Pontifícia Universidade Católica Do Rio Grande Do Sul Faculdade de Letras Programa de Pós-Graduação em Letras
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FACULDADE DE LETRAS
Porto Alegre
2008
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Porto Alegre
2008
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3
AGRADECIMENTOS
H. P. Lovecraft
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RESUMO
ZUSAMMENFASSUNG
Diese Magisterarbeit handelt sich um die Beschreibung und die Kritik von
Erzählungen über Gespenster, die in Lektüren von Kindern und Jugendlichen
vorkommen. Dazu werden 72 für Kinder und Jugendliche geeignete Kurzgeschichten
über Gespenster analysiert. Die Erzählungen sind in völkerkundlichen Sammlungen
oder in Werken von Schriftstellern, die sich mit diesem Thema beschäftigen,
gefunden worden. Die Beschreibung des gemeinsamen Kennzeichen, das mit dem
Inhalt und der Form gebunden ist, und die tiefe Analyse von vier Geschichten zeigen
die Vielfalt der Gattung und erlauben, dass man vier Gruppen festsetzt. Diese
Gruppen achten auf die Figur des Gespenstes und seine Vorstellung in den
Erzählungen. Durch die Einordnung der Kurzgeschichten und durch die
Beschreibung ihrer Kennzeichen versucht man eine Typologie der Gattung zu
entwerfen. Es gibt Untersuchungen, die von der Völkerkunde, der Kinderliteratur oder
der fantastischen Gattung handeln; aber keine kümmert sich genau um die
Erzählungen über Gespenster für Kinder und Jugendlichen. Da die Figur des
Gespenstes so haüfig in den kulturelischen Medien heutzutage benutzt wird, ist
diese Arbeit also sehr wichtig und kommt rechtzeitig in den literarischen Bereich an.
Auβerdem begleiten die Erzählungen über Gespenster schon lange den Menschen
durch die mündliche Übertragung.
LISTA DE ILUSTRAÇÕES
LISTA DE TABELAS
SUMÁRIO
1 INTRODUÇÃO ....................................................................................................... 12
6 CONCLUSÃO....................................................................................................... 115
1 INTRODUÇÃO
O gosto por histórias do gênero que aqui se estuda, foi revelado à autora
deste trabalho quando de sua experiência docente. Não se pretende, contudo, ao
longo da dissertação, investigar o porquê dessa preferência, mas sim buscar
estabelecer uma caracterização comum ao gênero em produções destinadas ao
público infanto-juvenil. Pensa-se que as razões da preferência de crianças e jovens
e, poder-se-ia dizer, de alguns adultos por tais histórias estão afetas a investigações
por outras áreas de conhecimento.
O mote da investigação proposta surgiu a partir do interesse pessoal da
mestranda por manifestações literárias não-canônicas, de cunho popular. A
monografia de Graduação da aluna versou sobre a canção popular e sua utilização
em sala de aula pelo professor de Literatura. A intenção, nesse caso, foi aprofundar
os estudos acerca da ligação entre música e literatura e valorizar a canção popular,
gênero rico esteticamente e tão representativo da cultura brasileira.
Do mesmo modo, o gosto por manifestações literárias de origem popular é
agora direcionado para o estudo do folclore e, mais especificamente, para os contos
de assombração do tipo fantasma. O fascínio que esse tipo de narrativa tem
exercido sobre o ser humano, em diferentes sociedades e épocas, é realmente
intrigante e leva ao desejo de uma pesquisa sobre o gênero.
A proposta deste estudo tem como objetivo identificar e descrever elementos
caracterizadores de narrativas de assombração do tipo fantasma, em obras infanto-
juvenis e de verificar, a partir delas, o estabelecimento de categorias que dessem
conta da forma e do conteúdo vinculados a esse gênero.
No que se refere à metodologia empregada, o tipo de pesquisa que aqui se
desenvolve é de natureza bibliográfica e baseada em obras teóricas acerca da
narratologia, da literatura infanto-juvenil, bem como em obras literárias destinadas a
crianças e jovens leitores. Para efetuar as análises era necessário, em primeiro
lugar, formar um corpus. A busca estendeu-se então a bibliotecas públicas e
privadas e a livrarias, a fim de coletar narrativas curtas que mencionassem
fantasmas e que fossem voltadas ao público infanto-juvenil. Foi possível encontrar
amostras em coletâneas de contos folclóricos ou infantis, em livros cujos títulos
sugeriam a presença de histórias de fantasmas ou em obras de autores cuja
produção explora a temática da assombração.
De imediato, formou-se um corpus bastante volumoso, o que já revelou a
abundância de produções com a proposta que se procurava. Depois de lidas tais
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Bandeira, “Maria Angula”, de Maria Gómez e Renan de la Torres, “A mais bela noite
de Margarida”, de Edson Gabriel Garcia, “A moça de branco”, de Luciana Garcia,
“Caio?”, de Angela Lago, “Vovó Maria”, de Heloisa Prieto, História de fantasma, de
Tatiana Belinky, “Bu!”, de Kevin Crossley-Holland e “Companhia à noite”, de
Orígenes Lessa.
No entanto, os títulos selecionados para a análise pormenorizada sofreram
nova redução, dada a previsão de extensão excessiva, caso as observações em dez
narrativas fossem levadas a cabo. A nova seleção privilegiou autores brasileiros e
abrangeu narrativas cujas fontes ou variantes pudessem ser identificadas. Além
disso, assegurou-se que cada uma das narrativas escolhidas pertencesse a uma
categoria diferente, para que, assim, se pudesse explicitar, na prática, elementos
próprios de cada grupo. Os contos de Edson Gabriel Garcia, de Angela Lago, de
Pedro Bandeira e o não-mencionado de Sônia Travassos foram os preferidos para a
análise da história e do discurso narrativo.
Depois de observados aspectos gerais acerca da forma e do conteúdo do
corpus das 72 narrativas, expressos por meio de tabelas e gráficos que poderão ser
conferidos neste trabalho, passou-se à análise aprofundada das quatro narrativas.
As atividades da pesquisa puderam ser divididas em etapas, que previram a
leitura das narrativas selecionadas e constituição do corpus definitivo, a descrição
dos elementos constitutivos das narrativas, a análise e a interpretação dos dados e a
redação final do texto.
No Capítulo 2, que segue nas próximas páginas, apresentam-se aspectos
teóricos da narrativa: sua origem, definição e manifestações. Os laços entre
narrativa e oralidade são retomados, bem como a ligação entre a narrativa infanto-
juvenil e o popular. Dois estudos sobre narratologia são aqui pormenorizados: o de
Propp, que trata das formas do conto maravilhoso, e o de Genette, que se ocupa da
análise do discurso da narrativa.
O Capítulo 3 trata das fontes da narrativa de fantasma. Para tanto, são
definidos os termos da busca empreendida neste trabalho e se apresentam
apontamentos de diferentes teóricos que, sob um viés ou outro, versaram sobre a
literatura com temáticas sobrenaturais. Essa reunião conta com produções de
Propp, Romero, Cascudo, Lovecraft e Todorov.
No Capítulo 4, é estabelecida a caracterização geral das 72 narrativas infanto-
juvenis de fantasma, presentes neste corpus, que se pretende, deem conta dos
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aspectos formais, como o tipo de narrador utilizado, a faixa etária das personagens
envolvidas na trama, as referência a animais, os elementos constituintes do espaço
e do tempo e a modalidade das narrativas, bem como dos aspectos conteudísticos,
como a influência de outros gêneros – a aventura, a autoajuda, a literatura espírita –
e a função da personagem fantasma. Sempre que possível, procurou-se relacionar
os aspectos comentados às categorias propostas, consolidadora, desmistificadora,
anuladora e corruptora.
O Capítulo 5 é o que trata da análise pormenorizada das quatro narrativas
infanto-juvenis representantes das categorias, sendo elas: “A mais bela noite
Margarida”, “Caio?”, O pequeno fantasma e “Mão de Cabelo”. Em cada um dos
contos, observaram-se aspectos da história e do discurso, com base em Reis,
Genette, Propp e Todorov.
Na Conclusão, tratou-se de retomar o que havia sido dito acerca de cada uma
das quatro categorias, a fim de salientar, após as análises dos textos que compõem
o corpus, o que se confirmou ou se modificou em sua definição a respeito de
aspectos do conteúdo e da forma. Igualmente, comentaram-se as contribuições dos
conceitos desenvolvidos por Todorov, fantástico, maravilhoso e estranho, para a
ampliação das definições das categorias. Além disso, os aspectos do contexto
histórico-social relacionados a cada categoria que puderam ser observados foram
apontados na Conclusão.
Por fim, constam ainda neste trabalho Apêndices, que consistem em dois
instrumentos utilizados durante esta pesquisa: a lista completa com os títulos e
referências de todas as narrativas pertencentes ao corpus e a ficha utilizada para a
análise das narrativas do Capítulo 5.
2 ASPECTOS TEÓRICOS DA NARRATIVA
1 De acordo com o Novo dicionário da língua portuguesa, de Aurélio Buarque de Holanda Ferreira (s.d.), e com a Enciclopédia luso-brasileira de
cultura(s.d.), a palavra folclore foi utilizada pela primeira vez em 1846 por William G. Thomas para designar o estudo das populações civilizadas e, dessa
forma, opor-se ao termo etnologia, empregado no estudo dos povos primitivos. O significado do étimo modifica-se ao longo do tempo e perde sua
característica etnocentrista, passando a ser considerado um ramo da etnologia que visa, em especial, recolher e descrever as tradições orais de qualquer
povo; aí, além de crenças, conhecimentos e costumes populares, incluem-se provérbios, canções, lendas e contos. Tais formas populares, repassadas por
meio da oralidade, constituem a literatura oral de um determinado grupo social.
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Vê-se, portanto, que não somente em histórias da literatura, mas também nas
escolas, a literatura oral é deixada de lado. Reiterando a importância dos
conhecimentos vindos da tradição, afirma Cascudo que “o folclore ensina a conhecer
o espírito, o trabalho, a tendência, o instinto, tudo quanto de habitual existe no
homem” (1955, p.4); além disso, é o primeiro contato intelectual que a criança tem
na infância por meio da voz materna ou de outros familiares.
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em primeiro lugar, que alguém a escreva e que outro alguém a leia. E, para
ela passar das mãos do autor aos olhos do leitor, várias instâncias se
interpõem: editor, distribuidor e livreiros são três delas. O trio constitui uma
espécie de corredor econômico pelo qual deve passar a obra literária antes
que se cumpra sua natureza social, de criar um espaço de interação entre
dois sujeitos: o autor e o leitor (LAJOLO, 2001, p.18).
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Lajolo menciona ainda mais um elemento essencial a uma obra para que
possa ser considerada literatura, qual seja, o reconhecimento perante os críticos,
capazes de “estabelecer e afiançar o valor ou a natureza artística e literária de uma
obra” (LAJOLO, 2001, p.18). Vista a questão da existência de um sistema literário,
agregador de obras, desponta a importância do ato de escrita pressuposto na
criação de uma narrativa literária. O escritor, que está ausente na narrativa oral,
receptor, sem que infrinja padrões estéticos e formais da literatura, por assim dizer,
para adultos.
Para muitos teóricos, a distinção entre literatura infanto-juvenil e literatura
adulta não pode ser facilmente estabelecida, motivo pelo qual tal questão vem sendo
amplamente discutida. A problemática acerca do conceito de literatura infanto-juvenil
parece residir substancialmente no receptor, ou seja, “na diferença de idade e de
interesses entre adultos e crianças” (SILVA, 1986, p.59). Fundamental é não subtrair
da obra voltada ao público infantil e/ou juvenil o seu caráter literário e, portanto,
artístico. Assim, tudo o que já se disse aqui acerca da narrativa literária, vale
também para a literatura produzida tendo em vista a leitura de crianças e jovens.
Esse posicionamento, no entanto, não desconsidera o fato reconhecido de
que, quando a concepção de criança se altera, modifica-se também aquilo que é
entendido por literatura infanto-juvenil. Sabe-se que a literatura infanto-juvenil, tal
como hoje é concebida, é recente na história da humanidade. Tendo iniciado como
simples adaptação dos textos da literatura adulta para crianças e jovens, seu
surgimento se dá a partir dos séculos XVII e XVIII, na Europa, quando do
estabelecimento de uma nova classe social, a burguesia. É a partir de sua ascensão
que as crianças passam a receber tratamento e educação especiais, respeitando-se
suas necessidades e características. Até então, a criança era vista e considerada
um adulto em miniatura e, sendo assim, compartilhava de todas as manifestações
culturais de seu meio social.
A consolidação da burguesia como classe social desencadeou não só uma
mudança na concepção da infância, como também uma alteração nas instituições a
ela relacionadas. À medida que a família e a escola passaram a ser valorizadas,
tornaram-se necessários textos dirigidos especialmente às crianças. Inicialmente o
material utilizado na educação das crianças era constituído de adaptações de textos
para adultos. Aos poucos, começaram a aparecer coletâneas de histórias de cunho
popular, como as recolhidas por Charles Perrault, na França, ou pelos Irmãos
Grimm, na Alemanha. Em plena Idade Moderna, portanto, já se verificava uma
ligação entre o infantil e o popular.
Maria Zaira Turchi (2002) afirma que as raízes dessa ligação são mais
profundas do que uma simples referência histórica pode apontar, uma vez que
simbolizam o inconsciente.
24
Propp define, por fim, o que entende por conto de magia: “todo
desenvolvimento narrativo que, partindo de um dano ou uma carência e passando
por funções intermediárias, termina com o casamento ou outras funções utilizadas
como desenlace” (1994, p.85). A este desenvolvimento dá-se o nome de sequência.
A cada novo dano, prejuízo ou carência, inicia-se uma nova sequência.
Para uma classificação segundo as propriedades estruturais, deve-se,
portanto, em primeiro lugar, destacar os contos de magia dos demais e, depois,
classificá-los enquanto tais. Para tanto, Propp define: “o conto de magia é uma
narrativa construída de acordo com a sucessão ordenada das funções citadas em
suas diferentes formas, com ausência de algumas e repetição de outras, conforme o
caso” (1994, p.92). De acordo com essa definição final, o termo magia acaba
perdendo seu significado primordial. Daí ser possível, por um lado, encontrar um
conto de magia fantástico construído de modo diferente, como alguns de Andersen;
por outro lado, também podem ser encontrados contos que não são de magia, mas
que são construídos segundo o esquema citado.
Estudos mais recentes de narratologia mostram que toda narrativa pode ser
em dois planos, fundamentais à sua análise, quais sejam: o plano da história e o
plano do discurso. Afirmam Reis e Lopes que essa “concepção orgânica
desenvolve-se e aprofunda-se pela particularização de categorias da narrativa e
domínios de codificação de onde decorrem as práticas narrativas na sua existência
concreta” (1990, p.264) e pode ser abarcada pelos estudos da personagem e de
suas modulações de relevo, composição e caracterização; pelo estudo do espaço e
de seus diversos modos de existência; bem como pelo estudo das ações e de suas
variedades compositivas.
2 Cabe salientar que o tempo pode ser analisado em um nível macronarrativo, isto é, o das grandes articulações, que toma consideráveis segmentos da
obra para análise; também pode dar-se o estudo em um nível micronarrativo, a análise pode então ser feita a cada enunciado. Genette utiliza, em seu
estudo, esses dois tipos de análises do tempo: o que leva em conta a macroestrutura da obra e o que leva em conta sua microestrutura.
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Elipse e pausa, segundo Genette, são os dois extremos das quatro formas
fundamentais do movimento narrativo; as formas intermediárias são a cena,
dialogada, na maioria das vezes, e o sumário, uma “forma de movimento variável (ao
passo que os três outros têm um movimento determinado, pelo menos em princípio),
que cobre com grande adaptabilidade de regime todo o campo compreendido entre e
cena e a elipse” (1995, p.94). Esquematicamente, essas quatro formas podem ser
assim representadas:
nenhuma narrativa pode „mostrar‟ ou „imitar‟ a história que conta. Mais não
pode que contá-la de modo pormenorizado, preciso, „vivo‟, e dar assim mais
ou menos a ilusão de mimese que é a única mímesis narrativa possível,
pela razão única e suficiente de que a narração, oral ou escrita, é um fato
de linguagem, e que a linguagem significa sem imitar (apud GENETTE,
1995, p.162).
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E o que fazer quando não há falas? Como fazer com que o objeto narrativo se
conte por ele mesmo, sem que ninguém precise falar por ele? Para esclarecer essas
questões, afirma o estudioso, é necessário distinguir narrativas de acontecimentos e
narrativas de falas.
A narrativa de acontecimentos é sempre narrativa; transcrição do não-
verbal em verbal. “A sua mimese nunca será mais que uma ilusão de mimese, como
toda a ilusão dependendo de uma relação eminentemente variável entre o emissor e
o receptor” (GENETTE, 1995, p.164). Daí que a relação do leitor com o texto é
variável segundo indivíduos, grupos e épocas. Essa narrativa pode ser mais
desenvolvida ou mais pormenorizada (chamada de cena) e não tem um narrador ou
informador (caso tenha, sua presença é mínima).
Para os pós-jamesianos, a melhor forma de narrativa é aquela em que a
história é contada por uma personagem em terceira pessoa. Assim, afirma
Friedman: “o leitor dá conta da ação filtrada pela consciência de uma das
personagens, mas dá conta dela diretamente, tal qual ela afeta essa consciência,
evitando a distância que inevitavelmente implica a narração retrospectiva na primeira
pessoa” (apud GENETTE, 1995, p. 166).
“Se a „imitação‟ verbal de acontecimentos não verbais mais não é do que a
utopia ou ilusão, a „narrativa de falas‟ pode parecer, ao contrário, condenada a
priori” à absoluta imitação (1995, p.167). Não se pode falar aqui em narrativa, já que
o narrador recopia a frase do herói; ele mal a imita e também não a conta. Por isso,
Platão reduz o discurso a acontecimentos, o que inspira Genette a propor três
estados do discurso da personagem (seja ele pronunciado ou interior) que levam em
conta a distância da narrativa. São eles: 1) discurso narrativizado ou contado: é o
estado mais distante e, em geral, o mais redutor; 2) discurso transposto, em estilo
indireto. Embora seja mais mimético que o discurso contado, essa forma não dá ao
leitor garantia nenhuma nem sentimento de fidelidade literal às falas pronunciadas. A
presença do narrador é muito sensível; 3) discurso relatado ou reportado, de tipo
dramático. O narrador finge ceder a palavra à personagem. É a forma mais
mimética.
A perspectiva é o segundo modo de regulação da informação apresentado
pelo teórico. Ela procede da escolha de um ponto de vista e é estabelecida em três
termos, a seguir relacionados e esquematizados no quadro: 1) Narrativa de narrador
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onisciente ou a visão por trás: o narrador sabe mais que a personagem, por isso,
diz mais do que aquilo que qualquer personagem sabe; 2) A narrativa de certo ponto
de vista, ou de campo restrito, ou a visão com: o narrador diz apenas aquilo que
certa personagem sabe; 3) A narrativa objetiva ou visão de fora: o narrador diz
menos do que sabe a personagem.
Genette retoma o termo focalização, a fim evitar aquilo que a visão e o ponto
de vista têm de especificamente visual, apresenta os tipos focalização zero,
focalização interna (que pode ser fixa, variável ou múltipla) e focalização externa,
e lembra que o partido tomado pela focalização não é necessariamente o mesmo
em toda a narrativa. A fórmula da focalização se ajusta melhor a uma passagem, e
não à obra toda. Variações de ponto de vista em uma narrativa são mudanças de
focalização. Todavia, se uma mudança de focalização surgir isolada em um contexto
coerente, pode configurar-se em “uma infração momentânea ao código que rege
esse contexto, sem que a existência desse código seja por si só posta em questão”
(1995, p.193).
NÍVEL
extradiegético intradiegético
RELAÇÃO
direcionaram as buscas desta pesquisa. Para tanto, foi preciso valer-se de apoio
lexicográfico nas explicações que seguem, pois o gênero proposto – narrativas de
fantasma – especificamente e suas eventuais definições não constam em estudos
teóricos, nem mesmo em materiais consultados acerca do folclore e da literatura
oral.
No Dicionário Etimológico Nova Fronteira da Língua Portuguesa, Antônio
Geralado da Cunha aponta a palavra assombração como sinônima de
assombramento e conduz ao termo sombra, cuja definição é: “espaço sem luz ou
escurecido pela interposição de um corpo opaco” (1999, p.735); fantasma, por sua
vez, é palavra afim de fantasia, caracterizada como uma “espécie de imaginação,
devaneio” (1999, p.349). Já o Dicionário etimológico da língua portuguesa, de José
Pedro Machado, discute a origem do termo assombração, também ligando-o à
sombra e, sobre o termo fantasma, diz ser ele proveniente do grego phántasma, do
latim phantasma e variante culto de abantesma e designado como um “ser
imaginário, espectro” (1977, p.29). Fantasia relaciona-se com fantasma e é o léxico
que melhor define o significado: “aparição de coisas extraordinárias que causam
ilusão, visão; espetáculo, [...] particularmente de coisas extraordinárias, próprias
para ferir a imaginação, acto de provocar a imaginação; imagem que aparece ao
espírito [...] ” (1977, p.20). O termo imagem, anteriormente sugerido por fantasia,
também revela proximidade com fantasma, sendo definido da seguinte forma: “[...]
imagem, sombra de um morto; fantasma, visão, sonho, aparição, espectro; [...]”
(1977, p.266).
A Enciclopédia luso-brasileira de cultura (s.d.), do Editorial Verbo, confirma os
significados do termo fantasma já expostos e acrescenta-lhe novos: é uma imagem
ou aparição e “designa o produto da fantasia, ou objeto representado pela
imaginação” (s.d., p.357); para a Psicanálise, é uma “representação mental que, em
certas circunstâncias, se impõe ao indivíduo sem que este se aperceba da sua razão
de ser” (s.d., p.358), e pode ser distinguida de fantasia, que é sonho diurno, ficção
ou ilusão consciente porque está ligado a “núcleos de representação relacionados
com o instinto ou desejo infantil, pulsões libidinais e agressivas, emoções e
mecanismos de defesa” (s.d., p.358). Para a Etnologia e o folclore, o fantasma faz
parte de uma série de seres sobrenaturais, e é uma entidade tradicional do povo que
singulariza medos relacionados a determinados lugares e personalidades. O
fantasma “é pessoal e representa alguém, remoto ou recente, que morreu e
39
Propp (1984) foi um dos primeiros a estudar a narrativa sob o ponto de vista
de textos folclóricos, isto é, de tradição popular. Em Morfologia do conto
maravilhoso, o teórico trata apenas de contos de magia, no sentido exato da
palavra, chamados por ele de maravilhosos e, para tanto, utiliza um corpus
formado por 449 contos folclóricos reunidos pelo também russo Afanássiev. No
primeiro capítulo de seu clássico, Propp expõe e discute a classificação proposta por
diferentes estudiosos para os contos folclóricos3. Uma das razões para a grande
dificuldade na obtenção de precisão e clareza na resolução de problemas
relacionados aos contos maravilhosos reside, segundo o teórico, no fato de serem
tais contos constituídos de material heterogêneo e variado. Como os contos são
3 Este assunto faz parte do capítulo inicial de Morfologia do conto maravilhoso e serve para justificar a posterior classificação proposta por Propp para os
contos de magia, desenvolvida no Capítulo 2 desta dissertação. Feita de acordo com a construção, ou seja, com o sistema de indícios formais, estruturais,
das narrativas, a classificação do estudioso é completamente inovadora em relação à dos demais teóricos por ele apresentados.
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muito variados, deve-se primeiro classificá-los. Alerta Propp que a classificação deve
ser “o resultado de um exame preliminar profundo” (1984, p.15), visto que a divisão
mais habitual dos contos maravilhosos, “a que distingue os contos de conteúdo
maravilhoso, os contos de costumes e os contos sobre animais” (1984, p.15)
apresenta falhas, pois existem contos de animais que contém algo de miraculoso e
vice-versa. Propp traz então outras divisões utilizadas para os contos maravilhosos.
O estudioso Wundt (apud PROPP, 1984, p.16), em Psicologia dos povos,
propõe a seguinte classificação: 1) contos-fábulas mitológicos; 2) contos de feitiçaria
puros; 3) contos e fábulas biológicas; 4) fábulas puras de animais; 5) contos sobre a
origem; 6) contos e fábulas humorísticas e 7) fábulas morais.
Essa divisão também apresenta problemas, segundo Propp, pois não se sabe
o que Wundt compreende por fábula. O conceito humorístico, por sua vez, é
inaceitável, pois um mesmo conto pode ser analisado de forma heroica ou de forma
cômica. Algumas categorias podem ainda se misturar em alguns contos, por
exemplo, as “fábulas puras de animais” e as “fábulas morais”.
Essa divisão dos contos é feita por categorias. Existe também a divisão feita
por enredos, a qual é, para Propp, absolutamente impossível: significa o caos
completo. R. M. Volvok (apud PROPP, 1984, p.17) publica, em 1925, uma obra
sobre o conto maravilhoso e a classificação por ele adotada, exposta a seguir, se dá
de acordo com o enredo do conto fantástico, sendo sobre: os inocentes perseguidos,
o herói tolo, os três irmãos, os que lutam contra dragões, a procura de uma noiva, a
donzela sábia; sobre encantados e enfeitiçados, o possuidor de um talismã, o
possuidor de objetos encantados, a mulher infiel, etc., e alcançando o total de 15
enredos.
De acordo com Propp, não se sabe como esses enredos foram estabelecidos:
se pelo nó da intriga, se pelo caráter do protagonista, se pelo número de
protagonistas, se por um dos momentos do desenrolar da ação. Também existem
contos em que as categorias, ou seja, os enredos se misturam. Por exemplo,
aqueles em que os três irmãos saem à procura de noivas. O estudioso salienta:
acordo com seu gosto pessoal, e a divisão objetiva dos contos resultará
simplesmente impossível (1984, p.18).
Além disso, afirma ele, “não existem critérios absolutamente objetivos para o
estabelecimento de uma divisão entre dois enredos. Onde um pesquisador vê um
enredo novo, outro verá uma variante, e vice-versa” (1984, p.18).
A classificação de Aarne (apud PROPP, 1984, p.19), um dos fundadores da
escola finlandesa, explicita também um elenco de enredos. Graças a ela, tornou-se
possível numerar os contos, uma vez que Aarne chama os enredos de tipos e cada
tipo é numerado. Mesmo que tal designação seja curta e convencional, ela também
apresenta defeitos quanto à classificação, quantos a erros cometidos por Volkov.
São três os tipos de Aarne: 1) contos de animais; 2) contos maravilhosos
propriamente ditos e 3) anedotas. Os contos de feitiçaria constituem uma subclasse,
que se subdivide nas seguintes categorias: a) o inimigo mágico; b) o esposo mágico;
c) a tarefa mágica; d) o auxiliar mágico; e) o objeto mágico; f) a força ou o
conhecimento mágico ou g) outros motivos mágicos.
Diz Propp a respeito da classificação de Aarne:
em 1927 na Revista The Recluse, o ensaio é revisado por Lovecraft entre 1933 e
1934 e reeditado somente em 1973, isto é, 35 anos após sua morte.
Segundo Lovecraft, “o conto de horror é tão velho quanto o pensamento e a
linguagem do homem” (1987, p.7) e sua sobrevivência, evolução e aperfeiçoamento
ao longo do tempo justifica-se pelo fato de ser o medo a mais antiga e profunda
emoção sentida pelo ser humano. O sentimento de medo do desconhecido,
chamado pelo escritor de “horror sobrenatural”, pode ser encontrado nas mais
antigas manifestações folclóricas; seus traços, contudo, são reconhecíveis ainda
hoje na literatura clássica e na literatura de baladas, a qual, infelizmente, perdeu-se
no tempo, por falta de registro escrito.
Na Idade Média, o gênero teve um enorme impulso, solidificado pela herança
do folclore, da magia e do ocultismo. Foi assim que histórias de bruxas, vampiros,
lobisomens e duendes ficaram incubadas na tradição oral até migrarem para a
composição literária formal. No entanto, acrescenta o autor, tomam direções
diferentes no Oriente e no Ocidente.
foi, segundo o autor, “um pioneiro na captura clássica da atmosfera macabra” (1987,
p.10). Também se encontra o horror nas situações horripilantes de Morte d’Arthur,
de Malory, nas bruxas de Macbeth e no fantasma de Hamlet, de Shakespeare.
Durante o século XVII e parte do XVIII, proliferaram “lendas e baladas de
feição astrosa” bem como “folhetins de horror e assombração” (LOVECRAFT, 1987,
p.11), o que favoreceu o nascimento de uma nova escola literária: a gótica. As
primeiras novelas góticas surgem no século XVIII e Horace Walpole, por meio da
narrativa O Castelo de Otranto, é o responsável por dar forma definitiva ao impulso
crescente da época, que ansiava por “toques de mistério e antiguidade fantasmal”
(LOVECRAFT, 1987, p.15). Embora seja desconstituída do verdadeiro horror
cósmico, a história de Walpole acaba por criar um novo tipo de cenário, de
personagens e de incidentes e estimula o desenvolvimento de uma escola gótica
que o imita, vindo a gerar então “os verdadeiros criadores do terror cósmico”
(LOVECRAFT, 1987, p.15). A chamada por Lovecraft “parafernália dramática” (1987,
p.15) consistia em um castelo, com labirintos e ruínas, corredores úmidos e tumbas
escondidas, fantasmas e lendas tenebrosas. Sua repetição ao longo da história da
novela gótica chega a ser cômica e encontra reflexos mais sutis na literatura atual,
por utilizar técnicas menos ingênuas e óbvias.
Segundo Lovecraft, o apogeu do romance gótico inicia-se com Matthew
Gregory Lewis, por meio da obra O monge, publicada em 1796. A partir de então,
romances góticos multiplicam-se; merecendo alguns mais atenção do que outros: é
o caso de Melmoth, o vagabundo, de Charles Robert Maturin, de Frankenstein ou o
Prometeu moderno, de Mary Shelley, ou de Morro dos ventos uivantes, de Emily
Bronte, que é símbolo de uma transição literária, pois marca uma escola nova e
mais saudável.
Informa Lovecraft:
Bierce e de outros tantos, como Henry James ou Edward Lucas White, influenciados
de alguma maneira por Poe.
No que tange às Ilhas Britânicas, Lovecraft cita e comenta os autores
Rudyard Kipling, Lafcadio Hearn, Oscar Wilde, Matthew Phipps Shiel até chegar ao
conhecido Bram Stocker, criador de Drácula, que se tornou praticamente o “padrão
moderno na exploração do medonho mito dos vampiros” (1987, p.75) e que
influenciou diversas produções posteriores.
As melhores histórias de horror do tempo em que Lovecraft redige seu ensaio,
isto é, entre o final da década de 1920 e o início da de 1930, são, para ele,
infinitamente mais dotadas de técnica e de conhecimento psicológico do que
qualquer das amostras góticas de um século ou mais atrás. Nesse contexto,
menciona Arthur Machen, Blackwood, Lord Dunsay e Montague Rhodes James
como mestres do conto de horror moderno e diz que o gênero continuará existindo,
embora se possa esperar uma maior sutilização de técnicas. Lovecraft finaliza seus
apontamentos, afirmando que o conto de horror sobrenatural é
Nesse tipo de estudo, afirma ele, podem surgir algumas perguntas, como: tenho que
ler tudo o que existe do gênero?
O conceito de gênero, segundo o teórico búlgaro, assim como o
procedimento científico, apoia-se no fato de que não é necessária a observação de
todas as instâncias de um fenômeno para descrevê-lo. O que se faz é levantar um
número limitado de ocorrências, tirar daí uma hipótese geral e verificar a hipótese
em outras obras, corrigindo-a ou rejeitando-a. Ele observa que qualquer que seja o
número de obras estudadas, “estaremos sempre muito pouco autorizados a daí
deduzir leis universais, a quantidade das observações não é pertinente, mas
unicamente a coerência lógica da teoria” (TODOROV, 1975, p.8).
Outro questionamento que, segundo Todorov, pode surgir quando se estudam
textos a partir do gênero é: existem só os gêneros poético, épico e dramático, ou seu
número é infinito? Para ele, os formalistas russos são os que melhor esclarecem
essa questão, pois dizem que “os gêneros existem a diferentes níveis de
generalidade” e “o conteúdo dessa noção se define pelo ponto de vista escolhido”
(1975, p.90). Ex: o poema de Byron, a novela de Tchekov, a poesia proletária, etc.
Além disso, outra pergunta capaz de surgir é: como posso falar de gênero, se
“a obra é essencialmente única, singular, vale pelo que tem de inimitável, de
diferente de todas as outras obras, e não por aquilo que as torna semelhantes”
(1975, p.9)? Essa pergunta, que não é propriamente falsa, mas um pouco
deslocada, afirma Todorov, aponta um problema próprio da Estética. Essa mesma
objeção pode ser proposta em termos diferentes, qual seja, o aparecimento de um
novo exemplar não modifica as características da espécie? Ao passo que nas
Ciências Naturais, a resposta seria não, no campo das Artes não seria possível dizer
o mesmo. Aqui, “toda obra modifica o conjunto dos possíveis, cada novo exemplar
muda a espécie” (TODOROV, 1975, p.10).
Todorov identifica um duplo movimento, presente em qualquer estudo literário
que se conduza, que vai “da obra em direção à literatura (ou ao gênero) e da
literatura (do gênero) em direção à obra” (1975, p.11), e que pode solucionar todas
as questões por ele apresentadas. O que se faz usualmente, portanto, é privilegiar
um dos dois movimentos, salientando semelhanças ou diferenças.
O teórico define finalmente o fantástico como um evento em que há incerteza
acerca de sua realidade; o evento ocorre no nosso mundo, mas parece ser
sobrenatural, daí a hesitação por ele causada. Todorov ilustra o que diz por meio da
50
4 A hipótese de quatro categorias foi um item que constou ainda no projeto da presente pesquisa e que consistiu em uma primeira tentativa de organizar o
material coletado.
53
Mais adiante, se vai saber que a alma desse morto, cujo corpo foi preservado
pelo herói, está de volta na forma humana de Miguel, que se torna seu grande
companheiro e auxiliar nas tarefas impossíveis. No dia seguinte ao do casamento do
herói com a tão difícil e tão desejada princesa, o fiel companheiro revela sua
verdadeira identidade e, assim como aparecera, repentinamente, desaparece no ar,
sem causar assombro algum ao herói, situando a narrativa, portanto, dentro da
categoria anuladora.
Mesmo sabendo que essas coisas não vão nos machucar, nós temos
medo. Mas afinal, por que é que nós temos medo? (ROCHA; LORCH,
2004, p.15)
Esse tipo de livro tem, desde sua concepção, um propósito definido, qual seja, o de
oferecer à criança soluções para problemas cotidianos. No caso aqui exposto,
utilizou-se a estratégia do discurso conduzido por um narrador criança, para
aproximar o texto de seu leitor infantil e, desse modo, estimulá-lo a reconhecer-se no
narrador e, junto com ele, resolver seus próprios medos.
Uma única narrativa formou uma variante da categoria anuladora, por
apresentar um propósito completamente diferente dos perceptíveis nas demais
narrativas deste corpus. Em “Até a vista, turma!”, de Wagner Costa (1992), subjazem
crenças doutrinárias espíritas5. Por isso, os eventos sobrenaturais nela ocorridos são
apresentados como fenômenos naturais da vida e as personagens que deles
participam rumam a um autoconhecimento, por meio do desenvolvimento de sua
mediunidade. Portanto, embora esses fenômenos causem estranhamento à maioria
dos integrantes da turma, que desconhecem a doutrina espírita, são tratados com
naturalidade por outros, que dão mostras de compreender os eventos
fantasmagóricos e saber lidar com eles. Importante esclarecer que essa narrativa
tem em vista um leitor mais velho e, portanto, mais maduro linguistica e
psicologicamente que o infantil. Essa produção literária espírita, voltada para
adolescentes, não deixa de ser panfletária, pois visa a explicitar crenças, estando a
favor de uma finalidade extraliterária.
Outras narrativas, pertencentes à categoria anuladora destacaram-se no
corpus, não pelo gênero discursivo predominante, mas por apresentarem o fantasma
como sujeito, isto é, como o protagonista das ações, e não como simples objeto de
medo de alguém. É o que acontece, por exemplo, nos textos de Luciana Garcia, em
Branquinho, o fantasminha triste, de Regina Capanema de Almeida, em Pluft, o
fantasminha, de Maria Clara Machado, ou na história em quadrinhos “Um caso de
morte”, protagonizada por Penadinho, personagem, criada por Maurício de Souza
(1991), sujeito e também protagonista na maioria das histórias em quadrinhos que
ganham seu nome. Penadinho, conforme seu nome sugere, é uma alma penada
que, apesar de viver em um cemitério, executa tarefas diversas, comuns aos seres
humanos vivos: arruma a cova onde habita, sai com os amigos para escutar a
transmissão de um jogo de futebol, mantém uma namorada, etc. Do mesmo modo
5 O Espiritismo, ou Kardecismo, é um sistema doutrinário desenvolvido por Allan Kardec, no século XX, cujas crenças baseiam-se na sobrevivência da alma
após a morte e na comunicação entre vivos e mortos, isto é, entre encarnados e desencarnados, por meio de médiuns (FERREIRA, Aurélio Buarque de
Holanda. Novo dicionário da língua portuguesa. Rio de Janeiro: Nova Fronteira, [s.d.], 1ª ed., p.569).
59
que um ser humano, Penadinho se aflige diante questões próprias à sua existência,
que, dada sua natureza, consistem em amparar e orientar almas recém chegadas ao
cemitério ou em aceitar a própria reencarnação em um novo corpo. Vale notar que
Penadinho não está sozinho em sua tirinha, ele aparece geralmente com uma turma
de amigos, da qual fazem parte outros seres sobrenaturais: um vampiro, um
lobisomem, uma múmia que age como se fosse viva, uma criatura à la Frankenstein
e outras almas penadas.
Em “O fantasma de Samuel”, de Kevin Crossley-Holland, evidencia-se esse
procedimento; o fantasma de um menino, de nome Samuel, tem a trajetória própria
de um herói dos contos maravilhosos: após a morte, precisa reunir todas as partes
de seu corpo e entregá-las para uma Grande Minhoca, que as comerá; somente
depois de passar por esse ser fantástico, a alma do finado Samuel poderá
transcender e libertar-se de um mundo povoado de seres espectrais. Somente no
parágrafo inicial da narrativa é que se fala de um ser vivo, o próprio Samuel, antes
da morte: “Pobre Samuel! Ele estava dormindo, quando sua casa pegou fogo, e
acordou tarde demais. Era apenas um menino e morreu queimado; virou cinzas”
(CROSSLEY-HOLLAND, 2003, p.58). A partir daí, tem-se a odisseia do fantasma do
menino. Assim como nos contos maravilhosos, o fantasma vai por três vezes à sua
casa, destruída pelas chamas, com o objetivo de reunir as cinzas de seu corpo e
entregá-las à Grande Minhoca e de buscar as duas partes que lhe faltam: um braço,
que amputara anos atrás, e uma unha, que perdera quando vivo. O fantasma
encontra as cinzas do braço, mas não as de uma unha e, na terceira vez em que
encontra a Grande Minhoca, descobre que, em função da impossibilidade de
entregar seu corpo inteiro, pela ausência da unha, terá de vagar eternamente em um
mundo de almas penadas. Em razão de seu desfecho, “O fantasma de Samuel” é
considerada uma variante pertencente à categoria consolidadora.
Essas narrativas, em que se privilegia o fantasma, em detrimento do humano,
parece também estar presente em produções mais atuais, exceto pela amostra
anteriormente citada; embora ela tenha sido retirada de uma coletânea publicada em
2003, a fonte é referida a uma coletânea folclórica de língua inglesa, datada de
1891. Cabe apontar que esse tipo de narrativa pode ter sido inaugurada, ou, ao
menos, consagrada, pelos quadrinhos norte-americanos de Gasparzinho, o
fantasminha camarada, editados a partir da década de 1940 pela Harvey Comics.
Com o título original Casper, the friendly Ghost, essas histórias ganham versões em
60
desenhos animados, que passam então a serem produzidos pela Famous Studios e
pela Harvey Films na década de 1950. Voltadas para o público infantil, as histórias
em quadrinhos de Gasparzinho só chegam ao público brasileiro em 1970, lançadas
então pela editora O Cruzeiro, e os desenhos animados começam a ser exibidos na
década de 1980 pela Record, mas ambas as produções culturais já encontram aqui
outras que se lhes assemelham.
TIPO DE NARRADOR
TITULO AUTOR HETERODIEGÉTICO HOMODIEGÉTICO
1 Tem fantasma na rua! MARTINS, Cláudio X
2 História de fantasma BELINKY, Tatiana X
3 "O fantasma e o alfaiate" PRIETO, Heloisa X
4 "O médico-fantasma" PRIETO, Heloisa X
5 “O fantasma da sorte” PRIETO, Heloisa X
6 “O jovem que não tinha medo de nada” PRIETO, Heloisa X
7 “Vovó Maria” PRIETO, Heloisa X
8 “Amor de fantasma” PRIETO, Heloisa X
9 “A Loira do Banheiro” PRIETO, Heloisa X
62
TIPO DE NARRADOR
TITULO AUTOR HETERODIEGÉTICO HOMODIEGÉTICO
10 “Francisquinha” PRIETO, Heloisa X
11 “O Moleque Palhaço” PRIETO, Heloisa X
12 “Caio?” LAGO, Angela X
13 “A rosa assombrada” LAGO, Angela X
14 "A casa sonhada" LAGO, Angela X
15 “Encurtando o caminho” LAGO, Angela X
16 Casa assombrada LAGO, Angela X
17 “Até a vista, turma!” COSTA, Wagner X
18 “Uma noite na Feiticeira” MARTINS, Adelino X
19 “O fantasma da chácara” MARTINS, Adelino X
“A casa mal assombrada ou o tesouro
20 escondido” BRAHE, Tycho X
21 “Uma noite muito estranha” MORAIS, Flávio X
22 “A queda da casa de Usher” POE, Edgar Allan X
23 “A casa do pesadelo” WHITE, Edward Lucas X
24 “A casa B... em Cadmen Hill” CROWE, Catherine X
25 “O vigia da fronteira” DICKENS, Charles X
26 “Billy” CROSSLEY-HOLLAND, Kevin X
27 “O fantasma de Samuel” CROSSLEY-HOLLAND, Kevin X
28 “A destemida” CROSSLEY-HOLLAND, Kevin X
29 “Bu!” CROSSLEY-HOLLAND, Kevin X
30 “A loira do banheiro” GARCIA, Luciana X
31 “A moça de branco” GARCIA, Luciana X
32 “O zumbi” GARCIA, Luciana X
33 “Mão de Cabelo” TRAVASSOS, Sônia X
34 Fantasma existe? ROCHA, Ruth; LORCH, Dora X
ALMEIDA, Regina Capanema
35 Branquinho, o fantasminha triste de X
36 O pequeno fantasma BANDEIRA, Pedro X
37 Pluft, o fantasminha MACHADO, Maria Clara X
38 “A mortalha” THESOURO da juventude X
39 “Os sapatinhos de pão” THESOURO da juventude X
40 “As três noites no castelo encantado” THESOURO da juventude X
41 “A lavadeira encantada” THESOURO da juventude X
42 Uuuuuuu: um barulho estranho IACOCCA, Liliana X
FICHTNER, Marília; NUNES,
43 O fantasma Artur Sanfelice X
44 A noite assombrada JUNQUEIRA, Sonia X
45 O barulho fantasma JUNQUEIRA, Sonia X
46 Apalka CARDENAL, Ernesto X
DANSA, Salmo; BRAZ, Júlio
47 “Kigbo e os espíritos do mato” Emílio X
48 “A montanha viajante” CABRERA, Luis Urteaga X
49 “As cavernas de Aguas Buenas” TOMÉ, Jesús X
LAMBERTUS, Abelardo
50 “Os cavaleiros de Isabela” Jiménez X
GÓMEZ, Maria; TORRE, Jorge
51 “Maria Angula” Renán de la X
CARIZZO, Jesús Maria;
52 “A sombra negra e o gaúcho valente” GARRIDO, Nelly X
DOMENECH, Manuel; RAMOS,
53 “A gruta do Jacinto” Juan Antonio X
54 “O tesouro enterrado” GUARDIA, Rosa Cerna X
63
TIPO DE NARRADOR
TITULO AUTOR HETERODIEGÉTICO HOMODIEGÉTICO
55 “Os dois caçadores e a Saiona” ARISMENDI, Santos Erminy X
56 “Companhia à noite” LESSA, Orígenes X
57 "A velha que não morria" MESSIAS, Adriano X
58 “A porca, ora, a porca” MESSIAS, Adriano X
ANDRADE, Carlos Drummond
59 "Flor, telefone, moça" de X
60 "A história do pescador" KWAN, Michael David X
61 "A cantora da noite" KWAN, Michael David X
62 "A borboleta" KWAN, Michael David X
63 "A mais bela noite de Margarida" GARCIA, Edson Gabriel X
64 "O casal de velhos" GARCIA, Edson Gabriel X
65 "Os dentes de Madalena" GARCIA, Edson Gabriel X
66 "O companheiro de viagem" PIMENTEL, Figueiredo X
67 "O besouro de ouro" PIMENTEL, Figueiredo X
68 "A casa mal-assombrada" PIMENTEL, Figueiredo 1
69 "A alma do outro mundo" PIMENTEL, Figueiredo X
70 "O fantasma lambão" BUSCH, Wilhelm X
71 "Um espanto" DISNEY, Walt X
72 "Um caso de morte" SOUZA, Maurício de X
TOTAL 55 17
Tipo de narrador
24%
heterodiegético
homodiegético
76%
6 Todos os gráficos apresentados nesta dissertação foram elaborados a partir das tabelas que constam no início de cada subcapítulo.
64
Na segunda narrativa, o caso está inserido na fala de Bá, uma velha mulher,
descendente de escravos africanos e detentora de boas histórias de assombração,
segundo o adolescente. É, portanto, Bá quem conta o caso de um homem tão mau,
que, depois da morte, não é recebido nem por Deus nem pelo diabo, razão por que
sua alma vaga incansavelmente mundo afora. Instala-se, assim, uma mudança de
narrador, visto que se tem, na verdade, duas narrativas, estando uma inserida
dentro da outra.
Genette descreve esse fenômeno como a existência de dois níveis narrativos
distintos, cujos acontecimentos narrados situam-se fora da narrativa primeira, sendo,
portanto, extradiegéticos. Segundo o teórico, as duas narrativas mantêm uma
relação temática de analogia, visto que o mote proposto em ambas é o da
assombração; no entanto, elas não possuem continuidade espácio-temporal, isto é,
65
SUBTOTAL 20 6 2 15 18 0 7
TOTAL 21 6 2 18 18 0 7
OBSERVAÇÃO: O subtotal não contabiliza as narrativas cuja inclusão em uma categoria ficou
imprecisa, representadas por X?. Já o total leva em conta todas as narrativas, inclusive aquelas
cuja classificação ficou imprecisa.
7 Cabe esclarecer que a categoria jovem foi criada com o intuito de oferecer uma alternativa na classificação das personagens que não eram referidas pelo
narrador nem como criança, nem como adulto. Assim, sempre que se mencionava “jovem”, “moça”, “rapaz”, ou que se compreendia na caracterização da
personagem essa fase transitória entre o infantil e o adulto, classificou-se a faixa etária da personagem como jovem. Interessante notar a pouca ocorrência
de narrativas que tivessem como personagens exclusivamente crianças ou jovens.
69
Total: 64 Total: 31
narrativas narrativas
■ adulto
■ criança
Total: 27
narrativas ■ jovem
8 Na versão 2 do gráfico Faixa etária das personagens, é possível verificar o total de ocorrências de cada uma das três faixas etárias propostas neste
estudo; no entanto, esses valores só podem ser comparados entre si e não formando um número percentual, visto que a soma das ocorrências ultrapassa a
totalidade, isto é, os 100% ou as 72 narrativas que compõem este corpus.
70
REFERÊNCIA A ANIMAIS
TÍTULO AUTOR ANIMAL(IS) CITADO(S)
1 Tem fantasma na rua! MARTINS, Cláudio onça, tigre, leão e elefante
2 História de fantasma BELINKY, Tatiana -
3 "O fantasma e o alfaiate" PRIETO, Heloisa -
4 "O médico-fantasma" PRIETO, Heloisa -
5 “O fantasma da sorte” PRIETO, Heloisa -
“O jovem que não tinha medo de
6 nada” PRIETO, Heloisa touro e cavalo
7 “Vovó Maria” PRIETO, Heloisa -
8 “Amor de fantasma” PRIETO, Heloisa -
9 “A Loira do Banheiro” PRIETO, Heloisa -
10 “Francisquinha” PRIETO, Heloisa -
11 “O Moleque Palhaço” PRIETO, Heloisa -
12 “Caio?” LAGO, Angela -
13 “A rosa assombrada” LAGO, Angela -
14 "A casa sonhada" LAGO, Angela -
15 “Encurtando o caminho” LAGO, Angela -
16 Casa assombrada LAGO, Angela gato
17 “Até a vista, turma!” COSTA, Wagner -
18 “Uma noite na Feiticeira” MARTINS, Adelino cão
19 “O fantasma da chácara” MARTINS, Adelino morcego
“A casa mal assombrada ou o
20 tesouro escondido” BRAHE, Tycho cão
21 “Uma noite muito estranha” MORAIS, Flávio ave abatida e galo
22 “A queda da casa de Usher” POE, Edgar Allan cavalo e dragão
23 “A casa do pesadelo” WHITE, Edward Lucas porco e javali
24 “A casa B... em Cadmen Hill” CROWE, Catherine gato
25 “O vigia da fronteira” DICKENS, Charles -
26 “Billy” CROSSLEY-HOLLAND, Kevin -
27 “O fantasma de Samuel” CROSSLEY-HOLLAND, Kevin minhoca
28 “A destemida” CROSSLEY-HOLLAND, Kevin -
29 “Bu!” CROSSLEY-HOLLAND, Kevin -
72
REFERÊNCIA A ANIMAIS
TÍTULO AUTOR ANIMAL(IS) CITADO(S)
30 “A loira do banheiro” GARCIA, Luciana -
31 “A moça de branco” GARCIA, Luciana -
32 “O zumbi” GARCIA, Luciana ave, cavalo
33 “Mão de Cabelo” TRAVASSOS, Sônia -
34 Fantasma existe? ROCHA, Ruth; LORCH, Dora lobo, galinha e barata
35 Branquinho, o fantasminha triste ALMEIDA, Regina Capanema de -
36 O pequeno fantasma BANDEIRA, Pedro pomba
37 Pluft, o fantasminha MACHADO, Maria Clara peixe, baleia e tubarão
38 “A mortalha” THESOURO da juventude -
39 “Os sapatinhos de pão” THESOURO da juventude -
“As três noites no castelo
40 encantado” THESOURO da juventude -
41 “A lavadeira encantada” THESOURO da juventude cisne
42 Uuuuuuu: um barulho estranho IACOCCA, Liliana -
FICHTNER, Marília; NUNES, Artur
43 O fantasma Sanfelice -
44 A noite assombrada JUNQUEIRA, Sonia cobra
45 O barulho fantasma JUNQUEIRA, Sonia -
46 Apalka CARDENAL, Ernesto tucano, jacaré, tubarão e peixe
Visto que não é possível, devido à brevidade e aos objetivos deste estudo,
conduzir uma análise pormenorizada de cada uma das referências a animais e de
sua significação na narrativa, traça-se, nas próximas linhas, um panorama do que se
pôde observar de modo geral, no que diz respeito às funções das referências.
Há menções a animais que realmente acrescentam ou reforçam significados
da narrativa. Todos os animais mencionados no conto “A borboleta”, de Michael
David Kwan (2004), por exemplo, são altamente simbólicos e estão ligados a
personagens, somando-lhes significações, ocultas em uma primeira leitura. Eis
porque a jovem bondosa, já morta, aparece para o rapaz na forma de uma
borboleta, signo do efêmero e do transcendental e, por meio de seu fascinante voo,
o conduz até a floresta; também em uma borboleta é que se transforma o herói
depois da morte, para então poder compartilhar com a amada a eternidade; a velha
bruxa que, para viver, precisa alimentar-se do sangue de homens, transforma-se em
um corvo, animal que representa um estado de degradação e que é repelido pelos
seres humanos.
Algumas referências a animais são feitas com a intenção de melhor
caracterizar um espaço simplesmente, com ele fundindo-se e nem sempre
acrescentando uma nova significação ao que é narrado. O aparecimento de uma
onça, um tigre, um leão e um elefante em Tem fantasma na rua!, de Cláudio Martins,
é justificado porque esses animais fazem parte do circo, cenário que se constrói ao
longo da narrativa. É o caso também do morcego e das aranhas, em “Companhia à
noite”, de Orígenes Lessa; a existência desses animais contribui para a criação de
um ambiente de abandono, propício para um evento sobrenatural. Essas menções,
portanto, apenas auxiliam na construção de uma atmosfera de horror, preparando o
leitor para a sugestão fantasmagórica. A fim de instalar um clima macabro, pode-se
apelar a animais e insetos bastante conhecidos das histórias de horror: cobras,
aranhas, morcegos, corujas, gatos e outros animais noturnos; embora existam
narrativas do corpus em que constam esses clichês, elas não formam um grupo
expressivo quantitativamente.
Existem, nas narrativas, referências feitas a outras espécies de animais que
não têm função autônoma e não caracterizam o espaço, mas são elementos
qualificadores de personagens, sendo seu meio de transporte ou seu instrumento de
trabalho. É o caso da mula em “A sombra negra e o gaúcho valente”, de Jesús Maria
74
9 No decorrer do texto, o cachorro é chamado pelo narrador às vezes de “cachorrinho”, “cão”, “cãozinho” ou pelo nome, “Salguerito”. Essa diferença no
modo de chamar parece ser usada simplesmente para evitar repetições e não leva em consideração que o termo cão, no Brasil, pode fazer referência ao
diabo, sendo “cão” um de seus sinônimos. Explica Ferreira: “Para não enunciar o nome Diabo, a superstição popular substitui-o por muito outros: anhangá,
[...] cão, [...] diacho, [...] tinhoso”, etc. No entanto, esse não é um dos significados atribuídos ao cão da história “O tesouro enterrado”. O sentido que lhe é
atribuído pode ser encontrado no Dicionário de simbologia de Manfred Lurker (1997, p.114), sob o verbete cão: “é um animal do limiar, encontra-se entre o
aqui e o além, é guardião no portal do mundo dos mortos” e intermediário entre os dois mundos. A associação do cão à morte e ao inferno é apontada
também por Jean Chevalier e Alain Gheerbrant (1990). Sua primeira função mítica é guiar o homem na noite da morte, depois de ter sido seu companheiro
no dia da vida. Sua outra função é interceder entre os dois mundos, “atuando como intermediário quando os vivos querem interrogar os mortos e as
divindades subterrâneas do país dos mortos” (CHEVALIER; GHEERBRANT, 1990, p.177). Muitas vezes, o cão foi usado em métodos divinatórios e pode
ser considerado o guardião dos infernos. Cascudo, em seu dicionário, também registra algumas crendices populares associadas ao cachorro, que podem
ser relacionadas às descritas no conto de Guardia: “Cachorro [...] com o focinho voltado para a casa, [...] é anuncio de dinheiro. [...] Quando está uivando é
porque vê almas do outro mundo” (2002, p.93).
75
OBSERVAÇÃO: O subtotal não contabiliza as narrativas cuja inclusão em uma categoria ficou
imprecisa, representadas por X?. Já o total leva em conta todas as narrativas, inclusive aquelas cuja
classificação ficou imprecisa.
77
31%
noite
dia
69%
Os 31% atingidos por histórias cujo evento principal se dá de dia têm grande
incidência em contos que não são do gênero assombração, embora tratem de
fantasmas, conforme já se comentou anteriormente; é o que sucede nas narrativas
anuladoras Pluft, o fantasminha, de Maria Clara Machado, O fantasma, de Marília
Fichtner e Artur Sanfelice Nunes (1996) e Branquinho, o fantasminha triste, de
Regina Capanema de Almeida, entre outras. O percentual de 31% é muito
expressivo e aponta para uma tentativa de descaracterização do fantasma, presente
em diversos textos infanto-juvenis, que pretendem tornar a figura sobrenatural e
assustadora do fantasma em uma personagem amigável e parte do cotidiano do
leitor implícito, como se verá mais adiante.
Interessante notar a preferência por horários intermediários, isto é, de
transição entre o dia e a noite; encontra-se um número expressivo de narrativas em
que o evento principal ocorre em um momento descrito como o amanhecer, o
anoitecer ou escurecer. É bem sabido que horários intermediários, ou seja, os dois
crepúsculos, matutino e vespertino, têm notáveis diferenças de luminosidade solar.
Nessas “horas abertas”, termo utilizado por Cascudo (2002, p.421), instala-se uma
débil nitidez, que confunde o que é visto; o embaraço do sentido da visão é,
portanto, momento propício para o acontecimento de eventos sobrenaturais. Além
disso, tais horários de transição representam a passagem de um estado a outro.
Segundo Chevalier e Gheerbrant, os crepúsculos exprimem “o fim de um ciclo, e, em
consequência, a preparação de outro. [...] é uma imagem espaço-temporal (sic): o
instante suspenso. O espaço e o tempo vão capotar ao mesmo tempo no outro
mundo e na outra noite. Mas essa morte de um é anunciadora do outro: um novo
espaço e um novo tempo sucederão aos antigos” (1990, p.300) [grifo dos autores].
A meia-noite, conforme se pôde apontar no estudo aqui desenvolvido,
também é um dos horários prediletos para o aparecimento de fantasmas. No
imaginário popular, aponta Cascudo (2002, p.421), a meia-noite é “hora horrível, é
de universal assombro fantástico”. Também ela representa uma fenda temporal por
onde outros níveis de existência se dão a conhecer.
Estabeleceu-se, durante o levantamento de dados temporais, mais um item a
ser observado, chamado mau tempo, em que foram incluídas todas as narrativas
cujo acontecimento principal fosse acompanhado por ventos, chuvas, tempestades
ou baixas temperaturas. Apenas 9 narrativas, 13% do total, apresentaram alguns
desses fenômenos naturais; esse baixo índice contrariou as expectativas desta
79
OBSERVAÇÃO: O subtotal não contabiliza as narrativas cuja inclusão em uma categoria ficou
imprecisa, representadas por X?. Já o total leva em conta todas as narrativas, inclusive aquelas
cuja classificação ficou imprecisa. O descritor total de casas assombradas contabiliza as casas
que são assombradas ou assim conhecidas, que foram representadas ao longo da tabela por meio
do sinal *.
42%
meio urbano
meio natural
58%
4.3.5 Modalidade
MODALIDADE DA NARRATIVA
TITULO AUTOR FOLCLÓRICA ARTÍSTICA
1 Tem fantasma na rua! MARTINS, Cláudio X
2 História de fantasma BELINKY, Tatiana X
3 "O fantasma e o alfaiate" PRIETO, Heloisa X
4 "O médico-fantasma" PRIETO, Heloisa X
5 “O fantasma da sorte” PRIETO, Heloisa X
6 “O jovem que não tinha medo de nada” PRIETO, Heloisa X
7 “Vovó Maria” PRIETO, Heloisa X?
8 “Amor de fantasma” PRIETO, Heloisa X?
9 “A Loira do Banheiro” PRIETO, Heloisa X?
10 “Francisquinha” PRIETO, Heloisa X?
11 “O Moleque Palhaço” PRIETO, Heloisa X?
12 “Caio?” LAGO, Angela X
13 “A rosa assombrada” LAGO, Angela X
14 "A casa sonhada" LAGO, Angela X
15 “Encurtando o caminho” LAGO, Angela X
16 Casa assombrada LAGO, Angela X
17 “Até a vista, turma!” COSTA, Wagner X
18 “Uma noite na Feiticeira” MARTINS, Adelino X
19 “O fantasma da chácara” MARTINS, Adelino X
“A casa mal assombrada ou o tesouro
20 escondido” BRAHE, Tycho X
21 “Uma noite muito estranha” MORAIS, Flávio X
22 “A queda da casa de Usher” POE, Edgar Allan X
23 “A casa do pesadelo” WHITE, Edward Lucas X
24 “A casa B... em Cadmen Hill” CROWE, Catherine X
25 “O vigia da fronteira” DICKENS, Charles X
26 “Billy” CROSSLEY-HOLLAND, Kevin X
27 “O fantasma de Samuel” CROSSLEY-HOLLAND, Kevin X
28 “A destemida” CROSSLEY-HOLLAND, Kevin X
84
MODALIDADE DA NARRATIVA
TITULO AUTOR FOLCLÓRICA ARTÍSTICA
29 “Bu!” CROSSLEY-HOLLAND, Kevin X
30 “A loira do banheiro” GARCIA, Luciana X
31 “A moça de branco” GARCIA, Luciana X
32 “O zumbi” GARCIA, Luciana X
33 “Mão de Cabelo” TRAVASSOS, Sônia X
34 Fantasma existe? ROCHA, Ruth; LORCH, Dora X
35 Branquinho, o fantasminha triste ALMEIDA, Regina Capanema de X
36 O pequeno fantasma BANDEIRA, Pedro X
37 Pluft, o fantasminha MACHADO, Maria Clara X
38 “A mortalha” THESOURO da juventude X
39 “Os sapatinhos de pão” THESOURO da juventude X
40 “As três noites no castelo encantado” THESOURO da juventude X
41 “A lavadeira encantada” THESOURO da juventude X
42 Uuuuuuu: um barulho estranho IACOCCA, Liliana X
FICHTNER, Marília; NUNES, Artur
43 O fantasma Sanfelice X
44 A noite assombrada JUNQUEIRA, Sonia X
45 O barulho fantasma JUNQUEIRA, Sonia X
46 Apalka CARDENAL, Ernesto X
47 “Kigbo e os espíritos do mato” DANSA, Salmo; BRAZ, Júlio Emílio X
48 “A montanha viajante” CABRERA, Luis Urteaga X
49 “As cavernas de Aguas Buenas” TOMÉ, Jesús X
50 “Os cavaleiros de Isabela” LAMBERTUS, Abelardo Jiménez X
GÓMEZ, Maria; TORRE, Jorge
51 “Maria Angula” Renán de la X
CARIZZO, Jesús Maria; GARRIDO,
52 “A sombra negra e o gaúcho valente” Nelly X
DOMENECH, Manuel; RAMOS,
53 “A gruta do Jacinto” Juan Antonio X
54 “O tesouro enterrado” GUARDIA, Rosa Cerna X
55 “Os dois caçadores e a Saiona” ARISMENDI, Santos Erminy X
56 “Companhia à noite” LESSA, Orígenes X
57 "A velha que não morria" MESSIAS, Adriano X
58 “A porca, ora, a porca” MESSIAS, Adriano X
59 "Flor, telefone, moça" ANDRADE, Carlos Drummond de X
60 "A história do pescador" KWAN, Michael David X
61 "A cantora da noite" KWAN, Michael David X
62 "A borboleta" KWAN, Michael David X
63 "A mais bela noite de Margarida" GARCIA, Edson Gabriel X
64 "O casal de velhos" GARCIA, Edson Gabriel X
65 "Os dentes de Madalena" GARCIA, Edson Gabriel X
66 "O companheiro de viagem" PIMENTEL, Figueiredo X
67 "O besouro de ouro" PIMENTEL, Figueiredo X
68 "A casa mal-assombrada" PIMENTEL, Figueiredo X
69 "A alma do outro mundo" PIMENTEL, Figueiredo X
70 "O fantasma lambão" BUSCH, Wilhelm X
71 "Um espanto" DISNEY, Walt X
72 "Um caso de morte" SOUZA, Maurício de X
SUBTOTAL 39 28
TOTAL 39 33
85
OBSERVAÇÃO: O subtotal não contabiliza as narrativas cuja inclusão em uma categoria ficou
imprecisa, representadas por X?. Já o total leva em conta todas as narrativas, inclusive aquelas
cuja classificação ficou imprecisa.
Modalidade da narrativa
46% folclórica
54% artística
JUVENIL
protagonista hesita acerca da veracidade dos fatos: teria ele vivido um amor irreal?
Estaria Margarida, a mulher com quem dançara e a quem declarara amor eterno,
realmente morta há tempos? Quando a narrativa toma o rumo do sobrenatural, isto
é, quando o ocorrido na noite do baile e a presença insólita do casaco de Pedro na
lápide de Margarida não ganham explicações, fica clara a escolha do autor pelo
maravilhoso.
O retrato mostrado por Magnólia a Pedro, em que ele reconhece a mulher
amada, é um objeto que instaura o fenômeno do tipo informação, mencionado por
Propp10. Tal objeto tem papel fundamental para o nó da intriga, pois é por meio dele
que funções se ligam. Somente a partir desse primeiro reconhecimento, o
protagonista começa a suspeitar da natureza fantástica do que vivera e é graças a
ele que têm sentido as próximas ações. A ida ao cemitério e a visita ao túmulo da
morta visam à confirmação do caráter sobrenatural dos fatos que, de início, o herói
não queria admitir.
Encontra-se, na coletânea folclórica de Antônio Augusto Fagundes (1992)
Mitos e lendas do Rio Grande, uma lenda correspondente ao conto de Edson
Gabriel Garcia, o que revela o aproveitamento de material folclórico na construção
da obra artística. Há vários elementos coincidentes entre “A lenda da Moça que
dançou depois de morta” e “A mais bela noite de Margarida”: as duas personagens
principais são um rapaz e uma moça, o local do evento fantástico é um salão de
baile e o período, o sábado à noite. A moça da lenda é descrita de maneira
semelhante à do conto: muito bonita, sozinha, mas triste. O rapaz, quando a vê,
também por ela se encanta, e, juntos, dançam até a meia-noite. Na hora de levá-la
para casa, ele lhe empresta sua capa, para protegê-la do frio da noite. No dia
seguinte, com a desculpa de reaver a capa, ele vai à procura da moça, com quem
pretende iniciar namoro. Quem atende a porta é um homem maduro, muito triste,
que diz ao rapaz não morar moça alguma ali. O rapaz insiste, e consegue ver, pelo
vão da porta, um retrato da moça com quem dançara. O homem anuncia que a
moça da foto é sua filha, morta há um ano. Como o rapaz fica surpreso, o pai da
10 Segundo Propp, as informações servem para deixar uma personagem a par daquilo que se passa (ou se passou) com outra. Se essas informações são
omitidas, a personagem age ex machina ou é onisciente.
Propp salienta que as funções informação e momento de conexão são fenômenos do tipo informação, mas que constituem uma função independente
devido à importância que têm para o nó da intriga. “A informação pode intercalar-se entre as mais variadas funções” (1994, p.66); ela também pode tomar a
forma de um diálogo. Uma personagem pode tomar conhecimento de alguma coisa através de outra personagem ou também através da visão de algo. Em
caso de objetos muito pequenos ou distantes, esses são trazidos; em casos de seres humanos, conduzidos.
91
Uma mulher bonita, sem dúvida, apesar do jeito antigo das roupas, do
sapato de salto alto grosso e do corte dos cabelos. Era tão bonita que
Pedro Sobreira não deu a menor importância para esses detalhes e [...]
puxou uma conversa que continuou pelo resto da noite (GARCIA, 1991,
p.10) [grifo nosso].
Mas, toda vez que [Pedro] tentava apertá-la contra seu peito, não
conseguia sentir-lhe o calor do corpo (GARCIA, 1991, p.11) [grifo nosso].
p.8); a cerveja, bebida pelo protagonista, é descrita como “uma deliciosa cerveja
gelada” (GARCIA, 1991, p.9). Essas opiniões proferidas pelo narrador soam, de fato,
como do próprio Pedro, que é quem realmente experimenta as sensações ou
situações da narrativa. A passagem “Algum tempo depois, desanimado e muito sem
graça, ele saiu do salão, com um quarto ou quinto copo de conhaque duplo na mão”
(GARCIA, 1991, p.9) [grifo nosso] suscita, no leitor, os seguintes questionamentos,
que encerram a ambiguidade sugerida pela focalização interna: quem não tinha
certeza de quanto Pedro bebera? O homem, que realmente ingerira a bebida, ou o
narrador, que se encarregou de contar o que observara ou ouvira?
Na análise do tempo, no nível micronarrativo, pôde-se localizar uma única
prolepse, isto é, um pequeno adiantamento, da parte do narrador, do que viria
acontecer na noite do baile: “Fora do salão, o destino havia preparado uma surpresa
para ele” (GARCIA, 1991, p.10). Essa prolepse não interfere em nada o andamento
da narrativa, não quebrando sua sequencialidade.
No nível macronarrativo, foi possível identificar uma anacronia, que
desempenha papel fundamental na narrativa: a analepse, que toma forma na
revelação feita por Magnólia a Pedro acerca do dia da morte de Margarida e
constitui-se em uma narrativa de segundo nível, tendo a irmã da morta por
narradora. Seu alcance, isto é, a que tempo dista do presente, são 40 anos antes do
tempo presente da narrativa principal. A amplitude da anacronia é relativamente
curta, durando o tempo do diálogo entre Pedro e Magnólia, em que ela conta ter
morrido a irmã há 40 anos atrás. Um esquema da relação entre o tempo da história
e o tempo do discurso permite visualizar a analepse:
N2 N1
I I 40 anos I I ■
o dia da morte de Margarida a aventura de Pedro Sobreira no lugarejo
N1 narrativa principal
N2 narrativa secundária
início da narrativa
■ término da narrativa
I...I analepse
Quadro 3 – Relação entre o tempo da história e o do discurso em “A mais bela noite de Margarida”
94
Figura 3 – Ilustração da página inicial da narrativa “A mais bela noite de Margarida” (p.6)
95
5.2 “CAIO?”
Figura 4 – Montagem com detalhes ampliados da capa de Sete histórias para sacudir o esqueleto
96
que mantém a dúvida acerca da naturalidade das coisas e somente ao final define
sua permanência no mundo real, pertence à descrição do fantástico estranho,
identificado por Todorov, no estudo anteriormente mencionado. Apesar de
estabelecer o fantástico, a narrativa de Lago não perde o tom anedótico; exemplos
disso são os diálogos, recheados de dupla significação, e o final cômico, com uma
personagem despencando inesperadamente do forro e desfazendo, assim, a tensão
causada pelo medo do sobrenatural.
Tal tom humorístico não é encontrado em outras versões para a mesma
história. Apenas no corpus desta dissertação, foram encontradas mais três
narrativas em que o protagonista conversa com uma voz fantasmagórica e ossos
caem do teto. As diferenças entre os três textos resumem-se ao número e sexo dos
protagonistas. Em comum têm o tipo da residência assombrada, uma casa, ao invés
da fazenda de Lago, e a premiação, por meio de tesouros, conferida somente
àqueles que conseguem enfrentar o medo diante do fantasma e aguentar ver caírem
todas as partes do seu corpo.
A mais antiga das variantes, publicada em 1896, é “A casa mal-assombrada”,
de Figueiredo Pimentel. Nela, duas mulheres muito pobres acabam indo morar em
uma casa mal-assombrada, por não terem mais onde ficar. À noite, ao ouvir uma
voz, anunciando que irá cair, a mais jovem responde “― Pois caia, com Deus e
Virgem Maria!” (PIMENTEL, 1896, p.85). O caráter religioso da resposta da heroína,
ausente no conto de Lago, se repete na fala do fantasma, que dá explicações acerca
de sua atual condição e insere, assim uma história intercalada:
― Eu sou uma alma penada, que ando sofrendo por causa deste
dinheiro. Quando era vivo, roubei-o de uma pobre viúva, desgraçando-a,
bem como aos órfãos, seus filhos. Deste dinheiro, a metade é para você e
sua mãe, e a outra metade é para distribuir com os pobres, e mandar dizer
cem missas por minha alma (PIMENTEL, 1896, p.85).
11 De acordo com Propp, elementos que favorecem a triplicação são comuns em contos populares, como detalhes particulares de caráter atributivo (por
exemplo, um dragão de três cabeças), ou funções isoladas e pares de funções (como perseguição-salvamento), grupos de funções ou sequências inteiras.
Além disso, a repetição “pode ser uniforme (por exemplo, três tarefas, três anos de serviço), ou produzir uma intensificação (a terceira tarefa pode ser a mais
difícil, o terceiro combate o mais terrível), ou apresentar por duas vezes um resultado negativo, e na terceira vez um positivo” (PROPP, 1994, p.67).
99
27).
existência de um sobrenatural aceito de antemão por todos e ao qual não são dadas
explicações.
Já que Psiu é apresentado com características próprias às de um ser
humano, também sob esse viés ele pode ser analisado. Psiu demonstra
acomodação diante de sua condição de fantasma; ele não a questiona, nem tenta
modificá-la, razão por que parte da fábrica de lençóis, à noite, com intenção de
assustar pessoas e, assim, “começar sua carreira de fantasma” (BANDEIRA, 1998,
p.16). Sua nova condição de fantasma exerce grande domínio sobre ele, indicando-
lhe o que e como deve ser. O trecho em que diz “Se sou um fantasma, se nasci para
assustar os outros, tenho de ser corajoso!” (BANDEIRA, 1998, p.16), revela a falta
de questionamento de Psiu acerca da própria existência, bem como a plena
aceitação de sua natureza.
Além disso, é clara a intenção de fazer o leitor pensar que Psiu é um bom
fantasma, de temperamento amigável. Já na ilustração da capa do livro, que pode
ser conferida abaixo (Figura 6), é sugerido um protagonista bondoso, simpático –
impressões denotadas a partir do sorriso e do aceno de mão de Psiu, contrárias ao
esperado de um fantasma.
No entanto, não é possível dizer que Psiu realmente é bondoso ou que não
tem talento para assombrar pessoas, pois nem sequer chega perto disso. O que
acontece com ele antes de encontrar seu feliz destino, é sofrer uma série de
fracassos e humilhações ao ingressar num ambiente novo, o da cidade. Logo, o final
que o aguarda, ser o lençol de um bebê, constitui-se, para ele, em um alívio para os
103
12 As personagens auxiliares são ainda divididas por Propp em três categorias: a dos auxiliares universais, “capazes de cumprir as cinco funções do
auxiliar” (1994, p.76) – apenas o cavalo teria essa função –, a dos auxiliares parciais, aptos a desempenhar certas funções, mas não as cinco do auxiliar –
é o caso de alguns animais, espíritos ou personagens – e a dos auxiliares específicos, que cumprem somente uma função; segundo o estudioso, apenas
objetos podem desempenhar esse papel. Observa ele ainda que frequentemente o herói não necessita de um auxiliar. Em alguns casos, o herói apresenta
um atributo do auxiliar, como, por exemplo, o poder de adivinhação. Também pode o auxiliar exercer uma função específica do herói, ocupando assim seu
lugar.
104
o na cama da filha, ainda bebê. Ela, portanto, é quem tem o poder de transformação:
faz Psiu, de fantasma, voltar a ser um simples lençol. A dona da fábrica, por sua vez,
é outra personagem que tem o poder de transformação: ao dobrar o lençol com
defeito e colocá-lo na pilha dos lençóis descartados, no início da narrativa muda o
destino de Psiu.
O bebê, que é a única personagem criança na história, tem, ao contrário das
mulheres adultas citadas, papel passivo, embora não se possa negar que a nova
vida adotada por Psiu ao seu lado passe a ser sinônimo de felicidade para ambos.
Se observadas as ilustrações, vê-se o bebê como uma criatura amável, sorridente,
sendo, segundo o narrador, “o mais lindo dos bebês” (BANDEIRA, 1998, p.40). A
harmonia da futura relação entre o fantasma e o bebê, bem como o desejo do autor
de fazer o leitor render-se à bondade e à meiguice de Psiu, podem ser conferidos na
Figura 6, a seguir, que ilustra o final do conto:
Pensa-se que a ilustração da p.26, que pode ser visualizada abaixo, na Figura
7, tenha o efeito de coroar esse sentimento de pena, sugerido pelo narrador, pois
nela encontra-se o fantasma sozinho, à noite, em um praça, sujo e esfarrapado;
108
grafado com letras enormes, acima dele, seu condoído choro, depois do dia passado
em busca de trabalho. A cena, composta pelo ilustrador da obra, Carlos Edgard
Herrero, condiz com a ideologia da narrativa.
N2a N1 N2b
a ■ ■ ■
explicação sobre a origem dos fantasmas história de Psiu menção ao passado do narratário
N1 narrativa principal
N2 narrativa secundária
início da narrativa
■ término da narrativa
13 O termo imbecilizar aplicado à literatura infantil é utilizado por Maria da Glória Bordini, quando se refere a um problema muito comum surgido nas
adaptações de obras de adultos para jovens e crianças, que consiste em abusar de “fórmulas verbais com diminutivos e adjetivações profusas e construções
frasais canhestras” (1986, p.7), no intuito de aproximar a linguagem do seu de seu novo leitor implícito.
110
O livro Bicho-papão para gente pequena, bicho papão para gente grande, da
carioca Sônia Travassos (2007) é, dentre os comentados neste capítulo, o mais
inovador no que diz respeito à forma. Embora o modo narrativo seja predominante
nos textos que o compõem, neles não se narra exatamente uma história; os 16
textos constituem uma espécie de glossário sobre bichos-papões, divido em duas
partes, com explicações prévias das respectivas narradoras. Na primeira parte, a
narradora, mãe da menina que é narradora na segunda, apresenta monstros e
outras assombrações conhecidas da cultura popular brasileira, como a Cabra-
cabriola, o Papa-Figo, o Mão de Cabelo, o Homem do Saco, o Quibungo; na
segunda parte do livro, a filha assume a narração e expõe sua coleção de bichos-
papões, inventados por ela mesma, com intenção de assustar a mãe ou outros
adultos, daí constarem as figuras fictícias denominadas Xicama, Mão de Sopa, Nó
de Escova, Senhor da Meia-Noite, entre outras.
A descrição que aqui se pretende analisar é a do “Mão de Cabelo”, ocupada
por uma única página, além da página em que predomina a ilustração, e
representante da categoria corruptora. Segundo a narradora, Mão de Cabelo é um
fantasma alto, vestido de lençol branco, que tem cabelos compridos e até as mãos
feitas de cabelo. Durante as madrugadas, ele ronda os quartos das crianças,
passando suas mãos de cabelo pelas camas. A criança que tiver a cama molhada
será punida com pesadelos horríveis durante a noite. A dica dada pela narradora
para espantar essa assombração é chamar o Barbeiro Tesourão, personagem
imaginária, única capaz de cortar as melenas do fantasma.
Como se pode ver, não há um conflito a ser resolvido por uma determinada
personagem pertencente à história. O conflito que se instaura, ou seja, o medo de
encontrar o terrível fantasma, é dirigido ao narratário e, consequentemente, lançado
para o circuito externo da comunicação literária, no nível do leitor implícito; é o
pequeno ouvinte ou leitor quem deve sentir o medo do fantasma e tomar cuidado
para não molhar a cama durante a noite. O que a autora pretende é provocar temor
no leitor pela própria narrativa, feita tão somente da descrição de características e
ações desse fantasma. Essa estratégia discursiva remete às narrativas exemplares,
111
14 A motivação, explica Propp, é a razão e/ou o objetivo que leva a personagem a realizar determinada(s) ação(ões); é um dos elementos mais instável e
versátil do conto maravilhoso. Ações semelhantes ou idênticas podem corresponder a motivações diversas. Alerta o estudioso: “o sentimento de carência,
frequentemente, não recebe nenhuma motivação” (1994, p.71).
112
sua aparência, seu nome, o momento, o local e a finalidade com que aparece e a
punição reservada ao indivíduo que diante dela se deparar, tendo cometido uma
falta (isto é, ter urinado na cama). Ao final, o leitor se depara com uma surpresa: a
possibilidade de vencer a assombração; assim, é oferecida ao leitor uma espécie de
solução para o conflito que vive, embora ela seja dada por um agente externo.
Encontra-se no Dicionário do Folclore Brasileiro, de Cascudo (2002), um
verbete correspondente ao mesmo fantasma descrito por Travassos:
assombrações, que para não encontrá-las, basta não sair à rua tarde da noite, é
difícil prevenir-se do ataque do Mão de Cabelo. A única solução seria, portanto,
manter a cama seca durante a noite.
A presença, ao final da narrativa, da nova personagem, o Barbeiro Tesourão
constitui-se, sem dúvida, em um mecanismo capaz de abrandar o medo do leitor,
causado pelos terríveis atos do Mão de Cabelo. O nome da personagem fictícia,
exagerado pelo aumentativo (para estar de acordo com a estatura do fantasma) bem
como o detalhe, no canto esquerdo da ilustração na página 12, que mostra uma
tesoura e a palavra “recorte”, (um convite para o leitor recortar o medonho fantasma
e sua cabeleira), conferem um tom humorístico à narrativa.
6 CONCLUSÃO
ZILBERMAN, 2003, p.36). Além disso, apontam Ariès e outros historiadores, a morte
era fator corriqueiro, inclusive a de crianças, seja por falta de higiene, doenças, fome
ou pelas intempéries. Mesmo que se sofresse a perda da morte, ela era entendida
como um acontecimento banal, capaz de suceder em qualquer casa (apud
AZEVEDO, 2008, p.1).
Além disso, o espírito popular medieval, salienta Ricardo Azevedo (2008, p.2),
“era marcado pelo fatalismo, pela crença no fantástico, em poderes sobre-humanos,
em pactos com o diabo e em personificações de todo tipo”. Nesse mundo, a crença
em seres e eventos sobrenaturais era disseminada em rodas de histórias, em plena
praça pública. Logo, presume-se que almas penadas também deveriam ser assunto
das histórias então contadas. Nessas narrativas de assombração, as almas
receberiam um tratamento que confirmaria seu caráter sobrenatural, o que as
tornaria obedientes aos critérios da categoria consolidadora, a qual, como se
verificou nesta pesquisa, está presente até hoje nas narrativas infanto-juvenis.
A categoria anuladora, por sua vez, surge, ou melhor, se consolida, a partir
da Revolução Industrial de 1750, período que marca o nascimento da própria
literatura infantil, a reorganização da escola, e em que se concede novo status à
infância, graças à ascensão da família burguesa. A família moderna, afirma
Zilberman (2003), procura a privacidade e está voltada a reforçar o vínculo afetivo
existente entre pais e filhos. A pesquisadora salienta ainda que “o aparecimento e a
expansão da literatura deveram-se antes de tudo à sua associação com a
pedagogia, já que aquela foi acionada para converter-se em instrumento desta”
(2003, p.33-34).
A associação da literatura infantil com a pedagogia traz mudanças que podem
ser percebidas até os dias de hoje, no que se refere aos usos e às finalidades
atribuídas ao trabalho com a literatura em escolas. Conforme Edmir Perrotti (1986), a
nova interpretação da infância que se instala a partir do século XVIII, e que é
conduzida ao longo do século XIX, conta com a atenção de filósofos, educadores e o
auxílio da Sociologia e da Psicologia, duas ciências novas e vizinhas, criando um
novo discurso. A infância passa a ser associada às ideias de “inocência, proteção e
segregação” (1986, p.79). Em virtude disso, a criança começa a ser vista como um
ser frágil e inocente, que deve ser amado, protegido, e sua educação deve ser
controlada, banindo-se alguns temas, anteriormente comuns.
122
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WHITE, Edward Lucas. A casa do pesadelo. In: POE, Edgar Allan et al. O grande livro do
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26. “Billy”
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32. “O zumbi”
GARCIA, Luciana. O zumbi. In: ______. O mais assustador do folclore: monstros da mitologia
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38. “A mortalha”
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GARCIA, Edson Gabriel. O casal de velhos. In: ______. Sete gritos de terror. São Paulo:
Moderna, 1991, p.15-22.
Referência:
DISCURSO
Voz:
Tempo de narração:
( ) ulterior
( ) anterior
( ) simultânea
( ) intercalada
Narratário:
( ) implícito ( ) explícito
( ) extradiegético ( ) intradiegético
Modo:
Distância:
Predomínio da
( ) mimese ( ) diegese
Discurso da personagem:
( ) narrativizado ( ) transposto ( ) relatado ( ) misto
140
Perspectiva:
( ) visão por trás ( ) visão com ( ) visão de fora
( ) sem anacronia
Predomínio de
( ) pausa ( ) cena ( ) sumário ( ) elipse
HISTÓRIA
Personagens:
Elementos espácio-temporais:
Ações:
141
CDD 028.5