A Invencao Da Democracia
A Invencao Da Democracia
A Invencao Da Democracia
democracia
Em Atenas, o legislador Sólon lançou as bases de um novo sistema de
governo - num período cheio de golpes, assassinatos, revoltas e lutas
pelo poder.
Texto: Agência Fronteira | Edição de Arte: Juliana Vidigal | Design: Andy Faria | Ilustrações: Caco Neves e Getty Images
Apesar do perdão das dívidas dos pequenos agricultores, a reforma não gerou
grandes mudanças sociais – os eupátridas continuaram detendo o poder
político e econômico. Mas, ao abolir os privilégios de nascimento, o arconte
deu a chance das classes mais pobres ascenderem socialmente com frutos do
próprio trabalho. “O pacote de reformas de Sólon lançou as bases da
democracia que viria a se consolidar cem anos depois com o progressista
Clístenes”, escreveu o professor da Universidade Cambridge Paul Cartledge,
uma das maiores autoridades em Grécia Antiga.
Revolução democrática
O político, que vinha da classe mais pobre e era um ferrenho opositor dos
privilégios, rebelou-se contra os superpoderes do Aerópago, o tribunal
formado por aristocratas que zelava pelas leis. Efialtes determinou que o
grupo não devia mais se meter nas decisões políticas, que agora ficariam
concentradas no Conselho dos 500, na Assembleia e na Heleia, que havia se
tornado uma espécie de corte popular de primeira instância, com a figura do
promotor público. Nessa época, foi instituído também o misthós, um salário
pago a todo cidadão que exercia um serviço público. A remuneração atraiu os
mais pobres, que começaram a participar mais assiduamente das decisões
políticas.
O radical Efialtes foi assassinado em 462 a.C. – provavelmente por ter mexido
com o poder dos bem-nascidos. No lugar dele, assumiu Péricles, um político
com vitórias vultosas, como a negociação de 30 anos de paz com Esparta. No
seu governo, ele mandou reconstruir o Partenon e outros templos destruídos
na guerra de 449 a.C. contra os persas. Péricles tinha enorme apreço às artes e
à arquitetura e convocou artesãos, artistas, escritores, dramaturgos e arquitetos
a se mudar para Atenas, que se tornou um centro cultural dinâmico. Sob seu
comando, a principal cidade grega floresceu, e a democracia atingiu o seu
auge. Não é à toa que a Grécia do século 5 a.C. abrigou a santíssima trindade
da filosofia (Sócrates, Platão e Aristóteles) e do teatro (Eurípides, Sófocles e
Ésquilo). A essa altura, a democracia estava consolidada e havia uma certa
estabilidade no ar.
Boa parte dessa vocação intelectual foi sustentada com o trabalho dos
escravos. Enquanto os cidadãos gregos se dedicavam às atividades políticas e
artísticas, sobrava para os escravos ralar nas minas de minérios, nas olarias e
no campo. E todo mundo achava isso normal – até Platão, que deixou claro
que “é próprio de um homem bem-nascido desprezar o trabalho”.
Por volta de 440 a.C., Péricles deu o pontapé inicial para a construção da
Acrópole, um conjunto de templos, teatros e prédios erguido na parte alta de
Atenas, que se tornou o maior símbolo da Grécia Antiga. Quase todos os
atenienses tinham alguma tarefa no projeto. A cidade já tinha 40 mil
habitantes, e milhares de escultores, pedreiros, carpinteiros foram convocados
a trabalhar na obra.
Por dentro da Acrópole
Popularidade invejável
Para piorar, no verão de 430 a.C., a peste se abateu sobre Atenas. Por três
anos, milhares morreram vítimas da doença que, acredita-se, tenha sido a
febre tifoide. Nessa época, Péricles estava fora da cidade, liderando ataques
navais no Peloponeso. Quando voltou, ficou estarrecido. Cadáveres em
decomposição devorados por ratos, aves e cachorros espalhavam-se pela
cidade. A população não dava conta de enterrar seus mortos. Os templos e
demais prédios públicos da cidade ficaram cheios de cadáveres e os mortos
eram cremados ou enterrados de maneira caótica, sem as cerimônias fúnebres.
Péricles tentou achar uma saída. Mas ninguém sabia o que fazer – não havia
cura para a doença. Ele foi acusado de ter sido negligente: enquanto milhares
morriam, ele estava longe travando batalhas.
A Eclésia, então, votou por sua destituição. O estadista estava arrasado. Ele
próprio perdera dois filhos para a peste. Em 429 a.C., Péricles caiu doente e
morreu. Era o fim do século de ouro da Grécia, mas não da democracia. A
forma de governo de todos e para todos provou que é ainda a mais bem
acabada obra política do homem.