Murgo

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A AFETIVIDADE NA RELAÇÃO PROFESSOR-ALUNO 211

A afetividade na relação professor-aluno: perspectivas de


estudantes de Pedagogia

Affection in teacher-student relationships: Pedagogy students’


perspectives

Camélia Santina Murgo1


Wagner Aparecido Alves2
Marcos Vinicius Francisco1

Resumo
Esta pesquisa verificou como os alunos de um curso de graduação em Pedagogia concebem a afetividade em
sala aula e avaliam a abordagem da mesma na formação inicial. Participaram 25 estudantes do segundo e
terceiro anos de uma instituição particular de uma cidade do interior de São Paulo. O estudo é qualitativo de
cunho fenomenológico. Na coleta de dados utilizou-se um questionário composto de perguntas abertas e,
para a análise, recorreu-se à Análise de Conteúdo. Ao descreverem a afetividade, os participantes reportaram-
-se a sentimentos relacionados à afeição e à interação entre as pessoas. Ressaltaram que uma relação afetiva em
sala de aula pode ser favorável ou não para que os alunos tenham êxito no processo de ensino e aprendizagem,
sobretudo, porque a dimensão afetiva de um professor extrapola a dinâmica das relações interpessoais, ao
abarcar, inclusive, seus posicionamentos e ações na práxis-pedagógica. Por fim, destacaram a importância da
afetividade na relação educativa desde a formação inicial.
Palavras-chave: Afeto. Pedagogia. Sala de aula. Relação professor-aluno.

Abstract
The present study analyzed how undergraduate pedagogy students perceive affection in the classroom and evaluate
how this issue is explored during their initial training. This is a qualitative phenomenological research that involved 25
second and third grade students of a private school in an inland city in the state of São Paulo, Brazil. A questionnaire
composed of open-ended items was used to collect data, which were analyzed using Content Analysis. When describing
affection, the participants referred to feelings of fondness and interaction between people. They stressed that affective
relationships in the classroom may or may not affect student achievement, especially because the affective dimension
of teachers goes beyond the dynamics of interpersonal relationships by revealing their reflections and actions in the
pedagogical praxis. Finally, the participants pointed out the importance of addressing affection in the educational
relationship during their initial training.
Keywords: Affection. Pedagogy. Classroom. Teacher-student relationship.
1
Universidade do Oeste Paulista, Faculdade de Educação, Programa de Pós-Graduação em Educação. Rod. Raposo Tavares, km 572, 19067-175, Presidente
Prudente, SP, Brasil. Correspondência para/Correspondence to: C.S. MURGO. E-mail: <[email protected]>.
2
Prefeitura Municipal de Tatuí, Secretaria de Educação, Cultura e Turismo. Tatuí, SP, Brasil.

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Introdução Tassoni e Leite (2013) chamam atenção para o


fato de que a afetividade vai ganhando complexidade
O papel da afetividade frente ao processo de com o passar dos anos, tendo em vista que há um
ensino e aprendizagem aprimoramento nas trocas afetivas e novas exigências
vão aparecendo na vida de um indivíduo. Wallon
A afetividade tem sido cada vez mais
(1975; 1998; 1999) demonstrou a aproximação estreita
reconhecida como determinante no desenvol-
entre as relações humanas e a constituição da pessoa
vimento humano, no processo de ensino e
ao enfatizar o meio físico e o humano como instâncias
aprendizagem, bem como nas relações interpessoais
de igual importância na construção do indivíduo.
na escola. Ela, juntamente com a dimensão cognitiva,
Apenas o aparato orgânico não é capaz de edificar o
devem ser vistas como funções inter-relacionadas e
ser humano que pensa, sente e se movimenta no
determinantes para o desenvolvimento do indivíduo
mundo material.
ao favorecerem a relação sujeito (aluno) e objeto
(conteúdos escolares) e, por conseguinte, contribuírem Esses aspectos corroboram elementos
para a aprendizagem (Almeida, 1999; Leite & Tassoni, defendidos por Vygotsky (1995), que aponta ser
2002; Ribeiro, 2004; Leite & Tagliaferro, 2005; Tassoni & impossível estudar e compreender a criança em seu
Leite, 2011; 2013; Leite, 2012;). processo de desenvolvimento sem considerá-la como
pertencente a um meio social e cultural. Defende,
Interessa para esta pesquisa conhecer como a
ainda, que é na síntese entre os planos de
afetividade é descrita, como os elementos
desenvolvimento natural (biológico) e cultural
constitutivos de representação da mesma são
(histórico) que as crianças se desenvolvem.
organizados por estudantes de Pedagogia e quais
relações estabelecem entre a dimensão afetiva e o Leite (2012, p.361) argumenta sobre os dois
processo de ensino e aprendizagem. Há que se autores supracitados:
destacar que o estudo contemplará discussões feitas Comparando-se as posições de Wallon e
por investigadores os quais assumem Wallon como Vygotsky sobre a afetividade, percebe-se que
aporte teórico. os autores apresentam pontos comuns com
relação aos aspectos essenciais do fenômeno
Para Wallon (1998), a dimensão afetiva ocupa
em pauta: a) ambos assumem uma concepção
lugar central tanto do ponto de vista da construção
desenvolvimentista sobre as manifestações
da pessoa quanto do conhecimento, sendo que a
emocionais: inicialmente orgânica, vão
emoção tem a função mediadora nessa relação. O ganhando complexidade na medida em que
processo de desenvolvimento infantil realiza-se nas o indivíduo desenvolve-se na cultura, passando
interações que objetivam não só a satisfação das a atuar no universo simbólico, ampliando-se e
necessidades básicas como também a construção complexificando-se suas formas de
de novas relações sociais, com o predomínio da manifestação; b) assumem, pois, o caráter social
emoção sobre as demais atividades. da afetividade; c) assumem que a relação entre
a afetividade e inteligência é fundante para o
O referido autor defende que a constituição processo do desenvolvimento humano.
da afetividade depende de dois fatores: um orgânico
e um social. Essa relação recíproca impede qualquer Em suas produções teóricas, Wallon (1975; 1998;
tipo de interpretações deterministas sobre o 1999) dedicou-se ao estudo da afetividade
desenvolvimento humano, tanto que a constituição contemplando, fundamentalmente, o desenvolvi-
biológica da criança ao nascer não será a lei única do mento social do ser humano ao buscar na
seu futuro destino. Os seus efeitos serão amplamente psicogênese a articulação entre o biológico e o social.
transformados pelas circunstâncias sociais e objetivas Além disso, atribuiu às emoções um papel de primeira
presentes em sua vida. grandeza na formação da vida psíquica e estabeleceu

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uma interação entre o social e o orgânico. O autor ao ambiente que ele quer criar em sala de aula. Toda
enfatizava que as relações da criança com o mundo essa dinâmica, quando sistematizada e organizada,
exterior são, desde o início, relações de sociabilidade. oferece maiores possibilidades para que atinja mais
É necessário frisar que a afetividade, para evoluir, rapidamente seus objetivos, além de explicitar o
depende de conquistas realizadas no plano da respeito e cuidado com seus alunos, aspectos estes
inteligência e vice-versa, sendo que o vínculo afetivo que favorecem a construção da afetividade (Sousa &
entre professor e aluno faz toda a diferença. Lima, 2008).
Acerca da afetividade nos processos Tassoni e Leite (2013) discutiram sobre o tema
educativos, destaca-se a investigação realizada por nos processos de ensino e aprendizagem, a partir de
Ribeiro (2004), a qual teve como objetivo verificar a uma pesquisa realizada numa cidade do interior de
existência de uma representação social de afetividade São Paulo. Os resultados evidenciaram oito aspectos
em professores da Universidade de Feira de Santana. que se fazem essenciais na dimensão afetiva durante
Constatou-se que esses profissionais viam a os processos de ensino e aprendizagem: as formas
afetividade como um sentimento, uma atitude e uma como o professor ajuda o aluno frente às suas
ação. Também foi vista como um estado por meio do dificuldades; as formas como estabelece diálogo com
qual o aluno estabelece três níveis de vínculo: consigo seus alunos, seja individual ou coletivamente;
mesmo, com o outro e com o universo. Ao analisar a atividades, que sejam capazes de envolver os alunos
importância da afetividade para o processo de ensino numa aprendizagem significativa; aquelas que vão
e aprendizagem, verificou-se que a dimensão afetiva além dos conteúdos propostos; a postura do professor
por parte dos professores auxiliou no fortalecimento durante as atividades de corrigir e avaliar, a fim de
do vínculo com os alunos. que os estudantes tenham clareza do que precisam
O professor que apoia, instrui, corrige quando melhorar e onde têm êxito; que a qualidade da
necessário, mostra interesse e coopera, oferecendo mediação do professor pode interferir na
ajuda e disponibilidade em auxiliar o seu aluno tem compreensão dos alunos e no tipo de relação que
muitas possibilidades de afetá-lo de maneira positiva. eles estabelecem com os objetos do conhecimento;
Portanto, constata-se a grande importância desse os professores precisam dominar aquilo que estão
profissional estar bem preparado para saber articular ensinando, além de expressarem satisfação no que
afetividade com os conteúdos a serem trabalhados fazem. Por fim, os professores “bem vistos” eram
em sala de aula (Tassoni, 2000). aqueles considerados pacientes, ou seja, que
explicavam mais de uma vez quando necessário, eram
Em sua investigação, Sousa e Lima (2008)
brincalhões e preocupados com seus alunos.
buscaram compreender alguns dos elementos
presentes na prática docente em articulação com a Partindo dos pressupostos até aqui apre-
questão da afetividade na relação professor-aluno. Os sentados, delinearam-se os questionamentos da
professores participantes da pesquisa eram dos 6º ao pesquisa: quais as concepções dos alunos de
9º anos do Ensino Fundamental da rede privada de Pedagogia acerca da afetividade na sala de aula? Mais
Teresina (PI). Percebeu-se, em muitos participantes, especificamente, quais descritores esses graduandos
um sentimento de repulsa para com os alunos. Muitos utilizam para caracterizar a afetividade nesse con-
alegaram não se envolver afetivamente com eles por texto? Qual importância conferem à afetividade? O
causa do medo de perderem sua posição dentro da que pensam sobre a preparação do graduando para
sala. As verbalizações dos professores revelaram um desenvolver a dimensão afetiva em sua futura prática
compromisso somente com o conteúdo ministrado. docente?
Embora muitos tenham reconhecido a importância
de trabalhar o lado afetivo, não se achavam em Procedimentos Metodológicos
condições de desempenhar essa função.
A relação afetiva professor-aluno começa no O presente estudo é qualitativo e de cunho
planejamento e na intenção do docente em relação fenomenológico. Conforme Triviños (1987), essa

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perspectiva de pesquisa é essencialmente descritiva. alunos dos anos já mencionados. Primeiramente,


As descrições dos fenômenos estão carregadas de explicaram-se os objetivos da pesquisa e foi realizado
significados conferidos pelo contexto. Dessa forma, o convite. Em seguida, solicitou-se que os
impera a visão subjetiva dos participantes, ou seja, participantes assinassem o Termo de Consentimento
suas percepções acerca do fenômeno. Livre e Esclarecido, caso aceitassem participar. Para a
Outro aspecto a ressaltar é que o significado é coleta de dados, o questionário foi entregue aos parti-
a preocupação essencial nesse tipo de abordagem, cipantes, sendo que a aplicação ocorreu na própria
concedendo-se, assim, atenção aos pressupostos que IES durante o horário de aulas e teve duração
fundamentam a vida das pessoas. Privilegia, ainda, a aproximada de uma hora. Vale apontar que os
análise diante do fato de que os significados atribuídos mesmos foram preenchidos individualmente.
pelos participantes de uma pesquisa aos fenômenos Os dados coletados foram analisados por meio
são fruto dos pressupostos culturais produzidos pelo da técnica de Análise de Conteúdo (Bardin, 2000). Essa
meio no qual esses indivíduos estão inseridos abordagem pode ser definida como um conjunto de
(Triviños, 1987). instrumentos metodológicos, cada vez mais sutis e
Os participantes foram alunos do curso de em constante aperfeiçoamento, aplicados a discursos
graduação em Pedagogia de uma instituição (conteúdos e continentes) extremamente diver-
particular localizada em uma cidade de médio porte sificados.
no interior de São Paulo. A amostra foi composta por Segundo Bardin (2000), através da cate-
25 estudantes do 2º e 3º anos, sendo 24 do sexo gorização, realiza-se a classificação de elementos
feminino e 1 do masculino. constitutivos de um conjunto por diferenciação e,
O instrumento utilizado na pesquisa foi um em seguida, por reagrupamento segundo analogia
questionário composto de nove perguntas abertas com critérios previamente definidos. O agrupamento
com vistas a identificar qual a concepção que os é realizado em função dos caracteres comuns desses
graduandos apresentavam acerca da dimensão afetiva elementos.
na sala de aula. Ou seja, a partir de suas percepções, No caso desta pesquisa, esses critérios ficaram
procurou-se analisar como definiam a afetividade; expressos nos três polos defendidos por Bardin (2000)
quais descritores (palavras) utilizariam para durante a Análise de Conteúdo, ou seja, na pré-análise,
caracterizar esse aspecto na sala de aula; que na exploração do material e no tratamento dos dados.
características da dimensão afetiva acreditavam ter; Na pré-análise, seguiu-se as seguintes regras: (1)
quais ações de um professor corroboravam a exaustividade - todo o material coletado foi lido, sem
afetividade; se consideravam existir uma estreita omissão de nenhuma parte; (2) representatividade -
relação entre afetividade e aprendizagem, bem como contemplou-se a amostra de 25 estudantes, entendida
quais relações seriam essas; se achavam que a como suficiente para o objeto de análise, em tela; (3)
dimensão afetiva nas relações educativas, nos cursos homogeneidade - utilizou-se a mesma técnica de
de formação inicial de professores, são trabalhadas e coleta dos dados para todos os participantes; (4)
de que forma; se, durante sua formação inicial, a pertinência - todo material foi adaptado aos objetivos
dimensão afetiva já havia sido trabalhada e em quais da investigação; e (5) exclusividade - nenhum
disciplinas; e como descreveriam um professor afetivo. elemento foi classificado em mais de uma categoria
Antes da realização do estudo, o projeto de (Bardin, 2000).
pesquisa foi submetido ao Comitê de Ética em Já na exploração do material alguns indi-
Pesquisa com Seres Humanos (Protocolo de cadores foram escolhidos, agregando-os em unidades.
Aprovação nº 23/10). Para a coleta de dados, os Foram selecionados os trechos de respostas dos
pesquisadores solicitaram autorização da Instituição participantes que melhor indicavam suas percepções
de Ensino Superior (IES), a fim de fazer o convite aos acerca de como concebiam a afetividade em sala de

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aula e como avaliavam a abordagem da afetividade vocábulos também foram percebidos por estudantes
durante o processo de formação inicial. Por fim, no da educação infantil, ensino fundamental e médio
tratamento dos dados, a partir das inferências e como marcas de uma boa relação estabelecida entre
interpretações e com o auxílio da literatura, buscou- professores e alunos.
-se conferir sentido às análises realizadas. Outros descritores também apresentados
pelos futuros pedagogos para definir a afetividade
foram amizade, auxílio, reciprocidade e
Resultados e Discussão comprometimento. Estes foram associados a
expressões ou elementos da afetividade em sala de
Serão apresentadas as respostas dos aula.
estudantes de Pedagogia, participantes da pesquisa,
obtidas por meio da coleta de dados. Com a intenção Solidariedade, amizade, respeito, compa-
de melhor organizar o conteúdo das respostas, foram nheirismo, confiança; Percepção, confiança,
construídas seis categorias descritas a seguir. responsabilidade, reciprocidade; Amizade, diálo-
go e compreensão; Respeito, dedicação, respon-
sabilidade, amor e carinho.
Conceito de afetividade
A respeito dos vocábulos citados, cabe buscar
consonâncias com as ideias de Toro (2002), o qual
A primeira categoria de análise contempla os
defende que a afetividade implica um estado de
diversos conceitos de afetividade. É possível afirmar
afinidade profunda entre os seres humanos, uma
que, para os participantes, a definição do termo
relação que tem por regra a reciprocidade. Assim, na
associa-se essencialmente a sentimentos e
interação afetiva com o outro, o indivíduo intensifica
manifestações de carinho, cuidado e atenção entre
sua relação consigo mesmo, observa seus limites e,
as pessoas.
ao mesmo tempo, aprende a respeitar os limites do
Afetividade é carinho pelo outro, saber ouvir, outro (Wallon, 1998; 1999).
respeitar; Acredito que afetividade é toda atenção Constatou-se, dessa forma, que afetividade,
prestada a alguém, de forma carinhosa, amorosa; para os estudantes de Pedagogia, está atrelada às
A capacidade de lidar com os sentimentos nas
ações intrinsecamente ligadas às relações humanas,
relações sociais; carinho, respeito, bem querer,
pressupondo a formação de vínculos. Assim, a mesma
identificação mútua estabelecida em uma
confunde-se com a própria ação, mas, como
relação.
assinalaram os participantes, não é uma ação
A literatura da área corrobora os resultados qualquer. Ao contrário, “é uma ação portadora de
dessa categoria (Ribeiro et al., 2005; Tassoni & Leite, sentimentos”. A reciprocidade entre os sujeitos dessas
2013). Ao se referirem ao conceito de afetividade os interações parece ser uma marca na descrição dos
participantes deste estudo elencaram sentimentos de alunos entrevistados. São, portanto, evidenciadas
amor, carinho, afeição e amizade. Igualmente, Ribeiro aproximações entre a literatura e os achados deste
et al. (2005) constataram a existência de uma estudo no tocante à conceituação e à descrição da
pluralidade de vocábulos entre os professores de um afetividade (Wallon, 1998; Tassoni, 2000; Leite & Tassoni,
curso de licenciatura na definição de afetividade, 2002; Ribeiro, 2004; Leite & Tagliaferro, 2005; Tassoni &
dentre os quais motivação, interesse, ternura, empatia, Leite, 2011; 2013; Leite, 2012).
sentimentos e emoções. Isso indica que estudantes
de Pedagogia e professores, ao descreverem o termo, Dimensão afetiva do professor
se reportam a sentimentos muito semelhantes e
quase sempre relacionados à afeição e interação entre Nesta categoria ressalta-se a importância da
as pessoas. Na pesquisa de Tassoni e Leite (2013), esses dimensão afetiva do professor. Alguns alunos disseram

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que esta está diretamente ligada à ação desse professor em sala de aula, produzindo
profissional em sala de aula. Foi destacado o bom continuamente impactos positivos ou
preparo do docente, que deve estar ciente da negativos na subjetividade dos alunos. Trata-
importância de sua profissão, tendo como princípios -se, pois, de um fator fundante nas relações
a compreensão das emoções de seus alunos e o que se estabelecem entre os alunos e os
respeito às diferenças. Esses aspectos estiveram conteúdos escolares. A qualidade da mediação
expressos em diversas falas: pedagógica, portanto, é um dos principais
determinantes da qualidade dos vínculos que
É o professor competente, é estar ciente da se estabelecerão entre os sujeitos/alunos e os
profissão e com seus alunos; É um profissional que objetos/conteúdos escolares (Leite, 2012,
além de cumprir com o seu dever, tem uma relação p.365).
humana com os alunos, não se atenta ao
conteúdo, compreende as emoções; Maneira Todos esses aspectos conduzem ao
com que o professor lida com a classe, conquista entendimento de que a dimensão afetiva do professor
seu respeito e reconhecimento, confiança e bom extrapola a dinâmica das relações interpessoais
entendimento; O professor que compreende os estabelecidas dentro de uma escola. Abarcam,
alunos, independente de suas individualidades. inclusive, seus posicionamentos e ações em sua
De acordo com Leite (2012), a dimensão afetiva práxis-pedagógica. Nesse prisma, a teoria do
do professor deve estar expressa em sua intervenção desenvolvimento de Wallon (1975; 1998; 1999) pode
profissional e na mediação do conhecimento por auxiliar os professores na ampliação de suas
meio de decisões que considerem, em especial, cinco possibilidades de atuação frente ao processo de ensino
aspectos: (1) a escolha dos objetivos de ensino e aprendizagem com os alunos. O autor descreveu os
(reflete valores, crenças e concepções), sendo que os estágios do desenvolvimento humano que, ao serem
alunos deverão perceber relevância nesses objetivos, compreendidos por um docente, podem conduzi-lo
tanto para sua vida e futuro profissional quanto para durante os momentos de planejamento e intervenção
a sociedade em que vivem; (2) a decisão sobre o da prática pedagógica no sentido de respeitar as
início do processo de ensino (o professor deve iniciar especificidades de seus alunos.
o ensino a partir dos conhecimentos prévios dos
alunos), tendo em vista o estabelecimento de uma
relação afetiva positiva entre os alunos e os conteúdos Dimensão afetiva presente nos discursos dos
abordados; (3) a organização dos conteúdos de estudantes de Pedagogia
ensino (não podem ser apresentados de forma
As respostas dos participantes forneceram
aleatória e sem conexão uns com os outros); (4) a
escolha dos procedimentos e atividades de ensino dados importantes para a compreensão do seu
(atividades bem escolhidas e adequadamente pensamento frente à afetividade. Além de terem sido
desenvolvidas através de variadas metodologias e indagados quanto às dimensões afetivas que
recursos aumentam as chances do aprendizado dos consideravam desejáveis para um professor, foram
alunos); (5) a escolha dos procedimentos de também convidados a falar sobre aquelas que
avaliação do ensino (a avaliação tradicional tem sido reconheciam em si próprios. Várias respostas
apontada como um dos maiores entraves para o apontaram que os estudantes acreditam possuir
sucesso do processo de ensino e aprendizagem, o características como respeito, empatia, paciência,
que repercute no distanciamento afetivo entre o capacidade de ajudar, de compreender o outro, de
aluno e o objeto/conteúdo). Complementa o autor oferecer carinho e de amar:
que:
Comunicativa, gosto da profissão, compreensão;
[...] é possível defender que a afetividade está Respeito, dedicação, responsabilidade, amor e
presente em todas as decisões assumidas pelo carinho; Respeito, compartilhar e aprender novos

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conhecimentos; Empatia, confiança, hones- profissionalismo. Pode-se notar, nesta categoria, que
tidade; Atenciosa, carinhosa, amorosa, dedicada, a ação citada com maior recorrência foi aquela
paciência, respeito. relacionada ao entender as necessidades e
Compreende-se que os graduandos de dificuldades dos alunos.
Pedagogia já consideram a importância de se criar Entende as necessidades e dificuldades; Quando
um laço afetivo com os futuros alunos frente às ele dá um prazo maior na entrega de trabalhos,
qualidades relatadas. Fica evidenciada a significativa pois entende que muitos estudam, trabalham e
importância da dimensão interpessoal como moram fora; Mesmo que o aluno esteja passando
requisito para o desenvolvimento da afetividade. Para por problemas, o professor deve ajudá-lo a superar;
que o processo de ensino e aprendizagem se Auxílio do professor nas dificuldades dos alunos,
desenvolva, é necessário um bom relacionamento sejam familiares, aprendizagem.
entre professores e alunos. Há que se destacar, ainda,
a forma como os participantes da pesquisa Para a exemplificação dessa representação de
descreveram sua dimensão afetiva, o que parece ser ações afetivas recorreu-se ao resultado da pesquisa
importante para que se tornem profissionais os quais de Tassoni (2000), através do qual se observou que
tenham como base uma relação dialógica e afetiva proximidade e receptividade são de suma importân-
com seus alunos. cia. Proximidade diz respeito ao deslocamento do
professor no sentido de atender alguma necessidade
Ribeiro et al. (2005), Tassoni e Leite (2011) e Leite
do aluno, e receptividade é entendida através das
(2012) convergem para a mesma direção, pois, para expressões “estar próximo é ter amizade, é gostar deles,
os autores, a proximidade física entre professor e aluno se importar com o que fazem”. Quando o docente se
é sinônimo da existência de afinidades e sentimentos achega ao aluno mostrando que se importa com o
de equidade na relação. Essa proximidade é condição que está fazendo, gera um clima de segurança e
para que se estabeleça a confiança e o diálogo, além aumenta os laços afetivos.
de estimular a aprendizagem dos alunos.
Outras ações podem se destacar nessa relação,
Tassoni e Leite (2011) argumentam que a figura entre elas a comunicação verbal. O tom de voz
do professor, sua conduta, suas características pessoais utilizado pelo professor evidencia o que pretende com
construídas socialmente, além do jeito como se sua prática (Tassoni & Leite, 2013). “Falar com jeito e
relaciona, age e dialoga com seus alunos, poderão falar com calma foram indicados como aspectos que
favorecer o aparecimento de sentimentos e emoções contribuíam para a produção de sentimentos de
que interferem na produção de conhecimentos em consideração e respeito” (Tassoni & Leite, 2013, p.265).
sala de aula. Esses aspectos poderão afetar Na mesma perspectiva, Almeida (1999) e Wallon (1975;
significativamente a relação dos alunos com o 1998) reiteram que a comunicação diversifica-se por
conteúdo, com a turma de colegas, com a escola, meio da linguagem e a palavra toma cada vez mais
com os professores e consigo mesmos. Em linhas força, substituindo, em parte, a sensibilidade orgânica
gerais, os sentimentos e emoções presentes na pela sensibilidade oral e moral.
dinâmica da práxis-pedagógica poderão produzir a
Corroborando essas análises, Vigotski (1993,
aproximação ou o afastamento dos estudantes no
p.129) afirma que “o pensamento tem que passar
processo de ensino e aprendizagem. primeiro pelos significados e depois pelas palavras”,
fato que implica reconhecer a mediação dos signos,
Ações docentes representativas de afetividade estes que são considerados instrumentos culturais
essenciais ao desenvolvimento da consciência e da
Os alunos descreveram como ações docentes personalidade humanas. “As palavras desempenham
afetivas a maneira do professor se relacionar com seus um papel central não só no desenvolvimento do
alunos, entender suas dificuldades e necessidades, pensamento, mas também na evolução histórica da
estar preocupado com seu bem-estar, ter respeito e consciência como um todo” (Vigotski, 1993, p.132).

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Relação entre afetividade e aprendizagem ensino/instrução escolar, além de defender a relação


entre processos de aprendizagem e processos de
Nesta categoria serão esclarecidas as relações desenvolvimento como questão fundamental para a
entre afetividade e aprendizagem a partir do que efetivação das potencialidades humanas.
pensam os alunos de Pedagogia, sendo que o
conteúdo das respostas indicou a existência de
Formação de professores na dimensão afetiva
relações entre esses dois construtos. Algumas
afirmações são apresentas abaixo: Os participantes da pesquisa consideram que,
nos cursos de formação em Pedagogia, a dimensão
Quando o aluno percebe que o professor se
importa com ele, a maneira de aprender é melhor;
afetiva vem sendo contemplada numa dinâmica na
Quanto maior a afetividade, melhor apren- qual se evidencia o respeito e a compreensão, em
dizagem; Para tornar o aprendizado mais fácil é especial por parte dos professores. Para os futuros
preciso ter um carinho entre o que está sendo pedagogos, na graduação, essa dimensão foi
ensinado e para os alunos; Com a afetividade, trabalhada por meio das disciplinas de Psicologia,
cumplicidade, o aluno pode ter mais confiança e Sociologia e Didática.
interesse.
Para completar a relação de descritores da
Observa-se que os participantes entenderam dimensão afetiva na formação de professores, convém
a relação entre o afeto e o aprender como construtiva, mencionar o diálogo e a preocupação que o docente
sendo incisivos na afirmação de que a afetividade deve ter com seus alunos:
influencia significativamente a aprendizagem.
Sim, a preocupação em ajudar o próximo e
Segundo Dantas (1992) e Wallon (1975), é impossível trabalhar em grupo); Sim. O diálogo, a com-
construir uma sólida relação afetiva à distância. Os preensão; São desenvolvidas aquelas que
alunos acreditam na proximidade física como uma consideramos mais importantes, que são o
forma de ajudar, transmitir segurança e tranquilidade dialogo; O diálogo pertence à natureza do ser
durante as realizações das atividades e essa humano, enquanto ser de comunicação.
proximidade possibilita inúmeras formas de interação.
Esses aspectos trazem à tona a necessidade
Percebe-se então que os estudantes de
de se refletir sobre a importância de cursos de
Pedagogia acreditam que a cumplicidade entre o
formação inicial de professores os quais consigam
professor e o aluno é necessária no processo de ensino
desmobilizar “verdades” construídas anteriormente e
e aprendizagem. Leite e Tagliaferro (2005), numa
que, muitas vezes, permanecem cristalizadas. Tassoni
perspectiva histórico-cultural, afirmam a importância e Leite (2013) vão apontar que uma dessas verdades
do outro/sujeito mediador na construção do apregoadas pelo senso comum está na ideia de que a
conhecimento e também no processo de constituição escola deve trabalhar exclusivamente com os
dos próprios indivíduos em suas formas de ser e agir. conteúdos de ensino. “Não se trata de esquecer os
É na relação de cumplicidade que o processo de conteúdos, mas pensar num trabalho que passa pela
mediação ocorrerá, o professor colocará para os seus qualidade da relação que se estabelece entre professor,
alunos os diferentes conhecimentos objetivados pelo aluno e conhecimento” (Tassoni & Leite, 2013, p.270).
gênero humano em perspectiva de análise e Os autores prosseguem afirmando que a escola deve
apropriação, a fim de que possam conhecer suas ser entendida enquanto um local de interações sociais
determinantes e implicações no atual contexto. intensas e variadas, sendo que, nesses espaços, os
Esses aspectos coligam postulados de alunos devem ter a oportunidade de repensar e
Vygotsky (2001), já que o autor valoriza o trabalho do problematizar inclusive sua inserção social frente ao
professor na ‘formação dos processos psicológicos gênero humano no tocante às diferenças,
superiores’ e na ‘formação dos conceitos’ dos desigualdades, preconceitos, moral, costumes e afetos
estudantes. Destacava, também, a importância do difundidos ao longo da história.

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Considerações Finais Colaboradores

Sem a pretensão de esgotar as discussões C.S. Murgo, W.A. Alves e M.V. Francisco
acerca da temática, este trabalho permitiu conhecer colaboraram na concepção, na coleta e análise dos
o conceito e o sentido das concepções de afetividade dados, na redação e na revisão do artigo.
de estudantes de Pedagogia. Atentos ao valor do
desenvolvimento humano, no que concerne às
emoções e aos sentimentos, os discentes enfatizaram Referências
os seguintes elementos ao fazerem referência à
Almeida, L.R. A emoção na sala de aula. Campinas: Papirus,
afetividade: vínculo, expressão, comunicação verbal,
1999.
comunicação não verbal, diálogo, respeito,
Bardin, L. Análise de conteúdo. Lisboa: Edições 70, 2000.
cooperação, apoio, capacidades de inclusão e de
Dantas, H. A afetividade e a construção do sujeito na
participação e gestão dos conflitos pela negociação.
psicogenética de Wallon. In: La Taille, Y.; Oliveira, M.K.;
É indispensável conferir atenção necessária à Dantas, H. Piaget, Vygotsky, Wallon: teorias psicogenéticas
afetividade na relação educador-educando, pois, do em discussão. São Paulo: Summus, 1992. p.85-100.
contrário, estar-se-á trabalhando somente com a Leite, S.A.S. Afetividade nas práticas pedagógicas. Temas
construção do real, do conhecimento mecanizado, em Psicologia, v.20, n.2, p.355-368, 2012.
deixando de lado o trabalho da constituição do Leite, S A.S.; Tagliaferro, A.R. A afetividade na sala de aula:
próprio sujeito e de seu desenvolvimento integral, um professor inesquecível. Psicologia Escolar e Educacional,
v.9, n.2, p.247-260, 2005.
enquanto um ser social e culturalmente construído.
Leite, S.A.S.; Tassoni, E.C.M. A afetividade em sala de aula:
Com o conjunto das análises realizadas, as condições de ensino e a mediação do professor. In:
percebeu-se que os estudantes de Pedagogia Azzi, R.G.; Sadalla, A.M.F.A. (Org.). Psicologia e formação
participantes da investigação, quando se referiram docente: desafios e conversa. São Paulo: Casa do Psicólogo,
2002. p.113-141.
ao conceito de afetividade, elencaram sentimentos
positivos. Para eles, o professor afetivo é aquele que Ribeiro, M.L. Une analyse des représentations sociales de
l’affectivité chez des enseignants qui participent au
demonstra um bom interesse por seus alunos, tendo programme de formation en enseignement primaire dans une
motivação e satisfação com seu trabalho e université publique de l’État de Bahia. 2004. Thèse (PhD)
consciência de sua responsabilidade em manter um Faculté d’éducation, Université de Sherbrooke, Canadá,
clima agradável, respeitoso e amigo dentro da sala 2004.
de aula. Compreende-se, frente às informações Ribeiro, M.R.; Jutras, F.; Louis, R. Análise das representações
sociais de afetividade na relação educativa. Psicologia da
relatadas, que os docentes em formação, ou seja, os
Educação, n.20, p.31-54, 2005.
graduandos de Pedagogia, já consideram a
Sousa, R.L.M.; Lima, J.S. A prática docente e a questão da
importância de se criar um laço afetivo com os futuros afetividade na relação professor aluno. Revista Ágora, v.3,
alunos. Evidencia-se significativa importância n.1, p.6-16, 2008.
conferida à afetividade nas relações interpessoais, Tassoni, E.C.M. Afetividade e produção escrita: a mediação
todavia, caso essas características não forem tra- do professor em sala de aula. 2000. Dissertação (Mestrado)
balhadas, ganhará contorno uma dimensão negativa - Faculdade de Educação, Universidade Estadual de
Campinas, Campinas, 2000.
da afetividade. A fim de sintetizar e reafirmar os
pressupostos defendidos pelos estudiosos abordados Tassoni, E.C.M.; Leite, S.A.S. Um estudo sobre emoções e
sentimentos na aprendizagem escolar. Comunicações, v.18,
nesta investigação, ressalta-se a necessidade de n.2, p.79-91, 2011.
reconhecer e refletir constantemente sobre o aspecto
Tassoni, E.C.M.; Leite, S.A.S. Afetividade no processo de
afetivo no processo de ensino e aprendizagem, de ensino-aprendizagem: as contribuições da teoria
maneira que produza sentimentos e emoções de walloniana. Educação, v.36, n.2, p.262-271, 2013.
tonalidades mais agradáveis, influenciando Toro, R. Biodanza. São Paulo: Olavobrás. 2002.
positivamente nas relações entre alunos e Triviños, A.N.S. Introdução à pesquisa em ciências sociais: a
conhecimento; alunos-alunos e alunos-professor. pesquisa qualitativa em educação. São Paulo: Atlas, 1987.

Rev. educ. PUC-Camp., Campinas, 21(2):211-220, maio/ago., 2016


220 C.S. MURGO et al.

Vigotski, L.S. Pensamento e palavra. In: Vigotski, L.S. Wallon, H. A evolução psicológica da criança. Lisboa: Edições
Pensamento e linguagem. 3.ed. São Paulo: Martins Fontes, 70, 1998.
1993. p.103-132. Wallon, H. Os meios, os grupos e a psicogênese da criança.
Vygotsky, L.S. Obras escogidas III: problemas del desarrollo In: Werebe, M. J.G.; Nadel-Brulfert, J.; Wallon, H. (Org.).
de la psique. Madrid: Visor, 1995. Henri Wallon. 2.ed. São Paulo: Ática, 1999. p.168-178.
Vygotsky, L.S. Obras escogidas II: problemas de Psicología
General. 2.ed. Madrid: A. Machado Libros, 2001.
Wallon, H. Psicologia e educação da infância. Lisboa: Recebido em 19/5/2015, reapresentado em 17/12/2015
Estampa, 1975. e aprovado em 19/1/2016.

Rev. educ. PUC-Camp., Campinas, 21(2):211-220, maio/ago., 2016

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