Artigo - LOGOARTE
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Artigo - LOGOARTE
Bárbara Ratusznei1
Sheila Maria Hesketh Rabuske2
Resumo
Neste artigo, realiza-se uma reflexão sobre a busca do sentido através da Arte, numa
perspectiva conceitual da abordagem humanista que tem como base teórica a Logoterapia.
Evidenciando a Logoarte como uma terapia artística Marianne da Silva Prado explana os
princípios da mesma no livro Logoarte: Pintura com sentido. O objetivo deste trabalho é
compreender por meio da literatura o efeito curador da Arte na vida das pessoas que estão
vazias de sentido, seja por causa da depressão, estresse, esgotamento emocional, ou seja, em
todas as esferas que envolvam a mente humana e sua essência. A Arte permite o ser
expressar-se e libertar-se das amarras que lhe causam dor, e sofrimento. Fazer Arte é uma
viagem, nas cores, formas, texturas, orientando a um porquê, uma direção, auxiliando no
significado de existir e estar no mundo. Existem várias formas de encontrar sentindo. A
Logoarte revigora a mente e direciona, respeitando as decisões e estimulando a autonomia da
pessoa que se permite mergulhar no processo terapêutico e artístico. A Logoarte é uma
terapia individual na qual cada um faz o seu trabalho, em seu próprio ritmo, uma forma de
autoconhecimento.
Abstract
A reflection on the search for meaning through Art, in a conceptual perspective of the
humanist approach to Logotherapy, demonstrating to Logoarte an artistic therapy, by the
Marianne da Silva Prado, who explains the principles of it in the book Logoarte: Pintura com
sentido . The objective of this work is to understand through literature the healing effect of
Art in the lives of people who are empty of meaning, whether because of depression, stress, or
emotional exhaustion, that is, in all spheres involving the human mind and its essence. Art
allows one to express oneself and to free oneself from the bonds that cause him pain and
suffering. Making Art is a journey, in colors, shapes, textures orienting a why, a direction,
aiding in the meaning of existing and being in the world. There are several ways to find
feeling, the Logoarte invigorates the mind and directs, respecting the decisions and
stimulating the autonomy of the person who allows himself to delve into the therapeutic and
artistic process. Logoarte is an individual therapy, each one does his work, at his own pace, a
form of self-knowledge.
a neurose do século XX. Este teórico defende que o vazio existencial se fundamenta “no
niilismo singular de cada indivíduo, que se caracteriza pela ausência de sentido da vida: perda
Frankl percebe que a sociedade contemporânea, com sua ordem consumista, reduz o
A partir dessa lógica da sociedade contemporânea, a busca pela felicidade não alcança
os resultados esperados e as pessoas sentem-se vazias, incompletas, e não sabem o que fazer
para mudar essa realidade. Isso leva o ser humano a uma frustração existencial, que ultrapassa
a repressão sexual apontada por Freud como origem da neurose, assim como o sentimento de
Logoterapia foi criada por Viktor E. Frankl, como uma psicoterapia centrada no sentido, a
qual concentra-se nos sentidos a serem realizados pelo paciente em seu futuro. A Logoterapia
busca fazer o paciente retirar o foco existencial dos círculos viciosos e mecanismos
retroalimentadores que auxiliam na criação das neuroses, confrontando o paciente com o
sentido de sua vida e o reorienta para o mesmo, considerando que “a busca de sentido na vida
da pessoa, é a principal força motivadora no ser humano” (Frankl, trad. Schlupp e Aveline,
2004.p.124).
De acordo com Silva, Breitenbach (2009, p. 1): “A busca pelo sentido da vida é uma
atividade natural do ser humano. Somente ele é capaz de se interrogar pela sua existência e
discutir a problematicidade do ser. O homem é um ser que procura sentido por participar da
Na visão de Frankl o homem encontra sua função existencial, quando se sente útil
austríaco, o ser humano sente-se realizado quando vive em busca de algo, abandonando seu
pequeno ego para pertencer a uma causa que lhe traga sentido. Frankl postula que essa causa
Para Frankl (2008), apud Souza e Gomes (2012, p.53): “O que é, então, um ser
humano? É o ser que sempre decide o que ele é. É o ser que inventou as câmaras de gás; mas
é também aquele ser que entrou nas câmaras de gás, ereto, com uma oração nos lábios”
utilizar o conhecimento para a empatia e bem estar comum, ou pender para o lado egoísta,
responsabilidade são inerentes ao ser humano, o definindo, como postula a filosofia que
“O homem é o único na procura de um sentido para sua vida, mas não precisa inventá-
lo, como propõe o existencialismo ateu de Sartre (para ele a vida é um absurdo). Segundo
C. J, 1988, p.44) .
psique, a interação com a sociedade, ou seja, o ser humano em todas suas esferas existenciais.
Frankl condena o reducionismo, pois o corpo não se separa da mente, e o ser não vive sem
relações, ou sem interações com o meio, portanto o ser humano é histórico, cultural, e integral
na sua forma de viver e conviver. Frankl relata essa perspectiva com base na Logoterapia e na
Análise Existencial:
Assim se pode, pois, definir o órgão de sentido nele “embutido”. Ele ilumina a respectiva
possibilidade de sentido (Frankl, Viktor E. (1981). Trad. Jorge Mitre, 1990, p.45.)
Convite ao novo: o sentido
O apego ao passado, impede a mudança e a busca pelo novo, observando esse fato
May, Rollo (1975), faz um convite para experimentar, o que as pessoas ainda não
descobriram, através de uma viagem com visão no futuro, pela coragem de criar:
De acordo com May, se não ouvirmos o nosso eu interior, trairemos a nós mesmos e a
comunidade, por não contribuir para o todo; assim a principal característica dessa coragem é
originar-se no centro, no interior do nosso eu, pois do contrário nos sentiremos vazios. O
"vazio" interior é igualado à apatia exterior; e essa como tempo transforma-se em covardia.
Logoterapia, para criar o conceito de Logoarte, isto é, o uso da experiência artística como
Logoarte e suas potencialidades terapêuticas, numa sociedade que vive carente de sentido.
A origem da Logoarte
A Logoarte tem por fundadora Marianne da Silva Prado, que escreve sua experiência
como terapeuta que utiliza a Arte como forma de psicoterapia por meio de seu livro “Logoarte
pintura com sentido” (Prado, 2004), o qual será uma das fontes dessa pesquisa. Segundo a
autora, a Logoarte associa a terapia artística à Logoterapia. Prado coloca que essa proposta
não será plenamente compreendida através da explicação com palavras; por esse motivo, a
autora faz um convite aos seus leitores para que a desenhem, pintem e modelem, da mesma
maneira que ela teve a oportunidade de fazê-lo durante o processo deste trabalho.
Segundo Prado (2004), essa terapia é uma complementação ao tratamento dado pelo
médico, buscando o estímulo de forças internas do paciente, de maneira que este supere suas
enfermidades e assim transforme sua vida por meio do autoconhecimento. Nesse processo,
argumenta a autora, a doença, que era algo ruim, torna-se resiliência, a medida que ocorre a
Logoterapia não é somente psicoterapia, mas tem uma essência filosófica. Na Logoarte,
segundo Prado, de forma análoga à Logoterapia, vê-se a busca do sentido da vida como a
mais alta motivação do ser humano. Através da terapia artística, o indivíduo possui a
possibilidade de trabalhar-se por meio da arte, agregando mais uma possibilidade terapêutica
assim desejando, pode dialogar sobre as ideias que surgem durante o trabalho; o diálogo é o
quadro de referência para o terapeuta. As técnicas mais utilizadas na Logoarte são: Desenho
de formas com giz de cera ou lápis macio -Pintura molhado no molhado -Pintura em papel
seco-Modelagem com argila. Ao realizar uma obra de arte, o artista tem algo diferente e novo
para encontrar. Na arte, o resultado final é importante. Na terapia, procura-se o processo para
a busca do equilíbrio e da harmonia, e experimenta-se mudanças, o que na vida real não pode
ser experimentado. Na vida, é necessário tomar decisões. Por exemplo: não se pode
[...] como um ser direcionado para uma meta, que o convida a buscar algo de
valor, algo pelo qual se valha à pena viver e lutar; pode ser algum trabalho, servir
a outra pessoa com amor, ensinar… É como se esse valor irradiasse para a
pessoa uma forca para agir. Este deve ser tão forte que pequenos obstáculos não
a façam desistir, mas ela simplesmente os salta e continua em frente. Os
obstáculos acumulados diante do propósito podem, no entanto, serem tão
grandes, ou de longa duração, que as próprias forças da pessoa não são
suficientes para sobrepujá-los (p.16).
A arte torna o ser humano criativo, sendo uma ferramenta facilitadora. A Criatividade
Criar é basicamente, formar. É poder dar uma forma a algo novo. Em qualquer
que seja o campo de atividade, trata-se, nesse “novo”, de novas coerências que se
estabelecem para a mente humana, fenômenos relacionados de modo novo e
compreendidos em termos novos. O ato criador abrange, portanto, a capacidade
de compreender; e esta, por sua vez, a de relacionar, ordenar, configurar,
significar (p.9).
visão e a partir dessa a percepção de acordo com Berger (1973): “ver precede as palavras. A
apaixonado tem a visão da pessoa amada com uma completude, a qual nenhuma palavra ou
abraço pode competir, somente o ato de entrega ao outro pode mensurar a completude. O
olhar, não é simplesmente ver um objeto, mas sim a relação com as coisas e nós mesmos. Da
mesma forma que observamos somos observados, é uma relação de reciprocidade (p.10-11)
reprodução fiel é uma das formas, e a arte de maneira reflexiva, partindo do pressuposto do
interior, que envolve os sentimentos e emoções, assim Silveira (2001) descreve as duas
Certamente há muitas maneiras de ver as coisas. Existem aqueles que têm olhos
apenas para o mundo exterior e esperam do desenho ou da pintura cópias mais
ou menos aproximadas de seres e de coisas da natureza externa. Outros, como
Kandinsky, aceitam a existência de uma realidade interna, mesmo mais ampla
que a natureza externa, realidade que unicamente pode ser apreendida e
comunicada por meio da linguagem visual (p.82).
As cores são fundamentais para a arte, segundo Battistoni (1989), “a cor é um dos
principais meios para dar variedade, ênfase e unidade ao seu trabalho, quer para criar efeitos
A cor afeta os olhos e coração, tanto física como metaforicamente. Cada tonalidade
age distintamente, para acalmar ou alertar os sentidos; age ainda sobrea sensibilidade, o
desenho, na pintura, ou na escultura de argila. A criatividade que estava escondida pode ser
libertada, e a partir do momento que toma formas, não é mais algo desconhecido, e sim
compreendido e compartilhado.
A arte é uma forma de expressão, de libertação de algo muito intimo de cada ser, por
meio dela é possível acessar conteúdos esquecidos, inconscientes, angústias, mas também
alegrias tornando-se assim uma oportunidade de colocar externamente o que incomoda, sendo
positivo ou negativo.
A arte está em relação com valores espirituais, aos quais proporciona o acesso do
expectador, e que o criador deve cultivar. No século XIX, esses valores são os de
uma Grécia eterna e amplamente imaginária: beleza, harmonia, equilíbrio etc.
Correlativamente a arte não tem (e não deve ter) intenção utilitária “baixamente”
material e deve até evitar escrupulosamente qualquer relação muito direta com a
realidade contemporânea, que só pode ser contingente (Aumont, 1990, p.297-
298).
A logoarte faz esse movimento de utilizar a arte como busca de sentido, por isso ela
passa a ser um mecanismo de ajuda para a vida das pessoas, portanto essa relação é descrita
como:
Na Logoarte fazemos uma relação entre o papel em branco que temos à nossa
frente, com as possibilidades que temos em nossa vida. Somos seres livres, mas à
medida que nosso trabalho artístico vai avançando, entramos em contato com
leis que regem as cores e as formas: os materiais utilizados possuem seus limites,
que aos poucos vamos conhecendo. Assim também acontece na vida: não
vivemos sós e para um convívio social existem muitas regras mais ou menos
rígidas e a Logoterapia fala de ”liberdade para” e não ”liberdade de,”, ou seja,
não posso ignorar que eu tenho uma família na hora de tomar decisões, pois estas
irão afetar todos os envolvidos. Devo seguir certas leis e é só dentro de certos
limites que posso fazer mudanças. O ser humano não tem domínio de todos os
fatores: somente pode mudar algumas coisas; não se pode mudar o jeito de uma
outra pessoa agir, somente o seu próprio meio de agir. (Prado, 2004, p.7-8)
empregue sua personalidade e construa algo que lhe seja positivo, nesse sentido pode ter um
efeito de cura da alma. Mas o sentido dessa liberdade implica em respeitar o lugar do outro,
no entanto não priva o ser humano de ter atitude para tomar decisões e ousar mais no dia a
dia.
Segundo Silveira a arte tem fato marcante para as veias da arte, portanto descreve
(1992):
Marco importante foi a atitude do pintor Jean Dubuffet, criador da noção de arte
bruta, Dubuffet define: “produções de toda espécie – desenhos, pinturas,
bordados, modelagens, esculturas, etc, que apresentam um caráter espontâneo e
fortemente inventivo, que nada devem aos padrões culturais da arte, tendo por
autores pessoas obscuras, estranhas aos meios artísticos profissionais” 30(p.88).
expressão diversa das emoções e sentimentos, sem levar em consideração um modelo pré-
resultando a coleção da Arte Bruta, essa foi levada para a cidade de Lausanne na Suíça, e o
acervo foi instalado no Castelo de BeauLieu, e assim inaugurou-se o Museu de Arte Bruta, em
1976.
O encontro dessas duas formas de ver o mundo, auxiliam na reflexão, agir sem
padrões, cópias ou imposições, para com a sua criatividade e vontade criar o que considera
bom para si, e sentir-se realizado com essa criação. Buscar sentido em que acredita, e que
Uma frase de MokitiOkadacitada por Sato (2011), na primeira página de seu livro
Oficina Terapêutica de Arranjos Florais –Ikebana, apresenta o contemplar das coisas simples,
De acordo com Sato (2011) apud Merleau- Ponty, 1971, p.III: retornar as coisas
mesmas é voltar-se para este mundo anterior a todo conhecimento, do qual o conhecimento
dependente, assim, como a geografia com relação á paisagem , onde aprendemos de início o
Esse pensamento permite segundo a visão de Sato (2011) desprender-se das visões
formais, da rigidez que aprisionam o agir livre, faz a relação de Mokiti Okada com Merleau-
Considerações finais
porque viver, e pode ser remédio para dor emocional e física. Desenvolver qual seja forma de
Arte possibilita ser livre, e expressar-se o seu interior, por meio de uma pintura, foto, gravura,
música ou dança. É uma conexão do interno com o externo, torna-se uma companhia nos
momentos de solidão de reflexão. Os sentimentos existem para todos, são universais, e podem
ser experimentados e sentidos por meio da Arte. Dessa maneira a união da Logoterapia e a
Arte traz luz a uma nova perspectiva de buscar sentido a Logoarte, o ato de desenhar, pintar,
usar as cores e escolhe-las possibilita ser livre, expressar o que necessita no momento, e esse é
então sentir-se útil e compreender o real significado. Com o olhar da Logoterapia o ser é visto
como alguém que pode dominar e oprimir, dependendo de sua percepção de mundo, mas
também um ser que enfrenta o mundo, olhando o horizonte, o alto, mesmo em situações de
adversidades, luta para ser resiliente, aprender mesmo que seja algo limitante. A arte no
porque. Utilizando a frase de Vitor Frankl, o qual fala que encontrou o sentido da sua vida,
ajudando as pessoas encontrarem o sentido das suas, ilustra o objetivo da Logoarte, que
através do ato criativo a pessoa artista de sua vida empregue um novo significado, uma nova
cor, forma e movimento. Cada pessoa é respeitada de acordo com seu tempo de ação, não
2.BATTISTONI, F.D. Pequena História da Arte. 3ªed. Campinas, São Paulo: Papirus, 1989.
3.BERGER, john. Modos de Ver. Trad. Lúcia Olinto. Rio de Janeiro: Rocco, 1999.
14.SILVEIRA, NISE DE. O Mundo das Imagens. São Paulo: Ática, 2001.