854 163 PB
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854 163 PB
2013
ISSN: 2317-2428
www.rigs.ufba.br
Gestor Executivo
Gestão Financeira
Kleber Moitinho
[email protected] Hugo Cardoso do Vale
(CIAGS/EA/UFBA)
Marcelo Fraga da Silva
Editoras do Número Temático
Revisão da Língua Portuguesa Metodologias Integrativas para a
e Normalização Participação
Kleber Moitinho Valéria Giannella
(UFCA)
Gestão da Comunicação
Rodrigo Maurício Freire Soares Vanessa Louise Batista
(CIAGS/EA/UFBA) (FACED/UFC)
Foto da Capa
André Magalhães
Quadrimestral.
Descrição baseada em: Vol. 1, n.1 (jan./ abr. 2012).
ISSN 2317-2428
9 Editorial
11 Foto da Capa
Contribuição fotográfica
André Magalhães
Metodologias Integrativas para a Participação
editorial
É com prazer que nos debruçamos sobre este número da RIGS, repleto de novidades
sobre as metodologias integrativas para a participação. Trata-se de uma sessão temática
coordenada pelas editoras convidadas, professoras Valéria Giannella e Vanessa Louise
Batista. As novidades transbordam no que se refere a reflexões relevantes, expressões
originais, ideias enriquecedoras e novas propostas de prática. Os trabalhos (textos, fotos e
vídeo) permitem-nos melhor compreender contextual e conceitualmente o princípio das
metodologias integrativas no contexto da gestão social, ao explorarem esse princípio no
âmbito de escolas, do teatro, da intuição, do corpo, do planejamento urbano, do bordado, da
criatividade, da arte e da gestão cultural.
Além da sessão temática, contamos com um conjunto rico, interdisciplinar e variado de
leituras. Em duas leituras, a liderança é estudada e ensinada no campo da prática artística,
da criatividade e da aprendizagem. Em outra leitura, mergulhamos no processo histórico
de articulação de interesses ligados ao modelo de desenvolvimento do Estado do Espírito
Santo. Numa última leitura, aprendemos sobre a análise de microinterlocuções em
comportamentos verbais e não verbais que acontecem durante a realização de grupos focais.
Bom proveito!
Semeando Humanidade
André Magalhães
2012
Semeando Humanidade –
Representando o florescimento
de um sonho comunitário
para a construção de uma nova
humanidade: a fertilidade do
encontro entre cultura e natureza.
É um detalhe do “Manto
do Vaqueiro”, adornado por
bordadeiras do entorno da
cidade de Cordisburgo, Minas
Geais – localidade de Guimarães
Rosa. Desenho de José Murilo
de Oliveira.
Foto: Nancy Adler
s e t . /d e z . 2013
v.2n.3 p . 1 3 - 2 7
ISSN: 2317-2428
copyright@2013
www.rigs.ufba.br
Abstract Extraordinary leadership is born in who leaders are, not merely in the
summation of their learned strategies and tactics—no matter how well
executed. The 21st century confronts us with markedly challenging times—
times that call for extraordinary leadership at a global, national, organizational,
and community level. To increase the possibility of business leaders
14 Liderando com Maestria
influencing the world in ways that benefit both society and the company’s
bottom-line, McGill University launched a seminar on The Art of Leadership
in 2003. Aspects of the seminar have since been offered to managers and
executives in Austria, Canada, Dubai, France, India, Israel, Japan, Korea,
the Netherlands, New Zealand, Slovenia, Sweden, Switzerland, and the
United States. Drawing on artistic traditions and processes, the seminar
goes beyond traditional management by focusing on our culture’s most
profound understanding and appreciation of “the possible.” The seminar is
designed to develop participants’ capacities to create, support, and enhance
economically vibrant organizations while simultaneously creating a more
peaceful, compassionate, and sustainable society. It explicitly focuses on
leadership, rather than management; and on the more compelling challenge
of significance rather than the more traditional goal of success. The seminar
is designed to enhance who each individual is as a leader, rather than on their
use any particular set of leadership tools or techniques.
“Em algum momento nos próximos cinquenta anos ou mais, a palavra gerente
irá desaparecer da nossa compreensão de liderança, e que assim seja. Outra pa-
lavra surgirá mais rica em possibilidades, mais útil, que certamente não será de-
cidida numa comissão, que descreverá o novo papel da liderança emergente. Tal
liderança abrange uma pessoa atenta, flexível, centrada no diálogo, espirituosa,
que não tenha desistido de seu intelecto e que ainda possa agir e atuar rapida-
mente quando necessário. Muito da sabedoria necessária para desenvolver essas
características está não em nossas disciplinas empíricas e estratégicas, mas em
nossas tradições artísticas. É o artista em cada um de nós que agora devemos
mostrar para o mundo, seja trabalhando numa fundação para promoção da
arte ou numa organização petrolífera. Com autonomia, é necessário desper-
tar os nossos poderes artísticos e visionários em nossas refinadas competências
analíticas e dedutivas.” David Whyte (1994, p. 240-241), poeta.
liderança. Isso é fundamentado por pesquisas recentes sobre liderança, sugerindo que os
líderes excepcionais são aqueles capazes de buscar inspiração, tanto em fontes espirituais
quanto mundanas, para articular e comunicar simbólica e artisticamente. O seminário “Arte
da liderança” baseia-se numa ampla gama de tradições e processos artísticos— incluindo
o literário, o visual e as artes cênicas — com o intuito de melhorar a capacidade dos
participantes de fazer contribuições significativas para suas empresas e para a sociedade
como um todo.
O seminário usa a experiência de artistas para aprofundar e enriquecer as capacidades dos
participantes de compreender e interpretar a si mesmos e ao mundo em redor. Para esse
fim, o seminário está estruturado a partir de encontros com artistas renomados, bem como
através de experiências de liderança utilizando uma gama de processos artísticos. A seguir,
apresenta-se uma breve descrição dos seis dias do seminário. Observe que o seminário
propriamente dito está constantemente envolvendo a reflexão da cultura e a experiência dos
participantes, a disponibilidade de artistas específicos e instituições de artes, bem como as
experiências mais recentes baseadas em artes que parecem mais atraentes.
[…]Todos nós desejamos trabalhos mais inteligentes do que mais duros. En-
tretanto, estamos todos familiarizados com as ocupações frenéticas que nos
© RIGS revista interdisciplinar de gestão social v.2 n.3 set. / dez. 2013 17
Gestão, como sabemos, cuida de tarefas diárias. Liderança, por outro lado, transcende a
gestão cotidiana. De acordo com o Professor de Harvard Howard Gardner, um líder é um
indivíduo que, sem recorrer à coerção, usa a persuasão para influenciar significativamente
os pensamentos e comportamentos dos outros. A liderança excepcional exige um nível de
inspiração, perspectiva ampliada, coragem, entendimento e compromisso que transcende a
gestão ordinária. Utilizando a pesquisa de Gardner relatada em seu livro “Leading Minds”,
esta sessão enfoca sobre o que os gestores podem aprender com quem tem sido exemplo
de liderança extraordinária. Entre as leituras recomendadas sobre liderança e líderes
extraordinários incluem-se Gardner (1995) e Franck e outros (2000).
Escrevendo uma autobiografia de liderança. Depois de analisar as pesquisas sobre líderes
extraordinários, os participantes têm a oportunidade de contar suas histórias de liderança
pessoal. Como uma introdução, os participantes leem a história autobiográfica de Adler
(2008) “Eu sou filha da minha mãe”. Para prepará-los, eles são instigados a pensar sobre o
líder que eles foram, o líder que são hoje e o líder que mais gostariam de ser no futuro e a
18 Liderando com Maestria
escrever uma autobiografia sobre essa pessoa. Eles esboçam o livro (a autobiografia), dão-
lhe o título principal e nomeiam cada um dos capítulos. Então, eles escrevem um sumário
executivo, destacando os principais temas em suas histórias de vida e dando ao leitor uma
razão para querer ler o livro.
Há mais de 10.000 artigos publicados sobre liderança e mais de 350 definições do que é um
líder, e ainda não há consenso entre os especialistas sobre o que separa bons líderes de maus
líderes. Como você definiria a liderança? Como você definiria a liderança excepcional? Quais
tipos de liderança você mais admira? Com base na sua experiência e observações, quais tipos
de liderança você acredita que as organizações e a sociedade necessitam no século XXI?
Esta sessão usa fotos dos líderes mais influentes do mundo para trazer à tona a definição
implícita de liderança em cada participante e, em seguida, desenvolve uma definição coletiva
de liderança baseada na dinâmica da sociedade contemporânea e dos negócios. Leituras
recomendadas incluem uma série de artigos sobre teorias de liderança bem conhecidas.
O Líder mais admirado. Na preparação para esta sessão, cada participante seleciona um
líder que ele ou ela admira fortemente e traz um retrato dele para o seminário, juntamente
com uma pequena lista das qualidades, características e comportamentos que lhes fazem
admirar o líder escolhido. Alguns selecionam líderes famosos, como Louise Arbour do
Canadá, Mahatma Gandhi da Índia, Aung Sang Suu Kyi de Burma, Nelson Mandela da
África do Sul ou Jack Welsh dos Estados Unidos, enquanto outros selecionam um membro
da família ou amigo que os influenciou fortemente. Antes da introdução à história das
teorias da liderança, os participantes apresentam seus líderes aos seus colegas para começar
a trazer à tona suas atuais teorias da liderança, ainda que estejam até agora implícitas.
© RIGS revista interdisciplinar de gestão social v.2 n.3 set. / dez. 2013 19
O ritmo da vida está pulsando mais rápido e mais caoticamente do que em qualquer outro
período histórico já registrado. “[...] O ser humano espera fazer[…]ordem a partir do caos;
nós almejamos criar estabilidade, ao descobrir um lugar no qual ficar[...] (Whyte, 1994, p.
218). Em tal contexto, um líder mundial deve combinar desenvoltura estratégica com reflexão
cuidadosa. Já há meio século, as pesquisas de Henry Mintzberg demonstraram que um
executivo médio é interrompido a cada 5 minutos. Ao contrário do que se imagina, líderes e
22 Liderando com Maestria
administradores não têm a luxúria de longos períodos ininterruptos de tempo para pensar e
planejar. Essa sessão introduz as ciências da complexidade como um meio de compreender
o ambiente aparentemente caótico no qual a maioria dos líderes atua. É introduzida a
concepção do fazer artístico do Professor da Harvard Business School, Rob Austin, e do
diretor de teatro Davin Lee, em vez do fazer industrial, como uma abordagem eficaz para
a liderança na turbulenta economia e sociedade do século XXI. Ator, escritor, produtor e
diretor de teatro de improviso, Rob Nickerson treina os participantes numa série de técnicas
do teatro de improviso criadas para desenvolver as habilidades necessárias para responder
espontaneamente, como indivíduos e como times, a desafios complexos enfrentados pelos
líderes, num mundo extremamente mutante. Entre as leituras recomendadas, incluem-se
Gladwell (2005), Austin e Devine (2003), Crossan (1997), Cross e Sorrenti (1997), Olivier
(2003) e Olivier e Janni (2004).
dos outros?
Histórias pessoais de coragem. Para se preparar para a sessão, os participantes escrevem
uma história pessoal de coragem no contexto da liderança, utilizando o ciclo de narrativas
clássicas do mitólogo Joseph Campbell para estruturá-la: (1) o chamado para a ação —
algo tão poderoso que o líder se sente compelido a agir; (2) o limite — um incidente
após o qual não há retorno; (3) a luta — seja entre várias pessoas, ou entre as pessoas e as
circunstâncias, ou entre emoções em conflito ou princípios dentro de si mesmo; (4) outro
limiar – uma resolução para lutar; e (5) um retorno — uma reintegração de volta ao lar ou
à vida regular. Entre as leituras recomendadas para esta sessão, incluem-se Adler e Hansen
(2012), Schulessler (2001), Exxex e Mainemelis (2002), Whyte (1994, 2001), March (2006)
e Palmer (1999).
equipes examinam como o tipo de arte tem sido usado para a liderança ou aprendizagem
organizacional. Eles, em seguida, criam uma apresentação interativa e experiencial,
envolvendo, assim, os participantes do seminário nos diversos processos artísticos.
Notas
1 Tradução: Paulo Wenderson Teixeira Moraes e Claudiani Waiandt
2 Frank guarda o aforismo de Goethe consigo como “um credo estético”, lembrando-lhe “que o
mundano merece ser modelado pelo artístico.” Franck et al. (1998: 275). Note que uma nova
edição de “What does It Mean to be Human?” foi publicado em 2000 pela St. Martin Press,
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© RIGS revista interdisciplinar de gestão social v.2 n.3 set. / dez. 2013 27
Abstract The increasing complexity of society and its demand for fast answers in a
globalized world makes it mandatory for companies to reformulate their
traditional processes, so that they can recreate their own business. In
this context, the evolution of the concept of leadership can be observed,
requiring the ability to deal with situations demanding creativity as well as
continuous learning. From this perspective, the objective of this article is to
contribute to the process of reflecting upon the importance of art within
leader development programs.
estudos foram alvo de críticas por vincularem-se à compilação de listas de estilos ideais,
denotando um reducionismo restritivo para a compreensão mais aprofundada do fenômeno.
No intuito de superar as fragilidades apontadas nos estudos anteriores, emergiram outras
frentes de pesquisas revestidas de caráter mais abrangente que levavam em conta o contexto
em que o líder atuava. Conforme destacaram Bowditch e Buono (1992) e Robbins (2005),
vários estudos foram desenvolvidos nessa direção, tais como: Teoria Contingencial de
Fiedler, Teoria do Caminho-Meta de Robert House, Teoria Situacional de Hersey e
Blanchard, Modelo do Estilo Líder-Participação de Vroom e Yetton, Teoria da Atribuição,
Teoria do Processamento de Informações Sociais, Relações Líder-Membro.
Merece destaque a emergência de proposições relativas à liderança transacional que enfatiza
a articulação de processos de troca pelos quais o líder recompensa o comportamento dos
liderados. Outra perspectiva relevante refere-se à liderança transformacional que ressalta
o carisma do líder como aspecto relevante para estimular o potencial dos liderados e sua
capacidade de dotá-los de autonomia para que atuem como agentes de mudanças.
Os apontamentos resgatados, até este ponto, insinuam que os estudos empreendidos
envolveram aspectos ainda pouco claros que dizem respeito à relação entre o indivíduo
(líder) e o ambiente em que atua. Torna-se evidente que aquelas abordagens pautadas numa
racionalidade que desvinculava o sujeito de seu contexto incorreram num reducionismo
capaz de comprometer a compreensão mais ampla do fenômeno. É neste sentido que
ganham espaço e relevância os enfoques que procuram abrir novas possibilidades de
compreensão. Tornam-se “bem-vindas” alternativas que tratem da liderança como expressão
de indivíduos que mobilizam, articulam e aplicam recursos por meio de relações complexas,
sustentadas em aspectos subjetivos, simbólicos e sensíveis. Para além de mitificar ou ofuscar
a compreensão, esses aspectos jogam luz sobre a natureza social da liderança, considerando
que sua gênese se dá num processo de relação social. Conforme apontaram Pagès et al.
(1987, p. 31), não se deve perder de vista que “a organização é um conjunto dinâmico de
respostas e contradições” e que os líderes precisam reinterpretar e atribuir significados à
realidade com a qual se deparam (BENNIS; NANUS, 1988).
Como observa Carvalho Neto (2010):
[...] no caminho percorrido pelas teorias sobre liderança, a partir dos anos 1980,
incorporou-se também a necessidade de se levar em conta a cultura nacional,
em um mundo onde as diferenças estão cada vez mais presentes, onde o líder
deve ter a capacidade de conviver com a novidade, com a diversidade, com o
diferente, tirando o melhor proveito desse embate para a organização da qual é
responsável (CARVALHO NETO, 2010, p. 81).
Uma experiência que se fundamenta nos enfoques mais atuais sobre o tema é descrita por
Adler (2013) e refere-se ao seminário, promovido em 2003 pela Universidade de McGill,
intitulado “A arte da liderança”. O que chamou a atenção nessa iniciativa foi justamente
a valorização da construção de sentido como elemento essencial ao desenvolvimento da
liderança, em detrimento da meta mais tradicional de sucesso. Nessa perspectiva, os esforços
orientaram-se para aperfeiçoar o potencial de liderança dos participantes, ao invés de utilizar
qualquer conjunto particular de técnicas ou ferramentas prescritas.
Na reflexão sobre “liderança”, não se deve perder de vista, conforme explicou Vergara (2007,
p. 63), “o quanto a construção do mundo e de nós mesmos foi alicerçada em um pensamento
cada vez mais fragmentado que ainda domina a humanidade”. Reconhecendo a influência
desse esfacelamento nas decisões e ações dos líderes, essa autora alertou, “teremos de admitir
que esse tipo de pensamento criou modelos mentais que hoje já não conseguem mais
responder aos desafios com que líderes se defrontam a cada dia” (p. 63).
Os estudos recentes sobre liderança vêm reforçando a necessidade de encarar o desafio atual
de grande parte das organizações que se encontram em um patamar entre a estabilidade e
instabilidade e, nesse contexto, a persistente busca pela estabilidade, em vez de ser benéfica,
apresenta-se como uma das causas da decadência e morte organizacional. A ideia de uma
relação direta e ambígua, por vezes contraditória, entre o indivíduo e o contexto em que atua
é, com propriedade, elucidada por Vergara (2007, p. 62) que nos relembra, “somos todos seres
situados”. Tempo e espaço são, portanto, variáveis determinantes de uma realidade dinâmica
e envolvente que, de forma sutil ou voraz, impõe desafios ao exercício da liderança. Dessa
noção decorre, na visão dessa autora, a pertinência do “pensamento complexo”, nos termos
empregados por Edgar Morin. Segundo ela, a aquisição e a renovação de conhecimentos
tornam-se necessárias diante de uma realidade turbulenta e, nesse sentido, explica que uma
postura orientada à aprendizagem de si mesmo, do outro e do contexto pode contribuir para
adoção de novos comportamentos.
Em sua análise sobre a contribuição das ciências sociais para o estudo da liderança, Dourado
(2010), referindo-se à contribuição da teoria da complexidade, estabelece que qualquer
organização deve ter inovadores, pessoas curiosas, um tanto transgressoras, o suficiente para
trazer algo inédito, impensado, que se oponha ao conformismo próprio daquelas pessoas que
não se preocupam com o bem estar ou o futuro da organização, prestam seus serviços, mas
estão empenhadas em seus próprios interesses. Tal teoria sugere ainda que a maior fonte de
criatividade vem de dentro – da interação de indivíduos e grupos dentro da organização –
cujas ações, intercâmbios e adaptações podem redirecionar a organização como uma liderança
emergente. E acrescenta:
A liderança emergente se apresenta para estimular e imprimir significado aos padrões,
fornecer elos a estruturas emergentes, fortalecendo portanto as conexões entre os membros da
organização. Os líderes e gestores organizacionais precisam entender os novos padrões e lidar
© RIGS revista interdisciplinar de gestão social v.2 n.3 set. / dez. 2013 35
com situações de complexidade, mais do que seus resultados; devem focar menos em controlar
o futuro e mais em permitir, estimular futuros produtivos.
Nesse aspecto, a arte apresenta-se como elemento essencial na formação do líder, sobretudo
considerando os desafios que os líderes atuais enfrentam num mundo de rápidas mudanças
em que é essencial a capacidade de compreender e interpretar a si mesmos e ao mundo que os
cerca para responder à exigência de reinventar as organizações e inovar.
Coerentemente, Adler (2013) enfatiza que artistas e líderes enfrentam desafios similares: ver
a realidade como ela é, sem sucumbir ao desespero, enquanto imagina simultaneamente as
possibilidades que vão muito além da realidade atual; ter coragem tanto de combater o engodo
quanto de articular futuros possíveis que, até então, permanecem inimagináveis; e inspirar as
pessoas individual e coletivamente a se superarem em benefício de todos.
A capacidade de ver além das aparências, que se adquire no exercício da arte, pode ser
vislumbrada nos versos da poeta Adélia Prado: “fico triste quando olho pedra e vejo pedra
mesmo, pois é sinal de que a poesia me faltou”.
Para assinalar a importância de associar praticidade e capacidade artística, Adler (2013) recorre
ao poeta David Whyte (1994):
O artista precisa da praticidade de se estabelecer na vida para testar e moderar
o lirismo do insight com a observação da experiência. A corporação necessita
do insight do artista e do poder de concentração a fim de conectar a criativi-
dade e o mundo interior da alma com o mundo exterior da forma e da matéria.
O encontro desses dois mundos constitui o cerne da [liderança excepcional]
(WHITE apud ADLER, 2013, p. 2).
Como se pode observar, os estudos recentes têm enfatizado a importância de uma formação
transdisciplinar, mais voltada para a flexibilidade, a criatividade e a interatividade com vistas
a capacitar o líder para enfrentar os desafios de uma realidade instável, complexa e dinâmica.
36 Considerações Sobre a Arte na Formação do Líder Contemporâneo
É inegável a importância da arte que, segundo Eisner (2002), tem o papel de refinar os
sentidos e alargar a imaginação para potencializar a Cognição.
Podemos concluir, portanto, que a arte na formação do líder certamente poderá contribuir
para uma melhor compreensão da diversidade do mundo globalizado e prepará-lo para lidar
com situações imprevisíveis, utilizando de sua criatividade para desvendar oportunidades e
mobilizar pessoas para responder às exigências atuais de transcender a realidade tal como hoje
se apresenta.
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DOURADO, M. L. G. Novo enfoque das ciências sociais para estudar o fenômeno da
© RIGS revista interdisciplinar de gestão social v.2 n.3 set. / dez. 2013 37
Abstract The objective of this study is to identify the role of the Federação das
Indústrias do Espírito Santo (Findes) in the model of development adopted
by the state of Espírito Santo in the second half of the twentieth century. The
historical process of lobbing in Espírito Santo does not follow the same logic
to what happened in Rio de Janeiro and São Paulo, because there was not
in Espírito Santo the formation of a dual model of representation nor was
the industrialists’ organization the result of outbreaks of industrialization.
Therefore, an entity of the corporatist system, the Findes, became the sole
representative of industrial interests in the state and found no competition in
access to government. Rather, Findes actively participated in the formulation
40 A Participação da Federação das Indústrias do Estado do Espírito Santo...
Introdução
O processo de desenvolvimento econômico do estado não foge ao modelo brasileiro no
que tange ao papel do poder público como indutor do desenvolvimento econômico. De
antemão, sabe-se que, só no final do século XIX, o Espírito Santo encontrou uma atividade
econômica capaz de amparar minimamente as finanças do estado (BITTENCOURT, 2006).
Nesse período, a atividade cafeeira, a qual estava bem desenvolvida no norte fluminense,
expandiu-se para os estados de São Paulo e Espírito Santo. O café foi a mola propulsora
do desenvolvimento desses dois estados, mas as bases desse desenvolvimento foram bem
diferentes, senão opostas.
Em linhas gerais, enquanto em São Paulo, com o decorrer dos anos, o excedente da produção
de café foi destinado à indústria, com o consequente deslocamento e transformação da elite
cafeeira em uma elite industrial e urbana, no Espírito Santo, a elite agroexportadora não
teve essa capacidade de renovação e diversificação dos negócios, o que, por sua vez, manteve
a economia do estado baseada na monocultura do café por quase um século (CAMPOS Jr.,
1996).
Quando, na década de 30, Vargas criou a estrutura corporativista de representação de
interesses com a intenção de incorporar as classes emergentes (empregadores e trabalhadores)
ao sistema político de forma a facilitar o controle do Estado, o Espírito Santo estava muito
distante desse processo de urbanização e industrialização, o qual era visível no Rio de Janeiro
e em São Paulo. Logo, essas classes tipicamente urbanas não compunham o cenário político
e econômico do estado.
Apenas na década seguinte, as diretrizes centrais do governo Vargas, voltadas para o
desenvolvimento e a modernização da economia, chegaram ao estado do Espírito Santo,
através da instalação, em 1942, da Companhia Vale do Rio Doce (CVRD) e da concepção
industrializante do interventor Jones Santos Neves (1943-45). Entretanto, não fora o
suficiente. Os interesses agroexportadores continuaram dominando a cena política capixaba
até a década de 1950, quando houve o endurecimento da política de erradicação do café.
Por isso, é difícil pensar numa elite industrial minimamente representativa no Espírito
Santo antes da década de 60. Daí em diante, o Espírito Santo sofreu bruscas transformações
econômicas em direção à industrialização, num processo marcado pela forte interferência
do Estado.
© RIGS revista interdisciplinar de gestão social v.2 n.3 set. / dez. 2013 41
Nesses estados, a formação de entidades de defesa dos interesses industriais surgiu antes
da estruturação do sistema corporativista implantado por Vargas. As primeiras associações
industriais tiveram caráter efêmero, mas desempenharam um importante papel em defesa da
indústria num contexto de amplo predomínio dos interesses agroexportadores e propiciaram
ainda a formação de novas lideranças. A primeira entidade de caráter permanente organizada
pelos industriais sem a interferência estatal foi o Centro Industrial Brasileiro (CIB), em
1904. Sua criação foi motivada pela defesa da tarifa protecionista, mas também não se
pode esquecer que a conjuntura de greves e manifestações operárias foi, historicamente,
um fator motivador da organização de entidades patronais. A década de 1920, apesar de ser
um momento de crise industrial, foi também um período de construção da identidade das
associações da indústria.
Quando Getúlio Vargas chegou ao poder, encontrou os industriais organiza-
dos em associações setoriais e regionais nos principais centros industriais
brasileiros: Rio de Janeiro, São Paulo, Juiz de Fora e Rio Grande do Sul. O
modelo associativo que os industriais haviam adotado supunha: a) uso de en-
tidades privadas; b) intensa colaboração com os poderes públicos; c) estrutura
corporativa privada, formada pelas associações setoriais que, por sua vez, se
uniam num centro industrial regional de caráter abrangente e misto. (LEOP-
OLDI, 2000, p. 75)
Percebe-se que o processo de formação das entidades patronais no Espírito Santo foi bem
diferente do que ocorreu em São Paulo e no Rio de Janeiro, onde a força do setor industrial
estava, entre outros fatores, no grau de organização de suas entidades. Nesses estados,
como descreveu Leopoldi (2000), o empresariado adequou o modelo de representação
pré-existente ao sistema corporativista, sabendo tirar proveito do acesso ao Estado que tal
modelo proporcionava, mas se resguardou de possíveis intervenções do Estado mantendo
as entidades privadas de representação. Nesse sentido, pluralismo e corporativismo se
combinaram. No Espírito Santo, o sistema corporativista não esteve combinado com
entidades autônomas de representação de interesses. A formação das entidades patronais
foi um processo “forçado” por algumas poucas lideranças, já que não havia grupos sociais
representativos (em termos quantitativos e de volume de capital) para compor entidades
desvinculadas do poder público.
Daí surge um paradoxo: a criação da Findes por “alguns poucos gatos pingados”, os mesmo
que compunham a entidade até 1968, contradiz a relevância da entidade no primeiro
decênio de atuação.
Mas como explicar, então, plausivelmente, a discrepância que se apresenta di-
ante de nós entre a avaliação histórica que se faz da importância inicial da
Findes e a modéstia da base social de que partiu e se formou? Ou seja, já que ela
não era representativa de um poderoso setor industrial cujos interesses es-
tivessem claramente definidos, pugnando pela sua expansão em detrimento
de outros setores, como explicar então a grande importância histórica que a
nova entidade teve naquele contexto? (SANTOS, 2011, p. 119, grifo nosso)
A grave crise econômica pela qual passava o estado naquele momento histórico é a chave
para compreender esse dilema.
A fundação da Findes no começo de 1958 e sua influente atuação nos anos se-
guintes eram fatos sociais novos na história da organização sindical do empre-
sariado capixaba [...] Mas ele estava ocorrendo, não por acaso, num momento
muito importante da história econômica, social e política do Espírito Santo
que muito condicionou sua atuação (SANTOS, 2011, p. 120, grifo nosso)
A criação do GT não foi exatamente uma ideia inovadora, já que no Brasil a criação de
conselhos, comissões técnicas e grupos de trabalhos estavam se popularizando desde a
criação do sistema corporativo. Todavia, no Espírito Santo, a prática era nova e, como previa
o governador, funcionou como uma assistência direta de planejamento e execução da política
econômica. Sem entrar em outras incumbências do GT, o resultado mais impactante de sua
atuação foi a criação do Conselho de Desenvolvimento Econômico – Codec6.
O Codec, exercendo o papel de uma Secretaria de Planejamento, institucionalizou a
participação dos grupos que compunham o GT na política econômica estadual. Espaço
conquistado graças às pressões da Findes. Uma das primeiras atividades do Codec foi a
realização do Plano de Desenvolvimento Trienal, esse plano resumia os objetivos defendidos
no triênio 1961-1963 e seria entregue para o governo federal, no encontro com os
governadores marcado para outubro de 1961. Porém, a renúncia de Jânio Quadros, seguida
da grave crise política que marcou o Brasil e levou ao rompimento com a democracia,
inviabilizou a ajuda federal naquele momento.
Em âmbito estadual, o resultado do pleito de 1962 não foi favorável ao grupo político que
estava no poder. A derrota eleitoral do PSD (partido de Carlos Lindenberg e Jones dos
Santos Neves) adiou a execução do plano de investimentos traçado no decorrer do governo
Lindenberg. Com a volta ao poder de Francisco Lacerda de Aguiar (1963-1965), o foco
deixou de ser a indústria. A Findes perdeu o espaço que tinha no governo Lindenberg para
a Associação de Crédito e Assistência Rural do Espírito Santo (Acares).
O plano de modernização do Espírito Santo só seria retomado no governo de Cristiano
Dias Lopes Filho (1967-1970) primeiro governo do período militar. O golpe militar de
1964 não teve rebatimentos imediatos na política estadual, Lacerda de Aguiar foi mantido
no posto devido a articulações. No entanto, não conseguiu se manter até o final do mandato.
Escândalos de corrupção, forte oposição dos grupos políticos opositores ao governador
© RIGS revista interdisciplinar de gestão social v.2 n.3 set. / dez. 2013 51
A atuação da Findes foi intensa durante o governo de Christiano Dias Lopes, até porque
a conjuntura econômica (decadência da economia cafeeira) favorecia. Como o objetivo
central do Seminário realizado em 1959 era a obtenção de recursos federais, transformando
o Espírito Santo numa “pequena Sudene”, não havia sido alcançado, houve uma nova
mobilização das lideranças estaduais. Com a instauração do regime militar, o Espírito
Santo ganhou novas possibilidades de articulação com o governo federal, o qual passou
a elaborar planos específicos para cada área, como o Plano Nacional Rodoviário, o Plano
Nacional de Telecomunicações, o Plano Nacional de Educação, entre outros. Cabia aos
estados, principalmente os periféricos, articularem para que seus projetos fossem incluídos
nos planos e, consequentemente, serem contemplados com a liberação de verbas.
No segundo ano do governo Dias Lopes, foi realizado o Simpósio sobre os Problemas
do Espírito Santo. A Findes conseguiu o patrocínio do Clube de Engenharia do Rio de
Janeiro. O Simpósio trouxe a Vitória autoridades federais como o Ministro do Transporte,
Mário Andreazza, o Ministro do Planejamento, Helio Beltrão, e o Presidente Marechal
Arthur Costa e Silva. Ao contrário do governo Lindenberg, quando o Seminário precedeu
o diagnóstico, no governo Christiano Dias Lopes, o Simpósio foi realizado com a finalidade
de atrair visibilidade para os problemas do Espírito Santo, já que esses problemas haviam
sido levantados pelo diagnóstico realizado em 1966. O Simpósio foi uma estratégia de
52 A Participação da Federação das Indústrias do Estado do Espírito Santo...
Apesar de todos os governos militares terem uma ligação com a Findes, o período mais
emblemático de atuação da entidade junto ao poder público ocorre durante o governo
Christiano Dias Lopes e, anteriormente, durante o governo Lindenberg. Isso por ser o
momento de formulação do plano de desenvolvimento que norteou o desenvolvimento do
Espírito Santo. Os interesses empresariais ficaram expressos nesse plano através da atuação
da Findes. O que não pode ser entendido como algo unilateral, dado que os governadores
não foram exatamente pressionados por esses interesses. Por entenderem que o estado não
teria forças suficientes para impulsionar o processo de mudanças, as lideranças políticas
buscaram sustentação/legitimidade política e econômica nesse grupo de interesse.
Considerações Finais
O processo de industrialização tardia do Espírito Santo é um elemento essencial para
compreender a formação das entidades de representação empresarial no estado. A formação
do empresariado capixaba como ator político relevante no cenário estadual foi um
processo forçado por alguns governantes e empresários que almejavam a modernização da
economia do estado. A defesa dos interesses empresariais não foi encabeçada por industriais
propriamente ditos, mas por comerciantes que se aventuravam no setor da produção. Nesse
sentido, entidades sindicais surgiram antes mesmo de seus setores econômicos estarem
estruturados. Isso, num período no qual o sistema corporativista já estava implantado no
Brasil. Assim, no Espírito Santo, não houve formação de entidades paralelas ao modelo
corporativista de representação de interesses.
O processo de organização dos empresários no Espírito Santo está relacionado ainda
com o fato de que, no estado, não houve uma tendência espontânea à identificação de
interesses convergentes frente um “inimigo” comum (trabalhadores ou Estado), mas um
processo “forçado” por algumas poucas lideranças que viam na representação através do
sistema corporativista um meio de subsidiar (mais do que pressionar) o governo, com apoio
técnico e financeiro, na formulação de políticas de apoio ao desenvolvimento industrial.
Esses, entre outros fatores apontados, mostram que o processo histórico de articulação de
interesse entre Estado e empresariado no Espírito Santo não segue a mesma lógica do que
ocorreu no Rio de Janeiro e em São Paulo, pois não houve no Espírito Santo a formação
de um modelo dual de representação, tampouco a organização dos industriais foi fruto de
surtos de industrialização.
Além disso, no Espírito Santo, é possível identificar a ativa participação da Findes, uma
entidade do sistema corporativista, com os governos ligados a um grupo político9. Essa
parceria resultou num projeto que norteou o desenvolvimento do estado nas décadas de 1960
e 1970. Isso significa dizer que os interesses empresariais representados por essa entidade
54 A Participação da Federação das Indústrias do Estado do Espírito Santo...
NOTAS
1 É o caso de São Paulo e Rio de Janeiro, onde as entidades utilizaram-se desse fator para atrair
membros e até mesmo convencer filiados a aderirem ao modelo corporativista. Cf. Leopoldi
(2000).
2 No Espírito Santo, o processo histórico de formação dos interesses empresariais favoreceu
a homogeneidade das entidades. A Fecomércio era composta basicamente pelo mesmo
grupo político que passou a concentrar esforços na Findes como indutora de um processo de
modernização da economia do estado. Como “única” entidade de representação de interesses
industriais no estado e composta por membros com interesses em comum (criar condições
para o desenvolvimento industrial no Espírito Santo), a Findes tornou-se praticamente o
único grupo organizado de interesse naquele momento no estado e, como tal, único grupo a
estabelecer relação com o governo do estado.
3 Os efeitos da crise do café e da industrialização são questões amplamente estudas na história
do Espírito Santo. Cf. Zorzal e Silva (1995); Santos (2011); Vasconcellos et al. (2010); Rocha
e Morandi (1991); Correia da Silva (1993).
4 Sobre os impactos da ideologia desenvolvimentista no Espírito Santo. Cf. Santos (2011).
56 A Participação da Federação das Indústrias do Estado do Espírito Santo...
5 Jones dos Santos Neves compartilhava dos ideais getulistas de desenvolvimento industrial
induzido pelo Estado, enquanto Lindenberg, mais conservador, partilhava da alternativa
preconizada pela burguesia agromercantil. Além disso, sob a perspectiva de Lindenberg, o
Estado deveria atuar no sentido de manter suas funções tradicionais e não como indutor das
transformações capitalistas via intervenção econômica.
6 Sobre o Codec Cf. Correia da Silva (1993).
7 Durante o governo Christiano, o Espírito Santo, através do Decreto 880/69, conseguiu
incentivos financeiros que viabilizou seu o desenvolvimento (VASCONCELLOS et al., 2010).
8 Embora tenham sido realizados um seminário e um diagnóstico em cada um dos dois governos
mencionados, pode-se falar de um único plano de desenvolvimento para o Espírito Santo, uma
vez que foram realizados pelo mesmo grupo político e econômico, havendo continuidade de
ideais.
9 Políticos que constituíram o Partido Social Democrata (PSD) e que, com o governo militar,
passaram para a Arena.
Referências
BIANCHI, Álvaro. Crise e representação empresarial: o surgimento do pensamento
nacional das bases empresariais. Revista Sociologia & Política, Curitiba, n. 16, jun. 2001.
BITTENCOURT, Gabriel. História geral e econômica do Espírito Santo: do engenho
colonial ao complexo fabril-portuário. Vitória, 2006.
CAMPOS Jr., Carlos. O novo arrabalde. Vitória, PMV/SMCT, 1996.
CORREA DA SILVA, Justo. Espírito Santo: o processo de industrialização e a formação
da estrutura do poder executivo 1967/1983. Dissertação (Mestrado em Administração) –
Universidade Federal de Minas Gerais, Belo Horizonte, 1993.
DINIZ, Eli. As elites empresariais e a nova república: corporativismo, democracia e reformas
liberais no Brasil dos anos 90. Ensaios FEE, Porto Alegre, v. 17, n. 2, 1996.
_________; BOSCHI, Renato Raul. Globalização, herança corporativa e representação dos
interesses empresariais: novas configurações no cenário pós-reformas. In: BOSCHI, R.;
DINIZ, E. Elites políticas e econômicas no Brasil contemporâneo, São Paulo: Fundação
Konrad-Adenauer, 2000.
GROS, Denise B. Organizações empresariais e ação política no Brasil a partir dos anos 80.
Civitas, v. 3, n. 2, jul. a dez. 2003.
GURGEL, Antonio de Pádua. A Federação das Indústrias e o Desenvolvimento. Vitória:
Contexto Jornalismo & Assessoria Ltda./Findes, 1988.
LEOPOLDI, Maria Antonieta Parahyba. Política e interesses na industrialização
brasileira. As associações industriais, a política econômica e o Estado. Rio de Janeiro: Paz
e Terra, 2000.
© RIGS revista interdisciplinar de gestão social v.2 n.3 set. / dez. 2013 57
Abstract The article discusses the analysis of nonverbal and verbal behaviors in focus
groups, which is called micro-interlocutor analysis. It also offers three other
methodological contributions: (a) presentation of an example of integrated
analysis of verbal and nonverbal communication in data from focus groups,
(b) systematization, in an integrated manner, of individual and collective
60 Comportamento Verbal e Não Verbal em Grupos Focais
Introdução
O renovado interesse pela pesquisa qualitativa nas últimas décadas tornou-se visível pelo
aumento do número de periódicos e de publicações dedicadas a essa abordagem de pesquisa
(MORGAN, 2001; GONDIM; ARAÚJO, 2013). Além disso, cresce também o número de
pesquisas que adotam abordagem multimétodos, procurando usufruir dos benefícios tanto da
abordagem quantitativa, quanto da qualitativa. Esse interesse renovado pelo uso de técnicas
de abordagens qualitativas para compreender fenômenos sociais compele os pesquisadores e
defensores dessa abordagem a investirem na redação de artigos metodológicos que orientem
procedimentos para a análise de dados qualitativos, um de seus maiores desafios.
Para lidar com a abundância e a riqueza de informações geradas pelas abordagens qualitativas
é preciso investir em tecnologias de simplificação e análise, a fim de facilitar a interpretação
e difusão do conhecimento gerado. O presente artigo vem ao encontro dessa tendência,
com enfoque específico na técnica de grupos focais que, apesar de amplamente difundida
nas últimas duas décadas, principalmente para estudos na área de saúde e educação, ainda
se defronta com a dificuldade de encontrar padrões mais sistemáticos de procedimentos de
análise de dados.
Em síntese, o objetivo deste artigo é apresentar um exemplo de análise de dados em grupo
focal que contempla análise de comportamentos não verbais e verbais. Essa análise, nomeada
como “análise de microinterlocuções”, além de identificar respostas decorrentes do coletivo,
também integra dados não verbais e processuais do processo de interlocução em dois níveis
de análise: individual e grupal.
Outro aspecto do cenário atual em metodologia qualitativa que será tratado neste artigo
é a possibilidade de uma abordagem dessa natureza incorporar elementos quantitativos.
Durante décadas, a proposição de desenhos de pesquisa que faziam uso de métodos de análise
mistos foi criticada por aqueles que argumentavam que os pressupostos que orientavam
© RIGS revista interdisciplinar de gestão social v.2 n.3 set. / dez. 2013 61
Número de participantes:
entre 6 e 12
Delimitar o Duração: entre 1 e 2 horas
objetivo do Frequência: indefinida
1. Planejamento grupo focal. Moderação: individual ou
Barbour (2009), e organização Estabelecer o em equipe
Johnson e escopo do grupo Foco do grupo: questões/
Onwuegbuzie focal. tópicos - guia estruturados
(2004) previamente
Krueger, (1994)
Krueger e Casey
Fontes pessoais: indivíduo,
(2000), Identificar
grupos e interações
Onwuegbuzie, 2. Coleta de informações
Fontes de registro: papel,
Dickinson, Leech e dados relevantes a
áudio e imagens
Zoran (2009), partir das fontes.
Wilkinson, (2004).
Transcrições literais
Sistematizar os
Resumos e transcrições de
3. Análise dos dados levantados
notas de campo
dados na coleta de
Memória do moderador
dados.
Dentre os aspectos metodológicos para a realização de grupos focais está a análise de dados,
cujo objetivo precípuo é a sistematização de dados capturados no momento da coleta. A
análise de dados textuais constitui o escopo deste trabalho e constitui o cerne da discussão
que se segue.
Dada essa diversidade de possibilidades, Flick (2004) aponta que, por conveniência, a
opção de pesquisadores é converter todos os dados qualitativos em texto escrito. Tal fato
exige muitos recursos de organização e sistematização de dados, a fim de que o volume de
dados gerados não inviabilize a pesquisa. Além da organização sistemática dos dados em
textos escritos, outro procedimento adotado é o uso de técnicas analíticas que se destinam
à agregação de dados, o que facilita a realização de comparações entre dados oriundos
de diferentes fontes e meios de coleta de dados, bem como a compreensão do conjunto
analisado.
Para os fins deste artigo, será apresentada a técnica de microinterlocuções, a qual se destina à
agregação dos dados de grupo, de forma a situar os desafios existentes ao se analisar grupos
focais no nível de análise individual e grupal. A análise de dados de grupos focais pode
ocorrer a partir de dois eixos de orientação epistemológica: um eixo focado em análises do
comportamento verbal e outro em análises do comportamento não verbal.
Algumas adaptações foram feitas na proposta de Onwuegbuzie et al. (2009), de tal forma a
contemplar as especificidades do estudo em questão. Foram realizadas seis etapas: na primeira,
procedeu-se à transcrição literal do minigrupo; na segunda, diversas leituras e audições
flutuantes do registro coletado; na terceira, foi discutida a categorização dos conteúdos
emergentes e aspectos da comunicação não verbal que fortalecia ou não a comunicação
verbal; e, na quarta etapa, foi feita a análise de microinterlocuções e a discussão comparada
dos elementos analisados. A quinta etapa destinou-se ao uso de quase estatísticas e a sexta
etapa à apresentação do diagrama de Venn. Cada etapa será apresentada com mais detalhes,
a partir da orientação proposta por Onwuegbuzie et al. (2009), para, em seguida, ilustrar
com o exemplo do MMDGS.
Quadro 2 - Exemplo de transcrição que leva em conta também comportamentos não verbais
C – consenso (Dar o
consentimento, expressar
Part.3: Sim, eu já vi também (falando ao fundo com Part. convergência de opiniões)
3- C - 8 segundos de pausa). (P.3, linha 91). ID – interação direta
Part.3: Vamos deixar com Part.2 que já começou, né? (ID (Buscar interação com
com Part. 1). (P.3, linha 93). outro complementando sua
fala ou direcionando-lhe a
palavra).
Conteúdos
Verbalizações Emergentes
Expressão-chave
Lista de Competências
Conteúdos e verbalizações Domínio e classificação
Apresentadas
identificadas de cada verbalização
(Tópico-guia)
“os instrumentos de
política pública para o
desenvolvimento social,
Cognitivo/Avaliação
são muito velhos, são
muito arcaicos, são muito
paternalistas”, (v.1);
“as instituições
Participante 1
envelheceram muito, as
instituições que lidam com Cognitivo/Avaliação
COMP. 1 Cognitivo/
essas questões sociais.”,
Avaliação
(v.2);
“Reconhecer as novas
“a dimensão do social configurações dos
implica numa abordagem territórios presentes
[...] múltipla de aspectos”, Cognitivo/Análise nas estratégias de
(v.3); desenvolvimento que
integram Estado,
“momento de revolução formas organizadas
do conhecimento, de Cognitivo/Compreensão da sociedade civil
interesses” (v.4); e organizações
empresariais.”
“uma concepção de direitos
humanos”, (v.1); Cognitivo/Avaliação
Participante 2
relacionados a elas.
“o mestrado tá muito
focado nesse papel nobre
e maior de todo o serviço
Cognitivo/Análise
público, maior de todos: o
Estado”, (v.2);
ACSGS: Indica quanto o curso contribuiu para a ampliação dos conhecimentos dos
participantes sobre Gestão Social.
O terceiro passo é a análise das divergências e convergências das falas dos participantes,
de tal forma que se tenha um panorama transversal da contribuição de cada participante,
considerando o conteúdo que ele fez emergir. O quarto passo é uma adaptação da proposta
inicial de análise de grupos focais e atende às peculiaridades da avaliação de impacto de
programas educacionais, a qual se ampara, em grande medida, na literatura de sistemas
instrucionais. O processo de avaliação do mestrado profissional foi desenhado a partir
do referencial de objetivos instrucionais. Em sendo assim, este quarto passo consiste em
classificar os conteúdos de verbalizações dos participantes relativos ao desenvolvimento
das 21 competências em três domínios de aprendizagem: cognitivo, afetivo e psicomotor
(BLOOM et al., 1979). A título de esclarecimento, far-se-á breve descrição de cada
um desses domínios. O domínio cognitivo diz respeito à aprendizagem intelectual.
Seus níveis de desenvolvimento possuem seis categorias crescentes em complexidade:
conhecimento (memorização), compreensão (elaboração simples), aplicação (usar
corretamente a informação), análise (decompor a informação e inter-relacionar), síntese
(aglutinar níveis anteriores e produzir algo novo) e avaliação crítica (amplo julgamento).
O domínio afetivo abrange aspectos de incorporação de valores e disposições emocionais
e atitudinais. Seus níveis de desenvolvimento possuem cinco categorias crescentes em
complexidade: receptividade (aquiescência), resposta (ação congruente com o valor),
valorização (importância dada ao valor), organização (compara e prioriza o valor em
relação aos demais) e internalização de valores (incorporação completa do valor que passa
a orientar a vida pessoal). O domínio psicomotor envolve habilidades físicas, motoras e
coordenação muscular na execução de tarefas com o objetivo de automatização. Seus níveis
de desenvolvimento possuem cinco categorias crescentes em complexidade: percepção
(atenção aos movimentos), posicionamento (ajusta-se e ajusta o ambiente para iniciar os
movimentos), execução acompanhada (execução ainda hesitante), mecanização (execução
completa e sem erros) e domínio completo dos movimentos (execução automática).
O Quadro 4 (pág. anterior) ilustra a referida etapa de classificação taxonômica, considerando
como exemplo a categoria de amplo consenso nomeada “Ampliação dos Conhecimentos
sobre Gestão Social”.
Em que pese tal escolha, no escopo deste trabalho, é indispensável identificar o paralelismo
existente entre as verbalizações (proferidas pelos participantes), os conteúdos (provenientes de
análise) e as competências (compreendidas como indicadores de conhecimentos, habilidades
e atitudes contidos nos conteúdos emergentes das verbalizações dos participantes).
Após esse momento, as categorias podem ser nomeadas, com um rótulo que as organize (5º
passo). Na Figura 4, será apresentado quadro contendo a síntese das referidas etapas. Nele,
podem ser identificados os conteúdos emergentes no minigrupo, para a primeira questão-
guia apresentada, sendo que tanto as contribuições do grupo, quanto as contribuições
individuais nesse momento da categorização já podem ser visualizadas.
O grupo reconheceu por pleno consenso (ou seja, todos os membros mencionaram essa
categoria em suas falas e suas contribuições convergiram no mesmo sentido) a: a) Ampliação
dos Conhecimentos sobre Gestão Social (ACSGS); b) Mudança de Atitude na Atuação
© RIGS revista interdisciplinar de gestão social v.2 n.3 set. / dez. 2013 71
C = 1, ID = 8, PE = C = 3, ID = 3, PE C = 2, ID = 4,
Síntese Individual 15, PH = 24, PEX = 5, PH = 9, PEX PE = 9, PH = 12,
=3 =1 PEX = 1
O Quadro acima apresenta os registros verbais e não verbais dos três participantes a partir
da questão-guia. Os três participantes ofereceram contribuições distintas individualmente.
O Participante 1 apresentou mais inflexões em sua contribuição e teve sua participação
74 Comportamento Verbal e Não Verbal em Grupos Focais
marcada por elevado número de pausas hesitativas e explicativas (PH e PE). Em sentido
contrário, em termos de manifestação de consenso (C), esse participante foi o que menos
acordou com os demais participantes, ainda que tenha sido o que mais interagiu com o
moderador principal (1àMP), com o participante 3 (1à3) e com o grupo (1àG).
A demarcação de elementos não verbais nas interlocuções permitiu perceber a postura
reflexiva dos participantes, associados com os conteúdos emergidos, e apresentou elementos
que sublinhassem temas confluentes.
Classificação
Níveis de
Participantes Verbalizações quanto ao Categorias Sínteses
Consenso
Domínio
Amplo Consenso
Número de Verbalizações de cada
Consenso Afetivo
Lateral
participante por
Psicomotor
categoria
Individual
Contribuições
Individuais
Fonte: Elaboração própria
Obs: A coluna de classificação varia conforme o referencial teórico adotado no estudo.
DPS SBA
GCM
APD
ART
ICD DPAP
ACSGS
MAAP
GCM
APD
ICOA
PARTICIPANTE 3 – (P3)
Além desses dados, consensos laterais também podem ser observados, ou seja, foi possível
perceber que os três participantes, formaram consensos entre si, dois a dois e, por vezes, os
três juntos.
Considerando que essa atividade se realizou no contexto de uma pesquisa sobre avaliação
de impacto de Mestrado Profissional sobre o desempenho dos egressos, os resultados
encontrados fomentaram análises do referencial teórico de origem e identificação de lacunas
existentes nesse contexto teórico.
Considerações Finais
Uma alternativa para análise de dados em grupos focais foi apresentada neste artigo. O
ponto de partida foi a percepção de que a análise de microinterlocuções pode auxiliar
na identificação, sistematização e análise de comportamentos verbais e não verbais que
ocorrem em grupos focais e, com isso, integrar níveis de análise distintos em um mesmo
escopo analítico. Pode-se perceber que pressupostos epistemológicos distintos norteiam
esse tipo de análise integrativa de comportamentos verbais e não verbais e constitui ponto
de convergência de autores defensores do uso de métodos mistos de análise (CRESWELL,
2007). A análise de microinterlocuções de Onwuegbuzie et al. (2009) foi usada no exercício
de análise de um minigrupo focal, discutida e adaptada. A proposta conta com maior rigor
metodológico que propostas anteriores e pode contribuir para estudos de desenhos mistos.
O artigo atende a três demandas metodológicas. A primeira é a da apresentação de um
exemplo de análise integrada de verbalizações e comportamentos não verbais em grupos
focais. A segunda é a da identificação e sistematização, de forma integrada, níveis de
análise individual e grupal. A terceira é a utilização de diagramas e quadros-resumo como
facilitadores e integradores dos dados provenientes de diferentes fontes humanas, o que
possibilita identificar a força do consenso e do dissenso, um dos principais objetivos dos
grupos focais.
Certamente outras tantas lacunas permanecem e exigem esforços dos pesquisadores: a
estruturação de análise de interlocuções em grupos maiores; o uso de softwares de análise
de dados qualitativos associados a essa abordagem; os mecanismos de aprimoramento de
representações gráficas dos resultados usando, por exemplo, mapas cognitivos; a aplicação
de análise de microinterlocuções em estudos multiníveis.
Referências
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78 Comportamento Verbal e Não Verbal em Grupos Focais
Editoras convidadas
Valéria Giannella (UFCA)
Vanessa Louise Batista (FACED/UFC)
Resumo Este texto procura refletir e indagar os vastos campos ligados às práticas
participativas, de ampliação da esfera pública, a partir das experiências
coletadas neste número temático. Elas se inserem no âmbito denominado
de Gestão Social e nos levam a ampliar/reconceituar este campo para
além do locus costumeiramente tido como próprio da gestão. A dimensão
metodológica, em sua declinação integradora, é o fio que nos guia nesta
exploração, levando-nos a discutir a necessidade de ampliarmos os conceitos
de racionalidade comunicativa, para além da comunicação lógico-racional;
o conceito de esfera pública, que seja mais do que campo de luta entre
argumentos racionais; o conceito de cidadania, como algo que alcança o
nível planetário. E tudo isso como consequente à nova descrição da realidade
enquanto rede altamente interconectada entre local e global, indivíduo e
totalidade. Também reconhecemos que essas distinções são apenas, favoráveis
à compreensão humana, mais do que estreitamente correspondentes à
alguma realidade externa, seja o que ela for. Uma reflexão ampla, que religa
a pesquisa e prática em Gestão Social às mais avançadas e inovadoras do
campo unitário das ciências contemporâneas.
Abstract This text wants to reflect and explore the vast fields linked to participatory
practices, to the expansion of the public sphere, moving from the experiences
collected in this special issue. They fall within the area named as Social
Management and lead us to extend / re-conceptualize it beyond the locus we
customarily assume is that of management. The methodological dimension in
its integrative declination is the thread that guides us along this exploration,
leading us to discuss the need to broaden the concept of communicative
84 Metodologias Integrativas. Tecendo Saberes e Ampliando a Compreensão
Introdução
Apresentamos aqui – Valéria Giannella e Vanessa Louise – um espaço de reflexão e diálogo
aberto, há pouco mais de um ano, com a chamada de trabalhos sobre “Metodologias
Integrativas (MI) na Participação” que a RIGS acolheu, acreditamos por ser sua própria
proposta editorial de inovação, experimentalidade e criatividade, condizente com a temática
deste número. Os artigos aqui apresentados apontam para um novo paradigma das ações
comprometidas com a participação social e popular, assim como trazem olhares pertinentes
para uma práxis libertadora no campo da Gestão Social.
A RIGS é parte, a nosso ver, do processo de ampliação dos meios de debate e consolidação do
campo temático da Gestão Social, um campo novo aninhado em outro (o chamado “Campo
de Públicas”1), que se autodefine, desde a sua recente origem, pela discussão – e às vezes, a
polêmica – em torno de seu próprio conceito matriz: a Gestão Social (GS). O que é, afinal,
GS, ainda não foi definido pelos ocupantes desse campo, de forma unívoca e inconteste.
Ainda ressoam em nossos ouvidos as discussões e debates travados nos ENAPEGS2 ou
nas reuniões de diversos projetos nas quais, vez ou outra, observamos e, provavelmente,
fomos incomodados, com essa multiplicidade de entendimentos, de enfoques, de agendas...
Como muitas outras coisas, neste período de transição, as velhas disciplinas demostram os
seus limites e não nos satisfazem mais; ao mesmo tempo, o que se apresenta como novo
nos assusta, às vezes, pela sua indefinição excessiva, pela confusão, falta de objetividade...
todas características que chocam com o ideal do que deveria ser o saber científico, pelo que
aprendemos dele em nossa formação acadêmica e de pesquisadores.
A chamada para este número temático buscou mapear e destacar experiências que, por levar
a sério o princípio da participação cidadã, indagam, refletem e experimentam metodologias
apropriadas para realizá-la. Ora, já faz parte do debate corrente a desconfiança com a
participação, já que ela se tornou um mote obrigatório de toda e qualquer política pública ou
© RIGS revista interdisciplinar de gestão social v.2 n.3 set. / dez. 2013 85
projeto, sem que isso chegue a garantir a efetiva inclusão dos que, em cada situação, são ou
serão afetados pelos problemas em pauta. É fato que, frequentemente, encontramos práticas
tradicionais (tecnicistas e autoritárias) maquiadas pelo rótulo da participação. O tecnicismo
e o desprezo a tudo o que não se apresenta nas vestes do conhecimento codificado como
científico ainda vigora, e começamos a entender o quão profundamente a ciência moderna
formatou a nossa visão e determina o que consideramos válido, e legítimo. As barreiras
para a real integração na esfera pública dos que não comungam das mesmas formas de
conhecimento, que não dominam a fala analítica ou o argumento racional, são concretas e
muito difíceis de se transpor.
O intuito deste artigo introdutório é de apresentar sinteticamente, e sem pretensão de
exaustividade, uma visão do campo da Gestão Social a partir de algumas contribuições
recentes que se deram o objetivo explícito da autorreflexão. Após isso, adentraremos uma
ilustração das que foram definidas de Metodologias Integrativas, descrevendo o referencial
teórico e o intuito pragmático e político delas. Finalmente chegaremos a indagar algumas
questões que podem parecer “de fronteira”, mas que originam da reflexão oriunda dos
materiais aqui coletados (artigos e filme), se olhados a partir das inquietações que a ciência
contemporânea instiga como um potencial ainda inalcançado, mas presente. Contamos
com isso avançar e ampliar a busca que nos une: construir coletivamente os caminhos para
sairmos da democracia formal e adentrarmos a democracia de fato, no Brasil como em
outros países. Democracia que pede, hoje, uma reformulação do conceito de cidadania em
um sentido que abranja a dimensão planetária, e da noção de convivência que extrapole o
nível individual e social para integrar o transpessoal3. Fecharemos o artigo com uma breve
apresentação dos materiais que compõem o número, ressaltando, ao “bordar” a teia das
nossas conclusões, os pontos principais da visão construída a partir de uma livre análise de
seu conteúdo.
Da Gestão Social
Descrevendo a gestão a partir de um olhar moderno, característico da industrialização
taylorista, ela é um conjunto de técnicas instrumentalmente orientadas4, codificadas e
formalizadas, que tornam absoluta uma forma específica de racionalidade (a racionalidade
técnica) e reificam os processos de produção (de produtos materiais ou imateriais5),
assumindo a possibilidade de controlar e determinar todo e qualquer fator interveniente,
com vistas à realização das metas pré-definidas de forma eficiente e eficaz.
Quando passamos à noção de “social”, ela remete-nos, de forma abstrata e sintética, às
características da sociedade; com isso podemos imaginar (apesar dos diversos modelos
de sociedade que possamos assumir como referência), algo heterogêneo, complexo,
potencialmente conflituoso, variavelmente influenciado por estruturas de poder, culturas,
condicionantes econômicos, políticos e ambientais. A gestão aplicada ao social não
significaria tentar fazer deste último um objeto manipulável ao prazer de quem detém o
domínio dos mecanismos do sistema vigente?
86 Metodologias Integrativas. Tecendo Saberes e Ampliando a Compreensão
De fato, a junção dos dois termos pode gerar uma variedade de significações. Como já
sinalizava França Filho (2008), podemos entender o social: a) enquanto adjetivo da gestão
(uma gestão já não tecnicista e sim pautada e condicionada pela dimensão interativa e
relacional); b) como seu objeto (uma gestão que se ocupa e visa solucionar os problemas
sociais, sem que seja colocada em pauta a modalidade dessas soluções); c) ou, ainda, como o
seu fim (sendo o objetivo dela o alcance do bem estar coletivo, sem que seja posta a questão
de quem define os contornos de tal objetivo). Essas diversas declinações são detectáveis no
debate com acentos e ênfases diferentes conforme as conjunturas e os autores observados.
Uma leitura contextualizada é a que propõem Boullosa e Schommer (2009) sinalizando
como, na passagem entre século XX e XXI, diante de crises multifacetadas – ambiental,
social, política, econômica e fiscal – começa-se a usar a locução “Gestão Social” como:
[...] expressão, que costumava designar variadas práticas sociais, entre orga-
nizações de origem governamental, na sociedade civil, em movimentos sociais
e empresariais – relacionada às noções de cidadania corporativa ou de respon-
sabilidade social, parece assumir progressivo caráter de solidez, passando a rep-
resentar um modo especial de problematizar e gerir realidades sociointeracio-
nais complexas. A noção de gestão social indica e fortalece um novo modelo de
relações entre Estado e sociedade para o enfrentamento de desafios contem-
porâneos. Um modelo no qual o Estado revê sua suposta primazia na condução
de processos de transformação social e assume a complexidade de atores e de
interesses em jogo como definidora dos próprios processos de definição e con-
strução de bens públicos (BOULLOSA; SCHOMMER, 2010, p. 66).
E ainda:
“[...] mais do que lutar pela participação que ficaria comprometida nas condições
estruturais [...] da realidade brasileira, empurrando massas para o debate onde
serão tragadas pelos mais capacitados, seria lutar pela progressão das condições
educacionais” (PINHO, 2010, p. 51).
É possível contra-argumentar que, essa visão, aborda a questão da educação de uma forma
simplória e que deixa de considerar dois elementos importantes. O primeiro diz respeito
a uma avaliação mais apurada do papel do sistema educacional com relação à formação
de cidadãos participantes. O debate sobre a capacidade da educação de ser formadora de
sujeitos aptos à análise crítica da realidade e dispostos ao envolvimento participativo, e não
apenas reprodutora de sujeitos engajados na competição no mercado global, nos permite
avaliar com mais clareza a natureza da ressalva exposta acima. Dito de outra maneira: não
é qualquer educação que seria condizente com a “construção de novos sujeitos públicos”.
Outro aspecto relevante é que, apontando o presumido despreparo dos cidadãos para
participar, se negligencia o fato de que os próprios processos participativos podem constituir
eficazes dispositivos educacionais, de natureza informal, contextualizados, significativos e
mobilizadores para os sujeitos neles envolvidos. Ora, se a participação é um direito de todos
e os processos participativos podem ser enxergados como um dispositivo de formação de
cidadãos capacitados para tratar de problemas públicos (os novos sujeitos públicos dos quais
falamos acima), decorre que precisamos problematizar as modalidades concretas em que
essa participação se dá. Os paradigmas, as teorias, as logicas, os métodos e as linguagens que
a constroem.
Podemos observar que grande parte dos debates, análises e intervenções com vistas à
avaliação e implantação de processos participativos são pautados em uma visão abstrata
de universalidade do acesso à esfera pública12. Essa visão é baseada na chamada “virada
argumentativa” (FISCHER; FORESTER, 1993) nas ciências sociais aplicadas e tem os
conceitos de racionalidade dialógica ou comunicativa e de processos deliberativos entre os
90 Metodologias Integrativas. Tecendo Saberes e Ampliando a Compreensão
Com essas bases e premissas, podemos lançar um olhar mais atento e crítico às condições
de uma participação apenas pautada no uso dos códigos dominantes, que confirmam as
fronteiras já postas da inclusão/exclusão e impedem o que, no discurso, almejariam, isto
é, a ampliação do acesso à esfera pública para novos sujeitos. A mais radical inclusão que
possamos imaginar é a que amplie as formas de expressão para além das sacramentadas
como normais pelo paradigma dominante nos últimos cinco séculos.
Diante disso, e incluindo a observação crítica a partir da vivência direta de processos
participativos, elaboramos inicialmente o conceito de Metodologias Não Convencionais
(GIANNELLA, 2008; GIANNELLA; MOURA, 2009) e, em seguida, cumprindo
a passagem de uma definição negativa para uma positiva, o conceito de Metodologias
Integrativas, o qual definimos da seguinte forma:
Chamamos de Metodologias Integrativas as abordagens, técnicas e métodos,
norteados pela busca de uma recomposição entre as partes cindidas do ser hu-
mano. A mente se incorporando, a racionalidade tornando-se sensível, a ciên-
cia subjetivando-se, o método abrindo-se para a intuição e a criatividade, etc.
(GIANNELLA, ARAÚJO, OLIVEIRA NETA, 2011, p. 143).
integrativa das metodologias indica uma real troca de saberes e poderes, considerando a
diversidade (geo-histórica, ético-política, afetivo-cognoscitiva) das pessoas a quem compete
responsabilidade deliberativa, decisória e executiva. O embasamento teórico mais detalhado
e o enraizamento dessa proposta no campo da virada paradigmática, do positivismo para o
pós-positivismo, que caracteriza as MI, também pode ser conferido em Giannella (2008).
Além do mais, cabe-nos aqui um outro destaque, para evitar o equívoco de se pensar as MI
enquanto “técnicas” necessárias quando pretendemos envolver os “pouco educados”, os que,
por serem radicalmente excluídos, não dominam os códigos comunicativos vigentes.
Não há razões para se usar de recursos integrativos (desenhos, mapas afetivos, teatralizações,
jogos, música e canto; da possibilidade de se reconhecer em suas raízes humanas e
culturais), apenas com quem não tiver familiaridade em argumentar, analisar, diagnosticar,
prognosticar, nos moldes postos pela ciência e pelas várias vertentes acadêmicas. Pois, essas
outras modalidades de interpretação e expressão são, de fato, uma forma para libertarmos
e valorizarmos o ser criativo escondido e censurado dentro de cada um/a, provavelmente,
mais ainda nos altamente educados do que em quem não teve esse treino e experiência. E
não é sempre mais comum se reconhecer a necessidade de nos afastarmos dos esquemas
conhecidos de solução dos problemas que enfrentamos, pois eles (os esquemas) são parte do
mesmo paradigma que criou os problemas e a crise geral que nos acomete? A criatividade
não é um dos recursos apontados como estratégico para encontrarmos os novos caminhos
que estamos precisando (GIANNELLA, 2008; MELUCCI, 1994; RUAS, 2005)?
De fato, a abordagem das MI move de um posicionamento epistemológico de crítica ao
paradigma cientificista ainda dominante em nossas sociedades e campos disciplinares. No
novo paradigma em construção, a religação dos saberes (MORIN, 2001) e reintegração
das dualidades com que a ciência positivista nos acostumou (MORAES, 2008; VARELA;
ROSCH; THOMPSON, 2003) são passos primordiais. A superação das dicotomias é, de
forma aparente, uma exigência do nosso mundo em transição, em muitos e muitos campos.
Nas organizações, precisamos de gerenciamento criativo para enfrentar os múltiplos desafios
da complexidade ambiental; em toda aplicação de métodos predefinidos, a capacidade
de redefinição e improvisação é primordial; em toda atividade de planejamento, se exige
flexibilidade e resiliência, sob pena de irrelevância e ineficácia... O que ainda precisamos
compreender (e não apenas com as nossas mentes e sim pela sensibilidade do corpo, pela
emoção, pela intuição de dimensões transcendentes) é que a oposição entre corpo e mente,
razão e emoção, arte e ciência, cultura e natureza, criatividade e método, ordem e desordem,
planejamento e improvisação..., não é algo natural e sim uma construção historicamente
determinada que denominamos de ciência ocidental e de positivismo nas ciências sociais.
Um passo a mais, que os materiais aqui coletados nos permitem ousar, é destacar como
o recurso às inteligências múltiplas dos sujeitos, o criar espaço para que se manifestem
enquanto sujeitos criativos e integrais (incluídos enquanto corpomentes, razão sensível e
emocionada, eus que reconhecem a conexão com os outros em uma unidade maior) pode
ser vetor de empoderamento, fator de auto(re)conhecimento, e contribuir, portanto, com sua
trajetória de autoconstrução enquanto sujeito público e planetário (MORIN, 2013).
© RIGS revista interdisciplinar de gestão social v.2 n.3 set. / dez. 2013 93
A observação dos materiais aqui coletados leva-nos a dizer que o que se apresenta como
gestão manifesta campos distintos do saber e do fazer, e que a participação social foi
dimensionada de diferentes formas em cada um dos trabalhos relatados. Entre os focos
metodológicos (artístico, psicológico, transpessoal urbanístico, performático, crítico-
reflexivo), forma-se um eixo orientador e aglutinador que pode ser interpretado como um
fluxo de ações, reflexões e transformações passíveis de serem empreendidas dentro dos
espaços de vida como alternativa ao funcionamento do mundo-máquina. Um caminho de
94 Metodologias Integrativas. Tecendo Saberes e Ampliando a Compreensão
uma nova forma de nos relacionarmos conosco mesmos, com os outros e com o
contexto social. Ao trazer essa perspectiva teórica, o autor também discute conceitos
fundamentais das ciências sociais, quais sejam comunidade, identidade, alienação,
ideologia, além do próprio conceito de desenvolvimento.
yy Tempo de bordar. O artigo, que esquiva o típico molde acadêmico, nos envolve
na narrativa de uma experiência que visa, através do dispositivo do bordado, um
encontro íntimo entre as pessoas que participam dela. Aponta para o bordado
como meio expressivo, ao mesmo tempo tradicional e inovador, remetendo às
diversas formas de marcação da vida humana no campo da materialidade enquanto
fato histórico e milenar. O cuidado com a beleza e o pronunciamento estético,
especificamente ligado a elementos materiais simbólicos para cada contexto, é base
de uma vida íntima conectada à sua dimensão pública. Ao produzir coletivamente
peças artísticas, as pessoas mergulham em suas raízes culturais, se apossam e
exercitam o fluxo participativo de introjeção do que é público, comunicando o que
desse público é privado. A produção coletiva de um processo histórico através do
bordado reúne a potência do movimento estético a uma dimensão ancestral de
explicitação de si e apropriação simbólica do coletivo. Conhecer a história de “minha
terra” em processo de produção criativa instiga o desejo de gerar visibilidade ao que
é comum a todos. Expor a história da “nossa terra” torna-se, nesse processo, um ato
político que, além de colocar cada sujeito na intimidade de sua produção poética,
gera inteireza ao situá-lo na coletividade. Um “eu” apropriado de si e conectado ao
outro e ao todo.
NOTAS
1 Usamos da definição que se encontra na “Carta do Campo de Públicas”, redigida em Brasília, 1
e 2 de outubro de 2013, em ocasião do XI Fórum de Coordenadores e Professores do Campo de
Públicas, o qual presenciou o julgamento do recurso contra as Diretrizes Curriculares Nacionais
(DCNs) do Curso de Administração Pública (Resolução CNE/CES 266), indeferido por
unanimidade pelo pleno do Conselho Nacional de Educação (CNE): “O Campo de Públicas
é o campo multidisciplinar de formação acadêmica, científica e profissional de nível superior,
assim como da pesquisa científica, comprometido com a consolidação democrática. Tem como
objetivo formar profissionais, gerar conhecimentos, desenvolver e difundir metodologias e
técnicas, propor inovações sociais e promover processos que contribuam para o fortalecimento
da esfera pública, a qualificação e melhoria da ação governamental e a intensificação e ampliação
das formas de participação da sociedade civil na condução dos assuntos públicos. Compreende
tanto as ações de governo quanto as de outros agentes públicos não governamentais, sobretudo
as organizações da sociedade civil sem fins lucrativos.”
2 Encontros Nacionais de Pesquisadores em Gestão Social. O primeiro destes encontros
aconteceu em 2007 em Juazeiro do Norte e o próximo (o oitavo) será acolhido em Cachoeira-
Bahia pela Universidade Federal do Recôncavo Baiano.
3 A dimensão Transpessoal (WEIL, 2003; WILBER, 1980; WALSH; VAUGHAN, 1999)
remete a “possibilidades que ultrapassam a concepção de uma limitação orgânica e biográfica
para as experiências conscienciais e desvelam possibilidades transcendentais para a consciência
humana”. Vale ressaltar que tal concepção parte de um movimento científico que congrega
teóricos das ciências naturais e sociais, a partir de revolucionários avanços científicos do século
XX, representando uma nova visão para a ciência ocidental. Sendo assim, a visão transpessoal
propõe a “existência dessa dimensão maior e mais profunda da realidade e do ser, onde é
descrita uma interligação e interpenetração cósmica ocorrendo em todos os níveis e campos do
universo, sugerindo que estarmos mergulhados em uma inefável e pluridimensional realidade
unitária [...] extremamente complexa e organizada, na qual são superadas todas as noções de
temporalidade e espacialidade assumidas pelo modelo cartesiano-newtoniano de realidade”
(BOAINAIN, 2003, p. 11).
4 Isto é, que visam um fim objetivo e inconteste, do tipo maximização do lucro, organização
racional do trabalho, minimização dos custos, etc.
5 Desde os objetos de consumo até as decisões ou o comportamento das pessoas a qual, sem
medo, chamamos de gestão de recursos humanos.
6 Nessa perspectiva, a GS vem se consubstanciando em termos de “[...] coprodução do bem
público como estratégia de produção de bens e serviços públicos em redes e parcerias, contando
com engajamento mútuo de governos e cidadãos, individualmente ou em torno de organizações
associativas ou econômicas. Por meio da coprodução, os cidadãos são ativamente envolvidos na
produção e na entrega dos bens e serviços públicos, tornando-se corresponsáveis pelas políticas
públicas” (SCHOMMER et al., 2011, p. 40).
7 Não podemos ser ingênuos com relação ao sentido de reivindicar para determinado campo
o estatuto de ciência. O qualificar algo como científico se tornou, durante os últimos séculos,
a garantia de legitimidade, a autoridade, capaz de silenciar muitos outros discursos. Para
aprofundarmos as implicações que esse pertencimento implica, veja: Alvares (2000); Escobar
(2000); Santos (2005); Santos; Menezes (2010).
8 Como mostrado pela teoria dos sistemas abertos (os que funcionam nas margens da
estabilidade), esses são produtos da sequência das suas configurações, onde eventos imprevisíveis,
mínimas flutuações de energia, podem levar o sistema para um novo estado de menor entropia.
Nesse sentido, eles são produto de sua própria história (PRIGOGINE; STENGERS, 1979;
© RIGS revista interdisciplinar de gestão social v.2 n.3 set. / dez. 2013 103
SANTOS, 2005).
9 Ao falarmos de envolvimento integral, estamos apontando para um tipo de mobilização dos
sujeitos que não seja pautada apenas em interesses e cálculos econômicos e sim na capacidade
de despertar e canalizar a possibilidade de desejar, sonhar e tentar realizar condições de vida
diferentes (GIANNELLA, 2008).
10 Como mostram diversas dissertações recentemente defendidas, focadas na análise de casos de
políticas territoriais participativas no nordeste brasileiro. Veja Alves (2013); Caillou (2013).
11 Para uma reflexão crítica e clarificação de um sentido possível do ambíguo conceito de
empoderamento, veja o artigo de Giannella; Baron; Souza, neste número.
12 Esfera pública é definida em Wikipedia como: “[...] a dimensão na qual os assuntos públicos
são discutidos pelos atores públicos e privados. Tal processo culmina na formação da opinião
pública que, por sua vez, age como uma força oriunda da sociedade civil em direção aos
governos no sentido de pressioná-los de acordo com seus anseios.” Tenório (2008) acrescenta:
“O conceito de esfera pública pressupõe igualdade de direitos individuais (sociais, políticos e
civis) e discussão, sem violência ou qualquer outro tipo de coação, de problemas por meio da
autoridade negociada entre os participantes do debate” (TENÓRIO, 2008, p. 41).
13 A que fundamenta o cálculo, a análise objetiva, a explicação monocausal e linear, visando à
previsão e controle dos resultados.
14 Provavelmente, a educação infantil representa a única exceção a essa situação. No entanto, a
visão da educação como treino para a competição no sistema global leva a antecipar sempre
mais, até nas crianças, o momento em que o estímulo das inteligências múltiplas é substituído
pelo fortalecimento da (presumidamente) única inteligência valorizada pelo mercado.
15 Neste texto, encontra-se a descrição de algumas Metodologias Integrativas utilizadas na
condução do ENAPEGS 2011, em Florianópolis.
16 Aludimos aqui a um diálogo também integrativo, isto é, não apenas baseado na afirmação da
racionalidade lógico-formal, mas sim na possibilidade ampla de expressão e de escuta do outro,
que as próprias MI nos ensinam e apresentam.
17 É costumeira a concepção de esfera pública apenas como locus da luta entre argumentos
racionais, ou entre poderes. Aqui estamos introduzindo uma noção diferente que implica
no reconhecimento da esfera pública como campo de tensão entre dimensões que a visão
mecanicista nos leva a desconsiderar, como a ética e a estética.
18 Termo alemão utilizado para definir o “espírito da época”, no qual se contextualizam as produções
científicas e/ou heurísticas. O novo espírito do tempo que estamos precisando construir pautar-
se-á no saber da limitação dos nossos saberes; na consciência da interdependência global que
exige um novo cuidado com a vida e, como consequência, no conceito de terra-pátria. A nossa
pátria é o próprio planeta (MORIN, 2013) e é nesse sentido que podemos falar da necessidade
de emergência de um sujeito público planetário.
19 “Os hologramas possuem uma característica única: cada parte deles possui a informação
do todo. Assim, um pequeno pedaço de um holograma terá informações de toda a imagem
do mesmo holograma completo. Ela poderá ser vista na íntegra, mas a partir de um ângulo
restrito. [...] Este conceito de registro “total”, no qual cada parte possui informações do todo,
é utilizado em outras áreas, como na Neurologia, na Neuro-fisiologia e na Neuro-psicologia,
para explicar como o cérebro armazena as informações ou como a nossa memória funciona”
(Wikipédia, Holograma, disponível em rede). Trata-se de um procedimento metodológico
oriundo da Física (ótica). No entanto, o uso da metáfora do holograma para a mente ou o
universo implica dizer que estes (mente e universo) contêm um complexo de informações de
forma imanente (potencial); deste complexo, só se atualiza um conjunto específico, a partir do
104 Metodologias Integrativas. Tecendo Saberes e Ampliando a Compreensão
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108 Metodologias Integrativas. Tecendo Saberes e Ampliando a Compreensão
Introdução
A gestão social, que há cerca de duas décadas vem sendo discutida no contexto
acadêmico, representa uma nova forma de conceber os trabalhos comunitários, imbuindo
as ações sociais de objetivos éticos, de emancipação, autonomia, conscientização,
fortalecimento local e participação dos grupos nos espaços decisórios. Contudo, ante
a realidade social existente em nosso país, no que diz respeito à distribuição de renda,
violência, desinteresse político, defasagem da educação, políticas públicas meramente
assistencialistas que pouco estimulam uma cidadania verdadeiramente democrática,
pensar a gestão social representa um desafio e uma necessidade (FISCHER, 2007).
A Gestão Social
O surgimento e expansão de políticas públicas voltadas para o social e a crescente organização
de empreendimentos populares, a partir de iniciativas da sociedade civil, favorecem que as
tradicionais formas de gestão sejam repensadas, visto que os mecanismos clássicos de gestão
não conseguem dar conta, de modo satisfatório, do trabalho de gerir grupos comunitários.
A partir de tal constatação, começou a constituir-se, em meados da década de 1990, a gestão
social, a qual “[...] é, ao mesmo tempo, uma área de conhecimento emergente, que tem a
contribuição de diversas disciplinas e, especialmente, um locus, de práticas ressignificadas de
gestão” (FISCHER, 2007, p. 5).
Voltada principalmente para ações empreendidas pela sociedade civil ou pelas políticas
públicas sociais, em que os grupos cooperativados e organizados são o foco, percebe-se a
114 Da Timidez à Participação
gestão social “[...] como um processo que deve primar pela concordância, onde o outro deve
ser incluído e a solidariedade o seu motivo” (TENÓRIO, 2008, p. 40). Enquanto na gestão
estratégica prevalece o monólogo – o indivíduo – na gestão social deve sobressair o diálogo
– o coletivo.
Tenório (2008), ao comparar os paradigmas da gestão estratégica com os da gestão social,
afirma que a “primeira atua determinada pelo mercado, portanto, é um processo de gestão
que prima pela competição, onde o outro, o concorrente, deve ser excluído e o lucro é o seu
motivo” (TENÓRIO, 2008, p. 40).
França Filho (2008) vem propor esta distinção, esclarecendo que na gestão privada
[...] a finalidade econômico-mercantil da ação organizacional condiciona sua
racionalidade intrínseca, baseada num “cálculo utilitário de conseqüências”
(Guerreiro Ramos, 1989). Nesta lógica, todos os meios necessários devem ser
arregimentados para a consecução dos fins econômicos definidos numa base
técnica e funcional segundo os parâmetros clássicos de uma relação custo-be-
nefício. Em um tal modo de gestão importa menos a qualidade intrínseca das
ações (seu sentido e significados – remetendo ao plano ético da conduta), e
mais a sua capacidade (da ação) em contribuir para a consecução dos fins pro-
postos, sempre definidos em termos meramente econômicos” (FRANÇA FI-
LHO, 2008, p. 31).
Logo, pode-se definir Gestão Social conforme o preceitua Tenório (2008), como um
“[...] processo gerencial dialógico onde a autoridade decisória é compartilhada entre os
participantes da ação ação que possa ocorrer em qualquer tipo de sistema social – público,
privado ou de organizações não governamentais” (TENÓRIO, 2008, p. 39). Dessa forma,
concebe-se a “[...] Gestão Social como o processo gerencial decisório deliberativo que
procura atender as necessidades de uma dada sociedade, região, território ou sistema social
específico” (op. cit., p. 54). É neste sentido que se concebe a gestão social neste trabalho.
Esta nova racionalidade acerca da gestão pressupõe que aquele que irá gerir tais grupos possua
uma atitude de facilitador para ocorrência dos processos de autogestão, horizontalidade das
relações, cooperativismo e fortalecimento dos grupos. O gestor social detém um caráter de
facilitador do grupo comunitário, sendo necessário que domine, tanto teoricamente como na
prática, conceitos como autogestão, capital social, protagonismo, entre outros que auxiliam
no processo de gestão social. Logo,
O papel do gestor social é bem diferente do gestor tradicional de empresas
privadas. O primeiro prima pela participação popular, cidadania, ampliação e
acesso aos bens e serviços sociais, em uma sociedade multifacetada e desigual.
O que exige que tenha, sobretudo, poder de articulação e negociação. Já o se-
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Com base nessas reflexões, passa-se a expor como o Projeto Gestão Social nas Escolas tem
buscado em sua prática a aproximação com os princípios da gestão social. Tal prática inclui a
utilização da Psicologia Social Comunitária, a partir dos grupos operativos, dialogando com
as Metodologias Integrativas, conhecidas também como Metodologias não Convencionais
(MnC) (GIANNELLA, 2009).
Giannella (2009) afirma que as metodologias anseiam contribuir com a produção do
conhecimento interativo, valorizando as competências reais dos sujeitos. Além disso, tais
metodologias utilizam-se de técnicas voltadas à mobilização da inteligência coletiva, à
gestão de trabalho em grupo, análise, interpretação e solução participativa de situações-
problema. Para tanto, o método utiliza-se de recursos, tais como a arte e o lúdico, como
meio de integrar as inteligências múltiplas dos sujeitos, sejam elas a partir da abordagem
analítico-racional, a estética, a intuitiva ou a sensível. A perspectiva é que a participação
efetiva dos cidadãos esteja pautada na consciência da necessidade de multiplicar as formas de
leitura, interpretação e simbolização da realidade de acordo com a riqueza das capacidades
humanas (GIANNELLA, 2009).
A metodologia dos grupos operativos proporciona a execução de tarefas grupais, mas
também produz como efeito secundário a qualidade de vida, a promoção da saúde mental
e o bem-estar do sujeito no grupo, na medida em que é dado a todos o direito igualitário
de participação e de expressão na resolução dos problemas. Ou seja, “a terapia não é o
objetivo principal do grupo operativo de aprendizagem, mas algumas de suas consequências
podem ser consideradas terapêuticas, na medida em que capacitam o sujeito para operar na
realidade” (PICHON-RIVIÈRE, 2009, p. 253).
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Encontro de Integração -- 01
Fonte: Acervo do projeto
A utilização das salas de aula para a realização das atividades causou um efeito dicotômico.
Por um lado, a aceitação por parte dos alunos foi unânime. A grande maioria viu nas
atividades do projeto uma possibilidade de experimentar novos conceitos e de uma forma
divertida com cores, sons e formas distintas, que os tirava da rotina positivista presente no
cotidiano das escolas. Contrapondo a aceitação dos alunos, muitos professores tiveram um
comportamento hostil ao cederem o espaço e horário que lhes era normalmente cabido.
No intuito de estabelecer uma aproximação e obter parcerias junto aos professores, reuniões
e formações foram promovidas para esclarecimentos dos propósitos e das metodologias do
PGSE. Alguns professores sensibilizaram-se e incluíram em suas aulas atividades ligadas ao
projeto. Outros utilizaram-se das temáticas e resultados das ações do projeto para promover
eventos escolares, tais como Feiras de Ciências e atividades alusivas ao meio ambiente, além
de participação em feiras escolares temáticas promovidas em espaços externos à escola,
demonstrando interação com os alunos e com os escopos do projeto. No entanto, esse
quadro foi pontual, pois a maioria dos professores permaneceu distante, sem demonstrar
indicativos de interesse em se envolver, contribuir e participar das atividades juntamente
com os alunos.
Outro aspecto desafiador do projeto foi a forma de construção dos empreendimentos, a
partir de um processo de sensibilização e fortalecimento dos sujeitos pois, como adverte
Paul Singer (2002, p. 21) “As pessoas não são naturalmente inclinadas à autogestão, assim
como não o são à heterogestão”, logo, “[...] o poder local de uma comunidade não existe a
priori, tem que ser organizado, adensado em função de objetivos que respeitem as culturas e
diversidades locais, que criem laços de pertencimento e identidade sócio-cultural e política”
(GOHN, 2004, p. 24).
Sendo assim, a primeira etapa do Projeto foi dedicada a fomentar nos jovens discussões
referentes ao autoconhecimento, ao conhecimento do grupo e da comunidade, levando-os a
enxergar-se como sujeitos capazes de modificar sua realidade. Para tanto, conforme descrito
no quadro abaixo, uma sequência de ações, dinâmicas e atividades foram promovidas nos
quatro pri meiros meses do projeto.
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Os jovens foram convidados a refletir sobre as potencialidades e limitações dos bairros nos
quais estão inseridos, analisando aspectos estruturais, ambientais e sociais. Os bairros são o
Frei Damião, onde está localizada a escola CAIC, o Parque Antonio Vieira, onde se situa a
Escola Prefeito Antonio Conserva Feitosa e o Centro, onde se localiza a Escola José Bezerra.
Trata-se de bairros que apresentam uma série de problemáticas, as quais englobam a falta
de segurança, saúde, saneamento básico e onde muitos jovens moradores estão vulneráveis
ao envolvimento com as drogas e a prostituição.
Nessa fase introdutória, foi também instigado o desejo de conhecer o grupo em que
estavam inseridos. A aplicação da dinâmica das duplas rotatórias contribuiu para esse
reconhecimento, pois cada um teve a oportunidade de conversar com todos do grupo a
partir da seguinte indagação: Em que me pareço com você? Essa atividade teve por objetivo
“a instauração de um campo de fala e negociação democrática [que] apoia o sentimento de
pertencimento ao grupo e o enraizamento numa coletividade [...]” (CORTEGOSO; LUCAS,
2008, p. 45 – grifo no original).
A ação seguinte visava que os jovens refletissem sobre os problemas existentes em suas
comunidades e alternativas para solucioná-los. Portanto, aplicou-se uma atividade de
observação, onde teriam que identificar, durante a trajetória da escola para casa, o que mais
os incomodava. Como resultados dessa ação, foram apontadas como queixas principais
a poluição/lixo, a violência/drogas e as estradas/estrutura das ruas. A apresentação dos
resultados foi feita a partir de uma atividade interativa definida como: Muro das lamentações
e Árvore dos Sonhos. A fala de um dos jovens demonstra a descoberta das potencialidades
a partir da interação do grupo quando relata: “Foi importante por causa do conhecimento
e aprendizagem, conscientizou a alguns alunos a saber que você pode mudar o mundo se
divertindo e fazendo novas amizades” (Fala de jovem participante do PGSE). É notório que,
ao compartilharem algo em comum entre si, os jovens reconhecem não apenas o ambiente
em que estão inseridos, mas também se reconhecem como parte desse ambiente e do grupo.
120 Da Timidez à Participação
Giannella (2009) demonstra em seus estudos que a utilização da arte como recurso para
instigar processos criativos é um meio de afirmação do potencial dos sujeitos e de aquisição
de autoconfiança e autoestima. Nessa perspectiva, seguindo os preceitos das metodologias
não convencionais, ou integrativas, que valorizavam as inteligências múltiplas, o próximo
passo foi mapear os talentos existentes nas turmas trabalhadas, pois “um mapeamento das
capacidades e talentos dos moradores de uma comunidade é etapa essencial na construção
do desenvolvimento de dentro para fora” (NEUMANN, 2004, p. 45). Utilizando-se de
dinâmicas grupais, os jovens foram convidados a apresentar seus talentos, fosse ele musical,
artístico, linguístico, dançante, entre outros.
Mapeados os talentos, desenvolveu-se uma ação para mobilizá-los no sentido de propiciar
que os jovens percebessem que seus talentos e habilidades podem ser utilizados na resolução
de seus problemas cotidianos. Essas atividades integrativas representaram um passo
fundamental no projeto, tendo em vista que elas favoreceram a participação dos jovens: “O
nosso desafio no começo era a timidez e também a falta de comunicação de alguns alunos,
mas conseguimos vencer por meio de brincadeiras e conversas.” (Fala de jovem participante
do PGSE).
O reconhecimento das metodologias integrativas como importante elemento para o alcance
dos resultados propostos é demonstrada pelos jovens e também por outros atores. Uma
representante da CREDE afirma:
A sensibilização que foi feita, como as brincadeiras, foi o mais importante, mas
não era uma brincadeira, mas uma metodologia específica para chamar atenção
dos meninos. Esse acompanhamento/monitoramento que vocês fazem, essa
avaliação, tudo é muito importante, porque o que nós vemos é que os projetos
são muitos, mas não acontecem de fato, eles tendem a acabar, há toda uma
estrutura, envolvimento de todos para dar certo. Vocês descobriram talentos
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nos alunos, eles só precisassem de um empurrão, ele pode ir mais longe, esse
direcionamento foi dado (Fala de representante da CREDE 19).
A partir desse convite para o sonho e para a ação, deu-se início, então, à segunda fase do
projeto. Nessa oportunidade, foi explicado que, a partir desse momento, somente aqueles
que se identificaram com as ações já realizadas é que continuariam no projeto, ou seja,
enfatizou-se a adesão voluntária, afinal uma ação que é imposta não gera protagonismo.
Sendo assim, o projeto seguiu com metade da quantidade inicial de alunos, passando de
500 jovens para pouco menos de 250, permaneceram apenas aqueles que se identificavam
com a proposta e que tinham disponibilidade para participar das atividades, especialmente
as vivenciadas no contraturno. “Na raiz do protagonismo deve existir a livre opção do
jovem, ele tem que participar na decisão de fazer ou não a ação”. (ESPÓSITO, 2010, p.
97). Os jovens ressaltaram que a participação de todos foi incentivada através das atividades
apresentadas, quando declararam que o “Trabalho é de forma dinâmica para que ninguém
desista, incentivando os alunos para que não deixem de participar do projeto.” (Fala de
jovem participante do PGSE).
Segundo Meirelles (2007), ao falar sobre rede de aprendizado, destaca-se que
O projeto assume o pressuposto de que a qualidade da educação avança na medida em que
aprofundam as ações e reflexões conjuntas, com sujeitos que operam e refletem em parceria,
em suma, em rede de aprendizagem e colaboração mútua. Nesta direção, a mobilização
e articulação dos diferentes atores constituem-se em estratégias fundamentais e, como
não poderia deixar de ser, plenas de desafio (MEIRELLES, 2007, apud GIANNELLA,
OLIVEIRA, CALASANS, 2010, p. 105).
122 Da Timidez à Participação
Seguindo esses fundamentos, foi realizada uma dinâmica denominada “Tocou-colou”, cujo
objetivo era mostrar aos jovens a necessidade de se pensar em rede e de se manter conectado
para que fosse possível realizar a segunda etapa do projeto, a qual consistiria em elaborar
coletivamente planos de ação com impacto socialmente positivo.
Tinha-se em vista que, na busca da legitimação de todos como atores da esfera pública, faz-
se necessário uma reinvenção da fala individual e coletiva, bem como uma reapropriação da
integralidade de seres sentir-pensantes. Nesse sentido, as metodologias não convencionais,
ou integrativas, visam proporcionar a produção do conhecimento interativo, valorizando
as competências reais dos sujeitos e ainda mobilizar toda a riqueza do humano na esfera
pública (GIANNELLA, 2009).
Figura 4 - Atividade do PGSE na UFC
A segunda etapa dos trabalhos foi reiniciada com a construção das regras do funcionamento
grupal, como forma de estabelecer o enquadre dos grupos operativos que se formavam
(ZIMERMAN, 1997). Portanto, foi elaborado o contrato grupal da turma, onde os jovens
criaram coletivamente as normas e valores que deveriam ser obedecidos para o bom
desempenho das atividades e a permanência no projeto. A proposta do contrato grupal
relaciona-se com o que é evidenciado por Tenório (2007, p. 117), ou seja, que “[...] a
participação voluntária ocorre mediante um grupo que cria suas próprias normas, maneiras
de atuação e objetivos”.
Essa retomada das atividades deu-se após o período de férias letivas, ocorridas no mês de
julho de 2011. No entanto, o planejamento foi alterado devido à greve dos professores,
a qual se manteve durante todo o semestre. O episódio representou um desafio para o
andamento do projeto, pois surgiu de forma inesperada, atrasando o cronograma de
atividades que havia sido previsto. Porém, “o gestor do desenvolvimento social [precisa ser]
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foi realizado o segundo Encontro de Integração para que os jovens colocassem em prática
suas ideias e trocassem experiências. Foi promovido e organizado com os jovens um dia de
oficinas, apresentações artísticas, palestras, desfiles, entre outras atividades. Esse encontro
representou o encerramento do projeto para aqueles grupos que executaram seu plano de
ação e a passagem para a terceira etapa do projeto para aqueles grupos que criaram propostas
de geração de trabalho e renda.
Figura 6 - Atividade integrativa do 2º Encontro de Integração
Durante toda a realização do projeto, uma preocupação constante foi com o fortalecimento
dos vínculos cooperativos entre os jovens, assim como o desenvolvimento do protagonismo
e do fortalecimento do capital social comunitário. Compartilha-se da opinião de Cortegoso
e Lucas (2008) de que
[...] simulando situações que devem ser resolvidas em colaboração, os apren-
dizes vivenciam a interação positiva – mesmo que eventualmente conflituosa
– com os colegas e aprendem a se expor, argumentar e ouvir. Estimular senti-
mentos recíprocos de ajuda faz parte da intervenção, como prática pedagógica
(busca de novos esquemas cognitivos) e como prática psi (busca de novos pro-
cessos de subjetivação). É preciso construir uma relação onde o sucesso de cada
membro está ligado à conquista do grupo, potencializando o coletivo, geran-
do uma postura mais auto-reflexiva e crítica [...] (CORTEGOSO; LUCAS,
2008, p. 61).
As atividades do PGSE eram facilitadas pelos estagiários, sempre direcionadas por uma
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finalidade, proporcionar a coesão grupal, lidando com conteúdos implícitos e explícitos que
emergiam por meio dos diferentes papeis que circulavam entre os integrantes do grupo.
Enfatiza-se que
A técnica operativa do grupo, sejam quais forem os objetivos propostos no grupo (diagnóstico
institucional, aprendizagem, criação artística, planejamento, etc.) tem como finalidade que
seus integrantes aprendam a pensar numa co-participação do objeto de conhecimento,
entendendo-se que pensamento e conhecimento não são fatos individuais, mas produções
grupais (PICHON-RIVIÈRE, 2009, p. 245).
Figura 8 - Metodologias Integrativas do Projeto Gestão Social nas Escolas
Considerações
A experiência acima descrita permite pensar que, para atuar no contexto de grupos
comunitários a fim de elaborar ou desenvolver projetos de intervenção, o gestor social
terá que perceber a importância de estabelecer como “objetivo o fortalecimento dos laços
coletivos, atuando a partir do entendimento dos processos grupais desenvolvidos em cada
organização solidária, utilizando técnicas de dinâmica de grupo que favoreçam a emergência
das características singulares do grupo [...]” (COUTINHO; BEIRAS; PICININ;
LUCKMANN, 2005, p. 11). Portanto, defendemos a importância de um trabalho
interdisciplinar, já que algumas áreas do conhecimento possuem métodos e técnicas para
atuar nesse sentido, como os grupos operativos.
É válido ressaltar que o uso das MnC ou Metodologias Integrativas foi um forte aliado
no diálogo com os jovens. A cada dinâmica, os jovens sentiram-se desafiados e, portanto,
motivados em dar continuidade às tarefas propostas e, por conseguinte, ao projeto. Além
disso, mostraram-se mais seguros para expor suas opiniões e expressar seus sentimentos
diante do grupo, pois reconheciam a si próprios e ao outro de uma forma lúdica, o que
valorizou os saberes e as habilidades individuais e do grupo.
Os resultados alcançados contaram com alguns desafios. Como exposto anteriormente, o
PGSE iniciou as suas atividades em campo com cerca de 500 alunos distribuídos em 11
turmas do ensino médio. O grande número de alunos por sala deu oportunidade a todos
conhecerem a proposta do projeto para decidir se permaneciam ou não na segunda etapa.
Essa escolha metodológica da primeira etapa, por vezes, dificultou a comunicação entre eles,
especialmente nos momentos das devolutivas, no final de cada atividade. Primeiramente, a
limitação do tempo não permitia que todos falassem e, segundo, o grande grupo inibia os
mais quietos, sendo assim, não raro o diálogo ficava a cargo daqueles que já possuíam a
habilidade da comunicação em público. Por outro lado, é importante observar que alguns
jovens que inicialmente se mostraram tímidos e por vezes recuados a participar, com o
passar do tempo, foram estabelecendo relações de confiança com o grupo, se apropriando
do processo de construção coletiva e, por fim, já eram capazes de sugerirem e solicitarem a
utilização de dinâmicas interativas.
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Torna-se relevante destacar que foi um processo muito valioso na construção da autonomia
e cidadania, afinal, muitos dos jovens envolvidos no PGSE mostraram-se estudantes ativos
e, pelo uso adequado da fala, utilizaram instrumentos de negociação de conflitos por meio
de rodas de conversa e reivindicações junto à escola, onde foi construído um Jornalzinho,
o qual trazia informações sobre a escola e institucionalizava também um espaço aberto
para a fala dos jovens. Observamos ainda que outro indicador de cidadania e autonomia é
o reposicionamento dos jovens enquanto moradores que conhecem a realidade do bairro,
tanto as potencialidades que fortalecem o sentimento de pertencimento local quanto as
fragilidades. Essas últimas foram foco de propostas criativas e não convencionais para
transformação de situações cotidianas.
A experiência do PGSE enfatiza os ganhos provenientes do trabalho interdisciplinar
e demonstra que as metodologias para trabalhar com gestão social estão em construção,
moldando-se a partir das realidades vividas, o que ressalta a contribuição desse projeto rumo
à elaboração de propostas metodológicas nesse setor.
NOTAS
1 Laboratório de Pesquisa Transdisciplinar sobre Metodologias Integrativas para a Educação e
Gestão Social da Universidade Federal do Ceará.
2 Incubadora de Empreendimentos Populares e Solidários da Universidade Federal do Ceará,
Campus Cariri.
Referências
BORGES, A. C. V. et al. Ensino e Pesquisa em Administração e Gestão Social: uma
experiência de integração academia-sociedade. In: CANÇADO, A. C.; SILVA JÚNIOR, J.
T.; SHOMMER, P. C.; RIGO, A. S. (Org.). Os Desafios da Formação em Gestão Social.
Palmas-TO: Provisão, 2008.
CORTEGOSO, A. L.; LUCAS, M. G. (Org.). Psicologia e Economia Solidária: interfaces
e perspectivas. São Paulo: Casa do Psicólogo, 2008.
COUTINHO, Maria Chalfin; BEIRAS, Adriano; PICININ, Dhiancarlos;
LUCKMANN, Gabriel Luiz. Novos Caminhos, Cooperação e Solidariedade: a Psicologia
em empreendimentos solidários. In: Revista Psicologia Social, Porto Alegre, v. 17, n. 1,
2005. Disponível em: <http://www.scielo.br/pdf/psoc/v17n1/a02v17n1.pdf>. Acesso em:
20 fev. 2011.
ESPÓSITO, Marlene Veiga. O Educador Social e a Busca Ativa a Crianças e Adolescentes
Exploradas Sexualmente. 2010. Disponível em: <http://pair.ledes.net/gestor/titan.
php?target=openFile&fileId=233>. Acesso em: 20 maio 2011.
FAVERO, Eveline; EIDELWEIN, Karen. Psicologia e Cooperativismo Solidário: possíveis
(des)encontros. In: Revista Psicologia Social, Porto Alegre, v. 16, n. 3, dez. 2004.
130 Da Timidez à Participação
Resumo O Estatuto da Cidade alavancou e deu garantias para uma efetiva participação
popular nos destinos da cidade. Avançou-se em processos mais densos de
negociação neste campo. No entanto, o planejamento urbano brasileiro
não tem logrado tornar melhores as cidades para a vida de seus cidadãos,
carecendo de experiências dialógicas que os envolvam. A participação social
tornou-se imprescindível para a criação de cidades capazes de abraçar seus
cidadãos em circuitos de inclusão social. É com essa concepção que relatamos,
neste artigo, o processo participativo ocorrido em uma das periferias da
cidade de São Paulo, para refletir e propor projetos de reurbanização de áreas
degradadas pelo adensamento desordenado e com riscos socioambientais.
Trata-se de processo adotado na gestão social urbana junto à população
da microbacia do Rio Cabuçu de Cima, região norte em São Paulo pela
Secretaria Municipal da Habitação (SEHAB), para ouvir os moradores
quanto a propostas sobre o território para a elaboração de um plano urbano
integrado. Esse projeto foi igualmente provocado pela presença da Prefeitura
de São Paulo na 5ª Bienal de Roterdã/2012 - Making City, a qual teve como
fio condutor pensar a cidade a partir da voz dos moradores.
134 Gestão Social Urbana
Abstract The City Statute promoted and assured ways to carry out people’s
participation in the city planning. Progresses were made regarding a more
consistent negotiation process in this field. However, Brazilian Urban
planning has not succeeded in making better cities for their citizens, lacking
of dialogical experiences including them. Social participation has become
essential for the creation of cities able to embrace their citizens in circuits of
social inclusion. It is on the base of such view that we report, in this article,
the participation process which occurred in one of the outskirts of São
Paulo city, to reflect and propose projects of redevelopment for degraded
areas, affected by chaotic urbanization and socio-environmental risks. The
process was carried out as an urban social management project with the
population of the micro basin of the Cabuçu de Cima River, located at
northern São Paulo; it was run by the Municipal Housing Department,
listening to the residents about the proposals for their territory, in order
to elaborate an integrated urban plan. This project was also encouraged by
the participation of the Municipality of São Paulo in the 5th Biennale of
Rotterdam/2012 - Making City, which had as its guiding thread thinking
the city on the base of the voice of residents.
The process resulted in broad and rich negotiation between public managers
and the population affected by the urban projects. To be carried out, eight
workshops were designed, whose core theme was “lived and desired
urban environment”, seeking to reveal competencies and consolidate the
political expression of its inhabitants. No social negotiation is done without
exchanging information and learning between technical team (technical
knowledge) and residents (knowledge acquired from the everyday
experience of the urban environment), which resulted in qualified debate,
taking into account the collective and the territory as a whole.
INTRODUÇÃO
São Paulo é uma megacidade, complexa, que cresceu de forma desordenada e caótica, ditada
pela voracidade da iniciativa privada. O poder público manteve-se a reboque atuando de
forma impotente para regular, normatizar os fluxos e traçados da cidade. Possui atualmente
11.821.873 milhões de habitantes e uma área de 1.523km², com seu espaço praticamente
todo ocupado, conformando territórios bastante heterogêneos que expressam a desigualdade
socioespacial. Vários planos municipais e metropolitanos foram propostos e pouco foi
realizado para transformar o cenário urbano precário das periferias.
O novo plano municipal de habitação para o período 2010/2024 avançou, buscando um
novo olhar sobre o território, um plano de urbanização integrado por sub-bacias com
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resulta em intervenção mais eficaz, pois terá a voz e a adesão dos moradores nas decisões
tomadas.
A maioria dos loteamentos nos bairros periféricos como os do Jaçanã/Tremembé, na região
norte de São Paulo, foi construída ilegalmente, incluindo moradias autoconstruídas em
terrenos pequenos, sem áreas verdes e de lazer, infraestrutura urbana precária, ruas e calçadas
estreitas, entre outros problemas.
É nessa arena constantemente produtora de tensão e conflito urbano que se faz necessário
inverter as lógicas tradicionais de se operar projetos urbanos habitacionais “de cima para
baixo”, introduzindo como ação prévia e continua a interlocução com a população local
que será afetada. Não qualquer interlocução, mas aquela que reconhece nos moradores seus
potencias e, por isso mesmo, cria espaços horizontais de troca.
Dessa forma, neste relato, destacamos o processo de negociação social utilizado como tarefa
inerente ao campo de gestão do território. O foco dessa ação está na própria negociação
prévia entre gestores públicos e a população a ser afetada por projetos urbano-habitacionais,
evitando conflitos recorrentes nessa área e, sobretudo, incluindo as proposições, história e
demandas de seus habitantes no próprio planejamento da intervenção urbana.
A negociação foi realizada por uma equipe de consultoria social externa1 com a participação
dos técnicos da SEHAB. Valeu-se de oficinas com moradores e integrantes de organizações
comunitárias para refletir sobre as ambiências urbanas nos seus bairros: as ausências, as
potências e arranjos urbanos de que se valem e de quais aspiram valer-se. A proposta das
oficinas teve como fio condutor pensar a cidade interagindo com os moradores - gerar um
espaço de troca, onde os moradores possam dar voz às suas demandas.
Para tal, partiu-se da hipótese de que, ao desenvolver a fluência comunicativa dos
moradores, reconhecer e valorizar o seu conhecimento sobre o território, se poderia criar
um rico espaço de trocas de saberes entre os técnicos e os moradores. De acordo com
Vargas (1999), “o conceito de qualidade ambiental urbana (de vida urbana), vai além dos
conceitos de salubridade, saúde, segurança, bem como das características morfológicas do
sítio ou do desenho urbano. Incorpora também os conceitos de funcionamento da cidade
fazendo referência ao desempenho das diversas atividades urbanas e às possibilidades de
atendimento aos anseios dos indivíduos que a procuram”.
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É uma área acidentada com vários morrotes, composta por vários bairros, tais como: Jardim
Fontalis, Jardim Guapira I e II, Jardim Filhos da Terra, Jardim Galvão, São João III, Jardim
Felicidade, etc. Esses bairros estão localizados próximo à Serra da Cantareira, e alguns deles
em áreas fronteiriças. Esses bairros possuem loteamentos regulares, clandestinos e ocupações
em áreas públicas. É difícil distingui-los a olho nu, frente à carência de infraestrutura. Em
muitos deles, as habitações estão sediadas em área de risco.
Alguns desses bairros foram constituídos na década de 80 com os programas municipais
PROMORAR e PROPERIFERIA3, portanto, são caracterizados por habitações em
pequenos lotes, poucas áreas destinadas a equipamentos públicos, espaços verdes e de lazer,
apesar desses terem sido contemplados nos projetos. Consequentemente, o bairro tornou-se
uma “área cinzenta”, como nomeiam os moradores.
Figura 3 - As ruas estreitas e ausência de verde, lotes pequenos (MENDES, 2011).
MATERIAIS E MÉTODOS
Algumas premissas serviram de base para pensar as oficinas:
Não há qualificação da cidadania sem ganhos de confiança social que processam a própria
inclusão. A confiança é a própria potência, a própria força ou o trampolim que nos impulsiona
mais adiante (TEIXEIRA, 2003).
A população marcada pela pobreza pode possuir uma baixa escolaridade formal, mas porta
saberes construídos na experimentação, na observação cotidiana, nos processos solidários
presentes nas relações sociais do seu território. Esses conhecimentos são muitas vezes
desqualificados e, portanto, não aparecem como potência.
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Essa atividade foi utilizada em todas oficinas, pois funcionou como um diário dos registros
das discussões e ações propostas no processo. O Mapa dos Afetos mobilizou os participantes
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Retrato do Lugar
Mais um procedimento foi adotado, uma atividade lúdica com as fotografias tiradas
pelos moradores no passeio, chamado de Retrato do Lugar. Essa atividade consistiu na
desconstrução do bairro e na construção de um bairro possível. Esse retrato foi feito pelos
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participantes durante várias oficinas nas quais se discutiam e faziam várias intervenções
acerca de um bairro possível, colocando suas aspirações e proposições. Entre elas, o desejo
de transformar as margens do rio em parque linear com ciclovias, novas áreas de lazer e
muito verde em todo o território.
Figuras 7 - Os participantes recortando as fotos e montando um bairro desejado (MENDES,
2011).
Foram registradas todas as alterações feitas pelos participantes, durante cada oficina, numa
cartolina verde, onde eram colocadas e retiradas as fotografias recortadas, a partir de uma
dinâmica reflexiva. Esse processo foi inteiramente fotografado; ao todo foram tiradas
mais de 400 fotografias editadas em um stop motion (um filme montado a partir de várias
fotografias) com uma duração de 2’:23’’.
Figura 8 - Os moradores marcando as áreas de risco (MENDES, 2011).
Maquete do Bairro
A maquete da região, feita pelos técnicos da SEHAB, foi outro instrumento utilizado nas
oficinas, para analisar a topografia do lugar, os atalhos e as áreas de risco. Foi trabalhada
com eles, a percepção sobre as áreas de risco, a troca de informações sobre a região, sobre
a dinâmica das águas em época de alagamento, as questões vivenciadas no território e os
recursos utilizados por eles no enfrentamento (as áreas que costumam alagar na época de
chuva e os terrenos baldios que servem de descarte de lixo clandestino, a falta de água, etc.).
Cartografia do Lugar
A Cartografia do Lugar foi outro procedimento adotado nas oficinas, atividade lúdica que
consiste na história em pontos para trabalhar a percepção e as questões cristalizadas. A partir
de um tecido de algodão de 2:00x1:60 m, os participantes foram convidados a desenhar
um mapa afetivo do lugar, colocando referências afetivas e espaços que eles gostariam que
tivessem no bairro (parque linear nas margens do rio). Para tal, foram fornecidos, pelos
técnicos da equipe, retalhos, tintas, fitas, botões.
Figura 9 - O mapa afetivo bordado por eles (MENDES, 2011).
trecho do bairro, revelou a importância dos atalhos no microterritório. Esses eram a forma
que os moradores encontraram para circular a pé no bairro (andar de ônibus, além de ser
caro, é demorado), sendo muitos dos acessos precários, sem degraus ou iluminação.
Outra questão percebida pelos técnicos foi o sentimento presente de pertencimento
e solidariedade; todos se conheciam e se ajudavam. Os participantes disseram que uma
das melhores condições do bairro era o relacionamento construído entre eles, sendo que a
maioria mora ali há mais de vinte anos, e que vivenciaram toda a formação do bairro. Apesar
da deficiente rede de equipamentos públicos (escolas, creches, hospitais, etc.) e da precária
infraestrutura urbana, os participantes, durante o percurso, expressam uma preocupação
maior com a ausência de áreas verdes e de lazer no bairro, bem como com a preservação da
Serra da Cantareira.
Após o passeio, os participantes registraram o percurso, suas impressões e colaram objetos
colhidos (flores, frases, etc.) no Mapa dos Afetos.
Figura 10 - Trabalhando no Mapa dos Afetos, as referências colocadas pelos moradores
(MENDES, 2011).
Na terceira oficina, momento em que se realizou a reflexão sobre o território, foram utilizadas
as fotografias da caminhada e outras trazidas pelos moradores. Foram colocadas todas as
fotos numa mesa e solicitado que escolhessem três fotos e discutissem em grupo os temas
propostos em três questões sobre o bairro: O que eu transformaria? O que eu manteria no
bairro? O que não pode mais haver no bairro?
Solicitou-se então que respondessem as questões por escrito e também apresentassem
as fotos escolhidas, o porquê da escolha e, em seguida, que as colocassem no mapa onde
achassem melhor sua inserção. As respostas assemelharam-se: o foco foi o saneamento
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básico, as áreas de risco, a segurança, melhoria nas casas, área de lazer, preservação da Serra
da Cantareira, escolas de ensino médio, hospital, posto de saúde, ausência de calçadas, entre
outros. Das respostas apresentadas, a que mais chamou a atenção foi a preocupação com a
Serra da Cantareira e a ausência de verde no bairro, ressentem que o bairro é ausente de cor,
considerado cinza por eles.
As áreas verdes e a Serra foram o quê os três grupos concordaram em manter no bairro.
Outra questão que chamou atenção foi a de um grupo que manteria as casas do jeito que
elas estão, apesar do tamanho e da precariedade das instalações e ausência do verde, tão
valorizado por eles. A casa não é um espaço qualquer, é um lugar de experimentação de
emoções, onde as histórias afetivas ocorrem e se constroem as relações (TUAN, 1983).
Para aprofundar a reflexão, foram apresentados aos participantes os demais instrumentos:
a Cartografia e o Retrato do Lugar. Colocou-se em duas mesas os materiais de cada
instrumento: as cartolinas e as fotografias para fazer o Retrato do Lugar, o tecido, retalhos e
linhas para fazer a cartografia. Explicou-se o significado de cada instrumento e foi solicitado
ao grupo escolher um deles, em qual gostaria de trabalhar: no Mapa dos Afetos, Retrato do
Lugar ou Cartografia do Lugar.
As mulheres, enquanto maioria, ficaram vidradas pela cartografia e começaram a escolher os
panos e a proposta a ser desenvolvida, tanto que os outros grupos acabaram ficando menores.
Dessa forma, a cartografia precisou de pouca orientação: os moradores apreenderam
rapidamente a ideia e começaram construindo em volta do rio um parque linear e uma
ciclovia gerando mais uma proposta a partir de uma modalidade amplamente utilizada para
se locomover no bairro.
Figura 11 - As mulheres trabalhando na cartografia (MENDES, 2011).
A escolha do Mapa dos Afetos foi feita pelos participantes mais articulados politicamente.
Iniciaram construindo uma legenda: rota do seu cotidiano (escola, comércio, trabalho, etc.),
lugares para transformar, lugares de convívio, áreas de lazer, serviços de apoio (ONGs,
serviços públicos, etc.). Os participantes se envolveram e se debruçaram no mapa iniciando
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primeiro a rota do cotidiano e a área de lazer. Foi muito interessante vê-los descobrindo o
percurso diário, discutindo entre si onde poderia ser um lugar de lazer ou escola em áreas
que se apresentavam vazias. Outras áreas para os equipamentos eram eles que informavam
à equipe técnica da SEHAB, áreas que os técnicos desconheciam a disponibilidade. A
preocupação com a Serra da Cantareira volta a aparecer, pontuam a fragilidade da vigilância
sobre ela, das invasões clandestinas no mapa. Conversam com os técnicos da SEHAB sobre
as áreas que poderiam ter um jardim, uma praça, apontam áreas que, apesar de pertencerem
tanto à SABESP como à CESP, são faixas de servidão.
Figuras 14 e 15 - Os recortes e as montagens (MENDES, 2011).
Para o Retrato do Lugar foram dispostas cartolinas de várias cores para que o grupo
escolhesse uma delas como fundo do retrato. Aqui aparece o verde, mais uma vez, como a
cor preferida. Essa atividade teve duas funções: uma, fazer uma reflexão/ desconstrução e
reconstrução do bairro e um stop motion (uma animação de fotografias de curta duração)
do processo, para ser apresentado na Bienal. Foi solicitado aos membros do grupo que
recortassem as coisas de que mais gostavam nas fotografias espalhadas na mesa (o ipê, o
rio, as pessoas, crianças, etc.) e, com esses recortes, montassem um retrato do bairro. Essa
atividade durou 4 oficinas.
Figura 16 - As frases formando um trajeto no mapa (MENDES, 2011).
Com os recortes em mãos, eles iam montando uma história do bairro. Por ser um exercício
para pensar sobre o bairro, as fotos só foram coladas na última oficina. Esse processo de
escolher as fotos, recortá-las, colocá-las na cartolina, retirar, trocar, colocar um recorte sobre
o outro e discutir no grupo levou-os a refletir a potencialidade dos lugares e o que eles
queriam para o bairro. Essas configurações feitas com os recortes de fotografia foram sendo
modificadas ao longo das oficinas e formaram uma história do lugar. Esse processo foi
fotografado (mais de 400 fotos) e no final foi feito um filme - stop motion - de 2:33 minutos.
Todos adoraram o filme, pois identificaram o cotidiano vivenciado, mais colorido e mais
bonito. No final das oficinas, todos os participantes ganharam um DVD com o filme feito
por eles. Esse filme (stop motion) foi apresentado também na Bienal.
Na continuidade das oficinas, foi reservado um tempo de síntese retrospectiva do processo
realizado, pedindo que escrevessem frases e depois as fixassem em forma de um trajeto
no Mapa dos Afetos. As discussões sobre os problemas no bairro foram produtivas; os
participantes introduziram novas informações pesquisadas no intervalo de cada oficina,
perceberam o quanto caminharam na troca de informações e na construção do conhecimento
150 Gestão Social Urbana
sobre o bairro. No final dessa reflexão, foi solicitado aos participantes que escrevessem, para
a próxima oficina, sobre a sua história de vida no bairro, as histórias seriam compartilhadas
nas oficinas.
Na quinta oficina, a temática foi a percepção de risco dos participantes: qual era o nível de
informação e de entendimento que eles possuíam das situações de perigo no bairro. Esse
encontro iniciou-se com a leitura da história de vida escrita por uma das participantes,
solicitada na oficina anterior. A moradora apresentou sua trajetória pessoal, iniciada no
bairro em 1982. Retoma, em sua história, a formação do bairro partilhada por muitos dos
presentes: a ocupação de áreas; a ausência de saneamento básico e equipamentos públicos;
as enchentes, as conquistas feitas (água e luz no bairro e nas favelas). Não percebia relação
de risco nas enchentes vivenciadas no passado; passa a considerar área de risco as áreas dos
morros depois que a prefeitura fez o alerta, há pouco tempo. Teve dificuldade de acreditar,
pois nunca a Prefeitura tinha se manifestado antes.
A percepção de risco dos participantes sobre as áreas mostrou-se muito próxima das
avaliações técnicas feitas pela SEHAB, revelando o grau de informação e conhecimento
que possuem sobre as questões do bairro. Sabiam que a remoção das casas nas áreas de
risco é necessária, mas não concordavam com a forma como a SEHAB tratava a remoção
das famílias desabrigada, oferecendo R$300,00 de aluguel e o lugar para morar deveria
ser procurado pela própria família. Não ofereciam nenhum acompanhamento ou mesmo
orientação/informação para as famílias quanto à existência de habitações em áreas mais
próximas. Muitos tem que buscar uma outra região para reiniciar a vida, isso significa
fragilizar relações e redes de enfrentamento no seu cotidiano. Essa era uma preocupação de
todos.
Mostram preocupação com as enchentes e, conhecimento de causa, a falta de verde, o
adensamento e a topografia do lugar propiciam que algumas áreas inundem na época das
chuvas. Sinalizam o que pode ser feito: o alargamento ou um coletor no Rio Piqueri, traçam
suas hipóteses e a necessidade de remoção de famílias para outras áreas no bairro.
Na continuidade, o grupo do Mapa dos Afetos teve como missão pontuar as áreas de risco no
mapa e propor ações. Apresentaram várias situações de risco: as habitações no morro perto
do Rio Piqueri, as áreas de enchentes tanto as próximas ao rio como as de fundo de vale para
onde correm as águas, os terrenos baldios que servem de descarte de lixo clandestino, a rota
de droga nos fundos das favelas, a falta de iluminação nas ruas, etc.
Refletiram sobre a necessidade de remoção dos imóveis construídos na margem do Rio
Piqueri e propuseram outra área próxima, onde poderia ser construída as novas residências; a
necessidade do alargamento do córrego e a construção de uma calha de drenagem; a criação
de área verde ao longo das margens do rio; a construção de uma estação de tratamento
de esgoto na Vila Zilda e outra próxima ao CEU Jaçanã. Destacaram igualmente, na área
próxima ao Jardim Filhos da Terra, a necessidade de remanejamento das famílias das áreas
de risco para outra área no bairro, a construção de muro de arrimo para proteger as famílias
remanescentes.
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Propuseram também a revitalização de toda a área que passa pela torre de alta tensão, com
projetos de agricultura comunitária; a recuperação da área do CDM que hoje se encontra em
poder da guarda metropolitana. Fizeram a indicação de áreas para as famílias que precisam
ser remanejadas das áreas de risco e indicação de áreas para os serviços públicos necessários
para a região: UBS, hospital, creches, praças. Reafirmaram que a região em que vivem é
carente de serviços de saúde. Apresentaram um projeto (com planta e detalhamento) de
horta comunitária para um terreno baldio hoje utilizado para descarte de lixo clandestino.
Na sexta e na sétima oficina, foram finalizados os produtos com os participantes e os
gestores da Secretaria de Habitação. Foram divididos em três grupos. Cada grupo elaborou
uma pauta para ser discutida nessa reunião sobre o lugar onde vivem: demandas, sugestões
de revitalização urbana, serviços necessários, etc. Um grupo resolveu abordar a questão da
saúde e educação, outro sobre habitação, saneamento e as áreas verdes, outro sobre projetos
que eles já têm para o bairro. Cada grupo elegeu seu porta voz. O grupo de moradores fez
uma lista de convidados, moradores do bairro atuantes nas questões do território. A pauta
do encontro: apresentação do plano de urbanização da SEHAB com as sugestões colhidas
nas oficinas para serem discutidas com os moradores. Discussão do plano e apresentação das
demandas pelos participantes dos grupo.
Na oitava oficina, último encontro, foram convidados vários gestores de várias secretarias
(Saúde, Habitação, Meio Ambiente), consultores nacionais e internacionais (grupo de
holandeses da Bienal) e os escritórios de arquitetura que ganharam a licitação para fazer
o plano. Um total de 80 pessoas. O encontro ocorreu no CIC Norte, no mesmo local
onde foram feitas as oficinas. Iniciou-se pela apresentação de um plano urbanístico para
a área pela secretaria. Havia uma preocupação dos técnicos da SEHAB que os moradores
não conseguissem acompanhar a explanação do plano de urbanização. Contudo, eles não
tiveram problemas de compreensão das inúmeras plantas apresentadas; fizeram perguntas
pertinentes indicando que estavam entendendo tudo. A apresentação dos moradores, por
sua vez, deixou todos os gestores impressionados com a fluência argumentativa e com os
dados apresentados que seriam impossíveis de se prever pelo projeto técnico.
Resultados Substantivos
A população detém um saber vivido, decorrente de aprendizados acumulados em suas
trajetórias de vida urbana, sabendo se valer dele para diagnosticar e propor. Esse saber é
imprescindível na formatação de projetos urbanísticos e habitacionais. No entanto, essa
ação nem sempre ocorre, seja pela presunção do conhecimento técnico que os profissionais
da produção urbana detêm, e que desqualifica o saber vivido dos moradores do território;
seja porque não se sabe buscar a adesão da população. Os moradores são competentes na
produção de um diagnóstico urbano social quando há espaço para fruição e intercâmbio
entre conhecimento vivido e conhecimento técnico.
Quando a população vivencia um processo participativo horizontal (democrático) com
técnicos e gestores da política pública, ela é capaz de contribuir significativamente nas
152 Gestão Social Urbana
Considerações Finais
Todo e qualquer planejamento urbano feito com a comunidade tem mais condições de
ser efetivo à medida em que conjuga as demandas e as dinâmicas do ambiente vivido,
propiciando o engajamento dos moradores na construção do futuro de seu bairro. Permite
também a mudança de percepção dos urbanistas sobre a potencialidade das áreas periféricas
quando interagem com a comunidade e vivenciam mais de perto o território.
Explorar o território por meio de oficinas reflexivas-propositivas foi uma estratégia acertada.
A metodologia utilizada nas oficinas permitiu desvelar a particularidade das questões
urbanas no microterritório. Assegurou:
yy Espaço de reflexão e empoderamento dos moradores, levando-os a articular e
repensar o território coletivamente;
yy Espaço de conhecimento da dinâmica do ambiente vivido pelos moradores e pelos
técnicos urbanistas;
yy Espaço de diálogo entre os dois saberes: dos técnicos e dos moradores, permitindo
conhecer as demandas e proposições dos moradores para determinadas áreas no
microterritório;
yy Espaço de acolhimento dos desejos coletivos;
yy Espaço de integração e articulação das redes sociais locais.
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NOTAS
1 O desenho e a coordenação dessa negociação por meio das oficinas foi feito pela equipe social
externa, contratada para esse fim. Essa equipe foi composta por duas assistentes sociais e
uma artista plástica. A coordenadora dessa equipe foi a Prof. Dra. Maria do Carmo Brant de
Carvalho.
2 Os planos de Ação Integrada fazem parte da proposta de planejamento urbano pensada pela
SEHAB.
3 Os programas municipais PROMORAR (retirada de famílias de favelas para um novo
loteamento, com terrenos de meio lote 6/12m2, com habitações de 43m2 para serem concluídas
pelos proprietários) e PROPERIFERIA (a regularização dos loteamentos clandestinos, com
a introdução de meio lote (6 por 12m2) e a introdução de equipamentos sociais e áreas verdes
nos projetos regularizados). Esses programas foram desenvolvidos na administração Reinaldo
de Barros, 1979-1983.
4 CIC-Norte - Centro de Integração da Cidadania – Secretaria da Justiça e da Cidadania –
Governo do Estado de São Paulo.
5 Os instrumentos foram desenhados pela equipe social externa, especialmente para este projeto,
a partir da demanda da Secretaria e da Bienal (esta queria produtos para serem expostos).
Partiram de suas referências e experiências profissionais.
6 Metodologia utilizada por Thibaud ( 2004) para capturar as ambiências urbanas vivenciadas
pelos habitantes in loco.
7 Uma técnica da equipe social externa que coordenava a atividade e um técnico (arquiteto) da
equipe da SEHAB como observador.
REFERÊNCIAS
AUGOYARD, Jean-Franços. Pas à pas – Essai sur le cheminement quotidien en milieu
urbain Paris: Éd. du Seuil, 1979.
CARVALHO, M. C. B. Desenvolvimento Social e o Impacto nas Políticas Públicas.
Conferência CEPAM, São Paulo, 2010.
154 Gestão Social Urbana
Patricia Assistente social, doutora em Saúde Pública pela Faculdade de Saúde Pública
Brant da Universidade de São Paulo (USP), pós-doutora em Sociologia Urbana
Mourão pelo Laboratoire Cresson-CNRS, França, pesquisadora colaboradora do
Teixeira Centro de Memória da UNICAMP.
Mendes
156 Gestão Social Urbana
Abstract A version of this paper was originally written in 2004 to be studied by volunteer
teaching artists working with the Youth Onstage! Community Performance
School in New York City. Youth Onstage!, which recruits its participants
from New York City’s poorest neighborhoods, is a youth program of the
All Stars Project, Inc. (ASP) and grows out of the Castillo Theatre. It was
meant to introduce these teachers to the history and methodology of these
organizations. This is essentially a subjective, experiential paper, a reflection,
by an active participant, on 30 years of community organizing, theatre
making and discovery. It unpacks some of the history and practice—along
with the self-study and reflection—that has gone into building the Castillo
Theatre and some of its sister organizations in the United States. Although
the experience it describes has been informed by theory (in particular, that
of Karl Marx, Lev Vygotsky, Fred Newman and Lois Holzman), it is not
a theoretical or research paper, and makes no claim to being a scholarly or
objective work. To the extent it has been researched, the research consists
primarily of what has come to be called “participatory research.” As such, its
stance is clearly subjective—and the gaze of that subjective stance is itself
somewhat variable. The first person plural “we” that is used throughout
sometimes refers to the author, sometimes to the Castillo Theatre where he
now serves as artistic director, sometimes to the All Stars Project, and, most
often, to the larger network of organizations and activities that calls itself the
“development community,” of which Castillo and the All Stars are a part. In
the end, the views expressed here are those of the author and are not meant
to represent the institutional views of either Castillo or the All Stars.
Resumo Uma versão deste artigo foi originalmente escrita em 2004, para servir na
capacitação de professores/artistas voluntários, que trabalhavam junto ao
projeto “Youth Onstage!” ( Jovens no Palco!) da Escola Comunitária de
Performance em Nova Iorque. “Youth Onstage!”, o qual recruta os seus
participantes nos bairros mais pobres de Nova Iorque, é um programa para
jovens do “All Stars Project, Inc.” (ASP) e nasce da extensa experiência do
Castillo Theatre (Teatro Castillo). O artigo foi concebido para introduzir
esses professores à história e metodologia dessas organizações.
Trata-se, em sua essência, de uma contribuição experiencial e subjetiva,
baseada na reflexão e nas descobertas de um participante ativo de trinta
anos de organização de teatro comunitário. Ela revela um pouco da
história e da prática, junto com o autoestudo e reflexão, que alimentam
a construção do Teatro Castillo e de algumas de suas organizações irmãs
nos Estados Unidos. Embora a experiência que ele descreve seja informada
pela teoria (em particular, a de Karl Marx, Lev Vygotsky, Fred Newman e
Lois Holzman), não é um trabalho teórico e não tem pretensão de ser um
trabalho acadêmico ou objetivo. Na medida em que tem sido pesquisado,
o que apresentamos consiste basicamente no que veio a ser chamado de
“pesquisa participativa”. Como tal, a sua abordagem é claramente subjetiva
e os pontos de vista assumidos, dentro dessa abordagem, são também um
pouco variáveis. Assim, a primeira pessoa do plural “nós”, que é usada ao
longo do texto, pode se referir ao autor, ao Teatro Castillo onde ele agora
atua como diretor artístico, ou, por vezes, ao “All Stars Project”; na maioria
das vezes, refere-se à maior rede de organizações e atividades que se
autodefine de “comunidade de desenvolvimento”, da qual o Castillo e o All
Stars Projects são partes. As conclusões tiradas no final pertencem ao autor
e não representam a visão institucional do Castillo Theatre ou do All Star
Project.
development is to remain possible. On the most basic level, we, in the development
community, have come to understand development as the activity of being able to see new
possibilities and having the willingness (and support) to act on them. Performance, as we
understand it, is what makes it possible to go from here to there. When performing, we are
who we are (because we can’t help but be who we are) and at the same time, we are who we
are not, who we are becoming.
Thus, our efforts to create a more democratic, developmental society, to transform what
it means to be human, to develop, have led us to performance. For us, performance is not
primarily an artistic category, although it can be done beautifully. It is better understood,
we believe, as a sociological or anthropological or (as I hope to demonstrate) revolutionary
activity. Performance is not a rarified craft requiring special training (acting), nor is it
institutionally limited to the stage (theatre, film, television). It can be done by any of us;
it is a day-to-day activity with the potential to be transformative of day-to-day life. We
understand performance to be the universal human capacity to be both who we are and
who we are not at the same time. It is this ability, we believe, that allows human beings to
develop beyond instinctual and patterned behavior.
This understanding of performance, while extremely radical in its implications, is not totally
unprecedented. The anthropologists Arnold van Gennep, at the turn of the last century,
and building on his work, Victor Turner and Brian Sutton-Smith, working at mid-century,
identified performance as an activity that could result in individual and social change. They
called it “liminal” activity, that is, activity that passes through (or beyond) the threshold of
traditional or conventional behavior.
Van Gennep (1960) first noticed this liminality in the performatory rituals that usually
accompany social changes in tribal societies (from peace to war, change of season, etc.), as
well as socially recognized transformations in individual lives (from child to adult, single to
married, etc.).
Turner expanded the concept of the liminal (he called it liminoid) to explain what he
called “social drama,” that is, the transformative activities of social groups, whether they be
inter-clan disputes in tribes or revolutions in modern nation-states. Turner (1957, 1969,
1974, 1984a, 1984b) identified performance as that activity which allowed social groups to
go beyond established relations and old ways of doing things. Sutton-Smith emphasized
the inherent subversiveness of performance. He suggested that individuals and groups had
much to learn from the “disorderliness” of performance, which he called “the source of new
culture” (Sutton-Smith, 1972).
Starting in the mid-1970s, this group of anthropologists, particularly Turner, began to have a
significant impact on theatre researchers, prompting them to look at performance outside of
the theatre. This movement, in which Richard Schechner (1977, 1985) has played a key role,
has led to the development of performance studies as an academic discipline distinct from
theatre history and dramatic theory. Both anthropology and performance studies continue,
however, to view performance as a special category of human life, studying performance
in sports, weddings, political rallies, etc. — but not, for the most part, examining it within
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While Evreinoff implied a connection between performance and development, his writings
are anecdotal and romantic. A more systematic look at the role of performance in human
development comes not from the theatre, but from the research of Russian psychologist
Lev Vygotsky (1896-1934), a contemporary of Evreinoff. Among his many important
discoveries, Vygotsky noted that infants and young children develop by performing. They
learn language and all the other social skills that constitute being human by creatively
imitating the adults and older children around them, in Vygotsky’s words they perform “a
head taller than they are.” (VYGOSTSY, 1978, p. 102).
It was Vygotsky’s discovery of the link between performance and development that was
the most direct and important influence on Newman’s approach to performance. All of
development community’s work — in psychology, culture and electoral politics — taught
us that adults could continue to develop if they continued to find ways of performing
“a head taller than they are.” We also learned quickly that performance was much more
difficult for adults than for babies and small children. Newman noted a dilemma that
Vygotsky never directly grappled with — the fact that, although performance was necessary
for basic socialization, successful socialization in our society led to the end of performance.
As soon as we learn how to perform in ways appropriate to our gender, class and ethnicity
we are pressured (by the very caretakers who at first encouraged performance, indeed who
performed with us) to stop playing/performing. We are told to “act our age,” to “grow up,”
to “act like a young lady,” etc. Except for the tiny handful who become professional actors,
162 Performance and Development
most of us stop performing, and hence stop developing, by early adolescence. (Actors are
supposed to only perform on stage; off-stage their behavior is as prescribed as anyone else’s.)
“A lot of what we have learned (through performance) becomes routinized and rigidified
into behavior,” writes Lois Holzman in a 1997 article in Special Children. (It is Holzman,
a developmental psychologist, who introduced the work of Vygotsky to Newman and the
development community.) “We become so skilled at acting out roles that we no longer keep
creating new performances of ourselves. We develop an identity as ‘this kind of person’ —
someone who does certain things and feels certain ways” (HOLZMAN, 1977, p. 33).
The kind of people we become are, among other things, alienated individuals within a social
framework upon which we apparently have no significant impact—most of us never even
question that the world we live in might, in fundamental ways, be changeable. The early
21st century alienated individual has become a passive object (as distinct from an active
subject) in our social narrative. S/he behaves (and feels) within the context of a ready-made
discursive setting, a setting that by its very nature is in the service of those in power.
This passive behavior is, of course, non-developmental. As long as we “behave ourselves”, we
are trapped as atomized individuals in basically unchanging roles, fossilized performances,
that have been pre-determined for us over the last 500 years of history, and before.
By passive, I do not necessarily mean non-violent or non-aggressive. The passivity I refer to
is relative to the framework of the social structure. Some prescribed social roles, for example,
those given to young Black men in America today, are “written” to be aggressive and violent.
The aggression however is internally directed — internal to the individual, his immediate
community, or others from the broader society — it is not directed at established social
relations. Today’s “thug”, unlike the Black revolutionary of 40 years ago, is no threat to the
status quo.
Given the intense alienation and relative stasis of this moment in history, performance, we
are convinced, has become the only way out of the trap of alienated (socialized, dead-in-life)
behavior. Here is where the connection between performance and social transformation
begins to become evident.
circumstances and […] human […] self-changing”, which he regards as two aspects of the
same activity (MARX, 1974, p. 121).
As people who passionately felt the world needed to change radically (and that to do
so people needed to change radically), we asked ourselves: what does this commonplace
transformative activity, this “practical-critical activity” consist of ? What distinguishes it
from other daily activities and behaviors? And how does it relate to qualitative social change?
Our understanding of performance as revolutionary activity, as the method of liberation,
grew out of Newman’s and Holzman’s study of Vygotsky and our experience of creating a
theatre while, at the same time, building support for it in communities throughout the New
York metropolitan area. The long hours we spent on the streets and subway platforms and
canvassing door to door, raising money to maintain our financial (and hence creative and
political) independence, posed many challenges. Some of us found the work humiliating;
asking for money on the street, no matter how much we believed in the cause, felt, to some
of us, like begging. For others (particularly men), it was difficult not to be reactive when
people on the street were dismissive or hurtful. Those involved in this work came with
various levels of social skill, and for some of us it was hard to even look a stranger in the eye,
never mind engage them in a cultural/political conversation.
It gradually occurred to us, or, more accurately, to Newman, who pointed it out to the
rest of us, that what we were doing on the street (“street work” as we called it then) was
a performance. On stage, we were doing all sorts of odd things, performing characters
wildly different from ourselves. Why couldn’t we do that on the street? Why did we have
to “be ourselves,” to be stuck in our already formed social roles, when we were organizing
on the street? Couldn’t we create characters that built on our friendliness, humor and
passion for what we were trying to build? We could and did. We began to approach this
organizing activity as a performance and that is what allowed us to sustain and develop it
for so long. This turn towards performance as a method led us toward a more playful and
joyous activity in which there were designated “directors” for each performance responsible
for leading the creation of an ensemble; the emphasis shifted from each individual’s skill at
raising money to the collective creation of a performance of meeting new supporters. Even
more importantly, it led us to discover the connection between performance and social (and
personal) change — and we gathered more support (and money) than before.
Newman’s grounding in philosophy, along with his study of Vygotsky, his decades of work as
an innovative psychotherapist and his experience as a theatre director, playwright (he wrote
44 plays and musicals) and actor at Castillo, combined with the development community’s
street fundraising experience, led him to conclude, much as Turner did earlier and in a
much different context, that performance was a transformative social activity. For Turner,
however, performance always remained an object of study, something to be watched and
analyzed. For Newman and those of us who followed him, performance became something
to do.
“We understand performance very broadly,” Newman (1996, p. 6) said:
164 Performance and Development
From our point of view performance might have nothing to do with being on
the stage. We think you can perform at home, at work, in any social setting […]
With the proper kind of support, people discover that they can, that we can, do
things through performance that we never thought we could do […] In a sense,
we’re trying to broaden each person’s notion of ‘what you’re allowed to do’.
That articulation is both mundane and revolutionary — and it is that contradiction that
makes performance so powerful. We have come to regard performance as a common human
activity that allows human beings to act and to be self-reflective of our actions at the same
time (what Marx called “practical/critical”), whether we are on a stage or on a street corner
or at the dinner table. When performing, the activity and the thought about the activity are
inseparable. In the process of performance, there is no separation of practice and theory;
we are the practical and the critical simultaneously. Given its inherent self-reflective nature,
performance consistently transforms its “theory” through the activity of its practice, and
theory (self-reflectivity) constantly impacts on practice. (Although those terms, as distinct
entities, lose much of their received meaning within the unified activity of performance.)
Performance, we have come to believe, is not only the way out of the alienation of the
postmodern world; it is, at one and the same time, the practical-critical activity, the
revolutionary activity, of our epoch. It is the practice of dialectics in everyday life. Given
the highly developed alienation of contemporary society and the weight of tradition and
convention, revolutionary activity has increasingly become performatory.
As early as 1989, just as he was taking on the responsibilities of artistic director at Castillo,
Newman (1989) wrote: “In a world so totally alienated as ours doing anything even
approaching living requires that we perform. To be natural in bourgeois society is to be
dead-in-life. Unnaturalness is required if we are to live at all.”
alone and do many tasks without others around, but your performance is none-the-less a
social activity. That the nature of that social activity may be lonely makes it no less social.
This is where the activity of community building becomes critical. After all, if performance
is an ensemble activity, the question of what the ensemble is that we are performing
in—and how that ensemble is built—is extremely important. We at Castillo have come
to understand our community as ever-evolving; it is creating itself as it performs. For us
community is not so much a thing as an activity, a mass improvisational performance.
Obviously this differs from the more conventional understanding of community as the
people who live in a particular geographic area (such as a town or a neighborhood) or the
people of a particular ethnic group (as in the “Black community”) or people engaged in a
particular profession (as in the “commercial real estate community”). Those understandings
of community are inherently conservative because they are based in the past (who we are
as shaped by history, i.e. “Black”) or based only on what is (who we are by virtue of where
we live or work, i.e., a “New Yorker” or a “real estate broker”). The conventional concept of
community provides us, at best, with a pre-scripted performance or, at worst, with dead-in-
life behavior.
The broad performance community of which Castillo and the All Stars is a part is, of course,
like all communities, a social construct. Being a social species, we human beings have
always organized ourselves into social constructs—tribes, religious groups, nation states,
classes, etc. These groupings were/are not institutions imposed from the outside, by God,
gods or anyone else; we human beings created them.
The difference between the development community and these other social constructs is
that they are closed and organized around the past (received identity) and/or the dynamics
and needs of that which already exists (such as being “working class” based on the social and
economic circumstance you were born into). Our activity of community is, we have become
convinced, a breakthrough social construct because, unlike other social constructs, it is not
based on the past or simply what exists, what is, but on what-is-becoming. It is created and
shaped by anyone who chooses to join its performance, and its performance is development.
It is therefore dynamic in a way that the older concepts of community cannot be. It is
continually transforming itself through its continually changing performance. It is, among
other ways of describing it, a performance community.
As with our approach to performance, this concept/practice of community was first
articulated by Newman. In a talk called “Community as a Heart in a Havenless World,”
delivered in 1990, he said:
I want to introduce a whole new concept of community […] What I mean by
community […] is a community which takes responsibility for defining what
community is. The folks who run this cruel world usually do the defining […]
They do it with big dollars. They do it with major institutions that control the
newspapers and television stations; they control the schools […] We will be an
activist community of people and no one, least of all the people who control the
heartless institutions, is going to tell us what our community is (NEWMAN,
1991, p. 144-147).
166 Performance and Development
This “activist community”was started by political activists working in the poorest communities
of New York City in the 1970s, who have gone on to organize middle class and wealthy
people to work with them to support poor people to develop and provide leadership to the
process of positive social change, free of government, corporate or university dependence.
Today, this activist community is often talked about as the “development community” and
is identified with organizations and programs for which “development” is central to their
mission: the All Stars Project and its youth development programs (the All Stars Talent
Show Network, the Development School for Youth and Youth Onstage!), a free university-
style development school, UX (“U” for university, “X” for the unknown), and the Castillo
Theatre; a community based research and training center, the East Side Institute for Group
and Short Term Psychotherapy (ESI); the Social Therapy Group in New York City and
social therapy affiliates in other cities; independentvoting.org, which co-ordinates the
organizing of activists in electoral politics working outside the two historically dominant
parties in the U.S.; and the bi-annual Performing the World conferences, co-sponsored
by the ESI and the ASP, which bring together performance activists from around the
world and from various disciplines and walks of life. These organizations have national
and international reach, with the direct participation of tens of thousands who impact on
hundreds of thousands. Along with their varied foci is a shared methodology that involves
people of all ages in the ongoing collective activity of creating new kinds of environments
where they can be active performers of their lives.
People become involved in this development community for many reasons—to get help
with their emotional pain, to perform in a talent show, because they want to work with
young people, because they want to do theatre, because they are looking to do something
meaningful. The reasons are endless; whatever the motivation, their performance of
participating/building the community changes not only themselves, it changes the
community, which is, after all, not a thing-in-itself, but a work in progress. Participating in
the building of this community, therefore, is opting to embrace the unknown, to take risks,
to do beyond one’s self, to impact on others, to provide leadership; that is, to perform in an
improvisational ensemble.
Becoming a part of this ensemble does not take one out of the complex of communities
(static and/or dynamic) that make up the larger world society. The identities of race,
ethnicity, nationality, religion, profession, gender and sexual preference obviously assert a
tremendous grip on us all. However, for those involved in the All Stars community, these
received identities and social constructs are not the end; they are simply the beginning. They
are the backstories that we, as performers, as changers of the world-historic play, take as the
material we need to work with, not unlike the script of a play is to an actor on stage.
Thus, participating in this community is not an alternative to the larger world; it is not a
“counter-culture.” It is a mainstream activity. Those involved in the community still earn
livings, raise families, pursue hobbies, etc. Yet, by creating a community without formal
membership, we are bringing a new thing into the world, which, of course, impacts on all
the established institutions to which it has a relationship.
© RIGS revista interdisciplinar de gestão social v.2 n.3 set. / dez. 2013 167
The establishment of the ASP’s youth theatre training program, Youth Onstage!, in 2003
when the organization moved to its 42nd Street youth development and performing arts
complex (in New York City’s commercial theatre district) is an example. By virtue of the
existence of the ASP center, Forty-Second Street is no longer a place where young people
come solely to play video games in the arcades or go to films in the movie complexes. It is
also a place where young people create politically-engaged theatre, which connects them to
the broader cultural community. This fact changes what 42nd Street as a social institution is.
It also changes the possibilities for youth and for youth theatre.
Our community’s performance is thus connected to and transformative of other communities
and social activity in the world. This is precisely why the development community has such
transformative potential. Our performance and growth impacts on every other social unit
(family, school, job, union, class, church) with which we are involved.
Alienation is the result, Marx first pointed out, of the fact that, under capitalist economic
relations, the bulk of humanity (the working class) is not directly connected to the product
of their labor. Instead of creating for use (or for immediate exchange), workers create
products that belong to others. Work is no longer, for the most part, connected to the
product it creates or to the life of the producer. In Marx’s words, work under capitalism “is
not the satisfaction of a need, but only a means for satisfying other needs” (MARX, 1966,
p. 98). People work to “make a living,” that is, they sell their labor power as a commodity
168 Performance and Development
(an item of exchange). Their labor power creates other commodities to which they have no
connection, except, perhaps, as consumers, in which case they must buy back what they have
(collectively) built, as in the case, for example, of the autoworker who buys a car.
Thus, work — and life in general — becomes, Marx noted, increasingly “alienated.” This
alienation applies not only to material things, such as cars, but to social constructs, such as
communities, and to the process of creation itself.
Marx’s term “alienation” is most often understood today as a psychological state. Such
an understanding, we believe, minimizes its importance and, in fact, alienates it from the
process of its creation. As Newman (1991, p. 30) puts it:
[...] we don’t take the notion of alienation to be psychological. We take it to be
sociological. What we mean by that is that alienation is not simply a state of
mind; it’s not how people feel. Rather, it’s how people are. And people get to be
that way by virtue of how the entire system and activity of production (which
influences more than simply the narrow acts of industry, but rather influences
the total process of human production and human life in our society) creates a
fundamentally alienated society.
How does alienation impact on the creation of community? Profoundly. Despite the best
of intentions and despite an attempt to be conscious of the fact that we are creators of our
community, as the products of 500 years of capitalist development, we are nonetheless apt
to fetishize our activity and become alienated from it. There is always a strong pull to relate
to “The Community” as something finite and other than our own activity, something over
and above our ongoing creation of it.
This is analogous to what happens when the creative performance of childhood becomes
hardened into the behavior of teenagers and adults. We become alienated from the activity
of creating new performances and accept the fixed role, the “personality” we have created
with others as a given, static reality that we have no power to fundamentally alter.
The same alienation happens to social constructs. The American sociologist Erving Goffman,
writing in the 1950s and ’60s, pointed out that although all social constructs are created in
response to a social need and begin as activity, once created, they have a tendency to become
self-perpetuating institutions, that is, to look out for the security and continuation of the
construct as a thing-in-itself (GOFFMAN, 1961). He wrote specifically about mental
hospitals and prisons, but the same thing can be seen in everything from marriage to trade
unions, from schools to revolutionary parties.
Our community came into being and continues to build in an alienated culture and as
such it/we are vulnerable to alienation and fetishization. The challenge is to keep the
improvisation going and not fall into the trap of becoming reified and self-perpetuating.
Once bureaucracy or “proper procedure” or tradition becomes dominant over creative
revolutionary activity, it is time to try a new performance. That is why the history of our
community is characterized by the nearly constant reorganization of groups, projects and
activities. One of Newman’s many skills as an organizer and leader was to accept failure and,
© RIGS revista interdisciplinar de gestão social v.2 n.3 set. / dez. 2013 169
These performances spaces are ones that we create, just as we create the performances that
take place on them. The youth programs of the All Stars Project, for example, are self-
consciously built to be just such “performances spaces.” Thus, development, as we understand
it, is not predetermined by ideology (or religion or science or any other script), but created
continuously by our shared improvisational activity
© RIGS revista interdisciplinar de gestão social v.2 n.3 set. / dez. 2013 171
Many of those of us who launched the development community are supporters of radical,
participatory democracy and of collective (as opposed to atomized, alienated, individuated)
life. We passionately hope that the human race can find ways of reorganizing the processes of
production and distribution to eliminate the obscene disparities of wealth (and opportunities
for development) within the various nation-states and between the industrialized north and
the rest of the world. It follows from the inclusive nature of this development community
that not everyone in it shares the same values or worldviews. However, the values and
dreams of the community’s most active builders remain an important part of the mix.
No doubt all improvisers (on stage and off ) bring with them what Pierre Bourdieu (1977)
and other sociologists and anthropologists call “habitus,” that is, patterns of thought and
behavior, sensibilities and tastes acquired from family, ethnicity, class and the overall culture
they grew up in. That may be where the improv starts; the point is that it is not where it
has to end. We all bring our baggage to the improv process, and recognizing this baggage
as the material we’re creating with is a very important part of the process. In Newman’s
words, it is helpful to “radically accept” where you’re starting from, because it allows you
to more productively move forward. However, being aware of the habitus you bring to the
process is not the same as short-circuiting the process by imposing a solution, a resolution,
a conclusion. What is potentially transformative about the created performance “space” is
that it provides the people involved with permission to pretend and play beyond who they
“are,” to move through a liminal process that takes them beyond the ideology and habitus
they bring to the performance. If that were not the case, human culture(s) would never
change.
The history of 20th century politics teaches that the imposing of “solutions” is a far greater risk
than trusting the performance process. In fact, the founders of the development community
have come to distrust the very concept of “solution.” We trust, instead, in the activity of
performance, in the human capacity to create, through improvisation, new scenes, new
plays, new worlds. As improvisational performers, we believe in building with everything
(including all the “backward” habitus) that is offered. That is how a scene is constructed
and a world reconstructed.
Thus, on the most basic level, what differentiates the founders of the development community
from orthodox leftists is that we don’t believe the answers to the challenges facing humanity
can be known in advance. Answers, or perhaps more accurately, new ways of living may (or
may not) emerge through the social activity of performance. All performance, even when
scripted on a stage, is essentially an improvisationary “in the moment” activity that people
do together. There is a vast difference between having a moral/political orientation (which
the founders and leaders of the development community do) and “knowing the answer”
(which they don’t). Ideology and performance are very different things; one is a thing
(fixed, static, dead), the other, an activity.
For us development is neither inevitable nor imposed from above or from the outside. It is
what emerges from the creative process of performance.
© RIGS revista interdisciplinar de gestão social v.2 n.3 set. / dez. 2013 173
When Newman began writing plays for Castillo in the late 1980s, his plays broadened the
lens and deepened the philosophical depth of Castillo’s work while continuing to explore
the ethical and political issues of concern to the development community and the larger
world. Sally and Tom (The American Way) (1995), for example, is a musical that looks at the
relationship between Thomas Jefferson and his slave and mistress Sally Hemings, a 35-year-
long relationship which embodied the contradiction between democracy and slavery and
the legacy of racism that continues to define so much American history and culture. Lenin’s
Breakdown (1994) portrays Lenin, leader of the Russian Revolution, as an old homeless
man who checks himself into Bellevue, a mental hospital in New York City, looking to
understand the failure of his life (and of 20th Century Communism). In Sessions With Jesus
(2002), Jesus returns to earth (the Upper West Side of Manhattan to be precise) looking
for a therapist. He needs a therapist, because he is hearing the voice of Osama bin Laden
asking for forgiveness. Jesus, of course, is all about forgiveness, but he’s having a hard time
forgiving the mass murderer.
As these examples illustrate, Castillo creates theatre that functions as a social forum. While
theatre, at its best, has always done this, in recent times it has done so less and less. As
theatre has been commodified over the last few centuries and evolved into a (increasingly
minor) branch of “show business”, its function as a social forum has decreased. For society
as a whole, film and television have taken over this role. Given the vast amount of capital
necessary to create and distribute film and television, it is no surprise that, to the extent that
serious social, political, ethical and philosophical issues are explored on the large and small
screen, they tend to be presented in conventional ways and resolved on terms favorable to
the status quo.
For social constructs — classes, ethnic groups, communities — with little or no power in
American society, there has been no performatory forum, for much of the 20th century, in
which social conflict could be explored from their experiential perspective. To the extent
that live theatre has a future in the United States beyond the spectacles of Broadway or
as an elitist specialty niche, it lies in being connected to a community and providing that
community with a performatory means of exploring its conflicts, dreams and values.
As part of a very specific community, one that is constantly redefining itself as it is coming
into being, one whose method of growth is based on not knowing, our theatre has played
a very particular role in helping people in the community grapple with the developmental,
political and philosophical issues that arise from the very activity of creating the community.
Community members come to our theatres to struggle with these issues. Since we work
seeking to disengage from the certainties of ideology, we don’t presume to teach through the
theatre. Most of the plays produced by Castillo — in particular the 44 plays and musicals
written by Newman — entertaining though they are, are exercises in asking questions, not
answering them, challenging our audiences, not comforting them.
The conventional concept of good theatre is conditioned by the theatre’s two and a half
millennium history, and for much of that history, theatre has played the role of resolving,
through ritualistic performance on stage, social conflict that had no resolution in society1.
© RIGS revista interdisciplinar de gestão social v.2 n.3 set. / dez. 2013 175
Unlike earlier theatre (“political” or otherwise), Castillo is not primarily concerned with
resolving social conflict on stage. Indeed, we have come to consider theatrical resolution
to be conservatizing. This is significantly different from Augusto Boal’s “Theatre of the
Oppressed,” the other major trend in political theatre. As its name suggests, Theatre of the
Oppressed starts with a pre-defined social category, “the oppressed”, and works to bring
members of this category onto the stage to, in Boal’s words, “rehearse the revolution”. Our
long-term perspective is not to get more people (oppressed or otherwise) into the theatre,
but to bring performance off stage into the daily lives of people from all social strata, to do
away with the very distinction between theatre and life, rehearsal and revolution.
Castillo, as the theatre of a community that approaches performance as developmental, has
another, very specific function. Theatre is a 2,500-year-old institution deeply embedded in
our culture. Theatre gives social legitimacy to what is going on, in different ways, throughout
the development community: performance. Because of its societal legitimacy, theatre — in
our case, Castillo — is an environment in which the community can experiment with its
most radical ideas in the most outrageous ways — it is theatre, after all!
Thus, our theatre has become, in effect, a laboratory, or perhaps more appropriately, a
playground, in which new performances can be experimented with and where, through
performance, we can explore issues and ideas that are taboo or that would be ignored or not
taken seriously in other contexts.
The aim of those of us who have built Castillo is to create environments in our city, country
and world which can generate hundreds, indeed thousands, of Castillos, all of them playing
with new possibilities, including the possibility of liberating performance itself from the
confines of the theatre. Community building and theatre building are, for us, inextricable.
Our dream has never been to build one or two “great” theatres in New York City; it is to
generate hundreds of “mediocre” theatres everywhere.
This statement, made by Fred Newman years ago, is purposely provocative to trained theatre
professionals, myself included. “Mediocre” is a difficult term for artists to deal with; after all,
artists dedicate years of training and lifetimes of effort to transcending the mediocre and
achieving the beautiful. I use the word here not because our community is committed to
mediocrity in art, but because we are committed first and foremost to community building.
For us, the “beautiful” is not an abstract set of aesthetic criteria, it is what helps performers
and audiences develop.
Which brings us back around to development, community and social change. It is Castillo’s
conviction that theatre, qua theatre, can change very little. Theatre as part of a larger
development community that uses performance as a way to grow and transform can play
a vital role. In this context, it is neither a commodified entertainment nor a rarified and
contained aesthetic activity. It becomes, instead, an environment for doing practical-critical
experiments in everyday living. Castillo is at once and the same time a theatre and not a
theatre.
176 Performance and Development
Nota
1 For a historical study of the emergence of theatre as an institution of social stabilization, see
Thomson (1968).
Referências
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Press, 1977.
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Goffman, Erving. Asylums: Essays on the Social Situation of Mental Patients and
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SUTTON-SMITH, Brian. Games of Order and Disorder. In: Simpósio Forms of
Symbolic Inversion, 1 dez. 1972, Toronto, Canadá. Apud: TURNER, Victor. From Ritual
© RIGS revista interdisciplinar de gestão social v.2 n.3 set. / dez. 2013 177
Abstract “We seek papers that promote the reconnection of various dimensions [...]
creativity, art and science [...] body, emotion and intuition within the analysis
and research.” This call for papers of the number of RIGS on Integrative
Methodologies (MI) instigated us to submit a narrative and reflection on
the topic, based on what we have experienced with groups in universities
and other contexts. Our intention is to dialogue about the possibilities of
collectively generate “new” knowledge, in the classroom as well as in the
180 Metodologias Integrativas: Abrindo Novos Caminhos ....
ABERTURA AO DIÁLOGO
A percepção da gestão social enquanto liderança coletiva remete-nos a uma vontade
partilhada por muitos que vivenciam este campo1 - a aprendizagem e a prática de valores
emancipatórios (solidariedade, cooperação, justiça, respeito à diferença, democracia
participativa e zelo com a vida) no próprio processo de gestão; onde quer que essa se realize,
em organizações da sociedade civil, estatais, empreendimentos econômicos, territórios,
redes colaborativas, entre outras (Moura, Moura e Calil, 2009).
Podemos dizer que a prática dessa gestão social requer metodologias que estimulem o
diálogo, o reconhecimento e respeito das diversidades; que fortaleçam as capacidades de
escuta e fala integradas, e de (cri)ação coletiva de planos, projetos e ações de desenvolvimento
ecossocioterritorial. Trata-se de uma mudança significativa frente aos modelos de gestão
dominantes, baseados na hierarquia, nas tomadas de decisão centralizadas e na separação
entre quem decide e quem executa.
Observando muitas das nossas reuniões e salas de aula vamos nos deparar com pessoas
presentes ausentes, um ou poucos falando, reproduzindo a verticalidade e as relações
de mando, obediência e absenteísmo. Isso tende a acontecer, inclusive, nos processos
participativos fomentados desde o Estado e/ou a Sociedade Civil.
A esse respeito, Giannella (2008) fala-nos da necessária virada paradigmática frente aos
dilemas que se apresentam nos processos participativos, na medida em que se mostram
insuficientes os códigos tecnocientíficos baseados, essencialmente, na racionalidade lógico-
analítica-verbal. Virada paradigmática que pode ser propiciada pela integração, no âmbito
da formação e da gestão, de dimensões esquecidas do humano, do ser fazer humano –
corpo, emoção, intuição, arte… . É aqui que encontramos um campo fértil para dialogar
sobre as experimentações que muitos de nós temos trilhado – o campo das Metodologias
Integrativas. E é desse lugar que falamos e que tecemos as experiências que propiciaram a
narrativa/reflexão que segue, sendo este um convite ao diálogo.
© RIGS revista interdisciplinar de gestão social v.2 n.3 set. / dez. 2013 181
As experiências que vamos abordar aqui são duas oficinas sobre Metodologias Integrativas2
e uma atividade em sala de aula na universidade3; embebidas pelas vivencias anteriores com
estudantes da graduação e da pós-graduação, desde 2008. Tais experiências têm evidenciado
o quão fecunda é a conexão com a nossa natureza mais próxima, o nosso corpo, aliada
à interação das pessoas e à disposição das cadeiras em círculos. Esses dois elementos de
conexão pessoal e coletiva propiciam um caminho de encontro com o sensível e o intuitivo
e de mobilização das pessoas para a produção compartilhada do conhecimento, para criar
coletivamente.
E como isso acontece? Através de diferentes chaves: toques, movimentos corporais,
respiração, sons, ativação dos sentidos no contato com a natureza exterior a nós; integração
de múltiplas linguagens de percepção e expressão, olhar e partilha com o outro e com o
coletivo, entre outras dinâmicas de grupo.
Com base nesse tipo de dinâmica, temos observado a emergência de campos de unidade e
(in)formação que favorecem a mudança de percepção sobre nós mesmos e o nosso entorno
e, também, a co-criação coletiva. Esse é um ponto que merece ser aprofundado no âmbito
das metodologias integrativas, sendo este ensaio um passo nessa direção.
Encontramos em Maria Cândida Moraes (2004, p. 66) um caminho de diálogo fecundo,
quando nos fala da “importância do clima gerado nos ambientes de ensino-aprendizagem”
através da integração do corpo, das emoções, do diálogo e da convivência humana. Isso
porque, ainda de acordo com a autora, o ambiente de aprendizagem, assim como todo lugar
“onde a vida acontece”, pode ser percebido como um “campo energético e vibracional de
diferentes frequências, moldado pelas relações, intenções, decisões e consciência daqueles
que o habitam” (p. 66).
A partir dessa indicação, evidencia-se a possibilidade de gerarmos ambientes que favoreçam
a co-criação coletiva, conforme veremos a seguir com o caminho que temos trilhado com
os grupos para deixar vir as percepções sobre o que são Metodologias Integrativas (ou
quaisquer outros temas), sem nenhuma leitura ou exposição prévia sobre o tema.
A TRILHA
Ponto de Partida
Um ambiente harmonizado e que favoreça a interação é um dos elementos básicos que
caracterizam o campo das MI. Um passo é colocar as cadeiras (ou almofadas, ou bancos...)
em círculo, seja numa sala na universidade ou num centro de convenções, ou, ainda, em
uma varanda ou um jardim. O centro pode ser constituído com um ou mais objetos ou,
simplesmente, com um papel onde escrevemos/desenhamos o tema, para ajudar na formação
do círculo e na coesão do grupo.
A chegada das pessoas vai compondo o cenário e, a depender da hora e do ânimo com o qual
chegam, podemos dispor de um ou mais recursos para auxiliar no despertar das pessoas e na
182 Metodologias Integrativas: Abrindo Novos Caminhos ....
Tanto nas oficinas, como na sala de aula, temos percebido que esse tipo de prática permite
criar um campo de unidade, um campo fecundo para o fluir da intuição e de outros
níveis de percepção. Após uma breve pausa no processo de caminhada introduzimos uma
pergunta, por exemplo: O que são as Metodologias Integrativas?
Vamos caminhar e sentir que estamos adentrando num campo de informação sutil das MI.
Qual a palavra, frase ou imagem que vem quando perguntamos: o que são as MI?
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Não é nossa intenção aqui aprofundar a análise das definições acima. Queremos destacar
o fato de que, sem leitura prévia ou qualquer exposição sobre o tema, os grupos criaram
sínteses a partir das percepções individuais, que convergem e acrescentam ao conceito de
Metodologias Integrativas, conforme as autoras citadas trazem. Esse fato coloca-nos diante
de um potencial de construção coletiva do conhecimento quando integramos o sensível e
o intuitivo tendo como elementos catalisadores a observação e movimentos corporais, o
posicionamento do grupo em círculo, as artes e o lúdico.
Vamos seguir adiante com o registro das sínteses elaboradas pelos subgrupos na oficina de
março de 2012.
Metodologias Integrativas constituem um campo de Sabedoria-legítima, com
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poder de gerar conexões entre pessoas, da pessoa consigo, com o meio e com
o Divino, ativa e integra conhecimentos individuais e coletivos e sentimentos
de paz, harmonia e unidade. O corpo e a arte são chaves para criar e agir em
coletivo, com base em propósitos comuns.
Agora, vamos às definições sobre MI elaboradas pelos estudantes na sala de aula (abril/2012).
Propiciam a união dos sentidos e do intelecto [...] diversas formas de saberes
e expressões.
ENCERRANDO A NARRATIVA
As percepções intuitivas e as sínteses sobre Metodologias Integrativas que foram geradas
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nos grupos revelam a ponta do iceberg do potencial que temos e vivenciamos. O trabalho a
partir do dos círculos, mobilizando o corpo-natureza, a arte e o lúdico, desperta teclas que
estavam adormecidas em nossa consciência de humanidade e abre possibilidades de novas
conexões neurais e de integração em vários níveis (do pessoal ao coletivo e com a Teia da
Vida).
O poder de harmonização e de pacificação que podemos experimentar com as Metodologias
Integrativas cria canais para que possamos lidar de forma mais criativa com os conflitos e
tensões que presenciamos, com os desafios que encontramos em termos do relacionamento
entre pessoas, da escolha dos caminhos a seguir e da sustentabilidade dos projetos e grupos,
na sala de aula e em outros âmbitos.
Certamente, limitações e paradoxos também se revelam nessa caminhada. Destacamos aqui
o que nos parece um corte na passagem dos estados de sensibilização, quietude, alegria e/
ou celebração em grupo, para o momento de atribuição de significados/sentidos, integrando
os códigos da racionalidade lógica e verbal. Parece-nos que a riqueza do que se vivencia e se
percebe a partir da intuição e da expressão com símbolos, palavras, cenas, poesia e/ou música,
se perde, em parte, quando adentramos o momento da compreensão intelectiva – que tende
a se realizar através da associação, correlação, análise crítica e síntese verbal. Seria esse um
paradoxo entre o sensível e substantivo e o instrumental (a delimitação de objetivos/ações e
alcance de resultados) no âmbito da gestão? Essa é uma questão que merece ser aprofundada
e, para isso, precisamos recorrer e dialogar com outros campos de conhecimento e teorias,
alguns que são afins à gestão social (aprendizagem organizacional, por exemplo) e outros
que, ainda, estão distantes (estudos transpessoais, psicologia social, dinâmica de grupos e
teoria dos sistemas vivos, por exemplo). Este é um convite para seguirmos adiante com o
campo das Metodologias Integrativas na formação e na gestão social.
NOTAS
1 A Gestão Social é um campo de práticas diversas, antigas e novas, que vem se constituindo
como campo de conhecimento, que se manifesta, entre outros, através de cursos de graduação
e pós-graduação e do Encontro Nacional de Pesquisadores em Gestão Social, o qual acontece
desde 2007. Encontramos nos Anais desses encontros um amplo debate conceitual sobre
Gestão Social, mas esse não é nosso objetivo aqui.
2 Falamos, especificamente, da oficina realizada em outubro de 2011 a pedido dos integrantes
do Programa Ecobairro do Instituto Roerich de Salvador, e da realizada em março de 2012 no
Fórum Nacional de Educação Ambiental, também em Salvador/BA.
3 Na graduação e na pós-graduação, encontro com estudantes da graduação sobre o tema das
MI, em abril de 2012.
4 Óleo essencial de laranja doce e de tangerina podem ser encontrados em lojas de produtos
naturais.
5 Relato da oficina realizada no Fórum Nacional de Educação Ambiental (março/2012).
6 Exercícios de harmonização e desbloqueio que permitem o fluir da energia vital – parte dos
ensinamento da medicina tradicional chinesa.
188 Metodologias Integrativas: Abrindo Novos Caminhos ....
7 Ver nota 4.
8 Relato da Oficina realizada em outubro de 2011 com integrantes do Ecobairro/Instituto
Roerich (Salvador).
9 Ver nota 7.
10 Uma das técnicas que utilizamos na formação do RYE (Rede de Investigação sobre Yoga na
Educação.
11 Esta última definição foi escrita por uma pessoa ao final da reflexão do primeiro grupo.
REFERÊNCIAS
BRADEN, Gregg. A matriz divina: Uma Jornada através do Tempo, do Espaço, dos
Milagres e da Fé. São Paulo, Cultrix, 2008.
CAPRA, Fritjof. As conexões ocultas: Ciência para uma Vida Sustentável. São Paulo:
Editora Pensamento-Cultrix Ltda, 2003.
GIANNELLA, Valéria. Base Teórica e Papel das Metodologias Não Convencionais para
Formação em Gestão Social. In: CANÇADO, Airton et al. (Org.). Os desafios da formação
em gestão social. Palmas, Tocantins: Nesol; UFT; Católica do Tocantins; UNITINS, 2008.
p. 11-36, (Coleção ENAPEGS; v. 2).
GIANNELLA, Valéria; MOURA, Maria Suzana. Gestão em rede e metodologias não
convencionais para a gestão social. Salvador: Editora CIAGS, 2009. v. 2. (Série Editorial
CIAGS / Roteiros Gestão Social).
MORAES, Maria Cândida. Pressupostos Teóricos do Sentipensar. In: MORAES, Maria
Cândida; DE LA TORRE, Saturnino. Sentipensar: Fundamentos e Estratégias para
Reencantar a Educação. Petrópolis/RJ: Vozes, 2004.
MOURA, Maria Suzana; MOURA, Solange; CALIL, Monica. Sala em Cena: Jogos Teatrais
na Formação do/a Gestor/a Social. Revista Terceiro Incluído: Transdisciplinaridade
e Educação Ambiental. Goiânia, v. 1, n. 1, p. 57-74, jan./jun. 2011. ISSN 2237079X.
Disponível em: < www.revistas.ufg.br/index.php/teri/article/view/14389>. Acesso em: 15
maio 2013.
Tempo de Bordar
Beth Ziani
Da integração com o Grupo Teia de Aranha e do contato com outros grupos de bordadeiras,
especialmente em Minas Gerais1, percebemos que essa linguagem tomara uma dimensão
expressiva e criamos o Projeto Brasil Fio a Fio, bordar criar compartilhar2, com o objetivo
de proporcionar um espaço de reflexão, criação e uma mostra dessa linguagem. A estrutura
do encontro refletiu a proposta expressa no nome do evento (bordar criar e compartilhar) e
tornou possível apresentar os métodos de trabalho utilizados pelos catorze grupos reunidos.
Organizamos uma exposição coletiva; oficinas; bate-papos com os grupos e palestras, enfim
todos expuseram, dividiram e trocaram suas experiências, refletindo sobre convivência,
integração e criação.
Neste encontro, foi possível perceber as várias funções dessa linguagem, as formas de
trabalhá-la e destacar alguns aspectos, tendo em vista os objetivos dos grupos reunidos.
Como aspecto comum a todos os grupos, tínhamos a proposta de compartilhamento e
convivência entre as pessoas. Portanto, o bordado quase sempre se apresentava como
linguagem de integração e união. Para quase todos os grupos, havia também a perspectiva
de estimular processos criativos.
Figura 2 - Oficina – Brasil Fio a Fio.
Composição da Capa
A impressão da capa foi elaborada na perspectiva de compor o sertão em várias dimensões.
Destacamos a atmosfera dessa paisagem, imprimindo as suas cores características: do azul
celeste do céu ao ocre da terra batida. O cuidado com a tonalidade buscou representar a
atmosfera local desse espaço.
A literatura de Guimarães Rosa concretizou-se no tecido através de imagens de um artista
plástico também nascido na cidade do escritor, Cordisburgo, e que desenvolveu diferentes
leituras sobre a região e a obra do autor, entre elas, Grande Sertão: Veredas. José Murilo
Batista de Oliveira ( J. Murilo) é um artista que traz em sua pintura a singularidade dos
intertextos da prosa de Rosa, em uma profusão de detalhes de cenas e temas do sertão.
Desse trabalho, selecionamos alguns episódios que foram impressos na parte de trás da
capa: o julgamento de Zé Bebelo, o pacto e o cortejo de morte de Diadorim. Na parte da
frente, foram impressas algumas cenas do sertão.
Imprimimos também na capa o próprio texto do autor. Selecionamos duas páginas do
seu diário de viagem (viagem ao sertão de Minas realizada em 1952) e a primeira página
de Grande Sertão: Veredas, de um dos rascunhos da obra. Assim, texto e pesquisa foram
registrados na parte interna da capa e apresentam o processo criativo do escritor.
196 Tempo de Bordar
Frente e verso, dentro e fora, foram compostos representando o espaço, a geografia, o texto e
a sua tradução em outra linguagem, criando assim uma composição a ser trabalhada através
de outra linguagem, o bordado.
Figuras 5 e 6 - Capa Ideal - referência da memória sertaneja e recriada a partir de referências
da literatura de João Guimarães Rosa.
Miniaturas
Três miniaturas foram criadas como réplicas da capa maior para comporem o acervo das
cidades que participaram do processo das oficinas. Percebemos a importância de concretizar,
para cada local, sua participação no processo através de algo que ficasse nas cidades. Nas
três capinhas, foram impressos elementos da capa maior, com espaço na parte de trás para
registrar aspectos da identidade de cada cidade. A proposta era que essas miniaturas ficariam
nas respectivas cidades como memória do projeto.
Figura 7 - Miniatura de Cordisburgo.
Assinaturas
Para registrar a participação de todos no processo sem que isso ficasse restrito ao bordado,
propusemos que cada participante deixasse a sua identificação pessoal e desenvolvesse a sua
assinatura. Utilizamos o alfabeto criado por Ariano Suassuna a partir de marcas de gado
e cada integrante compôs, com duas ou três letras, a sua marca de vaqueiro/vaqueira para
assinar o objeto. O resultado foi um painel com mais de 170 assinaturas que acompanha o
projeto.
Figura 9 - Painel de assinaturas baseado no alfabeto criado por Ariano Suassuna.
Oficinas
O nosso principal objetivo foi integrar e compor a memória do sertão com o estímulo
da obra de Guimarães Rosa. Bordar era um pretexto para compor imagens e o pano de
fundo das paisagens impressas, mas especialmente queríamos representar esse fio que unia
as comunidades através da literatura, para que essa integração fosse registrada não apenas
nos projetos culturais realizados nas cidades5, mas que a capa fosse um símbolo desse
Movimento. As oficinas concretizaram a união entre os espaços e as comunidades.
Tínhamos o desejo de compor um diálogo entre o bordado e as artes plásticas com os
desenhos de J. Murilo. A proposta foi estimular essa comunicação sem que o bordado
fosse apenas instrumento de preenchimento dos desenhos e que não concorresse com as
imagens impressas, enfim teríamos que achar uma forma de compartilhar linguagens com
um objetivo bastante estimulador: achar o belo nessa composição.
Realizamos cinco oficinas em cidades diferentes. A capa partiu da cidade de São Paulo para
Cordisburgo, Andrequicé, Três Marias e Morro da Garça. Cada local teve um processo
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A Capa foi trabalhada em seis partes e tínhamos a peça piloto à disposição para observar
a sua composição. Com a intensa participação das bordadeiras nas localidades, algumas
orientações em relação aos destaques a serem compostos eram discutidas e depois elas
assumiam a composição entre a linguagem do desenho e do bordado.
Figuras 10 e 11 - Capa impressa: cores, imagens e textos (seis partes).
A principal preocupação era como intervir nos desenhos, destacar algumas partes, quais
seriam as partes bordadas. Assim, além da imagem representada, tínhamos que avaliar
e retomar os episódios literários. Como exemplo, nas figuras 12 e 13: Cortejo de morte
Diadorim e o Pacto, com detalhes bordados.
200 Tempo de Bordar
Experimentos têxteis foram estratégias propostas pensando nas pessoas que tinham
pouco ou nenhum contato com o bordado. Iniciávamos atividades em panos individuais
onde foram impressos alguns desenhos do artista J. Murilo. A proposta foi proporcionar o
contato com o bordado, mas também trazer, através desses fragmentos têxteis, a memória do
sertão. Neles imprimimos bois, carros de boi, veredas, buritis, cenas de pessoas caminhando
e vaqueiros andando a cavalo. Essa etapa foi essencial, pois estimulávamos a reflexão sobre
as imagens, cores, situações. Era o momento em que o processo de criação participativo era
intenso, para que posteriormente, cada um fizesse escolhas em seu próprio pano. Crianças e
jovens participaram intensamente dessa etapa.
Figura 14 e 15 -Intervenções de bordado nos desenhos de J. Murilo.
Nas Miniaturas da Capa, o bordado foi trabalhado num processo bastante integrado, pois
o desafio foi torná-las a referência da cidade. Portanto, a parte de trás de cada capinha
caracterizou as cidades:
• Em Cordisburgo, foi registrada a frase pronunciada por Guimarães Rosa
no seu discurso de posse na Academia Brasileira de Letras sobre a cidade
que nasceu “Cordisburgo, pequenina terra sertaneja...”;
• Em Morro da Garça, foi trabalhada uma lenda da região sobre um dragão.
História registrada por um escritor local, além de elementos da cidade;
© RIGS revista interdisciplinar de gestão social v.2 n.3 set. / dez. 2013 201
A capa tornou-se Manto pela força da criação coletiva e pelo significado que adquiriu no
processo, compondo não apenas linguagens artísticas, mas intenções e afetos na experiência
de bordar a memória. Ela integrou realidade com ficção, literatura narrada à vida das
pessoas, e assim a memória local encontrou um suporte para se manter viva e preservada.
O Manto de Vaqueiro é a representação do sertão mineiro e uma homenagem aos nossos
vaqueiros, personagens tão importantes na história do Brasil. É também uma possível leitura
202 Tempo de Bordar
da literatura de João Guimarães Rosa, mas acima de tudo é expressão de uma experiência
coletiva de tecer a beleza de muitas histórias.
Diante dessa mostra de atividades, fica perceptível como o bordado criou um espaço
significativo e tem traduzido expressões importantes relacionadas à memória particular e
coletiva, à literatura, à cultura popular, entre tantos outros temas, e também se colocado
como expressão artística. Especificamente, achamos singular e importante essa abertura a
uma linguagem tradicional e antiga que possibilita diálogos entre gerações, gêneros, além de
ter um potencial inclusivo surpreendente.
As referências particulares da linha e da agulha são os instrumentos facilitadores para que
as pessoas experimentem bordar. E aqui nos reportamos à Larrosa6, quando nos oferece
a reflexão em torno da experiência e do saber experiência, uma vez que hoje o excesso de
informação e opinião, a falta de tempo, entre outros aspectos da vida, nos afastam do contato
mais direto, pois, para Larrosa, a experiência
é a possibilidade de que algo nos aconteça ou nos toque e requer um gesto de
interrupção [...] requer parar para pensar, parar para olhar, parar para escutar,
pensar mais devagar, escutar mais devagar, parar para sentir, sentir mais devagar,
demorar-se nos detalhes, suspender a opinião [...] suspender o automatismo
da ação, cultivar a atenção e a delicadeza, abrir os olhos e os ouvidos, falar sobre
o que nos acontece, aprender a lentidão, escutar aos outros, cultivar a arte do
encontro, calar muito, ter paciência e dar-se tempo e espaço (LARROSA,
2002, grifo nosso).
O tempo do bordar é esse tempo descrito por Larrosa, processual e forte. O que conta é a
disposição de cada bordador para se relacionar com a linha, com a agulha, com o tecido e
com o outro. Nessa pulsação entre particular e coletivo, entre o eu e o outro, entre a fala e o
silêncio, surge esse novo tempo, um tempo necessário para cultivarmos a nossa sensibilidade
e estimular a criação.
NOTAS
1 Desde 1995, participamos e apoiamos a organização de semanas culturais em cidades do
Circuito Literário Guimarães Rosa. Nessa longa experiência, convivemos com a idealização e
constituição de grupos de bordados de Cordisburgo, Morro da Garça e Andrequicé.
2 Brasil Fio a Fio foi um evento realizado no SESC Pinheiros/SP em 2011 e reuniu catorze grupos
de bordado com curadoria de Beth Ziani. http://www.youtube.com/watch?v=hMs3LFcuEl0
3 A criação do Manto do Vaqueiro faz parte do projeto Memória Viva do Sertão com curadoria
de Beth Ziani, estudiosa da obra do escritor Guimarães Rosa, em parceria com a figurinista
Joana Salles. Esse projeto integra a Nova Exposição do Museu Casa Guimarães Rosa de
Cordisgurgo/MG, onde o Manto está exposto.
yy https://www.youtube.com/watch?v=qxyJhFGVSiU&feature=player_embedded
yy www.jornalwebminas.com.br/notas_novo.php?coluna=224
4 Museu Casa Guimarães Rosa é situado em Cordisburgo/MG, cidade natal do escritor. O
© RIGS revista interdisciplinar de gestão social v.2 n.3 set. / dez. 2013 203
Circuito Literário Guimarães Rosa é composto por cidades com referências sobre a vida ou a
obra do escritor.
5 As cidades que participaram do projeto realizam Semanas Culturais anualmente, quando
reúnem artistas, pesquisadores, críticos e apaixonados pela literatura do escritor mineiro.
6 Bondía, Jorge Larrosa. Notas sobre a experiência e o saber de experiência. Revista Brasileira de
Educação, n.19, 2002
Referências
BONDÍA, Jorge Larrosa. Notas sobre a experiência e o saber de experiência. Revista
Brasileira de Educação, n. 19, 2002.
ROSA, João Guimarães. Grande sertão: veredas. Rio de Janeiro: Nova Fronteira, 2005.
ZIANI, Beth. Texto de abertura do evento Brasil Fio a Fio/SESC Pinheiros, 2011.
Introdução
No campo da Gestão Social, é frequente deparar-se com um paradoxo ao trabalharmos com
sujeitos “radicalmente excluídos”: enquanto objetivamos o empoderamento, a assunção de
responsabilidade consigo mesmo e com a coletividade, o cuidado com uma ideia de bem
comum que alude a um futuro melhor, esses sujeitos estão presos, na maior parte dos casos,
em um círculo vicioso de descrença (com relação ao seu próprio potencial), delega e falta de
responsabilização, individualismo competitivo, reprodução irrefletida dos mesmos modelos
culturais que os excluem (GIANNELLA, 2009).
É comum que se identifique a dimensão econômica como crucial para reverter essa situação.
Os projetos direta ou indiretamente relacionados à geração de renda, através do circuito
convencional ou solidário, são, provavelmente, os que mais concentram esforços de ação
no campo da Gestão Social. No entanto, avançamos a dúvida, baseada em observações
repetidas e vivências pessoais, de que o apoio na geração de renda não consegue, por si
só, desativar o círculo vicioso citado logo acima. A própria tentativa de se instalar, nesses
contextos, iniciativas de economia solidaria esbarra, frequentemente, no fato de que os
sujeitos envolvidos estão tão longe quanto se possa imaginar dos princípios que a sustentam
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Empoderamento
Em nosso campo da Gestão Social, assim como em outros contíguos, preocupados com o
desenho e implementação de políticas públicas mais inclusivas, o conceito de empoderamento
ganhou destaque nas últimas décadas. No entanto, como relatado por diversos autores
(COSTA, 2000; HOROCHOVSKY; MIRELLES, 2007; VIERA et al., 2009), o significado
do conceito, é assumido, em muitos casos, como autoevidente, sem que seja explorada a sua
proximidade com outros de grande complexidade. Assim, como sabemos que o conceito de
poder (para falar apenas do mais evidentemente ligado ao objeto) se presta a interpretações
múltiplas, é pelo menos provável que o de empoderamento também possa sofrer a mesma
sorte. Até a sua origem não parece segura, sendo o movimento negro norte-americano e o
das mulheres os dois âmbitos que reivindicam sua procedência originária. É evidente, no
entanto, que se trata de contextos de marcada exclusão com relação às condições sociais e
econômicas, mas, também, culturalmente discriminados e simbolicamente estigmatizados.
É claro que aqui não vai ser possível uma análise extensa da complexidade embutida no
conceito. Apenas tentaremos apontar alguns possíveis significados alternativos e o que
privilegiamos como mais relevante para os nossos fins.
Um primeiro modo de conceber o empoderamento está vinculado a uma visão substantiva
de poder, entendido como “poder sobre”. Nessa visão mais tradicional, o poder é uma
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substância, algo que se tem ou não se tem. Para que um sujeito destituído de poder possa
chegar a ganhá-lo, alguém deve perder a posição de poder anteriormente possuída. Assim, por
exemplo, se as mulheres ganharem poder é porque, necessariamente, os homens o perderão.
O poder implica especialmente em capacidade de mandar, coagir outros, obrigá-los a agir
conforme a sua vontade. O poder é enquadrado assim num esquema do tipo “jogo de soma
zero”, onde os ganhos sempre equivalem às perdas e, no caso do poder, ele simplesmente
passaria dos sujeitos anteriormente poderosos para os que eram dele destituídos (IORIO,
apud VIERA et al., 2009). O conceito de empoderamento não seria, nesse caso, muito mais
do que se levar algum sujeito já desprovido de poder a tê-lo, apoiando, através disso, uma
inversão de papeis.
Uma visão alternativa a essa primeira costuma-se denominar como visão relacional do
poder e reconhecer como sua matriz primária a obra do autor francês Michel Foucault. Ele,
a partir de obras como “Microfísica do poder” (2005) e “Vigiar e punir” (2007), desperta a
atenção para o caráter molecular e capilarmente presente do poder, o que já não seria um
atributo do sujeito e sim das relações humanas que são por ele entremeadas. Ele “rompe com
essa noção de poder como algo que se detém e o propõe como algo que se exerce e se efetua
nas relações. Partindo desta concepção, o poder não “surge” frente ao homem, sendo próprio
de seu caráter humano” (VIERA et al., 2009, p. 136). “Pode-se afirmar que o poder está
presente do leito conjugal de um casal à sala presidencial do Palácio do Planalto” (COSTA,
2000, s/p).
Ora, é nessa visão relacional do poder, que o reconhece enquanto consubstancial a toda
relação humana, que o conceito de empoderamento assume mais relevância e que se
propõem algumas reflexões instigantes. A saber: a) não existe relação de poder sem que
haja uma, pelo menos parcial, colaboração dos sujeitos que estão na relação; b) não existe
relação que não implique, de alguma forma, uma relação de poder.
Com relação ao ponto a, podemos fazer, como exemplo extremo, o caso de um ditador.
Diante dessa figura autoritária, poderia se discutir a noção de existência, do outro lado,
de uma forma de colaboração com a relação ditatorial. No entanto, como mostrado por
vários exemplos históricos, até nesse caso, podemos admitir que existe colaboração ou,
pelo menos, certa condescendência entre quem exerce e quem sofre a relação autoritária,
como demonstrado pelas formas igualmente extremas de reação de quem, para se subtrair
definitivamente à relação de poder e demonstrar a sua radical discordância com ela, chega a
tirar sua própria vida, ou criar movimentos de oposição que colocam em risco as vidas dos
envolvidos (e, infelizmente, até de outros que não queriam se envolver).
Quanto ao ponto b, se chegamos a admitir que não existe relação humana que não implique
relação de poder, será mais fácil evitar visões ingênuas. Reconheceremos assim, por um lado,
que não existe sujeito completamente desempoderado, e, por outro, que a própria relação
de empoderamento nos coloca diante de um problema de difícil solução. Parafraseando o
que dizia Paulo Freire com relação à educação, podemos afirmar que ninguém se empodera
sozinho, mas também, que ninguém empodera ninguém. A única saída para esse quebra
cabeça é que: os homens se empoderam partilhando, em comunhão (FREIRE, 1987); isto
210 Pedagogia da Criatividade
é, existe uma solução dialética pela qual, sujeitos relativamente empoderados se dispõem
a facilitar a busca de sujeitos relativamente desempoderados por caminhos autônomos de
valorização individual e solidariedade coletiva.
Educação
Sumarizando então, entendemos o conceito de empoderamento como o que leva pessoas
e comunidades a serem “protagonistas de sua própria história” (GOHN, 2004). Porém,
um ponto fundamental a se responder nos parece o seguinte: qual ou quais são, hoje, os
principais fatores de desempoderamento e, portanto, quais seriam os pontos estratégicos a
se enfrentar para contrastar esse problema? Uma resposta comum a essa pergunta é que a
pobreza desempodera (FRIEDMAN, apud HOROCHOVSKY; MIRELLES, 2009), pois
retira dos pobres a condição de usufruir substantivamente dos direitos de cidadania. É esse
tipo de resposta que justifica a grande quantidade de projetos de gestão social, voltados à
geração de trabalho e renda.
Contudo, essa constatação, em sua força contundente, ainda obscurece algumas considerações
mais sutis ligadas às características que se costumam destacar, hoje em dia, ao se procurar
descrever as nossas sociedades contemporâneas. Sociedades do conhecimento (SQUIRRA,
2005), complexas, “líquido-modernas” (BAUMANN, 2007), são algumas das definições
as quais, com acentos diversos, frisam elementos comuns, convergentes, inclusive com
a experiência que nós mesmos, enquanto atores e gestores sociais, temos dos contextos
de nossa ação. O fato de “as mesmas coisas terem sentidos diferentes” (SCLAVI, 2000)
conforme o contexto onde elas acontecem e a significação cultural que se opera nelas; a
rapidez das mudanças tecnológicas, mas também sociais e culturais que tornam arriscada
qualquer previsão, assim como as tentativas de controlar os acontecimentos futuros que
já pautaram disciplinas classicamente modernas como os vários tipos de planejamento; o
nível de interconexão dos sistemas (informacional, econômico e cognitivo, mas também das
migrações, das doenças, etc.), todos esses fatores levam muitos autores a considerarem que o
elemento crucial para se navegar com êxito nesses mares turbulentos é a educação.
Uma educação, no entanto, redefinida com relação ao padrão tradicional que a queria
voltada principalmente à aquisição de informações e técnicas. A educação para o século XXI
deve ajudar os sujeitos a encontrar as chaves de interpretação do mundo global e de suas
multíplices versões locais. Será uma educação da visão crítica e da autonomia ou não será.
Será uma educação que reconhece os limites da racionalidade linear e instrumental típica
da modernidade e busca reintegrá-la com outras fontes de sabedoria e outras racionalidades;
uma educação que move do reconhecimento de que muitas são as maneiras de ler e
interpretar o mundo, e que reconhece lucidamente que esse mundo, por mais que nos pareça
o único mundo possível (pelo vício que temos de naturalizar o que nós mesmos, enquanto
seres humanos, fizemos (VIERA et al., 2009)), é apenas uma das muitas configurações
existentes. Aliás, uma configuração que está manifestando, com sinais alarmantes, os seus
pontos de crise.
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Ora, chegamos aqui em um ponto interessante de reflexão, pois, quem se interessa e está
envolvido no campo da educação sabe muito bem que, por mais que se reclame das taxas
de evasão escolar ou das percentagens de crianças que não acessam as escolas, os processos
formais de educação estão longe de assegurar, hoje, respostas adequadas ao problema em
pauta. Os modelos epistemológicos e pedagógicos que fundamentam o sistema educativo
em muitos países, até centrais do sistema-mundo e no Brasil, com certeza, são ultrapassados
e não dialogam com os desafios que a história humana nos propõe. Nessa situação, além
da busca imprescindível pela atualização desses modelos, é possível até que os múltiplos
processos de educação informal que vêm sendo desenvolvidos em campos como a
Gestão Social apontem caminhos relevantes e pertinentes para as respostas que estamos
procurando. Assim, parece-nos que a afirmação do potencial criativo de todo educando,
esteja ele envolvido em processos formais ou informais de educação, é um ponto de partida
fundamental no processo de aquisição de uma visão crítica e de uma postura autônoma e
não simplesmente reprodutiva com relação ao mundo.
É nesse intuito que avançamos a proposta de uma pedagogia da criatividade, especificamente
relacionada à questão do empoderamento enquanto processo intrinsecamente educativo que
nos leva à busca de novas formas do sujeito, individual e coletivo, estar em, e se relacionar
com, o mundo.
Voltando à pergunta inicial deste tópico sobre os fatores principais de desempoderamento
em nosso mundo contemporâneo, podemos adicionar, agora, a ideia de que o estigma
social e cultural que acomete sujeitos como moradores de favelas e bairros periféricos,
mulheres e jovens que nelas moram, sujeitos marginalizados por condições de vida (sem
teto, desempregados, dependentes químicos, presidiários,...) e o olhar depreciativo que esses
sujeitos muitas vezes introjetam, nos parece um fator crucial de desempoderamento, sobre
o qual a dita pedagogia da criatividade nos permite operar.
Fase 2009-2010.
O projeto iniciou-se em colaboração com o Ponto de Cultura, GAM (Galpão das Artes de
Marabá), e em colaboração com a comunidade pioneira de Marabá, Cabelo Seco. O objetivo
212 Pedagogia da Criatividade
acúmulo dessas realizações culturais estimulou um convite para desenvolver uma parceria
artístico-pedagógica com a Escola de Ensino Fundamental Judith Gomes Leitão, ao criar
um modelo de colaboração para 2012 com todas as escolas que atendem as crianças e jovens
do bairro Cabelo Seco. A colaboração pioneira dessa parceria gerou uma apresentação
artística diante de 500 alunos e duas apresentações artísticas diante de 200 mães e pais,
catalisando o Prêmio Nacional do Itaú-Unicef 2011, na categoria de ‘Pequeno Porte’ para
‘Educação Integral: experiências que transformam’.
Finalizamos o ano e a fase com uma festa solidária de celebração de todos os gestores jovens
e adultos do projeto, cujo tema de solidariedade se concretizou a partir da ressignificação
de um cachê da Vale do Rio Doce (realizadora-financiadora do Festival Giro Cultural) em
uma moeda solidária para 15 membros da comunidade de Cabelo Seco com necessidades
especiais. Na reflexão final dessa segunda fase do projeto, percebemos uma popularização das
músicas e o potencial gestor cultural do grupo ‘As Latinhas de Quintal’ como base possível
de uma cultura popular emergente da comunidade de Cabelo Seco; e uma obra cultural
imaterial capaz de sensibilizar a cidade, a região amazônica do sudeste do Pará e o país,
sobre a necessidade de repensar os conceitos dominantes de juventude e desenvolvimento
acelerado.
Avaliamos que o reconhecimento municipal do grupo juvenil como gestores e produtores de
uma nova comunidade ética, solidária e sustentável possível afirmou a proposta pedagógica
que aplica as artes como linguagem de transformação socioeducativa e cultural. Também
justificou o uso do prêmio do Itaú-Unicef para realizar uma terceira fase: a continuidade do
projeto da autotransformação comunitária, baseada nos três eixos organizadores de formação
artística; gestão e produção cultural; e intervenção intercomunitária e transcultural.
Sentindo-nos mais preparados para ampliar o projeto ao alcançar a comunidade inteira,
decidimos estender nossas ações culturais para além dos quintais de seus integrantes, a fim
de incluir as cozinhas e os quartos da comunidade. Acreditamos que um CD das músicas
das ‘As Latinhas de Quintal’ poderia sensibilizar a comunidade e divulgar os valores do
projeto, para cultivar autoestima e autoconfiança. Também, sentimos a possibilidade de
convidar artistas, educadores e gestores solidários de fora, para diversificar a experiência
cultural da comunidade, estimular o olhar através do outro e inspirar a troca de saberes,
como iguais, entre convidados de respaldo e os artistas e gestores de Cabelo Seco. Essas
reflexões geraram a proposta de um programa de residência artística em colaboração com o
Instituto Heinrich Boll da Alemanha.
Finalmente, refletimos sobre a vulnerabilidade econômica do grupo ‘As Latinhas de Quintal’,
o qual chegou a aceitar o cachê da Vale (que está bancando a exploração e devastação do
Sudeste da Amazônia), mesmo depois de uma decisão coletiva de participar no seu festival
de Cultura para propor uma Amazônia sustentável, sem aceitar remuneração. Refletimos
também sobre a vulnerabilidade da comunidade em geral à sedução de grandes empresas.
Definimos um quarto eixo organizador: o cultivo da economia solidária. Essa decisão gerou
três novos objetivos específicos para o Casarão de Cultura para demonstrar à comunidade sua
capacidade de autossustentação e criar uma base para uma economia solidária comunitária
214 Pedagogia da Criatividade
possível: integrar uma placa solar; integrar um sistema de reciclagem de chuva; e criar uma
moeda solidária.
Porém, dois acontecimentos na comunidade provocaram os núcleos gestores a repensar
sua estratégia de como realizar esses objetivos: a inesperada gravidez em novembro de uma
integrante de 14 anos do grupo ‘As Latinhas de Quintal’, uma das mais comprometidas
jovens do projeto; e o espancamento na rua do filho adulto do Diretor Musical do projeto
por mulheres da comunidade, provocadas pela sua ameaça e violência sexual. Mesmo sendo
um músico reconhecido, ele não havia conseguido evitar uma vida sem teto, viciada em
drogas e cachaça.
O primeiro acontecimento reforçou a resistência do grupo mais articulado e conservador na
comunidade, o qual já desacreditava no poder transformador da formação cultural e advogava
soluções socioeconômicas a partir do mercado de trabalho e repressão decisiva policial. O
segundo acontecimento transpareceu a necessidade de ampliar a base de colaboradores
qualificados e de instituições parceiras para lidar com o grau de sequelas psicoemocionais
de séculos de exclusão e violência socioeconômica.
Ambos acontecimentos machucaram a autoconfiança de uma parte do núcleo adulto gestor
e, nas últimas reuniões dos dois núcleos gestores em 2011, geraram duas novas prioridades
para o projeto: cuidar da questão de gênero e sexualidade para cultivar a autoconfiança das
meninas e moças em Cabelo Seco; e integrar parceiros solidários em cada espaço do projeto.
coletiva e de toda preparação que isso comporta. Estão se tornando, entre alegria e dor,
sujeitos públicos, chamados a se posicionar em conflitos de porte global (a relação entre
empresas multinacionais como a Vale e a comunidade de Marabá), a vislumbrar caminhos
futuros, antagônicos com o dominante, e a reconhecer na sua própria pele o tamanho do
desafio que isso tudo implica.
Figura 2 - Uma página do calendário de 2013, produzido como forma de divulgação das ações
do projeto.
Essa voz, no entanto, não chega até as páginas das revistas, nem ao fórum das conferências,
a não ser levada por mediadores, “intérpretes”, que se encarreguem de traduzir as formas das
palavras deles nos formatos aceitos. Esquecer-se das fronteiras e barreiras existentes entres
códigos distintos de comunicação seria ingênuo e, de fato, culposo de perpetuar a crença
de que o discurso científico seja a única forma válida de descrever o mundo, para pensar e
escolher as formas de sua transformação.
Para finalizar estas páginas, podemos afirmar que a proposta aqui apresentada, de uma
“Pedagogia da Criatividade”, fundamentada na adoção de Metodologias Integrativas
e de Transformance aponta para percursos de autoafirmação criativa dos sujeitos, como
elementos chave de processos de empoderamento, autonomia, responsabilização, com
relação ao presente e futuro, individual e coletivo. Sabemos da inércia dos paradigmas e
da força intrínseca das modalidades consolidadas de interpretar o mundo. No entanto,
parece-nos que continuar focalizando a dimensão material da falta de dinheiro como a
principal que determina a condição de marginalidade e exclusão de sujeitos e comunidades
seja uma manifestação do poder ainda exercido por uma visão simplória e instrumental dos
fenômenos de inclusão/exclusão social. Nosso auspício, com este trabalho, é lançar mão
de um diálogo que nos parece urgente e que tem como objetivo o aumento da eficácia das
práticas de intervenção em gestão social, para a inclusão social e ampliação da cidadania.
NOTAS
1 http://www.humiliationstudies.org/documents/
BaronCohenRelatoriodoSegundoSemestre2012do16deJaneiroUNICEF2013.pdf
2 Por exemplo, a elaboração de uma dissertação de mestrado que traz a reconstrução de algumas
histórias de vida que retratam o poder da vivência com arte na construção do sujeito (NEVES,
2013), ou projetos exitosos como o da Fundação Casa Grande (Nova Olinda, CE: http://www.
fundacaocasagrande.org.br/); ou de escolas no ensino fundamental no Brasil (a exemplo da
Escola Lumiar, SP: http://www.lumiar.org.br/) ou no exterior (Escola da Ponte, no Portugal:
http://beta.escoladaponte.com.pt/); ou ainda da experiência registrada pelo filme Lixo
Extraordinário, do diretor Lucy Walker, que retrata o trabalho do artista plástico Vik Muniz,
ao longo de dois anos, com catadores de um dos maiores aterros sanitários do mundo, o Jardim
Gramacho (RJ, http://www.lixoextraordinario.net/).
3 http://www.fundacaocasagrande.org.br/principal.php
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INTRODUÇÃO
A Fundação Casa Grande – Memorial do Homem Kariri, situada em Nova Olinda,
Sertão do Cariri (CE), é uma organização não governamental comprometida em formar
jovens e crianças nos campos da arte e comunicação, memória, turismo, esporte e meio
ambiente. As atividades formativas em comunicação e artes dividem-se em trabalhos de
campo e laboratoriais, para a captação, produção e edição dos materiais relacionados aos
temas trabalhados. Cada laboratório responsabiliza-se por organizar as ações próprias da
TV, rádio, editora, gibiteca, discoteca, biblioteca e videoteca, e desenvolvem atividades de
complementação escolar através dos laboratórios de Conteúdo e Produção.
“Habitar no Tempo” foi resultado de uma ação formativa, após dois períodos de residências
artísticas vividos por André Magalhães: o primeiro ocorreu em 3 meses, no ano de 2009, e o
segundo em 6 meses, no ano de 2010. Período que proporcionou a formação interdisciplinar
de crianças e jovens na sensibilização do ver, escutar, fazer e conviver mediante o acesso à
qualidade do conteúdo e ampliação do repertório para produção cultural.
de vídeo, mas também havia demandas para vivenciar com música, teatro, animação, técnica
de audio e luz, gestão cultural e outras atividades.
“Rua do Vidéo” - o primeiro projeto via Prêmio Interações Estéticas 2009, concedido pela
FUNARTE - abordou principalmente a música. O foco foi o grupo “Abanda”, já existente
na casa. O objetivo da intervenção, em forma de direção e produção artística, foi o de
aprofundar a música a fim de criar um musical. Ativamente, todos os meninos envolveram-
se para criar as animações, fotos, poesias, roteiros, transformando-se num DVD musical
com uma participação verdadeiramente coletiva.
Figura 3 - Iedo Lopes Fotografando.
Concomitante a essa criação, foram feitas sessões de orientação para a elaboração de projetos
culturais, a fim de facilitar aos jovens a comunicação sobre suas potencialidades criativas e
poderem participar de editais, executando atividades em prol de sua autonomia artística. Essa
atividade resultou em conquistas tais como o Edital “Nossa Onda”, lançado pelo MINC,
em que Aécio Diniz recebeu aprovação com seu projeto de radio documentário; também,
o Projeto “Sertão Sonoro”, edital público da Eletrobrás, planejado, escrito e excutado junto
com os jovens, acompanhados por uma coodenação externa de profissionais que se reuniram
para fomentar ainda mais a automonomia desses jovens na gestão cultural daquele espaço.
Tal construção fez fomentar a iniciativa desses meninos e meninas para gerarem
228 Habitar no Tempo
do Cariri, além de se evidenciar como uma das referências em educação para a cultura, no
Brasil e no mundo.
Figura 5 - Teatro Violeta Arraes.
NOTAS
1 www.blogfundacaocasagrande.wordpress.com
2 http://www.youtube.com/watch?v=luQZYzLyCBY&feature=relmfu