O Globo História
O Globo História
O Globo História
Jornal carioca inicialmente vespertino, mais tarde matutino, fundado por Irineu Marinho em 29
de julho de 1925.
LANÇAMENTO
Após deixar a direção de A Noite, no início de 1925, Irineu Marinho viajou para a Europa, onde
permaneceu algum tempo. Ao voltar ao Brasil, uniu-se a Herbert Moses e a Justo de Morais para
fundar um jornal que “renovasse os padrões dominantes na imprensa carioca”. O nome da nova
folha — O Globo — foi proposto pelo jornalista Elói Pontes e consagrado através de concurso
popular.
Em seu primeiro número, O Globo traçava as diretrizes pelas quais pretendia pautar sua atuação.
Irineu Marinho destacou “o dever ineludível em que nos vimos de continuar a consagrar-nos, tanto
quanto nos consinta a nossa reduzida capacidade, à defesa das causas populares que nos
empolgaram e nos dominam há bem mais de duas décadas”. O novo jornal declarava-se ainda
totalmente independente, na medida em que não desejava a intervenção de nenhuma força
externa a seus próprios quadros: isento de “afinidade com governos”, livre de “interesses
conjugados com os de qualquer empresa”, o jornal tampouco se ligaria “a grupos capitalistas ou a
plutocratas isolados”.
Fundado no fim do governo Artur Bernardes, O Globo preocupou-se em seus primeiros números
em demonstrar interesse por questões populares. O jornal defendia o aumento nos vencimentos
do funcionalismo público, combatia a carestia, criticava o abandono em que se encontravam certas
ruas da cidade e acompanhava passo a passo as ações da Central do Brasil e da Light. Segundo o
próprio jornal, as “entidades que exploravam os serviços públicos viviam sob a mira fiscalizadora
de O Globo”.
Paralelamente à defesa dos interesses de ordem popular, O Globo logo iniciou uma campanha
em favor de Henry Ford, “o grande industrial arquimilionário norte-americano” que viera ao Brasil
investir capital com vistas ao restabelecimento da antiga escala de produção de borracha da
Amazônia. Segundo o jornal, Henry Ford viera ao Brasil “para combater o preço extorsivo da
borracha”, cujo mercado estava predominantemente em mãos inglesas. Desde o início, portanto, o
jornal mostrou-se favorável ao ingresso do capital estrangeiro — sobretudo norte-americano — no
país. Além disso, defendeu a importação de automóveis, que crescia vertiginosamente,
considerando-a sinônimo de progresso.
Vinte e um dias depois da fundação de O Globo, entretanto, Irineu Marinho morreu. Francisca
Marinho, sua viúva, tornou-se a principal proprietária do periódico e entregou sua direção ao
secretário do jornal, Euricles de Matos. Na parte administrativa permaneceram Herbert Moses, no
cargo de diretor-tesoureiro, e Antônio Leal da Costa, como gerente.
No período que se seguiu, O Globo foi contra a candidatura de Washington Luís à presidência da
República e mostrou-se simpático aos tenentes e à Coluna Prestes.
A REVOLUÇÃO DE 1930
Em 1929, ao se iniciarem os debates em torno da sucessão de Washington Luís na presidência da
República, o compromisso estabelecido entre as oligarquias mineira e paulista relativo à
alternância de representantes no Catete foi rompido. Washington Luís, eleito pelo Partido
Republicano Paulista, indicou para seu sucessor outro paulista, Júlio Prestes de Albuquerque,
frustrando assim as esperanças dos mineiros. Contra a candidatura oficial, e procurando em última
análise romper a hegemonia paulista sobre os demais estados da União, articularam-se Minas
Gerais, Rio Grande do Sul e Paraíba, formando a Aliança Liberal. A frente oposicionista lançou as
candidaturas de Getúlio Vargas à presidência e de João Pessoa à vice-presidência da República.
O Globo, que, num segundo momento, passara a mostrar reservas em relação ao movimento
tenentista, assumiu de início posição reticente diante dos princípios aliancistas. À medida que a
Aliança Liberal adquiriu expressão nacional, contudo, o jornal se aproximou de seus postulados. A
despeito da afirmação contida na edição comemorativa do 30º aniversário do jornal, de que desde
o início a candidatura liberal teria sido aceita sem ressalvas, Ricardo Marinho afirma que
O Globo apoiou a candidatura Vargas apenas em sua fase final.
Após a vitória de Júlio Prestes nas eleições de 1º de março de 1930, O Globo manifestou decidida
oposição à degola das bancadas mineira e paraibana eleitas para a Câmara e não reconhecidas pela
Comissão de Verificação de Poderes. Em julho, o jornal denunciou o assassinato de João Pessoa
como um ato ordenado pelo governo federal. Considerou também como ato intervencionista a
subseqüente concentração de tropas federais em Princesa, hoje Princesa Isabel, na Paraíba, a
pretexto de controlar a situação.
A eclosão da Revolução de 1930 a 3 de outubro não foi noticiada pelo jornal: a partir de 4 de
outubro, a imprensa foi submetida a censura na capital federal. Nesse dia, o editorial de O
Globo condenou moderadamente as medidas tomadas pela polícia em relação a alguns jornais
cariocas, cujos diretores foram presos. Dizia o texto: “As notícias relativas às perturbações da
ordem, que circularam desde ontem, puseram em movimento as autoridades. Nada mais justo e
natural do que as providências e cautelas do governo, uma vez que há motivos para tanto.
Aconteceu, porém, que a polícia, pelos seus agentes, achou que podia e devia prender diversos
colegas que dirigem o Diário Carioca, O Jornal e A Batalha, levando a sua ação até mesmo aos
extremos de deter os auxiliares das oficinas daqueles jornais. Hoje de manhã nenhum deles
circulou. Cogita-se de uma arbitrariedade que, até virem esclarecimentos, dispensa
demonstrações. O chefe de polícia tem recomendado aos jornais que evitem notícias alarmantes.
Nada mais alarmante do que o ato da polícia, detendo todos os que trabalham naqueles jornais,
conduzindo-os de cambulhada e pondo-os sob custódia, como se eles tivessem cometido delito.”
Por fim, com a deposição de Washington Luís, em 24 de outubro, e a conseqüente formação da
junta militar composta pelos generais Tasso Fragoso e João de Deus Mena Barreto e pelo almirante
Isaías de Noronha, O Globo declarou em editorial que “a ação das forças pacificadoras da guarnição
militar da capital da República consagrou na manhã de hoje, desoprimindo a população
atormentada, a vitória da revolução que empolgou o país de Norte a Sul”.
O GOVERNO PROVISÓRIO
O apoio de O Globo à Revolução de 1930 jamais foi irrestrito. Segundo a edição comemorativa de
1955, o jornal “não se deixou contagiar pelos que viram na revolução o remédio eficaz para os
problemas nacionais”. No período seguinte, segundo a mesma fonte, o jornal teria defendido a
aceleração do processo de redemocratização, colaborando dessa forma “para que a nova ordem de
coisas produzisse seus frutos”. Os editoriais da época procuravam alertar a opinião pública para a
necessidade da “restauração do clima constitucional”, através da eleição de uma assembléia
constituinte. As principais críticas ao Governo Provisório visavam à extrema arbitrariedade dos
interventores. Euricles de Matos, que se mantinha à frente do jornal, se teria gradualmente
afastado da situação, “como defensor da ordem jurídica”.
Entretanto, em 5 de maio de 1931, morreu o segundo diretor de O Globo. Três dias depois
Roberto Marinho, filho mais velho de Irineu Marinho, passou a dirigir o jornal, sendo mais tarde
assessorado por seus irmãos Rogério e Ricardo Marinho.
Segundo o próprio jornal, decorrido o primeiro ano do Governo Provisório, faltava um programa
aos revolucionários: “Nas incertezas deste primeiro ano escoado com as inquietações financeiras,
com as dívidas políticas e com as impaciências, o novo regime precisa firmar os seus objetivos.” Em
junho de 1932, O Globoconsiderou como fato da maior gravidade a deposição do general Leite de
Castro da pasta da Guerra: “A nação não pode mais transigir com os caprichos do governo.” Em 11
de julho do mesmo ano, noticiou a eclosão de um “movimento armado contra o Governo
Provisório”, em São Paulo, chefiado pelo general Isidoro Dias Lopes. A chamada Revolução
Constitucionalista de São Paulo foi amplamente noticiada pelo jornal, que realizou cobertura
completa dos dois lados da luta através de correspondentes. Procurando rebater o argumento do
governo de que se tratava de um movimento separatista, o jornal publicou editoriais tentando
mostrar que os revoltosos visavam apenas à reconstitucionalização do país.
Por fim, após terem sido realizadas as eleições para a Assembléia Nacional Constituinte (ANC),
em 1933, e ter sido promulgada a Constituição, em 16 de julho de 1934, O Globo afirmou que
estava “extinto o regime discricionário”.
Segundo Ricardo Marinho, entretanto, o jornal não se teria manifestado expressamente a favor
da Constituição de 1934, que permitira a Getúlio Vargas eleger-se presidente indiretamente.
Fazendo na ocasião um balanço dos anos decorridos desde a Revolução, o jornal concluía em
editorial que, apesar de o chefe do Governo Provisório ter tido à sua disposição todas as forças
imagináveis, não lograra “resolver um só dos problemas nacionais”, bastando “lembrar apenas que,
a despeito de todas as fiscalizações, métodos e estatísticas das finanças públicas, não tivemos
nenhuma vez orçamentos em dia, não soube nunca o país quanto nem como se gastou, nem quais
os créditos abertos”. O “único orgulho da revolução foi o de dizer que não fez empréstimos sem ter
a coragem de confessar que não os fez porque não teve crédito em nenhum mercado monetário,
como foi a sua única e exclusiva vaidade a de reduzir, negar ou discutir parte de suas dívidas com o
estrangeiro ou explorar, na aquisição de títulos, a cuja margem se realizaram as mais tristes
negociatas, o próprio descrédito nacional”.
Em 1935, as forças oposicionistas mais radicais concentraram-se de um lado na Aliança Nacional
Libertadora (ANL), movimento lançado em março de 1935, que abrigava propostas
antiimperialistas e contrárias à concentração da propriedade territorial, e, de outro, na Ação
Integralista Brasileira (AIB), movimento liderado por Plínio Salgado que encampava os princípios
sindical-corporativistas. O Globomostrou-se radicalmente contrário a ambas as tendências,
considerando-as de cunho extremista e “perigosas ao funcionamento da democracia”.
A decretação, em abril de 1935, da Lei de Segurança Nacional, instrumento de poder do Estado
contra a oposição radical representada pela ANL e pela AIB, foi nesse sentido aceita pelo jornal.
Segundo depoimento de Ricardo Marinho, contudo, O Globo teria feito algumas restrições, na
medida em que a nova lei não faria mais do que fortalecer Getúlio Vargas. A posição contrária à lei,
ainda que não expressa com clareza, transparecia mais nas omissões cometidas nos editoriais. Por
sua vez, a dissolução da ANL, em julho de 1935, foi considerada por O Globo como o desfecho de
uma das mais ruidosas campanhas em que o próprio jornal se empenhara desde a sua fundação. E
uma vez fechada a ANL, o jornal comprometeu-se a não poupar esforços “no combate aos
extremismos verde e vermelho”.
A deflagração da Revolta Comunista no Nordeste em novembro de 1935 foi noticiada por O
Globo na edição no dia 25, que deu especial atenção aos eventos ocorridos em Olinda e Natal. Dois
dias depois, a rebelião eclodiu no Rio de Janeiro, através do levante do 3º Regimento de Infantaria,
sediado na Praia Vermelha, e de uma companhia de Escola de Aviação Militar do Campo dos
Afonsos. O Globo cobriu amplamente o acontecimento, tirando sucessivas edições à medida que
seu corpo de repórteres, enviado para diversos pontos nas vizinhanças da Praia Vermelha, obtinha
novas informações. O levante foi sufocado ainda em 27 de novembro e no dia seguinte O
Globo declarava em editorial que “sobre as cabeças de seus criminosos” cairiam as “maldições da
sociedade brasileira”.
Após o colapso do levante, Roberto Marinho recomendaria diariamente a seus repórteres
vigilância aos comunistas e integralistas. As perseguições desencadeadas pelo governo contra os
comunistas foram do inteiro agrado do jornal, para quem “o combate à ideologia vermelha com
seu rosário de inconveniências para um povo da nossa formação moral e religiosa continuava como
um dos objetivos mais sérios”. O jornal procuraria “advertir as autoridades quanto aos perigos que
o comunismo representava”.
Em 1937, estando próximo o fim do mandato de Getúlio Vargas e iniciando-se os debates em
torno da sucessão presidencial, O Globo apoiou a candidatura de Armando de Sales Oliveira, que
concorria contra o candidato oficial, José Américo de Almeida. Armando de Sales seria “o candidato
das correntes democráticas nacionais”, portador de uma “mensagem progressista mais elevada”,
em contraposição aos “traços demagógicos” de José Américo.
O ESTADO NOVO
Com o golpe perpetrado em 10 de novembro de 1937, estabeleceu-se o Estado Novo, período
em que Getúlio Vargas governou ditatorialmente. O novo regime, através da criação do
Departamento de Imprensa e Propaganda (DIP), afetou toda a imprensa, que a partir de então foi
submetida a censura. Em edição especial, em 10 de novembro de 1937, O Globo noticiou a outorga
da nova Constituição e a dissolução do Senado e da Câmara, bem como das assembléias legislativas
e das câmaras municipais. A censura fez com que o jornal preferisse “muitas vezes omitir a notícia a
divulgá-la sob a forma recomendada, com flagrante desvirtuamento do fato, pelo interesse dos
governantes e pela determinação dos censores”. Segundo Ricardo Marinho, O Globo sofreu
intervenção do DIP e Roberto Marinho chegou a ser chamado a prestar depoimento.
De modo geral, durante o Estado Novo o jornal passou a dar maior destaque à seção de esportes,
divulgando com maior cuidado, igualmente, o noticiário internacional. Entretanto, O Globo criticou
a medida governamental que instituiu impostos indiretos sobre o consumidor, vendo aí sérias
possibilidades de aumento do custo de vida. Mais adiante, o jornal apoiou a reforma da legislação
criminal, cujo projeto havia sido elaborado por José de Alcântara Machado de Oliveira.
Internacionalmente, O Globo mostrou-se favorável à política externa de Franklin Roosevelt,
presidente dos Estados Unidos, preocupado em conclamar as nações para um esforço conjunto em
prol da reconstrução da ordem mundial, sob o argumento de que “nenhum grupo de nações pode
gozar de prosperidade enquanto outra parte se debate em terrível e desagregante crise”.
Em 1938, o movimento integralista articulou um golpe que contou com o apoio de setores
oposicionistas liberais e pretendia depor Vargas. O chamado putsch integralista (11/5/1938), que
redundou em fracasso, foi veementemente condenado por O Globo. O editorial referente ao
episódio afirmava: “Contra esse estado de coisas... sempre protestamos, timbrando em não
diferençar nos seus intuitos e técnicas os amantes do credo verde dos de Moscou”.
A vigilância do governo sobre a imprensa não impediu O Globo de, embora mantendo-se
favorável à construção da usina siderúrgica de Volta Redonda, fazer pequenas críticas ao fato de
esta ter sido construída no estado do Rio, cujo interventor, Ernâni Amaral Peixoto, era genro de
Vargas. Contudo, em relação à política social de Getúlio, O Globo não fez restrições, apoiando o
desenvolvimento da legislação trabalhista. Da mesma forma, a aproximação de Getúlio Vargas com
o Eixo, manifestada por essa ocasião através do incremento das relações comerciais entre Brasil e
Alemanha, não foi criticada pelo jornal. Também passou despercebido ao crivo de O Globo o
discurso pronunciado por Getúlio Vargas em julho de 1940 a bordo doMinas Gerais, considerado
simpático ao fascismo. Nesse pronunciamento, Getúlio manifestou-se partidário das mudanças
sociais, econômicas e políticas, devido à época turbulenta que se atravessava, afirmando que
“passou a época dos liberalismos imprevidentes” e que “à democracia política substitui a
democracia econômica”.
Por outro lado, desde o início da Segunda Guerra Mundial, O Globo se colocou a favor dos
Aliados, mostrando-se decididamente contra a neutralidade brasileira e expressando em editorial
sua esperança de que os ideais pan-americanistas “abroquelassem cada vez mais as nações do
continente contra incursões do imperialismo distante”. Em dezembro de 1941 os norte-americanos
entraram na guerra e, em janeiro de 1942, o Brasil rompeu relações com o Eixo. Por fim, em agosto
de 1942, O Globo considerou “traiçoeira selvageria” a agressão de navios brasileiros por
submarinos alemães, publicando o editorial “Desafio e ultraje ao Brasil”, em que defendia o
ingresso do Brasil na Guerra. A partir daí, O Globo faria ampla cobertura da Força Expedicionária
Brasileira (FEB) na Itália, lançando o tablóide O Globo Expedicionário, dirigido por Pedro Mota Lima,
destinado a manter elevado a moral dos pracinhas brasileiros que combatiam na Itália. O tablóide
foi publicado de 7 de julho de 1944 a 23 de maio de 1945, semanalmente. Além disso, O Globo fez
apelo ao voluntariado. Por essa ocasião, também em dezembro de 1944, nascia a Rádio Globo.
Durante os últimos anos do Estado Novo, O Globo uniu-se às correntes políticas que buscavam
reintegrar o país ao processo democrático. Em função do que chamava de espírito continuísta de
Getúlio, o jornal considerava inevitável a deposição do presidente. Nesse sentido, apoiou e deu
ampla cobertura ao chamadoManifesto dos mineiros, lançado em outubro de 1943 com as
assinaturas de importantes nomes da política mineira. O documento, que reivindicava a
democratização do país, é considerado a primeira manifestação ostensiva da oposição ao Estado
Novo, partida de lideranças políticas liberais e conservadoras.
À medida que se enfraquecia o regime, O Globo assumia posições favoráveis à anistia, às eleições
livres e à eleição de uma constituinte que elaborasse uma nova carta para substituir a Constituição
de 1937. A organização da sociedade civil e a conseqüente criação de partidos foi acompanhada
cuidadosamente pelo jornal, que, se inicialmente não se definia por nenhum programa de maneira
integral, mantendo uma seção onde se debatiam os mais diversos princípios partidários, acabou
por apoiar a União Democrática Nacional (UDN) e a candidatura do brigadeiro Eduardo Gomes à
presidência da República. Contra Eduardo Gomes, disputavam o cargo o general Eurico Dutra, do
Partido Social Democrático (PSD), Iedo Fiúza, apoiado pelo Partido Comunista Brasileiro (PCB) e
contra quem o jornal desencadeou campanha sob a acusação de corrupção na prefeitura de
Petrópolis, e Plínio Salgado, pelo Partido de Representação Popular (PRP). Por essa ocasião, O
Globo publicou uma entrevista de Góis Monteiro em que este declarava ter regressado de
Montevidéu para “acabar com o Estado Novo”. Logo em seguida, a anistia concedida aos inimigos
do regime foi aplaudida pelo jornal, que entretanto não a desejava irrestrita e ampla. O jornal foi
contrário às últimas medidas econômicas de Vargas, como a lei de repressão ao abuso do poder
econômico, a chamada Lei Malaia, decretada em junho de 1945.
DE 1945 A 1964: A RECONSTITUCIONALIZAÇÃO
Por fim, a deposição de Getúlio Vargas, em 29 de outubro de 1945, foi do inteiro agrado de O
Globo, que se mostrara durante o mês de agosto decididamente contrário à marcha dos
trabalhadores queremistas e à proposta da “Constituinte com Getúlio”. Entretanto, o jornal
demonstrou expectativa diante do governo do presidente José Linhares, não o apoiando
incondicionalmente.
O período imediatamente posterior ao Estado Novo era considerado por O Globo como de
redemocratização lenta, em que a vida política nacional se recompunha, “somente perturbada pela
ação subversiva dos comunistas que, através de sua atividade partidária e parlamentar,
mantiveram a nação permanentemente agitada... com a fomentação de greves e outras
provocações”. As greves eram desencadeadas “por conta dos asseclas de Luís Carlos Prestes”, líder
do então legalizado PCB.
O Globo não fez oposição sistemática ao governo do marechal Eurico Dutra, vitorioso nas
eleições de 2 de dezembro de 1945. Durante esse período, o jornal solidarizou-se com o
lançamento do PCB na ilegalidade (1947) e fez campanha para que fossem cassados os mandatos
dos representantes comunistas, tanto na Câmara dos Deputados, onde chegavam a 14, quanto na
Câmara do Distrito Federal, onde ocupavam 18 cadeiras, num total de 50. O Globo apoiou
igualmente o rompimento das relações diplomáticas com a União Soviética.
Nos debates em relação à estratégia do desenvolvimento econômico a ser seguida, O Globo era o
principal porta-voz da linha neoliberal, que tinha como teórico Eugênio Gudin. O jornal defendia a
fórmula que, segundo Thomas Skidmore, baseava-se na suposição de que o mecanismo de preços
deveria ser respeitado como principal determinante da economia. As medidas fiscais e monetárias,
bem como a política de comércio exterior, deveriam seguir os princípios ortodoxos estabelecidos
pelos teóricos e praticantes da política de banco central dos países industrializados. Os orçamentos
governamentais deveriam ser equilibrados e as emissões, severamente controladas. O capital
estrangeiro deveria ser bem recebido e estimulado como ajuda indispensável para um país carente
de capitais. As limitações impostas pelo governo ao movimento internacional do capital, do
dinheiro e dos bens deveriam ser reduzidas ao mínimo. Essa autodisciplina aumentaria ao máximo
a mobilidade dos fatores e relegaria o Brasil a seu papel econômico natural, inevitável e inapelável,
sob a lei inexorável da vantagem comparativa.
Os debates relativos à sucessão de Dutra se articularam em torno das candidaturas de Getúlio
Vargas, lançado pela coligação do Partido Trabalhista Brasileiro (PTB) com o Partido Social
Progressista (PSP); do brigadeiro Eduardo Gomes, novamente indicado pela UDN; e de Cristiano
Machado, do PSD. O Globo, o primeiro órgão de imprensa a levantar, já em 1949, a possibilidade
de retorno de Vargas ao poder, apoiou mais uma vez o brigadeiro, o que se deveu, segundo Ricardo
Marinho, “à sua figura de grande democrata e patriota”. Ainda assim, a edição comemorativa do
30º aniversário do jornal declarava que, “durante a campanha eleitoral que se desdobrou intensa
não só na capital da República como em todo o país, O Globomanteve uma linha de conduta de real
imparcialidade. Procurava esclarecer a opinião pública e trazê-la bem informada, sem manifestar-
se favorável a esta ou àquela corrente em luta. Dentro de tal propósito, ofereceu ampla cobertura
de todos os setores, com reportagens, entrevistas de candidatos e completo noticiário, fartamente
ilustrado”.
Com a vitória de Vargas desencadeou-se o debate em torno da legitimidade de sua vitória,
levantado pelo líder oposicionista Carlos Lacerda sob a alegação de que o candidato não havia
obtido maioria absoluta nas eleições. Segundo Ricardo Marinho, O Globo omitiu-se diante da
questão, uma vez que não desfrutava de base política para apoiar um movimento de caráter
inconstitucional. Após a posse de Vargas, no entanto, o jornal fez intensa oposição a seu governo.
Durante esse período, a discussão em torno da estratégia econômica a ser adotada partia de três
posições fundamentais: a neoliberal, cujo principal teórico continuava a ser Gudin; a
desenvolvimentista, preconizada pela Comissão Econômica para a América Latina (CEPAL); e a
nacionalista radical, encampada pelo PCB. O Globo permaneceu fiel aos princípios neoliberais,
apoiando também o Plano Lafer, plano qüinqüenal elaborado por Horácio Lafer, então ministro da
Fazenda, que pretendia investir um bilhão de dólares nas indústrias de base e nos setores
estrangulados de transportes e energia. O Globo se mostraria outra vez favorável a Lafer, mais
tarde, no momento em que sua política antiinflacionária de contenção de crédito se chocou com a
política de crédito fácil preconizada por Ricardo Jafet, presidente do Banco do Brasil.
Em janeiro de 1952, O Globo manifestou-se contra o decreto presidencial que limitava em 10% a
remessa de lucros. Segundo Ricardo Marinho, O Globo jamais se posicionou contra o capital
estrangeiro, cujo ingresso era considerado benéfico na medida em que concorria para o
crescimento do país. Em março do mesmo ano, o jornal apoiou a substituição, no Ministério da
Guerra, do general Newton Estillac Leal, considerado “simpatizante do credo de Moscou”, pelo
general Ciro do Espírito Santo Cardoso. Logo em seguida, nas eleições para a presidência do Clube
Militar, o jornal apoiou a candidatura do general Alcides Etchegoyen, representante do grupo
favorável à íntima cooperação entre o Brasil e os EUA, que acabou por derrotar Estillac Leal.
Durante 1953, O Globo manifestou-se contra a Instrução nº 70 da Superintendência da Moeda e
do Crédito (Sumoc), que instaurou uma política cambial mais flexível, estabelecendo categorias
múltiplas para diversos tipos de exportações, importações e movimentos de capital. O jornal
desencadeou também violenta campanha contra a Petrobras, cuja criação foi aprovada nesse ano
pelo Congresso. Ainda em 1953, o aumento em 100% do salário mínimo, decidido pelo ministro do
Trabalho, João Goulart, foi considerado nefasto pelo jornal, que viu aí a principal causa do aumento
do custo de vida.
À medida que se intensificava a crise política do governo Vargas, O Globo acirrava a oposição ao
presidente encampando a tese do impeachment proposta pela UDN e participando da intensa
campanha que a imprensa movia contra o jornal situacionista Última Hora, de Samuel Wainer.
Segundo Ricardo Marinho, O Globojustificava sua atitude contra um governo eleito
constitucionalmente em função dos “desmandos” que cometera.
O Globo fez ampla cobertura do chamado atentado da Toneleros, em 5 de agosto de 1954,
contra Carlos Lacerda, cuja vítima foi seu acompanhante, o major-aviador Rubens Vaz. O jornal
cobriu igualmente o inquérito policial-militar instaurado pela Aeronáutica para apurar os
responsáveis. O inquérito, instalado na Base Aérea do Galeão, dispôs de amplos poderes para
convocar autoridades suspeitas de envolvimento no crime e constituiu importante elemento no
quadro do acirramento da campanha contra Vargas. O Globopublicou todo o relatório do inquérito
num tablóide sob o título O livro negro de corrupção.
O suicídio de Vargas, 19 dias após o atentado da Toneleros, em 24 de agosto de 1954,
determinou o apedrejamento da sede de O Globo e a queima de caminhões de entrega do jornal.
Em conseqüência disso, o jornal evitou tecer comentários sobre o episódio, limitando-se a noticiá-
lo. O governo de João Café Filho, vice-presidente de Getúlio e seu substituto imediato, foi contudo
apoiado pelo jornal por causa da sua aproximação política com a UDN. Café Filho chegou a nomear
Eugênio Gudin ministro da Fazenda.
Com o início dos debates sobre a sucessão presidencial, articularam-se as candidaturas de
Juscelino Kubitschek e João Goulart, pela coligação entre PSD-PTB, e de Juarez Távora, pela UDN. O
Globo permaneceu fiel aos princípios udenistas que o orientavam. Durante esse período,
aproximou-se igualmente de elementos do Exército ligados à UDN, identificando-se sobretudo com
o general Canrobert Pereira da Costa e acreditando na veracidade da chamada Carta Brandi. O
documento, divulgado em julho de 1955, seria endereçado a João Goulart pelo deputado argentino
Antônio Jesus Brandi e aludiria a supostas articulações com o governo peronista para a deflagração
de um movimento armado no Brasil. Um inquérito instaurado no mesmo ano comprovou tratar-se
de um documento forjado por falsários argentinos para ser vendido aos opositores de Goulart.
Com a vitória de Juscelino Kubitschek, O Globo encampou a tese da maioria absoluta novamente
lançada pela UDN e seguiu identificado com as propostas desse partido ao longo dos episódios que
se sucederam, culminando no movimento do 11 de Novembro de 1955. Esse movimento militar,
liderado pelo general Henrique Lott com o objetivo de barrar uma conspiração contra a posse de
Juscelino, que supostamente se preparava no governo, acabou por provocar o impedimento do
presidente interino, Carlos Luz, substituto de Café Filho, que se havia licenciado por motivo de
saúde.
Ao longo do governo de Juscelino Kubitschek, O Globo manteve-se na oposição, apoiando a
política do Fundo Monetário Internacional (FMI), que preconizou maior combate à inflação e
restrição ao crédito, com o qual o presidente acabou rompendo. Em editoriais e mesmo através de
colaboradores, o jornal criticava a construção de Brasília, atribuindo a inflação que se verificava aos
excessivos gastos de Juscelino. Na questão desencadeada entre Lucas Lopes, ministro da Fazenda,
que procurava conciliar-se com o FMI, e Pais de Almeida, presidente do Banco do Brasil, O
Globo apoiou o primeiro. Viu, contudo, com bons olhos, a implantação da indústria automobilística.
A despeito da oposição movida por O Globo, Juscelino Kubitschek nomeou Roberto Marinho
secretário da Comissão Nacional da Ordem do Mérito. Ainda durante a gestão Juscelino, o jornal
desencadeou uma campanha contra o recém-fundado Instituto Superior de Estudos Brasileiros
(ISEB), considerado como um “pedante ninho algo luxuoso de agitadores comunistas”. Além de
ataques pessoais ao diretor Roland Corbisier, O Globo chamou a atenção para a “indisfarçável e
curiosa coincidência de linhas políticas que se constata nos movimentos dos rapazes isebianos —
agindo na superestrutura — e as Ligas Camponesas no Nordeste — agindo junto às camadas mais
sensíveis de nosso povo”.
Por ocasião dos debates em torno da sucessão de Juscelino, O Globo apoiou irrestritamente a
candidatura Jânio Quadros, que com o apoio da UDN venceu o pleito, derrotando o candidato
petebista, o marechal Henrique Lott. O vice-presidente de Jânio, contudo, seria João Goulart,
filiado ao PTB.
Durante o governo de Jânio Quadros, o jornal recebeu com perplexidade algumas das medidas
presidenciais, sobretudo as relativas à política externa. A condecoração de Ernesto “Che” Guevara,
ministro das Relações Exteriores de Cuba, e o projeto de reatamento de relações diplomáticas com
os países socialistas foram violentamente combatidos. Ainda assim, O Globo considerava
inoportuna a campanha que Lacerda, então governador da Guanabara, desencadeara contra o
presidente.
A renúncia de Jânio, em 25 de agosto de 1961, foi igualmente recebida com perplexidade. De
imediato, O Globo foi contra a posse de João Goulart, apoiando, no entanto, a opção
parlamentarista, adotada pelo Congresso em setembro de 1961, como forma conciliatória para
propiciar a posse do vice-presidente. Durante o governo João Goulart, O Globo permaneceu na
oposição, defendendo os interesses do capital estrangeiro e atacando as reformas de base
propostas pelo presidente.
O jornal declarou-se contrário à reforma agrária, mesmo se esta fosse feita com indenização,
afirmando considerar o minifúndio economicamente prejudicial. Manifestou-se contra o plebiscito
de janeiro de 1963, que promoveu o retorno ao regime presidencialista, alijando o
parlamentarismo do cenário político. Condenou igualmente a desapropriação dos bens da
American and Foreign Power Company (Amforp) em abril de 1963, permanecendo ao lado das
proposições do FMI, que dera parecer desfavorável à política econômica levada a efeito por João
Goulart. O Globo pronunciou-se também contra a Lei de Remessa de Lucros, cuja regulamentação
foi emitida em janeiro de 1964.
Por fim, a eclosão do movimento militar de março de 1964, que derrubaria o governo João
Goulart, foi prontamente apoiada por O Globo.
DE 1964 AO GOVERNO GEISEL
No início de abril de 1964, O Globo declarava que “agora o Congresso dará o remédio
constitucional à situação existente, para que o país continue a sua marcha em direção a seu grande
destino, sem que os direitos individuais sejam afetados, sem que as liberdades públicas
desapareçam, sem que o poder do Estado volte a ser usado em favor da desordem, da indisciplina
e de tudo aquilo que nos estava a levar à anarquia e ao comunismo”. Posteriormente, no
editorial 50 anos, publicado por ocasião do 50º aniversário do jornal, o movimento militar de 1964
era visto como o reencontro da Nação: “Os tenentes, então generais reformados, os
expedicionários, então responsáveis pela chefia das forças armadas, e os líderes políticos herdeiros
de tradições de várias décadas de luta pela democracia uniram-se, sob a pressão das grandes
marchas populares para uma nova revolução”.
O Globo deu apoio ao governo do marechal Castelo Branco, presidente eleito pelo Congresso em
11 de abril de 1964. Contudo, tendo rompido com Carlos Lacerda em 1963, nas eleições de outubro
de 1965 Roberto Marinho apoiou a candidatura oposicionista de Negrão de Lima ao governo da
Guanabara contra o candidato de Lacerda, Flexa Ribeiro. A despeito do apoio a Negrão de Lima, O
Globo permaneceu identificado com Castelo Branco, encampando as renegociações do governo
com o FMI, o Plano de Ação Econômica organizado por Roberto Campos e o programa de
austeridade mon etária, e não se manifestando contra as diversas cassações perpetradas pelos
primeiros atos institucionais
Ainda durante o governo Castelo Branco, em 1965, Lacerda denunciava “infiltração de capital
forasteiro” na televisão. Na verdade, referia-se a “acordos ilegais” firmados entre a TV Globo —
fundada em abril daquele ano — e o grupo norte-americano Time-Life. A denúncia fora efetuada
através do depoimento de Alberto Hernandes Catá, assessor de Roberto Marinho na TV Globo.
Catá teria vínculo trabalhista apenas com Time-Life, que lhe pagava em dólares, e denunciava a
subordinação do grupo brasileiro ao estrangeiro em face da situação econômico-financeira das
empresas e a orientação ministrada através da assessoria técnica, decorrente do contrato firmado.
Catá referiu-se também à conferência pronunciada pelo vice-presidente de Time-Life, Weston
Pullen Jr., sobre a ampliação de suas atividades nos países sul-americanos e de comentários
publicados pelo órgão especializado Television Age sobre a aquisição pelo Grupo Marinho-Time-Life
de mais uma emissora em São Paulo. Alegou, finalmente, a violação do artigo 160 da Constituição e
do artigo 28 §2º, item II, do Regulamento dos Serviços de Radiodifusão (Decreto nº 52.795, de 31
de outubro de 1963), que dizia: “Proibição de ser firmado qualquer convênio, acordo ou ajuste
relativo à utilização das freqüências consignadas e exploração do serviço, com outras empresas ou
pessoas, sem prévia autorização do Conselho Nacional de Telecomunicações (Contel).”
Enquanto a questão era levada ao conhecimento do Contel, o deputado Eurico de Oliveira
apresentava requerimento à Câmara pedindo instauração de uma comissão parlamentar de
inquérito para apuração das denúncias. À campanha desencadeada contra O Globo aderiram os
Diários Associados, através de João Calmon, presidente da Associação Brasileira de Empresas de
Rádio e Televisão, e mais adiante O Estado de S.Paulo. A favor de Roberto Marinho permaneceu
o Jornal do Brasil, que considerava a campanha “jacobinismo provinciano”.
Acusava-se O Globo de ter recebido em dólares importância superior a cinco bilhões de cruzeiros
e de ter vendido o prédio da TV Globo ao Time-Life, alegando-se a existência de contratos que
provariam o vínculo societário, proibido pela Carta Magna e pelo Código Brasileiro de
Telecomunicações. Uma vez instalada a CPI, obteve-se de início as cópias dos contratos celebrados
entre as empresas nacional e estrangeira (contrato da sociedade em conta de participação,
contrato de assistência técnica e escritura de cessão de direitos e promessa de compra e venda do
prédio da TV Globo) e na Junta de Registro de Comércio apurou-se extravio do processo da TV
Globo Ltda., que lá deveria se encontrar arquivado, o mesmo ocorrendo no 11º Ofício de Notas,
onde se constatou o desaparecimento da folha correspondente ao instrumento da escritura da
cessão de direito e promessa de compra e venda do prédio da TV.
Depuseram Roberto Marinho e alguns ex-diretores da TV Globo e José Tomás Nabuco de Araújo,
representando o grupo Time-Life. Roberto Marinho contestou as acusações argumentando que “o
contrato denominado principal, a que se refere o mesmo ofício, foi celebrado em Nova Iorque em
22 de junho de 1962, não tendo sido remetidos para o Brasil os respectivos originais. Esse contrato
só entraria em vigor cumpridas condições previstas em sua cláusula II, e antes que isso se
verificasse foi ele revogado por acordo mútuo, havendo sido convertido em financiamento sob
forma de conta de participação, em um contrato de cessão de promessa de venda do terreno à rua
Von Martius s/nº, bem como do edifício nele construído”. Mais adiante, Roberto Marinho afirmava
que “confirmamos assim os dizeres do nosso ofício anterior, no qual esclarecemos que o contrato
denominado principal não chegou a ter existência legal no Brasil, pois embora rubricada a
respectiva minuta pelas partes em 1962, foi enviado aos Estados Unidos para ser celebrado lá, não
tendo voltado jamais ao Brasil sob a forma definitiva para início das relações contratuais”.
Contudo, em 21 de janeiro de 1966 Roberto Marinho concordou em enviar ao Contel cópias dos
contratos da TV Globo com o Time-Life. No mesmo dia, o presidente Castelo Branco determinou a
instalação de uma comissão de alto nível para investigar as denúncias de infiltração estrangeira na
imprensa, que seria constituída cinco dias depois por Gildo Ferraz, Bruno Negreiros e Celso Silva. As
conclusões a que chegou a comissão, assinadas por Gildo Ferraz, declaravam reconhecer a
ingerência estrangeira nos negócios da empresa e que a expansão do domínio de Time-Life poria
em risco a própria segurança nacional, “pois já se encontram sob o seu controle, nas mesmas
condições da TV Globo, os bens adquiridos pelo sr. Roberto Marinho à Organização Victor Costa,
compreendendo entre outros a TV Paulista e a TV Bauru”. O parecer de Gildo Ferraz finalizou
advertindo para “o perigo da propagação pelo país... dado que o sr. Roberto Marinho possui em
tramitação no Contel pedido de concessão de 36 emissoras de rádio, algumas com canal de
televisão, nas capitais e cidades mais populosas”. Contudo, segundo Ricardo Marinho, Roberto
Marinho desligou-se do grupo Time-Life, indenizando-o para “evitar pretextos que viessem a afetar
a empresa”.
O Globo foi favorável à prorrogação do mandato de Castelo Branco. Durante o governo do
marechal Costa e Silva, empossado em 15 de março de 1967, o jornal, embora seguisse em seu
apoio às principais teses do movimento militar de 1964, mostrou algumas reservas. Já o governo do
general Garrastazu Médici recebeu total adesão. Transformado gradualmente no mais governista
dos jornais, O Globo deixou lentamente sua posição favorável à privatização das empresas,
encampando, a partir do governo Ernesto Geisel, a política de estatização, num momento em que
órgãos da imprensa liberal, como o Jornal do Brasil e O Estado de S.Paulo, lhe faziam restrições e
combatiam a Petrobras. O Globo, ao contrário, embora fosse um tradicional inimigo da Petrobras,
passou a apoiá-la durante o governo Geisel.
O editorial comemorativo do 50º aniversário do jornal, em 1975, reafirmou o propósito de O
Globo de dar “firme combate à subversão”, declarando ao mesmo tempo que o crescimento
econômico do país criara “condições de trabalho profícuo, ensejando que, embora sempre
vigilantes, possamos partir para a implantação do desenvolvimento político e social”.
ABERTURA POLÍTICA
O projeto de distensão “lenta, gradual e segura”, apresentado pela facção liberal do regime
militar, foi tratado nas páginas de O Globo como um processo contínuo de transição para a
democracia. Momentos conturbados como o Pacote de Abril, que redundou no fechamento do
Congresso, em abril de 1977, para a aprovação de um conjunto de leis com o intuito de fortalecer o
partido governista, foram vistos pelo jornal como momentos de intransigência por parte da
oposição, capazes de impedir a “boa evolução do problema institucional brasileiro”.
Em 1979, quando foi aprovada a lei da anistia, permitindo a libertação de presos políticos e a
volta do exílio de personagens como Luís Carlos Prestes e Leonel Brizola, O Globo elogiou o
encaminhamento dado à questão e procurou encontrar na atitude do presidente João Figueiredo
um sentido de conciliação e compromisso com os princípios de liberalização do regime. A escalada
de atos terroristas promovidos por grupos militares de direita, iniciada logo após a aprovação da
anistia, recebeu imediata desaprovação do jornal. Todos os principais atentados a bomba foram
listados na edição de 2 de maio de 1981, como parte da cobertura do caso Riocentro. Nessa
ocasião, uma bomba explodiu durante um show em comemoração ao Dia do Trabalho, atingindo
dois militares num automóvel estacionado naquele centro de convenções localizado no Rio de
Janeiro. A reportagem de O Globo divulgou a explosão de uma segunda bomba, meia hora depois,
na casa de força, contrariando a versão oficial de que os militares seriam vítimas, e não autores.
DA REFORMA PARTIDÁRIA À ELEIÇÃO DE TANCREDO
O fim do bipartidarismo e a extinção dos partidos governista e oposicionista, a Aliança
Renovadora Nacional (Arena) e o Movimento Democrático Brasileiro (MDB), em dezembro de
1979, deram origem a um novo sistema partidário, acirrando a competição entre os partidos. O ano
de 1982 seria fundamental para testar esse sistema, com os governadores passando a receber o
voto direto da população. No Rio de Janeiro, a candidatura de Leonel Brizola chamou especial
atenção pelo que representava seu passado de líder trabalhista, sendo tratada por O Globo como
um “fenômeno populista”, soma de oposicionismo generalizado e habilidade política para explorar
as dificuldades econômicas do povo. Nessa eleição, O Globo apoiou o candidato do Partido
Democrático Social (PDS), Moreira Franco, ex-prefeito de Niterói, considerando-o mais bem
preparado intelectualmente em relação aos seus adversários e também o único portador de uma
real experiência administrativa.
Durante os três primeiros dias da apuração dos votos das eleições para governador, as empresas
Globo foram acusadas de participação em uma tentativa de fraude. Os dados da Proconsult,
empresa de computação contratada pelo TRE (Tribunal Regional Eleitoral), apontavam então a
vitória de Moreira Franco. Esse resultado era também confirmado pelas pesquisas divulgadas então
pela Rede Globo. Na verdade a emissora reproduzia, por medida de economia, os resultados do
jornal O Globo, que vinha divulgando mais lentamente os dados e começara pelas urnas do interior.
Esses dados contrastavam fortemente, porém, com todas as pesquisas de boca de urna então
divulgadas e que acabaram sendo confirmadas pela recontagem dos votos.
O governo Brizola foi duramente criticado pelo jornal como centralizador e ineficiente. Seu
principal projeto ligado à educação, a construção dos CIEPs, foi tratado como dispendioso e movido
por objetivos de promoção política. Na data em que se completaram cem dias de
mandato, O Globo anunciou uma crise administrativa, com reflexos na segurança pública e na
discussão do aumento do funcionalismo, cuja natureza estaria no estilo personalista do
governador.
A sucessão do presidente João Figueiredo foi marcada pela tentativa de promulgação da emenda
Dante de Oliveira, que propunha, de imediato, a eleição direta para presidente da República. O
Globo não apoiou a campanha nacional a favor da emenda, iniciada no fim de 1983. Entretanto, a
cobertura dos últimos comícios ganhou destaque, tendo sido considerado o comício da Candelária,
no Rio de Janeiro, a maior concentração política da história da cidade. Porém, quando o governo
do presidente João Figueiredo decidiu encaminhar uma proposta que mantinha o Colégio Eleitoral
e definia as bases das eleições diretas, adiadas para o próximo pleito, O Globo enfatizou: “O
reconhecimento pelo governo de uma vontade nacional de mudança, na direção única da abertura
política, confere ao projeto de reforma constitucional do presidente Figueiredo uma índole
democrática que nenhuma imperfeição ou omissão tópica da emenda pode desmerecer”.
As medidas de exceção impostas em Brasília para evitar concentrações públicas de apoio às
diretas também receberam aprovação do jornal, sendo consideradas perfeitamente de acordo com
a ordem constitucional vigente. Na data da votação da emenda Dante de Oliveira, O
Globo conclamou o Congresso a votar afastado do apelo das ruas, cumprindo seu papel específico.
Após a derrota da emenda, em 25 de abril de 1984, o jornal passou a defender ainda mais
enfaticamente a proposta do presidente Figueiredo, entendendo-a como a única possibilidade de
negociação entre o governo e a oposição.
Em 7 de outubro de 1984, no editorial “O julgamento da revolução”, publicado na primeira
página, Roberto Marinho fez um balanço da atuação de seu jornal durante os anos do
autoritarismo e concluiu: “Não há memória de que haja ocorrido aqui, ou em qualquer país, que
um regime de força, consolidado há mais de dez anos, se tenha utilizado de seu próprio arbítrio
para se autolimitar, extinguindo os poderes de exceção, anistiando os adversários, ensejando
novos quadros partidários, em plena liberdade de imprensa. É esse o maior feito da Revolução de
64.”
Meses mais tarde, a escolha de Tancredo Neves para concorrer com Paulo Maluf na disputa pela
presidência da República pela via indireta recebeu apoio do jornal. Trazendo o lema da conciliação,
a candidatura Tancredo foi vista como uma garantia de transição sem riscos. Após a confirmação
de seu nome pelo Colégio Eleitoral, O Globo chamou-o de “O mensageiro da conciliação”, homem
público capaz de reconhecer, apesar de sua militância oposicionista, “o relevante papel do
presidente Figueiredo e das Forças Armadas no feliz encaminhamento da sucessão presidencial e
da transição para a plenitude democrática”.
A NOVA REPÚBLICA E AS ELEIÇÕES DE 1989
Com a morte de Tancredo Neves, em 21 de abril de 1985, e a posse de seu vice José Sarney, O
Globo passou a considerar o novo presidente um continuador da obra de Tancredo, “timoneiro
munido das credenciais necessárias” para manter a sustentação política da Nova República.
O segundo ano do governo Sarney foi marcado pela euforia do Plano Cruzado, havendo uma
resposta popular intensa de apoio às medidas econômicas por ele implementadas. O Globo deu
total apoio ao plano, visto como a “reforma mais importante da história do país”, e rebateu as
críticas de Leonel Brizola, de que seria apenas fruto do desespero de “um projeto de poder pessoal
desalojado pelo programa de estabilização econômica”.
As eleições para os governos estaduais, em novembro de 1986, representaram um capítulo a
mais nas desavenças entre Roberto Marinho e Leonel Brizola. Em nota oficial, divulgada pouco
antes das eleições, o governador acusou o ex-presidente João Figueiredo, o presidente José Sarney
e as Organizações Globo de estarem conspirando juntos contra o seu governo. Como resposta, O
Globo publicou, em 10 de novembro de 1986, um editorial que tratava essas acusações como uma
fábula narrada por alguém “que não dispõe de um mínimo de argumentos para justificar o
dramático fracasso de sua administração”, além de pedir à população um voto de repúdio ao
governo do PDT. Dias depois, em 13 de novembro, ao focalizar o último comício do candidato
apoiado por Brizola, o vice-governador Darci Ribeiro, no editorial “O terrorismo moreno”, afirmava
o jornal : “No desfile organizado pelos banqueiros do bicho, na avenida Rio Branco, para
encerramento da campanha eleitoral a que ora se dedicam no sentido de organizar o continuísmo
da sua impunidade, não poderia faltar um carro alegórico. Uma elefanta, com um cartaz em que se
lia o número 12 — que corresponde ao do animal no jogo do bicho e ao do candidato Darci Ribeiro
na cédula eleitoral — constitui-se no símbolo da grande aliança entre a marginalidade e o governo
estadual.”
Durante os trabalhos da Assembléia Nacional Constituinte, iniciados em 1º de fevereiro de
1987, O Globocriticou a “prodigalidade nociva” dos capítulos referentes aos direitos sociais.
Procurou demonstrar o quanto esses benefícios poderiam implicar a elevação dos custos da
produção industrial, na medida em que “a Constituinte preocupa-se mais com benesses e favores
trabalhistas excessivos e menos com medidas que impulsionem nossa economia”. Também acusou
os parlamentares de colocarem o Brasil na “contramão da história”, ao dificultar a entrada do
capital estrangeiro.
Outros pontos de atrito com a Constituinte foram a questão tecnológica e a reserva de mercado
para a informática, os monopólios das empresas estatais, o tabelamento dos juros em 12% ao ano
e a proposta parlamentarista, considerada golpismo, conforme o editorial de 19 de novembro de
1987, onde se lê: “Os atuais congressistas foram eleitos para exercer funções legislativas, mas não
para eleger e depor, de forma indireta, o chefe do Poder Executivo.”
Contudo, em 5 de outubro de 1988, O Globo enfatizou que a nova Constituição que se
promulgava naquele dia exprimia a recuperação da cidadania, parabenizando-a por ter sido
“moldada sobre a soberania popular”. Nessa data, as únicas críticas do jornal recaíram sobre o
deputado Ulisses Guimarães, cuja autoridade teria ultrapassado os limites da presidência dos
trabalhos constituintes para servir aos seus interesses futuros, rumo à presidência da República.
Nos primeiros meses da campanha sucessória de 1989, o noticiário do jornal tinha em pauta o
problema do grande número de greves, ocorridas no vazio da não-regulamentação desse direito
pela Constituição de 1988. A greve nacional dos bancários recebeu destaque em diversos editoriais,
com ênfase na sua natureza política e irresponsável. Questionou-se a violência das greves,
principalmente após o movimento dos vigilantes de transportadoras de valores, quando vários
carros-fortes foram apedrejados por grevistas em piquetes. Por conta disso, O Globo apoiou a
medida provisória que regulamentava o direito de greve e definia os serviços considerados
essenciais, pois, na sua opinião, “quando os locais de trabalho são depredados e as empresas são
lançadas à insolvência, o trabalhador perde tanto quanto seu empregador”.
No campo internacional, iniciava-se a cobertura da crise do socialismo, com o noticiário sobre o
massacre dos estudantes chineses que protestavam contra o regime comunista na praça da Paz
Celestial, em Pequim, ocupando as manchetes principais por diversos dias. A repercussão dessa
cobertura permitiu o jornal repudiar “uma ideologia que perdeu fascínio e credibilidade, um regime
despido de lógica e coerência”. Em novembro de 1989, a queda do Muro de Berlim seria o ponto
alto dessa cobertura, pois naquele momento registrava-se o fim do “socialismo de incubadeira — o
socialismo que mantém a uma distância profilática outros regimes, povos e nações, o socialismo do
confinamento a instâncias burocráticas, pretensamente ungidas de pureza ideológica”.
O descontrole da economia, provocado pelo insucesso dos planos Cruzado (fevereiro de 1986),
Bresser (junho de 1987) e Verão (janeiro de 1989), e denunciado através da elevação dos índices
inflacionários, foi outra preocupação constante, por parte de O Globo, na cobertura das eleições de
1989. Na edição de 3 de agosto, a manchete principal assegurava: “Inflação derruba Maílson”. Era
um furo jornalístico feito a partir de fontes inexistentes, que demonstrava a indisposição do jornal
com o então ministro da Fazenda, Maílson da Nóbrega. A proximidade das eleições fez com que as
críticas à má condução da política econômica ganhassem cada vez mais espaço. O perigo da
avalanche inflacionária influir sobre a escolha dos candidatos em 15 de novembro levou o jornal a
acusar o governo de agir com “negligência criminosa”, nada fazendo para impedir a chegada da
inflação à marca dos 50% ao mês.
Os últimos meses da campanha revelaram o tratamento diferenciado do jornal aos principais
concorrentes à eleição presidencial, que seria a primeira a contar com o voto popular após 21 anos
de regime militar. Em outubro de 1989, O Globo divulgou uma foto de um depósito clandestino de
armas e munições, onde teria sido encontrado um pôster do então candidato do PDT à presidência
da República, Leonel Brizola, abraçado a um suposto traficante conhecido por Eureka. Tratava-se
de uma falsificação, pois a pessoa da foto era um líder comunitário, em nada envolvido com o
tráfico de drogas. Enquanto isso, a trajetória do candidato do Partido da Reconstrução Nacional
(PRN), Fernando Collor de Melo, era registrada nas páginas do periódico com notícias que
enfatizavam o crescimento de seu desempenho nas pesquisas de opinião e o apoio dado pelos
eleitores em todos os lugares por ele visitados.
Com a vitória de Collor no primeiro turno, O Globo posicionou-se ao seu lado, ressaltando os
aspectos positivos de sua personalidade, tais como patriotismo e espírito de liderança. Defendeu
suas idéias principais, resumidas no interesse pela abertura comercial e na redução do tamanho do
Estado, em detrimento das propostas acolhidas pelo Partido dos Trabalhadores (PT), consideradas
simplificadoras e retrógradas.
As acusações de Mirian Cordeiro, ex-namorada de Luís Inácio Lula da Silva, de ter sofrido
pressões do candidato petista para abortar a filha Luriam, feitas no horário gratuito do PRN, às
vésperas do último debate eleitoral, receberam grande destaque, ao lado de notícias sobre o
envolvimento da Igreja progressista na campanha da coalizão de partidos que apoiava a
candidatura de Lula, a Frente Brasil Popular, e de invasões de terras incitadas por militantes
petistas.
No editorial “O teste decisivo”, publicado após o debate final entre os candidatos, O Globo fez
um apelo em prol do voto “em quem revelou o discernimento, a segurança e a capacidade de
liderança indispensáveis ao próximo presidente da República: Fernando Collor de Melo”.
Conhecido o resultado das urnas, após o pleito de 17 de dezembro, fez-se uma avaliação da
eleição, vista como a “mais limpa e livre jamais levada a efeito no Brasil”. A vitória de Fernando
Collor foi avaliada por O Globo de maneira positiva: “Ele prega o restabelecimento da eficácia de
um Estado mais magro e mais ágil como a única via para alcançar a justiça social. Quer abrir os
portos, dinamizar as trocas, aumentar a produção e a produtividade com base na maior liberdade
em empreender e pretende encontrar saídas para os pontos de estrangulamento pela via do
diálogo e da inserção do país na comunidade das grandes potências econômicas.”
GOVERNO COLLOR
A posse de Fernando Collor, em 15 de março de 1990, e a subseqüente apresentação de seu
plano econômico mantiveram a expectativa positiva trazida por O Globo desde o encerramento das
eleições. A despeito dos aspectos recessivos do plano e da polêmica causada pela brutal redução
do meio circulante, feita através da limitação dos saques da poupança, conta corrente e aplicações
de curto prazo, houve uma tendência de valorizar a ênfase dada pelo novo governo ao processo de
privatizações e à reforma administrativa.
A repercussão internacional do Plano Collor foi acompanhada com bastante interesse por O
Globo, que chamou atenção para os novos investimentos feitos no Brasil após conversações entre a
ministra Zélia Cardoso de Melo e as agências de crédito no exterior. Anunciava-se uma nova visão
sobre o desenvolvimento econômico nacional, com ampla participação do capital estrangeiro, na
qual Collor estava perfeitamente engajado.
No decorrer de 1990, entretanto, a ação do Executivo através de medidas provisórias, em
conflito com as decisões emanadas do Supremo Tribunal Federal, especialmente nos casos
relativos à redução de salários de servidores federais postos em disponibilidade, e a dificuldade de
compor uma maioria estável para o governo passaram a formar a maior parte do noticiário da
imprensa. Mesmo não tendo conseguido realizar boa parte de seu programa, segundo O Globo o
presidente Collor detinha no mês de setembro um índice de popularidade de 79%.
A edição do Plano Collor II, em fevereiro de 1991, criticada por lideranças empresariais, devido à
sua opção de manter o congelamento de preços e salários, contou com o apoio de O Globo, que
criticou as previsões feitas na época, em vista das novas conseqüências recessivas do plano, como a
queda da produção, dos salários e do emprego.
As denúncias de corrupção que começaram a freqüentar o noticiário da grande imprensa a partir
do caso S.O.S. Rodovias, em junho de 1990, só tiveram repercussão em O Globo a partir de outubro
de 1991, quando o jornal denunciou a compra superfaturada de fardas e lençóis pelo Exército. As
denúncias divulgadas em 24 de maio de 1992 por Pedro Collor, em entrevista à revista Veja, sobre
a existência de um esquema de corrupção montado no interior do governo, e a posterior instalação
de uma CPI no Congresso para investigar a veracidade dessas acusações, também foram
timidamente recebidas, limitando-se O Globo a divulgar as notícias relativas ao caso, sem publicar
sua opinião em editoriais. Apenas a partir da cobertura das manifestações públicas de repúdio ao
presidente, iniciadas em agosto de 1992, com uma grande participação dos jovens, conhecidos
como “caras-pintadas”, passou o jornal a abordar diretamente o assunto em seus editoriais. Dias
após a conclusão dos trabalhos da CPI, em 1º de setembro de 1992, O Globo manifestou-se
dizendo: “Caso vingue o processo de impeachment, o Brasil não poderá voltar as costas aos
avanços significativos que já fizemos na direção de um país moderno, eficiente e, por isso, justo. O
atual programa de governo, em suas linhas gerais, representa mais que uma opção correta: ele é a
única escolha para uma sociedade que não se conforma com a estagnação e a miséria. Portanto
transcende as pessoas e os partidos.”
A DEFESA DAS REFORMAS
A defesa do projeto de modernização, via abertura comercial e atração de investimentos
externos para o Brasil, através da venda de empresas estatais, abraçada por O Globo desde fins do
governo Sarney, fez o jornal apoiar com reservas o governo Itamar Franco, iniciado em outubro de
1992, após o afastamento de Collor. As primeiras notícias referentes a esse governo demonstravam
o desentendimento entre as forças que o apoiavam. Na pasta da Fazenda, a rápida mudança de
nomes dos titulares causava apreensão. Nada se sabia quanto às possibilidades do programa de
privatizações, ao passo que Itamar acenava com propostas consideradas extravagantes, como a
recuperação da indústria automobilística, através da produção de carros populares, com a volta ao
mercado do modelo da Volkswagen popularmente conhecido como Fusca. Em abril de 1993, a
convocação de um plebiscito sobre forma e sistema de governo, em que se discutiu o
parlamentarismo, o presidencialismo e a monarquia parlamentar, não chegou, na opinião de O
Globo, a empolgar a população, que preferiu aproveitar o dia da votação para o lazer, em muitos
casos justificando sua ausência nas agências dos correios, onde as filas foram maiores que nas
seções eleitorais. As razões do desinteresse pelo plebiscito, levantadas no editorial “O voto da
desconfiança”, seriam resultado da desilusão produzida pelos políticos nos últimos anos, pela
frustração de expectativas provocada com o fracasso dos muitos planos econômicos e pela falta de
novas idéias no cenário político. A recusa ao voto foi encarada porO Globo como uma forma de
manifestação política normal, havendo nessa oportunidade espaço para a defesa do voto
facultativo: “Desta vez não houve disfarce possível. O que aconselharia antes de mais nada a
liberação dessa forma civilizada de protesto. Sendo um direito, o voto não deveria ser nunca uma
obrigação.”
No segundo semestre de 1993, entretanto, uma nova série de denúncias de corrupção, dessa vez
levantadas contra o Legislativo, reacendeu a corrida pelo jornalismo investigativo, que marcara a
atitude da grande imprensa no ano anterior. Uma CPI instalada para averiguar as possíveis fraudes
na apresentação de emendas ao orçamento da União conseguiu provar o envolvimento de diversos
parlamentares, conhecidos como os “anões do orçamento”, que negociavam verbas para
prefeituras em suas áreas de influência. O Globo apoiou a iniciativa do Congresso de proceder a
uma devassa nas suas próprias atividades, só chamando a atenção para o perigo de se interromper,
em nome da CPI, os trabalhos de revisão constitucional que se iniciavam.
Ao encerrarem-se as investigações da CPI do Orçamento, O Globo afirmou estar o Legislativo
redimido de seus vícios históricos e pronto para o estabelecimento de procedimentos mais
austeros no trato dos recursos públicos. Para o jornal, daí por diante estaria aberto o caminho das
reformas constitucionais, consideradas o desdobramento natural do salto qualitativo dado pelos
parlamentares após a aprovação dos expurgos na Câmara e no Senado.
O insucesso do esforço realizado em fevereiro de 1994 para acelerar a aprovação dessas
reformas fez com que O Globo protestasse contra a falta de interesse da maioria dos políticos em
participar efetivamente dos trabalhos legislativos, o que teria facilitado a resistência da oposição,
através da obstrução das propostas de revisão constitucional, por conta da falta de quórum no
plenário do Congresso.
Ainda nesse mês, O Globo iria saudar a implementação da segunda fase do plano de estabilização
econômica, elaborado pela equipe do ministro Fernando Henrique Cardoso, após um período
inicial de ajuste das contas públicas no fim de 1993. Segundo o periódico, a chegada, em 28 de
fevereiro, da URV (Unidade Referencial de Valor), diferentemente dos planos anteriores, teria sido
submetida a uma ampla discussão, revelando, assim, a sua natureza inovadora e democrática.
De acordo com o jornal, as condições econômicas no começo de 1994 eram bastante favoráveis,
“os mercados e a sociedade é que na verdade determinarão a fase de transição. A discussão prévia
sobre as regras de conversão e a postura não-intervencionista do governo devem contribuir para
que esse período seja breve e a URV possa rapidamente se transformar na moeda nacional”.
A fase final do plano, com a adoção do real como moeda corrente, em 1º de julho, contou com a
confiança de O Globo, que mais uma vez frisou a distância entre essas medidas e os antigos pacotes
econômicos, sobretudo o Plano Cruzado. Também foi ressaltado que o real não possuía qualquer
característica de mistificação ou arbitrariedade, contava com a autoria de uma equipe de técnicos
experientes e com a aprovação de especialistas estrangeiros. Contudo, a condição essencial para a
manutenção da estabilidade econômica residiria ainda “nas grandes reformas modernizadoras que
deveriam ter sido feitas na revisão constitucional”.
Para O Globo, a autoridade do presidente Itamar Franco saiu renovada com o plano, pois esse
garantia as condições ideais para a realização da maior eleição já realizada no Brasil desde 1950. O
país saía naquele momento do “quadro de calamidade pública” deixado pela inflação.
A confirmação do nome de Fernando Henrique Cardoso para concorrer à presidência logo iria
torná-lo o principal concorrente de Luís Inácio Lula da Silva, até então o mais bem colocado nas
pesquisas de opinião. Daí por diante, o debate entre os dois candidatos marcou-se pela crítica e
pela defesa do Plano Real. Fatos marcantes da campanha presidencial de 1994, como a conversa
informal entre Rubens Ricupero e o jornalista Carlos Monforte, nos estúdios da Rede Globo de
Televisão, captada por antenas parabólicas, quando o ministro da Fazenda afirmou não ter
escrúpulos para “faturar” politicamente com o real, e as acusações do deputado petista Chico
Vigilante, de uso indevido da máquina do governo na campanha de Fernando Henrique, não
receberam maior atenção por parte de O Globo, que preferiu se fixar no acompanhamento das
pesquisas de opinião, no crescimento da economia e na Operação Rio, desencadeada no fim de
1994, destinada a combater o contrabando de armas e o tráfico de drogas no Estado do Rio.
A falta de segurança que se instalou na cidade do Rio de Janeiro recebeu críticas contundentes
de O Globodurante todo o ano de 1994. Em fevereiro, uma de suas edições registrava na primeira
página: “Zona Sul tem madrugada de Bósnia”. Todo esse caos, segundo o jornal, teria sido
provocado durante o segundo mandato do governador Leonel Brizola, cuja administração falhara
nos mais diversos campos, evidenciando-se sua “incompetência”, através da “desmoralização da
autoridade que chegou ao ponto dramático de exigir uma intervenção branca das Forças Armadas
no combate ao crime organizado”.
Em 3 de outubro, O Globo anunciava o resultado da pesquisa de boca de urna do IBOPE (“FH será
presidente”), indicando, assim, a definição da eleição presidencial já no primeiro turno. Em
entrevista com o diretor desse instituto, o jornal deixou claro que a expressiva votação alcançada
por Fernando Henrique havia se dado em conseqüência do sucesso do Plano Real, observando,
porém, ser esse apenas o “primeiro passo” entre as muitas reformas necessárias, “no sentido de
um país moderno e socialmente justo”.
Durante 1995, O Globo apoiou de maneira incondicional o esforço do governo Fernando
Henrique Cardoso para realizar as chamadas reformas estruturais, que atingiriam a ordem
econômica e social, com a flexibilização dos monopólios, a extinção de determinados privilégios
contidos em aposentadorias especiais e a reforma administrativa, que acabaria com a estabilidade
dos funcionários públicos.
A partir de março de 1996, O Globo começou a publicar uma série de reportagens revelando
fatos, inéditos até então, sobre a chamada guerrilha do Araguaia, na qual militantes do Partido
Comunista do Brasil (PCdoB), em oposição ao regime militar iniciado em 1964, enfrentaram o
Exército e foram derrotados, no início da década de 1970. O Globo divulgou testemunhos de ex-
combatentes, laudos técnicos de peritos legistas, arquivos secretos e fichas com anotações feitas
por militares, que revelaram as circunstâncias em que foram mortos os guerrilheiros, assim como
os locais onde seus corpos foram enterrados. As reportagens se concentraram também na
cobertura do comportamento do governo e das chefias militares diante das novas descobertas, em
meio aos processos de indenização às famílias de vítimas de ação repressiva, naquele período, que
se encontravam sob tutela do Estado.
Em seguida, em julho de 1996, O Globo voltou a divulgar informações polêmicas sobre o período
mais duro da repressão política durante o regime militar. Foi o caso da divulgação do laudo da
necropsia do líder guerrilheiro Carlos Lamarca, morto em setembro de 1971 no interior da Bahia. O
laudo desmentia a versão oficial segundo a qual teria havido um diálogo entre Lamarca e seu
captor, o então major Nílton Cerqueira. Pelo laudo, após levar três tiros no coração, Lamarca não
teria condições de travar o diálogo, conforme descrito no relatório oficial sobre o cerco em que
morreu (a Operação Pajussara).
O Ministério do Exército reagiu duramente à reabertura do caso Lamarca, após a publicação
em O Globo do laudo cadavérico que indicava a execução do guerrilheiro. Para os militares,
Lamarca morrera em combate, e por isso sua família não teria direito à indenização. O
representante da Câmara na Comissão Especial de Desaparecidos Políticos, deputado Nilmário
Miranda, do PT de Minas Gerais, porém, deu parecer favorável à concessão de indenização aos
parentes de Lamarca, incluindo no seu relatório o dossiê publicado por O Globo.
Ainda neste ano o jornal divulgou revelações sobre a morte, em 20 de agosto de 1971, de Iara
Iavelberg, companheira de Lamarca. Segundo testemunhas ouvidas pelo jornal, Iara teria sido
morta a tiros, e não se suicidado, conforme a versão que os órgãos de segurança da ditadura
forjaram e que fora aceita até pela própria família da guerrilheira.
ASPECTOS INTERNOS
Em sua fase inicial, O Globo contou com a colaboração, entre outros, do barão de Itararé e de
Raul Bopp. Posteriormente, tornar-se-iam colaboradores do jornal, escrevendo sobre diversos
assuntos, Eugênio Gudin, Gustavo Corção, Oto Lara Resende, Nélson Rodrigues, Davi Nasser, Edmar
Morel, Franklin de Oliveira, Luís Alberto Bahia, João Antônio Mesplé, Evandro Carlos de Andrade e
Francisco Alves Pinheiro. Em 1954, Ibrahim Sued iniciou no jornal sua coluna social, que
impulsionaria esse tipo de jornalismo.
O jornal, inicialmente vespertino e circulando diariamente com duas edições, em 1935
acrescentou mais uma edição vespertina e outra matutina, a qual, no entanto, deixou de circular
em 1937. A partir de 1962, tornou-se exclusivamente matutino.
A primeira sede do jornal, na rua Bittencourt Silva, foi desapropriada pela Prefeitura do Distrito
Federal. Em outubro de 1954, o jornal transferiu-se para a rua Irineu Marinho, onde permanece até
hoje. A rotativa Hoe, que adquiriu então, foi substituída em 1978 por rotativas Goss Metrolines
Rockwell, em off-set.
O Globo foi o primeiro jornal brasileiro a utilizar o flash nas máquinas fotográficas, assim como
o flasheletrônico, a teleobjetiva e as máquinas de 35mm com filme ultra-sensível. Em junho de
1959, o jornal publicou a primeira radiofoto colorida da imprensa da América do Sul, reproduzindo
a visita da rainha Elizabeth II ao Canadá. O Globo adotou igualmente máquinas Unifax para a
recepção de fotografias de qualquer ponto do planeta por rádio ou telefone e o sistema de
fotocomposição em substituição ao de linotipos com composição a chumbo.
Em 1995, passou por uma série de alterações gráficas e editoriais, que culminaram com o
“redesenho” do jornal, projetado pelos designers americanos Milton Glaser e Walter Bernard.
Entre as mudanças, que tiveram início com a edição de 20 de dezembro, incluem-se a criação de
um logotipo, uma hierarquia na disposição das notícias e um espaço maior para as fotos na
primeira página. Houve também a preocupação de ampliar o espaço editorial do jornal, que passou
a ter duas páginas diárias de opinião. Os suplementos e cadernos especiais foram reformulados,
procurando-se torná-los mais próximos do formato de revistas. Foi criado um suplemento literário,
“Prosa e verso”, com circulação aos sábados. Ao completar 70 anos, O Globoentrou
definitivamente na era digital, implantando o sistema Hyphen de editoração eletrônica,
responsável pelo controle da redação do jornal.
A chefia de redação também sofreu mudanças nesse ano, com a saída de Evandro Carlos de
Andrade, que após 20 anos passou ao comando do jornalismo da Rede Globo, sendo substituído
por Merval Pereira Filho.
Em dezembro de 1998 O Globo inaugurou seu novo Parque Gráfico, à época o maior da América
Latina. Neste mesmo ano foi lançado novo jornal do Grupo Infoglobo, o Extra, voltado para o
público das classes B e C. Esse movimento de diversificação foi estendido a São Paulo, com
o lançamento, em setembro de 2001 do jornal Diário de São Paulo, também direcionado para
a mesma faixa de mercado do Extra.
Em dezembro de 2004, O Globo foi agraciado com o Prêmio Esso de Jornalismo pela série de
reportagens "Bastidores do Poder - Os Homens de Bens da Alerj (Assembléia Legislativa do Rio de
Janeiro)", de autoria dos repórteres Angelina Nunes, Alan Gripp, Carla Rocha, Dimmi Amora, Flávio
Pessoa, Luiz Ernesto Magalhães e Maiá Menezes, e que expôs a variação patrimonial de setenta
parlamentares da Alerj entre 1996 e 2001. A premiação, porém, criou polêmica entre diretores de
redação de outros grandes veículos, como a Folha e oEstado de S.Paulo, que antes mesmo do
anúncio do vencedor criticaram os organizadores do prêmio, questionando a representatividade
dos jurados e suspeitando de favorecimento às empresas Globo. Também a revista Veja contestou
a premiação.
Em julho de 2005, O Globo comemorou seus 80 anos com uma exposição das suas primeiras
páginas no Centro Cultural Banco do Brasil, no Rio de Janeiro.
No ano seguinte foi promovida uma renovação do site do Globo Online, em comemoração aos
seus primeiros dez anos de vida, com mudanças no layout, investimento em multimídia, ênfase no
chamadojornalismo participativo e criação de uma editoria somente para a publicação de material
enviado pelos eleitores. O site contava então com mais de 2,5 milhões de usuários cadastrados.
A estratégia de expansão de mercados do Infoglobo teve prosseguimento em 2007, com o
lançamento do jornal Expresso, direcionado para as faixas C e D do mercado carioca.
Neste mesmo ano O Globo foi objeto de ataques do presidente venezuelano Hugo Chávez, em
longo discurso proferido por aquele chefe de Estado ao ser homenageado no dia 19 de janeiro de
2007 pela Assembléia Legislativa do Rio de Janeiro, com a medalha Tiradentes. Chávez reagira à
cobertura internacional de O Globo sobre a difícil relação do presidente venezuelano com setores
da mídia de seu país.
Em setembro de 2008, foi lançada pelo O Globo a campanha "Muito além do papel de um jornal”.
O objetivo era ampliar a interação dos internautas com o Globo Online, levando os
leitores a participar no debate sobre a cidadania, através, inclusive, do envio de material sob a
forma de vídeos, fotos, textos, e críticas. Neste mesmo mês veio a público a série de reportagens
“Favela S/A”, que dariam a O Globo, o prêmio do “Every Human Has Rights Media
Awards”, concedido às melhores reportagens sobre direitos humanos publicadas
em todo o mundo.
Em seu balanço de 2008, a Infoglobo, que publicava os jornais O Globo, Extra, Expresso da
Informação eDiário de S. Paulo, além co-editar o Valor Econômico com o Grupo Folha de
S.Paulo, divulgou que a receita bruta do grupo fora de 1,027 bilhão de reais e o lucro líquido
registrado, de R$ 172,9 milhões, com crescimento significativo em relação aos números do ano
anterior: R$ 1,006 bi de recita bruta e R$ 92,2 milhões de lucro líquido. Também em 2008, segundo
o Instituto Verificador de Circulação (IVC) O Globo era o segundo jornal de maior circulação diária
do país, com média de 293 mil exemplares por dia.
Em 2009 O Globo também sentiu os efeitos da crise econômica mundial, deflagrada ao final do
ano anterior, e sofreu uma queda de 8% de circulação no primeiro semestre. Somente no primeiro
trimestre deste ano o jornal enfrentou uma queda significativa em relação ao começo do
Século XXI, quando a média era de 334 mil exemplares por dia, fechando o trimestre com uma
média de 260 mil, resultado que só fora inferior, nos últimos dez anos ao ocorrido em momentos
de 2003 (258 mil), e de 2004 (250 mil).