Assimetria - Gestores de Fundos Multimercad - Fulda, Mathias
Assimetria - Gestores de Fundos Multimercad - Fulda, Mathias
Assimetria - Gestores de Fundos Multimercad - Fulda, Mathias
Prefácio
Introdução
Capítulo 1
Capítulo 2
Capítulo 3
Capítulo 4
Capítulo 5
Capítulo 6
Capítulo 7
Capítulo 8
Capítulo 9
Capítulo 10
Capítulo 11
Capítulo 12
Capítulo Bônus
Bibliografia
Glossário
Prefácio
A democratização das aplicações financeiras traz, cada vez mais, novos
investidores brasileiros para o mercado. Em paralelo, a evolução do próprio
sistema financeiro torna necessário o desenvolvimento dos investidores,
para que ambos caminhem em conjunto. Em um cenário dinâmico e de
busca constante por rentabilidade, uma classe de ativos que ganha destaque
são os fundos multimercado.
@explicaana
Introdução
Como pensam gestores de fundos multimercado?
Esse é um dos diversos take-aways das conversas que tive com gestores de
12 Assets. Em um formato ágil de perguntas e respostas, exploro as
habilidades dos gestores para tomarem decisões de investimentos de forma
estruturada, sob o escrutínio público da cota diária.
Vamos nessa?!
Mathias Fulda
Capítulo 1
FABIANO RIOS |
ABSOLUTE INVESTIMENTOS
F abiano Rios é o CIO da Absolute Investimentos e lidera um time de
gestores que possuem um limite de risco individual para alocar em seus
mercados de especialização. A Asset também utiliza o conceito de back
book, permitindo que posições estruturais dos fundos multimercado possam
ser compartilhadas por gestores de mercados diferentes.
A nossa equipe é relativamente enxuta, pois ela é bem sênior. Nós temos
mais ou menos 20 pessoas que colaboram na geração de ideias macro,
micro, análise quantitativa e gestão. Um dos maiores desafios de qualquer
gestora macro é fazer as ideias circularem. Precisamos extrair as melhores
ideias da equipe. Acredito que quem tem sucesso na gestão é quem
consegue fazer isso. Quem consegue fazer com que a equipe toda trabalhe
junto de verdade, um colaborando com o outro dentro da sua especialidade,
fazendo aquela informação fluir.
Acho que todo gestor tem uma sistemática de investimento. O que gosto de
fazer, onde me sinto confortável, é onde acho que há valor esperado
positivo grande. Quando acontece essa virada macro, em geral, os preços
não se movimentam em formato de V. Então, o que eu gosto de fazer? É
enxergar onde há uma grande tendência, uma acomodação de preços com
determinado nível e, após essa acomodação, saber que vai acontecer alguma
coisa. Pode ser até seguindo a tendência ou para o lado oposto. Fazendo
dessa maneira não há risco de tentar “segurar uma faca caindo”, como se
diz popularmente no mercado. Não gosto de fazer isso, não faço. Uso um
ponto de stop relativamente fácil e próximo, que é o que chamo de
disciplina ou sistemática de gestão. Procuro um movimento grande, uma
acumulação e o potencial de algo acontecer depois dessa acumulação. Aí, é
o cenário macroeconômico que vai dizer para que lado isso vai.
Eu tenho certeza que tem gente que sabe fazer isso muito bem e que ganha
dinheiro com isso. Infelizmente, não consigo fazer e acho bastante difícil.
Existe a questão do survival bias. Principalmente no exterior, enxergamos
os fundos que deram certo, que conseguem ganhar dinheiro. Tenho certeza
absoluta que milhares de tentativas não deram certo e ficaram pelo
caminho. É algo que fascina muita gente, mas é bastante difícil de se
implementar.
Nos fundos macro quem dá certo é minoria. Muita gente fica pelo caminho.
É muito difícil conseguir ter consistência e ser um gestor reconhecido pela
capacidade de dar retorno no longo prazo. Ir bem no curto prazo pode ter
um componente de sorte, mas, no longo prazo, as equipes, mais do que as
pessoas, têm de ter método, visão e disciplina para conseguir entregar.
Existir, existe. Mas esses modelos são mais uma informação. A minha
experiência em tomar decisão baseada nesses modelos não foi bem-
sucedida. Acho que é uma informação, está lá. Há, por exemplo, Bancos
Centrais que divulgam os modelos de câmbio. Nós, aqui, tentamos replicar.
Temos modelos de inflação e um modelo que simula o do Banco Central.
Temos os instrumentos e é importante tê-los. É mais uma maneira de
checarmos nossa visão de mercado. Mas, tomar a decisão única e
exclusivamente baseado no modelo não é o que fazemos aqui, e não acho
que isso funciona.
Como vocês traduzem o cenário macro para posições efetivas?
Bom, acho que essa é a arte. Nosso trabalho tem um quê de arte. Senão,
qualquer matemático, engenheiro, qualquer um que fosse bom de modelos e
de contas seria bem-sucedido. Sabemos bem que não é esse o caso. Tem um
pouco da experiência de situações passadas, de já ter vivido situações
semelhantes. Tentar buscar na história situações que se assemelham com
aquela que o cenário está apontando.
Como você lida com a frustração em relação tanto a trades que não
funcionaram quanto a trades onde você saiu cedo demais e poderia ter
ganho mais?
Todo gestor precisa ter uma sistemática, uma maneira de atuar. Se não, a
frustração será grande e constante. Costumo dizer que quem investe na
economia real, numa fábrica por exemplo, só vai saber se deu certo ou
errado daqui a cinco ou dez anos. Aqui eu sei se deu certo ou errado com
uma frequência infinitamente maior. E isso implica em frustração. Ou em
euforia, às vezes. Então, um gestor de sucesso não pode ficar eufórico, nem
frustrado. Tem que seguir a dinâmica que ele pré-estabeleceu, uma
sistematização vencedora. Óbvio, ele sempre vai se questionar. Mas acho
que ele não vai se questionar se foi burro porque zerou antes da hora. Ele
pode questionar a sistematização: “Será que está no momento de reavaliar a
minha maneira de pensar? Ou não?”. Acredito que estas reavaliações devem
ser bem pouco frequentes. E é por isso que cada um tem suas
características. O que tira o gestor da frustração é a disciplina. Eu me
considero um cara bastante disciplinado. Não vou dizer que sou imune a
isso, mas que lido bem com a frustração. A experiência ensina a lidar com
as diversas situações. Penso até que acabamos nos cobrando mais do que os
nossos próprios clientes. Quando há interação com os clientes, em geral,
eles parecem bem mais satisfeitos com os resultados do que nós mesmos. É
porque alguma coisa correta estamos fazendo.
A primeira coisa que eu diria em relação à sua pergunta é que não acredito
em posição consensual. Posição tem que ter dono. Porque a posição
consensual que ganha é de todo mundo e a posição que perde não é de
ninguém. Temos livros que exigem uma aprovação qualificada. Mas, no
final das contas, alocamos a posição para cada gestor individualmente. Pode
até fracionar uma posição. Mas, se der certo, o gestor já sabe quantos por
cento daquele resultado vai ser dele e, se der errado, também. Então, o
gestor fica mais atento à posição.
Converso pouco. Tem amigos com que eu converso socialmente, mas falo
mais trivialidades do que sobre análise de mercado. O que tentamos fazer é
acompanhar a posição aplicada por fundos grandes. Tentar entender onde os
fundos, não só os multimercados, estão posicionados. No Brasil, com a cota
diária, é fácil acompanhar isso. Esse acompanhamento ajuda na tomada de
decisão dentro da sistematização de pensamento, na maneira de montar a
posição.
São tantas lições... Respeitar o mercado, não achar que sou o dono da
verdade. Essa questão do stop vem um pouco disso, de saber que ninguém é
maior que o mercado. Nunca se achar o melhor e também não se achar o
pior. O gestor tem que se preocupar em fazer o trabalho bem feito. Costumo
dizer internamente que não estamos proibidos de olhar para o lado.
Devemos olhar para ver se podemos melhorar, mas a preocupação é fazer o
trabalho bem feito. Se fizermos o trabalho bem feito, vamos ter recursos
para gerir. Em um momento, vamos estar com resultados melhores, em
outros, piores. Mas o importante é fazermos o trabalho bem feito. Às vezes,
ao olhar para o lado, o gestor acaba deixando de focar no que interessa. Na
época em que eu trabalhei em banco achava que os bancos americanos eram
melhores. Os americanos eram mais pragmáticos, tinham tomadas de
decisão mais eficientes etc. Quando fui trabalhar em banco americano, vi
que eles tinham os próprios problemas. Como eu trabalhei com eles em
2007, ficou bem evidente isso com a crise financeira lá nos Estados Unidos.
O que diferencia gestores é como eles reagem às situações. No Joesley Day,
a nossa reação aqui na Absolute foi em função dessa experiência. Agimos
friamente, mantivemos a forma de pensar. Trata-se também de manter uma
sistemática de sizing . Pelo lado psicológico, a posição grande é a que
perdemos e a posição pequena é a que ganhamos. Então, se temos uma
disciplina de sizing, mantemos a posição de acordo com o nível de
convicção. Dessa forma ganhamos o que tínhamos de ganhar. Não tem
tortura psicológica de achar que a posição era maior ou menor do que
deveria ser. A grande mensagem que eu captei de todos esses anos é a
questão da disciplina. Nos fundos de arbitragem, que na verdade são fundos
de grandes assimetrias, a disciplina é importante. Não acho que seja
diferente dos outros fundos, é só que nesses isso fica mais claro. Disciplina
na tomada de decisão, no sizing, no stop . Isso é que faz o gestor conseguir
chegar a 10 anos com um bom histórico. Senão, ele vira um freerider e
pode ganhar pra caramba em um curto período de tempo, mas, em algum
momento, vai quebrar a cara. Outra coisa importante é vender corretamente
o fundo para o cliente. O cliente precisa entender o que está comprando.
Uma das grandes dificuldades das gestoras é passar isso para os clientes.
Precisamos fazer com que o cliente não compre única e exclusivamente o
retorno passado daquele fundo, mas entenda porque o gestor teve aquele
retorno. Entender porque o gestor teve aquele drawdown, porque teve
aquela grande alta. Para um investidor profissional é mais fácil. Mas houve
um crescimento substancial das plataformas de investimento. Nesses casos,
as gestoras precisam contar com a ajuda dos profissionais que estão nas
plataformas para informar corretamente o que o cliente está comprando.
Esse ainda é um desafio. No longo prazo, acho que ele vai ganhar dinheiro,
mas pode ser que aconteça amanhã um evento negativo para o fundo.
Capítulo 2
MARCIO APPEL | ADAM CAPITAL
A parte de Long & Short ficou mais desenvolvida do que era antes e segue
sendo uma fonte de retorno relevante. Ela pega bem as trading ideas
relacionadas a mudança de hábitos e é menos vinculada a outros efeitos
econômicos. Isso é uma das coisas que evoluímos desde então, do ponto de
vista de mercados. O resto, não.
Stress testing é uma das coisas que mais olhamos. Não o stress test
histórico, mas aquele que nós desenhamos. O stress histórico já faz parte do
nosso processo de controle de risco. Mas, quando tentamos equilibrar as
posições, olhamos prospectivamente o que parece ser um cenário adverso.
Às vezes, não conseguimos achar uma nova alocação que ganhe dinheiro e
tenha uma correlação negativa com o resto do portfólio. Então, fazemos
posições menores. Mas em Long & Short e moedas, por exemplo,
conseguimos isolar o risco de beta.
Mercados com vol mais baixa são mais complicados porque, normalmente,
geram movimentos abruptos e intensos. Então, é preciso ter cuidado, porque
se errarmos o processo em seis meses ou um ano, podemos sofrer. Eu me
lembro da crise de 2008. O cenário estava estranho desde 2007, mas não
acertamos mesmo estando certos de que o mercado cairia, porque os
processos de alta são muito mais longos que as quedas. Por isso, é mais
fácil carregar grandes posições compradas do que vendidas. E no momento
de disrupção, para os clientes, é mais difícil compreender. Vale lembrar que,
em geral, cotistas gostam de baixa volatilidade. Mas em 2019 muitas
pessoas, especialmente as pessoas físicas, sofreram com a vol repentina dos
fundos de crédito. Pessoa física gosta de “vender pó” (opções baratas),
ganhar pouco durante muito tempo. Só que isso, normalmente, aumenta a
chance de se perder muito em pouco tempo. E nós tentamos fazer o
contrário. Prefiro ter volatilidade baixa em momentos de mercados calmos e
depois, quem sabe, ter uma vol alta quando a disrupção estiver para o nosso
lado.
Posso dar o exemplo do ouro, uma das commodities que deu bom retorno
em 2019. No início, havia um potencial movimento de queda da taxa de
juros nos Estados Unidos. Havia também uma tensão geopolítica que
indicava uma boa chance do resto dos países do mundo querer diversificar e
sair um pouco do dólar. E, dado a situação de carrego de outras moedas, o
ouro parecia um caminho para a diversificação de reservas. Você tinha,
portanto, dois fatores muito favoráveis para a posição de ouro: a diminuição
do custo de carrego da posição e a demanda dos Bancos Centrais. Da
maneira como nós fazemos, há uma certa dificuldade em separar essas
coisas em caixas isoladas. Por exemplo, carregamos uma posição comprada
em ações de financials nos Estados Unidos já faz um bom tempo. E essa
posição possui uma correlação inversa com a taxa de juros. Normalmente,
são papéis que tendem a sofrer quando a curva de juros fecha. Então, havia
essa leitura positiva sobre o ouro, que caminhava perfeitamente com a
leitura sobre financials . São essas coisas que nós tentamos fazer. Por isso
que separar a gestão em mesas ou books , no nosso caso, não funciona. Não
queremos perder a capacidade de achar essas relações. Olhando para o caso
de petróleo, no passado, já tivemos posições tanto compradas quanto
vendidas. Petróleo apresenta uma relação de eficiência de produção e
consumo, que vem do nível de atividade econômica. Num dado momento,
tivemos uma posição vendida em petróleo, mas gostávamos de Petrobras. E
essas posições se combinavam. O portfólio é um quebra-cabeças entre valor
esperado positivo e equilíbrio. Enquanto a tese de ações nos Estados Unidos
estarem caras não se provava correta, o restante da carteira pagava o custo
de estar errado em uma das posições centrais do fundo. Temos de ser
capazes de dar o fôlego necessário para sustentar posições de prazos mais
longos. Isso, normalmente, também não fica isolado.
Sim, preocupa, por isso a posição deve ser compatível. Mas, faz parte do
dimensionamento da posição, porque pode acontecer um atentado em
algum lugar e o petróleo no dia seguinte subir 10%. Isso faz parte, sem
dúvida. São coisas não estruturais, pontuais, e a posição deve ser capaz de
suportar esses eventos. Passamos por isso, recentemente. Estávamos
vendidos, o petróleo subiu, mas depois caiu. A posição é dimensionada para
isso. Já tivemos posições em ações de tecnologia que, quando saía o
balanço, era um sobe e desce de cerca de 10%. Então, de novo, o tamanho
das posições deve ser compatível com essas descontinuidades que podem
acontecer.
Funciona, mas não consigo dizer se funciona sozinho. Não operamos esse
dado isoladamente, é apenas um indicador, mas que acompanhamos. Por
exemplo, na nossa posição de ouro, uma das coisas que me preocupa é que
todo mundo já está nessa posição. Quando começamos, não. Mas, agora,
sim.
Olhando para a soja, por exemplo, tivemos essa discussão com o nível de
estoque. Mas, é um mercado menos especulador e direcionado pela
economia real, como a safra e a demanda. Ouro tem muito position
financeiro. No passado, o petróleo teve um volume muito grande em
posições financeiras, mas hoje é menor. Todas têm suas peculiaridades.
Mas, ainda assim, é um mercado muito grande. Commodities,
normalmente, tem um caminho estreito com o mercado físico. A parte
especulativa costuma ser menos relevante do que em outros mercados
puramente financeiros. Já aconteceu com o petróleo. Havia, inclusive,
especuladores com navio parado cheio de petróleo. Mas, normalmente, não
é caso.
Fazemos o comitê econômico uma vez por mês e, a cada seis meses, um
grande comitê de duas semanas no qual olhamos 18 países. Cada dia é para
olhar um determinado número de países e fazer um estudo mais profundo.
Depois, monitoramos e atualizamos. Pode aparecer, também, algo
extraordinário. Alguém pode apresentar um case de outro país que achou
interessante, ou de um ativo que não acompanhamos de perto. De qualquer
forma, duas vezes por semana, na hora do almoço, temos a apresentação de
um estudo. Seja de um país, empresa, setor ou determinada commodity. Às
vezes, depois disso, montamos uma posição, às vezes, não. Em alguns casos
trocamos uma posição por outra. O ouro foi ideia de um dos membros da
equipe. Olhamos, estudamos, vimos que encaixava bem com o resto do
portfólio e fizemos.
Exercitamos ser agnóstico e tentar não ter preferências, mas turning points
são sempre mais difíceis. Prefiro tendências, você nem precisa pegar o
início. As posições em que fico mais confortável são uma combinação
daquelas que acho que são de tendência e com pouca gente. Quando todo
mundo está junto, fico desconfortável, porque a posição é mais frágil, do
ponto de vista técnico. Gosto de ter posições que ninguém tem.
Com certeza. Posições “da moda” geram algum nível de buzz ? Vocês
tentam ler isso?
Estamos fazendo essa leitura do ponto de vista do big data, em termos de
mídia social. Por outras fontes é mais complexo. Mas, o extremo, é difícil
não ver. Não precisava ter mídia social para achar que a febre de bolsa no
Brasil em 2019 era gritante. Tinha bastante advogado e professor
perguntando sobre investimento. E isso é explicado pela mudança na
maneira como o investimento é distribuído no Brasil. Relevante e rápida. O
que está fazendo muita gente entrar em uma onda. Normalmente, esses
movimentos de massa me preocupam. Não gosto de participar.
A geração de alpha pode ser comprada ou vendida. Eu sei que, para pessoa
física, é uma decisão complexa. A pessoa física deveria entender que
existem momentos bons ou não para investir. Esse é o principal. E,
normalmente, quando todo mundo está falando de investimento, não é um
bom momento. Quando todo mundo está desinteressado, é um bom
momento para investir. Porque é bom ter uma gordura razoável para entrar
no mercado de risco. E juros baixos, no mundo, é um mal indicador. A
performance histórica mostra que períodos de queda de taxa de juros são
ruins para a bolsa e períodos de alta de taxas de juros são bons. E a coisa
surpreendente: uma boa parte dessas pessoas que estão fazendo migração
por causa do juros baixos, não é quem antes era rentista. Não é o sujeito que
vivia de renda e agora está apertado. É quem nunca teve dinheiro para
renda, possui só uma poupança e, por algum motivo, agora acha que esse
capital precisa trabalhar para ele. É uma mudança radical na propensão à
risco, que não tem qualquer relação com a taxa de juros, exceto pela onda.
A rentabilidade do dinheiro nunca foi um fator determinante para essas
pessoas. O timing tem que ser determinado pela oportunidade de
investimento, não por uma necessidade sua. Senão, você vai acabar fazendo
alguma bobagem. O motivo de tomar risco é porque existe uma boa
oportunidade para tomar esse risco. O fato da taxa de juros estar fazendo
com que as pessoas tomem mais risco não é o processo correto. Um
argumento seria o de que o país está tomando as medidas corretas, por
exemplo. Mas não a taxa de juros em si. Seria melhor se a taxa de juros
estivesse subindo do que caindo, um motivo até melhor para investir. A taxa
de juros estaria subindo, as empresas performando melhor, a bolsa estaria
mais barata e valeria muito mais à pena. Mas esses processos podem ser
razoavelmente duradouros. E, na maioria das vezes, não terminam bem, só
se a sorte ajudar. Há momentos em que vale investir e momentos em que é
melhor não fazer nada. Se você acerta, faz toda a diferença. Se investe
quando está todo mundo falando, acho que pode ser desastroso com o
passar do tempo. A maioria das pessoas são levadas a comprar bolsa porque
o amigo falou que está ganhando dinheiro. Melhor investir uma parcela da
carteira ativos de risco por 20 anos, e não porque o amigo falou, te levando
a entrar all in . E era a força desse movimento, com vários outros
indicadores, que levavam a crer que estávamos passando por uma febre. O
momento certo para investir é quando há barganhas.
Indo para um outro lado, gerir recursos e tomar riscos é algo que se
aprende na prática?
E você acha que tem um bom perfil emocional para esse business ?
Não, ao contrário. Sou preocupado por natureza. Se, por um lado, o fato de
ser cético e preocupado me faz sobreviver, por outro, realmente gera um
nível alto de estresse. Talvez, tenha gente que faça isso com menos estresse
do que eu. Não consigo dizer. É um negócio que possui um custo, com altos
e baixos. É necessário ter um policiamento para não ficar exuberante nos
altos. Quando se faz isso muitas vezes, depois de velho, parece que quem
lida bem com isso é quem liga pouco. Mas, alguém que liga pouco me dá
um certo medo, porque é quem pode quebrar. Por outro lado, não é fácil
equilibrar a capacidade de tomar risco com o medo de quebrar.
Muitas vezes. Você perde o sono nos dois pontos da curva. Tanto quando as
coisas vão muito bem, e quando as coisas vão mal. Minha cabeça remói nos
dois casos.
Mas você fica mais preocupado quando está ganhando dinheiro e tem
medo de devolver o ganho ou quando está perdendo dinheiro e talvez
esteja fazendo algo errado?
É duro mesmo. Esse mental fitness é algo que você consegue resolver
sozinho ou é preciso trocar ideias com alguém? Você acha o processo de
investimento muito solitário?
Conheci muita gente inteligente que não ganhava dinheiro. Existem bons
argumentos para comprar e vender um mesmo ativo. Pessoas inteligentes
serão capazes de sustentar pontos contrários. Mas alguns argumentos são
mais importantes que outros. Nesse negócio, você é treinado para
identificar padrões. Padrões que funcionam ao longo do tempo.
Acho que sim. Vou fazer até morrer, porque gosto desse negócio.
É quase um vício?
Capítulo 3
SERGIO SILVA E BERNARDO ZERBINI |
AZ QUEST
Sergio: Para termos uma visão total da economia, passamos por todos os
indicadores de atividade, inflação, parte fiscal, balanço de pagamentos,
entre outros. O grau de importância deles vai variando de tempos em
tempos para vermos em que ponto do ciclo macroeconômico estamos. Nos
reunimos semanalmente com os nossos economistas e eles vão nos
municiando com todas essas informações. Montamos uma radiografia
macro.
Zerbini: Acho que não. Acho que é uma combinação dos dois. Ela tem uma
objetividade matemática, nos juros principalmente. No mercado de juros
existe uma expectativa de política monetária, é uma conta simples e
matemática. Existe uma subjetividade de como ela irá se comportar, qual a
velocidade com que cairão os juros, e isso é subjetivo. Mas se você acha
que o ciclo é de 300 basis , isso é matemática. Agora, a subjetividade vem:
como serão entregues esses 300 basis ? Qual é a velocidade? Isso é
subjetivo. Cada um acha uma coisa. A interpretação sobre a comunicação
de um Banco Central é subjetiva para cada pessoa.
Zerbini: Tendemos a falar: “Nunca isso vai acontecer”. E acho que as crises
te ensinam que, sim, isso pode acontecer. Se eu falar: “O futuro pode ficar
abaixo do spot”, alguém menos experiente pode dizer: “Isso nunca vai
acontecer, a matemática não permite”. Ou alguém dizer: “ Um banco
americano grande nunca vai quebrar”; “Um fundo grande como LTCM não
pode quebrar”. Então, são essas lições que carregamos conosco.
Sergio: Aqui não temos por hábito construir a posição toda de uma vez só.
Não precisa. Toda vez que discutimos e falamos do tamanho de uma
posição, vamos construindo essa posição aos poucos. O segredo está na
construção. Não dá para chegar e falar: “Olha, esse preço está
completamente errado e vamos fazer uma posição muito grande nesse
preço”. Tudo pode ficar muito errado por muito tempo. E o que está
completamente errado pode passar a ser o novo normal daqui a algum
tempo.
Zerbini: Não tomamos posição aqui porque os outros estão achando isso ou
aquilo. Tomamos posição dado o que achamos. Às vezes o que achamos
não é o que todo mundo acha. Eu gosto de seguir a tendência. Se ela está
favorável ao que nós achamos, não vejo problema em seguir a tendência. Já
tivemos posições contrárias? Já. No câmbio já tivemos posição contrária.
Enquanto o mercado estava querendo comprar dólares, estávamos
vendendo.
Sergio: Não dá para tentar ter sucesso baseado em ideias alheias, porque é a
mesma coisa que colar no colégio. Não adianta muita coisa. Você pode até
passar, mas provavelmente no outro ano se o cara que te deu cola vai
embora, você vai bombar. Então não é por aí.
Zerbini: É bom analisar o lado técnico e saber que tem um fundo gigantesco
“stopando” uma posição. Isso é importante saber para ver o timing de
entrada. Se queremos ir contra ou não. Mas não pesquisamos ou
investigamos o que os outros estão fazendo. Trata-se de entender se existem
posições concentradas em um formador de preços e saber que esse player
pode mexer o mercado para um lado ou para o outro.
Zerbini: Stress. Stress é o único hard limit que temos. Por exemplo, se o
stress do Multi estiver 0,01% acima do limite, você é obrigado a diminuir a
posição. E o drawdown é um soft limit que você tem um X para receber
durante três meses consecutivos. Se perder, você senta numa sala, conversa
com o CEO e com o comitê de risco para explicar sua posição. Mas não
necessariamente tem de reduzir a posição. Nós temos um livro consensual e
um livro individual. No individual somos obrigados a “stopar” o risco se
atingirmos o drawdown . No livro consensual, não. A área de risco não olha
o livro individual ou o consensual. Eles olham como um todo. O Sergio e
eu, como responsáveis pelo fundo, olhamos o livro individual para impor
disciplina aos traders abaixo de nós e dos nossos livros individuais
também. Então o drawdown no final é um limite soft . Para que serve um
drawdown na nossa opinião? Ele serve para você pegar uma teimosia. “Por
que você está dado nos juros e o mercado só sobe? Não é que ele sobe há
um mês. Ele sobe há seis meses”. Então isso também é para te questionar e
evitar teimosias de traders, inclusive do fundo. O VaR usamos também, mas
mais para quantificar realmente se você está perto do seu orçamento ou não.
Mas também é soft .
Zerbini: Eu acho importante que o livro individual gere uma posição core ,
no sentido de que, se você tiver uma ideia boa e as pessoas não estão
olhando ou não acreditam, você no seu livro individual é capaz de formular
essa ideia via sua performance, se ela está indo bem. Se você tiver um
argumento positivo, no final você vai convencer as pessoas de que aquela
posição faz sentido para o fundo como um todo, podendo colocá-la num
size maior se a maioria concordar com o seu argumento. É claro que isso é
um momento de construção. Então as pessoas primeiro vão ter de ver esse
indivíduo ganhando dinheiro e, depois que ele continua ganhando, vai
convencendo de que aquele case faz sentido. Outra coisa importante que faz
parte das discussões de consenso e livros individuais é que nós não somos
um fundo de caixinha, que é diferente de muitos fundos que têm por aí.
Aqui não temos um cara que só opera pré, um que só opera câmbio, um que
só opera bolsa, um que só opera dólar, cupom, o que quer que seja. Aqui
temos pessoas que têm complementariedade, com mais experiência ou
especialidade em alguns ativos, mas aqui não temos a obrigação que uma
caixinha exige. De um trader de câmbio ter risco o tempo inteiro para
ganhar dinheiro nessa caixinha de câmbio. Achamos que isso acaba
desperdiçando VaR , e aí você acaba não aproveitando a assimetria que
talvez seja maior no mercado de juros. Nós temos essa visão aqui dentro.
Nós sabemos que preferimos ter assimetria num ativo que é mais claro. Isso
foi usado em 2017 nos juros, foi usado em 2018 na bolsa, esse ano foi
usado novamente nos juros no segundo tri. Isso é um privilégio para quem
não tem esse modelo, porque se você tem uma caixinha, teoricamente cada
caixinha tem 25% do limite do risco. Então você vai conseguir ganhar
dinheiro no juros com esse seu 25% de limite. Nós, não. Nós temos
condição de usar 75% de limite nos juros ou no câmbio ou na bolsa ou no
que quer que seja. Não estou falando que isso é o certo ou errado e que
nunca vamos mudar. Talvez um dia mudemos de ideia, mas julgamos que
esse modelo se enquadra dentro do fundo macro e dentro da AZ Quest.
Estamos felizes com esse nosso modelo.
Zerbini: Sim, temos um livro de book relativo, que a Ana toca, mas eu já
coloquei posições relativas no meu book , tanto no book consensual quanto
no individual. Operamos bolsa local comprada contra uma outra vendida lá
fora, e vice-versa. Ou um setor específico contra o outro. Uma moeda
comprada contra uma moeda vendida. Então temos bastante Long & Short
macro dentro do fundo. E aí vem aquela história de análise macro. Quanto
mais profundo você pode ser e quanto mais amplo em termos de atingir
várias análises em vários países, maior sua capacidade de fazer Long &
Short macro. Comprar moeda do Brasil, vender do México, comprar da
Austrália, vender da Nova Zelândia ou Coreia contra a África do Sul. Então
vai depender das oportunidades e da nossa capacidade de penetração nas
histórias individuais. Temos uma pessoa que é especialista nisso, que é a
Ana Abraão. Ela também tem um book de gestão e é um book que
chamamos de book relativo, pode fazer o que quiser contra o que quiser.
Zerbini: Existe essa identificação. Acho que cada um tem a sua. Pelos dois
anos e meio que eu estou aqui, sinto que a casa tem uma tendência otimista.
Ganhamos doado em juros, ganhamos vendidos em dólar, ganhamos mais
comprados em bolsa do que o inverso. Mas houve momentos de bear
market . Então eu diria que, honestamente, tendemos a ser uma casa mais
otimista. Tendemos a ganhar mais em momentos otimistas do que em
momentos pessimistas, mas não quer dizer que não ganhemos em
momentos pessimistas. Compramos bastante dólar quando o dólar bateu
R$3,70, então teoricamente montamos uma posição pessimista nesse ativo.
Mas eu diria que você pode analisar isso matematicamente falando. Você
pode ver o comportamento da nossa cota versus o comportamento dos
mercados e a direção dos mercados. Eu diria que 70% do mercado de
fundos performa em um cenário otimista.
Vocês têm esse viés por ser difícil explicar para o cotista que o fundo foi
mal, enquanto o mercado andou positivamente?
Zerbini: Não, eu acho que é uma tendência. Conheço gente bastante bear ,
que ganha dinheiro no bear market . Não que nós não tenhamos ganhado.
Eu não estava aqui, mas teve um cenário pessimista no Brasil com a Dilma,
no final do segundo mandato Lula, como no final do segundo mandato
Dilma e começo do último da Dilma. Era um mercado claro de se ficar
bearish com relação ao Brasil, comprado em dólar. Então existem cenários
em que realmente você vai ganhar numa posição bearish . Aliás, acho que é
uma questão individual. Eu me considero mais otimista do que pessimista, e
eu falo: “Ganhei mais no otimismo do que num cenário econômico
negativo”. É uma característica minha.
Sergio: Brasil?
Sim, Brasil.
Sergio: De verdade, na minha opinião é só correção de preço. Nunca
tivemos default da dívida interna. Sempre que fomos caminhando para o
extremo as medidas foram tomadas para que a rota fosse corrigida. Eu acho
até que podemos ter esse sentimento por um período X de tempo, mas pelo
menos nesses últimos 25 anos que eu estou no mercado, de alguma forma,
as coisas sempre foram endereçadas. Talvez não na rapidez e com a
urgência que gostaríamos, mas acho que nunca ficamos em xeque, de
olharmos e falarmos: “Nossa, estamos caminhando para um período de
insolvência”. Acho que não. Houve períodos difíceis? Sim. Nessas horas,
talvez nós tenhamos tido oportunidades. Talvez essas oportunidades não
voltem mais. Olhávamos e falávamos o seguinte: “Nossa, NTN-B 2045.
IPCA + 9%. Insolvente”. Era uma preocupação que estava lá atrás no nosso
raciocínio? Estava. Hoje quando você olha a NTN-B 2045 a três e pouco,
você olha e fala: “Meu Deus do céu, que saudade do IPCA + 9%”.
Sergio: Os políticos são um tipo curioso. Nós flertamos com essa ideia de
insolvência inúmeras vezes. Mas uma coisa é você estar na beira do
precipício, outra coisa é você se jogar. E eu acho que quando você olha
racionalmente, a opção de qualquer político, de qualquer governo, é não se
jogar. Tudo bem, já houve default da dívida externa, mas dívida interna não.
De alguma forma, ao longo do tempo, fomos corrigindo a rota. Eu acho que
é emblemático o que vimos nessa aprovação de Reforma. Por mais que não
tivéssemos a organização política que esperávamos ou talvez a articulação
política que imaginávamos no início, tivemos efetivamente um Congresso
fazendo o que deveria ser feito. Talvez, na margem, estejamos melhorando
um pouco.
Trading é uma coisa que pode ser ensinada? Como vocês aprenderam
na experiência pessoal?
Sergio: Tem que ver o seu lugar no mercado. Existem caras muito bons,
mas tomar risco não é a deles.
Zerbini: O cara tem um currículo dez vezes melhor do que o meu, mas não
consegue ser trader. Ou porque às vezes acha que a coisa é cartesiana
demais, e falamos que não é. Existe o feeling, a sorte. Eu não estou falando
que ganhamos dinheiro por sorte, mas não existe trader azarado. Ninguém é
bom azarado. Não existe isso. Acho que tudo isso tem a ver com a energia e
a vivência que você foi desenvolvendo ao longo do tempo, criando aptidão
pela profissão. Acho que o meu papel e o do Sergio aqui é identificar essas
pessoas e motivar essas pessoas, para ter um time cada vez melhor e para
que essas pessoas venham, um dia, a substituir os seniores. Acho que esse é
o objetivo das pessoas mais experientes. Passar um legado para alguém.
Mas esse alguém precisa se esforçar, não é só ter uma pós e achar que a
parte acadêmica e o que aprendeu na faculdade é tudo. Precisa aprender,
viver, ver se aquilo faz parte da sua vocação para ter o sucesso.
Capítulo 4
CARLOS CALABRESI |
Você falou da contribuição dessa parte Long & Short de bolsa dentro
fundo. Como vocês comunicam as apostas nessa estratégia?
Esse foi o grande trade do ano passado. Foi o trade que não deu susto.
Como somos organizados por mercado, no caso de montagem de um trade
relativo, utilizamos books apartados e com divisão dos resultados entre os
responsáveis por cada mercado.
O tempo inteiro. Todo mundo aqui tem relações que ao longo do tempo
foram sendo exploradas, relações de mais confiança. Com as pessoas que
agregam, que você confia, que não mentem. Há, sim, uma troca de
informações importante com o mercado, mas acho que tem de ser algo
seletivo. Cada um na sua área, mas existem as pessoas que são respeitadas,
que contribuem. Não é só jogar conversa fora, porque não existe tempo para
isso. É preciso ver quem são as pessoas que têm o que contribuir e explorar
isso.
Começamos a ver aquele cara que está um pouco mais arisco e colocamos a
pessoa para ajudar. A pessoa começa a ajudar, a participar, dar palpites,
ideias. Se começamos a ver que ela tem um certo grau de acerto no que fala
e em suas ideias, em algum momento falamos: “Agora você vai poder fazer
na vida real tudo isso que está tentando contribuir no plano teórico”. Esse
novato vai fazer posições pequenas. Vamos medindo e corrigindo o que não
deu certo, e o processo evolui. Mas tem que ser realmente com um mentor
do lado, começando pequeno e evoluindo aos poucos. Isso vale para os
seniores também. Quando eu contrato um profissional novo que não
conhece a casa e que a gente também não o conhece, mesmo que seja uma
pessoa sênior com nome no mercado, que veio por recomendação e que foi
bem na entrevista, sempre seguro um pouco a rédea. Vamos ver como esse
profissional se sai, até eu entender o estilo dele, e ele entender o meu. Em
algum ponto a gente começar a soltar um pouco mais os limites. Até para
ele não entrar e bater no muro, porque aí já abala um pouco a
autoconfiança. O psicológico é muito importante. A série Billions , da
Netflix, é a história de um hedge fund. Tem muita coisa ali baseada em fatos
reais, mas o que achei interessante e nunca tinha me passado pela cabeça é
que, na empresa dele, a terceira pessoa mais importante é a mulher do RH.
Não porque ela faz a parte de RH, mas porque ela é uma psicóloga. Ela traz
os gestores para sessões de psicologia na rotina do fundo, porque eles
muitas vezes perdem a confiança ou tomam uma perda muito grande. Ela
faz esse trabalho psicológico para os tomadores de risco voltarem a ter
confiança e a produzir. Nunca tinha me passado isso pela cabeça, mas vi
que essa parte é importante. Às vezes o gestor, inexplicavelmente, entra
numa fase ruim, tem dificuldade para ganhar dinheiro e, de repente, sai da
má fase. Isso é puro psicológico. Temos que trabalhar esse lado também.
É caso a caso, porque existe gestor que olha gráfico, existe gestor que não
olha gráfico. Não quer dizer que o gestor que olha gráfico vai ganhar e que
o outro que não olha não vai ganhar. Tem aquele cara que olha outras
coisas. Particularmente, me ajuda olhar para gráfico, porque ele me dá uma
relação temporal de onde o preço está em relação a onde já esteve. Tem
gestor que diz: “Nesse nível de preço eu começo a fazer a posição”. Aí
entra um pouco daquele trading skill . Cada um tem o seu jeito de operar. O
importante é que a gente trabalhe sobre uma mesma base. Ou seja, que a
gente tenha definido o cenário e para onde a gente quer direcionar o fundo.
Tamanho, timing e instrumento eu deixo para cada gestor. Resumindo, não
tem uma receita nesse sentido. Tem aqueles que preferem usar e usam
gráfico e aqueles que usam outras ferramentas.
Não é nada muito exato, mas tentamos fazer uma regressão entre cotas de
fundos e movimento de ativos, pegando os principais players . Temos uma
lista hoje dos 30 maiores fundos e tentamos modelar qual é o
posicionamento de cada um, para ver se isso faz sentido para o movimento
de mercado. Obviamente, usamos também as cartas mensais para dar uma
ajustada, para ver se os caras estão mais ou menos alocados. Não é uma
ciência exata, mas dá uma boa indicação.
Isso acaba fazendo com que vocês montem posições mais estruturais?
É, não vai ter aquele negócio que só você vai saber, que só você vai ver. É
difícil. Em relação à bolsa, como são muitos cases , pode acontecer. Mas
juro e câmbio é mais difícil. Um banco que sabe um fluxo XYZ consegue
se preparar para isso, mas dentro de uma Asset é muito difícil. É na base do
estrutural mesmo. Qual a direção que você quer ir. Aí se usa um pouco de
skill : “Acho que foi demais, vou diminuir. Caiu demais, vou aumentar”.
Até a hora que acontece alguma coisa estrutural que te fale: “Acabou. A
direção não é mais aquela, é para cá que vou agora”.
O fato de vocês terem books diferentes pode fazer com que um book
possa estar numa posição diferente da outra em termos de view ?
No caso de juros temos dois modelos. Um para juros de curto prazo, para
12 meses, e um para juros de médio prazo, de 2 anos. E eles respondem a
fatores diferentes. O modelo de curto prazo tem uma resposta melhor à
política monetária. O modelo mais longo é um pouco mais complexo, pois
o prêmio de risco da curva responde a mais variáveis. Entramos com uma
grande quantidade de dados, envolvendo séries de preços, dados técnicos de
mercado, posições etc. Medimos se as posições em aberto e se as
compradas ou vendidas estão aumentando ou diminuindo. Adicionamos
sazonalidade, dados de inflação, vários dados de atividade econômica,
dados relativos às contas do governo... Nós montamos uma série de quase 2
mil dados, e os sistemas trabalham em cima deles. Temos alguns artifícios
de Inteligência Artificial para vermos quais variáveis estão ganhando ou
perdendo peso, para recalibrar o modelo. O modelo indica a direção de
mercado e se o sinal é de movimento forte ou fraco. Em função disso, ele já
sugere o tamanho da posição. O modelo também define os drawdowns e os
stops . O modelo diz qual a probabilidade de cada mercado ir para um lado
ou para o outro nos próximos 20 dias. Tudo isso é feito com milhares de
back-tests . É um trabalho contínuo. O interessante foi ver que a
modelagem de juros foi mais demorada. Mas agora que temos a maioria das
variáveis mapeadas, os modelos de câmbio e bolsa estão saindo mais
rápido. Nesse sentido, na hora que formos analisar ativos do mercado
internacional, pode ser bom. Porque é um mercado que nós conhecemos
menos. Obviamente temos muito mais informação sobre o mercado
brasileiro. Temos mais dados e estamos mais próximos das empresas e do
governo aqui. Lá fora, não. Não tem como ter o mesmo nível de
informação. Então, o approach de investigar milhares de variáveis pode
ajudar a melhorar a nossa performance no mercado internacional.
Capítulo 5
RODRIGO TERNI | GIANT STEPS
O ser humano sempre buscou, de uma forma ou de outra, a ciência por trás
do investimento. Essa busca se acelerou a partir da década de 50, quando
Markowitz contribui com o desenvolvimento do conceito de risco, que até
então não era fácil de medir estatisticamente. Posteriormente, Sharpe e
outros cientistas e matemáticos começaram a trazer novos conceitos para o
mercado. Essencialmente, algo que era muito baseado na intuição e
experiência humana passou a se aproximar muito mais da ciência. O que
acontece hoje é simplesmente um passo natural como em qualquer outra
indústria: aplica-se muito mais matemática e tecnologia em um processo
ainda muito baseado no ser humano. No final das contas, qualquer gestão
de recursos lida com quantidades, números, e não há como escapar disso.
Agora, gestão sistemática faz bastante sentido porque, afinal, qualquer
fundo no mundo segue um processo, seja ele qual for. O gestor cria o seu
processo e tenta segui-lo da melhor forma possível. E é desejável que ele
faça isso. Até porque, quando alguém investe em um gestor profissional,
não espera que ele deixe a emoção interferir. Espera-se que ele seja
totalmente racional. E, se ele for, desenhará um processo para ser seguido,
com um limite de riscos. Se existe um limite de risco, espera-se que o
gestor saia da posição quando ele for atingido. Muitos pensam que intuição
humana é muito importante. Mas como a intuição humana ajudaria um
gestor em um caso de limite de risco, por exemplo? Se for atingido e a
intuição humana o levar a se manter na posição, obviamente o limite de
risco será ultrapassado. Se der certo, foi possível ganhar dinheiro. Mas e se
der errado? Na história, milhares de traders e fundos quebraram, e alguns
poucos sobreviveram com essa intuição. Estatisticamente, apostar no gestor
que vai seguir o emocional não é muito interessante. É preferível seguir
alguém mais racional, que segue um processo. E, se esse for o caso, por que
não testar esse processo como se fosse um experimento científico? Existem
dados disponíveis para realizar esse experimento e ver se ele fez sentido no
passado ou se foi movido pela sorte. Na gestora, lidamos com profissionais
inteligentes, com formação acadêmica relevante e uma experiência grande
de mercado. Transformamos o processo que eles desenvolveram ao longo
do tempo em um método científico. O processo se desenvolve em algumas
etapas, mas trata-se basicamente de aplicar as ideias desses profissionais em
uma sequência de passos que acabam recebendo o nome de algoritmos. São
feitos testes dos processos com dados passados e, se eles fizerem sentido, os
computadores são programados para executá-los automaticamente. No final
das contas, é uma repetição de algo já feito todos os dias. Não vejo outra
forma de fazer isso. Acontecem muitas falhas se o processo for puramente
humano, com influência de emoções, vieses comportamentais e cognitivos,
que já foram mais do que comprovados. Não vejo como um gestor
conseguiria sobreviver em um mundo cada vez mais rápido e com mais
dados para analisar. Alguns gestores dizem ler 400 ou 500 páginas por dia.
Mas isso não quer dizer muita coisa em comparação com a quantidade de
informação criada diariamente. Outros gestores com investimento em
tecnologia estão lendo 400 milhões de páginas em vez de 400. Então, é um
pouco de arrogância pensar que ele vai conseguir sobreviver nesse mundo
com a mesma gestão que foi feita há 20, 30 anos. Trata-se de fazer a
evolução de uma indústria tradicional, assim como está em curso a
evolução da indústria de bancos, seguros, farmacêutica e do cinema.
Praticamente todas as indústrias estão tendo grandes revoluções baseadas
em tecnologias exponenciais, como Inteligência Artificial, blockchain e
tantas outras que surgiram ao longo dos últimos cinco anos.
Para montar a Asset vocês se inspiraram em outras gestoras de
recursos do exterior?
Grande parte das ordens que temos estão automatizadas, exceto no caso de
mercados onde isso não é possível. Por exemplo, para instrumentos de
balcão, opções de alguns determinados ativos, não há liquidez em tela,
então é necessário um trader humano para executar essas operações.
Na sua opinião, analisar mercados e gerir recursos é algo que possa ser
ensinado?
Como diz Nassim Taleb no livro Fooled by Randomness: “ It’s easier to sell
or buy than frying an egg”. Então, assumir risco é fácil, o difícil é assumir
risco com qualidade. Primeiramente, há pessoas que tem perfil mais
propenso a assumir risco e pessoas que são mais avessas à tomada de risco.
Não existe certo ou errado, são perfis diferentes. Se o profissional possui
uma qualidade que é desejável aproveitar, ele será aproveitado em funções
diferentes. Uma coisa é o analista, outra coisa é, por exemplo, um gestor de
portfólio propriamente dito. Nesse caso, é recomendável que o profissional
seja mais propenso a assumir risco, e o que pode ser feito é ensiná-lo a
assumir risco com qualidade, ajudá-lo a tomar decisões com maior
embasamento e em situações onde seja possível verificar que a relação
risco/retorno é mais adequada. Um investimento no qual há dois para
ganhar e cinco para perder parece menos interessante do que um
investimento com cinco para ganhar e dois para perder. Parte do trabalho é
procurar assimetrias. Então, existe o profissional que não assume risco e o
que assume. Quem assume risco pode ser ajudado a fazer isso com melhor
qualidade.
Essa é uma discussão ótima. Tenho uma visão um tanto agnóstica. Nos
Estados Unidos os ETFs de renda variável e os fundos passivos já devem
ser maiores que os fundos ativos. Esse é o cenário no Japão há alguns anos.
No Brasil esse é o caminho que está sendo trilhado. E o problema, ou
característica, do ETF, é que ele acaba intensificando fluxos para ativos com
os maiores pesos nos índices. Então, algumas distorções são criadas. Por
exemplo, a ação da Amazon recebeu a maior parte do fluxo que vai para
ETFs de ações nos Estados Unidos. As ações de empresas menores, que
talvez estejam fora de ETFs , acabam sendo prejudicadas em relação a essa
alocação de capital. Isso, por outro lado, gera uma oportunidade. Um gestor
que não se preocupa com um índice de ações, gerindo um fundo do tipo
total return , pode enxergar aí uma oportunidade. Pode avaliar que a
Amazon está supervalorizada e que as ações fora dos índices têm uma
oportunidade de valor. Consequentemente, o gestor pode comprar todas
essas ações que estão fora do índice. Esses gestores, em tese, estariam
arbitrando essa distorção causada pelos ETFs . Globalmente, os grandes
gestores de ações de valor têm sofrido nos últimos anos. Mas houve
momentos de pequenas reversões desse movimento. Em alguns momentos
de mercado, que chegou-se a chamar de quant quake , as ações tipo growth
registraram grande queda . Nesses períodos, os índices continuaram como
se nada tivesse acontecido. Mas quem estava observando os diferentes
fatores notou que esse acontecimento gerou movimentos extremos. Fluxos
como esse podem gerar essas distorções, é um aprendizado. A distorção
pode ser também uma oportunidade, para quem tem estômago, aguentar um
tempo maior.
Que tipo de conselho você dá para quem quer aprender mais sobre o
funcionamento dos mercados e conceitos de investimento?
Verdade. Que mais você aprendeu com as crises sérias, como a Crise da
Ásia de 1997 e a Crise Financeira de 2008, por exemplo?
A lição é zerar rápido. Zere rápido e saia da frente se você não sabe como o
negócio acaba. Só é possível diminuir risco de uma maneira: zerando a
posição. Não tente fazer hedge , por exemplo, protegendo uma posição
comprada em real vendendo peso mexicano. Essa é uma fórmula para
perder mais dinheiro. Zere o que você tem e irá dormir mais tranquilo,
mesmo que você tenha sido atropelado naquele dia. Zerar uma posição de
alta convicção é mentalmente difícil. Mas nas grandes crises, a alternativa é
você morrer antes de poder aproveitar a volta, seja porque foi demitido,
porque seu cliente resgatou o capital ou sua contraparte cortou as suas
linhas de crédito. Estar vivo é a prioridade.
Capítulo 7
SÉRGIO BLANK E RODRIGO MARANHÃO |
Rodrigo: Você pode se perguntar por que não desligar um modelo quando o
mercado está de lado. A verdade, é que nunca encontramos nada que tenha
o poder preditivo de adivinhar quando as tendências vão ou não acontecer.
Ao se tentar acertar o timing de ligar ou desligar um modelo, corre-se o
sério risco de não pegar o movimento quando ele acontecer. O resultado do
back-test ao testarmos ligar e desligar os modelos, é o pior possível. De
acordo com a filosofia do modelo de seguir tendências, as perdas são muito
pequenas quando comparadas aos ganhos. Por mais que seja desagradável,
ali, quando se está passando por um período de mercado com mais
ziguezague ou sinais falsos, se olharmos no longo prazo, a perda será
irrelevante perto do momento em que o fundo se recuperar. Acho que esse
longo histórico no back-test dá muita confiança para continuarmos seguindo
aquelas regras.
Vocês têm algum modelo que coleta prêmios de risco a partir de dados
macro?
Sérgio: Temos relatos de fundos que operam, por exemplo, com bases em
fotos de satélite do estacionamento do Walmart. Se está cheio, é porque está
vendendo muito e a economia melhorando. Mas, se o estacionamento está
vazio, a economia está piorando. Sabemos que existem gestoras operando
dessa forma e estamos atentos para esse tipo de input. Mas, como o Rodrigo
disse, ainda não temos nada do tipo. Na verdade somos conservadores em
nossas estratégias e gostamos de back-tests longos. Não só longos, mas que
passaram por diferentes momentos em diversos ciclos econômicos.
Queremos que os nossos modelos sejam robustos, com economia crescendo
ou em recessão, com vol alta ou baixa. Para isso, precisamos de mais dados
para ficarmos confortáveis, e modelos que operem a partir de premissas
diferentes. Ainda não achamos, mas, nada impede de termos algo assim no
futuro.
Sérgio: O Rodrigo deu um exemplo de Sharpe de 10, que nós sabemos não
existir. Mas, às vezes, o sujeito apresenta uma estratégia de Sharpe de 1,0
que pode até parecer razoável. Mas, pela complexidade da programação,
cometeu um erro muito difícil de identificar. Você vai achar que a estratégia
realmente possui um Sharpe de 1,0 e, quando colocar na prática, não vai
acontecer. Então, qualquer estratégia que programamos e testamos é sempre
“back-testada” por pelo menos duas pessoas independentes dentro da
empresa. Estes programadores precisam chegar aos mesmos resultados e
em linguagens de programação diferentes.
Rodrigo: Até hoje nunca encontramos um vendor que entregasse uma base
de dados que confiássemos plenamente. Então, sempre que compramos uma
base de dados, de qualquer mercado ou ativo, verificamos. São comuns
erros esdrúxulos. Por exemplo, já vi uma vírgula errada no preço do dólar.
Ao invés de 4.100,00 vi 41,0000. Erros assim são normais. Se pegarmos
uma base de dados com erros desse tipo e colocarmos no backtest , o
modelo vai achar que o preço despencou de 4.100 para o 41. Ficou
bilionário ou quebrou, em um movimento que não aconteceu. Na série de
preços, também é comum acharmos um zero no meio do nada. No caso de
dados point-in-time , como, por exemplo, dados de balanço de empresas,
que podem ser utilizados como inputs para modelos. Os balanços se
referem a um determinado período. O vendor tem o balanço referente ao
trimestre ou período. Só que esse dado não é, obrigatoriamente, o mesmo
que foi divulgado à época e que teríamos acesso no passado. As empresas
podem publicar uma revisão. Por exemplo, as regras contábeis podem ter
mudado e foi preciso republicar o balanço, ou acharam um erro. Nesse caso,
é importante que o dado reflita o que teria sido visto naquele momento em
que se estaria operando. Isso é um cuidado que deve ser tomado, saber se
aqueles dados realmente estavam disponíveis naquele instante. Acabamos
gastando bastante tempo para cuidar disso. É claro que, depois de tantos
anos, já temos muita coisa pronta. Temos um banco de dados enorme, e
basicamente o atualizamos, colocamos dados novos e empilhamos mais
coisas. Mas, com frequência, queremos pensar em um mercado novo ou
uma coisa nova e temos que refazer esse processo.
Capítulo 8
MARCO FREIRE | KINEA INVESTIMENTOS
Cada book tem uma cota. Então todo dia eu tenho as cotas gerenciais dos
fundos, a minha e a de cada gestor. Isso é importante para o processo de
investimento. Porque decisão colegiada às vezes gera frustração. O gestor
leva uma ideia e essa ideia não passa no comitê. Então cada gestor tem
liberdade para montar as suas posições. Um gestor pode estar comprado em
NTN-B no book dele e eu vendido no mesmo ativo no meu book . No final
do ano, vamos ver se eu não aloquei certo ou se o erro foi do gestor do
mercado de juros que não geriu bem no mercado dele. Então isso fica claro,
sem frustação. Fica existindo uma atribuição de responsabilidade. Nós
temos os comitês, mas a decisão é totalmente descentralizada. Cada gestor
toma suas próprias decisões, e se eu não gostar, faço o contrário no meu
book . Até porque, em algum momento, eu posso estar no meu fundo
procurando proteções. Imagine que está todo mundo otimista com Brasil, e
a mesa de dólar está vendida em dólar, a mesa de bolsa está comprada em
bolsa, a mesa de juros está aplicada em pré. Eu penso: “Opa, acho que está
muito concentrado, tenho que procurar uma proteção”. Aí procuro um
hedge para que a carteira total faça sentido. Eu não necessariamente estou
alocando nas mesma ideias deles. Às vezes sim, mas o importante é que a
posição total do fundo faça sentido.
No dia a dia penso mais as posições de longo prazo, mas a minha equipe
sabe as posições que eu tenho em cada mercado. Se sai alguma notícia
relevante, eles vêm imediatamente me avisar. Às vezes um movimento de
preços pode me levar a concluir que seria bom diminuir ou aumentar um
pouco a posição. Mas preciso discernir o que é tendência e o que é ruído.
Por exemplo, eu posso fazer uma posição Long & Short no setor de
elétricas. Se faço isso, dimi nuo o risco de juros, porque todas essas
empresas são influenciadas por juros. Diminui também o risco de
regulação, porque todas as empresas são do mesmo setor. Além disso,
dentro deste setor, uma empresa vai se sair melhor do que outra, por
exemplo, na construção das linhas de transmissão. Se eu pegar uma ação
individual, ela estará sujeita a vários fatores, mas posso usar hedges para
pegar o fator que eu quero. Às vezes, fazemos isso. O caso da Petrobras é
outro exemplo. Eu não quis investir nessa ação durante algum tempo, mas
houve uma melhoria na gestão da empresa. A empresa ia melhorar, ser mais
profissional, ia vender ativos, diminuir as alavancagens etc. Entretanto, ela
ainda estava dependente do preço do petróleo. As melhorias de gestão não
adiantam muito se o petróleo despencar, porque é o produto que a empresa
vende. Então, eu posso travar esse risco, de certa forma, se eu comprar
Petrobras e vender contratos de futuros de petróleo. Existe uma arte que é
saber quanto de petróleo vender. Isso não é uma decisão fácil, mas pode ser
tomada. Portanto, com operações intrassetoriais, intersetoriais e trade de
ações para os mercados macro, é possível apostar em ativos específicos,
isolando alguns riscos. No câmbio, essas operações são mais difíceis,
porque são muitos fatores influenciando. Além dos fatores locais de
determinada moeda, existe sempre a influência do dólar e das decisões do
FED, que impactam o mundo. Já as operações com juros de curto prazo são
as que têm menos influência. Geralmente juros curtos têm a ver somente
com a política monetária e a economia do país em questão. Já nos juros
longos, existe um componente global forte. Geralmente, os vencimentos de
juros longos de diversos países andam mais juntos do que os vencimentos
de curto prazo. Então, até construirmos um portfólio, prefiro que meus
gestores façam mais posições nos juros curtos do que nos longos. Nós
estamos em um período de juros brasileiros baixos, então está todo mundo
com a cabeça do TINA: “ there is no alternative to equity ”. Muitos pensam
que todo mundo no Brasil vai ter que comprar ações porque os juros estão
baixos. Quando pensam em ações, pensam em Ibovespa. E qual é o
problema de disso? É porque 30% das ações do Ibovespa são ligadas a
commodities. Ações de commodities não tem a ver com os juros baixos no
Brasil. Além disso, 30% do Ibovespa é composto por ações de bancos. E
pode ser que os bancos percam com esse cenário de juros baixos. Não é
óbvio que eles vão ganhar. Para essa dinâmica faz mais sentido comprar
uma ação de uma empresa de consumo doméstico, por exemplo. Todos
esses aspectos são considerados.
Como você define a alocação de risco em cada gestor dentro dos 50%
do fundo que não estão sob a sua gestão?
Levo em conta a confiança que tenho nesse gestor para ganhar dinheiro e os
aspectos qualitativos das conversas do dia a dia. No aspecto qualitativo,
para alocar no gestor, preciso ver que o processo dele está redondo e que ele
de fato tem um bom gerenciamento de risco. No aspecto quantitativo, a
primeira coisa que olhamos é a performance histórica do gestor. Em seguida
olhamos a correlação desse gestor com os demais. Se temos dois gestores
que consideramos igualmente bons, preferimos alocar mais naquele que
está menos correlacionado com os outros. Não adianta termos dois gestores
muito bons que sempre ganham juntos e perdem juntos. É mais interessante
termos dois gestores que ganhem em momentos distintos. Que na hora da
crise, entreguem retorno de formas diferentes. O book Long & Short
geralmente tem baixíssima correlação com o mercado. Mas um cara que faz
bolsa direcional tem mais correlação com o que faz pré. A terceira coisa
que nós olhamos para alocar risco em um gestor é como ele se comporta em
eventos extremos. Clientes se preocupam quando há uma queda grande da
cota. É isso que, no final das contas, preocupa o cliente. É o critério mais
difícil de se ter dados. Calcular o retorno do gestor pela cota diária é fácil.
Já calcular como ele se comporta em cenários de cauda é mais difícil,
porque não há tantos dados. Então, tentamos medir isso, mas o bom senso
prevalece. Não adianta alocarmos muito dinheiro num gestor de ações small
caps , porque a liquidez desse mercado é restrita. Se alocarmos mais, ele vai
parar de ganhar dinheiro. Podemos alocar mais num gestor de pré, porque
esse mercado tem mais liquidez. Isso é importante também. Não podemos
supor que o gestor vai para o mesmo nível de rentabilidade
independentemente do capital alocado nele. Então, o quarto critério é
liquidez. Temos esses quatro critérios que vamos observar para alocar ou
reduzir capital de um gestor. E isso é feito de forma dinâmica ao longo do
tempo.
Capítulo 9
LUIZ FERNANDO FIGUEIREDO E
LUIS GARCIA | MAUÁ CAPITAL
L uiz Fernando Figueiredo é CEO da Mauá Capital. Antes de fundar a
Asset, foi sócio de Armínio Fraga na Gávea Investimentos, diretor de
política monetária do Banco Central e executivo em diversas instituições
financeiras. Luis Garcia também ocupou posições de destaque no mercado
financeiro, e lidera o time de gestores responsáveis pela estratégia macro
da Mauá Capital.
Luiz Fernando: O Warren Buffet tinha uma frase assim: “O mercado, todos
os dias, diz quanto acha que valem seus investimentos. E ele está sempre
errado. Ele invariavelmente está errado”.
Luis Garcia: Acho que este é o starting point. O mercado de juros, por
exemplo, depende muito do mercado interno, da política monetária, e pouco
do cenário dos outros países. Outros ativos, como a taxa de câmbio, são
mais complexos, como falei, e dependem, no mínimo, de dois cenários
macros bem calibrados, o do seu país e do outro, para fazer o cruzamento.
Quando falamos de bolsa, por exemplo, precisamos do nosso cenário macro
e também de cenário micro. Então, a coisa fica mais complexa. O que nós
acreditamos é no jeito de analisar essas grandes oportunidades ou grandes
assimetrias. Não sabemos o que vai acontecer, obviamente. Mas olhamos
para o preço e avaliamos se há uma chance muito menor de ele ir contra do
que a favor, em relação à direção que acreditamos que o valor desse ativo
seguirá.
Luiz Fernando: Um exemplo legal disso que o Luis falou foi em 2015 ou
2016. Achávamos, se não me engano, que os preços de serviços iriam cair
muito. Então, a inflação, que tinha sido 7,0%, iria cair para 5,0% no ano
seguinte. Acontece que o mercado apostava em 8,0% de inflação para
aquele ano. Então, se estivéssemos errados e o preço de serviços não caísse
e a inflação ficasse em 7,0% ou 8,0%, nós não perderíamos. Quando o Luis
fala em assimetria é o seguinte: achamos que vai acontecer algo diferente
do que o mercado acha, só que o mercado nos dá “colchão” suficiente para
que, mesmo que estejamos errados, não percamos ou percamos pouco.
Luis Garcia: E por que é tão difícil? Porque os Bancos Centrais e políticos
estão sempre procurando um jeito de reverter aquela tendência negativa dos
mercados. Então, você está sempre sujeito a acordar de manhã com uma
notícia de uma autoridade monetária, de um político ou de um grande
player de mercado.
Luiz Fernando: Foi muito interessante. É uma ilusão achar que o Banco
Central sabe mais que a gente. E que ele é onipotente ou onipresente.
Onipotente, às vezes, até é. Mas, onipresente, é uma bobagem. Muitas
vezes, no Banco Central, você tem menos informação até do que o
mercado. Ele está entendendo menos do que o mercado sobre o que está
acontecendo. Então, isso era uma preocupação muito grande. Eu tinha que
me informar muito bem sobre o que estava acontecendo. É um jogo. Os
agentes de mercado diziam ao Banco Central o que era melhor para eles, e
não o que realmente estava acontecendo. Eu tinha a vantagem de lidar com
estas pessoas todos os dias até ir para o Banco Central. Eu vinha de um
banco de investimentos sofisticado. Então, sabia de todos os meandros.
Quando nós entramos, fizemos uma lista, se não me engano, de 10 ou 12
coisas que tínhamos de fazer. O mercado havia criado um mecanismo para
enviar dinheiro para fora e nós descaracterizamos direitinho esse
mecanismo. Eu lembro bem de um cara, de um banco grandão, que veio me
visitar. Ele me disse: “Essa regra aqui é muito séria. Muito pesada”. Eu
respondi: “Gosto mais dela agora. Você está achando que é pesada? Então
ela é boa. Se você achasse que era tranquila, é que seria ruim”. Enfim,
tínhamos as informações de todo mundo. Criei um mapa que me fornecia a
posição em juros e câmbio de todos os bancos, consolidada com os fundos,
aqui e lá fora. Eu sabia qual era a posição do cara quando ele vinha
conversar comigo. Tínhamos uma diferença de mindset . O objetivo era
fazer o menos possível, porque quanto mais se interfere no mercado, mais
ele fica viciado em uma muleta. Por outro lado, o objetivo era manter a
funcionalidade. Eu tinha a vantagem de conhecer tudo o que é “trique-
trique” e fomos fechando todos. Isso ajudou muito o mercado a ganhar
corpo naquela época. Foi esse olhar de mercado que me ajudou a ver, do
ponto de vista do regulador, como agir e como seria a reação. O acadêmico
não entende isso. Nunca fez isso. É como ter estudado medicina a vida toda
e nunca ter feito uma cirurgia. Não estou fazendo juízo de valor, mas é uma
questão de característica. Outra coisa é que as decisões são colegiadas e
cada um tem um background diferente. Havia muito respeito dentro do
colegiado. Se uma decisão exigisse conhecimento de mercado, tínhamos
liberdade para tomar a decisão. Foi uma experiência muito rica, inclusive
para ver erros que cometemos. Vou dar um exemplo: acho que foi em 2001,
quando tivemos de intervir no mercado de câmbio. Alguns disseram: “Só a
intervenção não adianta, precisa impor um monte de medidas”. Então,
viemos com um conjunto de medidas, junto com o Ministério da Fazenda.
O mercado não deu a menor bola. Daí chegou uma quinta ou sexta-feira e
nós vendemos muito dólar, 5 ou 7 bilhões em dois dias. Naquela época,
cada bilhão era um mundo pra gente. Então, a gente viu que errou. Quando
foi na segunda-feira, nos reunimos e inventamos a ração diária no câmbio.
O Banco Central tem uma perspectiva e um objetivo diferente do mercado.
Quanto mais calmo estiver, melhor. Depois veio o ano de 2002, que foi
aquela confusão. Terminava um dia e pensávamos: “Como será o
próximo?”. Todo dia tinha uma encrenca. Num determinado fim de semana,
o assessor de imprensa me ligou: “Oi Luizinho! Está muito esquisito, não
tem nenhuma crise!”. Eu respondi: “Aproveita, porque daqui a pouco vem
outra!”.
Luiz Fernando: Tem um valor enorme passar por lá. Você passa a entender
como uma decisão é tomada. Eu não sei qual decisão vai ser tomada, mas o
processo eu entendi como é. Sei qual é o ponto de vista de quem está
tomando a decisão. Não quer dizer que nós sempre acertemos, já erramos
várias vezes. Porque uma decisão do Banco Central tem um grau de
aleatoriedade muito grande. Várias vezes, eu pedi opinião na reunião do
Copom. Várias vezes diretores pedem opinião. O sujeito pode ir com uma
cabeça e sair com outra, numa boa. No Brasil, o governo é uma coisa muito
grande. Se você ficou lá e entende a lógica desse agente, tão influente e
importante na economia, fica mais fácil compreender o todo. Por exemplo,
uma visão que nós temos aqui é que, invariavelmente, os analistas erram
porque não levam em consideração as respostas de governos. Todo governo
responde. Pode ser atrasado, menos que deveria, mas sempre responde.
Então, é muito difícil que um país vá, definitivamente, para o buraco. Pode
acontecer, mas entender qual é o mais certo para aquele governo fazer é
muito importante. Tem governo que deixa ir pro buraco. Por exemplo, a
Argentina não fez nada. Foi pro buraco primeiro. Outros países também. Se
jogam para depois tentar ressuscitar. É preciso entender a lógica e a cultura.
É possível dizer que grande parte dos brasileiros gosta de samba. Então, não
gosta de ir pro buraco.
Luis, você passou por vários bancos. Como foi essa experiência?
Luis Garcia: Eu comecei no J.P. Morgan, muito tempo atrás. Eu acho que lá
havia bons traders. Os traders de mercado brasileiro eram bons, mas os
traders de mercado emergente eram excelentes. E conseguíamos trocar
ideias com eles. Então, em um banco estrangeiro, você tem essa vantagem
de ser exposto a um grupo de pessoas que vão além do seu grupo. Claro, era
uma interação muito menor, mas você consegue ter uma exposição. Acho
que ali já estiveram bons professores. Depois eu passei um tempo no
Bankers Trust que, pra mim, era um sonho de consumo. Porque o Bankers
Trust era um banco de traders . Era um banco de trading mais agressivo até
que a Goldman Sachs. Por serem um banco puramente de traders, se
valorizava demais isso. Acho que aqui no Brasil eu tive a honra e a
felicidade de trabalhar com o Oscar Camargo, da GAP, que é um cara que
eu admiro e respeito demais como trader . Aprendi muito com ele.
Conversávamos com uns caras faixa-preta, muito bons mesmo. Depois
quando eu fui para o BBA tive contato com outros traders que eu respeito
demais, como Pedro Cerize, e o Leonardo Callou. Era um grupo de traders
muito bom. Não tive a felicidade de passar pelas escolas tradicionais como
Garantia, BTG e Bahia, mas tive o benefício de ter acesso a traders
internacionais que me ajudaram bastante.
Luis Garcia: Sim, é mais difícil. Não se trata apenas de falar com a
autoridade monetária, mas, principalmente, estar inserido em um network
de operadores que estão lá o tempo inteiro, para trocar ideias. Isso é mais do
que falar ou não com a autoridade. Você não está no clube dos caras que
operam aquilo lá para viver. Mas, aqui no Brasil, há muitos traders que
operam juros nos Estados Unidos e você pode entrar em um clubinho. Esse,
pra mim, é o grande diferencial. No mercado americano, não vamos ganhar
mais que os caras da Goldman Sachs. Eu só preciso saber se eu consigo ter
um conjunto de informações sobre oportunidades onde eu consiga ganhar.
Luiz Fernando: Tinha uma máxima que dizia o seguinte: no curto prazo,
ninguém vence a autoridade monetária. No médio prazo, se ela estiver
fazendo uma bobagem, todo mundo ganha. Essa era a máxima que eu
lembro como tesoureiro. Quando o Banco Central entrar na frente, não
fique na frente dele. O nosso sistema de câmbio, lá por 1996 ou 1997, já
estava fora do lugar. Só que o governo foi tocando. Aprendeu a operar nos
contratos futuros, esticou muito a corda. Até que veio o estopim.
Vocês acham que essa nova maneira dos Bancos Centrais atuarem é
algo preocupante?
Luis Garcia: Se ajustarmos por volatilidade, não tenho a menor dúvida que
o multimercado será maior tomador de risco do que os fundos de renda fixa
tradicionais. Claro que o volume de recursos dos fundos de renda fixa será
muito maior. 100, 200 ou 500 bilhões. Há uma parte dos tomadores de risco
que pensa: “Vou ficar aqui na renda fixa e está tudo bem”. Mas o fundo
multimercado é o produto do futuro, cujo interesse está crescendo. Eu não
vejo isso sendo revertido, no curto prazo, nem por tesouraria de banco e
nem por fundo papai e mamãe. Este último, na minha opinião, é o próximo
da cadeia a perder tamanho e participação na indústria. E tem um agente
novo que ainda é bem pequeno na indústria, que é o pessoal dos fundos
quantitativos, que usa algoritmos. Essa turma está entrando no mercado e,
lá fora, já está bem mais desenvolvida. Aqui há alguma coisa, com
investidores estrangeiros quantitativos. Eles estão na fronteira, além dos
multimercados. Antigamente, se fôssemos falar em fronteira, tínhamos
fundos papai e mamãe, e tesouraria de banco. Aí, os caras da tesouraria de
banco foram encolhendo, e quem fazia risco passou para multimercado. O
fundo de renda fixa tradicional continua sem correr risco. Os bancos estão
fora do jogo, não correm mais risco. Você tem um agente correndo muito
risco, que são os fundos multimercado. Acho que o volume dos fundos sem
risco vai cair e passar um pouco para o multimercado, que vai continuar
tomando muito risco. Na ponta da inovação, os fundos quantitativos estão
chegando.
Luis Garcia: Tem modelo para tudo que é gosto. Tem modelos que dão 20
sinais por dia e outros que dão um sinal a cada 20 dias. Há modelos com
janelas de tempo maiores, que usam componentes econométricos, da
economia real, que são os de tendências mais longas. É difícil dizer, hoje, se
aumentou ou diminuiu a frequência com que cada um desses sistemas entra
no mercado. Mas os modelos sistemáticos, em geral, amplificam as
tendências. Quando o mercado está em uma tendência ruim, eles
amplificam a queda. Quando o mercado está em uma tendência boa, eles
amplificam a alta. Eu sempre digo, seja no computador, seja no humano, o
trade mais difícil de se fazer é o da inflexão. O momento em que o mercado
vai virar. É reconhecer que já subiu demais e agora vai mudar a tendência
ou que já caiu demais e vai começar a se valorizar. É difícil o ser humano
passar essa percepção para o computador, um conjunto de regras que
determinam essa inflexão. O normal é o trend following, no qual se
aproveita para surfar a tendência. Agora, identificar a reversão da
tendência… Há modelos que predizem quando é a hora da tendência acabar,
mas o success ratio deles é muito menor. O payoff é diferente. É aquilo que
sempre falamos. Se alguém consegue surfar em uma tendência boa não
precisa ficar preocupado com a virada da tendência. Se já surfou bem a
tendência, na hora em que ela virar só perderá um pedaço do resultado. O
bom identificador de tendências no início é muito mais valioso do que
aquele que identifica o fim da onda.
Luiz Fernando: Acho que é difícil dar uma resposta objetiva. Lógico que
nós prestamos atenção a essa quantidade imensa de informação, mas o que
isso significa na nossa função de reação? Se estivermos em um período
onde a formação de preço dos ativos seja feita no fundamento
macroeconômico, essa profusão de informações influencia menos. É o que
chamamos de melhor quadro de risco. À medida em que entramos em um
período de maior headline risk , com maior risco político, risco de eleição, a
qualidade do risco piora muito. Então, nesse admirável mundo novo, temos
de prestar atenção a isso. Temos de fazer o dever de casa, a fundamentação.
Precisamos estar super convictos de que o fundamento está apontando para
aquela direção. Mas, se estivermos em uma época de muito headline risk,
teremos de fazer uma posição menor, porque a qualidade do risco é pior.
Isso não conseguimos controlar ou prever. Podemos ter quatro, 40 ou 400
economistas e ninguém vai conseguir dizer qual a próxima coisa que o
Trump vai “twittar”. Esse conceito de qualidade do risco veio para ficar e
respeitamos muito. Aliás, sempre foi verdade. Sempre em época de
eleições, montávamos um cenário macro que estava uma beleza, mas aí
vinha uma pesquisa eleitoral de surpresa que complicava o cenário. Agora,
temos esses extremos frequentemente. Acho que depois da eleição do
Trump a piora da qualidade do risco é um novo paradigma de mercado.
Luis Garcia: Não há como fazer gestão de recursos sem ter uma parte
considerável em dívida pública. Quando se faz operações de futuros, é
necessário depositar margem em títulos públicos. Então, precisamos ter
títulos públicos anyway . Num cenário ruim, tentaríamos reduzir ao máximo
a posição em dívida pública, mas mesmo assim não íriamos conseguir
reduzir muito, por causa das exigências de demanda de margem. E mesmo
quando você faz uma troca de duration , colocando em vencimentos mais
curtos, isso pode ser um tiro no pé. Quando acontece um default , todos os
preços vão para o preço nominal. Em um título com duration mais longa,
você comprou um título a 70% do valor de face antes do default , agora ele
cai para 40%. Na ordem do default, todos os títulos negociam no preço
nominal. Então esse encurtamento muitas vezes pode ser um tiro no pé.
Como foi para vocês passar por várias crises importantes, não só locais,
como lá de fora?
Luis Garcia: É curioso você falar isso, porque temos, seja no mercado
brasileiro, mas sobretudo no exterior, uma geração inteira que ficou
desacostumada à volatilidade. Depois da crise de 2008, a interferência na
política monetária e um crescimento muito anêmico no começo da
retomada produziu uma janela de baixa volatilidade em dez anos. Quase
dez anos. Então, você teve uma geração de traders que nunca viu grandes
volatilidades. E, sem dúvida nenhuma, ter passado por todos estes eventos,
para quem tem mais cabelo branco ou pouco cabelo, foi muito importante.
Um gestor acostumado a um ambiente de baixa vol, fica perdido quando a
vol sobe. É como falar de um capitão de embarcação de rio contra um de
embarcação de mar. O cara do rio, se colocar no mar, afunda o barco. Não
tem jeito, ele não sabe como lidar com as ondas. Então é muito importante
ter quem já passou por isso para ter aquela função de reação super ágil.
Mas, ao mesmo tempo, é importante também entender quanto o local, o
ativo ou o mercado em que se está inserido mudou.
Capítulo 10
JOSÉ TOVAR E BRUNO GARCIA |
TRUXT INVESTIMENTOS
Tovar: O nosso fundo multimercado macro é livre para fazer qualquer coisa.
Operamos tanto no Brasil quanto no exterior. Obviamente, a nossa
vantagem competitiva é Brasil, porque podemos falar com a autoridade
monetária, com os reguladores, com os CEOs e com os grandes
economistas. Então, nossa vantagem é Brasil. Mas queremos também
aproveitar movimentos globais. A gente é menos profundo em casos
internacionais do que locais, mas queremos ter os dois. Para isso, temos um
time de gestão de macro razoavelmente grande. Temos dois portfolio
managers focados em Brasil e dois portfolio managers de mercados
offshore . Um deles é responsável pelo risco para mercados emergentes e
outro para mercados G10. Mas o risco dessa caixinha de offshore é menor
do que a caixinha de Brasil. Na verdade, temos aumentado gradualmente o
risco de offshore a partir do momento em que começamos a ficar mais
confortáveis nessas operações. Mas eu ainda acho que o investidor é um
pouco mais tolerante se eu errar alguma coisa no Brasil do que lá fora. Não
usamos ações no fundo macro, só índice futuro. Mas o fundo macro compra
15% do fundo Long & Short. Temos, além dos quatro portfolio managers ,
três economistas apoiando a análise macro de Brasil e três apoiando a
equipe de offshore. De manhã, os analistas e os portfolio managers
conversam sobre todos os temas. Todas as observações do dia anterior, do
overnight , da abertura na Ásia, da Europa são discutidas. Os temas de
interesse são discutidos secundariamente em reuniões menores depois. Mas
tudo o que a casa sabe é discutido nessa reunião. Não se discute posição
exatamente, não se discute detalhes da posição, mas o que se pretende fazer.
Além disso, eu convido a turma de vendas, risco e compliance para se
atualizarem. Eles ficam por dentro do que a gestão está pensando, e os
comerciais passam para os cliente. Outro ponto que dedicamos muito tempo
é com seleção e treinamento. A gente gosta muito de treinar estagiários high
potential para formar gente na casa.
Bruno: Exatamente. O melhor gestor, tanto para macro quanto para renda
variável, é aquele que não tem preconceito e se adapta às situações.
Moramos no Brasil e o cenário muda tão rápido que ser fiel a um
determinado estilo e operar da mesma forma a vida toda não tem a mesma
eficiência nos diversos ciclos. Você tem que se adaptar em função do ponto
do ciclo em que estiver. Vou puxar o gancho agora para ações.
Determinados gestores dizem: “Só compro ações de empresas de qualidade,
empresas privadas, que têm um management excelente”. Em 2014 e 2015
isso foi muito bom, porque o cenário estava muito ruim. As empresas que
eram vistas como premium se desvalorizaram muito pouco com o mercado
caindo. Esses mesmos gestores, depois do impeachment, não compraram
ações de empresas estatais, por exemplo, que tiveram desempenho
fantástico em comparação com outras conhecidas por ter melhor gestão.
Eles também não compraram empresas ligadas à internet, porque, talvez, o
valuation fosse mais etéreo, mais difícil de precificar. O bom gestor é
aquele que tem capacidade de se adaptar e de fazer as operações adequadas
ao cenário, e não aquele que fica escravo de uma estratégia só e de uma
forma de operar.
Bruno: Nunca sabemos. Temos que tomar decisões sempre com base na
incerteza. São dois os grandes segredos de operar: saber dimensionar as
posições corretamente e não ser teimoso. Se você quer pegar uma faca
caindo, e coloca todas as fichas neste movimento, não vai ter estômago para
aguentar até o fim. E lembre-se que não é o seu dinheiro. O fundo é de
cotistas que olham o valor da cota todo dia. Dependendo da percepção deles
sobre o seu trabalho, eles podem sacar o dinheiro. Então, se o gestor pensa
que está certo e que todo o mercado está errado e começa a aumentar
posições que estão caindo, ele será parado pelo limite de risco do fundo ou
pelos cotistas que vão sacar o dinheiro. Neste caso, o gestor pode até estar
certo, mas não vai conseguir ganhar. A pior coisa é estar certo e não ganhar.
A teimosia é outro fator que atrapalha muito. O gestor bom é aquele que
não tem amor às posições e que consegue reavaliar os cenários. Caso a tese
dele não esteja mais válida diante das novas circunstâncias, não há o menor
problema em desfazer as posições e mudar a carteira. Quando olho alguns
gestores macro mostrando a opinião em Twitter, Instagram e palestra, com
uma exposição muito grande, vejo uma armadilha. Já é super difícil mudar
de ideia e zerar posições. Se você torna pública sua avaliação e, depois, ela
está errada, a resistência a mudar o rumo será muito maior. Então, o
dimensionamento correto de posições e a flexibilidade para mudar de ideia
em função de um cenário novo são elementos importantes para um gestor,
especialmente os que estão apostando contra a manada.
Bruno: Não. Enquanto as teses estiverem válidas, não tem por que ficar
alterando as posições. Você movimenta quando acha que está errado ou
quando a assimetria já não é mais positiva, quando o que tem a ganhar é
próximo do que tem a perder. Salvo essas duas situações, não tem motivo
para ficar girando posição.
Para montar uma posição, além da tese, o timing faz diferença?
Bruno: Eu não uso. Não conheço e não gosto. Não é que a análise técnica
não funcione. Na verdade, funciona se as pessoas acreditarem que funciona.
Algumas pessoas convencionaram determinadas regras de comportamento
do mercado. Toda vez que acontecer isso, a consequência é aquela, e aí elas
passam a operar dessa forma. E acaba que muitas vezes dá certo. Apesar de
saber que muita gente boa opera dessa forma, nunca fiz e não uso.
Bruno: Sim. É interessante para validar suas teses. De repente, você acha
que descobriu a pólvora, olha para o lado e está todo mundo usando a
pólvora há muito tempo. Então, não tem motivo para fazer uma aposta
grande porque está todo mundo apostando na mesma coisa. Por outro lado,
quando você tem uma posição diferente dos outros, vale a pena ouvir
pontos de vista de terceiros, que fazem você repensar. Sou a favor de
conversar com os outros, sim.
Tovar: Testar o conceito, a gente faz internamente. Por exemplo, você tem
reuniões sobre as posições e todo mundo dá sua opinião. Você já testa
internamente. Eu acho que é mais para formar a opinião. Falo com os
parceiros próximos, que fazem a mesma coisa que a gente. Você troca
opinião com todo mundo. O networking é importante. Quando você não dá
nada, ninguém mais quer dar nada a você. Então, tem que trocar.
Obviamente, mantidas as confidencialidades, mas você pede opinião e dá
opinião. Incorpora algumas coisas que não estavam no seu raciocínio,
corrige outras que acha que estava fazendo errado, mas as teses mesmo são
discutidas internamente. Se discute o assunto e se forma esse consenso. Se
você consegue antecipar o consenso, você ganha dinheiro. Você não
consegue ganhar dinheiro apostando após ler o caderno de economia dos
jornais. O que foi para o jornal é passado. O ideal é acertar a manchete do
jornal de amanhã. Essa é a dificuldade.
Bruno: Fica cada vez mais difícil, porque o mercado está mais eficiente.
Cada vez mais há pessoas capacitadas cobrindo os mesmos eventos, com
acesso a mais dados e a informação em tempo real. A Inteligência Artificial
está sendo usada também, especialmente lá fora. Está cada vez mais difícil
ganhar dinheiro.
Tovar: O cotista tem que avaliar que tipo de risco eu corri para ter aquela
rentabilidade. Em geral o cotista não vê isso, ele vê quem acertou. Acho
muito importante ver como o fundo acertou. Se acertou correndo um risco
alto e deu sorte. Um gestor não vai dar sorte sempre na vida. Tem que ver se
o risco foi calculado, planejado e se o fundo acertou mais do que errou.
Esse deveria ser o grande teste. Como o gestor passou essa ou aquela crise?
Se ele quase quebrou, não é o cara que o cotista deveria querer. Quanto ele
ganhou, obviamente, é importante, mas como ele ganhou é muito relevante
no processo de avaliação.
Tovar: O fato é que fundos macro, como um todo no mundo, vêm perdendo
tamanho e relevância. Eu vejo isso cada vez mais lá fora. Cada vez menos
gestores de hedge funds macro estão conseguindo ganhar dinheiro, se
diferenciar e entregar um bom retorno para os cotistas ao longo do tempo.
Vem sendo um desafio grande no exterior. Aqui no Brasil ainda estamos um
passo atrás, muito macro e pouca renda variável. Um percentual grande dos
recursos no mundo estão sendo investidos em ações de forma passiva.
Simplesmente você vai lá e compra uma cota de um fundo atrelado a um
índice. Não tem gestão, não tem conhecimento algum ali. Mas as pessoas
acham que aquela economia de custo compensa porque o gestor, na média,
não consegue justificar a taxa que ele ganha. Esse fenômeno aconteceu
muito em fundos macro no exterior. Aconteceu em fundos de renda
variável. Pela curva de captação de fundo ativo e de fundo passivo, estima-
se que em 2021 e 2022 vá existir mais fundo passivo do que fundo ativo no
mercado mundial. Pode também ser um processo cíclico, no qual o mercado
ficou eficiente, os fundos macro desapareceram. Os fundos de gestão ativa
de ações tenderiam a diminuir. Sobraria pouca gente e o trabalho dos
gestores ficaria mais fácil, por haver menos competição, abrindo
oportunidade para se gerar alpha de novo. Aí, ocorreria a tendência
contrária, de aumentar os fundos ativos. Seriam ciclos ao longo do tempo.
Bruno: Eu não tenho essa certeza. Para o gestor de ações costuma ser mais
difícil bater um índice que está subindo do que caindo. Existem
determinados papéis que são representativos no índice, mas os negócios
dessas empresas não são tão bons assim. Gestores de ativos estão
comprados na maior parte das vezes em empresas de qualidade, que têm um
diferencial de gestão. Aí, esses gestores podem não pegar a alta com a
mesma intensidade do índice.
Bruno: Crises te deixam experiente, calejado. Você sabe que o mundo não
vai acabar e que pode manter a calma, porque essas coisas acontecem. Vão
e voltam muito rapidamente. Duas crises me chamaram atenção. A pré-
eleição do ex-presidente Lula, quando o dólar disparou de forma absurda. O
cupom cambial de um mês no Brasil era 10%. O mercado tinha um grande
medo do risco de fronteira. As pessoas não queriam ter dólar futuro na B3
para receber o ajuste em reais. As pessoas queriam ter dólar físico lá fora
porque tinham medo que as fronteiras fechassem. Foi uma crise aguda e
impressionante. O Banco Central, se não me engano, subiu juros entre o
primeiro e o segundo turno das eleições de uma maneira importante. Alguns
bancos quebraram. Foi um aprendizado. Foi a primeira crise importante que
eu vivi de forma intensa como gestor. Lembrando que eu comecei lá em
1998, 1999. Peguei aquela crise, mas ainda era inexperiente para entender o
que estava acontecendo. Não tomava risco que doesse na pele com as
decisões que tomava. Uma segunda crise incrível foi a de 2008, com a
quebra do Lehman Brothers. Também era um sentimento de que o mundo ia
acabar, uma falta de liquidez absurda, uma avalanche. Basicamente as
pessoas vendiam os ativos que tinham para pagar resgates e aqueles que
estavam comprando tinham preocupação grande porque iam comprar os
ativos que os outros estavam vendendo para pagar resgates. Mas, no dia
seguinte, eles podiam ter que vender aqueles mesmos ativos para pagar os
resgates deles próprios. Não era um jogo de quanto valiam os ativos. Era
um jogo de qual era a minha capacidade de carregar esses ativos. Era um
jogo de: “Será que a economia mundial vai permanecer solvente? Será que
é um castelo de cartas? Qual o meu risco de contraparte?”. Eram coisas
absurdas. Você se preocupava não só com o seu derivativo estar na ponta
certa, mas qual era a contraparte do seu derivativo para ter certeza que ia
receber de volta o ajuste positivo do ganho do derivativo. Foi uma crise
intensa. O lado bom foi que essas duas crises foram rápidas. Não
demoraram tanto tempo assim e geraram oportunidades interessantes
depois. Foram as duas piores crises que eu já vi no mercado: a pré-eleição
do ex-presidente Lula e a crise de 2008.
Bruno: No passado, esse foi o caso na maior parte das vezes. Se existe a
crise, se existe o pânico, naquele momento não se sabe se vai continuar
sendo o caso. A crise vem com a percepção de que, naquele momento, as
coisas não terão solução. É estudar o cenário e manter a frieza, tentar não se
influenciar pelo quanto a sua cota está caindo ou por quanto as suas
posições estão perdendo. Manter a capacidade de tomar decisões na crise é
importante.
Você acha que isso tem mais a ver com o investidor individual ou
também acaba afetando um gestor de fundos?
Bruno: Afeta todo mundo. O que queremos como gestores é dar boa
rentabilidade para o cliente. Se virmos uma tendência positiva acontecer
com determinado ativo e acharmos que vai continuar, vamos tentar capturar
e nos posicionar para isso. Eventualmente, podemos estar comprados no
ativo que julgamos, naquele momento, estar caro, porque achamos que
alguém irá comprá-lo de nós no dia seguinte mais caro ainda. Podemos. É
um jogo superperigoso e temos que fazer com parcimônia, mas é feito pelos
gestores, sim.
Bruno: É mais fácil errar junto com a manada do que errar contra a manada.
Apesar de os trades mais lucrativos serem aqueles que você faz contrário ao
mercado, eles são os mais difíceis de serem feitos. Psicologicamente eles
doem, porque você vai perdendo dinheiro e confiança à medida que as
coisas vão contra você. É o aspecto psicológico do investimento. Apostar
contra é mais difícil do que apostar a favor. Vai contra tudo aquilo que a
gente faz como ser humano desde que o mundo é mundo. Todo mundo
corre do fogo, você vai ficar para ver o fogo? Não, então aqui é parecido. É
difícil. É cada vez mais psicológico. É óbvio que a economia tem um papel
importante, é óbvio que desenhar o cenário tem um papel importante, mas
mais importante é se antecipar ao que os outros vão fazer. E, para isso, você
vai ter que entender como, na média, as pessoas agem. Ânsia, medo,
comportamento de manada, ancoragem. A bolsa bateu 100 mil pontos.
Quantas matérias vocês leram sobre 100 mil pontos? Por que 100 mil
pontos é mais importante do que 101 ou 99? Não tem importância
nenhuma, mas essas ancoragens psicológicas influenciam o mercado. À
medida que você reconhece que existe esse viés psicológico nas pessoas,
você consegue se posicionar de forma mais efetiva.
Você chega a perder o sono ou dorme tranquilo?
Bruno: É um jogo de repetição. Você faz isso há tanto tempo que vai se
acostumando com esse sentimento. É óbvio que tem momentos em que
você fica mais nervoso, mais ansioso. As coisas dando errado te deixam
mais tenso, mas faz parte da profissão.
Bruno: Você tenta quantificar quanto tem a ganhar e quanto tem a perder.
Isso se faz meio que mentalmente: “Quanto eu tenho a ganhar no cenário
bom e quanto eu tenho a perder no cenário ruim? Será que está simétrica
essa relação? O ativo é líquido o suficiente para apostar? Qual o tamanho da
posição que eu vou fazer? Como vou reagir se o mercado vier contra? Vou
aumentar?”. Então você tende a fazer um plano de voo assim.
Bruno: O mercado é cíclico. É quase certo que vai haver alguma crise nos
próximos 12 meses e que naquele momento as pessoas vão ficar
desesperadas e que o mercado vai atribuir um prêmio grande àquele
momento. O grande segredo é você capturar as tendências de uma forma
saudável, com posições normais e conseguir estar leve em momentos de
pânico para poder aproveitar o pânico dos outros para se posicionar. Isso
seria o que todo mundo gostaria de fazer. Pegar os momentos bons com
maiores posições e estar leve nos momentos de crise. Seria o mundo
perfeito. Mas é óbvio que haverá crises. Se olharmos os movimentos do
mercado nos últimos 20 anos... Não sei quantos foram, mas serão muitos.
Se olharmos para a indústria de fundos no Brasil, o que me chama a atenção
é a quantidade de fundos que têm tempo de mercado, que tem 10 anos ou
mais de histórico. Isso diz um pouquinho sobre como os gestores fazem
gestão de fundos. Essa cabeça de saber se posicionar corretamente, com
tamanhos adequados, ser parcimonioso, não ser teimoso, saber mudar a
posição, zerar posições. Ao longo do tempo, isso dá retorno positivo,
porque você está vivo e consegue apostar nos momentos de crise. A última
vez que eu vi havia mais de mil gestoras independentes abertas. Dessas mil,
quantas estão com tamanho suficiente para manter uma equipe bem
remunerada, adequada e ganhando? De repente 100? Quantas dessas
existem há mais de cinco anos? Talvez 20 ou 30. É interessante ver como
esses gestores macro que estão no mercado há 10, 15 anos fizeram para
sobreviver a esses ciclos todos e o que aprenderam com isso. Os erros mais
frequentes que eu vi na minha vida de mercado foram gestores que se
empolgaram, fizeram posições muito grandes, subestimaram o risco, foram
teimosos e obrigados a zerar posições no pior momento possível. Se
olharmos para trás, na maior parte das vezes as casas estavam certas. Elas
não erraram na tese. Erraram no tamanho das posições e na gestão do risco.
Qual é a característica principal que faz com que o time consiga dar os
retornos acima da média, pagar a taxa de administração e ainda dar
retorno para o investidor?
E RODRIGO CARVALHO |
VINTAGE INVESTIMENTOS
Ricardo: Essa questão de ver outros mercados foi interessante. Quando saí
do (Credit Suisse) Garantia, montamos um family office só para operar o
nosso dinheiro. E ali me aprofundei mais na área de mercados
internacionais e comecei a aprender a lidar com os diferentes mercados. Em
2006 fui viver no exterior e me desenvolvi ainda mais.
Rodrigo: Outro aspecto é a cota diária. Numa instituição financeira, o
cliente é o chefe, o dono do limite de risco. Em banco os chefes ligados à
administração da tesouraria vinham da mesa também. Eram chefes que
entendiam muito bem o que estava sendo feito. Num fundo, o chefe é o
cotista, que está na ponta final. Normalmente, há um intermediário, um
profissional que entende do produto e faz a mediação com o cliente final.
Mas na gestão de fundos a questão de drawdown é mais sensível, então a
preocupação em acertar esse timing de montar uma posição, mesmo que
seja estrutural, é maior do que em uma tesouraria. Em tesouraria havia mais
flexibilidade para errar o timing de montar a posição porque o sócio, o
cliente, entendia daquele business .
Rodrigo: Pelo fato de querermos ser um hedge fund enxuto, decidimos não
ter muitos produtos, não ter muitos funcionários e nem ter um patrimônio
gigante. Em função dessa escolha empresarial, adequamos nosso processo
de investimento. Ele é Top-Down . Esse é o nosso approach , algo também
visto em vários hedge funds globais. Contamos, claro, com profissionais
que operam também com um processo de investimento mais detalhado,
mais Bottom-Up . Mas temos três heads generalistas globais com posições
que, na média, são maiores em Brasil. Esse é o estilo do nosso processo de
investimento.
Amaral: Acho que é preciso um pouco de dom. Existem algumas coisas que
não se aprende em lugar nenhum. Há duas ou três coisas que levo em
consideração. Uma delas é a lógica de raciocínio. Se o profissional possui
uma boa lógica de raciocínio, a chance dele alcançar o sucesso em várias
áreas é gigante. Outro aspecto que levo em consideração é saber ler a
psicologia do mercado e do ambiente macro. Se o profissional consegue
fazer bem a leitura do psicológico das ruas, do mercado, do Banco Central,
dos políticos, ele sai na frente. Gestão é um desafio, mas o trabalho também
precisa ser divertido. É óbvio que o trabalho não vai ser diversão 100% do
tempo, mas é preciso rir até mesmo dos erros, senão o sucesso não vem.
Rodrigo: Há pessoas que simplesmente não suportam dormir mal, mas nós
conseguimos. É inerente à profissão. Normalmente alguém com uma
formação cartesiana só assume risco quando tem a convicção matemática
de que aquele negócio vai dar certo. E isso raramente acontece em gestão.
Então, é um misto de pragmatismo com característica pessoal, de entender
que faz parte do negócio assumir posições arriscadas onde não há 100% de
convicção. Claro que se houver menos convicção, um tomador de risco
deveria assumir uma posição menor com um stop mais rigoroso. Em
compensação, quando houver mais convicção, ele deveria montar uma
posição maior.
Amaral: Não é que o profissional com estômago para gestão seja melhor ou
pior que um analista. Eles são complementares. O gestor em geral não tem a
profundidade de um analista. Até porque se tiver, não vai conseguir
exercitar as outras características de gestão. É provável que ele seja um bom
leitor de cenários. Existem pessoas que possuem uma aptidão enorme para
resolver um problema, juntar as peças, buscam dicas, conseguem desenhar
um cenário e explorá-lo. Já outras se desesperam diante de um quebra-
cabeça. Uma coisa é implementar algo, outra é fazer. Amanhã pode ser
outro cenário. É necessária uma constante análise do cenário e testar a
convicção como um todo. O importante é testar. Às vezes, uma posição que
começa pequena e direcional pode se tornar um Long & Short , e depois
uma posição de três pernas. O processo é dinâmico. É preciso ter jogo de
cintura para não ficar preso na primeira página da análise. Conseguir fazer a
migração para algo complexo, com mais pontas, combinar diversos riscos e
ter uma visão de portfólio. Faz diferença vivenciar várias situações. Se
desenvolve um equilíbrio para lidar com a situação estressante e agir no
timing certo.
Rodrigo: Um erro que eu evitei, e que pode ser praticamente fatal em uma
indústria como a nossa, é o oversizing em uma determinada tese, ou seja, a
concentração grande de risco . O gestor se sujeita à dependência absoluta de
sua tese estar correta. Não faz sentido manter uma posição mega-
alavancada para ganhar 3% ou 4% e correr o risco de perder 25%. Então
esse erro de dimensionamento, com excesso de confiança, é o que procuro
evitar. Preferimos esse estilo de preservação de capital. Muitos gestores
focam em volatilidade do fundo , talvez isso seja um erro também. Existe
uma confusão conceitual entre volatilidade e risco. Algumas pessoas são
normalmente induzidas a assumir mais risco quando a vol dos ativos está
baixa. Temos uma percepção diferente. Historicamente, corremos mais
risco quando a vol está alta, porque são nesses momentos que a assimetria
melhora. Uma coisa é aplicar pré a 4,50% e esperar que chegue a 4,30%.
Outra coisa é aplicar a 13,00% porque houve um Joesley Day, e está todo
mundo “stopando” posições. Qual é a chance de perda permanente de
capital se você continuar a 13,00%? Vai oscilar para 14,00% ou para
12,00%, mas o risco de perda permanente é muito menor do que aplicar a
4,50%.
Amaral: Concordo com essa questão de concentração e ter uma convicção
extrema. Chega a ser arrogante não enxergar determinados riscos e acreditar
que está 100% convicto. Vivenciei um tipo de erro que muitos também
devem vivenciar. É o famoso amor à posição, a dificuldade de se desfazer
dela. No banco, eu era de renda fixa e só depois comecei a prestar mais
atenção em equities, e a gostar muito. Em equity é possível identificar a
questão do amor à posição. Há uma lista com 20 papéis. De repente o gestor
escolhe um, coloca na posição e pronto, se torna uma tese. Nesse caso,
infelizmente, é comum ignorar os sinais de que aquilo não é exatamente
como o esperado. Esse viés é difícil tirar, mas há mecanismos para controlar
isso melhor. Uma das coisas que ajuda é não concentrar. Não gosto de usar
a palavra diversificação, porque ela está gasta. Também, se diversificar
demais, não se faz nada. Em vez de falar diversificação, o importante é a
não concentração. É uma arte montar a posição do tamanho certo para que
ela não seja algo que use energia e recursos da empresa e, quando a tese
estiver certa, gere um movimento pequeno para o investidor ou cota. É
natural olhar com mais carinho para algo que você tem na carteira, mas
existem mecanismos para testar isso constantemente . Outra coisa que ajuda
é que, ao trabalhar com seus pares, é possível colocar mais em jogo as suas
teses. Temos essa confiança e liberdade entre nós para fazermos isso.
Apesar de todo mundo saber da responsabilidade própria em seus books ,
compartilhamos muito. Isso é positivo para a gestão como um todo. Fomos
unânimes no desejo de montar algo com três sócios, porque pode chegar um
momento no qual alguém vai falar uma coisa, o outro vai falar outra e não
haverá solução. Com um terceiro sócio, é possível desempatar e resolver
melhor. Essa divisão entre sócios de igual para igual é o cenário ideal para
montar sociedade. É o nosso caso. Criamos afinidade e confiança mútua ao
longo do tempo. Mesmo que você admire certos profissionais, que os
conheça há muitos anos, se nunca trabalhou e conviveu com eles, a chance
da sociedade não dar certo é grande.
Amaral: A questão é saber lidar emocionalmente com isso, admitir que está
errado e “stopar” a posição. É um exercício constante para aprender a lidar
com o erro. O profissional desenvolve uma resistência às situações. Além
dos erros ativos, ainda é preciso lidar com o que eu chamaria de erros
passivos, que são as oportunidades que deixamos passar. Não há
necessariamente perdas, mas também se deixa de ganhar dinheiro. Até para
esse tipo de situação é preciso desenvolver resistência.
Tendo tido sucesso pessoal ao longo de muitos anos, o que motiva vocês
a continuarem gerindo recursos após tanto tempo?
Rodrigo: Somos intelectualmente desafiados todos os dias. E esse é o
grande chamariz da profissão. Existe o desafio intelectual diário de tentar
entender o que está acontecendo no mundo e como isso vai se traduzir em
preço. No final das contas, é um desafio atrativo. Não é à toa que fazemos
isso a vida inteira. É uma atração e um desafio intelectual que encanta.
Ricardo: São duas coisas. Saber que você é capaz, mas querer novos
desafios. O segundo ponto vai além do desafio de mostrar que é capaz, é
trabalhar com pessoas mais novas que você. Isso gera entusiasmo. Se você
trabalha só com gente mais velha, acaba envelhecendo. Não tem ideias
novas. Se você trabalha com gente mais nova, alguém sempre te oferece
algo diferente. E isso motiva para a vida. Não interessa se vai dar resultado
ou não. Você ouve pessoas mais velhas, mas onde você aprende de verdade
sobre a vida atual é ao lado de pessoas mais novas.
Capítulo 12
JÚLIO FERNANDES E BRUNO MARQUES |
XP ASSET
Bruno: 90% do risco do nosso fundo vem de juros, câmbio e bolsa local. E
todos os instrumentos que envolvam esses três mercados. No mercado de
juros, você tem juros nominais e juros reais, você tem opções. No mercado
de câmbio você tem câmbio futuro e opções. Na bolsa você tem índice
futuro, opções, ações especificas. A gente não opera nada com modelo
quantitativo, somos zero quantitativo. Teve um modelo de câmbio que
funcionou durante muito tempo no Brasil, embora tivesse baixa capacidade
de previsão. Quando o spread do preço com o valor do modelo abria muito,
o modelo conseguia identificar isso bem. Só que, de março do ano passado
para cá, esse modelo parou de funcionar. Porque mudou o modus operandi,
o câmbio passou a sentir mais os juros baixos.
Júlio: No mercado de juros não tem modelo, mas naturalmente a gente olha
a curva de juros para trás. Olhamos como se comportou a curva de um ano,
de dois anos, de três anos, de cinco anos, para trás. Então, usamos dados
históricos, para avaliar como que o mercado se comportou em cada
oportunidade. Num ciclo de easing , e em um de aperto. Mas também olhar
as especificidades de cada momento. Então, num ciclo de easing , 2008,
lembra da Lehman Brothers? Ali, o Banco Central teve que cair juros de
emergência. Então, olhar os dados para trás faz parte da nossa função aqui,
para tentar comparar com o momento e ver se tem alguma informação, se
está muito fora de preço ou não. Mas, aí, nesse caso, tem toda a
subjetividade e a nossa capacidade de analisar os dados.
Júlio: A nossa experiência aqui já nos faz filtrar quais dados, tanto no
Brasil, quanto no exterior, são importantes. Lá fora é divulgada uma bateria
de dados quase todos os dias, mas a gente sabe exatamente o que olhar. Se
no atual momento o que importar for a atividade econômica, então vamos
olhar dados de geração de emprego. Tem momentos que o foco está em
inflação e aí sabemos que um dado de payroll forte não vai afetar o
mercado. O CPI vai ser o foco de atenção. Há períodos nos quais o mercado
está todo focado no payroll , porque está olhando a atividade. Você sabe que
um payroll forte e um dado de average hourly earnings forte pode fazer o
FED subir mais os juros. Isso foi a narrativa de 2018. Em 2019 o medo é o
contrário: já é de desaceleração, então o foco começa a ser a inflação. Se a
inflação não sobe como ele imaginava, o FED vai cortar ainda mais os
juros. Tem momentos em que a atividade é protagonista, em outros a
inflação é importante.
Bruno: Essa parte quantitativa de ver a regressão dos fundos entra no risk
management. Usamos para compor o cenário, tentando buscar uma
otimização de posição . Mas sempre olhando um cenário de médio e longo
prazo. Temos de ter uma vantagem comparativa. Ponto. O resumo é esse.
Então, por que a gente não opera o mercado externo? Porque não temos
vantagem comparativa. Se o cliente quer investir em multimercado com
40% de risco offshore , recomendo: “Investe 60% com a gente e investe
40% em um fundo bom lá fora”. A nossa vantagem comparativa,
certamente, não é prever o movimento das próximas duas semanas.
Certamente não é essa. Não quer dizer que a gente não consiga tentar
otimizar a gestão do fundo por conta disso. Mas, para quê? Para conseguir
estar vivo e monetizar o cenário de médio e longo prazo. Quantitativo como
trigger de gestão, a gente não usa. Tipo: “Toda vez que acontece isso, a
gente faz aquilo”. Não é muito a nossa praia. Acho bem complexo fazer
isso em macro. Tem pouca gente no mundo que faz isso bem em gestão
macro.
Júlio: Nesse período que o Bruno citou, tivemos dois períodos que damos
como exemplo de gestão de risco. Na votação do Brexit a probabilidade de
a Inglaterra ficar era elevada. E a saída era improvável. Então, tínhamos
pouco para ganhar e poderíamos ter muito a perder se o Brexit acontecesse,
o que acabou acontecendo. Então antes do Brexit reduzimos 50% do risco
das nossas posições, mesmo estando com uma visão de médio prazo
otimista, apenas para passar pelo evento. Acabou acontecendo o
imponderável. Tivemos volatilidade, e o mercado voltou mais rápido do que
a gente imaginava. Quando vimos que normalizou tudo, voltamos à
alocação anterior. Então, o nosso fundo acabou voltando à posição original
sem ter passado por aquele período de volatilidade que houve durante um,
dois, três dias ali. E em novembro de 2016 tínhamos a eleição americana.
Então, mesmo estando otimista com bolsa e com a curva de juros, uma
semana ou duas antes a gente já foi reduzindo grande parte do nosso risco
para o dia da eleição. Em juros trocamos temporariamente a posição em DI
Futuro por NTN-Bs, reduzindo o risco de maneira consolidada. E até
montamos um put spread de bolsa para proteger o nosso portfólio. Por quê?
Porque achávamos que a probabilidade da Hillary ganhar era muito alta.
Isso estava precificado, teríamos pouco a ganhar. E se desse o
imponderável, no caso a eleição do Trump, poderíamos ter muito a perder.
Então, o nosso cenário de longo prazo não estava sendo alterado, mas, no
caso da eleição, reduzimos 75% do risco no portfólio como um todo, só
para passar por aquele evento. Acabou dando o imponderável de novo. É
claro que o mercado se recuperou, de novo, mais rápido do que
imaginávamos. Mas são exemplos de que ex post , o nosso fundo passou
pelos eventos e não caímos do cavalo. Se não nos preocuparmos com os
eventos, podemos ser “stopados”. Entre aspas, poderíamos não aguentar um
eventual drawdown . Eventualmente reduzimos as posições para nos
proteger dos eventos perigosos e assimétricos. Em seguida, se acharmos
que nada mudou, montamos a posição de novo, para conseguir monetizar
isso no longo prazo. Nosso cotista, no final das contas, acaba sofrendo um
pouco menos. Nosso fundo tem um bom índice de Sharpe, em função de
uma gestão bem ativa de risco, minimizando a volatilidade nesses
momentos nos quais achamos que há mais riscos iminentes.
Júlio: Não temos stop formal para cada posição. O cenário é o primordial
para cada posição. É natural que, ao montar uma posição, você tenha um
objetivo de retorno. Você fala: “Eu acho que uma posição tem potencial de
ganhar 50 basis points e, no pior cenário, perdemos 30 basis” . Claro que,
chegando lá na frente, a gente pode reavaliar, caso ganhemos 50 basis .
Você reavalia o cenário e pode achar que tem mais 50 para ganhar. Lá na
frente. Mas, em um primeiro momento, você fala: “Eu tenho 50 para ganhar
e eu acredito que, se nada mudar muito, eu tenho 30 para perder”. Se
estivermos perdendo os tais 30 basis , não tem um stop que fala “vamos
‘stopar’ no 30”. “Mas será que tem alguma coisa que não estamos vendo ou
entendendo? Será que é o cenário lá fora que está pior? Ou, será que aqui
dentro o Banco Central pode estar tendo reuniões com os agentes e falando
outra coisa?”. Reavaliamos, novamente, em termos de cenário. Se aquela
posição é válida ou se deveríamos reduzir um pouco ou “stopar” a posição.
Se a perda de 30 basis veio muito rápido, poderíamos chegar à conclusão
que foi um agente do mercado específico, alguém que distorceu o mercado
e pode ser que a gente aproveite para aumentar a posição. Por isso que é
muito importante ter essa reavaliação.
Bruno: O modus operandi faz muita diferença. Modus operandi, para mim,
entra no combo risk management. É difícil comerçarmos uma posição full .
Digamos que uma posição devesse ser de 100. É muito difícil começar com
100. Porque você parte do pressuposto de que já está entrando no melhor
momento e que não tem nenhum risco sobre aquilo ali. Então, o ideal é
você entrar com uma posição entre 40 e 60 e, aí, ir aumentando.
Bruno: Não. Timing é muito difícil. Prever o que vai acontecer no mercado
no curto prazo é a forma mais errada, ou a mais fácil, de perder dinheiro.
Bruno: Não. A gente não tenta mapear o quão crowded um trade está. Eu
não tenho a menor restrição com crowded trades . O quão crowded um
mercado está, às vezes, restringe e deixa o risco-retorno pior. Aí, é uma
questão tática. De como otimizar a alocação. Mas o fato de o trade estar
crowded não é um impeditivo.
Bruno: Deve estar crowded há, pelo menos, uns quatro anos!
Júlio: Nesse caso, você fica suscetível aos drawdowns . Você tem que estar
atento para isso.
Júlio: Esse contrarian precisa de timing , porque, se ele não tiver timing ,
ele vai quebrar. Ele pode estar certo daqui a 20 anos, mas ele quebra antes.
Então, esse cara tem que esperar 20 anos e entrar para acertar a virada.
Isso faz com que vocês tenham um viés otimista nas posições ou vocês
são completamente desapegados disso?
Bruno: Pode acontecer. Já aconteceu uma vez ou outra, mas não é a coisa
mais recorrente do mundo. Por quê? Para fazer hedge de qualquer um dos
três mercados, preciso estar na posição contrária em outro. Se a correlação
for perfeita, é, simplesmente, igual a estar menor. Não tem a menor
diferença. O hedge funciona se existe uma assimetria na distribuição de
retorno esperado dos ativos. Se um ativo, na melhora, andar mais do que o
outro, e, na piora, eles andarem igual. Nesse caso você pararia para fazer o
hedge . Mas você tem de ter um assumption muito forte para ter essa
percepção dos resultados. De probabilidades etc. É um negócio difícil, não
é trivial. É um skill de traçar cenários cross-asset . Propomos algo diferente.
Júlio: Você pode estar com o cenário correto, colocar muito risco, muito
beta e, no final, vão te perguntar: “Você ganhou dinheiro? Você acertou o
cenário?”. Alguém pode dizer: “Putz, acabei que eu exagerei, coloquei logo
100% da posição na largada. Aí veio o Joesley Day ou um vento lá de fora,
acabei me 'stopando' e esqueci de voltar para a posição. Mas eu estava com
a posição correta e não ganhei dinheiro”. Então, nesse nosso business , o
estar vivo, a nossa filosofia de gestão, é muito importante. E isso é um
diferencial no longo prazo. Tem Assets que acertaram, mas tropeçaram no
meio do caminho. Se enrolaram no modus operandi e quando chegou no
final do ano, no período, não conseguiram entregar o que gostariam. Todo
esse alinhamento, pessoas boas, somado ao modus operandi, é o que faz
com que a gente consiga entregar o que a gente se propõe.
Bruno: Acho que objetivos de retorno e de vol se falam muito. Eu acho que
a vol é mais clara. Na média, vamos estar com 5% de vol. Se estivermos
com posições muito confiantes, ela vai estar mais perto de 7%. E, quando
não tiver nada de bom, estaremos com uma vol perto de 3%. E por aí vai.
Achamos que a vol é uma boa forma de padronizar, porque se consegue
fazer um link razoável entre volatilidade e retorno. No Brasil, bons fundos
tiveram Sharpe perto de 1. No médio prazo, um Sharpe muito maior do que
1 é difícil para caramba. Então, se tivermos um Sharpe de 1, vamos ter um
retorno médio, líquido, de taxas de CDI + 5%. Imagine que a gente tenha
uma posição comprada em bolsa. Digamos que a bolsa tenha volatilidade de
25%. Tudo mais constante, se eu tiver 20% comprado em bolsa, eu vou
trazer uma vol de 5% para o fundo. Isso baliza o tamanho das posições que
a gente pode ter. Só que a vol de curto prazo nem sempre é o melhor
previsor da vol do ativo. Às vezes, o mercado mostra uma vol muito baixa,
mas sabemos que aquilo ali não é a vol de longo prazo daquele ativo. Sabe-
se que, na média, a vol é maior. O mercado de juros, por exemplo, é um
mercado que tem uma vol muito baixa, mas uma vez por ano, pelo menos,
tem um movimento de estilingada de stop que é descontrolado. Então a vol
média é alta, mas no curto prazo, às vezes, ela é baixíssima. Você tem que
tentar fazer uma projeção do que você acha ser a vol esperada e as
correlações entre os ativos, para tentar fazer uma vol projetada do futuro.
Temos um modelo desenvolvido nosso, para tentar projetar a vol do fundo e
aí fazer um balizamento das posições em função disso.
Vocês conversam com outros players para entender como está a cabeça
do mercado?
Júlio: É natural, dado o tempo que temos de mercado. Tenho uma rede de
contatos, o Bruno tem uma rede de contatos. Eu conheço os contatos dele,
ele conhece os meus, mas tenho mais proximidade com alguns, ele tem
mais com outros. E é natural uma troca de opiniões recorrente entre pessoas
de mercado que você confia. Então, é mais uma segunda maneira de
conversar. Você conversa com pessoas da sua equipe, que é de onde vem a
informação primária, o fundamento, atividade, inflação, as nossas
projeções... Vamos criando o nosso cenário, mas você usa os seus parceiros
de mercado e amigos para ficarem te questionando: “Tem algo que eu não
estou vendo? Será que tem algo que alguém aqui possa estar falando de
diferente do que os meus economistas estão falando?”. Então, é importante
sim, a gente faz almoço de mercado, com o pessoal de mercado. A gente vai
a eventos, vai a Brasília, a eventos políticos aqui na XP. Aí, você fica
refinando a sua análise. Eu acho que o primário vem da casa. E a gente usa
inputs de fora, para ficar se questionando o tempo todo.
Júlio: A gente até brinca aqui que é maio... Maio tem sido um mês não
muito bom para o nosso fundo. Especificamente, maio de 2017 e maio de
2018. Basicamente, todo mundo sabe da história, do Joesley Day, não
preciso nem entrar no mérito do black swan . Do imprevisível do
imprevisível. Nunca poderíamos imaginar que ocorreria aquilo, num
momento em que a inflação e a atividade estavam fracas. A inflação
brasileira estava afundando. O Banco Central estava num ciclo forte,
agressivo de queda de juros. E estava aumentando a confiança. Se não me
engano, ele iria até acelerar. Naquele momento, tinha risco de ele acelerar a
queda de juros. Então, era um momento de muita convicção dos players ,
por isso que houve aquele movimento exagerado no DI. Então o Joesley
Day foi um dos nossos piores momentos, foi o maior drawdown que a gente
teve na cota. Mas, como a gente é todo centrado em fundamento, cenário, a
nossa reação foi: como o cenário mudou, a gente achou que, do dia para a
noite, o cenário passou a inexistir, não saberíamos nem o que sairia no
áudio. O Joesley disse que tinha um áudio, mas não disse o que tinha no
áudio. Foi um dia às escuras. Então, na ausência de cenário, zeramos as
posições para esperar que o cenário clareasse novamente. Esse foi maio de
2017. Maio de 2018 foi uma agonia um pouco mais lenta, uma greve de
caminhoneiros que parecia inicialmente inofensiva. Eu nunca tinha visto
uma naquela proporção. Estava já ocorrendo um movimento de dólar forte
no mundo, com moedas de emergentes começando a desvalorizar. A greve
dos caminhoneiros virou um evento até meio político e antecipou uma
discussão eleitoral. O Brasil tem um risco de populismo maior do que
imaginávamos. Aí que o mercado lembrou do risco das eleições. O real, que
já estava depreciando por motivos externos, ampliou o movimento. A gente
foi se questionando: “Será que estamos corretos? Será que há risco dos
juros pararem de cair?”. Chegou uma hora que a gente falou: “Tem mais
risco do que a gente imagina”. Fomos reduzindo, reduzindo, reduzindo as
posições e não tivemos um drawdown do tamanho que poderíamos ter tido
se não reavaliássemos o tempo todo. Acabou que, mesmo em menores steps
, um dos piores meses que tivemos foi maio de 2018.
Júlio: Na minha vida profissional antes da XP, uma coisa que eu aprendi é
respeitar o mercado, principalmente o mercado de juros. Em alguns
momentos que você começa a olhar e fala: “Não pode ser verdade o que
está ocorrendo”. O mercado de juros começa abrindo 50 basis e você fala:
“Não é verdade, cara! Eu achava que o mercado tinha que fechar e o
negócio está abrindo”. Por isso os limites também de VaR e Stress são
importantes. Porque eles te obrigam a ter uma disciplina. Mas o ideal é que
você tenha essa disciplina antes de bater nos limites. O meu maior momento
de aprendizado e que mostrou que a disciplina é muito importante foi 2006.
O Brasil vinha de um momento de melhora muito forte. Tínhamos iniciado
um ciclo de queda de juros em setembro de 2005. De 19,75% ele caiu para
11,5%. Foi o maior tempo caindo juros no Brasil. Nesse momento de
euforia o Brasil estava abrindo o mercado para investidor estrangeiro. Ele
estava começando a aplicar em NTN-Bs 2045. Mas só que, no meio desse
período, em abril e maio de 2006, teve um soluço forte lá fora, de medo de
inflação americana. Foi tão forte que jogou as Treasuries para cima. Os
juros da B45 tinham caído de níveis de 8,0% de juros para 6,0%. E de
repente tivemos um soluço, uma volta de 200 basis points. A taxa da B45
voltou de 6,0% para 8,0% de novo. Em um mês. O vento estava vindo lá de
fora, não era daqui. Nessas horas é preciso ter um respeito e atentar para a
questão da posição técnica. Você tem que fazer esses grandes movimentos
logo nos primeiros 25% - 30% do movimento, para você não morrer. Então,
a gente “stopou” toda a posição. Não tem problema em realizar uma perda.
Tivemos uma disciplina adequada de tentar avaliar o que estava
acontecendo e o que não estava se encaixando no quebra-cabeças. Se eu não
tivesse tido essa disciplina à época, eu teria tido um drawdown muito,
muito forte, que poderia atrapalhar muito o business . Depois que ocorreu o
movimento, em maio de 2006, impressionantemente, o cenário foi ficando
cada vez mais claro, lá fora acalmou. Daí em diante, até o final de 2006,
foram alguns dos melhores momentos que já tive na carreira. O mercado foi
fechando continuamente até meados de 2007. Fui gradualmente voltando a
ter confiança, aumentando as posições e esperando, além de analisar para
ver se tinha algo que pudesse sair do script . Mas foi um aprendizado em
termos de respeito e disciplina, e de visualizar de onde pudesse vir algo que
não estava mapeado. Foi respeitar o mercado. Para poder sobreviver e, no
final, monetizar o que eu tinha originalmente na cabeça.
Bruno: O meu primeiro grande trade foi horroroso. Foi um trade de valor
relativo entre papeis de dívida externa brasileira. O mercado estava achando
que ia ter swap, eu achava que não ia ter. E se tivesse ia ser um fracasso.
Acabou tendo o swap e foi um fracasso. Só que quando anunciaram o swap
o meu trade andou para trás e depois voltou. O que fica desse evento é de
que o grande disciplinador do mercado é o mercado de juros. Ele vai
mexendo devagarzinho e, de repente, ele abre igual a um alucinado. Ele
fecha 2, 3 basis por dia, todo dia, durante cinco meses. E, de repente, ele
abre 200 basis em duas semanas. Os outros mercados têm menos diferença
de volatilidade na melhora e na piora. O mercado de juros é um mercado
unidirecional, só tem um tomador, que é o Tesouro Nacional. E o resto, a
economia inteira, é doador, não tem a outra ponta. Então, as volatilidades
são extremas. O aprendizado que ficou é: nunca se coloque numa posição
na qual você pode ficar em corner . Isso vale para vários ativos. Toda
posição é uma teoria. E aquela teoria é testada consistentemente. Como em
ciência, tudo tem que ser refutado. Você não consegue provar um positivo,
não prova um negativo. Se jogar uma maçã para cima e a maçã não cair de
volta, a gravidade foi para o caramba! Toda teoria tem que estar sendo
constantemente refutada para continuar valendo. Mas você não pode se
colocar em uma situação em que se você for refutado, você quebra, não
consegue sair ou não consegue gerenciar. Você acaba com um risco de
business muito grande. Então, trata-se de tentar ter posições adequadas para
estar vivo. Quando o mercado está num high e você está ganhando, você
não é o único que está posicionado. Na hora que o negócio vai mal, é
melhor estar melhor que os outros, do que estar melhor que os outros
quando o negócio vai bem.
Que conselho vocês dariam para alguém que está começando nesse
business ?
Bruno: Eu acho que a pessoa tem que gostar bem de estudar. Tem que
gostar bem do que faz. Meu primeiro chefe me falou algo que eu nunca vou
esquecer: “A sua profissão tem que virar o seu hobby. Você tem que
imaginar que, se você ganhar na loteria, vai continuar fazendo o que você
está fazendo”. Você tem que ter prazer em fazer aquilo. Se você tem prazer,
você vai fazer cada vez melhor. E eu acho que o negócio que fazemos é
sedutor, porque nosso negócio é ficar estudando o dia inteiro, ficar
estudando o tempo todo e ficar pensando em teorias e por aí vai. Então você
tem de ser uma pessoa que goste de estudar, mas que seja aberta a se
questionar o tempo todo. Para a gente, tudo é resultado, então, você tem que
estar aberto a escutar as teses contra você. Você também tem que ter uma
humildade intelectual grande. Tem algo que acho curioso na vida do gestor:
você tem que ter arrogância para tomar uma posição, para dizer que aquele
preço está errado e, no limite, você está dizendo que aquele preço está
errado o tempo todo. Mas tem que ter humildade para quando o negócio ir
contra. Porque isso significa que você está errado. Acho bem legal isso.
Capítulo Bônus
ANA LAURA MAGALHÃES E
MATHIAS FULDA
Ana Laura: Não devemos estar 100% alocados apenas em juros ou ações.
Fundos multimercado permitem ao investidor se posicionar em vários
ativos simultaneamente, trazendo uma amplitude de estratégias e uma
gestão ativa que balanceia posições em juros, inflação implícita, ações,
moedas e commodities, entre outras. Essa é a beleza das diferentes posições
simultâneas, que permitem aos gestores explorarem as assimetrias de preços
em vários mercados, maximizando o retorno com risco adequado. O
aumento da quantidade de alocações tende a reduzir o risco. Ou seja, essas
multiestratégias combinadas trazem diversificação, redução de riscos e
maximização de retornos. Ter fundos multimercado no portfólio de
investimentos é esse ncial.
Mathias: É uma classe de ativos diferenciada mesmo. É interessante reparar
a forma como cada fundo implementa essas estratégias por meio de
diferentes abordagens. Alguns gestores, junto à equipe de analistas, se
especializam em avaliar o cenário econômico e estimar onde os preços de
mercado deveriam estar. Frente a preços fora do equilíbrio, se posicionam
em função da premissa de que os preços irão convergir para o cenário deles.
Já outros têm um approach levemente diferente. Avaliam como os vários
agentes do mercado irão perceber o cenário econômico no futuro, daqui a
uma semana, um mês ou mais à frente. Estão mais interessados em entender
o que outros investidores comprarão no futuro por um preço maior do que o
atual. Isso me faz lembrar o conceito do Beauty Contest, popularizado pelo
economista John Maynard Keynes em 1936 para descrever o
comportamento dos participantes do mercado acionário. Keynes comparava
a arte de selecionar ações à atividade de prever corretamente o vencedor de
um concurso de beleza imaginário. Nesse concurso, os jornais publicariam
fotos de 100 mulheres, e cada leitor deveria escolher as cinco fotos que
achava que os outros leitores escolheriam. Quem acertasse o consenso de
todos os outros leitores, ganharia o jogo. Keynes dizia que o sucesso nesse
jogo não estaria relacionado ao ato de escolher os rostos que, no julgamento
pessoal do leitor, seriam os mais bonitos, nem mesmo aqueles que a média
das pessoas consideraria serem os mais bonitos. Seria a terceira derivada:
antecipar o que a opinião média dos leitores esperaria ser a opinião média
dos outros. E ele acreditava que alguns leitores chegariam a praticar,
inclusive, a quarta, quinta e outras derivadas. Em outras palavras, Keynes
acreditava que, no caso do mercado acionário, selecionar ações seria um
jogo psicológico de prever quais ações outras pessoas escolheriam no
futuro.
Ana Laura: Acho muito bom falarmos desse assunto, porque não é difícil
encontrar pessoas que investem em produtos que não são aderentes ao seu
perfil de investidor. Alguns investidores escolhem fundos de um gestor
mais conhecido ou fundos que investem em uma classe de ativos mais
popular. Então, para começar, eu gosto de analisar algumas informações.
Por mais que rentabilidade passada não seja previsão de rentabilidade
futura, ela nos mostra, minimamente, as estratégias de controle de risco dos
gestores. E o passado me ajuda a entender o que esperar no futuro. Acho
importante olharmos para o desempenho de cada fundo em momentos de
estresse nos mercados. Ver se usaram estratégias de proteção e como cada
gestor controlou a volatilidade. Se olharmos um panorama dos últimos
cinco anos, por exemplo, é importante ver quais fundos se saíram melhor no
época do impeachment do governo Dilma, durante o governo provisório, no
Joesley Day, no período eleitoral de 2018 e agora, nesse cenário de
pandemia. É interessante ver quais fundos conseguiram lidar melhor com as
incertezas do mercado e trazer rentabilidade mais equilibrada ao longo do
tempo. Eu gosto, também, de entender quem são as pessoas que compõem o
time e saber se elas estão alinhadas. O dinheiro delas está lá dentro?
Quando o fundo vai mal, ele também perde o próprio dinheiro? Me deixa
mais satisfeita investir em fundos onde sei que todo ou grande parte do
patrimônio dos gestores também está lá. E, por fim, gosto de Assets que são
comprometidas com o conceito de partnership . Quanto mais elas fidelizam
seu time, em uma estratégia de longo prazo, maior é o compromisso da casa
com os cotistas do fundo.
Mathias: Sem dúvida existem fundos de um mesmo tipo que têm alta
correlação entre si, resultando em baixa diversificação. Mas dentro de um
mesmo estilo de fundos, acontece de um fundo ir mal enquanto outros estão
indo muito bem, especialmente em momentos de alta volatilidade ou de
crise. Então, sempre que possível, gosto de diversificar em um número
maior de fundos. E, na hora de pensar quanto alocar em cada fundo, vejo
basicamente três abordagens igualmente válidas: alocar igualmente entre os
fundos, alocar com auxilio de um ranking ou otimizar uma carteira de
fundos. A alocação por ranking supõe alocar mais nos fundos com melhor
posicionamento na sua lista de indicadores de performance. A otimização
também pode ser uma ferramenta útil, permitindo associar risco, retorno e
correlação histórica entre os fundos. De todos esses anos visitando diversas
Assets, que experiências você vivenciou no contato com os gestores?
Ana Laura: A principal lição é que os mercados são cíclicos. Num mundo
integrado, podemos sentir mais impactos que em crises passadas. Então, de
fato, uma crise importante em um ponto do mundo vira também uma crise
em outro lugar como consequência. Eu gosto de ver, por exemplo, a
vivência dos gestores que passaram por outras crises e o aprendizado que
trazem para a crise atual. É impressionante perceber como todos eles
concordam que não existem muitas similaridades, e que hoje nós passamos
por um processo em que a crise vem da economia real e impacta, a
posteriori, o mercado financeiro. Isso é superinteressante. Porque se
olharmos para a crise europeia ou para a crise de 2008, vemos que foram
crises financeiras que, a posteriori, impactaram a economia real. É curioso
ver o quanto os gestores também passam por um processo de aprendizado,
tendo que lidar com novos fatos, notícias e expectativas do mercado.
Quando o investidor escolhe um fundo para investir seu capital, ele confia
que o gestor tenha expertise suficiente para absorver as novas informações e
tomar uma decisão melhor do que o investidor individual poderia fazer
sozinho. Também aprendi que cada momento da economia é diferente.
Momentos de crise nos mostram quem consegue olhar para o menos óbvio.
Enquanto muitos gestores renomados estão fazendo posições idênticas em
momentos de grande otimismo, outros percebem que é hora de começar a se
posicionar de forma conservadora ou até mesmo contrária. Não tem
ninguém comprando ouro? Compra ouro. Todo mundo comprado em bolsa?
Vende S&P Futuro. Um exemplo que gosto de citar é o do Howard Marks,
gestor americano que escreveu o livro The Most Important Thing . Ter esses
gestores na carteira pode fazer sentido no longo prazo, já que traz um
equilíbrio, reduzindo a volatilidade da carteira de fundos do investidor. Por
isso vale a pena escolher fundos complementares. É um filtro interessante
na hora de escolher um bom produto.
Bibliografia
Os livros para ler sobre o mercado financeiro evoluem com o tempo.
Encontrei nas páginas abaixo uma curadoria incrível com os melhores
títulos para quem já trabalha no mercado ou para quem está começando a
ler sobre investimentos.
@bibliotecadomercado
www.bibliotecadomercado.com.br
Vale a pena!
ANTES DE TERMINARMOS...
Obrigado e um abraço,
Mathias Fulda
Glossário
As definições desse glossário levam em conta o contexto da gestão de
investimentos. As respostas são breves ( short answer ) e sem tecnicismo,
de forma a facilitar o entendimento prático.
Bearish: estar com uma visão negativa para um mercado ou preço de ativo.
Bullish: estar com uma visão positiva para um mercado ou preço de ativo.