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Aperfeiçoamento em Astronomia para a docência

Leitura semana 22: Evolução Estelar - II

EVOLUÇÃO ESTELAR - II
Roberto Ortiz

No capítulo anterior estudamos a evolução de estrelas de massa intermediária e baixa,


i.e. M* < 8 Msol. O cenário descrito aplica-se à imensa maioria das estrelas do Universo, as
quais terminam sua evolução como anãs-brancas. Neste capítulo, iremos estudar a evolução
de estrelas com massa superior a esse limite, chamadas genericamente de estrelas massivas.
Apesar do número de estrelas massivas no Universo ser quase desprezível quando comparado
ao número de estrelas de massa baixa ou intermediária, diversos fenômenos ocorrem somente
em estrelas deste tipo. Ao final de sua evolução, estrelas massivas explodem como
supernovas, liberando uma grande quantidade de energia no meio interestelar. Alguns
astrofísicos argumentam que a energia advinda dessa explosão seria um mecanismo precursor
do colapso de nuvens de gás no meio interestelar e posteriormente iniciando a formação de
novas estrelas.

Fig. 22.1: Todas as estrelas que compõem a figura do caçador da constelação de Orion são massivas:
Betelgeuse (8 ~ 16 Msol), Bellatrix (8 Msol), Meissa (28 Msol), Rigel (21 Msol) e Saiph (15 Msol). As três estrelas que
compõem o cinturão (as populares “Três Marias”) também são massivas: Mintaka (20 M sol), Alnilam (tipo
espectral B0Ia) e Alnitak (27 Msol).

1. A formação de uma proto-estrela massiva

Estrelas formam-se a partir de condensações distribuídas ao longo de filamentos de


gás hidrogênio presentes no interior de nuvens moleculares. Uma proto-estrela é formada
quando a condensação sofre uma contração gravitacional que prossegue até que a temperatura
em seu núcleo atinja cerca de 10 milhões de kelvin. A massa da estrela resultante dependerá
da massa inicial da condensação: as mais massivas formarão também estrelas mais massivas

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(e vice-versa). No entanto, nem todo o material da condensação será incorporado à nova


estrela. Parte dele permanecerá como matéria circunstelar sob a forma de um disco de gás e
poeira em torno das estrelas menos massivas ou como um envoltório circunstelar de grandes
dimensões, de formato aproximadamente esférico em torno das estrelas de maior massa.
Portanto, a evolução da proto-estrela ocorre de maneira distinta, de acordo com a massa do
objeto.

A contração gravitacional de proto-estrelas massivas tem muitas diferenças quando


comparada a de estrelas de menor massa. Em ambos os gasos, a condensação inicial tem
aproximadamente a mesma temperatura, porém, por possuir maior massa, a progenitora de
uma estrela massiva é maior, o que lhe propicia maior luminosidade (devido principalmente
ao seu maior raio). Modelos teóricos indicam também que, durante a fase de contração, a
proto-estrela move-se horizontalmente no diagrama H-R, da direita para a esquerda (figura
22.2). Essa trajetória evolutiva de luminosidade constante deriva do fato de que, durante a
contração, o raio da proto-estrela diminui com o quadrado do aumento da temperatura.

Fig. 22.2: Trajetória evolutiva de uma estrela de 6 massas solares, da fase de proto-estrela à sequência principal
(SP), i.e. da direita para a esquerda (cálculos teóricos de Tognelli et al. 2011). A faixa cinza assinala a posição da
sequência principal e os números em vermelho marcam a posição das estrelas de acordo com suas respectivas
massas, entre 3 e 8 massas solares (Drilling & Landolt 2000). Créditos: do autor.

2. A produção de energia em estrelas de alta massa

Quando a temperatura no núcleo estelar atinge cerca de 10 milhões de kelvin, inicia-se


o processo de fusão de hidrogênio em hélio, conhecido como ciclo p-p. No entanto, em
estrelas massivas, o maior peso das camadas externas eleva a temperatura e pressão do núcleo
a valores muito mais altos. Quando a temperatura atinge de cerca de 15 milhões de kelvin um
ciclo de reações diferente do p-p começa a tornar-se importante: o ciclo CNO. Neste ciclo, 4
núcleos de hidrogênio são convertidos em hélio, assim como no ciclo p-p, porém as reações
nucleares de fusão ocorrem entre prótons e núcleos de isótopos de Carbono, Nitrogênio e
Oxigênio. É importante ressaltar que, embora esses núcleos atuem como “reagentes” das
reações nucleares do ciclo CNO, eles não são criados nem destruídos ao longo de uma

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sequência completa de reações. O ciclo opera utilizando os núcleos de C, N e O que já


existiam na estrela desde a época de sua formação. A tabela 22.1 apresenta alguns ciclos e
reações nucleares e as respectivas temperaturas mínimas para que ocorram.

Fig. 22.3: A explosão de uma bomba de hidrogênio (bomba-H) ocorrida no atol de Enewetak, Oceano Pacífico,
em 1 de novembro de 1952. Durante a explosão, átomos de hidrogênio foram convertidos em hélio, como ocorre
no núcleo das estrelas.

Nome do ciclo ou “reagentes” & “produtos” Temperatura mínima


reação nuclear requerida (K)
ciclo p-p 41H → 4He 1,0 x 107
ciclo CNO 41H → 4He 1,5 x 107*
reações- 34He → 12C ~108
12C + 4He → 16O

fusão do carbono 12C + 12C → 24Mg 8 x 108


12C + 12C → 20Ne + 4He
12C + 12C → 16Ne+ 24He

fusão do oxigênio 16O + 16O → 32S 2 x 109


16O + 16O → 28Si + 4He
16O + 16O → 24Mg+ 24He

Tabela 22.1: Alguns ciclos ou reações nucleares responsáveis pela produção da luminosidade em estrelas e a
temperatura mínima necessária para que operem. *Temperatura em que a luminosidade gerada pelo ciclo CNO
corresponde a 1/10 daquela do ciclo p-p. Créditos: Lang (1999)

Quando a temperatura no núcleo da estrela supera 18 milhões de kelvin a taxa de


produção de energia do ciclo CNO torna-se superior à luminosidade produzida por meio do
ciclo p-p. Pode-se portanto afirmar que o ciclo CNO é o principal mecanismo de produção da
luminosidade de estrelas de alta massa, por meio da transformação de hidrogênio em hélio no
núcleo da estrela enquanto esta se encontra na sequência principal.

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Após alguns poucos milhões de anos o hidrogênio no núcleo estelar se esgota. De


maneira análoga à evolução de estrelas de baixa massa, esse esgotamento leva a estrela a
deixar a sequência principal em direção à direita no diagrama H-R (figura 22.4). Se
lembrarmos que o raio estelar aumenta para direita e para cima, concluiremos que essa
trajetória evolutiva leva a estrela a se tornar primeiro uma gigante e, dependendo de sua
massa, posteriormente uma supergigante K ou M. O núcleo inerte torna-se gradativamente
maior, à medida que mais hélio lhe é incorporado. Esse aumento de massa ocasiona sua
contração (devido à gravidade) e aumento de temperatura. Quando esta atinge cerca de 2 x
108 K, iniciam-se as reações de conversão de hélio em carbono no núcleo pelo ciclo triplo-.
Neste ponto, a estrela move-se horizontalmente para a esquerda no diagrama H-R (figura
22.4), aumentando novamente sua temperatura fotosférica.

Fig. 22.4: Trajetória evolutiva de uma estrela de 20 massas solares, da sequência principal ao final da fase de
reações triplo- no núcleo da estrela. Créditos: Arnett et al. (1989).

O tempo em que uma estrela de alta massa “queima” hélio em seu núcleo equivale a
apenas 1/10 do tempo que operam os ciclos do hidrogênio no núcleo estelar (tabela 22.2).
Após o esgotamento do hélio, sucedem reações nucleares tipo  (e outras) envolvendo
núcleos cada vez mais pesados, tais como o carbono, oxigênio, neônio, silício e assim por
diante. No entanto, conforme mostra a tabela 22.2, o tempo somado de todos os demais ciclos
além da “queima” de hélio é extremamente curto, apenas poucas centenas de anos no caso do
carbono e meses ou dias para núcleos mais pesados. Portanto, pode-se afirmar que o tempo de
vida de uma estrela de alta massa é aproximamente igual ao ciclo de “queima” do hidrogênio
somente.

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“Reagente” Tnucleo (x 109 K) Duração (anos) L*/Lsol


H 0,04 1,0 x 107 6,9 x 104
He 0,19 9,5 x 105 1,4 x 105
C 0,81 3,0 x 102 1,1 x 105
Ne 1,7 0,38 1,1 x 105
O 2,1 0,50 1,1 x 105
Si 3,7 2 dias 1,1 x 105

Tabela 22.2: Diversas reações nucleares de fusão que produzem a luminosidade no núcleo de uma estrela
massiva. (Créditos: Arnett et al. 1989).

É importante observar que, enquanto elementos cada vez mais pesados são
sintetizados no núcleo, outras reações nucleares – que necessitam de menor temperatura –
continuam a ocorrer nas camadas superiores adjacentes. Portanto, estrelas massivas possuem
diversas camadas produtoras de energia, simultaneamente, como uma “casca de cebola” (fig.
22.5), na qual a reação nuclear que requer maior temperatura ocorre no núcleo da estrela e as
demais em torno deste, em ordem decrescente de temperatura.

Fig. 22.5: Uma estrela massiva tem temperatura suficiente para que ocorra a fusão de He, C, O .. Si, etc. A
sequência continua até que região central passa a ser ocupada por um núcleo de ferro, que é envolvido por
camadas onde “queimam” cada um dos elementos químicos citados. Créditos: “Astronomia e Astrofísica”, Kepler
de Souza Oliveira Filho & Maria de Fátima Oliveira Saraiva.

A grosso modo, pode-se dizer que quanto maior o número atômico Z do elemento
químico, maior a temperatura necessária para que ocorram reações nucleares envolvendo este
elemento. Este efeito é devido à barreira coulombiana, que age como uma força de repulsão
entre núcleos atômicos e cuja intensidade aumenta com o produto dos números atômicos dos
envolvidos na reação. Deste modo, à medida que a estrela vai necessitando de reações
envolvendo elementos com maior Z, aumenta também a temperatura necessária para que essas

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reações ocorram. Cada vez que se esgotam as reações envolvendo um determinado elemento
químico no núcleo este sofre uma contração e aquece-se até que a temperatura atinja o
mínimo necessário para a “queima” do elemento atômico seguinte. Este processo continua até
o surgimento do elemento ferro no núcleo da estrela.

3. O colapso do núcleo da estrela e sua explosão como


supernova

A tabela 22.2 mostra que, à medida que a estrela caminha para a “queima” de
elementos com maior Z, esse processo torna-se cada vez mais rápido: enquanto o esgotamento
de carbono no núcleo ocorre após 300 anos, esse tempo para o silício é de apenas 2 dias! A
“queima” de silício no núcleo da estrela leva rapidamente à formação do elemento ferro (Z =
26), o mais estável de todos os núcleos atômicos, no núcleo estelar. Nessas condições, a
temperatura no núcleo é maior que 3 ~ 8 bilhões de kelvin e há um grande número de fótons
com alta energia () de modo que ocorrem as seguintes reações:

56Fe +  → 13 4He + 4n

4He +  → 2p+ + 2n

As reações acima, nas quais o ferro é destruído, são chamadas de fotodesintegração.


Observe que, por meio destas reações, a estrela desfaz toda a sequência de reações de fusão
que ela promoveu em seu interior desde o início de sua evolução, retornando a ter um núcleo
composto por hidrogênio (p+) e hélio. É fácil concluir que essas reações são endotérmicas
(absorvem energia), pois constituem o caminho oposto às reações exotérmicas (que liberam
energia) que predominaram na estrela até aqui. Sem ter como produzir energia, o equilíbrio
hidrostático é rompido e o núcleo estelar colapsa sob o peso das camadas superiores. Ao
mesmo tempo, a energia cinética produzida por essa queda de matéria sobre o núcleo estelar é
absorvida pelas reações nucleares de desintegração (endotérmicas), facilitando ainda mais o
colapso.

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Fig. 22.6: Antares, uma supergigante de tipo espectral M1.5Iab, possui massa equivalente a 12 massas solares.
Esta estrela já esgotou o hidrogênio em seu núcleo e atualmente produz sua luminosidade convertendo hélio em
carbono e elementos mais pesados. Futuramente explodirá como uma supernova tipo II.

O colapso de uma estrela é um acontecimento dramático. Quando sua temperatura


atinge 8 x 109 K e sua densidade cerca de 1010 g cm-3, os prótons gerados pela
fotodesintegração do ferro e hélio combinam-se com elétrons livres para formar nêutrons (n):

p+ + e- → n + e,

onde e é um neutrino, partícula que escapa facilmente da estrela, carregando consigo grande
quantidade de energia.

O núcleo estelar não colapsa isotropicamente: sua parte interna colapsa “em bloco”,
enquanto a parte mais externa é “deixada para trás”, em queda-livre. A velocidade do colapso
pode atingir 70 mil km/s, equivalente a 23% da velocidade da luz! O colapso só é
interrompido quando a densidade do núcleo estelar atinge 8 x 10 14 g cm-3. Nessas condições,
os nêutrons não podem se aproximar mais uns dos outros porque violariam um princípio da
Física chamado de Princípio da Exclusão de Pauli. Em uma fração de segundo depois, a parte
externa do núcleo estelar, que havia sido deixada para trás, cai violentamente sobre o núcleo
interno. Uma onda de choque se propaga para fora da estrela, que em seguida choca-se com o
restante do volume da estrela, composto majoritariamente de hidrogênio. O resultado do
choque é uma violenta explosão, que carrega consigo quase todo o volume da estrela,
deixando em seu centro um núcleo extremamente denso, composto de nêutrons.

4. Observando supernovas

Conforme o exposto acima, estrelas massivas terminarão sua evolução como uma
explosão de supernova “tipo II”. Também é possível que um sistema composto por um par

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de estrelas de menor massa evolua para uma explosão de supernova. Para que isto ocorra,
deve haver transferência de massa de uma componente para outra, de modo que a estrela
“receptora” atinja a massa que lhe falta para iniciar a fusão de elementos pesados e
posteriormente explodir como uma supernova tipo I. De qualquer maneira, supernovas são
um fenômeno extraordinário que podem atingir magnitude absoluta Mv= – 18, equivalente ao
brilho de uma galáxia inteira!

Supernovas são relativamente raras: estima-se que ocorram apenas 10 eventos por
milênio na Via-Láctea. Provavelmente a maior parte deles passa desapercebida por ocorrer em
regiões da Galáxia com visão severamente obstruída pela poeira interestelar, que absorve a luz
das estrelas. Ironicamente, nenhuma supernova foi vista explodir na Via-Láctea desde a
invenção do telescópio no início do século XVII. No último milênio, temos registrada a
ocorrência de apenas três eventos na Via-Láctea que puderam ser observados a olho nu:
supernova do Caranguejo (Crab), observada por astrônomos chineses no ano de 1054 d.C.;
supernova de Tycho (observada pelo astrônomo dinamarquês Tycho Brahe) no ano de 1572;
supernova de Kepler (observada pelo autor das Leis de Kepler) no ano de 1604. Além desses
registros oculares, existiram mais quatro eventos supostamente ocorridos no último milênio,
conforme indicam algumas características dos remanescentes que foram detectados mais
recentemente em imagens no óptico ou em rádio frequências.

Fig. 22.7: A supernova de Shelton (SN1987A) explodiu na Grande Nuvem de Magalhães na noite de 23 de
fevereiro de 1987 e atingiu magnitude visual m v = 3,5, tornando-se visível a olho nu durante vários meses. À
esquerda, imagem da supernova; à direita, imagem da estrela progenitora, feita antes da explosão. A seta indica
a posição de Sk – 69 202. Créditos: Anglo-Australian Observatory.

A baixa ocorrência de supernovas na Via-Láctea não constitui um empecilho à sua


observação. Todos os anos, várias supernovas são observadas em outras galáxias, uma grande
parte delas por astrônomos amadores, que realizam um trabalho sistemático de
monitoramento com telescópios pequenos. O método utilizado é o seguinte: o observador
observa o maior número possível de galáxias em uma noite; ele compara a imagem da galáxia
vista ao telescópio com uma imagem tomada anteriormente, disponível em atlas de galáxias

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ou sítios da internet; se na noite de observação houver uma “estrela” nas imediações da


galáxia que não aparecia no atlas é bem provável que esse objeto seja uma supernova. Nesse
caso, o evento deve ser comunicado rapidamente à União Astronômica Internacional (UAI ou
IAU em inglês) para ser confirmado por astrônomos profissionais.

Na noite de 24 de fevereiro de 1987, o astrônomo Ian Shelton utilizava um astrógrafo


(um tipo de telescópio) de 25 cm de diâmetro do observatório de Las Campanas, na
cordilheira dos Andes chilenos. O projeto científico de Shelton não tinha relação com
supernovas e por isso foi com surpresa que ele notou a presença de uma estrela brilhante na
placa fotográfica recém-obtida. Ao perceber que aquela estrela brilhante não aparecia em
imagens anteriores da mesma região, Shelton saiu do prédio e viu, a olho nu, uma estrela de
5a. magnitude. Imediatamente comunicou suas observações à IAU (IAU Circular No. 4316)
que posteriormente confirmou sua descoberta.

A ocorrência de uma supernova tão próxima, em uma época em que a Astronomia


dispõe de instrumentos modernos de observação constituiu uma oportunidade singular para o
estudo desses objetos. Se estudarmos cuidadosamente a sucessão de eventos ocorridos nas
horas que antecederam a descoberta de Shelton obteremos algumas informações sobre como
ocorreu a explosão e verificar até que ponto as observações estão de acordo com os modelos
teóricos.

A placa fotográfica obtida por Shelton foi tomada às 05h31m, hora de Greenwich
(Tempo Universal, T.U.). Observações do astrônomo amador neozelandês Albert Jones feitas
na noite anterior (23 de fevereiro), às 09h21m (T.U.) não mostraram qualquer sinal da
supernova. No entanto, cerca de 1 hora mais tarde dessa mesma noite, precisamente às
10h37m (T.U.), R.M. McNaught, do observatório de Siding Springs (Austrália), obteve uma
imagem da supernova com mv=6,5. Observações feitas nos dias seguintes com o observatório
ultravioleta IUE (International Ultraviolet Explorer) revelaram linhas de absorção do
hidrogênio rasas, indicativas de hidrogênio sendo ejetado à velocidade de 30 mil km/s,
confirmando que se tratava de uma supernova tipo II (pois SN tipo I apresentam tipicamente
linhas do ferro em seu espectro).

É interessante comparar as observações acima com o exposto na seção 3. Cerca de 2 a


3 horas antes da supernova ser detectada visualmente um grande fluxo de neutrinos foi
detectado. Sabemos que neutrinos devem ser produzidos em grande quantidade durante o
rápido colapso do núcleo estelar, quando prótons são comprimidos contra elétrons, gerando
nêutrons (e neutrinos, e). A emissão de neutrinos pela supernova deve anteceder a explosão
em algumas horas ou minutos. As observações de SN1987A mostraram que durante as horas
seguintes à observação do fluxo de neutrinos praticamente todo o volume da estrela foi
ejetado a uma velocidade equivalente a 10% da velocidade da luz, gerando um aumento de
brilho de um fator 100 em apenas 3h!

Após a excitação inicial no meio científico causada por SN1987A, astrônomos


debruçaram-se sobre antigos dados para tentar encontrar a estrela progenitora. Ela foi

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identificada como Sanduleak – 69 202 ou CPD – 69 402, uma supergigante de tipo espectral
B3I e magnitude aparente visual mv=12.4. Esses dados são surpreendentes porque esperava-se
que a progenitora fosse uma supergigante vermelha. Outras observações de Sk – 69 202
obtidas durante os 100 anos que anteciparam a supernova não revelaram qualquer alteração de
brilho. O espectro da progenitora obtido anteriormente à explosão também não exibia nenhum
aspecto peculiar. Essas informações mostram que: (1) aparentemente nem todas as supernovas
originam-se de estrelas supergigantes vermelhas; (2) as estrelas progenitoras podem exibir
características espectrofotométricas normais, sem nenhuma indicação de estarem na iminência
de se tornarem supernovas. Essas conclusões reforçam a tese de que o colapso de uma estrela
massiva é um fenômeno interno, que afeta inicialmente o seu núcleo e que depois se propaga
para a estrela como um todo.

Fig. 22.8: Curvas de luz de diversos tipos de supernovas. Créditos: Wikimedia Commons.

Ao gráfico da magnitude de uma estrela variável em função do tempo damos o nome


de curva de luz. As supernovas têm exibido uma grande variedade de formatos de curvas de
luz (fig. 22.8). Além da classificação entre tipos I e II, atualmente existem cerca de uma
dezena de subtipos diferentes de supernovas, classificadas de acordo com suas curva de luz e
características espectrais. Os diferentes tipos provavelmente estão relacionados às diferenças
entre as estrelas progenitoras, especialmente sua massa e composição química.

5. Após a supernova

Na seção anterior vimos que o destino de uma estrela massiva é sua explosão como
uma supernova tipo II. Durante esse evento, a maior parte do volume da estrela é lançado ao
espaço e pode ser detectado como uma nebulosa em expansão, como a nebulosa do
Caranguejo, catalogada por Charles Messier como M1 e facilmente visível com telescópios

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pequenos ou binóculos. Nesta seção, iremos estudar o destino do núcleo da estrela, i.e., sua
parte mais interna, a qual sofreu um violento colapso e que não foi ejetada com o restante da
estrela.

Fig. 22.9: A remanescente da supernova que explodiu no ano de 1054 d.C., chamada de Nebulosa do
Caranguejo (M1). Créditos: Hubble Space Telescope (HST).

O resultado da desintegração radiativa durante o colapso (v. seção 3) é a formação de


um núcleo estelar formado por nêutrons. A quantidade de massa necessária para formar esse
núcleo de nêutrons depende principalmente da massa total da estrela: aquelas que na
sequência principal possuíam entre 8 e 20 (ou 25) massas solares irão formar um núcleo de
nêutrons cuja massa é de aproximadamente 3 ~ 5 massas solares (Carroll & Ostlie 1996,
Smartt 2009). A diferença entre a massa inicial da estrela e a massa do seu núcleo após a
ejeção da supernova chamada de “perda de massa”. O núcleo de nêutrons é inerte (i.e. nele
não ocorrem reações nucleares) e se mantém em equilíbrio hidrostático devido à intensa
pressão de degenerescência que atua entre os nêutrons, opondo-se à força da gravidade. Essa
pressão é resultante do Princípio da Exclusão, formulado por Wolfgang Pauli, o qual postula
que duas partículas (neste caso, dois nêutrons, que são partículas com spin semi-inteiro
chamadas genericamente de férmions) não podem apresentar o mesmo conjunto de números
quânticos. O colapso do núcleo estelar além do que é efetivamente observado violaria este
princípio e portanto não é permitido por essa lei da Física Quântica. No entanto, a pressão de
degenerescência dos nêutrons não é ilimitada, de modo que se o núcleo estelar tiver massa
maior que 3 ~ 5 massas solares (o valor é um pouco incerto), a força da gravidade vence a
pressão de degenerescência e o núcleo continua a colapsar. Neste caso, o objeto resultante é
um buraco negro. Portanto, o destino final de uma estrela massiva depende principalmente

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de sua massa e o resultado do colapso gravitacional será genericamente estudado nas


próximas seções.

5.1. As estrelas de nêutrons e os pulsares

As observações e os modelos teóricos mostram que estrelas com massa dentro do


intervalo 8 < M*/Msol < 20~25 terminam sua evolução como um tipo de objeto degenerado
chamado estrela de nêutrons. Apesar do nome, esses objetos não são estrelas, pois não
ocorrem reações nucleares de fusão em seu interior. Seria mais correto incluí-los na classe de
objetos degenerados, como as anãs-brancas. Enquanto a pressão de degenerescência dos
elétrons é a responsável pelo não-colapso das anãs-brancas, é a degenerescência dos
neutrônica quem evita o colapso das estrelas de nêutrons. Comparando-se a massa e a
gravidade do núcleo da estrela precursora com a densidade necessária para haja
degenerescência neutrônica, pode-se estimar o tamanho de uma estrela de nêutrons, o qual
resulta ser de 11 ~ 12 quilômetros de raio.

A figura abaixo ilustra esquematicamente essa sequência evolutiva.

Fig. 22.10: Esquema ilustrando a evolução de uma estrela massiva, desde a fase de sequência principal até a
formação de uma “estrela de nêutrons”. Créditos: “Astronomia e Astrofísica”, Kepler de Souza Oliveira Filho &
Maria de Fátima Oliveira Saraiva.

Embora já tivessem sido previstas teoricamente há quase um século (Baade et al.


1934), as estrelas de nêutrons foram descoberta por acaso. Em 1967, Jocelyn Bell era uma
estudante de doutoramento sob a orientação de Anthony Hewish e fazia observações de um
tipo de radiofonte chamado quasar, na frequência de 81.5 MHz. Em meio aos dados obtidos
com o radiotelescópio havia uma fonte de origem externa ao Sistema Solar e que emitia
pulsos regulares a cada 1,33 segundo. Pouco tempo depois, Jocelyn Bell descobriu uma
segunda radiofonte localizada em outra direção do céu com características semelhantes e
desde então, mais de 2 mil pulsares já foram descobertos.

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O nome pulsar deve-se ao fato de que este tipo de objeto emite pulsos regulares de
radiação em uma ampla faixa espectral, de ondas de rádio até raios-. A distribuição de
período (tempo decorrido entre dois pulsos consecutivos) dos pulsares conhecidos é bastante
larga, mas mostra um máximo em 0,5 segundo. Em geral, há três interpretações possíveis para
fenômenos periódicos em Astronomia: (1) estrelas binárias; (2) estrelas pulsantes; (3) estrelas
em rotação. A primeira possibilidade pode ser descartada porque ela implicaria em duas
estrelas muito próximas uma da outra, com separação de apenas de 1,6 mil quilômetros
(supondo cada uma delas com 1 massa solar e período de revolução de 0,8 s) e há pulsares
que pulsam muito mais rapidamente, com período de milésimos de segundo. A segunda
possibilidade poderia explicar parcialmente a pulsação de quasares de longo período, mas não
os pulsares mais rápidos, com período de milisegundos. Sabe-se hoje que os pulsares são
estrelas de nêutrons em rotação. O colapso do núcleo estelar é acompanhado pelo surgimento
de um forte campo magnético (1010 ~ 1012 gauss), cujos pólos não estão alinhados com o eixo
de rotação da estrela. Os pulsos de radiação são observados porque cada um dos pólos de uma
estrela de nêutrons emite radiação majoritariamente na direção de um cone. Assim, à medida
que a estrela gira, o feixe de radiação gira também e se um observador estiver localizado na
direção varrida pelo feixe, ele observará a emissão da estrela de nêutrons como um pulsar (fig.
22.11).

Fig. 22.11: Esquema de um pulsar. A estrela de nêutrons gira em torno de seu eixo, cuja posição não coincide
com a de seus pólos magnéticos. “Feixes de radiação” saem de cada pólo magnético, girando juntamente com a
estrela de nêutrons.

Diante do exposto acima, podemos concluir que: (1) todo pulsar (aparentemente) é
uma estrela de nêutrons; (2) nem toda estrela de nêutrons é um pulsar. A primeira afirmação
baseia-se na interpretação que fazemos dos pulsos de radiação observados; a recíproca (2) não

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é verdadeira porque a Terra pode estar em uma direção que não é varrida pelo feixe de
radiação.

A observação de pulsares ao longo dos últimos 50 anos mostrou que a radiação


emitida leva consigo parte do momento angular do pulsar, causando a diminuição de sua
velocidade de rotação. É possível que a perda de momento angular também ocasione a
diminuição da intensidade do campo magnético e consequentemente a intensidade da radiação
emitida pelo pulsar. Segundo essa interpretação, o pulsar “apagaria” à medida que fosse
girando mais lentamente. Uma segunda possibilidade é a de que poderia haver uma rotação
diferencial entre a parte mais interna e uma possível “crosta” do pulsar. Neste caso, o efeito
dínamo causado por essa rotação diferencial manteria o pulsar “aceso”, mesmo que este
diminua muito sua velocidade de rotação. A incerteza que temos sobre o destino final de um
pulsar decorre do fato de que não se conhece exatamente o mecanismo que produz sua
radiação.

Fig. 22.12: O pulsar Crab, situado no centro da Nebulosa do Caranguejo.O quadro em preto e branco representa
uma sequência de imagens tomadas em intervalos de fração de segundo (de cima para baixo e da esquerda
para a direita). O pulsar “acende” e “apaga” ao longo da sequência de imagens, enquanto uma estrela próxima
mantém seu brilho constante. Créditos: National Optical Astronomy Observatory (NOAO).

5.2. Os buracos negros

O que acontece com o núcleo da estrela se a força da gravidade superar a pressão de


degenerescência neutrônica? Neste caso, o colapso do núcleo da estrela não será interrompido
e, após a conversão de prótons e elétrons em nêutrons, o núcleo continuará se contraindo até a
formação de um buraco negro. Este é o destino final de estrelas cuja massa (na sequência
principal) é maior que 20 ou 25 massas solares. A massa mínima do núcleo estelar para que
um buraco negro se forme é de cerca de 3 a 5 massas solares. A gravidade de um buraco negro

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é tão intensa que nem mesmo os fótons por ele emitidos são capazes de escapar da estrela, por
isso a denominação “negro”, significando que ele não emite radiação.

Fig. 22.13: Esquema ilustrativo da evolução de uma estrela massiva, desde a fase de sequência principal
(quando a estrela tem mais de 20 ~ 25 massas solares) até a formação de um buraco negro. Créditos:
“Astronomia e Astrofísica”, Kepler de Souza Oliveira Filho & Maria de Fátima Oliveira Saraiva.

A distância do centro do buraco negro, dentro da qual a radiação permanece confinada,


é chamada de horizonte dos eventos e seu tamanho pode ser calculado pela seguinte
expressão:

Rs = 2 GMBN/c2,

onde Rs é o raio de Schwarzchild. Observe que ele é diretamente proporcional à massa do


buraco negro, de modo que pode-se escrever diretamente:

Rs = 2,95 km/massa solar

Portanto, um buraco negro contendo 3 vezes a massa do Sol teria um horizonte dos
eventos com raio de apenas 9 quilômetros! É importante notar que o buraco negro situa-se
internamente ao raio de Schwarzchild e portanto seu raio é menor que este valor.

Embora os buracos negros não emitam fótons, eles podem ser detectados de outras
maneiras. Por exemplo, Cygnus X-1 é uma potente fonte de raios-X localizada na constelação
de Cygnus do hemisfério norte, a uma distância de 1,86 x 10 3 parsecs. A posição da fonte de
raios-X coincide com a da estrela HD226868 uma supergigante de magnitude m v=9,0 e
classificada espectroscopicamente como O9.7Iab. Observações dessa estrela ao longo de
muitos anos revelaram que ela é um dos membros de um sistema binário cujo período é de
apenas 5,6 dias. No entanto, apesar de o sistema estar relativamente próximo, a companheira
de HD226868 não é visível. Utilizando-se a terceira lei de Kepler é possível calcular sua
massa: 15 Msol. Esses dados são surpreendentes pois se a companheira fosse uma estrela, ela
seria de tipo espectral B1 e seria portanto visível.

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A emissão de raio-X desse sistema provavelmente origina-se de um disco de acreção


que gira em torno do buraco negro (fig. 22.14). Segundo esse modelo, a estrela supergigante
perde massa, que é atraída para o buraco negro. No entanto, ao invés de cair diretamente, a
matéria forma um disco de gás ionizado em órbita em torno do buraco negro. O movimento
das cargas aceleradas na parte mais interna desse disco (prótons e elétrons do plasma) gera
emissão de radiação em um amplo espectro de frequências.

Fig. 22.14: A fonte de raios-X Cygnus X-1 é associada a um sistema binário composto por uma estrela
supergigante e um buraco negro. Na representação artística acima, a supergigante (à esquerda) transfere massa
para sua companheira (o buraco negro), formando um disco de acreção (à direita). Créditos: Space Telescope
Institute (STI).

Bibliografia
1.ARANY-PRADO, Lilia Irmeli. À Luz das estrelas: ciência através da Astronomia. Rio
de Janeiro, DP&A, 2006.
2.ARNETT, W.D., BAHCALL, J.N., KIRSHNER, R.P. & WOOSLEY, S.E. Supernova
1987A. Annual Rev. Astron. Astrophys., vol. 27, 629-700, 1989.
3.BAADE, W., ZWICKY, F. Remarks on supernovae and cosmic rays. Phys. Rev., vol. 46,
76-77, 1934.
4.CARROLL, B.D. & OSTLIE, D.A., An Introduction to Modern Astrophysics. Addison-
Wesley, 1996.
5.DRILLING, J.S. & LANDOLT, A.U. in Allen's Astrophysical Quantities, p.p. 381-396,
Springer, 4th edition, 2000.
6.LANG, K.R. Astrophysical formulae. Vol. 1, 3a edição, Springer, 1999.
7.OLIVEIRA FILHO, Kepler de Souza; SARAIVA, Maria de Fátima Oliveira. Astronomia
& Astrofísica. São Paulo, Editora Livraria da Física, 2004.

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8.SMARTT, S.J. Progenitors of Core-Collapse Supernovae. Ann. Rev. Astronomy and


Astrophysics, vol. 47, 63-106, 2009
9.TOGNELLI, E., PRADA MORONI, P.G., & DEGL'INNOCENTI, S., A database covering
a wide range of Z, Y, mass and age values. Astronomy & Astrophysics, No. 533, 109-123,
2011.

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