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DA EMIGRAÇÃO À IMIGRAÇÃO?

POR UMA
ANÁLISE DO PERFIL MIGRATÓRIO
BRASILEIRO NOS ÚLTIMOS ANOS
ANA LUIZA BRAVO E PAIVA
ANA PAULA MOREIRA RODRIGUEZ LEITE

Resumo: Desde a década de 80, o país era caracterizado pelo grande número de
emigrantes que se dirigiam, em geral, para os Estados Unidos e para a Europa. Esse
fenômeno trouxe durante muito tempo efeitos negativos para o Brasil, na medida em
que tínhamos uma fuga de cérebros (brain drain), ou seja, nossa mão de obra
qualificada se direcionava a estas regiões, buscando novas oportunidades profissionais.
Contudo, esse panorama vem se alterando na conjuntura mais atual. O Brasil nos
últimos anos, além de uma potência regional, tornou-se um dos países com maiores
índices de desenvolvimento, sendo hoje a 6ª economia mundial.
Sendo assim, esta comunicação tem como escopo analisar o momento de inflexão que o
Brasil atravessa com vistas a verificar se, de fato, o país estaria experimentando uma
transformação em seu perfil migratório, passando a assumir o papel de importador de
mão de obra. Talvez ainda seja muito cedo para falar em inversão dos fluxos, mas já é
possível, a partir da análise empírica, observar indícios de mudanças e, por essa razão,
há a necessidade de investigarmos suas causas.
PALAVRAS-CHAVE: imigração no Brasil, política imigratória brasileira, o Brasil e o
cenário internacional

Abstract: Since the 80s, the country was characterized by the large number of
emigrants who went, in general, to the United States and Europe. This phenomenon has
brought long negative effects for Brazil, in that it had a brain drain ( brain drain ), ie,
our skilled labor is directed to these regions, seeking new career opportunities .
However, this scenario is changing at the present conjuncture. The Brazil in recent
years, as regional power, has become one of the countries with the highest rates of
development, and is currently the 6th world economy.

Artigo recebido em 24 de Novembro de 2013 e aprovado para publicação em 12 de Fevereiro de 2014.


 Doutoranda do Programa de Pós Graduação em História Comparada PPGHC/UFRJ.
E-mail: [email protected]
 Doutoranda do Programa de Pós Graduação em História Comparada PPGHC/UFRJ.
E-mail: [email protected]
Thus, this communication is scoped to analyze the turning point that crosses Brazil in
order to verify if, indeed, the country was experiencing a transformation in their
migratory pattern, coming to assume the role of importer of labor. Perhaps it is still too
early to talk about reversing the flow, but it is possible, from the empirical analysis,
notice signs of change and, therefore, there is need to investigate its causes.
Keywords: immigration in Brazil, Brazilian immigration policy, Brazil and
international scenary

INTRODUÇÃO
Nos anos mais recentes, a migração assumiu patamares jamais vistos em
toda a história da humanidade. De acordo com dados das Nações Unidas (ONU), houve
um aumento significativo das migrações (stock) nas últimas décadas do século XX, o
número de migrantes saltou de aproximadamente 75 milhões em 1965 para 150 milhões
em 1990 (United Nations, 2004). Os países mais desenvolvidos como Estados Unidos e
Europa Ocidental têm sido recorrentemente alvo de migrações, sejam de trabalhadores
ou de refugiados. De acordo com o estudioso de diásporas Bimal Gosh (2000), estes
países recebem cerca de 1 milhão de migrantes por ano, sendo estes regulares, uma vez
que existe certa dificuldade em contabilizar nas estatísticas as pessoas que entram por
canais irregulares – tráfico e contrabando de pessoas.
Dados da Organização Internacional para a Migração (OIM), apontam
para o crescimento do número total de migrantes no mundo. Atualmente, 214 milhões
de pessoas vivem em território que não o de seu nascimento1 (UNITED NATIONS,
2008). Os cômputos exprimem que de cada 33 habitantes do planeta, um não vive em
seu país de origem. Embora os migrantes representem apenas 3,1% da população
mundial, não se podem desconsiderar os impactos que tais deslocamentos podem
representar para todos os países no mundo – tanto para aqueles que recebem tais fluxos,
quanto para os que exportam mão de obra.
Sabe-se que o fenômeno migratório não é recente, mas que o aumento
das migrações nos dias de hoje são fomentadas em grande medida pelos novos
processos de reestruturação da economia global. Do ponto de vista econômico, a nova
estrutura dos mercados globais criou uma demanda por mão de obra nas sociedades
industriais mais desenvolvidas, além de aprofundar as disparidades entre países ricos e

1
Esse número representa o volume total de migrantes no mundo inteiro, incluindo migrantes econômicos
e refugiados.
pobres, visto que o crescimento dos países se faz de forma desigual. A conjugação
desses dois fatores aumenta o impulso e até mesmo a necessidade de migrar para outros
países.
Além disso, do ponto de vista social, o advento de novas tecnologias de
comunicação e transporte levou a criação de uma “sociedade em rede” (CASTELLS,
1999). Em um mundo cada vez mais interconectado, a relativa facilidade de
deslocamento entre as fronteiras - pelo menos do ponto de vista das viagens - e as
informações propagadas com maior amplitude pelos meios de comunicações - televisão,
cinema, internet – geram sonhos e criam expectativas de que a vida pode ser melhor nos
países mais ricos.
Sendo assim, ao estudar as migrações internacionais contemporâneas é
importante considerar os fatores estruturais que determinam o direcionamento dos
fluxos. Para o trabalho em questão, considera-se que “a ascensão dos países emergentes
está revolucionando a imigração global, tendência intensificada pela crise econômica na
Europa, Japão e EUA.” (MARGOLIS, 2008 apud PATARRA, 2012). Seguindo esta
premissa, pode-se afirmar que haveria uma tendência de inversão no padrão migratório
em escala mundial. Até então, os fluxos concentravam-se predominantemente no eixo
Sul-Norte. Entretanto, no contexto de crise econômica, países em desenvolvimento –
como o Brasil - começam a despontar como polos de imigração.
Ainda que seja cedo para falar em uma alteração no perfil migratório
brasileiro, já é possível identificar o aumento da imigração e do retorno de emigrantes
ao país. Podemos destacar como as causas principais dessa inversão: a crise econômica
vivenciada no continente europeu, a elevação do status brasileiro no cenário
internacional e a demanda por mão de obra especializada. Estes dois últimos fatores se
inserem, conforme veremos adiante, em um projeto nacional que visa à consolidação da
estabilidade macroeconômica e da redução da vulnerabilidade externa, sendo a política
externa um dos principais veículos para lograr tais fins.
Considerando as causas acima mencionadas, optou-se por utilizar como
aporte teórico as teorias conhecidas como push and pull. O termo é geralmente
traduzido para o português como modelo de atração e repulsão. Esse aparato teórico
considera que as causas da migração devem ser atribuídas às diferenças econômicas
entres os países. Nesse sentido, a pobreza e salários baixos nos países menos
desenvolvidos seriam os responsáveis pela repulsão/atração de mão de obra. Enquanto,
nas sociedades de destino, a demanda por empregos e melhores salários atrairiam os
trabalhadores (MÁRMORA, 1997; FUSCO, 2007). Em geral, os adeptos dessa corrente
arrolam como causas da migração: o diferencial de renda; a estagnação econômica; o
crescimento demográfico dos países em desenvolvimento que gera mão de obra
excedente; violações de direitos humanos (SOARES, 2002).
Embora estejamos adotando a teoria econômica de atração e repulsão para
a compreensão da nova dinâmica migratória que o Brasil começa a se inserir, não
desconsideramos os fatores políticos e sociais que também contribuem para alavancar as
migrações internacionais. No entanto, por se tratar de um movimento migratório novo,
acredita-se que as novas levas de imigrantes estariam sendo motivadas essencialmente
por questões econômicas, sendo atraídas pelas vagas disponíveis no mercado de trabalho
brasileiro, uma consequência da redução da vulnerabilidade externa brasileira. Ademais,
ao analisar processos migratórios, é preciso considerar que tais fenômenos engendram a
formação de redes sociais - que serão fundamentais para a manutenção de fluxos de
pessoas entre países que experimentam alterações significativas no perfil
socioeconômico.
Não obstante, a migração é um fenômeno complexo cuja análise não deve
ser engessada em conceitos rígidos, sendo, portanto, necessário considerar todas as
diversas instâncias que envolvem o projeto migratório. De acordo com Sayad, os estudos
acadêmicos não devem tratar da imigração como fenômeno isolado em sua totalidade.
Para este autor, imigrar é apenas uma ponta do processo, o deslocamento se dá nos atos
de emigrar e imigrar; há uma origem e um destino. Sendo assim, destaca-se a
importância de buscar na origem as causas endógenas da emigração e os efeitos
exógenos da imigração. Resumindo, todo imigrante, é antes um emigrante e, dessa
forma, os fatores de atração e repulsão encontram-se imbricados. Por essa razão, ao
analisar o novo fenômeno migratório brasileiro, buscou-se avaliar de que maneira as
mudanças no cenário internacional criaram uma condição favorável à migração
transnacional nas duas pontas do fluxo, ou seja, nos países de origem e nos países de
destino.
A discussão atual gira em torno da real contribuição das migrações no
fomento ao desenvolvimento dos países, tanto nos países receptores quanto nos países
exportadores de mão de obra (MARTINE, 2005; PEREIRA, 2008). As remessas
enviadas pelos migrantes para seus países de origem é o exemplo clássico da migração
como facilitador do desenvolvimento. Não obstante, existem outras iniciativas que
podem contribuir para tal finalidade. No caso dos países receptores, o ganho pode
acorrer através do brain gain2, uma vez que a maioria dos países privilegia a imigração
de profissionais qualificados. Por outro lado, esse mesmo processo pode representar a
perda de recursos humanos para os países exportadores de trabalhadores, fenômeno
conhecido com brain drain3 ou fuga de cérebros.
Evidentemente, a falta de governabilidade4 dos fluxos leva a
consequências sérias para os países envolvidos em uma dinâmica migratória. Para
aqueles que sofrem com a evasão populacional, a perda de capital humano pode
representar sérias consequências. Enquanto isso, nos países receptores dos fluxos
populacionais, os governos argumentam que o grande volume de imigrantes,
principalmente ilegais, pode representar um alto custo econômico-social e político. Não
obstante, acadêmicos e representantes de ONGs em todo o mundo defendem que
aspectos ditos negativos da migração podem ser reduzidos com a adoção de políticas
mais coerentes que levem em conta todos os fatores – políticos, econômicos e sociais –
que imbricam os fluxos migratórios. Fica, portanto, patente que, diante da inevitabilidade
da migração internacional, a única opção viável para os governos é a adoção de políticas
menos seletivas e que visem à interação social entre nacionais e migrantes.
Nas linhas que se seguem, como forma de orientar a análise, procurou-se
avaliar as novas dinâmicas do cenário internacional, estabelecendo um nexo entre o
aumento da projeção internacional brasileira, a crise econômica internacional e o recente
aumento da imigração no país. Para, então, em um segundo momento, a partir da análise
de dados quantitativos, identificar o padrão migratório do Brasil.

2.0 – A Conjuntura Internacional como propulsora da inflexão: Ascensão


econômica brasileira e Crise Internacional

O século XX experimentou, por algumas vezes, mudanças de paradigmas


no que se refere às relações internacionais e nas relações de poder projetadas por alguns
países. No início do século, a Inglaterra projetava seu poder em relação ao resto do
mundo, ao passo que os Estados Unidos projetavam-se em direção a América Latina.

2
Atualmente, as políticas migratórias de países desenvolvidos privilegiam a imigração de profissionais
qualificados. O brain gain pode ser definido como o ganho obtido pelos países que importam mão de
obra qualificada, não sendo necessário o investimento em recursos humanos.
3
O fenômeno do brain drain significa a perda de cidadãos que poderiam colaborar para o
desenvolvimento do país exportador de mão de obra. A evasão dos melhores recursos humanos dos países
mais pobres é vista como um inibidor do desenvolvimento. Cf.: PEREIRA, 2008.
4
A governabilidade dos fluxos migratórios pressupõe o respeito aos acordos internacionais no que diz
respeito às migrações e aos direitos humanos de todos os migrantes.
Situação que se manteve até o deflagrar da Primeira Guerra Mundial quando, envolvida
no conflito mais notadamente contra a Alemanha que buscava desestabilizar o poder
inglês, perdeu sua imponência.
A transferência de poder deu-se da Inglaterra para os Estados Unidos que
despontou como grande líder no cenário internacional mantendo-se desta forma
hegemônico até o fim da Segunda Guerra Mundial. A partir de então, o poder passou a
ser competido entre Estados Unidos e União Soviética e o mundo passara a ser regido
pela égide bipolar. No entanto, com a criação da ONU em 1948, deixava claro que
outros países tinham um poder de interferência partilhando com as duas potências os
poderes de se fazer a guerra ou promover a paz no mundo ao serem detentores do poder
de veto no que tange aos assuntos internacionais.
A outra mudança de paradigma deu-se no fim da Guerra Fria
legando aos Estados Unidos a condição de única superpotência que reunia,
simultaneamente, força militar e hegemonia estratégica global, o que
provocou um debate sobre a configuração de poder que se sucederia à
dissolução da União Soviética. (VILLA; REIS, 2006)

No auge desses debates, o consenso era por uma nova configuração em


que o poder unipolar fosse suplantado pelo multilateralismo em relação à distribuição
do poder, visto que novos atores ascenderam e outros perderam projeção. Logo, a partir
desse momento, o Brasil buscaria projetar-se internacionalmente de forma mais
expressiva, com isso ascendendo como um novo ator emergente.
Sendo assim, nos últimos anos, sobretudo após o governo de Luís Inácio
Lula da Silva, o Brasil vem se destacando no cenário internacional, notadamente ao que
se refere ao desenvolvimento econômico, tornando-se uma das mais importantes
potências emergentes capaz de promover mudanças nas relações com diversos atores
mundiais. Tais mudanças tornaram-se possíveis por meio do pagamento da dívida em
2006 com o FMI por um aumento do fluxo de capitais para países periféricos,
permitindo que o país deixasse o status de devedor e em 2009 passasse a ser credor.
Além disso, inaugurou uma nova gestão econômica que permitiu uma maior abertura
financeira (PRATES, 2006 apud NOIJE, 2012). Portanto, mais investimentos puderam
ser capitalizados e destinados a setores estratégicos como, por exemplo, o energético.
Além disso, o país garantiu uma melhor projeção internacional visto que
seu corpo diplomático mostrou-se mais assertivo e eficaz do que os anteriores - apesar
desta diplomacia ter um histórico favorável desde Rio Branco - uma política de defesa e
novas políticas econômicas em que se privilegiou o desenvolvimento socioeconômico
com bases na estabilidade econômica dando uma visibilidade nunca antes vivenciada.
A nova postura adotada garantiu novos olhares e atraiu grandemente
tanto grupos particulares bem como outros Estados. O Brasil, já membro do
MERCOSUL, atraíra novos atores e passar a integrar-se a outros complexos regionais
como UNASUL, CPLP, BRICS e G20 garantindo assim sua presença nas mais
importantes esferas decisórias internacionais. Sendo assim, aumentaria também seu
poder de barganha em negociações e sua projeção internacional. Nas questões
multilaterais buscou-se transitar do multilateralismo utópico para o multilateralismo de
reciprocidade (CERVO, 2008).
Trata-se não apenas de projeção de poder, mas sim de um projeto de
Estado com objetivos para além dos socioeconômicos sócioeconômicos, visando
também a sua projeção em processos decisórios da esfera internacional. Desta forma,
com a ascensão de novos atores, a globalização e a multipolarização, verifica-se novas
necessidades e estratégias para o gerenciamento das relações internacionais. Nesse
sentido, o Brasil vem insistindo na reformulação do Conselho de Segurança da ONU
por entender o novo paradigma pautado na cooperação, no multilateralismo e na
ascensão de novos atores capazes de causar mudanças significativas na balança de
poder. Em 2005, o Brasil ingressara no Conselho de Segurança em caráter não
permanente.
A atuação do Brasil no órgão norteou-se sempre, pela defesa do
multilateralismo e do respeito ao direito internacional. Por meio de sua
presença, o Brasil bateu-se pela preservação e fortalecimento das Nações
Unidas como instância de encaminhamento das questões de alcance
internacional e trouxe para o órgão uma perspectiva coerente com os
interesses dos países em desenvolvimento da região latino-americana e
caribenha (VIEGAS, 2008).

Portanto, um dos objetivos deste ensaio é demonstrar que a nova posição


brasileira o evidencia em questões transnacionais como um polo de atração de migrantes
econômicos. Segundo a reportagem do O Estado do RJ, que utilizou dados da OCDE, o
Brasil a partir do início da crise em 2008 entrou na rota de imigrantes sendo um dos
destinos mais procurados, sobretudo por africanos, países vizinhos, e observa-se
também a chegada de portugueses e espanhóis que fogem da crise que assola a Europa.
Ainda segundo a reportagem do jornal O Estado do RJ em 17/12/2012, a "Copa do
Mundo e Olimpíadas são eventos que aquecem o mercado de serviços e o crescimento
econômico do país é visto como garantia de oportunidade."
Destacamos, no entanto, que países como Portugal e Espanha, são países
que historicamente sofrem constantes inflexões nos fluxos migratórios. Em momentos
de crise o fluxo tende a se direcionar para outras regiões onde se encontram as melhores
oportunidades de trabalho. Trata-se de países de emigração, porém, após a adesão à
União Europeia favoreceu grandemente o crescimento econômico sendo responsável
pela inversão dos fluxos migratórios, que na verdade é um importante benefício e
incremento para a economia. A partir disso, converteram-se em países de emigração
para países de imigração.
Contudo, a partir de 2008 Portugal e Espanha começaram a sofrer os
efeitos da crise internacional. As políticas econômicas desses países passaram a
empregar medidas de austeridade, transferindo o ônus da crise para a população. As
consequências foram drásticas para o mercado de trabalho, pois o nível de desemprego
atingiu as mais altas taxas europeias sensibilizando o Estado de Bem-Estar social. Esses
fatores associados causaram uma nova inflexão dos fluxos, que levam grandes somas de
espanhóis e portugueses a buscarem trabalho no Brasil.
A tendência dos fluxos migratórios vem sendo alterada nas últimas
décadas. Se antes, a preferência dos migrantes era para os países desenvolvidos,
caracterizando um movimento sul-norte, hoje o que se observa é um panorama deveras
diferente. De acordo com dados das Nações Unidas, metade das pessoas que emigram
se deslocam entre países em desenvolvimento (PNUD, 2009). Além disso, desde 2010,
já era possível identificar um aumento, ainda que seja sutil, nas migrações de países
desenvolvidos para os emergentes.
Dentro desta nova disposição, podemos enquadrar as migrações recentes
de portugueses e espanhóis para o Brasil. Conforme demonstrado pelo World Migration
Report 2013, nos últimos três anos, teriam chegado ao Brasil cerca de 222.148
imigrantes portugueses, criando assim um dos maiores corredores migratórios em escala
global. Os especialistas europeus costumam arrolar como causas o aumento na migração
norte-sul: o crescimento econômico das nações emergentes que tornou países como
Angola e Brasil mais atrativos e as sociedades comerciais e industriais europeias com
perspectivas internacionais começaram a criar sucursais no estrangeiro. Ademais, a crise
de 2008 e o crescimento das economias emergentes teriam levado os imigrantes de
origem estrangeira que residiam em Portugal a retornarem a seus países de origem. Este
fora o caso de 157.766 brasileiros no quinquênio 2005-2010 (JORNAL DE NOTÍCIAS,
2013).
Recentemente, o Brasil aparece, em pesquisas realizadas por todo o
mundo pelo grupo WIN/Gallup, como sendo um dos doze Estados mais cobiçados para
se morar. Cabe registrar que o país é a única economia emergente que integra o rol dos
destinos mais desejados pelos imigrantes. Em entrevista ao Jornal Folha de São Paulo, o
Professor de Relações Internacionais Alberto Pfeifer considera que, embora a resposta
dos entrevistados seja baseada em questões utópicas, o crescimento da economia
brasileira na década de 2000 foi um elemento crucial para que o Brasil passasse a
integrar as rotas mais importantes de migração internacional (O ESTADÃO, 2014).
Além dessas questões, é preciso levar em consideração aspectos relativos
à forma como a identidade internacional brasileira é construída no cenário internacional.
De acordo com a diplomata Liliam Chagas de Moura, o maior interesse pelo país
também pode ser entendido como resultado do "soft power" brasileiro. Para Moura, o
fato de possuirmos uma cultura diversa e riquíssima, de sermos uma democracia e
sermos reconhecidos em nossa política externa por ser um país pacífico são elementos
importantes para a compreensão deste novo fenômeno.
Nesse sentido, é importante considerar que, embora toda ação econômica
seja socialmente orientada, os migrantes também devem ser vistos como agentes
racionais. De acordo com a perspectiva teórica neoclássica, ao decidir empreender um
projeto migratório, os migrantes fariam cálculos dos custos e benefícios da experiência
migratória, levando em consideração sim as características do mercado de trabalho do
país de destino, mas também outros fatores como: educação, domínio da língua e tempo
de permanência no destino. Esse modelo explicativo define, então, o sucesso do
migrante a partir de seu capital humano. Mais recentemente, como forma de preencher
as lacunas deixadas por essa teoria, estudiosos passaram a avaliar o papel que o
desenvolvimento de redes sociais representaria no sucesso da migração.
À medida que, os fluxos migratórios vão se consolidando, eles vão se
tornando cada vez mais autônomos e menos sensíveis às mudanças de curto prazo nos
incentivos econômicos.
Os custos e riscos do movimento são reduzidos pela operação destas
“pontes sociais” para além de fronteiras nacionais, permitindo que
mulheres e crianças juntem-se aos chefes de família no exterior. As
pessoas migram por razões outras que os incentivos econômicos: para
se juntar à família, por exemplo, ou para preencher as expectativas
normais de jovens trabalhadores. (FUSCO, 2002)

Assim sendo, podemos inferir que a recente alteração nos fluxos migratórios
internacionais e o consequente interesse pelo Brasil como destino da imigração seria
resultados não somente de fatores estruturais, como o crescimento econômico do país e
de uma melhor inserção internacional, mas também de fatores subjetivos, qual seja: a
leitura que os agentes migratórios fazem da imagem do país no cenário internacional.
Além disso, o desenvolvimento dos laços sociais entre os países de origem e destino faz
com que o fluxo migratório se torne cada vez mais estruturado.
Vale ressaltar, que o governo brasileiro vem mostrando-se cada vez mais
favorável à chegada de imigrantes, sobretudo no momento em que o país prepara-se
para os grandes eventos. Busca-se a mão de obra qualificada conforme afirmou o
ministro da Secretaria de Assuntos Estratégicos (SAE) da Presidência da República,
Moreira Franco, em reportagem à Agência Brasil. Segundo o ministro, falta ao Brasil
uma expertise no tratamento das políticas que visam atender esses imigrantes
qualificados, “mas também precisamos ter uma sociedade mentalmente aberta e o
debate sobre política migratória deve passar pelo plano político” (AGÊNCIA BRASIL,
29/01/2013).

3.0 – A nova Imigração no Brasil: repensando um novo paradigma de política


migratória

Com o aumento progressivo do número de imigrantes nos últimos cinco


anos, a questão migratória vem tomando uma proporção cada vez maior na agenda
política brasileira. Até o início dos anos 2000, o país era caracterizado como um país
exportador de mão de obra e, por essa razão, as iniciativas em prol da renovação da
política migratória brasileira – datada dos tempos do regime militar – não passavam do
plano do discurso. Contudo, em função do recente crescimento econômico e do
aumento da projeção do país associadas às conjunturas de crise econômica e
humanitária no cenário internacional, o Brasil passa novamente a figurar a rota dos
imigrantes e refugiados5. A nova dinâmica migratória brasileira faz ressurgir o debate
acerca do tema, trazendo à tona os interesses e preocupações do governo brasileiro.

5
Embora seja cada vez mais difícil estabelecer uma diferenciação entre refugiados e migrantes
econômicos, é importante apresentar o conceito clássico. Tradicionalmente, por migrante econômico
entende-se o indivíduo que deixou seu lugar de residência habitual para se reassentar em outro lugar
diferente de seu país de origem com o intuito de melhorar sua condição de vida. Em geral, essa
classificação é usada para distingui-los dos refugiados. Estes, por sua vez, são definidos como indivíduos
que tiveram de deixar seus países de origem forçadamente em função de perseguição política, étnica e/ou
religiosa, sendo, portanto, passíveis de proteção jurídica internacional. Ao adotar o termo migrante
econômico, não se pretende assumir que as causas dos fluxos migratórios sejam estritamente econômicas,
pois a migração internacional é um fenômeno de múltiplos matizes e dimensões.
Historicamente, o Brasil é reconhecido como país de imigração. Desde a
descoberta do país ao final do século XV, como parte do próprio processo de
colonização, levas e levas de imigrantes europeus africanos aportavam em terras
tupiniquins com o objetivo de ocupar o território. Com o passar do tempo, escravos
africanos foram trazidos contribuindo fortemente para a formação demográfica e
cultural da recém-nascida colônia. Para alguns estudiosos, entretanto, não podemos
considerar os europeus chegados anteriormente a 1822, data em que o país se torna
independente de sua antiga metrópole, como imigrantes, mas sim como colonizadores,
visto que o país ainda não tinha consolidado o seu projeto nacional, sendo apenas uma
colônia.
Seguindo esta perspectiva, é somente, a partir de 1870 que o Brasil, ao
receber milhares de portugueses, italianos, espanhóis, alemães e japoneses, consolida
seu caráter imigrantista de compromisso. Entre o final do século XIX e o início do XX,
estima-se que o país tenha recebido um contingente de imigrantes em torno de 4,4
milhões, provenientes de Portugal, Espanha, Itália, Japão e Alemanha. Neste período, a
imigração fora fomentada, necessidade de substituição da mão de obra escrava que
trabalhava nas lavouras, logo após a proibição do tráfico negreiro e, por fim, com a
abolição da escravidão. Com o passar do tempo, os trabalhadores estrangeiros passaram
a ser utilizados como força de trabalho na incipiente indústria que surgia nos centros
urbanos.
O último grande pico de imigração para o Brasil ocorreu na década de
50. No contexto pós-guerra, as dificuldades de reconstrução na Europa e Japão fizeram
com que português, espanhóis, italianos e japoneses deixassem seus países de origem
em busca de melhores condições de vida. O Brasil passou a atrair esses imigrantes em
função do crescimento econômico, fomentado por um amplo projeto
desenvolvimentista.
Cumpre destacar que, até meados do século XX, a imigração fazia parte
de uma política governamental que visava não somente ao suprimento das demandas do
mercado de trabalho, mas que também focalizava o branqueamento da população
brasileira. Amplamente difundido no imaginário social e político da época, o
pensamento eugenista de autores como Oliveira Vianna e Sílvio Romero argumentava
em favor da imigração de europeus como uma das formas de se promover um processo
de redução étnica cuja finalidade última era a extinção do elemento negro da sociedade
brasileira.
Na década de 60, a ascensão dos militares ao poder, trouxe um novo
elemento para o debate acerca da imigração: a questão da segurança nacional.
Paulatinamente, as políticas de atração de imigrantes converteram-se em “políticas de
controle, que acabaram culminando em leis profundamente autoritárias e restritivas”
(PERFIL MIGRATÓRIO BRASILEIRO, 2010: 11). Com a consolidação do regime
autoritário, que perdurou por 21 anos, a imigração para o país passou a ser praticamente
imperceptível, levando a uma reorientação do fluxo migratório.
A emigração brasileira para países estrangeiros é fato recente. É somente
nos anos 80 que o país passa a exportar significativa parcela de sua força de trabalho,
assumindo, em termos de movimento populacional um perfil emigrantista. Para os
primeiros analistas que tentavam compreender a emigração brasileira, esta estaria
relacionada com a crise econômica que assolava o país desde o esgotamento do milagre
econômico no final década de 70 (ASSIS, 2000). No entanto, também podemos
relacionar este fenômeno com processo de globalização.
As ondas de migração contemporânea – diferentemente dos fluxos
migratórios do século XIX e início do XX – foram potencializadas pelos processos de
reestruturação da economia global. Em primeiro lugar, o desenvolvimento de novas
tecnologias de transporte e comunicação atuou como facilitador do fenômeno
migratório. De outro lado, percebe-se que as disparidades econômicas entre países
desenvolvidos e menos desenvolvidos são potencializadas, fazendo com que cada vez
mais um número maior de pessoas opte por migrar em busca de melhores condições de
vida. Conforme nos demonstra George Martine (2005):
Nos dias de hoje, o horizonte do migrante não se restringe à cidade mais
próxima, nem à capital do estado ou do país. Seu horizonte é o mundo –
vislumbrado no cinema, na televisão, na comunicação entre parentes e
amigos. O migrante vive num mundo onde a globalização dispensa fronteiras,
muda parâmetros diariamente, ostenta luxos, esbanja informações, estimula
consumos, gera sonhos e, finalmente, cria expectativas de uma vida melhor.
(MARTINE, 2005: 3)

Sendo assim, pode-se afirmar que o fenômeno da emigração no Brasil é


fruto da crise econômica que assolou o país na década de 80, potencializado pelas
mudanças sociais relacionadas com o processo de globalização. Nos anos 80 – a
chamada “década perdida” -, a única possibilidade de uma vida melhor para uma
parcela da população parecia ser deixar o país.
Dados mais recentes do Ministério das Relações Exteriores (MRE), em
2012 existiam aproximadamente 2.546.874 brasileiros vivendo em diversos países ao
redor do globo6. Dentre inúmeros países, os destinos mais procurados pelos emigrantes
brasileiros são, em primeiro lugar, os Estados Unidos – 1.066.559 brasileiros residem
no território americano – e, em segundo, a Europa – que abriga um contingente de
752.012 imigrantes brasileiros. No ano de 2009, as estimativas do MRE apontavam para
a existência de 3.040.993 brasileiros vivendo ao redor do mundo. Quando comparados
aos dados atuais, verifica-se a diminuição da emigração de brasileiros, sugerindo o
retorno de brasileiros que se encontravam no exterior e também o uma redução no
estímulo para emigrar.
Paralelamente ao desaquecimento do processo de emigração de
brasileiros é observado o aumento progressivo de imigrantes no país. No cômputo geral,
hoje vivem no país cerca de 1, 466 milhão de estrangeiros. Embora os números
indiquem que o Brasil ainda é um país com perfil emigrantista, projeções demográficas
apontam para o crescimento da imigração nos próximos anos.
Além de atrair imigrantes provenientes da África e de países menos
desenvolvidos da América, o país começa a receber levas de imigrantes europeus
originários principalmente de países como Portugal e Espanha. De acordo com dados do
MTE, o número de concessões de trabalho temporário para estrangeiros (com validade
de 2 anos), no Brasil, mais que dobrou nos últimos três anos. Em 2008, o MTE aprovou
aproximadamente duas mil e quinhentas licenças, aumentando progressivamente para
cinco mil novecentos e setenta no último ano. Contudo, ainda que tenha manifestado o
desejo de receber um número crescente de imigrantes, o país ainda conta com pouca
estrutura para orientar e acolher os recém-chegados.
Visando à atração de talentos e de capital humano, as autoridades
brasileiras sinalizam a intenção de revisar a política migratória vigente, buscando novas
estratégias capazes de tornar o Brasil um polo de imigração qualificada. De acordo com
Neide Patarra,
o governo atual, com seus compromissos claramente assumidos, busca traçar
rapidamente uma arquitetura oficial que dê conta das novas demandas e dos
novos conflitos, embora sempre carregando traços seletivos, com frequência
restritivos e com discriminação e xenofobia frente alguns grupos de
migrantes. Pode-se afirmar que o tema estará presente em quase todo o
território brasileiro, tomará conta de debates nos três poderes (executivo,
legislativo e judiciário) e nas instituições afins. (PATARRA, 2013: 7)

6
Cabe ressaltar que O MRE produz suas estimativas a partir dos dados disponíveis nos Consulados e
Embaixadas brasileiras no exterior. Deve-se, contudo, esclarecer que existe certa dificuldade em se
produzir dados exatos sobre a migração, uma vez que é extremamente problemática a mensuração dos
fluxos migratórios irregulares. Nesse estudo, os dados do MRE serão utilizados apenas exemplificar a
tendência da emigração brasileira.
Encontramo-nos, portanto, em um momento de inflexão, no qual a
discussão entre a sociedade civil e as esferas governamentais será de suma importância
para a construção de uma política imigratória mais inclusiva. Recentemente, é possível
identificar o aumento da pressão de grupos sociais organizados e de ONGs pela abertura
da imigração aos imigrantes mais pobres e vítimas de catástrofes climáticas ou sociais.
Essa nova tendência pró-imigração manifestada pelo governo brasileiro
aparentemente caminha na contramão das propostas restritivas dos países
desenvolvidos. No entanto, cumpre registrar que, assim como os Estados Unidos e
alguns países europeus, a iniciativa brasileira tem uma finalidade muito específica: a
atração de mão de obra qualificada, sobretudo aquela vinda da Europa. Enquanto isso,
trabalhadores pouco qualificados oriundos de regiões mais pobres ingressam no
território brasileiro, geralmente de forma irregular, passando a ser motivo de constante
preocupação das autoridades governamentais.
Recentemente, o Brasil foi confrontando pelo aumento crescente de
ondas migratórias. Desde 2010, em função da crise climática e do agravamento das
condições de vida no Haiti, muitos haitianos passaram a considerar a realização de um
empreendimento migratório. A primeira leva que se dirigiu ao Brasil, ao chegar ao país,
valendo-se da prerrogativa de estarem sofrendo uma grave violação dos direitos
humanos no país de origem. Após análise das solicitações de asilo, o governo decidiu
pela aprovação de vistos de trabalho temporário. Até aquele momento, por se tratar de
um contingente reduzido, a chegada dos haitianos ainda não figurava uma grande
preocupação para as autoridades brasileiras.
A escolha do Brasil como país de destino pode ser entendido como
resultado de uma maior projeção internacional, em consequência da nova realidade
econômica brasileira. Soma-se a isso a presença brasileira, desde 2004, em território
haitiano na qualidade de líder da Missão das Nações Unidas para a estabilização no
Haiti (MINUSTAH). Desde então, pode-se verificar o estabelecimento de laços sociais
entre a população haitiana e os militares brasileiros. Por essa razão, ao invés de
diminuir, com o passar do tempo, o fluxo de haitianos para o Brasil tomou uma
proporção muito maior. Em janeiro de 2011, um ano após o terremoto, milhares de
haitianos tentaram ingressar no Brasil através das fronteiras com o Peru e a Bolívia. Ao
invés de recebê-los, em resposta ao aumento do fluxo de haitianos, o governo brasileiro,
optou por fechar as fronteiras e proibir a entrada destes imigrantes. Na ocasião, mais de
300 haitianos se encontravam em território peruano, sob condições precárias, esperando
a autorização do governo brasileiro para atravessar a fronteira.
O governo brasileiro argumenta que a legislação brasileira não prevê a
concessão de refúgio para casos que estejam relacionados a desastres naturais e, por
esse motivo, os haitianos não poderiam ser considerados refugiados. Com efeito, o
conceito que define refugiado como o indivíduo que esteja em situação de violação de
direitos humanos é deveras amplo, sendo, portanto, passível de contestação.
Diante das pressões internas e internacionais, a saída encontrada pelo
governo brasileiro foi disposta pela Resolução Normativa n° 97, de 12 de janeiro de
2012, segundo a qual seriam concedidos vistos temporários – com validade de cinco
anos - e de caráter humanitário. Além disso, a partir da data de implementação da
resolução, foram estabelecidas cotas anuais para a concessão de vistos para haitianos e
os solicitantes deverão dar entrada ao processo ainda no país de origem - no Consulado
Brasileiro no Haiti. Com a adoção deste dispositivo, cerca de dois mil e quinhentos dos
quatro mil haitianos que se encontravam em situação irregular puderam permanecer no
Brasil. Contudo, apesar das autoridades brasileiras terem se mostrado propensas a
solucionar este litígio, a situação ainda pode ser considerada preocupante. Por
conseguinte, tais limitações têm provocado inquietações entre os defensores dos direitos
humanos. De acordo com a reportagem de 10/09/2012, a diretora do Conectas Direitos
Humanos afirma:
Estamos preocupados com o funcionamento efetivo do 'visto humanitário' e
também com a situação daqueles que têm sua entrada negada no Brasil. Há
relatos de famílias desabrigadas em zonas de fronteira, confrontadas pela
Polícia Federal e sem ter como nem para onde regressar. Isso não é
condizente com uma política que se autodenomina humanitária.

A opção do governo brasileiro em recebê-los como migrantes


temporários, sob a roupagem de um discurso humanitário, deixa patente o caráter
seletivo da política imigratória que as autoridades pretendem desenvolver no país.
Acredita-se que a atuação do governo brasileiro no caso dos haitianos visava inibir os
fluxos de migrantes indesejados.
Como observado, diante da nova pressão migratória, a revisão da política
migratória brasileira torna-se imperativa. Não somente pela necessidade do governo de
desenvolver estratégias para a contenção dos fluxos não desejados, mas também porque
a legislação em vigor, fruto do período militar, é muito burocrática e restritiva na
concessão de vistos de trabalho, fato que dificulta a atração de mão de obra qualificada,
um dos interesses mais prementes do governo brasileiro.
Desde o início dos anos 90, com o reestabelecimento da democracia, são
identificados esforços no sentindo de eliminar a herança autoritária da legislação
migratória, mas recorrentemente esta questão foi posta para segundo plano. Em 2009,
no entanto, tais esforços convertem-se em ação. Nesse ano o governo brasileiro elabora
uma nova proposta para o Estatuto do Estrangeiro, visando à promoção da igualdade
entre nacionais e estrangeiros. Atualmente, o projeto de lei nº 5.655/2009 está em
tramitação no Congresso Nacional, mas ainda não se atingiu um consenso no que tange
às regras de ingresso, permanência e saída de estrangeiros no país. Por essa razão, as
discussões no âmbito legislativo encontram-se travadas.
Nesse ínterim, com o aumento progressivo da imigração para o país,
novas alternativas ao Novo Estatuto do Estrangeiro já estão sendo discutidas pelas
autoridades. A Secretaria de Assuntos Estratégicos da Presidência da República estuda,
em conjunto com acadêmicos, as novas demandas por mão de obra no mercado
brasileiro. Além da falta de profissionais qualificados em setores estratégicos, o declínio
da taxa de fertilidade começa a preocupar as autoridades. Hoje, a população brasileira
ainda é jovem, mas os cenários prospectivos indicam que a situação tende a mudar para
os próximos quinze anos. Nesse sentido, a nova proposta do governo visa à elaboração
de uma legislação menos burocrática que facilite e estimule a concessão de permissões
de trabalho no país. As sugestões em curso são: a ampliação de vistos de trabalho para
os membros da família de estrangeiros, redução dos encargos e do número de
documentos a serem apresentados e, por fim, a criação na forma de lei de uma comissão
ou agência com a finalidade de estimular a imigração.
Assim como no passado, excetuando as questões de raça, o interesse em
promover a imigração encontra-se dentro de um projeto amplo de desenvolvimento
nacional. Mais uma vez, diante da demanda do mercado de trabalho, o governo
brasileiro necessita importar mão de obra. Contudo, se antes o país carecia de “braços
para a lavoura”, hoje a grande demanda vem dos setores de alta tecnologia, que
encontram em estágio incipiente. Sem dúvida, o crescimento de determinados setores
dependem sobremaneira da disponibilidade imediata de mão de obra qualificada e, no
momento, a imigração parece ser a única saída.
Entretanto, o gerenciamento dos fluxos migratórios no país tem de ser
feito de forma responsável e consciente. Não basta incentivar a imigração e não
promover a integração dos estrangeiros na sociedade. É indiscutível os benefícios do
diálogo intercultural, mas estes só poderão ser gozados se o Brasil investir em políticas
públicas com tais finalidades.
Conforme se pode observar, a proposta brasileira tende a seguir a mesma
lógica recrudescente dos países desenvolvidos. Diante da incapacidade de contenção
dos fluxos migratórios, uma vez consolidado o fenômeno da globalização, identifica-se
o esforço dos governos em proteger seus mercados e seus territórios da presença dos
imigrantes, em especial dos que se encontram em situação irregular. Mas, por outro
lado, reconhece-se a necessidade de mão de obra estrangeira para suprir as demandas
laborais nas sociedades industriais. No limite, a nova realidade brasileira parece
corroborar com a ideia de um processo de globalização inacabado e excludente já
observada há tempos no cenário internacional. Não restam, portanto, dúvidas de que as
regras do jogo do liberalismo não se aplicam à migração internacional: “enquanto o
capital financeiro e o comércio fluem livremente, a mão de obra se move a conta-gotas.”
(MARTINE, 2005: 3)

4.0 - Considerações Finais


As migrações, sejam elas internas ou internacionais, passam
constantemente por inversões dos fluxos obedecendo a causas estruturais tanto nos
países de origem como nos países de destino. Entre os problemas estruturais, podemos
destacar as crises econômicas e o consequente desemprego que motivam a emigração.
Nesse sentido, haveria uma tendência dos indivíduos a deslocarem-se em
direção a regiões com maiores oportunidades de trabalho. Para esta pesquisa, cabe um
questionamento sobre o atual momento de inflexão do fluxo migratório brasileiro: o
Brasil passou de um país de emigração para um país de imigração?
Historicamente o Brasil foi um país de imigração até meados do século
XX, sofrendo um momento de inflexão na década de 80 quando o país registrou altas
taxas de emigração como consequência da estagnação econômica brasileira, arrocho
salarial e elevadas taxas de desemprego.
Contudo, nos últimos anos, destacamos um crescimento do número de
imigrantes no Brasil, como resultado de um crescimento no desenvolvimento
econômico do país que o elevou a um papel de destaque no cenário internacional,
convertendo-se em polo de atração de imigrantes econômicos.
Destacamos o aumento dos fluxos de africanos, de cidadãos dos países
limítrofes e de países assolados pela crise internacional como Portugal e Espanha.
Cumpre registrar que a escolha desses países pelo Brasil, não está relacionada somente à
questão econômica, mas também são levados em consideração os elos históricos e
culturais entre essas nações, sendo a questão linguística e a formação de redes sociais
fatores de suma importância.
Convém ressaltar o interesse do Estado brasileiro em receber imigrantes
qualificados, logo a questão vem aumentando sua importância na agenda política
buscando revisar a nossa política migratória. Porém, ainda é cedo considerarmos uma
completa mudança no perfil migratório, basta analisar os dados: hoje o país tem cerca
de 2.546.874 de emigrantes, contra 1.466 milhões de imigrantes. Contudo, os novos
dados apontam para uma mudança na dinâmica migratória. Estamos, portanto, em um
período de inflexão que exige maiores esforços de pesquisa nesta direção.

5.0 - Referências Bibliográficas

5.1 - Documentos consultados:

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migratórias para haitianos. Disponível em:
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