Biomecanica e Comportamento em Equinos de Trabalho
Biomecanica e Comportamento em Equinos de Trabalho
Biomecanica e Comportamento em Equinos de Trabalho
Mestrado 2019
Orientadora:
Prof.ª Drª. Paula Gomes Rodrigues
Co-orientadora:
Prof.ª Dr.ª Kátia de Oliveira
SÃO CRISTÓVÃO – SE
2019
FICHA CATALOGRÁFICA ELABORADA PELA BIBLIOTECA CENTRAL
O
1. Zootecnia. 2. Equinos - Biometria muscular. 3.
Cinemática. 4. Etologia equina. 5. Equinos - Treinamento
funcional. I. Rodrigues, Paula Gomes orient. II. Título
CDU: 636.1:591.5
“Pra quem sempre sofreu hoje em dia é feliz: fé em Deus;
Pra quem não alcançou tudo que sempre quis: fé em Deus;
Pra quem ama, respeita e crê, e pra aquele que paga pra ver:
Tenha fé, vai na fé, nunca perca a fé em Deus.”
AGRADECIMENTOS
Agradeço primeiramente a Deus, pela força diária, saúde e principalmente fé, para eu trilhar
a minha jornada e realizar todos os meus sonhos.
À minha família, minha base de tudo. Meus pais: Maria luz da minha vida e Guilherme (in
memoriam) que sempre foi o maior incentivador dos meus estudos. Minha família pé vermelho, que
mesmo com a distância sempre estiveram torcendo por mim e felizes por cada conquista alcançada.
Meu noivo Victor por todo amor, respeito e incentivo desde o 1º período da graduação.
À minha orientadora Paula Rodrigues, pelo acolhimento e ajuda desde a graduação, por me
guiar até aqui. À minha co-orientadora Kátia, por toda ajuda, pelos conhecimentos passados e por
nos apresentar essa técnica que pode melhorar a vida daqueles que mais amamos: os cavalos.
Ao professor Anselmo por toda a ajuda e parceria que foi de extrema importância para a
realização desse projeto.
À CAPES com o auxílio de bolsa de estudos, sem a qual não seria possível a realização desse
estudo.
À EPMon pela parceria de sempre e por ceder o espaço e os animais para a realização desse
trabalho, foi a base de tudo. Gostaria de agradecer a todos os envolvidos, a todos os polícias que
participaram do projeto respondendo os questionários, ao Major S. Junior, Ten Célio, Sgt Leite, Sgt
Flávio e Cabo Santana. Em especial, Sgt. Adicley e Cabo Clistenes por todo auxílio que foi
fundamental para esse estudo e pela amizade que construímos.
Por último e não menos importante, a todos meus bichinhos: Boquim, Destaque, Fantasma,
Feroz, Fulgaz, Lady, Sankal, Saturno, e em especial, Ativo, Dragão, Flexa, Holifield, Imperador,
Monterey, Slash e Shakira, que me proporcionaram uma convivência incrível durante 3 meses e sem
vocês não seria possível a realização desse trabalho. Todo o meu carinho a vocês.
SUMÁRIO
Página
RESUMO ..................................................................................................................................................... i
ABSTRACT ................................................................................................................................................. ii
LISTA DE TABELAS ................................................................................................................................. iii
LISTA DE FIGURAS .................................................................................................................................. iv
LISTA DE ABREVIATURAS...................................................................................................................... v
1. INTRODUÇÃO ....................................................................................................................................... 1
2. REVISÃO DE LITERATURA................................................................................................................. 3
2.1 Anatomia funcional dos equinos ............................................................................................................ 3
2.1.1 Sistema esquelético ............................................................................................................................. 3
2.1.2 Sistema muscular ................................................................................................................................ 5
2.2 Avaliação ultrassonográfica da musculatura ........................................................................................... 7
2.3 Biomecânica em equinos........................................................................................................................ 9
2.4 Comportamento de equinos .................................................................................................................11
2.4.1 Relação entre agressividade e dor crônica .........................................................................................12
2.5 Exercícios funcionais terapêuticos .........................................................................................................13
3. REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS ....................................................................................................17
CAPÍTULO 1 .............................................................................................................................................22
1.1RESUMO ..............................................................................................................................................23
RESUMO ...................................................................................................................................................23
1.2ABSTRACT ..........................................................................................................................................24
1.3 INTRODUÇÃO ....................................................................................................................................25
1.4 MATERIAL E MÉTODOS ...................................................................................................................27
1.5 RESULTADOS ....................................................................................................................................35
1.6 DISCUSSÃO ........................................................................................................................................37
1.7 CONCLUSÕES ....................................................................................................................................43
1.8 REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS ...................................................................................................44
RESUMO
i
ABSTRACT
FIDÊNCIO, Camila Fernanda. Functional exercises in the epaxial musculature, biomechanics
and behavior in work horses. Sergipe: UFS, 2019. 58p. (Dissertation - Master in Animal Science).
The use of functional exercises improves flexibility and stimulates muscle strengthening, making
muscles better prepared for physical activities and promoting a better quality of life for animals. The
objective was to evaluate the effectiveness of the application of a functional training program on
epaxial musculature, biomechanics and behavioral changes in working horses. The experiment was
carried out in the Mounted Police Squad of the Military Police of the State of Sergipe (Aracaju / SE).
Sixteen horses were used, with a mean weight of 418 ± 50 kg, BCS of 5.09 ± 0.71 and 14.0 ± 3.5
years of age. These animals were randomly assigned to two experimental groups: submitted (n = 8)
or not (n = 8) to the functional exercises. The exercises were performed three times a week for three
months, and consisted of techniques of dynamic mobilization, reflexive mobilization, dynamic
imbalance and passive stretching. Data from all variables were collected at the beginning and end of
the study. The variables collected were: muscular biometry, linear kinematic analysis and behavior.
The depth of the Longissimus dorsi muscle on the left side (LDL) and right (LDR) and total cross
section area of the Musculus multifidus, left side (MML) and right (MMR) were evaluated. For the
kinematic evaluation of the gait, the animals were filmed for determination of stride length (CPp) for
the walk (SLw) and trot (SLt), and tracking distance to the walk (TDw) and trotting (TDt). The
behavioral evaluation consisted in the application of questionnaires to the horsemen / amazons that
formed the sets with the animals, referring to the temperament of the animal before, during and after
patrolling. An increase (P <0.05) was observed in the total cross-sectional area of MML and MMR
in the animals submitted to functional exercises. SLw and SLt were higher (P <0.05) in horses
submitted to functional training. The TDw was positive for both treatments, that is, the animals
performed the overtracking, however, the value of TDw was higher (P <0.05) in the animals
submitted to functional training. The TDt was negative for both treatments, that is, the animals
performed the undertracking, being the highest values observed in the horses submitted to the
training. Less (P <0.05) drowsiness and lower stubbornness were observed in the animals submitted
to functional exercises. It was concluded that the functional training promotes hypertrophy in
Musculus multifidus, increases the length of the past, the distance of the past and also promotes
positive changes in the expression of the behavior of the animals submitted to the exercises, which
were less sleepy and stubborn during the day of job.
ii
LISTA DE TABELAS
Tabela 1 - Média e desvio padrão da espessura (cm) do Longissimus Dorsi e área transversal total
(cm2) do Musculus Multifidus, nos lados direito (D) e esquerdo (E) do corpo de equinos submetidos
ou não a treinamento funcional. ..................................................................................................... 35
Tabela 2 - Média e desvio padrão do comprimento (cm) da passada ao passo (CPp) e ao trote (CPt)
e da distância (cm) da passada ao passo (DPp) e ao trote (DPt) em equinos submetidos ou não a
treinamento funcional.................................................................................................................... 36
iii
LISTA DE FIGURAS
FIGURA 4 – Ilustração do exercício de equilíbrio dinâmico: spinning para o lado direito. ........... 30
iv
LISTA DE ABREVIATURAS
v
1. INTRODUÇÃO
A utilização de equinos em atividades de lazer, trabalho e esporte são comuns, e assim como
em atletas humanos, animais que realizam atividade física constante estão sujeitos a desordens
musculoesqueléticas (ALEMAN, 2008). A incidência dessas desordens é aumentada quando a
atividade física em questão não é realizada de forma correta, quando a intensidade dos
exercícios/trabalho é exagerada, nas ocasiões em que o cavaleiro ou amazona não possui um nível
mínimo de equitação ou até mesmo quando ocorre a utilização de equipamentos inadequados àquele
animal (CLAYTON, 2004; STUBBS e CLAYTON, 2008).
Estas desordens, quando não diagnosticadas logo no início ou quando não tratadas de maneira
adequada, acabam restringindo o movimento do animal devido ao estabelecimento de lesões
musculares que, com o passar do tempo, é responsável por causar grande desconforto físico ao animal
(CLAYTON, 2004; OLIVEIRA, 2017). Como consequência, o animal começa a apresentar uma
movimentação de baixa qualidade, desempenho atlético reduzido, claudicações, baixa capacidade de
concentração e vontade de trabalhar ou treinar reduzidas, resultando em uma diminuição no valor
comercial dos equinos, principal causa de perdas econômicas na equideocultura (HODGSON et al.,
2014).
Além disso, as dores musculares são capazes ainda de influenciar o comportamento dos
animais, tornando-os mais arredios e agressivos ao tentar defender-se de algo ou de alguma situação
que intensifica a sensação de desconforto (FUREIX et al., 2010). Na maioria das vezes, animais
classificados como agressivos acabam recebendo um manejo diferenciado ao longo do tempo, tais
como redução do tempo em liberdade e manipulação mais agressiva por parte dos tratadores, o que
acaba por piorar o comportamento inadequado dos animais sem resolver o problema efetivamente.
Apenas uma avaliação adequada poderá confirmar se o comportamento inadequado de um
determinado animal é decorrente de algum tipo de dor ou se é algo natural e inerente àquele indivíduo
(GOFF, 2016).
Para solucionar problemas musculares já estabelecidos e aumentar a proteção da musculatura
do animal contra lesões futuras é indicado a adoção de um programa de treinamento funcional. Este
programa consiste na realização de uma série de exercícios funcionais capazes de restaurar de forma
simples e não invasiva a funcionalidade de diversos grupos musculares, tornando-os mais flexíveis,
fortalecidos e preparados para realização de atividade física (STUBBS et al., 2011; GUIRRO et al.,
2012; OLIVEIRA, 2017). Com isso, os animais terão uma significativa melhora em seu bem-estar,
tornando-os mais dispostos e eficientes para realização de seu trabalho e/ou treinamento.
A ocorrência da maioria das alterações musculares pode ser verificada por meio de
ultrassonografia em tempo real. Com esta ferramenta é possível determinar a presença de atrofia e
1
assimetrias musculares, bem como a eficácia de terapias e/ou da utilização de exercícios físicos
específicos por meio da hipertrofia e recuperação do músculo em questão (MCGOWAN et al., 2007b;
RADAELLI et al., 2011; STUBBS et al., 2011).
Outra forma de avaliar a integridade funcional de equinos atletas é por meio da análise
cinemática. Esta avaliação permite relacionar o andamento do animal com possíveis transtornos
musculares, uma vez que o desconforto causado por lesões e restrições musculares, é responsável por
causar uma piora na movimentação do animal (PIERCY, 2013).
Entretanto, é essencial uma avaliação precisa da condição musculoesquelética do cavalo para
saber qual tratamento de exercícios será selecionado. A aplicação dessas técnicas requer aprofundado
conhecimento da anatomia e fisiologia do sistema musculoesquelético equino, bem como de todos os
métodos do treinamento e suas indicações para cada indivíduo em particular (GOOF, 2009).
Diante do exposto, objetiva-se com esse estudo avaliar a eficácia da aplicação de exercícios
funcionais sobre a biometria da musculatura epaxial, biomecânica e o comportamento em equinos de
trabalho.
2
2. REVISÃO DE LITERATURA
Além de proteger órgãos internos, a coluna contribui com a sustentação do peso, absorção de
impacto e promove flexibilidade (HIGGINS e MARTIN, 2012).
Outras estruturas, como as articulações, são responsáveis pela movimentação junto ao
esqueleto. As articulações são formadas quando há a união de um ou mais ossos e são classificadas
3
em fibrosas, cartilaginosas e sinoviais, sendo esta última de maior importância (GETTY, 1986;
ALVES, 2008). As articulações fibrosas apresentam os ossos conectados por tecido conjuntivo denso
e dispõem de pouca mobilidade; as articulações cartilaginosas conectam os ossos através de
cartilagem, permitindo poucos e limitados movimentos; e as articulações sinoviais conectam as
extremidades ósseas por meio de uma cavidade preenchida por fluido (líquido sinovial) e permitem
o movimento máximo (MCILWRAITH e VAN WEREEN, 2015).
A articulação sinovial apresenta grande estabilidade e evita que movimentos anormais sejam
realizados, reduz os impactos durante as atividades físicas, facilita a mobilidade e torna o atrito entre
os ossos praticamente inexistente devido a membrana sinovial que protege as extremidades ósseas.
Essa membrana produz o líquido sinovial que apresenta função lubrificante da articulação, e este é
responsável por evitar o atrito evitando que haja desgaste da mesma (DYCE et al., 2004).
No ponto de vista anatômico, as articulações sinoviais são classificadas como móveis,
permitindo o deslocamento do osso em três dimensões: flexão e extensão longitudinal
compreendendo o plano sagital, flexão lateral compreendendo o plano frontal, e os movimentos de
rotação. A direção desses movimentos depende da forma das superfícies articulares (ALVES, 2008).
Deste modo, a locomoção ideal dos cavalos ocorre quando não há restrição de movimento nas
articulações, ou seja, quando ocorre a perfeita contração e relaxamento dos músculos associados a
determinadas articulações, como, por exemplo, a articulação lombo-sacral (L6-S1) (OLIVEIRA,
2017). Essa articulação é responsável pela inclinação pélvica e colabora com a protração e retração
dos membros (CLAYTON, 2016). No ponto em que a coluna vertebral se liga com a pélvis encontra-
se a articulação sacro-ilíaca, é neste local que ocorre a transferência das forças de propulsão
estabelecidas pelo membro posterior para a coluna vertebral (HENSON, 2009).
Portanto, a restrição de movimento contribui para mudanças nas articulações prejudicando sua
funcionalidade e podendo promover o desenvolvimento de movimentos assimétricos (LILJEBRINK
e BERGH, 2010).
Assim, a estabilidade articular, a movimentação dos membros, a postura e a locomoção
dependem da ativação dos músculos. Os movimentos corporais, isto é, para frente, para os lados, para
trás ou até mesmo movimentos sem alteração de localização, são resultados de movimentos
coordenados de partes corporais individuais (ALVES, 2008). Estes movimentos dependem de grupos
funcionais de músculos, como acontece na locomoção dos cavalos em que os membros são movidos
devido à ativação desses músculos (KÖNIG e LIEBICH 2016).
4
2.1.2 Sistema muscular
O sistema muscular dos equinos corresponde a mais de 700 músculos (PILLINER et al.,
2009), que são importantes para a sustentação do corpo do cavalo e representam de 40 a 45% do peso
corporal total do animal (HODGSON et al., 2014). Os músculos são formados por fibras musculares
responsáveis por transmitir o movimento ao esqueleto ao realizar a contração e por tendões que são
responsáveis por unir o tecido muscular ao esqueleto e transferir a força gerada pela contração
(ALVES, 2008; KÖNIG e LIEBICH 2016).
As fibras musculares ficam agrupadas nos fascículos (pequenos feixes) e são revestidas pelo
perimísio. Acima do perimísio encontra-se o endomísio, tecido conjuntivo que reveste o músculo
(HINCHCLIFF et al., 2008). Na terminação desse tecido conjuntivo encontram-se os tendões (DYCE
et al., 2004).
A contração muscular ocorre pelo encurtamento das miofibrilas em que os filamentos de
actina deslizam sobre os de miosina. Esse processo tem início com a chegada de um impulso nervoso
até a fibra muscular na região da placa motora, causando a despolarização das células e fazendo com
que o cálcio ionizado armazenado no retículo sarcoplasmático das fibras musculares seja liberado nos
túbulos transversos. O cálcio ionizado, ao atingir a actina, desbloqueia seus sítios de ligação e permite
a ligação entre a actina e miosina. Neste momento, na presença de ATP, ocorre o encurtamento do
sarcômero e a contração muscular propriamente dita (KLEIN, 2014).
Os equinos apresentam, de forma geral, dois tipos de fibras musculares esqueléticas: fibras do
tipo I (vermelhas) e fibras do tipo II (brancas). As fibras vermelhas são classificadas como de
contração lenta dependentes do metabolismo aeróbico para produção de energia, são menos
susceptíveis a fadiga e, geralmente, são encontradas nos músculos estabilizadores. Já as fibras brancas
são classificadas como de contração rápida que utilizam o metabolismo glicolítico anaeróbico para
síntese de ATP de forma mais rápida, geralmente são encontradas nos músculos mobilizadores que
se fadigam mais rápido (DYCE, 2004). Os equinos possuem ainda outros tipos de fibras musculares,
como aquelas do tipo IIA e IIX, que possuem metabolismo intermediário quando comparadas às do
tipo I e II (DYCE, 2004; REGATIERI e MOTA 2012).
Os músculos responsáveis pela movimentação do esqueleto equino podem ser divididos em
grandes grupos, tais como: músculos do pescoço (Splenius, Rhomboideus, Serratus ventralis cervicis,
Sternocephalicus, Braquiocephalicus e Omotransversarius); músculos do cinturão torácico (Serratus
Thoracis, Pectoralis, Subclavius e Trapezius); músculos epaxiais (Musculus Multifidus, Longíssimus
Dorsi e Iliocostalis); músculos abdominais (Rectus, Transversus e Oblíquus internus e externus) e
sublombares (Iliopsoas e Psoas minor) e músculos pélvicos (Gluteus Medius e superficial, Bíceps
femoris, Semitendinosus, Semimembranosus, Tensor fascie latae e Gracilis) (STUBBS e CLAYTON,
2008).
5
Os músculos são nomeados de acordo com sua função ou de acordo com os lugares que estão
localizados, e podem ser apresentados em dois sistemas: superficiais e profundos. Os músculos
superficiais estão logo abaixo da pele, enquanto que os profundos encontram-se intrinsicamente
ligados às articulações, às vertebras e à parte óssea (PILLINER et al., 2009; OLIVEIRA, 2017).
O fortalecimento dos músculos do pescoço é importante para que o cavalo tenha um melhor
equilíbrio e distribuição de peso. O trabalho em conjunto da cabeça e pescoço permite que o animal
altere com maior facilidade o seu centro de gravidade. Quando a cabeça e o pescoço se abaixam, o
centro de gravidade se move para frente porque mais peso é transferido aos membros torácicos e, ao
contrário disso, quando a cabeça e o pescoço se levantam o centro de gravidade recua e mais peso é
deslocado aos membros pélvicos (PILLINER et al., 2009).
Ao considerar os músculos epaxiais, destaca-se o Longissimus Dorsi (LD), músculo
superficial de grande importância ao equino devido à sua destacada influência na extensão e flexão
da coluna vertebral (D’ANGELIS et al., 2007). O LD é o maior músculo presente no corpo do equino,
que se origina dos processos espinhosos do sacro, vértebras lombares, torácicas e asa do ílio. Em
conjunto com o Iliocostalis, o LD é capaz ainda de promover a flexão lateral do dorso.
Dentre a musculatura epaxial, o músculo classificado como profundo é o Musculus Multifidus
(MM). O mesmo desempenha uma função importante de estabilização da coluna ao atuar como a
principal fonte de ligação entre suas vértebras, por este motivo é também chamado de músculo
estabilizador (ALVES et al., 2007; STUBBS e CLAYTON, 2008; OLIVEIRA, 2017).
A região tóraco-lombar é responsável por fornecer sustentação ao dorso do cavalo e, além de
dar condições ao animal para que suporte melhor o peso do cavaleiro, esta capacidade é alcançada
por meio da ação do MM em conjunto com os músculos abdominais. Caso isto não ocorra devido ao
enfraquecimento destes grupos musculares, o LD começa a apresentar espasmos musculares devido
ao esforço excessivo que o mesmo passa a realizar (OLIVEIRA, 2017). Ao longo do tempo, o LD
acaba cedendo à pressão constante do cavaleiro sobre seu dorso e o animal começa a apresentar
lordose (CLAYTON et al., 2012).
Estes músculos podem sofrer alterações em seu tamanho, desde a hipertrofia ocasionada pelo
treinamento correto e constante, até a atrofia causada por patologias, uso de equipamentos e
treinamentos inadequados (TABOR, 2015).
Assim como em humanos, uma das principais causas de lombalgias em equinos é a atrofia do
MM. Hides et al. (2008), estudaram a lombalgia em humanos ao comparar MM de pacientes com ou
sem histórico de dor lombar crônica, e constataram que os pacientes com lombalgia possuíam a área
de seção transversal (AST) do MM significativamente menor quando comparados aos pacientes sem
lombalgia. Além disso, verificaram ainda que os pacientes com lombalgia apresentavam assimetria
lateral no músculo, com distribuição de dor unilateral ipsilateral ao de menor tamanho.
6
O MM, quando atrofiado, interfere na estabilização da coluna do cavalo e na habilidade de
seus movimentos e, mesmo que o animal apresente redução nos sintomas de dor na região, este
músculo pode não necessariamente apresentar regeneração e redução na atrofia, a menos que se
realizem exercícios de treinamento específico a fim de reativar e fortalecer esse músculo (STUBBS
e CLAYTON, 2008). Além da dor, um dos sinais de atrofia do MM é a presença de espasmos
musculares palpáveis no LD devido ao aumento de sua tensão ao tentar compensar a inativação do
MM (CLAYTON, 2016). Oliveira (2017) relatou a importância do MM em melhorar a qualidade do
desempenho de equinos atletas, principalmente em movimentos que necessitam de grande
transferência de força dos membros pélvicos para a coluna, movimentos estes, naturalmente
desestabilizadores.
O desenvolvimento muscular na região da garupa é importante para melhorar a locomoção do
cavalo através do aumento da protração dos membros pélvicos e uma maior flexibilidade. De acordo
com Hill e Crook (2010), a manipulação dos músculos caudais (glúteo superficial, semitendinoso,
semimembranoso e bíceps femoral) aumenta a protração passiva dos membros pélvicos, e esses
associados com uma maior retração dos membros torácicos promovem uma melhoria na flexibilidade
e na flexão lateral do corpo do cavalo.
Os membros torácicos apresentam função de controlar a impulsão da projeção do cavalo para
frente e age como amortecedores dando uma maior estabilidade na postura. Enquanto os membros
pélvicos são propulsores e responsáveis por mover o cavalo para frente geralmente em grande
velocidade (PILLINER et al., 2009; BIKNEVICIUS et al., 2004). Se esses membros apresentam um
alinhamento adequado, consequentemente o animal vai apresentar um maior equilíbrio e uma maior
agilidade na locomoção.
8
Através de outro estudo foi possível verificar a eficácia da utilização da US para medir a AST
do MM, Tabor (2014) observou um aumento no tamanho desse músculo em cavalos de corrida após
realização de exercícios de mobilização dinâmica durante 90 dias.
12
A dor pode ser expressa por duas formas: pelo componente sensitivo-discriminativo que é
quando o animal apresenta um estímulo aversivo a localização corporal, como a presença de
claudicação e sensibilidade ao local da dor; e componente afetivo-motivacional que é quando o
animal apresenta uma resposta emocional e mudança comportamental devido à dor, como a
agressividade e o fato de evitar alguma situação ou objeto (GOFF, 2016). Ou seja, muitas vezes um
equino é rotulado como agressivo ou teimoso quando, na verdade, o animal está apenas reagindo às
dores constantes que possui em determinada região do corpo.
De acordo com Fureix et al. (2010), a dor crônica no dorso é o problema de maior incidência
em equinos de esporte e, ao mesmo tempo, o menos compreendido clinicamente. Landman et al.
(2014) encontraram problemas no dorso em 32% de 805 equinos atletas avaliados quanto a presença
de dores crônicas. Já Fonseca et al. (2006) concluíram que 100% dos animais atletas da raça Quarto
de Milha avaliados apresentaram problemas nas vertebras tóraco-lombar após avaliação por meio de
ultrassom e termografia.
O efeito da dor crônica sobre o comportamento destes animais ainda é pouco estudado.
Contudo, é possível que a agressividade, teimosia, medo e até mesmo ansiedade sejam problemas
relacionados a algum tipo de desconforto, podendo refletir no desempenho atlético e no trabalho dos
animais no campo e em grandes centros urbanos.
A fisioterapia para cavalos, nesse caso os exercícios funcionais, pode ser positivo para
promover o bem-estar de cavalos que sofrem com lombalgias, além de trazer benefícios econômicos
ao seu proprietário aumentando a qualidade de vida do animal (TABOR, 2015).
15
Utilizar de técnicas de fortalecimento muscular e alongamentos são práticas essenciais que
irão trazer incontáveis benefícios ao animal, maximizando seu desempenho atlético e sua capacidade
de realizar determinado trabalho, além de poder proporcionar ainda um maior grau de bem-estar ao
animal.
O alongamento passivo corresponde ao elongamento das fibras musculares e ligamentos
promovendo aumento da flexibilidade e amplitude de movimento do pescoço, dorso ou membros e
reduzindo o risco de lesões de músculos e tendões (KANEPS, 2016; OLIVEIRA 2017). O
alongamento pode ser passivo ou ativo: o passivo consiste na aplicação de força a um determinado
segmento do corpo ou membro a fim de alongar os músculos relaxados além de seus comprimentos
normais de descanso (HAUSSLER, 2010). O alongamento ativo promove o alongamento no animal
por meio do uso de seus próprios movimentos, geralmente utiliza-se cenoura como petiscos para
indução de alongamentos do pescoço e tronco a fim de estimular o animal a aumentar sua flexão e/ou
extensão (STUBBS e CLAYTON, 2008). Os exercícios de alongamento passivo usualmente aplicado
são: protração, retração e cruzamento dos membros torácicos e pélvicos (GOFF, 2009; HAUSSLER,
2016).
Os exercícios de desequilíbrio dinâmico têm como objetivo melhorar o equilíbrio, estabilidade
e coordenação motora por meio de exercícios que induzem a contração muscular do animal em
resposta ao deslocamento de seu centro de gravidade durante um movimento. Isso pode ser obtido
pela aplicação de exercícios de recuo, caminhada sobre obstáculos e spinning (OLIVEIRA, 2017).
16
3. REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
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21
CAPÍTULO 1
22
1.1 RESUMO
RESUMO
23
1.2 ABSTRACT
The use of functional exercises improves flexibility and stimulates muscle strengthening, making
muscles better prepared for physical activities and promoting a better quality of life for animals. The
objective was to evaluate the effectiveness of the application of a functional training program on
epaxial musculature, biomechanics and behavioral changes in working horses. The experiment was
carried out in the Mounted Police Squad of the Military Police of the State of Sergipe (Aracaju / SE).
Sixteen horses were used, with a mean weight of 418 ± 50 kg, BCS of 5.09 ± 0.71 and 14.0 ± 3.5
years of age. These animals were randomly assigned to two experimental groups: submitted (n = 8)
or not (n = 8) to the functional exercises. The exercises were performed three times a week for three
months, and consisted of techniques of dynamic mobilization, reflexive mobilization, dynamic
imbalance and passive stretching. Data from all variables were collected at the beginning and end of
the study. The variables collected were: muscular biometry, linear kinematic analysis and behavior.
The depth of the Longissimus dorsi muscle on the left side (LDL) and right (LDR) and total cross
section area of the Musculus multifidus, left side (MML) and right (MMR) were evaluated. For the
kinematic evaluation of the gait, the animals were filmed for determination of stride length (CPp) for
the walk (SLw) and trot (SLt), and tracking distance to the walk (TDw) and trotting (TDt). The
behavioral evaluation consisted in the application of questionnaires to the horsemen / amazons that
formed the sets with the animals, referring to the temperament of the animal before, during and after
patrolling. An increase (P <0.05) was observed in the total cross-sectional area of MML and MMR
in the animals submitted to functional exercises. SLw and SLt were higher (P <0.05) in horses
submitted to functional training. The TDw was positive for both treatments, that is, the animals
performed the overtracking, however, the value of TDw was higher (P <0.05) in the animals
submitted to functional training. The TDt was negative for both treatments, that is, the animals
performed the undertracking, being the highest values observed in the horses submitted to the
training. Less (P <0.05) drowsiness and lower stubbornness were observed in the animals submitted
to functional exercises. It was concluded that the functional training promotes hypertrophy in
Musculus multifidus, increases the length of the past, the distance of the past and also promotes
positive changes in the expression of the behavior of the animals submitted to the exercises, which
were less sleepy and stubborn during the day of job.
24
1.3 INTRODUÇÃO
A utilização de equinos em atividades de lazer, trabalho e esporte são comuns, e assim como
em atletas humanos, animais que realizam atividade física constante estão sujeitos a desordens
musculoesqueléticas (ALEMAN, 2008). A incidência dessas desordens é aumentada quando a
atividade física em questão não é realizada de forma correta, quando a intensidade dos
exercícios/trabalho é exagerada, nas ocasiões em que o cavaleiro ou amazona não possui um nível
mínimo de equitação ou até mesmo quando ocorre a utilização de equipamentos inadequados àquele
animal (CLAYTON, 2004; STUBBS e CLAYTON, 2008).
Estas desordens, quando não diagnosticadas logo no início ou quando não tratadas de maneira
adequada, acabam restringindo o movimento do animal devido ao estabelecimento de lesões
musculares que, com o passar do tempo, é responsável por causar grande desconforto físico ao animal
(CLAYTON, 2004; OLIVEIRA, 2017). Como consequência, o animal começa a apresentar uma
movimentação de baixa qualidade, desempenho atlético reduzido, claudicações, baixa capacidade de
concentração e vontade de trabalhar ou treinar reduzidas, resultando em uma diminuição no valor
comercial dos equinos, principal causa de perdas econômicas na equideocultura (HODGSON et al.,
2014).
Além disso, as dores musculares são capazes ainda de influenciar o comportamento dos
animais, tornando-os mais arredios e agressivos ao tentar defender-se de algo ou de alguma situação
que intensifica a sensação de desconforto (FUREIX et al., 2010). Na maioria das vezes, animais
classificados como agressivos acabam recebendo um manejo diferenciado ao longo do tempo, tais
como redução do tempo em liberdade e manipulação mais agressiva por parte dos tratadores, o que
acaba por piorar o comportamento inadequado dos animais sem resolver o problema efetivamente.
Apenas uma avaliação adequada poderá confirmar se o comportamento inadequado de um
determinado animal é decorrente de algum tipo de dor ou se é algo natural e inerente àquele indivíduo
(GOFF, 2016).
Para solucionar problemas musculares já estabelecidos e aumentar a proteção da musculatura
do animal contra lesões futuras é indicado a adoção de um programa de treinamento funcional. Este
programa consiste na realização de uma série de exercícios funcionais capazes de restaurar de forma
simples e não invasiva a funcionalidade de diversos grupos musculares, tornando-os mais flexíveis,
fortalecidos e preparados para realização de atividade física (STUBBS et al., 2011; GUIRRO et al.,
2012; OLIVEIRA, 2017). Com isso, os animais terão uma significativa melhora em seu bem-estar,
tornando-os mais dispostos e eficientes para realização de seu trabalho e/ou treinamento.
A ocorrência da maioria das alterações musculares pode ser verificada por meio de
ultrassonografia em tempo real. Com esta ferramenta é possível determinar a presença de atrofia e
assimetrias musculares, bem como a eficácia de terapias e/ou da utilização de exercícios físicos
25
específicos por meio da hipertrofia e recuperação do músculo em questão (MCGOWAN et al., 2007b;
RADAELLI et al., 2011; STUBBS et al., 2011).
Outra forma de avaliar a integridade funcional de equinos atletas é por meio da análise
cinemática. Esta avaliação permite relacionar o andamento do animal com possíveis transtornos
musculares, uma vez que o desconforto causado por lesões e restrições musculares, é responsável por
causar uma piora na movimentação do animal (PIERCY, 2013).
Entretanto, é essencial uma avaliação precisa da condição musculoesquelética do cavalo para
saber qual tratamento de exercícios será selecionado. A aplicação dessas técnicas requer aprofundado
conhecimento da anatomia e fisiologia do sistema musculoesquelético equino, bem como de todos os
métodos do treinamento e suas indicações para cada indivíduo em particular (GOOF, 2009).
Diante do exposto, objetiva-se com esse estudo avaliar a eficácia da aplicação de exercícios
funcionais sobre a biometria da musculatura epaxial, biomecânica e o comportamento em equinos de
trabalho.
26
1.4 MATERIAL E MÉTODOS
A execução do projeto foi aprovada (protocolo 07/2017) pelo Comitê de Ética em Pesquisa
com Animais de Produção (CEPAP) da Universidade Federal de Sergipe e foi realizado segundo as
normas do Conselho Nacional de Controle de Experimentação Animal (CONCEA), de acordo com a
lei nº 11.794/2008.
27
sendo: ⅓ do total ofertado às 07:00h, ⅓ às 11:00h e ⅓ às 18:00h. Já o alimento concentrado era
fracionado em duas refeições diárias: metade às 04:00h e a outra metade às 14:30h.
Todos os animais foram submetidos ao mesmo regime de trabalho durante todo o período
experimental que consistia em 6 horas de patrulhamento/dia realizado duas vezes na semana. Nos
demais dias da semana os animais permaneceram em repouso no interior de suas baias, sem realização
de qualquer tipo de atividade física neste período.
1 2
FIGURA 2 - Ilustração do exercício para fortalecimento do cinturão torácico: 1 - região torácica com
curvatura normal; 2 - levantamento da região torácica durante estímulo.
28
Para o fortalecimento da musculatura epaxial foram aplicados exercícios de mobilização
dinâmica que consistiram em: extensão cervical; flexão cervical longitudinal (cabeça no peito, cabeça
entre os carpos, cabeça entre os cascos) e flexão cervical lateral (cabeça na espádua, cabeça na patela
e cabeça no jarrete) para os lados direito e esquerdo (Figura 3). Foram adotadas cinco repetições com
duração de cinco segundos cada. Estes exercícios foram realizados com o auxílio de um petisco
(cenoura) para que os animais assumissem a postura correta dos exercícios e se mantivessem na
posição ideal durante o tempo requerido.
2 3 4
5 6 7
FIGURA 3 - Ilustração dos exercícios de fortalecimento da musculatura epaxial: 1 – extensão do pescoço; 2
– cabeça no peito; 3 – cabeça entre os carpos; 4 – cabeça entre os cascos; 5 – cabeça na espádua; 6 – cabeça
na patela; 7 – cabeça no jarrete.
29
Para fortalecimento da musculatura pélvica foi realizado o exercício de desequilíbrio
dinâmico denominado spinning. Este exercício consistiu em encorajar o animal a realizar um pequeno
círculo ao passo de forma a cruzar seus membros pélvicos durante o movimento. Adotaram-se dez
voltas completas para cada lado, direito e esquerdo (Figura 4).
Para o alongamento passivo foram realizados exercícios de protração dos membros torácicos
e pélvicos e cruzamento dos membros torácicos (Figura 5). Foram realizadas 3 repetições com
duração de 30 segundos cada.
1 2 3
FIGURA 5 - Ilustração dos exercícios de alongamento do segmento apendicular: 1 – prostração do membro
anterior; 2 – protração do membro posterior; 3 – cruzamento dos anteriores.
FIGURA 6 - Imagem ilustrativa da avaliação ultrassonográfica dos músculos Longissimus Dorsi e Musculus
Multifidus no lado esquerdo (E) dos animais.
As avaliações ultrassonográficas foram realizadas nos lados esquerdo e direito do corpo dos
animais para que, desta forma, também fosse determinada a existência ou não de simetria muscular
no animal.
31
(OLIVEIRA et al., 2015). Para isto, uma régua de madeira de 1,0m de comprimento foi utilizada no
cenário das filmagens para calibração do programa e determinação das distâncias (MIYASHIRO,
2012).
O comprimento de passada foi definido como a distância percorrida por um mesmo membro
ao tocar no solo duas vezes consecutivas, neste caso considerou-se o membro posterior esquerdo
como referência (PROCÓPIO, 2005; MIYASHIRO, 2012) (Figura 7).
A distância da passada foi definida como a distância máxima obtida entre as pinças dos cascos
dos membros anterior e posterior, ambos do lado esquerdo, quando apoiados no solo sucessivamente
(Figura 8). Para análise de distância da passada foram adotadas três classificações: ultrapegada
(quando o casco do membro pélvico aterrissava a frente do local onde o casco torácico ipsilateral
estava anteriormente apoiado no solo) gerando valores positivos; sobrepegada (quando o casco do
membro pélvico aterrissava exatamente no local onde o casco torácico estava anteriormente) gerando
valores iguais a zero; e retropegada (quando o casco do membro pélvico aterrissava atrás do local
onde estava anteriormente o casco do membro torácico) gerando valores negativos, conforme descrito
por Oliveira et al. (2015).
32
Avaliação comportamental
O comportamento dos animais foi avaliado antes, durante e após o trabalho de patrulhamento,
uma vez ao mês, durante todo o período experimental. Para isso, foi aplicado um questionário aos
cavaleiros/amazonas que formavam os conjuntos com os animais do experimento. Os
cavaleiros/amazonas foram previamente treinados para que se familiarizassem com a definição de
cada comportamento.
O questionário foi adaptado de acordo com a metodologia descrita por Pessoa et al. (2016),
considerando os seguintes comportamentos:
Alerta: animal com pescoço e orelhas eretas direcionadas ao objeto e/ou pessoa de interesse;
Assustado: animal se assusta facilmente e/ou reage com medo a determinadas situações e/ou
objetos;
Curioso: animal demonstra interesse por objetos, pessoas ou animais que se aproximam, não há
medo nem agressividade;
Distraído: animal desvia a atenção para outras situações que não seja a colocação/retirada dos
equipamentos e comandos de equitação durante o trabalho;
Nervoso: animal excitado e de difícil controle, alterna os andamentos, pode ou não demonstrar
agressividade contra objetos, animais ou pessoas, apresenta mudanças bruscas de comportamento, dá
coices, murcha as orelhas e/ou tenta morder durante a colocação/retirada dos equipamentos;
Sonolento: animal cabisbaixo com olhos parcial ou totalmente fechados, podendo as orelhas
estarem posicionadas horizontalmente;
Teimoso: animal fica girando ao ser montado, tenta evitar a colocação ou retirada dos
equipamentos, durante o patrulhamento reluta em obedecer a determinados comandos, neste caso não
há sinais de medo ou agressividade;
As frequências de ocorrência de cada um dos sete comportamentos avaliados foram
determinadas e classificadas dentro de uma escala de 1 a 5, onde:
1 = NUNCA: tal comportamento nunca era observado;
2 = RARAMENTE: tal comportamento raramente era observado;
3 = OCASIONALMENTE: tal comportamento ocasionalmente era observado;
4 = FREQUENTEMENTE: tal comportamento era observado na maior parte do tempo;
5 = EXTREMAMENTE: tal comportamento era observado durante todo o tempo.
Análises estatísticas
Os dados obtidos foram avaliados estatisticamente pelo programa Statistical Analysis
Systems® (SAS, 2015). Os efeitos fixos do tratamento (com ou sem treinamento funcional),
33
características musculares, biomecânica e comportamental, foram analisados por meio de análise de
variância considerando o modelo misto (PROC MIXED) após teste de normalidade dos dados. Foi
considerado como erro aleatório o animal dentro de tratamento. As médias das características
musculares e biomecânica foram comparadas pelo teste F e as médias das características
comportamentais pelo teste de Student, considerando 5% de significância.
34
1.5 RESULTADOS
Tabela 1 - Média e desvio padrão da espessura (cm) do Longissimus Dorsi e área transversal total
(cm2) do Musculus Multifidus, nos lados direito (D) e esquerdo (E) do corpo de equinos submetidos
ou não a treinamento funcional.
35
Tabela 2 - Média e desvio padrão do comprimento (cm) da passada ao passo (CPp) e ao trote (CPt)
e da distância (cm) da passada ao passo (DPp) e ao trote (DPt) em equinos submetidos ou não a
treinamento funcional.
Características comportamentais
Os comportamentos de alerta, assustado, curioso, distraído e nervoso não diferiram entre os
tratamentos (P>0,05). Entretanto, os animais submetidos ao treinamento funcional apresentaram
menor sonolência e teimosia (P<0,05), como ilustrado na tabela abaixo (Tabela 3).
36
1.6 DISCUSSÃO
O Longissimus dorsi é considerado o músculo epaxial superficial mobilizador mais importante
do corpo do equino, sendo responsável ainda pela elevação e sustentação da cabeça (RITRUECHAI
et al., 2008). A posição em que se encontra na coluna do cavalo permite que este músculo controle o
movimento do dorso, além de apresentar funções na coluna vertebral de flexão lateral quando ativo
unilateralmente e extensão quando ativo bilateralmente (D’ANGELIS et al., 2007; RITRUECHAI et
al., 2008; PILLINER et al., 2009).
Durante a atividade física o LD é intensamente trabalhado. D’Angelis et al. (2007) avaliaram
doze cavalos puro sangue árabe submetidos a treinamento aeróbico durante 90 dias recebendo ou não
suplementação de creatina e verificaram que a hipertrofia do músculo ocorreu com ou sem a
suplementação de creatina, constatando a eficiência do treinamento e não da suplementação.
O resultado desse estudo corrobora com o achado de Oliveira et al. (2015). Esses autores não
observaram efeito significativo na espessura do LD ao comparar grupo de equinos de equoterapia
submetidos a exercícios de mobilização dinâmica (5,40 e 5,80 cm, no início e ao término do estudo
respectivamente), ginástica laboral (4,94 no início e 5,18 cm ao final do período experimental) e em
animais sedentários (5,26 e 5,02 cm, respectivamente no início e final das avaliações). Ou seja, pode-
se afirmar que os exercícios funcionais aplicados em ambos os estudos não foram eficientes em
promover uma mudança significativa na espessura do LD.
Ainda segundo estes autores, para promover uma alteração significativa no músculo diversos
fatores podem interferir nos resultados, tais como características individuais, tipo, intensidade e
duração da atividade física. A utilização dos cavalos deste trabalho em patrulhamento urbano pode
contribuir para que os animais estivessem mais propensos à uma atrofia muscular dorsal,
provavelmente isto ocorreu pelo fato dos militares passarem longas horas montados sobre esta região.
Segundo Clayton et al. (2010), os exercícios de mobilização dinâmica auxiliam de maneira
bastante efetiva no fortalecimento da musculatura epaxial, mais especificamente na musculatura
profunda, afirmação comprovada pelos resultados encontrados nesse estudo ao identificar um
aumento significativo na área transversal do MM.
O Musculus multifidus é um músculo profundo responsável por estabilizar a coluna vertebral.
Os músculos estabilizadores da coluna são inibidos pela dor, o que resulta em instabilidade das
articulações vertebrais e predispõe o animal à patologias dorso-lombares, por isso se torna importante
a realização de exercícios que ativem a funcionalidade do MM (STUBBS et al., 2011). De acordo
com McGowan et al. (2007), os músculos profundos são ativados no processo de reaprendizado
durante a reabilitação, obtido através da aplicação de exercícios estáticos e dinâmicos (atividades
indolores e controladas).
37
Resultados semelhantes ao presente estudo foram encontrados por outros pesquisadores.
Stubbs et al. (2011) realizaram exercícios de mobilização dinâmica em equinos durante cinco dias na
semana ao longo de 3 meses. Os autores observaram o aumento na área transversal do MM ao
comparar as medidas iniciais (9,1 e 9,2 cm², lado esquerdo e direito respectivamente) com as finais
(10,6 cm² para o lado esquerdo e 10,6 cm² para o lado direito).
Estes resultados foram semelhantes àqueles encontrados por Oliveira et al. (2015), que
também observaram aumento na área transversal do MM em animais submetidos a ginástica laboral
e mobilização dinâmica quando comparados a animais sedentários após 90 dias de exercícios. Já
Tabor (2015) observou aumento da área transversal do MM a partir de seis semanas após início de
treinamento com exercícios de mobilização dinâmica realizado durante cinco dias na semana ao longo
de 3 meses.
Os valores encontrados para a área transversal do MM foram menores quando comparados
àqueles obtidos por Stubbs et al. (2011) e Oliveira et al. (2015). Isto ocorreu, possivelmente, pelo fato
dos animais do presente estudo apresentaram um MM muito atrofiado devido ao seu tipo de trabalho,
incapaz de estimular o fortalecimento deste músculo, outro fator é a variação natural quanto ao
tamanho muscular entre animais e até mesmo nos diferentes níveis espinhais de cada indivíduo em
particular (MCGOWAN et al., 2007).
Estes resultados diferem de outra pesquisa em que o MM apresentou maior simetria após 90
dias de exercícios funcionais (STUBBS et al., 2011). O treinamento funcional em equinos que
apresentam assimetria muscular promove desenvolvimento muscular e propicia o estabelecimento de
simetria; em equinos que já apresentam simetria, o músculo atrofiado se desenvolve igualmente em
ambos os lados, como observado no presente estudo.
A atrofia muscular pode ser unilateral ou bilateral nos músculos epaxiais, sendo um sinal
clínico de dores lombares. Esse é um dos principais problemas encontrados em equinos atletas capaz
de reduzir seu desempenho atlético devido à menor amplitude dos movimentos e limitação da
flexibilidade (ALLEN et al., 2010; TABOR, 2015).
Em humanos, diversos estudos foram realizados utilizando ultrassonografia para identificar
atrofia unilateral e/ou bilateral, e os resultados encontrados constataram que pacientes sintomáticos
para lombalgia apresentavam atrofia no MM, sendo que as lombalgias eram sempre mais evidentes
no lado onde a atrofia era mais acentuada (HIDES et al., 1996; HIDES et al., 2008). Como não foi
encontrada diferença entre os lados direito e esquerdo dos músculos avaliados neste estudo, mas foi
observada mudança na musculatura para ambos os lados, é possível inferir que a atrofia muscular dos
animais avaliados fosse bilateral.
No entanto, mesmo com essas diferenças entre os trabalhos, em ambos os casos houve uma
hipertrofia significativa desse músculo.
38
Apesar de não ter sido verificado efeito significativo sobre a simetria da musculatura epaxial,
pode-se inferir que cavalos submetidos ao treinamento funcional tiveram alterações visuais na postura
de suas linhas dorsais (Figura 9).
D0 D60
D0 D60
D0 D90
FIGURA 9 - Alterações posturais na linha dorsal dos animais submetidos ao treinamento funcional.
39
possível aumentar a velocidade de movimento e o comprimento da passada ao diminuir a frequência
do passo (HINCHCLIFF et al., 2008; BACK e CLAYTON, 2013).
Quanto mais o cavalo for capaz de aumentar a velocidade e o comprimento do passo sem
aumentar a frequência, melhor será seu movimento (DVOŘÁKOVÁ et al., 2009). A velocidade
média pode aumentar à medida que se aumenta a retração do membro (HASANEINI et al., 2014).
A alteração no CP ao passo depende das alterações na protração e retração do membro
(OLIVEIRA et al., 2015). A retração e protração dos membros pélvicos estão relacionadas com a
flexibilidade e são dependentes da amplitude de movimento (flexão e extensão) da garupa, enquanto
os membros torácicos são dependentes da flexão e extensão da articulação do cotovelo com auxílio
da rotação e deslocamento da escápula (HILL e CROOK, 2010; CLAYTON et al., 2011; OLIVEIRA
et al., 2015). Portanto, a amplitude de movimento melhora com exercícios funcionais, sendo
necessárias atividades físicas que estimulem e fortaleçam a musculatura dessas regiões (CLAYTON
et al., 2011).
Exercícios de alongamento passivo são frequentemente usados para que os cavalos produzam
movimentos eficientes para melhorar elasticidade e flexibilidade, aliviar a dor, prevenir lesões e
melhorar o desempenho atlético. A flexibilidade determina a amplitude de movimento em uma
articulação ou grupo de articulações. Existem evidências que demonstram que o alongamento
aumenta a flexibilidade e que essa é a chave para praticamente todos os movimentos (FRICK, 2010).
De acordo com Haussler (2018) os exercícios de alongamento passivo dos membros apresentam
efeitos relativos sob o comprimento da passada e amplitude do movimento.
Em um estudo realizado por Hill e Crook (2010) observaram um aumento no CP ao realizarem
terapia de massagem nos músculos caudais do membro posterior em equinos. Diferente dos resultados
encontrados por Rose et al. (2009) quando avaliaram o CP ao passo e não observaram diferença após
realização de exercícios de alongamento durante três dias/semana ao longo de oito semanas, estes
autores utilizaram em cada sessão duas repetições de 10 e 20 segundos sucessivamente. Nesse estudo,
os exercícios de alongamento dos segmentos apendiculares foram eficientes em promover maior
aumento no CP.
Em outro estudo, Oliveira et al. (2015) realizaram exercícios de mobilização dinâmica e
ginástica laboral (extensão cervical, flexão cervical longitudinal e flexão cervical lateral, flexão
lateral da pélvis, caminhada sobre obstáculos, recuo e spinning) durante 90 dias. Estes autores
observaram diferença no CP ao passo no grupo submetido a ginástica laboral, valores superiores
comparado aos grupos submetidos somente aos exercícios de mobilização dinâmica e animais
sedentários.
Desta forma pode-se dizer que a execução de exercícios para o alongamento e fortalecimento
da musculatura dorsal é capaz de promover melhorias na cinemática linear dos equinos. Os resultados
40
encontrados por Oliveira et al. (2015) corroboram com aqueles obtidos neste trabalho, estes autores
também realizaram exercícios para os músculos epaxiais. Entretanto, foi adicionado ao programa de
treinamento com ginástica localizada sobre o músculo abdominal reto, para isso os animais foram
submetidos a caminhadas sobre obstáculo e recuo, obtendo maiores diferenças e valores de
comprimento de passada àqueles observados no presente estudo. Possivelmente o músculo abdominal
reto do equino promove maior protração pélvica e, consequentemente, um aumento no comprimento
da passada.
Já as alterações na DP dependem de alterações do CP em todos os andamentos (CLAYTON,
1995; PILLINER et al., 2009). A DP ao passo foi semelhante àquela encontrada por Oliveira et al.
(2015), estes autores concluíram que somente a ginástica laboral promoveu aumento da DP quando
comparada com a mobilização dinâmica e animais sedentários. Esses autores observaram valores
negativos na DP semelhante a esse estudo, indicando que ambos os tratamentos realizaram
retropegada.
As técnicas desses exercícios variam de acordo com a direção, amplitude, velocidade, duração
e a força aplicada, portanto a combinação de posições, técnicas e duração das sessões de alongamento
são difíceis de definir qual a mais eficaz para aumentar a amplitude de movimento (HAUSSLER,
2016). Há necessidade de mais pesquisas para melhor elucidar os benefícios do alongamento sobre a
cinemática dos equinos, e assim, promover melhoria na flexibilidade.
Os equinos são animais que apresentam aversão por coisas ou lugares que lhe causaram dor,
e, em decorrência disso, expressam respostas emocionais (TAYLOR et al., 2002). Essas respostas
podem ser comportamentos como agressividade, medo, teimosia ou ansiedade. No presente estudo,
os animais submetidos ao treinamento funcional apresentaram menor sonolência e teimosia quando
comparado ao outro grupo, ou seja, apresentaram-se mais receptivos às ajudas do cavaleiro.
A menor sonolência é um resultado positivo para animais de patrulhamento, pois esta
mudança comportamental reflete em uma maior atenção do animal aos comandos do
cavaleiro/amazona, maior disposição e rapidez em responder aos comandos. Muitas vezes um animal
é rotulado como teimoso erroneamente, sendo essa recusa do animal em obedecer a determinados
comandos uma forma de evitar uma sensação desagradável de dor. Segundo Dyson et al. (2018),
equinos que apresentam resistência aos comandos são classificados como problemáticos e, como
consequência, muitas vezes acabam sendo punidos e/ou expostos à treinamento ainda mais intenso.
Isso ocorre por falha do montador/treinador em reconhecer que a razão pela resistência do animal é a
dor, contudo, o reconhecimento da dor em animais é muito complexo e necessita de avaliações
comportamentais associadas com avaliações fisiológicas e de desempenho (WAGNER, 2010;
STUBBS et al., 2011).
41
Equinos com problemas vertebrais apresentavam comportamento de agressividade em relação
aos humanos (FUREIX et al., 2010). Isso demonstra que animais que sentem algum desconforto
podem demonstrar alterações comportamentais. Entretanto, é importante salientar que a dor é
subjetiva e os animais apresentam respostas individuais variadas ao expressá-la, sendo assim, difícil
de avaliar quando o animal está com dor sem um histórico prévio do seu comportamento e do seu
temperamento (GOFF, 2016).
Considerando estes fatores, os questionários aplicados no presente estudo foram respondidos
sempre pelo mesmo cavaleiro/amazona, uma pessoa que possui um convívio intenso e prolongado
com o animal avaliado. Além disso, os militares estão familiarizados com o comportamento do seu
conjunto, indicando que possuem grande capacidade de perceber qualquer alteração comportamental
que o animal possa apresentar.
Nenhum comportamento foi expresso de forma máxima em nenhum dos grupos
experimentais. Estes valores são similares aos encontrados por Kim et al. (2013), que avaliaram o
comportamento de 114 equinos do Instituto Nacional de Ciência Animal, e Gontijo et al. (2014) que
estudaram o temperamento de equinos da Cavalaria da Polícia Militar do Paraná utilizaram escore de
1 (menor intensidade) a 3 (maior intensidade).
Vale salientar a extrema importância da realização contínua e frequente dos exercícios
funcionais para que os benefícios alcançados relacionados à capacidade de suporte do dorso,
qualidade da passada e comportamento dos equinos não apresente um retrocesso.
42
1.7 CONCLUSÕES
Equinos na função de patrulhamento submetidos a um programa de treinamento funcional
desenvolvem hipertrofia da musculatura epaxial de sustentação da coluna, tornando-os mais
preparados para atividade física e promovendo melhorias na amplitude da passada. Além disso, a
realização de exercícios funcionais é capaz ainda de promover mudanças positivas na expressão do
comportamento dos animais, reduzindo a sonolência e teimosia ao longo do dia de trabalho.
43
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