PDT Inelegibilidade Bolsonaro 7 Setembro 1

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Tribunal Superior Eleitoral

PJe - Processo Judicial Eletrônico

08/09/2022

Número: 0600972-43.2022.6.00.0000
Classe: AÇÃO DE INVESTIGAÇÃO JUDICIAL ELEITORAL
Órgão julgador colegiado: Colegiado do Tribunal Superior Eleitoral
Órgão julgador: Corregedor-Geral Eleitoral Ministro Benedito Gonçalves
Última distribuição : 08/09/2022
Valor da causa: R$ 0,00
Assuntos: Abuso, Abuso - De Poder Econômico, Abuso - De Poder Político/Autoridade
Segredo de justiça? NÃO
Justiça gratuita? NÃO
Pedido de liminar ou antecipação de tutela? NÃO
Partes Procurador/Terceiro vinculado
PARTIDO DEMOCRÁTICO TRABALHISTA (PDT) - MARA DE FATIMA HOFANS (ADVOGADO)
NACIONAL (AUTOR) MARCOS RIBEIRO DE RIBEIRO (ADVOGADO)
EZIKELLY SILVA BARROS (ADVOGADO)
ANA CAROLINE ALVES LEITAO (ADVOGADO)
WALBER DE MOURA AGRA (ADVOGADO)
ALISSON EMMANUEL DE OLIVEIRA LUCENA (ADVOGADO)
JAIR MESSIAS BOLSONARO (RÉ)
WALTER SOUZA BRAGA NETTO (RÉ)
Procurador Geral Eleitoral (FISCAL DA LEI)
Documentos
Id. Data da Documento Tipo
Assinatura
15802 08/09/2022 09:57 AIJE - 7 DE SETEMBRO Petição Inicial Anexa
2907
EXCELENTÍSSIMO MINISTRO CORREGEDOR-GERAL ELEITORAL DO
EGRÉGIO TRIBUNAL SUPERIOR ELEITORAL.

PARTIDO DEMOCRÁTICO TRABALHISTA – PDT, pessoa jurídica de direito


privado, inscrita no CNPJ sob o nº 00.719.575/0001-69, com sede na SAFS - Quadra 02 -
Lote 03 (atrás do anexo do Itamaraty), Plano Piloto - Brasília/DF, CEP: 70042-900, neste
ato representado por seu presidente nacional, CARLOS ROBERTO LUPI, brasileiro,
solteiro, administrador, portador da cédula de identidade , expedida pelo
, inscrito no CPF/MF sob nº , com endereço eletrônico
, vem, respeitosamente, por seus advogados in fine assinados,
constituídos mediante instrumento procuratório que segue em anexo (doc. 01), perante
Vossa Excelência, com fundamento legal no art. 22 da Lei Complementar nº 64/90, propor
a presente

AÇÃO DE INVESTIGAÇÃO JUDICIAL ELEITORAL

em face de JAIR MESSIAS BOLSONARO, brasileiro, casado, inscrito no CPF sob o nº


, candidato à reeleição ao cargo de presidente da República, com endereço
no Palácio da Alvorada, SPP Zona Cívico- Administrativa, Brasília, Distrito Federal, CEP
70.150-000, e de WALTER SOUZA BRAGA NETTO, brasileiro, candidato ao cargo de
vice-Presidente da República, inscrito no CPF sob o portador da Cédula
de Identidade ), com endereço no
, o que faz com
espeque nos pontos de fato e de Direito doravante articulados:

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Número do documento: 22090809570127800000156711343
I. CONSIDERAÇÕES INICIAIS
I.I DO CABIMENTO DA AÇÃO DE INVESTIGAÇÃO JUDICIAL ELEITORAL

Dispõe o art. 22 da Lei Complementar nº 64/90 que, “qualquer partido político,


coligação, candidato ou Ministério Público Eleitoral poderá representar à Justiça Eleitoral,
diretamente ao Corregedor-Geral ou Regional, relatando fatos, indicando provas, indícios
e circunstâncias e pedir abertura de investigação judicial para apurar uso indevido,
desvio ou abuso do poder econômico ou do poder de autoridade, ou utilização indevida
de veículos ou meios de comunicação social, em benefício de candidato ou de partido
político”.

Buscou-se, com isso, proteger a normalidade e a legitimidade do pleito, que são


valores essenciais para a higidez do regime democrático (art. 14, §9º, da Constituição
Federal de 1988), especificamente para que a verdade eleitoral seja refletida através das
urnas. Daí a razão pela qual Rodrigo López Zílio salienta que “não pode haver qualquer
elemento que desvirtue ou perturbe a livre autodeterminação do eleitor, já que a
soberania popular é sustentáculo do princípio democrático”. 1

O art. 19, parágrafo único, da Lei Complementar nº 64/90, reforça, por sua vez,
que a necessidade de resguardar os referidos bens jurídicos tutelados quando acentua
que “a apuração e punição das transgressões terão o objetivo de proteger a normalidade
e legitimidade das eleições contra a influência do poder econômico ou do abuso do
exercício de função, cargo ou emprego na administração direta, indireta e fundacional da
União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios”.

1 ZÍLIO, Rodrigo López. Direito Eleitoral. 7. Ed. Salvador: Juspodvim, 2020. P. 649.

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Disso resulta que a Ação de Investigação Judicial Eleitoral (AIJE) tem por objetivo
impedir e apurar a prática de atos que que possam afetar a igualdade dos candidatos em
uma eleição, como nos casos de abuso de poder econômico, abuso de poder político e
utilização indevida dos veículos e dos meios de comunicação social; impondo-se como
sanção a denegação do registro de candidatura ou a cassação do diploma e a declaração
de inelegibilidade por oito anos, a contar da eleição em que os ilícitos eleitorais foram
perpetrados. 2 Portanto, a Ação de Investigação Judicial Eleitoral configura-se como o
instrumento processual vocacionado a combater qualquer tipo de abuso que interfira na
normalidade do pleito, independentemente da adequação típica.

Estabelecidas essas balizas inaugurais, arremata-se, de logo, que esta Ação de


Investigação Judicial Eleitoral tem por escopo a apurar e reprimir o abuso de poder
político e econômico, que ocorreu na ambiência do ato cívico de 7 (sete) de setembro. Isso
porque o evento foi desvirtuado apenas para satisfazer os interesses da campanha
eleitoral dos Investigados, sem ao menos voltar-se aos os fins a que se destinava.

Portanto, o abuso de poder político perfectibiliza-se pelo desvio de finalidade


coadunado às condutas divorciadas do bem comum. Já o abuso de poder político incidiu
na utilização do poder do Erário para o requinte da estrutura que foi utilizada como
palanque eleitoral em benefício da candidatura dos Investigados, em ordem a atingir a
normalidade e a legitimidade do pleito eleitoral de 2022.

Daí a razão pela qual o Partido Democrático Trabalhista (PDT) ajuíza a presente
Ação de Investigação Judicial Eleitoral para que os atos abusivos perpetrados pelos
Senhores Jair Messias Bolsonaro e Walter Souza Braga Netto sejam apurados, com a
consequente punição nas iras do art. 22, inciso XIV, da Lei Complementar nº 64/90.

2 AGRA, Walber de Moura. Manual prático de Direito Eleitoral.4. Ed. Belo Horizonte: Fórum, 2022. P. 361.

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II. DOS FATOS

Constitui fato público e notório que o Senhor Jair Messias Bolsonaro realizou atos
de campanha durante o desfile cívico comemorativo do bicentenário a independência do
Brasil, no dia 07/09/2022, em Brasília, através do uso do cargo com o fito de desvirtuar o
evento para promoção de sua candidatura. Além do uso da estrutura do evento
(palanque, veiculação através da TV BRASIL), que foi custeado com o Erário, o primeiro
Investigado cumprimentou pessoas, posou para fotos com aliados e, em discurso
realizado de cima de um trio elétrico, conclamou apoiadores a votarem nele no primeiro
turno e convencer aqueles que pensam "diferente de nós". Senão, vejamos a íntegra de
seu discurso através do link – https://www.youtube.com/watch?v=cJ0aLdnZIQc.
Degravação:

“Brasil, terra prometida. Brasil, um pedaço do paraíso. Alegria de ser brasileiro,


orgulho de ter nascido nessa terra. Cores preferidas? O verde e amarelo. O nosso
objetivo? A liberdade eterna. Tenho certeza, mais que oxigênio, a nossa liberdade
é essencial para a nossa vida. Nenhum país do mundo tem o que nós temos. Temos
tudo para sermos ainda mais felizes ainda, pode ter certeza. “Com a graça de Deus,
que me deu uma 2ª vida, e pela missão também que me deu de comandar o nosso
país, nós atingiremos juntos o nosso objetivo. Hoje vocês têm um presidente que
acredita em Deus, que respeita os seus policiais e seus militares. Um governo que
defende a família e um presidente que deve lealdade ao seu povo. Vocês sabem a
beira do abismo que o Brasil se encontrava há poucos anos, atolado em corrupção
e desmando. Demos uma nova vida a essa Esplanada dos Ministérios, com pessoas
competentes, honradas e patriotas. Começamos a mudar o nosso Brasil. Veio uma
pandemia. Lamentamos as mortes. Veio aquela errada política do fica em casa, a
economia a gente vê depois. Enfrentamos também as consequências de uma guerra
lá fora. Quando parecia que tudo estaria perdido para o mundo, eis que o Brasil
ressurge com uma economia pujante, com uma gasolina das mais baratas do

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mundo, com um dos programas sociais mais abrangentes do mundo, que é o
auxilio brasil, com recorde na criação de empregos, com a inflação despencando e
com um povo maravilhoso entendendo aonde o seu país poderá chegar. Somos
uma pátria majoritariamente cristã que não quer a liberação das drogas, que não
quer legalização do aborto, que não admite a ideologia de gênero. Um país que
defende a vida desde a sua concepção, que respeita as crianças na sala de aula, que
respeita a propriedade privada e que combate a corrupção para valer. Isso não é
virtude. É obrigação de qualquer chefe do Executivo. Sabemos que temos pela
frente uma luta do bem contra o mal. O mal perdurou por 14 anos em nosso país,
que quase quebrou a nossa pátria e que agora deseja voltar à cena do crime. Não
voltarão. O povo está do nosso lado, o povo está do lado do bem, o povo sabe o
que quer. A vontade do povo se fará presente no próximo dia 2 de outubro.
Vamos votar. Vamos convencer aqueles que pensam diferente de nós. Vamos
convencê-lo do que é melhor para o nosso Brasil. Podemos fazer várias
comparações, até entre as primeiras-damas. Não há o que discutir. Uma mulher de
Deus, família e ativa na minha vida. Não é ao meu lado, não. Muitas vezes ela está
é à minha frente. E eu tenho falado para os homens solteiros, para os solteiros que
estão cansados de serem infelizes: procurem uma mulher, uma princesa, se case
com ela para serem mais felizes ainda. Obrigado, meu Deus, pela minha 2ª vida.
Obrigado pela missão. Imbrochável, Imbrochável, Imbrochável, Imbrochável,
Imbrochável. Obrigado pela minha 2ª vida, pela missão que me deste pelas mãos
de 58 milhões de pessoas para estar à frente do Executivo Federal. A missão não é
fácil. Sabemos que é difícil, mas sempre tenho pedido a ele mais que sabedoria,
tenho pedido força para resistir e coragem para decidir. Pode ter certeza, é
obrigação de todos jogarem dentro das 4 linhas da Constituição. Com uma
reeleição nós traremos para dentro dessas 4 linhas todos aqueles que ousam ficar
fora dela. Tenho certeza, nessa esplanada, aqui a origem das leis que mudam nosso
país. Muito feliz em ter ajudado a chegar até vocês a verdade. Também ter
mostrado para vocês que o conhecimento também liberta. Hoje, todos sabem quem

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é o Poder Executivo, hoje todos sabem o que é a Câmara dos Deputados, todos
sabem o que é o Senado Federal e também todos sabem o que é o Supremo Tribunal
Federal. A voz do povo é a voz de Deus. Todos nós mudamos, todos nós nos
aperfeiçoamos, todos nós podemos ser melhor no futuro. Muito obrigado, meu
Deus, por esse momento, por mais esse momento junto com o povo aqui na
Esplanada dos Ministérios. Nunca vi um mar tão grande com essas cores verde e
amarela. Aqui não tem a mentirosa DATAFOLHA. Aqui é o nosso data povo.
Aqui, a verdade. Aqui, a vontade de um povo honesto, livre e trabalhador. Daqui
a pouco eu embarco para o Rio de Janeiro e estarei na praia de Copacabana,
participando de um evento semelhante a esse. Evento que une os brasileiros dos 4
cantos do país. Evento onde entre nós não há qualquer diferença. Somos todos
iguais. Todos nós queremos o bem da nossa pátria, o bem do nosso país. Temos
certeza que juntos, em outubro, daremos mais um grande passo para o futuro do
nosso país e das nossas famílias. Muito obrigado a todos vocês pela
oportunidade, pela confiança, pelo carinho e pelo calor. A reciproca é verdadeira.
Muito obrigado mais uma vez e até a vitória. Brasil acima de tudo.

Observa-se, a partir da análise do discurso proferido pelo primeiro Investigado,


que houve pedido explícito de votos, bem como utilização maciça do slogan de campanha
eleitoral, qual seja, “uma luta do bem contra o mal”. Diz-se isso porque essa é a narrativa
que vem sendo proferida em todos os seus discursos políticos, inclusive na Marcha para
Jesus, que ocorreu em São Paulo, no dia 09/07/2022. Confira-se: “Temos pela frente uma
luta do bem contra o mal. Está bem claro o campo de batalha. Mas, como a história sempre mostrou,
o bem será vitorioso. Estou aqui porque acredito em vocês, e todos nós estamos aqui porque
acreditamos em Deus”.3

3 Disponível em <
https://www.em.com.br/app/noticia/politica/2022/07/09/interna_politica,1379086/bolsonaro-sobre-
disputa-com-lula-luta-do-bem-contra-o-mal.shtml>. Acesso em: 07/09/2022.

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Como se vê, utilizou-se de toda estrutura da Administração Pública no ato de 7
(sete) de setembro para fins de promover a sua candidatura à reeleição para o cargo de
Presidente da República. Ressalta-se que o discurso proferido foi verbalizado a partir das
mesmas premissas entoadas em inúmeros discursos realizados, de modo que resta nítida
a utilização do eventos para fins eleitorais. Cite-se, por exemplo, o teor da fala do
primeiro Investigado no encontro com lideranças religiosas em Juiz de Fora (MG), onde
criticou-se o que chamou de "fechamento de igrejas" na pandemia da COVID-19, que
exigia isolamento social para evitar o aumento da curva de contágio, e reiterou-se o
discurso de que o pleito de 2022 configura-se como uma “luta do bem contra o mal".4

Tal narrativa iniciou-se no evento partidário realizado no dia 27/03/2022,


intitulado “Movimento Filia Brasil – É com ele que eu vou”, e desde então tem sido o
slogan da corrida presidencial, utilizado pelo primeiro Investigado em todos os seus
eventos políticos, a saber: “Não é uma luta da esquerda contra a direita, é uma luta do
bem contra o mal. E nós vamos vencer essa luta porque eu estarei sempre na frente de
vocês. Vocês nos fortalecem, nos dão ânimo, nos encorajam a mostrar que esta luta não
será em vão”.5

4 Íntegra - https://gauchazh.clicrbs.com.br/politica/eleicoes/noticia/2022/08/bolsonaro-volta-a-
chamar-eleicao-de-luta-do-bem-contra-o-mal-cl6wat19o003i01h2sjiu6oak.html, acessado em: 07/09/2022.
5 Íntegra - https://www.cnnbrasil.com.br/politica/se-aparecer-corrupcao-colaboraremos-para-que-fatos-

sejam-elucidados-diz-bolsonaro/, acessado em: 07/09/2022.

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https://g1.globo.com/politica/noticia/2022/09/07/7-de-setembro-em-discurso-em-
brasilia-bolsonaro-puxa-coro-de-imbrochavel.ghtml

O desvio de finalidade e o abuso político também restam patentes quando se


observa a entrevista concedida pelo primeiro Investigado à TV Brasil, que é a rede de
televisão pública do Poder Executivo Brasileiro, a qual pertence a Empresa Brasil de
Comunicação, conglomerado de mídia do governo do país, em prol de sua candidatura -
https://www.youtube.com/watch?v=a7VXyy29ETI, especificamente quando reverbera
diversos atos que são utilizados em sua propaganda eleitoral, no que reforça-se a
utilização da máquina pública em benefício da sua candidatura.

Por ser um ato público destinado a louvar um fato histórico para o país, o evento
não poderia ter sido transformado em um palanque eleitoral, com a utilização de toda
estrutura custeada com dinheiro público. Cite-se, por relevante, que, para a realização do
evento cívico comemorativo, foram gastos cerca de R$ 3.380.000,00 (três milhões,
trezentos e oitenta mil reais), conforme se extrai do Extrato de Contrato nº 63/2022 -

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UASG 410003. Repisa-se que toda essa estrutura foi utilizada em prol da candidatura dos
investigados:

https://www.in.gov.br/web/dou/-/extrato-de-contrato-n-63/2022-uasg-410003-
415560190

Não se faz necessário empreender esforços hercúleos para vislumbrar, por um


lado, a ocorrência de violação aos princípios da Administração Pública (art. 37, caput, da
CF/88) e, por outro, o acinte ao princípio da isonomia, uma vez que os demais candidatos
não dispõem de igual exposição, e a intensa agressão aos bens jurídicos tutelados pelo

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art. 22 da Lei Complementar nº 64/90. Deveras, é inegável que o Senhor Jair Messias
Bolsonaro se aproveitou do evento valendo-se de recursos públicos para promover a sua
imagem perante os eleitores, o que caracteriza o abuso de poder econômico e político,
consubstanciado em um fato de extrema gravidade, apto a ser apurado na ambiência
desta Ação de Investigação Judicial Eleitoral.

III. DA FUNDAMENTAÇÃO LEGAL E JURÍDICA


III.I DO ABUSO DE PODER POLÍTICO

O conceito de poder sempre esteve associado à determinação do seu titular,


quando não havia formas institucionais ou organização política, haja vista que estava,
naturalmente, associado à noção de força, razão qual, consequentemente, as
características de sua utilização mudavam conforme a titularidade do poder. 6 Com a
consolidação do Estado Democrático de Direito, a titularidade do poder político passa a
pertencer à soberania popular, na qual o povo exerce o seu papel principal, obrigando o
dirigente a esquadrinhar suas atividades de acordo com os estatutos normativos vigentes,
que encontram legitimidade na soberania popular. 7

O abuso de poder denota aspecto vicioso do ato administrativo, que configura


arbitrariedade na conduta do administrador, eivando o ato de nulidade.8 Trata-se de
aberração da discricionariedade da qual é detentor o administrador da res publica, que se
inclina ao interesse pessoal, ab-rogando com sua conduta o interesse da Administração.9
Trata-se de gênero que se bifurca nas espécies de excesso, omissão e desvio de finalidade.

6 KELSEN, Hans. Teoria geral do direito e do estado. 2. Ed. São Paulo: Martins Fontes, 1995. P. 250.
7 VIVANCO, Ángela. Las libertades de opinión y de informacíon. Santiago: Andrés Bello, 1992. P. 307.
8 TÁCITO, Caio. O desvio do poder no controle dos atos administrativos, legislativos e jurisdicionais.

Revista de Direito Administrativo, Rio de Janeiro, v. 228, p. 2, abr./jun. 2002.


9 CRETELLA JÚNIOR, José. Sintomas denunciadores do “desvio de poder”. Revista da Faculdade de

Direito da USP, v. 71, p. 79, 1976.

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O abuso de poder pela modalidade do excesso se configura todas as vezes em que
há uma afronta ao elemento normativo, de forma direta ou indireta, em razão de que o
sujeito extrapolou suas prerrogativas, indo além do que lhe era permitido legalmente.
Como a legalidade é a sacramentação do Estado Social Democrático de Direito, pune-se
toda a conduta em que há uma atuação em uma seara que ultrapassa os limites legais.
Configura-se em um vício de competência, consubstanciando o abuso pela inexistência
de atribuição legal para o ato.10

Os representantes do poder ostentam apenas a qualidade de mandatários, de


modo que o exercício abusivo põe em perigo os direitos do povo -e, assim, a própria
constituição do Estado- e a democracia substantiva. 11 O desvio de poder, ou
détournement de pouvoir representa um limite ao poder discricionário pelo lado dos fins,
dos motivos da Administração. 12 Ele, por sua vez, ocorre quando uma autoridade
manuseia o poder discricionário com o fito de atingir fim diverso do que se estima no
interesse público previsto na Constituição ou em lei .13 Assim, haverá desvio de poder
sempre que o agente atuar com finalidade diversa da perseguida em lei, ainda que não
seja contrário ao ordenamento de forma direta.14 Esse tipo de abuso de poder faz emergir
ato cujo fim é absolutamente incompatível com o espírito de Justiça e imparcialidade que
deve nortear os atos do agente público.15

Ao transpor essas digressões para o campo do Direito Eleitoral, tem-se as hipóteses


de abuso de poder (econômico, político, de autoridade e por uso indevido de meios de

10RIVERO, Jean. Droit Administratif. Paris: Dalloz, 2011. p. 247.


11CHOMSKY, Noam. Failed States: the abuse of power and the assault on democracy. New York: Henry
Holt and Company, 2006. P. 22.
12 QUEIRÓ, Afonso Rodrigues. A teoria do desvio de poder em Direito Administrativo. Revista de Direito

Administrativo, Rio de Janeiro, nº 7, p. 62-63, jan./mar. 1947.


13 DI PIETRO, Maria Sylvia Zanella. Direito Administrativo. 28. ed. São Paulo: Atlas, 2015. p. 253.
14 GORDILLO, Agustin. Tratado de derecho administrativo. 5. ed. Buenos Aires: Fundación de Derecho

Administrativo, 2000. p. 23-24.


15 CRETELLA JÚNIOR, José. Sintomas denunciadores do “desvio de poder”. Revista da Faculdade de

Direito da USP, v. 71, p. 79, 1976.

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comunicação), que ocorrem quando se ultrapassam os limites previstos para certas
condutas, em ordem a abalar a legitimidade e a normalidade do pleito. O abuso de poder
político ocorre quando o agente público, valendo–se de condição funcional e em
manifesto desvio de finalidade, desequilibra a disputa em benefício de sua candidatura
ou de terceiros. 16 Isso porque o “poder político encontra origem no exercício de
prerrogativas de direção ostentadas por sujeitos que ocupam determinadas posições na
burocracia do Estado”. 17

Essa conduta que estorva a vontade do eleitor configura-se no momento em que a


normalidade e a legitimidade das eleições são comprometidas por condutas de agentes
públicos que esboçam condutas em nítido desvio de finalidade para densificar as forças
de suas candidaturas. Para que haja a devida configuração do abuso de poder político em
determinado caso concreto é necessário que, além da prova da sua materialização, estejam
presentes ação, omissão ou desvio de finalidade de ato da Administração Pública e a
gravidade da conduta. Para averiguar a gravidade, verifica-se a capacidade de o fato
apurado como irregular desequilibrar a igualdade de condições dos candidatos à disputa
do pleito, ou seja, de as apontadas irregularidades impulsionarem e emprestarem força
desproporcional à candidatura de determinado candidato de maneira ilegítima. 18

No caso em apreço, o Senhor Jair Messias Bolsonaro, valendo-se de sua condição


funcional aproveitou-se de toda a superestrutura do evento cívico do bicentenário da

16 (RECURSO ORDINÁRIO ELEITORAL nº 172977, Acórdão, Relator(a) Min. Benedito Gonçalves,


Publicação: DJE - Diário da justiça eletrônico, Tomo 70, Data 22/04/2022). “Este Tribunal reconhece que
"[o] abuso de poder político, para fins eleitorais, configura–se no momento em que a normalidade e a
legitimidade das eleições são comprometidas por condutas de agentes públicos que, valendo–se de sua
condição funcional, beneficiam candidaturas, em manifesto desvio de finalidade" (RCED 661/SE, Rel. Min.
Aldir Passarinho Junior, DJE de 16/2/2011, dentre outros). (RECURSO ORDINáRIO ELEITORAL nº
729906, Acórdão, Relator(a) Min. Luis Felipe Salomão, Publicação: DJE - Diário da justiça eletrônico, Tomo
230, Data 14/12/2021)
17 (RECURSO ESPECIAL ELEITORAL nº 69853, Acórdão, Relator(a) Min. Sergio Silveira Banhos, Relator(a)

designado(a) Min. Edson Fachin, Publicação: DJE - Diário da justiça eletrônico, Tomo 185, Data
16/09/2020, Página 0)
18 AGRA, Walber de Moura. Manual prático de Direito Eleitoral.4. Ed. Belo Horizonte: Fórum, 2022. P.308.

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Independência do Brasil – custeado com o erário público (R$ 3.380.000,00 – três milhões,
trezentos e oitenta mil reais), especificamente para promover a sua imagem perante os
eleitores em total alvedrio às regras eleitorais e com o claro viés de desequilibrar o pleito,
haja vista que está se valendo do uso da máquina pública.

Com efeito, vislumbra-se que o Senhor Jair Messias Bolsonaro desvirtuou a


realização do ato para propagar seu programa de campanha, que dentre poucas coisas,
abarca “O povo está do nosso lado, o povo está do lado do bem, o povo sabe o que quer.
A vontade do povo se fará presente no próximo dia 2 de outubro. Vamos votar”. Isso dito,
não há como não perceber a presença de laços inquebrantáveis da conduta do ora
investigado com as Eleições 2022, no que não se pode, bem por isso, permitir a
desvirtuação da atuação legítima estatal para confortar ânimos eleitorais e escusos do
Chefe de Estado.

Há, na espécie, hipótese clara de desvirtuamento de poder, perfectibilizando-se o


abuso. O que ocorreu foi a demonstração e posterior profusão de ideais vinculadas à
candidatura à reeleição do Investigado, no contexto de um desfile cívico comemorativo
do bicentenário da independência do Brasil que deveria estar umbilicalmente interligada
ao interesse público. Mais ainda, utilizou-se de todo aparato estatal para estruturar o ato,
especificamente porque o desfile foi custeado com o erário público, em Brasília, bem como
também o seu conteúdo foi veiculado através da TV Brasil.

In casu, o Senhor Jair Messias Bolsonaro, ao promover ato de campanha no desfile


cívico do dia 07/09/2022, utilizando-se de seu poder político, beneficiou-se sobremodo
da conduta ilícita, pois auferiu dividendos eleitorais através da realização e difusão do
ato ora questionado, de modo a abalar a normalidade e a legitimidade do pleito. Portanto,
resta perfectibilizada a incidência da conduta sob análise na fattispecie de abuso de poder
político.

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III.II DO ABUSO DE PODER ECONÔMICO

O abuso de poder econômico refere-se à utilização excessiva, antes ou durante a


campanha eleitoral, de recursos materiais ou humanos que representem valor econômico,
buscando beneficiar candidato, partido ou coligação, afetando, assim, a normalidade, a
isonomia e a legitimidade das eleições. Ou seja, nesses casos existem gastos eleitorais em
demasia que têm como escopo influenciar negativamente a vontade do eleitorado,
desvirtuando-a de sua opção inicial para que escolha candidato que disponha desses
recursos.

Para Edson Resende de Castro, o abuso de poder econômico consubstancia-se na


transformação do voto em objeto de mercancia, materializando-se na compra, seja direta
ou indireta, da liberdade de escolha dos eleitores.19 Sintetiza André Ramos Tavares que o
abuso de poder econômico acontece quando o aporte de recursos é alheiro às praticas de
gastos autorizados pela legislação eleitoral.20 Já para Rodrigo López Zílio, ele ocorre
quando há excesso de aporte monetário que seja apto a provocar um desequilíbrio da
paridade de armas, com a finalidade de obter vantagem eleitoral, mesmo que indireta ou
reflexa.21

É assente para este Colendo Tribunal Superior Eleitoral que o abuso de poder
econômico configura–se pelo uso desmedido de aportes patrimoniais que, por sua
vultosidade, é capaz de viciar a vontade do eleitor, desequilibrando, em consequência, o
desfecho do pleito e sua lisura. 22 Para a correta tipificação do abuso de poder econômico
se faz necessária a verificação da gravidade lesiva da conduta, apta a influir no tratamento

19 CASTRO, Edson Resende. Teoria e prática do direito eleitoral. 5. ed. Belo Horizonte: Del Rey, 2010. p.
277.
20 TAVARES, André Ramos. Princípios constitucionais do processo eleitoral. In: TAVARES, André Ramos;

PEREIRA, Luiz Fernando. O Direito eleitoral e o novo código de processo civil. Belo Horizonte: Fórum,
2016. p. 33.
21 ZÍLIO, Rodrigo López. Direito eleitoral. Porto Alegre: Verbo Jurídico, 2008. p. 381.
22 (RECURSO ESPECIAL ELEITORAL nº 45262, Acórdão, Relator(a) Min. Benedito Gonçalves, Publicação:

DJE - Diário da justiça eletrônico, Tomo 121, Data 29/06/2022)

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isonômico entre os candidatos e no respeito à vontade popular, assim como exige-se o
critério quantitativo relativo a utilização exacerbada dos recursos financeiros.

In casu, o abuso restou perfectibilizado através da utilização do montante no


importe de R$ 3.380.000,00 (três milhões, trezentos e oitenta mil reais) para soerguer a
estrutura do evento. Cite-se, por esse norte, que toda estrutura do desfile que celebra o
Bicentenário da Independência representou um valor de 247% maior do que gasto na
mesma data de 2019. 23

Ou seja, utilizou-se aportes pecuniários de origem pública em demasia para a


celebração da data festiva que foi desvirtuada para fins eleitorais para realização de ato
de campanha, o que per se revela incontestável acinte ao princípio da isonomia e a todos
os outros princípios norteadores do Direito Eleitoral.

V. DOS PEDIDOS:

Pelo fio do exposto, requer a Vossa Excelência o seguinte:

a) A notificação dos Investigados para apresentem defesa no prazo de 5 (cinco)


dias, nos termos do art. 22, inciso I, a, da LC nº 64/90;
b) O envio dos autos ao Ministério Público Eleitoral para emissão de parecer;
c) Consoante entendimento do parágrafo inciso XIV, do art. 22, da Lei
Complementar nº 64/1990, declarada a inelegibilidade dos Investigados para as
eleições presentes e as que se realizarem nos 08 (oito) anos subsequentes, bem
como a cassação do seu registro ou diploma;

23Íntegra - https://www.metropoles.com/brasil/politica-brasil/governo-deve-gastar-r-33-milhoes-com-
desfile-de-7-de-setembro. Acessado em: 07/09/2022.

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Por fim, protesta provar o alegado através de todos os meios de prova admitidos
em Direito.

Nestes termos, pede deferimento.

Brasília (DF), 08 de setembro de 2022.

WALBER DE MOURA AGRA EZIKELLY BARROS


OAB/PE 757-B OAB/DF 31.903

ALISSON LUCENA MARCOS RIBEIRO DE RIBEIRO


OAB/PE 37.719 OAB/RJ 62.818

MARA HOFANS ANA CAROLINE LEITÃO


OAB/RJ 68.152 OAB/PE 49.456

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