Vita Nova de Dante
Vita Nova de Dante
Vita Nova de Dante
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Este livro desenvolve-se em torno de três
grandes núcleos, uma Literatura, a Literatura Ita-
liana da segunda metade do século Xlfl; um au-
tor universal, Dante Alighieri; e uma obra, a sua
primeira obra de renome, a Vita nova.
FACULDADE DE LETRAS
Ao contar a história do amor consagrado a
UNIVERSIDADE DE COIMBRA
Beatrice, a mulher-anjo que é restituída à sua ver-
dadeira essência depois da morte, Dante filtra e
aprofunda a poética do do Ice stil novo.
O estudo da génese e da estrutura da Vita
nova mostra como o simbolismo do seu texto se
consubstancia na celebração de Deus, do amor e EDiÇÕES COLIBRI
da palavra.
ISBN 972-772-210-5
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A VITA NOVA DE DANTE ALIGHIERI.
DEUS, O AMOR E A PALAVRA
Colecção: ESTUDOS
Rita Marnoto
Edições Colibri
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Faculdade de Letras da Universidade de Coimbra
Biblioteca Nacional – Catalogação na Publicação
INTRODUÇÃO ........................................................................................ 9
2. A escola siciliana
A osmose entre os estímulos de diversa proveniência que circu-
lam no ambiente florentino fica bem patente nas páginas do tratado
que consigna a primeira tentativa de sistematização e de historiciza-
ção, no plano linguístico-literário, da produção italiana em vulgar – o
De vulgari eloquentia de Dante. Escrito nos primeiros anos do século
XIV, chegou até nós incompleto, quedando-se pelo capítulo 14 do
segundo livro. Logo à partida, torna-se sintomático o facto de uma
obra de reflexão acerca da Literatura vulgar ser escrita em latim. Atra-
vés de uma estratégia pragmática muito hábil, o autor do De vulgari
eloquentia fazia chegar a sua mensagem a um público douto, mos-
trando que a apologia e o cultivo da língua vulgar de forma alguma
entravam em confronto com o uso do latim. Se a propensão teorética é
uma constante do percurso intelectual dantesco, entre a Vita nova e a
16 Rita Marnoto
Nam videtur sicilianum vulgare sibi famam pre aliis asciscere eo quod
quicquid poetantur Ytali sicilianum vocatur.
grande mapa assim desenhado uma força motriz que lhe defina a
comunidade de intentos, pondo em causa a denominação de escola
[Folena, 179]. De outra forma, há que distinguir a actividade dos poe-
tas pertencentes à magna curia, considerada em âmbito restrito, da dos
seus imitadores no Centro e no Norte da Península.
A problematização deste nó metodológico encontra-se estrita-
mente relacionada com os avanços críticos feitos nos últimos anos,
pelo que diz respeito às efectivas relações da corte do Imperador com
a Itália centro-setentrional e com a Toscana em particular. Petrocchi
[Lett. it. 7, 189-92] identifica uma primeira geração de poetas minores
toscanos, activos entre 1240 e 1260, que se move na órbita da magna
curia, imitando os módulos poéticos de Giacomo da Lentini e de Pier
della Vigna, aquém de qualquer objectivo evidente de definir opções
culturais próprias. Maestro Francesco e maestro Torrigiano são flo-
rentinos. Ugo di Massa nasceu em Siena. Arrigo Testa é aretino.
Paganino di Sarzana é oriundo desta cidade da Toscana ocidental.
Talvez o próprio Jacopo Mostacci fosse um pisano migrado para a
Sicília. Além disso, a ars dictaminis da chancelaria imperial é indisso-
ciável do magistério dos mestres de Bolonha, em cuja Universidade
Pier della Vigna teria estudado. Frederico deslocava-se regularmente
ao Centro e ao Norte da Península, mantendo com os Senhores dessas
zonas de Itália relações ora de confronto, ora de colaboração, mas, de
qualquer modo, intensas. Em 1231-32, circula entre Ravena e as
regiões que lhe são adjacentes; em 1236, atravessa toda a Itália; no
ano seguinte, trava a batalha de Cortenuova contra a Liga Lombarda;
em 1238 e, depois, em 1240-41, está em Pádua; entre 1244 e 1245,
estabelece-se na Toscana e avança para Cremona; em 1247-48,
encontra-se em Parma. Na sequência da derrota de Fossalta (1249), o
seu filho Enzo, também ele poeta, ficou prisioneiro dos bolonheses,
continuando a exercer o seu magistério nessa cidade da Emilia
Romagna. Aliás, Roncaglia avança a hipótese de que a cultura véneta
tenha funcionado como importante elo de transmissão, à magna curia,
de códices provençais.
De outra forma, a receptividade dos Sicilianos na Toscana é sobe-
jamente documentada pelo facto de os mais ancestrais testemunhos
escritos da sua produção poética serem códices gravados por copistas
dessa região [Bologna: Lett. it. 6, 493-518]. As suas composições
chegaram até nós não através de manuscritos elaborados no próprio
ambiente intelectual da magna curia, mas através de cópias realizadas
na área da Toscana, a partir de finais do século XIII. Ao transcreverem
os originais sicilianos, os amanuenses adaptavam, porém, as caracte-
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