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RESUMO
INTRODUÇÃO
Despertar o interesse dos alunos pela leitura é um desafio para os professores. A leitura
permite aprendizados significativos e, para incentivar o gosto pelo literário, o profissional de
Língua Portuguesa deverá ter a literatura como ponto de partida para a compreensão das práticas
sociais da leitura e da escrita. Assevera Rildo Cosson (2018, p. 120) que “o ensino de literatura
1
Apresenta-se uma síntese da dissertação A literatura de cordel em sala de aula: formação de leitores e afirmação
identitária, desenvolvida no Mestrado Profissional em Letras da Universidade Estadual de Santa Cruz (UESC/BA).
2
Mestre em Letras pela Universidade Estadual de Santa Cruz/ BA. [email protected] .
3
Doutora em Letras, professora da Universidade Estadual de Santa Cruz/BA. [email protected] .
passa a ser o processo de formação de um leitor capaz de dialogar no tempo e no espaço com sua
cultura, identificando, adaptando ou construindo um lugar para si mesmo.”
Diante disso, o cordel configura-se aqui como objeto de estudo para desenvolver a
afirmação da identidade nordestina e brasileira, a partir do desenvolvimento de uma prática
pedagógica que trabalhe o gênero em sala de aula, direcionada para os leitores/alunos da
Educação Básica, no Ensino Fundamental II. Espera-se, assim, que os alunos conheçam o cordel
como instrumento de propagação da diversidade cultural, articulado de forma crítica com outras
manifestações artísticas, como indica a BNCC: o aluno deve “analisar os efeitos de sentido
decorrentes do uso de mecanismos de intertextualidade (referências, alusões, retomadas) entre os
textos literários [...] e outras manifestações artísticas (cinema, teatro, artes visuais e midiáticas,
música)” (BRASIL, 2018, p.56).
A base teórica deste trabalho está alicerçada nos estudos do folclorista Luís da Câmara
Cascudo (2006) sobre a literatura oral/escrita e a cultura; o conceito sobre letramento literário e
as sequências didáticas básica e expandida de Rildo Cosson (2006; 2018); a concepção de leitura
literária de Teresa Colomer (2003; 2007); as pesquisas de viés histórico do cordel, com Marco
Haurélio (2012; 2013; 2016); a literatura popular de Arievaldo Viana (2010); e os estudos de
Jorge de Souza Araújo (2015) e Edilene Matos (2000) sobre Minelvino Francisco Silva e sua
obra, este o autor privilegiado para estudo. Deve-se salientar que, além desses últimos
pesquisadores citados, que entrevistaram o autor para a construção da biografia, mais nenhuma
referência foi encontrada sobre o cordelista itabunense, o que torna ainda mais justificável a
retomada dessa memória cultural para os/as estudantes contemporâneos/as.
Além disso, deve-se considerar que os folhetos, além de se configurarem como fonte de
informação, diversão e divulgação cultural, são referências potencialmente criativas para a
adaptação ou releitura em outras mídias/suportes, como atestam as recentes produções de
telenovela em horário nobre, como O Cordel Encantado (2011), e o filme, produzido em 2011,
com base nas histórias existentes no cordel, O Auto da Compadecida (1974), do autor,
escritor, dramaturgo e poeta paraibano Ariano Suassuna. Vale salientar que, quando Suassuna
era questionado sobre a originalidade de suas obras, dizia que buscava inspiração na
universalidade dos assuntos “multisseculares”, os chamados eruditos (clássicos) como na
Ilíada, de Homero, entre outros, pautados na cultura oral. E, ainda, importa compreender
que as culturas se entrecruzem, por isso “a fronteira entre as várias culturas do povo e as das
elites (e estas eram tão variadas quanto aquelas) é vaga e por isso a atenção dos estudiosos
do assunto deveria concentrar-se na interação e não na divisão entre elas [...]” (PETER
BURKE, 1998, p. 16-17). Cabe destacar, também, que, para Suassuna (2005), o cordel é um
representante autêntico da arte popular brasileira, exercendo a mesma função e relevância de
obras canônicas.
Assim, com tais pressupostos, apresenta-se, neste texto, uma proposta de atividade didática
para o trabalho com cordel na sala de aula de turmas do Ensino Fundamental II (em qualquer série,
observando-se as particularidades de cada etapa dos/as estudantes) a partir de uma sequência
básica para o letramento literário (COSSON, 2006), enfocando-se temas da obra do cordelista
itabunense Minelvino Francisco Silva que possam interessar mais diretamente aos/às alunos/as,
como, neste caso, os diferentes falares e saberes regionais. Entende-se que, desse modo, propicia-
se a identificação da obra com os/as discentes, pois de acordo com a Base Nacional Comum
Curricular, uma das competências almejada na disciplina de Língua Portuguesa consiste em
compreender “as linguagens como construção humana, histórica, social e cultural, de natureza
dinâmica, reconhecendo-as e valorizando-as como formas de significação da realidade e expressão
de subjetividades e identidades sociais e culturais” (BRASIL, 2015, p.65).
METODOLOGIA
RESULTADO E DISCUSSÕES
Visando estimular a leitura, a escrita, bem como a criatividade dos alunos para serem
potenciais leitores e autores desse gênero, apresenta-se uma sequência didática como
resultado/produto da pesquisa realizada a partir da metodologia explicitada. Por meio das
atividades propostas, estima-se reforçar o reconhecimento identitário, histórico e cultural dos/as
discentes em relação a sua realidade regional através dos folhetos de Minelvino Francisco Silva,
o “trovador apóstolo”, como ficou conhecido.
Sequência didática: Diferentes falares, diferentes saberes (2 aulas – 100 minutos)
Esse passo iniciará com a exposição de uma tirinha de “Chico Bento”, através do data show,
que abordará o falar dos personagens Chico Bento e Zé Lelé, típico de pessoas do meio rural. Os
alunos serão instigados a explanar o que entenderam da tirinha, fazer inferências sobre a origem e o
modo de se comunicar dos personagens, realizando alguns questionamentos: (15 minutos):
1. Caracterize o falar do amigo de Chico Bento: como ele se expressa? O que este falar
representa?
2. Os linguistas, atualmente, afirmam que o princípio da linguagem é falar e ser compreendido;
esse princípio foi exercido nessa tirinha? Explique:
Logo após, será exibido um vídeo da plataforma do youtube (com tempo de 8 minutos) do
poeta e cordelista Bráulio Bessa, que trata sobre os diferentes falares: dialeto e sotaques, intitulado
Dialeto nordestino, uma resposta ao preconceito4.
4
Disponível em: https://www.youtube.com/watch?v=npErliDE1x&t=339s)
Para os questionamentos sobre o vídeo (12 minutos), propomos as seguintes questões:
1. Bráulio Bessa diz que, ao expor sua tatuagem com o poema de Patativa do Assaré, numa rede
social, recebeu o seguinte comentário crítico: “como é que eu tinha coragem de tatuar um poema
de um poeta analfabeto que só escrevia e falava errado”? Como pode-se avaliar esse
posicionamento/comentário do crítico de Bessa? E você, como pensa?
2. Segundo o vídeo, o artista diz que o próprio Patativa do Assaré disse que “é melhor escrever
errado a coisa certa, do que escrever certo a coisa errada”. O que o cordelista quis dizer com
isso? Você concorda com ele? Por quê?
Material necessário: aparelho de datashow, computador com acesso à internet e folhas impressas
com o texto que será trabalhado.
Essa parte da sequência será trabalhada com a leitura da biografia do autor Minelvino
Francisco da Silva (2011), o cordelista em foco desta atividade, apresentada em forma de versos
pelo cordelista cearense Arievaldo Viana (Anexo 1).
Serão entregues aos alunos cópias do cordel, também exposto no data show, e a leitura
será compartilhada: cada aluno fará a leitura de uma estrofe, num total de 14 estrofes (5
minutos).
“Formar leitores é
algo que requer
condições favoráveis,
não só em relação
aos recursos
materiais
disponíveis, mas,
principalmente, em
relação ao uso que se
faz deles na prática
da leitura”.
(PCNs, 1997, p.71)
“A compreensão de um texto é um
processo que se caracteriza pela
utilização de conhecimento prévio: o
leitor utiliza na leitura o que ele já
sabe, o conhecimento adquirido ao
longo de sua vida”.
(KLEIMAN, 2005, p. 15)
Nesse passo, passa-se ao trabalho com um cordel de Minelvino Francisco Silva. Para
isso, a turma será dividida em dois grandes grupos: um realizará a leitura do cordel proposto
nesse momento, O encontro do trovador com uma fera monstruosa (Anexo 5), que trata do
analfabetismo ; e o outro grupo fará a leitura do ABC do Sertão (Anexo 6), letra da música de
Luiz Gonzaga, que se refere às variações linguísticas no tratamento de grafemas/fonemas do
alfabeto na Língua Portuguesa.
Logo após a leitura realizada individualmente, escolhe-se um aluno de cada grupo para
fazer a leitura em voz alta para o outro grupo. Será uma média de 5 minutos para a leitura
silenciosa, mais 5 minutos para a leitura de cada texto (10 minutos), e mais 5 minutos para
discussão sobre os dois textos lidos, estabelecendo-se um paralelo com tudo que já foi
exposto anteriormente, fazendo-se, como propõe Cosson, um diálogo entre autores, leitores e
comunidade.
[...] a questão não é falar certo ou errado, mas saber qual forma de fala
utilizar, considerando as características do contexto de comunicação, ou seja,
saber adequar o registro às diferentes situações comunicativas. É saber
coordenar satisfatoriamente o que falar e como fazê-lo, considerando a quem
e por que se diz determinada coisa. É saber, portanto, quais variedades e
registros da língua oral são pertinentes em função da interação
comunicativa, do contexto e dos interlocutores a quem o texto se dirige. A
questão não é de correção da forma, mas de sua adequação às circunstâncias
de uso, ou seja, de utilização eficaz da linguagem: falar bem é falar
adequadamente, é produzir o efeito pretendido. (BRASIL, 1997, p. 32).
Poetas niversitário,
Poetas de Cademia,
De rico vocabularo
Cheio de mitologia;
Se a gente canta o que pensa,
Eu quero pedir licença,
Pois mesmo sem português
Neste livrinho apresento
O prazê e o sofrimento
De um poeta camponês [...]
(ASSARÉ, 2002, p. 17).
Com esse cordel produzido na variante linguística não padrão o autor tentou demonstrar
que a questão da língua deve ser desmistificada, que existem diversas formas de se fazer uso da
língua portuguesa e cada variação tem uma origem e um porquê. Ele desfaz a ideia de que a
pessoa que não se comunica com a rigidez da gramática padrão não sabe o português, pois, a
língua é um organismo variável e também uma herança cultural, portanto não existe o certo e
errado no momento de se comunicar, existem falares diferentes que caracterizam o lugar, a
cultura, as pessoas e cada idioleto com sua relevância no meio em que está sendo utilizado e essas
especificidades que precisam ser valorizadas. Sabe-se que o desvio da norma praticado pelo
cordelista foi intencional para demonstrar que existe um valor, um legado, uma cultura linguística
específica e que deve ser considerada, pois conforme assevera Bagno (2007, p. 51): “é preciso
abandonar essa ânsia de tentar atribuir a um único local ou a uma única comunidade de falantes o
‘melhor’ou o ‘pior’ português e passar a respeitar igualmente todas as variedades da língua que
constituem um tesouro precioso de nossa cultura”.
Esses são os principais aspectos a serem considerados no estudo dos referidos folhetos do
cordelista destacado nesta proposta. Entretanto, cabe ao professor, como mediador e motivador
das atividades propostas, adequar e (re)criar suas próprias questões sobre os textos de acordo com
objetivos a serem alcançados.
CONSIDERAÇÕES FINAIS
Como afirmado ao longo deste trabalho, acredita-se que o cordel se configura como
um excelente objeto de estudo em sala de aula, pois está em constante mudança, adaptando-
se conforme as necessidades de cada período. Recria-se a história advinda do passado com
uma aparência contemporânea, mas, nela permanece a voz ancestral, rastros-resíduos, como
afirma Glissant (2005), recriados com uma configuração diferente nesse processo de
oralidade e escrita que permeia o cordel.
Essa renovação está aqui presente, pois apresenta-se uma proposta de atividade em que
os/as discentes se tornam criadores/as de releituras imbricadas com o passado: por mais que
sejam reescritas, existirão rastros/resíduos de uma história, de uma memória que não se pode
desprender. A Literatura de cordel, com suas especificidades, fornece condições para que sejam
trabalhadas questões identitárias, afirmando-se, positivamente, a cultura nordestina e brasileira.
Almeja-se, por fim, que esse processo de leitura, releitura, interpretação e
compreensão seja capaz de desenvolver a performance de leitores críticos. Leitores que
discutam, exercitem o pensamento, argumentem através das discussões em grupo e
socializem suas conclusões, no ambiente escolar, para a construção de um aprendizado
dinâmico e constante de transformação do ser.
Ademais, esta proposta de trabalho pretende incentivar e encantar os/as estudantes e,
sobretudo, garantir a leitura literária na escola, e, por consequência, desenvolver a criticidade
e criatividade dos/das educandos/as. Isso porque acredita-se que a literatura, entre outros
aspectos, humaniza através da prática no exercício da alteridade e, portanto, do
reconhecimento e respeito à diversidade.
REFERÊNCIAS
ANEXOS