Material 6 - Variação Linguística
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Material 6 - Variação Linguística
Diferentemente do que propõe o senso comum, a língua não é uma entidade imutável, que tem todas as suas regras e
palavras registradas definitivamente nas gramáticas e nos dicionários. As línguas, como entidades vivas que são, estão em
constante transformação ao longo do tempo, nos diferentes espaços, no uso por diferentes grupos sociais, nos mais
diversos contextos. Assim, habitantes de uma mesma comunidade podem usar a mesma língua de formas diferentes.
Observe a imagem a seguir, que representa três países lusófonos e alguns regionalismos e expressões características de
cada país e de diferentes regiões do Brasil.
MARTINS, G. Quais as
diferenças entre o português do
Brasil, Moçambique e Angola?
Superinteressante, 15 ago. 2016.
Mundo estranho. Disponível em:
https://super.abril.com.br/mundo-
estranho/quais-as-diferencas-
entre-o-portugues-do-
brasilmocambique-e-angola/.
Acesso em: 19 ago. 2020. Geiza
Martins/Abril Comunicações
S.A.
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Material 6 – Variações linguísticas – profa. Renata Rocha
1. Qual é a explicação para o fato de os três países destacados na imagem terem o português como língua nacional?
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2. Se esses países utilizam a mesma língua, por que as falas apresentadas são tão diferentes entre si?
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As variações podem ocorrer em vários níveis – morfológico, sintático, fonético- -fonológico ou lexical – e
ser representadas tanto na fala quanto na escrita.
Nível morfológico
Leia a seguir o trecho de um artigo sobre as mudanças sofridas ao longo do tempo pela expressão vossa mercê
[...] No caso específico de Vossa Mercê, por ser uma expressão um pouco longa, acabou sofrendo uma simplificação
fonética resultante da redução de segmentos e sílabas átonas, originando diversas variantes. Nascentes (1956, p. 119-
121) aponta dezoito registros de formas simplificadas de Vossa Mercê, além de você, podendo haver mais:
Cê, mecê, mincê, ocê, oncê, sucê, suncê, vacê, vainicê, vancê, vansmincê, vassuncê, voncê, vosmecê, vossemecê,
vosmincê, vossuncê, ucê.
Apesar de algumas dessas formas ainda existirem, especialmente nos dialetos rurais do Brasil [...] e de Portugal [...], foi a
forma você que se fixou na língua portuguesa, transformando-se em pronome de tratamento. O primeiro registro da
forma você aparece em texto do Padre Francisco Manuel de Melo, publicado em 1644 [...], e vai aos poucos ganhando
espaço. Atualmente, a forma você é usada na maior parte do país.
[...] PERES, E. P. De “vossa mercê” a “cê”: os processos de uma mudança em curso. (Con)Textos Linguísticos, Vitória, v. 1, n. 1, p. 155-168, jun. 2007. Disponível em:
https://periodicos.ufes.br/contextoslinguisticos/article/ view/5100/3832. Acesso em: 20 maio 2020
A palavra você, amplamente utilizada em grande parte das regiões no Brasil, originou-se de processos de contração da
expressão vossa mercê, utilizada na Idade Média em Portugal. Essa variação de sua estrutura, embora tenha uma certa
estabilidade atualmente, também está em constante mudança, haja vista a utilização das contrações cê, da oralidade, e vc e
c, presentes na escrita, especialmente pela internet.
Nível sintático
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Nível fonético-fonológico
Na imagem a seguir são listadas algumas diferenças de pronúncia das palavras respeite e português em várias capitais do
Brasil. O som do r, por exemplo, pode assumir diferentes pronúncias, como em rato e prato, e ser brando ou forte. Pode
também ser como o r retroflexo do dialeto caipira, que é semelhante ao r do inglês (are).
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Nível lexical
Leia, a seguir, o trecho da etapa de instruções de uma receita retirada de um site português. Qual o significado dos termos
destacados?
[...] Num tacho de ferro fundido (tipo caçarola), deitam-se duas colheres de azeite e as sainhas e deixam-se em lume
brando até que esta gordura cortada em pedacinhos de cerca de 50 gr fique bem tostadinha. Em seguida coloca-se o alho
a alourar, seguindo-se as febras, também elas cortadas em pedacinhos. Deixar novamente alourar esta mesma carne
durante cerca de 20 minutos. Depois de bem tostada a carne, cortam-se as cebolas em rodelas grossas e deixa-se estufar
em lume brando. Junta-se uma folha grande de louro, a pimenta, o sal, a salsa e cobre-se com vinho tinto até dois dedos
acima do nível da carne. [...]
SARRABULHO à moda de Mira. Sapo, [2020]. Disponível em: https://lifestyle.sapo.pt/sabores/receitas/ sarrabulho-a-moda-de-mira. Acesso em: 20 maio 2020.
Alourar: Febras:
Sainhas: Estufar:
Lume Brando:
Resumo
A variação regional ou geográfica é aquela própria de uma região, um estado, um país. Exemplos: alourar – dourar;
macaxeira – mandioca – aipim
A variação sociocultural ocorre em um agrupamento social específico e está relacionada, por exemplo, a determinadas
classes sociais, faixas etárias, graus de escolaridade, gêneros, profissões e atividades. Exemplos: late flip (manobra do
skate); magrela (gíria para "bicicleta")
A variação histórica representa estágios de transformações da língua, alterações de grafia ou de sentido das palavras ao
longo do tempo. Exemplos: vossa mercê – você – cê
A variação de registro se dá entre a língua falada e a língua escrita em alguns contextos de interação específicos.
Exemplos: Me liguei – Liguei-me; você – vc
Você viu que a língua muda constantemente e que pode se adequar a diferentes situações comunicativas. Compreender o
caráter dinâmico da língua é fundamental para combater situações como o preconceito linguístico. Conhecer a norma-
padrão e saber utilizá-la nos contextos em que ela é exigida é importante. No entanto, também é fundamental reconhecer
que a norma-padrão está relacionada a classes de prestígio social e cultural, e que a língua não é única nem uniforme.
Portanto, não se deve deslegitimar variantes que fogem a essa norma.
Leia este trecho do depoimento de Maria Barbosa da Silva, nascida em 1942, na cidade de Timbiras (MA). Com família
muito rígida, ela sempre trabalhou na roça e era proibida de ir aos festejos da região. Foi depois de casada que teve
contato com as músicas e danças regionais e se tornou mestre de festejos e brincadeiras infantis.
[...] Um dia o meu pai, nós estava assim em casa, aí quando a de noite veio uns gado livre, naquele tempo o gado era
solto, aí veio o gado, aí meu pai chamava: “cheirosa, cheirosa acorda, que somam a esse? Vai tanger o boi para não ir
para roça.” [...] Levantei, meu filho, eu saí lá fora mais a minha irmã, eram uns tirão no mato, assim que nem aqui. Nós
cheguemos lá o lobisomem correndo atrás. Corremos que chegou em casa: “papai...” “Mamãe...” Não contamos para ele
porque ele dizia que era mentira... E a mamãe: "ô, minha filha, o que é que faz..." Aí minha mãe levantou junto com a
gente, aquele negócio que o lobisomem quando ele caminha, ele sai da estrada, ele corre e bate a canela no chão assim.
[...] O povo vê muita coisa naquele Maranhão, história antiga que só vê o jeito que nossa senhora. [...]
A DONA do Lindô. Museu da Pessoa, 17 mar. 2008. Disponível em: https://acervo.museudapessoa.org/pt/conteudo/historia/a-dona-do-lindo-44645. Acesso em: 20
ago. 2020.
1. Além de características que marcam modos próprios de falar, as diferentes regiões do Brasil têm também uma cultura
própria. Por exemplo, cultivam uma certa tradição folclórica ou têm uma versão particular para uma história que circula
em todo o país. De acordo com Maria Barbosa, quais são as características do lobisomem?
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2. Considere as palavras tanger e tirão, que são típicas do linguajar maranhense de dona Maria Barbosa, e explique seus
significados, com base no contexto.
3. Relacione as expressões a seguir, retiradas do texto, a seus possíveis significados, formando pares.
A. “que somam a esse?”
B. “que só vê o jeito que nossa senhora”
I. Expressão que intensifica a palavra com a qual se liga
II. Expressão que equivale a “o que se passa?”.
7. Copie os itens a seguir no caderno e responda, para cada um, com exemplos de recursos do texto que caracterizam a
oralidade.
a) Repetições usadas em uma mesma sequência.
b) Concordância que não atende à norma-padrão.
c) Expressão equivalente a "deste modo" e que perde a referência sem o gesto de quem fala.
d) Conectivo que liga orações para dar sequência ao assunto, servindo de elo entre um acontecimento e outro.
1) Os amigos F.V.S., 17 anos, M.J.S., 18 anos, e J.S., 20 anos, moradores de Bom Jesus, cidade paraibana na divisa com
o Ceará, trabalham o dia inteiro nas roças de milho e feijão. “Não ganhamos salário, é ‘de meia’. Metade da produção
fica para o dono da terra e metade para a gente.” (Folha de São Paulo, 1° jun. 2002)
Os jovens conversam com o repórter sobre sua relação de trabalho. Utilizam a expressão “é de meia” e, logo em seguida,
explicam o que isso significa. Ao dar a explicação, eles
Vamos agora ver como o tópico sobre “Variação Linguística” é cobrado nos vestibulares. Para as questões dissertativas,
anote as respostas em seu caderno.
VILLA-LOBOS, H. Bachianas Brasileiras n. 5 para soprano e oito violoncelos (1938-1945). Disponível em:
http://euterpe.blog.br. Acesso em: 23 abr. 2019.
Nesses versos, há uma exaltação ao sertão do Cariri em uma ambientação linguisticamente apoiada no(a)
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3) Fuvest – 2012
“A correção da língua é um artificialismo, continuei episcopalmente. O natural é a incorreção. Note que a gramática só se
atreve a meter o bico quando escrevemos. Quando falamos, afasta-se para longe, de orelhas murchas.”
LOBATO, Monteiro, Prefácios e entrevistas.
a) Tendo em vista a opinião do autor do texto, pode-se concluir corretamente que a língua falada é desprovida de regras?
Explique sucintamente.
b) Entre a palavra “episcopalmente” e as expressões “meter o bico” e “de orelhas murchas”, dá-se um contraste de
variedades linguísticas. Substitua as expressões coloquiais, que aí aparecem, por outras equivalentes, que pertençam à
variedade-padrão
4) Unicamp – 2017 No dia 21 de setembro de 2015, Sérgio Rodrigues, crítico literário, comentou que apontar um
erro de português no título do filme Que horas ela volta? “revela visão curta sobre como a língua funciona”. E
justifica:
5)
“O título do filme, tirado da fala de um personagem, está em registro coloquial. Que ano você nasceu? Que série você
estuda? e frases do gênero são familiares a todos os brasileiros, mesmo com alto grau de escolaridade. Será preciso
reafirmar a esta altura do século 21 que obras de arte têm liberdade para transgressões muito maiores? Pretender que uma
obra de ficção tenha o mesmo grau de formalidade de um editorial de jornal ou relatório de firma revela um jeito
autoritário de compreender o funcionamento não só da língua, mas da arte também.”
(Adaptado do blog Melhor Dizendo. Post completo disponível em http:// www.melhordizendo.com/a-que-horas-ela-volta-em-que-ano-estamos-mesmo/. Acesso em: 8
jun. 2016.)
Entre os excertos de estudiosos da linguagem reproduzidos a seguir, assinale aquele que corrobora os comentários do
post.
a) Numa sociedade estruturada de maneira complexa a linguagem de um dado grupo social reflete-o tão bem como suas
outras formas de comportamento. (Mattoso Câmara Jr., 1975, p. 10.)
b) A linguagem exigida, especialmente nas aulas de língua portuguesa, corresponde a um modelo próprio das classes
dominantes e das categorias sociais a elas vinculadas. (Camacho, 1985, p. 4.)
c) Não existe nenhuma justificativa ética, política, pedagógica ou científica para continuar condenando como erros os
usos linguísticos que estão firmados no português brasileiro. (Bagno, 2007, p. 161.)
d) Aquele que aprendeu a refletir sobre a linguagem é capaz de compreender uma gramática – que nada mais é do que o
resultado de uma (longa) reflexão sobre a língua. (Geraldi, 1996, p. 64.)
Assalto à brasileira
Assaltante mineiro
"Ô sô, prestenção. Issé um assarto, uai. Levantus braçu e fiketin quié mió prucê. Esse trem na minha mão tá chein di
bala... Mió passá logo os trocado que eu num to bão hoje. Vai andano, uai ! Tá esperanuquê, sô?!"
Assaltante baiano
"Ô meu rei... (pausa). Isso é um assalto... (longa pausa). Levanta os braços, mas não se avexe não... (outra pausa). Se
num quiser nem precisa levantar, pra num ficar cansado Vai passando a grana, bem devagarinho (pausa pra pausa )
Num repara se o berro está sem bala, mas é pra não ficar muito pesado (pausa maior ainda). Não esquenta, meu
irmãozinho (pausa). Vou deixar teus documentos na encruzilhada."
Assaltante carioca
"Aí, perdeu, mermão! Seguiiiinnte, bicho. Isso é um assalto, sacô? Passa a grana e levanta os braço rapá ... Não fica de
caô que eu te passo o cerol.... Vai andando e se olhar pra trás vira presunto ..."
Assaltante paulista
"Isto é um assalto! Erga os braços! Passa logo a grana, meu. Mais rápido, mais rápido, meu, que eu ainda preciso pegar
a bilheteria aberta pru jogo do Curintias, meu... Pô, agora se manda, meu, vai... vai..."
Assaltante gaúcho
"O guri, ficas atento... isso é um assalto. Levanta os braços e te aquieta, tchê! Não tentes nada e cuidado que esse
facão corta uma barbariiidaaade, tchê. Passa as pilas prá cá! Trilegal! Agora, te mandas, senão o quarenta e quatro
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fala."
Assaltante de Brasília
"Companheiros, estou aqui no horário nobre da TV para dizer que no final do mês, aumentaremos as seguintes tarifas:
energia, água, esgoto, gás, passagem de ônibus, imposto de renda, licenciamento de veículos, seguro obrigatório,
gasolina, álcool, IPTU, IPVA, IPI, ICMS, PIS, Cofins."
Tarefa:
1) Assita ao vídeo “Sotaques do Brasil”, produzido pelo Jornal Hoje da Rede Globo, disponível no link e/ou QR
code abaixo. Em seu caderno, tome nota sobre:
https://tinyurl.com/3phb9zf9
2) Leia um dos materiais abaixo, indicado pela sua professora, e tome notas em seu caderno:
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3 “Dialeto caipira do interior paulista está https://tinyurl.com/5ahyetpz - Local de publicação/ fonte;
caindo em desuso, diz pesquisa” - Possível público alvo;
- O assunto geral do texto;
- Quais outras referências são
citadas (fontes de autoridade,
artigos científicos, livros, entre
outros);
- As variações linguísticas
retratadas no texto;
- Exemplos das variações.
4 https://tinyurl.com/uw948fwt - Local de publicação/ fonte;
- Possível público alvo;
Dicionário digital quer resgatar palavras - O assunto geral do texto;
antigas do vocabulário português - Quais outras referências são
citadas (fontes de autoridade,
Dicionário digital quer resgatar palavras artigos científicos, livros, entre
antigas da língua portuguesa outros);
- As variações linguísticas
retratadas no texto;
- Exemplos das variações.
https://tinyurl.com/4zjczrhc
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