Teorias Do Crime PDF
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PARTE GERAL
Teorias do Crime
SISTEMA DE ENSINO
Livro Eletrônico
DIREITO PENAL – PARTE GERAL
Teorias do Crime
Dermeval Farias
Teorias do Crime.............................................................................................................4
Introdução.......................................................................................................................4
1. Teoria Causal Clássica ou Sistema Naturalista de Ação. . ..............................................6
1.1. Conceito de Ação, Tipo, Tipicidade, Ilicitude e Culpabilidade na Teoria Causal
Clássica........................................................................................................................... 7
1.2. Resumo da Teoria Causal Clássica ou Sistema Naturalista...................................... 12
2. Teoria Causal Neoclássica ou Sistema Neokantista.................................................. 20
2.1. Conceito de Ação, Tipicidade, Ilicitude e Culpabilidade na Teoria Causal
Neoclássica.................................................................................................................. 20
2.2. Relação entre os Elementos do Injusto (Teoria da Ratio Cognoscendi, Teoria da
Ratio Essendi e Teoria dos Elementos Negativos do Tipo).............................................24
2.3. Resumo da Teoria Causal Neoclássica ou Sistema Neokantista..............................26
3. Teoria Finalista ou Sistema do Injusto Pessoal......................................................... 30
3.1. Conceito de Ação, Tipo, Tipicidade, Ilicitude e Culpabilidade na Teoria Finalista....... 31
3.2. Comparações e Críticas à Dogmática Finalista.......................................................35
3.3. Finalismo no Direito Penal Brasileiro......................................................................38
3.4. Resumo da Teoria Finalista ou Sistema do Injusto Pessoal..................................... 41
4. Teoria Social da Ação................................................................................................ 47
4.1. Conceito de Ação e Características da Tipicidade, Ilicitude e Culpabilidade na
Teoria Social da Ação................................................................................................... 48
4.2. Resumo da Teoria Social da Ação...........................................................................53
5. Teorias Funcionalistas Teleológica.............................................................................54
5.1. Teoria Funcionalista Teleológica..............................................................................55
5.2. Teoria Funcionalista Sistêmica................................................................................59
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Teorias do Crime
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Teorias do Crime
Dermeval Farias
TEORIAS DO CRIME
Introdução
Querido(a) aluno(a), é com satisfação que entregamos aos concurseiros o presente ma-
terial em PDF, com a finalidade de tornar mais claros os complexos temas do Direito Penal
cobrados em concursos das mais diversas funções públicas, ou seja, da Magistratura, Minis-
tério Público, Defensoria, AGU, Delegado de Polícia, analista de tribunais e muitos outros.
O material que ora se apresenta objetiva apontar com profundidade e clareza temas co-
brados principalmente nas provas do Ministério Público e da Magistratura. É certo que o can-
didato que estudar por este material poderá, estudando o mais complexo, preparar-se melhor
para as provas de outras carreiras jurídicas.
Não deve haver ilusão: o estudo para concursos está cada mais desafiador, por isso é
preciso melhor organização e preparação do candidato, com adequada divisão do tempo de
estudo, com o uso do material devidamente selecionado e indicado por professores que co-
nhecem a matéria e os desafios dos concursos públicos.
Depois de mais de 15 anos de experiência na atividade com candidatos a concursos pú-
blicos, na qual muitos venceram e se tornaram juízes, promotores de justiça, advogados da
União, defensores públicos, delegados de polícia, tabeliães, procuradores de estado, verifica-
mos que a correta divisão do tempo de estudos, as aulas de excelência, a leitura adequada da
doutrina, jurisprudência e leis secas, bem como a resolução constante de questões — tudo isso
em ciclo de repetições do estudo — aliadas à persistência e obstinação do candidato, fizeram
a diferença para a aprovação.
Nesse clima, o material em PDF de penal, PARTE GERAL, do Gran Cursos, da área jurídica,
surge para suprir lacuna do mercado, para oferecer aos estudantes o que há de melhor no
conteúdo doutrinário, jurisprudencial e de questões, com profundidade e clareza, sobre os
temas que mais são cobrados nos concursos e que fazem a diferença entre a aprovação e a
não aprovação dos candidatos.
Iniciaremos com o estudo das principais teorias do crime, do causalismo à teoria social
da ação, passando, portanto, pelo causalismo clássico, causalismo neoclássico, finalismo,
teoria social da ação, funcionalismo teleológico, funcionalismo sistêmico e teoria significati-
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No final do século XIX e início do século XX, as ideias da teoria causal clássica floresceram
na Alemanha. Os maiores expoentes do sistema causal-naturalista foram Franz von Liszt e
Ernst von Belling. É o primeiro sistema penal com a estrutura analítica do crime, ou seja, com
a sistematização da tipicidade, ilicitude e culpabilidade, que trouxe uma proposta formalista
de interpretação dessas categorias jurídico-penais (CABRAL, 2017).
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Releva anotar, para melhor identificação do modelo de interpretação da teoria causal clás-
sica, a sua base filosófica estruturada no positivismo reinante do século XIX. Naquele período,
a influência da Escola Positiva foi marcante na produção do conhecimento, de modo que, nas
ciências naturais, os fenômenos científicos eram explicados por meio de regras de observa-
ção empírica da realidade. Esse método, físico e mecânico, foi utilizado na sistematização
do Direito Penal do período causal, como também nas demais ciências humanas do período
histórico (TOLEDO, 1994).
O Direito do período teve dificuldade para se afirmar como ciência. Isso porque a priorida-
de voltava-se para o estudo das ciências naturais que contribuíam para o desenvolvimento
da produção industrial. Ademais, o Direito deveria ser alicerçado no modelo de Direito natural
racionalista, no método analítico de decomposição do todo em partes (GOMES FILHO, 2019).
Para o positivismo naturalista, a ciência somente poderia ser construída com o conheci-
mento oriundo do método empírico, indutivo, experimental e causal-explicativo. Por isso, “o
direito precisava livrar-se das referências metafísicas e de adotar conceitos e padrões pró-
prios das ciências da natureza” (BUSATO, 2010, p.217).
O método positivista das ciências naturais, de decomposição dos elementos para o co-
nhecimento do todo, influenciou o desenvolvimento da estrutura classificatória e analítica
do crime em tipicidade, ilicitude e culpabilidade no final do século XIX e início do século XX.
Desse modo, o conceito de crime foi dividido em partes com o objetivo de conhecimento do
todo, enquanto a análise dos elementos oriundos do todo – e agora conjugados – permitiu a
conclusão de que existe um fato criminoso que deverá ser imputado e gerar consequências
penais (TOLEDO, 1994).
Nesse período, as categorias jurídicas que explicam o fato criminoso foram construídas
e interpretadas mediante a observação da realidade naturalística, sem relação com o conhe-
cimento dos valores. Conforme leciona Luís Greco (2000, p.122): “o sistema naturalista, tam-
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bém chamado sistema clássico do delito, foi construído sob a influência do positivismo, para
o qual a ciência é somente aquilo que se pode apreender através dos sentidos”.
Os institutos da estrutura analítica do crime foram interpretados de maneira formal, sem
a possibilidade de o intérprete fazer juízo de valor. O crime foi dividido em duas partes: parte
objetiva, formada por tipicidade e ilicitude, denominada injusto; e parte subjetiva, formada
pela culpabilidade, dentro da qual estavam o dolo e a culpa, funcionando a imputabilidade
como mero pressuposto.
O conceito de ação consistia no movimento corporal voluntário causador de mudança no
mundo físico — no mundo exterior (LISZT, 2006). Portanto, o crime deveria produzir um resul-
tado com alteração do mundo exterior, pois “o conceito causal de ação não pode reconhecer
crime sem resultado” (TAVARES, 2003, p.132). Essa conclusão explicava o crime material,
mas trazia dificuldade de análise para o crime formal e, ainda, para o crime de mera conduta.
O tipo, cujo estudo foi desenvolvido com maior precisão na obra de Ernst von Belling, foi
compreendido de forma autônoma dentro da teoria do delito, composto de elementos com
função unicamente descritiva, sem prejuízo de seu exame como tipo causal clássico formado
de elementos objetivos e descritivos (BELING, 1944).
O tipo causal clássico era objetivo, neutro, avalorado, acrítico, mera descrição do aspec-
to externo da conduta. Ernst von Belling demonstrava preocupação com as funções do tipo
penal, ou seja, função garantia e função limitadora, ao afirmar que não bastava uma ação
antijurídica para se chegar à etapa da sanção penal, mas era preciso, para tanto, uma ação
tipicamente antijurídica e culpável (BELING, 1944).
A tipicidade, por sua vez, consistia na adequação do fato à letra da lei, em um juízo de ade-
quação do fato concreto ao tipo legal. Por isso, a tipicidade causal clássica era formal, uma
vez que significava a subsunção do fato à forma da lei, sem conteúdo valorativo. “Por essa
razão, não era possível, nessa época, aceitar o método axiológico, no exame da tipicidade,
com análise do grau de ofensa ao bem jurídico tutelado” (GOMES FILHO, 2019, p.55).
Exemplo: desse modo, não era possível nessa época desenvolver o princípio da insignificân-
cia, uma vez que a tipicidade causal clássica era formal, não possibilitando a análise de grau
de ofensa ao bem jurídico, somente possível em modelos de tipicidade material.
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sua vez, Ernst von Belling (1944) afirmava que, para a existência do dolo, o autor deveria ter
conhecido as circunstâncias do fato que pertence ao tipo, bem como a consciência da antiju-
ridicidade, destacando que se tratava de uma concepção dominante na ciência de seu tempo.
Prevalece o entendimento de que o dolo causal clássico era normativo, formado por co-
nhecimento das circunstâncias do fato, vontade de realizar o resultado representado e cons-
ciência da ilicitude. O dolo do sistema clássico também era psicológico, com espaços de va-
loração, incorporados em estados mentais do agente, e exigia a consciência da ilicitude, que
constitui um elemento axiológico, que se conectava à concepção de dolus malus do direito
romano (CABRAL, 2017).
Além das críticas dogmáticas relacionadas à estrutura analítica do crime, o modelo for-
mal, fechado e avalorado, impedia a construção de soluções supralegais e dava uma aparente
sensação de segurança jurídica, que era desmascarada na concretização do Direito Penal
diante das peculiaridades dos casos concretos.
É certo, ainda, que o conceito de ação humana na teoria causal clássica, marcado pela
influência do momento histórico, com o pensamento de causa e efeito da física newtoniana,
vinculava-se à realização de um resultado naturalístico e, por isso, não possibilitava uma
adequada explicação quanto aos crimes que se consumam sem a necessidade de modifica-
ção do mundo externo.
Com isso, o modelo causal desconhecia ações humanas que não fossem meros proces-
sos causais, pois não se examinava a finalidade (conteúdo da vontade) no conceito de ação.
A finalidade não era ignorada pelo modelo causal, porém só aparecia como objeto de valor no
âmbito da culpabilidade (MUÑOZ VONDE, 1988), uma vez que o dolo estava na culpabilidade.
O “dolo e a culpa eram considerados as duas espécies possíveis de culpabilidade” (PUPPE,
2004, p.03).
Do mesmo modo, o conceito mecânico de omissão como retração dos músculos não con-
seguia solucionar, com argumentação jurídica convincente, os crimes omissivos, uma vez
que tais crimes só podem ser explicados na perspectiva de uma omissão jurídica, com um
nexo normativo e de evitação, e não de forma mecânica.
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Pode-se dizer, dessa forma, que o intérprete estava moldado em um modelo formalista
que dificultava a valoração das categorias jurídico-penais. Acreditava-se que todos os pro-
blemas poderiam ser solucionados na ótica do ser. Não se deu crédito ao dever ser. Soma-se
a isso o caráter classificatório e formalista do sistema causal clássico, que foi etiquetado
como uma falácia naturalista.
Dessa forma, o critério ontológico de interpretação das categorias penais, alinhado à tipi-
cidade formal e neutra, na solução de casos práticos, faziam com que, a título de ilustração,
o furto de uma dúzia de ovos caipira ou o furto de um quilo de ouro fossem interpretados com
tipicidade, sem necessitar de exame do grau de ofensa maior ou menor ao bem jurídico tu-
telado. Portanto, o princípio da insignificância, que exige uma análise material da tipicidade,
não poderia ser desenvolvido nesse sistema penal.
Ressalte-se que o terceiro Código Penal brasileiro, ou seja, o de 1940, seguiu uma linha
positivista, influenciado tanto por ideias do causalismo clássico quanto pelo conteúdo do
Código italiano de 1930 (Código Rocco) e pelo Código suíço de 1937 (PIERANGELI, 2004) com
os seguintes aspectos: sistema do duplo binário, com a possibilidade de aplicar pena e medi-
da de segurança ao imputável; responsabilidade penal objetiva em diversas passagens; bem
como se alicerçou nas formulações iniciais de Liszt e Beling, malgrado tal período do Direito
Penal brasileiro, com raríssimas exceções, tenha sido marcado por uma pobreza doutrinária
(TAVARES, 1980).
Para Magalhães Noronha (2000), embora tivesse sido produzido dentro de um cenário
político totalitário, o Código de 1940 teve uma orientação liberal, merecendo elogios e críticas,
uma vez que, no segundo caso, não fugiu totalmente da responsabilidade penal objetiva. Sob
o aspecto filosófico, o referido autor dizia que o Código era eclético, que acendia uma vela a
Carrara e outra a Ferri.
Antes desse período, o Direito Penal brasileiro do século XIX foi marcado pelo Código
Criminal de 1830 e pelo Código Penal de 1890. O primeiro repetiu a previsão do princípio da
legalidade e seu corolário reserva legal, previstos na Constituição de 1824. O Código de 1830
apresentava uma mistura contraditória entre ideias liberais e retrógadas, revogou o livro V
das Ordenações Filipinas e trouxe novidades na pena de multa, ou seja, a dosimetria em dias-
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-multa, mas não conseguiu se desvencilhar de uma ideologia ruralista e escravagista, uma
vez que manteve a pena de morte sob o argumento de que seria a única medida para conter
os escravos. Por sua vez, o Código Penal de 1890 constituiu um documento apressado, sem
correspondência com as ideias penais no cenário mundial, e foi alvo de constantes alterações
legislativas, até ser substituído pelo Código Penal de 1940.
Exemplo: não era possível, nessa época, criar o princípio da insignificância, o qual depende
de tipicidade material.
A culpabilidade era psicológica, formada pelos elementos subjetivos dolo e culpa, e cons-
tituía o vínculo psíquico que ligava o agente ao fato por ele cometido. A imputabilidade era
mero pressuposto dessa culpabilidade.
O modelo causal clássico foi etiquetado como uma falácia naturalista porque acreditava
em soluções prontas e fechadas para os problemas penais, ou seja, com respostas em padrão
classificatório e formalista. Enfatiza-se que constituiu a primeira teoria com uma sistematiza-
ção tripartite do crime, com rigor científico em seus conceitos (GOMES FILHO, 2019).
Por fim, verifica-se que o modelo de interpretação do Direito Penal, oriundo da teoria cau-
sal clássica, em razão da influência do método positivista, que consistiu na sua plataforma de
desenvolvimento, estava alicerçado em estruturas prontas e fechadas, sem alicerce jurídico
para a construção de decisões penais valorativas e supralegais. Esse modelo foi combatido
pelas ideias neokantistas que surgiram na sequência (GOMES FILHO, 2019).
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DIRETO DO CONCURSO
COMENTÁRIO
Letra e.
Os itens II e III, sobre a teoria causal clássica não merecem reparos, pois estão corretos, con-
forme explicamos no tópico sobre a teoria causal clássica. Os itens I e V não deveriam ser
objeto de cobrança em uma prova objetiva, uma vez que o tema divide a doutrina brasileira
(conceito bipartido x conceito tripartido), conforme veremos no tópico sobre o finalismo. E,
além disso, a corrente dominante é a de que o crime é um fato típico, ilícito e culpável. O item
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Teorias do Crime
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IV aborda tema que será visto no tópico mais adiante sobre o finalismo. De antemão, não
merece reparo.
COMENTÁRIO
Letra b.
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Dermeval Farias
Conforme explicado no tópico sobre a teoria causal clássica, a sua culpabilidade se ancora
em teoria psicológica pura ou psicológica, de modo que a culpabilidade consiste no vinculo
psicológico que liga o agente ao fato, composta por dolo (crime doloso) e culpa (crime culpo-
so). A imputabilidade é mero pressuposto. Nessa fase ainda não havia surgido a exigibilidade
de conduta diversa.
COMENTÁRIO
Letra c.
Conforme explicado, o conceito de ação da teoria causal clássica é o seguinte: conduta hu-
mana voluntária que modifica o mundo exterior. A referida teoria explica, inclusive, a omissão
de forma naturalista. Beling dizia que a omissão correspondia à retração dos músculos. Hoje,
no finalismo ou em teorias normativas, a omissão é explicada de forma normativa e não de
forma naturalista.
Questão 4 (PROMOTOR DE JUSTIÇA SUBSTITUTO RN/2009) Acerca das teorias que regem
o direito penal e os seus institutos, assinale a opção correta.
a) A teoria final da ação foi elaborada por Von Liszt no final do século XIX, tendo sido de-
senvolvida também por Beling e Radbruch, resultando na estrutura mundialmente conhecida
como sistema Liszt-Beling- Radbruch.
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b) A teoria causal da ação teve por mérito superar a taxativa separação dos aspectos obje-
tivos e subjetivos da ação e do próprio injusto, transformando, assim, o injusto naturalístico
em injusto pessoal.
c) Para a teoria constitucional do direito penal, a verificação da ocorrência do fato típico do-
loso não se resume ao aspecto formal-objetivo, dependendo, ainda, da ocorrência de outros
elementos de índole material-normativa e subjetiva.
d) Para a teoria social da ação, um fato considerado normal, correto, justo e adequado pela co-
letividade, ainda que formalmente enquadrável em um tipo incriminador, pode ser considerado
típico pelo ordenamento jurídico, devendo, no entanto, ser excluída a culpabilidade do agente.
e) A teoria funcional da conduta está estruturada em duas vertentes: para a primeira, que tem
Claus Roxin como principal defensor, a função da norma é a reafirmação da autoridade do direi-
to; a segunda, cujo principal representante é Günther Jakobs, sustenta que um moderno direito
penal deve estar estruturado teleologicamente, isto é, atendendo a finalidades valorativas.
COMENTÁRIO
Letra c.
Sobre a teoria constitucionalista do delito, essa classificação não possui uma estrutura ana-
lítica do delito que compete com o causalismo ou com o finalismo, mas trata-se de um termo
utilizado, por pequena parcela da doutrina nacional, para se referir ao Direito Penal consti-
tucional, ancorado em princípios penais, em categorias materiais e valorativas, na proteção
de bens jurídicos principais, com a ideia de intervenção mínima. O termo ainda é usado para
tratar, no exame da tipicidade penal, das teorias da imputação objetiva e da tipicidade con-
globante. Ressalta-se que, ao tratar da teoria constitucional do delito, o candidato a concur-
sos deve sempre pensar em um sistema penal valorativo, de institutos materiais (tipicidade,
ilicitude), de intervenção mínima, de tutela de bens jurídicos penais dentro de um modelo de
ultima ratio. A letra A está errada porque Lizst, Beling e Radbruch são expoentes do causalis-
mo clássico e não do finalismo. A letra B está errada porque as características apresentadas
do item dizem respeito ao finalismo, não se trata de causalismo. A teoria social da ação não
corresponde ao item D. A letra E está errada porque trocou os nomes de lugar, Jakobs é autor
do funcionalismo sistêmico, que defende a reafirmação de validade da norma com a aplica-
ção da sanção penal, enquanto Roxin é o autor do funcionalismo teleológico.
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COMENTÁRIO
Errado.
O item está incorreto, uma vez que o conceito dado na questão corresponde ao conteúdo da tipi-
cidade material. Isso porque somente na tipicidade material é possível analisar o grau de ofensa
ao bem jurídico e, inclusive, analisar a possibilidade de incidência, conforme os requisitos jurispru-
denciais do princípio da insignificância. Já a tipicidade formal constitui a mera adequação do fato
à letra da lei. Não permite fazer juízo de valor do grau de ofensa ao bem jurídico.
COMENTÁRIO
Errado.
O item está incorreto porque a teoria que retira o dolo e a culpa da culpabilidade e os trans-
porta para o tipo é a teoria normativa pura do finalismo, que será vista mais adiante. A teoria
psicológica é a do causalismo clássico, que conceituava a culpabilidade como o vínculo psi-
cológico que ligava o agente ao fato por ele praticado, e era formada por dolo e culpa.
COMENTÁRIO
Certo.
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O item está correto porque, tanto no causalismo clássico quanto no causalismo neoclássico, o dolo
é normativo, formado por vontade, representação do resultado (ou consciência do resultado) e
consciência da ilicitude. E o causalismo clássico também é chamado de sistema naturalista.
COMENTÁRIO
Certo.
O item está correto porque, conforme ressaltado na questão anterior, tanto no causalismo
clássico quanto no causalismo neoclássico, o dolo é normativo, formado por vontade, repre-
sentação do resultado (ou consciência do resultado) e consciência da ilicitude. E o causa-
lismo clássico também é chamado de sistema naturalista. O elemento volitivo é a vontade.
O elemento cognitivo é a representação do resultado. E o elemento normativo é a consciência
da ilicitude, que somente passou a ser compreendida como potencial a partir da teoria da
cegueira jurídica do Mezger (tema estudado no material sobre erros essenciais, quando se
estuda as teorias do dolo, dentre elas a teoria limitada do dolo).
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COMENTÁRIO
Letra b.
Sobre a teoria constitucionalista do delito, conforme já salientado, a referida teoria analisa os
institutos penais de forma valorativa, de modo que a tipicidade é material, de forma a não se
contentar com a mera adequação formal do fato à letra da lei. É necessário analisar o grau
de ofensa da conduta ao bem jurídico. A letra A está incorreta porque, no causalismo, dolo e
culpa fazem parte da culpabilidade, não integram o fato típico. A letra C está errada porque
não foi erro, mas sim acerto de a teoria finalista deslocar o dolo e a culpa da culpabilidade
para o injusto, mais precisamente para a conduta que integra o fato típico. A letra D está er-
rada porque o direito penal do inimigo constitui uma teoria desenvolvida pelo Jakobs, não foi
desenvolvida pelo Roxin.
COMENTÁRIO
Letra a.
Para os defensores da ideia de uma teoria constitucionalista do delito, a tipicidade compre-
ende: adequação do fato à letra da lei, que gera lesão intolerável ao bem jurídico; a análise de
condutas não fomentadas e não autorizadas por outros ramos do ordenamento jurídico (ti-
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Não apenas como uma descrição formal-externa de comportamentos, mas materialmente como
uma unidade de sentido socialmente danoso, como comportamento lesivo de bens judicialmente
protegidos. (DIAS, 2007, p.242-243).
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Para que uma pessoa tivesse a reprovação de seu comportamento, segundo Frank, have-
ria a necessidade de: uma aptidão normal do autor, conhecida por imputabilidade; uma certa
e concreta relação psíquica do autor com o fato (dolo, culpa) e uma normalidade das circuns-
tâncias em que o autor atua. Desse modo, o autor não poderia ser reprovado quando realizas-
se ações sob circunstâncias que revelasse um quadro de anormalidade (FRANK, 2011).
A teoria normativa nasceu na Alemanha diante da necessidade prática de resolver com
justiça determinadas situações concretas, quando a não exigibilidade significava autorizar o
agente a agir contra a determinação da norma objetiva do Direito, uma vez que no âmbito da
referida norma não se encontrava a solução justa (C. NUÑEZ, 2002).
Dessa forma, a culpabilidade passou a ser um juízo de reprovação, de censura, que incide
sobre o agente por ter atuado de forma contrária ao Direito. Contudo, não era uma valoração
pura, pois não se abandonou os dados psicológicos, já que o juízo de valor incidiria sobre uma
“situação fática de ordinário psicológica” (TOLEDO, 1994, p.223).
Da ideia valorativa de reprovação, surgiu um novo requisito para a culpabilidade, denomi-
nado exigibilidade de conduta diversa. Portanto, a reprovação, na culpabilidade, só poderia
existir se fosse possível ao agente atuar de forma diversa; caso contrário, estaria afastado o
juízo de culpabilidade.
No modelo neokantista, a culpabilidade foi alterada na composição de seus elementos.
Nessa fase, a imputabilidade deixou de ser pressuposto e foi transformada em um elemento.
O dolo e a culpa deixaram de ser espécies de culpabilidade e se transformaram em elementos
da culpabilidade. Por fim, o terceiro e novo elemento, como já dito, passou a ser a exigibilida-
de de conduta diversa (GOMES FILHO, 2019). Esse contorno definitivo foi dado por Edmund
Mezger (TOLEDO, 1994).
A culpabilidade se alicerçava na teoria psicológico-normativa que acolheu o dolo norma-
tivo (dolus malus) e, desse modo, a consciência da ilicitude fazia parte do dolo. No contexto
dessa teoria, o dolo normativo estava dentro da culpabilidade e era composto de: representa-
ção da realidade fática (elemento intelectual), vontade dos efeitos e não do processo causal
(elemento intencional, volitivo) mais a consciência atual da ilicitude (elemento normativo).
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Com isso, desconhece a realidade das ações humanas, que não são simples processos causais
(pois, neste caso, não poderiam ser delas diferenciados os simples fenômenos da natureza), mas
processos causais dirigidos a um fim. (MUÑOZ CONDE, 1988, p.13)
O outro aspecto de fraqueza dos sistemas causais diz respeito à manutenção do dolo na
culpabilidade. Ora, o dolo não pode ocupar posição setorial diversa dos demais elementos
subjetivos do tipo. Essa posição equivocada do dolo tornava complicada a explicação do
crime tentado, havendo necessidade de examinar a culpabilidade e regredir à tipicidade para
a subsunção em casos, por exemplo, de dúvida entre lesão corporal e tentativa de homicídio
(GOMES FILHO, 2019).
Da mesma forma, a posição da culpa na culpabilidade, e não na conduta, tornava dificul-
tosa a tarefa de separação do crime culposo e do crime doloso: primeiro se investigava se
era dolo ou culpa na culpabilidade, depois se retornava ao injusto (tipicidade e ilicitude) para
análise dos demais elementos.
Do mesmo modo, no estudo do erro sobre a consciência da ilicitude, a adoção do dolus
malus (dolo normativo) “levava a consequências insuportáveis, benéficas especialmente para
o agente insensível às exigências do direito, que, por desconhecer a ilicitude de seu agir, ja-
mais possuiria dolo” (GRECO, 2000, p.126), uma vez que até então a consciência da ilicitude
era elemento do dolo.
Noutra ótica, Luís Greco aduz que o sistema neokantista merece aplausos ao fugir do
formalismo do sistema causal-naturalista. A construção teleológica de conceitos, o método
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A relação entre os elementos do injusto, segundo Juarez Tavares, constitui o dado mais
significativo da reformulação neokantiana (TAVARES, 2003). Na visão de Max Ernst Mayer,
a tipicidade e a antijuricidade deveriam ser compreendidas de maneira separada, porquanto
se comportam como a fumaça e o fogo e, desse modo, a tipicidade constitui um indício de
ilicitude (MAYER, 2011). Por conseguinte, o vínculo entre a tipicidade e a ilicitude denomina-
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-se ratio cognoscendi, o tipo passa a ser o elemento identificador da ilicitude. O delito, assim
como no período causal clássico, foi definido como uma ação típica, ilícita e culpável.
Exemplo: segundo Ernst Mayer, para ilustrar a separação entre tipicidade e ilicitude, o con-
denado que foge da penitenciária pratica um ato ilícito, pois está obrigado a cumprir a pena.
No entanto, ele não realiza, por ausência de previsão legal, uma conduta típica. E, de forma
inversa, os soldados de um corpo de engenheiros militares que, numa situação de guerra,
destroem a ponte de uma cidade, para preparar a sua defesa, realizam uma conduta típica
que, todavia, não é antijurídica (MAYER, 2011).
De outra forma, para Edmund Mezger, o delito (parte objetiva) deveria ser compreendido
como uma ação tipicamente antijurídica (MEZGER, 1955). O tipo (leia-se tipicidade) perderia
qualquer autonomia e se tornava fundamento da antijuridicidade, passando a constituir a
antijuridicidade tipificada, deixando a categoria isolada de tipo e se transformando em um
tipo de injusto. Passa a existir uma visão conjunta de tipicidade e ilicitude, que corresponde a
ratio essendi. Por conseguinte, a antijuridicidade se tornou o principal elemento do delito que
passou a ser visto como uma antijuridicidade típica (TAVARES, 2003).
Destaca-se, ainda, a teoria dos elementos negativos do tipo, a qual foi criada por Adolf Merkel
a partir de 1889. Depois foi desenvolvida, entre outros, por Reinhard Frank. Nesse contexto:
A distinção entre tipo e antijuridicidade perde sua importância, florescendo em alguns autores a te-
oria dos elementos negativos do tipo, que vê na ausência de causa de justificação um pressuposto
da própria tipicidade. (GRECO, 2000, p.125).
Desse modo, no primeiro caso (ratio cognoscendi), o tipo constitui um indício de ilicitude;
no segundo caso (ratio essendi), a antijuridicidade conteria o tipo; no terceiro caso (teoria
dos elementos negativos do tipo), o tipo conteria a antijuridicidade. Nos dois últimos casos,
antijuridicidade e tipo não são vistos como elementos autônomos, “mas sim, como um todo
normativo unitário” (TAVARES, 1980, p.45).
Exemplo: legítima defesa afasta a própria tipicidade, no caso da teoria dos elementos nega-
tivos do tipo.
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Dentro da teoria dos elementos negativos do tipo, desenvolveu-se um conceito de tipo to-
tal de injusto, dividido em duas partes: parte positiva (tipo positivo) composta dos elementos
objetivos, subjetivos e normativos; parte negativa (tipo negativo) que significa a ausência de
causas excludentes da ilicitude.
Portanto, as excludentes de ilicitude, dentro da teoria dos elementos negativos do tipo,
são os requisitos negativos do tipo de injusto. “Tomando em conta, por EXEMPLO, o art.121
do Código Penal, na visão da teoria em destaque, o tipo total deste injusto seria: matar al-
guém, salvo em legítima defesa, estado de necessidade etc.” (GOMES, 2001, p.82). Da mesma
forma, ao tratar da referida teoria, Hassemer (2005, p.285) expõe: “A injúria será punida com
[...] a não ser que ela ocorra em defesa de interesse legítimo”.
Winfried Hassemer faz severa crítica à teoria dos elementos negativos do tipo, pois não
se pode, ao mesmo tempo, censurar positivamente (tipo positivo) e justificar negativamente
(tipo negativo). Diz que a referida teoria trata a excludente de ilicitude como capaz de afastar
a relevância da conduta jurídico-penal.
Exemplo: matar alguém em legítima defesa seria o mesmo que tomar um café, pois, quanto
ao resultado, nenhum dos dois fatos é um injusto penal. Ora, matar uma pessoa em legítima
defesa é uma lesão a um ser humano. O fato de ser justificada não afasta a natureza de lesão,
“é uma transgressão à barreira do tabu (Tabuschranke) que co-determina a nossa cultura
jurídica” (HASSEMER, 2005, p.285).
A teoria dos elementos negativos é aceita na Itália. No Brasil, é minoritária a doutrina que
lhe rende aceitação. Além de Paulo Queiroz (2006), destaca-se Miguel Reale Junior (2009),
que compreende, num momento único, os juízos de tipicidade e de antijuridicidade, e não vis-
lumbra separação e nem autonomia entre esses institutos.
Na teoria causal neoclássica, a ação corresponde à conduta humana que altera a realida-
de exterior. O injusto (tipicidade + ilicitude) é material, ou seja, a tipicidade é material, a ilicitude é
material. A culpabilidade se ancora em uma teoria normativo-psicológica, formada pelos ele-
mentos: imputabilidade, dolo e culpa (elementos subjetivos e psicológicos), exigibilidade de
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conduta diversa. O dolo da culpabilidade é normativo, formado por três elementos: vontade;
representação do resultado; consciência da ilicitude. A teoria causal neoclássica (neokantis-
ta) é marcada por um dualismo metodológico, com total preponderância do dever ser sobre
o ser.
O alicerce filosófico do neokantismo constituiu a ferramenta para a interpretação das
categorias penais da estrutura analítica do delito no ambiente causal neoclássico, com a pre-
missa de uma filosofia da cultura, segundo a qual os valores deveriam reger o pensamento,
no sentido de que as ciências culturais estão orientadas a valores. Rompeu-se, portanto, com
o formalismo causal clássico positivista e abriu-se espaço para a construção de soluções
penais materiais no âmbito do injusto penal.
A ausência de limite ao intérprete no uso do método axiológico, com um acentuado subjeti-
vismo na interpretação dos casos penais, constitui a principal crítica à teoria causal neoclássica.
DIRETO DO CONCURSO
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COMENTÁRIO
Letra c.
Conforme explicado no tópico anterior, a teoria causal neoclássica (neokantista), com a fi-
losofia da cultura, transformou as categorias formais do causalismo clássico em institutos
materiais. Isso ocorreu com a tipicidade e a ilicitude, por exemplo. Ademais, no neokantismo,
havia uma divisão entre crimes normais, aqueles que não possuem elementar normativa e/
ou subjetiva (exemplo: homicídio-matar alguém) e crimes anormais, aqueles que possuem
elementar normativa e/ou subjetiva especial (exemplo: furto-subtrair para si ou para outrem
coisa alheia móvel). A letra B está errada (vimos isso durante a exposição da teoria causal
clássica) porque na teoria causal clássica (ou sistema naturalista) o crime é um fato típico,
ilícito e culpável. As demais letras trazem conteúdo do finalismo e do funcionalismo, que se-
rão desenvolvidos mais adiante. Sobre a teoria constitucionalista do delito, vale destacar que
não possui uma estrutura analítica do delito concorrente com o finalismo ou causalismo, mas
trata-se de um termo utilizado para se referir tanto a direito penal constitucional, ancorado
em princípios penais, em categorias materiais e valorativas, na proteção de bens jurídicos
principais, com a ideia de intervenção mínima. O termo ainda é usado para se referir ao uso,
no exame da tipicidade penal, das teorias da imputação objetiva e da tipicidade conglobante.
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determinadas por valores prévios e que contaminam, além de sua edição, também os próprios
autores de sua elaboração, sendo que uma pretensa ‘verdade jurídica’ vem influenciada pela
cultura”, se mostra ajustada à definição de:
a) causalismo.
b) neokantismo.
c) finalismo.
d) pós-finalismo.
e) funcionalismo.
COMENTÁRIO
Letra b.
Conforme explicado no tópico anterior, a teoria causal neoclássica (neokantista), com a fi-
losofia da cultura, transformou as categorias formais do causalismo clássico em institutos
materiais. Isso ocorreu com a tipicidade e a ilicitude, por exemplo. A Escola sudocidental de
Baden, orientada no sentido de uma filosofia da cultura, influenciou a concepção neokantista
— indicava que os valores deveriam reger o pensamento e lhe permitir alcançar a objetividade
(RADBRUCH, 1997).
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COMENTÁRIO
Letra d.
Os elementos normativos foram realmente descobertos no Neokantismo. Destaca-se, ainda
dessa época, que o dolo e a culpa estavam na culpabilidade. Os neokantistas, todavia, reco-
nheciam a presença de elementos subjetivos especiais no tipo, nominando os crimes com
essas características de anormais, exemplo, o furto, no qual consta o “para si ou para ou-
trem”. Os elementos subjetivos especiais, presentes em alguns tipos, faziam parte do termo
dolo específico. Ressalta-se que o dolo genérico estava na culpabilidade. Os crimes normais
não possuíam elementar normativa e/ou subjetiva especial (dolo específico), enquanto os cri-
mes anormais possuíam elementares normativas e/ou subjetivas especiais (dolo específico).
Desse modo, embora o dolo e a culpa só tenham sido transportados para o injusto quando
do finalismo, é certo que o neokantismo já reconhecia elemento subjetivo especial no tipo. De
todo modo, a questão ficou bem confusa e deveria ter sido anulada, mas não o foi. Merece
ainda destacar a letra “b” da questão, comentada no tópico sobre ratio essendi, dentro do de-
senvolvimento da teoria causal neoclássica. A letra A está correta, conforme tópico desenvol-
vido sobre a teoria causal clássica que conceitua ação como movimento corporal voluntário
que provoca mudança no mundo externo. Desse modo, a teoria causal clássica não consegue
explicar crime sem resultado naturalístico. Sobre a teoria finalista, letra “c”, é certo que Welzel
acreditava em finalidade na conduta culposa, não somente na conduta dolosa, conforme de-
senvolvido no tópico abaixo.
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que se opôs ao subjetivismo neokantiano, contra seu relativismo axiológico. Portanto, o fina-
lismo, com a valoração limitada à realidade, apresenta o método ontológico-dogmático em
substituição ao modelo axiológico do causalismo neoclássico.
Dessa forma, antes de tomar contato com um problema penal, o intérprete examina a
estrutura ontológica da ação, reconhece estruturas objetivas do ser que se apresentam ao
legislador e que não podem ser modificadas. O ser – que corresponde à matéria, às coisas –
não pode receber valoração de fora. Por isso, diz-se que o dever ser é valorado no ser, o valor
que se manifesta na realidade (ORDEIG, 2002).
Nessa dinâmica, o finalismo introduz um novo conceito de ação, o conceito de ação hu-
mana passa a ser “o exercício de atividade final” (WELZEL, 2006, p.41). A ação humana se
torna um acontecer final e deixa de ser puramente causal. A finalidade se baseia na ideia de
que o ser humano, graças ao seu conhecimento de causalidade, pode prever as consequên-
cias futuras de sua atividade.
A finalidade pressupõe um atuar consciente desde o início, enquanto a causalidade não
tem direção com esse objetivo. Por isso, Hans Welzel afirmava: “a finalidade é vidente; a cau-
salidade é cega” (WELZEL, 1976, p.54). Desse modo, o Direito Penal só se ocupa de ações que
possuem o sentido desta atividade finalista.
Exemplo: por isso, ficam excluídos do Direito Penal as ações que decorrem de mera ativi-
dade mecânica, como um desmaio repentino, que são oriundas de movimentos reflexos, ou
seja, ataques de choque ou reações indomináveis de susto. Com outras palavras, ensina José
Cerezo Mir que “os movimentos corporais daquele que sofre um ataque epilético, os reflexos
em sentido estrito e os movimentos durante o sono (pense-se no sonâmbulo) não correspon-
dem ao conceito finalista de ação” (CEREZO MIR, 2010, p.954).
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Com o novo conceito de ação, o dolo, que nas teorias causais, clássica e neoclássica es-
tava na culpabilidade, passa para o fato típico (dentro da conduta – ação e omissão). O tipo
constitui a descrição concreta da conduta proibida (WELZEL, 1976). No tipo doloso, segundo
a doutrina finalista, existe vontade finalisticamente dirigida a um resultado proibido pelo or-
denamento, uma vez que a finalidade está na ação.
No injusto doloso, a vontade integra o dolo. O dolo, com o finalismo, é formado por vontade
e representação do resultado, chamado de dolo natural. Abandona-se, desse modo, a cons-
ciência da ilicitude, a qual estava presente no dolo normativo causal clássico e neoclássico.
No causalismo clássico, para a tipicidade era suficiente a causação objetiva do resultado,
enquanto, no finalismo, para a existência de um injusto típico não basta que alguém tenha
causado um resultado, há de existir uma atuação da vontade do autor. A ação passa a cons-
tituir uma intervenção, guiada pela vontade, em um acontecimento causal.
Desse modo a ação de matar corresponde à ação, conduzida pela vontade, de matar uma pessoa;
ação de danificar constitui uma ação, conduzida pela vontade, de danificar uma coisa alheia (HIRS-
CH, 2010).
Da mesma forma, no injusto culposo, a vontade exerce um papel relevante. “Aqui o conte-
údo da proibição refere-se não a uma ação dirigida a um homicídio guiado pela vontade, mas
a uma ação descuidada em relação ao resultado típico” (HIRSCH, 2010, p.247). A culpa foi
transportada para a ação, já que a finalidade está na ação e, segundo a linha welzeliana, existe
finalidade na ação do crime culposo, mas não existe finalidade no resultado do crime culposo.
Esse é um resultado meramente causal. Isto é, “o tipo de injusto dos delitos culposos abrange
a produção de um resultado de modo puramente causal, cego, como consequência de uma
ação finalista que inobserva o cuidado objetivamente devido” (CEREZO MIR, 2010, p.251).
EXPLICANDO MELHOR: para o finalismo de Welzel, existe finalidade (vontade) na con-
duta culposa.
Exemplo: Caio dirige seu veículo com a finalidade de chegar a um hospital para visitar um
amigo que se encontra doente. Essa finalidade é lícita, amparada pelo ordenamento jurídico.
Todavia, se Caio, acelerar acima da velocidade permitida e, por imprudência, atropelar um
transeunte. A finalidade lícita de chegar ao hospital não desaparece. O resultado não decorre
dessa finalidade, mas sim da inobservância de uma norma de cuidado, da violação da norma
de cuidado.
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Portanto, no finalismo, o tipo é formal porque é uma mera descrição da conduta proibida.
Por outro lado, a adequação do fato à lei (tipicidade) é material, mas vinculada à realidade
concreta, ao mundo do ser, ao caso concreto sob análise. Não é uma tipicidade tão material
quanto a do neokantismo, que consistia numa valoração exclusiva do mundo do dever ser,
com o seu dualismo metodológico, já explicado no item anterior.
A antijuridicidade pode ser conceituada como a relação de contradição entre a ação e o
ordenamento jurídico; corresponde a uma característica da ação, a um juízo de valor objetivo
que recai sobre a ação; é uma só no ordenamento jurídico (civil, administrativo). A antijuridici-
dade corresponde à “contradição de uma realização típica com o ordenamento jurídico como
um todo (não apenas com uma norma isolada).” (WELZEL, 1976, p.76)
Diz Luís Greco (2000) que a antijuridicidade no finalismo deixou de ser enxergada como
dano social ao bem jurídico para ser vista como ilícito pessoal consubstanciado fundamen-
talmente no desvalor da ação que tem como núcleo a finalidade. A interpretação material da
tipicidade com o componente danosidade social se tornou difícil porque o finalismo priorizou
o desvalor da ação.
As causas de justificação ou excludentes da ilicitude passaram a ser tipos permissivos
(GRECO, 2000). Ressalta-se que os finalistas brasileiros aceitam o exame de excludentes su-
pralegais. Isso comprova que a antijuridicidade do finalismo, embora priorize o desvalor da
ação, não é cega e formalista como foi a do causalismo clássico ou, ao menos, o sistema
finalista admite uma abertura, não nos moldes neokantistas, mas, também, sem a limitação
causal naturalista (GOMES FILHO, 2019).
A antijuridicidade nada mais é do que a lesão de determinado interesse vital aferido pe-
rante as normas de cultura reconhecidas pelo Estado. A antijuridicidade material se funda-
menta em valores sociais, morais e políticos, sem um conceito específico, constituindo-se
em ofensa às normas de cultura reconhecidas e aceitas pelo Estado, um comportamento
antissocial (MIRABETE, 2006).
A culpabilidade no finalismo, por sua vez, estrutura-se no livre-arbítrio e constitui um
juízo de reprovação pessoal que tem por fundamento o poder de agir de outro modo e evitar
a prática do fato proibido. Essa possibilidade de o agente agir de outro modo é o centro da
culpabilidade do finalismo. Significa que o homem, quando capaz de agir conforme o Direito,
é responsável quando age de forma diversa.
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ATENÇÃO
Lembrar que o dolo e a culpa não fazem parte da culpabilidade, uma vez que foram transpor-
tados para a conduta, que integra o fato típico.
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Para Cerezo Mir (2010), somente o conceito finalista de ação permite compreender o Direi-
to Penal tendo como ponto de partida o ser humano como pessoa, ou seja, apenas a conduta
finalista, por ser uma conduta especificamente humana, pode ser objeto de valoração jurídica.
Portanto, qualquer conceito de ação diferente do apresentado pelo finalismo é equivocado,
incongruente e inútil para a interpretação dos tipos de injusto.
Hans Joachim Hirsch (2010), em defesa do injusto pessoal finalista, apresenta críticas
às propostas da teoria da imputação objetiva do resultado na forma apresentada pela teoria
funcional teleológica, por não oferecer solução convincente e por tratar de problemas especí-
ficos do crime culposo e do crime qualificado pelo resultado, ou seja, de um quadro específico
de crimes e não de uma teoria geral do injusto, de modo a concluir, por essas e outras razões,
que somente “uma evolução da teoria do injusto pessoal é que oferece a sistemática do delito
mais coerente” (HIRSCH, 2010, p.256).
O próprio Figueiredo Dias (2001), defensor de uma concepção teleológico-funcional do
fato punível, reconhece que a concepção finalista do ilícito pessoal se apresenta ainda hoje
cheia de valor. Afirma o autor português que todo ilícito é um ilícito pessoal. Portanto, sem dolo
e sem culpa, um fato não pode ser contrário à ordem jurídica, não pode ser ilícito (DIAS, 2001,
p.203).
Entre as críticas negativas feitas à teoria finalista, destacam-se as seguintes: a) não con-
seguiu se aproximar da realidade concreta, ficou preso às estruturas lógico-objetivas, tor-
nou-se refém de dogmas; b) a causa de sua relativa aceitação pela doutrina e jurisprudência
clássicas no Brasil se deveu ao fato de que era possível conviver com o finalismo sem aban-
donar o positivismo legalista (GOMES, 2003); c) ao ignorar boas contribuições teleológico-va-
lorativas do neokantismo, o finalismo retornou à falácia naturalista, pois se contentou com as
proibições de ações finalistas (GRECO, 2000); d) não conseguiu explicar a razão pela qual a
finalidade não faz parte do tipo subjetivo do delito culposo, pois “não é possível sistematizar
a culpa utilizando-se do critério da finalidade, mas unicamente através das regras da imputa-
ção objetiva” (ROXIN, 2006, p.84).
Jorge Figueiredo Dias afirma que o sistema finalista precisa ser revisado e, entre outras,
aponta as seguintes falhas no sistema do injusto pessoal: a) a base ontológica faz com que
o sistema finalista seja imutável, de inflexível conceitualismo, não aberto às opções político-
-criminais. As estruturas lógico-materiais, existentes nos conceitos utilizados pelo legislador,
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são vinculantes e livres de discussão. Nesse aspecto, o finalismo repetiu o erro do sistema
causal naturalista; b) o conceito finalista de ação decorre de um falso ontologismo, pois até
certos animais, segundo a moderna biologia, antecipam fins e escolhem os meios para alcan-
çá-los (DIAS, 2001, p.202-203).
Um debate importante, no campo da interpretação, envolve a compreensão da tipicidade
finalista. Se o modelo finalista é ontológico e não axiológico, poderia se concluir de maneira
precipitada que a tipicidade finalista seria formal e, por essa razão, o finalismo representaria
um retorno ao causalismo clássico com o seu formalismo na interpretação dos institutos do
Direito Penal.
Determinadores autores, principalmente os mais próximos da concepção teleológico-fun-
cional, fazem severas críticas ao finalismo e afirmam que a valoração, o critério axiológico,
não é compatível com a estrutura dogmática ontológica do finalismo. Assim, a análise da
tipicidade seria quase formal.
Ora, convém observar, de início, que esse dogmatismo não é absoluto ante a possibili-
dade, por EXEMPLO, de aplicação do princípio da adequação social. Conquanto o conceito
finalista de tipo seja a descrição legal da conduta proibida, Hans Welzel (1976) afirmou ser
contra a interpretação ao pé da letra e, ainda, que a adequação social afastaria o tipo de ação.
Com isso, a análise da tipicidade não é unicamente formal no modelo finalista, porquanto
as ações conformadas socialmente podem ser interpretadas como atípicas, conforme uma
perspectiva material da tipicidade, mediante um juízo de valor do intérprete, com o uso do
princípio finalista da adequação social (GOMES FILHO, 2019).
Luiz Regis Prado (2007) adverte que, na trajetória da concepção finalista, são constata-
das sucessivas e malfadadas confusões que contribuem para o surgimento de conclusões
equivocadas e falsas. Sobre o finalismo, diz o autor que, para o bem da verdade científica,
convém advertir “que essa doutrina não é pura e unicamente ontológica, visto que não deixa
de considerar ainda que de forma mais tímida, o aspecto axiológico, normativo (v.g. teoria da
adequação social)” (PRADO, 2007, p.74).
Acrescente-se que, embora Hans Welzel afirmasse a necessidade de que o tipo penal
correspondesse a uma descrição mais exata possível da conduta (Direito Penal substancial),
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reconhecia, por outro lado, certo espaço de valoração para o julgador nos casos de conduta
culposa e de omissão imprópria (WELZEL, 1976).
É certo que algumas características do finalismo, como o conceito de tipo consistente na
descrição legal da conduta proibida; a preponderância do desvalor da ação sobre o desvalor
do resultado; a visão ontológica do sistema com a impossibilidade de valoração fora do ob-
jeto em si (da realidade concreta), dificultam uma análise material da tipicidade nos moldes
neokantistas, que adotava uma interpretação subjetivista e o dualismo metodológico (GOMES
FILHO, 2019).
A teoria finalista foi adotada pela Reforma Penal brasileira de 1984 que alterou a parte
geral do Código Penal. Na doutrina brasileira, a primeira obra finalista só surgiu em 1970, com
o Curso de Direito Criminal (Parte Especial) de João Mestieri. Ele iniciou o finalismo na parte
especial, enquanto Fragoso foi pioneiro na parte geral em 1976, tudo isso antes da aprovação
da Reforma Penal brasileira de 1984 (TAVARES, 1980).
A influência finalista no Brasil, no campo doutrinário e jurisprudencial, foi facilitada em
razão de seu método ontológico-dogmático. Com isso, não se afirma que o finalismo constitui
um mero retorno à falácia naturalista do positivismo formal da teoria causal clássica, mas,
sim, que a adoção do sistema finalista não implicou ruptura significativa com o método de
ensino jurídico no Brasil (GOMES FILHO, 2019).
Com outras palavras, deve-se reconhecer que a adoção de modelo penal de alicerce axio-
lógico em detrimento de um modelo dogmático-ontológico teria sido mais complexa, uma vez
que exigiria muito mais alicerce filosófico no ensino jurídico nacional, bem como a sua des-
vinculação de uma plataforma de conhecimento repetidora de conceitos e classificatória nos
moldes positivistas (GOMES FILHO, 2019).
O finalismo não é, hoje, no Brasil, adotado de forma absoluta. A própria letra da Lei Penal
brasileira mitiga o finalismo, um exemplo disso é o art. 20, §1º (GRECO, 2005), no qual se ado-
tou a teoria limitada da culpabilidade, quando a proposta de Hans Welzel sempre foi a teoria
extremada ou estrita da culpabilidade.
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Exemplo: desse modo, João e Carlos, após o naufrágio de um barco, durante a noite escura,
disputam uma boia de salvação que só permitiria salvar a vida de um deles. Para tanto, João
mata Carlos. Todavia, ao amanhecer, João percebe que havia uma ilha muito perto do local
do naufrágio, a qual não foi vista em razão da escuridão. Com isso, conclui-se que tanto
ele quanto Carlos poderiam facilmente nadar até a ilha. Portanto, não estavam presentes
os requisitos do art.24 para caracterizar o estado de necessidade, uma vez que o perigo era
imaginário, pois a ilha permitiria que todos fossem salvos. A solução para o caso em apreço
se encontra no artigo 20 §1º do Código Penal, erro sobre pressuposto fático de uma causa
de justificação, ou seja, erro de tipo permissivo. Segundo a narração do texto legal referido,
tal erro, quando escusável (inevitável), isenta de pena; quando inescusável (evitável), gera
responsabilidade por crime culposo (culpa imprópria). Para a doutrina, tal erro (erro de tipo
permissivo) afasta o dolo (dolo do injusto) porque se trata de uma exceção ao finalismo do
Welzel, tendo o Código Penal brasileiro (neste aspecto, somente para o erro quanto a pressu-
posto fático de uma excludente de ilicitude) adotado a teoria limitada da culpabilidade.
A teoria limitada da culpabilidade apartou as duas formas de erro, afirmando que aquele incidente
sobre a os pressupostos objetivos das causas de justificação deveria ser tratado como erro de tipo;
os demais (existência, limites) seriam erro de proibição indireto.
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ATENÇÃO
Ressalta-se que o tema erro sobre as causas de justificação são muito cobrados em provas
de concursos. O exemplo anterior caiu em itens da prova de promotor de justiça do MPDFT
de 2015/2016. Muitos candidatos erraram o item porque buscaram uma resposta conforme
o estado de necessidade do art.24 e não conforme o erro sobre pressuposto fático de uma
causa de justificação, nos termos do art.20 §1º.
Embora a presença do finalismo ainda seja relativamente forte na doutrina brasileira, per-
cebe-se uma mitigação constante do modelo ontológico, principalmente na jurisprudência
penal brasileira, que tem decidido de maneira aberta e casuística com o uso de princípios.
No finalismo, o intérprete, na solução de um caso concreto, não pode utilizar juízo de valor de
acordo com a sua análise subjetiva, pois o juízo de valor, para solução do caso concreto, está
limitado ao objeto, não pode ser oriundo do subjetivismo do intérprete, nem se alicerçar em
uma solução axiológica que se distancia da realidade fática (GOMES FILHO, 2019).
Por outro lado, apesar da precisão dogmática da Parte Geral, de 1984, do Código Penal,
houve uma construção com possibilidade de abertura para a sua própria mitigação, ou seja,
ciente de que não existe uma sistemática superior no atual estágio da doutrina penal, é possí-
vel relativizar o finalismo com conceitos novos, com mais abertura axiológica na interpretação
das categorias penais, dentro de um equilíbrio que respeite a dogmática como linha argumen-
tativa racional, de modo a evitar o subjetivismo e o voluntarismo (GOMES FILHO, 2019).
Na construção das decisões penais, o Supremo Tribunal Federal já afirmou a opção fina-
lista da parte geral do Código Penal. Durante o julgamento da Ação Penal 470 (2012),
em determinado debate sobre a teoria do domínio do fato feito pelos Ministro do STF,
o Ministro Gilmar Mendes aduziu que ao estabelecer o dolo na ação típica final, como se
pode depreender da definição de erro de tipo, ao adotar o erro de proibição e ao aban-
donar o rigor da teoria monística, teria reconhecido que o agente responderia na medida
de sua culpabilidade. Portanto, o legislador teria acolhido as mais relevantes teses fina-
listas.
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Na sequência das teorias do crime, diante de algumas dificuldades enfrentadas pelo fina-
lismo, principalmente para explicar o crime culposo e a omissão culposa com o seu conceito
de ação, das respostas não convincentes dos finalistas para tais questões, surgiu a teoria
social da ação, examinada a seguir.
No finalismo, a ação humana se torna um acontecer final e deixa de ser puramente causal.
A espinha dorsal da ação finalista é a vontade. Desse modo, a finalidade se baseia na ideia de
que o ser humano, graças ao seu conhecimento de causalidade, pode prever as consequên-
cias futuras de sua atividade. O finalismo formula com mais precisão a estrutura dogmática
das categorias do delito, sob a perspectiva de sua posição topográfica, conquanto o injusto
pessoal seja a sua maior conquista.
A ação consiste no exercício de atividade final, na atividade humana dirigida a um fim.
Não há, portanto, necessidade de resultado naturalístico no conceito de ação, de modo que,
POR EXEMPLO, o conceito de ação finalista explica tanto os crimes de resultado material
(homicídio, roubo) quanto os crimes que se consumam sem resultado material (dano, porte
ilegal de arma de fogo).
A tipicidade é material, adequação do fato à letra da lei que gera lesão intolerável ao bem
jurídico. É possível essa análise no finalismo, sem a extensão subjetivista do neokantismo.
O princípio da adequação social, criado por Welzel, segundo o qual as condutas socialmente
adequadas carecem de tipicidade material, constitui a demonstração cabal de que a tipicida-
de é material. O dolo é natural, composto de vontade e representação do resultado. Tanto o
dolo quanto a culpa fazem parte da conduta, do fato típico.
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ATENÇÃO
Sobre o conceito de crime no Brasil. Já caiu na prova de promotor de justiça do MPSP de 2015
que o crime é um fato típico e ilícito, sendo a culpabilidade um pressuposto de aplicação de
pena. CUIDADO. Esse conceito bipartido é minoritário. Faz parte da doutrina do Rene Dotti,
Damásio, Mirabete e outros. O conceito majoritário de crime, desde o causalismo clássico até
os dias atuais, é de fato típico, ilícito e culpável (conceito tripartido).
DIRETO DO CONCURSO
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c) segundo a teoria normativa pura da culpabilidade, o dolo não é natural, vale dizer, compre-
ende a consciência da ilicitude;
d) para a teoria psicológica, dolo e culpa são espécies de culpabilidade, esgotando, em si,
seu conteúdo;
e) para a teoria psicológico-normativa, dolo e culpa, conquanto mantidos na culpabilidade,
consubstanciam, desta última, formas, graus, requisitos ou elementos, não suas espécies.
COMENTÁRIO
Letra c.
Na teoria normativa pura do finalismo, o dolo e a culpa não fazem parte da culpabilidade,
foram deslocados para a conduta, que integra o fato típico. O dolo é natural, composto de
vontade e representação do resultado. A culpabilidade é formada no finalismo, com base na
teoria normativa pura, pelos seguintes elementos: imputabilidade; potencial consciência da
ilicitude; exigibilidade de conduta diversa. Vale destacar que as questões que pedem para
marcar a incorreta são as melhores para se estudar, uma vez que a maioria dos itens são cor-
retos e facilita a compreensão da matéria.
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COMENTÁRIO
Letra b.
O tema foi visto no tópico sobre o finalismo, abordado nesse material. A teoria limitada da cul-
pabilidade realmente foi adotada pelo Código Penal brasileiro, na reforma de 1984, conforme
itens 17 a 19 de sua exposição de motivos. Todavia, a consequência disso se refere ao erro
sobre pressuposto fático de uma causa de justificação, artigo 20 §1º do Código Penal (pre-
sente, POR EXEMPLO, na legítima defesa putativa, no estado de necessidade putativo), o qual é
tratado como erro de tipo permissivo. A teoria limitada não interfere na solução dada aos erros
quanto à existência e quanto aos limites de uma causa de justificação, os quais continuam
sendo tratados como erros de proibição. Segundo a narração do texto legal referido, tal erro,
quando escusável (inevitável), isenta de pena; quando inescusável (evitável), gera responsa-
bilidade por crime culposo (culpa imprópria). Para a doutrina, tal erro (erro de tipo permissivo)
afasta o dolo (dolo do injusto). Os demais itens da questão estão corretos, conforme já foram
tratados nas abordagens sobre causalismo clássico, causalismo neoclássico e finalismo.
COMENTÁRIO
Letra b.
A culpabilidade no finalismo se livrou dos elementos subjetivos (dolo e culpa), passando a
constituir um juízo de reprovação, alicerçado na capacidade do agente (imputabilidade) de
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entender o caráter ilícito do fato (potencial consciência da ilicitude) e agir de outro modo (exi-
gibilidade de conduta diversa).
COMENTÁRIO
Letra d.
O item I está certo quanto ao conceito de tipicidade formal, adequação do fato à letra da lei.
O item II está certo porque o finalismo de Welzel constitui um modelo ontológico, ou seja,
vinculado à realidade concreta na sua perspectiva valorativa, que não permite juízo de valor
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do intérprete deslocado dessa realidade. Do mesmo modo, o finalismo trabalha com o dolo
natural (vontade + representação do resultado) na conduta. O item III está errado, a teoria
da causalidade adequada não é teoria igualitária. Ela é uma teoria diferenciadora na classi-
ficação das teorias do nexo causal, porque permite escolher uma causa de um resultado em
detrimento de outra causa. A teoria da causalidade adequada traz uma solução diferente da
teoria da equivalência para, por exemplo, as hipóteses de concausas relativas supervenientes
anormais, que fogem do desdobramento lógico do processo causal.
Exemplo: Caio, com a intenção de matar, feriu Francisco. A vítima foi levada ao hospital e
morreu em razão de um terremoto que derrubou o prédio do hospital. Nesse caso, Caio, com
suporte na teoria da causalidade adequada, só responde pelos atos praticados, pela tentativa
de homicídio, nos termos do art.13 § 1º do Código Penal).
O item IV está errado porque a teoria da equivalência é uma teoria igualitária, que não faz dis-
tinção entre as contribuições que antecedem a um resultado. Não é uma teoria diferenciadora.
COMENTÁRIO
Letra d.
Como o cabeçalho da questão não solicitou uma teoria específica, o candidato deveria seguir
as orientações da teoria finalista, adotada em grande medida na Parte Geral do Código Penal
de 1984. Desse modo, a culpabilidade constitui um juízo de reprovação. Dito de outro modo,
o agente praticou uma conduta típica e ilícita (injusto) quando tinha capacidade de compre-
ender o caráter ilícito do fato e agir de outro modo. Por essa razão, o juízo da culpabilidade
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COMENTÁRIO
Letra a.
O modelo finalista (Welzel) transportou o dolo e a culpa (elementos subjetivos, psicológicos)
da culpabilidade para o fato típico. Com isso, o injusto (tipicidade + ilicitude), mais preci-
samente, a tipicidade, passou a constar com os elementos subjetivos (dolo e culpa). Antes
disso, no causalismo (clássico e neoclássico), o injusto era apenas objetivo, não possuía os
elementos subjetivos, dolo e culpa, que estavam na culpabilidade (o neokantismo reconhecia
apenas a figura do dolo específico em alguns tipos penais, que não se confunde com o dolo
genérico que estava na culpabilidade do sistema causal neoclássico). A letra “b” está errada
porque traz elementos da culpabilidade do neokantismo, enquanto a letra “c” traz o conceito
de ação do causalismo clássico. Na letra “d”, o termo correto seria é imprescindível (necessá-
rio). E a letra “e”, por fim, se refere à teoria social da ação.
Ao lado do finalismo, houve o desenvolvimento da teoria social da ação cujas raízes, se-
gundo Juarez Tavares (2003), encontram-se em Eb.Schmidt ao definir a ação como fenômeno
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social. Em seguida, com fundamento no conceito social de ação, surgiram sistemas próprios,
com destaque para o modelo social de Hans-Heinrich Jescheck e, ainda, o de Johannes Wes-
sels (GALVÃO; GRECO, 1999).
É certo que a teoria social surgiu com o intuito de ajustar o causalismo às exigências sis-
temáticas de ordem jurídica e de superar polêmicas entre finalistas e causalistas com relação
às categorias da estrutura analítica do delito, depois se transformou em uma teoria da ação
com elementos próprios, englobando aspectos do causalismo e do finalismo no seu conceito
de ação (WESSELS, 1976).
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Exemplo: o motivo torpe seria um elemento da culpabilidade do crime doloso porque repre-
sentaria o reprovável ânimo do autor. Da mesma forma, a má fé e a falta de consideração.
Com relação à estrutura do delito, a teoria social da ação trata a tipicidade e a ilicitude ora
com os critérios teleológicos do Neokantismo e ora com o modelo ontológico do finalismo.
O tipo constitui o indício da antijuridicidade (ratio cognoscendi).
O conceito de delito na teoria social, assim como nos sistemas anteriores (causalismo, fi-
nalismo), é composto de tipicidade, ilicitude e culpabilidade. Além da dupla valoração do dolo
e da culpa que faz surgir uma teoria complexo-psicológica normativa da culpabilidade, vale
anotar que a consciência do injusto possui lugar na culpabilidade como elemento autônomo.
Enquanto a culpabilidade dolosa se caracteriza pela adversa ou indiferente posição do
agente diante das normas de direito, a culpabilidade culposa consiste “na descuidada posi-
ção do autor em face das exigências de cuidado da ordem jurídica” (WESSELS, 1976, p.89).
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Algumas críticas são feitas à teoria social da ação quanto à imprecisão da expressão
relevância social e a imprestabilidade desse juízo de valor no conceito de ação, “pois isto faz
esvaziar cada vez mais os componentes do delito, a ponto de tudo compreender-se na ação”.
(TAVARES, 1980, p.94). Dito de outra forma, esse conceito de ação esvazia a tipicidade, a ili-
citude e a culpabilidade.
Para Muñoz Conde (1988), o conceito de relevância social proposto pela teoria social da
ação se apresenta com excesso de ambiguidade, constituindo-se em um dado pré-jurídico
que não interessa de forma direta ao jurista, pois, para o intérprete do Direito, o que importa,
de maneira definitiva, é a relevância típica.
Ainda se pode dizer que a omissão é mais do que mera relevância social, ela exige uma
previsão jurídica, uma relevância normativa. Logo, o mero conceito social de ação não solu-
ciona de maneira imediata o problema dogmático da conduta omissiva, como propusera os
autores da teoria social.
De forma mais otimista, Rogério Greco e Fernando Galvão, em obra conjunta, ao tratarem
do conceito de ação, apontam a dificuldade de reunião, numa mesma categoria, das manifes-
tações dolosas, culposas e omissivas dos agentes. Porém, reconhecem que a teoria social,
nesse aspecto, “consegue alcançar essa meta reunindo todas essas formas de manifestação
humana sob um único ponto comum: a relevância jurídico-penal da conduta no ambiente so-
cial em que se verifica” (1999, p.68).
Uma vantagem, segundo Juarez Tavares (1980), da proposta do Wessels de análise do
dolo, tanto no tipo (dolo natural) quando na culpabilidade (desvalor do ânimo do agente), é a
solução para o erro sobre os pressupostos fáticos de uma causa de justificação, previsto no
art. 20, §1º, do Código Penal brasileiro, ou seja, com a manutenção do dolo do tipo e o afasta-
mento da culpabilidade dolosa.
No Brasil, há muita discussão sobre esse erro, que incide sobre um pressuposto fático de
uma causa de justificação, pois o Código Penal brasileiro o tratou como erro de tipo permis-
sivo, com base na teoria limitada da culpabilidade. De outro lado, parte da doutrina, adepta da
teoria extremada da culpabilidade, contesta essa solução porque o dolo não é afastado nesse
erro, logo não poderia ser erro de tipo.
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Exemplo: a título de ilustração, aponta-se o caso dos dois inimigos jurados de morte; um
mata o outro quando acreditava numa iminência de agressão ao ver o desafeto retirando uma
arma do bolso, que, por sua vez, não era arma, mas, sim, um celular. A solução é encontrada
no §1º do art. 20 do Código Penal, que indica um erro de tipo permissivo, que afasta o dolo
diante de um erro sobre pressuposto fático de uma causa de justificação, conforme já visto
no item 1.3 da presente pesquisa.
Na concepção da dupla posição do dolo (no tipo e na culpabilidade), o erro sobre o pres-
suposto fático de uma causa de justificação afastaria o dolo da culpabilidade e o agente não
responderia por crime algum se o erro, no caso concreto, fosse inevitável. No caso de erro evi-
tável, afasta-se o dolo da culpabilidade, mas o agente responde por crime culposo se houver
previsão legal (ALMEIDA, 2010).
Outro ponto para destaque que poderia transparecer em um pequeno uso da referida te-
oria diz respeito ao duplo uso do dolo e da culpa feito pelos Tribunais, embora não pareça a
melhor proposta, quando analisam dolo ou culpa na conduta e, novamente, intensidade de
dolo ou grau de culpa, na dosimetria da pena-base, no exame da culpabilidade como uma das
circunstancias judiciais da primeira fase de aplicação da pena.
Nesse sentido, JURISPRUDÊNCIA do STF e do STJ:
Supremo Tribunal Federal. Primeira Turma. Habeas Corpus 100.902/MS. Penal e Pro-
cessual Penal. Habeas Corpus. Dosimetria. Fundamentação bastante para fixação da
pena-base acima do mínimo legal. Observância do disposto no art. 59 do Código Penal.
Impossibilidade admitir-se o writ constitucional como sucedâneo de revisão criminal.
Ausência de nulidade flagrante. Ordem denegada. I - A culpabilidade deve ser anali-
sada em sua intensidade quando se trata de verificar a profundidade e extensão do dolo,
segundo autoriza o caput do art. 59 do Código Penal. II - Não se mostra carente de
fundamentação a dosimetria que descreve exaustivamente as circunstâncias do fato
delituoso na própria sentença. III - Inexistindo nulidade ou ilegalidade flagrante a ser
sanada, não se pode admitir o habeas corpus como sucedâneo de revisão criminal, ante
a verificação do trânsito em julgado do acórdão que tornou definitiva a condenação. IV -
Ordem denegada. PACTE.: Joedi de Souza Barbosa. IMPTE.: Defensoria Pública da União.
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O dolo e a culpa, considerando o modelo jurídico da parte geral do Código Penal brasileiro
de 1984, devem ser analisados somente na conduta, que integra o juízo de tipicidade, sem
qualquer referência no campo da dosimetria da pena, sob o risco de se incorrer em um fla-
grante bis in idem (GOMES FILHO, 2019).
O tema é controvertido na doutrina. Nucci (2009), com acerto, não concorda com a análise de
intensidade de dolo e de culpa na culpabilidade da pena base. De forma diversa, apoia a iniciativa
dos tribunais o doutrinador Ricardo Augusto Schmitt (2008), ao afirmar que a culpabilidade do
artigo 59 do Código Penal está ligada a intensidade do dolo ou o grau de culpa do agente.
A teoria social da ação não gerou outras considerações de impacto na doutrina e na juris-
prudência brasileira, tendo sido criticada por alargar o conceito de ação e pela dupla posição
do dolo e da culpa, tentando conciliar ideias causalistas e finalistas em um mesmo lugar.
Suas premissas não foram suficientes para impactar os alicerces do finalismo, o que somen-
te se concretizou com o surgimento das propostas funcionalistas, que serão analisadas nos
itens seguintes.
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DIREITO PENAL – PARTE GERAL
Teorias do Crime
Dermeval Farias
A teoria social da ação surgiu com o intuito de ajustar o causalismo às exigências sis-
temáticas de ordem jurídica; depois se transformou em uma teoria da ação com elementos
próprios e que engloba aspectos do causalismo e do finalismo. Com outras palavras, no que
diz respeito ao injusto (tipicidade + ilicitude), uniu contribuições do finalismo e do causalismo
A teoria social da ação ampliou o alcance do conceito de ação, que consiste na conduta
socialmente relevante, dominada ou dominável pela vontade. Buscava-se, desse modo, expli-
car a omissão culposa, não resolvida pelo finalismo. De outro lado, examina dolo e culpa tanto
na tipicidade quanto na culpabilidade, trazendo uma teoria complexa, normativa e psicológica
da culpabilidade.
DIRETO DO CONCURSO
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Teorias do Crime
Dermeval Farias
COMENTÁRIO
Letra d.
Com relação ao item III, a teoria social da ação conceitua ação como conduta humana so-
cialmente relevante, dominada ou dominável pela vontade. E essa análise de relevância social
é feita de forma valorativa com o meio social. Nesse aspecto, segundo crítica que será vista
mais adiante, a teoria se confunde com a proposta da teoria significativa da ação. Ressalta-se
que a teoria social, no que diz respeito ao injusto (tipicidade + ilicitude), uniu contribuições do
finalismo e do causalismo, conforme anotamos no desenvolvimento do tópico sobre a teoria
social da ação. Quanto aos itens I e II, os conceitos de ação, tanto da teoria causal clássica
(naturalista) quanto do finalismo, estão corretos, conforme já vistos na exposição dos tópicos
relativos a cada teoria.
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Teorias do Crime
Dermeval Farias
É sabido que não existe somente uma única corrente funcionalista. As duas linhas apre-
sentadas, embora divergentes em vários aspectos, denotam certo consenso no sentido de
que o sistema jurídico penal deve ser construído e guiado pelos fins do Direito Penal, não se
deve vincular a dados ontológicos prévios, como ação, causalidade e outros. Nesse aspecto,
ambas são opostas ao finalismo
Nos itens seguintes, constam, do ponto de vista da interpretação penal e sua relação
com a dogmática, as características principais dos modelos funcionais de Claus Roxin e de
Günther Jakobs. Ambos os modelos constituem objeto de estudo da doutrina brasileira, apre-
sentam propostas opostas entre si e, ainda, contrárias ao modelo finalista. Com a exposição,
buscar-se-á verificar, mais adiante, no que diz respeito ao funcionalismo teleológico, certas
semelhanças, em determinada medida, com a linha jurisprudencial penal do STF.
Embora reconheça méritos do finalismo, entre eles o desvalor da ação como elemento
integrante do injusto pessoal, o funcionalismo penal teleológico busca superá-lo, com a com-
preensão de que o finalismo, com seus dados ontológicos, “levou a desenvolvimentos em
parte corretos, em parte errôneos, juízo esse que corresponde à opinião atualmente dominan-
te” (ROXIN, 2006, p.61).
Para o funcionalismo teleológico, o finalismo deu importância à estrutura do crime, ao mo-
delo lógico-sistemático, sem se importar com a justiça da aplicação do Direito Penal, de modo
que a crença na solução de casos apenas com o método ontológico-dogmático representaria
um retorno à falácia naturalista (GOMES FILHO, 2019).
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Teorias do Crime
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Não obstante tenha obtido uma aceitação de parcela da doutrina, não há como negar que
o manto político criminal proposto por Roxin não evita subjetivações extremas nas decisões
judiciais, com o risco da abertura desordenada que existiu no neokantismo, diante da possi-
bilidade de conduzir a solução de casos penais com a ferramenta dos princípios, renegando
os alicerces dogmáticos (GOMES FILHO, 2019).
Günther Jakobs, em 1983, na primeira edição de seu tratado de Direito Penal, defendeu
que a elaboração das categorias dogmáticas do Direito Penal não deveria seguir o modelo
ontológico do Direito. Ao comentar o significado dessas categorias na obra de Jakobs, Eduar-
do Montealegre leciona no sentido de que a proposta se vincula aos fins e funções do Direito
Penal, “consistentes em garantir a identidade de uma sociedade. Isto significa, então, que se
trata de conceitos normativos edificados com total independência da natureza das coisas”
(MONTEALEGRE LYNETT, 2005, p.11).
O funcionalismo sistêmico se ancora nas ideias de Günther Jakobs. Sua obra tem raiz na
parcela que lhe interessa da teoria dos sistemas sociais desenvolvida pelo sociólogo alemão
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Niklas Luhmann. Segundo esta linha de pensamento, dentro da sociedade, cada ser humano es-
pera uma reação do seu semelhante, se a expectativa não é correspondida, há uma frustração.
Desse modo:
São as expectativas e as expectativas de expectativas que orientam o agir e o interagir dos homens
em sociedade, reduzindo a complexidade, tornando a vida mais previsível e menos insegura (GRE-
CO, 2000, p.139).
Exemplo: um senhor construiu, durante anos, uma casa de madeira que, após o término da
obra, foi arrastada por uma forte enchente. Resta ao senhor construir a casa no mesmo lugar
ou mudar de lugar, ele não pode manter a expectativa. Esse conflito se resolve com a mudança
de conduta.
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Teorias do Crime
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Exemplo: pedestre, motorista e esportista devem atuar de acordo com um conjunto de expec-
tativas. Compete a cada um deles organizar seu relacionamento social de modo a não infrin-
gir as normas penais.
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Teorias do Crime
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O sujeito deixa de ser cidadão e se torna inimigo com a reincidência, a habitualidade, a de-
linquência profissional e, por fim, o envolvimento com a criminalidade organizada. A transição
do cidadão para o inimigo faz surgir um ser altamente perigoso, sujeito às medidas de segu-
rança com aparência formal de penas (SILVA SÁNCHEZ, 2011).
O tratamento do inimigo com a eliminação do perigo deve ser feito com a antecipação da
tutela penal (pena para impedir fatos futuros), com uma legislação de combate, com medida
de segurança para o delinquente de condutas duradoras no âmbito da criminalidade econô-
mica, do terrorismo, das organizações criminosas, dos crimes sexuais, do tráfico de drogas e
de outras infrações penais graves (JAKOBS, 2008).
Günther Jakobs (2008) reconhece que a proposta do direito penal do inimigo deve ser vis-
ta com equilíbrio e afirma que situações mais extremas só deverão existir diante dos riscos
terroristas, quando não se fala em processo penal, mas em procedimento de guerra, que ele
denomina processo penal do inimigo, referindo-se, inclusive, ao episódio ocorrido em 11 de
setembro de 2001, com derrubada das torres gêmeas por terroristas na cidade de Nova Ior-
que, denominando autor por tendência.
Conquanto aponte dúvidas sobre a legitimidade da proposta, Silva Sanchez (2011) escla-
rece que, no âmbito dos inimigos, caracterizados por ausência da segurança cognitiva míni-
ma das condutas, observa-se uma negação frontal dos princípios políticos de convivência,
bem como indica certa dificuldade de persecução e de prova no que se refere ao terrorismo
e à criminalidade organizada, admitindo a discussão relativa ao uso da pena privativa com
relativização de garantias penais e processuais.
ATENÇÃO
No que concerne à eventual modelo de direito penal do inimigo na legislação pátria, não se
pode afirmar que o RDD (Regime Disciplinar Diferenciado) previsto no art. 52 da Lei de Exe-
cução Penal (LEP) tenha inspiração no modelo do direito penal do inimigo, examinado acima,
uma vez que a decisão judicial que aplica o RDD segue o devido processo legal, com garantia
de ampla defesa para o preso provisório ou definitivo, que se enquadre em alguma das hipó-
teses legais previstas no referido artigo.
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Em sentido contrário, Bruno Seligman (2006) aponta uma relação entre o direito penal do
inimigo e o Regime Disciplinar diferenciado (RDD). Do mesmo modo, Elisangela Melo (2006)
aponta semelhanças entre o RDD e o direito penal do inimigo.
Infere-se que o modelo funcional sistêmico constitui um sistema vinculado de forma ab-
soluta aos fins, sem uma preocupação com os meios legítimos. A crítica que se faz a Günther
Jakobs é que seu sistema é observado pela eficiência, sendo o fim de toda a estabilidade da
sociedade. Há, nesse caso, o risco de utilização de meios ilegítimos, podendo ferir até direitos
individuais consagrados no Estado Democrático de Direito, porquanto “abre-se uma via para
justificar qualquer tipo de sistema penal em nome da manutenção da coletividade” (GARCÍA
AMADO, 2006, p.236).
Todavia, há quem lhe renda críticas positivas. Para Marta Rodriguez (2010), a dogmática
tradicional se mostra insuficiente para regular as situações novas, havendo uma crise geral da
teoria do delito. Nesse cenário, mereceria elogio a proposta do funcionalismo sistêmico de
se preocupar com uma teoria da imputação, de romper com todas as teorias tradicionais do
delito, deslocando os olhos para o processo de imputação, respondendo a um diagnóstico de
crise da dogmática que abala os seus pilares fundamentais.
Desse modo, a teoria da imputação objetiva, com seus critérios normativos, mostra-se
mais preparada do que a teoria da causalidade naturalística para imputar responsabilidade
penal nas áreas, por exemplo, de meio ambiente, relação de consumo, mercado financeiro,
omissões culposas no Direito Penal econômico. Por fim, Marta Rodriguez (2010) defende que
a teoria da imputação do Günther Jakobs constitui uma proposta independente de suas ideias
sobre o direito penal do inimigo.
Com a ressalva de aplicação de alguns critérios da teoria da imputação objetiva, com os
critérios apresentados pelo Jakobs, em julgados isolados (EXEMPLO STJ HC 46.525), o mode-
lo funcional sistêmico ainda não repercutiu de maneira mais profunda na jurisprudência penal
brasileira.
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Teorias do Crime
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DIRETO DO CONCURSO
COMENTÁRIO
Letra d.
Conforme visto no tópico sobre funcionalismo sistêmico, o direito penal do inimigo constitui
uma forma de tutela preventiva, que antecipa resposta penal, sem processo, por considerar
o inimigo um não pessoa, que não oferece expectativa cognitiva positiva sobre seu compor-
tamento no meio social. O direito penal do inimigo é prospectivo, enquanto o direito penal do
cidadão é retrospectivo.
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Teorias do Crime
Dermeval Farias
COMENTÁRIO
Letra d.
Na classificação de Jesus-Maria Silva Sanchez, o direito penal do inimigo é situado na tercei-
ra velocidade do Direito Penal. Ressalta-se que a terceira velocidade é representada pela pena
de prisão acompanhada de relativização das garantias político-criminais, regras de imputa-
ção e critérios processuais. Essa terceira velocidade se faz presente atualmente no direito
penal socioeconômico, mas deveria ser reformulada para regredir à primeira ou à segunda
velocidade, segundo diz Sánchez (2010). Acrescenta-se que a segunda velocidade do Direi-
to Penal se caracteriza pela flexibilização das regras de imputação, garantias processuais e
princípios político-criminais, com tutela de novos riscos sociais, ou seja, proteção principal
de bens jurídicos supraindividuais, com antecipação da tutela penal com a tipificação dos cri-
mes de perigo presumido e crimes de acumulação, com o uso de penas restritivas de direitos
e pecuniárias- sem possibilidade de pena de prisão. Fala-se aqui em zona periférica (Direito
Penal periférico). Enquanto a primeira velocidade, destaca-se pela pena de prisão, seguida
por regras rígidas de imputação, de garantias processuais e de respeito aos princípios po-
lítico-criminais. Com outras palavras, é a fase inicial do Direito Penal liberal marcada pelo
respeito aos princípios penais e processuais, tutela principal de bens jurídicos individuais, uso
da pena privativa de liberdade. Denomina-se núcleo duro (Direito Penal nuclear). Uma quarta
velocidade não presente na obra de Sanchez, mas mencionada por outros setores da doutri-
na, consistente no modelo de Direito Penal, usado pelo TPI (Tribunal Penal Internacional) no
julgamento ex-chefes de Estado que praticaram crimes de lesa humanidade.
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Teorias do Crime
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Questão 23 (MP-PR/PROMOTOR DE JUSTIÇA/2016) A frase “há sujeitos que têm uma me-
nor possibilidade de autodeterminação, condicionados dessa maneira por causas sociais”,
está ligada à:
a) Ideia do conceito de causa supralegal exculpante;
b) Ideia do conceito de culpabilidade no funcionalismo teleológico;
c) Ideia do conceito normativo puro da culpabilidade;
d) Ideia do conceito psicológico-normativo de culpabilidade;
e) Ideia do conceito de coculpabilidade.
COMENTÁRIO
Letra e.
A coculpabilidade significa corresponsabilidade social. Isso significa dizer que a ausência de
concretização de direitos fundamentais na vida das pessoas pode ter relação com a prática
de crimes. Quando isso ocorre, o Estado falhou e a sociedade deve suportar. Ou seja, deve-se,
em tais casos, ao menos atenuar a resposta penal, com uma atenuante inominada (artigo 66
do Código Penal).
COMENTÁRIO
Letra a.
Conforme visto no tópico sobre funcionalismo sistêmico, o Jakobs, além de desenvolver uma
teoria do crime, chamada de funcionalismo sistêmico, também construiu a ideia do direito
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Teorias do Crime
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penal do inimigo, o qual é oposto ao direito penal do cidadão. O inimigo é o não pessoa, o in-
divíduo, que habitualmente se envolve em atividades criminosas (organizações criminosas,
terrorismo etc.), para o qual é possível antecipar a resposta penal, sem a obediência ao devido
processo legal, aos princípios penais e garantias processuais. Alguns países têm construído
legislação específica, diferenciada, para combater o terrorismo (exemplo: EUA). O cidadão,
por sua vez, se vier a praticar um crime, tem direito a ser julgado com o respeito a todos os
princípios e a todas as garantias e, após a condenação e cumprimento da pena, voltará a viver
em sociedade normalmente.
COMENTÁRIO
Letra d.
O modelo funcional sistêmico de Jakobs faz uso de uma metodologia axiológica, valorativa,
não se prende à realidade concreta, às estruturas lógico-objetivas, como ocorre em mo-
delos ontológicos (exemplo: finalismo). Os demais itens estão corretos e são importantes
para a compreensão de ideias do funcionalismo teleológico (Roxin) e do funcionalismo sis-
têmico (Jakobs).
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Questão 26 (MP-GO/2010) Segundo definição de Günter Jakobs e Manuel Cancio Meliá sobre
o direito penal do inimigo, “quem não presta uma segurança cognitiva suficiente de um com-
portamento pessoal, não só não pode esperar ser tratado ainda como pessoa, mas o Estado
não deve tratá-lo, como pessoa, já que do contrário vulneraria o direito à segurança das demais
pessoas” […] “Como já se tem indicado, Kant exige a separação deles, cujo significado é de
que deve haver proteção frente aos inimigos”. (in: Direito Penal do Inimigo: Noções e críticas.
Organização e tradução de André Luis Callegari e Nereu José Giacomolli. Porto Alegre: livraria
do advogado, 2005). A partir da noção de direito penal do inimigo, marque a alternativa correta:
a) A instituição do regime disciplinar diferenciado foi baseada no direito penal do inimigo, per-
feitamente admissível no Brasil, já que não ofende a dignidade da pessoa humana.
b) A noção de inimigo dada por Jakobs e Cancio Meliá não pode servir de fundamento para
a edição de lei penal que viole o princípio da dignidade da pessoa humana, já que o Brasil o
previu no artigo 1º da Constituição da República de 1988.
c) Para a defesa social (Estado Social) é possível restringir-se a dignidade de alguns indi-
víduos que não possuem o status de pessoa humana, daí não se poder falar em ofensa ao
princípio da dignidade da pessoa humana.
d) O direito penal do inimigo não ofende o paradigma do Estado Democrático de Direito.
COMENTÁRIO
Letra b.
Item correto, no sentido de que o direito penal do inimigo, tal qual proposto por Jakobs, com a
possibilidade de aplicar a sanção penal de forma antecipada, sem seguir os princípios penais
e garantias processuais, contraria as disposições do texto constitucional brasileiro. Vale des-
tacar a letra A, dada como errada, conforme sustentamos ao longo da exposição sobre direito
penal do inimigo, ou seja, o RDD (Regime Disciplinar Diferenciado) não se trata de direito pe-
nal do inimigo, porque segue o devido processo legal.
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as anteriores para quem se prepara para concursos públicos. Vale ressaltar que o tema já foi
cobrado em algumas provas, como a do MPGO (Promotor de Justiça).
Como ponto de partida, importa salientar que, na sequência das teorias do delito, obser-
vou-se uma mudança do eixo central da discussão do conceito ontológico de ação penal,
como primeiro elemento da discussão da solução de casos penais, para a ideia do tipo como
base, com a organização da teoria do delito.
No finalismo, houve uma proposta de aproximação entre essas duas categorias, fato que
se repete na teoria significativa da ação, com o termo tipo de ação como categoria fundamen-
tal, que pretende identificar a situação concreta relevante para o Direito Penal, considerando
que a norma deve realizar uma pretensão de justiça, sem desprezar o componente humano
(BUSATO, 2010).
Nesse sentido, Tomás Salvador Vives Antón (2011) propõe um conceito significativo de
ação. A partir de uma mudança do fundamento filosófico do sistema penal, isto é, com uma
abordagem do sistema penal a partir da filosofia da linguagem de Wittgenstein e com certa
influência da teoria da ação comunicativa de Habermas, entende os seus defensores que o
conceito significativo de ação constitui a melhor ferramenta para um direito penal moderno,
que responda aos objetivos de uma nova dogmática, com propostas político-criminais per-
meáveis, que apresente proteção para os direitos e as garantias fundamentais do ser humano.
Os defensores da teoria significativa da ação apresentam críticas quanto rendimento dos
modelos anteriores, tanto ao modelo finalista quanto ao modelo funcionalista: ao primeiro em
razão da centralidade e insuficiência da proposta ontológica de exame das categorias penais;
ao segundo, no que diz respeito à proposta teleológica-funcional, afirma-se que não conseguiu
limitar a expansão do direito penal com o alicerce de princípios político-criminais, enquanto o
modelo sistêmico apresenta o defeito da normativização extrema e uma insuficiência episte-
mológica (VIVES ANTÓN, 2011).
A ação é vista como o sentido que lhe é atribuído, de modo que todas as condutas (ação,
omissão), tipificadas nas diferentes normas penais, possuem um significado, e somente a gramática
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delimita o que pode ser dito. Portanto, o significado e o simbólico não só podem ser conside-
rados como pressupostos da ação, mas a própria ação, do mesmo modo, constitui um senti-
do (RAMOS VÁZQUEZ, 2008).
Por isso, na proposta de um conceito significativo de ação (significado de um fato, inter-
pretação do comportamento humano segundo regras sociais), o primeiro plano, mais desta-
cado, passa a ser ocupado pela interpretação, que é de ordem social. Não se trata de processo
físico, mas de casos de interpretação da conduta, de extrair o sentido daquilo que é feito pelo
ser humano e não se concentrar no algo que foi realizado. No segundo plano, reside a inten-
ção, que é subjetiva e pertence ao indivíduo.
Segundo Paulo César Busato (2010), o critério da ação significativa não é ontológico, por-
quanto não está fundamentado no ser, e nem é, de forma exclusiva, axiológico, pois não está
totalmente situado no campo do dever ser. Para Vives Antón (2011), a ideia de ação como o
significado de um fato prescinde de um aspecto valorativo, ou seja, não há necessidade de
apelar à valoração alguma.
A ação, desse modo, como categoria do Direito Penal, não constitui um evento, mas cor-
responde a interpretações que podem ser atribuídas ao comportamento, tendo como parâ-
metro os diferentes tipos de regras sociais. Os fenômenos psicológicos e internos, como a
vontade, são deixados de lado na construção do conceito significativo de ação. Não se im-
porta com o que quer o ser humano que atua, mas se concentra no sentido (ideia) transmitida
por sua conduta. A “ação deve ser identificada através de sua interpretação social, através
da comunicação, da linguagem, em definitivo, do sentido que possui” (BUSATO, 2010, p.149).
A partir dessa perspectiva, a distinção entre fato doloso e fato culposo não se situa no
campo da intenção psicológica nem na valoração jurídica, mas na capacidade de o fato co-
municar a intenção e o seu significado jurídico-valorativo. O significado de cada ação depen-
de das práticas sociais (regras e normas) que identificam uma conduta humana diante de
outras, que especifica o que o sujeito fez (VIVES ANTÓN, 2011, p.278-279).
Isso porque a ação é percebida e não determinada; transmite significado e a sua essência
está na comunicação, não corresponde a uma mera expressão de fatores psicológicos ou
normativos, mas constitui um “fenômeno que se relaciona com a comunicação mais do que
com determinação objetivas ou subjetivas. A ação é uma expressão que se produz da inter-
-relação do sujeito com o meio” (BUSATO, 2010, p.152).
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A ação aparece como o sentido de tipo (tipo de ação), com o seu significado produzindo
impacto na configuração normativa. A dogmática penal deixa de ser uma ciência, passa a ser
vista como uma forma de argumentação, sem condicionantes ontológicos, com a elaboração
de categorias jurídicas, com o objetivo de controle social direcionado à proteção de bens jurí-
dicos, em uma estrutura argumentativa que acredita ser coerente e segura, porquanto enrai-
zada em um sistema aberto (BUSATO, 2010).
No que concerne à organização dogmática da teoria do delito, a teoria significativa da
ação, com suporte na liberdade de ação como condição para a construção da dogmática
jurídico-penal, seguido de um destaque dado à razão prática, propõe um modelo no qual as
normas devem realizar uma pretensão de justiça, destacando duas premissas: a norma não
possui validez pelo simples fato de constituir uma norma, uma vez que não poderá desprezar
o componente humano; há necessidade de que a norma seja racionalmente fundamentada.
Ressalte-se que, na construção desse modelo sistemático, há uma ligação muito próxima
entre ação, norma, liberdade e razão prática. Em seguida, a estrutura jurídica da teoria do de-
lito passa a ser classificada segundo pretensões normativas, considerando que a norma deve
realizar uma pretensão de justiça do ponto de vista concreto. A primeira pretensão normativa
constitui uma pretensão de relevância que se desmembra em uma pretensão conceitual de re-
levância (presença do tipo de ação) e em uma pretensão de ofensividade (GOMES FILHO, 2019).
Quanto à pretensão do tipo de ação, ocorre quando se analisa a previsão normativa de
relevância da ação para o Direito Penal. Para tanto, é preciso compreender a ação, conforme
o tipo de ação definido na lei, não se esquecendo de que a ação é vista como expressão de
sentido, de modo que todos os elementos descritos no tipo (objetivos, subjetivos especiais,
normativos) são interpretados a partir da transmissão de sentido da ação.
Por sua vez, ao lado de uma pretensão conceitual de relevância existe uma pretensão de
ofensividade, isto é, a conduta é relevante porque constitui uma ação que lesionou ou colocou
em perigo um bem jurídico protegido. A ofensividade ao bem jurídico corresponde à antiju-
ridicidade material (VIVES ANTÓN, 2011). A norma, portanto, pretende ser relevante, por isso
não haverá relevância e, portanto, não existirá delito diante de conduta que não corresponda
a uma ofensa grave ao bem jurídico (BUSATO, 2010).
O segundo momento da pretensão normativa, que compõe o objetivo de validez da norma,
reside na pretensão de ilicitude, que é composta da antijuricidade formal com os acréscimos
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dos aspectos subjetivos do injusto. Nessa fase, a norma afirma que a conduta é ilícita quando
contraria o sistema jurídico, tanto presente na realização de algo proibido quanto na deso-
bediência a um mandado, ou seja, a uma norma que manda fazer algo (VIVES ANTÓN, 2011).
Ressalte-se que, no modelo da teoria significativa da ação, analisa-se os elementos sub-
jetivos do injusto (dolo e culpa) dentro da pretensão de ilicitude. Entende-se que, sem a verifi-
cação de dolo ou culpa, não é possível chegar à ideia de ilicitude, em razão da limitação dada
pelo princípio da culpabilidade em uma de suas funções (BUSATO, 2010).
Tendo em conta a norma como diretiva de conduta, o dolo, como compromisso de atuar
do autor, encontra-se na pretensão de ilicitude. Por sua vez, a culpa (ação impudente) cons-
titui a ausência desse compromisso, presente tanto na forma comissiva quanto na omissiva.
A culpa e o dolo são juízos normativos, representam instâncias de imputação da antinorma-
tividade de uma ação ou de uma omissão (RAMOS VÁZQUEZ, 2008).
A pretensão de ilicitude depende, por conseguinte, da existência de um compromisso do
agente com a violação de um bem jurídico, que corresponde ao tipo subjetivo (dolo e culpa).
Não se trata aqui de uma intenção do agente relacionada ao tipo de ação. Acrescente-se que
as excludentes de ilicitude (permissões fortes ou causas de justificação) e as causas de ex-
clusão de responsabilidade pelo fato (permissões fracas) são examinadas nesse momento.
Dito de outra forma, tanto as causas de justificação quanto as de exculpação são analisadas
no contexto da afirmação da ilicitude (VIVES ANTÓN, 2011).
Enquanto as pretensões de relevância e de ilicitude destinam-se à ação, a terceira fase
da pretensão normativa, chamada de pretensão de reprovação, dirige-se ao autor, que rea-
lizou a ação ilícita, quando poderia comportar-se de outro modo, mas afirma-se que não se
parte da premissa do livre arbítrio, uma vez que a ação corresponde a um atuar incondicio-
nado pelo meio.
A pretensão de reprovação, conhecida na doutrina tradicional como juízo de culpabilida-
de, possui duas condições no modelo da teoria significativa da ação: a imputabilidade, que
consiste na capacidade de o agente ser reprovado; e a consciência da ilicitude de sua ação.
As três primeiras pretensões (relevância, ilicitude e reprovabilidade) formam o conteúdo ma-
terial da infração penal.
Como última etapa do processo de pretensão de validade normativa, surge a pretensão
de necessidade de pena, com a proposta de uma visão da punibilidade em sentido amplo.
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Faz-se, ainda nessa fase, uma análise com o princípio da proporcionalidade, no sentido de
que toda pena desnecessária é injusta, logo não seria possível concluir pela existência de
um crime quando a aplicação da pena resultasse na produção de uma injustiça. A pena só é
necessária dentro da ideia de ultima ratio, para controle social do intolerável.
Ingressam, ainda, no momento da pretensão de necessidade de pena, a análise da presen-
ça ou ausência das condições objetivas de punibilidade, das causas pessoais de exclusão, de
anulação ou suspensão da pena e dos demais institutos que afastam a punibilidade, incluindo
as causas supralegais.
Observa-se que a proposta significativa da ação traz muitas novidades para a teoria do
delito, tanto sob a base filosófica quanto sob o aspecto da interpretação das categorias dog-
máticas. Como destaque crítico, a presença de elementos subjetivos (dolo e culpa) no exame
da pretensão de ilicitude, a não compreensão de exigibilidade de conduta diversa como ele-
mento da pretensão de reprovação, embora esteja aparentemente no conceito de ação, geram
algumas dificuldades iniciais, ainda não passiveis de convencimento, diante das explicações
apontadas na proposta da presente pesquisa, mais interessada em alguma contribuição ju-
risprudencial por parte da referida teoria.
De forma mais aguda, outras críticas foram apresentadas por Daniel Lagier (2013) no sen-
tido de: comparar a teoria significativa como uma nova versão da teoria social da ação; serem
exageradas as analogias entre ação e linguagem, quando se outorga à linguagem uma impor-
tância que esta não possui, pois o que se chama de significado, no campo da linguagem, inclui
muitas coisas distintas; o conceito de ação significativa negar a própria ação, uma vez que,
para Vives Antón, o significado não existe, pelo menos, em um sentido forte.
A crítica mais contundente aparece na compreensão do elemento intencional. Isso porque
Vives Antón insiste que o significado das ações é independente da intenção do agente (estado
mental subjetivo), o que importa é o sentido atribuído às ações segundo as regras sociais (in-
tencionalidade externa, objetiva). Para Daniel Lagier (2013), a teoria significativa da ação, ali-
cerçada em regras sociais e na intenção objetiva, é parcial e incompleta, uma vez que as regras
e convenções sociais não indicam a um observador, com certeza, o significado de uma ação.
As convenções linguísticas cumprem somente a tarefa de auxiliar na interpretação. Desse
modo, o julgador incorreria em grave contradição se condenasse um acusado que praticou
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o fato x, com base na ideia de uma intenção objetiva (sentido dado por regras sociais), se
estivesse convencido de que o acusado não teve a intenção (sentido subjetivo) de praticar o
fato x.
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QUESTÃO INÉDITA
Questão 27 (INÉDITA/2020) Com relação à culpabilidade nas teorias do crime, marque a as-
sertiva correta:
a) na teoria causal clássica, guiada pela teoria psicológica-pura, a culpabilidade é formada pelos
elementos dolo, culpa e imputabilidade;
b) na teoria causal neoclássica, com base na teoria psicológica-normativa, a culpabilidade apre-
senta os seguintes elementos: dolo, culpa; potencial consciência da ilicitude; exigibilidade de
conduta diversa;
c) no funcionalismo sistêmico, a culpabilidade e a necessidade de penal integram o conceito de
responsabilidade;
d) na teoria finalista, com base na teoria normativa pura, a culpabilidade apresenta os seguin-
tes elementos: imputabilidade; dolo, culpa; potencial consciência da ilicitude; exigibilidade de
conduta diversa;
e) na teoria significativa da ação, a pretensão de reprovação, conhecida na doutrina tradicional
como juízo de culpabilidade, possui duas condições no modelo da teoria significativa da ação: a
imputabilidade, que consiste na capacidade de o agente ser reprovado; e a consciência da ilici-
tude de sua ação.
COMENTÁRIO
Letra e.
Conforme visto no tópico sobre teoria significativa da ação, a culpabilidade faz parte, nessa
teoria, da pretensão de reprovação, sendo formada por imputabilidade e potencial consciên-
cia da ilicitude. Não existe, portanto, na culpabilidade da teoria significativa da ação a cate-
goria jurídica exigibilidade de conduta diversa. A letra “a” está errada, uma vez que, na teoria
causal clássica, a culpabilidade está ancorada na teoria psicológica pura e é formada pelos
elementos dolo e culpa, sendo a imputabilidade mero pressuposto. A letra “b” está errada por-
que a culpabilidade da teoria causal neoclássica, alicerçada na teoria psicológica-normativa,
não possui potencial consciência da ilicitude, mas possui imputabilidade, dolo (normativo),
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culpa e exigibilidade de conduta diversa. A letra “c” está errada porque a definição dada é de
funcionalismo teleológico e não de funcionalismo sistêmico. A letra “d” está errada porque
dolo e culpa não fazem parte da culpabilidade do finalismo, mas integram a conduta, estão
dentro da tipicidade.
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RESUMO
TEORIAS
AÇÃO TIPICIDADE ILICITUDE CULPABILIDADE
DO CRIME
Causalismo Movimento corpo- Formal. Formal. Tipicidade Teoria Psicológica pura. Cul-
Clássico ou Sis- ral voluntário que e ilicitude forma- pabilidade formada por dolo
tema Naturalista modifica a reali- vam o injusto obje- e culpa. A imputabilidade
dade exterior. tivo. é mero pressuposto. Dolo
normativo
Causalismo Conduta humana Material. Sistema Material. Análise de Teoria psicológica norma-
Neoclássico ou voluntária que axiológico. relevância social. tiva. Culpabilidade formada
Sistema Neokan- modifica a reali- Tipicidade e ilici- por dolo e culpa, imputabili-
tista dade exterior. tude formavam o dade e exigibilidade de con-
injusto objetivo. duta diversa. Dolo normativo.
Finalismo Exercício de ati- Material (não na Material. Rela- Teoria normativa pura. Culpa-
vidade final ou mesma extensão do cionada ao ilícito bilidade formada por imputa-
atividade humana neokantismo). Sis- pessoal. bilidade, potencial consciên-
dirigida a um fim. tema ontológico-dog- cia da ilicitude e exigibilidade
mático. de conduta diversa.
Teoria Social Conduta humana Material (contribui- Material (contribui- Teoria complexo-normativa
da Ação socialmente rele- ções do causalismo ções do causalismo psicológica da culpabilidade,
vante dominada e do finalismo). Dolo e do finalismo) formada pelos elementos
ou dominável pela e culpa na tipicidade do finalismo, mais o dolo e a
vontade. e na culpabilidade culpa.
(dupla função)
Funcionalismo Manifestação da Material. Sistema Material. Sistema Responsabilidade é igual a
Teleológico personalidade. axiológico. Chama axiológico. soma de culpabilidade mais
o fato criminoso de a necessidade de pena.
injusto responsável.
Funcionalismo Causação de um Não há uma preocu- Não há uma pre- A culpabilidade é guiada pela
Sistêmico resultado individu- pação exata com o ocupação exata função da pena (prevenção
almente evitável. conceito de tipicidade. com o conceito de geral positiva fundamenta-
Conceito negativo A teoria do delito ilicitude. dora, que busca reafirmar a
de ação. transforma-se em uma vigência da norma)
teoria de imputação.
Teoria Significativa Interpretação do A primeira pretensão Segundo momento, Pretensão de reprovação,
da Ação comportamento normativa constitui pretensão de ili- conhecida como juízo de
humano segundo uma pretensão de citude, composta culpabilidade. Elementos:
regras sociais. relevância que se des- da antijuricidade imputabilidade e potencial
membra em preten- formal com os consciência da ilicitude.
são do tipo de ação e acréscimos dos Existe ainda uma pretensão
pretensão de ofensivi- aspectos subjetivos de pena que não faz parte da
dade. do injusto. culpabilidade.
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DIREITO PENAL – PARTE GERAL
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