Práticas Educativas em Saúde: Autor: Profa. Gabriela Rodrigues Zinn

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Práticas Educativas

em Saúde
Autor: Profa. Gabriela Rodrigues Zinn
Professora conteudista: Gabriela Rodrigues Zinn

Enfermeira graduada em 2001 pela Universidade de São Paulo, especialista em Enfermagem Gerontológica pela
Universidade de São Paulo, mestre em Psicologia da Educação pela Pontifícia Universidade Católica de São Paulo
e doutoranda do Programa de Gerenciamento em Enfermagem da Universidade de São Paulo, onde desenvolve
um trabalho sobre a Política de Educação Permanente em Saúde. Atuou como enfermeira assistencial no Hospital
Universitário da Universidade de São Paulo de 2002 a 2005. Atua como docente da Universidade Paulista - UNIP desde
2004 e coordena o curso de enfermagem desde 2006 e alguns campi, atualmente no campus de Sorocaba.

Dados Internacionais de Catalogação na Publicação (CIP)

Z13p Gabriela Rodrigues

Práticas Educativas em Saúde / Gabriela Rodrigues Zinn. – São


Paulo: Editora Sol, 2013.

76 p. il.

1. Enfermagem. 2. Educação. 3. Saúde. I.Título.

CDU 614.8

© Todos os direitos reservados. Nenhuma parte desta obra pode ser reproduzida ou transmitida por qualquer forma e/ou
quaisquer meios (eletrônico, incluindo fotocópia e gravação) ou arquivada em qualquer sistema ou banco de dados sem
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Prof. Dr. João Carlos Di Genio
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Unip Interativa – EaD

Profa. Elisabete Brihy


Prof. Marcelo Souza
Prof. Dr. Luiz Felipe Scabar
Prof. Ivan Daliberto Frugoli

Material Didático – EaD

Comissão editorial:
Dra. Angélica L. Carlini (UNIP)
Dra. Divane Alves da Silva (UNIP)
Dr. Ivan Dias da Motta (CESUMAR)
Dra. Kátia Mosorov Alonso (UFMT)
Dra. Valéria de Carvalho (UNIP)

Apoio:
Profa. Cláudia Regina Baptista – EaD
Profa. Betisa Malaman – Comissão de Qualificação e Avaliação de Cursos

Projeto gráfico:
Prof. Alexandre Ponzetto

Revisão:
Carla Moro
Geraldo Teixeira Jr.
Sumário
Práticas Educativas em Saúde

APRESENTAÇÃO.......................................................................................................................................................7
INTRODUÇÃO............................................................................................................................................................7

Unidade I
1 BASES CONCEITUAIS E CONTEXTUAIS........................................................................................................9
1.1 Considerações iniciais.............................................................................................................................9
2 REFERENCIAIS TEÓRICOS PARA COMPREENSÃO DE PRÁTICAS EDUCATIVAS
EM SAÚDE............................................................................................................................................................... 13
2.1 O processo saúde‑doença.................................................................................................................. 13
2.2 O processo ensino‑aprendizagem.................................................................................................. 15
2.3 Educação: uma prática de liberdade e emancipação............................................................. 17
2.4 A organização política dos serviços de saúde no Brasil........................................................ 18
3 POLÍTICA NACIONAL DE EDUCAÇÃO PERMANENTE EM SAÚDE................................................... 20
4 COMUNICAÇÃO HUMANA: INSTRUMENTO ESSENCIAL PARA A PRÁTICA EDUCATIVA....... 24
4.1 Fundamentos da comunicação humana..................................................................................... 24
4.2 Saber ouvir............................................................................................................................................... 29

Unidade II
5 MODELOS PEDAGÓGICOS NA EDUCAÇÃO EM SAÚDE...................................................................... 38
5.1 Evolução dos pensamentos pedagógicos.................................................................................... 38
5.1.1 A promoção da saúde e os modelos de educação em saúde................................................ 42
5.1.2 O modelo preventivo de educação em saúde.............................................................................. 44
5.1.3 O modelo radical de educação em saúde...................................................................................... 44
6 MODELOS DE EDUCAÇÃO EM SAÚDE: REFLEXO DO CONTEXTO HISTÓRICO........................... 47

Unidade III
7 PLANEJAMENTO E EXCECUÇÃO DE UMA AÇÃO EDUCATIVA.......................................................... 56
7.1 Elaboração de um projeto educativo............................................................................................ 56
7.1.1 Diagnóstico................................................................................................................................................ 56
7.1.2 Plano de ação............................................................................................................................................ 61
8 AVALIAÇÃO......................................................................................................................................................... 64
APRESENTAÇÃO

O presente livro‑texto almeja uma aproximação do leitor com o tema educação e saúde, para isso
apresentará alguns conceitos e discussões que possibilitem a construção de conhecimento na área e, além
disso, vislumbra especialmente suscitar a reflexão sobre as possibilidades de atuação do profissional de
saúde na prática educativa. Compreender a relação indissociável entre educação e saúde, contextualizar
essa relação e descobrir caminhos que a transformem em uma prática consciente de cuidado com o
outro é o que esperamos.

INTRODUÇÃO

A disciplina Práticas Educativas em Saúde aborda conceitos do processo saúde‑doença e do processo


ensino‑aprendizagem em um exercício de prática reflexiva, privilegiando os elementos que podem
diferenciar o futuro profissional na prática de educação em saúde. A disciplina tem como objetivos:

• compreender a evolução histórica dos conceitos de educação em saúde;

• relacionar a educação em saúde com a promoção da saúde;

• compreender a relação ensino‑aprendizagem e suas implicações sociais;

• compreender a posição do profissional da saúde no processo ensino‑aprendizagem;

• conhecer as diversas metodologias de ensino, com destaque ao modelo dialógico;

• habilitar‑se no desenvolvimento de um projeto educativo em saúde.

7
PRÁTICAS EDUCATIVAS EM SAÚDE

Unidade I
1 BASES CONCEITUAIS E CONTEXTUAIS

1.1 Considerações iniciais

Para discorrer sobre a relação entre educação e saúde, torna‑se pertinente explicitar os referenciais
teóricos nos quais estarão pautados os conceitos que serão discutidos.

Temos que a saúde envolve compreensões que evoluíram ao longo da história, sofrendo grandes
modificações. Desde a crença nos aspectos sobrenaturais, evoluindo para o outro extremo, no qual a
verdade é considerada apenas a partir de aspectos físicos e orgânicos, concretamente comprovados,
sendo essa forma de perceber a saúde atrelada ao contexto filosófico positivista. Nessa evolução,
chega‑se nas formas atuais de compreender a saúde, que abrangem definições amplas e complexas,
o que não é surpreendente, uma vez que se trata de um atributo humano e, sendo humano, torna‑se
evidentemente complexo.

Olhar para a saúde como um processo já é um grande avanço e inserir nesse processo os aspectos
contextuais em que ele ocorre amplia ainda mais o olhar para esse fenômeno. Assim, hoje temos que o
processo saúde-doença é influenciado por questões de ordem política, econômica, ambiental, cultural,
social, emocional e até espiritual.

Ao encontro da forma de olhar, o processo saúde, doença, descrito anteriormente, pode‑se


trazer à discussão o processo ensino‑aprendizagem que também sofreu mudanças conceituais e
procedimentais ao longo da história. Nesse sentido, evoluiu‑se do olhar empírico e intuitivo no processo
ensino‑aprendizagem, passando por práticas metódicas de transmissão de conteúdos, até chegar às
discussões mais atuais em educação, que considera a participação e foca a formação crítica e política
dos sujeitos envolvidos nesse processo.

Como ponto de partida para esse panorama teórico‑conceitual que será apresentado, coloca‑se em
destaque a reflexão que nos remete à existência, na modernidade, do processo progressivo e permanente
de construção dos direitos democráticos em choque com a lógica do capital. Este choque entre o que
podemos chamar de cidadania ou democracia e o capitalismo não é um fato explosivo e concentrado
em um único momento, mas sim uma contradição existente em forma de processo marcado por avanços
e recuos, porém com uma tendência predominante da introdução cada vez maior de novas lógicas não
mercantis na regulação da vida social (COUTINHO, 2000).

Em síntese, coloca‑se como principal característica da modernidade a existência de um processo


dinâmico e contraditório, uma época histórica caracterizada pela promessa de emancipação do homem
de todas as opressões e alienações, contraditoriamente produzidas e reproduzidas pelo capitalismo e
9
Unidade I

conclui que as possibilidades abertas na modernidade para a humanidade referentes à emancipação


ainda não foram realizadas (COUTINHO, 2000).

Observação

Contextualizar o momento histórico com suas peculiaridades políticas,


econômicas e culturais é elemento‑chave para a compreensão do que se
pretende estudar. Neste momento, pretendemos contextualizar o cenário da
educação em saúde e compreender que as possibilidades de emancipação do
homem na modernidade ainda não foram realizadas e este é ponto de partida
para problematizar e refletir sobre os caminhos possíveis para essa emancipação.

Nesse sentido, trazemos à discussão uma questão central para o desenvolvimento deste trabalho
que é a saúde. Dejours (1986) questiona o conceito de saúde da Organização Mundial da Saúde (OMS) e
coloca em foco uma nova possibilidade de compreender esse fenômeno. Para OMS, saúde é um completo
estado de bem‑estar físico, psíquico e social. Destaca‑se a crítica desse autor à definição internacional
de saúde quando ele considera que a saúde não se trata de um estado de bem‑estar, mas de um estado
que se busca aproximar, ou seja, a saúde como um fim, um objetivo a ser atingido e não como algo
estático. Assim, saúde é um processo e não um estado (DEJOURS, 1986).

Além da crítica, o autor apresenta a contribuição de uma nova forma de conceituar a saúde: “a
saúde para cada homem, cada mulher ou criança é ter meios de traçar um caminho pessoal e original
em direção ao bem‑estar físico, psíquico e social”. Para o bem‑estar físico, o autor acredita na liberdade
de regular as variações que o organismo apresenta, por exemplo, dar ao corpo o direito de descansar
quando está cansado. Para o bem‑estar psíquico, a liberdade proporcionada ao desejo de cada um
na organização da sua vida e, por fim, para o bem‑estar social, a liberdade de se agir individual e
coletivamente na organização do trabalho (DEJOURS, 1986).

Desse modo, temos até aqui uma nova forma de olhar a saúde como um ideal a ser atingido e que
o elemento fundamental para o alcance dessa meta é a liberdade.

Essa ideia vai ao encontro do que Merhy (2012) apresenta em relação ao sistema de saúde do
Brasil. O autor compreende o SUS como utopia, o que traz a ideia de algo a ser alcançado, mas para o
autor, esse SUS apresentado como utopia representa a base para o reconhecimento de que este campo
de práticas sociais é pautado em disputas radicais, impactando os modos de produzir o cuidado em
saúde tanto no plano individual como coletivo. Em consonância com a ideia de Deleuze (2010), Merhy
(2012) destaca que não se trata de questões simplesmente conceituais, mas algo a ser vivido e, assim,
o SUS como utopia permite “construir nas ações práticas cotidianas de construção de novos sentidos
enriquecedores dos viveres, como forma de produzir saúde” (MERHY, 2012).

Assim, podemos correlacionar essa ideia de SUS utopia à ideia de saúde utopia, no sentido de
uma práxis pautada na liberdade que produz possibilidades de aproximação ao que seria o completo
bem‑estar físico, psíquico e social.
10
PRÁTICAS EDUCATIVAS EM SAÚDE

Saiba mais

Veja o seguinte filme que remete à reflexão e contribui para este mergulho
no pensamento da liberdade como elemento da emancipação humana:

UM SONHO de liberdade. Dir. Frank Darabont. Estados Unidos: Warner


Home Video, 1994.

Merhy (2012) levanta uma questão central e muito contraditória, a aposta de que a vida de qualquer
um vale a pena, não como algo a ser representado no pensamento, mas para ser vivida nos encontros
com os outros, especialmente no mundo do trabalho em saúde. Os milhares de encontros que ocorrem
entre usuários e trabalhadores de saúde constituem em si um ato vivo.

A tensão existente é expressa no questionamento de como conseguir operar o enfrentamento de


que a vida de qualquer um vale em uma realidade material de produção que é evidentemente centrada
em uma lógica invertida, na qual a vida do outro interessa como consumidor e substrato para o lucro
(MERHY, 2012).

O desafio apresentado está em ultrapassar e vazar essa lógica a partir do agir micropolítico, ou seja,
do trabalho vivo em ato que ocorre nos milhares de encontros entre profissionais de saúde e usuários,
nas diversas dimensões da produção do cuidado, produzindo novas possibilidades de sentido (MERHY,
2012).

Observação

Nesse sentido, inserimos a reflexão do trabalho em saúde e sua


formação elementar e permanente, compreendendo que aí está o potencial
de transformar os encontros entre profissionais de saúde e usuários em
novas possibilidades de liberdade e valorização da vida de qualquer um.

A intervenção profissional na área da saúde ocorre com o corpo vivo e em interação com o social
e com o ambiente, a partir de processos de subjetivação. Entretanto, a formação dos profissionais de
saúde tende a enfrentar o corpo vivo apenas ao final da graduação, o que gera uma tensão elementar
entre a imagem de dessecação do corpo apreendida ao longo da formação e não pela escuta e contato
com sua alteridade (CARVALHO; CECCIM, 2009).

Cabe citar o estabelecimento de discussões no âmbito ético‑político acerca da formação em saúde


ao longo das últimas décadas. Pode‑se pontuar como exemplo o estabelecimento do Programa Nacional
de Reorientação da Formação Profissional em Saúde (Pró‑Saúde), em 2005, para os cursos de medicina,
enfermagem e odontologia, com ênfase na integração entre instituições de ensino, estruturas de gestão
da saúde, órgãos de representação popular e os serviços de atenção à saúde (CARVALHO; CECCIM,
11
Unidade I

2009). Entretanto, essas diretrizes políticas e curriculares relativamente recentes ainda são pontuais e
não esgotam a demanda de discussão da formação em saúde aqui propostas.

Evidenciamos a necessidade de nos voltarmos para os sentidos, valores e significados do que


e para quem fazemos nossas ações em saúde. As questões de natureza ética e humana têm sido
preteridas na formação à medida que não se adotam metodologias de ensino que promovam a
participação do aluno e a sua responsabilização no processo de formação (CARVALHO; CECCIM,
2009).

Como elemento concreto para discussão e concretização do SUS “utopia”, pautada no conceito de
saúde “utopia” e, a partir de um trabalho vivo que considera a vida de qualquer um como algo a ser
muito bem cuidada, apresenta‑se a Política Nacional de Educação Permanente em Saúde que em seu
texto elucida conceitos coerentes com o que foi apresentado até aqui:

A Educação Permanente é aprendizagem no trabalho, onde o aprender


e o ensinar se incorporam ao cotidiano das organizações e ao trabalho.
A educação permanente se baseia na aprendizagem significativa e
na possibilidade de transformar as práticas profissionais. A educação
permanente pode ser entendida como aprendizagem‑trabalho, ou seja,
ela acontece no cotidiano das pessoas e das organizações. Ela é feita a
partir dos problemas enfrentados na realidade e leva em consideração
os conhecimentos e as experiências que as pessoas já têm. Propõe
que os processos de educação dos trabalhadores da saúde se façam a
partir da problematização do processo de trabalho, e considera que as
necessidades de formação e desenvolvimento dos trabalhadores sejam
pautadas pelas necessidades de saúde das pessoas e populações. Os
processos de educação permanente em saúde têm como objetivos a
transformação das práticas profissionais e da própria organização do
trabalho (BRASIL, 2009, p. 20).

Transformar diretrizes políticas em trabalho vivo é um desafio que passa pela necessidade de
mobilizações ético‑políticas, técnico‑científicas e psicossociais. Há a possibilidade de mudanças
que se tornarão reais nos atos vivos de cada profissional de saúde nos seus encontros, seja no
âmbito da gestão ou do cuidado direto com o usuário do serviço de saúde. A proposta da educação
permanente, se alicerçada em estrutura favorável, possibilitará a atuação de todos os sujeitos
envolvidos na atenção das reais demandas locais e, assim, vislumbramos uma nova forma de
conceber e agir em saúde.

Observação

O desafio apresentado é complexo e enfrenta muitas contradições, mas


encontra na atuação micropolítica a possibilidade de transformações.

12
PRÁTICAS EDUCATIVAS EM SAÚDE

Assim, apresenta‑se a seguir um panorama teórico sobre o processo saúde‑doença, o processo


ensino‑aprendizagem, o contexto político e social da organização dos serviços de saúde com enfoque
na PNEPS.

2 REFERENCIAIS TEÓRICOS PARA COMPREENSÃO DE PRÁTICAS EDUCATIVAS


EM SAÚDE

2.1 O processo saúde‑doença

A compreensão do conceito de processo saúde‑doença é necessária para que possamos atuar de


forma assertiva nos fatores que envolvem esse processo.

Podemos afirmar que a saúde e o adoecer são modos pelos quais a vida se manifesta, eles remetem
a experiências únicas e subjetivas que não podem ser reconhecidas e significadas integralmente pela
palavra. Contudo, é por meio da palavra que a pessoa expressa seu mal‑estar, bem como o médico dá
significação às queixas de seu paciente. Nessa relação entre a ocorrência do fenômeno concreto de
adoecer e as palavras do paciente e do profissional de saúde, situa‑se a tensão entre a subjetividade
da experiência da doença e a objetividade dos conceitos que lhe dão sentido e propõem intervenções
(CZERESNIA, 2003).

O discurso médico científico não abrange a significação mais ampla da saúde e do adoecer, pois a
saúde não é objeto que se possa delimitar, não pode ser traduzida em conceito científico, bem como
o sofrimento que envolve o adoecer. Descartes, considerado o primeiro formulador da concepção
mecanicista do corpo, reconheceu que há partes do corpo humano vivo que são exclusivamente
acessíveis a seu titular (CAPONI, 1997).

Nessa perspectiva, ressaltamos que a questão da saúde não diz respeito à incorporação de um
novo discurso que migra da dimensão da objetividade à da subjetividade, do universal ao singular, do
quantitativo ao qualitativo. Não se trata de optar por valores que ficaram subjugados no decorrer do
desenvolvimento da racionalidade científica moderna, submetendo‑se agora aos que eram anteriormente
hegemônicos. A questão não é construir novos posicionamentos que mantêm a reprodução de antigas
oposições, mas de conseguir transitar entre diferentes níveis e formas de entendimento e de apreensão
da realidade, tomando como base os acontecimentos que nos mobilizam a elaborar e a intervir e não
sistemas de pensamento (CZERESNIA, 2003).

Entretanto, com a finalidade de contextualização do processo saúde‑doença, ressaltamos a relação


dialética entre o biológico e o social, ou seja, consideramos que a reprodução dos grupos sociais nas
diversas etapas produtivas deve ser levada em conta na detecção do perfil epidemiológico das classes
sociais (BREILH, 1980).

Dessa forma, torna‑se relevante a análise dos perfis epidemiológicos em uma dada formação social
de classes e frações de classe em que se segmenta a sociedade. A categoria classe social é base para uma
análise da produção e distribuição das enfermidades (LAURELL, 1983).

13
Unidade I

Considera‑se que no modelo capitalista de organização social temos diferentes classes sociais que se
inserem nos modos de produção de formas distintas e, portanto, reproduzem, ou seja, vivem conforme
a inserção nesses modos de produção lhes possibilita. Essas diferentes formas de produzir e reproduzir
no cenário de uma sociedade capitalista geram fatores de fortalecimento e desgaste no que se refere ao
processo saúde‑doença (ZINN, 2007).

Assim, podemos relacionar as estratégias de promoção à saúde com as ações de fortalecimento das
classes sociais nos modos de reprodução social.

A atuação do profissional de saúde consiste em focalizar o potencial da pessoa para o bem‑estar


e encorajá‑la a modificar ou fortalecer hábitos pessoais, estilo de vida e ambiente, de modo a reduzir
os riscos e aumentar a saúde e o bem‑estar. Para isso, o princípio de corresponsabilização nas práticas
terapêuticas torna‑se fundamental.

Saiba mais

Uma importante leitura que resgata as diferentes teorias interpretativas


do processo saúde‑doença ao longo da história é o artigo:

OLIVEIRA, M. A. C.; EGRY, E. Y. A historicidade das teorias interpretativas do


processo saúde‑doença. Rev.Esc.Enf. USP, São Paulo, v. 34, n. 1, p. 9‑15, 2000.

Exemplo de aplicação

Após a leitura do artigo sugerido anteriormente, reflita sobre o último parágrafo das considerações
finais, transcrito a seguir:

Na medida em que se evitasse que as necessidades de saúde fossem reduzidas a processos


fisiopatológicos, em que se buscassem formas de assistir que fossem cada vez mais “totalizadoras” e
não meramente a somatória de especificidades tecnológicas, em que se resgatasse a subjetividade, quer
da coletividade, quer dos trabalhadores em saúde, como parte desse processo de inovação (SCHRAIBER;
MENDES‑GONÇALVES, 1996 apud OLIVEIRA; EGRY, 2000 p. 15).

Essa afirmação se refere ao questionamento de como as necessidades de saúde são consideradas


para que sejam planejadas as ações de promoção e intervenção em saúde. Tal levantamento decorre da
compreensão do que seja saúde ou doença. Dessa forma, reflita:

O que você compreende por saúde?

O que você compreende por doença?

Qual seria a infraestrutura necessária de atenção à sua saúde hoje?

14
PRÁTICAS EDUCATIVAS EM SAÚDE

2.2 O processo ensino‑aprendizagem

A atuação na promoção da saúde envolve, necessariamente, a compreensão de educação em saúde,


pois, através das práticas educativas em saúde, os profissionais envolvidos podem concretizar as ações
de fortalecimento da população frente aos riscos de agravos à saúde.

A educação é compreendida como mediação básica da vida social de todas as comunidades humanas
(SEVERINO, 2000). A díade educação e saúde compreendem práticas socialmente produzidas em tempos
e espaços históricos específicos (RUIZ‑MORENO, et al., 2005).

Considerando a relação entre educação e saúde e compreendendo que esse binômio está diretamente
relacionado com o amplo contexto de vida das pessoas, ressaltamos a importância de modelos de intervenção
adequados para uma prática educativa efetiva que possibilita uma aproximação à saúde “utopia”.

Refletimos sobre a reorientação do modelo hegemônico de educação em saúde para um modelo


dialógico, em que a diferença consiste basicamente na consideração do sujeito no processo de
aprendizagem, partindo do pressuposto de que os usuários dos serviços de saúde são portadores de
saberes acerca do processo saúde‑doença‑cuidado e de condições concretas do cotidiano (ALVES, 2005).

Assim, se o objetivo é o fortalecimento das populações para que as classes sociais possam fazer face
de maneira mais adequada aos determinantes do processo saúde‑doença, é preciso lançar mão de uma
pedagogia não normativa, mas dialógica e emancipatória (ZINN, 2007).

Entretanto, esses pressupostos dialógicos e emancipatórios são contraditórios a muitas situações reais
de atenção à saúde, uma vez que os profissionais de saúde não têm praticado ações de fortalecimento,
mas sim a ministração de prescrições comportamentais utilizadas no verbo imperativo, a exemplo de
“não fume”, “use cinto de segurança”, dentre outros (LEFÈVRE; LEFÈVRE, 2007).

Em uma reflexão paradigmática sobre a assistência de enfermagem, temos que o processo de


formação acadêmica, historicamente, tem se baseado predominantemente nos conhecimentos
oriundos das ciências biológicas de forma fragmentada. Diante dessa limitação teórica, sugere‑se a
busca de subsídios que fundamentem um ensino que não apenas reitere nossas vivências, mas que
favoreça a formação profissional de enfermeiros capazes de apreender e praticar um cuidado pautado
no pensamento complexo (SILVA; CIAMPONE, 2003).

Essa reflexão vai ao encontro do pensamento de Severino (2000), que elucida a educação como
elemento gerador de novas formas de concepção de mundo potencialmente capazes de se contraporem
à concepção de mundo dominante, rompendo assim com a ideia de elemento de reprodução de
determinado sistema social, como sugerem as teorias reprodutivistas.

Severino (2000) nos traz uma concepção de educação que a compreende como a mediação da
articulação intencionalizante entre o conhecimento e as práticas históricas. O autor discute a educação
como “uma práxis cujo sentido é intencionalizar as práticas reais pelas quais os homens buscam
implementar sua existência”.
15
Unidade I

O autor coloca em pauta a relação visceral entre o processo educacional e o da sociedade a partir de
uma atitude crítica e de superação, em uma relação que pode ser reprodutora ou transformadora das
ideologias e relações sociais dominantes.

Nesse sentido, Severino (2000) lembra Gramsci que, transportando para o campo educacional a
filosofia político‑social do marxismo, concebe a educação como força de transformação social. O fio
condutor dessa discussão é a concepção de homem como um ser natural histórico, determinado pelas
condições objetivas e que atua sobre elas por meio de sua práxis.

Assim, inferimos a compreensão do educador como um mediador da prática transformadora através


de sua práxis. O autor nos remete à discussão da educação como uma práxis técnica (laboral), política
(sociabilidade) e simbólica (SEVERINO, 2000).

Referente à perspectiva técnica, o autor discute o teor laboral da educação questionando a produção
de bens materiais concretos por meio deste trabalho:

Com efeito, quando os homens desempenham suas práticas


predominantemente simbolizadoras, desenvolvem‑nas também para prover
sua existência material. Tanto é que, nas modernas sociedades capitalistas,
as atividades intelectuais são remuneradas com o salário, que assume
a forma de um bem universal, permutável por qualquer outro de que se
necessite. Sem dúvida, o produto imediato da educação não é material,
mas é socialmente útil, sob a forma de um serviço necessário à sociedade
(SEVERINO, 2001, p. 71).

Quanto à dimensão política, a prática educativa compreende o compromisso em preparar os


educandos para o trabalho e, mais do que isso, aprender a viver e sobreviver.

O último aspecto refere‑se ao fato de que a preparação para o mundo do trabalho, se realizada a
partir de práticas laborais, torna a aprendizagem mais significativa. É, portanto, por meio da prática que
se educa e se aprende.

Toda a discussão aqui apresentada acerca da educação deve ser inserida em um contexto
histórico, uma vez que, conforme apresentado por Pereira (2003), a evolução das abordagens
pedagógicas, acompanhando os diferentes momentos políticos e econômicos, apresentou modelos
compreendidos como tradicionais, renovados, por condicionamento e libertadores, sendo estes
últimos mais eficazes em seus resultados que os demais. Acrescentamos ainda que ao dizer
anteriormente de uma prática educativa dialógica e emancipatória, tais características estão
inseridas no conceito de educação libertadora.

16
PRÁTICAS EDUCATIVAS EM SAÚDE

Saiba mais

Para maior compreensão da evolução histórica dos modelos pedagógicos,


leia:

GADOTTI, M. História das ideias pedagógicas. São Paulo: Ática, 2001.

2.3 Educação: uma prática de liberdade e emancipação

Dejours (1986) nos apresenta como meio para o alcance da saúde a liberdade; esta se torna questão
singular na dinâmica de busca pelo estado de bem‑estar físico, psíquico e social. Em consonância
com essa forma de pensar, temos a necessidade da liberdade como elemento essencial no processo
ensino‑aprendizagem.

Freire (2005) diz que a libertação autêntica trata da humanização em processo, ou seja, não é algo
que se deposita nos homens, não é uma palavra, mas sim uma práxis, a qual demanda ação e reflexão
dos homens sobre o mundo para transformá‑lo:

A educação que se impõe aos que verdadeiramente se comprometem com


a libertação não pode fundar‑se numa compreensão dos homens como
seres vazios a quem o mundo “encha” de conteúdos; não pode basear‑se
numa consciência espacializada, mecanicistamente compartimentada, mas
nos homens como “corpos conscientes” e na consciência como consciência
intencionada ao mundo. Não pode ser a do depósito de conteúdos, mas a
da problematização dos homens em suas relações com o mundo (FREIRE,
2005, p. 77).

A proposta pedagógica de Paulo Freire remete à crítica e à superação dos modelos educacionais
hegemônicos. A educação apresenta‑se como um caminho para a mudança social, para a formação de
sujeitos históricos, atores e autores de seus processos cotidianos de emancipação coletiva e individual
(OLIVEIRA et al., 2008).

Destacamos a importância do diálogo como meio dessa relação educador e educando em um


processo ensino‑aprendizagem libertador. Freire (2005) nos traz elementos importantes para pensarmos
o diálogo; ele afirma que se não há profundo amor ao mundo e aos homens, não há diálogo. O autor
ainda nos diz que sem humildade também não há diálogo, pois a autossuficiência impede a aproximação
necessária ao diálogo. Nessa aproximação, ou seja, neste lugar de encontro, não há ignorantes totais,
nem sábios absolutos, mas sim homens em comunhão que almejam saber mais (FREIRE, 2005).

Complementarmente, no aspecto metodológico, Freire (2005) destaca que a investigação desde o seu
início necessita da presença crítica de representantes da comunidade do início ao fim, desde a análise
da temática levantada, prolongando‑se na organização de conteúdo programático da ação educativa.
17
Unidade I

Partimos da ideia de educação como um ato de troca em que o educador é aquele “que enquanto
educa, é educado, em diálogo com o educando que, ao ser educado, também educa” (FREIRE, 2005).

Educar vem do latim educere que significa conduzir. É preciso então entender que a proposta
educativa de tipo condutivista, na promoção da saúde, deve ser abandonada em favor da proposta
informativa, porque as pessoas não devem ser “educadas”, mas, ao contrário, com a ajuda da
informação e dialogando com a informação técnica devidamente decodificada, conduzir sua
vida. “Em vez de educar conduzindo é preciso informar o cidadão de modo claro, transparente...”.
(LEFÈVRE; LEFÈVRE, 2007).

Saiba mais

Uma leitura fundamental:

FREIRE, P. Pedagogia da autonomia: saberes necessários à prática


educativa. São Paulo: Paz e Terra; 1996.

Exemplo de aplicação

Como estratégia de reflexão e pertencimento ao tema aqui apresentado, reflita a partir das seguintes
direções:

1. Pense em uma experiência de aprendizado positiva que você já vivenciou e tente compreender
quais os fatores que tornaram essa experiência positiva.

2. Pense em um professor que você teve ao longo da sua trajetória de vida e que você considerou
como um ótimo educador. Quais características desse docente fizeram com que você o
admirasse?

3. Em contraposição, lembre‑se de um professor que você não considerou com bom desempenho.
Que características desse educador fizeram com que você não o admirasse?

2.4 A organização política dos serviços de saúde no Brasil

O SUS, mais do que uma forma de sistematizar e, portanto, nortear a administração do setor saúde,
é um modelo de atenção à saúde e surge como um ideal contra‑hegemônico constituído a partir de um
expressivo esforço da sociedade civil.

O SUS foi elaborado com base em intensas discussões que tiveram como marco o Movimento
da Reforma Sanitária na década de 1970; exemplo de um movimento resultante da organização

18
PRÁTICAS EDUCATIVAS EM SAÚDE

da sociedade que, em síntese, criticava e lutava pela mudança nas práticas e na organização dos
serviços de saúde. Estas práticas, na ocasião, eram fundamentadas na dicotomia entre preventivo e
curativo, individual e coletivo, com ênfase no âmbito curativo e individual, restritas aos contribuintes
previdenciários (SALUM, 1998).

O cenário vigente no setor saúde não era, portanto, democrático, uma vez que o acesso à saúde
não era universal, mas restrito a parcelas da população e, além de não ser integral, era reducionista
(centrado na patologia) e fragmentado, não atendendo à totalidade das necessidades de saúde do
indivíduo (ZINN, 2007).

A Reforma Sanitária constituiu‑se de um processo modernizador e democratizante de


transformação nos âmbitos político‑jurídico, político‑institucional e político‑operativo para dar
conta da saúde dos cidadãos, entendida como um direito universal e suportada por um Sistema
Único de Saúde, constituído sob regulação do Estado, permeado pela eficiência, eficácia e equidade,
com foco de construção permanentemente através do incremento de sua base social, da ampliação
da consciência sanitária, da implantação de um outro paradigma assistencial, do desenvolvimento
de uma nova ética profissional e da criação de mecanismos de gestão e controle populares sobre
o sistema (VILAÇA, 1994).

As discussões levantadas no Movimento da Reforma Sanitária foram oficializadas na VIII Conferência


Nacional de Saúde (CNS) ocorrida em 1986, e foi baseada nessas discussões que a nova Constituição
Brasileira, de 1988, instituiu o SUS e elaborou o texto que rege a área da saúde.

A implantação de um sistema de saúde universal no Brasil foi iniciada em um contexto político e


econômico não favorável, em meio a um cenário neoliberal com evidente posicionamento de organizações
internacionais contrárias ao financiamento público de sistemas de saúde nacionais e universais (PAIM
et al., 2011).

Apesar de todos os avanços, o SUS é um sistema de saúde em desenvolvimento que permanece


na luta para garantir a cobertura universal e equitativa. A participação do setor privado no mercado
é crescente e as interações entre os setores público e privado criam contradições e uma competição
injusta, culminando em ideologias e objetivos opostos, a exemplo do acesso universal contrário à
segmentação do mercado. Isso gera resultados negativos na equidade, no acesso aos serviços de saúde
e nas condições de saúde. Um dado importante para esta análise é que, apesar do financiamento federal
ter aumentado cerca de quatro vezes desde o início da última década, a porcentagem do orçamento
federal destinada ao setor de saúde não cresceu, acarretando restrições de financiamento, infraestrutura
e recursos humanos (PAIM et al., 2011).

É evidente a necessidade de um modelo baseado na promoção intersetorial da saúde e na integração


dos serviços de saúde. Nesse sentido, o Pacto pela Saúde e sua proposta de uma rede de serviços
de saúde organizada com fundamentos na atenção básica, associado às recomendações da Comissão
Nacional sobre Determinantes Sociais da Saúde, as quais orientam para a necessidade de abordar as
causas primordiais dos problemas de saúde, podem ajudar nessa conformação de modelos de atenção
ampliados (PAIM et al., 2011).
19
Unidade I

Pode‑se dizer que o maior desafio enfrentado pelo SUS é político. Aspectos como o financiamento,
a articulação entre público e privado e as desigualdades persistentes não poderão ser resolvidas
unicamente na esfera técnica (PAIM et al., 2011).

Observação

Inferimos aqui que a proposta de educação libertadora viabiliza a reflexão


de atuação política de cada cidadão, ultrapassando os aspectos técnicos
e científicos, assim, corrobora com a ideia de transformação da realidade
a partir de uma atuação ético‑política, reconhecidamente necessária
para seguir na luta de manutenção dos princípios do SUS, em especial os
princípios doutrinários de universalidade, equidade e integralidade.

3 POLÍTICA NACIONAL DE EDUCAÇÃO PERMANENTE EM SAÚDE

A PNEPS foi instituída pela Portaria GM/MS nº 198, de 13 de fevereiro de 2004 e foi alterada pela
Portaria GM/MS nº 1.996, de 20 de agosto de 2007, que dispõe sobre novas diretrizes e estratégias para
a implantação desta.

Essa política traz a proposta de constituir o SUS em uma rede‑escola, modificando o pensamento
do ensino transmitido de modo unidirecional, dos detentores do conhecimento para os trabalhadores
de saúde, mas considerando o espaço concreto de trabalho como um local de ensino‑aprendizagem
compartilhado. Além disso, a Educação Permanente em Saúde constitui estratégia que viabiliza as
transformações do trabalho na saúde para que este seja local de atuação crítica, reflexiva, propositiva,
compromissada e tecnicamente competente (BRASIL, 2009; CECCIM, 2005).

A Educação Permanente é aprendizagem no trabalho, onde o aprender e o


ensinar se incorporam ao cotidiano das organizações e ao trabalho. A educação
permanente se baseia na aprendizagem significativa e na possibilidade de
transformar as práticas profissionais. A educação permanente pode ser
entendida como aprendizagem‑trabalho, ou seja, ela acontece no cotidiano
das pessoas e das organizações. Ela é feita a partir dos problemas enfrentados
na realidade e leva em consideração os conhecimentos e as experiências que
as pessoas já têm. Propõe que os processos de educação dos trabalhadores da
saúde se façam a partir da problematização do processo de trabalho, e considera
que as necessidades de formação e desenvolvimento dos trabalhadores sejam
pautadas pelas necessidades de saúde das pessoas e populações. Os processos
de educação permanente em saúde têm como objetivos a transformação das
práticas profissionais e da própria organização do trabalho (BRASIL, 2009, p.20).

Cabe lembrar que a Organização Pan‑Americana de Saúde lançou, no início dos anos 1980, a
proposta de Educação Permanente em Saúde com vistas a uma nova conceituação e uma reorientação
dos processos de capacitação de trabalhadores dos serviços de saúde (DAVINI; NERVI; ROSCHKE, 2002).
20
PRÁTICAS EDUCATIVAS EM SAÚDE

Dessa forma, a produção PNEPS representou o esforço de cumprir uma das metas da saúde
coletiva de tornar a rede pública de saúde uma rede de ensino‑aprendizagem no exercício do trabalho
(CECCIM, 2005).

Destacamos, entretanto, a necessidade de descentralizar e disseminar a capacidade pedagógica


por dentro do setor para nos permitir constituir o SUS verdadeiramente como uma rede‑escola
(CECCIM, 2005).

Aquilo que deve ser realmente central à Educação Permanente em


Saúde é sua porosidade à realidade mutável e mutante das ações e
dos serviços de saúde; é sua ligação política com a formação de perfis
profissionais e de serviços, a introdução de mecanismos, espaços e temas
que geram auto‑análise, autogestão, implicação, mudança institucional,
enfim, pensamento (disruptura com instituídos, fórmulas ou modelos)
e experimentação (em contexto, em afetividade – sendo afetado pela
realidade/afecção) (CECCIM, 2005b, p.162).

Em estudo recente, com o objetivo de analisar a prática de atividades educativas de


trabalhadores da saúde em Unidade Básica de Saúde segundo as concepções de educação
permanente em saúde e de educação continuada, concluiu‑se que, apesar da presença majoritária
de estratégias de ensino participativas que indicam a preconização da reflexão sobre as práticas
de saúde em espaços de discussão coletiva, verificou‑se uma prática pautada na concepção de
educação continuada a qual preconiza os fundamentos técnico‑científicos das áreas profissionais
específicas para promover o desenvolvimento das instituições. Ressalta‑se do trabalho realizado
a necessidade de ampliação das ações educativas de trabalhadores no próprio espaço cotidiano
de trabalho (PEDUZZI et al., 2009).

Complementarmente, ressaltamos que o conceito de educação continuada está atrelado ao saber


técnico‑científico e utiliza a atualização do conhecimento específico das categorias profissionais, com
utilização recorrente da transferência de conteúdos, o que conduz à fragmentação das práticas de
saúde (SILVA, 2009).

Constatamos que os conceitos de educação continuada e educação permanente possuem


características técnicas, teóricas e políticas diferentes. Porém, algo conceitualmente distinto pode
eventualmente possuir semelhanças na aplicação prática, uma vez que são os sujeitos envolvidos que
dão vida, em ato, às propostas e diretrizes existentes. Portanto, há a necessidade de um cuidado peculiar
na aplicação fidedigna da proposta de educação permanente em saúde, a qual, em detrimento de
protocolos predefinidos, apenas lança os princípios para uma construção coletiva e interdisciplinar do
processo de ensino‑aprendizagem.

Peduzzi e Montanha (2010) nos apresentam o resultado de um estudo referente ao levantamento


de necessidades educacionais de trabalhadores de enfermagem. O foco está nas falhas identificadas
e nos problemas evidenciados, resultando em ações educativas voltadas para os procedimentos
técnicos de enfermagem, o que se desdobra na reiteração do modelo de cuidado e de atenção
21
Unidade I

hegemônico e biomédico à saúde e na concepção também dominante de educação continuada;


apesar de, em menor escala, também outras fontes serem utilizadas no planejamento das atividades
educativas.

As autoras vislumbram em suas conclusões uma possível resposta ao questionamento de como


seria possível investir em uma dimensão emancipatória a partir de um cotidiano restrito à reiteração
do paroxismo técnico‑científico. A possível resposta apresenta‑se a partir dos resultados que, apesar de
atestarem o predomínio de ações educativas de trabalhadores de enfermagem orientadas pela concepção
de educação continuada, coexistem com a identificação por parte desses mesmos trabalhadores, da
necessidade e possibilidade de atividades educativas com novos formatos, conteúdos e sentidos, na
perspectiva da educação permanente. Isso corrobora com o entendimento de que ambas as concepções
podem ser complementares e que a distinção clara entre elas permite o reconhecimento do espaço que
devem ocupar na gestão do trabalho (PEDUZZI; MONTANHA, 2010).

A PNEPS sugere, sem a intenção de esgotar as possibilidades, um quadro para sistematizar uma
sequência que vai da prática à informação, da informação à aquisição de competências e capacidades, e
da aquisição à programação de soluções práticas. Considerar esta sequência é importante uma vez que o
acesso a informações e conhecimentos será pobre de significados se não houver reflexão e identificação,
na prática, dos problemas (BRASIL, 2009).

O quadro referido anteriormente é apresentado a seguir (BRASIL, 2009):

Quadro 1

Estudo de Casos;

Ação‑Reflexão Trabalho de Campo;


Identificar problemas.
Investigação‑Ação Sistematização de dados locais;

Construção e priorização de problemas.


Acesso Bibliográfico Seminário de estudos;
Problematizar as práticas

Acesso a Dados Estágio in loco;


Ampliar o conhecimento.
Acesso à Educação virtual Grupos de Discussão;

Acesso a Outras Experiências Teleconferências e Redes Interativas.


Aquisição de Supervisão‑Capacitante;
Desenvolver competências competências e Treinamentos focalizados específicos;
específicas e da equipe.
capacidades específicas. Oficinas de elaboração de projetos de trabalho.
Grupos Operativos de Qualidade;
Buscar soluções; Coordenar condutas
Oficinas de programação local;
Colocá‑las em prática e com outros e Trabalho em Redes.
Avaliá‑las. Avaliação de processos e resultados.

22
PRÁTICAS EDUCATIVAS EM SAÚDE

Saiba mais

O artigo de Ricardo B. Ceccim contribui para a compreensão da Educação


Permanente em saúde:

CECCIM, R. B. Educação Permanente em Saúde: desafio ambicioso e


necessário. Comunic, Saúde, Educ., v. 9, n. 16, p. 161‑77, 2005.

Leia atentamente a situação‑problema abaixo:

Uma enfermeira que atua em uma Unidade Básica de Saúde (UBS) da periferia do
Município de São Paulo recebeu esta semana para consulta de enfermagem o Sr. JAB, 72
anos, morador do bairro em que está situada a UBS, aposentado (trabalhava na lavoura),
residente em uma casa de alvenaria de dois cômodos com um dos sete filhos, a nora e três
netos com idades abaixo de dez anos. A renda familiar é de um salário mínimo e meio.
O Sr. JAB é portador de Hipertensão Arterial Sistêmica (HAS) e Diabetes Mellitus (DM). É
analfabeto e permanece a maior parte do tempo sozinho em sua casa. Na consulta, ao
ser questionado sobre o uso dos medicamentos, a enfermeira percebeu compreensão
insuficiente do Sr. JAB sobre o uso adequado dos medicamentos, ele referiu uso irregular
conforme sensação de bem‑estar ou mal‑estar. Como o Sr. JAB possui vínculo com a
enfermeira há mais de um ano, sentiu‑se à vontade para dizer que parou de fazer uso do
remédio de “urinar” (Hidroclorotiazida), pois estava sentindo muita fraqueza. Referiu ainda
muita dor em membros inferiores e dificuldade para enxergar.

Agora leia a seguinte afirmativa:

Exemplo de aplicação

“A educação influencia e é influenciada pelas condições de saúde, estabelecendo um estreito contato


com todos os movimentos de inserção nas situações cotidianas em seus complexos aspectos sociais,
políticos, econômicos, culturais, dentre outros” (MENDES; VIANA, 2001).

Faça a reflexão sobre as seguintes questões:

1. Qual é a relação entre a situação‑problema apresentada e a afirmação dos autores Mendes e


Viana, 2001?

2. Quais são os fatores sociais e econômicos encontrados na situação‑problema apresentada que


podem influenciar a saúde do Sr. JAB?

3. Quais seriam as ações educativas possíveis de serem desenvolvidas nesta situação?

23
Unidade I

4. Como colocar essas ações educativas em prática (recursos, tempo, estratégias)?

5. Como mobilizar a equipe de saúde a trabalhar de forma coerente com a afirmação citada de
Mendes e Viana (2001)?

6. O vínculo estabelecido entre o Sr. JAB e a enfermeira configura uma relação profissional positiva
ou negativa nessa situação? Por quê?

4 COMUNICAÇÃO HUMANA: INSTRUMENTO ESSENCIAL PARA A PRÁTICA


EDUCATIVA

4.1 Fundamentos da comunicação humana

Sabemos que a comunicação destaca‑se como o principal instrumento para que a interação e a
troca aconteçam e, consequentemente o processo de cuidar, no seu sentido mais amplo, tenha espaço
para acontecer. Segundo Mendes (1994), “os componentes da comunicação formam o clima e a nutrição
para a compreensão”.

Etimologicamente, a palavra comunicar origina‑se do latim communicare que significa “pôr em


comum” Mendes (1994). A comunicação interpessoal pode ser definida como um conjunto de movimentos
integrados que calibra, regula, mantém e, por isso, torna possível a relação entre os homens (SILVA, 2001).

Encontramos muitas definições para o que vem a ser comunicação, afinal como afirmam Watzlawizk,
Beavin e Jackson (1967), não se comunicar é impossível, mesmo na inatividade ou no silêncio tudo tem
valor de mensagem; “a comunicação é o princípio natural que une um ser a outro”(RUESCH, 1987).

Segundo Silva (2006), a comunicação pode ser dividida em verbal – associada às palavras expressas
por meio da fala ou da escrita, e em não verbal – desenvolvida através de gestos, silêncio, expressões
faciais, postura corporal, entre outros.

Ao compreendermos a educação em saúde como um elemento de cuidado humano, percebemos logo


a importância de uma comunicação com qualidade para que haja uma atenção efetiva e de qualidade.

Waldow (1998), ao fazer uma reflexão histórica sobre como o corpo e o toque são percebidos,
refere‑se à possibilidade do mundo da tecnologia avançada substituir esse instrumento próprio do ser
humano. A autora lembra que o afago e o aperto de mão que oferecem apoio e suporte, bem como o
olhar carinhoso e amigo parecem não ser mais necessários. A máquina assume o cuidado e o cuidador
permanece ocupado e absorvido no manuseio desta tecnologia, por vezes esquecendo o ser humano a
ela conectado.

Na comunicação há o envolvimento do comportamento recíproco entre as pessoas que estão se


relacionando, o que significa que não existe um fluxo de comportamento numa só direção (MENDES,
1994). Com ou sem intenção, sempre há a transmissão de mensagens uma vez estabelecida a interação.
24
PRÁTICAS EDUCATIVAS EM SAÚDE

O indivíduo participa simultaneamente de duas dimensões existenciais que decorrem de duas


formas de se relacionar com o mundo: uma verbal, que lhe confere um repertório psicolinguístico,
proporcionando uma exteriorização do ser social, e outra não verbal, que constitui um estatuto
psicobiológico, proporcionando uma exteriorização ser psicológico (SILVA, 2006).

A comunicação é um processo pautado em compreender e compartilhar mensagens enviadas e


recebidas, estas mensagens exercem influência no comportamento das pessoas que vivenciam essa
interação (STEFANELLI, 2005).

Exemplo de aplicação

Foi apresentada uma afirmação de Stefanelli (2005), importante para o eixo da nossa discussão,
pois se as mensagens enviadas e recebidas exercem influência no comportamento das pessoas que
vivenciam essa interação, apresentamos perguntas para reflexão:

Como estamos nos comunicando no exercício da nossa profissão?

Como influenciamos e somos influenciados pelos nossos colegas de trabalho?

Como influenciamos e somos influenciados pelas pessoas de quem cuidamos, para quem prestamos
um serviço de saúde?

Será que temos consciência das nossas expressões não verbais?

Será que estamos atentos às expressões não verbais das pessoas com quem nos relacionamos?

Vale destacar uma pesquisa desenvolvida com crianças cegas e surdas desde o nascimento e
que, apesar de nunca terem aprendido por imitação, pois nunca puderam olhar o rosto da mãe, elas
demonstram as emoções da mesma maneira que nós que enxergamos. Seus olhos brilham e sorriem
quando estão felizes, choram quando estão tristes, ficam vermelhas e desviam a direção do olhar quando
estão com vergonha, levantam as sobrancelhas e abrem mais os olhos e, conforme o grau de surpresa,
também a boca (SILVA, 2006).

Silva (2002) constatou, portanto, que as emoções básicas são expressas da mesma maneira em
qualquer ser humano. A autora coloca em destaque que os pacientes olham para o rosto dos profissionais
e não para as mãos, porque esperam entender o que os profissionais da saúde sentem ao lhes prestar
cuidados, pois nem sempre têm condições de fazer a avaliação técnica desse trabalho.

Assim, a autora nos ensina que:

A compreensão que os pacientes precisam ter do profissional da área da saúde


passa, principalmente, pela compreensão de que quando nos comunicamos
com as pessoas não temos apenas o compromisso de passar um conteúdo,
25
Unidade I

uma informação, pois toda comunicação envolve um sentimento, ou


seja, o que é que sentimos quando ficamos diante do outro; o que é que
sentimos quando ficamos diante daquela pessoa e diante da informação
que temos a transmitir; o quanto concordamos com Natagori, quando ele
diz: “Abandonarei todas as honras, menos a de te servir” (SILVA, 2002 p.74).

Silva (2006) nos lembra que toda comunicação tem duas partes: de um lado, o conteúdo, o fato, a
informação que queremos transmitir; de outro, o que estamos sentindo quando nos comunicamos com a
pessoa. O conteúdo está intimamente ligado ao referencial de cultura e, cabe lembrar, que o profissional
de saúde tem uma cultura própria, diferente do leigo, por isso é importante saber que quanto mais
informações possuirmos sobre aquela pessoa e quanto maior a nossa habilidade em correlacionar esse
saber do outro com o nosso, melhor será o nosso desempenho no aspecto da informação e do conteúdo.

Aqui inferimos o quanto essa afirmação vai ao encontro das premissas de Paulo Freire, que nos
apresenta um modelo de educação dialógica na qual os saberes do outro são fundamentais para uma
construção de novos saberes.

A comunicação pressupõe a informação e o domínio sobre o que queremos


comunicar, a nossa intenção, emoção e o que pretendemos quando nos
aproximamos do nosso cliente ou do nosso paciente. O interessante é que
nem sempre o profissional da área de saúde tem a consciência de que, ao
falarmos em comunicação, não falamos apenas das palavras expressas para
a outra pessoa – que podem ser dimensionadas como comunicação verbal.
Acontece que toda comunicação humana, face a face, interpessoal, também
se faz através da comunicação não verbal, ou seja, de todas as formas de
comunicação que não envolvem diretamente as palavras. Até podemos
afirmar que quando falamos de relacionamento interpessoal a comunicação
verbal, sozinha, não existe, pois além dela existe a maneira como falamos –
que podemos chamar de paraverbal: os silêncios e grunhidos que utilizamos
ao falar, as pausas que fazemos entre as frases e palavras, a ênfase que
colocamos na voz. Além do paraverbal, temos as expressões faciais, as
nossas posturas corporais diante do outro, a maneira como o tocamos, as
distâncias interpessoais que mantemos com essa outra pessoa (SILVA, 2006
apud SILVA, 2002, p.75).

Dessa forma, para afirmarmos que a comunicação está efetivamente ocorrendo, temos que ter
coerência nas nossas palavras e em toda nossa comunicação não verbal. E aqui se destaca as quatro
finalidades da comunicação não verbal (SILVA, 2002):

1. A primeira é complementar a comunicação verbal. Por exemplo, quando dizemos “bom dia”
sorrindo para o outro e olhando nos seus olhos;

2. A segunda é contradizer o verbal. Por exemplo, quando dizemos “muito prazer” e apertamos a
mão do outro com medo ou nojo de tocar;
26
PRÁTICAS EDUCATIVAS EM SAÚDE

3. A terceira é substituir o verbal. Por exemplo, o meneio positivo da cabeça, olhando para a outra
pessoa e dizendo não verbalmente “estou te ouvindo”, “estou atenta a você”.

4. A quarta finalidade do não verbal é a demonstração dos nossos sentimentos (SILVA, 2002).

Comunicação não verbal (SILVA, 1996):

• Paralinguagem: qualquer som produzido pelo aparelho fonador que não faça parte do sistema
sonoro da língua usada.

• Cinésica: linguagem do corpo / movimentos.

• Proxêmica: é o uso que o homem faz do espaço.

• Tacêsica: é tudo que envolve a comunicação tátil.

• Características físicas: são a própria forma e a aparência do corpo.

De maneira geral, não temos consciência nem controle voluntário de toda essa sinalização não
verbal. Exemplo disso é uma situação de interação, na qual gostamos do que está acontecendo, a
nossa pupila se dilata involuntária e inconscientemente. Evidentemente, em situações onde não existe
alteração de luminosidade, nem alterações químicas, porém é fato comprovado que quando a interação
é prazerosa para a pessoa a sua pupila se dilata. É interessante que diante da contradição, na dúvida
entre a mensagem verbal e a não verbal, as pessoas confiam na linguagem silenciosa, que fala da
essência do ser humano e do que estamos sentindo (MCCASKEY, 1999).

Cabe aqui destacar que em um processo educativo e/ou em um processo de cuidado em saúde,
estamos tratando de interação humana e, portanto, a habilidade em se comunicar será elemento
fundamental para qualificar a relação estabelecida. Se o que foi apresentado até aqui evidencia que a
comunicação não verbal transmite o que sentimos ao nos relacionarmos, retomo o que Paulo Freire nos
ensina ao dizer que “educar exige querer bem aos educandos” (FREIRE, 1996) e o parafraseio dizendo
que cuidar exige querer bem àqueles de quem cuidamos.

Fica claro que se alguém está apenas preocupado em transmitir informações e não interessado
na compreensão do que o outro apreende da informação, o seu não verbal expressará mensagens de
descuidado. Dessa forma, o outro, que estará ouvindo a informação, perceberá na sutileza do não verbal
a impossibilidade de questionamento, a impossibilidade de esclarecer dúvidas.

Então a dica é tomarmos consciência do que pretendemos fazer em uma prática de educação em
saúde. Queremos apenas cumprir uma meta institucional e/ou política? Ou almejamos contribuir para
uma efetiva reflexão e construção de modos saudáveis de vida? Temos que ter a consciência de que o
discurso sozinho tem pouco impacto se não acompanhado da confirmação não verbal. E essa expressão
não verbal não mente, ela emite a mensagem do nosso real sentimento em determinada situação.

27
Unidade I

Saiba mais

A leitura do livro Comunicação tem remédio é uma possibilidade de


aprender sobre a comunicação e sobre como nos comunicarmos.

SILVA, M. J. P. Comunicação tem remédio – a comunicação nas relações


interpessoais em saúde. 11. ed. São Paulo: Gente, 2006.

Leia atentamente a parábola O canto do galo:

Era uma vez um granjeiro. Era um granjeiro incomum, intelectual e progressista.


Estudou administração, para que sua granja funcionasse cientificamente. Não satisfeito,
fez um doutorado em criação de galinhas. No curso de administração, aprendeu que,
num negócio, o essencial é a produtividade. O improdutivo dá prejuízo; deve, portanto,
ser eliminado. Aplicado à criação de galinhas, esse princípio se traduz assim: galinha que
não bota ovo não vale a ração que come. Não pode ocupar espaço no galinheiro. Deve,
portanto, ser transformada em cubinhos de caldo de galinha. Com o propósito de garantir
a qualidade total de sua granja, o granjeiro estabeleceu um rigoroso sistema de controle
da produtividade de suas galinhas. “Produtividade de galinhas” é um conceito matemático
que se obtém dividindo‑se o número de ovos botados pela unidade de tempo escolhida.
Galinhas cujo índice de produtividade fosse igual ou superior a 250 ovos por ano podiam
continuar a viver na granja como galinhas poedeiras. O granjeiro estabeleceu, inclusive, um
sistema de “mérito galináceo”: as galinhas que botavam mais ovos recebiam mais ração.
As galinhas que botavam menos ovos recebiam menos ração. As galinhas cujo índice de
produtividade fosse igual ou inferior a 249 ovos por ano não tinham mérito algum e eram
transformadas em cubinhos de caldo de galinha. Acontece que conviviam com as galinhas
poedeiras galináceos peculiares que se caracterizavam por um hábito curioso. A intervalos
regulares e sem razão aparente, eles esticavam os pescoços, abriam os bicos e emitiam
um ruído estridente e, ato contínuo, subiam nas costas das galinhas, seguravam‑nas pelas
cristas com o bico e obrigavam‑nas a se agachar. Consultados os relatórios de produtividade,
verificou o granjeiro que isso era tudo o que os galos – esse era o nome daquelas aves –
faziam. Ovos, mesmo, nunca, jamais, em toda a história da granja, qualquer um deles botara.
Lembrou‑se o granjeiro, então, das lições que aprendera na escola, e ordenou que todos
os galos fossem transformados em cubos de caldo de galinha. As galinhas continuaram a
botar ovos como sempre haviam botado: os números escritos nos relatórios não deixavam
margens a dúvidas. Mas uma coisa estranha começou a acontecer. Antes, os ovos eram
colocados em chocadeiras e, ao final de vinte e um dias, eles se quebravam e de dentro deles
saíam pintinhos vivos. Agora, os ovos das mesmas galinhas, depois de vinte e um dias, não
quebravam. Ficavam lá, inertes. Deles não saíam pintinhos. E, se ali continuassem por muito
tempo, estouravam e de dentro deles o que saía era um cheiro de coisa podre. Coisa morta.
Aí o granjeiro científico aprendeu duas coisas: Primeiro: o que importa não é a quantidade
dos ovos; o que importa é o que vai dentro deles. A forma dos ovos é enganosa. Muitos
28
PRÁTICAS EDUCATIVAS EM SAÚDE

ovos lisinhos por fora são podres por dentro. Segundo: há coisas de valor superior aos ovos,
que não podem ser medidas por meio de números. Coisas sem as quais os ovos são coisas
mortas.

Fonte: ALVES, R. Entre a ciência e a sapiência. O dilema da educação. 6 ed. São Paulo: Loyola, 2001. pp. 67‑71.

Exemplo de aplicação

Com base na leitura da parábola, reflita:

Que associações podem ser feitas a partir da mensagem contida no texto e as práticas educativas
em saúde que encontramos no cenário econômico e social em que vivemos?

4.2 Saber ouvir

Para refletir sobre o tema saber ouvir, seleciono um texto que fala por si, Escutatória, de Rubem Alves
(com grifos para reflexão):

Sempre vejo anunciados cursos de oratória. Nunca vi anunciado curso de


escutatória. Todo mundo quer aprender a falar. Ninguém quer aprender a ouvir.
Pensei em oferecer um curso de escutatória. Mas acho que ninguém vai se matricular.
Escutar é complicado e sutil.

Diz o Alberto Caeiro que “não é bastante não ser cego para ver as árvores e as flores.
É preciso também não ter filosofia nenhuma”. Filosofia é um monte de ideias, dentro da
cabeça, sobre como são as coisas. Aí a gente que não é cego abre os olhos. Diante de nós,
fora da cabeça, nos campos e matas, estão as árvores e as flores. Ver é colocar dentro da
cabeça aquilo que existe fora. O cego não vê porque as janelas dele estão fechadas. O que
está fora não consegue entrar. A gente não é cego. As árvores e as flores entram. Mas –
coitadinhas delas – entram e caem num mar de ideias. São misturadas nas palavras da
filosofia que mora em nós. Perdem a sua simplicidade de existir. Ficam outras coisas. Para
ver é preciso que a cabeça esteja vazia.

Faz muito tempo, nunca me esqueci. Eu ia de ônibus. Atrás, duas mulheres conversavam.
Uma delas contava para a amiga os seus sofrimentos. (contou‑me uma amiga, nordestina,
que o jogo que as mulheres do Nordeste gostam de fazer quando conversam umas com
as outras é comparar sofrimento. Quanto maior o sofrimento, mais bonitas são a mulher e
a sua vida. Conversar é a arte de produzir‑se literariamente como mulher de sofrimentos.
Acho que foi lá que a ópera foi inventada. A alma é uma literatura. É nisso que se baseia a
psicanálise...). Voltando ao ônibus. Falavam de sofrimentos. Uma delas contava do marido
hospitalizado, dos médicos, dos exames complicados, das injeções na veia – a enfermeira
nunca acertava ‑, dos vômitos e das urinas. Era um relato comovente de dor.

29
Unidade I

Até que o relato chegou ao fim, esperando, evidentemente, o aplauso, a admiração,


uma palavra de acolhimento que, supostamente, ouvia. Mas o que a sofredora ouviu foi
o seguinte: “Mas isso não é nada...” A segunda iniciou, então, uma história de sofrimentos
incomparavelmente mais terríveis e dignos de uma ópera que os sofrimentos da primeira.

Parafraseio o Alberto Caieiro: “Não é bastante ter ouvidos para se ouvir o que é dito. É
preciso também que haja silêncio dentro da alma.” Daí a dificuldade: a gente não aquenta
ouvir o que o outro diz sem logo dar um palpite melhor, sem misturar o que ele diz
com aquilo que a gente tem a dizer. Como se aquilo que ele diz não fosse digno de
descansada consideração e precisasse ser complementado por aquilo que a gente tem
a dizer, que é muito melhor. No fundo somos todos iguais às duas mulheres do ônibus.

Certo estava Lichtenberg – citado por Murilo Mendes: “Há quem não ouça até que lhe
cortem as orelhas.” Nossa incapacidade de ouvir é a manifestação mais constante e
sutil da nossa arrogância e vaidade: no fundo, somos os mais bonitos...

Tenho um velho amigo, Jovelino, que se mudou para os Estados Unidos, estimulados
pela revolução de 64. Pastor protestante (não “evangélico”), foi trabalhar num programa
educacional da Igreja Presbiteriana USA, voltado para minorias. Contou‑me de sua
experiência com os índios. As reuniões são estranhas. Reunidos o participante, ninguém
fala. Há um longo, longo silêncio. (Os pianistas, antes de iniciar o concerto, diante do piano,
ficam assentados em silêncio, como se estivesse orando. Não rezando, reza é falatório
para não ouvir. Orando. Abrindo vazios de silêncio. Expulsando todas as ideias estranhas.
Também para se tocar piano é preciso não ter filosofia nenhuma). Todos em silêncio, à
espera do pensamento essencial. Aí, de repente, alguém fala. Curto. Todos ouvem. Terminada
a fala, novo silêncio. Falar logo em seguida seria desrespeito. Pois o outro falou os seus
pensamentos, pensamentos que julgava essenciais. Sendo dele, os pensamentos não são.
São‑me estranhos. Comida que é preciso digerir. Digerir leva tempo. É preciso tempo para
entender o que o outro falou. Se falo logo a seguir são duas as possibilidades. Primeira:
“Fiquei em silêncio só por delicadeza. Na verdade, não ouvi o que você falou. Enquanto você
falava eu pensava nas coisas que iria falar quando você terminasse sua (tola) fala. Falo como
se você não tivesse falado”. “Ouvi o que você falou. Mas isso que você falou como novidade
eu já pensei há muito tempo. É coisa velha para mim. Tanto que nem preciso pensar sobre
o que você falou”.

Em ambos os casos estou chamando o outro de tolo. O que é pior que uma bofetada. O
longo silêncio quer dizer: “Estou ponderando cuidadosamente tudo aquilo que você falou”.
E assim vai a reunião.

Há grupos religiosos cuja liturgia consiste de silêncio. Faz alguns anos passei uma
semana num mosteiro na Suíça, Grand Champs. Eu e algumas outras pessoas ali estávamos
para, juntos, escrever um livro. Era uma antiga fazenda. Velhas construções, não me esqueço
da água no chafariz, onde as pombas vinham beber. Havia uma disciplina de silêncio, não
total, mas de uma fala mínima. O que me deu enorme prazer às refeições.
30
PRÁTICAS EDUCATIVAS EM SAÚDE

Não tinha a obrigação de manter uma conversa com meus vizinhos de mesa. Podia comer
pensando na comida. Também para comer é preciso não ter filosofia. Não ter obrigação de
falar é uma felicidade. Mas logo fui informado de que parte da disciplina do mosteiro
era participar da liturgia três vezes por dia: às 7 da manhã, ao meio‑dia e às 6 da tarde.
Estremeci de medo. Mas obedeci.

O lugar era sagrado era um velho celeiro, todo de madeira, teto muito alto. Escuro.
Haviam aberto buracos na madeira, ali colocando vidros de várias cores. Era uma atmosfera
de luz mortiça, iluminado por velas sobre o altar, uma mesa simples com um ícone oriental
de cristo. Uns poucos bancos arranjados em “U” definiam um amplo espaço, vazio, no centro,
onde quem quisesse podia se assentar numa almofada, sobre um tapete. Cheguei alguns
minutos antes da hora marcada.

Era um grande silêncio. Muito frio, nuvens escuras cobriam o céu e corriam, levadas por
um vento impetuoso que descia dos Alpes. A força do vento era tanta que o velho celeiro
torcia e rangia, como se fosse um navio de madeira num mar agitado. O vento batia nas
macieiras nuas do pomar e o barulho era como o de ondas que se quebram. Estranhei. Os
suíços são sempre pontuais.

A liturgia não começava. E ninguém tomava providências. Todos continuavam do mesmo


jeito, sem nada fazer. Ninguém que se levantasse para dizer: “Meus irmãos, vamos cantar o
hino...” Cinco minutos, dez, quinze. Só depois de vinte minutos é que eu, estúpido, percebi
que tudo já se iniciara vinte minutos antes.

As pessoas estavam lá para se alimentar de silêncio. E eu comecei a me alimentar de silêncio


também. Não basta o silêncio de fora. É preciso silêncio dentro. Ausência de pensamentos. E aí,
quando se faz o silêncio dentro a gente começa a ouvir coisas que não ouvia.

Eu comecei a ouvir. Fernando Pessoa conhecia a experiência, e se referia a algo que se


ouve nos interstícios das palavras, no lugar onde não há palavras. É música, melodia que
não havia e que quando ouvida nos faz chorar. A música acontece no silêncio. É preciso que
todos os ruídos cessem. No silêncio, abrem‑se as portas de um mundo encantado que mora
em nós – como no poema de Mallarmé, A catedral submersa, que Debussy musicou. A alma
é uma catedral submersa. No fundo do mar – quem mergulha sabe – a boca fica fechada.
Somos todos olhos e ouvidos.

Me veio agora a ideia de que, talvez, essa seja a essência da experiência religiosa – quando
ficamos mudos, sem fala. Aí, livres dos ruídos do falatório e dos saberes da filosofia, ouvimos
a melodia que não havia, que de tão linda nos faz chorar. Para mim Deus é isto: beleza
que se ouve no silêncio. Daí a importância de saber ouvir os outros: há beleza lá também.
Comunhão é quando a beleza do outro e a beleza da gente se juntam num contraponto”.

Está apresentado no texto acima um cenário de reflexão sobre a arte de ouvir, de escutar. Como
percebemos não é fácil. Vivemos em um mundo de muitos barulhos, de muitas informações e de muita
31
Unidade I

velocidade, assim, torna‑se cada vez mais difícil esvaziar nossas mentes para ouvir o outro e, mais difícil
ainda, ter tempo para digerir a fala do outro. Ressalto aqui a fala verbal e não verbal.

Fica então o desafio, desafio de exercitarmos a escuta ao que o outro tem a nos dizer, o educando,
o usuário do serviço de saúde.

Em um serviço de saúde repleto de pessoas para serem atendidas e, ao mesmo tempo, com todo o
contexto de cobrança de produtividade (quantitativa) de serviço prestado, como colocar em prática o
exercício da comunicação que requer uma escuta reflexiva?

Vamos pensar que um caminho possível seria a tomada de consciência das nossas reais intenções.
Se realmente queremos educar bem, aprender bem, cuidar bem, então isso será transmitido em cada ato
não verbal e o mesmo tempo, mesmo que curto, utilizado em uma interação humana, será qualificado
pela consciência crítica do porquê estamos ali e o que pretendemos com esse encontro.

Resumo

Nesta primeira unidade, foi possível esboçar um panorama


teórico‑conceitual acerca dos temas que envolvem as práticas educativas em
saúde, focando o processo saúde‑doença, o processo ensino‑aprendizagem,
a educação libertadora, a organização dos serviços de saúde no Brasil e a
Política Nacional de Educação Permanente em saúde.

Percebemos que contextualizar os temas a serem discutidos nos seus


aspectos históricos, políticos, econômicos, sociais e culturais é elemento
que fundamenta e amplia a compreensão sobre o assunto.

Tornou‑se evidente a relação existente entre educação e saúde e o que


entendemos por cada um desses conceitos que, ao longo do tempo, sofreu
e ainda sofre modificações quanto às suas definições e práticas.

Mais do que compreender a relação entre educação e saúde, foi possível


compreender como esses temas se inserem em nossa atual organização
política de atenção à saúde.

Compreender o Sistema Único de Saúde, sua origem histórica, seus


princípios e diretrizes legais, propicia a nós uma compreensão mais
consistente sobre como pensar a saúde e a doença, o ensinar e o aprender
nesta realidade concreta e atual que vivemos.

Com isso, a apresentação dos potenciais da Política Nacional de


Educação Permanente em saúde suscita a possibilidade repensar a formação
elementar e permanente dos profissionais que atuam na área da saúde
32
PRÁTICAS EDUCATIVAS EM SAÚDE

para uma prática educativa consciente que promova verdadeiramente a


autonomia, a emancipação humana e a liberdade de criação. Desse modo,
torna‑se possível o desenvolvimento de um movimento espiral e crescente
de construção de novas formas de pensar e agir em saúde.

Esta é de fato a grande finalidade de vivenciar uma prática educativa


nessas bases conceituais apresentadas: propiciar um movimento livre e
emancipatório contínuo a caminho do alcance do bem estar físico, psíquico
e social.

Para resumir as bases conceituais até aqui apresentadas podemos dizer


que a palavra síntese é a liberdade. Liberdade necessária para o alcance
da saúde como foi citado por Dejours (1986) e liberdade necessária para
uma educação que rompe com as imposições hegemônicas e possibilita
a descoberta e expressão de novas possibilidades de ser e agir no mundo.

Diante desse panorama, explicitamos ainda as contradições nas quais


vivemos e desenvolvemos as práticas educativas e de saúde. De um lado,
o atual cenário econômico que atribui valor financeiro a atributos não
valoráveis, tais como a vida e a educação, e de outro lado os princípios de
integralidade, equidade e emancipação humana.

Diante do exposto, cabe a reflexão de cada leitor acerca das possibilidades


micropolíticas de atuação para o alcance das mudanças necessárias, ou
seja, da atuação cotidiana ocorrida em cada encontro humano no qual
cada ato refletirá em frutos libertadores ou reiterativos do que pensamos
em saúde e em educação.

Em uma consulta realizada pelo enfermeiro, dentista, fisioterapeuta,


profissional de educação física, e todos os demais profissionais da área da
saúde, a consciência do respeito ao saber do outro e a sensibilidade em
contextualizar o cenário de vida do outro, fará, certamente, a diferença na
condução desse encontro e, nesse sentido, teremos mais interação e não
apenas informação e, com isso, acreditamos na possibilidade de mudanças
reias nos hábitos de saúde e principalmente nos fatores de fortalecimento
da nossa saúde.

Complementarmente, nesta unidade, evidenciamos a importância da


comunicação nos processos de interação humana, em especial nos encontros
de cuidado à saúde e dialeticamente, nos encontros de educação em saúde.

Para além das técnicas e conteúdos necessários para a informação correta,


há a real necessidade de conhecermos as habilidades de comunicação. Saber
sobre os conteúdos verbais e não verbais e o impacto disso na interação.
33
Unidade I

Verificamos as finalidades da comunicação não verbal frente à


comunicação verbal e, com isso, percebemos que a tomada de consciência
sobre o que sentimos é fator necessário para cuidarmos dos momentos de
interação e, portanto, de comunicação com o outro.

As mensagens enviadas e recebidas em um processo de comunicação


exercem influência no comportamento das pessoas, dessa forma, cuidar da
comunicação é cuidar da influência que podemos ter frente àqueles que
pretendemos educar em saúde.

Não basta dominar o conteúdo teórico, técnico e científico; mais do que


isso, é necessário que tenhamos habilidades de comunicação para que toda
a bagagem de conteúdo possa ser efetivamente compartilhada e praticada.

Outra questão destacada foi a habilidade de escutar. Para escutar, é


necessário esvaziar a mente, é necessário humildade para valorizar o que
o outro tem a dizer. Isso não é algo comum e simples, em especial em um
mundo repleto de ruídos, informações e pressa.

O desafio colocado é o estabelecimento de relações conscientes e


reflexivas. Desenvolvendo habilidades de comunicação, que é, em si, o elo
que une um ser ao outro.

Exercícios

Questão 1. “O binômio educação e saúde constituem práticas socialmente produzidas em tempos e


espaços históricos definidos” (RUIZ‑MORENO et al., 2005). Nesse sentido, analise as afirmações abaixo e
em seguida assinale a alternativa correta:

I – A compreensão dos condicionantes do processo saúde‑doença não oferece subsídios para a


adoção de novos hábitos e condutas de saúde.

II – A educação influencia e é influenciada as/pelas condições de saúde, estabelecendo um estreito


contato com todos os movimentos de inserção nas situações cotidianas em seus complexos aspectos
sociais, políticos, econômicos e culturais.

III – Educação em Saúde é também um conjunto de saberes e práticas orientados para a prevenção
de doenças e promoção da saúde.

Assinale a alternativa correta:

A) Todas as afirmativas estão corretas.

34
PRÁTICAS EDUCATIVAS EM SAÚDE

B) Todas as afirmativas estão incorretas.

C) Apenas a afirmativa I está incorreta.

D) Apenas a afirmativa II está correta.

E) Apenas as afirmativas I e II estão corretas.

Resposta correta: alternativa C.

Análise das alternativas:

A) Alternativa incorreta

Justificativa: a afirmação I está incorreta já que compreensão dos condicionantes do processo


saúde‑doença oferecem sim subsídios para a adoção de novos hábitos e condutas de saúde.

B) Alternativa incorreta.

Justificativa: as afirmações II e III estão corretas. Como afirmado no item I, a educação influencia as
condições de saúde e esta é influenciada pela educação e tanto educação como saúde estão inseridas
no cotidiano social, político, econômico e cultural. Já no item II, é correto dizer que educação em saúde
é composta por conhecimentos e práticas que promovem saúde e previnem doenças.

C) Alternativa correta.

Justificativa: como já mencionado, a afirmativa I é incorreta.

D) Alternativa incorreta.

Justificativa: como já mencionado, além da afirmativa II, a afirmativa III também está correta.

E) Alternativa incorreta.

Justificativa: como já mencionado, a afirmativa I é incorreta.

Questão 2. Observe a pesquisa de Bruno et al. (2009), descrita no resumo a seguir:

Objetivo: avaliar os aspectos epidemiológicos na reincidência de gravidez na adolescência.

Métodos: estudo de coorte que incluiu 187 adolescentes grávidas, atendidas e acompanhadas
durante cinco anos após o parto em um serviço de atendimento de adolescentes do Estado do Ceará.
Foram analisados: faixa etária, estar ou não estudando, morar com os pais, escolaridade, condição marital
e condição do companheiro atual. Os dados foram digitados e analisados no programa EPI‑INFO. Foram
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Unidade I

feitas análises estatísticas das variáveis independentes (idade, escolaridade, estudar, trabalhar, morar
com os pais, estado civil e mudança de parceiro) e comparadas quanto à variável dependente (ter ou
não uma nova gravidez cinco anos depois). O teste exato de Fisher foi utilizado para avaliar associação
entre os fatores que poderiam influenciar a repetição da gravidez, considerado como tendo associação
quando o p<0,05. Foram calculados os riscos relativos para a escolaridade, condição marital e mudança
de parceiro por serem fatores que se mostraram significativos para a reincidência de gravidez.

Resultados: foi verificado que 61% das adolescentes engravidaram nos cinco anos seguintes
ao primeiro parto. Não foram fatores protetores: idade, estudar, trabalhar ou morar com os pais.
Entretanto, quando as adolescentes tinham oito anos ou menos de escolaridade, o risco de engravidar
quase duplicou (risco relativo (RR)=1,8 (IC95%=1,3‑2,6)). Novas gestações foram mais frequentes entre
as solteiras sem companheiro estável (RR=1,3 (IC95%=1,1‑1,6)) e aquelas que mudaram de parceiro
(RR=1,4(IC95%=1,1‑1,7)).

Conclusões: a baixa escolaridade, a mudança de parceiros e uniões não estáveis foram fatores de
risco para reincidência de gravidez.

Assinale a alternativa correta:

A) A falta de conhecimento dos métodos contraceptivos é o fator mais relevante na pesquisa citada
para a reincidência de gravidez.

B) A prática educativa em saúde pautada no modelo pedagógico da transmissão é o mais indicado


para mudar a realidade apresentada na pesquisa.

C) Conhecer o perfil epidemiológico da população e os fatores envolvidos em determinada situação


de saúde é importante para planejar as estratégias educativas a serem utilizadas e subsidiar parâmetros
para avaliação de resultados.

D) Trabalhar e morar com os pais foram fatores protetores para reincidência de gravidez na
adolescência.

E) A escolaridade não interfere na nova ocorrência de gestação na adolescência.

Resposta correta: alternativa C.

Análise das alternativas

A) Alternativa incorreta.

Justificativa: os fatores relevantes para nova ocorrência de gravidez na adolescência foram: a baixa
escolaridade, a mudança de parceiros e uniões não estáveis.

B) Alternativa incorreta.
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PRÁTICAS EDUCATIVAS EM SAÚDE

Justificativa: transmitir informações não atingiria o objetivo de solucionar questões de ordem social
e afetiva tais como baixa escolaridade, mudanças de parceiros e uniões não estáveis.

C) Alternativa correta.

Justificativa: com dados como os obtidos no estudo as estratégias educativas serão pautadas nas
reais necessidades de intervenção.

D) Alternativa incorreta.

Justificativa: trabalhar e morar com os pais não foram fatores protetores para reincidência de
gravidez na adolescência

E) Alternativa incorreta.

Justificativa: a escolaridade interfere na nova ocorrência de gestação na adolescência.

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