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UNIVERSIDADE ESTADUAL PAULISTA

ANDRÉIA MELANDA CHIRINÉA

O ÍNDICE DE DESENVOLVIMENTO DA EDUCAÇÃO


BÁSICA (IDEB) E AS DIMENSÕES ASSOCIADAS À
QUALIDADE DA EDUCAÇÃO NA ESCOLA PÚBLICA
MUNICIPAL

MARÍLIA
2010
1

ANDRÉIA MELANDA CHIRINÉA

O ÍNDICE DE DESENVOLVIMENTO DA EDUCAÇÃO


BÁSICA (IDEB) E AS DIMENSÕES ASSOCIADAS À
QUALIDADE DA EDUCAÇÃO NA ESCOLA PÚBLICA
MUNICIPAL

Dissertação apresentada à Faculdade de


Filosofia e Ciências da Universidade Estadual
Paulista, Campus Marília, como parte dos
requisitos para a obtenção do título de Mestre
em Educação, Área de Concentração: Políticas
Públicas e Administração da Educação
Brasileira, sob orientação da Prof.ª Dr.ª Iraíde
Marques de Freitas Barreiro.

MARÍLIA
2010
Ficha Catalográfica
Serviço de Biblioteca e Documentação – UNESP - Campus de Marília

Chirinéa, Andréia Melanda.


C541i O Índice de Desenvolvimento da Educação Básica
(IDEB) e as dimensões associadas à qualidade da
educação na escola pública municipal / Andréia
Melanda Chirinéa. - Marília, 2010.
121 f. ; 30 cm.

Dissertação (Mestrado em Educação) – Faculdade


de Filosofia e Ciências, Universidade Estadual
Paulista, 2010.
Bibliografia: f. 106-112.
Orientador: Prof.ª Dr.ª Iraíde Marques de Freitas
Barreiro.

1. Qualidade educacional. 2. Avaliação externa. 3. Escola


Pública. 4. Índice de Desenvolvimento da Educação
Básica (IDEB). I. Autor. II. Título.

CDD: 379
2

ANDRÉIA MELANDA CHIRINÉA

O ÍNDICE DE DESENVOLVIMENTO DA EDUCAÇÃO BÁSICA (IDEB)


E AS DIMENSÕES ASSOCIADAS À QUALIDADE DA EDUCAÇÃO NA
ESCOLA PÚBLICA MUNICIPAL

Dissertação apresentada à Faculdade de Filosofia e Ciências da Universidade


Estadual Paulista, Campus Marília, como parte dos requisitos para a obtenção do
título de Mestre em Educação, Área de Concentração: Políticas Públicas e
Administração da Educação Brasileira, sob orientação da Prof.ª Dr.ª Iraíde Marques
de Freitas Barreiro.

Banca examinadora:

___________________________________________
Prof.ª Dr.ª Iraíde Marques de Freitas Barreiro
Universidade Estadual Paulista

___________________________________________
Prof.ª Dr.ª Graziela Zambão Abdian
Universidade Estadual Paulista

___________________________________________
Prof. Dr. Pedro Ganzeli
Universidade Estadual de Campinas

Marília, 02 de dezembro de 2010.


3

AGRADECIMENTOS

Em primeiro lugar, agradeço a Deus pelo dom da vida, pela sabedoria, e por
colocar em meu caminho pessoas tão especiais que me ajudaram ou me
capacitaram para a realização desse trabalho.
À Prof.ª Dr.ª Iraíde Marques de Freitas Barreiro, pela orientação segura, pela
dedicação, paciência e compreensão, e principalmente por ter contribuído muito com
meu crescimento pessoal e profissional.
À Irmã Elvira Milani, por acreditar no meu potencial e pelos incansáveis
incentivos e apoio.
À minha mãe, Olinda, pelos momentos de partilha, pelo incentivo, apoio e
pelas palavras de carinho.
À minha irmã Adriana Melanda, porque a vida é cheia de surpresas, e porque
tive o privilégio de conviver com você durante 33 anos da minha vida. Obrigada
sempre.
À minha irmã Claudia Melanda, obrigada pelo carinho, pelo apoio e por
caminhar sempre ao meu lado.
Ao meu marido Vicente, pelo amor, carinho, paciência e apoio e por estar
sempre ao meu lado, em todos os momentos.
A todos os professores com quem tive contato durante o curso, pelas
contribuições enriquecedoras para este trabalho.
Aos meus queridos sogros Selma e João Carlos, pelo carinho, apoio e pelas
orações em todos os momentos.
Aos colegas e amigos, em especial à Ana Lúcia Garcia, pela amizade, apoio,
convívio e pelas alegrias e tristezas partilhadas nesta jornada. Ana, você é muito
especial.
Aos professores Dr. Pedro Ganzeli e Dr.ª Graziela Zambão Abdian por
fazerem parte da banca examinadora deste trabalho.
4

Há três passos para a felicidade: ensinar


o que se sabe, praticar o que se ensina e
perguntar o que se ignora.
São Beda
5

RESUMO

Este trabalho procurou investigar as dimensões engendradas no interior de duas


escolas municipais de ensino fundamental que contribuem para elevar a qualidade
da educação no Brasil, demonstrada por meio de testes padronizados, como Prova
Brasil e SAEB (Sistema de Avaliação da Educação Básica), e compilados no Índice
de Desenvolvimento da Educação Básica (IDEB). Para tanto, buscou-se
compreender as dinâmicas que contribuem para a qualidade na educação,
explicitada por meio de índices. Os dados foram coletados em duas escolas dos
municípios de Itápolis e Assis, ambas no interior do Estado de São Paulo, com nota
IDEB de 8,2 e 2,4, respectivamente, no ano de 2007, ou seja, uma escola com
melhor e outra com pior IDEB. O trabalho caracterizou-se por uma pesquisa de
abordagem qualitativa com dois objetos de estudo. Os métodos utilizados para a
coleta de dados foram: observação, análise documental e entrevistas. Já as análises
dos resultados tiveram como parâmetro o documento elaborado pelo MEC/INEP:
Indicadores da Qualidade na Educação. O trabalho é relevante para a área da
política e gestão da educação na medida em explicita contradições da própria
política educacional e qualidade da educação no âmbito da unidade escolar. Os
resultados demonstraram que o nível socioeconômico e cultural dos estudantes, os
níveis de ensino oferecido na escola e seu tamanho físico, assim como os processos
de gestão, constituem fatores determinantes para a qualidade da educação.

Palavras-chave: Qualidade educacional. Avaliação externa. Escola Pública.


6

ABSTRACT

This study aims to research the dimensions engendered in Brazilian public schools,
which contribute to use the quality of the education in Brazil, demonstrated through
standardized tests like “Prova Brasil” (Brazil Exam) and “SAEB” (Assessment of
Basic Education System) and compiled on IDEB (Basic Education of development
index). Thus this paper proposes to uncover the dynamic that contribute to the
education quality beyond the cognitive aspects proved through indexes. The data
were collected in two schools in Itápolis and Assis, both located in the interior of the
state of Sao Paulo. The best school has gotten 8.2 and the worst one has gotten 2.4
in 2007 respectively. This paper is characterized as a qualitative research of the case
study type, which contains two objects of study. The methods of collecting the data
were observing, document analyzing and interviewing. And the result of the analysis
had as a parameter a document elaborated by MEC/INEP (Indicators of quality of
education). This study is relevant to the education field, because it seeks to
demonstrate the observed variables, and how the circumstances and the conditions
help the development of the education itself. The results demonstrated that the
socioeconomic and cultural levels, the education, and the physical size, as the
management processes constitute determinant factors to the quality of the education.

Key-words: Educational quality, External evaluation, Public School


7

LISTA DE ILUSTRAÇÕES

Gráfico 1 – Número de matrículas na rede pública e particular de Itápolis ........................... 21


Gráfico 2 – Número de matrículas na rede pública e particular de Assis.............................. 23
Gráfico 3 – Alteração da dinâmica da sala de aula em função do teor dos testes
padronizados ............................................................................................................... 80
Gráfico 4 – Condição e motivação de trabalho – Itápolis ..................................................... 89
Gráfico 5 – Condição e motivação de trabalho – Assis ........................................................ 89
Gráfico 6 – Frequência de cursos de capacitação das professoras entrevistadas – Itápolis 91
Gráfico 7 – Frequência de cursos de capacitação das professoras entrevistadas – Assis ... 91
Gráfico 8 – Nível de formação do corpo docente – Itápolis .................................................. 92
Gráfico 9 – Nível de formação do corpo docente – Assis ..................................................... 93

Quadro 1 – Formas de propriedade e de administração dos setores do Estado .................. 35


Quadro 2 – Comparação da dimensão ambiente educativo e ambiente físico escolar ......... 76
8

LISTA DE TABELAS

Tabela 1 – Educação Básica no município de Itápolis ......................................................... 21


Tabela 2 – Educação Básica no município de Assis ............................................................ 22
Tabela 3 – Notas do IDEB 2005, 2007 e projetos para o Brasil............................................ 62
Tabela 4 – Taxa de matrícula, transferência, evasão, aprovação e reprova – Itápolis ......... 82
Tabela 5 – Taxa de matrícula, transferência, evasão, aprovação e reprova – Assis ............ 82
Tabela 6 – Resultado do IDEB nas escolas investigadas..................................................... 83
9

LISTA DE ABREVIATURAS E SIGLAS

BIRD – Banco Internacional para Reconstrução e Desenvolvimento


BM – Banco Mundial
CSU – Centro Social Urbano
DASP – Departamento Administrativo de Serviço Público
EJA – Educação de Jovens e Adultos
Enade – Exame Nacional de Desempenho de Estudantes
Enem – Exame Nacional do Ensino Médio
EUA – Estados Unidos da América
FHC – Fernando Henrique Cardoso
Fudescola – Fundo de fortalecimento da escola
Fundef – Fundo para o desenvolvimento e valorização do magistério
HTPC – Hora de trabalho pedagógico coletivo
IDEB – Índice de Desenvolvimento da Educação Básica
IDESP – Índice de Desenvolvimento da Educação no Estado de São Paulo
IDH – Índice de Desenvolvimento Humano
INEP – Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais Anísio Teixeira
MARE – Ministério da Administração Federal e Reforma do Estado
MEC – Ministério da Educação
OCDE – Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Econômico
PDE – Plano de Desenvolvimento da Educação
PIB – Produto Interno Bruto
PNE – Plano Nacional de Educação
PNUD – Programa das Nações Unidas para o Desenvolvimento
PNUD – Programa das Nações Unidas para o Desenvolvimento
PPP – Projeto Político-Pedagógico
PROEP – Programa de Expansão da Educação Profissional
SAEB – Sistema de Avaliação da Educação Básica
SAEP – Sistema Nacional do Ensino Público do 1.º grau
Saresp – Sistema de avaliação de rendimento escolar do estado de São Paulo
Sinaes – Sistema Nacional de Avaliação da Educação Superior
Unesco – Organização das Nações Unidas para a Educação a Ciência e a Cultura
Unicef – Fundo das Nações Unidas para a Infância
10

SUMÁRIO

INTRODUÇÃO .......................................................................................................... 11
O QUE É O IDEB?............................................................................................................ 16
DESCRIÇÃO DA PESQUISA ........................................................................................... 17
A CIDADE DE ITÁPOLIS.................................................................................................. 20
A CIDADE DE ASSIS ....................................................................................................... 22
CAPÍTULO 1 CONTEXTO GERAL DE REFORMA DO ESTADO E SEUS
IMPACTOS NA POLÍTICA EDUCACIONAL BRASILEIRA ..................................... 26
1.1 POLÍTICAS PÚBLICAS E NEOLIBERALISMO ..................................................... 26
1.2 ANTECEDENTES HISTÓRICOS.......................................................................... 29
1.3 HISTÓRICO DAS REFORMAS ADMINISTRATIVAS NO BRASIL ........................ 30
1.4 O CONTEXTO POLÍTICO, ECONÔMICO E SOCIAL DO BRASIL NA
IMPLANTAÇÃO DAS REFORMAS DA DÉCADA DE 1990 ............................................... 32
1.5 O IMPACTO DA REFORMA NA EDUCAÇÃO ....................................................... 36
1.6 A REFORMA DA EDUCAÇÃO BÁSICA E O LIMIAR DE UMA NOVA QUALIDADE
EDUCACIONAL ............................................................................................................... 41
CAPÍTULO 2 O REFERENCIAL DE QUALIDADE LEGITIMADO PELA
AVALIAÇÃO EXTERNA ........................................................................................... 46
2.1 MARCO HISTÓRICO DA AVALIAÇÃO EXTERNA NA AMÉRICA LATINA ............ 46
2.2 OLHAR HISTÓRICO ............................................................................................ 50
2.3 DEFINIÇÃO DE QUALIDADE ............................................................................... 53
2.4 REFERENCIAL DE QUALIDADE LEGITIMADA PELA AVALIAÇÃO EXTERNA ... 56
2.5 TRAJETÓRIA DOS SISTEMAS DE AVALIAÇÃO EXTERNA NO BRASIL............. 59
2.5.1 SAEB e Prova Brasil ......................................................................................... 59
2.5.2 Índice de Desenvolvimento da Educação Básica .............................................. 61
2.6 O IDEB E A QUALIDADE: FATORES DESVINCULADOS .................................... 63
CAPÍTULO 3 O IDEB E OS FATORES INTERVENIENTES À QUALIDADE DA
EDUCAÇÃO ......................................................................................................... 67
3.1 DISCUSSÃO DOS DADOS COLETADOS ............................................................ 69
3.1.1 Ambiente educativo e ambiente físico escolar .................................................. 72
3.1.2 Prática pedagógica e avaliação ........................................................................ 76
3.1.3 Ensino e aprendizagem .................................................................................... 81
3.1.4 Gestão escolar democrática ............................................................................. 83
3.1.5 Formação e condições de trabalho dos profissionais da escola........................ 87
3.1.6 Acesso e permanência dos alunos na escola ................................................... 94
3.2 PERCEPÇÕES DOS SUJEITOS ENTREVISTADOS SOBRE QUALIDADE ......... 94
CONSIDERAÇÕES FINAIS .................................................................................... 100
REFERÊNCIAS ....................................................................................................... 106
APÊNDICE A – ANÁLISE DOCUMENTAL ............................................................ 113
APÊNDICE B – OBSERVAÇÃO DO AMBIENTE ESCOLAR E DA ESTRUTURA
FÍSICA..................................................................................................................... 114
ANEXO C – ENTREVISTA COM DIRETOR ESCOLAR......................................... 116
ANEXO D – ENTREVISTA COM PROFESSOR ..................................................... 118
11

INTRODUÇÃO

As discussões sobre a qualidade da educação no Brasil suscitam questões


sobre formação docente, financiamento, estrutura física do prédio, prática
pedagógica, perfil socioeconômico do aluno e gestão escolar. Elementos
considerados determinantes da qualidade da educação em uma unidade escolar. No
arcabouço das discussões estão as avaliações externas como forma de qualificar as
escolas e os sistemas de ensino no país. A aplicação de testes que aferem o
desempenho acadêmico de alunos das escolas públicas e privadas no Brasil tornou-
se uma constante a partir da década de 1990, após a reforma do Estado e com uma
nova agenda política para a área educacional, tendo em vista a reconfiguração da
economia e a valorização de critérios como eficiência, eficácia, produtividade e
competências para a educação brasileira.
A regulação do Estado na educação, construída na perspectiva dos governos
neoliberais, denota uma mudança na ação do próprio Estado, do ponto de vista da
não intervenção na economia e no mercado, a não ser como um avaliador dos
serviços prestados.
Na área da educação, duas são as perspectivas de Estado a serem
consideradas. A primeira delas é o Estado provedor, que atua efetivamente na oferta
obrigatória e gratuita da educação básica. A outra perspectiva é o Estado Avaliador,
que institui mecanismos para aferir a qualidade da educação ministrada nas escolas
e nos sistemas de ensino, tendo como critério os mesmos parâmetros de eficácia,
eficiência e produtividade.
No caso da educação, o Estado Avaliador mede e avalia a qualidade da
educação tendo como ferramenta os testes realizados em larga escala, cuja
proposta promove ethos competitivo nas unidades escolares, assim como repassa
para as escolas a responsabilidade pelo sucesso ou fracasso demonstrado nas
avaliações externas.
Com base nesses testes, são elaborados quadros demonstrativos de índices
de desempenho, como é o caso do Índice de Desenvolvimento da Educação Básica
(IDEB), que reúne informações coletadas a partir do Censo Escolar e das médias de
desempenho alcançadas no Sistema de Avaliação da Educação Básica (SAEB) e na
Prova Brasil. O IDEB leva em consideração o fluxo escolar (promoção, repetência e
evasão) e as médias de desempenho dos estudantes em testes padronizados
12

(avaliação externa). A proposta do índice, portanto, considera somente os fins da


educação e não seus processos, tampouco suas especificidades.
No entanto, existem algumas dimensões que contribuem para qualificar
escolas e aumentar o nível do IDEB, mas que são negligenciadas pelos testes
padronizados. O tipo de gestão, o ambiente educativo, a formação e as condições
de trabalho dos profissionais da escola, sua estrutura física e a prática didático-
pedagógica, não são considerados no momento da aferição do IDEB. Contudo,
constituem fatores determinantes para a qualidade, na medida em que se articulam
em prol de um bom desempenho escolar.
Nesse sentido, não basta levar em consideração somente os indicadores e os
resultados quantificáveis e mensuráveis sem refletir sobre as especificidades dos
contextos e dos processos educativos (AFONSO, 2001). É preciso entender como
essas dimensões são engendradas no interior das escolas e como seus
delineamentos conduzem à qualidade educacional, para além dos aspectos
considerados pelas avaliações externas e compilados pelo IDEB.
Ao buscar contribuir com a temática da qualidade educacional, esta pesquisa
objetivou compreender as dimensões e dinâmicas produzidas no interior da escola
que orientam ou contribuem para qualificação de seus processos educativos.
Como parâmetro de análise sobre a qualidade, teve-se como referência o
IDEB e os Indicadores da Qualidade na Educação, documentos elaborados pelo
MEC/INEP para balizar políticas, metas e ações que devem ser empreendidas pelas
escolas brasileiras na busca de qualificar seus processos educativos.
Cabe destacar que, enquanto o IDEB é um referencial estatístico e
quantitativo de qualidade, os Indicadores da Qualidade na Educação se configuram
numa perspectiva mais reflexiva, pois articula o engajamento da própria escola na
luta pela melhoria da qualidade.
Para estabelecer parâmetros de reflexão e mobilização da escola, no que se
refere à melhoria da qualidade, os Indicadores da Qualidade na Educação
estabelecem elementos fundamentais denominados dimensões, a saber: ambiente
educativo, prática pedagógica e avaliação, ensino e aprendizagem da leitura e da
escrita, gestão escolar democrática, formação e condições de trabalho dos
profissionais da escolar, espaço físico escolar e, finalmente, acesso, permanência e
sucesso na escola.
13

Segundo o documento, a qualidade da educação é permeada por essas sete


dimensões e tem por objetivo ajudar a comunidade escolar a avaliar e a melhorar a
qualidade da escola. Nesse sentido, o documento procura demonstrar alguns
critérios e prioridades que conduzem ou promovem a qualidade.
O IDEB é um indicador estatístico, condutor de políticas públicas de melhoria
da educação. Seu cálculo é baseado no tempo de permanência dos alunos na
escola e na média de desempenho dos estudantes em testes padronizados. As
metas do IDEB são bienais e servem para traçar a evolução dos índices de
qualidade da educação no país, assim como para mobilizar uma série de ações
estratégicas das escolas e sistemas de ensino para o alcance das metas
estabelecidas.
No entanto, essas metas estão relacionadas somente às médias de
desempenho acadêmico dos alunos e às taxas de rendimento escolar, não havendo
ligação alguma entre os contextos específicos de cada escola, ou suas
peculiaridades.
Contudo, entende-se que esses contextos específicos conduzem a escola aos
resultados apresentados pelo IDEB, influenciando dessa forma a qualidade da
educação. Há, nesse sentido, algumas dimensões ou elementos próprios do
ambiente escolar que contribuem para a qualidade e que estão além das taxas de
desempenho e fluxo.
Diante disso, cabe perguntar: quais são os elementos ou dimensões que, no
interior de duas escolas municipais de ensino fundamental, contribuem para elevar a
qualidade educacional e que estão além do enfoque pedagógico e dos conceitos de
fluxo escolar (promoção, repetência e evasão) e médias de desempenho?
Para responder a essas perguntas, procurou-se analisar as dinâmicas
conduzidas pelas próprias escolas públicas municipais investigadas no que se refere
à qualidade, tendo como pressuposto o Indicadores da Qualidade na Educação.
Portanto, esta pesquisa insere-se num conjunto de investigações sobre
qualidade da educação aferida por meio de avaliações externas1 e procurou
evidenciar os fatores considerados qualitativos em duas escolas do interior do
Estado de São Paulo.

1
Consideram-se avaliações externas todos os mecanismos que regulam a educação via testes
padronizados, como o SAEB, a Prova Brasil, o Enem e o Enade.
14

Para realização da pesquisa, foram coletados dados em duas escolas,


localizadas nas cidades Itápolis e Assis, ambas no interior do Estado de São Paulo,
situadas nos extremos da aferição do IDEB realizado no ano de 2007. Enquanto
Itápolis alcançou média de 8,2, Assis ficou com média 2,4 2 na escala de
classificação divulgada pelo INEP. As informações foram coletadas e analisadas nas
duas escolas numa perspectiva comparativa, tendo como eixo norteador os
Indicadores da Qualidade na Educação.
A escolha desse documento deu-se principalmente pela descrição que traz
das dimensões da qualidade, dando a possibilidade de estabelecer categorias de
análise de acordo com a perspectiva do próprio Estado, uma vez que os Indicadores
da Qualidade na Educação foram formulados com a parceria do MEC/INEP; Ação
Educativa; Unicef e PNUD.
Dessa forma, foram utilizadas as dimensões descritas nos Indicadores:
ambiente educativo; prática pedagógica; ensino e aprendizagem da leitura e escrita;
gestão escolar democrática; formação e condições dos professores; ambiente físico
escolar e, finalmente, acesso e permanência como parâmetros de análise e
comparação.
Além de investigar as dinâmicas e as dimensões engendradas no ambiente
escolar na busca pela qualidade, esta pesquisa também procurou analisar e apontar
as características e peculiaridades de cada escola investigada; identificar os
elementos considerados qualitativos dessas escolas e, enfim, comparar os
resultados obtidos nas duas escolas, buscando entender os fatores que, junto com
os conceitos de fluxo escolar e médias de desempenho, contribuem para elevar a
qualidade da educação.
O interesse em pesquisar o tema qualidade na educação surgiu das
inquietações pedagógicas da pesquisadora enquanto professora do Ensino
Fundamental da rede pública de ensino e de indagações políticas e ideológicas
sobre a axiologia da qualidade. Essas perguntas tinham como foco a qualidade do
processo de ensinar e aprender e a busca de um constante aprimoramento das
práticas didático pedagógicas.
Concomitantemente a isso, questionava o valor e o sentido da qualidade para
a educação, considerando que ela assume características diferentes, dependendo

2
Ensino Fundamental Regular – Séries iniciais (até a 4.ª série). Dados referentes ao ano de 2007.
Disponível em: <http://www.portalinep.inep.gov.br>. Acesso em: 14 dez. 2009.
15

do enfoque dado, ciente, no entanto, de que esse atributo advém de outros fatores
que estão externos à sala de aula e à própria escola, como o nível socioeconômico e
cultural das famílias cujos filhos frequentam a escola; a gestão democrática e a
participação de pais.
Paralelamente à prática docente, o interesse em pesquisar a temática da
qualidade educacional também surgiu das muitas análises e ponderações discutidas
em encontros docentes, seminários, congressos em que o assunto é tratado.
Quando o IDEB passou a ser o grande referencial de qualidade para a
educação a partir de 2005, os questionamentos aumentaram, na medida em que
havia o entendimento da qualidade como um contexto maior do que simplesmente a
aferição de taxas de aprovação e desempenho.
Por isso a escolha em estudar o IDEB numa perspectiva comparativa,
procurando considerar os contextos próprios de cada unidade escolar e como estes
contextos ou especificidades influenciam a qualidade da educação e,
consequentemente, o Índice de Desenvolvimento da Educação Básica.
Outra questão na qual esta pesquisa se debruçou e procurou compreender
são as avaliações externas como mecanismo de controle do Estado, vinculando o
rendimento escolar dos alunos com promoções, méritos e bônus financeiros para
escolas, gestores e professores que alcançarem níveis estatisticamente satisfatórios
nas avaliações externas. A qualidade, portanto, é vista como algo meramente
estatístico e fundamentalmente quantitativo, baseada em critérios de produtividade,
eficácia e eficiência.
Engendradas, essas políticas procuram adequar a qualidade da educação no
país de forma a inseri-lo no grupo dos países desenvolvidos até o ano de 2021,
ocasião em que o Brasil estará às vésperas de completar 200 anos de sua
independência e tem como expectativa alcançar o índice 6,0 no IDEB, que é a média
atingida por países desenvolvidos que integram a OCDE.
Dessa premissa, entende-se que a educação é vista somente como um
indicador a ser buscado em longo prazo para a inclusão do Brasil no grupo dos
países desenvolvidos e para a formação de indivíduos capazes de responder às
demandas do mercado. A qualidade da educação, nesse sentido, não emerge como
direito do cidadão, mas como uma exigência de qualificação dos processos
educativos pela racionalidade imposta pelas inovações tecnológicas, pela
16

reestruturação do capitalismo e pela nova sociedade da informação e do


conhecimento.
De acordo com as assertivas acima e na busca de desvelar as dinâmicas
escolares que norteiam o Índice de Desenvolvimento da Educação Básica, é que
esta pesquisa ora apresentada, objetiva investigar as dimensões que contribuem
para a qualidade da educação.

O QUE É O IDEB?

O Índice de Desenvolvimento da Educação Básica (IDEB) é um instrumento


de medida criado pelo Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais
Anísio Teixeira (INEP), que combina dois indicadores: o desempenho dos alunos em
testes padronizados e os indicadores de fluxo, como promoção, repetência e
evasão.
Os testes padronizados, cuja pontuação média determina o IDEB (como a
Prova Brasil, que avalia somente os estudantes do ensino fundamental, no quinto e
nono anos e o SAEB, Sistema de Avaliação da Educação Básica, que avalia os
estudantes do quinto ano e do nono anos do ensino fundamental e avalia também os
estudantes do terceiro ano do ensino médio) são os principais instrumentos de
avaliação externa que conduzem ao resultado do índice, no que se refere a
rendimento e desempenho escolares.
O escopo do índice, segundo Fernandes (2007), é monitorar o sistema
educacional no país, diagnosticar possíveis falhas e nortear ações políticas de
melhoria para o sistema de ensino. Dessa forma, os objetivos do IDEB são:

a) detectar escolas e/ou redes de ensino cujos alunos apresentem


baixa performance em termos de rendimento e proficiência;
b) monitorar a evolução temporal do desempenho dos alunos
dessas escolas e/ou redes de ensino. (FERNANDES, 2007, p. 8).

Caracterizado como um instrumento de análise da qualidade educacional nas


escolas públicas brasileiras, o IDEB é um dos parâmetros que o MEC tem para
atingir as metas propostas no Plano de Desenvolvimento da Educação (PDE),3 que

3
Plano elaborado a partir do documento “Todos pela Educação” – movimento organizado em 2006
por diferentes setores da sociedade e que defendem metas qualitativas a serem atingidas pela
educação no Brasil. Documento disponível em: <www.todospelaeducacao.org.br>.
17

tem como objetivo promover um salto qualitativo no sistema educacional brasileiro,


tendo como base a avaliação e a responsabilização.
Uma das metas da PDE é interligar avaliação, financiamento e gestão,
tomando como referência o conceito de responsabilização (accountability) e, como
decorrência, a mobilização social em prol da educação de “qualidade”. As avaliações
externas estão relacionadas à ideia da responsabilização e da prestação de contas
por parte de todos os envolvidos na educação. O accountability 4 pode incluir outras
informações, mas a ênfase é sempre nos resultados, ou seja, no desempenho dos
estudantes. A responsabilidade é motivada por incentivos que podem ter ou não
prêmios ou punições atrelados aos resultados e pela divulgação dos resultados
alcançados pelas escolas e sistema de ensino, contribuindo dessa forma para o
estabelecimento de rankings e para o estímulo à competitividade entre as unidades
escolares (GRAMAUD; FERNANDES, 2009).
As avaliações externas como forma de “medir” o nível de qualidade da
educação brasileira tornou-se uma constante a partir da década de 1990, em
decorrência principalmente de um novo modelo de gerenciamento do Estado, da
reestruturação capitalista e das novas exigências advindas de um novo paradigma
social, a chamada de sociedade da informação e do conhecimento, em que a
exigência do aprender a aprender, aprender a conviver, aprender a fazer e aprender
a ser (DELORS, 2001), passaram a ser as ferramentas mais importantes para o
desenvolvimento econômico de um país e para o individuo lograr êxito profissional.
As avaliações externas, desse modo, são utilizadas como instrumentos de
medida, adequação e controle dos sistemas educativos, passando a orientar
políticas públicas na área da educação.

DESCRIÇÃO DA PESQUISA

Trata-se de uma pesquisa de natureza qualitativa, pois, de acordo com


Bogdan e Biklen (1994), privilegia a compreensão dos comportamentos a partir da
perspectiva dos sujeitos participantes da investigação. A pesquisa qualitativa busca

4
A responsabilidade pelo desempenho dos estudantes nas avaliações externas fica a cargo dos
professores e diretores das unidades escolares que podem ou não, dependendo da política adotada,
receber incentivos pelos “bons” resultados alcançados. ANDRADE, Eduardo. School accountability no
Brasil: experiências e dificuldades. Revista de Economia Política, v. 28, n. 3, p. 443-453, 2008.
18

compreender melhor o comportamento e a experiência humana. Teve como campo


de coleta duas escolas públicas municipais de educação, localizadas nas cidades de
Itápolis e Assis, ambas no interior do Estado de São Paulo, que tiveram notas IDEB
2007 díspares, do ponto de vista da medição da qualidade aferida pelo índice.
A escolha dessas escolas foi estabelecida mediante análise dos dados
estatísticos divulgados pelo MEC/INEP,5 na publicação dos dados referente ao IDEB
2007. Essa análise permitiu verificar que Itápolis alcançou uma nota de 8,2,
enquanto Assis obteve somente 2,4. O critério de escolha, portanto, foi a nota do
IDEB no ano de 2007.
A metodologia adotada foi o estudo de caso, partindo do pressuposto de que
este trabalho procura compreender as realidades específicas de cada escola, assim
como as variáveis existentes nos contextos investigados que determinam ou
influenciam os índices de qualidade.
Segundo André (2005 p. 33), o estudo de caso apresenta como uma de suas
vantagens “a possibilidade de fornecer uma visão profunda e ao mesmo tempo
ampla e integrada de uma unidade social complexa, composta de múltiplas
variáveis”.
Ao fundamentar a pesquisa sob o enfoque do estudo de caso com dois
objetos de estudo, ou seja, duas escolas e suas especificidades e contextos
próprios, procurou-se estabelecer comparações, descrições e explicações dos
fenômenos investigados, possibilitando análises das questões referentes à
qualidade dentro desses contextos específicos.
Os instrumentos escolhidos para coleta de dados foram a observação, a
entrevista semiestruturada e a análise documental, que considerou o Projeto
Político-Pedagógico das duas escolas participantes da pesquisa.
Fundamentando-se em Triviños (1987), a pesquisa utilizou a técnica da
triangulação de dados, por isso a escolha da observação, da entrevista semi-
estruturada e da análise documental, com o intuito de abranger a máxima amplitude
nas análises, descrições e explicações dos contextos investigados.
As entrevistas foram realizadas no segundo semestre do ano de 2009.
Primeiramente, com as diretoras das escolas investigadas e num segundo momento

5
Divulgação dos dados estatísticos do IDEB – planilhas para download. Disponível em:
<http://www.portalideb.inep.gov.br>. Acesso em: 27 set. 2010.
19

com seis professoras de cada escola. O critério de escolha das professoras


entrevistadas foi determinado pela própria diretora da escola, que solicitou que a
pesquisadora entrevistasse aquelas que não estavam em sala de aula no momento
da coleta de dados.
As entrevistas seguiram um roteiro previamente elaborado, com perguntas
semiestruturadas e objetivaram um olhar mais aprofundado dos fatores que
contribuem para a qualidade e que conduzem a escola para as melhores ou piores
notas do IDEB. As entrevistas foram utilizadas em conjunto com as demais técnicas
de coleta de dados.
A observação nas escolas foi realizada para estreitar o contato com as
dinâmicas do cotidiano, assim como observar as ações dos sujeitos investigados,
constituindo-se a vantagem de verificar a ocorrência de situações que nos permitem
chegar mais perto da perspectiva dos sujeitos. De acordo com Lüdke e André (1986,
p. 36):

não é possível aceitar plena e simplesmente o discurso verbalizado


como expressão da verdade ou mesmo do que pensa ou sente o
entrevistado. É preciso analisar e interpretar esse discurso à luz de
toda aquela linguagem mais feral e depois confrontá-lo com outras
informações da pesquisa e dados sobre o informante.

A análise documental é importante porque se constitui num elemento a ser


considerado na coleta e análise dos dados, colaborando, inclusive para validar ou
ratificar as informações coletadas pelas entrevistas.
A análise dos dados coletados possibilitou entender os contextos
investigados, compará-los e descrevê-los, contribuindo para elucidar as questões
centrais que nortearam esta pesquisa, bem como para a consecução dos objetivos
estabelecidos.
Para estabelecer categorias de descrição, como apontado anteriormente,
utilizou-se como parâmetro o documento Indicadores da Qualidade na Educação,
elaborado pelo MEC/INEP, que permite às escolas analisar determinados aspectos
ou elementos considerados como qualitativos.
O objetivo dos Indicadores da Qualidade na Educação é contribuir com
escolas, ajudando-as a avaliar e melhorar a qualidade de seus processos
educativos, estabelecendo para tanto seis elementos fundamentais, chamados de
dimensões pelos quais a qualidade da escola deve necessariamente passar.
20

Durante a pesquisa, os Indicadores da Qualidade na Educação foram


importantes na medida em que estabeleceram um referencial para a comparação
entre os objetos investigados, assim como contribuíram para constituir categorias de
análise.
A seguir, será feita a descrição de forma pormenorizada das escolas
participantes da pesquisa, bem como de seus municípios.

A CIDADE DE ITÁPOLIS

Itápolis é uma cidade localizada no centro geográfico do Estado de São


Paulo, a 360 km da capital paulista, numa área territorial que abrange 995 km². A
cidade conta hoje com aproximadamente 38.633 habitantes, segundo estimativa do
IBGE de 2007. O IDH da cidade é de 0,785.6
O principal produto agrícola cultivado na cidade é a laranja, que é
industrializada e importada, senvindo ao mercado interno e externo, movimentando a
economia local.
A cidade também é uma referência nacional no setor da aviação, pois possui
uma escola de formação de pilotos situada no Aeroclube de Itápolis e certificada
pela Agência Nacional de Aviação Civil (ANAC).
A cidade é relativamente pequena se comparada à Assis. Embora sua área
territorial seja maior, a cidade não cresceu tanto na área urbana, principalmente em
função da produção agrícola.
Itápolis possui atualmente 15 escolas de Ensino Fundamental, 7 escolas de
Ensino Médio e 11 escolas de Educação Infantil, conforme Tabela 1.

6
Segundo o Atlas do Desenvolvimento Humano. Programa das Nações Unidas para o
Desenvolvimento (PNUD). Disponível em: <http://www.pnud.org.br/atlas>. Acesso em: 17 nov. 2009.
21

Tabela 1 – Educação Básica no município de Itápolis


Descrição Quantidade
Ensino Fundamental – Escola pública estadual 10
Ensino Fundamental – Escola pública municipal 2
Ensino Fundamental – Escola particular 3
Ensino Médio – Escola pública estadual 4
Ensino Médio – Escola particular 3
Educação Infantil – Pré-escola pública municipal 8
Educação Infantil – Pré-escola particular 3
Fonte: IBGE (2008).

O maior índice de matrículas incide no ensino fundamental da rede pública


estadual. O percentual de matrículas é de 58%, contra 4% da rede municipal.

Gráfico 1 – Número de matrículas na rede pública e particular de Itápolis

Matrícula Ensino Fundamental –


1% Escola pública estadual
3% 13% Matrícula Ensino Fundamental –
Escola pública municipal
Matrícula Ensino Fundamental –
16%
Escola Particular
58%
Matrícula Ensino Médio - Escola
5% pública estadual
4% Matrícula Ensino Médio - Escola
Particular
Matrícula Educação Infantil –
Pré-escola pública municipal
Matrícula Educação Infantil –
Pré-escola particular

Fonte: IBGE (2008).

A escola pesquisada em Itápolis foi inaugurada em 1989 e está em bom


estado de conservação. Ao todo são cinco salas de aula para as turmas do 1.º ao 5.º
anos, funcionando em dois períodos, manhã e tarde, possui uma sala de informática
nova, porém sem acesso à internet, e uma quadra poliesportiva. Atualmente, atende
a 266 alunos matriculados. O quadro docente é formado por 14 professores e não
22

há equipes de coordenação e vice-direção. A diretora e a secretária exercem


funções que vão desde serviços burocráticos e administrativo até inspeção de
alunos no horário de intervalo.
A escola está localizada em bairro periférico da cidade, mas atende famílias
com bom nível socioeconômico, considerando-se acesso a bens culturais como
jornais, revista, internet, cinema, rádio e televisão e atividades de lazer e cultura.
Uma realidade bastante distinta da escola investigada em Assis.

A CIDADE DE ASSIS

Assis é uma cidade localizada no sudoeste do Estado de São Paulo, distante


448 km da capital, numa área territorial de 462 km². Possui aproximadamente 92.965
habitantes, segundo estimativa realizada pelo IBGE em 2007. O IDH da cidade está
em 0,829.7
A cidade é caracterizada como um importante ponto de entroncamento
rodoviário entre os Estados de São Paulo, Paraná e Mato Grosso do Sul.
Sua posição geográfica privilegiada contribui para um perfil econômico
diversificado na agricultura, comércio e prestação de serviços, despontando como
grande centro educacional e tecnológico. É a única cidade da América Latina a ter o
curso de Biotecnologia. Tem forte potencial turístico no rio Paranapanema.
Assis possui atualmente 42 escolas de Ensino Fundamental, 21 escolas de
Ensino Médio e 31 escolas de Educação Infantil, conforme Tabela 2:

Tabela 2 – Educação Básica no município de Assis


Descrição Quantidade
Ensino Fundamental – Escola pública estadual 12
Ensino Fundamental – Escola pública municipal 21
Ensino Fundamental – Escola particular 9
Ensino Médio – Escola pública estadual 13
Ensino Médio – Escola particular 8
Educação Infantil – Pré-escola pública estadual 1
Educação Infantil – Pré-escola pública municipal 20
Educação Infantil – Pré-escola particular 10
Fonte: IBGE (2008).

7
Segundo o Atlas do Desenvolvimento Humano. Programa das Nações Unidas para o
Desenvolvimento (PNUD). Disponível em: <http://www.pnud.org.br/atlas>. Acesso em: 17 nov. 2009.
23

As matrículas estão distribuidas entre as redes municipal, estadual e


particular, mas a grande maioria está alocada na rede municipal de ensino, conforme
representação gráfica.

Gráfico 2 – Número de matrículas na rede pública e particular de Assis

Matrícula Ensino Fundamental –


3% 14% Escola pública estadual
25%
Matrícula Ensino Fundamental –
Escola pública municipal
18% Matrícula Ensino Fundamental –
Escola particular
Matrícula Ensino Médio - Escola
9% 31% pública estadual
Matrícula Ensino Médio - Escola
particular
Matrícula Educação Infantil – Pré-
escola pública municipal

Fonte: IBGE (2008).

A escola investigada em Assis foi fundada em 2004 e atende alunos do 1.º ao


5.º anos do ensino fundamental e também alunos da educação infantil, funcionando
em período integral. Dessa forma, os alunos assistem às aulas formais no período
da manhã e à tarde participam de oficinas de língua estrangeira; experiências
matemáticas; estudos e pesquisas; futsal; expressão corporal; meio ambiente;
iniciação musical; saúde e qualidade de vida; hora da leitura; informática e xadrez.
As oficinas são ministradas em parceria com o Centro Social Urbano (CSU) e
a Associação dos Policiais Civis da região de Assis (Apocira).
A escola investigada na cidade, atualmente, atende 341 alunos divididos em:
97 na Educação Infantil; 212 no Ensino Fundamental; 32 na sala de recurso (para
alunos com deficiência intelectual)8 e está localizada em bairro periférico da cidade.
É uma escola grande, com boa infraestrutura, agregando espaços como
brinquedoteca, lactário e horta. A unidade tem uma área total de 6.511,81 m², no
entanto não possui quadra poliesportiva e biblioteca.

8
Dados referentes ao ano de 2009.
24

Ao todo são 36 professores que trabalham na escola, além estagiário e


monitores que colaboram nas oficinas que colaboram nas oficinas.
O núcleo gestor da escolar é formado pela diretora, vice e as coordenadoras
pedagógicas dos dois segmentos, Educação Infantil e Ensino Fundamental.
As crianças que frequentam a escola são provenientes dos bairros adjacentes
e também da zona rural da cidade de Assis. A escola está situada num bairro onde
há altos índices de criminalidade e violência e atende predominantemente famílias
carentes.
Ressalta-se que este trabalho discute questões relacionadas à qualidade
educacional brasileira, contudo, é preciso esclarecer que, em se tratando de
qualidade, as variáveis são muitas, e perpassam o âmbito da política pública dentro
e fora do ambiente escolar, como plano de cargos carreiras e salários, FUNDEB,
gestão democrática da escola e PIB dos municípios.
Diante das muitas perspectivas trazidas pelo tema, privilegiou-se neste
trabalho as dinâmicas próprias do ambiente escolar, e a condução dos processos
pedagógicos e administrativos para alcançar índices satisfatórios no IDEB, tido como
o referencial de qualidade das escolas públicas e particulares do país.
A pesquisa está estruturada em três capítulos. No primeiro capítulo, “Contexto
geral de reforma do Estado e seus impactos na política educacional brasileira”,
buscou-se analisar os mecanismos engendrados que influenciaram as proposições
políticas a partir da década de 1990.
Nesse sentido, a discussão perpassa a reforma do Estado promovida pelo
Governo Fernando Henrique Cardoso e a nova agenda política para a área da
educação. Ainda nesse capítulo, foram analisados os impactos da reforma na
educação e como as proposições de políticas públicas foram sendo implantadas
com vistas a atender ao ideário neoliberal e às agências multilaterais sob o ponto de
vista da reestruturação capitalista.
O segundo capítulo, “O referencial de qualidade legitimado pela avaliação
externa”, procurou evidenciar como as avaliações externas foram implantadas na
América Latina e no Brasil e qual o referencial de qualidade subjacente à aferição
por meio de testes padronizados. Também discutiu-se como as avaliações externas
passaram a ser as grandes propositoras de políticas públicas para a área
educacional no país.
25

Já o capítulo terceiro, intitulado “O IDEB e os fatores intervenientes à


qualidade da educação”, concentra o eixo central do trabalho de análise e a
discussão dos resultados. Procurou analisar como as escolas articulam diferentes
dimensões próprias do contexto escolar para a busca da qualidade, assim como
entender os fatores determinantes da qualidade em cada escola investigada numa
perspectiva comparativa.
Busca-se compreender neste capítulo as dinâmicas que orientam o IDEB sob
o ponto de vista das escolas investigadas e os fatores que numa análise mais
aprofundada são evidenciados reais na escola, mas não são levados em
consideração pelas avaliações externas.
26

CAPÍTULO 1 CONTEXTO GERAL DE REFORMA DO ESTADO E SEUS


IMPACTOS NA POLÍTICA EDUCACIONAL BRASILEIRA

1.1 POLÍTICAS PÚBLICAS E NEOLIBERALISMO

Para entender as dinâmicas sociais que afetam as sociedades pós-modernas


e, consequentemente, a escola como instituição social, é importante compreender os
mecanismos engendrados que determinam e influenciam as proposições de políticas
públicas, especialmente a partir da década de 1990, quando o Estado brasileiro,
através do Ministério de Administração e Reforma do Estado (MARE) propôs e
implantou um Estado com a função de regulador social dos serviços prestados pelo
próprio Estado e pela iniciativa privada.
O entendimento de termos como neoliberalismo e regulação social pelas vias
do mercado, originários do século XVII, em que a essência do pensamento
neoliberal encontrou suas formulações teóricas a partir do liberalismo clássico, é
bastante representativo para compreender as dinâmicas sociais do século XXI.
O neoliberalismo pressupõe que o Estado deve intervir o mínimo possível nas
questões econômicas, políticas e sociais, transferindo essa responsabilidade para o
mercado, pois somente ele é capaz de estruturar e coordenar racionalmente os
problemas sociais.
Segundo Teixeira (1998), o neoliberalismo foi a resposta encontrada pelos
países capitalistas para um modelo de estado centralizador e “letal” que tem em sua
base o intervencionismo em todos os setores sociais, principalmente após a
Segunda Guerra Mundial. Segundo o autor, o principal fator da crise de eficiência e
governabilidade do Estado é justamente a interferência que ele tem em todas as
questões sociais.
O modelo neoliberal – cujos principais expoentes teóricos são Friederich
Hayek da Escola de Viena, ganhador do prêmio Nobel de Economia em 1974, e
Milton Friedman, da Escola de Chicago, ganhador do mesmo prêmio em 1976 –
postula a análise da sociedade, do Estado e da política, nos moldes do liberalismo
clássico, cuja formulação teórica defende um Estado constitucional, do ponto de
vista jurídico, no qual a liberdade social de cada indivíduo seja respeitada segundo
um conjunto de normas e leis expressas num código ou numa constituição. Há,
portanto, um limite no poder do Estado quanto à sua ação, em detrimento da
27

liberdade dos indivíduos, constituindo-se a partir daí, os direitos naturais. No


entendimento de Bobbio (1984, p. 15): “[...] os direitos naturais constituem um limite
ao poder do Estado, pelo fato de que o Estado deve reconhecê-los, não pode violá-
los, pelo contrário, deve assegurar aos cidadãos o seu livre exercício”.
Os direitos naturais asseguram aos indivíduos a garantia contra o poder
absoluto do Estado, bem como a liberdade de exercer seus direitos, enquanto
cidadão (TEIXEIRA; OLIVEIRA, 1998).
Bianchetti (2005) entende o neoliberalismo como uma proposta hegemônica
dos países capitalistas, desenvolvido a partir da década de 1970, que teve como
princípio romper com o paradigma keynesiano e com as políticas distributivas do
Estado de Bem-estar Social, num período de instabilidade financeira decorrente
principalmente da crise do petróleo.
Portanto, todos os problemas originários na sociedade como emprego, renda,
previdência, habitação, saúde e educação são passíveis de serem resolvidos pelo
próprio mercado e pela liberdade de atuação dos indivíduos e não somente por
políticas públicas desprendidas pelo Estado, que se ocupem de resolver essas
questões.
As premissas que apoiam esse modelo são predominantemente: a
reestruturação econômica do capitalismo, caracterizada como a mínima participação
do Estado nos rumos da economia; aumento da produção com vistas ao
desenvolvimento econômico; livre comércio e uma política de privatização das
empresas estatais. Na compreensão de Morrow e Torres (2003, p. 275): “[...] o
Estado, o intervencionismo estatal e as empresas estatais são parte do problema,
não da solução”.
Azevedo (2004) critica o neoliberalismo ao afirmar que ele é usado para o
total convencimento da sociedade, sendo considerado a “solução” para todos os
males sociais. No que se refere à educação, o ideário neoliberal tenta melhorar as
economias nacionais, via processos educativos, com vistas à formação de mão-de-
obra para atendimento às demandas do mercado.
Enquanto política social, a educação é subsidiada pelo Estado, sob a
justificativa da educação ser um elemento importante para minimizar as
desigualdades sociais, assim como fazer avançar a sociedade.
No entanto, esse subsídio do Estado é dividido com o setor privado sob a
alegação de estimular a competição e “aquecer o mercado” educacional, assim
28

como estabelecer o equilíbrio necessário, com vistas a garantir a qualidade nos


processos. Portanto, a política neoliberal é consolidada por um Estado menos
intervencionista e mais regulador.
Na orientação do Estado Mínimo, as políticas públicas, de cunho social, são
as principais responsáveis pela crise atual do Estado, uma vez que elas ferem os
princípios liberais tanto no plano econômico como no plano social e moral. Segundo
Bianchetti:

As políticas adequadas para retomar o crescimento econômico nas


sociedades capitalistas (...) exigirão necessariamente transformações
profundas nas estruturas das sociedades ocidentais, com a
perspectiva de liberar novamente o funcionamento dos mecanismos
naturais, que se expressam no mercado e que foram desvirtuados
pela aplicação de políticas redistributivas direcionadas pelo Estado.
(BIANCHETTI, 2005, p. 23).

As políticas redistributivas citada por Bianchetti são consubstanciadas no


Estado de Bem-estar Social ou Welfare State, cuja organização política e econômica
fica a cargo do Estado, que tem como função organizar e promover a economia,
provendo serviços como saúde, educação, seguridade social e habitação.
O Estado de Bem-estar Social entrou em conflito diante das estruturas
capitalistas ante a crise do petróleo na década de 1970, do estancamento
econômico, da inflação, das inovações tecnológicas e do fortalecimento do setor
financeiro internacional, refletindo inevitavelmente no crescimento econômico e na
acumulação do capital. Nesse contexto, o neoliberalismo foi a resposta encontrada
para a crise do capitalismo e o Estado, como instituição que detém o poder, é o
mediador e o regulador da mesma crise (MORROW; TORRES, 2003).
O Estado regula porque determina regras e normas que devem ser aplicáveis
em situações gerais, enquanto os indivíduos ficam livres para se relacionarem na
sociedade, segundo seus próprios interesses.
As experiências dos governos de Margaret Thatcher, na Inglaterra, e Ronald
Reagan nos Estados Unidos, caracterizam um marco teórico-prático da corrente
neoliberal nas sociedades modernas.
Na América Latina, o primeiro país a implantá-lo foi o Chile, no governo
ditatorial do general Augusto Pinochet, em 1974, seguido dos governos de Carlos
Saul Menem, na Argentina, e de Carlos Salinas, no México (PALMA FILHO, 2005).
29

No Brasil, o modelo neoliberal começou a delinear-se no final da década de


1980, no governo do então presidente Fernando Collor de Melo, mas sua efetiva
consolidação ocorreu na década de 1990, ocasião em que foi implantada a Reforma
do Estado, através do Ministério da Administração Federal e Reforma do Estado
(MARE), no governo de Fernando Henrique Cardoso (PERONI, 2003).

1.2 ANTECEDENTES HISTÓRICOS

Embora o modelo neoliberal tenha sido colocado em prática somente após a


redemocratização do Brasil, e mais especificamente no governo FHC, os
antecedentes históricos remontam da década de 1980, quando o Consenso de
Washington, agregando membros do governo norte-americano e de organismos
financeiros como o Fundo Monetário Internacional, Banco Mundial e o Banco
Interamericano de Desenvolvimento, reuniram-se para avaliar e recomendar as
reformas a serem empreendidas em toda a América Latina, como requisito para
cooperação financeira externa, propondo um programa de ajuste estrutural
amparado por políticas neoliberais (TEIXEIRA; OLIVEIRA, 1998).
A partir dos anos 1980, o Banco Mundial começou a se destacar como o
principal financiador de reformas estruturais de países em desenvolvimento, assim
como propositor de políticas públicas internas, condicionadas aos empréstimos para
implementação de programas de ajuste estrutural (SOARES, 1998).
No geral, essas reformas podem ser entendidas como medidas regulatórias
com o propósito de reduzir o tamanho do Estado, assim como favorecer a abertura
da economia ao mercado internacional.
No Brasil, as propostas de reforma abrangiam as seguintes áreas: disciplina
fiscal; priorização dos gastos públicos; reforma tributária; liberalização financeira;
regime cambial; liberalização comercial; investimento direto estrangeiro;
privatização; desregulação e propriedade intelectual.
O programa de ajuste teve seu início com o governo de Fernando Collor de
Mello. As ações previam privatização das empresas estatais, abertura econômica ao
mercado externo via redução de barreiras alfandegárias, combate à inflação e
programa de reestruturação produtiva destinado às empresas, uma vez que era
preciso atender a demandas cada vez mais exigentes, impetrando um processo de
gestão da qualidade, bem como da produtividade como alternativas para tornar
30

essas empresas cada vez mais competitivas e capazes de se adaptarem ao mundo


desenvolvido.
Teixeira e Oliveira (1998) afirmam que, após a saída do presidente Fernando
Collor de Mello, as políticas neoliberais e os programas iniciados na sua gestão
lograram êxito sob a presidência de Fernando Henrique Cardoso, que manteve a
agenda neoliberal e propôs inclusive, um plano para remodelar a Constituição
Federal e flexibilizar as relações entre Estado e sociedade, concretizando, portanto,
a proposta de reforma idealizada por agências multilaterais no consenso de
Washington.
Para efetivar a proposta de reforma, foi criado o Ministério de Administração
Federal e Reforma do Estado (MARE) que tinha a incumbência de definir objetivos e
estabelecer diretrizes para a reforma da administração do Estado brasileiro.
É importante ressaltar que a reforma proposta pelo MARE vai delinear
também as políticas educacionais para o Brasil, na medida em que propôs a
avaliação externa como mecanismo de controle e regulação do Estado como uma
exigência imposta por organismos multilaterais.

1.3 HISTÓRICO DAS REFORMAS ADMINISTRATIVAS NO BRASIL

Cabe aqui destacar os elementos históricos que, dentro da perspectiva


neoliberal, deram suporte à reforma do Estado Brasileiro.
O termo reforma deriva de Reformismo e caracteriza-se como um movimento
que visa melhorar e aperfeiçoar o ordenamento existente, sem, contudo, ser
revolucionário, pois considera os valores absolutos da civilização como princípios
básicos, entendidos como a liberdade individual e o bem-estar de todos os
indivíduos da sociedade. Quanto ao sistema político, o reformismo é caracterizado
pelo fortalecimento e pela ampliação da democracia liberal na perspectiva de que a
eficiência econômica como sinônimo do aumento da produtividade cria os meios
necessários para a melhoria de vida das populações, sendo essa uma condição
indispensável para a participação democrática (SETTEMBRINE, 1986). Portanto,
para reordenar as prioridades do Estado, assim como alterar seu processo de
influência em todos os setores sociais, faz-se necessária sua reforma.
A primeira reforma administrativa no Brasil ocorreu em 1936, promovida por
Maurício Nabuco e Luís Simões Lopes, no governo de Getúlio Vargas, com a criação
31

do Departamento Administrativo do Serviço Público (DASP) e estava baseada na


teoria administrativa de Taylor e na burocracia de Max Weber. Essa reforma foi
implantada com a perspectiva de substituir a administração patrimonialista, que
definiu as monarquias absolutas, na qual o patrimônio público era confundido com o
privado e o Estado considerado patrimônio do rei (PEREIRA, 1996a).
Com o avanço do capitalismo industrial e das democracias parlamentares no
século XIX, esse tipo de administração apresentava-se inadequado, havendo a
necessidade do estabelecimento de uma administração burocrática que levasse em
conta a separação entre o público e o privado, e entre o político e o administrador
público. Surge então a administração burocrática racional-legal (PEREIRA, 1996b).
No entanto, com o desenvolvimento e o crescimento do Estado liberal, a
administração burocrática cada vez mais se mostrou ineficiente, lenta, cara e não
orientada para o atendimento aos cidadãos. Enquanto o Estado crescia e assumia
outras responsabilidades, sua organização burocrática continuava lenta, ineficiente e
ineficaz na medida em que não atendia aos problemas decorrentes de seu
crescimento. Isso porque o Estado adotou no século XX papéis econômicos e
sociais, assumindo a educação, a saúde, a cultura, a previdência e a assistência
social, a pesquisa científica, bem como a regulação do sistema econômico interno e
das relações econômicas internacionais (PEREIRA, 1996b).
No final da década de 1960, por meio do Decreto-Lei n.º 200, de 1967, houve
uma tentativa de superar a rigidez burocrática e buscar uma administração mais
eficiente e eficaz, porém de forma descentralizada, exercida por mecanismos como
o planejamento, a racionalidade e o controle de resultados. No entanto, esta
tentativa de reformar a administração estatal não logrou êxito, em função,
principalmente, do contexto político do Brasil, que passava por um período de
ditadura militar.
Somente a partir de 1995, o Brasil conseguiu efetivar a reforma administrativa
do Estado, transitando, dessa forma, de uma administração burocrática para uma
administração gerencial e descentralizada, de controle e de privatização, e com o
propósito de dividir responsabilidades mediante a transferência a outros setores ou
instituições de prestação dos serviços sociais. Nesse caso, o Estado não deixa de
subsidiar os serviços sociais; reduz seu papel enquanto executor direto desses
serviços, mas aumenta o controle e a regulação das instâncias que os oferecem.
32

1.4 O CONTEXTO POLÍTICO, ECONÔMICO E SOCIAL DO BRASIL NA


IMPLANTAÇÃO DAS REFORMAS DA DÉCADA DE 1990

A redução do papel do Estado de executor das políticas, para regulador das


mesmas, se deu principalmente diante da crise de ineficiência e legitimidade que o
Estado teve, a partir da década de 1970, principalmente em função da diminuição na
taxa de crescimento econômico, do aumento no número de desempregados e dos
elevados índices de inflação.
Esses fatores, aliados ao desequilíbrio financeiro dos países da América
Latina e do Leste Europeu, contribuíram para aumentar ainda mais a grande
dificuldade da administração de políticas sociais, implantadas com sucesso após a
Primeira Guerra Mundial e a Grande Depressão.
Nesse período, o Estado passou a desempenhar um papel estratégico na
coordenação da econômica capitalista, pois tinha como principal preocupação
aumentar o desenvolvimento econômico e estabelecer uma distribuição de renda
mais igualitária (PEREIRA; SPINK, 1998).
No entanto, esse modelo de Estado mostrou-se ineficaz e ineficiente sob o
ponto de vista de sua “benevolência”, ao prover tudo a todos, e de sua gestão, num
período de crescente desenvolvimento tecnológico, globalização e competição
econômica mundial (BRASIL, 1995). Esses fatores exigiram novas configurações do
papel do Estado e um reordenamento de sua base institucional legal.
Diante desses fatores, era preciso minimizar as funções do Estado,
principalmente nas questões sociais. Foi a partir dessa perspectiva que a reforma do
Estado foi implantada com o principal objetivo de racionalizar recursos e diminuir sua
interferência, principalmente no que se referia a políticas sociais, dentro da
perspectiva neoliberal.
Luis Carlos Bresser Pereira, então ministro da Administração e Reforma do
Estado, no governo FHC, foi o grande idealizador da reforma do Estado em 1995.
Segundo ele, alguns fatores foram determinantes para redefinir o papel do Estado,
dentre eles: a globalização, a crise fiscal do Estado, ainda baseado na
burocratização weberiana e sua ineficiência, a estagnação econômica do país e a
necessidade do ajuste estrutural da economia em toda a América Latina.
33

Condizente com a política e o ideário neoliberal, e buscando dividir


responsabilidades com a sociedade civil, Bresser Pereira afirma que há uma crise na
gestão pública brasileira. Segundo ele:

O Estado tinha se tornado muito grande, aparentemente muito forte,


mas de fato muito fraco, ineficiente e impotente, dominado pela
indisciplina fiscal, vítima de grupos especiais de interesse, engajados
em práticas privatizadoras do Estado, ou seja, no rent seeking.
(PEREIRA, 1996a, p. 16-17).

A Reforma do Estado proposta pelo governo Fernando Henrique Cardoso, em


1995 por meio do MARE e do Plano Diretor da Reforma do Estado, objetivava a
descentralização política e administrativa, por meio da delegação de autoridade,
recursos e atribuições. Objetivava também tornar a economia nacional competitiva
internacionalmente.
Para alcançar esses objetivos, a organização estatal deveria deixar de ser
uma administração pública burocrática para se transformar numa administração
pública gerencial, composta de valores como eficiência e qualidade. Para tanto, era
necessário fortalecer o Estado, superar o modelo burocrático, romper com questões
como o paternalismo, o corporativismo e a ineficiência para a implantação de uma
nova administração pública (PEREIRA, 1998a).
Na perspectiva neoliberal, apontada pelo ex-presidente Fernando Henrique
Cardoso, reformar o Estado significava:
[...] abandonar visões do passado de um Estado assistencialista e
paternalista, de um Estado que, por força de circunstancias
concentrava-se em larga medida na ação direta para a produção de
bens e de serviços. Hoje, todos sabermos que a produção de bens e
serviços pode e deve ser transferida à sociedade, à iniciativa privada,
com grande eficiência e com menor custo para o consumidor.
(CARDOSO, 1998, p. 15).

O objetivo da reforma era, portanto, transformar os moldes da administração


do Estado, da tendência burocrática à gerencial com o objetivo de implantar uma
nova administração pública, baseada na eficiência, na qualidade e na produtividade
dos serviços públicos.
O Plano de Reforma do Estado foi pensado e implantado sob forte influência
do neoliberalismo, partindo do pressuposto de que a crise é originada no interior do
Estado e somente o mercado é capaz de resolvê-la.
34

As estratégias de reforma do Estado envolviam quatro setores: 1) o núcleo


estratégico do Estado, que é o definidor de leis e políticas públicas; 2) as atividades
exclusivas do Estado, caracterizadas como aquelas em que o Estado, tem poder de
legislar, tributar; 3) os serviços não exclusivos ou competitivos, caracterizados como
serviços não envolvendo o poder de Estado, mas que o próprio Estado realiza
porque considera de alta relevância; 4) a produção de bens e serviços para o
mercado, que é exercido pelo Estado através de empresas de economia mista, que
operam em serviços considerados públicos ou estratégicos (PEREIRA, 1996a).
35

Quadro 1 – Formas de propriedade e de administração dos setores do Estado


Forma de
Forma de propriedade
administração
Setores do Estado Pública
Estatal não- Privada Burocrática Gerencial
estatal
Núcleo Estratégico: Legislativo,
Judiciário, Cúpula dos Ministérios,
Ministério Público
Atividades Exclusivas:
Regulamentação, fiscalização,
fomento, segurança pública,
seguridade social básica
Serviços não exclusivos:
Publicização
Universidades, hospitais, centros de
pesquisa, museus
Produção para o mercado:
Privatização
Empresas estatais
Fonte: BRASIL, 1995, p. 59.

A reestruturação dos serviços executados pelo Estado orientou-se pela


necessidade de “transferir para o setor privado as atividades que podem ser
controladas pelo mercado” (BRASIL, 1995, p. 17), uma vez que o Estado gerou
distorções e ineficiências ao tentar assumir as funções diretas de execução. Era
preciso e necessário “dividir” as responsabilidades, porém com mecanismos de
controle e fiscalização exercidos pelo próprio Estado.
Segundo o Plano Diretor da Reforma do Aparelho do Estado, desenvolvido
pelo MARE, as políticas sociais estão contempladas em serviços não exclusivos do
Estado, que segundo o Plano:

[...] o Estado reduz seu papel de executor ou prestador direto de


serviços, mantendo-se entretanto no papel de regulador e provedor
ou promotor destes, principalmente dos serviços sociais como
educação e saúde, que são essenciais para o desenvolvimento, na
medida em que envolvem investimento em capital humano; para a
democracia, na medida em que promovem cidadãos; e para uma
distribuição de renda mais justa, que o mercado é incapaz de
garantir, dada a oferta muito superior à demanda de mão-de-obra
não-especializada. Como promotor desses serviços o Estado
continuará a subsidiá-los, buscando, ao mesmo tempo, o controle
social direto e a participação da sociedade. (BRASIL, 1995, p. 18).

O subsídio do Estado, no entanto, é caracterizado pela transferência de


responsabilidades do próprio Estado para setores públicos não estatais e o controle
das ações empreendidas por estes. Nesse sentido, há a descentralização para o
36

nível estadual e municipal das funções executivas de prestação de serviços sociais e


de infraestrutura, porém sob o julgamento do próprio Estado, enquanto propositor
macro de políticas públicas.
O Estado deixa, portanto, de ser o provedor direto de serviços como saúde,
educação e seguridade social e passa a ser o regulador dos mesmos serviços, já na
perspectiva de transferência dos serviços e da publicização.9
A educação, assim como os demais setores da sociedade, também sofreu os
impactos reforma do Estado, pois ela é entendida como um serviço não exclusivo do
Estado, portanto, passível de ser executado por instituições públicas não estatais,
assim como instituições privadas, sob o ponto de vista da divisão de
responsabilidade com a sociedade civil. Isso representou menor preocupação do
Estado com essas questões e culminou com a criação de mecanismos de controle,
estabelecendo-se, para tanto, um sistema de parceria entre o Estado e a sociedade
civil.
Essa nova configuração do Estado regulador, imprime introduzir mecanismos
de mercado na educação. Isso se dá principalmente pelo controle de conteúdos
curriculares, pela avaliação externa e pelo estímulo à competição entre as escolas e
sistemas de ensino.

1.5 O IMPACTO DA REFORMA NA EDUCAÇÃO

O quadro educacional, em meados da década de 1980, era caótico: 50% das


crianças em idade escolar repetiam o ano ou eram excluídas no decorrer da primeira
série; 30% da população era analfabeta; havia 23% de professores leigos; 30% das
crianças não tinham acesso à escola ou estavam fora dela. Somam a esse quadro,
oito milhões de crianças matriculadas no Ensino Fundamental com mais de 14 anos;
60% dessas matrículas estavam concentradas nas séries iniciais. Além disso, é
importante destacar que 60% da população brasileira vivia abaixo da linha da
pobreza (SHIROMA; MORAES; EVANGELISTA, 2004).
Palma Filho (2005) lembra também que apenas 34% de alunos ingressantes
no ensino fundamental conseguiam concluí-lo e com um tempo de permanência 50%

9
Entende-se por publicização a transferência direta dos serviços, antes executados somente pelo
Estado, para instâncias públicas não estatais. Nesse contexto, cabe exemplificar a municipalização
do ensino nas séries iniciais do Ensino Fundamental.
37

maior do que os oito anos previstos na legislação. Entretanto, ao longo dos anos
1980, ampliaram-se as oportunidades de escolarização em todo o território
brasileiro, muito embora esse aumento quantitativo não tenha sido seguido pelo
qualitativo e pela universalização do Ensino Fundamental, pois continuavam
acentuadas as brutais diferenças regionais e a ausência de políticas públicas
voltadas para minimizar essas discrepâncias.
Esse cenário foi o “pano de fundo” para a reforma da educação. Segundo os
propositores, a crise existente no sistema escolar brasileiro emperrava o
desenvolvimento do país. Esse quadro, segundo os reformistas, exigia uma
reorganização política e uma mudança significativa na área da educação e foi nesse
sentido que a reforma educacional10 se concretizou.
Popkewitz (1997) pondera que o conceito de reforma é normativo e possui
implicações simbólicas. No entanto, o autor é bastante pragmático ao afirmar que a
escola é a instituição primeira onde a reforma se efetiva. Afirma ainda que a escola é
uma instância privilegiada para operar a reforma, pois ela é a primeira instituição a
estabelecer a direção, a finalidade e a vontade da sociedade, cabendo a ela,
portanto, conduzir a modernização das demais instituições. No olhar de Popkewitz
(1997, p. 21): “A reforma do ensino é vista como um mecanismo para alcançar o
ressurgimento econômico, a transformação cultural e a solidariedade nacional”.
Assim, as reformas são concebidas como necessidade de atualização e
modernização dos sistemas escolares, com a finalidade de introduzir inovações e
adequações da escola à demanda. Reformas são, portanto, repostas à crise da
educação.
No entender de Afonso (2005), as reformas na educação são também
tentativas para solucionar problemas enfrentados pelo Estado moderno, mais
especificamente a crise fiscal e a necessidade de promover processos de
acumulação e legitimação.
As mudanças transcorridas a partir da reforma pretendiam, portanto, adequar
a educação a uma nova ordem social e econômica vigente, caracterizada
principalmente pela reestruturação do capitalismo, pelos avanços científicos e
tecnológicos, pela alteração nas concepções de Estado e suas funções,

10
Embora o conceito de reforma educacional tenha significados distintos, tomou-se como referência a
fundamentação teórica do sociólogo Enguita (1995). Para uma análise sobre essa questão, ver:
AFONSO, Almerindo Janela. Avaliação educacional regulação e emancipação: para uma
sociologia das políticas avaliativas contemporâneas. São Paulo: Cortez, 2005.
38

principalmente com a diminuição de sua interferência nas questões sociais e,


consequentemente, o fortalecimento das leis de mercado.
Para tanto, era preciso alinhar a educação aos interesses econômicos e
políticos, com o objetivo de aumentar sua eficiência e eficácia, bem como atender a
novos parâmetros produtivos. Sob essa prerrogativa, cabe à educação ressignificar
as propostas políticas com vistas a atender à nova agenda política neoliberal.
Com a eleição do presidente Fernando Collor de Mello em 1990, a abertura
do mercado aos produtos estrangeiros e a queda da produção da indústria brasileira,
via-se na educação a sobrevivência à concorrência do mercado e à formação do
cidadão do século XXI.
A competitividade passa a ser o referencial de destaque nas políticas públicas
para a educação no Brasil, ao ser considerada ferramenta para consolidação do
cidadão do século 21 e para a sobrevivência do mercado. No olhar de Delors:

Os sistemas educativos devem dar resposta aos múltiplos desafios


das sociedades da informação, na perspectiva de um enriquecimento
contínuo dos saberes e do exercício de uma cidadania adaptada às
exigências do nosso tempo. (1999, p. 68).

Para concretizar essa proposta, a escola deveria adequar-se a um novo


paradigma de gestão. Segundo Mello (1995), a efetividade das mudanças se
desenvolve por meio da gestão estratégica e da racionalidade das ações
empreendidas. Para a autora, a escola deve formar para a qualificação da cidadania
moderna e competitiva, com conteúdos básicos voltados para a demanda do
mercado, passando também pelas novas tecnologias de informação e comunicação,
uma vez que o indivíduo deve dominar os códigos da modernidade.
Mello (1995) é bastante pragmática ao afirmar que os problemas da educação
brasileira – como capacitação de professores e sua valorização, as condições
mínimas de desenvolvimento do processo ensino aprendizagem, como materiais
didáticos, bibliotecas, laboratórios e a própria infraestrutura da escola – requerem
uma nova forma de organização e gerenciamento. Sob essa perspectiva, a autora
entende que a gestão é a mola propulsora da qualidade, tanto para a educação
básica quanto para políticas públicas.
Afirma, ainda, que é preciso redimensionar os processos de gestão da escola
pública, devendo esses ser alicerçados na perspectiva neoliberal e no dinamismo da
39

gestão da escola privada, onde os parâmetros de eficiência, eficácia e produtividade,


originários da economia de mercado e internalizados pelos sistemas escolares, são
os grandes fatores considerados qualitativos.
Para fundamentar seus argumentos, Mello (1995) estabelece requisitos
mínimos, concernentes à gestão, para a efetiva qualificação e capacitação do
individuo para as demandas exigidas no século XXI, bem como a busca de um
padrão de gestão eficiente, eficaz e racional.
Segundo a autora, é preciso rever o padrão de financiamento e alocação de
recursos; examinar o planejamento para a expansão e ocupação da rede física;
qualificar a gestão escolar; instituir sistemas de avaliação externa da aprendizagem
dos alunos; estimular e criar modelos alternativos para a formação docente, além de
capacitar os professores em efetivo exercício da profissão; fazer um levantamento
das dificuldades e propor alternativas de solução para a questão salarial; optar por
uma política do livro didático; qualificar a demanda no sentido de promover maior
preocupação da sociedade civil e das mídias de forma geral com a qualidade da
educação no país; por fim, é preciso estabelecer diretrizes para a integração da
escola com outras instâncias como saúde, lazer, esporte e cultura, a fim de propiciar
aos alunos experiências inovadoras (MELLO, 1995).
A modernização e a competitividade são os fatores que direcionam a
fundamentação teórica da autora, uma vez que considera a educação um processo
voltado ao atendimento das necessidades emanadas pelo mercado. Para tanto,
entende que a avaliação é um mecanismo importante e, acima de tudo, necessário,
pois o papel da escola é transmitir conteúdos básicos exigidos para o cidadão do
século 21.
Esses fatores orientam a gestão da escola caracterizando-se como exigência
para manutenção do mercado, uma vez que a qualidade da educação serve aos
resultados obtidos com a reestruturação produtiva, o que, em larga medida, exige a
formação de cidadãos conscientes e aptos a enfrentarem as exigências da
sociedade moderna.
Portanto, a busca da qualidade está muito mais ligada ao desenvolvimento
econômico do país e sua inserção no grupo dos países desenvolvidos do que na
premissa da democratização das oportunidades educacionais e da garantia do
direito à educação e formação cidadã a todos.
40

Corrobora com esse entendimento a análise realizada por Freitas (2004) ao


recriminar a busca da qualidade baseada somente em resultados mensuráveis
alcançados por meio de testes padronizados, sem que se leve em conta outros
fatores subjacentes à realização da avaliação.
Ao criticar o caráter eminentemente pragmático da busca da qualidade, o
autor interpreta a política pública educacional brasileira como mecanismo de ajuste
dos estudantes a determinados contextos e exigências. No olhar de Freitas (2004),
as medidas assumidas pelo Estado ganham o caráter de políticas neotecnicistas, ou
seja, uma nova tentativa de modelar o comportamento do aluno e produzir
indivíduos competentes para o mercado de trabalho.
Segundo o autor:
Foi criado o conceito de equidade, entendido como a responsabilidade
da escola ter que ensinar qualquer aluno, independentemente de seu
nível socioeconômico. Dessa forma, descontado o nível
socioeconômico, o que restava era percebido como [...] de
responsabilidade da escola e de seus recursos pedagógicos. Bastava
treinar (ou credenciar) os professores, mandar livros didáticos, criar
parâmetros curriculares, eliminar os tempos fixos como nos ciclos ou
na progressão continuada e, sobretudo inserir avaliação externa. Este
tem sido o cotidiano dos sistemas educativos sob o impacto das
políticas públicas mais recentes. (FREITAS, 2004, p. 147).

No Estado de São Paulo, essas políticas consolidaram-se nos currículos


escolares e na nova proposta curricular, na progressão continuada e nas avaliações
externas como forma de gerar competências e medir qualidade nos processos
educativos. É interessante destacar que a implementação dessas políticas gera um
clima de competição entre as escolas e os profissionais da educação, na medida em
que se vincula à nota obtida na avaliação externa com o bônus do professor e dos
profissionais da escola.
Cabe explicitar que o desenvolvimento deste trabalho pressupõe outros
fatores intervenientes na qualidade que estão além do enfoque pedagógico e dos
conceitos de fluxo escolar como promoção, repetência e evasão, assim como
médias de desempenho quantificáveis em testes padronizados.
Entende-se que há outras dimensões que influenciam a qualidade como a
gestão escolar, o ambiente educativo, a condição socioeconômica das famílias cujos
filhos frequentam a escola, a formação do professor e suas condições de trabalho, a
estrutura física da escola e as políticas próprias de cada instituição.
41

1.6 A REFORMA DA EDUCAÇÃO BÁSICA E O LIMIAR DE UMA NOVA


QUALIDADE EDUCACIONAL

No campo da educação, coube a José Goldemberg (1993), então ministro da


educação, realizar na década de 1990, um diagnóstico da educação brasileira, com
o intuito de torná-la mais eficiente e capaz de atender às necessidades emergentes
do mercado.
Do diagnóstico realizado por Goldemberg, juntamente com as propostas
implantadas a partir da Conferência Mundial de Educação para Todos, realizada em
Jomtien, na Tailândia em 1990 – quando se estabeleceu que as políticas
educacionais direcionar-se-iam à educação básica, com o objetivo de reduzir a
pobreza e formar capital humano – resultaram nos pressupostos para a reforma na
educação.
Segundo Goldemberg (1993), é preciso educar as massas, sob o ponto de
vista da democratização do acesso à escola, para o sentido da cidadania plena e dar
oportunidade a essa população ter acesso aos bens e serviços oferecidos pela
sociedade.
Na mesma perspectiva, o autor argumenta que a necessidade de educar está
alicerçada na alteração do processo produtivo e do desenvolvimento tecnológico,
exigindo maior qualificação e melhor formação. Para justificar essa afirmação,
Goldemberg (1993) alega que o problema não está na democratização, mas na
permanência desses jovens na escola, principalmente de nível médio, como forma
irrevogável de preparação para o mercado de trabalho e desenvolvimento do país.
Para o autor, a ineficiência do sistema educacional brasileiro é o principal obstáculo
para a modernização da sociedade e, muito embora a democratização tenha sido
um avanço, a qualificação em todos os níveis dos sistemas de ensino e ainda é
bastante falha e passível de ser reajustada.
Ainda, segundo o autor, não basta construir escolas e universalizar o acesso,
é preciso combater a pobreza, erradicar o analfabetismo, reorganizar o
financiamento da educação básica, bem como controlar os dispêndios públicos com
educação. Foi, portanto a partir desses fatores, que o MEC negociou um empréstimo
com o Banco Mundial (BM) destinado a melhorar o desempenho do sistema
educacional como um todo. A reforma na educação, financiada pelo BM, tinha como
objetivo propiciar treinamento de professores; melhorar as condições físicas de
42

ensino e do material educacional e estimular a melhoria do gerenciamento da


educação pelos estados brasileiros.
A concessão do empréstimo do BM estava condicionada a esforços
planejados pelos governos estaduais à correção da situação, buscando eficiência e
eficácia do sistema.
Socialmente, o BM tem dado ênfase especial à educação com propostas que
vão desde a macropolítica até a sala de aula e a formação do professor. Essas
recomendações são destinadas aos países em desenvolvimento, como pacotes de
medidas a serem adotadas com vistas a melhorar a qualidade e a eficiência da
educação, assim como as aprendizagens escolares na escola pública.
Em conjunto com a Unesco, o Unicef, o PNUD, o BM definiu a educação
básica como prioridade, por meio da Declaração Mundial de Educação para Todos,
influenciando fortemente as políticas educacionais dos anos 1990. Algumas
constatações realizadas pelo BM demonstraram a preocupação em assegurar a
reforma educacional tendo em vista:

 O número de absoluto de crianças sem educação tem


possibilidade de aumentar nos próximos vinte anos.
 Apenas pouco mais da metade dos alunos da escola primária
completam o ciclo primário.
 A alfabetização dos adultos permanece como sendo um grande
problema.
 Impulsionada em parte pelo êxito no primeiro grau conseguido no
passado, a demanda pela educação secundária e superior vem
crescendo mais rapidamente que a capacidade que muitos
sistemas educativos têm de atendê-la.
 Vem se alargando a distância educacional entre os países da
OCDE (Organização para a Cooperação e o Desenvolvimento
Econômico) e as economias de transição da Europa Oriental e da
Ásia Central. (BM, 1995 apud TORRES, 1998).

Portanto, reformar a educação básica significava melhorar o acesso, a


equidade e a qualidade do ensino, esta última entendida como um problema geral
que afeta o mundo, prejudicando o desenvolvimento sustentável, assim como a
diminuição da pobreza sob perspectiva neoliberal. Cabe ressaltar a urgência do BM
em reduzir a distância entre a reforma educativa e a reforma das estruturas
econômicas. Ou seja, a importância de aliar os aspectos econômicos e financeiros
aos aspectos pedagógicos desencadeados para o desenvolvimento do país.
43

Segundo a Declaração do BM, a educação é um meio de reestruturação


capitalista e a escola é sua instância formadora:

A educação é a pedra angular do crescimento econômico e do


desenvolvimento social e um dos principais meios para melhorar o
bem estar dos indivíduos. Ela aumenta a capacidade produtiva das
sociedades e suas instituições políticas, econômicas e científicas e
contribui para reduzir a pobreza, acrescentando o valor e a eficiência
ao trabalho dos pobres e mitigando as conseqüências da pobreza
nas questões vinculadas à população, saúde, nutrição [...] o ensino
de primeiro grau é a base e sua finalidade fundamental é dupla:
produzir uma população alfabetizada e que possua conhecimentos
básicos de aritmética capaz de resolver problemas no lar e no
trabalho, e servir de base para sua posterior educação (BM, 1995
apud TORRES, 1998).

Nessa perspectiva integram-se as competências e habilidades que o indivíduo


deve possuir para agir de forma eficiente e eficaz em situações diversas, utilizando
conhecimentos essenciais aprendidos na escola e utilizados no mundo do trabalho.
Esse é o referencial de qualidade proposto pelo BM e seu maior desafio também.
Embora a Unesco seja a principal agência responsável pela proposição e
implementação das ações afirmativas desencadeadas na Conferência Mundial de
Educação para Todos e na Cúpula Mundial de Educação para Todos, o Banco
Mundial tem deslocado as propostas originais da Unesco de forma a conduzir as
ações empreendidas sob o ponto de vista da estrutura econômica, uma vez que
essas ações visam a atender a reforma neoliberal proposta pelo Estado. Nessa
perspectiva, Torres (1998, p. 131) destaca que a proposta do Banco fundamenta-se
nos seguintes elementos:

a) Prioridade na educação básica;


b) Melhoria da eficácia da educação;
c) Ênfase nos aspectos administrativos;
d) Descentralização e autonomia das instituições escolares,
entendida como transferência de responsabilidade de gestão e de
captação de financiamento, enquanto ao Estado caberia manter
centralizadas as funções de fixar padrões, facilitar os insumos
que influenciam o rendimento escolar, adotar estratégias flexíveis
para a aquisição e uso de tais insumos e monitorar o
desempenho escolar.

Em se tratando de qualidade na educação básica, o Banco Mundial considera


que sua efetividade se dá nos resultados, em decorrência do desempenho escolar,
44

julgado a partir de metas e objetivos elencados pela escola. Métodos de ensino,


validade de conteúdos e sentido de aprendizados não são questionados, uma vez
que a referência são os insumos e produtos educacionais (TORRES, 1998).
Tais insumos são fatores determinantes para o processo educativo. Segundo
a proposta do BM, eles são: bibliotecas; tempo de instrução; tarefas de casa; livros
didáticos; conhecimentos do professor; experiência do professor; laboratórios;
salário docente; tamanho da sala de aula.11
A partir desses fatores, o BM faz suas recomendações aos países em
desenvolvimento, propondo políticas públicas que priorizem a educação como fator
imprescindível que agrega valor e desenvolvimento aos países.
Para consubstanciar a reforma na educação, propõe-se maior contribuição e
participação das famílias e da comunidade, bem como maior atuação da iniciativa
privada nesse setor. É importante que a escola busque tais participações, que
devem resumir-se às contribuições econômicas para a manutenção da infraestrutura
escolar e à influência nos critérios de organização e gestão. Essas propostas
visavam principalmente a “[...] uma redefinição dos parâmetros e prioridades da
despesa pública e uma contribuição maior das famílias e das comunidades nos
custos da educação”. (TORRES, 1998, p. 137).
As recomendações propostas pelas agências multilaterais são elaboradas
tendo como referência a análise econômica em detrimento ao viés pedagógico.
Numa linguagem mais comum, é a relação custo-benefício para o Estado dos gastos
com a educação e do retorno que ela oferece. O predomínio, portanto, das
proposições políticas está baseado sob o ponto de vista econômico e não educativo,
cabendo ao Estado a regulação do sistema educacional e sua avaliação, alcançada
por meio de testes padronizados, que objetivam “medir” a qualidade do ensino
ministrado nas escolas públicas brasileiras.
No Brasil, os recursos advindos de acordos com organismos multilaterais,
como o BM, são utilizados em projetos que visam à melhoria da qualidade da
educação básica, definida por resultados via testes padronizados, e incentivam as
novas pedagogias que, em sintonia com organismos financeiros, se aliem com os
interesses econômicos. Nesse sentido, para a escola, a presença de professores e
de uma pedagogia não é vista. Ela, tão somente, configura-se em torno de variáveis

11
Segundo Torres (1998), o investimento recai prioritariamente no tempo de instrução, nos livros
didáticos e na formação de professores.
45

observáveis e quantificáveis, afastando-se dos aspectos qualitativos essenciais para


a educação.
Para Shiroma, Moraes e Evangelista (2004), a reforma educacional no Brasil,
cujo maior objetivo era garantir o acesso à educação e a permanência nela,
incentivou a implantação dos programas: “Acorda Brasil! Tá na hora da escola”,
Aceleração da Aprendizagem, Guia do Livro Didático – 1.ª e 4.ª séries e o Bolsa
Escola. Quanto ao financiamento, o MEC implementou programas como: Dinheiro
Direto na Escola, Programa Renda Mínima, Fudescola, Fundef, Proep, além de
projetos destinados às novas tecnologias como o TV Escola, Programa Nacional de
Informática na Educação, Programa de Apoio à Pesquisa em Educação a Distância
e Programa de Modernização e Qualificação do Ensino Superior.
No tocante à regulação e ao controle dos processos, o governo implantou, a
partir da década de 1980, avaliações externas como forma de medir e quantificar os
resultados educacionais. Destacam-se como formas de intervenção de natureza
avaliativa a Prova Brasil, que avalia o rendimento dos estudantes de 5.º e 9.º anos
do Ensino Fundamental; o Sistema de Avaliação da Educação Básica (SAEB), que
afere a proficiência em Matemática e em Língua Portuguesa, nos alunos do 5.º e 9.º
anos do Ensino Fundamental e da 3.ª série do Ensino Médio; o Exame Nacional do
Ensino Médio (Enem) e o Exame Nacional de Desempenho de Estudantes (Enade),
cujo objetivo é avaliar a aprendizagem nos cursos de nível superior (SHIROMA;
MORAES; EVANGELISTA, 2004). Nesse sentido, a avaliação externa assume a
característica de controle e de racionalidade econômica, exercendo a função de
apontar a relação custo benefício.
Todas essas iniciativas governamentais estão voltadas à recondução das
ações educativas baseadas nas mudanças trazidas pelas reformas e propostas por
meio de “recomendações” dos organismos multilaterais.
Cabe ressaltar o caráter mercadológico que a educação ganha ao subsidiar
suas propostas sob o ponto de vista econômico e não pedagógico e ao colocar a
qualidade como um referencial que busca interligar sistema educativo e de mercado,
insumos e produtos, qualidade, eficiência e produtividade.
No capítulo seguinte, será analisada a trajetória das avaliações externas no
Brasil e o referencial de qualidade subjacente à aferição por meio de testes
padronizados. Esta análise se faz importante para melhor compreensão e
interpretação do objeto desta pesquisa.
46

CAPÍTULO 2 O REFERENCIAL DE QUALIDADE LEGITIMADO PELA


AVALIAÇÃO EXTERNA

2.1 MARCO HISTÓRICO DA AVALIAÇÃO EXTERNA NA AMÉRICA LATINA

Um dos primeiros países a mobilizar ações voltadas à avaliação externa foi os


EUA, com a apresentação do relatório Coleman, o primeiro levantamento
educacional realizado com testes padronizados aplicados em larga escala durante a
segunda metade da década de 1960.
Esse relatório foi importante por organizar informações coletadas com 645 mil
alunos distribuídos em cinco diferentes níveis, objetivando verificar as divergências
existentes em cada escola e a alteração dos conhecimentos assimilados pelos
estudantes, constatando-se que essas variações existiam principalmente entre os
alunos que apresentavam níveis socioeconômicos menos favorecidos.
Ele também se constituiu num marco para os demais países em função da
ampla divulgação que ganhou, originando debates e estudos sobre fatores
considerados qualitativos para os processos educativos (HORTA NETO, 2009).
De acordo com Afonso (2005), vários relatórios elaborados pelos EUA, já na
década de 1980, mostravam que os alunos norte-americanos apresentavam baixos
índices de aproveitamento em matérias escolares consideradas fundamentais. No
entanto, o relatório A Nation at Risk: the imperative for educational reform foi um
marco nos debates conduzidos nos EUA e o primeiro propositor das mudanças
educacionais do país. O relatório demonstrou a vulnerabilidade dos EUA, ante os
outros países industrializados e que estavam ganhando o mercado concorrencial.
Portanto, tinha a missão de resolver a crise de produtividade e competitividade da
nação norte americana, através da reforma educacional.
O relatório faz um diagnóstico da educação, com propostas pontuais de
melhorias, contempladas em recomendações básicas:

1) Cinco conteúdos básicos para a escola média (inglês,


matemática, ciências, estudos sociais, e ciências da
computação);
2) A adoção de “padrões mais vigorosos e mensuráveis”;
3) Mais tempo para o aprendizado de conteúdos básicos;
4) Aperfeiçoar a preparação de professores e tornar a profissão
mais compensatória e respeitável na sociedade;
47

5) Valorizar a liderança educacional responsável por implantar


essas recomendações e dotá-las de suporte financeiro
(OLIVEIRA; SCHWARTZMAN, 2003, p. 877).

O então presidente Ronald Reagan que, até a publicação do relatório,


defendia a mínima participação do governo federal no setor, cabendo, portanto, aos
Estados a responsabilidade com a divulgação do relatório, alterou agenda da
educação, com propostas que iam:

(...) da regulação para a desregulação; da escola pública para as


escolhas educacionais e para a competição entre as escolas; das
preocupações sociais para as preocupações com a economia e com
a produtividade; da igualdade de oportunidades para a excelência;
das necessidades educativas para as capacidades individuais e para
a selectividade. (AFONSO, 2005, p. 67).

Vale ressaltar que essas ações fizeram parte da primeira reforma educacional
nos EUA, sob a presidência de Ronald Reagan, e que não lograram o êxito
esperado por serem medidas externas à escola. No entanto, num segundo
momento, já no segundo mandato como presidente, Reagan conduziu nova reforma,
agora dando maior nível de autonomia às escolas (AFONSO, 2005)
Já no governo de George Bush, a avaliação continuou a ser valorizada. O
relatório America 2000: an education strategy implementava novas estratégias de
avaliação por meio de testes padronizados, ainda sob a mesma perspectiva da
competitividade e produtividade, porém com outras duas dimensões: o accountability
e a competição entre as escolas (AFONSO, 2005)
Segundo Dias Sobrinho (2002), a avaliação externa transformou-se em
accountability, uma vez que ela tinha a função de prestar contas ao governo e à
sociedade, assim como cobrar das instâncias executoras, neste caso, as unidades
escolares, o cumprimento de obrigações, sob o ponto de vista da eficiência. Nesse
sentido, sua característica mais marcante era demonstrar índices de rendimento,
tanto aos governos como para a sociedade civil, além de controlar e propor políticas
públicas, legitimando o controle do Estado.
Segundo Oliveira (2005), sob esse aspecto, é possível afirmar que as
avaliações externas, realizadas via testes padronizados, ganharam um papel
significativo nas sociedades contemporâneas, cabendo-lhes, pois, a
responsabilidade de validar e legitimar iniciativas educacionais.
48

Percebe-se, portanto, que a reforma educacional está ligada aos ideais


neoliberais, sendo ações subjacentes aos aspectos da racionalidade econômica, sob
o referencial da excelência, eficácia, competitividade e produtividade. A premissa
que contempla essa afirmação é relação existente entre o baixo nível de
desempenho escolar e os problemas de origem econômica.
No entanto, Afonso (2005) pondera que as crises educacionais,
diagnosticadas pelos baixos índices de desempenho podem constituir-se numa
estratégia de governos para culpar instituições escolares e sistemas de ensino pelos
ditames e desastres da economia. Segundo o autor, esse procedimento caracteriza-
se como uma estratégia governamental de gerenciar a crise, recaindo sobre a escola
a culpa pelo desemprego ou pela pobreza.
Afonso (2005), ao trabalhar a centralidade política e social da avaliação
externa nas últimas décadas, bem como a ampliação da sua legitimação, o faz sob o
ponto de vista sociológico, uma vez que as avaliações e suas modalidades12 não
podem ser vistas desconectadas do contexto das mudanças econômicas e políticas
mais amplas. Portanto, a educação é perpassada pelos limites e possibilidades da
dinâmica econômica, social, cultural e política de uma sociedade.
Isso porque é preciso desvelar as relações existentes entre a avaliação13 e as
mudanças sociais, tendo como pressuposto que a avaliação passou a ser a grande
propositora de políticas públicas educacionais nas últimas décadas.
As avaliações externas representam a legitimação e a chancela da qualidade
educacional no país na tentativa dos governos em melhorar a economia pelo
fortalecimento dos laços de escolarização, trabalho e produtividade.
Entende-se que esse processo é orientado pelas políticas neoliberais em
virtude das repercussões que a regulação no mercado vem provando no setor
educacional, na medida em que tece uma nova relação entre mercado e educação.
Afonso (2005) esclarece que emerge dessa relação o conceito de quase-
mercado14 educacional, referenciando práticas de mercado adotadas na educação,
uma vez que passa a ter como referência modelos próprios do mercado como

12
O trabalha o enfoque sociológico da avaliação com diferentes modalidades de avaliação.
13
Cabe ressaltar as relações de poder e disciplina que a avaliação pedagógica realizada pelo
professor em sala de aula impõem, assim como pressão e controle da avaliação externa nas escolas
e sistemas de ensino.
14
É quase-mercado, porque se distingue do mercado de livre concorrência. LE GRAND, Julian.
Quasi-markets and social policy. Economic Journal, v. 101, n. 408, p. 1256-1267, 1991.
49

competitividade, controle, eficiência e eficácia, na busca constante pela qualidade da


educação e o pleno desenvolvimento da nação.
A esse respeito, Afonso esclarece que:

É, aliás, esta combinação específica de regulação do Estado e de


elementos de mercado no domínio público que, na nossa perspectiva,
explica que os governos da nova direita tenham aumentado
consideravelmente o controlo sobre as escolas (nomeadamente pela
introdução de currículos e exames nacionais) e, simultaneamente,
tenham promovido a criação de mecanismos como a publicitação dos
resultados escolares, abrindo espaço para a realização de pressões
competitivas no sistema educativo. (2005, p. 116).15

O conceito de quase-mercado está, portanto, ligado a novas práticas de


administração dos serviços não exclusivos do Estado, assim como a substituição de
mecanismos de administração burocráticos por mecanismos de mercado.
Na mesma perspectiva, Ball aponta para o processo de mercantilização
postulando que

[...] o/a estudante é cada vez mais mercantilizado. Cada estudante é


posicionado/a e avaliado/a de uma forma diferente no mercado
educacional, ou seja, o processo de competição institucional no
mercado apela a uma “economia do valor do/a estudante”. Nos
sistemas onde o recrutamento está diretamente relacionado ao
financiamento e indicadores do desempenho são publicados como
“informações do mercado”, os “custos” educacionais e da reputação
do/a estudante, e não os seus interesses e necessidades, passam a
ser centrais na resposta dos “produtores” aos que exercem o seu
direito de escolha. (2001, p. 108).

Interessa-nos delinear como as práticas aqui conceituadas como quase-


mercado educacional direcionam as avaliações externas como forte mecanismo de
pressão e controle do Estado, assim como induz à competitividade entre as escolas
e sistemas de ensino.
As avaliações externas fazem um levantamento de dados sobre o rendimento
escolar para estabelecer condições para uma comparação linear, assim como o
estabelecimento de relações de poder entre alunos, instituições educacionais,
cidades, Estados ou regiões do país, permitindo a concorrência e solidificando uma
política de incentivo financeiro para as instituições de melhor desempenho.

15
Grifos do autor.
50

A força do mercado sobre a escola é tamanha que, em alguns casos, quando


a nota do IDEB é divulgada, as melhores instituições, ou as que mais se destacaram
no índice, são colocadas numa base mais comercial, cujos pais/alunos e, em uma
alusão ao mercado, consumidores, vêem-se atraídos a matricular seus filhos nessas
instituições, funcionando, portanto, como marketing educacional.

2.2 OLHAR HISTÓRICO

A partir de 1930, a sociedade brasileira passou por transformações políticas,


econômicas e sociais, principalmente em função da transição de uma sociedade pré-
capitalista, agrário-comercial, para uma sociedade urbano-industrial, aumentando,
portanto, o crescimento da população urbana. Esse aumento manifestou-se também
numa maior demanda pela educação, uma vez que ela representava um meio de
êxito profissional e acesso a posições socialmente valorizadas. Esses fatores
contribuíram para a ampliação do sistema escolar no país e, em decorrência de tais
transformações, o Estado passou a ser interventor em todos os setores da
sociedade e também da educação, criando para tanto, o Ministério de Educação e
Saúde Pública e o Conselho Nacional de Educação (HAIDAR, TANURI, 1998).
A educação passou a ser considerada numa perspectiva quantitativa, uma
vez que o país investiu muito na expansão da rede de ensino. Na década de 1950, a
população era de 50 milhões de pessoas; destes, cerca de 30% frequentavam a
escola e o país aumentava cada vez mais o atendimento educacional, investindo na
sua expansão, que sempre foi vista nas políticas e normas educacionais como
atendimento à demanda, considerando principalmente as camadas desfavorecidas
da sociedade. A expansão, nesse sentido, tinha como objetivo favorecer a inclusão,
sob o ponto de vista de atendimento. A preocupação, portanto, estava centrada na
quantidade (OLIVEIRA, 2005).
A qualidade do ensino, segundo o olhar de Beisiegel (2005), começou a ser
prejudicada justamente pela rápida expansão da rede. O autor entende a crise do
ensino no que se refere à sua qualidade, como consequência da extensão de
oportunidades educacionais às camadas mais carentes da população,
principalmente após a Lei n.º 5.540/68, que incidiu sobre o Ensino Superior, e a Lei
n.º 5.692/71, que alterou a sistemática de funcionamento do ensino do primeiro e
segundo graus e formalizou a expansão educacional.
51

A expansão quantitativa da rede, a complexidade resultante do crescimento, a


multiplicação e diversificação dos quadros e tarefas resultaram na burocratização e
ritualização dos serviços. Além disso, a expansão trouxe problemas como a
improvisação de salas de aula e de professores, a escassez de recursos, a
multiplicação dos períodos de funcionamento da escola, bem como a alteração do
currículo com vistas a atender às novas exigências e necessidades da demanda
(BEISIEGEL, 2005).
O autor aponta que, com a democratização do ensino, a escola acabou por
atender a níveis muito diversificados de alunos e, consequentemente de saberes,
ficando, pois, a qualidade do ensino ministrado na escola comprometida. Portanto,
ao defender a democratização, é preciso aceitar a escola como ela está e os alunos
como são. Isto é, aceitar a qualidade intelectual da população que entrou e que
conquistou a escola, segundo Beisiegel:

É precisamente essa população subalterna, pobre, rústica,


dominada, que invadiu a escola, que conquistou a escola, que cria as
maiores dificuldades de rendimento na escola, mas eu defendo que é
necessário aceitar essa escola tal como ela existe, porque isso é o
ponto de partida para se pensar, inclusive, uma escola que será
capaz de dar, a essas populações, algo mais do que a escola que
existe atualmente está dando. (2005, p. 120-121).

A democratização do ensino, na perspectiva apontada por Beisiegel, impele a


qualidade. “O rendimento precário da nossa escola é um dado da nossa realidade
nacional” (BEISIEGEL, 2005, p. 121). Portanto, enquanto no passado o sistema de
ensino atendia a poucos e rendia mais, qualitativamente, a abertura da escola para
as camadas mais menos favorecidas da população a fez crescer em número de
vagas, mas a fez também perder, guardadas as devidas proporções, a qualidade do
ensino ministrado. Ainda segundo Beisiegel (2005), embora a escola tenha perdido,
em termos qualitativos, a democratização trouxe às camadas carentes serviços
antes inacessíveis. Mesmo que a educação não seja considerada qualitativamente
relevante, ela proporciona melhorias significativas para as camadas populares que
frequentam a escola.
Portanto, “as avaliações da qualidade da escola pública não podem ignorar as
transformações qualitativas introduzidas no ensino no processo de sua extensão às
classes populares” (BEISIEGEL, 2005, p. 151).
52

Ainda na opinião do autor, a própria expansão quantitativa da rede se


materializa como um fator qualitativo. Ou seja, a democratização do acesso é um
dado considerado como qualidade.
Ao contemplar a questão da quantidade sobre a qualidade nas ações políticas
para a área da educação no Brasil, Oliveira (2005) afirma que a quantidade sempre
foi a grande preocupação dos governos e suas políticas educacionais.
Somente na década de 1990, e após a reforma do Estado, o Brasil manifestou
uma preocupação efetiva com a qualidade da aprendizagem dos alunos e com sua
aferição, obtida por meio de instrumentos de avaliação externa como o SAEB, a
Prova Brasil, o Enem e o Enade, e com a implantação de indicadores para monitorar
os sistemas de ensino, como é o caso do IDEB e do IDESP. 16
Esses mecanismos de avaliação foram propostos, principalmente em
decorrência da lógica da modernização desencadeada pela globalização da
economia, pelas novas tecnologias da informação e comunicação e pelas
modificações no mundo do trabalho.
Para Coelho (2008), a ineficiência do sistema escolar, bem como as novas
exigências de qualificação e formação, aliadas à reestruturação do Estado brasileiro,
foram os alicerces da implantação das avaliações externas no Brasil. No momento
em que o Estado deixa de ser provedor para ser o regulador, as recomendações de
agências internacionais como o Banco Mundial, o Fundo Monetário Internacional, a
Organização das Nações Unidas para a Educação, a Ciência e a Cultura passam
adequar o sistema escolar brasileiro a um modelo economicista, para atender às
necessidades do mercado de trabalho.
Cumpre explicar que essas medidas tinham como objetivo, ainda que velado,
a priori, de qualificar os estudantes para atender às novas exigências trazidas pela
reorganização do capitalismo e emanadas pelo mercado.
Para Bruno (1996), as mudanças ocorridas pela reestruturação capitalista,
principalmente no mundo do trabalho, exigem cada vez qualificação no que se refere
a competências e habilidades. Não é à toa que os relatórios das avaliações externas
contemplam os conhecimentos em Língua Portuguesa e Matemática sob a
nomenclatura de competências e habilidades.17

16
Índice de Desenvolvimento da Educação do Estado de São Paulo.
17
Relatório Técnico do SAEB. Disponível em: <www.inep.gov.br>.
53

A qualificação dos processos educativos, medida via testes padronizados,


está relacionada à dimensão valorativa que o capitalismo confere à qualidade.
Portanto, a autora entende a qualidade como a “capacidade de realização das
tarefas requeridas pela tecnologia capitalista” (BRUNO, 1996, p. 92).

2.3 DEFINIÇÃO DE QUALIDADE

Definir qualidade é um processo extremamente perigoso porque o conceito


qualidade não existe em si; não se mantém sozinho, estanque e independente de
outros fatores, como ideologias, valores, crenças, ideais de sociedade e visão de
homem.
O termo qualidade vem impregnado de uma subjetividade própria do conceito.
Cada ser humano vê qualidades diferentes, bem como estabelece critérios
diferentes de qualidade. Rios argumenta que:

O conceito de qualidade é totalizante, abrangente, multidimensional.


É social e historicamente determinado porque emerge em uma
realidade específica de um contexto concreto. Portanto, uma análise
crítica da qualidade deverá considerar todos esses aspectos,
articulando aqueles de ordem técnica e pedagógica aos de caráter
político-ideológico. (2001, p. 64).

A qualidade não existe em si porque depende de fatores que lhe dão validade
e credibilidade. Esses fatores são determinantes porque constituem e caracterizam a
qualidade como boa ou ruim, dependendo da cultura, da sociedade e dos valores
estabelecidos.
Demo (1994) define qualidade como dimensão de intensidade. Está ligada à
questões como perfeição, profundidade e competência humana, no sentido de
mobilizar a capacidade de agir, construir e de participar. Quanto à educação, o autor
afirma que:

Educação passa a ser o espaço e o indicador crucial de qualidade,


porque representa a estratégia básica de formação humana.
Educação não será, em hipótese nenhuma, apenas ensino,
treinamento, instrução, mas especificamente formação, aprender a
aprender, saber pensar, para poder melhor intervir, inovar. (DEMO,
1994, p. 20).
54

O referencial de qualidade apontado pelo autor enfatiza a mudança do perfil


da escola, sentida justamente no momento em que a sociedade, ao passar por um
período de transição, alterou a dinâmica dos processos educativos, cabendo, pois,
ao estudante dominar uma série de conteúdos e sua aplicabilidade, sob a forma de
competências e habilidades.
Atualmente, a qualidade pode ser mensurada por resultados escolares
aferidos via taxas de retenção e promoção, egressos dos cursos superiores, testes
padronizados e comparações internacionais do rendimento escolar, caracterizando-
se, segundo olhar de Enguita (1995, p. 98) na “[...] lógica da competição do
mercado”.
Nesse sentido, para qualificar as instituições escolares, é preciso adequá-las
à lógica de competição, como sinônimo de eficiência e produtividade. Há, portanto,
direcionamentos sob a égide da boa escola, do bom ensino, de bons professores,
não para todos, como a questão da democratização em termos quantitativos, mas,
para poucos privilegiados, geralmente os frequentadores de escolas particulares,
contribuindo para perpetuação do dualismo público e privado. Segundo Enguita:

Na competição entre escola pública e privada, por exemplo, a


segunda acaba sempre ganhando, porque a simples opção por ela,
entre outras razões, denota já por si própria a busca de um ensino de
qualidade. (1995, p. 108).

Daí a ideia de que a boa escola, a que tem “melhor” qualidade, em termos de
processo ensino e aprendizagem, infraestrutura, recursos humanos e materiais, é a
escola privada, equipada para qualificar a elite que pode pagar por um ensino de
“melhor qualidade”, em contraposição à ideia pejorativa da escola pública, vista,
muitas vezes, como uma escola de “qualidade questionável”.
Gentili (1995), ao concordar com Enguita, afirma que o próprio conceito de
qualidade educacional, numa perspectiva voltada para o mercado, é uma ferramenta
de manutenção da sociedade, bem como do projeto neoconservador. O autor
destaca que, numa sociedade democrática, não devem existir diferenças entre o
acesso à escola e o tipo de serviço prestado por ela, criticando as “qualidades”
demandadas pela escola pública e pela privada. Segundo o autor, é preciso
transformar a qualidade dos sistemas de ensino num direito comum a todos e não a
55

uma pequena parcela da população, pois “qualidade para poucos não é qualidade é
privilegio” (GENTILI, 1995, p. 177).
Considera-se relevante para este estudo a argumentação de Dourado,
Oliveira e Santos sobre o conceito de qualidade.

O exame da realidade educacional, sobretudo em vários países [...]


com seus diferentes atores individuais e institucionais, evidencia que
são diversos os elementos para qualificar, avaliar e precisar a
natureza, as propriedades e os atributos desejáveis ao processo
educativo, tendo em vista a produção, organização, gestão e
disseminação de saberes e conhecimentos fundamentais ao
exercício da cidadania. (2007, p. 7).

Para os autores, a qualidade deve ser entendida de forma polissêmica, ou


seja, repleta de muitos significados e interpretações. Nesse sentido, não basta um
único enfoque para a qualidade escolar se materializar. É preciso que as ações na
busca pela qualidade educacional sejam realizadas dentro e fora da escola,
enfrentando, com a adoção de políticas públicas questões como a violência,
abandono, acesso à cultura e aos esportes, saúde e emprego.
É interessante notar que, enquanto a sociedade passa por todas essas
questões, o Estado elabora testes padronizados para aplicação em larga escala com
o intuito de medir a qualidade da educação brasileira. Não seria mais prudente se
ele trabalhasse em prol dessas mesmas questões elencadas, através de políticas
públicas consistentes e efetivas, não sob o ponto de vista de propostas de governo,
como é o caso da Bolsa Família, ou Bolsa Escola, mas numa perspectiva voltada a
projetos e ações duradouras e conscientes?
Isso evidencia que a qualidade educacional não existe em si mesma,
independentemente de fatores sociais, culturais e econômicos. A qualidade
educacional também considera os entraves sociais como o capital econômico,
cultural e social das famílias. Ou seja, um dos fatores intervenientes na qualidade
educacional é a desigualdade social, um fator que está extrínseco à escola e que
pode afetar sua qualidade.
56

2.4 REFERENCIAL DE QUALIDADE LEGITIMADA PELA AVALIAÇÃO EXTERNA

Segundo alguns teóricos (BRUNO, 1996; OLIVEIRA, 1996; SOUZA, 1997), a


busca da qualificação da escola está ligada à reestruturação capitalista e à lógica da
produtividade, uma vez que, numa sociedade globalizada e tecnológica, o foco do
processo produtivo passa a ser o intelecto e não a força. Nesse sentido, é preciso
investir na qualificação do sistema de ensino a fim de formar cidadãos capacitados
para atender às necessidades emanadas pelo mercado. Portanto, a busca da
qualidade na educação não é referência para a consolidação do direito que é cabido
ao cidadão para exercer sua participação política e social. A busca da qualidade
está muito mais ligada ao desenvolvimento econômico do país, bem como sua
inserção no grupo dos países desenvolvidos. Dessa premissa, Souza (1997 p. 264)
esclarece que “[...] a educação precisa alcançar qualidade capaz de responder às
demandas decorrentes das transformações globais nas estruturas produtivas e do
desenvolvimento tecnológico”.
A qualidade, portanto, emerge da necessidade de se preparar os indivíduos
para processos mentais cada vez mais requintados e abstratos, qualificando-os para
o pleno exercício de uma profissão no mercado de trabalho. A qualidade, nesse
sentido, não é uma qualidade que emerge do núcleo formador da escola e sistemas
de ensino, como direito do cidadão, mas uma qualidade concebida por agências
multilaterais com o propósito de diminuir a taxa de pobreza dos países em
desenvolvimento e de adequar a educação, com vistas a atender à reestruturação
produtiva do capitalismo, onde ela ganha papel central, ao ser considerada uma
condição geral de produção (BRUNO, 1996).
Para Souza (1997), as avaliações legitimam a qualidade nos processos
educativos e nas escolas, pois funcionam como instrumentos de medida, adequação
e controle dos sistemas educativos, passando a orientar políticas públicas na área
da educação.
Contribuindo com esse argumento, Afonso (2005), entende que
responsabilidade não recai sobre os governos e políticas públicas, mas sobre as
escolas e sistemas de ensino. Nesse sentido, o autor alega que se cria, a partir da
responsabilização das escolas e sistemas de ensino, um ethos competitivo, baseado
na lógica do mercado.
57

[...] desta ideologia da privatização, ao enaltecer o capitalismo de


livre mercado, conduziu a alterações e mudanças fundamentais no
papel do Estado, tanto ao nível local como ao nível nacional. Neste
sentido [...] diminuir as despesas públicas exigiu não só a adopção
de uma cultura gestinonária ou gerencialista no setor público, como
também induziu a criação de mecanismos de controlo e
responsabilização mais sofisticados. A avaliação aparece assim
como um pré-requisito para que seja possível a implementação
desses mecanismos (AFONSO, 1998, p. 49).

Essa premissa implica a emergência de adequar os processos de gestão da


escola pública baseada na perspectiva neoliberal aos modelos de gestão privada,
cujos parâmetros de eficiência, eficácia e produtividade, originários da economia de
mercado e internalizados pelos sistemas escolares, são os grandes fatores
considerados como qualitativos nos processos educativos.
Para tanto, cabe à escola modificar seu conteúdo cultural, em prol de uma
formação que atenda aos objetivos do mercado.
Tanto Azevedo (2009) quanto Lima (2008) entendem esse processo como a
mercantilização da educação, na medida em que se compara e administra uma
escola, com valores econômicos próprios de uma empresa privada.
Cabe ressaltar que a Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional (LDB)
n.º 4.024/61, diante de um contexto econômico e político caracterizado pelo
desenvolvimentismo do governo Juscelino Kubitschek, já estabelecia no seu artigo
96 a qualidade da educação fundamentada na produtividade.
Isso porque o país vivia uma fase internacionalização da economia e
progresso acelerado. Segundo a lei nº. 4.024/61, artigo 96:

O Conselho Federal de Educação e os conselhos estaduais de


educação na esfera de suas respectivas competências, envidarão
esforços para melhorar a qualidade e elevar os índices de
produtividade do ensino em relação ao seu custo:
a. Promovendo a publicação anual das estatísticas do ensino e
dados complementares, que deverão ser utilizados na elaboração
dos planos de aplicação de recursos para o ano subseqüente;
b. Estudando a composição de custos do ensino público e
propondo medidas adequadas para ajustá-los ao melhor nível de
produtividade.

Destaca-se que o trinômio ensino, qualidade e produtividade, sob o ponto de


vista da relação custo-benefício, já se fazia saber legalmente na primeira LDB
58

brasileira, entretanto a maior ênfase nessas questões só foi dada após a década de
1980.
A qualidade educacional e a estratégia de avaliar os processos educativos por
meio de avaliações também estão contempladas na Constituição Federal de 1988. O
artigo 206 estabelece a garantia de padrões de qualidade; já o artigo 209 garante e
autoriza aos poderes públicos a realizarem avaliações para medir a qualidade de
seus sistemas de ensino.
Entretanto, para Pinto (2008), embora a legislação contemple a qualidade da
educação estabelecendo aos sistemas de ensino preceitos legais que a garantam, a
realidade está longe de ser cumprida, pois, segundo o autor, enquanto as escolas
particulares preparam suas crianças e seus jovens para o ensino superior, a escola
pública não consegue garantir domínios mínimos de leitura, escrita e cálculo. No que
se refere à aferição da qualidade, o autor explica que:

O atual sistema chamado de avaliação [...], mas que na verdade não


passa de um conjunto de testes padronizados de português e
matemática, é claramente insuficiente para aferir a qualidade da
educação oferecida pelos sistemas de ensino, mesmo considerando
os limites dos objetivos postos pela legislação. (PINTO, 2008, p. 59).

O autor trabalha com a hipótese de que quanto mais insumos, referindo-se a


recursos humanos e físicos das próprias escolas, maior será a qualidade,
representando também estratégias para melhorar o desempenho dos estudantes
nos testes padronizados.
Portanto, para Pinto (2008), não existe qualidade sem infraestrutura,
equipamentos, laboratórios de informática com acesso a internet, bibliotecas,
remuneração de professores, ou seja, não existe qualidade na escola, porque não
há insumos suficientes para atendê-la.
Em suma, é possível afirmar que educação de qualidade custa caro e não é
somente por meio da pressão exercida pelo Estado com palavras de ordem como
descentralização, democratização, flexibilização, autonomia e participação, ou por
meio da remuneração por competência avaliada com base na produtividade e
certificações e estimulada com bônus vinculados aos resultados do IDEB e IDESP, é
que se consubstancia a qualidade nos processos educativos.
Entende-se a avaliação como uma condição necessária à melhoria da
qualidade de ensino no país, principalmente na escola pública. No entanto, as
59

questões de qualidade, sua busca e melhoria devem emergir do núcleo da própria


escola e dos que dentro dela atuam e frequentam, exigindo do Estado, enquanto
propositor e regulador de políticas, condições para a efetiva qualificação de escolas
e sistemas de ensino.

2.5 TRAJETÓRIA DOS SISTEMAS DE AVALIAÇÃO EXTERNA NO BRASIL

No Brasil, os mecanismos de aferição da qualidade educacional tiveram início


no final de década de 1980. Em 1987, o Ministério da Educação instituiu o Sistema
Nacional do Ensino Público do 1.º grau, substituído, em 1990, pelo SAEB, com o
objetivo de monitorar o sistema e subsidiar políticas públicas para a área da
educação (COELHO, 2008).
No entanto, algumas ações já haviam sido empreendidas desde 1906, quando
a elaboração do Anuário Estatístico do Brasil exigia medições sobre número de
escolas, professores, matrículas e repetências dos níveis superior, profissional,
secundário e primário das esferas públicas e privadas da educação brasileira. Em
princípio, essa medida era executada somente no Rio de Janeiro, ou seja, na sede
do Distrito Federal. Essas medições foram feitas de 1906 a 1918, sendo retomadas
novamente em 1936, agora com informações envolvendo todo o território nacional
(HORTA NETO, 2007).

2.5.1 SAEB e Prova Brasil

O primeiro sistema de avaliação da educação brasileira foi instituído pelo


Ministério da Educação, em 1987, sob a nomenclatura de Sistema Nacional do
Ensino Público do 1.º Grau (SAEP), como uma das exigências do Banco Mundial
para prover financiamentos para projetos executados no Brasil. No entanto, sua
efetivação só ocorreu em 1990, já sob a nomenclatura de SAEB (COELHO, 2008).
O SAEB avalia as competências cognitivas e habilidades utilizadas pelos
alunos no processo de construção do conhecimento. Seu objetivo é monitorar a
qualidade na educação básica brasileira, tendo como referência instrumentos de
coleta como teste de língua portuguesa, matemática e questionários a serem
respondidos por alunos, professores, diretores e pelo responsável pela coleta de
60

dados. Além de monitorar a qualidade, o SAEB constitui um importante mecanismo


de direcionamento das políticas públicas voltadas à qualidade, na medida em que
fornece aos gestores dos sistemas de ensino informações relevantes para subsidiar
decisões (HORTA NETO, 2007).
O teste é aplicado por amostragem nos sistemas públicos e particulares de
educação, contemplando estudantes do 5.º e 9.º anos do ensino fundamental e 3.º
ano do ensino médio. Não entram na amostra alunos que frequentam salas
multisseriadas, de aceleração e classes de educação de jovens e adultos (ARAÚJO;
LUZIO, 2005).
Segundo Oliveira (2005), os resultados do SAEB indicam que a maioria dos
alunos das escolas públicas não atinge os padrões mínimos exigidos e que o
desempenho verificado em escolas estaduais e municipais é o mesmo. Entretanto,
alguns especialistas apontam que esses testes não revelam exatamente o
diagnóstico do sistema educativo.
Isso ocorre porque os resultados dos testes sofrem influência de variáveis
como o perfil socioeconômico da família e o nível de escolaridade dos pais. Esses
são fatores inerentes ao processo de avaliação e que acabam interferindo em seus
resultados.

Os dados do SAEB indicam o desempenho relativo dos alunos nos


vários estados. O fato de um estado ou uma rede de ensino ter
média superior a de outros estados ou redes significa que em média
os alunos desse estado ou rede de ensino sabem mais do que os
outros em relação as competências avaliadas. Mas isto não significa
que o ensino seja melhor. Há outras variáveis que afetam os
resultados escolares como educação dos pais, renda, nível
socioeconômico (OLIVEIRA, SCHWARTZMAN, 2003, p. 27).

Para o INEP, a análise dos resultados dos levantamentos do SAEB permite


acompanhar a evolução do desempenho dos alunos e dos diversos fatores
incidentes na qualidade e na efetividade do ensino ministrado nas escolas,
possibilitando a definição de ações voltadas à correção das distorções identificadas
e o aperfeiçoamento das práticas e dos resultados apresentados pelas escolas e
pelo sistema de ensino brasileiro.
No entanto, enquanto o SAEB avalia por amostragem, a Prova Brasil
caracteriza-se como uma avaliação censitária, ou seja, universal para todos os
61

alunos matriculados no 5.º e 9.º anos do Ensino Fundamental público, privado ou


federal (BRASIL, 2009).
A Prova Brasil, ou Avaliação Nacional de Rendimento Escolar, foi um
instrumento de avaliação externa criado pelo MEC/INEP em 2005, com o objetivo de
avaliar o desempenho dos estudantes das escolas de nível fundamental urbanas,
nas áreas de Língua Portuguesa, com foco na leitura, e Matemática. A Prova Brasil é
mais detalhada, uma vez que agrega todas as escolas, sem exceção,
complementando a avaliação realizada pelo SAEB (BRASIL, 2009).

2.5.2 Índice de Desenvolvimento da Educação Básica

Criado pelo INEP, o IDEB é um indicador sintético da educação brasileira, que


leva em consideração resultados acadêmicos e fluxo escolar, obtidos por meio da
Prova Brasil, do SAEB e do Censo Escolar (FERNANDES, 2007). O princípio do
IDEB é que o aluno aprenda e passe de ano e seu cálculo é feito da seguinte forma:

Ideb = (1/T). N (nota)

T é o número de anos que em média os alunos gastam para completar uma


série (tempo). Quando esse fluxo é feito adequadamente (1/T), o IDEB assume o
valor da nota, e sua tendência é manter-se estável ou aumentar. Mas quando o fluxo
é interrompido por repetência, evasão ou abandono, T assumirá valores maiores e,
consequentemente, o índice tende a diminuir. Nota é a média das avaliações
externas, ou seja, o valor do desempenho dos estudantes no SAEB e na Prova
Brasil. Logo, os referenciais tempo de estudo e nota de desempenho dos estudantes
são os dados quantitativos que formam o IDEB (FRANCO; ALVES; BONAMINO,
2007).
A compilação desses dados resulta em uma média para as Unidades da
Federação e para as próprias escolas, gerando gráficos informacionais sobre o nível
de qualidade de cada um (FERNANDES, 2007). O IDEB se constitui no principal
indicador utilizado para monitorar a qualidade da educação básica no país. A
proposta oficial é coibir a reprovação indiscriminada e estabelecer metas para os
sistemas de ensino e as escolas, numa mobilização pela qualidade da educação
62

para que, em 2021, o país atinja a meta de qualidade educacional dos países
desenvolvidos.
Para alcançar as metas propostas pelo IDEB, é preciso que escolas e
sistemas de ensino regularizem o fluxo escolar, ou seja, quanto menor a reprovação
e o abandono de alunos, melhor a nota do índice. Outra exigência para aumentar o
valor da nota é a melhoria do desempenho dos alunos, principalmente nas
avaliações externas.
A média nacional da aferição do IDEB no ano de 2005 foi de 3,8. Já no ano
de 2007, o resultado ficou em 4,2, contra 6,0 alcançado por países desenvolvidos.
Logo, a média 6,0 passa a ser a meta a ser alcançada em 2021, às vésperas de
completar 200 anos de sua independência. Com os objetivos atingidos, poderá fazer
parte dos países integrantes da Organização para a Cooperação e o
Desenvolvimento Econômico (HADDAD, 2008).
Há ainda outros tipos de avaliações externas no Brasil, como o Enem, criado
em 1998 e aplicado somente aos alunos concluintes do Ensino Médio, com o
objetivo de analisar o desempenho e o rendimento do estudante; o Enade, criado em
1996 e aplicado a alunos de graduação no Ensino Superior (INEP/MEC, 2009).
De acordo com as notas obtidas pelo IDEB, é possível realizar projeções,
conforme indica a Tabela 3, tendo em vista que a expectativa é que o Brasil passará
a fazer parte do grupo dos países mais desenvolvidos do mundo, até 2021.

Tabela 3 – Notas do IDEB 2005, 2007 e projetos para o Brasil

Anos iniciais do Ensino Anos finais do Ensino


Ensino Médio
Fundamental Fundamental
IDEB IDEB IDEB
Metas Metas Metas
Observado Observado Observado
2005 2007 2007 2021 2005 2007 2007 2021 2005 2007 2007 2021
TOTAL 3,8 4,2 3,9 6,0 3,5 3,8 3,5 5,5 3,4 3,5 3,4 5,2
Dependência administrativa
Pública 3,6 4,0 3,6 5,8 3,2 3,5 3,3 5,2 3,1 3,2 3,1 4,9
Federal 6,4 6,2 6,4 7,8 6,3 6,1 6,3 7,6 5,6 5,7 5,6 7,0
Estadual 3,9 4,3 4,0 6,1 3,3 3,6 3,3 5,3 3,0 3,2 3,1 4,9
Municipal 3,4 4,0 3,5 5,7 3,1 3,4 3,1 5,1 2,9 3,2 3,0 4,8
Privada 5,9 6,0 6,0 7,5 5,8 5,8 5,8 7,3 5,6 5,6 5,6 7,0
Fonte: Prova Brasil e Censo Escolar. (INEP/MEC, 2009).
63

Ao levar em consideração indicadores de fluxo e rendimento escolares, o


IDEB das escolas alcançará notas altas, simplesmente por não reter os estudantes,
sem que isso signifique, de fato, qualidade nos processos educativos.
Não é objetivo deste trabalho questionar as taxas de repetência. No entanto,
cabe lembrar que esse fator é levado em consideração no momento de se calcular o
índice. Nesse sentido, Freitas (2007, p. 981) adverte que o “aumento de aprovados
não é o mesmo que aumento de aprendizagem”.

2.6 O IDEB E A QUALIDADE: FATORES DESVINCULADOS

Durante muito tempo, os problemas da educação brasileira foram sendo


mantidos num constante “jogo” de tensões entre duas vertentes. De um lado, as
questões pedagógicas próprias da educação formal e, consequentemente, da
escola, e de outro, os fatores sociais. Nenhum dos dois lados assume a
responsabilidade pela produção do fracasso ou pela qualidade isoladamente.
Freitas (2007) argumenta que as duas vertentes são responsáveis, em
conjunto, no coletivo e de forma dialética. Por isso, somente a responsabilização da
escola pelo sucesso ou fracasso escolar, baseado no IDEB, sem levar em
consideração outras variáveis que interferem no processo e que são relegados ou
negligenciados pelo índice, pode comprometer o resultado.
Ainda segundo Freitas (2007), algumas dessas variáveis são deixadas de fora
no processo das melhores e piores escolas ranqueadas pelo IDEB. Questões como
absenteísmo de professores e sua carga horária, tipo de gestão escolar, número de
alunos na sala de aula, além do nível socioeconômico e cultural das famílias cujos
filhos freqüentam a escola pública. Na opinião do autor:

Diante deste quadro, escolher apenas uma variável, desempenho do


aluno, para analisar a educação básica brasileira, como o IDEB faz, é
certamente temerário em face deste complexo de variáveis.
(FREITAS, 2007, p. 972).

O autor ainda adverte que a ideia de regulação da qualidade, por meio de


testes padronizados, vem ganhando força no Brasil, como se fosse possível
“monitorar” escolas com realidades tão especificas. Nesse sentido, entende que
escolas e sistemas de ensino, principalmente os municipais, sentindo a pressão
64

imposta pelas avaliações externas, contratam grandes grupos educacionais para se


enquadrar nas exigências impostas pelos testes ou, no limiar de uma saída
“estratégica” para burlar o IDEB, treinam os alunos para a realização das provas, ou
utilizam outros meios, mais criativos e menos ortodoxos.
A qualidade, portanto, não emerge da própria escola e de sua construção
coletiva, consubstanciada no Projeto Político-Pedagógico, “a qualidade é vista como
objeto de medida de desempenho como eficiência do sistema de ensino e não como
igualdade de resultados dos alunos matriculados nesse sistema” (FREITAS, 2007, p.
974).
Na mesma perspectiva, Paro (2001) entende que não há na escola um
padrão único de aferição de sua qualidade. Até porque não há previsão dos insumos
(alunos) que entram no sistema escolar, tampouco um acompanhamento dos
egressos deste sistema. Avaliar a qualidade da escola sob essa perspectiva requer
definir padrões de um bom ensino, como sinônimo de um bom processo e, portanto,
garantia de um bom produto, que é o próprio aluno, após sua etapa de
escolarização.
Azevedo (2009) também condena a avaliação centrada nos “produtos”,
ignorando os processos e “coisificando” o conhecimento. Segundo o autor, a função
da avaliação externa é quantificar, mensurar, padronizar e após tudo isso elaborar
escalas de competição entre as escolas.
O fato é que esse tipo de avaliação desconhece a complexidade dos
processos educacionais. Os parâmetros buscados são o da eficiência, eficácia e
produtividade. Segundo Azevedo:

O conhecimento é reduzido à sua dimensão cognitiva, traduzido em


acúmulos quantitativos, mensuráveis, como se fosse possível
separá-lo das relações ricas e complexas entre educador, educando,
desvinculá-lo do emaranhado que tece os laços da instituição escola
com valores éticos e culturais que compõem os contextos
educativos. (2007, p. 10).

Nóvoa (1995) entende que as instituições de ensino possuem especificidades


muito particulares, não podendo ser pensadas ou administradas com alto grau de
racionalidade como as empresas. Segundo autor, as mudanças na sociedade
exigem mudanças também na escola. Todavia, é preciso pensar essas mudanças
65

sob o ponto de vista da complexidade técnica, científica e humana, próprio das


instituições de ensino.
Na opinião de Lima (2008), a avaliação em larga escala centra-se somente
nos resultados observáveis e que podem ser medidos, todavia, numa ação que
tramita de fora para dentro da escola, sem que se leve em conta as questões
culturais ou subjetivas do processo. Segundo Lima:

Convoca-se uma mono-racionalidade de tipo técnico e uma


perspectiva gestionária-utilitária (neo-tayloriana), decompõe-se e
fragmenta-se o processo de avaliação, quantificando, mensurando,
formalizando; adopta-se uma visão mecanicista da organização
escolar, centrada nas operações técnicas, na eficácia e na eficiência.
(2008, p. 131).

Castro (2009) também argumenta que as avaliações externas como SAEB, o


Enem e o Enade constituem um referencial vago e inadequado para a qualidade na
educação. Segundo a autora:

Essas avaliações baseadas em indicadores de desempenho mostram-


se restritas e inadequadas para media a qualidade efetiva da
educação, pois não ultrapassam o nível instrumental. Fundamentam-
se em pressupostos técnicos que se distanciam de juízo de valor, do
compromisso com a justiça social, bem como das ações e dos
interesses dos sujeitos que, concretamente, a definem e a adotam.
(2009, p. 31).

Conclui-se, portanto, que os fatores considerados qualitativos são aqueles


preconizados pelas políticas neoliberais de adequação de escolas e sistemas de
ensino para formar e qualificar o “capital humano”, seja sob o ponto de vista de
qualificação para o mercado, seja sob a perspectiva de fornecer condições iguais
para que todos aprendam e tenham oportunidade de alcançar lugares mais
valorizados na sociedade.
Para tanto, cabe às políticas públicas exercerem certa pressão nas escolas e
sistemas de ensino, a fim de aumentar a eficácia e a eficiência dos processos
educativos.
As ferramentas para a consolidação dessas políticas se fazem por meio de
mecanismos engendrados que conduzem à qualidade, do ponto de vista
quantitativo, como os méritos, os rankings, o bônus vinculado à produtividade e os
66

prêmios financeiros destinados àquelas instituições que apresentarem os melhores


resultados e, consequentemente, o melhor índice.
Não obstante, cabe ressaltar que, para além do aspecto pedagógico e dos
saberes cognitivos mensurados na avaliação externa e demonstrados pelo IDEB, há
outros fatores que, quando mobilizados, direcionam a melhoria da qualidade de
ensino e consequentemente os resultados do IDEB. Esses fatores fazem a diferença
numa unidade escolar e não podem ser desprezados.
A escolha do IDEB como referência à qualidade foi proposital, uma vez que,
de acordo com as assertivas de Ball (2001); Souza e Oliveira (2003) e Afonso
(2005), ele funciona como uma espécie de quase-mercado educacional na medida
em que se insere hoje como parâmetro de qualidade na área educacional ao eleger
e diferenciar escolas e sistemas de ensino, promovendo inclusive a competição
entre as escolas. Isso porque, após a divulgação de seus dados pela mídia e órgãos
oficiais, elege-se a melhor escola, assim como a pior, funcionando, portanto, como
um marketing educacional. 18
Na próxima seção analisar-se-ão as dinâmicas escolares e suas dimensões
como condutores da qualidade numa perspectiva comparativa, procurando entender
os mecanismos ou os fatores que diferenciam as escolas dentro dos seus contextos
e de suas especificidades.

18
Geralmente, os rankings com as melhores escolas são elaborados e divulgados pelos meios de
comunicação em massa.
67

CAPÍTULO 3 O IDEB E OS FATORES INTERVENIENTES À QUALIDADE


DA EDUCAÇÃO

Este capítulo trata dos fatores investigados nas escolas na busca de


diagnosticar os referenciais considerados qualitativos, por se entender que a
qualidade não é, tampouco pode ser concebida como um conceito único e
totalizante. Concebe-se que a qualidade educacional está além dos enfoques de
fluxo escolar (promoção, repetência e evasão) e médias de desempenho (SAEB,
Prova Brasil). Para além desses enfoques aferidos pelas avaliações externas
existem outras dimensões que contribuem para a qualidade da educação, como
formação docente, estrutura física da escola, insumos (como livros e material
didático, perfil da gestão), enfim, dimensões que estão além do referencial de
desempenho aferido pelos testes padronizados.
Cabe lembrar que as avaliações externas, e consequentemente o IDEB,
passaram a ser, a partir da década de 1990, um mecanismo de controle e uma
forma de regulação da educação no país, considerando apenas os aspectos de
produtividade escolar medida por meio de testes aplicados em larga escala. Essa
política acaba por desconsiderar cenários educativos reais e suas peculiaridades. O
conhecimento como produto da ação pedagógica é reduzido apenas à sua dimensão
cognitiva, traduzido em dados mensuráveis e qualitativos dispostos em gráficos e
divulgados pela mídia e por órgãos oficiais.
Vale, nesse caso, a premissa do custo-benefício sem que se leve em
consideração outras dimensões que estão imbricadas no processo de avaliação,
mas que não são levadas em consideração no momento da coleta dos dados,
tampouco no momento de sua análise e divulgação.
Corrobora com essa constatação a indagação realizada por Viana:

Será razoável colocar centenas de milhares de sujeitos em uma única


escala [...], ignorando completamente a diversidade social, econômica,
cultural e educacional dessa população e as distorções que
influenciam a caracterização dos vários índices de desenvolvimento
humano? (2003, p. 34).

Cabe, portanto, analisar as dimensões ou os fatores que são relevantes e


conduzem a qualidade da educação nas instituições aferidas pelo IDEB buscando
68

compreender as dinâmicas que no interior das escolas brasileiras propiciam ou são


relevantes para a qualidade educacional.
Para se obter um parâmetro de análise além do referencial fluxo e
desempenho, optou-se por trabalhar as dimensões descritas nos Indicadores da
Qualidade na Educação.
Os Indicadores da Qualidade na Educação são fruto de um trabalho realizado
por um grupo de pesquisadores, cujos objetivos são a construção e a disseminação
de um conjunto de indicadores educacionais qualitativos, de fácil compreensão e
que seja construído pela comunidade escolar (RIBEIRO; RIBEIRO; GUSMÃO,
2005).
As autoras ainda valem-se das argumentações de Spink sobre avaliação
democrática e participação dos envolvidos no processo escolar como determinantes
para a fundamentação teórica dos indicadores. Segundo o autor:

Ter um indicador “limpo” para uso internacional é um problema das


agências internacionais e não para a esmagadora maioria das
pessoas que querem melhorar as condições de vida de seu bairro,
localidade, região e país. Portanto, em vez de aceitar automaticamente
o “internacional”, não seria melhor inverter a situação e pedir a estes
que assumam a iniciativa de debater e dialogar com os atores locais
sobre a importância e a utilidade de certos métodos de mensurar, em
vês de exigir ou forçar? (2001 p. 22 apud RIBEIRO; RIBEIRO;
GUSMÃO, 2005, p. 234).

Portanto, a construção dos Indicadores Qualitativos da Educação pretende


envolver a comunidade escolar para buscar, de forma refletida, a qualidade dos
processos educativos (RIBEIRO; RIBEIRO; GUSMÃO, 2005).
A proposta dos Indicadores é que a escola, de forma coletiva, reflita sobre
seus processos educativos, e que essa reflexão permita a autoavaliação, de forma a
intervir na busca pela qualidade. Essa intervenção é feita pela própria escola,
quando analisada suas fragilidades e potencialidades.
É importante destacar que o próprio documento coloca a qualidade como uma
busca constante e não como um conceito estandardizado. A qualidade nos
processos educativos “[...] é um conceito dinâmico reconstruído constantemente.
Cada escola tem autonomia para refletir, propor e agir na sua busca pela qualidade”
(BRASIL, 2007, p. 5).
69

Os fatores que o IDEB leva em consideração para sua formatação, bem como
os resultados obtidos com a Prova Brasil e o SAEB, estão relacionados somente ao
fluxo e ao desempenho escolar. Não há, portanto, uma relação específica entre os
Indicadores da Qualidade na Educação e os resultados obtidos por meio dessas
avaliações. Os dados, nesse sentido, são puramente quantitativos e não mobilizam a
escola a refletir sobre outras questões além do aspecto didático pedagógico.
Good e Weinstein (1995) explicam que a variação de resultados observáveis
nas duas escolas depende dos processos internos das instituições e do clima
organizacional instalado e produzido pela gestão. Os autores afirmam que as
escolas e todas as relações estabelecidas nesse ambiente influenciam e conduzem
o sucesso ou o fracasso escolar.
Não é intenção deste trabalho encontrar uma resposta única para o conceito
de qualidade na educação. Não há um conceito absoluto sobre o que é qualidade. O
que se pretende somente é investigar como se organizam e se relacionam as
dimensões propostas nos Indicadores da Qualidade na Educação do MEC para
buscar a qualidade na educação, ainda que ela seja definida sob a forma de médias
de desempenho estudantil.

3.1 DISCUSSÃO DOS DADOS COLETADOS

Alguns teóricos (LIMA, 1998; NÓVOA, 1995) apresentam a qualidade da


educação como um elemento complexo e que envolve muitas dimensões, não
podendo, pois, ser considerada apenas numa única proporção. O conceito de
qualidade traz implícito em seu bojo uma série de variáveis que, no conjunto,
contribuem para o processo de ensinar e aprender e, consequentemente, para a
qualidade da educação. Esses teóricos apontam que a qualidade não se faz
somente na sala de aula, mas em toda escola e na comunidade onde a mesma está
inserida.
Nóvoa (1995), tendo como base os trabalhos de Purkey e Smith (1985);
OCDE (1987) e Reid, Hopkins & Holly (1998) define as características de uma
escola eficaz ou qualitativamente relevante. Segundo o autor, a primeira
característica a ser considerada é a autonomia da escola, ao permitir à instituição
delinear um projeto educativo próprio e sua identidade, assim como é importante
reconhecer a responsabilidade dos atores sociais. Do ponto de vista político, a
70

autonomia é a capacidade destinada à escola de responder de forma adequada aos


diversos desafios cotidianos.
Quanto à liderança organizacional, Nóvoa vale-se dos trabalhos de Chapman
(1990) e Rollin (1992) para explicar que:

A coesão e a qualidade de uma escola dependem em larga medida da


existência de uma liderança organizacional efectiva e reconhecida,
que promova estratégias concertadas de actuação e estimule o
empenhamento individual e coletivo na realização dos projetos de
trabalho. A liderança organizacional deve ser legitimada por uma
tomada de decisão e participação colegiais, envolvendo o conjunto da
comunidade educativa na definição e salvaguarda dos objetivos
próprios do estabelecimento de ensino. (NÓVOA, 1995, p. 26).

Além de uma liderança organizacional, é preciso trabalhar com a estabilidade


profissional, principalmente a do corpo docente. Não há educação de qualidade se o
corpo docente de uma escola não está bem articulado, ou se há constantes
mudanças de instituições. Escolas eficazes incutem segurança e sentimento de
pertença nos professores, combinado com fatores como mobilidade e incentivo.
Assim como é importante que os professores se sintam parte de um projeto
educativo maior, também é importante investir na formação destes profissionais.
Nesse sentido é imprescindível a implementação de programas de formação
continuada e profissional. Segundo Nóvoa (1995), as escolas ou sistemas de ensino
eficazes oferecem cursos ou programas de aprimoramento, principalmente ao corpo
docente. Além disso, a participação dos pais ou da família na educação de seus
filhos também se consubstancia num fator determinante para a qualidade.
Finalmente, a prescrição do autor valoriza maior participação do Estado nas
questões educacionais, não como forma de controle, mas de auxílio, tanto material,
como financeiro, principalmente para as populações ou comunidades menos
favorecidas.
Segundo o autor:

A reivindicação da autonomia não invalida a necessidade de contar


com um apoio forte das autoridades centrais, regionais e locais,
sobretudo nas zonas desfavorecidas. Este apoio é fundamental, tanto
do ponto de vista material e econômico, como numa perspectiva de
aconselhamento e consultoria. As autoridades podem disponibilizar
recursos humanos qualificados que ajudem a desenvolver uma
avaliação-regulação (a posteriori) das escolas, que não pode ser
confundida com um controlo normativo e prescritivo (a priori).
71

Por outro lado, é fundamental que as escolas tenham uma integração


harmoniosa no tecido comunitário e nas redes de relação ao nível
local. (NÓVOA, 1995, p. 28).

Contribuem com essa perspectiva as argumentações de Dourado; Oliveira e


Santos (2007), ao considerarem que uma escola eficaz é o resultado de ações
engajadas entre Estado, comunidade escolar, instituição, ou seja, ações políticas,
sociais e pedagógicas são fatores determinantes para uma escola de qualidade, ou
que apresente resultados positivos em termos de aprendizagem.
Embora esse discurso pareça simplista, do ponto de vista de avaliar ou
elencar os fatores determinantes para a qualidade de uma unidade escolar, ele se
faz necessário na medida em que contribui para perfazer o escopo teórico deste
trabalho.
Para traçar o perfil de uma escola a ponto de julgá-la, é preciso analisar as
características e os fatores que constituem os indicadores de qualidade da escola.
Nesse sentido, trata-se de aspectos intra e extraescolares que contribuem para
definir sua eficiência e eficácia.19
Definir qualidade somente do ponto de vista estatístico não conduz melhorias
na educação do país, tampouco mobiliza ações concretas das próprias unidades
escolares, a não ser quando procuram adequar os conteúdos das provas para
treinar os estudantes para realização das mesmas. Definir qualidade em educação
requer o estabelecimento de parâmetros além do desempenho dos estudantes;
pessoal docente capacitado e motivado; gestão; ambiente físico favorável à
aprendizagem; prática pedagógica adequada; material didático, enfim, julgar
desempenho escolar é diferente de julgar qualidade educacional. A qualidade não
está no desempenho, está nos processos internos e externos da escola que
conduzem ao desempenho.
Ao procurar analisar as dimensões que contribuem para qualidade, a próxima
etapa deste trabalho elencará as dimensões descritas nos Indicadores da Qualidade
na Educação, buscando analisar essas dimensões em cada escola investigada na
perspectiva de compreender as dinâmicas e práticas que conduzem, ou não, à
qualidade educacional.

19
A qualidade depende de fatores que estão dentro e fora da escola. Por isso, Dourado; Oliveira e
Santos (2007) utilizam as expressões intra e extraescolar.
72

A seguir, tratar-se-ão as dimensões pesquisadas em cada escola, no sentido


de buscar explicações definidoras do sentido de ser uma escola de qualidade, sob a
ótica das dimensões analisadas, além de buscar verificar os fatores que se
distanciam ou se aproximam como facilitadores ou não da qualidade, para ambas as
escolas pesquisadas.

3.1.1 Ambiente educativo e ambiente físico escolar

O primeiro indicador proposto e o grande desafio da qualidade na escola é o


ambiente educativo. Um bom ambiente escolar conta com recursos disponíveis
favorecedores de aprendizagens e interação da comunidade intra e extraescolar.
Um espaço limpo e organizado, com bibliotecas, salas de leitura, laboratório
de informática, compõe um dos elementos importantes para o estímulo à
aprendizagem. Segundo Dourado; Oliveira e Santos (2007, p. 13): “A existência de
um ambiente escolar adequado é diretamente relacionada à questão do
desempenho dos estudantes”.
O primeiro ponto analisado nas escolas foi sua estrutura física e seu ambiente
educativo. Cabe, nesse ponto, descrevê-los, a fim de contextualizar os campos de
investigação dessa pesquisa.
A escola da cidade de Itápolis é bem organizada, possui cinco salas de aula
com dez turmas que se organizam entre os períodos matutino e vespertino; atende
somente ao Ensino Fundamental, do 1.º ao 5.º anos. A escola conta com laboratório
de informática, quadra poliesportiva coberta e um consultório odontológico, cujo
profissional atende os estudantes duas vezes por semana. Não há espaços
reservados para a sala dos professores, sala da gestão (diretora) e secretaria da
escola. Os professores ficam no pátio nos momentos que antecedem o início das
aulas e a diretora da escola, juntamente com a secretária, ficam alojadas numa sala
só. Também não há uma biblioteca estruturada na escola, tampouco salas de leitura.
Os livros ficam à disposição dos alunos dentro da sala de aula. O estado geral de
conservação da escola e das salas de aula é adequado, com boas condições de
higiene, iluminação e ventilação.
73

A escola atende a 266 alunos somente do Ensino Fundamental (1.º ao 5.º


anos), o quadro docente é formado por 14 professores. 20 Por meio das entrevistas,
percebeu-se um forte vínculo entre os professores e um sentimento de pertença que
pode ser comprovado por meio dos baixos índices de absenteísmo apresentados.
Não há equipes de vice-direção e coordenação pedagógica na escola e essas
funções são assumidas pela própria diretora, que se encarrega inclusive de preparar
as HTPCs.
A entrevista com a diretora evidenciou que há uma parcela significativa de
pais que participam da educação de seus filhos contribuindo para o trabalho
realizado na escola. Segundo a diretora, os pais se envolvem também em trabalhos
e eventos realizados pela escola, sempre contribuindo e participando.
A escola é bastante procurada pelas famílias, pois é considerada a melhor
escola pública da cidade em função da nota IDEB 2007. Há inclusive um quadro
localizado na parede ao lado de fora da escola, com a nota do IDEB e uma menção
parabenizando a escola pelo desempenho.
Já os dados coletados na escola da cidade de Assis evidenciaram uma escola
mais ampla, com maior número de alunos, atendendo os níveis da Educação Infantil
e Ensino Fundamental. A escola atende também a modalidade da Educação
Especial e funciona em período integral: os alunos vão para a escola no período da
manhã, almoçam na escola e ficam também no período da tarde realizando
atividades diversas, em forma de oficinas, como estudo de língua estrangeira,
experiências matemáticas, estudo e pesquisa, expressão corporal, meio ambiente,
iniciação musical, saúde e qualidade de vida, leitura, xadrez e informática. As
oficinas são ministradas na escola em parceria com o Centro Social Urbano e
APOCIRA (Associação dos policiais civis da região de Assis). O intuito das oficinas é
garantir aproveitamento escolar, elevando a autoestima dos alunos.
A escola possui salas amplas e espaços bem delimitados, sala dos
professores, secretaria, sala da direção e da coordenadora pedagógica, espaço
reservado para a Educação Infantil (creche e pré-escola), sala de informática,
brinquedoteca. As salas de aula são bem ventiladas e iluminadas e as condições de
higiene são bastante adequadas.

20
Dados referentes ao ano de 2009.
74

A escola não possui biblioteca, os livros ficam na sala dos professores e as


crianças não têm acesso livre a eles. Há uma pequena quantidade de livros de
literatura infanto-juvenil e outra de apoio pedagógico compondo esse acervo.
Também foi constatada a ausência de uma quadra poliesportiva na escola e um
parque para os alunos da educação infantil, embora a escola disponha de uma
brinquedoteca.
A escola atualmente atende 341 alunos, sendo 212 no Ensino Fundamental;
97 na Educação Infantil; 32 na sala de recurso (para alunos com deficiência
intelectual).21 Está localizada num bairro periférico da cidade, com alto índice de
violência e criminalidade.22 As famílias cujos filhos frequentam a escola apresentam
baixo nível sociocultural e econômico.
Segundo depoimento de uma professora, os alunos apresentam bastante
dificuldade de aprendizagem e não há o incentivo dos pais ou das famílias. A
participação deles na escola também é escassa.

[...] Muitas vezes a gente não consegue contar com a ajuda dos pais,
que é uma coisa muito importante, né. O apoio da família, inclusive
na minha sala eu tenho uma criança que eu aceitei como ouvinte,
porque ela não parava na sala de aula dela, é uma criança que ela
não para mesmo, a gente tem que fazer um trabalho muito grande
para conseguir fazer com que ela pare, e não fazendo exatamente o
que o restante da turma está fazendo. Fazendo outra atividade, e
hoje eu fiquei sabendo que esta criança tem a avó que, além de se
prostituir ali na rodovia, é usuária de droga, o pai veio falar hoje cedo
comigo, logo 7 horas da manhã, já estava cheirando a álcool, a mãe
o abandonou e foi embora, ele mora junto com o pai e a madrasta,
então são estes tipos de dificuldades que a nossa escola tem. A
maioria das nossas crianças que dão trabalho são crianças vindas de
uma realidade assim (professora 7 – Assis).

As entrevistas evidenciaram que as professoras não possuem sentimento de


pertença à escola, o que favorece a alta rotatividade de docentes, e alto índice de
absenteísmo. As professoras entrevistadas demonstraram maior preocupação com
questões voltadas para a marginalidade, drogas e violência.

Eu acredito que aqui dentro da escola, existem alguns problemas de


comportamento, dos alunos, é o que eu vejo mais freqüente assim.
Um outro problema é a alta rotatividade de professores. Ninguém
quer ficar (professora 6 – Assis).

21
Dados referentes ao ano de 2009.
22
Conforme descrito no Projeto Político-Pedagógico.
75

Essa constatação também foi verificada pela fala da diretora da escola e sua
preocupação com a alta rotatividade de professores. Segundo dados apresentados,
essa rotatividade chega a 75% e é considerado muito alto pela direção da escola.
O quadro docente da instituição é formado por 36 profissionais, assim
distribuídos: 20 professores do Ensino Fundamental, 4 da Educação Infantil e 12 que
trabalham com as oficinas. Há também os estagiários e monitores que colaboram
nas oficinas.
Uma das razões do absenteísmo e rotatividade dos professores, segundo
conversa com a coordenadora pedagógica, e com as próprias professoras, é a
localização da escola numa área da cidade marcada pela marginalidade. Segundo a
coordenadora pedagógica, esta é uma questão que acaba prejudicando a escola,
porque o trabalho pedagógico muitas vezes é interrompido por faltas ou licenças, e
pela constante remoção de professoras da escola.
Segundo depoimento da diretora, algumas ações são feitas para que o
professor permaneça na escola, segundo sua verbalização:

É uma equipe grande. Há uma alta rotatividade de professores (75%


– muito alta). A escola procura fazer uma integração até com as
famílias dos professores, para que eles se sintam pertencentes ao
espaço escolar.

No decorrer da análise dos dados coletados, foram observadas


principalmente as questões relacionadas ao atendimento e sua estrutura. A escola
de Assis atende um número maior de alunos em dois níveis diferentes de ensino,
enquanto a escola de Itápolis oferece somente o Ensino Fundamental e gerencia
uma quantidade menor de alunos.
Sobre essa comparação, Pinto (2008) esclarece que escolas menores em
geral apresentam melhores resultados, pois tendem ao fortalecimento de vínculos na
comunidade interna e externa à escola. Corrobora com a análise de Pinto o fato de
os professores da escola investigada em Assis apresentarem alto índice de
absenteísmo e pouco sentimento de pertença à escola, fato que, em conjunto com
os demais, colaborou com a baixa nota da escola alcançada no IDEB 2007,
comprometendo a qualidade.
76

Outra questão pertinente é o nível socioeconômico dos estudantes. Enquanto


a escola de Itápolis apresenta um bom nível socioeconômico, o que pôde ser
observado no momento da coleta de dados, a escola de Assis sofre os efeitos da
carência de recursos financeiros e culturais de seus alunos.
Nessa primeira dimensão investigada nas escolas, pode-se destacar como
pontos de comparação capazes de interferir na qualidade: os níveis e modalidade de
ensino oferecidos pelas escolas, o tamanho da escola, o número de alunos
atendidos e o nível socioeconômico e cultural dos estudantes, conforme ilustra o
Quadro 2.
Entende-se, a partir dessas premissas, que escolas que apresentam
melhores recursos físicos e humanos tendem a garantir melhor educação, mesmo
considerando a avaliação externa como medida.

Quadro 2 – Comparação da dimensão ambiente educativo e ambiente físico escolar


Escola de Itápolis Escola de Assis
Oferece o Ensino Fundamental e a Oferece Educação Infantil; Ensino Fundamental; e
modalidade EJA (noturno) duas modalidades: EJA (noturno) e Educação Especial
Há apenas uma diretora na escola A equipe gestora é formada por uma diretora e duas
coordenadoras pedagógicas
Atende 266 alunos Atende 341 alunos
Possui 14 professores Possui 36 professores, mais os monitores das oficinas
(estagiários)
Bom nível socioeconômico dos alunos Baixo nível socioeconômico dos alunos

3.1.2 Prática pedagógica e avaliação

De modo essencial, os aspectos qualitativos devem ser direcionados à prática


pedagógica, ao desenvolvimento de projetos educativos, ao planejamento e à
avaliação. Para Dourado (2007), as ações desencadeadas pelo Projeto Político-
Pedagógico (PPP) são de extrema importância para a qualidade na educação.
Segundo o autor, um projeto consistente, elaborado coletivamente e que tenha
metas claras comum a todos, é o grande referencial de qualidade de uma unidade
escolar, aliado a domínio de conteúdos, formação docente e condições de trabalho.
Para a elaboração do PPP, tanto as diretoras quanto as professoras das
escolas investigadas responderam que há um momento logo no início do ano letivo
para sua elaboração. Os PPPs analisados são de 2007 (Itápolis) e 2008 (Assis).
Segundo a análise do documento, as duas escolas possibilitam momentos de
77

planejamento coletivo nos horários da HTPC e momentos de reuniões com o


colegiado da escola e com pais de alunos.
No depoimento da diretora da escola de Itápolis, percebe-se a preocupação
com elaboração coletiva do PPP:

Nós nos reunimos, né, a direção com as professoras no início do ano.


Pegamos a proposta do ano anterior, damos uma lida e vamos
reformulando de acordo com a necessidade da escola, com o
desempenho dos alunos, o que nós falhamos, nós vamos [...] vemos a
falha que nós tivemos do ano anterior, e vamos trabalhando em cima
de uma missão. Que nesta última agora, a nossa missão era a
inclusão, então nos trabalhamos, porque nós temos duas alunas aqui
de inclusão que é a surda e a cadeirante, então nós trabalhamos em
cima da inclusão, nesta última proposta que nós fizemos e no
desempenho do aluno durante o ano. Então a gente procura ver o que
foi que aconteceu, quais foram as falhas que nós tivemos para
atingirmos os nossos objetivos, neste ano. Todo ano no inicio do ano
nos fazemos isso. O que nós queremos atingir naquele ano, o porque
que nós falhamos, qual foi a causa se a falha foi nossa, se a falha foi
dos pais, se a falha foi do sistema. Como este ano, essa gripe que
teve. Isso daí vai dar uma lacuna na aprendizagem do aluno, foram 14
dias que as crianças ficaram em casa, esses 14 dias a criança vai
sentir sempre isso daí, porque por mais que nós estejamos repondo
aos sábados, os primeiros sábados as crianças vinham, 90, 98, por
período, nós temos 136, e 130, então vinha 90, 98, 80%, 85%. Agora,
nós estamos com 30, 34, por mais que a gente chame a criança para
vim, converse, eles não vem mas não é a criança, é a família, que já
acostumou não ter aula aos sábados. Fiz reunião com os pais, falei da
importância do sábado, mas não mandaram, então isso quando nós
fazermos a nossa proposta o ano que vem, já vamos ter que ver que a
falha não foi nossa, não foi do aluno, não foi também do pai, porque
não trouxe a criança, a falha foi da epidemia que aconteceu, que
suspendeu a aula (Diretora – Itápolis).

Os depoimentos das professoras e diretoras entrevistadas revelaram que a


prática pedagógica exercida em sala de aula segue a orientação dos planos de
trabalho elaborados para o desenvolvimento do conteúdo programático proposto
pela legislação educacional. Outro fator constatado foi o trabalho com projetos e
eixos temáticos aliados à interdisciplinaridade.

Eu acredito pelo que eu tenho percebido, é que o material usado é


um bom material, na questão da parte didática, né, os professores
também não ficam presos ao material didático, se trabalha projetos
diferenciados, você vai buscar os temas da atualidade, as datas
referentes ao mês, ah... percebo também que os professores se
atualizam bastante, fazem, pelo que eu ouço as meninas falando de
78

cursos de pós graduação. A organização, a parte de direção tá


sempre em cima, observando, se tem algum problema com aluno
corre atrás para ver o que tá acontecendo, questão de falta, porque
as vezes pode dar alguma repetência, alguma coisa, por falta, né,
porque o aluno não vai bem, mas também não comparece, cobrança
nos pais, se tiver algum problema em sala, a (diretora) liga, não só
questão de doença mas questão de disciplina. Então é sempre
assim. É exigido uma certa disciplina das crianças, os professores,
cobram isso em sala, e que mais, poderia ser citado, eu acho que o
básico seria isso (Professora 6 – Itapolis).

As duas escolas possuem horários reservados para o planejamento coletivo,


ocorrido na HTPC. As avaliações são realizadas mediante objetivos previamente
definidos em função de conteúdos escolares. Os conteúdos exigidos nas avaliações
externas, como Prova Brasil e SAEB, são retomados em sala de aula para estudo e
aprendizagem dos alunos, antes da realização das provas. Isso foi verificado nas
duas escolas em momentos que antecederam à aplicação oficial da prova.

Nós temos as HTPCs semanais, toda a segunda feira nos temos


HEs, que são discutidos os assuntos pertinentes que acontecem na
escola, com o professor, e nós passamos, eu particularmente, nós
temos que fazer o semanário, das atividades que são dadas, e isso é
olhado por elas, se as atividades estão sendo realizadas, se está
dentro do que é pedido por ela, este é o jeito que ela nos avalia. E a
gente tá sempre em comunicação, isso é uma constante, ela tá
sempre entrando na sala para vê como funciona, o comportamento
dos alunos, como você está trabalhando pedagogicamente
(Professora 8 – Assis).

Todas as professoras entrevistadas utilizam de alguma forma o resultado da


avaliação externa para modificar sua prática pedagógica e mesmo o seu processo
de avaliação. A esse treinamento, as duas escolas deram o nome de Sarespinho,
por ocasião da aplicação da prova oficial do Estado de São Paulo, o Saresp.23

Professora 2 – Itápolis: Eu altero algumas dinâmicas com vistas a


atender sim, as provas que a escola faz. Passo gabaritos para os
alunos e ensino como fazer as provas. Já trabalho a questão das
provas bem antes da aplicação para eles já terem vivência e noção
do que são as provas.

Professora 5 – Itápolis: Sim, assim, ano que vem a gente


acompanha, a gente vê assim o resultado que tá tendo na sala de
aula, a gente vai mudando as estratégias, mesmo para o aluno, há a

23
As provas do Saresp, no ano de 2009, foram realizadas nos dias 11, 12 e 13 de novembro.
79

informação da família, no contexto escolar, até no próprio município,


então a gente tem que entender toda essa demanda, e preparar o
conteúdo para atingir esta melhoria dentro da sala de aula. Isto é
uma prática que a gente tem que ter. A gente faz simulados com as
provas que já foram aplicadas. Esta semana a gente já fez simulado.
A gente acompanha, mesmo as atividades de sala de aula, eu tenho
retirado estas atividades, para tá treinando estes alunos, para esta
avaliação mesmo, tanto na parte pedagógica, quanto
emocionalmente, porque eles ficam ansiosos, eles ficam querendo
saber, pensa que às vezes é uma coisa assim, é muito diferente de
uma realidade, que eles fazem então a gente tem que ter este
cuidado até da parte emocional com eles. Eles ficam numa
ansiedade? Então a gente tem que cuidar disso também.

Professora 9 – Assis: Vejo as provas que tiveram e a gente o quê!


Sistematiza com as crianças. Por quê? Porque vem, né, você é
avaliada em cima disso, e a gente acaba assim como se diz, uma
treinada. Quer dizer, é conteúdo, é conteúdo, você acha importante
trabalhar produção de texto, interpretação, é, mas às vezes você
trabalha de uma forma, e você cobra de outro jeito. A partir do
momento que você sabe que vem de uma outra maneira, igual
quando começou este texto todo aglutinado, que criança tem que
fazer a segmentação para pôr letra cursiva maiúscula, pontuação. Se
você não prepara a criança para isso, ela fica perdida. Se você não
trabalha com este tipo de... Então na verdade acaba fazendo parte
do seu conteúdo, né.

Professora 11 – Assis: Sim. Aplicando atividades diversas baseadas


em avaliações aplicadas anteriormente.

Evidencia-se, portanto, uma mudança nas estratégias e conteúdos de ensino,


de forma a treinar os alunos para realização das avaliações externas.
Em Itápolis, o percentual de professoras que alteram a dinâmica dos
trabalhos com vistas a atender as exigências dos testes padronizados ficou em 67%,
conforme demonstra o Gráfico 3.
80

Gráfico 3 – Alteração da dinâmica da sala de aula em função do teor dos testes padronizados

As entrevistadas de Assis foram unânimes ao afirmarem que alteram a


dinâmica de trabalho em função dos conteúdos exigidos pela avaliação externa. A
explicação para tal fato se dá, principalmente, em função da necessidade de
mudança do foco do conteúdo para a exigência do sistema em pautar a avaliação e
mesmo o rendimento do professor em termos de produtividade medido por meio da
avaliação externa.
O dado mais significativo para a pesquisa foi a estratégia utilizada pelas
escolas para treinarem seus alunos para a realização dos testes padronizados, uma
vez que se evidenciam nas ações da gestão escolar os procedimentos de
ressignificação das avaliações externas, ou seja, a adaptação do ambiente escolar e
dos conteúdos curriculares para que os alunos tenham a noção de como a prova é
realizada, que conteúdos serão exigidos deles no momento da aplicação do testes e
como responder as questões. Tudo isso na busca de demonstrar o atributo ou o
nível de qualidade (IDEB) de cada escola, para receber méritos, não sansões.
Salienta-se que essa prática adotada pelas escolas responde a exigências
que avaliações externas cobram, que é o desempenho dos estudantes. Como a
política instalada vincula resultado escolar e bônus para o professor, percebe-se que
esse treino se configura numa tentativa de responder a essa exigência, assim como
a oportunidade de receber os incentivos financeiros pela produtividade alcançada.
81

3.1.3 Ensino e aprendizagem

Ao se analisarem os dados referentes à aprendizagem dos alunos, procurou-


se confrontar as informações coletadas e os documentos oficiais das escolas como
taxas de aprovação, repetência e evasão.
De acordo com Madaus, Airasian e Kellaghan (1980), o desempenho dos
alunos nos testes padronizados está intrinsecamente relacionado à qualidade da
instrução dada pelo professor. Os autores entendem o processo ensino e
aprendizagem como “qualidade de instrução” considerando-o uma variável ou
dimensão relacionada à qualidade educacional. Questões relativas à clareza da
apresentação do professor, manejo da sala de aula, método de ensino adotado,
orientação adequada às tarefas em sala de aula, assim como o encorajamento que
utilizam para motivar os alunos, são processos que contribuem para o desempenho
dos estudantes em testes padronizados e influenciam a qualidade.
As escolas investigadas têm suas propostas curriculares pautadas nos
Parâmetros Curriculares24 e uma referência construtivista de educação,
principalmente nas séries iniciais do Ensino Fundamental. As duas escolas
trabalham com projetos didáticos e procuram utilizar metodologias interdisciplinares
em seus processos educativos.
Nenhuma das duas escolas possui bibliotecas; no entanto, conforme
observação realizada, os alunos da escola de Itápolis têm à disposição dentro da
sala de aula uma caixa de livros de vários gêneros para leitura. Já na escola de
Assis, os livros ficam na sala dos professores, que se incumbem de levá-los à sala
de aula para escolha e empréstimo dos alunos.
Os horários de HTPC são destinados ao planejamento e à reflexão sobre a
importância do papel do professor e da escola, constituindo-se em momento de troca
de informações e experiências entre as profissionais. Não são realizados cursos de
aperfeiçoamento nos horários de HTPC. A Secretaria Municipal de Educação se
encarrega de organizar e oferecer cursos de capacitação aos professores das duas
escolas investigadas.
Em Itápolis, houve uma preocupação maior com as professoras que ficariam
responsáveis pelos anos iniciais do Ensino Fundamental, principalmente a partir do

24
No início do segundo semestre de 2010, as escolas municipais de Itápolis passaram a adotar o
material didático do Sistema Anglo de Ensino.
82

ensino de nove anos. Para tanto, a atribuição dessas salas foi realizada pela própria
diretora da escola.
Em Assis, o critério de escolha das salas de aula foi definido pelas próprias
professoras em conjunto com a diretora.
As Tabelas 4 e 5 demonstram os índices das escolas pesquisadas, no que se
refere à matrículas, transferências, aprovação, evasão e reprova. Esses dados
constituem um referencial sobre o processo ensino e aprendizagem.

Tabela 4 – Taxa de matrícula, transferência, evasão, aprovação e reprova – Itápolis


Índices Ano: 2006 Ano: 2007 Ano: 2008
Matriculados 158 184 208
Transferidos 7 9 6
Evadidos 0 0 0
Aprovados 151 175 202
Retidos 0 0 0
Fonte: Dados cedidos pela escola.

Tabela 5 – Taxa de matrícula, transferência, evasão, aprovação e reprova – Assis


Índices Ano: 2006 Ano: 2007 Ano: 2008
Matriculados 269 262 220
Transferidos 62 38 34
Evadidos 3 2 0
Aprovados 201 164 166
Retidos 3 58 20
Fonte: Dados cedidos pela escola.

Ao comparar os resultados apresentados pelas escolas, considerando as


matrículas dos alunos durante o ano de 2007, é possível perceber que, na escola de
Assis, a taxa de aprovação ficou em 62,6%, enquanto na escola da cidade de
Itápolis a aprovação foi de 95,1%.
Como o IDEB é um indicador de fluxo e desempenho, seu cálculo leva em
consideração a pontuação média dos estudantes em testes padronizados e a taxa
média de aprovação desses mesmos estudantes.
Diante dos dados apresentados, percebe-se que escola da cidade de Assis
ficou com um índice de aprovação muito inferior à escola de Itápolis,
comprometendo, destarte, seu desempenho no IDEB. Observa-se que na escola de
Itápolis não houve reprova tampouco evasão e taxa de transferência ficou em 4,9%.
Já na escola de Assis, 22,1% dos alunos foram reprovados; 0,8% dos alunos se
evadiu e 14,5% foram transferidos da escola.
83

A seguir, a Tabela 6 mostra os resultados do IDEB alcançados pelas escolas


e a meta estabelecida para ano 2021.

Tabela 6 – Resultado do IDEB nas escolas investigadas

Resultados do IDEB
ESCOLA 2005 2007 2009 Meta para 2021
Itápolis 6,3 8,2 6,7 7,8
Assis 4,5 2,4 4,5 6,6
Fonte: MEC/INEP

Destaca-se que a escola de Assis, entre os anos de 2007 e 2009, procurou


operacionalizar ações para aumentar o resultado do índice. As ações empreendidas
pela direção e pelas professoras da escola foram: simulados das provas, reforço
sistemático aos alunos (salas de apoio), projetos de inclusão das famílias na escola,
incentivo aos professores para cursos de formação e ainda a inclusão dos
conteúdos pertinentes à avaliação no trabalho realizado em sala de aula.

3.1.4 Gestão escolar democrática

Os indicadores da qualidade na educação caracterizam a gestão democrática


da educação como uma ação integrada que envolve todos os atores sociais
participantes do processo educativo ocorrido na escola.
Lück et al. (2005) pontuam a gestão democrática como um processo que
promove o compartilhamento das decisões tomadas pela escola, com o objetivo de
legitimar o sistema escolar, assim como dividir responsabilidades no âmbito do
poder decisório, na busca de atingir com eficiência os objetivos propostos pela
escola.
Segundo a autora:

Os gestores participativos baseiam-se no conceito da autoridade


compartilhada, por meio da qual o poder é compartilhado com
representantes das comunidades escolar e local e as
responsabilidades são assumidas em conjunto. (LÜCK et al., 2005, p.
21).
84

De acordo com Kanter (1977 apud LÜCK et al., 2005, p. 22), a melhoria da
produtividade escolar, entendida aqui como qualidade nos processos educativos,
está associada com estratégias de gestão participativa.
Há, portanto, um clima na organização escolar que pressupõe um referencial
comum a ser atingido por todos, assim como um padrão de desempenho profissional
dos educadores, que se reflete em normas de qualidade não reguladas. Logo a
gestão da escola condiciona ou conduz a qualidade dos processos educativos.
Partilham dessas ideias Glatter (1995), Good e Weinstein (1995) e Nóvoa
(1995) ao entenderem que as escolas criadoras de um clima organizacional
favorável e uma estrutura de liderança participativa tendem a obter melhores
resultados em termos de aprendizagem dos alunos. Essa constatação permitiu
pensar na gestão das escolas de Itápolis e de Assis e como elas conduzem as
referidas unidades escolares para a qualidade e para os índices no IDEB.
A escola de Itápolis, além de ser menor, do ponto de vista da estrutura física e
dos níveis de ensino oferecidos, consegue articular um clima organizacional
favorável à aprendizagem dos alunos.
A direção procura, nos horários destinados à HTPC, duas vezes por semana,
após o período vespertino de aula, motivar as professoras para o trabalho didático e
coletivamente decidir ações de melhoria na aprendizagem dos alunos. Durante a
observação realizada no momento da HTPC, percebe-se que a diretora faz, num
primeiro momento, uma reflexão com as professoras lendo e discutindo um texto
previamente preparado e, num segundo momento, comenta sobre ações
administrativas e pedagógicas da escola, dando oportunidade das professoras se
manifestarem. Além disso, percebe-se a troca de experiências entre as professoras,
principalmente no que se refere a estratégias didáticas, aprendizagem e
comportamento dos alunos.
Quanto às questões do planejamento participativo e mesmo da elaboração do
projeto político pedagógico da escola, 83% das professoras entrevistadas
responderam que participam do processo, sugerindo novas ideias e projetando
ações futuras. Desta amostra, 17% disseram que não participaram da construção do
PPP porque entraram na escola após a reunião de reconstrução do projeto. No
entanto 100% das professoras entrevistadas foram unânimes ao afirmarem que
participam de reuniões com a diretora para decidirem questões referentes à gestão
85

da escola como métodos pedagógicos, currículo, alfabetização e provas de


avaliação externa.
Essa constatação permite considerar o argumento sugerido por Lück et al.
(2005, p.25 grifo nosso) de que:

O planejamento participativo e o relacionamento entre professores que


quebra o isolamento do tradicionalmente associado ao ensino e que
promove o senso de unidade e propósito no ambiente escolar são
características encontradas nas escolas eficazes. Onde quer que haja
um forte sentimento de se sentir parte de uma comunidade, observa-
se melhoria mensurável nos resultados escolares e comportamento
dos alunos.

A escola investigada em Assis não partilha deste perfil, até pelo tamanho e
sua estrutura de funcionamento. A gestão da escola é partilhada entre a diretora da
unidade e duas coordenadoras pedagógicas: uma da Educação Infantil e outra do
Ensino Fundamental, que também tem sob sua responsabilidade a organização das
oficinas.
O PPP da escola contempla a gestão participativa e as verbalizações das
professoras da escola de Assis também denotaram que participam da elaboração do
PPP. Quanto à tomada de decisões na escola, as professoras entrevistadas
disseram que participam muito pouco dos processos decisórios da escola, mas que
são sempre informadas sobre esses processos. Observou-se, durante o período de
coleta de dados, que a coordenadora pedagógica do Ensino Fundamental gerencia
as ações administrativas e pedagógicas na escola, orientando os professores sobre
a prática docente, analisando e sugerindo adequações nos planos de ensino,
coordenando projetos didáticos e oficinas.
Percebe-se, portanto, que a liderança da escola é exercida pela coordenadora
do Ensino Fundamental. Isso ficou fortemente evidenciado no momento da
entrevista com a diretora da unidade que, para responder às perguntas, solicitava a
anuência da coordenadora. Num discurso velado, e pela observação, nota-se
também certa centralização do poder nas mãos da coordenadora, que apenas
comunica as decisões tomadas à direção da escola.
O perfil da gestão da escola de Assis difere da escola de Itápolis, por ser uma
escola maior, de tempo integral e atender outro nível de ensino, além do
Fundamental. Outra questão que se apresenta na escola de Assis é a falta de
86

interesse da maioria das famílias na educação de seus filhos. Segundo a opinião da


maioria das professoras entrevistadas, assim como o da diretora e da coordenadora,
o grande problema da escola é a população atendida. Na opinião de uma das
professoras:

O grande problema enfrentado pela escola é a participação dos pais


na educação de seus filhos e a infraestrutura física da escola para
atender à educação em período integral. A gente chama os pais, faz
reunião, mas são poucos os que participam e que estão realmente
preocupados com a educação de seus filhos (Professora 11).

Portanto, cabe à gestão a função de motivar os professores para o sucesso


das aprendizagens dos alunos; criar um ethos de partilha de decisões e de
responsabilidade e ainda adotar uma postura dinâmica e empreendedora junto à
comunidade (GLATTER, 1995).
A qualidade da gestão, por conseguinte, produz uma influencia determinante
nos resultados dos testes padronizados. De acordo com Glatter (1995, p. 159):
“Nenhum membro da comunidade educativa (alunos, professores, pais) ganha com
uma escola gerida deficientemente”.
Russo (2005) defende que a gestão escolar deve criar condições que
favoreçam o processo de aprendizagem dos alunos, o qual pode acontecer com
pouca ou muita eficácia e com baixa ou alta eficiência. Portanto, o trabalho escolar
deve ser organizado segundo a natureza do processo de produção pedagógico.
Para atingir a finalidade da educação de cunho transformador, o PPP,
articulado no dia-a-dia escolar, cumpre o papel de mediador na gestão, pois oferece
“[...] ações que podem contribuir para que, com os recursos existentes e disponíveis,
se ‘produza’ o máximo de educação possível, ou seja, que a escola atenda o maior
número de alunos com a melhor (qualidade?)”. (RUSSO, 2005, p. 33).
Enfim, para que a gestão escolar promova ações que assegurem a qualidade
do ensino se faz necessário elaborar os objetivos da educação conforme natureza e
especificidade de cada escola. Não obstante, o grande desafio da escola é ser
gerenciada sem que se viole a natureza do processo pedagógico e se entregue à
alienação do trabalho docente, oriunda dos pressupostos capitalistas.
87

3.1.5 Formação e condições de trabalho dos profissionais da escola

De acordo com Demo (1995), para uma educação de qualidade acontecer, é


fundamental a transformação do papel do professor de “auleiro” para orientador
construtivo e participativo. Não basta apenar ministrar aulas, é preciso engajamento
político, assim como ideais de formação para a cidadania.
Segundo o autor, o professor “auleiro” está inerte do próprio processo de
conhecimento, apenas reproduz conteúdos predeterminados, sem que isso tenha
qualquer resultado, tanto para ele quanto para o aluno. Na opinião de Demo:

[...] o professor é vitima de um processo de treinamento que o


estigmatiza como repassador copiado. Destituído de
propedêutica básica, afastado da pesquisa, alheio à inovação
pelo conhecimento, não sabe mais que “dar aula”, há nisso
uma forma de cultivar a ignorância, que coíbe a cidadania ou a
faz de segunda classe. (1995, p. 55).

Segundo o autor, há falhas nos processos de ensinar e aprender, processos


esses relevantes para a qualidade da educação, na medida em que a formação, a
motivação e as condições de trabalho do professor são dimensões significativas num
quadro qualitativo e encontram suas raízes na própria formação desse profissional.
A formação deve levar em consideração algumas competências docentes como a
pesquisa e o desafio de construir conhecimento, a elaboração própria como
processo de codificar pessoalmente o conhecimento, a teorização das práticas como
forma de exercer um movimento de pensar a própria prática, a formação permanente
como forma de atualização profissional e capacitação para a tarefa de educar e o
uso de novas tecnologias da informação e comunicação, como forma de aprimorar o
trabalho educativo em sala de aula.
Outra questão discutida por Demo (1995) é a valorização do professor como
estratégia de uma educação qualitativa. Para o autor, um professor competente e
satisfeito representa a melhor motivação para a qualidade. O referencial é o trabalho
do professor. Todavia, outros fatores contribuem para essa perspectiva, como
gestão competente, apoio assistencial, utilização de recursos e equipamentos e
interesse dos alunos.
Na mesma perspectiva, Dourado, Oliveira e Santos (2007) argumentam que
as escolas eficazes ou escolas com um nível adequado de qualidade possuem um
88

quadro de profissionais qualificados e compromissados com a aprendizagem dos


alunos. Segundo os autores, algumas características são fundamentais à
qualificação das escolas no que se refere ao quadro docente: titulação adequada;
vínculo efetivo com a instituição; condições de trabalho adequadas; valorização da
experiência docente; plano de carreira, por meio de qualificação permanente.
Não obstante, cabe destacar que horários destinados a estudos coletivos,
planejamentos, preparação de aula, atendimento a alunos e à comunidade são
prerrogativas que também contribuem para qualificar os processos educativos, bem
como instituir um clima organizacional adequado ao desenvolvimento profissional
(DOURADO; OLIVEIRA e SANTOS, 2007).
Na escola de Itápolis, 50% das professoras afirmaram que as condições de
trabalho e a motivação são adequadas: 17% das entrevistadas manifestaram que as
condições e a motivação do trabalho poderia melhorar e 33% da amostra
consideram-nas satisfatórias, conforme demonstra o Gráfico 4.
89

Gráfico 4 – Condição e motivação de trabalho – Itápolis

Como você avalia a sua condição e motivação de trabalho

33%

50%
muito boa
Satisfatória
Poderia melhorar
17%

Já em Assis, a análise dos dados coletados demonstrou que 16% consideram


as condições e a motivação para o trabalho muito boa; 67% das entrevistadas
consideram-nas satisfatórias e apenas 17% disseram que tanto as condições de
trabalho quanto sua motivação poderiam melhorar, conforme representação gráfica.

Gráfico 5 – Condição e motivação de trabalho – Assis

Como você avalia a sua condição e motivação de trabalho

17% 16%

muito boa
Satisfatória
Poderia melhorar

67%
90

O tempo de dedicação à escola, a jornada de trabalho das professoras das


instituições investigadas e a frequência com que as mesmas fazem cursos de
formação continuada ou aperfeiçoamento são variáveis importantes de serem
investigadas, pois possibilitam diferenciar o impacto dessas questões quanto à
qualidade.
Em Itápolis, 67% dos docentes trabalham numa única instituição, cumprindo
uma jornada de 30 horas semanais, incluindo 10 horas destinadas a estudo e
planejamento. Do restante da amostra, apenas 33% trabalham em outras instituições
concomitantemente, cumprindo jornada de trabalho de 40 horas semanais com
horários destinados a estudo coletivo e planejamento de aulas.
Assis demonstrou o mesmo percentual que Itápolis: 33% dos docentes
trabalham em dois turnos, em escolas diferentes, com a diferença na jornada de
trabalho, que é de 50 horas semanais, incluindo os horários de estudo coletivo e
planejamento, e 67% do corpo docente trabalha numa única instituição com uma
carga horária de 30 horas semanais, também com horários destinados a estudo
coletivo e planejamento.
Nesse ponto, cabe destacar que, quanto à jornada de trabalho e ao tempo de
dedicação ao trabalho da escola, não houve, segundo as análises da coleta de
dados, diferenças significativas a ponto de serem consideradas elemento condutor
da qualidade.
Na opinião de Dourado, Oliveira e Santos (2007), a dedicação exclusiva do
professor numa única instituição de ensino é relevante na medida em que permite
aos professores vinculados somente a uma instituição dedicarem-se mais às
necessidades da escola, dos alunos e da comunidade. Escolas com maior número
de professores efetivos tendem a obter melhores resultados em termos de qualidade
do que escolas onde há grande rotatividade de pessoal docente.
Em relação à formação continuada, ao serem indagados sobre a quantidade
de cursos que participavam, as respostas evidenciaram que os docentes da escola
de Itápolis realizam em média dois cursos de capacitação por ano, enquanto os
professores de Assis realizam em média três cursos ao ano, conforme demonstram
o Gráficos 6 e 7.
91

Gráfico 6 – Frequência de cursos de capacitação das professoras entrevistadas – Itápolis

Frequência de cursos de capacitação/aperfeiçoamento/formação continuada

2º semestre de 2008
17%

1º. semestre de 2009


16%

2º. semestre de 2009


67%

Gráfico 7 – Frequência de cursos de capacitação das professoras entrevistadas – Assis

Frequência de cursos de capacitação/aperfeiçoamento/formação continuada

2º semestre de 2008
17%

2º semestre de 2009
83%

Em relação ao nível de formação inicial das professoras entrevistadas nas


escolas, assim como a escolha do dirigente escolar, os dados coletados
evidenciaram que em Itápolis 50% das professoras ouvidas cursaram Licenciatura
92

em Pedagogia; 33% possuem algum curso de pós-graduação Lato sensu e somente


17% ainda estão cursando Pedagogia. Portanto, possuem somente o curso de
magistério de nível médio, conforme representação do Gráfico 8. É interessante
destacar que a escolha da dirigente se deu mediante indicação política.

Gráfico 8 – Nível de formação do corpo docente – Itápolis

Nível de Formação - Itápolis


Magistério (nível médio) Pedagogia Especialização

17%
33%

50%

Em Assis, a escolha da dirigente também se deu por indicação política,


embora a liderança na instituição seja exercida pela coordenadora pedagógica.
O nível de formação das professoras ouvidas em Assis apresentou o seguinte
perfil: 83% com licenciatura em Pedagogia e 17% com o curso incompleto, tendo
somente como formação inicial o magistério de nível médio, conforme demonstração
gráfica.
93

Gráfico 9 – Nível de formação do corpo docente – Assis

Nível de Formação - Assis


Pedagogia Superior em Pedagogia incompleto

17%

83%

Portanto, em relação à formação e as condições de trabalho dos profissionais


da educação na escola, mais especificamente o professor e seu trabalho na sala de
aula, é relevante destacar que duas premissas se articulam em busca de uma
qualidade: formação adequada e valorização socioeconômica.
A formação adequada não inclui somente cursos de graduação e pós-
graduação, mas toda e qualquer possibilidade de construção de conhecimento,
principalmente o científico. A competência essencial do professor passa então a ser
vista como a de pesquisador e orientador (DEMO, 1995).
Comparando os dados apresentados, é possível afirmar que os professores
da escola situada na cidade de Assis percebem a condição e a motivação de
trabalho de forma mais positiva do que os professores da escola de Itápolis, muito
embora as perguntas abertas da entrevista e a observação realizada demonstrem
uma incoerência entre esses dados. Quanto à jornada de trabalho, verificou-se que
as duas escolas apresentaram índices iguais de jornada, ao se constatar que 67%
dos professores das escolas investigadas trabalham em regime de dedicação
exclusiva. No que se refere à formação dos profissionais envolvidos na pesquisa, é
possível afirmar que, mesmo com 17% do corpo docente ainda cursando Pedagogia
em nível superior, a escola de Itápolis se destaca por apresentar 50% de
professoras com nível de pós-graduação Lato sensu, embora os cursos de
94

capacitação realizados pelos professores da escola de Assis superem a quantidade


de cursos realizados pelos professores da escola de Itápolis.
As diferenças entre as duas escolas investigadas são míninas na dimensão
formação e condições de trabalho dos profissionais da escola, evidenciando que a
qualidade passa por essa dimensão. Contudo, ela não configura um referencial
significativo para a qualidade demonstrada pelo IDEB.

3.1.6 Acesso e permanência dos alunos na escola

Os dados coletados referentes ao acesso e permanência dos alunos nas


escolas indicam que ambas as unidades investigadas preocupam-se com o
desempenho escolar de seus estudantes, dado relevante para planejamento e para
implementar programas de reforço escolar. O acesso e a permanência dos alunos é
garantido mediante programas suplementares como oferta de material didático,
alimentação (merenda) e assistência à saúde.
As escolas procuram garantir desempenho satisfatório aos estudantes, até
porque esta é uma das condições que as avaliações externas impõem e
principalmente o IDEB, quando considera qualitativa a relação fluxo e desempenho
escolar.
Não obstante o acesso e a permanência dos alunos na escola, também
condiciona a remuneração dos profissionais da educação, na medida em que o
reconhecimento do trabalho se materializa no bônus que o professor recebe uma
vez por ano e está vinculado aos resultados obtidos pelo trabalho dele e da escola
como um todo, em termos de produtividade e desempenho.

3.2 PERCEPÇÕES DOS SUJEITOS ENTREVISTADOS SOBRE QUALIDADE

A análise realizada sobre a percepção das diretoras e professoras entrevistas


a respeito dos fatores considerados como qualitativos nas unidades investigadas
demonstrou que a busca da qualidade educacional depende em grande medida de
processos extraescolares, como incentivo e colaboração dos pais à educação, e
empenho dos alunos para a aprendizagem.
95

Essa assertiva demonstrada pelos sujeitos entrevistados também é


argumentada por Dourado, Oliveira e Santos (2007), quando afirmam que, sem a
participação da família nos processos educativos ocorridos na escola, a qualidade
da educação fica comprometida.
Tanto as professoras da escola da cidade de Itápolis, quanto da escola de
Assis manifestaram que a qualidade da educação está diretamente relacionada ao
nível socioeconômico e cultural das famílias e ao esforço dos alunos.
Em Itápolis, as percepções acerca da qualidade passam por questões como:
o esforço e a ajuda que a família oferece à educação de seus filhos; o tamanho da
escola, seus processos de gestão e a formação e capacitação de seus professores.
Essa constatação pode ser verificada no depoimento a seguir:

A união de todos na escola, a primeira coisa. A participação dos pais


porque hoje a gente tem problema muito com o que vai para casa
(tarefa). E com a união dos pais a gente não tem quase estes
problemas aqui. Então dá para gente trabalhar muito bem, a gente
consegue muita coisa, com a cooperação de todos, com a união de
todos. Fora o empenho que cada um tem, aqui dentro da escola,
principalmente, o meu. Sabe eu viso muito no que eles trabalham no
que eles precisam, na participação deles diariamente, porque a
minha avaliação é diária. Sabe eu deixo bem claro isso para eles.
Então como nós temos a participação dos pais, isso ajuda a melhorar
bem aqui na escola e consegue trabalhar bem em casa, a gente tem
retorno e isso é muito bom para mim, eu acho que ajuda a crescer
muito. Porque o que adianta a gente trabalhar muito, fazer de tudo
aqui na escola, ai a criança vai pra casa e não corre atrás de nada. E
o trabalho em casa queira ou não ajuda e muito a melhorar o que
você trabalha aqui na escola. Nosso empenho aqui vale muito, e
cada uma tem o seu trabalho e uma ajuda a outra quando precisa
(professora 4 – Itápolis).

Na instituição investigada em Itápolis, quando questionadas sobre os fatores


que podem comprometer a qualidade da educação oferecida na escola, as
professoras verbalizaram que o ensino de nove anos era uma agravante a ser
trabalhada na escola. Isso porque no momento da coleta de dados a escola estava
se estruturando para receber crianças do primeiro ano do Ensino Fundamental.
Outros fatores também foram citados, como a ausência de uma coordenadora
pedagógica e a falta de materiais didáticos.
Na escola de Assis, as percepções de qualidade são justificadas pelo espaço
físico da escola, pela capacitação do professor, assim como o trabalho realizado
pela equipe escolar. De acordo com uma professora entrevistada:
96

A qualidade da escola para mim está na qualificação dos


professores, neste envolvimento entre professor, diretor, isso. Às
vezes, a gente pode até achar que não, mas aqui, a comunidade vai
influenciar muito, tudo o que é trabalhado em grupo, isso com
certeza faz crescer (professora 7 – Assis).

No que se refere a fatores que podem prejudicar a qualidade da escola e,


consequentemente o resultado do IDEB, as percepções verbalizadas pela diretora,
pela coordenadora e pelas professoras recaem, quase unanimemente, sobre a
condição socioeconômica das famílias. Outros fatores foram destacados como a
rotatividade de professores e o comprometimento e a colaboração das famílias na
educação dos filhos assim como o empenho dos estudantes, conforme ilustra a fala
da diretora:

Alunos que apresentam dificuldade na aprendizagem não


conseguem reter as informações, são normalmente faltosos. Famílias
descomprometidas e alta rotatividade de professores (índice
pequeno de efetivos) prejudicam a qualidade da escola.

As análises de tais relatos demonstram que a qualidade não é um fator


estanque e não pode ser buscada somente com testes que medem o conhecimento
cognitivo dos alunos; outras questões conduzem ou contribuem para a qualidade da
educação. O tamanho da escola, por exemplo, faz diferença em termos qualitativos.
Escolas menores são mais fáceis de gerenciar. Escolas com equipes mais estáveis
e menor índice de absenteísmo dos professores tendem a apresentar melhores
resultados em termos de qualidade; o perfil do diretor e seu tipo de gestão podem
influenciar a qualidade dos processos educativos (PINTO, 2008).
A comunidade escolar também é um referencial a ser levado em
consideração: alunos oriundos de camadas mais carentes e menos favorecidas da
população tendem a apresentar maiores dificuldades no seu processo de
aprendizagem. No entanto, isso não é desculpa para os professores se isentarem da
responsabilidade de educar, como fora percebido durante as entrevistas.
Esses pressupostos são legitimados por Pinto quando afirma que alguns itens
têm forte impacto na qualidade da educação. Segundo o autor:
97

1) Tamanho das escolas: escolas menores em geral são melhores,


pois fortalecem vínculos comunitários, embora os custos com
aluno sejam maiores [...];
2) Equipe profissional estável, como poucas faltas, e unida em torno
de um projeto pedagógico construído com sua participação ativa:
este é um dos problemas mais sérios no Brasil, pois os
profissionais estão sempre migrando de escolas das regiões mais
pobres (tanto dentro do estado como do município) para regiões
mais afluentes e os projetos pedagógicos, em geral, seguem um
modelo padronizado, sendo feitos de cima para baixo;
3) Equipe de direção sempre presente na escola e com legitimidade
perante os demais profissionais da escola e de seus usuários (pais
e alunos);
4) Comunidade escolar participante da gestão: cabe esclarecer, neste
item que a participação aqui deve ser entendida não como um
dever, em especial dos pais, mas como um direito de toda a
comunidade de discutir e definir os rumos do projeto pedagógico e
realizar a avaliação periódica e sua implementação. No Brasil esta
participação é muitas vezes entendida apenas como forma de
ajudar a resolver os problemas da escola decorrentes da ausência
do Poder Público, ou da própria incapacidade da equipe escolar de
resolver problemas que são de sua responsabilidade; na escola
brasileira, em geral só existe democracia enquanto ônus;
5) Presença de grêmios e outras instâncias de mediação (colegiados
escolares, grupos de pais, comissão de professores,
representantes de turma) que ajudam a prevenir conflitos e dão
consistência à gestão democrática. (2008, p. 68).

Todas essas questões influenciam a qualidade da educação, na medida em


que formam um clima escolar que conduz ou auxilia a qualidade, para além das
perspectivas de desempenho e fluxo escolar.
Tais fatores apontados por Pinto (2008) constituem aspectos a serem
buscados dentro e fora do espaço escolar. Como a qualidade na educação não se
faz somente nos intramuros da escola, o IDEB, ao ser um indicador de qualidade,
deveria também tomar por base aspectos extraescolares, pois, da forma como está
estruturado, o indicador não é capaz de alcançar dimensões fora do espaço da
escola. Isso restringe seu cálculo somente a aspectos pedagógicos e desconsidera
outras questões tão importantes à qualidade da educação quanto o desempenho
dos estudantes.
No entendimento de Castro (2009), para a qualidade da educação escolar se
constituir, é preciso considerar insumos internos e externos, bem como seus
processos no interior das unidades escolares. A autora defende que o conceito de
qualidade não pode ser reduzido somente o desempenho escolar, tampouco ser
tomado como referência para constituir um ranking entre as escolas.
98

Dessa forma, entende-se que testes não são suficientes para qualificar
escolas e sistemas de ensino por se constituírem como referência somente o
desempenho dos alunos nas provas, ignorando questões que influenciam
intensamente os resultados como o nível socioeconômico dos alunos e suas
famílias. Segundo Pinto:

[...] o que os estudos no Brasil e no mundo mostram é que o


desempenho dos alunos nestes testes é fortemente influenciado pelo
nível socioeconômico de suas famílias. Isto faz com que leituras
apressadas dos resultados levem a consideram como “efeito escola” o
que é, na verdade, “efeito socioeconômico familiar”. (2008, p. 62).

Portanto, o nível socioeconômico das famílias dos alunos das escolas


públicas brasileiras tem intensa relação com os resultados demonstrados no IDEB e
não devem ser desconsiderados no momento da aferição do índice.
As avaliações externas são necessárias na medida em que auxiliam a
reflexão da própria escola sobre suas fragilidades. O que é questionável é o uso
estatístico que se faz das avaliações externas como mecanismos de coerção do
Estado para atingir metas de qualidade e produtividade na educação brasileira, sob
o pretexto de medir a qualidade da educação. Dessa maneira, concorda-se com
Castro quando afirma que:

[...] os testes padronizados são instrumentos necessários, mas


insuficientes para avaliar a melhora da qualidade da educação,
principalmente os testes como SAEB e o Enem, adotados pelas
políticas publicas, pois possuem um caráter restrito de avaliação. É
importante considerar, nesse processo, não só os insumos, mas
também outros indicadores como a cultura organizacional da escola,
as práticas e as relações entre professores e alunos. (2009, p. 34).

Na mesma perspectiva, Paro aponta que uma educação de qualidade não


pode ser medida somente por seus resultados sem que se pese considerar também
seus processos. Segundo o autor:

Em síntese, o que parece essencial na defesa da escola pública de


qualidade é que esta se refira à educação por inteiro, não apenas a
aspectos parciais passíveis de serem medidos mediante provas e
exames convencionais. (2001, p. 45).
99

Entende-se, portanto, que, sem uma reflexão da própria escola sobre suas
potencialidade e fragilidades, a avaliação externa se reduz à mera atividade técnica
e mecanicista, cujos critérios de eficiência, eficácia e produtividade acabam por
direcionar todo o processo educativo.
Esses critérios restringem o processo didático-pedagógico em detrimento do
resultado final alcançado pela escola no IDEB, através apenas do desempenho
estudantil, apresentado em dados quantitativos.
100

CONSIDERAÇÕES FINAIS

O objetivo dessa pesquisa foi investigar as dimensões escolares que


contribuem para a qualidade, além dos aspectos de fluxo e desempenho, cujo
principal expoente é o IDEB, Índice de Desenvolvimento da Educação Básica. Uma
política pública que objetiva monitorar a qualidade da educação brasileira e
promover um salto qualitativo na educação brasileira até o ano 2021.
O IDEB é um indicador de qualidade importante na medida em que demonstra
fragilidades nas escolas brasileiras relacionadas a fluxo e desempenho escolar, no
entanto é insuficiente por restringir-se apenas a essas duas variáveis,
desconsiderando outros aspectos igualmente importantes para a qualidade como a
cultura organizacional da escola, a prática docente, o nível socioeconômico e cultural
das famílias, e o estilo de gestão e liderança.
Atualmente, o índice é considerado o grande termômetro da educação
brasileira. No entanto, ele demonstra apenas dados estatísticos ou quantitativos.
Não obstante, o índice coíbe as escolas a se adequarem a determinadas normas de
condutas, principalmente da gestão escolar para atingir notas cada vez mais altas no
IDEB e alcançar expectativas pré definidas de desempenho escolar.
Evidencia-se que, além dos referenciais de fluxo e desempenho, há outros
atributos ou fatores que contribuem para a qualidade da educação, mas que são
negligenciados pela avaliação externa.
A qualidade da educação, nesse sentido, deve ser vista numa perspectiva
multilateral, pois são muitas as variáveis intervenientes nesse processo.
Ao tomarmos como parâmetro de análise os Indicadores da Qualidade na
Educação pudemos constatar que o tipo de gestão da escola, o clima organizacional
e o sentimento de pertencimento dos professores são condições que favorecem a
qualidade. Além dessas dimensões evidenciou-se que a condição socioeconômica e
cultural dos estudantes e de suas famílias também constitui fator determinante para
a qualidade da educação.
Nesse sentido a diferença mais marcante na comparação realizada entre as
duas escolas é o tipo de gestão, o tamanho da escola, a clientela atendida e a noção
de pertencimento a uma instituição, por parte dos professores investigados.
Quanto à gestão escolar, destaca-se que a responsabilização da escola pela
qualidade da educação tornou-se num primeiro momento uma estratégia do Estado,
101

na medida em que expõe à sociedade os resultados alcançados pela escola, e num


segundo momento, uma ferramenta da gestão, do ponto de vista da articulação e
mobilização de ações da própria escola para suprir as deficiências e melhorar não a
qualidade de ensino, mas a nota do índice.
A escola de Assis mobilizou ações para melhorar o IDEB entre os anos de
2007 e 2009. Essas ações pautaram-se no treinamento dos estudantes para a
realização da avaliação externa; no preenchimento pela própria escola, na presença
dos pais ou familiares dos formulários do SAEB e SARESP; na adoção de
mecanismos de recuperação de conteúdos, e na mudança do próprio currículo
escolar ajustado de acordo com as especificidades de cada avaliação. Desta forma
os conteúdos das provas oficiais foram trabalhados pelas professoras no decorrer do
ano letivo.
A escola de Itápolis também fez adequações no currículo e na dinâmica da
sala de aula para atender às exigências da avaliação externa e também realizou
simulados para treinar os estudantes para a realização das provas.
Quanto à liderança foi possível perceber que a escola de Itápolis possui um
estilo de gestão, onde as decisões são tomadas em partilha com os professores nos
momentos de HTPC. Nessas ocasiões, os problemas são discutidos e resolvidos
coletivamente. A escola de Assis demonstrou uma gestão mais centralizada, com
poucos momentos de partilha entre a direção e os professores e com uma liderança
exercida, não pela diretora, mas pela coordenadora pedagógica do Ensino
Fundamental, que articula e coordena todas as ações administrativas e pedagógicas
ocorridas na escola.
Outro fator identificado foi o nível de ensino oferecido pelas escolas e o
tamanho físico das mesmas. Administrar escolas menores no que se refere à
infraestrutura, com apenas um nível de ensino, e velar pela aprendizagem de
poucos alunos é mais fácil do ponto de vista da gestão escolar. Nesse sentido a
escola de Itápolis se destaca, pois atende a 266 alunos, numa estrutura física bem
menor do que a escola investigada em Assis, cujo número total de alunos atendidos
chega a 341.
Cabe explicar que a escola de Assis atende dois níveis de ensino diferentes:
Educação Infantil e Ensino Fundamental, com duas modalidades, enquanto a escola
de Itápolis atende somente ao Ensino Fundamental, com uma modalidade de EJA
102

no período noturno. O número de alunos atendidos também causa um impacto na


qualidade, assim como o nível socioeconômico dos mesmos.
Evidencia-se que a escola da cidade de Itápolis trabalha com alunos
pertencentes a níveis socioeconômicos e culturais mais favorecidos, com acesso a
bens culturais, incentivos e cuidados da família quanto à educação, assim como
cobranças e expectativas que devem ser alcançadas pelos estudantes. Em
contrapartida, os alunos atendidos pela escola da cidade de Assis são provenientes
de uma camada da população menos favorecida sócio, cultural e economicamente;
o acesso a bens culturais é incentivado somente no interior da escola; a maioria dos
alunos vem de uma realidade marcada pela pobreza e marginalidade. As famílias,
embora preocupadas com a educação de seus filhos, não participam efetivamente
da vida escolar dos mesmos.
Diante dessa característica da clientela atendida pela escola de Assis,
destaca-se que a qualidade também passa pela cultura organizacional da escola, o
que envolve o sentimento de pertença do professor para com a instituição.
Enquanto os professores da escola de Itápolis demonstram alto grau de
satisfação com a escola, os professores investigados em Assis, apresentaram-se
preocupados com as condições da população atendida, o que pôde ser evidenciado
pelo alto índice de absenteísmo e rotatividade do corpo docente.
Diante desses resultados, entendemos que a complexidade do processo
educativo não pode ser reduzida a alguns produtos que podem ser mensuráveis, ou
visíveis e que servem para fornecer resultados significativos por meio de testes
padronizados.
Essas medidas tornam a perspectiva da qualidade educacional limitada, por
não considerar outros fatores além do desempenho estudantil. Possuem, portanto,
um caráter reducionista.
A qualidade da educação emerge no interior de cada unidade escolar e é
conduzida pelos processos de gestão próprios de cada instituição e suas
peculiaridades. Portanto, tanto escolas e sistemas de ensino quanto os alunos que
frequentam as escolas influenciam de forma diferente o sucesso e o fracasso da
qualidade.
Além disso, a valorização e o reconhecimento do trabalho docente, o
processo de ensino e de aprendizagem, assim como insumos adequados, do ponto
de vista de recursos físicos e humanos, constituem fatores importantes.
103

Entende-se que o conjunto desses fatores favorece a qualidade do ponto de


vista da formação social do estudante e do direito que ele tem em receber uma
educação de qualidade. Não do ponto de vista de formação para o mercado, ou para
mostrar dados estatísticos a organismos multilaterais, mas uma educação que seja
efetivamente capaz de produzir indivíduos capazes de viver em sociedade.
É preciso ressignificar a utilização dos testes padronizados e da prática social
que se faz da avaliação externa como forma de qualificar escola, sob a perspectiva
desses instrumentos não constituírem um indicador seguro de qualidade.
A crítica feita não é sobre a avaliação externa e a responsabilização que ela
acarreta; o problema é o uso social que se faz da avaliação externa, isolando-a das
demais dimensões que, no conjunto, formam ou propiciam uma educação de
qualidade.25
Entendemos que a avaliação externa se caracteriza como propositora de
políticas públicas do Estado para mobilizar ações de melhoria para o setor
educacional, definindo prioridades a partir dos dados coletados. No entanto, essa
racionalidade do Estado se manifesta somente nos dados estatísticos apresentados
no momento de divulgação do IDEB, pois ações e propostas de melhoria da
qualidade educacional, como valorização docente, piso salarial compatível com a
função, redução do número de estudantes por sala, bibliotecas e salas de
informática bem equipadas cursos de formação e aperfeiçoamento para os
professores e aumento do valor de financiamento da educação não são comumente
implantados pelo Estado a partir da apresentação dos índices.
O que o Estado faz é transferir as responsabilidades para a escola, dando
premiações àquelas instituições que apresentarem o melhor desempenho e a melhor
avaliação. Essa política de premiação do Estado pode ser considerada um quase-
mercado, pois o valor da educação é, antes de tudo, econômico e os resultados das
avaliações são considerados apresentação de seus produtos. Os incentivos e as
sanções estão sob a égide de mobilização dos profissionais da escola para
buscarem melhores resultados no índice.
Tais produtos podem ser aferidos por meio de competências, produtividade,
eficiência e eficácia demonstrados nas avaliações externas, compilados no IDEB e

25
Um dos usos sociais da avaliação externa é o ranking que a mídia faz das escolas e sistemas de
ensino, após a divulgação do IDEB pelo MEC/INEP.
104

divulgados pela mídia, que colabora para estabelecer um ranking educacional e


acirrar a competitividade entre as instituições.
O que o Estado entende como qualidade na educação está relacionado
apenas a conhecimentos e habilidades passíveis de serem mensurados via testes
padronizados, pois a política empreendida pelo Estado, ao estabelecer o IDEB como
referencial de qualidade, pautou-se numa dimensão generalizada e global de
educação sem levar em consideração as peculiaridades de cada região, de cada
município e de cada escola, assim como seus contextos e especificidades.
A qualidade ainda é o grande desafio da educação brasileira, porém enquanto
não forem consideradas a clientela e os contextos próprios onde cada “educação” se
faz, o país periga continuar a formar alunos capazes de realizar as provas das
avaliações externas, mas incapazes de mobilizar conhecimentos em situações reais.
Mesmo que os dados demonstrados nas avaliações externas como o SAEB
evidenciem que o desempenho dos alunos das escolas públicas brasileiras fica
aquém do esperado nas habilidades de matemática e leitura, quando estes mesmos
dados são divulgados pela mídia, a visibilidade dada é que houve aumento no
desempenho escolar, considerando o treinamento dos alunos, a articulação das
escolas para realização das provas, e o impulso que as políticas de
responsabilização causam nos profissionais da educação.
A qualificação de escolas e sistemas de ensino é importante, na medida em
que contempla um direito como prerrogativa legal de todo educando, de ter acesso à
educação de qualidade.
Para atender a essa prerrogativa, é importante rever a questão da qualidade
educacional em bases mais abrangentes, de forma a reconhecer que todos têm
direito à educação de “boa qualidade”, mesmo aqueles que não possuem condições
financeiras para pagar por isso. E o reconhecimento vai além do discurso, passando
principalmente pela formação de professores e pela gestão escolar que tem em seus
princípios a função de promover e zelar pela qualidade do processo ensino
aprendizagem.
Para redefinir uma educação de qualidade no país, é fundamental construir
um sistema de avaliação menos restrito e que possa captar diferentes dimensões e
fatores que influenciam a qualidade da educação brasileira.
A educação ressignifica-se por meio de um ensino que possa atender às
necessidades dos alunos inseridos em um contexto histórico e social complexo e de
105

uma prática educativa planejada e sistematizada durante um longo e contínuo


período. Essa prática deve propiciar qualidade ao processo educacional ao criar
condições e oportunidades para o desenvolvimento de capacidades e para que os
alunos aprendam conteúdos necessários para enfrentarem e resolverem diferentes
modalidades de desafios, assegurando-lhes o direito de aprendizagens significativas
imprescindíveis à atuação crítica e transformadora.
106

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VIANNA, Heraldo Marelin. Avaliações em debate: SAEB, ENEM, Provão. Brasília:


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113

APÊNDICE A – ANÁLISE DOCUMENTAL


Instrumento 1

 Avaliação do projeto pedagógico: práticas de avaliação e socialização dos


objetivos e metas alcançados pelo PP e o envolvimento da comunidade escolar.
 Rendimento Escolar: últimos três anos – registros, análise das taxas de
aprovação, reprovação e abandono e o plano de melhoria a partir desses dados.
(rendimento escolar por classe).
 Frequência Escolar: últimos três anos – ações para controle de frequência e
medidas para assegurar permanência.
 Uso dos resultados de avaliação: analisa e compara seus resultados
educacionais e propõe ações de melhoria.
 Transparência de resultados: divulgação dos resultados e ações à comunidade.
 Características dos alunos (necessidades especiais, classe social, nível
socioeconômico).
 Composição do corpo docente.
 Verificar quantos professores trabalham como eventuais e quantos são efetivos.
 HTPC, planejamento e avaliação.
 Prática pedagógica.
114

APÊNDICE B – OBSERVAÇÃO DO AMBIENTE ESCOLAR E DA ESTRUTURA


FÍSICA

Instrumento 2

1) DADOS DE IDENTIFICAÇÃO:
1.1- Observador(a):
1.2- Data _____/_____/______
1.3- Nome da Escola:
1.4- Rede:
2) INSTALAÇÕES FÍSICAS:
2.1- Tamanho da sala em relação ao número de alunos:
( ) Pequena ( ) Média ( )Grande
2.2- Ventilação:
( ) Suficiente ( ) Insuficiente
2.3- Iluminação:
( ) Suficiente ( ) Insuficiente

3) ASPECTOS DE ATENDIMENTO
3.1- Séries oferecidas:
3.2- Organização do Ensino:
( ) Por série ( ) Por ciclo ( ) Por série e ciclo
3.3- Turnos de funcionamento:
3.4- Número de alunos:
3.5 - Número total de classes:
4. QUADRO DE PESSOAL
4.1- Número de funções docentes em classes de Ensino Fundamental:
4.2- Número de funções docentes em Atividades de Coordenação:
4.3- Número total de professores:
4.4- Diretor(a):
4.5- Vice-diretor(a):
4.6- Coordenadora:
4.7- Funcionários administrativos:.
4.8- Outros:
4.9- Número total do quadro de pessoal da escola:

5) DADOS SOBRE AS INSTALAÇÕES FÍSICAS DA ESCOLA:


5.1- Número total de salas:
5.2- Espaços físicos existentes:
( ) Sala de professores ( ) Diretoria
( ) Biblioteca ( ) Quadra de esportes
( ) Refeitório ( ) Laboratório de Informática
( ) Sala de reuniões ( ) Sala de Vídeo
( ) Cozinha ( ) Sanitários
( ) Área coberta ( ) Auditório / anfiteatro
Outros:_________________________________________________________
5.3- Estado geral de conservação:
Observação:_____________________________________________________
115

5.4- Número de sanitários em condições de uso:_________________________


5.5- Iluminação:
( ) Suficiente em todos os ambientes;
( ) Suficiente em apenas alguns ambientes.
( ) Insuficiente.
5.6- Ventilação:
( ) Suficiente em todos os ambientes;
( ) Suficiente em apenas alguns ambientes.
( ) Insuficiente
5.7- Condições Gerais de higiene:
( ) Água encanada
( ) Torneiras em condições de funcionamento
( ) Sabão
( ) Água potável em bebedouros
( ) Papel higiênico
5.8-Estado geral da escola quanto à limpeza:
( ) Muito bom ( ) Bom ( ) Ruim ( ) Muito ruim.
5.9-Organização do espaço físico:
( ) Muito bom ( ) Bom ( ) Ruim ( ) Muito ruim.
5.10-As carteiras em condições de uso são suficientes para o número de alunos?
( ) Sim ( ) Não
5.11-Há mesas em condições de uso na biblioteca?
( ) Sim ( ) Não
5.12- A sala de informática é adequada para atender aos alunos e é utilizada com
freqüência?
( ) Sim ( ) Não
5.13- Há responsável presente em tempo integral na sala de informática para
atender os usuários
( ) Sim ( ) Não
5.14- Prática do professor em sala de aula e no tratamento com os alunos.
5.15 – Tratamento direcionado pela direção aos professores.
116

ANEXO C – ENTREVISTA COM DIRETOR ESCOLAR


Instrumento 3
1) Dados de Identificação
a. Nome da Escola:
b. Identificação do entrevistado:
c. Sexo ( ) Feminino ( ) Masculino
d. Nível de Formação:
e. Curso:
f. Ano de ingresso na função:
g. Tempo de magistério na função de docente:
2) Sua escola está localizada em:
a) ( ) perímetro urbano, em região central da cidade
b) ( ) perímetro urbano, em bairro distante do centro da cidade
c) ( ) zona rural
3) Períodos de funcionamento da escola:
a) ( ) manhã
b) ( ) tarde
c) ( ) noite
d) ( ) outros
4) Níveis / modalidades de ensino oferecido na escola:
a) ( ) Educação Infantil
b) ( ) Ensino Fundamental – Ciclo I
c) ( ) Ensino Fundamental – Ciclo II
d) ( ) EJA - Fundamental
e) ( ) EJA – Médio
f) ( ) Outros: ____________________________________________
5) Número de alunos matriculados em 2009:
6) Como são organizadas as turmas em sua escola?
a) ( ) por idade
b) ( ) por ordem de chegada
c) ( ) por desempenho
d) ( ) outras formas: ____________________________________

7) Na sua escola, os dados das avaliações externas:


a) ( ) São básicos para a formulação da Proposta Pedagógica da Escola
b) ( ) Não são considerados para a formulação da Proposta Pedagógica
c) ( ) São divulgados e discutidos com os professores
d) ( ) Não são divulgados e discutidos com os professores
e) ( ) São divulgados e discutidos com os pais e alunos
f) ( ) Não são divulgados e discutidos com os pais e alunos
g) ( ) Geram mudanças nas práticas dos professores em sala de aula
h) ( ) Não geram mudanças nas práticas dos professores em sala de aula.

8) Como é elaborado o projeto político pedagógico da sua escola? Quem


participa da elaboração do PPP?
9) Como é realizado o planejamento das aulas? Que ações são
desencadeadas?
10) Como o diretor ou a (equipe gestora) avalia o desempenho dos professores
(qualidade das relações que estabelecem com os alunos, conhecimentos dos
117

conteúdos da disciplina, domínio de métodos e procedimentos de ensino e de


avaliação, compreensão do processo de aquisição de conhecimento, etc.)
11) As decisões da escola são partilhadas com os professores e funcionários da
escola?
12) A escola possui uma proposta pedagógica escrita que descreve as
aprendizagens esperadas para cada ano/série, os tipos de atividades a serem
realizadas durante as aulas e as estratégias de avaliação?
13)Qual foi o desempenho / nota de sua escola na Prova Brasil realizada em
2007?
14) Qual foi o desempenho / nota de sua escola no SAEB realizado em 2007?
15) Qual a nota da escola no IDEB – Índice de Desenvolvimento da Educação
Básica no ano de 2005 e 2007?
16) Quais as ações empreendidas entre 2005 e 2007 para elevar o “nível de
qualidade” da educação na sua escola?
17) Quais os fatores, que a seu ver são relevantes na sua escola e que
contribuem para o sucesso escolar, e consequentemente, para a qualidade
da educação?
18) Quais os aspectos negativos da sua escola, e que de certa forma podem
influenciar na qualidade da educação e consequentemente nos resultados
obtidos nas avaliações externas.
19) Quais as maiores dificuldades encontradas em seu trabalho?
20) Como a escola acolhe os alunos que apresentam situações de dificuldades?
21) Quais as políticas próprias da escola no que se refere ao acesso e
permanência dos alunos?
118

ANEXO D – ENTREVISTA COM PROFESSOR


Instrumento 4
1) Dados de Identificação
a)
Escola:
b)
Nome do entrevistado:
c)
Sexo: ( ) Feminino ( ) masculino Idade: ___
d)
Nível de Formação:
e)
Curso:
f)
Curso Inicial realizado em instituição: ( ) pública ( ) privada
g)
Tempo total de magistério:
h)
Tempo de magistério na escola pesquisada:
i)
Turma/série que leciona:
j)
Período e jornada de trabalho:
k)
Realiza algum trabalho fora do magistério? ( ) Sim ( ) Não
l)
Em caso positivo: qual?
________________________________________
2) Você participa regularmente de cursos de capacitação / aperfeiçoamento?
a) ( ) SIM
b) ( ) NÃO

3) Com que frequência:


a) ( ) 1 a cada um ano
b) ( ) 2 a cada um ano
c) ( ) 3 a cada um ano
d) ( ) 4 a cada um ano
e) ( ) 5 ou mais a cada um ano
f) ( ) Não participo

4) O último curso de capacitação que você participou foi:


( ) este semestre
( ) semestre passado (1.º 2009)
( ) 2.º semestre de 2008
( ) 1.º Semestre de 2008
( ) No ano de 2007
( ) No ano de 2006
( ) Outro: ___________________________________
( ) Não me lembro
5) Você considera o rendimento escolar na escola onde você trabalha:
a) ( ) muito alto
b) ( ) alto
c) ( ) baixo
d) ( ) muito baixo
e) ( ) não sabe responder

6) Considera a repetência na sua escola:


f) ( ) muito alta
g) ( ) alta
h) ( ) baixa
119

i) ( ) muito baixa
j) ( ) não sabe responder

7) Como você avalia a sua condição e motivação de trabalho:


a) ( ) Muito boa
b) ( ) Boa
c) ( ) Satisfatória
d) ( ) Poderia melhorar
e) ( ) Acho inadequada as condições de trabalho, e não tenho motivação

8) Sua escola enfrenta alguma dificuldade atualmente? Cite algumas:


9) Você participa de momentos destinados ao planejamento coletivo
a) ( ) SIM
b) ( ) NÃO
10) Como você é avaliado pelo diretor (equipe gestora)
11) Como você desenvolve seus processos avaliativos e sua prática
pedagógica?
12)Você participa da elaboração do Projeto Político Pedagógico da escola?
Como ele é construído?
13) Você participa das decisões da escola no que se refere a questões de âmbito
administrativo-pedagógico
14) A escola possui uma proposta pedagógica escrita que descreve as
aprendizagens esperadas para cada ano/série, os tipos de atividades a serem
realizadas durante as aulas e as estratégias de avaliação?
15) Você tem conhecimento dos resultados da Prova Brasil, SAEB e IDEB na
sua escola?
( ) Sim
( ) Não
( ) Somente de alguns: ______________________________________
16) Você participa de reuniões com a direção, onde é informado das decisões da
escola, bem como dos resultados das avaliações externas?
( ) Sim
( ) Não
17) Você altera a dinâmica do seu trabalho com vistas a atender as
necessidades emanadas pelas avaliações externas e exigidas pela direção?
De que forma?
18) Quais os fatores, que a seu ver são relevantes na sua escola e que
contribuem para o sucesso escolar, e consequentemente, para o aumento no
IDEB?

19) Quais os aspectos negativos da sua escola, e que de certa forma podem
influenciar nos resultados obtidos nas avaliações externas.
20) Como são estabelecidas as relações entre professores e alunos e entre os
professores e o trio gestor?

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