Livro MulheresPanAmazonidas PDF
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ISBN 978-85-7143-091-4
9 788571 430914
Série Icamiabas
1 Volume 1
MULHERES PAN-
AMAZÔNIDAS:
ENCICLOPÉDIA COOPERATIVA DE BIOGRAFIAS
Série Icamiabas
Volume 1
Editora do NAEA
Comitê editorial
Armin Mathis
Edna Maria Ramos de Castro;
Fábio Carlos da Silva
Juarez Carlos Brito Pezzuti
Luis Eduardo Aragón
Marília Ferreira Emmi
Nirvia Ravena
Oriana Trindade de Almeida
Revisoras
Estér Roseli Baptista (FACFARMA-UFPA)
Ligia T. Lopes Simonian (NAEA-UFPA)
Socorro Ruivo (SEDUC-PA; Arquivo Público Municipal de Curuçá)
Revisora do espanhol
Nara Arzivenko Gesing
Capa
Ligia T. Lopes Simonian; Ione Sena
Imagem da capa
Thevet, 1558, apud Imagens da formação territorial. Rio de Janeiro: Fundação Emílio
Odebrecht, 1993. p. 77.
Projeto editorial
Ione Sena
MULHERES PAN-
AMAZÔNIDAS:
ENCICLOPÉDIA COOPERATIVA DE BIOGRAFIAS
Série Icamiabas
Volume 1
Belém
NAEA/UFPA
2011
Dados Internacionais de Catalogação de publicação (CIP)
(Biblioteca do NAEA/UFPA)
v
Agradecimentos
vii
LIGIA T. LOPES SIMONIAN • Organizadora
viii
Mulheres Pan-Amazônidas: enciclopédia cooperativa de biografias
ix
LIGIA T. LOPES SIMONIAN • Organizadora
x
Prefácio
xi
LIGIA T. LOPES SIMONIAN • Organizadora
xii
Mulheres Pan-Amazônidas: enciclopédia cooperativa de biografias
São mulheres que educam, que produzem arte como Annita e Ckalu,
que produzem ciência em tempos onde a atividades científica era ainda mais
circunscrita aos círculos masculinos. Mulheres que se deslocam de suas
terras para construir encontros com desafios políticos, científicos, sociais,
religiosos, educacionais e tantos outros demonstrados pela trajetória das
biografias apresentadas neste volume da Enciclopédia.
O encontro com a história dessas mulheres nos demonstra que muito
ainda temos a caminhar para compreender a importância da valorização da
mulher no cenário mundial e em especial na Pan-Amazônia. Nesse sentido,
o trabalho da Profª. Drª. Ligia Simonian na organização desta obra que se
inicia reveste-se de uma importância singular, pois contribui com um debate
importante sobre a condição e o exercício de ser mulher circunstanciada na
ambiência pan-amazônica.
E ao mesmo tempo em que convida todos os leitores a uma reflexão
acerca do papel atribuído às mulheres na história da Pan-Amazônia, e como
esse papel se distancia daquilo que elas são e sentem em suas existências e
vivências particulares. Trata-se, portanto, de um trabalho que abre portas
e janelas para a compreensão dos sentidos atribuídos à vida regional,
especialmente, por suas autoras: as mulheres pan-amazônicas.
xiii
Sumário
PREFÁCIO ................................................................................ xi
PARTE I
INTRODUÇÃO ................................................................................... 01
Ligia T. Lopes Simonian.
PARTE II
BIOGRAFIAS
xv
LIGIA T. LOPES SIMONIAN • Organizadora
xvi
Mulheres Pan-Amazônidas: enciclopédia cooperativa de biografias
xvii
LIGIA T. LOPES SIMONIAN • Organizadora
PARTE III
AUTORAS E AUTORES .................................................................... 357
xviii
Parte I
INTRODUÇÃO
1
Introdução
1
De fato, dentre centenas de verbetes, apenas 17 são sobre as mulheres da Amazônia
brasileira.
2
Ainda, a expectativa é de que se revele sua participação e relevância na sociedade, cultura
e relações de trabalho, no meio rural e no urbano pan-amazônico e ao longo de suas vidas
e em uma perspectiva biográfica.
3
LIGIA T. LOPES SIMONIAN • Organizadora
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Mulheres Pan-Amazônidas: enciclopédia cooperativa de biografias
3
Inclusive, “[...] passando para as imaginações inquietas dos curumins e cunhantãs as
fantasias inspiradas pela natureza ubérrima, satisfazendo com a narrativa de mitos e
superstições o espírito cuíra dos pequenos tapuios” (id., ibid.).
4
Sobre Meriam e sua obra existem uma biografia e estudos, como a de Patricia Tovar, mais
adiante.
5
Para ressaltar sua importância para o país e sua cultura, o Museu do Suriname (Paramaribo),
apresentou faz pouco ao público uma exposição sobre a vida e obra cientifica e artística
dessa notável (Simonian, 2009d).
6
Neste projeto, ela foi perdendo uma a uma as pessoas que a acompanhavam, inclusive
dois irmãos.
5
LIGIA T. LOPES SIMONIAN • Organizadora
século XIX foram profícuos em dar nomes a muitas, como Agassiz, Agassiz
([1865-1866] 1975), Bates [1863] 1873, Coudreau (1897), Florence ([1825-
1829] 1941), Moura ([1910] 1989), de Wallace ([1853] 1939) e elas estão
também em obras recentes (Valente Júnior, 1987). Assim, tem-se a cabana
Margarida de Jesus Cunha, a kayapó Macabaió, a Guarani Jombré Scherer, a
“D. Antônia”, da fazenda Buriti (próxima à Cuiabá), a cafuza e “ajudante de
naturalista” Alexandrina etc.
A pensar-se em estudos biográficos ou biografias completas de
mulheres específicas, a produção é bem mais recente. Uma dessas biografias
é a de Helena Valero, uma menina ribeirinha do Amazonas que os Yanomami
raptaram, viveu entre eles, se casou e teve filhos com um deles (Yo, 1984)7. E
como não poderia ser diferente, nessa obra tem-se uma percepção processual
acerca da cultura desses indígenas.
Depois disto e inspirada em obras de Chryssides (1993) e Ofner
(1993), produtoras de biografias sobre lideranças indígenas da Austrália e
a Nova Zelândia, Simonian (2012a, b, c, no prelo) fez pesquisa sobre três
mulheres amazônidas. Elas são Verônica Tembé – a capitoa dos Tembé; Maria
Rodrigues de Souza – uma agroextrativista do rio Aripuanã; e Ronôré – a
“mamãe grande” dos Akrãtikatêjê (Simonian, 2012a-b; Simonian, Valadão,
2012). Ainda, a autora revela a importância social e política dessas mulheres
nos contextos onde viveram ou vivem.
Na contemporaneidade, mulheres estão a se destacar na Pan-Amazônia
e nos campos politicoadministrativo, economicoeducacional e sociocultural.
Sobre duas que atuam no Brasil, produziu-se biografias. Elas são mulheres
inseridas no contexto político-partidário mais alto da nação. Uma dessas
biografias trata da ex-senadora pelo Amazonas Eunice Michelis (Barbosa,
2006) e a outra da senadora pelo Acre, Marina Silva (Cézar, 2010). Na
primeira, enfatiza-se feitos da ex-primeira senadora do país e seus impactos
na sociedade; na segunda, bandeiras políticas da senadora, notadamente no
campo ambiental.
7
Em sua essência, essa é uma autobiografia produzida a partir de um relato detalhado de
Helena.
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LIGIA T. LOPES SIMONIAN • Organizadora
Dentre outros aspectos, tratou também sobre a cirurgia que ela fez de
adequação sexual a qual foi submetida no Hospital de Base de São José do
Rio Preto (SP), em 2000. Ainda, sobre sua inserção política nas questões
ligadas ao segmento de Lésbicas, Gays, Bissexuais, Transexuais, Travestis e
Transgêneros – LBBTTT e da cultura de origem afrorreligiosa.
Depois, tem-se a trajetória da artista e arte-educadora Carmen Lucia
Barbosa – a Ckalu, 46 anos, nascida em Belém, e que Leila Cristina Leite
Ferreira produziu. Ela é formada em pedagogia pela UFPA e, dentre outros
trabalhos que faz, a mesma desenvolve os de graffite. Nos anos de 1990, ela
participou do Projeto Pichando Arte, isso em Belém. E, mais recentemente,
ela está a pesquisar e trabalhar com materiais reciclados e se declara militante
da arte e das liberdades feminina e artística.
O terceiro capítulo versa sobre Maria Benedita Costa Neves de Brito
– a Maria do Andirá, pajé curuçaense que viveu entre 1923-1994. De acordo
com a pesquisa de Ligia T. Lopes Simonian, 61 anos, e de Laura Arlene Saré
Ximenes Ponte, ela foi uma pajé importante e cumpriu uma função social
importante quanto à cura em Curuçá, num tempo em que ali médicos,
enfermeiras formadas etc. não existiam. Ainda, ela preparou algumas das
mães de santo que hoje atuam nesse município.
A seguir, tem-se o capítulo quatro, uma produção sobre Maria Veras
Alves de Campos, 87 anos, também referida como Professora Marizinha e
como “Primaveras”. Em linguagem poética, Socorro Ruivo – 51 anos – diz
que “Fé e Razão traçaram seus caminhos, equilibrando seus passos, suas
escolhas; também encanto e magia floriram seus jardins ao longo da vida
[...]”. Ainda, revela que Maria Veras teve uma vida de superação e de ganhos
pessoais e sociais ao dedicar-se a trabalhos públicos, nos âmbitos da educação
e do poder judiciário.
A quinta homenageada nesta enciclopédia é Ruthe Pinheiro Conduru
Chelala, que nasceu em Belém em 1932 e nessa cidade viveu e faleceu em
1974, tendo sido uma pioneira no campo da biblioteconomia. A partir de
pesquisa sobre a trajetória de vida de Ruthe Chelala, Ana da Silva Santos
e Valdenira Maria de Jesus Moreira revelam a sua importância para a
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Isto num momento em que poucos se preocupavam com os aspectos formais da produção
acadêmica.
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REFERÊNCIAS
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Parte II
BIOGRAFIAS
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ALMEIDA, Beatriz de, 1978 - ...
MULHER TRANSEXUAL, LÍDER ESPIRITUAL
E ATIVISTA EM SALVATERRA, PARÁ
1 INTRODUÇÃO
1
Como a própria Beatriz – nascida em Santos, SP, e que é residente no Pará há anos –
declara, a luta pelo reconhecimento da identidade sexual e do gênero “[...] não começou
com a cirurgia [de transgenitalização], mas sim, desde o nascimento [sic] [...]”.
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Estas últimas, aliás, só mais recentemente têm conquistado maior visibilidade social,
em especial pelos avanços na ciência médica que têm lhes permitido adequar o corpo à
identificação com o gênero feminino.
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Mulheres Pan-Amazônidas: enciclopédia cooperativa de biografias
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Na literatura especializada, muitas são as explicações sobre as estratégias de crianças e
de adolescentes no trato de sua condição conflitante, quer consigo próprias quer com o
meio social que as rodeia. A respeito, é paradigmático o entendimento de Ramsey (1998),
psicólogo clínico que acompanhou muitos e muitas pacientes transexuais estadunidenses.
Assim, na infância, por volta dos cinco anos, elas expressam os sentimentos por meio das
ações. Nesse caso, a infelicidade se manifesta pelo choro, tal como nas situações em que
lhes é proibida a participação em jogos e brincadeiras definidas como de meninas.
4
Conforme as lembranças da infância, Beatriz recorda que desde cedo já se apresentava
socialmente como menina, embora não tivesse a dimensão precisa do desconforto que
isso causava aos adultos próximos. Foi essa atitude que chamou a atenção da madrinha
Ivete, já falecida, de quem não se recorda o sobrenome.
5
Pouco se ouvia falar a respeito nos anos de 1980 pelos meios de comunicação no Brasil.
Então, a mãe de Beatriz tinha apenas informações vagas e imprecisas sobre a cirurgia de
redesignação sexual que era realizada no exterior. No Brasil, essa cirurgia passou a ser
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LIGIA T. LOPES SIMONIAN • Organizadora
garantida aos e às transexuais por meio da Portaria nº 1.707 (Brasil, 2008), que beneficiou
Beatriz e tantas outras cidadãs. Brasileiras na mesma condição tiveram o direito de alterar
o nome civil e o sexo em todos os documentos. Anterior a essa norma, tem-se a Resolução
nº 1482, de 10 de setembro de 1997, do Conselho Federal de Medicina (CFM, 1997),
que instituía a cirurgia, mas a título experimental, e definia os critérios que tornavam
os indivíduos aptos a serem classificados como transexuais. Em seis de novembro de
2002, esse instrumento foi alterado pela Resolução nº 1652 do CFM (2002). Essa última
inovava ao condicionar a cirurgia ao acompanhamento do/da paciente por uma equipe
multidisciplinar pelo período mínimo de dois anos, até o diagnóstico da transexualidade
e que a candidata atingisse a maioridade, apresentando características morfológicas
apropriadas. Atualmente, o processo transgenitalizador é disciplinado pela Resolução
nº 1955/12 ago. 2010 (CFM, 2010).
6
Esta cirurgia não é recomendada na infância, o que se dá em função da irreversibilidade
total do processo para o ou a transexual. Isso por mais que os pais desejem ajudar os filhos
no acesso à mesma (Ramsey, 1998). Dessa maneira, a transgenitalização só se aplica à vida
adulta, quando o indivíduo pode tomar decisões conscientes sobre as intervenções no
próprio corpo. Ademais, do ponto de vista psicológico, conforme Ramsey (1998, p. 91),
se uma “[...] criança for realmente transexual [...]”, nada no mundo a fará mudar de ideia
sobre o que acredita ser. Daí decorre a necessidade de uma avaliação clínica rigorosa da
pessoa transexual antes da indicação cirúrgica, o que se mostrou inconteste no caso de
Beatriz.
7
Ainda que segmentos mais reacionários da sociedade se sentissem agredidos pela morenice
e pela plasticidade corporal feminina de Roberta.
8
Somente após a finalização deste texto, Beatriz revelou ter nascido hermafrodita, o que
teria contribuído para a realização da cirurgia de redesignação sexual.
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Antes da cirurgia, Beatriz, a mãe e o irmão Severino, num esforço coletivo, empenharam-
se na venda de roupas para conseguir o montante de R$ 10.000,00. Todo o dinheiro seria
utilizado para cobrir as despesas hospitalares, que incluíam quinze dias de internação.
Como explica Beatriz, na época, a cirurgia não era coberta pelo Sistema Único de Saúde
(SUS), razão pela qual a família precisou trabalhar bastante.
10
Precisamente, Severino de Almeida e Sérgio Luis de Almeida, este último assassinado
brutalmente em uma tentativa de assalto.
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LIGIA T. LOPES SIMONIAN • Organizadora
a admoestação praticada por parte de familiares, como pelo tio paterno José
Bernardino de Oliveira, é compreensível quando se toma como referência a
origem familiar11. À revelia das críticas, o pai seguia compreensivo à condição
do ou da filha, tratando-o ou a por vezes com substantivos e adjetivos femininos
ou, ainda, presenteando Alcebyades com brinquedos “de meninas”.
De Santos, SP, a família migrou para Belém em 1986, quando Beatriz
tinha dez anos de idade12. Segundo lembra, a vontade da mãe Odete em
conhecer a capital do Pará motivou a viagem; encantada com as peculiaridades
locais, essa resolveu se estabelecer nessa cidade. À época, como assinalado
por Doimo (1995), o Brasil experimentava as diretrizes cidadãs de uma
Constituição nova, instituída pós-regime autoritário13.
O movimento homossexual, que na década passada se aproximava do
Partido dos Trabalhadores – PT, organizava-se pela conquista do direito à
igualdade num clima de intolerância a gays, lésbicas, travestis e transexuais.
Apesar da imagem de país complacente às diferenças sexuais, suscitado
principalmente pelo Carnaval (Matta; 1983; Green, 2000), o certo é que
ao longo de mais de três décadas, no Brasil, assiste-se à alternância entre
momentos mais e menos hostis a tais segmentos da população. Recentemente,
os mesmos são conhecidos pelo acrônimo extensivo LGBTTI14.
11
Os parentes relacionados ao pai e à mãe são provenientes da região Nordeste do país,
marcada entre outras coisas pelo machismo, decorrente do patriarcalismo colonial de que
se ocupa Freyre (2005) em sua discutida obra “Casa Grande e Senzala”.
12
As mudanças de domicílio se refletem na escolarização de Beatriz. O ensino primário
foi realizado em São Vicente, SP, na Escola Estadual – EE Professor Eneios Vilas Boas.
Em Ananindeua, PA, em 1990, ela retomou os estudos na EE de Ensino Fundamental
Armando Farjado. O ensino médio é cursado no antigo Colégio Lauro Sodré e concluído
em 1994, no Colégio Rutherford, ambos localizados na cidade de Belém, PA. Em 2009, no
Marajó, Beatriz matriculou-se na Escola Tecnológica de Educação do Pará em Salvaterra
no curso de Técnico em Computação, inconcluso (Segundo conversa realizada no dia 13
de janeiro de 2012).
13
A mesma resultou da contribuição de pressões sociais de grupos diferentes e organizados
em torno da inclusão de questões como habitação, meio ambiente, educação e gênero na
agenda política do Estado.
14
Ou seja, lésbicas, gays, bissexuais, transgêneros, transexuais, interssexuais e simpatizantes.
Todavia, no Brasil, a partir da I Conferência de Gays, Lésbicas, Travestis e Transexuais,
realizada entre os dias 06 e 07 de junho de 2008, em Brasília, DF, adotou-se oficialmente
a sigla LGBT (Brasil, 2008).
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Mulheres Pan-Amazônidas: enciclopédia cooperativa de biografias
15
De acordo com Ferreti (2006), os voduns são ancestrais divinizados difíceis de definir,
que representam as forças da natureza na crença dos povos de Daomé. Ao citar Maupoil
(1965), Ferreti informa um panteão entre 200 e 600 voduns.
16
Também, foi nesse templo que venerou pela primeira vez voduns, orisás, encantados e
caboclos.
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LIGIA T. LOPES SIMONIAN • Organizadora
se seguiu pelos anos de 2008 e 2009 (Figura 2, Prancha I). Nesses festejos
em que contou com o apoio do deputado estadual Bira Barbosa, do Partido
pela Social Democracia Brasileira – PSDB,17 ela comenta ter obtido presença
maior de representantes de terreiros da cidade de Soure18. Entre outras coisas,
Beatriz acredita que a vergonha à exposição social de pais, mães e filhos de
santo é muito grande no Marajó, sobretudo pela expansão do pentecostalismo
entre os ilhéus e as ilhoas. Mas apesar disso, ela não se intimida e avança em
seus projetos pessoais e sociais.
Além de preocupar-se com a realidade religiosa dos cultos de matriz
africana, a vivência em Salvaterra fez Beatriz perceber a realidade problemática
de gays, lésbicas e travestis. Relatos de discriminação e preconceito que
chegavam ao Templo levaram a promover a visibilidade do segmento LGBT.
Nessa direção, em 29 de novembro de 2008 e com o apoio do deputado
federal Zenaldo Coutinho do PSDB, ela realizou a I Parada do Orgulho Gay
de Salvaterra, registrada em parte na Figura 3, mais adiante.
Tal manifestação pública corresponde a uma mobilização internacional,
cujas raízes remontam à resistência de lésbicas, gays, travestis e transexuais à
truculência da polícia novaiorquina contra os frequentadores do bar Stonewall
Inn, em 28 de junho de 1969 (Vieira Júnior, 2008; Canela, 2010). Desde então,
em datas específicas, em todo o mundo, inclusive no Brasil, o segmento LGBT
ganha as ruas em sua diversidade, símbolos e cores. E isso para expressar o
orgulho de ser o que são e reivindicar direitos ainda interditos.
Esforços pela organização política de lésbicas, gays, travestis e
transexuais em Salvaterra também foram realizados por Beatriz, embora sem
sucesso. Fracasso que atribui ao desinteresse desse segmento da população
pela militância contra o preconceito e pelo acesso a uma vida mais cidadã, tal
como assegura a Constituição de 1998, na qual todos têm direito a receber
tratamento igualitário por parte do Estado e da sociedade. Ademais, ao adotar
17
Partido do qual Beatriz é filiada desde 2008.
18
Este município é separado de Salvaterra pelo rio Paracauari, numa travessia fluvial de
rabeta (embarcação motorizada de porte pequeno, comum na navegação nos rios
brasileiros) de cerca de 30 minutos.
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Isso para evitar quaisquer embaraços, ainda que os pais de ambos fossem favoráveis ao
relacionamento.
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Prancha I
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3 CONCLUSÕES
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LIGIA T. LOPES SIMONIAN • Organizadora
REFERÊNCIAS
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gênero. Ágora, Rio de Janeiro, v. 9, n. 1, p. 49-63, jan./jun. 2006.
; MURTA, D. Diagnóstico de transtorno de identidade de gênero às
redescrições das experiências da transexualidade: uma reflexão sobre gênero,
tecnologia e saúde. Physis: Revista de Saúde Coletiva, Rio de Janeiro, v. 19,
n. 1, p. 15-41. 2009.
BENTO, B. A. de M. O que é transexualismo. São Paulo: Brasiliense, 2008.
. Da transexualidade oficial às transexualidades. In: PISCITELLI, A.;
GREGORI, M. F.; CARRARA, S. (Org.). Sexualidades e saberes: convenções
e fronteiras. Rio de Janeiro: Garamond, 2004. p. 143-172. (Coleção
sexualidade, gênero e sociedade).
BRASIL. Ministério da Saúde. Portaria nº 1.707; 18 ago. 2008. Institui, no
âmbito do Sistema Único de Saúde (SUS), o Processo transexualizador...
Diário Oficial [da] República Federativa do Brasil, Brasília, n. 159, 19 ago. 2008.
Seção 1, p. 43.
. Dossier sobre a I Conferência de Gays, Lésbicas, Travestis e Transexuais.
Brasília, 06 e 07 de junho de 2008. Disponível em: <http://www.
direitoshumanos>. gov.br/brasilsem/IConf. Acesso em: 2011.
CANELA, M. A. R. De sujeitos sociais a sujeitos de direitos: o Programa “Brasil
sem homofobia” e a construção da cidadania homossexual. Niterói, 2010,
105 f. Dissertação (Mestrado em Política Social)–Universidade Federal
Fluminense, 2010.
CLEMENTS-NOLLE, K.; MARX, R.; KATZ, M. Attempted suicide among
transgender persons… Journal of Homosexuality, v. 51, n. 3, p. 53–69, 2006.
CONSELHO FEDERAL DE MEDICINA. Resolução nº 1482, de 10
de setembro de 1997. Disponível: <http://www.cremerj.org.br/skel.
php?page=legislacao/resultados.php>. Acesso em: 18 nov. 2011. Revogada
pela Resolução CFM nº 1.652/2002.
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LIGIA T. LOPES SIMONIAN • Organizadora
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BARBOSA, Carmen Lúcia, 1965 - ...
ARTE NA VIDA DE CKALU
1 INTRODUÇÃO
1
Observe-se ainda que, no Brasil, poucos são os estudos sobre a participação das mulheres
na arte da pichação ou do grafite. O paper de Cruz e Costa (2008) é um dos poucos que
aparecem no Google Acadêmico, contudo menos ainda trata da participação das mulheres
no grafite ou na pichação. De todo modo, muito já se produziu a respeito, notadamente
na língua inglesa. Os trabalhos de Reich, Buss, Fein, Kurtz (1977) e de Stocker, Dutcher,
Hargrove e Cook (1972) são alguns dos pioneiros e exemplares quanto à presença das
mulheres e/gênero no grafite, mas muito mais se produziu a seguir.
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LIGIA T. LOPES SIMONIAN • Organizadora
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Na compreensão de Arce (1999), o graffite e a pichação significam a mesma coisa e o
primeiro só se diferencia do segundo pelo colorido colocado nos desenhos, enquanto que
a pichação é escrita e normalmente feita com uma única cor; de todo modo, essas artes são
produzidas nos muros e fazem parte de uma mesma realidade. Projetos de inserção social
recentes vem desenvolvendo uma concepção diferente, em que se valoriza essa primeira
modalidade em detrimento da segunda, como no Arte sim, pichação não (Cidade, 2010).
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Mulheres Pan-Amazônidas: enciclopédia cooperativa de biografias
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Note-se que João Batsita Leão Figueiredo, autor acima referido, era o coordenador de tal
projeto, à época.
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LIGIA T. LOPES SIMONIAN • Organizadora
E como uma artista que se envolve com tudo o que é mais atual, Ckalu
também trabalha com o reaproveitamento de materiais como o CD. Ela
reutiliza esse recurso quando ele perde a sua função para as demais pessoas
e transforma em mini-quadros. Essa mesma abordagem ela desenvolve em
relação à sarrapilha, que depois de esvaziada na feira ela reaproveita junto
com seu amigo, o também artista plástico Sandro Pardal. Nesse caso, os
dois fabricam telas para suas pinturas que não estão nas paredes. Ainda em
dupla, esses dois artistas utilizam o cartão telefônico descartado que são
transformados em cartão de natal para venda nas ruas da cidade.
Ckalu é uma artista plástica que não gosta de ser denominada assim,
mesmo que saiba sobre a importância de sua ação no campo das artes plásticas.
De fato, ela prefere ser identificada como arte-educadora, pois busca com a
educação uma maneira de militância melhor por meio da arte (Figura 1 e 2).
No seu entendimento, ela diz que
Mas apesar desse destaque dado por Ckalu para a relação arte-educação, é
de lembrar-se as análises de Moraes (2009), nas quais revela as limitações, os
impasses e as lutas dos trabalhadores da arte e da educação.
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Mulheres Pan-Amazônidas: enciclopédia cooperativa de biografias
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LIGIA T. LOPES SIMONIAN • Organizadora
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Isto com a Galera do NPC13.
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Mulheres Pan-Amazônidas: enciclopédia cooperativa de biografias
Figuras 3-4: Jovens que participaram do Projeto Pichando Arte na Escola Estadual de Ensino
Fundamental Hilda Vieira, bairro da Marambaia.
Fonte: Fernando d’Pádua, 2002.
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LIGIA T. LOPES SIMONIAN • Organizadora
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Mulheres Pan-Amazônidas: enciclopédia cooperativa de biografias
4 CONSIDERAÇÕES FINAIS
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LIGIA T. LOPES SIMONIAN • Organizadora
REFERÊNCIAS
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Mulheres Pan-Amazônidas: enciclopédia cooperativa de biografias
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BRITO, Maria Benedita Costa Neves de, 1923-1994
54 ANOS DE PAJELANÇA EM CURUÇÁ
1 INTRODUÇÃO
1
Assim, esta pajé será mencionada ao longo do texto, pois desde que começou a atuar
em processos e ações de cura, passou a ser conhecida como tal (Simonian, 2010-2009).
No que respeita ao ano de nascimento, existe uma controvérsia: na carteira de trabalho
encontrada, aparece o ano de 1919 e na lápide de seu túmulo, no Cemitério Municipal
São Benedito – CMSB, o ano de 1923. E como a documentação do cartório de Curuçá
passou por um incêndio, em 22 de dezembro de1997, não se pôde resolver essa questão.
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LIGIA T. LOPES SIMONIAN • Organizadora
2
Neste caso, encontrou-se apenas duas fotos do tipo fotodocumento, uma que aparece
na carteira de trabalho nunca assinada, mas que se encontra danificada e, outra que se
encontra nesta biografia, em condições melhores, ambas sob os cuidados de uma das filhas.
3
Eles foram e são homenageados pelas autoridades e população curuçaense não só com o
nome dessa localidade; a respeito, o salão paroquial da igreja matriz de Nossa Senhora do
Rosário foi e é denominado “Palácio dos Andirás” e, no passado, existiu uma agremiação
carnavalesca denominada “Arranco dos Andirás” (Lima, 1995).
4
Do interior do município, vinha gente de Algodoal, Boa Vista, Ramos, Flexeira, Beira
Mar, Candeua etc.
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Mulheres Pan-Amazônidas: enciclopédia cooperativa de biografias
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Uma das filhas informou que a mãe era analfabeta. Ela não teria
estudado porque teve que ajudar a mãe adotiva, que teve um filho, mas
morreu ainda criança, e não tinha marido (Oliveira, 2010). Então, segundo a
mesma fonte, a menina Maria Benedita tinha que ajudá-la nas atividades do
roçado, o que, junto à pesca, garantia às duas, a sobrevivência.
Esta curuçaense seguia simultaneamente a pajelança e, nesse contexto
religioso e cultural, fazia o bem às pessoas que a procuravam em busca de
cura, o que, aliás, é unanimidade entre os entrevistados. Mas, seguia a ‘linha
de fundo’, do bem, e não a feitiçaria ou ‘linha negra’ (Oliveira, 2010). Ela
trabalhava com os encantados e os espíritos da cabocla Mariana e do Preto
Velho. Maria do Andirá começou a atuar num tempo em que quase não
havia serviços de saúde em Curuçá e nos município próximos.
Maria do Andirá era católica. Nessa direção, essa pajé era devota
de São Jorge, de Nossa Senhora da Conceição e na sala de sua casa tinha
um altar com estátuas de ambos (Figura 2-3), o que em parte se observou
quando em campo5. Todos os anos ela organizava uma festa em homenagem
a essa Nª. Sª. e fazia questão de promover a ladainha e de oferecer comida
aos convidados (Costa Filho, 2010; Oliveira, 2010). Ainda, ela teve muitos
afilhados!
Figuras 2-3: Última casa em que Maria do Andirá residiu e altar usado por ela.
Fonte: L. Simonian, 2010.
5
A imagem de São Jorge já não existia, pois logo após o falecimento de Maria do Andirá,
uma galinha (Gallus gallus domesticus) pulou no altar e com o movimento que fez, jogou a,
quebrando-a.
50
Mulheres Pan-Amazônidas: enciclopédia cooperativa de biografias
6
O esposo era alcoólatra e frequentemente agredia Maria do Andirá, aliás, uma situação
vivenciada por muitas famílias, tanto na região como no mundo todo (Simonian, 1994).
Nesse caso, muitas pessoas presenciaram cenas violentas, como por Maria Pedroso
Ferreira (2011, n. p.), nascida em 1941 e mais conhecida como Maria Pretinha; conforme
revelou em entrevista, “[eu estava lá, ele chegou, avançou sobre a Maria, quando deu
uns tapas nela]”. Nessa oportunidade, a pajé saiu de casa; o próprio marido arrependido
e Maria Pretinha saíram atrás e a encontraram muito magoada e longe de casa. Ainda
segundo a mesma entrevistada, “[...] ela aceitou voltar comigo” (id., ibid.).
7
Maria Novais e Neuza de tal.
8
Nesta segunda casa, por muitos anos funcionou uma escola, sendo que a família cedeu o
espaço.
51
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adoeceu e onde seus filhos Nestor e Antônio viviam até a pouco e foram
entrevistados9. Em 2010, a cozinha encontrava-se como Maria do Andirá a
deixou.
Depois da morte do esposo, o filho Nestor retornou e passou a viver
com Maria do Andirá. Isso depois de ter vivido por décadas em Belém (Costa
Filho, 2010). Além da terra herdada, essa pajé também passou a receber uma
pensão do marido, que se aposentara como trabalhador rural, a qual lhe foi
paga entre 1981 e inícios de 1993.
Com 71 anos Maria do Andirá adoeceu, depois de levar uma queda e
vomitar. Ela foi levada para Belém, onde chegou a passar alguns dias em um
hospital, mas não resistiu e faleceu em 23 de fevereiro de 1994. Seu corpo
foi transferido pelos filhos para Curuçá, onde o sepultaram no CMSB, nas
proximidades da capela. De acordo com Maria Pedroso (2011, n. p.), 60 anos,
conhecida como Maria Pretinha, “Maria do Andirá teve um dos enterros
mais concorridos de Curuçá; muita gente com rosas e flores compareceu”.
Em que pese a vida simples e frugal, Maria do Andirá se impôs
enquanto esposa, mãe e pajé. Como se discutirá adiante, por anos sua vida
foi permeada por conflitos, pois seu esposo nem sempre aceitou o trabalho
de caridade que desenvolvia enquanto pajé. Mas, Maria soube impor-se, e
nunca deixou de atender a quem a procurasse.
9
Ao tempo da pesquisa, Antônio tinha construído uma casa de alvenaria no próprio terreno
– uma herança de parte dos avós paternos –, para onde se mudou logo após.
10
Mas, note-se, o que lembram é suficiente para permitir uma compreensão do que
ocorrera.
52
Mulheres Pan-Amazônidas: enciclopédia cooperativa de biografias
53
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11
Precisamente, o alecrim (Rosmaninus officinolis), o pau d’angola (Piper latifolium (DC)
Yunker), o paricá (Anadenathera columbrina; A. peregrina) e o fumo (Nicotiana tabacum).
12
Ele preparava cinco tauaris, sendo que um ficava pronto para uma emergência. Depois de
sua morte, quem os preparava era seu filho Nestor, também conhecido como Sampaio, o
que fez até a morte da mãe pajé.
54
Mulheres Pan-Amazônidas: enciclopédia cooperativa de biografias
Ela não trabalhava com pontos; mas a casa era defumada por dentro
e por fora. Apenas depois da defumação ela ficava “atuada” pelos caboclos.
Segundo Costa Filho (2010), por dentro, ela defumava primeiro com o
tauari, com baforadas nos quatro cantos do ‘recinto’; depois, defumava com
semente de alecrim, de cominho, e, eventualmente, de alfazema13. Tudo era
colocado no fogareiro e então defumava-se a casa por dentro e por fora.
Muitas vezes, as pessoas atendidas recebiam orientações e se tratavam
em suas casas. Em alguns casos, ela as hospedava em sua casa e ali os tratava.
Em outros, ela informava que a cura não era para que ela pudesse solucionar
e que, assim, procurasse outro recurso.
De fato, a pajé Maria do Andirá marcou a sua atuação longa pela
ética. Ela apenas aceitava desenvolver um trabalho de cura se tivesse certeza
que poderia fazê-lo. Assim, “[...] quando era para Mina ou outro rito, ela
dizia que não era para ela, que [o enfermo] tinha que procurar o médium
apropriado” (Santos, 2010, n. p.). Aliás, essa era uma de suas virtudes mais
estimadas pelos seus pacientes, o que é sempre lembrado ao se falar dela em
Curuçá.
Nos casos em que ficava com os enfermos em casa para o tratamento,
seu marido a ajudava (Azevedo, 2010; Oliveira, 2010). Precisamente, ele saía
em busca das plantas indicadas para o tratamento, em geral encontradas nas
matas ciliares próximas14. O preparo e a aplicação ficavam por conta de Maria
do Andirá, que continuava com sessões para receber os encantados e rezar
pela cura.
Exemplar nesta direção foi a cura de Maria do Rosário Dias de Azevedo,
nascida em 1957 e residente em Curuçá. Ela esteve internada em hospital de
Castanhal, Pará, com o pé direito gangrenado e parte da perna a ser amputada
(Azevedo, 2010). Mas ela decidiu sair do hospital15 e procurou por Maria do
Andirá, que a recebeu, hospedou por um mês e curou, tendo assim evitado
13
Respectivamente, Baccharis dracunculifolia, Cuminum cyminum e Lavandula spp.
14
Tentou-se, mas não se conseguiu identificar os nomes das plantas usadas nas curas por tal
pajé.
15
Ela tomou tal decisão quando soube que teria o pé amputado; o marido teve que assinar
um documento assumindo a responsabilidade por qualquer problema com a paciente.
55
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16
As cicatrizes aparecem em partes diversas do pé de Rosário, conforme se pôde observar
em campo e inclusive, fotografar. Apesar de curado e de poder andar, devido à gravidade
das feridas, essa senhora ficou com os movimentos do pé reduzidos.
17
Seu marido apenas provia a sua própria alimentação e a visitava com os filhos.
56
Mulheres Pan-Amazônidas: enciclopédia cooperativa de biografias
5 CONCLUSÕES
REFERÊNCIAS
57
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58
Mulheres Pan-Amazônidas: enciclopédia cooperativa de biografias
59
CAMPOS, Maria Veras Alves de, 1924 - ...
“PRIMAVERAS”: O EXEMPLO DE UMA
TRAJETÓRIA VITORIOSA
1 INTRODUÇÃO
1
Excerto da paródia em homenagem à superiora irmã Urbanina, na música de Santa Lúcia.
2
E muitos frutos bons, também...
61
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Maria Veras iniciou seus estudos aos cinco anos, idade em que
aprendeu a ler, tendo como mestra sua mãe. Aos sete anos foi matriculada
no “Grupo Escolar de Curuçá” e concluiu o curso primário aos onze anos de
idade, na mesma escola. Aos nove anos, em 1933, o governador Magalhães
Barata escolheu alunos que se destacaram nos estudos para irem passar o
feriado de 07 de setembro, em Belém. Foi uma das escolhidas e lembra até
hoje dessa viagem, de canoa, em companhia da professora Cacilda Pinto, pois
3
Na Figura 2, Marizinha e o irmão Manoel de Christo aparecem por ocasião da primeira
comunhão.
63
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para aquela menina a viagem era uma novidade enorme. As maresias [...] e
os enjôos [...] viagem sofrida, mas que valeu a pena e até hoje está encravada
nos subterrâneos da memória de Maria, então pequena, hoje adulta.
Ser normalista, à época, era o desejo de toda jovem de formação social
e religiosa boa, para tanto, seguiu para Belém, a capital do estado, onde
foi aprovada no exame de admissão ao Curso Normal do Colégio Santo
Antônio. Nessa época, morou com a família do Dr. Fabiliano Lobato. Foi um
período sem grandes turbulências, simplesmente a vida seguindo o traçado
do “destino” e ela avançando intelectualmente. Então, também se interessou
pelas artes plásticas, precisamente pela pintura, e a partir de um contato com
Annita Hurley,4 artista curuçaense.
Em 1941, aos 17 anos, diplomou-se professora normalista (Figura 3),
quando regressou a Curuçá. Ali, em 1942, passou a exercer a profissão no
Grupo Escolar “Gonçalo Ferreira”, cuja diretora era a professora já renomada
Olinda Veras Alves, sua genitora. Trabalhou com turmas de 2ª. à 5ª. séries
primárias, durante 25 anos. E o fez com profissionalismo e amor.
4
Ver nesta obra, o capítulo que trata dessa artista, que em parte viveu em Belém, onde
Maria Veras a conheceu.
64
Mulheres Pan-Amazônidas: enciclopédia cooperativa de biografias
5
Ainda não se conseguiu saber mais sobre tal sanitarista, mas pesquisa a respeito continua.
65
LIGIA T. LOPES SIMONIAN • Organizadora
6
Os mesmos chegaram ao Brasil em 1934, a pedido do arcebispo de Belém, Antonio
de Almeida Lustosa (Padres, 1974). Desde 1948, essa irmandade não mais atua na paróquia.
7
E, tanto que a médica que fez o parto, Olga Paes de Andrade, teria dito: “Saiu
uma curuçaense que teve um filho de 4.200 kg e não fez escândalo [...]“ (Campos,
2010a, n. p.).
66
Mulheres Pan-Amazônidas: enciclopédia cooperativa de biografias
Ainda quanto ao âmbito familiar, para cada filho Maria Veras dava um
apelido carinhoso. E tem feito o mesmo quanto os netos e bisnetos. O esposo
faleceu em 2002, mas a companhia dos filhos, 19 netos e seis bisnetos, até
agora, preenche seus dias.
É também pintora. Sim, descobriu-se artista plástica em 2005, aos
81 anos de idade, na escola de pintura Porto Arte. Nesse ambiente de
aprendizado, é chamada “Primaveras”, codinome que representa muito
bem a personalidade dessa dama cheia de vida. E, quanto ao seu interesse
pelas artes, ainda canta! A respeito, participou dos corais São Francisco de
Assis – da Igreja dos Capuchinhos; do coral Delival Nobre – do Tribunal de
Justiça do Estado do Pará e idealizou e dirige o coral “Cantando com Jesus”,
formado por associadas do Apostolado da Oração, no Centro Catequético e
de Promoção Social Santa Izabel da Hungria, no Conjunto Alacid Nunes,
onde reside, em Belém do Pará.
8
Ordem dos filhos, nomes da esquerda para a direita e idades respectivas: Manoel (46
anos), Sávio (48 anos), Newton (64 anos), Libania (54 anos), Olinda (50 anos), Regina
(51), Alcilio (65), Eduardo (56) e Henrique (47 anos).
67
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A Marizinha doce relembra que a ida da família para Belém foi devido
sua aposentadoria e, principalmente, em busca de proporcionar condições
melhores para a educação dos filhos. Na capital do estado, retornou à sala
de aula até 1973. Nessa oportunidade, passou a lecionar as disciplinas
Português, Matemática, História, Geografia, Ciências e Geometria, de 1ª. à
5ª. séries, precisamente nos colégios particulares “Padre Guido del Toro” e
“Santa Rosa Gattorno”.
Em 1972, aos 48 anos de idade, ingressou em um curso preparatório
para prestar vestibular na Universidade Federal do Pará, tendo sido aprovada
no curso de Direito. Diplomou-se como Bacharel, em 1977, com 53 anos
(Figura 5). Sempre foi muito organizada com seus estudos e como não podia
comprar livros, copiava tudo o que o professor ou professora falava. Após
os filhos se recolherem à noite, começava a estudar, por volta de 23 horas.
Seu estímulo para seguir em frente, sempre foi um pensamento: “[...] meus
filhos precisam de um futuro [...]” (Campos, 2010a, n. p.). Afinal, por isso
que a família havia transferido a residência para Belém!
68
Mulheres Pan-Amazônidas: enciclopédia cooperativa de biografias
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9
Localidade ribeirinha do interior de Curuçá.
70
Mulheres Pan-Amazônidas: enciclopédia cooperativa de biografias
São pessoas como essas que inspiram muitas e muitos a buscar o melhor da
vida, o melhor do mundo.
São tesouros humanos vivos. E personalidades vitoriosas que estão a
dizer que vale a pena viver. Assim, fazem seus próximos acordar todos os
dias abençoando e agradecendo a vida maravilhosa que têm.
3 CONCLUSÃO
71
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e abençoada que faz brotar os sentimentos mais belos nos que a rodeiam. Ela
nasceu para isso...
Precisamente, para perfumar ambientes com os cheiros mais nobres,
tal qual flores mais finas e delicadas que, apesar da aspereza do caminho,
enfeitam os passos de muitas e muitos e as/os encorajam a prosseguir. Isso
porque aos 87 anos sabe que vale a pena caminhar. De fato, ao se olhar para
trás, vê-se que os rastros deixados estão cobertos de pétalas floridas, fazendo
da vida uma primavera eterna...
REFERÊNCIAS
CAMPOS, Maria Veras Alves de. Entrevista concedida à Socorro Ruivo. Curuçá,
2010a. (Arquivo pessoal de S. Ruivo).
. Superiora Irmã Urbanina, na música de Santa Lúcia: uma paródia em
sua homenagem. Belém, 19 nov. 2010b. (Manuscrito; Arquivo pessoal de
Maria V. A. de Campos).
. Vista de Camboa, interior de Curuçá. Pintura sobre tela. Belém, 2007.
(Acervo pessoal de Maria Veras Alves de Campos).
HAY, L. O poder das afirmações positivas. Rio de Janeiro: Sextante, 2009. 62 p.
PADRES Crúzios: 40 anos trabalhando pelo Pará. O Liberal, Belém, p. 16,
27 nov. 1974.
72
CHELALA, Ruthe Pinheiro Conduru, 1932-1974
PIONEIRISMO E DEDICAÇÃO NA
BIBLIOTECONOMIA DO PARÁ
1 INTRODUÇÃO
1
Por erro cartorário, a grafia deste último sobrenome aparece como Chalala em sua certidão
de casamento.
2
Isso se traduz nas obras que publicou, nas associações de classe que ajudou a fundar,
bem como pelo papel importante que desempenhou na formação de uma geração de
bibliotecários.
73
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3
A exemplo de seus pais, irmãos, esposo, dentre outros.
74
Mulheres Pan-Amazônidas: enciclopédia cooperativa de biografias
4
Precisamente, percebe-se a influência de seu genitor, agrônomo graduado na primeira
turma da Escola de Agronomia e Veterinária do Pará, com estudos de aperfeiçoamento na
Suíça e França, autor de livros técnicos, e que possuía uma considerável coleção de livros
que ocupavam um quarto da casa onde residiam. Sua mãe, mesmo sem possuir curso
superior era uma pessoa que lia muito, tinha facilidade e sabia escrever bem; por vezes
escrevia documentos para a família Conduru, que mesmo possuindo várias professoras,
recorriam a ela para que redigisse o que fosse necessário.
75
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3 ASPECTOS FAMILIARES
5
A saber, com as professoras Almira Bordalo da Silva e Clotilde Pereira, respectivamente,
mestras requisitadas pelas famílias daquela época pela formação completa que davam a
seus alunos
76
Mulheres Pan-Amazônidas: enciclopédia cooperativa de biografias
77
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por essa encampados. Então, criou-se uma BC completa,6 mas persistia uma
questão, pois não havia servidores para trabalhar.
Chamou-se então a professora Aracy Fiúza da Costa, da Universidade
Federal do Ceará – UFC, para em um curso de três meses, selecionar pessoas
para trabalhar como auxiliar de bibliotecas na UFPA. O edital para a seleção
que constava de um teste de inglês atraiu mais de 100 pessoas das quais se
selecionou 58. Elas fizeram o curso chamado Normalização dos Trabalhos de
Biblioteca e as oito primeiras colocadas foram chamadas pelo reitor Silveira
Neto para organizar a BC da UFPA.
Daise Maria do Nascimento, Lourdes Calheiros, Oneide Abud, Maria
Lucia Pacheco de Almeida, Ruthe Conduru, Regina Ruth Pinto Mota,
Margarida Martins Veloso e Tereza Lobato formaram o primeiro quadro
de funcionários da BC inaugurada em abril de 1962. Em janeiro de 1963,
realizou-se o primeiro concurso vestibular para o curso de biblioteconomia
e esse grupo foi inscrito ex-oficio. O diretor da BC, Clodoaldo Beckmann,
iria precisar de bibliotecários para organizá-la e mais adiante para dirigi-la.
O curso de era de três anos, regulares. Contudo, o último ano precisou
ser intensivo para que as cinco primeiras classificadas no curso seguissem
para o Rio de Janeiro para fazer a parte prática e especializar-se. Fez-se isso
no então Instituto Brasileiro de Biblioteconomia e Documentação – IBBD,
hoje Instituto Brasileiro de Informação em Ciência e Tecnologia – IBICT.
Ruthe (Figura 1) fazia parte desse grupo e só quando ela e as demais
retornaram em dezembro de 1965, já especialistas, é que receberam o grau
de bibliotecárias. Logo em seguida, o reitor nomeou Ruthe como diretora
da BC da UFPA. Isso para o período de 1966-1969 (Figura 2). Mais tarde,
algumas e alguns desses alunos e alunas tornaram-se os primeiros professores
efetivos do CB.
6
Onde basicamente tivesse a parte da informação, dicionários, a documentação toda de
referência, guias e manuais das especialidades, os guias bibliográficos, os abstracts, enfim,
toda essa gama de informação textual e documental para o levantamento de informação.
78
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5 ATIVIDADES DOCENTES
7
Na oportunidade, coube à Marise Conduru, sobrinha de Ruthe e bibliotecária da UFPA,
receber a distinção.
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6 PRODUÇÃO CIENTÍFICA
8
Desta maneira, resolveu-se uma situação que era a dificuldade de transporte, o que era
muito oneroso quanto à vinda de professores até Belém.
80
Mulheres Pan-Amazônidas: enciclopédia cooperativa de biografias
9
Segundo a apresentação deste folheto, a necessidade de escrever esse manual surgiu
quando Ruthe foi convidada a orientar as alunas do curso de Serviço Social da UFPA, na
preparação da monografia final.
10
Especificamente no que se refere ao desenvolvimento cultural e educacional e destacam
os movimentos associativos e as entidades de classe dos bibliotecários.
81
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Mulheres Pan-Amazônidas: enciclopédia cooperativa de biografias
11
Este primeiro tem por missão orientar, supervisionar e disciplinar o exercício e a ética
profissional no país; e estes dois, a de fiscalizar o exercício da profissão, impedindo e
punindo as infrações à legislação vigente
12
Criou-se este pela Resolução nº. 4 (12 jun. 1966), que foi reformulada pela Resolução
nº. 151 (06 mar. 1976) do CFB, isso em decorrência da Lei nº. 4.084 (30 jun. 1966) e do
Decreto nº. 56.725 (16 ago. 1965).
83
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Mulheres Pan-Amazônidas: enciclopédia cooperativa de biografias
REFERÊNCIAS
85
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86
CHUJI GUALINGA, Mónica, 1973 - …
MUJER, INDÍGENA, KICHWA, Y EL RETORNO
DE LOS TIEMPOS BUENOS DEL
SUMAK KAWSAY
Guadalupe Rodríguez
1 INTRODUCCIÓN
87
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Hoy, ella misma es madre y estos son los valores que, a su vez, transmitirá a
sus hijos como legado.
Con el paso de los años, la niña y más tarde la joven Mónica Chuji
veía cómo los territorios iban reduciéndose. Cuando su padre reclamaba,
nadie le hacía caso. Pero cuando la comunidad era la que se movilizaba
como uno solo, entonces las autoridades escuchaban. Como explica Mónica
(Chuji Gualinga, 2011, entrevista, n. p.), “Esas experiencias me formaron en
la firme convicción de que la unidad y la organización era la única forma de
seguir manteniendo los territorios de la comunidad”.
Desde la comunidad ella escuchaba a una emisora de radio, que le dejó
una huella profunda y le permitió darse cuenta de la gran influencia que tenía
la comunicación en la vida de las personas. Esa toma de conciencia fue la que
determinó su inclinación por una profesión donde pudiera hacer uso del
hablar, de la palabra. “Pero también me di cuenta que tal como se escuchaba
las noticias, a la Amazonia nunca se la mencionaba y me hacía pensar que no
existíamos como personas y tampoco como región […]” (Chuji Gualinga,
2011, entrevista, n. p.). Se sostenía en su interior la voluntad personal firme
de revertir esta situación y de que la Amazonia llegara a estar en la mente y el
corazón de todo el planeta. No se equivocaba.
88
Mulheres Pan-Amazônidas: enciclopédia cooperativa de biografias
Pero, sobre todo, algo que llamó la atención a nivel internacional fue el
reconocimiento de los Derechos de la Naturaleza. Éstos nacen desde la
89
LIGIA T. LOPES SIMONIAN • Organizadora
1
Precisamente según Chuji Gualinga (2011, entrevista, n. p.), un diálogo nacional “[…]
honesto y sin condiciones que permita avances reales y respeto mutuo”.
90
Mulheres Pan-Amazônidas: enciclopédia cooperativa de biografias
2
Tukuishimi significa Todas las voces.
91
LIGIA T. LOPES SIMONIAN • Organizadora
Así dijo ella, como que abriendo una puerta a la esperanza de cambios y con
el compromiso que la caracteriza. Sin duda, es gracias a las mujeres como
ella que se hacen posibles esas transformaciones sociales.
92
Mulheres Pan-Amazônidas: enciclopédia cooperativa de biografias
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LIGIA T. LOPES SIMONIAN • Organizadora
4
También, mostraba a la tierra, a la madre naturaleza, a su propia lengua, a su cultura y
tradiciones, al conocimiento ancestral, a su medicina; y el carácter amazónico.
94
Mulheres Pan-Amazônidas: enciclopédia cooperativa de biografias
Los pueblos indígenas tienen una larga lista de reivindicaciones que se han
convertido en altas prioridades en sus agendas de trabajo y reivindicación:
el carácter inalienable, imprescriptible e inembargable de sus tierras y
territorios; la defensa de la biodiversidad y de los ecosistemas, los recursos
naturales, incluso los recursos del subsuelo, los minerales.
95
LIGIA T. LOPES SIMONIAN • Organizadora
Estos mismos indígenas, igual que toda sociedad, poseen sus propias
visiones del mundo, así como prácticas propias de convivencia, instituciones
políticas, jurídicas, económicas y culturales también propias, además de los
propios códigos de ética, principios y valores. A partir de todo esto, han creado
modos propios de supervivencia, los que han mantenido hasta la actualidad,
y que se transformaron en resistencia, en medio a tantas adversidades.
El tradicional Sumak Kawsay se consolida como concepto alternativo
mientras la globalización contemporánea continúa con su carrera
desenfrenada en dirección al crecimiento económico y al desarrollo. Es,
pues, una opción para reemplazar a estas viejas nociones de desarrollo y
crecimiento económico que nace en el contexto del pensamiento indígena,
en un momento en que, precisamente como efecto del mismo “desarrollo”,
el planeta se ha sumido en una gran crisis y se ahondan las inequidades,
mientras todas y todos pagamos las consecuencias. Bajo esta visión, no
se contempla como prioridad número uno y como principio y fin, la
acumulación monetaria5.
El Sumak Kawsay es el objetivo central de los planes de vida
diseñados por los pueblos indígenas. Se basa en los principios de la equidad,
solidaridad, reciprocidad, disciplina, respeto, reconocimiento a la diferencia,
conservación y, sobre todo, el reconocimiento de que somos parte integrante
de la naturaleza, que somos parte de la biodiversidad y que desde esa
perspectiva tenemos la responsabilidad de cuidar nuestro hábitat (Mónica
Chuji, 2010). Es una concepción de la vida que cuestiona el individualismo,
la búsqueda del lucro, la relación costo-beneficio, la utilización de la
naturaleza, la relación estratégica entre seres humanos, la mercantilización
total de todas las esferas de la vida humana.
Es una de las pocas ocasiones en las que en el mundo contemporáneo,
una nación expresa una práctica de convivencia ancestral respetuosa con
la naturaleza, con las sociedades y con los seres humanos, se posiciona de
manera visible en el debate político. Esa realidad se inscribe con fuerza en
el horizonte de posibilidades humanas. E, incluso, ocupa un lugar en dos
textos constitucionales: el ecuatoriano y el boliviano.
5
Lo que ocurre a partir de la explotación indiscriminada del hombre y de la naturaleza.
96
Mulheres Pan-Amazônidas: enciclopédia cooperativa de biografias
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98
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REFERÉNCIAS
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Mulheres Pan-Amazônidas: enciclopédia cooperativa de biografias
101
CONCEIÇÃO, Esmeralda Maria da, 1910 - ...
E SUA NARRATIVA DA MISÉRIA DO MUNDO
DOS FAZENDEIROS DE MARAJÓ
1 INTRODUÇÃO
1
Este igarapé desemboca no rio Arari e no trecho deste mesmo município.
2
Ali, também ela viu nascer os netos, filhos da filha mais velha, Ernestina da Conceição; e
da segunda, Maria Euzébia.
103
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3
Para mais detalhes sobre a vida de Esmeralda. ver o artigo Santos (2008).
4
Especialmente, de mandioca e macaxeira (Manihot esculenta Crantz; Manihot utilissima
Pohl).
5
Dentre eles, Liberato Magno da Silva Castro, dos seus irmãos, Leopoldo da Silva Castro
e Bertino Lobato; e Rui Conduru.
6
Além da memória de Esmeralda, todo um grupo de pessoas antes expulsas participou da
busca de informações sobre tais famílias e com o objetivo de precisar os dados.
7
Muitas outras famílias buscaram refúgio nesse Porto Santo, nas cidades de Cachoeira do
Arari e de Ponta de Pedras, em bairros de Belém, capital do estado e em casa de familiares
dentro do próprio rio Gurupá.
104
Mulheres Pan-Amazônidas: enciclopédia cooperativa de biografias
105
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8
Toda a narrativa a seguir apresentada é de autoria de Esmeralda (Conceição, 2011, n. p.).
106
Mulheres Pan-Amazônidas: enciclopédia cooperativa de biografias
9
Esmeralda recorda claramente sua participação na audiência do Teodoro Lalor de Lima:
“Eu falei que tinha uma vontade para ir em uma Audiência, mas estou sem condição. Eu
não enxergo não. Meu filho me levou na de Teodoro, em Cachoeira do Arari”.
107
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10
Sacoglottis uchi Huber.
108
Mulheres Pan-Amazônidas: enciclopédia cooperativa de biografias
11
Como jogar os alimentos que estavam nas panelas e as estratégias de derrubar casas,
queimar casas derrubadas etc.
12
Verão, inverno.
109
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Uma pausa foi feita por Esmeralda para falar e refletir sua reação. Com
filhas tendo criança recém-nascida, não tinha outra alternativa que falar dos
direitos que não lhe eram reconhecidos e não foi buscar compaixão do autor
do despejo que lhe ofereceu um “lugar” no seu “terreno”.
110
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Como outras famílias, Esmeralda buscou apoio na sua rede social e foi um
compadre que lhe auxiliou por um período.
Mais tarde, a família conseguiu comprar um terreno em Porto Santo,
onde a equipe de pesquisa a visitou e entrevistou. No relato, detalha como
se fixou ali:
O nosso compadre Estevão foi que nos deu a moradia
na casa dele, nós fizemos uma barraca lá até o dia que
meus filhos compraram aqui esse terreno e essa terra lá
do Antonio do Gado e hoje nós estamos aqui.
O Estevão morava bem na ponta da ilha. Primeiro, ele
morava lá em cima, mas era rio, era uma ilha e depois
que começou a secar que não dava mais pra passar, ele
passou pra cá pra defronte dessa ilha da Malvina. Eu não
sei se a casa grande dele ainda ta de pé. Agora que eu
não enxergo eu não sei mais por onde vou... mas ainda
tem um filho do velho Estevão que está morando ai, ele
agora mora pra Ponta de Pedras.
Esse terreno era da cooperativa. Da Nela e do Ângelo,
que eles nos doaram. Nós pagamos simplesmente a
moradia.
Eu ainda fui lá, ainda fui chorar lá pro João Caniço lá
na Boa Vista, porque nos deixaram debaixo da vala, sem
direito de tirar um nada! Como era que eu podia viver
com meus filhos? Passou uns três dias, eu fui lá, eu com
esse meu genro: “Doutor como é que eu posso viver?
O senhor me joga na rua. Me tirou de onde era meu,
porque aquela casa fosse do jeito que fosse era minha!
Me deixa sem nada na vida, sem direito de tirar uma
fruta da terra pra eu me alimentar com meus filhos!”
Ele disse que me levava pro terreno dele: “Eu disse
não vou! Diante do nosso Deus que a minhoca do seu
terreno não vai comer a minha carne. Já que o senhor
me tirou do lugar de onde o meu pai me deixou, então
nem a minhoca da sua terra vai comer da minha carne!
Foi que ele nos liberou pra tirar um resto de açaí que
tinha e que nós apanhamos.
111
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13
Deste modo, eles poderão acessar as várzeas e a terra firme do rio Gurupá expropriadas
pelos fazendeiros.
112
Mulheres Pan-Amazônidas: enciclopédia cooperativa de biografias
14
Tal noção não se explica pela descendência comum, a exemplo de lugar de origem,
consanguinidade ou raça. Mesmo uma língua comum, religião, cultura ou mesmo visão
de mundos semelhantes, não explicam a existência da comunidade étnica.
113
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4 CONCLUSÃO
114
Mulheres Pan-Amazônidas: enciclopédia cooperativa de biografias
REFERÊNCIAS
115
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116
CUNHA, Dercy Teles de Carvalho, 1954 - ...
MEMÓRIA BIOGRÁFICA DE UMA LÍDER
SINDICAL; XAPURI, AC
Marcos Montysuma
1 INTRODUÇÃO
117
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1
Por colocação entende-se a localidade de moradia do seringueiro; usa-se esse termo os
tempos iniciais do seringal na região do Acre. O sujeito que foi colocado num local, que
foi distribuído, recebia uma colocação.
2
O local fica distante da sede do município cerca de 18h de viagem a pé.
3
Também, já fixou residência na cidade de Rio Branco e no interior do Amazonas. Mas
retornou para o mesmo local em Xapuri, onde permanecem seus familiares, e continua
morando na colocação Pimenteira, que é o local onde se sente bem.
4
Aqui, a fonte em história oral é o conteúdo narrado que fica gravado.
5
E, por discorrer sobre a questão eleita para falar, por onde exercita suas interpretações
apresenta o conteúdo dentro de seu modo de ver o mundo.
6
De fato, é um recurso metodológico – por excelência utilizada na escrita de textos
acadêmicos.
7
Não é demais apontar que na escrita de biografias e autobiografias, também recorreu-se
aos seus usos.
118
Mulheres Pan-Amazônidas: enciclopédia cooperativa de biografias
Dercy Teles, assim como seus irmãos, foi alfabetizada pelo próprio
em casa. Para obter os certificados escolares efetuou os chamados provões
do supletivo primeiro grau. Depois frequentou algumas etapas em sala de
aula para cursar matemática, literatura, língua inglesa, biologia, química, para
depois fazer as provas do supletivo do segundo grau. Seu segundo grau foi
obtido aos 30 anos, em janeiro de 1992.
Dercy Teles casou-se com Manuel Stébio de Cavalcanti da Cunha em
cerimônia católica e civil no ano de 1982, separando-se nove anos depois, em
1991. Divorciou-se posteriormente. Do matrimônio com Manuel Stébio,
Dercy Teles foi mãe de sua filha única aos 37 anos, a Tainá de Carvalho
Cunha, que nasceu em 17.08.1991. Dercy passou por um segundo casamento
com Francisco Amaro da Silva, no período de 1999 a 2008.
8
De acordo com o mesmo autor, “Cada individuo não totaliza diretamente a sociedade
inteira, ele totaliza-a por meio de seu contexto social imediato, os pequenos grupos de que
faz parte” (Ferraroti, 1991, p. 174).
119
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Figura 1: Dercy Teles sentada ao centro, com trabalhadores e crianças do seringal Filipinas.
Fonte: Acervo de Dercy Teles, 2009.
9
Onde militou até 1989, mas ressalta que continuou votando nos candidatos deste partido.
120
Mulheres Pan-Amazônidas: enciclopédia cooperativa de biografias
vocação não é pra área urbana, que não é feliz na zona urbana [...]”. De fato,
gosta muito da zona rural, ou melhor, da floresta, porque foi no seringal que
ela se criou10.
Como sinal da quebra de uma vida “tranquila” nos seringais, aponta
que foi nos anos de 1970 que os seringueiros começaram a sofrer dificuldades,
devido às mudanças ocorridas no seringal tradicional. Então, ocorreu a falência
da exploração, em suas palavras, da “borracha nativa”. E foi em fins dessa
década, que se começou a grilar os seringais, comprados e ocupados pelos
pecuaristas das regiões sul e sudeste, para cobrir as terras com pastagens. Para
tal fim, decidiram expulsar os seringueiros daquelas áreas.
Dercy Teles se forma politicamente no enfrentamento dos problemas
que atingiram os seringueiros naqueles idos11. Relata que a certa altura fora
convidada para ser monitora de um grupo de evangelização, na região onde
morava. Aponta que até então levava uma vida sem preocupação, pois a
partir do seu desempenho como monitora foi tornar-se delegada sindical. E
depois, na transição de cargo, da primeira diretoria eleita do STR de Xapuri,
composta por Luiz Damião, Chico Ramalho e Alberto Amorim, é que foi
convidada a encabeçar a chapa, para concluir aquele mandato, entre 1981 a
1982.
Foi no percurso da passagem pela direção do sindicato que sua vida
mudou. Ali trabalhou num projeto piloto de educação na zona rural, que
implantou as primeiras escolas nas florestas de Xapuri, denominado Projeto
10
Comenta ainda que “[...] adora a cidade para ir de vez em quando, fazer o que se precisa
fazer na cidade: passear, curtir um pouco das coisas fáceis que a cidade oferece [...]”
(Cunha, 2006, n. p.).
11
Os problemas que ali surgiam estavam embutidos nos projetos agropecuários, que eram
planejados e desenvolvidos pelos governos militares para a Amazônia. Estes projetos uma
vez implantados na região de Xapuri, ao fazer as primeiras vítimas, logo desencadearam
a mobilização dos povos da floresta. Ela destaca que sua entrada na luta dos movimentos
sociais aconteceu a partir do final da década iniciada em 1970, quando iniciou o trabalho
na igreja católica, seguindo as práticas da teologia da libertação, que mobilizava um laicato
ativo, envolvido na execução de tarefas, antes dispensadas somente ao clero.
121
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Seringueiro12. Nele, Dercy Teles trabalhou por cinco anos, onde contribuiu
para implantar as duas primeiras escolas13.
No ano de 1986, Dercy Teles saiu do Projeto Seringueiro e em agosto
de 1987 foi trabalhar no interior do Amazonas, também com seringueiros.
Ali suas atividades se voltavam para o chamado Movimento de Educação
Base – MEB, cuja ação vinculava-se à Conferência Nacional dos Bispos do
Brasil – CNBB14. Foi naquelas paragens que compreendeu as dimensões do
que chamava de inferno verde, porque era um lugar com muito mosquito
(subordem Nematocera) picando, onde não havia sossego.
Em abril de 1990, retorna ao Acre, para trabalhar por quatro anos como
funcionária da Fundação Cultural desse estado. Ao ser foi demitida em 1995,
retomou para Xapuri. Nesse município, atuou num projeto da Cooperativa
Agroextrativista de Xapuri – CAEX, numa ação politicoeducativa,
mobilizando os seringueiros através do associativismo15.
Quando foi no ano de 2003, fez um concurso para agente comunitário
de saúde da zona rural de Xapuri. Desde então realiza trabalho como agente
comunitária de saúde. Em junho de 2006, concorreu às eleições do STR de
Xapuri, sendo eleita presidenta. Esse mandato durou de 2006 a 2009. Depois,
Dercy se elegeu para o mandato de 2009-2013.
Chico Mendes comentava quando era vivo que seus companheiros
eram muito machistas e que não sabiam aproveitar o potencial da Dercy
12
Então, a sua administração estava a cargo Centro de Trabalhadores da Amazônia – CTA,
em consórcio com o STR de Xapuri, já sob a presidência de Chico Mendes.
13
Daqueles idos rememora que valeram a pena as longas distâncias de doze, quinze horas,
percorridas a pé, entre os diversos seringais que recebiam as escolas do projeto. Sua
participação neste projeto, assim como a dos demais membros da equipe mudou a vida
das pessoas atendidas.
14
Relata que nesse período trabalhava com ribeirinhos, e dadas às características do lugar
atuava numa realidade totalmente diferente daquela vivenciada em Xapuri.
15
Conforme explica em suas palavras “[...] a minha tarefa era fazer educação cooperativista. E
eu trabalhei até 1997. Nesse ano, concluiu-se o projeto e eu retornei para a colocação, para
nossa colocação, onde estou até hoje. Plantando arroz [Oryza sativa], feijão [Phaseoulos
vulgaris – FABACEAE], mandioca [Manihot esculenta Crantz; Manihot utilissima Pohl]
e criando galinha [Gallus gallus domesticus], porco [família Suidae] [...] fazendo de tudo
um pouco” (Cunha, 2006, n. p.)..
122
Mulheres Pan-Amazônidas: enciclopédia cooperativa de biografias
Teles. Isso na sua primeira estada à frente do sindicato16. Ela comenta que
a opinião dos homens mudou, significativamente, em relação a ter uma
mulher como presidenta do sindicato.
Além dos aspectos conjunturais que marcaram o enfrentamento do
latifúndio em expansão, se apresenta uma questão principal que distingue o
período passado e os limiares do ano de dois mil e seis. Historicamente, as
lideranças políticas do sindicato negligenciaram na elaboração e execução de
uma política de formação,17 isso no mesmo perfil que Dercy Teles acumulou
ao longo dos anos de militância. Não ocorreu nenhum trabalho visando
formar novas lideranças, que apresentasse amplo grau de compreensão das
questões políticas para longo prazo e em especial que envolvesse a presença
das mulheres à frente das questões políticas18.
Ao seguir sua linha de raciocínio, Dercy Teles aponta ainda que
um sindicato “[...] é um organismo de luta, é uma entidade que busca a
organização de sua categoria. Principalmente no que se refere à política
social, a política organizacional, em todos os níveis” (Cunha, 2006, n. p.).
Na sua compreensão a ação política está tímida no seio da categoria por falta
de atitude do sindicato para elevar a participação de seus sócios, que seus
esforços caminham neste sentido.
Porém, ainda hoje, quando ocorre uma assembleia de trabalhadores
rurais perdura a presença das mesmas pessoas da década iniciada em 1980
no debate. Não tem ninguém das gerações mais próximas que apresente um
nível bom de compreensão política. Isso ocorre em função da concentração
de poder que aconteceu no decorrer dos anos. E caracteriza um problema
histórico de concentração de poder, de um grupo de pessoas,19 que ao longo
de vinte e quatro anos, conduziu o processo organizativo dos trabalhadores.
16
Na oportunidade, ela concluiu o mandato do titular afastado Luiz Damião.
17
E com consciência da situação, que possibilitasse as demais mulheres seringueiras
desenvolver massa crítica a respeito dos mesmos entendimentos das questões políticas e
sociais.
18
Mas a problematizar-se mais esta questão, ocorre uma dimensão maior na sociedade
brasileira, em que os homens atuam, reprimindo, de varias formas, a participação política
de mulheres nas instâncias de poder.
19
Que ela derrotou nas eleições sindicais.
123
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20
Nos seguintes termos, quando um não estava atuando na direção do sindicato, está numa
posição de mando na CAEX. Quando a pessoa não estava na cooperativa ela atuava na
Associação de Moradores da Reserva Extrativista – AMOREX.
21
Seu trabalho desde o período eleitoral consiste em insistir e discutir a importância da
descentralização de poder, da democratização interna na distribuição dos cargos para
executar os trabalhos no interior do sindicato. Por isso, enfrenta dificuldades que passam
pela compreensão da figura da/o presidenta/e sindical. Considera que mesmo pregando
e praticando a democracia interna e defendendo a mudança de paradigmas na sociedade,
ainda perdura muito a compreensão sobre a centralidade da hierarquia.
124
Mulheres Pan-Amazônidas: enciclopédia cooperativa de biografias
22
Nelas, interage com técnicos do Centro Nacional de Desenvolvimento Sustentado das
Populações Tradicionais – CNPT e do Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos
Recursos Naturais Renováveis – IBAMA.
125
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23
A mesma é falha, porque: não tem meios de transportar a madeira produzida; falta
trafegabilidade durante o ano inteiro; e quando a chuva chega, as vias de acesso não
funcionam.
24
Assim se manifesta: “[...] a gente vive na prática, tem o conhecimento a partir da vivência
com a floresta. Eu tenho no meu quintal uma madeira aguana, que ela tem dez anos, ela
está nessa espessura. Eu acho que tem em torno, de no máximo, de 40 a 50 cm. Isso ela está
no campo, recebendo toda luz. Dentro da floresta, ela vai competir com outras árvores, aí
ela vai ter uma altura triplicada, mas uma espessura inferior às demais. Aí você vendo esses
exemplos você duvida da sustentabilidade. Quando eles (técnicos e políticos) colocam um
prazo de trinta anos, para a floresta se restabelecer e produzir novas árvores, eu tenho essa
dúvida. Mas sou discriminada por contestar” (Cunha, 2006, n. p.).
25
Argumenta que cada sujeito tem o direito de implantar o PMM na sua área; mas não existe
experiência concreta provando que o mesmo é sustentável; e por não haver resultados
concretos quanto à sustentabilidade, ela se posiciona contra. Argumenta ainda que se
políticos/técnicos que defendem o PMM provarem o contrário, ela passará a defender tal
sistema. Todavia, considera absurdo persistirem na aplicação dessa proposta manipulando
as pessoas só para conseguir madeira certificada para o mercado consumidor.
126
Mulheres Pan-Amazônidas: enciclopédia cooperativa de biografias
26
Isto para facilitar o entendimento do que está por trás das palavras e das ações das pessoas.
Na sua compreensão, depois da morte do Chico Mendes, as pessoas fizeram questão
de dar evidência ao nome dele, mas no interior da floresta ninguém recebeu formação
política que mantivesse a sua lembrança viva. A presidenta do sindicato destaca em seu
entendimento, que para os setores que fazem do nome dessa liderança uma possibilidade
de especulação, o líder seringueiro é bem lembrado, mas para os trabalhadores rurais ele
morreu e a vida deles continua como sempre foi. Neste sentido, que Dercy Teles acusa a
falta de um trabalho voltado para formar politicamente as pessoas
27
Dercy Teles considera que, todavia, não existem dados concretos, que possam garantir a
sustentabilidade por meio dessa prática. Defende ainda, que retirar uma peça de madeira
na floresta, por si só já constitui uma prática devastadora. Afirma que sabe disso com
propriedade, porque nasceu e se criou no seringal e tem experiência própria da vida
acompanhando tais fenômenos.
28
Nesse sentido, lembra que o sistema capitalista não está preocupado com preservação
ambiental nem com a cultura do outro, mas com a expansão do capital. E quando se trata
da indústria madeireira, o discurso da sustentabilidade perde sentido, porque o mercado
quer sempre mais madeiras. Diante dessa assertiva, a líder sindical aponta seu modelo
de manejo da madeiras, a saber: consiste no beneficiamento das árvores derrubadas pelo
vento e caídas, ou aquelas que são cortadas para abrir roçados nos lugares onde se planta a
agricultura de subsistência. No entanto, é impossível a vigência de tal panorama quando se
trata de uma indústria que produz em escala. E por isso, tem-se uma ameaça permanente
que pesa sobre as florestas.
127
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3 CONSIDERAÇÕES FINAIS
29
Algumas até danificam o meio ambiente no Brasil, como é o caso do eucalipto (gênero
Eucalyptus) e de um tipo de pinheiro (Pinus spp)..
30
Ainda, considera que parte significativa das pessoas não pensa no futuro das gerações
próximas, e que está preocupada apenas com o seu presente.
31
Por seus cálculos, o local que foi o berço da luta de preservação da floresta conta com
um cenário, onde 99,5% das pessoas defendem o manejo madeireiro. Dercy Teles se
sente apenas uma, dentre as poucas pessoas que tem visão contrária a este modelo de
desenvolvimento econômico para a região. E com a aprovação no Código Florestal atual,
crê-se que ela tem motivos para temer o futuro das florestas.
32
Primeiro nas fileiras do PT, o que preponderou até tempos recentes. Desde então, atua no
PSOL, cuja filiação ocorreu, conforme apontado, no ano de 2011.
128
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REFERÊNCIAS
129
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130
FERREIRA, Maria Hyluisa Pinto, 1917-1981
BIOGRAFIA DE GLÓRIA
Alexandre Cunha
1 INTRODUÇÃO
1
Segundo declarações de Glória, ele morreu nos seringais da Amazônia, deixando órfãos
Glória e seus irmãos gêmeos João Pinto e Joaquim Pinto. O primeiro tornou-se o escultor
mor do século XX na região e, o segundo, desenhista e pintor importante.
2
O Raimundo Moreira das Neves que foi funcionário do Ministério da Agricultura – MA.
131
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3
Sobre isto houve um fato interessante narrado por Do Carmo. Manoel navegava na canoa
de seu pai, a Cristovina, que era uma freteira com que se fazia a linha Belém-Curuçá-
Belém, mas chegando até o Marajó, isso antes da estrada de rodagem Castanhal-Curuçá
implantada em 1937. Certa vez, ao parar em Icoaraci, Manoel resolveu consultar um
vidente chamado Zizi que jogava cartas. Queria saber se seu casamento daria certo.
Zizi jogou e disse que era com essa moça que iria casar-se só haveria um atrapalho, que
adiaria o casamento. Esse problema foi a morte de seu pai Manoel do Carmo, que adiou
o casamento.
4
Aliás, como era costume nos tempos coloniais brasileiro; então os senhores moravam
em suas propriedades no campo, as casas da cidade ficavam fechadas e eram ocupadas
somente nas festas ou outras vindas à cidade.
132
Mulheres Pan-Amazônidas: enciclopédia cooperativa de biografias
5
Da sala, descia-se a uma varanda ampla acimentada, que era seguida por uma cozinha, com
fogão a carvão e lenha e um girau para lavagem das louças e tratamento dos alimentos.
Esse segundo corpo da casa tinha as paredes de taipa rebocada e pintada. Na frente da casa,
flores formavam o jardim (com papoulas (família PAPAVERACEAS), crótons (Codiaeum
variegatum) e rosas (família ROSACEAE) com desenhos de pedra, pelas laterais, salvando
o quintal com criações; e arvoredos frutíferos tomavam conta (com laranjeiras (nome
científico da espécie), mangueiras (Mangifera indica L.), murucizeiros (gênero Byrsomina),
goiabeiras (Psidium guajava L.) etc.), muitas vezes chegando próximo das janelas em um
paisagismo ao qual Glória dedicou toda a sua vida, tanto no cultivo como na difusão. De
fato, ela deixou discípulos na ornamentação vegetal como Odinéa, uma das suas muitas
afilhadas e filhas de criação.
6
O corpo principal erguia-se sobre um alicerce de pedra e toda edificada em madeira, com
paredes de tábuas verticais unidas por ripas que formava um desenho bonito. O acesso
frontal era por degraus de madeira que introduziam uma sala assoalhada ampla, ladeada
por dois quartos, um para o casal, o outra para os agregados.
7
Isto ocorria ou em sua casa ou nos locais mais longínquos onde era chamada, levada
de todos os meios de transporte; e em qualquer horário e sob quaisquer condições.
Precisamente, a pé, de canoa a remo, de moto, em bicicleta, a cavalo, carros dos mais
variados tipos; também, sol a pino ou chuva torrencial da madrugada ou de qualquer hora.
133
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8
Um senhor uma vez disse: “[...] antes de Glória, muitas mulheres morriam de parto
[...]”, principalmente por hemorragias, por posição problemática do feto ou ataques de
albumina.
9
Por exemplo, uma vez em que foi atender uma parturiente na localidade Mocajubinha e
enquanto realizava o parto no quarto, lá fora o marido afiava uma faca para justiçar em
caso de insucesso.
134
Mulheres Pan-Amazônidas: enciclopédia cooperativa de biografias
10
Mães fundadoras do CdeM: da esquerda para a direita: Lília Rocha, Glória, França Cunha,
Jacira Numes.
11
Mãe de Glória, Francisca e seu padrasto Agostinho, moravam com ela em Rio Quente. Em
1955. Francisca adoeceu gravemente e veio a falecer. Houve um féretro triste e concorrido
em Curuçá, onde ela foi enterrada. A mesma abriu a cova que hoje abriga Glória e seu
esposo Manoel do Carmo, além do seu padrasto Agostinho.
12
Ainda, para quase todos arrumaram os empregos que desfrutam até hoje. Isso certamente
devido à influencia política de ambos.
135
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13
Precisamente, muitas destas promovidas por Glória para angariar recursos para as mães
que atendia.
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Mulheres Pan-Amazônidas: enciclopédia cooperativa de biografias
14
Glória criou três CdeM e incentivou outros e, nos dias das mães, junto às autoridades
municipais, fazia comemorações, com recital de poesia, declamações em homenagem às
mães, além de outras atividades.
15
Os médicos de Castanhal e Belém diziam, “[...] quando é cliente de Glória que chega, é
porque o caso é difícil, dificílimo”.
137
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16
Tanto assim, que nem placas alusivas colocava em suas obras, como, entre outras, a feita
no largo do Rosário, a praça Cel. Horácio e a praça Cristo Alves atuais.
17
Nesta sucessão, houve uma cisão no grupo da situação e um vereador, que tinha sido
o mais votado com apoio de Glória e M. do Carmo, queria ser o candidato e lançou-se
contra esse. Essa candidatura contra representava a agregação do mesmo tipo de políticos
contra os quais antes se lançaram M. do Carmo, Glória e os Cunha.
18
Um compadre seu, devedor de favores à Glória, a procurou para dizer da proposta e pedir
que ela somente mandasse um café para ele na prisão, pois a defenderia de tal zombaria.
138
Mulheres Pan-Amazônidas: enciclopédia cooperativa de biografias
Assim, Glória retirou-se de volta para o sítio Rio Quente e lá construiu outra
casa.
Ainda lá foi perseguida por seus opositores que criaram, mesmo sem
amparo legal ou administrativo, uma Comissão Geral de Investigação –
CGI fictícia. Por meio de um funcionário da prefeitura, seus integrantes
enviaram intimações diversas para que Do Carmo fosse depor, o que ele
recusou dignamente. Entretanto, na ultima vez que o estafeta estivera no
Rio Quente, Glória mostrou sua coragem e firmeza. Ao apresentar-lhe o
oficio, Glória pegou em um rifle,19 engatilhou-o, e o apontou em direção
ao individuo e, com palavras enérgicas disse que parasse com tal afronta e
mandasse que seu chefe em pessoa os viesse intimar20.
Glória continuou trabalhando na UMSC como funcionária. E a
atender o povo que a procurava em casa. Em certa época, exerceu a direção
dessa unidade e coordenou o serviço de que tanto necessitava a população de
Curuçá e dos municípios vizinhos.
No âmbito paraense, ela conseguiu eleger o seu candidato a deputado
estadual e mantinha-se na militância política. Quatro anos depois, candidatou-
se à prefeitura como vice de Agnaldo Souza, que tinha como adversário, um
sobrinho. Talvez, essa ligação familiar fez com que Agnaldo abrisse mão para
o parente e diminuísse o empenho na campanha. Mesmo assim, a campanha
foi tensa, fundamentalmente contra Glória, que recebeu ameaças de morte.
No ultimo comício, realizado em frente onde é atualmente o Banco
do Brasil, como última oradora, Glória tomou a palavra no discurso de
encerramento e falou assim como falariam as lideranças mundiais mais
importantes:
Glória teve trabalho para dissuadi-lo da vontade, até porque dizia que a passeata não iria
acontecer, com não aconteceu no formato de enterro.
19
Era um rifle velho chamado de “papo-amarelo” e sem possibilidade de uso; servia de
enfeite na parede da sala.
20
O estafeta retrocedeu em desabalada carreira desabalada, deixando os calçados e sumindo
na estrada, para nunca mais voltar, nem ele nem o seu mandante, com medo da disposição
de Glória e vendo que a farsa estava acabada.
139
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21
Então, construiu-se o prédio da prefeitura, que Manoel do Carmo por estar no final de
sua administração e para não deixar endividada a municipalidade, só começara o que,
confiante, seu sucessor terminaria. Enfim, quando retomaram o poder cumpriram o que
tinham prometido ao povo.
22
Ele a conhecia, pois Do Carmo era prefeito de Curuçá quando fora governador do estado
pela primeira vez.
23
Tais características faziam com que, qualquer pessoa que falasse com ela por alguns
minutos ficasse fascinada com o entusiasmo, a alegria que irradiava, contando os fatos de
sua luta diária para atender o povo.
140
Mulheres Pan-Amazônidas: enciclopédia cooperativa de biografias
24
Ele servira anos antes na UMSC como funcionário do estado; então, decidira cobrar
remuneração a todos os atendimentos fora da unidade, mesmo que o paciente ou seus
familiares fossem paupérrimos; e recebia qualquer bem pelo atendimento dado; inclusive
algumas vezes, nos partos que realizava chegou a mandar matar a ave, dividir ao meio e
levando metade da galinha com pagamento dos seus honorários, mesmo que a paciente
tivesse apenas uma galinha (Gallus gallus domesticus) que comeria no resguardo.
25
Ela foi chamada em processo para depor na então Policia Federal – PF temida do regime
ainda ditatorial. Na oportunidade, seus amigos políticos perguntaram se ela não queria
proteção, ou algum advogado, mas Glória dispensou com muita tranquilidade e disse que
iria só e que saberia se defender.
26
De fato, ela não poderia deixar os medicamentos estragar, pois lhe tinham passado a
responsabilidade sobre tudo isso e, também, não cometeria um crime maior de deixar
uma vida se acabar pelo não uso dos mesmos.
27
Assim, arquivou-se o processo por improcedência e falta de provas. Glória entrou só, saiu
só e vitoriosa para as vidas que salvava, para os sofrimentos que estancava, para alegria e
felicidade que restituiria ao povo.
28
O mesmo localiza-se em frente à cidade de Curuçá, dividido pelo rio do Tanque e pelo
mangue que circunda a área urbana que é diariamente cheia pela maré salgada que enche
e vaza nesse município
141
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3 APORTE CONCLUSIVO
Era o ano de 1980, Glória contava com 63 anos de uma vida intensa
de trabalho, de quem fez muito, como disse uma vez monsenhor Edmundo
Igreja que fora pároco durante anos na mesma área de atuação dela29. Glória
nesse ano continuava à frente da Sociedade; chegaram a mudar o estatuto,
permitindo reeleições e ela era a presidenta. Assim, com Do Carmo, ela
esteve à frente de todas as noites de festas, como anos atrás nos Círios30.
Então, pelas 4h30 do terceiro dia de festa, Glória sentiu-se cansada,
pediu a Manoel do Carmo que a levasse para casa, caminhando com o esposo
pelas ruas desertas e escuras de Curuçá31. Ao chegar à casa, deitou-se e pelas
5h sentiu-se mal. Sua testa pulsava arroxeada. Às pressas foi encaminhada
à Belém, sendo internada no Hospital dos Servidores, onde, ao recuperar-
se recebeu a visita de Alacid da Silva Nunes, o governador do estado. Pelo
diagnóstico, tinha tido uma Angina pectoris. Algumas semanas depois, estava
recuperada e voltou para Curuçá.
29
Esta área compreendia os municípios atuais de Curuçá, Terra Alta, São Caetano, São João
da Ponta e Marapanim, ou um pouco mais, pois ela atuava ainda em parte do município
de Castanhal.
30
Quando, mais jovem, Glória atuava a partir do clube de mães, sempre na sua ligação com
as mulheres, noitadas festivas memoráveis, no bar da santa, uma das vezes trazendo um
conjunto da Policia Militar de Belém, que enchia a praça com seu som, enquanto mesas e
copos mantinham o mesmo diapasão.
31
Estava cansada, mas feliz, as três noites foram um sucesso e fazia planos para o outro ano,
não havia planos para a manhã desse dia.
142
Mulheres Pan-Amazônidas: enciclopédia cooperativa de biografias
32
Por certo, ela percebeu que suas mãos e braços, peritos em salvar vidas, perdiam a força.
Mas, continuava.
33
O médico residente e outro que apareceu por lá aconselharam que ela não poderia ser
transferida para outro lugar e, também, não havia ambulância no local.
34
Também, fora transportada em carro da família, ela que tanto lutara por transporte público
para os doentes.
143
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familiares. Mas quando o corpo chegou, coisa que não se fazia há muito
tempo, os sinos tocaram fúnebres pelas mãos de Rico, um barbeiro da cidade
e seu compadre. Ao final da tarde, levou-se o corpo à Igreja Matriz e de lá
as mulheres o tomaram em seus braços e o conduziram ao cemitério, onde
o mesmo foi enterrado na tumba que abrigava os restos de sua mãe e de seu
padrasto. Ali, repousa eternamente.
Agora faz 30 anos que Glória morreu. Nesse tempo, uma escola de
samba reverenciou a sua memória e seu nome está aposto em uma escola
de ensino fundamental em Curuçá e em uma ala da UMSC que dirigiu.
Nos dias de finados, muitas pessoas levam velas a sua sepultura. A família
criada por ela, não incentivou qualquer tipo de homenagem à memória
ou aos serviços que Glória prestou, mesmo porque, pela voz do povo e no
imaginário desse, ela continua prestando serviços à população, com algumas
histórias contadas, a cada ano.
REFERÊNCIA
144
HURLEY, Anna de Christo Cabral, 1911-1958
ARTISTA PLÁSTICA, CURUÇÁ/BELÉM, PARÁ
1 INTRODUÇÃO
1
Originário do Rio Grande do Norte; foi mais conhecido como Jorge Hurley, pois assim
assinou suas obras; foi juiz em municípios paraenses, inclusive em Curuçá, intendente de
Macapá, desembargador etc.
145
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146
Mulheres Pan-Amazônidas: enciclopédia cooperativa de biografias
2
A mesma era mais conhecida como Anica.
3
Seus pais levaram a filha mais velha e em Cametá tiveram mais três filhas, mas não
ficaram muito tempo, pois nessa cidade perderam a primogênita em afogamento e então
retornaram à Curuçá.
4
O batizado de Anita deu-se no dia 04 de abril de 1915, na matriz da ICAR local (Curuçá.
Livro, 1915).
5
Nesta oportunidade, Annita já se encontrava casada, por isso não se encontra na foto.
6
Esta área é a mesma da orla central da cidade. A destruição do casarão deu-se nos anos
pós-1980 (Ferreira, 2010).
147
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Annita não avançou nos estudos, apesar de ter sido sempre considerada
brilhante. Assim, “Fez seus estudos primários no Grupo Escolar de Curuçá,
revelando sempre inteligência e amor ao estudo” (Suicidou-se, 1958, p. 2). Ao
residir em Belém, interessou-se pelas artes e passou a frequentar o Colégio
Santa Catarina, onde desenvolveu seus dons artísticos e, notadamente,
estudou pintura, bordado, bandolim e piano. Inclusive, conforme lembra
a filha Ana Maria (Martins, 2010), ela a levava junto nas tardes que passava
com as irmãs e, enquanto a mãe se envolvia com as artes, as catequistas
tomavam conta dela.
Casou-se aos 15 anos com Jorge Hurley, sendo a diferença de idade
em relação ao marido de 28 anos7. A festa do casamento foi à moda antiga,
de três dias8. Depois de casada, morou em Curuçá por cerca de 10 anos. A
convivência como o marido pesquisador e autor de obras diversas sobre a
história e a cultura paraense, dentre outras, foi importante para sua formação
e sofisticação cultural.
Nestes termos, além de redigir muito bem, ela lia, opinava e ajudava
a corrigir os textos do marido, o que a filha Ana Maria tem ainda muito
presente em sua memória (Martins, 2010). Por sua vez, Hurley (1931, p.
5) reverenciou a inteligência da esposa em dedicatória feita em uma de suas
obras, a saber: “A’ minha querida esposa Annita [...], espírito culto e brilhante,
offereço este livro [...]”.
Em Belém, com o esposo, Annita morou na rua São Jerônimo,9 a
Malcher atual, e na avenida Nazaré, onde ela aparece na Figura 310. Nessa
cidade, Annita aparece vestindo luto pela morte da mãe (Figura 4). Por anos e
como não tinha filhos, Annita e o marido cuidaram de suas irmãs, pois antes
7
Jorge conheceu Annita ainda muito criança e, mais tarde, quando foi nomeado juiz e
mudou-se para Curuçá, obteve o consentimento da família para o casamento.
8
Apesar da pompa da festa, não se encontrou fotos das bodas.
9
Laíde Cabral Borges, 84 anos e prima de Annita pelo lado paterno, conheceu esta casa da
Annita na rua São Jerônimo; e pelo que revelou, a mesma era ampla e muito bonita, mas
sem luxo; tinha um local onde Annita trabalhava, uma espécie de ateliér (Borges, 2011).
10
Esta primeira casa foi adquirida pelo marido Jorge Hurley, assim que se estabeleceram
em Belém, mas ele próprio a vendeu anos depois. Consta que a segunda residência era
alugada.
148
Mulheres Pan-Amazônidas: enciclopédia cooperativa de biografias
11
No local onde hoje se encontra o hotel Crowne Plaza Belém.
149
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foram por ela produzidas e se encontram no álbum que ela organizou para a
filha Ana Maria12.
Aliás, foi com esta câmera que Annita fotografou alguns momentos
de sua presença no Colégio Santa Catarina. Soube-se que ali ela geralmente
passava as tardes em aulas de arte. E as fotos que aparecem a seguir como
Figuras 8 e 9 são algumas dentre as que ali a mesma produziu.
12
Ana Maria mantém um acervo documental com produções da mãe: obras de arte e um
álbum preparado para ela.
150
Mulheres Pan-Amazônidas: enciclopédia cooperativa de biografias
13
As observações manuscritas foram feitas pela própria Annita.
14
Consta que passara a receber 10% apenas de pensão em relação à aposentadoria do marido;
a filha que estudava no Colégio Santa Catarina teve que ser transferida para o Paes de
Carvalho; ela inclusive vendeu o piano para fazer frente às despesas, mas o comprador
nunca honrou o pagamento.
15
O documento original desta transação encontra-se no APMC.
151
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16
Com o seu falecimento, seu pai vendeu a casa adquirida em Curuçá e colocou o recurso
aferido em uma poupança para a neta, que continuou a residir em Belém. Segundo Ana
Maria (Martins, 2010), o período entre a morte do pai e da mãe e logo após foi de muito
sofrimento; e como era muito jovem, muita coisa não conseguia entender.
17
Embora se tenha tentado e muito, não se conseguiu acesso a tal documento.
152
Mulheres Pan-Amazônidas: enciclopédia cooperativa de biografias
18
Annita fez doações à Matriz da ICAR de Curuçá, a exemplo do vitral da parte frontal
(Ferreira, 2010) e a sua terceira janela do flanco direito. No que respeita a essa última
doação, Hurley (1928, p. 9) assim documenta: “As janellas fôram doadas: [...] Flanco
direito: [...] 3.ª Exma.ª Sra. Anna de Christo Cabral Hurley – cidade de Curuçá”.
19
O padre Benedito, que foi pároco desta igreja matriz, mandou restaurar as obras de arte
ali existentes e inclusive a Via Sacra pintada por Annita e composta por 14 quadros. O
restaurador ainda não foi identificado.
20
Annita Hurley produziu tal tela em Belém e se identificou muito com ela (Martins,
2011); Jorge Hurley contratou um carro de aluguel para levá-la para Curuçá (Martins,
2010). A mesma teria sido encomendada e adquirida por Amélia Mendes Pereira da Silva
(1899-1964), que a doou ao Batistério da matriz da ICAR de Curuçá (Ferreira, 2010).
21
A saber, com imagens de uma nave celestial e anjos.
153
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22
A obra que se encontrava no batistério desta igreja, o padre Antão, um pároco, a jogou em
um poço de lixo e a incinerou. Aliás, foi justamente tal obra que Annita foi buscar em uma
capela do interior do município, depois de saber que um padre a tinha levado da igreja
matriz e doado para tal capela. Ana Maria esteve com a mãe nessa empreitada, mas não
recorda do nome da localidade da capela (Martins, 2010). Ela foi atrás e encontrou a obra
jogada na sacristia da capela do interior; a seguir, pegou-a e a devolveu à igreja matriz em
questão.
154
Mulheres Pan-Amazônidas: enciclopédia cooperativa de biografias
óleo, precisamente: Cristo no monte das Oliveiras; Coração de Jesus; Fé23; Natureza
morta; Paisagem europeia24 (Simonian, 2010-2009). Com Ana Clara, está uma
tela a óleo com a imagem de Santa Terezinha25 (Simonian, 2010-2009). A irmã
Inah tem uma tela com o Coração de Jesus (Simonian, 2010-2009). E, como
ressaltou-se antes, todas essas obras necessitam ser restauradas.
23
A tela com a imagem de uma náufraga era uma alegoria e a preferida de Anita; é de 1940
(Martins, 2010).
24
Reprodução ampliada de um cartão postal.
25
Esta neta também tem um oratório que era de Anita e fora presente de seu avô materno.
26
A mesma conta com a inscrição Annita Hurley, também em relevo alto.
27
Ainda não se conseguiu desvendar com quem Annita aprendeu a fazer as bases dessas
duas obras, se com as irmãs da escola onde estudou artes. Note-se que parte do rouge
que aparece na face esquerda de Santa Terezinha é batom que Maria de Fátima Pinheiro
de Sousa, 60 anos, usava ao beijar a imagem quando pedia a intersecção da Santa para
concretizar seus pedidos feitos anos atrás (Sousa, 2011).
155
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28
Dentre os artistas de destaque nesta área, tem-se atualmente Antonio Coutinho, de Vigia,
pintor de telas e igrejas; e Marileno Sanches, de Belém, escultor e produtor de santos em
madeira, dentre outras obras.
29
Mais conhecida como Marizinha; ver sua biografia nesta Enciclopédia.
156
Mulheres Pan-Amazônidas: enciclopédia cooperativa de biografias
ateliê, tendo se interessado (Campos, M., 2011) e dito que tinha vontade
de pintar uma tela, pois só desenhava e pintava a lápis, ao que a artista teria
respondido: “[...] tu vais pintar” (Campos, M., 2010, n. p.). A seguir, segundo
a mesma Maria Veras, Annita preparou uma tela pequena, tintas, pincéis, deu
orientação de como usar a tinta e Maria Veras pintou a primeira tela30.
É possível que existam outras obras de Annita Hurley e a expectativa
é de que esta biografia, ainda que reduzida, sirva de estímulo para localizá-
las. De todo modo, as buscas só estão no início e precisam continuar. Talvez,
parentes e ou outras igrejas conservem quadros ou murais de sua autoria,
mas isso apenas com tempo se poderá revelar. Inclusive, quem sabe se em
um futuro próximo não se possa ter um museu com sua obra reunida e
o mesmo possa até ter início com a restauração da Via Sacra existente em
Curuçá, Pará.
4 CONCLUSÕES
30
Esta, ela guarda até hoje em casa. Depois de aposentada, Maria Veras voltou a pintar e faz
telas com imagens paisagísticas, como a da p. 70 desta obra.
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REFERÊNCIAS
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Mulheres Pan-Amazônidas: enciclopédia cooperativa de biografias
159
IAÇÁ, tempo imemorial - ...
SOFRIMENTO DE MULHER PRODUZ
O AÇAÍ NA PAN-AMAZÔNIA
1 INTRODUÇÃO
1
“Em toda a Amazônia existem mais de 40 espécies de açaí. São 19 na Colômbia, nove no
Brasil, oito na Venezuela, três na Bolívia e outras nos demais países amazônicos” (Reis,
2010, n. p.).
161
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Note-se, neste ponto, que já são muitas as imagens sobre Iaçá. Assim,
as versões da lenda publicadas em livros ou revistas impressos ou via Internet
são acompanhadas de imagens relativas aos trágicos momentos trágicos do
final de sua vida. Também, outras imagens aparecem associadas aos aspectos
da cultura amazônica, notadamente de Belém do Pará. De todo modo e como
posto por Simonian (2007), todas são fundamentais enquanto elementos
formadores de uma imagética dessa mulher lendária.
Em suas versões distintas, Iaçá surge com uma biografia muito
particular, portanto a mesma se remete à condição de indivíduo, ainda
que lendário, mas plena de complexidades. Aliás, não faz muito tempo,
Velho (2006) ressaltou a importância de se superar as tendências analíticas
que levem às simplificações e esquematizações, notadamente nos estudos
biográficos. Nesses termos, por sua natureza lendária, essa entrada nominal
se insere não apenas em um contexto cultural, mas também, ideológico.
O que segue é uma apresentação da lenda de Iaçá strictu senso. A mesma
aparece em versões distintas, mas a estrutura sequencial dos acontecimentos
se mantem em todas elas. Logo, tem-se uma análise sobre sua importância
no contexto cultural amazônico-estuarino, o que é seguido de alguns pontos
conclusivos.
162
Mulheres Pan-Amazônidas: enciclopédia cooperativa de biografias
163
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Outras versões similares existem acerca dessa lenda, embora em geral mais
sintéticas, como a de Vasconcelos (1992); tentou-se localizar uma versão de
séculos anteriores, mas não se conseguiu chegar a uma documentação inicial
e data respectiva de apresentação ao público.
Interpretações existem para o contexto ambiental e sociocultural da
lenda do açaí. Exemplar é a análise de Batista (2009), em que sugere uma
estrutura política a partir do domínio do cacique e da ordem que ele impõe.
Nesses termos e ao considerar-se,
[...] a teoria sobre o sistema de dominação, tem-se
no cacique o dominante e, no restante da tribo, os
dominados. Não existe marginalidade. O sistema pode
ser classificado como de ordem onde há uma função
política que estabelece o ordenamento social e outra
que se submete ao mesmo. No entanto, pode-se afirmar
que o cacique é um cidadão pleno porque não só possui
direitos como deveres. Ao criar a ordem de matar os
recém-nascidos para que eles tivessem alimentos, não
excluiu a própria neta. Não agiu com favoritismo,
embora tivesse condições de fazê-lo. E a solução para
o problema da tribo veio do sacrifício da família do
cacique que gerou a fonte de alimentos. Portanto, Iaçã
e sua filha deram a vida pela própria gente. A sociedade
tribal indígena, nesta lenda, encontra-se em processo
civilizatório (Batista, 2009, p. 6-7).
2
A primeira imagem tem um approach tipo cartum; a segunda, o enfoque é a la art naif.
164
Mulheres Pan-Amazônidas: enciclopédia cooperativa de biografias
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166
Mulheres Pan-Amazônidas: enciclopédia cooperativa de biografias
3
De todo modo, a pesquisa a respeito continua.
167
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Mulheres Pan-Amazônidas: enciclopédia cooperativa de biografias
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Assim, tais mulheres acabam tendo que assumir a chefia de sua família ou
então são vítimas de violência. E se recebem algum apoio de parte do Estado
quanto a essa primeira situação, no que tange à última, nem mesmo o avanço
nas leis tem evitado a violência contra elas.
4 CONCLUSÕES
170
Mulheres Pan-Amazônidas: enciclopédia cooperativa de biografias
REFERÊNCIAS
FÉLIX de tal. Iaçá e sua filha. (Ilustração). In: SILVA, J. F DA. A lenda do açaí.
View, Manaus, n. 26, p. 10, il., 1999.
171
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LENDAS do açaí: vídeo com encenação. Produção dos alunos do 1º. ano
do Ensino Médio do CEC. N. d. Disponível em: http://www.youtube.com/
watch?v=EX6cKawvhXU.
SILVA, J. F DA. A lenda do açaí. View, Manaus, n. 26, p. 10, il., 1999. (Ilustração
de Félix de tal).
SIMONIAN, L. T. L. Anotações de campo e produção fotográfica sobre as bandeirinhas
indicativas de venda de “vinho” de açaí e sobre outros aspectos culturais envolvendo esse
produto. Belém, 2010-1993. Acervo da autora.
. Ah! Açaí em Belém tem! Texto poemizado. Belém: Editora do NAEA,
2007. 64 p.
VASCONCELOS, G. Açaí inspira compositores. Beira do Rio, Belém, UFPA,
n. 35, p. 4, dez. 1992.
173
JUREWATI, tiempos inmemoriales - …
PRINCESA DE LA LAGUNA GUAYCABA,
AMAZONIA COLOMBIANA
1 INTRODUCCIÓN
1
Su nombre aparece en grafias diferentes: Jurewati e Jorewati.
175
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del final del clásico drama occidental Romeo y Julieta que, aunque de
naturaleza fúnebre, se impone desde el romanticismo.
Cuanto a la metodología, se buscó un abordaje interdisciplinario como
en Teixeira (2004). Las nociones de trayectoria y de biografía (Montagner,
2007) fueron consideradas para esta producción. También se contó con la
perspectiva de representación (Simonian, 2007), a ejemplo de una pintura
reciente encontrada en Florencia, en la que se puede visualizar esa mujer
mítica. La propuesta de Lévi-Strauss (1978, 1967) acerca del mito fue
considerada en la producción textual que sigue, mientras noticias recientes
revelan que este mito es una construcción de pocos años atrás.
A seguir, se discute la perspectiva conceptual acerca del mito y de la
leyenda en cuanto a la posibilidad de producción de biografías de mujeres
míticas. Después, se sitúa el área del Caquetá en lo que se refiere al contexto
ecológico, histórico y social. Sigue a eso, una trayectoria biográfica de
la Princesa Jurewati, una mujer mítica y, finalmente, en la conclusión se
destacan los impactos en la esfera de los recursos naturales y de los valores.
176
Mulheres Pan-Amazônidas: enciclopédia cooperativa de biografias
2
Ejemplar en esta dirección es la relación revelada por Lévi-Strauss (1978) cuanto al mito y
el simbolo en la cultura Cuna de la América Central, notadamente cuando el xamã cuenta
el mito del parto junto a una parturienta que así trae al mundo su hijo con má tranquilidad
y naturalidad.
177
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178
Mulheres Pan-Amazônidas: enciclopédia cooperativa de biografias
3
Ver todo un debate sobre la dicotomia falsa entre el arte y la artesanía en Ortega (1999).
179
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180
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181
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4
Manihot esculenta Crantz; Manihot utilissima Pohl.
5
Pourouma cecropiaefolia.
6
Colónia o nidal de hormigas, a ejemplo de las Polyergus rufescens.
182
Mulheres Pan-Amazônidas: enciclopédia cooperativa de biografias
Más tarde, datos más precisos fueron enviados por la misma Mejía Leudo
(2010b, n. p.):
183
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5 NOTAS FINALES
184
Mulheres Pan-Amazônidas: enciclopédia cooperativa de biografias
esa verdad. Esas, junto a las dos imágenes encontradas, son igualmente
importantes en un proceso diseminador de esa leyenda en cuanto elemento
de la cultura florenciana.
La imagen hecha en un muro y la que aparece en una publicación
de 2010 son elementos a más a dar existencia a tal personaje mítico. Pero,
es temprano todavía para afirmar si los indígenas, que desde algún tiempo
viven en esa área urbana de la Amazonia colombiana, van a apropiarse de tal
leyenda en su proceso de ajuste al medio, pero no imposible. Además, con el
paso del tiempo la población amazónica florenciana sabrá dar un rumbo a las
versiones existentes y de acuerdo con sus intereses en cuanto a su memoria.
REFERENCIAS
185
LIGIA T. LOPES SIMONIAN • Organizadora
186
Mulheres Pan-Amazônidas: enciclopédia cooperativa de biografias
187
LIMA, Dulcinéia – 1970 - ...
LIDERANÇA SERINGUEIRA DA PARTE MÉDIA
DO RIO JURUÁ, AMAZONAS
1 INTRODUÇÃO
189
LIGIA T. LOPES SIMONIAN • Organizadora
190
Mulheres Pan-Amazônidas: enciclopédia cooperativa de biografias
1
Principalmente, mandioca e macaxeira (Manihot esculenta Crantz; Manihot utilissima Pohl).
2
Conforme documentado por Schweickardt (2010), alguns seringueiros que se destacavam
na atividade e que possuíam relações mais próximas com alguns patrões, acabavam se
tornando donos de barcos-regatões pequenos, comerciantes de porte pequeno do rio.
3
Isto para tomar conta do barracão no seringal Samaumeira, um pouco abaixo do Bonfim.
Embora, pudessem todos voltar a estar mais em casa, alguns irmãos de Dulcinéia não
queriam a mudança. Alguns dos filhos-homens mais velhos já haviam se casado e havia
restado apenas filhas mulheres e alguns meninos ainda pequenos em casa que resistiam
um pouco à mudança para outro seringal. De todo modo, a família acabou indo morar no
Samaumeira, mesmo já em tempos precários para a exploração da borracha.
191
LIGIA T. LOPES SIMONIAN • Organizadora
4
E ainda como posto por Gusfield (2005) e Schweickardt (2010), tal ocorre seja por
pertencerem a um mesmo local de moradia, seja, principalmente, por recorrerem a uma
identidade comum, a regras específicas de solidariedade e lealdade, e cuja coesão é a sua
própria razão de ser.
5
Quando Dulcinéia era menina, com 12 anos, as meninas andavam só pelas mãos dos pais.
Ela lembra com certa nostalgia desse tempo já que hoje em dia, segundo ela, meninas
dessa idade já ficam soltas nas festas.
192
Mulheres Pan-Amazônidas: enciclopédia cooperativa de biografias
irmã mais velha de Dulcinéia que era casada com um primo dele. Além das
festas, ela fazia passeios na casa de sua irmã e aos poucos foi crescendo a
intimidade entre os dois.
Quando estavam com seis meses de noivado, foi o período em que
o pai de Dulcinéia aceitou gerenciar o barracão no seringal Samaumeira,
função com a qual sempre havia sonhado. Significava o reconhecimento
do seu trabalho de seringueiro e sua fidelidade ao patrão. Porém, como o
Samaumeira ficava distante do Mandioca onde a família do Manoel se fixara
há tempos, Manoel se adiantou em pedi-la em casamento6.
Marcou-se o casamento para dezembro de 1988, na comunidade
Mandioca. Mas, o pai de Dulcinéia autorizou Manoel a vir buscá-los para
o casamento caso aparecesse um padre pelo rio Juruá, mesmo antes da data
prevista. Assim, em setembro, Manoel apareceu no Samaumeira avisando
que havia um padre fazendo missa no seringal São Sebastião, rio acima, e que
eles precisavam aproveitar a ocasião, o que fizeram7.
Depois de casados, Dulcinéia e Manoel foram morar com os pais dele,
Joaquim Cunha e Noêmia, na mesma casa, embora contassem com uma peça
separada8. A família Cunha trabalhava no verão amazônico, época seca, no
Mandioca e no inverno, época das chuvas, iam para uma colocação no centro
chamada Bom Jardim. No centro e logo após o casamento, Manoel fez uma
casa pequena para eles do outro lado do igapó para morarem separados9. No
verão seguinte, retornando à comunidade Mandioca, voltaram a morar com
os pais de Manoel até que a casa deles ficasse pronta10.
6
De pronto, Dulcinéia achou que era brincadeira, mas aceitou mesmo não estando ainda
bem certa se era o que queria e meio desconfiada por eles terem pouco tempo de namoro.
O fato é que palavra empenhada entre os camponeses é uma questão de honra, não se
volta atrás. Ele falou com o pai dela que aceitou o pedido.
7
Então, subiram o rio e se casaram apenas no religioso, como de costume na região, no dia
26 desse mês e ano. Dulcinéia estava então com 18 anos e Manoel com 20.
8
É comum nesta região que as moças mudam-se para o local onde mora o seu marido,
quando esse tem suas próprias estradas de seringa e sua roça com sua família paterna.
9
Naquele ano a família havia aumentado com a chegada de Birinha, nome carinhoso de
Antônia Raimunda, primeira filha do casal.
Ao seguir a tradição local, quando a casa deles – construída pelo próprio Manoel – ficou
pronta, a peça em que moravam na casa de Noêmia ficou para Moça, irmã do Manoel,
193
LIGIA T. LOPES SIMONIAN • Organizadora
cujo marido havia se mudado para a comunidade. Assim, eles ficaram lá até que sua
própria casa também ficasse pronta.
11
Conferência da Organização das Nações Unidas – ONU para o Meio Ambiente
e o Desenvolvimento Sustentável, ocorrida no Rio de Janeiro, em 1992, que ficou
popularmente conhecida como ECO-92. O livro em questão tem por título “No coração
da Amazônia – Juruá, o rio que chora”, reeditado em 2007.
12
Como não eram acostumados a estas viagens distantes e de vários dias, depois que Manoel
pegou o barco para Carauari e o avião para Xapuri, Dulcinéia ficou apreensiva por acreditar
que ele não iria mais voltar.
194
Mulheres Pan-Amazônidas: enciclopédia cooperativa de biografias
13
Ela lembra que participou intervindo e questionando quando discordava das propostas
colocadas pela coordenadora da reunião.
195
LIGIA T. LOPES SIMONIAN • Organizadora
14
Nunca gostou de levar as meninas para a roça, não porque não fosse coisa de mulher, mas
porque se elas fossem, ninguém fazia o serviço da casa e quando ela chegasse, cansada,
ainda teria que fazê-lo.
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Mulheres Pan-Amazônidas: enciclopédia cooperativa de biografias
pequenos, e o Manoel já estava “no mundo”, expressão que ela usa para suas
viagens, a comunidade a ajudava na lida. Agora, com seus filhos já rapazes e
moças, luta sozinha com sua família nuclear.
15
Seus filhos mesmo, se dedicam à atividade com muito gosto, em função da renda que ela
gera a partir da venda para a ASPROC e pela subvenção paga pelo governo federal, pelo
estado e pelo município.
16
Mesmo estudando à noite, às vezes até às 22h, deita um pouquinho ao chegar em casa,
197
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Como se sabe, a farinha que a família produz, por ser de um roçado pequeno,
é apenas para o consumo e para ajudar a filha mais velha que faz faculdade na
capital. Então, o extrativismo contribui para com a reprodução social dessa
família.
e levanta-se às 23h para ir para a estrada de seringa. Com esse dinheiro da borracha,
Emanuel ajuda sua mãe a pagar a despesa da cantina na comunidade.
17
Sem a Reserva, talvez hoje quase não houvesse mais floresta na região e as famílias que
não estavam envolvidas com a retirada indiscriminada de madeira, nem com as redes de
comercialização do pescado, não teriam do que viver.
18
Com os créditos da reforma agrária disponibilizados pela primeira vez para moradores de
uma Área Protegida – AP.
19
De saneamento básico e construção de poços artesianos nas comunidades.
20
Este é implementado pelo governo do estado do Amazonas e consta de apóio com capital
de giro para a implantação e manutenção das cantinas comunitárias por meio da ASPROC.
198
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Mulheres Pan-Amazônidas: enciclopédia cooperativa de biografias
REFERÊNCIAS
201
MENDES, Laura da Silva, 1918-2009
PROFESSORA E GESTORA ESCOLAR
DA REDE PÚBLICA DE ENSINO,
NASCIDA EM CURUÇÁ-PA
1 INTRODUÇÃO
Uma menina tão branca que chegava a parecer cor de rosa, de olhos
azuis como o céu, Laura da Silva Mendes nasceu na vila conhecida como
Ponta de Ramos, no município de Curuçá, numa manhã, como a própria
fazia questão de mencionar. Era o dia 6 de março de 1918, sua mãe foi Maria
da Silva Mendes, de quem o parto foi assistido por Raymunda Guerreiro, que
era irmã da primeira esposa falecida1 de seu pai, parteira competentíssima da
vila e a quem com desvelo chamava de “Tia Guerreiro”.
Era filha do português naturalizado brasileiro, o tenente Luiz
Rodrigues Mendes, comerciante influente na época e na região. Ela contou
com apoio e cuidado de seus pais, que a fizeram muito cedo frequentar a
escola regida na época pela cunhada de Laura, a professora Mariana de Sousa
Mendes. Sua alfabetização deu-se nesse contexto.
O seu batismo deu-se na igreja matriz de Nossa Senhora do Rosário,
em Curuçá, no dia 19 de janeiro de 1919. O padre José Maria do Lago oficiou
o batismo e Domingos Antonio Pereira da Silva e Amélia Mendes Pereira da
Silva foram os padrinhos. Esses, por sua vez, eram respectivamente cunhado
e irmã.
Laura realizou seus estudos primários na cidade de Curuçá. Nessa
época, ela passou a morar na residência de seus padrinhos de crisma, a
1
Cujo nome era Maria do Rosário Ferreira Mendes.
203
LIGIA T. LOPES SIMONIAN • Organizadora
2 A PROFESSORA
2
Tais bailes aconteciam nos salões do prédio da prefeitura municipal anterior, que se
localizava onde atualmente encontra-se o prédio da câmara municipal, ou seja, na praça
Coronel Horácio. Na época, comentava-se que Laura da Silva Mendes era umas das
moças mais belas da sociedade curuçaense.
204
Mulheres Pan-Amazônidas: enciclopédia cooperativa de biografias
205
LIGIA T. LOPES SIMONIAN • Organizadora
Prancha I
Figura 1: Laura 20 anos, Figura 2: Laura da Silva Mendes, Figura 3: Foto da licenciada
usando o uniforme da em meio à moças amigas3; 1940. Laura da Silva Mendes.
Instrução pública – IP. Fonte: AP de LdaSM. Fonte: AP de LdaSM.
Fonte: Arquivo pessoal –
AP de LdaSM.
3
3
A penúltima da esquerda para a direita.
206
Mulheres Pan-Amazônidas: enciclopédia cooperativa de biografias
INSTITUIÇÃO
CURSO PERÍODO LOCAL
PROMOTORA
Revisão Gramatical Departamento de Ensino 1971 Belém
Primário – SEDUC-PA
Administração e Gerência Programa Intensivo de 1972 Belém
Mão-de-Obra – PIPMO;
Departamento de Ensino
Médio do Ministério de
Educação e Cultura –
MEC
Educação Sexual Associação dos 1973 Belém
Professores do Instituto
de Educação do Pará
APIEP
Licenciatura em Pedagogia Universidade Federal do 1973 Belém
e Administração Escolar Pará –UFPA
Formação de Secretários de Centro de Educação 1974 Belém
estabelecimentos de Ensino Técnica da Amazônia
– CETEAM;
Departamento de Ensino
Médio – MEC
Encontro de Diretores de Coordenadoria dos 1977 Belém
Escolas de 1º. Grau Órgãos Regionais e de
Cooperação Financeira –
SEDUC-PA
Atualização de secretários CETEAM; 1978 Belém
de escolas de 2º. Grau Departamento de Ensino
Médio – MEC
Atualização Pedagógica para CETEAM; 1981 Belém
Docentes do ensino de 2º. Departamento de Ensino
Grau Médio – MEC
Atualização em Legislação CETEAM; 1981 Belém
do Ensino Aplicado ao 2º. Departamento de Ensino
Grau Médio – MEC
Tecnologia Educacional Fundação Educacional do 1981 Belém
Pará – FEP; SEDUC-PA
Treinamento para o FEP; SEDUC-PA 1981 Santarém
Sistema de Organização
Modular de Ensino
Fonte: AP de L. Mendes; Arquivo Público Municipal de Curuçá.
207
LIGIA T. LOPES SIMONIAN • Organizadora
4
Na parte abaixo das árvores maiores, tem-se uma praça totalmente destruída.
208
Mulheres Pan-Amazônidas: enciclopédia cooperativa de biografias
Até 1980, Curuçá não possuía uma escola que oferecesse o curso
de formação de professores ao nível de magistério, sendo o número de
professores leigos no exercício da docência escolar na rede pública, tanto
municipal quanto estadual, muito grande. Isso causava desconforto para
aqueles educadores que almejavam avançar nos estudos e conseguir sua
qualificação profissional. Inclusive, para estudar, eles tinham que deixar o
município e se dirigir à cidade de Castanhal, o que se fazia com dificuldades.
A professora Laura da Silva Mendes, mesmo residindo em Belém,
onde exercia a docência e a função de secretária do IEP, decidiu lutar pelo
interesses de seus conterrâneos sedentos de formação profissional adequada.
Assim, ela se empenhou e conseguiu que se implantasse uma escola de 2º.
grau que oferecesse o curso de magistério, cujo objetivo era qualificar os
professores leigos do município. Em 1979, ela fora convidada a retornar a
Curuçá para compor a comissão responsável pela implantação de tal escola.
Por sua experiência na área de gestão escolar e formação profissional
técnica, Laura da Silva Mendes foi indicada para exercer a gestão de tal
unidade de ensino especializada, que recebeu o nome de Escola de Ensino
Médio “Profª. Olinda Veras Alves”. Cerca de um ano depois, ela foi nomeada
209
LIGIA T. LOPES SIMONIAN • Organizadora
5
O professor Manoel Viegas Campbell Moutinho foi quem assinou esta portaria, isso na
condição de superintendente geral da Fundação Educacional do Pará – FEP.
6
Na terceira fila, sentada e de óculos, a terceira da esquerda para a direita.
210
Mulheres Pan-Amazônidas: enciclopédia cooperativa de biografias
Prancha II
211
LIGIA T. LOPES SIMONIAN • Organizadora
212
Mulheres Pan-Amazônidas: enciclopédia cooperativa de biografias
Prancha III
Figura 9: Atendendo em seu gabinete, Figura 10: Aos 91 anos, a Profª. Laura ainda demonstrava
como Chefe do Departamento seu sentimento patriótico participando das cerimônias
Municipal de Educação, 1994. cívicas7. Fonte: AP de LdaSM.
Fonte: AP de LdaSM.
7
5 A MORTE E A IMORTALIDADE
7
Da esquerda para a direita: Profª. Maria Campos, a Profª. Laura, o autor deste artigo,
Maria Lucimar Sousa Santos, Darcy Alves de Lima e o Vereador Egídio Nascimento Paes.
213
LIGIA T. LOPES SIMONIAN • Organizadora
REFERÊNCIAS
8
Ver este poema no Anexo 1, que inclui outro.
214
Mulheres Pan-Amazônidas: enciclopédia cooperativa de biografias
Professora Laura
por Telma Coelho, 2010
215
LIGIA T. LOPES SIMONIAN • Organizadora
Personagem da história
216
Mulheres Pan-Amazônidas: enciclopédia cooperativa de biografias
217
MERIAN, Anna Maria Sybilla, 1647-1717
NATURALISTA Y PINTORA: ENTRE EL ARTE
Y LA CIENCIA EN EL SURINAME
Patricia Tovar
1 INTRODUCCIÓN
1
A seguir ella será referida como María Sybilla Merian o como María Sybilla.
2
Insectos (gén. Cantharis L.); orugas (família NOCTUIDAE); ranas (RANIDAE); lagartos
(gén. Abronia, Gray).
219
LIGIA T. LOPES SIMONIAN • Organizadora
De hecho, trece años tenía cuando se dio cuenta de que los insectos
no surgían espontáneamente del barro de la tierra, ni de la materia en
descomposición, como se creían algunos, y como si fuera por arte del
demonio. Con cuidado los recogía a escondidas de sus vecinos, para que
no la acusaran de brujería, los guardaba, los alimentaba, los observaba y los
pintaba. Asi, llegó a la conclusión de que las misteriosas creaturas aladas que
llegan en verano a los campos europeos dejaban diminutos huevos, y que de
allí emergían larvas3.
Cuando emprendió su viaje a América del Sur, María Sybilla (Figura
1-3) tenía ya gran reputación en Europa, había publicado importantes obras
y era común verla en los círculos de naturalistas, con quienes mantuvo una
nutrida correspondencia, además de hacerse visitante en el recién creado
Jardín Botánico de Amsterdam. Para esa altura llevaba varios años divorciada
de Johann Andreas Graff, diez años mayor que ella, de profesión dibujante y
grabador, procedente de una familia notable de Nuremberg. Ya María Sybilla
había nacido en Frankfurt am Main, en el seno de una familia de pintores y
artistas.
3
Entonces, poco a poco y en un proceso lento, comían vorazmente, crecerían, tejerían un
capullo y se transformarían en “aves de verano”, como llamaban a las mariposas en esa
época.
220
Mulheres Pan-Amazônidas: enciclopédia cooperativa de biografias
221
LIGIA T. LOPES SIMONIAN • Organizadora
que estaba a cargo de las mujeres y que ella podía observar fácilmente. Eso
se ve reflejado en sus primeras pinturas, que fueron del gusano de seda
alimentándose de las hojas de la morera (Morus nigra). Su segundo libro fue
un tratado sobre las abejas, constantes, industriosas y útiles en producir la
miel, agradable “don de dios”, como lo describió en uno de sus escritos.
Nadie en su familia se sorprendía de las excentricidades que se le
notaban desde pequeña, ni de que pasara horas observando a los extraños
objetos que había en el Gabinete de Curiosidades que tenía su família. Eso era
una espécie de mini museo, que estaba de moda entre las clases acomodadas
de Europa. De igual manera, la aristocracia encargaba mariposas y otros
insectos para sus colecciones privadas, pagando a veces sumas exorbitantes.
A los dieciocho años María contrae matrimonio con Johann Graff,
uno de los estudiantes favoritos de la escuela de su padre, y se traslada a
Nuremberg, donde nace su primera hija, llamada Johanna Helena. Allí
continúa su trabajo de recolección, observación y pintura de flores e insectos
y se dedica a enseñar su técnica y sus conocimientos a un grupo selecto
de jovencitas de la ciudad. Se rodea de otras mujeres también pintoras e
ilustradas como ella, y establece una gran amistad con Dorothea María
Auerin, quién será la madrina de su segunda hija y a quién bautizará con el
mismo nombre.
Su vida matrimonial no era muy feliz, razón por la cual solicita el
divorcio. Eso era algo posible, pero no muy corriente a una mujer de su
época. Así, ella retorna a firmar sus trabajos con su apellido de soltera y,
para sostenerse con dos hijas, vende bordados y dibujos, hace uno que otro
retrato, además de publicar un libro de flores de jardín que se suponía serviría
como muestras y patrones para labores de bordado.
Dos obras ilustradas de ciencias naturales mui importantes vieron la
luz en esta época; El teatro de insectos y otras criaturas menores, de Jan Swannerdam,
y La Historia General de los Insectos, publicada en el año 1669. Ese último
libro intentaba clasificar diferentes especies y mostraba algunos momentos
de transformación. Pero se centraba en la disección de los animales y sus
diferentes órganos internos, vistos posiblemente a través de un microscopio.
222
Mulheres Pan-Amazônidas: enciclopédia cooperativa de biografias
223
LIGIA T. LOPES SIMONIAN • Organizadora
aunque nacida Luterana, junto con su madre y sus hijas se une a la comunidad
de los Labadistas, radicada en Frankfurt, entregando todos sus bienes y
talentos terrenales al servicio del grupo. Allí vive en un ambiente austero
y de mortificación, alejado de los placeres del mundo, en donde se entera
de los esfuerzos de varios de sus correligionarios, así como de sus intentos
en asentarse en las colonias convirtiendo a las tribus y a los esclavos que allí
vivían. Seis años duró esa experiencia, hasta que deja atrás la austeridad y el
misticismo y se muda a la ciudad de Ámsterdam.
En el siglo XVII, pocos fueron los naturalistas que viajaron a tierras
distantes con el propósito de observar directamente a los especímenes, tomar
notas, bien como recogerlos. Cuando María Sybilla tenía apenas un año, se
publicó la Historia Natural de Brasil, resultado de una expedición auspiciada
por el príncipe Johan Maurits of Nassau-Siegen. Él también viajó con dos
médicos ilustres, con el fin de observar directamente las cosas raras y curiosas
de las colonias.
De igual manera, los mercadores de la Compañía Oriental de las
Indias Holandesas recibían encargos de importantes notables de la época.
Con el fin de impresionar a sus amigos, ellos querían oír de primera mano
y obtener muestras para sus colecciones, como objetos, animales, plantas y
minerales. Con excepción del viaje de María, la gran parte de las expediciones
eran financiadas por la realeza o por personajes de muchos recursos, que no
querían ni podían hacer el viaje ellos mismos.
La calidad y variedad del trabajo de Merian le habían permitido vivir
confortablemente como mujer divorciada que se hacía cargo de dos hijas.
Sin embargo, esto no era suficiente para su viaje a Surinam, acompañada
de una hija soltera. Por tanto, decide vender muchas de sus propiedades y
obras a coleccionistas. Y como mujer independiente, solicita un préstamo,
el cual garantiza, ya que tardaría varios años en pagarlo, pues en prenda se
respaldaría con lo que pudiera traer a su regreso.
Un viaje transatlántico de esta envergadura necesitaba varios años de
preparación y se corría toda clase de riesgos. Las tormentas, los piratas y otras
desgracias acechaban a los viajeros, cosa que hacía necesaria la elaboración de
224
Mulheres Pan-Amazônidas: enciclopédia cooperativa de biografias
225
LIGIA T. LOPES SIMONIAN • Organizadora
4
Aquellos que siglos después la antropología llamaría de informantes.
226
Mulheres Pan-Amazônidas: enciclopédia cooperativa de biografias
5
Ejemplos de esto era lo que escribía sobre la división del trabajo en el cultivo de plantas,
las tareas asignadas a cada género y los extraños rituales de iniciación; también reportaba
otros usos de los insectos para demostrar el valor y la fortaleza; o en el caso de los hombres,
cuyas esposas acababan de dar la luz y que, en tanto, ellos eran los que se recluían en sus
hamacas por varias semanas, como si estuvieran en un capullo.
227
LIGIA T. LOPES SIMONIAN • Organizadora
Figura 6-8: (1) Dibujo de la papaya (Carica papaya); (2) dibujos en estampillas de los EUA,
(3) Cassava con polilla sphinx (Sphinx ligustri) y Boa constrictor (todos hechos por Merian.
Fuentes: (1) London: The Royal Collection; (2) Frankfurt am Main: Städel Museum; (3)
Merian (1705, apud Davis, 1995).
228
Mulheres Pan-Amazônidas: enciclopédia cooperativa de biografias
6
El fue dedicado a la Pia Memoriae Matris Ejus Maria Sibylla Merian y para los amantes de
los insectos.
229
LIGIA T. LOPES SIMONIAN • Organizadora
4 CONCLUSIONES
230
Mulheres Pan-Amazônidas: enciclopédia cooperativa de biografias
231
PRINCESA DO IPOMONGA – desde
tempos imemoriais - ...
ENCANTAMENTO NAS TERRAS DE CURUÇÁ
1 INTRODUÇÃO
233
LIGIA T. LOPES SIMONIAN • Organizadora
234
Mulheres Pan-Amazônidas: enciclopédia cooperativa de biografias
235
LIGIA T. LOPES SIMONIAN • Organizadora
1
Uma bebida que tem por base a Paullinia cupana Kunth.
236
Mulheres Pan-Amazônidas: enciclopédia cooperativa de biografias
2
Objeto de uso doméstico produzido a partir do fruto da cuieira (Crescentia cujete L. –
BIGNONIACEAS).
237
LIGIA T. LOPES SIMONIAN • Organizadora
238
Mulheres Pan-Amazônidas: enciclopédia cooperativa de biografias
3
O mesmo é autodidata, tem 36 anos, nasceu em Belém e há 12 anos reside na cidade de
Curuçá.
239
LIGIA T. LOPES SIMONIAN • Organizadora
240
Mulheres Pan-Amazônidas: enciclopédia cooperativa de biografias
A pedra que lhe foi dada como amuleto não poderia ser
destinada para nenhuma outra pessoa. Era um amuleto,
uma proteção para você. Uma vez que você não quis
ficar com ela, é preciso que a devolvas a mim. Tens um
prazo de sete dias a contar de hoje para me devolvê-la.
Caso contrário, tuas noites serão mais angustiantes que
a de hoje.
Caminhando ao longo da praia a bela princesa
desapareceu. O temeroso pescador, mesmo depois da
extraordinária visão que teve ainda tentou a pescaria.
Mas nessa noite, “a maré não estava pra peixe” (Oliveira,
Daniel Marques de, 2002, entrevista).
Poucos peixes foram pescados. Não foi nada fácil convencer o Aguinelo a
desfazer o negócio e devolver a pedra. Porém, os argumentos apresentados
pelo pescador a quem a pedra fora dada naquela noite na beira da praia e
pelo cabo Daniel eram irrefutáveis o que fez com que o Dumas devolvesse a
pedra aos dois amigos para que esta pudesse ser devolvida ao mar.
Ao seguir a orientação que recebera da princesa, o pescador foi
fazer a devolução da pedra para as águas do mar. Remou mar afora. Ao se
ter distanciado um pouco da margem pegou a pedra e a soltou no mar.
Diferentemente do que ocorrera nos momentos anteriores, a pedra não
ficou a flutuar. Imergiu.
241
LIGIA T. LOPES SIMONIAN • Organizadora
3 CONCLUSÕES
REFERÊNCIAS
4
Índias, boiadeiras, princesas, prostitutas etc.
242
Mulheres Pan-Amazônidas: enciclopédia cooperativa de biografias
OLIVEIRA, Daniel Marques de. Relato sobre uma pedra encantada de Ipomonga.
Curuçá, 2011.
OLIVEIRA, J. C. de. Folclore amazônico, lendas... Belém, Ed. São José, 1951.
SANTOS, R. C. de M.; BRITO, J. F. V. Pedra, tempo, água, mulher e cerveja:
elementos do caos e do cosmo nas narrativas orais de Curuçá e Irituia. Castanhal,
2002. 42 f., il. TCC (Graduação em Letras) – Universidade Federal do Pará,
Castanhal, 2002.
SIMONIAN, L. T. L.; ALBERTO, D. P. S.; BATISTA, I. M. DA S.;
BAPTISTA, E. R. Pacamorema / RESEX Marinha Mãe Grande: terra de
feiticeiras ou metáfora para impasses ao desenvolvimento? Belém: Editora
do NAEA, 2011. 142 p., il. [E-book].
243
SADALA, Maria de Lourdes Gomes – 1930-2005
BALATEIRA, PROFESSORA, VEREADORA DE
ALMEIRIM/PARÁ
1 INTRODUÇÃO
245
LIGIA T. LOPES SIMONIAN • Organizadora
como ocorria ao relatar sua trajetória política. Como mãe de sete filhos,1
Marina demonstrou o zelo ao lidar com a formação desses e a tristeza por
nem sempre tê-los por perto. Contudo, sua atuação nessa função teve o
reconhecimento por quem a teve como mãe. Por certo, os desafios dessa
mulher revelam práticas que são comuns a tantas outras que vivenciam os
dilemas de atuarem em espaços diferentes e desenvolvendo tarefas múltiplas
para além daquilo que lhes é atribuído por serem mulheres.
Desenvolveu-se o percurso metodológico desta pesquisa com
utilização de entrevistas e conversas informais, como em Langness (1973)
e Oliveira (1996), com Marina Sadala, seus filhos e pessoas idosas do
município. Fez-se as entrevistas com ênfase em questões que permitissem
a análise e compreensão da vida de Marina em suas atividades produtivas e
sociopolíticas. Procedeu-se desse modo tanto no âmbito do espaço doméstico,
quanto no espaço público do município de Almeirim. Conforme orientação
de Alberti (2000) e de Zimmermann e Medeiros (2004), a preocupação foi
com a produção de um texto biográfico.
Utilizou-se a entrevista não dirigida como um instrumental
metodológico valioso. Isso porque a mesma torna possível “[...] apreender o
que as próprias pessoas julgam que seja importante ou que, pelo menos, elas
pensam ser importante dizer ao antropólogo” (Langness, 1973, p. 67). Assim,
a pesquisa desenvolvida nesse estudo baseia-se em estudos etnográficos e
fontes históricas não escritas.
Trabalhar com história oral implica em utilização de uma metodologia
que enfatiza a memória. Entretanto, não se trata apenas do que é lembrado
pelas pessoas, mas também os seus esquecimentos (Assmann, 2003). O
destaque tanto às lembranças quanto aos esquecimentos se justifica dentre
outras coisas pelo fato de que ambos são elementos constitutivos da memória,
seja ela individual ou coletiva.
Esta ênfase aos estudos com base antropológica e da história oral
vincula-se ao fato de que a historiografia oficial trata o passado de Almeirim
1
Ver mais detalhes mais adiante.
246
Mulheres Pan-Amazônidas: enciclopédia cooperativa de biografias
2
Dentre as exceções, ver a tese de doutorado de Pedroso (2004).
3
Revolta de trabalhadores na extração da balata, que ocorreu no início do século XX, a
partir do rio Jari, mas se estendendo à localidade de Arumanduba e à cidade de Belém.
247
LIGIA T. LOPES SIMONIAN • Organizadora
2 A PARLAMENTAR
Muita gente fala mal, mas ele não era mau. Quando a
pessoa é má não ajuda seus empregados. Ele obrigava as
crianças a estudar e os grandes também, e conseguiram
ter uma profissão. Pagava professora e exigia relatório.
Não tinha criança na rua, o capataz Sombreira ia à casa
4
Esta prática solidificou-se no início do período republicano, por meio produtores rurais
de porte grande que mantinham o controle político local via uso do poder econômico e
da força.
248
Mulheres Pan-Amazônidas: enciclopédia cooperativa de biografias
249
LIGIA T. LOPES SIMONIAN • Organizadora
250
Mulheres Pan-Amazônidas: enciclopédia cooperativa de biografias
5
Esta “resistência” pode ser vislumbrada em sociedades tradicionais e não tradicionais
diversas. Ao discutir experiências passadas e desafios políticos das mulheres em geral,
e das indígenas em particular, Simonian (2009, 2005) afirma que elas têm integrado,
mesmo que de maneira velada, os processos organizativos do fazer política.
251
LIGIA T. LOPES SIMONIAN • Organizadora
O que se evidencia é que sua participação ao lado do marido teve início desde
o começo de seu casamento e que só não perdurou devido a problemas de
saúde. Mais tarde, quando diversificou-se as atividades para além da extração,
e Ofir se tornou comerciante da balata, além de outros fatores pessoais e
afetivos, foram várias as alterações no cotidiano desse casal.
Todavia, não se percebeu em sua fala qualquer rancor em ter ido
trabalhar na extração da balata e em ter enfrentado todas as adversidades
advindas dessa atividade produtiva. Cabe destacar que os depoimentos orais,
segundo Janotti (1988), possuem uma pluralidade de aspectos subjetivos,
posto que a memória envolve uma carga emocional forte, que interfere na
narrativa e na sua interpretação. Possivelmente, isso ocorreu com Marina
ao “esquecer” de sua vida nos balatais devido a essa carga emocional que as
lembranças desse período poderiam trazer-lhe.
Ainda em relação a tal atividade, é importante ponderar que o trabalho
desenvolvido por mulheres nem sempre é reconhecido e valorizado por
elas próprias (Simonian, 2006). Como ocorre com o trabalho agrícola
6
Como posto por Simonian (2006), em Almeirim, Marina foi a única extrativista que
conseguiu se aposentar como soldada da borracha, ou seja, por ter trabalhado como
extrativista no período da II Guerra Mundial.
252
Mulheres Pan-Amazônidas: enciclopédia cooperativa de biografias
4 MARINA MÃE
7
A desvalorização do trabalho feminino pela própria mulher também está presente, por
exemplo, na pesca como demonstram os estudos de Cardoso (2007), Alencar (1993) e
Maneschy (1995), e em outras atividades produtivas (Simonian, 1995; Campbell, 1996).
8
Os demais filhos moram em Monte Dourado (distrito de Almeirim), Macapá e Rio de
Janeiro. O que eles têm em comum é o fato de terem acompanhado mais de perto Marina
nos últimos anos de sua vida. Com problemas respiratórios crônicos, ela precisou vir
mensalmente a Belém, para acompanhamento médico adequado.
253
LIGIA T. LOPES SIMONIAN • Organizadora
Figura 2: Marina e Ofir (ver setas) no casamento da filha Wanda Sadala, em 1966.
Fonte: Arquivo pessoal de Fifi Sadala.
9
Ofir Sadala teve mais sete filhos com Neide Sadala.
254
Mulheres Pan-Amazônidas: enciclopédia cooperativa de biografias
Fifi é o filho mais novo do casal Ofir e Marina Sadala. Ele ficou com
sua mãe em Almeirim e a acompanhava sempre que ela precisava se deslocar
para Belém. Traz muitas lembranças de sua vida em família e após a separação
de seus pais, seguia com a mãe Marina nas atividades que ela desenvolvia.
Fez referência as etapas da vida e as dificuldades enfrentadas em Belém, na
casa da Quintino. Nas Figuras 3 e 4, tem-se duas fotografias quando Marina
estava com 53 anos e com 74 anos.
5 CONCLUSÕES
255
LIGIA T. LOPES SIMONIAN • Organizadora
REFERÊNCIAS
256
Mulheres Pan-Amazônidas: enciclopédia cooperativa de biografias
257
LIGIA T. LOPES SIMONIAN • Organizadora
258
SILVA, Antônia Maria Gomes da – 1952 - ...
MULHER DOS RIOS E FUROS DE BELÉM
1 INTRODUÇÃO
1
Beatriz, Thiago e Tobias são filhos de Adriana Maria Gomes de Lima e Flávio Gomes de
Lima, filhos de Antônia.
259
LIGIA T. LOPES SIMONIAN • Organizadora
2
Isto, durante o período da pesquisa exploratória nos meses de março e abril de 2011.
3
Isto por meio de um protocolo de 10 perguntas abertas relacionadas com sua trajetória
de vida pessoal, profissional e sua relação com a vida comunitária da ilha Cotijuba. As
respostas foram dadas, em parte pessoalmente, por meio de uso de correio eletrônico
e telefonemas, tendo em vista que Antônia reside atualmente no município de Breves.
Entrevistou-se a filha dela, a Andréia, por meio de conversas informais, em parte,
pessoalmente e outra através de correio eletrônico e telefonemas que se registrou no
diário de campo.
260
Mulheres Pan-Amazônidas: enciclopédia cooperativa de biografias
261
LIGIA T. LOPES SIMONIAN • Organizadora
matrimonial, o que culminou com o divórcio dois anos depois de ela ter
ingressado no curso superior. Escolheu a faculdade de serviço social, por
compreender a importância do profissional da assistência social para a
sociedade. Realizou os estudos superiores com sacrifício em instituição de
ensino particular (Figura 1). Essa fase não foi fácil na vida dessa mulher.
262
Mulheres Pan-Amazônidas: enciclopédia cooperativa de biografias
4
O animal jovem da espécie Gallus gallus domesticus.
5
A pousada ainda existe. Ela atualmente chama-se Quarto Crescente e não é mais em
parceria com a amiga Lidia. A gestão da pousada está sob responsabilidade de Adriana
Maria Gomes de Lima, filha de Antônia.
263
LIGIA T. LOPES SIMONIAN • Organizadora
Mas como não aguentou mais a maratona de idas e vindas entre Belém
e Cotijuba, Antônia resolveu deixar os empregos formais desgastantes e se
dedicar mais à organização social das mulheres das ilhas de Belém. Porém,
com o tempo, necessitou de recursos financeiros e resolveu aceitar o convite
de assessorar a Secretaria de Municipal de Promoção Social de Breves. Lá,
a mesma chegou como contratada e como fez concurso e foi aprovada,
faz parte do quadro permanente de servidores públicos municipais como
assistente social.
De uma jovem simples do interior, Antônia transformou-se em uma
trabalhadora ética e comprometida com a vida social das pessoas que mais
necessitam. Assim, essa mulher mostrou que ser dependente de marido e
desiludida com a carreira profissional já não era mais aceitável. Mas teve que
lutar muito, sendo que esse aprendizado de sobrevivência terminou na lição
mais importante em sua vida.
264
Mulheres Pan-Amazônidas: enciclopédia cooperativa de biografias
265
LIGIA T. LOPES SIMONIAN • Organizadora
6
Note-se que até então não existia um espaço destinado a tal finalidade, uma vez que a
presença masculina na maioria das organizações sociais comunitárias locais dificultava o
espaço para as vozes femininas.
266
Mulheres Pan-Amazônidas: enciclopédia cooperativa de biografias
267
LIGIA T. LOPES SIMONIAN • Organizadora
7
Tal oficina fez parte do plano de trabalho desse bolsista, que integrava o Projeto Mudança
do Estuário Amazônico – MEGAM por meio da ação antrópica e gerenciamento
ambiental, coordenado pela Profª. Drª. Edna Castro (NAEA/UFPA).
268
Mulheres Pan-Amazônidas: enciclopédia cooperativa de biografias
percepção do papel social das mulheres das ilhas de Belém, Antônia e outras
associadas do GMAPIC decidiram desligar-se da APIC. Isso ocorreu em
assembléia geral realizada no dia 6 de setembro de 2002. Tal decisão teve por
base o fato de terem percebido que, durante a ampliação do GMAPIC, já não
eram mais respeitadas como mulheres, associadas e formadoras de opiniões.
Desde então, tais mulheres iniciaram um trabalho mais independente
e não mais limitado somente à ilha Cotijuba, nascendo assim o MMIB
como um movimento social emergente. Seu objetivo principal foi o
de buscar alternativas para a inclusão social da mulher cabocla da Belém
insular, principalmente em questões como a organização social, a capacitação
profissional e a geração de rendas, expandindo a área de atuação para
outras ilhas adjacentes. Dentre essas, priorizou-se as ilhas Jutuba, Paquetá,
Urubuoca, Nova e Tatuoca.
No período compreendido entre 2002 e 2005 e sob coordenação de
Antônia, o MMIB chamou a atenção de empresas privadas e ONG por seus
ensaios de sobrevivência e lutas pela inserção social das mulheres da Belém
insular. Ainda, por meio do MMIB, promoveu ações pontuais para incentivar
as mulheres a buscarem independência. Observou-se que em sua gestão
aconteceu, em novembro de 2002, o curso de “formação de lideranças” com
o apoio da FASE.
Em janeiro de 2003, iniciou-se a plantação de priprioca (Cyperus
prolixus) em convênio com a empresa Natura, beneficiando 11 famílias da
ilha Cotijuba, o que se viabilizou com a implantação de área piloto do projeto.
Em fevereiro de 2003, em parceria com a Cruz Vermelha/PA, realizou-se o
curso de Primeiros Socorros para os Agentes Comunitários de Saúde das
ilhas pertencentes ao raio de atuação do MMIB. No ano de 2004, construiu-
se a sede do MMIB, a “Casa da Mulher Insular”, o que ocorreu via parceria
com a empresa Natura.
No mesmo ano, ainda sob gestão de Antônia, o MMIB assinou
um convênio com o Instituto PEABIRU de Ecoturismo/SP para ações de
ecoturismo e geração de rendas. Em julho de 2005, o MMIB, inaugurou
a Agência Comunitária de Ecoturismo, uma espécie de empresa
comunitária para tratar de assuntos referentes à planificação, organização e
269
LIGIA T. LOPES SIMONIAN • Organizadora
4 CONCLUSÕES
8
De acordo com os depoimentos das mulheres, isso contribuiu muito para que as famílias
das associadas do MMIB pudessem ter a dignidade de construir suas vidas dentro da ilha.
270
Mulheres Pan-Amazônidas: enciclopédia cooperativa de biografias
REFERÊNCIAS
271
LIGIA T. LOPES SIMONIAN • Organizadora
272
SILVA, Celina Cadena da – 1946 - ...
CONHECIMENTOS TRADICIONAIS
INDÍGENAS E OCIDENTAIS
NA ORGANIZAÇÃO INDÍGENA
E POLÍTICAS PÚBLICAS
1 INTRODUÇÃO
1
O primeiro contato da autora com Celina foi após o encerramento de uma assembleia
indígena, no final dos anos de 1980. O mesmo se consolidou em contatos esporádicos
de apoio mútuo, para elaboração e participação em projetos. Dentre eles, destaca-se o
“Ritual na Floresta”, em 1996 (Congresso da Young President Organization – YPO, que
congrega os presidentes das maiores empresas nacionais e internacionais e que realizavam
seu evento anual em Manaus, Amazonas, em 1996), e o estudo de França (2002) sobre
suas estratégias verbais e não verbais para a promoção da saúde (1998-1999).
2
Inclusive, isto lhe direcionou a ajudar o outro, a promover a saúde e a educação, seja por
meios convencionais ou não.
273
LIGIA T. LOPES SIMONIAN • Organizadora
3
Notadamente, entre as subjetividades entrevistador/entrevistado, enquanto usam as
palavras para reconstruir o tempo. Note-se, segundo Silva (2010), que aquele que fala
nunca está sozinho, mesmo quando fala para si mesmo, pois o pensamento é constituído
de diálogos internos múltiplos que se externalizam, evidenciando lições de vida e
exemplos educativos que envolvem outras personagens, numa história que é individual/
coletiva.
4
Nome da mãe: Catarina Bolívar Cadena; nome do pai: Guilherme Pereira da Silva. Nome
dos parteiros: o negro Papitunati Rivas (Natividad) e a esposa indígena Mamitamaia
(Mariana do povo Dyarumari).
274
Mulheres Pan-Amazônidas: enciclopédia cooperativa de biografias
5
Como cuidar das crianças menores, cozinhar, tirar lenha na floresta, encher as vasilhas
com água do rio etc.
6
Nome do tio: Waldyno Bolívar Cadena, que foi criado pela mãe de Celina e considerava
de grande valor retribuir à sobrinha proporcionando estudo formal no colégio religioso
salesiano Madre Maria Mazzarello.
275
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7
Nome da pessoa do primeiro relacionamento afetivo Agostín Orozco.
8
Maryluz Cadena Orozco.
9
O afastamento do lar por tempo prolongado comprometeu o relacionamento conjugal no
retorno.
10
Antonio Cordeiro.
11
Então, fez cursos de: hotelaria, garçonete, camareira, telefonista, secretária executiva,
cozinheira e continuava prestando socorro aos doentes.
12
Manoel de Jesus Cardoso Neto, conhecido por Neco. Na revisão da história de vida de
ambos, descobriu já conhecê-lo numa prestação de socorro à família dele, em São Gabriel
da Cachoeira.
13
Keyth Yajaira Cadena da Silva; William Guilherme Cadena da Silva e Johnny da Silva
Cardoso. Só o último recebeu o sobrenome paterno.
276
Mulheres Pan-Amazônidas: enciclopédia cooperativa de biografias
14
O Fórum Regional Antidrogas da Região Norte foi realizado em Manaus, sob a
coordenação local do Conselho Estadual de Entorpecentes, com o objetivo de coletar
propostas dos movimentos sociais para o Fórum Nacional Sobre Drogas de Brasília,
que seria realizado em 2005, em Brasília, visando a implementação da Política Nacional
Antidrogas para o Brasil.
277
LIGIA T. LOPES SIMONIAN • Organizadora
15
General Paulo Yog Uchôa, presidente da Secretaria Nacional Antidrogas – SENAD.
16
No final de sua fala, foi convidada formalmente a participar do Fórum Nacional de 2005,
por ser uma presença imprescindível, com a oferta de todos os gastos assegurados.
278
Mulheres Pan-Amazônidas: enciclopédia cooperativa de biografias
17
José Rocha é assessor de comunicação do Conselho Indigenista Missionário – CIMI,
onde atua desde 1988 e fez muitas viagens pelo interior com Celina, para realização de
assembléias com grupos indígenas.
18
Segundo Rocha, todos os indígenas participam das assembléias nas comunidades;
contudo, em eventos que requerem deslocamento e permanência fora da comunidade são
eleitos representantes, geralmente homens, o que explica o número menor de mulheres
em assembleias ou outros eventos.
279
LIGIA T. LOPES SIMONIAN • Organizadora
19
Atuou como delegada, membro do Conselho Estadual de Saúde do Amazonas e comissões
de trabalho junto a tal ministério (Silva, 2012, entrevista).
20
Os indígenas sofrem um processo histórico de desvalorização étnica desde a colonização.
Altini et al. (2011) revela práticas de escravidão, chacinas, guerras, epidemias de doenças
infecciosas e o descaso colonial com a perspectiva de exterminação dos indígenas,
considerados “entraves ao desenvolvimento”. Daí o motivo do atendimento à saúde
indígena, muitas vezes, se restringir a medidas paliativas e emergenciais.
280
Mulheres Pan-Amazônidas: enciclopédia cooperativa de biografias
21
Constituído pelas Portarias nº 53, de 29 set. 2005 e nº 84, de 02 out. 2008 do MS/
Secretaria de Vigilância em Saúde – SVS.
281
LIGIA T. LOPES SIMONIAN • Organizadora
22
Na ata de setembro de 2008, Silva (2008) se manifesta sobre o índice alto de infectados
que, devido à discriminação, buscam ajuda em locais distantes; aborda a falta de vigilância
[epidemiológica] nas zonas de fronteira, e informa que o primeiro caso veio da Guiana
Francesa.
23
Ademir Ramos (2012, entrevista) foi o primeiro presidente da Fundação Estadual de
Política Indigenista – FEPI-AM (2002), que foi transformada em Secretaria Estadual
de Política Indigenista do Amazonas – SEPI; Coordena o Núcleo de Cultura Política –
NCPAM da Universidade Federal do Amazonas – UFAM.
24
Nheengatu é a língua geral, criada pelos jesuítas na época da colonização portuguesa.
282
Mulheres Pan-Amazônidas: enciclopédia cooperativa de biografias
que reconhece que muitas não têm domínio de toda a realidade, porque
seu trabalho se restringe aos gabinetes. Por isso, sente responsabilidade de
transmitir o que sabe e o que vê acontecendo com a população. Quando tem
condições, tira fotos para comprovar o que diz. “A gente conhece a realidade
e sabe que não pode ficar calada” (Silva, 2012, entrevista). Celina diz que
sente um nó na garganta, temendo sofrer um derrame ou ataque do coração
se não falar, devido ao comprometimento social e espiritual com o outro.
Por ter trabalhado em sanatórios, revida a tese de que tuberculose
é doença de pobre, pois pessoas ricas também sofrem dela (Silva, 2012,
entrevista). Como conhece o sofrimento de crianças abandonadas em
orfanatos, condena mães que tomaram e tomam remédios para abortar ou
usam drogas, causando lesões ou deficiências nos filhos, que depois são
rejeitados e traumatizados por toda a vida. Defende que a prevenção é mais
importante, porque evita a necessidade e os gastos com tratamento.
Dentre os trabalhos preventivos que realizou, considera o mais
gratificante aquele que envolveu adolescentes, amigos de seus filhos, que
estavam usando drogas e correndo o risco de entrar no submundo da
criminalidade. Com a ajuda dos filhos, Celina levou os adolescentes para sua
casa e deu a eles uma atenção especial, por meio de conversas e brincadeiras
que atravessavam a noite e iam pela madrugada. Depois, eles eram levados
para suas casas e não ficavam perambulando pelas ruas, expostos à violência.
Assim, ela criou laços de amizade e de confiança que ajudaram na recuperação
do grupo. Hoje, eles são trabalhadores e cidadãos dignos. Seus filhos a
chamam de vovó.
4 CONCLUSÃO
283
LIGIA T. LOPES SIMONIAN • Organizadora
REFERÊNCIAS
284
Mulheres Pan-Amazônidas: enciclopédia cooperativa de biografias
285
SILVA, Luzarina Varela da, 1961 - ...
DO MUNDO DAS ÁGUAS AO MUNDO DO
MOVIMENTO DAS MULHERES EM MANAUS
1 INTRODUÇÃO1
Há quem diga que a vida não é feita de certezas lineares nem de destinos
previsíveis. É feita de contradições, dilemas, alegrias e tristezas, encontros e
desencontros, dramas e tramas. E todos esses processos e relacionamentos
sociohistóricos são sempre mediados pelo trabalho. Aqui vou narrar um
pouco da história e das estórias, por que não, de uma mulher guerreira
que nasceu nas terras molhadas do município do Careiro da Várzea e ainda
criança migrou para Manaus e se tornou uma liderança dos movimentos de
mulheres no Amazonas.
Neste capítulo, discute-se a trajetória de vida de Luzarina Varela da
Silva, uma mulher, mãe, trabalhadora, política etc. do estado do Amazonas.
Essa modalidade de estudo já foi definida como ilusória, nesse caso, por
Bourdieu (1996). Mas independentemente de tal interpretação, o uso da
história oral (Thompson, 2002) no decorrer da pesquisa permitiu que se
produzisse um conjunto de evidências precisas sobre a biografada de modo
a garantir uma exposição convincente.
Luzarina nasceu em 12 de setembro de 1960, na comunidade2 Nossa
Senhora de Perpétuo Socorro. A mesma situa-se na localidade da Costa da
Terra Nova, município do Careiro da Várzea, distante 22 km de Manaus em
linha reta. Lugar de várzea que se costuma denominar de terras molhadas
porque estão sempre propícias a serem inundadas pelos rios Amazonas e
Solimões.
1
Ou “[...] na Costa da Terra Nova: vida ribeirinha”.
2
Este conceito precisa ser compreendido por uma perspectiva crítica, como posto por Silva
e Simon (2005).
287
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Seus pais são originários do mesmo lugar. Não se sabe ao certo, mas
seus avós possivelmente vieram na leva de migrantes/retirantes nordestinos
que mudaram para o Amazonas na época da produção gomífera. Seu pai
era pescador e assim o fazia para subsistência e o excedente era vendido na
comunidade ou nos mercados à beira-rio da capital. A mãe era agricultora
e mulher forte, que cuidava dos afazeres da casa e plantio da roça como as
demais mulheres no mundo rural brasileiro.
Mas quando Luzarina era pequena os pais se separam e cada um refez
e constituiu famílias novas. E ambos tiveram outros filhos. Assim, a sua
família é numerosa, como é natural em vários lugares da Amazônia.
288
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6 O CORTE DE GÊNERO
295
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Mulheres Pan-Amazônidas: enciclopédia cooperativa de biografias
REFERÊNCIAS
299
SILVA, Raimunda Moreno da – 1881-1909
ALMA MILAGROSA DE SANTA RAIMUNDA
DO SERINGAL ICURIÃ, ACRE
1 INTRODUÇÃO
301
LIGIA T. LOPES SIMONIAN • Organizadora
1
Para uma discussão sobre a pesquisa bibliográfica e de campo, a produção fotográfica e o
escrever, ver, dentre outros, Oliveira, R. (1996) e Simonian (2007).
302
Mulheres Pan-Amazônidas: enciclopédia cooperativa de biografias
303
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307
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308
Mulheres Pan-Amazônidas: enciclopédia cooperativa de biografias
2
Comunicação pessoal à autora, em 2011.
309
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pela capela, mas sabem que a legislação brasileira não permite. Relatam
também que tudo o que é ofertado para a Santa é roubado por brasileiros e
bolivianos, o que por dificuldades diversas não se pôde comprovar.
A imagem da Santa e seu manto são depredados e muitos romeiros são
maltratados e explorados por comerciantes brasileiros que ficam na fronteira
trinacional. Os peruanos, ao contrário do costume dos brasileiros e bolivianos,
quando fazem uma promessa passam o resto da vida pagando. Consequente,
eles são os que mais visitam a Santa Raimunda durante o ano todo.
3 CONCLUSÃO
REFERÊNCIAS
310
Mulheres Pan-Amazônidas: enciclopédia cooperativa de biografias
311
SNETHLAGE, Emília, 1868-1929
UMA CIENTISTA ALEMÃ NA AMAZÔNIA
Miriam Junghans*
1 INTRODUÇÃO
1
Precisamente, em casas de família, na Inglaterra, Irlanda e na própria Alemanha.
313
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2
O primeiro país de língua alemã a aceitar mulheres na universidade foi a Suíça, em 1865,
seguido pela Áustria, que desde 1878 permitia que assistissem às aulas como ouvintes. Na
Alemanha, a Universidade de Freiburg foi a primeira a aceitar oficialmente a matrícula de
mulheres, a partir do semestre 1899/1900.
314
Mulheres Pan-Amazônidas: enciclopédia cooperativa de biografias
3
A autora agradece a ambos pelo envio dessas informações e por ter autorizado seu uso.
315
LIGIA T. LOPES SIMONIAN • Organizadora
O que leva uma mulher de 37 anos deixar sua terra natal – a Europa – e
transferir-se para um país distante e desconhecido? Certamente, a vontade
de ter uma carreira independente, mas também o desejo de conhecer
um lugar que devia fazer parte do seu imaginário, como de tantos outros
europeus dessa época. Pois Emília Snethlage nascera na segunda metade do
século XIX, século marcado por viagens de exploração e pela conquista de
impérios coloniais. Incontáveis viajantes e naturalistas percorriam as partes
menos conhecidas do mundo e os relatos dessas viagens eram publicados,
alimentando o imaginário de todas as classes sociais europeias.
Talvez, Emília Snethlage tenha ouvido falar de uma conterrânea,
Amalie Dietrich (1821-1891), que percorreu a Austrália. Em tal oportunidade,
Amalie coletou espécimes de história natural entre 1863 e 1872 (Stresemann,
316
Mulheres Pan-Amazônidas: enciclopédia cooperativa de biografias
1975). Como se depreende ainda de Leite (2002), pode ainda ter lido algum
dos 13 livros publicados pela austríaca Ida Pfeiffer (1797-1858), que viajou
sozinha por diversas regiões do mundo, passando pelo Brasil em 1846.
Das regiões de língua alemã vieram para o Brasil naturalistas viajantes
e etnólogos como Spix, Martius, Wied-Neuwied, Karl von den Steinen, dos
quais certamente a cientista havia lido algum relato. No imaginário europeu,
os trópicos eram vistos como uma região de grandes riquezas naturais, o
lugar ideal para os trabalhos de um naturalista. E essa talvez tenha sido uma
das motivações de Emília Snethlage ao transferir-se para Belém.
A especialidade de Snethlage era a ornitologia, o estudo das aves. Ao
chegar a Belém passou a trabalhar como assistente da seção de zoologia do
Museu Goeldi, que era chefiada pelo próprio diretor. Com o retorno desse a
sua Suíça natal, em 1907, ela ficou como chefe da seção.
Durante o tempo em que ali trabalhou, a cientista percorreu
incansavelmente a região da parte baixa do rio Amazonas, fazendo coletas e
observando os hábitos e a distribuição das aves. Em consequência, a área em
que atuou ficou conhecida entre os ornitólogos, como “a área da Snethlage”.
Portanto, o trabalho de campo, atividade que muitas vezes apresentada como
impedimento para a participação das mulheres nas ciências naturais, foi uma
das marcas que distinguiu a trajetória científica de Snethlage.
Outras mulheres percorreram a região amazônica antes da naturalista,
mas em geral, dentro de outras condições sociais e institucionais e com
objetivos diferentes do trabalho por ela desenvolvido. Como exemplo
tem-se a princesa Teresa da Baviera (1850-1925), doutora honoris causa pela
Universidade de Munique e coletora ávida de espécimes para suas coleções,
que percorreu parte da Amazônia em 1888 (Bumann, Neukum-Fichtner,
1997). Ou então Octavie Coudreau (1870-1910), cartógrafa, desenhista
e topógrafa que, junto com seu marido, o explorador e geógrafo Henri
Coudreau (1859-1899), fez pesquisas na região amazônica4.
4
Com a morte do esposo e para honrar o contrato firmado com o governo do Pará, ela
assumiu o controle das expedições e publicou os resultados (Corrêa, 2003).
317
LIGIA T. LOPES SIMONIAN • Organizadora
5
De acordo com uma estimativa feita por seu sobrinho, Heinrich Snethlage, Emília
preparou, ao longo de toda sua carreira, aproximadamente 10.000 peles de aves, que estão
em coleções de museus brasileiros, europeus e norte-americanos (Snethlage, H., 1930).
Uma relação recente, na qual são contabilizadas apenas as peles seguramente preparadas
por Snethlage e cuja localização foi confirmada, apresenta 7.636 peles de aves. Como
muitas peles foram inutilizadas pelo tempo, outras não foram localizadas, a estimativa
de H. Snethlage apresenta-se como razoável. Nesse ponto, um agradecimento é devido
à Fátima Lima, assistente de ornitologia no Museu Goeldi, pelas informações acima,
fornecidas em comunicação pessoal.
318
Mulheres Pan-Amazônidas: enciclopédia cooperativa de biografias
Das suas muitas excursões e viagens a mais importante, que teve grande
repercussão nos meios científicos do Brasil e do exterior, foi a travessia entre
os rios Xingu e Tapajós, em 1909 (Snethlage, 1912a). A região ainda não
havia sido percorrida por nenhum não índio. A viagem, desde a partida até
o retorno a Belém, durou aproximadamente cinco meses e teve início na
‘volta grande do Xingu’, na localidade de Vitória, hoje parte do município
de Altamira.
319
LIGIA T. LOPES SIMONIAN • Organizadora
6
Para uma análise dos trabalhos de etnografia de Snethlage, ver Corrêa (2003).
7
Esta obra contém todas as espécies descritas e mencionadas até 1913. Ao trabalhar com
mais de 10.500 peles de aves da região das coleções do Museu Goeldi e com as informações
fornecidas por uma rede vasta de cientistas, coletores, coleções, além da literatura, ela
ordenou sistematicamente todas as informações sobre o assunto às quais teve acesso até
1913, inventariando 1.117 espécies de aves amazônicas.
320
Mulheres Pan-Amazônidas: enciclopédia cooperativa de biografias
321
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8
Ela percorreu o Maranhão, Espírito Santo, Minas Gerais, Bahia, Mato Grosso e Goiás, do
Paraná ao Rio Grande do Sul, Argentina e Uruguai.
322
Mulheres Pan-Amazônidas: enciclopédia cooperativa de biografias
1930, uma obra geral sobre a avifauna brasileira. Antes de partir comenta com
Roquette-Pinto (1940, p. 88), então diretor do Museu Nacional, “[...] esta
será a minha última viagem”. Deveras. Com a saúde debilitada por longos
anos de luta contra a malária, Emília Snethlage faleceu em Porto Velho, no
dia 25 de novembro de 1929.
4 CONSIDERAÇÕES FINAIS
323
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REFERÊNCIAS
324
Mulheres Pan-Amazônidas: enciclopédia cooperativa de biografias
*
Este capítulo desta enciclopédia tem por base parte da dissertação de mestrado da autora
intitulada “Avis rara: a trajetória científica da naturalista alemã Emília Snethlage (1868-
1929) no Brasil”, defendida em 2009, na Casa de Oswaldo Cruz/FIOCRUZ. A pesquisa
foi orientada pela Drª. Magali Romero Sá e contou com bolsa da FIOCRUZ. Aproveita-
se ainda a oportunidade desta publicação para dedicar in memoriam este capítulo ao
zoólogo e historiador do Museu Paraense Emílio Goeldi – MPEG, Osvaldo Rodrigues
da Cunha, falecido a 11 de março de 2011, cujos trabalhos foram fundamentais para
pesquisa realizada pela autora e para as de outros historiadores da ciência que se dedicam
às questões da Amazônia.
325
SOUSA, Regina Lúcia Barata Pinheiro de – 1960 - ...
REGINA BARATA – ESSA PETISTA É ÓTIMA
1 INTRODUÇÃO
1
Formou-se pelo Centro de Estudos Superiores do Estado do Pará – CESEP, a Universidade
da Amazônia – UNAMA atual, onde estudou com auxílio do crédito educativo.
2
Nestas ocasiões, geralmente extrapolava seu horário de trabalho no intuito de esclarecer e
apoiar as pessoas quanto a seus direitos
327
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3
Área considerada o ‘berço’ do PT, onde nasceu a liderança de Luiz Inácio da Silva, ou
melhor, de Lula.
328
Mulheres Pan-Amazônidas: enciclopédia cooperativa de biografias
3 A PARLAMENTAR
329
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Mulheres Pan-Amazônidas: enciclopédia cooperativa de biografias
Abstenção % Abstenção %
4
O mesmo seria concedido às empresas que desenvolvessem ações de combate a tal crime.
331
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5
Também, ressaltou a necessidade de se buscar apoiar os direitos das pessoas com
deficiência e das demais minorias, como os das mulheres, e cada vez mais, proteger
crianças e adolescentes e tirá-los de situações de risco. Regina Barata (Sousa, 2007b) falou
ainda das medidas tomadas na cidade de Belém para facilitar a locomoção dos deficientes
de toda espécie.
332
Mulheres Pan-Amazônidas: enciclopédia cooperativa de biografias
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6
Ela alcançou 23.380 votos, o que representou 6,59% do total obtido para o cargo em todo
o estado e 9,7% dos votos obtidos pelo seu partido.
334
Mulheres Pan-Amazônidas: enciclopédia cooperativa de biografias
7
Tal proposta encontra-se incluída no orçamento do estado do Pará e teve por objetivo
fortalecer tais centros, por meio de sua efetivação.
335
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8
Regina Barata só entrou nessa Comissão, após o PT ter assegurado na justiça uma das
vagas (PT, 1999).
336
Mulheres Pan-Amazônidas: enciclopédia cooperativa de biografias
4 CONSIDERAÇÕES FINAIS
9
Note-se ainda que na medida em que sua visibilidade cresceu, ela procurou ocupar um
cargo de representatividade maior dentro da carreira política.
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REFERÊNCIAS
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Mulheres Pan-Amazônidas: enciclopédia cooperativa de biografias
339
WAJURU, Valda Ibañez Braga – 1977 - ...
UMA VIDA EM DEFESA DAS CAUSAS
INDÍGENA E AFRO-BRASILEIRA
1 INTRODUÇÃO
1
Por isto, é preciso dar visibilidade ao trabalho, ao papel, à atuação dessas mulheres
guerreiras que enfrentam tudo quanto é dificuldade. Isso nas entranhas da floresta e às
margens dos rios para melhorar as condições de vida de seus familiares, construindo
341
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Mulheres Pan-Amazônidas: enciclopédia cooperativa de biografias
7
Este é um mecanismo utilizado em todo país para aniquilar as especificidades de cada
povo. Suas línguas tradicionais eram consideradas atrasadas, “língua de bicho” que
precisava ser substituída pela língua oficial brasileira, a “ língua de gente”. Isso significava
uma tentativa de destruir as culturas dos indígenas e dos afro-descendentes, impondo
uma “cultura” genérica da sociedade brasileira, como parte de sua homogeneização.
345
LIGIA T. LOPES SIMONIAN • Organizadora
8
A exemplo da palmeira ubim (Geonoma deversa (Poit) Kunth) e da Xylopia nitida Dun.
(ANNONACEAE).
9
Como o açaí (sendo o mais comum o Euterpe oleracea Mart.), a bacaba (Oenocarpus bacaba
Mart. (ARECACEAE)), o patoá ou patuá (Ocnocarpus patuai), o buriti (Mauritia flexuosa
Mart.), a castanha-da-amazônia (Bertholletia excelsa K. B. K, (LECYTHIDACEAE) Mart.),
a pupunha (Bactris gasipaes Kunth), dentre outros; também, extraem óleos medicinais da
copaíba (Copaifera spp), da andiroba (Carapa guianensis), do angico (Hcourbaril L.).
346
Mulheres Pan-Amazônidas: enciclopédia cooperativa de biografias
10
Assim, reaproveita-se até matérias-primas que iriam se decompor. Transformam, desse
modo, o broto dessa palha em artesanato que possui tanto valor de uso cotidiano quanto
valor de troca, o que proporciona o aumento da renda familiar.
11
Precisamente, tem-se o aproveitamento cuidadoso de cocos, da castanha que serve tanto
para alimento quanto para extração de óleo, produção de artesanato; a atenção para não
347
LIGIA T. LOPES SIMONIAN • Organizadora
destruir um açaizeiro e outras palmeiras que produzem frutos que servem de alimentos,
servem para a extração de óleos vegetais e os resíduos ainda são reaproveitados para
produzir artesanato ou para lenha.
12
E, conforme Cruz (2010, no prelo), são práticas culturais de respeito ao meio ambiente
que revelam uma sabedoria que brota do chão cotidiano e que vai sendo transmitida de
pais e mães para filhos e filhas.
13
Respectivamente, Swietenia macrophylla King. (MELIACEAE), Cedrela fissilis Vell e
Amburana cearensis (Fr. All.) A. C. Smith.
348
Mulheres Pan-Amazônidas: enciclopédia cooperativa de biografias
14
O “[termo “peixe” [é] utilizado por conveniência, e não por unidade taxonômica, porque
os peixes não compõem um grupo monofilético” (Aprenda, n. d.).
15
Respectivamente, Melanosuchus niger, família dos ANATIDAE, Ara chloropterus e Ara macao.
16
Ainda, segundo Valda Wajuru, eles não fiscalizam com rigor a atuação dos turistas e, por
outro lado, perseguem os moradores com apreensão até de utensílios artesanais de pesca.
349
LIGIA T. LOPES SIMONIAN • Organizadora
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Ela ressalta ainda: “Eu aprendi. A gente tem muitas plantas no mato, né? Hoje
em dia eu já conheço. Fui levada no mato pelos meus tios também” (Wajuru,
2009, entrevista). Ela revela um pouco destes seus conhecimentos tradicionais:
É importante destacar que Valda afirma ter aprendido esses remédios desde
“os tempos de criança”, ou seja, a aprendizagem se dá via práticas cotidianas20.
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Os Aricapu, Canoé, Cojubim, Coruborá, Diarróio, Macurap, Miquelém, Sacaré, Tupari,
Urueu-wau-wau.
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Assim, Valda incentiva suas companheiras com palavras e, sobretudo, com ações. Ela,
como tantas outras mulheres de sua região, têm uma versatilidade impressionante: pesca,
caça, trabalha no roçado, faz farinha de mandioca (Manihot esculenta Crantz), capa porcos
(Sus domesticus), confecciona artesanatos de produtos florestais e de cerâmica e conhece os
segredos da medicina da mata.
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Ou seja, do fazer-se nas aldeias e comunidades do Guaporé, onde os mais velhos
transmitem às crianças e jovens a sua sabedoria, as práticas medicinais e outras dimensões
da cultura.
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Há o tempo certo para preparar o roçado, para plantar, para colher, para a
extração de madeira que se transformará em canoa, para capar porcos; o
tempo de caçar, o tempo de pescar, enfim, é a natureza quem determina os
tempos das atividades agroextrativistas.
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Wajuru (2009, entrevista) revela essa sabedoria: “A banha do jacaré é usada mais pra
bronquite, pra asma, pra pneumonia que é usado a banha de jacaré com o mel. Ainda,
usa-se a banha de arraia também pra bronquite, pneumonia”. E, na sua narrativa ela
enfatiza: “Aprendi com a minha vó, com a minha mãe. Minha vó não deixava a gente
beber remédio de farmácia, tudo era esses remédios. Tudo era com esses remédio. A casca
do jabuti ela usava muito. Ela fazia só na lua minguante o jabuti torrava e dava pra gente
com o pau d’alho, esse cipó que tem no mato”. Essa fala revela a influência da lua na
produção deste remédio.
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3 CONCLUSÃO
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Próxima a Rolim de Moura do Guaporé; era uma localidade fundada por seu bisavô
Bernadino Nery da Trindade; hoje moram em Guajará Mirim, mas desejam retornar caso
ele se torne Terra Quilombola – TQ.
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Nestas oportunidades, a equipe faz atendimento médico, prevenção do câncer, levando
remédios. Esse trabalho tem melhorado significativamente as condições de saúde de tais
comunidades.
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REFERÊNCIAS
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Parte III
AUTORAS E AUTORES
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ACEVEDO MARIN, Rosa Elizabeth. Tem doutorado em História pela
École des Hautes Études en Sciences Sociales – EHESS e Pós-Doutorado
pelo Centre National de la Recherche Scientifique, França. É professora e
pesquisadora do Núcleo de Altos Estudos Amazônicos – NAEA/Universidade
Federal do Pará – UFPA; coordena o Projeto Nova Cartografia Social da
Amazônia – PNCSA. Tem muitas publicações no país e no exterior, o que
inclui artigos, capítulos de livros e livros. E-mail: <[email protected]>.
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Esta obra foi publicada
em dezembro de 2011, na
cidade de Belém. Fonte
Aldine401 BT, corpo 11/16.
E-Books – Série Icamiabas.
MULHERES PAN-AMAZÔNIDAS
ISBN 978-85-7143-091-4
9 788571 430914
Série Icamiabas
1 Volume 1