Revista Hominum Dez 2020

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REVISTA HOMINUM

Humanidades & Ensino


Semestral

Organização:
Prof.ª Esp. Cintia Rufino Franco Shintate

São Paulo – SP
2020
Corpo Editorial

Editora-Chefe: Prof.ª Esp.ª Cintia Rufino Franco Shintate (SEDUC/SP)


Editor-Executivo: Prof. Dr. (UFGD) Ary Albuquerque Cavalcanti Junior
(UFMS/CPCX)
Assistente de Editoração: Daniel Gomes Fernandes Miranda
Ilustradora: Prof.ª Me. (UFGD) Sthefany de Souza Ribeiro

Pareceristas

Prof.ª Me. (UFRN). Aluizia do Nascimento Freire (SME/RN)


Prof. Me. (UFMG) Arthur Oliveira da Silva
Prof. Dr. (UFGD) Ary Albuquerque Cavalcanti Junior
Prof. Me. (UNEB). Gabriel José Brandão de Souza
Prof. Me. (UFGD). Guilherme Nogueira Magalhães Muzulon (SEC/MS)
Prof. Me. (UNEB) Ítalo Nelli Borges
Prof. Me. (UNEB) Jacson Lopes Caldas
Prof.ª Me. (UFGD) Joice Souza Garcia
Prof.ª Me. (UFAM) Lidiane Álvares Mendes
Prof.ª Dr.ª (PUC/SP) Lilian Santos Lacerda
Prof.ª Me. (UFRGS) Lisete Bertotto Corrêa
Prof.ª Me. (UFRB) Ludimila de Oliveira de Amorim
Prof.ª Me. (UFRB) Patrícia de Santana Souza (SEC/BA)
Prof.ª Me. (UFS) Queila Patrícia Pereira de Jesus
Prof. Me. (UFOP) Raphael Ribeiro Machado
Prof.ª Me. (UNEB) Rosana de Jesus Andrade (SEC/BA)
3
Prof.ª Dr.ª (UFGD) Silvana Aparecida da Silva Zanchett (UFMS/CPCX)
Prof.ª Me. (UFGD) Sthefany de Souza Ribeiro
Prof.ª Me. (UFGD) Suellen Cerqueira da Anunciação de Souza (SEC/MT)
Prof.ª Dr.ª (UEMS)Talita Cuenca Pina Moreira Ramos (SME/MT)
Prof.ª Dr.ª (UFGD) Vanessa Cristina Lourenço Casotti Ferreira da Palma
(UFMS/CPTL)
Prof. Me. (PUC/MG) Víctor Almeida Gama

4
SUMÁRIO

Apresentação ................................................................................................... 7
Cintia Rufino Franco Shintate

Dossiê

Ensino de História: saberes e aprendizados no ensino fundamental e


médio em Coxim/MS (2008-2010) ................................................................. 11
Silvana Aparecida da Silva Zanchett

Avaliação escolar: acompanhamento da aprendizagem e


redirecionamento da prática docente .......................................................... 18
Alana Rafaela Borsekowsky; Fabiana Lasta Beck; Jorge Alberto Lago Fonseca

Instrumentos não estruturados: uma estratégia para todos ..................... 25


Daiane Marcelino Cabral da Silva

A história das mulheres na sala de aula: entre desafios e possibilidades


.......................................................................................................................... 32
Ary Albuquerque Cavalcanti Junior

Reflexões sobre a organização curricular da BNCC para a educação


infantil ............................................................................................................. 38
Lilian dos Santos Lacerda

Estudantes LGBTQIAP+ e os desafios da permanência nas escolas: da


exclusão a inclusão ....................................................................................... 44
Jacson Lopes Caldas

5
A importância de novas metodologias no ensino de História .................. 48
Karina da Silva Santos; Mariana da Silva Oliveira

Seção Livre

O Instituto Plínio Corrêa de Oliveira e o neoconservadorismo católico


.......................................................................................................................... 5 5
Víctor Almeida Gama

O lugar da soberania na biopolítica de Michel Foucault e Giorgio


Agamben ......................................................................................................... 62
José Luis Ferraro

Os desafios para a construção de um mundo mais equilibrado e justo em


um cenário pós-pandemia ............................................................................ 69
Leonardo Freire Marino

Relatos de experiências docente

Feira dos saberes: uma experiência de interdisciplinaridade e ensino


remoto ............................................................................................................. 76
Arthur Oliveira da Silva; Marianna Panisset Pedreira Ferreira Ribeiro

Concepções acerca dos anfíbios com estudantes do 7º ano do ensino


fundamental – ciência x superstição ........................................................... 82
Alana Rafaela Borsekowsky; Carolina Farias da Costa; Daniela
Carolina Ernst; Fabiana Lastra Beck

De Mídia Digital a Ambiente de Conhecimento: O Facebook como espaço


de ensino e aprendizagem ............................................................................ 89
Crístian Andrei Tisatto
6
APRESENTAÇÃO

Cintia Rufino Franco Shintate1


[email protected]

“Qualquer um pode se dizer historiador.


Contudo, nada mais difícil e raro do que ser historiador”
Pierre Vilar

Pensar sobre educação é pensar sobre seus atores, em diversas variáveis e


múltiplas dimensões. Adianto que não pretendo apontar culpados, mas reflexões que
apontem para o encaminhamento de discussões e debates, extremamente necessários
e que possuem possibilidades infinitas.
É preciso mudar o olhar para o estudante, pois este nasceu na era das
tecnologias da comunicação e informação e no seio de todas as consequências que ela
carrega consigo. Fake News, desinformação, produção de conteúdo em volume jamais
visto anteriormente (e não necessariamente de qualidade), negacionismos.
O professor e suas múltiplas dimensões. O ator que fica no centro do palco
recebendo aplausos e tomates vindos dos seus telespectadores. Professores são seres
humanos, ficam tristes e felizes. Têm dias bons e ruins. Carregam consigo suas
experiências sociais e profissionais. Como qualquer outro profissional, precisam ser
respeitados e valorizados como tal, pois sabe-se que educação não se faz com
achismos. Aplausos e menções honrosas chegam a soar como zombaria por parte de
alguns governantes.
É preciso destacar também a necessidade de haver políticas públicas que
estejam realmente comprometidas com o ensino básico do Brasil. Sem máscaras. É
preciso ter comprometimento com o ensino de qualidade, garantir não apenas acesso,
mas permanência dos estudantes. Ofertar reais planos de carreira, condições de
trabalho e salário adequado ao ofício docente. Investir pesadamente na educação, em

1
Editora chefe da Revista Hominum. Especialista em História pela PUCSP. Pedagoga. Docente
da Educação Básica do Estado de São Paulo.

7
bons materiais, nos prédios das escolas, promovendo uma educação de qualidade,
equidade e acessibilidade.
Também quero dar atenção ao abismo que existe entre a academia e a
educação básica. Há muitos indicadores que mostram que grande parte dos formados
em Licenciaturas saem das universidades e faculdades sem terem conhecimentos
básicos pedagógicos. Parece improvável, já que estão saindo de licenciaturas. Mas
olhando de perto as grades de disciplinas dos cursos de licenciatura das universidades
e faculdades, percebe-se que há uma grande preocupação com o conhecimento técnico
do curso em detrimento ao prático pedagógico. Sabe-se que alguns cursos têm
consciência disso e já há um movimento na direção de mudar esta realidade. O que
quero destacar aqui é o fato de muitos formandos saírem das cadeiras da universidade
com o intuito de não atuar na educação básica, mas no ensino superior ou mesmo nem
pisar numa sala de aula. Por diversas variáveis que não cabe discorrer aqui, muitos
destes acabam dentro da sala de aula sem a mínima noção do como proceder, como
dar aula, como preencher diários, como preparar aula, que conteúdo ministrar, como
ministrar, como lidar com as múltiplas dimensões de uma sala de aula.
A sensação é a de ter passado pela graduação e não ter aprendido
absolutamente nada. Toda a teoria aprendida na área específica é possível de ser
ensinada desde que façamos adaptações. Adaptar o conteúdo, o tempo, a linguagem,
a abordagem. Mas ninguém nos ensina sobre isso na graduação. O docente tem que
aprender “na raça”, levando anos para “pegar o jeito”. Entendo que docentes precisam
ser reflexivos, perceber suas “falhas” e buscar se aprimorar. Sem dúvidas o caminho
seria muito mais leve se saíssem da graduação preparados à docência. Entendo que o
aprimoramento precisa estar no cerne da atuação do professor, assim como
compreendo que a formação também acontece no momento da atuação.
Neste contexto, me pergunto o que a academia poderia proporcionar ao
professor da educação básica que já está atuando, para auxiliar nessa formação
posterior a graduação. Existem inúmeros latu senso e strictu senso, sem dúvidas. São
caminhos importantes e necessários ao aperfeiçoamento de qualquer profissional.
Revistas acadêmicas abertas, todas amplamente disponíveis oferecendo conhecimento
de qualidade, fruto de inúmeras pesquisas científicas realizadas no interior das
universidades. Também. Porém, estando na ponta de cá, com experiência da ponta de
lá, posso dizer com certeza: existe um enorme abismo entre a produção acadêmica e a
educação básica.

8
Refletindo sobre a citação de Pierre Vilar, nos encontramos num momento da
História mundial em que qualquer pessoa sem formação pode construir conhecimento,
o que é uma faca de dois gumes. Se por um lado, vemos emergir perfis nas mídias
sociais que inundam a internet com todo tipo de conhecimento, por outro lado fica difícil
filtrar o que é feito com qualidade. Passamos do positivismo ao negacionismo,
revisionismo e fofocas históricas. Precisamos, como pesquisadores, reaver e reocupar
este lugar, mostrando que as inúmeras pesquisas realizadas dentro das universidades
não são balbúrdia, mas que têm impacto na vida política, social, cultural e econômica
do leitor não especialista. Que nossas pesquisas não são frutos do acaso nem de
achismos.
Neste sentido, acredito que toda produção acadêmica realizada dentro das
universidades deveria ser acessível a toda sociedade, não apenas a um público
específico. Se o que eu produzo academicamente não é possível ser compreendido
pelos meus pais, irmãos, sobrinhos, ou qualquer pessoa que não está no meio
acadêmico, para quem estou produzindo? É preciso ter cientificidade? Sem dúvidas.
Não quero dizer que não devemos produzir para nossos pares, mas que esse
conhecimento precisa ser acessado e compreendido pelo restante da sociedade de
alguma forma, e um caminho possível é através da educação básica e de publicações
que tenham esse objetivo como norteador de suas diretrizes.
Desta forma, a Revista Hominum se propõe a ser uma ponte entre a academia
e a educação básica. Nossa preocupação primeira está em oferecer conteúdo
acadêmico de qualidade com acesso aberto e livre e com linguagem didática.
Ao propor este dossiê e no decorrer do processo de avaliação dos artigos me
perguntei incessantemente: “Poderia levar este texto para a sala de aula ou para a sala
dos professores?” A resposta para esta questão é o que norteou a escolha dos artigos
desse dossiê e é o parâmetro que a Revista Hominum coloca como essencial em suas
publicações deste momento em diante.

9
DOSSIÊ

10
ENSINO DE HISTÓRIA: SABERES E APRENDIZADOS NO ENSINO
FUNDAMENTAL E MÉDIO EM COXIM/MS (2008-2010)

Silvana Aparecida da Silva Zanchett2


Docente/UFMS/CPCX
[email protected]

Resumo: Este artigo tem visa pensar as possibilidades do fazer docente e o Ensino de
História, para compreendermos as possibilidades e as demandas que permeiam o
aprendizado. Considerando que, aprender e ensinar História vai muito além da sala de
aula, pois o conhecimento deve ser interligado com sentidos e significados.
Palavras-chave: Ensino de História, Aprendizagem, Sala de aula

Abstract: This article aims to think about the possibilities of teaching and teaching
history, in order to understand the possibilities and demands that permeate learning.
Where as, learning and teaching history goes far beyond the classroom, as knowledge
must be interconnected with senses and meanings.
Keywords: History Teaching, Learning, Classroom

Inicio a discussão do meu lugar de fala, um lugar permeado de sentidos e


significados para o fazer do professor e professora da rede de ensino. Trago para a
reflexão essa questão devido existir muitas discussões sobre os processos de
aprendizagem, no entanto, elas apenas apontam as fragilidades do fazer pedagógico,
isso ao pensar a partir do lugar de quem forma professores e professoras que atuarão
e/ou atuam no espaço escolar da educação básica. Nesse sentido, a discussão parte
da pergunta: O que temos ensinado ou aprendido quando lecionamos História e qual a
nossa importância no processo educativo?
É nessa perspectiva que este trabalho pretende discutir a prática docente e o
ensino de História, com base metodológica de ensino. O eixo central da discussão está
na questão de que didática e metodologia da História se constituem pontos importantes
para se pensar esse fazer e o aprender história. Sendo que, o conhecimento é uma
construção e nesse caminho, o ensino de história tem um papel importante na formação
cidadã dos(as) estudantes.

2
Doutora em História pela Universidade Federal da Grande Dourados (UFGD/Brasil), Professora
Adjunta da Universidade Federal de Mato Grosso do Sul (UFMS/Brasil) Campus Coxim e
Membro do Grupo de pesquisa “Trilhas: migrações, fronteiras e gênero”.

11
Para pensar o Ensino de História, trago para a discussão a autora Circe
Bittencourt (2012), que destaca a importância de se refletir sobre a formação do
professor de história e o cotidiano da sala de aula.

O professor de História pode ensinar o aluno a adquirir as ferramentas


de trabalho necessárias; o saber fazer, o saber fazer bem, lançar os
germes do histórico. Ele é responsável por ensinar o aluno a captar e
a valorizar a diversidade dos pontos de vistas. Ao professor cabe
ensinar o aluno a levantar problemas e a reintegrá-los num conjunto
mais vasto de outros problemas, procurando transformar, em cada aula
de História, temas em problemática. (BITTENCOURT, 2012, p. 57).

Para pensar nesse processo de aprendizado, não basta sermos autônomos em


nossas atitudes e práticas diárias em sala de aula, mas como nos ensina Paulo Freire
(2011) ao propor, em seu livro Pedagogia da autonomia, que ensinar exige respeito à
autonomia de ser do educando(a), “o respeito à autonomia e à dignidade de cada um é
um imperativo ético e não um favor que podemos ou não conceber uns aos outros”, e
afirma que:

O professor que desrespeita a curiosidade do educando, o seu gosto


estético, a sua inquietude, a sua linguagem; o professor que ironiza o
aluno, que o minimiza, que manda que “ele se ponha em seu lugar”,
que se furta ao dever de ensinar, de estar respeitosamente presente à
experiência formadora do educando, transgride os princípios
fundamentalmente éticos de nossa existência (FREIRE, 2011, p. 58).

Sendo que, a construção do conhecimento é um processo de aprender a


aprender, de pensar e sistematizar o pensado, com base em problemáticas postas pelo
contexto em que se inserem os sujeitos envolvidos os/as estudantes, professores(as) e
a comunidade escolar. Ou seja, quando esse processo é autoritário, o(a) professor(a) é
o único detentor de todo o conhecimento, o aprendizado não faz sentido aos estudantes
e nem mesmo ao profissional da educação, pois não há trocas, mas somente a
transmissão.
Freire (2011) nos ensina que esse fazer autoritário e desumano, contribui para
reproduzir a educação “bancária”, a serviço da opressão, e não da libertação. Por essa
razão, é de extrema relevância promover a participação, a autonomia e o protagonismo
na escola, que precisa se mostrar aberta a desenvolver atividades que vão além da
transmissão dos conteúdos formais, precisa criar espaços e situações que favoreçam a
experiência da solidariedade, o fortalecimento da sociabilidade, o acesso a atividades
culturais e mesmo ao conhecimento de forma mais participativa, como em debates e

12
seminários. Para Freire (2011, p. 110), precisamos desenvolver a prática de falar com
e não a de falar a, e complementa:

[...] o sonho que nos anima é democrático e solidário, não é falando


aos outros de cima para baixo, sobretudo, como se fôssemos os
portadores da verdade a ser transmitida aos demais, que aprendemos
a escutar, mas é escutando que aprendemos a falar com eles (2011,
p. 111).

Nesse sentido, procurei sempre utilizar a prática do escutar os estudantes, num


sentido de aprender com o falar deles e dessa maneira, democratizar o saber. Por que
optei por trazer o renomado autor Paulo Freire para pensar o processo educativo e
narrar a minha experiência em sala de aula? Ao estudar a metodologia freiriana, aprendi
que o sucesso do aprendizado não está no estudante e tão pouco no professor(a), mas
nos dois ao mesmo tempo, portanto, se esse processo não é dialógico ele não faz
sentido aos dois.
Nessa direção, relatarei algumas experiências de uma professora recém-
formada que vai se aventurar a ministrar aulas para estudantes do Ensino Médio de uma
escola muito renomada na cidade de Coxim. Um dia antes da colação de grau, fui
indicada para ministrar aulas na Escola Estadual Pedro Mendes Fontoura, ao chegar e
me apresentar como candidata ao cargo, a coordenação me olhou e falou: Você não
está preparada para assumir essas aulas, pois os estudantes são muito inteligentes e
para uma pessoa que irá se formar será muito difícil você conseguir realizar essa função.
Engoli o nervosismo e falei, me dá uma chance que eu farei o possível para estar ao
nível deles. No entanto, não sabia que por um erro matemático da professora anterior,
todos os estudantes estavam aprovados na disciplina, isso faltando dois bimestres, mas
isso não foi empecilho para desenvolver a atividade docente.
Então em meados de 2007, iniciei as atividades como professora de história,
momentos ricos que me mostraram que há um abismo entre o saber acadêmico e o
ensino de história. Essa afirmação, se deu ao longo do fazer e me fez refletir muito no
período e hoje na academia, pois ao “formar” professores e professoras, muitas vezes
construímos esses agentes que se distanciam dos(as) estudantes, nos colocando em
um patamar de superioridade. Destaco essa reflexão a partir da minha experiência em
sala de aula, uma professora em início de carreira que teria que lidar com estudantes
do ensino médio já aprovados na disciplina, mas que, no entanto, teriam que cursar o
componente curricular de história, de qualquer maneira.

13
Embasada nas palavras de Schmidt (2004), compreendi que:

A sala de aula não é apenas um espaço onde se transmite


informações, mas onde uma relação de interlocutores constrói sentido.
Trata-se de um espetáculo impregnado de tensões em que se torna
inseparável o significado da relação, teoria e prática, ensino e pesquisa
(2004, p. 57).

Articulando elementos do fazer histórico e do fazer pedagógico, entendo que é


preciso e urgente focar em novas estratégias de ensino, sendo assim, todos os dias eu
pensava nos planejamentos e refletia que eu deveria preparar as melhores aulas, com
todas as metodologias possíveis para serem aplicadas naquela situação. E assim, tive
muitos aprendizados com aqueles jovens e adolescentes, visto que mesmo
aprovados(as), sempre participavam das aulas, dos debates e dos seminários de uma
maneira muito participativa. Além de estar com as turmas do Ensino Médio, também tive
a oportunidade de ministrar aulas para alunos do sexto ano do Ensino Fundamental, no
qual desenvolvi trabalhos com teatro, construção de história em quadrinhos, que ao final
do ano, trouxe uma alegria ao ver o resultado final.
E a grande lição que tive como docente da Educação Básica foi a possibilidade
da implantação da metodologia freiriana, ao adotar mesmo sem muito saber a fundo
que era uma ferramenta teórica importante. Levar o protagonismo aos estudantes, fazer
rodas de conversa, ouvir músicas, assistir um filme temático, analisar imagens de
jornais, estar em outros espaços físicos e ainda possibilitar debates e coleta das
impressões levantadas por eles mesmos e principalmente, provocar a reflexão e
questionamentos para a construção do saber.
Quando analisamos o componente curricular do Ensino de História, muitas vezes
observamos desconhecimentos, como espaços geográficos, culturais, sociais, enfim,
observei também o distanciamento temporal de culturas primitivas e se isso não for bem
trabalhado, fica um vazio no processo de aprendizado. Como aprender sobre a África,
se ele/ela não sabe nem a localização no mapa dos países africanos, ou ainda, ao falar
do continente africano, direcionarmos apenas pelo viés escravista. Ou seja, o ensino
muitas vezes é levado ao desinteresse do conhecimento, e assim apreendi que muitos
conteúdos históricos caem nesse abismo, ao não interligar-se com outros eixos, como
o cultural, o político e o social.
A escola consiste-se em um dos espaços privilegiados para propiciar os
processos cognitivos de aprendizagem e se não houver a participação ativa dos(as)
estudantes, esse processo não é democrático. Assim, acredito que o grande papel do

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professor é provocar e propiciar a autonomia e o protagonismo dos estudantes nesses
espaços. Acredito que não adianta desculpar nossas falhas docentes e culpabilizar os
estudantes o fracasso, o desinteresse e a apatia nos resultados escolares, se não
proporcionamos a eles possibilidades de atuação como sujeitos dentro da escola, nas
salas de aula, espaços de conhecimentos que eles passam boa parte de suas vidas.
Douglas Orestes Franzen(2016), em seu texto Educação para os direitos
humanos: debates e práticas como possibilidades para o ensino de história na educação
básica, destaca ao longo do debate a importância que a disciplina de História, não
somente com foco na disciplina em si, mas em diálogo com temáticas que se ligam.
Destaca ainda que,

Certamente, uma das maiores dificuldades do ofício de educador é


constantemente ter a capacidade ou a disponibilidade de construir
novas práticas e metodologias de ensino. Isso se torna quase que uma
necessidade diante das características dos estudantes da educação
básica, que buscam a cada momento novidades e algo que possa os
atrair no ambiente escolar, além de oxigenar e desafiar a atividade de
docência por meio da reformulação e adoção de novas práticas pelos
professores. O marasmo das mesmas posturas e dos mesmos
métodos retrata a falta de perspectiva e inovação na docência, em que
o mais do mesmo torna o ato de ensinar cansativo e pouco prazeroso
com o passar dos anos. Inovar e ressignificar são práticas necessárias
para o exercício da docência. O primeiro aspecto a ser destacado é o
fato de que temos de contextualizar na disciplina a noção de processo.
(FRANZEN, 2016, p.40-41)

Utilizei essa metodologia participativa, utilizando a prática com rodas de


conversa propiciando, um ambiente diferente, e ainda rompendo com os estereótipos
culturalmente determinados de que os estudantes não têm conhecimentos. Assim,
ministrei muitas aulas embaixo de um pé de manga, observando o espaço físico da
escola e proporcionando um ambiente diferente da rotina escolar. No início da
experiência de retirar os(as) estudantes da sala, propiciar um ambiente diferente do
tradicional, me colocava sujeita ao fracasso, pela dispersão, no entanto, foi uma
experiência agregadora, e que me ensinou que existem aprendizados fora da sala de
aula comum e que o diálogo fluía de maneira mais descontraída e assim, houve
aprendizados e sentidos para os(as) estudantes. Franzen (2016) destaca ainda que,

[...] se os currículos e os temas históricos são postos como


fragmentados no plano de ensino e nos livros didáticos, é função do
professor conjecturar os temas para que haja a concepção processual
do fato histórico. A noção de que “terminamos” um conteúdo e
“iniciamos” outro ainda é bastante presente na sala de aula. Portanto,
no nosso caso, ao se tratar da Revolução Francesa, da Declaração

15
Universal dos Direitos Humanos e da Constituição brasileira de 1988,
é necessário deixar claro que esses três momentos têm relações entre
si, não são fragmentos isolados, mas fazem parte de uma mesma
caminhada histórica. Essa noção de processo é muito importante e o
aluno deve ter isso presente. (FRANZEN, 2016, p.41)

Dessa forma, desenvolvi muitos debates a partir dos temas geradores,


propiciando aos estudantes a desconstrução do senso comum, como no caso debates
políticos que para eles não tinha significado algum, ou seja, algo muito distante para
eles. A experiência foi gratificante e pode servir de exemplo para outros espaços, dentro
e fora do ambiente escolar, a fim de desconstruir essa visão de que os(as) estudantes
de hoje são apáticos e que a sua participação no processo não tem sentido ou
significados. Acredito que, plantei algumas indagações e reflexões que hoje faz sentido
para eles, ou seja, há possibilidades infinitas para romper com os padrões autoritários
do ensino de história e que ao dialogar com os estudantes, não diminui a sua
importância no processo, pelo contrário, aproxima e torna o ensino mais interessante.

Referências

BITTENCOURT, Circe Maria Fernandes. Ensino de História: Fundamentos e Métodos.


São Paulo: Cortez, 2004.

FRANZEN, Douglas Orestes. Educação para os direitos humanos: debates e práticas


como possibilidades para o ensino de história na educação básica. In: MACHADO,
Ironita A. Policarpo; GERHARDT, Marcos; FRANZEN, Douglas O. (Org.). Ensino de
História: experiências na Educação Básica. Passo Fundo: UPF Editora, 2016.

FREIRE, Paulo. Pedagogia da autonomia: saberes necessários à prática educativa.


São Paulo: Paz e Terra, 2011.
____________. Pedagogia do oprimido. 55. ed. Rio de Janeiro: Paz e Terra, 2013.

MACHADO, Ironita A. Policarpo; GERHARDT, Marcos; FRANZEN, Douglas O. (Org.).


Ensino de História: experiências na Educação Básica. Passo Fundo: UPF Editora,
2016.

16
SCHMIDT, Maria Auxiliadora. A formação do professor de história e o cotidiano da
sala de aula. In: BITTENCOURT, Circe (Org.). O saber histórico na sala de aula. São
Paulo: Contexto, 2004.

17
AVALIAÇÃO ESCOLAR: ACOMPANHAMENTO DA APRENDIZAGEM E
REDIRECIONAMENTO DA PRÁTICA DOCENTE

Alana Rafaela Borsekowsky3


Instituto Federal Farroupilha Campus Panambi
E-mail: [email protected]
Fabiana Lasta Beck4
Instituto Federal Farroupilha Campus Panambi
E-mail: [email protected]
Jorge Alberto Lago Fonseca5
Instituto Federal Farroupilha Campus Panambi
E-mail: [email protected]

Resumo: O presente artigo analisa o uso errôneo dos instrumentos avaliativos em sala
de aula a partir de um relato de experiência realizado durante um estágio de docência
na Educação de Jovens e Adultos (EJA).
Palavras-chave: ensino, processos avaliativos, metodologias de ensino, instrumentos
avaliativos

Abstract: This article analyzes the erroneous use of evaluative instruments in the
classroom from an experience report performed during a teaching internship in Youth
and Adult Education (EJA).
Keywords: teaching, evaluation processes, teaching methodologies, evaluation tools

Introdução

A avaliação é um processo natural no cotidiano de todo ser humano, possuindo


um papel importante na vida social e escolar de todos, aparecendo desde os primeiros
anos de vida e se estendendo até o final. O “julgar” e o “comparar” estão sempre em
ação, atitudes intrínsecas, seja por meio das reflexões informais que orientam as

3
Graduanda de Licenciatura em Ciências Biológicas no Instituto Federal Farroupilha Campus
Panambi.
4
Professora Doutora em Educação pela UFPEL, Professora EBTT do Instituto Federal
Farroupilha Campus Panambi
5
Professor Doutor em Educação pela Universidade do Vale do Rio dos Sinos, Professor EBTT
do Instituto Federal Farroupilha Campus Panambi

18
frequentes opções do dia a dia ou formalmente, mediante a reflexão organizada e
sistemática que define a tomada de decisões, como pontua Dalben (2005, p. 66).
No âmbito escolar a avaliação vai além do processo de análise ou resultado final,
ela está inserida em um projeto de construção pedagógica que engloba o social, no qual
o ambiente escolar está inserido e o pessoal dos indivíduos, com seu tempo de
desenvolvimento próprio.

A avaliação escolar é um meio e não um fim em si mesma; está


delimitada por uma determinada teoria e por uma determinada prática
pedagógica. Ela não ocorre num vazio conceitual, mas está
dimensionada por um modelo teórico de sociedade, de homem, de
educação e, consequentemente, de ensino e de aprendizagem,
expresso na teoria e na prática pedagógica (CALDEIRA, 2000, p.122).

Porém, ainda se percebe que a avaliação carrega uma carga histórica iniciada
no decorrer do século XVI, com o surgimento da escola moderna (LUCKESI, 2002, p.
5). Neste modelo, os professores possuíam o hábito de avaliar o desempenho dos seus
alunos com exames/testes que tinham por objetivo classificar seletivamente o
aprendizado do aluno, recompensando-o com uma nota. Esse sistema de aprovação ou
reprovação que visa somente o momento em que o exame foi realizado não contempla
o desenvolvimento dos alunos ao decorrer do ano letivo e, muitas vezes, acaba por
desestimular a busca pelo conhecimento autônomo do aluno. Esses resquícios,
infelizmente, ainda assombram os processos de ensino e aprendizagem.
É preciso desconstruir a ideia de que a avaliação como classificação é mais
importante do que o aprendizado e o não aprendizado em sala de aula. Para tanto, o
processo deve ser observado como um todo e não feito de forma robótica/mecânica
como acontece na maioria das vezes pelos docentes. O caminho percorrido em sala por
estudantes e professores, envolvendo a preparação das aulas e atividades é o que faz
uma avaliação ser bem sucedida. Este tema será explorado no decorrer deste artigo,
como forma de revisão bibliográfica, trazendo à baila o próximo tópico, que se refere a
metodologia utilizada.

Metodologia

Com base no cotidiano escolar verificado durante o Estágio Curricular


Supervisionado I (observacional), respaldado pelo Instituto Federal Farroupilha -
Campus Panambi, realizado em uma escola pública de Ensino Fundamental do

19
noroeste do Rio Grande do Sul, constatou-se a necessidade de abordar o tema e gerar
discussões. Isso evidenciou-se quando havia muitas reclamações e relatos de
ansiedade por parte dos alunos relacionados ao formato avaliativo proposto à turma,
principalmente em uma semana de provas. No primeiro contato com os alunos da
escola, foi observado que a avaliação acontecia com apenas dois instrumentos:
confecção de cartazes e provas, não possibilitando que estes se expressassem de
outras maneiras.
Após uma intervenção no Estágio Curricular Supervisionado II, de regência, pela
supracitada instituição e na mesma escola, outros métodos avaliativos foram utilizados,
como seminários, trabalhos com pesquisas na Internet e feedback de cada aluno após
cada aula, relatando o que entendeu com desenhos, frases e palavras. Esses
instrumentos avaliativos se revelaram muito mais eficientes no acompanhamento dos
conteúdos não compreendidos pela turma, além de estimular outras habilidades e
possibilitar que cada aluno, com a sua singularidade, aprendesse o que era proposto.
Percebe-se que há duas realidades no sistema educacional brasileiro quando o
assunto é avaliação escolar: uma que é não inovadora e monótona e a outra que preza
pelo estímulo de diversas habilidades com diferentes metodologias. Para compreendê-
las, uma busca por autores que abordassem o tema “Avaliação Escolar” foi realizada e
compilada neste trabalho, tendo o objetivo de gerar discussões e despertar o pensar no
leitor.

Avaliação Escolar

O ato de avaliar acompanha o homem em seu cotidiano, sendo apresentado


desde o início de sua vida escolar e que se for proposto de uma maneira negativa pode
vir a prejudicar o seu desenvolvimento psíquico e social. Como menciona Meira (2003),
“na grande maioria dos casos, essas avaliações se restringem a diagnosticar o aluno”,
colaborando com práticas que legitimam a culpabilização da criança pelo não aprender
tornando-a facilmente alvo de rotulações tais como portadora de distúrbios de
aprendizagem (TULESKI, 2007).
O sistema de avaliação nas escolas brasileiras geralmente se baseia na
“classificação do educando, minimamente, em “aprovado ou reprovado”; no máximo, em
uma escala mais ampla de graus, tais como as notas” (LUCKESI, 2005, p. 2). Essa
maneira de avaliar sinaliza apenas o conteúdo aprendido pelos alunos deixando, em
muitos casos, de sinalizar as deficiências do ensino. Esse método de avaliar leva em

20
conta apenas o resultado final, pensando no aluno como um ser “pronto” que se obtiver
um desempenho insatisfatório será responsabilizado pelo resultado; caso o contrário
aconteça, o mérito será do sistema educacional (LUCKESI, 2005).
Diferentemente do que comumente se pensa, o resultado negativo no
desempenho avaliativo não é responsabilidade apenas do aluno, mas de um conjunto
de fatores que englobam e sinalizam os déficits nas metodologias pedagógicas
utilizadas pelos docentes em sala. A maioria dos profissionais pensa no mesmo roteiro
de aula para todos os conteúdos, não inovando em metodologias de ensino e,
consequentemente, não inovando na forma de avaliar. Isso acaba gerando um ambiente
monótono e desestimulante, além de contribuir para a contínua aparição de distúrbios
emocionais quando o assunto são provas e exames.
As experiências escolares são repletas de senso de competências e
incompetências e, infelizmente, a escola se torna um lugar onde muitas crianças são
depositárias da incompetência (CALDAS, 2005, p.9). Constantemente os alunos se
julgam e são julgados incapazes de aprender por tirarem notas baixas em provas
avaliativas tradicionais nas quais prioriza-se a “decoreba” de conteúdo e ignora-se
outras potencialidades, como as artísticas, sociais e cooperativas.

A média mínima de notas é enganosa do ponto de vista de ter ciência


daquilo que o educando adquiriu. Ela opera no que diz respeito ao
aproveitamento escolar, com pequena quantidade de elementos -
dois, três ou quatro resultados; e a média, em número reduzido de
casos, cria, como sabemos, uma forte distorção na expressão da
realidade (LUCKESI, 2009, p.8).

A avaliação, que é vista como instrumento de quantificação, deveria ser um


recurso utilizado para reorganizar a forma de ensino, gerar movimentação para
mudanças, provocação e estímulo “na tentativa de reciprocidade intelectual entre os
elementos da ação educativa” onde “professor e aluno buscam coordenar seus pontos
de vista, trocando ideias, reorganizando-as” (HOFFMANN, 1991, p. 67).
Na tentativa de mudar essa realidade que assola as instituições de ensino no
Brasil, as novas gerações de licenciados estão sendo estimuladas a buscar alternativas
para um ensino acolhedor e eficaz, em que há o diagnóstico das fraquezas educacionais
e a busca por mudanças. O foco necessita ser a aprendizagem e não somente a nota
final, considerando a avaliação como um percurso, um processo balizador para
qualificar o ensino e a aprendizagem, respeitando tempos e espaços.

21
Com as diferentes metodologias didáticas sendo exploradas em sala de aula
várias formas avaliativas alternativas foram e estão sendo desenvolvidas, nas quais
instrumentos tecnológicos e de mídia, trabalhos em grupos, seminários cooperativos,
feedbacks ao final de cada aula, apresentações livres que estimulam o pensar e a
expressão artística, pesquisas na Internet e em livros e debates que exploram o ponto
de vista de cada indivíduo vem para substituir os exames e sua temível ansiedade.
Como refere Luckesi (2000, p.1) “A avaliação da aprendizagem não é e não pode
continuar sendo a tirana da prática educativa, que ameaça e submete a todos”, cabendo
aos docentes mudarem essa visão ultrapassada de avaliação quantitativa para um
método avançado e justo que utilize processos avaliativos com a finalidade de
contemplar as diversas habilidades coletivas e individuais da turma, almejando a
aprendizagem de todos e verificando as falhas no sistema educacional da escola.
Ir para a escola aprender não deve ser algo desgastante e que desperte medo
e ansiedade, nem que torne os estudantes reféns de um número final no boletim, mas
deve ser algo que desperte paixão e interesse de todos os envolvidos.

O ato de estudar, de ensinar, de aprender, de conhecer é difícil,


sobretudo exigente, mas prazeroso [...]. É preciso, pois que os
educandos descubram e sintam alegria nele embutida, que dele faz
parte e que está sempre disposta a tomar todos quantos a ele se
entreguem (FREIRE, 1993, p.83).

Assim, entende-se o processo avaliativo como algo que possa ser natural, porém
não excludente, para que o ato de estudar, ensinar e aprender seja menos árduo, e mais
prazeroso. Nesse sentido, ressalta-se que, em todos os itens abordados anteriormente,
percebe-se que a avaliação está intrínseca ou extrínseca ao planejar aulas, ao elaborar
o plano de aula e o plano de ensino, ao buscar as metodologias de ensino e, por fim, a
própria avaliação escolar, passar por um processo avaliativo, quando o professor define
a melhor forma de proceder.

Considerações Finais

Quando se fala em avaliar ou identificar os conhecimentos e a falta deles em


uma turma, o docente não pode ignorar o fato de estar diante de seres humanos com
emoções, experiências e diferentes visões de mundo. Um ambiente no qual apenas
notas positivas são glorificadas e as negativas são crucificadas, não é um local onde a
saúde mental dos alunos é priorizada. Além disso, não se configura como um ambiente

22
acolhedor que entende e aprende a ter um olhar diferente para as especificidades dos
indivíduos. Uma sala de aula em que o professor trabalha com amor, respeito e entende
as diferentes vivências e realidades de seus alunos acaba se transformando em um
local com menos evasão escolar, menos crises emocionais e mais interesse e sede pelo
conhecimento.

Referências

CALDAS, Roseli Fernandes Lins. Fracasso escolar: reflexões sobre uma história
antiga, mas atual Psicologia: Teoria e Prática, vol. 7, núm. 1, 2005, pp. 21-33, 2005.
Disponível em: >https://www.redalyc.org/pdf/1938/193817415003.pdf< Acesso em: 24
jun. 2020.

CALDEIRA, Anna M. Salgueiro. Ressignificando a avaliação escolar. Comissão


Permanente de Avaliação Institucional: UFMG-PAIUB. Belo Horizonte:
PROGRAD/UFMG, 2000. p. 122-129 (Cadernos de Avaliação, 3).

DALBEN, Ângela I. L. de Freitas. Avaliação escolar. Presença Pedagógica. Belo


Horizonte, v. 11, n. 64, jul./ago. 2005.

FREIRE, Paulo. Professora sim tia não: cartas a quem ousa ensinar. 2. ed. São
Paulo: Olho d’Água, 1993.

HOFFMANN, Jussara M.L. Avaliação: mito e desafio- uma perspectiva


construtivista. Educação e Realidade, Porto Alegre, 1991.

LUCKESI, Cipriano Carlo. O que é mesmo o ato de avaliar a aprendizagem? Pátio.


Porto alegre: ARTMED. Ano 3, n. 12 fev./abr, 2000. Disponível em:
>https://edisciplinas.usp.br/pluginfile.php/2723974/mod_resource/content/2/O%20que
%20%C3%A9%20mesmo%20o%20ato%20de%20avaliar%20a%20aprendizagem.pdf
< Acesso em: 25 jun. 2020.

LUCKESI, Cipriano Carlos. Avaliação da Aprendizagem na Escola e a Questão das


Representações Sociais. Eccos Revista Científica, vol. 4, fac. 02, Universidade Nove
de Julho, São Paulo, pág. 79 a 88. Eccos revista científica, São Paulo, v. 4, n. 2, p. 79-
88, 2002.

23
LUCKESI, Cipriano Carlos. Avaliação da Aprendizagem...mais uma vez. ABC
EDUCATIO nº 46, junho de 2005, p. 28- 29, 2005.

LUCKESI, Cipriano Carlos. Verificação ou Avaliação: o que a escola prática? IN:


Avaliação da Aprendizagem Escolar: estudos e proposições. São Paulo. Cortez, 2009.

TULESKI, Silvana Calvo; EIDT, Nadia Mara. Repensando os distúrbios de


aprendizagem a partir da psicologia histórico-cultural. Psicol. estud. vol.12 no.3
Maringá Set./Dec. 2007.

24
INSTRUMENTOS NÃO ESTRUTURADOS: UMA ESTRATÉGIA PARA
TODOS

Daiane Marcelino Cabral da Silva6


[email protected]

Resumo: A brincadeira está presente na vida das crianças desde o nascimento.


Conforme se desenvolve, a criança aproveita qualquer utensílio ao seu alcance para
fazer um brinquedo. E é a partir daí que ela inicia seu processo de aprendizagem.
Palavras-chave: ludicidade, desenvolvimento integral e criatividade.

Abstract: Play has been present in children's lives since birth. As it develops, the child
takes advantage of any utensils within his reach to make a toy. And it is from there that
it begins the learning process.
Keywords: playfulness, integral development and creativity.

Introdução

A brincadeira é a primeira atividade que a criança tem contato logo após o seu
nascimento. Inicialmente, os pais e parentes mais próximos fazem brincadeiras com o
intuito de receber um sorriso. Com poucos meses, o bebê já começa a ter contato com
seus primeiros brinquedos.
Considerando que o aprendizado das crianças pequenas acontece,
principalmente, por meio das brincadeiras vivenciadas diariamente no espaço
educacional da Educação Infantil, entende-se que as atividades lúdicas são as melhores
maneiras de auxiliar no desenvolvimento integral da criança.
Este artigo tem como tema os instrumentos não estruturados como estímulo ao
desenvolvimento integral da criança. Toma-se como instrumento não estruturado todo
e qualquer utensílio utilizado como brinquedo no processo de ensino-aprendizagem,

6
Licenciada em Ciências Biológicas pela Universidade Estadual de Mato Grosso do Sul (UEMS);
licenciada em Pedagogia pela Faculdade Educacional da Lapa (FAEL); e Especialista em
Atendimento Escolar Especializado pela Faculdade Educacional da Lapa (FAEL).

25
tendo em mente que o mesmo instrumento pode ser utilizado de formas diferentes por
diferentes crianças.

A lucidade na educação infantil

Silva (2014) apresenta a Educação Infantil como uma fase onde a criança
precisa de um suporte pedagógico diferenciado, sobretudo no modo de educá-las, onde
é preciso construir um espaço educativo de qualidade.
De acordo com o Referencial Curricular Nacional para a Educação Infantil
(RCNEI, 1998, p. 23),
na instituição de Educação Infantil pode-se oferecer às crianças
condições para as aprendizagens que ocorrem nas brincadeiras e
aquelas advindas de situações pedagógicas intencionais ou
aprendizagens orientadas pelos adultos. É importante ressaltar,
porém, que essas aprendizagens, de natureza diversa, ocorrem de
maneira integrada no processo de desenvolvimento infantil.

Para Vygotsky (1998) e Leontiev (1998), o brinquedo tem uma relação natural
com o desenvolvimento infantil, principalmente na idade pré-escolar. O jogo e a
brincadeira são fundamentais para o desenvolvimento da criança. Segundo Pacheco e
Garcez (2012), ambos promovem o desenvolvimento da imaginação e da criatividade,
destacando que a imaginação é importante para o conhecimento da realidade.
O RCNEI (1998, p. 23) ainda nos traz que o brincar constitui em

uma atividade interna das crianças, baseada no desenvolvimento da


imaginação e na interpretação da realidade, sem ser ilusão ou mentira.
Também tornam-se autoras de seus papéis, escolhendo, elaborando e
colocando em práticas suas fantasias e conhecimentos, sem a
intervenção direta do adulto, podendo pensar e solucionar problemas
de forma livre das pressões situacionais da realidade imediata.

O brincar deve fazer parte das atividades diárias das crianças, não apenas em
horários de recreação, mas também no decorrer de aulas, tendo em vista que quando
a criança brinca ela interage e desenvolve (SOUTO et al., 2015).
De acordo com Portugal (1998), as crianças e bebês possuem um desejo
espontâneo de explorar o mundo através dos sentidos. E em alguns casos, o brincar
constitui certos riscos, principalmente em se tratando de bebês. De forma automática e
involuntária, os adultos acabam limitando certas atividades com o intuito de poupar a
criança desses riscos.

26
Neste sentido, Tovey (2011, apud BENTO, 2017, p. 388) afirma que, em prol da
proteção e da segurança das crianças, o risco é muitas vezes compreendido como algo
que deve ser removido, ignorando-se a sua influência no brincar e no desenvolvimento
da criança. Porém, para Adams (2002, apud BENTO, 2017, p. 388), o risco deve ser
compreendido como uma dimensão subjetiva, que depende da análise que cada sujeito
faz das situações, atendendo às suas experiências passadas, ao tipo de recompensa
percebida e à propensão individual para enfrentar desafios.

Os instrumentos não estruturados

Post e Hohmann (2011) definem as características dos instrumentos não


estruturados como “materiais cujo uso não está predeterminado ou estritamente limitado
a uma ação ou um objetivo; pelo contrário, podem ser usados pelas crianças de
diferentes maneiras” (p. 115). Sendo assim, os instrumentos não estruturados permitem
que o bebê ou a criança os explorem de forma livre e diferenciada.
Um brinquedo não precisa ser necessariamente comprado. Segundo Kishimoto
(1994, p. 7),

[...] o brinquedo é compreendido como um objeto suporte da


brincadeira, ou seja, é um objeto. Os brinquedos podem ser
considerados: estruturados e não estruturados. São denominados de
brinquedos estruturados aqueles que já são adquiridos prontos. Os
brinquedos denominados não-estruturados são aqueles que não são
industrializados, são simples objetos como paus ou pedras, que nas
mãos das crianças adquirem novo significado, passando assim a ser
um brinquedo, dependendo da imaginação da criança.

Gomes (2011) dá exemplos de materiais que podem ser utilizados nas práticas
pedagógicas com bebês e crianças: “caixas, embalagens, bases dos rolos de papel,
cones de linha, carreteis, tampinhas, recipientes plásticos e pedaços de objetos
cotidianos estragados [...]” (p. 11).
Já Buckingham (2011), oferece sugestões de como preparar uma aula utilizando
os instrumentos não estruturados, indicando que o professor deve se divertir na procura
dos materiais e pode pedir ajuda a outras pessoas para isso. Deve improvisar com os
materiais e observar como as crianças os utilizam com o objetivo de adaptar as suas
ideias em uma próxima ocasião. Na hora da atividade, deve apresentar os recursos de
forma organizada, tornando-os atrativos para a exploração de forma simplificada. Não
se pode esquecer de dar às crianças tempo e liberdade para que elas explorem,

27
descubram, manipulem e exercitem-se durante esse processo e que é muito importante
utilizar os nomes corretos de todos os objetos utilizados.
De acordo com Machado (2007), um instrumento não estruturado permite a
quem brinca com ele desvendá-lo e ‘ressignificá-lo’, pois trata-se de um objeto que
possui inúmeros significados que não são óbvios, nem estão evidentes. Dessa forma,
surgem novas e inusitadas relações que, aparentemente, podem nos parecer absurdas,
mas que para o bebê fazem total sentido.

Relato de experiência

Enquanto estagiária em um Centro de Educação Infantil Municipal (CEIM) na


cidade de Dourados / MS durante o ano de 2018, foi possível participar de atividades
realizadas com alunos do Berçário II (2 a 3 anos) utilizando instrumentos não
estruturados.
A creche recebe periodicamente material de qualidade do Governo para as
atividades pedagógicas, os quais também são utilizados nas aulas. Estes incluem livros,
jogos e brinquedos pedagógicos, objetos com texturas para exploração etc. Porém, a
participação mais efetiva das crianças quando eram utilizados instrumentos não
estruturados era notória.
Em uma das atividades, foi oferecido cestos com as laterais perfuradas e
canudos, onde o objetivo inicial era que os bebês fizessem o encaixe dos canudos nas
perfurações dos cestos. Inicialmente os instrumentos foram apresentados aos alunos e
foi permitido o manuseio e exploração dos mesmos. Em poucos minutos, mesmo sem
indicar o que era para ser feito, alguns bebês pegaram os canudos e começaram a fazer
o encaixe, conforme o esperado. Os demais bebês, seguindo o exemplo, logo fizeram
o mesmo. Em poucos minutos, um bebê começou a encaixar um canudo em outro
canudo. Logo em seguida, outros bebês se aproximaram e começaram a ajudar o
primeiro bebê a formar uma “cobra gigante” com a união de vários canudos.
Em outra ocasião, os bebês ficaram apenas de fralda e foram oferecidos pinceis
e tinta. Inicialmente, começaram a pintar o grande papel que estava forrando o chão.
Logo depois, começaram a explorar seu próprio corpo e a experimentar a textura da
tinta. E poucos minutos, todos os bebês estavam coloridos e passaram a utilizar seus
pés e mãos nesse processo, ao invés de apenas o pincel.
E em outra ocasião, foram oferecidas latas e pequenos pedaços de cabo de
vassoura. Os bebês exploraram os instrumentos por um tempo e em poucos minutos,

28
tinha-se uma banda formada. Foram inseridos, então, novos instrumentos para
estimular a criatividade: garrafas pet cheias com feijões, outras com arroz e outras com
água. Cada bebê pode escolher seu instrumento de preferência, então colocou-se uma
música para tocar e todos acompanharam o ritmo, cada um a seu modo. Outros bebês
aproveitaram para tentar equilibrar a lata no pedaço de madeira, encontrando assim um
novo objetivo para a atividade.
Ao longo de todo o ano foi possível acompanhar a professora regente em suas
propostas e com apenas esses três exemplos fica claro que toda a fundamentação
teórica encontrada sobre o tema é verificada na prática. As crianças interagem com
todos os instrumentos apresentados, bem como umas com as outras. Não apenas os
objetivos iniciais foram alcançados, mas a cada nova descoberta foi possível verificar a
criatividade das crianças levando-as a um novo nível de aprendizagem.

Considerações finais

É notória a importância da ludicidade para o desenvolvimento integral das


crianças, principalmente nos anos iniciais da Educação Infantil. A interação entre as
crianças e das crianças com os adultos que as cercam é muito mais prazerosa e
eficiente quando a diversão está inserida na atividade proposta.
Os brinquedos pedagógicos são de grande importância na sala de aula, mas os
instrumentos não estruturados se mostraram uma excelente ferramenta no
desenvolvimento integral das crianças. Há um maior estímulo da criatividade com essa
metodologia e os resultados se mostraram muito favoráveis.
Instrumentos não estruturados estão ao alcance de todos, por isso se tornam de
fácil acesso e são considerados interessantes para se trabalhar. Uma aula bem
preparada e organizada previamente com essa metodologia permite não apenas
alcançar os objetivos propostos, mas superar as expectativas e desenvolver a criança
de forma plena.
O professor pode criar um objetivo com determinado instrumento, mas ao chegar
na sala de aula, as crianças podem dar um novo significado àquele instrumento,
trazendo um novo ponto de vista para as demais crianças e, até, para o próprio
professor. Não se deve limitar a criatividade da criança, mas sim estimulá-la a cada
situação ou experiência.
Percebe-se, portanto, que o instrumento não estruturado permite experiências
diversas de forma individual com cada bebê e, ainda, de forma coletiva com toda a

29
turma, pois um mesmo instrumento pode ser utilizado de uma forma com uma criança,
mas de outra completamente diferente com outra. E é isso que torna essa metodologia
tão importante no processo de ensino-aprendizagem.
Sabe-se que as crianças gostam de explorar e descobrir coisas novas, ainda que
precisem de proteção e segurança. Mas se elas forem encorajadas no desenvolvimento
de suas habilidades com estímulo à criatividade, é notório que progressivamente vão
dominando a sua coordenação motora e ganhando autonomia e confiança, não apenas
em si mesmas, mas também nos outros.

Referências

BENTO, M. G. P. Arriscar ao brincar: análise das percepções de risco em relação ao


brincar num grupo de educadoras de infância. Revista Brasileira de Educação. V. 22 n.
69 abr.-jun. 2017.

BRASIL, Ministério da Educação e do Desporto. Secretaria de Educação Fundamental.


Referencial Curricular Nacional para a Educação Infantil - RCNEI. 6ª Edição. Vol. 1.
São Paulo, Brasil, 1994. Disponível em:
<http://portal.mec.gov.br/seb/arquivos/pdf/rcnei_vol1.pdf>. Acesso em 04 set. 2020.

BUCKINGHAM, D. The material child: growing up in consumer culture. Cambridge:


Polity Press, 2011. 261p.

GOMES, P. Os Materiais Artísticos na Educação Infantil. Em: C. CRAID, & G.


KAERCHER, Educação Infantil pra que te quero (pp. 109-121), 2011.

KISHIMOTO, T. M. Jogo, brinquedo, brincadeira e a educação. São Paulo: Cortês,


1994.

LEONTIEV, A. N. Uma contribuição à teoria do desenvolvimento da psique infantil. In:


VIGOTSKI, L. S.; LURIA, A. R.; LEONTIEV, A. N. Linguagem, desenvolvimento e
aprendizagem. 6. ed. São Paulo: EDUSP, 1998.

MACHADO, M. M. O brinquedo-sucata e a criança: a importância do brincar -


atividades e materiais. São Paulo, SP. 6ª Edição. 2007.

30
PACHECO, F. P. e GARCEZ, E. M. S. O jogo e o brincar: Uma ação estratégica na
promoção da saúde mental. Revista de Saúde Pública de Santa Catarina, 5(1), 87-142.
2012.

PORTUGAL, G. (1998). Crianças, Famílias e Creches - Uma Abordagem Ecológica da


Adaptação do Bebé à Creche. Porto: Porto Editora.

POST, J., & HOHMANN, M. Educação de Bebés em Infantários. Lisboa: Fundação


Calouste Gulbenkian. 2011.

SILVA, E. A. Ludicidade e aprendizagem: a importância do brincar na educação


Infantil. 2014. 46 f. Monografia (Especialização) - Curso de Pedagogia, Universidade
Federal da Paraíba, Itaporanga, 2014.

SOUTO, M. K. N.; FERREIRA, L. M. C.; SANTOS, V. E.; MACIEL, M. R. G. Importância


do brinquedo em sala de aula na educação infantil. In: II CONGRESSO NACIONAL
DE EDUCAÇÃO, 2., 2015, Campina Grande. Anais. Campina Grande: Conedu, 2015,
p. 1 – 6.

VIGOTSKY, L.S. O papel do brinquedo no desenvolvimento. In: A formação social da


mente. 6. ed. São Paulo: Martins Fontes, 1998.

31
A HISTÓRIA DAS MULHERES NA SALA DE AULA: ENTRE DESAFIOS E
POSSIBILIDADES

Ary Albuquerque Cavalcanti Junior7


Docente da Universidade Federal de Mato Grosso do Sul (UFMS/CPCX)
[email protected]

Resumo: O presente artigo busca elucidar, ainda que brevemente, os desafios e as


possibilidades de se abordar a história de mulheres em sala de aula, tencionando
desconstruir perspectivas androcêntricas e silenciamentos.
Palavras-chave: História; Ensino; Mulheres.

Abstract: This article seeks to elucidate, albeit briefly, the challenges and possibilities of
approaching the history of women in the classroom, intending to deconstruct
androcentric perspectives and silences.
Keywords: History; Teaching; Women

Introdução

É com o famoso título do livro da historiadora Michelle Perrot (1995) que inicio a
escrita do presente texto. Faço isso, pois foi a primeira experiência que tive com uma
literatura que me permitisse refletir, além do que minha percepção e consciência
histórica, sobre minha função enquanto professor/historiador. A partir disso, pude
entender as diferentes possibilidades que temos ao olhar para a História, bem como os
próprios desafios ao se realizar estudos sobre a história das mulheres, tanto na
academia, mas principalmente em sala de aula. Posto isso, o objetivo deste breve texto
não é apenas levantar problemas, ou muito menos propor soluções, mas sim, trazer
reflexões sobre as possibilidades para um ensino de história que apresente as mulheres
como protagonistas de seu tempo.
Com certeza você já deve ter ouvido falar em Joana D’arc e Olga Benário,
mulheres que em diferentes períodos e países se destacaram mediante suas ações e
pelo enfrentamento aos diferentes cerceamentos a elas impostos. Nos últimos anos, o

7
Doutor em História pela Universidade Federal da Grande Dourados (UFGD). Membro do
Laboratório de Estudos de gênero, história e interculturalidade (LEGHI/UFGD/UNESCO);
Membro do Laboratório de ensino de História e Letras (UFMS/CPCX).

32
próprio setor cultural passou a produzir filmes, documentários e outras formas de
expressão artística, os quais colocaram diferentes mulheres como protagonistas de
suas produções.
No contexto da cinematografia nacional, por exemplo, podemos mencionar as
produções: “Olga Benário” (2004)8; “Zuzu Angel” (2006)9, Nise (2016)10 os quais
destacam mulheres em diferentes contextos históricos e suas ações em prol de causas
coletivas, mas que traziam como pano de fundo as dificuldades que a sociedade
empunha acerca do ser mulher. Por outro lado, devemos estar sempre atentos a
compreender que as produções cinematográficas são representações do passado, e
não necessariamente tem qualquer compromisso com o mínimo de verdade dos fatos
(CHATIER, 1991; VALIM, 2012). Isso nos permite perceber que muitas obras, como as
mencionadas anteriormente, podem em algum momento trazer uma visão muito
romanceada acerca das mulheres, algo que acaba muitas vezes retirando seu
protagonismo ou tangenciar suas trajetórias sem a devida problematização contextual.
Assim, é fundamental que nós estejamos atentos/as aos vazios não apresentados e
cuidarmos para não cairmos na linha de raciocínio do entretenimento, que muitas vezes
dá ênfase ao final, onde o casal vive feliz para sempre. Pois, para muitas mulheres a
ruptura ou o enfrentamento com determinadas normativas foi feita de forma combativa
e dolorosa.
Em nível internacional, podemos mencionar os exemplos de “As Sufragistas”
(2015) e recentemente a série "Nada ortodoxa” (2020) disponibilizada por uma
produtora de streaming. Ambas, às suas maneiras, trazem não apenas discussões para
se pensar história e suas relações com as diferentes possibilidades de representação,
mas o próprio lugar da mulher na sociedade. O que entendemos ser uma importante
ferramenta didática, desde que com as devidas problematizações e observações acerca
dos discursos e contextos apresentados (VESENTINI, 2008).

8
O filme “Olga: muitas paixões de numa só vida” lançado em 2004, foi dirigido por Jayme
Monjardim sendo a maior bilheteria do daquele ano. Disponível em:
https://cultura.estadao.com.br/noticias/cinema,olga-supera-cazuza-em-
bilheteria,20040824p3914 Acessado em 17/10/2020 às 21:15.
9
O filme Zuzu Angel foi lançado em 2006, com a direção de Sérgio Rezende. A obra, baseada
em fatos reais, conta a luta da estilista carioca Zuzu Angel para saber o paradeiro de seu filho
Stuart Angel em meio ao contexto da Ditadura Militar brasileira. Disponível em:
http://www.adorocinema.com/filmes/filme-124850/ Acessado em 10/11/2020 às 12:10.
10
O filme “Nise: o coração da loucura” (2016) foi dirigido por Roberto Beliner, baseado em fatos
reais, conta a história da médica Nise da Silveira e a prática de novas técnicas para o tratamento
de esquizofrenia. Disponível em: http://www.adorocinema.com/filmes/filme-240724/ Acessado
em 17/10/2020 às 21:20.

33
A história das mulheres na sala de aula

Quanto a sala de aula, por mais que ao longo dos últimos anos uma série de
metodologias e ferramentas tenham sido propostas, ainda vemos o nosso “velho” e
querido livro didático como o grande produtor de conhecimento, muitas vezes
disputando com a/o própria/o docente (BITTENCOURT, 2004). Com isso, entendemos
a importância do ensino de história e a função do/a professor/a, uma vez que para que
consigamos ter sucesso com a disciplina histórica devemos partir dos questionamentos
que tecemos acerca do passado (PINSKY e PINSKY, 2020).
Pensando ainda no que pontuamos no parágrafo anterior, fazemos o primeiro
questionamento: você leitor/a já ouviu falar em Maria Gomes de Oliveira? Pois é, talvez
com seu verdadeiro nome não né? Mas, este é o nome de batismo de umas das únicas
mulheres que pertenceu ao grupo do famoso cangaceiro Lampião, responsável por
inúmeras ações no período conhecido como Primeira República ou República “Velha”.
Porém, nota-se que Maria Oliveira é mais reconhecida como “Maria Bonita”, a “esposa”
do “Rei do Cangaço”, algo que com todo cuidado que se mereça a abordagem, reduz
sua participação ao seu companheiro. Porém, estudos apontam que sua trajetória foi
muito além do que essa visão, amplamente difundida, principalmente pela indústria
cultural, escondeu seu protagonismo e sua importância para o período (NEGREIROS,
2018). Para isso, basta fazermos o exercício de se pensar como era ser mulher no início
do século XX, em meio a todos os cerceamentos impostos por uma sociedade patriarcal,
onde as mulheres não eram reconhecidas como cidadãs (PINTO, 2008). Ou seja, cada
vez mais é importante falarmos sobre a participação das mulheres na história e
desnaturalizar um discurso que ainda impera, trazendo-as muitas vezes em notas ou
sessões como o “você sabia?”.
A partir das primeiras considerações, podemos fazer um exercício e nos colocar
a refletir: como as mulheres são representadas nas ferramentas utilizadas para o ensino
de história? Como combater visões totalizantes que acabam por retirar a autonomia
feminina de seus atos e consequentemente seus nomes dos registros históricos? Será
que enquanto educadores/as conseguimos elaborar aulas que proponham elucidar as
mulheres como protagonistas de seu tempo?
Bem, o primeiro aspecto a se pensar ao responder os questionamentos
anteriores acerca da história das mulheres é observar o contexto de suas vidas ao
utilizarmos suas trajetórias em sala de aula. Uma vez que esta observação nos permite

34
compreender como diversas mulheres, com suas diferenças, raciais, de classe etc.,
lutaram às suas maneiras contra as diversas formas de opressão a que foram expostas.
Por outro lado, o trabalho com a história das mulheres requer um cuidado, pois o foco
deve ser a representatividade feminina nos diferentes eventos que ocorreram na história
e não criação de heroínas, pois isso acaba por retirar seus sentimentos, medos e ações.
Assim, uma proposta a ser realizada em sala de aula consiste em ao final de
cada tema levantado propor o questionamento acerca de onde estavam as mulheres?
Ou até mesmo a realização de pesquisas pelos discentes acerca de mulheres
importantes dentro do tema e do recorte temporal proposto pelo/a docente. Por exemplo:
mulheres cientistas e suas descobertas, atuação feminina na Revolução Francesa, na
resistência a Ditadura Militar no Brasil etc. A função é a compreensão de que as
mulheres estiveram presentes nos diversos eventos e descobertas ao longo da história.
A partir do que destacamos, entendemos poder contribuir para o exercício do
pensamento histórico, no qual nunca devemos aceitar as informações sem analisar o
contexto de sua produção. Ou seja, levando em consideração questões culturais, o
tempo, as classes sociais etc. (CERRI, 2020). Elementos que permitem observar como
os diferentes períodos produziram discursos, relações de poder, e como estes
influenciaram não apenas a sociedade em si, mas o próprio silenciamento feminino na
história (FOUCAULT, 2014; COLLING, 2014).
Outra possibilidade é propor a realização de pesquisas acerca dos nomes das
ruas, bairros, escolas e entidades onde alunos/as morem, buscando observar quantos
desses locais levam nomes de mulheres e quem são elas. Muito provavelmente, notarão
o nome de presidentes e lideranças políticas, em sua grande maioria homens, e aqui
entra uma de nossas tarefas, a de problematizar a construção da história, sua
naturalização e a inserção dos discursos em nosso cotidiano. Uma vez que combater
uma lógica machista proveniente de uma cultura patriarcal ocidental e em nosso caso
brasileiro com raízes profundas não é uma tarefa das mais simples, nem rápidas. Dessa
forma, a melhor forma de problematizar o silenciamento histórico e transcender a partir
das ferramentas que estão a nossa disposição é propor diálogos abertos acerca das
relações de gênero, bem como das mulheres como entes ativas nos processos
históricos.
Ainda quanto às possibilidades didáticas, uma alternativa é fazer uma reflexão
junto os/as discentes, a respeito de quantas mulheres estão à frente de entidades ou
órgãos de representatividade, sejam elas políticas, sociais, presidências de países etc.
Com isso, além de ajudar a refletirmos sobre o presente, torna possível uma discussão

35
quanto aos avanços das diferentes frentes de luta feminina ao longo da história, pela
cidadania, pelo direito ao voto, bem como a relação entre a sociedade e as mulheres.
Uma vez que quanto mais o/a aluno/a se sentir próximo da História e se ver inserido nos
temas, passará a ter um diálogo e uma reflexão acerca do passado histórico e seus
impactos na atualidade (PINSKY e PINSKY, 2020).

Conclusão

Por fim, destacamos o quanto avançamos ao longo dos séculos e o quanto a luta
feminina foi importante para que pudéssemos avançar em muitos debates, combatendo
lógicas patriarcais e machistas, ainda que estas imperem em nossa sociedade. Mas, o
presente texto buscou elucidar ainda que brevemente a importância de se pensar a
presença feminina nas aulas de história, e as problematizações possíveis para um
ensino que respeite as diferenças e que não permita silenciamentos. Com isso,
esperamos ter contribuído com reflexões e possibilidades, na esperança de que muito
em breve este texto se torne ultrapassado, mediante o avanço e aplicabilidade de um
conhecimento histórico onde as mulheres possam enfim ser reconhecidas como
fundamentais para o avanço das sociedades que ao longo do tempo se constituíram.

Referências

BITTENCOURT, Circe. Livros didáticos entre textos e imagens. BITTENCOURT, Circe


(Orgs.). O saber histórico na sala de aula. 11ª ed. São Paulo: Editora Contexto, 2008,
pp. 69-90.

CAVALCANTI JUNIOR, Ary A. História das mulheres e o ensino através de uma


abordagem regional e local. In: Bueno, André; Estacheski, Dulceli T.; Zarbato, Jaqueline.
(Org.). Ensino de História e Estudos de Gênero. 1ed.Rio de Janeiro/ Nova Andradina:
Sobre ontens, 2020, v. 1, p. 106-111.

_____________; SOUZA, Suellen. C. A. Da teoria à prática: o ensino de história e a


representação da mulher negra na sala de aula. In: BUENO, André; KELLI, Marcus
Vinicius; VELOSO, Wendell dos Reis. (Org.). Diálogos na Rede: História, Educação,
Ensino e Pesquisa. 1ed.Rio de Janeiro: Sobre ontens, 2020, v. 1, p. 65-70.

36
CERRI, Luis Fernando. Ensino de história e consciência histórica: implicações
didáticas de uma discussão contemporânea. 4ª ed. Rio de Janeiro: Editora FGV,
2020.

COLLING, Ana Maria. Tempos diferentes, discursos iguais: a construção do corpo


feminino na história. Dourados, MS: Ed. UFGD, 2014.

CHARTIER, Roger. O mundo como representação. Estudos avançados, v. 5, n. 11, p.


173-191, 1991.

FOUCAULT, Michel. Vigiar e punir: nascimento da prisão. Trad. Raquel Ramalhete. 42


ed. Petrópolis, Rio de Janeiro, 2014.

NEGREIROS, Adriana. Maria Bonita: sexo, violência e mulheres no cangaço. São


Paulo. Objetiva, 2018.

PINSKY, Jayme. PINSKY, Carla Bassanezi. O que e como ensinar: Por uma história
prazerosa e consequente. In: KARNAL, Leandro. História na sala de aula: conceitos,
práticas e propostas. 6ª ed. São Paulo: Editora Contexto, 2020, pp. 17-36.

PINTO, Céli Regina Jardim. Uma história do feminismo no Brasil. Ed: Fundação
Perseu Abramo, São Paulo, 2003.

VALIM, Alexandre Buezassko. História e cinema. CARDOSO, Ciro F; VAINFAS,


Ronaldo. Novos Domínios da História. Rio de Janeiro: Elsevier, p. 283-300, 2012.

VESENTINI, Carlos Alberto. História e ensino: o tema do sistema de fábrica visto através
de filmes. In: BITTENCOURT, Circe (Orgs.). O saber histórico na sala de aula. 11ª ed.
São Paulo: Editora Contexto, 2008, pp. 163-175.

37
REFLEXÕES SOBRE A ORGANIZAÇÃO CURRICULAR DA BNCC PARA A
EDUCAÇÃO INFANTIL

Lilian dos Santos Lacerda11


Secretaria Municipal de Educação de Piracicaba
[email protected]

Resumo: Este artigo pretende suscitar a discussão acerca das implicações da


implantação da Base Nacional Comum Curricular (2017) na educação infantil a partir da
organização curricular em campos de experiência num contexto de impasses e desafios
ao exercício da docência.
Palavras-chave: Educação infantil. Campos de experiência. Política curricular. Teoria
Crítica da Sociedade.

Abstract: This article intends to raise the discussion about the implications of the
implantation of the National Common Curricular Base (2017) in child education based
on the curricular organization in fields of experience in a context of impasses and
challenges to teaching.
Keywords: Early Childhood Education. Fields of Experience. Curricular Policy. Critical
Theory of Society.

Introdução

A inserção da educação infantil como primeira etapa da educação básica


desponta como um marco importante para as políticas da infância. Todavia, aponta para
o reconhecimento de que a criança é um sujeito de direitos o que implica em romper
com uma educação baseada no assistencialismo e assumir a perspectiva da formação
integral.
O direto à educação vai se constituindo por meio da legislação: Constituição
Federal (1989); Estatuto da Criança e do Adolescente (1990); Lei de Diretrizes e Bases
da Educação Nacional (1996); Referencial Curricular Nacional para a Educação Infantil

11
Doutora em educação pela Pontifícia Católica de São Paulo (PUCSP), professora de educação
infantil no município de Piracicaba.

38
(1998); Diretrizes Curriculares Nacionais para a Educação Infantil (2009); Base Nacional
Comum Curricular (2017).
Prevista na legislação brasileira, a BNCC faz parte do bojo das políticas que
expressam interesses neoliberais e tem sido alvo de discussões por parte dos
educadores e da comunidade cientifica. Entretanto, a implantação da Base Comum
Curricular Nacional (BRASIL, 2017) resulta num período de muita preocupação,
principalmente pelo impeachment da presidenta Dilma Rousseff que configurou o golpe.
O documento foi discutido e elaborado por um grupo de especialistas, por meio
de portarias. Apesar da importância e da abrangência, o documento não foi discutido
com a sociedade brasileira, com os educadores e pesquisadores que se debruçam
sobre a temática.
São vários os questionamentos que nos instigam a debater a organização do
currículo para educação infantil tal como prescreve a BNCC. O documento norteador do
currículo resulta de um movimento amplo de política que disputa as dinâmicas da escola
e da formação, cujas diretrizes oficiais impõem um currículo estruturado em campos de
experiência.
A partir do exposto, este estudo pretende analisar à luz da Teoria Crítica a
organização curricular em campos de experiência que orienta o trabalho do professor
de educação infantil. De caráter documental e bibliográfico, primeiramente, realizou-se
a leitura da BNCC e posteriormente, a análise do documento.
Ademais, compreende-se que o processo de ensino-aprendizagem resulta de
interações e deve ser proporcionar aos alunos apropriação da cultura. Investigar a
organização curricular tal como nos é imposta faz-se necessário, por se entender a
necessidade de articulação entre o desenvolvimento infantil e as práticas de ensino
utilizadas para a mediação do conhecimento às crianças.
Considerando a brevidade do estudo, pode-se afirmar que o documento se
apresenta como inovador e progressista, mas foi constituído sem a participação da
sociedade e dos professores e pesquisadores da área e, portanto, não atende as
demandas das nossas crianças.

Conceito de experiência em Walter Benjamin

O conceito de experiência é entendido como possibilidade da apropriação


subjetiva da cultura pelo indivíduo. A partir da perspectiva dialética, a experiência é
fundamental para a formação, haja vista que sem a realização efetiva da experiência, a

39
formação não se realiza de forma significativa, com o impedimento de o indivíduo
estabelecer relações espontâneas com a cultura, com a sociedade e com a natureza,
enfim, com o outro.
Sua crítica engendrou matizes teóricas que originou uma vasta reflexão sobre o
conceito de experiência (Erfahrung) cujas análises desvelam a dialética da relação entre
o sujeito e a sociedade, entre a tradição e a modernidade.
Ao considerar as mudanças ocorridas no mundo moderno e na educação parece
cada vez mais difícil as possibilidades de desenvolvimento da autonomia e de
emancipação. Ora, e essa é uma situação que torna as pessoas incapazes de novas
experiências. Todavia, a sociedade está estruturada e se sustenta, justamente, nessa
incapacidade e como consequência produz seres não diferençados uns dos outros e
integrados à totalidade social.
Benjamin (1975), alerta para o fato de que as transformações que ocorreram na
sociedade moderna alteram a percepção do indivíduo, bem como sua capacidade de
realizar experiências. Assim, a racionalidade tecnológica subjugou o saber, o
conhecimento e acarretou a perda da capacidade de pensar. O resultado de tais
transformações é um indivíduo pobre de experiências, pois o que lhe restou foi o tempo
da vivência.
Segundo Benjamin (1975, p.105), o conceito de experiência é um saber
historicamente acumulado e transmitido pela tradição, tanto no âmbito individual quanto
coletivo: “(...) a experiência é matéria da tradição, tanto na vida privada quanto na
coletiva. Forma-se menos com dados isolados e rigorosamente fixados na memória, do
que com dados acumulados e com frequência inconscientes, que afluem à memória”.
A experiência é o lugar em que diferentes tempos se entrelaçam. Nas palavras
de Benjamin (1975, p.107), "onde há experiência no sentido estrito do termo, entram em
conjunção, na memória, certos conteúdos do passado individual com outros do passado
coletivo".
Neste sentido, a experiência se apresenta como um processo que envolve a
memória cujos acontecimentos apreendidos se relacionam com o passado individual e
torna-se coletiva em seu potencial de transmissão, de narrativa e pelo exercício da
memória. A experiência é algo que possa ser transmitida de geração em geração.
Todavia, Benjamin (1975), alerta que no mundo moderno torna a experiência cada vez
mais individual, uma “experiência vivida” de forma isolada.
Ora, se a experiência resulta da tradição, do individual e do coletivo, torna-se
necessário diferenciar o que poderia ser a experiência dos adultos e a das crianças.

40
Nesse sentido, Benjamin afirma que para a criança “(...) toda e qualquer experiência
mais profunda deseja insaciavelmente, até o final de todas as coisas, repetição e
retorno, restabelecimento da situação primordial da qual ela tomou o impulso inicial. (...)
“a criança volta para si o fato vivido, começa mais uma vez do início.” (Benjamin, 1984,
p. 74-75).
De sua parte, o adulto tem seu potencial na narrativa. Assim, a experiência se
realiza por meio da retomada da memória e comunicada. Todavia, para Benjamin (1975,
p.107) a narrativa “(...) não tem a pretensão de transmitir um acontecimento pura e
simplesmente (como a informação o faz); integra-o à vida do narrador, para passá-lo
aos ouvintes como experiência”.
Vale ressaltar que no mundo moderno não há espaço para a tradição
historicamente erigida. Assim, a vivência (erlebnis) passa a ser a possibilidade
experiência moderna, onde o vivido individual possa servir de orientação coletiva.

Proposições da BNCC na organização curricular na educação infantil: breves


reflexões

Após homologação da versão final da Base Comum Curricular Nacional


(BRASIL, 2017), que contempla a educação infantil e ensino fundamental, inicia-se a
ampla divulgação do documento nas Instituições escolares, gerando muitas
expectativas aos professores, principalmente naqueles que não estavam por dentro ou
não acompanharam o processo de construção da base. Assim, tecemos algumas
considerações no sentido de deixar evidente o que a BNCC propõe para o ensino
fundamental mais especificamente na educação infantil e nos anos iniciais.
Durante sua elaboração o documento passou por várias modificações, até a
segunda versão, o processo foi amplamente discutido. No entanto, a terceira versão e
a versão final homologada foram discutidas com especialistas que defendem grandes
corporações.
Diante desse cenário, tem-se a BNCC como um documento legal de caráter
normativo que define um conjunto de aprendizagens essenciais esta etapa da educação
básica. Ademais, a Base dispõe de conhecimentos e de competências sinalizando para
constituição de um currículo para a educação infantil. Todavia, esse é um tema polêmico
e controverso se tomarmos as DCNEI enquanto documento mandatório. “O currículo na
Educação Infantil tem sido um campo de controvérsias e de diferentes visões de criança,
de família, e de funções da creche e da pré-escola. (BRASIL, 2009, p. 6).

41
Vale ressaltar que as DCNEI possuem caráter mandatório e que a BNCC é um
documento subordinado às Diretrizes, embora não esteja explicito no texto da Base.
De acordo com as proposições da BNCC, a educação infantil deverá acontecer
partir de seis direitos de aprendizagem – conviver, brincar, participar, explorar,
comunicar e conhecer-se que estão organizados em torno de dois eixos - o eixo das
interações e o eixo das brincadeiras. Para garantir os direitos à aprendizagem deve-se
articular quatro áreas do conhecimento: linguagens, ciências humanas, ciências da
natureza e matemática, que devem ser vivenciadas por meio de campos de
experiências.
Portanto, são os campos de experiências e seus objetivos que constituem o
currículo para a educação infantil. No texto da BCNCC (BRASIL, 2017, p. 38), “os
campos de experiências constituem um arranjo curricular que acolhe as situações e as
experiências concretas da vida cotidiana das crianças e seus saberes, entrelaçando-os
aos conhecimentos que fazem parte do patrimônio cultural.”
Outro ponto que merece destaque, refere-se as orientações prescritas na BNCC,
cujas proposições têm como base os Campos de Experiências para as Escolas da
Infância italianas onde a proposta pedagógica cede lugar as indagações, curiosidades
e dos interesses das crianças. O professor assume o papel de observador e sua prática
se volta para a mediação das possibilidades materiais, relacionais e materiais.

Algumas considerações

Este estudo tem por objetivo provocar reflexões a partir das implicações da
implantação da Base Nacional Comum Curricular (BRASIL, 2017), na educação infantil
a partir da organização curricular em campos de experiência.
Investigar a organização curricular tal como nos é imposta faz-se necessário, por
se entender a necessidade de articulação entre o desenvolvimento infantil e as práticas
de ensino utilizadas para a mediação do conhecimento às crianças.
Durante o exercício de análise do documento, encontrou-se várias contradições
em seu texto:
1. As prescrições contidas na BNCC são extensas e as proposições
aparecem sem referências bibliográficas e sem menção a metodologia de
apoio.
2. A documento preconiza uma organização de currículo a partir dos
eixos: interações e brincadeiras claramente desconsidera os estudos acerca

42
do desenvolvimento infantil e nega o processo de ensino e de aprendizagem
em detrimento dos campos de experiência.
3. Não há menção acerca propostas pedagógicas o que pressupõe
que o professor se transforme num trabalhador flexível e capaz de interpretar
os interesses dos alunos. Assim, o fazer docente se resume a organizar
momentos que proporcione experiência as crianças.
4. Ao delinear as habilidades e as competências essenciais para
garantir os direitos de aprendizagem das crianças, a BNCC cerceia e impede a
prática docente o que aponta para o controle do trabalho do professor, já que
este não ensina e não leciona.
5. O documento não demonstra preocupação com a formação
continuada.
Vale ressaltar que, a BNCC é um documento normativo que se apresenta como
resultado de uma conquista democrática com a finalidade de garantir educação de
qualidade a todos, mas na verdade é um documento autoritário, constituído sem a
discussão de professores, pesquisadores da área e da sociedade.
Diante do exposto, o exercício da docência encontra-se ameaçado, já que nos
moldes do documento, os professores atuam de forma mimética, um mero organizador
de situações como se não tivessem nada a ensinar as crianças.
Compreende-se que a sociedade e o processo de ensino e de aprendizagem
sofrem transformações constantemente. Todavia, o que não foi possível constatar nada
para além é de uma proposta que atenda aos interesses do capitalismo com caráter
liberal.

Referências

BENJAMIN, Walter. Reflexões: a criança, o brinquedo, a educação. São Paulo:


Summus Editorial, 1984.

BENJAMIN, Walter. Obras escolhidas II. São Paulo: Brasiliense, 1975.

BRASIL. Parecer CNE/CEB n.º 20, de 11 de novembro de 2009. Revisão das Diretrizes
Curriculares Nacionais para a Educação Infantil. Brasília, DF, 2009.

BRASIL. Base Nacional Comum Curricular. Brasília: MEC/CNE. 2017.

43
ESTUDANTES LGBTQIAP+ E OS DESAFIOS DA PERMANÊNCIA NAS
ESCOLAS: DA EXCLUSÃO A POSSIBILIDADE DE INCLUSÃO

Jacson Lopes Caldas12


Professor de História na Rede Privada de Ensino
[email protected]

Resumo: O presente artigo tem o objetivo de discutir o acesso e a permanência do


público LGBTQIAP+ nos espaços escolares ao evidenciar a homofobia como o principal
motivo para a evasão desses sujeitos da escola, destacando as possibilidades de
intervenção para a efetivação de uma escola inclusiva e sem homofobia.
Palavras-chave: Educação; Escola, Homofobia; Inclusão

Abstract: This article aims to discuss the access and permanence of the LGBTQIAP+
public in school spaces by highlighting homophobia as the main reason for the dropout
of these subjects from school, highlighting the possibilities of intervention for the
realization of an inclusive school without homophobia.
Keywords: Education; School, Homophobia; Inclusion

A escola enquanto espaço de formação e interação sociocultural, é também local


de disseminação de preconceitos e discriminação contra estudantes LGBTQIAP+
(lésbicas, gays, bissexuais, travestis, transexuais, transgêneros, queers/não binários,
intersexuais, assexuais, pansexuais e mais). Refletir sobre a escola e o cotidiano escolar
significa debater até que ponto as escolas estão prontas para receber, lidar e acolher
estudantes diversos que não se encaixam no padrão da heteronormatividade e do
binarismo de gênero, garantindo a estes sujeitos permanência no espaço escolar. É
possível uma escola sem homofobia? As escolas estão preparadas para receber
estudantes, professoras e professores LGBTQIAP+? Quais os limites e dificuldades
encontrados por estudantes LGBTQIAP+ para permanência nas escolas diante as
possibilidades de serem vítimas de preconceitos, discriminações e violências
homofóbicas?
Em 2016 o site “Nova Escola Gestão” publicou que cerca de 68% dos jovens
gays, lésbicas, travestis, transexuais e transgêneros já sofreram violência na escola

12
Professor da Rede Privada de Ensino. Graduado em História pela Universidade Estadual de
Feira de Santana (2013). Mestre em História pelo Programa de Pós Graduação em História
Regional e Local – Universidade do Estado da Bahia (2016).

44
provenientes de ataques homofóbicos, tanto por parte de outros estudantes, quanto por
atos de homofobia de funcionários, professoras e professores em direção a estas e
estes estudantes. Nota-se, dessa forma, que o problema da homofobia na escola denota
não apenas um reflexo social de violência e exclusão à comunidade LGBTQIAP+, mas
também um despreparo da equipe gestora, professoras, professores e funcionários em
lidar com a diversidade sexual e de gênero no ambiente escolar.
Este mesmo site aponta que os espaços mais propícios para a disseminação de
ataques homofóbicos na escola, ocorrem geralmente nas aulas de Educação Física e
no banheiro, fatores que foram compreendidos a partir do medo de estudantes
LGBTQIAP+ frequentarem essas aulas e ambientes. Para Claudiene Santos, Elaine
Souza e Joilson da Silva (2016), pesquisadoras e pesquisador de temáticas voltadas à
diversidade sexual e homofobia na escola, muitos educadores e gestores, encontram
dificuldades pessoais (religiosas e/ou princípios morais individuais) e de formação
acadêmica para lidar com a questão da diversidade sexual no ambiente escolar, o que
reitera e contribui significativamente para a homofobia na escola.
Ao invés de ser um lugar de combate ao preconceito, à discriminação sexual e
de gênero, as escolas são também espaços de propagação da homofobia, da
perseguição às pessoas que não atendem a demanda padrão da heterossexualidade,
fator que aponta a segregação, marginalização, exclusão e preconceito contra
estudantes LGBTQIAP+. Neste caso, contribuindo para déficit na aprendizagem dessas
e desses estudantes, como também sendo um aspecto relevante para a evasão de
pessoas LGBTQIAP+ do ambiente escolar.
A escola deveria ser um ambiente propício à orientação e cuidado direcionado
aos grupos marginalizados, buscando entender as especificidades e necessidades de
cada grupo social, especialmente de crianças e adolescentes, em fase de formação e
construção de suas identidades culturais, sexuais e de gênero. Porém, a escola acaba
se tornando um ambiente que promove a categorização dos sujeitos por hierarquias
excludentes, recortadas pela raça, pela cor, pela etnia, pela sexualidade e pelo gênero.
A ausência do debate de gênero e diversidade sexual nas escolas entre
estudantes, gestão, professoras, professores e demais membros do ambiente escolar,
contribui para a permanência dos ataques homofóbicos. Observa-se que se a equipe
escolar não se preocupa com a promoção da equidade de direitos em seu espaço
promovendo o respeito mútuo às diferenças, para que exista uma convivência
harmônica e respeitosa entre todas, todes e todos, esse ambiente se torna tóxico para
alguns sujeitos, pois, uma hierarquização balizada por maniqueísmos, pelo “certo ou

45
errado”, promove a não identificação de determinados sujeitos com aquele ambiente,
pois se um sujeito individual ou um grupo de sujeitos são perseguidos no espaço
escolar, a exemplo de pessoas LGBTQIAP+, isso pode gerar uma aversão a escola
acompanhada do medo de sofrer novas violências nesse espaço.
A Constituição Cidadã de 1988, em seu artigo 6º, legitima que a educação deve
ser garantida a todas, todes13 e todos os sujeitos, de modo que a escola em parceria
com o Estado, deve garantir acesso e permanência de toda, tode, todo e qualquer
cidadã/cidadão no ambiente escolar, porém, para além do documento escrito, isso não
é o que acontece no Brasil em relação a comunidade LGBTQIAP+, pois segundo
registros do jornal Correio Brasiliense, a discriminação rouba o direito de transexuais
permanecerem nas escolas. Ainda segundo o Correio Braziliense, uma pesquisa
conduzida pelo defensor público João Paulo Carvalho Dias, presidente da Comissão de
Diversidade Sexual da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB) em 2016, o país
concentra 82% da evasão escolar de travestis e transexuais, devido aos ataques
violentos sofridos no ambiente escolar. Deste modo, o direito ao acesso a educação e
permanência na escola, estabelecido pela Constituição de 1988, é negado a um
percentual elevado de pessoas transexuais e travestis que vivem no Brasil, o que
impulsiona a interrupção forçada dos estudos para essas/esses cidadãs e cidadãos,
como também tornam essas pessoas propícias à vulnerabilidade social e
marginalização.
Conforme informações obtidas no “Observatório da Violência” no site do
Sindicato dos Professores do Ensino Oficial do Estado de São Paulo, nota-se que 27%
de estudantes lésbicas, gays, bissexuais, travestis, transexuais e transgêneros já
sofreram violência no ambiente escolar. Os dados acima, catalogados em 2016
demonstram que as violências sofridas por pessoas LGBTQIAP+ nas escolas, não são
apenas simbólicas ou verbais, mas também são compostas por violências físicas e
psicológicas, afetando inclusive o desempenho dessas e desses estudantes com
relação à aprendizagem.
Diante os dados e argumentos apresentados acima, nota-se que a homofobia
pode ser combatida no espaço escolar, quando a demanda de uma “escola sem
homofobia” é pautada com a merecida atenção pela gestão, pelas professoras,

13
O uso do termo “todes” corresponde a uma linguagem mais inclusiva que objetiva respeitar as
identidades de pessoas não binárias aumentando a igualdade de gênero. Ou seja, indica uma
expressão neutra, não relacionada ao gênero masculino ou feminino, para evitar preconceito,
discriminação e exclusão.

46
professores, funcionárias, funcionários e demais estudantes. Para isso é necessário que
estudantes LGBTQIAP+ sejam todas, todes e todos ouvidos pela comunidade escolar
para que medidas de proteção, respeito, inclusão e adequação dos espaços físicos
sejam organizadas conforme as necessidades das pessoas LGBTQIAP+ que
frequentam as escolas, a exemplo da utilização do nome social nos documentos
escolares e da reformulação do uso dos banheiros.
É preciso que o corpo docente esteja aberto a formação continuada que deve
ser promovida pela gestão escolar para o aprendizado acerca da diversidade sexual e
de gênero, como também para atender as necessidades de estudantes LGBTQIAP+
quanto a possíveis conflitos relacionados à homofobia: violência simbólica, verbal ou
física. A escola enquanto espaço de formação deve e pode ser um espaço sem
homofobia, onde as pessoas LGBTQIAP+ encontrem acolhimento e tenham seus
direitos garantidos para que possam concluir as etapas na Educação Básica e Ensino
Médio. É imprescindível uma educação escolar de combate a homofobia, ao machismo,
sexismo e misoginia para a transformação social, para que no futuro, pessoas
LGBTQIAP+ não sejam parte dos grupos marginalizados que tiveram seus direitos
negados pelo Estado e pela Escola. Lutar por uma escola sem homofobia é obrigação
de toda a sociedade, na tentativa de construção de um mundo melhor em que pessoas
LGBTQIAP+ possam ser incluídas nos espaços de poder sem nenhuma desvantagem,
contribuindo para a construção da democracia e da cidadania no Brasil.

Referências

http://www.apeoesp.org.br/publicacoes/observatorio-da-violencia/27-dos-estudantes-
lgbt-afirmam-ja-terem-sido-agredidos-na-escola-aponta-pesquisa/

https://gestaoescolar.org.br/conteudo/1670/agressoes-ja-atingiram-68-dos-jovens-lgbt-
em-escolas

SOUZA, Elaine de Jesus; DA SILVA, Joilson Pereira; SANTOS, Claudiene. Diversidade


sexual e homofobia na escola: (des) conhecimento e vivências de docentes. In:
Revista Educação em Questão, Natal, v. 54, n. 41, p. 111-138, maio/ago. 2016

47
A IMPORTÂNCIA DE NOVAS METODOLOGIAS NO ENSINO DE HISTÓRIA

Karina da Silva Santos14


[email protected]
Mariana da Silva Oliveira15
[email protected]

Resumo: O presente trabalho tem como objetivo refletir sobre a utilização de novas
práticas metodológicas no processo de ensino-aprendizagem das aulas de História,
dinamizando as aulas durante o processo de aquisição de conhecimento.
Palavras-chave: Ensino de História. Dinâmicas. Metodologia.

Abstract: This paper aims to reflect on the use of new methodological practices in the
teaching-learning process of History classes, streamlining classes during the knowledge
acquisition process.
Keywords: History teaching. Dynamic. Methodology.

Introdução

O estágio é um campo de conhecimento, possibilitando a interação entre os


cursos de formação e os espaços profissionais, permitindo o desenvolvimento de novas
metodologias nas práticas educativas, e servindo inclusive, como atividades para
pesquisa. Nesse sentido, a docência é entendida como uma prática social, tendo como
objetivo fundamental a intervenção na realidade e criando possibilidades para o
processo formativo e humanizado dos sujeitos. (PIMENTA; LIMA, 2005/2006, p.6-7)

A profissão de professor também é prática. E o modo de aprender a


profissão, conforme a perspectiva da imitação será a partir da
observação, imitação, reprodução e, às vezes, da reelaboração dos
modelos existentes na prática, consagrados como bons. Muitas vezes
nossos alunos aprendem conosco, observando-nos, imitando, mas
também elaborando seu próprio modo de ser a partir da análise crítica

14
Graduanda da Universidade do Estado da Bahia–Campus XIV do curso de Licenciatura em
História.
15
Graduanda da Universidade do Estado da Bahia–Campus XIV do curso de Licenciatura em
História.

48
do nosso modo de ser. Nesse processo escolhem, separam aquilo que
considera adequado, acrescentam novos modos, adaptando-se aos
contextos nos quais se encontram (PIMENTA; LIMA, 2005/2006, p.7).

O contato com a sala de aula, proporciona refletir sobre as práticas pedagógicas


desenvolvidas nesses espaços e a importância de compreender a dimensão cultural,
social e econômica. Contudo, o momento do estágio também oportuniza analisar as
melhores formas para a aplicação das atividades, permitindo selecionar e readaptar os
materiais a serem utilizados, já que a observação a outros professores, possibilita
perceber lacunas que em diversos momentos não é possível ser identificados na prática.
A observação e integração ao espaço escolar possibilita perceber a importância
da relação entre escola e estudantes, em que as decisões não devem ser tomadas sem
justificativas, assim sendo possível o desenvolvimento de diálogos acerca dos
problemas apresentados. De acordo com Pimenta e Lima (2005/2006, p.9) o processo
educativo é complexo, e com isso se torna necessário que os profissionais dos espaços
escolares desenvolvam técnicas e habilidades para contornar as situações existentes,
compreendendo a importância da relação entre escola e comunidade para a criação de
uma sociabilidade.

[...] saber ouvir o que os alunos, como sujeito coletivo, têm a dizer. É a
partir desse momento que o professor pode estabelecer um diálogo
com o universo simbólico dos alunos, desvelando as suas falas, as
suas narrativas, a sua utopia, os seus sonhos, as suas necessidades,
as suas possibilidades e seus limites. Na condição de gestor/mediador
de identidades e subjetividades, o professor deve estar aberto a vários
níveis de escuta dos sujeitos da educação: [...] (FÁVERO SOBRINHO,
2010, p.13).

Para o desenvolvimento pedagógico, a escuta na sala de aula se torna


fundamental na busca por técnicas inovadoras, proporcionando o uso de novas
abordagens, com o intuito de dinamizar as aulas durante as aquisições de
conhecimentos, já que, a partir da análise de Fávero (2010, p.13) as opiniões se
expressam em diversas formas, tais como o silêncio, gestos ou até pelas vias verbais,
e assim devem estar atentas para identificar os anseios de cada um durante as aulas,
permitindo elaborar atividades que respondam positivamente as perspectivas dos
estudantes.
“A infância de quem trabalha desde muito cedo, vive nas ruas, tem acesso às
vivências reais desde muito cedo'' (FÁVERO SOBRINHO, 2010, p.2), a construção do
conhecimento e o acesso desses indivíduos à informação se inicia e solidifica desde

49
muito cedo, fazendo com que a construção identitária ocorra de maneira mais
independente e ao mesmo tempo igualmente relevante. Cada sociedade tem sua
dinâmica sociocultural construídas por sujeitos, em que as identidades se concretizam
por meio da diversidade sociais e culturais do cotidiano de cada indivíduo. (FÁVERO
SOBRINHO, 2010, p.3)

Para que estudar História?

O contato com a sala de aula nas aulas de História é comum a seguinte


indagação: para que saber do passado? Nesse sentido, se torna fundamental enfatizar
na sala de aula as narrativas dos fatos passados, pois de acordo com Bittencourt (2011,
p.142), a apresentação dos aspectos passados nos leva a refletir e interpretar os
significados, assim compreendendo as mudanças e permanências do contexto social.
O Ensino de História deve ser pensado numa perspectiva em que haja diálogo
entre as questões sociais, culturais e étnico raciais, em que as metodologias devem
utilizar técnicas que estimulem os alunos a interagirem e assimilaram os conteúdos com
temas ou situações cotidianas. Assim, as aulas devem ser elaboradas com o objetivo
de proporcionar aos estudantes a reflexão sobre as influências dos elementos históricos,
sejam eles econômicos, sociais e culturais, instigando a compreender os resquícios
presentes na formação da sociedade local, regional e mundial.
As instituições precisam se tornar espaços que tenham intenções educativas
com diversos objetivos, não centrando a aprendizagem apenas em conteúdo
específicos, pois a formação do sujeito deve ser algo contínua e permanente,
possibilitando as transformações sociais. Ferreira (2013, p.130) nos leva a refletir sobre
a necessidade de estabelecer diálogos entre passado-presente-futuro, já que a História
oferece elementos para que os indivíduos se orientem no tempo, entendendo como os
fatos passados influenciam na construção identitária.
Assim,
[...] a representação social ultrapassa essa atividade de conhecimento
prático e preenche igualmente uma função de comunicação. Ele
permite as pessoas inserir-se em um grupo e realizar trocas, intervindo
na definição individual e social, na forma pela qual o grupo se expressa
(BITTENCOURT, 2011, p. 236).

Nos inícios das aulas, é fundamental o levantamento de indagações para


perceber o conhecimento prévio dos estudantes, desenvolvendo diálogos que permitam
identificar as mudanças e permanências, porém evitando o anacronismo. O uso de

50
novas práticas metodológicas é indispensável no processo ensino aprendizagem. Para
isso, o(a) professor(a) deve aderir a constantes adequações das metodologias
utilizadas, sendo que o diálogo com a turma proporciona que a aquisição de
conhecimento ocorra de maneira horizontal. Como Fávero Sobrinho (2010, p.2) propõe
pensar as mudanças frequentes de comportamento dos indivíduos, os acessos a novas
tecnologias, em que a influência virtual proporciona que a criança experimente desde
muito cedo o acesso fácil a tudo. O que pode tornar a aprendizagem prazerosa ou
desestimulante a depender da metodologia aplicada.
Dinamizar o Ensino de História é torná-lo mais prazeroso, estimulando a
aprendizagem, dando espaço a novos experimentos e técnicas de ensino. O(a)
professor(a) na contemporaneidade deve estar aberto a novas técnicas de ensino, pois
o acesso às tecnologias e as facilidades que estas proporcionam, possibilita que os
alunos exijam que novos métodos sejam implantados para atender a novas perspectivas
que inspiram novos paradigmas à educação.
O Ensino de História é definido como um conjunto de múltiplas possibilidades,
aspectos e usos sociais de concepções históricas possíveis. Cabendo ao professor(a)
modificar suas práticas pedagógicas, desconstruindo os modos formais e
institucionalizados, criado para ações intencionais na educação, a fim de valorizar uma
determinada identidade.
O diálogo com os veículos ideológicos, tais como os meios de comunicação
midiática, nas aulas de História, proporciona problematizar os interesses de grupos
políticos, culturais e sociais dominantes, possibilitando aos estudantes aguçar a
consciência crítica, para que atrelado ao senso comum, proporcione aquisição de
conhecimento e capacidade de conhecer, analisar e transformar a sociedade que estar
inserido, preparando-os para atuar e viver criticamente na sociedade.
O desenvolvimento de jogos na sala de aula, sejam eles eletrônicos ou não,
desencadeia a participação ativa dos estudantes, assim possibilitando destrinchar
conceitos através das etapas do jogo, buscando desenvolver os argumentos para o
enfrentamento das perspectivas etnocêntrica. A utilização desses mecanismos nos
espaços escolares se torna fundamentais para descontruir visões discriminatórias
cotidianas, vivenciadas nas próprias escolas, já que “para alguns estudantes a escola é
um território de vivências de situações discriminatórias em maior grau que o espaço da
rua, trabalho e da própria comunidade” (FLEURI, 2003, p.26), ou seja, a escola é um
espaço multicultural, sendo necessário abordagem que compreenda os aspectos
sociais, culturais e econômicos dos sujeitos.

51
A música também é uma ferramenta metodológica fundamental para o
desenvolvimento de abordagens, incentivando a leitura e possibilitando um melhor
desenvolvimento na compreensão e interpretação, já que de acordo com Takahashi
(2004, p.116) são essas atividades que tornam a comunicação aberta e saudável, em
que uma única palavra pode instigar e despertar o estudante a participar e expressar de
acordo com suas concepções e conhecimentos prévios acerca do tema. Para utilização
desse recurso metodológico, é fundamental compreender o contexto socioeconômico
em que a letra foi escrita, os compositores envolvidos, já que são fatores que contribuem
para compreender o cenário social ao qual a música está se referindo.
Diante do exposto, observar que as metodologias empregadas ao Ensino de
História é um instrumento importante quando utilizadas de forma a despertar a
criticidade, é responsável por transformar os indivíduos comuns em cidadãos críticos
que buscam construir suas próprias histórias, não aceitando mais a história do outro
como um modelo a ser adequado e seguido, mas criar mecanismo para que os sujeitos
se proponham a fazer parte e construir a própria história. O professor de História deve
ser o agente transformador político, econômico, cultural e social dos sujeitos históricos
na construção social do indivíduo, com a utilização de metodologias que permitam
pensar a realidade e o cotidiano dos estudantes e consequentemente, o contexto que
influenciam suas ações na atualidade.

Referências

BITTENCOURT, Circe Maria Fernandes. Ensino de História: fundamentos e métodos.


São Paulo: Cortez, 2011.

FÁVERO SOBRINHO, Antônio. O ALUNO NÃO É MAIS AQUELE! E AGORA,


PROFESSOR? A transfiguração histórica dos sujeitos da educação. In: I SEMINÁRIO
NACIONAL: CURRÍCULO EM MOVIMENTO, nov, 2010, Belo Horizonte, Anais[...],
Universidade de Brasília.

FERREIRA, Marieta de Moraes. Aprendendo História: reflexão e ensino. 2.ed. Rio de


Janeiro: Editora FGV, 2013.

FLEURI, Reinaldo Matias. Intercultura e educação. Revista Brasileira de Educação.


n. 23, p. 16 – 35, maio/ Jun/ Jul/ Ago, 2003.

52
PIMENTA, Selma Garrido; LIMA, Maria Socorro Lucena. Estágio e docência: diferentes
concepções. Revista Poíesis, v. 3, n. 3 e 4, pp.5-24, 2005/2006.

TAKAHASHI, R.T.; FERNANDES, M.F.P. Plano de aula: conceitos e metodologia. Acta


Paul Enf. São Paulo, v.17, n. 1, p. 114-8, 2004.

53
SEÇÃO LIVRE

54
O INSTITUTO PLINIO CORRÊA DE OLIVEIRA E O NEOCONSERVADORISMO
CATÓLICO

Víctor Almeida Gama16


PUC - MG

Resumo: Este trabalho é uma compilação de notas para o estudo do Instituto Plinio
Corrêa de Oliveira e sua recente inserção no meio neoconservador e articulação com
outros movimentos semelhantes, que evidenciaria uma ruptura com seu próprio
passado.
Palavras-chave: Instituto Plinio Corrêa de Oliveira. Neoconservadorismo. Sociedade de
Defesa da Tradição, Família e Propriedade.

Abstract: This paper is a compilation of notes for the study of the Instituto Plinio Corrêa
de Oliveira and its recent insertion in the neoconservative environment and articulation
with other similar movements, which would evidence a break with its own past.
Keywords: Instituto Plinio Corrêa de Oliveira. Neoconservatism. Society for the Defense
of Tradition, Family and Property.

Introdução

O Instituto Plinio Corrêa de Oliveira é um movimento civil de inspiração católica


fundado em 2008 por remanescentes da Sociedade Brasileira de Defesa da Tradição,
Família e Propriedade, a TFP. Este foi um movimento idealizado e liderado por Plinio
Corrêa de Oliveira, ativista católico contra a reforma agrária, homem de ideais
reacionários, que teve papel importante na história política brasileira, especialmente no
período que antecede ao golpe militar até o final da década de 1980.
Em seu tempo, a TFP fez história como um importante movimento da direita
política e religiosa brasileira. Alinhada a um modelo de conservadorismo reacionário,
ela vê no comunismo o grande mal da contemporaneidade e da Igreja Católica e se
propõe a combatê-lo.
Os temas centrais da agenda e da reflexão da TFP foram ao longo dos anos o
comunismo, as questões morais como o divórcio, o aborto, casamento homossexual e

16
Doutorando em Ciências da Religião pela Pontifícia Universidade Católica de Minas Gerais,
professor de Sociologia da Religião no Seminário Provincial Sagrado Coração de Jesus.

55
o que compreendiam como a imoralidade dos programas de TV. Assuntos em completa
sintonia com os setores conservadores que também militavam por estas causas, muito
embora a TFP tivesse uma fundamentação privilegiadamente religiosa para suas ideias.
Em 1995 falece Plinio Corrêa de Oliveira, o fundador e líder. Com ele,
desaparecem muitos dos temas que eram importantes para o movimento e outros
perdem um pouco de seu lugar dentro da organização.
Ao mesmo tempo, com o vácuo deixado pelo líder falecido, se criava uma divisão
interna pela disputa do poder na organização, que resultou numa divisão da qual o IPCO
se pretende o herdeiro integral da TFP, sua ideologia e métodos de ação.

Neoconservadorismo católico

É importante identificar algumas características deste grupo que chamamos aqui


de neoconservadorismo católico. Dentro da tipologia da “direita católica” há um grupo
que surge mais recentemente, e que tem na internet o seu campo de ação principal.
Grupos formados em parte por jovens, que veem no conservadorismo sua nova
contracultura. São movimentos de inspiração católica, que compartilham uma visão da
realidade orientada sobretudo pelo escritor Olavo de Carvalho como liderança
intelectual e que repercutem certas ideias e autores do conservadorismo americano.
São grupos que apesar de sua filiação religiosa ao catolicismo, atuam
principalmente no campo político, mobilizando mídias, parlamento e até mesmo a
justiça, como no recente caso da decisão judicial que a pedido do Centro Dom Bosco,
grupo católico do Rio de Janeiro, obrigou que o movimento Católicas pelo Direito de
Decidir excluíssem a expressão “católicas” de seu nome (PINHONI; FIGUEIREDO;
STOCHERO, 2020).
É com movimentos como este que o IPCO se articula e trabalha em conjunto.
Em seu canal no Youtube, pode-se encontrar dois vídeos em parceria com o CDB. O
primeiro, uma entrevista com o monge beneditino Dom Justino, do mosteiro de São
Bento do Rio de Janeiro, em que fala-se sobre a construção de um mosteiro beneditino
segundo as práticas tradicionais do catolicismo no interior do Rio de janeiro, construído
com ampla participação e financiamento do Centro Dom Bosco. O segundo vídeo trata-
se de uma entrevista com Álvaro Mendes, vice-presidente do CDB. Antes disso, um
terço público foi empreendido pelos dois movimentos nas ruas da cidade do Rio.
(INSTITUTO PLINIO CORRÊA DE OLIVEIRA, 2020)

56
No próprio canal do CDB também se pode assistir a quatro vídeos de
conferências de Bertrand de Orleans e Bragança, membro do IPCO e da antiga família
real brasileira, tratando de temas religiosos como O reinado social de Jesus Cristo e O
retorno à cidade de Deus, uma alusão ao livro A cidade de Deus de Santo Agostinho.

Atuação

Com o passar do tempo e a diminuição do número de integrantes (PINHO, 2017),


o IPCO torna-se mais operante através do universo virtual. É na internet que
encontrariam o novo campo de ação sobre a opinião pública. Isso coincide também com
o modo de operação do neoconservadorismo político que no mesmo período do início
dos anos 2010 começa a surgir como um importante grupo organizado.
O IPCO mantém uma página virtual e um canal no Youtube por onde divulga
vídeos interpretando as informações e atualidades segundo sua visão. Especialmente
o canal do YouTube começa a ter uma atividade maior a partir de 2019, o que não deixa
de chamar a atenção. É este o período em que os canais de movimentos
neoconservadores como Centro Dom Bosco (CDB), Terça Livre e Brasil Paralelo
alcançam grande visibilidade.
A atuação do IPCO apresenta hoje ligeira alteração em relação à atuação da
antiga TFP. O movimento opera mais fortemente como um grupo de pressão
atualmente. Exemplo disso foram as votações dos Planos Municipais de Educação, o
PME, em 2015. (CALDEIRA; GAMA, 2019). Nas diversas cidades onde o IPCO possuía
representação, se fez presente durante as audiências, portando seus símbolos e
pressionando contra a introdução da educação sexual nos planos.
Mas não só os métodos de atuação são compartilhados com o
neoconservadorismo virtual, mas também há importantes cruzamentos ideológicos, que
fazem com que o IPCO vá se afastando da TFP enquanto sua matriz ideológica.
Acompanhando as tendências do neoconservadorismo, a ideia de marxismo cultural, -
termo muito divulgado por Olavo de Carvalho -, o IPCO reformula sua própria
compreensão do que é e de como atua o comunismo na atualidade.

57
O novo comunismo

Plinio Corrêa de Oliveira sempre compreendeu o comunismo como um


fenômeno em mutação, ou seja, que ele se apresentaria ao longo da história com
formatos e métodos diferentes com o passar do tempo (OLIVEIRA, 2009, p. 117)
Seguindo as teorias do dito marxismo cultural, o IPCO também acredita que o
comunismo aparece sob novas roupagens e métodos. A noção clássica do comunismo
como abolição do Estado e coletivização dos meios de produção é relida. Compreende
Olavo de Carvalho que na verdade o comunismo teria abandonado os métodos de luta
armada com os quais teria operado no Brasil pré ditadura e agora se expressaria de
outra forma.
Ele se daria agora numa manobra cujo objetivo seria mudar as convicções das
pessoas através da cultura, por aí tornando-as comunistas sem que elas se
apercebessem. Diz ele:

Estava portanto inaugurada, depois do marxismo clássico, do


marxismo soviético e do marxismo de Eduard Bernstein (o primeiro
tucano), a quarta modalidade de marxismo: o marxismo cultural. Como
não falava em revolução proletária nem pregava abertamente
nenhuma truculência, a nova escola foi bem aceita nos meios
encarregados de defender a cultura ocidental que ela professava
destruir. (CARVALHO, 2002)

Embora não oficialmente, esta é a compreensão de comunismo partilhada tanto


pelo neoconservadorismo conduzido pela figura de Olavo de Carvalho quanto pelo
IPCO, que vê no comunismo um fenômeno em permanente mutação. Ele hoje já não
seria o mesmo que até então a antiga TFP combatia: nada de luta armada, nada de
conquista do Estado. O comunismo vestia nova roupagem e possuiria nova aparência.
Em 2012, Bertrand de Orléans e Bragança publica um livro em que põe em
dúvida o aquecimento global, as discussões científicas mais atualizadas sobre o tema,
vendo no crescente movimento de preservação ambiental um mecanismo de limitar e,
por fim, extinguir a propriedade privada, considerada como direito sagrado e inalienável.
(BRAGANÇA, 2012)
Toda e qualquer política progressista como união civil homoafetiva, legalização
de drogas ou o próprio ambientalismo são compreendidos como recursos deste novo
formato de comunismo pulverizado para atingir e abalar as estruturas de uma sociedade
que para o IPCO, se basearia em fundamentos cristãos. O objetivo final seria, portanto,

58
destruir os rastros e permanências do cristianismo da sociedade, para aí então poder
implantar o tão desejado comunismo.
O IPCO não considera, porém, que o ocidente ao qual ele qualifica de “civilização
cristã” não foi formado exclusivamente a partir do pensamento cristão, mas também com
um pensamento em forte oposição ao cristão. Muitos dos valores que são caros a
sociedade atual que os deseja preservar surgiram, por exemplo, do Iluminismo, em
franca oposição ao pensamento católico.

Alinhamentos políticos

O Instituto Plinio Corrêa de Oliveira não deixa também de se aliar politicamente


a grupos e personagens da política nacional alinhados com este pensamento
neoconservador. O mais reconhecido, certamente, é o próprio presidente do Brasil eleito
em 2018, Jair Bolsonaro.
Parte significativa dos vídeos do canal IPCO no YouTube se referem a apoios,
ainda que eventualmente com pontuais discordâncias, ao presidente. Aproveitando-se
da movimentação conservadora na política nacional, busca alcançar penetração nos
espaços políticos com o apoio explícito ao presidente, em contraste com a atuação da
antiga TFP que em seus 60 anos de existência evitava tratar da política partidária e
manifestar apoio a políticos profissionais.
Em consonância com sua trajetória anti-esquerda, a TFP excepcionalmente
manifestou apoio apenas a Collor, nas eleições de 1989, no segundo turno, para evitar
que o candidato do Partido dos Trabalhadores, Luiz Inácio Lula da Silva, tivesse
vantagem. Sobre isso diz Plinio:

Em vista de tudo isto eu recomendava no manifesto, a todos os


eleitores com opiniões consonantes com as da TFP, que não dessem
seu voto a Lula. E que a alternativa era votar no candidato Collor.
Eu deixava bem claro que a meta da TFP não era oferecer votos a
ninguém. E que ela não via na candidatura Collor senão uma
contingência a ser aceita quase automaticamente pelo eleitor, quer
centrista, quer direitista, pois decorria de modo inexorável da
candidatura de Lula. (OLIVEIRA, 2015, p. 721)

Em seu caso, o IPCO assume quase que completamente a defesa do presidente,


de suas pautas e valores. Inclusive nas medidas negacionistas que dizem respeito à
pandemia de Covid-19, entendida pelo IPCO como um plano de dominação chinesa.
Pediam, inclusive, a reabertura das igrejas em meio à pandemia.

59
Também o filho do presidente, o deputado Eduardo Bolsonaro, foi convidado
pelo movimento para dar uma palestra em São Paulo, em maio de 2019, mostrando
uma inteira sintonia também com a ala política neoconservadora. (AÇÃO JOVEM DO
IPCO, 2019).

Conclusão

O neoconservadorismo católico surge como uma alternativa à velha direita


católica, já sem expressão. Ele é um projeto ético, político e religioso, que acaba tendo
o fator religioso apenas como fundo.
E nesta mudança, muitos movimentos da velha direita católica buscam se
adequar e se aproximar do neoconservadorismo como uma forma de sobreviver às
mudanças que ocorrem dentro dos meios da própria direita católica.
No desejo de não permanecerem como grupos rígidos, fixos e residuais, mudam
seus métodos de atuação, suas práticas e mesmo pontos importantes de sua própria
ideologia. É o caso do Instituto Plinio Corrêa de Oliveira, que com o tempo se afasta de
sua antiga matriz ideológica, a Sociedade Brasileira de Defesa da Tradição, Família e
Propriedade.
É a partir da sua inserção neste ambiente e no abandono das antigas práticas,
ideias e métodos que consegue alcançar uma maior penetração na opinião pública mais
conservadora no Brasil.

Referências

BRAGANÇA, Bertrand de Órleans. Psicose ambientalista: os bastidores do


ecoterrorismo para implantar uma “religião” ecológica, igualitária e anticristã.
Instituto Plinio Corrêa de Oliveira: São Paulo, 2012.

CALDEIRA, Rodrigo Coppe; GAMA, Víctor. Cruzada pela família: os métodos de


penetração no espaço público de um movimento católico. Revista Eclesiástica
Brasileira. Petrópolis:v. 79, n. 314 (set/dez 2019)

CARVALHO, Olavo. Do Marxismo Cultural. 8 de jun. 2002. Disponível


em:<https://olavodecarvalho.org/do-marxismo-cultural/>. Acesso em: 31 out. 2020.

60
AÇÃO JOVEM DO IPCO. Instituto Plinio Corrêa de Oliveira convida para palestra
sobre legítima defesa. São Paulo, Instituto Plinio Corrêa de Oliveira, 03 de maio de
2019. Disponível em: <https://ipco.org.br/video-convite-para-conferencia-eduardo-
bolsonaro-e-paes-de-lira//>. Acesso em: 31 de out. 2020

OLIVEIRA, Plinio Corrêa de. Minha vida pública: relatos autobiográficos de Plinio
Corrêa de Oliveira. Artpress: São Paulo, 2015.

OLIVEIRA, Plinio Corrêa de. Revolução e Contrarrevolução. Artpress: São Paulo,


2009.

PINHO, Ângela. Fundadores da TFP brigam com mais novos por brasão e
ideologia. São Paulo, VEJA São Paulo, 01 de junho de 2017. Disponível em:
<https://vejasp.abril.com.br/cidades/religiao-brigas-tfp-ipco-brasao/>. Acesso em: 31 de
out. 2020

PINHONI, Marina; FIGUEREDO, Patricia; STOCHERO, Tahiane. Justiça de São Paulo


proíbe ONG ‘Católicas pelo Direito de Decidir’ que defende aborto legal, de usar
‘católicas’ no nome. São Paulo, G1, São Paulo, 27 de out. 2020. Disponível em:<
https://g1.globo.com/sp/sao-paulo/noticia/2020/10/27/tribunal-de-justica-de-sp-proibe-
ong-catolicas-pelo-direito-de-decidir-que-defende-aborto-legal-de-usar-catolicas-no-
nome.ghtml>. Acesso em: 31 de out. 2020

61
O LUGAR DA SOBERANIA NA BIOPOLÍTICA DE MICHEL FOUCAULT E GIORGIO
AGAMBEN

José Luís Ferraro17


Pontifícia Universidade Católica do Rio Grande do Sul
[email protected]

Resumo: O presente ensaio visa discutir o lugar da soberania na biopolítica de Michel


Foucault e Giorgio Agamben. Para tanto, articula o tema do poder soberano com
conceitos relacionados à compreensão de biopolítica em ambos autores.
Palavras-chave: soberania; Michel Foucault; Giorgio Agamben.

Abstract: This essay aims to discuss the place of sovereignty in Michel Foucault and
Giorgio Agamben biopolitics. To this end, it articulates the theme of sovereign power with
concepts related to the understanding of biopolitics in both authors.
Keywords: sovereignty; Michel Foucault; Giorgio Agamben.

O termo biopolítica, cunhado pelo filósofo francês Michel Foucault, marca a


associação do fator biológico ao conceito de poder relacionando-se ao governamento
dos vivos. Trata-se de um biopoder como um conjunto de técnicas e procedimentos que
se exerce por meio de dispositivos – tecnologias de poder – sobre aquilo que se
convencionou chamar de população. Assim, o biopoder se converte no meio pelo qual
a biopolítica é exercida, tendo a população como seu alvo (FOUCAULT, 2008a; 2008b).
Foucault desenvolve suas percepções sobre a biopolítica quando propõe o
estudo em torno da governamentalidade. Governar é conduzir condutas; logo, não se
trata, agora, dos mecanismos disciplinares até então discutidos pelo autor e que tinham
o corpo como território do exercício de um poder que desejava corrigi-lo. O objetivo
desloca-se do corpo individual ao corpo social, garantindo uma melhor circulação de
coisas e pessoas em um espaço previamente organizado pela distribuição disciplinar
(FOUCAULT, 1999; 2008a).
Nesse contexto, serão os dispositivos de segurança – a inserção de eventos
(in)desejáveis no interior de um cálculo de risco – que irão possibilitar a antevisão ou
previsibilidade de acontecimentos prováveis, contabilizados pela média de sua

17
Doutor em Educação. Professor dos Programas de Pós-Graduação em Educação e Educação
em Ciências e Matemática da Pontifícia Universidade Católica do Rio Grande do Sul (PUCRS).

62
ocorrência e/ou recorrência. A reorganização das formas de circulação visa produzir um
estado de normalização desejável a partir de parâmetros aceitáveis (FOUCAULT,
2008a).
É assim que a partir do século XVIII que, segundo Foucault, os governantes
passaram a atuar cuidando da população, transformando espaços a partir da
instauração de novos regimes de circulação dos indivíduos 18, para que não haja
exposição dos mesmos a riscos desnecessários. Na pior das hipóteses – com a
continuidade dos riscos –, que os mesmos possam ser diminuídos pela intervenção
após um olhar atento e vigilante do governante (FOUCAULT, 2008a). A vigilância desde
o poder disciplinar19, continua a exercer um papel fundamental no governamento da
população; agora ampliada, é compreendida como surveillance – um estágio
aprimorado da vigilância e suas tecnologias – na sociedade de controle20 (DELEUZE,
1992).
Caso, risco, perigo e crise; um escalonamento que corresponde a diferentes
dimensões as quais um governante pode ater-se para analisar o avanço de
determinados acontecimentos e desenhar possíveis intervenções biopolíticas para que
o cuidado com a população de fato se materialize e se efetive a partir do imperativo
“fazer viver”. A vigilância em relação a identificação dos casos para posteriormente –
individualmente para cada caso – calcular os riscos e, então, averiguar os perigos
associados e um potencial desencadear de uma crise (FOUCAULT, 2008a).
Para ilustrar, Foucault em Segurança, território e população (FOUCAULT,
2008a), apresenta o exemplo da epidemia de varíola na Inglaterra entre os séculos XVII
e XVIII. As práticas de imunização como estratégias biopolíticas, foram essenciais para
que o número de casos diminuísse. Assim, foi essencial para que a crise em decorrência
do espalhamento do contágio pudesse ser evitada.
O fato é que a emergência de um discurso biopolítico fez despertar a
necessidade de um saber sobre a população. Ao longo do século XVIII foi necessário

18
Os regimes de circulação correspondem aos modos como governantes passam a determinar
a circulação de pessoas e coisas em determinado território. A garantia da “boa circulação” faz
parte da ação daqueles que governam as populações, tema central da biopolítica foucaultiana.
19
O poder disciplinar é o poder que se exerce sobre os corpos dos indivíduos com a finalidade
de corrigi-los. O disciplinamento dos corpos depende da vigilância que se exerce sobre os
mesmos para que, assim, se possa intervir através de sanções que normalizem gestos, ações,
comportamentos em um nível individual.
20
A sociedade de controle, segundo Gilles Deleuze, consiste em uma derivação da sociedade
de disciplinar. Enquanto nesta o poder se produz e circula a partir de práticas institucionalizadas
– confinando os indivíduos –, na sociedade de controle o poder não necessita do confinamento
institucional, sendo utilizadas tecnologias para controlar indivíduos de maneira remota, mas
oferecendo aos mesmos uma sensação de liberdade.

63
esboçar pesquisas censitárias para averiguar os modos de vida das populações na
Europa: conhecer as taxas de natalidade, mortalidade, os números relacionados às
doenças e a distribuição geográfica dos casos etc. Surge a necessidade de analisar
séries específicas referentes à população que são de interesse do Estado; surge a
estatística, em espanhol “estadística” – uma ciência que insere os acontecimentos
relacionados à população em uma lógica numeramentalizada.
Ainda, dois séculos antes, ao longo do século XVI como nos mostra o autor
francês, o governamento da população se converte em um dos temas mais importantes
discutidos. Nesse período são publicados uma série de tratados políticos, cada um deles
compreendido como uma diferente arte de governar (FOUCAULT, 2008a). Governar a
si mesmo, governar a família, governar as crianças, governar o Estado. Múltiplas formas
de governamento foram debatidas exaustivamente; neste caso, na esfera da moral, da
economia, da pedagogia e da política, respectivamente.
Entre elas, Maquiavel aparece dando conselhos ao príncipe (MAQUIAVEL,
1976). Sua obra consiste em auxiliar um príncipe imaginário a estreitar os laços entre
este governante e seu principado. Tratava-se de fazer o mesmo ser aceito pela
população que agora, por ele, passa a ser governada, já que o mesmo a transcende por
não se tratar de uma relação orgânica natural – considerando que o principado tende a
ser herdado, comprado, mas geralmente é conquistado por meio da imposição de certa
violência referente à subjugação inerente ao ato da conquista.
Nessa perspectiva, a partir da fragilidade da relação príncipe-principado, o
soberano compreende que é este ponto que tende ser o alvo dos ataques de seus
inimigos para desestabilizar o seu governo. Logo, uma intervenção inimiga que abalasse
tal relação, dificultaria que a população endossasse suas práticas e seu nome como seu
governante legítimo. Assim, Maquiavel sugere ao príncipe que se dedique a um governo
político – o que significa colocar o bem comum acima de qualquer moral, valorizando a
população, focando em seu bem-estar. Se os súditos compreendessem a dedicação do
governante à população, poderia tranquilizar-se para sair a conquistar mais territórios
ampliando seu poderio e a força política de seu governo (FOUCAULT, 2008a;
MAQUIAVEL, 1976).
O que se coloca aqui é, claramente, o problema da soberania. Foucault evidencia
um Maquiavel que exerce cada vez menos seu poder pela força e pela violência e opta
por uma biopolítica do cuidado. O filósofo francês assinala que com o desfazimento do
sistema feudal houve uma transição do soberano – que dispunha do poder de vida e

64
morte – para o governante que deveria fazer viver; um governante cuja finalidade é
sempre o governo da população (FOUCAULT, 2008a).
No entanto, a soberania é vista de maneira distinta quando se trata de perceber
a compreensão biopolítica que nos é oferecida por Giorgio Agamben em relação a
Michel Foucault. Para Agamben, não há esse abandono da soberania na transição das
formas de governo. Os governantes modernos e contemporâneos permaneceram
dispondo de um poder soberano. Segundo o autor italiano, o exercício deste poder
consiste na possibilidade de exposição dos indivíduos, ou seja, da população, à
violência: seja ela física ou simbólica (AGAMBEN, 2002; 2004; 2008).
A implicação de um governar pela violência que está no cerne da soberania é a
produção de um estado de exceção que se configura pela suspensão de direitos. Isso
significa que durante o estado de exceção há a impossibilidade do exercício pleno e
efetivo de direitos, tendo em vista às restrições impostas à população. A exceção se
produz como captura do sujeito para o interior de uma realidade violenta de degradação
das formas de vida, pois aos sujeitos é oferecido um mínimo para sua sobrevivência. O
“fazer viver” como compromisso político do governante para com a população agora se
transfigura em sobrevida; na sobrevivência que oferece o mínimo para uma vida
degradante (AGAMBEN, 2002; 2004; 2008).
A violência do poder soberano observada na organização das sociedades
neoliberais retira as potências da vida reduzindo os seres vivos a um mínimo biológico.
A perda da dignidade humana acompanha a dessacralização da vida e produz aquilo
que Agamben denominou de vida nua. A vida nua é a vida matável. É uma vida protegida
como bem jurídico, tutelada pelos direitos humanos e, portanto, não sacrificável, mas
uma vida matável por ser uma vida sem valor, ou com valor reduzido (AGAMBEN, 2002).
Na sociedade de controle, quando se fala na gestão dos indesejáveis,
geralmente se está fazendo referência à vida nua, àquela que pode ser aniquilada, tal
qual nos campos de concentração, onde os prisioneiros sofriam diariamente os efeitos
do poder soberano sobre seus corpos e comportamentos, de um estado de exceção
que os objetifica e que os lança sua própria sorte, tal qual o Homo sacer21,
personificação da vida nua (AGAMBEN, 2002). Na Roma antiga, com a perda de seus
direitos por ter ameaçado a Pax Deorum, o Homo sacer estava consagrado aos deuses;

21
O Homo sacer corresponde ao “homem sagrado”. Tendo realizado algum ato que pudesse
ameaçar a Pax Deorum, um pacto entre os deuses e os humanos, sua consagração diz respeito
ao fato de ser entregue aos deuses, lançado assim à sua própria sorte; deixado à mercê da
vingança divina. Nesse sentido, torna-se sagrado, em sentido negativo. Por ameaçar a paz entre
humanos e divindades, perdia seus direitos e tornava-se uma vida sem valor, matável.

65
no entanto, se alguém o assassinasse não seria punido, pois consistia na personificação
da vida nua (AGAMBEN, 2002).
A crítica de Agamben em relação à política está direcionada, exatamente, ao
exercício político. Proposições reformistas, como as que temos vistos na atualidade –
que retiram direitos da população como as reformas trabalhista e da previdência –,
coadunam com a ideia de exposição da população a um tipo de violência simbólica que
produz a vida nua como modo existencial da classe trabalhadora, cada vez mais
mergulhada em condições aviltantes de sobrevivência. Reafirma-se, assim, a soberania
que produz a exceção e – em seu interior – o paradoxo do poder que acompanha as
decisões do soberano, onde ao mesmo tempo percebemos a in/exclusão da vida,
atribuindo a ela, simultaneamente, um (des)valor (AGAMBEN, 2002; 2004).
Na ordem política de exercício da soberania, ainda, outro paradoxo se produz,
segundo Agamben: o posicionamento concomitantemente exterior e interior do
governante em relação à lei. Interior porque o mesmo tem o poder de jurisdição, ou seja,
de dizer o direito em relação à população que governa (AGAMBEN, 2002). A jurisdição
consiste em fazer valer a vontade do soberano em relação ao modo como ele
quer/deseja que as coisas sejam reguladas. No entanto, para a manutenção da lei, o
soberano deve contar com as instituições.
Por estar em uma posição exterior no que tange à manutenção desse direito, ele
precisa estabelecer uma espécie de relação obrigatória e positiva com personagens
específicos: trata-se de uma simbiose com os representantes institucionais de um país:
outros membros do executivo, com o legislativo, com o judiciário, peritos e expertos nas
mais diversas áreas (AGAMBEN, 2004). Trata-se de esboçar uma articulação política
que lhe permita garantir o funcionamento da ordem jurídico-legal de acordo com seus
desígnios.
Esse movimento, muitas vezes, produz uma falsa impressão de jogo
democrático ao normalizar determinadas relações entre personagens políticos que não
consideradas republicanas. Evidencia-se uma banalização da soberania o que produz
em muitos governantes a crença de que detêm um poder ilimitado e que pode ser
colocado acima de qualquer coisa, inclusive do Estado de Direito. Destarte, opera-se
uma normalização da violência como forma de governo observada pela truculência e
pela indigência das políticas e das intervenções governamentais que passam a constituir
formas de governos totalitárias que produzem a exceção cada vez mais como uma
tecnologia do poder soberano.

66
Na análise biopolítica que pode ser realizada entre Foucault e Agamben existe
entre ambos uma divergência marcada pela percepção em torno da soberania.
Enquanto que para Foucault a soberania continua se exercendo em termos de uma
relação de governamento que perdura entre governante e população relacionada ao elo
entre ambos, que permite que o primeiro exerça o biopoder sobre a segunda; em
Agamben a soberania é elemento intrínseco ao poder político e está associada à
possibilidade vil e repressiva sob forma de intervenção soberana.
Não se trata, neste breve ensaio, de confrontar autores para que se possa adotar
um posicionamento que exprima algum juízo de valor que, por sua vez, exija um
posicionamento maniqueísta em relação à biopolítica entre Foucault e Agamben –, mas
de perceber duas importantes leituras de realidade que, na contemporaneidade, nos
permitem compreender distintos cenários políticos e suas tramas, bem como as
complexas tomadas de decisão dos governantes na esfera pública.
Por fim, problematizar o lugar da soberania no interior da política e do fazer
político, consiste em perceber que não há rompimento entre esta e a biopolítica;
evidenciada como forma de resistência ao próprio poder soberano que pouco nos
oferece, diminuindo as potências da vida. Passamos, assim, a colocar sob suspeita toda
e qualquer forma de governamento, ao mesmo tempo em que se produz em nós um
despertar crítico em tom de insubmissão (FOUCAULT, 1990), momento a partir do qual
nos questionamos em relação às formas como nos estamos deixando governar. A crítica
e as contracondutas como resistência biopolítica se convertem nos pulsos de uma
população que, ainda, pulsa.

Referências

AGAMBEN, Giorgio. Homo sacer: o poder soberano e a vida nua. Belo Horizonte:
Editora UFMG, 2002.

______. Estado de exceção [Homo Sacer, II, I]. São Paulo: Boitempo Editorial, 2004.

______. O que resta de Auschwitz: o arquivo e a testemunha [Homo sacer III]. São
Paulo: Boitempo Editorial, 2008.

67
DELEUZE, Gilles. Sobre as Sociedades de Controle Post-Scriptum. In: DELEUZE,
Gilles. Conversações. São Paulo: Editora 34, 1992.

FOUCAULT, Michel. Qu'est-ce que la critique? Critique et Aufklärung. Bulletin de la


Société française de philosophie, Vol. 82, nº 2, pp. 35 - 63, avr/juin 1990.

______. Vigiar e punir. 21. ed. Petrópolis: Vozes, 1999.

______. Segurança, território e população. São Paulo: Martins Fontes, 2008a.

______. Nascimento da biopolítica. São Paulo: Martins Fontes, 2008b.

MAQUIAVEL, Nicolau. O Príncipe. Rio de Janeiro: Editora Civilização Brasileira, 1976.

68
OS DESAFIOS PARA A CONSTRUÇÃO DE UM MUNDO MAIS
EQUILIBRADO E JUSTO EM UM CENÁRIO PÓS-PANDEMIA

Leonardo Freire Marino22


[email protected]

Resumo: O presente ensaio tem como objetivo traçar um cenário pós-pandêmico,


apontando de que forma as medidas adotadas para atenuar os efeitos da pandemia
poderão influenciar o aprofundamento dos problemas sociais ou contribuir para a
superação dos mesmos.
Palavras-Chave: pandemia; impactos socioespaciais; pós-pandemia.

Abstract: The present essay aims to outline a post-pandemic scenario, pointing out how
the measures adopted to mitigate the effects of the pandemic may influence the
deepening of social problems or contribute to overcoming them.
Keywords: pandemic; socio-spatial impacts; post-pandemic.

Introdução

Vivemos um momento de grandes transformações socioespaciais. Parte dessas


transformações está diretamente vinculada a disseminação do Sars-CoV-2 pelo globo
terrestre. A circulação do vírus, o elevado número de óbitos, são marcas do momento
atual e determinaram diversas medidas com o objetivo de controlar a disseminação do
vírus. Tais medidas têm produzido impactos em nosso cotidiano e gerado profundas
discussões a respeito das suas consequências em um futuro próximo.
Neste curto ensaio, buscarei discutir de que forma o momento atual,
caracterizado pela adoção de medidas com o objetivo de reduzir a disseminação do
vírus, poderá influenciar o as relações socioespaciais nos próximos anos. Michel
Foucault (2019), aponta que a produção de discursos a respeito da realidade,
especialmente quando os discursos são construídos com base em uma reconhecida
racionalidade, constitui um exercício de poder. O poder é exercido de diversas maneiras,
entre as quais merece destaque a construção de narrativas a respeito do mundo em

22
Mestre e Doutor em Geografia pela Universidade Federal Fluminense (UFF). Professor Adjunto
da Universidade do Estado do Rio de Janeiro (UERJ)

69
que vivemos. A construção de narrativas, de formas de descrever a realidade que
estamos inseridos, constitui uma forma de intervenção no presente, uma vez que
interfere nos processos sociais que ainda não se consolidaram.
O futuro é uma construção em aberto. Contudo, as condições futuras não se
materializam por acaso, elas se concretizam com base em procedimentos e artefatos
pensados e estabelecidos em uma realidade objetiva. É com base nesta afirmativa que
propomos a presente discussão. Acredito que alguns aspectos da conjuntura atual
apontam para mudanças sociais em um futuro próximo e que, por esta condição,
precisam ser objetos de análises no presente. Por esta característica, não pretendo
apresentar considerações definitivas, mas elencar possibilidades e apontar campos que
se encontram abertos e que devem ser disputados pelos atores sociais que buscam a
construção de uma sociedade mais equânime e justa.

A pandemia e as transformações sociais

No dia 11 de março de 2020, a Organização Mundial da Saúde, classificou a


disseminação do Sars-CoV-2 como pandemia. Neste momento, aproximadamente um
terço da população mundial iniciou um gradativo processo de quarenta e isolamento
social. Acredito que a orientação mundial para o isolamento social apontou o início de
um processo de grandes transformações socioespaciais. No entanto, as transformações
ainda não se consolidaram, estamos inseridos em um momento marcado por estruturas
pré-pandêmicas e a adoção de soluções para atenuar os efeitos da pandemia.
A história demonstra que os períodos marcados por pandemias foram
determinantes para a consolidação do mundo atual. Neste sentido, a seguir
apresentaremos algumas das medidas adotadas para o enfrentamento dos efeitos da
pandemia que podem culminar com profundas mudanças socioespaciais. Vale ressaltar
que cada uma delas apresenta possibilidades positivas e negativas, o que aponta a
existência de campos em aberto, de arenas de disputa social que podem determinar a
construção de um mundo mais equânime e equilibrado ou o aprofundamento de nossas
desigualdades.
Entre as possíveis consequências do isolamento social, podemos destacar as
mudanças nas dinâmicas de trabalho e a consolidação de novos espaços de labor. O
cenário atual aponta que as tecnologias digitais utilizadas durante a pandemia não serão
abandonadas em um futuro próximo. As atividades remotas e os espaços destinados
para a sua realização deverão pautar as condições de trabalho e um mundo pós-

70
pandemia. Esta condição poderá apontar para um mundo melhor ou pior? Essa resposta
não se encontra encerrada e dependerá da forma como empregaremos as tecnologias
no mundo do trabalho. O distanciamento poderá acirrar as desigualdades de gênero e
salariais, ampliando a fragmentação social e a desvalorização da mão-de-obra feminina.
Além disso, o distanciamento social poderá desencorajar as manifestações políticas em
espaços públicos e reduzir as possibilidades de construções de pautas unificadas. Por
outro lado, a realização das atividades laborais de maneira remota reduzirá o tempo
gasto com deslocamentos, diminuindo os engarrafamentos, a possibilidade de
acidentes de trânsito e a emissão de poluentes na atmosfera. Além disso, a flexibilização
dos horários para a realização das atividades laborais poderá garantir aos indivíduos
um maior tempo para o seu lazer, para a convivência comunitária e familiar e,
especialmente, para a construção de hábitos mais saudáveis, como por exemplo, a
realização de atividades físicas.
O pensador estadunidense Richard Sennett (2020), destacou que o mundo
pós-pandemia será marcado por grandes desafios em relação ao planejamento urbano,
sobretudo em relação as regiões urbanas centrais, tradicionalmente, marcadas por
grandes adensamentos populacionais. Para Sennett, a concentração populacional
representa um bom princípio ecológico e social, uma vez que reduz os gastos para a
construção de infraestruturas e possibilita um maior contato social. No entanto, para
prevenir ou reduzir os impactos de futuras pandemias, certamente, as cidades passarão
a apresentar uma nova configuração. Será preciso encontrar um equilíbrio entre as
concentrações de residências e de habitantes com a disponibilidade de equipamentos
urbanos e de atividades econômicas. No mundo pós-pandêmico, a preocupação com o
estabelecimento de uma arquitetura que não possibilite a propagação de doenças
ocupará um lugar central no planejamento das cidades.
O medo do contágio não desaparecerá e continuará a norteando parte dos
hábitos sociais. A tendência é que os contatos físicos sejam reduzidos e que nossas
relações sociais não voltem mais a apresentar o padrão que existia no período que
antecedeu a pandemia. Para o sociólogo Dacher Keltner (2003), a redução do contato
físico provocará alterações no senso de confiança e nas conexões entre os indivíduos.
Para ele o contato físico é responsável pela construção de relações de cooperação e a
sensação de pertencimento a uma comunidade. A permanência de medidas de
isolamento alterará de forma considerável esta dinâmica. Somos criaturas sociais e por
esta condição acredito que estabeleceremos novas formas para mantermos nossos
contatos e relações sociais. No entanto, não podemos esperar que as novas relações

71
se estabeleçam nas mesmas bases de confiança e solidariedade que existiam no
período pré-pandêmico. Corremos o risco de construirmos sociedades que aprofundem
o individualismo, o exclusivismo espacial e o desprezo a vida dos diferentes.
O receio pelo contágio e, especialmente, pela circulação de pessoas
contaminadas nos espaços urbanos, tem levado a ampliação dos mecanismos de
controle social. Esses mecanismos procuram evitar a disseminação do vírus e,
consequentemente, a ampliação do número de óbitos. Hoje, em diversos espaços
existem mecanismos e medidas de controle que podem provocar graves prejuízos a
privacidade dos indivíduos. Em alguns países da Ásia as pessoas estão sendo
monitoradas por governos, empresas privadas e pesquisadores da área de saúde.
Como consequência do monitoramento, os cidadãos, muitas vezes sem consentirem,
tem seus passos rastreados por sofisticados sistemas de georreferenciamento. O
filósofo Byung-Chul Han (2020), alerta para o risco da implementação de um regime de
vigilância tecnológica permanente. Para Han, o big-data cada vez mais constituíra o
principal mecanismo de controle das populações, aspecto que indicaria o soerguimento
de uma psicopolítica que, entre outros objetivos, buscará influenciar o pensamento e as
emoções dos cidadãos.
Em relação aos sistemas de ensino, as medidas adotadas para atenuar os
efeitos da pandemia determinam o fechamento das escolas e o estabelecimento de
processos formativos de maneira remota. Neste cenário, ampliamos a utilização das
redes informacionais nos sistemas de ensino e a tendência é que estes recursos
continuem a ser amplamente utilizados em um mundo pós-pandemia. Alguns aspectos
deste novo cenário indicam questões preocupantes, como por exemplo, o
aprofundamento das desigualdades nos processos formativos, com a ampliação do
abandono dos alunos que apresentem necessidades especiais, dificuldades de
aprendizagens e/ou limitações de acesso as novas tecnologias digitais. A consolidação
do ensino remoto poderá tornar o acesso aos processos formativos e a educação de
qualidade uma exclusividade ainda maior dos grupos mais abastados. No entanto, outra
possibilidade existe, a ampla utilização das redes informacionais nos processos
formativos, podem ampliar o acesso a diversos saberes para um número cada vez maior
de indivíduos. São incontáveis os recursos formativos que podem ser disponibilizados
nas redes informacionais. Hoje, vivenciamos este processo, uma vez que o isolamento
não produziu o imobilismo e observamos a multiplicação de lives, seminários, tutoriais,
e-books e cursos online na rede mundial de computadores.

72
O mundo pós-pandêmico certamente será diferente do que foi antes da
pandemia. Corremos o risco de que os mecanismos que procuram atenuar os efeitos
da pandemia, consolidem uma ordem social ainda mais desigual, marcando um mundo
pautado pelo exclusivismo e pela fragmentação social. Naomi Klein (2008), em seu livro
‘Doutrina do Choque’, reforça a ideia de que os momentos de crise favorecem o
estabelecimento de novas formas de exercício do poder. Contudo, passado o choque,
o medo inicial, as soluções pensadas e estabelecidas ganham concretude e assumem
uma disposição permanente. Vivemos este processo, ainda estamos inseridos na crise
e, por esta condição, ainda estamos em choque. No entanto, não podemos abandonar
as discussões que envolvem a adoção de mecanismos que buscam atenuar os efeitos
da pandemia. Sempre existem outras possibilidades e elas passam pela forma como
adotamos as soluções no presente.

Considerações finais

A conjuntura atual, nos impõe o desafio de governarmos as tecnologias. As


desigualdades são multidimensionais e muitas vezes observarmos e enfrentamos
apenas uma das dimensões da desigualdade. O desafio é reduzirmos a desigualdade
em sua multidimensionalidade e democratizarmos o acesso ao conhecimento, a cultura
e, por conseguinte, as novas tecnologias e modos de vida. A maior parte das medidas
adotadas para atenuar os efeitos da pandemia não estão sendo pautadas em medidas
que contribuam para a superação de nossas contradições.
Precisamos repensar maneira radical os processos que podem apontar a
ampliação das desigualdades sociais. Hoje, uma parte da humanidade incorporou de
maneira efetiva o distanciamento social, porém outra parte seguiu vivendo em um
mundo pré-pandêmico. O isolamento social, a realização da quarentena não foi uma
condição democratizada, pelo contrário, foi um privilégio dos grupos sociais mais
abastados que puderam se isolar em suas residências e continuaram sendo atendidos
pelos indivíduos mais empobrecidos. O distanciamento social representou um marcador
de status social, um identificador das desigualdades sociais simbolicamente
manifestadas em nosso cotidiano.
No mundo pós-pandêmico, corremos o risco de construirmos relações sociais
ainda mais marcadas pelo exclusivismo social, pela privatização da vida cotidiana e por
sistemas de vigilância que reduzirão ainda mais as possibilidades de contato social. É
preciso imaginarmos um mundo socialmente mais justo. Se os discursos não apenas

73
retratam fragmentos da realidade, mas também projetam uma realidade futura, é
urgente que outras narrativas sejam criadas e que as medidas que buscam atenuar os
efeitos da pandemia sejam avaliadas e, quando necessário, corrigidas.

Referências

FOUCAULT, M. A Ordem do Discurso: aula inaugural do Collège de France. São


Paulo: Edições Loyola, 2019.

HAN, B. La révolution virale n’aura pas lieu. Journal Libération. Disponível em:
https://www.liberation.fr/debats/2020/04/05/la-revolution-virale-n-aura-pas-
lieu_1784260. Acessado em 20/10/2020.

KELTNER, D., GRUENFELD, D. H., ANDERSON, C. Power, Approach, and


Inhibition. Psychological Review, 2003, 110 (2), pp. 265–284.

KLEIN, N. A Doutrina do Choque: a ascensão do capitalismo de desastre. Rio de


Janeiro, Nova Fronteira, 2008.

MARINO, L. Reaprendendo a Ensinar e Aprender. Revista Biblioo Cultura


Informacional. Disponível em: https://bityli.com/Ek38L. Acesso em 25/10/2020.

SENNETT, R. El futuro después del coronavirus. Jornal El País. Disponível em:


https://elpais.com/especiales/2020/coronavirus-covid-19/predicciones/hacia-ciudades-
de-15-minutos/. Acessado em 20/10/2020.

74
RELATOS DE EXPERIÊNCIAS
DOCENTE

75
FEIRA DOS SABERES: UMA EXPERIÊNCIA DE INTERDISCIPLINARIDADE E
ENSINO REMOTO

Arthur Oliveira da Silva23


Professor de História da Fundação Educacional Machado Sobrinho
[email protected]
Marianna Panisset Pedreira Ferreira Ribeiro24
Coordenadora de Informática da EDUTEC
[email protected]

Resumo: Este artigo tem como finalidade relatar uma experiência didática,
interdisciplinar, intitulada como Feira dos saberes, que aconteceu no período de aulas
remotas devido a Pandemia do COVID-19. Esta experiência foi desenvolvida na
Fundação Educacional Machado Sobrinho, uma escola particular de Juiz de Fora, com
o Ensino Fundamental II.
Palavras-chave: ensino remoto; interdisciplinaridade; Feira dos Saberes

Abstract: This article aims to report a didactic and interdisciplinary experience, entitled
as "Feira dos Saberes". It took place in the period of remote classes due to COVID- 19
pandemic. This experience was developed at Fundação Educacional Machado
Sobrinho, a private school in Juiz de Fora with elementary school students.
Keywords: remote teaching; interdisciplinarity; Knowledge Fair

Introdução

Em março deste ano, para amenizar os impactos gerados pelo novo coronavírus
o Ministério da Educação permite a adoção do ensino remoto em substituição das aulas
dos cursos presenciais, considerando que os dias letivos e hora-aula deveriam ser
trabalhados integralmente. Entre dúvidas e receios, os ambientes educacionais
passaram a vislumbrar nesse modus operandi circunstancial para a manutenção da
vinculação dos educandos com o ambiente escolar. Em junho deste ano, foi publicada

23
Licenciatura em História pelo Centro de Ensino Superior de Juiz de Fora e pós-graduado em
Estudos do Lazer pela Universidade Federal de Minas Gerais.
24
Graduada em Pedagogia, Licenciada em Computação e pós-graduada em Psicopedagogia e
Educação à distância.

76
no Diário Oficial a Portaria do MEC nº 544, que trata da substituição das aulas
presenciais por aulas em meios digitais, enquanto durar a situação de pandemia da
Covid-19, revogando as portarias 343 e 345/2020, que tratavam do assunto. Os
parâmetros sociais, econômicos, culturais foram estremecidos e modificados, nos
inserindo inevitavelmente dentro de uma nova realidade, agora comumente expressada
pelo jargão “novo normal”. Para educandos, pais, responsáveis, educadores e todos os
elementos que compõe o complexo processo escolar não foi diferente, o quarto do casal
se transformou em escritório, a cozinha da casa na sala dos professores e a tela do
computador é a sala de aula. A situação de emergência atual fez com que muitas
instituições educacionais, mesmo as mais tradicionais, migrassem para o Ensino
Remoto Emergencial, visando dar ao estudante possibilidades de continuidade ao ano
letivo.
No contexto supracitado, escolas e educadores se reinventaram buscando
atividades diferenciadas para que seus educandos se mantivessem vinculados ao
processo de aprendizagem. Neste sentido, a Fundação Educacional Machado
Sobrinho25 (FEMS) a partir do trabalho coletivo entre direção, coordenação e
professores, concebeu a Feira dos Saberes, isto é, um trabalho interdisciplinar, que
envolveu temas atuais na qual seus produtos finais foram apresentados por meio de
ferramenta tecnológica26. Desta forma, o objetivo deste artigo é descrever um pouco da
nossa experiência didática, enquanto educadores, neste período de educação remota,
relatando nosso projeto interdisciplinar, totalmente online, a “Feira dos Saberes”.

Aulas remotas durante a pandemia do Covid-19

No século XXI nossa cultura é marcada pelo uso das tecnologias digitais de
informação e comunicação (TDIC) que nos possibilitam uma rápida comunicação, esse
fenômeno é chamado de WEB 2.0 por LEVY (1999). Temos acesso à smartphones,
computadores, tablets, notebooks o que nos permite maior interação entre professores,
alunos e o ambiente educacional, possibilitando o compartilhamento de informações,

25
A Fundação Educacional Machado Sobrinho, foi fundada em 1909 por Antônio Vieira de Araújo
Machado Sobrinho com o objetivo de preparar a juventude juizforana através de cursos
comerciais. No momento presente a instituição atua com os segmentos da educação infantil,
fundamental I e II, ensino médio e faculdade.
26
As aulas são ministradas através do aplicativo Google Meet, esse mesmo recurso foi
utilizado para as apresentações da Feira dos Saberes.

77
construções da aprendizagem de uma forma mais autônoma e a colaboração na
construção do conhecimento.
Em 2020 fomos surpreendidos com uma pandemia universal, a doença
provocada pelo covid-19 se constituiu como uma Emergência de Saúde Pública de
Importância Internacional.
As plataformas educacionais de aprendizagem e as ferramentas de tecnologia
ganharam bastante espaço dentro deste contexto educacional. Em nosso município a
prefeitura e as escolas decretaram distanciamento social no dia 18 de março de 2020.
Nesta mesma semana utilizamos o site institucional para postagens de atividades, na
qual educandos e responsáveis poderiam ter acesso, na semana posterior, foi iniciada
a utilização o Google Sala de Aula e as ferramentas de apoio do Google para dar
continuidade ao currículo.
É importante destacar que o ensino remoto é uma medida extraordinária e
temporária e não tem caráter idêntico a Educação a Distância (EaD), pois atualmente,
no Brasil não é permitida a modalidade EaD para o ensino básico. Além do ensino
remoto, adotado pelas instituições educacionais, muitos educadores se dedicaram a
utilizar da gama de possibilidades existentes nas mídias sociais (dentre as mais
conhecidas temos o YouTube, Instagram, Facebook e WhatsApp) para a difusão do
conhecimento, divulgação de ideias inovadoras e exposição do trabalho do profissional,
seja de forma individual ou coletiva.
O Colégio Machado Sobrinho, escola que atuamos, manteve-se alinhada e
atualizada em relação ao uso de tecnologias, seja por meio do laboratório de
informática, no qual os alunos trabalham com o uso tecnologias e projetos maker e
também por meio das ferramentas educacionais do Google Education. Além das aulas
são oferecidas capacitações à professores e educandos por meio da empresa parceira
da instituição, EDUTEC MG.27
No cenário pré-pandemia ocorria anualmente a Feira de Ciências, evento
presencial desenvolvido no colégio com apresentações que objetivavam a articulação
de teórica e prática dos aprendizados obtidos em sala de aula.
Seguindo as recomendações do Ministério da Saúde sobre o isolamento social
e regras adotadas no município de Juiz de Fora/MG, a coordenação convocou os
professores para repensarmos juntos a feira, de modo que os alunos pudessem
desenvolver atividades em grupo, refletir sobre temas relevantes, mas sem precisar

27
Empresa de inovação tecnológica.

78
encontrar ou sair para comprar materiais. Desta forma pensamos no trabalho
interdisciplinar, que envolvesse temas transversais que perpassam sobre todas as
disciplinas, atuando em consonância com a BNCC28.

decidir sobre formas de organização interdisciplinar dos componentes


curriculares e fortalecer a competência pedagógica das equipes
escolares para adotar estratégias mais dinâmicas, interativas e
colaborativas em relação à gestão do ensino e da aprendizagem;
(BRASIL, 2016, p.16)

Junto à coordenação, nos dividirmos como “padrinhos”, isto é, orientadores das


turmas, cada turma de 6º, 7º, 8º e 9º ano teria dois ou três educadores responsáveis por
orientar os alunos. A partir da escolha dos orientadores o próximo passo foi definir os
temas a serem trabalhados de forma transversal. Surgiram temas como: Olímpiadas,
Nosso planeta, Evolução dos animais, Leonardo Da Vinci, História da Matemática,
Identidade e Alteridade, entre outros.
Dentro dos temas e subtemas escolhidos foi proposto a criação de um texto
explicativo e um produto final para apresentação do conteúdo de forma lúdica e prática.
Dentre esses produtos sugerimos atividades que foram desenvolvidas ao longo do ano
letivo em História, Artes e/ou Informática, como por exemplo, cartaz digital no Canva ou
Fotojet, uma atividade maker, robótica, animação no scracth, vídeo ou outra atividade
de acordo com suas próprias intenções e criatividade.
Os educandos definiram os seus grupos de trabalho de forma autônoma, nós
educadores trabalhamos na orientação através de reuniões de semanais. O objetivo era
acompanhar o processo de desenvolvimento dos grupos como mediadores.

Identidade e alteridade na Feira dos Saberes

Os grupos orientados por nós trabalharam dentro da temática Identidade e


Alteridade, nossos alunos abordaram temas como: Fascismo, Mulheres Espartanas e
Atenienses, Mahatma Gandhi e Caça às Bruxas na Idade Média. Dentre os produtos
finais foram realizados vídeos, nos quais os educandos interpretavam personagens
históricos, outros confeccionaram animações, exploraram livros e músicas. Todo o
processo foi constituído através do aspecto teórico (História) e prático sobre o assunto
(Artes e as tecnologias).

28
Base Nacional Comum Curricular

79
Os trabalhos foram avaliados pelos orientadores e por outros dois professores
avaliadores. As considerações foram realizadas por meio de um formulário no Google
Forms.
Ao final do trabalho foi enviado um questionário para os educandos com três
perguntas: a) O que vocês acharam da feira dos saberes e da proposta do tema e dos
produtos para apresentação? Quais foram os pontos positivos e negativos (desafios)
encontrados? Vocês preferem atividades e trabalhos mais teóricos ou práticos?
Exemplifique relatando alguma atividade que você goste de desenvolver.
Dentre as respostas tivemos a percepção da feira como algo “muito interessante,
mostrando que podemos fazer algo diferente mesmo virtualmente”. Sobre os temas,
outro educando considerou da seguinte forma: “eu achei incrível, adoro quando os
professores propõem temas como esses”, ou seja, a partir dos relatos é possível
perceber a necessidade do processo educativo se relaciona com questões práticas do
cotidiano dos educandos e que tenham impacto na sociedade.
É necessário destacar que a atividade foi desenvolvida toda de forma remota,
sem encontros presenciais ou apresentações físicas, e através do uso da tecnologia
ocorreram reuniões, pesquisas, confecção e apresentação do trabalho.
A reação dos educandos sobre o último questionamento deixa claro que
atividades trabalhadas com as mãos, a mente, respeitando as diversas forma de ser e
fazer dos indivíduos é uma missão para todos os educadores. Os estudantes
ressaltaram em suas respostas a preferência por atividades mais práticas, para eles é
mais fácil e mais divertido aprender, contudo não descartaram a importância da teoria
no processo de aprendizagem.

Conclusão

Entendemos que as aulas remotas emergenciais, mesmo não sendo o modelo


de ensino ideal nos possibilitou a continuidade do ano letivo, desta forma, professores
e alunos podem interagir através dos meios tecnológicos e comunicativos. Uma nova
experiência de ensino e interatividade teve de ser criada e a Feira dos Saberes é um
exemplo prático, que levou em consideração os saberes e interesses dos alunos,
articulou disciplinas, teve diálogo constante entre todas as partes que compõem um
ambiente educacional e utilizou de ferramentas tecnológicas como aliadas para a
adaptação do ensino.

80
Referências

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Pátio, Porto Alegre, 2015. Disponível em: <http://loja.grupoa.com.br/revista-
patio/artigo/11551/aprender-e-ensinar-com-foco-na-educacao-hibrida.aspx>. Acesso
em: out. 2020.

BRASIL. Ministério da Educação. Secretaria da Educação Básica. Base nacional


comum curricular. Brasília, DF, 2016. Disponível em: <
http://basenacionalcomum.mec.gov.br/#/site/inicio>. Acesso em: out. 2020.

LÈVY. Pierre. Ciberspaço. Tradução de Carlos Irineu da Costa. São Paulo: Editora 34,
1999.

LIBÂNEO, José Carlos. Tendências pedagógicas na prática escolar. São Paulo,


2014.https://praxistecnologica.files.wordpress.com/2014/08/tendencias_pedagogicas_li
baneo.pdf. Acesso outubro 2020.

SANTAELLA, L. Navegar no ciberespaço: o perfil cognitivo do leitor imersivo. São


Paulo: Paulus, 2004.

SANTAELLA, Lucia. SIIMI 2012. Palestra com Lucia Santaella (Pub. em 22 jan. 2013).
Disponível em: https://www.youtube.com/watch?v=NOLkoHluIxk. Acesso em: 22 dez.
2017.

81
CONCEPÇÕES ACERCA DOS ANFÍBIOS COM ESTUDANTES DO 7º ANO DO
ENSINO FUNDAMENTAL - CIÊNCIA X SUPERSTIÇÃO

Carolina Farias da Costa29


Instituto Federal Farroupilha Campus Panambi
[email protected]

Daniela Carolina Ernst30


Universidade da Fronteira Sul
[email protected]

Alana Rafaela Borsekowsky31


Instituto Federal Farroupilha
[email protected]

Fabiana Lastra Beck32


Instituto Federal Farroupilha Campus Panambi
[email protected]

Resumo: O presente artigo tem como objetivo analisar o conhecimento dos alunos do
7° ano do Ensino Fundamental de uma escola pública e de suas famílias sobre a classe
dos Anfíbios, além de observar as superstições conhecidas acerca destes animais.
Palavras-chave: educação, ensino, família, escola, religião

Abstract: This article aims to analyze the knowledge of the students of the 7th year of
elementary school of a public school and their families about the class of amphibians,
besides observing the known superstitions about these animals.
Keywords: education, education, family, school, religion

29
Graduanda de Licenciatura em Ciências Biológicas no Instituto Federal Farroupilha campus
Panambi.
30
Mestre em Ensino de Ciências pela UFFS.
31
Graduanda de Licenciatura em Ciências Biológicas no Instituto Federal Farroupilha campus
Panambi.
32
Professora Doutora em Educação pela UFPEL, Professora EBTT do Instituto Federal
Farroupilha Campus Panambi.

82
Introdução

O Brasil é o país com maior diversidade de espécies de anfíbios, principalmente


anuros, que são facilmente encontrados e devido a isso são bem conhecidos pelos
brasileiros, e também fonte rica de muitas lendas e crenças populares envolvendo seus
nomes (COELHO, et al, 2018). O ensino de ciências, em algumas comunidades
específicas do Brasil, principalmente municípios pequenos e no interior dos estados
pode ser uma tarefa difícil, pois muitas vezes a teoria científica acaba se contrapondo
a outras de cunho maior e mais significativa aos estudantes, como o conhecimento
popular ou a de cunho místico. Como aponta Cunha e Terán (2015), no Brasil pouco se
sabe a respeito dos anfíbios, pois muitas vezes esses animais trazem consigo uma
história de perigo, nojo e repugnância.
Outro ponto importante para a formação do conhecimento dos estudantes são
os ensinamentos passados de geração a geração nas famílias e comunidades. A
Ciência já apresentou fatos aceitáveis que mostram que são errôneas algumas
superstições, como comer manga e após tomar leite. Segundo a nutricionista Anita
Sachsa (2011), na época do Brasil Colonial o leite era um alimento muito raro e caro,
sendo unicamente destinado aos patrões e senhores de engenho; como eles não
queriam que os escravos consumissem, espalhou-se a lenda, já que as mangas eram
mais abundantes e facilmente localizadas pelos escravos.
Este trabalho pretende refletir sobre o entendimento das famílias dos estudantes
de uma escola pública do 7º ano do Ensino Fundamental, do município de Panambi na
região noroeste do Estado do Rio Grande do Sul e suas percepções a partir de uma
atividade proposta durante uma aula de ciências da natureza sobre superstições acerca
dos anfíbios.
A discussão será embasada levando em consideração o levantamento sobre o
assunto realizado com os familiares e as percepções dos alunos a respeito do assunto,
na tentativa de entender esses apontamentos e as hipóteses que levaram a esse
entendimento.

Metodologia

O presente trabalho se trata de uma pesquisa de cunho qualitativo-teórica-


empírica, também descritiva, na perspectiva da pesquisa-ação. A pesquisa foi
desenvolvida durante as aulas de ciências da natureza no decorrer do Estágio

83
Curricular Supervisionado II, em uma turma de 7º ano do Ensino Fundamental de uma
Escola Estadual da rede pública de ensino no município de Panambi - RS. A turma
continha o total de 17 alunos, sendo oito meninas nove meninos, na faixa etária dos 12
a 15 anos de idade.
A proposta do trabalho era que os alunos pesquisassem em casa, com os seus
familiares, superstições envolvendo os anfíbios e trouxessem para ser discutido em sala
de aula. É de conhecimento popular várias superstições ou “macumbas”, como é
vulgarmente chamada, envolvendo principalmente os animais pertencentes à ordem
anura, os sapos, rãs e pererecas. A intenção do trabalho era que os alunos viessem
com essas informações sobre as superstições levantadas no âmbito familiar e
tentassem, de forma conjunta, entender por que esse fato ocorre, explicando de
maneira científica o real da situação, já que esse trabalho foi elaborado após todas as
aulas sobre a classe dos anfíbios.

Desenvolvimento (resultados e discussão)

Foram poucos os alunos que de fato realizaram a pesquisa, pois muitos


apareceram com cópias idênticas a do colega. Porém, analisando as pesquisas
compartilhadas pelos alunos que as realizaram, foi possível detectar que a grande
maioria consultou os familiares sobre o tema, como sinaliza o quadro 1.
Quadro 1

Superstição da Família Discussão Percepção do Aluno

84
“Se você pegar um sapo “Ele não irá urinar em você,
ele fará xixi, queimando
tanto que ele irá fugir de você,
sua pele.”
sua urina não é capaz de

Apesar de sapos urinarem com frequência para se queimar você.”


defender, o xixi do animal não apresenta nenhuma
substância letal ao ser humano, lembrando que o animal
só irá urinar se estiver se sentindo ameaçado de alguma
forma. Os sapos são animais que apresentam, na parte
logo atrás dos olhos, glândulas de serosa, que só serão
liberadas se de algum modo o animal estiver ameaçado ou
o local for pressionado. Alguns desses animais possuem
veneno que pode ser letal ao ser humano se levado em
contado com a mucosa ou na corrente sanguínea.

“Não maltratar ou Recentemente uma pesquisa apontou que foi encontrada “Por que um sapo iria até sua
na secreção das glândulas parotóides do sapo Bufo alvarius casa para matá-lo? O
machucar o sapo que a
uma substância psicodélica, a A 5-metoxi-N, N-
noite ele vai até sua dimetiltriptamina (doravante denominada 5-MeO-DMT) e fato é que devemos pegar o
casa e te mata jogando tornou-se popular em ambientes naturalistas como sapo com cuidado sem
sua baba” tratamento de problemas de saúde mental ou como meio
machucar e levá-lo para
de exploração espiritual, mas ainda não existem resultados
concretos sobre o que essa substância pode causar, a um lugar úmido ou perto da
longo prazo, no corpo humano (UTHAUG, M.V. et al., água”.
2019). Contudo, até os dias atuais não existe nenhuma
pesquisa que relata toxicidade.

85
“Meu pai falou que “Ele não faz nada com a
quando encosta em um pessoa e não transmite
sapo ele dava azar”
nada, quando você chegar

A religião católica é uma das mais praticadas no país, vindo perto dele, ele não fará
logo seguida pela crença evangélica (IBGE, 2010). Por esse nada”
motivo, muitas teorias têm embasamento religioso em
nosso cotidiano. Mesmo sem perceber, temos costumes
tão fortes em nossa sociedade que apresentam um cunho
fortemente religioso. Um dos livros mais lidos na história
do mundo é a bíblia e nela são apresentadas várias
situações em que alguns animais são citados, como Rã Tri
Cefálica. É levantada a hipótese de que, por essas situações
descritas, esses animais sejam considerados pagãos,
principalmente por fazerem parte da crença dos Egípcios.

“Quando alguém mata “Isto está errado, só chove


um sapo e ele vira de quando tem umidade no
barriga para cima, Sabe-se que existem espécies que se viram de barriga para ar”.
dizem que vai chover cima para fingir de morto, como forma de defesa e esse
comportamento é denominado “tanatose”. De acordo
forte”
com o biólogo Renato Gaiga (2013), a estratégia da “falsa
morte” é muito eficaz na natureza, já que muitas espécies
se alimentam apenas de carne fresca.

“As cecílias são usadas “Cecílias são apenas animais,


para separar casais, ou não fazem mal
seja, matando-a você nenhum”.
Os sapos, rãs e pererecas estiveram por muito tempo
separa o casal”
associados à magia e bruxaria, uma vez que as secreções
desses animais eram consideradas tóxicas e, devido a isso,
simbolizavam o mal e a morte. Logo esses animais foram
associados à bruxaria, sendo vistos negativamente pelas
sociedades, trazendo má sorte e usados para fins místicos
de má intenção.

Fonte: Autores

86
Considerações finais

A floresta amazônica e a mata atlântica detêm as maiores quantidades de


anfíbios no Brasil, porém ainda há pouco estudo em torno desses animais, seja no
âmbito de descobertas de novos exemplares ou nas descrições das características
daqueles já registrados. Há também falta de especialistas que trabalhem na área de
pesquisas desses animais, dificultando mais ainda novos estudos sobre a classe
(SABINO, José & PRADO, 2003).
O objetivo do trabalho foi averiguar as superstições que se encontram no âmbito
familiar dos alunos, conduzindo-os a repensar na sua veracidade logo após terem
estudado sobre esses animais. A escrita se deu de modo restrito devido à escassez de
material para pesquisa, sendo que a maioria dos assuntos abordados ainda não foram
discutidos de maneira científica, pois como já citado, há pouco interesse nessa classe.
O trabalho também buscou problematizar alguns aspectos que talvez possam se
constituir em alguns dos problemas que cercam o desinteresse em torno desses
animais. Claro que a questão financeira também interfere de maneira muito significativa
na falta de pesquisas, já que a ciência infelizmente luta contra esse problema.
Ainda há muito mais a ser estudado sobre esses animais que apresentam
enorme importância para o nosso ecossistema. O trabalho ressalta o pouco que se sabe
desses animais e incentiva a realização de mais pesquisas em torno deles, com o intuito
de aprimorar os estudos que cercam essa classe, tendo consciência que o
conhecimento é sempre inacabado.

Referências

COELHO, Fernanda de Azevedo; COSTA, Loraine Sans Reppso da; ARAUJO, Rafael
Almeida de; GOMES, Lirian Gonçalves Pereira; ALBUQUERQUE, Ana Beatriz Souza
de Santa Anna; LELIS, Thamires & SOARES, Marcelo de Araújo. ESTRATÉGIAS DE
EDUCAÇÃO AMBIENTAL PARA A CONSCIENTIZAÇÃO E PRESERVAÇÃO DE
ANFÍBIOS ANUROS NA ZONA OESTE DO RIO DE JANEIRO. 7º Simpósio de Gestão
Ambiental e Biodiversidade. UFRRJ. Rio de Janeiro. 2018.

87
CUNHA, Renata Gomes da & TERÁN, Augusto Fachin. ALFABETIZAÇÃO
ECOLÓGICA NA EDUCAÇÃO INFANTIL USANDO ANFÍBIOS ANUROS EM
ESPAÇOS EDUCATIVOS. VII Fórum Internacional de Pedagogia. Parintins - AM.

GAIGA, Renato. Sapos fingem-se de mortos por defesa. Instituto das Águas da Serra
da Bodoquena. Publicado em: 28/08/2013. Acessado em: 17/10/2019. Disponível
em: http://iasb.org.br/noticia/sapos-fingem-se-de-mortos-por-defesa.

IBGE – INSTITUTO BRASILEIRO DE GEOGRAFIA E ESTATÍSTICA. População


residente por religião, 2010. Disponível em:
https://www.ibge.gov.br/estatisticas/sociais/populacao/9662-censo-demografico-
2010.html?e dicao=9749&t=destaques. Acessado em: 01/10/2019.7

RAN-ICRBio. Centro Nacional de Pesquisa e Conservação de Répteis e Anfíbios.


Acesso em: https://www.icmbio.gov.br/ran/anfibios.html. Acessado em: 23/06/2020.

SABINO, José & PRADO, Paulo. VERTEBRADOS. Disponível em:


https://www.mma.gov.br/estruturas/chm/_arquivos/Aval_Conhec_Cap6.pdf. Acessado
em: 28/10/2019. p. 75-77. 2003.

UTHAUG, M.V., LANCELITTA, R., van OORSOUW, K. et al. A single inhalation of


vapor from dried toad secretion containing 5-methoxy-N , N -dimethyltryptamine
(5-MeO-DMT) in a naturalistic setting is related to sustained enhancement of
satisfaction with life, mindfulness-related capacities, and a decrement of
psychopathological symptoms. Psychopharmacology. v. 236. p. 2653–2666.
September. 2019.

88
DE MÍDIA SOCIAL A AMBIENTE DE CONHECIMENTO: O FACEBOOK COMO
ESPAÇO DE ENSINO E APRENDIZAGEM

Crístian Andrei Tisatto33


UNISINOS
[email protected]

Resumo: O estudo propõe uma narrativa da experiência acerca do ensino na Educação


de Jovens e Adultos (EJA), por meio de ferramentas como o Facebook, no período de
pandemia global. O relato apresenta uma experiência vivenciada na Região do Vale dos
Sinos, no Rio Grande do Sul, no ano de 2020.
Palavras-chave: Educação de Jovens e Adultos. Aprendizagem. Ensino Remoto.

Abstract: The study offers a narrative of the experience about teaching in Youth and
Adult Education (EJA), through tools such as facebook, there is no global pandemic
period. The report presents an experience lived in the Region of Vale dos Sinos, in Rio
Grande do Sul, in the year 2020.
Keywords: Youth and Adult Education. Learning. Remote Teaching.

Introdução

O ano de 2020 foi tempo de culminância dessas disputas. Um país marcado


pelas desigualdades e pelos desafios de garantir acesso e permanência, de fazer valer
o direito à educação garantido na Constituição Federal de 1988 (artigo 205), dentre
outros objetivos que parecem difíceis de serem alcançados, vivencia um movimento de
contrarreforma curricular34 – denominada Base Nacional Comum Curricular, além de
discussão do (sub) financiamento da educação a partir do findar do prazo do Fundeb e
da Emenda Constitucional número 95, que congela investimentos em áreas essenciais,
inclusive a educação. O que não se supunha era o surgimento de um vírus – com altas
taxas de contaminação – que provou a paralisação nos sistemas educacionais de muitos

33
Mestrando em Ciências Sociais/UNISINOS. Especialista em Gestão Escolar. Graduado em
Ciências Sociais, Geografia e Pedagogia.
34
Para compreender a caracterização da reforma Educacional no Currículo Brasileiro ocorrida
em 2017, conhecida por BNCC, e o porquê caracterizar-se como Contra Reforma, sugiro ver:
AGUIAR, Márcia Angela da Silva.; DOURADO, Luiz Fernandes. (orgs.). A BNCS na contramão
do PNE 201-2024: avaliação e perspectivas. Recife: ANPAE, 2018.

89
países do mundo, que provocou o fechamento para comércio de blocos econômicos e,
apontou indicadores alarmantes que comprovaram a letalidade do vírus e a alta taxa de
transmissão do mesmo.
Não bastasse os desafios centenários da educação pública brasileira, o mundo
é surpreendido com o surgimento e propagação de um vírus. A escola, por não se tratar
de uma ilha e por estar imersa, influenciada e influenciando práticas sociais, enfrenta as
consequências de um novo fenômeno necessário: o distanciamento social. O Brasil
observa, paralisado, e estuda meios de garantir a continuidade do ano letivo e é neste
contexto, que a experiencia relatada ocorre.

A pandemia como janela de oportunidade: desconstruindo o Facebook como


ferramenta (só) de entretenimento

Foi a partir da perspectiva de reinvenção das práticas, que a escola na qual atuo
– uma escola da zona urbana, que atende a jovens e adultos, mobilizou-se. Com o olhar
pautado pela sensibilidade e atentos aos dados que acompanham um panorama sobre
o público atendido e suas rotinas, novos significados precisaram ser atribuídos a um
recurso cotidiano, que nos envolve, nos aproxima e, constrói relações apresentando-se
como ferramenta eficaz, uma vez que já se encontra inserida no cotidiano de grande
parcela da população brasileira: o Facebook.
Para a escola, que está inserida numa estrutura maior, é difícil pensar suas
atribuições, seus papéis, distantes da realidade em que vive a comunidade educativa.
Ou seja, é impossível alienar-se dos processos de inserção e desenvolvimento da
tecnologia, mesmo que este uso se restrinja a processos recreativos e de lazer e que
as mídias sociais, como Facebook e Instagram sejam utilizados sem alguma
intencionalidade específica. Com isso, quer-se ressaltar a emergência das tecnologias,
que estão cada vez mais presentes no cotidiano e provocam impactos de diferentes
naturezas em diversas áreas, sobretudo na educação. Com a associação das TICs à
educação, surgem novas possibilidades no processo de ensino e aprendizagem. Os
alunos aprendem de formas distintas exercendo algum protagonismo e os docentes
explorando as possibilidades de ensinar.
Ocorre que, diante de uma pandemia, de uma paralisação dos sistemas
educacionais – a tecnologia ganha outra conotação e passa a exercer função de
facilitadora das aprendizagens, de meio, de instrumento para a chegada dos conteúdos
aos estudantes. Cabe destacar que com a expansão e as disputas pelo mercado,

90
protagonizadas pelas companhias de telefone, o acesso a rede móvel de internet foi
disponibilizado pela maioria das operadoras - com acesso e uso de dados ilimitados
para mídias digitais como o Facebook. Daí a importância destas mídias na organização
e nas dinâmicas sociais.
Enquanto país, driblar o coronavírus e garantir o direito humano à educação nos
coloca diante de um paradoxo: como garantir o direito à vida, à saúde e à educação de
todos, com certa qualidade? Como garantir a execução dos preceitos constitucionais
que garantem o acesso e permanência e a educação de qualidade?
Diante disso, compartilhamos brevemente a experiência de utilização do
Facebook como espaço de construção de saberes e de aprendizagens. Trata-se de
olhar para as mídias digitais como ferramenta-meio de se atingir a uma parcela maior
de estudantes. Já que a educação atribui um novo sentido àquelas ferramentas
utilizadas cotidianamente, através do ressignificar, do revisitar os espaços virtuais das
mídias sociais. Na realidade aqui apresentada, de uma escola vinculada a uma rede
filantrópica em que o Facebook se torna espaço de aprendizagem e, alunos
trabalhadores de 15 a 72 anos inserem-se numa nova modalidade de estudo, as aulas
remotas. O movimento inicial exigiu sensibilidade, um olhar para as peculiaridades de
uma educação de jovens e adultos que mescla gerações (X, Y, Z), mescla objetivos,
além de habilidades diferentes para o uso das tecnologias. Alguns nascidos em
momentos históricos de expansão da rede mundial de computadores, outros nascidos
em tempos em que a comunicação se desenvolvia através de cartas e acompanharam
todo o processo de avanço e transformação das relações a partir das tecnologias. A
maioria dos alunos, independente de faixa etária, muito distante de todos estes avanços
e da promessa de progresso que o computador trazia, visto que a aquisição destes
recursos, sobretudo no contexto em questão, era escassa e restrita a uma parcela da
população que detém maior poder aquisitivo, ocupando outra posição nas relações de
consumo. Nesse contexto, relato aqui uma experiência transformadora. Ainda não há
possibilidades de mensurar o quanto tal experiência foi bem sucedida, mas alguns
avanços e um novo olhar se construiu a partir de então. O Facebook transforma-se em
uma plataforma e ambiente de aprendizagens para aqueles estudantes mais
empobrecidos da Educação de Jovens e Adultos em uma cidade do Vale do Rio dos
Sinos, no interior do Rio Grande do Sul.
Oriundos de diferentes realidades, com experiências distintas de acesso e
interação no Facebook e surpreendidos com a suspensão das aulas presenciais em
meados de abril, os estudantes foram convidados a adotar diferentes formas de contato

91
(ligação telefônica, WhatsApp e no próprio Facebook) para se inserirem em grupos
criados no Facebook. Os alunos responderam a uma série de questionamentos sobre a
turma e ano que frequentam e aguardaram a aprovação por parte da equipe pedagógica
da escola. Aprovados, interagiam com os professores, de forma ainda tímida nos
comentários a cada aula postada. O processo inicial foi marcado por atividades
elaboradas e disponibilizadas em formato PDF - constatou-se após rodadas de
discussão que esses arquivos eram de fácil acesso por parte dos estudantes, visto o
espaço que ocupavam na memória dos telefones e, a facilidade de abrir determinada
extensão de arquivo nos aparelhos de telefonia, além do baixo consumo de dados.
O processo foi marcado por estudantes apropriando-se da nova modalidade de
aprendizagem. Aos poucos, cada grupo de turma ganhava mais membros, que
interagiam com os professores e setores pedagógicos, os quais acompanhavam
cotidianamente comentários, dúvidas, sugestões, “marcando” os professores nos
comentários, a fim de formar uma rede capaz de auxiliar e mediar os processos.
Cabe destacar que o estudante da modalidade de Educação de Jovens e
Adultos, já teve negado direitos e sofreu alguma vulnerabilidade de distintos campos da
vida social: seja no aspecto econômico, político, de trabalho e/ou no acesso a direitos
(que no limite foram negados, como o direito à educação na idade própria). Um público
que experiencia de forma constante a perversidade do sistema capitalista, que exclui,
marginaliza e segrega. Em suas experiências e trajetórias da vida, o público estudante
da EJA acompanha um constante desacreditar, fomentado pelo sistema e pela
estruturação da sociedade - que se mostra excludente e, de poucas oportunidades.
Considerando tal experiência, os docentes foram provocados a ousarem no
modo de promover aprendizagens. O desafio da disponibilização de videoaulas a partir
de premissas de interdisciplinaridade, deu origem a uma nova forma de trabalho, aliando
objetivos de diferentes componentes do currículo, criando uma rede de diálogo
constante, trocas e compartilhamentos entre os docentes. Houve, portanto, modos de
ressignificar práticas, revisitar posturas, planejamentos, além de compartilhar
experiências no uso das tecnologias da informação e comunicação, sem perder de vista
os compromissos presentes em uma escola, que tem tarefa essencial de transformar as
trajetórias daqueles que se dispuseram a buscar novos meios de legitimar suas buscas
por inclusão social e participação na sociedade, tal como Freire (2007) evidencia:

Se o meu compromisso é realmente com o homem concreto, com a


causa de sua humanização, de sua libertação, não posso por isso
mesmo prescindir da ciência, nem da tecnologia, com as quais me vou

92
instrumentando para melhor lutar por esta causa. (FREIRE, 1978. p.
22)

O homem concreto é aquele mediado e construtor de processos de


humanização, e isso diante de um contexto de revolução tecnológica, nos coloca diante
do desafio de utilizar os recursos como meios e não fins. Por fim, é importante relatar o
processo de avaliação realizado. Diante dos novos paradigmas, foram articulados
momentos para debate sobre instrumentos e metodologias de avaliação. Dada a
realidade e a dinâmica exigir protagonismo e autonomia dos estudantes, mesmo
reconhecendo as possíveis adversidades, a avaliação foi proposta a partir de um
instrumento de formulário criado e divulgado através dos grupos de interações no
Facebook, onde cada estudante foi desafiado a avaliar suas trajetórias.

Considerações finais

O contexto novo que se apresentou com o surgimento da pandemia, exigiu


posicionamentos das instituições e dos agentes que a compõe, clareza na condução e
um processo pautado pela ação-reflexão-ação no ato de planejar e pensar as práticas
pedagógicas. Um novo ambiente educacional apresentou-se pela apropriação de
ferramenta que se consolidava como mero entretenimento e ganhou outra função,
construir e mediar conhecimentos. De forma constante, foi necessário revisitar os
processos, realizar adaptações e, expandir os modos de condução da proposta. Pois
tornar uma rede digital um espaço de aprendizagens, oferecendo materiais diversos e
construindo práticas pedagógicas, mostrou-se desafiador e propôs uma nova
possibilidade para tal ferramenta - de uso cotidiano da grande maioria do público da
Educação de Jovens e Adultos - estudantes que, em suas trajetórias, vivenciaram
processos de exclusão, de marginalização e tiveram seus direitos negligenciados. A
experiência significativa e que proporcionou um novo olhar sobre a prática pedagógica,
o ato de planejamento, a articulação de componentes curriculares, evidenciou também
o papel social, de desenvolver sociabilidades, redes de contatos e de solidariedade,
além da concepção de grupo e de pertencimento que os ritos e liturgias escolares
pressupõe.
O público estudante da Educação de Jovens e Adultos vivencia momentos de
trocas, compartilhamentos não só de saberes, mas de experiências de vida oriundas de
trajetos e percursos permeados por diferentes contextos e saberes múltiplos. Também
observa-se que, embora a experiência tenha sido ousada, o espaço da escola, ritos e a

93
noção de pertencimento são essenciais para dar suporte e, potencializar a persistência
nos estudos - o que é desafio constante na EJA, visto que, o público é formado por
jovens e adultos trabalhadores, oriundos de famílias de baixa renda e, sofrem com as
múltiplas funções de estudante, trabalhador, mãe, pai, filho e, em muitos casos,
conduzindo e chefiando famílias. Não cabe aqui espaço para romantizar as
desigualdades e o acesso. No entanto, é preciso fortalecer a escola como uma
instituição que supera a reprodução de conteúdo, a transmissão de saberes.
A escola é potência para outros fazeres e saberes. É espaço de socialização, de
pertencimento, de coletivos, de fortalecimento de vínculos, de redes de contatos e
interações que perpassam os conteúdos do currículo constituído e legitimado - há um
outro currículo, que as matrizes e planos de estudo não contemplam. Há saberes
múltiplos, diferentes, oriundos de diferentes experiências. Um currículo que perpassa o
conteúdo, mas evidencia a relação, os afetos, num contexto desigual, marcado por
vivências e a exigência de uma habilidade socioemocional, que fortalece os sujeitos na
construção e na condução de suas vidas.

Referências

AGUIAR, Márcia Angela da Silva.; DOURADO, Luiz Fernandes. (orgs.). A BNCC na


contramão do PNE 201-2024: avaliação e perspectivas. Recife: ANPAE, 2018.
Disponível em <https://www.anpae.org.br/BibliotecaVirtual/4-Publicacoes/BNCC-
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94
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um fenômeno em construção. Psicologia da Educação, 2014. Disponível em:
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95

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