t 200 − t 4
R 2 1
O fator integrante é µ(t) = e 200−t
dt
= e−2 ln(200−t) = .
(200 − t)2
1 0 2 3/4
y + y = ⇔
(200 − t)2 (200 − t)3 (200 − t)2
1 3/4 3
2
y= + c ⇔ y(t) = (200 − t) + c (200 − t)2
(200 − t) 200 − t 4

Falta determinar o valor de c para achar a solução particular pretendida.

53
Equações Diferenciais

3 13
y(0) = 20 ⇔ 20 = 200 + c2002 ⇔ c = −
4 4000
A solução do problema é

3 13
y(t) = (200 − t) − (200 − t)2
4 4000

Neste caso, como a quantidade de água é variável, é interessante verificar qual a evolução
da concentração de sal na água ao longo tempo. A concentração ao longo do tempo é dada
pela expressão
y(t) 3 13
c(t) = = − (200 − t).
5000 − 25t 100 100000

0.03
40
0.025
30
0.02

0.015
20
0.01
10
0.005

50 100 150 200 50 100 150 200

Evolução da quantidade de sal. Evolução da concentração.

4.2 Equações Diferenciais como Modelos Matemáticos


A matemática é a linguagem que usamos para descrever, compreender ou prever fenómenos
físico-químicos do mundo real, tendo as equações diferenciais um papel de relevo neste
processo.
A representação ou descrição de leis naturais, físicas ou de fenómenos do mundo real
usando conceitos matemáticos é conhecida como Modelo Matemático. Ao longo do semestre
temos estudado vários modelos para exemplificar a utilização em contexto real dos conceitos
matemáticos que estudámos, mas neste capítulo a utilidade da modelação matemática é
mais facilmente demonstrada, e por isso dedicamos esta secção a estudar alguns modelos
em particular.
Vamos começar por dois modelos que são normalmente usados para estudar o crescimento
populacional: o modelo exponencial e o modelo logístico. O primeiro é um modelo mais
básico e o segundo mais complexo.
Quando falamos de crescimento populacional, podemos falar do crescimento da popula-
ção de animais ou plantas num determinado espaço, ou de uma cultura de bactérias, por
exemplo. Estes modelos também podem ser usados para estudar a disseminação de doenças.

54
Equações Diferenciais

Em ambos os casos, quanto mais fechado ao exterior o sistema for mais fiável será o modelo.
Os estudos reais são feitos com modelos mais complexos, mas em muitas situações estes
modelos dão-nos alguma indicação sobre a situação real.

Modelo de Crescimento Exponencial


Neste modelo a população de uma comunidade (animais, vegetais, bactérias, ...) cresce
a uma taxa proporcional ao tamanho dessa mesma população.
Em termos matemáticos, se y(t) é o número de indivíduos da população no instante t,
então y 0 (t) é a taxa de crescimento da população nesse mesmo instante t.
O modelo de crescimento exponencial é descrito pela equação

y0 = k y , k 6= 0 .

Esta equação é simultaneamente linear e de variáveis separáveis.


A solução da equação y 0 = k y é

y(t) = y0 ekt ,

onde y0 = y(0) é a população inicial.


A equação resolve-se da mesma maneira para valores de k positivos ou negativos, no
entanto o sinal da derivada y 0 (t) é diferente e portanto correspondem a situações distintas.

• k > 0 – Modelos de crescimento exponencial.

• k < 0 – Modelos de decaimento exponencial.

O modelo de crescimento exponencial é frequentemente bastante exato no início do


crescimento de uma população, mas torna-se desadequado à medida que o tempo passa,
por isso houve necessidade de criar modelos mais adaptados a evoluções mais longas.

Modelo Logístico
Neste modelo a população cresce exponencialmente quando a população é pequena, e
tende a estabilizar quando a população se aproxima da chamada capacidade de suporte.
A capacidade de suporte é a população que o ambiente consegue sustentar a longo prazo.
No caso da disseminação de certo tipo de doenças pode-se considerar como capacidade de
suporte o percentagem da população necessária para se atingir a imunidade de grupo, altura
em que a doença tenderá naturalmente a estabilizar. Na situação pandémica da Covid19,
esse número é obviamente muito alto e por isso foi necessário tomar medidas para sustê-la
antes de atingir esse valor.

55
Equações Diferenciais

Em termos matemáticos, a equação logística é:

y 0 = k y (L − y) , k>0,

onde L > 0 é a capacidade de suporte.


A taxa de crescimento é proporcional ao produto do tamanho da população e da capa-
cidade que a população ainda tem para aumentar.

Solução da Equação Logística


dy 1
= k y (L − y) ⇔ dy = k dt ⇔
dt y (L − y)
Z Z Z Z
1 1 1 1
dy = k dt ⇔ + dy = k dt ⇔
y (L − y) L y L−y
L−y
ln |y| − ln |L − y| = kLt + c ⇔ ln = −kLt − c ⇔
y
L−y L−y
= e−kLt−c ⇐⇒ = Ce−kLt , C = ±e−c 6= 0
y y
Temos assim que a solução da equação logística é:
L L
y= ⇔y= , onde D = e−kL > 0 é uma constante real positiva.
C e−kLt +1 t
CD +1
L − y0
Fazendo y0 = y(0), a população no instante inicial, obtemos que C = .
y0
Não é difícil verificar que neste modelo a população tende para o valor da capacidade de
L
suporte, lim y(t) = lim = L, com k > 0.
t→∞ t→∞ Ce−kLt + 1

• Se y0 ∈]0, L[ a população vai aumentar.

• Se y0 ∈]L, +∞[ a população vai diminuir.

Teoricamente também é possível considerar o modelo logístico com k < 0. Neste caso a
população tenderia para 0.

Exponencial vs Logística
Os próximos gráficos servam para comparar a evolução de uma população de crescimento
exponencial e de crescimento logístico. Consideramos os mesmos valores iniciais para a
população e para a taxa de crescimento, 100 em ambos casos (y 0 (0) = k y(0) e y 0 (0) =
k L y(0), respetivamente). A taxa de crescimento considerada é propositadamente muito
alta para que sejam facilmente visíveis as diferenças entre os dois modelos
Do lado esquerdo vemos que nos instantes iniciais não há grandes diferenças entre as
duas curvas, mas do lado direito a diferença entre os dois modelos já é bem visível, com o
modelo logístico a estabilizar enquanto o exponencial contínua a crescer.

56
Equações Diferenciais

y0 = 100 L = 1000 k = 1 (exponencial) kL = 1 (logística)

275
4000
250

225 3000
200
2000
175

150
1000
125

0.2 0.4 0.6 0.8 1 1 2 3 4 5

t ∈ [0, 1] t ∈ [0, 5]

A diferença entre o crescimento duma pandemia, no seu início ou atingindo uma maior
percentagem da população, pode também ser observado nos gráficos do número de casos de
Covid19 nos primeiros meses em Itália e no Mundo. Essencialmente, durante esse período a
pandemia cresceu a um ritmo quase exponencial em todo mundo, onde a proporção de casos
registados em relação ao total da população era ainda bastante baixa. Em Itália depois de
um início onde a doença era desconhecida, e cresceu naturalmente, a curva começou a ser
achatada em virtude de medidas restritivas muito severas. Neste caso o modelo comportou-
se de modo semelhante ao da curva logística, o que na nossa linguagem significa que a
capacidade de suporte do sistema foi drasticamente reduzida.

Logística de Crescimento Negativo


Para que o estudo fique completo mostramos também o gráfico de um função logística
onde o valor inicial é maior do que a capacidade de suporte, y0 > L.

57
Equações Diferenciais

y0 = 2000 L = 1000 kL = 1
2000

1750

1500

1250

1000

750

500

250

1 2 3 4 5

t ∈ [0, 5]

Exercício
Um estudante portador do vírus da gripe regressa a um colégio com 1000 alunos. Supo-
nha que o colégio está isolado e que o vírus se propaga com uma taxa de variação proporci-
onal não apenas ao número y de alunos já infectados mas também ao número de alunos não
infectados. Determine o número de alunos infectados após 6 dias, sabendo que passados 4
dias eles são já 50.
Estamos nas condições no modelo logístico com L = 1000 e y0 = 1. Da solução da
equação logística, sabemos que:
L L − y0 1000 − 1
y= t
com C = = = 999 .
CD +1 y0 1

Por outro lado, sabemos também que


1000 1000
y(4) = 50 ⇔ 50 = 4
⇔ 999 D4 + 1 = ⇔
999 D + 1 50
 1/4
4 19 19
D = ⇔D= .
999 999
Finalmente concluímos que
1000
y= ,
19 t/4

999 999
+1
e portanto
1000
y(6) = ≈ 276 .
19 3/2

999 999
+1

De seguida vamos descrever dois modelos práticos de aplicação das equações diferenciais,
o modelo de desintegração radioativa e a lei de arrefecimento de Newton. Em ambos os casos,
eles são essencialmente modelos de decaimento exponencial.

58
Equações Diferenciais

Desintegração Radioativa e Datação por Carbono


Neste modelo matemático, que descreve a desintegração radioativa de uma dada subs-
tância, é assumido que a taxa de desintegração dos átomos é proporcional ao número de
átomos presentes em cada instante.
Em termos matemáticos, se m(t) representa a massa da substância radioativa no instante
t, então m0 (t) é a taxa de (de)crescimento da massa nesse instante.
Este modelo de decaimento exponencial é descrito pela equação

m0 = k m , k<0.

A solução da equação m0 = k m é

m(t) = m0 ekt ,

onde m0 = m(0) é a massa inicial.

A constante k é usualmente determinada em termos da meia-vida do material, isto é o


tempo necessário para uma quantidade inicial dessa substância, m0 , por desintegração se
reduzir a metade. Designemos por V > 0 a meia-vida do material, logo

m(V ) 1 m0 ekV 1 ln 2
= ⇔ = ⇔k=− .
m0 2 m0 2 V

Temos assim que a solução da equação m0 = k m é


ln 2 t
m(t) = m0 e− V
t
= m0 2− V ,

onde V é a meia-vida do material.

Exemplo 4.6. Um pedaço de madeira foi encontrado com 1/500 da quantidade original de
Carbono 14. Determine a sua idade, sabendo que a meia-vida de Carbono 14 é 5600.
Pelos cálculos que fizemos anteriormente, sabemos que:
t
m(t) = m0 2− 5600 .

Queremos descobrir o valor de t quando m(t) = m0


500
.
m0 t 1 t t
= m0 2− 5600 ⇔ = 2− 5600 ⇔ 500 = 2 5600 ⇔
500 500
t
= log2 500 ⇔ t = 5600 × log2 500 ≈ 50200
5600
O pedaço de madeira tem aproximadamente 50200 anos.

59
Equações Diferenciais

Lei de Arrefecimento de Newton


A lei do arrefecimento de Newton estabelece que a taxa a que um corpo arrefece é
proporcional à diferença entre a temperatura do corpo e a temperatura do meio que circunda
o corpo, o chamado meio ambiente.

Em termos matemáticos, se T (t) representa a temperatura do corpo no instante t, então


T (t) é a taxa de arrefecimento (ou de aquecimento, conforme o caso). Designamos por Ta
0

a temperatura do meio ambiente.

Este modelo é descrito pela equação

T 0 = k (T − Ta ) , k < 0 assumindo que o corpo está a arrefecer .

O modelo é de decaimento exponencial em relação a T − Ta , e não em relação à variável T .


A solução da equação do arrefecimento é
1
T 0 = k(T − Ta ) ⇔ T0 = k ⇔
T − Ta
Z Z
1
dT = k dt ⇔ ln(T − Ta ) = kt + c, c ∈ R, T > Ta ⇔
T − Ta

T = Ta + C ekt , C > 0.

Além disso, fazendo t = 0 obtemos C = T0 − Ta , (T0 é a temperatura inicial) pelo que a


solução da equação é
T (t) = Ta + (T0 − Ta )ekt .

Por exemplo, para determinar a hora de um óbito usa-se T0 = 37o C.

60
Álgebra Linear

5 Álgebra Linear
A Álgebra Linear é uma área muito vasta da matemática da qual iremos estudar apenas
uma pequena parte. O nosso principal objetivo no estudo que vamos realizar é mostrar
como calcular a reta de regressão linear, e estudar outros problemas semelhantes. Para isso
vamos introduzir uma ferramenta que nos vai ser útil para o fazer, as Matrizes.

5.1 Matrizes
Definição 5.1. Uma matriz A do tipo m × n é um quadro que se obtém dispondo m × n
números reais em m linhas e n colunas.
 
a11 a12 ··· a1n
 a21 a22 ··· a2n 
 
A=  .. .. ... .. 
 . . . 

am1 am2 · · · amn

De forma abreviada, escrevemos A = [aij ]m×n , onde aij denota o elemento (ou entrada
ou componente) genérico da matriz situado na linha i, coluna j de A.

• Se m = n (no linhas=no colunas), a matriz A diz-se quadrada de ordem n.

• Uma matriz do tipo 1 × n chama-se vetor linha.

• Uma matriz do tipo m × 1 chama-se vetor coluna.

Exemplos 5.2.
 
  5
" # −2 1 " #
1 0 1 0 1 1
  h i
A= B =  0 1 C = D=  E= 3 0 2
 
−1 2 3 0 1 4
0 1
6

1. A matriz A é do tipo 2 × 2 (matriz quadrada).

2. A matriz B é do tipo 3 × 2.

3. A matriz C é do tipo 2 × 3.

4. A matriz D é do tipo 4 × 1 (vetor coluna).

5. A matriz E é do tipo 1 × 3 (vetor linha).

61
Álgebra Linear

Matrizes Especiais
Existem algumas matrizes que desempenham um papel especial na aritmética de matri-
zes. Nomeadamente a matriz a nula e a matriz identidade que desempenham o papel de
elemento neutro para a adição e para a multiplicação de matrizes, respetivamente, como
veremos mais à frente.
 
0 0 ··· 0
0
0 0 · · · 0
0
 
1. Matriz Nula 0m×n  ..
= ..
.. . . .. 
. .
(todas as entradas são 0) . .. 
0 0 0 ··· 0

 
d1 0 · · · 0
2. Matriz Diagonal  0 d2 · · · 0 
 
(matriz quadrada que tem zeros fora da D=. . .

. . . .. 
. . . .
diagonal principal)

0 0 · · · dn

 
1 0 ··· 0
3. Matriz Identidade 0 1 · · · 0
 
(matriz diagonal com  ..
In =  .. . . .. 
. . . .
d1 = d2 = · · · = dn = 1)

0 0 ··· 1

A matriz nula e a matriz identidade não são uma única matriz, mas sim uma família de
matrizes. Para cada tipo de matrizes existe uma matriz nula, e para cada tipo de matriz
quadrada existe uma matriz identidade. (Uma matriz diagonal é um caso ainda mais geral.)

De seguida vamos estudar as principais operações de matrizes. O nosso modelo serão


as operações com vetores, que nos vai servir da base para a definição das operações com
matrizes.

Adição de Matrizes
Só é possível somar matrizes do mesmo tipo. A soma de duas matrizes é feita somando
os elementos que estão na mesma posição, tal como é feito com vetores do mesmo “tamanho”.

Exemplo 5.3.    
1 0 0 0 −1 −2
A = −4 0 1 B = 2 0 2
   

0 2 0 0 1 1

62
Álgebra Linear

   
1+0 0−1 0−2 1 −1 −2
A + B = −4 + 2 0 + 0 1 + 2 = −2 0 3
   

0+0 2+1 0+1 0 3 1

Multiplicação por um Escalar


O produto de uma matriz por um escalar é uma matriz do mesmo tipo da primeira, que
se obtém multiplicando todas as entradas pelo valor escalar. Mais uma vez, este caso é
idêntico ao que acontece quando multiplicamos um escalar por um vetor.

Exemplo 5.4.    
1 0 0 2 0 0
O produto de 2 pela matriz A = −4 0 1 é a matriz 2A = −8 0 2 .
   

0 2 0 0 4 0

Teorema 5.5. Sejam A, B e C matrizes do tipo m × n e α, β ∈ R. São válidas as seguintes


propriedades.

1. A + B = B + A (comutatividade)

2. A + (B + C) = (A + B) + C (associatividade)

3. Existe uma única matriz 0 do tipo m × n tal que A + 0 = A. (elemento neutro da


soma)

4. Para cada matriz A existe uma única matriz −A = (−1)A tal que A + (−A) = 0.
(elemento simétrico)

5. α(βA) = (αβ)A (associatividade do produto por escalares)

6. (α + β)A = αA + βA (distributividade)

7. α(A + B) = αA + αB (distributividade)

Nota. A diferença entre duas matrizes do mesmo tipo pode definir-se à custa da adição e
da multiplicação por −1:
A − B := A + (−1)B.

Antes de definirmos o produto de matrizes, vamos relembrar como se calcula o produto


escalar de vetores. O produto de matrizes de um vetor linha por um vetor coluna é uma

63
Álgebra Linear

matriz 1 × 1 em que a única entrada tem exatamente o valor do produto escalar desses dois
vetores.

Produto Escalar de Vetores


O produto escalar do vetor a = (a1 , a2 , · · · , an ) pelo vetor b = (b1 , b2 , · · · , bn ) é
n
X
< a, b >= a1 b1 + a2 b2 + · · · + an bn = ai bi .
i=1

Se considerarmos a como vetor linha, e b como vetor coluna, definimos o produto das
matrizes  
b1
 b2 
h i  
a = a1 a2 · · · an e b =  . 
 .. 


bn
como sendo a matriz 1 × 1 em que a única entrada é o valor < a, b >.
" n
#
X
a b = [a1 b1 + a2 b2 + · · · + an bn ] = ai b i
i=1

Multiplicação de uma Matriz por um Vetor Coluna


Sejam agora A uma matriz m×n; L1 , L2 , · · · Lm as suas linhas e b um vetor coluna n×1.

A multiplicação da matriz A pelo vector coluna b é um vetor coluna do tipo m × 1, onde


o elemento na linha i é o valor do produto interno da linha i, Li , pelo vetor b:
 
< L1 , b >
 < L2 , b > 
 
Ab =  .. .
.
 
 
< Lm , b >

Exemplo 5.6.    
2 4 −2 −1
A= 4 9 −3 b= 2 
   

−2 −3 7 2

   
2 × (−1) + 4 × 2 + (−2) × 2 2
Ab =  4 × (−1) + 9 × 2 + (−3) × 2  =  8 
   

(−2) × (−1) + (−3) × 2 + 7 × 2 10

64
Álgebra Linear

Multiplicação de Matrizes
Sejam agora A uma matriz m×n como anteriormente, B uma matriz n×p e C1 , C2 , · · · Cp
as suas colunas. O produto AB é uma matriz m × p, onde o elemento na posição (i, j),
i.e. na linha i e coluna j, é igual ao produto escalar da linha i de A com a coluna j de B,
< Li , Cj >.

Se designarmos por aij e por bij os elementos na posição (i, j) de A e B, respectivamente,


n
X
então < Li , Cj >= aik bkj .
k=1

O produto de duas matrizes só está definido quando o número de colunas da primeira matriz
é igual ao número de linhas da segunda.
   
1 2 3 3 2
Exemplo 5.7. Consideremos A = 4 5 6, do tipo 3 × 3, e B = −5 1, do tipo 3 × 2.
   

7 8 9 8 0
Então o produto de A por B está definido e
   
1 × 3 + 2 × (−5) + 3 × 8 1×2+2×1+3×0 17 4
AB = 4 × 3 + 5 × (−5) + 6 × 8 4 × 2 + 5 × 1 + 6 × 0 = 35 13 .
   

7 × 3 + 8 × (−5) + 9 × 8 7×2+8×1+9×0 52 22

O produto BA não está definido, pois o número de colunas de B é diferente do número


de linhas de A.

Teorema 5.8. Sejam A, B, C e D matrizes, α ∈ R. São válidas as seguintes igualdades


sempre que as multiplicações estiverem definidas.

1. A(BC) = (AB)C (associatividade)

2. A(B + C) = AB + AC (distributividade à esquerda)

3. (B + C)D = BD + CD (distributividade à direita)

4. α(AB) = (αA)B = A(αB)

5. Se A é uma matriz m × n, então

AIn = A e Im A = A. (elemento neutro)

Nem todas as propriedades das operações com números reais são válidas para as opera-
ções com matrizes, em particular o produto de matrizes não é comutativo.

65
Álgebra Linear

Matrizes Invertíveis

Definição 5.9. Uma matriz quadrada A, de ordem n, é invertível se existe uma matriz B
(quadrada de ordem n) tal que
AB = In = BA.
Se existir, essa matriz é única, designa-se por inversa de A e denota-se por A−1 .

Nem toda a matriz quadrada tem inversa, no entanto se uma matriz quadrada tiver
inversa de um dos lados, então é invertível. O próximo teorema diz exatamente isso.

Teorema 5.10. Seja A uma matriz quadrada.

1. Se B é uma matriz quadrada tal que BA = I, então B = A−1 .

2. Se B é uma matriz quadrada tal que AB = I, então B = A−1 .

Matriz Invertível de ordem 2


" #
a b
Uma matriz A = é invertível se e só se ad − bc 6= 0.
c d
Neste caso a sua inversa é
" #
−1 1 d −b
A = .
ad − bc −c a

Exemplo 5.11.
" #−1 " # " #
5 2 1 3 −2 3 −2
= =
7 3 5 × 3 − 2 × 7 −7 5 −7 5

Nota. Ao valor ad − bc chama-se determinante da matriz A. O determinante para matrizes


quadradas de ordem superior também se pode definir, no entanto não o faremos no nosso
curso.

Teorema 5.12. Sejam A e B matrizes invertíveis e α 6= 0.

1. A matriz AB é invertível e (AB)−1 = B −1 A−1 .

2. A matriz αA é invertível e (αA)−1 = α1 A−1 .

66
Álgebra Linear

Transposta de uma Matriz

Definição 5.13. A transposta da matriz A é a matriz que resulta de A, escrevendo as linhas


como colunas (ou as colunas como linhas) pela mesma ordem. Esse matriz designa-se por
At .

Se A for do tipo m × n, então a matriz transposta de A, At , é do tipo n × m.

 
"# 1 5
1 2 3 4 2 6
Exemplo 5.14. A = At = 
 

5 6 7 8 3 7
4 8

Definição 5.15. Uma matriz quadrada é simétrica se At = A.

Proposição 5.16. Sejam A e B duas matrizes, α ∈ R. São válidas as seguintes proprieda-


des:

1. (At )t = A.

2. (A + B)t = At + B t .

3. (αA)t = αAt .

4. (AB)t = B t At .

5. Se a matriz A é invertível, então At é invertível e (At )−1 = (A−1 )t .

6. Se a A é invertível e simétrica, então A−1 também é simétrica.

Sistemas de Equações Lineares


Um sistema de equações lineares do tipo m×n, isto é com m equações e n incógnitas, é
um conjunto de equações lineares da forma



a11 x1 + a12 x2 + · · · + a1n xn = b1

a x + a x + · · · + a x

= b2
21 1 22 2 2n n
.. ,


 .


am1 x1 + am2 x2 + · · · + amn xn = bm

onde os valores aij e bi são constantes e as variáveis xj são as incógnitas do sistema.

67
Álgebra Linear

Forma Matricial
Usando o produto de matrizes, um sistema de equações lineares pode ser escrito como
uma equação matricial
    
a11 a12 · · · a1n x1 b1
 a21 a22 · · · a2n   x2   b2 
    
 . .. .. 
 . ..  .  =  . .
.   ..   .. 
   
 . . .
am1 am2 · · · amn xn bm

Ou seja, o sistema pode ser escrito na forma Ax = b, onde:

• a matriz A é uma matriz m × n, e é designada por matriz do sistema ou matriz dos


coeficientes;

• o vetor coluna x é uma matriz n × 1 e é o vector das incógnitas;

• o vetor coluna b é uma matriz m × 1 e é o vector dos termos independentes.

O conhecimento da inversa de uma matriz, quando existe, permita resolver um sistema


de equações lineares através de uma simples multiplicação de matrizes.

Teorema 5.17. Se A é uma matriz invertível de ordem n, então para cada vector b do tipo
n × 1, o sistema Ax = b tem uma e uma única solução, nomeadamente x = A−1 b.

Mas nem todos os sistemas têm uma solução única.

Definição 5.18. Os sistemas lineares podem ser classificados como:

(i) impossíveis (os que não têm soluções);

(ii) possíveis e determinados (têm uma única solução);

(iii) possíveis e indeterminados (têm uma quantidade infinita de soluções).

Já vimos uma maneira simples de resolver os sistemas possíveis e determinados quando


a matriz do sistema é invertível.
De seguida vamos ver como achar uma solução para um sistema impossível. Claro
que sendo um sistema impossível não tem solução, o problema que vamos estudar a seguir
consiste em achar a melhor solução possível. Existem várias alternativas para definir o que é
a “melhor” solução, na linguagem de funções o melhor é o mínimo de uma função (de várias
variáveis). O método que vamos usar para determinar a melhor solução baseia-se na forma
matricial do sistema.

68
Álgebra Linear

5.2 Método dos Mínimos Quadrados


Sejam A uma matriz do tipo m × n e b um vector m × 1.
Se um sistema Ax = b for impossível, não existe nenhum vector x n × 1 que satisfaça
a igualdade Ax = b. No entanto, podemos procurar os vetores x que tornem mínima a
distância entre Ax e b, isto é, a norma kAx − bk.

Definição 5.19. Um vector x do tipo n × 1 é solução no sentido dos mínimos quadrados


do sistema Ax = b se

kAx − bk = min{kAx − bk : x é um vetor n × 1}.

Para determinar a solução no sentido dos mínimos quadrados temos que achar o mínimo
da função de n variáveis f (x1 , · · · , xn ) = kAx − bk, que é equivalente a determinar o mínimo
da função g(x1 , · · · , xn ) = kAx − bk2 . No entanto como já foi dito anteriormente, vamos
usar a forma matricial do sistema para calcular essa solução.

Teorema 5.20. Sejam A uma matriz do tipo m × n e b um vetor m × 1. Então o sistema


Ax = b tem sempre solução no sentido dos mínimos quadrados.
O vetor x é solução no sentido dos mínimos quadrados de Ax = b se e só se é solução
do sistema (At A)x = At b.

Se o sistema Ax = b é possível, então a solução o sistema (At A)x = At b tem exatamente


a(s) mesma(s) solução(ões).
Portanto, para calcularmos uma solução no sentido dos mínimos quadrados de Ax = b
apenas temos de resolver o sistema At Ax = At b. Notemos que a matriz At A é simétrica.

Definição 5.21. O erro da solução aproximada, no sentido dos mínimos quadrados, é o


valor de kAx − bk, onde x é (um)a solução no sentido dos mínimos quadrados de Ax = b.


  
1 5 3
Exemplo 5.22. Sejam A =  2 −2 e b = 2.
   

−1 1 5
O sistema Ax = b é impossível. Para achar a solução no sentido dos mínimos quadrados
resolvemos o sistema:

   
" # 1 5 " # 3
1 2 −1  1 2 −1  
At Ax = At b ⇔  2 −2 x = 2 ⇔

5 −2 1 5 −2 1
−1 1 5

69
Álgebra Linear

" # " # " #


6 0 2 1/3
x= ⇔x=
0 30 16 8/15

O erro desta solução é


   
1 5 " # 3
 1/3
kAx − bk = k  2 −2 − 2 k =
  
8/15
−1 1 5

     
3 3 0
p
k −2/5 − 2 k = k −12/5 k = (12/5)2 + (24/5)2 ≈ 5.36
     

1/5 5 −24/5

Isto significa que o mínimo da função


g(x1 , x2 ) = kAx − bk2 = (x1 + 5x2 − 3)2 + (2x1 − 2x2 − 2)2 + (−x1 + x2 − 5)2 é atingido
quando x1 = 1/3 e x2 = 8/15.

Há vários problemas em que o objectivo passa pelo determinação de uma função


y = f (x) que se ajuste a um conjunto de dados experimentais da melhor maneira pos-
sível. Normalmente pretende-se que o gráfico da função seja tão simples quanto possível,
como uma reta ou uma parábola.
Vamos começar por estudar como se calcula a reta de regressão linear.

Regressão Linear
Queremos determinar a recta y = mx + b que melhor se ajusta a um conjunto de pontos
do plano: (x1 , y1 ); (x2 , y2 ); · · · ; (xn , yn ).

Substituindo os valores dos pontos na equação da reta, obtemos um sistema linear com
n equações (uma por cada ponto) e duas incógnitas, m e b.
    
 m x1 + b = y1 x1 1 y1
 " #  
 x2 1 m  y2 

 mx + b = 
2 y2
⇔ . .
 . . b
 = ..
.


 ···  . .  .

m xn + b = yn xn 1 yn

Se os pontos (x1 , y1 ); (x2 , y2 ); · · · ; (xn , yn ) não forem colineares (ou estiverem sobre uma
reta vertical), o sistema é impossível. Neste caso podemos procurar a reta que melhor se
aproxima dos pontos no sentido dos mínimos quadrados.

70
Álgebra Linear

Exemplo 5.23. Determinemos a reta y = mx + b que melhor se ajusta, no sentido dos


mínimos quadrados, aos pontos (1, 2), (2, 2) e (3, 4).

    
 m + b = 2 1 1 " # 2
 m

2m + b = 2 ⇔ 2 1 = 2
  
 b
3m + b = 4 3 1 4

O sistema é impossível. A solução no sentido dos mínimos quadrados é a solução do


sistema    
" # 1 1 " # " # 2 " #" # " #
1 2 3   m 1 2 3   14 6 m 18
2 1 = 2 ⇔ = .
1 1 1 b 1 1 1 6 3 b 8
3 1 4

Resolvendo o sistema obtém-se que m = 1 e b = 2/3, e portanto a reta que melhor se


ajusta, no sentido dos mínimos quadrados, aos pontos dados tem equação y = x + 2/3.

Erro na Regressão Linear


O cálculo do erro faz-se, como no caso geral, calculando a norma da diferença entre os
valores estimados e os valores reais, ou seja o erro é
   
y1 m x1 + b
 y2   m x2 + b 
   
k .  −  ..  k,
.
  
.  .


yn m xn + b
onde m e b são os valores obtidos na solução no sentido dos mínimos quadrados.

No exemplo anterior, o erro é


   
2 1 + 2/3

k 2 − 2 + 2/3 k = 6/3 ≈ 0.82
   

4 3 + 2/3

Graficamente, o erro é a norma do vetor em que as coordenadas são o módulo da diferença


entre a ordenada de cada ponto (xi , yi ) e a ordenada do ponto com a mesma abscissa da
reta de regressão linear, |yi − (mxi + b)|.

Nota. A reta y = mx+b serve para estimar o valor de y em função de x, mas não o contrário
uma vez que o erro é medido na variável y.
Para estimar o valor de x em função de y é preciso calcular a reta x = ny + a, que só
por coincidência será a mesma.

71
Álgebra Linear

Erro medido na variável y. Erro medido na variável x.

Regressão Quadrática
O ajuste de uma curva a um conjunto de pontos não precisa de ser feito por uma
reta. Podemos, por exemplo, usar uma parábola de equação y = ax2 + bx + c (regressão
quadrática). Neste caso as incógnitas que é preciso determinar são a, b, e c.

Exemplo 5.24. Determinar a parábola y = ax2 + bx + c que melhor se ajusta, no sentido


dos mínimos quadrados, ao conjunto de pontos {(0, 0), (1, 1), (2, 3), (−1, −1)}. Vamos ter
um sistema com 4 equações e 3 incógnitas, substituindo na equação da parábola x e y pela
ordenada e pela abscissa de cada um dos pontos para obter as quatro equações.

 
a 02 +
   
b 0+ c = 0 c = 0 0 0 1   0
a

 

2
 
 a1 + b 1+ c = 1  a+b+c = 1 1 1
 1    1 
 
⇔ ⇔  b =  

2
 a2 + b 2+ c = 3  4a + 2b + c = 3 4 2 1 3
c

 

2
−1 a−b+c −1 1 −1 −1
 
a (−1) + b (−1)+ c = = 1

A solução no sentido dos mínimos quadrados deste sistema é a solução do sistema:

   
  0 0 1     0     
0 1 4 1  a 0 1 4 1   18 8 6 a 12
 1 1 1     1 

0 1 2 −1    b  = 0 1 2 −1   ⇔  8 6 2  b  =  8 
     
4 2 1 3
1 1 1 1 c 1 1 1 1 6 2 4 c 3
1 −1 1 −1

Resolvendo o sistema obtém-se que a = 41 , b = 21


20
e c = − 20
3
, portanto a parábola
que melhor se ajusta, no sentido dos mínimos quadrados, aos pontos dados tem equação
x2 21x 3
y= + − .
4 20 20

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Referências
[1] J. Stewart, Cálulo – Volumes I e II, 5ªed., Thomson Learning, São Paulo, 2007.

[2] A. P. Santana, J. F. Queiró, Introdução à Álgebra Linear, Gradiva, Lisboa, 2010.

[3] Dennis G. Zill, Equações Diferenciais com aplicações em Modelagem, Cengage


Learning Editores, 2003.

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