Aula 03
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AULA
obscuras no currículo: o que
temos em mente?
Meta da aula
Apresentar relações entre o currículo
escolar e a produção da exclusão na
sociedade e na escola.
objetivos
INTRODUÇÃO No estudo anterior, refletimos sobre as propostas curriculares tradicionais, sua liga-
ção íntima e pessoal com a Revolução Industrial e a reorganização do mundo do
trabalho derivada daquele momento histórico. Agora, estudaremos as mudanças
axiológicas, ou seja, mudanças nos valores que foram ocorrendo no mundo por
volta dos anos 1960, e quais as produções, no campo do currículo que chamaram
a atenção para as intencionalidades veladas nas práticas escolares.
Nosso convite é para que você se deixe levar pelas sensações da época: as
propostas de mudança, as aspirações revolucionárias na forma de vivermos
a vida e, nisto, o pensamento crítico do currículo:
• Qual currículo? Para qual sociedade?
• Quais os principais conceitos que ajudaram o desenvolvimento de uma
perspectiva crítica do currículo?
• Currículo crítico em qual escola? Para formação de qual sujeito?
Essas são algumas das questões que pretendemos responder nos estudos
desta aula.
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Figura 3.2: Rosa Parks,
com Martin Luther King
ao fundo. No Alabama
(EUA), em dezembro de
1955, Rosa, uma costu-
reira negra, negou-se a
levantar do banco que
ocupava, reservado aos
brancos, em um ônibus.
Sua atitude desencadeou
um movimento pelos di-
reitos civis dos negros. Em
Montgomery, especifica-
mente, culminou com o
fim da lei segregacionista
nos ônibus da cidade.
Fonte: http://pt.wikipedia.
org/wiki/Movimento_dos_Di-
reitos_Civis.
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Figura 3.5: Patente do primeiro contraceptivo oral sintético, mais conhecido como pílula anticoncepcional.
Fonte: http://pt.wikipedia.org/wiki/Ficheiro:Miramontes_patent.jpg.
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Figura 3.6: Foto de Neil Armstrong pisando na Lua,
em 1969.
Fonte: http://pt.wikipedia.org/wiki/Neil_Armstrong.
Figura 3.7: Janis Joplin, cantora que participou do movimento de contracultura hippie
no Festival de Woodstock, na cidade rural de Bethel, Nova York, 1969.
Fonte: http://upload.wikimedia.org/wikipedia/commons/1/11/Janis_Joplin_Passport.jpg.
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Figura 3.9: The Beatles, banda formada na década de 1960, que influenciou além
da música, novas formas de comportamento na sociedade.
Fonte: http://pt.wikipedia.org/wiki/The_Beatles.
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Essas são algumas imagens que marcaram as turbulências e trans-
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formações políticas, científicas e culturais dos anos 1950 a 1960. São
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algumas imagens, evidentemente, não todas. A segunda metade do século
passado é intensa em transformações, o socialismo do Leste Europeu,
a política do estado de bem-estar social da Europa, a revolução cubana
com as figuras marcantes de Che Guevara e Fidel Castro, as ditaduras
militares na América Latina, tempos que contrastam o desenvolvimento
científico e tecnológico com o aumento da pobreza e da exploração, por
exemplo, dos países do Norte sobre os países do Sul.
Esse contexto de contradições e transformações provoca crítica à
forma como o mundo se organiza no que se refere à produção e distribui-
ção de riquezas. A crítica à desigualdade social e o estudo da produção
dessa desigualdade atingem, também, as instituições escolares e, nelas,
o currículo escolar. Essas críticas construídas buscaram demonstrar, por
exemplo, como o Estado, a Igreja e a escola atuam mais como mantene-
doras das diferenças sociais (entre ricos e pobres, entre direitos de homens
e de mulheres) do que como meios de superação dessas desigualdades.
No estudo do currículo, por exemplo, surgem movimentos que
formulam críticas não apenas aos procedimentos técnicos ligados à orga-
nização da aula (o modo de ensinar), mas, também, ao conteúdo que, de
forma explícita (o que a escola diz ensinar) e de forma implícita (o que a
escola ensina, mas não diz), reforçam comportamentos de exclusão (com
base em classes sociais, em gênero ou em etnias, por exemplo).
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ATIVIDADE
Atende ao Objetivo 1
Fonte: http://www.rio.rj.gov.br/ipp/memoria/favelas/pages/favela.htm
No Brasil, os 10% mais ricos detêm para si 75% da renda nacional. Os 90%
mais pobres compartilham 25%. Somos cerca de 60 milhões de famílias, das
quais 5 mil ficam com 45% da renda e da riqueza nacionais. As quatro cida-
des que concentram 80% das famílias mais ricas: São Paulo, Rio de Janeiro,
Brasília e Belo Horizonte (Le Monde Diplomatique Brasil, out. 2007).
No mundo, segundo o Relatório do Instituto Mundial de Pesquisa sobre
a Economia do Desenvolvimento, da Universidade das Nações Unidas,
divulgado em 2006, 2% dos adultos do planeta detêm mais da metade
da riqueza mundial, incluindo propriedades e ativos financeiros. A riqueza
está fortemente concentrada na América do Norte, na Europa e nos países
de alta renda da Ásia e do Pacífico. Os moradores desses países detêm
juntos quase 90% do total da riqueza do planeta. Os 50% mais pobres do
mundo compartilham apenas 1%.
A sociedade coloca em evidência sua produção de mercadorias: computado-
res do dia, aparelhos digitais, tênis que quase caminham sozinhos, máquinas
que fazem o serviço doméstico, roupas e carros que vendem imagens de
felicidade, modernidade e sucesso. Ao mesmo tempo, uma imensidão de
pessoas não consegue sequer o mínimo para sua alimentação. Morre-se
de fome e de doenças que já possuem cura, causadas pela fome, ou por
condições indignas de vida: falta de saneamento ou de vacinas básicas.
Discutir a violência urbana, o narcotráfico, a violência escolar precisaria
incluir o debate sobre a organização social em que vivemos: mostramos
que as pessoas valem pelo que consomem e, ao mesmo tempo, queremos
que as pessoas –, jovens, crianças ou adultos que não conseguem consumir
– aceitem-se seres menores, sem direitos ou cidadania.
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Para vencer a fome, seria preciso investir pouco: US$ 30 bilhões por ano
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(no primeiro auxílio ao sistema bancário, em setembro de 2007, nos EUA,
o governo americano investiu mais de US$ 700 bilhões; os países-membros
da Organização para a Cooperação e o Desenvolvimento Econômico –
OCDE – investiram em armamentos US$ 1,2 trilhão).
Terminada a leitura do texto, identifique e comente a exclusão social e
escolar percebida em sua localidade.
COMENTÁRIO
A exclusão social pode ser percebida a partir das pessoas que
vivem na rua, ou mesmo as pessoas que, sem emprego formal,
são obrigadas a sobreviver em ocupações que lhes negam direitos
básicos como previdência (aposentadoria ou renda, no caso da
impossibilidade de trabalho) ou saúde. As caras da exclusão são
muitas: o desemprego, a fome, a mendicância, a violência contra a
mulher, o racismo, o preconceito social, enfim, todas as formas de
convivência que provocam e praticam a exclusão dos direitos básicos
de cidadania (humanos, econômicos, sociais, políticos e culturais).
Na escola, a observação sobre a exclusão social pode ser feita
com base em dados de reprovação e evasão escolar, preconceitos
de classe, gênero ou etnia, rechaço à participação das famílias na
escola, em especial as de mais baixa renda e, inclusive, o trabalho
com conhecimentos escolares tomados de preconceitos ou estereó-
tipos, além de um dos principais preconceitos, ligados à divulgação
da ideia de que crianças pobres não aprendem na escola: falamos
de um conhecimento desconhecido para a criança (um conteúdo
escolar qualquer, específico), com uma linguagem que ela também
desconhece (termos que, para nós, são comuns, mas para os quais
a criança não consegue estabelecer significado, ou o faz de maneira
equivocada) e a acusamos de não aprender porque é hiperativa,
ou pouco ativa ou, ainda, indolente ou incapaz.
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culo e estrutura social, currículo e cultura, currículo e poder, currículo
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e ideologia, currículo e controle social etc.” (MOREIRA; SILVA, 2008,
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p. 16).
Com a intencionalidade de entender a favor de quem o currículo
trabalha e como fazê-lo trabalhar a favor dos grupos e classes oprimidas,
criticam-se as práticas curriculares instrumentais, apolíticas e ateóricas
(idem). O grupo ligado ao movimento de reconceitualização, de origem
americana, subdividia-se em uma corrente associada às Universidades
de Wisconsin e Columbia, com Michael Apple e Henry Giroux como
teóricos mais conhecidos no Brasil, e outro grupo ligado à Universidade
de Ohio, com William Pinar à frente das elaborações teóricas. Entre estes
dois subgrupos, o primeiro atribuía mais ênfase à estrutura de classes na
sociedade e o segundo a experiências individuais que teriam capacidade
de resistência e transcendência às questões de classe (ibidem).
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ATIVIDADE
Atende ao Objetivo 2
RESPOSTA COMENTADA
Ao desenvolver as ideias da educação chamada por Freire como
bancária, é importante que você tenha incluído a separação de
papéis entre educadores e educandos, separação esta que se
afirma na ideia de que o educador é o que detém o conhecimento
e o educando é aquele que deve receber, de forma passiva, a
educação que o educador impõe. Ao trabalhar com a educação
libertadora, ou dialógica, ou problematizadora (termos diferentes,
mas que representam a concepção defendida por Freire), você deve
ter incluído qualidades dessa educação como a produção conjunta
de conhecimentos (entre educadores-educandos), a educação
para conscientização, que denuncia a exclusão social e anuncia
possibilidades de transformação da realidade, por meio da inserção
crítica nesta realidade.
As possibilidades curriculares necessitam, então, da vivência de um
movimento entre os saberes trazidos pelos alunos, suas formas de ver
o mundo e explicá-lo, e o diálogo problematizador, entre educadores-
educandos, solidário e curioso, provocador de atos possíveis de
emancipação pela conscientização que permitiria conceber outras
realidades possíveis, mais humanizantes e menos excludentes.
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CURRÍCULO, IDEOLOGIA, PODER E CULTURA
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Um dos principais conceitos para entendermos as contribuições
da perspectiva curricular crítica na proposição de um ensino menos
excludente e mais emancipador para os alunos de classes populares é
o conceito de ideologia. Este conceito tem sua formulação na obra de
Althusser, A ideologia e os aparelhos ideológicos de estado. Para Mo-
reira e Silva (2008), o conceito de ideologia que nos ajuda a entender o
currículo de forma crítica:
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CONCLUSÃO
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Atende ao Objetivo 3
O Operário em Construção
Vinicius de Moraes (1956)
[...]
Mas tudo desconhecia
De sua grande missão:
Não sabia, por exemplo
Que a casa de um homem é um templo
Um templo sem religião
Como tampouco sabia
Que a casa que ele fazia
Sendo a sua liberdade
Era a sua escravidão.
[...]
Mas ele desconhecia
Esse fato extraordinário:
Que o operário faz a coisa
E a coisa faz o operário.
De forma que, certo dia
À mesa, ao cortar o pão
O operário foi tomado
De uma súbita emoção
Ao constatar assombrado
Que tudo naquela mesa
– Garrafa, prato, facão –
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[...]
Notou que sua marmita
Era o prato do patrão
Que sua cerveja preta
Era o uísque do patrão
Que seu macacão de zuarte
Era o terno do patrão
Que o casebre onde morava
Era a mansão do patrão
Que seus dois pés andarilhos
Eram as rodas do patrão
Que a dureza do seu dia
Era a noite do patrão
Que sua imensa fadiga
Era amiga do patrão.
[...]
COMENTÁRIO
É importante que você identifique, no poema, o momento em que,
ao cortar o pão, o operário se dá conta de que tudo o que existia
era ele que fazia (dar-se conta que vai se ampliando no decorrer do
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poema: da garrafa, prato e facão, para banco, enxerga, caldeirão,
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vidro, parede, janela, até chegar na casa, cidade, nação).
As experiências escolares recordadas por você podem ter trazido
tanto situações chamadas por Freire como experiências de educação
bancária, em que a recitação dos conteúdos e a principal atividade,
e somos levados a repetir palavras ou verdades da ciência que
para nós não fazem sentido, porque não as sentimos (no sentido
de vivê-las, saboreá-las), quanto, no sentido contrário da educação
bancária, situações nas quais fomos levados a refletir sobre o mundo,
situações que nos possibilitaram viver o pensamento libertador (tal
qual o operário em construção).
RESUMO
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Currículo | Escusos poderes e relações obscuras no currículo: o que temos em mente?
O que veio depois da perspectiva crítica, no campo dos estudos sobre currículo?
Pós-modernismo? Pós-estruturalismo? Pós-colonialismo? Na próxima aula,
discutiremos as relações entre o currículo e o feminismo, as etnias e raças, a opção
sexual, os discursos e as dominações, questões que compõem a perspectiva pós-
crítica do currículo.
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