O Campo Teórico Da Política Educacional Cesar Tello
O Campo Teórico Da Política Educacional Cesar Tello
O Campo Teórico Da Política Educacional Cesar Tello
OBJETOS DE ESTUDO
Resumo: Este trabalho, de caráter teórico, propõe-se a apresentar algumas reflexões conceituais que estão sendo
desenvolvidas no contexto do que chamamos as Epistemologias da Política Educacional, que, através do Enfoque das
Epistemologias da Política Educacional (EEPE) tem por finalidade propor um esquema de análise sobre o campo da
investigação em política educacional como um campo teórico, a partir de componentes que contribuem para a reflexão
campo meta-analítica do campo. Assim, propomos três argumentos a partir dos quais se pode definir o objeto de estudo
da política educacional, assumindo que a sua definição, modelo e abordagem é múltipla e multidimensional. O primeiro
argumento está relacionado com a categoria de episteme de tempo; o segundo com a posição epistemológica do
pesquisador e o terceiro diz respeito ao entrelaçamento dos traços históricos e o modo de nomear do campo teórico da
política educacional. Por fim, apresentamos algumas ideias que podem orientar a amplitude do campo, que tem o
objetivo de definir o objeto de estudo da política educacional como o estudo da tomada de decisão na educação.
INTRODUÇÃO
Este artigo, de caráter teórico, se propõe a apresentar algumas reflexões conceituais que se
vêm desenvolvendo no marco daquilo que denominamos as Epistemologias da Política Educacional
(TELLO, 2013; 2012; 2010; 2009) que, através do Enfoque das Epistemologias da Política
Educacional (EEPE) (TELLO, 2013; 2012) têm por finalidade propor um esquema de análise sobre
o campo de investigação da política educacional como campo teórico, a partir de componentes que
contribuem à reflexão meta-analítica do campo.
Nossas premissas consistem em considerar, por um lado, que a política educacional
enquanto campo teórico se define a partir da perspectiva e o posicionamento epistemológico de
quem a interpreta ou caracteriza e, por outro lado, que essa definição com um determinado
posicionamento epistemológico responde a uma episteme de época. Com isto, dizemos que não
existem caracterizações universais para a política educacional como campo teórico e para seu objeto
de estudo. Dado que o objeto de estudo da política educacional se constrói de um modo que não é
neutral, o próprio desenvolvimento histórico do campo teórico vai definindo “novos” objetos de
1
César Gerónimo Tello: professor da Universidade Nacional de Tres de Febrero. Diretor da rede Latino-americana de
Estudos Epistemológicos em Política Educacional. E-mail: [email protected].
2
Hildegard Susana Jung: mestranda em Educação pelo Programa de Pós-graduação Stricto Sensu em Educação/
Mestrado em Educação da Universidade Regional Integrada do Alto Uruguai e das Missões/ Câmpus de Frederico
Westphalen. E-mail: [email protected].
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estudo ou transformando o existente à maneira daquilo que Khun denominou como paradigma e do
contexto no qual se define o objeto de estudo da política educacional, em termos de Foucault, como
uma episteme de época.
Enfim, estas questões serão sugeridas no desenvolvimento deste artigo, mas não a modo de
tópicos, e sim como eixos horizontais que nos permitam a reflexão e assim, de algum modo,
observar a complexidade epistêmica para a caracterização do campo e seus objetos de estudo.
3
Para maior desenvolvimento e aprofundamento destes conceitos, pode-se ver Tello (2009; 2010; 2011, 2012a; 2012b;
2012c; 2013ª; 2013b; 2013c).
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realidade, mas modos de construí-la em termos de reflexividade epistemológica. Neste sentido, o
posicionamento epistemológico se converte em posicionamento político e ideológico do
investigador e repousa sobre a seleção que o pesquisador realiza quanto à perspectiva
epistemológica com a qual desenvolverá sua pesquisa. Podemos mencionar os posicionamentos
neoinstitucionalistas, institucionalista, jurídico-legal, construtivismo político, da complexidade,
ecletismo, pós-moderno, pós-modernista, hiperglobalista, cético, neoliberal, enfoque transformador,
funcionalista, crítico, crítico radical, crítico-analítico, teórica da resistência, crítico-reprodutivista,
humanista, economicista, etc.
Vários estudos revelam que não existe a “cabeça vazia” do pesquisador e que se têm
empregado diversos modos metodológicos para nomear esta questão, por exemplo: “pressupostos
do investigador” ou “antecipação de sentido” (SIRVENT, 1999, p. 12), entre outros. Enfim, o
posicionamento e a perspectiva epistemológica não emergem de uma “cabeça vazia”, ao contrário,
possuem substrato e sustentação. A dificuldade se observa quando o pesquisador em políticas
educacionais não pode nomear o que lhe está acontecendo como perspectiva ou posicionamento
epistemológico. E tenta construir sua pesquisa a partir da pseudo-neutralidade; é nesta mesma linha
que assume o objeto de estudo da política educacional como objeto fossilizado.
Assim, Espina Prieto (2007) sustenta que a observação do objeto não pode se separar da
observação do dispositivo que o observa. Isto supõe um objeto de estudo e um sujeito que o
conhece de dentro. Ou seja, desde esta perspectiva, o objeto não é entendido como um ente neutral,
recortado do seu contexto, no qual o pesquisador não está envolvido, mas se assume a implicância
mútua como ponto de partida, em termos de Norbert Elias (1993) como “compromisso e
distanciamento” com o objeto de estudo; portanto, o compromisso deve ser entendido no sentido da
sensibilidade social do investigador para compreender a realidade. Neste sentido, o pesquisador se
envolve com o objeto, considerando que em pesquisa em educação o objeto é outro, um sujeito,
enquanto que, simultaneamente, esta afetação não deve impedir-lhe de ter um olhar analítico sobre a
situação que está abordando. Nesta perspectiva, Núñez Sarmiento (2002, p. 109) explica que o
pesquisador em ciências sociais deve cumprir quatro requisitos: “1. Evitar o erro de posicionar-se,
enquanto cientistas sociais, “frente” aos “objetos” de estudo. 2. Reconhecer e analisar quais são
suas ideologias, e qual é a influência que elas exercem sobre sua prática investigativa. 3. Identificar
conscientemente as coações às quais estão expostos. 4. Evitar o erro de coisificar e desumanizar as
figuras sociais que fazem parte de suas pesquisas.”
É por isso que o pressuposto epistemológico da reflexividade supõe a interação entre o
sujeito que investiga com um posicionamento e, a partir de uma perspectiva epistemológica e o
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objeto a ser investigado, entender a subjetividade como constitutivas e construtoras de realidade e
do conhecimento.
Tendo explicado estas questões, é fundamental considerar que o EEPPE, enquanto esquema
de reflexão possui uma flexibilidade que nos permite conjugar diversos componentes teóricos
dentro um próprio posicionamento ou perspectiva epistemológica. Entretanto, estas devem conter
uma coerência em sua matriz epistemológica interna. Do contrário, se estabelece um ecletismo
cujos resultados de pesquisa são sempre “uma verdade absoluta” porque o processo investigativo é
tão desprolixo com referenciais teóricos de diversas perspectivas que se torna difícil discutir,
concordar ou confrontar com os resultados da pesquisa.
Com isto, dizemos que um processo de investigação com uma fraca coerência
epistemológica não contribui com a produção do conhecimento em política educacional.
Aos investigadores em política educacional isto traz um grande desafio: quais são nossas
flexibilidades epistemológicas para desenvolver marcos teóricos que nos permitam compreender a
realidade? Como estamos pensando o marxismo, o pós-estruturalismo ou o pluralismo enquanto
perspectivas epistemológicas para compreender as políticas educacionais em nossas pesquisas?
Neste sentido, é necessário que um pesquisador em política educacional, em seu processo de
investigação, enriqueça sua pesquisa com “zonas de conhecimento possível” (González Rey, 2002),
isto significa: outros possíveis ângulos e perspectivas de análise. Mas claramente não se pode
incluir múltiplas perspectivas e posicionamentos na mesma pesquisa. O que se pode fazer é mostrar
outras formas possíveis de abordar esse objeto ou outras formas de construir esse objeto: zona de
conhecimento possível. Mas em uma só investigação não se pode realizar a abordagem a partir de
todas as zonas possíveis de conhecimento, já que obteríamos por resultados – se me permitem a
expressão – uma salada eclética com a qual não se poderia debater.
Finalmente, para concluir este tópico, é necessário considerar que, se há algo que ficou claro
no debate epistemológico contemporâneo, é que toda epistemologia está carregada de valores. Não
se investiga a partir da neutralidade. E é a partir daqui que o EEPE quer refletir, a partir da solidez
da investigação. Sader (2009) sugere que existe uma crise ideológica que afetou as práticas teóricas
e as ciências sociais:
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Assim, os pesquisadores de política educacional correm o risco de perderem o pensamento
epistêmico (ZEMMELMAN, 2003), que é a razão de ser dos investigadores em geral em ciências
sociais, e em particular em política educacional. O epistemólogo das ciências sociais mexicano
explica que Bachelard afirma que a tarefa da ciência é propor nome às coisas. Segundo Bachelard, o
problema seria cuidar de dois grandes riscos: um, de não propor nome velho às coisas novas e dois,
de acreditar que, por não terem nome no momento em que se sugerem, são inomináveis. É nesse
trânsito, entre o colocar nomes velhos em coisas novas e acreditar que, por não terem nome não
inomináveis, que se situa o que chamamos de pensamento epistêmico em termos do EEPE.
Devido a isso, o EEPE se transforma em um modo de reflexão sobre os processos de
investigação em política educacional que em algumas ocasiões são meramente descritivas, o que
não seria um grande problema, o problema surge quando, ao lermos uma pesquisa, nos perguntamos:
desde que perspectiva o autor está escrevendo? E por outro lado, existe uma excessiva preocupação
por parte dos investigadores em política educacional em que, a partir da pesquisa, se obtenha
resultados para a ação, ou seja, soluções. Às vezes soluções mágicas. Em uma entrevista realizada
por Mainardes e Marcodnes (2009) com Stephen Ball, este adverte a respeito:
O que o pesquisador inglês em políticas educacionais está explicando, é que todos querem
que, através da pesquisa, se desdobre resultados para a ação, resultados que com um pouco de
magia se convertam na panaceia do mundo. Isso não é pesquisa.
Definitivamente, as questões assinaladas anteriormente, são as que dificultam efetivar
processos de pesquisa em política educacional com solidez epistemológica.
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de decisões e ação política). Max Weber (1991, p. 83 [1918]) em “O político e o cientista”,
sustentou com ênfase a clara diferenciação que distingue “as tomadas de posição política” (Políticas
educacionais no plural) da “análise científica dos fenômenos políticos” (Política Educacional no
singular).
Às vezes se comete o erro de definir o campo da política educacional vinculada a
adjetivações ou à realidade política. E esta dificuldade é uma carga que tem os pesquisadores latino-
americanos da escola americana com uma definição muito empregada em nossas pesquisas. Nos
referimos aqui às politics e às policy, que para os não anglo-falantes são categorias que, como
afirma Cox (2006, p. 3) “não se pode recuperar o sentido do segundo termo sem especificar
políticas setoriais”. Portanto, tentar definir a política educacional a partir destas categorias gera
confusão nas regiões que precisam realizar a tradução (é o caso dos países hispano-falantes da
América Latina, e também não existe um modo de traduzir essas categorias ao português, francês,
alemão ou italiano).
Esta questão não é menor para nós, que tentamos analisar e estudar o campo teórico da
política educacional, dado que, como assinala Yehezkel Dror (1982, p. 33) “la falta de uma
diferencia entre ‘politics’ y ‘policy’ en un gran número de idiomas, crea un gran problema en el
desarrollo del análisis de políticas em muchos países. Al mismo tiempo, la falta de esta diferencia
señala realidades y percepciones descuidadas en el análisis de políticas […]” (o grifo é meu).
A efeito das ideias que desenvolvemos neste trabalho, definimos a política educacional (no
singular) como campo teórico e as políticas educacionais (no plural) como a realidade sociopolítica
a ser analisada, indagada, pesquisada. Ou seja, as políticas educacionais são o objeto de estudo da
política educacional. Neste sentido, é importante levar em conta a advertência de Ana Vitar (2006, p.
26) quando afirma que “No debemos confundir los procesos políticos y sociales con las
herramientas para pensarlos”. Assim, podemos afirmar que, em termos da academia americana, não
estaríamos referindo-nos à political science.
Definimos o campo da política educacional como campo teórico homologável ao campo
acadêmico em termos de Bourdieu (2000), pois a partir desse campo se produz conhecimento
(pesquisa), se gera circulação de conhecimento (formação acadêmica) e se desenvolve um uso ou
aplicação desse conhecimento (a profissão de cientista político da educação), considerando que não
necessariamente estes três espaços são consecutivos.
Poderíamos pensar na possibilidade de definir alguns traços das epistemologias da política
educacional, mas nunca considerar que se poderia definir a “teoria da política educacional”
entendida como uma redução epistemológica, dado que os conceitos epistemológicos atuais não
requerem a “demarcação” disciplinar. Isto responde a estudos e concepções clássicas a partir da
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epistemologia que diferenciava, por exemplo: Ciência-Pseudociencia-Disciplinas, entrando no falso
caminho do cientificismo; por outro lado, assumimos no sentido de Wallestein (1997) uma postura
a favor da ciência e o conhecimento contra o cientificismo.
Devemos considerar que, de algum modo, as regulamentações internas do campo da política
educacional se estruturam tendo como base sua relação com outros campos de estudo e é ali onde
encontraremos as epistemologias da política educacional – utilizando um termo que poderia parecer
contraditório – em seu estado puro, digo que “poderia parecer contraditório”, porque seu “estado
puro” como campo tem a ver com a complexidade dos campos com os quais se vincula. Deste modo,
consideramos o campo da política educacional como a possibilidade de novas construções
conceituais que permitem a interação múltipla e recíproca entre distintos campos de conhecimento.
Em termos de Gianella “El retículo tiene una estructura doblemente compleja, ya que en la red se
admiten integrantes que a su vez son redes” (2006, p. 79). Deste modo, se poderia pensar na
perspectiva do rizoma deleuziano para definir o campo da política educacional, portanto a fluidez
de qualquer parte do rizoma poderá se empalmar com outra.
Nesta linha de análise, definimos o objeto de estudo da política educacional pela sua
episteme de época. Entendendo que o objeto de estudo da política educacional não é outra coisa,
senão uma construção de contexto, de história e de posicionamento epistemológico.
Entendendo as transformações do campo nas diversas regiões do mundo: a partir da
sociologia política na Gran Bretânia, a political science nos EUA, os estudos de política e
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Administração da educação dos enfoques cognitivos de corrente francesa, junto com a perspectiva
de sociopsicanálise da política educacional, entre outros.
E assim devemos considerar o impacto dessas correntes sobre o campo. Em uma breve
historização podemos dizer, a modo de Notas Históricas sobre o campo teórico da política
educacional, que se aponta o marco fundador na ciência política: a pedido da UNESCO se reúnem
em Paris experts e estudiosos com a finalidade de tentar redefinir e delimitar seu objeto de estudo.
As deliberações se concluem com a confecção da célebre “Lista Tipo 4 ”, elaborada sob forte
influência do pensamento anglo-saxão. Ainda que ela constitua tão somente uma mera enumeração
pragmática de temas, segue sendo, apesar de sessenta anos após sua elaboração, um eixo de
referência para a elaboração de marcos teóricos e a confecção de currículos universitários com
relação às ciências políticas, incluindo a área curricular da política educacional atual nos cursos de
pedagogia e ciências da educação na América Latina.
É a partir desta data que começam a desenvolver-se em diversas universidades latino-
americanas as ciências políticas como campo de estudo com “pretensão científica”, e quase
exclusivamente a partir do enfoque jurídico-institucionalista (BARRIENTOS DEL MONTE, 2009).
Isto se produz considerando que, finalizada a Segunda Guerra Mundial, se desenvolveram
políticas de bem-estar centradas em questões tais como a saúde e a educação. Deste modo, pode-se
observar que emerge um novo modo de conceber as políticas públicas na América Latina. Com o
desdobramento das políticas de bem-estar, os organismos governamentais apelaram aos
investigadores das ciências sociais para buscar soluções aos problemas que a planificação das
atividades estatais supunha, incluindo aquelas relacionadas com o crescimento e a reforma dos
sistemas educativos; isto é, como dizíamos anteriormente, a perspectiva pragmático-funcionalista da
ciência política americana, pela qual a América Latina tem sido fortemente influenciada.
Neste marco, quanto mais começava a desenvolver-se a ciência política como campo de
estudo, maior era o volume e a variedade dos temas a estudar. Isto se converteu em uma dificuldade
neste momento – o que é comum nos campos emergentes do conhecimento – devido ao esforço que
supunha o estabelecimento de uma lógica coerente no aumento da quantidade de temáticas que o
campo deveria estudar, mas este esforço de abertura do campo (BOURDIEU, 2000) daria lugar, de
4
Os diferentes temas propostos ficam agrupados em quatro seções:
I. Teoria política: a) Teoria política. b) História das ideias políticas.
II. Instituições políticas: a) Constituição. b) Governo central. c) Governo regional e local. d) Administração pública. e)
Funções econômicas e sociais do governo. f) Instituições políticas comparadas.
III. Partidos, grupos e opinião pública: a) Partido político. b) Grupos e associações. c) Participação do cidadão no
Governo e a Administração. d) Opinião pública.
IV. Relações internacionais: a) Política Internacional. b) Organização e administração internacional. (UNESCO, 1948).
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algum modo, à política educacional como um espaço incipiente que se desprendia – a partir da
perspectiva histórica desse momento – como sub-disciplina da ciência política.
Dotada das características principais das ciências políticas, surgia na década de 1950 a
política educacional como campo teórico, com uma visão fortemente centrada na legislação e, em
alguns casos, consistia em estabelecer eixos de comparação legislativos entre diversos países e entre
a estrutura dos sistemas educativos, entre outros temas de comparação linear e quase
descontextualizada. Mas, sem dúvida, respondia à matriz analítica das ciências políticas na América
Latina com o enfoque jurídico-institucionalista.
Nesta década (1950) começa-se a observar na Argentina, no Brasil, no Chile, no México e
na Colômbia, entre outros países da América Latina, alguns processos incipientes de
“institucionalização” da política educacional como campo e que se desdobra através da criação de
cátedras de política/s educacional/is. Levando em conta que não nos referimos ao início das
reflexões políticas sobre a educação, dado que estas poderiam situar-se em Aristóteles ou Platão,
mas ao processo de “institucionalização” citado por Gómez Campo e Tenti Fanfani (1989) quando
explicam que os processos pelos quais certas práticas se recortam como específicas, seja com a
criação de uma cátedra, um curso, um centro de estudos ou um departamento em âmbito
universitário, dão mostra do processo histórico e a presença real de um espaço institucional, que
permite a circulação e produção do conhecimento.
Outros modelos classificatórios que, ainda que pareçam mais amplos, não deixam de ser
lineares e se aproximam aos cânones positivistas, é a análise em política educacional a partir do top-
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down ou do botton-up, onde a análise segue sendo vertical de cima para baixo (em oposição ao
rizoma deleuziano). Traçando a análise política e compreendendo as políticas educacionais como
algo que sobe ou desce. Esquecendo que a política educacional é muito mais complexa que isso,
esta deve ser entendida em termos de um paradigma de complexidade, isto é, em termos de
swarming. E a partir daí construir um objeto de estudo com suas múltiplas mediações no processo
de desenvolvimento político.
Whitty e Edwards (1994, p. 15) sugerem que é necessário que se dê uma definição de
política educacional, assumindo de algum modo o pensamento de Jennings (1977) ao resenhar que
o político é produto de uma decisão. Para isto, os autores sugerem:
Pois bem, claramente os autores tentam dar uma definição operativa em termos de
organização do campo, dado que se requer “reduzir (...) a soma de inumeráveis decisões individuais
e/ou coletivas”. Nossa pergunta é por quê. O campo da política educacional tem por objetivo de
estudo a tomada de decisões. E ali se podem observar decisões em diversos níveis de um sistema
educativo no sentido de Ball (ciclo de políticas) ou decisões complexas em termos de coalizões
(Sabatier), ou em qualquer um dos modelos sugeridos anteriormente a partir de diversas
perspectivas e posicionamentos epistemológicos.
Assim, tentamos não reduzir a caracterização teórica do objeto de estudo da política
educacional e assumimos como aproximação conceitual a que se ocupa do estudo das decisões
políticas no âmbito educativo, considerando que existem decisões políticas nos diversos níveis do
sistema educativo e que as decisões políticas se referem ao uso do poder conjuntas ou individuais.
Deste modo, é necessário diferenciar os ângulos de estudo deste complexo e rizomático objeto de
estudo, por exemplo, políticas curriculares, políticas docentes, políticas de financiamento, etc., que
podem ser observadas através do exercício de poder do governo, de atores sindicais, docentes,
técnico, etc., nos níveis micro, meso e macro do sistema educativo ou na inter-relação entre eles.
Devemos considerar que o enfoque racional do Estado moderno assumiu o exercício e a
decisão política como numa linha de “cima para baixo”. Mas há tomadas de decisão que vão além
das decisões de um governo, existem decisões além das que toma um governo estatal.
Aqui temos um dilema: precisamos definir o objeto de estudo da política educacional a
efeito de organização de campo ou poderíamos assinalar que não é possível esta definição, a não ser
que a intenção seja operativa e estratégica como a sugerida por Whitty e Edwards; e assim
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estabelecer que a política educacional tenha como objeto de estudo somente as decisões tomadas a
partir dos governos estatais.
Assim, Roth Deubel (2008) explica que existe certa centralidade nos estudos em políticas
públicas a partir de um posicionamento epistemológico específico como o Public Choice, que
segundo o autor “se centra em analisar os arranjos institucionais, particularmente o desenho das
instituições estatais e as normas legais e constituições” (DEUBEL, 2008, p. 80), Neste sentido,
assumimos a posição das Advocacy Coalitions, estrutura gerada por Paul Sabatier, começando a
busca de uma síntese dos melhores dispositivos com os quais contribuíram os enfoques top down e
botton up para o estudo das políticas públicas.
Deubel (2207) sugere que estas concepções consideram “as interações entre sociedade e
Estado, mais em suas dimensões horizontais (um e outro são sócios) do que verticais (um domina o
outro e vice-versa) e de sinalizar a interpretação crescente entre as esferas política e privada.” (p.
51).
Flores Crespo e Mendoza (2012) explicam que o referencial teórico de Sabatier pode ser
pouco conhecido na América Latina devido ao caráter autoritário e linear das ações dos estados na
região e, entretanto, assinalam os autores, é um esquema analítico potente para o estudo das
políticas educacionais onde existem múltiplos atores nos diversos níveis da tomada de decisões e,
aqui, é necessário regressar à categoria de episteme de época para perguntar-nos: não será o próprio
estilo de governo estatal em nossa região que leva os pesquisadores a se centrarem nele?
Bowe et al (1992) advertem sobre a dificuldade de compreender e analisar as políticas
educacionais de um modo verticalista, assim, Raab (1994) explica que o Estado deve ser
compreendido como um componente a mais na complexa trama das política educacionais. Neste
sentido, ao refletir sobre o referencial teórico de Sabatier, Deubel sugere que “a unidade de análise
não pode se limitar à estrutura governamental, mas a um ‘subsistema de política’. Este subsistema,
como parte do sistema político, está composto de uma variedade de atores, públicos e privados, que
estão ativamente implicados ou interessados em um problema de política ou de uma controvérsia”.
(DEUBEL, 2008. p. 82). E seguindo nossas postulações, onde o ângulo do estudo, ou seja, o objeto
de estudo, pode ser ou não o Estado.
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Assim é que definimos a complexa mobilidade das políticas educativas em termos de
swarming. Esta categoria não tem uma tradução clara ao espanhol nem ao português, um swarm é
um enxame de abelhas e o swarming são as abelhas em busca de um lugar onde possam construir o
favo. São as abelhas em movimento, mas juntas, quase sem poder identificar a tradicional
hierarquia que estas têm, dado que a busca do lugar para a construção do favo não está circunscrita
à decisão da Abelha Rainha.
Neste sentido, as políticas educacionais como ação política possuem múltiplos atores,
vinculações, decisões, lutas de poder, ações, impacto, implementação, etc. A pergunta chave aqui, a
partir da imagem do swarming é: É possível definir e conceituar as políticas educacionais? Quantas
mil abelhas se observam na fotografia? Quantos componentes teóricos, atores, instituições, decisões,
implica a política educacional como swarming?
Meu argumento é que uma resposta a esta pergunta precisaria de várias enciclopédias, que
creio que nunca terminaríamos de escrever. Pois bem, se pode fazer um recorte epistemológico com
o fim de construir um objeto de estudo, claramente artificial e a partir de um posicionamento
epistemológico. Isto significa que, construir um objeto de estudo para investigar em políticas
educacionais implica reconhecer o recorte do swarming e simultaneamente não desconhecer, ao
menos, os principais traços do swarming em seu conjunto; E compreender que este objeto já não
mais estará em movimento. Também se deve levar em conta que os modelos analíticos para a
análise de políticas educacionais não deverão ser determinantes. Por exemplo: Onde começam as
políticas educacionais? Ou: Onde terminam? Sem dúvida, tentar responder a estas perguntas é
assumir uma posição e uma perspectiva epistemológica. Por exemplo: a partir do ponto de vista de
top down ou botton up, isto implica reconhecer o começo e o final em uma análise vertical, quase
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positivista. E se pensarmos as políticas educacionais como movimento horizontal, em um contínuo
de decisões? As quais vão se transformando a cada passo, de forma progressiva, a partir das
autoridades de um governo estatal até um mestre onde a tomada de decisões desdobra
transformações e mais transformações no desenvolvimento des-ordenado e des-dobrado da ação
política. Onde umas implicam e transformam as outras.
Assim, pois, tentamos compreender a realidade das políticas educacionais como swarming.
Como um trajeto intertextual. Stephen Ball (1989) definiu as políticas educacionais como textos e
como discursos. Ao referir-se às políticas educacionais como textos, explica o autor (Ball, 1989)
que é o produto do trajeto sinuoso e imprevisto que se gera nas diferentes arenas políticas de cada
contexto, mediante lutas, compromissos, interpretações e reinterpretações da autoridade pública,
que logo serão decodificadas pelos autores, que atribuirão diversos sentidos, elaborando ajustes
secundários ao próprio contexto, de modo complexo. Contudo, nesta caracterização se observa o
olhar vertical e de fases do trajeto político (policy cicles) com autores principais e secundários.
Na proposta da política educacional como intertextual, como swarming, os textos estão em
constante transformação na ação política. É aqui onde geralmente se produz a confusão da trajetória
política, ou seja: entre quem tem o maior ou o menor poder nas ações de governo. Com isto,
dizemos que se produzem lutas de poder, mas não necessariamente as ganha quem tem maior poder.
O processo é muito mais complexo, dado que as implicações recíprocas entre os atores com
diferentes graus de poder transformam o poder do outro em uma perspectiva intertextual e
rizomática. Para Deleuze, um rizoma é um modelo descritivo no qual a organização dos elementos
não segue linhas de subordinação hierárquica – com uma base ou raiz, dando origem a múltiplas
ramificações, de acordo com o conhecido modelo da árvore de Porfírio -, mas que qualquer
elemento pode afetar ou incidir em qualquer outro. Em um modelo arbóreo ou hierárquico
tradicional de organização como as taxonomias do top down, o botton up ou o policy cicles, o que
se afirma dos elementos de maior nível é necessariamente verdadeiro dos elementos subordinados, e
também pode acontecer o contrário.
Por outro lado, em um modelo rizomático, qualquer predicado atribuído a um elemento pode
incidir na concepção de outros elementos da estrutura, sem importar sua posição recíproca. O
rizoma precisa, portanto, de centro.
Enfim, a ideia que queremos sugerir sobre as políticas educacionais em termos de ações
políticas é que estas conformam uma intertextualidade rizomática à maneira de swarming.
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Desde que nestes estudos se cumpram os requisitos mencionados anteriormente: a tomada
de decisões em educação com um componente político e com a presença das mediações próprias do
campo.
Entendendo que isto não é outra coisa, senão uma construção arbitrária e organizada por
aqueles que constituem o campo como pesquisadores.
NOTAS FINAIS
Esta é uma das principais contribuições que consideramos que este trabalho pode trazer:
contribuir para o fortalecimento epistemológico do campo teórico, sem ter como horizonte a
distinção entre ciência, disciplina ou subdisciplina, entendendo, em termos de Tenti Fanfani (2007,
p. 224) no campo do social, que toda a classificação e divisão disciplinar é, em grande parte, uma
construção arbitrária e não supõe necessariamente uma origem ligada à “natureza das coisas”.
Ao contrário, o fortalecimento epistemológico do campo teórico se dá à medida que assume
sua multidisciplinaridade e complexidade interdisciplinar no desenvolvimento para a pesquisa em
política educacional, que se manifesta em sua multidisciplinaridade de Posicionamentos
epistemológicos, Perspectivas epistemológicas e Enfoques epistemológicos com a construção de
objeto de estudos diversos (relatório técnico, projeto acadêmico de pesquisa, consultoria, etc.).
Sendo um campo eminentemente das ciências sociais, se desdobra a partir da própria
multiplicidade teórica, o qual não questiona – na nossa perspectiva – sua fortaleza epistemológica,
mas ao contrário, é um espaço fértil e sólido, a partir de sua diversidade, para a análise das políticas
educacionais.
Enfim, a partir desta caracterização consideramos que podem desprender-se múltiplos
objetos de estudo da política educacional como campo teórico.
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