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ETHNOSCIENTIA V. 3, 2018
www.ethnsocientia.com
ISSN: 2448-1998
D.O.I.: 10.22276/ethnoscientia.v3i0.191
Ethnoecological knowledge in the artisanal fishery of marine shrimp (Penaeidae): synergy of the
knowledge
Glória Cristina Cornélio do NASCIMENTO ; Eduardo Beltrão de Lucena CÓRDULA ; Thyago de Almeida SILVEIRA ; Maria Cristina Basílio
1* 1 2
Crispim da SILVA . 3
(PRODEMA) Universidade Federal da Paraíba- UFPB, Professor Doutor -Instituto Federal de Ciência e Tecnologia da Paraíba- IFPB, Campus Cabedelo, Professora Doutora
2 3
Associada IV, Departamento de Sistemática e Ecologia (DSE), CCEN, Universidade Federal da Paraíba- UFPB. E-mail: [email protected]
*
RESUMO:
A pesca no Brasil apresenta significativa importância por ser exercida por muitas comunidades ao longo da costa e por
ser uma atividade fornecedora de alimento e renda. Além destas, possui uma grande variedade de técnicas e diversidade
no manejo das espécies capturadas. Uma das técnicas de pesca mais utilizadas na costa nordestina é a do arrastão de praia,
sendo tradicionalmente direcionada para a captura dos camarões. O objetivo desta pesquisa foi analisar comparativamente
o conhecimento etnoecológico dos pescadores proprietários de redes de arrasto (n=8) entrevistados, frente aos fatores
bióticos e abióticos dos dados coletados na localidade, suas implicações sobre a dinâmica da pesca e como estes
influenciam diretamente nas estratégias de pesca no município de Lucena, estado da Paraíba. Os dados foram coletados
de janeiro a dezembro/2016. Para buscar o conhecimento dos especialistas, foi utilizada a técnica da “Bola de neve”
(“snowball”) e, a partir destes informantes, foram realizadas entrevistas com formulário semiestruturado, com perguntas
abertas e fechadas, durante o mês de agosto de 2016. Para a análise dos dados foi estruturada uma Tabela de Cognição
Comparada que apontou conhecimentos controversos dos pescadores a respeito da reprodução dos camarões peneídeos,
sinalizando a necessidade de troca de conhecimentos entre o pesquisador e o público pesquisado. Os especialistas
demonstraram conhecimentos em relação aos ventos, às marés, à lua, e todas as influências que estas possuem na pesca
do camarão. Os lances de arrasto também sofrem influência direta com o tipo de sedimento na área em que ocorrem, o
que corrobora com o conhecimento local dos pescadores para escolha do melhor local de pesca. A fenologia quanto à
ocorrência das espécies também foi confirmada com as informações obtidas com os pescadores, sobre a pluviometria e a
produção de produto pescado. Assim, este registro poderá contribuir com informações para conservação destas espécies,
assim como registro da cultura tradicional da pesca artesanal no município e na sua relação com a natureza.
PALAVRAS-CHAVE: Conhecimento ecológico local; Pesca de arrasto; Xiphopenaeus kroyeri; Litopenaeus schmitti
ABSTRACT
Fishing in Brazil is of great importance, not only because it is carried out by many communities along the coast, but also
providing food and income. One of the fishing techniques used mainly on the northeastern coast is the beach
trawler, traditionally used for catching shrimp. The aim of this research was to analyze the ethnoecological knowledge of
the fishermen interviewed, who use this type of trawler (n = 8) compared to the biotic and abiotic factors of the data
collected in the locality, their significance on the fishing dynamics and how these directly influence fishing strategies in
the municipality of Lucena in the state of Paraiba. The data from the biotic and abiotic factors were collected from January
to December in 2016. To obtain knowledge from the specialists, the "snowball" technique was used and the owners of
the trawlers were interviewed using a semi-structured form with open and closed questions during the month of August
2016. For the analysis of the data, a table of comparative cognition was structured which pointed out the controversial
knowledge that these fishermen have regarding the reproduction of the peneid prawns, signaling the need for an exchange
of knowledge between the researcher and the public surveyed. Experts have demonstrated knowledge about the winds,
tides and the moon, and all the influences they have on shrimp fishing. Drag trawls also have a direct influence on the
type of sediment in the area in which it occurs, which corroborates with the local knowledge of the fishermen for the best
place for fishing. The phenology as to the occurrence of the species was also confirmed by the information obtained from
fishermen on rainfall and fish production. Thus, this registry may contribute information for the conservation of these
species, as well as a record of the traditional culture of artisanal fishing and its relationship with nature.
KEYWORDS: Local ecological knowledge; Trawling; Xiphopenaeus kroyeri; Litopenaeus schmitti
Nascimento et al. Conhecimento etnoecológico na pesca artesanal do camarão marinho (Penaeidae): sinergia dos saberes. Ethnoscientia v. 3: 1-18, 2018. DOI:
10.22276/ethnoscientia.v3i0.191
INTRODUÇÃO
A pesca no Brasil apresenta significativa importância por ser exercida por muitas comunidades ao
longo da costa, fornecendo alimento e renda (SILVANO, 2004), além de apresentar grande variedade de
técnicas e diversidades no manejo das espécies capturadas (DERMAN e FERGUSON, 1995). A pesca de
camarões peneídeos tem altas concentrações nas regiões tropicais e subtropicais. Porém, no Nordeste do Brasil,
apesar de sua importância econômica, ainda são escassas as informações sobre esta atividade e as espécies
capturadas (SANTOS e FREITAS, 2002). Segundo esses autores, a pesca tradicional com arrastão de praia
direcionada para a captura dos peneídeos é ainda realizada em algumas localidades da costa nordestina e em
águas rasas.
Na Paraíba, quanto ao estudo com camarões marinhos e comunidades pesqueiras, Silva (1986)
registrou em sua pesquisa a pesca com arrastão de praia no município de Lucena, descrevendo esta faina como
a base pesqueira desta localidade. Nos anos de 1997 a 1998 Sarmento et al. (2001) determinaram os períodos
de entrada de pós larvas dos camarões peneídeos no litoral de Lucena-PB e no estuário do Rio Paraíba da
mesma localidade. Estudos sobre biometria dos peneídeos e sua importância econômica neste município
também foram registrados por Moura et al. (2003). Já Santos et al. (2006) direcionaram as suas pesquisas para
todo o Nordeste, analisando o crescimento do camarão-branco – Litopenaeus schmitti (Burkenroad, 1936) –
incluindo, nestes dados, o município de Lucena como área/base amostral. Em 2007, Pereira-Neto (2007)
relacionou a atividade da pesca de arrasto em Lucena com a saúde dos pescadores, adotando uma abordagem
multidisciplinar. Portanto, estudos em diversas áreas, como geografia, biologia e saúde, vêm sendo realizados
no município de Lucena sobre a pesca de arrasto de camarão (peneídeos).
A precariedade nesta atividade da pesca e outros conflitos foram descritos por Silva e García (2013),
demonstrando que sua continuidade está ameaçada enquanto atividade de subsistência tradicional. O município
de Pitimbú-PB também apresenta essa atividade pesqueira com arrastão de praia e direcionada aos camarões
peneídeos, onde foram realizados estudos relacionados à importância socioeconômica, bioecologia das
espécies de camarões, áreas de pesca, produção e estratégias de captura (MOURA, 2005).
Apesar desta atividade ser registrada há décadas no estado da Paraíba (SILVA, 1986; SARMENTO et
al., 2001; MOURA et al., 2003; SANTOS et al., 2006; PEREIRA-NETO, 2007; SILVA e GARCÍA, 2013),
nenhum estudo buscando o Conhecimento Ecológico Local ainda foi realizado, portanto, tornando-se este
relevante no fornecimento de dados para futuros planos de manejo ou políticas públicas que venham a ser
implantadas na região. Há, portanto, uma carência em pesquisas com enfoque etnoecológico com comunidades
locais no Litoral Norte da Paraíba, em especial no município de Lucena, principalmente sobre a pesca artesanal
de camarões (ZEINEDDINE et al., 2015). As pesquisas neste campo científico podem proporcionar medidas
de ordenamento ao utilizarem como base os conhecimentos dessas comunidades e que contribuiriam de forma
impactante para a conservação dos estoques naturais e para a continuidade da cultura pesqueira no município
(SOUTO, 2010). A relação que estes pescadores possuem com o ambiente faz parte de uma rede ecossistêmica
e que deve ser analisada sob o contexto das relações sociais e não só pelo que se refere ao uso e à apropriação
dos recursos naturais (MONTENEGRO et al., 2001).
A pesca artesanal e o conhecimento etnoecológico têm foco de interesse da comunidade científica, por
se perceber que estes conhecimentos portam riquezas em detalhes inerentes às atividades da faina, dos
ambientes e das culturas locais (HANAZAKI, 2003). Esta parceria entre os pescadores e os cientistas pode
esclarecer determinados eventos sobre as mudanças no ambiente local e, assim, proporcionar ações de
adaptações culturais e socioambientais, e que poderiam ser implementadas para o enfrentamento a estas
mudanças que afetam diretamente o modo de vidas das populações humanas (ALVES, 1987).
Portanto, o objetivo desta pesquisa foi analisar comparativamente o conhecimento etnoecológico dos
pescadores proprietários de redes de arrasto entrevistados frente aos fatores bióticos e abióticos dos dados
coletados na localidade, suas implicações sobre a dinâmica da pesca e como estes influenciam diretamente nas
estratégias de pesca no município de Lucena, estado da Paraíba.
2. MATERIAL E MÉTODOS
Área de Estudo
O município de Lucena está localizado no litoral norte da Paraíba, ocupando uma área de 88.944 km , 2
com aproximadamente 16 km de extensão de praia (orla) (FERNANDES et al., 2011). Segundo o IBGE (2010),
o município possui uma população de aproximadamente 11.545 habitantes. Conforme descrição de Córdula et
al. (2015), o município possui chuvas de outona e inverno, vegetação com resquícios de Mata Atlântica,
Manguezais e rios perenes (Miriri, Vieira, Marco João, Jardim, Caboclo, Pico Camaçari e Araçá). Quanto às
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características urbanas e rurais, possui dois assentamentos agrícolas, com produção de alimentos que atendem
a população local e aos municípios circunvizinhos, além de áreas de monocultura para indústria de alimentos
do estado: canavieira e de cultivo de coco. Além destas, historicamente o município possui uma
representatividade na pesca extrativista artesanal, com destaque para a pesca de arrasto ou arrastão, visando o
camarão marinho, a pesca de costa e alto mar, além da catação de marisco, ostra, siri e caranguejo (CÓRDULA
et al., 2015; NASCIMENTO et al., 2018). Existem também duas Colônias de Pesca, a Z-5 na sede do município
(cidade de Lucena) e a Z-19 na comunidade de Costinha, que atendem a todos do município que realizam
pesca artesanal profissional (CÓRDULA et al., 2018). Conforme estudos de Nascimento et al. (2018), a
produção da pesca em Lucena é voltada para o consumo do próprio pescador e para atender à demanda da
comunidade local por meio da venda do produto pescado para atravessadores ou comercializado pelo próprio
proprietário de rede de arrasto durante a pesca na praia (NASCIMENTO et al., 2018).
Figura 1: Área de estudos e locais de desembarque dos arrastões de praia na pesca do camarão em Lucena-PB.
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seguem uma distribuição Normal, como as que não apresentam essa suposição. A presença dessa característica
facilita o uso dos componentes em análises posteriores, caso seja o objetivo do estudo. Os dados em questão
passaram pelo teste de Anderson Darling para verificação de normalidade dos dados, levando em consideração
um nível de significância de 5%, o que foi comprovado para as variáveis em questão. O programa utilizado
para as análises estatísticas foi o software livre R 3.4.0.
Ética na Pesquisa
Esta pesquisa foi submetida e aprovada pelo Comitê de Ética da Universidade Federal da Paraíba,
Protocolo n. 0211/2015 (CE/CCS/UFPB), através da Plataforma Brasil CAAE n.445935154.8.0000.5188.
Todos os participantes entrevistados neste estudo assinaram o Termo de Consentimento Livre e Esclarecido
(TCLE) fazendo este parte das Normas de Ética na Conduta da Pesquisa com Seres Humanos, da Resolução
n. 510/2016 do Conselho Nacional de Saúde (BRASIL, 2016).
3. RESULTADOS E DISCUSSÃO
Fatores Abióticos
Ventos, Lua e maré
As variáveis ambientais (chuva, lua, maré e ventos) são atribuídas pelos pescadores artesanais como
condicionantes para o sucesso ou fracasso de suas atividades (RAMIRES et al., 2012). Fuzetti e Corrêa (2009)
relataram que os pescadores da Ilha do Mel, Paraná, relacionam as variáveis ambientais na tomada de decisão
para a escolha de pontos de pesca, manejo e espécies a serem capturadas.
Os pescadores de camarão (donos de rede) associam os ventos como um dos fatores que afetam a
atividade da pesca. Questionados sobre qual o melhor vento para pesca do camarão, 37,50% citaram os ventos
leste (E) e sul (S) (Figura 2). Estas respostas foram analisadas comparativamente e associadas ao total de
captura (em kg), em relação aos ventos que predominaram nos dias de pesca, que foram confirmadas com os
dados abióticos obtidos nos dias de realização das coletas. Durante a ocorrência do vento tipo E, houve uma
produção de 353,8kg; com o vento S, a produção foi de 401,4kg; o vento este-sudeste (ESE) apresentou uma
produção de 134,0kg. O vento norte (N) não obteve relação com a produção porque não houve pesca no período
de incidência destes ventos e que foram indicados pelos próprios pescadores proprietários de rede de arrasto.
Figura 2: Conhecimento Ecológico Local (CEL) dos pescadores (donos de rede) quanto ao melhor vento para a captura do camarão
na praia de Lucena-PB e comparativamente associados com a produção de camarão nos dias de coleta em que ocorreram tais ventos.
Percebe-se que os pescadores associam os ventos à questão da força que estes exercem sobre as
correntes marítimas na localidade. A maioria das respostas caracteriza este tipo de afirmação, como: “O vento
sul é bom porque arrasta o camarão” ou “É bom porque traz produção”; “O vento leste é melhor porque o
camarão aparece mais”. As respostas ainda apresentaram outros tipos de ventos, porém, com baixa frequência
(ESE, N) (Figura 2).
A representação de fenômenos climáticos por pescadores é bastante enfatizada com relação aos ventos.
A observação constante e a proximidade com esses fenômenos naturais fazem com que desenvolvam formas
de enfrentamento e preparo para esses eventos (CARDOSO, 2004). Baseado nesses fatores climáticos e que
influenciam a pesca, os pescadores classificam e descrevem as condições do tempo como favoráveis ou não à
realização das atividades pesqueiras (BURDA e SCHIAVETTI, 2008).
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Figura 3- Conhecimento Ecológico Local (CEL) dos pescadores (donos de rede) quanto à melhor fase lunar para a captura do camarão
na praia de Lucena-PB (NS = não soube responder), analisado comparativamente e agregado ao total da produção de camarão associado
com a Lua nos dias de coleta.
Em Ubatuba, no estado de São Paulo, foram realizados estudos das variáveis ambientais na atividade
pesqueira, e foi constado que os desembarques pesqueiros tiveram melhor rendimento durantes as fases da lua
crescente (CLAUZET, 2000). Já os pescadores artesanais do Vale do Ribeira e do Litoral Sul de São Paulo
divergiram quanto à influência da Lua na atividade de pesca, uma vez que das seis comunidades analisadas,
cinco incluíram nas respostas que a Lua não teria influência, enquanto que a sua fase cheia obteve maior
porcentagem na maioria das respostas de uma única comunidade (RAMIRES et al., 2012). Portanto, estudos
realizados no litoral do Brasil mostram que a fauna marinha sofre forte influência da lua, o que é um fator
favorável ao pescador que sabe interpretar esta variável ambiental (FIGUTI, 1998; CUNHA, 2003; MOURÃO
e NORDI, 2003; COSTA-NETO e LIMA, 2000).
O tipo de maré também reflete o Conhecimento Ecológico Local que os pescadores detêm, e isso
influencia em seus comportamentos (horário de pesca), tipos de apetrechos e outras condutas que venham a
ser adotadas, durante as atividades da pesca ao longo dos anos (FERNANDES-PINTO e MARQUES, 2004).
Além deste fator, a hidrodinâmica dos oceanos caracteriza os tipos de marés e permite aos pescadores nomeá-
las (SOUTO, 2008). As marés de “lançamento” são representadas pela fase em que a Terra se encaminha para
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o alinhamento com a Lua e o Sol, formando as marés de sizígia e quando se pode observar as maiores e
menores amplitudes (ALVES e NISHIDA, 2003). O contrário ocorre com as marés de “quebramento”, em que
as forças antes exercidas perdem intensidade. Segundo os pescadores de camarão de Lucena, quando
questionados sobre a melhor maré para a sua captura, informaram que seria a maré denominada de
“lançamento” (75,0%), seguida da maré “morta” (25,0%) (Tabela 1).
Tabela 1 - Resposta dos pescadores (donos de rede) quanto à melhor maré para a captura do camarão.
Maré Frequência absoluta (n) Frequência Relativa (%)
Lançamento 6 75.0%
Morta 2 25.0%
Total Geral 8 100.0%
Os dados da produção da pesca nos dias de coleta demonstraram que as marés de “lançamento” foram
favoráveis para a captura de camarões (30,96%) (Tabela 2), conforme descrição literal da fala de dois deles:
“A maré de lançamento cresce e vai desenterrando o camarão da lama”; “É boa a maré de lançamento por
que ela cresce mais e vem lançando cada dia e traz o camarão”. Em pesquisa realizada em duas comunidades
do município de Peruíbe, São Paulo, os pesquisadores relacionaram as marés baixa, média e alta com a
biomassa pesqueira e constataram que, nas marés altas, a captura da biomassa pesqueira foi maior, apesar da
baixa quantidade de desembarques estudados (RAMIRES e BARRELA, 2003).
Tabela 2 - Dados do tipo de maré de acordo com a opinião dos pescadores (donos de rede) da praia de Lucena-PB e produção do
camarão nos dias de coleta.
Maré Produção camarão (kg) Produção camarão (%)
Lançamento 446.4 30.96%
Maré grande 410.6 28.47%
Maré morta 201.3 13.96%
Quebramento 383.7 26.61%
Total Geral 1.442,0 100.0%
Além disso, os pescadores de Lucena associam a fase da Lua com os tipos das marés, demonstrando
a relação direta entre eles, e isso pode ser percebido na resposta com relação às fases lunares (Figura 4),
conforme a afirmação de um dos entrevistados: “A lua crescente é boa porque dá maré de lançamento”.
Figura 4: Representação das fases da lua e tipos de maré de acordo com o Conhecimento Ecológico Local dos pescadores de camarão
do município de Lucena-PB.
Áreas de pesca
Os pescadores adquirem conhecimentos ao longo das suas atividades e utilizam-se destes para obter
maior sucesso em suas pescarias (MARQUES, 2001). Segundo Batista et al. (2007), o conhecimento
tradicional também é construído através do processo de territorialização, por consequência da relação direta
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de uso, dependência dos recursos e da interpretação realizada através dessas interações. Mediante o
conhecimento dos “caminhos do mar”, os pescadores realizam suas escolhas dos melhores locais de pesca
(MALDONADO, 1986). Na pesquisa realizada por Paulo Júnior et al. (2012), constatou-se que no litoral da
Paraíba a maioria dos pescadores não possui GPS e costuma se orientar por algumas referências na costa, como
moradias ou algum elemento da paisagem natural, bem como utiliza a profundidade do local e o tipo de
sedimento do fundo (rochas, areias, cascalhos ou lama) para identificação dos melhores pontos de pesca.
Na pesca do camarão em Lucena, os locais escolhidos para realizar os “lances” (lançar as redes da
praia para o mar e trazê-la de volta à praia) não eram aleatórios. Segundo os pescadores, o tipo de sedimento
(“lama”) é um dos fatores que influenciam esta ação, pois, dependendo da sua textura (tipologia) no momento
da pesca, a rede poderá “atolar” (ficar presa ou ter maior aderência ao sedimento) prejudicando toda a
atividade, e necessitando de um maior esforço físico por parte de todos que participam da pesca. O número de
lances possui correlação direta com o período chuvoso, tanto em termos de grandeza na correlação da
granulometria e quanto do tipo de substrato que se apresentam. Desta forma, por consequência no período
chuvoso a quantidade de lances aumenta, e isto é evidenciado pela concentração de redes no local onde o tipo
de sedimento (areia grossa) ocorre. Na análise de granulometria realizada, com as coletas de sedimento, foram
identificados por essa ordem de grandeza e correlação: Areia Grossa, Matéria Orgânica (MO), Areia Fina e
Cascalho. O número de lances apresentou correlação negativa com Argila e Silte no período seco (Figura 5).
Figura 5: Análise de Componentes Principais para o ponto de Coleta 1 na pesca de arrasto do camarão na praia de Lucena-PB.
Na Figura 6, que representa o ponto de Coleta 2, o cenário é muito semelhante, sendo que a ordem de
correlação do número de lances com as demais variáveis é: período chuvoso, Areia Grossa, MO, Areia Fina e
Cascalho. Mais uma vez, Argila e Silte apresentaram uma correlação negativa com o número de lances, bem
como com o período seco.
Figura 6: Análise de Componentes Principais para o ponto de Coleta 2 na pesca de arrasto do camarão na praia de Lucena-PB.
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No ponto de Coleta 3, apresentado na Figura 7, percebe-se que o número de lances se relaciona com:
MO, Cascalho, Areia Grossa e Areia Fina, nessa ordem por grandeza de correlação. Assim, como nos outros
pontos de coleta, a Argila e a Silte tiveram uma correlação negativa com os lances, com o período chuvoso e
com o período seco.
Figura 7: Análise de Componentes Principais para o ponto de Coleta 3 na pesca de arrasto do camarão na praia de Lucena-PB.
Fenologia
A pesca do camarão em Lucena ocorre o ano todo, porém os pescadores associam a ocorrência dos
camarões a determinadas épocas do ano: “O camarão espigudo gosta de água fria e suja”; “O camarão branco
aparece mais no verão e gosta de água limpa”. Este tipo de conhecimento reflete as diferenças no
comportamento dos camarões Xiphopenaeus kroyeri (“espigudo”) e Litopenaeus schmitti (“camarão-branco”)
ao longo do seu ciclo de vida. De acordo com os dados de produção, em 2016 as maiores frequências nos
arrastos de X. kroyeri foram nos meses onde a pluviosidade obteve maiores índices, enquanto L. schmitti
apresentou uma frequência maior nos meses com pouca ou quase nenhuma chuva (Figura 8), o que corroborou
com o conhecimento ecológico dos pescadores na localidade. Isto ocorre devido à vazão estuarina que aumenta
de acordo com os índices de pluviosidades ocorridos naquela região e, com isso, o aporte de nutrientes nas
águas costeiras tende a ser também maior, acarretando águas mais “sujas” e baldeadas (na linguagem do
pescador), ou seja, com maior intensidade de sedimentos dissolvidos (DIAS-NETO, 2011). Em mares
tropicais, as variações hidrológicas se relacionam diretamente com as flutuações da pluviosidade nas regiões
estuarinas próximas à costa (ALMEIDA, 2006; ARAÚJO e RIBEIRO, 2005). Além disso, os pescadores
associam com a estação do ano para denominar o que dizem ser “água fria” (inverno - chuvas) e “água quente”
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(verão - estiagem). Em Alagoas, Maceió, os estudos realizados por Marques (1991) mostraram que pescadores
não utilizam o clima/tempo com base nas estações do ano de “inverno” e “verão”, mas sim, em “fragmentos
do tempo”, relacionados com períodos de muita chuva e estiagem.
140 450
400
120
Número de indivíduos (kg)
350
Pluviometria (mm)
100
300
80 250
60 200
150
40
100
20
50
0 0
JAN FEV MAR ABR MAI JUN JUL AGO SET OUT NOV DEZ
Figura 8: Frequência das espécies de camarões e a pluviometria do ano de 2016 no município de Lucena-PB.
Ainda em Alagoas, pescadores de camarão alegaram existir uma relação direta com a produção e a
pluviosidade (SANTOS e FREITAS, 2000). Eles relataram que no verão as águas ficam transparentes e,
consequentemente, os camarões desaparecem. No Paraná, Andriguetto-Filho et al. (2016) constataram que a
captura do camarão X. kroyeri é influenciada pela dinâmica hidrológica em decorrência dos períodos chuvosos
que, consequentemente, ocasionam descargas locais de materiais particulados pelos estuários. Conforme
Bastos e Silva (2000), a atividade de pesca de L. schmitti no estuário do Rio Caeté-PA diminuiu na estação
chuvosa. Isto é corroborado com a afirmação de Capparelli et al. (2012), que em seus estudos na Baía de
Ubatuba, São Paulo, mostraram que o aumento da pluviosidade acarretava uma menor frequência de captura
desta espécie (CAPPARELLI et al., 2012). Todos esses estudos e pesquisas confirmam e coincidiram com os
dados desta pesquisa, demonstrando que os pescadores conhecem estas relações sazonais e as espécies que são
ou não beneficiadas nesses períodos.
Fatores Bióticos
Conhecimento ecológico local versus literatura científica
Os pescadores foram questionados sobre a reprodução, alimentação, predadores e o tipo de habitat em
que os camarões viviam. A cognição deles foi comparada com informações da literatura científica, permitindo
encontrar semelhanças, complementariedades e diferenças entre elas (Tabela 3).
Sobre a reprodução dos camarões, foram abordadas duas questões: se sabem diferenciar os machos
das fêmeas e como eles se reproduzem. Os pescadores entrevistados relacionaram as diferenças sexuais ao
tamanho e à estrutura do corpo do animal; outros o fizeram com os caracteres externos, comparando-os com
características do aparelho reprodutor humano (pênis/testículos). Os camarões capturados nos arrastos em
Lucena apresentam dimorfismo sexual. Os machos detêm uma estrutura chamada petasma, que está localizada
entre o primeiro par de pleópodos, e as fêmeas possuem uma estrutura chamada de télico (onde os
espermatóforos se fixam na cópula). Porém, 50% dos pescadores não souberam expressar uma resposta ao
questionamento realizado sobre o dimorfismo sexual, enquanto 75% dos pescadores não souberam responder
como a reprodução ocorre. Além disso, 25% das respostas associaram a reprodução dos camarões com duas
espécies diferentes e que, frequentemente, aparecem nos arrastos. Porém, estas duas espécies são capturadas
com baixa frequência de indivíduos e não possuem importância comercial para os pescadores. Estas espécies
foram identificadas como Exhippolysmata oplophoroides (Holthuis, 1948) e Nematopalaemon schmitti
Holthuis, 1950). Durante seu ciclo reprodutivo, essas espécies carregam seus ovos nos pleópodos, o que
diferentemente ocorre com X. kroyeri e L. schmitti, que são da família Penaeidae e não apresentam esse tipo
de cuidado parental (ALMEIDA et al., 2012; MELO, 1996; BAEZA et al., 2010; HENDRICKX, 1995).
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Além desta constatação, a coloração do corpo também facilita esse tipo de associação, pois as
colorações de E. oplophoroides e N. schmitti se assemelham, uma vez que N. schmitti e L. schmitti possuem
colocação branca, enquanto E. oplophoroides e X. kroyeri possuem coloração avermelhada. Na estação
ecológica de Juréia-Itatins, no município de Peruíbe, São Paulo, Zeineddine et al. (2015) registraram que os
pescadores também associam a reprodução dos camarões marinhos com as ovas encontradas no abdome dos
indivíduos, onde 50% das citações associaram esta observação ao camarão-branco; além disso, 65% dos
pescadores entrevistados não souberam identificar os machos. Fica evidente, portanto, que os aspectos
reprodutivos ainda são pouco conhecidos entre os pescadores e os conhecimentos produzidos entre eles em
relação a esta questão são intuitivos e associativos com outras espécies marinhas.
Tabela 3: Tabela de cognição comparada entre o conhecimento dos pescadores (donos de rede) sobre aspectos do camarão e
informações da literatura científica.
Camarões (XiphopenaeusKroyeri), (PenaeusSchmitti), N= 08 pescadores
Categorias CEL (Conhecimento Ecológico Literatura Científica Fonte
Local)
Reprodução Macho mais magro, fêmea mais Machos possuem órgão D’Incao (1995); Dall et al.
(Diferença entre gorda. copulador (petasma) e as fêmeas (1990); Fernandes et al.
macho e fêmea) Macho tem dois ovinhos, fêmea apresentam o télico (receptor). (2011); Peréz-Farfante
não tem. (1970).
Macho tem entre as patas um
pênis, fêmea não tem.
Machos maiores e fêmeas
menores (12,5% cada).
NS (50%).
Reprodução Existe uma “mãe” do camarão que Exhippolysmata oplophoroides Almeida et al. (2012);
(Como se carrega os ovos na barriga (uma é (Holthuis, 1948) – camarão de Melo (1996); Baeza et al.
reproduzem) vermelha, referente ao camarão- coloração avermelhada. (2010); Hendrickx (1995).
sete-barbas, e a outra é branca, Nematopalaemon schmitti
referente ao camarão-branco (Holthuis, 1950) – camarão de
(25%). coloração branca
NS (75%). Os embriões dessas espécies são
incubados nos pleópodos das
fêmeas.
Predadores Bagre (12,5%) e peixes (87,5%). Peixes, crustáceos, cefalópodos, Dall et al. (1990); Peréz-
celenterados, aves. Farfante (1970)
Habitat Lama (70,0%); mar aberto, pedras Fundos lamosos, fundos Barros e Jonsson (1967);
(10,0%); sargaço (20,0%). arenosos, areia lamosa, areia Fausto Filho e Nomura
com fanerógamas, lama com (1966); D’Incao (1995).
conchas.
Com relação à alimentação, a predadores e ao habitat dos camarões, as respostas foram muito variadas,
porém se complementaram com a literatura científica, demonstrando certo conhecimento a respeito dessas
questões (DALL et al., 1990; BRANCO e JÚNIOR, 2001; PERÉZ-FARFANTE, 1970), conforme observado
na Tabela 3.
No Brasil, a principal medida de ordenamento pesqueiro para o camarão marinho é o defeso
(VASQUES e COUTO, 2011). Segundo esses autores, o poder público não se utiliza do conhecimento
tradicional/local desses pescadores e sugerem que estes poderiam fornecer informações importantes e com
maior precisão para o manejo dos recursos marinhos. Por essa razão, durante a aplicação do formulário
semiestruturado os pescadores foram questionados sobre um possível período de defeso para a pesca do
camarão no município de Lucena-PB, e o porquê que ele deveria ou não ser implantado. As respostas
concentraram-se nos meses de junho, julho e agosto como os melhores meses para interromper as atividades
pesqueiras (Quadro 1). Os principais fatores elencados por eles para esse período, como o de maior
produtividade pesqueira, foi o fato de que os camarões estavam “pequenos” (em desenvolvimento) ou se
reproduzindo (fase madura e fértil). A biometria realizada com os camarões coletados em campo e analisados
comparativamente com os meses citados pelos pescadores apontou que o comprimento total do camarão X.
kroyeri durante a fase adulta (reprodutiva) possui um comprimento menor, enquanto os camarões da espécie
L. schmitti possuem um comprimento maior. A possível implantação do período de defeso deverá ser
cuidadosamente avaliada, visto que as duas espécies possuem ciclos reprodutivos e de recrutamento em épocas
diferentes.
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Nascimento et al. Conhecimento etnoecológico na pesca artesanal do camarão marinho (Penaeidae): sinergia dos saberes. Ethnoscientia v. 3: 1-18, 2018. DOI:
10.22276/ethnoscientia.v3i0.191
Quadro 1: Resposta dos pescadores de camarão da praia de Lucena-PB (donos de rede) quanto aos meses que deveria ser implantado
o período de defeso versus biometria dos dados biológicos coletados.
Respostas dos pescadores de camarão sobre os meses que deveria ser Biometria (dados de campo) 2016
Meses implantado o defeso (n) =8 CT (comprimento total=cm)
Pescador 1 2 3 4 5 6 7 8 X. kroyeri L. schmitti
jan 7˫10 7˫12
fev 5˫10 7˫9
mar 5˫8 8˫13
abri 4˫7 8˫12
mai 4˫6 8˫14
jun 5˫7 11˫15
jul 5˫8 11˫14
ago 5˫7 9˫13
set 5˫8 10˫14
out 5˫9 9˫13
nov 5˫9 7˫11
dez 6˫10 7˫11
Em Ilhéus, Bahia, 75% dos pescadores de camarão sugeriram que parte do defeso para o sete-barbas
deveria ser implantada nos meses de maio a julho, e consideraram que seriam necessários estudos do ciclo de
vida para o camarão-rosa antes da definição integral do defeso na região (VASQUES e COUTO, 2011). Souza
(2008) constatou que na localidade de Perequê, no município de Guarujá-SP, existe o defeso para a pesca do
camarão X. kroyeri e que este acarretou problemas para os pescadores, pois, segundo 80% dos relatos dos
próprios pescadores a reabertura do período para pesca afetou diretamente os indivíduos jovens (março a
maio), enquanto que o período de defeso (outubro a dezembro) atua sobre os estoques de camarões “graúdos”,
considerados como os ideais para a captura.
Quando questionados sobre o destino do camarão pescado, os proprietários de rede de arrasto de
Lucena afirmaram que os destinam para venda através de um atravessador, raramente consumindo-os. Existe
apenas uma exceção entre um dos entrevistados, que comercializa o camarão com “casca” (com exoesqueleto)
a R$ 15,00 o espigudo e R$ 25,00 o branco. Já o “filé” (sem o exoesqueleto), o quilo varia de R$ 25,00 para o
espigudo a R$35,00 para o branco.
Topografia corporal
A percepção dos pescadores de arrasto em Lucena-PB, a respeito da morfologia externa dos camarões
capturados foi analisada com a utilização de uma imagem ilustrativa didática (desenho) de um camarão típico.
As partes do corpo do camarão foram apontadas e nomeadas pelos pescadores, em sua linguagem e
conhecimentos locais. Os pereiópodos e o pleiópodos tiveram maior frequência de respostas, para os diversos
nomes atribuídos a estas estruturas (Figura 9), onde os pescadores os associaram com a função de locomoção
(pé ou perna) e função de natação (nadadeiras ou natação). As outras partes do corpo do camarão não obtiveram
respostas divergentes daquelas que eles percebem (cabeça, olho, espinho, espeto). A estrutura do télson e do
urópodo receberam nomes semelhantes, não tendo distinção entre elas (rabo, calda). Observou-se que a
associação dos pescadores com a estrutura corporal do camarão, em relação à função que estas exercem no
animal, corrobora com a morfologia científica (DALL et al., 1990).
Na comunidade de Acupe, em Santo Amaro, Bahia, a topografia corporal dos camarões também foi
analisada por Souto (2004), comparando a terminologia científica com a nomenclatura folk das estruturas
referentes às partes do corpo do animal: rostro (“esporão”), urópodo (“cauda”), pereiópodos (“pernas”),
pleópodos (“nadadeiras) e cefalotórax (“cabeça”).
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Figura 9: Topografia corporal de um camarão Penaeidae, mostrando a comparação entre os termos locais (CEL) e acadêmicos. Fonte:
https://bit.ly/2PbttFC
Além da morfologia externa das partes do corpo do camarão, os pescadores foram questionados sobre
como diferenciavam uma espécie da outra, principalmente na hora da separação para a venda. A maior parte
das respostas (82,4%) esteve relacionada com a cor, tamanho e estrutura da cabeça dos camarões (rostro): o
camarão-espigudo (X. kroyeri) tem o “espeto” (rostro) maior e fino, coloração avermelhada e menor tamanho,
enquanto o camarão-branco (L. schmitti) tem o “espeto” (rostro) menor e com diâmetro maior, cor branca e
também apresenta um tamanho maior que o espigudo (Figura 10). O critério morfológico de coloração
utilizado pelos pescadores de camarão de Lucena atua como importante característica na diferenciação das
duas espécies economicamente importantes, influenciando também na nomenclatura folk local desses
camarões. Segundo Carneiro (2012), a presença ou ausência de estruturas no corpo do animal torna-se
essencial na identificação do exemplar pelos pescadores, através de atribuições associativas de forma, função,
cor etc.
Figura 10 – Morfologia externa dos camarões economicamente importantes na pesca de arrastão em Lucena-PB. Em “A”, destaque
para o “espeto” (rostro), estrutura que os pescadores observam no momento da separação das espécies; e em “B”, comparativo do
exemplar de maior tamanho da amostra coletada, do camarão branco (Litopenaeus schmitti) (11cm) em relação ao camarão “espigudo”
(Xiphopenaeus kroyeri) (5,6cm). Fonte: Glória C. C. do Nascimento, 2016.
4. CONCLUSÃO
O presente estudo, através dos dados científicos obtidos com as análises abióticas e bióticas, associadas
ao conhecimento etnoecológico dos pescadores de camarão com arrastão de praia em Lucena-PB, trouxeram
informações que, até então, eram escassos em publicações científicas sobre a região.
Quanto aos fatores abióticos, em relação aos ventos, lua, marés, direção das correntes marinhas, tipos
de sedimentos, períodos de chuva e estiagem, foram utilizados de forma associativa pelos pescadores de
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Lucena na escolha dos melhores dias, períodos e locais de pesca ao longo do ano. Quanto aos fatores bióticos,
os pescadores estabeleceram a nomenclatura folk das espécies de camarões capturadas, diferenciando-as por
aspectos morfológicos, além dos períodos de maior ocorrência de ambas, e pelos aspectos fisioecológicos,
estabelecerem o período da fase de desenvolvimento destas espécies, bem como, seus habitats e relações
ecológicas com outras espécies marinhas. Assim, conseguem estabelecer uma relação de convergência com os
fatores abióticos para possibilitar maior obtenção do pescado (camarão), com menor esforço físico durante as
suas pescarias.
Porém, houve divergência dos conhecimentos locais quanto ao período reprodutivo e ao
reconhecimento do dimorfismo sexual nas espécies dos camarões peneídeos, sinalizando a necessidade de
troca de conhecimentos entre pesquisador e pesquisados. Para sanar este último, o conhecimento sobre
reprodução e período de recrutamento das espécies economicamente importantes, será estabelecida à posterior,
uma parceria junto as colônias de pesca da localidade, como mais um retorno científico à comunidade local,
além dos dados/resultados já apresentados, para um melhor esclarecimentos para os pescadores, sobre estas
informações com o objetivo de ajudá-los em tomadas de decisão futuras durante as pescarias ao longo do ano.
Os períodos sugeridos pelos pescadores para defeso deverão ser analisados e complementados com
estudos temporais mais longos, para que se possa determinar um período de defeso que coincida com os das
duas espécies de valor econômico capturadas na região, visto que elas possuem comportamento ecofisiológico
diferente.
Portanto, este registro poderá contribuir também com outros campos da ciência, como a biologia
(zoologia) e a sociologia, promovendo a integração dos conhecimentos locais com os científicos, para a
utilização dos recursos naturais visando a etnoconservação das espécies envolvidas e na manutenção de um
ambiente equilibrado. Desta forma, os dados aqui apresentados e analisados poderão contribuir com futuros
planos de manejo das espécies envolvidas e da preservação da atividade da pesca artesanal tradicional com
redes de arrasto no município de Lucena, Paraíba.
AGRADECIMENTOS
Aos pescadores artesanais tradicionais de camarão do município de Lucena, Paraíba, pela luta diária,
persistência numa pesca de difícil manejo e pela cordialidade e receptividade com os pesquisadores. Ao
Instituto Federal de Tecnologia (IFPB) Campus Cabedelo, pela parceria nas análises granulométricas do
sedimento marinho. À CAPES, pela bolsa concedida à primeira autora e a todos os amigos que se empenharam
na ajuda de campo.
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