Introduo Nos ltimos dez anos trabalhando com cursos de Comunicao Social, vimos notando a ausncia, no mercado, de textos

que auxiliem os alunos a interpretarem e compreenderem o processo de criao de linguagem na mdia. Muitas das expectativas que os acadmicos trazem para as universidades, nem sempre so preenchidas nos primeiros semestres ou primeiros anos , na verdade, eles apenas se deparam com certos termos e certas prticas de leitura quando os cursos se especificam. Essa uma das preocupaes desse livrinho, dar um panorama geral para que o aluno, se vai

optar no trmino do perodo, que ele opte, ento, um pouco mais esclarecido com a rea que escolheu principalmente pelo contedo que a segunda parte enfoca, se no isso, o acadmico ao ler esses apontamentos pode despertar, talvez, algum talento inato na produo ou interpretao dos mdia. Este trabalho no tem grandes pretenses, no traz nada pronto, apenas aponta caminhos, da esse ttulo: Na Trilha dos Signos. Esses caminhos nos mostram como a interpretao dos MCM (meios de comunicao de massa), podem nos ajudar, no s como profissional ou como optarmos pela carreira a seguir, mas tambm a no crermos em tudo que lemos, em tudo o que vemos impresso ou em imagens pelo

mundo. Os MCM tm um objetivo: o de seduzir-nos, o de nos trazer informaes para o nosso crescimento ou para a nossa mais absoluta alienao. A informao que existe no mundo tem um peso insuportvel em nossa vida, todos os veculos que trazem informao vo despejando, a todo momento, toneladas de imagens impressas em revistas e jornais, outdoors e folhetos, ou toneladas de informaes verbais, pelo rdio por exemplo, ou verbais e visuais, no caso do cinema e da tev. A leitura desse trabalhinho deve preceder as disciplinas especficas dos cursos, o acadmico, deve, antes,

mergulhar no processo de interpretao e recepo para depois criar os seus prprios. A informao que existe no mundo est, a cada dia, mais globalizada, grandes redes lanam seus signos que vo formando, por sua vez, grandes malhas nas quais somos presos. Para tornarmos comum o que pensamos precisamos criar e enviar mensagens por meio de signos, eles so responsveis pela comunicao entre os seres, eles substituem os objetos que nos rodeiam e nos ajudam a interpretar a realidade. Da mesma forma que eles substituem os objetos que ali esto, eles tambm habitam essa realidade, ocupam um espao no jornal, nos livros, no cinema, na tev e assim por diante,

eles tm um corpo material, eles dividem com os nossos corpo o espao a nossa volta, por isso um leque de interesses disputam a produo, o envio, a recepo e a poltica dos signos. O que guia o nosso raciocnio terico, neste trabalho, a Semitica, ela ser delineada na primeira parte. A Semitica de Peirce, que a est, uma instigante doutrina dos signos que nos ensina a ler o mundo como linguagem. O mundo dos signos e o mundo dos objetos podem ser interpretados a um s tempo, j que os signos tambm podem ser 'lidos' como objetos pertencentes realidade, e os objetos como signos existentes 'per si', pois tambm carregam informaes.

A Semitica de Peirce no foi escolhida ao acaso. A base da viso do signo de Peirce est na concepo tridica do signo, ou seja, a viso de que o signo composto de uma materialidade, ou seja, de suas letras, cor ou som, de um significado que ele desperta na mente das pessoas, e de um objeto que ele representa. Por isso, dissemos que o mundo dos objetos tambm pertence ao mundo dos signos e a recproca verdadeira. Talvez neste erro tenham cado outras cincias da linguagem, pois, ao descartarmos o objeto que o signo representa estamos alijando da interpretao do mundo, o mundo mesmo.

Se o mundo linguagem e a linguagem, o mundo, aqui vai uma pequenina trilha aberta na floresta dos signos. Se conseguirmos criticar os signos criados pelos homens nos MCM, tambm saberemos criticar o mundo a nossa volta, e enfim escolhermos sempre, se no a ideal , pelo menos a melhor trilha para cada um de ns. 1. Semitica 1.1 Histrico Semitica uma cincia nascida nos primrdios de nosso sculo, no entanto, h umas poucas dcadas ela comea a despertar interesse de um pblico um pouco mais amplo.

A Semitica tem como objetivo maior estudar a ao dos signos sobre os homens, sobre os objetos que esses signos representam e sobre outros signos; essa ao conhecida como semiose. Deste vasto escopo da Semitica, podemos concluir que ela tem um carter interdisciplinar porque trabalha com os signos, que representam seu universo e todos os elementos que a esto, que fazem parte do nosso universo, real ou imaginrio, podendo ser at mesmo, objeto de estudo de qualquer outra cincia. Por tudo isso podemos dividi-la em dois nveis: a Semitica Pura, doutrina dentro da qual se configura a teoria dos signos e suas aes sobre o mundo como um todo e a Semitica

Aplicada, que se nos deparamos ao utiliz-la como ferramenta de outra cincia. A Semitica Aplicada visa estabelecer critrios de um sistema ou categorias que possam capacitar a anlise de um sistema de signos pertencente a qualquer universo que possibilite conhecimento. A doutrina dos signos teve dois pais que viveram na mesma poca, mas no se conheceram. O primeiro, europeu chamava-se Ferdinand de Saussure, e na realidade pai da Lingstica, cincia que tem como objetivo o estudo da linguagem verbal, e tendo estudado as vrias relaes da palavra com o homem Saussure em sua busca nos legou muitos

conceitos e termos que utilizar como emprstimo.

podemos

Saussure (1971:82) pareceu vislumbrar uma Semitica, chamada por ele de Semiologia, ao afirmar: "quando a Semiologia estiver organizada, dever averiguar se os modos de expresso que se baseiam em signos inteiramente naturais - como a pantomima - lhe pertencem de direito(...)", mais tarde foi Roland Barthes que apodera-se desse termo e desenvolve amplos conceitos que se estendem e se solidificam at hoje. O outro pai da Semitica era norte-americano, filho de um professor de Harward, bacharel em Qumica,

lgico e matemtico. Charles Sanders Peirce, como se chamava, era apaixonado pela Lgica e por toda a sua vida busca relacionar o envolvimento dos fenmenos e dos signos que os representam. A obra de Peirce muito vasta, para se ter uma idia aproximada de tudo que ele estudou necessria uma leitura de suas 12.000 pginas publicadas em vida e das quase 95.000 que ele passou a visa produzindo e ficaram sem publicao; ainda hoje, muitos pesquisadores procuram dar conta de suas anotaes, e como Saussure teve muitos seguidores um que primeiro se destacou foi Charles Morris que divulgou muitos dos conceitos deixados por Peirce. Conforme nos indica Winfried

Nth (1994:13) o termo "semitike" surgiu num livro de John Locke (16321704) que se intitulava "Essay on human Understanding" de 1690 e postulava uma doutrina dos signos. Um termo semelhante "zemaiotikon" foi utilizado por Galenum de Pergamun, um mdico que viveu de 139 a 199 e utilizou o termo num estudo do diagnstico dos signos das doenas. O termo "semeion" em grego significa sinal, marca. Semeion ou Sema gerou muitos vocbulos: Semntica, disciplina que estuda a significao das palavras, esse termo, parece ter se analogia com o termo "mancia" que significa adivinhao, que podemos observar em quiromancia, por exemplo, que a arte de se adivinhar o destino

das pessoas pelas linhas e sinais na palma da mo entre essas arte ainda encontramos, hidromancia, rabdomancia e geomancia entre outras. O vocbulo Semiologia utilizado por Saussure tambm, advm do mesmo radical, porm parece-nos uma latinizao em analogia s outras "logias". Semitica o termo utilizado por Peirce cunhado diretamente do grego e no se carrega de dbias interpretaes por contaminaes e analogias anteriores. Para Peirce o procedimento de utilizar termos novos para idias novas faz parte de uma tica, que segundo a qual, ainda que a grosso modo, termos novos ainda no se conspurcaram de significaes aleatrias ou errneas. O termo Semitica foi adotado

internacionalmente em 1969 pela Associao de Estudos Semiticos da qual participava Roland Barthes, Emile Benveniste, Greimas, Jakobson, Sebeok entre outros. Nesta poca os estudos semiticos estavam ampliando seus horizontes a muitas linguagens no verbais alm da verbal. Vemos , ento, explicitamente, que o termo pulsou aqui e ali e se generaliza em 1969, porm o interesse por uma doutrina que se preocupasse com os signos remonta Plato (427347). Plato se refere a um signo de trs componentes a) noma (nome; b) aidos, logos (idia, noo); c) pragma (coisa). Esta preocupao em nomear o objeto e estabelecer as relaes que esse objeto mantm com seu nome e a idia que ele desperta na mente das

pessoas no recente. Sendo assim a preocupao com o desenho, a palavra ou o som que utilizamos para nomear as coisas por no ser nova, desperta muitas dvidas at hoje, principalmente porque a tecnologia responsvel pela proliferao de equipamentos que multiplicam essas linguagens numa velocidade vertiginosa, povoando o mundo de muitos cdigos complexos e mistos. neste momento que a Semitica nos auxilia com suas teorias a fim de que tentemos compreender a trilha dos signos que se abre a nossa frente no nosso dia-a-dia, seja nos estudos ou no ir e vir de todos ns. A diferena entre a Semitica e

as outras cincias da linguagem, como a Lingstica, por exemplo, que ela v os signos que povoam o mundo como um objeto de estudo sem descartar o objeto do qual resultou o signo, como fizeram outros pensadores da linguagem. Como Saussure, por exemplo, que chamou de significante a parte material do signo, e seu processo mental, de significado. Hoje as vrias correntes semiticas existentes trafegam em muitos caminhos diferentes, o que aqui veremos ser delineado pouco a pouco.

1.2 Suscitando Dvidas Segundo o prprio Peirce (1975:53) " a ao do pensamento

excitada pela incitao da dvida e cessa com o atingir a crena; e assim o chegar crena a funo nica do pensamento." Disto posto, esse caminho para gerar dvidas a fim de gerar conhecimento. Peirce ainda diz que ao atingirmos a crena estaremos, momentaneamente em repouso, porm na medida em que aplicamo-la, teremos novamente a ao do pensamento e a ento geramos conhecimento outra vez, nas mesma medida em que geramos dvida.
1.3 Esboo de uma teoria Charles Sanders Peirce, passou toda a sua vida buscando conhecer a relao entre as vrias formas e manifestaes do conhecimento

humano. Para ele Semitica seria um outro nome para a Lgica, a Lgica Pura, como Peirce a concebia. Alguns lgicos, atualmente, preferem denominar de logstica a Lgica Aplicada. A Semitica de Peirce consolidase em bases filosficas anteriores. Ao percorrermos os escaninhos da filosofia que o antecedeu, percebemos que Peirce conheceu profundamente seus predecessores. Sua genialidade deixou-nos uma teoria do conhecimento na medida em que desenvolve mtodos de se desembaraar as relaes entre os signos que representam a realidade e aqueles que os interpretam. Observar a realidade que est a nossa volta, interpretando-a dando-lhe novas interpretaes e criando outras formas

de represent-la um ato que Peirce denomina de semiose. Conforme nos aponta Fisch, via Nth (1990:42) " Estritamente falando, a semiose e no o signo, o objeto de estudo da semitica." Peirce, tambm via Nth (idem) afirma que semitica " a doutrina essencial da natureza fundamental das variedades possveis de semioses." 1.3.1 O Lugar da Semitica entre outras Cincias Se a Semitica uma que estuda as vrias relaes signos e os signos so constituintes das trs existentes de linguagem doutrina entre os unidades matrizes devemos

colocar ordem no caos antes de encaixarmos a Semitica em seu devido lugar. 1.3.1.1 Realidade e Linguagem Para tentarmos conceituar a realidade sempre teremos de utilizar uma forma de linguagem, e isto, sempre dificulta a compreenso de conceitos e veremos o porqu adiante. Linguagem define-se como um sistema de representaes utilizado para materializar nossos pensamentos, que por sua vez existem porque o mundo nossa volta os despertam, j que o homem dotado da capacidade de transformar aquilo que v, ouve, toca e sente em linguagem.

Ento tudo o que podemos ver, tocar, ouvir, sentir, saborear podemos denominar de realidade. Se a realidade algo percebido, pois como sabemos, os olhos, a boca, a pele o nariz e os ouvidos so as portas da nossa percepo, ento, no momento em que percebemos os objetos a nossa volta, seja, por qualquer uma dessas portas "traduzimos" esse sentir por um pensamento, e esse pensamento pode vir em forma de palavras, de sons, de imagens, ou tudo isso junto, depende da capacidade de pensar de cada um. Imagens, sons, palavras, tudo isso so formas de representao, funcionam como signo do objeto percebido, aquele que ali est compondo a realidade ao nosso redor.

Para tornarmos esse pensamento comum, transformamo-lo em desenhos, palavras, msica, etc; em unidades de representao, ou seja, um signo. Vejamos como isto funciona: Se voc est sentado para almoar e as travessas vo sendo postas na mesa e assim uma delas esbarra em sua mo, no mesmo momento seu crebro recebe uma mensagem enviada pela sua pele: "Quente!", a ento, voc tira sua mo depressa, sacudindo-a no ar dizendo: "Ai! Est quente." Voc representou essa realidade por intermdio de dois signos; um visual, o gesto, e um verbal, a frase. Voc transformou aquilo que era

real, que estava fora de voc, em linguagem, voc comunicou (tornou comum) o que voc absorveu da realidade. Transformar a realidade em linguagem conhec-la, quanto mais somos capazes de utilizar signos, ou linguagens, para traduzir o que nos rodeia, mais conheceremos a realidade. A linguagem o nico caminho que nos levar at a realidade, de outra forma ela ser intocvel, inatingvel, pois o seu toque sobre ela j estar sendo uma forma de interpret-la, j estar carregado com a sua interpretao de mundo. 1.3.1.2 Fenomenologia

A Fenomenologia para Peirce era necessria, conforme vimos anteriormente, pois s se capaz de descrever e explicar coisas se as vemos, tocamos, cheiramos, saboreamos etc. Se para ele semiose a ao do signo e esta por sua vez estabelece uma ligao entre o homem e os objetos que compem a realidade, ento a Fenomenologia entra como um mtodo para estudar os fenmenos e suas interpretaes. Fenmeno vem do grego phainmenous e significa aquilo que se manifesta visivelmente. A Fenomenologia nos convida a ver o mundo com olhos abertos, com as portas da percepo escancaradas, j

que ver pode se estender s outras formas de percepo, pois quantas vezes o "Deixe-me ver" pode estar significando pensar, sentir, pegar etc. Se a Filosofia deu a Peirce respaldo ao nascimento da Semitica, a Fenomenologia tambm faz com que Peirce a transforme num de seus instrumentos do pensar. Conforme coloca Santaella (1992:122) ele estabelece o seguinte quadro: 1.1.2 Filosofia 1.1.2.1 Fenomenologia 1.1.2.2. Cincias Normativas 1.1.2.2.1. Esttica

1.1.2.2.2. tica 1.1.2.2.3 Lgica ou Semitica 1.1.2.2.3.1. Gramtica Especulativa 1.1.2.2.3.2. Lgica Crtica 1.1.2.2.3.3. Retrica Especulativa ou Metodutica 1.1.2.3. Metafsica Para Peirce a filosofia uma cincia que se ocupa com "aprender o que pode ser apreendido com uma experincia diria ou no." (1990:197), e acrescenta que a fenomenologia parte da filosofia, dentro da qual, ainda, ele estabelece as categorias universais do pensamento e da natureza, e finalmente, as Cincias Normativas que trata das relaes

entre os fenmenos e seus fins. 1.4 Delegando Poderes Encontrada a Semitica no quadro elaborado por Peirce vejamos aquelas com as quais ela mantm relaes de hierarquia: a) Esttica - ocupa-se em estudar as formas de representaes da realidade que tenham como finalidade despertar a qualidade do belo. b) tica - ocupa-se com a conduta do nosso raciocnio, com o modo de conduzirmos nossas aes em conformidade com o objetivo a ser atingido. c) Semitica ou Lgica - seria a cincia responsvel pelo estudo dos signos e suas relaes entre ele mesmo,

entre ele e o objeto que ele representa e entre ele e a mente que o interpreta; da que ela seja dividida em: - gramtica especulativa ou gramtica pura: estuda todos os tipos de signos como eles representam aquilo que representam e quais as suas propriedades aplicativas. - lgica crtica: estuda os trs estgios do raciocnio, como a mente os recebe e os interpreta. So eles: - abduo: capacidade contemplativa; - induo: capacidade ,de discernir diferenas entre as coisas. - deduo: capacidade de generalizar observaes em categorias ou classes abrangentes. - retrica pura ou retrica especulativa: Estuda o poder que os

signos tem de gerar interpretantes. Este quadro elaborado por Peirce apenas o comeo de sua arquitetura filosfica, e ao procurar a lgica existente entre os vrios fenmenos do universo ele acabou produzindo esta hierarquia to lcida e necessria, entre outras. O ideal de Peirce era a Lgica e para conceber seu exato lugar era necessrio aprofundar-se naquelas cincias que a rodeavam. Como podemos ver nas exposies a lgica ocupa-se com os vrios modos do pensar e encontra-se no cerne de sua Semitica, enquanto que na sua primeira categoria, a lgica concebida por Peirce o ramo da semitica mais conhecido, e exatamente o mais

estudado, inclusive essas relaes de significao do signo foi a preocupao mais premente dos lingistas e daqueles primeiros semilogos, podemos at supor que este fato tivesse levado ao desenvolvimento de outras cincias preocupadas com a significao, tais como a psicanlise, a antropologia a arqueologia; todas de certo modo trabalham com indcios de materiais para a significao de algo, ora de atitudes humanas, ora de uma coletividade primitiva ou no, ora com os restos deixados por uma civilizao anterior nossa. Ora, Peirce coloca no corao da Semitica a Lgica, o pensar, para ele, deve ser, ento, o responsvel pelas conexes entre o homem e a realidade,

e ao concordarmos com isso chegaremos a concluir que a produo de linguagem s se opera dentro de nossa mente, durante o ato do pensar. O modo como nos deparamos com os fenmenos e como os encaramos a fim de tirarmos as nossas concluses ou acrescentarmos mais algumas ou ainda, aceitar as concluses tiradas a respeito dele, faz com que transformemos aquilo que apreendemos do mundo em linguagem, em signos. Como colocamos no incio, a dvida leva ao conhecimento, e uma mente cientfica, ou seja, aquela que produz conhecimento, um alojamento de dvidas porque nela o pensar no se esgota e a crena leva ao exerccio da aplicao de teorias, e toda aplicao, gera novamente mais dvidas.

1.5 Homem X Signo 1.5.1 As Categorias Universais O pensamento de Peirce, segundo ele prprio, dada a sua paixo pela lgica, leva-o a uma viso lgica do universo. Lgico e Matemtico, com um ideal a perseguir, Peirce procurou deixar claro o lugar e a importncia da lgica entre as outras cincias, e utilizando a fenomenologia, demonstrou como os fenmenos esbarram e foram as portas de nossa percepo e ns os interpretamos e os transformamos em linguagem. A Fenomenologia, segundo Peirce, a primeira diviso da filosofia, a

segunda seria a que contm as Cincias Normativas e a Terceira a Metafsica. A Fenomenologia para que possa nos servir de estudo, deve ter como ferramentas nossos rgos do sentido bem despertos. Peirce se refere s faculdades que o artista tem e "v as cores aparentes da natureza como elas realmente so(...)" (1980:17). Quando assume essa afirmao, o filsofo diz que "o poder observacional do artista altamente desejvel na fenomenologia" (1980:17); e assim, ele incorpora a tudo que est no presente momento em seu esprito, que seja provocado por um fenmeno que, por sua vez, pode estar fora ou dentro de voc, seja real ou no, seja um existente individual ou no, esse algo pode se manifestar a voc neste exato momento de qualquer

forma. No que ns deveramos ser artistas para absorvermos melhor a realidade, mas sim que desenvolvssemos um apurado controle dos nossos rgos do sentido a fim de aproximarmo-nos muito mais das coisas que nos rodeiam . Faneron (phaneron) o termo que Peirce utiliza para designar a noo de fenmeno, toda e qualquer manifestao externa ou interna aos nossos sentidos, e, entre as ltimas podemos enquadrar os sonhos, os devaneios, a imaginao e a fico, etc. Peirce leva esse conceito muito alm pois esse conceito h de gerar para ele o conceito de signo, j que o fenmeno desperta o pensamento e ele por sua vez uma possvel forma de

representao. Santaella (1994:157) nos apresenta uma das definies de signo encontrada na obra de Peirce, entre as muitas deixadas por ele e segundo ela mesma "bastante sugestiva": "(...) incluindo sob o termo signo, qualquer pintura, diagrama, grito natural, dedo apontando, piscadela, mancha em nosso leno, memria, sonho, imaginao, conceito, indicao, ocorrncia, sintoma, letra, numeral, palavra, sentena, captulo, livro, biblioteca, e, em resumo, qualquer coisa que seja, esteja ela no universo fsico, esteja ela no mundo do pensamento, que - quer corporifique uma idia de qualquer espcie (e nos permita usar amplamente esse termo para incluir propsitos e

sentimentos), quer esteja conectada com algum objeto existente, quer se refira a eventos futuros atravs de uma regra geral - leva alguma outra coisa, seu signo interpretante, a ser determinado por uma relao correspondente com a mesma idia, coisa existente ou lei (MS 774:4)". Como podemos observar o faneron, responsvel pela produo de signos pode ser uma sensao, uma semelhana com outra coisa, ou ainda, uma causalidade ou at mesmo um existente e se manifesta conforme trs categorias universais. 1.5.1.1 Primeiridade original aquilo que primeiro. A

idia de primeiridade to livre que se voc se fixar para pensar nela ela j estar aprisionada em alguma comparao e no ser mais primeira. A primeiridade um estado de qualidade daquilo que variado, mltiplo, impreciso, dada a multiplicidade de possibilidades. No a impreciso da ausncia, mas sim, da fartura. Para Peirce a primeiridade uma qualidade de sensao, s a qualidade, pois o que produz essa sensao ainda incorpreo. Imagine um frio sem ainda estarmos no inverno, uma cor sem estar impressa em algo, uma dor ainda no sentida. Peirce afirma(1980:89) :"Parece-me que uma qualidade de sensao pode ser imaginada sem qualquer ocorrncia." Disto supomos que a primeiridade est

num estado pr ou quase. 1.5.1.2 Secundidade segundo tudo aquilo que terminado, que tem como elemento o conflito. Se voc empurra uma cadeira, ela com sua massa e seu peso resiste at que sua fora seja maior sua resistncia e ela mude de lugar. Causa e efeito, ao e reao, memria, realidade, polaridades negativo/positivo, doce/salgado, vida/morte. Se primeiro vir a ser, o segundo a existncia mesma. 1.5.1.3 Terceiridade a mediao. O incio primeiro e o segundo o fim, entre eles est o

terceiro. terceiro aquilo que representa algo para algum, a mediao entre a conscincia e o que est fora dela. O terceiro geral. A generalidade um terceiro porque a aceitamos, porque ela nos faz ter a idia do que a realidade efetivamente. Toda lei um terceiro porque denota algo que ocorre repetidamente, um desvio na estrada um terceiro em relao ao incio e o fim desta estrada pois me faz entender que ela faz a mediao entre outras localidades; se lano uma pedra para o alto, sei que ela voltar. Tudo o que pensamos a mediao entre a realidade e o que est em nossa conscincia.

A terceiridade nos delega um poder sobre o futuro porque na medida em que repetidas aes, ou ainda repetidas palavras ou idias vo sendo utilizadas com determinados sentidos, com determinados significados eles podem nos trazer leis para as nossas aes futuras. Conduzindo-nos a outras significaes, essas aes e palavras podem gerar dvidas, ao gerar dvidas ampliamos seus espectros e ampliaremos no futuro suas generalidades. No mundo semitico temos aquilo que terceiro. No reino dos signos ocorre o que est descrito sobre as aes futuras.

1.5.2 mundo

Viso

pansemitica

do

O prefixo pan significa todo e para Peirce, o homem um signo, pois como vimos, o homem poder ser considerado um terceiro, uma mediao entre outros homens e a realidade na medida em que um ser produtor de linguagem. Para Peirce o homem pode ser considerado uma espcie de smbolo porque vai adquirindo novos significados, novas conotaes medida que evolui assim como afirma o filsofo (1975:307/8): " a palavra nada significa seno aquilo que algum homem a fez significar(...)", isso vlido tambm para o homem, j que o homem se

transforma e evolui e aprende novos conceitos sobre si mesmo e sobre o universo que o rodeia, e, assim, conseqentemente aprende mais sobre si mesmo novamente. Peirce afirma que o homem enquanto smbolo verdadeiro imortal, e um smbolo verdadeiro aquele que deixa provas da sua existncia, aquele cujo carter peculiar o transforma num signo na conscincia de outros homens. Mesmo os fenmenos vo crescendo em significado na medida em que o homem busca conhec-los melhor. Assim como os signos que o homem cria, o mundo uma cadeia de signos a ser elucidada pelos homens e o homem um signo a ser compreendido por ele

mesmo. 1.6 Alguns apontamentos sobre o 1.6.1 Introduo O signo, conforme uma das vrias definies de Peirce(1975:94), "algo que sob, certo aspecto ou de algum modo, representa alguma coisa para algum" . Sendo assim o signo dirige-se a algum substituindo o objeto ou referindo-se a ele, j que simplesmente o representa. Mesmo a prpria coisa pode represent-la pois, na medida em que a tocamos, ou derramamos um olhar cheio de significao para ela j ter sido um signo. Re-presentar por sua vez significa tornar presente, apresentar

signo

novamente; o signo representa, ou seja, torna presente aquilo que no momento no est aqui, portanto o signo envolve um conceito de substituio. Na medida em que recebemos esse algo que substitui um componente da realidade, como vimos anteriormente, criamos em nossa mente imagens e explicaes para o signo que poder ser mais ou menos desenvolvidas, dependendo do grau de familiaridade que mantivermos com ele. Por exemplo; se usamos a palavra gua, ela sozinha pode conter muitas das nossas experincias em relaes a esse componente lquido, inodoro , inspido e incolor que existe na realidade. Uma das nossas experincias pode ser o banho, o mar, a sede, a piscina ou at

mesmo a sua molcula H2O. Sendo assim esse signo gua contm muitos objetos. Um signo pode conter muitos objetos, mas sua nica funo representar esses objetos, referir-se a eles. A palavra gua no pode permitir nenhuma experincia direta com a gua mesma, nem me faz-la reconhecer, porque ao usar a palavra no sofro o mesmo efeito que ao abrir a torneira. A gua que no pode estar no mar, nos seus olhos, no copo e matar sua sede a palavra gua. Lcia Santaella (1993:39) conclui "1) que o signo determinado pelo objeto, isto , o objeto causa o signo, mas 2) o signo representa o objeto, por isso mesmo o signo; 3) o signo s pode representar o objeto parcialmente e 4)

pode at mesmo represent-lo falsamente, 5) representar o objeto significa que o signo est apto a afetar uma mente, isto produzir nela algum tipo de efeito; 6) esse tipo de efeito produzido chamado de interpretante do signo; 7) o interpretante imediatamente determinado pelo signo e mediatamente determinado pelo objeto, isto 8) o objeto tambm causa o interpretante, mas atravs da mediao com o signo." Estas concluses vm a sintetizar o que est exposto anteriormente: em (1) vemos que cada objeto que compe a realidade pode ser representado por um signo seja verbal, seja visual, seja sonoro como j vimos, e isso se estende at (2) onde ao utilizarmos qualquer

representao de gua no nos molhamos nem matamos nossa sede e em (3) vemos que a concluso confere e se estende ao (4) porque s vezes podemos com um simples papel celofane azul criar um mar num comercial de TV, uma falsa representao de gua, como no filme "Os dez Mandamentos" de Cecil B. de Mille em que Moiss ao cruzar o mar Vermelho, o separa para que o povo hebreu possa passar e assim fugir perseguio dos homens do Fara; o item (5) refere-se s experincias que tenho do objeto, no nosso caso o banho, a sede, o choro, a frmula etc, essas experincias despertadas em nossa mente, na medida em que utilizo ou algum prximo de mim utiliza, chamamos de interpretante, que no podemos

confundir com intrprete ( o que interpreta, a mente interpretadora, portanto algum), o interpretante pode ser igual em muitas mentes interpretadoras, pode ser diferente na medida em que determinados fatores culturais sejam diferentes; o interpretante surge em nossa mente despertado pelo signo no momento em que pronunciamos uma palavra, contemplamos uma foto, etc, vai da que em (8) a afirmao de que o objeto tambm causa o interpretante deve-se ao fato que na medida em que nossa necessidade de substituirmos, representarmos a realidade, qualquer gesto, qualquer olhar derramado sobre ela est carregado de signos, da que a realidade em si produza interpretantes mas sempre atravs da mediao com o

signo. Vejamos um exemplo. No momento em essas pginas so lidas imaginemo-nos diante de uma paisagem muito bonita que fica mais ou menos a quinhentos metros de onde estamos. nossa frente um rio manso desliza entre guaps, margem oposta de onde nos encontramos muitas colinas com verdes pastagens contrastam com as manchas brancas que podemos supor, sejam bois. Ao longe ouvimos o rudo de uma barcaa que se aproxima, sabemos que se aproxima porque ouvimos o efeito do som se acelerar. Tudo isso ocorre, dentro da realidade, ao mesmo tempo, se fosse real, nossos olhos e nossos ouvidos escolheriam pontos em que se apoiar a fim de que pudssemos

descrever em forma de palavras, se fosse uma fotografia nosso olhar debruar-se-ia sobre um ponto mais atraente at os pequenos detalhes, se fosse uma msica que ainda no conhecssemos, com certeza os sons mais estridentes chamariam mais a nossa ateno. 1.6.2 As partes de que se compe o signo Para que o que ficou dito atrs se resolva agora de modo mais ordenado, coloquemos ordem nessas conjeturas. Se compreendemos os passos anteriores, encontraremos um terreno firme na prxima estrada. O signo um todo, algo que no

pode ser dividido, no entanto, podemos dizer que ele composto de trs partes, elas so inseparveis, j que o signo uma unidade de representao da realidade.

1.6.2.1 O representmen Peirce denominou de representmen o corpo do signo, sua materialidade. A materialidade do signo nada tem a ver com o objeto que ele representa, s vezes poeticamente possvel, porm para efeitos didticos, digamos que essa materialidade aquela que utilizamos para fazer o signo aparecer. Para exemplificar quando escrevo

a palavra seis, as letras S,E,I,S colocadas uma ao lado da outra materializam algo e essas letras colocadas desta forma sempre sero signo de algo que envolve a quantidade que elas representam. Se tomo em minhas mos a foto de uma criana o representmen o papel a textura do papel, o colorido, os contornos daquela criana, sua imagem. Se ouo um som sua tonalidade, sua intermitncia ou sua suavidade sero sua materialidade, seu representmen. Conclumos ento, que o representmen o corpo no qual o signo se manifesta, assim como o seu corpo necessita de roupas adequadas para uma festa ou outra ocasio, os objetos necessitam de letras, cores, traos ou

sons para se deixarem representar. 1.6.2.2 O objeto O signo comporta dois objetos: a) imediato e b) dinmico: a) Objeto imediato: aquele que o signo carrega dentro de si mesmo. O signo GUA carrega dentro de si mesmo vrios objetos: o Mar Vermelho separado, representado no cinema, o celofane azul no comercial de TV, a foto do mar, o som de uma cascata, a frmula H2O, o copo de gua, a lgrima etc. Todas essas coisas so signos da gua e comportam cada uma, um de seus aspectos, porm somadas no so a prpria substncia em sua totalidade de aspectos, que j foi num passado

distante cristalina e pura e hoje , nos grandes centros, poluda e mal cheirosa. Por isso, algumas pginas atrs dissemos que o signo comporta vrios objetos, como pode comportar apenas um, como pode comportar um objeto que ainda venha a existir, ou que j tenha existido. Por exemplo o livro Viagem Lua de Jlio Verne, na poca em que foi escrito, era signo de algo que estava no futuro, como o filme Blade Runner, o Caador de Andrides pode estar sendo signo de algo que poder existir; outro exemplo, so as escavaes de arquelogos em busca de civilizaes que desapareceram, s vezes um dente, um crnio pode ser signo de algo que j tenha existido em grandes extenses.

b) Objeto dinmico: aquele que est na realidade, que pertence, pertencer ou pertenceu ao mundo no semitico. Como j vimos o mundo no semitico s pode ser "tocado" por intermdio dos signos. O homem substituiu a realidade por signos e a compreenso do conceito fica difcil porque ainda que quisssemos exemplificar seria em palavras e seria uma mediao. Para que compreendamos melhor, execute uma tarefa: estenda sua mo agora enquanto l esse texto e toque em algo que esteja prximo a voc e que no faa parte de voc. Sinta esse objeto, o seu toque sobre ele um signo, sua pele um rgo do sentido e transmite a voc alguma informao

sobre ele, agora olhe-o, suas cores, sua materialidade, oua-o se ele for capaz de produzir algum som, agora abandone-o e l est ele compondo a realidade. Suponhamos que algum entre onde voc est, pegue esse objeto e o lance fora, pela janela; l estar ele, talvez a dez, talvez a dois metros abaixo, l na rua, compondo a realidade. A realidade a est, voc a toca de uma forma, outros de outra e sobre isso Peirce afirma que: "Diferentes espritos podem firmar-se nas mais conflitantes posies, e; no obstante, o progresso da investigao os levar, por fora externa a uma nica e mesma concluso" (1975:667). Por que um lgico chegaria a essa afirmao?

Porque conhece o carter de veracidade da realidade e sabe que caminhamos em busca de respostas e que chegaremos a elas mais cedo ou mais tarde porque a realidade est nossa espera e ao nosso alcance como objeto do saber. Disso tudo podemos concluir que o signo comporta dois objetos, um que est dentro dele, e que s ele comporta, e outro que pertence, pertenceu ou pertencer ao mundo externo, no semitico. 1.6.2.3 O Interpretante O signo comporta trs interpretantes: a) interpretante imediato; b) interpretante dinmico e

c) interpretante em si: a) interpretante imediato: o significado, ou imagem mental que o signo est apto a produzir em nossas mentes. preciso compreendermos que o interpretante imediato aquele que est embutido no signo em potencial. um significado que pode estar l dentro do signo, qualquer que seja ele. b) interpretante dinmico: o significado ou imagem que o signo efetivamente produziu ou produz na minha mente, ou na sua. No instante que se depara com o representmen ele desperta em nossa mente algum efeito. c) interpretante

em si, ou

interpretante final: dever ser o resultado final do processo de semiose, so as vrias explicaes, significados, efeitos e imagens que o signo capaz de produzir na medida em que ele transita em vrias mentes, por vrias geraes e assim por diante. Esse significado seria muito amplo, e, dada a vastido do seu conceito ns s podemos imaginar esse tipo de interpretante.
1.6.3 As tricotomias Como j observamos, Peirce classifica os fenmenos sempre em trs categorias. Ele denomina de tricotomias as relaes que o signo estabelece entre os objetos que denotam, ou entre os representmens ou ainda entre os

interpretantes. Sero trs tricotomias, das quais ele saca dez classes de signos e segundo sua frmula ser o trs elevado dcima potncia, gerando 59.049 tipos de signos.

1.6.3.1 O signo e seu representmen Nesta relao temos uma relao de comparao, uma relao de possibilidades lgicas j que essa uma tricotomia de primeiridade. O signo em si mesmo, ou seja, o representmen em si mesmo pode ser uma mera possibilidade, um existente real ou uma lei geral. QUALI-SIGNO - qualidade,

originalidade, estado quase. No pode atuar como signo at que esteja corporificado e quando se materializa no ser mais um quali-signo. Repare que a simples possibilidade de algo se manifestar como um signo um signo. SIN-SIGNO - Um evento real que um signo. Algo que funcione como um signo de alguma coisa. Aqui um existente pode nos avisar sobre a existncia de outro. Um grito, uma interjeio pertencem a esta categoria. LEGI-SIGNO - Todo signo convencional. Toda aquela representao que foi convencionalizada pelos homens. As palavras por exemplo so usadas

significando o que significam porque alguns antes de ns resolveram que elas significam aquilo. Para entendermos esse tipo de conveno vejamos os cdigos de certas gangues; os componentes utilizam certos termos que s o grupo conhece o significado e utilizam quando precisam falar e no podem ser entendidos por outros. Todo o nosso vocabulrio se faz desta forma. As pessoas convencionaram que as palavras significam o que significam, algumas palavras , no entanto, ficariam de fora desta classificao, como por exemplo as onomatopias, ou seja as palavras que imitam os sons dos animais ou equipamentos ou fenmenos da natureza, talvez elas possam ser enquadradas na categoria anterior.

Peirce, muitas das vezes, parece utilizar o termo signo no mesmo sentido de representmen, se isto estiver correto aqui seria o representmen em relao a ele mesmo, e nas seguintes o representmen e suas conexes como o objeto que ele representa e na terceira o representmen e o que jaz nele , mesmo , que possa gerar interpretantes. 1.6.3.2 O signo e seu objeto Essa relao se estabelece entre o representmen e o objeto que ele representa. uma relao de desempenho, de natureza dos fatos reais. O signo pode manter algum carter em si mesmo, manter alguma relao existencial com seu objeto ou

se referir ao objeto que denota por fora de uma lei. CONE - denota um objeto por fora de sua semelhana com seu objeto, ainda que esse objeto exista ou no. Qualquer coisa pode ser cone de qualquer coisa na medida em que seja semelhante a essa coisa em algum aspecto. Uma pintura abstrata, uma msica instrumental, etc. NDICE - Atua como signo do objeto que representa na medida em que afetado por este. Um girassol pode ser signo do sol na medida em que o acompanha durante o dia. SMBOLO - se refere ao objeto que denota por fora de uma

conveno, de uma lei. A palavra um smbolo por excelncia. 1.6.3.3 interpretante O signo e seu

Essa relao se d quando o representmen est apto a despertar um interpretante como signo de possibilidade, ou como signo de fato ou ainda como um signo de razo, por isso Peirce afirma ser essa uma tricotomia das relaes com o pensamento, da natureza das leis. REMA - um signo que para seu interpretante um signo de possibilidade, ele entendido como um possvel objeto. As formas nas nuvens que buscamos podem ser consideradas

remticas porque geram interpretantes desta categoria. DICENTE - um signo que para seu interpretante representado como um existente, entendido como representando seu objeto. Um exemplo dado por Peirce a bssola. ARGUMENTO - um signo que para seu interpretante um signo de lei, representa seu objeto em seu carter de signo. Essa tricotomia a tricotomia da razo, do pensamento. O pensamento de cada um de ns opera com vrias linguagens, quando pensamos misturamos muitas linguagens para traduzir o que pensamos. A todo

momento usamos pensamentos que ampliam pensamentos anteriores, portanto, todas as tricotomias aqui expostas no funcionam isoladamente, mas sim em suas combinaes. 1.7 As dez classes de signos _________________________ __________________________ tricot representmen objeto interpretante cat. _________________________ __________________________ Primeiridade quali-signo cone rema _________________________ _____________________________ _______ Secundidade sin-signo

ndice

dicente _________________________ __________________________ Terceiridade legi-signo smbolo argumento _________________________ __________________________ A partir deste quadro Peirce elabora as dez classes de signos: Signos de Primeiridade - Quali-signo (remtico icnico):o quali signo aquele cujo representmen uma mera possibilidade, por isso uma mera qualidade, como um rema s pode ser interpretado como um signo de possibilidade.

Signos de Secundidade -Sin-signo icnico (remtico): um objeto particular e real que estabelece analogia a outro pelas suas particularidades. Para Peirce um diagrama se enquadra nessa classe pois um objeto fruto de uma experincia que determina a idia de outro objeto. - Sin-signo indicial remtico: um objeto que pelas suas caractersticas determina outro objeto, mas por ser remtico seu interpretante representa-o como possibilidade. Um grito, por exemplo. - Sin-signo dicente (indicial): um signo que afeta seu objeto diretamente, que proporciona informao concreta a respeito do objeto. Para Peirce um cata-vento se

inclui nesta classe. Em tese uma manchete de jornal ou um briefing pode ser incorporado nesta categoria. Signos de Terceiridade - Legi-signo icnico (remtico): um cone interpretado como uma lei. Um diagrama numa fbrica que produza muitas peas semelhantes. O Projeto grfico de um jornal, por exemplo - Legi-signo indicial remtico: Lei geral que estabelece que cada um de seus casos seja afetado pelo objeto e atraia a ateno. Um pronome demonstrativo enquanto palavra um legi-signo porm, atrai a ateno para um objeto e remtico pois um pronome demonstrativo sozinho, sem o

substantivo que o acompanhe, seu interpretante o representa como um signo de possibilidade. Uma placa de trnsito que anuncia a possibilidade de encontrarmos adiante um desmoronamento, ou animais ou neblina, etc. - Legi-signo indicial dicente: Objeto real que fornea informaes reais sobre um objeto. Uma placa de trnsito, por exemplo, daquelas que avisam sobre travessia de escolares, curva fechada frente, etc. - Legi-signo simblico remtico - Smbolo-remtico: qualquer smbolo que ainda no seja uma proposio, ou seja que no procure definir um objeto qualquer. Uma palavra no dicionrio, por

exemplo, um smbolo remtico, pois no dicionrio ele representa sua caracterstica mais geral, mais variada na possibilidade e seu interpretante represent-lo como um signo de possibilidades. - Legi-signo simblico dicente Smbolo Dicente: Uma proposio; um signo ligado a seu objeto atravs de uma associao de idias de modo que se interpretante represente-o como sendo realmente afetado por seu objeto, como uma lei ligada ao objeto indicado. - Argumento (Simblico legisigno): Representa seu objeto como um signo ulterior atravs de uma lei, que tende a ser verdadeira.

1.8 A classificao dos signos de Peirce aplicada leitura de uma primeira pgina de jornal, apenas como exemplo

Seria muita ousadia aqui falar de toda a classificao dos signos de Peirce, j que sua extensa obra prev 59.049 tipos de signos. Mas atenhamonos principalmente s trs matrizes as quais utilizaremos: a primeira estabelece o signo em relao ao seu representmen, ou seja o signo em relao ao material de que ele feito, a segunda, o signo em relao ao seu objeto, ou seja o objeto que ele representa, a terceira finalmente do

signo em relao ao seu interpretante, e para Peirce o interpretante a imagem, ou imagens que o signo pode despertar numa mente interpretadora. Cada uma dessas categorias divide-se em trs outras que se pode aplicar na leitura das representaes. Leitura aqui tem o mesmo sentido daquela que Popper nos ensina em seu livro Conjecturas e Refutaes, ou seja, leitura no sentido de interpretao. Em primeiro lugar delimitemos nossa rea : a primeira pgina de um jornal, a escolha da primeira pgina porque ela parece sintetizar o cotidiano das pessoas, seja num jornal de pequena circulao ou no a primeira pgina estabelece um dilogo com o

leitor, e que mostra todos os principais fatos ocorridos na semana, se o jornal for semanal, ou no dia anterior, se o jornal for dirio. A primeira pgina tem uma diagramao, nos dias de hoje, que depende de vrios fatores. O principal o tecnolgico, j que os meios de produo grficos avanaram sobremaneira nos ltimos dez anos, assim tambm, desde da dcada de setenta o uso da cor se estabelece com um atrativo e deixa o dilogo mais realista, mais aberto ao desejo, outro fator que determina a diagramao de uma primeira pgina a seleo do que precisa ser mostrado j que a primeira pgina a propaganda do produto e o produto ao mesmo tempo, e poderamos acrescentar a tambm o carter de embalagem do produto, o segundo fator

que entra na composio da primeira pgina a seleo dos assuntos que ela apresenta, e que sempre uma tarefa difcil, em virtude da grande quantidade de fatos que produzem um volume extenso de informaes. A primeira pgina atingir seu objetivo na medida em que contiver mais informaes a fim de atrair o leitor. A combinao das fotos, das legendas e dos textos nos guiar na ordem de leitura dos cadernos do jornal. O jornal um veculo de informao que pela prpria natureza de sua montagem pode ser lido aos cacos, ao contrrio, aos poucos; essa caracterstica, tpica da modernidade, faz o jornal renascer a cada leitor, e compor-se diferentemente aos olhos de

cada um, exatamente como nos coloca Jlio Cortzar em seu pequeno conto As Metamorfoses do Jornal. Tendo delimitado o objetivo de aplicao da semitica, relembremos, embora de maneira breve, a teoria que servir de escopo nossa leitura: a Semitica de Peirce nos d em uma de suas divises a ferramenta necessria ao nosso objetivo. A Gramtica Especulativa aquela que trata da classificao dos signos e que ser esclarecida daqui a pouco, a Lgica, ou a parte da semitica que trata dos processos mentais dos signos, e finalmente a Retrica Especulativa, ou a parte da semitica que elucida os vrios empregos que fazemos dos signos e suas significaes. Tendo localizado

nossa teoria elucidemo-la: a Gramtica Especulativa vai nos ensinar como classificar os signos que nos rodeiam, e como eles surgem dentro da nossa realidade. Um signo pode ser observado apenas em seu carter de signo, ou melhor, apenas a sua materialidade. O que faz de um signo ser um signo que ele tem um corpo que representa parcialmente um objeto, parcialmente porque esse o carter do signo, um signo no pode representar o objeto por inteiro, pois a ele no representaria, ele seria o prprio objeto; por exemplo uma foto no o objeto fotografado, assim como um filme apenas representa o filmado, nada mais. Assim uma foto pode ser analisada apenas pela sua

materialidade, sua cor, sua textura, sem necessariamente nos atermos ao objeto que foi fotografado. A primeira tricotomia dada por Peirce aquela do signo em relao ao seu representmen, ou seja, a materialidade que faz com que o signo exista, todo signo habita um corpo que o manifesta: a letra, a tela e a tinta, o livro e assim por diante, quando analisamos um signo apenas pela sua materialidade podemos classific-lo em quali-signo, sin-signo, e legi-signo. O primeiro podemos conceituar como um signo em seu estado de qualidade pura; e a primeira pgina em seu estado qualidade pura papel, efmero papel com algumas manchas grficas. O sinsigno, na concepo de Peirce um

evento que ocorre singularmente, uma nica vez, e exatamente a primeira pgina jamais se repetir, apesar de ser a mesma todos os dias, de parecer ser a mesma todos os dias, cada dia uma, no se repetir jamais. O legisigno, para Peirce aquele signo que uma lei, e como tal admite rplicas, ora a primeira pgina repete-se todos os dias, seu esquema de diagramao o mesmo todos os dias; todos os dias o editor monta uma primeira pgina sobre os moldes que ele mesmo cria a fim de habituar os olhos do leitor. A tricotomia seguinte dada por Peirce aquela que relaciona o signo ao seu objeto, ou melhor dizendo, quais so os traos do objeto que podemos encontrar no signo, exemplificando;

numa foto encontramos uma certa semelhana da imagem com o fotografado, o que no ocorre numa palavra, uma vez que seu significado foi convencionado pelos homens. Assim sendo Peirce divide essa tricotomia em cone, ndice e Smbolo. O cone o signo que possibilita qualquer analogia com o objeto, um trao, uma cor podem ser anlogos ao objeto, para o criador da semitica, um diagrama pode ser cone, uma vez que ele guarda semelhanas com o objeto que representa, uma primeira pgina um diagrama, pois o que est disposto nas fotos, legendas e textos, traz uma hierarquia entre os fatos que esto ali alinhados, a primeira pgina o diagrama do mundo no dia anterior, ela traz o mundo retalhado em boxes, em

fotos, em legendas e textos, diagramados de modo a trazer para o seu leitor uma imagem do dia anterior no seu pas, na sua regio, na sua cidade no dia anterior. O signo indicial aquele que se v afetado pelo objeto que representa, ora o jornal e seu compromisso com a objetividade traz em suas reportagens, principalmente as da primeira pgina, a maior preciso de fatos possvel, uma vez que enquanto veculo de informao , tem seu compromisso com a verdade, e enquanto produto tem um compromisso com seu consumidor. Vai da que o signo indicial que podemos encontrar numa primeira pgina so as matrias veiculadas dando o rigor de verdade. uma foto dentro de uma batalha, um ladro esfaqueado na calada, ou a inaugurao de uma

rodovia pelo prefeito da cidade, esses textos ou essas fotos reconstroem a realidade de cada um de ns. O signo simblico para Peirce aquele signo arbitrrio e convencional. A arbitrariedade na primeira pgina est naquilo que o editor convencionou ser o mais importante do dia, e voc enquanto leitor aceita essa conveno, arbitrria ou no a primeira pgina aquilo que o leitor engole como o principal porque algum antes dele j determinou como tal. Simblicos somos todos na medida em que aceitamos a convenes que ordenam o mundo dentro de uma lgica pr-selecionada. A terceira tricotomia de Peirce nos oferece o signo e seu interpretante. Interpretante, como j

foi citado, o efeito que o signo provoca em uma mente interpretadora, esse efeito pode ser visual, verbal, sonoro ou misto. Esta tricotomia nos ensina que o Rema o signo cujo efeito uma mera qualidade, a primeira pgina desperta a cada manh trazendo uma surpresa, ela procura dar conta do estado em que se encontra o mundo e exatamente a juno de todas as coisas que ela traz pode despertar um rema. Um signo remtico, vem a ser a primeira pgina ao despertar em ns uma possibilidade de sentir o mundo diante de ns. O signo dicente aquele que nos d uma proposio, aquele que afirma algo sobre alguma coisa. Uma foto de algum que eu conheo, por exemplo um signo dicente na medida em que demonstra a foto de algum que

eu reconheo como sendo aquele algum, ou ainda uma orao com um sujeito e um predicado que enuncie algo sobre o sujeito, e a partir da ento, eu posso inferir que a primeira pgina em seu carter de signo dicente me faz reconhecer o que acontece no mundo, pois as fotos trazem legendas que enviam novamente s fotos e aos textos internos, os textos me remetem aos textos mais esclarecedores dos cadernos seguintes e assim por diante, podemos concluir que na medida em que a primeira pgina uma proposio do que ser desenvolvido no interior do jornal que ela se comporta, nesse aspecto como um signo dicente. Por ltimo nesta categoria encontramos o Argumento, que para Peirce mora no corao da lgica. O Argumento um

signo feito de algumas proposies a respeito de um determinado objeto a fim de determinar o carter de veracidade daquele objeto. O Argumento composto de proposies a respeito de um objeto de modo que se esclarea algo sobre ele. Se inferirmos a respeito de uma primeira pgina qualquer, descobriremos que ela uma tentativa de reconstruo da realidade dentro da qual vivemos, ao elaborar uma primeira pgina com os cacos do mundo, o editor compe uma realidade que acreditamos ser a nossa, que acreditamos ser daquela forma, porque vivemos nela. Enfim, uma primeira pgina sempre uma e mltipla ao mesmo tempo,

 algo repetvel dentro de sua irrepetibilidade, um relativo dentro de absoluto, a afirmao de uma negao, pois ao negar a do dia anterior afirma-a porque dentro de si a mesma lei que produziu a anterior, a multiplicidade dentro da singularidade, pois ao ser a nica daquela edio, traz as outras edies que fizeram o jornal ser o que , catica pois divide o mundo em pedaos e o recompe de forma a criar uma outra realidade em que nos reconheamos como tal. um lugar, o topos que nada contm, pois efmera demais para ser algum lugar, para conter algo. 1.9 Concluindo precocemente ainda que

Para finalizar o importante que fiquem claras as noes de representmen, objeto e interpretante e que no devem ser confundidas entre si. Para cada tipo de representmen h um ou mais tipos de objeto imediato ou dinmico, ou tipos de interpretantes. Importante tambm no confundir, embora parece pouco provvel, a idia de objeto imediato com a idia de interpretante. O objeto imediato est dentro do signo e o interpretante o que ele capaz de produzir fora dele, portanto o signo gua com seus inmeros objetos imediatos em estado latente, est apto a produzir em nossa mente vrias imagens ou sons ou sensaes, talvez tantos quantos objetos imediatos ele comporte, a diferena consiste em o signo sendo

veiculado, pois ele exige uma mente interpretadora seja ela qual for, e assim comporta um interpretante, bem como contm um objeto imediato; em estando em repouso, como no dicionrio por exemplo, a face que ele apresentaria seria a dos objetos imediatos. Quanto s tricotomias que foram estabelecidas mais tarde, dentro delas Peirce estabeleceu, ento, as dez classes de signos e podemos perceber que ele as opera a partir do representmen, porque ele que d materialidade ao signo. O representmen pode ser um existente ou no (no caso, o quali signo mera possibilidade) mas a existncia do representmen que determina as

vrias classes de signos. Peirce vai combinando a partir da tricotomia dos representmens porque eles definem enquanto corpo, enquanto vestimenta o objeto que o signo representa e o interpretante que ele desperta, e como o quali-signo mera possibilidade ele s poder combinar-se ao cone e ao rema, e portanto primeiridade pura, pertence apenas uma classe, o que parece muito natural, pois sem roupagem o signo no capaz de trafegar pela linguagem. As trs classes que seguem sero pertencentes secundidade, uma secundidade hbrida com a primeira para as duas primeiras classes e uma secundidade pura para a ltima; para as classes de terceiridade ficamos com muitas combinaes e

muitas possibilidades de construir signos, de criar novas representaes. Podemos notar que o filsofo foi combinando os representmens sempre com os quadros anteriores superiores ou laterais, para representmens singulares, os sin-signos, ele combinouos aos seus superiores e vizinhos, o mesmo se d com os legi-signos, que se combinam com as tricotomias de primeiridade, de secundidade e de terceiridade e surge assim um nmero maior de legi-signos e suas nuanas . Muitos como podemos ver, so signos que embora sejam convencionais podem ser icnicos, indiciais ou simblicos, se a relao que eles guardam com seu objeto for de primeiridade, secundidade ou terceiridade, o mesmo

ocorre com o interpretante que o representa: rema,dicente ou argumento. Nosso prximo passo apresentar alguns aspectos dos MCM, com os quais podemos nos deparar no dia a dia, ou mesmo num estudo mais aprofundado deles, quais classes poderemos ser capazes de reconhecer ou de aplicar ou at mesmo de analislos com um fenmeno sgnico independente de ridas classificaes, mas antes disso, reporte-se ao quadro seguinte e faa uma reviso do que foi visto neste captulo.