Livro Violencia Domestica
Livro Violencia Domestica
Livro Violencia Domestica
Vice-Reitor
Rafael Frederico Henn
Pró-Reitor Acadêmico
Rolf Fredi Molz
Pró-Reitor Administrativo
Dorivaldo Brites de Oliveira
EDITORA DA UNISC
Editora
Helga Haas
COMISSÃO EDITORIAL
Helga Haas - Presidente
Adilson Ben da Costa
Carlos Renê Ayres
Cristiane Davina Redin Freitas
Hugo Thamir Rodrigues
Marcus Vinicius Castro Witczak
Mozart Linhares da Silva
Rudimar Serpa de Abreu
PREFÁCIO
Ingo Wolfgang Sarlet.....................................................................9
APRESENTAÇÃO
Miloš Sklenka..............................................................................13
APRESENTAÇÃO
Profª Carmen Lúcia de Lima Helfer.............................................17
APRESENTAÇÃO
Eduardo Ritt, Caroline Fockink Ritt............................................19
Miloš Sklenka,
Cônsul Geral da República Tcheca
APRESENTAÇÃO
Eduardo Ritt1
Caroline Fockink Ritt2
NOTAS
1
Eduardo Ritt, professor das disciplinas de Direito Penal e Processo Penal do
Curso de Direito e nas Especializações (presencial e Direito Penal e Processual
Penal da Universidade de Santa Cruz do Sul (UNISC). Promotor de Justiça
Criminal no Ministério Público do Estado do Rio Grande do Sul. Mestre em
Direito. E-mail: [email protected]. Currículo Lattes: 8342935944007299.
2
Caroline Fockink Ritt é Doutora em Direito e Pós-Doutora em Direitos
Fundamentais na PUC – RS. Professora de Direito Penal no Curso de
Direito da UNISC. Coordenadora do Projeto de Extensão “Enfrentamento
da Violência Doméstica e Familiar: Direitos da Mulher Agredida”. E-mail:
[email protected]
A IMPORTÂNCIA DA EXTENSÃO
UNIVERSITÁRIA NA FORMAÇÃO DO
ESTUDANTE E NA SOCIEDADE, POR MEIO
DE PROJETO DE PREVENÇÃO À VIOLÊNCIA
DOMÉSTICA E FAMILIAR
1 INTRODUÇÃO
O presente artigo científico tem como objetivo principal
demonstrar a importância de projetos de extensão universitária na
formação acadêmica de alunos, em especial em uma Universidade
comunitária como a UNISC. Como referência para corroborar
essa experiência prática que enriquece a formação estudantil,
detalharemos a relevância do projeto de extensão intitulado
“Enfrentamento da Violência Doméstica e Familiar: Direitos e
Garantias da Mulher Agredida”, coordenado pelos Professores
Eduardo Ritt e Caroline Ritt, da UNISC.
O trabalho desenvolve-se três tópicos: (1) concepção e
diretrizes de extensão universitária; (2) aprendizado do estudante e
contribuições para a sociedade: o papel da extensão das Universidades
comunitárias; e (3) o projeto “enfrentamento da violência doméstica
e familiar: Direitos e garantias da mulher agredida: nascedouro e
contribuições acadêmicas e sociais. Uma revisão conceitual sobre
a extensão universitária que norteia as políticas educacionais do
país e uma visita aos documentos, como o projeto e os relatórios de
atividades em questão, foram nossos faróis para o desenvolvimento
do artigo.
O resgate do manifesto de Córdoba, considerado o marco
fundador da extensão universitária, a Lei de Diretrizes e Bases da
Educação Brasileira e a própria Constituição Federal são textos e
contribuições importantes para concebermos uma formação integral
de um universitário. De outra parte, os marcos legais da própria
UNISC, como o Plano de Desenvolvimento Institucional e o
26
Fundações Educacionais).
As universidades comunitárias também estão unidas pelo
Fórum Nacional de Extensão e Ação Comunitária das Universidades
e Instituições de Ensino Superior Comunitárias, o FOREXT, espaço
em que se qualifica a ação extensionista por meio da troca de
experiências e da busca por tornar a extensão universitária e seus
resultados ainda mais visíveis e valorizados nas mais diversas
instâncias. O FOREXT define que a extensão é um
por vezes, acaba distanciada dele, que se depara com esse contexto
apenas quando adentra no mercado de trabalho com a profissão que
escolheu.
O atendimento é realizado pelas bolsistas do projeto, todas
mulheres, para minimizar o constrangimento e oportunizar o
acolhimento e a empatia pelas vítimas, visto que o relato da agressão
sofrida é um momento difícil para a agredida. As acadêmicas foram
orientadas pela coordenação do projeto e pela delegada Lisandra
de Castro de Carvalho, responsável pela DPCA de Santa Cruz do
Sul, sobre como tornar esse relato menos duro para as mulheres,
propiciando-lhes segurança e empoderamento, visto que, apesar
de que o papel das bolsistas é prestar os esclarecimentos jurídicos,
muitas vezes atuam como ouvintes da tristeza e da decepção das
agredidas, prestando um verdadeiro suporte moral a essas mulheres.
A troca de experiências entre bolsistas, coordenadores e a delegada
permanece ao longo de todo o período de execução das atividades.
Considera-se, também, a importância da parceria com a
DPCA, pelo acolhimento à proposta de realização do projeto. Sabe-
se que existe toda uma estrutura de amparo à mulher agredida,
mas que, por vezes, não chega ao conhecimento dela. É necessário
destacar, na pessoa da delegada Lisandra, o reconhecimento sobre a
necessidade desse trabalho de amparo à vítima, proporcionando-lhe
um espaço seguro e discreto, para que possa se abrir e compartilhar
suas dores.
O atendimento é feito de forma individual, em sala
separada, somente entre bolsista e vítima. Em alguns casos,
familiares acompanham, oportunidade em que também podem
esclarecer dúvidas e contribuir com o relato da agredida, trazendo
a leitura de quem presenciou a agressão, o que colabora com os
encaminhamentos necessários em termos de registro de ocorrência,
além de possibilitar a identificação de mais membros da família
que passam por igual situação. É também realizado contato
telefônico com as vítimas, como forma de monitorar a situação após
o atendimento e de propiciar amparo e interesse sobre a vida da
agredida após seu comparecimento à delegacia.
Conforme dados do relatório do projeto (RITT, 2019), o
maior problema no apoio às vítimas de violência doméstica é o
40
5 CONSIDERAÇÕES FINAIS
O presente artigo traduz de forma incontestável que a
experiência prática proporcionada aos docentes e discentes, quando
da realização do projeto de extensão de “Enfrentamento da Violência
Doméstica e Familiar: Direitos e Garantias da Mulher Agredida” é
imensurável. O relato das mulheres beneficiadas com a atenção aos
seus problemas, somado ao rico processo de formação humanista
acumulado pelas alunas, são exemplos de uma formação acadêmica
integral. Os benefícios são mútuos e a UNISC cumpre sua missão
institucional de promover e desenvolver soluções dos problemas de
sua comunidade.
A extensão universitária na formação prática dos acadêmicos
43
NOTAS
1
Mestre em Desenvolvimento Regional pela Universidade de Santa Cruz do
Sul (UNISC). Bacharel em Direito pela UNISC. Assessora da Direção de
Extensão e Relações Comunitárias da UNISC. E-mail: [email protected].
2
Mestre em Desenvolvimento Regional pela Universidade de Santa Cruz
do Sul – UNISC. Fisioterapeuta pela Universidade Luterana do Brasil
(ULBRA). Diretor de Extensão e Relações Comunitárias da UNISC. E-mail:
[email protected] .
45
REFERÊNCIAS
Eduardo Ritt1
Camila Alves Nemecek2
Joseane Medtler3
4 CONCLUSÃO
No que se refere ao cenário de confinamento, muito embora
nos atenhamos a positivas prospecções de retorno à “normalidade”
com a flexibilização do isolamento social, é preciso manter em
evidência o estado de atenção à mulher.
De todo modo, os rastros gerados pela pandemia vão
além dos entonados pela mídia, vez que poderão vir a acentuar
vulnerabilidades econômicas e dificultar o cenário de rompimento
da relação abusiva.
Nesse diapasão, é imperioso exigir do Estado, e atuar
enquanto sociedade, no sentido de além de conter a pandemia da
Covid-19, não deixar o período de isolamento tornar a violência
doméstica invisível e estrita ao lar. É, mais do que nunca, necessário
que se forneçam meios adequados à efetivação de denúncias, com
segurança, possibilitando condições mínimas de acesso à informação
e garantindo os direitos humanos e fundamentais da mulher.
NOTAS
Possui graduação no curso de direito pela Universidade de Santa Cruz do
1
REFERÊNCIAS
1 CONSIDERAÇÕES INICIAIS
O presente trabalho tem como objetivo geral analisar de
que maneira a atuação conjunta entre Estado e sociedade pode
contribuir com a prevenção e combate à violência doméstica. O
tema da pesquisa está relacionado à atuação conjunta entre Estado
e sociedade na prevenção e combate à violência doméstica estando
delimitado ao contexto brasileiro em termos de legislação bem como
das medidas que serão analisadas ao longo do desenvolvimento do
artigo. O método de abordagem utilizado é o dedutivo, o método de
procedimento monográfico e as técnicas de pesquisa estão resumidas
em consulta em livros, revistas, periódicos, teses, dissertações,
dentre outros meios.
Assim, considerando a necessidade de prevenir e combater a
violência doméstica no cenário brasileiro, bem como a existência de
políticas públicas e legislativas sobre a temática, além do fato de que
o Estado de forma isolada não consegue atuar em todos os setores,
questiona-se: de que maneira a atuação conjunta entre Estado e
sociedade pode contribuir com a sua prevenção e combate?
A hipótese inicial é no sentido de que a atuação conjunta
entre Estado e sociedade é cada vez mais necessária na medida em
que tão somente medidas legislativas não dão conta de solucionar
este grave problema necessitando da participação social desde
a prevenção até a detecção de casos de violência doméstica, os
quais devem ser comunicados às autoridades competentes. Por sua
vez, as autoridades policiais e judiciárias necessitam priorizar o
70
5 CONSIDERAÇÕES FINAIS
O presente trabalho objetivou analisar de que maneira a
atuação conjunta entre Estado e sociedade pode contribuir com
a prevenção e combate à violência doméstica estando o estudo
delimitado à verificação dos instrumentos existentes na legislação
brasileira de modo que foram citados exemplos no campo
constitucional, legislativo e também de estratégias desenvolvidas na
esfera pública, privada e também de forma conjunta.
Para isso, em um primeiro momento foram delimitados
os aspectos conceituais e introdutórios relacionados à violência
doméstica, realizando uma breve exposição teórica sobre o seu
conceito e uma contextualização histórica, ainda que de forma
sucinta e neste ponto verificou-se que há uma necessidade de uma
constante atualização legislativa e também de estudos doutrinários
sobre o tema, tendo em conta que a partir de uma compreensão
sobre a sua origem e modos de ocorrência é que se torna possível a
instrumentalização de formas de prevenção e combate à violência
doméstica. Ademais, constatou-se que a violência doméstica não é
uma realidade recente, estando presente há séculos, não somente
na história brasileira, mas de uma forma global, o que indica a sua
persistência secular e necessidade constante de aprimoramento dos
mecanismos de prevenção e combate.
83
NOTAS
REFERÊNCIAS
sociedade-exerce-um-papel-fundamental-nessa-luta-em-prol-
do-fim-da-violencia-contra-a-mulher-afirma-coordenadora-d-
o-nudem&catid=8&Itemid=180. Acesso em: 11 ago. 2020.
ÉPOCA NEGÓCIOS. App do Magazine Luiza ganha botão
para denunciar violência contra mulheres. 2019. Disponível em:
https://epocanegocios.globo.com/Empresa/noticia/2019/03/app-
do-magazine-luiza-ganha-botao-para-denunciar-violencia-contra-
mulheres.html. Acesso em: 11 ago. 2020.
FURTADO, Lucas Rocha. As raízes da corrupção no Brasil:
estudos de caso e lições para o futuro. Belo Horizonte: Editora
Fórum, 2015.
GOVERNO FEDERAL. Ligue 180. Disponível em: https://www.
gov.br/mdh/pt-br/navegue-por-temas/politicas-para-mulheres/
ligue-180. Acesso em: 05 ago. 2020.
GUIMARÃES, Maisa Campos; PEDROZA, Regina Lucia Sucupira.
Violência contra a mulher: problematizando definições teóricas,
filosóficas e jurídicas. Revista Psicologia & Sociedade, local ?, n.
27, v. 2, 256-266, 2015.
LEITE, Renata Macêdo; NORONHA, Rosangela Moraes Leite. A
violência contra a mulher: herança histórica e reflexo das influências
culturais e religiosas. Revista Direito & Dialogicidade, Crato, CE,
vol.6 , n.1, jan./jun. 2015.
PORTO, Rosane Teresinha Carvalho. A implementação das
práticas restaurativas na prevenção ao feminicídio enquanto
política pública para os homens autores de violência de gênero
no Brasil. Tese (Doutorado em Direito) - Universidade de Santa
Cruz do Sul, Santa Cruz do Sul, 2016.
RBSTV. Campanha ‘Máscara Roxa’ possibilita denúncia de
violência doméstica em farmácias do RS; saiba como funciona.
2020. Disponível em: https://g1.globo.com/rs/rio-grande-do-sul/
noticia/2020/06/10/campanha-mascara-roxa-possibilita-denuncia-
de-violencia-domestica-em-farmacias-do-rs-saiba-como-funciona.
ghtml. Acesso em: 11 ago. 2020.
RITT, Caroline Fockink; COSTA, M. M. A violência nas relações
de gênero: uma afronta aos direitos humanos, direitos fundamentais
87
1 CONSIDERAÇÕES INICIAIS
A Convenção Interamericana para Prevenir, Punir e Erradicar
a Violência contra a Mulher, também conhecida como Convenção de
Belém do Pará (1994), ratificada pelo Brasil em 1995, proclama que
a violência contra a mulher constitui violação aos direitos humanos
e às liberdades fundamentais.3 No capítulo concernente aos deveres
dos Estados, mais especificamente no artigo 7, prevê, dentre outras
disposições, que os Estados-Membros acordam em incorporar em
sua legislação interna, normas necessárias para combater a violência
contra a mulher e estabelecer procedimentos judiciais eficazes.
Entretanto, apesar do compromisso internacional, só no ano de 2006
o Congresso Nacional brasileiro aprovou uma lei específica voltada
à problemática da violência doméstica e familiar.
Criada com o objetivo de estabelecer mecanismos para coibir
e prevenir a violência doméstica e familiar contra a mulher, nos
termos do § 8º do art. 226 da Constituição Federal, da Convenção
sobre a Eliminação de Todas as Formas de Violência contra a Mulher,
da Convenção Interamericana para Prevenir, Punir e Erradicar
a Violência contra a Mulher e de outros tratados internacionais
ratificados pela República Federativa do Brasil, a Lei 11.340/06 (Lei
Maria da Penha) dispôs sobre a criação dos Juizados de Violência
Doméstica e Familiar contra a Mulher e estabeleceu medidas
de assistência e proteção às mulheres em situação de violência
doméstica e familiar, conforme refere em seu artigo 1º. Além disso,
conceituou as formas de violência doméstica e familiar contra a
89
ato para homologação (ou não), bem como para as demais medidas
judiciais possíveis.
Deferidas as medidas protetivas, a autoridade policial estará
apta a efetuar a prisão em flagrante do agressor em razão de eventual
descumprimento, hipótese em que somente a autoridade judicial
poderá arbitrar fiança, ou representar pela decretação de sua prisão
preventiva. Tais circunstâncias denotam a eficiência que o legislador
pretendeu dar a esse instituto de proteção, bem como a relevância
da atuação da autoridade policial que, em regra, é a primeira a ser
cientificada do descumprimento através de novo registro policial
efetuado pela vítima.
4 CONSIDERAÇÕES FINAIS
O enfrentamento da violência doméstica e familiar constitui
desafio diário para a Polícia Civil. Nesse contexto, a dinâmica
delineada pelo legislador na Lei Maria da Penha evidencia que a
atuação dos Delegados de Polícia e suas equipes é fundamental para
a preservação imediata da integridade da vítima e de seus familiares,
bem como para a responsabilização criminal do agressor.
Assim, as primeiras providências adotadas pela autoridade
policial na fase pré-processual, como a garantia de proteção policial,
encaminhamento médico-pericial, fornecimento de transporte
para local seguro, ou, ainda, a autuação em flagrante e posterior
representação pela prisão preventiva, são capazes de garantir a
sobrevivência das vítimas. É nesse viés que a alteração legislativa
que possibilitou ao Delegado de Polícia afastar imediatamente o
agressor do local de convivência com a vítima - mesmo que apenas
102
nos Municípios que não são sede de comarca - é vista como positiva,
por ampliar o caráter protetor da Lei.
Além disso, a condução eficiente da investigação a fim de
formalizar indícios qualificados de autoria e materialidade que
assegurarão a responsabilização criminal do agressor e a utilização
de mecanismos tecnológicos para agilizar a conclusão do inquérito,
possibilitando o célere início da ação penal, garantem a efetivação
da proteção almejada pelo legislador e reduzem a sensação de
impunidade e desamparo promovida pela morosidade ou ausência
de tutela estatal.
Dessa forma, a atuação da Polícia Civil firma-se como peça
fundamental e imprescindível para a efetivação da ruptura do ciclo
de violência que transcende a mulher-vítima e atinge todo o núcleo
familiar, causando sérias consequências de ordem social, de forma
gradativa e silenciosa.
NOTAS
E-mail: [email protected].
O artigo 1 da Convenção Interamericana para Prevenir, Punir e Erradicar a
3
lher no Brasil foi implantada na cidade de São Paulo, em 1985, ou seja, ante-
riormente à Lei 11.340/06.
6
Dentre os vinte e três municípios do Vale do Rio Pardo, que abrigam mais
de 418.000 mil habitantes, Santa Cruz do Sul é o único a contar com uma
DEAM. (SZCZECINSKI, Fernanda). Santa Cruz é o único município da re-
gião com uma delegacia da mulher. Portal GAZ – Notícias de Santa Cruz
e Região. 27 set. 2019. Disponível em: http://www.gaz.com.br/conteudos/
jornal_gazeta_do_sul/2019/09/27/154761-santa_cruz_e_o_unico_munici-
pio_da_regiao_com_uma_delegacia_da_mulher.html.php.
7
Dados atualizados em 16/06/2020 pela Secretaria de Segurança Pública do
Rio Grande do Sul.
8
A Delegacia de Sobradinho está localizada na região Central do Estado do
Rio Grande do Sul, denominada Centro-Serra, e abrange seis Municípios:
Sobradinho, Ibarama, Passa Sete, Lagoa Bonita do Sul, Segredo e Lagoão,
que juntos abarcam mais de 40.000 habitantes. Todas as infrações criminais
de violência doméstica e familiar praticadas nos Municípios descritos per-
tencem à circunscrição da Delegacia de Sobradinho, que também atua na
apuração de quaisquer outros delitos praticados nesses locais, na medida em
que não é Delegacia Especializada.
9
Art. 69. [...] Parágrafo único. Ao autor do fato que, após a lavratura do termo,
for imediatamente encaminhado ao juizado ou assumir o compromisso de a
ele comparecer, não se imporá prisão em flagrante, nem se exigirá fiança. Em
caso de violência doméstica, o juiz poderá determinar, como medida de cau-
tela, seu afastamento do lar, domicílio ou local de convivência com a vítima.
10
Art. 41. Aos crimes praticados com violência doméstica e familiar contra a
mulher, independentemente da pena prevista, não se aplica a Lei nº 9.099, de
26 de setembro de 1995.
11
Art. 12-C. Verificada a existência de risco atual ou iminente à vida ou à inte-
gridade física da mulher em situação de violência doméstica e familiar, ou de
seus dependentes, o agressor será imediatamente afastado do lar, domicílio
ou local de convivência com a ofendida:
I - pela autoridade judicial;
II - pelo delegado de polícia, quando o Município não for sede de comarca; ou
III - pelo policial, quando o Município não for sede de comarca e não houver
delegado disponível no momento da denúncia.
§ 1º Nas hipóteses dos incisos II e III do caput deste artigo, o juiz será co-
municado no prazo máximo de 24 (vinte e quatro) horas e decidirá, em igual
prazo, sobre a manutenção ou a revogação da medida aplicada, devendo dar
ciência ao Ministério Público concomitantemente.
12
Ressalta-se que a alteração também não demonstra nenhum prejuízo ao con-
traditório e à ampla defesa, pois mantém-se a possibilidade de questionar a
decisão administrativa perante o Judiciário, por meio de habeas corpus, da
mesma forma que ocorre com a prisão em flagrante e a imposição de fiança.
104
REFERÊNCIAS
1 INTRODUÇÃO
O artigo encetou sobre as atribuições funcionais do Ministério
Público e analisou a (im)possibilidade de abarcar a proteção jurídica
às mulheres transgêneros e transexuais por intermédio da Lei nº
11.340/2006.
Para o desenvolvimento do artigo, restou empregado o
método dedutivo e a pesquisa bibliográfica, correlacionando a
atividade ministerial com a Lei Maria da Penha, para enfrentamento
da exponencial violência doméstica numa era de sociedade de risco
ou modernidade líquida. Num segundo momento, são explicitados
os entendimentos doutrinários divergentes sobre a possibilidade
de aplicar os ditames da Lei Maria da Penha numa perspectiva
transcendente à natureza biológica da mulher.
Na terceira parte, tematiza-se o uso da técnica interpretativa e
a conjugação de princípios constitucionais, da proibição de proteção
deficiente e cânones do direito internacional para referendar a
incidência da Lei Maria da Penha no tocante à violência doméstica
de gênero.
Princípio 02
“Direito à igualdade e a não-discriminação”
Todas as pessoas têm o direito de desfrutar de todos os
direitos humanos livres de discriminação por sua orientação
sexual ou identidade de gênero. Todos e todas têm direito
à igualdade perante a lei e à proteção da lei sem qualquer
discriminação, seja ou não também afetado o gozo de
outro direito humano. A lei deve proibir qualquer dessas
discriminações e garantir a todas as pessoas proteção igual e
eficaz contra qualquer uma dessas discriminações.
A discriminação com base na orientação sexual ou identidade
gênero inclui qualquer distinção, exclusão, restrição ou
preferência baseada na orientação sexual ou identidade
de gênero que tenha o objetivos ou efeito de anular ou
prejudicar a igualdade perante à lei ou proteção igual da
lei, ou o reconhecimento, gozo ou exercício, em base
igualitária, de todos os direitos humanos e das liberdades
fundamentais. A discriminação baseada na orientação sexual
ou identidade de gênero pode ser, e comumente é agravada
por discriminação decorrente de outras circunstâncias,
inclusive aquelas relacionadas ao gênero, raça, idade,
religião, necessidades especiais, situação de saúde e status
econômico. (PRINCÍPIOS..., 2006, p. 12-13).
123
5 CONCLUSÃO
A vicejante metamorfose sociocultural na complexa pós-
modernidade ou sociedade líquida demanda atuação mais célere
e eficiente do Estado, sem protelar ou descurar da tutela jurídica
às minorias vulneráveis, sujeitas à restrição de cidadania e alvo de
violação de direitos.
Embora crescentes as estatísticas de violência, inclusive de
gênero, o Ministério Público empenha-se na luta para reprimir tais
crimes, ajuizando ações penais contra o agressor, requerendo medidas
protetivas de urgência à mulher e acompanhando a implementação
da rede de atendimento à ofendida, além de ser indutor de políticas
públicas na área.
A inscrição do termo “gênero” no regramento da Lei Maria da
Penha não é aleatória, cimenta a construção social alusiva às visões
de masculino e feminino, refletindo o contraste ao designativo
“sexo” de cunho restritivo morfobiológico.
A Lei nº 11.340/2006 não é um repositório hermético
que limita guarida à mulher apenas na tradicional perspectiva
biologizante, pois permite interpretação extensiva e teleológica para
a amplitude dos sujeitos de direitos, sem exigir readequação física
ou alteração registral. Destarte, sujeitar transgêneros ou transexuais
à mutilação corporal (transgenitalização), esterilização e terapias
hormonais, bem como à burocrática formalidade de retificação do
registro civil, para lhes conceder a terminologia somática mulher e
titularidade de gozarem amparo quando vítimas de agressões de seus
companheiros, representa execrável discriminação e preconceito,
porquanto relegam a dignidade e a autodeterminação do ser humano,
além de subverter princípios de Yogyakarta, no sentido de que as
pessoas de orientações sexuais e identidades de gênero diversas
devem gozar de capacidade jurídica em todos os aspectos da vida.
Por sua vez, a proibição de proteção deficiente, consectário
do princípio da proporcionalidade, traduz um status de garantismo
127
NOTAS
REFERÊNCIAS
1 ASPECTOS INTRODUTÓRIOS
O presente artigo problematiza a violência doméstica
contra a mulher e a atuação profissional do Serviço Social neste
âmbito, trazendo elementos para uma reflexão crítica a partir do
olhar da garantia efetiva de direitos e de proteção social. Destaca-
se, inclusive, que este estudo traz um levantamento de dados
importante realizado junto aos órgãos da rede de proteção às
mulheres vítimas de violência do município de Santa Cruz do Sul/
RS. Esse levantamento subsidia as reflexões tecidas no decorrer
dos aprofundamentos e problematizações. O objetivo central deste
itinerário, então, é tecer uma reflexão crítica acerca da atuação do
Serviço Social nesta complexa temática trazendo aportes teórico-
metodológicos bem como referendando a importância das políticas
públicas no atendimento direto às mulheres vítimas de violências.
A temática evidenciada, violências contra a mulher, é
apontada como uma violação de direitos humanos e como um
problema de saúde pública pela Organização das Nações Unidas
(ONU). Em outras palavras, as violências contra as mulheres são
causadoras de doenças considerando os aspectos biopsicossociais
de vida dessas mulheres. Enfatiza-se que, violências – no plural,
quer destacar, neste estudo, que todo ato de violência é gerador de
violências em suas diferentes formas e complexidades.
A violação de direitos humanos, nesta temática, se revela de
forma nua, fria, desumana e, historicamente, difícil de ser superada
enquanto um processo de trabalho coletivo e de responsabilidade
social. O extremo das violências contra as mulheres é o mesmo
extremo da vida humana, a saber: a morte. Não raras vezes as
violências contra as mulheres no Brasil culminam neste extremo.
132
Fonte: Informações coletadas pelas autoras (2020)
4 CONSIDERACOES FINAIS
Ao realizar uma abordagem geral do contexto de violências
contra a mulher em Santa Cruz do Sul, é importante observar que
muitas mulheres não levam em frente suas denúncias, por medo
ou vergonha da sociedade, e, em outros casos, por dependerem
financeiramente do agressor. Estar ligada emotivamente ou ainda
acreditar na mudança também influencia sobremaneira no processo
da denúncia. Sublinha-se que, mesmo havendo avanços políticos e
sociais, eles ainda não são suficientes para minimizar o elevado índice
de violências contra a mulher, estes presentes no Brasil e no mundo.
Questionamentos e reflexões são constantes: estão as políticas
realizando um trabalho efetivo frente a esse tipo de violência? Quais
as nuances da violência contra mulher na contemporaneidade?
Destaca-se a importância de estudos locais, como este,
que refletem acerca dos dados reais e buscam propor alternativas
diferenciadas em uma realidade especifica. Neste caso concreto,
percebe-se uma rede ampla existente com potencial importante
para trabalhar de forma conectada e planejada. Diferentes órgãos,
instituições trabalhando coletivamente e articuladamente faz
toda a diferença para aportar impactos sociais mais relevantes e
permanentes.
A melhoria na qualidade dos serviços oferecidos às mulheres
em situação de violências é de fundamental relevância, é assunto
ligado a mobilização da sociedade civil e ao engajamento político. A
participação junto aos fóruns que discutem as questões das mulheres,
no conselho da mulher, incentivando mais mulheres a participarem
efetivamente da política, ocupar espaços públicos, faz, com certeza,
maior diferença.
Considerando os equipamentos públicos existentes no
município que atendem mulheres em situação de violência,
comparando com os demais municípios do estado e do país, o
município de Santa Cruz do Sul tem uma rede consideravelmente
ampla com: Delegacia Especializada da Mulher, Brigada Militar
com Patrulha Maria da Penha, Escritório Municipal da Mulher, casa
de acolhimento para mulheres em situação de violência, Centro de
Referência Especializado de Assistência Social, assistência jurídica
145
NOTAS
REFERÊNCIAS
1 CONSIDERAÇÕES INICIAIS
O presente artigo trata da abordagem da violência doméstica
e familiar contra a mulher, a partir de elementos históricos,
doutrinários e dados estatísticos de órgãos oficiais, que refletem
a efetivação das legislações internacionais e nacionais no âmbito
de gênero, vislumbrando-se a proteção dos direitos humanos das
mulheres como uma conquista histórica na evolução da humanidade.
Para tanto, visando a aplicação da legislação protetiva à mulher
existente no Brasil, a efetivação de tais ditames legais deve vir
acompanhada de políticas públicas que atendam às necessidades
materiais de prevenção, repressão imediata, repressão qualificada
e assistência às mulheres em situação de violência doméstica
ou familiar. No desenvolvimento do presente trabalho, a fim de
concretizar o atingimento dos objetivos acima elencados, propõem-
se a adoção do método de abordagem dedutivo. Do ponto de vista
dos procedimentos técnicos, a pesquisa se desenvolverá levando
em conta a revisão bibliográfica, jurisprudencial, documental e de
levantamento de dados.
4 CONSIDERAÇÕES FINAIS
A existência de toda uma plêiade protetiva de direitos
humanos das mulheres, em âmbito internacional e na legislação
interna do Brasil, revela antes de mais nada a necessidade de se
garantir uma igualdade material entre homens e mulheres, de modo
a permitir, através de políticas públicas protetivas das mulheres,
essa condição mínima. É somente a partir do reconhecimento dessa
condição de igualdade plena que a violência doméstica poderá ser
aplacada, pois apesar de todos esforços protagonizados pelos atores
da rede de proteção à mulher, bem como das ações estatais que se
revelam nessa seara, sabe-se que a gênese da violência de gênero
contra a mulher está justamente calcada na errônea e absurda noção
de sua inferioridade de gênero.
A despeito de toda a legislação protetiva consubstanciada nos
tratados e convenções internacionais dos quais o Brasil é signatário,
bem como da legislação nacional existente - notadamente a Lei
n. 11.340/06, “Lei Maria da Penha” -, que é uma das legislações
mais avançadas, os dados oficiais de violência contra a mulher
revelam que as políticas públicas situam-se na condição de condutos
necessários para garantir a efetividade das previsões legais.
Ainda, tendo em vista toda a construção histórica e cultural
que coloca o homem em condição de superioridade em relação à
mulher, é importante registrar que esse padrão se reproduziu nas
legislações e mesmo nas construções doutrinárias que servem de
fonte do Direito. O ordenamento jurídico brasileiro adota tradição
jurídica da civil law, que possui como fonte principal do Direito as
diversas leis e codificações, a partir do texto constitucional, onde
a doutrina exerce um papel de relevância, enquanto mecanismo
de interpretação da legislação. Porém, vivemos sob a égide de
162
NOTAS
REFERÊNCIAS
1 INTRODUÇÃO
Na forma tradicional de tratamento dos conflitos,3 os
cidadãos buscam pelo acesso ao sistema jurisdicional, encontrar
justia para seus problemas. Esse modelo se caracteriza por ser
forma heterocompositiva, ou seja, quando um terceiro – Estado – é
chamado para atender e resolver a disputa. O poder judiciário se
encontra com suas vias esgotadas, devido à grande demanda de
litígios que lhe são submetidas, causando a morosidade processual e
gerando sua ineficiência, o que é consequência da crise na jurisdição.
Para tanto, na tentativa de auxiliar o Estado criam-se os
meios autocompositivos de tratamento de conflitos como solução
a esse problema. Essa forma se caracteriza por ter como base o
consentimento espontâneo na resolução do conflito - de uma das
partes ou de ambas-, sem existir a participação de um terceiro com
poder decisório para definir a situação conflitiva. Nesse caso, a
autocomposição entende que os litígios devam ser tratados a partir
da aproximação dos envolvidos, da comunicação, do diálogo direto
e pessoal, sem necessidade dos formalismos que a lei/norma jurídica
impõe.
Desse modo, o legislador brasileiro implementa os meios
alternativos de solução de conflitos, que usam do consenso para o
tratamento da lide, identificando-os como: conciliação, mediação e
arbitragem, a tríade básica opcional à tradicional jurisdição estatal.
Destacando-se o meio autocompositivo da mediação, como tema
principal da pesquisa, cumpre dizer que esse iniciou com seus
primeiros passos, sendo institucionalizado, primeiramente, pela
Resolução nº 125/2010 do Conselho Nacional de Justiça (CNJ).
167
5 CONCLUSÃO
Em suma, é notável que os conflitos, embora inerentes à
condição humana, podem ser vistos como oportunidade, quando
compreendidos, na medida em que propagam a transformação
social. Já a questão da violência, rompe com as normas e regras do
jogo, tornando o seu ato ilegal. Desse modo, a busca por solucionar
problemas de forma mais adequada, ou ao menos, prevenir que
outros aconteçam, traz o uso de práticas como o da mediação para
atender a este fim.
Com isso, vê-se a mediação como forma autocompositiva de
administrar conflitos de maneira mais eficaz, porquanto a vontade
de entabular um acordo ou de ao menos tentar começar pelas
181
NOTAS
1
Mestranda em Direito junto ao Programa de Pós-Graduação UNISC, com bol-
sa BIPPS Edital 02/2019, na linha de pesquisa de Políticas Públicas de Inclu-
são Social. Integrante do grupo de pesquisa denominado Políticas Públicas
no Tratamento de Conflitos, vinculado ao CNPq e liderado pela Professora
Pós-Drª Fabiana Marion Spengler, com vice-liderança do Prof. Ms Theobal-
do Spengler Neto. Mediadora voluntária de família no Projeto de Extensão
da UNISC denominado: “A crise da jurisdição e a cultura da paz: a mediação
como meio democrático, autônomo e consensuado de tratar conflitos” desen-
volvido junto a Defensoria Pública de Santa Cruz do Sul. Pós Graduada em
Direito de Família e Sucessões pela Fundação Escola Superior do Ministério
Público (FMP/RS). Bacharela em Direito pela Pontifícia Universidade Cató-
lica do Rio Grande do Sul (PUCRS). E-mail: [email protected]
Bolsista de Produtividade em Pesquisa (PQ2) do CNPq. Possui graduação
2
com bolsa CAPES e pós-doutora pela Universidade degli Studi di Roma Tre
(2011) com bolsa do CNPq. Atualmente é professora adjunta da Universida-
de de Santa Cruz do Sul lecionando na graduação as disciplinas de Direito
Civil - Família, Processo Civil I, Mediação e Arbitragem, e na pós graduação
junto ao Programa de Mestrado e de Doutorado em Direito as disciplinas de
“Políticas Públicas no Tratamento de Conflitos” e “Políticas Públicas para
uma nova jurisdição”. Publicou diversos livros e artigos científicos. Desen-
volveu atividades de consultora junto ao Programa das Nações Unidas para
o Desenvolvimento - PNUD -, no âmbito do projeto BRA/05/036 executado
pela Secretaria de Reforma do Judiciário ligada ao Ministério da Justiça. É
líder do grupo de pesquisa “Políticas Públicas no Tratamento dos conflitos”
certificado pelo CNPQ. Líder da Rede de Pesquisa em Direitos Humanos
e Políticas Públicas (ReDiHPP) (site: http://bit.ly/1LePnPi ). É integrante
do grupo de pesquisa internacional “Dimensions of Human Rights” (http://
www.ijp.upt.pt/page.php?p=298), mantido pelo Instituto Jurídico Portuca-
lense (IJP). É integrante da Comissão de mediação e Práticas Restaurativas
da OAB de Santa Cruz do Sul. Recebeu Menção Honrosa no Prêmio Capes
de Teses 2008. Recebeu o primeiro lugar no Prêmio SINEPE/RS 2010 na
categoria Responsabilidade Social pelo projeto de extensão em Mediação
(UNISC). Foi vencedora no X Prêmio Conciliar é Legal, promovido pelo
CNJ, na Categoria Ensino Superior, também com o projeto de Extensão em
Mediação (UNISC). É mediadora. Email: [email protected]
“O conflito é a exceção e ocorre quando o almejado equilíbrio social não é
3
REFERÊNCIAS
em: https://www.unisc.br/pt/home/editora/e-books?id_livro=336 .
Acesso em: 04 ago. 2020.
ZAPPAROLLI, Célia Regina. A experiência pacificadora da
mediação: uma alternativa contemporânea para implementação
da cidadania e da justiça. In: MUSZKAT, Malvida Ester (coord.).
Mediação de conflitos: pacificando e prevenindo a violência. São
Paulo: Summus, 2003.
O PROJETO “ESCUTATÓRIA”: EFETIVIDADE
AO PRINCÍPIO DA DIGNIDADE DA PESSOA
HUMANA ÀS VÍTIMAS DE VIOLÊNCIA
DOMÉSTICA
1 CONSIDERAÇÕES INICIAIS
A constatação da historiadora Mary Del Priore (2019) de
que, na medida em que a população feminina foi reivindicando
a ampliação dos seus horizontes, para além da casa e da família,
foram se multiplicando situações de violência contra a mulher, que,
ainda hoje, se mantém irrefutável. Ao descrever como era a vida na
década de 1980, a autora aponta: “fumar, usar biquini e ver Malu
Mulher, naqueles tempos, podia acabar em morte” (DEL PRIORE,
2019, p. 393).
Um dos crimes de maior repercussão no cenário nacional, de
violência contra a mulher, aconteceu em um reduto de mansões de
luxo do Rio de Janeiro, na Praia dos Ossos, em Búzios. Num final
de tarde de dezembro, o paulista Doca Street matou, com três tiros
no rosto e um na nuca, a mineira Ângela Diniz:
gosta de ‘assuntar’
3. Ouvido terra: forma de escuta baseada no corpo e na
receptividade global, mais tátil e concreta do que a que se
pratica com os ouvidos. Percebe o ambiente com ênfase em
suas pequenas diferenças.
4. Ouvido água: é a escuta dos pescadores de afetos,
emoções e sentimentos. Ela flui como a água, ora formando
cascatas, ora em corredeiras intensas, ou ainda em vagarosa
morosidade e até mesmo formando lagoas ou poças
pantanosas.
5. Ouvido ar: é a escuta reflexiva ou filosófica, que nós
entendemos como demais curadores da alma. Disposta
a acolher aquilo que é mais reflexivo ou argumentativo
construindo cenários e futuros possíveis assim com histórias
imprevistas.
6. Ouvido fogo: é a escuta intuitiva ligada às narrativas
imagéticas. É uma forma de escuta que convida para a
ação, para a decisão, assim como para a solidariedade e
comunidade entre as pessoas em torno de uma história
ou de um sentido comum. Ela se faz valer de paisagens e
cenários sonoros que aguçam a curiosidade em busca das
possibilidades escondidas de uma determinada situação ou
pessoa.
7. Todos os ouvidos integrados: escuta ampla e totalmente
integrada, acessada por poucos, envolve coordenar os
sucessivos movimentos cooperativos e competitivos, em um
esforço simultâneo de acolher e transformar a situação pela
ação conjunta dos participantes. (DUNKER, 2019 p. 165).
4 CONCLUSÃO
A violência contra a mulher é endêmica, desafiadora e
complexa. As deficiências de implementação da Lei Maria da Penha,
na sua plenitude, em especial no que diz respeito ao tratamento
diferenciado que o tema merece, no Poder Judiciário, restou
evidenciado a partir da análise do relatório Justiça em Números do
Conselho Nacional de Justiça, edição 2019. O mesmo registra que, até
dezembro de 2018, das 9.627 unidades judiciárias do juízo estadual,
apenas 131 haviam sido instaladas para atender, exclusivamente,
aos procedimentos relativos à violência doméstica. Ou seja, há uma
evidente escassez de juizados da violência doméstica no Brasil.
Isso significa que a maior parte dos feitos, que envolvem o tema,
tramitam em juízos que não dispõem da estrutura mínima prevista
em lei para atendimentos das vítimas de violência doméstica. A falta
de estrutura vai da ausência de espaços físicos a total inexistência
de equipes técnicas qualificadas, capazes de elaborar estudos que
podem subsidiar decisões judiciais nos expedientes instaurados em
razão da Lei Maria da Penha.
Por outro lado, o Centro Judiciário de Solução de Conflitos
e Cidadania de Santa Cruz do Sul vem se consolidando enquanto
207
NOTAS
judiciárias nacionais.
Art. 14. Os Juizados de Violência Doméstica e Familiar contra a Mulher,
5
REFERÊNCIAS
1 CONSIDERAÇÕES INICIAIS
A discriminação e a violência praticada contra as mulheres
acontecem em todo o mundo, sem distinção de classe social, cor,
religião, etc. Assim, existe a necessidade dessa discussão na atual
conjuntura brasileira.
A Lei Maria da Penha (Lei nº 11.340/06) cumpre o respeitável
papel de afirmação dos direitos humanos, em atendimento a todas
as formas de discriminação contra a mulher, voltadas à prevenção, à
punição e à erradicação da violência doméstica.
Importa destacar que a Constituição Federal/88 determina a
criação de mecanismos para coibir esse tipo de crime no âmbito
das relações familiares, em favor dos preceitos fundamentais da
dignidade da pessoa humana e da igualdade.
Diversos dispositivos foram contemplados na nossa Carta
Magna no que tange ao princípio da igualdade entre homens e
mulheres em todos os campos da vida social (art. 5º, I), na vida
conjugal (art. 226, inciso 5º) e, ainda, a inserção do art. 226, inciso
8º, em que o Estado se compromete com as situação referente à
violência contra as mulheres.
A Lei Maria da Penha consagra um novo microssistema
jurídico de democratização do acesso à justiça e abordagem
sistêmica do problema, por meio de políticas públicas afirmativas
de prevenção e de mediação dos conflitos.
Não obstante de todos os avanços, da equiparação entre o
homem e a mulher realizada pela nossa Constituição Federal de
1988, a ideologia patriarcal ainda subsiste a todas essas conquistas.
A desigualdade sociocultural é uma das razões da discriminação
feminina e, especialmente, de sua dominação pelos homens que se
consideram como sendo seres superiores e mais fortes.
212
4 CONSIDERAÇÕES FINAIS
A conquista pelos direitos das mulheres teve uma grande
evolução, todavia, ainda há muito para avançar. Importante destacar
que o ideal das mulheres não é tirar o espaço do homem na sociedade,
mas alcançar o seu próprio espaço.
Desse modo, o tema abordado é de extrema relevância social,
pois a realidade evidencia que a mulher de nossos dias, de regra
emancipada em diversas situações, não é reconhecida como sujeito,
apesar da sua luta por reconhecimento. Percebe-se que a dominação
masculina ainda persevera em diversos casos.
Com a criação da Lei 11.340/06, houve uma maior proteção
aos direitos das mulheres em situação de violência familiar e
doméstica, a qual elenca as mais diversas formas de violências
que podem ser praticadas contra elas, exclusivamente, no âmbito
doméstico e familiar.
Contudo, a lei também responsabilizou o Estado na
implantação de medidas que devem auxiliar as vítimas de violência
doméstica e familiar, para, assim, pôr em prática as exigências
abstratas descritas na lei. Observa-se que a várias cidades do país
não possuem locais apropriados para receber e proteger as mulheres,
em delegacias especializadas, conforme prescreve a lei.
Com o surgimento da Lei n. 11.340/06 houve uma maior
conscientização e contribuição para o enfrentamento da violência,
pois ela representa um instrumento jurídico fundamental para que
se possa enfrentar essa situação.
Assim, a Lei Maria da Penha pode ser considerada marco
histórico em relação à luta das mulheres em busca de direitos e
contra a discriminação, bem como contra violência cometidas contra
as mulheres, ou seja, houve um avanço na sociedade com o advento
da referida Lei Maria Penha.
Ademais, a intenção da lei é proteger a mulher vítima de
violência e, além disso, há muito para ser aprimorado, como no
que se refere à disponibilização de programas de prevenção para
as mulheres que se encontram nessas situações, dando maior
efetividade à lei.
227
NOTAS
ambos os sexos. A sua prática é vista como algo natural, fazendo parte da
natureza humana. É uma das primeiras formas de acometimentos agressivos
que colocaram as pessoas em contato direto, das quais, aprenderam outras
condutas violentas. Passou a sociedade a legitimar esses comportamentos e,
atualmente, a violência contra a mulher é um problema em diversas esferas
da sociedade.
No decorrer da história feminista, o gênero começou a ser usado mais se-
7
REFERÊNCIAS
1993.
PESSIS, Anne-Marie; MATÍN, Gabriela. Das origens das
desigualdades de gênero. In: CASTILLO-MARTÍN, Márcia;
OLIVEIRA, Suely de. Marcadas a ferro. Violência contra a
mulher: uma visão multidisciplinar. Local ?: editora ?, 2005.
SABADELL, Ana Lucia. Manual de Sociologia Jurídica:
introdução a uma leitura externa do Direito. 3. ed. São Paulo:
Revista dos Tribunais, 2005.
SICA, Leonardo. Justiça restaurativa e mediação penal. O novo
modelo de Justiça Criminal e de Gestão do Crime. Rio de Janeiro:
Lumen Júris, 2007.
SOUZA, Sérgio Ricardo de. Comentários à Lei de Combate à
Violência contra a Mulher. 2. ed. Curitiba: Juruá Editora, 2008.
TELES, Maria Amélia de Almeida; TELES, Mônica de Mello. O
que é violência contra a mulher. São Paulo: Brasiliense, 2003.
ZEHR, Howard. Trocando as lentes: um novo foco sobre o crime
e a justiça. Tradução de Tônia Van Acker. São Paulo: Palas Athenas,
2008.
VIOLÊNCIA DOMÉSTICA CONTRA A MULHER:
JUSTIFICA-SE A INTERVENÇÃO ESTATAL EM
DISSONÂNCIA COM A VONTADE DA VÍTIMA?
1 INTRODUÇÃO
O fenômeno da violência doméstica, principalmente
contra as mulheres, é complexo e comum a diferentes sociedades,
ainda hoje. As estatísticas reveladas no âmbito nacional e pelos
organismos internacionais são preocupantes sobre o tema que, além
de multifacetado, somente é compreensível à luz de uma perspectiva
interdisciplinar. Mais do que um problema jurídico e criminológico,
apresenta-se como um problema social, econômico e cultural.
A busca por estratégias e medidas de atuação frente à
violência doméstica, e a preocupação em proteger importantes
direitos fundamentais e a dignidade humana das vítimas-mulheres,
têm feito com que Estados de Direito (como Brasil) adotem
posturas paternalistas e protecionistas, olvidando – e muitas vezes
contrariando – a vontade e a própria autonomia dessas vítimas. Tal
contexto estabelece peculiar tensão entre a necessidade de proteção e
o respeito à vontade e à autonomia das vítimas de violência doméstica,
e é daí que emerge a problemática: justifica-se a intervenção estatal
penal nos casos de violência doméstica contra a mulher, mesmo
dissonante de sua vontade? Como desdobramentos: a intervenção
contrária à vontade da vítima pode resultar outra violência? Ou
o acato à vontade da vítima pode implicar complacência com a
violência doméstica? São questões que não geram respostas singelas
e têm projeções dogmáticas interessantes.
Para o tratamento da problemática conformada naquelas
questões, limitada à violência doméstica contra a mulher,
traçaremos considerações sobre a intervenção do Estado em sede de
violência doméstica contra a mulher, começando pela verificação da
234
4 CONCLUSÃO
Sendo certo que o fenômeno – de âmbito mundial – da
violência doméstica contra a mulher é algo complexo, não
surpreende que a solução de um problema que é social, econômico
e cultural não se sintetize na singela responsabilização penal do
agressor. Exatamente por ser multifacetada, com ramificações tanto
jurídicas como criminológicas, a violência doméstica tem de ser
estudada por uma perspectiva interdisciplinar para que se atinja
um bom termo na defesa dos direitos fundamentais e da dignidade
humana das vítimas.
Esse contexto, por si só, revela nosso pensamento de que a
opção paternalista ou protecionista de um Direito penal desatento
à vontade e à autonomia da vítima da violência doméstica não só
é insuficiente para enfrentar efetivamente o problema e proteger
a mulher, como pode gerar a ela outra violência. E é importante
frisar que o desafio em identificar formas de controlar de modo
eficaz o fenômeno não pode ser adiado, seja pelos custos sociais,
econômicos, morais e políticos que traz às sociedades atuais,
seja porque sua perpetuação enseja contínua violação de direitos
fundamentais e da dignidade humana das mulheres.
Como meio inequivocamente profícuo de enfrentamento
da violência doméstica, sobressai-se a intervenção preventiva
primária do Estado, já que, como a denominação sugere, assume
papel eminentemente preventivo. De fato, não ter o problema,
evitado antes de sua concretização, é a melhor forma de combatê-
lo. Logo, a intervenção preventiva primária deve merecer máxima
atenção e investimento. Contudo, sabemos todos – assim informam
as estatísticas – que, diariamente, milhares de situações escapam à
prevenção, materializando-se em eventos de violência doméstica.
Para esses casos resta a intervenção pós-conflitual, com
a atuação do Direito penal, de escopo remediativo ou repressivo
da violência – mas que, pela atuação, acaba também agregando
um componente preventivo. Nesse quadro, ponderamos que,
249
NOTAS
6
A CEDAW foi plenamente aprovada pelo Congresso Nacional, em 1994, e
ratificada pelo Presidente da República (Decreto Legislativo nº 26/1994 e
Decreto nº 4.377/2002). Cf. ANGELIM, p. 23.
7
Na primeira vez, em 29 de maio de 1983, seu parceiro simulou um assalto e
desferiu um tiro contra Maria, deixando-a paraplégica. Dias depois, objeti-
vando consumar seu intento homicida, tentou eletrocutá-la por meio de uma
descarga elétrica, enquanto ela tomava banho. A história completa pode ser
lida na obra publicada pela própria vítima, vide PENHA, 2012.
8
Cf. DIAS, 2012, p. 16.
9
Cf. DIAS, 2012, p. 33.
10
Os dados revelados quando da apresentação do projeto da Lei nº 11.340/2006
eram impactantes: nos 10 anos de implementação dos JECrim, 90% dos ca-
sos eram arquivados ou conduzidos à transação penal; apenas 2% dos acusa-
dos por violência doméstica ou familiar eram condenados; de cada 100 brasi-
leiras assassinadas, 70 eram vítimas no âmbito das suas relações domésticas.
Vide FEGHALI, 2005, p. 18.
11
A Lei nº 9.099/95, conhecida como a Lei dos Juizados Especiais, disciplina,
na área criminal, o processamento e julgamento das infrações de “menor po-
tencial ofensivo”, assim consideradas as contravenções penais e os delitos
cujas penas não excedam dois anos. Dentre os institutos despenalizadores,
estão a transação penal, a suspensão condicional do processo e a composição
civil dos danos, como causas extintivas da punibilidade.
12
Cf. DIAS, 2012, p. 30.
13
Nesse sentido, destacamos a recente Lei Estadual nº 15.484, de 07 de julho de
2020, que, no âmbito do Rio Grande do Sul, Estabelece a promoção de ações
que visem à valorização de mulheres e meninas e a prevenção e combate à
violência contra as mulheres.
14
V. FARO, 2012p. 1; BELEZA, 2008, p. 282.
15
Acerca da prevenção através da intervenção precoce, v. MEDINA ARIZA,
2002, p. 204-205.
16
Dentre essas, a responsabilização na seara civil do agressor, e a ação de di-
vórcio, nos casos de violência doméstica praticada por cônjuge. FERREIRA,
2005, p. 76.
17
O Tribunal Europeu dos Direitos Humanos (TEDH) condenou alguns Esta-
dos vinculados à Convenção Europeia dos Direitos Humanos por não terem
adotado as medidas necessárias a assegurar um adequado nível de proteção
de quem vive em relação íntima com outrem (Ac. Opuz c. Turquia, Processo
nº 33401/02, de 09-06-2009, e arestos aí citados). LEITE, 2010, p. 50.
18
LARRAURI, 2008, p. 96.
252
19
LARRAURI, 2008, p. 97.
20
MUÑOZ CONDE; HASSEMER, 2011, p. 137.
21
Cf. LARRAURI, 2008, p. 102-103.
22
Vide LARRAURI, 2008, p. 103-104.
23
Cf. LARRAURI, 2008, p. 104.
24
LARRAURI, 2008, p. 107. Essa desconsideração também se dava pela Cri-
minologia Positivista, que polarizava a explicação do comportamento cri-
minoso em torno do delinquente, considerando a vítima um objeto neutro e
passivo, que nada fornece à gênese do fato criminal. Cf. GARCIA-PABLOS
DE MOLINA, 2009, p. 108.
25
Cf. GARCIA-PABLOS DE MOLINA, 2009, p. 79; HASSEMER, 1984, p.
92 e ss.
26
Aqui se refere mais especificamente à “Victimologia moderna, interaccio-
nista (Gutotta, Fattah, Beristáin, etc.), impulsionada por el movimiento inter-
nacional en favor de las víctimas y de los derechos humanos.” HASSEMER,
op. cit., p. 92. Para estudo aprofundado, vide HERRERA MORENO, 1996.
27
Cf. SANGRADOR apud GARCIA-PABLOS DE MOLINA, 2009, p. 109.
Atualmente, o estudo da vítima está recuperando o interesse que merece,
quer por parte da Criminologia, do sistema legal, da Política Criminal e da
Psicologia Social. Para estudo dos fatores que explicam esse fenômeno, vide
GARCIA-PABLOS DE MOLINA, 2009, p. 109-115.
28
Cf. LARRAURI, 2008, p. 117.
29
LARRAURI, 2008, p. 181.
30
Nesses casos, o sistema penal deve atentar para a realidade distinta das mu-
lheres com filhos, buscando dar respostas que diminuam os custos pessoais e
econômicos da separação, de modo a ajudá-las a se libertarem da situação de
violência a que estão submetidas. LARRAURI, 2008, p. 130-132.
31
Cf. FORD apud LARRAURI, 2008, p. 179.
32
Acerca da intervenção estatal contrária à vontade da(s) vítima(s), importa
referir os casos de Magatte Gueye e Valentín Salmerón Sánchez (Processos
apensos C-483/09 e C-1/10), v. Espanha. Submetidos os casos à apreciação
do Tribunal de Justiça de la Unión Europea, este declarou que os artigos
2.°, 3.° e 8.° da Decisão Quadro 2001/220/JAI do Conselho, de 15/03/2001,
relativa ao estatuto da vítima em processo penal, devem ser interpretados no
sentido de que não se opõem a que uma sanção obrigatória de afastamento
com uma duração mínima, prevista pelo direito penal de um Estado Membro
a título de pena acessória, seja pronunciada contra os autores de violências
cometidas no seio da família, mesmo que as vítimas dessas violências con-
testem a aplicação de tal sanção. Disponível em: http://eur-lex.europa.eu/
253
LexUriServ/LexUriServ.do?uri=CELEX: 62009CJ0483:PT:NOT.
33
Cf. LARRAURI, 2008, p. 168.
34
Cf. LARRAURI, 2008, p. 168.
35
Para estudo mais aprofundado, vide BEST, 1999.
36
Cf. LARRAURI, 2008, p. 170-171.
37
Não é incomum que a expansão do Direito penal se apresente como uma es-
pécie de perversidade do aparato estatal, que buscaria no permanente recurso
a legislação penal uma (aparente) solução fácil aos problemas sociais, deslo-
cando ao plano simbólico o que deveria se resolver em nível instrumental, ou
seja, de proteção efetiva. Cf. SILVA SÁNCHEZ, 2011, p. 6-7.
38
Cf. LARRAURI, 2008, p. 171-172.
39
LARRAURI, 2008, p. 173-174.
40
Cf. MEDINA ARIZA, 2002, p. 75.
41
Essa discussão estabeleceu-se na Espanha - Cf. LARRAURI, 2008, p. 174; e
no Brasil, em relação ao crime de lesões corporais leves, sendo que o Supre-
mo Tribunal Federal entendeu que é público, ao julgar, em 2012, a Ação Di-
reta de Constitucionalidade 19-3/610 e Ação Direta de Inconstitucionalidade
4.424, 08-12-12, relator Ministro Marco Aurélio. DIAS, 2012, p. 88.
42
Esses argumentos são elencados por CORSILLES, p. 853-881, ao analisar a
adoção das denominadas no drop policies, as quais abarcam diversas políti-
cas jurisdicionais, que variam nos diferentes Estados americanos, mas visam
impedir que as mulheres-vítimas retirem as acusações depois de ter apresen-
tado a denúncia.
43
ARMERO apud LARRAURI, 2008, p. 177.
44
Cf. LARRAURI, 2008, p. 167-198; MEDINA ARIZA, 2002, p. 533-534.
45
LARRAURI, 2008, p. 179-180.
46
NEVES, 2010, p. 5.
47
Nesse sentido é o entendimento de LARRAURI, 2008, p. 181.
48
LARRAURI, 2008, p. 182-183.
49
Cf. HANNA, 1996, p. 1901-1905.
50
Cf. GONDOLF, 2002, p. 175-176.
51
LARRAURI, 2008, p. 184.
52
LARRAURI, 2008, p. 97-98.
254
REFERÊNCIAS
dados que revelaram que uma em cada três mulheres foi vítima
de violência doméstica, como também obrigada a manter relações
sexuais ou submetida a outros tipos de violência.
A violência, em suas mais variadas formas de manifestação,
afeta a saúde e a vida. Também produz enfermidades, danos
psicológicos e pode provocar a morte. Tem como objetivo causar
dano a um organismo vivo, ou seja, é qualquer comportamento que
tem como objetivo o de causar dano a outrem.
Especificamente à violência contra a mulher e à violência
doméstica, há uma explicação suplementar para a sua grande
ocorrência no Brasil. Ela não está ligada somente à lógica da
pobreza, ou desigualdade social e cultural. Também está ligada
diretamente ao preconceito, à discriminação e ao abuso de poder
que possui o agressor com relação à sua vítima. A mulher, em razão
de suas peculiaridades, compleição física, idade, e dependência
econômica, está numa situação de vulnerabilidade na relação social
(LINTZ, 1987, p. 27,34,35).
Devido à relação de poder e à dominação que existe no
relacionamento afetivo, geralmente o agressor detém, em relação à
mulher que ele agride, a força física e o poder econômico, passando
a manipulá-la, violá-la e agredi-la psicologicamente, moralmente e
fisicamente.
A violência praticada contra a mulher possui aspectos
históricos determinados pela cultura machista que considera a
mulher como uma propriedade do homem, e que ocorre até nos dias
de hoje, mesmo diante de muitos avanços com relação a direitos das
mulheres, produzindo inúmeros danos em suas vítimas, consoante
abordado.
Percebe-se que, culturalmente, a formação da mulher
está atrelada à adoção de uma postura coadjuvante, e, por vezes,
inferiorizada, e que a gênese do homem, ao contrário, suscita
a superioridade. Assim, a formação dos indivíduos envolvidos
nesses conceitos negativos é influenciada pelo comportamento
discriminatório em relação ao gênero e dificulta a promoção da
igualdade pretendida como elemento intrínseco da dignidade da
pessoa humana. Ao tratar da desigualdade, Catless (1999) afirma
260
5 CONCLUSÕES
A violência doméstica e familiar contra a mulher é fruto de
uma construção histórica, enraizada em nossa sociedade e justificada
pela superioridade na força física masculina e na fragilidade da
mulher. Tal conduta, na realidade, é fruto das sociedades patriarcais,
responsáveis por estabelecerem uma relação de dominação-
subordinação entre homens e mulheres, fazendo, assim, com que a
desigualdade de gênero seja um dos eixos estruturais da sociedade.
Nesse seguimento, tem-se que a luta pelo reconhecimento
de direitos, embora necessário, não é suficiente para romper a
estrutura social da violência. As conquistas de direitos, por outro
272
REFERÊNCIAS
NOTAS
REFERÊNCIAS
Rafael Souza1
Alba Regina Zacharias2
1 CONSIDERAÇÕES INICIAIS
Não é de hoje que a violência contra a mulher está presente
no contexto familiar, silenciosa, carregada de medo, vergonha
e insegurança. Para Silva; Almeida (2018) e Bonetti; Pinheiro
e Ferreira (2008), ambientes como esses aliados a um contexto
de vulnerabilidade social e o baixo desenvolvimento intelectual
colocam em risco a vida da mulher que muitas vezes é obrigada a
conviver com as agressões, sejam elas físicas, psicológicas, sexuais,
etc., por questões financeiras, afetivas e ou emocionais.
Segundo os autores, fatores como esses asseguram a
dificuldade do rompimento da relação agressiva, assim como a busca
por auxílio uma vez que, geralmente o agressor é o companheiro
com quem constituiu família. Nesse sentido, Cisne e Oliveira
(2017) caracterizam a prática de violência contra mulher como ato
de violação sistemática de direitos, que não se limita ao ambiente
doméstico, pois afeta a integridade física, social e emocional da
mesma.
No Brasil é utilizado o caso da Sra. Maria da Penha Fernandes
para representar a gravidade das agressões e consequências oriundas
dessas práticas, pois após sofrer duas tentativas de homicídio pelo
marido, ficou paraplégica. Uma das primeiras pesquisas realizadas
no Brasil, apresentada por Venturi e Recamán (2004), revelou
que 43% das mulheres já sofreram com algum tipo de violência
doméstica, em que 70% dos casos o companheiro, ex-companheiro
ou namorado são os responsáveis.
Na pesquisa realizada por Almeida (2018) é apresentado um
crescimento de 47% dos casos de violência doméstica contra mulher
296
6 MÉTODO E RESULTADOS
Este artigo trata de uma revisão integrativa de leitura a
partir de estudos qualitativos, retrospectivos, realizados com o
levantamento das produções científicas publicadas no período
de janeiro de 2015 a junho de 2019 nas bases de dados Google
acadêmico, Biblioteca Virtual em Saúde (BVS) e Portal de Periódicos
CAPES, as quais frequentemente indexam produções científicas
brasileiras. Uma revisão integrativa, além de proporcionar uma
síntese do conhecimento, incorpora a aplicabilidade de resultados
de estudos significativos na prática. Determina o conhecimento
atual sobre um tema específico através da identificação, análise e
sistematização dos resultados de diversos estudos sobre o mesmo
302
7 DISCUSSÃO
O fenômeno de violência contra mulher no contexto
doméstico é uma das principais formas de violação dos direitos
humanos, além de uma realidade problemática enfrentada pela
mulher na atualidade (SOUZA, SANTANA; MARTINS, 2018).
Frente a isso, o presente estudo teve como objetivo, realizar uma
análise das publicações nacionais sobre as Políticas Públicas / rede
de enfretamento e assistência às mulheres vítimas de agressões
doméstica existentes no país, no período de janeiro de 2015 a
junho de 2019.
Para discussão dos resultados, serão utilizados como
categorias de análise os objetivos específicos deste estudo. Dessa
304
8 CONSIDERAÇÕES FINAIS
Os estudos assinalam a criação de diversos dispositivos
voltados às mulheres vítimas de violência intrafamiliar, além da Lei
Maria da Penha, a qual representa um marco na luta contra a violência
de gênero, estabelecendo dispositivos protetivos de urgência e de
assistência à mulher, que deveriam punir com severidade o agressor.
Observou-se que a Lei, assim como os locais disponíveis quando
bem estruturados, promovem à vítima segurança e proteção. Mas,
devido à escassez de recursos humanos e financeiros faz com que
esses serviços não sejam efetivos da forma como deveriam ser.
Desse modo, ressalta-se a necessidade de um olhar mais
atento por parte dos órgãos públicos para a efetividade das políticas,
bem como suas adequações de acordo com o contexto no qual está
inserida, de modo que possa atender às solicitações da vítima de
maneira efetiva, mantendo e garantindo a segurança da mesma,
assim como do profissional da rede. Observou-se também a
necessidade de uma comunicação fluída entre as instituições que
compõem a rede de enfrentamento à violência contra mulher, assim
como a necessidade de um trabalho interprofissional e setorial.
É válido ressaltar, a necessidade de um olhar atento também
dos pesquisadores no tocante à produção de discussões voltadas
para a agressão intrafamiliar contra a mulher, pois as pesquisas
contribuem de diversas formas, tanto para a divulgação da gravidade
do tema em questão, quanto para a produção de estratégias que
visem coibir qualquer forma de violência no âmbito familiar, a qual
apresenta crescimento substancial, independente da classe social.
Espera-se que os resultados desta pesquisa contribuam para uma
reflexão sobre ações desenvolvidas para o combate à violência
contra a mulher, e possam refletir em melhorias na implantação de
estratégias para o enfrentamento das práticas de violência contra
311
NOTAS
REFERÊNCIAS
1 CONSIDERAÇÕES INICIAIS
Tendo em vista o fato de que a violência contra as mulheres
é um problema de grandes dimensões no Brasil, o que o colocou, no
ano de 2015, na lastimável 5º posição, no mundo, em um grupo de
83 países com dados homogêneos (WAISELFISZ, 2015), é urgente
que se promova reflexões sérias e críticas a respeito de como o
tema é tratado em nossa sociedade. Esse é o objetivo principal do
presente estudo, que se dedica a realizar uma análise da violência
contra a mulher baseada em reflexões teórico-críticas e também em
realidades práticas dessa questão na rede de atendimento à mulher,
especialmente no âmbito da saúde pública.
O problema que orienta o estudo pode ser assim formulado:
levando em consideração os altos índices de violência contra as
mulheres no Brasil, e, em particular, o aumento vertiginoso dos
casos paralelamente ao período em que o país enfrenta uma grave
crise de saúde em razão da pandemia do novo coronavírus, esse
é um problema enfrentado, de fato, como uma questão de saúde
pública no Brasil? Como hipótese inicial tem-se que, embora haja
uma verdadeira “epidemia” de violência contra as mulheres, essa
não é uma questão tratada com a seriedade que exige, não apenas em
função de questões práticas, mas, sim, em virtude de profundas – e
estruturais – construções culturais diferenciais nas relações sociais,
que aprisionam milhares de mulheres em situações de violência e
opressão, em um cenário em que a violência doméstica ainda não
foi assumida como um problema não apenas de saúde pública, mas
político, concernente, portanto, à sociedade como um todo.
320
voz das mulheres que foi silenciada nesse processo, de modo que a
história da psiquiatria é, na verdade, uma história dos discursos dos
psiquiatras homens sobre mulheres loucas.
Outro acontecimento histórico que deve ser destacado a fim
de se atentar ao fato de como o corpo da mulher sempre foi objeto
de controle e crueldade é o fenômeno da caça às bruxas, objeto
de amplo estudo realizado por Silvia Federici (2004), cujo ápice
se deu entre os anos de 1580 e 1630 (RODRIGUES; ARAÚJO,
2019). Conforme observa Federici (2004, p. 337-338), a caça às
bruxas foi um fato histórico e político marcado por uma verdadeira
guerra contra as mulheres, em uma “tentativa coordenada de
degradá-las, demonizá-las e destruir seu poder social”, uma vez
que foi “precisamente nas câmaras de tortura e nas fogueiras, nas
quais as bruxas morreram, onde se forjaram os ideais burgueses
de feminilidade e domesticidade”. Esse poder social constituía-se
justamente no fato de que a bruxaria se tratava de um “movimento
social e político de mulheres, voltado para a construção de um modo
de vida e de produção de saber próprios e não mais submisso ao
patriarcado” (RODRIGUES; ARAÚJO, 2019, p. 499).
Essas análises remetem à existência de um controle muito
específico – e longevo – dirigido aos corpos e às subjetividades
das mulheres. Nesse ponto, conforme anteriormente mencionado,
investigar esse campo em uma abordagem inicial a partir de um
marco teórico biopolítico e que se entrelace com os estudos de
gênero parece trazer importantes contribuições ao debate. Tomando
como ponto de partida o entendimento de Foucault (2005) a respeito
da biopolítica, tem-se que se trata de uma nova tecnologia de poder
surgida a partir de meados do século XVIII, por meio da qual há
uma mudança no exercício do poder soberano: “Pode-se dizer que
o velho direito de causar a morte ou deixar viver foi substituído
por um poder de causar a vida ou devolver à morte” (FOUCAULT,
2005b, p. 130).
Ocorre que esse deslocamento não gera uma diminuição,
mas sim um aumento da violência. O paradoxo dessa questão é
explicado pelo racismo, que passa a ser incorporado como condição
para que se exerça o direito de matar, já que é ele que permite que
se faça uma cesura no corpo da população, estabelecendo as raças
323
como boas ou más, e, a partir disso, que se atue sobre (ou que se
“deixe morrer”) a raça inferior. A esse funcionamento do Estado que
necessita do racismo, Maiquel Wermuth e Joice Nielsson (2016, p.
10) acrescentam um outro mecanismo: o sexismo, pois é a partir do
sexo que, da mesma forma, uma sociedade patriarcal estabelece a
“hierarquização das vidas humanas a partir de diferenças biológicas”.
Posteriormente a Foucault, Giorgio Agamben veio a
aprofundar o tema, agregando novos elementos à análise biopolítica
inaugurada pelo primeiro. Acontece que essa forma de poder coloca
em jogo uma vida biológica, à qual Agamben (2002) chama de vida
nua: uma vida fendida, separada da bíos, que, para os gregos, era a
vida qualificada, em contraposição à zoé, vida comum a todos os
seres viventes cujo lócus é o oîkos (a casa), e não a pólis (cidade).
O problema da vida nua é que ela é uma vida matável, cujo símbolo
é o homo sacer, emblemática figura recuperada por Agamben do
direito romano arcaico, que era o ser duplamente excluído: tanto do
direito humano, pois poderia ser morto impunemente por qualquer
pessoa, quanto do direito divino, pois já não poderia ser sacrificado
na forma dos rituais. Nesse contexto, o âmbito de realização máxima
da biopolítica e da produção de vida nua é o campo (paradigma
formulado a partir da análise dos campos de concentração criados no
nazismo), local onde a exceção pode ser realizada de forma estável,
onde tudo se torna possível, eis que a lei é integralmente suspendida
(AGAMBEN, 2002).
Se essas proposições, descritas em breve síntese, colocam em
pauta a problemática justamente da inscrição da vida – “biológica”,
em Foucault, e “vida nua”, em Agamben – nos cálculos do poder
soberano, tensionando, com isso, diversos mecanismos em curso
na sociedade atual,6 realizar essa análise permeada por questões de
gênero é importantíssimo para aprofundar a reflexão. Isso pois tanto
Foucault quanto Agamben não adentraram nesse viés, no entanto
suas pesquisas têm sido apropriadas como categorias analíticas para
o estudo das profundas opressões e violências de gênero que são
características de diversas sociedades, dentre elas a brasileira.
Nesse sentido, os estudos de Michele Perrot (2015, p.
76) em “Minha História de Mulheres” exemplificam a possível
aproximação entre teorias de Foucault e de gênero, pois a autora
324
4
DEMONSTRAÇÕES ACERCA DA REDE DE
PROTEÇÃO ÀS MULHERES EM SITUAÇÃO DE
VIOLÊNCIA
Apesar de considerada um problema de saúde pública e
presente em políticas e legislações brasileiras, a violência contra
as mulheres segue sendo um grave problema no Brasil, conforme
se verificou. Sendo assim, o presente momento dedica-se a analisar
algumas pesquisas que trataram da violência contra as mulheres
especialmente na perspectiva da saúde. Segundo explica Carmen
Hein de Campos (2016), embora a Lei Maria da Penha tenha operado
uma profunda ruptura paradigmática no Brasil, de tal forma que ela
está amplamente presente no imaginário social atual, é necessário
ainda uma segunda ruptura paradigmática, voltada menos ao sistema
de justiça criminal e mais para a perspectiva integral – que é a soma
de prevenção, assistência e contenção –, a qual já está prevista na
própria Lei Maria da Penha.
Acontece que a violência é complexa e assim também são suas
consequências, de forma que é impossível que o sistema de justiça
criminal responda adequadamente às necessidades das mulheres
(CAMPOS, 2016). Essa percepção parece já ter sido incorporada
nos documentos que tratam do assunto: o Pacto Nacional de
Enfrentamento à Violência Contra a Mulher (2011), por exemplo,
lançado em 2007 e reavaliado em 2011, prevê expressamente a
necessidade de ampliar a fortalecer a rede de serviços para a mulher,
além de políticas integradas entre todos os entes federativos. No
entanto, a realidade prática não reflete as previsões. Campos
(2016, p. 8) assinala, por exemplo, a desarticulação entre a Política
333
5 CONSIDERAÇÕES FINAIS
O percurso realizado no presente estudo visou realizar uma
abordagem, ainda que parcial, tendo em vista sua amplitude, que
desse conta de olhar para alguns aspectos envolvidos no tema da
violência contra as mulheres no Brasil. A reflexão teórica mostra-
se necessária, já que a partir dos estudos de gênero, aliados à
perspectiva biopolítica, é possível realizar abordagem profunda que
dê conta de suscitar uma análise crítica dos modos como a sociedade
se organiza em suas relações sociais. Por outro lado, examinar
como o problema constatado é manejado, na realidade prática, é
outro aspecto relevante para que se possa desvendar que medidas
mostram-se necessárias e adequadas para um melhor enfrentamento
da violência contra as mulheres.
Se é certo que as relações desiguais de gênero estabelecem
relações de opressão e violência interpessoal, as quais exigem, no
âmbito prático, uma ressiginificação coletiva dessas ideias de gênero
e mesmo que se pense em uma nova sociabilidade, pautada na justiça
social, o que é necessário problematizar, e que se buscou realizar
nesse texto, é a dimensão pública da violência contra a mulher. Ou
seja, não se trata, nesse viés, apenas de dizer quem é o agressor e de
como deve ser punido ou de que meios alternativos se pode lançar
mão a fim de produzir atitudes diferenciadas, mas, sim, apontar para
fato de que a violência contra a mulher é um problema crônico, não
individual, mas incutido nas relações de gênero da nossa sociedade.
Daí o questionamento, realizado na abertura deste estudo, e
a hipótese inicial que supunha uma “epidemia” de violência contra
a mulher, no Brasil. Em um momento histórico em que a pandemia
do novo coronavírus suscitou em diversos lugares do mundo graves
crises de saúde pública e colapso dos sistemas de saúde, é urgente
também encarar de fato o problema da violência contra a mulher
um problema de saúde pública. Diz-se encarar “de fato” pois,
conforme se viu, esse já é um problema reconhecido como de saúde
pública, contudo, no Brasil, ele parece ser invisibilizado. Não nos
instrumentos formais, mas na realidade prática – leia-se, na “vida
real” – de milhares de mulheres. Esse não é um aspecto irrelevante,
pelo contrário: as pesquisas em gênero, aliadas a uma perspectiva
biopolítica, demonstram uma racionalidade perversa agindo sobre
337
NOTAS
REFERÊNCIAS
Editora, 2015.
ALBUQUERQUE NETTO, Leônidas de et al. As redes sociais de
apoio às mulheres em situação de violência pelo parceiro íntimo.
Texto contexto – enferm., Florianópolis, v. 26, n. 2, 2017, p. 01-11.
Disponível em:https://www.scielo.br/pdf/tce/v26n2/pt_0104-0707-
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ARBOIT, Jaqueline et al. Violência doméstica contra mulheres
rurais: práticas de cuidado desenvolvidas por agentes comunitários
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ARENDT, Hannah. Sobre a violência. 7. ed. Rio de Janeiro:
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BANDEIRA, Lourdes Maria. Violência de gênero: a construção de
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ver local, v. 29, n. 2, maio/ago. 2014, p. 449-469. Disponível em:
https://www.scielo.br/pdf/se/v29n2/08.pdf. Acesso em: 22 jun.
2020.
BECCON, Janaina Matheus Collar; MATOS, Izabella Barison. O
que revela a produção científica da saúde coletiva, após dez anos da
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BIROLI, Flavia; MIGUEL, Luiz Felipe. Gênero, raça, classe:
opressões cruzadas e convergências na reprodução das
desigualdades. Mediações, Londrina, v. 20, n. 2, p. 27-55, jul./dez.
2015. Disponível em: http://www.uel.br/revistas/uel/index.php/
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BIROLI, Flávia. O público e o privado. In: BIROLI, Flávia;
MIGUEL, Luis Felipe. Feminismo e política: uma introdução. São
Paulo: Boitempo, 2014.
BRASIL, Decreto nº 1.973, de 1º de agosto de 1996. Disponível em:
planalto.gov.br/ccivil_03/decreto/1996/D1973.htm. Acesso em: 25
jun. 2020.
340
1 INTRODUÇÃO
O presente artigo abordará alguns aspectos históricos e
culturais sobre o surgimento da violência doméstica e familiar
contra a mulher, ressaltando a sua incidência durante a pandemia
da Covid 19 que o Brasil enfrenta. A violência de gênero, a qual
está intimamente ligada à violência contra a mulher, é resultado de
um processo construído ao longo da história, enraizado em nossa
sociedade desde os primórdios dos tempos.
A nossa sociedade historicamente é formada sob bases de
conceitos e cultura patriarcal, onde o papel do homem e os valores
masculinos predominavam e se sobrepunham aos da mulher. A
violência surge como materialização dessa forma de constituição da
sociedade, que, por mais que tenha melhorado ao longo dos anos,
ainda nos dias atuais conserva um viés que coloca o masculino em
destaque, razão pela qual a violência contra a mulher ainda se faz
muito presente.
Enfaticamente e, principalmente, o presente trabalho discorre
a posterior sobre o tema da violência doméstica e familiar contra
a mulher no contexto do momento atual, durante a pandemia
de Covid-19 que estamos vivendo em nível nacional e mundial.
Segundo os dados oficiais e as estatísticas, as taxas de violência e de
feminicídio aumentaram, no Brasil e no mundo, e ascenderam um
alerta sobre o assunto.
Diante dos métodos aconselhados pelas autoridades de saúde
e utilizados para tentar frear a pandemia – quarentena, isolamento,
distanciamento social -, as mulheres se viram “trancadas” em casa
com seus agressores e mais suscetíveis à violência, até por não
terem para onde ir, de modo a ficar convivendo com o agressor. Tal
345
5 CONCLUSÃO
A violência contra a mulher é uma condição enraizada em
nossa sociedade. Em que pese o surgimento da Lei Maria da Penha,
de inúmeras políticas públicas, projetos e iniciativas de combate a
este crime, é algo que certamente jamais será completamente extinto
do meio social.
O escopo do presente artigo foi analisar a violência doméstica
e familiar contra a mulher no momento atual da pandemia do
coronavírus, situação que aumentou o número de casos e agravou a
situação das vítimas.
Esse aumento se explica diante do fato de a mulher precisar
ficar mais tempo em casa nesse período - em razão da quarentena/
distanciamento social - em convivência direta com o agressor. Da
mesma forma, aulas suspensas, filhos dentro de casa, o agressor
muitas vezes sem trabalho, somados a problemas de alcoolismo e
drogadição, são os ingredientes para o aumento desses índices, já
publicizados por órgãos de segurança pública, conforme abordado
no presente capítulo.
Da mesma forma, mostrou-se a importância dos projetos e
iniciativas públicas e privadas – alguns já existentes e outros criados
especialmente para este momento - que, de alguma forma, ajudam
a minimizar os efeitos devastadores da violência doméstica, mas
levam informações, assistência e procuram afastar os agressores das
vítimas e das suas residências.
Foram destaques os projetos de extensão universitária,
especialmente o projeto “Enfrentamento da violência doméstica e
familiar – Direitos e garantias legais da Mulher agredida”, conforme
363
REFERÊNCIAS
1 CONSIDERAÇÕES INICIAIS
Em qualquer lugar do mundo, quando se falava do Brasil,
de imediato fazia-se à associação às praias paradísicas, à técnica
futebolística, às festas carnavalescas, à sonoridade ímpar da bossa-
nova. Contudo, nos últimos anos, o Brasil vem ganhando holofotes
no cenário internacional por fatos bem menos agradáveis a que
as areias de Copacabana, o futebol-arte de Pelé, os desfiles da
Sapucaí ou as notas de Tom Jobim. Dentre esses dissabores, está
a súbita fama dando conta de que o país é um dos mais violentos
para os integrantes da chamada população LGBT+ (lésbicas, gays,
bissexuais, transgêneros, dentre outros), baseada em pesquisas
recentes, como levantamentos realizados pelo Mapa da Violência
de Gênero.
Dentro da comunidade LGBT+, há segmento específico
que demanda maior atenção no que se refere a serem vítimas de
violência: os transgêneros. Invisíveis à sociedade por muito tempo
– ou simplesmente ignorados –, os transgêneros tiveram sucesso em
trazer à baila suas pautas e hoje são vistos em filmes, novelas do
horário nobre e grandes campanhas publicitárias, algo impensável
há não mais que duas décadas. Ainda assim, o preconceito e a
ignorância fazem com que continuem a ser vitimados em reiterados
episódios, alguns brutais.
Embora seja cediço que sofram das mais variadas formas de
violência, o presente artigo tem como enfoque a discussão sobre
instrumentos legais proteção e políticas públicas relacionadas à
prática de violência doméstica e familiar contra mulheres trans,
haja vista a ocorrência de possível omissão legislativa que as teria
excluído das ferramentas protecionais.
369
5 CONSIDERAÇÕES FINAIS
Ser mulher em uma sociedade de estrutura patriarcal é
difícil; ser mulher e trans em uma sociedade que prega como
padrão a cis-heteronormatividade é mais difícil ainda. Há, assim,
uma dupla vitimização da mulher trans: por ser mulher, é tida
como ser inferior ao homem; por ser trans, é alvo de preconceito
e condutas discriminatórias, enraizadas pela ignorância e/ou
repugnância quanto à noção de diversidade. A interseccionalidade
dessas formas de opressão desemboca em um cenário propício a
quem sofre constantes e variadas formas de violência, sobretudo na
seara doméstica, razão pela qual são imprescindíveis o estudo e o
aprimoramento dos instrumentos legais de proteção e de políticas
públicas voltadas a essa minoria.
Preambularmente, é imperativa a compreensão quanto à
distinção de sexo biológico, gênero e orientação sexual. Sem ter
em mente as corretas definições, não saberemos a quem proteger,
tampouco como formular leis e políticas públicas adequadas. A
mulher trans, nesse contexto, é assim considerada pela sua identidade
de gênero, elemento psicossocial.
Embora nascido em conjunto e por muito tempo visto como
componente do movimento LGBT+, o movimento de visibilidade
trans conquistou cada vez mais espaço, defendendo reivindicações
específicas dessa categoria. Contou, inclusive, com apoio das
universidades, que fomentaram o debate e pesquisa sobre gênero.
Nas duas últimas décadas, viram-se importantes vitórias: a criação
do Conselho Nacional de Combate à Discriminação; o lançamento
de campanhas antidiscriminatórias; a articulação de políticas
públicas, em especial no campo da saúde, a exemplo da realização
do processo de redesignação sexual pelo SUS; a validação do uso
do nome social na administração pública; no campo internacional,
a decisão da OMS em não mais considerar a transexualidade como
uma patologia mental.
386
NOTAS
REFERÊNCIAS
JusPodivm, 2017.
SCOTT, Joan. Gênero: uma categoria útil para análise histórica. In:
Gender and the politics of history. Tradução de Christine Rufino
Dabat e Maria Betânia Ávila. Nova York: Columbia University
Press. 1989 (publicação original). Disponível em:https://direito.
mppr.mp.br/arquivos/File/categoriautilanalisehistorica.pdf>.
Acesso em: 06 ago. 2020.
SOUSA, Keila Simpson. E assim nasceu o movimento nacional
de Travestis e Transexuais. Disponível em:https://antrabrasil.org/
historia. Acesso em: 06 ago. 2020.
ANÁLISE DO AUMENTO DO FEMINICÍDIO E O
EMPODERAMENTO FEMININO COMO FATOR
DE MUDANÇA
Rosmeri Kunkel1
Vinícius de Melo Lima2
1 INTRODUÇÃO
O artigo analisa a escalada no aumento dos índices do
feminicídio apesar das leis vigentes e o que fazer para reverter
esse quadro assustador. Parte-se da premissa de que o Estado tem
o poder-dever de promover a igualdade e a proteção e esse não
se pode mostrar omisso frente à questão discriminatória que mata
tantas mulheres e deixa órfãs uma legião de crianças, sob pena de
ser responsabilizado por não garantir os meios necessários para a
aplicação das leis e o desenvolvimento das políticas públicas.
Para tanto, aborda a relação de dominação do homem sobre a
mulher introduzida pelo patriarcalismo e de que forma isso impactou
na violência de gênero que vitimiza as mulheres até os dias atuais.
A inovação legislativa, muito embora represente um avanço na
luta pela proteção dos direitos humanos da mulher, não está sendo
suficiente para dirimir os estarrecedores números de violência de
gênero presente em todos os estratos sociais. Com vistas a combater
os feminicídios latentes, propõe-se uma mudança comportamental
para promover a desconstrução dos modelos repressivos que
sobrevivem hodiernamente.
Conforme será demonstrado, apesar de a rede de atendimento
estar institucionalizada, ainda há deficiência de equipamentos
públicos comunitários no combate ao feminicídio. A queda de
investimentos financeiros, no RS, por parte de gestores públicos,
nos últimos cinco anos, é paradoxal aos percentuais de mortes de
mulheres gaúchas. A alteração legislativa mais recente, de 2020,
institui a inserção de medidas protetivas que têm o propósito de
reeducar o agressor a fim de não reincidir em outras eventuais
agressões. A polaridade presente está no fato de que se os homens
393
7 CONCLUSÃO
A partir do exposto, abstrai-se que a minimização de casos de
violência contra a mulher é utópica sem pensar na mudança de olhar
da humanidade. E essa se faz pela educação. As crianças que crescem
em um lar em que a violência é uma constante, sabidamente, irão
reproduzir as estruturas erradicadas no seu cotidiano, quer como
agressoras, quer como vítimas.
408
NOTAS
REFERÊNCIAS
Eduardo Ritt1
Isadora Hörbe Neves da Fontoura2
Flávia Esteves3
1 INTRODUÇÃO
A Lei nº 11.340/2006, conhecida como Lei Maria da Penha,
trouxe diversos benefícios às mulheres que se encontram em
cenário de violência doméstica e familiar. Em 2006, ano em que foi
promulgada, inovou e revolucionou o direito da mulher trazendo
inúmeras disposições legais que garantem proteção jurídica à mulher
que sofrer uma das cinco espécies de violência que a referida lei
visa combater, quais sejam: violência física, violência psicológica,
violência sexual, violência patrimonial e violência moral.
Para a execução do combate à violência doméstica e
familiar, a Lei Maria da Penha elencou, em seu artigo 22, medidas
protetivas que possuem como finalidade o obrigatório afastamento
e/ou não contato do agressor da vítima e, se for o caso, de seus
filhos e familiares, inclusive sob pena de prática de novo crime de
desobediência, com a possibilidade da prisão em flagrante. Todavia,
as medidas de afastamento e não contato dependem, em regra, de
determinação judicial, e necessitam, na maioria das vezes, que a
vítima compareça a uma delegacia de polícia para registrar boletim
de ocorrência, indicando elementos para que as medidas sejam
deferidas pela autoridade judicial. Esses elementos, porém, nem
sempre são possíveis de serem fornecidos, por falta de testemunhas
presenciais e pela grave situação psicológica em que se encontra a
vítima, dificultando a tomada de decisões por parte das autoridades,
por apenas ter em mãos o registro de ocorrência.
417
2 A LEI Nº 11.340/2006
Intitulada Lei Maria da Penha, a Lei nº 11.340 chegou no ano
de 2006 com o objetivo de revolucionar e efetivar, finalmente, os
direitos das mulheres em cenário de violência doméstica e familiar,
estabelecendo, para tanto, cinco espécies básicas de violência a que
as mulheres podiam estar sujeitas, quais sejam: violência física,
violência psicológica, violência sexual, violência patrimonial e
violência moral (artigo 7º). Nesta seara, o seu principal propósito
foi o de garantir que as mulheres que fossem violentadas por alguma
dessas formas tivessem a proteção jurídica adequada, ou seja, que
tivessem os seus direitos humanos assegurados após o terrível
período que vivenciaram com o autor do delito:
Foi uma luta árdua para que a Lei 11.340 fosse realmente
promulgada e efetivada em 2006. Essa conquista começa pela
história de uma mulher sobrevivente do ciclo de violência doméstica,
chamada Maria da Penha Maia Fernandes, sendo feita que a
denominação de Lei Maria da Penha, justamente, em homenagem
a esta mulher.
Maria da Penha viveu um matrimônio com o Marco Antônio
Heredia Viveros. O início de seu relacionamento, como muitas
vezes ocorre, foi saudável, não havia ainda as agressões presentes no
cotidiano. Todavia, esse cenário começou a ser modificado ao passar
dos anos, com o nascimento de suas duas filhas, desenvolvendo-se
para o ciclo da violência:
3 AS FORMAS DE VIOLÊNCIAS
Historicamente, desde os primórdios do sistema patriarcal,
o homem era considerado responsável por todo o sustento de sua
família, a pessoa que detinha mais direitos e mais liberdades,
tanto na esfera profissional como na esfera familiar. A mulher, ao
contrário, era vista pela sociedade como um ser frágil, só possuindo
como responsabilidade o cuidado com a sua família, não sendo
considerado um ser detentor de direitos e liberdades como o homem.
Dessa maneira, como o homem tinha a posse da mulher, algo
normal para a era patriarcal, a violência já existia ao matrimônio
422
domicílio familiar;
V - informar à ofendida os direitos a ela conferidos nesta
Lei e os serviços disponíveis, inclusive os de assistência
judiciária para o eventual ajuizamento perante o juízo
competente da ação de separação judicial, de divórcio, de
anulação de casamento ou de dissolução de união estável.
(BRASIL, 2006, http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_
ato2004-2006/2006/lei/l11340.htm).
Como o FRIDA contém questionamentos a respeito da vida
do agressor em conjunto com a vítima e da sua personalidade, no
momento em que a solicitação das medidas protetivas de urgência
chegar ao magistrado, ele não terá somente um registro de ocorrência
de um delito que ocorreu em uma única situação, ao contrário, terá
uma ampla visão dos fatos e das necessidades inerentes a ele. O
Formulário permite ao magistrado ter conhecimento de todas as
ocasiões em que o violentador executou uma atitude ilícita contra
a ofendida; como são as suas condutas perante a sociedade; quais
os níveis de agressividade que ele possui e o quanto a vítima está
deteriorada por conta das agressões vividas.
Dessa maneira, o magistrado terá ciência do grau de urgência
das medidas protetivas à mulher que estiver solicitando e terá a
possibilidade de concedê-las antes mesmo do prazo de 48 horas que
é atribuído a ele. Nesse sentido, o FRIDA auxilia nas céleres decisões
dos magistrados às vítimas de violência doméstica e familiar por
meio de todas as respostas que substanciam os questionamentos.
Nos casos dos delitos que não são caracterizados pela
violência física, o FRIDA também pode auxiliar na previsão de
uma possível agressão concretizada no corpo da mulher, em virtude
dos questionamentos acerca das condutas do agressor perante a
vítima e a sociedade. Mesmo que não tenha agredido fisicamente
a vítima no momento em que ela solicitou as medidas protetivas
de urgência, através das respostas do FRIDA será possível concluir
que o violentador possui um perfil agressivo e o magistrado terá a
possibilidade de conceder as medidas protetivas de urgência a uma
mulher que sofreu uma ameaça, uma perturbação da tranquilidade
ou a destruição de seus objetos, como precaução de uma possível
futura violência que será evoluída para a física:
436
6 CONCLUSÃO
A Lei Maria da Penha foi um grande marco na vida de todas
as mulheres que sofreram e sofrem alguma das espécies de violência
que a referida Lei possui como objetivo erradicar, garantindo
proteção jurídica e permitindo que a mulher tenha o direito de gritar
por justiça.
Elencadas no artigo 22 da supracitada Lei, estão as medidas
protetivas de urgência que possuem como finalidade afastar
o violentador da ofendida e, se for a situação, de seus filhos e
familiares, bem como de garantir outros direitos à mulher, dando-
lhe tranquilidade e proteção legal.
Para que a vítima obtenha as medidas protetivas de urgência,
437
NOTAS
REFERÊNCIAS
Luciane Bertoletti1
1 CONSIDERAÇÕES INICIAIS
A violência doméstica é um fenômeno produzido
historicamente e ocorre quando existem relações assimétricas de
poder.
Tal fenômeno tem recebido, ao longo dos anos, tratamento
específico pelo ordenamento internacional e pela ordem jurídica
brasileira e portuguesa, especialmente, no que tange à violência
praticada contra a mulher
Nesse sentido, será destacada a evolução dos direitos humanos
no plano internacional referente à violência contra a mulher, em
especial quanto a Convenção para Eliminação de Todas as Formas
de Discriminação contra a Mulher – CEDAW, a Declaração sobre
a Eliminação da Violência Contra a Mulher da Organização das
Nações Unidas, a Resolução do Parlamento Europeu A4-0250/97
e a Convenção para Prevenir, Punir e Erradicar a Violência contra
a mulher da OEA, conhecida como Convenção de Belém do Pará.
Após, será abordada a evolução legislativa do crime de
violência doméstica no ordenamento português, desde o seu
surgimento até os dias atuais, com as diversas alterações operadas
no Código Penal Português. A partir dessa análise preliminar,
o tipo será examinado, a fim de realizar um comparativo com a
incriminação e os institutos existentes no ordenamento jurídico
brasileiro.
Adentrando no ordenamento jurídico brasileiro,
averiguaremos a legislação aplicada às violências praticadas antes
da Lei 11.340/2006 (Maria da Penha), cuja competência para
o julgamento dos crimes pertencia, na sua maioria das vezes, ao
Juizado Criminal de Pequenas Causas.
Averiguaremos, então, a Lei Maria da Penha, desde seu
441
Adiante:
5 CONSIDERAÇÕES FINAIS
A violência doméstica é um fenômeno que não afeta apenas
homens e mulheres, mas afeta crianças, jovens e idosos, causando
uma instabilidade pessoal e familiar de efeitos devastadores cuja
consequência gera repercussão em nível pessoal, social, econômico
e cultural.
Tal espécie de violência ultrapassa barreiras geográficas e
460
NOTAS
REFERÊNCIAS
1645-829X.
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Lisboa: QUID JURIS, 2010.
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setembro de 2011. Disponível em: https://stj.jusbrasil.com.br/
jurisprudencia/21049641/habeas-corpus-hc-212767-df-2011-
0159507-5-stj/inteiro-teor-21049642?ref=juris-tabs. Acesso em: 10
set. 2017.
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vítimas de violência doméstica. A Tribuna, local 2017. Disponível
em: http://www.atribuna.com.br/noticias/noticias-detalhe/cidades/
sete-mulheres-sao-mortas-por-dia-no-brasil-vitimas-de-violencia
domestica/?cHash=e9725b351c147fbfaa72d0741149ab5c. Acesso
em: 29 ago. 2020.
LAMIM, Vieira Acórdão Tribunal da Relação de Lisboa. Processo
nº 144/15.4PKLRS-A.L1-5, de 19 de janeiro de 2016. Disponível em:
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d47477a899ad907980257f4b007c5f6c?OpenDocument. Acesso
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MENEGHEL, Maíra de Quadros et al. Repercussões da Lei Maria
da Penha no enfrentamento da Violência de Gênero. Ciência &
Saúde Coletiva, local 2013. Disponível em: phttp://www.scielo.
br/pdf/csc/v18n3/15.pdf. Acesso em: 24 ago. 2020.
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REDONDO, João. Sem violência doméstica. Uma experiência de
trabalho em rede. Coimbra: Editor regional de Saúde do Centro,
2012. ISBN 978-989-95137-4-7.
SALOMÃO, Luis Felipe de Rel. Acórdão do Superior Tribunal de
Justiça. Resp 1419421/GO, de 11 de fevereiro de 2014. Disponível
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especial-resp-1419421-go-2013-0355585-8-stj. Acesso em: 10 set.
2017.
470
Camila Conrad1
1 CONSIDERAÇÕES INICIAIS
São décadas de mobilização da sociedade civil e dos
movimentos de mulheres contra o fim da violência de gênero.
Conforme Pinto (2003) a partir da década de 1950, as mulheres
passaram a questionar sobre a naturalização da opressão e da
discriminação da qual eram vítimas. Assim, teve início uma série de
reflexões, movimentos, produções literárias e ações de resistência,
como a marcha da panela vazia, a participação na luta pela anistia
e pela redemocratização do País, a criação de grupos feministas
para discutir sobre literatura relacionada às mulheres ou sobre a
sexualidade.
A violência doméstica é a mãe de todas as violências.
As vítimas não são apenas as mulheres e crianças que sofrem
reiteradamente, apanham, são estupradas e eventualmente são
mortas. A vítima termina sendo toda a sociedade. Além do
sofrimento cotidiano, a violência doméstica reproduz e alimenta
um aprendizado que geralmente não fica restrito às paredes do lar.
Crianças e jovens que crescem nesse meio, muitas vezes, respondem
aos conflitos quotidianos e à necessidade de autoafirmação, tão
típicos da juventude, usando a linguagem aprendida, da violência.
Quando tais incidentes ocasionam uma morte, uma espiral de
agressões e de vinganças recíprocas envolvendo grupos de jovens
gera inúmeras outras vítimas fatais, sendo que o rastro da origem
de todos os problemas há muito foi apagado por uma sequência de
eventos, tornando invisíveis para a sociedade as consequências do
aprendizado da violência intrafamiliar (CERQUEIRA, 2015).
Diante desta realidade que assombrou, e até hoje assombra
nossa sociedade, o Estado se deu conta que era preciso criar
mecanismos em nosso ordenamento jurídico, por meio de adoção de
472
2 DESENVOLVIMENTO
3 CONSIDERAÇÕES FINAIS
Diante de toda história de luta contra a violência contra a
mulher pode-se disparar o salto do Estado Brasileiro frente a tanto
com a criação da Lei 11.340/06, a qual já foi considerada pela ONU
como a terceira melhor lei contra violência doméstica do mundo.
Assim, este estudo alcançou o objetivo inicial proposto para
identificar os tipos de violência, e o procedimento de concessão
das medidas protetivas de urgência previstas na Lei, assim como
as inovações decorrentes para as mulheres uma vez que a Lei nº
11.340/2006 é efetiva em aumentar o rigor das punições sobre
crimes domésticos, e também em prevenir futuras agressões e punir
os devidos agressores.
A lei criou instrumentos legais para maior proteção à mulher
vítima de violência doméstica e familiar, compreendida como
qualquer ação ou omissão que resulte em morte, lesão, sofrimento
físico, sexual, psicológico e dano moral ou patrimonial que ocorra
no âmbito familiar ou domiciliar.
Considerado o maior marco na busca à efetivação ao direito
das mulheres vítimas de violência doméstica e familiar, as Medidas
Protetivas de Urgência e hoje, sua penalização, vieram para amparar
a mulher em risco iminente afastando e restringindo direitos do
ofensor.
As medidas protetivas de urgência são deferidas em desfavor
do agressor com o objetivo de garantir a integridade física e
psíquica da mulher vítima de violência doméstica e familiar. Em
caso de descumprimento e, dessa forma, de retorno à situação
de risco que ensejou a concessão do instrumento, o juiz poderá
tomar determinadas medidas para garantir sua eficácia, inclusive
determinando a prisão do agressor.
Com o texto, percebemos que as medidas protetivas de
urgência não têm prazo de duração e permanecem enquanto forem
necessárias à proteção ao direito tutelado.
Caracterizamos a natureza jurídica das medidas protetivas de
urgência como de natureza cível, com vistas a garantir a integridade
física ou psíquica da vítima em situação de violência doméstica em
491
REFERÊNCIAS
medidas%20protetivas%20previstas%20na,das%20cautelares%20
previstas%20no%20CPP.&text=Pretende%2Dse%20evitar%20
a%20fuga,investiga%C3%A7%C3%A3o%20ou%20a%20
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contra a mulher: análise crítica e sistêmica. 1. ed. Porto Alegre:
Livraria do Advogado, 2007.