BMPOggioni
BMPOggioni
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Rio de Janeiro
Mês de 2022
I
O PAPEL DAS FERRAMENTAS NO ENSINO DO DESENHO TÉCNICO
Aprovada por:
___________________________________
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Rio de Janeiro
Abril de 2022
II
Oggioni, Barbara de Macedo Passos
III
Dedicatória
IV
Agradecimentos
Não posso deixar de iniciar meus agradecimentos à minha família. Todas as minhas
conquistas, eu devo ao apoio incondicional que recebo de quem mais amo. Nesses dois
anos, em meio a uma pandemia, as aulas da especialização ficaram misturadas aos
desafios do isolamento dentro de casa. Só tenho a agradecer ao meu marido Robson
Oggioni, pela parceria e carinho, e aos meus filhos Robinho e Marina, pela compreensão
com os momentos de ausência.
Aos meus novos amigos, colegas dessa jornada: Mariana, Anderson, Carol, Rafaela,
David, Fernanda, Maria Cecília, Vinicius, Danielle. É uma felicidade ter encontrado
vocês em meu caminho. Toda parceria, apoio, união... essa pós foi melhor porque eu
tinha vocês ao meu lado, caminhando junto comigo!
V
RESUMO
RIO DE JANEIRO
ABRIL, 2022
VI
SUMÁRIO
INTRODUÇÃO ............................................................................................................... 1
5. REFERÊNCIAS ................................................................................................. 39
VII
LISTA DE ILUSTRAÇÕES
Figura 1 – Exemplo de desenho técnico a partir de ferramentas tradicionais ................ 9
VIII
INTRODUÇÃO
A Geometria Descritiva de Gaspar Monge, disciplina que tem por finalidade representar
as figuras do espaço no plano, de modo a estudar suas propriedades e a resolver
problemas relativos às mesmas com o auxílio da geometria plana (MACHADO, 1986),
fundamentou o ensino do desenho técnico das escolas de engenharia, design e
arquitetura no Brasil.
Segundo Soares (2007), o desenho técnico foi estruturado como uma disciplina
científica no mundo a partir do século XVIII, servindo como um suporte ao processo de
industrialização da sociedade. Dessa forma, como o autor destaca, o desenho técnico,
ao aliar o desenho geométrico (para fins de precisão e construção do traçado) com a
geometria descritiva (para a exata localização e correlação de pontos), formatou-se
como uma linguagem visual de caráter universal de comunicação das informações que
o fabricante necessita para a construção de um objeto.
Sua importância tornou-se tão grande para a representação gráfica de projetos que
todos os países industrializados regularam, por meio de normas técnicas oficiais e não
apenas acadêmicas, a sua elaboração (SOARES, 2007). No Brasil, a Associação
Brasileira de Normas Técnicas (ABNT) é a responsável pela padronização e
normalização do desenho técnico.
1
as décadas de 1990 e 2000. No contexto atual, novas tecnologias de modelagens
paramétricas e de design digital, já utilizadas no meio profissional, passam também a
influenciar a condução dessas disciplinas nos cursos de nível superior.
Entretanto, mesmo mais de vinte anos depois da entrada das tecnologias digitais na
expressão gráfica e com a consolidação de seu uso como ferramenta profissional para
engenheiros, arquitetos e designers, ainda restam dúvidas quanto ao uso de
ferramentas tradicionais e digitais no ensino.
Nas universidades brasileiras, de acordo com Sobral Filha e Barbosa (2013), como
decorrência das reformulações das disciplinas de representação gráfica, o conteúdo do
desenho técnico e de suas disciplinas teóricas de base vem sendo comprimido por
novas regras curriculares, pela diminuição da carga horária das disciplinas afins, pela
inserção das tecnologias computacionais, dentre outras questões. Contudo,
2
Os trabalhos encontrados nas principais revistas de expressão gráfica brasileiras1
discutem o uso do desenho à mão livre (AMARAL et al., 2019; CURTIS; ROLDO, 2015;
JACQUES et al., 2008; PALHACI, 1999; ROCHA et al., 2015; SILVA et al., 2009), o uso
de softwares gráficos de desenho e modelagem (ANDRADE; AMORIM; PEREIRA,
1993; BORGES; SOUZA, 2015; CELANI; VAZ; PUPO, 2013; LUCAS; FERREIRA, 2020;
SANTOS; DIAS; BRAIDA, 2020; TEIXEIRA et al., 2015) e de novas tecnologias, como
a prototipagem (CASTELAN; GOMEZ, 2017), no ensino de desenho técnico, mas o uso
de ferramentas tradicionais (esquadros, réguas, compasso) é, em geral, pouco
discutido, apesar de ainda ser utilizado em cursos de desenho técnico no ensino
superior.
A partir das análises das ementas das instituições, o relatório (ABRANTES; GRANADO,
2016) aponta um diagnóstico do ensino da representação gráfica, que inclui as
disciplinas de desenho básico, geometria descritiva e desenho técnico. Algumas das
observações, que representam o momento em que o relatório foi gerado, são
destacadas a seguir:
1
Revista Brasileira de Expressão Gráfica, Revista Educação Gráfica e Revista Educa Online
2
Os autores tratam cada campus da Universidade Estadual do Rio de Janeiro como uma
instituição, somando ao todo nove instituições analisadas.
3
As habilidades visuoespaciais são necessárias para a execução de diversas tarefas que
envolvem a percepção e manipulação de informações espaciais
(https://lndufmg.wordpress.com/projetos-realizados/cognicao-numerica/dificuldades-de-
aprendizagem-na-matematica-e-habilidades-visuoespaciais-papel-principal-ou-coadjuvante/)
3
• O ensino da Geometria Descritiva possui foco na capacidade de se representar
um objeto tridimensional, em vistas ortográficas, como base para o desenho
técnico. Não são abordados os aspectos mais teóricos sobre ponto, reta e
planos.
• O relatório constatou a importância do uso de modelos tridimensionais (modelos
físicos) de peças no ensino da geometria descritiva.
• Não se observou a prática exclusiva de ensino apenas via computador (somente
em uma universidade). Na maior parte das instituições, reforça-se a
necessidade e a importância da prática de rascunhos ou croquis à mão livre.
Observou-se também que o uso de ferramentas tradicionais de precisão
(esquadros, compassos, réguas) não é valorizado, embora sejam utilizados em
quase todas as instituições analisadas.
• O diagnóstico confirma a necessidade de os engenheiros aprenderem
habilidades para se expressarem graficamente via mão livre, já que a prática
profissional requer que o engenheiro elabore pequenos rascunhos e esboços.
• Nenhuma das instituições analisadas faz uso da impressão tridimensional (3D)
como ferramenta de apoio aos desenhos feitos nas disciplinas de
Representação Gráfica.
Das nove instituições analisadas, duas são universidades privadas e sete são públicas.
Desse quantitativo, somente uma universidade, privada, possui o ensino da
representação gráfica totalmente realizadas pelo computador. Em todas as outras, há a
utilização das ferramentas tradicionais e computacionais, sendo predominante a
quantidade de horas para o ensino com ferramentas tradicionais.
Diante do que foi exposto, o objetivo desse estudo é averiguar quais são as
características principais do ensino do desenho técnico com diferentes ferramentas
(tradicionais e digitais), visando facilitar a tomada de decisão do docente quanto aos
respectivos usos. Tem, portanto, como objetivos específicos:
4
3. Levantar os aspectos cognitivos inerentes à aprendizagem do desenho técnico.
Essa é uma pesquisa de caráter qualitativo e de cunho exploratório, realizada por meio
de levantamento da bibliografia de referência a respeito do tema. Sua relevância para a
área acadêmica está centrada na compreensão do impacto causado pelo uso das
ferramentas, tradicionais e digitais, no aprendizado do desenho técnico com o intuito de
orientar seus respectivos empregos.
Por fim, nas considerações finais apresentadas no capítulo 4, tem-se uma análise dos
dados explorados, sintetizados em três pontos que exercem efeitos relevantes na
escolha das ferramentas para o desenho técnico, destacando seus papéis para a
construção e o ensino. Além disso, são levantadas possibilidades de aprofundamento
desta pesquisa em trabalhos futuros.
5
1. DESENHO TÉCNICO COMO UM OBJETO INTERMEDIÁRIO DE PROJETO
O termo intermediário foi utilizado em seu sentido mais comum e neutro, para indicar
que um objeto está localizado entre vários elementos, vários atores ou entre estágios
sucessivos de trabalho (resultado intermediário), sem buscar qualificar como ele é
(JEANTET et al., 2008).
6
(CALLON, 1991 apud JEANTET, 1998). Bruno Latour avançou na tese de que os
objetos devem constituir um princípio epistemológico geral na sociologia (LATOUR,
1994 apud JEANTET, 1998) e Alain Jeantet e Dominique Vinck formataram o conceito
no âmbito do projeto (JEANTET, 1998; VINCK, 2013; VINCK; JEANTET, 1994).
De acordo com Vinck (2013), a consideração dos objetos passa pelo conhecimento das
pessoas e dos grupos (quem comanda, quem concebe, quem fabrica e quem utiliza),
das suas lógicas de ação e de suas práticas. Segundo Vinck, por trás de cada elemento
técnico, encontra-se um ou vários atores que se fazem de porta-vozes. Dessa forma, o
propósito dos objetos intermediários é melhorar a troca, para permitir que os pontos de
vista das diferentes profissões sejam expressos e que sejam feitos compromissos.
Quando o projeto é compartilhado entre diferentes projetistas, a circulação desses
objetos torna-se o local da construção (divisão e integração) da ação coletiva (VINCK;
LAUREILLARD, 1995).
7
de produção, manutenção, demonstração e venda etc. Em uso, uma série de
intermediários o tornam tangível ao mesmo tempo que o fazem existir de uma
maneira diferente a cada vez. Sua própria materialidade é uma das mediadoras
de sua presença (Lavoisy e Vinck, 1997, p. 17, tradução nossa)4.”
4
“Le dessin n’est pas un objet mort ; il n’a d’ailleurs de sens qu’en acte, em usage. Il est alors
éphémère et évanescent. Il n’existe que parce qu’on l’utilise et dépend de chaque usage qui en
est fait : enseignement, coordination, prescription d’un ordre de fabrication, maintenance,
démonstration et vente, etc. En usage, une foule d’intermédiaires le rend tangible en même temps
qu’elle le fait exister d’une manière chaque fois différente. Sa matérialité, elle- même, est un des
médiateurs de sa présence”.
8
projeção, rotação, rebatimento e estudo de seções (ULBRICHT, 1998 apud SILVA,
2001).
9
setores de projetos e a fabricação. Outro exemplo são os canteiros de obra na
construção civil que não possuem sistemas informatizados disponíveis para consulta
dessa documentação.
De acordo com Silva et al. (2013), a utilização dos sistemas CAD baseava-se
essencialmente na representação de projeções ortogonais com múltiplas vistas,
substituindo o trabalho de desenho técnico em prancheta, com a possibilidade de se
obter alguma informação adicional mais rapidamente a partir do desenho, como áreas,
medições de elementos, dentre outros.
Houve uma mudança nas ferramentas, tais como pranchetas, materiais de desenho
(esquadros, réguas, compassos, papeis), mapotecas, para pranchas de desenho
técnico realizadas pelos softwares gráficos bidimensionais e salvos em arquivos de
computador, conforme exemplo da Figura 2. Dessa maneira, permitiu-se maior agilidade
nos projetos, mas não houve grandes mudanças em relação à função anterior, somente
a evolução das ferramentas para a construção do mesmo tipo de objeto intermediário:
o desenho técnico a partir de vistas ortogonais múltiplas e perspectivas.
10
Figura 2 – Exemplo de desenho técnico por vistas ortogonais confecionada no software Autocad 2D
(fonte: https://www.profissionalizecursos.com.br/cursos/projetista/)
Devido às demandas por produtos cada vez mais sofisticados e complexos na forma,
resultado das possibilidades surgidas com novos materiais e processos de fabricação,
os métodos tradicionais de desenhos para produtos industriais não conseguiram mais
atender à velocidade e precisão exigidas. Nesse contexto, surgiram as condições
adequadas para o aparecimento e aplicação de novas tecnologias computacionais ao
processo de projeto (SOARES, 2007).
Na década de 1990, os sistemas CAD evoluíram para uma outra filosofia, baseada na
representação paramétrica de modelos tridimensionais (3D), permitindo que toda a
informação das peças individuais e de montagem de conjunto pudessem ser
armazenadas, independente das dimensões envolvidas (SILVA et al., 2013).
Com o acesso ao espaço virtual, foi possível desenhar objetos com as dimensões X, Y
e Z da sua verdadeira geometria (SOARES, 2007). Os modelos passaram a ser mais
detalhadamente representados, obtendo-se imagens das peças em qualquer posição e
com diferentes efeitos de visualização (SILVA et al., 2013), como observado na Figura
11
3. Estas imagens, geradas sobre os planos ortogonais principais da épura descritiva e
do desenho técnico ou sobre qualquer outro plano, são possibilidades que abalam
profundamente as técnicas de representação, pois significam o fim da trabalhosa
sequência de traçados para a construção de cada vista do objeto (SOARES, 2007).
A partir da modelagem 3D, as imagens das vistas ortográficas são obtidas de forma
automática, o que permite a representação de todos os detalhes sem que isso signifique
mais tempo de trabalho de construção de desenhos (SILVA et al., 2013). Com isso,
deixa-se a tarefa de tradução da forma tridimensional para o sistema de representação
ortogonal (o mesmo que é realizado com papel e instrumentos tradicionais) para o
software, conforme o exemplo da Figura 4.
Fonte: https://www.joiascomrhinoceros.com/
12
Figura 4 – Vistas ortográficas, formatadas em folha de desenho técnico, geradas a partir de uma
modelagem 3D no software Rhinoceros 3D
Fonte: https://www.joiascomrhinoceros.com/joalheiro-vantagens-usar-software-3d/
13
Figura 5 – Exemplo de impressora 3D
Fonte: https://perfisplasticos.blogspot.com/2016/09/3d-manufatura-aditiva-manufatura.html
A MA pode ser definida como um processo de fabricação por meio da adição sucessiva
de material na forma de camadas, com informações obtidas diretamente de uma
representação geométrica 3D, originado de um sistema CAD (VOLPATO, 2017).
Portanto, não é mais necessária a documentação com representações de múltiplas
vistas do objeto para a fabricação, já que o próprio modelo 3D gerado é a base para a
fabricação.
14
reunir uma variedade de métodos de construção digital em uma única casa
(OVERSTREET, 2018).
Fonte: https://www.archdaily.com/891443/eth-zurich-uses-robots-to-construct-three-story-timber-framed-
house?ad_source=search&ad_medium=search_result_all)
15
2. CONCEITOS MOBILIZADOS PARA A REPRESENTAÇÃO DO DESENHO
TÉCNICO: TEORIA, TÉCNICA E FERRAMENTA
Partindo de uma descrição mais geral dos conceitos por meio de três perguntas – o que
é teoria? o que é técnica? e o que é ferramenta? – pretende-se caracterizá-los no
contexto do desenho técnico e fornecer exemplos para a compreensão, nos
subcapítulos 2.1 e 2.2, respectivamente.
• O que é teoria?
Teoria, do grego “theoría”, aparece na Grécia do século VI a.C., como uma maneira de
conhecer, contemplar, abstraindo “tudo o que não fosse essencial para a compreensão
do que era pensado” (VARGAS, 1994 apud ALESSIO; SHIMIZU, 2001).
Para Alessio e Shimizu (2001), a concepção atual de teoria está relacionada com um
“conjunto de proposições de teor nomotético5 que, logicamente organizado, se
desenvolve em raciocínios, viabilizando a descrição, a compreensão e a explicação da
realidade objetiva”. De acordo com os autores, a partir desse contexto, surge a ciência,
que “é um sistema de saber simbólico, objetivo, teórico, explicativo da realidade
pensada e experienciada, ou seja, da natureza e da cultura. A teoria na ciência moderna
passa a ter vinculação com o objeto pesquisado e, portanto, com a experiência, ou
experimentação, na relação direta de causa-efeito (PEREIRA, 1990).
5
Nomotético - Diz-se de método ou disciplina que formula ou trata de leis gerais para o
entendimento de um determinado evento, circunstância ou objeto (definição de Oxford
Languages).
16
• O que é técnica?
A ciência moderna, a partir do Renascimento, possui uma via teórica e uma via prática,
sendo o resultado da conjugação das duas. É um sistema simbólico para o
conhecimento da natureza e da cultura, objetivamente válido (ALESSIO; SHIMIZU,
2001). Entretanto, a separação entre teoria e prática não existe de modo absoluto. A
teoria apresenta um lado de abstração, que é o aspecto teórico da prática, mas não se
prende, caminha junto com a prática em busca de uma unidade (PEREIRA, 1990). Os
conceitos se encontram entrelaçados, possuem uma relação estreita, o que pode
dificultar a compreensão de suas definições em separado.
Ao analisar o conceito de tecnologia, Ruy Gama (1986) tece definições sobre técnica,
que é um dos elementos que a compõe. O conceito de técnica, na visão de Gama, é
caracterizado por
• O que é ferramenta?
Uma ferramenta pode ser caracterizada como um artefato. A noção de artefato designa
qualquer coisa que tenha sofrido uma transformação de origem humana, ainda que
mínima e não está restrita somente ao significado de coisas materiais (objetos), mas
também pode englobar sistemas simbólicos (RABARDEL, 1995).
De acordo com Rabardel (1995), o termo artefato é um objeto, material ou não, que é
projetado para um uso qualquer, como uma ferramenta de marcenaria, um sistema de
17
produção, um software de computador. Os artefatos podem ser adaptados e
desenvolvidos para se encaixar em diferentes atividades finalizadas. Dessa forma, o
artefato encarna uma solução para um problema ou uma classe de problemas
socialmente colocados.
Teoria
Ferramentas Processos
Sob esta ótica, a geometria descritiva serve à resolução de problemas por meio,
exclusivo, de representações planas de objetos tridimensionais, ou ainda, de projeções
ortogonais desses objetos realizadas sobre planos perpendiculares entre si.
18
No entanto, há autores que apresentam outro entendimento da geometria descritiva,
considerando-a como um método de resolução de problemas e de descobertas em
geometria plana e espacial, independente do suporte em que é representado (GANI,
2015).
19
• O que é ferramenta para o desenho técnico?
Destaca-se que as ferramentas digitais são compostas por uma série de outras
ferramentas. Um software 2D ou 3D é formado por diversas ferramentas de elementos
e de construções geométricas.
2.2. Exemplos
20
Figura 8 – Cadeira Barcelona
Fonte:
https://www.facebook.com/AmiraGadouraArchitect/photos/pcb.6395954080479312/6395930853814968/?t
ype=3&theater
"A curva primária das costas da poltrona e da perna frontal são formadas por
uma circunferência com raio idêntico ao quadrado, cujo centro é o ponto A. A
curva da circunferência original é repetida (...) com uma circunferência idêntica,
com centro no ponto B. Uma outra circunferência, cujo raio é a metade do
primeiro, define a perna posterior, com centro em “C”.
Figura 9 - Análise dos elementos gráficos para a construção bidimensional da cadeira Barcelona
B+
Fonte: https://www.cliquearquitetura.com.br/artigo/poltrona-barcelona.html
21
O desenho de uma circunferência de círculo, MÂO, conforme a Figura 10. O uso deste
recurso, ou de outros similares, tem como fundamento a própria definição da figura.
Argumenta-se que a noção de equidistância é reforçada pelo processo.
Fonte: https://pt.wikihow.com/Desenhar-um-Círculo
22
medida do raio; da localização do centro e da medida do diâmetro; da localização de
três pontos; dentre outras). Mantendo os parâmetros utilizados nos exemplos anteriores,
usaremos a ferramentas de construção de circunferências dados o centro e o raio. Neste
caso, a circunferência não é construída gradativamente, ela surge por inteiro ocultando
a ideia do movimento de inúmeros pontos equidistantes de um ponto fixo, o centro. O
processo está escondido pela ferramenta.
Fonte: A autora
Quanto mais complexa a ferramenta, como as digitais, mais oculto pode se tornar o
conceito geométrico. A teoria fica escondida, encapsulada pelo apertar de um botão e
pela definição das variáveis solicitadas pelo programa computacional.
23
Contudo, o mesmo pode ocorrer com as ferramentas tradicionais, caso os conceitos
geométricos não sejam utilizados como base para a aprendizagem.
A teoria parece ficar menos evidente com as ferramentas digitais, mas independente
disso, pode ser ressaltada pelo professor. No uso do compasso, mesmo que o professor
não chame a atenção para o conceito de lugar geométrico no momento da execução, o
aluno está observando o movimento de rotação, mantendo a distância do centro,
acontecer. Na ferramenta digital, se o aluno não for alertado quanto a essa propriedade
da circunferência, dificilmente irá perceber isso sozinho.
Figura 13.
24
Figura 13 – Construção do dodecaedro a partir da definição do ângulo 63,435º
Fonte: a autora
25
Figura 14 – Construção do dodecaedro regular: determinação gráfica do ângulo de rotação das faces.
26
Ponto de encontro
dos vértices e1 ; e2 e'
e1
e a
e2
Fonte: a autora
27
definições de conceito e de esquema de ação propostos por Vergnaud (1990; 1985) e
da definição do conceito de instrumentos proposto por Rabardel (1995) para definir um
novo modelo que relacione artefatos e esquemas mentais e que permita analisar a
aprendizagem de um conteúdo específico.
Para Piaget e Inhelder (1948), a construção das relações espaciais ocorre ao longo de
diferentes períodos do desenvolvimento sensório-motor, do nascimento até o início da
construção do espaço representativo, a partir dos dois anos. Póla (2000) exemplifica
que a criança nessa fase inicial é capaz, por exemplo, de perceber formas geométricas
como círculos ou quadrados muito antes de poder reconstruir essas mesmas formas
usando o pensamento representativo.
Higele (1985, p.124 apud Póla, 2000), ao resumir a evolução dos estágios da construção
do espaço representativo em Piaget, indica que três tipos de compreensão do espaço
são construídos:
28
por exemplo: em uma linha, um ponto pode estar entre dois outros pontos); de
separação (mesmo que dois elementos vizinhos se interpenetrem, eles estão
dissociados); de sucessão e de continuidade. A criança neste nível não leva em conta,
no nível da representação, os caracteres métricos e projetivos, enquanto no nível
perceptivo os discrimina muito bem.
- Espaço projetivo, que permite a coordenação de pontos de vista: o sujeito pode situar
os objetos em relação uns aos outros ou em relação a si mesmo. O domínio deste
espaço é necessário, em particular, para colocar em um mesmo plano elementos
localizados em planos diferentes.
A geometria projetiva diz respeito às modificações das formas e das relações que vêm
tanto da mudança de ponto de vista em relação aos objetos, quanto da projeção da
forma desses objetos em um plano (DUCRET, [s.d.]). Portanto, representar um objeto
por uma imagem mental ou representar por um desenho é tomar consciência ao mesmo
tempo do ponto de vista a partir do qual ele é percebido e das transformações
decorrentes da intervenção desse ponto de vista (PÓLA, 2000).
Para Póla (2000), a geometria descritiva, disciplina que tradicionalmente deu origem ao
desenho técnico por meio de vistas ortográficas, baseia-se nas projeções de objetos.
Para compreendê-la totalmente, o aluno deve ter construído corretamente o espaço
projetivo. Dessa forma, de acordo com a autora, durante o desenvolvimento destes
diferentes espaços, o aluno poderá utilizar as capacidades intelectuais que aplicará na
resolução de problemas de geometria descritiva ou de exercícios de desenho técnico.
29
Esses exercícios consistem na construção de um esboço ou vista, seja de uma
perspectiva ou de duas vistas ortogonais.
Para que o aprendizado do desenho técnico seja efetivo, não basta ensinar somente as
regras e convenções de construções geométricas sem entender a maneira como a
compreensão do espaço representativo é construída pelo indivíduo. Entende-se que,
além de considerar os aspectos sociais e culturais do aluno, é também importante
basear o conteúdo em metodologias fundamentadas pela teoria construtivista que
permitam que o aluno desenvolva as habilidades necessárias para a compreensão da
geometria.
Póla (2000) faz um levantamento dos princípios7 que precisam ser considerados para a
criação de uma metodologia que permita aos alunos superar as dificuldades de leitura
do desenho técnico e construir as operações necessárias para a sua representação:
6
“Une des sources de difficultés des étudiants pour apprendre le dessin technique et on pourrait
dire la géométrie descriptive aussi, est que toute une partie de l’enseignement du dessin a été
négligée, à savoir celle qui porte sur l’apprentissage du langage graphique, avec son code et ses
normes, sa morphologie et sa syntaxe. La reconnaissance d’un certain nombre de signes, de
règles et de normes que l’étudiant doit assimiler ne suffit pas. La lecture d’un dessin étant un
langage, l’expression d’une pensée exige la mise en œuvre de capacités mentales diverses,
concourant à des cheminements intellectuels d’analyse et de synthèse des cheminements.”
7
Baseados nos estudos de Blin et al., 1985; Higele, 1985; Artaud et al. 1985.
30
adquirir gradualmente as propriedades do objeto e do espaço projetivo e
euclidiano. De acordo com Póla (2000), aprender desenho técnico e geometria
descritiva requer o domínio do espaço e de sua representação.
A partir da base conceitual trazida por Póla, o ensino do desenho técnico deve permitir
que a explicação de conceitos, difíceis de visualizar e de representar, seja trabalhada
de tal forma que a sua compreensão se torne mais fácil para o aluno.
8
“L’étudiant doit apprendre à décentrer par rapport à sa perception immédiate pour se situer de
manière abstraite en un point de vue donné. La maîtrise des opérations projectives est nécessaire
à la coordination des différents points de vue, car elle permet à un individu de se déplacer
mentalement dans l’espace et donc, par exemple, d’imaginer la vue de gauche d’une pièce
présentée de face”.
31
3.2. Aprendizagem com o uso de instrumentos
Todo artefato, que pode ser uma ferramenta, uma máquina ou até mesmo um processo
de produção, é utilizado por um indivíduo e, para isso, são necessárias maneiras de
fazer e de agir, formas de pensar, conceitos operativos, competências e valores que
permitem ou que são associados a essa utilização (BÉGUIN, 2008).
9
Informações obtidas em:
http://www.edumatec.mat.ufrgs.br/atividades_diversas/ativ12/cabri.htm e
http://www.cabri.net/cabri2/introduction.php
32
novas situações devido à existência de uma entidade constituinte da cognição:
esquemas ou schèmes. Um esquema é a estrutura ou a organização de ações,
conforme elas se transferem ou generalizam mediante a repetição dessa ação em
circunstâncias semelhantes ou análogas (INHELDER; PIAGET, 1966).
Gomes (2000b) adota o esquema (schème) como unidade de análise para verificar a
organização de ações relacionadas com uma situação, um artefato, um problema ou
uma interação social. Nesse processo, o autor descreve as sequências de passos
realizados que sejam resultantes da adaptação do indivíduo ao uso de um artefato,
como no aprendizado de um conceito a partir de uma interface computacional, por
exemplo.
33
O conceito é progressivamente apreendido na medida em que os indivíduos dominam
mais e mais suas propriedades, as formas possíveis de representação e as relações
com situações diversas, ou seja, “quando os indivíduos começam a dominar essas
dimensões de um conceito, o mesmo começa a fazer-lhe sentido” (GOMES, 2000b).
A partir da base trazida por Vergnaud e Rabardel, Gomes (2000a, b) propõe a análise
do desenvolvimento conceitual consecutivo ao uso de instrumentos em duas partes:
34
Ao identificar situações com o uso de instrumentos, Gomes (2000a) localiza as
sequencias de ações com o mesmo conjunto de artefatos, identificando também classes
de situações que servirão para realizar a análise da influência de um uso anterior de um
conjunto de artefatos na adaptação a um outro sistema.
O resultado apresentado por Gomes (1999) pode contribuir para uma análise dos
exemplos de construções geométricas apresentados no subcapítulo 2.2. A técnica
empregada para a construção de um conceito geométrico (circunferência, por exemplo)
com ferramentas tradicionais (compasso), pode contribuir para que esse processo de
construção seja mais claro, o que facilita o aprendizado do aluno quanto ao conceito.
O ensino do desenho técnico deve considerar, portanto, dois aspectos. O primeiro diz
respeito ao entendimento de como o espaço representativo é construído pelo indivíduo
para que o professor possa criar estratégias que conduzam ao aprendizado da teoria
35
geométrica. Quanto ao segundo aspecto, deve-se levar em conta que o uso do
ferramental pode facilitar a apreensão do conceito geométrico envolvido na construção
da representação gráfica pretendida. Como pode-se observar nos exemplos do capítulo
2.2, algumas ferramentas permitem uma compreensão maior da teoria geométrica que
outras. Dessa maneira, a mobilização de diferentes ferramentas pode contribuir para
que o entendimento do conceito seja mais efetivo.
36
4. CONSIDERAÇÕES FINAIS
Notou-se que a literatura concentra suas discussões no ensino por meio de ferramentas
computacionais gráficas e pouco se discute sobre o ensino por meio de ferramentas
tradicionais. Ainda assim, ferramentas como réguas, esquadros, compassos ainda são
utilizadas como ferramental no ensino de desenho técnico em cursos superiores.
Como resultado, esta pesquisa foi estruturada para entender, primeiramente, a função
comunicativa do desenho técnico e o papel das ferramentas para esse fim. Em seguida,
os conceitos que embasam a construção do desenho técnico (teoria, técnica e
ferramenta) foram levantados e descritos por meio de exemplos. Por fim, os aspectos
cognitivos da aprendizagem do desenho técnico, com base na teoria construtivista de
Piaget, Vergnaud e Rabardel, mobilizados em Póla (2000) e Gomes (1999), foram
discutidos.
A análise do percurso desta monografia nos três capítulos anteriores permitiu apontar
quatro pontos importantes para a compreensão do uso de ferramentas no ensino do
desenho técnico.
37
representar um objeto tridimensional em um plano bidimensional, já que é possível
fabricar diretamente do modelo 3D.
Ainda com base nos exemplos, percebeu-se que algumas ferramentas facilitam a
compreensão da teoria geométrica na medida em que permitem certa transparência, ou
seja, consegue-se perceber o percurso da construção dos elementos geométrico.
Quanto mais complexa a ferramenta, maior a precisão e a rapidez na construção,
porém, aumenta também a chance de que a teoria fique “escondida em uma caixa
preta”, já que nem todas as etapas da construção geométrica ficarão visíveis. Contudo,
o uso das ferramentas tradicionais, se focadas em um passo a passo sem reflexão e
sem relação com a teoria geométrica, também encapsula essas etapas.
38
ocorre no espaço e, consequentemente, também contribuem para o
processo construtivo geométrico; e
(ii) a apreensão dos conceitos geométricos com o uso de diferentes
ferramentas. Como discutido no capítulo 3.2, ao aprender a utilizar uma
ferramenta, o individuo desenvolve competências para utilizá-la e, a partir
desse desenvolvimento, o conceito geométrico também passa a fazer
sentido para o indivíduo.
Por esse motivo, compreender os impactos do uso dessas ferramentas no ensino deve
ser levado em consideração, já que essa escolha possui papel importante para a
aprendizagem do desenho técnico. Diferentes tipos podem ser mobilizados pelo
professor para que o aluno compreenda a teoria balizadora do desenho técnico (a
geometria) e a técnica necessária para a sua representação.
Outra possibilidade que se abre para estudos futuros é compreender a utilização dos
objetos intermediários nas etapas iniciais do processo de projeto. Na fase do
desenvolvimento de alternativas para o projeto, quais recursos intermediários são
utilizados e qual o papel das ferramentas nesse processo.
39
5. REFERÊNCIAS
BÉGUIN, P. Argumentos para uma abordagem dialógica da inovação. LaboReal, [s. l.],
v. IV, p. 72–82, 2008.
40
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JACQUES, J. J. De; GARCIA, D.; LERSCH, I. M.; POZZI, M. D. F. A sala de aula como
laboratório para construção de objetos de aprendizagem aplicáveis ao ensino presencial
à distância. Educação Gráfica, [s. l.], p. 114–130, 2008.
41
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sociologie des processus de conception. Sociologie du travail, [s. l.], n. 3, p. 291–316,
1998.
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dans les équipes intégrées de conception de produit. In: TERSSAC, G. De;
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2008. p. 87–121.
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robots-to-construct-three-story-timber-framed-
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43
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Expressão Gráfica, [s. l.], v. 8, n. 1, p. 1–25, 2020.
SILVA, A.; RIBEIRO, C. T.; DIAS, J.; SOUSA, L. Desenho Técnico Moderno. Rio de
Janeiro: LTC, 2013.
44
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Serie, 1994.
VINCK, D.; LAUREILLARD, P. Coordination par les objets dans les processus de
conception. In: “REPRÉSENTER, ATTRIBUER, COORDONNER”, JOURNÉES CSI
1995, Anais... [s.l: s.n.]
45
ANEXO A: Ementas das disciplinas de Expressão Gráfica para
Engenharia
Campus: Maracanã
46
[2] Universidade do Estado do Rio de Janeiro
Campus: Resende
47
[5] Universidade Católica de Petrópolis
48
[7] Universidade Federal Fluminense – UFF
49
[8] Universidade Federal do Rio de Janeiro – UFRJ
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