Material CIM Completo RositaFedrigo

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CIM - Certificação Ítalo Marsili

Conteúdo Semanas * 01 a 12

Rosita Fedrigo
2022
Sumário
ARTES CÊNICAS .............................................................................................................................................................12
SEMANA 01: TEATRO.......................................................................................................................................................13
OS SÍMBOLOS DO TEATRO .............................................................................................................................. 13
A DIFERENÇA ENTRE SER UMA PESSOA E AGIR COMO ELA ........................................................................................ 14
A EVOLUÇÃO DO TEATRO COM STANISLAVSKI ...................................................................................................... 16
AÇÕES FÍSICAS E AÇÕES MENTAIS ...................................................................................................................... 17
SEMANA 02: EMOÇÕES...................................................................................................................................................24
EMOÇÕES NÃO PODEM SER PRODUZIDAS ................................................................................................................... 24
PALAVRAS VAZIAS DE SENTIDO ................................................................................................................................. 25
ATENÇÃO ÀS AÇÕES ................................................................................................................................................ 25
SEMANA 03: A AÇÃO NA PERSPECTIVA DAS QUATRO CAUSAS ARISTOTÉLICAS.....................................................29
A AÇÃO NA PERSPECTIVA DAS QUATRO CAUSAS ARISTOTÉLICAS...................................................................................... 29
A AÇÃO DO PONTO DE VISTA MORAL ......................................................................................................................... 31
CAUSA FORMAL E CAUSA FINAL NA AÇÃO ................................................................................................................... 33
SEMANA 04: PRESENÇA E NEUTRALIDADE ...................................................................................................................35
PRESENÇA E NEUTRALIDADE..................................................................................................................................... 35
A PERCEPÇÃO DO HOMEM CONTEMPORÂNEO ............................................................................................................ 35
OBSERVAÇÃO DO CÉU COMO EXERCÍCIO DE PRESENÇA ................................................................................................. 37
IMAGENS DO CÉU DO CAMPO X LUMINOSIDADE DAS GRANDES CIDADES ........................................................................ 40
SEMANA 05: CARÁTER .....................................................................................................................................................41
O CARÁTER: ELEMENTO FIXO ................................................................................................................................... 41
TENSÕES FÍSICAS .................................................................................................................................................... 44
CONSCIÊNCIA CORPORAL ......................................................................................................................................... 47
SEMANA 06 : CAUSA FINAL..............................................................................................................................................50
A CAUSA FORMAL APONTA PARA A FINAL .................................................................................................................. 50
IMPLICAÇÕES DAS CAUSAS FORMAL E FINAL ................................................................................................................ 52
VONTADE E CAUSA FINAL NA VIDA HUMANA .............................................................................................................. 55
SEMANA 07: PENSAMENTO ............................................................................................................................................60
DISCURSO VERBAL E PENSAMENTO ........................................................................................................................... 60
1
O GESTO COMO PENSAMENTO ................................................................................................................................. 61
COMENTÁRIOS ÍTALO MARSILI E ROBERTO MALLET – SEMANA 07................................................................................. 63
SEMANA 08: MUSCULATURA..........................................................................................................................................67
MUSCULATURA E RESPIRAÇÃO .................................................................................................................................. 67
EXERCÍCIO DE RELAXAMENTO ................................................................................................................................... 68
EXERCÍCIO DE VOZ .................................................................................................................................................. 69

FILOSOFIA .......................................................................................................................................71
SEMANA 01: ÉTICA E CRISE DA CULTURA......................................................................................................................72
ÉTICA E CRISE DA CULTURA ....................................................................................................................................... 72
O MISTÉRIO DA ALMA HUMANA................................................................................................................................ 74
O PROBLEMA DO RELATIVISMO ................................................................................................................................. 75
ALTERNATIVAS AO “BOM SENSO” ............................................................................................................................. 78
PAPO FILOSÓFICO ÍTALO MARSILI E VICTOR SALES – SEMANA 01.................................................................................. 79
SEMANA 02: CULTURA .....................................................................................................................................................83
CULTURA EDIFICANTE & CULTURA DIVERSIONISTA........................................................................................................ 83
A CULTURA DO ESPETÁCULO NA INFORMAÇÃO ............................................................................................................ 85
O DESEJO MIMÉTICO NAS REDES SOCIAIS .................................................................................................................... 87
ESCOLHA DOS MODELOS .......................................................................................................................................... 89
PAPO FILOSÓFICO ÍTALO MARSILI E VICTOR SALES – SEMANA 02.................................................................................. 90
SEMANA 03: O HOMEM: SER INTERMEDIÁRIO ENTRE ANIMAL E DEUS .................................................................97
O HOMEM: SER INTERMEDIÁRIO ENTRE ANIMAL E DEUS ............................................................................................. 97
O HOMEM EM RELAÇÃO À SOCIEDADE ....................................................................................................................... 99
FACULDADES DA ALMA HUMANA ............................................................................................................................ 100
PAPO FILOSÓFICO ÍTALO MARSILI E VICTOR SALES – SEMANA 03................................................................................ 107
SEMANA 04: ROMANTISMO & ILUMINISMO ............................................................................................................114
ROMANTISMO E ILUMINISMO ................................................................................................................................ 114
CONFLITO ENTRE CIÊNCIAS NATURAIS E HUMANAS ..................................................................................................... 118
A BARBÁRIE DA ESPECIALIZAÇÃO ............................................................................................................................. 124
PAPO FILOSÓFICO ÍTALO MARSILI E VICTOR SALES – SEMANA 04................................................................................ 126
SEMANA 05: A CRISE NO FUNDAMENTO DA REALIDADE.........................................................................................133
2
A CRISE NO FUNDAMENTO DA REALIDADE ................................................................................................................ 133
NIILISMO E RELATIVISMO ....................................................................................................................................... 136
VIDA HUMANA E TRANSCENDÊNCIA ......................................................................................................................... 141
PAPO FILOSÓFICO ÍTALO MARSILI E VICTOR SALES – SEMANA 05 ................................................................................ 143
SEMANA 06: O PROCESSO DE MASSIFICAÇÃO............................................................................................................150
O TÉDIO COMO CONSEQUÊNCIA DA DIVERSÃO........................................................................................................... 152
O PROBLEMA DA AUTORIDADE ............................................................................................................................... 154
PAPO FILOSÓFICO ÍTALO MARSILI E VICTOR SALES – SEMANA 06 ................................................................................ 154
SEMANA 07 : POLÍTICA COMO FORMA DE AMIZADE ................................................................................................158
AMIZADE FUNDAMENTADA NO PRAZER: .................................................................................................................. 158
AMIZADE UTILITÁRIA: ........................................................................................................................................... 158
AMIZADE VIRTUOSA: ............................................................................................................................................ 158
INDIVIDUALISMO E TOLERÂNCIA.............................................................................................................................. 159
DEMOCRACIA E TIRANIA ........................................................................................................................................ 160
CONSEQUÊNCIAS DO INDIVIDUALISMO .................................................................................................................... 163
PAPO FILOSÓFICO ÍTALO MARSILI E VICTOR SALES – SEMANA 07 ................................................................................ 164
SEMANA 08: OS QUATROS TIPOS DE AMOR...............................................................................................................168
STORGE: ............................................................................................................................................................. 169
PHILIA: ............................................................................................................................................................... 169
EROS: ................................................................................................................................................................. 171
ÁGAPE/CARIDADE:............................................................................................................................................... 172
IMPORTÂNCIA DOS SÍMBOLOS NA PSICOLOGIA E COMENTÁRIO ACERCA DA TERAPIA ........................................................ 173
PAPO FILOSÓFICO ÍTALO MARSILI E VICTOR SALES – SEMANA 08 ................................................................................ 175

NUTRIÇÃO.....................................................................................................................................179
SEMANA 01: NEUROTRANSMISSORES........................................................................................................................180
O QUE SÃO ......................................................................................................................................................... 180
PARA ALÉM DA PRODUÇÃO DE NEUROTRANSMISSORES .............................................................................................. 187
RESUMO NEUROTRANSMISSORES ........................................................................................................................... 189
SEMANA 02: VITAMINAS D E B12 ................................................................................................................................190
VITAMINA D ............................................................................................................................................. 190

3
DEFICIÊNCIA E REPOSIÇÃO .................................................................................................................................. 191
VITAMINA B12 .......................................................................................................................................... 192
GRUPOS DE RISCO ............................................................................................................................................ 193
AVALIAÇÃO E REPOSIÇÃO ................................................................................................................................... 194
PAPO NUTRICIONAL ÍTALO MARSILI & RENNAN CAMINHOTTO – SEMANA 2 ............................................................. 196
SEMANA 03: FÁRMACOS PARA ANSIEDADE ...............................................................................................................202
FÁRMACOS PARA ANSIEDADE ............................................................................................................................. 202
FITOTERÁPICOS COMO ALTERNATIVA ................................................................................................................... 203
TABELA RESUMO FITOTERÁPICOS * ANSIEDADE ................................................................................................. 208
SUPRIR A DEFICIÊNCIA DE MAGNÉSIO .................................................................................................................. 208
PAPO NUTRICIONAL ÍTALO MARSILI & RENNAN CAMINHOTTO – SEMANA 3 ............................................................. 211
L-TEANINA ...................................................................................................................................................... 213
SEMANA 04: CICLO CIRCADIANO .................................................................................................................................217
MELATONINA E CORTISOL .................................................................................................................................. 217
REGULAÇÃO HORMONAL DA MELATONINA ........................................................................................................... 219
REGULAÇÃO HORMONAL DO CORTISOL ................................................................................................................ 222
PAPO NUTRICIONAL ÍTALO MARSILI & RENNAN CAMINHOTTO – SEMANA 4 ............................................................. 226
TABELA MEDICAMENTOS REGULAÇÃO : MELATONINA & CORTISOL .......................................................................... 230
SEMANA 05: TENSÃO PRÉ-MENSTRUAL ......................................................................................................................231
ORIGEM E SINTOMAS ............................................................................................................................................ 231
OPÇÕES DE TRATAMENTO ...................................................................................................................................... 232
VITAMINAS DO COMPLEXO B.............................................................................................................................. 232
OUTROS SUPLEMENTOS ......................................................................................................................................... 235
ALTERAÇÕES NA DIETA .......................................................................................................................................... 238
PAPO NUTRICIONAL ÍTALO MARSILI E RENNAN CAMINHOTTO - SEMANA 05 ................................................................. 241
SEMANA 06: TESTOSTERONA........................................................................................................................................245
FATORES QUE CAUSAM DEFICIÊNCIA DE TESTOSTERONA ....................................................................................... 245
CAUSA 01 = TRATAR O SOBREPESO: ........................................................................................................................ 245
CAUSA 02 = DORMIR BEM: .................................................................................................................................... 247
CAUSA 03 = EVITAR O ESTRESSE: ........................................................................................................................ 248

4
CAUSA 04 = NUTRIÇÃO ADEQUADA: ................................................................................................................... 249
COMENTÁRIOS NUTRICIONAIS ÍTALO MARSILI E RENNAN -SEMANA 06 ................................................................... 251
OUTRAS QUESTÕES ASSOCIADAS À BAIXA TESTOSTERONA ..................................................................................... 257
SEMANA 07: INSULINA E DIETA LOW CARB ...............................................................................................................259
INSULINA E DINÂMICA METABÓLICA ................................................................................................................ 259
DIETA LOW CARB ....................................................................................................................................... 261
PRÁTICA CLÍNICA ........................................................................................................................................ 262
COMENTÁRIOS ÍTALO MARSILI E RENNAN -SEMANA 07 ...................................................................................... 262
SEMANA 08: INGESTÃO E INFLAMAÇÕES ...................................................................................................................265
PROCESSO DE DIGESTÃO E INFLAMAÇÃO .......................................................................................................... 265
INFLUÊNCIA DA MICROBIOTA INTESTINAL .......................................................................................................... 267
POSSIBILIDADES DE TRATAMENTO ................................................................................................................... 267
SUPLEMENTAÇÃO ANTI-INFLAMATÓRIA ............................................................................................................ 268

ANTROPOLOGIA DA MODA ..................................................................................................................................270


SEMANA 01: MODA........................................................................................................................................................271
A APARÊNCIA COMO ELEMENTO DE INFORMAÇÃO.................................................................................................. 271
A INFLUÊNCIA DA MODA NAS QUESTÕES DO COTIDIANO ......................................................................................... 272
A MODA COMO FERRAMENTA DE AMADURECIMENTO ............................................................................................ 274
PAPO ESTILISTA ÍTALO MARSILI E PAULA SERMAN – SEMANA 01 ............................................................................ 275
A MODA COMO INSTRUMENTO AO SETTING TERAPÊUTICO ..................................................................................... 277
A IMPORTÂNCIA DA ELEGÂNCIA .......................................................................................................................... 279
SEMANA 02: MODA........................................................................................................................................................286
INTRODUÇÃO ................................................................................................................................................... 286
TEORIA DAS JANELAS QUEBRADAS ...................................................................................................................... 286
ELEMENTOS DA IMAGEM QUE PRECISAM DE ATENÇÃO ............................................................................................ 288
CONVIVÊNCIA, AUTOPERCEPÇÃO E OLHAR VOLTADO AO PACIENTE ............................................................................ 294
PAPO ESTILISTA ÍTALO MARSILI E PAULA SERMAN – SEMANA 02............................................................................. 295
SEMANA 03: IMAGEM FERRAMENTA TERAPEUTICA.................................................................................................304
A IMAGEM COMO FERRAMENTA TERAPÊUTICA ..................................................................................................... 304
ELEMENTOS QUE TRANSMITEM AUTORIDADE ....................................................................................................... 305

5
ARTICULAR A PERSONALIDADE AO ESTILO DO AMBIENTE ........................................................................................ 307
PAPO ESTILISTA ÍTALO MARSILI E PAULA SERMAN – SEMANA 03............................................................................. 313
SEMANA 04: MENTALIDADE UTILITARISTA .................................................................................................................318
INFLUÊNCIA DA MENTALIDADE UTILITARISTA ........................................................................................................ 318
BELEZA, ELEGÂNCIA E BOM GOSTO ...................................................................................................................... 321
BELEZA NATURAL ............................................................................................................................................. 324
HÁBITOS CONCRETOS ........................................................................................................................................ 325
PAPO ESTILISTA ÍTALO MARSILI E PAULA SERMAN – SEMANA 04............................................................................. 327
SEMANA 05: VIRTUDES ..................................................................................................................................................330
O QUE SÃO AS VIRTUDES .............................................................................................................................. 330
AS VIRTUDES ENVOLVIDAS NO VESTIR-SE BEM .................................................................................................... 331
RECEPTIVIDADE DA BELEZA............................................................................................................................ 337
SEMANA 06: OS SETES ESTILOS UNIVERSAIS ...............................................................................................................339
OS SETE ESTILOS UNIVERSAIS ......................................................................................................................... 339
ESPORTIVO:.................................................................................................................................................. 339
CLÁSSICO OU TRADICIONAL: ....................................................................................................................... 340
CONTEMPORÂNEO OU ELEGANTE: ............................................................................................................. 340
ROMÂNTICO: ............................................................................................................................................... 340
SEXY: ............................................................................................................................................................ 340
CRIATIVO:..................................................................................................................................................... 341
MODERNO: .................................................................................................................................................. 341
ESTILOS COMO FERRAMENTA TERAPÊUTICA ....................................................................................................... 341
SEMANA 07 : TRAÇOS INDIVIDUAIS .............................................................................................................................343
OBSERVAÇÃO E ANÁLISE DE TRAÇOS NATURAIS .................................................................................................. 343
OLHOS .......................................................................................................................................................... 343
CABELO ........................................................................................................................................................ 344
ROSTO .......................................................................................................................................................... 345
CORPO .......................................................................................................................................................... 345
SEMANA 08: AS CORES...................................................................................................................................................347
CORES E CARACTERÍSTICAS NATURAIS .............................................................................................................. 347

6
CONTRASTE ENTRE CORES ............................................................................................................................. 347
A MENSAGEM DE CADA COR .......................................................................................................................... 348
DIMENSÕES DAS CORES ................................................................................................................................ 348
COORDENAÇÃO E COMBINAÇÃO ..................................................................................................................... 348
CÍRCULO CROMÁTICO .................................................................................................................................. 349

PSICOPATOLOGIA.......................................................................................................................................................351
SEMANA 01: TÉCNICAS DA PSICOPATOLOGIA ............................................................................................................352
DESAFIOS NO DOMÍNIO DAS TÉCNICOS DE PSICOPATOLOGIA ................................................................................. 352
SÚMULA PATOLÓGICA: A FERRAMENTA FUNDAMENTAL AO TERAPEUTA.................................................................... 352
UMA NOVA GERAÇÃO DE TERAPEUTAS ............................................................................................................. 353
A VISÃO AMPLA DO HOMEM ......................................................................................................................... 355
Psicopatologia Explicativa: .......................................................................................................................... 355
Psicopatologia Descritiva:............................................................................................................................ 356
SEMANA 02: ATITUDE E APARÊNCIA ............................................................................................................................356
ATITUDE E APARÊNCIA ................................................................................................................................. 356
UM OLHAR SIMBÓLICO SOBRE APARÊNCIA E ATITUDE .......................................................................................... 357
O CORPO: CABEÇA, TRONCO, BRAÇOS E PERNAS ................................................................................................. 358
CONCLUSÕES ............................................................................................................................................. 362
SEMANA 03: PSICOMOTRICIDADE & SENSOPERCEPÇÃO ..........................................................................................363
PSICOMOTRICIDADE .................................................................................................................................... 363
PSICOMOTRICIDADE E PATOLOGIAS ..................................................................................................................... 364
ECOPRAXIAS: ............................................................................................................................................... 364
FLEXIBILIDADE CÉREA OU CATATONIA: ............................................................................................................. 364
MANEIRISMOS: ............................................................................................................................................ 364
SENSOPERCEPÇÃO ...................................................................................................................................... 365
ALTERAÇÕES QUANTITATIVAS DA SENSOPERCEPÇÃO .............................................................................................. 365
ALTERAÇÕES QUALITATIVAS DAS SENSOPERCEPÇÃO ............................................................................................... 366
SEMANA 04: INTELIGÊNCIA HUMANA .........................................................................................................................368
A ‘INTELIGÊNCIA’ MINERAL, VEGETAL E ANIMAL ................................................................................................ 368
A INTELIGÊNCIA HUMANA: ABSTRAÇÃO DE CONCEITOS ........................................................................................ 369

7
O MUNDO DOS CONCEITOS ANTERIOR À MATÉRIA .............................................................................................. 371
SEMANA 05: LINGUAGEM .............................................................................................................................................372
LINGUAGEM .............................................................................................................................................. 372

LINGUAGEM PROPRIAMENTE HUMANA ........................................................................................................... 373


VONTADE / CONAÇÃO ................................................................................................................................ 376
SEMANA 5: LINGUAGEM (ANEXO) .......................................................................................................... 378
ALTERAÇÕES DA LINGUAGEM - DALGALARRONDO (2008): ..................................................................................... 379
SEMANA 06: MEMÓRIAS E FANTASMAS.....................................................................................................................383
RELAÇÃO ENTRE ATENÇÃO E MEMÓRIA ........................................................................................................... 384
A FORMAÇÃO DE FANTASMAS E CONCEITOS ...................................................................................................... 385
IMAGINAÇÃO E A ORIENTAÇÃO NO MUNDO...................................................................................................... 387
SEMANA 06: MEMÓRIA (ANEXO) .................................................................................................................. 390
ALTERAÇÕES QUANTITATIVAS ............................................................................................................................. 390
SEMANA 07 – CONSCIÊNCIA E PENSAMENTO ............................................................................................................393
CONSCIÊNCIA ............................................................................................................................................ 393
PENSAMENTO .................................................................................................................................................. 396
SEMANA 08 – AFETO ......................................................................................................................................................399
FORMAÇÃO E FUNCIONAMENTO DO AFETO ...................................................................................................... 399
CARACTERÍSTICAS DO AFETO ......................................................................................................................... 401
SEMANA 09 – MÉTODO TERAPÊUTICO ........................................................................................................................404
O QUE É A VIDA? ........................................................................................................................................ 404
NARRATIVA COMO FERRAMENTA ................................................................................................................... 406
CENÁRIOS E LOCAIS ..................................................................................................................................... 407
PAPÉIS DESEMPENHADOS ............................................................................................................................. 408
LITERATURA E MITOLOGIA ............................................................................................................................ 409
SEMANA 10 – OS MEIOS DE AÇÃO ...............................................................................................................................412
MEIOS DE AÇÃO: MATÉRIA E ELEMENTOS IMATERIAIS .......................................................................................... 412
PAIXÕES, VONTADE E INTELECTO .................................................................................................................... 416
ORIENTAÇÃO NO MUNDO ............................................................................................................................. 420
SEMANA 11: QUATRO VETORES DA AÇÃO HUMANA E OS ARGUMENTOS VITAIS ...............................................422

8
INTRODUÇÃO ............................................................................................................................................ 422
QUATRO VETORES POSSÍVEIS DA AÇÃO HUMANA ................................................................................................ 424
OS ARGUMENTOS VITAIS .............................................................................................................................. 426
OS ARGUMENTOS VITAIS - RESUMO ............................................................................................................... 436
SEMANA 12.1 – AS SETES FACULDADES HUMANAS..................................................................................................437
O OBJETO DE ESTUDO DA SIMBÓLICA ............................................................................................................... 437
AS SETE FACULDADES HUMANAS .................................................................................................................... 442
TRÊS NÍVEIS DA REALIDADE ........................................................................................................................... 447
SEMANA 12.2 – A PERSPECTIVA SIMBÓLICA DAS ESTAÇÕES DO ANO ...................................................................452
AS ETAPAS DAS ESTAÇÕES ............................................................................................................................. 452
AS ESTAÇÕES E O AMADURECIMENTO .............................................................................................................. 457
Anexo Rosita - Ciclo de Estações em Planilhas ............................................................................................ 462

9
LÓGICA DA CONSTRUÇÃO DESTE MATERIAL:
Este material contempla os textos enviados pela CIM e as falas dos professores, que em um primeiro
momento foi feito para meus estudos, e acabei disponibilizando para as pessoas que estão ainda nas
buscas dos ‘heróis e heroínas solares’, e eu estou na fase da ‘heroína lunar’ !

Etapas do processo:

1)Copio o arquivo completo PDF/CIM de cada aula e insiro em


um documento WORD;

2) Os tópicos do arquivo PDF/CIM, neste material é um subtítulo


e assim o sumário foi gerado;

3)Abro a aula na plataforma CIM e o arquivo WORD, e


compartilho a tela conforme a imagem ao lago;

4)Escuto uma frase, e digito no arquivo... O desafio é quando a


minha mente viaja em reflexões / pensamentos e esqueço uma
palavra da frase e tenho que escutar novamente. Acontece
muitoooooo....

CORES e suas observações:

Os textos na cor preta ➔ são os textos retirados do arquivo PDF da


CIM ;

❖ Textos em Itálicos na cor Ouro com o bullet ➔ 90% das falas


transcritas dos professores, conciliados com o arquivo da CIM.

Cor lilás ➔ alguma observação minha 😊

Com destaca texto em amarelo ➔ palavra não identificada e mesmo escutando numa velocidade 0.75,
não consegui entender a palavra.

Observação: somente no resumo do mês 07 é que achei o padrão de formatação.

Todas as informações de rodapé, foram para conceituar de forma rápida aquela palavra ou uma pequena
biografia de alguém citado. A grande maioria dos rodapés, busquei na Wikipédia. Afinal, aqui não é uma
monografia

10
Agradecimentos

Agradeço as colegas que contribuíram para acelerar um pouco este processo:

Caroline Holthausen Sandrini (Floripa / SC);

Marcela Dutra (Palmas / TO);

Elizangela Gondim (Uberlândia / MG) e

Gabriela Magalhães (Barreiras / BA).

As colegas citadas, ajudaram na transcrição das disciplinas do mês 01, para a 4ªquarta. avaliação e
cabia a mim, a formatação. Sem o apoio delas, o material estaria com menos transcrições.

Tiago MonteCardoso, incansável em orientar os alunos em dificuldades nas disciplinas e me deu algumas
dicas de organização do material. Não tive tempo hábil de organizar e passar um ‘pente fino’, para
deixar com a qualidade que eu aprecio.

Meu agradecimento especial para Júlia Fernandes, fisioterapeuta de Niterói / RJ, mãe de 2 crianças em
idade escolar e mesmo após ter obtido a Certificação, transcreveu as aulas 5 e 6 de Filosofia, Moda e
Psicopatologia.

Estarei em pensamento com os colegas que farão a avaliação no domingo, dia 03/04.

Abraços, com carinho,

Rosita Fedrigo

11
ARTES CÊNICAS

ROBERTO MAL ET

12
SEMANA 01: TEATRO

Esta aula vai discorrer a respeito do teatro, do simbolismo no teatro grego, da evolução do teatro
grego para o moderno, bem como a influência que essa evolução provocou no imaginário do público.
Também serão abordadas as relações entre artes cênicas e psicologia, e de que modo o teatro pode
elucidar questões fundamentais sobre nossa personalidade.

OS SÍMBOLOS DO TEATRO

Trataremos, neste curso de Artes Cênicas, de teatro, história e gesto. “Teatro” vem da junção das
palavras gregos “Theo”, que significa “observar, contemplar”; com “atrium”, que significa “espaço,
edifício”. De fato, o teatro é um lugar onde se contempla.

❖ Eu gostaria de começar falando sobre a própria ideia de teatro, e a palavra teatro em grego significa
lugar de onde se vê, “atrium” é um espaço no meio de uma colina, que geralmente ficava numa
montanha.
❖ O teatro era um lugar que na Grécia, era uma montanha, uma colina, um símbolo do próprio
universo. Os teatros eram construídos mais ou menos no meio da montanha / colina,, onde você
sentava para contemplar, ver, iluminados pelo sol, não tínhamos luz elétrica. Então o teatro era
construído de tal maneira que, as representações das tragédias eram feitos ao longo do dia,
começava de manhã e as pessoas ficavam ali o dia inteiro ali assistindo as tragédias e comédias, sob
à luz do sol .
❖ Aqui você já tem um simbolismo tradicional e muito essencial você tem a montanha iluminada pelo
sol, que é o símbolo da inteligência e
símbolo do próprio Deus. Aliás, a
teoria tem a mesma raiz de THEOS
para os gregos. Então para os gregos,
Deus é aquele vê, que contempla.
❖ Mas ficavam vendo o quê?
Fundamentalmente personagens,
“homens e mulheres” (hoje em dia
sempre temos que fazer esta ressalva)
em ação, fazendo coisas, realizando
ações em conflito, cada um buscando
os seus objetivos, querendo alcançar
determinada coisa. E ficava ali no

13
meio da montanha, ou seja, entre o céu e a terra, é como se subindo aquela colina você saísse,
digamos assim, do seu entorno, da sua realidade cotidiana e fosse para um lugar um pouco
destacado.
❖ Você já deve ter subido uma colina / montanha, quando você sobe uma montanha, você vê aquela
realidade na qual você estava inserido e que, exatamente, por estar ali no meio do ‘afã’ do seu
cotidiano, você tinha uma visão um pouco particularizada, vamos dizer assim, ou diminuída da vida,
porque você está ali com problemas cotidianos.
❖ E você vai para um olhar um pouco mais amplo por um lado e um pouco menos contingente, das
coisas do dia a dia que desaparecem. Quando olhamos de cima, quando você está subindo no avião,
por exemplo, você olha sua cidade, de uma certa forma, você vê a estrutura daquela cidade como
que despojada das suas coisas mais cotidianas, contingentes, que no fundo não importam muito.
❖ O que já mostra um pouco algo que hoje em dia a gente perdeu, quando pensamos em artes
dramáticas, na verdade, a nossa referência fundamental é o cinema e portanto um tipo de arte
muito próximo do realismo, pessoas se comportam ali como se comporta no dia a dia.
❖ E nesse lugar aí, entre o céu e a terra, quando você olha de uma certa forma você estiliza aquela
realidade, você vê nela o que há de mais por um lado, inteligível, o que é mais claro, e você leva em
conta todas as relações tendo um olhar portanto mais contemplativo e mais estilizado.

Como a plateia contempla a representação dos atores, Deus contempla nossas ações. Ir para o alto da
colina assistir às apresentações de teatro era, para o grego, sair de sua realidade cotidiana e contemplar
as ações dos homens desde um ponto intermediário entre o céu e a terra. Os homens não eram, como
são hoje, sedentos por realismo. O grego não exigia que o ator fosse o personagem em vez de apenas
representá-lo.

A DIFERENÇA ENTRE SER UMA PESSOA E AGIR COMO ELA

❖ Na Grécia, imagina, o ator usava uma máscara que era enorme, estava em cima de um coturno,
um calçado alto e com uma roupa pesada. Nós ficamos impregnados de naturalismo, de um realismo
nos últimos 150 anos, 200 anos. No próprio teatro, antes do surgimento da invenção da luz elétrica
não havia essa situação que você conhece hoje em dia no teatro, em que você fica no escuro e só a
cena é iluminada; então aquilo adquire uma espécie de realidade fantasmática, que lá não tinha, lá
era muito claro que aquilo era uma representação, que os atores não eram os personagens. Os
atores estavam representando, ou seja, apresentando para nós, um outro.
❖ Isto nos faz pensar em uma coisa que quero aprofundar muito com vocês, que é a distinção entre as
pessoas e as suas ações. Essa confusão é muito frequente quando a gente pensa teatro, quando a
gente pensa o trabalho do ator, e de uma certa forma quando a gente pensa a nossa própria vida.

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O teatro de hoje, bem como no público de hoje, existe uma confusão entre representar o personagem
e ser o personagem. Essa confusão aparece em nossa própria vida sempre quando imaginamos, por
exemplo, poder construir a nossa própria personalidade.

A personalidade não é uma coisa que se construa e, mesmo se fosse, sua personalidade é a sua própria
pessoa, e é impossível que você se construa a si mesmo.

❖ Quando você pensa assim: eu tenho que construir minha personalidade. Como é que você faz para
construir sua personalidade? Sua personalidade, sua pessoa, é uma coisa que você possa construir?
❖ E mais ainda: quem está construído essa personalidade? Não é você mesmo? Como é possível que
você, construa você mesmo, no fundo não faz sentido.

A mesma confusão aparece também quando pensamos em “autoimagem”. Uma coisa é o terapeuta
olhando para o paciente, com determinado arcabouço teórico, tentando desenhar uma imagem dele.
Outra, muito diferente, é a própria pessoa querer enxergar a si mesma. Como alguém poderia ser, ao
mesmo tempo, sujeito e objeto de sua própria consciência?

❖ É como o negócio da autoimagem: eu vou cultivar minha autoimagem, vou fomentar, vou termais
consciência de mim mesmo. Mas a sua imagem, não é você ! Você quem tá olhando, não é isso?
Você não pode se ver, por definição, por que quem está olhando?

Essa confusão evidencia, também, a conexão que existe entre as Artes Cênicas e a Psicologia. Não se
trata de uma coincidência, as duas ciências tiveram, no século XX, um avanço significativo.

❖ O problema aqui, é que você não pode se ver, por definição. Você se conhece, vamos dizer assim,
você tem consciência sim, mas a consciência não é uma visão nesse sentido, porque não tem
separação entre sujeito e objeto. Você simplesmente sabe, isso é um problema hoje em dia, porque
ainda mais século 20, onde depois da psicanálise surgem vários autores que estudam a alma
humana, e nada contra , pelo contrário.
❖ Mas isso nos gerou uma excessiva preocupação com o autoconhecimento, de uma forma pouco
obtusa, porque uma coisa é você estar diante de um terapeuta, por exemplo, e o terapeuta tentar te
compreender, aí você tem o sujeito e o objeto. Agora quando eu mesmo quero me compreender,
como é que eu faço?
❖ Veja a analogia que isso tem com o negócio do trabalho do ator e como a gente pensa, porque assim
como houve um ‘boom’ aí da Psicologia, ou da Psiquiatria, enfim do conhecimento da alma humana,

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também tem um boom, no trabalho do autor, no desenvolvimento da técnica
do trabalho ator, isso não era assim, isso começa com Stanislavski1 e
certamente você já ouviu falar sobre ele.

A EVOLUÇÃO DO TEATRO COM STANISLAVSKI

O ator moderno é resultado do pensamento de Stanislavski. Ele foi o primeiro a


sistematizar o trabalho do ator e seu trabalho impregnouse em nossa cultura. A
conhecida expressão “memória emotiva” vem de sua obra.

❖ Tem um autor, o Eugenio Barba2, um homem de teatro, italiano, que ele disse
que se o homem vem do macaco, eu não acho que o homem venha do macaco
mas enfim, é o que o Barba diz, então o ator moderno descende diretamente
de Stanislavski.
❖ E é verdade, não tem como você pensar teatro no ocidente, sem se debruçar sobre a obra do
Stanislavski, porque foi o primeiro cara que tentou sistematizar o trabalho do ator e isto impregnou-
se de uma certa forma na nossa cultura. Você já deve ter ouvido falar na expressão memória
emotiva, vem dali, de Stanislavski.

Antes de Stanislavski, apresentações teatrais feitas por amadores eram muito comuns. As pessoas
encenavam sem se preocupar com a técnica, mas apenas com narrar uma história.

A preocupação em narrar é, inclusive, uma das marcas que diferenciam o gênero dramático do gênero
épico. A narração, própria do épico, pretende contar uma história e não fazer com que ela se desenrole
diante de seus olhos; sua matéria dirige-se aos ouvidos.

❖ Antes e mesmo na época do Stanislavski, era muito comuns nas apresentações teatrais com
amadores, as pessoas faziam teatro sem se preocupar com a técnica, elas estavas preocupadas no
quê? Em contar uma história, porque essa diferença fundamental, entre o épico e o dramático, ou
entre narrativa e o teatro.
❖ Na narrativa, a ação não está acontecendo diante do público,o narrador está contando algo que
aconteceu num passado, seja passado cronológico, seja passado mitológico ...’No princípio Deus

1
Constantin Stanislavski: (Moscou, 1863 / 1938) foi um ator, diretor, pedagogo e escritor russo de grande destaque entre
os séculos XIX e XX. Stanislavski é mundialmente conhecido pelo seu "sistema" de atuação para atores e atrizes, onde reflete
sobre as melhores técnicas de treinamento, preparação e sobre os procedimentos de ensaios. Embora pensadas para o
teatro, suas proposituras cênicas são largamente utilizadas por artistas de cinema e televisão.
2
Eugenio Barba (Brindisi, 1936) é um autor italiano, pesquisador e diretor de teatro. Fundador e diretor do Odin Teatret,
criador do conceito da Antropologia Teatral, fundador e diretor do Theatrum Mundi Ensemble, e criador da ISTA (International
School of Theatre Anthropology)
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criou o céu e a terra, e da terra...’ e aí você
vai contando aquela história, eu não estou
vendo isso estou ouvindo isso. A narrativa se
dirige ao ouvido.

O teatro, que é gênero dramático, dirige-se aos


olhos. Se você está assistindo a Hamlet, você não
escuta a história, mas a vê representada.
Stanislavski sofisticou a representação, dando mais ênfase ao trabalho do ator. Isso afetou o imaginário
do público.

❖ O teatro ao contrário se dirige ao olhar, então eu vejo, no caso, por exemplo, se fosse essa narrativa
mitológica, isso nunca dá certo, nunca vi um filme que consiga resolver esse problema aí... ‘No
princípio Deus criou o céu e a terra...’ como é que você faz isso? Como imagem, como é que a
imagem de Deus? É aquele ..., a gente tem algo..., na criação do universo, na criação do homem,
lá na Capela Sistina, aquela famosa imagem de Deus, com o dedo quase tocando o dedo de Adão,
sendo criado.
❖ E você tem uma imagem ali do Deus Pai criando, bom é uma solução que não me convence, eu acho
que não convence ninguém. Você olha assim e pensa: ‘Aquilo ali é Deus?’ Como é que você
representa Deus, é um problema. Se representar o ser humano já é grave, que dirá representar Deus.
❖ Mas enfim, eu dizia que, as pessoas faziam teatro sem se preocupar muito com a técnica do ator, o
trabalho do ator, não era propriamente uma arte que, sobre a qual as pessoas se colocassem um
olhar e ficassem lá dizendo: “ah, esse é bom ator, esse não é bom ator...” Não, eles estavam
interessados na história que estava sendo mostrada, não contada, eles estavam vendo: ‘Então entra
o Hamlet, para ir ver a Ofélia rezando e vai conversar com ela...’ Você está vendo as pessoas agindo
na sua frente...Então é isso é o que distingue a arte do drama, da arte da narrativa.
❖ Com Stanilaski, você começa a focar o olhar, até do público, sobre o trabalho do ator até porque o
trabalho do ator começa a ficar mais sofisticado.

Depois de Stanislavski, a maior parte das pessoas supõe que construir a personagem é ser alguém. O
problema é que tornar-se outra pessoa é impossível. Você pode, apenas, agir como alguém. Da mesma
forma, quando tentamos, nós mesmos, mudar nossa maneira de ser, não vamos jamais conseguir ser
menos orgulhosos ou ser mais humildes. A única coisa que conseguiremos é mudar nossas próprias
ações.

AÇÕES FÍSICAS E AÇÕES MENTAIS

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❖ E aí entra no nosso Imaginário também, este problema veja que, entra por um lado científico (pela
Psicanálise, Psicologia, Psiquiatria) e entra por um aspecto, vamos dizer, do imaginário, das
histórias, das fábulas, que é o problema da ação humana e da pessoa humana, pessoa humana que
age e da construção dessa pessoa humana, seja na nossa vida, seja em teatro.
❖ Aqui tem um gancho, tem um ponto que pode ser de muito interesse para nós, e eu como ator, e sou
professor também de atores, diretor de teatro, então essa questão perpassa toda minha vida. E a
gente vê qual é o problema da construção da personagem por exemplo; e a gente vê que a maioria
das pessoas acham que construir a personagem é ser alguém, ser o Hamlet, por exemplo.
❖ As pessoas pensam isso, usamos isto no jargão do teatro mesmo, você vai fazer o Hamlet, é uma
coisa, outra coisa é você dizer : ‘ Você vai ser o Hamlet’. Não dá pra ser o Hamlet! Você pode fazer
as ações que o Hamlet faria, você pode fazer as ações como o Hamlet faria. São coisas distintas,
uma coisa é eu pegar uma xícara, estou pegando uma xícara como eu pego uma xícara. Como
Hamlet pegaria...
❖ Aqui já temos uma distinção, uma coisa é ação, outra coisa é a maneira, o modo como ela é feita,
não é a mesma coisa. Aqui eu agi como o Malet, agora como o Hamlet faria? Não sei, talvez ele
ficasse em dúvida se ia beber ou não. O Hamlet é o homem das dúvidas. Então quando ele se
aproximaria, ele pegaria e haveria uma leve dúvida: ‘Será que eu pego, pego ou não pego, eis q
questão? ‘
❖ Não sei se vocês estão captando a relação muito íntima entre essas duas questões, não é, porque
quando você se pergunta assim, ou você diz, por exemplo ‘Eu sou muito orgulhoso...’ não é? Todos
nós somos bastante orgulhosos, eu sou muito orgulhoso... tem que deixar de ser menos orgulhoso...
Como se faz? O orgulho não é uma substância, é? A gente pergunta como pode deixar de ser
orgulhoso, mas vamos pegar o oposto.
❖ ‘Eu gostaria de ser mais humilde’. Como é que você faz para insuflar humildade na sua pessoa?
Resulta que, você começa a falsear sua própria realidade imaginando que você está sendo humilde.
Você não pode ser humilde. A humildade não é uma substância. O que que acontece é que as
pessoas que se diminuem..., ‘É, eu sou muito humilde....’ Olha o que acontece com meu corpo
(postura curvada)? Porque na verdade eu não estou sendo humilde, , eu estou dizendo para você
que eu sou humilde.
❖ Você consegue captar a distinção disso? Porque isto é meio caminho andado se você percebe, que
uma qualidade não pode ser feita! Uma qualidade não é uma ação! Se você pegar lá as categorias
de Aristóteles, você vai ter uma das categorias é a Qualidade, outra categoria e a Ação. São
categorias distintas, não é a mesma coisa. Eu não posso fazer uma qualidade. Eu posso fazer uma
ação que tenha determinada qualidade. Uma ação humilde é perguntar para as pessoas aqui, ‘O
que eu devo dizer.... tenho que dar essa aula aqui....’ Aí eu fico perguntando: ‘Escuta, me diz uma
coisa, está bom?’ Aí alguém pode dizer: ‘Que humilde, que ele é! (Risos)
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❖ É igual aquele pessoal que diz assim ‘Ah, eu sou muito humilde, sou uma das pessoas mais humildes
que conheço..., todo mundo deveria ser tão humilde quanto eu, e o mundo seria melhor...’
❖ Então, isto é uma coisa boa de se fazer, uma coisa é qualidade, uma qualidade não é uma ação. A
ação pode ter determinada qualidade, percebe a distinção?

Não há como representar qualidades. É possível representar, com tranquilidade, uma ação física. O tom
de sua voz, por exemplo, é algo que você é capaz de mudar. Com meu corpo, eu posso dar a impressão
de estar mais ou menos presente, mais ou menos triste. Alguém pode dar a entender que está triste,
ausente, sem de fato estar triste ou ausente; o seu corpo, porém, deu a impressão desses estados.

❖ Voltando à personagem e portanto a personalidade, a personalidade, a pessoa é aquela que age,


então eu não posso fazer a pessoa, só quem pode faz pessoa é Deus. Eu posso fazer ações, minha
pessoa, eu, faço coisas, ajo, num sentido, em outro sentido, quero isso, quero aquilo, faço isso e
aquilo. E quando eu quero coisas faço algo em direção a esse objeto.

Temos responsabilidade sobre nossos estados mentais, porque muitas vezes eles são influenciados pelo
nosso corpo. É um vício querer relacionar-se com o ambiente apenas de modo mental. Se alguém tenta
mostrar presença e confiança, mas apenas mentalmente é presente e confiante, não vai convencer. Seu
corpo vai apresentar ausência e insegurança.

É por isso que, embora seja importante desenvolver a “leitura corporal”, muito mais necessária é a
“escrita corporal”. Desenvolvê-la é essencial para o ofício do ator. O ofício do ator não consiste em, como
muitos imaginam, sentir como uma personagem, mas em fazer suas ações. Saber disso é útil para nossa
própria vida.

❖A questão do Hamlet, a famosa questão do Hamlet, ’Ser ou não Ser’ não pode ser resolvida
diretamente, você é. Na verdade quando Hamlet disse ‘Ser ou não Ser’, ele está se perguntando: ‘Eu
me mato ou não?’ ... Se você pegar o monólogo, o que ele está se perguntando não é assim... ‘Que
qualidade de ser ou devo fazer?’ Não, ele está se perguntando assim: ‘Eu continuo aqui lutando,
faça o que eu tenho que fazer eu desisto disso e me mato?’ Ou seja, está se perguntando que ações
o que eu faço, ajo ou não ajo, essa é a real do Hamlet, daquele momento.
❖ Então se, por exemplo, eu peso ficamos com Hamlet, que é uma personagem bastante conhecida,
em vez de tentar fazer alguém que está em dúvida, como é que você faz alguém que está em dúvida?
Você não faz! você tem que criar ações e negar essas ações, vamos dizer assim. É esta brincadeira
que fiz com a xícara, ‘pego ou não pego’ . Percebeu que, nesses gestos, só agora volto a falar com
você, coloco foco em você, mas você percebeu que em algum momento aqui, eu titubeei, quase fui
para uma outra ação e voltei para cá. Então o próprio trabalho do ator, como a própria palavra diz
é agir, e não ser. Ser você já é.

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❖ Então, voltando por exemplo para a qualidade ‘Eu sou muito tímido, ... eu sou tímido, doutor... eu
tento fazer as coisas, mas fico com medo...’ Mas eu não estou tentando tímido aqui, fazendo isto
com vocês, na verdade eu coloquei meu corpo numa determinada condição... se eu fizer isto aqui
(Malet faz um movimento, projetando a parte superior para frente, com segurança) você não vai
acreditar, não é verdade, por quê? Porque o que estou fazendo não tem a qualidade da timidez. Eu
não estou tentando fazer a qualidade da timidez,.....
❖ Minhas ações aqui são: primeiro colocar meu corpo numa determinada condição, isto aqui é
essencial...Você é capaz de modificar a qualidade física do seu corpo, qualquer um de nós pode fazer
isso aí, com tranquilidade. Por exemplo se eu agora abaixar o que eu posso chamar de tonicidade,
e isso tem até com problema da presença, veja que eu estou falando com você agora e eu estou
menos presente. Menos presente em que sentido? Estou menos palpável? Não, eu só mudei, uma
ação, vamos chamar assim, geral sobre o meu corpo, que determina uma qualidade física. Agora se
eu disser isto assim..., vou soltar meu corpo (Malet, mudando a posição do corpo, deixando-o solto),
ignorando que eu estou dando esta aula, não ignorando, estou sabendo, você está aí, não é? Mas
você vê que tudo diminui em mim, eu fico mais opaco, eu não gero interesse, se eu aumentar isso
ainda, e agora ficar até um pouco entristecido, e pouco até, não sei (Malet, com voz chorosa e parou
a representação)....Aí alguém pode dizer: “Ele viveu, ele estava sentindo....”. Eu não estava sentindo
‘coisa’ nenhuma, eu estava simplesmente modificando a minha ação, gerando, uma outra qualidade
física.
❖ Muitas vezes isto é só um problema de você compreender que, o seu estado emocional, ele é uma
escolha não consciente, muitas vezes, mas você está fazendo este estado. O estado emocional não
é só algo que nos acontece, ele também é resultado da minha ação, da minha responsabilidade que
eu tenho sobre minha própria condição psicofísica.
❖ Um problema que as pessoas sempre enfrentam, como é que eu me comporto diante de um público?
E elas tentam, de fora para dentro estabelecer isto, quer dizer, ‘Não, eu tenho que estar aqui, eu
tenho que....’ (Malet, com gestos vigorosos). Isto se torna, vamos dizer assim, falso, formal, exterior,
você está forçando a barra, por quê? Porque você está pensando..., de uma certa forma se olhando
de fora, tentando adequar a sua ação a essa imagem que você tem de fora, de você mesmo´, não
sei se isto está claro...
❖ Os atores erram muito aí, ele tenta se ver de fora, eu digo: ‘Meu filho não dá de se ver de fora, por
definição, a não ser se você olhe no espelho e ainda assim não é você que está lá, é você que está
olhando. Então você é quase o contrário, você tem, claro, uma noção de como é que o está fazendo
está chegando no outro. Mas isto você pode ter de dentro.
❖ O que você pode fazer é colocar seu corpo numa determinada condição, que é, vamos dizer assim,
presente. Eu estou aqui diante de você, falando com você. Isto já me traz para cá! A não ser que você
não esteja atento e esteja tentando fazer isso, vamos dizer, na sua alma.
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❖ Então estar diante de alguém, PRESENÇA, etimologicamente é isso , estar diante de, ser diante de.
Bom você já é diante das pessoas, não precisa aumentar a sua substância, mas você está de fato
diante das pessoas, você está em relação com elas, ou tem um filtro, tem um caminho mental aqui,
através do qual você quer estar em relação. É o que a maioria das pessoas fazem: ‘Eu tenho que
encontrar a maneira de..’, não, você tem que estar no espaço físico, diante das pessoas, em
relação...nós vamos voltar a este tema, porque isso é um ponto fundamental.
❖ A nossa relação é uma relação que se dá no espaço e no tempo. Quando eu quero entrar em relação
com você, eu tenho que ter uma noção clara de onde eu estou e onde você está e onde nós estamos,
quer dizer, no universo no qual a gente está.
❖ Nós temos muitos maus hábitos que vem da nossa ... história, enfim. E sobre isso nós vamos falar
com muito cuidado, numa próxima aula, mas já estou levantando este tema, porque isto... porque
as vezes você se habituou, por exemplo, a sentar-se ou a caminhar, com o corpo... com o nível de
energia, abaixo do que seria o normal.
❖ Se por exemplo, você fica em pé (Malet, se levanta e vai representando as explicações, ombros um
pouco arqueados), na verdade o teu tônus muscular é abaixo do normal, você vê que aqui tudo
diminuiu, a minha voz baixa, porque não tenho apoio, está vendo como a minha voz vem para
dentro, estou falando aqui, e você diz lá: ‘Quem é esse cara, que que esse cara está fazendo, por que
que esse cara está aí?’ E eu digo: ‘Eu estou aqui porque sou um professor e estou aqui para ensinar
para você alguma coisa....’ E você diz: ‘Ok, mas eu não tenho interesse nisso .’ Por quê ? Porque
minha própria condição física está dizendo; ‘Eu não estou interessado nisso.’ Mesmo que eu esteja,
mas estou interessado mentalmente.
❖ E aqui nós entramos em um problema, muitas vezes a nossa relação com o Cosmos e com as pessoas
é uma relação mais mental do que física. A gente acha que é físico mas não é, é só nossa cabeça.
Estou muito interessado em você, mas meu corpo não está dizendo isto. É uma expressão perigosa...,
‘o corpo fala...’ Quem fala é você! Então o corpo fala no sentido que, o corpo que está expressando
aquilo que de fato está acontecendo. Ah isso é verdade.
❖ Então por exemplo, se estou muito na minha cabeça, você não percebe isso evidentemente porque
você não tem o olhar treinado para isto. Agora eu que tenho o olhar treinado, passeia a minha vida
olhando ator, trabalhando em cena, eu.. uma espécie de deformação mental (risos), fiquei lá olhando
ator, você vai captando , ‘... você está pensando em outra coisa’. Se por exemplo eu estou falando
aqui com você e penso em outra coisa, eu não vou pensar em outra coisa, porque só estou
mostrando, mas você vê.
❖ Então este negócio de leitura corporal é um negócio que você tem que desenvolver mesmo.

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❖ Aliás, eu estava brincando ontem, conversando aqui, dizendo ‘Olha, leitura corporal eu talvez possa
ensinar melhor, por ser ator, porque o ator trabalha com escritura corporal e raramente as pessoas
trabalham com isso, elas não percebem, não é seu ofício.
❖ O ofício do ator tem esta particularidade. Não é bem como as pessoas dizem, se você finge que é
alguém, é, mas depende de como você vai entender isto. Você não finge que é outra pessoa. Só um
mau ator, vai tentar fazer isto e não vai dar certo. Você age como outra pessoa, você faz as coisas
como ‘SE’.
❖ Não sei se vocês já leram, a obra do Stanislavski , infelizmente em português a gente não tem ainda,
já se passaram mais de 100 anos, mas da obra publicada quase 100 anos. Nós não temos uma
tradução ainda do original, parece que está sendo feita agora. Nós temos uma tradução da versão
americana, ‘a construção da personagem e a preparação do ator’ é o inverso, ‘A preparação do Ator
e a Construção da Personagem’ que tem muitos cortes e não é o original.
❖ Mas enfim é essa confusão que os Stanislavski fez entre ‘fazer as emoções e sentir as emoções’
.Achar que o trabalho do ator é sentir as emoções da personagem. O ator está fazendo como ‘SE’. O
Stanislavski sua uma expressão que não sei como é em russo, não falo russo, que está traduzido por
‘Ser Mágico’. Eu acho isso, um horror, eu nunca usei esta expressão, não vou virar para um ator e
dizer assim: ‘Agora você usa o Se Mágico’, não dá para dizer isso.
❖ A ideia é isso mesmo, se eu fosse o Hamlet, isso é muito diferente de você tentar entrar em cena e
dizer: ‘Eu sou o Hamlet...’ Não dá para fazer, você não pode ser o Hamlet. Você é você mesmo e
acabou. Toda a tentativa neste sentido vai dar errado. Agora se eu fosse o Hamlet, ah o tal do ‘SE’ é
mágico mesmo, porque ele libera a tua imaginação. ‘Ah, porque se eu fosse o Hamlet, talvez...., o
Hamlet, era gordo não?... ‘ Ninguém tem isso no imaginário, porque temos o cinema em geral e é só
num momento lá que o Shakespeare aponta... mas o Hamlet era um pouco gordo. Então se eu fosse
fazer o Hamlet, já é um segundo ‘SE’ mágico aqui, eu trabalharia a partir desta ideia de que ele é
meio rechonchudo. Eu não posso tentar ser rechonchudo, porque ó (Malet, apontando para seu físico
magro), sou o oposto disso. Mas eu posso imaginar que sou gordo e aí, me comportar um pouco...,
meu gesto já amplia, porque se eu fosse pegar a xícara como Hamlet eu poderia imaginar que ele
pega um pouco assim..., de maneira que, veja, estou fazendo coisas, estou agindo e não tentando
ser.
❖ Esse parece ser um tema essencial, porque vem de novo, como dizia antes, vem da nossa própria
vida, tem que ser menos orgulhoso, não dá para fazer isso. Como você faz, ser menos orgulhoso? A
não ser que você entenda, que é esse conselho: ‘ah tá bom, eu tenho que, por exemplo, é não insistir
na minha visão das coisas. Bom, isso já melhorou um pouquinho não é.
❖ Veja, uma coisa física, geralmente as pessoas que são orgulhosas elas tendem a olhar para os outros
de cima para baixo. E você vai perceber que muitas, não sempre, mas é comum que uma pessoa
orgulhosa ela te olhe um pouco de cima... Aí você pensa, ‘Esta pessoa é o rei o universo...’, mas ela
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não está pensando que é o rei do universo, ela está simplesmente te olhando de cima, porque é o
lugar que ela se imagina.

Como poderíamos, de uma hora para outra, sentir menos orgulho? Podemos, entretanto, mudar a nossa
postura, os nossos gestos, a nossa maneira de olhar para transmitir menos orgulho. Quem sabe, depois
de agir bastante como pessoas humildes, acabemos por ficar menos orgulhosos.

❖ Ah, então como ator, eu pudesse pensar nisto, vou fazer um orgulhoso e vou olhar as pessoas um
pouco de cima. Agora isto causa uma tensão aqui, porque olhar os outros de cima eu contraio um
pouco o pescoço. Então talvez se eu, baixar um pouco, como a gente diz: ‘oh, baixa a bola...’ então
‘baixe a cabeça um pouco,’ não tem isso? Eu tenho que baixar a cabeça? É uma expressão que a
gente usa, para quebrar o orgulho. Ora então talvez você precise trabalhar seu pescoço (Malet,
‘massageando’ seu pescoço), de tal forma que assim, quando você vai olhar de cima, você ‘.. opa,
pare aí, ...’, e isto vai te ajudar ao longo dos meses, ao longo dos anos. Vai aos poucos modificar uma
condição que é, psíquica, uma ideia que você tem de você mesmo.

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SEMANA 02: EMOÇÕES

Esta aula trata da percepção equivocada a respeito das emoções e do discurso. Trata também das tensões
musculares e problemas de respiração, e apresenta meios para resolvê-los

EMOÇÕES NÃO PODEM SER PRODUZIDAS

No livro A Preparação do Ator, de Stanislavski, há uma situação em que os estudantes preparam uma
cena de Otelo. Ao final, o diretor comenta: “só em um momento em toda a cena aconteceu alguma
coisa. No resto do tempo, vocês ficaram tentando sentir as emoções da personagem”. Um aluno
questiona se isto não é, justamente, o trabalho do ator: sentir. E muitas pessoas acreditam que é isso
mesmo.

Então, o diretor dá outro exercício aos alunos: determina que um sinta tristeza; outro, alegria; outro,
angústia. Nesse momento, eles percebem o absurdo do que estavam tentando fazer.

As emoções, por definição, não podem ser produzidas. Ex movere é ser movido de fora. Portanto, as
emoções acontecem a alguém. O que lhe move de fora pode ser inclusive um pensamento, mas ninguém
pode realizar a emoção – é um patos, algo que se padece.

❖ Não é possível produzir ou querer sentir emoções. Tente sentir alegria, angústia ou tristeza. Emoções
são algo que você não realiza, vem de fora. EX MOVERE. Você não sente as emoções por definição
você não realiza são coisas que acontecem mas ex movere, ser movido de fora. Você sofre a emoção,
padece. É um PATHOS, uma patologia.

A personagem do livro continua: “quando nós estávamos em cena, não parecia absurdo”. Há algo em
nós que acredita que em situações de representação, como em uma palestra, podemos produzir
emoções.

O homem é o único animal que é capaz de fazer uma coisa acreditando piamente que está fazendo
outra. Fazemos isso diariamente. Às vezes, em detalhes muito sutis. Outras vezes, em questões
fundamentais.

❖ “O homem é o único animal que faz uma coisa acreditando piamente que estão fazendo outra.”
Alguém tenta ser humilde”. Pode esquecer, não vai conseguir. O privilégio do ser humano é o falar.
Nós temos as palavras, os animais e os anjos, não. É um grande privilégio e um grande perigo. Porque
posso construir uma frase que só tem sentido vocabular.

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PALAVRAS VAZIAS DE SENTIDO

O privilégio do ser humano é falar. Mas a palavra é também o grande perigo, porque torna alguém capaz
de construir frases aparentemente com sentido, quando este, na verdade, é apenas vocabular. Pode- se
dizer que vai desenhar um quadrado redondo, mas não é possível fazer isso de fato.

❖ Exemplo: vou desenhar um quadrado redondo. Você formula isso, mas não consegue fazer. Mas dá
pra dizer, pois dá pra acreditar nisso, desde que não tente fazê-lo. E pode passar a vida nesse projeto,
dizendo ainda que ninguém nunca fez isso. E é verdade, ninguém nunca fez.

Esse é um exemplo banal, mas há quem passe a vida toda com um projeto que não pode ser realizado.
Uma pessoa que leva sua vida normalmente, mas com o grande projeto de ser muito humilde, por
exemplo. Isso é pretensão, pois ela quer criar uma realidade, uma qualidade, e não dá para fazer isso.

❖ Mas tem gente que passa a vida tentando fazer esse grande projeto: ‘Vou ser bom, vou ser humilde’.
Só que isso já é um pouco pretencioso. Não dá pra fazer isso, criar essa realidade. Cuidado com a
virtude de falar para não cobrir a realidade com palavras.

É preciso muito cuidado com o falar, porque muitas vezes cobrimos com palavras a realidade que
estamos vendo. Aliás, quando se insiste tanto hoje em dia sobre a importância da literatura na formação
do homem, é porque os grandes escritores conseguem expressar realidades sem mascará-las.

Refere-se à pessoa que esconde alguma coisa como ator, hipócrita. Mas se a máscara cotidiana põe uma
coisa por fora, enquanto outra está acontecendo por dentro, a máscara teatral é o contrário: ela revela
o que não está visível no dia a dia, o que está na alma da personagem.

❖ A máscara teatral é o oposto da máscara cotidiana. Ela revela o que acontece na alma da
personagem. Tudo que conta são as ações: você está sempre agindo.

ATENÇÃO ÀS AÇÕES

Tudo o que conta, não somente no trabalho do ator, mas na vida humana mesma, são as ações.

No organismo humano, acontecem inúmeras ações, embora inconscientes. Tudo o que existe, existe em
função ou é resultado de alguma ação. Mesmo uma pedra está exercendo uma pressão sobre o solo e
refletindo luz. É materialismo raso olhar para as coisas e pensar que tudo está estático.

❖ Se você tenta ficar parado, uma série de coisas estão acontecendo: seu fígado está trabalhando, seu
coração está batendo, você só não lembra (e nem pensa isso). Tudo que existe é resultado de uma

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ação. Até uma pedra está exercendo uma pressão no chão. Também reflete luz. Não é uma ação
consciente, mas é ação.
❖ Coloque uma célula num microscópico e você vê um monte de cosia acontecendo. Quase nada está
parado. Se você tem uma tensão no ombro, quem está tencionando? É você! Não é o cosmo, nem os
outros.

Costuma-se pensar que as tensões musculares são coisas que nos acontecem, colocando a culpa no
cosmos, na situação, nos outros. Mas é o sujeito que está produzindo a tensão inconscientemente. O
pescoço, os ombros e a lombar são as três regiões mais críticas. Conforme a pessoa se torna adulta,
perde contato com o próprio corpo. É preciso recuperar esse contato.

RESPIRAÇÃO
Respirar é uma ação que pode ser inconsciente ou consciente. Se alguém está muito tenso, precisa
respirar.

A maioria das pessoas inspira quando alguém lhe diz para respirar. Porém, na verdade, respirar bem é
expirar bem. Tirando todo o ar do pulmão, a inspiração acontece naturalmente enchendo primeiro o
abdômen, o diafragma.

Além da importância para a vida orgânica, boa parte do discurso mental que atordoa, muitas vezes, é
falta de respiração. Tentar interromper o pensamento sem respirar pode fazer mudar o tema, mas o
cansaço mental vai continuar, porque é como se houvesse uma espécie de desconexão entre o ser como
um todo e a cabeça.

❖ Precisamos respirar bem e a maioria das pessoas não sabem disso. Quando pensam em respirar elas
inspiram e não expiram.
❖ Quando se está tenso, expire: respire com o abdômen, profundamente, não com a parte superior
do corpo. E se você prestar atenção, perceberá que boa parte do discurso mental (preciso pagar tal
conta, preciso trabalhar, estou cheia de coisas pra fazer...) é fala de respiração.

Muitos dos problemas reais, como o problema da respiração, não são abordados porque a pessoa está
tentando resolver problemas mentais. Há um abismo entre os problemas que estão na cabeça e os reais,
entre a cabeça e o coração. Mas com esse trabalho orgânico sobre a respiração – o qual leva tempo, pois
todos os processos corporais são lentos –, respirando com mais amplitude, parte dos problemas vão
desaparecer.

❖ Nós tendemos a privilegiar o discurso mental achando que estamos fazendo uma coisa integral.
Muitos dos nossos problemas, eu diria que a maioria deles, são apenas discursivos. Você conversa
com os outros sobre os problemas e tudo fica como uma tese. Muitos dos nossos problemas são

26
mentais e não reais. E não abordamos os problemas reais porque estamos preocupados com os
mentais.
❖ Ex. Você se esquece da respiração porque “tem” muita coisa para fazer. Só que isso são só coisas
que estão na sua cabeça. Na maioria de nós há um abismo entre a cabeça e o coração.
❖ Se você fizer o trabalho orgânico sobre a respiração, respirar com mais amplitude, parte dos
problemas desaparecem, pois eles não são concretos. São só problemas que se tem na cabeça.

PRESENÇA
Assim como as preocupações mentais desconectam da vida concreta, ter o agradável como critério para
a condição física é algo que aliena, porque é como se a pessoa entregasse seu corpo. Alguém deitado no
sofá ou na poltrona parece ser engolido, além de respirar pior, já que perde a posse de sua musculatura.

❖ Uma pessoa que está pensando em muita coisa, no que tem que fazer, está desconectado da sua
realidade concreta. Você precisa estar presente. Na sua cabeça você pode ir até a lua. Você não pode
perder uma fatia de vida “voando” em pensamentos. Se você se larga num sofá, relaxa e dorme, e
gosta, você acha que gosta só porque não está pensando, só isso.

É fundamental estar presente, estar em relação, não somente com quem está diante de si, mas com o
espaço concreto, o chão, a cadeira. Por isso, é importante sentar-se sobre os ísquios3 (ossos da parte
inferior do quadril).

Quando alguém se senta arredondando as costas, fecha-se em si mesmo, fica em uma posição fetal, de
ponto de interrogação, como que perguntando: “quem sou eu? O que é a vida?”. Por outro lado, uma
pessoa sentada sobre os ísquios está fazendo, agindo.

❖ Preocupações mentais te desconectam da vida concreta. E querer só o agradável, só o físico, te torna


alienado. Quando você senta, deve sentar sobre seus ísquios. Fazendo isso, você está agindo.
❖ Se você se larga num sofá, deixa de agir. Sentado sobre os ísquios você está agindo e tem presença.
A presença não deve ser só física, mas também com a cadeira, com o chão, o espaço, o mundo
concreto. Não é só insuflar uma sensação mental – “Estou presente”.
❖ Densidade existencial é diferente de densidade muscular. No nosso dia a dia ficamos aquém da nossa
relação concreta com as pessoas. Isso quando não se está abandonando coisas.

Exercício: dois minutos por dia, sentar-se sobre os ísquios em uma cadeira ou banco de madeira. Mudar
para a posição arredondada das costas e perceber as mudanças. Voltar a sentar sobre os ísquios.

❖ As pessoas gostam de poltrona porque ela te engole um pouco. Cadeira estofada é mais gostoso.
Presença não e insuflar o ser em si mesmo. Estar presente é estar presente em relação com o outro.

3
Ísquio ("anca") é um osso que constitui a zona inferior da pélvis (quadril) e que apoia o corpo quando estamos sentados.
27
❖ Sente-se sobre seus ísquios. Eles foram feitos pra isso. Não arredonde seu modo de sentar. Se tudo
arredonda já vira um ponto de interrogação, já fica uma posição de dúvida. Se você senta nos ísquios
está fazendo, agindo. Quando você está relaxado abandona sua musculatura e consequentemente
respira pior.

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SEMANA 03: A AÇÃO NA PERSPECTIVA DAS QUATRO CAUSAS ARISTOTÉLICAS

Nesta aula, vamos abordar o conceito de ação a partir das quatro causas de Aristóteles, com base em
um texto de Mário Ferreira dos Santos.

A AÇÃO NA PERSPECTIVA DAS QUATRO CAUSAS ARISTOTÉLICAS

Diz Aristóteles que para que alguma coisa exista no universo concreto é necessária a concorrência de
quatro causas distintas. A melhor maneira de compreender isso é usando um objeto como exemplo.

Para que uma cadeira exista, precisa ser feita de alguma coisa.

Esta é a primeira, a causa material – tudo o que existe no mundo concreto é feito de alguma matéria.
Depois, a cadeira tem uma finalidade, um objetivo – causa final. Se ninguém precisasse de um objeto
para se sentar, não se pensaria em fazer uma cadeira.
Além disso, é necessário que alguém faça a cadeira – causa motora ou eficiente.
A pessoa que vai fabricá-la pensa em uma forma, uma ideia de cadeira – causa formal.
A cadeira em si, pura e simples, não existe, porque todo objeto é feito de alguma matéria. De acordo
com a finalidade, escolhe-se a matéria mais adequada.

❖ Agora pense que uma madeira (matéria) também não existe. E eu escolho a matéria que é mais
adequada ao meu objeto. Uma cadeira de rodas ou uma de sala de aula são outras espécies de
cadeira. O objetivo vai determinar a ideia e a matéria dessa cadeira. Então, no caso da cadeira,
temos:

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1- Causa Eficiente: o carpinteiro (quem faz);
2- Causa Material: madeira (matéria);
3- Causa Formal: a forma da cadeira (o que);
4- Causa Final: sentar-se (o objetivo do objeto – sentar-se de uma determinada condição).

O exemplo abaixo foi retirado do livro ‘O Chapéu do Mago’ (Ítalo Marsili) de uma Escultura

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Onde entra a Ação? A Ação é o Ato da causa Eficiente, de acordo com a definição de Mário Ferreira dos
Santos. A ação de fazer uma cadeira, por exemplo, é o que o carpinteiro faz. E ela tem início no momento
em que ele recebeu a encomenda da cadeira e a aceitou, pois começou a conceber a cadeira e a
trabalhar.

Outro exemplo: uma xícara, cuja matéria é vidro e a forma é a ideia de xícara. Quando percebemos sua
imagem, já intuímos seu objetivo: “parece uma coisa em que colocamos coisas dentro, e ainda tem a
alça que se encaixa na mão, como se estivesse pedindo para pegá-la”. Se alguém segurar a xícara como
um copo normal, logo nos perguntamos o porquê.

Falando como ator, uma ação simples pode gerar um pensamento na cabeça da plateia. O ponto que
merece atenção é: alguém que use a xícara de modo estranho a seu objetivo está indo contra sua
estrutura.

❖ Uma ação simples (falando como ator) pode gerar um pensamento na cabeça das pessoas. É isso que
um bom ator, um bom diretor de teatro faz: ele não só conduz a atenção da plateia, ele muitas vezes
produz pensamentos na cabeça da plateia.
❖ Se eu pego uma xícara pela base, alguém que observa pode se perguntar : ‘Por que não estou pegando
pela asa dela?’, que é a forma que foi feita para ser pega.

A AÇÃO DO PONTO DE VISTA MORAL

❖ As ações não só no trabalho do ator, mas na nossa vida, são quase tudo, TUDO É AÇÃO.

Tudo na vida é Ação. Como no exemplo da aula anterior, da pessoa que tem uma tensão nos ombros e
pensa que isso é uma fatalidade, mas é ela mesma que está produzindo a tensão.

Parêntese: é importante pensar nisso do ponto de vista dos vícios e mesmo das virtudes naturais, que
na verdade são características. Os vícios e características são como Ações que fazemos apesar de nós
mesmos. Dizemos muito: “eu sou assim”. É verdade, mas podemos nos transformar, desde que
conscientemente agindo sobre a estrutura psicofísica. Ao longo do tempo, descobrimos que dá para ser
de outro modo.

❖ Por exemplo: você por exemplo é uma pessoa carinhosa, bondosa, isto não é uma escolha, é o seu
caráter (falaremos mais adiante). Aí você diz: “Eu sou assim, sou uma pessoa doce”. Doce é bom é
uma boa qualidade, para pensarmos aqui...’sou uma pessoa doce’. Você é..., é quase que é seu corpo
uma configuração dessa relação matéria e forma, que é o seu corpo que é daquele jeito. Você não
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consegue ‘não o ser’, você não consegue transformar isso através de uma ação também. Então é como
se, uma ação que você faz apesar de você mesmo. Fiz esta ponte, porque dizemos ‘ah eu sou assim,
sou muito grosseiro....’ É, é verdade a gente é assim mesmo, mas podemos transformar isso, desde
que conscientemente você vá agindo sob sua estrutura psicofísica e vá transformando isso, , ao longo
do tempo você vá descobrindo que ‘ah, dá pra ser de outra maneira’ .

No entanto, não há possibilidade de modificar-se a si mesmo diretamente, porque o sujeito e o objeto


da Ação seriam o mesmo. E uma característica é que o agente da ação sempre atua sobre um sujeito, a
Ação se dá fora dele. Retomando a primeira aula: não criamos qualidades; em última instância, a
qualidade é sempre de uma Ação.

❖ A ação se dá sempre fora do sujeito. Não há possibilidade de eu modificar a mim mesmo diretamente,
não dá, porque o sujeito e o objeto são o mesmo. É o Eu que quer mudar o EU, diretamente não dá
para fazer isto.

A questão é ainda mais profunda porque uma pessoa não é uma coisa, é um ato. Retomando a
definição do Mário Ferreira dos Santos: Ação é o ato da causa Eficiente. A qualquer momento, temos
potência de realizar inúmeras ações: pegar uma xícara, um isqueiro, levantar, deitar... Aplicando isso ao
campo moral, há muito que meditar sobre o problema.

❖ A Ação é o ato da causa eficiente. Um ato.


❖ Eu tenho a potência de pegar essa xícara. Ação simples, banal. Posso levantar, deitar, pegar um
isqueiro...posso fazer coisas inomináveis. Se aplicar isso ao âmbito da moral tem-se anos de
meditação pela frente.
❖ Hoje as pessoas se acham boas, que a substância é a bondade, especialmente no meio artístico e
intelectual. Dá trabalho ser bom. Porque ser bom e fazer cosias boas e não ter uma substância boa.

No meio intelectual e artístico, as pessoas acham que a sua substância é a bondade, são todos
rousseaunianos: o homem nasce bom. Mas dá trabalho ser bom, porque não se trata apenas de ter uma
substância boa, mas de fazer coisas boas. Filosoficamente, tudo o que é, por definição, é bom. Então, o
problema é o que fazemos.

A qualidade da Ação está relacionada à sua forma e à sua finalidade porque, como visto, a forma de
algo está diretamente relacionada ao objetivo.

Na arte, todo mundo está cheio de boas intenções: “eu faço porque amo a arte, queria que o mundo
fosse melhor”. Mas a obra em si é uma porcaria formalmente, pois a pessoa não estuda, não treina, não
trabalha.

❖ Um dia um aluno perguntou sobre aquela frase: ‘De boas intenções o inferno está cheio.’ Eu tenho
uma avaliação que é assim: ‘De boas intenções o inferno e o Centro Cultural estão cheios’. Isto é uma
32
discussão com os artistas, porque se você pega as obras de arte hoje, estão cheias de boas intenções.
Dizem: ‘Eu faço porque amo a arte...’ ; Eu amo a humanidade...’; ‘Eu gostaria que o mundo fosse
melhor’; Ok, isto tudo é ótimo, mas vamos ver a obra? A obra é uma porcaria, formalmente falando.
❖ No Brasil, não sei no resto do mundo, o público tem o teatro que merece. Quantas vezes você foi ao
teatro, e não era muito boa a peça e quando terminou a peça, você aplaudiu , em pé. Hoje em dia as
pessoas pensam que isto é normal, quando termina você aplaude e levanta. Um ator . Fernando
Peixoto, um dia comentou, que as pessoas estão aplaudindo e dizendo para quem está ao seu lado, ‘
vamos aplaudir, mas foi ruim’. Eu sou da opinião se está ruim, está chato se levanta e vá embora.

Na verdade, a razão para fazer aquilo é outra, e não é propriamente uma boa intenção, porque a boa
intenção sabe o objetivo e a forma, ou seja, qual Ação é adequada para alcançá-lo.

❖ A boa intenção seria aquela que sabe qual é o objetivo que ela visa e qual é a forma da ação, ou seja,
que ação é adequada para chegar àquele objetivo.

CAUSA FORMAL E CAUSA FINAL NA AÇÃO

Toda Ação tem uma forma. Quando o carpinteiro levanta e vai buscar o martelo, a matéria é o corpo e
a forma é a sequência de tensões feitas até pegar a ferramenta.

Há, portanto, uma ação completa que é fazer a cadeira, composta de várias ações que só podemos
compreender na medida em que compreendemos a causa final.

❖ Uma Ação completa – fazer a cadeira – é composta de várias ações também. Que só compreendo a
medida que compreendo a causa final. O carpinteiro precisa pegar o martelo para fazer a cadeira.
Claro, essa ação tem um objetivo menor, mas que está associado a outro objetivo.

Há um objetivo maior – construir a cadeira – mas, no início, há um objetivo menor – pegar o martelo.
Pode-se dizer que esta é uma Ação completa, mas está associada a outra.

Além disso, uma ação é completamente diferente da outra, de acordo com o objetivo: levantar-se para
pegar o martelo é diferente de levantar para alongar-se.

O objetivo da ação determina o modo como ela é feita. E, pelo modo como ela é feita, pode-se
entender qual o objetivo, o que a pessoa pretende.

❖ Quando alguém abre a porta do seu escritório, eu já sei mais ou menos o que ele quer. Quando alguém
te cumprimenta, tu já sabe mais ou menos o objetivo que tem ali. Por exemplo se a pessoa te
cumprimenta porque quer só te cumprimentar mesmo: “Oh, fulano tudo bem, estava com saudades
de você...’. Outra coisa é quanto alguém te cumprimenta porque está interessado, naquele emprego
que você pode dar uma ajudinha: ‘ O fulano, a quanto tempo...” E o sujeito começa a ficar mais....

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Enfim, várias situações.... As vezes a gente não percebe por não ter os dados, todos os elementos que
estão em jogo para que alguém realize a ação.
❖ A forma da Ação configura o objetivo. As coisas nem sempre estão explícitas nas intenções.

Às vezes, é perceptível que há algo por trás de uma ação, mas não se sabe o quê, por falta das
informações sobre todos os elementos em jogo.

Exercício: meditar sobre como tudo o que existe tem uma causa formal, material, final e eficiente.

❖ Meditação: tudo que existe tem quatro causas. Tudo está agindo o tempo todo. A cadeira também
está agindo: está resistindo a um corpo.

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SEMANA 04: PRESENÇA E NEUTRALIDADE

Nesta aula, vamos abordar o conceito de ação a partir das quatro causas de Aristóteles, com base em
um texto de Mário Ferreira dos Santos.

PRESENÇA E NEUTRALIDADE

Estar presente é estar “diante de”. A presença não é uma substância, é uma situação.

Um conceito teatral que nos ajuda a compreender isso é a neutralidade. O ator tem de ser capaz de ficar
neutro, ou seja, não estar expressando algo. Alguns entendem a neutralidade equivocadamente, como
anular-se. Mas estar neutro é estar presente no espaço diante de alguém, pronto para agir.

❖ Existem coisas básicas que se sabe que não são neutras, por exemplo, se você está em pé e coloca o peso em uma
perna só, isto não é neutro. Quando estou em pé apoiado nas duas pernas, estou equilibrado e neutro, pois não
estou nem para a direita, nem para a esquerda. Qualquer movimento que saia deste eixo, já está expressando
alguma coisa.
❖ Quando um ator está parado na sua frente, se ele está erguido / reto, olhando no horizonte, sem
gestos, isto quer dizer que ele está neutro, pronto para uma AÇÃO. É uma Presença. Porém se ele olha
um pouquinho para um lado, ou para cima, ou se curva etc. perdeu-se a neutralidade.
❖ Tem pessoas / atores que pensar que estar ‘neutros’, é anular-se, estar num vazio, no nada, sem
respirar. É muito sutil esta percepção. Ele fica uma espécie de zumbi, porque ele está pensando, ‘eu
estou neutro’.
❖ O que é neutro então: é estar presente, neste espaço, diante de alguém. Vamos lembrar a aula
passada, o Hamlet nunca existiu, é uma construção poética, se você olhar com cuidado ele é o
resultado imaginário de uma série de frases que estão escritas na obra...É matéria e forma. A matéria
do Hamlet, pelo menos a matéria que o Shakespeare é um número, razoavelmente grande de falas.
❖ Aristóteles dizia que a matéria da tragédia são as palavras, na tragédia enquanto texto, porque ele
não considera nem os cenários e nem os atores.
❖ A matéria do espetáculo teatral inclui cenário, figurino, adereços, os atores, o espaço.

A PERCEPÇÃO DO HOMEM CONTEMPORÂNEO

Somos cartesianos, no sentido de pensarmos que o “eu” é uma espécie de universo fechado que se
relaciona com o cosmos fora de si, mas não acontece desse modo. Em uma sala com várias pessoas, por
exemplo, o ar não passa pelos pulmões de um só indivíduo, mas de todos os outros.

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❖ Reflexão: você já parou para pensar que quando está em uma sala com outras pessoas, respirando,
o ar que você respira, que vai para seus pulmões, sangue e depois você expira, outras pessoas irão
respirar um ar que pode ter passado dentro de você?

Também imaginamos o Universo conforme a descrição da Física newtoniana. Pensamos em estrelas, a


Terra girando em torno do Sol, o sistema planetário, ou seja, em forças materiais, mas não incluímos
pessoas.

Em geral, a pessoa sequer inclui a si mesma, ou seja, pensa em um Universo onde não há “eu”. É verdade
que o Universo existiria se não houvesse um indivíduo específico, mas isso é apenas uma possibilidade.
A realidade inclui o sujeito que está pensando.

As pessoas também não imaginam anjos, quando pensam no Universo. Até porque os anjos não têm
corpo, e não podemos imaginar algo imaterial.

❖ Não para imaginar uma coisa que é imaterial. Por exemplo, anjos não tem forma, mas as pessoas
podem imaginar um bonequinho feito anjinho barroco.
❖ O universo também, imaginamos uma descrição
da física mecânica newtoniana, imaginamos as
estrelas, a terra girando em torno do sol , o sistema
planetário, alguns podem pensar em ondas
quânticas... mas pensamos em forças materiais,
forças da gravidade...
❖ Não imaginamos pessoas no universo, nunca o
universo foi fotografado pela sua imensidão.

Imaginar, por definição, é produzir uma imagem. Ou seja, algo que passou pelos sentidos e está na
memória, na imaginação.

❖ Não dá para imaginar uma coisa imaterial. Imaginar o AMOR? Não para imaginar
o AMOR, podemos usar símbolos como um ‘coração e uma flecha’.

Ao falar dos anjos, pensamos em uma representação (barroca, por exemplo).

Do mesmo modo, é impossível imaginar o amor, pois é imaterial; podemos


somente usar símbolos. É importante abordar o simbolismo, pois todo o
universo é simbólico.

❖ O UNIVERSO é todo SIMBÓLICO. A ideia de alguma coisa, também é símbolo


de outra coisa.
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FORMA E IMAGEM

A aula anterior mostrou que tudo é composto de forma e matéria. O aspecto formal, a ideia de algo,
também é um símbolo. Forma e ideia são a mesma coisa, são um princípio estrutural. Mas há distinção
entre ideia e imagem, que representa um objeto específico.

A ideia é imaterial. A ideia de triângulo, por exemplo, é


um gênero que compreende espécies dentro de si
(triângulo isósceles, equilátero etc.). Portanto, não se
pode desenhar a ideia de triângulo em geral, somente de
cada uma das suas espécies.

❖ Triangulo é uma figura fechada de três lados. Isto não


é uma ideia, é uma definição. Você não consegue desenhar um triângulo, e sim um dos gêneros. A
ideia do triangulo é imaterial, ele é uma ideia, não tem imagem.

Ao mesmo tempo, se alguém pensa em um triângulo, não pensa só na ideia abstrata, mas produz a
imagem de um triângulo específico porque, como disse Aristóteles, pensamos por imagens.

❖ Forma e ideia é a mesma coisa. É o princípio estrutural de alguma coisa.


❖ Anjos são ideias! São ideias vivas, mas são ideias. Por exemplo, quando falamos de Universo, na
imaginação não aparece os anjos e nem as pessoas. Somente as formas físicas.
❖ As pessoas enquanto pessoas são também imateriais. São ideias vivas, não é ideia no sentido de
abstração, ideia no sentido de forma. Por exemplo, se não tenho este conhecimento, confundo muito
as coisas. Se olho para alguém eu confundo as emoções, com a pessoa, com a imagem da pessoa,
mas devemos ter esta distinção.
❖ Quando eu peço para você pensar no Universo, você se incluiu? Não, você pensa em tudo, menos eu.
Imaginamos o Universo onde não há eu. O universo real, para bem ou para o mal, incluí você. Isto
tem relação com a PRESENÇA.

OBSERVAÇÃO DO CÉU COMO EXERCÍCIO DE PRESENÇA

Uma pessoa que vive no campo ou em uma cidade com menos artifícios mecânicos, eletrônicos, tem
mais facilidade para não ficar no mundo puramente abstrato do discurso, porque está mais próxima da
realidade.

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❖ As pessoas que moram em cidades como São Paulo, tem mais dificuldade desta visão, pois estão longe
da natureza. Nisto os cariocas têm mais vantagens, porque tem um contato maior com a natureza. E
o homem do campo, mais vantagem ainda, por vive direto dentro da natureza.
❖ A natureza te atropela, te coloca mais próxima do que é o real. Moradores de grandes cidades, com
grandes prédios, pouca natureza, vivem mais de maneira tecnológica, e vão perdendo a noção do que
é real.

O mundo urbano, por outro lado, coloca as pessoas em perspectiva horizontal, faz com que se esqueçam
da transcendência, das relações verticais.

❖ Conheço muitos atores, não alunos, atores mesmo que para se situar no espaço / cena necessitam de
uma marca no chão, porque não sabem em que lugar ele está no espaço. Isto é uma falta de
orientação radical. Isto quer dizer que, há uma certa desconexão entre a consciência e a realidade
psicofísica. É uma consciência mental diminuída.

As pessoas não olham mais para o céu, não conhecem as constelações, o que acarreta uma falta de
consciência, pois se reduz o Universo àquilo que está ao alcance. Isso é normal em certo sentido, porém,
não podemos nos esquecer completamente de que estamos cercados por um Universo imensurável.

❖ Perdemos a noção da vastidão do universo, não paramos para pensar, observar ou imaginar sobre o
universo e seu espaço.

Este também é um problema da imaginação. Como a trabalhamos pouco, ela acaba se tornando abstrata
quando, na verdade, é corporal.

❖ Boa parte da nossa vida psíquica se dá por imagens.

Uma pessoa que está com fome se orienta pela imaginação para buscar a comida na geladeira, por
exemplo. A imaginação recorta, amplia ou diminui determinada zona do espaço.

Alguns atores não se situam no palco sem uma marca no chão, o que é uma falta de orientação radical,
uma desconexão entre a consciência e a realidade psicofísica.

❖ O grande problema é você quase nunca


lembrar do universo corporal no qual
você está inserido. E isto no mundo
urbano é muito comum.
❖ Vivemos em um mundo horizontal, não
é a toa que perdemos a transcendência.

Observar o céu (especialmente o céu


noturno) traz a certeza da permanência

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das coisas. A relação entre o Sol e a Lua, por exemplo, é a relação entre aquilo que permanece e que
muda, respectivamente. Há também a analogia de que a inteligência é o Sol e a Lua, a razão, pois os
raciocínios são uma espécie de movimento, enquanto a inteligência capta o que é imutável.

❖ Olhar o céu, nos dá a certeza da permanência das coisas. A relação entre o SOL e a LUA é uma relação
entre aquilo que permanece e aquilo que muda. Há uma analogia entre o SOL e a Inteligência e a Lua
a Razão. O sol nasce todos os dias, e sempre é o mesmo. A Lua não, ela tem as suas fases.
❖ A razão chega por meio de raciocínios e movimenta a compreensão de algumas coisas que são
imutáveis e a inteligência capta.
❖ Olhar o céu em uma Lua Nova, você tem a ideia de infinito.

Além da permanência e imutabilidade, a observação do céu carrega a ideia de infinito, pois é um símbolo.
Porém, o céu não nos lembra somente do tamanho do Universo, mas de nosso próprio tamanho, da
relação em que estamos inseridos no mundo que nos garante presença.

A presença depende de uma espécie de enraizamento no mundo concreto, no solo. Quem entende a
neutralidade como esvaziar-se não está presente de fato, pois estar presente é agir diante de alguém. A
desconexão com a realidade é uma das causas da falta de consciência corporal. Tendemos a ficar na

mente abstrata, raciocinante. Daí a necessidade de lembrar-se do mundo concreto, pois quem está em
relação com o cosmos é o indivíduo como um todo.

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IMAGENS DO CÉU DO CAMPO X LUMINOSIDADE DAS GRANDES CIDADES

O prazer de contemplar o céu noturno em toda a sua plenitude é algo que não está acessível grandes
cidades. Apenas alguns poucos corpos celestes com brilho aparente mais intenso, como a Lua e os
planetas, e algumas estrelas mais luminosas, se destacam no não tão escuro céu urbano, o que o torna
menos interessante a possíveis
observadores.

Isso ocorreu devido ao desenvolvimento de


diversas tecnologias e em especial a
iluminação artificial e ao uso de
combustíveis fósseis. A luz artificial nos
possibilitou avanços incríveis, estendendo
o horário em que diversas atividades
podem ser desenvolvidas e também
aumentou a segurança para todos.

Ao observar no campo em uma noite de


céu limpo e sem luar, quando estrelas de
diversas luminosidades se espalham pela abóbada celeste formando um espetáculo que não pode ser
visto das cidades, a experiência é totalmente diferente, pois não há o domínio da iluminação artificial.
(Fonte: Instituto Purunã)

40
Semana 05: Caráter

Esta aula explica o que é o Caráter e o diferencia dos estados de alma. Aborda também as tensões
físicas que se somam ao Caráter e o modo de superá-las

O CARÁTER: ELEMENTO FIXO


O Caráter é um elemento fixo do corpo humano, quer falemos de temperamentos ou de uma
caracterologia mais complexa como a de René Le Senne4.

❖ O caráter é um elemento fixo do corpo humano, é como se fosse um carimbo.


A palavra Caráter tem a mesma raiz de carimbo, algo como que determinado no momento do
nascimento, e que se mantém ao longo da existência neste mundo, enquanto estrutura corporal,
psicofísica.

Não se trata da acepção de Caráter enquanto costume moral.

❖ Isto não é na questão de agir de maneira boa ou má: “Fulano é mau caráter..” , já tem uma
conotação e sentido moral e não é neste sentido que estamos falando. Estamos falando de Caráter
como determinação da Individualidade humana em termos corporais. Na linguagem moderna
poderíamos falar em termos psicofísicos.
❖ Se pensar numa cosmovisão medieval ou da visão do homem medieval, a imaginação, todas as
paixões da alma são corporais, então seria um organismo psicofísico. Não vou entrar em
caracterologia aqui, estou mostrando neste aspecto porque é a base a partir da qual iremos pensar.
Porque ela vai determinar no nosso comportamento, em uma ou outra medida.
Compreender essa questão a partir do ponto de vista teatral pode contribuir muito, pois distinguir os
aspectos da realidade ajuda a mover-se melhor dentro dela.

1
René Le Senne: (1883/ 1954) Moralista e filósofo espiritualista francês. Foi membro da Academia de Ciências Morais e
Políticas desde 1948, e presidente do Instituto Internacional de Filosofia em 1952. Junto com seu amigo Lavelle, com quem
fundou a coleção "Philosophie de l'esprit" da editora Aubier, ele é o principal representante da chamada "filosofia do espírito"
francesa. Compartilha com Lavelle uma interpretação idealista e espiritualista da crítica kantiana, que o leva, por meio de
uma análise do espírito e das experiências diretas, à redução do ser à consciência.

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❖ Conseguir distinguir os aspectos as dimensões da realidade nos ajuda a nos movermos melhor dentro
desta realidade, melhor orientados.

Um dos sinônimos de personagem é Caráter. Como se interpreta, por exemplo, um avarento? O avarento
é alguém que sempre está querendo ganhar dinheiro e economizar o que tem, alguém que acumula.

❖ Como se faz um avarento? Já vimos em uma aula passada que não dá para ser avarentos, não dá para
fazer isto. Vamos tentar definir o caráter do avarento, do harpagão. O avarento é alguém que está
sempre querendo ganhar dinheiro e economizar seu dinheiro. É alguém que acumula.

Portanto, um Gesto que pode ser incorporado na construção do Caráter do harpagão (pessoa muito
sovina) é, em vez de dizer “vem cá” com a mão aberta, fazê-lo com a mão meio fechada, como se
estivesse puxando para si. Desse modo, imita-se o Caráter do avarento, que é um pouco torto, quer tudo
para si.

❖ Então com os gestos conseguimos imitar o caráter de um avarento.

O Caráter é aquilo que é fixo na personagem. A estrutura física é fixa, não muda. Mesmo ao longo dos
anos, muda apenas superficialmente.

❖ A tua estrutura é o que te individualiza e nas situações diversas que uma pessoa se encontra, ela pode
estar em estados de almas muito distintos. O harpagão ele pode estar alegre, triste, angustiado,
agoniado, deprimido.
❖ Estes estados de alma são variações no plano de sentimentos e emoções que não modificam
estruturalmente o caráter.
Os estados de alma também não modificam estruturalmente o Caráter, são variações no plano dos
sentimentos, das emoções. O Caráter vive as diversas situações, passa por variados estados anímicos;
as emoções como que colorem a vida física.

❖ O que o ator imita? Ele imita caracteres em ação. O trabalho do ator começa a ficar sútil e complexo,
por exemplo ao imitar o harpagão já me curvo um pouco, é tudo para mim, mãos mais contraídas,
dedos mais fechados. Se eu gesticulo abrindo os braços, é “este cara está dando.. esse cara não pode
ser um sovina... .”.
A estrutura física, de certa forma, antecede lógica e ontologicamente os Gestos. Isso tem a ver com a
presença de que falamos anteriormente. Quando colocamos o corpo em determinada condição física,
isso altera o que fazemos.

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❖ É uma estrutura física que antecede, os gestos, isto tem a ver com a história da Presença que já
falamos antes, Uma coisa é eu me colocar em uma condição física, e outra é o que eu faço
(gesticulando) com esta condição física.
❖ Se você está em um tipo de energia (se solta sobre a cadeira, não está sentado sobre os ísquios), tudo
diminui. Ficará falso se você tentar articular a voz, pois não tem energia. A pessoa pode até se
expressar muito articulada em sua entonação de voz, porém o corpo não dá sustentação para isto.
❖ Parte da tua articulação vem, só da tua condição física. Se eu me sento mais ereto, naturalmente eu
articulo melhor.
❖ Voltemos o Harpagão, ele tem uma avareza, um
envelhecimento, um endurecimento da própria musculatura. A
avareza.... ela não respira. O respirar é também expirar o
harpagão diz: ‘Nem meu ar eu posso dar muito.... eu dou ar, mas
é pouco, uma parte eu economizo, vai que irei precisar dele
amanhã...”
Em termos de estado
de alma, não é possível produzir determinado sentimento,
como a tristeza. Mas pode-se colocar o próprio corpo em
condição análoga à que ele fica quando está triste, pois
temos uma memória
sinestésica das
condições do corpo.

❖ Então estou imitando um caráter (de um avarento), então tudo fico


meio torto, porque ele fica segurando, agarrando ele quer tudo para si.

❖ E uma moça dadeira, fica tudo aberto, tudo se abre, é o oposto


do avarento e isto é o caráter.

❖ Caráter mais tenso, mais contido!

43
❖ Soldado fanfarrão, a comédia da ‘Elati’ trabalha muito com
caracteres estilizados, tipos, que é alguém sempre que está
‘cantando marra, tudo nele é grande...
❖ O que estou chamando atenção é que este caráter ele vai viver as
diversas situações e estar em diversos estados anímicos, emocionais
que são fisicamente, variações / estados, daquele caráter.
❖ Uma coisa é tua individualidade, outra coisa é são os estados de alma, sentimentos as emoções, como
que colorem a vida física.

TENSÕES FÍSICAS
Determinadas tensões físicas acrescentam-se ao Caráter, como que se tornam parte do corpo (por
exemplo, alguém que tem os ombros muito tensos, para dentro). Isso é algo constante, a pessoa pode
estar alegre, triste, e os ombros continuam quase que na mesma posição, o Caráter é o mesmo.

❖ Agora pensando não em personagens, mas em nosso caráter, tem algo que se acrescenta que
podemos colocar no caráter, neste sentido que estamos falando, constituição física de uma pessoa
algo que já foi falada em outra aula: determinadas tensões físicas, se tornam como se fosse parte de
seu corpo.
❖ Por exemplo, alguém que tem o ombro muito tenso, ele pode estar alegre, triste, tenso, deprimido,
etc., mas o ombro, continua igual. Não exatamente igual, terá uma variação, mas o caráter é o
mesmo.
Um exercício de relaxamento ao longo dos meses pode diluir e alterar o Caráter, compreendido aqui no
sentido mais amplo, como uma estrutura secundária que vem da história pessoal.

Algumas linhas da psicanálise estudam como determinados acontecimentos traumáticos se fixam na


personalidade, por meio da musculatura ou de comportamentos. Existem alguns hábitos adquiridos nos
quais não pensamos, mas que se mantém na estrutura física, e tensões
musculares que se tornam parte do organismo e repercutem, inclusive,
sobre outros órgãos (gerando doenças ou problemas de voz, por
exemplo).

❖ Algumas linhas da psicanálise, como Reich5 especialmente, e outros


autores, pesquisaram muito isto: como é que determinados traumáticos

5
Wilhelm Reich: (1897 /1957) foi um psiquiatra, sexólogo, psicanalista, biólogo e físico austríaco-americano de ascendência
judaica, mais conhecido como uma das figuras mais radicais da história da psiquiatria. Ele foi o autor de vários livros,
incluindo Psicologia de Massas do Fascismo e Análise do Caráter, ambos publicados em 1933. Ele é o pai da bioenergética,
incluindo através de seu ex-colaborador Alexander Lowen.
44
se fixam na personalidade e, segundo eles, se fixam na musculatura, ou num comportamento, como,
por exemplo alguém que ‘anda como se tivesse um perigo eminente’ , um perigo físico em torno dele.
A pessoa não faz de maneira consciente, bom isto pode ser um hábito adquirido no qual não pensa
mais, porém se mantém na sua estrutura física.
❖ Por isso este trabalho que estou propondo no campo de exercício de manipulação, de massagem, de
diluição de tensões, pode ajudar na saúde corporal, mas também psíquica.
❖ Se você tem uma determinada tensão muscular que se tornou parte do seu organismo, esta tensão
localizada, primeiro a energia não irá fluir direito naquela zona ali, segundo esta tensão terá
repercussões sobre outras partes do organismo, inclusive sobre órgãos. Então algumas doenças vem
de uma tensão muscular ‘fixada’ vamos dizer assim. Assim como alguns problemas de voz, não só de
articulação, mas também de articulação, esta musculatura aqui (conforme imagem ao lado) que
articula a mandíbula com a qual você fala. Se ela é muito tensa, você não tem muita articulação.
A estrutura física determina o modo como fazemos as coisas. Uma pessoa que tem medo tende a recuar;
como ela age sempre assim, passa a acreditar que é tímida, mas na verdade é o medo que se tornou
uma espécie de símbolo encarnado nela.

❖ Se você tem um ‘recuo’ aqui (mostrando o queixo) e se tornou seu, do seu caráter, só por eu ‘recuar’,
já muda minha voz. E se tornou fixo, a minha voz se tornou assim e vou achar que tenho a voz assim
(mais para dentro) e todo mundo vai achar, as pessoas só vão achar que ela é desagradável. O que
a pessoa pode fazer? Soltar esta tensão e a voz deixará de ser desagradável, e a voz volta a ser natural
para esta organização física.
❖ A estrutura física, vai determinar o modo que você faz as coisas. Só pensamos isto em temas
caracterológicos naquele sentido que falava antes,
temperamentos.... como se não houvesse uma outra camada, que
é o resultado ou de maus hábitos adquiridos ou tensões adquiridas.
Por exemplo a pessoa que tem medo, ela tende a recuar, se o medo
se fixa no seu corpo, acabo agindo meio com um jeito de timidez. O
medo se tornou como se fosse um símbolo encarnado em você.
❖ Observa-se nas narrativas terapêuticas pessoas que viveram
durante meses ou alguns anos numa situação que era de perigo.
Depois passou o perigo, porém ela ficou tanto tempo agindo
daquele jeito, que aquilo se tornou um modo de agir, a estrutura
física dela.
Quando certos modos de agir começam a fazer parte de uma identidade falsa, doentia ou alienada, é
preciso desfazer o mau hábito para recuperar a organicidade.

45
❖ Vamos voltar ao caráter, que podemos pensar algumas outras coisas ligadas a isso que podem
iluminar um pouco nosso olhar. Por exemplo, assim como antes pensei no avarento e já fiz uma
associação com um tipo de comportamento, podemos pensar no ‘intrometido’ alguém que está
sempre querendo saber o que está acontecendo e é como se ele fosse conduzido pelo nariz. Assim
como uma velhinha fofoqueira, parece que o nariz puxa.
❖ Então você pode criar, um personagem, a partir desta ideia, que o que move é o nariz e pode estar em
quaisquer situações... está sempre cheirando, se está namorando está sempre ‘cheirando’. Veja, que
isto é só como um mote, que a partir daí vou descobrindo ideias.
❖ Agora alguém que é glutão, já pensei no estômago, barriga, tudo para ele que vê é algo na boca. Isto
começa a me dar sugestões de ações poéticas, agora na construção do personagem que me veio de
uma imagem da gula, vem tudo pela boca... agora ele foi namorar, e não vem mais pelo nariz, e
quando ele vai elogiar algo, é quase como se ele estivesse saboreando.
❖ Um luxurioso, alguém que pensa a partir da pélvis, a partir da sexualidade, neste caso, já não é mais
o nariz, a boca, o estômago mas é na região pélvica e quando ele vai, como se diz, ‘ele vai com tudo’.
Ele se aproxima não pela zona superior (Mallet representou.... não falou em palavras).. ou seja, você
tem um jogo que pode iluminar.....
❖ Isso tem a ver coma a questão que comentava outro dia, da leitura... Porque as pessoas falam da
leitura corporal como se o corpo fosse uma espécie de tela, onde estão inseridas as coisas, a leitura
corporal é uma leitura de ações. Por exemplo, as vezes um movimento de mão mostra como se fosse
um raciocínio, se eu fizesse este movimento, não pensaria em nada, somente no gesto que estou
fazendo, e quem vê tem a impressão de que eu estou pensando em alguma coisa. Por quê? O ator
pensa em ações que significam ações internas, raciocínios ou até emoções... Um personagem é uma
construção poética.
❖ Se leva adiante este raciocínio, não em termos de caráter, mas em termos de alma, se pegar a tristeza,
tem que sentir tristeza, falamos na outra aula não dá para fazer isto a não ser que aconteça alguma
coisa aqui que me provoque a tristeza. Mas se você lembrar como é estar triste, você tem na sua
memória, a condição física, a qualidade da energia, vamos chamar assim, da tristeza. E isto pode-se
fazer, colocar meu corpo em uma posição análogo que ele fica quando estou triste, isto dá para fazer,
isto não é ficar triste, é “imitar a tristeza”. Coloco aquela analogia como uma determinada qualidade
física, e vou explorando como se age naquela qualidade física.
❖ Você tem uma memória sinestésica, você tem uma memória da condição do seu corpo. Quando você
está excitado, por exemplo, como é que seu corpo fica? Você age sobre o seu corpo, colocando-o na
situação física análoga que ele fica naturalmente quando você está excitado com alguma coisa que
vai acontecer.

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CONSCIÊNCIA CORPORAL
❖ Quando pensamos em entender, pensamos que entendemos só com a cabeça, se fosse assim já
estaríamos morto há muito tempo. Tente atravessar uma rua, calculando a distância, velocidade dos
carros....
Não entendemos as coisas somente com a mente. Alguém não atravessa uma rua movimentada
somente por calcular a distância, a velocidade dos carros, mas levando em conta o próprio poder
muscular, lembrando de outros momentos em que precisou correr.

❖ Você já pensou a quantidade de cálculos que você faz quando você atravessa uma rua movimentada?
Você está levando em consideração muitas coisas, não é só a velocidade dos carros, distância, você
está levando em conta o teu próprio poder muscular, o quanto você consegue chegar no outro lado
da rua, se você está cansado ou não, se você está medindo, a tua força física. Você está lembrando,
você está calculando outros momentos que você precisou correr, e você sabe mais ou menos o quanto
você vai conseguir tem um grande número de cálculos que você está fazendo, mas não é com a cabeça,
porque não dá. Se fizer só com a cabeça, você morre.
❖ Eu sempre digo para meus alunos, atores, que quando entra em cena você está, é uma metáfora, mas
é uma metáfora que é justa, corresponde a realidade: você está diante de um perigo de morte. A
morte do quê? A morte do teatro, no caso. Quantas vezes você viu uma peça que não gostou? Aquilo
não é teatro, só aparece, não tem nada acontecendo lá, ou o que está acontecendo não é eficaz, não
é teatral de fato.
❖ Isto é metaforicamente, mas tem uma coisa que é real: toda vez que você entra em cena, é de uma
certa forma, é mesmo a única... De uma certa forma ‘bom depois de fazer esta peça, eu vou morrer.’
Isto deveríamos levar para nosso dia a dia, se você pega as tradições espirituais isto é muito comum,
ter este conselho: quando você acorda, você reza imaginando que vai morrer hoje que não vai dormir;
e quando você vai dormir você pensa, eu não vou acordar. Isto te põe na realidade, até porque um
dia, você vai aceitar.
❖ De uma certa forma isto é verdadeiro, por que onde está o dia de ontem? Morreu.... então se olharmos
com cuidado, morrermos todos os dias, nascemos todos os dias, que nem o sol. Nós não temos muita
consciência disto e o trabalho do ator deveria dar isto, porque você está sempre trabalhando com o
aqui e agora, em relação. Fiz uma nota de rodapé, vamos voltar....
Ou seja, a pessoa faz diversos cálculos, que não são apenas mentais. Levamos em conta muitas coisas a
partir do ser como um todo – inteligência, vontade, imaginação, sentidos.

❖ Se você para calcular e entender só com a mente você vai errar..... Se eu não estivesse totalmente
presente em dar esta aula, se eu estivesse preocupado com outra coisa que não fosse a aula, você
perceberia na minha ação esta preocupação. Você não conseguiria ‘ler’ o que é, porque isso seria
impossível, mas você saberia mais ou menos que importância e que tipo de coisa, por exemplo, se
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fosse uma preocupação ‘que tem alguém doente’, isto me deixa em um estado ‘X”; agora pelo
contrário ‘marquei um encontro, mas tenho que dar esta aula ainda...’, então tem algo em mim que
está já no futuro...
❖ Então esses comentários que fizemos hoje, tanto sobre caráter, como de estados de alma, como sobre
emoções, estão intimamente relacionados com que acabo de dizer, que todas estas ações, esses
elementos que compões a ação humana....
Os elementos que compõem a ação humana não são vazios de significado, pelo contrário, são símbolos
de realidades concretas, invisíveis aos olhos do corpo, mas que se manifestam na própria ação. Como
somos muito mentais, ignoramos o próprio corpo e também o corpo do outro. Temos a impressão de
nos comunicarmos com o outro diretamente, alma a alma, mas não é assim que acontece. Nós nos
comunicamos através do corpo, através da palavra, que também é corporal.

❖ Como somos muito mentais, ignoramos o nosso corpo, como ignoramos o corpo do outro quando
estamos nos comunicando. Não nos comunicamos alma a alma, nos comunicamos por meio dos
corpos, por meio das palavras, mas isto tudo é corporal. Se eliminar o corpo não há comunicação
possível entre nós seres humanos, aqui, nesta terra.
❖ Por exemplo, tem uma pessoa conversando e sua perna não para, fica tremendo, e ele não percebe,
mas chama atenção do outro. E isto está dizendo o quê? Isso eu não sei. Mas mostra que tem algum
nervosismo ali, tem alguma coisa que o está incomodando, ou tem alguma inquietação, poderíamos
dizer hoje, subconsciente... ou é um mau hábito ‘gosto de ficar assim, me dá prazer’ ..
❖ Os tiques nervosos, as pessoas não o percebem, não é algo que vem de fora, é algo que a pessoa está
fazendo, só que internalizou isso, então nem percebe que faz o tique, para os outros chama muito
atenção. É preciso tomar consciência, não adianta usar aparatos para travar, ou alguém ficar
chamando atenção. Porém, em um trabalho de consciência corporal é você recuperar a consciência
natural que deveríamos ter do nosso corpo. E que a nossa história, num meio ambiente urbano,
tecnológico, nos afastou.
A consciência corporal é a consciência natural que alguém deveria ter do corpo, mas que perdeu,
normalmente por causa de um modo de viver urbano, tecnológico.

❖ As crianças pequenas estão plenamente no seu corpo, mas elas vão crescer e vão perder este contato,
a não ser aquelas que vivem em um ambiente muito natural. Então quando crescer tem que recuperar
e depois que recuperar, aí esquece. Eu não faço trabalho de consciência corporal mais de duas
décadas. Porque, porque não preciso. Mas se estou com uma tensão excessiva, ombros, lombar,
nessas regiões que são mais tensas, aí faço um trabalho de relaxamento, dou uma ‘soltada’, as vezes
só ’exxxxxxpirar’, já libera a tensão, quando se expira a tensão sai.

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Ao distinguir o Caráter natural dos estados de alma, adquirimos a capacidade de mudar o estado de
alma, alterar as tensões, por meio de uma ação física. Respirar adequadamente diante de um problema,
por exemplo, em vez de aumentar o nível de tensão, é algo que pode nos ajudar a resolvê-lo.

❖ Então por hoje era isto, esta questão do caráter por um lado, e esta distinção de caráter que é fixo,
mesmo que tenhamos por cima um caráter natural, um caráter adquirido, de tensões localizadas e
ações, emoções, estados de alma que já estão em outro lugar, mais sutil, que em geral chamamos de
alma, psiquismo, psiquê e a possibilidade que esta distinção nos dá de, por meio de uma ação física
mudar nosso estado de alma. Isto quer dizer, se você está preocupado com algo, e respirar, a
preocupação ficará do tamanho correto, digamos assim, mais adequado. Porque as vezes você
naquela preocupação e o nível de tensão vai aumentando, fica desproporcional ao tamanho do
problema. Então solta, respira, dá uma volta, aí retorna ao problema e você vai atacá-lo, ou vai
resolvê-lo na medida adequada, caso contrário você irá colocar os pés pelas mãos e tratar um
problema X com uma força maior e vai causar outro problema, em última instância.

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SEMANA 06 : CAUSA FINAL

Esta aula retoma o tema da Causa Formal, já tratado anteriormente, aprofundando e levantando
outras questões

A CAUSA FORMAL APONTA PARA A FINAL


❖ Hoje vou retomar o tema da forma, já tratamos em uma aula e gostaria de levantar algumas outras
questões a essa noção.
Na primeira vez em que abordamos a forma, usamos o exemplo da
xícara para indicar que por seu formato captamos a razão pela qual ela
foi feita, que Aristóteles chamou de Causa Final.

❖ Usamos esta xícara e comentamos que na própria forma dessa xícara


eu já capto a razão pela qual ela foi feita, que Aristóteles chamou de
Causa Final. Isto é algo que as pessoas levam certo tempo para
captar, para entender.
Assim, a forma não é uma estrutura estática do objeto, mas tem uma espécie de vetor, aponta para um
sentido, uma razão para existir.

❖ A forma aponta para um vetor que é o uso, o motivo (esta palavra se usa muito no teatro, qual a
motivação do personagem), a ideia de mover, de movimento é muito essencial para esta teoria que
estamos desenvolvendo aqui.
Relacionando isso ao que já falamos sobre a emoção, perceberemos que a ideia de mover é essencial,
porque o movimento é o resultado da ação.

❖ A ação se traduz, se manifesta, se realiza em movimento.


❖ Eu vejo a xícara, e quando percebo o sentido, qual é a razão de ser dela, e esta razão de ser é o que o
Aristóteles chamava de Causa Final, a finalidade da xícara, que é beber. O mais correto seria eu usar
a finalidade da alça também, segurar pela alça e pegar corretamente.
As coisas têm um aspecto dinâmico, uma força que aponta para a sua finalidade. O objeto pode ser
usado para outros objetivos, como a xícara pode ser usada para colocar canetas, embora nesse caso haja
uma espécie de traição de sua verdadeira finalidade. Há outras coisas, porém, que estão fora de
possibilidade. Não se pode usar uma xícara para bronzear-se, por exemplo. Essa questão está
relacionada à boa intenção de que tratamos antes.

❖ Portanto a forma da xícara tem um aspecto dinâmico, vamos chamar assim, tem uma força que
aponta para a finalidade dela. Pode ser usada para outras coisas? Sim, eu por exemplo, lá na minha

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casa tenho uma xícara, ao lado da minha mesa, cheia de lápis, canetas, estou usando a xícara.. Estou
traindo a xícara na sua verdadeira finalidade. É como se eu aproveito a forma da xícara para algo
que não foi o projeto do fabricante, da causa eficiente, como a gente chamou.
❖ Mas a forma da xícara serve também para colocar lápis, canetas, assim como cinzeiro... Posso usar
para encher um filtro com água etc. Mas não posso usar a xícara, por exemplo, para pescar; mas
talvez possa catar uns peixinhos no aquário com a xícara, é, não é... Deixa eu pegar outro exemplo,
não posso usar a xícara para me bronzear, não serve, não é uma possibilidade desta forma. É uma
impossibilidade, pura e simples. Eu não posso usar a xícara para escrever, não dá, esta forma aqui (da
xícara) não tem esta possibilidade.
❖ Então é interessante isto da forma, ela tem uma finalidade própria, a mais adequada, aquela que é
essencial, e ainda aquela forma me permite utilizá-la de outras maneiras. Acho que ficou claro e não
é necessário desenvolver mais este ponto.
Uma intenção supostamente boa, mas que é apenas discursiva, mental, é algo que se atribui à coisa, mas
que ela não tem de fato.

❖ Portanto a forma da xícara tem um aspecto dinâmico, vamos chamar assim, tem uma força que
aponta para a finalidade dela. Pode ser usada para outras coisas? Sim, eu por exemplo, lá na minha
casa tenho uma xícara, ao lado da minha mesa, cheia de lápis, canetas, estou usando a xícara.. Estou
traindo a xícara na sua verdadeira finalidade. É como se eu aproveito a forma da xícara para algo
que não foi o projeto do fabricante, da causa eficiente, como a gente chamou.
O que é uma Boa Intenção? É aquela intenção que vai ao encontro da Causa Final!

❖ Outra coisa que falamos, relacionado a isto, é a ideia da boa intenção, daquela frase conhecida: ‘De
boas intenções o inferno está cheio’. O que é no caso uma boa intenção, nesta frase? É uma intenção
discursiva, mental, é uma intenção que atribuo alguma coisa que ela não tem. É como eu usar a xícara
para colocar lápis e canetas.
O indivíduo pode falsear, trair o sentido da coisa, utilizar-se dela para algo que não é tão próprio. A
palavra intenção vem de ‘tendere’, que significa tender, ir para; é algo que está dentro e vai para a Causa
Final. A boa intenção verdadeira é aquela adequada à Causa Final da coisa.

❖ Uma Forma tem um vetor e ela tende a uma Causa Final, mas pela sua própria estrutura ela pode
tender para outros objetivos. Você falseia, você trai o sentido da coisa, utilizando-a para uma outra
coisa que não é tão própria, vamos dizer assim, mas que, pode ser usada.
❖ No teatro é um dos pontos essenciais quando você começa a estudar uma peça, olhar para um
personagem, e vai se perguntando qual é o objetivo. Se você pegar a obra de Stanislavski essa noção
de objetivo é fundamental. Que eu saiba, eu não sou um especialista em Stanislavski, mas que eu

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saiba ele nunca leu Aristóteles. É muito impressionante isto como a obra de Stanislavski é harmônica
e as vezes é literalmente o que está na obra de Aristóteles.
❖ No teatro é muito comum as pessoas estudarem Aristóteles, isto é, estudam a poética de Aristóteles.
Acontece que você não entende a poética de Aristóteles se você não tiver uma ideia mais clara da
estrutura da obra dele como um todo, da filosofia dele. Esse é um problema com a filosofia antiga e
medieval, quando as pessoas vão estudá-las, por exemplo a teoria das Quatro Causas.

IMPLICAÇÕES DAS CAUSAS FORMAL E FINAL


A teoria das quatro causas (Causa Formal, Material, Eficiente e Final) não é exatamente uma teoria,
pois não é uma construção mental, mas a enunciação de algo que Aristóteles captou na realidade.

❖ Outro dia eu ouvia o Ítalo falando sobre isso, em relação a teoria das doze camadas, e fazendo a
mesma observação, que ela não é propriamente uma teoria, porque não é uma construção mental.
Na verdade, ela é uma espécie de descrição de algo que você captou na realidade.
❖ Ora, a teoria do Aristóteles também é isso. Aliás a palavra ‘Teoria’, falamos isso na primeira aula, está
na raiz da palavra ‘Teatro’. E teoria em grego, a melhor tradução é ‘contemplação.’
A melhor tradução para “teoria” em grego é contemplação, isto é, olhar, ver e dizer o que se viu.
Aristóteles olhou para a realidade e percebeu que nada poderia vir à existência por suas próprias forças,
pois precisaria existir antes.

❖ Não é que Aristóteles sentou lá e ficou pensando, ele não sentou, ele andou, ficava caminhando e
pensando ‘Ah agora vou pensar num negócio...’, isto é coisa de moderno, de ocidental moderno, pós
cartesiano. Não, ele olhou para realidade e percebeu : ‘Olha tudo aquilo que existe, tem uma Forma,
é composto de uma Matéria, tem uma composição de Matéria e Forma, Alguém pôs na existência,
porque aquilo não poderia vir a existência pela sua própria força, por definição uma coisa não pode
se criar por si mesmo, senão ela teria que existir antes e tem uma Finalidade, isto é tende para um
objetivo.
❖ Ele aplicava isso para o cosmos inteiro. Cosmos tem
uma finalidade para Aristóteles, qual é a sua
finalidade, não entraremos neste problema aqui, não
se trata uma aula de metafísica, vou deixar um
problema com vocês.
❖ Qual é a finalidade da árvore, do sol... Aristóteles
dizia, que se existe, tem uma forma, tem uma matéria,
alguém pôs aquilo ali na existência e tem uma função,
tem um sentido.

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Ele percebeu ainda que tudo tende a um objeto. A Causa Formal e a Causa Material estão no objeto;
mas a Causa Eficiente (quem originou o objeto) e a Causa Final (o objetivo) o transcendem. Isso é algo
que tem grandes consequências existenciais.

❖ O fabricante desta xícara pode estar em qualquer lugar do planeta e pode não estar mais no planeta.
A finalidade dela agora, não está sendo cumprida (está vazia), que é permitir que eu beba o líquido.
Então a Causa Final, ou o objetivo, nunca pode ser a própria coisa, por definição. A forma está
apontando, como dizia no início uma realidade que transcende o objeto. É para a qual ele tende,
intenção.
❖ E eu posso usar, volto a afirmar, que isto é uma coisa que tem muitas consequências existências, a
boa intenção da forma é aquela que está na sua própria razão de ser. Mas eu posso usar para outras
coisas.
O Caráter, no sentido de estrutura psicofísica, tem uma forma e, portanto, cada pessoa tem tendências
que apontam para determinadas direções.

❖ O caráter na estrutura psicofísica, o ‘carimbo’ que você tem no seu corpo ou no seu organismo
psicofísico, se há um caráter, este tem uma forma e portanto fisicamente você tem tendências. Essa
forma te aponta para determinadas direções.
Observando os Temperamentos, isso se torna muito claro. Mesmo os tiques ou manias, ou outras
questões adquiridas ao longo do tempo, também estão cumprindo uma função, ainda que a intenção
não seja consciente.

❖ Observando os Temperamentos, não é só o modo, mas o interesse para onde aquele organismo
psicofísico tende, intenção.
❖ Se você pegar aquela outra camada sobre o qual falamos, que são os hábitos adquiridos, as vezes os
tiques / manias que temos.... na última aula, falávamos de pessoas que tinham tiques (piscando), isto
é só um tique mecânico? Não isto está cumprindo uma função, há uma intenção, não é consciente, e
qual é a intenção? Hummmm, pode ser várias, cada caso é um caso. Mas não vamos pegar um tique
que é uma coisa quase mecânica, que se mecanizou...
❖ Não sabemos por que na sua história, foi ‘escolhendo’, escolhendo sem perceber que estava
escolhendo, uma voz ‘aqui’ (um trejeito de falar) .....
O acaso não existe realmente; só existe no sentido de que é um encontro de séries causais, mas é
possível remontar a essas séries e perceber como, dentro de um ponto de vista mais amplo, tudo faz
sentido. A rigor, não existe nada absurdo; mesmo um Pensamento absurdo pode ser remontado às suas
causas.

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❖ A rigor não existe nada absurdo, a não ser o nosso pensamento, que as vezes é absurdo, por quê?
Porque é incoerente, mas mesmo este absurdo do pensamento, é possível remontar as suas causas.
Veja que estes pensamentos das Causas do Aristóteles, que não é do Aristóteles, é simplesmente
aquilo que eu dizia antes é uma teoria que ele olhou e disse: ‘Olha as coisas são assim’.
❖ Temos que ser muito agradecidos ao Aristóteles, quem sabe quanto tempo levaria para olhar e
perceber isto?
Os acadêmicos em geral, atualmente, olham para a teoria das causas e dizem que se trata de uma
construção.

Descartes olhou para ela e elegeu a Causa Eficiente como a mais importante, e não a Causa Final, como
indicou Aristóteles. Isso é um engano, porque a Causa Final está ontologicamente no princípio e
cronologicamente no fim de tudo; tudo começa e termina com a Causa Final, quando é bem-sucedido.

❖ Aristóteles olhou para a realidade e disse: ‘Toda forma em conjunção com a matéria tem uma Causa
Final. A Causa Final é mais importante porque ela que está no princípio, no sentido ontológico da
palavra, e no final no sentido cronológico. Tudo começa com a Causa Final e tudo termina quando é
bem-sucedido na Causa Final.
Quando a aula foi planejada, havia a ideia de que seria preciso ter uma cadeira. Alguém foi ao carpinteiro,
que captou a ideia tanto da forma quanto da matéria e, dominando a técnica, fez a cadeira, que foi
levada ao ambiente da aula. Assim, a ação cumpriu sua finalidade.

❖ Você foi ao carpinteiro e falou que queria uma cadeira de madeira. Então você deu a forma e a
matéria. O carpinteiro captou a ideia tanto da forma quanto da matéria e dominando os meios, a
técnica, técnica é isso, a capacidade de realizar um objeto. Tendo a técnica de construir cadeiras, ele
pegou a madeira e fez a cadeira. Entregou a cadeira para a produção e a cadeira veio parar aqui e
aquela ação cumpriu sua finalidade. Então a cadeira está aqui.
A cadeira estava no início, quando ainda era uma possibilidade, e está no final, ao realizar-se
plenamente.

❖ A cadeira estava no início do processo quando concebeu a finalidade : ‘Precisamos de uma cadeira
para aqui.’ A cadeira ainda não existia. A cadeira estava no princípio e agora ela está no final quando
ela se realiza plenamente.
Em cada um de nós, quando concebido, há uma forma que toma corpo – há a ideia de alguém. E nossa
existência é uma realização progressiva dessa forma, de sua intenção. Ou seja, deve haver uma Causa
Final, que poderia ser a realização da personalidade (embora essa possa não ser a Causa Final última).

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❖ Aristóteles dizia: ‘A alma é a forma do corpo’. Estamos falando da ideia de alguém...eu, você... e a
nossa existência é justamente uma progressiva realização, desta forma, desta intenção, deve haver
uma causa Final ..
❖ Digamos que a Causa Final seja, ‘hãaa’ essas palavras são sempre perigosas, mas enfim, a construção
ou a realização da tua personalidade. Talvez ela não seja a sua Causa Final última, mas não vamos
entrar em problemas metafísicos.
Quando alguém dá o último suspiro, é como se completasse sua história, que é a realização das
possibilidades que estão em sua concepção.

Uma pessoa não poderia escolher viver no fundo do mar ou como uma árvore, porque isso está fora das
possibilidades humanas.

❖ Por exemplo, você não poderia ter uma vida submarina, ‘vou viver minha vida no fundo do mar’... não
dá para fazer isto, mesmo que seja numa estação submarina, ainda durante um tempo você vai
crescendo, etc. você tem uma vida humana, você não pode ter uma vida submarina ou uma vida de
árvore...
❖ Pensando nas possibilidades, na tua forma, você não pode, por exemplo, voar. ‘Ah posso voar de
avião’, ‘Não meu filho, quem está voando é o avião não é você. O avião pode voar, foi feito para voar,
aliás se você olhar para o avião, eu intuo, aquilo ali tem duas asas, tem uma espécie de bico, e lembra
as aves, não é? Eu olharia um avião e não pensaria em morar, não está na forma do avião.
Um ser humano também não pode voar. O que pode fazer é pegar um avião, cuja própria estrutura nos
faz intuir que foi feito para voar, porque tem duas asas e um bico, lembra as aves. A forma das coisas
nos fala de sua finalidade; não com palavras, mas fala de algum modo.

❖ Está captando como este conceito de forma é essencial, para vida humana.
❖ Até dizer o conceito de Forma pode ser perigoso, porque de novo, entramos no raciocínio que é muito
contemporâneo, moderno. Ah, é um conceito, é um constructo, não, não é isso. A ideia talvez seja
melhor ou a Forma das coisas está nos dizendo a finalidade dela, ela está falando conosco, não são
palavras, nem frases, mas ela está falando.
❖ Quando olho uma árvore, se está um dia quente, ela (a árvore) me convida, a sentar a sua sombra,
ela também pode me convidar para outras coisas, a subir. Mas ela nunca vai me convidar, a cantá-la.
Não dá para cantar uma árvore, você pode fazer uma canção sobre a árvore, mas a árvore não é uma
música... Está entendendo?
❖ Eu distingo as coisas por causa da forma.

VONTADE E CAUSA FINAL NA VIDA HUMANA


Distinguimos as coisas por sua forma inteligível, como chamava Santo Tomás de Aquino.

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❖ Eu entendo a Forma com a minha inteligência. E quando eu entendo uma Forma eu percebo o seu
sentido e portanto isto se liga com outra realidade da qual não falamos e falaremos muito pouco aqui,
que é a Vontade.
Quando entendemos uma Forma, cria-se uma relação com a Vontade. Quando alguém capta uma maçã,
percebe que ela é saborosa, que é para comer. Mas a maçã não está movendo a vontade, está movendo
o desejo.

❖ Nós distinguimos as coisas por causa da sua forma. Quando eu capto uma Ideia, uma forma, por
exemplo, uma maçã, eu vejo uma maçã, algo em mim percebe que ela é saborosa, é algo para comer,
veja que é muito diferente de uma árvore. Quando vejo uma árvore, eu não tenho vontade de comer
uma árvore, o cupim deve ter. Mas eu olho uma árvore eu não penso em comê-la a não ser que tenha
maçã. Mas aí eu penso em comer a maçã, não a árvore.
❖ Só que está movendo minha Vontade? Não está movendo um desejo, está movendo meu corpo.
Quando eu vejo uma comida saborosa, aí vem, como falávamos em outra aula, aí vem o glutão, que
quando vê um bolo, já começa salivar. Ou seja, aquela Forma moveu o desejo, moveu o corpo que
quer..... mas ao mesmo tempo, agora já não estamos falando do glutão, porque ele não consegue
evitar e nem quer evitar o desejo...
❖ Imaginemos que você está querendo emagrecer ... emagrecer já é uma ideia, você nunca viu
emagrecer... emagrecer não é uma realidade concreta, não é física, é uma ideia e você tem vontade
de emagrecer, porque você acha que magro você estará melhor e você tem ao mesmo tempo, ‘eu sou
gaúcho e um bom exemplo para mim é uma picanha – bem gorda, aquela gordura tosta’ , e todo teu
corpo quer comer a picanha, mas a sua Vontade que é Imaterial, não é corporal, diz ‘Não eu não vou
comer porque , por isso ou por aquilo, porque quer emagrecer, porque você tem colesterol, ou
simplesmente porque você está de jejum.’
Se pensarmos na vida, nas peças de teatro, em todas as histórias há um conflito entre Vontade e desejo.

❖ Você vai ver que os objetivos das personagens, teus objetivos, muitas vezes entram em conflito
porque, você deseja uma coisa, mas você quer outra. As vezes você quer usar uma coisa cuja Causa
Final é beber, mas você quer usar para colocar canetas, lápis e você diz: ‘Ah, não me importa a Causa
Final da xícara, eu quero usar porque estou precisando de um lugar para colocar... e não tem nenhum
problema com isso, no caso da xícara, mas as vezes fazemos isto com realidades bem mais
substanciais.
Em algumas questões, não há problema em contrariar a Causa Final, como no uso da xícara para colocar
canetas. Mas é possível fazê-lo em realidades mais substanciais.

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É necessário estar atento à forma das coisas, para onde elas apontam, ao sentido que está inscrito nelas
mesmas. Essa é uma chave para a compreensão da estrutura da vida humana, das relações, das
dimensões da realidade.

❖ Em outra aula falávamos do hipócrita, por exemplo, que te cumprimenta alegremente mas ele está
interessado em outra coisa, então ele está te usando como pessoa para um objetivo que não é você.
Ele está dialogando com você, dizendo, ‘Oi tudo bem?...’, mas na verdade que ele está dizendo é ‘Olha
estou precisando utilizar você, para subir aqui na empresa.., etc., etc.’
❖ Não irei desenvolver isto aqui, porque só estou dando um instrumento teórico para que você perceba
que ‘se eu ficar atento para estas realidades, que é a forma das coisas e para onde estas coisas /
formas estão apontando, ou seja, qual é o sentido daquelas realidades, que já vimos em algumas
aulas que está inscrito na própria coisa é a intenção daquela forma’, isto é uma chave para a
compreensão da própria estrutura da vida humana, das relações e de todas as dimensões da
realidade.
❖ Porque tudo aquilo que existe, volto a afirmar, repetindo nosso amigo Aristóteles, tudo aquilo que
existe é uma composição de forma e matéria, posta na existência, com um sentido. Acho que com esta
afirmação aqui, sintetizamos, incluímos tudo aquilo que vimos nestas aulas.
Tudo quanto existe é uma composição de forma e matéria, colocada na existência com um sentido. Isso
pode ser aplicado às aulas ou a qualquer outra coisa.

Uma tensão cristalizada na lombar precisa ser desfeita para se reencontrar a estrutura formal própria
do corpo humano. Como aquele aspecto não corresponde à forma adequada do corpo, ele não está
plenamente realizado.

❖ Quando penso numa tensão lombar, que tenho e está cristalizada e eu preciso desfazê-la para
encontrar a estrutura formal própria do corpo humano, porque aquela tensão ali está deformando,
não é isto que dizemos? Eu tenho corpo deformado, é, aquele aspecto não corresponde a forma
adequada do corpo humano; às vezes é irreversível, mas tudo bem, é só corpo. É, eu não tenho braço,
é ‘fud@x@’, você pode ter até um braço mecânico, mas não é a mesma coisa. Mas isto é um defeito,
é uma falha e você olha e diz está faltando alguma coisa...., está deformado, agora no sentido de
estar torto, está faltando, mas é uma deformação também.
❖ Ou seja, aquela Forma, de um corpo humano, não está plenamente realizada, naquele indivíduo.
Ao recuperar a ressonância da voz, uma pessoa passa a falar com uma voz mais própria; exceto nos casos
patológicos ou de má formação congênita, a voz é adequada à estrutura física. Ao falar em finalidade,
pensamos em uma coisa específica.

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❖ Ou quando você recupera a ressonância da voz, ahh! agora você está falando, com uma voz mais
própria porque mais adequada a sua forma, porque exceto nos casos patológicos ou de má formação
congênita, a sua voz é adequada a sua estrutura física.
❖ Ou seja, a forma do seu corpo determina a qualidade da sua voz. Então isto pode ser aplicado tanto
aos temas que desenvolvemos aqui nessas aulas, quanto a quaisquer outros temas que tudo aquilo
que existe, volto a afirmar é uma composição de Forma e matéria posta na existência por uma Causa
Eficiente com uma determinada intenção com sentido.
❖ Quando falamos em finalidade pensamos que é uma coisa específica, não. É um sentido, é um sentido
da vida humana.
Mas o sentido da vida humana é algo abstrato, não existe uma vida humana em geral. Cada vida tem
um sentido que não é fixo, porque temos vontade, liberdade, podemos escolher caminhos e traçar a
própria trajetória.

❖ Existe a minha vida, existe a tua vida, e é cada uma dessas vidas tem um sentido que não é fixo porque
temos vontade, liberdade, podemos escolher caminhos, etc. e vamos traçando assim a nossa
trajetória.
Como somos seres humanos, o sentido não é mecânico e definido de fora para dentro, mas de dentro
para fora, a partir do interior, da alma, do espírito.

❖ Traçar a trajetória é de fato realizar um sentido, mas como nós somos seres humanos, este sentido
não é mecânico, e definido de fora para dentro. É definido de dentro para fora, a partir do nosso
interior, da nossa alma, da nossa pessoa, poderíamos dizer, do nosso espírito, aí tem pontos de vista
distintos.
❖ Você vai fazendo escolhas e você vai traçando seu destino, como dizemos, ou seja, você vai realizando
as possibilidades que você tem, que são as possibilidades da tua forma e que se dão que, numa
situação dada, num tempo / espaço dado, num mundo concreto.
❖ Isto é uma coisa que as narrativas sejam teatrais, seja romance, cinema etc., as narrativas de vidas
humanas são exatamente isto, realizações de possibilidades, daqueles indivíduos e elas iluminam a
nossa própria existência.
Cada pessoa realiza as possibilidades que são dadas em determinada situação. As narrativas do teatro,
do cinema, da literatura são isto: a realização de possibilidades que iluminam nossa própria existência.

❖ Então finalizamos aqui com essa ideia, e de certa forma essa ideia mesmo já é, vamos dizer, nós
explicitamos de uma certa forma, a Causa Final também destas aulas onde tornamos real, torna
existente um projeto, que é deixar claro determinados pontos sobre a questão da vida humana, do
teatro, da presença, da gestualidade. Ou seja, a realização de uma ideia, de um projeto que se dá
no tempo / espaço e cumpre mal ou bem, melhor ou pior, uma intenção que estava, inicialmente, na

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nossa mente, na nossa inteligência, projeta isto e que está agora realizada num mundo concreto,
na nossa própria existência.

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Semana 07: PENSAMENTO

Esta aula aborda o Pensamento, que não é puramente discursivo, e explica sua relação com os
Gestos

DISCURSO VERBAL E PENSAMENTO


Em geral, as pessoas identificam o Pensamento como discursivo, por meio de palavras. No entanto,
quando alguém se lembra de algo, de um dia passado, não está exatamente produzindo um discurso,
mas uma imagem, e isso também é Pensamento.
❖ Por exemplo você pode dizer: “Estava pensando naquele dia que tomei sorvete...” Você não estava
tendo um pensamento discursivo, você estava lembrando de alguma coisa.
Aristóteles diz que o homem pensa por Imagens. Essa afirmação pode ser tomada em sentidos distintos,
porque as palavras também são imagens.
No sentido do Pensamento Discursivo, a pessoa constrói frases com sujeito, verbo, predicado,
traduzindo pelo discurso verbal as coisas que está compreendendo. Contudo, nem sempre há o discurso
verbal.
❖ Posso traduzir em um discurso verbal uma sensação, por exemplo: “Estou sentindo no meu pescoço
um sinal...” A partir daí você pode começar a fazer um discurso: ”Este sinal pode ser um cisto...”; “Este
sinal é porque peguei sol demais”. Isto é um pensamento discurso, as vezes até meio aleatório, sem
um rigor lógico de uma demonstração formal.
❖ Os pensamentos discursivos ocupam muito a mente da pessoa no tempo que correm, principalmente
na atualidade.
Ao atravessar uma rua, não se usa o Pensamento Discursivo. Mas também não se atravessa
simplesmente sem pensar. A ação de atravessar a rua também é um Pensamento, realiza-se como um
Pensamento, é um Pensamento em Ação. E isso também cabe na definição aristotélica.
Quando se diz Imagem, a maioria das pessoas pensam em Imagem visual. No entanto, Imagem é tudo
o que passou pelos sentidos e está na memória.
Formamos também Imagens Gustativas, Olfativas, Táteis, Auditivas. De fato, as imagens visuais são em
maior número que as demais, ao menos na consciência, mas elas são uma espécie do gênero imagem.
❖ Temos uma Memória Paliativa, o sabor de um café, de uma comida, uma Memória Olfativa, você se
lembra do cheiro de alguma coisa. Isto não é uma palavra, é uma Imagem Olfativa. Temos imagens,
táteis, auditivas e imagens visuais.
❖ Na nossa consciência o que marca são as imagens visuais, pela riqueza de detalhes.

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Para o trabalho do ator, isso é fundamental, pois há também as Imagens Sinestésicas. ‘Kínesis’ é
movimento em grego. Há, portanto, a imagem de uma dor no estômago, ou da tensão de um abraço,
que não é somente a imagem da pessoa ou do contato, mas das tensões musculares que compõem o
abraço.
❖ Quando digo “Estou com uma bola no estômago”; estou usando um símbolo, uma imagem. Se tivesse
que discorrer sobre isto, daria muito trabalho, pois normalmente não temos as palavras técnicas para
discorrer discursivamente sobre a “bola no estômago”.
❖ Se fossemos descrever analiticamente e discursivamente, iriamos paralisar, ninguém faz isso. Então
fazemos poesia naturalmente.
❖ Quando você diz “Você é um anjo; você é uma flor; hoje estou morto de cansado”, isto é poesia. É usar
uma imagem para traduzir uma sensação. Para descrever o cansaço, tem que ser um bom escritor, ou
alguém que domine bem a língua.
❖ Falamos pouco “literalmente” hoje em dia. Por isso as pessoas estão malucas. As vezes pensamos que
estamos falando alguma coisa, e é outra.
Existem exercícios em teatro de fazer Gestos sem pensar. Mas no fundo isso não é possível, assim como
não é possível fazer um Gesto sem sentido.
O que se pretende dizer, na verdade, é fazer um Gesto sem planejar. Isso é uma Imagem Metafórica,
que sugere algo que, se fôssemos descrever discursivamente, exigiria mais esforço.
Assim como alguém que diz que está com uma bola no estômago está usando uma metáfora.
No dia a dia, estamos fazendo poesia, ainda que de baixa densidade, pois usamos imagens para traduzir
sensações. Nós falamos literalmente muito pouco, já que é necessário dominar bem a língua para falar

O GESTO COMO PENSAMENTO


O Gesto é sempre significativo. Quando alguém está de posse do próprio corpo, os Gestos são mais
significativos ainda. Não existe um depósito do qual se possa sacar os Gestos, apesar do que ensinam
nos cursos de oratória, que se deve gesticular de tal e tal modo.
❖ Expressar é algo mais assertivo, mais forte. Porém muitos Gestos são mini expressões, que o Roberto
prefere chamar de significativo.
❖ Os Gestos são palavras, pensamentos e que em um corpo vivo, orgânico e experiente, os Gestos vêm
organicamente (naturalmente).
❖ O corpo pensa. O corpo fala porque pensa. Todo Gesto corporal é um pensamento.
Os Gestos também são palavras, são Pensamentos. E em um corpo vivo, de alguém com mais
experiência, os Gestos vêm organicamente.

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O corpo pensa, e todo Gesto corporal é um Pensamento que, portanto, pode ser lido. É possível fazer
esta distinção: existe o Pensamento Mental, e existem outras formas de Pensamento, que não
eliminam a mente.
Nós não atribuímos um sentido a algo que uma pessoa faz – nós captamos um sentido. A ideia de
atribuição de sentido é moderna, pós-kantiana: tudo está na subjetividade, interpretamos o mundo.
Mas essa ideia mesma é uma impossibilidade, pois se alguém diz que tudo é interpretação, está falando
algo objetivo.
Na verdade, quando alguém afirmar isso, está usando as palavras com outras intenções. Como dito em
outro momento, uma pessoa pode afirmar que vai desenhar um quadrado redondo, mas não pode
realmente fazê-lo.
É o mesmo dizer que a verdade não existe. É uma frase impossível, pois ela mesma seria uma verdade.
É fato que não se pode captar a verdade absoluta do universo, mas captamos verdades contingentes.
Quando alguém afirma que tudo é relativo, o que está querendo dizer é que quer pensar de tal modo e
pronto. Mas a pessoa não pode dizer isso claramente, pois aí teria de reconhecer uma realidade que
talvez não queira.
❖ Quando uma pessoa diz que a verdade é relativa, porque ela não existe, é porque, muitas vezes não
tem boa intenção.
❖ Uma frase: “Você é linda!” Pode ser verdade, se a pessoa for linda, e pode também ser uma poesia,
pois o locutor está querendo dizer outra coisa. `
Algumas palavras podem esconder outras intenções. E os Gestos, do mesmo modo.
O orgulhoso, por exemplo, tem um queixo erguido, olha de cima, porque se acha superior. Ele interioriza
isso, e mesmo em casa mantém a postura. Apesar de não poder falar abertamente que se acha
maravilhoso, está dizendo isso com sua postura, com seus Gestos.
Estes são Pensamentos que não são puramente mentais, discursivos, mas interferem na comunicação,
porque estão acrescentando elementos ao contato, que não tem a ver com o assunto.
Todas as ações humanas são Pensamentos. Assim, é possível perceber a condição psíquica de alguém
pela maneira como ela se senta, por exemplo. Só não enxergamos isso por conta da desatenção, mas se
estivéssemos interessados de fato, isso seria visível.
❖ Podemos analisar alguém só por seus Gestos e ações. Você percebe o interesse, o desinteresse. Somos
muito mais transparentes do que pensamos. Não estou dizendo para ficar olhando e analisando. Você
olha e vê, isto é inteligência.
Pensamos que somos muito interiores, que temos uma subjetividade. Isso é verdade, mas também
somos mais transparentes do que pensamos.
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Não se trata de análise, mas de inteligência, intuição, olhar e ver.
Inteligência vem de ‘intus-legere’, que significa ver dentro. É estar atento, pensando em plenitude,
discursivamente, intuitivamente, imageticamente, poeticamente, prosaicamente.
A ação humana faz sentido, é um Pensamento, seja consciente, semi ou inconsciente. Tudo faz sentido,
desde que se tenham olhos para ver.
Ampliar o vocabulário não é uma questão de erudição, é adquirir instrumentos para captar aspectos e
dimensões da realidade para os quais as palavras estão apontando.
É como se os discursos verbais fossem traduções de intelecções da própria realidade, que são expressas
de forma mais ou menos adequada.
É por isso que os grandes escritores traduzem em uma frase ou verso uma realidade que já foi captada
por nós, mas está ainda obscura.
Vale a mesma coisa para os Gestos. Quando, por exemplo, um ator desenvolve suas possibilidades
físicas, considerando que no dia a dia quase não é necessária a sutileza nos Gestos, ele percebe que o
corpo tem muito mais possibilidades de movimento que o uso em geral.
Quem começa a desenvolver a expressão e dominar essas sutilezas, como que adquire um vocabulário
maior em seus Gestos e conversação e passa a traduzir nuances do que está falando por meio do Gesto.
❖ A realidade é muito mais rica de sentido, do que possa imaginar nossa vã filosofia.

COMENTÁRIOS ÍTALO MARSILI E ROBERTO MALLET – SEMANA 07


ÍTALO MARSILI
Na idade média foi teorizado que nada está na inteligência sem que antes não tivessem passado pelos
sentidos. Gato, cachorro e animais têm sentido, mas não formam conceitos. Eles se orientam no mundo
respondendo a estímulos imediatos.

Dois teóricos, falando a mesma coisa mas por ângulos diferentes, aparecem no século XX. Um espanhol
, Xavier Zubiri, fala que tem “Inteligência sem Ciente”. Isto quer dizer: Porque o homem que é um bicho
material ele chega a formar conceitos e as vacas que também são bichos materiais, não formam
conceitos. Xaver Zubiri explica: Porque no homem Sentir já é Inteligir. Ou seja, na própria substância
material, existe uma entrega para a Inteligência que é uma faculdade Imaterial, de algo já imaterial, ou
seja, tem de haver algo distinto na sensibilidade humana e animal, para que o homem chegue a formar
conceitos, e os animais não formam conceitos e Zubiri fala, isto tem que estar na Sensibilidade.

Por outro lado, o teórico francês, Marcelo Jousse, no livro ‘Antropologia do Ato’, diz que o grande pecado
da nossa civilização escrita é que nada que não esteja na escrita seja valorizado. Ou seja, só podemos
valorizar aquilo que está escrito, que pode ser discursivo.
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O Gesto é uma grande dádiva. É como se o Gesto comunicasse algo de forma inteligente o Gesto fala.

O ator gestualiza de um modo muito diferente que eu gestualizo. Neste momento estou gestualizando
de modo natural. O exercício do ator, o atuar, esse exercício profissional do Gesto, isto pode de que
modo aumentar a inteligência do homem, no sentido de ele alcançar a sua Causa Final, ou seja a
Salvação.

Porque se tudo que é material, e o Gesto é Causa Material, uma Causa Eficiente, uma Causa Final e
Formal,, os meus Gestos têm uma Causa Final também, que podem se aproximar da finalidade própria
para qual eu tenho um corpo e podem se afastar desta finalidade mesma para que eu tenha um corpo.

O fato que o verbo se encarnou; e a expiação; quando Ele é crucificado na cruz é um corpo que ali padece
também, e isto não pode ser sem sentido. Aquilo que ocorre no corpo do Cristo tem um sentido também.
Não é que a alma do Cristo, o espírito seja só santo, parece que o corpo também é cheio de sentido.

Se podemos fazer uma correlação no Gesto do Cristo , o meu gesto humano inteligente e uma certa
atividade humana, que é uma atuação, que parece que oferece ou não um “Que” de maior perfeição do
Gesto. Se não podemos extrair daí uma ferramenta, para que o homem que não é um ator, consiga uma
maior perfeição dos seus gestos e se aproximam mais da Causa Final.

ROBERT MALLET
A primeira coisa que me ocorre é que se você adquirir literariamente em termos de discurso, de fala,
você amplifica o seu vocabulário por exemplo, isto não é só uma qualidade erudita, cultural, as palavras
são instrumentos para que você capte aspectos, detalhes dimensões da realidade para qual elas estão
apontando.

Quando você amplia o seu vocabulário, você está ampliando a própria intelecção da própria realidade.
Porque é como se os discursos verbais são traduções de intelecção da própria realidade.

Por isso tem autores que expressam aquela realidade que já captei, mas para mim está obscura de
descrever. Isto acontece o mesmo com o Gestos, mas hoje em dia que temos tantos artefatos de
comunicação, as possibilidades físicas ficam diminuídas porque usamos pouco o corpo, os movimentos.

As pessoas comuns têm os Gestos meio que iguais, estereotipados. A vida é muito rica de nuances, mas
nós empobrecemos nos Gestos. Se eu não exercito meus braços, que me proporcionam muito
movimentos, perco uma possibilidade de comunicar. Temos muitos músculos em nosso corpo e usamos
como blocos.

Se eu conseguir dominar naturalmente nos meus gestos estas sutilezas, existe a possibilidade de um
vocabulário maior. Começo a traduzir nuances do que quero comunicar nos Gestos. Esse movimento de

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expressão corresponde a sentidos e portanto você está captando mais detalhes, mais nuances da própria
realidade e complexidade do universo.

A palavra “Logos” quer dizer Verbo, Palavra, Sentido. Quando se fala o verbo se fez a carne um dos
sentidos disto. O Ser Humano é um microcosmo, ou seja, o corpo humano por analogia, tem todas as
dimensões, todos os aspectos do universo, inclusive dos anjos, pela nossa inteligência, que é material.

Então o Ser Humano, Corpo, Alma e Espírito é um símbolo do Universo, Microcosmos e Macrocosmos.
Por excelência, isto é assim no corpo do Cristo, no homem Jesus Cristo.

O verbo se carne e portanto é a ideia do universo como um todo que se encarna num ser humano
concreto. Então o Cristo na cruz é também o próprio Universo na cruz e por isso ele tem essa redenção
e este acontecimento, tem a dimensão universal. Abarca toda a realidade física, corporal e temporal. A
própria cruz é o símbolo do universo. Você tem o eixo e o plano horizontal.

ÍTALO MARSILI
Parece que a Inteligência do Zubiri e Jousse é colocar a Inteligência não no topo da cruz, mas no centro.
Pegando o Universo: os anjos no plano superior, os demônios no fundo, os animais, vegetais no horizonte.
O ser humano não é o sujeito que está no topo e nem que está no fundo; não está à direita e nem à
esquerda. Ele está no Centro.

Por um lado nós temos os conceitos, as ideias que estão no eixo vertical e no horizontal está a matéria,
os gestos. A Inteligência está no meio disto tudo, ela perpassa todo o gestual pelo nosso corpo e este
universo de conceitos. É aí que está o ponto.

É falado que para aumentar nosso imaginário, é necessário ler livros, estudar literatura, estudar poesia.
Isto é fato, é verdade, mas esta é só uma parte do imaginário. Mas tem outro imaginário que passa pelos
gestos, pelas mãos, pela nossa instalação material no mundo. Isto amplia nossos conceitos, nosso mundo
imaginário.

Não é porque vamos estudar teatro, gestos, que iremos agir mecanicamente de modo calculado. Mas
não teríamos uma maior consciência, domínio de nosso corpo físico para nos comunicar?

ROBERT MALLET
Sim até porque o corpo humano tem uma dimensão simbólica.... Na astrologia, de uma imagem medieval,
distribuí o corpo humano pelo zodíaco. Não é só uma atribuição simbólica exterior. É a analogia entre
microcosmo e macrocosmo.

Quando temos o domínio corporal, comunicamos sutilizas que não saem por palavras e sim por gestos.

“A arte está para a vida, assim como o vinho está para as uvas”.

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A arte é uma espécie de concentração de sentido e o descarte de tudo que é acessório, contingente e chegasse
a uma coisa mais essencial. É como se fosse uma intensificação simbólica e poética da vida. Que nos ajuda a ver
no cotidiano aquilo que nos escapa.

É isso que São Tomás de Aquino dizia de forma inteligível.

CORPO HUMANO E SIGNOS

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Semana 08: MUSCULATURA

Esta aula traz exercícios e comentários sobre a presença física e as tensões musculares.

MUSCULATURA E RESPIRAÇÃO
O primeiro exercício é colocar-se em pé, com os olhos no horizonte, os braços soltos ao longo do corpo
e os pés com a mesma abertura dos ombros e pélvis; essa seria uma postura básica, neutra.
Normalmente, ao olhar para o horizonte, as pessoas erguem o queixo. A zona da nuca é muito enervada,
é comum que ombro e pescoço comecem a doer, porque se está contraindo a musculatura.
Exercícios de relaxamento e massagem são bons para resolver esses problemas de tensão. Algo que se
pode fazer ao longo do tempo é observar o próprio corpo, para perceber onde está mais tensionado.
Outra coisa é inspirar, soltando braços e ombros, de modo que liberem a tensão; e ainda soltar a coluna
vertebral, vértebra por vértebra, descendo o corpo em um movimento redondo, deixando os braços
soltos e sem deslocar a pélvis para trás ou o peso para o calcanhar. Ao voltar para posição inicial, também
vértebra por vértebra, cuidar para não erguer demais a cabeça. Esse exercício, feito três vezes na
semana, vai alongar a musculatura.
Hoje em dia, existem muitas correntes, como pilates, que trabalham para desfazer tensões que se
tornaram fixas. Contrações que se tornaram parte do caráter, mas não são do caráter em sentido
próprio, estão ali como intrusas.
Quando ficamos em pé, em geral, jogamos o joelho para trás. Desse modo, as coxas ficam tensionadas
e a troca de energia com o solo fica prejudicada, podendo até causar problemas de circulação.
A posição normal do corpo é em pé e com o joelho solto, embora isso exija uma atenção física.
Outra questão é o salto alto. Quando muito alto, exige um esforço para manter-se em pé, uma contração
da coxa, panturrilha e lombar. Não há problema em usá-lo de vez em quando, mas é prejudicial para a
estrutura física.
Há ainda a tendência de jogar o quadril para trás, que também vem de uma contração da lombar. A
pélvis deve estar razoavelmente colocada, para que não haja essa compensação. Não se trata de
flexionar os joelhos, mas deixá-los soltos, osso sobre osso.
É interessante observar um atlas anatômico ou em esqueleto, pois é o sistema ósseo que dá a estrutura
física, e o sistema muscular a sustenta.
Na postura, também acontece de o abdômen ser projetado. A musculatura vai se abrindo e os órgãos
internos deformam-se um pouco.

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A musculatura da mandíbula também é muito tensa. Primeiramente, porque mantemos a boca
fechada; se a soltássemos, ela se abriria com o peso do queixo. Depois, porque apertamos esses
músculos, principalmente se estamos com raiva. Por isso, deve-se tomar cuidado com essa musculatura.
Hoje em dia, as pessoas respiram muito mal. A expiração é um ato voluntário da respiração. Para a
respiração, um exercício é ficar na posição inicial da aula e, com os pés paralelos, expirar de cima para
baixo. A inspiração começa quando quase todo o ar foi retirado; o abdômen enche e é necessário abrir
o tórax para entrar mais ar. Até o ombro parece encher-se um pouco.
Também se pode deitar com os braços soltos, assim como no exercício em pé. Atentar à posição porque, quando
deitamos, geralmente o queixo também fica alto e a lombar, muito encurvada. Em seguida, colocar a mão direita
um pouco abaixo do abdômen, inspirar profundamente e deixar o ar entrar.
Pode-se ainda colocar a outra mão sobre o osso esterno e fazer uma respiração ampla, tirando todo o ar dos
pulmões, inspirando do abdômen até em cima, de modo que o tórax vá se abrindo.
A expiração deve ser pela boca, e a inspiração pelo nariz. Esse exercício, feito três vezes por semana, nos faz, aos
poucos, tomar consciência do movimento orgânico da respiração.

EXERCÍCIO DE RELAXAMENTO
O exercício a seguir deve ser feito com muita lentidão. Ele foi criado pelo terapeuta Moshé Feldenkrais,
que desenvolveu uma série de exercícios cujo objetivo é o que temos apontado: desfazer o que ao longo
dos anos se tornou fixo, cristalizado.
➢ O exercício exige paciência. Muitas pessoas começam a fazê-lo, mas não aguentam dez minutos e
querem parar.
➢ O exercício completo demora entre 1h30 e 2h, mas, no início, pode-se levar de 40 a 50 min.
➢ Ele terá um resultado muito eficaz se feito, por exemplo, uma vez por semana, ao longo de seis
meses, pois os processos de reorganização muscular são lentos.
➢ Pode-se corrigir um pouco hoje e, em seguida, retornar para as tensões habituais.
➢ Começar deitando, com as pernas estendidas, os olhos fechados e o corpo solto no chão.
➢ Mapear as zonas que estão em contato com o chão e as que não se encostam a ele, por causa da
curvatura natural do corpo (abaixar o queixo diminui essa curvatura).
➢ Feito o mapeamento, flexionam-se as pernas, colocando as solas dos pés no chão paralelamente,
e observando o que acontece (redução da curvatura lombar).
➢ Em seguida, cruzar a perna direita sobre a esquerda (pode-se abrir um pouco os braços), e deixar
que as pernas caiam para a direita com o próprio peso, até o limite, sem forçar, ficando um pouco
nessa posição. A zona posterior se alonga toda. Depois, retorna-se à posição inicial.

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Ao recolocar, fazemos isso a partir da pélvis, com a perna subindo junto. A recomendação é repetir o
movimento vinte vezes.
❖ Terminados os movimentos, descruzar as pernas, voltando à primeira posição alongada,
sentido novamente o corpo pesar, sem esquecer-se da respiração.
❖ Percebendo novamente quais zonas se encostam ao chão e quais não encostam; aqui já pode
começar a aparecer uma diferença de contato entre um lado e outro.
❖ Em seguida, repete-se a série com a mesma perna e, depois de voltar à posição inicial, faz-se
o mapeamento do contato com o chão.
❖ Na terceira vez, fazer um duplo movimento: cruzar os dedos das mãos atrás do topo da
cabeça; deixar as pernas caírem como antes e, ao mesmo tempo, a partir dos braços, puxar
a cabeça ao centro do corpo.
❖ Expira-se no movimento de ida e volta-se devagar inspirando; faz-se esse movimento vinte
vezes, em um trabalho lento, concatenando braços, pernas e pulmão.
❖ Ao final, faz-se a mesma coisa: descruzar pernas, soltar os braços ao lado do corpo e arrumar-
se, percebendo a diferença entre um lado e outro.
❖ Repete-se a série de vinte movimentos.

O terceiro movimento é flexionar as pernas, colocar as mãos atrás da cabeça e fazer somente o
movimento dos braços, expirando ao subir e inspirando ao voltar. É importante puxar bem a cabeça.
❖ Feito isso, voltar à posição original, braços ao longo do corpo e observar o contato do corpo
com o chão.
❖ Em seguida, fazer as mesmas sequências de movimento do outro lado (duas de vinte somente
com as pernas, descanso, duas de vinte com pernas e braços, descanso, vinte somente com
os braços, descanso).
❖ Na última, é importante prestar atenção aos dedos cruzados; normalmente, as pessoas
sempre cruzam do mesmo modo (lado direito sobre o esquerdo, por exemplo), por isso, deve-
se inverter.
❖ Ao levantar, o ideal é girar o corpo para o lado, apoiar-se e sentar; sem fazer movimentos
bruscos ou tensões

EXERCÍCIO DE VOZ
O próximo exercício está fundamentado no fato de que a voz ressoa no crânio e nos ossos do peito,
como uma caixa acústica.
A maioria das pessoas pensam em voz somente no aparelho vocal, de modo que se alguém lhes disser
para falar mais alto, elas irão gritar, forçar muito as cordas vocais. Mas é possível falar alto sem gritar.
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Há também os maus hábitos, como colocar a voz no nariz ou garganta e habituar-se a isso, até que todos
acham que a voz é assim, inclusive a própria pessoa; e seu comportamento também começa a adequar-
se à voz meio falsa.
Exercício de voz - 1:
❖ Para começar o exercício, deve-se ficar em pé com os pés paralelos e olhos no horizonte.
❖ Produzir um som semelhante ao de soprar um cano (por isso, é chamado de “exercício do
cano”).
❖ Pode-se colocar as mãos no crânio levemente, para perceber se ele vibra (é algo muito sutil,
por isso, não se deve apertá-lo).
❖ Ao soprar, deixar vibrar, deixar o volume aumentar. A voz deve ser pensada a partir do
crânio. O ar sai a partir do abdômen.
❖ O joelho não deve estar para trás. No início, a vibração não será sentida, por isso, é preciso
insistir.
Esse exercício é usado como aquecimento vocal, antes de entrar em cena, de dar uma aula.
Feito por um ou dois minutos, a voz já estará mais aquecida.

Exercício de voz - 2:
❖ Um desenvolvimento do exercício, que só deve ser feito depois de três ou quatro semanas
praticando o primeiro:
❖ Começar com o “cano” (soprando), continuar somente falando U, e depois voltar para o
cano.
❖ Praticar mais duas ou três semanas. Depois, incluir a vogal I
▪ Soprar, falar U, falar I, falar U e soprar.
Desenvolvendo esses exercícios ao longo de alguns meses, haverá uma mudança substancial na
qualidade da voz.

70
FILOSOFIA
VICTOR SALLES

71
SEMANA 01: ÉTICA E CRISE DA CULTURA

Esta aula vai discorrer sobre a Ética enquanto disciplina filosófica. Também tratará dos assuntos: o
que é a Ética, qual é a sua relação com a Psicologia e como o estudo da Ética das Virtudes pode
remediar o mal causado pelo relativismo moral e filosófico da sociedade contemporânea

ÉTICA E CRISE DA CULTURA

A ética é uma disciplina filosófica que tem por objeto a felicidade, isto é, a boa vida humana. O trabalho
do Dr. Ítalo Marsili tem a ética em seu fundamento, pois aponta a insuficiência de certas visões
contemporâneas a respeito da felicidade e propõe outra visão, resgatando a sabedoria clássica e
tradicional.

❖ O que é a ética? É a ciência da vida boa, é uma reflexão filosófica sob os aspectos que realizam a
pessoa humana; Ética como uma disciplina filosófica;
❖ Crítica: Insuficiência, inconsistência e a fragilidade das versões de vida boa contemporânea, que não
realizam nem satisfazem a pessoa humana e portanto não geram felicidade;
❖ Proposta: Resgate da sabedoria clássica e tradicional.

Não é por acaso que esse trabalho seja relacionado à Psicologia, outra disciplina Filosófica. A
modernidade, entretanto, limitou a Psicologia ao atribuir-lhe o status de mera ciência. A Psicologia só
pode, ainda assim, ser compreendida se levarmos em conta manifestações que não são sensíveis, entre
as quais a cultura em que ela está inserida.

❖ Psicologia também é uma disciplina filosófica mas que na modernidade se separou da sua “mãe”
Filosofia aderindo a uma nova forma de conhecimento, de pensamento e de prática que é a Ciência;
❖ Tensão entre Filosofia e Ciência: A Filosofia também é a ciência pois é um tipo de conhecimento da
Verdade, porém a ciência reduz o escopo de conhecimento a uma dimensão material, tangível,
sensível e empírica, a fim de conhecê-lo por completo. O objeto da Filosofia que é a psique, a alma
humana, não se pode conhecer apenas por suas manifestações sensíveis. Estamos num âmbito da
Linguagem Simbólica que podemos chamar de Cultura.
❖ Não é possível compreender a alma humana sem a cultura humana na qual ela sempre está inserida.
A reflexão sobre Ética e a Psicologia Moral , que pertence a Ética, deve estar enquadrada em um
horizonte da cultura.

A Cultura contemporânea, que podemos chamar de pós-moderna, é uma espécie de crise, de ruptura,
de mudança. Só entendemos a cultura contemporânea se compreendermos a tradição com a qual ela
está rompendo e para onde ela pretende ir.

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Ora, o objetivo da Cultura contemporânea é a liberdade do indivíduo em relação às instituições que
antes o orientavam. Sem instituições como família, tradição, cultura e religião, o indivíduo não se torna
livre, mas incapaz de guiar-se.

❖ Cultura moderna se caracteriza por uma crise, por uma ruptura; a cultura que se sobressai é a
cultura do indivíduo, individualista, que promove a liberdade individual como realização do
indivíduo;
❖ Liberdade com relação as instituições que, antes orientavam e estruturavam a pessoa na vida,
principalmente a tradição e a experiência do passado, em instituições como: a família, a religião, o
Estado, a cultura das músicas/literatura e o indivíduo livre fique desorientado e perdido.
❖ A crise da Cultura é uma crise de Sentido.

Não é culto aquele que fala muitas línguas, conhece literatura antiga ou música clássica, mas sim aquele
que dispõe de uma linguagem para interpretar suficientemente o que acontece ao seu redor.

❖ A Cultura é o mapa da vida, uma pessoa culta não é aquela necessariamente erudita, é quanto ela
tem uma linguagem que consegue compreender os fenômenos ao seu redor.

Essa linguagem é sempre normativa, pois não abarca apenas a descrição das coisas, como também o seu
aperfeiçoamento e a sua melhor realização.

❖ No caso da Psicologia, a Ética concerne não só a descrever os fenômenos internos e as motivações,


os movimentos interiores da pessoa, mas também o seu modo funcional, harmônico, o seu modo
pleno de realização das faculdades.

Se a cultura não é capaz dessa abrangência, ela está em uma crise de sentido.

❖ Portanto a crise de sentido é na verdade uma falta de linguagem para interpretar e conhecer o mundo
ao seu redor e principalmente se autoconhecer.

❖ Crise da cultura = tirou o sentido da vida!

❖ A finalidade da Filosofia e da Psicologia é o autoconhecimento!

❖ Jacques Lacan falava que se sentia um herdeiro de Sócrates, exatamente porque propunha um
autoconhecimento pela maiêutica6, pela provocação que um terapeuta ao perguntar
sistematicamente, partejando ideias, ou afetos, sentimentos que o analisando tinha já no interior de
sua alma, que não poderiam ser gestados sem o influxo de um interlocutor privilegiado.

6
Maiêutica: método socrático que consiste na multiplicação de perguntas, induzindo o interlocutor na descoberta de suas
próprias verdades e na conceituação geral de um objeto.
73
O MISTÉRIO DA ALMA HUMANA

A ciência tende a reduzir o conhecimento a um esquema de problema e solução. A internet, por exemplo,
só é possível graças a uma série de problemas resolvidos pela computação e pela matemática.

❖ A ciência tende a considerar o mundo como um problema a ser solucionado, como se fossem
equações de matemática.
❖ Porém a alma humana nunca poderá ser reduzida a um problema que pode ser resolvido
matematicamente, a uma solução orgânica, embora a vida tenha aspectos que podem ser resolvidos
de maneira orgânica, mas a alma é um mistério, tem um aspecto de insondabilidade;
❖ Heráclito de Éfeso, um dos grandes filósofos da antiguidade dizia “Procurareis nos confins da alma
e não os encontrarei.” A alma na dimensão intelectual e afetiva é infinita.

A mesma coisa é impossível de se fazer com a alma humana, já que ela possui um componente de
mistério. O corpo é delimitável, seus limites se encontram na matéria; a alma, entretanto, desconhece
limites materiais.

❖ Santo Agostinho disse que só poderíamos conhecer nossa alma se pudéssemos ver a si mesmos
como Deus nos vê, porque a minha alma é praticamente do tamanho de Deus.
❖ É claro que a linguagem que a cultura estabelece para interpretar esses fenômenos, precisa estar de
algum modo proporcional ao objeto da alma. E esta proporcionalidade significa que temos que ter
uma linguagem de que não se reduza a linguagem científica, que não se reduza a um objeto lógico
e matemático.
❖ Portanto o Cientificismo ou o Positivismo quer a redução do conhecimento humano a forma ou a
baliza das ciências naturais, das ciências lógico e matemático, é uma das crises das ciências humanas
em geral.

Se a alma não é um objeto lógico e matemático, uma cultura que apenas considera os aspectos lógicos
e matemáticos da realidade jamais conseguirá compreendê-la.
Precisamos, para isso, de um horizonte mais amplo de reflexão, e devemos buscá-lo na Filosofia.

❖ A Filosofia é uma anciã das ciências humanas e já atravessou uma série de crises culturais.
❖ Ela é uma ciência aberta a linguagem simbólica da cultura.
❖ Por isso devemos estar sempre muito atentos a cultura, muito atentos as linguagens que são
utilizadas para expressar e interpretar a alma humana, os fenômenos morais em geral.

74
O PROBLEMA DO RELATIVISMO

❖ As vezes seus clientes, não tem palavras para descrever seus sofrimentos, dramas. Por isso a cultura
tem um papel fundamental de apresentar e fornecer uma série de símbolos e signos, eloquentes e
transparentes destas experiências.
❖ Trecho do conto “Os Sobreviventes” de Caio Fernando Abreu, para vocês perceberem o ponto de
partida do Relativismo Moral Absoluto, de que nós partimos na crise da cultura:

▪ Já li tudo, cara, já tentei macrobiótica psicanálise drogas acupuntura suicídio ioga dança natação
Cooper astrologia patins marxismo candomblé boate gay ecologia, sobrou só esse nó no peito,
agora o que faço? Não é plagio do Pessoa não, mas em cada canto do meu quarto tenho uma
imagem de Buda, uma mãe Oxum, outra de Jesusinho, um poster de Freud, às vezes acendo vela,
faço reza, queimo incenso, tomo banho de arruda, jogo sal grosso nos cantos, não te peço solução
nenhuma, ora não me venhas com autoconhecimentos-redentores, já sei tudo de mim, tomei mais
de cinquenta ácidos, fiz seis anos de análise, já pirei de clínica lembra? Te desejo uma fé enorme,
em qualquer coisa, não importa o quê.”

❖ Nietzche7 foi um dos filósofos que perceberam o esvaziamento de todos os valores e a indiferença
substancial entre os valores. E se os valores todos se equivalem, não há norte, não há mapa e nos
sentimos totalmente perdidos. E o resultado é um estado blasé, passivo, de ‘tanto faz’.

❖ A Felicidade é impossível no Relativismo, pelo simples fato que a Felicidade é um estado que
alcançamos a partir da realização das nossas virtudes. A partir da realização do que é bom, do que é
justo, do que é correto, que faz sentido.

7 Friedrich Wilhelm Nietzsche: ( Reino da Prússia, 1844 /1900) foi um filósofo, filólogo, crítico cultural, poeta e compositor
prussiano do século XIX, nascido na atual Alemanha. Escreveu vários textos criticando a religião, a moral, a cultura
contemporânea, filosofia e ciência, exibindo uma predileção por metáfora, ironia e aforismo. Suas ideias-chave incluíam a
crítica à dicotomia apolíneo/dionisíaca, o perspectivismo, a vontade de poder, a morte de Deus, o Übermensch e eterno
retorno. Sua filosofia central é a ideia de "afirmação da vida", que envolve questionamento de qualquer doutrina que drene
uma expansiva de energias, não importando o quão socialmente predominantes essas ideias poderiam ser.[2] Seu
questionamento radical do valor e da objetividade da verdade tem sido o foco de extenso comentário e sua influência
continua a ser substancial, especialmente na tradição filosófica continental compreendendo existencialismo, pós-
modernismo e pós-estruturalismo. Suas ideias de superação individual e transcendência além da estrutura e contexto tiveram
um impacto profundo sobre pensadores do final do século XIX e início do século XX, que usaram estes conceitos como pontos
de partida para o desenvolvimento de suas filosofias.

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❖ O trecho acima, é um trecho de uma pessoa simplesmente deprimida, é uma pessoa que não tem
nenhuma expectativa de cura; pelo simples fato que não tem nenhuma esperança de solução para o
vazio em que ela emergiu. O vazio absoluto do Relativismo Moral e Cultural em que ela se encontra.
Isto é Niilismo.

❖ Niilismo: absolutamente ‘o nada’ do ponto de vista ontológico, substancial e real em que uma pessoa
se encontra.

❖ Qual é a consequência da crise da cultura? Demissão da Ética, da Psicologia, da religião, da política,


de todas as instituições que realizam a pessoa humana. A demissão da Família, Beleza, Bondade,
Verdade, não há Ética, Estética, não há ciência, tudo se esvazia por completo.

❖ É esvaziado por completo, numa concorrência avassaladora, que o Pluralismo moderno trouxe, de
modo que se todos estão no mercado das possibilidades humanas, então nenhuma é verdadeiro em
si.

❖ O trecho acima, seriam palavras de uma mulher falando para seu amigo / amante, e depois ela
vomita, e o vômito é um símbolo, inclusive no livro do Apocalipse, desta rejeição e mornidão, que não
é quente nem frio, de numa indiferença moral profunda. Ela tentou várias coisas, entre elas a Religião.

❖ A Religião é um ponto muito importante na crise da cultura, porque a religião realmente considerada,
equacionada na vida humana tem uma função hierárquica e conglobante porque ela lida com aquilo
que transcende a própria vida.

❖ No conto também aparece o poster do Freud no quarto dela. Freud defende um ateísmo psicanalítico.
Mas ela tinha imagens de Jesus, Buda, Oxum, é absolutamente impossível equacionar Freud, o
ateísmo, Jesus, Buda e Oxum. Ela não tem mais capacidade de pensar, está completamente
entorpecida. Claro que esta personagem está no nível extremo e claro que o Caio Fernando Abreu está
apresentando um nível exacerbado de crise da cultura, de crise de sentido que encontra variações e
degradações as mais distintas.

❖ O que importa aqui é o princípio da crise da cultura, como crise de sentido e como negação da
possibilidade de conhecer um sentido objetivo e real para as coisas. Isso proveio de uma defesa da
liberdade. Esta personagem gostaria de ser livre, mas ela está absolutamente encarcerada, em si
mesmo.

❖ A pessoa não consegue encontrar uma norma, uma regra objetiva a qual ela deve se adequar. Antes
da crise da cultura toda base da educação era o princípio elementar da base moral, espiritual,
intelectual.

76
❖ O que é a educação? É livrar a pessoa da sua própria ignorância, livrar a pessoa do seu pequeno ego,
da sua pequena experiencia restrita e assimilá-la num horizonte muito maior de uma tradição;

❖ Na personagem citada, ela está subtraída desta possibilidade, ela é apedeuta (pessoa desprovida de
cultura) não porque ignora aquilo que preencheria sua alma mas porque ela nega essa possibilidade,
ela nega a possibilidade de aprender alguma coisa.

Existe uma visão filosófica, chamada “Relativismo”, que exclui a possibilidade mesma da felicidade
humana, porque não crê que possamos encontrar uma visão objetiva sobre as coisas. Quem vive de
modo relativista oscila entre as mais variadas visões de mundo, terminando no vazio existencial. Não
tem esperança de cura, porque não acredita na existência de cura.
O fato de muitas pessoas viverem hoje como relativistas não é por acaso; é, na verdade, consequência
da aposta na liberdade individual em detrimento da tradição e da ética.

Tradicionalmente, o conhecimento, sobretudo o conhecimento de si, não vem sem o aperfeiçoamento,


que não é obtido isoladamente, mas por meio de uma integração social.

Uma abordagem terapêutica que não leve em conta a Ética não conseguirá livrar o paciente do vazio
existencial relativista. No máximo, conseguirá resolver um ou outro trauma pessoal, ou torná-lo mais
funcional.

❖ Há dois modelos básicos de Ética (Victor simplificou), a saber:


➢ Ética Clássica: a realização humana depende da prática de determinadas virtudes, que implica
força, o esforço a superação para alcançar algo maior. Esta é a Ética que os gregos, romanos e
cristões defendiam e que alguns modernos defendem.

➢ Ética Moderna ou Pós-Moderna: há uma redução profunda da expectativa e da proposta de


realização humana pela formação do caráter, pelo amadurecimento da personalidade.

❖ A Ética que o Ítalo Marsili aplica é a Clássica, onde sabe-se que há uma verdade objetiva,
transcendente e a alma humana tem uma natureza específica e esta natureza se dá numa forma de
pessoa. O autoconhecimento clássico sempre esteve ligado com o autoaperfeiçoamento;

❖ Indivíduo humano X Pessoa humana


➢ Pessoa Humana: um modelo em que temos certas faculdades fundamentais a serem
desenvolvidas pela virtude, faculdade que nos integram às outras pessoas pela razão e
principalmente pela capacidade de amar, amar como um ato de liberdade e comunhão;

77
➢ Indivíduo Humano: não há a aposta de que somos pessoas humanas, de que somos livres,
racionais e capazes de amar, capazes de nos unir com outras pessoas. Pessoas que são indivíduos
ficam isoladas, desintegradas e perdem-se a si mesmas, se alienam. Mas só se pode falar em
alienação se há uma identidade a qual é preciso preservar. Alien = outro, eu só posso perder-me
a mim mesmo se eu tivesse eu como antes.

❖ Se a personalidade humana não tem uma forma, não é concreta, ela é líquida (Bauman), tudo se esvai,
tudo evapora e se perde no ar, de forma radical, e é isso que vivemos hoje em dia; são pessoas que
não tem personalidade, identidade, projeto real de vida.

❖ Cada período histórico tem a sua neurose, e a nossa é a perda de sentido, perda dos valores,
decomposição da estrutura social moral que antes existia;
❖ Não levar esta abordagem como algo pessimista e derrotista e idealizar o passado, de que no passado
tudo era perfeito e funcionava, que todo mundo amadurecia, tinha família, igreja, boas artes, música
etc. O drama da humanidade sempre existiu, sempre houve uma tensão entre a ordem da alma e a
ordem da polis, sempre houve uma tensão para alcançar a ordem da alma; Só que estas tensões se
revelam de determinadas formas históricas, importante entender a nossa experiência atual, o que
carregamos já de outros períodos;

ALTERNATIVAS AO “BOM SENSO”

Os problemas originados no relativismo serão tratados pelo terapeuta inexperiente por meio de uma
ferramenta que podemos chamar de “bom senso”. Como podemos notar de imediato, ela não é, nem
de longe, a ferramenta mais adequada a um profissional de psicoterapia.

Existem escolas de pensamento que podem fornecer uma ferramenta mais adequada. A Ética das
Virtudes, por exemplo, vem de uma tradição que remonta a Platão e Aristóteles, e oferece a visão de
que todas as instâncias da vida humana podem, em primeiro lugar, ser aperfeiçoadas e, em segundo
lugar, integradas. Esse aperfeiçoamento e integração devem se dar a partir de modelos concretos de
pessoas a serem imitadas.

Um terapeuta que utilizasse da ferramenta da Ética das Virtudes primeiro investigaria em um paciente
a sua maneira de lidar com os prazeres. Como meu paciente, perturbado com seu vazio existencial, lida
com os prazeres da mesa e da cama? Depois, investigaria seu modo de lidar com os outros.
Esses pontos constituem o que Platão chama de “Virtudes Cardeais”. Só a obra “Ética a Nicômaco”8 de
Aristóteles lista uma série de virtudes que o profissional pode utilizar para o auxílio de seu paciente.

8A Ética a Nicômaco é a principal obra de Aristóteles sobre Ética. Nela se expõe sua concepção teleológica e eudaimonista
de racionalidade prática, sua concepção da virtude como mediania e suas considerações acerca do papel do hábito e da
78
PAPO FILOSÓFICO ÍTALO MARSILI E VICTOR SALES – SEMANA 01
Ítalo Marsili

“Quando um cliente entra no consultório, entra com seu corpo, com sua genética, com suas vivências
familiares (uma hereditariedade social) , trejeitos herdados pela mãe, pai, tios, irmão mais velhos, toda
uma biologia, uma articulação entre a genética e o fator ambiental em que é exposto.

O homem não é só genético e hereditariedade, sofre influências da escola, conjunto de crenças, que são
adquiridas pelo que vivemos no nosso ambiente, nos livros que lemos e na cultura que estamos
inseridos; sua educação escolar e todo ambiente social e cultural que está inserido. Os dramas são
diferentes de acordo com as épocas e suas crises culturais. Essa moça do conto é uma caricatura deste
‘eu social’ que chega no consultório.

Queria que você falasse um pouquinho, ou só indicar que existe algo que está para além do Bom Senso,
que o Bom Senso não é a grande escola de filosofia moral. As vezes parece isso, o terapeuta fala eu
tenho ‘Bom Senso’ que pode indicar ou conhecer os caminhos que fazem o sujeito ser feliz. Existem
escolas que exploram esta arte do bem viver, esses caminhos que levam o sujeito serem mais ou menos
feliz.

Só para você pontuar, Vitor, aquelas escolas dos sistemas de filosofia moral, escolhas de sistemas éticos,
clássicos e contemporâneos que te parecem serem mais relevantes para compreender os caminhos de
felicidade do homem”.

Victor Sales

“A Ética das Virtudes é a escola que tem maior possibilidade de responder com mais propriedade esses
dilemas, pelo simples fato que ela tenta analisar o ser humano na sua completude. A tradição da ética
das virtudes, remonta a Platão, se desenvolve em Aristóteles e no ocidente culmina com Santo Agostino
e São Tomás de Aquino. Percebem que todas as instâncias da vida humana podem ser aperfeiçoadas e
integradas.

prudência. Toda racionalidade prática é teleológica, quer dizer, orientada para um fim (ou um bem, como está no texto). À
Ética cabe determinar a finalidade suprema, que preside e justifica todas as demais, e qual a maneira de alcançá-la. Essa
finalidade suprema é a felicidade, que não consiste nem nos prazeres, nem nas riquezas, nem nas honras, mas numa vida
virtuosa. A virtude, por sua vez, se encontra no justo meio entre os extremos, e será encontrada por aquele dotado de
prudência e educado pelo hábito no seu exercício. Vale destacar aqui que a ideia de virtude, na Grécia Antiga, não é idêntica
ao conceito atual, muito influenciado pelo cristianismo. Virtude tinha o sentido da excelência de cada ação, ou seja, de fazer
bem-feito, na justa medida, cada pequeno ato (além disso os valores da altura e local em que ele escreveu tal obra eram bem
diferentes dos leitores atuais; a palavra bem ou mal por exemplo apresenta significados totalmente opostos).

79
Tudo que a gente faz pode ser feito melhor se temos um de padrão de excelência. Um padrão de
excelência depende de modelos. Pertence ao bom senso se inspirar em alguém mais velho, mais
experiente, mais maduro, alguém que já desenvolveu esta faceta, disponível em minha personalidade.
E provavelmente esta pessoa não é perfeita em todos os aspectos da vida, portanto o ideal é que eu me
espelhe em vários modelos de outros aspectos da vida, visando realizar toda a minha personalidade.
A tradição clássica da Ética das Virtudes parte da ideia pedagógica da natureza humana, que o Bom Senso
também tem.
O Bom Senso sempre tem a ideia de que o ser humano é falível, ele é fraco e que portanto ele precisa
de um apoio e uma ajuda de instituições que lhe deem o critério de excelência e de pessoas que o
realizem de forma máxima. Ele precisa de caminhos concretos, de pessoas concretas que realizem estes
caminhos de critérios para desenvolver sua personalidade em todos os aspectos.
Vamos dar um exemplo hipotético do que um terapeuta, alguém que pudesse ajudar a personagem que
aliás não tem nome, é um eu lírico anônimo, ela vai vomitando todas estas tristezas, estes dramas e
aliás, olha como o conto termina, no final ela diz o seguinte:

“Tenho uma coisa apertada aqui no meu peito, um sufoco, uma sede, um peso, ah, não me venha
com essas histórias de atraiçoamos todos os nossos ideais, eu nunca tive porra de ideal nenhum,
eu só queria era salvar a minha, veja só que coisa mais individualista elitista, capitalista, eu só
queria ser feliz, cara, gorda, burra, alienada e completamente feliz”.

Claro que ela nunca seria feliz , primeiro que ela não seria feliz ‘burra’, no sentido moral, ela não seria
feliz exatamente alienada, dissociada do seu íntimo, da sua personalidade. Então como um terapeuta ou
alguém que pudesse ajudar esta mulher com base na ética das Virtudes iria ajudar? Iria começar a ver
os elementos da alma humana, como ela lida com os prazeres mais elementares da mesa e da cama?
Como ela lida com a paixão do medo? Como ela lida com as decisões que ela toma e quais são os
princípios norteadores da sua vida? e Como ela lida com os outros?

Isso é o que Platão chama das Virtudes Cardeais: Temperança, Prudência, Fortaleza e Justiça. Só isto já
poderia arrumar a vida dela. Não é um toque de mágicas, mas ela pode perceber que ser gorda, pode
ser uma obsessão alimentar, pode ter anorexia, bulimia, obesidade, ter uma compulsão alimentar, já é
um elemento e que toda a ciência médica e psiquiatra atua, é óbvio.

Mas qual a causa dela ter esta compulsão, a causa psicológica e moral? Em segundo lugar, ela pode ter
um medo, uma fobia, um problema qualquer. O medo é uma paixão muito profunda, por isso tem uma
virtude que a regula que é a virtude da Fortaleza ou Coragem (é muito mais amplos, isto é só uma
síntese).

80
Ela é uma pessoa atabalhoada, apressada, que não pensa, que fala sem pensar, isto é imprudente. Se
pegar a Ética Nicômaco de Aristóteles, você já aprende sobre um campo enorme do que é a Prudência,
que é a arte da tomada de decisões.

E a tomada de decisões dependem de dois fatores:


• Quais são seus princípios;
• Quais são os meios para realizá-los e se esses meios são adequados para esses fins e qual
contexto governa a situação.

E o outro ponto, é o que ela faz com os outros, a Justiça, o que ela deve aos outros, como ela serve os
outros, como ela trabalha, o que ela entrega. Isto é a virtude cardeal da Justiça. Sem Temperança, sem
Fortaleza, Sem Prudência e sem Justiça ela não tem os pontos cardeais de orientação moral.

Esta tradição clássica, perdura, sobretudo na igreja católica, que é a grande herdeira desta ética porque
o doutor comum da igreja Tomas de Aquino assimilou esta linguagem de Aristóteles. O que não quer
dizer que apenas, filósofos ou teólogos ou católicos intelectuais defendam este modelo há muitos outros
atores que também propõe este modelo, como o Aristotelismo contemporâneo de um autor como
Alasdair MacIntyre9. Autor muito interessante para psicólogos, porque seu primeiro livro tem como
objeto central a psicanálise de Freud, o Inconsciente. Depois ele estudou a escola de Frankfurt, escreveu
um livro sobre Marcuse10 - a Psicologia Política, ou a Politização da Psicologia, como a política e as
estruturas de poder geram o superego para os ressentimentos e como a liberdade sexual poderia
resolver o problema do homem.

Mais tarde, escreveu um tratado extraordinário “Depois da Virtude”, que norteia muito a reflexão: como
a Moral passou a ser pensada, depois que o conceito da Virtude foi supostamente superado, então ele
percebeu que acabou a ética. Depois da Virtude não tem Ética, depois da Virtude fica o Relativismo,
depois da Virtude fica a Fraqueza total , de quem não consegue escrever, normativamente. Porque não
se trata só de descrever, se trata de aperfeiçoar. A Virtude é o conceito descritivo e normativo que
permite um ideal de excelência e aperfeiçoamento da vida humana.

9
Alasdair Chalmers MacIntyre (Glasgow, 12 de janeiro de 1929) é um filósofo britânico principalmente conhecido por suas
contribuições para a moral e pela filosofia política, mas também é conhecido por suas obras no campo da história da
filosofia e teologia. Ele é pesquisador sênior do Centro de Estudos Contemporâneo Aristotélicos em ética e política (CASEP)
na Universidade Metropolitana de Londres, e professor emérito da Universidade de Nossa Senhora (Notre Dame).
10
Herbert Marcuse: (1898/1979) sociólogo e filósofo alemão naturalizado norte-americano, pertencente à Escola de
Frankfurt. Em suas obras escritas, ele criticou o capitalismo, a tecnologia moderna, o materialismo histórico e a cultura do
entretenimento, argumentando que eles representam novas formas de controle social. De origem judia[ assim que os
nazistas tomaram o poder em 1933, ele emigrou com sua família, primeiro para a Suíça e depois para os Estados Unidos. Após
seus estudos, nas décadas de 1960 e 1970, ele ficou conhecido como o principal teórico da Nova Esquerda e dos movimentos
estudantis da Alemanha Ocidental, França e Estados Unidos; alguns o consideram o "pai da nova esquerda".

81
Há outras escolas que poderia mencionar, mas eu acho que por amor a síntese o Aristotelismo Tomista
ou não em geral, porque depois o MacIntyre se torna um filosofo Tomista porque ele considera uma
abertura ao transcendente e as virtudes sobrenaturais, que me parece o fundamento da crise da cultura
e o fundamento de muitas patologias da nossa época que é o fechamento do mundo na imanência, que
se toca nos sentidos, no materialismo, secularismo, como se ficasse dentro de uma caverna. E as virtudes
teologais da Fé, Esperança e Caridade nos abrem para uma outra dimensão e redimensionam toda nossa
experiência humana.

82
SEMANA 02: CULTURA

Esta aula apresenta a fisionomia da cultura de massa, midiática e digital e faz considerações acerca
de suas consequências sobre a autopercepção.

CULTURA EDIFICANTE & CULTURA DIVERSIONISTA

❖ Nesta aula 2 quero apresentar a fisionomia geral da Cultura e fazer algumas considerações acerca
das consequências que nossa cultura de massa e principalmente midiática acarreta a nossa
autopercepção. A começar por um livro e por um argumento muito interessante de Mário Vargas
Llosa, prêmio Nobel de Literatura, num livro chamado “A Civilização do Espetáculo”, uma radiografia
do nosso tempo.

Atualmente, há um fenômeno de espetacularização da realidade e “propagandização” da vida corrente.


Isso se dá, sobretudo, com o uso desmedido das redes sociais. Há uma diferença entre cultura nos
sentidos humanista e diversionista. A primeira consiste na apresentação de um padrão de excelência.

❖ Cultura Edificante: é uma apresentação de um padrão de Excelência Formal. Formal no sentido da


atualização das potências de uma determinada linguagem e conduta.

As grandes obras de arte normalmente têm duas características: apuração técnica ou formal e conteúdo
moral perene.

1. Apuro Técnico ou Formal: com uma linguagem que é elaborada, desenvolvida, que é refinada.
2. Conteúdo Moral Perene: atualmente as pessoas se sentem desassistidas no sentido Moral, não
tem quem seguir, do ponto de vista moral.

Nesta dimensão edificante, a arte registra um padrão moral no horizonte de uma cultura, mantendo
vivos os modelos que estimulam e motivam. São exemplos a Ilíada de Homero, em que há o
estabelecimento do padrão moral do guerreiro;

❖ Aquiles que é justo e ao mesmo tempo “ misericordioso” (numa época pré-cristã). Um guerreiro que
tem sua honra maculada, sai da guerra e volta por um bem comum que é o destino da sua pátria...
Foi muito importante para a cultura grega manter viva a chama do heroísmo Moral.
❖ Nós temos que ser HERÓIS, não no sentido literário, mas no sentido ético de quem busca sempre a
superação, a excelência e da perfeição de nossa existência. Por isso é importante a cultura manter
modelos que nos estimulem e motivem.

83
❖ A cultura do ponto de vista do mero entretenimento, da mera diversão, da cultura pop, se torna
muitas vezes de um consumo imediato para mera “fruição” e esquecimento em seguida. Pense nos
filmes que assistiu ao longo da vida, quais personagens você se lembra ?
❖ Se você leu os diálogos de Platão, certamente você será incapaz de esquecer o herói Intelectual que
Platão criou.
O padrão de excelência intelectual desenvolvido por Platão, a partir do ser humano concreto que foi
Sócrates;

❖ Platão: criou um padrão de excelência sobre seu grande mentor Sócrates; honesto, íntegro,
pedagógico, maiêutica, para ajudar as pessoas a despertarem do marasmo, de dogmas do senso
comum. Platão despertou a inteligência de toda o ocidente de 2.400 anos, desenvolvendo a partir do
modelo, de um ser humano que nada escreveu, chamado Sócrates, todo o padrão de excelência
intelectual e moral . Uma vida de busca pela verdade, de refinamento das palavras, da inteligência,
de pensamento, de contraste dialético com os erros, porque a verdade será sempre uma sobrevivente.

E os santos, reconhecidos pela Igreja como padrão de excelência espiritual, mostrando possibilidades
reais.
❖ Igreja: nomeia santos mostrando para seus fiéis que existe um padrão de excelência espiritual a ser
seguido.

Nós também temos de ser heróis no sentido ético, de quem busca sempre a superação, a excelência, a
perfeição da existência. Hoje, no entanto, do ponto de vista moral, as pessoas não têm a quem seguir. A
cultura do mero entretenimento, a cultura pop, se torna um produto para a fruição imediata e
esquecimento em seguida.

Nossa época é marcada pelo consumismo: a ideia de que podemos comprar produtos, experiências, e
esgotá-los, para consumi-los novamente no dia seguinte.

❖ A personagem que analisamos na aula passada, não tinha heróis, santos para se inspirar. O que ela
consumia? Que tipo de cultura, que tipo de literatura, de música, de artes plástica essa personagem
consumia?
❖ Que tipo de cultura o homem contemporâneo consome? Nossa época é uma época
predominantemente consumista. O consumismo está muito ligado ao materialismo e ao
economicismo. É a ideia que podemos comprar produtos, comprar experiências e consumá-las e
esgotá-las. Para no dia seguinte, ou no mês seguinte, ou no ano seguinte eu possa consumir
novamente numa lógica de mercado.
❖ A ideia do mercado oferecer produtos a serem consumidos, que logo se obsoletizam, que logo se
esquecem e se preterem em frente a novos produtos. Esta obsoletização constante gera uma ideia
de descartabilidade.

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O mercado oferece produtos que logo se tornam obsoletos, gerando a ideia de descartabilidade. O
sociólogo Zygmunt Bauman percebe que a lógica do consumo é projetada nas relações sociais, as quais
se tornam descartáveis e substituíveis.

❖ Sociólogo Bauman diz que nos tornamos consumistas de relações sociais descartáveis. A lógica que eu
preciso inovar, melhorar, modernizar, experimentar, e vou consumir outras pessoas, outros amigos,
outras esposas, outros maridos, outros namorados. Vou buscar sempre um frenesi do novo, do
diferente.

O resultado da cultura do espetáculo consumista, da descartabilidade, é a total alienação, ou seja, a


ausência de um núcleo, de gravitação existencial para a órbita da existência.

❖ Quando não temos EIXO por onde gravitar, perdemos a estrutura.

A CULTURA DO ESPETÁCULO NA INFORMAÇÃO

A cultura do espetáculo também se dá no nível da informação. Vivemos num mundo de informação


diária, também chamado de jornalismo (da palavra francesa jour, dia).

❖ As informações têm que ser de hoje, isto gera um presentismo, isto gera uma prisão no agora.

O ser humano tem três dimensões de tempo: passado, presente e futuro; Santo Agostinho ainda dizia:
“cuja unidade transcende na eternidade”. Mas, no presentismo, sentimo-nos escravizados pelo hoje;
as coisas não têm duração, permanência, estabilidade ontológica.

❖ Vivemos embriagados pelas notícias do dia. E nós queremos nos noticiar diariamente, somos
produtores das notícias. Queremos dar um espetáculo as nossas vidas por meio das redes sociais.

O mecanismo de um story é um exemplo eloquente disso, pois em 24 horas ele desaparece. Isso mostra
a dimensão líquida do tempo, da experiência.

❖ Ficamos perdidos neste mar de informações.

Do mesmo modo, a lógica da ciência contemporânea de atualização periódica implodiu o conhecimento


científico. O resultado da informação constante é a obstrução da inteligência, pois ela precisa fincar
raízes em algo sólido, ou seja, precisa de formação.

❖ Se você quiser se atualizar na sua área de pesquisa científica, na sua área de trabalho, você não tem
mais meios de fazer isto. Ficará afogado em uma série de artigos acadêmicos e científicos que
diariamente são produzidos ao longo do mundo todo.

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❖ O resultado da informação constante, recorrente, incessante é a obstrução da inteligência. A
inteligência precisa fincar bases, raízes em um solo sólido, em algo estável. Ou seja, nós precisamos
de formação.
❖ T.S. Eliot, um dos grandes poetas do século XX, dizia nuns versos reflexivos do poema ‘A Pedra’:
▪ ‘Onde está a vida que perdemos vivendo?
▪ Onde está a sabedoria que perdemos no conhecimento?
▪ Onde está o conhecimento que perdemos na informação?’

❖ Vejam que ele trabalha com três níveis de Inteligência: Informação, Conhecimento e Sabedoria.
❖ Hoje nós temos, quase exclusivamente Informação. Nós sabemos os fatos, conhecemos os fatos já
espetacularizados, pelas mídias e redes sociais, num processo sistemático de desinformação.
❖ Atualmente, nós somos informados, super informados e portanto desinformados, também, mas não
temos Conhecimento para interpretar estas Informações.
❖ Nós carecemos de uma visão geral de mundo, de uma hierarquia de valores, de uma hierarquia de
princípios que nos permitam considerar o que há de vil, ignominioso, baixo e o que há de alto, nobre,
honrado, belo. Perdemos a capacidade de comparar, coisas que seriam incomparáveis. Nós perdemos
a capacidade, exatamente, orientar estavelmente em nossa vida, por causa desta cultura jornalística,
descartável e comercial.

A cultura jornalística descartável e comercial se dá principalmente pela primazia do visual sobre o


verbal.
❖ Este é um ponto muito importante da cultura contemporânea. A educação clássica, a educação geral,
até mais ou menos o século XX se deu a partir do desenvolvimento da linguagem verbal, a partir da
capacidade que nós temos de verbalizar, de dizer o mundo por palavras, de traduzir o mundo, todas
as experiências do mundo pela palavra. Daí a prioridade da literatura, dos poetas nessa formação. A
capacidade de nós temos de imaginar, isto é, de desenvolver as imagens a partir dos signos verbais.
❖ Por isso pensamos na educação como sendo Português e Matemática. Então temos a capacidade
analítica desenvolvida pela matemática, e a capacidade sintética e simbólica desenvolvida pelo
português.

Desde o século XX, com a ascensão dos meios visuais de comunicação de massa, houve uma saturação
de imagens e progressiva decadência verbal.
❖ Atualmente temos uma saturação de imagens e uma decadência verbal, proporcionados pelas TVs,
tablets, celulares. Os alunos de universidades, não têm mais capacidade verbal, de fazer uma
dissertação de 30 páginas, sem erros gramaticais a cada linha. Além disso tem a perda da capacidade
e não conseguem expor ideias novas.

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Não é só o erro gramatical que está em jogo aqui, mas a perda da capacidade racional e especulativa de
usar o pensamento.
❖ Isto porque estão expostos constantemente, desde a infância, a telas e a imagens. As imagens os
privam da capacidade da imaginação. A saturação de imagens torna a pessoa menos imaginativa.
Ao passo que a multiplicação do vocabulário dado pela literatura e pela linguagem elevada, torna a
pessoa capaz de articular as palavras.
❖ Um dos grandes humanistas de nosso século, George Steiner (falecido recentemente), era professor
das melhores universidades do mundo (Princeton, Yale, Oxford), ele dizia, para pessoas que estão,
certamente, infinitamente superiores da média do brasileiro, que “acompanhou a decadência da
inteligência ocidental ao longo da vida”. Homem que foi criado escutando música
erudita e lendo e seus alunos foram criados vendo televisão e cinema.
❖ Estes grandes poetas tiveram a capacidade de perceber o valor da cultura. O valor
intelectual que tem uma dimensão moral. E isto se esvazio por completo no nosso mundo digitalizado,
virtual.

O DESEJO MIMÉTICO11 NAS REDES SOCIAIS

❖ Qual é o mecanismo das redes sociais no contexto do Hedonismo e desse Exibicionismo.


❖ Quero propor para vocês uma interpretação do botão “Curtir” a partir da Teoria Mimética, de René
Girard.

De acordo com a Teoria Mimética, de René Girard, há uma inclinação natural do ser humano a formar
comunidades.

❖ Nós nascemos dentro de uma família, então queremos sempre nos integrar. Esta integração se dá por
imitação. Aprendemos a falar, andar, imitando.

Somos seres miméticos que desejam o que os outros lhes fazem desejar.
❖ Se pensarmos na propaganda política e/ ou comercial, temos sempre modelos, que consomem objetos
ou que votam em determinados candidatos que nos inspiram a segui-los. É o mecanismo muito básico
da moda e da propaganda em geral.

Todo desejo é inspirado num modelo que torna o objeto desejável. Se for um modelo próximo no tempo
e espaço, torna-se um concorrente.

11
Mimético: Semelhança que tomam certos seres vivos, seja com o meio no qual habitam, seja com outras espécies
protegidas. Reprodução maquinal de gestos e atitudes.
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❖ Isto gera o pecado capital – fundamental da inveja. Há um misto de admiração, emulação12 e inveja.
Se pudéssemos nos colocaríamos no lugar dele, e concorrência e rivalidade.

Mas há modelos distantes de nós com os quais não nos comparamos, porque não os podemos alcançar.

❖ Principalmente no campo espiritual. Nos deparamos com certos modelos que estão muito acima de
nós, que não podemos alcançar.

Segundo Girard, a mediação externa era característica da sociedade aristocrática: um aristocrata era
quem cultivava a excelência. Na sociedade democrática e liberal contemporânea, porém, todos estão
igualados, logo, há uma crise mimética em que um imita e quer estar no lugar do outro.
❖ As pessoas querem ostentar mais que o outro, e aí que entra o Exibicionismo: “Preciso postar e mostrar
para os outros, o que eu tenho, o que eu compro, o que eu sou, o que eu como, onde estou, o que eu
faço...”

A lógica do consumismo se complementa com o exibicionismo das redes sociais. O ímpeto originário é
positivo: alguém que compartilha uma coisa boa gostaria que os outros também a tivessem. No entanto,
acaba gerando inveja e orgulho. A inveja é querer ocupar o lugar do outro, enquanto o orgulho é querer
ser invejado.
❖ A vaidade é querer que me cobicem, que me desejem é querer que queiram estar no meu lugar, no
meu papel.

O narcisismo (expor-se, apresentar-se vaidosamente) e o voyeurismo (querer ver os outros, invadir sua
vida privada) se complementam.
❖ Atualmente as pessoas vivem mostrando suas casas, seus quartos, suas vidas... “O seu narcisismo
sacia o meu voyeurismo. O meu voyeurismo patrocina e promove o seu narcisismo”.

Um like nas redes sociais significa não apenas que alguém apoia aquilo, mas também que emula, quer
participar do que acontece. Há uma simbiose entre aprovar, compartilhar e imitar. Por isso, as redes
sociais são uma cadeia mimética interminável.
❖ Nas redes sociais as pessoas simplesmente repetem, a linguagem, os trejeitos, a moda, as roupas, as
palavras, as correntes, as tendências.
❖ Nada mais vaidoso do que querer criar moda, do que querer ser imitado, cobiçado, querer ser
compartilhado, querer ser seguido. É isto que Girard está dizendo, ‘Nós queremos ser seguidos.’

12
Emulação: sentimento que leva o indivíduo a tentar igualar-se a ou superar outrem; competição, disputa, concorrência
(ger. em sentido moralmente sadio, sem sentimentos baixos ou violência).
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A cultura do espetáculo, do consumo e da rivalidade mimética tem um efeito moral muito específico: a
falta de introspecção, sem a qual não há autoconhecimento. A intimidade e a interioridade se perdem
e, sem elas, não há como amar e relacionar-se efetivamente com as pessoas.
❖ Não temos mais nossa intimidade, alienamos nossa intimidade. Alienar no duplo sentido, não só de
vender, pois você pode vender e ganhar um dinheiro com isso. Mas você renunciou a ela. Você
entregou a sua intimidade.
❖ Perde-se desta maneira a interioridade, o que é próprio, o que é só meu, o que eu só entrego para
quem eu quiser, a quem eu achar realmente que merece gozar da minha intimidade.
❖ Isto é uma crise que esvazia a personalidade humana, pois esta tem uma interioridade que merece ser
cultivada, que merece ser desenvolvida.
❖ Por isso a cultura no sentido edificante que nos interioriza. Temos que ter um tempo de leitura diária,
um tempo para escutar a boa música, a grande música, porque a boa música depende de algo que
não conhecemos mais, que é o Silêncio, a Introspeção, a Reflexão, a Paciência, a Calma.
❖ Se você escuta uma sinfonia, como a 3ª. de Beethoven, você tem um movimento que demora 18
minutos para resolver. Dezoito minutos é uma eternidade para a geração apressada, imediatista. Com
18 minutos você já viu a vida de todo mundo, que mal conhece nas redes sociais, já ‘zapeou’ por todos
os canais, por todos os sites, ´prints’, stories nas redes sociais.
❖ Sem certas virtudes como da Paciência e do Silêncio você não vai conseguir desenvolver esta
introspeção de que depende o seu autoconhecimento.
❖ Esta cultura do espetáculo, essa cultura de massa, do consumo , da rivalidade mimética, da inveja, do
orgulho, toda esta cultura que nós estamos inseridos , tem um efeito moral muito específico: a falta
de introspecção, silêncio e interiorização sem a qual não nos autoconhecemos.
❖ Não temos mais autoconhecimento numa cultura midiática como a nossa. E se não temos isto, não
temos como amar, como nos relacionar efetivamente a partir de quem somos e a partir, de fato, de
quem elas são. O que temos é um teatro das ‘Sombras’.

O que temos é uma sociedade espectral da Aparência, da Imagem e, portanto, da Vaidade.

ESCOLHA DOS MODELOS

O homem antigo tinha como momentos de pausa o teatro e a liturgia, em que estava diante de algo
totalmente distinto de si. Com o passar do tempo, o teatro passa a aproximar-se dos dramas cotidianos.

As artes plásticas e a arquitetura também sofrem um processo de realismo, que se torna mais concreto
com o cinema e a televisão na comunicação de massas, e ainda mais agudo com o uso do celular.

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Antes, sabiam-se mais ou menos quais eram as possibilidades do homem, por causa da formação a que
se era exposto. Hoje, há uma diminuição do conhecimento das possibilidades superiores, por causa da
tendência ao realismo na formação e na cultura.

Uma parte das neuroses e sofrimentos aparecem porque o homem está olhando para outros homens,
fomentando o que Girard expôs: um ciclo de vaidade e orgulho. Girard pode ser aplicado
magistralmente no sentido da ascensão do espírito.

No entanto, no campo dos modelos há dois riscos: o de animalização, pela ausência, ou de cristalização,
comportando-se anacronicamente como a figura exemplar.

PAPO FILOSÓFICO ÍTALO MARSILI E VICTOR SALES – SEMANA 02


Ítalo Marsili

Tudo que você expôs pode ajudar muito alguém que está diante de uma alma humana, seja um
terapeuta, pode ser algum orientador intelectual, espiritual, moral físico, professores, pedagogos etc.
Quando você fala de todo este fenômeno POP e articulas com o desejo mimético do Girard, a primeira
coisa que aparece é o seguinte: com a entrada da televisão e do cinema, nesta grande ciranda das
comunicações de massa, e nas casas, entra uma coisa que é o Realismo.

Se por um lado o teatro e liturgia que era aqueles momentos de pausa na semana, do sujeito antigo, por
assim dizer, eles eram submetidos ali na liturgia, algo absurdo para a mentalidade contemporânea. Então
você está vendo um sujeito no teatro, que é completamente distinto de mim, a começar pela
maquiagem, pela roupa, pela forma de se expressar. Não temos como remontar historicamente uma
peça grega, mas conseguimos imaginar, a partir do texto e dos relatos. Uma peça grega começava 8
horas da manhã e ia até as 16h da tarde, quando o sol começava a se por. Eram de 8 a 10 horas de
espetáculo, mas um espetáculo diferente do que estamos acostumados. Personagens muito distantes,
por um lado da trivialidade cotidiana com umas falas diferentes da nossa.

Depois a liturgia que era um tipo de espetáculo, então um rito sacrificial no templo de Apolo, com seus
tempos, as suas oferendas, os cânticos, eventualmente, os hinos, as invocações etc. Isso vai se
desenvolvendo ao longo da história e o teatro também sofre ali de um Realismo e começa a se tornar
cada vez mais próximo dos nossos dramas cotidianos.

Depois entramos na era do Romance, onde os problemas triviais da corte, começam a aparecer “Será
que vou encontrar o amor de minha Vida?”; “O príncipe gosta de mim?”; “Eu, como uma plebeia, posso
me apaixonar por um príncipe?” Todo o teatro e a literatura vão se aproximando muito da nossa vida
cotidiana e trivial vida, isto numa parte da história das Artes.
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Depois a própria história das Artes e da Arquitetura e Artes Plásticas, vão também sofrendo este mesmo
processo de Realismo . Uma aproximação do nosso olho, do que vemos do dia a dia.
Se pegarmos as manifestações artísticas antigas, existe ali uma.... o homem vulgar ‘’Ahh, aquilo está
pintado errado, as pessoas não são assim...” O artista não dominava ainda a técnica da perspectiva, não
dominava a técnica do Realismo. Até que chega aquele momento do Realismo, aquele momento
histórico que a gente identifica como o Renascimento no qual começamos a ver as Artes Plásticas ou
quadros se aproximando muito daquilo que vemos no dia a dia.
Se pegarmos uma tela de Raffaello, ou se pegamos uma pintura de Michelangelo, Da Vinci pensamos ‘É
realmente as pessoas são assim, são parecidas com isto que ele está pintando, portanto isto é melhor. ’
Esta é uma primeira ideia que pode vir na cabeça. Isso está mais próximo da realidade. Então vemos um
Realismo aparecendo tanto no Teatro, quanto nas Artes Plásticas.

Depois chegamos na era da televisão e do cinema e parece que é uma ruptura grande com o que era o
Teatro e por mais que uma história de cinema seja absurda, por exemplo o filme 007 , algo trivial da
cultura POP, ninguém vai pular da colina, vai entrar em um Boeing caindo, vai voar e entrar no Boeing
e salvar, isto não é realista. A história pode não ser realista, mas o modo como está sendo filmado e
contada é ‘lá é uma pessoa e um avião’ que são realidades que estão muito próximas de mim.

Depois desse cinema e televisão que eram grandes pontos de entretenimento do homem, isto é, as
pessoas paravam para assistir aquilo, hoje a gente vê, como fenômeno cotidiano, as pessoas não perdem
mais tanto tempo assistindo o telão, mas a telinha, o celular na mão e passam a se informar e a se
entreter com algo que é mais realista. Teatro, Cinema e Televisão e Stories, Instagram, Facebook, Feed.

Para mim fica muito claro, quando chega um paciente, uma pessoa, um sujeito com drama espiritual ,
drama intelectual, drama filosófico, um drama cotidiano das suas relações ... esta pessoa, em primeiro
lugar, ela não tem hierarquia, ela não tem mais claro na cabeça dela ou na alma dela, quais são as
possibilidades do homem. Um pouco por causa desta crise de sentido, é por esta crise de formação.

Antes eu sabia, mais ou menos quais eram as possibilidades do homem porque eu estava sendo exposto
a uma formação, que hoje podemos tomar como absurda, porque não realista. Então, de fato há uma
diminuição da possibilidade do homem conhecer quais são as suas possibilidades superiores. Uma parte
das suas neuroses, uma parte dos seus sofrimentos aparecem porque o homem está olhando para outros
homens e tudo que Girard ensina para gente, se torna um grande circo de vaidade e orgulho somente.
As críticas que eu vi ao Girard: ‘ah, parece que isso aí é uma apologia a inveja, uma apologia ao orgulho’,
olha essas críticas são absurdas, claramente absurdas. Mas de fato dá para compreender, numa
comunidade como a nossa, onde só se apresenta esses desejos mais vulgares ou realistas. Realmente,
eu não preciso do Girard, que eu não preciso aprender a desejar uma coisa que o outro está desejando,

91
porque isto já está dentro de mim. É (rsrsrs) uma confusãozinha, estou jogando uma coisa, estou falando
mais rapidamente, para podermos desenvolver isto em conversa.

Mas se o sujeito ele é exposto a um desejo que o Sófocles13 colocava para gente, aos desejos que a
liturgia coloca para gente, o Girard se aplica magistralmente no sentido de uma formação, de uma
ascensão, na possibilidade de ascensão do espírito.

Numa sociedade como a nossa hoje, onde há uma tendência ao Realismo, a alma do homem se diminui,
justamente por esta tendência ao Realismo no grande aspecto da formação e da cultura. Se por um lado
o Realismo é importante, para ver o que a realidade me mostra, mas a realidade não é só este aspecto
material trivial cotidiano. A realidade é muito superior e ampla e se o terapeuta não tem isto na mente,
se ele acha que a realidade é ‘desejo, necessidade fisiológica’, realidade é, ‘tem que pagar boleto’ , etc.,
isto é uma parte da realidade, mas e as outras partes da realidade? Sobretudo que entram na gente de
outra forma, que só a arte pode comunicar para gente.

Meu olho captura estas narrativas cotidianas, triviais mesmo... E as coisas fantásticas? E as possibilidades
fantásticas, não ilusórias, ficcionais, mais fantásticas do homem mesmo? As narrativas de um herói, as
narrativas de um santo, contados de um modo possível que a inteligência possa capturar. Isso não
parece de fato algo que foi se perdendo ao longo da história, da civilização, da cultura , quando você põe
na aula: ‘o olho captura uma coisa, então as artes visuais entregam uma coisa, que é boa, é possível, mas
tem uma coisa da narrativa, que o ouvido também captura alguma coisa, e aqui há uma disjuntiva que
parece ser uma disjuntiva que tem que estar articulada num lugar específico. As artes visuais elas dão
para gente algo que está concreto, que é fixo, está estável. As narrativas dão para gente algo que eu
preciso de calma, tempo para poder ouvir aquilo.

Existe uma poesia muito antiga, século XIII, “Cede audito solo tutto creditor (Eu preciso ouvir para
acreditar)”. Tem uma coisa que foi se perdendo, essa aposta no visual, no imediato, no feed, no story...
Por um lado amplia uma instalação no mundo, mas por outro lado diminui uma ascendência, uma
possibilidade de ascender.

Então, realmente, as artes visuais parecem que dão uma oportunidade de você estar ampliado no eixo
horizontal, mas o eixo vertical que é o eixo da ascensão e da queda, isto parece estar muito diminuído,
e deve haver aí uma articulação assim possível, que se perde, e se o terapeuta não está atento a isso,
ele irá sempre apostar numa figura de homem diminuída.

13
Sófocles: Sófocles foi um dramaturgo grego, um dos mais importantes escritores de tragédia ao lado de Ésquilo e Eurípedes,
dentre aqueles cujo trabalho sobreviveu. Suas peças retratam personagens nobres e da realeza. Sua obra-prima "Édipo Rei"
o consagrou como o maior poeta trágico da Antiguidade Grega. Sófocles, Ésquilo e Eurípedes foram considerados os três
grandes poetas dramáticos da Grécia Antiga.
92
Victor Sales

Sem dúvida. A história da cultura ocidental pode ser lida como ascensão de um padrão realista de
representação estética e uma crise deste padrão. E Realismo pode ter duas acepções, pode ser um
Realismo ligado ao Idealismo. O Idealismo aqui não é a fuga do real em nome de algo abstrato ou algo
mental, mas é a ascensão do real a sua consecução, a sua realização. Quando eu falo, ‘Eu tenho um
ideal’, isto é extremamente positivo.

Quando vimos na aula passada a perda dos ideais, na demissão dos ideais, a gente está preso nesse
Realismo que é mais um Naturalismo e um Prosaísmo. Então a representação imagética nas redes
sociais, do que simplesmente acontece, nos prende em possibilidades mínimas, muito diminuídas, muito
rebaixadas de pessoas prosaicas, de miméticos inferiores.

Então o gênero é um gênero cômico, um gênero da palhaçada, da bobagem. O Machado de Assis, por
exemplo, que foi um dos grandes escritores de nossa língua, percebia que, estes anti-heróis, esses
‘Quincas Borbas’, esses ‘Braz Cubas’, esses idiotas, esses medalhões, eram tão estúpidos, tão ridículos,
tão patéticos, gente tão mesquinha, tão invejosa, tão pequeno burguês, no pior sentido, sem senso de
heroísmo, sem senso de grandeza, mostrando que é possível buscar patamares superiores.

A arte tem esta função. Isto pode se dar no Cinema, na Fotografia, nas Artes Plásticas, você mencionou
três dos maiores Renascentistas, o Da Vinci, Michelangelo e Raffaello, eles eram realistas e idealistas,
porque a realidade que eles representavam esteticamente, não se reduzia as formas materiais, mas
também a forma espiritual. Portanto não só o horizonte, mas também o vértice.

É claro que é necessário formação, que é a Forma em Ação. Forma, este conceito filosófico tão
importante, é a possibilidade de um ente, é o que estrutura um ente, e a matéria é a desordem, é a
estrutura amorfa. Quando a matéria com forma, ela ganha um ideal de excelência e de realização e um
dinamismo, então a formação é uma dinâmica. Sem modelos miméticos, nobres, honrados, dignos e sem
representações destes modelos, para aqueles que não tiveram a fortuna de conviver com eles, a gente
não tem educação. E por isso vivemos em um mundo em que não há educação. Mas como não é possível
educar a próxima geração, não é possível não apresentar algum modelo, os modelos são os piores, os
modelos são esses heróis do Cazuza que morreram de overdose.

Você falou do James Bond, do 007, a simbólica do heroísmo, a narrativa do herói ainda permanece em
boa parte das narrativas, nas novelas, nos cinemas. Mas de uma forma relativamente cínica, de uma
forma relativamente desdenhosa, de uma forma relativamente cômica, sem grandeza. Isso o Nietzche
percebeu muito também, estes são os últimos homens de sua obra, que perderam suas asas e rastejam

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pelo chão, apodrecendo tudo que roem. É um conjunto de pessoas que perderam as asas e ficam
corroendo e apodrecendo tudo que rói.

Então eu acho que a recuperação da educação estética, a recuperação da grande arte, a recuperação da
literatura... e porque eu digo a ‘recuperação’? Porque não tem nenhuma possibilidade da arte
contemporânea gerar alguma coisa boa para a próxima geração. Por outro lado a cultura tem essa
grandeza que a gente não perdeu o que de bom já foi construído.

Se você vai começar a estudar Filosofia, você não deve não começar, a não ser por Platão. Você não vai
começar por Nietzche, por exemplo, não tem nenhum sentido começar pelo fim. Se você quer estudar
pintura, você vai começar pelo apogeu do representacionismo pictórico14 no Quattrocento15 e
principalmente no Renascimento. Se for estudar música, vai começar com Bach, qualquer conservatório
de música no mundo tem Bach como princípio. Então Platão na Filosofia, Bach na música, Raffaello na
pintura, Pelé no futebol. Todas as áreas terão suas grandes referências, o grande modelo, o grande
paradigma ideal. Platão, Bach, Raffaello, Pelé, existiram, Pelé está vivo, são seres humanos vivos e a
cultura os perpetua e perpetua a sua vitalidade cultural, perpetua a possibilidade de renovação.

A história da música é tão didática, para isso que, se você ouvir Bach, não é possível que isso tivesse
continuidade, é tão grande, e tão alto. E o que aconteceu? Vieram 15, em duas gerações, em três gerações
no século XIX, sabem por quê? Porque eles aprenderam, porque eles ouviram e buscaram fazer um pouco
melhor. O Schubert seguia Beethoven na rua, ele tinha vergonha de falar com Beethoven pois o
considerava um rei, um Deus e muitos consideram que Schubert chega ao nível de Beethoven. Isto é
emulação positiva, de uma imediação externa, que não é vaidosa, na verdade o que está em jogo ali é .
uma forma superior de beleza, de perfeição, de moralidade de comunicação. Um projeto de grandeza,
sem este projeto de grandeza não há educação, não há cultura e a descendemos, voltamos para o nível
fisiológico.

O resultado social da animalização, é o caos social, é a total desintegração da sociedade, um bando de


animal no cio, que não tem logos para se comunicar, para se ensinar e para aprender. Quando eu vou só
buscar meu pequeno prazer, que vai concorrer com o teu pequeno prazer, a gente vai litigar. Então o
resultado social da animalização é o caos total. Por isso a Justiça é uma virtude tão importante, e ela
depende da Prudência, da Temperança, da Fortaleza.

14
Representação Pictórica: Linguagem comunicativa composta por desenhos, tabelas e gráficos, dentre outras formas de
representação visual. Se constitui em uma linguagem de comunicação baseada em desenhos, gráficos, tabelas e outras
formas de representação visual. A prática pedagógica em Matemática exige elementos diversos na sua constituição.
15
Quattrocento: refere-se aos eventos culturais e artísticos do século XV na Itália, analisados em conjunto. Engloba tanto o
final da Idade Média (arte gótica e Gótico Internacional), quanto o começo do Renascimento. Os artistas voltaram-se mais às
formas clássicas da Grécia e Roma
94
Ítalo Marsili

Sim e neste grande campo, o risco do modelo são dois:


• Não ter modelos, que leva a isso tudo, não se tem um modelo claro que seja esteticamente
apreciável ou moralmente válido etc. vai levar ao risco da animalização. Vai passar a desejar
aquilo que o outro deseja e se o que o outro deseja é algo vulgar, banal etc., isto não é
propriamente um desejo, por assim dizer.

• O outro risco é uma cristalização dos modelos, que é algo bastante perigoso. O iniciante quando
ouve isto tudo não pode cair numa outra coisa que é o anacronismo (que não está de acordo com
sua época)... então, ‘Bom mesmo é Bach, ficarei escutando Bach o dia inteiro, vou me comportar
como Bach’ , então ‘Bom mesmo é Camões, então vou começar a falar como Camões falava’...

Eu vi acontecer algumas vezes em certos grupos, uma queda no anacronismo, seja cultural,
comportamental ou espiritual. A virtude aqui está na articulação entre ‘eu tenho modelos mas eu sou
eu’. Se cristalizamos no modelo, viramos uma caricatura. Precisamos de uma exposição aos modelos,
um amor aos modelos, mas sem a neurose de ‘ Serei infeliz se eu não for exatamente igual ...., se eu não
usar a gravata que ele usava, se eu não falar do jeito que ele falava’, isto eu vi acontecer algumas vezes
no consultório.

Ao mesmo tempo que deve haver um polo ativo na busca dos modelos , tem que haver um polo passivo,
bastante vivo em si , ‘deixa o modelo me iluminar em mim’ . O Amor aos modelos não faz com que a
gente perca a nossa identidade, mas pelo contrário, que a gente conheça os limites da expansão, quais
são os limites meus, aonde eu posso chegar, com estas ideias na cabeça, com esta família, com esta
cultura, onde eu posso chegar? O terapeuta tem que estar atento.

Victor Sales

Estou de perfeito acordo contigo e uma das definições tuas que eu mais gosto é que Vocação é chamado
de ‘mais circunstâncias’. Não podemos perder de vista o nosso contexto, a nossa circunstância, as nossas
contingências. Aí vem um erro muito grande de um certo Positivismo que é abstrair por completo a
história, tanto a história geral, quanto a história individual. Para esses que querem imitar Camões ou
Bach, precisamos lembrar que Camões foi altamente inovador a partir dos seus modelos e Bach foi
absolutamente revolucionário a partir dos seus modelos. A grandeza está na dinâmica da imitação e não
no estático, não na cristalização como um leão empalhado, que não tem vida não tem dinamismo.

O dinamismo é a inovação a partir da perpetuação do que é rico, estrutural. A história da música do


século XVII, XVIII e XIX é a história da riquíssima dinâmica de certas descobertas musicais desde o
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Renascimento. Então você descobre uma possibilidade musical, e a partir desta, alguém multiplica,
aprofunda, a dimensiona, até você chegar a um primeiro modelo perfeito de fuga de polifonia com Bach.

Perfeito em aspectos insuperáveis, mas não quer dizer que vai parar, vem outros, tem o
desenvolvimento até que em uma crise. Sempre há modelos, a atenção é ‘quem são eles?’. O homem
maduro, reflexivo, ele elege livremente seus modelos, a partir dos influxos que ele já teve. E o homem
imaturo acha que não tem modelos, vive numa lógica de autenticidade ilusória “Eu só sou eu, só devo a
mim, não tenho modelos”, isso também não cabe.

Os modelos são idolatrados e divinizados, esse é o problema. O desejo metafísico de algo perfeito é tão
grande que você tem o grande risco de rebaixar esta perfeição que é um atributo divino a uma pessoa e
com isso você a diviniza e a idolatra.

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SEMANA 03: O homem: ser intermediário entre animal e Deus

Esta aula apresenta a psicologia moral de Platão, que propõe uma análise do interior do homem, isto
é, da alma humana.

O HOMEM: SER INTERMEDIÁRIO ENTRE ANIMAL E DEUS

A República, de Platão, é a obra mais importante da filosofia ocidental.

❖ A República, de Platão, é a obra mais importante da Filosofia ocidental; e muitas vezes é considerada
uma obra sobre política. Para Platão a política é uma questão Psicológica, e a Psicologia é uma
questão, eminentemente moral.
❖ Platão fez uma análise da crise do seu tempo a partir de uma análise interior do homem, isto é da
ALMA HUMANA.

Muitas vezes, é considerada uma obra sobre política, mas para Platão a política é uma questão de
psicologia, e a psicologia é uma questão moral.
❖ Este modelo de Psicologia Moral ou de Ética Normativa é importante ser recuperado em um contexto
de crise da Psicologia pela sua adesão ao modelo cientificista: ou a alma é reduzida ao corpo, ou a
alma é sempre descrita sem uma faculdade que tem que ser aperfeiçoada por uma virtude.

É importante recuperar este modelo no contexto atual de adesão ao cientificismo ou positivismo. Platão
nos permite pensar as faculdades básicas do ser humano a partir de seu ideal de realização (virtudes).
❖ Nestes moldes cientificistas ou positivistas, ou a alma é reduzida ao corpo, ou as funções da alma são
simplesmente descritas sem que se considere como uma faculdade que tem que ser aperfeiçoada por
uma virtude.
❖ O modelo de Platão, nos permite pensar nas faculdades básicas do ser humano, mas a partir do ideal
de sua Realização, na forma de virtude.
❖ Este é o primeiro traço muito distintivo da Psicologia Clássica da Psicologia Moderna e
Contemporânea. Em segundo lugar, há uma preocupação em integrar estas faculdades e estas
virtudes, na Ordem do Amor.

Há também a preocupação em integrar as faculdades na “ordem do amor” – que era como Santo
Agostinho chamava a virtude. Ou seja, equacionar os desejos, vontades, apetites e inclinações em uma
unidade orgânica de sentido.

O ideal moral em questão é a humanização e divinização do ser humano. Platão e outros filósofos
clássicos perceberam que o homem é um ser intermediário entre o animal e Deus. Temos a possibilidade

97
de descer, reduzindo-nos a animais, se vivemos entregues às paixões mais primitivas; ou de acender, se
obedecemos a uma dimensão mais elevada da alma e nos santificamos, divinizamos.
❖ Se convivemos com pessoas que mentem, matam, roubam, violentam, que são simplesmente
entregues as suas paixões mais primitivas, mais elementares, podemos dizer que estas pessoas foram,
de algum modo animalizadas; vivem numa selvageria, vivem numa barbaridade.
❖ Por outro lado, podemos dizer que existem pessoas que vivem uma obediência a uma ordem elevada
da alma, a uma dimensão superior da alma. Essas pessoas se divinizam, se santificam, ascendem em
um patamar da humanidade.
❖ Tanto a decadência quanto a elevação são possibilidades humanas fundamentais.

Platão representou isso na famosa Alegoria da Caverna, que simboliza a essência da filosofia platônica
e da pedagogia: libertar os prisioneiros da manipulação, da ignorância.
❖ Este modelo merece ser conhecido por nós, porque inspirou boa parte das pedagogias e dos ideais
morais da Psicologia Ocidental.
❖ Alegoria da Caverna: Esse modelo diz que nascemos presos, no fundo de uma caverna escura, que tem
uma lareira, que projeta uma luz que permite que certos intelectuais sofistas manipulem marionetes,
e falem, e nos manipulem por imagens espectrais e palavras. Até que um filósofo percebe que isto
tudo é uma grande farsa, isto tudo é uma grande manipulação (hoje diríamos- ideológica e na época
diriam - retórica), e busca a verdade das coisas, fugindo da caverna e escalando uma montanha (a
caverna é subterrânea) íngreme e escarpada. Ele vai se ferindo, se macerando, até chegar à libertação
de fora da caverna onde a luz do sol banha a realidade das coisas e ele é capaz de contemplar a
verdade das coisas e depois retornar para tentar libertar outros prisioneiros.
❖ Isto é a essência platônica e da pedagogia, libertar os prisioneiros do erro da manipulação, da
ignorância, porque a maior inimiga da verdade não é a ignorância, mas é a pseudoverdade.

Platão reflete profundamente sobre o que é a verdade e como conhecê-la. Nossa questão aqui não é
ontológica ou epistemológica, mas moral – como praticar, como encarnar a verdade. E a verdade moral
depende da consecução das faculdades básicas do ser humano.
Os antigos dividiam o mundo entre gregos e bárbaros. Era uma visão restrita à cultura helênica: aqueles
que sabiam grego pertenciam à civilização.

❖ O que é a civilização, significa as coisas da cidade. A cidade é o local onde resolvemos nossos
problemas pela linguagem. A cidade é o local onde há o direito, onde há a polícia, onde há o judiciário,
e também o local da cultura humana. Local onde a alma humana é cultivada pela educação, pela
escola, pela linguagem refinada, pelo teatro, pela religião.
❖ Fora da cidade, tanto os gregos como os romanos, tinham uma noção que o homem do campo era
animalizado.

98
O homem do campo, por outro lado, era bárbaro, um homem violento que não se comunica, mas busca
simplesmente destruir o que está à sua frente.

❖ A visão que nós temos dos bárbaros, com a queda do império romano do ocidente, no século V, era
de um homem violento. educação, pela escola, pela linguagem refinada, pelo teatro, pela religião.
Era uma visão que temos de pelo menos uma tribo germânica, que eram os vândalos, que geralmente
chegavam nas cidades, tocavam fogo nas casas, estupravam todas as mulheres,
❖ comunica, que não tenta resolver e que não tenta entender o outro e que muito menos tenta entender
a si mesmo. Então bárbaro era aquele que tem o ímpeto de destruição.

Platão, ao olhar para esse quadro bárbaro, percebia que tudo depende do interior, isto é, de como a
alma é formada.

❖ Depende de como a alma é formada, e de como a pessoa organiza sua vida do ponto de vista interno.
❖ Para Platão, a Filosofia era filha da Medicina. Platão tinha dois grandes modelos básicos: Pitágoras
(pai da Matemática) e Hipócrates (pai da Medicina).

Platão queria superar a Matemática e a Medicina, integrando seus saberes em um conhecimento


universal. Ele fez isso ao fundar a Academia, precursora da universidade medieval.

Filosofia é amor ao conhecimento e a toda a realidade. Do mesmo modo que a realidade é complexa,
a pessoa humana traz em si a complexidade do cosmo, porque participa de diversas dimensões do ser.

O HOMEM EM RELAÇÃO À SOCIEDADE

A alma humana tem pelo menos três dimensões: a vegetal, a animal e a intelectual.

Platão identificou que o corpo tem um ideal de excelência: a saúde; e tem uma ciência para promovê-
la, chamada Medicina. Deve, então, haver uma ciência, que hoje chamaríamos de Psicologia, para tratar
da saúde da alma.

❖ O que nós temos na nossa cultura em crise é por um lado o reconhecimento da Medicina, como uma
ciência de ponta, como ciência válida, como ciência demonstrada como experimentos empíricos,
testada e portanto toda a difusão das farmácias pelas esquinas e da cultura médica exacerbada na
nossa época, e o médico com uma autoridade, para além do que era devido. No banquete de Platão
o médico é debochado, ele quer explicar o que é o Amor por motivos orgânicos, por motivos
fisiológicos .

O verdadeiro psicólogo, ou verdadeiro filósofo, – os dois são praticamente sinônimos – é quem entende
que o amor é um desejo de perfeição e de união com o que é perfeito. Para entender a alma humana, é
necessário entender o que é o amor.
99
❖ Para entender a ALMA HUMANA tem que entender o que é o AMOR e a ORDEM do AMOR.

Platão busca um modelo de perfeição do corpo para que haja uma sociedade sadia e para que,
reciprocamente, essa sociedade gere homens sãos; ou seja, há um ciclo que pode ser virtuoso ou vicioso.

No plano histórico ou social, não haverá sociedade ou pessoa perfeitas; o que temos de fazer é equilibrar
as instituições sociais que aperfeiçoam as pessoas, para que sejam estas capazes de superar as limitações
do meio e estabelecer padrões superiores de excelência.

FACULDADES DA ALMA HUMANA

Para Platão, temos quatro inclinações fundamentais. São como partes da alma. Como esta é imaterial e
intangível, podemos relacioná-la a partes do corpo.

❖ É muito difícil de ver a alma, já que ela é imaterial e intangível, então nós temos que pensá-la. E o
nosso pensamento depende também de nossas experiências sensíveis.
❖ A melhor maneira de “ver” a alma é representando por três partes do corpo: o Baixo Ventre, abdômen
entre a genitália e o estômago; o Peito e a Cabeça. Em quarto lugar temos uma ALMA ordenada junto
de outras ALMAS ordenadas em comunhão, que será a virtude da Justiça.

Cada uma das partes corresponde a uma faculdade da alma que, se bem desenvolvida, se torna uma
virtude; do contrário, torna-se um vício.

BAIXO VENTRE:
Abrange o abdômen, entre o estômago e a genitália. Consiste no desejo de vida individual e de vida da
espécie. Compara-se ao que Freud chamava de princípio de prazer, o Eros como apetite para a mesa e
desejo sexual para a reprodução. São os desejos mais poderosos da vida humana, porque ela depende
deles.

❖ Para Platão estes desejos era os mais poderosos pois a vida depende disto. Isto
não pode depender de escolha. Ninguém escolhe ter FOME, ninguém escolher
ter APETITE SEXUAL. São desejos inatos. Podemos falar de instinto, de libido. Nós
somos passivos em relação a esses desejos. É a parte BAIXA da ALMA!
❖ A imagem simbólica que Platão faz desta alma é um Monstro Policéfalo, é a
cabeça da MEDUSA. O que caracteriza esta parte é a dispersão, é a difusão, é
não saber por onde se vai, o que se quer, um monstro com várias cabeças e esses desejos podem ser
autocontraditórios. É ceder ao prazer.

100
A imagem simbólica dessa parte da alma é um monstro policéfalo, como a cabeça da Medusa, indicando
sua característica de dispersão, pois os desejos podem ser contraditórios.

Faculdade da alma: Apetite.

Virtude: Temperança, também chamada de continência ou autodomínio (controle ou a resistência ao


prazer).

❖ Toda faculdade se for bem desenvolvida é uma VIRTUDE e se for mal desenvolvida é um VÍCIO. E tanto
a Virtude ou um Vício são hábitos ou do Bem ou do Mal.
❖ Por isso a educação é algo muito importante para a alma humana, porque estabiliza os nossos
DESEJOS. A alma tem que ter um senhor, a alma tem que ter um governador, a alma tem que ter quem
mande, e é claro que não vai se propor que quem mande é o Baixo Ventre.
❖ A virtude da alma é não ceder os prazeres. É a Temperança, o Autocontrole, o Autodomínio.

PEITO:
Dimensão da pessoa que tem honra, nobreza, um ideal de permanência e a vontade desenvolvida.

❖ A faculdade desta parte é a VONTADE.

Platão falava de um espírito irascível, uma força de caráter que mobiliza o corpo e se relaciona ao desejo
de poder.

❖ Este espírito é uma energia psíquica, que persegue o Bem, a Verdade e que mobiliza o nosso corpo.

Faculdade da Alma: Vontade.

Virtude: Coragem ou Fortaleza (resistência ao desprazer).

❖ Esta é a Virtude dos guerreiros, a Virtude da virilidade. Virilidade e da RESISTÊNCIA ao desprazer.


❖ Esta faculdade está ligada a um ideal que está na cabeça. Ele regula a paixão do medo. Então nós
temos essa paixão do prazer, que é passiva e a paixão do medo que também é passiva. Nós só seremos
ativos e livres quando desenvolvermos a virtude da Prudência e chegarmos à cabeça.

Dimensão intermediária, até aqui somos como um animal semidomesticado que consegue conter-se.

❖ Um animal que consegue conter um pouco seus instintos como um cachorro bem treinado.
❖ Isto era muito valorizado pelos gregos, pois tinham uma cultura atlética e guerreira, pois eles tinham
que domar e sacrificar seu corpo, com dietas, atividades físicas, com corridas, com maratonas, com
jejuns, abstinência e com competição.
❖ Esta visão é que está associada ao Cristianismo. A competição é no nosso interior, eu tenho que
crescer, evoluir, me aperfeiçoar, ser melhor.
101
❖ No primeiro momento temos o desejo de PRAZER (Baixo Ventre), e esta segunda faculdade é um
desejo de PODER tem dupla dimensão: ou dominar os outros ou servir aos outros.

CABEÇA:

❖ Em terceiro lugar, além do Prazer e do Poder, aqui está a dimensão propriamente psicológica e
filosófica. Há o desejo de Verdade, que não se confunde com o Prazer e com o Poder.

Simboliza o desejo pela verdade. Na estrutura anatômica do corpo, a cabeça é a parte alta do homem.
É também a parte imaterial, divina, pois o que colocamos na cabeça não é tangível, diferente do
alimento.

❖ A cabeça é a parte mais alta do homem, é imaterial, é a parte divina do homem. O que eu coloco na
minha cabeça, não é tangível, não há materialidade e finitude.
❖ Platão percebeu que a Inteligência é alguma coisa que a gente “coloca”, a gente alimenta a nossa
mente e ela pode ficar, na memória, por exemplo. Ela pode permanecer na nossa alma.

Faculdade: Inteligência, que pode ser teórica ou prática (prudência).

Virtude: Prudência.

Ela se volta às verdades eternas e imutáveis; ao articulá-las com a experiência corrente, forma um
critério de excelência, em que há verdadeiro Prazer e Poder, pois estão regulados pela Verdade.

❖ O Prazer também estava muito ligado a Beleza. O Poder muito ligado a Bondade. Mas além da Beleza
e da Bondade existe, existe um terceiro transcendental do ser que é a Verdade.
❖ Isto é o oposto do que a Modernidade / Pós-Modernidade trouxe: “A verdade subjetiva” . Não existe
uma “verdade para mim”, é uma perspectiva, uma versão. É a minha percepção, mas não é a Verdade,
que deve ser universal.
❖ Platão achava que neste momento era o momento de amadurecimento, é o momento da ascensão da
personalidade ao que é universal, inclusive compreender tudo isto. Tudo isto que estamos fazendo é
um exercício da cabeça, da parte alta da alma. Reconhecer que existe Prazeres, reconhecer que existe
Poder e reconhecer que existe Verdade.
❖ E qual seria resultado da Temperança, da Fortaleza e da Prudência, porque a virtude esta faculdade
superior da cabeça tem duas dimensões: a Inteligência é, por definição, Teórica e Prática. Existe uma
razão Teórica e uma razão Prática.
❖ A Modernidade / Pós-Modernidade aposta as todas as fichas na razão Teórica e menospreza a razão
Prática. A razão Prática é esta razão Moral da Psicologia Moral. A razão Teórica é o que chamamos
de Ciências da Natureza, para conhecer coisas diferentes do homem.

102
❖ Porque quando o homem se autoconhece teoricamente, ele também passa agir sobre si. Toda ação
humana é baseada numa visão de homem, numa versão que pode estar mais ou menos errada. Se
você considerar que o homem é um animal passional e egoísta, como Thomas Hobbes,16 o pai do
pensamento político moderno, que promove uma ‘guerra de todos contra todos’, então você tem que
conter este animal, tem que policiar esse animal. Boa parte da filosofia política moderna acredita
que nós temos que policiar a sociedade, colocar câmeras em todos os locais, colocar guardas em cada
esquina e policiar como se fossemos um bando de animais que não conseguem se autogovernar, ou
que não se pode governar pela linguagem.
❖ Porque o modelo clássico fala que somos animais sociais, porque racionais, mas isto depende de uma
aposta muito profunda na capacidade racional do homem se autogovernar e se comunicar com os
outros. Entrar em comunhão a partir do logos17, a partir da razão, a partir da linguagem.
❖ Todo o Direito é baseado neste ideal, de que as leis podem regular as ações sociais e se houver
desavenças ou divergências sobre elas, existe um poder impessoal, imparcial ou neutro que é a
jurisdição do Estado para equacionar esta divergência.
❖ Então a parte alta tem a Prudência e a Inteligência como virtudes. A Prudência é a que mais nos
interessa aqui, porque uma Psicologia saudável, uma alma saudável e íntegra é uma alma exatamente
Prudente.
❖ Usamos a Prudência como sendo espécie de previdência, ‘Ah, eu sou prudente, economizo dinheiro’;
‘Eu sou prudente, não me exponho aos riscos’; ‘Eu sou prudente, escuto mais do que falo’... Então
tendemos a ver a Prudência de uma forma um pouco diferente que os gregos achavam.

A linguagem corrente a entende como uma forma de cautela, previdência. Na verdade, governa nossas
ações diante do imprevisto, ao mesmo tempo em que origina um plano de vida, relacionando princípios
gerais e casos particulares.

16
Thomas Hobbes (1588/1679): foi um matemático, teórico político e filósofo inglês. Na sua obra Leviatã (1651), explanou
os seus pontos de vista sobre a natureza humana e sobre a necessidade de um governo e de uma sociedade fortes. Cada um
de nós tem direito a tudo e, uma vez que todas as coisas são escassas, existe uma constante guerra de todos contra todos.
No entanto, os homens têm um desejo, que é também em interesse próprio, de acabar com a guerra e, por isso, formam
sociedades através de um contrato social. Tal sociedade necessita de uma autoridade à qual todos os membros devem render
o suficiente da sua liberdade natural, de forma que a autoridade possa assegurar a paz interna e a defesa comum. Defendia
a ideia segundo a qual os homens só podem viver em paz se concordarem em submeter-se a um poder absoluto e
centralizado. O Estado não pode estar sujeito às leis por ele criadas pois isso seria infringir sua soberania.
17
Logos: é a lógica por trás de um argumento; é persuadir uma audiência usando argumentos lógicos e evidências de apoio.
É uma técnica persuasiva usada frequentemente na escrita e retórica. Os sofistas usaram o termo para significar
discurso; Aristóteles aplicou o termo para se referir ao "discurso fundamentado" ou "o argumento" no campo da retórica e
o considerou um dos três modos de persuasão ao lado do ethos e do pathos. Os filósofos estóicos identificaram o termo com
o princípio divino de animação que permeia o Universo.

103
❖ A Prudência é a Inteligência Prática, a Razão Prática, que governa todas as nossas ações durante as
ocorrências da vida e que também faz um Plano de Vida, uma organização da nossa existência. O que
chamamos normalmente de profissão, estado de vida....
❖ A Prudência é a constante relação entre estes princípios gerais de vida e os casos concretos e
particulares, que vão reforçando ou desafiando, estes nossos princípios ou valores.
❖ O homem prudente é um homem examinado, que está constantemente refletindo sobre estes
princípios.
❖ Estas são as 4 virtudes cardeais, na tradição Clássica.
❖ Então em quarto lugar está a virtude da Justiça. A virtude da justiça tem uma imagem o corpo
organicamente integrado. O ideal de saúde, é o ideal de harmonia das partes do corpo, dos humores
do corpo, exatamente dos Temperamentos, que estão integrados na nossa alma e no nosso corpo.

Por fim, há a alma ordenada junto com outras almas ordenadas em comunhão, o corpo organicamente
integrado que é uma imagem da virtude da justiça.

O ideal de saúde individual corresponde a um ideal de saúde social, e a saúde social é a justiça, em que
cada um recebe e dá o que lhe é devido e obrigado. Por isso, uma personalidade madura é altamente
útil aos demais.
❖ Isto é a ideia da Saúde Social, onde cada um faz suas funções e elas estão integradas numa unidade,
numa ordem.

❖ Então você tem que ser Prudente consigo, você deve se autoconhecer, se autodominar, se
autogovernar, isto é estabelecer padrões de excelência, critérios, objetivos, pelo domínio dos prazeres
do Baixo Ventre, o seu ímpeto de Poder, o seu ímpeto de Verdade ou de adaptação e assimilação da
verdade das coisas e por fim dar aos outros tudo isso.

É importante ressalvar que o modelo de Platão não quer dizer que a inteligência busque sempre os
objetos perfeitos e de modo perfeito; ao mesmo tempo, a sensibilidade também pode captar de modo
inteligente o que vem da realidade.

❖ Por isso que uma personalidade madura, formada, é uma personalidade altamente útil aos demais,
serve aos demais.
❖ Platão estava pensando na formação dos cidadãos, estava pensando também na formação de
soldados, de guardiões, de trabalhadores manuais. Então todas estas ‘castas / classes sociais’ (eram
muito estancadas) a partir destas faculdades da alma.

❖ Esta transposição da Psicologia para a Política é altamente problemática em Platão, se considerarmos


estanques, como se houvessem castas fechadas, porque vai contra o dinamismo da alma humana.

104
❖ Todos, segundo Platão, podem ser filósofos, isto é, podem desenvolver a parte alta da alma, se tiverem
a educação devida. E filhos de filósofos podem ser trabalhadores manuais senão conseguirem
assimilar a educação filosófica.

Assim como educamos a faculdade superior da alma, devemos ter uma educação própria das partes
inferiores, para que não haja a ideia de que o corpo sempre puxa para baixo, para a infelicidade,
enquanto a mente puxa para cima. Em uma pessoa saudável, deve haver um tipo de fruição da
inteligência nas sensibilidades inferiores.

❖ Por um lado Platão percebeu o dinamismo da alma humana, portanto o dinamismo da sociedade. Por
outro lado, parece ele ter indicado um certo fechamento das classes sociais, como se filhos de pedreiro
fossem necessariamente pedreiros. Isto gera um modelo antiliberal, muito contrário a própria
liberdade humana.

❖ O que nós temos hoje em dia? Que partes da alma são valorizadas na nossa cultura? Quais são os
ideais de excelência? Quais são os ideais formativos de educação? É elevar o homem da animalidade
primitiva, da animalidade espontânea e inata dos desejos baixos para um patamar superior de
verdade objetiva e universal? Para servir a sociedade com o Poder conquistado sobre si mesmo; ‘Eu
conquisto poder sobre mim e portanto eu imprimo poder sobre o outros’. Claro que uma pessoa que
tem poder sobre si, tem de algum modo poder sobre aqueles que não tem poder sobre si. Porque as
pessoas que têm poder sobre si são ATIVAS. Nós só começamos a ser Ativos, propriamente
protagonistas da nossa personalidade, quando nós chegamos ao patamar intermediário e
principalmente ao patamar superior.

❖ O que eu percebi, analisando a cultura contemporânea, que nossa sociedade é pautada


predominantemente na satisfação dos prazeres baixos:
➢ Consumismo - pecado capital da Avareza e da Ganância;
➢ Gula – desejo de saciar os prazeres da mesa imediatamente;
➢ Luxúria – é o sexappeal do desejo sexual desenfreado que está plasmado exatamente no culto da
pornografia.

❖ Que tipo de música nós ouvimos? Isto Platão deixou bem claro. A alma humana depende diretamente
do tipo de música que ela escuta. Você é interiormente o tipo de música que você escuta. Porque a
música não tem apenas o efeito do conteúdo moral que é transmitido.

105
❖ Platão estudou tudo que tinha para estudar na sua época sobre música, estudo as formas jônicas, as
formas dóricas18 e toda uma estrutura de uma música que não sabemos bem como eram, porque as
músicas não eram escritas , porque não se sabe ao certo, porque não temos como ‘bater o martelo’,
como sabemos em relação a uma música de Bach, por exemplo do século XVIII, porque ele escreveu e
nós sabemos exatamente como funciona a notação musical. A notação musical foi uma invenção
medieval atribuída ao Papa Gregório Magno, canto Gregoriano que é precursor da música polifônica
ocidental.

❖ Platão percebeu que a música, se for uma música de vibração, é uma música que nos animaliza e que
nos deixa na parte baixa da alma, nos deixa preso na caverna dos sentidos elementares. E este tipo
de música é um tipo de música que excita, que ela dá fome e apetite sexual, deixa nosso corpo
vibrando. E esta vibração é um vício, porque ela se repete, então você vai buscar de novo esta música.

❖ Na primeira aula eu citei a personagem de Caio Fernando Abreu, ela foi a boate gay e outras
atividades predominantemente do corpo , natação, ioga (elevação do corpo), patins e ela buscou a
vibração do corpo. Mas ela não conseguiu porque provavelmente estava presa neste tipo de vibração.
Então quem está acostumado com boate, não consegue praticar ioga, não consegue praticar a
oração.

❖ Há tipos de músicas que acalentam o nosso corpo, que consolam o nosso corpo e nos permitem a
elevação da alma. Então o tipo de música é muito importante para o que estamos defendendo aqui.
Música, não só, como artes das musas, mas como o alimento natural de nossa alma.

❖ Nas escolas existe uma desarmonia entres as disciplinas, pois tem mais aulas das ciências humanas e
exatas, em detrimento a Educação Física e Artística. Então as músicas que escutamos vão moldando
a nossa alma.

A interpretação dualista, maniqueísta do platonismo está equivocada.


Outra imagem platônica que ajuda a compreender é a do cocheiro que
governa dois cavalos. É um modelo triádico, em que há um ponto de
conexão entre a inteligência abstrata e o corpo bruto.

18
Modos Musicais: são um tipo de escala com características melódicas distintas. Na música, no contexto da Harmonia modal,
o Modo musical também se refere ao conjunto de escalas com diferentes organizações intervalares/organizações sonoras
criadas conforme a cultura de algumas regiões da Grécia Antiga, chamadas de Modos gregos (Jônio, Lídio, Mixolídio, Dórico,
Frígio, Eólio e Lócrio).

106
PAPO FILOSÓFICO ÍTALO MARSILI E VICTOR SALES – SEMANA 03

ÍTALO MARSILI
Esse modelo maravilhoso que você apresentou pode dar uma ideia de que, por um lado existe uma
faculdade no homem, uma parte no homem que ela é perfeita em si, nos objetos que busca e na
operação que realiza para buscar esses objetos, seja a Inteligência ou qualidades superiores. Do outro
lado teriam as faculdades que são imperfeitas em si e buscam objetos imperfeitos em si , que seriam as
faculdades inferiores. No entanto sabemos que a coisa não funciona deste jeito, que a Inteligência
sempre busca de modo perfeito os objetos perfeitos, e notamos que muitas vezes não acontece isso.

Lá na Escolástica19, falaram para gente que nada está na inteligência sem ter passado pelos sentidos.
Quando sou bebê começo a perceber o mundo, me afeta de modo passivo, e vão se formando fantasmas
ali em mim. Os fantasmas ficam dentro de mim, sem pretensão de localizar tecnicamente onde estes
fantasmas ficam, e começamos a pensar, raciocinar, inteligir a partir destes fantasmas.

Dito de outro modo, estamos aqui nesta sala, estamos vendo coisas, sentindo sabores etc. e os
fantasmas vão sendo criados dentro da gente. Você está falando um monte de coisas, estas coisas estão
entrando pelos olhos, pelos ouvidos das pessoas e vai sendo guardado em algum canto, para que num
momento futuro quem está assistindo a gente possa sacar isso e operar a partir disso que está em algum
canto, esse fantasma que está formado, por assim dizer.

Os animais também têm sentido, eles veem, eles sentem, tem um sabor que aparece neles e no entanto
nestes animais nunca chega a se formar os Conceitos, do mesmo modo que são formados em nós. Os
bichos andam e comem, mas não vamos vê-los teorizar sobre andar e comer, simplesmente eles andam
e comem.

A partir daí, um filósofo espanhol do século XX, Xavier Zubiri20 propõe uma ideia da Inteligência sem
ciente, quer dizer, na nossa própria sensibilidade deve haver uma coisa que é distinta dos animais, para
que a própria sensibilidade já possa capturar de modo inteligente aquilo que vem da realidade. Como se
a própria sensibilidade tivesse uma inteligência também.

19
Filosofia Escolástica foi um período da Filosofia Medieval caracterizada por uma maior valorização da filosofia
aristotélica e do conhecimento científico defendido por Aristóteles na Antiguidade. Os responsáveis por esse resgate são os
monges Alberto Magno e Tomás de Aquino.
20
Xavier Zubiri foi membro da Escola de Madrid, onde conviveu com filósofos como José Ortega y Gasset, Julián
Marías e Pedro Laín Entralgo. A filosofia de Zubiri foi categorizada como um "materialismo realista",[6] que tentou reformular
a metafísica clássica sob uma perspectiva totalmente compatível com a ciência moderna
107
Do mesmo modo que a gente deveria educar esta faculdade superior da Alma, Inteligência, ou a cabeça
que busca a verdade, deveria haver uma educação própria das partes inferiores, do tórax, do ventre,
como está proposto pelo modelo do Platão.

E aqui que está a reflexão, gostaria que não houvesse uma disjuntiva, como houvesse assim, o corpo
sempre puxa para baixo ou sempre puxa para a infelicidade ou sempre puxa para um lugar de desgraça,
de prejuízo, de tragédia, de desintegração, e a mente, ou a cabeça sempre vai te puxar para cima. Numa
pessoa saudável, não só numa alma saudável, somos feitos de corpo e alma, deveria vir algum tipo de
fruição de Inteligência das faculdades inferiores também, que é uma coisa que se deva buscar, se deve
pretender. O terapeuta quando está olhando para uma pessoa olha... ‘não é que você sempre vai ter
que encontrar desgraça, prejuízo, tragédia, sofrimento, infelicidade’ nessas operações que são, por
assim dizer materiais. No homem, diferente dos animais, existe algo de sublime, de elevado, espiritual,
de transcendente na própria operação da sensibilidade.

Daí pode-se derivar uma série de abordagens específicas, humanas, por assim dizer. Não gostaria que
houvesse no consultório, num confessionário, numa palestra de orientação de pessoas, essa disjuntiva,
então de um lado você tem o seu corpo que sempre vai te oferecer sofrimento, os teus desejos carnais,
do ventre, do outro lado você vai ter a inteligência, a tua mente sempre te oferecendo alegria. A verdade
é que a mente também, as vezes encontra objetos, operações intelectuais, que vão te levar a
infelicidade.

Os grandes ‘edifícios’ filosóficos de filósofos que pensaram, e inteligiram e estavam em uma atividade
puramente intelectual , não é porque a atividade é puramente intelectual que os levou a um lugar bom,
o sujeito pode ter ido para a tragédia, para o crime, para ....... construção de proposta política, proposta
psicológica, ou proposta para a própria vida espiritual dele, que o leva a infelicidade.

Por outro lado, tem pessoas que tem uma sensibilidade mais ou menos ordenada, organizada e que não
tem grandes voos intelectuais, mas são pessoas que podem ter uma vida muito saudável.

VICTOR SALES

Esta pergunta é maravilhosa porque permite superar o modelo dualista e maniqueísta21 de interpretação
do Platonismo que afetou diretamente o Cristianismo na heresia do Maniqueísmo.

E é relativamente simples de responder, com Santo Agostinho , que foi ‘Maniqueu’ por nove anos. Ele
era Platônico, se tornou Maniqueu e começou a perceber que o modelo de separação ontológica, radical
de corpo e alma, sendo que corpo, a carne, a matéria, é trevas, puxa para baixo, é demoníaco, é ruim, é

21
Maniqueísmo: é uma filosofia religiosa sincrética e dualística fundada e propagada por Manes ou Maniqueu, filósofo
heresiarca do século III, que divide o mundo simplesmente entre Bom, ou Deus, e Mau, ou Diabo. A matéria é intrinsecamente
má, e o espírito, intrinsecamente bom
108
limitado, é pérfido; e da alma é luminosa, o espírito é inteligente, vai para o céu, é errado, é
antropologicamente errado. E ele percebeu que o nexo que une a alma humana é o AMOR, e por isso a
ordem do Amor. O corpo tem o Amor, o Amor integrado e o Eros é exatamente é o desejo de Amor
perfeito que começa na carne, que começa no corpo. A tua referência a Zubiri é interessante porque
uma educação do Amor, uma educação dos sentidos e principalmente uma integração, já educa estes
apetites.

E veja que interessante, eu falei prazeres da mesa e prazeres da cama. O prazer na mesa, já é um prazer
humanizado. Se eu te convido para tomar uma cerveja, um vinho, um café, para jantar, para almoçar,
para vir na minha casa para comer, estou, por um lado em primeiro lugar te oferecendo um alimento,
um álcool, dá um prazer enorme, o café dá um prazer enorme, um churrasco etc. dá um prazer enorme,
mas na mesa, na casa.

Da mesma forma na cama, e veja, usamos toalhas na mesa, lençóis na cama, tem um ideal de higiene
que não é higienista, tem um ideal civilizado na aculturação dos desejos animais. Então toda alimentação
que não seja na mesa e é claro que podemos comer fora de uma mesa, não é isso que vai nos
desumanizar, claro que podemos ter relações íntimas fora da cama, não é isso que vai nos animalizar.
Mas se não tivermos um critério cultural e social mínimo para comer e para ter relações íntimas,
estaremos em um nível sub-humano.

O nível humano é o nível do Amor integrado, o nível que vamos realizar o apetite da mesa, que é digno,
que é bom, o apetite da cama, que é digno, que é bom, integrado com nossas faculdades superiores. E
Santo Agostinho que é visto erroneamente, como tendo perpetuado seu maniqueísmo de juventude na
tradição cristã, isso é um erro tremendo, foi o filósofo que enfatizou a encarnação e a ressureição do
corpo glorificado. Ou seja, o corpo tem uma dimensão digna, não só porque Cristo assumiu essa natureza
humana, a segunda pessoa da Santíssima Trindade, como ele tem um destino eterno, coisa que o
Maniqueu não podia nem sonhar, porque ele não via como paginar, corpo e espírito, carne e espírito.

Aí eu defendo, com toda tranquilidade, Agostinho e Platão que não são suscetíveis de ser articulados
com este dualismo que vem do Oriente, dualismo Persa de Zoroastro22, então isto é fonte de neurose, é
fonte de falta de educação do corpo, educação dos sentidos.

22
Zoroastro: O Oxford Dictionary of Philosophy considera Zoroastro como o primeiro filósofo. Também foi descrito como o
pai da ética, o primeiro racionalista e o primeiro monoteísta (acreditando em apenas um Deus), bem como o primeiro a
articular as noções de céu e inferno, julgamento após a morte e livre arbítrio. A religião fundada por Zoroastro foi a
primeira grande religião mundial e teve influência significativa em outros sistemas religiosos e filosóficos, incluindo
as religiões abraâmicas, o budismo, o gnosticismo e a filosofia grega.
109
Tem uma outra imagem do Platão que a gente pode pensar, que é a do cocheiro com os cavalos, é uma
imagem muito interessante. Estas três partes da alma, correspondem, não agora a Baixo Ventre, Peito e
Cabeça, mas a um cavalo preto, a um cavalo branco e um cocheiro.

Então nossa alma é um cocheiro, então pensa num ‘uriga’ que tinha que lutava na guerra, tinha dois
cavalos, uma arma e uma carroça e ele tinha que as vezes ficar sem conduzir os cavalos para atirar.

E o equilíbrio para Platão está no cavalo branco, porque o cavalo preto ele é muito forte, mas ele é
indomável. Por ser tão forte, ele não é dócil, ele tem uma força que tem que ser cooptada, você precisa
desse cavalo. O cavalo branco, ele é cavalo, e ele que equilibra o cavalo preto, mas ele não é tão forte
quanto o cavalo preto, mas ele é forte, ele é cavalo. E qual a diferença entre o cavalo preto e o cavalo
branco além da força? A docilidade do cavalo branco em relação ao cocheiro. Então olha como Platão
vai construindo, esse daqui tem menos força, mas ele tem inteligência e é domesticável, e o cocheiro, é
a cabeça, aquele que governa. Ele precisa governar os cavalos, ele não pode tirar o cavalo preto, ele não
pode tirar o cavalo branco. É o modelo trinitário, é o modelo tripartido, não dualista, você precisa das
três dimensões.

Você precisa de um ponto de conexão entre a inteligência abstrata, e o corpo bruto. Então entre o animal
e o anjo, não somos anjos encarnados em animais. Não é esse o modelo antropológico adequado,
personalista, pessoal. O homem é o intermediário entre este cavalo preto, que nós somos, que nós
temos, e que tem que ser domando nos seus próprios termos, ‘Ao corpo, é preciso dar-lhe um pouco
menos que o necessário. Senão, atraiçoa.’ dizia
Josémaria Escrivá23. Então o corpo é traiçoeiro e
temos que saber disso, mas temos corpo e por isso a
gente regula o corpo, com dietas, com regime,
comendo na mesa. E precisamos de um cavalo
branco, bem domado, forte e dócil, que é a Vontade.
Porque a Inteligência por si só, não tem força . Este é
o ponto.

A Terapia da Guerrilha, o livro, quando li pela


primeira vez, que era uma ênfase na virtude da Fortaleza, da Resistência, da Resiliência, da Tenacidade,
da Vontade que está fraca. Porque não adianta a pessoa ser superinteligente, a pessoa contemplar a
Verdade e não ter a capacidade de praticar o bem.

23
São Josémaria Escrivá: “Santo do cotidiano” foi um sacerdote católico, espanhol e fundador do Opus Dei. Canonizado por
São João Paulo II, propagava que a santidade era possível e para todos.

110
Então as pessoas dizem, força do pensamento, isto está errado, o pensamento não tem força. O
pensamento tem que ser verdadeiro. Então você pode contemplar a Verdade, eu contemplei a Verdade
quando vi a Paixão de Cristo, mas ainda tem o caminho, a vida, não me tornei santo porque vi a Verdade.

Todas as dimensões da Alma são formas de Amor que devem ser integradas, e portanto são coisas boas,
são coisas que realizam. Você não pode ignorar uma virtude, não pode ignorar uma faculdade. O
Maniqueísmo é um grande erro. É um erro antropológico grave, gera os extremos do materialismo, do
corporalismo, do hedonismo, ou do outro extremo do espiritualismo, de um intelectualismo. Os dois não
são humanos, nós não somos nem anjos, abstratos, sem matérias e nem animais. Somos o interstício de
elevar espiritualmente o corpo ou animalizar o espírito.

ÍTALO MARSILI
Tem um jesuíta, Marcel Jousse24, fala que na própria prática litúrgica dos judeus havia uma dinâmica
corporal. Os salmos, por exemplo, eles não eram recitados só com a mente, ou com a memória, ou com
pensamento, eles eram recitados com o modo binário, como o corpo, como se este repetisse uma série
de pulsação do coração e do pulmão, um ir para trás e voltar. Esse maniqueísmo ele subsiste, há quem
pense que a própria vida espiritual litúrgica do fiel é uma atividade só mental. Isto é um prejuízo enorme,
porque ignora toda uma dimensão humana que é o corpo. O corpo com sua inteligência, com sua
dignidade específica que também precisa ser educado. A inteligência, não só a inteligência, esse sopro,
essa ‘coisa’ imaterial, por assim dizer, não tem força sozinha. Existe uma educação do próprio corpo,
porque o corpo tem uma própria inteligência, tem uma dignidade específica que precisa ser trabalhada
e não ignorada. No livro ‘Amor a letras e o desejo de Deus’25 o Goff (?) fala a mesma coisa, ‘Os monges
medievais quando estavam fazendo a liturgia das horas, usavam o corpo também’. O corpo precisa de
uma manifestação inteligente de um modo ordenado e um modo liturgicamente também. Este é próprio
ideal, fazer oração, ter uma vida espiritual , parado sem se mexer, ou alitúrgico do ponto de vista corporal
pode levar uma neurose por aumento desta distinção. Por um lado tenho inteligência ou pensamento
que são excelentes e por outro lado tenho um corpo que precisa ser anulado.

VICTOR SALES

24
Marcel Jousse: (1886-1961) foi padre jesuíta e antropólogo francês.

25
O Amor às Letras e o Desejo de Deus: Este é um livro de iniciação aos autores monásticos da Idade Média dirigido a
estudantes. Publicado pela primeira vez em 1957, impôs-se como um clássico não só pela solidez das informações e acuidade
das percepções, mas também pela autenticidade da atitude intelectual que traduz: rigor científico e interesse por um saber
aberto sobre as questões essenciais da existência humana. Dividida em três partes, a obra é composta por uma série de
lições dadas a jovens monges do Instituto de Estudos Monásticos do mosteiro de Santo Anselmo, em Roma, durante o inverno
de 1956-1957..
111
Já que tocaste no tema da liturgia, isso ficou muito claro com a discussão da liturgia virtual, porque isso
rompe exatamente com a realidade da eucaristia, como comunhão substancial, do corpo, sangue, alma
e divindade. Rompe com a materialidade, a carnalidade, e agora não se pode assistir tudo por....., e aqui
a imagem cântico dos cânticos da união matrimonial nupcial, é união da carne, a vida do espírito
depende da união da carne. Isso é o maniqueísta, ele simplesmente não tem como entender isto, isto
para ele não faz sentido.’ Como assim a união espiritual depende da carnalidade, depende de colocar o
pão na boca? Como assim meu amor por ti tem que ser mostrado na união carnal? Eu te amo, mas em
abstrato?’

Isto é o Amor “platônico” que a idade média... uma certa interpretação de Platão, que é o ‘amor que eu
não vejo a pessoa, o amor que a pessoa não sabe, amor da adolescência - que era platônico porque a
pessoa não sabia, etc.’. Não o Platão não pensava assim, inclusive Sócrates dormia com seus discípulos,
depois ele deixou de dormir, depois ele disse, tanto faz dormir ou não dormir, por uma outra pedagogia,
porque a educação...

Mas ali tem uma verdade muito profunda de uma união, ele usou a metáfora do sexo, para pensar na
educação como uma união... Eu e tu estamos conversando aqui, olho no olho, existe uma comunhão
muito profunda aqui entre nós, da nossa inteligência, das nossas palavras...

Então Platão achava que isto tinha uma analogia com uma união do corpo. Só que Sócrates percebeu
que era uma pederastia, que você não precisa dormir, mas que tinha que ter uma união, ou seja era
presencial, mas não sexual. Então fica a imagem, tem que estar olho no olho, corpo a corpo, tem que
haver o toque, que não é mais o erótico.

Mas ele nunca desprezou o toque, quer a prova disto para arrematar? Ele falou ‘A Filosofia não se dá
por carta, não se dá por livro’. Isto é o ápice da reflexão de Platão sobre a corporeidade da Filosofia. Olha
se você não conhecer o Sócrates, já era meu amigo, vou até te dizer o que ele falou, vou até te dizer,
‘mutatis mutandis’26 , você pode até ler Terapia da Guerrilha, mas se você não tiver contato presencial
com o autor, você não vai ter o contato completo com sua ideia encarnada com a personalidade.

Eu lembro de uma exortação (conselho, encorajamento) tu me deste, eu nunca esqueço, por lado é uma
exceção, mas confirma a regra:

➢ Tu disseste para eu fazer lives diárias,


➢ Eu perguntei qual o tema e

26
Mutatis mutandis : é uma expressão advinda do latim que significa "mudando o que tem de ser mudado". Pode ser, grosso
modo, entendida como: “com as devidas modificações”, “com os devidos descontos”. Tal expressão é geralmente empregada
a respeito de uma sentença ou ideia anteriormente citada e compreendida pelo leitor. Ela indica, assim, que posteriormente
algo fora alterado ou que se pode fazer uma analogia de tal fato, porém tomando as devidas proporções e alterações
necessárias.
112
➢ você falou que o tema era o menos importante, o tema é menos importante que a
personalidade, o tema é menos importante que a pessoa ali vibrando..

Porque o intelectual, que eu não sou, mas que eu poderia ter sido dizendo: ‘não o que importa são as
ideias, vou aqui ficar pensando em todas as ideias, vou fazer um tema de cinquenta temas, vou fazer 50
lives....’ e tu colocas isto em segundo plano, é óbvio que não desprezas, tem que ter um conteúdo, mas
a personalidade é o mais importante, e estamos falando de live ainda, que tem muito mais vida, mais
vivacidade e gestualidade e corporeidade que um texto escrito, que um autor se camufla atrás da
palavra abstrata.

Então é um desafio falar de maniqueísmo, que é um desafio de todas as épocas, porque nossa época é
gnóstica, é uma época “espiritualizada” que despreza o corpo por um lado, ou enaltece por outro , fica
nesta gangorra. Ou o corpo é tudo ou ele não é nada. Não, não, o corpo não nem tudo, nem nada, ele
está no âmbito da personalidade, ele é elemento constitutivo da personalidade.

113
SEMANA 04: ROMANTISMO & ILUMINISMO

Esta aula reflete sobre as ciências naturais e humanas, partindo dos movimentos históricos do
Iluminismo e Romantismo, e analisa seus impactos na sociedade atual.

ROMANTISMO E ILUMINISMO

A modernidade se erigiu a partir do projeto de iluminar o mundo com as luzes da razão científica. O
Iluminismo, movimento que surgiu no séc. XVIII, é muito importante para entendermos a crise cultural,
científica e moral em que estamos.

❖ ILUMINISMO: foi no século 18 que o Iluminismo proporcionou o crescimento da ciência. Atualmente


vivemos uma crise na ciência e a crise da moral. Paradoxalmente a crise da ciência é o seu sucesso.
❖ Vivemos uma época Cientificista, Positivista que tributa a ciência a possibilidade de desvendar todo
mundo.

Nossa época atribui à ciência a possibilidade de desvendar o mundo. Em um âmbito específico da


realidade, a ciência tem êxito; por exemplo, na Medicina, telecomunicações, Engenharia Civil, indústria
etc. A tecnologia extrai da natureza tudo o que ela tem para nos dar, desenvolve e aperfeiçoa a vida
humana pela ciência.

❖ A Medicina é a ciência do corpo e não é possível negar, o sucesso da Medicina em muitos aspectos da
saúde. Há menos de um século atrás, morríamos de doenças que hoje são tratadas com toda
objetividade, simplicidade e precisão com base na tecnologia de diagnóstico de ponta sobre os efeitos
e as causas de uma maneira geral.
❖ Se estudarmos um pouco de história os últimos dois séculos, desde a Revolução Industrial e da
aplicação sistemática da ciência na dominação da natureza pela tecnologia, perceberemos o grande
sucesso das telecomunicações, grande sucesso da construção civil, da indústria alimentícia.
❖ O Iluminismo é um projeto Ideológico que prega que a Ciência poderia desenvolver-se ao limite. Que
a Ciência deveria servir a Sociedade e o Ser Humano.

O Iluminismo tem uma dimensão cognitiva e uma dimensão moral: a ciência poderia desenvolver-se ao
infinito e deveria servir à sociedade.

❖ A primeira dimensão é propriamente científica, que é a mente cognitiva. A segunda dimensão é uma
dimensão moral, porque é uma tentativa de expandir a ciência para a sociedade.
❖ Na Universidade, segundo a Lei de Diretrizes e Base da Educação, principalmente as leis que regem a
vida universitária, tem três dimensões, a universidade serve para: Pesquisa, Ensino e Extensão.
➢ Pesquisa: produz novos conhecimentos;
➢ Ensino: reproduz os conhecimentos e

114
➢ Extensão: expande os conhecimentos para a sociedade.
❖ É um típico projeto Iluminista, que de algum modo nos pertencemos. A universidade tem este viés
Iluminista, pesquisar, ensinar e oferecer a sociedade os benefícios desta ciência. No caso da Medicina
é muito didático: pesquisamos, ensina para uma nova geração de médicos e pesquisadores de
Medicina e serve a sociedade, por exemplo com a distribuição de medicamentos ou técnicas de
intervenção médica em geral.

Aparentemente, esse projeto estava sendo bem-sucedido. Mas, principalmente a partir da 2ª. Guerra
Mundial, houve uma grande crise na aplicação política e moral da ciência, que até então reivindicava
certa neutralidade.

❖ Ciência pelo uso da Tecnologia se tornou um Conhecimento Neutro, que reivindicava uma certa
neutralidade moral, dando ao ser humano, ou aos detentores deste conhecimento um grande poder.
E como falei em aulas passadas, o poder serve para ‘servir’ ou para ‘dominar’.
❖ O Iluminismo começou a se tornar uma busca pelo conhecimento com vistas a dominação. E as
experiencias totalitárias da política do século XX, como a de Hitler ou de Stalin, eram pautadas em
supostas ‘ciências’, como a ciência da ‘história marxista’ e ciência ‘racista eugenista27 do nazismo’.

A busca do conhecimento passou a ter o objetivo da dominação, como as experiências totalitárias de


Hitler e Stálin, que eram fundamentadas em pseudociências.

❖ Não haveria Nazismo e nem Comunismo se não fossem pseudociências por trás. E aí de repente falei
de medicina que cura, falei de medicina que mata. Então existem práticas abortistas, eutanasistas e
eugenistas em geral por médicos nazistas.
❖ Aqui há um nó em nossa cabeça, porque comecei elogiando a ciência, a ciência se tornou um grande
método de conhecimento do mundo e de intervenção tecnológica sobre o mundo e depois a ciência
passou a ser uma grande inimiga, por assim dizer. Quando existe o extermínio genocida de populações
inteiras com base na suposta ciência da história da ascensão do comunismo.
❖ Quando se olha para o materialismo histórico-dialético e percebe-se que obviamente não é uma
ciência, não se comprova, não se sustenta, nem a filosofia da história, nem a economia política de
Marx se sustentam, do ponto de vista objetivo e real. Porém muito se acreditou nestas ‘ciências’ e
muito mal se fez com base nesta ‘ciência’.

Um dos aspectos do drama da civilização ocidental, portanto, é a crise da ciência: afinal, ela é boa ou
má? Ajuda ou piora? No séc. XIX, surgiu uma espécie de ressaca do Iluminismo, como se a civilização

27
Os eugenistas defendiam a ideia de que as qualidades raciais das futuras gerações dependeriam de um controle social que
visasse o melhoramento da espécie humana. Para isso, desenvolveram diversos métodos que tentassem impedir que “maus
elementos” se reproduzissem, sobretudo indivíduos de raça negra.
115
tivesse se embriagado de ciência, o que gerou um ressentimento de perder algo que não cabe na medida
da ciência.

❖ A ciência simplifica ou complexifica nossa vida? Surge no século XIX a ressaca do Iluminismo, como se
a civilização tivesse se embriagado de ciência, se tornado racionalista, isto é, positivista, e se
arrependido / ressentido de ter perdido alguma coisa que não cabe na bitola da ciência.

Surge, portanto, um retorno ao passado, ao Romantismo.

❖ A Romantismo é um movimento cultural de amplo alcance, de profunda influência na sociedade.

Tudo o que hoje chamamos de sentimentalismo, cultura da afetividade, relativismo subjetivista,


espetacularização do que é belo e impactante está ligado a ele. Nossa civilização é extremamente
romântica, no sentido técnico e filosófico. As pessoas tendem a atribuir grande importância aos sentidos,
às emoções, como se elas revelassem uma verdade que a inteligência não revela. Na aula anterior,
abordamos a integração entre corpo e alma.

❖ Falamos da integração de corpo e alma, passando pela Vontade, dos desejos de vida, da vontade de
poder e de desejos de perfeição e de harmonia.

Na modernidade, isso se desmembrou, como se por um lado houvesse a razão técnica e, por outro, a
razão moral. Isso gera uma desconfiança diante da afirmação de que a Ética é uma ciência moral, de que
a Psicologia alcança a verdade sobre o homem.

❖ Na modernidade temos robôs e animais, como se houve por um lado a razão instrumental, uma razão
técnica capaz de conhecer a verdade do mundo e intervir sobre a natureza e por outro lado uma
incapacidade de uma razão moral.
❖ Se eu dissesse que a Ética é uma Ciência Moral, vocês desconfiariam profundamente exatamente por
conta da cultura ambivalente por um lado positivista e por outro lado romântica em que estamos
inseridos. Pois a Ética é exatamente moral uma ciência moral. A Ética é exatamente um tipo de
conhecimento sobre a verdade moral, mas se eu disser ‘verdade moral’, vocês desconfiam.
❖ Nós tendemos a desconfiar profundamente de uma ‘verdade moral’, ou dizer que a Psicologia alcança
a verdade sobre o homem. Bem se a Psicologia não encontra a verdade sobre o homem, é melhor
pagar a conta do analista, como vimos na primeira aula e demitir a possibilidade de conhecer quem
eu sou. Porque se não há um espelho, e a especulação é um espelho que reflete minha alma. Se eu
não encontrar palavras, conceitos, se eu não conseguir verbalizar o que se passa na minha alma, seja
pela Teologia, seja pela Filosofia, seja pela Psicologia, seja por todas as outras ciências, é melhor não
ter ciência sobre o homem.

116
No entanto, se não houver possibilidade de conceituar o que se passa na alma, é melhor não haver
ciência a respeito do homem – e essa é a crise da ciência. Por um lado, temos as ciências naturais, que
crescem vertiginosamente, cujo domínio só prospera.

❖ Nós avançamos no conhecimento da natureza e na capacidade de dominá-la, dominar a


temperatura, dominar a telecomunicação. O fato de vocês estarem me ouvindo e vendo com tanta
perfeição com tanta acuidade é prova consumada da perícia técnica dos operadores de toda
tecnologia da ciência da comunicação, e de uma linguagem artística.

Por outro lado, as ciências ditas humanas foram tachadas de ideológicas, devido aos acontecimentos
históricos.

❖ É muito fácil percebermos de imediato a ideologia do nazismo, e salvo uma minoria muito nefanda28
não há mais nazismo no mundo. Não é uma ideologia que tem a força que teve na década de 30 do
século passado, em que Hitler e seus seguidores dominaram um povo altamente culto.
❖ Pensadores da Escola de Frankfurt29, como Theodor Adorno30 pensaram como uma sociedade alemã
da década de 30, que era uma sociedade relativamente bem-educada, escolarizada, culta pode
acreditar numa ideologia como o nazismo.
❖ Não deveria a ciência Iluminista que propagou, por exemplo, a escolarização das crianças, que é uma
proposta tipicamente Iluminista e estatista, e não entrarei no tema do positivismo político. Mas não
deveriam estas crianças da juventude Hitlerista resistirem a uma ideologia como a nazista?

Poderíamos dizer que a população russa que acreditou na Revolução Comunista era pouco escolarizada
e supersticiosa, portanto, tratou-se de uma substituição da religião por uma ideologia. No entanto, a
sociedade alemã da década de 1930 era culta, as crianças tinham uma educação tipicamente iluminista
e, ainda assim, não resistiram à ideologia nazista.

28
Nefanda: Nefanda é o feminino de nefando. O mesmo que: execranda, abominosa, odiosa, ominosa. Sobre o que não se
pode nem se deve falar (por causar aversão); que é abominável; execrável.
29
Escola de Frankfurt: foi uma escola de análise e pensamento filosófico e sociológico que surgiu na Universidade de
Frankfurt, situada na Alemanha. A teoria estabelecida pelos intelectuais da Escola de Frankfurt é chamada de teoria
crítica por dois motivos: primeiro, porque faz uma crítica social do desenvolvimento intelectual da sociedade que incide sobre
as teorias iluministas; e, em segundo lugar, porque propõe uma leitura crítica do marxismo, com novas propostas para além
dele sem perder de vista os principais ideais da esquerda.
30
Theodor Ludwig Wiesengrund-Adorno (1903/1969) foi um filósofo, sociólogo, musicólogo e compositor alemão. É um dos
expoentes da chamada Escola de Frankfurt, juntamente com Max Horkheimer, Walter Benjamin, Herbert Marcuse, Jürgen
Habermas, entre outros. Estudou filosofia, sociologia, psicologia e música na Universidade de Frankfurt, mudando-se
para Viena aos 22 anos para prosseguir seus estudos em composição com Alban Berg. Ele é amplamente considerado como
um dos principais pensadores do século XX em estética e filosofia.

117
❖ Se acreditou numa ideologia como a comunista, porque a Rússia czarista era agrária, analfabeta e
baseada em superstição religiosa, então é fácil substituir (assim pensa o iluminista), religião é
superstição, é fácil substituir a religião por uma ideologia de tipo religioso como o comunismo, que foi
uma espécie de religião com culto ao ídolo, com culto aos fundadores. Se você for hoje na praça
Vermelha em Moscou, você verá o mausoléu com chama eterna velando o corpo de Lênin31, o líder da
revolução.
Essa reflexão sobre a crise das ciências humanas gerou um grande ceticismo.

❖ Esta reflexão muito profunda sobre a crise das crises das Ciências Humanas, por serem consideradas
Ideológicas, por serem relativizadas, gerou um grande ceticismo.

CONFLITO ENTRE CIÊNCIAS NATURAIS E HUMANAS

Tudo isso pode ser resumido em uma frase do escritor francês François Rabelais 32: “Ciência sem
Consciência é a ruína da Alma”. Ou seja, não se trata de ser contra a ciência, mas de perceber que ela
depende da consciência moral.

❖ François Rabelais falou isto um pouco antes de Pascal33 e Descartes34, ele está dizendo algo que vai
ser o mote da modernidade, ele não está dizendo contrariamente à ciência. A ciência é muito boa,
mas a ciência depende da consciência, moral, de saber no fundo o que se faz com a ciência e o papel
da ciência na vida humana. É isto que desaprendemos.

31
Vladimir Ilyich Ulianov, mais conhecido pelo pseudônimo Lenin (1870/1924), foi um revolucionário comunista, político
e teórico político russo que serviu como chefe de governo da Rússia Soviética de 1917 a 1924 e da União Soviética de 1922
até sua morte. Sob sua administração, a Rússia e em seguida a União Soviética tornaram-se um Estado
socialista unipartidário governado pelo Partido Comunista (PCUS). Ideologicamente marxistas, suas teorias políticas são
conhecidas como leninismo.
32
François Rabelais: (1494/1553) foi um escritor, padre e médico francês do Renascimento, que usou, também,
o pseudônimo Alcofribas Nasier, um anagrama de seu verdadeiro nome. Ficou para a posteridade como o autor das obras
primas cómicas Pantagruel e Gargântua, que exploravam lendas populares, farsas, romances, bem como obras clássicas.
O escatologismo (doutrina das coisas que devem acontecer no fim do mundo) foi usado para condenação humorística. A
exuberância da sua criatividade, do seu colorido e da sua variedade literária asseguraram a sua popularidade. No entanto,
como poeta, foi um precursor da moderna poesia visual, como no poema " A Divina Garrafa", texto poético inserido na
ilustração de uma garrafa
33
Blaise Pascal (1623/1662) foi um importante cientista francês do século XVII que realizou grandes contribuições para a
física e a matemática. Inventou uma das primeiras calculadoras mecânicas, e era reconhecido por sua grande erudição.
34
René Descartes (1596/1650)foi um filósofo e matemático francês, fundador do método dedutivo na Filosofia, do
racionalismo e criador da geometria analítica. René Descartes, filósofo e matemático francês. René Descartes foi um
importante filósofo e matemático, além de ter deixado significativas contribuições para a Física. Autor da frase: "Penso, logo
existo".

118
O cientificismo é um erro profundo, pois divinizou a ciência. A partir da Revolução Francesa, atribuiu-se
à ciência um poder político e intelectual de dominar a sociedade.

❖ O cientificismo é um erro, não porque esteja errada, mas porque ela está tão certa, que ela se
embriaga da sua possibilidade e se afoga em um delírio de onisciência35 e de onipotência. E vocês
sabem quem tradicionalmente tem os atributos da onisciência e da onipotência. Por isso a ciência a
ciência foi divinizada, idolatrada e considerada o centro da vida humana.
❖ Os rituais pseudo litúrgicos dos revolucionários franceses, que expurgaram a catedral de Notre Dame
das estátuas dos apóstolos, do nosso Senhor, de nossa Senhora e colocaram os revolucionários lá; e
colocaram a deusa Razão.
❖ Vejam a implicação sociopolítica do cientificismo, agora vai se cultuar a deusa Razão, num projeto
maçônico, de uma divindade racional e impessoal; e agora os revolucionários que vão superar a
superstição das trevas religiosas, medievais do antigo regime, substituindo pelo reino da ciência.
❖ A ciência se arvora de um poder político por um poder intelectual de dominar a sociedade toda. Eu
falei a primeira aula que a alma humana não é um problema a ser resolvido pela ciência. A alma
humana é um mistério a ser cultivado, pelo que nós chamaríamos de ciências humanas e por aquilo
que não é ciência. Isso é muito importante para que vocês entendam. Vocês não entendem jamais um
livro como Chapéu do Mago, do Ítalo, sem entender um pressuposto epistemológico fundamental. A
alma humana para ser decifrada, para ser cultivada, para ser refletida, precisa de disciplinas.

Mas a alma humana precisa de disciplinas altamente elaboradas, que não passam pelo crivo da ciência
moderna, ou seja, precisa de ciências tradicionais como Filosofia, História, Literatura, Simbologia e
Religião. (Estas são todas ciências não modernas).

❖ Como a modernidade é ciosa de si mesma e como a modernidade estabeleceu um padrão


epistemológico absolutizante, ela excluí aquilo que não entra no seu escopo limitado na sua baliza. A
simbologia, por exemplo, do Tarot não é de tipo lógico matemático, não é uma ciência natural. A
Sagrada Escritura, por exemplo, o livro mais importante ou influente, ou a coleção de livros mais
importantes ou influentes da história humana, não é ciência moderna.
❖ Qual é o papel do Iluminista, do Positivista, do cientificista? Exclui a Sagrada Escritura, ou as cartas
do Tarot, ou as Tragédias Gregas, ou a Filosofia Platônica, ou a própria Filosofia sobreviveu o século
XIX com o Positivismo e depois sucumbiu. Praticamente todos os autores do século XX ficam falando
do fim da Filosofia, embora, como dizia Hegel, a filosofia sempre enterra seus coveiros, a filosofia
renasce como uma coruja de Minerva36 no final do dia.

35
Onisciência: saber absoluto, pleno; conhecimento infinito sobre todas as coisas.

36
Coruja de Minerva: O filósofo alemão Friedrich Hegel em sua obra Filosofia do Direito ilustra muito bem a harmoniosa
relação entre a coruja e a filosofia. Escreve ele: “A coruja de Minerva alça seu voo somente com o início do crepúsculo”. O
119
❖ A Filosofia não irá morrer, a História não irá morrer, a Literatura não irá morrer, porque a Filosofia, a
História, a Literatura, a Religião são um discurso para o mistério que é a alma humana, sobre este
enigma que nós trazemos, no nosso peito, no nosso coração que é a dimensão insondável da existência
humana.

Nesse sentido, o Existencialismo é uma corrente muito importante, pois resgatou alguma sabedoria da
existência subjetiva. No momento em que todo mundo cultivava a ciência, Kierkegaard afirmou a
irredutível complexidade da alma humana, afirmando que ela só pode ser pensada pela religião.

❖ No momento que todo mundo cultivava a ciência, cultivava os médicos, os engenheiros, os


matemáticos, no momento que todo mundo atribuía a grande capacidade da decifração do mundo
natural, Kierkegaard37 no século XIX, um pastor luterano dinamarquês, afirma a irredutível
complexidade da alma humana. Ele diz “A alma humana só pode ser equacionada /pensada pela
religião.
❖ Um admirador de Kierkegaard, Nietzche sabia exatamente isso, que os grandes problemas da
existência, não são resolvidos pela ciência.

Por isso, o terapeuta está em uma fronteira complexa entre o corpo, a alma e o espírito, que exige um
conhecimento que a ciência empírica tende a descartar. A ciência empírica também desconsidera o
papel subjetivo do terapeuta, tentando mantê-lo em uma neutralidade, o que é uma ilusão. Não se pode
lidar com uma pessoa de modo impessoal. Isso não significa trabalhar de forma enviesada; é possível
buscar a objetividade, mas não a impessoalidade.

❖ O psicólogo, o terapeuta em geral está em uma fronteira, extraordinariamente complexa, entre corpo,
alma e espírito, numa intersecção altamente complexa que exige um conhecimento, de um tipo de
ciência....primeiro, de experiência de vida, que é algo que a ciência empírica tende a descartar. Tende

papel da filosofia é justamente elucidar o que não é claro ao censo comum, é alertar acerca da vida. O crepúsculo é o linear
do dia pra coruja, enquanto cessamos nossas obras e nos recolhemos em nossos lares, a coruja “alça seu voo” a trabalho. É a
noite que a fascina, por isso seu nome em latim: Noctua, “ave da noite”. Não é a beleza o seu destaque, mas é a capacidade
de ver o que aves diurnas não conseguem ver. Seu pescoço gira 360º, dando-lhe uma visão completa capacitando-a a ver o
todo. É também uma ave de rapina, rápida na escolha, e que por ver a presa e não ser vista, sempre tem sucesso na caça,
apanhando os despreparados e desprovidos que se arriscam na noite escura.

37 Soren Kierkegaard : (1813 /1855) foi um filósofo, teólogo, poeta e crítico social dinamarquês, amplamente considerado o
primeiro filósofo existencialista. Durante sua carreira ele escreveu textos críticos sobre religião organizada, cristianismo,
moralidade, ética, psicologia, e filosofia da religião, mostrando um gosto particular por figuras de linguagem como a metáfora,
a ironia e a alegoria. Grande parte do seu trabalho filosófico aborda as questões de como alguém vive sendo um "único
indivíduo", priorizando a realidade humana concreta sobre o pensamento abstrato e destacando a importância da escolha e
do comprometimento pessoa.

120
a descartar a experiência existencial e portanto o papel subjetivo, não só o conhecimento objetivo do
terapeuta. Tende a descartar a dimensão pedagógica desta relação, tentando manter nesta
neutralidade, que é uma grande e perniciosa ilusão das Ciências Humanas. Porque as Ciências
Humanas não podem ser, jamais, neutras, não podem ser, jamais, impessoais. Vejam que contradição
em termos, como é que vou lidar com uma pessoa de forma impessoal? Quando eu lido com uma
pessoa de forma impessoal eu a despersonalizo, eu a privo da sua dimensão, propriamente humana e
pessoal. O que não quer dizer que eu precise trabalhar de uma forma enviesada, numa perspectiva
que não possa ser, marcada pela isenção. É claro que posso buscar objetividade, nas Ciências
Humanas, eu posso buscar isenção, mas nunca neutralidade ou impessoalidade, porque isto é
simplesmente impossível.

Muitas ciências humanas foram marcadas ou pelo extremo do cientificismo, tratando as pessoas como
objetos e desprezando o conhecimento humanístico (Literatura, História, Filosofia, Religião), que foi
considerado supersticioso.

❖ Como se formavam os filósofos e cientistas até o século XIX? Se formaram lendo Homero38, lendo
Hesíodo39, lendo Sófocles40, Ésquilo 41, Eurípedes42, lendo Platão, Aristóteles etc. Este era o básico do

38 Homero foi um poeta épico da Grécia Antiga, ao qual tradicionalmente se atribui a autoria dos poemas épicos Ilíada e
Odisseia. Os gregos antigos geralmente acreditavam que Homero era um indivíduo histórico, mas os estudiosos modernos
são céticos: nenhuma informação biográfica de confiança foi transmitida a partir da antiguidade clássica, e os próprios
poemas manifestamente representam o culminar de muitos séculos de história contadas oralmente e um bem desenvolvido
sistema já muitas vezes usado de composição poética.

39 Hesíodo foi um poeta oral grego da Antiguidade. Sua poesia é a primeira feita na Europa na qual o poeta vê a si mesmo
como um tópico, um indivíduo com um papel distinto a desempenhar. Autores antigos creditavam a ele e a Homero a
instituição dos costumes religiosos gregos, e os acadêmicos modernos referem-se a ele como uma das principais fontes para
a religião grega, as técnicas agriculturais, o pensamento econômico (chegou a ser referido, por vezes, como o primeiro
economista), a astronomia grega arcaica e o estudo do tempo.

40Sófocles: foi um dramaturgo grego, um dos mais importantes escritores de tragédia ao lado de Ésquilo e Eurípedes,
dentre aqueles cujo trabalho sobreviveu. Suas peças retratam personagens nobres e da realeza. Filho de um rico mercador,
nasceu em Colono, perto de Atenas, na época do governo de Péricles, o apogeu da cultura helênica.

41 Ésquilo: foi um dramaturgo da Grécia Antiga. É reconhecido frequentemente como o pai da tragédia, e é o mais antigo dos
três trágicos gregos cujas peças ainda existem (os outros são Sófocles e Eurípedes). De acordo com Aristóteles, Ésquilo
aumentou o número de personagens usados nas peças para permitir conflitos entre eles; anteriormente, os personagens
interagiam apenas com o coro. Apenas sete de um total estimado de setenta a noventa peças feitas pelo autor sobreviveram
à modernidade; uma destas, Prometeu Acorrentado, é tida hoje em dia como sendo de autoria de um autor posterior.

42 Eurípides: foi um poeta trágico grego, do século V a.C., o mais jovem dos três
grandes expoentes da tragédia grega clássica,
que ressaltou em suas obras as agitações da alma humana e em especial a feminina. Tratou dos problemas triviais da
sociedade ateniense de seu tempo, com o intuito de moderar o homem em suas ações, que se encontravam descontroladas
121
que se chamava ‘cultura clássica’. Hoje muitas pessoas veem esta cultura clássica grega (e romanas
também) como verniz, como mera erudição vazia, superficial, epidérmica. Não percebem que esta
educação liberal colocada nos clássicos, educa e expande os nossos conhecimentos sobre os seres
humanos; nos dá uma sensibilidade; nos dá uma ternura, uma atenção ao fenômeno humano muito
mais profunda, muito mais complexa. A mesma coisa vale para os textos sapienciais das religiões.
Você começa a ter uma percepção muito mais aprofundada, muito mais adensada e este
conhecimento foi ignorado, pela ciência moderna. Ignorado como sendo um conhecimento
supersticioso, que prescreveu, que não é positivo.

Mas o ser humano não é apenas um ser positivo, ou seja, palpável, tangível.

❖ O que é positivo? Positivo é meu corpo, ele é tangível, ele é palpável, ele é um positum, ele está posto
na realidade sensível e pode ser enfocado pelos sentidos. Os sentidos vão elaborar esta percepção e
trazer a Conceitos inteligíveis e universais e assim produzir a ciência . Experimentação, Observação,
Hipotetização e Dogmatização, você cumpre um método científico e ele funciona para o meu corpo,
para o meu corpo funciona muito bem, e os médicos merecem todos o prestígio que tem em relação
a isso.
❖ Por outro lado, a alma humana, a sociedade humana, agora vamos projetar por exemplo para a
Sociologia. Augusto Comte queria fazer a geometria social e dar ao estudo da Sociologia o mesmo
rigor e precisão da geometria, que estaria na mesma escala, na mesma linha de conhecimento,
mudando apenas o objeto.

Auguste Comte43 queria dar à sociologia o mesmo rigor e precisão da geometria, mas o resultado foi um
fracasso: sua sociologia tornou-se uma ideologia, porque não é possível mensurar a alma humana
individual, nem a variedade da vida social, que é marcada pela relação de pessoas livres.

e sem parâmetros, pois o que se firmava naquela sociedade era uma mudança de valores de tradições que atingiam
diretamente no modo de pensar e agir dos homens gregos.

43
Isidore Auguste Marie François Xavier Comte (1798 / 1857) foi um filósofo francês que formulou a doutrina
do Positivismo. Ele é considerado como o primeiro filósofo da ciência, também é visto como o fundador da disciplina
acadêmica de Sociologia. Influenciado pelo socialista utópico Henri de Saint-Simon, trabalhou intensamente na criação de
uma filosofia positiva como tentativa de remediar o mal-estar social da Revolução Francesa, criando uma doutrina social
baseada nas ciências. Comte foi uma grande influência no pensamento do século XIX, influenciando o trabalho de intelectuais
sociais como Karl Marx, John Stuart Mill e George Eliot. As teorias sociais de Comte culminaram em sua "Religião da
Humanidade", que pressagiava o desenvolvimento de organizações humanistas e humanistas religiosas não teístas no século
XIX. Comte cunhou o significado da palavra altruísmo. As ideias de Comte influenciaram as palavras Ordem e Progresso, lema
da República Federativa do Brasil.
122
❖ Não é possível mensurar a alma humana e um conjunto infinito de variedades da vida social . A vida
social é marcada pela interrelação de pessoas humanas livres. Nós vamos tratar da Massificação
numa outra aula que é exatamente o esgotamento, ou exaurimento da liberdade individual pela
padronização e homogeneização dos costumes por mecanismos de massificação, mas mesmo uma
sociedade massificada, ainda não é previsível como a chuva. Vejam uma coisa tão simples, que
deveria ser tão óbvia, já falamos do Senso Comum e do Bom Senso, se perdeu na Modernidade.
Aristóteles começa Ética a Nicômaco dizendo que a ciência do ethos44, do comportamento humano, não
é cognoscível como as ciências matemáticas; e isso é uma coisa óbvia.

❖ A ‘Ética a Nicômaco’ é o principal tratado moral junto da ‘Ética Eudemo’45, Aristóteles escreveu
amplamente sobre isto. Escreveu sobre a Política, escreveu sobre as Constituições, escreveu sobre a
Alma, num tratado chamado ‘De Anima’, tem muitas considerações sobre a alma na poética, na
retórica. Então é um pensador muito abrangente e era um cientista da natureza, cujo pai era médico
da corte do Felipe da Macedônia.

Mas como atualmente o ideal cognitivo é a ciência da natureza, em que tudo é objetivo, para as
humanidades resta o ceticismo, o relativismo, o Romantismo, tudo é subjetivo.

❖ Na Natureza tudo é verdade objetiva, na Humanidade é subjetivo; na Natureza tudo é seguro, certo,
real, matemático, comprovável, do lado da Humanidade, da Alma, da Psiquê, da Espiritualidade, dos
anseios imateriais do ser humano, fica uma nuvem de incerteza, de dúvida, de ceticismo, de
relativismo e de romantismo.

Esse é um paradoxo extremo de nossa época; por um lado, se afirma a ciência da natureza; por outro,
a impossibilidade de uma ciência humana. Se alguém se apresenta como cientista político, cientista da
alma, a primeira reação é de desconfiança: qual é o partido, a religião, a perspectiva dele? A ciência foi
esvaziada em discurso, local de fala, poder de fala. Com isso, a verdade objetiva e a busca de
conhecimento real também são esvaziadas

❖ Quando surge alguém das ciências humanas, surgem as desconfianças (que sexo, que cor, que raça,
que classe etc., é desta pessoa?). Temos mecanismos de relativização do que se chama de discurso.
Por isso a universidade que como local de produção da ciência foi esvaziada, criticada, isolada da
sociedade. A ciência que deveria expandir a sociedade, hoje em dia é fechada numa redoma, isolada
e amuralhada em um feudo intelectual.

44
Ethos: conjunto dos costumes e hábitos fundamentais, no âmbito do comportamento (instituições, afazeres etc.) e da
cultura (valores, ideias ou crenças), característicos de uma determinada coletividade, época ou região.
45
A Ética a Eudemo (às vezes abreviado como EE em trabalhos acadêmicos) é um trabalho de filosofia e seu foco é na ética,
tornando-a uma das fontes primárias disponíveis para o estudo da ética aristotélica. Tem seu nome por causa de Eudemos
de Rodes, pupilo de Aristóteles que também contribuiu com a edição final do trabalh0. Acredita-se geralmente que foi escrita
antes da Ética a Nicômaco, apesar de este fato não estar livre de controvérsia
123
❖ Para concluir esta aula quero mencionar um aspecto muito relevante da crise da ciência que concerne
diretamente a proposta a proposta desta formação, desta disciplina ou deste módulo que é a Barbárie
da Especialização. Como vocês veem estou repetindo certos conceitos a fim de deixá-los
didaticamente sedimentados na mente de vocês. E um deles é ‘Barbárie’ que é o oposto da Civilização
e da Cultura.
A BARBÁRIE DA ESPECIALIZAÇÃO

Outro aspecto importante é a barbárie da especialização (barbárie é o oposto de civilização e cultura, é


a violência).

❖ A ciência na modernidade precisou se especializar, e a Especialização, vou sempre dialético porque é


assim que procede o pensamento filosófico ao mostrar o aspecto positivo e negativo e a tentativa de
composição ou síntese destas dimensões.

A especialização é uma coisa boa, é a abstração das partes que compõem o todo para a concentração
em um de seus elementos, a fim de aprofundar-se nele e aguçar o conhecimento.

❖ A Especialização verticaliza um único conhecimento em detrimento dos demais e com isso aguça e
aprofunda o conhecimento desta parte. O exemplo da Medicina mais uma vez se impõe, queremos
um especialista na área que estamos lidando. É claro que um pediatra tem um estudo e
aprofundamento diferente de um oftalmologista, que tem um aprofundamento e experiência
diferente de um cardiologista e assim, sucessivamente, ao infinito potencial, porque pode ter
subespecialidades. A Medicina já era uma especialidade, dentro da medicina você tem a oftalmologia
e dentro da oftalmologia você tem diversas subespecialidades e assim ao infinito potencial.
❖ A modernidade subdividiu toda a seara do conhecimento humano em partes menores e estas em
partes cada vez menores gerando uma especialidade. Repito isto é bom.
❖ E por que isto é mal também, por que isto é ruim? Porque isto alienou os especialistas do todo, se
perdeu de vista a totalidade da realidade.

Por outro lado, o especialista se aliena do todo da realidade. O homem é um microcosmo, porque
condensa em si a complexidade do Universo, participa de todos os seus níveis.

❖ Do nível inorgânico ao nível matéria;


❖ Do nível imediato, vegetativo ao nível material ativo e locomotivo da sensibilidade animal;
❖ Ao nível intelectivo da espiritualidade da dimensão imaterial de alcançar o que está para além do
tempo e do espaço.
❖ A medicina já era uma especialidade, quando você perde de vista o corpo humano como um todo,
claro que tem uma crise da medicina. Quando você perde de vista a relação do corpo e da alma, você
tem a crise das ciências médico psicológicas em geral.
124
Quando se perde de vista o corpo como um todo, a relação entre corpo e alma, a unidade entre o
indivíduo e sua família e comunidade, há uma crise, perde-se de vista a unidade do mundo.

O símbolo é o oposto disso: ele reúne, condensa, sintetiza, o que antes estava disperso.

❖ O Símbolo é um feixe de intelecções que nos permite articular as coisas , por isso que o pensamento
simbólico tradicional, da literatura, da religião é importante e precisa ser resgatado. Pois ele foi
simplesmente expurgado, extirpado das universidades positivistas modernas, de modo que você
considera isso não como ciência. E não é ciência positiva mesmo, não é ciência natural mesmo, mas
tem sabedoria, mas tem consciência, mas tem experiência, influenciou a história, foi um espelho que
a humanidade se refletiu.

Por isso precisamos resgatar o pensamento simbólico tradicional da Literatura, da Religião, da Filosofia.
Quando a ciência se subtrai do todo, torna-se um fator de desordem e desorientação – essa é a crise da
ciência. Para se ter um conhecimento efetivo sobre o ser humano, não se pode ser um especialista
excludente, mas ter, para além da especialidade, a sabedoria acumulada pela tradição.

❖ O dilema da especialização: ela aprofunda e isto é positivo, por outro lado aliena e isola e abstrai e
isto é negativo. Não queremos retroceder a um nível em que havia um conhecimento geral mas
superficial, porque o generalista, aquele que conhece um pouquinho de tudo não vale também. Por
outro lado aquele que conhece tudo de pouco, também não vale, não é bom.
❖ O dilema é: conhecer um pouco de tudo ou tudo de quase nada? Conhecer quase nada de tudo ou
tudo de quase nada.
❖ A nossa proposta pedagógica geral é a formação de especialistas. E o que acontece com estes
especialistas? Estes especialistas são profundos conhecedores das suas áreas e podem apresentar um
conhecimento objetivo, positivo das suas áreas, mas nas outras são profundos ignorantes. Ignoram
profundamente todo o resto e não são capazes de se situar na vida humana, não são capazes de
colocar as coisas nos seus lugares. Não são capazes de ter uma visão geral do mundo.
❖ Quem dá a visão geral do mundo é a Religião e a Filosofia. Isto quer dizer que, quem tem uma
cosmovisão, muito embora você possa ter uma cosmovisão, uma visão conglobante pela política ou
pela história em geral, a Religião e a Filosofia sempre tiveram como função o quadro geral da
existência humana, em que as coisas têm um local cosmológico.
❖ Quando a ciência, conhecendo / enfatizando as partes se subtrai e nega o todo ela atua como sendo
um fator de desordem, como sendo um fator de desorientação.
❖ Esta é a crise da ciência que nós vimos nesta aula e que merece ser atendida. Se vocês querem ter um
conhecimento efetivo sobre o ser humano, vocês não podem ser especialistas excludentes. Repito,
podem ser especialistas, devem ter uma especialidade, mas não excluir as demais formas de saber, as

125
demais dimensões de saber e principalmente a sabedoria acumulada pela tradição, que não se encaixe
na linguagem fechada, porque precisa das ciências naturais modernas.

PAPO FILOSÓFICO ÍTALO MARSILI E VICTOR SALES – SEMANA 04

ÍTALO MARSILI
Vitor é comum nos consultórios, com outros colegas, nas sessões clínicas, discutindo com outros colegas
psiquiatras, médicos, discutindo casos de pacientes com depressão, e no início vem a aquela conversa,
o sujeito está com deficiência na Serotonina, ou isto é uma disfunção do sistema dopaminérgico etc.

É claro que por um lado existe uma causa material, para as depressões, pegando aqui como exemplo os
casos concretos que a gente pode analisar, é verdade que existe uma causa material para um certo
estado que leva o sujeito a anedonia, que leva o sujeito a uma desesperança profunda, a se questionar
sobre seu lugar no mundo etc. No entanto a depressão ela também tem uma outra causa ou outras
causas como tudo quanto existe. O ‘velho’ Aristóteles já falava para gente ‘tudo quanto existe tem pelo
menos quatro causas’, tudo quanto existe aqui no mundo material tem quatro causas : uma causa
material, outra eficiente, outra formal e outra é final.

Houve uma aposta nos últimos séculos por explorar a causa material , e como você bem disse, essa
aposta, por assim dizer, foi muito bem-sucedida. O homem pisou na Lua, o homem inventou a penicilina,
os edifícios arranhando o céu, botando milhares de pessoas habitando num espaço de chão muito curto
que pode..., as enchentes que antes aconteciam aqui no bairro, agora estão sendo evitadas porque existe
uma técnica específica que se vale de uma ciência que vê a causa material dos fluidos que corre etc.,
então já não temos certos desastres naturais, a mortalidade infanto juvenil diminuiu e até alguns
remédios foram criados para as pessoas deixarem de sofrer, de hipertensão, de diabetes etc., isto tudo
é excelente, como você bem apontou.

Agora existe um obscurecimento das outras causas que regem tudo quanto existe. Se por um lado é
verdade que para um sujeito que está e depressão ele pode ter uma deficiência de Serotonina, uma
disfunção de Dopamina, ou no sistema noradrenérgico, isto é verdade, por outro lado a gente não pode
excluir as outras causas. Não é impossível que a gente imagine o seguinte, tudo quanto existe tende a
sua perfeição, ou deveria atender a sua perfeição. Existe uma perfeição por exemplo para cada idade,
então o sujeito de 15 anos tende para uma coisa, um sujeito de 45 anos, 55 anos, tenderiam para outra
coisa. Não dá para imaginar que as causas depressivas de um sujeito de 15, possam se explicar pelos
mesmos elementos, ou pelas mesmas ferramentas de um sujeito de 55 anos. Porque um sujeito de 55
anos, dado a ordem natural das coisas, ele precisaria ter vivido certas coisas que um sujeito de 15 não
deveria ou necessitaria ter vivido.

126
Por exemplo, se por um lado a ciência dá grandes contribuições que alimentam a técnica, que fazem a
nossa vida ser possível, deste modo que a gente conhece hoje, por lado o cientificismo que é aí sim, uma
anomalia, uma anormalidade da ciência, é um esvaziamento da consciência, como Mallet (?) colocou,
ou seja, você não pega... a ciência não está mais integrada, ela está dissociada, aposta só em uma das 4
causas para explicar tudo quanto é. Evidente que isto vai gerar do ponto de vista pessoal as neuroses,
do ponto de vista social, as convulsões, e no ponto de vista da organização da totalidade, a desesperança,
a tristeza etc.

Então neste sentido o cientificismo mesmo, precisa estar muito na pauta, no olho sobretudo do
terapeuta, de quem está ali com o paciente, por quê? Porque as pessoas têm esta visão, estão dentro
desta cultura cientificista. Há uma aposta, as pessoas sabendo ou não da explicação de tudo quanto
existe, no ponto de vista material, por exemplo, que tristeza é explicar o amor, como sendo
simplesmente a explosão de neurotransmissores ou de hormônios. Isto é uma das causas mesmo,
daquilo que a gente percebe como o amor, pode-se perceber assim, mas não é a única e provavelmente
não é a mais importante.

Depois como você apontou, é claro existe uma consequência que é uma certa embriagues que vai levar
a um ceticismo, porque é óbvio, a matéria é esta coisa que a gente conhece, é mutável, se decompõe,
muda de lugar, não tem uma consistência . Então um sujeito que se acostuma, uma civilização que se
acostuma a olhar sempre para o aspecto material das coisas, vai acabar na desesperança, desesperança
desta coisa que muda, que não tem um centro, não tem uma referência, portanto não tenho onde me
ater, não tenho onde me apegar. Qual é meu referencial mesmo? Existe um referencial eterno,
permanente, imutável, diante do qual eu possa olhar, viver, agir etc.

O cientificismo portanto, como você colocou, sem dúvida é uma das causas do estado de ânimo
entristecido, disfuncional, desesperançoso das pessoas que vivem no nosso tempo aqui, sem excluir a
gente aqui. Portanto o cientificismo é um destes males que temos que olhar e colocar num lugar. Se
por um lado ele explica muitas coisas e é muito útil, por outro lado, ele é uma aposta muito ineficaz,
muito errada no fundo de olhar para a realidade. Porque se eu não sei para o quê eu tendo, qual é minha
finalidade? De onde eu vim? Qual é minha causa eficiente? Quais são as minhas possibilidades?
Evidente que vou ter uma vida, muito, muito diminuída, portanto entristecida.

Há uma tendência, e isto eu não gostaria que nossos alunos, nossos terapeutas tivessem, que a gente
possa olhar para o ser humano como se fosse uma coisa. A gente pode olhar para o ser humano como

127
se ele pudesse ser descrito como uma órbita de um planeta, por exemplo. Newton46, Kepler 47 , os pais
da astronomia, sujeitos que fundaram a astronomia como conhecemos hoje, eles estavam olhando para
um aspecto material do mundo a órbita, e aquilo ali era apreensível de fato, a gente consegue descrever
a órbita de saturno, a órbita terrestre, a órbita solar, mas por quê? Porque aquilo ali é muito estável,
aquilo é sempre do mesmo jeito.

É muito difícil a gente imaginar que as pessoas são como órbitas planetárias, as pessoas têm suas
particularidades, as pessoas têm suas características, elas estão inscritas num tempo específico, elas tem
seu mundo interior, seu universo, isso por um lado. Por outro lado é interessante também que aquelas
coisas que são fixas, estáveis e permanentes em todos os sujeitos estejam em desatenção total nos
consultórios hoje, então se a gente pegar as Sete Faculdades da Alma, que os escolásticos trabalharam
muito bem. Isso de fato é estável no homem, todos os homens têm aquilo ali e não é material, e esta
coisa não se presta atenção. Não se presta atenção por quê? Porque teve uma aposta nas causas
materiais e então se descreve com perfeição os processos bioquímicos de um ser humano.

Você pega um livro de bioquímica, perfeito, o ser humano funciona assim mesmo, ele tem uma causa
material de funcionamento vital do homem. Você pega um atlas de anatomia, é escrito com detalhes as
variações anatômicas, é uma espelhação perfeita da causa cinética do homem, o homem se move por
isso, tem esta estrutura específica. Agora a causa do movimento psíquico, a causa do movimento
emotivo, a causa do movimento do movimento espiritual está amputada. Está amputada possivelmente
porque se deu uma ênfase muito grande para as causas materiais.

VICTOR SALES
O materialismo é um reducionismo. A redução pertence ao método científico, reduzir a complexidade
dos fenômenos para uma das suas partes abstraindo as demais, a fim de conhecer esta parte com mais
propriedade. Se eu enfoco só nos teus olhos e me concentro só nos teus olhos, eu os vejo melhor do
que veria se eu focasse no contexto da face, e menos ainda se eu focasse olhando para o corpo inteiro
e muito menos ainda, se eu focasse olhando para toda a tua família. Se eu olhasse para toda a sua família,
eu veria muito menos teus olhos, porque minha atenção estaria desperta em muita gente. Então é

46Isaac Newton (1643/ 1727greg) foi um matemático, físico, astrônomo, teólogo e autor inglês (descrito em seus dias como
um "filósofo natural") que é amplamente reconhecido como um dos cientistas mais influentes de todos os tempos e como
uma figura-chave na Revolução Científica. Seu livro Princípios Matemáticos da Filosofia Natural, publicado pela primeira vez
em 1687, lançou as bases da mecânica clássica. Newton também fez contribuições seminais à óptica e compartilha crédito
com Gottfried Wilhelm Leibniz pelo desenvolvimento do cálculo infinitesimal.
47 Johannes Kepler (1571 / 1630) foi um astrônomo, astrólogo e matemático alemão. Considerado figura chave da revolução
científica do século XVII, é todavia célebre por ter formulado as três leis fundamentais da mecânica celeste, denominadas Leis
de Kepler, tendo estas sido codificadas por astrônomos posteriores com base nas suas obras Astronomia Nova, Harmonices
Mundi e Epítome da Astronomia de Copérnico. Essas obras também forneceram uma das bases para a teoria da gravitação
universal de Isaac Newton.

128
natural que se queira reduzir foco da atenção, se eu fosse pintor por exemplo, a gente falou do Da Vinci,
Michelangelo e Rafael (Raffaello), mas qualquer destes grandes gênios que tinha uma tensão a certas
partes do corpo por exemplo, como os olhos, que são janelas da alma, eles precisavam se concentrar e
podem destacar em um quadro enorme, apenas os olhos, ficar horas... Então a redução pertence ao
método, eu posso reduzir minha atenção aos teus olhos, sem esquecer que ele pertence a tua face, que
pertence ao teu corpo, que pertence a tua personalidade.

O erro da ciência moderna é a falta dialética sintético simbólica , porque a análise é a divisão para parte;
a síntese é a recuperação da unidade do todo. Na República o Platão explica exatamente os dois
movimentos: você vai do todo à parte e da parte ao todo, e vice-versa e fica num movimento dialético.
Então a Serotonina é um problema, vamos enfrentar esta dimensão, esta parte, nos termos dela. A
solidão social é um problema, vamos enfrentar esta dimensão, nesta parte, há uma questão religiosa,
filosófica, intelectual, vamos enfrentar nesta parte. Todas estas três partes são muito mais, e o problema
é que o ser humano é complexo e tem não só sete Faculdades, quatro Virtudes, três... A gente tenta
numericamente domar esta complexidade inexorável. A gente tenta dizer, quatro Virtudes Cardeais,
três Teologais, sete faculdades, a gente tenta.... Ajuda dizer os três motores da Alma Humana48, a gente
tenta fazer classificações e a história da Filosofia, da Psicologia, da Sociologia é repleta de tabela de
categorias, todas boas, adequadas, mas o ser humano não se reduz a nenhuma delas.

ÍTALO MARSILI
Você falou do olho, quando vai no Oftalmologista porque não está enxergando bem, o Oftalmologista
não te pergunta ‘Você quer colocar uma lente aqui para ajustar a miopia para ver o quê?’ Ele não
pergunta isso, e é bom que ele não pergunte, porque ele não tem nada a ver com isso. No entanto eu
quero ajustar meu olho, porque existe uma coisa que é a visão, que é a finalidade do olho. O olho é a
causa material, por assim dizer. E o cientificismo é justamente isto, a finalidade dos atos, a finalidade
das coisas sai da pergunta, não está se questionando mais sobre isso.

Quando chega uma pessoa para mim, eu tenho que colocar em ordem esta estrutura material, esta
estrutura física, sem dúvida, mas tem uma finalidade para isso tudo. A qualidade do olho é ver, é visão.
Eu vou ver o quê? Para perceber o quê, para ir para onde.

VICTOR SALES
Isto é muito interessante, porque tu falaste dois elementos da filosofia Aristotélica que são abolidos, ou
que são suspensos, na modernidade, não só a teoria das quatro Causas (Material, Formal, Eficiente,

48
Os três motores descritos por Santo Tomás, a dizer, que a alma é imaterial, subsistente e imortal, dão uma noção básica
sobre a natureza da alma humana. Garrigou-Lagrange afirma que estas três qualidades também as conhecemos como a
característica espiritual da alma humana.
129
Final), mas a ideia da enteléquia49 , que todos os entes tende a sua perfeição. Quando nasce uma criança,
a gente faz o teste do olhinho, do pezinho, a gente quer que todas as suas faculdades físicas, do seu
corpo, funcione tal como é previsto para funcionar, que ele desenvolva. O desenvolvimento das
faculdades somáticas, a gente chama de saúde, que é a consecução da finalidade do corpo. Você
consegue andar, você consegue falar, você consegue ouvir, respirar, digerir, coração está batendo, está
tudo funcionando, saudável, estou bem!

E a ALMA? Como ela funciona bem? Como ela pensa bem? Com a ciência chamada Lógica. Como você
comunica bem? Tem uma ciência, chamada Retórica. Como você domina as estruturas da língua, tem
uma ciência chamada Gramática. Se você não tiver a ciência do Trivium50, você não consegue pensar,
falar, a se comunicar.

Seu corpo está funcionando perfeitamente bem, mas a sua mente, na dimensão teórica, está sem os
instrumentos. Lembra o Trivium, são as três vias instrumentais para chegar as Ciências Supremas da
Medicina, do Direito e da Teologia na Idade Média. Quando você chega na ciência, médica, jurídica e
teológica, você tem uma verdade ali, em cada qual. Com o Trivium e com as Ciências Supremas você tem
a integração / atualização das máximas potências sociais, morais etc. É um paradoxo que a gente vive,
de reconhecer a consecução das faculdades somáticas e não das faculdades intelectuais ou morais, num
ceticismo científico ou moral. O ceticismo é um suicídio grave do pensamento, é uma renúncia, é uma
remissão da nossa possibilidade de conhecer o mundo, que dava sabor ao mundo, intelectual, até pouco
tempo atrás.

Eu acho que o terapeuta tem que ser um humanista, tem que ser alguém cujos olhos brilhem diante de
um ser humano, que reflete e espelhe humanidade. Quando Schindler51 salvou milhares de pessoas
(Spielberg filmou e está muito bonito e é fato real), salvou cem, mil, sessenta mil, salvou milhares, mas
não salvou todos, morreram seis milhões, e ele falou “Bem, se eu tivesse salvado um, em um ser humano
está a humanidade” . Isto é um humanista profundo, isto é alguém que, não é dois, dois mil, vinte mil,
duzentos mil, a lista de Schindler já não interessa mais quantidade, o que interessa é esta paixão pelo
concreto que tem uma dignidade um valor e incomensurável.

49
Enteléquia: na filosofia aristotélica, é a realização plena e completa de uma tendência, potencialidade ou finalidade natural,
concluindo um processo transformativo de todo e qualquer ser animado ou inanimado do universo. É o ser em ato, isto é,
plenamente realizado, em oposição ao ser em potência.
50
Trivium: A fase inicial do ensino universitário, durante a Idade Média, caracterizado por possuir três disciplinas sendo elas:
gramática latina, lógica e retórica; as disciplinas que eram ensinadas antes do quadrivium, constituindo as artes liberais.
51
Oskar Schindler: (1908 /1974) foi um industrial alemão, espião e membro do Partido Nazi, que salvou da morte
1200 judeus durante o Holocausto, empregando-os nas suas fábricas de esmaltes e munições, localizadas nas
atuais Polónia e República Checa, respectivamente. É o tema principal do romance de 1982, Schindler's Ark, e do filme de
1993, Schindler's List, que mostra a sua vida como um oportunista interessado no lucro, inicialmente, mas que acabou por
mostrar uma iniciativa e dedicação extraordinárias com o objetivo de salvar as vidas dos seus empregados judeus.
130
ÍTALO MARSILI
Falávamos isto outro nome, o próprio nome, a ‘Lista de Schindler’, já é uma tendência a materialização,
é a quantificação... A ‘Alma de Schindler’, o ‘Olho de Schindler’, a ‘Vida de Schindler’, talvez fosse ‘A Ação
de Schindler’, talvez fosse mais preciso para dizer o que ele fez. Por isso, se ele tivesse salvo um, já teria
feito de algum modo.

VICTOR SALES
Porque a ciência massificou e a ciência materializou a vida humana, e tornou exatamente a vida humana
quantificável. Este é um aspecto da massificação. A massificação é quando há uma despersonalização da
pessoa, do indivíduo, pela sua redução ao número. Então você é consumidor, você é cidadão, você é
cliente, você é seguidor, você é alguma categoria ... Eu posso ser tudo isso também, mas ou mais que
um seguidor, um cidadão, um votante, um cliente, um consumidor, um fiel de uma denominação....

ÍTALO MARSILI
E a gente percebe claramente por que o texto poético, o texto sagrado, repreende, amaldiçoa aqueles
governantes que recensiam seu povo. É muito curioso, fica um pouco hermético, ‘por que aquele
governante fica amaldiçoado pelo censo, por ter recenseado o povo ?’ Olha, isto é uma explicação, é
uma tentativa de reduzir a quantidade, algo que não pode nunca ser reduzido a quantidade.

VICTOR SALES
É isso, o reino da quantidade que neutraliza a qualidade. É uma perda, é uma verdade parcial, o
Chesterton52 dizia isso e agrada muito essa ideia: ‘A modernidade é uma grande quantidade de heresias’.
Ele escreveu ‘Os hereges’53 de uma série de versões ideológicas, falsas, e usou a metáfora religiosa da
heresia, muito antes da conversão. E aí pediram,: ‘Bem, senhor Chesterton você escreveu os Hereges,
então qual a sua ortodoxia?’. Ele muito, jocosamente, decidiu escrever um livro chamado de
‘Ortodoxia’. Mas não seria a ortodoxia tradicional da igreja, seria digamos a ‘minha verdade’. Ele
percebeu que a ‘verdade’ do ‘comum sense’, a verdade das coisas óbvias, já tinham sido ditas há dois
mil anos, as verdades mais elementares, e ele se converte intelectualmente.

Uma das coisas básicas da crítica do cientificismo na ortodoxia é exatamente que o cientista quer colocar
o mundo todo na sua cabeça e isto é atitude do louco. Isto é atitude que Machado de Assis54 no conto

52
Gilbert Keith Chesterton: (1874 /1936), foi um popular ensaísta, romancista, contista, teólogo amador, dramaturgo,
jornalista, palestrante, biógrafo, e crítico de arte inglês. Chesterton é muitas vezes referido como o "príncipe do paradoxo".
53
Os Hereges: é uma obra em que G.K. Chesterton esboça a própria filosofia ao identificar os pontos fracos nas filosofias de
seus contemporâneos.
54
Joaquim Maria Machado de Assis: (1839 /1908) foi um escritor brasileiro, considerado por muitos críticos, estudiosos,
escritores e leitores o maior nome da literatura brasileira. Escreveu em praticamente todos os gêneros literários, sendo
poeta, romancista, cronista, dramaturgo, contista, folhetinista, jornalista e crítico literário. Testemunhou a Abolição da
131
‘O Alienista’ descreve a neurose de quem quer entender tudo e colocar tudo na cabeça. Este é o ser
humano mais inexperiente das coisas humanas, incapaz de rir, incapaz de se arrepender, incapaz de
perdoar, de entrar no drama humano que é marcado pela imprevisibilidade, pela contingência. Isso não
quer dizer que não possa haver Ciência Humana. Isso não quer dizer que Ciência Moral, porque aí, o
Chesterton escreve, ‘Já que não posso ter o conhecimento da moralidade, tal como conheço a Medicina,
então não vou ter nenhum’. Estupidez, reducionismo, radicalismo. E a modernidade é cheia destas
heresias que cortam um pedaço e excluem um todo e cujo sentido só faria com o resto. A Medicina
psiquiátrica tem todo sentido integrada ao resto. A Psicologia tem todo sentido integrada a Sociologia,
que tem todo sentido integrada a Economia, a História, a Religião. Então quando temos uma visão
integrada do mundo, aí sim, as coisas fazem sentido.

escravatura e a mudança política no país quando a República substituiu o Império, além das mais diversas reviravoltas pelo
mundo em finais do século XIX e início do XX, tendo sido grande comentador e relator dos eventos político-sociais de sua
época.
132
SEMANA 05: A CRISE NO FUNDAMENTO DA REALIDADE

Esta aula trata da crise no fundamento da realidade, que é a crise na existência de Deus enquanto ser
absoluto e ordenador da natureza humana

A CRISE NO FUNDAMENTO DA REALIDADE

❖ Nessa quinta aula do nosso módulo de ética, eu pretendo refletir com vocês sobre a crise do
fundamento de toda a realidade cultural. Que filosoficamente pode ser chamada de niilismo, e que
fica clara com a declaração de um filósofo chamado Nietzsche, da morte de Deus.
Estamos refletindo sobre uma série de ideologias que obscurecem a compreensão acerca do ser humano,
sobre a ética no campo da cultura. O niilismo é a crise no fundamento de toda a realidade; e este
fundamento é Deus.

❖ Então eu quero tratar com vocês hoje não só do ateísmo, mas do niilismo. Estamos refletindo sobre
uma série de ideologias, de pseudoverdades que obscurecem a nossa compreensão acerca do ser
humano, da alma humana, do comportamento humano, refletindo a ética no âmbito da crise da
cultura. E a crise da cultura é a crise do fundamento de toda a realidade, de todo o conhecimento, de
todo o valor possível. E o ser que é considerado o fundamento de toda a realidade na nossa tradição
é Deus.
Podemos pensar sobre Deus em dupla perspectiva: uma religiosa e outra filosófica, embora ambas
estejam interligadas. Nietzsche percebeu, no século XIX, que a sociedade européia não era mais cristã,
não tinha a religião no centro de seus valores morais e sociais. Vários autores deste período passam a
professar um chamado ateísmo esclarecido, interpretando a realidade e propondo uma nova experiência
humana e social, em que Deus não tem papel determinante.

❖ E Deus deve ser pensado aqui em uma dupla perspectiva, numa dupla dimensão:
➢ Religiosa: Obviamente uma religiosa, porque Deus é uma palavra da pessoa suprema que criou
o mundo, que na tradição cristã é a santíssima trindade, que vai redimir o mundo pelo seu filho
com a efusão do espírito santo.
➢ Filosófica: Mas também em uma perspectiva filosófica. É claro que eu quero focar mais na
filosófica. Embora eu deva dizer desde já que há uma relação umbilical entre a dimensão religiosa
e metafísica.
❖ Nietzsche percebeu, no século XIX, que a sociedade europeia já não era mais cristã, já não tinha mais
a religião no centro da sua valoração moral e social.
❖ Vimos na aula passada que o positivismo passou a considerar o conhecimento religioso superstição,
historinha, mito.

133
❖ Há vários autores no século XIX, que passam a professar um ateísmo esclarecido. Nietzsche é um
deles, Marx, Freud, Freheubar (que tanto influenciou Marx). Então há uma série de intelectuais que
estão ao mesmo tempo interpretando a realidade do seu tempo, mas também propondo uma nova
forma de experiência humana e social, em que Deus já não desempenha mais um papel
determinante e protagonista na realidade social, moral, cultural.
❖ O que significa isso para Nietzsche? Como ele interpreta a famigerada morte de Deus?
Nietzsche fala da morte de Deus, usando essa expressão jocosa para apontar que a sociedade não atribui
a Deus um papel preponderante. A Igreja não tem mais seu papel pedagógico, normativo e influente na
sociedade. A religião passa a ser vista como um fenômeno individual que não tem relevância na vida
cultural e política; essa é a compreensão do laicismo.

❖ Em primeiro lugar isso já é por si só uma expressão jocosa, irônica, porque Deus é imortal. Eu disse
ainda pouco que a filosofia enterra seus coveiros. O que dirá Deus que de fato não morre. Então em
primeiro lugar é a neutralização de DEUS para a sociedade. É a secularização.
A questão está além da descrença pessoal, a própria ideia de Deus é desvalorizada, e essa indiferença é
ainda pior que o secularismo. Quando falamos em ideia de Deus, não nos referimos a uma ideia
subjetiva, mas à forma eterna, imutável e perfeita que estrutura o aperfeiçoamento da realidade,
conforme compreendia Platão.

❖ A sociedade já não atribui mais a Deus, as instituições positivas, como as igrejas cristãs, nenhum
papel preponderante na vida individual das pessoas.
❖ A Igreja perdeu seu papel pedagógico, normativo e influente na sociedade.
Por exemplo pela formação das famílias pelo sacramento do matrimônio, na influência nas escolas
e nos currículos das escolas das crianças, a influência nos valores morais que vão ser veiculados pelos
parlamentos, pelos congressos, pela política.
❖ A religião passa a ser vista como um fenômeno individual.
❖ Veja, a religião é até tolerada do ponto de vista político como um direito individual, um direito a
liberdade religiosa. Então você pode ter religião se quiser, não vai mudar nada na sociedade. É essa
compreensão do Laicismo, é que a sociedade já não é pautada na religião, e que a religião não tem
força normativa na vida social, cultural e política. Repito, ela pode ser importante na sua vida
individual.
❖ Só que o Nietzsche percebe que não faz nenhum sentido Deus ser relevante para mim e não ser
relevante para a sociedade. É claro que se Deus fosse real, realmente obedecido, conhecido, seguido,
ele teria uma autoridade pública, sobre todas as pessoas. Ele seria o fundamento da política, o
fundamento da ciência, o fundamento da ética, o fundamento da cultura, que é o papel filosófico
que ele desempenhou ao longo da história.

134
❖ Então a nossa época não é só de um ateísmo individual, mas também não é uma questão de descrença
pessoal. Eu posso perguntar: Você acredita em Deus? Você não acredita em Deus? Como é a sua vida
acreditando em Deus? Como é a sua prática religiosa? Essa é uma questão importantíssima.

Não é essa a questão que o Nietzsche faz, a questão que ele faz é: nós desvalorizamos a ideia de Deus,
e não conseguimos mais viver, nem os religiosos, como se Deus de fato existisse.

Porque no fundo nós desvalorizamos metafisicamente, o fundamento que é Deus. E, portanto Deus
está morto. Não como o fenômeno religioso da secularização apenas, isso também é um papel, é uma
dimensão. Não como o fenômeno político do Laicismo, que é a exclusão da religião da esfera pública
e a sua privatização. Então você pode ser religioso dentro do seu quarto, dentro da sua comunidade
religiosa.
❖ É como se você fosse praticar um esporte tolerado nos limites da lei. Não, é pior do que o secularismo,
é pior do que o laicismo, é pior do que o individualismo religioso. É no fundo um indiferentismo
metafísico pelo fundamento.
❖ E Deus seria a ideia, e quando eu falo em ideia, não é a ideia mental ou subjetiva de cada um de nós,
mas a realidade formal eterna e imaterial que estrutura toda a realidade. Deus no sentido inclusive
que Aristóteles mencionava na metafísica. Que Platão na República, chamava de ideia do bem, no
banquete de ideia do belo. Aquela forma eterna, imutável, perfeita, que estrutura o aperfeiçoamento
de toda a realidade.
Todo ente tende à perfeição; para isso, é necessário que haja um ser perfeitíssimo, que realiza em si
mesmo todas as possibilidades, que está em puro ato, ou seja, não conhece a potência, a mudança. Deus
está em um patamar ontológico superior e transcendente, confere unidade à perfeição, articulando a
possibilidade de uma perfeição moral e intelectual. Se hoje não temos mais ideais normativos de
perfeição e excelência, é porque perdemos a fé, a crença cultural de que há Deus.

❖ Mencionamos na aula passada em um diálogo com o Ítalo a ideia da perfeição intrínseca a que tente
todo ente. Para que todo ente tenda à sua perfeição; é necessário que haja um ser perfeitíssimo, um
ser que realiza em si mesmo todas as suas possibilidades, que está em puro ato, um ser que não
conhece a potência, que não conhece a mudança, nem para pior, nem para melhor.
❖ Ele não piora porque já é perfeito. Ele não melhora porque se ele melhorasse ele seria ainda
imperfeito. Então Deus está em um patamar ontológico superior e transcendente, que confere
unidade à essa perfeição, e portanto articula a possibilidade de uma perfeição moral, de uma
perfeição educacional, e uma perfeição intelectual.
❖ É por isso que nós não temos mais ideais normativos de perfeição e de excelência, entre outras coisas,
é porque perdemos a fé, mas não só no sentido religioso, mas a crença cultural de que há Deus.

135
❖ Nietzsche em um aforismo muito famoso, de uma obra chamada “A Gaia Ciência”, falava do homem
louco. “O homem louco foi para a praça do mercado com uma lanterna.” E aqui é uma alusão a
Diógenes, o Cínico. Que andava pela praça da cidade grega procurando um homem com uma lanterna
ligada à luz do dia. Falando: “Procuro um homem, procuro um homem!”
❖ O Cínico está criticando sobretudo as aparências, a vaidade, todo aquele espetáculo que nós
mencionamos na segunda aula.
Há uma passagem de Nietzsche que descreve bem o niilismo contemporâneo, que é um ateísmo prático,
um indiferentismo moral: um homem louco vai à praça pública e afirma: “Deus está morto, e nós o
matamos”. Há aí a crença de que a vida não tem sentido último, porque a morte apaga tudo, não há
mais um valor supremo, como é o amor na tradição cristã. Nietzsche percebe a transvaloração, uma
mudança nos valores, no modo de aquilatar o valor das coisas.

❖ Nietzsche para fazer essa frase, esse acontecimento famoso na história da filosofia descrito por
Diógenes e Laércio, diz que o homem louco foi para a praça perguntando: “ Para onde foi Deus? Gritou
ele. Já lhes direi, nós o matamos vocês e eu. Somos todos seus assassinos. Mas como fizemos isso?
Como conseguimos esvaziar um mar? Quem nos deu a esponja para apagar o horizonte inteiro? Que
fizemos nós ao desatar a terra do seu sol? Para onde ele se move agora? Para onde ela (a terra) se
move? Para onde nos movemos nós? Para longe de todos os sóis? Não caímos continuamente para
trás, para os lados, para frente, em todas as direções? Existem ainda em cima e embaixo? Não
erramos como que através de um nada infinito? Não nos bafeja o espaço vazio? Não se tornou mais
frio? Não anoiteceu eternamente?”
❖ Essa passagem do Nietzsche, a meu ver, é a passagem mais eloquente para descrever o niilismo
contemporâneo, um ateísmo prático, um indiferentismo moral. Uma crença de que a vida não tem
sentido último, de que a morte apaga tudo, esgota tudo, de que tem nenhum valor supremo, como o
amor na tradição cristã.
❖ E principalmente, isso é muito importante, tudo é uma questão de valor.
❖ Nietzsche percebe que a transvaloração de todos os valores é a mudança na maneira de aquilatar o
valor das coisas.
NIILISMO E RELATIVISMO

❖ Antes as coisas eram consideradas como bens.


O pensamento moderno é oposto à virtude, pois as virtudes – como a temperança, a fortaleza, a
prudência, a justiça – dependem da natureza humana. Ou seja, uma natureza regida por uma lei, o que
implica a ideia de um Criador, uma inteligência que a estruturou. Os dados da criação – como os
temperamentos, as cores primárias, as estações do ano – são reais e objetivos, são dados metafísicos da
realidade, não são fruto do acaso.
136
❖ A palavra virtude é oposta a essa tradição moderna porque ela é diferente da palavra valor.
Quando eu falo que a temperança é uma virtude e não um valor eu quero dizer que você tem na sua
alma a capacidade de temperar os prazeres e de ordenar os prazeres. Quando eu falo da virtude da
fortaleza, eu digo que você tem a paixão do da covardia, do medo e pode superá-lo pela virtude da
coragem. Você pode ter paciência, resistência, resiliência, magnanimidade.
❖ Você pode buscar coisas mais altas voos de Águia ao invés de rastejar como galinha de capoeira. Você
pode ter prudência, contextualizar refletir, pensar, silenciar, deliberar. E por fim você pode ser justo.
Dar aos outros o que lhes é devido, respeitá-los, amá-los, ajudá-los. Isso não são valores meus. Isso
são verdades morais da sua alma.
Mas se não há uma inteligência suprema que ordena e governa as leis naturais, não há natureza humana;
e se não há natureza humana, a liberdade é vazia. Jean-Paul Sartre, leitor de Nietzsche, proferiu uma
palestra chamada “O existencialismo é um humanismo”, em que afirma que não há Deus para ter criado
uma natureza humana; o ser humano não tem essência, somente existência; ou ainda, para ele, a
existência é que precede a essência. Assim, estamos em um mundo sem sentido, sem um princípio de
perfeição, porque esta é transcendente, e nós estamos presos na imanência.

❖ Isso depende de uma natureza humana. E vejam só, uma natureza humana depende de um Criador,
depende necessariamente de alguém ou de uma inteligência que estruturou a regulação formal desse
fenômeno.
❖ O que é Natureza? Natureza é o que nasce, está ligado a “nascere”, ligado a vida. Mas não é uma
vida desordenada. Está ligada a uma lei natural de reprodução, de desenvolvimento, de procriação.
Tudo que é natural, tem uma lei que o regula.
❖ Então, uma árvore, é um ente da natureza, podemos estudar essa árvore a partir das leis naturais, da
fotossíntese, do modo de nutrição desta árvore que tem uma alma vegetativa, se ela dá frutos, se ela
dá frutos na primavera, no verão, como é que ela resiste ao Inverno, ao outono.
Toda a teoria dos temperamentos, por exemplo, ligar aos elementos fundamentais, as estações
fundamentais, as cores fundamentais, os humores fundamentais da alma humana. Vejam que isso é
uma questão material, objetiva, real, que interfere. Você tem um temperamento, você tem uma
relação com pessoas que tem por sua vez temperamentos. E portanto a relação interpessoal será uma
relação Inter temperamental. E vejam que isso é objetivo, real, isso é um dado da criação, um dado
metafísico da realidade, se não tem Deus isso não é fruto do acaso. As cores primárias, as estações do
ano, as notas musicais, nada disso é fruto do acaso.
❖ Então, quando não se tem uma inteligência suprema governando e ordenando a natureza, não há
natureza humana; e se não há natureza humana, a liberdade é vazia.
❖ Jean-Paul Sartre, em 1947, leitor de Nietzsche, percebeu essa problemática e proferiu uma palestra
chamada “O existencialismo é um humanismo”, em que ele propõe mais um ateísmo esclarecido. E o
ateísmo dele nessa palestra é muito didático, muito simples. Ele diz: “Não há Deus para ter criado
137
uma natureza; o ser humano não tem uma essência, ele só tem existência; ou melhor, (ele diz uma
coisa que é metafisicamente impossível e até engraçado) a existência precede a essência.
Nós estamos, segundo o Existencialismo de Sartre lançados em um mundo sem sentido. E se o mundo
não tem sentido não tem princípio de perfeição, porque a perfeição é uma transcendência , e nós
estamos presos na imanência55.
❖ Vocês lembram da primeira aula quando eu falei da caverna de Platão, essa é outra imagem
extraordinária para contrastar. Segundo Sartre nós estamos presos em uma caverna sem saída. E é
assim mesmo, é um conjunto de sombras, é um conjunto de aparências, é um conjunto de enganos. E
ele diz, famosamente, a vida é uma paixão inútil. Não tem muito o que fazer.
❖ Qual o resultado disso? Você pensa que o Sartre era uma pessoa feliz, alegre, motivada, satisfeita,
servindo, escrevendo? Alguém que estava amargurando as dores da guerra, e devemos até desculpar
e conceder muitas ressalvas.
❖ Muitas dessas concepções, são concepções profundamente pessimistas. Porque não conseguem ter
nenhuma esperança, nem transcendente, nem imanente. Porque veem bombas e veem mortes ao seu
redor. Muitas pessoas na nossa época podem ceder ao pessimismo, justamente pela falta de modelos
que plasmam as virtudes e a inteligência da alma humana, podem considerá-las impossível de serem
alcançadas.
Victor Frankl dizia que cada época tem sua neurose coletiva, e a de nosso tempo é o niilismo, o
esvaziamento de todos os valores. Os ideais de autonomia e autenticidade, de estabelecer os próprios
valores, mostraram-se frágeis, geraram uma mudança no modo de encarar a ética. Somente Deus pode
oferecer um parâmetro a nossos comportamentos, porque Ele é absoluto.

❖ Victor Frankl dizia que cada época tem sua neurose coletiva, e a de nosso tempo é o Niilismo, o
esvaziamento de todos os valores.
❖ Principalmente porque se os valores forem fundados no sujeito eles não se sustentam, porque o sujeito
não é estável o suficiente para estabelecer os seus próprios valores. Os ideais de autonomia e
autenticidade, mostraram-se frágeis.
❖ A autenticidade é a ideia de que eu de algum modo sou eu mesmo, e não me baseio, não me guio,
não sigo outras pessoas, sou autêntico. Na verdade eu posso reivindicar a minha autenticidade em
relação a uma moda, a uma tendência, aderindo à outra, porque eu sempre terei um modelo, eu

55
Imanente, é um termo que se utiliza na filosofia para designar aquilo que é inerente a algum ser ou que se encontra unido,
de forma inseparável, à sua essência. Desse termo ainda deriva outros como “imanência”, termo derivado que designa a
existência de um ser supremo dentro de um mundo físico. Tal conceito cria um contraste com a ideia de transcendência.
Imanência é um conceito filosófico e ontológico que significa a presença interior de algo ou uma qualidade como parte de um
ser, ou do ser como parte dela, sendo antitético ao conceito de transcendência.

138
sempre terei uma forma, eu não sou o único homem no primeiro dia da criação. Eu sempre me
relaciono com propostas.
A consequência do niilismo é o relativismo. Quando o homem deixa de acreditar em Deus, passa a
idolatrar todo o resto. Mais ainda, o homem passa querer ser seu próprio deus, em um subjetivismo
exacerbado que considera o sujeito individual como a fonte de seus valores e reivindica para si as
qualidades de Deus: a onisciência, presente na relevância exacerbada ao conhecimento científico, e a
onipotência, expressa na dimensão do domínio técnico.

❖ Adão e Eva no paraíso tinham duas opções muito claras, a de Deus e a da serpente. E portanto são
livres. Eles não são autênticos e nem autônomos. Mas a proposta da serpente é exatamente ser senhor
do bem e do mal, conhecer o bem e o mal (Nietzsche adorava isso).
Nietzsche propôs uma moral para além do bem e do mal. Que é o relativismo absoluto, é esse
relativismo que não tem nem em cima nem embaixo, nem o bom, nem o pior, nem o melhor
❖ Porque a valoração é subjetiva, e esse niilismo gera um subjetivismo. Gera uma autoidolatria, uma
autodivinização. Eu me torno o Deus da minha própria vida. E se isso fosse bom, positivo, capaz de
tornar pleno e saciar o coração humano, todos os niilistas, os ateístas práticos, os relativistas, os
subjetivistas, estariam felicíssimos.
❖ Mas talvez, seja o contrário, muito provavelmente ,eles estão lotando os consultórios de vocês.
❖ Segundo Nietzsche os valores se tornaram infundados. Você pode ter valor, no futebol, na música, na
família. Tudo bem, mas se isso é só um valor, amanhã você pode desvalorizar. Você pode dizer eu não
dou mais valor, ou dou o maior valor, falamos isso no cotidiano.
❖ Hoje você pode dar valor, amanhã pode não dar mais. Amanhã você pode não dar valor a vida.
Nietzsche percebe que a transvaloração de todos os valores, é uma mudança no modo de valorar a
realidade e de encarar a própria ética, que é o que estamos estudando. Diferente de encará-la por
bens e por virtudes e principalmente com base na verdade que só Deus pode conferir ao
comportamento. Porque Deus é absoluto, transcendente, eterno, imutável, perfeito, inteligente, bom.
Então tudo que dele deriva, tudo que dele se articula tem uma realidade, uma bondade e uma beleza
que não é minha, mas da qual eu participo, pelo amor.
❖ Nietzsche percebeu muito bem tudo isso. Percebeu essa ideia, de Deus, da verdade, da bondade, da
participação pelo amor, mas agonizou, sofreu muito, inclusive psíquica e psiquiatricamente. E
percebeu que sua sociedade e ele mesmo já não eram mais capazes de viver com base naquela
perspectiva. Porque aquela perspectiva tradicional tanto religiosa quanto metafísica foi neutralizada
pelo positivismo e pelo romantismo.
❖ Ele é um príncipe do romantismo. Ele está no movimento alemão típico, de Schopenhauer na filosofia,
de Bethoven, Schulman, Schubert na música. E sobretudo de Wagner que ele tanto amava. Até
Wagner ter apresentado o seu Deus substituto. Até Wagner ter demonstrado que não é possível viver
sem Deus. Ou você tem Deus ou você tem ídolos, isto é você tem um Deus substituto.
139
❖ Claro que Wagner transformou a música, a sua grande ópera e o Estado Germânico em Deuses. E
Wagner começou com algo que o Nietzsche odiava que era o antissemitismo. Porque você deixa de
acreditar em Deus e passa a acreditar em todo o resto. Você precisa de algum polo estável, alguma
gravidade para enfocar todo o resto. Então, não é que Wagner fosse simplesmente pós cristão, e não
mais cristão. Wagner tinha outra religião. Uma religião pagã que cultua o Estado, e que tem na música
a sua liturgia.
❖ Já falamos em um diálogo de uma das aulas, o Ítalo mencionou a liturgia e o teatro como sendo menos
realistas, do ponto de vista representacional, mas que nos apresenta uma forma superior de vida. Ao
passo que a crise da representação gerou um hiper-realismo em que nós mesmos nos expomos uns
aos outros. Então nós passamos a nos idolatrar. Se antes uma procissão religiosa lotava as ruas, hoje
uma banda de rock lota as ruas, comícios políticos, atividades esportivas.
❖ A pergunta que o Nietzsche se faz é: É igual, tanto faz, tanto fez, é a mesma coisa ir para uma
procissão religiosa ou para uma procissão esportiva? É a mesma coisa ir para uma procissão
econômica de uma Black Friday ou para uma procissão política?
❖ O moderno é assim, você vai ao shopping, eu vou pra política, o outro vai para o esporte, o outro para
a música, o outro para a igreja... Tudo bem... Tanto faz...cada um na sua... a gente se tolera. Essa é a
ideia do liberalismo.
❖ E a pergunta que Nietzsche faz é, será que não tem alguma coisa superior que outra? Alguma coisa
melhor que outra? Algum esporte mais saudável, mais edificante do que outro? Um produto que você
compre no shopping melhor que outros produtos? Ou tudo é uma questão de propaganda? Ou tudo
é uma questão de retórica?
❖ E aí podemos lembrar que a caverna de Platão, que é esse horizonte em que estamos acachapados,
presos, é um horizonte de relativismo. Claro que a consequência do niilismo é o relativismo. Porque
não há mais hierarquia, não há mais verticalidade, não há mais nada acima ou abaixo. Tudo está
acachapado. Nietzsche percebe que cada ser humano quererá ser seu próprio Deus.
No Zaratustra que é uma obra prima dessa filosofia niilista, Nietzsche afirma: “Dizia-se Deus, outrora,
quando se olhava para mares distantes. Mas agora eu vos ensino a dizer super-homem. Mas deixai
que vos abra totalmente o meu coração amigo, se houvesse Deuses, como toleraria eu não ser um
Deus. Logo não há Deuses.”
❖ Há uma compreensão aqui, de o sujeito passa a ocupar o local que antes era de Deus. E esse
subjetivismo exacerbado, considerar o sujeito individual como a fonte máxima de valores é
completamente estéril, infecundo, fraco, pelo simples fato de que não há capacidade de fundar os
valores na própria subjetividade.
❖ Eu vou ler um texto de um filósofo chamado Alain Renoir, de um livro “A Era de um indivíduo”, sobre
esse antropocentrismo do humanismo moderno. “O que na antiguidade, ainda mais na era medieval
era o lugar de Deus, torna-se na modernidade o lugar do homem. Que logo reivindica para si os dois
atributos tradicionais de Deus: Onisciência, daí a representação da cultura moderna como marcada
140
pela relevância concedida ao conhecimento científico, e obviamente ao pensamento em sua feição
meditativa. E a Onipotência, ou poder total que deverá expressar-se por meio da dimensão técnica de
nossa cultura. Fato que efetivamente significa a mobilização do pensamento enquanto puramente
voltado ao cálculo.
Essa perspectiva também pode ser considerada gnóstica, conforme explica Eric Voegelin. A gnose é a
compreensão de que uma espécie de conhecimento iluminado pode transformar a realidade para
melhor, mas isso tem um custo. Voegelin percebe que as guerras mundiais e os totalitarismos são como
religiões políticas e gnósticas da modernidade: têm o projeto de progresso social, mas a custo do poder
total do Estado e da ciência.

❖ É exatamente o positivismo que nós vimos na aula passada afeiçoado a tecnologia de transformação
do mundo.
❖ Esse gesto também pode ser considerado, nas palavras de um outro filósofo importante chamado
Eric Voegelin, um gesto gnóstico. A Gnose, que está ligada ao antigo maniqueísmo, é o conhecimento
científico iluminado capaz de transformar a realidade para melhor. Então o projeto gnóstico é um
projeto de transformação da sociedade para o progresso social. Só que isso tem um custo. Ele
percebe que as guerras mundiais e principalmente os totalitarismos, são as religiões políticas
gnósticas da modernidade. O custo é o poder total do Estado. O custo é poder total da ciência. E por
isso o positivismo sem limite na lei natural. E por isso o positivismo sem limite na lei divina.
❖ E por isso o positivismo quer é o poder da ciência tudo conhecer e excluir o que ela não pode
conhecer, e excluir tudo aquilo que possa o Estado, ou as instâncias desenvolver e aplicar e praticar
esse “progresso”. Então, imperativo do progresso em dois âmbitos: A ciência sempre pode progredir,
sempre pode conhecer mais da realidade material, não há limite.
VIDA HUMANA E TRANSCENDÊNCIA
❖ A religião sempre foi um limite ao conhecimento científico, não que ela o limitasse, mas porque,
como disse Blaise Pascal, o último passo da razão é entender que infinitas coisas a transcendem. O
verdadeiro sábio é aquele que percebe a limitação do conhecimento científico, a limitação da sua
capacidade de conhecer.
A religião sempre foi um limite ao conhecimento científico, não porque ela o restringisse, mas porque, como disse
Blaise Pascal, o último passo da razão é entender que infinitas coisas a transcendem. O verdadeiro sábio é aquele
que percebe a limitação de sua capacidade de conhecer. Os grandes cientistas reconheceram uma inteligência
suprema que ordena o cosmos, a existência de Deus. E isso era o que impedia a sacralização do mundo secular. O
cristianismo, naturalmente, foi a religião que separou com mais clareza os poderes político e religioso.

❖ Quando Pascal diz: “o último passo da razão é entender que infinitas coisas a transcendem”. Isso
significa que você precisa ter chegado no último passo da razão. Você nem começou a pensar, nem

141
começou a estudar, nem começou a investigar, e já está dizendo que não existe Deus e nem uma
inteligência suprema.
❖ O próprio Einstein dizia: “Deus não simplesmente joga os dados.”
❖ A maioria dos grandes cientistas reconheceram essa inteligência, reconheceram a existência de
Deus. Reconheceram a inteligência dessa realidade suprema inteligente e inteligível num aspecto
que organiza e ordena o cosmos. E essa realidade transcendente impediu a divinização
e a sacralização do mundo secular.
❖ O cristianismo naturalmente foi a religião que mais separou com perfeição e com mais clareza, os
âmbitos de Cesar e de Deus. “Daí a Cesar o que é de Cesar. Daí a Deus o que é de Deus”. Porque
antes Cesar era Deus. Em todas as tradições o poder político estava intrinsecamente ligado,
associado ao poder religioso e autoridade religiosa. E o político era aquele responsável por regular
o cosmos social, como Deus regula o cosmos natural.
O reconhecimento da existência de Deus é fundamental para a vida humana, para que haja liberdade e
obediência na adesão a um projeto de aperfeiçoamento, felicidade e plenitude. O indiferentismo
religioso, o niilismo, a negação do fundamento da realidade geram as patologias que são enfrentadas no
consultório e na vida prática.

❖ Portanto, para concluir, o reconhecimento de que Deus existe ou não existe, é fundamental para a
vida humana, é fundamental para essa dimensão da liberdade como obediência e na adesão a um
projeto de aperfeiçoamento, felicidade e plenitude, como a sabedoria clássica e tradicional propõe.
Ou da inexistência de Deus, portanto o ônus que o próprio homem tem de seguir as modas do seu
tempo, seguir os ídolos do seu tempo ou o ídolo que ele mesmo se transforma a si mesmo de um
narcisismo auto idolátrico.
Em nosso tempo, é inegável a influência de Freud, que também era um seguidor de Nietzsche. Freud foi
uma espécie de Platão às avessas. Se para este o Eros é uma força ascensional, que busca a beleza, a
perfeição e a transcendência, para Freud, a libido é uma força que move a alma para o prazer. Além
disso, considerar que, para o ser humano, tudo tem origem sexual é um modo totalmente incompleto
e incorreto de compreendê-lo. Perde-se assim a capacidade de enxergar a dimensão superior da vida
humana, ficamos não além, mas aquém do bem e do mal.

❖ O indiferentismo religioso, o niilismo, que é essa total negação do fundamento gera as patologias que
são enfrentadas no consultório e na vida prática em geral. Não me refiro só a depressão, a tristeza, a
acídia, a tibieza, ao tédio, não só todas essas manifestações evidentes do niilismo. Mas também uma
idolatria positiva do Estado, da Economia, da História, ou da Ciência.
A proposta de Freud, de que o centro agente do homem é o seu inconsciente, é o contrário do mito da caverna
de Platão, em que se busca a ascensão, a luz. Freud vai pelo caminho contrário da caverna, afunda cada vez mais,
chega a um lugar profundamente escuro. Esse modo de compreender o ser humano é o princípio do caos.

142
Papo Filosófico Ítalo Marsili e Victor Sales – Semana 05

ÍTALO MARSILI:
Queria que você falasse um pouco sobre o Freud, um pensador que orienta o pensamento da psicologia
contemporânea, em concreto essa ideia da transvaloração moral e um uma certa impossibilidade de
coexistência da psicanálise freudiana com a tradição antropológica clássica.
Em nenhuma dele você encontra uma explicação do que é o homem, isso é muito curioso. Não existe ali
um lugar epistemológico para a pessoa, para o homem, para o “Eu”. Ele começa a falar sobre o homem
sem se perguntar quais são as possibilidades desse mesmo homem. Ele tinha uma visão sobretudo
mecanicista do homem. Inclusive ele mesmo enuncia, ele puxa conceitos da termodinâmica para explicar
o funcionamento do homem, o que é muito curioso conectando com a aula anterior. Então Freud tem
uma visão materialista do homem. Eu queria trocar uma ideia sobre a conversa entre esses dois filósofos
superimportantes do nosso tempo (vamos colocar Freud como um filósofo aqui, porque ele não deixa
de ser).

O Nietzsche por um lado, aquele sujeito que filosofa com um martelo. E o Freud que também é um
niilista, mas você não vê essa energia do martelo mas na mão do Freud. Freud já é um niilista cansado.
O próprio olhar dele nas fotos nos mostra alguém perplexo, cansado. Quase que vivendo o tédio, um
niilismo cansado pouco propositivo. Não é igual àquela perplexidade do Nietzsche que vemos um olhar
de fogo. Um sujeito que ainda se colocava questões quase não querendo acreditar no que ele mesmo
dizia.

Não dá pra negar a importância do Freud no nosso tempo. Toda a nossa vida prática está inundada pelo
pensamento freudiano, que por um lado propõe um certo niilismo, por outro lado na sua mesma
concepção do homem aposta em um hedonismo. O que é muito curioso. Nas palavras dele : “ Pra que
ter prazer se no fundo uma psicanálise bem-sucedida levaria o sujeito ao suicídio ?” Mas como vivemos
o tabu, isso não consegue se completar. (São palavras do próprio Freud para a prática dele).

O Freud era esse sujeito que, assim como o Nietzsche, que faz uma aposta no conhecimento do bem e
do mal. Tem uma coisa que eu acho muito curiosa que é até o título da obra do Nietzsche, a própria
proposta dele, “Para Além do Bem e do Mal”. Eu não consigo ler esse título sem imaginar que o próprio
Nietzsche está fazendo uma piada sobre a coisa. Não é possível que ele não soubesse que ele estava
falando o que na verdade era aquém do bem e do mal. Como o homem que é um bicho que morre, pode
estar para além do bem o do mal?

143
Victor Salles:
É muito desafiador interpretar dois dos maiores filósofos e protagonistas do pensamento
contemporâneo. Mas tentamos trazer principalmente para as consequências desses pensamentos.
Em relação ao Freud me parece que ele é um Platão invertido.
Para Platão, o Eros é uma força ascensional, que busca a beleza, a perfeição e a transcendência, a saída
de si. A libido, do Freud parece uma força que move a alma para a gratificação, para o prazer. E como o
princípio do prazer é cerceado pelo princípio da realidade, e a formação dos tabus e o pelo superego,
há uma tensão psíquica que precisa da famosa sublimação. Essa é uma forma tão difícil, tão errada, tão
incompleta, tão imperfeita de compreender a realidade humana. Você considerar que tudo tem origem
sexual. Você falar de sexualidade infantil como desejos de satisfação de uma libido, uma pulsão inscrita
no corpo, que vai gerar a linguagem. Que a produção cultural, que a religião, que a grande arte, a grande
música, os grandes códigos de lei, que tudo de grandioso que se produz vem no fundo dessa castração
originária. É contraintuitivo, muito frágil, e que só encontra ressonância a meu ver em outro grande erro,
que é o erro de Marx, ao achar que a superestrutura é projeção da infraestrutura material.
Com esses dois materialistas, mecanicistas, o ponto de partida é tão errado, que você não tem
capacidade de compreender a dimensão superior da vida humana, a dimensão cultural, espiritual, moral.
E a sua questão é muito interessante. Portanto eles estariam aquém do bem e do mal. Mas eu acho que
o sentido do além... o Nietzsche usa palavras muito fortes, que eram palavras que na Alemanha se usava
muito no século XIX, muito progresso, pra frente, pra cima, pra além, a consumação, a consecução, a
evolução. Então eu acho que ele quer dizer a superação de um modelo metafísico em que há bem e mal.
Em que o bem está no topo e o mal está embaixo. E que há uma gradação, e que há uma elevação da
alma.
Para ele, isso é negar o humano demasiado humano, é que há só terra não há céu. Não há alto, só há
baixo. E se não há alto... nem o baixo é baixo também, porque o baixo só é baixo em relação ao alto. A
morte exclui tudo, a morte esgota todas as possibilidades, o que sobra é esse corpo pulsante.
Só que o Nietzsche não era tão reducionista quanto o Freud. Nietzsche achava que tinha uma vontade
de poder que atravessava a pessoa, que atravessava as sociedades, que é absolutamente irracional, que
é um vetor sem tê-los, sem destino, sem ordem, sem finalidade. Mas que arrasta e permite fazer coisas
grandes.
Nietzsche tinha uma noção de grandeza, relativa, claro. Mas ele olhava para o Schopenhauer e admirava
muito, olhava para o Napoleão e falava, esse homem é grande. Com o Freud eu não sei se isso é possível
de ser dito. Quem é um homem grande? Quem é um homem realizado? Quem é um homem pleno? É
um homem adaptado.
A Hannah Arendt tem uma frase que eu também não esqueço em um artigo chamado “A Crise da
Educação” que diz, a psicanálise, pelo menos a prática da psicanálise... Eu também quero ser muito

144
honesto, eu não estou falando tanto do Nietzsche e do Freud em si mesmos, mas das consequências
culturais dessa prática, do niilismo e da psicanálise.

Para ela a consequência da prática da psicanálise é a adaptação, a normalização de uma sociedade


doente. Reconhecimento de que no fundo todo mundo é doente, tem traumas, neuroses, psicoses, ou
é um ou é outro. E que você precisa se adaptar minimamente e aceitar uma sociedade que no fundo
nunca realizaria.

Que proposta de vida, que concepção de vida, profundamente pessimista. É o reconhecimento de uma
doença incurável. Agora isso depende de um gnosticismo, de um Deus mal. Isso depende do gnosticismo,
se existe uma doença incurável... Que realidade é essa? Que plano é esse?

ÍTALO MARSILI:
Claro. Podemos discutir a visão da Hannah Arendt sobre o Freud em algum momento. Acho até válido.
Mas tem uma outra coisa que eu queria jogar aqui pra conectar com a caverna de Platão. Você falou que
o Freud talvez fosse um Platão às avessas.
E a partir de um certo momento eu não consegui ler Freud sem imaginar que a proposta dele do
inconsciente como o centro agente do homem fosse de fato o mito da caverna ao contrário. Se por um
lado eu tenho o Platão ascendendo e procurando a luz e dizendo aqui está, nessa ascensão e nessa luz
que está o fundamento mesmo da possibilidade de ação do homem por assim dizer, ou de livrar o
homem desses fantoches. O Freud, ele vai no caminho contrário da caverna, afunda cada vez mais,
chegando em um lugar totalmente escuro, lugar do qual não se pode falar, porque se você fala já não é
mais inconsciente.

Se veio à tona por um ato falho ou por uma verbalização consciente, já não é mais inconsciente, é pré-
consciente ou consciente. Mas subjaz no homem esse fundo inconsciente, que é o que explicaria o
homem. Ora como você pode explicar o homem a partir de algo que é completamente escuro, sem vida,
morto, onde não se distingue as formas? Essa é ou não é uma visão do homem profundamente niilista?
Pra dizer o mínimo.

VICTOR SALLES:
E é o princípio do caos. É o princípio da desordem. Porque no princípio era o verbo, no princípio é o
logos, no princípio é a ordem, cuja desordem pode ser comparada, como todas as tradições pensavam,
com um estágio de perda da ordem, um estágio de decadência de uma ordem primitiva, de uma ordem
primeira. Se o núcleo agente é o inconsciente, é o escuro e se não tem possibilidade de ordená-lo, se ele
não é a privação de luz, mas ele é aquilo que subjaz em uma iluminação parcial, realmente não tem
possibilidade de iluminar ou de lidar com esse princípio de modo construtivo e articulado com os demais.

145
Por isso que “o inferno são os outros”, por um grande freudiano que é o Jean Paul Sartre. Por isso que a
relação humana vai ser insuportável. Por isso que o princípio das relações sociais se tornará intolerável,
e por isso que a política se tornará guerra. Guerra contida muitas vezes. Mas não mais uma esperança
de amizade, de comunhão, de comunicação real. Mas será uma disputa, uma luta.
E aí temos essas duas bases muito claras, Hobbes, toda a filosofia política moderna, que vai influenciar
o Nietzsche e o Freud, que é a ideia do indivíduo preso nele mesmo, e que não se liberta com os outros,
não dá as mãos aos outros para se libertar e alcançar alguma coisa junto. Mas que está preso em si.

ÍTALO MARSILI:
Me chama a atenção o final da vida do Freud, como a paródia Platônica final. Do mesmo jeito que
Sócrates bebe a Cicuta, por um certo motivo, o Freud também se mata bebendo veneno, suicídio. Porque
não aceita mais aquelas dores, porque não aceita aquela realidade da vida dele.

VICTOR SALLES:
O suicídio passa a ser um tema filosófico com Albert Camus com o mito do Sísifo. Não é racional, nem
razoável, mas bastante compreensível para essa geração, que realmente já não vê sentido em tudo.
Existe o suicídio real, consumado. E existe o suicídio em vida, a perda da vitalidade, a perda da energia
vital, a perda da esperança, que vai obscurecendo o mundo.

Nietzsche fala: “A morte de Deus é o apagamento do sol, e Deus é o único sol de luz própria na galáxia.
A lua tem luz refletida. A vida toda depende do calor do sol, ele é a fonte de vida. O sol não é iluminado
por nenhum outro astro, nem tem o seu calor debitário de outro astro. Esse é Deus, simbolicamente. E
Apolo também. Não havendo isso... Trevas.

ÍTALO MARSILI:
Que é a aposta freudiana, que existe umas trevas, que é o que rege toda ação humana. Evidente que o
fim da vida de um sujeito que pensa assim vai ser a morte mesmo.

VICTOR SALLES:
Morte autoimposta. Vista inclusive como um ideal de grandeza. Camus se pergunta no mito de Sísifo: “
O suicídio é um sinal de grandeza e de coragem?” Só cogitar esses termos já é ter partido de uma
premissa muito falsa. De que a vida é gratuita, de que a vida é arbitrária. De que a vida é ociosa do ponto
de vista metafísico. De que nós não somos pessoas humanas intrinsecamente dignas. A desvalorização
da vida dos outros também. E daí o aborto, o homicídio. O que é o genocídio da guerra? A vida humana,
tanto faz, 5.000 a menos, 6.000 a mais...

ÍTALO MARSILI:

146
Vale a pena investigar e desconfiar dessas grandes filosofias que prepararam a grande guerra e que
vieram logo após elas. Algo de muito doente em ambas.

VICTOR SALLES:
O que tem na guerra (como a primeira e a segunda guerras) é a metonímia desse desespero total. Que
tiveram antecedentes, mas nunca no mesmo nível de destruição, de negação e de gratuidade, de
indiferença do que se estava fazendo. Tem um filme: Apocalipse Now, que embora fale da guerra do
Vietnam, está falando da gratuidade da violência, um matando o outro por nada. Isso mostra a
gratuidade da vida, e as vezes vai virar realidade.
E não vai ser só a causa do filme ou de vídeo game. Existe uma causa de fundo ali, nesse niilismo. O
Niilismo é um dos grandes temas do cinema, que é uma arte que cresce no século XX, e ganha
visibilidade. Exemplo: Taxi Driver niilismo não tem grandeza, não tem redenção.
Nietzsche odiou a última obra do Wagner, Parsifal56, porque ele viu o tema cristão de redenção. Como
se isso fosse perder a tragicidade, como se a tragicidade não fosse um problema. É se render a tragédia.
Aquela concepção trágica que ele gostava do Wagner, como se o mundo fosse um combate incoersivo
de forças que se entrechocam sem sentido, sem redenção, sem harmonização possível, sem amor.

ÍTALO MARSILI:
O filme ‘Fita Branca’, é um filme que grava muito bem isso. ‘Fita Branca’ é a história que se passa na
geração que precede a grande guerra. Filma os jovens antes da grande guerra, totalmente reprimidos.
As crianças que cometiam erros triviais, eram punidas e marcadas com uma fita branca. Elas não podiam
pedir desculpas, e não havia ninguém que as desculpasse também. Isso gera um estado de alma
específico. Um mal sem a possibilidade de redenção, cria algo no sujeito. Um mal sem a possibilidade de
redenção cria algo no sujeito. E a tese é, foi essa geração que deu suporte a grande guerra, que causou
a guerra.

56
Parsifal: é uma ópera de três atos com música e libreto do compositor alemão Richard Wagner, que estreou em Bayreuth
no mês de julho de 1882. É vagamente baseada em Parzival, atribuído a Wolfram von Eschenbach, um poema épico do século
XIII do cavaleiro arturiano Parzival (Percival) e sua busca pelo Santo Graal (século XII).Wagner concebeu o trabalho pela
primeira vez em abril de 1857, mas não o concluiu até vinte e cinco anos depois. Foi sua última ópera completa e, ao compor,
aproveitou a particular acústica de seu Bayreuth Festspielhaus. O Festival de Bayreuth manteve o monopólio das produções
de Parsifal até 1903, quando a ópera foi apresentada no Metropolitan Opera, em Nova York.Wagner descreveu Parsifal não
como uma ópera, mas como Ein Bühnenweihfestspiel (Um Festival para a Consagração do Palco). Em Bayreuth surgiu uma
tradição de que não haveria aplausos após o primeiro ato da ópera. A grafia de Parsifal feita por Wagner em vez do Parzival
que ele usou até 1877 é informada por uma etimologia errônea do nome Percival derivando-a de uma origem supostamente
persa, Fal Parsi significando "tolo puro”.

147
VICTOR SALLES:
Ideal da perfeição neurótica, não podem errar, não podem brincar, tem que acertar sempre. E portanto
não amadurecem, são pessoas rígidas. Muito do que estamos falando passa pela virtude da prudência.
Senso comum, bom senso, flexibilidade virtuosa, resiliência e percepção de que é algo difícil. A educação
humana é muito complexa. Nesse há a ausência completa do amor, do mais trivial do dia a dia. Um beijo,
um abraço, um “tudo bem?”, um carinho. É a visão do pai freudiano como sensor e castrador. Só.
Superego, violento, da lei, que oprime, que gera ressentimento, recalque, medo, temor. Era a visão que
ele tinha da tradição judaica. De um Deus vigilante que está me vigiando a todo momento, me
atormentando. E que me apequena. Nietzsche tinha essa visão também, que no mundo em que há Deus,
os homens são pequenos. O que é uma estupidez.

ÍTALO MARSILI:
Curioso que no Totem e Tabu57, Freud para adiante de Abraão, quando Deus manda Abraão sacrificar
seu filho Isaac. O mesmo Deus para a mão de Abraão e oferece um cordeiro, de modo benévolo e
amoroso, e também para diante da cruz de um Deus que mata o seu próprio filho, mas ele depois o filho
ressuscita de modo glorioso. Existe uma desonestidade intelectual no Freud.

Victor Salles:

Desonestidade ou um estágio de civilização, onde o cristianismo perdeu essa inteligibilidade. Podemos


até especular, procurar a versão mais fidedigna, mas me parece que esses autores, como o Freheubar,
Nietzsche, Freud, Marx, estão falando do cristianismo mas eles não sabem mais o que é o cristianismo.
Estão falando de uma caricatura, de algo que não corresponde mais a tradição de 1900 anos na época.

Por exemplo: Falar que a essência de Deus é pequena aos homens. E os grandes homens cristãos? E os
grandes santos, mártires, heróis, cavaleiros, pintores, escultores, músicos. O próprio Nietzsche que era
músico, não pode negar a grande música cristã. Schulman, Schubert, esses compositores compuseram
missa.
Aqueles autores estavam se levantando claramente contra a fé cristã. Lacan fala: “Toda a minha vida foi
uma tentativa de destruir o cristianismo. Mas ele tem recursos, perdi.” Ele tem recursos porque trabalha

57
Totem e Tabu:livro de 1913 de Sigmund Freud, no qual Freud aplica psicanálise aos campos da arqueologia, antropologia,
e o estudo da religião. É uma coleção de quatro artigos inspirados pelo trabalho de Wilhelm Wundt e Carl Jung e foi
primeiramente publicado no jornal Imago (1912-1913): "O Horror do Incesto", "Tabu e Ambivalência Emocional", "Animismo,
Mágica e a Onipotência dos Pensamentos" e "O Retorno do Totemismo na Infância". Totem e Tabu tem sido um dos clássicos
da antropologia, comparável a "Cultura Primitiva" de Edward Burnett Tylor de 1871 e "O Ramo de Ouro de James Frazer de
1890. O trabalho é considerado atualmente desacreditado por alguns antropólogos. O antropólogo cultural Alfred L.
Kroeber foi um crítico precoce de Totem e Tabu, publicando uma crítica ao trabalho em 1920. Outros autores veem valor
redentor no trabalho.
148
com a ideia de ressurreição, de redenção, de renovação, com o pólo positivo de vida.
A morte não é a última palavra, por isso que São Paulo diz: “Oh morte, onde está a tua vitória?”. A morte
não vence, não tem a palavra final, tem uma palavra intermediária para um plano de vida.
É romântico querer retroceder e recuperar Platão ou Aristóteles, sem a tradição cristã que os
recepcionou, e os assimilou a uma verdade maior. Por isso podemos falar também que esse tema da
morte de Deus no niilismo e no ateísmo, pressupõe um reconhecimento da abertura do espírito humano
ao transcendente, e que isso é fator de sanidade.
Chesterton dizia: “O homem que tem misticismo é saudável. O racionalista é mórbido e enlouquece.”
O homem que se subtrai do mistério, enlouquece. Porque ele vai querer racionalizar tudo, vai querer
compreender tudo, e o resultado pode ser o suicídio.

ÍTALO MARSILI:
Os sofrimentos humanos podem ter seis causas. A causa do sofrimento humano pode ser simbólica em
um primeiro momento, algo que tem a ver com a própria entrada dele no mundo. Pode ser causa física.
Pode ser causa afetiva baixa. Pode ser sofrimento de causa afetiva alta.
Existem duas dimensões acima que não se falam, a psicologia contemporânea ignora de alguma forma
isso. Ou pelo menos não fala disso claramente. Freud fala de sofrimentos afetivos. Mas tem duas causas
de sofrimento que são as ignorâncias intelectuais e espirituais.

Quando uma pessoa chega, nós ignoramos a dimensão intelectual, aquilo que ele deveria saber e não
sabe. Ou a dimensão espiritual, aquilo que ele deveria amar e não ama, porque não conhece também.
Quando ignoramos isso, estamos alienando, amputando, diminuindo, a pessoa fica pequena.

149
SEMANA 06: O PROCESSO DE MASSIFICAÇÃO

Esta aula reflete sobre a massificação, fenômeno característico da crise da cultura que afeta a vida moral e,
principalmente, a noção de responsabilidade individual pelos próprios atos e pela sociedade.

A Massificação é um fenômeno da cultura que afeta a nossa moral e principalmente a noção da responsabilidade
individual pelos próprios atos e destino da sociedade. É uma característica de uma sociedade Industrial, avançada
e tecnológica.

Sempre houve um processo de padronização do pensamento e da linguagem pelas instituições que inserem o
indivíduo na sociedade. É natural que aqueles que frequentam as mesmas instituições (escola, igreja, clubes etc.)
tenham pensamento e comportamento comuns.

A ética pode ser considerada a inserção do indivíduo em comportamento normativo.

Quem chega a um país desconhecido, por exemplo, começa a comportar-se como os demais cidadãos, até mesmo
por mimetismo (adaptação na qual um organismo possui características que o confundem com um indivíduo de
outra espécie).

Mimetismo:

❖ Consiste na presença, por parte de determinados organismos denominados mímicos, de características que os
confundem com um outro grupo de organismos. Por exemplo o bicho-folha é confundido com a folha de
determinada espécie de planta.
Sempre houve nas sociedades de uma maneira geral, a padronização da linguagem e do pensamento pelas
instituições que inserem os indivíduos na sociedade.

É normal e esperado que os indivíduos tenham pensamentos e comportamentos mais ou menos comum,
frequentando as mesmas instituições como a escola, a família, a igreja a cultura. A própria língua já faz isto.

No entanto, no século XX houve um processo de Massificação que ultrapassa a padronização do pensamento ou


linguagem, que consiste em afogar-se na massa que age de forma igual e não se sente responsável por isso.

Nesse sentido, a responsabilidade individual é um ponto importante a ser articulado nesta aula.

Martin Heidegger percebeu que a pessoa humana precisa afirmar-se de modo autêntico por meio de sua
liberdade, contra o fluxo inautêntico daqueles que não têm coragem para assumir uma identidade própria, se
sentem inclinadas a seguir pessoas em massa. Isto se chama Ditadura do Impessoal.

❖ Criou-se um hábito: “A gente faz”; “A gente come”; “A gente gosta deste tipo de música. Espere aí!!!! Quem é
“ a gente”? “Quem é do ponto de vista individual – “A gente”? Quem é o “diretor” desta massa. Heidegger
percebe que “Não é Ninguém”!
A obra de Heidegger foi publicada em 1927, quando os meios de difusão e Massificação ainda eram radicalmente
menores que os nossos.

150
Hoje, temos uma possibilidade de Massificação ainda maior, porque estamos mais conectados pelas redes sociais.

A internet é um fluxo contínuo de informações e, ao mesmo tempo, é uma caverna na qual estamos presos; as
pessoas gostam como todos gostam, odeiam como todos odeiam.

Heidegger percebe nisso um paradoxo: “A gente é todo mundo e é ninguém”. A pessoa que não está integrada
na massa se sente alienada, ao mesmo passo que a integração massificante a aliena.

❖ A massificação despersonaliza e a massificação impessoaliza. Deixa de haver uma pessoa por trás da ação e
deixa de haver responsabilidade por ela. E isso é extremamente relevante para a assunção da responsabilidade
que a maturidade pessoal exige. Assumir os influxos geracionais, os influxos genéticos e hereditariedade social,
cultural, o influxo do meio, das instituições normativas, que normalizam o nosso comportamento.
Rede é algo que liga, porém também nos prende. Ficamos presos nesta rede, nesta caverna. Precisamos odiar em
cadeia, como os “Haters”, os “Dislikes” em massa.

A pessoa que não está integrada na massa se sente alienada, ao passo que no fundo essa massificação a aliena.

❖ As discussões políticas todas hoje são pelas redes sociais. A Ágora58 da política de hoje, são as redes sociais.
A Massificação despersonaliza e impessoaliza. Heidegger observa que a massificação torna a existência humana
inautêntica, resignada, e irresponsável, porque o indivíduo não busca ser quem é e se conforma com o espírito
do tempo, acredita que não tem nada a fazer para superá-lo.

A Massificação torna as pessoas resignadas, conformadas e derrotadas:

❖ “Eu não posso fazer nada!”; “Eu não sou nada.”; “Eu não tenho meios”, “É o nosso tempo, é a nossa época, é a
nossa geração”.
❖ Nós não somos obrigados a fazer o que todos fazem. Victor Sales e Ítalo Marsili não dão celular para os filhos,
porque não desistem de serem responsáveis pela educação dos filhos. Muitos pais que dão celular para os filhos
pequenos, é porque desistiram de educar os filhos.
❖ A Massificação é quando ocorre que a nossa vida terá um destino inevitável, implacável, inflexível.
❖ Se um aluno sabe o que ler e se dedica a ler o tempo que assistiria uma aula, será mais inteligente do que os
alunos que frequentam uma aula. Claro que ir contra a massa, exige força, resistência, determinação e
reconhecer que o destino não é socialmente determinante.
Com a Massificação, nosso destino é reduzido a algo inexorável. Mas existe a possibilidade de resistir a ela,
desde que se tenha fortaleza, e principalmente se reconheça que o destino não é socialmente determinado,
não é socialmente obrigatório.

58
Ágora: A ágora de Atenas foi um espaço público de fundamental importância na constituição do espaço urbano
da Atenas clássica. Atualmente, encontra-se em ruínas e é considerada bem tombado e um dos principais espaços
turísticos da cidade de Atenas e de toda a Grécia.

151
O TÉDIO COMO CONSEQUÊNCIA DA DIVERSÃO

Outro ponto importante é o tédio. A Massificação impõe um ritmo de alternância entre trabalho e ócio, em que
o tempo de trabalho é considerado efetivo, e o resto do tempo seria inútil.

O ócio é considerado como “tempo inútil”, “tempo vazio”, “tempo sem sentido”.

Os antigos não percebiam dessa forma; para eles, o tempo livre era aquele desobrigado às funções materiais de
subsistência, e os cidadãos livres aqueles que aplicavam seu tempo em atividades edificantes, de contemplação
da realidade. Esse era o tempo para as artes, a religião, a política, o diálogo entre amigos buscando o bem comum,
para observar as diferenças, dialogar sobre as diferenças e se possível integrá-las no corpo social.

Na vida massificada, as pessoas exaurem todas as suas energias físicas e mentais no trabalho, e não sobra tempo
para nada, somente para ser esvaziado em passatempos.

Aqui surge a grande indústria cultural de entretenimento que massifica a sociedade.

Nós temos profissões diferentes, cada qual com sua característica. É normal que pessoas da mesma profissão se
padronizem.

Mas no tempo em que estão livres do trabalho, as pessoas poderiam fazer algo único, diversificado, e empregar
seu tempo ocioso em uma atividade construtiva com energia, vitalidade.

O que acontece atualmente, porém, é que a pessoa liga a televisão, o celular, e consome o que a indústria cultural
de entretenimento e espetáculo tem a oferecer.

Por isso, restringe-se do ciclo do trabalho ao ciclo restrito da comunicação de massa. Isso é importante porque
está nos privando do tempo e do silêncio necessários para refletirmos sobre o sentido último da vida, para
participarmos da vida com mais profundidade e intensidade.

Segundo Blaise Pascal (filósofo do século XVII), assumir uma experiência autêntica depende de um tempo
dedicado à introspecção e à crítica.

❖ Quem sou eu?


❖ As pessoas às vezes respondem: “Eu sou professor....”; “Eu sou um pai...”
❖ Acontece que você está dizendo que é uma função onde existe um “conceito massificado desta função”! Você
não está respondendo quem é você. No fundo, é porque você não assume uma experiência real sobre sua
responsabilidade.
❖ Por isso o tempo de introspecção, de autoconhecimento, de reflexão, de buscar critérios para críticas
construtivas, para avaliar.
❖ Se você não tem critérios de avaliação, você não pode criticar, você não pode aquilatar59 o valor das coisas.

59
Aquilatar: determinar o quilate de metal ou pedra preciosas, apreciar, avaliar, julgar o valor de algo ou alguém.
152
❖ É para isto que serve o tempo ocioso, quando não tiramos um tempo para fazer uma avaliação, ponderação,
colocar em perspectiva sua vida, você não saberá de fato quem você é. Estará afogado.
Neste módulo, estamos buscando critérios pelos quais criticar, ou seja, avaliar, aquilatar o valor das coisas.

O que estamos propondo é cultivar a interioridade por meio da meditação no tempo ocioso.

Se alguém vive em um ritmo frenético, mas não tem tempo para examinar a própria vida, para colocá-la em
perspectiva, pode estar sendo um bom pai, marido, cidadão, mas tem uma vida interior murcha, apequenada.

A Massificação pode se apropriar da linguagem religiosa e artística para o entretenimento.

A arte e a religião também podem ser reduzidas ao entretenimento, sua linguagem pode ser apropriada pela
televisão ou internet, como se não fossem substancialmente diferentes de um filme.

Mas a religião não tem o objetivo de entreter ou passar o tempo, pelo contrário, é uma imersão no sentido último
da vida. E a grande arte também tem a dimensão de suscitar questões existenciais profundas.

A maturidade exige a responsabilidade de assumir os influxos geracionais, genéticos, a hereditariedade social,


cultural e das instituições normativas.

Uma pessoa ocupada com passatempos tem a personalidade diluída nas realidades exteriores, e um dia sucumbe,
pergunta-se: “para que tudo isso?”.

A boa literatura é repleta dessas tomadas de consciência e crises existenciais.

A diversão não é o oposto de tédio, mas a sua causa. Só quem se diverte é quem se entedia. A geração entediada
de hoje em dia, é uma geração saturada, de tanto entorpecer-se com diversões.

Esse é o paradoxo que os filósofos e sociólogos percebem. A nossa época, há uma quantidade extraordinária de
coisas para fazer, mas as pessoas estão entediadas, porque o ritmo não é natural, mas atende a uma expectativa
– viajar como todo mundo viaja, para fazer as coisas que todos fazem nas cidades turísticas.

A diversão não vem de dentro, vem de expectativas. Você vai tirar férias e aí já chegam as perguntas: “Você vai
viajar?”; “Vai fazer turismo?”; Então você viaja e vai fazer exatamente o que todo mundo faz nas viagens e nos
pontos turísticos que todo mundo vai. Você não escolhe, você é induzido.

❖ Religião e Arte podem ser entretenimento, inclusive a massificação pode se utilizar da linguagem religiosa e da
arte para entretenimento. Por exemplo, você pode assistir uma missa num canal da TV, ou em um Youtube,
pode assistir uma sinfonia, num story, numa live, numa TV. Um filme de Arte é diferente de um filme de
entretenimento. A religião não tem como finalidade entreter as pessoas, divertir as pessoas, não é um
cirquinho; não é uma diversão imediata e descartável. É uma imersão no sentido da vida, no sentido último da
existência, que está sempre diante da morte.
❖ A grande arte tem esta dimensão religiosa, suscita questões existenciais profundas, reais e nos faz pensar.
Portanto precisamos de um tempo para digerir, para fermentar religião e arte, a cultura em geral. Tempo este
que a nossa sociedade tende a considerar como ocioso, inútil, vago. E com isso perdemos a nossa humanidade,
responsabilidade a nossa autenticidade e lavamos as mãos.
153
O PROBLEMA DA AUTORIDADE

A pessoa de massa pensa que vive para ganhar dinheiro, descansar, ter pequenos prazeres, sempre se
preocupando com a saúde e se desincumbe do mistério da existência, que se dá com o cultivo do interior.

❖ Dois terços (2/3) de nosso dia, deveria estar disponível para reflexões.
O homem-massa exige que a vulgaridade seja validada, por não reconhecer que existem instâncias superiores.

A Massificação aparece justamente no momento atual, em que não se reconhece mais a autoridade, o que pode
parecer um paradoxo, mas não é.

É a banalização, a trivialidade, que levam a pessoa ao tédio que pode encadear o desespero e todo tipo de
disfunções cognitivas, afetivas e espirituais.

Existencialmente, é importante reconhecer que há autoridades familiares, sociais e espirituais. Porém, atualmente
há uma crise da autoridade e as pessoas não conseguem mais reconhecê-la.

É muito importante e reconfortante quando temos autoridade. Nos ajudam em termos de condução de vida,
de referência. Hoje as autoridades estão borradas, estão em crise.

O impacto é justamente a Massificação, à perda de referências, que leva ao medo, ao desespero e às tiranias.

O homem-massa rechaça o que é grande, nobre e distinto, porque o vê como uma ameaça a sua vulgaridade.

PAPO FILOSÓFICO ÍTALO MARSILI E VICTOR SALES – SEMANA 06


ÍTALO MARSILI
Vítor chamou atenção uma frase que você falou no finalzinho. No início fala sobre a Massificação e no final da
aula você fala “Tanto quanto você faz todo o resto...”, por exemplo, “uma pessoa está olhando o feed do
Instagram, do FaceBook, assistindo uma live, uma missa, uma aula, como se tudo estivesse no mesmo nível”.
Puxando a luz do filósofo Ortega, que percebe que este homem massa tem sua vulgaridade e não percebe que
existe instâncias superiores. E tem um capítulo do livro que ele pergunta: “Quem Manda no Mundo?”, aí ele faz
uma análise histórica, em diferentes épocas, daquele mando autoritário, por exemplo “Napoleão invadiu a
Espanha, mas não mandou na Espanha, nenhum dia”. Não mandou no sentido de autoridade. O espanhol não
reconhecia Napoleão como autoridade capaz de mandar no povo espanhol, porque era um invasor, porque era
um ditador. Aí linka com nossa prática diária. A massificação surge neste momento no qual não se reconhece mais
autoridade, não reconheço mais ninguém que manda em mim, “Sou o senhor do mando, sou o senhor do mundo”
. Evidentemente isto pode parecer um paradoxo, mas não é, isto leva o sujeito a massificação, a banalização a
trivialidade, por fim ao tédio, que pode desencadear no desespero e outras disfunções cognitivas, afetivas e
espirituais.

A massificação como resultado, desta perda de autoridade, desta coisa opaca de quem manda, não há nada mais
confortável reconhecer que existe autoridade, tantos sociais, quanto familiares, quanto espirituais, quanto
intelectuais.

154
Duas coisas, de fato há um apagamento destas autoridades, não está claro quem manda, não está claro que exista
autoridades visíveis no nosso tempo, as autoridades estão borradas, por motivos históricos, por um lado. Por
outro lado, é que mesmo que houvesse autoridades, porque há, existem, as pessoas não refletem sobre isso.
Onde está o tempo no quarto, não com celular, mas meditando, contemplando. Por um lado, sim, existe uma crise
das autoridades.

1. O que é alguém com autoridade.


2. O sujeito reconhece autoridade? Consegue declarar que é salutar haver autoridade? É salutar que haja
uma hierarquia?

E isto podemos analisar, isso não aparece do nada, isso não surge na nossa mente do nada. Existe um assédio
ideológico ao longo dos últimos séculos querendo planificar. É que o governo agora não é de alguém superior, o
governo é de todos, é um sujeito vulgar. Se for agrupar, este grupo de pessoas vulgares tem toda a capacidade de
mandar numa nação, num governo. Existem ideologias políticas que propõem isto. E o impacto disto na alma do
homem é justamente este que estamos discutindo agora: existe uma massificação, a massificação é a vulgaridade,
e a vulgaridade é a perda da capacidade de contemplar a hierarquia das coisas. E essa vulgaridade leva no fundo
a perda do referencial; e a perda do referencial, leva ao medo e o medo leva ao desespero e o desespero leva
toda a sorte de tirania.

VICTOR SALES
Estou de pleno acordo. O mais tragicômico de tudo isto é que a demissão da autenticidade se dá no exato
momento em que se nega a autoridade. Veja que o radical é o mesmo, AUTO, Autoridade - capacidade de mando;
Autenticidade – capacidade de ser quem se é. Se não tenho reconhecimento dos padrões dos modelos e das
hierarquias, eu não sou autêntico e vou ser massificado, porque vou seguir esse “Eu Anônimo – Coletivizado” .
Esta tua análise que alcança a ideia de regime político democrático ao que promove a massificação política é
perfeita, porque ninguém tem responsabilidade, quem tem é o povo, mas quem é o povo? O povo é uma
abstração política. Todo poder emana do povo que exerce diretamente por meio de representantes, são os termos
da nossa constituição. Os representantes conseguimos nominar, os representantes se decalcam do povo. Mas
será que o poder vem do povo só por que o elege? Porém a pessoa do povo tem sua individualidade, que pertence
a uma hierarquia do Cosmos. E em tua há hierarquia, e em tudo existe grau de perfeição e realização.

Ortega (começo do século XX) reconhece que este homem massa reconhece autoridade dos especialistas nas suas
práticas, nas suas profissões, estou com dor de dente, vou em um dentista.... Mas o que é felicidade? Aqui não
tem especialista. Aqui não tem autoridade sacerdotal, autoridade sapiencial .... é este dilema que nos massifica
cada vez mais, negamos a autoridade, mas em vez de conquistar uma autenticidade, eu não acredito em ninguém,
eu me vulgarizo, eu me banalizo, eu me trivializo.

Ortega já via a massificação no início do século XX. Ele falava que todo o mundo lia o mesmo jornal, todo mundo
não, os homens que eram alfabetizados, as mulheres ainda não sabiam ler, estavam começando a se inserir na
sociedade, eram homens minimamente políticos e engajados em alguma atividade e liam os mesmos jornais. Se
liam 2 jornais eram muitos. Em Belém tem 2 jornais. No Rio de Janeiro devem ter 3 ou 4. A internet também
massifica, mas é diferente, pois também ela dispersa mais e forma bolhas. Este é outro ponto que dá para pensar
também. As bolhas se massificam internamente e perdem a comunicação. Então agora há um pluralismo de
massas nas suas bolhas. Isto é uma distinção do início do século XX, que só tinha um jornal, depois iria ter 1 canal
de rádio depois TV, 1 ou 2 canais. Agora já tem infinitos jornais, embora 2 ou 3 acabam manipulando, como as
155
agências internacionais de informação ou desinformação, acabam alimentando os polos de difusão, mas há muito
mais bolhas possíveis de massificarem. Então, aqui há uma ressalva a ser feita.

ÍTALO MARSILI
Não consigo deixar de pensar quando você fala dos jornais de uma análise que um discípulo do Ortega faz, sobre
eles: “Em um certo momento na Espanha a venda dos jornais caiu vertiginosamente, e ele se questionava (pois
ele escrevia para os jornais) porque isto estava acontecendo. Ele encontra um dos fatores, e um deles era,
pasmem, a entrada dos derivados de petróleo no consumo diário: os sacos plásticos, os forros do chão... Ele diz
que, muitas pessoas que compravam jornal, elas até liam o jornal, mas o uso que mais davam para os jornais era
para embalar as frutas quando iam a feira.” Então era essa a importância para o homem massa a informação. Ele
não reconhecia mais autoridade daquilo. Ele está se informando, está lendo, mas ele pede a vulgaridade. Ortega
diz, o homem massa é vulgar e dá autoridade para esta vulgaridade.

VICTOR SALES
E ele rechaça o grande, o nobre, o distinto. Ele tem ódio ao distinto, ele quer massificar o distinto. O distinto que
se alça para além da vulgaridade, é hostilizado pelo homem massa, visto como ameaça a sua vulgaridade. No
fundo, o distinto denuncia a vulgaridade do homem massa com sua própria vida, tanto quanto o santo incomoda
o pecador. E o que se faz com o santo? Se extirpa, crucifica-o. E a massa grita uníssona: Crucifica-o! Crucifica-o! A
massa sempre segue: um grita Barrabás; todos gritam Barrabás; um joga a primeira pedra, todos jogam a pedra.
É um mecanismo mimético. A psicologia das massas é algo importante, neste momento.

ÍTALO MARSILI
Isto está completamente conectado com nosso dia a dia, rechaçamos o Ócio e no negócio fazemos tudo igual. A
prática diária é muito semelhante para todo mundo. Se não existe um passo atrás, de valorização do Ócio, não
como o Ócio como descanso, deitar na rede....mas daquele Ócio contemplativo, vou contemplar a arte, vou
contemplar as monções superiores, vou contemplar as possibilidades humanas, sem isso o sujeito se massifica
necessariamente.

VICTOR SALES
O que é interessante, é que a ciência se apresentou como uma libertadora do trabalho maçante das pessoas. Agora
a ciência deveria dar tempo livre, deveríamos ter tempo de sobra para o Amor, para a Confraternização, para a
Contemplação. Porque agora a Ciência aplicada na tecnologia faz muita coisa pela gente, e por uma lógica que
podemos atribuir ao capitalismo no sentido pejorativo do lucro pelo lucro que quer se reinvestir constantemente
numa roda de um círculo vicioso, por uma sociedade industrial que é cada vez mais.... há o crescimento do
trabalho. Isto é um paradoxo difícil de equacionar. Trabalhamos mais em um momento histórico que poderíamos
trabalhar menos, e aí vem uma desvalorização: “você trabalha pouco”; “você trabalha menos, deveria trabalhar
mais....”. Aí vem uma lógica do empreendedorismo também numa massificação da produtividade: “eu tenho que
produzir...; eu tenho que acrescentar...”; aí vem toda a patologia do vício do trabalho, o workaholic, trabalho,
trabalho, trabalho, trabalho.... e um crescimento ininterrupto como se tivesse que sempre melhorar e aperfeiçoar.
Nietzsche dizia que quem não dispõe de 2/3 do seu dia é escravo. E isto ele falava em uma época que não se
trabalhava como hoje. Atualmente somos escravos 100%.

ÍTALO MARSILI

156
Certíssimo, e do mesmo jeito que se romantiza o Comunismo como ideologia, também o Capitalismo como
ideologia.

VICTOR SALES
O Comunismo também era produtivista, só que era estatizado. O Capitalismo é produtivista mas é individualizado,
para aumentar minha conta, aumentar minha produtividade e meu senso de utilidade. Isto é muito importante. O
senso de utilidade de uma pessoa depende de quanto ela produz de riqueza, que é convertida em $$ , horas de
trabalho e cifras $$. Isto reduz toda a existência humana. Quantas horas você e capaz de trabalhar e quanto você
é capaz de ganhar? Claro que não! Mas as pessoas sofrem muito com isso, sofrem por não conseguir atender as
expectativas da sociedade.

ÍTALO MARSILI
No fundo era Isto que estávamos conversando o tempo todo, da massificação..... A incapacidade de reconhecer
que existe instâncias superiores do espirito, seja de um lado, ou de outro.

157
Semana 07 : POLÍTICA COMO FORMA DE AMIZADE

Esta aula trata da crise da política e do modo como ela influencia a composição dos afetos, emoções, desejos,
vontades e comportamento individual

O mote desta disciplina é a crise da cultura e o estado de desorientação que ela gera. Temos observado e falado
como a crise da cultura afeta e influencia as nossas vidas. Ela causa uma desorientação, por uma vida interior
vazia e a exterior em busca de prazeres supérfluos.

Na primeira aula, apresentou-se uma Antropologia Clássica, contraposta à noção moderna de Individualismo que
se fundamenta em uma série de ideologias (como hedonismo, materialismo, secularismo, ateísmo, positivismo) e
deixa o homem abandonado a si mesmo e seus prazeres, dificilmente encontrando a harmonia social.

No Modelo Clássico, pelo contrário, que percebe o ser humano como animal racional e social, o desejo de poder
está a serviço do bem comum, porque articulado ao desejo de verdade.

Os clássicos pensavam a política como uma forma de amizade, uma forma de união, em que o bem comum é
compartilhado.

Aristóteles definia a amizade de três modos diferentes, sendo os dois primeiros extrínsecos e o terceiro,
intrínseco:

AMIZADE FUNDAMENTADA NO PRAZER:


❖ Não há preocupação com a pessoa do amigo, mas com o bem-estar que ele causa. É uma troca de prazeres,
simplesmente isto. Porém neste caso, qualquer pessoa pode me dar este prazer.

AMIZADE UTILITÁRIA:
❖ Há uma relação de troca (econômica, comercial, etc.). Eu quero dar aula e você quer aula. Eu não me interesso
sobre você, sua vida e vice e versa.

AMIZADE VIRTUOSA:
❖ Entre aqueles que se ajudam mutuamente para alcançarem o bem, e que percebem um ao outro como alguém
insubstituível. É a amizade entre pessoas virtuosas, que juntas buscam o bem. É uma amizade pedagógica,
onde os amigos se ajudam mutuamente, a alcançarem o bem, o bem comum, o bem do amigo. É o modelo
das relações humanas onde integra as relações, o amigo quer o bem do outro. O amigo é alguém
insubstituível. O amigo é uma pessoa humana, única.
Para Aristóteles, a amizade é uma condição necessária para a felicidade. Não é possível a felicidade sem uma
verdadeira amizade. Poucos e bons amigos a quem ajudarmos a desenvolver a capacidade moral e de quem a
gente recebe também a mesma ajuda, para ascendermos no bem comum.

Na Antiguidade, a Pólis era uma comunidade espiritual, em que os cidadãos estavam unidos numa espécie de
espírito comum, de alma coletiva, de modo que a saúde da cidade dependia da saúde de cada indivíduo e vice-
versa. Por isso, havia sinergia entre a vida individual, familiar, social.

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A melhor maneira para entendermos esse modelo não individualista é pensar na comunhão dos santos da teologia
cristã: uma inter-relação de bondade compartilhada no tempo, no espaço e na eternidade, por todos os cristãos
que compõem o corpo de Cristo. De modo que não consegue se pensar uns sem os outros.

❖ Não tem a possibilidade de pensar o isolamento e a autonomia e a separação, por exemplo, de um membro
de uma família. Eu estou feliz mas meu irmão está triste, então não tem problema, há uma sinergia. A
imagem é essa: uma alma coletiva.

INDIVIDUALISMO E TOLERÂNCIA

Na modernidade, porém, surge o Individualismo, o surgimento do Individualismo onde o modelo antropológico


do homem não é mais pensado como um animal racional e social, no modelo de Aristóteles.

Thomas Hobbes (anti-Aristotélico, por excelência) e como Maquiavel, anticristão, por excelência, dizia que somos
animais antissociais, egoístas e passionais. Surge aqui o egoísmo moral e o Individualismo político. Ainda, que o
medo da morte violenta é a primeira lei natural, o que abre a possibilidade para matar.

Agora o desafio da Pólis é como equacionar seres egoístas e passionais. Ele citava que a primeira lei natural é
morrer de morte violenta. E o medo de morrer de uma morte violenta, não dá uma possibilidade de matar. Somos
assassinos potenciais, porque somos vítimas potenciais.

Seu modelo é o da “guerra de todos contra todos”, ou seja, a guerra como possibilidade iminente de dissolução
do pacto social. Hobbes está nesse momento numa crise religiosa profunda, no século XVII antes da Revolução
Gloriosa, cujo grande filósofo é John Locke; que é seu sucessor e tem um modelo

John Locke, por sua vez, tem um modelo menos beligerante e litigioso, que trabalha com a ideia de Tolerância,
que é cara ao liberalismo político moderno.

Ele parte do pressuposto de que, se todos forem livres para seguir sua individualidade, haverá divergências; a
Tolerância é o que resta para que haja uma convivência pacífica.

Este modelo de Tolerância é a forma que temos que conviver baseados na diferença. A ênfase da liberdade
moderna é na diferença.

Parte do seguinte pressuposto: se formos livres, descompromissados com vínculos comuns, nós vamos divergir.
Se cada um for se deixar levar pelas suas idiossincrasias, pelas suas paixões, pelos seus prazeres, chegaremos a
caminhos próprios, a caminhos diferentes.

O próprio Locke reconhece que a Tolerância é uma forma secularizada do princípio da caridade cristã. Enquanto
a caridade é a consecução da amizade perfeita pelo amor, o amor oblativo (voluntário, piedoso) a Tolerância é
um princípio político de resistência ao ataque, à guerra civil.

É isto que Hobbes e Locke estavam vivendo, guerra religiosa, muito profunda que rasgou por completo os laços
que uniam a sociedade, neste caso específico, a sociedade inglesa.

159
A palavra Tolerar é “aceitar algo ruim”. Eu não estou preocupado com o bem do outro, mas eu aceito.

O modelo de Tolerância liberal entrou em crise no século XIX e culminou nas guerras mundiais do século XX.
Embora talvez não tenhamos uma alternativa viável ou com o mesmo nível de elaboração teórica, o liberalismo
político está em crise.

Sua crise é exatamente o Individualismo radical, em que cada um persegue seu próprio objetivo e a democracia
passa a ser um regime litigioso, sendo o Direito não mais o nexo de harmonia social, mas um instrumento de
disputa.

O estado respeita os direitos individuais e os cidadãos respeitando seus próprios direitos, passam a litigar.

A democracia, com cada um perseguindo seu próprio objetivo, passa a ser um regime litigioso, sendo o direito
não mais o eixo de harmonia social, mas um instrumento de disputa jurídica.

Foi falado em outra aula que o “Bárbaro” não tinha a capacidade de mediação racional do logos (inteligência
ativa), das leis que comandam o universo, do direito, da lei, da justiça. É aquele que nega o desejo de harmonia
da alma e da sociedade.

DEMOCRACIA E TIRANIA

A ordem do amor – a que se tem referido desde o início – é um ideal de ordem, harmonia e unidade. Essa unidade
é dupla, tanto na alma, quanto pólis. Essa é a intuição fundamental de Platão que muitos filósofos
contemporâneos como Lévi Strauss e Erik Fegnem acabam atualizando para os desafios da ciência liberal
moderna.

O problema é que a alma do homem democrático é dispersa, pois é governada por sua parte baixa, pelo desejo
elementar de prazer, é uma alma desintegrada internamente.

No começo da República de Platão há uma imagem do Deus Eros como sendo um monstro Policéfalo, de várias
cabeças, e o acéfalo é o velho que não tem mais servidão, que não é mais servo do erotismo desordenado dos
jovens democratas.

Os jovens democratas, segundo Platão, no livro a República, de forma alusiva, irônica e dramática eram os jovens
impetuosos, vaidosos, erotizados ao extremo que queriam expandir imperialisticamente a democracia grega, sem
se preocupar com o cuidado da alma.

Assim, Platão percebe que a Democracia se torna uma passagem para tirania, pois o homem democrático tem
desejos tirânicos, porque não encontra limites aos seus desejos.

Há certa semelhança entre esse homem descrito por Platão e o homem-massa descrito por Ortega y Gasset, pois
o homem-massa também quer vulgarizar, banalizar e trivializar toda autoridade constituída e encontra
ressonância no homem democrático, cuja alma é completamente dispersiva.

160
É dispersiva porque é governada pela parte baixa da alma. Aquele desejo elementar de vida e prazer, por isso o
Deus Eros.

Para Platão, Eros era uma força de elevação e ascensão da alma, da vontade e da inteligência. O resultado é que
a política democrática é uma política na caverna.

Na segunda aula, falou-se da “caverna digital” e da “caverna das redes sociais”, em que o reino da aparência, das
sensações, a notícia sensacionalista e do espetáculo, a notícia dispersiva e ideológica, o reino da retórica, têm
influência direta na política.

Nesse sentido, a política democrática se torna o ambiente da opinião, do achismo, em que as pessoas se
movimentam por suas impressões. Uma política da impressão nós somos movimentados de acordo com nossas
impressões.

❖ Se pensarmos na eleição do Brasil de 2022, tudo depende de alguns elementos circunstanciais das vésperas
da eleição. Tudo acontece por algum protagonismo, que no mês anterior manipule as opiniões. Claro que
existe um eleitorado que não se baseie aos acontecimentos da véspera. E por incrível que pareça, estes não
são os democratas no sentido do Platão, é que eles não são democráticos no sentido da alma dispersa nos
prazeres. Eles reconhecem a autoridade.
❖ “Para aqueles jovens hedonistas, a filosofia é mais um dos prazeres dispersivos com que entretenham os
momentos soltos de sua vida, que não compõe uma unidade orgânica e ordenada.” (Trecho do livro Crise da
Cultura e a Ordem do Amor do Victor Sales).
❖ A parte alta da alma, esta filosofia, este amor a sabedoria, essa “erosofia” para o homem democrático é
apenas um prazer momentâneo.
❖ Na minuciosa análise da psiquê do homem democrático, Platão percebe que ele é incapaz de hierarquizar
valores segundo uma ordem de prioridade e importância, relativizando constantemente ao sabor das
contingências.
❖ Hora o homem democrático se dedica a música, hora a dieta para emagrecer. Hora dedica-se ao esforço da
ginástica, hora reiniciar a preguiça. Ocupa-se com a filosofia ou com a política, para em seguida abandoná-
las de repente. Quando fica com inveja de guerreiros, vira-se para esse lado, se se trada de comerciantes,
para o lado este lado. Nem a palavra, nem a ordem, nem a necessidade lhe definem a conduta. Chama de
livre, semelhante vida, agradável, perfeitíssima, comportando-se desta maneira até o fim.
Em nome da liberdade individual, a política democrática institucionaliza o relativismo moral, negando a
capacidade da razão discernir os valores verdadeiros, e disciplinar eticamente o indivíduo.

❖ Observem como estamos “amarrando” este módulo que despontou na primeira aula e que aqui ganha
voltagem social e política aquele homem conturbado, internamente desordenado, não vai ser capaz de
ordenar a sociedade. Pelo contrário, usará a instituição social e política para impor seus caprichos,
considerando que seus desejos são direitos.
O homem democrático, internamente desordenado, não será capaz de ordenar a sociedade. Pelo contrário, usará
a instituição social e política para impor seus caprichos, considerando que seus desejos são diretos.

161
Atualmente, há um movimento jurídico que reivindica desejos como direitos, e a contrapartida é que os demais
têm o dever de respeitá-los e o Estado, de garantir sua tutela.

Sendo esses desejos arbitrários, a sociedade não tem como se ordenar, pois, conforme a tradição clássica, direitos
dependem de uma ordenação racional da justiça, que é uma virtude.

Sem harmonia na alma, sem ordenação interna de temperança, fortaleza e prudência, não há ordem na pólis.

O resultado é que o excesso de liberdades resulta na escravidão, na tirania. Platão percebe que a democracia é
intrinsecamente instável, não é capaz de fincar raízes por longo prazo, pois sempre há golpes, revoluções,
mudanças de regime.

A crise de nossa democracia se estende há várias décadas ou séculos. Uma dificuldade de manter um regime
democrático por um tempo.

Para Platão, uma vez que os desejos do homem democrático são tirânicos, não se estabelece ordem.

Maquiavel tentou suspender a ética na política, considerando que esta teria suas próprias regras, ou seja, como
se o desejo de poder não estivesse integrado ao desejo de verdade. Como se a virtude da política não pudesse ser
avaliada pela virtude humana em geral.

Para Maquiavel, que se voltou contra o modelo cristão de ética política da Idade Média, o governante tem de
aprender quando e o melhor modo de praticar a crueldade e ser temido, não apenas amado, embora parecendo
íntegro. Mentir, subornar, trapacear e roubar para ser bem-sucedido, mas parecendo ser íntegro e piedoso.

Maquiavel estabelece um modo de cinismo político, que ele considera como realismo político. Este é um ponto
interessante: ele não considera a realidade como o ideal de consecução das potências de um ente moral, mas
enxerga somente os fatos de uma época em crise. No entanto, se os políticos eram corruptos em seu tempo, isso
faz pressupor que há um estágio normal, que é a honestidade.

❖ A realidade de um professor é dar boas aulas, o professor que não consegue dar boa aula, que não tem clareza
de pensamento, clareza de linguagem, de comunicação, não é um bom professor, só que é uma realidade
diminuída.
❖ No caso do político, não podemos dizer que a realidade é quando a política está em crise. É como se
disséssemos que a realidade de um doente é a doença, porém é a saúde. Então a Florença que estava em
crise, não pode ser a realidade que Maquiavel queria falar. E aí que está o problema da Psicologia: se estamos
em uma época de crise em que as pessoas estão psicologicamente doentes, desordenadas, não podemos
elevar este estágio crítico para as regras gerais. Foi exatamente isto o que Maquiavel fez: se os políticos são
corruptos na Florença do século XVI, não quer dizer que os políticos sempre serão corruptos.
❖ Corrupção quer dizer decadência, corpo corrompido, isto quer dizer que antes estava íntegro.
Assim como Hobbes, Maquiavel tem como modelo a guerra – a política é vista como um jogo de xadrez, que exige
estratégia para dominar os rivais.

162
O príncipe de Maquiavel tem de tomar o poder e não permitir que ninguém lhe tire. Em contraponto a ele, há o
modelo de Dante Alighieri que, dois séculos antes, em resposta a uma política também em crise, reconhece os
desejos fundamentais de prazer e de verdade, mas tenta integrá-los pelo amor.

❖ Realidade mimética é aquela em que os indivíduos estão no mesmo nível espiritual e podem portanto ocupar
os mesmos espaços. Maquiavel tem que conquistar o poder e cuidar para ninguém conquiste o poder como
ele, pois ele sabe que, mimeticamente os outros vão querer tomar o poder dele. O príncipe de Maquiavel é
“Tomar o poder e não deixar que ninguém tome de você”. Para ele o líder político é aquele que tem a
serpente e o leão ao mesmo tempo. A astúcia da serpente e a força do leão.
❖ Dante Alighieri era católico e seguia São Tomás de Aquino. Dante falava do amor, da harmonia, de luz e da
ordem. No início da Divina Comédia ele encontra 3 animais que representam os vícios:
➢ Loba: representa a avareza;
➢ Onça: simboliza a concupiscência (apetite sensual0 e
➢ Leão: o Poder.

CONSEQUÊNCIAS DO INDIVIDUALISMO

O Individualismo pode causar radicalismo. Na aula anterior, viu-se que a massificação faz com que as pessoas
usem a mesma linguagem, pensem da mesma forma, que não haja diferença entre elas. Os que estão fora da
massa, são considerados alienados, ao passo que a massa aliena os indivíduos.

A contemporaneidade é marcada pela formação de bolhas no espaço público democrático. Os diversos grupos se
fecham em fendas e consomem destas bolhas, também massificadas. Não tem tempo de retração, de reflexão
para a compreensão.

Depois do isolamento, ocorre a afirmação da própria identidade pela rivalidade contra os outros grupos.

❖ Quando essas bolhas vão para a deliberação pública, o objetivo não é o bem comum. A esquerda x direita;
cristão x pagão; jovens x velhos; capitalistas x comunistas; liberais x conservadores; e a sociedade vai se
fechando nas bolhas e a oposição se dá pelo ritual mimético. Não buscando o bem comum, usam de armas
jurídicas para considera que a eliminação do inimigo é necessária para a sobrevivência da pólis, pois ele seria
uma ameaça a democracia.
❖ Observem sem esta amizade política para o bem comum não existindo, quando perde a fraternidade e
tolerância política, o que sobra? O risco de viver em um estado de exceção é termos o risco permanente que
acirra e radicaliza a diferença. E a política deveria ser a busca pela unidade, pela ordem, pela justiça e pela
harmonia.
Utilizam-se armas jurídicas para considerar que a eliminação do inimigo é necessária para a sobrevivência na pólis,
pois ele seria uma ameaça à democracia.

É importante tomar cuidado com as filosofias concebidas durante períodos de guerra ou que preparam períodos
de guerra. É necessário conhecê-las, entender que elas têm grande influência social, mas que não estão
exatamente descrevendo a realidade como é.

163
Conectando isso à vida cotidiana, é verdade que alguns casais, por exemplo, comportam-se de um modo que
parece ser a guerra de todos contra todos. O terapeuta não pode olhar para essa situação tomando-a com
naturalidade, mas compreender a visão das pessoas a respeito de família, relacionamentos, trabalho.

Observando as relações humanas, percebesse que seu fundamento não é a guerra, mas o amor: uma mãe cuida
do filho, as pessoas se juntam nas cidades para uma vida mais confortável etc.

PAPO FILOSÓFICO ÍTALO MARSILI E VICTOR SALES – SEMANA 07


ÍTALO MARSILI
Temos que desconfiar das filosofias que surgem na guerra. Pois o sujeito ao observar o mundo é uma alma
amedrontada, cética, pois assistia as barbáries de uma guerra.

Então terapeutas, cuidado com as filosofias que surgem em tempos de guerra. Ao ler sobre Hobbes e Locke temos
que ter um cuidado, eles não são oráculos ditando como a vida é.

Tem casais que se comportam de um modo que parece ser a “Guerra de Todos Contra Todos”, um querendo puxar
o tapete do outro, parece que estão numa arena, para vem quem tem razão: qual restaurante irão jantar, sobre a
educação dos filhos, sobre visitar a sogra ou não, montam um picadeiro de guerra.

O terapeuta não pode tomar como naturalidade e pensar: “É assim mesmo”. Se a guerra fosse o princípio
construtivista de mundo e relações humanas, não haveria a segunda geração de homens, pois ao nascer uma
criança, a mãe que está numa “Guerra de Todos Contra Todos”, não hesitaria em matar o filho sem oferecer
nenhuma resistência.

O princípio fundante do ser humano não é a guerra, é o AMOR. A mãe cuida do seu filho, as pessoas se juntam na
pólis, nas cidades, para que a vida seja mais confortável, mais amena, mais facilitada. Que uma pessoa possa
trocar sua colheita pelo tecido do outro.

VICTOR SALES
Maquiavel e Hobbes por mais errados e criticados que sejam, influenciam muito a política moderna e da fundação
do estado moderno, que concentra no poder o quere dominar a sociedade como um Leviatã (monstro). Este poder
tem instituições que dominam a sociedade.

A nossa vida social e individual é toda pautada e intermediada pelo direito do estado, que pode nos proteger uns
dos outros e por outro lado, podemos usar o estado como uma arma contra o outro. Para Hobbes o princípio do
ser humano é a guerra, não o AMOR. A guerra é a crise do AMOR. Por outro lado a “Guerra de Todos Contra
Todos” é o risco eminente da dissolução da unidade da pólis e das cidades. E o exército pode enfraquecer e se
dissolver, e aí temos a anarquia.

Se o casal entrar nesta “Guerra de Todos Contra Todos”, pode descambar em uma anarquia. Quando se perde os
princípios constitutivos da relação, como a educação dos filhos, o casal pode facilmente se separar e não encontrar
mais pontos de intersecção e se isto acontecer com a maioria da sociedade? Os indivíduos naufragam nesta
alienação individual, os indivíduos ficam soltos, sem laços.

164
Aí percebemos a consequência e a causa do Individualismo. Você não tem família, não tem sociedade e não tem
estado. O que se tem? Indivíduos auto interessados, egoístas e passionais prontos para a guerra. É só o que resta.

ÍTALO MARSILI
As pessoas hoje enxergam suas famílias, seus relacionamentos no trabalho, no clube, na igreja, como se fossem
leviatãs, ou como se houvessem leviatãs por ali, isto leva uma disfunção muito grave do relacionamento humano.

Este é um olhar que o terapeuta tem que ter: Pode ser que o sujeito, sem saber, seja maquiavélico, prático, que
esteja totalmente inspirado em Hobbes. É importante estudar Hobbes e Maquiavel pela influência social que tem,
não pelas suas teorias. Todos os dias estamos sendo assediados por Hobbes e Maquiavel.

VICTOR SALES
É muito importante os terapeutas conhecerem uma ideologia que deforma a vida das pessoas: o feminismo
radical. Uma coisa é a consequência natural da igualdade de direitos e de participação econômica e igualdade
educacional, e outra coisa é a famosa guerra de sexos que o feminismo propõe. Se eu considero por princípio de
que os sexos têm uma disputa de poder, que o sexo masculino quer dominar por princípio o sexo feminino e que o
sexo feminino tem que se emancipar do masculino numa relação litigiosa, você não tem mais como ter uma base
de união matrimonial, por exemplo. A própria sexualidade será vista como fato dominador ser castrado pela
mulher emancipada.

Isto é um tipo de ideologia, que o feminismo radical politiza algo que por fundamento não é político. Esta
radicalização simplesmente implode a possibilidade de união sexual real, que pode ser marcada por deturpações,
exageros, erros históricos profundos de diminuição da mulher.

O casal deve buscar se conhecer, se amar, se integrar, se unir. A lógica do feminismo é a desintegração, de divisão
e de rivalidade. O ponto do radicalismo político e radicalismo social é que a lógica é o “amigo inimigo”. Na
verdadeira amizade pode haver desentendimentos, diferenças, mas continuam amigos. A lógica do “amigo
inimigo” é: “Eu preciso te eliminar, só com tua eliminação que eu sobrevivo. Imagina se a mulher disser isto para
o homem? Se o homem disse isto para mulher? Se o patrão disser isto para o empregado e vice-versa?” Se a
sociedade não consegue conviver, perdeu-se o laço social.

ÍTALO MARSILI
O terapeuta tem que ter em mente o que é amizade verdadeira. Como o homem pode se relacionar de um modo
mais pleno, mais digno, mais amplo, com outro homem ou mulher e o terapeuta pode ou não ser amigo do
paciente?

Quando um terapeuta pergunta isso, ela já mostra que tem um total desconhecimento do que é amizade. É
verdade que não convém que o terapeuta e seu cliente tenham uma relação daquela primeira amizade, de
compartilhar prazeres, pois este é um vínculo mais frágil, pois é só prazeres. Por outro lado, o terapeuta e paciente
podem ter um vínculo de outra ordem, mais profundo.

VICTOR SALES

165
Eu acho esta questão uma das mais desafiadoras, da ética do terapeuta. O modelo positivista, que nasce na
psicanálise de Freud, que era um médico, fisiólogo e que ao buscar as causas orgânicas das patologias, era o
modelo marcado pela impessoalidade, por aquela neutralidade que condenei. Não é possível tratar uma pessoa
de modo impessoal. Só posso te tratar como coisa, como cadáver, médico legista está diante de uma coisa.

Porém o corpo animado por um animal racional, que compõe uma unidade substancial de pessoa humana, nunca
é uma coisa. É o segundo imperativo categórico do Kant, tratar a pessoa como pessoa, não como coisa ou meio
para algum fim, como por exemplo, escravizar alguém.

Lacan no seminário 8 (ele – Lacan, tenta interpretar psicanaliticamente o Banquete de Platão, na verdade, fugindo
um pouco texto, explicando mais a psicanálise do que Platão) falou algo que marcou Victor(nas palavras dele,
nunca saiu de sua mente): “Nós somos herdeiros de Sócrates. A psicanálise é a maiêutica” (uma das formas
pedagógicas do processo socrático, a qual consiste em multiplicar as perguntas a fim de obter uma indução dos
casos particulares e concretos, um conceito geral do objeto em estudo).

A psicanálise é a descoberta da verdade interior que pela conversa, que parteja (parir, servir de parteiro(a)) o
inconsciente. Platão buscava o consciente a luz. A consciência ilumina a inconsciência.

A filosofia, que Lacan se considera herdeiro, é uma prática de amizade. Aristóteles achava que a amizade filosófica,
era a mais nobre, pois buscava a virtude, a virtude intelectual, que não é a virtude teórica, é a virtude moral.

Então a amizade entre os virtuosos que buscam o bem, que amam o bem divino da inteligência, é a amizade
perfeita. Agora tem um detalhe, esta amizade, diferente da amizade utilitária sofística, não tem preço, não tem
hora, é um compartilhamento de vida. Como o terapeuta será amigo neste sentido? É muito difícil. Me parece que
o modelo de mentoria, em que há abertura da alma, uma preocupação genuína, pois isto é a busca de crescimento
vida, não é atuar em cima de uma queixa do cliente.

No livro “Chapéu do Mago”, no primeiro capítulo Ítalo fala das 4 causas, citou o exemplo de uma pessoa que tem
fobia e como tratar.

ÍTALO MARSILI
O bom terapeuta pergunta pela “Causa Final”. Tem certas responsabilidades humanas que são sociais, não são
utilitárias. Por exemplo: seu filho está em colégio particular e você perdeu o emprego e não tem mais condições
de pagar. O colégio não deveria tirar o aluno.

Se um paciente perde seu poder de pagar, o terapeuta deve saber que ele deverá continuar o tratamento, pois
existe um vínculo. O terapeuta tem que saber que o processo não para por falta de pagamento. O processo termina
quando é resolvido, acalmado e pacificado. Se o terapeuta não tem isso em mente, todo o processo é ineficaz.

De acordo com Victor Frankl apontou, o que trata um processo terapêutico é o AMOR do terapeuta, a
personalidade do terapeuta, é a esperança que o terapeuta pode acender no coração do outro.

VICTOR SALES
Existe um recurso para a gente pensar isto de uma forma bem apropriada. O caso central é o que caracteriza a
finalidade da relação? Então a pergunta é: Por que você tem essa relação profissional? Se a finalidade for o

166
dinheiro, ela é utilitária, se a finalidade for prazer, ela é hedonista, mas se a finalidade for a virtude, a bondade,
acender a chama flamejante da esperança do coração do paciente, ela é virtuosa.

Aristóteles não disse que o que tem que almejar é a terceira possibilidade, o que não quer dizer que não terá
retorno financeiro e prazer. Qual é a vocação? É isto que temos que nos perguntar. É minha vocação pois faço por
Amor (sem dinheiro). A finalidade última de um casamento não pode ser nem por dinheiro e nem por prazer,
embora possa existir as duas coisas. Não é a “Causa Final”, nem da terapia, nem da profissão.

ÍTALO MARSILI
Nos dez anos como psiquiatra, eu não tinha prazer, porque escutava histórias tristes. Quando ministra aulas, ele
tem prazer. No consultório é dor do início ao fim. O AMOR do Psicólogo é SEMI-SACERDOTAL. Um amigo
verdadeiro, é um outro eu. É um alterego.

VICTOR SALES
Fica superficial e castrador quando somente o cliente abre a sua alma. Um terapeuta tem que ter resistência a
solidão, assim como o sacerdote. A solidão não é algo que o terapeuta tem que estar evitando, mas ele mora ali.
Quando estou diante de outra pessoa, tenho que esquecer de mim.

167
Semana 08: OS QUATROS TIPOS DE AMOR

Esta aula reflete sobre a ordem do amor e seus diferentes tipos.

Desde o início, percebemos que a crise da cultura que desorienta o homem contemporâneo é também uma
desordem do amor.

Usou-se o termo “virtude” para expressar a consecução das faculdades morais e percebeu-se que a saúde da alma,
a saúde da vida humana, depende do funcionamento íntegro e harmônico dessas faculdades.

Santo Agostinho de Hipona, filósofo do começo da idade média, conceituava a virtude como a ordem do amor.
Essa é uma definição muito adequada, se considerarmos que o amor é o movimento fundamento da vida humana.
Nós somos quem amamos e como amamos.

❖ Santo Agostinho dizia:


➢ Meu peso é meu amor, serei levado por onde ele quer que eu seja levado;
➢ Dizia também na obra “Cidade de Deus”: Dois amores geram duas cidades.
o O amor de Deus recusando-se a si mesmo, gerou a Cidade de Deus.
o O amor de Si, recusando-se a Deus, gerou a Cidade dos Homens.
➢ A alma humana tem um anseio, intrínseco, no seu núcleo algo eterno. O amor tem uma dimensão de
perpetuação de permanência. O amor carrega consigo um ideal de definitividade.
➢ A ideia desta aula é vermos coma a vida humana pode se realizar por meio do Amor. É a pergunta central
da Ética e temos que ter esta resposta, o que torna a vida feliz.
➢ Não estamos negando o corpo, a sociedade, e o inconsciente, negar todos os aspectos que fazem parte da
vida e da alma humana. O desafio é como integrá-los, como reuni-los de forma ordenada. E esta concepção
que é de tipo platônica e cristã plasma a essência da filosofia clássica.
O grande drama da existência é o amor. Não há quem não ame; as diferenças estão em “o que”, “quem” e
“como” amamos.

Amor é uma palavra polissêmica, com vários significados que podem ser ambíguos.

❖ Posso escrever “amo estudar, dar aula, o marido, o time de futebol, uma música, Deus.... Posso amar várias
coisas. Posso amar objetos, trabalho, pessoas, animais.
Usualmente, “amor” descreve um afeto muito intenso. Mas o filósofo e o psicólogo precisam buscar conceituar
experiências distintas deste mesmo núcleo. O amor está ligado a uma inclinação para a união, que se dá de
formas diferentes.

❖ Token tentou mostrar o cristianismo de uma nova forma.


❖ O cristianismo é uma filosofia e ética muito profunda. Existe uma sabedoria muito profunda, normalmente
tendemos a dizer que isto é uma questão de fé. A fé está acompanhada pela razão e aqui estamos
argumentando filosoficamente sobre um pensamento que é platônico e cristão. Cristão porque é a forma
superior de amor pois foi revelada por Jesus Cristo. É o AMOR caridade, AMOR Ágape, é o AMOR Doação de si
para a felicidade do amado.
168
A obra Os Quatro Amores, de C. S. Lewis, faz uma reflexão oportuna para distinguirmos a ordem a gradação do
amor.

STORGE:
O primeiro tipo de amor, mais comum, natural, e o mais difundido na família e na sociedade. É uma afeição, laço
empático representado pela mãe amamentando o filho, abrange tanto o amor-necessidade (filho) como o amor-
doação (mãe). É o mais humilde dos amores, a afeição que se tem pelas pessoas da convivência, um certo
companheirismo com o vizinho ou o colega de trabalho, por exemplo. É um sentimento espontâneo, que é fraco,
mas importante.

❖ É o mais humilde dos amores. Ninguém dá importância a ele, ninguém se orgulha dele, como se faz com o
AMOR EROS e o AMOR AMIZADE. Ninguém chega em casa falando que tem Amor pelo colega, pois é uma
afeição, um coleguismo. É normal que uma perpetuação deste amor possa surgir uma amizade.
❖ Aristóteles falava que era a mais importante das relações humanas que fundava a política, na amizade e no
bem comum. E esta convivência afetiva pode surgir o Amor Eros, o Amor Sexual, quando há o envolvimento
com uma pessoa em particular. O Amor Eros é um Amor individualizado, focado, que exclui os outros para
concentração naquela pessoa.
❖ C.S. Lewis diz: “Há sem dúvida um charme peculiar tanto na Amizade quanto em Eros, nestes momentos em
que o Amor Apreciativo (Amor Afeição) adormece enrodilhado (torcido, embaraçado), por assim dizer na mera
comodidade no relacionamento, livre na solidão, mas que ninguém que esteja sozinho nos toma. Não é preciso
conversar, não é preciso fazer amor, nem é preciso fazer nada, exceto talvez incrementar o fogo”
❖ Por exemplo, ninguém sente saudades de um colega nas férias, ninguém sente falta quando um colega se
ausenta quando doente. É um amor natural, simples, apequenado, mas que é importante.
❖ Tentem imaginar um ambiente profissional sem o mínimo de coleguismo, sem o mínimo de amor. Seria horrível,
uns desconfiando dos outros, como se todos se odiassem.
❖ Ele é baseado nas virtudes da Empatia, da Convivência, da Alegria, do Bom Humor, da Generosidade e da
Tolerância. Então este amor é extremamente importante.
❖ Diz o autor “A afeição trará felicidade, se e somente se, houver Bom Senso, a Reciprocidade e Decência. O mero
sentimento não basta. É preciso Bom Senso, isto é Razão e Prudência. É preciso Reciprocidade, isto é Justiça ,
estimular constantemente a mera afeição quando ela desaparece e restringi-la quando se esquece da arte de
amar ou a desacatar. É preciso decência, não há como esconder o fato que isto signifique bondade, paciência,
abnegação, humildade e intervenção contínua de uma espécie de amor muito superior ao que a afeição por si
mesma é capaz de ser. Este é o ponto essencial, quando tentamos viver só da afeição, a afeição nos faz mal”.
❖ Isto quer dizer que viver só de afeição não basta, não se consegue viver só de relação de colegas apenas, como
se nosso coração quisesse algo a mais, não se consegue viver só entre vizinhos.
❖ Chega um determinado momento que necessitamos nos aprofundar no relacionamento e passamos para o
segundo tipo de AMOR PHILIA.

PHILIA:
É natural que do amor difuso entre colegas venha a amizade. Não mera afeição, mas apreço, apoio e ligação
profunda entre pessoas com interesses ou vida em comum.

169
Na aula anterior, foram expostos os três tipos de amizade: hedonista, utilitária ou virtuosa. A ênfase de Lewis é
no bem comum que une os amigos.

A amizade é um triângulo: dois amigos de mãos dadas, lado a lado, olhando para um ponto em comum.

Recebemos uma influência muito profunda dos amigos, na mesma medida em que os influenciamos. Todo mundo
é amigo a partir de alguma coisa em comum.

❖ C.S. Lewis fala sobre este Amor: “Esse é o menos natural dos amores, não está ligado ao impulso da emoção,
ele se dá essencialmente entre os indivíduos que se decalcam na multidão e se individualizam na alteridade “Eu
e Tu”. E esse “Tu” que se torna um outro “Eu” por uma abertura de alma. Eu abro aminha alma e acolho a alma
de meu amigo aberto a mim e nesse momento há uma união entre duas pessoas que é muito profunda. Para
os antigos, a amizade parecia a mais feliz e a mais plenamente humana de todos os amores, coroa da vida e
escola da virtude ou do vício.”
❖ Isto é interessante, conforme o ditado popular: “Diga-me com quem andas e te direi quem és”, é fundamental
para discernir a personalidade de uma pessoa porque somos mimeticamente influenciados pelos nossos amigos
e companhias. Por isso é extremamente importante entender o círculo social que frequentamos, o tipo de
música que escutamos. Temos uma influência muito grande deste ambiente e das pessoas que nos espelhamos
como modelos.
❖ Nossos amigos têm uma influência muito profunda em nossa alma, sempre. Somos influenciados pelos nossos
amigos à medida que os influenciamos.
❖ Muitas vezes nas terapias e dramas psicológicos há relacionamentos problemáticos, corrosivos, que fazem mal,
que devem ser compreendidos para serem eventualmente tolhidos.
❖ Lewis diz, “O mundo moderno ignora a amizade porque trabalha com a ideia de massificação, individualismo.
E tem pessoas que se consideram autônomos, “não, eu não preciso de amigos, eu me resolvo, me sustento,
pago minhas contas. Naqueles tempos a ideia mais profunda e permanente era a de ascetismo60 e renúncia
ao mundo. Era o único dos amores que parecia levá-los aos níveis dos Deuses ou dos Anjos para além das
emoções e instintos animais e reprodução e conservação.

A ideia central da amizade em Aristóteles é a união de almas por um bem comum, de modo que não há mais
alteridade radical, mas uma identidade, como se a personalidade de um estivesse ampliada no coração do outro.

❖ Não se consegue separar o amigo do amigo. O amigo regozija como se fosse ele próprio, como se a felicidade
do amigo fosse minha própria felicidade, como seu aniversário fosse meu próprio aniversário.
Lewis aponta que a amizade é desnecessária, como a filosofia, a arte e o próprio Universo; não tem valor de
sobrevivência, não tem valor utilitário, mas é antes uma das coisas que lhe dão valor. Por isso, precisamos de
amigos com quem compartilhar a vida, com quem contar.

60
Ascetismo : abstenção de prazeres carnais e de conforto material, de quem busca alcançar a perfeição mora e
espiritual. Doutrina.

170
❖ As amizades servem para celebrarmos a vida, comemorarmos a existência. A arte, liturgia, amizade não são
utilitárias porque não promovem o bem material e sim espiritual. “Exatamente por ser o mais ritual dos amores,
pois assedia também o espiritual. A amizade é um tipo de amor espiritual.

EROS:
Um dos temas mais relevantes da literatura, da filosofia, da psicologia. A própria fundação da psicanálise, com
Freud, é uma teoria de Eros; ele compreende que tudo na vida humana provém de um erotismo primordial.

❖ Na primeira aula falamos do desejo de vida individual, cujo prazer se dá na mesa com alimentação, cujo vício
é a gula. O desejo de vida geracional, o coletivo, o da espécie cujo prazer se dá na cama, cujo vício é a luxúria,
o sexo irracional, desordenado.
❖ Para Freud a pulsão da vida era uma pulsão sexual, por isso a ideia da matriz das ações sexuais e dos interditos
pela possibilidade do incesto.
Aqui, a imagem fundamental não é mais a dos dois amigos olhando para o bem comum, mas de um homem e
uma mulher olhando um para o outro, abraçados, na cópula.

Todos os filósofos percebem que o Eros é uma paixão muito intensa, um fogo que aquece e queima.

Lewis contrasta Eros e Vênus, sendo esta o desejo impessoal por qualquer homem ou mulher, o desejo pelo prazer
em si. Eros, por outro lado, quer a pessoa amada, não somente o prazer que ela oferece.

❖ Lewis diz: “O desejo sexual, Vênus sem Eros, deseja isso a coisa em si, o sexo, o prazer. Eros quer a amada e
não só o prazer que ela oferece. A coisa é um prazer sensorial, ou seja um fato que se passa dentro do corpo. É
uma expressão extremamente infeliz dizer que o homem lascivo, perambulando pelas ruas, quer uma mulher.
Estritamente falando, uma mulher é o que ele não quer. Ele quer o prazer e o instrumento necessário por acaso
é uma mulher. O quanto ele se importa com a mulher pode ser medido pela sua atitude em relação a ela cinco
minutos depois da fruição. Não se guarda o maço vazio depois de fumar os cigarros.
❖ De algum modo misterioso, mais indiscutível, o amante deseja a amada mesmo e não o prazer que ela pode
dar.
❖ O sexo é Afrodite (Vênus) ou Eros. Afrodite, em tese, é a mãe de Eros. Podemos dizer que o aspecto afrodisíaco
é o aspecto da sensualidade e da atração erótica e o Eros seria o sexo bruto. Para Lewis é o oposto: Afrodite é
o sexo bruto, sexo com a prostituta em busca do orgasmo, é a masturbação e a possibilidade de conseguir o
orgasmo e o prazer sexual independentemente de quem seja o parceiro, pode haver a masturbação a dois, ou
a autoerotismo.
❖ Quando se procura uma namorada, noiva ou esposa, para a “coisa” em si, se está em Vênus.
❖ Lewis percebe que Eros é muito mais que a consumação dos corpos, o prazer franqueado pelo corpo. É também
um desejo muito profundo pela pessoa amada e um desejo de ficar com ela para além da cópula. “Eros
transforma maravilhosamente assim, diz Lewis, aquilo que é um prazer necessário, por uma excelência no mais
apreciativo de todos os prazeres.
Há uma necessidade sexual inscrita na corporeidade, de propagação da espécie. No entanto, o amor Eros vê o
objeto como algo admirável em si mesmo, digno de ser contemplado e não só consumido, com uma importância
que ultrapassa a relação de amor-necessidade, tornando-se assim um fator de união.
171
A revolução sexual fez com que as relações não estivessem mais ligadas à união de tipo procriativo, o que causou
a despersonalização do sexo.

❖ O homem pode ser pai sem ser marido e pode ser marido sem ser pai. As relações sexuais não estão mais
ligadas a uma união de tipo criativo, é o descarte e a despersonalização do sexo.
Daí a proliferação da indústria pornográfica.

❖ É um prazer pseudo sexual, por quê? O sexo é a união de duas pessoas de carne e osso e ao passo que a
pornografia é uma ilusão, é uma fantasia, é o apelo a gratificação com a imaginação masturbatória.
❖ O Amor, necessidade de Vênus é convertido no maior dos prazeres, um prazer que se limita ao momento da
consumação do ato.
❖ Adquirir uma seriedade muito profunda porque é o aprofundamento da criação humana, que na teologia e
religião e dignificada pelo sacramento do matrimônio.

ÁGAPE/CARIDADE:
Os três primeiros amores(Afeição, Amizade e Eros) são naturais, não bastam a si mesmos, precisam ser elevados,
para a doçura e bondade. São como matos que dependem da poda para serem jardins, cuja beleza depende da
poda que extirpamos as ervas daninhas. “Deus como criador da natureza implanta em nós, amores doação e
amores necessidade.

A revelação cristã é baseada no fato de Deus ser amor e de Cristo ter amado profundamente os homens para sua
salvação.

Lewis reflete sobre isso, ao comentar que Deus coloca em nós amores-necessidade e amores doação, e estes
últimos são imagens naturais dele mesmo. O amor-doação de Deus é inteiramente desinteressado e deseja
simplesmente o que é melhor para o amado.

No Amor-Amizade e Amor-Eros, o interesse no amado está, de certo modo, ligado aos próprios interesses,
ao ego; enquanto o amor caridoso suplanta definitivamente o egoísmo.

Esse amor permite amar o que não é naturalmente amável, e é o único amor capaz de perdoar. Num sublime
paradoxo, Deus permite ao homem ter um amor-doação voltado para o próprio Criador.

Todos nós precisamos da caridade dos outros, mas, apesar de essa ser a espécie de amor de que precisamos, não
é a espécie de amor que queremos.

❖ Queremos ser amados porque merecemos, por nossas qualidades, por nossa beleza, inteligência, honestidade.
O Amor Caridade, tudo perdoa, tudo suporta, não se envaidece... E esse amor é eterno, supera o tempo, não é
limitado, não acaba.
O orgulho inscrito em nós quer que sejamos amados por mérito, mas o amor-caridade é o amor a quem não
merece ser amado; ele é absoluto, incondicional, eterno.

172
Afirma o autor: “os amores naturais só podem ter esperança de eternidade na medida em que se permitirem ser
assumidos pela eternidade da caridade”.

Na aula anterior, comentou-se que a amizade intrínseca, virtuosa e pautada no bem comum, pode assimilar o
prazer e a utilidade.

O exemplo mais didático, embora não esteja no livro de Lewis, é o amor matrimonial, que engloba os três
primeiros tipos de amores e, pautado no sacramento do Matrimônio, redimensiona-os pelo amor-caridade. O
tempo corrói tudo, mas os outros amores, quando pautados na caridade, não passam.

“Deus pode despertar no homem um amor apreciativo sobrenatural por Ele. De todas as dádivas, é a que mais se
deve desejar. [...] Quando não podemos ‘praticar a presença de Deus’, já é alguma coisa praticar a ausência de
Deus, ir tomando consciência de nossas inconsciências até nos sentimentos como um homem que está diante de
uma grande catarata e não ouve nenhum ruído. Saber que já se está sonhando e não está perfeitamente
adormecido”, diz Lewis.

Esse argumento final da obra é muito interessante. Quando amamos com muita intensidade no nível afetivo,
amistoso e sexual, passamos a intuir certa transcendência, algo que falta´, que transcende estes próprios amores.

❖ É como pressentir o barulho da cachoeira, que eu não escuto. Mas quando olhamos para uma cachoeira muito
profunda é claro que tem um barulho ensurdecedor, é como se déssemos um ‘mute’ em um filme, e todo mundo
estivesse falando, ‘tem alguma coisa sendo falada aí, tem alguma coisa sendo dita aí’, que não estou
conseguindo ouvir porque o aparelho está emudecido. É como se Deus estivesse pressentido e permeando estas
relações, que ainda não foi assumido. E quando se encontra Deus aí sim se antecipa, desde já a bem
aventurança eterna.
E aqui se dá um passo para dentro da vida espiritual, sobrenatural e religiosa propriamente dita.

IMPORTÂNCIA DOS SÍMBOLOS NA PSICOLOGIA E COMENTÁRIO ACERCA DA TERAPIA

O positivismo é a crença de que conhecemos o mundo a partir dos órgãos dos sentidos e que conseguimos
descrever os fenômenos naturais a partir de suas percepções.

❖ Nossa razão é sempre debitaria ao descrever nossos sentidos. As ciências naturais evoluíram muito a custa de
ignorarem os símbolos, a filosofia, a poesia e a história.
Simplificando, isso gerou empirismo e materialismo, de modo que as ciências se desenvolveram às custas de
ignorarem a sabedoria tradicional.

Atualmente, psicólogos – que lidam com o que há de mais misterioso, a alma humana – não recorrem ao
manancial da sabedoria tradicional; leem Freud, Jung e tantos outros sem recorrer ao que eles estudaram, como
a mitologia grega ou as Sagradas Escrituras.

173
Não há nada de errado em fazer psicologia teorizando a partir da poesia, de temas da mitologia, das escrituras
ocidentais ou orientais; pelo contrário, é impossível fazer psicologia de outro modo.

A Alegoria é uma metáfora, em que uma coisa menor, que não existe, fala de uma coisa maior, que existe.

O Símbolo, por outro lado, é algo menor que exprime algo maior por participação e por presença.

A alma humana é um Símbolo que abre a uma realidade espiritual, imaterial. Por isso é importante cultivar a
imaginação simbólica, para que se possa perceber o que transcende os sentidos.

Trazendo para a vida concreta, existe uma percepção sobre o amor que precisa ser melhor posicionada: a
empatia.

Na convivência uns com os outros, os defeitos ficam visíveis; e o homem contemporâneo tende a considerar o
amor como uma aceitação gozosa dos defeitos.

❖ Mas o Amor Verdadeiro é olhar para as incapacidades do outro, atravessá-las e perceber a perfeição que ele
pode ter. Essa deve ser a visão do terapeuta. A intervenção terapêutica, portanto, consiste em um olhar
amoroso que leva o paciente, articulando toda a matéria bruta de defeitos e incapacidades numa narrativa de
vida que tende à perfeição para a qual ele foi criado.
➢ O Amor é intrinsicamente pedagógico. O terapeuta é um educador, que está remodelando a alma a partir
das modelagens que ela tem.
➢ As pessoas são modeladas pelo pai, mãe, pela literatura, pelo partido, escola, música, e o terapeuta deve
aparar as arestas e as vezes propor uma remodelagem radical. Isto é educação.
➢ O relativismo irá dizer: qualquer forma basta. O relativismo leva ao ódio perante as pessoas.

174
PAPO FILOSÓFICO ÍTALO MARSILI E VICTOR SALES – SEMANA 08

ÍTALO MARSILI
Foi muito importante você trazer o tema da Mitologia, tanto da Mitologia Grega, quanto da Mitologia da
Escritura. Um dos grandes ganhos que considero, a partir da atuação pública que comecei a ter há uns 4 anos,
foi colocar estes assuntos para os psicólogos, pois antes eram assuntos um pouco proibidos por assim dizer. Um
psicólogo clínico ou um teórico da Psicologia sentia-se de fato acanhado ou como se tivesse alguma coisa
errada, ele pensar, ele agir, ou ele teorizar, ou ele articular isto tudo a partir de poesia, a partir de escritura
sagrada (seja ocidental ou oriental) e a partir de mitologia grega.
Não há nada errado em fazer Psicologia assim, pelo contrário,, impossível de fazer Psicologia de outro modo. Isto
não somos nós que estamos dizendo. Vamos pegar a Psicologia Contemporânea, o próprio Freud que foi o pai
desta Psicologia, o que ele usa? Ele não usa nada científico, como se entende ciência hoje. Ele não usa
experimentos de laboratórios, uma teoria quantitativa, não, ele usa a Mitologia Grega, como fundamento de toda
sua dissertação e especulação.

O que é o Complexo de Édipo, senão uma derivação do próprio Mito do Édipo.

O que é o livro Totem e Tabu, que é um livro central, na súmula tópica do Freud, senão uma especulação acerca
dos mitos, que estão presentes nas Sagradas Escrituras ocidentais.

Quando nessa aula você trata da Mitologia Grega, quando você traz a Mitologia Escritura usando Cristo como
arquétipo, ou a Vênus como arquétipo do movimento da alma, Afrodite etc., isto é absolutamente preciso para
especulação dentro da Psicologia. Não se faz Psicologia de outro modo.

Quando você traz, os esquemas Platônico, do baixo ventre, tórax e cabeça e outra dimensão é assim que se faz
Psicologia, não tem outra forma de fazer Psicologia, porque é muito difícil a gente tentar analisar este fenômeno,
ou isso que é o homem, de outro modo. Toda esta narrativa baseada nos mitos, representam o “EU” que contém
um universo em si. Dado que o homem tem um universo. Segmentar o homem só na natureza biológica ou
esquema mecanicista, é amputar o homem nos seus movimentos mais complexo.

Jung em toda sua obra, ele utiliza a Sagrada Escritura, ora como evento histórico, ora como arquétipos. Por
exemplo, quando você fala de Cristo, podemos entendê-lo como um homem que encarnou há 2.000 anos e
também Cristo como um arquétipo. Para nossa finalidade, ambas as percepções valem.

Podemos pensar em Vênus, como alguma coisa que os gregos pensavam, isto é uma percepção muito diminuída,
que a inteligência pode ser um obstáculo para a inteligência do homem cientificista, do nosso tempo. Só acreditar
ou só querer ouvir as coisas que podem ser mensuradas, que estão no nosso dia a dia, do mundo contemporâneo
do século 21. Com este olhar não se pode fazer Psicologia ou mesmo ciência.

Vamos pegar uma teoria universal que acreditamos, teoria da gravidade, a atração dos corpos segundo uma lei
específica, que Newton descreveu por meio da matemática. Antes desta descrição matemática, ele teve uma
imaginação, ele precisou criar uma narrativa, contar a história para conseguir formular as equações. Uma história
só pode ser contada se o sujeito tem a expansão imaginária. Newton antes da matemática teve suas narrativas,

175
até chegar à fórmula, de uma operação da natureza. Se Newton fosse cientificista e mecanicista ele não poderia
fazer uma narração de uma equação da natureza.

Isto tudo para explicitar que toda Mitologia seja pagã ou profana, seja Oriental ou Ocidental é plena de símbolos,
que tem recursos complexo e amplos que podem nos proporcionar narrativas e que nos dizem alguma coisa.

Victor, você falou um verso belíssimo: “Transforma-se o amador na coisa amada”. E este processo da
transformação desse eu que ama, naquilo que ele ama.

VICTOR SALES
Citei nas aulas sobre o Positivismo que descreve que os fenômenos que percebemos são pelos nossos sentidos
até onde eles alcançam. De modo que a razão é sempre debitaria dos sentidos. Isto gera um empirismo e um
materialismo.

As ciências naturais se desenvolveram muito a custa de ignorarem a sabedoria tradicional dos símbolos a custa
de excluírem as disciplinas humanísticas tradicionais: da literatura, incluindo poesia e religião lato sensu, história
e filosofia. De modo que é inadmissível o quadro que temos no século 20 / 21 de um psicólogo que vai lidar com
o que há de mais misterioso do mundo, que é a ALMA HUMANA, os desejos humanos, a inteligência humana, a
imaginação, os apetites sem recorrer ao manancial da sabedoria tradicional. E o maior paradoxo é que irão ler
Freud, Jung e “tutti quanti” sem recorrer ao que eles estudaram, por exemplo a Mitologia Grega, as Sagradas
Escrituras.

Com isso o psicólogo se castra, de antemão de conhecer a alma humana, que repito a ALMA HUMANA É UM
SÍMBOLO, segundo Platão, pois ela participa de uma esfera superior. O símbolo está ligado ao espírito.

O Lewis tem um livro, Alegoria do Amor, da idade Média. É um tratado mais acadêmico sobre o amor na Idade
Média. Logo no começo ela faz a distinção entre Símbolo e Alegoria. O grande erro da mentalidade moderna é
achar que tudo isso é Alegoria.

A Alegoria é uma metáfora, em que uma coisa menor, fala de uma coisa maior; algo que não existe, fala que
existe.

➢ Exemplo de Alegoria: Token no prefácio do livro II do “Senhor dos Anéis”, diz que não é um livro alegórico,
ou seja, ele não está representando a 2ª. Guerra Mundial, ou o Cristianismo, ou a Crise da Idade Média, ou a
Revolução Francesa. Ele dizia que o Senhor dos Anéis é uma história verdadeira, porque ela não representa
nada do passado, porque ela é simbólica, participa de uma verdade superior.
O símbolo é algo menor que exprime algo maior, por participação ou por presença. Como a Alma é um Símbolo,
porque abre uma realidade espiritual, ela participa desta inteligibilidade. Quando desenvolvemos este olhar,
vemos que a realidade não se exaure a algo material. A meu ver a ciência não consegue tocar no núcleo da
humanidade, que chamamos de ALMA, de PSIQUÊ.

Aristóteles era filho de médico e Platão era um poeta, os dois grandes filósofos. Momentos que Aristóteles se
rende a poesia, entendeu a tragédia, mais não tinha a essência poética que Platão tinha.

176
É muito importante esta sensibilidade simbólica que você, Ítalo, tanto cultivas. O teu livro “Chapéu do Mago”, tem
muito a ajudar neste pensamento simbólico.

Enfim, Camões, de certo, se eu amo animais, acabo me animalizando e também humanizando um pouco o animal.
Se eu amo a Deus, é claro que a gente se eleva, se diviniza; preenchemos nosso coração, nosso pensamento,
voltamos para a realidade que a gente ama. Camões é platônico neste verso, ‘agostiniano’ neste verso.

ÍTALO MARSILI
Tem uma percepção acerca do Amor, que eu entendo por um lado, mas por outro lado, que necessitamos
posicionar que é sobre EMPATIA. Quando eu olho para você e vejo seus defeitos e você olha para mim e vê meus
defeitos, somos humanos, temos defeitos, existe uma incapacidade de entender o amor mesmo que seria, nesta
sociedade contemporânea, um amor a estes defeitos, a estas incapacidades. “Não mexe aí, eu te aceito assim
mesmo...” Seria uma empatia.

A visão mais profunda do AMOR é: eu olho para você, atravesso seus defeitos, e vejo a perfeição que poderia
ser. Esta é a visão que o terapeuta deveria ter, sem atropelar, aquilo que se apresenta como incapacidade,
inconsistência, como imperfeição. O olhar amoroso do terapeuta deve ir arrastando para este lugar.

VICTOR SALES
O Amor é intrinsicamente pedagógico. O ser humano tem que buscar se elevar sempre. Pai e mãe são fantásticos
no sentido que buscar fazer os filhos se tornarem pessoas melhores, sempre. O terapeuta é um educador, que
está remodelando a alma a partir das modelagens que ela tem. As pessoas são modeladas pelo pai, mãe, pela
literatura, pelo partido, escola, música, e o terapeuta deve aparar as arestas e as vezes propor uma remodelagem
radical. Isto é educação. O relativismo irá dizer: qualquer forma basta. O relativismo leva ao ódio perante as
pessoas.

O verdadeiro educador, o verdadeiro terapeuta, quer que a pessoa se liberte para uma vida mais plena, por isso
deve haver um pressuposto que há verdade moral, há verdade psicológica. Não pode ser um discurso, uma
ideologia, uma moda, uma linha psicanálise, behaviorista, junguiana, logoterapia, como se cada um fosse revelar
algo. Deve haver uma unidade.

ÍTALO MARSILI
E o relativismo leva ao ódio em relação as pessoas. Até a 2 ou 3 séculos era ensinado: a gente odeia o erro e ama
aquele que erra. A gente odeia o erro por quê? Porque dá balizas muito claras do que é verdade e o que é mentira,
o que é o certo e o errado. Quando odiamos o erro, se torna possível amar aquele que erra, porque a gente não
quer que ele volte a errar, para que ele seja feliz. Quando o relativismo entra, a gente já tolera o erro, não temos
o conceito do que é certo e o errado, toleremos o erro, e passamos a odiar as pessoas. É só olhar na família, nas
redes, no Instagram, esse ódio, desejam que o outro morra, falam se odiando. E porque existe isso hoje, não
estamos na tolerância, não existe a sua verdade e a minha verdade? Era para todo mundo se amar mais (o
inocente pensa assim). Porém aí é que está o problema: o coração do homem precisa de balizas claras da estrutura
da realidade . Quando estamos orientados na baliza da verdade, do bem e do mal , só aí se torna possível amar
uma pessoa, pois você deseja que ela vá para aquele lugar de bem, de verdade. Quando estas balizas caem, vem
o ódio, o rechaçamento por causa do medo. Tem medo de quem está ao teu lado.
177
VICTOR SALES
O outro é visto como uma ameaça a mim. É a lógica do amigo inimigo. Preciso eliminar o outro para sobreviver,
porque ele quer me eliminar. E o erro a culpa é nele e aí surge os processos de vitimizações. Aí iniciam os processos
de acusações: “Você é meu agressor e sou tua vítima, mas neste momento estou te condenando e estou
legitimando que sejas o bode expiatório da sociedade. ” Todos se tornam bodes expiatórios na sociedade. Isto é
a guerra iminente de Todos Contra Todos. É a dissolução do AMOR, é a crise na cultura na sua manifestação.

ÍTALO MARSILI
O terapeuta tem que estar atento a isso, muito atento a isso. As pessoas carregam para o setting terapêutico estas
imagens interiores.

VICTOR SALES
Lembrei de uma história: Era uma família que tinha o pai um pouco problemático e a mãe foi no terapeuta e
descobriu que o problema dela era o marido, o filho foi também e descobriu que o problema era o pai, outro filho
descobriu o problema é o pai. Sempre tendemos a buscar o gesto do bode expiatório; o gesto de buscar culpados.
O meu problema é o pai, o meu problema é porque nasci no Brasil, o meu problema é que não estudei na
Sorbonne, o meu problema é a igreja... o problema sempre está no outro. Temos que ter a consciência que o
“problema é o meu” a partir de realidades problemáticas. É um processo de vitimização, infantilização, de
culpabilização dos outros;, de busca de culpados por seus próprios problemas, é muito comum numa sociedade
mimada.

ÍTALO MARSILI
E não se trata de tornar o terapeuta insensível. De fato, se sou pobre, vou ter dificuldades diferentes daquele que
é rico. Se sou preto, vou ter problemas diferentes daquele que é asiático. Se sou brasileiro terei dificuldades
diferentes daquele que é inglês..... Victor Franck ajuda com a imagem do campo de concentração, ele foi jogado
neste campo, um dos lugares mais terríveis que um ser humano possa ter passado, pois não há nenhuma
possibilidade de romantizar um campo de concentração. Ele perdeu mulher, filho, pai, emprego, dignidade,
tudo.... e curiosamente ele não diminui, ele aumentou sua alma. Então sem minimizar a dor do outro, cada um
tem suas dores, O TERAPEUTA NÃO PODE VALIDAR A VITIMIZAÇÃO, PORQUE ISTO NÃO É TERAPEUTICO. Isto é
profundamente alienante, isto torna o sujeito mais disfuncional ainda.

A imagem do campo de concentração serve para o terapeuta saber que existe algo que é a liberdade interior,
de se tornar melhor a cada ato, de olhar com amor.

VICTOR SALES
Como conquistar a liberdade interior.

178
NUTRIÇÃO

RENNAN CAMINHOTTO

179
SEMANA 01: NEUROTRANSMISSORES

Esta aula, trataremos de neurotransmissores: o que são, como são sintetizados e quais nutrientes
são necessários para a sua síntese ou sua atuação.

O QUE SÃO

❖ Para entender o que são os neurotransmissores, primeiro temos que relembrar o que é o nosso
Sistema Nervoso. Ele é particularmente nosso cérebro, e é constituído a partir de bilhões de células e
entra elas os principais são os neurônios que é a base funcional de todo este sistema.
❖ Os neurônios se comunicam entre si e a função do Sistema Nervoso, função cerebral depende de uma
boa comunicação entre essas células. Esta comunicação se dá por estímulos eletroquímico, são
estímulos que tem uma característica elétrica, o potencial de ação dos neurônios
e são ativados por alguns compostos químicos que chamamos de
Neurotransmissores.

Dentre as bilhões de células que compõem nosso cérebro, as principais são os


neurônios, que se comunicam entre si por meio de estímulos eletroquímicos provocados pelos
neurotransmissores.

❖ Estes neurotransmissores são muitos importantes para toda a função do Sistema Nervoso e para
regulação de nosso humor.
❖ Os fármacos utilizados para tratamentos de transtorno de humor, como depressão, como ansiedade
são fármacos que interagem de alguma forma na função destes neurotransmissores. Seja na melhor
ativação do receptor por estes neurotransmissores, seja mimetizando a ativação destes
neurotransmissores ou mesmo aumentando o tempo de permanência, de disponibilidade desses
neurotransmissores na fenda sináptica, por exemplo como os inibidores de recaptação de Serotonina,
Noradrenalina etc.

Os Neurotransmissores são tão importantes que a ação de muitos fármacos depende deles. Cabe
entendermos, por ora, como os neurotransmissores são produzidos e quais são os seus efeitos no
organismo.

❖ É de suma importância nós entendermos esses neurotransmissores, tende em vista que todo o
tratamento do ponto de vista orgânico, do ponto de vista material, todo o tratamento farmacológico
que nós temos, se dá na regulação das funções destas moléculas.

180
❖ Quero conversar com vocês sobre como estes neurotransmissores são feitos, cada um em particular e
quais são os efeitos no nosso organismo. Para entendermos uma coisa uma característica base de
todos esses neurotransmissores, gostaria de relembrá-los uma coisa: nós temos que produzir os
nossos neurônios, as nossas células nervosas produzem esses neurotransmissores.

As células nervosas sintetizam neurotransmissores a partir dos “precursores dos neurotransmissores”.


Esses precursores são moléculas químicas, que, em geral, adquirimos por meio da alimentação. A seguir,
apresentamos os principais neurotransmissores e como eles são sintetizados:

DOPAMINA

❖ A DOPAMINA é um neurotransmissor que está associado ao sentimento de recompensa; à capacidade


de engajamento e permanência em alguma atividade. Está associada aos nossos desejos, a nossa
capacidade de desejar as coisas. Isto tudo porque a Dopamina alimenta centros de recompensa no
nosso Sistema Nervoso Central.

A Dopamina é um neurotransmissor que está associado ao sentimento de recompensa, à capacidade


de engajamento e permanência em alguma atividade.

❖ Toda vez que fazemos alguma atividade, onde este centro de recompensa é ativado, estes estímulos
tende a induzir o indivíduo a repetir aquele ato que originou o estímulo inicial. É para isto que serve
esta sensação de recompensa.
❖ É uma forma do seu organismo garantir que vai repetir aquele ato. Por exemplo, dois exemplos que
estimulam bastante a ativação deste centro de recompensa via Dopamina é alimentação, o ato de se
alimentar, e a relação sexual.
❖ São dois exemplos, um do ponto de vista individual e o outro do ponto de vista da espécie , são eventos
que precisam ocorrer na vida das pessoas. Se o homem ou animal não come, não subsiste, ele não
tem toda a questão material que necessita para sobreviver. Do ponto de vista da espécie se ele não
tem relação sexual, a espécie morre, acaba.
❖ A ativação deste centro de recompensa este prazer que a gente tem no comer e na relação sexual é
a garantia que a gente vai repetir este ato. É a garantia orgânica.

A falta desse neurotransmissor prejudica a realização de tarefas simples como comer, se higienizar ou
manter relação sexual.

❖ Nossa capacidade de trabalho, capacidade de relação, realização de tarefas simples, tudo isto será
prejudicado se não houver Dopamina suficiente sendo produzida.
❖ Este desequilíbrio na produção ou na resposta da Dopamina está particularmente / geralmente
associada, geralmente presente em Vícios. O alcoólatra, o viciado em drogas, o viciado em
pornografia, viciado em sexo, vício em telas, alguns tipos de comidas específicas, confort foods, que
181
são tipos de comidas muito ricas em calorias, açúcar, gordura e aumentam muito a Dopamina. Todos
estes vícios desequilibram nossa resposta a Dopamina.
❖ Estes vícios promovem um grande pulso de produção de Dopamina, que quando você volta para a
vida real, é muito difícil de conseguir. Então você se adapta a ter grandes necessidades de Dopamina.

O desequilíbrio na liberação desse neurotransmissor é responsável pelos vícios e compulsões. Para a


produção de Dopamina, é necessário que um aminoácido chamado fenilalanina, obtido por meio da
alimentação, chegue ao Sistema Nervoso central.

❖ Como é feita no organismo: no teu cérebro, no teu neurônio precisa ter Fenilalanina
que é um que aminoácido. Este aminoácido precisa chegar no seu Sistema Nervoso
Central para que haja o início da produção de Dopamina. A Fenilalanina é um
aminoácido que chamamos de essencial. Existem alguns aminoácidos que a gente
produz, que nosso corpo produz, existem outros que não. Esses outros precisamos
adquirir pela nossa alimentação.

A fenilalanina é convertida primeiro em tirosina, depois em l-dopa, para então tornar-se Dopamina. A
conversão desse aminoácido em neurotransmissor ocorre por meio de enzimas, que funcionam como
catalisadores da reação química.

❖ A Fenilalanina precisamos adquirir pela alimentação e depois


diversas reações químicas precisam ocorrer até a produção de
Dopamina. Estas reações químicas não acontecem de modo
espontâneo, acontecem devido a presença de compostos
químicos, proteínas, chamadas de Enzimas. As enzimas são
catalizadores químicos, faz com que a reação ocorra de modo
eficiente / rápido. Quero ressaltar 2 enzimas na segunda e terceira
reação.

No caso da transformação da fenilalanina em Dopamina, é necessária a enzima tirosinahidroxilase na


segunda reação, e dopadescarboxilase na terceira. Isso não é tudo. Também são necessários cofatores
enzimáticos para que a enzima possa atuar.

182
No caso da enzima tirosinahidroxilase, esse fator é o cobre; no caso da enzima dopa-descarboxilase, esse
fator é a Vitamina B6.

❖ Vitamina B6 e Cobre, são coisas que, assim como a Fenilalanina, conseguimos pela nossa alimentação.
Só na síntese da Dopamina, estamos diante de 3 reações químicas que dependem da alimentação.
❖ Quadros de deficiência, de alguns destes nutrientes podem prejudicar portanto a síntese da
Dopamina.
❖ Não só uma deficiência quantitativa, mas também uma deficiência relativa da capacidade de
funcionamento destes nutrientes.

Uma deficiência de Cobre, seja por desnutrição, seja porque o metal se antagonizou com Alumínio ou
Zinco presentes no organismo, dificultará a síntese da Dopamina.

❖ Exemplo: o Cobre é um metal e sua função pode ser antagonizada através da contaminação de outros
metais, como por exemplo Alumínio e o Zinco.
❖ As pessoas pela pandemia de Covid estão tomando 50 mg de dose ‘cavalar’ de Zinco Quelado. Doses
acima de acima de 30 mg de Zinco, são doses que aumentam muito o risco de haver competição entre
o nosso Cobre e esse Zinco que está sendo ingerido. Você pode estar começando a prejudicar a
capacidade do Cobre de se envolver na reação química (apresentada acima) por suplementação
errada de Zinco. Ou uma contaminação por Alumínio.
❖ A Vitamina B6, será falada em outra aula, mas o excesso de estrogênio pode prejudicar a função desta
enzima também.

NORADRENALINA

Trata-se de um neurotransmissor produzido a partir da Dopamina. É o responsável, junto com a adrenalina, pela
resposta de lutar ou fugir diante de uma situação de estresse.

❖ É o principal neurotransmissor associado a resposta de Luta ou Fuga, a nossa adaptação


principalmente aguda ao estresse. Quando estamos de frente a uma situação de estresse, um susto
muito grande, uma reação maior, percebemos isto no
susto, ou num assalto, ou qualquer situação que
coloque sua vida em risco. Temos uma descarga de
produção de Noradrenalina e uma descarga de
liberação deste neurotransmissor e ela junto da
Adrenalina, que é sua versão circulante no nosso
organismo, é a grande responsável por esta adaptação
aguda ao estresse.
183
❖ Os efeitos da Noradrenalina e Adrenalina juntas são:

➢ aumento da glicemia;
➢ aumento da frequência cardíaca;
➢ aumento da pressão arterial;
➢ dilatação da pupila e
➢ contração dos esfíncteres (do intestino e da bexiga).

❖ É claro, estamos numa situação de Luta ou Fuga, não iremos parar e ir ao banheiro, a gente ‘trava’,
a pupila dilata, o coração vem na boca e fica-se muito atento para responder ao estresse.
Sua atuação em nosso organismo inclui o aumento da glicemia, da frequência cardíaca e da pressão arterial;
também a dilatação da pupila e a contração dos esfíncteres.

O desequilíbrio da Noradrenalina (tanto sua falta quanto


seu excesso) resulta em medo e ansiedade; as crises de
pânico são decorrentes desse desequilíbrio.

A Vitamina C atua na produção de Noradrenalina, e é


comprovada sua utilidade no tratamento de ansiedade.

❖ O desequilíbrio deste neurotransmissor causa uma


dificuldade nesta adaptação e tanto pode ser a
falta como o excesso. Este desequilíbrio se
manifesta no medo e no descontrole, e este
descontrole é muito material. O exemplo disto é a
crise de Ansiedade e crise de Pânico. A frequência
cardíaca aumenta muito, dando a sensação de poder ter um
infarte, o ar começa a não entrar, as mãos tremem, perdem a
capacidade de se movimentar, se orientar. É uma sensação de
descontrole e descompasso físico. Parece que a matéria não vai
dar conta daquela situação.

❖ Esta reação química também depende de um nutriente, que


é a Vitamina C. Poucas pessoas sabem disto, mas esta
vitamina pode ajudar no transtorno da Ansiedade.

184
❖ Fizeram um estudo nacional com estudantes de Medicina que estavam em época de prova, era um
público ansioso e suplementaram 15 dias estas pessoas com a Vitamina C. Fizeram uma avaliação
antes e depois da suplementação, com apenas vitamina C, estas pessoas tiveram menores escores de
Ansiedade. E apenas 24h da primeira dose da vitamina C,
estes indivíduos já tinham a frequência cardíaca diminuída.
Claramente que é um sinal de regulação de Noradrenalina.

❖ A vitamina C é necessária para a produção da Noradrenalina


e ela também controla, um ajuste fino a quantidade da
Noradrenalina na Fenda Sináptica. Então a vitamina C atua
como regulador para que não haja nem a falta e nem o
excesso na Fenda Sináptica.

SEROTONINA

❖ É o neurotransmissor mais associado a depressão.

Devemos o sentimento de felicidade, de sentido da vida, de


preenchimento interior à atuação da Serotonina em nosso
organismo. O seu desequilíbrio está associado aos quadros de
depressão.

❖ A grande maioria dos fármacos antidepressivos, mexem de


algum modo com a serotonina, na emissão da sua recaptação, agonismo61 do seu receptor etc.
❖ A falta dela portanto, se a presença causa a felicidade, a falta dela causa uma tristeza, um vazio, falta
de sentido.
❖ Como ela é feita: tem um precursor que é um aminoácido que é o Triptofano, aminoácido essencial,
assim como a Fenilalanina, precisamos consumir, adquirir por meio da nossa dieta.

O aminoácido, obtido por meio da alimentação, precursor da Serotonina é o triptofano.


O triptofano, com a ajuda da enzima triptofano-5-hidroxilase, é convertido em 5-HTP.
O 5-HTP, com a ajuda da 5-HTP-descarboxilase, é convertido em Serotonina.
Essas duas enzimas têm os mesmos cofatores enzimáticos nutricionais, que são a Vitamina B6 e o
Magnésio.

61
Em bioquímica, um agonista é uma substância capaz de se ligar a um receptor celular e ativá-lo para provocar uma resposta
biológica, uma determinada ação na célula, geralmente similar à produzida por uma substância fisiológica. Enquanto um
agonista causa uma ação, um antagonista bloqueia a ação do agonista.
185
❖ Você precisa ter a vitamina B6 e Magnésio para ter as reações químicas e produzir a Serotonina de
modo adequado. Além de consumir Triptofano na dieta.

Uma dieta, portanto, rica em Triptofano, Vitamina B6 e Magnésio favorece a síntese e a liberação da
Serotonina no organismo.

❖ É um clássico, a vitamina B6 está em bastante lugares, ainda falaremos dela em mais um


neurotransmissor. O excesso de estrogênio (na síndrome pré-menstrual), prejudicando a capacidade
da vitamina B6 em ser este cofator enzimático, prejudica a formação de Dopamina,
consequentemente de Noradrenalina, prejudica a produção de Serotonina, prejudica diversos
neurotransmissores.

A Vitamina B6 auxilia em diversas reações essenciais aos neurotransmissores.

A deficiência de Vitamina B6, ou o seu impedimento de atuar como cofator enzimático, prejudica a
produção de Serotonina, Dopamina e Noradrenalina.

GABA E GLUTAMATO
❖ GLUTAMATO e GABA: esses dois neurotransmissores, são produzidos numa mesma rota bioquímica,
o Glutamato de um lado e o Gaba do outro, participam de um equilíbrio muito fino entre o processo
de estimulação do Glutamato e o processo de inibição via Gaba.

Esses dois neurotransmissores atuam conjuntamente na excitabilidade do Sistema Nervoso central. O


equilíbrio entre eles é muito sensível.

❖ O equilíbrio destes dois neurotransmissores é essencial para regulação exata / perfeita da


excitabilidade do nosso Sistema Nervoso Central.

Glutamato atua na estimulação do Sistema Nervoso central, enquanto


Gaba atua na sua inibição.

O Glutamato é produzido pelo mecanismo mitocondrial. Ele é


convertido, depois, em Gaba, que por sua vez volta à mitocôndria para
alimentar novamente algumas reações químicas que produzirão
Glutamato.
Vitamina
1. Glutamato, através de algumas reações químicas é convertido em
B6
2. Gaba que volta para a

186
3. Mitocôndria

Essas reações químicas dependem também da Vitamina B-6.

PARA ALÉM DA PRODUÇÃO DE NEUROTRANSMISSORES

❖ Foi citado vitaminas e minerais que são necessários na síntese, na produção dos neurotransmissores.
Os nutrientes não são importantes apenas na síntese dos neurotransmissores, mas também em sua atuação.

A síntese de neurônios dopaminérgicos, por exemplo, depende de vitamina D. A vitamina D age na atuação de
algumas enzimas, como a TirosinaHidroxilase. Para a produção da tirosina hidroxilase, você precisa da vitamina D.

❖ Mas há nutrientes que são responsáveis, também, pela capacidade do neurotransmissor exercer o
seu efeito biológico via receptores, por exemplo. Ou mesmo via existência de neurônios capazes de
produzir aqueles neurotransmissores. Vou dar alguns exemplos:
➢ Dopamina: neurônios dopaminérgicos, o aparecimento de neurônios que são capazes de produzir
Dopamina dependem, por exemplo, da Vitamina D. A vitamina D é capaz de estimular a
produção de neurônios que sintetizam a Dopamina.
➢ Também a vitamina D também age na expressão de algumas dessas enzimas, como por exemplo,
a TirosinaHidroxilase . A vitamina D é necessária para sua expressão genica proteica 62 . Então
a vitamina D vai lá no gene do neurônio estimula a transcrição do gene e a síntese da proteína
que dará origem a TirosinaHidroxilase. Para ter TirosinaHidroxilase você precisa de vitamina D,
para produção desta enzima.

Outro exemplo é a atuação do zinco e do Magnésio nos receptores de Glutamato e Gaba. Esses dois minerais são
capazes de modular a atividade de ambos os receptores.

❖ A capacidade do Glutamato e do Gaba de ativar estes receptores dependem de nutrientes, por


exemplo, o Zinco e o Magnésio. São dois mineiras que modulam a atividade de ambos os receptores,
receptor de Glutamato que é o neurotransmissor excitatório e do Gaba que é o neurotransmissor
inibitório.
❖ De modo sucinto, isto aqui é a introdução, uma discussão que temos que ter, antes de começar a
entrar nos outros assuntos, por quê? Se é muito interessante , se é muito bom conseguir através de
um fármaco modular a ativação de um receptor de um neurotransmissor, ou da quantidade de

62
Expressão Gênica. As etapas do processo de síntese das proteínas é regulado pelos genes. Expressão gênica é o nome do
processo pelo qual a informação contida nos genes (a sequência do DNA) gera produtos gênicos, que são as moléculas de
RNA (na etapa de transcrição gênica) e as proteínas (na etapa de tradução gênica).
187
neurotransmissor ali na fenda sináptica, é tão interessante quanto a gente garantir, que vai haver
produção adequada desses neurotransmissores.
❖ Mesmo um fármaco que aumenta a biodisponibilidade de serotonina na fenda sináptica, este fármaco
depende que a Serotonina, seja produzida. E para a produção da Serotonina, produção de Dopamina
etc. é necessário que uma porção de coisas que a gente encontra na alimentação ou que possa ser
otimizado / corrigido via suplementação.
❖ É interessante modular a resposta final, é interessante também a gente produzir, garantir uma
produção adequada destes neurotransmissores via nutrição e suplementação.

188
RESUMO NEUROTRANSMISSORES

189
SEMANA 02: VITAMINAS D e B12

Nesta aula, trataremos das vitaminas D e B12: o que são, onde e como agem, modos de avaliação de
deficiência e reposição.
❖ Nesta segunda aula iremos discutir como a vitamina D e a vitamina B12 pode influenciar em um
quadro de depressão.
VITAMINA D

A vitamina D, que também é discutida como hormônio na endocrinologia, é produzida pelo corpo a partir
da exposição adequada ao sol. É mais comum que se lembre de sua ação no metabolismo ósseo.
❖ A incidência dos raios solares na nossa pele ,converte alguns precursores de vitamina D em vitamina
D, aí tem todos os efeitos biológicos.
❖ Quando começa a falar em vitamina D, lembramos dos efeitos dela no metabolismo ósseo. A pessoa
está ficando mais velha, um idoso, ou uma mulher após a menopausa, ela começa a se preocupar
com a densidade mineral óssea, aí o clínico começa a avaliar a vitamina D. A vitamina D adequada
ela influencia na absorção do cálcio, em todo metabolismo do cálcio e na densidade mineral óssea.

Entretanto, hoje se sabe que a vitamina D tem várias funções no organismo, sendo importante em
quadros de transtorno de humor, como a depressão.
❖ Existe um grande estudo, de uns trinta mil participantes, que já demonstrou uma correlação /
associação entre deficiência de vitamina D e quadro de depressão.
❖ Existem estudos demonstrando que a reposição de vitamina D em indivíduos que tem deficiência
dela e também tem depressão, melhoram o quadro depressivo destas pessoas, faz com que as
pessoas respondam melhor a medicação antidepressiva.
❖ Então a vitamina D não age só apenas neste metabolismo do cálcio, na densidade mineral óssea.
Este é o primeiro ponto que temos que entender, a vitamina D age em inúmeros locais de nosso
organismo.

Ela atua em diversas estruturas do Sistema Nervoso central, como na neuroplasticidade e neuro
inflamação, além de agir no aumento de expressão gênica63 de alguns componentes necessários para a
produção de neurotransmissores.
Sua deficiência pode ser um fator que predispõe o indivíduo à depressão, ao passo que a reposição
pode melhorar o tratamento.

63
Gênica: energia, entusiasmo, tenacidade.
190
DEFICIÊNCIA E REPOSIÇÃO

Se um paciente tem um quadro de depressão diagnosticado ou apresenta cansaço ou sintomas de


tristeza, é bom pedir-lhe exames de sangue com a dosagem de 25-hidroxi-vitamina D, a nomenclatura
bioquímica da vitamina D circulante no organismo.
O valor de referência é uma faixa bastante extensa, que varia entre 20 a 100.
A sugestão é considerar que se o paciente estiver abaixo de 20, trata-se de uma deficiência de vitamina
D; se estiver entre 20 e 40, considerar valores inadequados e buscar melhorá-los; se estiver acima de 40,
60, considerar um bom índice; e se estiver 4 acima de 100, tomar cuidado, pois pode haver toxicidade.
❖ Valor entre 20 e 40 existe de certa forma um ‘limbo’, onde há discussões. Há pessoas que são adeptas
de concentrações acima de 20, mas abaixo de 40 são concentrações inadequadas; há outras pessoas
um pouco mais conservadoras que acreditam que acima de 20 a ‘coisa’ está boa.
❖ Na minha (Rennan) prática clínica e muitos profissionais eu vejo que algo acima de 40 é desejável.
Hoje em dia, perto do COVID até 60, parece ser algo bastante desejável e eu aponto que isto é bastante
desejável onde há depressão.
❖ Exame: sangue para medir a 25-hidroxi-Vitamina D e seus valores de referência (20 a 100):
➢ Deficiência: abaixo de 20;
➢ Valor Inadequado e tentar melhorar: entre 20 e 40;
➢ Valor adequado: entre 40 e 60;
➢ Toxidade: acima de 100 (tem que parar de suplementar se estiver acima de 100).

Conforme a Associação Brasileira de Endocrinologia, qualquer valor abaixo de 20 é uma deficiência clara
e a reposição deve ser feita obrigatoriamente via suplementação. Nesse caso, somente a prescrição de
tomar sol não resolve.
Para produção de vitamina D, é necessária uma exposição adequada ao sol, entre 10h e 14h, e existem
desvantagens dermatológicas nessa indicação.
A prescrição de x unidades de vitaminas D, 1000 UI ou 2000 UI, também é inadequada.
O paciente deve tomar no mínimo 50000 UI semanal, em pulsos de vitamina D ou dividido em 7000 UI
diária.
❖ Prescrição ideal de suplementação na deficiência:
➢ Reposição : 50.000 UI semanal ou 7.000 UI diária.
➢ Não é adequado prescrição de 1.000 UI ou 2.000 UI diários

Para as grávidas, a Sociedade Brasileira de Endocrinologia recomenda que não se façam pulsos, mas
reposição fracionada. Para os demais, é uma questão de escolha.
❖ Existe um problema que vejo, muitos profissionais acabam confiando em 50.000 UI semanal durante
três meses vai resolver o problema do paciente, porém muitas vezes não resolve. Hoje em dia sabe-
191
se que há variações de polimorfismos de absorção de vitamina D, tem pessoas que absorvem melhor,
tem pessoas que absorvem pior (depende da qualidade da vitamina).

A vitamina D é lipossolúvel, deve ser diluída em gordura para que ocorra a absorção adequada. Se
consumida em comprimidos, precisa de uma alimentação rica em gordura para garantir a absorção.

Prescrita a dose padrão para quem está com deficiência, em dois ou três meses deve-se refazer o exame
para garantir que a deficiência foi sanada.
Em seguida, é necessário descobrir a dose de manutenção adequada para o paciente. Esta não é
padronizada, precisa de testes, ou seja, prescrever uma quantidade para dois meses e refazer os exames.
❖ Para a dose adequada, não existe receita de bolo. Tem pacientes que estavam com um bom valor, foi
prescrito 4.000 UI para esta manutenção e a vitamina D voltava a cair, era um paciente que precisava
um pouco mais. Isto é muito, muito comum. Tem pessoas que necessitam 10.000 UI para se manter
em níveis adequados de vitamina D. Tem pessoas que foi prescrito 5.000 UI diários, e com três meses
já estavam com um valor maior que 100 (uma paciente do Rennan que era muito magrinha).

VITAMINA B12

❖ A vitamina B12 na depressão (esta aula é só sobre depressão) está presente em alguns casos bastante
interessantes.
❖ Caso da Revista Brasileira de Endocrinologia:
➢ Paciente do sexo feminino de 42 anos, solicitou encaminhamento ao psiquiatra porque tinha
alguns sintomas depressivos que persistiam com uso da medicação, ela tinha depressão
refratária. Já fazia um ano que ela tomava antidepressivo, já havia trocado alguns, aumentava e
diminui as doses, e o quadro não melhorava. No psiquiatra ela se queixou de insônia intermediária
(que é algo interessante de ser perguntado ao paciente- qualidade do sono dele), e despertar
precoce. Ela acordava no meio da noite, ou despertava muito cedo e não conseguia voltar a
dormir. Tristeza persistente, redução do apetite, perdendo peso sem fazer dieta, falta de energia,
retraimento social, humor deprimido e dizia que não tinha nenhum problema de saúde.
➢ Considerando a hipótese de ‘episódio depressivo maior’, psiquiatra começou a trocar medicação
(no caso – Fluoxetina até 40 mg/dia); houve uma pequena melhora no apetite, mas o quadro não
evoluiu.
➢ Depois de 8 semanas o quadro ainda persistia, trocou alguns antidepressivos.... e depois de quase
um ano de tratamento, ao total quase dois anos de tratamento, o médico resolveu fazer alguns
exames. Nesses exames foi identificado uma alteração hematológica, hemácias com aumento do
seu volume (esta paciente havia se queixado de anemia, que ela tratava com ferro e não resolvia).
➢ Vendo esta alteração hematológica, um quadro de anemia, que não respondia a suplementação
de ferro e que tinha ali uma alteração no tamanho das hemácias, este médico começou a
192
suspeitar algumas vitaminas entre elas a B12, por quê? É clássico, todos os nutricionistas sabem,
qual a função da B12?

A função mais comentada da vitamina B12 é o favorecimento do processo de hematopoiese, ou seja, o


processo de formação das hemácias.

❖ Classicamente sabemos que quando há alteração de


hemácias, principalmente do aumento do tamanho das
hemácias, há geralmente alteração de B12.
❖ Continuando Caso R.B.E.: Só que esta paciente não tinha
apresentado alterações de tamanho até agora, prestem
atenção neste detalhe, depois de 2 anos de depressão, que
ela começou a apresentar esta alteração, foi quando eles
foram dosar a B12,. A B12 dela estava em 41
64
picogramas /ml. Para vocês terem ideia o valor de
referência da B12 é de 190 a 900. Ela tinha uma deficiência
grave, que passou todo este tempo desapercebida porque a
alteração hematológica não ocorria, que é o que mais classicamente associa a B12. Iniciaram uma
reposição intramuscular de B12 e em seis meses a paciente estava de alta de todos os antidepressivos
que usava.

Mas seu efeito não se limita a isso (hematopoiese – processo de desenvolvimento de células vermelhas),
pode até haver deficiência de B12 onde não há alteração nenhuma de células sanguíneas.

Se o paciente tem um quadro de depressão, apresenta cansaço, fadiga, principalmente mental, é


importante dosar a vitamina B12. O valor de referência é de 190 a 900, mas sua avaliação é mais
trabalhosa.

❖ A avaliação da inadequação ou não é algo que tem que ter todo cuidado.

GRUPOS DE RISCO

Há grupos de risco para os quais a deficiência da vitamina B12 é mais comum. Pessoas que não
consomem alimentos de origem animal (em geral, a vitamina B12 está presente nesses alimentos) muito
provavelmente precisam de reposição.

❖ Veganos devem fazer reposição de vitamina B12.

64
Picograma: Unidade de peso equivalente a um milionésimo de micrograma. Símbolo: ‘pg’
193
Além disso, quem tem gastrite e faz uso de citoprotetores gástricos (como o Omeprazol) podem ter a
absorção de vitamina B12 prejudicada, pois não produz a acidez estomacal necessária para que o
organismo a absorva.

❖ A absorção da B 12 é algo um pouco mais intricada, ela precisa se ligar a um fator intrínseco produzido
pelo estomago, depois é absorvida por um pedaço específico do intestino... então ela precisa de umas
etapas, no teu organismo e necessita da acidez estomacal também. Se tem gastrite, pode não produzir
o fator intrínseco de modo adequado e ter uma baixa absorção de B12.
❖ Se usa citoprotetores gástricos, tem uma menor acides gástrica e pode influenciar também a absorção
de B12.

Outro grupo é o dos diabéticos que fazem uso da metformina (Glifage), fármaco que interfere na
absorção intestinal.

Anticoncepcionais orais também diminuem níveis de B12 e de B6 no organismo.

Por fim, os bariátricos, tanto sleeve65 quanto by-pass66 (pior o by-pass), podem apresentar deficiência.
Nesse último caso, o paciente terá baixa absorção crônica de B12.

❖ Estas pessoas têm que avaliar constantemente, avaliar os níveis sanguíneos de B12 e repor B12. Os
bariátricos repõe até de modo contínuo.

AVALIAÇÃO E REPOSIÇÃO

❖ Identificar a causa da deficiência da B12 é algo bastante importante para conseguir definir o melhor
meio de reposição. Por exemplo, o Vegano não tem nenhum problema de absorção, ele só não
consome. Este você pode repor de forma oral tranquilamente.

65
A Gastroplastia Sleeve por Videolaparoscopia é uma técnica restritiva de cirurgia bariátrica, na qual é retirada a grande
curvatura gástrica. Isso envolve parte do corpo e o fundo gástrico do estômago. Neste método, o estômago é transformado
em um tubo que possui entre 80 e 100 ml de volume. Além disso, com a retirada do fundo gástrico, o paciente deixa de
produzir a substância grelina, responsável pela estimulação do apetite. Dessa forma, em casos bem indicados, a perda de
peso da cirurgia bariátrica sleeve pode chegar a ser tão eficaz quanto no bypass gástrico.
66
By-Pass: Nesta técnica, o estômago é remodelado e reduzido a um reservatório de 20 a 30 ml de volume. Além disso, é
realizado um desvio do trânsito intestinal (Y de Roux), composto de três partes: 1)Alça alimentar: com aproximadamente
100 cm, conduz o alimento a partir do novo estômago; 2)Alça biliopancreática: com aproximadamente 100 cm, leva os sucos
digestivos (bile, suco pancreático, suco gástrico) até o alimento ingerido no canal comum; 3)Alça comum: com 4 metros,
onde é processado o encontro dos conteúdos das alças alimentar e biliopancreática, digestão dos alimentos e absorção dos
nutrientes. Por isso, essa técnica de cirurgia bariátrica é considerada mista, visto que realiza duas intervenções: redução do
estômago e desvio do intestino.

194
❖ Um bariátrico (hoje em dia já se sabe que em via oral em doses altas, até daria) já sai com uma
prescrição de injeção intramuscular de B12 ( o famoso Citoneurin). Inicialmente é muito, muito
recomendada as injeções intramusculares porque tem uma dificuldade de absorção muito grande,
depois disso você pode repor em doses maiores (como Rennan não especificou o que são essas doses
maiores, eu presumo que seja via oral).

Para avaliar se o paciente está com deficiência, não basta olhar o valor de referência. A quantidade de
B12 no sangue não é uma medição padrão ouro para identificar o status nutricional, pois a principal
função da vitamina B12 se dá no ambiente intracelular.

❖ Muitas vezes dentro da sua célula já se acabou a B12, mas lá


na circulação ela ainda está em níveis aceitáveis nos valores
de referência.

Portanto, é importante observar os sintomas. Há cansaço? Há


fadiga mental? Se o valor estiver abaixo de 500, vale a pena
suplementar. A suplementação de vitamina B12 é muito segura.
Seu principal efeito adverso é a acne.

Pode-se confirmar de modo laboratorial, dosando a homocisteína, que é um marcador inespecífico. Se


estiver acima de 8, mas houver sintomas e concentração menor que 500, é necessário suplementar.

❖ A homocisteína é um marcador inespecífico, quando a B12 para de funcionar, quando não tem a
vitamina B12 suficiente para ter as reações químicas no organismo, a tua homocisteína tende a subir.
❖ O problema é que a homocisteína ela não é um marcador específico, ele pode ser também um
marcador de baixa função de ácido fólico e de vitamina B6.

O marcador específico da vitamina B12 é o ácido metilmalônico. Seu aumento é sinal inequívoco de
deficiência, mas a dosagem é difícil de ser feita em clínica.

A reposição pode ser intramuscular (prescrita somente por médicos) ou oral. Sugere-se começar com
1000 µg na forma ativa de vitamina B12, que é a metilcobalamina; também se pode usar o Citoneurin,
com até 5000 µg por dia.

❖ Não há uma receita de bolo, você tem que fazer teste, você pode usar 1000 ug / 2000 ug três vezes
ao dia; você pode usar 5.000 ug duas vezes ao dia.

A vitamina B12 também tem impacto na memória. Idosos com quadro aparente de demência podem,
na verdade, estar com deficiência de vitamina B12.

195
Em resumo, devem-se incluir as vitaminas D e B12 nos exames de rotina, repeti-los com certa frequência
e fazer a reposição de acordo com os resultados.

PAPO NUTRICIONAL ÍTALO MARSILI & RENNAN CAMINHOTTO – SEMANA 2

ÍTALO MARSILI
Eu lembro de uma paciente que atendi, foi minha primeira paciente psiquiátrica, chegou para mim
depois te ter passado por alguns médicos, alguns psiquiatras, aqui do Rio de Janeiro, tinha professores
meus, inclusive. Quando você está no início da carreira e chega um paciente, que já rodou por outros
psiquiatras notáveis, que foram teus professores, você pode inventar de ficar mudando dose de
antidepressivo , ela já tinha tomado alguns antidepressivos no quadro. Ela tinha começado com uma
anedonia, alteração de sono profunda, quando ela chegou para mim ela não estava mais indo na
faculdade.

Na primeira vez que a vi, era uma jovem, tinha 17 / 18 anos, estava na universidade, primeiro período
da faculdade trancada, cabelo meio quebradiço, estava magrinha, aquele rosto bem entristecido,
descuidada, uma menina bonita, mas estava totalmente descuidada. Tinha o exame de sangue dela em
mãos, que não tinha dosagem de vitamina B12. Quando vi, comecei a pensar, não vou começar a ficar
alterando depressivo, meus professores já fizeram isto, vou procurar outras causas orgânicas de
depressão nela. No exame de sangue dela, tinha o VCM 67 um pouquinho aumentado e um RDW68
aumentado. Então VCM aumentado, comecei a pensar, será que estes eritrócitos, estas hemácias estão
em um tamanho maior que o normal e o RDW também. Ou seja, a contagem de hemácias elas tinham
tamanhos diferentes entre si, talvez ela tenha uma anemia megaloblástica69 causando todo este quadro
depressivo dela. Ela já saiu da consulta com a prescrição da B12 e um pedido de exame de sangue novo.

Estou dizendo isso porque, o exame de sangue é complementar, a clínica é soberana. A menina tinha
uma depressão refratária, estava tomando mediação antidepressiva, e tinha uma indicação que tinha
uma deficiência de B12 e saiu com a suplementação. Lembro que suplementei intramuscular, não fiz
suplementação via oral. Para mim não estava claro ainda que as megadoses de vitamina tinha
equivalência com a intramuscular, saiu de lá com uma prescrição bem ‘agressiva’, por assim dizer. Já
adianto para nossos terapeutas que nunca prescreveram ou nunca tomaram a B12 intramuscular, que

67
VCM (Volume Corpuscular Médio) é um índice hematimétrico presente no hemograma e indica o tamanho médio das
hemácias, as células vermelhas do sangue. As alterações identificadas pelo VCM podem indicar características e índices de
determinados problemas de saúde.
68
RDW é um parâmetro da variabilidade de tamanho dos eritrócitos, traduzindo o grau de anisocitose numa amostra
sanguínea. O mesmo proporciona informações complementares ao Volume Corpuscular Médio (VCM), que representa a
média do tamanho dos eritrócitos.
69
Anemia megaloblástica afeta todas as linhagens sanguíneas. A característica morfológica mais marcante é a dissociação
núcleo-citoplasma (núcleo desproporcionalmente imaturo em relação ao citoplasma), e a principal causa da condição é a
deficiência de vitamina B12 e/ou ácido fólico.
196
dói, Citoneurin dói. O fato é que esta menina, ela começou a suplementar a B12, teve uma melhora
expressiva, e voltou a vida dela normal. Acabou terminando esse curso, depois fez Psicologia e hoje é
nossa colega e provavelmente vai fazer nossa formação. É uma pessoa que mantenho contato até hoje.

É um destes casos que é um antidepressivo era uma coadjuvante no tratamento, e havia uma causa
orgânica que não havia sido tratada, e mudou a vida dela completamente, a partir da suplementação da
B12.

Na minha prática, eu nunca pedi a dosagem de ácido metilmalônico 70, que é o padrão ouro para você
ver, nunca precisei... Eu tinha uma referência muito limitada ali, o início do hemograma que todo mundo
pede, tinha um VCM aumentado e RDW alterado mais a clínica, isto já me autorizou a pensar em
deficiência de B12. Na consulta seguinte, o exame que ela me trouxe, já com a dosagem de B12 no
sangue, realmente a B12 é muito baixinha, não lembro agora, muito abaixo da referência. Lembro que
pedi para ela dosar no mesmo dia e suplementar no dia seguinte, porque a B12 é assim, você toma a
B12 hoje, faz o exame amanhã, a dosagem já disparou.

Coisas que você falou que acho muito importante pontuar: a referência do laboratório; gostei muito
quando você falou para trabalhar com nível de 500; e isso muda nos laboratórios. O laboratório mais
famoso do Rio de Janeiro a referência é 190, então só considera deficiência de B12 abaixo de 190. Para
as pessoas entenderem, não é que queremos ser agressivos, vanguardistas ou pouco conservador,
aquela é uma referência para doenças hematológicas.

Estamos falando de outro referencial, que são as doenças psiquiátricas, Transtorno de Humor e de
Memória. Quando estamos falando de doença psiquiátrica abaixo de 300 com segurança já tem que
suplementar, porque a pessoa já começa a ter alteração do humor e de memória possivelmente. A aula
é de depressão, como você falou, mas a B12 também tem um impacto muito grande em memória.
Existem quadros, sobretudo nos idosos, que a gente começa a pensar assim, será que esse vovô está
ficando demente e quando você vai ver, ele tem uma B12 de 80 / 60 / 70. É um velhinho, que já tem uma
Catexia71 , tem uma Anorexia, já come muito pouco, come pouca carne, usa fármacos que já prejudicam
a absorção, e uma B12 baixinha. Então já reverti quadros de só pensando em Demência, você faz uma
prescrição de B12, volta a memória dele. São coisas que devemos estar bem atentos. Gosto deste limite
de 500, acho seguro, confortável, para a trabalharmos.

Quero saber da tua experiência, eu hoje, na prática, eu tenho prescrito muita B12 oral, eu acho que se
fizermos megadoses de B12, Citoneurin um comprimido pela manhã e um a noite, comprimido de 12

70
Ácido metilmalônico é pedido para detectar níveis altos sugestivos de deficiência de vitamina B12. Níveis baixos
desse ácido não têm significado clínico. O nível de ácido metilmalônico pode aumentar também em doenças renais. Com
diminuição da excreção renal do ácido, há acúmulo no sangue.
71
Catexia: concentração de todas as energias mentais sobre uma representação bem precisa, um conteúdo de memória,
uma sequência de pensamentos ou encadeamento de atos; catexe.
197
/12 horas, ele já cumpre a função. A gente vê no exame laboratorial, em regra, a B12 subir. Tenho cada
vez menos prescrito a injetável por questões de conforto do paciente. Depende do caso, se tem uma
demência, que você pode reverter com a B12 oral, e tem uma depressão como daquela menina grave,
você faz uma injetável.

RENNAN CAMINHOTTO
Só uma história com minha esposa, ela estava grávida de gêmeos no terceiro trimestre, uma barriga
enorme, já tínhamos dois filhos e ela precisava tirar todo dia um cochilo a tarde, nada mais justo. Dosou
a B12, estava 270, dentro do valor de referência. Ela tomou o Citoneurin injetável, tomou na segunda
feira, e no final de semana ela percebeu que não precisava mais dormir de tarde depois da
suplementação.

De fato a B12 tem este papel de fadiga mental, esta coisa de memória, as vezes a pessoa está com
embotamento mental, uma dificuldade cognitiva, a B12 influencia muito neste tipo de fadiga e na fadiga
como um todo. Na prática clínica, geralmente eu utilizo a Metilcobalamina72 , que é a B12 já ativada,
pelo menos 1.000. A ‘brincadeira’ começa acima de 1.000, três vezes ao dia. É bom ter mais um pico de
ingestão da B12, para facilitar o processo de absorção. Nunca cheguei ao Citoneurin 5000 mg, duas vezes
ao dia, nunca cheguei a esta dose, trabalho com doses um pouco menores. Mas as doses menores
podem ser que demorem um pouco mais no exame para subir.

ÍTALO MARSILI
Isso é outra coisa interessante de falar, porque depende da mão do terapeuta, também. Para alguns
casos eu tenho uma mão mais pesada. Efeito colateral da B12? Nenhum. Acne? Tive pouquíssimas
pacientes que estourou uma ou outra acne, sabe-se que tem casos de acne mais severo, mas isto é raro,
na minha prática clínica eu nunca vi e olha que quase todo mundo sai do meu consultório com uma B12
prescrita.

Você tem que pesar, efeito colateral, nenhum... muito pouco, muito toleráveis por assim dizer. Talvez
vale a pena...

RENNAN CAMINHOTTO

72
Metilcobalamina é a versão ativa da famosa Vitamina B12. Por essa razão, essa opção é biodisponível e pode ser absorvida
com facilidade — especialmente, porque o organismo não precisa convertê-la. Em resumo, podemos dizer que
a Metilcobalamina é a forma mais natural da Vitamina B12, podendo ser obtida tanto por meio de alimentos específicos,
quanto com a ajuda de suplementos.

198
Não tem receita como a Vitamina D, que é 7.000 diário ou 50.000 , isto é uma receita padronizada, tem
que ser no mínimo isto. A B12 vai variar de cada caso e é sempre bom dosar novamente para garantir
que aumentou, que a dose foi suficiente.

ÍTALO MARSILI
De injetável, queria falar de minha prática clínica, o protocolo que eu utilizava, utilizo ainda mas muito
menos hoje, utilizava injetável num protocolo mais ou menos agressivo também. Como eu fazia:
Citoneurin injetável, 7 doses, dia sim, dia não; intervalo de uma semana, mais um por semana, por um
mês; era muito agressivo o protocolo de B12 injetável. Porque, claro, eu estava tendo pacientes muito
graves na época... Volto a falar, hoje qual é a minha prescrição de B12 um comprimido pela manhã e um
comprimido a noite. Então não tem uma receita de bolo a B12, a gente vai tentando retorno clínico do
paciente.

O fato que aquela menina lá, de 17 / 18 anos, ela saiu de lá com protocolo de injetável bastante agressivo
e curiosamente ela gosta de mim.... Intramuscular, no glúteo, porque dói, dói... Também tem o
inconveniente que tem que ter alguém que aplique, nem toda a farmácia tem um farmacêutico para
aplicar, não vai ter um enfermeiro disponível, no Posto de Saúde as vezes você não consegue, então, o
via oral é muito mais confortável para o paciente e tem resultados muito equivalentes. A megadose
oral, estudos mostraram, que ela cumpre muito bem a função.

A vitamina D, você tocou num assunto que é a minha brincadeira com as minhas colegas
dermatologistas. Tem certas coisas que eu não compro briga, na clínica, dermatologista é um médico
que as pessoas gostam de ir. Não vou mandar as pessoas pegar sol ao meio-dia, para a vitamina D
aumentar, e depois as pessoas trabalham, então como vai parar para tomar sol de 11h a 13h? Tem alguns
aplicativos que dosam, qual a entrada de sol naquele momento específico da cidade, quanto tempo você
precisaria tomar sol para você ter doses de vitamina D, que não funcionam porque você não consegue
ficar ali. Depois você está no seu trabalho e você diz assim: “Pessoal, hoje não vou ficar aqui, porque vou
tomar sol!”. Você vai pegar sol, onde campeão? Você tem que ficar de sunga para pegar sol...
risos...Então na prática, nas cidades grandes, na nossa rotina de vida, é muito difícil você ter uma dose
de sol que seja capaz de aumentar a vitamina D. Nas cidades grandes, a incisão do sol já é muito
prejudicada pelos prédios, pela própria composição da atmosfera, então você tem que acabar
suplementando mesmo.

RENNAN CAMINHOTTO
Exato, não tem jeito, principalmente quando há deficiência. Se não passar pelo protocolo, a deficiência
não vai melhorar. Podem perguntar sobre a alimentação: sardinha tem vitamina D, mas é muito pouco,
salmão, atum, um pouquinho na gema do ovo, mas é muito pouquinho. A nossa produção deveria vir
por meio do sol, não dá, tem que partir para a suplementação, não tem jeito.
199
ÍTALO MARSILI
Tem um estudo muito elegante dos africanos que migraram para os países escandinavos e deprimiam.
E a primeira coisa que você pensa é que migraram e deprimem é porque a cultura completamente
diferente, estão expatriados etc. Alguém pensou o seguinte, pode ser a B12 porque as pessoas pegavam
sol, a composição da atmosfera, as cidades eram menores, vamos repor a vitamina D e eles não
deprimiam mais. A vitamina D ela tem um papel muito bem documentado na manutenção do humor
das pessoas.

Dosar vitamina D e repor vitamina D, cuidado com as doses tóxicas, como você falou, acima de 100, não
é que não possa, mas já começa a ficar inseguro, vai ser necessário um acompanhamento médico mais
detalhado. Algumas patologias, sobretudo as patologias que têm um componente de imunidade,
imunomodulação73 , o clínico vai dar superdose de vitamina D e vai trabalhar com valores muito alto.
Então o próprio protocolo do dr. Coimbra, que está aí em discussão, são protocolos com a vitamina D
muito alta mas não é o nosso caso, estamos falando de outra coisa aqui.

Vamos trabalhar no limite seguro, uma vitamina D dosada de 60 / 70, está no limite, já vai colocar o teu
corpo funcionando direito e como você falou, tem que ficar ‘redosando’. Qual a dose de manutenção,
só sublinhando o que você já falou mais uma vez, não tem dose de manutenção prescrita, você vai ter
que ver em função do que o exame de sangue está te entregando e sobretudo da clínica do paciente.

RENNAN CAMINHOTTO
Até existe uma dose sugerida de recomendação, de 1.000 a 2.000 IU diárias, se funciona é outra coisa.

ÍTALO MARSILI
Você vai estudar polimorfismo74 de todo mundo
também.... não dá.... fica muito longe da prática clínica
cotidiana. Vão ficar fazendo análise de polimorfismos de
expressão gênica de ‘conversão’ de vitamina D.. é um
tipo de coisa que não faz; pode fazer; mas não vai ficar
fazendo para todo mundo, porque onera o tratamento e

73
Imunomodulação: Os imunomoduladores são substâncias que atuam no sistema imunológico e potencializam a resposta
orgânica a determinados microrganismos, incluindo vírus, bactérias, fungos e protozoários, por meio da produção de
interferon e seus indutores. A imunomodulação se refere a qualquer processo biológico ou mediado por receptor que altera
o nível desejado de uma resposta imune. Numerosos microrganismos podem modular o nível da resposta imune para
estabelecer ou consolidar uma infecção. Assim, a imunomodulação pode ser benéfica ou prejudicial para o hospedeiro.
74
Polimorfismo: é uma variação fenotípica que pode ser separada em classes distintas e bem definidas. Como exemplos de
polimorfismos, pode-se citar grupos sanguíneos do Sistema ABO (classes A, B, AB, O). Nesse caso, só existem 4 fenótipos
possíveis. Se fosse possível colocar os fenótipos em um gradiente contínuo, o caso não se trataria de polimorfismo..
200
no fundo vai te entregar um resultado que você meio já..... já que sabia, no fundo é isso. Ah, estou dando
4.000 de vitamina D; 7.000 de vitamina D, 10.000 vitamina D e a vitamina da pessoa está sempre baixa,
então certamente existe um polimorfismo ali, então você terá que aumentar a vitamina D ali. Então quer
dizer, é um tipo de exame que você pode solicitar o estudo do polimorfismo, mas na prática, a gente não
faz, ou faz pouco em casos muito concretos.

RENNAN CAMINHOTTO
Em resumo é isso.

Tem que ter vitamina D e B12 nos exames de rotina, tem que repetir com certa frequência e repor de
acordo com os resultados.

201
SEMANA 03: FÁRMACOS PARA ANSIEDADE

Esta aula trata do uso de fármacos no tratamento de ansiedade, bem como as alternativas possíveis:
fitoterápicos e Magnésio.

FÁRMACOS PARA ANSIEDADE

❖ Nesta aula vamos conversar sobre ansiedade.

Os ansiolíticos são fármacos utilizados para o tratamento da ansiedade. Dentre esses, os


benzodiazepínicos são a principal classe, como Rivotril ou Alprazolam. Eles são relativamente seguros e
mais eficazes comparados a outros. Entretanto, causam efeitos adversos, como prejuízo na realização
de tarefas do dia a dia. Além disso, seu uso prolongado pode provocar dependência.

❖ Os benzodiazepínicos são a principal classe de fármacos ansiolíticos, geralmente quando se diz sobre
ansiolítico geralmente se remete a alguma benzodiazepina, como Rivotril ou Alprazolam.
❖ Esta é alinha de frente, eles são considerados os fármacos de primeira escolha para o tratamento de
sintomas de ansiedade. Eles são relativamente seguros e mais eficazes comparados a outros
fármacos. Entretanto, possuem alguns efeitos adversos que devem ser levados em consideração.

Quem faz uso contínuo de Rivotril, por exemplo, não pode parar de tomá-lo repentinamente, necessita
de “desmame”. O sono induzido por esse tipo de fármaco não é totalmente reparador, porque diminui
a entrada do sono REM75, fase em que mais descansamos. A coordenação motora também costuma ser
prejudicada por eles

❖ Eles funcionam a base de um estado de sedação, então quando se está em uso de uma
benzodiazepina, pode prejudicar como prejuízo um pouco no trabalho, na capacidade de dirigir etc.
❖ Além disso, seu uso prolongado muito a utilização dos benzodiazepínicos pode aumentar o risco uso
abusivo deste tipo de fármaco, as pessoas começam a ter uma certa dependência deles, tanto física
ou orgânica quanto psicológica. São pessoas que as vezes não conseguem dormir se não utilizar um

75
Sono REM: é uma fase de sono que se caracteriza por movimentos oculares rápidos, sonhos vívidos, movimentos
musculares involuntários, atividade cerebral intensa, respiração e batimentos cardíacos mais acelerados que garantem maior
oferta de oxigênio neste período. Essa fase do sono é muito importante no processamento das memórias e conhecimentos,
por exemplo. Durante o sono ocorrem vários momentos diferentes, sendo que o primeiro momento consiste no sono mais
leve e depois passa por outras fases até chegar no sono REM. No entanto, para que se consiga atingir o sono REM são
necessárias algumas medidas antes de dormir, como evitar uso de celular, ingestão de bebidas e alimentos ricos em cafeína
e álcool e é preciso manter um ambiente escuro para ativar a Melatonina, que é o hormônio produzido pelo corpo com
função de regular o sono

202
Rivotril, e casos de dependência química mesmo, são tipos de fármacos que necessitam de desmame,
não é um fármaco que se pode parar de tomar do dia pra noite.
❖ Quem faz uso contínuo de Rivotril, por exemplo, não pode parar de tomá-lo repentinamente,
necessita de “desmame”. O sono induzido por esse tipo de fármaco não é um sono 100% reparador,
porque diminui a pessoa que dorme base de Rivotril geralmente acorda cansada como se não tivesse
dormido muito, porque os fármacos benzodiazepínicos diminuem a entrada do sono REM, porque é
a fase em que a gente mais descansa, tem maior recuperação durante o sono.
❖ Em coordenação motora também as pessoas acabam acordando topando na mesa, estes são alguns
efeitos não muito benéficos ou agradáveis que se tem com o uso deste tipo de fármaco,
principalmente no seu uso excessivo, no uso abusivo e em médio-longo prazo.
❖ Tudo isso faz com que as pessoas procurem alternativas de tratamento, e elas existem. É delas que
vamos falar aqui hoje, eu vou citar alguns estudos bastante interessantes sobre o tema.
❖ Primeiramente vamos entender como os benzodiazepínicos funcionam.

Os benzodiazepínicos funcionam interagindo com o neurotransmissor GABA, cuja presença diminui a


agitação, coloca em estado de calma e viabiliza o sono. Para que o GABA funcione, sua molécula precisa
se ligar a um receptor na membrana celular. Os benzodiazepínicos facilitam a ligação do GABA com seu
receptor, induzindo ao estado de sedação, diminuindo a euforia e provocando sonolência.

❖ Os benzodiazepínicos funcionam interagindo com o neurotransmissor GABA (que é o principalmente


neurotransmissor inibitório do nosso organismo), cuja presença diminui a agitação, coloca em
estado de inibição ou calma e facilita o sono. Para que o GABA funcione, sua molécula precisa se
ligar a um receptor na membrana celular isso faz com que exista então sinais de inibição. Os
benzodiazepínicos facilitam a ligação do GABA com seu receptor é como se precisássemos de menos
GABA para ter este efeito biológico de inibição.

O problema é que, com o tempo, o organismo se adapta, causando necessidade de maiores


concentrações para alcançar o mesmo efeito

❖ O problema disto é que começar a ter um grau de tolerância, cada vez mais você precisa de maiores
concentrações de benzodiazepínicos para ter o mesmo efeito, este tipo de coisa ocorre, um evento
de como adaptação do organismo. Esta é a principal hipótese um aumento de afinidade do GABA
com os neurotransmissores, este é a forma como os benzodiazepínicos agem.

FITOTERÁPICOS COMO ALTERNATIVA

❖ Partindo disso podemos pensar será que existe algo que possa substituir esta função da
benzodiazepina? Existem. Diversos tipos de fitoterápicos vêm ganhando destaque, por possuírem

203
princípios bioativos ansiolíticos, que diminuem a ansiedade, muitas vezes agindo da mesma maneira,
facilitando a ativação deste receptor induzido pelo GABA. Vamos citar alguns destes fitoterápicos.

Diversos fitoterápicos vêm ganhando destaque por possuírem princípios bioativos ansiolíticos, muitas
vezes agindo da mesma maneira.

❖ O primeiro fitoterápico é a famosa Passiflora Incarnata, também conhecido por Maracugina, parente
do maracujá.

PASSIFLORA INCARNATA:
Também conhecido por Maracugina, fitoterápico com longa história de uso na medicina tradicional e
popular. Sua função na diminuição da ansiedade por melhor resposta do GABA é bem documentada em
modelos animais. Há estudos em humanos que estarão nas referências do curso.

❖ É um fitoterápico que tem uma com longa história de uso na medicina tradicional e popular como
ansiolítico. Existem muitos estudos, a coisa está muito bem documentada modelos em animais , a
função da Passiflora Incarnata na diminuição da ansiedade principalmente via essa melhor resposta
do GABA no nosso Sistema Nervoso central, isto está bastante documentada em modelos animais.
❖ Em seres humanos não existem grandes estudos, mas tem um estudo que eu quero comentar com
vocês, é um estudo bastante interessante que mostra o quão promissor é este tipo de fitoterápico na
substituição ou pra ajudar como coadjuvante no tratamento da ansiedade junto dos
benzodiazepínicos.
➢ Este estudo pegou pacientes que tinham TAG – transtorno de ansiedade generalizada. Então
pacientes com TAG foram alocados, um grupo recebia tratamento clássico via benzodiazepínicos,
no caso eles recebiam o Ozezapam, e um outro grupo recebia a Passiflora. Então, um grupo era
tratado com um fármaco benzodiazepínico e o outro grupo só recebia o tratamento fitoterápico.
➢ Eles avaliaram como os sintomas do TAG se comportavam ao longo do tempo. O estudo contou
com 36 pessoas e durou 4 semanas. Os resultados ao longo destas 4 semanas não mostraram
diferença entre os dois ansiolíticos. Tanto s pessoas que utilizaram benzodiazepínicos quando as
pessoas quem utilizaram Passiflora tiveram a mesma redução no grau de ansiedade.
➢ Alguns dados interessantes do estudo (este dado já sugere fortemente que a Passiflora, neste
estudo ao menos, foi tão eficaz quanto os benzodiazepínicos na eliminação dos sintomas da
ansiedade, conclusão dos próprios autores).
➢ Os indivíduos do grupo que receberam Passiflora, isto é um fitoterápico, relataram uma melhora
no desempenho do trabalho:
1. Porque a ansiedade prejudica o desempenho no trabalho;

204
2. Os benzodiazepínicos podem prejudicar o desempenho no trabalho, por seu efeito sedativo
e outros efeitos adversos com noites mal dormidas, embora os indivíduos tratados com
benzodiazepínicos relatarem um início mais rápido do alívio dos sintomas.
➢ Resumindo o estudo: 4 semanas, um grupo utilizava o fármaco e o outro utilizava Passiflora, ao
fim das 4 semanas todos tiveram a mesma diminuição no grau da ansiedade.
➢ O grupo da Passiflora até melhorou o desempenho no trabalho, mas o grupo que usou
benzodiazepínico relatou diminuição mais rápida dos sintomas.
➢ São características que o estudo trouxe, mas que mostra que a Passiflora foi uma ótima
alternativa ao tratamento. Este é o primeiro fitoterápico que quero comentar com vocês.

Suplementação:

Recomenda-se o uso de doses de 200 a 600 mg.

Doses mais altas são indicadas para casos agudos, pois o paciente sentirá bastante sono. Em uma crise
de ansiedade, pode ser uma alternativa; no dia a dia, porém, é melhor usar doses mais baixas (fracionar
600 mg em três doses de 200 mg ao longo do dia, por exemplo).

❖ Geralmente estas doses mais altas, elas até podem até ser usadas em casos mais complicados /
agudos, você pode dar uma dose de 600 m, porém ele sentirá bastante sono. O efeito sedativo será
algo bastante pronunciado. Então numa crise de ansiedade / numa crise de pânica, pode ser uma
alternativa.
❖ No dia a dia é melhor que você comece com uma dose mais baixa. Se quiser fracionar ao longo do dia,
dê 3 doses de 200 mg em três momentos.
❖ Não existe receita de bolo, terá que ter teste. Cada caso será um caso.

MELISSA OFFICINALIS:
Mais conhecida como erva cidreira (não confundir com capim cidreira). Usada na medicina tradicional
em forma de chá para diminuição de estresse e ansiedade, além de melhora na qualidade do sono. Além
da afinidade com o receptor do GABA, outra hipótese para sua eficácia é a diminuição de sua
degradação.

❖ No que diz respeito a utilização dela, deve-se levar em conta este aspecto sedativo, presente nos
benzodiazepínicos, presente pela ativação de GABA. Ela parece, vejo isso na clínica e nos estudos,
parece ter um efeito um pouco mais sedativo que a Passiflora. Você tem um efeito sedativo com a
Passiflora, não pode ser desconsiderado, mas a Melissa para ter um efeito sedativo um pouquinho
maior.

205
Na prática clínica, é preferível prescrever Melissa à noite, como indutora de sono, por sua característica
mais pontual e sedativa; e Passiflora distribuída ao longo do dia.

❖ Tem estudos que usaram a Melissa antes de testes cognitivos e ela piorou o teste cognitivo do sujeito.
Então o sujeito tomou Melissa antes de fazer a prova e foi pior na prova, justamente por este efeito
sedativo um pouco mais pronunciado, ela irá dar sono.
❖ Pode ser utilizada principalmente como indutor de sono para quem está muito dependente de
benzodiazepínico para dormir, a Melissa é uma alternativa bastante interessante.
❖ Um aspecto interessante, a Passiflora naquele estudo foi usada durante 4 semanas, para ter uma
melhora na ansiedade.
❖ A Melissa tem um efeito pontual, isto é, um efeito agudo bastante pronunciado. Então você não
precisa tomar, Melissa todos os dias de noite, durante 4 semanas para ter uma melhora do sono. Você
terá a melhora do sono, assim que tomar ela. Esse efeito sedativo, via Gaba, vai garantir que, se eu
tomar hoje, é bem provável que eu durma melhor.
❖ Diferente da Passiflora, do estudo anterior, a Melissa tem uma ingestão pontual, uma ingestão
aguda, bastante eficaz. Fiquem com esta dica, que é bastante interessante.
❖ No caso da Melissa, há uma hipótese além dessa de afinidade com o receptor do GABA, mas também
da diminuição da degradação do GABA. Parece que ela, facilita / melhora a quantidade de GABA NA
fenda sináptica.

Suplementação:

Recomendam-se doses de 300 a 600 mg, seguindo as mesmas prescrições da Passiflora, com a ressalva
de que o efeito sedativo da Melissa é maior.

Uma dose alta só faz sentido em quadros de insônia grave, crise de ansiedade ou de pânico fortes.

❖ Recomendam-se doses de 300 a 600 mg, seguindo as mesmas prescrições da Passiflora. Melissa já dá
sono e com uma dose mais alto é um ‘sossega leão’.
❖ Um quadro de insônia grave, uma crise de ansiedade, uma crise de pânico forte, tudo bem. Caso
contrário comece com uma dose um pouquinho menor e geralmente antes de dormir. Não arrisque
muito de dia que ela irá dar sono.

KAVA-KAVA:
❖ É um suplemento bastante interessante.

Planta tradicionalmente utilizada como bebida recreativa por tribos indígenas do Pacífico Sul. Não temos
conhecimento preciso de seu mecanismo; ela parece agir um pouco via GABA, mas também em outros
neurotransmissores.

206
❖ As tribos indígenas usavam como forma recreativa e até em acordos de paz, era o cachimbo da paz,
o ‘chá’ da paz daquela região.
❖ Ela tem um efeito interessante na questão da agitação, diminui a agitação, o estresse, a ansiedade.
Não se tem conhecimento exato do mecanismo, parece que age um pouco via GABA e parece que age
em outros neurotransmissores, até mesmo numa dopamina, numa serotonina.
❖ Destes três fitoterápicos (Passiflora, Melissa e Kava-kava), é o menos sedativo. A Kava-kava,
consegue-se utilizar para um tratamento de ansiedade, pela manhã, a pessoa não tem tanto sono
como com a Melissa, menos ainda que a Passiflora.

É a opção menos sedativa, por isso tem a conveniência do uso pela manhã. É um dos suplementos mais
estudados em seres humanos, sendo o mais estudado dos três aqui citados.

❖ A Kava-kava é um dos suplementos mais estudados nos seres humanos. Tem muitos estudos nos seres
humanos e destes três fitoterápicos, com certeza a Kava-kava é o mais estudado.

❖ Estudo:
➢ Selecionaram indivíduos que já estavam dependentes / viciados em benzodiazepínicos, já faziam
uso abusivo, faziam uso prolongado de alguns benzodiazepínicos e eles queriam desmamar. Só
que o desmame é o seguinte, se a ansiedade não for tratada de outra maneira, a baixa da
medicação pode ser ruim. Você pode baixar a medicação e vai aumentar o quadro da
ansiedade...
➢ Há estudos em que eles começam a introduzir a Kava-kava conforme a diminuição do
benzodiazepínico. Então numa determinada semana será diminuída “X%” de benzodiazepínico.
Vai ser colocado um ‘tantinho de Kava-Kava. Na próxima semana vai-se diminuir vai se cortar
pela metade (hipótese) o benzodiazepínico, aumentando mais um pouco a Kava-Kava.

❖ Então tem estudos mostrando um efeito benéfico, uma boa utilização do Kava-Kava durante o
desmame de benzodiazepínicos, e ele dá ‘conta’ de segurar a ansiedade, mesmo na ausência de um
fármaco que mexe de modo tão relevante em sistemas inibitórios do Sistema Nervoso.
❖ Por ele não ser tão sedativo, como a Melissa, por exemplo, a suplementação pode ter aspecto benéfico
na cognição, principalmente de ansiosos. Parece que ‘tem a ver’ com a Serotonina, Dopamina....
❖ Dos três fitoterápicos:
➢ Melissa: usa-se mais à noite;
➢ Kava-Kava: é um suplemente que vai ter um efeito benéfico na ansiedade e cognição e
➢ Passiflora: é uma outra alternativa.

Suplementação:

207
As revisões recomendam doses de Kava-kava de 210 a 240 mg. Em doses menores, o efeito é pequeno
e em doses mais altas não há maiores benefícios.

❖ A Kava-kava tem uma dose muito estreita, entre 210 a 240 mg, esta é a dose boa. Menos o efeito é
menor e mais não agrega.

TABELA RESUMO FITOTERÁPICOS * ANSIEDADE

SUPRIR A DEFICIÊNCIA DE MAGNÉSIO

❖ Falei de três fitoterápicos que tem efeitos parecidos com os benzodiazepínicos, agora irei falar de um
quarto suplemento, que é importantíssimo para a regulação daqueles dois neurotransmissores, o
Glutamato e o Gaba. O Magnésio.

O Magnésio é importante para a regulação do Glutamato e do GABA, neurotransmissores que


estimulam a inibição e a excitabilidade do Sistema Nervoso.

É difícil identificar sua deficiência, pois a dosagem padrão ouro é a quantidade intracelular (assim como
a vitamina B12).

208
❖ O Magnésio é o seguinte, comparando com a vitamina B12, é mais difícil de identificar sua deficiência.
A dosagem padrão ouro do Magnésio não é a quantidade no sangue, é a quantidade intracelular.
Você até consegue dosar o Magnésio Eritrocitário, pega-se a Hemácia (célula vermelha) , você dosa o
Magnésio dentro dela.
❖ As dosagens séricas, acaba-se não levando muito em consideração, pode-se ter um valor de referência
tipo ‘1.9 / 2’ e o Magnésio estar deficiente.

Existe também dificuldade de medir com precisão a quantidade de Magnésio ingerida, pois apesar de se
saber que está em alimentos de cor verde escura (como couve e brócolis), a quantidade presente varia.
Parece um beco sem saída, mas na verdade é fácil de resolver.

❖ Por outro lado, existe também a dificuldade de saber com precisão a quantidade de Magnésio que
está sendo ingerida na dieta. Alimentos de cor verde escuros, são alimentos ricos e Magnésio (como
couve e brócolis), são alimentos que tem bastante Magnésio.
❖ Só que a quantidade de Magnésio no alimento, vai mudar de acordo com o local que foi plantado.
Eu não sei se a couve que eu como, tem a mesma quantidade de Magnésio que a couve que você
come, de acordo com que o seu paciente come, ou que a couve que existe naquela tabela nutricional,
onde se faz cálculos nutricionais, para descobrir a quantidade de alimento para consumir há
quantidade de Magnésio o suficiente, compreendem?
❖ Existe a dificuldade de identificar a deficiência por um lado e existe a dificuldade de você identificar se
está consumindo ou não a quantidade certa de Magnésio. Parece um beco sem saída, mas na verdade
é muito fácil de sair daqui.

- Recomendações de uso

❖ O que eu preconizo para meus alunos e meus pacientes, garanta a ingestão mínima de Magnésio via
suplementação. E aqui o termo suplementação está sendo usado de modo impróprio. Não estou
aconselhando a consumir uma quantidade maior de Magnésio, que o organismo precisa. Eu só estou
querendo dizer o seguinte, garanta a ingestão mínima via suplementação.

A deficiência de Magnésio causa agitação mental, dificuldade de concentração e no sono. Para quem
tem insônia ou ansiedade, é fundamental garantir a ingestão mínima, o que deve ser feito por
suplementação. Na verdade, não se trata de suplementação, pois não é um consumo em maior
quantidade.

Como a dose varia de 260 a 350 mg, fazemos a média de 300 mg.

❖ 300 mg, é o que chamo Magnésio Elementar. O que é isto? Você é uma pessoa ansiosa, tem
dificuldade no sono, aí você pensa ‘Preciso usar Magnésio!’. Acabei nem citando a deficiência do
Magnésio causa uma agitação mental, uma dificuldade de concentração, uma dificuldade de iniciar

209
sono, de aprofundar sono. Se você tem insônia, se você tem ansiedade, é essencial que você garanta
a tua ingestão mínima de magnésio.
❖ Você vai chegar na farmácia e vai pedir: ‘Eu quero Magnésio, por favor.’; aí o farmacêutico vai
perguntar: ‘Qual? Aqui eu tenho: Magnésio Quelato, Magnésio Dimalato, tenho Cloreto de Magnésio,
eu tenho Óxido de Magnésio, eu tenho Leite de Magnésio..’ (leite de Magnésio, é outra coisa, é
laxante). Tem um monte de fórmula e a questão é, qual forma utilizar?
❖ Em algum outro momento eu poderia especificar cada um deles..... O Magnésio Dimalato, pode
favorecer a produção de energia, é uma hipótese. O Magnésio Quelato, pode induzir o sono, é uma
outra hipótese. E como ele faz isto? Por esta outra porção da molécula. O que é o Magnésio Dimalato?
É o nutriente Magnésio mais ‘moléculas de malato’ que funcionam para a produção de energia.
❖ O Magnésio Quelato é o magnésio com o aminoácido glicina, que favorece a indução do sono.

Recomenda-se o uso do Magnésio Dimalato (Magnésio e ácido málico), que segundo a hipótese favorece
a produção de energia, ou Magnésio Quelato (Magnésio e o aminoácido glicina), que segundo a hipótese
favorece a indução de sono. O importante é evitar a deficiência, não importando tanto qual o tipo.

❖ Então existem estes diversos tipos de magnésio, mas o que eu quero que vocês saibam é o seguinte:
o importante, em casos de ansiedade principalmente, em quadros de insônia, evitar a deficiência dele.
Não importa qual tipo de Magnésio estejamos suplementando.
❖ Eu recomendo muito pela facilidade de encontrar, pela qualidade da absorção o Magnésio Dimalato
e o Magnésio Quelato.

Na embalagem haverá uma tabela nutricional; as 300 mg devem ser calculadas com base nela. Não se
considera apenas o peso do comprimido, porque ele se refere à massa molecular completa. Por isso,
calcula-se quantas cápsulas somam 260 a 350 mg de Magnésio elementar, isto é, do elemento Magnésio
puro. Em caso de manipulação, deve-se especificar a quantidade (300 mg de Magnésio elementar).

❖ Quando comprar, você deve ter um potinho e atrás deste tem uma tabela nutricional. Você tem que
calcular estas 300 mg, com a informação que está na tabela nutricional. Não é o peso do comprimido.
Isto gera muita, muita confusão. O peso do comprimido leva em consideração a massa molecular da
molécula toda, leva em consideração o peso do Magnésio do Dimalato; do Magnésio e da Glicina; do
Magnésio e do L-treonato etc. Então tem que olhar na tabela nutricional, quantas cápsulas você terá
que tomar, para você conseguir alcançar uma faixa de 250 a 350 mg de Magnésio Elementar. Isto é
do ‘elemento’ do magnésio puro.
❖ Se for mandar manipular, escreva isso: 300 mg de Magnésio Elementar na fórmula de Magnésio
Dimalato, Magnésio Quelato, Magnésio L-treonato etc.

O Cloreto de Magnésio, o Citrato de Magnésio e o Óxido de Magnésio são sais. Sua absorção é pior e,
por um processo osmótico, comumente provocam diarreia no paciente com menor tolerância.

210
❖ É muito comum, o próprio Óxido e o Cloreto, principalmente causarem diarreia, se você consome um
pouquinho a mais ou tem uma tolerância menor, geralmente tem diarreia porque na forma de sal,
são menos absorvidos e aí gera um processo osmótico.
❖ O Dimalato e o Quelado são dois tipos de quelados. O Quelado geralmente é com Glicina a absorção
deles é muito boa e é muito fácil de se encontrar.

O leite de magnésia é um laxante, não tem relação alguma com o Magnésio de que estamos tratando.

❖ Tem um terceiro tipo, que está aparecendo em alguns estudos de modo bastante interessante, que é
o Magnésio L-Treonato. Eu desacreditava no início, mas acabei encontrando alguns estudos e parece
que a ‘coisa’ funciona. Parece que o Magnésio L-Treonato não só é melhor absorvido no intestino, mas
é melhor absorvido pelo Sistema Nervoso. Parece que esta junção de Magnésio mais L-treonato
favorece a entrada no Sistema Nervoso Central, que é onde ele vai atuar, na ansiedade, na depressão,
que o Magnésio agem de um modo bastante benéfico, na indução do sono etc.
❖ O Magnésio age via regulação da resposta do receptor de Glutamato e GABA, também no controle na
quantidade desses neurotransmissores, porque você precisa de magnésio, por exemplo para a
produção de Glutamato dentro da matriz mitocondrial. Ele regula de modo muito fino, regula esses
receptores e a sua aplicação é muito, muito grande na ansiedade, na insônia e também na depressão.
❖ Quero ressaltar, o Magnésio na depressão, há estudos muito interessantes, estudos inclusive antigos,
demonstrando principalmente quando há aquela depressão ansiosa, depressão associada a
ansiedade.

Outro tipo de Magnésio é o L-treonato. Estudos apontam o seu bom funcionamento, já que parece ter
maior absorção não somente no intestino, mas também no Sistema Nervoso.

❖ Nesta aula nós falamos de suplementações para Ansiedade, suplementações ansiolíticas. Passiflora
Incarnata, Melissa Officinalis e Kava-kava são fitoterápicos que agem de modo semelhante, cada um
ao seu modo, aos benzodiazepínicos. Pode ser utilizado no desmame dessas medicações, para que
está no processo de desmame como coadjuvante.
❖ Por fim, falei do Magnésio é um nutriente / mineral essencial para o equilíbrio do Glutamato e do
GABA, os principais neurotransmissores de excitação e inibição do nosso organismo, não dá para
confiar muito no exame, como eu disse, e tem aquela maneira certa de suplementar.

PAPO NUTRICIONAL ÍTALO MARSILI & RENNAN CAMINHOTTO – SEMANA 3

ÍTALO MARSILI
Vamos discutir mais sobre o manejo clínico da Kava-kava, Passiflora e da Melissa? Estamos muito
acostumados a usar os benzodiazepínicos, então quando você coloca estas três opções fitoterápicas, não

211
tem como deixar de pensar naquela tabela de equivalência dos benzodiazepínicos e nos seus manejos.
Então, Midazolam é um benzodiazepínico de meia vida, muito curta. Tem os benzodiazepínicos curtos,
o Alprazolam, Lorazepam, Bromazepam. Tem os benzodiazepínicos que são os intermediários que tem
uma meia vida maior que os demais, Clonazepam, por exemplo e o Diazepam, então é assim que a
gente pensa os benzodiazepínicos.

Ou seja, meia vida muito curta e efeito de ação rápido, Midazolam, ele serve bem para quê? Para eu
induzir o sujeito em um estado hipnótico, colocar o sujeito para dormir. Não é que seja a primeira
escolha para empurrar o sujeito para o sono, mas é mais ou menos assim que pensamos: ‘Preciso colocar
o sujeito para dormir: Midazolam...’ , nem sempre é bem isso, mas é só para estruturar nosso raciocínio.

O sujeito tem um TAG, tem uma ansiedade generalizada, ela não está muito localizada em nenhuma
hora do dia e então preciso fazer uma cobertura nele, ao longo do dia inteiro. Estou imaginando que o
benzodiazepínico seja o fármaco que vou utilizar ali para manejar o paciente com ansiedade. Então o
sujeito tem um TAG, não tem picos de ansiedade, não localizo direito se acontece de manhã, ou a tarde
ou a noite, ele está sempre naquele estado ansioso, então provavelmente eu vou lançar mão de um
benzodiazepínico de meia vida longa, como o Clonazepam por exemplo, ajusto a dose e vamos em
frente.

Então o sujeito não tem um pico, não tem um distúrbio do sono importante, não tem um pico muito
claro de ansiedade que está fazendo um pânico, mas ele vai ficando mais ansioso a noite, então dou um
Alprazolam a noite que tem uma meia vida de ação mais longa que o Midazolam e mais curta que o
Clonazepam.

É mais ou menos assim que pensamos. O clínico tem que ter a tabela de equivalência das meias vidas
em início de ação dos benzodiazepínicos na mente dele. Estou pensando como psiquiatra.

Então agora vamos imaginar que eu tenho este cenário, tenho um paciente que, por exemplo, toma
Clonazepam de dia, toma 0,25 mg de Clonazepam de dia , é um paciente com TAG, Transtorno de
Ansiedade Generalizada e uma dificuldade de sono a noite. Tem uma disfunção de sono proximal,
demora para dormir. Imagina que ele chega no consultório e eu quero ajudar a diminuir a dose do
benzodiazepínico e ele toma seu 0,25 mg de Clonazepam de manhã e aí ele abusa no meio da tarde – o
médico não prescreveu, mas ele toma um ou dois comprimidinhos no meio da tarde do Clonazepam e
já está fazendo 0,75 de Clonazepam / dia. Um sublingual pela manhã, dois no meio da tarde, está
abusando e a noite ainda toma um Stilnox, por exemplo ou Zolpidem 10 mg a noite, um hipnótico para
ele dormir. Caso clássico.

Como poderíamos conduzir, baseado na aula, em vistas de ajudar o paciente . Acho que em primeiro
lugar não vai tirar os benzodiazepínicos, vai adicionar os fitoterápicos e ver o que acontece. Eu queria
entender o manejo do Kava-kava. Eu já entendi que a Melissa, vão dar a noite, porque a Melissa coloca
212
o sujeito para o sono. Então vamos tentar substituir o Stilnox pela Melissa. O Kava-kava, como ele entra
nisso? Melhor, a tua escolha pessoal, entre o Kava-kava e a Passiflora, é isso que eu queria discutir aqui.

Rennan Caminhotto
A Kava-kava, que eu vi é o seguinte, é como nos estudos , olhando para os estudos, existe aquela questão
de cognição, uma certa melhora cognitiva, diferente da Passiflora, por exemplo. O Kava-kava tem muito
composto biotipo ali no meio, ninguém sabe quem é o principal e qual principal mecanismo de ação.
Aparentemente existe uma melhora de outros neurotransmissores, como Serotonina e também
Dopamina. Nesse caso, geralmente eu gosto de prescrever o Kava-kava pela manhã, mas já tive paciente
que prefere tomar de noite. Gosto de prescrever o Kava-kava pela manhã e ele parece ter um efeito de
certa forma mais duradouro. A Passiflora numa dose de 600, uma dose mais alta, assim como a Melissa
ela tem efeito imediato, a Kava-kava não, a Kava-Kava não é algo que você toma e tem um efeito
imediato. Geralmente utilizo o Kava-Kava pela manhã, eu não percebo este efeito tão intenso na
sedação, quando comparado com a Passiflora, por exemplo, Melissa nem se fala, só que tem que ser por
um período maior de tempo.

O Magnésio, sem dúvida tem que entrar neste meio aí, só que o efeito é um pouco mais longo.

E para ajustar (...acabei nem falando desse suplemento, é bom que houve a pergunta), de modo
pontual, ajustar os picos de ansiedade ao longo do dia, sem induzir sedação, eu gosto muito da chama
L-teanina.

L-TEANINA

Composto isolado do chá preto. Diminui a ansiedade também via Glutamato e GABA, sem induzir
sedação. Favorece a cognição e a atenção.

Confesso que uso muito pouco a Passiflora, se é para dar sono, eu vou para a Melissa, se não é para dar
sono, Kava-Kava, L-teanina. Não sei se te respondi.

ÍTALO MARSILI
Responde, eu não tenho experiência com Kava-Kava, a L-teanina eu usava bastante, a Passiflora e a
Melissa. A Kava-Kava precisamos do efeito acumulado. Essa é uma outra coisa também.

Os nossos remédios da psiquiatria, exceto os benzodiazepínicos, os inibidores seletivos, por exemplo,


eles também não fazem efeito hoje, é necessário um acúmulo de doses, que pode chegar até quatro
semanas. Então quando começa tomar um Lexapro ou Citalopram, não é que será percebido a melhora
da ansiedade ou da depressão de imediato, isso vai demorar um tempo até acumular. Não adianta torcer
o nariz para a Kava-kava ou Magnésio e dizer assim: ‘ah, mas isso aí demora para fazer efeito’. É que

213
efeito em Sistema Nervoso Central, exceto as anfetaminas e os benzodiazepínicos, em regra vai ser
assim. Você tem um tempo até que se consiga ter dose acumulado para o efeito máximo. Magnésio
idem.

RENNAN CAMINHOTTO
Sim, precisa de um tempo, que é o tempo que vai garantir que não há mais deficiência no organismo,
vamos colocar duas semanas pelo menos.

ÍTALO MARSILI
Eu tenho uma experiência boa com o L-treonato, o Magnésio Quelado com L-treonato, parece que de
fato ele tem uma ação mais limpa, por assim dizer, não digo mais rápida, mas ele ... o efeito fica mais
claro, no fundo....

RENNAN CAMINHOTTO
Eu tinha ouvido falar dessa dinâmica de absorção de chegar até o neurotransmissor , mas .... não achava
o artigo, quando eu achei, era um estudo em animal, só achei em estudo de animal, se tem em seres
humanos eu não sei. Quando eu achei o animal, a ‘coisa’ estava muito bem-feita, aí comecei a
pensar...realmente parece que essa dinâmica de chegada maior no Sistema Nervoso acontece. Eu tenho
uma experiência muito, muito boa com Dimalato, porque é muito fácil de encontrar. O Quelado, na
manipulação você acha mais fácil; o Dimalato, qualquer farmácia que você for tem o Cloreto e o
Dimalato.

Ítalo Marsili
Isto que eu ia falar o L-treonato tem que ser prescrito, você tem que mandar manipular. Na farmácia,
aqui no Brasil, aqui eu nunca encontrei L-treonato e magnésio, pode ser que tenha, mas eu não sei.
Encontramos na farmácia o Dimalato...

RENNAN CAMINHOTTO
Cloreto e Dimalato, sempre encontra; Quelado é muito fácil de manipular, os outros não veio muita
necessidade ....

ÍTALO MARSILI
...(papo sobre o ‘leite de magnésio...’ rsrs) Os fitoterápicos com o magnésio e a L-teanina, são recursos
muito úteis para controle de ansiedade, pelo menos como coadjuvante, não é?

RENNAN CAMINHOTTO

214
Tem um aspecto interessante que você citou, pode tomar junto com medicação... tem muita gente que
fica com medo ‘...Ah, mas vou misturar, estou tomando o Rivotril, .....’. Pode, comece tomando junto,
você vai se sentir mais apto para chegar para seu médico e dizer que pode reduzir a dose, é muito
comum. E se precisar reajustar a dose do fitoterápico, ou adicionar alguma terceira coisa ao longo do
desmame a gente faz. tomar junto

ÍTALO MARSILI
Em geral é assim que fazemos, com qualquer remédio é assim, não chegamos substituindo e trocando
o magnésio, isso é coisa de clínico inseguro ou está no início: ‘... Já sei qual é o esquema, o esquema não
é esse, o esquema é outro...’ . Tinha um paciente meu que tomava mais de 15 medicações, uma para
dormir, uma para acordar, um inibidor etc. e o curioso é que não foi ele que inventou este esquema,
tudo aquilo tinha sido prescrito por um médico. Eu olhei para aquilo ali, graças a Deus eu já estava mais
experiente na clínica, eu não fiz talvez o que faria quando estava recém-formado, tipo ‘ah, isto daqui
não tem sentido nenhum, deixa eu mudar isto daqui tudo’ . Um médico / clínico experiente ele olha para
aquilo e diz ‘calma, vamos mexer em uma medicação que parece que está muito fora de ‘jogo’’; e assim
vamos como num jogo de xadrez, não vai mudar o tabuleiro todo do dia para noite, você vai adicionando
um pouco, depois tira outro ...; e realmente tinham algumas drogas ali no esquema que parecia que não
fazia sentido nenhum, mas se tirasse o sujeito poderia parar de funcionar.

Então isto é algo que a experiência dá e com os fitoterápicos é a mesma coisa, você pega um esquema,
o sujeito está fazendo uso de benzodiazepínico, que parece abusivo e é francamente abusivo. Primo
lugar você não pode tirar os benzodiazepínicos do dia para a noite, pois podes ter síndrome de
abstinência. Este é o primeiro ponto. A retirada de benzodiazepínicos, em regra tem que ser progressiva
para baixo, vai tirando em pouquinho em pouquinho. E nestas retiradas suaves ,os fitoterápicos, o
magnésio e a L-teanina ajudam muito neste processo, porque o sujeito não tem o sintoma da ansiedade
ou da disfunção do sono, não é?

RENNAN CAMINHOTTO
Exato, vale muito a pena, aprender este esquema, quem funciona rápido..., então num quadro desse,
um indivíduo começa com Magnésio, Kava-kava, começa o desmame, começa a piorar o sono, se ele
usar a Melissa, agora, ele já vai ter o resultado, em doses um pouco mais altas. É bom ter todos estes
esquemas, articulados e ir ajustando o quadro, conforme o sintoma vá aparecendo.

ÍTALO MARSILI
A Melissa a gente acha em farmácia? Eu manipulava. A L-teanina não sei se tem em farmácia, eu
manipulava também, fazia em gota.

RENNAN CAMINHOTTO
215
Melissa e L-teanina, manipulado. Vale a pena comentar, até pela Kava-kava, todo o fitoterápico, temos
a ideia ‘ah, é natural, não faz mal ‘; tem que ter um pouco de calma. A Kava-kava, há houve casos de
hepatotoxicidades, se eu não me engano era um extrato padronizado ‘y’ . Mas todos os fitoterápicos,
são fitoterápicos que tem um certo risco. Entrou com fitoterápico no paciente, faz exame de enzima
hepática antes, confere se está tudo certo, função renal, padrão, TGO, TGP, Gama GT, Creatina, Ureia.
Prescreve os fitoterápicos e 3 meses depois repete, por desencargo de consciência, vale a pena fazer
esta ressalva.

Na prática clínica, não se substitui um medicamento subitamente. A retirada de algum benzodiazepínico


deve ser progressiva, e o fitoterápico pode ser ingerido simultaneamente, contribuindo com o processo.
Além disso, há a impressão de que os fitoterápicos não fazem mal algum, mas todos têm certo risco. Por
isso, antes de recomendar, vale a pena fazer um exame de enzima hepática. Se estiver tudo bem, pode-
se prescrever e repetir o exame a cada três meses

216
SEMANA 04: CICLO CIRCADIANO

Nesta aula, trataremos dos ritmos circadianos e de como a nutrição pode ajudar em sua regulação,
trazendo benefícios para a qualidade de vida.

MELATONINA E CORTISOL

❖ Nesta aula, nós vamos conversar sobre os Ritmos Circadiano, o que são estes ritmos e como a nutrição
e suplementação pode ajudar na regulação desses ritmos e quais benefícios para sua qualidade de
vida, o humor, a qualidade do sono , a disposição etc.

O ritmo circadiano designa um período de mais ou menos 24 horas. No organismo, há diversos eventos
que se repetem nesse período de tempo. O maior exemplo é o ciclo sono-vigília. Quem dá o gatilho para
a repetição desses ciclos é o núcleo Supraquiasmático76, presente no hipotálamo.

Não importa o que aconteça, esses ritmos se repetem no organismo; a questão é que os ritmos internos
devem estar sincronizados com os ritmos do ambiente externo. Dormimos à noite e ficamos acordados
durante o dia porque a luz ajuda na sincronização, por meio da produção de dois hormônios: a
Melatonina e o Cortisol.

❖ Se nós perdêssemos a capacidade de identificar a luz, por exemplo, nós iríamos continuar dormindo,
em geral a mesma quantidade de horas, só que em período deslocado deste meio externo. Isto é
péssimo para nosso organismo como um todo.
❖ Esta luz, que entra pelos nossos olhos, ajuda na sincronização deste ritmo interno com o ritmo externo.
❖ Como esta luz organiza, ajuda a organizar esta sincronização? Por meio da produção de dois
hormônios, são eles a Melatonina e o Cortisol.

Quando a luz incide sobre os olhos, inibe a produção de Melatonina, o conhecido hormônio do sono, no
Sistema Nervoso Central. Com a diminuição da luz, a Melatonina é produzida na Glândula Pineal e “avisa”
o organismo que é noite.

❖ Quando anoitece e a luz começa a acabar, começa a produção da Melatonina e é ela que sincroniza,
é o grande sincronizador do nosso ambiente interno com o externo . A presença da Melatonina é
extremamente importante para regulação de um outro hormônio chamado Cortisol.

O Cortisol é o hormônio que produzimos durante o dia, principalmente no início da manhã, ajudando no
despertar.

76
O núcleo Supraquiasmático (NSQ) é um centro primário de regulação dos ritmos circadianos mediante a estimulação da
secreção de Melatonina pela glândula pineal. Trata-se de um grupo de neurônios do hipotálamo medial (sua parte central).
217
Os dois hormônios são antagônicos: se a pessoa estiver estressada ao final do dia, por exemplo, a
produção de Melatonina ficará prejudicada pelo Cortisol.

A Melatonina e o Cortisol são


antagônicos, quando a Melatonina está
alta, o Cortisol está baixo. Quando o
Cortisol está baixo a Melatonina está
mais alta. A Melatonina é o hormônio
que produzimos durante a noite e facilita
o nosso sono. E o Cortisol é o hormônio
que a gente produz durante o dia,
principalmente no início do dia e nos
ajuda a despertar. Temos um grande pico
de Cortisol, pouquíssimo tempo antes do
nosso despertar.

Isso porque o Cortisol é um hormônio que ajuda na adaptação ao estresse e a passagem do sono para a
vigília é entendida desse modo pelo organismo. Ao dormir, o gasto energético é baixo. Quando
acordamos, precisamos de todas as funções vitais funcionando em um ritmo mais acelerado. O Cortisol
prepara o organismo para esse tipo de situação, facilitando a ação da Noradrenalina e Adrenalina.

❖ A passagem do sono para a vigília é entendido pelo nosso organismo como um evento de estresse.
Você está dormindo, com um gasto energético baixo.
❖ O Cortisol sempre prepara nosso organismo para resposta ao estresse. Para vocês entenderem,
quando citei a Noradrenalina na primeira aula, quando citei Sistema Nervoso Simpático77 , o que o
Cortisol faz é exatamente isto ele ajuda, ele facilita a Noradrenalina e Adrenalina, que é o hormônio
circulante em nosso organismo a adaptar o corpo ao estresse. Para vocês terem ideia a Adrenalina
age de modo muito rápido, quando temos descarga de Adrenalina, quando temos um susto, nosso
coração bate forte, fica com a mão mais gelada.
❖ O Cortisol é o hormônio que prepara suas células para bem responder a Noradrenalina, a Adrenalina.
Faz isto da seguinte forma: a Adrenalina age muito rápido, via um receptor de membrana e já o
Cortisol ele estimula a expressão de alguns genes. Na dinâmica a gente estuda que ele é um receptor
nuclear, o Cortisol ativa um receptor nuclear que ativa a expressão de alguns genes e faz com que
suas células tenha receptores para bem responder a Noradrenalina.
❖ O Cortisol é um hormônio que prepara o nosso organismo para responder ao estresse.

77
Sistema Nervoso Simpático: é um dos componentes do sistema nervoso autónomo, o qual é responsável pelo controlo
involuntário de vários órgãos internos. O sistema nervoso simpático atua de modo oposto ao parassimpático, preparando o
organismo para reagir em situações de medo, stress e excitação, adequando o funcionamento de diversos sistemas
internos para um elevado estado de prontidão.
218
❖ Quanto a Melatonina é um hormônio que induz ao sono, ela faz diversas outras coisas, mas para nós
basta sabermos que induz o sono.
❖ O Cortisol deve se elevar mais no início da manhã para ajudar a te acordar, se você estiver ao final do
dia muito estressado, ele vai prejudicar a tua produção de Melatonina e vice-versa. A Melatonina tem
que estar mais baixa no período que você vai despertar.
❖ Entendendo que estes ritmos biológicos são essenciais para nossa disposição, para nosso humor, é
evidente uma pessoa que não dorme, ela tem uma piora considerável da sua disposição. O excesso de
Cortisol é algo que influencia a nossa resposta ao estresse. Se o Cortisol é um hormônio que prepara
nosso organismo para o estresse, quanto mais Cortisol temos no organismo maior será nossa resposta
ao estresse numa situação desta.

REGULAÇÃO HORMONAL DA MELATONINA

❖ Diante disto, como podemos ajudar a regular a atuação destes hormônios, para que nosso Ritmo
Circadiano interno fique bem sincronizado com o ritmo externo.
❖ Primeiro ponto vamos falar sobre a Melatonina.

Deve-se ter uma higiene do sono adequada. Simplesmente apagar a luz quando se quer
dormir não resolve, pois o organismo demora para produzir a concentrações ideais de
Melatonina que induzem ao sono. Para ficarmos mais calmos, devemos evitar a exposição às
luzes, mesmo das telas.

❖ Não adianta apagar a luz na hora que quer dormir. Não adianta,’... é meia noite, agora quero dormir
vou apagar todas as luzes...’. A coisa não funciona tão rápido assim. Seu organismo demora um pouco
de tempo para entender que as luzes já se apagaram, já baixaram para que a produção de Melatonina
chegue a concentrações ideais para induzir o sono etc.
❖ A higiene do sono, é que temos que ficar mais calmos antes de dormir, temos que evitar a exposição
as luzes, mesmo a telas. Depois pesquisem sobre a higiene do sono e tudo isto é bom e funciona.

Partindo do pressuposto que a higiene do sono já é adequada, pode-se melhorar a


quantidade de Melatonina circulante por meio suplementação. Como se trata de um
hormônio, é necessária a prescrição médica, pois, do contrário, pode-se provocar efeitos
adversos.

❖ Doses mais baixa, as vezes você consegue sem prescrição médica. Mas, já que é um hormônio você
deve repor da maneira correta. Se você repor de maneira incorreta, poderá ter efeitos adversos. Isto
pode acabar atrapalhando o seu ciclo Circadiano e não o ajudando.

Os dois efeitos adversos mais comuns são um excesso de Melatonina que acaba gerando cansaço e
letargia nas primeiras horas do dia; e, paradoxalmente, insônia.
219
❖ A grande quantidade de Melatonina, acaba transbordando para as fases do teu ritmo Circadiano onde
ela não deveria existir. De maneira mais prática, é que você toma tanta Melatonina para dormir que
no outro dia, lá pelas 9 horas da manhã, onde você já está duas horas acordado, ainda tem Melatonina
circulante, e o resultado disso é uma letargia, vai ter dificuldade de levantar da cama, terá um
cansaço. É o excesso de Melatonina que extrapolou para outra fase do ciclo Circadiano.

DOSES DE MELATONINA:
Doses altas de Melatonina induzem a um processo de sedação semelhante ao dos benzodiazepínicos.
A pessoa dorme rapidamente, mas tem um sono conturbado. Acorda entre 3h e 5h com o ritmo
Circadiano desregulado, e não consegue mais dormir, num quadro de insônia intermediária.
❖ E por que isto acontece? Porque este alto efeito sedativo da Melatonina, nos induz a um processo de
sedação, você dorme e depois quando a sedação acaba, você acorda, acaba despertando, só que com
todo seu ritmo Circadiano já desregulado por este excesso de Melatonina.
❖ Estas são as duas queixas mais comuns que tenho no consultório. A pessoa que usa Melatonina para
dormir e acaba não dando certo por conta disso. O problema aí é que as doses são altas.
❖ E qual são as doses altas?

No mercado, vemos doses de 3, 5 e 10 miligramas de Melatonina.

❖ Na minha opinião, todas estas doses são doses altas, eu não recomendo.
Essas doses já são consideradas altas e, salvo se o médico estiver tratando um distúrbio de sono de
modo farmacológico, não são recomendadas.

É necessário trabalhar com doses mais próximas do fisiológico, que seriam de 0.3 a 0.7 miligramas. Para
a maioria das pessoas, essa dose é suficiente e evita os efeitos adversos.

❖ Precisamos trabalhar com doses mais aproximadas do fisiológico. Fora do pais hoje em dia, você até
encontra estas doses e vendem com a descrição ‘Reposição Fisiológica’. A gente sai de uma dose
muito farmacológica da Melatonina e vamos para uma reposição fisiológica. Igual ao Magnésio, só
garantimos a produção mínima via suplementação.
❖ Eu sugiro doses de 0.3 a 0.7 mg, estas doses para maioria das pessoas já é o suficiente para cobrir a
função fisiológica. Com doses assim, muito difícil
você ter estes efeitos adversos que citei, que é a
insônia intermediária e o cansaço matinal.
❖ Vou mostrar um gráfico que vocês que vocês vão ver
a dose de 0.5 mg, já é mais do que o suficiente para
cobrir a produção fisiológica. Geralmente
220
dependendo do peso da pessoa eu trabalho com essa dose de 0.3 a 0.7. Vou mostrar o artigo onde eu
vi este gráfico, e lá tem uma discussão maior, o porquê dessas doses serem melhores, leiam este artigo
quem tiver interesse neste tema, com calma.
❖ Há diversos tipos de insônias tratadas com Melatonina e eles devem ser tratadas de modo diferente:
➢ Insônia inicial: pessoa que tem dificuldade de começar o sono e depois ela dorme bem;
➢ Insônia intermediária: pessoa que dorme bem mas tem a dificuldade porque ela acorda no meio
da noite e fica muito tempo acordada;
➢ Despertar precoce: onde a pessoa acorda muito cedo 4h / 5h da manhã e não consegue voltar a
dormir.
❖ Nós podemos usar a Melatonina diferente nestas circunstâncias, prestem
atenção nisto.

As insônias tratadas com Melatonina devem ser abordadas de modos


diferentes. A produção do hormônio começa quando as luzes se apagam, tem
um pico no meio da noite e diminui ao amanhecer. (O gráfico 1 é a
reprodução fisiológica natural de um organismo).

❖ Acontece que a grande maioria dos suplementos de Melatonina tem a


seguinte distribuição de liberação no sangue, conforme o gráfico 2. Ela tem um
grande pico que depois cai, o pico não se dá no meio da noite.

A maioria dos suplementos, porém, provocam um pico instantâneo, não no meio


da noite, que funciona para pacientes com insônia inicial (dificuldade de iniciar o
sono).

❖ Este pico de Melatonina é algo muito bom para iniciar o sono. Se teu paciente tem dificuldade de
iniciar o sono, é ansioso e tal, demora muito para dormir, esta Melatonina (gráfico 2) é uma boa.

Para a insônia intermediária ou despertar precoce precisamos atentar ao ritmo de liberação, que deve
ser lento.

❖ Para a Insônia intermediária ou Despertar precoce, esta suplementação de Melatonina (gráfico 2)


pode prejudicar o quadro dele. Nestes casos, você tem que usar uma Melatonina que se comporte
mais como uma produção fisiológica (gráfico 1). Neste caso, não só a dose que tem que ter ajuste,
mas o ritmo de liberação dela. Para isso você consegue usando a ‘Slow Release’, em outras palavras,
liberação lenta. Tem Melatoninas sublinguais de liberação lenta. Essas Melatoninas mimetizam esta
produção de Melatonina (gráfico 1), que é a produção endógena, é muito boa e muito útil.
❖ Se a questão é o início do sono, a outra Melatonina, a convencional / normal, já será o suficiente.

221
❖ E o terceiro e último aspecto interessante é o carboidrato no jantar.

Outro ponto, bastante inusitado, é o consumo de carboidratos no jantar. Apesar de ouvirmos


que isso engorda e diminui o sono, pode ser uma ferramenta para regular a produção
endógena de Melatonina.

❖ Mas como isso ocorre? Como um prato de arroz, macarrão, pão etc. vai me ajudar a dormir melhor?
Quando comemos carboidratos temos um aumento de um hormônio chamado de Insulina. A Insulina
quando entra no sangue o que ela faz?

Os carboidratos aumentam a concentração de Insulina, que diminui a quantidade de BCAAs


(aminoácidos) e facilita a entrada de triptofano no Sistema Nervoso Central, onde é convertido em
serotonina. E a Melatonina é produzida no escuro a partir da serotonina.

Os estudos utilizam carboidratos de maior índice glicêmico, como arroz branco ou batata inglesa. Esse
recurso deve ser usado em situação oportuna cujo objetivo é ajustar o sono; não pode ser usado em
diabéticos, por exemplo.

❖ Há estudos demonstrando (estarão nas referências das aulas) que carboidratos no jantar,
principalmente os de alto índices glicêmicos, aqui quanto o ‘pior carboidrato’ melhor para dormir (rs).
Esses carboidratos de alto índice glicêmico facilitam então o processo de início de sono, eles diminuem
o que chamamos de ‘latência do sono’, você dorme mais rápido. A grande hipótese é essa: a facilitação
da produção endógena, da sua produção de Melatonina.
❖ Como conclusão do uso da Melatonina, quando produzida em quantidade e no tempo adequado, a
Melatonina promove uma melhor qualidade de sono, promove um menor cansaço ao despertar e ela
também regula o pico, a secreção matinal de Cortisol, que vai ajudar-nos, realmente, a levantar da
cama. Caso contrário o pico de Cortisol pode ser prejudicado iniciando um ciclo vicioso de estresses,
cansaços e distúrbios de sono..

REGULAÇÃO HORMONAL DO CORTISOL

❖ Vocês irão entender com o Cortisol alto, pode


prejudicar muito os seus pacientes que têm transtorno
de humor, principalmente os pacientes ansiosos.
❖ O Cortisol é produzido da seguinte forma:

Temos um grande pulso matinal de Cortisol, que


precede o despertar, e depois tende a cair, com
pequenos picos durante o dia.
222
Esses picos estão relacionados à alimentação, mas principalmente ao estresse.

Uma pessoa que passa o tempo todo estressada tem tantos picos que já não os distingue e perde a
capacidade de pico matinal, sofrendo uma piora na qualidade do sono e predisposição para situações de
estresse.

❖ Esse indivíduo perde a capacidade do pico matina, tem uma piora no sono, terá uma piora na
produção da Melatonina, e sempre predisposto a uma situação de estresse.
❖ Separei aqui, e vocês vão ver nos arquivos citados, alguns transtornos que foi demonstrado excesso
de Cortisol, excesso de produção de Cortisol durante o dia.

Pessoas com Transtorno de Ansiedade Generalizada (TAG) e fobias têm uma produção de Cortisol mais
alta que a média, o que gera um ciclo vicioso, pois quanto mais Cortisol, maior a resposta ao estresse e
vice-versa, o que piora os sintomas de ansiedade, prejudicando o sono.

❖ As pessoas que têm TAG, quando passam pelo estresse, geralmente tem um pico muito aumentado
de estresse e têm uma produção, basal / constante de Cortisol mais alta.
❖ Pessoas com Fobias, fobia Social, fobias de Trânsito etc., Tem estudos quando uma pessoa tem esta
fobia de Trânsito, no momento que entra em um carro, ela produz muitíssimo mais Cortisol que uma
pessoa que não tem este tipo de estresse. Estas pessoas que têm estes transtornos, particularmente
os transtornos mais associados de ansiedade, pois produzem bastante Cortisol e entram neste ciclo
vicioso: quanto mais Cortisol produzem maior será a resposta ao estresse que elas tem. E quanto
maior a resposta ao estresse maior Cortisol. Conclusão: piora os sintomas de ansiedade.
❖ Isto tudo vai favorecer uma dessincronização do ritmo de Cortisol, dificultando o pulso matinal e
aumentando o Cortisol principalmente ao final do dia, prejudicando a noite.

Isso também tem um impacto metabólico, pois a exposição crônica aumentada ao Cortisol aumenta o
desejo por comfort foods, ricas em calorias, açúcar e gorduras.

❖ Isto tem um impacto metabólico, por exemplo, pessoas que tem diabetes, quando passam por
estresses, acabam precisando de mais Insulina, a Glicemia desregula mais.
❖ O apetite também muda, a exposição crônica aumentada no Cortisol, aumenta muito nosso desejo
por comidas ricas em doçuras e gorduras.
❖ Tem um estudo que falava que se você não dormiu bem a noite, não passe em frente a uma padaria,
porque você vai comer besteira. Foi um estudo com ratinhos, eles faziam com que os ratinhos não
dormissem direito, eles ficavam com Cortisol mais aumentado, produziam menos Melatonina e
quando era colocada a comida, eles comiam muito mais, preferiam muito mais os alimentos mais
associados a excesso de calorias.

223
Para regular o Cortisol no organismo, temos a abordagem com fitoterápicos adaptógenos78, que têm
capacidade de aumentar a adaptação ao estresse, promover a diminuição do Cortisol e ajudar na
regulação do ritmo circadiano de produção do hormônio.

❖ Vou citar três fitoterápicos que tem a capacidade de aumentar nossa adaptação ao estresse:

ASHWAGANDHA:
❖ É um fitoterápico da medicina indiana e parece que este nome quer dizer ‘Cheiro de Cavalo’.
Acreditava-se que todo mundo que consumisse daquela erva, iria adquirir a estabilidade / virilidade
do cavalo.
❖ Existem estudos que já testaram este fitoterápico em condições de transtorno de humor, transtorno
de ansiedade.

Planta medicinal indiana que atua pela diminuição do Cortisol. Seu uso contínuo consegue uma redução
de cerca de 28 por cento do hormônio em pessoas que têm estresse.

❖ O principal efeito da Ashwagandha é via diminuição do Cortisol e nenhum fitoterápico se compara a


ela.
❖ Estudos:
➢ Pacientes estressados receberam 300 mg de Ashwagandha por dia e demonstrou uma
redução de 68% da disfunção social, melhorando a interação destes pacientes.
➢ Em outro estudo teve efeitos benéficos no TAG.
➢ Também já foi testada como terapia adjuvante no tratamento do TOC (Transtorno Obsessivo
Compulsivo). As pessoas tomavam medicação mas associavam a Ashwagandha e tiveram
melhores respostas ao tratamento.
❖ Percebam diversos transtornos de ansiedade, onde o estresse está muito presente a Ashwagandha é
um fitoterápico bastante eficaz. Eu mesmo uso bastante Ashwagandha, prescrevo para meus
pacientes e é algo muito eficaz.

DOSES ASHWAGANDHA:
Recomendam doses de 120 a 600 mg. Era considerada muito segura, mas em 2020 houve relatos de
hepatotoxicidade, principalmente associada a outros fitoterápicos. Por isso, é importante o
acompanhamento médico.

❖ As revisões mostram que é assim, uma faixa grande mesmo. Eu, particularmente trabalho com uma
dose de 500 mg. Mas as revisões mostram que funciona doses mais baixas como um pouquinho
mais alta também.

78
Adaptógeno: uma planta adaptogênica, ou adaptógena, são ervas que possuem substâncias capazes de aumentar a
resistência do organismo frente a fatores estressantes, seja ele físico, emocional ou ambiental. Melhorando o nosso
desempenho sem provocar desgaste.
224
❖ Para todos os fitoterápicos que vocês vão ver nesta disciplina, façam um checkup no seu paciente
antes, depois de 3 ou 4 meses depois façam de novo, por prudência.

ÓLEO DE LAVANDA:
❖ A Lavanda estou falando de óleo essencial. O cheiro que exala do difusor com óleo de Lavanda ajuda
muito. Existem estudos que já mostraram que o Óleo Essencial de Lavanda, no difusor, não estou
falando de consumo, é via olfativa mesmo, diminui o Cortisol e ajuda a produção a noite de
Melatonina.

Muitas pessoas desconfiam da eficácia, mas estudos demonstram que o óleo de lavanda no difusor
diminui o Cortisol e aumenta a produção noturna de Melatonina até mesmo em bebês.

❖ Para bebês pode ser colocada na água do banho, aí a mãe e o bebê dormem melhor, tem uma menor
produção de Cortisol, ficam menos estressados, melhora na qualidade do sono. Funciona e é
realmente via olfativa.

Por ser um óleo essencial, é necessário buscar mais informações sobre o uso. Não basta colocar uma
quantidade de gotas no difusor. Deve-se tomar cuidado com o uso excessivo, sobretudo em crianças.

❖ Não é necessário ingerir, pelo contrário, a ingestão de óleos essenciais, até perde o efeito, pois há
metabolização hepática, até chegar no SNC o caminho é muito longo. Via olfativa o aroma chega mais
rápido no SNC. Há artigos muito interessante sobre o tema.

DOSES LAVANDA:
❖ A Lavanda, como é óleo essencial, busca-se informações mais detalhadas em outros lugares, pois a
dinâmica do óleo essencial é uma coisa mais intricada, não é só colocar no difusor cinco gotinhas e
pronto.
❖ E tomem cuidado com o excesso também, principalmente com bebê, crianças etc.

RHODIOLA RÓSEA:
❖ A Rhodiola Rósea é uma prima da Ashwagandha, só que tem uma função distinta que irei explicar.
❖ A Ashwagandha é um adaptógeno, assim como a Rhodiola e ela funciona mais para aquele indivíduo
que está mais agitado, aquele indivíduo que está bastante estressado, o ansioso, o ‘estressado
clássico’, aquele indivíduo que está com insônia.
❖ A Rhodiola não, ela é um adaptógeno, tem efeitos benéficos na ansiedade, mas ela tem um efeito
muito particular no aumento do ânimo, no aumento da disposição, na melhora do humor.
❖ Ela é melhor aproveitada onde a ansiedade já colocou o indivíduo um pouco mais para baixo, a
aquelas ansiedades mais associadas a sintomas de depressão, por exemplo. É aquela ansiedade onde
o indivíduo já está desanimado, está dormindo um pouco demais, não tem ânimo para fazer suas
atividades.

225
❖ Ela, Ashwagandha (ou o Rennan quis dizer a Rhodiola, ou as duas ???) pode melhorar a insônia, pode
piorar até a insônia porque ela é bastante serotoninérgica, estimula muito a Serotonina e acaba até
reduzindo o Cortisol por conta disto. Só que este aumento agudo de Serotonina, quando a dose é um
pouco mais alta, pode causar um pouco de agitação, um pouco de insônia por uma dinâmica de
receptores. O efeito na ansiedade aparece um pouco mais no uso contínuo, mas este efeito de ânimo
já é visto com doses pontuais, doses agudas.

Mais indicada ao indivíduo muito estressado, agitado, ansioso ou com insônia. Além dos efeitos benéficos
na ansiedade, tem um efeito muito particular no aumento da disposição e na melhora do humor, por isso
é aproveitada em casos de ansiedade associadas a sintomas de depressão.

Como estimula a produção de serotonina, pode acabar aumentando a agitação.

DOSES RHODIOLA RÓSEA :


Doses crônicas de 200 ou 300 mg, e doses agudas de 600 mg, quando se procura um efeito imediato.

❖ Cuidado com estas doses mais altas, pois pode provocar insônia.

PAPO NUTRICIONAL ÍTALO MARSILI & RENNAN CAMINHOTTO – SEMANA 4

ÍTALO MARSILI
Vamos começar falando sobre, só para amarrarmos tudo – acho que será importante dar uma
concretizada nisto tudo, começando pela Melatonina, e a Melatonina é uma dessas drogas, por assim
dizer, apesar de ser uma substância que produz endogenamente, e manipulado... de modo externo e
pode ser administrado de modo exógeno, então é uma dessas drogas misteriosas por um lado, porque
servem para tudo, por assim dizer, vemos artigos com a ação da Melatonina desde terapia coadjuvante
para quimioterapia...
Recentemente foi publicado por aquele grupo ‘Front Line Covid 19 Critical Care Allience’ , um protocolo
que é o ‘I Mask’ prescrevendo Melatonina para profilaxia do Covid 19, numa dose de seis (6) miligramas,
dose alta. Então a dose da Melatonina vai depender do que você está querendo, depende da intenção
do terapeuta. Nas doses coadjuvantes nos tratamentos quimioterápicos a prescrição são altíssimas,
chegam a vinte (20) miligramas.

No nosso caso aqui, tentamos usar doses menores, mais fisiológicas, pois sabe-se que isto depende de
pessoa a pessoa. Então tem pacientes que vão tomar um (1) miligrama de Melatonina e talvez seja o
ideal para ele, 0,5 miligramas as vezes acordam sonolentos no dia seguinte, então tem um ajuste fino
que precisaremos dosar com mão. Tem que ir regulando caso a caso.

226
Como eu prescrevia Melatonina, em geral fazia como você está sugerindo, fazia prescrição de
Melatonina em dose baixa, porque é muito mais fácil a pessoa tomar dois comprimidos do que quebrar
uma cápsula que vem manipulado da farmácia, isto é óbvio. Então você prescreve 0,5 miligramas e se
não funcionou, se não fez tanto efeito você toma dois comprimidos a noite. Se eu passo prescrição em
cápsula de dois (2) miligramas, e aquilo é demais, como ele fraciona nessa dose, não dá, então são
‘truques’ da prática clínica.

No teu caso, dos seus pacientes, você vê que eles melhoram o sono com 0,5 miligramas?

RENNAN CAMINHOTTO
Sim, já é uma dose suficiente. Eu acabei estudando isto até por conta própria, eu precisava, para mim e
quando importei, foi de 3 miligramas, tomei e tive aquele quadro de insônia. Quando fui estudar, parti
a dose até chegar à dose de 0,5 miligramas, encontrei artigos demonstrando que já era uma dose que
cobria muito bem a faixa fisiológica. É uma dose que tomando depois do jantar, por exemplo, que já é
uma coisa que já dificulta um pouco a absorção, mesmo a Melatonina normal só que depois do jantar,
ela tem uma absorção um pouquinho mais lenta, pouquinho mais gradual. Em geral nos meus pacientes
vejo que é uma coisa bastante útil, não preciso de doses muito mais altas não.

ÍTALO MARSILI
Ainda na Melatonina, acho que vale a pena falarmos do assunto ‘carboidrato’, sabemos que tem piada
até sobre isso, o problema é o carboidrato depois das 18h, você não pode comer carboidrato....
Carboidrato não é vilão, é algo importantíssimo de deixar consignado aqui no curso; agora depende da
qualidade da comida que o sujeito está comendo. Uma coisa é o sujeito comer arroz, batatas, isto é
carboidrato, outra coisa é comer pizza, aí vai colocar culpa no carboidrato, que não são carboidratos
refinados é uma farinha de má qualidade, são coisas distintas.

RENNAN CAMINHOTTO
Até porque a pizza está rica em gordura, rica em proteína, tem muitas outras coisas que vai prejudicar a
absorção do carboidrato. Esses estudos, realmente utilizam um carboidrato de maior índice glicêmico,
aqui estou falando de arroz, arroz branco por exemplo, uma batata inglesa... o pico de insulina tende a
favorecer muito meus pacientes, meus alunos ... mas é aquela coisa... temos que usar ele numa situação
em que o objetivo é, naquele momento, ajustar o sono. Um paciente, diabético com este pico de
carboidrato não vai ser algo muito bom.. Então temos que pensar bem, quando e como utilizar da forma
mais correta.

Ítalo Marsili
Vamos falar sobre os adaptógenos, sobre a Ashwagandha, você apontou uma coisa interessante, que
uma dose mais alta, dose mais aguda, de algum desses adaptógenos / fitoterápicos elas podem alterar
o sujeito, elas podem deixá-los com um ‘drive’ maior. Como você observa isto na prática.

227
RENNAN CAMINHOTTO A Rhodiola (Ítalo se retratou, o comentário é da Rhodiola) funciona de modo
agudo. Você tem estudo de Rhodiola com paciente com ‘burnout79’, por exemplo, quadros mais de
depressão, principalmente associados aos de ansiedade e tem resposta muito boa.

Na clínica, vejo que tem resposta muita boa dos pacientes , tem que tomar cuidado com a questão de
insônia, principalmente nestas doses mais altas. Mas no geral é muito fácil você perceber, você olha para
o paciente e observa se ele está mais agitado ou se está mais desanimado, você tem que ter este ‘feeling’
para decidir para qual caminho você vai.

ÍTALO MARSILI
Em quais caso você indica ou prescreve a Rhodiola?

RENNAN CAMINHOTTO
Depressão eu prescrevo, cansaços, fadigas, quando a pessoa está precisando trabalhar, tem uma rotina
intensa de trabalho, a pessoa não está deprimida, mas tem uma rotina intensa no trabalho, uma fadiga
muito grande. A menopausa é uma condição que responde bem a Rhodiola. Faço uma vez ao dia, pela
manhã.

ÍTALO MARSILI
E a Ashwagandha, quais são os casos que você indica.

RENNAN CAMINHOTTO
Estresse, ansiedade, TAG, quando a pessoa está muito agitada, com dificuldade de dormir. A
Ashwagandha eu ainda não cheguei a conclusão de qual melhor horário. Eu gosto muito de usá-la pela
manhã, mas tem estudos utilizando-a de noite, que tem até um efeito benéfico na insônia. O efeito dela
não é tão agudo quanto da Rhodiola. A Rhodiola numa dose mais alta já dá este ‘drive’, hoje eu tomei
porque estava mais cansado. A Ashwagandha precisa de uma / duas semanas para ter o efeito, mas ela

79
Síndrome de Burnout: ou Síndrome do Esgotamento Profissional é um distúrbio emocional com sintomas de exaustão
extrema, estresse e esgotamento físico resultante de situações de trabalho desgastante, que demandam muita
competitividade ou responsabilidade. A principal causa da doença é justamente o excesso de trabalho. Esta síndrome é
comum em profissionais que atuam diariamente sob pressão e com responsabilidades constantes, como médicos,
enfermeiros, professores, policiais, jornalistas, dentre outros. Traduzindo do inglês, "burn" quer dizer queima e "out"
exterior. A Síndrome de Burnout também pode acontecer quando o profissional planeja ou é pautado para objetivos de
trabalho muito difíceis, situações em que a pessoa possa achar, por algum motivo, não ter capacidades suficientes para os
cumprir. Essa síndrome pode resultar em estado de depressão profunda e por isso é essencial procurar apoio profissional no
surgimento dos primeiros sintomas.

228
tem um efeito bastante bacana, geralmente TAG, pânicos, estresses, dificuldade de dormir, agitação de
modo geral.

ÍTALO MARSILI
Podemos revelar um pouquinho a utilização da Lavanda, que deixou a gente com curiosidade.

RENNAN CAMINHOTTO
Eu achava que era mais fácil, achava que era colocar 5 gotinhas no difusor e estaria tudo certo. Andei
vendo algumas pessoas mais especializadas falando do assunto e vi que o processo é algo mais
complicado, requer até alguns cuidados, se tiver criança, bebê. Eu confesso que preciso me aprofundar
nesta parte também. Mas o que eu posso dizer é, não façam ingestão do óleo essencial: 1)porque não
precisa; 2)porque no Brasil principalmente é algo mais complicado e perigoso, mesmo. Existem alguns
protocolos que eu ainda não me especializei.

Eu quis citar a Lavanda aqui pois parece que uma é bobagem, colocar uma coisa de fazer cheirinho....
mas o processo funciona. Estas terapias alternativas, elas vem cada vez mais confirmadas, em estudos
científicos, sérios, estudos muito bons com dosagens de Cortisol, Melatonina e o quadro realmente
melhorou. Eu acho que vale a pena apenas o recado dizendo, estas coisas funcionam, essas coisas são
sérias e vale a pena se especializar.

229
TABELA MEDICAMENTOS REGULAÇÃO : MELATONINA & CORTISOL

230
SEMANA 05: TENSÃO PRÉ-MENSTRUAL

Esta aula aborda o humor na mulher, particularmente, a síndrome pré-menstrual, também conhecida como
Tensão Pré-Menstrual ou TPM

ORIGEM E SINTOMAS

A Síndrome Pré-Menstrual tem origem multifatorial pouco elucidada. As teorias indicam que sua
principal causa consiste em uma alteração na produção de neurotransmissores, ocasionada por
desequilíbrios hormonais.

❖ Esses sintomas atrapalham muito as mulheres próxima a menstruação. Vamos caracterizar um pouco
estes sintomas?
Os sintomas são de ordem afetiva, física e comportamental; repetem-se a cada mês, na segunda fase do
ciclo menstrual, desaparecendo poucos dias após a menstruação.

Sintomas leves não são considerados parte da síndrome; algumas mulheres possuem um transtorno pré-
menstrual mais grave; e 3% a 8% possuem Transtorno Disfórico Pré-Menstrual (TDPM), que requer
tratamento adequado.
❖ Sintomas leves, no período pré-menstrual, que não interferem na rotina diária, não são considerados parte da
síndrome, o quadro tem que, realmente, afetar a rotina da mulher.

Tanto para TPM quanto para TDPM, há poucas opções de tratamentos farmacológicos: contraceptivos
orais, que somente adiam os sintomas, e antidepressivos. Eles atuam nos sintomas, mas não nas causas.

❖ As opções de tratamento que temos são: contraceptivos orais, e veja é uma suspensão do ciclo
menstrual, um adiamento do problema, o problema não é resolvido na sua base; e nós temos o uso
de antidepressivos, particularmente os Inibidores de Recaptação de Serotonina.
Ambos são eficazes até certo ponto, mas apresentam efeitos adversos. O anticoncepcional, por exemplo,
aumenta o risco de depressão. Por isso, alternativas de tratamento são muito bem-vindas.

❖ Os anticoncepcionais apresentam diversos efeitos, riscos para as mulheres, dentre eles mesmo, um
aumento do risco de depressão.
❖ Existem alguns estudos, embora de associações, alguns estudos interessantes, demonstrando uma
relação forte do início do uso do anticoncepcional com o início do uso de medicação antidepressiva,
fora os outros diversos efeitos que existem e os antidepressivos que são necessários principalmente
no TDPM, acaba muitas vezes não dando conta de resolver todo o problema. Então alternativas de
tratamento são muito bem-vindas e estão aparecendo na área acadêmica a cada momento.

231
OPÇÕES DE TRATAMENTO

❖ Separei algumas alternativas interessantes, alguns artigos mais recentes, outros artigos já antigos
mas de conhecimento bastante negligenciado.
❖ Esta aula, então será separada em duas partes:
➢ Vou falar sobre Suplementação e
➢ Falar de algumas alterações na dieta, que são importante.

❖ Vamos começar pela Suplementação, e o primeiro grupo que quero abordar aqui são as vitaminas do
complexo B .
VITAMINAS DO COMPLEXO B
❖ Diversas vitaminas deste complexo podem ajudar no controle dos sintomas da síndrome pré-
menstrual ou mesmo ajudar na base, na causa deste transtorno que são as alterações hormonais.
As vitaminas do complexo B são o primeiro grupo de suplementos, pois podem ajudar no controle dos
sintomas e também na causa desse transtorno.
Na primeira fase do ciclo menstrual, o Estrogênio deve predominar no organismo;
Na segunda fase, após a ovulação, deve predominar a Progesterona.

❖ Só para explicar para vocês de quais alterações hormonais estou falando: a mulher tem seu ciclo, que
se dá de modo muito reduzido da seguinte forma:

➢ Na primeira fase do ciclo menstrual


o Estrogênio predomina, o
Estrogênio é produzido em maior
quantidade e a ação dele deve
predominar no organismo;
➢ Na segunda fase do ciclo, após a
ovulação a Progesterona deve
dominar, o efeito dela deve dominar.

Porém, em certas condições, a produção de Estrogênio não diminui. Pelo contrário, aumenta,
ocasionando um desequilíbrio entre o Estrogênio e a Progesterona, que tem impacto negativo na
produção de neurotransmissores.

232
VITAMINA B6
A Vitamina B6 participa da produção de diversos neurotransmissores, como a
Serotonina. O excesso de Estrogênico pode interagir com essa vitamina,
impedindo-a de ser um cofator enzimático na síntese de Serotonina.

❖ A vitamina B6 como vimos na primeira aula, ela participa da síntese /


produção de diversos neurotransmissores, especialmente a Serotonina.
Precisamos da vitamina B6 em dose adequada e funcionando para ter uma boa
produção de Serotonina. Aquele neurotransmissor associado a felicidade, com o sentido da vida, com
uma sensação de preenchimento.
❖ O excesso de Estrogênio, particularmente nesta segunda fase do ciclo menstrual, acaba interagindo
com a vitamina B6 e impedindo a vitamina de ser um fator enzimático na síntese de Serotonina.

Portanto, mesmo com um nível adequado de B6, pode haver uma deficiência relativa, em que a vitamina
não funciona adequadamente.

❖ Para quem quer mais detalhes, o processo parece ser alostérica80 , essa presença física do hormônio
do Estrogênio parece dificultar a B6 de participar ali daquela reação química.
❖ Então aqui fica-se numa situação complicada porque a mulher tem um desequilíbrio hormonal, a
vitamina B6 pode estar presente em uma boa quantidade, ela pode não ter deficiência de B6, mas ela
tem o que podemos dizer de uma deficiência relativa: tem pouca B6 funcionando por causa de um
desequilíbrio e isto pode causar alterações, como por exemplo, na síntese da Serotonina.
❖ Como combater se há somente uma deficiência relativa?

Para combater essa deficiência relativa, saturamos a concentração de B6.

❖ Combatemos saturando de B6, começa-se a competir com o Estrogênio, adiciona bastante B6 no


organismo para fazer uma competição e a B6 acabe saindo vitoriosa.
❖ Os artigos que vocês receberão, são artigos da década de 70. Desde a década de 70 esta hipótese já
era discutida e a suplementação de B6 é feita em mulheres, tem ensaios clínicos, randomizados, com
duplo placebo e desde esta década já era visto que esta B6 realmente funciona, na dose certa, na dose
suficiente para saturar o sistema, mas não tão alta para não causar toxidade, porque o excesso de
B6 pode causar algum tipo de neuropatias, por exemplo. Na dose certa B6 ela pode sim restabelecer
o humor da mulher, e a principal hipótese é principal hipótese é via produção de Serotonina.

80
Alostérica: O controle alostérico, alosterismo ou alosteria refere-se a qualquer alteração na estrutura terciária ou
quaternária de uma enzima proteica induzida pela ação de uma molécula ligante, que pode ser um ativador, um inibidor, um
substrato, ou os três. A modificação da estrutura regula a sua atividade enzimática
233
A dose de que necessitamos habitualmente é entre 1 e 2 mg. Para saturar o sistema, a dose indicada é
de 50 mg. Essa é uma dose bastante segura. Acima de 100 mg, aumenta o risco de toxicidade e
neuropatias.

❖ É muito difícil ter deficiência de B6, porque


precisamos de pouco e tem bastante B6 presente nos
alimentos.
❖ Acontece que, se conseguirmos saturar este sistema e
competir com estrogênio a dose indicada é de 50 mg.
❖ É muito comum no escritório eu prescrever ou falar : “Vou
te mandar a vitamina B6 que vai te ajudar nesta alteração
de humor ...”. A paciente não espera a prescrição e sai
correndo para comprar na farmácia e compra qualquer B6
que encontra na frente. Pode acontecer de comprar na
dose errada, normalmente a que encontramos em
farmácia tem 1 a 2 mg. A dose precisa ser alta de 50 mg.
É uma dose bastante segura.

VITAMINAS B12 E B9
As vitaminas B12 e B9 (ácido fólico) também são particularmente importantes porque atuam como
cofatores enzimáticos no processo de detoxificação hepática do Estrogênio, que é uma das formas de
nosso corpo se livrar do excesso hormonal, quebrando as moléculas de Estrogênio e eliminando-as pela
bile.

❖ Só que para fazer isto ele precisa de enzimas que precisam de cofatores enzimáticos, como por
exemplo vitamina B12 e vitamina B9 que é o ácido fólico.

Anteriormente, já discutimos como avaliar clinicamente a vitamina B12.


No caso da vitamina B9, pode-se dosar o ácido fólico, mas também é recomendada a dosagem de
homocisteína.
Caso esteja acima de oito (8), pode-se suspeitar da deficiência quantitativa ou relativa dessas três
vitaminas do complexo B (B6, B9 e B12).

❖ A questão padrão no consultório é a seguinte tem alteração de humor na TPM, está com homocisteína
acima de oito – 8 , já suplementa tudo.
❖ Está com alteração de humor já pode suplementar a B6, sem fazer dosagem nenhuma. Se tiver a
dosagem de homocisteína, aí pode suplementar todas as outras, vale a pena para ajudar o organismo

234
neste processo de detoxificação do excesso do estrogênio. São medidas que vão contribuir para o
equilíbrio hormonal, que é a causa da TPM (o desiquilíbrio é que causa a TPM) .

Se houver alteração de humor na TPM, pode-se suplementar a vitamina B6, mas a dosagem de
homocisteína dá segurança para suplementar as outras.

VITAMINA B1 (TIAMINA)
A vitamina B1 (tiamina), pode regular as cólicas do período pré-menstrual, tendo em vista seus efeitos
no sistema nervoso e na regulação do tônus da musculatura do útero.

❖ Outra vitamina do complexo B interessantíssimo nesta fase é a vitamina


B1 ou Tiamina. A vitamina B1 tem uma função muito particular na saúde dos
nervos, nos neurônios no nosso sistema nervoso como um todo, inclusive no
nosso sistema nervoso periférico.

❖ O excesso de cólica, as cólicas neste período pré-menstrual elas podem


ser influenciadas por exemplo via suplementação de vitamina B1, via Tiamina, por quê? Porque via
efeitos no Sistema Nervoso e regulação do tônus da musculatura do útero.
❖ O útero é uma musculatura e quando essa musculatura contrai ,
quando a mulher consegue expulsar aquele endométrio que já
se descamou, e é neste processo de contração que se dá a dor via
suplementação de Tiamina B1 é possível ajudar de alguma forma
na regulação desse tônus muscular e essa dor diminui.

Sua dose é de 100 mg por dia, sempre na forma metilada


(metilfolato ou Metilcobalamina).

❖ Se tiver que baixar a homocisteína pode começar com doses de


15 mg se a deficiência não estiver muito grave de B12, com dose de 500 de B12 e 400 de ácido fólico,
você pode subir, o processo é mais de teste com teu paciente.

OUTROS SUPLEMENTOS

❖ Saindo do complexo B, vou falar sobre o Magnésio, que também vai ter efeitos na regulação do humor
via neurotransmissores, como já foi discutido na aula de ansiolíticos. É necessário você evitar, a todo
custo, deficiência de magnésios nesses quadros, por todo o impacto na transmissão destes
neurotransmissores no humor da mulher.

235
Em outra oportunidade, vimos como o Magnésio tem efeito na regulação do humor por meio dos
neurotransmissores.

Necessário evitar a deficiência de magnésio nos quadros de ansiedade e depressão. O Magnésio ajuda a
melhorar o humor na fadiga e nas cólicas.

A flutuação dos hormônios no organismo feminino induz à alteração na biodisponibilidade de Magnésio


e Cálcio no sangue, o que causa fadiga.

❖ O Magnésio tende a flutuar junto do Cálcio na circulação. A flutuação dos hormônios ajuda na
flutuação da biodisponibilidade do sangue, tanto no Magnésio como de Cálcio. O resultado prático
disto são sintomas de fadiga. Você precisa de Magnésio em quantidades adequadas para produção
de energia para suas células; você precisa de Cálcio adequado para ter contração muscular adequada,
para ter tônus muscular adequado.
❖ Se eles ficam flutuando, isto acontece nas mulheres quando há este desequilíbrio hormonal, a mulher
passa por fases de intensa fadiga, intenso cansaço perto da menstruação.

O Magnésio, portanto, melhora o humor, alivia a fadiga e atua diretamente na causa da TPM; o cálcio
auxilia nas cólicas menstruais porque participa do processo de contração do útero.

❖ Vale a pena suplementar ambos. Vale ressaltar também que o Magnésio também age na
detoxificação do estrogênio. Então o Magnésio está em todas. Ele melhora o humor, ele pode
melhorar a fadiga, ele pode melhorar a causa da TPM.
❖ Enquanto o Cálcio também vai influenciar de modo benéfico nas cólicas menstruais, justamente
porque o Cálcio participa do processo de contração da musculatura. Então níveis adequados de Cálcio
podem contribuir aí para regulação da contração do útero da mulher e melhorar as cólicas.

As doses de Magnésio são de 300 mg de magnésio elementar.


Quanto ao Cálcio, estudos indicam 500 a 1.500 mg, sendo que as doses menores são preferíveis.

VITAMINA E
A vitamina E é outro nutriente importante no processo de detoxificação hepática do Estrogênico.

❖ Mais um nutriente importante para que algumas reações químicas ocorram e que não haja excesso
de alguns hormônios / desiquilíbrios hormonais.

Sua suplementação está associada a melhoras no humor e nas cólicas, por conta de sua ação anti-
inflamatória e antioxidante.
Estudos indicam que a dose adequada vai de 100 a 400 UI.

236
❖ Ela é uma das minhas recomendações favoritas para a regulação nos sintomas na alteração de humor
e de cólicas da fase pré-menstrual.
❖ Eu, particularmente, gosto de trabalhar na dose de 400 UI. Mas estudos indicam já efeitos benéficos
de 100 UI.
❖ Vou revelar para vocês, minha ‘tríade’, o principal combo de suplementos que uso e dá muito certo.
E é realmente difícil uma TPM que não ceda com esta suplementação: Vitamina B6, Magnésio e
Vitamina E

O combo de suplementos recomendado é Vitamina B6, Magnésio e Vitamina E.

ÔMEGA 3
O Ômega 3 (óleo de peixe) tem intensa ação anti-inflamatória, por isso, é usado de modo efetivo para
melhora da cólica menstrual.

❖ Esta suplementação tem que ser contínua, levam alguns meses para ter o efeito.

Para fazer efeito, precisa ser consumido por alguns meses, e essa é sua desvantagem.
A dose recomendada varia de 1.000 a 1.500 mg de EPA mais DHA.

❖ É o mesmo raciocínio do Magnésio, vocês terão que comprar o suplemento e olhar na tabela
nutricional e fazer as continhas.

GENGIBRE
Outro campeão na suplementação para a cólica é o Gengibre, que pode ser utilizado em chá, em pó
(uma colher de sobremesa) e extrato (100 mg);
Ajuda também na redução da enxaqueca.

❖ Pode utilizar nas formas acima indicadas, em geral 7 dias antes da menstruação, reduz bastante as
cólicas e as dores de cabeça desta fase. O gengibre é um clássico para enxaqueca e o magnésio
também ajuda nas dores da enxaqueca desta fase.

O Óleo de Prímula é rico em um tipo de Ômega 6 que tem ação anti-inflamatória. Parece promover
melhora no desequilíbrio emocional e no humor, e pode ser usado de modo intermitente, de sete a
quinze dias antes do ciclo, com uma dose de 500 mg.

VITEX AGNUS-CASTUS
O Vitex Agnus-Castus é um fitoterápico recomendado para cólicas graves.
É o principal suplemento no combate à TPM, pois age nos sintomas e na regulação do desequilíbrio
hormonal.

237
Possui ação dopaminérgica, melhorando o humor, e é anti-inflamatório.
As doses variam de 30 a 300 mg, a depender do caso. (Rennan aconselha dores mais altas de Vitex , mas
é particular, segundo suas palavras).

❖ O Vitex-Agnus-Castus afeta muito o nosso Sistema Nervoso Central, diversos neurotransmissores, ele
tem uma ação dopaminérgica muito grande, melhora bastante o humor da mulher, é bastante anti-
inflamatório, ele diminui vias de dor, além de melhorar o equilíbrio hormonal.
❖ Só com estas suplementações, vocês já tem um ferramental enorme para melhora da saúde das
pacientes.

ALTERAÇÕES NA DIETA

❖ Quero adicionar algumas questões dietéticas, alguns cuidados na alimentação que vão ajudar a
regular principalmente a causa da TPM que são os desequilíbrios hormonais.

O excesso de carboidratos pode favorecer o desequilíbrio hormonal. O aumento da Insulina estimula a


expressão da Aromatase, que converte Testosterona
em Estrógeno. Se essa conversão é excessiva, ocorre o
desequilíbrio, que também gera um ciclo vicioso: o
açúcar que a princípio ameniza a alteração de humor
pela produção de Serotonina, na verdade, piora o
desequilíbrio hormonal.
É importante, portanto, ajustar a ingestão de
carboidrato. Não necessariamente retirar de todo, mas
adequar de acordo com a rotina, atividade física etc.

❖ O excesso de carboidratos, o carboidrato é bom


para dormir a noite, é! Mas o excesso do
carboidrato pode favorecer o desequilíbrio
hormonal porque a insulina - o pico da insulina, que
ocorre via consumo de carboidrato estimula a
expressão de uma enzima chamada de Aromatase.
❖ A Aromatase converte a testosterona em estrogênio. A mulher produz testosterona, para produzir
estrogênio, primeiro produz testosterona e converte em estrogênio. Só que na presença de um excesso
de carboidrato, na presença de uma hiperinsulinemia, uma insulina cronicamente elevada, esta
Aromatase passa a ser mais expressada pelo organismo da mulher e então começa a haver uma

238
conversão que não está prevista ali. Um excesso de conversão de testosterona em estrógeno. Isto é a
receita de bolo para o desequilíbrio hormonal.
❖ Então imaginem a mulher, que está necessitando de serotonina, está irritada, necessitando de
serotonina, então ela começa a comer carboidrato, e como estudamos na aula de melatonina, o
excesso de carboidrato favorece a entrada do Triptofano no Sistema Nervoso Central e lá produzimos
a serotonina a partir do Triptofano. Por isso que a mulher não resiste a um chocolate nesta fase.
❖ O que acontece? A mulher começa a comer este carboidrato, este açúcar em excesso para amenizar
a alteração do humor, só que ela piora o desequilíbrio hormonal. Aí entra um ciclo vicioso de piora de
um quadro dela. Tem que ficar esperto, tem que ajustar a ingestão de carboidrato. Uma low Carb
pode ser útil, mas cada caso deve ser avaliado com calma. Não necessariamente seja cortar todo o
carboidrato, mas adequar ele na quantidade certa, de acordo com a atividade física etc., etc.
❖ Outro ponto importante são as fibras, na alimentação. Além das fibras diminuírem o pico da glicemia
induzida pelo excesso de consumo do carboidrato, as fibras também têm um aspecto interessante na
diminuição do estrogênio circulante. Isto é, ela ajuda de certa forma na detoxificação hepática do
estrogênio circulante , como?

As fibras diminuem o pico de glicemia, induzida pelo consumo de carboidrato. Também atuam sobre a
diminuição do Estrogênio circulante, evitando a reabsorção da bile originária da detoxificação hepática,
a qual contém metabólitos de Estrogênio. Principalmente as fibras do tipo Psyllium conseguem otimizar
a detoxificação.
❖ O fígado pega este excesso de estrogênio, metaboliza e joga esse ‘lixo’ via bile. Acontece que esse
‘lixo’ - esses metabólicos do estrogênio já detoxificados, eles têm de uma certa forma uma função
estrogênica e podem ser recompostos em estrogênio e quando saem na bile, se não seguirem o
caminho das fezes, da evacuação, essa bile pode ser reabsorvida. Se ela for reabsorvida o desequilíbrio
pode ser alimentado por aquele metabólico que pode ser reconvertido em estrogênio.
❖ O que as fibras fazem? Elas diminuem a reabsorção da bile principalmente as fibras do tipo Psyllium,
que é um clássico, um tipo de fibra clássica, um fitoterápico, é um tipo de fibra que tema a capacidade
de formação de géis. Nessa formação de géis, este tipo de fibra retem, começa a reter estes sais
biliares e esses sais biliares não reabsorvidos, você consegue otimizar a detoxificação hepática do
estrogênio que está ocorrendo.

239
❖ Por fim quero ressaltar os vegetais crucíferos ou as brássicas81 e as frutas cítricas . Ambos os grupos
alimentares, possuem alguns compostos bioativos que estimulam o fígado no processo de
detoxificação hepática de estrogênio.

Os vegetais crucíferos (brócolis, couve-flor, couve-manteiga, rabanete, aspargos) e as frutas cítricas


(limão, laranja, tangerina, abacaxi) também contribuem para o processo de desintoxicação hepática,
por meio de compostos bioativos.

Essas pequenas alterações dietéticas podem contribuir para o equilíbrio emocional, principalmente se
associadas a um estilo de vida mais saudável .

❖ Adicionar estes grupos alimentares é uma estratégia interessante, não é tão impactante quanto um
Vitex Agnus-Castus, mas é uma coisa que todo mundo pode fazer. São pequenas alterações
dietéticas, que ressalto aqui para vocês, que podem contribuir para o equilíbrio hormonal, que é,
vejam só, a causa da TPM.
❖ Não estamos aqui como o anticoncepcional só ‘tampando o sol com a peneira’ , estamos tentando
resolver a causa da TPM.
❖ Associado a isto, evidentemente, um estilo de vida mais saudável vai ajudar, perda de peso, atividade
física, boa qualidade de sono.... Mas enfim, tem bastante coisas que vocês podem colocar em prática
na rotina das suas pacientes.
❖ Então de modo resumido, comentei:
➢ Suplementação – diversos suplementos;
➢ Vitaminas do complexo B, que vão ajudar desde o processo da detoxificação, que ajudará no
desequilíbrio hormonal, até variação de humor e cólica:
✓ vitamina B6, B12, B9 e B1;
➢ Magnésio e Cálcio:
✓ Magnésio – humor, fadiga, enxaqueca ;
✓ Cálcio - cansaço e cólicas ;
➢ Vitamina E vai ajudar no desequilíbrio hormonal e
também de modo bastante expressivo nas cólicas;
➢ Ômega 3 – ação anti-inflamatória que vai ajudar nas
cólicas;
➢ Gengibre – idem e uma ação benéfica na enxaqueca e o
➢ Vitex Agnus-Castus que é o grande fitoterápico que ajuda em diversas frentes da TPM;

81
Hortaliças brássicas: são também informalmente chamadas de “vegetais florais”, por conta de suas características físicas
muito semelhantes a um buquê de flor, como por exemplo: couve-flor, repolho, brócolis, couve, nabo, agrião, acelga,
rabanete, couve de bruxelas e rúcula.
240
➢ Pequenas alterações na dieta, que sua paciente pode fazer e que vai contribuir para o quadro
dela.

PAPO NUTRICIONAL ÍTALO MARSILI E RENNAN CAMINHOTTO - SEMANA 05

ÍTALO MARSILI
Rennan eu acho absolutamente importante falarmos deste assunto da TPM, primeiro pela prevalência,
então a TPM sozinha ele acomete até 80% das mulheres em período fértil, o que é um número muito
expressivo que equivale dizer que a totalidade das mulheres tem algum dos sintomas da Tensão Pré
Menstrual.
Acho que vale a pena formar os terapeutas que estão nos ouvindo que existe uma diferença entre a TPM
e a TDPM. A TPM é este Transtorno Pré Menstrual que vem carregado de um inchaço, dor de cabeça,
uma labilidade82 emocional discreta, mas que não chega a ser incapacitante. Então esta é a TPM que
acomete até 80% das mulheres.
Aquela Síndrome da Disforia Pré-Menstrual ou Transtorno da Disforia Pré-Menstrual a TDPM, esta é um
pouco diferente, chega a acometer 10% das mulheres em idade fértil, que também é um número muito
expressivo. Então até 10% das mulheres em idade fértil sofrem de TDPM, aquela clássica síndrome que
corre com incapacidade laboral e em relacionamento que a gente vê, algumas mulheres com uma dor
tão profunda, tão poderosa que acabam precisando faltar ao trabalho ou com uma labilidade emocional
tão acentuada que muitas vezes não conseguem sair da cama, se trancam em casa, choram de modo
bastante incontrolado até, então existe uma diferença entre elas. Muitas vezes esta Disforia Pré
Menstrual, estas sim, precisam ser medicadas com antidepressivos, e aqui tem duas formas de fazer isto.

Pode-se fazer nos 15 dias que antecedem o período menstrual, e uma vez que a mulher menstrua a os
sintomas cessam e a medicação é encerrada e retornam 15 dias depois. Ou deixa-se a mulher medicada
dependendo da gravidade. Isto para a TDPM, Disforia Pré Menstrual, que é essa grave que promove a
incapacidade laboral, uma labilidade emocional muito intensa, inclusive muitas pessoas mudam, que o
leigo diz, personalidade, não é isso, mas a pessoa fica irreconhecível.

Agora a Síndrome Pré Menstrual ou o Transtorno Pré Menstrual, que é a famosa TPM, que acomete
quase a totalidade das mulheres, até 80% essas podem ser amplamente abordadas com outras
estratégias que não só a farmacológica, que você mesmo apontou, mudança de qualidade de vida, e
todos estes compostos que você nos indicou.

82
Labilidade: conhecida como instabilidade emocional, é uma condição que acontece quando uma pessoa apresenta
mudanças muito rápidas de humor, ou tem emoções desproporcionais a determinada situação ou ambiente, apresentando
choro ou riso incontrolável.

241
Então queria que você falasse, só para complementar sobre o Óleo
de Prímula, que eu sei que você usa também na sua prática. Tem
como ‘amarrarmos’, pois é mais um recurso que podemos utilizar
isso para a mulher com o Transtorno Pré Menstrual.

Rennan Caminhotto
O Óleo de Prímula é um óleo rico em Ômega 6, mas é um Ômega 6
diferente, é muito parecido com o Ômega 3, ele se comporta como
um Ômega 3. Assim como o Ômega 3 ele possui uma intensa ação
anti-inflamatória e em paralelo a isso parece ocorrer uma melhora
de humor, uma melhora de todo desiquilíbrio hormonal que causa a
TPM através da utilização do Óleo de Prímula.
Diferente do Ômega 3 que você tem que usar de modo contínuo
durante alguns meses para ter o resultado, o Óleo de Prímula você
pode usar de modo quase pontual. Cerca de 7 a 15 dias antes do
ciclo, você não precisa usar o mês inteiro, cerca de 7 a 15 dias antes da menstruação a mulher pode usar
uma dose de 500 mg, por exemplo, e já tem um efeito benéfico na menstruação seguinte. Então ela
pode usar de modo intermitente, vamos colocar assim. É um suplemento parecido com o Ômega 3 (que
deve ser usado de maneira contínua), só que tem esta vantagem, pode ser usado de maneira
intermitente que tem estudos bastante interessantes.

ÍTALO MARSILI
Acho que vale a pena pontuarmos, o que seria terrível um terapeuta imaginar que o Transtorno Pré
Menstrual é algo que está ali no campo da somatização, ali no campo de algo puramente psicológico,

por assim dizer, o que poderia dificultar a abordagem da paciente se o terapeuta está convencido se
tem uma causa orgânica também. Sabemos que existe do ponto de vista da neuroplasticidade cerebral
uma relação muito direta entre o estrogênio e a formação de dendritos. Então temos nossos neurônios,
estes neurônios têm aqueles cabelinhos, aquelas ramificações que lembramos das aulas de biologia e
ali nestes dendritos muitas vezes são produzidos os neurotransmissores.

242
O que acontece é que o estrogênio tem uma característica tóxica nos dendritos, então quando vai
subindo o estrogênio, estes dendritos tendem a diminuir. Se lembrarmos do ciclo hormonal pré-
menstrual existe uma subida de estrogênio, depois uma queda brusca do estrogênio que leva até a
menstruação e quando ocorre esta queda tem uma melhora dos sintomas da mulher.

Então existe esta dinâmica. A cabeça, o cérebro, no Sistema Nervoso Central Feminino é diferente do
Masculino, justamente por este crescer e diminuir dos dendritos. Ao passo que o homem tem o seu
Sistema Nervoso Central, do ponto de vista biológico, sem sofrer estas alterações cíclicas, o homem não
tem variação hormonal grave ou brusca, cíclica e a mulher tem.

Na mulher aparece esta alteração do humor que é orgânica, não estou excluindo aqui outras causas
psíquicas. Mas a causa orgânica é muito profunda, o que acontece também na depressão pós-parto.
Então a mulher tem o nível do hormônio que vem estável ao longo de toda gestação, ela não menstrua,
está estável, o hormônio mantendo por meio do corpo lúteo etc. vai mantendo a vida intrauterina do
bebê e com o parto todos aqueles anexos saem e a mulher sofre uma queda brusca de hormônio então

aparece a depressão pós parte em muitas mulheres. Um dos fatores de risco para a depressão pós-
parto, inclusive, é um histórico prévio de Transtornos Pré Menstrual. Está bem estabelecido esta
correlação entre uma coisa e outra.

Também existem outros fatores psicológicos e sociais que podem levar a mulher a ter a depressão pós-
parto, às vezes é o abandono do marido, ou abandono do seu grupo de apoio, da família, expatriadas
etc., existem causas psíquicas e sociais, mas tem uma causa profundamente biológica ali que leva até a
depressão pós-parto.

Eu gostaria que você desse uma ‘amarrada’ pois deve ser muito útil para o prescritor para quem vai
prescrever toda estas substâncias Rennan é o seguinte: quando você está montando uma prescrição da

243
mulher, que está com o Transtorno Pré-Menstrual, você monta uma prescrição com todo estes
elementos ou você faz uso de um ou outro.

Rennan Caminhotto
Eu seleciono a partir de sintomas e tem questões subjetivas mesmo de preferência de algumas coisas.
Então por exemplo, humor = B6 sempre está lá; o Magnésio sempre está também, o humor é um pouco
difícil... o Vitex Agnus-Castus quando o quadro é um pouco mais grave, posso acrescentar ou não. Na
cólica a gente tem muitas opções, o Óleo de Prímula, o Feno Grego83 (acabei não falando dele aqui),
você tem o Gengibre, o Ômega 3, a vitamina B1... A mulher precisa tomar tudo isto? Não, ela não precisa,
compõe um pouco a ‘coisa’...., é um pouco subjetivo, confesso. Não prescrevo o Ômega 3 porque
geralmente eu quero um resultado um pouco mais rápido, a vitamina E já ajuda bastante, quando ela
não dá conta, eu posso associar a vitamina B1, quando o quadro de cólica é mais intenso, é uma coisa
mais subjetiva mesmo.

ÍTALO MARSILI
É total, na psiquiatria em geral é assim. Existem certas sociedades médicas que tem tudo bem
protocolado, por exemplo a cardiologia, na psiquiatra realmente não é assim. Temos poucos protocolos,
para abordar depressão, ansiedade etc. porque cada caso, de fato é um caso, então o olhar do terapeuta
tem que estar muito ajustado para a paciente. O que vale a pena é suplementar o complexo B, as
vitaminas do complexo B e ir adicionando um extrato de gengibre, ou um óleo de prímula conforme cada
caso mesmo, era como eu fazia, por isso estava te perguntando.

Rennan Caminhotto
A minha suplementação base, é o B6, o Magnésio e a vitamina E. O resto eu vou compondo de acordo
com o sintoma. Se a gravidade da cólica é muito grande eu vou adicionando alguns suplementos,
geralmente eu faço isso. Não tem receita não.

83
Feno Grego: Trigonella foenum-graecum é uma espécie vegetal da família Fabaceae,[sendo a espécie mais comum
do género botânico Trigonella. É também conhecida em português pelo nome, de origem árabe, de Alforva, e é um dos
constituintes do caril (também conhecido como curry) indiano. O feno grego, também conhecido como fenacho ou alforvas,
possui propriedades anti-inflamatórias, antioxidantes e antidiabéticas, sendo muito utilizada como remédio caseiro para
diabetes, cólica menstrual ou colesterol alto, por exemplo.

244
Semana 06: TESTOSTERONA

Esta aula trata do hormônio Testosterona e o seu impacto na saúde masculina.

FATORES QUE CAUSAM DEFICIÊNCIA DE TESTOSTERONA

Um estudo indica que um a cada quatro homens com menos de 30 anos tem baixo nível de Testosterona
no sangue, que consiste em concentrações menores de 250 ou 300 nano gramas por decilitro.

❖ Esta baixa concentração de Testosterona tem diversos efeitos na saúde do homem.


❖ Abaixo uma relação de efeitos da baixa de testosterona no homem na função sexual:
➢ Falta de Ereção Matinal;
➢ Disfunção Erétil;
➢ Baixo desejo sexual, baixa libido.
❖ Também são encontrados sintomas relacionados ao humor:
➢ Incapacidade de realizar atividades vigorosas;
➢ Sintomas de depressão;
➢ Fadiga
❖ Todos estes itens acima, são exemplos de baixa testosterona no organismo.

Além dos sintomas na função sexual, a baixa Testosterona também tem impacto no humor e gera
incapacidade de realizar atividades vigorosas, sintomas de depressão e fadiga.

Aqui, não se ensinará a reposição de Testosterona, mas o que pode ser feito para impactar sua
concentração de modo benéfico.

❖ Existem algumas coisas que todos nós podemos fazer e que pode impactar de modo benéfico (ou
maléfico) as concentrações de Testosteronas masculinas.
❖ Primeiro eu vou falar de causas da baixa Testosterona e o que podemos fazer:

CAUSA 01 = TRATAR O SOBREPESO:


Como a mulher, o homem também converte Testosterona em Estrogênico por meio da Aromatase.

❖ Como a mulher produz Estrogênio, (expliquei na aula de saúde da Mulher), é o seguinte:


➢ O ovário da mulher possui uma enzima chamada AROMATASE, que converte Testosterona em
Estrogênio.
❖ O homem também possui tem esta enzima e também possui a capacidade de converter a
Testosterona em Estrogênio. ‘Pô, Rennan, mas o homem não tem ovário!!!’. Pois é, mas o homem
tem gordura, que é formado pelo tecido adiposo. E o tecido adiposo, assim como o ovário é um

245
grande local de expressão da enzima Aromatase, portanto de conversão de Testosterona em
Estrogênio.
❖ Um homem que está acima do peso, particularmente do homem que está acima do peso com
gordura corporal (porque tem homem que pode estar acima do peso, porém tendo massa magra), é
um homem que produz mais estrogênio, converte mais testosterona em estrogênio
espontaneamente, naturalmente, principalmente na presença do aumento crônico de insulina, os
quadros de hiperinsulinemia, decorrentes de resistência a insulina.

Um grande local de expressão dessa enzima para os homens é o tecido adiposo.


Portanto, um homem que está acima do peso com gordura corporal converte mais Testosterona em
Estrogênico espontaneamente, principalmente quando há aumento crônico da Insulina.
Se o paciente tem muita gordura corporal, tem uma síndrome metabólica com resistência à Insulina ou
índice de Insulina circulante na faixa de 20 a 40, provavelmente tem desequilíbrio entre Estrogênio e
Testosterona.
Para resolver a situação, é necessário perder peso – especificamente, gordura corporal –, mas isso não
acontece da noite para o dia.

❖ Quanto mais insulina no sistema, maior será a expressão de atividade desta enzima e a conversão
de Testosterona em Estrogênio.
❖ Se o seu paciente está acima do peso, quando você vê que é nítido que ele não é um fisiculturista, é
um paciente que tem gordura corporal, é um paciente que possui síndrome metabólica, isto é, possui
características de resistência a insulina, possui um excesso de insulina circulante. Quando você dosa
no exame dele , dá 20 – 30 – 40 de insulina, é um indivíduo que, muito provavelmente você dosar o
Estrogênio e a Testosterona você vai encontrar um desbalanço. Para resolver isto é perdendo peso,
perdendo gordura corporal.
❖ Quero salientar uma coisa, esta situação não vai se resolver do dia para a noite, porque:
➢ Perder gordura corporal é algo que demanda esforço; demanda um tempo de tratamento e
➢ As fases iniciais do tratamento pode prejudicar ainda mais a Testosterona. Como? A restrição
calórica, que é uma coisa necessária para a perda de pesa, você tem que consumir menos
calorias, do que você gasta. Você tem que consumir menos calorias e gastar mais calorias,
para que haja perda de peso, perda de gordura corporal. Acontece que este déficit calórico é
encarado no organismo como um estresse, e o estresse é algo que está relacionado a baixa
testosterona, aumento da dificuldade da Testosterona exercer seu papel.

Mesmo porque as fases iniciais do tratamento podem prejudicar ainda mais a Testosterona, por conta
da restrição calórica que gera estresse no organismo e dificulta que a Testosterona exerça seu papel.

246
❖ É comum que seus pacientes que estão precisando perder peso, que já estão com a Testosterona
baixa, passem por uma fase de, digamos assim, até de piora, do quadro de libido etc., quando iniciam
uma restrição calórica intensa.
❖ Mas com o passar do tempo, com o passar das semanas, conforme for havendo peso de gordura
corporal, o equilíbrio hormonal passa a ser restabelecido. É um tipo de pessoa que você terá que ter
paciência, terá que explicar o processo, terá que explicar que a melhora da libido não virá de
imediato, a melhora da disposição não virá imediato. Com o passar do tempo, com a aderência ao
tratamento, ele vai conseguir estes benefícios.

Com o passar das semanas o equilíbrio hormonal se restabelece, por isso, é preciso paciência.

O exercício físico, especialmente de força, é muito útil, pois ajuda o paciente a perder gordura e manter
massa magra, além de ser um estímulo para a produção da Testosterona Endógena.

❖ O exercício físico é especialmente útil, principalmente o exercício de força, a musculação que vai
ajudar a direcionar a perda de peso para a perda de gordura corporal, a manutenção da massa
magra dele, e o próprio exercício em si é um estímulo para a produção da testosterona.
❖ É um processo longo, é um processo de perda de peso, não tem jeito. Vale a pena prescrever isto e
relatar que ele precisará ter paciência.

CAUSA 02 = DORMIR BEM:


❖ A segunda causa é a privação do sono. Tem estudos interessantes como este a seguir:
➢ Convidaram vários homens e deixaram eles dormirem 3 noites, 10 horas seguidas, que é uma
boa margem de sono;
❖ Em seguida, estes mesmos homens tiveram o sono restrito durante 8 dias, pela metade. Durante 8
dias estes homens dormiram apenas 5 horas por noite. Este tempo foi o suficiente para diminuir
cerca de 15% de sua testosterona total;
➢ Este declínio da Testosterona foi associado a menores escores de vigor, então o vigor deles
também caiu.

Algo muito recorrente, que pode ser causa da diminuição da Testosterona, conforme estudos.

Portanto, a qualidade do sono é essencial. Importante investigar se o paciente tem quadro de ansiedade
ou apneia.

❖ Portanto privação de sono é algo muito recorrente na nossa sociedade, muito recorrente nos nossos
pacientes, na nossa vida e muitas vezes isto está associado a diminuição da sua Testosterona e dos
seus pacientes.

247
❖ Então qualidade de sono é , relembrem na aula de melatonina, na aula de ansiedade, algum quadro
de ansiedade que piora o sono dele e é essencial uma qualidade de sono para que a testosterona
fique em níveis ótimos.
❖ Apneia, vale muito a pena lembrar dos quadros de apneia, que geralmente está associado ao excesso
de peso. Tudo isto tem que ser tratado.

CAUSA 03 = EVITAR O ESTRESSE:


O estresse diminui não somente a quantidade de Testosterona, mas também seu efeito.

O cortisol, hormônio que aumenta em situações de estresse, é extremamente antagônico à


Testosterona, pois diminui a massa muscular, facilita estoque de gordura, diminui a libido.

Nesse sentido, há um suplemento da medicina indiana, chamado Ashwagandha, que tem benefícios na
Testosterona e função sexual, muito provavelmente, por diminuição do cortisol e do estresse.

❖ Como o estresse diminui não só a quantidade da Testosterona mas também o efeito dela. Acontece
da seguinte forma o Cortisol, que é o hormônio do estresse que aumenta nos períodos de estresse,
ele é extremamente antagônico a Testosterona. Tudo que a Testosterona faz o Cortisol desfaz:
➢ A Testosterona aumenta sua massa muscular, o Cortisol diminui essa massa muscular;
➢ A Testosterona facilita a queima de gordura, o Cortisol facilita o estoque de gordura;
➢ A Testosterona aumenta a libido; o Cortisol diminui a libido.
❖ É fácil de entender a lógica do processo, imaginem uma situação de estresse onde o indivíduo está
lutando pela sua sobrevivência, libido, reprodução é algo que vai para segundo plano, então
indivíduos cronicamente estressados possuem uma baixa testosterona e também uma baixa do
efeito biológico da testosterona por causa do Cortisol.
❖ Neste sentido quero falar de um suplemento que falei em outra aula, que é a Ashwagandha. É um
suplemento da medicina indiana, que tem cheiro de cavalo, o próprio nome parece que quer dizer
isto. Eles acreditavam que todos que consumissem daquela planta, teriam o vigor e a virilidade
daquele animal. E de fato, pesquisas atuais confirmaram esses resultados.
❖ Estudo: homens estressados começaram a usar a Ashwagandha e viram benefícios na função sexual
e na Testosterona. A Testosterona destes homens aumentou, muito provavelmente por diminuição
de estresse, por diminuição de Cortisol e marcadores de função sexual melhoraram, por exemplo,
quantidade de líquido seminal, a qualidade dos espermatozoides, tudo isto melhorou após a
suplementação da Ashwagandha.
❖ Em homens, submetidos a treinamento de força, quando estão usando a Ashwagandha eles tem um
aumento maior da Testosterona induzida pelo exercício, por exemplo.

Um estudo apontou que ao usar a Ashwagandha homens tiveram aumento da Testosterona induzida
por exercício.
248
Parâmetros seminais também já foram avaliados, principalmente em casos associados a infertilidade e
estresse.

Dose: 160 a 600 miligramas.

Outro estudo também apontou que, quando ficavam em postura retraída, a concentração de Cortisol
em homens aumentava, enquanto a de Testosterona diminuía.

Daí a importância de exercícios físicos como a musculação, que colocam o sujeito em uma postura
aberta.

CAUSA 04 = NUTRIÇÃO ADEQUADA:


❖ Existem deficiências nutricionais que podem baixar o nível de Testosterona, citarei algumas.

VITAMINA D
❖ A primeira delas é a vitamina D que já foi falado na depressão. A vitamina D atua não só na saúde
óssea e no humor , tem como tecido alvo as gônadas, o órgão reprodutor masculino, são as
glândulas responsáveis pela produção adequada dos hormônios sexuais.

A deficiência de vitamina D pode derrubar o nível de Testosterona, pois ela tem as gônadas como alvo,
e estas são responsáveis pela produção adequada de hormônios sexuais.

❖ Estudo: selecionaram homens que tinham deficiência de vitamina D e suplementaram estes homens
com vitamina D. Pegaram o nível de Testosterona antes e depois e viram que estes homens tinham
baixa concentração de vitamina D e depois de um ano suplementando, foram conferir se a vitamina
D tinha impactado de alguma forma nas concentrações de Testosterona. Olhem que engraçado,
vocês já vão me dizer qual o erro deste estudo. Neste estudo as concentrações iniciais da vitamina
estava na faixa de 13 nano gramas por ml, deficiência clara, como vimos na primeira aula. Eles
tinham que repor no mínimo 7.000 UI diários ou 50.000 UI semanais. Eles usaram somente 3.000
UI/dia, então uma reposição de certa forma inadequada, isto durante um ano. E os valores após 1
ano de suplementação foram para 34. Então assim, recuperou mais ou menos, o processo não foi
bem desenhado. Essa recuperação nutricional não foi grande coisa, mas mesmo assim, mesmo com
uma reposição inadequada e uma recuperação não tão boa, no final dos estudos os indivíduos
tinham 25% de aumento de Testosterona, sem fazer mais nada, só suplementando vitamina D. Este
é meu ponto, se esta suplementação tivesse sido feito de modo correto, talvez o resultado tivesse
sido melhor e mais rápido.
❖ Então todo mundo que está com deficiência de vitamina D é muito provável que sua Testosterona
melhore após a suplementação.

249
Mesmo em um estudo em que a reposição de vitamina D foi baixa, os homens tiveram um aumento nas
concentrações de Testosterona.

Dose: 7000 UI diários ou 50000 UI semanais.

MAGNÉSIO
Outro suplemento interessante é o Magnésio, cuja deficiência parece estar associada a menores
concentrações de Testosterona livre.

❖ O que é Testosterona Livre? A Testosterona fica circulando associada a uma proteína


transportadora. Acontece que a parte biologicamente ativa da Testosterona é aquela parte que não
está ligada a essa proteína transportadora, então é o que chamamos de Testosterona livre.

A Testosterona circula pelo organismo associada a uma proteína transportadora, mas sua parte
biologicamente ativa é a que não está ligada a essa proteína, a chamada Testosterona livre.

❖ Então quando dosamos a Testosterona Total, vemos o total do organismo. Quando dosamos a
Testosterona livre, dosamos a Testosterona que é ativa biologicamente.
❖ Aqui faltam estudos, mas parece que concentrações adequadas de Magnésio ajudam, até de modo
físico, na liberação da Testosterona, deste complexo proteico. Então aumenta a biodisponibilidade
do hormônio. Então é outro nutriente que vale a pena vocês ficarem de olho.

Estudos apontam que a concentração adequada de magnésio ajuda na liberação da Testosterona desse
complexo proteico, ou seja, aumenta sua biodisponibilidade.

Dose: 300 mg de magnésio elementar.

ZINCO

❖ Tem estudos em humanos? ( ou um ano?) com suplementação de Zinco, também quando há


deficiência, não é só suplementar Zinco a ‘torto e a direito’, você tem que dosar para saber se tem
deficiência ou não... a vitamina D, já vimos.

Também é necessário prestar atenção ao Zinco. Primeiramente, deve-se dosar para descobrir se há uma
deficiência desse nutriente (considera-se 100 um valor adequado, e geralmente o nível das pessoas está
entre 70 e 75).

❖ O Zinco, é muito bom valores próximos ali de 100. Geralmente a faixa é de 70 /75 e me escapa agora
o quanto é o excesso. Geralmente o ideal é ao meio, que é sugerido.

250
❖ ‘De onde você está tirando isto, Rennan?’ Veja, não tem muito de onde tirar, é prática clínica. Você
vê pessoas com Zinco mais perto de 70 e tem queda de cabelos, mulheres principalmente, e começa-
se a repor o Zinco e o processo melhora. É algo mais da prática mesmo, eu sugiro perto de 100. Se
tiver abaixo de 70 é evidente que tem deficiência, não tem que discutir. Tem que suplementar
mesmo.

Homens inférteis, com Testosterona baixa, experimentam um aumento de Testosterona após a


suplementação de Zinco, em caso de deficiência.

❖ Isto não vai acontecer se você tem Testosterona normal, se você não tem deficiência de Zinco, não
adianta ficar suplementando Zinco para aumentar, que o processo não funciona assim.

Dose: geralmente, de 20 a 30 mg, preferencialmente na forma de Zinco Quelado.

❖ Lembrando que quando você chega perto de 30 mg o Zinco começa a interferir no Cobre. Lembram
lá na primeira aula lá do Cobre, na parte do Neurotransmissor que o Alumínio poderia interferir, o
excesso de Zinco também pode interferir. Se você vai suplementar doses maiores de 30 você tem que
suplementar Cobre Quelado junto na dose de 1 ou 2 mg, importante até para o humor do teu
paciente..

Doses maiores podem interferir no Cobre, tornando necessário suplementar Cobre Quelado 2 mg .

❖ De uma maneira geral, era isso: sono = qualidade do sono, sobrepeso o melhor era não ter
engordado, tem que ter paciência e passar por uma restrição calórica, esta restrição vai piorar a
Testosterona e sua libido mas depois o processo tende a melhorar. De modo resumido, era isto que
eu queria falar sobre a testosterona, são medidas que todo mundo tem que ter na vida, peso
adequado, sono adequado, baixo estresse e combater deficiências nutricionais. Isso todo homem
pode fazer .

COMENTÁRIOS NUTRICIONAIS ÍTALO MARSILI E RENNAN -SEMANA 06

Ítalo Marsili
Muito bom Rennan, acho que esse assunto é absolutamente importante também, não é, todos os
assuntos do módulo são importantes e bastante prático do modo que você está colocando, que não
precisamos imaginar que um sujeito vai necessitar de uma Testosterona exógena, para poder fazer uma
reposição, ou alguma coisa do tipo.
Esse é um grande capítulo da Medicina, mas aí foge um pouco do escopo do nosso curso, porque
precisaria de um médico que conhecesse muito bem os assuntos de reposição de Testosterona exógena
e não é o caso aqui. Eu acho que muitas medidas anteriores que precisa até pensar antes, no de imagina
de fazer uma terapia de reposição exógena, como você bem apontou: perda de peso e outras
251
abordagens. Gostaria de só lembrar de uma coisa para podermos discutir, a Testosterona no homem
está muito associada ao ‘drive’ sexual. Então quando as pessoas falam sobre Testosterona, uma das
primeiras coisas que vem na mente é o drive sexual, realmente tem a ver, mas a testosterona, nem de
longe, ele é importante só para isso.

A relação em primeiro lugar da Testosterona com a Cognição, quando está baixa, afeta a cognição.
Homem e mulher que tem uma baixa testosterona, podem ter uma cognição alterada. O que é uma
cognição alterada? É uma memória que não está no lugar, uma memória que já não consegue fazer o
registro claro das coisas que lhe acontece; atenção do sujeito fica prejudicada também, então ele vai
ter uma hipoviligância, hipotenacidade, então fica mais desatento para os dois lados. Uma desatenção
que já não consegue capturar todos os recursos e estímulos do ambiente e também não consegue
manter o foco naquilo que precisa manter. Às vezes está numa aula, está redigindo um texto, ou está no
trabalho dele e pode ficar um pouco mais disperso mesmo; isso acontece.

Depois a Testosterona como o grande promotor muscular. Então uma pessoa com uma baixa
Testosterona ela vai ter uma tendência a sarcopenia, que é a redução de massa magra, redução de
massa muscular. É sabido que a sarcopenia, ou a baixa densidade muscular (sarcopenia) é um dos
maiores preditores de morte, sobretudo nos idosos, principalmente no idoso que tenha pouca massa
muscular ele está mais sujeito a não se recuperar de uma pneumonia, de um resfriado, de uma gripe, ou
de uma internação na CTI, por exemplo, está é uma outra importância.

Há uma grande relação também com Testosterona alta, com fator de proteção cardiovascular. Os
homens com Testosterona mais alta, tendem a infartar menos também. Só daí já vemos que a
Testosterona rege boa parte da vida cinética, do movimento, quanto da vida psíquica, da cognição do
homem.

Iremos também colocar aí, neste grande bolo o drive sexual, então muitas pessoas vem ao consultório
com queixas no drive sexual e vamos dosar a Testosterona do sujeito e ela está baixa também. É uma
coisa que está bastante no dia a dia que está no consultório. Dito de outro modo, a Testosterona também
deveria ser dosada no sangue do homem que chega no nosso consultório.

Aqui, falamos muito no homem, Testosterona para o homem. Queria levantar um assunto que é o
seguinte: muitas mulheres também chegam no consultório com a Testosterona quase zerada. Então não
é assim, homem é bom ter Testosterona, a mulher não precisa ter. Não, a Testosterona é importante
para todos os seres vivos. As mulheres precisam ter Testosterona também, e uma das grandes causas de
bloqueio da mulher é o uso do anticoncepcional oral baixa, ele bloqueia a produção da testosterona na
mulher e a mulher pode sofrer tudo que foi falado aqui também: sarcopenia, cognição diminuída, baixa
de drive sexual. A Testosterona rege de modo assim excelente nossa vitalidade, por assim dizer.

252
Outro ponto importante sabermos é o seguinte: hoje chega no consultório muitas pessoas, muitos
homens sobretudo os que já fizeram ciclo de anabolizante sem acompanhamento médico, não que o
uso de anabolizante seja uma coisa proscrita, que não possa ser usada, não. Cada caso é um caso e se
um médico estiver acompanhando e se tiver uma equipe multiprofissional estiver acompanhando a
pessoa, pode ter a indicação e ele estará com a saúde em dia, com a saúde OK. Mas é importante
sabermos isto também, quando oferecemos Testosterona exógena, ou seja, o sujeito relatou no
consultório que fez uso de anabolizante, teremos que dosar Testosterona, FSH e LH, são dois hormônios
que tem que estar dosado no sangue também, para verificarmos se o eixo dele está bloqueado ou não.
Então o sujeito que fez uso de esteroide anabolizante, passou
a apresentar sintomas de Testosterona baixa, ou seja, fadiga,
cognição diminuída, perda muscular, eventualmente,
alteração de libido, alteração de drive sexual, temos que
imaginar que ele bloqueou o eixo, ou seja, as gônadas não
produzem mais Testosterona exógena, ou seja, o “saco”, os
testículos, as células de Leydig84 não produzem mais
Testosteronas e aí precisaremos abordar. Não vou ensinar aqui como se aborda a reversão, desse
hipogonadismo transitório, mas isto tem que estar no foco do terapeuta. Resumindo como o processo
funciona: ‘Chega um sujeito, cheio de queixa, meio depressivo, também desanimado, drive sexual está
meio alterado...’, tem que fazer parte da semiologia da anamnese sobretudo. Perguntar:
• Terapeuta: Já fez uso de ciclo esteroide anabolizante?
• Paciente: Já, já fiz.
• Terapeuta: Tem menos de 2 anos?
• Paciente: É... teve o carnaval, achei que a pandemia fosse embora e fiz um uso ali....

Terapeuta deverá solicitar dosagem de Testosterona, FSH e LH. Se o FSH e LH estiverem muito baixos,
quase zero, até mesmo as vezes indetectáveis, temos que pensar o seguinte, o eixo está bloqueado. Não
é necessário ir lá palpar o testículo do cara (rsrsrs), que me geral estará atrofiado, não é o pênis que
atrofia, isto é algo de mito.

As pessoas comentam o sujeito que toma bomba que o pênis do sujeito diminuiu. Não, não é o pênis
que diminuiu, mas o testículo diminui, ele atrofia mesmo. Por que atrofia? Porque ele não está mais
produzindo Testosterona, porque está recebendo Testosterona de fora. O testículo vai atrofiar porque
perde sua função. Então se o FSH e LH do sujeito estão baixos, será necessário fazer terapia de ‘pós

84
Células de Leydig: ou células intersticiais de Leydig são células que se encontram entre os túbulos seminíferos, no interstício
dos testículos. Produzem a hormona testosterona, quando estimuladas pela hormona luteinizante (LH). Possuem um núcleo
vesicular e arredondado e um citoplasma granular.
253
ciclo’85, fazer uma terapia para tentar, poucas vezes é irreversível - não tem jeito, mas a maior parte das
vezes é reversível sim, e conseguimos abordar ali, não vou explicar como faz, porque não é a ideia aqui
do curso, não é, mas temos algumas substâncias que podemos usar, tanto substâncias que alimentam
as células de Leydig no testículo, ou seja, colocam mais frutose para dentro, para que produza o esperma
e isto aí possa aumentar a produção da espermogênese. Por exemplo o ‘Proviron’ é uma substância que
faz isto ele aumenta a concentração da frutose nas células de Leydig, no testículo que alimenta as células
de Leydig, e o sujeito volta a fazer a espermogênese, esta é uma delas.
A outra, o próprio Beta HCG, a fração Beta do HCG ela parece muito com o FSH (tem uma semelhança
molecular), então voltaria a produzir a Testosterona endogenamente. Não vou dar dosagens, mas isto
tem que estar na cabeça do Terapeuta, por que estou falando isto? Porque é muito comum hoje me dia.
É muito comum as pessoas fazerem ciclo esteroide anabolizante. Não estou discutindo aqui se é bom ou
ruim, mas estou dizendo que isto acontece, veremos sim pacientes que fizeram uso e depois tem ali a
Testosterona bastante diminuída.
Vemos alguns artigos que, de fato, se o sujeito perde peso, se ele usa algumas suplementações, ele pode
sozinho voltar a produzir a Testosterona, mas se o eixo está bloqueado, ele vai precisar provavelmente
a abordagem farmacológica. Dificilmente outras condutas comportamentais vão dar conta ali de fazer
com que volte a produção endógena da Testosterona, isto no homem.
Na mulher, que está com o eixo bloqueado por causa do uso de anticoncepcional, não tem outro jeito,
terá que criar uma outra estratégia para ela, porque o anticoncepcional ela bloqueia o eixo, não tem
como a mulher tomar anticoncepcional e ter a produção endógena de Testosterona. Então é ‘batata’,
você pode dosar a Testosterona na mulher que usa anticoncepcional oral a maioria delas estará com a
Testosterona próxima de zero, não em praticamente produção endógena de Testosterona.
Rennan e nessa pequena passagem sobre Testosterona que aqui passamos eu queria voltar a falar da
vitamina D. Como é que é na prática, como é a tua canetada da vitamina D, para tentar voltar a
Testosterona para as pessoas.

Rennan Caminhotto
Geralmente quando há deficiência, eu prescrevo uma dose de 10.000 UI, que é uma dose bem tolerada
quando há deficiência, e há o acompanhamento a cada 2 / 3 meses com exames. A vitamina D, é
engraçado acabamos não tendo noção do todo, da amplitude da ação da vitamina D no organismo. Mas
de fato o homem ele fica com vigor, maior, uma capacidade física quando está sem deficiência de

85
Terapia pós-ciclo (TPC):é um regime dietético e de medicamentos feito por usuários de esteroides anabolizantes (AAS)
para compensar e minimizar o hipogonadismo decorrente do uso dos esteroides. O suposto objetivo é restaurar a produção
endógena normal de hormônio sexual depois que o uso do anabolizante é cessado, minimizando efeitos colaterais, como
atrofia testicular, diminuição da libido e depressão. Quando os AAS são colocados no corpo masculino, fazem com que o
corpo desligue sua própria produção de testosterona por meio do desligamento do eixo hipotalâmico-hipofisário-gonadal
(HPGA). HCG é comumente usado durante e após ciclos de esteroides para manter e restaurar o tamanho testicular, bem
como a produção normal de testosterona.
254
vitamina D, a mulher também, evidentemente, mas o homem também. Eu peguei poucos casos na
clínica de hipogonadismo, a grande maioria dos casos que peguei do hipogonadismo a deficiência da
vitamina D também estava presente, mas também com sobrepeso. Aí eram casos que, além da minha
abordagem eu tinha que encaminhar para o médico para a identificação da causa do hipogonadismo,
para um diagnóstico mais certeiro e até reposição em alguns casos.

Ítalo Marsili
Confesso que na minha prática de consultório particular, eu nunca peguei
um caso de hipogonadismo. Na faculdade e na residência, no hospital
universitário, sim eu peguei, mas no consultório particular nunca chegou
um caso de hipogonadismo.

Rennan Caminhotto
Eu acho que todos tinham excesso de peso, 130 kg, peso alto. Eu lembro
que peguei um caso de 75 de Testosterona Total, muito baixo, havia uma
síndrome metabólica, insulina lá em cima, muito peso e muita gordura corporal mesmo.

Ítalo Marsili
Com certeza, e isto é outra coisa que as Testosteronas muito baixa no homem, elas em geram fazem
parte de um outro quadro, de um quadro mais complexo, disto que estamos falando, de um estilo de
vida bastante prejudicado já. Então o sujeito tem hábitos alimentares que precisam ser regulados,
hábitos de sono, que precisam voltar para o lugar, o sedentarismo, claro uma visão de mundo muitas
vezes alterada e a parte do terapeuta muito importante. As vezes a pessoa tem uma visão de mundo de
desesperança, ou que o trabalho é tudo, ou que o prazer é tudo...É claro que isto vai ter repercussão,
das duas – uma, vai ter repercussão orgânica ou a causa orgânica é o motivo dessa visão de mundo, o
terapeuta tem que estar muito atento a isto tudo.

Rennan Caminhotto
Sem dúvida, outra questão do estresse, até me lembrei de um caso de uma doutora Amy Cuddy86 ela é
da área da Psicologia, ela estuda o estresse influenciando o cortisol e testosterona. Ela tinha uns estudos
muito interessante que eram estudos de posição corporal. Então a pessoa ficava dois minutos numa

86
Amy Cuddy: Em um estudo de 2010 duas pesquisadoras, Amy Cuddy e Dana Carley, analisaram como nossa química muda
com duas posições simples: a posição de poder ou a posição de fraqueza. A posição de fraqueza é o oposto: encolher o corpo
ou fechar os braços em sinal de proteção. Cuddy e Carley analisaram o que acontece conosco quando estamos em ambas as
posições por apenas dois minutos e sua conclusão é reveladora: se posicionarmos o nosso corpo com o gesto do poder,
conseguiremos um aumento de 20% de testosterona e a redução do cortisol em 25%. No entanto, se colocarmos o corpo
em uma posição de fraqueza, a testosterona cai 10% e o cortisol aumenta em 15%.

255
posição de ‘looser’ (perdedor) , que é uma posição retraída, ou outra posição as mulheres ficavam de
Mulher Maravilha, os homens de Super Homem numa posição de vencedor. E dois minutos assim nesta
posição, alteravam (estou citando de memória), mas aumentava de 20 a 30 % a concentração de cortisol
quando era a posição de perdedor e; concentração diminuía na posição de vencedor e a Testosterona
também uma faixa muito parecida. Provavelmente por pulsos, a Testosterona assim como o Cortisol
são hormônios produzidos na fora de pulsos. A ereção matinal, por exemplo, é decorrente de um pulso
que os homens têm no sono. É uma fase do sono específica que tem um pulso de Testosterona, por isso
a ereção matinal. Os interferia na tua capacidade orgânica. A importância, que comento com meus
pacientes que são sedentários, eu recomendo a musculação por exemplo, se você treina ‘peito e tríceps’,
a pessoa fica em forma de um ‘pombo’ , todo estofado. Imagina como fica a sua Testosterona ali, você
fica de peito aberto para o mundo. Então a Testosterona realmente é o mundo, e as pessoas acham que
é só tomar uma injeção disso ou repor, não, tem muita coisa desde estresse, a sono, a alimentação as
deficiências que podem influenciar.

Ítalo Marsili
Vou comentar mais duas coisas, essa que você indicou, que é uma das
coisas que tem que estar presente na anamnese também, que é sobre a
ereção matinal, que é um indicativo de saúde masculina. O homem que
não tem ereção matinal, terá que ser investigado, deve estar presente,
na maior parte dos dias da semana.
Outro ponto que gostaria de comentar, já falamos sobre hábitos
comportamentais relativos a alimentação, afim do sujeito emagrecer,
porque a gordura tem Aromatase e esta converte a Testosterona em
Estrogênio, então emagrecer é fundamental para manter os níveis séricos
de Testosterona, que tem todas estas funções biológicas importantes.
Outro ponto é o treinamento muscular de força, sabe-se que o estímulo muscular também tem a ver
com o aumento da produção da Testosterona, e vice-versa. Testosterona no lugar faz com que o sujeito
não tenha sarcopenia e o sujeito que dá o estímulo muscular para hipertrofia, ou seja de força, tem uma
tendência de aumentar os níveis de Testosterona também.
E aqui para nossos amigos terapeutas que atendem homem: homens que fazem musculação, em geral
não gostam de treinar membros inferiores, homens gostam de treinar braços, o homem que não
conhece musculação gosta de treinar bíceps, nada contra quem treina bíceps, mas bíceps é uma
musculatura muito pequena, ela tem duas cabeças, é um bíceps, o tríceps é uma musculatura maior que
o bíceps, então um treinamento de força de tríceps ele tende a aumentar a Testosterona que o
treinamento de bíceps. O que faz crescer o braço é o tríceps não o bíceps, o tríceps é o que envolve e
dá volume para o braço, o bíceps dá um pequeno contorno. O peitoral é uma musculatura maior que o
256
bíceps e o tríceps, os dorsais tem maior volume que os peitorais, porém os membros inferiores tanto os
quadríceps quanto os posteriores eles são a musculatura mais volumosa do corpo, então para a
finalidade de aumento da Testosterona é fundamental treinar perna, ou seja treinamento de membros
inferiores. Isso é bom ter em mente, por que estou falando isto para terapeuta e não educador físico?
Porque muitas vezes o terapeuta é o sujeito tem total confiança, faz uma grande transferência e o que
ele fala, em geral, o paciente tem que ouvir. O terapeuta tem que ter estas coisas na manga e na mente
para poder orientar. Não é que ele vá prescrever atividade física do paciente dele, enfim seria um pouco
de desvio de função, mas sei lá, se é um terapeuta que tem formação em educador físico pode fazer.
Mas estas coisas é importante ele ter em mente para poder orientar e saber das razões. Estamos aqui,
se detendo neste assunto porque isso é muito importante para a saúde biológica. Então treinamento de
força é fundamental, para o sujeito não ficar sarcopênico, para ter a Testosterona no lugar, pois esta não
tem só a ver com o drive sexual, mas com a cognição, a vitalidade e prevenção de saúde cardiovascular
e etc. Então musculação de membros inferiores é muito importante mesmo.

OUTRAS QUESTÕES ASSOCIADAS À BAIXA TESTOSTERONA

Todos devem tomar as medidas indicadas na aula: peso adequado, sono adequado, baixo estresse,
combate a deficiências nutricionais.

No homem, a Testosterona está associada à função sexual, mas é importante também para a cognição,
a memória e a atenção.

Níveis baixos de Testosterona podem gerar cognição alterada, atenção prejudicada, hipoviligância e
hipotenacidade.

A Testosterona também é o grande promotor muscular.

Baixa Testosterona gera tendência à sarcopenia (redução de massa muscular), que é um fator preditor
de morte, sobretudo em idosos.

Um idoso com pouca massa muscular está mais sujeito a não recuperação de pneumonia ou internação
no CTI, por exemplo.

Também há relação entre Testosterona alta e proteção cardiovascular, reduzindo risco de enfarte.

Por esses fatores, a dosagem de Testosterona deveria ser feita sempre. É importante pontuar que a
mulher também precisa de Testosterona.

Se tiver níveis baixos, ela pode sofrer todas as complicações mencionadas anteriormente; e uma das
causas de bloqueio da Testosterona em mulheres é o uso de anticoncepcional oral.

257
Nesse caso, será preciso criar uma estratégia específica. Se o paciente tiver feito uso de anabolizantes
sem acompanhamento médico, é necessário dosar Testosterona, FSH e LH, pois pode haver um quadro
de hipogonadismo, ou seja, as gônadas não produzem mais Testosterona.

Para reverter esse quadro, é necessária uma abordagem especial, que não será tratada aqui, mas tem
de estar no foco do terapeuta, pois nesse caso as medidas explicadas na aula dificilmente farão efeito.

258
Semana 07: INSULINA E DIETA LOW CARB

Esta aula aborda o conceito de resistência à Insulina, dieta Low Carb e seus impactos no humor dos pacientes

INSULINA E DINÂMICA METABÓLICA


A principal função da Insulina é o controle glicêmico.

O carboidrato que comemos chega à circulação através do intestino. Ele é digerido e conseguimos absorver a
parte mais elementar do nutriente, que é a Glicose.

Essa molécula é muito útil, pois é uma das principais fontes energéticas do organismo. Ela é essencial, por
exemplo, para o Sistema Nervoso Central.

Cérebro

Músculo
Fígado

Insulina
Gordura
Tecido
Adiposo

Carboidrato

Intestino

259
❖ A glicose é essencial para o Sistema Nervoso Central (SNC).

O excesso de Glicose na circulação é tóxico (glicotoxicidade)

❖ A glicose em excesso na circulação, como ocorre no diabetes, ocasiona diversas lesões no nosso
organismo:
❖ Lesões renais; lesões de vasos sanguíneos (endotélios, etc).
❖ Diversas funções são prejudicadas por este excesso.
❖ A glicose pode ficar no sangue numa faixa adequada. O excesso deve ser direcionada pela insulina
para os tecidos que vão utilizar;

Assim como ocorre no diabetes, o excesso ocasiona diversas lesões no organismo.

Por isso, a Glicose deve ficar em uma faixa adequada no sangue, e ser direcionada aos tecidos que vão
utilizá-la, o que acontece através do hormônio Insulina.

A Insulina direciona a Glicose para o músculo e para o tecido adiposo (gordura).

Sua principal função é manter os níveis de Glicose adequados na circulação.

❖ O excesso de Insulina prejudica diversas funções no organismo, por exemplo o fígado passa a ter
acúmulo de gordura, o que chamamos de Esteatose Hepática. Isto não é saudável para o organismo,
pois se não for tratado, esta Esteatose pode se transformar em Hepatite (não alcóolica). E esta
inflamação pode progredir para um câncer, para uma disfunção hepática, uma insuficiência hepática.
❖ Quando o fígado por excesso de glicose começa a transformá-la em gordura, começa também a
exportar gordura para a circulação na forma de TAG – Triacilglicerol ou Triglicerídeos (gordura que se
dosa no sangue) que circula no organismo.
❖ Outra coisa que fica desregulado é o colesterol (dislipidemia)
❖ A insulina também age nos rins como um controle do sódio.
❖ Age também no SNC e influenciando a Pressão Arterial de modo indireto. Quando a insulina passa a
não funcionar, estas funções ficam desreguladas. Pode-se ter hipertensão.

Entretanto, há situações em que a Insulina passa a não funcionar direito.

O organismo se torna resistente à ação do hormônio, por isso, produz-se cada vez mais Insulina para
manter a Glicose em níveis adequados, o que começa a prejudicar várias funções do organismo (por ex.,
acúmulo de gordura no fígado, colesterol desregulado, problemas nos rins e no Sistema Nervoso
Central).

Isso é a gênese do que se chama síndrome metabólica. O oposto disso é o Jejum.

260
Quando não nos alimentamos, não absorvemos a Glicose.

No entanto, não há com o que se preocupar, pois o fígado também tem capacidade de produzir Glicose,
o carboidrato não é um nutriente essencial.

A Adrenalina e a Noradrenalina também começam a funcionar mais, pois o jejum é uma situação de
estresse.

O tecido adiposo começa a liberar gordura na circulação em forma de ácidos graxos, que a musculatura
e outros tecidos e o fígado começam a usar como fonte de energia.

Se no excesso de Insulina o fígado produz e armazena gordura, aqui, ele a utiliza como fonte de
energia e passa a devolver para a circulação um outro metabólito.

Nesse processo, metabólitos começam a ser convertidos em corpos cetônicos, criando uma condição
chamada cetose, em que há um novo substrato energético para o Sistema Nervoso Central, garantindo
cerca da metade de sua energia (em condições normais de alimentação, a Glicose é o combustível
principal).

Ou seja, toda a dinâmica metabólica muda quando se está em jejum. Em 24 horas de jejum, essa
condição metabólica está estabelecida.

DIETA LOW CARB


Os corpos cetônicos também estão associados à dieta cetogênica, e uma delas é a Low Carb, quando se
reduz drasticamente a ingestão de carboidratos para que essa condição metabólica se instale no
organismo.

Ela favorece o tratamento da síndrome metabólica descrita anteriormente e também parece ter efeitos
benéficos na questão do humor.

Alguns pacientes se beneficiam muito com uma dieta Low Carb, justamente aqueles que têm síndrome
metabólica, isto é, excesso de triglicerídeos, gordura no fígado e resistência à insulina.

O profissional da nutrição que ainda insiste que essa é uma dieta perigosa está desatualizado; vários
ensaios mostram que ela é tão ou mais eficaz que outras.

Nossa ingestão habitual de carboidrato costuma ser muito alta. Cerca de 50% a 60% do valor calórico da
dieta do ocidental advém de carboidratos. Essa é a recomendação da OMS, inclusive.

Então, se alguém diminui esse consumo para 40% ou 30%, tecnicamente, já está fazendo uma dieta Low
Carb.

No entanto, isso está longe da adaptação vista no jejum prolongado, portanto, não é uma dieta
cetogênica.
261
Para que aquela condição se estabeleça, é necessária uma dieta very Low Carb, uma restrição mais
severa de carboidratos, que reduza o valor calórico total da dieta para 5%.

Em gramas, isso dá cerca de 20 g, 30 g de carboidrato por dia, o que torna necessário excluir da dieta
praticamente todas as frutas, cereais e grãos.

Alguns estudos sugerem que quando o indivíduo está em uma dieta cetogênica, a perda de peso tende
a ser maior, e o controle das taxas de síndrome metabólica parece ser superior a outros tipos de dieta.

Há estudos que também relacionam a dieta ao humor por meio de testes, e indicam que durante a fase
de restrição severa de carboidrato, parece haver uma melhora do humor. A hipótese é que os corpos
cetônicos têm sido associados a uma estabilização do Sistema Nervoso Central.

PRÁTICA CLÍNICA
Há dificuldades nos primeiros dias, antes de estar em cetose. E a manutenção também demanda muitas
mudanças de hábito.

Por isso, deve-se ser prudente, pois a dieta pode se tornar impraticável a médio e longo prazo.

Para pacientes que têm síndrome metabólica associada a transtornos de ansiedade, pode ser
recomendável, por exemplo, ter uma fase de estabilização, com dieta pouco restritiva de carboidratos,
mas com reeducação alimentar, suplementação e atividade física, tratando a ansiedade também com
terapia.

A perda de peso precisa ser tratada a médio e longo prazo, por isso, posteriormente pode-se usar a dieta
Low Carb, se for necessário.

O mais importante é prescrever a melhor dieta para o paciente, de acordo com suas circunstâncias.

COMENTÁRIOS ÍTALO MARSILI E RENNAN -SEMANA 07


RENNAN CAMINHOTTO

Na experiência clínica com pacientes ansiosos, notou-se que tanto técnicas de jejum intermitente (14h
ou 16h – tempo insuficiente para adaptação metabólica) quanto as dietas de restrição de carboidrato
não severas, podem piorar em vez de melhorá-lo.

Na opinião do Rennan, só há melhora no humor quando há corpos cetônicos.

Quadros de pânico, de TAG (Transtorno de Ansiedade Generalizada), são acentuados em dietas Low Carb,
não cetogênica.

Em casos que o paciente não consegue fazer uma dieta cetogênica, pode ser necessário não cobrar uma
dieta Low Carb, mas servir-se de outras estratégias, adaptar a abordagem, para tratar o sobrepeso e a
síndrome metabólica.
262
Há dificuldades nos primeiros dias, antes de estar em cetose. E a manutenção também demanda muitas
mudanças de hábito. Por isso, deve-se ser prudente, pois a dieta pode se tornar impraticável a médio e
longo prazo.

Na fase inicial não cobre tão intensamente a dieta Low Carb. Pode piorar o humor, e o cliente pode largar
a dieta, o tratamento. Faça uma fase de estabilização, um carboidrato mais ao final do dia, para um sono
melhor.

Para os psicólogos: e estiver com um cliente estressado pela dieta, entenda que a restrição não é fácil, a
mudança de hábito não é fácil para ninguém.

E se ele estiver fazendo uma dieta Low Carb não cetogênica, é possível que o humor tende a dar uma
piorada. Tente fazer outro tipo de dieta, restrição de gordura, contagem de calorias, que vai ser eficiente
para a perda do peso, mas não vai piorar seu humor.

Sugerir atividades físicas, suplementação.

Atualmente já existe suplementação de Corpos Cetônicos, sem restrição dos carboidratos.

Existem estudos experimentais onde a presença do Corpo Cetônico é um grande estabilizador do SNC.
Ainda não existem comprovações.

Há um psiquiatra que está tentando a dieta cetogênica em pessoas com Transtorno Bipolar. Os estudos
estão adiantados para os bipolares fazendo a dieta cetogênica ou usando suplementação, na forma de
sais ou álcool que estimulam a criação dos corpos cetônicos.

ÍTALO MARSILI

O início da dieta Very Low Carb é complicada para a maioria das pessoas, devido a dificuldades
comportamentais e aparece um certo mal-estar no início e isto é bem comum.

RENNAN CAMINHOTTO

Este mal-estar aparece como gripe Low Carb, aparece por um estado de diurese acentuada, a baixa
insulina vai favorecer a exceção de sódio na urina e isto faz a diurese. A alta ingestão de proteína também
faz isto e a diurese abaixa um pouco a pressão. Por isso a dieta Low Carb é boa para hipertensos. Neste
caso o tratamento deve haver uma ingestão de líquido e sal, não pode restringir sal e tem que tomar
bastante água.

E o principal motivo da dificuldade nos primeiros três, quatro dias, é porque nestes dias ainda não está
em cetose. Ainda está gastando o carboidrato da circulação e a proteína que está sendo consumida
mantém o estoque de glicogênese. Até este estoque realmente acabar, a pessoa fica mais para baixo. A
cetose aparece a coisa muda. O problema é se manter em cetose.

263
É uma mudança de vida, difícil de se manter. É algo impraticável a médio e longo prazo, a não ser que a
pessoa se identifique com a alimentação. Para os TAG, faça uma fase de adaptação.

ÍTALO MARSILI

A dieta Low Carb não é para o povo brasileiro, acaba sendo uma ruptura, pode ser considerada em
situações específicas. Nosso meio não é Low Carb, e esta ruptura pode gerar mais ansiedade, não só a
nível bioquímico, mas por ansiedade psíquica, por não conseguir se alimentar daquele jeito.

264
Semana 08: INGESTÃO E INFLAMAÇÕES
Esta aula aborda as funções do intestino, o processo de inflamação e suas repercussões no humor

PROCESSO DE DIGESTÃO E INFLAMAÇÃO

Quando nos alimentamos, a comida desce pelo esôfago e passa por um processo de digestão no
estômago, onde as proteínas particularmente são digeridas por desnaturação.

Em seguida, a comida parcialmente digerida chega ao intestino delgado, no duodeno.

O bolo alimentar sofre ação do suco pancreático, que é uma mistura de diversas enzimas, enzimas de
carboidratos, de gorduras, etc..

Em seguida, inicia-se o processo de absorção dos nutrientes, por meio de uma barreira intestinal, que
tem permeabilidade seletiva. Esta barreira é que define o que será absorvido ou não.

Quando a barreira intestinal é prejudicada em sua função seletiva, alguns problemas ocorrem:

❖ Ela perde a capacidade de selecionar o que é absorvido ou não;


❖ Moléculas do gênero de endotoxinas, proteínas e peptídeos não totalmente digeridos começam a
ser absorvidos, e isso não deveria acontecer.

Tudo isso pode desencadear processos de inflamação sistêmicos.

Trata-se de algo crônico, designado como inflamação subclínica.

❖ É uma endotoxina Lipopolissacarídeo (LPS) e quando isto passas a ser absorvido, a inflamação passa
a ser sistêmica. A LPS é uma molécula constituinte da membrana de bactérias gram-negativas e,
após a ligação desta molécula ao receptor TLR4 ocorre a ativação de diversas vias de sinalização as
quais aumentam a produção e secreção de moléculas pró-inflamatórias.

Quando as moléculas tóxicas entram no aparelho circulatório, ativam as células do sistema imune inato,
instalando um grau de inflamação no organismo que é subclínico, porque as características de
inflamação não são visíveis.

A inflamação crônica subclínica está na base fisiopatológica de diversas doenças, como a síndrome
metabólica, diabetes, câncer, entre outras.

Atualmente, há exames clínicos capazes de detectar essa condição, identificando se há risco baixo,
médio ou alto de inflamação. Geralmente, esse risco é associado a eventos cardiovasculares.

265
A maioria das pessoas está inflamada, principalmente se são sedentárias, não dormem bem ou têm
excesso de peso.

A inflamação não se restringe ao sistema digestivo, mas permeia todos os sistemas do organismo, como
o Sistema Nervoso Central.

Até pouco tempo, este era considerado um órgão com privilégios imunológicos, por também servir-se
de uma barreira seletiva (barreira da massa encefálica).

No entanto, essa barreira também se afrouxa durante a inflamação, permitindo a entrada de células do
sistema imune, principalmente citocinas inflamatórias, que prejudicam o metabolismo geral de diversos
neurotransmissores.

A síntese da Serotonina, por exemplo, é prejudicada pela inflamação. A recaptação da Serotonina na


Fenda Sináptica, pode ser prejudicada.

Uma vez inflamado o organismo, o sistema imune começa a estimular o sistema nervoso a produzir
moléculas neuro protetoras. Esta inflamação faz com que o cérebro produza menos Serotonina.

Para serem sintetizadas, elas precisam de precursores – os mesmos dos neurotransmissores.

Por exemplo, é necessário L-triptofano tanto para produzir ácido quinurênico, quanto para produzir
Serotonina.

O estado de inflamação dá prioridade ao uso de L-triptofano para o ácido quinurênico, e não para a
Serotonina, o que influencia diretamente na qualidade do humor.

A concentração de ácido quinurênico aumenta, mas sua ação protetora só se realiza em doses baixas.
Assim, em vez de proteger, o ácido quinurênico passa a inflamar mais o organismo, instalando a
desordem no Sistema Nervoso Central.

Alguns estudos mostram essa dinâmica em pessoas sensíveis ao consumo de glúten. O glúten causa
inflamações no intestino.

Notou-se uma piora no humor após a ingestão, com sintomas de ansiedade, irritação e embotamento
cognitivo. A principal hipótese é que a inflamação causada pelo glúten chegou ao Sistema Nervoso
Central, alterando a dinâmica dos neurotransmissores.

10% de pessoas com doenças celíacas, tem doenças psiquiátricas.

Como conclusão, os estudos apontam que a eliminação do glúten pode representar uma estratégia
eficaz para tratamentos de humor em pessoas que têm algum distúrbio.

A principal hipótese é que o intestino para de ficar inflamado, o que gera melhora no humor.

266
O glúten é um exemplo, mas a redução de consumo vale para qualquer outro tipo de agressão intestinal.

INFLUÊNCIA DA MICROBIOTA INTESTINAL


Em algumas pessoas, é a microbiota que causa inflamação. Todos têm diversos tipos de bactérias que
colonizam o intestino.

As cepas de bactérias variam de acordo com o estilo de vida, hábitos alimentares e até a genética.

Ao que tudo indica, alguns tipos são benéficos para certos casos, e outros tipos são ruins. Um intestino
colonizado por bactérias ruins tende a ser mais inflamado, enquanto as bactérias boas o deixam menos
inflamado.

Um exemplo é um estudo que acompanhou paciente com depressão: parte deles recebeu probióticos,
outra parte recebeu placebo. Os primeiros tiveram grande melhora, reduzindo os sintomas
depressivos.

Essa é uma área que vem sendo bastante estudada. Com os avanços, as orientações de tratamento
mudaram.

Há alguns anos, era comum recomendar uma suplementação genérica de probiótico ao paciente com a
microbiota alterada (disbiose).

Hoje em dia, os especialistas alertam que a situação pode até piorar, dependendo da cepa
suplementada. Portanto, deve-se esquecer a idéia de suplementar altas doses de diversas cepas para
qualquer pessoa.

Para suplementar probióticos, é necessário especializar-se nesta área; só assim as prescrições serão
adequadas e seguras.

POSSIBILIDADES DE TRATAMENTO
A suplementação não é a primeira alternativa. Antes de tudo, é preciso regularizar ao máximo a
inflamação por meio dos hábitos alimentares.

Temos de melhorar a alimentação excluindo ou, ao menos, diminuindo os alimentos inflamatórios para
cada pessoa, especificamente.

O leite, por exemplo, tem potencial inflamatório. Mas se esse potencial inflamatório não se concretiza
na pessoa, ela pode consumi-lo.

Algumas pessoas estufam se comem pão; outras, não.

Portanto, um modo simples e prático é perguntar-se o que acontece quando se consome o alimento: há
estufamento, gases, mudança na frequência ou aparência das fezes?

267
Muitas pessoas passam a vida convivendo com uma inflamação acreditando que isso é normal. Por isso,
pode ser necessário “limpar” a alimentação do paciente e reintroduzir os alimentos aos poucos.

Outro ponto é a raspagem de língua, técnica milenar da medicina indiana. Tradicionalmente, ela afirma
que a limpeza da língua aumenta a capacidade de digestão e função intestinal. Muitos estudos mostram
que a raspagem de língua muda toda a microbiota, a flora bacteriana da boca, e melhora a saúde bucal.

Na prática clínica, constata-se a melhora significativa no intestino em até uma semana de raspagem de
língua. É uma técnica fácil, elimina a borra branca que se acumula na língua, e pode ser feita com um
raspador de cobre ou uma colher.

SUPLEMENTAÇÃO ANTI-INFLAMATÓRIA

Outro ponto é a suplementação anti-inflamatória para o intestino.

Glutamina:
❖ Aminoácido muito utilizado por dois tipos de células – enterócitos (compõem a barreira intestinal) e
leucócitos (células do sistema imune) – que têm por característica um processo de replicação rápido
e, por isso, consomem bastante glutamina.
❖ É válida para ajudar o intestino a restabelecer-se após um quadro de inflamação.
❖ Doses de 5, 10 e até 15 g/dia;
❖ Podem ser fracionadas ao longo do dia.
Ômega 3:
❖ Molécula anti-inflamatória presente no óleo do peixe. Recomendável para qualquer tipo de
inflamação, com grandes benefícios na inflamação intestinal.
❖ A dose pode variar entre 1000 a 15000 mg de EPA mais DHA, que são ácidos graxos, são o Ômega 3
de fato.
❖ Já o óleo do peixe não é o ômega propriamente; por isso, quando se opta por ele, é necessário olhar
na tabela nutricional para identificar a concentração de EPA e DHA e calcular quantas cápsulas ingerir.

Quercetina:
❖ Tem sido muito usada em caso de COVID por seu aspecto antiviral.
❖ É um suplemento anti-inflamatório geral, ao qual o intestino responde bem.
❖ Recomenda-se a dose de 250 mg duas vezes ao dia ou uma dose de 500 mg.
❖ Tem efeito estimulante, semelhante à cafeína; é preferível consumila durante o dia.
Cúrcuma longa:
❖ Utilizada para endometriose óssea, cólica e diversos tipos de inflamação.
❖ O intestino também responde bem à suplementação.
❖ RDeve-se notar a tolerância do paciente; precisa ser suplementada junto à piperina, componente da
pimenta preta que facilita a absorção (1 mg de piperina para cada 100 mg de cúrcuma).
268
❖ Recomenda-se começar com doses menores.
Vitamina A:
❖ Reconhecida pela capacidade de beneficiar epitélios. Costuma-se indica-la para quem está com a pele
ruim, por sua função antioxidante.
❖ Como as células da barreira intestinal são, de certa forma, epiteliais, ela ajuda na recomposição da
barreira intestinal.
❖ Pode-se suplementar até 10.000 UI/dia, mas doses de 2.000 Ui já são bastante úteis.
❖ Deve-se considerar a vitamina A que o paciente já ingere (em alimentos como ovo ou fígado, p. ex.),
pois seu acúmulo no organismo é tóxico.
Psyllium:
❖ Fibra que, por ser pouco fermentável, não tem aspecto anti-inflamatório. Mesmo assim, aumenta a
umidade das fezes, favorecendo a evacuação e a regularização do trânsito intestinal.
❖ Dose de 5 a 15 g/dia; ou uma a duas colheres de sobremesa.
Inulina:
❖ É fermentável, servindo de alimento para as boas bactérias.
❖ A microbiota que se alimenta da Inulina começa a povoar mais o intestino.
❖ Com aumento da boa microbiota, tem-se uma fonte de ácidos graxos de cadeia curta (anti-
inflamatórios).
❖ Manipular em torno de 1g para alcançar bons resultados.
❖ É necessário tomar cuidado com a saúde intestinal, principalmente quando se está tratando o
humor.
❖ Importante procurar saber sobre o funcionamento intestinal do paciente, para melhorá-lo.

269
ANTROPOLOGIA DA
MODA

PAULA SERMAN

270
SEMANA 01: MODA

Esta aula vai discorrer sobre o papel da moda na vida humana e a importância da indumentária e adornos
para que o indivíduo desenvolva melhor as suas funções, serviços e papéis aos quais foi chamado

A APARÊNCIA COMO ELEMENTO DE INFORMAÇÃO

❖ Vamos começar a conversar sobre a antropologia da moda. A antropologia da moda é uma área de
estudo que visa entender a interferência e a influência dos adornos da roupa, dos ornamentos na
vida humana. Toda a história da vida humana foi contada com alguma roupa, com algo que cobriam,
que protegia o ser humano.
❖ Todo e qualquer elemento da imagem comunica alguma coisa, do fio de cabelo até a ponta do pé, a
unha, o brinco, a barba, os óculos, tudo comunica. Tudo é o código visual que diz alguma coisa, que
transmite uma mensagem de quem está vestindo, de quem tá usando isso.
❖ E por que a gente está tá falando sobre isso aqui ? Porque quando lidamos com pessoas, quando a
cuidamos de pessoas, precisamos observar a aparência da pessoa. A aparência é a primeira
informação de alguém que entra no consultório, alguém que entra numa sala. É o primeiro elemento
fundamental, é um elemento que nos dá muitas informações, sobre quem é aquela pessoa, como ela
se instala no mundo, como ela habita no mundo, qual o diálogo que ela quer estabelecer com quem
a vê.
❖ Moda em inglês se pronuncia ‘fashion’ , que vem de uma palavra francesa que significava ‘modo /
maneira’. Começou a falar em moda na Idade Média mais ou menos no século 15 que esta ideia
começou a circular.

A palavra moda vem do latim “modus” que significa maneira. O termo se popularizou na Idade Média,
quando o desenvolvimento das cidades e a reorganização da vida das cortes levaram ao aumento do
convívio entre as pessoas. Essa aproximação na área urbana levou ao desejo de imitar — a nobreza
criava, a burguesia imitava —, e assim começou a girar a engrenagem que conhecemos até hoje.

❖ Então desde esta época a moda serviu para distinguir, para estratificar, distinguir uma pessoa da
outra, uma classe social da outra.
❖ Ao longo de toda história a moda sempre acompanhou o contexto social econômico. Se dormirmos
durante 20 anos, podemos acordar pegar uma revista, hoje não seria revista, seria uma revista
virtual / site um perfil nas redes sociais de moda, e iremos conseguir entender de uma certa forma
como é que está o mundo, como homem, o ser humano está se instalando no mundo, como que
estão as relações interpessoais, as relações homens / mulheres.

271
❖ Eu recomendo um vídeo, muito interessante, que está disponível no YouTube, que se chama ‘ 100
anos de moda em 100 minutos’. É um vídeo de 2013, mas ele ainda é muito recente e ele mostra
toda evolução da moda ao longo de 100 anos e mostra também essa questão do comportamento.

A moda, desde os tempos mais antigos, sempre acompanhou o contexto social e econômico,
distinguindo não apenas classes sociais, mas sobretudo o indivíduo. Todo e qualquer elemento da
imagem comunica algo e a aparência é a primeira informação que uma pessoa transmite.

Por isso, todo profissional que cuida de pessoas, precisa observar a aparência do sujeito que se apresenta
diante dele, afinal este primeiro elemento fornece muitas informações sobre quem é aquela pessoa,
como ela se instala no mundo e qual o diálogo que ela quer estabelecer com quem a vê.

❖ Então a moda não se restringe somente aquela questão de ‘ah o que está em alta, o que é tendência,
que não é, o que está na passarela’. Isso tudo é um reflexo da pessoa e é nisso que eu vou focar. Na
verdade quem importa, o protagonista da moda é a pessoa, a pessoa que veste a roupa, é quem usa
acessório, é quem usa o adorno. Essa pessoa ela está comunicando, ela está falando alguma coisa,
quando ela coloca ‘ um apetrecho´. Na verdade ela está comunicando com intenção ou não! Ela pode
estar comunicando, bem ou mal, mas está comunicando. Então é isso que importa é a pessoa, é a
protagonista da moda
❖ Não se trata da gente falar de um pedaço de pano cobrindo alguém, não estamos falando de
instalação das pessoas na vida, na forma como essa pessoa habita o mundo.

A INFLUÊNCIA DA MODA NAS QUESTÕES DO COTIDIANO

❖ Como estamos falando de pessoas, vamos falar algumas características importantes do ser humano.
O ser humano ele tem uma intimidade, que seria isso? A intimidade é o mundo interior, é aquilo
que só ele conhece, o mundo vivo, criativo, da intimidade que brota a criatividade, da intimidade
que brota as ideias, os sonhos, os desejos, aquilo que a gente tem de mais íntimo está aí. Temos o
desejo de manifestar intimidade, manifestamos através do corpo, através da roupa. No entanto
queremos proteger essa intimidade, a intimidade não tem que estar esparramada, não tem que
estar exposta.
❖ Então temos um instinto natural de cobrir a intimidade, que chama pudor ou vergonha. Ao mesmo
tempo que é um desejo do ser humano manifestar esse mundo interior, é também um desejo
proteger um pouco ele.
❖ Essa intimidade é manifestada livremente. O ser humano ele decide o que que ele quer mostrar e o
que ele não quer, o que ele quer expor e o que ele não que, porque ele tem liberdade é um ser livre,
ele decide, ele tem a capacidade de escolher.

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❖ A liberdade permite ao ser humano a vida biográfica, que é superior às suas necessidades, aos
imperativos da realidade e a liberdade permite que o ser humano ame.
❖ A pessoa também tem uma condição de diálogo, o ser humano ele tem uma necessidade de dialogar,
de entregar o que ele tem dentro, para que alguém receba. Tudo isso está relacionado ao vestir, está
relacionado a esse ato diário, habitual, cotidiano, que todos nós temos que é o ato de se vestir.

O ato de vestir-se — e despir-se, por consequência — é puramente humano. Dessa forma, por meio do
vestuário, o ser humano comunica a sua essência em vários níveis. A moda, portanto, não se limita à
questão de tendência daquilo que está na passarela e tampouco a fornecer elementos que escondam a
intimidade do ser humano. Ela se apresenta, quando as pessoas buscam algo a mais.

❖ Esse ato de vestir são puramente humano, e o desvestir também. Não sei se vocês já pararam para
pensar nisto, mas só o ser humano se veste, ainda que a gente tem um bichinho de estimação e que
ele use uma roupinha... mas não foi ele que foi no armário para botar roupinha nele.... foi o dono
que colocou uma roupinha, que quis colocar aquela roupinha para trazer uma personalidade a ele,
para proteger do frio, enfim só o ser humano se veste, só o ser humano se despe também. Dessa
forma o ser humano comunica essência em vários níveis.
❖ Tem uma personalidade da área moda Alfredo Cruz ele diz que ‘Há que se distinguir entre cobrir o
corpo e adorná-lo. Se consiste somente em proteger o corpo do frio, é uma necessidade primária.’
Como de um animal de estimação, vamos proteger o corpo do frio. Nós seres humanos temos uma
necessidade além de só nos cobrirmos no frio, nos protegermos do sol, temos necessidade além.

A pessoa é a protagonista da moda. É ela quem veste a roupa, quem usa o acessório ou o adorno e é,
portanto, essa pessoa que está transmitindo uma mensagem.

❖ A moda aparece, quando buscamos esse algo mais do que uma simples satisfação de uma
necessidade de material. A moda humaniza a nossa presença física, concreta, nosso modo de estar
com a roupa. Então vestir não somente cobre o corpo, mas ele também carrega de sentido
expressividade a nossa presença física.

Por isso o ato de vestir-se interfere profundamente em todo nosso dia, em toda nossa vida e também
nas nossas. A Antropologia da Moda é a área de estudo que visa entender essa influência indumentária
e ornamental na vida humana. O objetivo deste curso, por sua vez, é ensinar quais os elementos
compõem uma boa imagem, para que ela possa ser uma ferramenta de amadurecimento para cada um.

273
A MODA COMO FERRAMENTA DE AMADURECIMENTO

Vestir-se é a decisão de como se apresentar e qual mensagem transmitir. É, em certa medida, a forma
possível para controlar o comportamento de quem nos vê. Este ato não diz respeito somente à pessoa
que se veste. Por esse motivo, vestir-se é um ato de responsabilidade, que provoca no outro algumas
respostas e reações.

❖ Quando a minha roupa não traduz minimamente quem eu sou, eu sou igual todo mundo e mais do
mesmo. Vestir-se é decidir como que eu me apresento, a mensagem que eu transmito, e como eu
posso controlar em certa medida o comportamento de quem me vê. Esse ato também não é algo que
só diz respeito a mim, não é algo que diz respeito a quem veste. Vestir é um ato de responsabilidade
porque a gente provoca nos outros alguma resposta, alguma reação e muitas vezes a uma questão
nesse ato de vestir-se, nesse ato diário.
❖ Certamente essa é a causa ou a consequência de questões nas relações conjugais, na atividade
profissional, na relação com os filhos, na própria relação consigo mesmo, tem alguma questão
financeira relacionada no ato de alimentar. Essa questão de vestir e o ato de alimentar, eu acho que
estão estreitamente relacionados, na organização pessoal, na educação.

O cuidado com a própria imagem é, portanto, um dos centros da estrutura humana saudável. O ser
humano saudável ele cuida e tem um apreço pela própria imagem, uma vez que a forma como nos
vestimos interfere profundamente no nosso comportamento, na nossa postura, instalação na realidade
e na nossa consciência.

Se não nos vestimos de acordo com o nosso papel social, ficamos desencaixados, perdidos, sem eixo,
sem direção. O ato de se vestir, mesmo considerado como algo corriqueiro, interfere profundamente
em todo nosso dia, em toda nossa vida e nas relações. Por isso, ter uma boa imagem é primordial .

❖ Então o meu objetivo nesse curso é ensinar quais os elementos que compõem uma boa imagem, para
que ela possa ser uma ferramenta de amadurecimento para cada um.
❖ E o que é basicamente compõe uma boa imagem? O que faz com que a gente se vista bem? Bom é
preciso um pouco de conhecimento próprio, conhecimento de quem eu sou, do que eu quero, para
onde eu vou, para que isso possa ser imprimido na minha indumentária.
❖ Depois é preciso conhecer também os códigos visuais que vão traduzir essa mensagem. É como se
fosse uma linguagem nova, que aprendemos para poder se comunicar. Esses códigos eles estão
dentro dos estilos pessoais. É importante que a gente tenha um domínio do nosso próprio corpo é de
entendermos o nosso corpo, a forma do nosso corpo aquilo que cai melhor, aquilo que nos veste
melhor, que está de acordo com a nossa silhueta. Isso também é uma das grandes dores do vestir,
esse descompasso entre a silhueta e a roupa

274
❖ É importante sabermos quais são aqueles elementos que sujam a nossa imagem, aqueles elementos
que dão uma empobrecida, que fazem com que a gente transmita uma mensagem de descuido, uma
mensagem de desleixo, ou uma mensagem desconectada mesmo com a nossa realidade.
❖ É importante também a gente saber que dentro do nosso ambiente de trabalho, como que eu me
visto? Também é bem relevante que a gente conversa sobre a Beleza, sobre Elegância que são
elementos importantes no vestir. Há muita confusão com relação a isso, com relação o que é Beleza,
o que é ser elegante, se elegância tem a ver com alto poder aquisitivo ou se todo mundo pode ser
elegante. A questão do bom gosto, como que eu posso ter um bom gosto, como que eu posso
aprimorar isso?
❖ Por último é importante que a gente entenda o que está envolvido nessa questão do vestir em termos
de comportamento, todo esse ato ele está impregnado de virtudes, impregnado de bons hábitos, de
boas inclinações, que vamos exercitando, conforme vamos nos arrumando, conforme vamos
construindo nossa imagem, vamos ganhando estes hábitos.
❖ Meu objetivo aqui é trilhar esse passo a passo, ensinar esse passo a passo, de como podemos
aprender esses códigos visuais como que a gente pode se comunicar melhor com a nossa imagem,
fazendo com que isso tenha um impacto em todo nossa vida, como uma a ferramenta de
amadurecimento humano; como uma ferramenta de instalação no mundo; como uma ferramenta de
diálogo; um diálogo intencional, um diálogo consciente com as pessoas demais.

PAPO ESTILISTA ÍTALO MARSILI E PAULA SERMAN – SEMANA 01

ÍTALO MARSILI
Queria agradecer, pela reflexão sobre a pessoa e a moda, mas a moda não entendida como... muitas
vezes a gente está nesse ambiente virtual, enfim de Instagram, Facebook etc. tendem a entender a moda
como puro ‘fashionismo’, o que tem seu lugar, não estamos falando mal deste assunto, tem de fato seu
lugar, que é um aspecto mais técnico por assim dizer com uma certa tendência com uma certa intenção.

Mas você propõe uma reflexão mais profunda acerca desse tema, eu queria que a gente pudesse
explorar isso aqui, fazendo uma reflexão a partir da nossa experiência, enquanto médico. Você já se
apresentou como médica, já no início dessa aula, desse modulo. Você é geriatra, nos conhecemos há
muito tempo, toda sua rotina e sua jornada no setor de cuidados paliativos, de pacientes terminais com
câncer.

Sempre que a gente entra num hospital, pelo menos para mim, eu não posso deixar de perceber uma
certa brutalidade que acontece com os pacientes, não tanto pela sua condição evidente, estou
refletindo sobre uma outra coisa aqui. Mas por aqueles panos que se jogam em cima deles, aqueles

275
aventais que se jogam em cima deles, não tem nenhum tipo de cuidado, aquilo é um recorte quadrado
e cobre-se aquela pessoa como a gente cobre uma estante para não pegar poeira. Então quando a gente
está falando de moda e de vestimenta, de indumentária, eu gosto da tua proposta de reflexão acerca
da pessoa humana, pelo ângulo dignidade. Se por um lado a gente veste as pessoas, de fato elas estejam
belas e chamem atenção uma certa intenção específica, seja a intenção de se apagar, de se acender,
de tornar sexy, de se tornar mais pensativa etc., isso é possível a gente fazer com recursos da
indumentária.

Mas tem uma coisa que chama muito a nossa atenção, tem um paciente lá no CTI ou na enfermaria do
hospital, coberto por um pano, com uma cor também bastante duvidosa, por assim dizer no ponto de
vista estético, e no geral é um branco, ou um verde água, ou azul piscina na melhor das hipóteses, com
emblema do hospital, indicando que é um tipo de móvel que está por ali, ou que ele é cujo alguém que
se apaga e aparece um quê, um portador de doença.

Eu acho que vale a pena fazer uma reflexão, a partir desse absurdo, que é uma das formas de se vestir,
por assim dizer do nosso tempo, que marcam uma fronteira, que é a fronteira do sujeito que já está
quase morrendo, do sujeito que ele tem ali uma perda, por assim dizer, da identidade, uma perda do
nome, e se aventura número, se aventura uma doença, se aventura um diagnóstico e se perde de algum
modo a história mais profunda, a história mais complexa daquele sujeito, inaugurando somente a
história da doença, uma doença a ser cuidada, uma doença a ser abordada. É claro que quando isso
aparece, tem atenção dos clínicos e psicólogos e dos enfermeiros que estão acompanhando estes
pacientes, esses pacientes acabarem também esquecendo que tem uma pessoa ali. Queria que você
explorasse um pouquinho esta conversa entre esse o modo de se vestir, a dignidade, futilidade, acho
que seria muito proveitoso para inaugurar este módulo.

PAULA SERMAN
Veio um filme assim na minha cabeça, quando você estava falando, porque essa minha atuação atual,
certamente teve uma semente, na época que eu estava com a paciente terminal, pacientes terminais
que de fato perderam.... a maioria dos pacientes que estão nesse estágio, principalmente por uma
doença acabam de desfigurando, tirando a forma, compromete a forma humana dele. E esse adorno
que a gente pode colocar, ele resgata essa forma humana. O adorno, a indumentária vem para
humanizar em qualquer situação, principalmente nesses casos, mais limite em que o ser humano já está
pela própria doença desumanizado.

De fato assim há um olhar muito pouco humano, um olhar que não capta a dignidade, é algo perceptível.
Na minha atuação, com paciente terminais, era muito interessante perceber quando eles iam, tinha
uma atividade, .... para os pacientes que conseguiam se locomover até um determinado local, que se

276
chamava, era um ‘day care’ onde eles tinham cuidado, cuidados de cabelo, unha. Quando os pacientes
não podiam ir, vinham os voluntários.

De fato era impressionante como que o próprio comportamento deles, diante da própria doença, diante
da dor, era muito diferente, a gente podia inclusive mensurar... Vamos supor, qual era a métrica, no
caso era um resgate de morfina, existiam muito menos resgate de morfina, muito menos doses
adicionais de morfina, para os pacientes que tinham dor, quando eles passavam por esse cuidado da
aparência, esse resgate da humanização, esse resgate de saúde, digamos assim, que uma maquiagem
trazia, que um corte de cabelo, uma barba feita, uma unha feita, fazia uma mudança de roupa inclusive.
Também a forma como os próprios profissionais de saúde se dirigiam a eles, olha que coisa,
impressionante. De fato precisa haver esse resgate mesmo, e essa intervenção, uma postura ativa dos
Profissionais de Saúde com relação a esse aspecto da estrutura humana.

A MODA COMO INSTRUMENTO AO SETTING TERAPÊUTICO

❖ A moda tem essa coisa da futilidade, esse falso pensamento, na verdade não é tão falsa assim, porque
em algum momento, para algumas pessoas, em algumas situações, que de fato aquilo pode ser fútil
mesmo, mas a gente não pode ficar aí nesse caminho, nesse pensamento. O vestir, indumentários, os
adornos trazem esse eixo, eles nos ajudam a ter essa consciência de nós mesmos, nos ajudam
humanizar mesmo a nossa presença física, como disse essa personalidade da moda.

Vestir traz consciência e humaniza a presença física. Por isso, é tão importante ao profissional de saúde
ter este olhar para aparência como elemento primeiro, que traz a visão do todo e das partes. É o primeiro
dado, fundamental para anamnese, para o diagnóstico e é um caminho de intervenção terapêutica.

❖ Quando você devolve para pessoa, principalmente a pessoa que está doente, quando você devolve a
forma, quando você devolve a cor, quando você devolve a beleza, o detalhe, o capricho, você devolve
um pouco de vida, aquilo de vida que falta nela. É claro que você não devolve tudo, mas é um caminho
de intervenção terapêutica, é um braço da intervenção terapêutica, que jamais pode ser esquecido,
que infelizmente não é nos ensinado. Não aprendemos isto na faculdade, a gente aprende isso de
outras formas, quem aprende é de outra forma, mas faz parte desse eixo da existência humana.

ÍTALO MARSILI

277
Eu percebo que esse assunto da vestimenta, sobretudo como se fosse
uma curva, uma curva de Gauss87 vamos colocar assim, quando
existe um ponto ótimo do vestir, sendo que para trás, se você está
desatento com a indumentária, com a vestimenta como você se
‘coisifica’, como por exemplo, esses casos de pacientes no hospital
são simplesmente cobertos com um pano, que é um pano sem
intenção por assim dizer, uma intenção funcional meramente. Está coberto ali, porque também não é
vai ficar com as coisas a mostra.

Então o sujeito se coisifica e esse ano ele pode ir se humanizando, ele pode ir dando uma intenção, pode
ir ganhando cor, ganhando textura, pode ir ganhando forma, revelando aquilo que quer se revelar,
escondendo aquilo que quer esconder etc. até que se chega num ponto chama ótimo no qual a
intimidade da pessoa aparece e depois entra todo grande campo da frivolidade onde começa a se
acrescentar supérfluos desnecessários. Então aí que vai também, eu acho que de cada circunstância, de
cada caso, para determinada pessoa um chapéu pode ser absolutamente supérfluo, para outra não e a
gente vai ter oportunidade de discutir isso aqui ao longo do seu curso do modulo, mas eu vejo como
uma curva, na qual a gente precisa.

Uma das funções do terapeuta, do psicólogo, do consultor de imagem & estilo, é encontrar exatamente
esse lugar, esse range, essa faixa na qual a pessoa amplifica sua dignidade, na qual ela revela mais a sua
essência, na qual ela não perde sua intimidade, na qual ela pode exercer melhor sua liberdade de ser
aquilo para qual ela pretende ser . Então essa é um pouco a ciência, gente ganhar recursos técnicos,
recursos antropológicos, para poder entender onde se dá esse lugar, o que para aquela pessoa é menos
e o que para aquela pessoa é mais.

Veja, ninguém vai dizer que, por exemplo, um hábito.... via uma foto esses dias, por acaso entrando
aqui, eu vi a foto de uns desses irmãos de caridade numa missão dessas de paz, no Haiti se não me
engano e um desse irmão de caridade, religioso, estava com uma pessoa no colo né uma criancinha no
colo, resgatando de algum lugar terrível, era uma foto. Esse sujeito ele está com entre aspas com um
‘pano marrom cobrindo’. Acho que vale a pena investigar qual a diferença desse pano marrom e do pano
do hospital, porque aparentemente parece a mesma coisa, mas não é a mesma coisa. Um você tem um
sujeito doente no hospital, doente, diminuído, olhado só por um ângulo dos médicos ali. É um fígado, é
um rim, um baço, é uma perna, é um câncer e por outro lado tem uma pessoa em missão, gente ativa

87
Curva de Gauss (curva em forma de sino) é um gráfico de distribuição normal de um determinado conjunto de dados e
representa uma função que possui propriedades peculiares. Este nome se deve à suposição que o cientista Gauss tenha sido
a primeira pessoa a fazer uso de suas propriedades. A aplicação desta função em estatísticas é fundamental, pois define a
probabilidade de ocorrência de certos eventos.

278
desprendida, não está presa a nada, ela não leva quinquilharias em sua bagagem, ela pode sair do Brasil
e ir para o Haiti, para dar sua vida por aquele pobre, que ele nem sabe quem é, que ele nem conhece.
Aparentemente é a mesma coisa, são dois panos, só que um é marrom e o outro branco. Mas em ação
não é verdade que revela duas coisas completamente distintas.

A IMPORTÂNCIA DA ELEGÂNCIA
PAULA SERMAN
❖ Eu sempre falo assim, a peça, ela nunca está sozinha, as roupas são para as pessoas, quem é mais
importante nessa história? É quem está dentro da roupa e qual é a função essa pessoa exerce? Quando
a gente coloca um pano marrom, numa pessoa que tem uma função de caridade, de entrega, de
serviço total, disponibilidade total de serviço a outro, a gente tá comunicando isso com esse pano
marrom: simplicidade, entrega, desprendimento, dá lugar para que uma outra pessoa viva nele, para
que ele possa se dar ao outro, para que ele possa exercer com toda a liberdade essa função.

A roupa está para o ser humano como a armadura está para o soldado: ela não pode prender, mas ao
contrário, precisa trazer mobilidade, ao mesmo tempo em que o protege para que execute a sua função.
A roupa, portanto, precisa nos ajudar a desenvolver o nosso papel no mundo, o nosso serviço. Neste
ponto, a elegância é a medida perfeita, que auxiliará na escolha da melhor roupa para o desenvolvimento
de uma função. Nem mais e nem menos.

❖ Eu costumo dizer que a roupa é uma armadura, mas não é uma armadura no sentido de nos prende.
Um soldado quando vai para uma guerra, ele precisa que a armadura que faça o quê? Que proteja,
que proporcione mobilidade para ele, ao mesmo tempo que protege que tem a carapaça, vai permitir
os movimentos para que ele lute. Na verdade hoje em dia as coisas são um pouco diferentes nesse
campo, mas eu gosto muito de ver filmes e séries antigas que mostra um pouco mais de valentia, de
corpo a com a corpo. E é muito interessante isso como que é aquela armadura ela não encarcera, é
uma armadura que ajuda a executar a função.
❖ Então a nossa “armadura” ela precisa ser dessa forma. Qual é a nossa função? Qual é a meu serviço?
A quem eu estou servindo, para quê, o que eu estou fazendo, e a partir daí eu vou buscar aquilo que,
não é nem mais nem menos. Eu vou fazer eu vou eleger aquilo que é melhor. E aí a gente eu gosto
muito dessa questão, de tocar nesse ponto da elegância, que é exatamente essa medida, que você
falou.
❖ A pessoa elegante ela de fato elege o melhor, mas, o melhor para quem? Não é o melhor para mim,
é o melhor para ela. Às vezes me perguntam: ‘Qual é a melhor roupa para isso?’ Eu não sei, a melhor
roupa é aquela que te serve, que serve para o teu estilo de vida, para tua condição financeira, para
tuas atividades diárias, dentro da situação geográfica, da tua geográfica do clima onde vive, então
tem todas estas variáveis que precisam ser consideradas.

279
A melhor roupa é, portanto, aquela que se encaixa no estilo de vida, na condição financeira, nas
atividades diárias, no contexto, clima, condição financeira e geográfica de uma pessoa. Essas variáveis
têm que ser consideradas e o sujeito que as equilibra tem domínio de si e da própria vida, ela não se
excede e nem carece.

❖ E a pessoa elegante, ela consegue medida , a pessoa elegante é essa pessoa que tem domínio,
domínio de si, domínio da própria vida, ela tem a rédea da própria vida. Por isso ela não se excede
e também não cai por menos.
❖ Eu vejo um movimento de menos, de uma certa rejeição. A roupa, a beleza, é um pouco de medo, o
medo de me vestir bem, medo de enfim.... o que eu vou provocar no outro, e se eu fizer outro pensar
algo ruim, uma certa rejeição a beleza, a uma aparência bonita, uma aparência que de fato aparece,
porque a gente aparece, a gente não é invisível. Por outro lado o exagero, a obstinação pela roupa
em si, a obstinação para ostentar, por aparecer de fato mais do que os outros.
❖ E a pessoa que é elegante ela não pensa assim, o melhor inclusive é o melhor por demais, é o melhor
para todo mundo.

A pessoa elegante não incomoda, não aparece nem mais nem menos, fala em tom adequado e é
agradável.

❖ É gostoso ficar perto de uma pessoa elegante a verdade é essa. Então acho que essa medida que você
tá falando é se encaixa muito nisso.

Podemos dizer que um missionário que está vestido com um pano marrom é uma pessoa elegante como
podemos que uma digital influencer com mais sofisticação e com mais adornos é uma pessoa elegante
também.

❖ Então é tudo vai depender de quem é aquela pessoa, das circunstâncias dela, daquilo que ela pretende
também com a imagem dela. Acho que é por aí, acho que está medida tem a ver com aquilo que a
gente quer, com o serviço que a gente vai prestar, para quem nos vê. Com diálogo que a gente vai
estabelecer com aquela pessoa que está ali na nossa frente.

ÍTALO MARSILI
Fico imaginando o personagem, não pela fama, mas olhando só pelo ângulo da indumentária, imagina
que você está vendo Obama a Kate Middleton e Madre Teresa de Calcutá, por exemplo. As roupas são
praticamente distintas, essa roupa do Obama, para começar é uma roupa masculina, a Kate Middleton é
uma princesa e a Madre Teresa de Calcutá é uma senhorinha de Calcutá, da Índia. São famosos, mas
um é um homem negro, a outra uma jovem branca, e a outra uma senhora indiana. Mas eu estaria errado
imaginar que todos eles estão elegantes, porque a gente sabe como o Obama se veste, como a Kate

280
Middleton se veste e a gente sabe como a Madre Teresa se veste, todo mundo tem no imaginário a roupa
dessas pessoas.

O Obama sempre daquele jeito mais clássico, a Kate Middleton, também clássica do jeito dela, a Madre
Teresa sempre com a mesma roupa, nunca mudou de roupas, sempre aquela roupinha branca e azul, se
eu não me engano, mas todos estão elegantes na sua medida, talvez porque exatamente eles tem uma
medida, a roupa comunica de algum modo a função deles, exatamente a roupa ela não chama atenção
nem para mais e nem para menos, a roupa não tira a potência do para o quê eles vieram ao mundo.

Um é o ex-presidente dos Estados Unidos, outra é princesa do Reino Unido / Inglaterra, e a outra é uma
missionária em Calcutá. A roupa dá uma forma, seria estranho a gente imaginar a Kate Middleton vestida
como a Madre Teresa; a Madre Teresa vestida como a Kate Middleton e o Obama vestido como Louis
Hamilton, corredor de Fórmula 1, o Obama vestido como Neymar.. não sei se funciona com shortinho....
Não tem uma coisa disso? Talvez, Neymar do jeito que ele se veste, está bem, é um atleta jovem, ele
precisa comunicar uma função da potência física, algo meio sexy, estaria errado pensar assim? São coisas
completamente distintas mas cada um parece ser elegante no seu modo. Não sei se você concorda do
Neymar ser elegante, se a Madre Teresa seja elegante.

PAULA SERMAN
“A minha imagem diz respeito a mim”: pensar assim é pensar de forma imatura, desconectada, egoísta.
Elegância tem total relação com o outro.

❖ Você tocou num ponto crucial, que é aquele ponto crucial da Elegância, do bem vestir, da convivência.
Quando a gente fala de se vestir, em Elegância, a gente tá falando na convivência, a gente tá falando
na nossa relação com os outros, que é esse ponto crucial: é adequação. A adequação é fundamental,
é você caber naquele lugar, é você caber naquela função, é faz parte da compostura, é uma coisa
meio antiga falar de compostura, uma coisa meio de avó. Mas acho até temos que resgatar muitos
desses hábitos, valores e ensinamentos dos nossos avós, bisavós, porque uma pessoa composta é
uma pessoa que cabe nos lugares, está encaixada.
❖ Uma coisa uma coisa muito interessante, que muita gente fala sobre conforto no vestir, “ aí eu quero
me sentir confortável, eu quero estar confortável”. O verdadeiro conforto ao vestir, não é você estar,
por exemplo, com uma roupa velha largada, chinelão, às vezes até é. O verdadeiro conforto é você
estar adequado as situações. Por exemplo, imagina eu chegando com uma roupa de praia no enterro,
é uma coisa assim totalmente desconecta da situação, uma falta de atenção minha, uma falta de
presença, é uma falta de observação do outro, do que aquela situação espera de mim, e isto geraria
um grande desconforto.
❖ Por outro lado não, por outro lado se estou adequada, se estou encaixada, se eu sei o que que se
espera de uma pessoa, nos diferentes ambientes, enfim qualquer que seja ...... Cada um tem seu estilo,

281
então eu posso usar um determinado estilo, diferente de outras pessoas, mas eu estou ali, mais ou
menos respondendo aquela situação, aquele chamado que eu tenho ali naquela situação, eu estou
confortável, estou adequada, eu estou elegante, eu estou dialogando com quem está ali, estou
instalada na realidade. E de fato, quando você está bem-vestido, você está perfeitamente instalado
na realidade.

ÍTALO MARSILI
Tem uma palavra mestre que precisamos abordar que é a desconstrução.
Ao passo que a desconstrução ela funciona como um conceito teórico, e
ela de fato ela vai informando muitas teorias sociais acerca do homem na
sociedade, das artes etc., ninguém está discutindo isso. Nossa ideia não é
fazer uma crítica cultural e discutir o conceito do desconstrucionismo, não
vamos chegar tão fundo.

Se por um lado existe essa coisa da desconstrução no campo das ciências


sociais, por outro lado na vida concreta, na vida prática, no enterro do seu
avô, você pode brincar de desconstrucionista que no fundo você vai ferir
muito sentimento da sua avó, do seu pai e a sua mãe.

Então no mesmo mundo que se fala de desconstrução e se fala de empatia, a gente tem que fazer uma
escolha, no fundo teremos que fazer escolhas algumas vezes na vida prática. Então existem
determinantes de vida prática, que você pode questionar no ponto de vista teórico. Mas a pessoa que é
minimamente madura se importa com outro.

Então a gente vê um jeito né de 20 /21 anos, que está estudando desconstrucionismo, está estudando
sobre Herbert Marcuse, está estudando a escola de Frankfurt, ele tem uma vida que acredita nestas
coisas. Seria muito ofensivo da parte dele se fosse para o enterro do seu avô, de roupa de praia. Isso
demonstra uma profunda imaturidade, você concorda? “Ah mas preconceituosa é minha avó!”... “Eu
sei meu filho, mas agora que ela está viúva, enlutada, você de fato está querendo brincar disso? Não
parece uma coisa tão óbvia que a gente fala assim: “Olha meu filho tudo bem, sua avó não sabe, não
estudou os conceitos do desconstrucionismo, sua avó não sabe quem é Herbert Marcuse, sua avó não

282
sabe quem é Derrida88, sua avó não sabe nada da Escola de Frankfurt, a sua avó não estudou Bauhaus89,
sua avó não sabe o que é uma ‘Cadeira Barcelona’90, a sua avó só está viúva, cara, ela só perdeu seu avô,
sua mãe acabou de perder o pai ...”

Então essa é uma coisa que o terapeuta tem que saber conduzir.... “Olha, existe momento para tudo,
momento para você estudar e escrever post no Facebook, no Twitter, até também escrever artigo
científico, livro sobre o desconstrucionismo e existe momento no qual você precisa, por respeito e empatia
se vestir adequadamente. Você coloca uma calça jeans e uma blusa preta, ninguém está pedindo para ir
de terno e gravata para o enterro do seu avô, você concorda? Mas uma calça jeans escura e uma blusa
preta e um olhar contrito já resolve o problema...” Não parece que é isso? Não tem algo por aí?

PAULA SERMAN
❖ Sempre comenta, que gente está bem quando a gente articula essa questão estilo pessoal, pode
envolver algo muito inovador, muito original, muito desconstruído, mas sempre tem que articular com
adequação ao ambiente, é com aquilo que situação espera de nós.
❖ Se não tivesse essa articulação, não dá certo, não sabemos conviver, estamos vivendo só para nós, só
para nossa criação, só para nossa... Tem o seu momento, quando falamos de beleza, falamos de
harmonia, de simetria, de tudo....
❖ Agora nem sempre a harmonia vai ser a melhor linguagem, às vezes a desarmonia, o contraste, ele
vai comunicar mais em determinada situação, vamos até usar um exemplo assim, quando do ‘nada’

88
Jacques Derrida ( Argélia, 1930 /2004) foi um filósofo franco-magrebino, que iniciou durante a década de 1960
a Desconstrução em filosofia. Esta "desconstrução", termo que cunhou, deverá aqui ser compreendido, tecnicamente, por
um lado, à luz do que é conhecido como "intuicionismo" e "construcionismo" no campo da metamatemática, na esteira da
obra de Brouwer e depois Heyting, ao qual Derrida irá adicionar as devidas consequências dos teoremas da
indecidibilidade de Kurt Gödel e, por outro, a um aprofundamento crítico da obra de Husserl, Heidegger e Levinas na
ultrapassagem da metafísica tradicional que ele vai apresentar como sendo uma "metafisica da presença".
89
Bauhaus: foi uma escola de arte vanguardista na Alemanha. A Bauhaus foi uma das maiores e mais importantes expressões
do que é chamado Modernismo no design e na arquitetura, sendo a primeira escola de design do mundo. A escola foi fundada
por Walter Gropius em 12 de Abril de 1919, a partir da reunião da Escola do Grão-Duque para Artes Plásticas. A intenção
primária era fazer da Bauhaus uma escola combinada de arquitetura, artesanato, e uma academia de artes, e isso acabou
sendo a base de muitos conflitos internos e externos que se passaram ali. A maior parte dos trabalhos feitos pelos alunos nas
aulas-oficina foi vendida durante a Segunda Guerra Mundial. A escola Bauhaus também influenciou imensamente a América
do Sul, tendo como seu principal representante o arquiteto Oscar Niemeyer. A jovem capital brasileira, Brasília, foi projetada
em 1957 sob as tendências modernas e funcionalistas inauguradas pelo bauhasianismo. Todo o plano-piloto, incluindo tanto
os edifícios residenciais quanto as construções públicas, são exemplos e ícones desta arte, em sua excelência.
90
Cadeira Barcelona é uma cadeira desenhada por Mies Van der Rohe e Lilly Reich para o Pavilhão Alemão da Exposição
Internacional de Barcelona de 1929. Até hoje, uma das cadeiras mais apreciadas por designers de produto, ela é composta
pelas duas peças (encosto e apoio para pés). A Cadeira Barcelona faz parte de um projeto completo de design de interior,
composta por mesas, bancos e outros mobiliários. Mies foi um dos pioneiros no desenho de móveis com estrutura de aço
tubular, permitindo a produção em escala industrial, um dos preceitos da Bauhaus, onde lecionava na ocasião.

283
pinta o cabelo de loiro, tem uma quebra de harmonia, mas que quer comunicar algo e tudo bem, tem
o momento, tem a intenção.

ÍTALO MARSILI
Risos..... Tem gente que não sabe, mas platinei meu cabelo há pouco tempo, exatamente..... rsrsrs

PAULA SERMAN
❖ E de fato havia uma intenção, naquela quebra de harmonia, que enfim, acredito que tenha sido
atingida. Só que tem momentos, tem que situações, que a gente precisa ler a situação e quando a
gente fala do vestir, toca no assunto da Elegância, a Elegância ela está junto, elegemos o melhor
para o outro. Precisamos pensar em quem está nos vendo.
❖ Vestir-se não é não é só sobre nós, a minha imagem não é sobre mim, pensar assim é pensar de
uma forma imatura, desconectada, egoísta... Eu preciso pensar no enterro da minha avó que está
ali no enterro, no casamento de alguém, “ahh, eu tenho um vestido super hip eu não gosto....” bom
em algum momento você vai ter que sair um pouco do seu estilo, para poder levar um pouco de
consideração, de carinho, de apreço, por quem está se casando. ‘ah, mas tudo bem a pessoa me ama
de qualquer, eu hippie ou não hippie...’ não tenho nada contra hippie, é só o exemplo de estilos
opostos, casamento tradicional na igreja e hippie não vai funcionar. Naquele momento você vai sair
de você, você vai dialogar, você vai pegar o que você tem de melhor e vai falar ‘bem eu vou fazer
isso por aquela pessoa’. Eu vou comunicar com a minha imagem, o meu carinho, a minha alegria
com aquela celebração, o meu contentamento.
❖ Então sempre é importante a gente articular essa coisa do estilo, da criatividade, da desarmonia,
da desconstrução, que seja com adequação com aquele que o outro precisa naquele momento.
❖ Eu só queria tocar num ponto dessa questão do se vestir em casa. Nestes últimos tempos muita
gente ficou em casa e na verdade o pijama virou indumentária de muita gente. Só que isso leva à
falência, a primeiro como é que a gente vai se relacionar, trabalhar em casa de pijama, como é que
vamos mostrar para os outros que temos mínimo de disponibilidade para o serviço quando estamos
o dia inteiro de pijama ou largadão...
❖ Nas situações mais cotidianas precisamos pensar ‘Bem, está tudo bem, eu até gosto de ficar de
pijamas e tal mas, qual é a função aqui agora.... o que eu preciso comunicar para meus filhos, para
o meu marido, para mim mesmo enfim... acho importante tocar neste assunto.

ÍTALO MARSILI
Vamos para a próxima aula deste módulo e gente deixa claro para os terapeutas, para nossos alunos, o
grande campo que a moda tem, tanto na percepção pessoal quanto na comunicação, sobretudo a
284
ferramenta, como isso é uma ferramenta muito útil para fazer com que o sujeito sai um pouco de si e de
suas questões, dos seus dramas e lá no fundo, daquele lugar mental sofrimento chamado egoísmo passe
olhar um pouco para o mundo, prestar um pouco mais de atenção no outro. Então não se trata tanto de
uma mudança de cosmovisão, de uma mudança de um conjunto de crenças, mais de uma proposição
prática que pode ajudar muito na vida prática e cotidiana.

285
SEMANA 02: MODA

Esta aula apresenta os elementos da imagem que requerem cuidado, por prejudicarem a
comunicação quando estão fora de ordem. Discorre também sobre os impactos da imagem na
convivência e na autopercepção

INTRODUÇÃO

❖ Nesta aula iremos conversar sobre o Detox da Imagem. Quando estamos com um cliente, é preciso
fazer a análise do todo e das partes. Há elementos da imagem que indicam que não são bons, que
não se encaixam e que empobrecem a imagem. Estes detalhes perturbam a comunicação e precisam
ser resolvidos.

❖ É importante a lembrarmos que desde que nascemos estamos em degeneração. Precisamos renovar,
limpar, tomar banho, escovar os dentes, cortar as unhas, sempre fazer essa reparação. Assim como
nós, as coisas também ficam gastas, os objetos ficam gastos as roupas ficam velhas os ambientes os
objetos quebram e precisam ser recolocados no lugar, então esse processo de Detox tanto da imagem
como do ambiente, ou seja, das coisas materiais, é um processo contínuo, é um processo que precisa
acontecer o tempo todo.
❖ Quando falamos de ser humano, falamos de beleza, de excelência no ser humano, sempre nos
‘esbarramos’ no esforço, isso requer comprometimento, requer dedicação! O que não podemos deixar
acontecer, o que não ajuda a amadurecer, é deixarmos as janelas quebradas, deixarmos janelas
quebradas sem consertos.
❖ A busca da Excelência no SER HUMANO requer esforço, dedicação, trabalho.

TEORIA DAS JANELAS QUEBRADAS

A teoria das janelas quebradas é um modelo norte-americano de política de segurança que entende a
desordem como fator de elevação de índices de criminalidade. Estudiosos da Universidade de Stanford
fizeram um experimento social em que colocaram dois carros idênticos em bairros diferentes, um com
índice de criminalidade alto e outro, com índice baixo.

Teoria desenvolvida no âmbito do modelo norte-americano de política de


segurança pública no enfrentamento do crime e ela tem como visão
fundamental a desordem como um fator de elevação desses índices de
criminalidade. Esta teoria pode ser extrapolada para a nossa imagem e para

286
outras situações. Trata-se de um experimento realizado há alguns anos atrás por estudiosos da
Universidade de Stanford.
❖ Teoria das Janelas Quebradas: experimento de Psicologia Social; onde realizaram uma experiência de
psicologia social, muito interessante. Esses pesquisadores colocaram dois carros idênticos em bairros
diferentes. Um carro foi colocado em um bairro de índices de criminalidade alto (Bronx). E o outro
carro foi colocado em um bairro nobre com baixos índices de criminalidade.
❖ O que aconteceu ao longo dos dias com esses carros?

O carro do primeiro bairro foi rapidamente deteriorado. O segundo ficou intacto, até que os
pesquisadores quebraram uma de suas janelas. Depois disso, o mesmo processo de destruição começou
a ocorrer. A janela quebrada transmitiu a sensação de “terra de ninguém”.

❖ O carro que estava no bairro de alta criminalidade (no Bronx) foi rapidamente deteriorado, primeiro
quebraram as janelas, depois saquearam, foi arranhado, foi dilapidado, foi totalmente deteriorado.
❖ Durante o mesmo período de tempo, o carro que estava no outro bairro (Palo Alto) que é um bairro
alto poder aquisitivo, um bairro com baixos índices de criminalidade, esse mesmo carro não sofreu
nenhum ataque. Até que esses pesquisadores quebraram uma das janelas desse carro e o que que
aconteceu? Aconteceu que o mesmo processo de saque e de destruição começou acontecer nesse
carro. Vejam que interessante: por que que esse segundo carro começou a se deteriorado no momento
em que uma janela foi quebrada e não reparada?
❖ Aquela imagem de uma janela quebrada transmitiu uma sensação de descaso, desleixo, descuido, de
terra de ninguém... E terra de ninguém, ninguém respeita. Quando a gente está na terra de ninguém,
não tem regra, não tem lei, se faz o que você quiser e bem entender. Aquela desordem gerou
desordem, gerou esse comportamento.
❖ Podemos ampliar essa teoria para nossa imagem e tantas outras situações – alimentação, casa,
trabalho. Se nos acostumarmos com pequenas janelas quebradas, sem o processo de Detox contínuo,
teremos uma imagem que comunica descaso, desleixo, e abre espaço para uma série de problemas
psíquicos e orgânicos, como transtornos depressivos, ansiosos, compulsões e acúmulos.
❖ Podemos aplicar essa teoria na nossa vida em vários aspectos:
➢ Na alimentação: ‘ah eu estou comendo aqui, uma coisinha que é meio tranqueira, já comi uma
vez e vou comer mais, vou comer a segunda, a terceira, quarta, enfim... Isso vira uma bola de
neve’.
➢ Na nossa casa: nos ambientes da nossa casa se começamos a não recolocar as coisas no lugar e
as ficam espalhadas, vamos nos acostumando com aquela desordem, com tudo fora do lugar e
aquilo vai se perpetuando de alguma forma.
➢ No trabalho: não nos preocuparmos com o ambiente de trabalho, com nossos colegas e nossas
tarefas diárias.

287
➢ Na imagem: Se nós nos acostumamos com pequenas janelas quebradas, com as janelas
quebradas da nossa imagem e deixar correr solto sem a gente fazer esse processo de Detox
contínuo, iremos sempre ter uma imagem mais empobrecida, uma imagem que vai comunicar
descaso, desleixo, descuido. Enfim, então é importante que a gente corrija, que a gente conserte
as janelas.
❖ Esse ambiente de desordem de desleixo, ele é um caldo de cultura para vários transtornos. Para
transtornos depressivos, ansiosos, compulsões, acúmulos, enfim uma série de problemas: problemas
psíquicos, problemas orgânicos que vão nos enfraquecer, vão nos deixar cada vez pior.

ELEMENTOS DA IMAGEM QUE PRECISAM DE ATENÇÃO

Ao analisar uma pessoa, é necessário prestar atenção ao todo e às partes. Não se trata de buscar
defeitos, mas de remediar detalhes que perturbam a comunicação. O processo de Detox – tanto da
imagem, quanto do ambiente – é contínuo. A beleza e a excelência no ser humano exigem
comprometimento e dedicação. Alguns elementos da imagem que precisam de atenção:

CABELO
Raiz branca ou de quem não o pinta há muito tempo; cremes e produtos que o deixam muito molhado,
com odor que incomoda; cabelo sujo, com raiz oleosa; cabelos muito longos, sem corte.
➢ Cabelo tingido que fica com a raiz branca: não retoca a raiz há muito tempo, traz
uma mensagem de descuido.
➢ Creme de cabelo: produto no cabelo que deixa o cabelo muito molhado, com odor
muito forte, isso incomoda, de uma certa forma quem está a nossa volta.
➢ Cabelos sujos: raiz oleosa
➢ Cabelos sem corte: cabelos muito longos, muito tempo sem corte.
➢ Tudo isso vai passar uma imagem ruim.

DENTES
Dentes malcuidados, amarelados, não escovados, halitose. Isso pode ser uma ferramenta diagnóstica,
estar em um contexto de doença, e não deve ser deixado de lado. Se o terapeuta tiver coragem de
intervir, será que o paciente não ficará mais saudável e feliz?

➢ Dentes malcuidados, amarelados, não escovar os dentes, halitose, tudo isso pode ser
sim uma ferramenta diagnóstica, tudo isso pode ser, por exemplo nesse caso, algo
que faz parte de um contexto de doença.
➢ Há um cuidado excessivo, um medo de atuar de intervir nesses detalhes de imagem.
288
➢ Um profissional pode ter medo de intervir nisso porque acha que a pessoa, em questão,
vai ficar ofendida.
➢ No entanto, será que esse problema não deveria ser cuidado? Se houvesse uma
coragem para intervir, será que essa pessoa não estaria melhor? A imagem dela não
estaria melhor? Ela não estaria mais feliz? Ela não estaria mais saudável?
PELE:
Pele oleosa, descamada, causando sensação ruim em quem a vê. Esses problemas também podem estar
associados a patologias, inclusive com comprometimento psíquico (lúpus, por exemplo).

➢ A pele é o maior órgão do corpo humano . Uma pele oleosa, uma pele descamada,
isso tudo pode ser muito feio, uma pele ressecada, isso tudo causa uma sensação ruim
em que nos ver. Também esses problemas podem estar associados a patologias. Há
patologias que tem, inclusive, um comprometimento psíquico, vamos supor por
exemplo, um paciente com lúpus, tem ali uma questão de pele e pode ter um
comprometimento psíquico.
➢ Para os homens: os homens eles têm uma tendência de produzir muito óleo, de ter a
pele mais oleosa. Então é preciso cuidar bem desse aspecto.
BARBA:
É preciso cuidar bem desse aspecto, não deixar uma barba malfeita, desgrenhada, suja, malcheirosa.

ACESSÓRIOS:
Muitas pessoas não observam bem e acabam usando acessórios, cintos e sapatos descascados, com
aspecto envelhecido. Ou ainda, adereços barulhentos muito grandes, exagerados. Tudo isso provoca um
rebuliço por onde a pessoa passa.

➢ Tem muita gente que acaba esquecendo e não observando muito bem os adornos que
usa, os acessórios, colares, cordões descascados, lascados, os elos abertos; sapatos
com couro descascado, cinto quebrado, aquele couro quebrado com aspecto
envelhecido o salto solto, a sola solta, o salto com o ‘ pininho’ que faz barulho. Tem
também pessoas que usam adereços muito barulhentos, brincos muito grandes,
pulseira, enfim, tudo isso que provoca um rebuliço por onde a pessoa passa.

PEÇAS DE ROUPA:
Roupas puídas, desbotadas, furadas, manchadas, desfiadas. Pode ser óbvio falar sobre isso, mas muitas
pessoas acham normal. Isso transmite uma mensagem de falta de cuidado. O bom estado das peças
também comunica; não a peça em si, mas como ela está conservada.

289
Peças muito justas (como a calça legging, usada em ambiente esportivo, mas que às vezes o extrapola),
decotes profundos, fendas e transparências passam a ideia de muita disponibilidade e descuido com a
intimidade.

❖ Para detectar todas essas sujeiras na imagem é preciso presença, atenção. A


atenção é importante nesse processo, nessa construção de uma boa imagem. Ter
atenção é necessário para construir nosso estilo, para olhar para o ambiente onde
a gente está e também para esses detalhes, para essas sujeiras para essas coisas
que precisam ser limpas, reparados, Detoxificado.

❖ O que olhar especificamente nas peças de roupa:

➢ Desgaste: as peças de roupas ficam com desgaste do tempo elas ficam com bolinhas, podem estar
puídas, rasgadas, desbotadas, furadas manchadas, desfiadas. Há muita gente que acha que é
normal usar uma peça de roupa dessa forma, uma peça de roupa mal-cuidada, uma peça de
roupa no mau estado de conservação.
➢ Transmite uma mensagem muito ruim, uma mensagem de desleixo, de falta de cuidado e por
exemplo, quando eu tenho uma falta de cuidado com a minha imagem, quem está me vendo,
quem está analisando, quem está recebendo essa informação, vai pensar o quê? Que eu também
tenho essa falta de cuidado com o trabalho, com os relacionamentos, com vários outros aspectos
da vida, com a saúde, então não é um mero detalhe, como eu falei, tudo comunica.
➢ Qualquer adorno, peça de roupa que eu colocar vai comunicar algo e o bom estado de
conservação das peças também vai comunicar, não é simplesmente a peça em si, mas é como ela
está cuidada, conservada.
➢ Botões soltos zíper aberto bainha malfeita se desfazendo bainha muito curta ou muito comprida
isso é muito comum e isso acaba desgastando a barra da calça.
➢ A camisa social de botão, por exemplo, geralmente acontece com as mulheres, quando as
mulheres o movimento de abrir o braço aparece os seios, aparece a pele, fica aberta, isso é um
sinal de que, por exemplo, aquela camisa não é do tamanho da pessoa, ela não está no tamanho
adequado é um sinal de que ali não houve a devida atenção.
➢ Camisas claras com mancha amarelada embaixo do braço, isso é bem comum de acontecer
manchas brancas de desodorante, peça escura esbranquiçada, aquela peça que a gente chama
de “russa”, pode ser resolvido.
➢ Tudo que estou falando aqui, essas peças, esses acessórios, não necessariamente, vão precisar
sair de um guarda-roupa, vão ser jogados no lixo. Eles podem ser reparados, só que necessitamos
observar esses detalhes, que sujam a imagem.
➢ Peças muito justas que marcam excessivamente o corpo por exemplo a calça legging é uma calça
que é muito usada no ambiente esportivo, mas que também muitas vezes sai do ambiente

290
esportivo. É uma peça muito reveladora uma peça que dependendo do tipo de material com a
qual ela foi feita, vai mostrar muita coisa, vai marcar as partes íntimas e não compõe uma boa
imagem.
➢ Decotes muito profundos, fendas, transparências muito exuberantes, tudo isso transmite uma
mensagem de muita abertura, muita disponibilidade, um pouco de descuido com a intimidade.

UNDERWEAR:
Peças íntimas que marcam excessivamente a roupa; cinturas muito baixas; blusas que expõem a barriga
quando com os braços levantados.

➢ under – aquilo que fica embaixo da roupa. São peças que devem ficar escondidas.
➢ Sutiã aparecendo, não compõe, não traz harmonia para o visual.
➢ Cuecas aparecendo traz uma mensagem desleixada.
➢ Peças íntimas que marcam excessivamente a roupa que mostram muito, quando a roupa mostra
muito contorno dessas peças íntimas, isso também não é legal.
❖ A proporção das peças como por exemplo, como a cintura muito baixa e próximas das regiões íntimas,
blusas muito curtas que expõe a barriga quando os braços estão levantados.
❖ Quando vestimos uma roupa, precisamos nos movimentar com roupa, para que a gente veja se aquela
roupa de fato tem um bom caimento.
❖ O que que é um bom caimento de uma peça? A peça tem um bom caimento quando parece que ela
foi costurada com uma pessoa dentro da peça. Ao vestir peças que não servem, estas deterioram,
empobrecem e comprometem a nossa imagem.
❖ Se tem muito desconforto, se eu levanto o braço e a peça sobe, se eu abaixo e a peça decai com os
meus movimentos naturais, se a peça sai muito do lugar, se ela perde muito da conformação dela,
aquela peça não me serve. Se essas peças que não servem, se usadas, elas empobrecem, elas
comprometem a nossa imagem. serve para homens e para mulheres.
❖ É comum que pessoas muito magras ou pessoas muito acima do peso tenham dificuldade de
encontrar peças com caimento adequado. Isso é algo que pode ser resolvido com ajustes nas peças.
Uma pessoa muito abaixo do manequim vai precisar ajustar para o seu tamanho e uma pessoa muito
acima pode tentar conformar uma peça ou mandar fazer a peça de acordo com seu tamanho. O que
não pode é nos contentarmos com uma peça que não é para nós.

UNHAS
Detalhe importante que muitas vezes é tratado como acessório. Unhas sujas, quebradas, descascadas
ou muito grandes comprometem a imagem.

291
➢ Detalhe muito importante na imagem, que muitas vezes é tratada assim como algo que não
importa. As unhas são consideradas, muitas vezes, acessórios, ela aparece, ela está ali
comunicando.
➢ Então é preciso que elas também sejam observadas. Unhas sujas, quebradas, descascadas, muito
grandes, são elementos que comprometem a imagem. Quando a unha está muito grande, por
exemplo, pode acumular sujeira embaixo da unha, pode dificultar a própria movimentação, pode
machucar os outros.
➢ Não se deve perturbar, incomodar os outros com a nossa imagem com os nossos adereços com os
nossos acessórios com a nossa roupa.
➢ Muitas vezes a unha não está de acordo com o ambiente no qual eu trabalho. Unha muito colorida,
uma unha decorada, uma unha cheia de desenhos, pode não se adequar ao ambiente que
frequenta.
➢ Unhas dos pés: as unhas dos pés são negligenciadas com frequência e andamos muito descalços, e
eles estão ali sendo sujos e sendo desgastados, quando as unhas não estão bem cuidadas logo elas
ficam amareladas, ficam sujas.

HÁBITOS:
A imagem não se restringe ao vestuário, engloba também o gestual, comportamento e expressões. Ficar
de pijama ou de roupa de academia o dia todo, por exemplo, é um mau hábito que pode ser caminho
para transtornos como depressão, ansiedade, falta de produtividade no trabalho, clima familiar
deteriorado.

❖ Alguns hábitos fazem com que a nossa imagem como todo fica empobrecida. A imagem aqui eu foco
muito na questão do vestuário, da roupa, mas a imagem ela não se restringe a isso. Ela também
engloba o gestual o comportamento as expressões.
➢ Ficar de pijama o dia inteiro, muito comum atualmente porque tem muitas pessoas trabalhando
em home office. É um hábito muito frequente só que isso é um caminho para muitos transtornos:
depressão, ansiedade, falta de produtividade no trabalho, clima familiar deteriorado etc.
➢ A experiência de tirar o pijama: nosso dia tem marcos: o dia amanhece, nós acordamos depois
ele vai seguindo, vai escurecendo, anoitece e logo um outro dia começa. A nossa indumentária
ela acompanha esses marcos do dia, essa rotina. Então saímos da cama, precisamos, de fato,
tirar a roupa que dormimos, mesmo que o pijama seja maravilhoso, ele é para dormir é uma
roupa adequada para dormir. Quando trocamos de roupa, estamos vestindo a nossa armadura
para lidar com esse dia a dia, com as batalhas.
➢ Roupa de academia o dia todo: outro hábito que também compromete bastante, a não ser que
você seja um profissional desse ramo, um personal trainer, terapeutas ocupacionais,
fisioterapeutas que precisam de alguma mobilidade maior, do contrário é importante tirar essa

292
roupa de exercício é importante tirar essa roupa de exercício. Qual a mensagem que transmite
você ficar de roupa de academia o dia inteiro? Uma mensagem de quem não tem o que fazer,
uma mensagem de quem está atoa, pode até ser que não seja essa a realidade, mas é o que
transmite.
➢ É sempre importante pensarmos que, mesmo que estejamos em casa na maior parte do tempo,
existem intercorrências, precisamos de fato estar vestida adequadamente para as atividades do
dia a dia.
❖ Tem um vídeo muito interessante, vocês podem digitar no YouTube: O Mendigo de Mallorca
(https://www.youtube.com/watch?v=7B9c_k6bilI)
➢ A história de uma transformação real que aconteceu num salão de cabeleireiro de Palmas de
Mallorca (cidade da Espanha).
➢ O salão ofereceu uma transformação para um guardador de carro, um senhor que vivia uma
situação muito ruim, ele tinha um cabelo malcuidado, uma barba mal feita e uma expressão facial
assim de desânimo, uma postura encurvada.
➢ Depois que ele sofreu essa transformação, que ele tirou essa sujeira da imagem, fez o Detox da
imagem. Ele cortou o cabelo, fez a barba, pintou o cabelo, trocou de roupa (tirou a roupa
desgastada, suja), colocou uma roupa bonita, uma roupa nova, bem cuidada, com bom caimento.
➢ É impressionante a transformação que esse homem sofreu. Ele muda completamente, chega a se
emocionar quando ele se vê daquela forma.

➢ Aquela humanidade foi resgatada, a ordem da imagem dele foi resgatada e ele sorri, e se
comunica muito melhor com as pessoas, a postura muda, ele fica ereto, ele está de peito aberto,
ele está aberto ao diálogo ele está aberto a essa convivência, ele se sente encorajado, ele sente
animado para trabalhar, ele consegue ter mais conforto consegue ser mais livre para se relacionar
com os outros.
❖ Essa falta de cuidado, essas sujeiras, esse excesso, ele macula a nossa dignidade, tira um pouco da
nossa humanidade. Quando a gente poda, quando a gente limpa a gente tem a humanidade
resgatada, essa ordem exterior e interior resgatados.

293
❖ Todos esses pontos concretos que eu apontei aqui devem ser encarados com seriedade, um desejo de
intervir por quem cuida de uma pessoa. Eles não podem ser tratados como meros detalhes. “Ai, mas
eu estou tratando de uma doença muito grave nessa pessoa, essa pessoa tem um câncer”, então como
que eu vou me importar com isso? Sim, de fato você vai se importar com isso! De fato, isso é
importante, as coisas pequenas são importantes.
❖ As coisas grandes se fazem de coisas pequenas! O asseio, a boa conservação e limpeza, adequação
a proporção, tudo isso tem que ser levado em consideração.
❖ Eliminar, fazer esse Detox, é um auxílio importantíssimo para a beleza da nossa imagem, essa sujeira
ela precisa ser limpa retirada.
❖ Algo que é muito importante no processo de amadurecimento a gente fica pensando “aí eu quero
madurecer, eu tenho desejo de amadurecer”, e aí a gente pensa em mudanças assim hercúleas,
mudanças grandes, “Nossa eu preciso ter mais fortaleza”, “Eu preciso ser mais forte”. Mas como que
você vai conseguir isso? É no concreto é no pequeno.
❖ Essas pequenas limpezas, essa faxina exterior e pode ser sim o primeiro passo para o amadurecimento
e é mais fácil, é mais rápido eu intervir no meu exterior eu investir na ordem exterior e isto gera uma
consequência no meu interior.
❖ Caminho de amadurecimento: uma aparência agradável bem cuidada ela é um ato de consideração
de carinho com quem está a nossa volta é um grande elemento da boa convivência, nada tem a ver
com poder aquisitivo alto, isto acontece com pessoas humildes, pessoas com menor poder aquisitivo.
❖ Isto tudo contribui para o equilíbrio psíquico, para o equilíbrio espiritual. É um passo fundamental
para o processo do amadurecimento. Começa com o processo de ordem exterior, essa limpeza exterior
vai impactar, com certeza nos processos interiores.

O dia possui marcos e a indumentária acompanha seu movimento e dinamismo. Esses são pontos
pequenos que parecem besteira, mas maculam nossa dignidade. O asseio, a boa conservação, a
adequação e a proporção têm de ser levadas em conta. No processo de amadurecimento, pensamos em
mudanças hercúleas e grandiosas, mas é preciso começar por coisas pequenas e concretas. Uma faxina
exterior pode ser o primeiro passo para o amadurecimento.

CONVIVÊNCIA, AUTOPERCEPÇÃO E OLHAR VOLTADO AO PACIENTE

A aparência agradável, bem cuidada, é um ato de carinho com quem está à nossa volta, um grande
elemento da boa convivência. Em questões conjugais, por exemplo, a vestimenta pode ser um recurso,
dentre vários, que demonstra compromisso com o outro; um símbolo que projeta as ações a um lugar
de cuidado. Não se trata de endeusar a moda, nem de utilizá-la como algo mágico; é um braço

294
terapêutico que não pode ser tratado isoladamente. Mas, vida, precisamos de coisas palpáveis, e a
roupa, o acessório e a imagem são aspectos concretos.

A percepção de que nos vestimos para o outro pode levar a um teatro de aparências. No entanto, o ato
de se vestir vai além da dimensão social. Ele expressa aquilo que levamos para nós mesmos, impacta na
dinâmica psíquica e corporal. A proposta é ter uma atitude concreta para perceber o impacto, ainda que
sem ânimo. Alguém com uma questão grave precisaria de maiores intervenções antes desse movimento
de cuidado, mas em geral o ânimo vem depois da ordenação. A beleza é um alimento. Se não nos
nutrimos dela, ficamos fracos.

Na teoria psicanalítica freudiana, há o conceito dos atos falhos, pelos quais podemos acessar o
inconsciente. A vestimenta pode ser um lugar em que os atos falhos, a cristalização de traumas e as
manifestações do inconsciente acontecem. O modo como o paciente entra no consultório revela muito
do que ele leva por dentro, seja porque está exposto ou porque ele está querendo esconder. É a arte do
terapeuta percebê-lo, além escutar o paciente antes de elaborar uma intervenção, que sempre deve ser
singularizada.

PAPO ESTILISTA ÍTALO MARSILI E PAULA SERMAN – SEMANA 02

ÍTALO MARSILI
A gente se veste só para o outro?
Existe uma percepção que pode ser alterada nas pessoas também que é o seguinte: que nos vestimos
só para o outro, isso pode cair também um pouquinho num teatro das aparências. Se por um lado, é
evidente que todo ato de se vestir tem uma dimensão social da convivência. Por outro lado, o se vestir
também tem uma dimensão da expressão daquilo levamos para o profundo do nosso interior. Quer
dizer, como é que estamos vivendo a vida? De outro modo, a maneira como nos vestimos, impacta um
pouco na nossa dinâmica psíquica na nossa dinâmica corporal.

O exemplo que eu acho muito bom, cabe muito bem no nosso dia é o home office, no qual as pessoas
acordam e pode ser que elas fiquem com a roupa que elas foram dormir. De fato no primeiro dia aquilo
ali não traz nenhum tipo de repercussão, no segundo dia não traz nenhum tipo de repercussão, no
quarto dia não traz nenhum tipo de repercussão. O fato é que a nossa experiência clínica vai mostrando
para gente, que sim isso vai trazer uma repercussão interior para pessoa ao longo dos dias.

Por quê? A roupa em si não tem um poder mágico a roupa não é um manto, não é uma capa da
invisibilidade, não é um gorro mágico que ao vestir você ganha poderes ou perca poderes, a roupa não
tem esse caráter mágico, então não é bem essa questão. Ao contrário, se eu acordar e estou em home

295
office e eu me maquiar, botar uma roupa etc. Poxa, minha produtividade vai super aumentar. Não, não
vai também porque o fato é que você se vestia assim quando trabalhava no escritório e sua
produtividade não era grande coisa também, concorda?

O fato é que você tem uma coisa interior, que se você está atento, aquilo ali pode te ajudar. Então, se
eu já estou atento, já fui procurar um psicólogo, procurar um terapeuta, quero resolver certas questões
relativas no meu relacionamento. Existem queixas ali, no meu dia a dia, que meu marido / minha esposa
reclama que eu não dou atenção para ele/ela. São queixas muito comuns no consultório, no terapeuta
de casais, do psiquiatra, de um conselheiro, questões relativas a um relacionamento.

A vestimenta pode ser um elemento, entre diversos elementos, que pode ter a ver com duas coisas:
primeiro com um sinal interior de que eu vou me vestir direito, porque eu tenho compromisso com
outro, não que a roupa vai dar conta e que agora - ah então agora me vesti direito então está resolvido!
Se me vesti direito não precisa agora mais preocupar com nada? Não, não é isso, mas aquilo ali é como
um sinal, é um símbolo que projeta as tuas ações para um certo lugar de cuidado. E o outro ele se sente,
ele nota que tem uma coisa diferente, que ele nem vai necessariamente notar que é aquilo, mas a
dinâmica familiar, ela pode sim começar a mudar de modo, claro superficial, inicial enfim é projetivo,
que não dispensa o cuidado da pessoa. Esse assunto da moda, da vestimenta e da antropologia relativa
à moda não pode ser endeusado.

PAULA SERMAN
A indumentária é um braço terapêutico, é uma intervenção.
O ser humano é muito complexo ele tem muitas dimensões e não dá para falarmos de uma coisa só, mas
nós precisamos de coisas concretas na nossa vida, coisas palpáveis e a roupa ou acessório ,a imagem em
si ela é uma coisa concreta. Ela é um aspecto bem concreto da nossa vida, então, a gente se veste sim
para o outro.

A roupa limita, da forma, ela dá essa coisa que precisamos olhar, quando nos olhamos no espelho,
precisamos ver isso uma coisa concreta delimitada, formada, para que possamos ter ideia de quem
somos, para que tenhamos um certo domínio da nossa vida, da nossa existência e dos nossos atos. Então
apesar de não ser a única intervenção é algo muito concreto, é como eu , é mais fácil, a meu ver, pela
minha experiência, mexermos no concreto / no material do que no imaterial: “aí eu preciso ser madura,
“eu preciso ser produtivo”. Tudo isso é muito abstrato, por isso que acho que essas atitudes bem
concretas, bem palpáveis podem ser muito boas para começarmos, para dar o pontapé inicial, para fazer
junto.

296
Sobre os relacionamentos, tem uma coisa que eu percebo que muitas pessoas que cuido, que atendo,
tem esse ponto, não necessariamente passam por uma crise conjugal, algo muito grave, mas falta essa
atenção, falta esse detalhe sensível na convivência. Às vezes não se trata de algo tão grave, de uma
separação eminente, mas de algo que está precisando no relacionamento conjugal, na educação dos
filhos, no clima, na atmosfera familiar, quando nos preocupamos com a nossa aparência a gente tá
cuidando do clima da atmosfera.

Roger Scruton fala que a beleza faz a gente perceber o mundo como um lar, e de fato tem aquele
quadrinho, “Lar Doce Lar”, por que a gente não fala assim: ‘apartamento doce apartamento?’ O lar é
aquele lugar ao qual pertencemos, é nosso, tem as nossas características, é o nosso cantinho, onde tem
quem amamos, nosso detalhe. Então a nossa aparência bem-posta ela ajuda a transformar o mundo
num lar, ela ajuda dar esse aconchego esse carinho, mesmo no meio do caos de uma família de crianças
barulhentas, daquela coisa normal do dia a dia. Então de fato não é um trunfo, mas é sim uma
ferramenta muito concreta para a começarmos, para melhorarmos, para harmonizar, para dar essa
atmosfera de lar.
Para o consultório, para trabalho esse raciocínio também é válido. A imagem do profissional deve ser
esse lar, esse aconchego esse sinal concreto, de que eu estou ali disponível para um paciente. Tudo que
ele ver, num primeiro momento, é através da minha imagem. Assim não é apenas uma questão de
produtividade, o ser humano não vive apenas para funcionar, se trata de humanizar o ambiente de forma
concreta, material, como um ponto inicial para evoluir para um processo mais interior, mais abstrato.

ÍTALO MARSILI
A roupa não funciona como um passe de mágica
No entanto, a experiência nos mostra que, às vezes, pequenas alterações na indumentária, uma roupa
nova, modificações na forma de se vestir, fazem mudanças absolutamente extraordinários mesmo, em
coisas muito graves como: ansiedade, depressão, sentido da vida, conflitos laborais e familiares.
Tenho casos concretos no consultório diante dos quais a primeira intervenção e praticamente a única
intervenção feita, foi alteração de vestimenta alteração de roupa que dramaticamente alteraram o
quadro de ansiedade, por exemplo, isso acontece mesmo.

PAULA SERMAN
Caso concreto
Uma cliente, médica, nova, competente produtiva que estava realmente desencaixada com a imagem
dela, isso gerava muito desânimo tristeza isolamento. Ela ficava tão desanimada que sentia tão mal, que
fazia com que ela não quisesse se relacionar, não queria mais sair, se sentia fora do contexto. E a questão
do relacionamento, de não conseguir namorar, uma menina que queria formar uma família, casar e não

297
recebia nenhuma cantada na rua, às vezes não é nada uma cantada ridícula, mas nem isso, alguma coisa
não está bem aí, alguma coisa não está bem porque não era uma pessoa feia, era uma pessoa simpática.
Começamos o processo de transformação da imagem e foi muito rápido, que ela entendeu onde que ela
deveria se encaixar. Ela tirou tudo aquilo que estava sujando a imagem dela e o que não estava bacana
e deslanchou e ficou mais animada, acabou conseguindo um namorado. Esse não era o objetivo
principal, isso era só um sintoma, não é assim: “consiga um relacionamento em três dias”, não, mas, era
um sintoma de uma postura de um uma falta de instalação no mundo, então uma pequena intervenção
ajuda muito.

Um outro caso, muito marcante, uma pessoa que estava muito acima do peso, isso é muito comum de
acontecer. A pessoa, realmente, fica meio sem norte e de fato fomos trabalhando na questão do
caimento, da modelagem, daquilo que dava para fazer dentro daquela situação. Ela se tornou uma
pessoa mais agradável para convivência, já era uma mãe com três filhos. E tinha aquela imagem ruim,
pois ela acabava recorrendo sempre a legging e o camisetão. Então era esse uniforme do dia, da noite,
do feriado, do final de semana. Depois da mudança, o clima mudou em casa, o clima com o marido
melhorou, não era ruim, mas assim ela começou a se enxergar com forma, com cor, com vida, ela
conquistou esse domínio dela mesma.

ÍTALO MARSILI
“De boas intenções o inferno está cheio”
Em uma das aulas, o professor Roberto Mallet usa uma expressão, que eu também uso e enfim e que
todo mundo usa, que é aquela boa e velha expressão “de boa intenção o inferno está cheio”!. O que
acontece é o seguinte, a roupa no fundo ela é uma forma de materializar aquilo que seria só uma boa
intenção, então de boa intenção o inferno está cheio, no sentido de que olha a gente até tem uma boa
intenção mas eu não encontro um lugar para essa boa intenção ser materializada: “até queria de fato
tratar melhor minha mulher”; “até de fato queria trabalhar melhor”; “é de fato queria estudar mais”; “é
de fato eu queria...” Mas são as intenções, a intenção é o princípio do movimento, sem intenção a gente
não tem nem como ter o movimento da mudança, da manutenção ou enfim, da entrega da justiça etc.

A intenção é o início do movimento, agora como a gente tem corpo, carne e osso a intenção precisa ser
materializada no mundo, e o terapeuta ele tem que ter essa percepção. Às vezes, a pessoa está muito
distante de trabalhar bem, porque ela não sabe trabalhar mesmo, porque ela não é capaz no sentido
técnico por assim dizer do termo, não tem formação, não está numa boa equipe, pegando um exemplo
laboral. Então essa pessoa tem uma boa intenção, ela quer trabalhar bem, mas vai ser difícil para ela.
Para essa intensão não morrer e para a pessoa não ir para o inferno simbólico, por assim dizer, não o
Inferno lá dos religiosos, mas um inferno simbólico, para a pessoa não se frustrar, não perder ali o seu
drive de energia, muitas vezes a indumentaria é o primeiro lugar, onde ela pode encontrar uma
298
repercussão dessa boa intenção. Então a pessoa tem uma boa intenção de trabalhar, então ela pode
começar a se vestir melhor, de modo mais adequado para sua função, a se vestir de modo mais coerente
sem imaginar que a vestimenta já te habilita a ser melhor. Por exemplo, no caso de meninos que são
filhinhos de mamãe, filhinhos de papai, que não jogam bola nenhuma, mas são os caras que tem a
chuteira de marca, um meião de marca, caneleira e o cara vai todo engomadinho para o campo, mas
não joga nada, ele só é o dono da bola. Não é o fato dele ter o meião, a blusa a chuteira nova que faz o
moleque jogar bola, óbvio que não.

Enfim, mas no mundo dos adultos realmente a indumentária, a roupa pode ser esse gancho, esse gatilho
que obviamente não tem efeito mágico, mas pode ter o efeito de manutenção daquela intenção
primeira, no grande campo das relações humanas familiares, por exemplo. Então você está vendo que o
teu casamento não está muito bem, está meio desleixado, pode ser que um grande gatilho ou um grande
gancho de manutenção, daquela intenção que te fez procurar o terapeuta, que é a intenção de melhorar
o teu casamento, melhorar o teu noivado, melhorar o namoro, sei lá, um gatilho de manutenção dessa
intenção, pode ser habitual que a gente faz todos os dias de modo concreto, como você apontou que é
vestir-se. Então existe um jeito de se vestir desleixado e existe o jeito de se vestir intencionalmente
comprometido por exemplo, que não tem nada a ver com gastar dinheiro que você não tenha com a
roupa. Existe uma arte, uma técnica para fazer isso e que vamos aprender mais aqui nesse módulo.

PAULA SERMAN
Caso concreto
Uma pessoa falou que o marido programou uma viagem e ele falou: “então, agora, você deixa suas
roupas de mãe em casa, tá?” Isso no fundo é triste, porque é uma conotação pejorativa para algo que
não tem nada de pejorativo, mas é que dá para entender o que ele quer dizer, essa perda do apelo
atrativo, daquele cuidado, daquele esmero com os detalhes que havia no namoro, que havia no início,
que agora se perdeu, porque a atenção ao marido se dispersou, se perdeu. Então, isso é só um sintoma,
só uma fala que quer dizer: “olha agora por favor, você se veste do jeito que você se vestiu antes quando
você me conquistou”, que na verdade é um dever de justiça. É preciso que não se perca esse ponto de
mira em qualquer situação.

ÍTALO MARSILI
O modo de se vestir pode ser uma cristalização de traumas
Outra coisa que é bom, que o terapeuta tenha sempre em mente, é que na teoria psicanalítica freudiana
existe todo o conceito de atos falhos. O doutor Freud ensina que podemos acessar o inconsciente através
de sonhos ou através dos atos falhos que são palavras que estão fora do lugar, são coisas que você
esquece cotidianamente. E existe outro lugar, onde os atos falhos acontecem ou a cristalização dos
traumas, que pode ser bastante verificada no modo como as pessoas se vestem. O modo como uma
299
pessoa se veste, pode ser uma cristalização mesmo de traumas, de percepções ou de manifestações
inconscientes, que é uma grande porta de acesso, muito clara para o terapeuta. Então o modo como
aquele sujeito entra no teu consultório, revela muito do que ele leva por dentro, seja porque está
revelado, ou porque está querendo esconder e aí vai da arte, que o terapeuta tem de perceber isso.

Caso concreto
Tem um caso de uma paciente, que era uma moça, que chegou no consultório no primeiro atendimento,
ela chega com uma blusinha branca, meio ruinzinha de qualidade, uma saia jeans também meio
desencontrada, um chinelo, ou seja malvestida. Então ela senta na cadeira, põe na mesa a chave do seu
carro, de modo displicente e começa a olhar para cima e começa a contar uma história muito triste,
muito enrolada com seu marido, do seu passado. O fato é que, quando ela botou a chave na mesa eu
olhei, era a chave de uma Mercedes e aí pela chave eu conseguiu estimar que aquele carro custava, sei
lá meio milhão de reais, na época, imagina aqui o carro que ela tá usando ou foi roubado ou não sei o
que aconteceu. Não é que ela precisa se exibir com a roupa, mas é que não era nem para ter exibição, a
roupa está muito desconectado da posição existencial dela, então dá para imaginar todo conjunto de
frustrações no relacionamento afetivo dela com o marido, com um filho.

O terapeuta tem que conseguir descrever isso, tem que imaginar a quebra de expectativa do marido
com a esposa, da esposa com marido, enfim o que cada um está entregando para o outro, o que está
acontecendo com essa dinâmica familiar. O terapeuta tem que ter a capacidade imaginativa de
descrever isso, que é uma habilidade que se recruta para o terapeuta, e uma intervenção ali na roupa já
pode ter uma grande mudança nos aspectos da dinâmica de expectativa de marido e mulher.

A paciente saiu da consulta com uma prescrição farmacológica, pois tinha uma ansiedade bastante grave
e uma prescrição de consultor de imagem e estilo, com dicas de como ela poderia olhar para a roupa e
se vestir, a unha dela também estava totalmente descascada, isso revela o estado interior da pessoa que
eu sei o que ela está entregando e o que ela está esperando do mundo e óbvio, não é difícil imaginar.

Assim, a prescrição foi o medicamento, o nome de um de um cabeleireiro, o tipo de roupa que seria bom
ela usar e a manicure. E eu disse que eu não gostaria de vê-la na próxima consulta sem essas mudanças.
E ela colocou em curso lá as coisas e na outra consulta ele voltou ainda um pouco descompassada e falou
que percebeu que a vontade de varrer a casa de madrugada diminuiu, ela tinha uma coisa de varrer a
casa de madrugada. Com essa pequena alteração de roupa dá para explicar todo motivo por que isso
aconteceu, mas eu estou apontando aqui só isso, que existem mudanças comportamentais de quadros
ansiosos e depressivos que podem de fato, ter um gatilho ali de promoção de melhora só a partir do
jeito da alteração de investimento da pessoa, isso é muito claro.

PAULA SERMAN
A Beleza é um alimento se a gente não se nutre da Beleza a gente fica fraco
300
Essa limpeza da imagem, esse Detox é puramente sintomático. É claro que a gente não pode também
ser tão reducionista de achar que uma unha descascada significa alguma coisa, pode ser falta de tempo,
mas é a janela quebrada e a gente não pode deixar a janela quebrada. Porque eu deixo uma unha
descascada hoje, amanhã, depois e vou entrando na rotina e isso tem que ser resolvido, nem que seja
apenas tirar o esmalte. Eu recebo muitos depoimentos, inicialmente a pessoa estranha esse tipo de
orientação, acha que é fútil que é que é besteira. E aí a partir do momento que a pessoa se propõe a de
fato limpar mesmo, fazer essa operação restauradora, ela percebe o impacto que tem todos os aspectos,
acho que vai muito melhor que a proposta também da experiência de botar em prática alguma atitude
bem concreta para que perceba o impacto. Eu recebo depoimento também de pessoa que fala assim:
“ah mas eu não tenho ânimo”; “eu não tenho ânimo para ir cortar o cabelo”, você sabe que o ânimo está
justamente por causa do cabelo mal cortado, a falta de ânimo pode ser por conta disso, não temos ânimo
se não comemos, só temos depois. Recuperamos a energia comendo.
A Beleza é um alimento, se a não nos nutrimos da Beleza, ficamos fraco, desanimado. Então esse
movimento é dependente do ânimo, claro que, se a pessoa tiver depressão grave vai precisar de uma
intervenção farmacológica junto, talvez junto ou antes desse movimento de cuidado, mas o ânimo vem
depois, o ânimo vem depois que a gente começa esse movimento de ordenar, como eu falei a desordem
gera desordem.
Tem um princípio da física, da segunda lei da termodinâmica que se refere a entropia. A entropia pode
ser interpretada como a desordem, e a entropia tende a se perpetuar caso não seja exercido um
trabalho, até o momento que uma atitude seja tomada, até o momento que uma intervenção aconteça,
então isso não pode depender do ânimo, porque o ânimo não vai vir com a desordem, a gente não vai
ficar animado com uma imagem desarrumada, com uma casa desarrumada, a gente fica animado depois
que a gente começa a intervir.

ÍTALO MARSILI

Existe uma visão estética, existe aquela coisa que é feia e aquela coisa que é bonita.
Certa vez no curso presencial eu estava falando sobre isso, sobre a questão da moda da estética da
vestimenta. E aí uma aluna se levantou muito nervosa e questionou sobre qual seria o meu padrão de
mulher, meu padrão de Beleza e isso gerou uma situação constrangedora. Então vale a pena pontuar
aqui, que isso não se trata de uma posição estética minha ou sua de A, B, C ou D. Um detalhe sobre a
consulta é que deve ser sempre muito delicado quando se fala sobre esses temas, porque o paciente
pode se sentir muito invadido, insultado, quando você, por exemplo, fala de um topete de uma unha de
um sinal no rosto.

Outro ponto é não impor a nossa visão estética, nosso gosto por assim dizer, existe uma visão estética,
existe aquela coisa que é feia e aquela coisa que é bonita. Agora entre o feio bonito, tem um arranjo de
possibilidade de estilo que variam muitíssimo. Portanto, não se trata de você impor seu estilo a sua
301
visão estética o seu gosto, ninguém está falando sobre isso, não deve ser assim mesmo, você vai ferir a
pessoa e vai despersonalizá-la.

Sobre a teoria da janela quebrada


(Ítalo tinha no consultório um removedor de esmaltes que às vezes era um grande gancho para a pessoa
poder falar sobre as limpezas e sobre as restruturações que ela queria fazer na vida dela).
Então um terapeuta tem que ter essas ferramentas, essas armas na sua / no seu arsenal, às vezes, a
pessoa, a partir de algo muito concreto, como o esmalte descascado que ela começa a tirar na tua frente,
que é uma coisa muito pequenininha, ela começa a elaborar a própria vida na tua frente, começa a
conseguir falar sobre aquelas coisas que ela precisa limpar, para reconstruir o que ela precisa.
É como a janela quebrada, quando você vai reconstruir uma janela quebrada, você não põe o vidro novo
em cima do vidro velho, você tem que tirar o vidro velho e arranjar um molde e botar o vidro novo. Na
nossa vida tem um monte de coisas que por analogia a gente pode entender que são assim também.
O terapeuta conhecendo tudo que a gente está falando aqui, tem que começar a montar o seu arsenal
próprio, para mim o removedor de esmalte era muito útil. A pessoa pegava olhava para sua própria unha
e começava a remover o esmalte e com duas ou três perguntas bem encaixados, a vida dela abre na tua
frente ali sem você precisar fazer um grande esforço, a pessoa começa a falar porque você deu para ela
um sinal concreto, uma materialidade simbólica diante da qual ela viu a vida inteira dela ali.

PAULA SERMAN
É muito importante essa delicadeza, esse ouvir, a atenção, a escuta e gente não aprende a escutar. A
ferramenta terapêutica da escuta
O material leva ao imaterial, a gente vê muito isso na prática do cuidado com a imagem. É mexer em
algo material que é só a ponta do Iceberg, mas tem muita coisa. De fato, a gente precisa ser muito
delicado e deixar a pessoa trazer a queixa, o que incomoda?
Há muitas regras, assim estratégia de imagem: fazer isso para alongar, fazer isso para afinar, mas o que
incomoda uma pessoa muito baixa? Às vezes a altura não é um problema e aí? Não tem uma receita de
bolo, então é realmente
Essa ferramenta terapêutica da escuta é muito valiosa, a gente parar, olhar, escutar, trazer para dentro
de si e elaborar uma intervenção, aí às vezes, a gente tem lá toda a receitinha lá na nossa cabeça, já tá
pronto para prescrever, não que seja errado, mas é preciso singularizar cada intervenção, cada
atendimento, é preciso personalizar cada intervenção que você faz, é porque enfim é isso que vai tratar
de fato alguém a gente vê muita gente reclamando, eu recebia muita gente reclamando quando eu
estava na residência: “Poxa mas eu vou lá no lugar tal e todo mundo recebe o mesmo remédio”. Talvez
não estivesse errado aquilo, talvez tivesse uma doença mais prevalente e uma prescrição mais
prevalente, mas é compreensível a queixa, é que eu não estou como quem eu sou, uma pessoa única.
Então é muito da delicadeza e da escuta.

302
ÍTALO MARSILI
Cada ser humano é único
Exatamente isso que se por um lado cada ser humano é único e cada história é única e irrepetível, por
outro lado só tem 10 lojas de roupa na cidade mesmo e só tem sete ou oito remédios que pode
prescrever para depressão mesmo, então as pessoas vão acabar tomando os mesmos remédios e se
vestindo do mesmo modo. A questão, no entanto, não é o que a pessoa veste ou quais os remédios ela
toma, mas é o modo pessoal como o prescritor ou como terapeuta fez a conexão entre uma coisa e outra
e é isso que torna e irrepetível o processo, a história personalizada e a pessoa sentem e percebe isso na
própria vida.

PAULA SERMAN
É preciso singularizar!
De acordo com um determinado tipo de método existem 12 cartelas de cores, existem sete estilos
universais, mas eu não tenho apenas 7 tipos de pessoas no mundo, eu não tenho só 12 tipos de
colorações, mas a gente precisa, dentro daquela gama limitada de classificações e de arquétipos,
singularizar.

Então mais do que ensinar regras e seguir as orientações das diretrizes é preciso saber aplicar aquilo
para cada um. Saber sair daquela diretriz, saber se movimentar dentro daquela regra, daquela
orientação, daquele caminho. Eu posso ir de bicicleta pelo mesmo caminho, eu posso ir de carro eu,
posso ir caminhando. O caminhante faz seu caminho e a gente precisa singularizar esse processo.

303
SEMANA 03: IMAGEM FERRAMENTA TERAPEUTICA

Esta aula apresenta as principais mensagens que um profissional que trata pessoas deve passar:
autoridade e acolhimento.

A IMAGEM COMO FERRAMENTA TERAPÊUTICA

O que trata o paciente é a personalidade do terapeuta. E a forma de vestir-se é uma expressão concreta
da personalidade. A primeira mensagem que o paciente ou cliente receberá é a imagem, e podemos
dizer que o tratamento começa aí.

❖ A forma de vestir-se é uma expressão concreta de personalidade, é uma linguagem não verbal tão
ou mais eloquente que as palavras.
❖ A primeira mensagem do seu cliente é sua imagem, seja em um atendimento no hospital, no
consultório, ou até mesmo on line. Já podemos dizer que é a partir daí que já começa o tratamento.

Depois da imagem, o ambiente também tem bastante impacto. Tudo o que chega à inteligência passa
pelos sentidos. É importante que os sentidos recebam uma mensagem agradável e correta. Para quem
busca tratamento psíquico, a mensagem deve ser de acolhimento, confiança e autoridade. Para
trabalhar bem, é preciso estar dentro do envoltório correto, que neste caso é a roupa.

❖ O ambiente de terapia também é muito importante, caso a consulta seja presencial. É muito
importante que os sentidos do cliente recebam uma mensagem de acolhimento, contentamento,
alegria. Por isto é importantíssimo que sua vestimenta transmita todas estas mensagens.
❖ Já falei em outras aulas, a indumentária, é como se fosse uma armadura para um soldado. Deve
oferecer distinção, mobilidade, deve oferecer proteção. Se o soldado não veste armadura, ele não
consegue exercer com excelência aquela função, aquela missão.
❖ Como se constrói uma boa imagem profissional? Uma imagem profissional, como um todo, envolve
comportamento, envolve linguagem verbal, a indumentária e a presença digital. O aspecto digital,
a presença digital é importantíssimo.

Uma imagem adequada articula estilo pessoal e ambiente, sempre é necessário conjugar estes dois
aspectos. Usaremos como referência um dentre os sete estilos universais já explicados. Para o
profissional da área de saúde, o estilo mais apropriado seria o clássico, pois transmite competência,
autoridade e seriedade.

❖ A imagem adequada é uma articulação entre o estilo pessoal e a adequação ao ambiente, sempre.
tem que conjugar o estilo pessoa e o profissional. O estilo pessoal pode ser um dos estilos universais
explicados anteriormente.

304
❖ Já para o estilo profissional, por exemplo para médicos, existe um estilo mais apropriado que é o
estilo clássico, que passa uma mensagem de competência, seriedade, de autoridade. Em geral é um
estilo que não oferece erro. Os códigos visuais de um estilo clássico, são seguros para um profissional
da saúde.
❖ O psiquiatra é um profissional que até têm uma certa licença poética, pode brincar um pouquinho
do estilo clássico, com ressalvas, o médico continua sendo médico.
❖ É esperado do profissional de saúde um pouco mais de seriedade.

As mensagens principais de um profissional que trata pessoas são autoridade e acolhimento. Quem
procura um profissional para tratar-se, espera que ele seja referência em sua área, que tenha domínio
técnico, e também deseja ser acolhido.

❖ Quando estamos fragilizados, doentes, qualquer que seja o âmbito da doença, queremos ser
acolhidos. Primeiro trataremos de como vamos transmitir esta Autoridade.

ELEMENTOS QUE TRANSMITEM AUTORIDADE

❖ Sempre falamos de códigos visuais devemos pensar em linhas, linhas retas ou linhas curvas, em
padronagens.

Para transmitir uma imagem mais assertiva e séria, recorremos à linha reta, à estrutura, ao peso visual:

➢ Peças de alfaiataria e estruturadas (aquelas que dão formato ao corpo e não o contrário, como
blazer, calça social, vestido social);
➢ Cores escuras – azul marinho, verde escuro, vinho – ajudam a transmitir certo distanciamento
importante e saudável entre terapeuta e paciente. O preto, em alguns casos, pode pesar mais,
mas é uma cor permitida.
➢ Peças de cores sólidas, ou seja, lisas e sem estampa transmitem uma imagem limpa e sofisticada.

Outro aspecto importante são os óculos.

➢ Armações mais escuras e com linhas retas ou armações metálicas finas que oferecem uma
mensagem de precisão que combina com o profissional.
❖ Óculos é um acessório que funciona maravilhosamente para ajudar a comunicar mensagens... é um
acessório importante, muito mesmo.

Calçados fechados, de bico fino para as mulheres; e para os homens, do tipo Oxford ou Derby, também
contribuem para a imagem de autoridade.

❖ Calçados fechados, de preferência.

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O jaleco distingue o profissional, caracterizando que é da área da saúde. Pode ser visto como uma peça
para estudantes, mas não é errado usá-lo.

❖ Em algumas situações, o jaleco pode ser uma ferramenta, que realmente vai distinguir o profissional,
vai dar essa caracterização de profissional da saúde. Em geral, o que se vê mais é o estudante usando
o jaleco, mas de forma alguma um jaleco é errado ser usado por um profissional experiente.

Cada profissional tem seu estilo e deve saber como fica mais confortável. Pode-se usar um jaleco bem
cortado, branco, tradicional. Jalecos decorados não transmitem autoridade.

Camisa para dentro da calça dá um ar mais arrumado e apropriado; usar blusas de manga ou manga
comprida, pois a blusa sem manga expõe muito.

❖ A blusa sem manga ela expões muito, quanto mais pele aparente, mais mensagens de abertura,
estamos transmitindo. Como falei, precisa haver um pouco de distanciamento, então é muito
recomendado que a camisa seja de manga, ou manga comprida, ou de manga sete oitavos. Sem
mangas é bom reservar para momentos mais informais.

Quanto aos acessórios, que sejam discretos, pequenos ou médios, e que não façam barulho.

Unhas em cores mais clássicas, vinho, vermelho, cores claras, nude ou mesmo sem esmalte. O que não
cabe são unhas muito coloridas, pois denotam recreação, informalidade.

O cabelo tem de estar arrumado, dominado, organizado, quer esteja preso ou não (não é regra usá-lo
preso).

Para os homens, cortes de cabelo e barba mais tradicionais.

Não é necessário usar todos esses códigos visuais, mas escolher dois ou três de acordo com o peso
pretendido para a mensagem de autoridade.

❖ E o Acolhimento?
➢ As pessoas que atuam mais com acolhimento, devem preferir linhas com mais curvas, mais
movimento; cores mais claras.
➢ Peças com caimento mais fluidos, como por exemplo, peças que sejam mais soltinhas. O que é
um caimento fluido? É aquilo que tem um certo movimento. Os tecidos normalmente são seda,
crepe, musseline, tecidos mais fininhos, eles tem um certo movimento.
➢ Cores mais claras, ou até cores quentes. O que é cores quentes? São cores que tem um pigmento
mais amarelado: amarelo, laranja, terroso, não necessariamente precisa ser um amarelo aberto,
pode ser um mostarda. Também são cores que transmitem proximidade, calor . O amarelo é cor
do sol, transmite esta mensagem de calor de proximidade.

306
➢ Óculos: com linhas mais curvas; óculos com linhas arredondadas, armação com cores mais claras,
até um pouco mais finas.
➢ Aí eu percebo que é como se fosse o contrário da Autoridade, só que estas duas características
Autoridade e Acolhimento elas podem caminhar juntas.
➢ Peças com estilo, mais descontraídas, não estou falando de peças festivas, fantasias, coisas muito
gritantes, porque isto não ajuda neste tipo de ambiente. Pode ter uma estampa, porém tem que
tomar cuidado com estampas. Quanto mais cor tiver, mais cansativa vai ficar visualmente ela vai
ser e mais risco tem de não combinar, das cores não estarem coordenadas. Se couber uma
estampa no seu visual, pode ser estampa com 2 cores; é mais seguro se está iniciando esse
processo de construção de imagem, se ainda está um pouco insegura.
➢ Estampas com 2 cores no máximo e de preferência uma das cores sendo neutra.
➢ Em algumas situações, usar um tênis mais social, não aquele tênis de academia, aquele tênis com
a cara bem esportiva. Um tênis que seja com cores mais neutras, cores mais sóbrias, ele pode
caber sim, em alguns ambientes de atendimento.
➢ Sapatilhas, sapatos baixos também podem ser usados, não é necessário usar salto. Pode usar
sapatilhas ou tênis estilosos;
➢ Por último peças com textura, como tricô, um casaco, uma blusa de lã. Por quê? Porque essas
peças transmitem um certo acolhimento, a lã é gostosa, aconchegante e quando usamos estas
peças com um pouquinho de textura, transmitimos essa mensagem.
❖ Então qual é o ideal?

ARTICULAR A PERSONALIDADE AO ESTILO DO AMBIENTE

O ideal é equilibrar os elementos de autoridade e de acolhimento. Conforme toma posse dessas


ferramentas, o profissional consegue dosá-las e incluir um pouco de cada peça.

❖ O ideal é articular elementos de Autoridade e Acolhimento. Conforme você for tomando posse, dessas
ferramentas, dessas informações, treinando, incluindo no seu dia a dia você vai conseguindo dosar
um pouco de cada peça. Vou
apresentar alguns exemplos
de looks :

LOOK FORMAL FEMININO:


❖ Por exemplo nesta primeira
foto, look mais formal,
feminino, todas as fotos
mostram uma peça mais
fluída com uma peça um

307
pouco mais estruturada. A primeira uma camisa branca mais fina e uma calça bege, duas cores
neutras, que transmitem uma mensagem um pouco mais sofisticada, mais conservadora; no segundo
exemplo, já tem uma corzinha, mas é um verde claro, junto com azul marinho, uma blusa mais fluída
que até tem uma manga mais bufante, com uma calça mais de alfaiataria. Percebam que uma calça
totalmente cumprida, que vai até o pé, ela é mais formal que a calça que vai até o tornozelo. São
detalhes que também fazem diferença. E por último, uma blusa de tricô bem fininha, e uma calça que
até tem uma estampam, mas é uma estampa que não incomoda, que não perturba, que é uma
padronagem pequena e um mix de cores mais neutras.

❖ É sempre assim, não podemos incomodar os outros com a nossa imagem. E temos que tomar um
pouco de cuidado para não fazer com que nossa roupa, chame mais atenção do que nós, do que
queremos falar. Isto não quer dizer que não possamos ter estilo, não possamos trazer um pouco da
nossa personalidade. Mas precisamos desviar, levar atenção para quem está nos escutando, para
onde a gente quer.

LOOK FORMAL MASCULINO:

❖ Aqui são os looks mais


formais, masculinos. Tem um
blazer azul marinho, com uma
camisa, calça chino91; outro um
blazer preto com uma calça cinza
e o outro com um blazer bege e
calça jeans azul. Uma calça jeans
pode entrar, mas tem que tomar
muito cuidado, se é um ambiente
muito, muito formal ou; se o seu estilo de atendimento for muito formal e; o seu paciente buscar um
profissional muito formal, não use calça jeans. Porém se não for tão formal assim, recomento uma
calça jeans escura, com corte tradicional, ela pode entrar neste ambiente.

LOOK CASUAL FEMININO :

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Calça Chino: é aquela com cara de calça de alfaiataria, mas que pode ser feita em outros tecidos, como o algodão e o jeans.
Com um corte mais reto e mais soltinha, a calça chino jeans é uma calça confortável e elegante, pois não marca o corpo e
ainda possui referências de shape de uma calça de alfaiataria.
308
❖ Se não for algo tão
formal, você já pode
trazer um pouco de cor,
conforme imagens
abaixo:
❖ Na foto ao lado, um
blazer amarelo, blusa
mostarda, apresentando
um pouco mais de
descontração nesse
visual; na segunda
imagem um tênis, o tênis
pode entrar sim, com uma calça, uma camiseta e um blazer por cima, é o que chamamos de high-
low92, ficou um hi-lo bem interessante; e na última imagem, uma saia, não havia falado de saia, mas
uma saia também pode entrar em um comprimento adequado, tem um blazer que é uma peça
estruturada com uma cor mais goiaba e uma saia mais estampada. Não é uma imagem que incomoda,
uma imagem que perturba quem está enxergando.

LOOK CASUAL MASCULINO :

❖ Na primeira imagem a
camisa com a calça, mas
não tem o blazer, tem um
tênis mais social; a segunda
imagem mais ou menos o
mesmo estilo; e a terceira
imagem, como eu falei para
vocês, um tricô, um suéter
que transmite esta
sensação de acolhimento.

92
High-Low: alto e baixo, também conhecido como Hi-lo, é uma expressão na moda utilizada para definir looks que unem o
melhor de dois mundos, o popular e o sofisticado. O estilo hi-lo possui uma combinação de elementos de grifes e outros mais
básicos.
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❖ Para acertar, este estilo de estilo pessoal e trabalho, devemos saber avaliar o ambiente de trabalho.
Basicamente podemos classificar entre um ambiente formal, um ambiente informal ou um
ambiente superinformal.

❖ Em geral, os locais / ambientes de atendimento de um paciente, se for o caso de um profissional


dessa área, um psiquiatra, um terapeuta, ou outros profissionais, em geral estes ambientes são um
pouco mais formais. Um ambiente de consultório é mais formal, um hospital é mais formal, uma
clínica é mais formal... precisamos sempre dosar os elementos de Acolhimento e Autoridade.
❖ Quando temos um consultório próprio, é mais fácil você construir uma imagem mais autoral, ainda
que o consultório seja próprio e a imagem mais autoral, tem que manter aquele ‘Q’ de autoridade.
Mas ele pode trazer mais a personalidade, até a disposição da decoração dos móveis, a forma como
você atende o paciente, pode ser até um atendimento mais próximo fisicamente, isto também traz
esta proximidade, até um pouco de descontração, mas enfim, trazer um pouco do seu estilo e incluir
elementos criativos nos detalhes...
❖ Uma coisa muito interessante, trazer alguns elementos não para tua imagem, não para a tua roupa,
mas para o ambiente do consultório, para decoração, aquilo faz parte da tua imagem, porém não
está em você. Isto pode ser bastante interessante.
❖ Algo, muito importante, na modalidade de atendimento on-line, ainda que só aparece a região
superior, também precisamos de uma imagem agradável, de uma imagem bonita e adequada, não
é só porque está no virtual que tem liberação de uma imagem menos caprichosa.

O capricho e a preocupação com a imagem independem do nível social de quem é atendido. Um


paciente humilde não se sentirá ofendido se o profissional estiver bem-vestido; mas se for desleixado,
negligente e sem consideração, sim.

❖ Este capricho, esta preocupação na produção da imagem profissional, ela independe do nível social
de quem é atendido. Atendi durante muitos anos pessoas que moravam em locais mais humildes, e
justamente por conta desta privação de ordem e de Beleza, é muito importante que levemos isto
com a gente. Como falei isto é terapêutico.
❖ É claro que existem ambientes que não vamos usar determinados adereços, por exemplo, adereços
mais chamativos, digamos joias, não convêm, não combina. Mas, uma imagem caprichosa, uma
imagem arrumada, uma imagem bonita, bem-posta, adequada, ela é sim, necessária para qualquer
tipo de paciente / cliente.
❖ Quem recebe um profissional que está bem-vestido, percebe, sente, repara, o carinho, a
consideração, a atenção que está sendo dada. Eu tive esta experiência com meus pacientes, e eles
realmente se sentiam muito honrados, quando estávamos muito bem arrumados, ele sentiam
privilegiados, acarinhados. Isto é uma dúvida muito frequente, entre os profissionais de uma
maneira geral, porque há um certo temor de humilhar o paciente, de fazê-lo sentir mal. Isto não
310
existe, a não ser que sua imagem seja uma imagem de ostentação, aí é totalmente desconectado
com qualquer ambiente. Um profissional que está ali ostentando, não está legal. O que ofende é o
desleixo, o descuido, negligência, é a falta de consideração, isto ofende.

O dresscode não deve encarcerar o profissional. Estas orientações são um caminho, uma diretriz, mas
podemos colocar nossa personalidade quer na imagem pessoal, quer no ambiente em que estamos. O
que não podemos é incomodar os outros com nossa imagem.

❖ Nenhum dresscode deve encarcerar o profissional, essas orientações são um caminho, uma diretriz,
mas não devem encarcerar ninguém.
❖ Podemos colocar a nossa personalidade, os nossos detalhes quer seja na nossa imagem, quer seja no
ambiente onde estamos.
❖ À medida que a pessoa vai amadurecendo profissionalmente, ela tem mais segurança tanto no uso
das ferramentas terapêuticas mas também no uso da própria imagem. É muito interessante este
processo, porque o amadurecimento profissional acontece também quando investimos no
amadurecimento da imagem, sendo um processo de retroalimentação. Com o amadurecimento
profissional, você vai tendo mais tranquilidade, vai conseguindo que a construção da tua imagem,
do teu vestir, seja mais fluido, seja mais autoral, mais personalizado.

A preocupação com o modo de vestir dos colegas de trabalho também não deve impedir o profissional
de vestir-se da maneira adequada. Pelo contrário, é grande a chance de elevar o tom do ambiente.

❖ É importante também haver uma preocupação com a vestimenta dos colegas de trabalho, e às vezes
isso pode até ter um impacto negativo. Já recebi muitas perguntas de pessoas que realmente não
querem se arrumar, não se arrumam, uma acabou se vestindo de uma forma um pouco mais
descuidada, desleixada, despojada demais porque os colegas de trabalho não se arrumam. Isso é um
pouco inibidor para algumas pessoas e causa uma certa vergonha.
❖ Não precisamos sentir assim, é importante haja uma harmonia na indumentária dos profissionais que
trabalham na mesma área, no mesmo setor, mas é preciso também que haja Beleza, haja adequação,
que haja ordem, então vá vestido do jeito que se deve ir.
❖ Se onde trabalha há uniforme (este traz uma uniformidade mesmo), é mais tranquilo, pois não há esta
preocupação de como se vestir. Você deve se arrumar adequadamente na sua maneira de vestir e
com certeza você tem a chance de elevar o tom daquele ambiente e que os outros colegas podem
começar querer te imitar, se vestirem melhor.

No ambiente profissional, não cabem peças extravagantes, muito justas, decotadas, com transparência
excessiva. Ao mostrar demais o corpo e a pele, transmite-se a ideia de menos autoridade e descuido da
intimidade, o que quebra o distanciamento saudável entre profissional e paciente, podendo gerar
sentimentos confusos.

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❖ O que não cabe no ambiente profissional: peças muito chamativas, extravagantes, não podemos
incomodar, perturbar a paz, de quem estamos cuidando; peças que fazem barulho; peças com
correntes; franjas; estampas muito extravagantes; cores muito florescentes; neon; acessórios que
fazem barulho; unhas muito grandes e muito coloridas; isso perturba sensorialmente.
❖ Peças muito justas; muito decotadas, transparências excessivas, quanto mais mostramos o corpo,
mostramos a pele, transmitimos uma mensagem de menos autoridade; uma mensagem de maior
abertura, de descuido da intimidade, isso quebra de uma certa forma o distanciamento saudável que
precisa ter entre o profissional e quem é cuidado, além do que isso pode nutrir algum pensamento,
alguma imaginação, algum sentimento pela pessoa que está sendo cuidada caso ela esteja mais
fragilizada e na maioria das vezes está, alguma coisa confusa com relação ao profissional, a gente
não deve permitir isso. Não estamos tratando o paciente se permitirmos que confusão dele aumente.

Bermuda, peças rasgadas e estampas infantis empobrecem a imagem. Profissionais que atendem
crianças podem ter elementos infantis no ambiente, mas não precisam infantilizar a própria imagem;
mesmo porque, na maioria das vezes, tratam com os pais.

❖ Bermudas, peças rasgadas, estampas infantis, isso também empobrece imagem infantiliza de uma
certa forma a imagem. É muito frequente entre profissionais que cuidam de crianças acharem que
eles precisam se vestir assim, de uma forma mais infantil, e não é necessário até porque quando você
trata criança você também, na maioria das vezes, quem você tem que tratar mesmo você tem que
intervir muito, são os pais da criança. A criança não vai se sentir mais confortável se você estiver
vestida de uma forma infantil, o que não significa que você não posso ter elementos infantis, objetos
infantis no teu ambiente. Não precisa infantilizar a sua própria imagem isso não é necessário pode
ser prejudicial .

O comportamento também tem algumas orientações básicas: cumprimentar o paciente, oferecer um


aperto de mão, mas sem abraços e beijos. Durante a consulta, é importante ter a atenção totalmente
dedicada, não usar o celular, falar sem grandes intervenções e escutar com paciência. A expressão do
rosto pode acompanhar a do paciente, pois isso traz conexão. Cuidar do tom de voz e postura. Despedir-
se com amabilidade, procurar não atrasar e avisar que haverá atraso, se acontecer.

❖ Vou falar um pouquinho de comportamento, ao receber o cliente dê um bom dia, boa tarde, boa
noite, um aperto de mão, não precisa ter beijo, abraço efusivo, isso não é necessário para mostrar
carinho e consideração.
❖ Durante a consulta, durante a sessão, é importantíssimo ter sua atenção seja 100% para quem você
está atendendo, sem pegar celular, a não ser que seja uma emergência. Mas em geral isso ofende,
isso quebra ali a relação de confiança do paciente em relação a você. Então não pegar celular, atenção
total ao que o paciente está falando, sem grandes intervenções, procurar escutar, escutar, escutar
com paciência.
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❖ A expressão do rosto pode acompanhar de uma certa forma a expressão do cliente do cliente
/paciente , se ele está contando uma coisa triste, você não precisa chorar junto com ele, tenha um
olhar um pouco mais acolhedor; algo feliz dê um sorriso, isso traz uma conexão entre as duas partes.
❖ Cuidado com tom de voz você, pode se sentar também confortavelmente, mas evitar uma postura
relaxada, jogada na cadeira, de perna aberta, ficar com pé batendo, evitar esses movimentos
repetitivos que acabam causando uma certa essa perturbação. Ao sair também, se despedir com
amabilidade, não precisa ter abraço efusivo, beijos etc. Algo fundamental, cuide para não atrasar
muito. Se for atrasar, pode acontecer, avisa, tenta avisar para pessoa poder se programar de uma
certa forma.

No ambiente online, também precisamos de uma imagem agradável, bonita e adequada. O digital é uma
grande vitrine, muitos pacientes e clientes buscam referências nas redes sociais. Cuidar da imagem
profissional é cuidar da carreira, demonstra o grau de excelência. Acima de tudo, a imagem ajuda a
cuidar do paciente.

❖ Por último eu queria tocar no assunto da presença digital. Todo mundo está na rede atualmente, ainda
que não esteja, ainda que você não tenha nenhuma rede social, mas sempre estamos na rede, hoje
em dia não dá para fugir. Atualmente há uma grande vitrine profissional, muitos pacientes ou clientes
enfim, eles vão te buscar baseado nas referências do teu perfil nas redes sociais, não todo mundo está
na rede.
❖ Tem essa consciência de que não basta você ter uma imagem ilibada, impecável fora da rede, mas na
rede ter uma imagem relaxado, extravagante, vulgar. Não é uma questão de você não poder ser
espontâneo não é isso. Mas a naturalidade que a gente pode ter e precisa ter, ela não é mera
espontaneidade, não é deixar correr solto, expor totalmente a vida, todos os aspectos, todos os
momentos da vida, não é necessário! Tenha cuidado com a sua intimidade, precisa ser guardada.
❖ Por último, cuidar da imagem profissional é cuidar também da sua carreira, quem te vê de uma forma
boa, com uma aparência bem montada, bem composta, vai imaginar que o teu cuidado, a tua
competência também é alta, e boa, que você tem um grau de excelência. Acima de tudo a tua imagem
também ajuda muito a cuidar do paciente, a tua imagem não diz só sobre você. Use nessa moderação,
essa ferramenta terapêutica que é valiosíssima para tua prática.

PAPO ESTILISTA ÍTALO MARSILI E PAULA SERMAN – SEMANA 03


ÍTALO MARSILI
Este é um assunto muito, muito, muito importante a ser discutido, obrigado por você ter trazido esse
assunto aqui. Queria começar a nossa conversa fazendo uma provocação hoje, talvez você lembre que
eu já falei desse caso uma vez de uma médica, que eu gosto muito, absolutamente competente, tem um
domínio profundo do assunto dela, tem o domínio teórico absoluto. Em relatos de outros pacientes
atendidos presencialmente, ela também é uma pessoa que tem uma presença muito forte, escuta muito
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bem, ela se importa para além da especialidade dela com a vida do paciente e curiosamente ela se veste
de modo que não é “médico’’ (médico entre aspas ou sem aspas como você queira). Ela é uma médica
do esporte e quando você chega no consultório dela, ela está vestida com roupa de ginástica, tênis da
Nike, calça de ginástica casaco (não está de top que a deixaria mais exposta) com casaco da Puma /
Adidas e etc., cabelo preso para trás, a unha sempre feita, cabelo sempre bem cuidado, mas ela se veste
roupa de ginástica e eu afirmo, não é estranho, curioso, eu não percebo estranheza ali como paciente
dela. Os outros pacientes que vão ser atendidos por ela nenhum deles relata isso como uma coisa que
tirasse valor, do atendimento ou da presença dela, pelo contrário todo mundo elogia e fala de como ela
ela atende bem, como ela é atenciosa e como que ela é ágil, prestativa etc., etc.. Então que exceção é
essa, Paula?

Paula Serman
Eu lembro bem dessa conversa, então como eu falei na verdade não é bem uma exceção. Na aula eu
falei. ‘conforme vamos amadurecendo profissionalmente, vamos tendo mais liberdade de imprimir a
nossa personalidade, imprimir alguns detalhes, algumas coisas que fazem parte da nossa essência. A
meu ver esse é o caso, de uma pessoa que tem um amadurecimento profissional e um domínio, é um
domínio da situação, de tal forma que ela foge do tradicional, digamos assim. Então eu não acho que
seria uma exceção, acho que é algo que denota uma certa liberdade de transitar nessa indumentária,
não conflita.
A nossa indumentária, a nossa imagem ela reforça o nosso discurso, ela suporta nosso discurso, quanto
mais bem construída a nossa imagem estiver, mais forte o nosso discurso vai ser. Então me parece que
nesse caso, existe um reforço do discurso, há uma congruência. Quando damos essas orientações, é um
caminho.

Acima de tudo acho que o profissional que está se formando, ele está no início da carreira, da vida
profissional, é bem importante que ele acolha esse caminho assim um pouco mais “regrado” digamos
assim, depois ele poderá fazer a receita dele. É como fazer um bolo, quando fazemos nas primeiras vezes,
colocamos de maneira toda certinha a quantidade dos ingredientes, e dá certo, e com o tempo, já vamos
acrescentando especiarias, trocar a farinha X pela Y, você vai pegando a liberdade, a fluidez daquilo,
tem que pegar o jeito, a segurança, no início.

A minha a minha orientação é pegar a mão, é entender os códigos visuais, entender a linguagem para
depois você incluir a gíria, para depois você incluir é as expressões idiomáticas. Eu trato a imagem como
uma linguagem que se aprende e no início você vai aprender, sim tudo “tatibitate” , de uma maneira
bem regrada, depois você implementa o seu o tom de voz, a tua forma de falar, eu acho que é por aí.

ÍTALO MARSILI

314
Eu comecei com essa provocação exatamente para abrir a cabeça das pessoas, para fazer elas
perceberem, em primeiro lugar, que eu não queria que as pessoas saíssem da formação como se
tivessem um uniforme da CIM - Certificação Ítalo Marsili, ‘para poder ser certificado pelo Ítalo Marsili
tem que se vestir assim, assim, assim, assado.....’ não mesmo! Eu estou totalmente de acordo,
concordamos 100% nesse ponto de que a experiência também dá um pouco isso, para que possamos
variar na receita, tem que dominar a receita básica de trás para diante, e não tem muito forma de
dominar a receita se você não a experimentar por muito tempo, até você entender para onde pode ir.

Paula Serman
Até para falar do teu caso, porque foi muito assim, eu acompanhei nessa transição de estilo e de fato
houve uma transição bastante congruente com teu discurso. Inicialmente era um estilo mais clássico,
mais tradicional, e depois foi tomando uma forma um pouco diferente, mas que manteve alguns
elementos, alguns elementos que trazem determinadas mensagens. Então é isso a nossa imagem vai
tomando forma , a nossa forma!

ÍTALO MARSILI
Tem algumas pessoas que falam, já vi alguns críticos falando: ‘Ítalo foi para internet, virou um
personagem, olha como ele se veste....’ Calma, na verdade se você tiver bastante atenção, você
entender que é o contrário. Eu, no consultório de psiquiatra tomei consciência muito rápido que eu
estava exercendo uma função muito importante e muito jovem. Eu com 25, 26 anos já estava atendendo
como psiquiatra, foi o inverso ‘Olha eu vou me vestir de modo mais senhorial, de modo mais clássico,
um terno quadrado superclássico, cores sóbrias, porque eu precisava imprimir uma confiança que o
paciente tem que ter de mim, isto quer dizer, ‘eu sei que sei o que estou fazendo, mas ele (o paciente)
precisa saber também.’

Ele precisa, de fato, estar ali, confortavelmente, sem a dúvida na cabeça ‘..Será que esse garoto sabe o
que ele tá fazendo?..’ Então a barba maior, até de desgrenhada propositalmente, como que o
envelhecimento, uma coisa do tipo, o cabelo um pouco maior também, o terno cortado de modo
quadrado, um pouco até mais largo do que o meu número, a calça um pouco mais ... Aquilo tudo ali foi
de algum modo calculado, em vista do conforto do paciente.

Você lembra bem, usava cores bastante sobras né era azul marinho e chumbo era o que que usava e isso
que eu usava, cores neutras, sóbrias e ponto. Depois, é evidente a autoridade vem vindo, os livros vão
sendo publicados, os resultados aparecem e eu senti um certo conforto mesmo, a liberdade para me
vestir mais como eu me visto naturalmente. Então quando as pessoas às vezes até falam que isso é um
personagem que o Ítalo criou para a internet olha, são pessoas muito desatentas no fundo, que não tem
mais a mínima ideia do que que é o dress code profissional, no ambiente profissional, médico etc., etc.

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Posso encabeçar uma outra conversa aqui contigo, Paula, só para gente concretizar, eu queria fazer uma
separação aqui entre homens e mulheres, podemos fazer, pois acho que faz muita diferença.
Terapeutas homens, na prática, no ambiente virtual, telemedicina, o que você recomenda?

Paula Serman
Sempre recomendo o terapeuta / médico, camisa social, não precisa ser necessariamente uma camisa
de cor sóbria, não precisa ser uma camisa lisa, pode até ser uma camisa um xadrez, alguma padronagem
até tradicional mas sair um pouco da cor sólida, pode-se ter um toque ali de cor, mas a camisa ela ainda
mais no online, que você só vê aqui para cima, eu penso que de fato a camisa tem um peso visual, é
importante. Traz uma autoridade interessante e como eu falei, você pode mexer um pouco no ‘estilão’
dela para talvez trazer um pouco mais de descontração, de proximidade.
A mulher não precisa ser camisa, pode ser uma camiseta, mas que não seja decotada, mulher sempre
tem que tomar um pouco de cuidado, não que o homem não tenha que ter cuidado, ele não deve, por
exemplo usar uma camisa mais aberta, eu já alguns profissionais da área médica, com a camisa bem
aberta e isso acaba sendo um decote, não é?

ÍTALO MARSILI
Tinha um professor da década de 70 ele era, com certeza que abotoava dois botões, rsrsrs , aquele
estilo, com os pelos do peito indo para fora, rsrsrs na faculdade, era tipo um ‘decote’ ....rsrsrs

Paula Serman
Então agora para mulher temos que tomar bastante cuidado com decote, não precisa ser algo
totalmente fechado, um decote que não chegue perto da região dos seios. Recomento que não use
alcinha, que use sempre a manga, um pouquinho de manga é bom, pode ser uma manguinha japonesa,
não precisa ser uma manga comprida necessariamente, mas manda eu acho importante, traz ali uma
compostura. Muita estampa também, não acho super adequado, pode ter cor, mas cor sólida ou então
essas padronagens: listra e esta é uma padronagem interessante que não compromete. Estampa as
vezes perturba visualmente, perturba, Mas estou falando assim para pessoas que estão construindo uma
imagem, eu já vi profissionais muito competentes, atendendo com uma camiseta uma estampa, mas de
duas cores, bem discreta, bem passada, com uma escala grande, era algo com muita informação.

Para mulher eu recomendo tomar cuidado com decote, um pouco de manga, pode ser uma camiseta,
pode ter cor, de preferência peça sólida, ou com alguma estampa com cor neutra a bem discreta.
Depende muito do quanto mais autoridade, mais estrutura tem que ter a peça. Quanto mais autoridade
você quiser transmitir, mais estrutura.

Sabe uma coisa interessante do atendimento online, que você pode trocar, ali rapidinho, de roupa
conforme o paciente / cliente que você estiver atendendo. Olha que interessante, acho bem legal essa
liberdade, que vamos supor, eu vou atender um senhor, uma pessoa mais velha, que espera uma
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determinada mensagem de mim, não que vá ficar fingindo que você é uma pessoa diferente a cada
atendimento, mas um pouquinho de adequação ali, não é um pouquinho de conexão com o paciente.

Você tem um trunfo ali, eu não havia pensado nisto. No consultório, você pode colocar / tirar o blazer,
conforme o que teu paciente espera de você. Eu acho que é uma ferramenta.

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SEMANA 04: MENTALIDADE UTILITARISTA

Esta aula discorre sobre os conceitos de Beleza, Elegância e bom gosto e explica como inseri-los no
cotidiano

INFLUÊNCIA DA MENTALIDADE UTILITARISTA

❖ Nesta aula vamos falar de Beleza, Elegância e Bom Gosto. Quem quer se vestir bem, quer se vestir
com Elegância e Beleza. Essa é uma demanda muito frequente.

Há quem acredite que Beleza é relativa, que Elegância é para quem tem muito dinheiro e Bom Gosto é
algo com o qual se nasce; porém, estas são colocações equivocadas.

❖ A Elegância é coisa de quem tem muito dinheiro e que Bom Gosto é algo com o qual se nasce. “Você
nasceu com Bom Gosto e se você não nasceu com já era...” Tem muita coisa equivocada nessas
colocações. Nós seres humanos precisamos da Beleza e ela não é relativa.
❖ O ser humano necessita ser elegante para ser feliz e só somos felizes quando somos elegantes e não
é algo próprio de quem tem um poder aquisitivo alto.
❖ O Bom Gosto ele pode ser aprendido ele pode ser adquirido com treino e educação. Todos esses
aspectos fazem parte de um ser humano que é dono de si, e que sabe conviver bem com os demais,
que é maduro.
❖ John-Mark L. Miravalle no seu livro chamado ‘ BELEZA - O QUE É E POR QUE IMPORTA’, fala que a Beleza
é como a felicidade, o amor e o entendimento, é para o que a pessoa humana foi feita. Uma orientação
pra Beleza é intrínseca à nossa natureza, obtê-la faz parte do nosso propósito. Ou seja, nascemos
para a Beleza e precisamos obtê-la.

O ser humano precisa de Beleza e Elegância para ser feliz, e o Bom Gosto pode ser adquirido com treino
e educação. Roger Scruton, falecido recentemente, afirma que a Beleza é uma necessidade universal e
nos faz ver o mundo como um lar, um local que nos acolhe. Aponta ainda que a Beleza é remédio para
o caos, consolação na dor e afirmação na alegria.

❖ Roger Scruton tem um documentário ‘PORQUE A BELEZA IMPORTA’, onde ele é afirma que a Beleza é uma
necessidade universal do ser humano que a percepção dela nos faz ver o mundo como lar. O lar é
aquele lugar do qual fazemos parte, é o que nos acolhe, é o aconchego no qual a nos sentimos bem e
livre. E a Beleza traz isso tudo, esse aconchego, esse pertencimento. E o Scruton continua falando
que a Beleza é remédio para o sofrimento, para o caos, ela é consolação na dor e afirmação na
alegria.
❖ E qual seria a utilidade da Beleza?

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Atualmente, tudo precisa ser útil, funcional, produtivo. Mas a Beleza transcende a funcionalidade e a
utilidade, pois não vivemos somente de necessidades básicas. Não basta comprar a primeira roupa que
aparece, sua função não é apenas a de nos cobrir.

❖ Vivemos num momento em que tudo precisa ser útil, funcional e que precisamos produzir. Sruton fala
que as pessoas precisam de coisas inúteis tanto quanto precisam de coisas úteis. Não exatamente que
a Beleza seja inútil, mas de fato não podemos comparar a Beleza a algo utilitário. Não é bem por aí.
❖ Esse equívoco, essa questão do útil traz muita fealdade, digamos assim, para a imagem, para a vida.
Vamos pensar: eu vou comprar uma roupa. E eu compro a primeira roupa que eu vi, pensando que
qualquer coisa serve. Em se tratando de algo que tem a função de ser útil e de me cobrir, o pensamento
está certo e qualquer coisa serve.
❖ Mas a Beleza, ela vai além disso, ela transcende a funcionalidade, a utilidade. Vamos muito além
disso.
❖ O ser humano não vive somente de necessidades básicas, não isso não é uma vida humana, isto é uma
vida animal e não estou falando e nem menosprezando os animaizinhos, o ser humano tem
necessidades profundas, de anseios mais profundos.
❖ Por exemplo, eu vou falar para vocês, eu tenho um gato e ele dorme numa caixa de papelão, que para
ele está tudo certo dormindo numa caixinha de papelão. Mas o ser humano vai dormir numa caixinha
de papelão? Infelizmente, em algumas situações, isso acontece. Mas quantas e quantas vezes uma
pessoa olha para essa situação e fala “Nossa, isso é desumano, que desumanidade”. E de fato é
desumano uma pessoa dormir numa caixa de papelão. Até serve para dormir, mas a gente não pode
viver só pensando naquilo que é útil no que serve no que funciona. O ser humano não nasceu somente
para necessidades básicas.
O homem contemporâneo tem necessidade de conhecer, trabalhar cada vez mais, ganhar dinheiro e
consumir. Essas coisas não são ruins em si, mas se tornam uma obstinação, deixam de ser um meio e
passam a ser um fim. Os sentidos ficam sobrecarregados com tantos estímulos e isso nos impede de
enxergar a Beleza, o que gera esgotamento.

❖ O homem contemporâneo tem uma necessidade de conhecer, de trabalhar cada vez mais de produzir,
ganhar dinheiro, de consumir. Essas coisas em si não são ruins, mas isso vira uma obstinação, não é
mais um meio e sim mais um fim da vida do homem contemporâneo.
❖ Então os nossos sentidos ficam superexcitados, é uma quantidade imensa de informações, de
estímulos, de demandas e isso nos deixa embotados para a Beleza, porque estamos saturados de
imagens ininterruptas, de barulhos incessantes. Nós perseguimos essa utilidade imediata de tudo,
isso é o valor econômico.

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❖ Nós supervalorizamos o trabalho e esse trabalho extenua nossas forças de forma que não
conseguimos contemplar e celebrar a Beleza, porque nós desaprendemos a admirar a Beleza, nós
desaprendemos a reconhecer o belo.

❖ Olha eu posso falar com experiência própria, o quanto que uma vida só de funcionar, de trabalhar, de
produzir é nociva para saúde. Nós realmente esgotamos - eu passei por isso, e eu posso falar
realmente que, a ausência de Beleza, a ausência dos momentos de contemplação, de pausa, de
descanso, eles nos adoecem.
❖ Essa mentalidade utilitarista, materialista, imediatista é fonte de muitos transtornos, de muitas
doenças. Burnout, que foi meu caso, que um esgotamento, muitas vezes relacionada ao trabalho,
depressão ansiedade, compulsão, insônia, enfim, transtornos também orgânicos, problemas
geralmente relacionados ao sistema cardiovascular, infartos, acidentes vasculares cerebrais, enfim...
❖ Podemos sim ter uma vida intensa, com um ritmo de trabalho intenso, o tempo preenchido, mas de
forma alguma nascemos para viver sem fazer nada. Mas a diferença entre trabalhar muito
intensamente e trabalhar de uma forma obstinada extenuante é grande.

A mentalidade utilitarista, materialista, é fonte de muitos transtornos e doenças, como Burnout,


depressão, ansiedade, compulsão, insônia e outros transtornos orgânicos relacionados ao sistema
cardiovascular.

❖ E como profissional na imagem eu posso afirmar que essa falta de presença, de atenção, de
contemplação é a causa de falta de Bom Gosto, de uma vestimenta ruim. Sabia que quem não tem
atenção, quem não tem presença se veste mal!
❖ Também é causa de acúmulos absurdos de roupa e de consumo excessivo, quantos armários cheios
de peças, com etiquetas que nunca foram, nem nunca serão usadas, simplesmente porque elas
precisaram estar ali, precisaram ser compradas. Por quê? Não sei... Muitas vezes essas peças nem são
bonitas, nem cabem na pessoa, nem cabe em quem comprou. Mas elas estão ali, com etiqueta,
esperando serem usadas em algum momento.
❖ Não é raro que muitas pessoas se endividam por esse comportamento impulsivo, compulsivo, que
causa endividamento, porque precisam possuir e ostentar por uma simples necessidade de preencher
um vazio que não vai ser preenchido dessa forma. Então estamos vendo algumas consequências da
ausência de Beleza.
❖ Mas de fato o que que é Beleza?

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BELEZA, ELEGÂNCIA E BOM GOSTO

A Beleza é aquilo que agrada quando é visto, segundo Santo Tomás de Aquino. É algo íntegro,
harmônico, que ilumina e se reveste de esplendor. Mas, apesar de a Beleza agradar aos sentidos, ela não
se restringe a isso.

❖ São Tomás de Aquino fala que a Beleza é aquilo que agrada quando é visto. E ele fala de algumas
características de algo belo:
➢ A integridade: vamos pensar em um buquê de flores. Quando tiramos uma parte das flores, ele
não está íntegro, ele não fica bonito.
➢ A harmonia:- vemos muitos autores falando sempre da harmonia, quando pensamos em Beleza,
que é esse pertencimento ao todo, essa consonância, é o aspecto resplandecente. A Beleza é
reluzente, ela ilumina, ela tem um esplendor.
❖ Mas, apesar da Beleza poder agradar os sentidos, ela não se restringe somente a uma experiência
sensível.

Para os clássicos, o que é belo também é bom, convém ao homem e o aperfeiçoa; é a expressão visível
do bem. A conexão entre Beleza e bondade remete à Elegância, que não se restringe a quem tem muito
dinheiro.

❖ Para os clássicos, o belo é o bom, aquilo que convém ao homem, que o aperfeiçoa. Em certo sentido,
a Beleza é a expressão visível do bem do mesmo modo que o bem é a condição metafísica da Beleza.
Quem dizia isso era João Paulo II.
❖ Platão falava que a força do bem refugiou-se na natureza do Belo. Essa conexão entre a Beleza e a
bondade nos remete a Elegância.

Elegância não é luxo ou ostentação, é a finura no trato com quem está ao redor. É gostoso estar perto de
uma pessoa elegante, pois ela se veste bem, com cada coisa em seu lugar, fala num tom de voz agradável,
traz conforto ao ambiente, não incomoda com seus movimentos, e sabe escutar.

❖ E o que é a Elegância? A Elegância é algo de gente tem muito dinheiro? Olha, não vamos ser
hipócritas! Quando temos mais possibilidade de compra, de fato nós podemos ter mais acesso a peças
que podem ter o melhor caimento, um tecido mais sofisticado, e de fato isso existe. Mas podemos ser
elegantes com pouco dinheiro. A Elegância não é luxo, não é ostentação, não é nem sequer a riqueza
da roupa. Mas é a finura no trato com quem nos rodeia.

A pessoa elegante possui compostura, limpeza e asseio com o corpo, as unhas, os dentes e o cabelo. A
compostura é uma disposição para aparecer publicamente e envolve certa ordem, saber mover-se de
modo conveniente e no momento adequado.
321
Esse domínio de si, o centro que reúne o que está disperso, é característico de uma pessoa elegante e
madura, que elegeu o melhor, fez boas escolhas. A Elegância envolve a naturalidade, que não é mera
espontaneidade. Não se trata de fazer o que quiser na hora que quiser, tampouco de assumir uma
postura introspectiva e antissocial.

❖ Vamos pensar numa pessoa elegante: eu já falei que é gostoso estar perto de uma pessoa elegante.
Porque ela se veste bem, tem cada coisa no seu lugar, adequadamente, caimento bom, é gostoso.
Também é gostoso ouvir a pessoa elegante porque ela fala num tom de voz agradável, ela é uma
pessoa que traz um conforto para o ambiente, é uma pessoa que não incomoda com seus movimentos,
ela tem a movimentação na medida, sabe escutar... A gente fica morrendo de vontade de ser elegante
e é desejável, é bom que a gente queira ser elegante.
❖ A Elegância envolve a eleição adequada para o diálogo. O diálogo adequado se faz possível, dentre
outras coisas, pelo vestuário, pela moda.
❖ Quando queremos avaliar puramente o vestuário, indumentária de uma pessoa e falar que ela é
elegante, devemos observar o caimento dessa roupa.

Se quisermos avaliar puramente o vestuário e a indumentária, um aspecto a observar é o caimento. O


bom caimento de uma peça se mostra quando parece que ela foi feita com a pessoa dentro. Isso nos
torna elegantes. Além do caimento, a peça precisa ter bom toque, tecido de qualidade, boa costura e
bons acabamentos.

❖ E o que é um bom caimento? Um bom caimento de uma peça é quando essa peça parece que foi feita
com a agente dentro. Ainda que precisemos fazer ajustes, não tem problema, é uma peça que nos
tornará elegantes. Essa peça é gostosa de tocar, ela tem uma textura boa, ou seja, ela tem um tecido
de boa qualidade, ela é uma peça que tem um acabamento bem-feito, as costuras são bem-feitas,
bem finalizadas.

Nos acessórios, também podemos analisar a qualidade material e o acabamento. Mas a Elegância é uma
característica de uma pessoa, por isso, precisamos olhar o todo.

❖ Se nos referirmos a uma única peça, um acessório ou adorno, podemos nos referir a questão da
qualidade do material e do acabamento. Mas a Elegância é uma característica de uma pessoa, então
temos que olhar para um todo.
❖ A pessoa elegante possui compostura. Que em primeiro lugar é o asseio, limpeza das unhas, dos
dentes, do cabelo, enfim, de uma forma geral, do nosso corpo. A compostura é uma certa disposição
e preparação para aparecer publicamente diante de quem, em cada caso corresponda. Envolve
também uma certa ordem, um saber mover-se, não só a ordem das coisas, mas um saber mover-se
de modo conveniente, no momento adequado, pois como eu falei é gostoso ficar perto de uma pessoa

322
elegante, porque ela sabe se mover, ela tem medida, ela tem gestos adequados, mas está muito
relacionado as boas maneiras.
❖ A pessoa composta tem um centro que reúne o disperso. Uma regra que mede e ordena. Um sossego
nascido de estar dona de si. E esse domínio próprio, esse domínio de si, ele é muito característico de
uma pessoa elegante e madura. Podemos dizer que uma pessoa madura é uma pessoa elegante. É
uma pessoa que elegeu o melhor, que fez e vem fazendo boas escolhas. Então podemos unir e conjugar
essas duas características nestas qualidades.
❖ A Elegância também envolve a naturalidade, que não é uma mera espontaneidade. Envolve sim uma
espontaneidade, mas uma pessoa natural que faz o que quer, na hora que quer, vamos supor que eu
esteja num enterro e começo a gargalhar em alto e bom som. Pode até ser espontâneo, mas isso não
é elegante, isso não é exatamente a naturalidade, não tem ordem aí, não tem medida. É uma atitude
um pouco desmedida.
❖ E também não se trata de um manter uma postura introspectiva, antissocial numa roda de amigos.
Isso também não é legal, isso também não é elegante. Também não é uma questão de viver
encarcerado, mas de não dar vazão a todas as nossas vontades e impulsos onde quer que seja.
❖ Então quem é elegante tem essa finura de alma, essa magnanimidade. Alma grande!

Quem é elegante tem magnanimidade, deseja elevar o tom, embelezar os ambientes, tornar a atmosfera
agradável. Pessoas de diferentes estilos pessoais podem ser elegantes; alguém com estilo esportivo e
natural pode ser tão elegante quanto quem tem um estilo contemporâneo, sofisticado. Quem ama a sua
dignidade, cuida da Elegância. Ser elegante consiste em encontrar motivos para expressar alegria. Ser
elegante consiste em encontrar motivos para expressar alegria.

❖ Quem é elegante deseja elevar o tom, embelezar os ambientes, trazer uma atmosfera agradável.

O Bom Gosto é a capacidade de afirmar se algo é bonito ou feio referindo-se ao todo, não às partes
isoladas. Não é algo inato, pode ser treinado e educado. Existe uma diversidade de gostos, mas há coisas
que são inegavelmente de mau gosto, que empobrecem e sujam a imagem.

❖ Bom Gosto é uma capacidade que permite afirmar aquilo que é bonito ou é feio. Quando olhamos
uma peça, nunca devemos olhar ela de forma absoluta, temos sempre que relacionar com o todo.
❖ Uma camiseta branca, pode estar bem colocada num ambiente, talvez descontraído e estar mal
colocada num casamento. Enfim, então nunca iremos avaliar algo como bom ou ruim, como bonito.
❖ O gosto não é algo inato, como eu falei no início. Ele é algo que pode ser treinado, educado. Claro que
há pessoas que nasceram em um ambiente com mais possibilidades, com uma educação que
promoveu experiencias, que apuraram o gosto de fato. O Bom Gosto é algo muito diverso. Não tem
uma regra fixa para dizermos o que é de Bom Gosto e o que é de mau gosto.

323
❖ O fato é que as coisas de mau gosto nunca são elegantes. São um pouco vergonhosas e são torpes.
Claro que existe uma diversidade de gostos, mas existe aquele que, inegavelmente, é de mau gosto.
Aquela coisa que empobrece que enfeia, que suja a imagem, como eu já falei em outra aula.
❖ O Bom Gosto ele mantém essa medida, essa ordem, mesmo dentro da moda. Mas não
necessariamente obedecendo todas as tendências e o bom gosto não nos deixa seguir cegamente as
exigências da moda, por exemplo. Aqui tem coisas que realmente não cabem, não são usáveis, são
torpes de fato.

BELEZA NATURAL

❖ E tem algo que é realmente bastante falado e comentado hoje em dia que a Beleza natural. É uma
valorização muito grande a Beleza natural.
Atualmente, há uma grande valorização da Beleza Natural. Mas enquanto uma montanha, o céu
estrelado, o amanhecer são belos por si mesmos, o ser humano vai se degenerando, envelhecendo.
Desse modo, alcançar a Beleza e a elegância exige esforço e comprometimento. A natureza, para o
homem, também abrange a cultura.

❖ Só que a Beleza do ser humano vai se degenerando, envelhecendo, a gente vai se sujando, então a
Beleza natural, não é que ela seja ruim, mas para que a gente alcance a Beleza e a Elegância, é
necessário um esforço, um comprometimento, de um adorno, de algo que complete o que está
faltando.
❖ E a pessoa elegante tem um estilo próprio. Ela não necessariamente é uma pessoa neutra totalmente.
Pessoas com diferentes estilos pessoais podem ser elegantes. Uma pessoa que tem um estilo mais
esportivo, mais natural, ela pode ser tão elegante quanto uma pessoa que tem um estilo
contemporâneo, que é um estilo mais sofisticado. Enfim, cada um dentro da sua realidade.
❖ Quem ama a sua dignidade, cuida da sua elegância. Ser elegante consiste em saber encontrar sempre
motivos para expressar alegria por meio do adorno. Muito bonito isso. E a pessoa magnânima sabe
como fazê-lo. Então essa virtude vem muito junto com elegância e com essa finura do trato.

Portanto, é necessário construir, edificar, não a partir da natureza material, mas da natureza conceitual,
que o ser humano captura por meio do intelecto. A Beleza é um transcendental que está na dimensão
da natureza conceitual. Se uma pessoa foge desse transcendental, é como um leão que foge da caça ou
um urso que foge de hibernar. Por isso não é ocioso nem fútil falar desse assunto.

❖ Então na prática como que podemos treinar esse olhar para o belo e consequentemente alcançar
elegância?

324
HÁBITOS CONCRETOS

Na prática, para treinar o olhar para a Beleza e alcançar a elegância, precisamos ter presença, ou seja,
uma capacidade contemplativa diante das coisas criadas e do ser humano. Por exemplo, observar a
natureza, que é uma fonte de Beleza, ordem, harmonia, esplendor, diversidade de cores e formas. É
importante prestar atenção à natureza todos os dias, ter momentos ao ar livre, pôr os pés na terra ou
grama, observar o céu, ter momentos de silêncio.

❖ Primeiro precisamos ter presença, fazer uns exercícios de presença. Presença é uma capacidade
contemplativa para as coisas criadas para o ser humano. Então, uma coisa muito simples que
podemos fazer é observar a natureza. A natureza é uma fonte de Beleza, de ordem, de Harmonia, de
esplendor, diversidade, inclusive, diversidade de cores, de formas. Então observar a natureza um
pouquinho todos os dias.
❖ Olha, isso é muito simples. Mas atualmente a grande maioria de nós, nem sequer olha na janela, nem
sabemos se está fazendo sol ou chovendo. O negócio é funcionar, trabalhar e produzir. Então mal
olhamos para o céu. Essa atitude de olhar e de contemplar é muito importante. Esse é o primeiro passo
para treinar o olhar para Beleza.
❖ Ter momentos ao ar livre, também é muito importante, ao sol, pé na terra, na grama, observar a
imensidão do céu, do mar, ter momentos de silêncio, ter um pouco de momento de silêncio. Como
falei somos bombardeados por um barulho incessantes, e isso embota os nossos sentidos.

Arrumar a cama é o primeiro passo para a implementação da ordem. Também arrumar-se todos os dias,
mesmo que para ficar em casa; usar maquiagem, no caso das mulheres; comer com a mesa arrumada.
São hábitos simples e concretos que nos ajudam a tocar a Beleza da criação e inserir Beleza em nossas
vidas, na imagem e no ambiente.

❖ Arrumar a cama. arrumar a cama, é um começo sim para podermos ir implementando ordem e
treinando nosso olhar; treinando nosso olhar para aquilo que está ordenado, que está bem-posto.
❖ Arrumar-se, óbvio que eu ia falar disso, arrumar-se todos os dias, todos os dias sem exceção, mesmo
que seja para ficar em casa, aliás isso não deveria nem ser uma exceção. Vou me arrumar todos os
dias, claro de acordo com cada situação. Cada situação exige um tipo de vestimenta, se arrumar para
ficar em casa pode existir uma vestimenta mais simples, se arrumar para dar uma saída noturna, vai
sair com seu namorado / marido, com os amigos envolve outra, mas arrumar-se e todos os dias dos
pais a cabeça.
❖ Comer a mesa, com a mesa arrumada, não precisa ser aquela mesa posta cheia de parafernália, que
eu particularmente acho muito bonito, mas enfim, sentar, comer, ter aquele momento da refeição,

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Não comer Jogado no sofá, em pé andando, existem circunstâncias que nos exigem às vezes alguma
coisa dessa forma, mas assim no geral é preciso esse tempo, essa pausa.
❖ Para as mulheres uma coisa bem prática, nesta questão do arrumar-se: maquiagem todos os dias. É
muito simples maquiarmos todos os dias, não demora nem 5 minutos, são produtos básicos que vão
devolvendo um pouco da cor, da vida, da ordem, da jovialidade realidade é que a gente tem. Um
acessório, arrumar o cabelo, arrumar de uma forma geral.
❖ Então esses hábitos simples e concretos, nos ajudam a tocar a Beleza, tocar a Beleza da Criação e
inserir a Beleza na nossa vida nossa imagem no ambiente. Não existe a reeducação alimentar, né
que às vezes você só come porcaria e aí você decide: ‘Não agora eu vou mudar, eu vou comer
realmente uma comida mais saudável, uma comida de verdade’, pois bem, mas você gosta mesmo é
de hambúrguer, é de tranqueira, o teu gosto está treinando para aquilo. Mas quando você faz uma
reeducação, você aprende, você vai treinando o teu paladar, você vai reeducando o teu paladar de
forma que, pode ser sim e é muito frequente, que você começou a gostar de salada, começa a gostar
e começa a mudar. Isso acontece com o gosto!
❖ Vamos falar de gosto para roupa, gente vai mudando à medida que a gente vai se educando,
educando a nossa sensibilidade, então não é algo nascemos de um jeito e vai morrer de um jeito,
não. Temos que realmente treinar é treinável isso, é totalmente possível da gente adquirir. Como eu
falei o Bom Gosto ele não é padronizado ele é diverso, mas de fato, ele nunca é torpe, nunca é
vergonhoso.

A Beleza nos salva do desespero. Muitas pessoas já tiveram a experiência de estar em um dia caótico,
mas, depois de parar e olhar para o céu, a contemplação trouxe esperança, consolo e ânimo, ainda que
os problemas continuassem lá. A Beleza é necessária, é um alimento. Se não nos nutrimos dela,
acabamos adoecendo. O amadurecimento passa pelo reconhecimento da Beleza, por saber eleger o
melhor – que é a elegância – e pelo Bom Gosto, ainda que este último seja diverso.

❖ Para finalizar vou citar uma parte de um documento de João Paulo II que fala de uma forma muito
bonita que é : “Esse mundo no qual vivemos, precisa de Beleza para não precipitar no desespero. A
Beleza como a Verdade, é o quê em fundo de alegria no coração dos homens é aquele fruto precioso
que resisti ao desgaste do tempo, que une gerações e as faz comunicar na admiração.”
❖ A Beleza nos salvar do desespero, olha você pode ter feito alguma experiência na tua vida de sentido,
você estava em um dia muito caótico, muito tenso, muito complicado e parou para olhar para o céu,
deu uma volta na praia, e aquele a tua vida continua, os problemas continuaram na mesma forma,
mas aquela contemplação te trouxe esperança, te trouxe consolo, te trouxe ânimo. De fato a Beleza é
necessária, é um alimento, nós estamos embotados, se não nos nutrimos de Beleza, estamos
desnutridos, adoecemos, e falo por experiência própria. Que a gente possa todos os dias se Nutrir de
Beleza e que a gente possa de fato reconhecer a Beleza, reconhecer aquilo que é melhor, reconhecer
aquilo que nos convém, que nos eleva para escolher um caminho Elegante e para amadurecer. O
326
amadurecimento passa pelo reconhecimento da Beleza saber eleger o melhor, pela Elegância e pelo
Bom Gosto ainda que ele seja diversa, então é isso.

PAPO ESTILISTA ÍTALO MARSILI E PAULA SERMAN – SEMANA 04

Ítalo Marsili

Eu acho que o terapeuta tendo assistido essa aula, vai tirar uma série de ferramentas para sua prática
clínica. Não se trata de enquadrar ninguém em um molde, mas nutridos de uma série de ferramentas
de um referencial teórico. Acho que ele pode conduzir muito bem o paciente, no sentido de ajudá-lo a
adquirir uma ordem.

Claro o que queremos é que ele tenha uma ordem interior, ou seja, que ele consiga diminuir seus
sofrimentos. Desse jeito consigo encontrar um sentido para uma vida que está esvaziada, para que ele
consiga encontrar uma vida mais funcional e nada melhor do que, em certas ocasiões, partir de uma
reestrutura material. Então a vestimenta e a indumentária são fundamentais para que consigamos
comunicar, esse primeiro princípio de ordem para o paciente, para alcançar uma estrutura de ordem
interior também.
Queria que você pontuasse a grande distinção de Beleza Natural ‘natural’ e Beleza Natural Humana. Ao
passo que uma montanha é bela por si só, um carvalho é belo por si só, o céu, seja estrelado, seja um
céu no amanhecer ou no pôr do sol, um céu noturno, muitas vezes coberto de nuvens, com raios
passando ali ao fundo, tudo isso é muito bonito, sem que seja necessário um toque humano para que se
realce essa beleza. Esse conjunto de coisas, dizem respeito as Belezas Naturais do mundo.

Um ser humano, ele tem um certo princípio dentro de si, que é distinto desse princípio natural. O ser
humano ele vai perdendo a ordem quando ele não se cuida. Isto é fundamental, esta é uma das
distinções mais marcantes entre o ser humano e qualquer outra coisa criada. Então você vê, um
cachorro, um cavalo, um lobo, largados na selva, largados na neve, enfim, vão se desenvolvendo
plenamente porque estão ali conforme a natureza.

O homem, ele também está conforme a natureza, mas a natureza para o homem também é cultura. Esta
é uma distinção que precisamos ter. Precisamos ter este conceito em mente. O homem largado na selva
- ele se animaliza; o homem largado na selva - ele perde os ideais; o homem largado na selva - ele
morre de medo, o homem largado na selva – ele vai perdendo sua humanidade, pouco a pouco.

Existe claro, de um lado a natureza e do outro lado a cultura. As duas coisas juntas, elas fazem a trama
da existência humana e isso sempre precisamos ter em mente. Então aquela grande discussão, aquele
grande debate, a cerca por exemplo do gênero, ‘meninos vestem azul e meninas vestem rosa’, essa
grande bobeira que circula por aí, e quando digo bobeira, digo bobeira de um lado e bobeira de outro.
327
Bobeira daqueles que defendem e bobeira daqueles que acusam. Daqueles que dizem ‘não existe
absolutamente nenhum determinante natural’ e daqueles que dizem ‘Existe um determinante natural’.
Evidente que isso aí, essa ideia polarizada, essa ideia bipolar, são pessoas que jamais observaram a
realidade.

A masculinidade e a feminilidade são ao mesmo tempo, de modo articulado, um apontamento natural


e uma cocriação da cultura, porque isso é próprio do ser humano. Essas situações humanas sempre
estiveram juntas, intricadas, para que possamos dizer que existe uma civilização humana e que ela
sempre teve também o seu elemento de cultura. E cultura é algo que se constrói, algo que se edifica,
algo que se discute, se debate, se articula e que não é um dado na natureza material é um dado da
natureza conceitual aquela que o ser humano consegue pelo seu intelecto capturar. Então por isso para
o homem estar integrado nessa natureza, para que o homem possa estar integrado na sua função, para
que o homem possa estar integrado nas suas potências, ele também precisa articular a natureza nele,
que não é só a natureza natural como costumamos perceber, mas a natureza conceitual também.

Essa natureza conceitual, também é carregada de um transcendental, como chamamos na técnica


chamada BELEZA. A Beleza é um transcendental, explico isso na minha parte do curso, mas é um
transcendental que o homem tem que estar atento e ir articulando na sua narrativa, na sua biografia. Se
o homem foge deste transcendental, é como um leão que fuja da caça, como um leão que fuja de comer
carne, é como um urso que fuja de hibernar. O urso pode fugir da hibernação, mas ele vai ser menos
urso, ele ficará fraco, ele volta na primavera fraco porque não hibernou no inverno. O leão ele realmente
pode não comer, pode não começar e não comer carne. Ele se tornará um leão atrofiado, estará traindo
sua natureza.

O homem ele tem também a natureza de animal, também se tem que cuidar da carne, obviamente, mas
precisa cuidar de outra coisa, que é do campo conceitual. A Beleza é um desses transcendentais que
estão particulados na estrutura humana, Por isso que não é ocioso, não é fútil, não é desnecessário a
gente falar de todos esses assuntos aqui, em vistas a admissão do sofrimento de nossos pacientes.

Muito do sofrimento das pessoas, se dão por esta visão naturalista do homem, que corre nos tempos
atuais: o homem como uma máquina; o homem como um relógio; o homem como simplesmente um
amontado de células ou de carne, que tem pulsões, desejos materiais que estão sendo sustentados ou
satisfeitos é isso, também é verdade, isso também é um homem.

Mas ele não é só isso, um homem a gente ele precisa se alimentar também do universo dos conceitos.
E uma das substâncias mais prevalentes no universo dos conceitos é isso que se chama de Beleza. Por
isso que eu recomendo, mais uma vez, vivamente, que o autor que a Paula citou aqui, Roger Scruton.
Ele tem diversos livros acerca do tema. E um dos grandes campos de análise de estudo do Roger Scruton
é a estética. Ele torna a estética bastante palatável para um não especialista em Filosofia, por isso que
328
é um autor que a gente recomenda com muita tranquilidade. Também tem um documentário produzido
sobre ele, está disponível na internet, ‘Porque a Beleza Importa’ é um e o outro é a ‘Consolação da
Filosofia’, no qual também se fala bastante sobre a Beleza bucólica do Campo. É um pouco romantizada,
confesso, para o meu gosto, mas aponta ali algo da Beleza que Roger Scruton está imerso
biograficamente. Então é um autor bastante palatável, bastante fácil de capturarmos os conceitos. Não
é um curso de estética, nem de simbólica, Estética, digo o campo da Filosofia chamada Estética, não é
que iremos aprofundar também neste domínio, mas que ele oferece muitos recursos, que o terapeuta
que queira entender o motivo pelo qual estamos falando essas coisas aqui.

É importante falarmos sobre a harmonia desse transcendental chamado Beleza, para a nutrição
biográfica do ser humano concreto, sobretudo que sofre, que aparece no nosso consultório,
diariamente, por este motivo daqui, que estamos apontando.

PAULA SERMAN
Eu repito, eu reforço, que precisamos dar atenção a esta contemplação, prestar atenção mesmo na
Beleza, porque de fato ,precisa que chegue nossos sentidos, ainda que não se reduza a uma experiência
sensível a Beleza, mas precisamos fazer com que chegue nos nossos sentidos informações boas e belas.
Falo porque eu estive no outro lado, no lado que estava só recebendo informações ruins, de dor, de
sofrimento, de mau cheiro, miséria e etc. é isso de fato adoece o ser humano, ainda que seja muito
nobre é digamos assim, ainda que seja muito importante o trabalho, a dedicação, a situação de fato
não diminui a intensidade do trabalho, pelo contrário faz com que a gente trabalha melhor, entenda
mas o ser humano, presta atenção, ouça, se acalme, organize as ideias, expanda a consciência. Essa
contemplação, essa atenção para aquilo que é bonito. Essa educação para reconhecer aquilo que é
bonito, enfim, reforça isso.

Quando você trabalha com imagem, é importante, de fato, que você capture o gosto de quem você está
atendendo, mas que também ensine, ensine um pouco do que de fato, vale a pena, o que que é elegível
o que que vale a pena eleger, no caso eleger no teu guarda-roupa. Muitas vezes, não dá para confundir
o gosto com aquilo que é bom. Às vezes o gosto ele é um gosto que ‘está mal-educado; gosto não
educado’. Então o gosto mal-educado vai eleger só coisa ruim . Eu gosto muito de fazer essa comparação
com alimentação, um paladar mal-educado vai escolher comida ruim e isso vai ter consequência.
Então é isso, é preciso também não ter medo, quem que se propõe a trabalhar dessa forma, a ensinar
de fato, (aprender também ) mas ensinar de fato aquilo que é elegível; aquilo que é desejável, para uma
imagem bonita, bem construída, respeitando a diversidade de gosto, isso totalmente é possível.

329
Semana 05: VIRTUDES

Esta aula indica as virtudes envolvidas no bem vestir-se e aponta alguns hábitos cotidianos que contribuem
para adquiri-las

O QUE SÃO AS VIRTUDES


Virtudes são bons hábitos que, repetidos várias vezes, tornam-se uma segunda natureza. São atitudes
firmes, disposições estáveis, perfeições habituais da inteligência e da vontade. Virtus significa força, as
virtudes forjam nosso caráter. Para ser uma pessoa madura, feliz e realizada, é necessário crescer em
virtudes.

❖ Fazem parte de nosso caráter. Precisamos crescer em virtudes para sermos mais maduros e livres.
❖ São atitudes firmes, disposições estáveis, perfeições habituais da inteligência e da vontade.
No fundo são esses bons hábitos que nos levam a perfeição na inteligência e na vontade.
Virtus significa força, as virtudes forjam nosso caráter. Perfilam cada vez mais a nossa
personalidade.
❖ Para ser uma pessoa madura, consequentemente mais feliz e realizada, é necessário crescer em
virtudes.
❖ Mas o que elas tem a ver com o ato de vestir-se que é um hábito cotidiano, corriqueiro, muitas
vezes fútil no imaginário de muitas pessoas?
As virtudes são obtidas no dia a dia, nos hábitos corriqueiros. E vestir-se é um ato puramente humano,
que envolve bons hábitos. Por trás da mãe de família ou de uma profissional bem-vestida, há uma mulher
que acordou cedo, vestiu uma roupa previamente escolhida e está pronta para cuidar da família ou para
promover um ambiente agradável no trabalho. Ou seja, há esforço envolvido nesse hábito.
❖ Por trás da mãe de família ou de uma profissional bem-vestida, há uma mulher que acordou cedo,
muitas vezes antes de todos, ainda com sono, sem muito animo pra muita coisa, mas o dia já começou
e muita gente depende dela. Ela está disposta a melhorar e aparência e sabe que isso pode trazer
muitos benefícios. Então ela toma um café rápido, vestiu uma roupa previamente escolhida no dia
anterior, porque senão não daria tempo dela escolher uma roupa boa, bonita e adequada se fosse
assim nessa correria e está pronta para cuidar da família ou para promover um ambiente agradável
no trabalho.
❖ Nessa hora que ela já está pronta e bem-vestida, toda a família acorda e eles gostam de vê-la bem-
vestida e bem cuidada. Eles começaram a gostar dessa mudança, de ver essa mãe e essa esposa com
uma boa aparência. Quando todos estão prontos, vestidos e alimentados, começa a rotina, que pode
ser em casa, em home office, na educação dos filhos, no cuidado com a casa ou na saída do trabalho.
Vamos supor que ela foi trabalhar, felizmente chegou na hora, e chama a atenção pela boa aparência,
todos gostam de estar perto dela, o ambiente fica naturalmente tranquilo, agradável. Os demais

330
acabam até se vestindo melhor por causa dessa mudança, dessa boa aparência dela. Em casa também
os ânimos se acalmaram, a comunicação familiar melhorou. Que história linda, mas vãos prestar
atenção nos detalhes pra que essa história tenha acontecido. Foi por acaso? Certamente não. Ou seja,
há esforço envolvido nesse hábito.
Por outro lado, se essa mulher vestisse qualquer coisa, se não acordasse a tempo para arrumar-se, se
achasse que não precisa vestir-se bem para ficar em casa, que a competência é suficiente, o ambiente
inteiro ficaria com um clima ruim.
❖ Se essa roupa não tivesse sido separada no dia anterior, se ela não tivesse acordado um pouco mais
cedo mesmo cansada, se essa mulher vestisse qualquer coisa, se não acordasse a tempo para arrumar-
se, poderia ter chegado atrasada no trabalho, se achasse que não precisa vestir-se bem para ficar em
casa, que a competência é suficiente, o ambiente inteiro ficaria com um clima ruim.
❖ Imagina também se toda essa intenção dela na busca da boa aparência fosse receber um elogio, como
seria a frustração se ela não tivesse recebido. E se ela fosse ficar em casa e achasse que não tivesse
obrigação de se arrumar nem nada. Ou se no trabalho achasse que não precisaria se vestir tão bem
porque a competência profissional é suficiente.
❖ O que fez com que tudo corresse tão bem foram as virtudes.
AS VIRTUDES ENVOLVIDAS NO VESTIR-SE BEM

As virtudes diretamente envolvidas no bem vestir-se, são as seguintes:

ORDEM:

A primeira é ordem, a presença de cada coisa em seu devido lugar, a hierarquização das prioridades. É
ela quem permite a escolha prévia da roupa, a programação dos acontecimentos para evitar atrasos.

❖ A justaposição, a presença de cada coisa em seu devido lugar, a hierarquização das prioridades. É
uma característica do que é belo. É uma ordem dos afetos, é uma ordem da inteligência e da vontade.
É ela quem permite a escolha prévia da roupa, a programação da sequência dos acontecimentos
para evitar atrasos, para que todos se beneficiassem, para que o dia corresse de forma tranquila.
No âmbito material, denota asseio, higiene e respeito pelos outros.
No âmbito imaterial, funciona como uma engrenagem bem articulada nos afetos e atividades, que
facilita, que tira o peso de nossa vida e da dos outros.
❖ Poupa trabalho e desgosto aos que convivem conosco e aos que colaboram com o nosso trabalho
profissional.
Essa ordem pode ser alcançada com atitudes simples e concretas, como ter um horário fixo para acordar,
arrumar-se todos os dias. O ordenamento exterior leva à ordem interior
331
❖ Isso alimenta, provoca, ajuda na ordem interior. Tirar realmente aquilo que não está legal, que suja
a imagem e organizar, por exemplo o guarda-roupa, especialmente na questão de vestir. É muito
importante que a gente visualize as roupas que temos, os pertences, os objetos que possuímos, para
que de fato possamos usar.
FORTALEZA:

Outra virtude é a FORTALEZA. Ela robustece a vontade, para que sejamos capazes de enfrentar as
dificuldades sem medo, para buscarmos os bens árduos sem desistir por causa dos sofrimentos.
É firmeza e constância na procura do bem. Para a maioria das pessoas, pode ser desafiador vencer o
desânimo, a preguiça, a falta de tempo e dinheiro para arrumar-se, mas não podemos paralisar diante
das adversidades normais da vida.

Para embelezar, precisamos nos esforçar. Acordar mais cedo, não comer de tudo o que tiver vontade,
não falar tudo o que vem à cabeça são alguns hábitos que podem contribuir na busca da fortaleza..

❖ Se frear um pouco especialmente na hora da raiva, sorrir mesmo nas situações difíceis, mesmo no
meio do caos, pra ser forte precisamos ser assim. E também ser constante, não desistir, permanecer,
manter esse hábito diário de vestir-se bem.
MAGNANIMIDADE

A MAGNANIMIDADE é a grandeza de alma, a vitória do amor e da fortaleza sobre pusilanimidade, sobre a


mesquinhez e o conformismo. É uma força que move alguém a sair de si mesmo, a fim nos prepararmos
para empreender obras maravilhosas em benefício de todos.
Quando calculamos as vantagens e benefícios em tudo, colocamos somente o mínimo esforço e estamos
sendo pusilânimes (pessoas que não tem ânimo, fracas). A pessoa que age assim nunca sairá do
acostamento da vida, nunca vai entrar na estrada grande, nunca vai sair da mediocridade, da
passividade,
❖ Ficará na mediocridade até chegar ao fim da vida. E vai chegar ao fim da vida com as mãos vazias.
Na questão do vestir-se, se alguém não faz esforço, acha tudo caro, não vê motivos para arrumar-se,
verá sua falta de vontade afetar outros âmbitos de sua vida. Muitos têm medo, não se vestem bem
porque não querem aparecer.
❖ Isso acaba fazendo com que a vida seja muito rasteira.
❖ Olha, não se trata de aparecer no sentido de desfilar, de fazer um teatro de aparências na frente dos
outros, não é um espetáculo.

Aparecer implica responsabilidade, mostra certa disponibilidade para o serviço.

332
A pessoa se engana dizendo que não quer ser vaidosa, mas, na verdade, o medo de aparecer pode ser
um sinal de mesquinhez.
❖ É uma mesquinhez de alma, de pusilanimidade, é querer ficar ali no cantinho, sem se envolver. Não se
trata de vaidade, mas sim de se vestir como uma pessoa madura e se colocar a serviço.
Para alcançar a Magnanimidade, é necessário começar a fazer tudo por amor, para servir, e fomentar o
desejo de uma vida elevada, de comprometimento.

❖ De querer aparecer para comprometer-se. Não ter vergonha de aparecer com uma imagem bonita,
bem-vestida e atraente, porque não tem nada de mal nisso, pelo contrário. Para que você assuma
as rédeas da sua vida. E permanecer firme no desejo de fazer os outros mais felizes. Porque quando
fazemos os outros felizes, ficamos mais felizes também.

É importante para nós mesmos vermos uma imagem bonita e ordenada de nós mesmos, podemos
mudar nossa vida e impactar positivamente a vida dos outros.
TEMPERANÇA

A virtude da TEMPERANÇA, que é a moderação dos desejos e prazeres sensíveis também, está relacionada
ao vestir-se. A falta de moderação aparece no consumo, no acúmulo (de coisas boas e ruins) ou na
economia exagerada.
A Temperança, porém, estabelece o equilíbrio e a harmonia entre a dimensão espiritual e a dimensão
corporal.

❖ Então essa medida nos ajuda a não esquecermos que somos seres humanos. Nós não somos só essa
dimensão biológica palpável.
Precisamos enxergar as roupas e adornos como meios e não como fins, ter o desprendimento de possuir
coisas, mas sem viver por elas.
❖ Encarar as coisas como elas são, coisas. Eu vejo muitos armários com bastante quantidade de roupas,
e um apego absurdo as peças, uma pena de se desfazer, e são peças que nem são usadas. E isso é uma
falta de medida.
Para alcançar essa virtude, algumas práticas são: eliminar o excesso de roupas, fazer uma lista de
necessidades, não comprar tudo o que se vê, comer somente até saciar a fome.

❖ E esse autodomínio não é pra mostrar força e autossuficiência. É para poder servirmos melhor.

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CARIDADE

A principal virtude é a CARIDADE. É ela que nos leva a amar sem reservas ou limites; que faz com que a
gente saia de nós mesmos, que nos doe, é a primeira de todas as virtudes, sem a qual as outras não têm
sentido.
No aspecto da beleza, da imagem, a caridade é o que nos motiva, pois o ato de arrumar-se bem só ganha
consistência, só tem valor verdadeiro se não se encerrar em si mesmo.
❖ Se ele não fizer com que nos afoguemos na nossa própria imagem, como o Narciso.
Tem de ser um ato para fora, que expande o coração, se envolver esse esquecimento próprio com o
objetivo de tornar os outros mais alegres.
❖ Está muito relacionada as outras virtudes e a magnanimidade, fazer as coisas por amor mesmo.
Esquecer de nós mesmos, dos nossos incômodos pelos outros.
Doar para quem não tem, ser generoso com os bens materiais, emprestar sem apego, sorrir e não
reclamar são hábitos que ajudam a crescer em caridade.

❖ Uma grande fonte de animosidade, de hostilidade no ambiente familiar é a reclamação infinita.


Nesse âmbito do vestir-se é bem comum reclamar porque não está dentro do peso, reclamar porque
não tem roupa, reclamar porque não tem o dinheiro que queria ter. Isso é uma atitude pouco
generosa. Então, procurar sorrir e não reclamar mesmo daquilo que de fato pode incomodar.
❖ Essa entrega de nos mesmos, que é o objetivo maior, foge um pouco dessa lógica humana calculista.
Esse crescimento nas virtudes faz com que sejamos mais livres, mais realizados. Uma pessoa
realizada não é necessariamente uma pessoa famosa profissionalmente, uma pessoa que tem
muitos bens, um poder aquisitivo alto, tem fama. Isso pode ser bom, mas na verdade o que nos faz
realizados é quando temos virtudes, quando temos uma vida virtuosa mesmo.
❖ Esses hábitos como doar, acordar mais cedo, pode nos dar a impressão de que estamos tirando um
pouco de nós, mas no final das contas não tira, só expande o nosso coração. Só preenche.
Vestir-se bem envolve todos esses bons hábitos e virtudes. É um passo importante para o
amadurecimento, que nos instala na realidade, ajuda-nos a servir e a sermos mais úteis.

ÍTALO MARSILI:
Paula, mas uma vez fantástico. Eu acho que tem uma série de exercícios aí implícitos dentro dessa aula,
para o terapeuta pegar e ir destrinchando e ir colocando em prática conforme for o caso com os
pacientes que apresentem as questões para ele, isso é claro.

334
Eu queria girar um pouquinho para discutirmos o outro lado, pólo receptivo também, a virtude de quem
está do outro lado. Não apenas em virtude de quem se veste.
E aqui eu queria colocar como referencial teórico, um sujeito chamado Romam Ingarden que criou o
método da estética receptiva alemã. Então ele começa trabalhando as obras de arte literárias. Ele diz o
seguinte: “o texto literário é um texto que é intencional e heterônomo”, ou seja, existe uma intenção
daquele sujeito que escreve o texto, existe uma virtude de quem escreve o texto, uma virtude com uma
intenção artística, com uma intenção simbólica. Mas, ele é heterônimo no sentido de que essa intenção
artística só se completa na receptividade daquele que está lendo o texto. Como se as obras de arte
fossem incompletas e só encontrassem a sua completude naquele que a recebe.

Então é como se fosse assim, quando me visto... E podemos fazer uma extrapolação, aqui já não é o
cânone por assim dizer da estética receptiva alemã. Então estou fazendo uma extrapolação para a nossa
função. Entendendo a vestimenta como uma história que se conta de modo artístico, quando se tem a
virtude no vestir. Claro que podemos nos vestir sem nenhuma intenção. Como um sujeito que de repente
vai ali parir uma coisa qualquer, ele vai dizer que aquilo é arte. Eu falo olha, se não existe uma intenção
estética, ou uma intenção de expressar a beleza aquilo não é arte, ainda que o outro lado perceba como
arte.

Essa é a discussão, existe uma discussão ampla sobre as artes desconstruídas contemporâneas. Eu tenho
uma ideia específica, na minha ideia, particular e concreta, sim aqueles borrões do Pollock são arte.
Podemos discutir isso em algum momento específico, de repente na formação continuada, em alguma
sessão clínica, podemos discutir sobre a percepção estética. Mas existe uma discussão, então isso não é
pacificado na teoria estética contemporânea.

Mas é ponto pacífico que existe outro lado, que é o polo receptivo. O Ingarden, sobretudo, depois as
escolas que sucedem, o Gadamer ele completa esses estudos. Mas o fato é que podemos compreender
agora com uma extrapolação minha, isso é uma leitura minha sobre a vestimenta. A vestimenta como
uma obra de arte narrativa.

Então, é arte se for intencional e é narrativa porque é uma pessoa que está vestindo. Que está contando
uma história através de um símbolo estético específico, que é a sua indumentária. Então percebemos,
por exemplo, que em obras de arte literárias mais realistas ou mais naturalistas, menos psicológicas, por
assim dizer, ou seja, grande parte dos romances contemporâneos e modernos, a roupa faz parte da cena
na maior parte das vezes. A história poética também se conta a partir da roupa. Então nesse sentido
existe uma virtude que é a intenção daquele que e veste, o pudor, a magnanimidade, caridade,
continência, várias virtudes específicas que poderíamos trabalhar.

335
Mas pegando a teoria da estética receptiva vamos pensar o seguinte, olha, é que essa virtude só se
completa quando temos o polo receptivo. Então esse é um ponto também a ser trabalhado nos nossos
pacientes. A história se completa quando os nossos pacientes fazem o pólo oposto daqueles que se
vestem para eles também. E que na vida prática e concreta é bastante simples. É valorizar, apontar,
comentar de modo positivo, propositivo sobretudo e de modo alegre sobre a roupa por exemplo dos
outros.

Nos nossos ambientes existe o clima de fofoca, clima de maledicência, clima de inveja, de disse me disse,
de tentar puxar o tapete um do outro, isso nós sabemos. O mundo estético, o mundo da beleza, ele
nunca se completaria desse modo. E talvez essa seja uma das grandes causas de neuroses do nosso
tempo. O polo receptivo da estética está corrompido porque a visão virtuosa está corrompida. Se ainda
existe um olhar para receber virtuosamente a estética oferecida, toda essa dimensão estética que
podemos apontar como triangular, porque existe aquele que emite, o referencial e aquele que recebe.
Uma das pontas do triangulo está quebrada. E aí o triângulo da virtude se frustra, em se frustrando o
triângulo da virtude que refere ao transcendental que é a beleza, vai haver claro um princípio de caos e
desorientação, que é propriamente o que se observa hoje.

Então podemos fazer uma conexão muito segura, ainda a nível especulativo, eu preciso realmente
escrever sobre isso ainda. Pegando a teoria da estética receptiva do Ingarden, a hermenêutica
trabalhada pelo Gadamer, trabalhar isso tudo com a virtude, apontando para a esperança, conectando
com a beleza. Na prática, no seu ambiente familiar, você deve ter um olhar que seja receptivo da beleza
oferecida pelo mundo. E como estamos em um universo humano, o sujeito só repara que você recebeu
a estética e a completou em si, se você falar. Porque o ser humano é um bicho de linguagem. E na prática
é mais concreto ainda, falar é elogiar, é comentar. E você pode fazer esse comentário de modo negativo,
destrutivo, quebrando um dos tripés do triangulo da estética. Ou completando, reforçando esse
triangulo.

Uma coisa que o terapeuta tem sempre que olhar no seu paciente, tentar propor pra ele, é trabalhar
essa virtude do olhar que completa a estética e que comunica isso para o mundo através de uma fala
amorosa, de uma fala propositiva. Ainda dito de outro modo para simplificar mais ainda, tentar quebrar
o espírito de maledicência e de inveja no fundo, porque isso é uma das coisas que a vestimenta pode
causar. Se aparece alguém bem-vestido, maquiado, pronto, o ambiente pode receber isso de modo
muito negativo. E o nosso paciente pode ser justamente um desses pés que quebra o processo. Quando
ele faz isso, ele é o maior prejudicado, porque ele não está conseguindo completar em si aquilo que a
estética tem a oferecer. Isso faz sentido?

336
PAULA SERMANN:
Isso faz muito sentido. Na prática estou lembrando aqui principalmente de mulheres que de fato se
vestem, impõe ali um empenho para estar mais apresentáveis, mais bem vestidas e o marido não elogia.
Isso é muito comum e frequente, e na dinâmica familiar esse é o caso que eu mais recebo. Isso é um
ponto mais sensível. Não é pra qualquer pessoa, mas no ambiente familiar acho que podemos sinalizar
esse desejo de recepção da estética. Meu conselho especificamente para essas mulheres que passam
por isso é esse. Realmente é uma falta de atenção de fato. E por isso não tem essa capacidade de receber,
de completar a virtude. Então acho que também podemos trabalhar nesse sentido de ajudar a pessoa a
perceber.

ÍTALO MARSILI:
E sem querer escandalizar ninguém, no fundo abrindo um outro campo dentro desse campo que é o
campo das traições, das infidelidades. Tudo é muito superficial e banal no fundo, por mais que a pessoa
ache que a história dela é incrivelmente diferente, é sempre a mesma coisa, sem querer excluir,
obviamente nunca se pode excluir a culpa por assim dizer, o a intenção daquele que trai.

Mas a verdade é essa, estou querendo localizar esse lugar muito sólido e muito concreto das relações
familiares, matrimoniais, conjugais, que é o complemento estético. Se a mulher nunca recebe elogio, e
ela não completa o vínculo transcendental da beleza com aquele que elogia, ou seja com o marido. O
fato é que se o marido não elogia, o amigo do trabalho vai elogiar. No fundo é bem banal, sempre começa
por aí. Vai elogiar e ali o triângulo estético está completo. Cria-se um vínculo transcendental através da
beleza e uma intimidade começa a se aventurar ali, e pode ser que haja um flanco aberto do outro lado.

Essas coisas obviamente não são determinantes, nem são mandatórias, porque tem sempre a liberdade
e a vontade no coração do homem e da mulher. Mas é um fenômeno que acontece, não podemos ser
bobos. E o terapeuta tem que ter certos movimentos muito claros na cabeça dele para conseguir ajudar.
Então ás vezes se pretendem voos muito elaborados acerca desses temas e a coisa é muito banal no
fundo, é muito simples. Tão simples quanto isso, por exemplo, a teoria da receptividade estética é muito
simples, mas ela dá conta de resolver um monte de questões relativas ao relacionamento.

RECEPTIVIDADE DA BELEZA

Roman Ingarden criou o método da estética receptiva alemã, a partir de obras de arte literárias,
afirmando que o texto literário é intencional e heterônomo, ou seja, há a intenção de quem escreve,
mas esta só se completa na receptividade de quem lê.

337
Extrapolando para a temática da aula, entende-se a vestimenta como uma história que se conta de
modo artístico, como uma obra de arte narrativa.
Assim, existe a virtude daquele que se veste, mas só se completa quando há o pólo receptivo.
Isso é um ponto a ser trabalhado: a história se completa quando os pacientes podem fazer o pólo oposto
àqueles que se vestem para eles.
Na vida prática, isso se dá na valorização, no apontamento, no comentário positivo sobre a roupa dos
outros.
Em nossos ambientes, existe um clima de fofoca, de maledicência, em que não existe um olhar para
receber virtuosamente a estética oferecida, e isso gera frustração.
No ambiente familiar, por exemplo, precisamos ter um olhar receptivo à beleza oferecida pelo outro,
pelo mundo.
Como a linguagem é característica do ser humano, o sujeito só repara que a estética foi recebida quando
o outro fala.
Por isso, é necessário quebrar o espírito de maledicência e inveja, e elogiar.

338
Semana 06: OS SETES ESTILOS UNIVERSAIS

Esta aula explica os sete estilos universais e o modo como eles contribuem para o amadurecimento

OS SETE ESTILOS UNIVERSAIS

A personalidade é a articulação entre nosso interior e o mundo que nos cerca. Ela é única, própria, e
alguns códigos visuais podem traduzir o modo como queremos nos expressar, ainda que sem dizer nada.
Os estilos pessoais são um modo de agrupar esses códigos visuais
❖ Eles e ajudam a expressar aquele nosso interior e aquilo que é único dentro de nós, nas diversas
situações.
❖ O que é o Estilo? O Estilo é a forma de dizer quem você é sem falar nada. O seu cliente quando entra
em seu consultório, ele já fala quem ele é, pela forma que se veste.
A americana Alyce Parsons criou uma classificação de estilos pessoais a partir de um estudo
comportamental de diferentes grupos de pessoas. É uma ferramenta que serve tanto para homens,
quanto para mulheres.
Seu objetivo não é encarcerar, mas oferecer um caminho, uma linguagem da qual a pessoa possa se
apropriar.
A classificação está dividida em sete estilos universais, e três deles são considerados principais. Estes
falarão mais alto, enquanto os outros quatro são complementares, adicionam criatividade e inovação à
imagem. Em geral, tentamos equilibrar dois estilos, mas não se trata de uma regra, mas de uma
ferramenta.

ESPORTIVO:
Também chamado de natural ou confortável (comfy). Transmite mensagem amigável, despretensiosa,
despojada, simples. Prima pelo conforto e praticidade, sem preocupar-se com detalhes.
Peças que oferecem mobilidade (bolsas grandes, tênis e sapatos baixos), adereços simples e poucos, combinações
de cores pouco elaboradas (cáqui, azul marinho).
Maquiagem, barba (não precisa ser bem elaborada, nem tão certinha) e cabelo naturais. Estilo próprio de quem
precisa de mobilidade no dia a dia e no trabalho (fotógrafos, mães ou professoras de crianças pequenas, pessoas
que trabalham com vendas, etc.).

Podem acontecer exageros no despojamento, passando a imagem de desleixo; mas, cuidando da elegância, é um
estilo que transmite mensagem de abertura e simplicidade.

339
CLÁSSICO OU TRADICIONAL:
Transmite mensagem de discrição, seriedade e competência. É um estilo de pessoas mais conservadoras
ou tradicionais, ou que trabalham em um ambiente que tem essa característica (advogados, médicos,
altos cargos, governo).
Peças mais fechadas, cores discretas e neutras (não necessariamente escuras), linhas retas bastante
presentes, peças de alfaiataria (calça social, blazer, saia reta ou lápis).
Quem tem este estilo, não é uma pessoa extravagante, espalhafatosa. Sempre passa a impressão de
uma pessoa bem apropriada.
Maquiagem adequada sem ser chamativa, cabelo organizado, acessórios discretos (pequenos ou médios).

CONTEMPORÂNEO OU ELEGANTE:
Transmite mensagem de sofisticação e refinamento. Característico de uma pessoa atenta ao que está
acontecendo na moda, o que não significa ser escravo da passarela.
São normalmente pessoas cultas, como jornalistas, influencers, consultoras de moda e diplomatas se enquadram
neste grupo.
Peças com linhas simples, medianamente estruturadas, alfaiataria mais moderna e menos séria, de alta qualidade
e bom caimento. Tecidos sofisticados como seda, couro e musselina.
Geralmente as peças que usam são de excelente qualidade, com um caimento impecável.
Podem ter um pouco mais de informação nos acessórios, como por exemplo: scarpin de oncinha, animal print,
salto agulha. No homem usa até um jeans mais curto, sapato docksider.
Maquiagem e cabelo impecáveis (para o homem também, cabelo impecável), cores neutras com valorização do
monocromático.

ROMÂNTICO:
Transmite mensagem de doçura, delicadeza e gentileza. Em geral, aparece mais em mulheres que em homens.
Característico de pessoas que trabalham com crianças, de conselheiros e terapeutas.
Peças com elementos delicados, como babados, rendas, bolinhas, saias e vestidos com balanço e movimento,
manguinha bufante.
Nos homens, aparece nas cores mais suaves, tons pastéis, cabelo um pouco mais comprido, peças acolhedoras,
como o tricô.
Quando os estilos complementares aparecem muito, podem dar um tom caricato.
Muitos elementos românticos, por exemplo, podem infantilizar, transmitindo uma mensagem ingênua e pueril.

SEXY:
Transmite certa ousadia, provocação, atrevimento. Quem tem esse estilo gosta de chamar atenção, o que pode
acontecer pelo olhar, pela maquiagem, até de forma sutil, sem necessariamente mostrar muito o corpo.
Peças mais justas, com mais decote, mostram mais a pele; couro, animal print, e mais transparência trazem a
mensagem de ousadia.
Pessoas com este estilo mais comumente trabalham como dançarinas, modelos, personal trainers, atores.
340
Pode-se ter esse estilo mantendo a elegância, mas ele transmite a mensagem de mais ousadia.
Quando em excesso, passa muita abertura e facilidade, por isso é necessário tomar cuidado com seus
elementos.

CRIATIVO:
Transmite mensagem de originalidade, inovação e liberdade. Quem tem esse estilo gosta de criar e
performar, inventar em cima da imagem, não liga para regras e proporções.
Em geral, é próprio de pessoas da mídia, produtores de moda, consultoras de imagem, artistas.
Nos códigos deste estilo, há a presença do hi-lo (alto-baixo), que é uma combinação de diferentes
estilos, mistura de texturas, peças opostas.
Maquiagem tem a característica de liberdade para criar, cortes de cabelo assimétricos, acessórios podem
ser étnicos ou vintage.
Se houver excesso, passa-se o ar de confusão e desorganização.
A pessoa pode não se importar, mas temos que considerar que a articulação entre estilo pessoal e
adequação é importante.

MODERNO:
Também chamado de dramático urbano. Transmite imagem de impacto e certo distanciamento, de
poucos amigos.
Típico de quem gosta de tendências, das passarelas, da atenção ao que está em alta.
Quem costuma aderir a este estilo são modelos, influencers, pessoas da área da moda, profissionais de
marketing.
Tecidos mais pesados como o couro, roupas escuras, acessórios metalizados e grandes, óculos escuros
bem presentes.
Elementos deste estilo em excesso podem causar a impressão de muito distanciamento, de esnobismo,
e de que a pessoa é uma fashion victim (escrava da moda).

ESTILOS COMO FERRAMENTA TERAPÊUTICA

Essa classificação é uma orientação, agrupa os diferentes códigos visuais. É uma ferramenta para
identificar alguém e interpretar o modo como ele se coloca, seu estilo de vida. O objetivo é ter uma
ferramenta para reconhecer e orientar alguém, para que ele se adeque melhor a seu ambiente.
O estilo pessoal está ligado à realidade e pode mudar ao longo da vida, de acordo com os diferentes
acontecimentos. Ao mudar de fase da vida, acontece uma mudança na imagem, pois a nova etapa exige
uma imagem de acordo.

341
Cada estilo traz uma imagem referente ao comportamento. Não existem somente sete tipos de pessoas,
os estilos universais são uma classificação que nos ajuda a entender o comportamento. Esta é uma
classificação entre tantas outras.
É importante que a imagem da pessoa seja singularizada. Duas pessoas com o mesmo estilo se
apresentam de formas diferentes, como nos exemplos apresentados na aula.
Entender os códigos visuais de cada estilo é uma ferramenta diagnóstica ou terapêutica. Por isso, é muito
importante treinar o olhar para captar os códigos visuais.
Em um primeiro momento, assumir um estilo pode parecer algo artificial, mas posteriormente esse
estilo passa a fazer parte da pessoa.
Uma pessoa que está encaixada no próprio estilo, também está instalada na realidade, o que a ajuda a
amadurecer, a ser quem realmente é.

342
Semana 07 : TRAÇOS INDIVIDUAIS

Esta aula comenta características físicas relativas ao corpo, rosto, olhos e cabelo e explica as mensagens que
elas transmitem.

OBSERVAÇÃO E ANÁLISE DE TRAÇOS NATURAIS

As pessoas manifestam seu interior e intimidade através do corpo, da cabeça aos pés. O rosto é
protagonista da imagem e deve ser o primeiro foco ao olharmos para alguém, pois seus elementos
contam uma história.

Isso não significa que os traços naturais traduzem exatamente quem somos, mas apontam para algo.Se
estiverem incongruentes com o que se deseja comunicar, é possível intervir com acessórios, mudanças
de cor, dimensões ou linha.

OLHOS

Os olhos são a janela da alma. Para conhecer uma pessoa, olhamos em seus olhos. Por outro lado, se
ela não está aberta, se ela não quer deixar se conhecer, desvia o olhar, não faz contato visual.
A forma dos olhos traz uma mensagem:
➢ Olhos Amendoados transmitem algo de vívido, sensual, curioso.
➢ Olhos pequenos, mais comuns em pessoas asiáticas, transmitem um olhar suave e às vezes cansado,
o que pode causar um ruído na comunicação.
➢ Olhos caídos têm uma queda na pálpebra e passam fragilidade emocional e também cansaço.
➢ Olhos fundos evidenciam as olheiras, mas podem ser mais penetrantes.
➢ Olhos grandes passam uma mensagem de atenção e expressividade.
Nenhum elemento do rosto ou corpo pode ser analisado isoladamente.
O tipo de olho não transmite tudo sozinho. Precisamos pensar também na cor, na sobrancelha, entre
outros elementos.
Por exemplo, olhos claros trazem uma mensagem de suavidade, enquanto os escuros trazem mais peso,
por exemplo.
Um elemento acessório ao rosto são os óculos. Muitas pessoas usam óculos permanentemente, de
modo que isso faz parte de sua imagem.
Se existe uma parte do rosto que incomoda, os óculos podem ser usados para tirar atenção deste local.
Esta é a grande estratégia da imagem.

343
Existem critérios que podem ser usados para escolher óculos que combinem: determinar o que se quer
transmitir e analisar a proporção das três partes do rosto (parte superior -testa, segundo terço- meio
do rosto, terceiro terço -boca e queixo e as partes que incomodam).
A cor dos óculos e armação também fazem diferença. Os óculos podem realçar a beleza natural, trazer
mais seriedade ou gravidade:
➢ Passar uma ideia de precisão:(armações metálicas, finas e com linhas retas);
➢ Levantar: desenho para cima;
➢ Cair o olhar: linhas inclinadas para baixo;
➢ Trazer uma energia masculina: aviador;
➢ Trazer energia feminina: linhas mais curvas;
➢ Preencher linhas de expressão: redondos;
➢ Transmitir ousadia: óculos gatinho.
Ou seja, sua função é muito importante.

CABELO

Outro elemento importante é o cabelo, que faz a moldura do rosto.

❖ Primeiro de tudo é importante ver o cuidado com o cabelo: se é cuidado, limpo, se tem corte
harmônico.
❖ As mensagens naturais não nos definem totalmente. O importante é observar o que queremos dizer,
qual a imagem que queremos passar.
Se o cabelo não está em conformidade com o rosto, transmite uma mensagem confusa.
Por isso é importante prestar atenção ao cabelo do paciente ao recebê-lo.
Em geral, fios mais lisos e retos transmitem organização, o que não quer dizer que uma pessoa que não
tem cabelo liso não seja organizada.
Importante lembrar que os traços naturais não nos definem totalmente.
Cabelos ondulados comunicam leveza e têm ar de sensualidade.
Cabelos cacheados ou crespos dão ideia de descontração e liberdade.
Fios curtos em mulheres podem trazer um pouco de energia masculina, ousadia;
Fios longos, denotam mais feminilidade, certo romantismo, por vezes pode pesar no semblante.
O cabelo louro transmite luminosidade, enquanto o escuro traz mais peso e até a ideia de mais idade.
Os fios coloridos (verde, rosa, azul) transmitem criatividade e originalidade.
Alguns tipos de penteado também trazem informações.
➢ Coque alto: mais atrevido e jovial;
➢ Coque baixo: tradicional, mensagem conservadora;

344
➢ Rabo de cavalo: mensagem despretensiosa e de praticidade;
➢ Cabelo raspado: força e desprendimento do apego excessivo à imagem;
➢ Cabelo baixo/batido nos homens: imagem mais organizada;
➢ Cabelo grande no homem: mensagem mais romântica e despojada;
➢ Franja: pode infantilizar, mas não se deve analisar isso de maneira isolada.

ROSTO
O formato de rosto também demonstra algo.
Se o rosto é mais arredondado, sem pontas ou linhas retas, traz ideia de suavidade e aconchego,
mensagem mais feminina e pueril.
Rostos quadrangulares são os que têm linhas mais retas, trazem mensagem de assertividade, mais força,
energia mais masculina.
Para os homens, a barba equivale à maquiagem, muitas vezes vale a pena investir nessa característica.
Traz uma mensagem de força e masculinidade; uma barba mais volumosa e preenchida também dá ar
de mais idade.
A barba tira a ideia de menino, e além de preencher e completar as partes do rosto, também pode
equilibrar suas dimensões.
Por outro lado, tirar a barba é uma estratégia para comunicar mais limpeza ou uma mensagem mais
conservadora, em alguns casos.

CORPO
O corpo é o grande mediador entre mundo interior e exterior, e existem diferentes tipos de corpos.
Tanto para homens, quanto para mulheres, podemos enquadrá-los em algumas classificações, as quais
têm objetivo de ajudar, não de encarcerar.
Retângulo: distância entre os ombros é a mesma do quadril, com pouca cintura; ampulheta: similar ao
retângulo, mas com mais cintura;
Triangulo ou Pêra: quadril mais largo que os ombros; oval: abdome mais pronunciado.
É possível haver também uma mistura dessas características.
É interessante definir o tipo corporal para saber quais peças favorecem mais. Isso é, de certo modo,
curar uma dor, porque é sofrido procurar uma peça que valorize você e não encontrar.
Isso acontece com pessoas que estão acima do peso, são muito magras ou têm uma desproporção
grande.
É sempre bom equilibrar com o jogo de claro e escuro, colocando o claro, estampa ou textura no lugar
que tem menor dimensão e trazer o escuro, opaco, para onde há maior dimensão.
Uma regra básica para equilibrar as dimensões, é não usar algo muito largo ou justo, mas o meio termo.
Atributos físicos que conferem força ao visual, geralmente mais presentes nos homens, mas não
necessariamente:
345
➢ Estatura alta,
➢ Escala óssea mais robusta (punho grosso),
➢ Pescoço mais grosso e curto,
➢ Ombros mais largos,
➢ Contraste pessoal (diferença de cor entre cabelo, pele e olho)
➢ Alto.
Atributos físicos que conferem mais suavidade ao visual:
➢ Estatura baixa,
➢ Escala óssea delicada (punho fino),
➢ Pescoço mais comprido e fino,
➢ Ombros mais estreitos,
➢ Contraste pessoal mais baixo.
Outro detalhe importante é a postura.
➢ Uma pessoa que tem postura ereta e peitoral aberto passa a impressão de mais confiança,
segurança e abertura para os outros.
➢ Postura encurvada traz mensagem de timidez, temor, fechamento, afastamento.
A forma como nos sentamos também traz uma mensagem:
➢ Sentar-se encostando na cadeira, perna cruzada ou apoiada passa a imagem de respeito;
➢ Bem diferente é sentar de modo relaxado, com as pernas abertas.
Essas são algumas ferramentas de observação do rosto e corpo.
Existem ainda outros elementos não abordados aqui, como o sorriso, que transmite uma mensagem
mais aberta, de quem quer conectar-se, enquanto quem não sorri passa uma mensagem mais séria,
reservada e, às vezes, mal-humorada ou triste.
É importante conectar os traços naturais do rosto aos adornos, ao corpo, pois isso também causa um
efeito. Todos esses elementos são uma linguagem, muitas vezes mais eloquente que palavras.

COMENTÁRIOS PAULA SERMANN


No Brasil o tipo de corpo bastante comum na mulher, é o corpo triangulo. É aquela mulher que tem o quadril e o
bumbum mais evidente, mais largo que os ombros.

Deve usar peças que disfarçam o quadril: saias mais soltas, evasê, não acrescentar volume embaixo, trazer o
volume para cima, colocar estampas para cima.

Os homens o tipo de corpo é o triângulo invertido, ombros mais largos que o quadril.

Quando tem “barriga e estômago”, usar peças mais soltinhas, linhas mais retas que criam uma ilusão de ótica.
346
Semana 08: AS CORES

Esta aula aborda as cores na imagem pessoal e a mensagem que elas transmitem

CORES E CARACTERÍSTICAS NATURAIS

A cor é o primeiro elemento percebido pelo interlocutor, por isso, é fundamental que saibamos
interpretar sua mensagem e seus efeitos.
Cada pessoa tem uma paisagem natural, cores que fazem parte dela: cabelo, pele, olho, boca, mãos. A
cor se concentra mais no rosto, é onde conseguimos percebê-la melhor.
Começamos observando a cor da pele, se a pessoa está corada, amarelada, com aspecto opaco ou
acinzentado. Isso pode ser resultado da roupa ou maquiagem interferindo no visual, ou mesmo trazer
informações sobre patologias, que podem 3 AULA 8 MODA ou não ter repercussão psíquica.
Além das cores próprias, há outros elementos, como acessórios e roupas colocados da cintura pra cima,
que impactam na expressão facial.
Na consultoria de imagem, há a etapa da coloração pessoal, em que se analisam quais cores melhor
harmonizam com a pessoa, trazendo ar de saúde e luminosidade, ressaltando pontos positivos.
As cores que não estão na coloração pessoal, por outro lado, trazem um ar mais abatido, de doença,
desânimo ou cansaço.
A coloração pessoal é uma análise técnica, feita por um profissional. Mas, com um olhar atento, é
possível perceber se a cor está valorizando a pessoa ou não. Uma dica é observar a pessoa sob a luz
natural.
CONTRASTE ENTRE CORES
O contraste é a diferença de claro e escuro entre cabelo, pele e olho.
A coloração própria e o contraste passam muitas mensagens. Por exemplo, a pessoa com cabelo e olhos
claros tem baixo contraste, e essa informação traz uma mensagem mais suave.
Se o cabelo e os olhos são escuros e a pele é morena, há um contraste médio, passando a mensagem de
aconchego e proximidade.
Cabelo escuro, pele clara e olhos também claros têm alto contraste entre pele e cabelo, mas com a
suavidade dos olhos.
Cabelo, pele e olhos escuros aumentam o contraste, dando a ideia de impacto e força.
Cabelos ruivos trazem uma mensagem mais exótica e ousada, por não ser tão comum.
No homem, a barba também deve ser considerada, pois pode ficar grisalha, trazendo contraste.

347
A MENSAGEM DE CADA COR
Cada cor tem uma mensagem. A psicologia das cores pode ser usada nas roupas e também nos
ambientes, na imagem pessoal e profissional.
➢ Azul é a cor mais aceita, agrada a maioria das pessoas, transmite tranquilidade, estabilidade,
serenidade.
➢ Verde lembra a natureza, tem vitalidade, nos faz lembrar da esperança e do dinheiro.
➢ Amarelo é uma cor solar, transmite calor, proximidade e descontração.
➢ Laranja é uma cor exótica, transmite prosperidade e sucesso.
➢ Roxo remete à espiritualidade, à magia e ao mistério.
➢ Rosa pode transmitir romantismo e feminilidade, mas, dependendo do tom, o significado varia.
➢ Vermelho transmite paixão, energia, excitação.
➢ Marrom transmite uma mensagem mais séria e profunda.
➢ Cinza passa neutralidade e estabilidade.
➢ Branco dá a ideia de paz, pureza e limpeza.
➢ Preto remete ao distanciamento e até à morte, mas também ao glamour.
As cores têm uma linguagem própria, que devem ser compreendidas dentro de um contexto. Nenhum
elemento pode ser interpretado isoladamente.

DIMENSÕES DAS CORES


A cor tem três dimensões: temperatura, intensidade e profundidade.
➢ Temperatura: cores quentes (pigmento amarelado), transmitem mensagem mais amigável e
acessível; e frias (pigmento azulado), passam uma mensagem sofisticada, mais distante e clássica.
➢ Intensidade: cores intensas, saturadas, com mais brilho passam dinamismo e energia. Cores
opacas transmitem mensagem mais conservadora, tímida e reservada.
➢ Profundidade: cores claras revelam, expandem, e transmitem leveza; podem dar a impressão de
que o ambiente ou a dimensão corporal são maiores do que 9 AULA 8 MODA realmente são.
As cores escuras fazem o contrário, retraem e disfarçam, passam gravidade e autoridade. Cores neutras
são chamadas de acromáticas

COORDENAÇÃO E COMBINAÇÃO
As cores Neutras (Acromáticas) foram misturadas com muitas cores e adquiriram essa característica
neutra. Não se impõe nem atrapalha, está no meio termo.
Neste grupo estão as cores cáqui, bege, azul marinho, cinza médio, bordô e verde militar.
São facilmente coordenáveis e trazem uma mensagem de sofisticação.
348
A coordenação de cores se remete à sua combinação. A primeira dica é olhar para a natureza e ver se
há tal combinação nela
O círculo cromático também é uma ferramenta para analisar se a combinação funciona.
Ele consiste em um arco-íris fechado com todas as cores, cujas dimensões e direções são usadas para
combinar cores complementares (cores opostas) ou cores análogas (próximas, uma ao lado da outra),
por exemplo.

CÍRCULO CROMÁTICO

Cores Complementares
Cores Complementares
Decompostas – Tríade

As cores complementares são aquelas que


Nessa combinação do círculo cromático,
apresentam maior contraste entre sim e
também chamada de tríade, utiliza-se três
são opostas no círculo cromático. Por
cores equidistantes que formam um
exemplo: vermelho e verde.
triângulo.

349
Cores Análogas: Trata-se das cores que estão lado a lado no círculo cromático, como laranja, amarelo e
verde, por exemplo.
É importante entender a mensagem da combinação de cores, analisar também suas dimensões, pois
não se trata de uma análise isolada.
A orientação para quem está começando a construir sua imagem é começar com poucas cores e
combinar cores neutras, sem muitas informações.
Para compreender a linguagem das cores, temos de analisar os traços naturais e a harmonia da
combinação de adornos, roupas e acessórios, observando se as cores realçam os traços naturais ou os
apagam.
Podem-se capturar muitas informações nas cores dos pacientes e aplicar isso à própria imagem.
Além de a cor ser um dado diagnóstico, também pode ser uma ferramenta.
❖ Combinação de cores opostos no círculo cromático, formam excelentes combinações:
➢ Roxo e Amarelo; Vermelho e Verde; Laranja e Azul .
❖ Combinação de cores análogos:
➢ Verde e Azul; Verde e Amarelo; Rosa e Vermelho.

350
PSICOPATOLOGIA

ÍTALO MARSILI

351
Semana 01: TÉCNICAS DA PSICOPATOLOGIA

Esta aula tratará sobre a importância no domínio das técnicas de psicopatologia para que o terapeuta
possa ter uma visão ampla do homem e, assim, realizar diagnósticos eficazes. Também abordaremos
características essenciais a um bom terapeuta

DESAFIOS NO DOMÍNIO DAS TÉCNICOS DE PSICOPATOLOGIA

Se pegarmos a origem etimológica do termo psicopatologia, saberemos que estamos falando sobre
patologias, ou seja, doenças da psique. Isso pode até parecer um pouco trivial e muito óbvio; no entanto,
em nosso tempo, vemos que cada vez mais psiquiatras e psicólogos escolhem não se aprofundar nas
técnicas da psicopatologia, tampouco entender as minúcias de cada doença psíquica, justamente por 3
acreditarem que o tratamento sempre se dá da mesma maneira.
❖ Psicopatologia: doenças da Psique. Psiquiatras e psicólogos não dominam as técnicas da
psicopatologia.
❖ O psiquiatra pensa: “Porque quero saber sobre a diferença entre uma pseudo-alucinação uma
alucinose, se no final das contas darei o mesmo remédio para todos eles?”.

De algum modo, a farmacologia acabou aplainando a visão diante dos fenômenos que a psicopatologia
tenta descrever. Se, por um lado, nós conseguimos entender o motivo pelo qual a psicopatologia foi
perdendo prestígio no último século, por outro lado nós também percebemos que, sem as ferramentas
da psicopatologia, fica muito difícil — para não dizer impossível — entender as manifestações
patológicas da psique.

❖ A farmacologia não dá conta das grandes doenças psíquicas. Atualmente muitos médicos se tornaram
“Prescritores de Fármacos”;

É disto que se trata esta disciplina: distinguir com precisão os fenômenos que se apresentam ao
terapeuta, tanto o caso do paciente completamente doente do ponto de vista psíquico (ou seja, o
paciente esquizofrênico) quanto o caso do paciente que não tem doença psiquiátrica, mas tem uma
disfunção na sua psicodinâmica.

SÚMULA PATOLÓGICA: A FERRAMENTA FUNDAMENTAL AO TERAPEUTA

No consultório, nos deparamos com as questões triviais dos pacientes, cotidianas e fantasiosas, as
dificuldades de se manter numa atividade profissional, familiar, espiritual, aqueles vazios no peito que
as pessoas relatam, às vezes sem nenhuma precisão.

352
O problema é que não há resolutiva para muitos casos, porque o próprio profissional não consegue
entender o que está acontecendo. Muitas vezes, na melhor das hipóteses, o profissional conta com o
bom senso ou com uma técnica mal compreendida que lhe foi ensinada durante a sua formação. A
Psicologia não é a disciplina do bom senso e do bate-papo, no entanto.

Por isso, a Súmula Psicopatológica é a ferramenta essencial ao terapeuta, sem a qual ele não pode olhar
para uma pessoa, dar-lhe um diagnóstico psiquiátrico e entender a sua psicodinâmica. Sem ela, não é
possível prescrever e iniciar um tratamento. Porém, para que seja eficaz, a súmula precisa ser feita da
maneira certa.

❖ Se não temos as ferramentas adequadas, podemos confundir os transtornos. Ítalo pegou um caso
diagnosticado como Esquizofrenia e na opinião dele, depois de realizar uma Súmula Psicopatológica
bem-feita, chegou ao diagnóstico de Transtorno Obsessivo Compulsivo. Ítalo acrescentou remédios
adequados para TOC e aos poucos as vozes que o paciente escutava foram diminuindo, e ele nunca
mais precisou ser internado.
❖ A Súmula Patológica é a ferramenta sem a qual o terapeuta não pode dar um diagnóstico psiquiátrico
ou entender a sua psicodinâmica. Por que um paciente não pode controlar sua compulsão alimentar
diante de um bom propósito? Por que não conseguem se manter numa atividade profissional, familiar,
espiritual e tem aqueles vazios no peito? Muitas vezes o terapeuta pode embarcar nas queixas
confusas, difusas do paciente e pode acabar piorando o estado mental.
❖ Qual é a ferramenta da psicanálise? Qual a visão de mundo da psicanálise? Qual a visão do homem
da psicanálise? A que pretende a psicanálise? A atual formação do psicanalista não consegue dar
resposta a estas questões.
❖ Neste curso irei proporcionar ferramentas para você responder e posicionar “o que é um homem e
uma mulher”; “o que é um homem e uma mulher disfuncionais / doentes” e quais ferramentas com
precisão, não com achismos (nem bom senso) chegar ao diagnóstico.
❖ A Psicologia não é a disciplina do bom senso, do bate papo e nem é “ah, tem um cara legal que me
entende”. O bom profissional tem que articular, uma boa apresentação moral e o conhecimento
técnico e profundo. Preciso que os alunos reflitam em seu próprio amadurecimento como profissional,
para termos excelência nesta certificação.

UMA NOVA GERAÇÃO DE TERAPEUTAS

O objeto do processo terapêutico é a personalidade do terapeuta que, como profissional, também tem
suas responsabilidades. A principal delas é articular a formação moral e o conhecimento técnico
profundo.
353
Os terapeutas lidam com o sofrimento, o vazio das pessoas, as vidas despedaçadas, fracas e
fragmentadas precisando de ajuda. Por isso, é muito importante que ele tenha uma personalidade
sólida e madura que possa servir de porto seguro, de referencial, de chão estável sobre o qual essas
vidas possam se desenvolver em paz.

O terapeuta precisa ter um comprometimento real, genuíno, verdadeiro e biográfico. Não basta ser um
curioso da técnica e da formação ou, por outro lado, apenas comprometer-se com a vida moral.

Há necessidade das duas coisas: ser uma pessoa moralmente boa e também possuir conhecimento
técnico e acadêmico. O terapeuta precisa, portanto, articular essas duas coisas dentro de si.

O terapeuta permanece sendo terapeuta quando volta à sua casa, durante o final de semana com a
família, quando está de férias. Isso significa que a visão de mundo e o olhar, o comprometimento do
terapeuta continuam mesmo depois de sair do consultório. A todo instante o seu olhar precisa estar
atento à realidade. Por isso a prática terapêutica não é uma atividade de pessoas imaturas.

❖ Neste curso irei proporcionar ferramentas para você responder e posicionar “o que é um homem e
uma mulher”; “o que é um homem e uma mulher disfuncionais / doentes” e quais ferramentas com
precisão, não com achismos (nem bom senso) chegar ao diagnóstico. A Psicologia não é a disciplina
do bom senso, do bate papo e nem é “ah, tem um cara legal que me entende”. O bom profissional
tem que articular, uma boa apresentação moral e o conhecimento técnico e profundo. Preciso que os
alunos reflitam em seu próprio amadurecimento como profissional, para termos excelência nesta
certificação.
❖ Temos que ter um comprometimento real, genuíno, verdadeiro e biográfico, enquanto terapeuta. Ele
tem que articular o conhecimento técnico e a retidão de comportamento humano. Um terapeuta
segue sendo terapeuta 24 horas por dia; é uma disponibilidade de alma, de olho, de percepção...Nosso
universo interior deve ser amplo, cheio de referências ou estarei sempre aquém, abaixo das questões
humanas.
❖ A terapia não é uma atividade de pessoas imaturas que não tem experiência de vida. Isto não está
relacionado a idade cronológica, mas a atenção focada no humano. Pessoas para serem bons
terapeutas devem ser ATENTOS.

A arte do terapeuta é descobrir o que a pessoa tem, no que ela acredita e como ela organiza uma coisa
na outra, como ela está integrando uma coisa na outra. De algum modo, dar o diagnóstico para agir
agora e prever onde vai estar o problema daqui a alguns anos. Esta é a arte no consultório!

354
A VISÃO AMPLA DO HOMEM

Quando o terapeuta está diante de um paciente, precisará entender que ele possui fenômenos corporais
e fenômenos que são interiores. O paciente se mostra com o seu corpo, mas o ser humano não é apenas
o seu corpo físico. Todos somos mais alguma coisa.

Da mesma maneira, um paciente quando chega no consultório, tem um corpo, manifestações corporais
e uma espécie de espelho — cuja residência é ainda desconhecida — que tem impressões sobre o mundo
no qual está instalado. Por isso, o terapeuta precisa ter alguma ferramenta que possibilite visualizar esse
corpo, entender e perceber o que é normal e o que são alterações ali presentes. É necessário ter a
mesma ferramenta para perceber nesse espelho interior o que é normal e se há nele alguma alteração.
Esta é a disciplina da psicopatologia.

A psicopatologia fornece, por meio de uma técnica fenomenológica, as ferramentas necessárias para
que o terapeuta consiga visualizar, de algum modo, o universo interior e o universo do corpo.
1
N
Imagem interna do produto /
A espelho

N Corpo / Produto
A
❖ Como terapeuta você tem que entender neste corpo o que é Normal ou se tem Alterações e tem que
ter as ferramentas para olhar o espelho e verificar se lá também está Normal ou se tem Alterações.
❖ Por meio de uma técnica fenomenológica você terá as ferramentas necessárias para que o terapeuta
consiga visualizar o universo interior e o universo do corpo.
❖ A psicopatologia investiga como está a saúde dos seus componentes, material do seu corpo. Tenta
acessar o universo interior do sujeito.

Psicopatologia Explicativa:
Parte do princípio de um referencial teórico; por exemplo: “o homem é um conjunto de células
organizadas, com impulsos e ligações nervosas, que respondem sempre a um mesmo modo a um
estímulo externo” (behaviorismo)”; “o homem é uma psiquê e seus arquétipos e se movimenta
arquetipicamente no mundo” (Jung). São linhas que já dão um referencial teórico do que é um homem.

355
Psicopatologia Descritiva:
Não parte de referencial teórico. Está preocupada em descrever, em observar este interior e
exterior. Não parte de referencial teórico. O terapeuta deverá ter domínio da linguagem, do seu
idioma e uma capacidade de escrever / descrever.

SEMANA 02: ATITUDE e APARÊNCIA

Esta aula tratará dos dois primeiros itens da súmula psicopatológica: Aparência e Atitude. Lançaremos
um olhar simbólico para elas, a partir da divisão do corpo humano em quatro partes: cabeça, tronco,
braço e membros.

ATITUDE E APARÊNCIA
A Aparência e Atitude comunicam muito. Não comunicam tudo, mas dão indícios do que se passa dentro
de uma pessoa.

No inventário médico, escreve-se uma Súmula Psicopatológica numerando de 1 a 18 itens. Nas


faculdades, não é ensinada a ordem interna da súmula (corpo, espelho e elemento integrador), mas sim
uma ordem qualquer e aleatória. Em geral, ordem alfabética.

❖ São os dois primeiros itens da súmula Psicopatológica: Atitude e a Aparência. Estes itens
comunicam muito. Tudo? Não, porém comunicam muito.
❖ Lapiseira e Giz: evocam uma mesma ação ➔ ESCREVER – verbo é uma ação e é imaterial;
❖ Copo de Plástico e Lapiseira de plástico: mesmo material, porém evocam verbos diferentes➔ BEBER
e ESCREVER;
❖ O mundo do corpo é uma presença de Verbos de Ações;
❖ “O mundo do corpo é a manifestação de algo que não é corpo”.
❖ Escrever é corpo? NÃO! Quando você olha para um giz ele evoca a presença de um verbo;
❖ Uma pessoa que está a minha frente é Presença de Quê de qual Verbo esta Pessoa é Presença?
❖ “Se sou terapeuta e logo dou um juízo, não tenho que ser terapeuta, tenho que ser um juiz, um
delegado. Não estou vendo a pessoa. Estou rotulando-a de acordo com algum dicionário, ou DSM
IV.
No entanto, existem dois itens da súmula que deveriam ser os primeiros, porque dizem respeito ao
corpo: Atitude e Aparência. O curioso é que se consultarmos os principais autores de psicopatologia,
veremos que dão pouca importância para esses dois elementos. Ora, são itens muito ricos, pois são a
primeira instalação do homem.

Nos livros de Psicopatologia, há somente descrições. Por exemplo: no que concerne à Atitude, o cliente
entra no consultório e não quer falar com o terapeuta: “Atitude não cooperativa”.
356
Ou, então, ele entra no consultório e o desafia: “Atitude desafiadora ou opositora”.

No final das contas, o terapeuta decora um monte de adjetivos.


➢ Ítalo comentou sobre a cirurgia para retirar um tumor do cérebro do seu avô. Para o neurocirurgião,
era apenas mais um cérebro, mas para o Ítalo aquele cérebro era a presença do seu avô, tinha uma
ligação com ele.

❖ Nosso corpo também pode ser dividido em quatro partes: temos que aprender a olhar estas partes
e descrever. Ao olhar uma pessoa, devemos refletir:
➢ Como a pessoa percebe o mundo;
➢ Como o mundo está entrando na pessoa;
➢ Como a pessoa está expressando esse mundo.

UM OLHAR SIMBÓLICO SOBRE APARÊNCIA E ATITUDE

Aqui, vamos explorar a simbólica da Aparência e da Atitude, e lhes dar o olhar simbólico que o terapeuta
tem de ter diante da vida.

Quando um objeto material aparece à nossa frente, ele comunica uma coisa que é um verbo. Um giz e
um lápis, por exemplo, são feitos de materiais diferentes; no entanto, quando os dois aparecem na
realidade, ambos evocam o mesmo verbo, que é escrever.

O mundo material, do corpo, é uma presença de verbos e de ações. Esses verbos se conectam em uma
história. Por isso, quando estamos diante de uma pessoa que é matéria, precisamos entender de que
presença é a pessoa, que verbo ela evoca. A Atitude e Aparência da pessoa já devem evocar a presença
de coisas para nós, cabendo-nos guardar isso para poder trabalhar em sequência.

❖ Devemos ter um olhar simbólico perante uma pessoa. Por exemplo, o Sol e o Leão, o que tem em
comum? Apresentam a realeza.
❖ Tudo que evoca um verbo, evoca um princípio. O número 4 evoca totalidade material.

➢ O corpo: Cabeça, Tronco, Braço e Pernas;.


➢ No espaço: Norte, Sul, Leste, Oeste;
➢ Na natureza: Quente, Frio, Úmido, Seco;
▪ Quente e Seco: Fogo
▪ Seco e Frio: Terra
357
▪ Frio e Úmido: Água
▪ Úmido e Seco: AR

O CORPO: CABEÇA, TRONCO, BRAÇOS E PERNAS

Há um campo da Filosofia que estuda a simbólica dos números. Um é unidade, dois é divisão e por aí
vai. O número quatro evoca totalidade material, como nos pontos de referência espacial (norte, sul,
leste, oeste).

Do mesmo modo, as qualidades dos entes materiais da simbologia clássica são quatro: quente, frio,
seco e úmido. Daí derivam os elementos tradicionais: quente e seco, fogo; frio e seco, terra; úmido e
frio, água; úmido e quente, ar.

Tudo quanto é material pode ser indicado pelo número quatro. Assim, existe uma classificação
tradicional que separa o corpo em quatro partes: cabeça, tronco, braços e pernas.

CABEÇA
A cabeça é a sede dos pensamentos e dos comandos. O rosto é o primeiro elemento de pessoalidade.
No entanto, a cabeça não tem força de ação. Na simbólica tradicional, associa-se a cabeça ao ar. Assim
como esse elemento, ela não move, mas comunica, pois é pelo ar que saem as palavras.

A Aparência e a Atitude da cabeça, que são duas notas distintas, dizem muito para nós.

A descrição da Aparência corresponde a como está a cabeça, ou seja, o cabelo, olhos, boca, dentes,
maquiagem, óculos, adereços.

A descrição da Atitude da cabeça guarda relação com o fato de ela estar para trás, (suspicácia); para
frente (imposição); para trás (desesperança); e outros movimentos de dúvida, obediência, desatenção;
inquietude etc.

❖ É o trono da tua linguagem lá estão os olhos, a boca, os ouvidos, o nariz. O que oferece uma
pessoalidade é o ROSTO. É o nosso centro de comando.

❖ Se uma pessoa entra em no consultório, tapando o rosto, com óculos, franjas, maquiagem, mãos,
você não deve fazer uma inferência tipo “A pessoa não está querendo ser reconhecida; Ah, esta
pessoa está escondendo quem ela é”. Porém aí tem algo, anote, a identidade desta pessoa ainda
não está bem clara para ela, deve estar querendo descobrir isto. Não é determinante, mas temos
que ir guardando estes sinais, estes olhares. O rosto é o que comunica, é o que expande para o resto
do corpo.

358
❖ A Cabeça, dos quatros elementos é o AR. Ela não tem força, ela não move o teu corpo; mas ela
comunica, comanda.

❖ Na Aparência, você descreve com maquiagem, sem maquiagem, sinais, piercing, tatuagem etc.

359
CABEÇA / AR
ATITUDE SIGNIFICADO
Trás: Suspicácia / desconfiança;
Baixo Tristeza / desesperança;
Frente Imposição;
Movimentos para os lados Dúvidas
Movimentos de cima para baixo Obediência
Movimento de Olhos para cima Desatenção
Movimentos rápidos para todos os lados Inquietude
A APARÊNCIA da cabeça é uma FOTO e a ATITUDE é um FILME.

TRONCO
O Tronco é uma parte bastante nobre do homem. Nele, ocorrem os mecanismos de troca: o ar que
entra e vai para o sangue, a digestão dos alimentos. Por isso, o tronco é símbolo da fornalha alquímica,
que gera energia e transformação, e do fogo, que expande, aquece e ilumina.

É evidente que a Aparência do Tronco comunica. Quanto a ela, descrevem-se a roupa e os adereços
que estão no tronco.

Mas o mais importante no Tronco é a Atitude.

O tronco pode estar encurvado, ter atitudes de fogo brando, fraco, apagado.

Já o Tronco ereto é uma chama acesa, um fogo que se expande, ilumina, capaz de agir no mundo.

❖ Na Aparência você descreve como está vestido, os acessórios que usa.


❖ O tronco é uma parte bastante nobre. Temos o estômago, o esôfago, coração, pulmão, vísceras,
intestino, aparelho excretor, aparelho reprodutor, pâncreas, bexiga.
❖ No tronco é que ocorre os mecanismos de trocar. O ar que entra e vai para o sangue. O sangue
devolve o ar que vai para os pulmões. Uma comida, por exemplo o pão, vira carne. O Tronco é o
símbolo da fornalha, é o FOGO.
❖ O fogo faz o quê: expande, aquece, ilumina. É daqui que vem a energia.

TRONCO / FOGO
ATITUDE SIGNIFICADO
Curvado Fogo se apagando, energia baixa, energia vital se acabando
Ereto Fogo que ilumina, expande, capaz de agir no mundo.
360
BRAÇOS
Os Braços e mãos moldam, ajustam e envolvem a realidade, tornando-a humana. Quando penso (ar)
em pegar um copo, por exemplo, eu preciso de energia (fogo), mas quem pega mesmo é minha mão.
Por isso, Braços e mãos são símbolo da água que envolve, limpa e revela coisas que estão sujas.

❖ Os braços são quem escreve, quem molda, quem envolve o mundo, que adequa o mundo.

Descreve-se Aparência dos braços como fortes, flácidos, com ou sem tônus, unhas feitas ou bem
cuidadas, esmalte descascado, unhas sem esmalte.
Em relação à Atitude, os braços podem estar parados, móveis, em riste, inquietos, moles.
Com essas observações, as descrições da Súmula Psicopatológica vão ficando ricas e nos dando
elementos para compormos a presença de quem essa pessoa é.

❖ No simbólico os Braços são a Água: Envolve e Limpa.

BRAÇOS / ÁGUA
ATITUDE SIGNIFICADO
Sabe o que tem que fazer, mas não tem os meios, não sabe como fazer.
Inquietos
Dá inquietude.
Não tem mais como fazer algo.
Parados
Não tem mais esperança;

PERNAS
As pernas são símbolos da terra. O chão nos permite andar, do ponto de vista estrutural. As pernas
sustentam o tronco, os braços e a cabeça, fazendo a pessoa andar de um lado para o outro. Elas nos
dão solidez para que possamos agir, não de modo humano, mas animal: um agir de expansão e
conquista territorial.

É um pouco mais difícil observar a Aparência das pernas, porque as pessoas, em geral, usam calça. Mas
vamos observar se a perna é cuidada ou descuidada, forte ou fraca, observar as unhas, o calcanhar.

Em relação à Atitude das pernas: se são inquietas ou paradas; se a pessoa cruza as pernas com
frequência ou as mantém relaxadas; se tem uma Atitude formal quando fica em pé; se tem postura de
ação, expansão, esperança na conquista; ou indica um retraimento, acanhamento e medo.

361
❖ É o que nos move, que nos sustenta. É o que nos dá solidez para agir. Qual o trato que dou as pernas.
❖ Olhar a Aparência: fortes ou fracas.

❖ Observar as unhas, calcanhar, pernas depiladas( por desleixo ou crença); Inquietas ou Paradas;
Postura de Ação ou Retração.

PERNAS/TERRA
ATITUDE SIGNIFICADO
Retraídas Sem energia, mais apegada ao passado.
Para frente Energia para a busca, para a luta da vida....

“Os verbos é que contam a sua História que é a sua Biografia”.


CONCLUSÕES

Tudo isso são informações. Pode não significar nada, depende do conjunto de coisas. Mas isso é a
técnica da psicopatologia, fenomenológica e descritiva.

Quando aprendemos a descrever essas coisas, vamos ganhando ferramentas muito concretas e precisas
para intuir e perceber que a cabeça, o tronco, os braços e as pernas são verbo, através da Aparência e
da Atitude.

Perceber os verbos, mudar um ou outro verbo são meios de ajudar alguém a perceber a história que
está sendo contada a partir deles. Assim, consigo fazer com que a pessoa organize a história que está
contando, que é a história da sua vida, e pode estar disfuncional.

362
SEMANA 03: PSICOMOTRICIDADE & SENSOPERCEPÇÃO

Esta aula apresenta as duas notas da Súmula Psicopatológica que completam as características
relacionadas ao corpo ou ao mundo material: Psicomotricidade e Sensopercepção

PSICOMOTRICIDADE

A Psicomotricidade olha para o movimento do sujeito como um todo. Diferente das notas já vistas, ela
não distingue as partes do corpo.

❖ A Psicomotricidade visa olhar o movimento do sujeito sem distinguir as partes.

Não é necessário usar terminologia técnica para descrever a Psicomotricidade. Deve-se olhar para o
sujeito, investigar e descrever se ele se move de modo agitado ou contido, se há coerência entre a
mobilidade da cabeça, a postura do tronco, os braços e as pernas.

❖ Precisamos observar se há uma coerência entre as partes com a postura e o movimento. É descritivo.

Elementos mencionados nas aulas de Artes Cênicas podem ajudar na descrição. O sujeito pode evocar
alguma referência, uma imagem do espelho (conforme Aula 1), e expressá-la no corpo.

❖ Atos em conjunto são PRESENÇA. O que devemos observar é a PRESENÇA do sujeito. Como ele atua?
❖ Seus pensamentos, seu mundo interior pode influenciar sua postura. Assim como sua postura, sua
presença pode influenciar seu mundo interior.

O contrário também é verdadeiro: o modo como se comporta pode influenciar seu mundo interior.

A relação entre Psicomotricidade, mundo interior – crenças, valores, relações familiares, espirituais e
afetivas – e outras notas da Súmula Psicopatológica é pouco estudada.

Uma referência para compreender melhor é a “Antropologia do Ato” (L’Anthropologie du Geste), de


Marcel Jousse. Mas, neste momento, basta trabalhar as descrições da aula anterior em conjunto.

A primeira coisa a verificar é o aspecto geral do movimento, se é calmo ou agitado. Estar parado não
significa estar calmo, pois o sujeito pode estar parado e tenso. Do mesmo modo, alguém pode ter
movimentos amplos e estar calmíssimo.

❖ O que o terapeuta deve observar é: se o aspecto geral do cliente é calmo ou agitado.


❖ Calmo: sujeito pode estar parado, porém está tenso, como estivesse em uma camisa de força. Então
ele pode estar agitado internamente.

Não é difícil diferenciar calma e agitação, desde que se esteja atento.

363
Muitas vezes, o paciente para de falar, mas continua se mexendo, como a indicar que o movimento não
terminou. Ele quer saber se você está prestando atenção para continuar falando.

Se o sujeito está totalmente travado e displicente, porém, é certo que está contando a história pela
metade. A postura do paciente muda quando ele chega ao cerne da questão. Essas questões dizem
respeito a pessoas funcionais.

❖ O que o paciente espera de mim? Empatia? Acolhimento? Que eu seja mais minucioso ? Que eu
investigue mais?

PSICOMOTRICIDADE E PATOLOGIAS
Há elementos da Psicomotricidade que indicam doenças específicas.

ECOPRAXIAS:
Na Ecopraxia, o paciente imita movimentos do terapeuta. Ele está buscando algum referencial externo
e se move de acordo com este referencial. É característica de bipolares graves e esquizofrênicos.
❖ O paciente imita movimentos do terapeuta, repetindo seus movimentos. Busca algum referencial
externo e se move de acordo com este referencial.
❖ É característica de bipolares graves e esquizofrênicos.

FLEXIBILIDADE CÉREA OU CATATONIA:


Na Flexibilidade Cérea ou Catatonia, o paciente fica na mesma posição em que é deixado, como se fosse
feito de cera.
❖ O paciente fica na posição que o terapeuta o coloca, como se ele fosse de cera.
❖ Por exemplo, se o terapeuta levanta o braço dele, este ficará assim durante toda a sessão.

MANEIRISMOS:
O Maneirismo também é comum, especialmente nas manias (como um paciente maniforme 93 que se
move à maneira de um imperador ou de um mordomo). Mas há pessoas sem disfunções que também
têm movimentos amaneirados, em ambientes religiosos ou empresariais, por exemplo.

93 Maniforme: Na fase de Mania Bipolar, o indivíduo tem muita energia, agitação, irritação, comportamento
impulsivo, dormirá menos horas. Mesmo assim, sente-se “muito bem”. Os pensamentos e a fala ficam acelerados.
A pessoa passa a apresentar otimismo exagerado, com aumento da autoestima, bem como aumento do interesse
sexual. Trata-se de um quadro muito intenso, e, como resultado, pode trazer muitos prejuízos físicos, financeiros
e sociais para a pessoa e seus familiares.

364
❖ O paciente cria uma imagem de maneiras de um ídolo, usa movimentos, comportamentos, uso de
roupas “A maneira de”;
❖ Exemplo: Paciente maniforme que se move à maneira de um imperador, de um mordomo.
❖ Há pessoas sem disfunções que também têm movimentos amaneirados, em ambientes religiosos ou
empresariais.
SENSOPERCEPÇÃO

A Sensopercepção é uma nota da psicopatologia muito importante, pois dá indícios precisos sobre os
movimentos interiores do homem. O mundo entra em nós por meio dos cinco sentidos (visão, audição,
olfato, tato e paladar).

❖ O Paladar distingue: o doce, o salgado, o insosso, o amargo;


❖ A Visão distingue: pequeno, grande, longe, perto, claro, escuro;
❖ O Tato distingue: liso, áspero, grosso, fino, rugoso;
❖ A Audição distingue: alto, baixo, grave, agudo;
❖ O Olfato distingue: diversos cheiros....

Existe outro sentido interno, chamado Sentido Comum, que agrupa as informações externas e forma a
percepção, estabilizando imagens dentro de nós. A Sensopercepção descreve como está a qualidade
dos sentidos externos e do senso comum. Ela organiza o mundo dentro de nós para que o percebamos
melhor e possamos nos orientar.

ALTERAÇÕES QUANTITATIVAS DA SENSOPERCEPÇÃO

HIPERESTESIA
A Hiperestesia é o aumento das sensações. Em geral, acontece com o uso de alucinógenos. Há a
impressão de perceber o mundo com mais vibração, mais cor, mais intensidade, mais conexão. No
entanto, a pessoa está percebendo de menos, porque a qualidade do mundo não se dá somente naquilo
que é o foco da atenção, mas sobretudo no foco da desatenção. Quando um elemento exógeno aumenta
muito a atenção, apagam-se as luzes do resto do mundo, e aí está o problema.

HIPOESTESIA
A Hipoestesia é uma alteração muito presente em caso de depressão. Faz com que o sujeito sinta o
mundo menos colorido, menos intenso. Os sentidos estão normais, a junção formada pelo Sentido
Comum é que parece mais apagada.
Outras variações das alterações quantitativas, mais raras, são a Anestesia e a Agnosia.

ANESTESIA
365
A Anestesia é uma lesão total do sentido; os sentidos externos ficam apagados e ocorre por fármacos
ou bebidas.
AGNOSIA
A Agnosia é uma lesão total do senso comum. O indivíduo percebe as informações dos sentidos, mas
não as conecta. Ocorre sobretudo em lesões corticais e físicas no cérebro ou em síndromes conversivas,
como a histeria.
❖ É raro e este é assunto de neurologista.

SENSO COMUM
O Senso Comum é simbolicamente representado pela lua, pois as sensações têm a mesma característica
de aumentar e diminuir. É importante notar que as fases da lua se alternam de maneira estável.
Assim, o
princípio
de AISTHESIS

Lua Nova Lua Crescente Lua Cheia Lua Minguante

estabilidade está em descrever a Sensopercepção, identificar o momento em que o sujeito está.

❖ É importante notar que as fases da lua se alternam de maneira estável;


❖ As vezes o paciente está em uma Lua Nova, onde a percepção é muito pequena, quase
nula.

A postura do terapeuta, no entanto, não pode depender da lua, mas de algo que é sempre
luminoso e presente, simbolizado pelo Sol.

❖ O terapeuta não pode ficar refém da AISTHESIS!!!

ALTERAÇÕES QUALITATIVAS DAS SENSOPERCEPÇÃO

As pessoas não se orientam somente pelo mundo material, mas pelo espelho (cf. aula 1). A matéria é
um sinal do que as coisas podem ser, mas é muito limitada em informações. Antes de nos orientarmos,
há sempre uma duplicidade: o mundo material revela algo que é possível e completamos a ação com o
que está no espelho, o que pode ou não ser verificado na realidade.
366
ILUSÃO
ILUSÃO é completar com o espelho, de modo anômalo e errado, o que a realidade mostra, por causa de
uma carga afetiva e imaginativa.
➢ Existem as Ilusões de Fato (p. ex.: depois de um filme de terror, alguém vê passar a sombra de
um gato e acredita que viu um espírito) e as
➢ Ilusões Cotidianas (p. ex.: moça recebe uma mensagem de um rapaz que sumiu há três meses e
acredita que ele a ama).

ALUCINAÇÕES
A descrição das alucinações é auditiva ou sinestésica.
Pode ser uma alucinação auditiva completa, quando o sujeito ouve a voz fora da cabeça;
Pseudo-alucinação, em que o sujeito ouve a voz dentro da cabeça.
As alucinoses são aquelas causadas por entorpecentes ou psicotrópicos

367
SEMANA 04: INTELIGÊNCIA HUMANA

Esta aula trata do que é a Inteligência humana. Partindo das definições de vigilância e tenacidade,
aprofunda-se na capacidade de intelecção e apreensão de Conceitos

A ‘INTELIGÊNCIA’ MINERAL, VEGETAL E ANIMAL

Os manuais de psicopatologia falam da Inteligência como a função que mantém o sujeito atento,
mencionando apenas dois aspectos: Vigilância e Tenacidade.

Vigilância é a capacidade de mudar o foco da atenção, e Tenacidade é a capacidade de aprofundar-se ou


manter-se no foco escolhido; ambas podem apresentar-se aumentadas ou diminuídas (por exemplo, um
sujeito hipervigil ou hipotenaz). No entanto, os manuais não definem direito o que é a Inteligência.
Alguns, inclusive, trazem erros conceituais.

❖ Vigilância: é a capacidade de mudar o foco de atenção, observar vários objetos.

❖ Tenacidade: é a capacidade de aprofundar-se ou manter-se no foco escolhido.

❖ Se a Vigilância está aumentada a Tenacidade está diminuída

De modo geral, eles apontam testes para percebermos se o paciente está com a Inteligência preservada
ou diminuída. Mas a Inteligência não é apenas isso; é uma das faculdades humanas mais nobres. Por
isso, é importante meditar sobre ela. Fazer o exercício de olhar para as pedras, um riacho, o mar e se
perguntar se essas coisas são inteligentes; olhar para uma planta e fazer a mesma indagação.

É possível entender que a pedra tem certo nível de Inteligência por manter-se coesa, que uma árvore é
inteligente por absorver os raios solares.

❖ Animal: se tomarmos o termo no mesmo sentido, os animais também têm Inteligência.

Nesse caso, considera-se que Existência e Inteligência são sinônimos.

A Inteligência do Reino Mineral é manter-se em ordem, em Passividade Inerte.

❖ Pedra: ela usa a Inteligência para se manter coesa. Passividade Inerte.

A Inteligência do Reino Vegetal é articular os quatro elementos da natureza com uma Passividade
Cinética, ou seja, movendo-se passivamente ao crescer.

368
❖ Vegetal: a planta precisa articular os 4 elementos Terra, Fogo, Ar e Água, com uma Passividade
Cinética, ou seja, movendo-se passivamente ao crescer (busca sol, ou busca sombra, terra mais seca,
terra mais úmida etc.)

Se tomarmos o termo no mesmo sentido, os animais também têm Inteligência. Eles têm uma presença,
assim como os minerais e os vegetais, mas fazem operações alquímicas transubstanciais (ou seja,
mudam a natureza das coisas, como uma vaca que transforma capim em carne ao comê-lo). Movem-se
no espaço, não crescem apenas para cima; reconhecem padrões e têm instintos, isto é, capacidade para
responder às demandas da natureza (por exemplo, cães pastores são capazes de identificar a
proximidade de um fenômeno natural).

O homem e a mulher também têm presença e fazem operações alquímicas, mas têm poucos instintos
de orientação no mundo. O instinto é uma resposta necessária a um estímulo vindo de fora. Por
analogia, podemos dizer que o ser humano é dotado de instintos, mas se investigarmos a fundo,
chegamos à conclusão de que isso é duvidoso.

Não há nada que seja necessário ao ser humano, entendendo aqui a acepção técnica de necessidade:
quando algo sempre acontece de tal modo.

Para o ser humano, comer é conveniente, mas não é necessário: pode-se decidir não comer. Quanto ao
instinto de sobrevivência, ao longo da história houve mártires políticos e religiosos. Inclusive, o homem
pode livremente abrir mão da própria vida, pode suicidar-se.
A propósito do instinto sexual: diferente dos animais, para o ser humano não é suficiente que haja uma
fêmea no período fértil e um macho viável para que eles copulem, ainda que os dois estejam unidos por
um vínculo.

A INTELIGÊNCIA HUMANA: ABSTRAÇÃO DE CONCEITOS

A inteligência é o que há de mais determinante no ser humano, que o distingue do resto das coisas
materiais: o homem olha para a realidade, que entra por seus sentidos, e é capaz de formar Conceitos.

O olho, que representa os cinco sentidos, recebe as informações do mundo Material e estas são
lançadas para o mundo do Espelho, formando Fantasmas, isto é, imagens difusas. Mas há algo que está
acima das imagens. Não temos somente a lembrança do que já vimos, mas também o Conceito do
objeto, que não se refere a um objeto concreto.

Precisamos do Conceitos para olhar para a realidade e dizer: “isto é um celular, um cachorro, um copo”.
❖ O espelho interior ou mente é o reflexo do que acontece no mundo externo. Nele são formadas
imagens da realidade a partir de como a pessoa percebe, que é o Senso Comum.
369
❖ No entanto, pode haver uma desconexão entre o que a pessoa forma no seu espelho interior e a
realidade como de fato ela é.
❖ Isso é o que o Ítalo chamou de disfunção na psicodinâmica.

O Conceitos é a forma necessária de ser. Para que um copo seja um copo, precisa obedecer a uma
proporção e forma, ou seja, as coisas que se organizam materialmente têm de possuir uma forma
específica. Algumas doenças psiquiátricas, como retardos graves, impedem as pessoas de
conceitualizar.

Além das coisas materiais, o ser humano também consegue ter Conceitos Narrativos, de história,
lealdade, justiça, vileza, crime, vingança. Por um lado, para saber o Conceito de vingança, precisamos
ter sido apresentados a histórias que a contenham. Por outro, uma vez que o Conceito está formado,
não se precisa da ocorrência de um ato material de vingança para saber e evocar o que ela é – um sujeito
consegue orientar-se mesmo sem presenciá-la.

A inteligência aparece como a clareza na formação de Conceitos Narrativos. Ela consiste em extrair de
histórias os seus princípios, o que é muito diferente de julgar. Uma pessoa inteligente consegue, a partir
de poucas informações materiais, criar um universo interior repleto de pontos de referência estáveis.
Isso acontece porque ela extraiu e apreendeu os Conceitos dessas informações materiais.

A partir dos elementos oferecidos, a pessoa inteligente identifica por trás daquela história algo de
lealdade, de justiça, de vileza, de crime etc. Uma das funções do terapeuta é fazer com que a pessoa
seja inteligente, que consiga fazer a intelecção, e não fique desorientada no mundo material, uma vez
que o ser humano se move nesses dois mundos: o da matéria, que lhe oferece poucas informações; e
o dos Conceitos, das Imagens.

O mundo material, do corpo, é uma presença de verbos e de ações. Esses verbos se conectam em uma
história. Por isso, quando estamos diante de uma pessoa que é matéria, precisamos entender de que
presença é a pessoa, que verbo ela evoca.

A Atitude e Aparência da pessoa já devem evocar a presença de coisas para nós, cabendo-nos guardar
isso para poder trabalhar em sequência

❖ Em um homem e uma mulher a Inteligência se estabelece quando consegue extrair Conceitos de


uma história.

370
O MUNDO DOS CONCEITOS ANTERIOR À MATÉRIA

Extrair um Conceito é proceder um exercício que somente o ser humano consegue. Trata-se de dizer
algo sobre a realidade, mas não de inventar. O Conceito já estava na realidade e, para que a coisa seja
real, tem de se organizar a partir dele.

Um exemplo é o Teorema de Pitágoras (em um triângulo retângulo, a soma dos quadrados dos catetos
é igual ao quadrado da hipotenusa). Além de haver o triângulo real, e os meios materiais em que ele
está (um quadro, um caderno), há o Conceito , que é a fórmula estável. A fórmula não está na memória,
pois continua existindo mesmo se houver perda da memória pessoal. Nem sempre houve a inteligência
humana (tanto criacionistas quanto evolucionistas entendem assim); e não foi a inteligência humana
que criou a fórmula, ela já existia.

Precisamos meditar sobre isto: a existência consistente de coisas imateriais que antecedem a matéria,
na ordem do existir e na ordem do ser.

A inteligência humana, portanto, é a faculdade que ultrapassa o mundo material e toca no mundo dos
Conceitos, imaterial, consistente e anterior à própria possibilidade de existência da matéria.

O ser humano só faz isso porque consegue estar fora da matéria e do tempo. Dos reinos mineral, vegetal
e animal há uma ascensão no domínio da matéria: a pedra é matéria, o vegetal coordena a matéria e o
animal vence o movimento.

O homem está acima disso tudo, tem a capacidade humana de ver além do agora, mas ver o todo, a
projeção e a unidade da matéria.

371
Semana 05: LINGUAGEM

Esta aula trata da linguagem e da conação ou vontade, notas psicopatológicas que estão na intermediação
entre mundo material e o espelho, ou seja, estão presentes no olho, segundo o esquema usado até aqui

❖ Esta aula apresenta as últimas funções / notas psicopatológicas que estão na intermediação. Está fora da
matéria, mas também não está no campo do espelho, é como se estivesse no OLHO.

N Imagem interna do produto /


A1 espelho

N
Corpo / Produto
A

❖ As duas últimas funções são a LINGUAGEM e CONAÇÃO/VONTADE

LINGUAGEM
❖ A linguagem contempla um componente direto, claro, técnico, objetivo e afetivo.
A primeira coisa que se analisa na linguagem de um paciente é o componente afetivo, chamado de
Prosódia. A prosódia é o modo como o paciente fala algo. Pode-se falar a mesma coisa de um jeito alegre
ou triste, por exemplo, e é importante que o terapeuta saiba fazer essa distinção.

❖ Temos que observar a forma como as coisas são ditas. Muitos terapeutas, hoje em dia, observam mais
o conteúdo.
Não podemos estar entre os sujeitos que, levados por ideologias, acham que as palavras tomadas
isoladamente comunicam. O modo como as coisas são ditas importa tanto quanto o que é dito.

❖ O terapeuta não pode estar envolto em certas ideologias, pois não conseguirão exercer uma tarefa
profissional, achando que as palavras tomadas isoladamente comunicam.
❖ Eu posso dizer algo que comunica especificamente uma ideia, e que um sujeito maldoso pode tirar a
prosódia e ficar só com a palavra. A palavra sozinha tem pouco poder de comunicação
❖ Quando o cliente comenta algo de forma neutra, você tem que explorar mais, para compreender sobre
o impacto que ele tem internamente do que ele está comunicando. Por exemplo: “Doutor, recebi uma
promoção no meu trabalho”. De que maneira foi comunicado? Com alegria, com frustração? Sem
nenhuma emoção? Ele gosta do que faz?
❖ Talvez uma das maiores tragédias desta modernidade, seja a perda do domínio da linguagem de
nomear os sentimentos.

372
❖ Às vezes, o paciente tem recursos linguísticos limitados para nomear a realidade interior ou
exterior. A utilização da linguagem exige um grau de consciência muito profundo, que o sujeito
pode não ter. Por isso, o terapeuta precisar estar atento à prosódia e ao conteúdo.
❖ O terapeuta tem que estar 100% atento a prosódia. O setting terapêutico é muito mais
importante capturar o que o cliente quer comunicar. Como ele está nominando a realidade seja
interior ou exterior.
❖ O paciente necessita dar nomes aos seus estados interiores. O terapeuta também tem que
observar e estar atento ao conteúdo.
Além disso, estudar as características técnicas da alteração da linguagem, quantitativas e qualitativas
(disponíveis nas referências do curso). A psicopatologia serve para dar diagnósticos concretos e fazer
intervenções que melhorem a vida do paciente. A simbólica e os motivos filosóficos são
importantíssimos, mas é preciso conhecer também a parte técnica.

Alguns exemplos de alteração da linguagem:


➢ Logoclonia: Alteração qualitativa da linguagem. Distúrbio da fala que consiste na repetição
involuntária de uma ou mais sílabas, geralmente acabadas de proferir. É uma alteração
qualitativa, característica de Demências;
➢ Coprolalia: é a tendência involuntária de proferir palavras obscenas ou fazer comentários
geralmente considerados socialmente depreciativos, Característica da Síndrome de Tourette.
➢ Alteração Gliscróide: Quando o paciente fala demais, não deixa o terapeuta concluir a sessão,
não percebe os limites de tempo e espaço no relacionamento
❖ Qualidade da atitude psicopatológica em que o paciente está insistentemente querendo
companhia, com quem é difícil encerrar conversa devido ao fato de querer manter a atenção
do médico sobre ele; Forma de falar do modo Gliscróide;
❖ Como exemplo alguns pacientes que têm uma hipomania Gliscróide, algumas demências.
➢ Alterações quantitativas, em que o paciente fala muito alto, muito baixo, fala pouco ou fala
muito. A lista desses fenômenos precisa ser estudada
❖ Pacientes que falam muito e alto: alteração quantitativa da linguagem está presente nos
quadros de MANIA.
❖ Pacientes que falam pouco e baixo: alteração quantitativa da linguagem pacientes que estão
em quadro de DEPRESSÃO.

LINGUAGEM PROPRIAMENTE HUMANA

A linguagem é uma função do homem que está por cima da matéria. Os animais têm um tipo próprio
de linguagem, elaborada a partir do mundo presente e imediato.

373
❖ Os animais têm um tipo próprio de linguagem, elaborada em símbolos e signos a partir do mundo,
presente e imediato. A linguagem deles não os capacita para elaborar a cerca dos conceitos
narrativos.
❖ Os cachorros por exemplo, eles não tem a fala humana, mas eles também não tem um padrão de
latido que se some a um padrão de latido, que se some a outro padrão de latido, que dê uma narrativa
pra eles, por exemplo, acerca da saudade. Ou acerca de qualquer realidade canina. A linguagem dos
cães e a dos golfinhos é muito precisa, acerca das coisas materiais, acerca das coisas concretas. As
vezes é mais precisa que a nossa inclusive.
A linguagem do ser humano, pelo contrário, tem uma capacidade de expansão que precisa ser explorada.
É um mau sinal quando alguém só consegue falar das coisas que estão à sua frente, pois demonstra que
a linguagem está diminuída, similar à dos bichos.

❖ Por exemplo, quando um casal que começou a namorar, está se conhecendo e se ama, e só consegue
se comunicar na base do beijo e do sexo e das coisas imediatas. Sai para jantar e só fala do sabor do
café, ou da xícara elaborada. Só consegue falar daquilo que está presente à frente.
❖ Isso é coisa da investigação da linguagem, pessoas que só falam acerca de coisas que estão
acontecendo agora são pessoas que tem uma linguagem diminuída, parecida com a dos bichos. E se
comportar como os bichos trás tristeza para os homens. Isso é um dos grandes motivos das neuroses
do nosso tempo. Uma confusão sobre homem e bicho. Porque aqui há um partidarismo. Essas coisas
de ideologia em terapia são muito graves e complicadas.
❖ As pessoas que dizem que os homens não são como os animais. As vezes os outros vão dizer que não
liga para animal ou não dão dignidade para o animal. Isso é absurdo. Porque uma coisa não exclui a
outra. Então temos que afastar essas ideologias de consultório porque só atrapalha no fundo.
Um exemplo é a conversa de elevador: falamos sobre o tempo para evitar o componente pessoal da
interação; aliás, sequer há tempo para interação pessoal. Os homens têm mais capacidade para esse
tipo de conversa. As mulheres, por outro lado, tendem a elaborar o trato com os outros; e como não há
tempo para desenvolver a pessoalidade, podem-se ocasionar problemas e conflitos

❖ Um exemplo é a conversa de elevador (é um típico exemplo do que não é uma conversa humana): Vai
chover hein.(você nem sabe se vai chover, você não é uma andorinha nem um cachorro, talvez nem
chova. Você nem saiba falar sobre isso, essa é a verdade. Conversa de elevador é uma aproximação
do animal. Falamos sobre o tempo para evitar, diminuir o componente pessoal da interação. Quando
eu entro no elevador é uma presença incômoda, não é um “quem” que eu descubro ou quero descobrir
a cerca dele. O que ele ama, o que projeta, quais são os sofrimentos, as expectativas, planos, crenças.
Aliás sequer há tempo para interação pessoa.

374
❖ Outro exemplo é falar de futebol, é um pouco mais humano, porque bicho não joga, mas é pouco
comprometedor. Os homens têm mais capacidade para esse tipo de conversa, são mais pragmáticos;
❖ As mulheres, tendem a elaborar o trato com os outros; e como não há tempo para desenvolver a
pessoalidade, podem-se ocasionar problemas e conflitos. Pode parecer tudo mal explicado.
Essa é uma tendência, em geral, diferente entre homens e mulheres. Desde o ponto de vista físico,
ambos são muito parecidos. Em algumas espécies animais o dimorfismo sexual é muito maior. Na
espécie humana, as diferenças não são tão claras. Tanto que basta uma geração confusa para que os
homens pensem como mulheres e vice-versa. Aliás, a maior parte dos problemas masculinos atuais é que
problemas femininos de linguagem foram indevidamente inseridos no universo dos homens. É preciso
um esforço cultural para que não haja tirania de um sexo sobre o outro, mas, sim, complementariedade.

❖ A diferença entre homem e mulher é muito pequena. Tem algumas mulheres que são maiores que os
homens, por exemplo. Em algumas espécies de animais isso é impossível.
❖ É possível isso, porque não tem tanta diferença mesmo. Exige um esforço cultural para manter os
Homens no lugar de “Homens” e Mulheres no lugar de “Mulheres”, sem que um tiranize o outro, sem
que haja o patriarcado nem o feminismo radical, mas que tenham complementariedade.
❖ O Patriarcado e o Feminismo Radical é uma espécie de tirania que um exerce sobre o outro. Que só é
possível na espécie humana e em alguns raros animais. Você jamais vai ver uma gorila fêmea
tiranizando um gorila macho. A espécie humana está confundindo as coisas por um certo tempo.
❖ A linguagem tem seus próprios, ela se manifesta de um modo específico. É importante que o terapeuta
conheça a linguagem, conheça o modo afetivo de falar, conheça as alterações concretas específicas
da fala, da linguagem para que ele possa perceber algumas alterações.
É importante que ele saiba que a linguagem humana precisa ser ampla: o ser humano para ser humano,
precisa saber falar do prato de comida, do sabor do café, de futebol, se vai chover ou não, mas também
falar dos estados interiores, dos estados interiores dos outros, dos conceitos abstratos, das realidades
imateriais.
O domínio humano da linguagem vai desde o grunhido, passando pela prosa, até a poética épica. Isso é
todo o reino, o intervalo de possibilidades da linguagem humana. O homem grunhe, fala
jornalisticamente, escreve em prosa, faz poesia e faz relato mítico. Ou seja, vai da dimensão mais chã à
mais elevada.
❖ O homem tem em si na sua capacidade de linguagem as características que um rio que corre no rés
do chão como a prosa, toda conectada de mãos dadas. Até aquele simbolismo das gotas de chuva
esparsas uma a uma que caem do céu atingindo a terra, fazendo essa união mística entre aquilo que
está para cima e é invisível e o que é embaixo e é visível, isso é a poesia.
❖ Simbolicamente por isso que a poesia é toda escandida, como as gotas da chuva, ela não está de mãos
dadas como as águas do rio? Isso são coisas da linguagem que vamos vendo, aprendendo.
375
E também tem aqueles sujeitos que tem a linguagem escandida mas colada no chão como as poças
da água, paradas, mortas.
❖ Então tem gente que não fala nada com nada, não conecta “Lé com Cré; nem A com B”. Não sabe
contar histórias, mas sabe manifestar desejos materiais. Tem gente que sabe contar histórias, historia
que está acontecendo. E tem gente que sabe falar sobre projetos, previsões, fala das coisas do alto.
❖ Podemos falar de coisas corriqueiras, mas também falar de nossos sentimentos, percepções.
❖ O homem será mais feliz quanto mais ele ascender. Isso é próprio do homem, e o homem tem essa
coisa esquisita de ser e feliz e ser triste. Os animais não tem muito isso. O cachorro tem pouco, porque
o cachorro é humanizado. Os animais domésticos tem isso um pouco porque se submetem ao regime
humano, então você pode ver realmente um cachorro triste, domesticado, um cachorro na selva nunca
vai ser triste. Os animais que não são domésticos só estão lá sendo eles mesmos. Você não vai ver
uma vaca encostada na cerca pensando se ela foi a vaca que ela podia ter sido hoje. Você não vai ver
uma formiga com a mão no queixo pensando será que eu formiguei do modo certo hoje.
Se a linguagem não está desenvolvida, o homem não sabe NOMEAR. Se ele não sabe NOMEAR; ele não
pode CONHECER. Se ele não pode CONHECER, ele não pode AMAR. Se ele não pode AMAR, ele
ENTRISTECE.

VONTADE / CONAÇÃO

A CONAÇÃO ou VONTADE, tem o SOL por símbolo; enquanto as ESTESES (cinco sentidos) são
simbolizados pela LUA.

Não devemos desprezar a Simbologia e a Mitologia, pois toda a psicologia contemporânea foi
desenvolvida à base de símbolos: Freud compôs sua teoria com base no mito grego de Édipo; (com base
no mito semítico de Abraão; então tem tabu nessa história).

Jung desenvolveu sua teoria a partir do tarô e da alquimia. As pessoas têm um universo misterioso
dentro de si, por isso, precisamos recorrer aos símbolos tradicionais para entendê-las melhor.

❖ Jung desenvolveu sua teoria a partir dos arquétipos do Tarô e da Alquimia. Assim é feita toda a
psicologia contemporânea. Não podemos ter estranhamento quando se fala em símbolos. Pra quem
é cientificista está um pouco fora do dia a dia da pessoa. Estamos lidando com pessoas e elas têm um
universo misteriosos dentro de si, por isso, precisamos recorrer aos símbolos tradicionais para
entendê-las melhor. Pra também se explicar um pouco melhor.
❖ Imagina que seu ponto de observação é a terra, e você está observando olhando para o céu e vendo
aqueles pontinhos luminosos lá em cima e atrás tem um fundo preto. Imagina que está de noite. Entre
a sua posição existencial (a terra) e esses pontos luminosos, se você observa o céu, vai ver algumas
coisas muito interessantes, algumas coisas girarem.

376
❖ Se você é atento e olhar para o céu por 1 ano, você vai ver coisas fixas, que são esses pontos luminosos.
E os outros eu não estão fixos, que estão andando devagar mas estão andando.
❖ Quando você olha para o céu e está chovendo, só que tem o sol batendo na chuva, você vê o arco –
íris. Se você ouve uma música consegue distinguir as notas musicais. Se você olha para o céu vai ver
alguma coisa girando.
Todas essas coisas constituem a fronteira entre o visível e o invisível, o mutável e o imutável aparecem
em número de sete 7. Assim como são sete as cores do arco-íris, sete notas fundamentais da música,
são sete os corpos girantes entre o estável (Terra) e as estrelas: Lua, Mercúrio, Vênus, Sol, Marte, Júpiter
e Saturno. Estes são os que enxergamos sem telescópio

❖ O Arco-Íris tem 7 cores → Arco símbolo de união entre o visível e o invisível, entre o que está no céu e
na terra, vem de cima e atinge embaixo. O sol passando pela chuva nos dando um arco de sete cores.
❖ As notas musicais são 7: Dó, Ré, Mi, Fá, Sol, Lá, Si; Sete notas fundamentais que conectam uma
gramática universal a um som gerando uma música.
❖ Os corpos girantes entre o estável – TERRA e as estrelas: LUA, MERCÚRIO, VÊNUS, SOL, MARTE,
JÚPITER e SATURNO (que enxergamos sem telescópio).
Em primeiro lugar, temos o senso comum, simbolizado pela Lua; em seguida, Mercúrio, que faz um
cálculo (este assunto será melhor explicado nas aulas seguintes); Vênus, símbolo do apetite
concupiscível. No meio, temos o Sol, que simboliza a vontade. Depois vem Marte, o apetite irascível. Por
fim, vem a inteligência, de que já falamos anteriormente. A inteligência, simbolizada por Saturno,
distingue os homens das demais coisas, e toca na fronteira da estabilidade, chamada conceito.

❖ Em primeiro lugar, temos o Senso Comum, simbolizado pela Lua; integra os sentidos em mim e me
faz perceber o mundo de certo modo.
❖ Em seguida Mercúrio, que faz um Cálculo (este assunto será mais detalhado nas aulas seguintes);
❖ Vênus, símbolo do Apetite Concupiscível (desejo sexual persistente e excessivo, Passível de suscitar a
ganância, a anseio por bens).
❖ No meio, temos o SOL, que simboliza a Vontade.
❖ Depois vem Marte, o Apetite Irascível (quem tem o gênio difícil ou se enraivece com facilidade:
personalidade irascível).
❖ Por fim temos a Inteligência, simbolizada por Saturno, distingue os homens das demais coisas, e toca
na fronteira da estabilidade, chamada CONCEITO. O planeta que está mais próximo das estrelas fixas.
Os Conceitos nos orientam no mundo e temos Vontade, que é a “coisa” que nos faz agir ou não.
A Vontade é como o Sol que ilumina a Terra, está no topo e no centro. Junto da Inteligência, a Vontade
também distingue o humano dos animais e outras coisas criadas. Uma pedra, uma árvore ou um animal
não agem por vontade própria.

377
A Vontade é como um Sol que ilumina as outras faculdades, e que pode queimar ou estar escondido por
baixo das nuvens. Nos manuais de Psicopatologia, a Vontade ou Conotação, está caracterizada em:
➢ Normabúlica: pessoas que tem Vontade Normal.
➢ Hiperbúlica: pessoas que tem Vontade Forte: comem demais, gastam demais, sexo demais, etc.
➢ Hipobúlica: pessoas que tem a Vontade Diminuída.
O terapeuta faz essas notas na Súmula, mas deve ir além, notando para onde está direcionada a Vontade
do paciente, ou seja, o que ela está movendo.
❖ A Vontade está iluminando os lugares certo daquele sujeito?
❖ O que a Vontade está movendo no sujeito?
❖ Este sujeito tem muita Vontade para jogar videogames, porém pouca Vontade para ajudar os pais.
❖ Um paciente deprimido pode estar hipobulíco para sua vida, mas pode estar hiperbulíco para se
suicidar.
A Vontade tem de ser bem orientada, pois muitas respostas aos problemas na biografia, na família,
no casamento, no trabalho, estão na Vontade.

SEMANA 5: LINGUAGEM (ANEXO)

Trata-se de um sistema de símbolos para a expressão


de pensamentos e para o exercício da comunicação,
segundo a American Speech and Hearing Association
(ASHA) (1). Dalgalarrondo (2008) cita que as funções da
linguagem englobam comunicação, suporte do
pensamento, instrumento de expressão, afirmação do
eu, dimensão artística ou lúdica (2).

As alterações da linguagem são atribuídas a lesões


neurológicas identificáveis (como Acidente Vascular
Cerebral e lesões expansivas) ou a transtornos
psiquiátricos (1, 2, 3). Distúrbios do aparelho fonador também constituem causas de alterações da
linguagem, no entanto, não são estudadas pela psicopatologia, como cita Cheniaux (2015) (3)

No âmbito psicopatológico, o Manual Diagnóstico e Estatístico de Transtornos Mentais, 5ª edição (DSM-


V) cita a linguagem entre os critérios diagnósticos de diversas patologias, com ênfase aos Transtornos
da Comunicação (Transtorno da Linguagem, Transtorno da Fala, Transtorno da Comunicação Social),
Transtorno do Espectro Autista, Delirium e Transtornos Neurocognitivos (4). Outros manuais e

378
compêndios de Psiquiatria Clínica e Psicopatologia relacionam as alterações específicas da linguagem a
transtornos psiquiátricos.

São encontradas divergências quanto às classificações das alterações da linguagem, sem discordâncias,
no entanto, quanto à conceituação. Por este motivo, foram divididas conforme descrevem
Dalgalarrondo (2008), Cheniaux (2015) e Alexandrina (2018).

ALTERAÇÕES DA LINGUAGEM - DALGALARRONDO (2008):


a)Secundárias a lesão neuronal: afasias, parafrasia, agrafia, alexia, disartria, disfonia, disfemia, dislalia;

b)Associadas a transtornos psiquiátricos: logorreia, taquifasia, loquacidade, bradifasia, mutismo,


perseveração e estereotipia verbal, ecolalia, tiques verbais ou fonéticos, coprolalia, glossolalia.

ALTERAÇÕES DA LINGUAGEM - ALEXANDRINA (2018):


a) Alterações por lesão orgânica localizável: afasias, parafasias, disartria, disfonia, dislalia,

b)Alterações da linguagem nos transtornos psiquiátricos: logorreia, bradifasia, mutismo, estereotipia


verbal, ecolalia, palilalia, tiques verbais, coprolalia, mussitação, glossolalia, pararresposta.

ALTERAÇÕES DA LINGUAGEM - CHENIAUX (2015):


a) Alterações quantitativas: afasias, agrafia, alexia, aprosódia, hiperprosódia, mutismo, logorreia,
oligolalia, hiperfonia, taquilalia, bradilalia, latência da resposta

b) Alterações qualitativas: ecolalia, palilalia, logoclonia, estereotipia verbal, mussitação, neologismos,


jargonofasia, parafasias, solilóquio, coprolalia, glossolalia, maneirismo, pedolalia, pararresposta,
respostas aproximadas.

1. ALTERAÇÕES QUANTITATIVAS DA LINGUAGEM


a) Afasias: alterações da linguagem falada e escrita por prejuízos na utilização e na compreensão dos
símbolos verbais. Os principais tipos são afasia motora (afasia de expressão ou de Broca), afasia sensorial
(afasia de compreensão ou de Wernicke), afasia global, afasia de condução, afasia transcortical e afasia
anômica)

b) Agrafia: incapacidade isolada de escrever. Pode estar associada às afasias.

c) Alexia: perda da capacidade de leitura. Pode ocorrer isoladamente ou associada às afasias e às


agrafias.

d) Aprosódia (hipoprosódia): perda ou diminuição, respectivamente, da modulação afetiva da fala, 6


AULA 5 PSICOPATOLOGIA tornando-se monocórdica, monótona. Pode associar prejuízos da capacidade
de compreensão da prosódia alheia. Esse distúrbio relaciona-se a lesões no hemisfério direito.
379
e) Hiperprosódia: acentuação da inflexão verbal; fala enfática, loquaz. Ocorre na mania.

f) Mutismo: ausência da fala. Pode expressar negativismo (silêncio deliberado) ou inibição psíquica (no
estupor esquizofrênico, depressivo, histérico ou do delirium).

g) Logorreia: expressão verbal aumentada. Observada tipicamente nos estados maníacos.

h) Oligolalia: (ou laconismo) expressão verbal diminuída, mas não abolida. O oposto da logorreia.
Observada nas mesmas situações em que o mutismo pode ocorrer.

i) Hiperfonia: elevação do volume da voz, ou seja, falar excessivamente alto.

j) Hipofonia: redução do volume da voz, falar excessivamente baixo.

k)Taquilalia e bradilalia: taquilalia (ou taquifasia) e bradilalia (ou bradifasia), respectivamente,


consistem em aumento e em diminuição da velocidade da expressão verbal. Correspondem às alterações
do curso do pensamento.

l) Latência da resposta: refere-se ao tempo que o paciente demora para responder às perguntas do
examinador, podendo estar aumentada ou diminuída. O aumento pode expressar uma inibição psíquica
(como ocorre na depressão), negativismo ou suspicácia. A diminuição pode estar relacionada a uma
síndrome maníaca ou a ansiedade.

2. ALTERAÇÕES QUALITATIVAS DA LINGUAGEM


a) Ecolalia: repetição, como um eco, da última ou das últimas palavras ditas pelo entrevistador (ou outra
pessoa do local), direcionadas ou não ao paciente. Ocorre na síndrome catatônica, no autismo e na
demência.

b) Palilalia: repetição involuntária da última ou últimas palavras ditas pelo paciente. Ocorre na
demência. Por exemplo, o examinador pergunta “qual é o seu nome?”, e o paciente responde “eu me
chamo João… João”.

c) Logoclonia: sinônimo da palilalia, mas a repetição é apenas das últimas sílabas. É encontrada
tipicamente na demência. Por exemplo, o examinador pergunta “qual é o seu nome?”, e o paciente
responde “eu me chamo João… ão”.

d) Estereotipia verbal: repetição monótona, inadequada e sem sentido comunicativo de palavras ou


frases. Ocorre na síndrome catatônica e na demência. Exemplo: um paciente ficava o dia inteiro gritando
“É uma coisa! É uma coisa!”.

e) Mussitação: o paciente fala com uma voz sussurrada, em volume muito baixo e tom monótono, quase
sem movimentar os lábios; fala para si próprio, e de forma incompreensível. Esse distúrbio é encontrado
na esquizofrenia.
380
f) Neologismos: criação de novas palavras ou atribuição de novos sentidos a palavras já existentes. São
encontrados principalmente na esquizofrenia.

g) Jargonofasia: a jargonofasia (ou salada de palavras, ou esquizofasia, ou confusão de linguagem) é


representada por uma desordem da linguagem, em que a sintaxe se torna incoerente. Ocorre emissão
de palavras conhecidas e, em geral articuladas corretamente, de forma desorganizada e ilógica, podendo
ser misturadas com neologismos, tornando o discurso complexo, indecifrável. Ocorre na esquizofrenia e
na afasia sensorial.

h) Parafasias: deformação ou alteração de palavras, podendo ser literais ou verbais. A parafasia literal
(ou fonêmica) ocorre quando há alteração de uma palavra para outra com som similar, como faca por
vaca, cadeira por cameila. Ocorre nas afasias motora e sensorial. Já a parafasia verbal (ou semântica)
consiste na substituição de uma palavra por outra semanticamente relacionada, como faca por garfo.
Ocorre na afasia sensorial.

i) Solilóquio: ato de falar sozinho. É indicativo de alucinação auditiva, mas pode ocorrer também em
pessoas sem distúrbios psiquiátricos.

j) Coprolalia: discurso composto por palavras vulgares, obscenas ou relativas a excrementos. Quando se
constitui num tique verbal, é uma manifestação típica da síndrome de Tourette.

k) Glossolalia: situação que se assemelha à pronúncia de uma nova língua. O indivíduo produz sons
irreconhecíveis, mantendo os aspectos prosódicos da fala normal.

l) Maneirismos: a fala torna-se pouco natural, como referir-se a si mesmo em terceira pessoa, escolha
peculiar das palavras (rebuscamentos, formalismo exagerado, uso excessivo de diminutivos, gírias ou
jargões), ou alterações da pronúncia.

m) Pedolalia: fala com uma voz infantilizada

n) Pararrespostas: respostas totalmente disparatadas, discrepantes, em relação às perguntas. Por


exemplo: “Qual é o seu nome?” – Resposta: “Acho que vai chover”. Podem ser encontradas na
esquizofrenia e na demência.

o) Respostas aproximadas: pode haver conceituação semelhante a “pararrespostas” de acordo com a


referência, mas trata-se de um fenômeno diferente do que acaba de ser descrito. O paciente, embora
compreenda perfeitamente a pergunta e conheça a resposta correta, deliberadamente dá uma resposta
errada, mas que está relacionada à pergunta. Por exemplo: “Quantas patas tem um cachorro?” –
Resposta: “Cinco”; ou então: “Quantos são ‘3 × 3’ ?” – Resposta: “Dez” (3). 1
REFERÊNCIAS

381
MELEIRO, Alexandrina Maria Augusto da Silva. Psiquiatria: Estudos Fundamentais. 1. ed. rev. Rio de Janeiro:
GUANABARA KOOGAN, [2018]. 1048 p. v. 1. ISBN 978-85-277- 3444-8.

DALGALARRONDO, Paulo. Psicopatologia e semiologia dos transtornos mentais. 2° ed. Editora: Artmed. Porto
AlegreRS, 2008

CHENIAUX, Elie. Manual de psicopatologia. 5. ed. rev. Rio de Janeiro: GUANABARA KOOGAN, [2015]. 230 p. ISBN
978-85- 277-2742-6.

AMERICAN PSYCHIATRICK ASSOCIATION. MANUAL DIAGNÓSTICO E ESTATÍSTICO DE TRANSTORNOS MENTAIS:


DSM-5. 5° ed. Editora: Artmed. Porto Alegre-RS, 2014.

IZQUIERDO, Iván. Memória. 2° ed. Editora: Artmed. Porto Alegre-RS, 2014.

382
Semana 06: MEMÓRIAS e FANTASMAS

Esta aula trata da memória e imaginação, notas da súmula psicopatológica da dimensão do espelho, e explica
suas funções e relevância para a orientação no mundo.

Anteriormente, falamos das notas da psicologia referentes ao corpo, à matéria. Depois migramos para
as funções do homem que integram as referências do mundo material na dimensão chamada Espelho,
que tem como que dois andares:

➢ 1º. Andar: dos Conceitos e


➢ 2º. Andar: onde estão os Fantasmas.
Nesta aula, trataremos de duas características da Súmula Psicopatológica, que ficam no 2º. Andar:
Memória e Imaginação, e do estado imaterial intermediário onde ficam os Fantasmas, ou seja, as formas
que têm uma correspondência com o que vemos, percebemos e ouvimos no mundo material.
É um lugar como se
Lealdade, justiça, estivesse fora da gente,
Conceitos
temperança, etc.. Ítalo chama de Conceito

Espelho Existe um lugar no espelho


oooo o que é muito próximo do
mundo material.
N
Material
A Fantasmas

❖ Exercício: Olhe para seu celular ou computador, fixe a imagem. Agora feche os olhos e tente
reproduzir esta imagem. Se não surgir nenhuma imagem, ou vem algo em algum lugar, mas não vem
a imagem ou um quadradinho do celular ou computador, entenda que a sua operação de memória é
fraca, mas a operação dos conceitos está funcionando, você sabe os conceitos.

Conceitos Vou adicionando a minha memória algumas


informações. Um pouco de cada informação,
vou formando meu conceito. Estas
informações são os fantasmas. Primeiro tenho
Memória que ser exposto a alguma informação ou
objeto, aí eu crio o 1º. fantasma. Se sou
exposto muito rapidamente, eu crio um
fantasma transitório que some.
Quando se faz o exercício de olhar para um objeto e fechar os olhos, a lembrança desse objeto aparece sem uma
corporeidade bem definida. Pode ser também que a imagem simplesmente não apareça, ou que venha uma
palavra em seu lugar. Nesses últimos casos, a operação da memória é fraca; o que está funcionando é a operação
do conceito.
383
O domínio da memória para a Psicopatologia se dá justamente no espelho, em que se visualiza o Fantasma, a
imagem de um objeto material, com forma mais ou menos vaga.

❖ O conceito de celular não foi você quem criou. Só podem existir os celulares na materialidade, porque
antes existe a possibilidade, uma fórmula de celular. Só pode existir esse quadro negro, porque em
algum lugar existe o tal do teorema de Pitágoras. Se não houvesse a possibilidade de quadrados, não
poderia haver o “quadrado” na realidade material, no mundo concreto.
❖ Existe um lugar (isso aqui não é investigação da psicologia portanto não precisamos ir lá) que tem as
fórmulas das coisas, não só as fórmulas matemáticas, até porque existem as fórmulas narrativas da
justiça, da lealdade, da nobreza, da vileza. Tem a possibilidade das coisas existirem. E existem as
individualizações dessas fórmulas no mundo concreto material.

Quando acessamos, pela atenção e inteligência, as coisas do mundo concreto, adicionamos fantasmas à memória;
depois, conseguimos estabelecer diferenças e semelhanças entre os fantasmas, e extraímos o conceito. O universo
dos fantasmas é o que chamamos de memória. Se alguém é exposto a algo material muito brevemente, cria um
fantasma transitório, que logo desaparece, ou seja, não ocorre o processo de fixação

❖ É assim que se dá a formação dos conceitos. Eu sou exposto a elementos da matéria, que se tornam
fantasmas, e esses fantasmas em algum momento se tornam 1 Conceito.
❖ O universo dos Fantasmas é o que chamamos de Memória. Isso aqui é o domínio próprio da Memória.
❖ E a Memória ela tem essa característica, primeiro eu preciso perceber as coisas, eu sou exposto, e aí
crio o primeiro fantasma. Esse fantasma tocou a minha Memória, fez andar meu processo no mundo,
mas não fixou. No entanto outras coisas que eu vi e li há muitos anos eu consigo lembrar.
❖ A Atenção está fora do processo de formação de imagens do espelho, mas ela que joga.

RELAÇÃO ENTRE ATENÇÃO E MEMÓRIA

Uma das notas da Súmula Psicopatológica é a Atenção. Algumas pessoas dizem que não têm memória,
mas muitas vezes, o problema é na Atenção, e não na formação mnemônica94. É porque não prestam
atenção que não formam fantasmas.
A ansiedade é um dos fatores que gera desatenção e impede a fixação de imagens na memória.
❖ Exemplo: chegam clientes que dizem que estão com Alzheimer precoce, com 30 anos de idade. Ítalo
diz: “Não, você deve estar muito ansioso, e a ansiedade faz com que você fique desatento e não fixe
informações na memória. É uma desatenção.” Não é que ela tenha uma amnésia, uma amnésia
lacunar, uma amnésia seletiva, ela tem uma desatenção.

94
Mnemônica: é um conjunto de técnicas utilizadas para auxiliar o processo de memorização.
384
❖ Então os testes de atenção, por exemplo, que fazemos, pedimos para a pessoa repetir uma sequência
numérica de forma rápida, pra ver se ele está atento ou desatento, isso não tem a ver com a
memória, isso tem a ver com a atenção.

A FORMAÇÃO DE FANTASMAS E CONCEITOS

O domínio da Memória é importante porque é com base nele que se formam os Conceitos, que nos
orientam no mundo, uma vez que são fixos e estáveis. Se uma pessoa se orienta pelos sentidos, torna-
se instável, pois assim como a lua eles mudam a todo instante.
❖ Os sentidos estão mais abaixo e podemos nos prejudicar se somos orientados por estes. Pois hora
estão vazios, hora estão crescendo; hora estão cheios e hora estão minguando. Eu me torno uma
pessoa instável.
O homem maduro tem de criar outras referências para suas ações. Se estiver na memória, também será
instável, porque a Memória também desaparece. A referência que não desaparece é o conceito. Quando
o sujeito consegue formar conceitos, as neuroses, o vazio no peito, a ansiedade e o medo começam a
diminuir. Uma vez A formação de fantasmas e conceitos que a memória é o lugar intermediário entre
sentidos e conceitos, trabalhá-la é fundamental
❖ O homem que pretende criar, que pretende ser feliz, que pretende caminhar, tem que criar referências
para suas ações. Pode até buscar na memória, mas esta é instável, tem momentos que some. O que
não some são os Conceitos.
Quando o sujeito consegue formar conceitos, as neuroses, o vazio no peito, a ansiedade e o medo começam a
diminuir. Uma vez A formação de fantasmas e conceitos que a memória é o lugar intermediário entre sentidos e
conceitos, trabalhá-la é fundamental.

❖ Exemplo: Se fosse igual a Dori, do filme procurando Nemo: vê um cachorro, esquece o que é um
cachorro, vê outro, esquece, e assim vai. Não forma o conceito de cachorro, não consegue fixar dois
fantasmas de cachorros na memória, não consegue especificar semelhanças e diferenças específicas.
Se lembrar da Dori no filme, tem uma hora que ela vê um tubarão, e fala “ah um tubarão que
bonitinho!” O tubarão come peixe, você esta entendendo? Ela não repara que tem um problema ali.
Porque ela não criou o conceito de tubarão.
❖ Isso também acontece com criança pequena, bebê, ela ainda não sabe, por exemplo, o que é tomada,
vai lá e coloca o dedo, várias vezes, uma hora ela sabe que dá problema, de tanto a mãe falar que não
pode, ela vai deixar pra lá e para de colocar. Porque ela não tem ainda o mundo mnemônico, ela não
tem ainda um mundo amplo interior. Ela está recebendo o mundo ainda. Ela tem o sentido já
funcionando, tem tato, tem audição, tem paladar, está tudo funcionando. Ela não tem ainda memória
acumulada, por isso ela não tem conceito de nada ainda. Ela não tem nem conceito de pai e mãe

385
ainda, ela nem entende por que você faz as coisas do dia a dia com ela. Dependendo do pai eu mãe
que você seja, ela forma um conceito de pai e mãe, em algum momento. Entre todas as pessoas que
cuidam de mim, estão do meu lado, umas se distinguem das demais. E é por isso que as pessoas tem
conceitos de mãe e pai tão diferentes. Porque pai e mãe é uma experiência muito primária, é uma das
primeiras experiências que a criança tem, um dos primeiros conceitos que ela forma. Ela não dá nome
pai e mãe, mas muitas das crianças a primeira coisa que elas falam inclusive é pai e mãe.
❖ Se não conseguimos fixar um pouco dos Fantasmas (ou espectros) não conseguimos formular
Conceitos.
❖ É uma experiência muito primária, pois é um dos primeiros Conceitos que a criança forma. Uma das
primeiras palavras que uma criança fala são: Papai e Mamãe. O fenômeno Pai e Mãe é muito diverso.
Não é um fenômeno unívoco. Cachorro é uma experiência mais emparelhada, mais estável.
Alguns conceitos são mais estáveis, enquanto outros dependem da experiência pessoal, como o conceito
de “Pai” e “Mãe”, que cada pessoa vivencia de modo diferente. Com a maturidade, o sujeito aperfeiçoa
os Conceitos que formou acerca de algo. Ele não para no primeiro Conceito que ele teve de algo, ele vai
evoluindo. Isso é o que se espera da inteligência do homem e da mulher.
❖ O que um homem e uma mulher que são “preguiçosos” ou em disfunção fazem? É normal fazermos
Conceitos provisórios acerca das coisas: acerca da justiça; de bem; de pai; de mãe; acerca de mim....
Não nos orientamos por memória, nos orientamos mais por conceitos.
De acordo com a experiência de um objeto, algumas pessoas terão um conceito mais primário e
provisório, enquanto outras terão uma intelecção mais aguda. Por exemplo, um veterinário que já viu e
conhece uma diversidade de cães será mais inteligente nessa matéria que uma pessoa comum, pois
consegue distinguir mais diferenças e semelhanças entre as espécies particulares
❖ Exemplo: um veterinário, que tem um canil sobre cachorros, que conhece uma diversidade de cães,
estuda, posta coisas, será mais inteligente neste quesito que uma pessoa comum. Ele consegue
distinguir mais diferenças e semelhanças nos fantasmas, entre as espécies particulares. Ele tem
intelecções mais agudas do que outra pessoa que não teve esta profissão.

Uma pessoa estulta95 néscia, burra e ignorante se fecha para a experiência sensorial e não deixa, por
obtusidade, por estultice, formar fantasmas em sua mente.
❖ As pessoas normalmente falam assim: “Não quero nem ouvir falar disso....”
O terapeuta, porém, não pode ser assim. Pelo contrário, precisa estar aberto e tratar os assuntos
importantes para o paciente (religião ou convicções políticas, por exemplo) de forma respeitosa. Não se

95
Estulta: Característica de quem não tem discernimento nem bom senso; néscio, inepto. Que não possui sensibilidade;
comportamento da pessoa que não tem educação; quem é insensível ou estúpido; estupidez
386
trata ferir os próprios conceitos fundamentais, mas de abrir-se e fazer um trabalho de memória, ver
muitas figurinhas do universo do paciente, pois você tem de saber quais são os conceitos que o orientam.
❖ Como terapeuta você não pode colocar seus Conceitos acima dos Conceitos do seu cliente. Você deve
deixar formar os fantasmas na sua cabeça do mesmo fantasma que está na cabeça dele. Você deve
absorver os Fantasmas do cliente, ir estudar, compreender, pois só assim poderá ajudar na evolução
terapêutica.
❖ O terapeuta tem que ter os dois universos de Memória e Conceitos simultâneos acerca desses dois
universos. Mesmo que você não acredite, tem que saber quais os conceitos que o orientam.
❖ Um exemplo, eu não sou da Wicca, não sou bruxo, mas eu tinha uma paciente lá que eu adorava, que
era uma bruxinha. Ela ia como uma bruxa para o consultório, toda de preto, vestido longo, chapéu
de ponta. E não era alucinação nem nada. Ela era assim, ela andava assim. Você acha que eu ignorava
as coisas que ela me falava? Não. Eu me deixava imaginar, eu deixava aqueles fantasmas da Wicca
preencher minha cabeça, ia atrás daquilo. E deixava o universo gótico entrar na minha cabeça,
criando conceitos acerca daquilo.
❖ Por que o terapeuta tem que fazer isto? Para Imaginar.

IMAGINAÇÃO E A ORIENTAÇÃO NO MUNDO

É necessário deixar a memória ser preenchida, pois precisamos ser capazes de Imaginar. Imaginação é
diferente de Pensamento. Enquanto o pensamento costura, relaciona, Memória, Conceito e Mundo
concreto, a Imaginação é uma operação dentro da Memória.
Imaginar é relacionar memórias, é brincar de “E se?”, ou seja, a Imaginação reúne Fantasmas e gera
outros Fantasmas que não dependem do mundo concreto e material.
❖ Imaginação é só o Pensamento que está dentro da Memória. Pensar não é brincar de “E se?”, porque
pensar bate no mundo material.
❖ “E se eu não tivesse duas pernas?”, isso não é pensamento, porque o pensamento bate no mundo
concreto, e no mundo material eu tenho duas pernas. Então isso não é pensar, isso é imaginar. O
que é imaginar? Eu estou pegando fantasma de pessoas sem pernas, estou pegando fantasma de
“eu aqui” e estou pegando fantasma de coisas que eu já vi pessoas sem pernas fazer. “E se eu não
tivesse perna?” Aí surge uma outra memória.
❖ A Imaginação gera outros fantasmas que não dependem do mundo concreto e material.
Ou seja, a imaginação é uma ferramenta poderosa de expansão das memórias e formação de conceitos;
o problema é que se estes não forem testados na realidade, Imaginação e a orientação no mundo a
pessoa pode orientar-se por referenciais falsos. É necessário, portanto, fazer um confronto entre
imaginação e realidade por meio do pensamento, sobre o qual se falará melhor em outro momento
387
❖ A Imaginação é uma ferramenta poderosa de expansão das memórias e formação de Conceitos; o
problema é que esses conceitos formados a partir da imaginação podem ser conceitos falsos porque
não tem uma referência no mundo concreto. Se estes não forem testados na realidade, a pessoa pode
orientar-se por referenciais falsos.
❖ A Imaginação pode ser uma ferramenta poderosa e benéfica, ela pode expandir a sua memória, pois
ao criar relações ela gera os Fantasmas e criar Conceitos. O ideal é passar pelo teste do Pensamento
para passar no mundo Material. Uma pessoa pode-se deixar conduzir por Conceitos que foram criados
só na Imaginação. Estes sendo sempre confrontados com a realidade, pode ajudar ou diminuir as
ilusões.
❖ O problema é que esses conceitos formados a partir da imaginação podem ser conceitos falsos, porque
não tem uma referência no mundo concreto. Você pode criar tantos fantasmas temáticos que você
gerou um conceito, só que você não fez o teste na realidade, porque você formou conceitos a partir
da imaginação e memória. Sem passar pelo escrutínio do pensamento. Você pode ter um monte de
referencial conceitual na sua cabeça que te orienta no mundo, que te leva a infelicidade, a tristeza,
porque você se deixou conduzir pela louca da casa, que é a imaginação. Nesse sentido, só nesse
sentido que a imaginação é a tal da louca da casa. A imaginação é poderosíssima, é benéfica, é
maravilhosa, desde que você consiga fazer uma operação de confronto com a realidade, isso se faz
através do pensamento. A imaginação é esse processo de correlacionar memórias.
❖ Tem um monte de coisas que você pode perceber no seu paciente e em você. Tem um monte de
conceitos na sua cabeça, sobre o seu pai, sua mãe, a pátria, a política, a religião, os animais, os
homens, as mulheres. Vários conceitos, ou seja, são forças orientadoras que vieram só da sua
imaginação. E você nunca confrontou isso com a realidade mesmo. Como é que as coisas são? A
realidade pra nós é como se fosse um limitador das possibilidades, porque eu estou dentro da
realidade material. Quando nos orientamos somente no domínio dos fantasmas, da memória,
começamos a expandir as memórias pela imaginação, podemos chegar mesmo a um lugar de
formação de conceitos desconectados da realidade material e concreta. Que faz com que a gente se
frustre, sofra.
A memória é o lugar de fixação das experiências sensíveis. Depois de formados alguns fantasmas e
conceitos, a imaginação pode trabalhar expandindo a memória. Uma pessoa pode ter um universo
interior amplo tanto no âmbito dos referenciais do mundo concreto, expandindo suas possibilidades
verdadeiras; quanto na imaginação, mas sem nenhum referencial na realidade, o que o torna infeliz,
triste, imaturo.
E você pode ter um universo interior, um espelho cheio de memórias geradas pela imaginação.
Lembra que memória + memória faz com que a pessoa forme conceitos.

388
O sujeito pode ter um universo diminuído, porque não usa a imaginação e não está atento ao mundo
material. Isso o torna alguém que tem poucos Conceitos, pouco humano, instável, que se orienta muito
pela sensibilidade (fome, calor, sede, cansaço), que muda. E vai se tornando uma pessoa infeliz porque
é instável.
A imaginação como eu disse é o processo de comparação desse seu mundo interior, vou comparando
memória com memória, fantasma com fantasma e criando outros fantasmas. Isso é o processo de
imaginar, e se? E se meu filho morresse? Aí cria-se um estado interior. Cria –se um fantasma. Cria-se
uma projeção de vida.
A Imaginação tem a capacidade de criar estados interiores ou projeções de vida, um sistema de
orientação conceitual que não permite que alguém se sinta perdido diante determinada situação. Uma
pessoa que medita sobre a morte dos próprios filhos, por exemplo, saberá orientar-se não apenas pelo
luto e perda da situação caso venha a perder um filho. Usar a imaginação a favor da construção de memórias
é importante, e é necessário que o terapeuta saiba trabalhar isso com seus pacientes.

❖ Se um filho meu morre, eu vou ficar profundamente triste, abalado. Eu vou ter uma convulsão por
assim dizer material. E pode ser que eu me oriente, que eu aja a partir obviamente disso que eu estou
sentindo no momento da perda do filho. Se eu já imaginei a morte dos meus filhos e fui criando
fantasmas aqui dentro, fantasmas de assombração, fantasmas de benção, fantasmas de superação,
uma série de fantasmas. Pode ser que se eu fiz esse exercício, eu possa ter formado um conceito acerca
de homens que perdem filhos. E pode ser que eu tenha um conceito já formado aqui dentro. E pode
ser que nesse momento da perda, eu vá ser orientado não somente pela minha convulsão física, a
perda, a dor, a tristeza, o choro, o luto, mas também por esse conceito formado anteriormente.
❖ Usar a Imaginação a favor da construção de memórias, a favor da construção de conceitos que não
dependam somente da realidade concreta e material, que sob muitos aspectos é muito rica e sobre
outros é muito pobre, é importante, e é necessário que o terapeuta saiba trabalhar isso com seus
pacientes.
Além de saber tudo isso, que não está nos livros de psicopatologia, o terapeuta precisa ter o
conhecimento técnico a respeito da memória (saber o que são as amnésias seletivas e lacunares, por
exemplo). Por isso é importante ler os textos complementares da disciplina.Sobre a Imaginação, há
pouca coisa escrita e ela é caracterizada somente como boa ou ruim. Com as ferramentas desta aula
será possível apontar mais detalhadamente se o paciente tem uma:
Imaginação:
➢ Fantástica: forma Conceitos de desorientação;
➢ A adequada
➢ Pobre
➢ Rica
389
❖ Obs. : Você começa a criar formas de descrever esse universo especular, esse universo do espelho.

Memória:

➢ Evocável: consegue criar Memórias com facilidade e


➢ Dificultosa: universo de Memória curto.

❖ Obs.: Tem formas mais técnicas para se descrever a memória.

Semana 06: Memória (Anexo)

A memória consiste na habilidade de registrar, reter e evocar


informações de fatos que ocorreram ao longo da vida, como
cita o Manual de Psiquiatria Clínica (1). Alguns fatores
psicológicos estão presentes no processo de memorização,
como fixação, conservação e evocação (2, 3).

Sua divisão é feita nos seguintes tipos: sensorial, de curto


prazo e de longo prazo. Esta última é subdividida em explícita
(episódica e semântica) e implícita (de procedimento,
condicionamento clássico, condicionamento operante,
aprendizagem não associativa e pré-ativação) (3, 4).

As alterações da memória envolvem a quantidade (aumento, diminuição, abolição) e a qualidade


(distorções ou alterações do conteúdo). Desse modo, as alterações da memória são divididas em
quantitativas e qualitativas e foram conceituadas conforme Dalgalarrondo (2008), Cheniaux (2015) e
Alexandrina (2018) descrevem.

ALTERAÇÕES QUANTITATIVAS

❖ Quanto à classificação temporal:


a) Anterógradas,
b) Retrógradas e
c) Retroanterógradas
❖ Quanto à extensão e ao conteúdo: generalizadas, lacunares e seletivas

390
a) Amnésia (hipomnésia) anterógrada: falha de fixação de memórias a partir do evento que
desencadeou o quadro. Primariamente ocorre no transtorno amnéstico e nos quadros demenciais.
Também pode ocorrer no delirium e nos estados crepusculares, nos estados de ansiedade e de agitação
psicomotora (incluindo a mania), na maioria dos pacientes com retardo mental grave. Ocorre ainda na
embriaguez alcoólica pela falha de fixação, os chamados blackouts, ou palimpsestos.

b) Amnésia (hipomnésia) retrógrada: relacionada à evocação. É a perda de memórias prévias ao evento


desencadeador. É rara a sua ocorrência isolada, isto é, não associada a amnésia anterógrada. Está
presente principalmente em quadros dissociativos histéricos, sendo encontrada ainda em traumatismos
cranioencefálicos, na intoxicação por monóxido de carbono e em lesões talâmicas.

c) Amnésia (hipomnésia) retroanterógrada: forma mais comum, também denominada mista ou de


fixação e evocação. Ocorre dificuldade de fixação e de evocação de eventos que podem ter ocorrido
antes e após o processo lesivo. É característica dos quadros demenciais e do delirium, podendo ocorrer
ainda após um traumatismo cranioencefálico ou uma aplicação de eletroconvulsoterapia.

d) Amnésia (hipomnésia) generalizada: afetadas todas as recordações de grande parte do passado,


podendo abranger curtos, médios e longos períodos, ou mesmo a vida inteira. Pode ocorrer após
traumatismo cranioencefálico grave, em fase terminal de demência e em transtornos dissociativos
histéricos.

e) Amnésia (hipomnésia) lacunar: também é chamada de localizada, pois ocorre falha pontual de
memória devido a um prejuízo de fixação. Os limites de espaço e tempo são relativamente precisos e os
eventos anteriores e posteriores a esse período são normalmente fixados e evocados. Ocorre
posteriormente a um estado de coma (como nas crises convulsivas do tipo grande mal) ou de delirium,
entre outros.

f) Amnésia (hipomnésia) seletiva: há associação entre o conteúdo e o significado afetivo da memória.


Um exemplo de amnésia seletiva, que também serve para caracterizar uma amnésia retrógrada pura,
seria o seguinte: uma moça briga com o namorado e, depois disso, quando o reencontra, não é mais
capaz de reconhecê-lo. Além disso, não consegue se lembrar de nenhum evento em que os dois
estiveram juntos (3).

g) Hipermnésia anterógrada: capacidade exagerada de armazenamento de novas informações.


Geralmente é restrita a uma habilidade específica, como memorizar nomes e músicas. Pode ocorrer em
situações fisiológicas ou patológicas, como no autismo.

h) Hipermnésia retrógrada: caracterizada pelo excesso de recordações num breve espaço de tempo.
Pode ser observada na síndrome maníaca (primária ou secundária).

391
i) Hipermnésia lacunar: é observada em pacientes com transtorno de pânico e no transtorno de estresse
7 AULA 5 PSICOPATOLOGIA pós-traumático, em relação à primeira crise ou ao evento traumático.

j) Hipermnésia seletiva: pode ocorrer na depressão, quanto a fatos dolorosos; na mania, quanto a
sucessos e realizações pessoais.

Alterações qualitativas

a) Alomnésia: distorção involuntária de uma memória verdadeira, também conhecida como ilusão de
memória. Está presente no delirium, na demência, no transtorno amnéstico esquizofrenia e em outros
transtornos.

b) Paramnésia: memória de evento que não ocorreu. Também é conhecida como alucinação de
memória, por se tratar de uma alteração análoga à que ocorre na sensopercepção. Pode ocorrer na
esquizofrenia.

c) Déjà vu e jamais vu: no déjà vu (já visto), há sensação de familiaridade diante de uma situação
inteiramente nova. No jamais vu (nunca visto), ocorre o oposto: ausência da sensação de familiaridade
diante de uma situação já vivenciada uma ou mais vezes no passado. Podem ocorrer na ausência de
distúrbios ou, ainda, na epilepsia do lobo temporal, na esquizofrenia, em síndromes de ansiedade.

d) Criptomnésia: recordações voltam à mente do indivíduo, mas não são reconhecidas, parecendo a ele
ideias novas. É o mecanismo dos casos de plágio involuntário.

e) Ecmnésia: trata-se de presentificar o passado, ou seja, uma recordação tão intensa que se assemelha
a uma ocorrência alucinatória. Um exemplo de ecmnésia, de natureza dissociativa, foi o de uma senhora
de mais de 60 anos que, após a morte súbita do marido, passou a agir como criança, brincava o dia inteiro
e ficava chamando pelos pais, falecidos havia muito tempo (3).

Referências

PARAVENTI, Felipe; CHAVES, Ana Cristina. Manual de Psiquiatria Clínica. 1° ed. Editora: Roca. Rio de
Janeiro-RJ, 2016

DALGALARRONDO, Paulo. Psicopatologia e semiologia dos transtornos mentais. 2° ed. Editora: Artmed.
Porto AlegreRS, 2008

CHENIAUX, Elie. Manual de psicopatologia. 5. ed. rev. Rio de Janeiro: GUANABARA KOOGAN, [2015].
230 p. ISBN 978-85- 277-2742-6.

MELEIRO, Alexandrina Maria Augusto da Silva. Psiquiatria: Estudos Fundamentais. 1. ed. rev. Rio de
Janeiro: GUANABARA KOOGAN, [2018]. 1048 p. v. 1. ISBN 978-85-277- 3444-8

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Semana 07 – CONSCIÊNCIA e PENSAMENTO

Esta aula trata da linguagem e da conação ou vontade, notas psicopatológicas que estão na intermediação
entre mundo material e o espelho, ou seja, estão presentes no olho, segundo o esquema usado até aqui

CONSCIÊNCIA

Se fôssemos tratar da Consciência e do Pensamento em toda a sua amplitude, seria necessário um curso
somente para isso. A ideia não é explorar tudo a respeito delas, mas contribuir na elaboração da Súmula
Psicopatológica, identificando o que é importante para diagnosticar o paciente.

❖ O tema da Consciência é vasto. A ideia é preparar o terapeuta para preparar a Súmula Psicopatológica
no item Consciência. Não será falado sobre os aspectos da Consciência. A abordagem é mais técnica.
Em primeiro lugar, deve-se verificar a Clareza da Consciência, que pode ser:
➢ Clara : paciente com a consciência clara;
➢ Obnubilada : paciente com a consciência confusa;
➢ Torporosa: paciente com a consciência em torpor;
➢ Comatosa: paciente em coma etc.
Trocando em miúdos, deve-se indagar: a pessoa está presente ou não?
❖ Ela consegue fazer um trajeto entre o mundo concreto, o mundo do espelho e o olho?

Exemplo: Um paciente com privação de sono ou embriagado, terá redução da Consciência por motivo de
natura fisiológica.

❖ Sua Consciência pode estar rebaixada, a pessoa não tem clareza de uma situação. Uma pessoa
embriagada não consegue dar respostas precisas.
❖ Em emergências psiquiátricas isto deve ser avaliado, a pessoa pode ter caído e batido a cabeça e ficou
desorientada, ou ainda, tentou suicídio – tomando uma cartela de remédios etc.
❖ Em consultórios e ambulatório, dificilmente encontramos estas situações de rebaixamento de
Consciência.
Outro aspecto é a Consciência de Morbidade, ou seja, o insight que o paciente tem a respeito do
problema de sua vida. Se o sujeito vai ao consultório porque a esposa ou outro familiar lhe pediu, está
ali somente para cumprir o que lhe foi ditado. Muitas vezes, o paciente tem uma vida disfuncional, mas
não percebe que há problema.

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❖ Muitos pacientes procuram terapia para cumprir um cronograma de família. Ele tem alguma
disfunção, mas ele mesmo não enxerga. Vai porque a esposa ou algum outro familiar pediu. Muitas
vezes, o paciente tem uma vida disfuncional, mas não percebe que há problema.
Um dos papéis do terapeuta é indicar sem feri-lo, sem julgá-lo, que algumas coisas podem melhorar em
sua vida. É importante analisar a vida concreta do paciente sem emitir juízo de valor e entender por que
ele não vê certas questões como problemas. Isso demanda uma pacificação interior em relação à história
do paciente.
❖ O terapeuta deve ir sugerindo insights na vida dele, acerca da vida dele.
❖ Exemplo: Adolescente que ficava 12h ao dia jogando em casa e com dificuldades nos estudos. Não
tinha amigos e colegas, tinha sobrepeso. Quando os pais pediam para o garoto sair com eles, ou
estudar ele dava um escândalo. Um dia quebrou a porta do armário porque não queria estudar.
Quando Ítalo perguntou por que ele foi fazer terapia, ele alegou que os pais não o deixavam jogar.
Ele não enxergava nenhum problema na vida dele. O terapeuta tem que olhar: a vida está funcional
ou disfuncional, o que está acontecendo na vida dele. Neste caso o terapeuta pode emitir um juízo
de valor, mas raramente deve fazer isto.
❖ Quando você está diante de uma alma, você não pode ter pressa em julgar, você tem que acolher,
respeitar os sentimentos.
❖ Ítalo comenta que o colégio para os jovens é chato, ensinam coisas que não fazem sentido para os
jovens, não veem utilidade e os pais pressionam para estudar. As aulas do colégio onde os jovens
não encontram o uso para aquelas teorias associadas a práticas. O terapeuta tem que ter AMOR
pelo cliente.
❖ Para este jovem, que sofria bullying no colégio, o mundo dos games era muito mais atraente, pois
ele participava de guerras, estratégias, mitologias, esporte. Nos games, ele tinha um papel na
equipe, ele socializava, não sofria bullying e era valorizado pelos colegas dos jogos online.
❖ O terapeuta tem que ter habilidade para entrar no mundo do paciente e compreendê-lo. O terapeuta
deve fazer uma manobra, reforçando o ambiente disfuncional dos pontos positivos e vai fazendo a
migração pouco a pouco do mundo online, de games, para o mundo real.

Ao registrar a Consciência de Morbidade na Súmula Psicopatológica, pode-se anotar “presente” ou


“ausente” e explanar as razões da presença ou ausência. A condução prática de casos como esses estará
nas aulas que apresentarão casos concretos, após a formação inicial.
Se a pessoa tem a Consciência da Comorbidade, deverá ser indicado onde ou qual Consciência ela tem,
e vice-versa também. Se não tem Consciência, fazer um breve relato.
Outra questão é a “Consciência do Eu”. Relativos a ela, é importante analisar a EXISTÊNCIA, a ATIVIDADE,
a UNIDADE e os LIMITES do “EU”.
CONSCIÊNCIA – EXISTÊNCIA
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Alguns pacientes esquizofrênicos não percebem que o “EU” deles existe, é um vazio. Em pacientes não
esquizofrênicos, a existência do “eu” pode ser posta em cheque com base no niilismo, tendo uma visão
de esvaziamento; para ele, tanto faz o “eu” existir ou não
❖ Em pacientes funcionais, a existência do “EU” pode ser posta em cheque com base no niilismo, tendo
uma visão de esvaziamento; para eles tanto faz o “EU” existir ou não.

CONSCIÊNCIA – ATIVIDADE
Quanto a atividade do “EU”, há pacientes que não consideram que o “EU” deles está agindo, não notam
que suas ações têm autoria própria. Não é o meu “eu” que age, é alguém que está agindo. Isso ocorre
em pacientes esquizofrênicos e, de modo muito menos dramático, com os não esquizofrênicos.
Para os pacientes funcionais ocorrem de usar os movimentos de Vitimismo , o paciente não se
reconhece como autor de suas ações, mas tende a justificá-las. De fato as circunstâncias nos influenciam,
mas, no limite, quem age é o paciente; e isto precisa ser mostrado pelo terapeuta.
❖ Exemplo: “ Eu ajo assim porque sou pobre....., porque não tive pai....., porque meu marido me
abandonou....” O terapeuta deve ir abordando e tratando, até um dia falar: mas no fundo quem age
é você.
Algumas pessoas negam a atividade do “EU” porque isso as leva a perceber a solidão. O “EU” tem uma
atividade própria: todo ato humano é sempre solitário. A falta dessa percepção é sinal de imaturidade.
❖ Exemplo: . Quando morrermos iremos sozinhos, se estivermos acompanhados no dia da morte, talvez
facilite o momento, mas morreremos sozinhos.

CONSCIÊNCIA – UNIDADE
Outro ponto é a Unidade do “EU”, que não se divide, é uno. Os esquizofrênicos têm alterações graves
em relação a isso, por exemplo, podem achar que são eles mesmos e Napoleão concomitantemente.
Outro ponto é a Identidade do “EU”, quando o sujeito de fato se reconhece como outro alguém
(Napoleão, por exemplo), identifica-se com ele integralmente.
Exemplo: Ítalo foi chamado para tirar um paciente do hospício que estava debaixo do chuveiro e não
queria sair. Era um homem forte e Ítalo não conseguiria tirar sozinho. Foi para o jardim, pensar o que
fazer, aí viu um homem com uma capa andando. Ítalo perguntou quem era, e ele respondeu que era
Moisés. Ítalo pediu ajuda a Moisés e os dois conseguiram tirar o paciente do chuveiro e colocar para
dormir.

Isso também ocorre em menor medida quando o sujeito olha para a própria história, para a própria vida,
e não se percebe, não se tem clareza a respeito da própria biografia. Não há continuidade na história,
há somente a ação conforme as necessidades do dia.
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Uma das coisas necessárias no ambiente terapêutico é fazer com que o paciente consiga dizer qual é seu
Argumento Vital, pois caso falte clareza a respeito dele, também haverá dúvidas quanto à própria
identidade.
❖ Argumento Vital: todos os filmes, histórias novelas há um argumento vital do personagem: alguns
procuram vida de prazer e conforto, outros estão servindo pessoas, outros estão protegendo pessoas,
outros são pessoas que estão buscando / procurando conhecer algo. Estes são os mocinhos e os
vilões fazem o contrário disso: em vez de proteger, eles atacam; por exemplo.

CONSCIÊNCIA – LIMITES
Ainda na consciência do “EU” há outra nota, que são os Limites do “eu”. Isso ocorre mais em pacientes
esquizofrênicos graves, que não notam o limite em ter seu “eu” e o mundo. Há, por exemplo, as
“publicações de pensamento”, algo que gera muita angústia, porque o paciente acha que seu
pensamento está sendo publicado, que todos sabem o que ele está pensando.
Outros não sabem o limite material do “EU”, por exemplo, se uma árvore está sendo cortada, sentem
em si a dor da árvore.
Essas são as notas sobre a Consciência: em primeiro lugar, seu aspecto MATERIAL (CLAREZA); depois, a
CONSCIÊNCIA DE MORBIDADE; por fim, EXISTÊNCIA, ATIVIDADE, UNIDADE E LIMITES DO “EU”.

PENSAMENTO

Vamos olhar algumas questões sobre o Pensamento: CURSO, FORMA e CONTEÚDO.


O Pensamento é a função que articula Conceitos, Memória e Mundo Material, analisando eventuais
correlações e formando novos Conceitos. Ele é fundamental para formação de Conceitos mais sólidos,
que sejam referenciais de orientação.

N1 Conceitos
Memória
A Espelho

N
Corpo / Matéria
Pensamento: transita em
A
todos estes universos

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❖ Temos Conceitos anteriores, comparamos com novos e formamos um novo conceito. Isto é chamado
de Silogismo.96 Assim vamos formando Conceitos mais claros, mais sólidos, mais elevados, mais
robustos, mais precisos, que sirvam para orientar no mundo.

PENSAMENTO – CURSO
O Curso do Pensamento indaga se ele está acelerado ou lento. Tem pessoas que tem pensamentos mais
lentificados.
Percebe-se isso pela observação de sinais externos, como o movimento do olho, a velocidade da fala, a
capacidade de fazer conexões entre informações diversas.
O Curso diz respeito, portanto a velocidade do Pensamento.

PENSAMENTO – FORMA
A Forma do Pensamento pode ser Linear, Radial ou Aleatória.

➢ Linear: nesta forma Linear, usualmente as coisas são explicadas em ordem cronológica ou
logicamente ordenada. Esse modo de pensar traz um conforto, por ser ordenado.

➢ Radial: a pessoa que tem um pensamento Radial tem uma unidade, quer mostrar um ponto,
mas explorando-o por diversos aspectos. Isso pode causar ansiedade, pois a impressão de
que a pessoa se perdeu, mas sempre volta ao ponto.

A pessoa com pensamento Radial tem uma unidade, porém


explora várias frentes de um mesmo ponto (filosófico, piadas,
notícias etc.) O interlocutor pensa que o sujeito se perdeu,
porém ele volta ao centro. Ele explora o tema, afetivamente,
biograficamente e historicamente.

❖ Aleatório: O pensamento Aleatório é confuso, não se vê unidade nele, não há um ponto


abordado. A pessoa não forma juízos e conceitos.
A pessoa não tem um ponto que está abordando, elas
nunca conseguem formar Conceitos, não querem mostrar
nada, conceituar nada, só querem estar falando.

96
Silogismo: é um termo filosófico com o qual Aristóteles designou a conclusão deduzida de premissas, a argumentação
lógica perfeita. É um argumento dedutivo constituído de três proposições declarativas que se conectam de tal modo que, a
partir das duas primeiras, é possível deduzir uma conclusão

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PENSAMENTO – CONTEÚDO
Há ainda o Conteúdo do Pensamento (Triste, Catastrófico, Alegre, Práticos). A vida humana é ampla, não
é monotemática.
Alegres: Pessoas com pensamentos sempre alegres perdem a profundidade da tristeza da seriedade;
Práticos: quem sempre tem pensamentos muito práticos perde a dimensão da abstração, da poesia, da
beleza; etc.
Catastrófico: para estas pessoas, seus pensamentos estão sempre voltados para catástrofes, sentem-se
acuadas, com medo.
Triste: para estas pessoas, perdem a alegria de viver, de encontrar ânimo para enfrentar a vida com mais
leveza.
Os conteúdos Monotemáticos na esfera do pensamento levam à pera de experiências vitais, conduzem ao
empobrecimento. Uma terapia bem-feita ajuda as pessoas a explorarem os diversos conteúdos de Pensamento.
Ao saber a estrutura do homem do ponto de vista Antropológico, suas faculdades, quais as ferramentas
necessárias à proposição de novos conceitos, o terapeuta conseguirá tirar pessoas de fobias e ansiedade.

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Semana 08 – AFETO
Esta aula trata da afetividade, nota da súmula psicopatológica analisada pelo modo como é expressa

FORMAÇÃO E FUNCIONAMENTO DO AFETO

A AFETIVIDADE é uma das notas da Súmula Psicopatológica que é analisada por um ângulo específico: os
psicopatologistas não buscam conhecer, identificar, nem descrever os conteúdos da afetividade, mas a
forma como ela é expressa; por assim dizer, o brilho afetivo.

❖ A afetividade pode ser definida como o conjunto de estados e tendências que uma pessoa vivencia de
maneira própria e imediata. Abrange todas as experiências que definem e limitam a vida emocional
da pessoa, e transcende a personalidade e o comportamento.

Em primeiro lugar, precisamos saber descrever se sujeito tem uma Exaltação ou Embotamento Afetivo;
primeiro, procura-se entender a quantidade de afeto e, depois, se ela é adequada às situações: como
está a labilidade, a continência ou incontinência; se o sujeito tem uma paratimia; se há ambivalência; ou
uma Neotimia.
❖ Exaltação: isto é se o brilho da afetividade está para cima ou
❖ Embotamento Afetivo: quando o brilho da Afetividade está para baixo.
Depois se a Afetividade é adequada às situações, a qualidade que pode ser:
❖Labilidade: instabilidade emocional;
❖Continência: é a capacidade afetiva e de transformação dos afetos em elementos simbólicos;
❖Incontinência: Mudanças súbitas e imotivadas de humor, sentimentos ou emoções.
❖Se o sujeito tem Paratimia : é um transtorno afetivo caracterizado pela inadequação da
expressão emocional no contexto (ou situação) em que a pessoa se encontra. Também engloba
as situações ou manifestações em que a expressão emocional é incompatível (ou incongruente)
com a expressão verbal do paciente.
▪ Também falamos em Paratimia quando a expressão mímica da pessoa não corresponde ao
sentimento que ela expressa externamente (por exemplo, quando alguém nos diz que está
sofrendo muito enquanto sorri).
▪ Como vimos, na Paratimia há uma inadequação, seja entre a expressão emocional (por
exemplo, chorar) e o contexto (em uma festa), ou entre a expressão emocional e gestual
(risos) e o que o paciente verbaliza (diz que está muito triste )
▪ Além disso, essa inadequação pode se referir tanto ao significado quanto à intensidade do
componente afetivo que acompanha a experiência (ou seja, quando essa intensidade é
excessiva ou menor do que o “esperado”).
❖ Verificar se há Ambivalência.

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❖ Verificar se há Neotimia:
❖ O terapeuta deverá saber ler no cliente estes oito conceitos.
Na fronteira do mundo concreto e interior, está a memória da sensibilidade, o que chamamos de afeto.
Desde o nascimento a criança recebe estímulos ambientais. A sensibilidade é estimulada e impressa pelo
mundo exterior no bebê que, de certo modo, tem o mundo interior vazio.
O bebê vai recebendo informações táteis, visuais, auditivas etc. que somam fantasmas simples; estes se fundem,
ampliam-se confrontam-se.

❖ É a primeira formação do mundo interior. Estes estímulos são água quente / fria; barriga cheia /
vazia; peito da mãe, o calor do abraço da mãe. O escuro / claro; conforto do lençol/edredom /toalha;
fralda limpa/suja. Isto é a sensibilidade que é estimulada e impressa na Memória da Sensibilidade.
❖ Onde está o afeto?
Na fronteira entre o mundo
Interior interior e exterior, está a
Memória da Sensibilidade,
Exterior que chamamos de Afeto.

Por volta dos três ou quatro anos, a criança acorda à noite depois de um pesadelo. Do ponto de vista do
desenvolvimento humano, isto é uma coisa maravilhosa, pois significa que ela consegue sentir,
visualizar, projetar a partir de algo que não está mais vendo; consegue fazer pequenas abstrações, agir
baseada no mundo abstrato, de fantasmas, imagens, memórias. Isto é bom porque ela consegue fazer
pequenas abstrações fora do mundo concreto / exterior.
As memórias vividas são o que chamamos de Afeto, isto é, são as memórias do mundo interior
brilhantes, intensas. Há outras que são menos carregadas de concretude.
❖ Exemplo: ao tomar um café, o sabor é muito vívido, pois está acontecendo de modo concreto. Depois
de bebê-lo, ainda resta uma lembrança quase tátil e gustativa; mas resta também outra lembrança,
mais abstrata, mais fantasmagórica, que é só uma imagem.
No mundo interior, existem três níveis: imagem sensitiva, imagem abstrata e conceito. Isto é, o mundo
interior é composto pelos níveis do afeto (mais próximo da sensibilidade), da memória (fantasmas,
formas sem carga sensível) e dos conceitos (traços sólidos da realidade imaterial).

Conceitos

Memória
Interior Afeto

Exterior
400
O Afeto, portanto, é o que no mundo interior mais se assemelha às coisas que acontecem no mundo
material. Justamente porque o mundo material tem um império físico, ele pressiona, quebra, tem uma
presença para nós.
Se o mundo afetivo estiver exaltado, muito vívido, a pessoa será conduzida por ele (pois a Memória e os
Conceitos não são acionados). O problema é que no mundo sensível, tudo se degenera, tudo muda o
tempo todo; por isso, agir com base no que estamos vendo, no que é concreto e material, é uma aposta
insensata.
❖ O desafio é que no mundo sensível, tudo se degenera, tudo muda o tempo todo; por isso, agir com
base no que estamos vendo, no que é concreto e material, é uma aposta insensata. Depois de 2/3
anos torna-se um mundo vazio, porque o mundo material muda toda hora.
O mundo da Memória é um pouco mais estável, porque é uma lembrança abstrata, ele captou um traço
mais ou menos fixo e característico das coisas. O Conceito é o que há de mais sólido e estável.
Podemos nos orientar no mundo por meio da Sensibilidade dos Afetos, da Memória e dos Conceitos.
A maturidade consiste em progredir nessa escala.
Quando o mundo afetivo está exaltado, é como se ele assumisse o comando. É evidente que os afetos
são importantes, porque dão um brilho material para o mundo interior. Mas o terapeuta tem de
perceber se o sujeito está Exaltado ou Embotado.
❖ Exemplo: se o paciente sobre um acidente antes da consulta, é normal que fale sobre isso, pois teve
uma exaltação afetiva e transitória. Ali naquele momento, imprimiu um fantasma forte, com brilho.
Mas se ele continuar falando disso por dias, torna-se um problema, pois o acidente já passou.

A Exaltação Afetiva é isto: o mundo material entra em nós, somos impressionados, ele tem uma
transitoriedade e desaparece. Depois se forma as Memórias e os Conceitos.
A vida Afetiva Embotada também é perigosa, porque significa que a pessoa não consegue formar
memórias. No limite ela sequer chega a formar Conceitos. Seu sistema de orientação no mundo também
é a sensibilidade.
Nos esquizofrênicos existe o Embotamento. Nas depressões e manias a Exaltação, porque o mundo
sensível brilha mais no mundo negativo. O que ele não tem é a Conação, a Vontade, não tem o impulso.
Tem uma formação afetiva negativa, por isso o deprime, porque vai formando Memórias e Conceitos
negativos acerca do mundo, acerca dos relacionamentos, a cerca dele.
CARACTERÍSTICAS DO AFETO

É necessário saber perceber isso no consultório:

EXALTAÇÃO AFETIVA:
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Se a pessoa está sempre super estimulada pelo mundo sensível, ela tem Exaltação Afetiva.

EMBOTAMENTO
Se a pessoa está pouco estimulada, ela tem um Embotamento. Nas Depressões e Manias, há Exaltação.
O deprimido sente mais do ponto de vista negativo; ele vai formando Memórias e Conceitos negativos
acerta do mundo.
LABILIDADE AFETIVA:
Ora a afetividade afeta muito, ora afeta pouco. O paciente não tem constância. Se falamos algo para o
paciente e ele fica normal; depois, falamos uma coisa semelhante e ele começa a chorar ou rir muito,
ele tem Labilidade Afetiva, tem uma formação errática dos primeiros fantasmas.
INCONTINÊNCIA:
É um agravamento, uma alteração quantitativa da Labilidade. Piadas ou comentários mais tristes vão
mostrando a amplitude dessa alteração, pois percebe-se como o paciente reage a eles na consulta.
É necessário ir percebendo que os fantasmas do mundo afetivo têm tamanhos diversos. Se eles são
diferentes para coisas parecidas, no final das contas, os conceitos estarão alterados e o sistema de
orientação vital será problemático.
❖ Observar as reações do cliente perante uma piada ou comentário acerca da realidade.

AMBIVALÊNCIA:
Estas acontecem em pacientes bipolares: a pessoa quer duas coisas ao mesmo tempo, mas não são
coisas excludentes.
Isso não acontece só nas doenças psiquiátricas (às vezes, a pessoa também quer ao mesmo tempo
dormir e trabalhar, ou então ir ao churrasco ou ir à igreja.
❖ Exemplo: Oferecer Guaraná e Coca-Cola: a pessoa não consegue agir, que os dois e não consegue
decidir.

O terapeuta experiente tem de fazer com que o paciente recrute para a tomada de decisão não o afeto,
mas o Conceito ou a Memória.
❖ Exemplo: “Você lembra que da última vez ficou dormindo, foi demitido e ficou sem dinheiro?” Isto é
fazer o cliente refletir e decidir. O terapeuta tem que estimular o mundo imaginário para o cliente
aprender a formar conceitos e decisões.

No caso das Ambivalências Disfuncionais, não se consegue recrutar a memória e nem o conceito. A
pessoa não chegar a tomar a decisão, até que se retire um dos estímulos sensíveis.
As Paratimias e Neotimias são percebidas em doenças graves, como esquizofrenia ou demência, por exemplo.

PARATIMIA:

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A sensibilidade gera um afeto contrário ao esperado e a pessoa reage afetivamente de modo anômalo
(fora da ordem, da norma estabelecida; diferente do normal; anormal, estranho, irregular).

❖ Exemplo: Um paciente com demência que cai na gargalhada ao descobrir que seu irmão morreu.

Em alguns esquizofrênicos, isso pode gerar consequências devastadoras.


❖ Exemplo: O caso do paciente que quebrou o pescoço da tia porque ele lhe negou um sanduíche.

NEOTIMIAS:
Em regra acontecem na esquizofrenia. A pessoa recebe um estímulo sensível e cria um afeto
completamente anômalo, que não é da mesma ordem.
Um exemplo é o Trema, que é o momento da descoberta da esquizofrenia para o paciente.
❖ Exemplo: Às vezes um paciente come um sorvete e tem o afeto de um pôr do sol, aí ela se surpreende,
gera uma grande ansiedade e não se reconhece mais. Ela pode se olhar no espelho e gerar afeto do
cachorro que morreu há cinco anos, e se vê como este cachorro.

Como a sensibilidade geram afetos anômalos, geram-se também Memorias e também Conceitos
anômalos;
Ao final, a pessoa cria uma estrutura de pensamento desvinculada do mundo sensível, e tem um sistema
de orientação lógico que não tem a ver com o mundo concreto.
Alguns alucinógenos, como LSD, também podem causar Neotimias
❖ Observação: Em estágios pré-oníricos, pode acontecer muito do pensamento estar desvinculado do
mundo sensível. Por exemplo, você está indo dormir e alguém te toca e você cria um outro afeto em
relação a este momento. Escuta um barulho e “Achei que estava caindo”.

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SEMANA 09 – MÉTODO TERAPÊUTICO
Esta aula retoma pontos tratados nas aulas anteriores e apresenta a definição de vida humana como
narrativa. Aponta também elementos estrutura narrativa que auxiliam o terapeuta no exercício de sua
atividade.

O QUE É A VIDA?
Antes de falarmos do conteúdo propriamente, vamos retomar o que conversamos até aqui.

Os professores Roberto Mallet, Paula Serman, Rennan Caminhotto e Victor Sales trataram de assuntos
mais práticos.

Aqueles elementos sozinhos são insuficientes para dar conta de uma questão mais séria ou totalizante.

Diante da pergunta “O que a é vida?”, pode haver uma dificuldade para responder de modo que leve
em consideração todas as dimensões do sujeito. Mas, se não tratamos de respondê-la com seriedade,
com certeza teremos uma vida frustrada.

❖ Muitas pessoas, ou o próprio terapeuta bem como seu paciente podem ter dificuldades de responder.
A resposta que devemos dar deve ser verdadeira, pessoal, profunda, prática que leve em consideração
todas as dimensões do sujeito da pessoa.
❖ Se perguntarmos “O que é a Vida?”, para um biólogo, ele vai responder com suas ferramentas,
provável que ele diga: “A vida é uma transição de composições químicas”. A vida para um biólogo
muitas vezes é um amarrado de muitos elementos químicos...
❖ Se eu pergunto para um físico “O que é a Vida?”, ele vai dizer “A vida é movimento, porque é assunto
da cinética, é o grande assunto da física”.
❖ Temos que tentar responder a sério esta pergunta, pois só podemos tratar de um fenômeno qualquer
que tenhamos no mínimo o conhecimento dos limites e das dimensões dele.
❖ Por exemplo: só posso aprender a usar esta mesa, este lápis se conhecer os limites deles. Quando falo
do tamanho, gostaria que vocês tivessem uma ampliação da percepção, não é só o tamanho físico,
é o tamanho das possibilidades. Este lápis tem 17 cm, mas este não é o ‘tamanho’ do lápis por assim
dizer, este é o tamanho físico. Mas quando falo do tamanho, estou falando de todas as possibilidades
deste lápis.
❖ Se eu não intuo, não conheço isso acerca das coisas, como posso utilizá-las bem. E aqui já é a nossa
primeira tomada de consciência deste fenômeno chamado VIDA. A chance de estarmos dentro disso,
que é a realidade mais decisiva e mais definitiva, e não saber como usá-la, não saber o que fazer, não
saber o que como padecer, não saber como projetar, é muito grande.
❖ Então mais uma vez eu falo, nas semanas 1 a 8, foram ensinadas várias ferramentas fundamentais,
para abordar o paciente segundos seus aspectos da crença, segundo os aspectos da postura, do ato,

404
da vestimenta, segundo os aspectos da biologia. Eu mesmo forneci uma ferramenta muito poderosa
que, afinal das contas é a ferramenta decisiva para você, um diagnóstico em Psicologia e Psiquiatria,
acerca da condição psíquica do seu paciente que é a Súmula Psicopatológica.
❖ Vejam bem, um sujeito pode estar muito bem, saudável, hormônios, nutrição, sono. É uma pessoa que
está com seu orgânico em 100% ou próximo disto, no auge da sua vitalidade física, perto dos 30/40
anos, maduro, ainda não está degenerando, mas este sujeito pode não conseguir dar esta resposta.
Está desorientado, mesmo, “O que é a Vida?” , “Por que você está aqui?” . Ele pode responder: “Como
assim, você deve estar brincando, estou aqui mas estou bem”. Esta resposta não é o suficiente.
❖ Por definição, temos que saber que, em algum momento, iremos morrer. No fundo é isto. Seja uma
morte lenta, uma morte boa. Muitas pessoas gostariam de morrer de repente, e isto já revela um
sintoma, já anuncia algo que corre por dentro (não é tema para agora). Por definição, vamos falar de
morrer que é ir perdendo a saúde, seja pouco a pouco, ou por uma doença.
Apostar na biologia, em uma vida saudável como o que dá o verdadeiro sentido é uma aposta furada,
porque todos morrem; e morrer é, por definição, perder a saúde.

Mais cedo ou mais tarde, a doença, o envelhecimento e a morte chegam. A alimentação saudável e o
exercício físico ajudam em muitos aspectos, mas nunca são a fonte de resposta para perguntas
fundamentais.

❖ Em algum momento, mais cedo ou mais tarde, o sujeito vai se confrontar com um muro intransponível,
chamado, doença, ou somente envelhecimento e morte. Ninguém consegue conservar a saúde física
e biológica para sempre.
❖ Estou explicando e amarrando tudo que foi ensinado para apresentar o Método, na semana de 9 a
12. Não há nenhum interesse em rotular este Método, é uma base.
❖ Independente da sua linha terapêutica de base, seja psicanálise, junguiana, logoterapia, cognitiva
comportamental, coach; vou te proporcionar uma base de trabalho, para você saber onde está
enquadrado e saber desenvolver a vida do seu paciente. .
❖ Se o meu olhar para a pessoa que pergunto, “O que é a Vida?”, cai no primeiro nível que é o biológico,
você terá pouquíssimas ferramentas para lidar com os dramas reais da existência deste paciente. Este
sujeito, que está no auge de sua forma física, biológica e de vitalidade, ele pode perceber que tem
dúvidas existenciais, que não está confortável com sua existência, com seu corpo, com dúvidas acerca
de seus’ relacionamentos, da sua fé, da transcendência, do seu passado, do seu futuro, não são
respondidas e nunca serão respondidas por um prato da vida saudável que come, pela quantidade de
exercícios, pela quantidade de horas que faz corridas, maratona. Estas coisas são boas, ajudam em
certos aspectos, mas nunca são a fonte de respostas.
Há pessoas com espírito filosófico e profundo, e há também aquelas que não têm anseios últimos. Mas
mesmo para essas pessoas aparecem questões que não se limitam às perguntas triviais.

405
❖ Por que trabalho tanto e não tenho dinheiro para ir viajar com a família? Por que trabalho tanto e não
sou promovido? São perguntas triviais. Não são questões últimas, mas já está um pouco mais além,
sobre m’eus’ aspectos físicos, por exemplo.
❖ Se um paciente perguntar para você “O que é a Vida?”, você não precisa responder, porém tem que
ter esta resposta dentro de você.’
❖ Se você escapa, como alguém que não acredita mais na vida, que esta pergunta não precisa ser mais
respondida, esta postura é de alguém que é cético.
❖ Se responde, a vida é gozar, é comer, é beber, é aproveitar, é o perfil de um materialista.

O terapeuta precisa ter uma resposta para a pergunta “O que é a vida?”. Essa resposta deve ser
totalizante, não excludente, e capaz de receber um grande número de pessoas.

❖ Há o modo de encarar do Niilista: “Do nada eu vim e para o nada voltarei”.


❖ Há o Universalista, aquele que aposta nas coisas do alto: “A vida é transcendência”.
Esses são dois exemplos extremos; sob certo aspecto, cristalizar-se em um desses pólos é ideologia. O
terapeuta precisa ter um tamanho de visão superior ao de seu paciente; do contrário, não há como
ajudá-lo.

❖ Não podemos ter preconceito, não podemos mostrar surpresas frente a história que escutamos.
A vida, para o ser humano, é narrativa, uma história que está sendo contada. Essa é uma resposta na
qual todos os questionamentos e visões de mundo cabem.

Quando o paciente chega, tem uma vida. Mas ele não sabe contar a própria história, por isso não tem
a vida entre as mãos.

❖ Para nós o que interessa? Conhecer quais são os elementos que o sujeito usa para contar sua história.
Tudo que aprendemos iremos enquadrar como ferramenta na história que o paciente nos narra.
NARRATIVA COMO FERRAMENTA
A primeira ferramenta é perceber cada pessoa como uma história que está sendo contada. O paciente
conta seus dramas através de uma queixa principal.

É importante ouvir e anotar as queixas principais, perceber o modo como o problema é apresentado,
como e a partir de onde se conta a história.

❖ Observem que toda história tem uma estrutura. Exemplo: história do Chapeuzinho Vermelho.
▪ Personagem Principal: Chapeuzinho Vermelho
▪ Cenário: Bosque e Casa da Vovó
▪ Antagonista: Lobo Mau
▪ Ajudante: Caçador (amigos)

406
▪ Motivo: Levar doces para casa da Vovó.
▪ Indumentária: O lobo mau se veste de vovó para enganar a chapeuzinho vermelho.
❖ Não é necessário ter todos os elementos. Por exemplo, nesta história não sabemos a data, quando
aconteceu.
❖ O Paciente não sabe contar a própria história, pois não tem a vida em suas mãos.
❖ Por exemplo, se eu quebro a ponta deste lápis, sei que posso apontá-lo e o regenero. Se o seu
paciente, quebra sua ponta, ele sabe regenerar? Ou melhor, você sabe como ajudá-lo a regenerar?
Você conhece a vida do seu paciente? Você conhece a história dele? A vida é narrativa.
❖ Se na nossa atuação, na nossa técnica não percebemos isso, não conseguimos ajudar. Por que não
conseguimos ajudar? Porque não conhecemos o tamanho da vida do sujeito.

CENÁRIOS E LOCAIS

Em seguida, é necessário mapear os cenários principais em que o paciente se move.


Primeiramente, os cenários físicos, como o local de trabalho, a casa. O cenário físico pode levar à
desorganização material, gerando ansiedade e estresse, por exemplo.
❖ Com uma queixa principal: você pode ouvir a queixa, anota e vai prestar atenção como ele apresenta
o problema dele. A partir de onde ele começa a contar a história, ali dentro do consultório.
❖ Cenários: nas próximas sessões, devemos observar e anotar os principais cenários físicos por onde
o paciente se move. Por exemplo:
▪ Local de onde trabalha: se é na rua, escritório, carro, fábrica etc.;
▪ Casa: local, tipo de imóvel, quantos quartos. (Exemplo da paciente do Ítalo que teve uma
crise de ansiedade, por trabalhar Home Office, e os brinquedos dos filhos ficavam espalhados
por não ter armário para guardá-los).
Se isso não for percebido, pode-se apontar a gênese do problema a um lugar equivocado.
Nem todos os problemas que aparecem no consultório têm dimensões absolutamente profundas. O
terapeuta precisa estar atento a tudo. Mas ele é um leitor crítico, não está escrevendo a história.
A missão, o motivo, o desejo, o propósito não são do terapeuta. Ele é como um revisor, um editor:
alguém lhe manda uma história e ele percebe o que não encaixa.

❖ O terapeuta tem que estar atento a tudo. No caso do exemplo acima, Ítalo sugeriu colocar armários
na casa, e a ansiedade diminui. Caso não tivesse este olhar, poderia pensar que a gênese da
ansiedade fosse outro ponto.
❖ É como se fossemos revisores e percebêssemos que algumas coisas não estão se encaixando e temos
que sugerir pequenas mudanças.

407
É importante mapear, investigar, também os locais em que o paciente se movimenta. Pode haver um
lugar a que a pessoa vai pouco, mas que é determinante para sua história. Nesse sentido, o terapeuta
precisa ser aberto, receber as histórias com interesse e ouvi-las.

❖ Aí que está a beleza de nossa arte. Tem lugares que o paciente vai pouco, mas que no fundo é
determinante em sua história, mas a pessoa não quer contar, mas temos que descobrir. Está é nossa
arte. O terapeuta deve saber investigar os lugares que o paciente frequenta. Onde a pessoa almoça,
seus finais de semana, enfim a rotina da pessoa.
Não estamos ali julgando, mas lendo uma história e tratando de fazer que ela tenha sentido. A pessoa
procura o terapeuta porque tem um problema a resolver, tem uma pretensão acerca da vida. Essa
pretensão pode ser limitada e pontual, ou a de querer ser um sábio, um herói.

O primeiro passo é entender os lugares que a pessoa frequenta e ter a sensibilidade de perceber pontos
cegos na história.

❖ O terapeuta tem que ser uma pessoa aberta, os pacientes não têm que ter vergonha de contar nada.
Muito cuidado com sua postura, a pessoa tem que se sentir à Vontade desde para contar que
frequenta uma ‘strip club’ até um culto. O terapeuta tem que ter um interesse, tem que receber estas
histórias e ouvi-las.
❖ O terapeuta não pode julgar a história de acordo com seus valores, por exemplo, se ele acha que é
perda de tempo ir ao culto, ao strip club etc.

PAPÉIS DESEMPENHADOS
O paciente é protagonista, coadjuvante e antagonista.

❖ No trabalho, por exemplo, o paciente pode ser o personagem principal e em outros aspectos o
personagem secundário. Tudo na vida é assim, e o terapeuta tem que mapear rapidamente todos
estes papéis desempenhados pelo paciente.
O terapeuta precisa perceber as cenas em que a pessoa exerce esses papéis e, ao mesmo tempo, dar
ao paciente a habilidade de entender que todos eles estão juntos, de certo modo.

Muitos desajustes existenciais do sujeito estão em achar que está sempre posicionado em um lugar. Na
natureza do “eu”, protagonismo, coadjuvância e antagonismo coexistem. As histórias infantis são
simples. Em histórias mais elaboradas, aparecem mais traços nos personagens.

❖ Por exemplo: o herói as vezes é um pouco hesitante; o herói as vezes tem egoísmo, o herói apresenta
titubeios. Isto é ser humano, não uma falha de caráter, não somos cristalino o tempo todo.
❖ O terapeuta tem que ajudar o paciente se ver nos diferentes papéis.

408
As histórias da mitologia grega, por exemplo, são fantásticas porque mostram a complexidade do ser
humano.

❖ Exemplo: na mitologia grega, Zeus que apresenta desejos carnais; Cristo como figura arquetípica,
perfeito, mas chora, pouco antes do seu sacrifício;
❖ São histórias complexas, o herói em si, encerra essa ambivalência.
Um terapeuta exposto a narrativas toscas, sem cultura literária, mitológica e sagrada, tem poucos
recursos para entender a vida. É necessário familiarizar-se com as narrativas – tanto as concretas, quanto
as literárias – para que se possa reconhecer suas estruturas.

❖ O bom terapeuta tem que estar atento as narrativas, não só dos seus pacientes, mas de suas tias,
sogra, familiares. Tem que observar estas histórias.
❖ Tem que ler romances, para pegar as estruturas narrativas. Os romances têm estruturas muito clara,
com início, meio e fim. Os dramas são muito cristalinos.
LITERATURA E MITOLOGIA

A literatura universal é uma ferramenta de trabalho. O terapeuta precisa tirar 20 minutos de seu dia
para dedicar-se a ela, familiarizando-se com a estrutura da narrativa.

❖ Sugestão de leitura: ler pelo menos os clássicos dos franceses, ingleses, espanhóis, russos
(Cervantes, Balzac...). Ler pelo menos 20 minutos ao dia. Com isto o terapeuta começa a se
familiarizar com a estrutura da narrativa. A vida é narrativa.
❖ O segundo nível é o romance.
Perceber como os autores descrevem os cenários, por exemplo, é uma ferramenta de semiologia. Ao ver
um grande autor descrever algo que é desinteressante a nós, percebemos como alguém pode nutrir
interesse por aquilo.

O próximo nível é a mitologia. Ela fala daquilo a que se chama arquétipo. As narrativas mitológicas não
têm a clareza do espaço e da descrição, não são concretas, mas falam dos traços possíveis.

❖ A mitologia apresenta possibilidades dos romances.


As histórias concretas são fragmentadas, não têm clareza. Afinal, ainda estão acontecendo, não se sabe
se o propósito será cumprido. No nível mitológico, também não há muita clareza, mas existem os traços
possíveis, do protagonismo, do antagonismo e da coadjuvância.

❖ Para nós são tipos de possibilidades psíquicas, os arquétipos da mitologia grega, por exemplo. O
terapeuta deve pelo menos ter em mente, 20 tipos de arquétipos.

409
Quando se fala de mitologia, trata-se tanto da grega quanto da Sagrada Escritura. Para os terapeutas,
ela tem função mitológica. Existe um nível simbólico do texto sagrado, em que se encontram muitos
referenciais arquetípicos.

O terapeuta precisa familiarizar-se com o texto sagrado, assim como com a mitologia grega, os
romances universais e as vidas concretas que acontecem ao seu redor.

Um autor ruim é aquele que conta uma história inverossímil, em que falta um pedaço. Um romance com
objetivo de provar um ponto partidário, por exemplo, torna a história desinteressante, boba, infantil.

Ao ganhar familiaridade com texto, o terapeuta consegue identificar se um romance é bom ou não. Não
se trata de julgamento, mas de perceber os pontos cegos na história.

Muitas pessoas estão ansiosas, tristes, deprimidas, porque contam suas histórias pessimamente.
Precisamos ouvir a história do paciente, encontrar os lugares, as personagens, os antagonismos,
protagonismos e coadjuvância.

Depois, refletir sobre o que está faltando. Aqui, ainda não estamos falando sobre uma coisa
fundamental, o argumento: “para que eu estou vivendo?”. No final das contas, grande parte das
perguntas trata disso.

❖ Ítalo citou o filme “Coração Valente” como um arquétipo de herói que morre no final (e nos frustra),
mas este filme acabou sendo um clássico. E também citou o filme “James Bond” , mas este apenas é
filme de entretenimento.
O terapeuta precisa também conhecer os meios de ação. Grande parte das frustrações acontece porque
existe um desajuste entre a possibilidade de agir e o que o sujeito pretende, deseja. A partir de agora,
entramos efetivamente na técnica.

❖ O terapeuta tem que identificar nas narrativas, por exemplo: ‘aqui está faltando, cor, aqui está
faltando ação....’
❖ Citou o caso de paciente, que ele recontou a história da vida dela, e ao final ela chorou emocionada,
pela maneira que o Ítalo narrou a história dela. O terapeuta tem que ter esta capacidade de recontar
uma história.
❖ Exemplo:
➢ Narrativa 01: “Havia uma velha, fraca, pobre, feia, que passava a vida com os pés sujos e
limpava bunda de gente pobre e mais feia que ela e morreu”.
➢ Narrativa 02: “Havia uma senhora que entregou sua vida por amor cuidando de pessoas
miseráveis e que os chefes de estado iam visitá-la querendo ser como ela”.

410
❖ As duas histórias acima são de Madre Teresa de Calcutá. Qual destas duas histórias é verdadeira?
Aquela que ela quiser contar. Percebam que as duas são verdadeiras é uma questão de ângulo. Toda
história é boa, desde que seja bem contada.
❖ Temos que pegar o pacienta pela mão, escutá-lo, identificar os protagonismos, antagonismos e
coadjuvância. As primeiras sessões, você tem que ter um interesse, não tem uma função propositiva
ainda, tem que ter o interesse pela história do paciente.
❖ O terapeuta tem que estar atento ao palco, ao camarim, ao ‘backstage’, e ver o que está faltando,
esta habilidade de reconhecimento de espaço, dos personagens. Isto tem que estar sempre muito
claro.
❖ Para quê este paciente está aqui? A forma mais útil que o Ítalo testou e a forma que levamos em
consideração as armas e ferramentas que temos para agir. Fundamental para o terapeuta saber são
os Meios de Ação. A grande parte das frustrações e vazios da vida é porque existe um desajuste entre
o “Meios de Ação de alguém e o que ele espera, pretende”.

411
SEMANA 10 – OS MEIOS DE AÇÃO

Esta aula aborda os Meios de Ação Humanos, que abrangem o corpo e os elementos imateriais. Trata
ainda das paixões, Vontade e intelecto, e de nosso sistema de orientação no mundo

MEIOS DE AÇÃO: MATÉRIA E ELEMENTOS IMATERIAIS

Os Meios de Ação são mais um componente da narrativa, determinantes para que o sujeito cumpra a
missão que acredita ter. Eles são ferramentas utilizadas para que se possa realizar algo.

❖ Ítalo citou o exemplo de comer miojo, os Meios de Ação neste caso podem ser: o garfo, o haschi,
as mãos, ou ainda virar o prato na boca.
❖ Para realizar alguma coisa neste mundo, necessito de um ‘meio, através de’, eu realizo minhas
ações.

A ação neste mundo é sempre mediada, existe um meio para que possamos realizá-la.

❖ Ítalo solicitou fazer um inventário de quais Meios de Ação no mundo que utilizo; como eu ajo no
mundo, o que utilizo para agir no mundo.
❖ Alguns exemplos que citou: a voz, os braços , os olhos etc.

Para que tenha uma história e não se torne vazio, é necessário agir, pois sem ação não há movimento.
Não se mexer é sinônimo de falta de vida; e se não temos Meios de Ação Humanos, não nos movemos
como humanos.

❖ Thomas Mann e Dante Alighieri fazem em suas obras observações sobre o inferno. Thomas Mann
diz que este é um frio cortante e Dante Alighieri também diz, que à medida que o protagonista de
sua obra descia, mais o frio era sentido. E o último círculo do inferno, é o mais frio de todos,
simbolicamente falando, era a morte.
❖ O frio é compatível com a falta de movimento, com a paralisia.
❖ O frio, aquilo que congela, faz com que a coisa não se mexa, não se expanda.
❖ Não se mexer é sinônimo de falta de vida. E uma das causas de não se mexer, é não ter meios, não
me movo.

Existem movimentos físicos, corporais, como a fome. Outros movimentos são mentais, têm relação com
a expectativa, como a Vontade de comer.

❖ Podemos perceber estes dois movimentos, a fome e a Vontade de comer. Vou fazer uma pergunta:
Onde a fome aparece? A fome aparece em seu ventre, na sua barriga. Quando sentimos fome, fome
mesmo, não escolhemos muito o que comer. A fome se dá no corpo. Quando a comida entra no
corpo, a fome é subtraída.
412
❖ E a Vontade de comer, onde aparece? E quando como um biscoito, a Vontade de comer desaparece?
Nem sempre
❖ A Vontade de comer, não é fome, esta é a distinção, pois as vezes comemos um biscoito e a Vontade
de comer não passa.
❖ Posso estar com fome e com Vontade de comer.
❖ Posso estar com fome e sem Vontade de comer.
❖ Posso estar sem fome e com Vontade de comer.
❖ A Vontade de comer aparece em outro lugar, não é bem na barriga. E o mais interessante da
Vontade de comer é que posso me alimentar e a Vontade não passe. Posso comer uma pizza, mas
se eu tiver com Vontade de comer uma comida japonesa?
❖ Nos casos extremos das doenças psíquicas, como as Bulimias, a pessoa não tem fome, mas tem
Vontade de comer.
❖ A Vontade de comer, aparece em outro lugar, que não é no corpo, ela aparece em um lugar onde os
corpos não são capazes de suprir este estado.
❖ A Vontade de comer só passa mesmo, quando encontra um alimento que esteja ajustado com as
expectativas.
❖ A fome é um movimento físico, corporal. E a Vontade de comer, podemos dizer, que é mental, tem
a ver com expectativas.

Existem ainda Vontades que não tem a ver com algo material, mas com a contemplação de uma
proporção, como a Vontade de beleza e de bondade. A beleza é a proporção das coisas estáticas; a
bondade é a proporção das narrativas.

❖ O que é proporção: Exemplo do Teorema de Pitágoras (catetos e hipotenusa). Proporção é algo


imaterial.
❖ A Estética, ramo da filosofia: ela investiga os entes proporcionais. Por que você repara em algumas
coisas como feia e como belas? Pode ser pelo gosto, mas é porque o gosto se adequa a proporção.
Reconhecer coisas belas é estar diante de Proporções bem definidas.
❖ Quando vamos a um museu, olhamos uma paisagem, uma praia, coisas que fazem fruir dentro da
gente uma certa alegria, um certo relaxamento; o que está acontecendo entre a nossa percepção e
o mundo? Nossa percepção está capturando uma proporção mediada pelo mundo.
❖ O desejo de um homem e de uma mulher ao contemplar coisas belas, elas desejam estar diante de
uma proporção que é mediada pelo mundo. O homem se alegra, se acalma com as coisas belas.
❖ Existe dentro da gente uma Vontade de beleza, Vontade de bondade. A bondade, a maldade, a
beleza, a feiura são proporções. A bondade e a maldade são proporções de um ato narrativo.
Necessário ter inteligência para compreender isto.
❖ Exemplo: Quando você está diante de uma cena, onde o sujeito recebe o troco do caixa e ele recebe
a mais do que deu e ele não devolve o troco, isto é uma cena injusta.
413
❖ A justiça e a injustiça são percebidas por mim pela mediação de uma história que está sendo
contada. E as histórias têm proporções específicas. São proporções narrativas, não são proporções
físicas, como um cubo. São densidades narrativas que agrupadas de um certo modo, dão o
referencial da justiça ou da injustiça. Aí reconhecemos o que é justo e o que é injusto.
❖ Bondade e maldade, é proporção, beleza é proporção. E proporção é o quê? Proporção é sempre
imaterial, é uma das coisas que está fora do tempo. Não está aqui, no mundo material, no concreto.
Existe, mas não está na matéria.
❖ Somente com este exercício, chegamos a conclusão que existem coisas que existem e não são
materiais, como o Teorema de Pitágoras, que antecede a matéria. Ele existe antes que pudesse haver
quadrados e retângulos.
❖ A declaração de um ato imaterial, não é uma declaração de fé, de crença, ato religioso, não tem nada
a ver com a religião, nada.
❖ A existência de uma realidade imaterial, ou seja, que não depende da matéria, mas que existe tão real
quanto a matéria, é um ato da inteligência, da percepção, não é necessário nenhum tipo de fé, para
isso.
❖ Exercício: Ítalo pegou um apontador de lápis e deixou cair. Questionou: ‘Onde está a queda do
apontador?’ Perguntou de modo diferente: ‘Esse apontador caiu, você viu, onde está o ato da queda
do apontador?’ Alguém pode responder: ‘Está na minha memória’. ‘E se você tivesse Alzheimer, ou
você desaparecesse, o apontador deixaria de ter caído?’
❖ Este exercício vocês devem fazer com alguma frequência. Isto é o tamanho de tua visão dentro do
mundo. Porque se você não entender isto, você não pode atender gente. Pois gente é o seguinte: tem
uma pessoa real na tua frente que tem uma carga, mas tem coisas tão reais dentro de si, como todo
seu passado, que influi sobre ela e todo um futuro não vivido. São coisas que não tem consciência
material atual, mas tem presença, tem existência, tem realidade, tem ser, tem ação. O terapeuta que
negar isso tem um problema vocacional, terá que fazer algo prático.

Cada pessoa concreta tem em si outras coisas tão reais quanto a materialidade: o passado e aquilo que
ainda não viveu. Essas coisas não têm consistência material atual, mas têm presença, existência. Um
ato que já aconteceu, como a queda de um apontador, não está apenas na memória, que é um suporte
abstrato, um registro.

❖ Onde está a queda do apontador? Confundir memória com o ato da queda do apontador é normal.
Confundir o ‘registro na memória da queda do apontador’ com a ‘queda do apontador’, é o mesmo
que confundir o ‘cardápio com a comida’. A queda do apontador não está na memória.
❖ A memória é um suporte abstrato, é um registro de algo, que é extrínseco a tua memória. Isto é
muito importante, porque muitas vezes o paciente se move pelas memórias e não pelo que
aconteceu.

414
Um caminho para a maturidade é o ajuste entre memória e realidade; alguém maduro se orienta mais
pela realidade do que pelos registros da memória, que sofrem muitas alterações ao longo do tempo.

❖ Onde está a queda do apontador? Está no passado.

O passado é um modo de referir-se à existência da realidade material que não é mais material.

❖ Napoleão marchou sobre a Espanha. Isto está na história, está no passado. Quando você fala que a
queda do apontador está no passado, eu aceito, desde que você não pense : ‘Ah, isto não aconteceu.’
A queda do apontador, ‘É’, aconteceu.

Quando tocamos nesse tipo de realidade, percebemos que existem proporções, tanto físicas quanto
narrativas, que não somem, que são, mesmo sem a matéria. E quando percebemos isso, chegamos à
conclusão de que todo o conjunto de coisas que tem existência, mas não matéria, está no mesmo lugar;
um lugar que é extrínseco a nós, mas no qual nós também estamos.

No ser humano, há o corpo e os elementos imateriais, os quais podem desejar tanto coisas corporais,
quanto coisas imateriais. Isso significa que os Meios de Ação do homem no mundo são seu corpo e seus
elementos imateriais.

Para o ser humano, o mundo é tanto coisas materiais, quanto proporções e registros que não são
providos de matéria. Nós agimos com a matéria (corpo) e com a consciência imaterial.

❖ O homem age no mundo através do seu corpo e através dos seus elementos imateriais. E o mundo
para o homem, é tanto as coisas materiais quanto o mundo das proporções e dos registros que
existem e não tem mais matéria, como por exemplo o ‘Apontador que caiu’.
❖ Agimos com matéria, corpo e também com uma parte imaterial, que está ao mesmo tempo
aprendendo, desejando, agindo etc. na matéria e fora dela.
❖ Contamos nossa história a partir da potência do personagem. Se faço uma aposta que meu
personagem é só corpo, eu excluo da minha história todos os elementos imateriais.

Apostar que o personagem é apenas corpo é excluir de sua história aquilo de imaterial que se move,
aspira, contrapõe-se, frustra etc. O problema dessa exclusão, além de fazer faltar uma parte, é o fato
que o corpo se corrompe, muda, perde o referencial.

❖ Qual é o problema de contar uma história só material? O problema é que o corpo se corrompe ele
não dura. O corpo ele muda, se decompõe, então você não tem um referencial concreto, claro, um
eixo que a tua história está girando. Tudo que muda, perde o referencial.

Ao contar uma história cujo referencial muda a todo momento, percebe-se que não há unidade nela e,
portanto, não há sentido.

415
Um dos motivos mais frequentes das neuroses de nosso tempo são as histórias sem unidade e sentido,
pois não se percebe a complexidade e a potência da dimensão imaterial do homem.

Viver uma história sem unidade e sentido é impossível, é desesperador, é chato, é angustiante.

Daí a necessidade de um terapeuta que olhe para o homem percebendo o tamanho que ele tem.

❖ O homem e a mulher têm um tamanho específico, e estamos em um mundo que também tem um
tamanho específico. Confundir homem com ‘tatu bola’ ou seja, eu rolo e como, eu rolo e como é o
que o ‘tatu bola’ faz.
❖ Agora vamos dar uns nomes para tudo isto aqui. Para dar os nomes, temos que conhecer as
dimensões, corporais e imateriais. E aqui já tem uma parte do método.

PAIXÕES, VONTADE E INTELECTO

Aristóteles aponta que o homem tem Paixões, Vontade e Intelecto.

❖ O ‘bom e velho Aristóteles’ (isto está espalhado pela obra dele e é muito bonito) ele não
sistematizou, não estava preocupado com isso, ele está olhando o ser humano e o que ele está
investigando ali é a justiça.
❖ Ele vê a realidade do mundo, está filosofando, ele percebe tudo isto que estamos estudando, como
a dimensão imaterial do homem. E ele faz uma classificação que não é determinante, no sentido que
ele não está fechando e no sentido que depois você pode expandir isto em maior número.
❖ Ele disse que no homem existem Paixões e as paixões são os movimentos do corpo (não é o
movimento dos amantes, rsrsrs).

As Paixões se referem aos movimentos corporais, a parte mais baixa que se move.

A Vontade é uma faculdade intermediária que se inclina com o objetivo de entender o que há de Bom
e Ruim no mundo, analisando as proporções narrativas, e é imaterial;

❖ Vontade, não é bem o nome que Aristóteles dava, nós é que nominamos. Esses três nomes mudam
pela Antropologia e Filosofia. Sempre irei associar estes nomes.

O Intelecto também é imaterial e se dedica a perceber o Verdadeiro e o Falso.

As Paixões estão sempre agindo, o homem sempre se inclina ao prazer e ao desprazer. O Desejo
(Vontade) de Bem e Mal não aparece sempre; e o Intelecto é uma capacidade que se manifesta ainda
mais tardiamente.

❖ As crianças não entendem o Bem x Mal, elas não têm isso.

416
Há pessoas que têm paixões desordenadas. Embora passe a distinguir o Verdadeiro do Falso, a pessoa
ainda não tem a faculdade intermediária bem formada, erra ao desejar o Bem e o Mal, e ainda está com
as paixões inferiores desorganizadas.

Coluna Coluna Coluna Coluna


MEIOS DE AÇÃODO HOMEM
01 02 03 04
Paixões
(Corpo: inclina ao prazer x desprazer)
Vontade
(Imaterial: distinguir bem x mal)
Intelecto
(Imaterial: distinguir verdadeiro x falso)

❖ Coluna 01: pessoas com paixões desordenadas, a Vontade desordenada e não está querendo saber
distinguir o verdadeiro do falso.
❖ Coluna 02: Em terapia, em algumas pessoas, podemos apontar a Verdade e a Falsidade. Pode-se
começar a mostrar para ela certas realidades acerca do que é Falso e do que é Verdadeiro. Podemos
começar a despertar, a ensinar a querer distinguir do que é Verdadeiro do que é Falso. Mas ela ainda
não encontra em si, essa faculdade intermediária não está bem formada. Ela sabe distinguir do que
é Verdadeira e Falso, mas ainda erra quando vai desejar o Bem e o Mal. E é claro que ela ainda está
com as paixões interiores desorganizadas.
❖ Coluna 03: Se continuarmos investindo nisto, mantendo uma formação intelectual de uma
pessoa, em algum momento consegue ordenar a faculdade intermediária, mas ela ainda tem
uma certa fraqueza na parte inferior, ou seja, as Paixões dela ainda estão desorganizadas. Isto
é uma proposta do homem maduro.
❖ Coluna 04: Se continuamos formando intelectualmente esta pessoa, se ela consegue distinguir
o Certo do Errado, ela começa ter uma prática na adesão do Bem e do Mal, ela começa a ter
uma ordem também no seu corpo. Isto é um homem maduro.
❖ Com isto a gente percebe que temos 4 formas humanas possíveis básicas, ou seja:
➢ o sujeito que não tem nenhuma forma de atuação ordenado;
➢ o sujeito que descobre que é possível ordenar o seu olhar,
➢ depois seu olhar e seu agir e
➢ finalmente a totalidade de seu agir. A sua forma final.

Se investimos em seu desenvolvimento intelectual, em algum momento ela consegue ordenar a


faculdade intermediária, ainda que haja fraqueza nas paixões.

417
Por fim, se continuamos formando-a intelectualmente, ela aprende os motivos para entender o que é
certo e errado, começa a ter prática na adesão do bem e do mal e a ter uma ordem no corpo. Esta seria
uma pessoa madura.

Ou seja, existem quatro formas humanas: o sujeito sem nenhum Meios de Ação ordenado; o que
descobre ser possível ordenar o olhar; aquele que ordena o olhar e o agir; e o que domina a totalidade,
do agir à forma final. Este seria o homem maduro.

O crítico Northrop Frye percebeu esses traços em personagens da literatura, acrescentando aos quatro
tipos o personagem que tem tudo isso, mais a ajuda divina.

❖ Northrop Frye, um crítico canadense, percebeu este esquema no Aristóteles e ele fez um trabalho
bastante portentoso97, ele percebeu estes traços em todos os personagens. Todos os personagens
da literatura se enquadravam em alguma das colunas da tabela.
❖ Ou os personagens estavam abaixo de todas as situações; as vezes não entendiam o que estava
acontecendo; às vezes entendiam, mas não conseguiam agir, porque não tinham a força; ou
entendiam, conseguiam agir mas a força ainda estava ‘intermitente’, ou quando conseguiam o
domínio total dos Meios de Ação humana. Eles entendem, eles agem, eles têm o resultado final,
ordenado com tudo.
❖ Ele ainda colocava um personagem que tinha isto tudo mais a ajuda divina.
❖ O ‘quadro, jogo dos Meios de Ação do Homem’ é o itinerário terapêutico, isto tem que estar claro.
Isto é uma visão geral.
❖ Tem pessoas que chegam na terapia que nem sabem o que pensar de suas histórias. Elas estão na
1ª. coluna. Ela não sabe qual é o seu Argumento Vital .

Coluna Coluna Coluna Coluna


MEIOS DE AÇÃO DO HOMEM
01 02 03 04
Paixões
(Corpo: inclina ao Prazer x Desprazer) 0
Não faz Não0 faz Não faz Faz
Vontade
(Imaterial: distinguir Bem x Mal) 0 00
Não deseja
0 Não deseja
0 Deseja Deseja
Intelecto 0 0
(Imaterial: distinguir Verdadeiro x Falso)
Não sabe Sabe Sabe Sabe

❖ Isto é um itinerário narrativo, de argumento biográfico.

97
Portentoso: que encerra milagre ou prodígio; maravilhoso, prodigioso, miraculoso.
418
Uma pessoa madura é aquela que entende o próprio argumento, deseja-o e consegue executá-lo. É
uma pessoa estável, em quem se pode confiar.

❖ A pessoa madura é aquela que diz que vai fazer e faz.


❖ Tem muitas pessoas que dizem que desejam, mas não fazem porque ainda não conseguem.
❖ A 2ª. coluna é a mais comum: é uma pessoa que diz que vai fazer uma coisa ou outra; e claro, ela
vai fazer uma coisa ou outra.
❖ O terceiro tipo, que já sabe seu argumento, deseja, mas não sabe direito como fazer. Estas pessoas
são confiáveis, tem que desculpar.
❖ Pessoas na 4ª. coluna ela sabe qual é seu papel social, são confiáveis e estáveis.

Coluna Coluna Coluna Coluna


01 02 03 04
MEIOS DE AÇÃO DO HOMEM Família / Estável/
Imaturas / Inseguros
Egoísta Papel
Inseguras Violentos
Útil social
Paixões
(Corpo: inclina ao prazer x desprazer) 0 Braços
Não faz Não0 faz Não faz Faz
Vontade 0
(Imaterial: distinguir bem x mal) 0 0 Coração
0
Não deseja Não deseja
0 Deseja Deseja
Intelecto 0 0
(Imaterial: distinguir verdadeiro x Cabeça
falso) Não sabe Sabe Sabe Sabe

Existe a pessoa que sabe qual é seu Argumento Vital , deseja-o, mas não entende direito como fazer;
essa pessoa já é confiável, e está a um passo de tornar-se estável.

❖ Pessoas na 3ª. coluna tem uma certa estabilidade. Ele sabe do seu argumento e as vezes ele se
encaminha para um lado de realizar plenamente aquele Argumento Vital e em outras dimensões da
vida dele, ele ignora totalmente o Argumento Vital porque aquilo parece distante dele. Parece que
em certas dimensões da vida, não se aplica. Ela é uma pessoa estável , mas não cumpre seu papel
socia ainda. Ela se move em regra, baseada no seu desejo, até tem uma certa estabilidade, mas faz
mais por ele. É um tipo de egoísta útil. Ele não vai trair com constância, não vai arrumar problema.
Ele defende os ’eus’, funciona para seu grupo.

Há também a pessoa que sabe seu argumento, deseja-o e ocasionalmente se encaminha para sua
realização. Mas em outros momentos ignora o argumento, porque ele lhe parece distante. Essa pessoa
é estável sob certo aspecto, mas faz mais por si mesma, é um egoísta útil. Por saber que precisa de um

419
Argumento Vital , mas ter insegurança a respeito do que deseja e consciência de que não sabe fazer
coisa alguma, torna-se insegura; e os inseguros são violentos, reativos.

❖ Pessoas da 2ª. coluna, sabem do seu Argumento Vital , porém tem uma insegurança, não sabe se
deseja e não sabe fazer nada. Não sabe desejar direito ainda. Ele acabou de descobrir seu Argumento
Vital e é inseguro demais. São violentos, pois tem uma ideia na cabeça, um coração inconstante e
braços fracos. A pessoa tem medo de perder aquilo que acabou de descobrir (seu Argumento Vital ),
são reativos. Tem uma inconstância grande no coração.

As pessoas mais imaturas são as que sequer sabem o próprio Argumento Vital e precisam sempre de
validação externa. Elas não têm força interior e não se percebem como uma unidade; são facilmente
manipuláveis, inconstantes.

❖ As pessoas da 1ª. coluna são imaturas, não sabem sequer seu Argumento Vital , elas necessitam
sempre da validação externa, não tem força interior, não tem uma unidade interior. O desejo acerca
da vida delas é a busca pela validação do que ela acha que os outros esperam dela. São inseguros
totais. São muito inconstantes e buscam a validação o tempo todo. Validação externa. São
facilmente manipuláveis, altamente inconstantes. A tristeza quando aparece é porque o outro não
olhou para ela, pois se o outro não olha para ele, ele não sabe para onde olhar.
❖ Então aqui tem quatros tipos humanos que aparecem no consultório. Normalmente tem dúvidas
de saber quem elas são, tem dúvidas do seu Argumento Vital .
❖ Quando vai se progredindo neste ‘tabuleiro / jogo’, quando entendemos este esquema de tipologia
humanas, isto faz um grande sentido. E para poder intervir nestas coisas , no sentido de analisar,
ajudar, deixar mais claro o modo de agir no mundo, precisamos ter um conhecimento melhor destas
três ferramentas (Paixões, Vontade e Intelecto).
❖ Se eu não descobrir de que modo o Intelecto é um Meio de Ação, de modo a Vontade é um Meio de
Ação, de que modo as Paixões são um Meio de Ação? A ideia é a seguinte, é que um vá iluminando
o outro. O Intelecto começa a agir, na Vontade e nas Paixões etc. E isto se torna uma ferramenta
terapêutica.

ORIENTAÇÃO NO MUNDO

O mundo oferece uma dimensão corporal e outra transcendental, imaterial. Nesta segunda dimensão,
estão as proporções, passado e possibilidades.

❖ Quando esta folha em branco se apresenta para mim com seu corpo branco, eu pego o lápis e escrevo
sobre esse corpo branco. Por quê? Porque é possível, essa folha receber o grafite e guardar o grafite

420
de algum modo. Ou seja, a possibilidade da folha conversa comigo. E eu ajo baseado na
possibilidade. Quando escrevo na folha eu pego o corpo, a parte material da folha está estática.

Nosso sistema de orientação no mundo é muito mais imaterial que material, pois agimos mais com
base no que podemos fazer, do que com base no que está acontecendo materialmente, assim como
quem escreve em uma folha não o faz a partir do papel mesmo, que está estático, mas da possibilidade
que ele tem de receber o grafite.

O Conceito surge de uma conversa entre Possibilidade, Passado e Proporção.


O mundo é percebido por nós como corpo, e detentor e uma dimensão imaterial, através da qual
percebemos proporções, passado e possibilidades.

❖ O Conceito é estável no mundo imaterial. É totalmente fixo e estável no mundo imaterial.

Com tudo isso articulado, acessamos o conceito, em que há uma imaterialidade estável, que nos
orienta.

Cada pessoa tem um corpo e uma dimensão imaterial, e na articulação de tudo isso aparece o que
chamamos de Vida. A vida é uma história que se dá em um lugar, com alguém.

Se uma pessoa não tem dimensão do tamanho do mundo e do próprio tamanho, terá uma vida anômala
ou pequena, uma história inverossímil, carente de elementos importantes.

❖ Quando estamos diante de um paciente, temos que ter este panorama dos Meios de Ação do Homem
e suas possibilidades.
❖ São duas coisas que serão necessárias investigar agora:
➢ Quais são os argumentos e
➢ Quais são as forças corporais e imateriais do EU.
❖ Ou seja, “ Qual é a História e Quem eu Sou?”, do ponto de vista operacional e prático.

421
SEMANA 11: QUATRO VETORES DA AÇÃO HUMANA E OS ARGUMENTOS VITAIS
Esta aula explica os quatro vetores possíveis da ação humana (diante do próprio eu, diante de outros ‘‘eus’’, no
tempo e no espaço) e apresenta quatro possibilidades de argumentos vitais (prazer, serviço, proteção, e
entender e explicar).

INTRODUÇÃO

❖ Na tabela apresentada na aula 10, houve uma certa aposta no Saber, na Cabeça e vocês podem estar se
perguntando: Por que o sistema não é invertido?
❖ Gostariam que vocês exercitassem o pensamento dialético. Meus alunos de cursos presenciais sabem que fico
feliz quando alguém me questiona algo e ‘podem me colocar em uma saia justa’.
Perguntas feitas ao professor precisam ter um quê de desafio; não podem ser muito generosas e fáceis, nem ter
muita malícia. Uma dúvida genuína possível a respeito da aula anterior é porque a progressão do
amadurecimento não é inversa; porque não começa pelo fazer, desejar e só depois saber.

❖ Quando você for fazer a pergunta, você tem que saber se quer 100% conhecer a resposta, ou se quer apenas
“derrubar” o professor.
❖ Você aprende mais quando sua pergunta tem um quê de audácia, um quê de impertinência.
❖ Perguntas muito generosas, faceizinhas faz com que você não aprenda nada e não estimula o professor a
responder.
❖ Quando estivermos nas sessões acadêmicas (PBLs - as aulas das sessões clínicos), quando a pergunta vem
com um pouquinho de malícia, é hora dela ser feita, e quando ela é muito inocente, é porque você está
querendo agradar o professor, ou ser notado por ele, ou bajular ele.
❖ Porém se a pergunta vem sempre com muita malícia, você atrai o desagrado da turma. Você não se torna um
par que as pessoas gostam de estar próxima. E aí o professor é obrigado a te responder, não para te ensinar,
mas para te colocar no seu lugar. Esta é uma das funções principais do mestre/professor, de colocar o aluno
no lugar dele, no bom sentido, não humilhar.
❖ Se você faz uma pergunta inocente, o professor gosta é de ser provocado intelectualmente, e a turma vê
você como bajulador. Estarei atento a vocês!
❖ (Ítalo olhando para a tabela ‘Meios de Ações do Homem’ – aula 10), Era muito importante ter vindo um
incomodo em vocês e questionarem, por que veio a progressão de baixo para cima e não ao contrário? Esta
é uma pergunta maliciosa, porque se eu não tiver uma resposta para isso, posso dar o dinheiro de volta.
❖ Estou me colocando no seu lugar, de aluno. O aluno pode pensar, tem pessoas que fazem coisas boas, mas
não sabem o motivo por que agem assim. Mas se eu pergunto qual o Argumento Vital dele, ele não sabe
responder.
❖ Ítalo desenha a tabela com a progressão de cima para baixo e levanta o questionamento:

422
Paixões (

Vontade

Intelecto

❖ Por que não faço primeiro as coisas boas e depois entendo? Por que não faço que as pessoas façam e desejem
e depois elas saibam?

❖ Aqui está todo grande campo do argumento.

Fazer está no campo das paixões, da manipulação da matéria. Desejar está na fronteira entre a matéria e o campo
transcendente. Uma vida fundamentada somente em manipular a matéria e fazer coisas tem um resultado
material e, portanto, mutável. Mesmo que se façam coisas boas, sem saber desejar e sem entender o porquê de
fazê-las, o resultado da vida não tem forma, não tem consistência.

MUTÁVEL
FAZER MATÉRIA BRAÇO (MATÉRIA SE
CORROMPE)

DESEJAR FRONTEIRA CORAÇÃO

SABER CONCEITOS CABEÇA

❖ Se a minha vida é escrita com meu braço, manipulando a matéria e fazendo coisas o resultado desta jornada
é do tipo: MATERIAL. Portanto mutável, porque a matéria se corrompe. Ou seja, mesmo que eu faça coisas
boas, sem desejar e sem saber o porquê faço, o resultado da minha vida não tem forma, ele muda. Se a vida
é conduzida diante de um eixo material, quando olho para trás da minha vida, do ponto de vista do EU, a
minha vida é uma vida sem sentido, ainda mesmo que eu seja uma pessoa que não incomode muito. Mas do
ponto de vista do EU, minha vida não tem consistência. Existem certas pretensões biográficas, que são
pretensões vitorianas ou moralistas. Muitas sociedades funcionam assim, porém, no ponto de vista de minha
alma é uma vida vazia, é uma vida sem sentido. É uma vida vivida em função dos outros, e não há problema

423
em viver assim, desde que você queira isto, desde que você saiba do porquê e do seu lugar na vida dos outros.
A pessoa que vive em função dos outros, sem desejar e sem não sabe o motivo é um erro do moralismo.
❖ A nossa aposta é que a tomada de consciência da vida venha a partir do conhecimento, pelo menos eu sei o
que deveria estar fazendo.

QUATRO VETORES POSSÍVEIS DA AÇÃO HUMANA


O EU é uma pessoa. Pessoa já foi definido como “invidua substantia rationalists naturae”: substância individual
de natureza racional. É necessário ter claro na consciência que cada pessoa é substância individual, não apenas
substância social.

❖ Pessoa é uma identidade, é você, é uma substância individual, ela é sua. Quando a minha ação é
inconsciente, indesejada mas coerente com a sociedade eu perdi a minha substância individual e
me tornei uma substância social. Estou desconfigurado, despersonalizado. Por isso entender os
motivos pelos quais se age é fundamental para que você seja percebido como pessoa.
❖ Você tem uma natureza racional- rationalists naturae , você tem que convocar as suas dimensões
superiores do espírito, ou seja inteligência e Vontade, para que possas perceber/saber em que
medida seus atos estão articulados com a convivência, com tua pessoalidade, com o tempo e o
espaço. Estas são as virtudes da justiça: Fortaleza, Prudência e Temperança.
❖ Eu não sou individual em sentido individualista (tipo “é eu, é comigo mesmo e o resto que se
dane”), isto é um desvio das virtudes da Fortaleza, Prudência e da Temperança.
❖ Somos também um animal político, estamos neste mundo em comunidade, sociedade e a nossa
personalidade se desenvolvendo de modo mais adequado, mais profundo quando estou diante
da convivência, pessoalidade, tempo e espaço.
❖ É EU, neste mundo, isto é, no Tempo e Espaço, agindo diante de outros ‘EUs’ . Eu sempre vou agir
diante outros Eus, comigo mesmo, no tempo e no espaço.
❖ Existem quatro vetores possíveis da ação humana: cada pessoa é um eu que age diante de outros, diante de
si mesmo, no tempo e no espaço. Existe uma ordem específica dos quatro vetores.
➢ A perfeição da ação diante de si mesmo é regida pela virtude da Fortaleza;
➢ A ação diante de outros ‘EUs’ é regida pela Justiça;
➢ A ação no Tempo, pela Prudência; e
➢ A ação no Espaço, pela Temperança.
A pessoa também tem uma natureza racional. Por isso, precisa perceber que o mundo é hierárquico: existe uma
dimensão Corporal, outra de Fronteira e outra Imaterial, Conceitual.

Os animais têm uma percepção aguda da realidade material, mas uma percepção nula dos Conceitos, não
hierarquizam a realidade inteira. Por isso, não são racionais.

Apostar em uma narrativa que não perceba a necessidade de hierarquizar a realidade é apostar em uma história
não humana.

424
Na terapia, o primeiro elemento a ser oferecido ao paciente é a capacidade de desenvolver sua natureza racional,
mesmo que ele não consiga amar o que conhece, nem fazer o que ama.

❖ O problema é que não consigo amar o que não conheço. É importante o cliente saber a história,
tem que conhecer o Argumento Vital dele. É um dos primeiros pontos do nosso método.
É importante que consigamos mostrar-lhe o grande panorama das responsabilidades narrativas; o paciente
precisa saber qual é seu Argumento Vital .

Precisamos ter uma visão antropológica ampla, de que o homem é Matéria (corpo) e Forma (possibilidades de
desenvolver-se, pensamentos, desejos, frustrações).

❖ O homem não é só reação bioquímica e o homem não é só sonho e arquétipo. O homem é um arquétipo
que faz reação bioquímica. Ele é as duas coisas. Os gregos diriam é matéria e forma. É Matéria, o corpo
que tenho e Forma que são as possibilidades que tenho de me desenvolver, pensamentos, desejos,
frustrações, as expectativas...
❖ Os religiosos podem dizer: corpo e espírito. Qualquer visão, seja uma visão natural, filosófica ou religiosa
que esteja ordenada ela leva em consideração, pelo menos esta dupla dimensão do homem. E igualmente
o mundo.
❖ O nosso método consiste numa visão antropológica e uma cosmológica.
A nossa cosmovisão, visão de mundo, também é a de que existe a matéria e um lugar de existência de realidade
sem matéria (passado, por exemplo). Esses são os princípios do nosso método. A nossa vida é narrativa, e precisa
ter um sentido.

❖ Em primeiro lugar é, o tamanho do homem e o tamanho do mundo. Depois se estabelece uma hierarquia
na importância das coisas que o homem tem. Hierarquizar é fundamental para podermos nos orientar. A
nossa hierarquia não é impositiva, no sentido de tirânica ou arbitrária, ela está absolutamente ordenada
com a visão que estamos tendo. Nossa vida é narrativa, e nossa história precisa ter um sentido. Se a
história não tem um sentido, você não a reconhece enquanto história.
Se a história é de uma pessoa, precisamos estar atentos para que essa pessoa seja o protagonista, com seus
elementos centrais:

✓ individualidade, sem individualismo; e


✓ racionalidade, sem racionalismo.
❖ Individualidade é você, racionalidade : existe uma hierarquia. Somos individuais e racionais e estas
dimensões sempre têm que estar presentes. Se não está presente, já não é uma história de uma pessoa.
❖ Então, esse é o nosso método: o homem tem esse tamanho, o mundo tem essas dimensões e o EU
enquanto protagonista precisa ser respeitado nas suas características de pessoa, para que seja sua própria
história, uma história funcional de uma pessoa.
❖ É necessário que haja uma individualidade, sem individualismo.

425
Individualidade corresponde às ações de um indivíduo, Convivência, Pessoalidade no Tempo e no Espaço. Ações
justas, com Fortaleza, Prudência e Temperança, tudo isso com respeito por uma natureza racional, ou seja, com
capacidade de hierarquizar.

O terapeuta precisa dar ao paciente o argumento para que ele saiba por que está vivendo, ainda que não deseje
os atos que são consequência desse saber, ou ainda que saiba, deseje, mas não consiga fazê-los. É o saber
conceitual, imaterial, que dá o referencial para as ações.

Mesmo que não se consiga fazer ou desejar com perfeição, já há uma história identificável, há uma qualidade, um
ponto sólido, que é o saber.

❖ Respondendo o porquê da inversão das bolinhas vermelhas e azuis: O importante é o saber, porque o saber
é o ‘saber conceitual’ imaterial portanto, que ter dá os referenciais para tuas ações. Mesmo que você
ainda não consiga desejar com perfeição ou fazer com perfeição, você já tem uma história identificável,
uma história tua, uma história que tenha consistência, que tenha sentido; mesmo que seja uma história
desastrosa do ponto de vista material, uma história que você já tenha uma qualidade, que é o saber. Você
já sabe como a ‘coisa’ tem que ser. É um ponto firme, um ponto sólido.

OS ARGUMENTOS VITAIS

PRAZER:
Temos algumas possibilidades de enredo, de Argumento Vital . Um eixo narrativo possível é o acúmulo das
possibilidades de Prazer. Não necessariamente imorais, como o sujeito que tem uma vida explicada em trabalhar
para acumular dinheiro e comprar uma casa confortável.

❖ Uma pessoa pode ter uma vida que seja melhor explicada por acumular possibilidades de Prazer. Muitos
personagens de histórias de cinema o que ele está tentando? Tentando acumular histórias de prazer. Por
exemplo: um sujeito cuja vida dele é melhor explicada por trabalhar, para acumular dinheiro, para comprar
uma casa grande e confortável. O que ele está fazendo? Está acumulando possibilidades de Prazer, pois
morar em uma casa grande e confortável dá mais Prazer do que morar na selva.
❖ Muitas vidas podem ser explicadas por este eixo, este pode ser um Argumento Vital . Por que o sujeito acorda
todos os dias? O sujeito acorda para trabalhar, trabalhar sério, com competência, com consistência, mas o
Argumento Vital dele é trabalhar para acumular Prazer.
❖ Talvez você já tenha meditado sobre o Prazer ou talvez só tenha gozado o Prazer (rsrs). Só que você é
terapeuta e é uma pessoa que tem que estar atenta e o Prazer por um lado ele gera aquilo que em geral
identifica-se com o aspecto do gozo. O Prazer traz para a gente um gozo, é óbvio.
❖ Agora se você tiver meditado um pouco sobre qualquer ato, qualquer coisa que te traz Prazer, a primeira coisa
que você percebe é o seguinte: o Prazer você não o controla. Confesso para vocês uma coisa, fumar charuto,
em geral, para mim é bom, porém este que estou fumando está horrível.
❖ Qualquer coisa que na maior parte das vezes nos dá prazer, pode não dá prazer também.
❖ Pense nas coisas prazerosas e você vai reparar que não existem coisas prazerosas. O Prazer é um efeito que
você não controla.

426
O Prazer é identificável pelo aspecto do gozo, mas é também um efeito não controlável.

❖ Vamos pensar em ‘comidas gostosas’: percebem que nem sempre é prazeroso comer hamburger. Você
adora comer hamburguês e vai no drive-thru que gosta, pegou o hamburguer para comer, entrou no carro,
e na primeira mordida o molho caiu todo na sua blusa. O que prevalece deste ato, é que você ficou ‘irritado’
porque sua blusa está suja e você tinha um encontro logo em sequência.

Coisas que, na maior parte das vezes dão Prazer, podem não fazê-lo às vezes. Logo, acumular Prazer é impossível.

❖ Não existe ato prazeroso, isto é uma das coisas mais frustrantes que você pode perceber e declarar. Logo
acumular Prazer é impossível. Não é que é difícil, é impossível acumular Prazer.
Pode-se tentar acumular meios que, por probabilidade (intenção, ou por expectativa ou por ingenuidade) , podem
dar o efeito que às vezes acontece, às vezes não.

❖ Estou falando quando não acontece. E quando acontece? Seria bom investigar o que é o Prazer. Você é o
terapeuta, você tem que estar atento aos movimentos da alma, do espírito, da pessoa e você começa pelos
teus. O prazer ele é bom? Você é que tem que responder, você precisa investigar isto.
❖ Quero que você analise o fenômeno do Prazer. Esquece qualquer tipo de ideologia, analise a ‘coisa’ em si,
o prazer de comer um sanduíche gostoso. Aquilo é muito bom, por quanto tempo e a partir de que
momento que aquilo deixa de ser bom. Quanto tempo dura um gozo e qual é a natureza do gozo enquanto
aquilo está acontecendo. Isto é que você tem que investigar e para cada pessoa a resposta é uma.
Sempre existe, intrínseco ao Prazer, o elemento da angústia decorrente de sua perda. O gozo atinge um ápice e
diminui; no momento em que se percebe a diminuição, já há angústia, ansiedade. Pode ser que isso aconteça já
no início. Essa é a natureza do Prazer.

❖ O prazer é ambivalente. O Prazer é consequência de atos que você não controla esta consequência, às
vezes tem, às vezes não tem. Depois quando você tem, intrinsicamente este efeito é ambivalente. Por um
tempo prevalece o gozo e depois este diminui. Já no início do gozo já começa a surgir um elemento de
angústia.

ANGÚSTIA / AGONIA

GOZO / PRAZER

427
❖ O gozo não se mantém, ele começa, atinge um ápice e diminui. Quando o gozo começa a diminuir, aparece
a percepção da falta do gozo. Esta percepção já é um tipo de angústia, é um tipo de ansiedade, de falta.
Isto é a natureza do Prazer.
❖ Existe um momento, um instante, um átimo98 ótimo que o gozo é pleno, isso dura ‘nada’ e neste momento
já aparece a angústia ou a percepção de falta. Por isso você se engaja novamente em uma atividade que
lhe possa dar o gozo.
Por isso, este Argumento Vital é, no mínimo, perigoso. Será o tipo de vida em que na maior parte das vezes a
percepção de frustração é maior.

❖ Perigoso por quê? Não podemos acumular aquilo que não tem forma. Você pode acumular possibilidades
de prazer, isto ainda dá.
O acúmulo de Prazer é impossível; o acúmulo de possibilidades de prazer é possível, mas difícil; mesmo que
alguém consiga, vai perdê-lo em algum momento, quando estiver prestes a morrer.

❖ Teve uma pesquisa que eu fiz um dia, que peguei os epitáfios, primeiro peguei as inscrições nas lápides
das pessoas, depois o que as pessoas falam na hora da morte, quais são as últimas palavras. É muito
curioso a presença da comédia, muitas pessoas fazendo piada na hora da morte. É muito curioso que
algumas funcionam e outras são uma tragédia disfarçada. Um dia falaremos sobre isto.
❖ Quero repetir para deixar marcado: O Prazer é uma consequência errática de atos, E quando vem, vem
com a angústia (Ítalo aponta para o ‘gráfico’ acima).

SERVIÇO:
❖ Existe outro argumento possível que se afasta mais da matéria. O primeiro argumento é bastante material
que traz uma frustração intrínseca. A matéria é corruptível, a matéria muda, a matéria não tem foco, a
matéria não tem consistência.
O segundo argumento se desloca mais da matéria, traz mais estabilidade, pois não é uma consequência errática
de atos, mas o ato em si.

❖ Tem um “EU”, este eu está no mundo e está convivendo com outros ‘Eus’.
❖ Eu percebo algo em mim, que já falei antes neste curso, quando eu faço qualquer coisa, quando eu bebo
este café, ainda que tivesse milhares de pessoas vendo eu beber este café agora, se eu estivesse tomando
diante de um estádio lotado. Quem bebeu o café? Vocês ou eu? Quando eu respiro, quando eu sofro,
quando eu amo, quando eu acordo, tu faz isto tudo sozinho, tudo bem, mas tu fazes tudo sozinho. E aí,
algumas pessoas podem tomar consciência disto de modo mais claro, de que existe uma realidade neste
mundo chamada Solidão. E a solidão não é algo que pode acontecer ou não. A solidão é a constituição
ontológica do homem.

98
Átimo: Período de tempo muito curto; momento breve; instante.
428
SOLIDÃO
ONTOLÓGICA EU
EU

EU EU

EU
EU

Neste modo de vida, percebe-se que a solidão é a constituição ontológica do homem. Quando alguém faz
qualquer ato, ainda que visto por milhares de pessoas, é este alguém que o está fazendo, sozinho.

❖ Você pode até discordar de mim dizendo ‘Como assim, condição ontológica do homem? Estamos sempre
acompanhados e Deus?’ Sim, você está sempre acompanhado, você tem muita fé, você acredita tem Deus
etc., mas você não é Deus. Por um lado existe uma coisa que você pode chamar companhia e por outro
lado existe uma coisa chamada de existência, e existência é uma coisa individual.
❖ Então na constituição do homem existe uma coisa chamada de Solidão. O homem é um bicho sozinho.
Entenda que se você está utilizando tristeza e solidão como sinônimos, você ainda não percebeu do que
estamos falando. Os “EUs” são universos por assim dizer, são microcosmos.
❖ Uma história humana contada em primeira pessoa, é uma das coisas mais fantásticas que tem. Entra uma
pessoa em teu consultório, com uma vida, com projetos, com frustrações, com olhar, com um monte de
coisas ali acontecendo num espaço vazio que começa a ser preenchido pelos atos dela, isto é incrível. Mas
quem está agindo é ela, é uma substância individual e ela está sozinha. E a gente que está sozinho, todos
nós, podemos sucumbir a esta solidão e se entristecer, porque tomamos consciência ‘Caramba, vou estar
sempre sozinho’ .
Um Argumento Vital possível é o daqueles que tomam consciência disso e se colocam na existência para servir.

Há pessoas que perceberam que estar sozinho é mais difícil e decidiram ajudar os outros, olhar para cada eu
individual notando a carência ontológica e buscando completar o que falta.

SERVIR

EU EU

EU EU
EU

EU 429
❖ Falei da história da Madre Teresa de Calcutá, ela claramente o Argumento Vital era Servir, de um modo
excelente. Como ela fazia: cada mendigo daquele continuava sendo sozinho, mas ela não os deixava
caírem em desespero, quando tomavam consciência disso, é isso que ela fazia.
❖ No fundo, no fundo, eu estou aqui, sozinho diante das câmeras, gravando, ninguém pode entrar aqui e
soprar em meu ouvido o que eu tenho para falar. Mas cada um que está fazendo esta história acontecer,
percebe que como eu sozinho, não tem como fazer acontecer este negócio. Se eu não estivesse sendo
gravado, produzido, iluminado, alimentado, eu não dou conta. Então sabendo ou não, cada um que está
aqui fazendo isto acontecer, está de algum modo servindo e eu estou servindo a vocês.
❖ A questão é, eu posso fazer isto de modo consciente. Se eu faço isto de modo consciente, ou seja, um dia
de minha vida, vou contar uma história de alguém que serve. No final do dia, o que acontece com a tua
cabeça quando deita no travesseiro, ‘Puxa, não sei porque, mas fez sentido a vida hoje!’
❖ Imagina que eu estivesse nesta sala, o ar estivesse quente, eu aspirando, o charuto estava ruim, enfim
está meio incomodo, se é nisto que estou prestando atenção , eu só estou procurando o Prazer. Vou chegar
ao final do dia e ao colocar a cabeça no travesseiro vou pensar: ‘Hum’.
❖ Não estou teorizando, seu paciente não tem que teorizar sobre isto, você é o terapeuta, você tem que
teorizar a vida do seu paciente: ‘Claro você está buscando uma vida pelo Prazer, você está buscando um
argumento material, não funciona’.
❖ Então, eu tenho uma solidão, que está sendo de algum modo amparada e completada para eu poder estar
aqui. Se cada uma das pessoas que estão aqui no estúdio, se elas tomam consciência, só por 18 horas, que
eu vou fazer aqui o que está faltando neles.
❖ O que acontece no final da jornada, é que você tem um argumento que funciona, que é o SERVIR, a tua
história tem um sentido, mesmo que tu chegues suada, amassado ao final do dia.
❖ Não estou tentando jogar alguma coisa.... isto você percebe, é assim. Então talvez esteja consciente para
você e não vai estar para o paciente. Então aqueles dias que fazem sentido, são os dias que o sujeito
encontrou um argumento que não está mais colocado na matéria.
❖ O primeiro dos argumentos vitais que não está colado na matéria, é este, SERVIÇO, SERVIR.
O dia é a unidade mínima da história vital; há o nascimento simbólico do despertar e a morte Simbólica do
adormecer.

Se em um dia o sujeito tem a capacidade de completar uma história com argumento, no dia seguinte faz o mesmo
e assim por diante, pela coesão de unidades mínimas com sentido, começa a ter uma vida com sentido.

❖ Um mês vivido com sentido, dá sentido para toda uma história anterior vivida sem sentido. Isto é muito
bonito, é a grande benevolência da composição humana.
Quem adquire uma narrativa com argumento transcendente, ainda que por pouco tempo, percebe essa narrativa
fazendo o movimento de informar toda a história passada.

430
❖ É como se toda a história passada, fosse explicada ou renovada ou englobada nesta história nova. Se for
vivida com sentido mesmo, claro !
Dito de outro modo: SEMPRE HÁ ESPERANÇA.

❖ Isso o terapeuta tem que ter para sempre. Imagina você atendendo uma pessoa com doença terminal e
está desesperançoso e só fez ‘burradas’ em sua vida, no fundo uma vida frustrante, e está para morrer, e
agora você o recebe, e daí? Tem aquela história do Viktor Frankl, que chegou para conversar com um
sujeito que estava condenado a morte e morreria no campo de concentração em uns 20 minutos. Pediram
para Viktor falar com ele e ele disse: “Não importa se você irá viver mais 20 anos ou 20 minutos, o que
importa é que tua vida tenha sentido, AGORA, portanto você faça algo que tenha sentido”.
❖ O que Viktor quis dizer: Vinte, 20, minutos com sentido, com intensidade, podem englobar toda uma
história, que não havia sido encontrado muito sentido nela. Como dar sentido em 20 minutos? Também
não sei.
❖ Mas em um dia dá! Você cumpre seu dever, você trata as pessoas, você não é injusto, você fala direito,
você está ali percebendo que existem buracos e lacunas na existência dos outros, que os outros são
unidades sozinhas, e a tua presença de algum modo faz com que ele repouse, com que ele se ilumine, com
que vivam um pouco melhor. Essa é uma vida de serviço. Talvez seja o grande argumento que alguém vai
ter na vida.

PROTEÇÃO:
❖ Tem outro Argumento Vital, também imaterial, este é um pouco mais sofisticado. É um esquema
parecido com o do SERVIÇO, mas tem um ponto a mais, que não é para todo mundo.
Outro Argumento Vital possível, também imaterial é o da Proteção. Ele está no mesmo eixo do Serviço, mas não
é para todos.

❖ O SERVIR, mesmo uma senhorinha, como Madre Teresa de Calcutá, fraquinha, pobre, ela pode
desenvolver massivamente o Argumento Vital SERVIR , pleno de sentido, mesmo não tendo nenhum
recurso.
PROTEGER
EU EU

EU EU

EU EU
MUNDO

431
❖ Este outro Argumento Vital que é Proteger. Observem que o SERVIR e Proteger estão no mesmo eixo.
Ambos estão falando da mesma coisa, estão falando sobre a Solidão.
❖ O primeiro a pessoa já está na Solidão, e eu vou lá e tento já dar um conforto para esta Solidão que está
instalada. Porque não tenho recursos para antecipar, não tenho dinheiro, não tenho força, não tenho
muita inteligência, não estou numa posição social relevante. Então o que eu posso fazer com esses ‘Eus’
que se esbarram em você, passivamente, você vai lá e ampara.
❖ O Argumento Vital da Proteção, já é mais raro, porque a pessoa para exercer este Argumento Vital tem
que ter recursos. Não só materiais, não é dinheiro, ela tem que ter a antecipação da visão do sofrimento
e antecipação da solidão. Ela tem que ter uma consciência clara acerca do próprio lugar e do lugar dos
outros no mundo, que ela antecipa a percepção da solidão no coração dos outros..
A pessoa precisa de recursos para mantê-lo, precisa da visão de antecipação do sofrimento e da solidão, de uma
consciência clara acerca do próprio lugar e do lugar dos outros no mundo.

❖ Você tem que ter este Argumento Vital: PAI e MÃE. Pai e mãe diante dos filhos , o Argumento Vital é a
Proteção. Você não vai esperar seu filho bater com a cabeça na quina da porta etc., você antecipa, você
tem que ter uma posição existencial de antecipar ‘eu sei quais são os sofrimentos que ele pode padecer,
eu entendo que ele tem uma solidão porque tem uma ignorância, não tem o desenvolvimento pleno de
suas faculdades, então eu tenho que estar na vida deste sujeito, protegendo-o’.
❖ Você entende que existencialmente, Pai e Mãe já tem mais recursos que o filho. Para começar, eles são
mais velhos, depois foi eles que fizeram, depois eles já conhecem a casa ... Então Pai e Mãe recebem os
filhos já nessa posição Existencial. A posição existencial do Pai e Mãe é proteger os filhos, vocês percebem
que isso é o exemplo, para que você note que nem todo mundo tem isto que se chama da Alma Maternal,
da Paternidade Espiritual. Mas tem pessoas que desenvolvem esta Paternidade Espiritual.
❖ Tem pessoas que assim, todos os outros ‘Eus’ são como meus filhos. Tem gente que é assim. Tem gente
que olha pro mundo, olha para os outros, e se põe existencialmente como pai. É assim, ‘eu me antecipo’.
Uma posição existencial que demanda esse Argumento Vital é a dos pais. O pai e a mãe têm diante dos filhos o
Argumento Vital de Proteção. Há pessoas que desenvolver a paternidade espiritual, que percebem todos os outros
como filhos.

❖ Tem um tipo de paciente muito comum no consultório, entre 28 a 40 anos, que é um casal que não pode
ter filhos. Isso é muito comum. É um sofrimento, pois casaram estão juntos, querem ter filhos e não podem
porque algum dos dois pode ter um problema, ou os dois tem, ou sei lá, enfim, ficam sofrendo, sofrem. É
óbvio que dá de entender o sofrimento, é uma expectativa frustrada. Aqui que está a passagem da
compreensão. Por que que está casal está sofrendo por não poder ter filhos. Ora tem uma explicação
bastante humana: ficam tristes porque não tem algo.
❖ A solução para estas questões é você conseguir dar para este casal uma posição existencial análoga a
posição existencial de mãe e pai, a solução passa pelo esquema acima. Ou seja as famílias, pais e mãe,
mulheres e homens que chegam no consultório com sofrimentos sérios, verdadeiros por não poder ter
filhos biológicos, se resolve se você consegue enquanto terapeuta identificar em que lugar (apontando
para o esquema gráfico do Prazer/Gozo) do esquema do Prazer, ou seja, “Será que este sujeito está

432
querendo ter filho porque acha que ter ‘filho é um direito’? Será que este sujeito que quer ter filho, acha
que é prazeroso.., porque acha que é uma resposta social, porque ‘minha prima’ , minha irmã tem?”. Não
é o prazer físico, é de uma adequação social, pode ser. O terapeuta tem que investigar o seguinte: qual é
o impulso material que faz com que este sujeito ache que ter filhos é.... , porque ele está triste por não ter
filhos, pode ter o impulso material que faz com que se entristeça. Depois existe o encaminhamento de
contemplação para que homem e mulher ali, percebam o que são os ‘Eus’ ontologicamente solitários.
Depois uma coisa mais sofisticada que é o esquema da Proteção, que é ‘diante de EUs ontologicamente
solitários, pai e mãe se apresentam para eles na existência como aqueles que antecipam os sofrimentos
causados por esta solidão; solidão da ignorância, da fraqueza física etc.’ Ficou confuso.
❖ Pai e mãe são ‘Eus’ que protegem esses ‘Eus’ pequeninos dos seus filhos, para que possam se desenvolver.
❖ Quando mulher e homem, quando um casal, conseguem fazer este caminho, isto é, desde projeções e
argumentos materiais (Prazer), passando pelo argumento do Serviço chegando no argumento da
Proteção, aí você consegue dar dois ou três dias, quatro ou cinco dias, nos quais a mulher e o homem,
desenvolvem este Argumento Vital da Proteção, o sofrimento deles por não ser pai, some, por não ser
mãe, some. Por quê? Porque eles se tornam pais e mães, argumentalmente, materialmente eles não são
pais e mães, mas o Argumento Vital deles, que é o argumento que vence ao final das contas. O Argumento
Vital é de Paternidade e Maternidade. Logo eles percebem a sua vida como eles sendo pais e mães, porque
no fundo, no fundo, no fundo, ser pai e mãe é isso – Proteger.
❖ Isto é um Argumento Vital um pouco mais sofisticado. Por que que é mais sofisticado? Porque ele
demanda primeiro lugar uma instalação no esquema do Serviço, uma instalação pelo menos cognitiva. A
posição ontológica do EU é a Solidão e que eu posso estar ali junto, como irmanado na trincheira de lama.
Existe uma posição antológica que, eu posso antecipar e fazer com que ele não se suje tanto de lama e
que a gente não vá para a trincheira. Esta é a posição existencial de pai e mãe. E eu posso assumir essa
posição argumentalmente, ou seja, de modo argumental, ou seja, sempre a minha história é contada
assim. Isto é o que me faz estar no mundo. Eu acordo para isso. Esse argumento vital é lindo, também. É
um pouco mais sofisticado e mais raro. É mais raro ter alguém com Argumento Vital da Paternidade ou
Maternidade ou da Proteção.

ENTENDER E EXPLICAR:
❖ O quarto argumento possível é o que você percebe que eu posso ser um irmão na trincheira, me ‘ lamear’
de lama, eu posso ser um pai com uma mãe que protegem esses ‘EUs’ dos efeitos da solidão, que servem
de modo antecipado ativamente.
❖ E eu posso perceber que esses ‘EUs’ estão no mundo e tem outros ‘EUs’ no mundo, tem outros ‘EUs’ que
estão ao redor dos ‘EUs” .
O quarto Argumento Vital possível é de que há o EU e outros ‘EUs’ com os quais não tenho contato direto. Esse
indivíduo sabe que conhece alguns ‘EUs’, mas não todos os que se relacionam com eles: conhece o mendigo de
quem está cuidando, mas não sabe com quem ele se relaciona; conhece o próprio filho, mas não os ‘EUs’ com
quem ele se relaciona.

433
❖ Não sei quem está ao redor do meu filho, seja filho biológico ou vamos chamar de ‘filho espiritual, filho
imaterial’.
❖ Ou seja a tua visão cosmológica pode-se ampliar.
A visão cosmológica99 pode se ampliar: não vê apenas as pessoas ao seu redor, mas também as que estão ao
redor destas.

Por isso, percebe que não basta cuidar dos efeitos da solidão nesses ‘EUs’, mas despertar neles um pólo de
iluminação para os outros ‘EUs’.

ENTENDER & EXPLICAR


EU

EU

EU EU

EU EU
MUNDO
EU
EU EU

❖ Esses ‘EUs’ que estão me tocando já não basta que eles sofram os efeitos da solidão. Mas eles têm que ser
polos emanadores para cuidar da solidão daqueles que estão ao redor deles.
❖ Tem uma diferença clara entre todos estes Argumentos Vitais.
➢ Tem um Argumento Vital que é : acumular possibilidades de prazer, ou seja EU estou olhando para ‘EU’
e não estou percebendo como a solidão bate em mim, no fundo é isso. Eu estou achando que café, sexo,
MacDonald etc. isso de algum modo diminui os efeitos da solidão;
➢ Existe o segundo Argumento que é, eu já percebi que não é assim que funciona, eu sou sozinho, como
todos eles são sozinhos, eu posso estar aqui ao lado deles ajudando que eles sejam menos sozinhos. É o
eixo narrativo do SERVIR é o argumento do Serviço;
➢ Existe um outro Argumento que é o de PROTEGER, eu já percebo que, não é comento no MacDonalds,
transando e cheirando que eu diminuo os efeitos da solidão em mim, e que eu posso antecipar no outro
os efeitos negativos da Solidão, então eu os protejo, assim como um pai e uma mãe protegem um filho;
➢ Posso perceber uma outra coisa ainda: é que existem muitos ‘EUs’ no mundo e EU sozinho não dou conta.
É preciso de outros ‘EUs’ sendo pólos emanadores de esperança, de luz etc. E para que eu possa

99
Cosmovisão: Modo particular de perceber o mundo, geralmente, tendo em conta as relações humanas, buscando entender
questões filosóficas (existência humana, vida após a morte etc.); concepção ou visão de mundo.
434
despertar nestes outros ‘EUs’ essa mesma visão, essa mesma percepção, eu vou precisar ENTENDER e
EXPLICAR.
Para isso, é necessário Entender e Explicar. Se alguém tem os argumentos claros, começa a direcionar sua vida. Se
ao menos sabe disso, passa a tentar amar uma vida assim e acaba fazendo coisas coerentes. O resultado passa
então a ser propriamente seu, pois ele fez o que fez de modo individual, consciente e hierarquizando tudo.

❖ Com os argumentos claros, se eu sei destas coisas eu começo a direcionar minha vida, porque pelo menos
eu sei disso, começo tentar amar uma vida assim. Quando eu começo a tentar a amar uma vida assim,
eu acabo fazendo coisas que são coerentes como estes argumentos, são coerentes com meu coração, e o
resultado no mundo, passa ser propriamente meu.
❖ Por que que ele é meu? Porque fui eu que fiz individual e de modo consciente, hierarquizando tudo,
entendendo a hierarquia do mundo, hierarquia do sofrimento, hierarquia da vida, hierarquia biográficas,
e eu passo então, pela primeira vez uma HISTÓRIA. Uma História com Sentido. E se para o homem a vida
é narrativa eu passo a ter uma vida com sentido.

435
OS ARGUMENTOS VITAIS - RESUMO

436
SEMANA 12.1 – AS SETES FACULDADES HUMANAS
Nesta aula, são apresentadas as Faculdades Humanas – voltando à terminologia usada anteriormente, os meios
de ação do homem no mundo. Em seguida, expõe-se um itinerário de evolução e amadurecimento.

O OBJETO DE ESTUDO DA SIMBÓLICA


Usamos até aqui o modelo Ternário de Cabeça, Coração e Paixões, que pode ser reduzido ou ampliado.

❖ Esta é uma forma de falarmos dos movimentos que se passam no homem/mulher. Alguns movimentos que se
passam no mundo material, outros que se passam no coração do homem, que são os desejos e um outro
movimento que se passa na cabeça, que é uma relação aos valores, conceitos etc.
❖ Este modelo ternário pode ser ampliado ou reduzido. No início falei do homem com corpo e mente, material e
imaterial. Depois fiz uma extrapolação e já fiz uma distinção da parte material e de duas partes que são
transcendentais que vão para algo que não é material. Estas distinções podem chegar a ser expandidas em
quantos números que se queira.
A expansão pode se dar de modo descritivo, ou fenomenológico, quando o psicopatologista percebe o sujeito a
partir de algumas notas; ou de maneira Simbólica.

❖ Na semana 1 a 8, vimos que um psicopatologista olha para um homem / mulher, ele vai olhar segundo algumas
notas que são fenomenológicas, ou seja, olha para este sujeito a partir de coo se manifesta, observando atitude,
aparência orientação, atenção, inteligência, conação ou vontade etc.
❖ Esta é uma forma e existe outra forma que é a Simbólica.
Esta última é mais robusta e prática.

❖ Eu vinha falando de cabeça, coração e paixões (partes inferiores). Nesta aula irei falar de duas coisas: primeiro
sobre os movimentos do homem, que iremos chamar de Faculdades, depois vamos retomar o quadro
vermelho e azul, colocando todo o itinerário da possibilidade de evolução e amadurecimento.
❖ Vou apresentar nesta aula, as ferramentas, ou seja, quais são as faculdades ou as dimensões do homem que
faz com que eles agem, voltando para terminologia da
primeira aula deste bloco, quais são os Meios de Ações do
Homem no mundo.
❖ Irei usar o quadro das bolinhas azuis e vermelhas, que
tinham 4 colunas e irei aumentar estas colunas, para que
possamos visualizar todo o itinerário de evolução e
amadurecimento do ser humano.
❖ Associando tudo que foi aprendido em todas as disciplinas das semanas 1 a 8 e das últimas semanas, teremos
uma base sólida para as análises e consolidação do conhecimento por meio dos casos clínicos.
❖ A divisão ternária que propus nas aulas anteriores, era simbólica também. O símbolo não pode ser visto como
alto distante e esotérico.
O Símbolo não é algo distante ou teórico. A Simbólica é uma realidade trabalhada pela Filosofia ao longo de muitos
séculos, embora tenha saído de seu domínio pelo menos desde o século XVI.
437
❖ A partir do século XVI vemos poucos simbolistas trabalhando. A Simbólica ela sai do domínio da Filosofia
e no máximo é discutida no círculo esotérico. No século 21 é muito comum ver uma associação entre o
Simbolismo e o Esoterismo.
❖ A Simbólica é um assunto fundamental para o terapeuta. A Psicologia não pode ser feita sem esta visão
da realidade.
A Psicologia não pode ser feita sem o conhecimento da Simbólica, não pode ser apenas empírica, pois tende a ver
o homem e seus movimentos interiores articulados com a realidade, levando em consideração a causa final desse
mesmo homem. Tudo o que é tende à sua perfeição.

❖ A Psicologia é algo mais profundo, ela tende ver o homem com seus movimentos interiores articulados com a
realidade em vista a execução a Causa Final deste mesmo homem. Vocês já aprenderam o que é Causa
Material, Causa Formal, Causa Eficiente e Causa Final.
❖ A Psicologia deve observar o homem, inserido no mundo e o mundo entendido não só como lugar material,
mas como um lugar transcendente.
Cada ente tem uma densidade de presença, e se estamos em união com a realidade, conseguimos perceber seu
propósito, tocar em seu ser. Por isso, o terapeuta precisa meditar e buscar entender qual é a Causa Final dos
entes, e levar a sério a teoria das Quatro Causas Aristotélicas.

❖ O terapeuta tem que meditar acerta da realidade. Tem que ser uma pessoa que não se deixa confundir pelas
aparências, não se deixa confundir com as ideologias. Deve usar a meditação para buscar entender qual é a
Causa Final dos entes.

Finalidade

Matéria Forma

Eficiente

Todos os entes têm uma Matéria, são feitos de algo.

Tudo o que é Material tem uma Forma, que é um conjunto de possibilidades.

Tudo o que é, é feito por alguém: isso é chamado de Causa Eficiente.

Tudo o que é também tem uma Finalidade.

A realidade é generosa para nós. Um pandeiro, por exemplo, tem uma Forma e Finalidade, a de ser percutido.
438
❖ Homem vulgar, mulher vulgar, a pessoa confusa, podem se confundir, por isto nos procuram. Qual é a
confusão?
Há algo da finalidade do pandeiro que tem uma interseção com a forma do violino, pois ele também pode ser
percutido. No entanto, o violino não foi feito para isso. Os entes têm uma dignidade própria, que acontece quando
a forma encontra a Finalidade. Percutir o violino é tratá-lo de modo indigno e usurpar a finalidade de outro ente.

❖ Os entes materiais, por causa da sua forma, a forma não é a figura externa, isto é como o homem vulgar chama
forma. A forma é o conjunto de possibilidades.
❖ A atividade do terapeuta é jamais isolar a forma da eficiência, da finalidade e da materialidade. O terapeuta
tem que estar profundamente atento as quatro causas em articulação.

Finalidade

Matéria Forma

Eficiente

❖ O homem / mulher desatentos, observam as causas os motivos de existência de um ente, daquilo que é de
modo desatento.
❖ A falta da visão articulada da realidade é uma das grandes causas de neuroses e sofrimento.
❖ Tudo que aquilo que É, é para Algo, dentro de um quadro de Possibilidades com uma Intenção com uma base
material.
❖ Um violino foi criado para ser instrumento de percussão? Isto que a meditação tem que responder. Para este
caso, é fácil responder.
❖ Não ele não foi criado para ser um instrumento de percussão, pois se eu ficar percutindo em um violino:

1. Não terá uma percussão perfeita;


2. Tem outros instrumentos que percutem melhor;

439
3. A matéria dele não comporta percussão por muito tempo, o luthier 100 quando fez o Violino, não utilizou a cola
a forma para aguentar a pancada. Ou seja o Violino foi feito para uma finalidade, ele é um instrumento de
corda, ele não é um instrumento de percussão.

❖ A finalidade do Violino é como se houvesse uma intercessão (1) ...entre forma e finalidade... Vamos fazer um
chá de meditação aqui (olhando para o esquema abaixo)....Os entes, é como se houve uma conversa generosa
na realidade.

❖ Então você imagina que tem um pandeiro aqui (Ítalo desenhas as 4 causas do Pandeiro). O Pandeiro tem uma
forma e uma finalidade. Evidente que a finalidade do Pandeiro tem uma intercessão (2) com a forma do Violino.
Reparem a realidade, ela é muito bonita. Então tem algo da finalidade do Pandeiro, que é ser percutido, que
tem uma intercessão com a forma do Violino.
❖ O Violino também pode ser percutido, ocorre que a sua finalidade não é ser percutida, a finalidade do Violino
é ser ..... cruzado por um arco (feito de crina de cavalo) que vai bater nas cordas e vai produzir um som mais
excelente, um som próprio do Violino.
❖ Isto é a meditação profunda da realidade dos entes, que nos dá esta acuidade diante da realidade. Este é o
conceito que chamamos de Dignidade.
❖ Os entes têm Dignidade própria, e o que é Dignidade? Dignidade é quando a Forma encontra a Finalidade.
❖ Tratar o violino como percussão é de modo indigno, porque estou usurpando a finalidade de um outro ente, do
pandeiro.
❖ O problema é que a Felicidade e a Dignidade, a expressão do Ser e a Dignidade são sinônimos, são coisas
unidas.

100
Luthier: profissional especializado na construção e no reparo de instrumentos de cordas, com caixa de
ressonância. Isto inclui o violão, violinos, violas, violoncelos, contrabaixos, violas da gamba e todo tipo
de guitarras (acústica, elétrica, clássica), alaúdes, archilaúdes, tiorbas, e bandolins.
440
❖ O próprio terapeuta diante da matéria de cada ente, de cada coisa, se deixar penetrar por esta matéria, devem
ter a pergunta: Esta matéria, este ente, eu sou presença do quê? Pergunta fundamental do terapeuta.
❖ Para que serve esta mesa? A mesa serve para apoiar; a xícara para beber; o lápis é para escrever.
Tudo quanto é Material é presença de algo, de um Verbo. A realidade inteira tem uma gramática intrínseca, fala
conosco para que alcancemos sua finalidade.

É nessa realidade que o terapeuta deve estar inserido; se tiver apenas a visão material do mundo, não terá os
instrumentos necessários para cumprir sua profissão.

❖ O Verbo em grego é Logos, a realidade material ela existe enquanto presença de Verbo. O Verbo é ação, é a
imaterialidade, é o movimento.
❖ Os terapeutas não podem passar pelo mundo só percebendo a materialidade dos entes. Este é um olhar
profundamente místico, não é religioso. O terapeuta que tem uma visão materialista do mundo, é evidente que
não consegue cumprir sua função.
A Simbólica estuda a presença. Existe o Verbo; do arque 101 Verbo, derivam outros verbos. Como se em uma teia
ficassem os verbos, e em um deles existem vários entes (escrever – lápis, caneta, giz de cera, livro etc.).

LOGOS

A Simbólica estuda a união dos entes através dos Verbos.

❖ Ou seja, caneta, lápis, giz, livro, escritor, estão unidos dentro da cadeia do Logos, ou na grande cadeia do SER.
Simbolicamente há uma união. A Simbólica estudo o Verbo do que as coisas são presença.
Quando estamos diante de um lápis, ele é uma matriz de intelecções, pois simboliza não apenas o próprio lápis,
mas tudo o que escreve.

101
Arque: O arché é um termo fundamental na linguagem dos filósofos pré-socráticos, dado que é caracterizado pela procura
da substância inicial de onde tudo deriva e é também a ideia mais antiga na filosofia, já que se tornou no ponto de passagem
do pensamento mítico para o pensamento racional
441
Tudo que se vê enquanto material tem uma forma, finalidade, eficiência, matéria e presença. A presença é
presença de um verbo e de mais coisas desse mesmo verbo.

As coisas que pertencem a um mesmo verbo estão unidas na cadeia do ser.

AS SETE FACULDADES HUMANAS


❖ Os Meios de Ações Humanos, não são só três. Existe um homem, material que se decompõe, mas ao mesmo
tempo este homem tem dimensões no seu EU que são imateriais. A sua inteligência é imaterial. As ações que
ele fez, que ele executou, isto está em algum lugar imaterial, isto é ele.
❖ A vida do homem é uma história, é uma narrativa, e a narrativa apesar de ter uma base material e em algum
momento, assim que ela acontece, ela vai para aquele lugar onde está a queda do apontador.
❖ O homem ele age, e vai de uma ação mais material possível, por exemplo, pegar uma folha e rasgá-la com
minhas mãos. Existe outro movimento aqui dentro que você sequer acessa, “acabei de fazer um movimento
aqui dentro, um movimento imaterial - lembrei dos últimos minutos da vida do meu avô, que morreu na minha
frente”. Este movimento é invisível, está por dentro, ele toca realidades, realidades eternas.
❖ Um movimento que acabei de fazer é de movimento, um desejo da justiça, e dizer coisas justas para vocês.
❖ O homem se move, desde aquilo que é mais chão, até aquilo que é mais elevado, que está na fronteira dos
conceitos. Percebam que pensar no conceito de justiça e uma lembrança dos últimos minutos de vida de meu
avô, é humano. Existe também uma fronteira entre o humano e o animal, como pode-se observar nos cães que
sofrem quando seus donos morrem.
❖ O homem tem uma ascensão daquilo que é visível até o invisível também. O que vai do visível até o invisível
tem uma presença numérica. O número sete – 7 é presença disto. O sete indica esta fronteira do visível e o
invisível. Entre o material e o imaterial. Entre este mundo e o outro mundo. Alguns exemplos que já foram
dados: as cores do arco íris, as notas musicais.
❖ O homem tem as sete faculdades. Não é à toa que o grande poeta Dante Alighieri ele tenha feito uma relação
entre os planetas, ou os céus com as possibilidades humanas. Ele fala o seguinte: o homem pode agir desde a
terra até o mundo dos conceitos, que é aquele mundo fixo das estrelas fixas, que quase não se movem. Acima
das estrelas tem uma abóbada negra que esta não se move. É uma realidade profunda, linda e luminosa, que
nos explica muitas coisas.
❖ Dante Alighieri e diversos outros sujeitos, que são agudos na percepção da alma, dos mecanismos das ações
do homem, falam o seguinte: “O homem tem em si, movimentos que são sempre dele e são constantes”. O
homem é material, tem o corpo, mas existe algo que é quase imaterial. E a característica das coisas que são
imateriais é que não mudam.
❖ A fórmula de Bhaskara102, Teorema de Pitágoras 103 , a ‘queda do apontador’, as coisas não mudam. A
proporção narrativa da justiça, da lealdade, do ódio, da traição, da vilania, a proporção narrativa destes

102
Fórmula de Bhaskara é um método resolutivo para equações do segundo grau cujo nome homenageia o grande
matemático indiano que a demonstrou.
103
Teorema de Pitágoras relaciona as medidas dos lados de um triângulo retângulo da seguinte maneira: em um triângulo
retângulo, o quadrado da hipotenusa é igual à soma dos quadrados dos catetos.

442
conceitos não muda, sempre tem a mesma proporção. Para que eu possa reconhecer um ato como de vilania,
de lealdade, de nobreza, não mudam, tem uma proporção.
❖ Existem poucas coisas neste mundo visível que mesmo sendo materiais não mudam, não se decompõem, não
se degeneram. Quais são as coisas deste mundo material, nós somos materiais, o homem é material, mas tem
uma dimensão nele que é quase imutável. Esse é nossos meios de ação.
❖ Dante Alighieri com uma grande precisão psicológica, ele observa o cosmos e fala o seguinte: “Tem coisas
materiais, que não mudam”. Quais são as coisas para mim que não mudam e são circulares? Existem poucas
coisas materiais que não mudam, que são cíclicas.
❖ Você é um terapeuta, você deveria meditar sobre a realidade do cosmos, faz parte do seu trabalho. Quando
um paciente falta, você deveria estar meditando sobre o mundo, não olhando Instagram e FaceBook.

❖ Há quanto tempo você não olha para o mundo, para o céu, por exemplo? O homem contemporâneo que mora
na cidade, talvez não veja o céu há anos.
❖ Ítalo dá um depoimento sobre a importância de observar a grandeza do céu, que foi muito importante para
ele, quando teve experiências de ‘mergulho e alpinismo’. Também relatou as experiências na casa de praia dos
avós, que tinha uma lagoa. Ele nadava, nadava, nadava, e quando cansado, começa a boiar e ficava
observando a beleza do céu, as estrelas, a lua....
❖ O terapeuta precisa ter uma certa acuidade, uma visão aguda destas coisas. Numa grande parte do Brasil, com
exceção do Sul, temos dificuldade de ver as estações mudarem.

443
Existem coisas no mundo que são cíclicas, permanentes e, mesmo sendo materiais, suas mudanças são poucas.

A mudança cíclica abaixo do céu, abaixo da abóbada celeste, é percebida de modo quaternário. São quatro pólos
de mudança, as Estações do Ano.

A estação do ano é a presença das qualidades da matéria: quente, fria, seca e úmida.

O frio e úmido chamamos de Inverno, que dá a mão para algo quente, a Primavera.

A Primavera marca a situação de expansão. A umidade passa a entregar secura ao calor e chegamos ao Verão.

Na secura do Verão, acontece uma mudança de calor para frio, que chamamos de Outono. Isso é um movimento
do homem.

Qualidades da Estações do
Matéria Ano
Frio e Úmido Inverno
Úmido e Quente Primavera
Seco e Calor Verão
Calor e Frio Outono

Nos relacionamentos, no trabalho, em qualquer coisa que está abaixo da esfera celeste é assim, também se
percebe esse ciclo.

❖ Qualquer expressão do homem é assim. Os inícios, no início dos amores, quando conheces uma dama, a relação
vai se tornando cada vez mais quente e mais seca. No início, ou seja, na Primavera dos amores, existe uma
interpenetração do ar, isto é, se envolvem e se identificam.
❖ Se junto dois ‘ares’ estão identificados, fundidos, são as primeiras expressões do amor, entre um homem e uma
mulher, por exemplo. Ocorre que em algum momento, esta umidade vai se tornando secura, mas ainda é
quente. Qual é a próxima etapa do relacionamento amoroso?
❖ Ainda existe a expansão do calor (ou do tesão), ainda existe a energia da expansão, mas aquela umidade, ou
seja, aquela capacidade de um estar fundido com o outro começa a mudar.
❖ Eles voltam a se perceber como indivíduos, mas ainda expandidos. E é onde começam as primeiras crises, as
primeiras brigas, o Verão dos relacionamentos é justamente isto.
❖ Aí iniciam os primeiros desafios, isto é, as duas identidades que voltam a se perceber ‘eu como eu’ e ‘ela como
ela’, começam a enfrentar o frio, ou seja, não existe mais a expansão, existe um mergulho na interiorização
que o frio produz. São os Outonos dos relacionamentos.
❖ O Outono dos relacionamentos é justamente aquele momento no qual, cada um dos dois, se percebendo como
uma individualidade, sem a loucura do calor, do tesão, voltam a se perceber como indivíduo em suas vidas,
começam a recolher as experiencias que a Primavera e Verão vividos em comunhão deixou em cada um deles.
É aqui que é a prova de fogo dos relacionamentos.
❖ O Outono dos relacionamentos é: cada um vai observar em si os efeitos que aquele relacionamento
deixou neles. E é aqui que tem as decisões do tipo: ‘Vamos continuar ou não vamos continuar? A comunhão

444
que o ar produz, esse tesão do Verão, deixou em mim ou eu deixei em você marcas que fazem sentido para
que continuemos juntos?”
❖ Uma vez passado o Outono dos relacionamentos, chegou o Inverno. A coisa ainda é fria, mas volta uma
umidade. Isto é, agora voltamos a nos identificar, não com a identificação que ‘eu não me reconheço sem
você, você não se reconhece sem mim. Agora eu me reconheço profundamente enquanto eu você e você
se reconhece profundamente em você. A coisa ainda é fria, mas a umidade volta e há uma recomunhão
entre as pessoas. E este é o ciclo de maturidade dos relacionamentos.
❖ Este é um exemplo que usei de relacionamentos, mas qualquer coisa que está abaixo da abóbada celeste
funciona assim. Isto é símbolo. Nos trabalhos também são assim.
Para cima da abóboda celeste, existem outras coisas materiais e constantes.

❖ Por cima da abóbada celeste, Dante Alighieri e os poetas, e os homens de profunda acuidade espiritual,
não no sentido religioso, mas que está olhando para a matéria com a causa final, causa eficiente e formal,
percebem que acima do céu azul existe os corpos girantes.
A primeira delas é a Lua. Por ainda estar próxima da abóbada celeste, ela tem uma constância que aumenta e
diminui: é Nova, Cresce, torna-se Cheia, depois Míngua e o ciclo continua.

Acima da Lua, percebemos outros planetas girantes: Mercúrio, Vênus, Sol, Marte, Júpiter e Saturno.

Eles são associados simbolicamente às possibilidades de manifestação do homem.

A primeira classificação ternária (cabeça, coração e braço) pode ser expandida de modo mais agudo e preciso
para a classificação de sete faculdades ou meios de ação.

❖ Os psicólogos agudos, os poetas superiores, os homens de espírito, os místicos, inclusive, associaram


simbolicamente estes 7 planetas, com as possibilidades de manifestações do homem.
❖ O terapeuta quando está diante de uma pessoa, ele tem que pensar o seguinte: ‘estes movimentos são muito
terrenos, como se fosse a mudança de estações de ano. E para cima, o homem tem sete Meios de Ação, até
que ele chegue no limite colado com o mundo dos Conceitos, o mundo da Transcendência Fixa e Estática.
À primeira faculdade, representada pela Lua, chamamos Sentido Comum.

2) Mercúrio: Razão;

3) Vênus: Apetite Concupiscível;

4) Sol: Vontade;

5) Marte: Apetite Irascível;

6) Júpiter: Intelecto Ativo;

7) Saturno: Intelecto Passivo.

445
❖ Isto aqui não é Astrologia é a Estrutura do Mundo, é Simbólica. Nos encontros das sessões clínicas, que
acontecerão periodicamente, para que tirarmos as dúvidas e vendo como estas coisas podem ser usadas na
clínica. Mas se não temos este conhecimento básico, se não temos a capacidade de fazer uma abertura
simbólica, nunca entenderemos o ser humano. A visão do ser humano será muito pequena.
❖ Quando uma pessoa entra em nosso consultório, tenho que perceber o seguinte que ele tem movimentos
interiores que são análogos, semelhantes , são presença, ou estão unidos na grande cadeia do ser, como os
movimentos das estações do ano. E para cima disto tudo, ele tem movimentos que são análogos, são parecidos
com esta ascensão, esta escala simbólica dos planetas. Isto não é Astrologia, isto é simbólica.
❖ As coisas que você despreza (Astrologia, Tarô), era conversa do Jung, ele estudou estas coisas. Era isto que ele
e Freud queriam saber: ‘Existe liberdade humana, ou o homem está condicionado pelas cartas ou pelos astros?’
❖ Então é evidente que um psicólogo contemporâneo, um psicólogo que está querendo dialogar, conversar e
compreender o que está no consultório, e sobretudo entender a alma do Freud, a visão do Jung, tem que
entender que Freud estava dialogando com a tradição mística. Quando Freud fala sobre Id, Ego e Superego,
ele está falando de um conceito da astrologia,
❖ Platão falava deste conceito com a carruagem, ou a Biga do Platão 104. A carruagem tem uma estrutura: tem
os cavalos, Platão falava do cavalo negro e cavalo branco, tem um cocheiro e um rei ali dentro da diligência. O
rei é o Sol, ele não aparece, mas está lá. O cocheiro é aquele pelo qual o reino novo, ou seja, é uma diligência,
um rei vai a um novo reinado. O rei vai com sua diligência e seu cavalo e o novo reinado quando vê aquela
diligência real chegando do reino vizinho, ele toma as qualidades do reino, não pelo rei que está dentro
escondido, mas pelo cocheiro. Isto é o Ascendente e
os cavalos são a Lua. Isto que Freud chama, pois
tentou dar uma cientifizada, de ID, Ego e Superego.
❖ A estrutura ternária psíquica do Freud é uma conversa
com a estrutura tradicional, tão antiga quanto o
mundo destes conceitos astrológicos.
❖ Aqui não vou falar de Tarô, Astrologia, Alquimia, vou
falar dos Meios de Ação do Homem. Alquimia e Tarô
são outras coisas. Mas isto aqui temos que falar:
Senso Comum, Razão, Apetite Concupiscível, Vontade, Apetite Irascível, Intelecto Ativo e Intelecto Passivo. É
isto que os homens usam para agir no mundo.
❖ Existe um homem sublunar, que é o das estações e existe um homem que está para cima. E ainda existe um
homem que está por baixo, que é o céu sublunar, que é o homem que se decompõe e degenera.
❖ O homem que se decompõe e degenera ele é objeto da Medicina. A medicina olha a parte do homem que se
decompõe e degenera, não olha o homem sublunar.

104
Biga de Platão: Platão cria a imagem de um condutor guiando uma biga puxada por dois cavalos. O condutor da biga
representa o intelecto, a razão ou a parte da alma que deve guiar o espírito à verdade; o cavalo branco representa o impulso
racional ou moral ou a parte positiva da paixão (e.g. indignação correta); o cavalo preto representa as paixões irracionais da
alma, o apetite ou a natureza concupiscente. O condutor dirige a biga/alma tentando impedir que os cavalos sigam direções
opostas e que sigam rumo à luminosidade.

446
❖ A Psicologia, neste sentido, é uma ciência superior a Medicina. O fato da Medicina ser mais valorizada do que
a Psicologia, já é um sintoma de nosso tempo, que valoriza mais o aspecto material, do que o aspecto da Causa
Final e Formal do homem. A
disciplina da Psicologia é superior a
Medicina da Psicologia, no sentido
Ontológico.
❖ O sistema é Geocêntrico ou
Heliocêntrico? Isto é uma bobeira,
depende do referencial. O
referencial é que sempre foi
Heliocêntrico.
❖ Para mandar foguetes para Lua é
usado o Geocêntrico. O cálculo é
mais elegante tomando a Terra
como referência do espaço. A Nasa,
para certas funções ela utiliza o referencial Geocêntrico.
❖ Tradicionalmente falando o referencial usado sempre foi o Heliocêntrico. Existe uma série de preconceitos
acerca do referencial, não entrem nesta discussão...
❖ O referencial é Heliocêntrico porque destes planetas todos, o Sol, simbolicamente, sempre foi posto do lado de
fora. O Sol é um planeta que ilumina, em primeiro lugar a Lua. E estes são o Rei e a Rainha do nosso sistema
de orientação. Metade do dia é governado pelo Sol e metade do dia pela Lua. A noite, a Lua é o sistema de
referência e no dia o Sol é o sistema de referência.
❖ Mercúrio, que é o segundo planeta mais próximo da Terra, que também é iluminado pelo Sol, todos os planetas
são iluminados pelo Sol, só que são fraquinhos, o que é mais forte é a Lua. Depois temos mais dois planetas,
Vênus e Marte.
❖ Tradicionalmente os planetas são representados por círculos, semicírculos e cruz.
O Sol ilumina todas as Faculdades Humanas, e ele é Símbolo da Vontade, ou seja, a Vontade ilumina os Meios
de Ação. Curiosamente, a Vontade cresce em nós conforme tomamos posse das nossas Faculdades Humanas.

TRÊS NÍVEIS DA REALIDADE


A realidade aparece em três níveis.

O nível de proporções Materiais, que se pode chamar de beleza ou estética, e é capturado pelo Senso Comum e
pela Razão.

❖ Quando as proporções materiais aparecem, existem duas pinças, existem duas faculdades que estão pegando
esta realidade que posso chamar de Beleza ou Estética. Ou seja, a proporção do mundo ela é capturada pelo
Senso Comum e pela Razão, iluminadas pela Vontade.
A segunda camada é a de captura do Bem e do Mal, a Moral. São os Apetites Concupiscível e Irascível os
responsáveis por esse aspecto.

447
❖ A segunda camada do mundo que aparece não é proporções apenas, mas é o Bem e o Mal , que é a Moral.
Quem captura o que é o Bem e o Mal, deste limite entre o aspecto Formal e o Aspecto Final, ou seja, será
quando me relaciono com um ente (o lápis), estou tocando na finalidade dele? Quem em mim percebe isso são
os apetites Concupiscível e Irascível, Vênus e Marte.
❖ Em alguma oportunidade, iremos para uma ‘laje’ e iremos olhar para o céu. No céu vou te indicar ou apontar
(fazer um estudo do céu) onde estão os planetas, para vocês fazerem uma meditação da qualidade de
movimentos, da qualidade de brilho, de luz de cada um deles. A partir daí, ter uma intuição de presença real
sobre você . Este é o trabalho do terapeuta.
❖ O terapeuta que não tenha feito esta correlação simbólica entre a presença dos planetas e ele mesmo, ele
ainda não tem a formação total. Se ele está diante de uma pessoa , ele tem que ver nesta pessoa se ela está
brilhando e se movendo de um certo modo.
❖ Tem uma forma que ela captura a Beleza, tem uma forma que captura o Bem e o Mal, que é aos moldes da Lua
e aos moldes de Mercúrio, aos moldes de Vênus e aos moldes de Marte. Este é ofício do terapeuta, esta são
as ferramentas do terapeuta.
❖ Dr. Jung quando dava palestras na Suíça, na década de 30 / 40, ele lotava auditório com umas 600 pessoas que
vinham da Europa inteira, e ele fala de ‘mandalas’ o tempo todo. Falava da origem do universo e da dimensão
simbólica disto com o ser humano.
❖ Dr. Jung e eu não falamos a mesma coisa. Isto que estou ensinando é minha Psicologia.
❖ Quando estou olhando para o céu, estou vendo os movimentos constantes do ser humano, aquilo que é
estável nele. Existe uma correlação simbólica entre Marte e ‘eu’. Isto não é astrologia, isto é a estrutura do
mundo, isto é o símbolo.
A dimensão intelectual captura a Verdade e a Falsidade; as faculdades são os Intelectos Ativo e Passivo.

A função da Vontade é iluminar as Inteligências, os Apetites, a Razão e o Senso Comum.

Essa luz cresce à medida que desenvolvemos cada uma dessas faculdades; por isso, é necessário que o terapeuta
saiba desenvolver as faculdades inferiores (Senso Comum e Razão), com exercícios para apreensão da Beleza, da
Estética.

Quando essas faculdades são uma base sólida, o indivíduo consegue dar um substrato para os apetites
Concupiscível e Irascível e distinguir o Bem e o Mal, ou seja, o melhor e o pior em cada situação; passa a ter uma
vida moral, ética.

❖ Na dimensão estética, o indivíduo começa a ter uma primeira vida de ‘Organização’. Ele conhece a ordem do
mundo, ele se organiza, começa a colocar as proporções em ordem.
❖ Depois tem uma vida Moral, ele começa a escolher o que é Melhor e Pior, o Bem e o Mal. Tem uma vida ética,
que não é tudo ainda.
❖ Quando o sujeito tem uma base Ética, uma base Moral ele começa a distinguir não só o Melhor ou o Pior,
mas o que é Verdadeiro e o que é Falso.
Em seguida, ele começa a distinguir o Verdadeiro e o Falso, a ter uma estrutura mais próxima das Estrelas fixas,
da Transcendência, dos Conceitos.

448
Quando o homem desenvolve a atividade intelectual, passa a ter uma vida de Amor e Caridade.

❖ O mundo oferece para o homem as possibilidades de Beleza, ou seja de Organização, as possibilidades do


Bem e do Mal e as possibilidades do Verdadeiro e do Falso. São as linhas que ele usa para costurar.... Aqui
está a imagem que quero que os terapeutas tenham em mente: já falamos de amadurecimento, de
personalidade. O que é a personalidade?

CONCEITOS

Intelecto
P Verdade Intelectual
Falsidade
A
= Amor
Apetites

I Bem
Moral = Ética
Mal
Vontade C

Razão
Beleza – Estética = Organização

Senso Comum
Estética

A Personalidade é como um bordado feito em um pano.

❖ A personalidade é um bordado que é feito em você. Você é como se fosse um pano e as agulhas são as
faculdades (Senso Comum, Razão, Apetites e Intelectos).
O bordado é feito com algumas agulhas, que são as faculdades.
As linhas são as estruturas do mundo: Estética, Moral e Intelectualidade.
Simbolicamente, essas linhas podem ser de Chumbo, Prata ou Ouro.

449
❖ Aqui eu já trago um outro símbolo, que é da Alquimia, mas não será discutido aqui, que foi um símbolo
extensamente tratado por Jung. Ele tem dois livros muito completos sobre Alquimia.
O Chumbo é o metal mais próximo do mundo; a Prata tem a característica que demonstra a possibilidade do Bem
e do Mal: ela pode estar tão próxima da materialidade que parece chumbo, ou tão longe que beira a pureza do
Ouro.

❖ Este é o princípio da simbólica alquímica.


É como se o mundo sempre nos oferecesse três linhas para a tessitura da personalidade: com fios de Chumbo,
quando somos toscos e só temos o Senso Comum e a Razão funcionando; com fios de Prata, se começamos a
desenvolvemos os Meios de Ação; com linhas de Ouro, se desenvolvemos as agulhas do Intelecto.

❖ Existe uma técnica para desenvolvermos os Meios de Ação, iremos discutir intensamente nas sessões clínicas
e conseguir capturar as linhas de Prata e bordar uma personalidade que seja mais semelhante àquilo que dura,
um metal mais nobre.
❖ E finalmente podemos pegaras agulhas do Intelecto para bordar uma personalidade com linha de Ouro .
A aula anterior expôs que podemos estar na dimensão do Fazer, do Desejar ou do Conhecer.

❖ É importante a gente sempre puxar o nosso paciente, e a gente mesmo, isto é autoterapia também. Não é que
o terapeuta precisa fazer terapia, ir ao setting terapêutico etc., mas ele tem que ter um exercício de autoterapia
constante.
❖ O terapeuta tem que se investigar profundamente, e estas são ferramentas muito práticas e eficazes, são
ferramentas, por assim dizer, muito mais sofisticadas do que as ferramentas da Psicanálise oferecem.
❖ Dr. Freud oferece pra gente, em primeiro lugar, uma visão de mundo reduzida do que essa que estamos
avaliando e investigando.
❖ Dr. Freud oferece pra gente no seu aparelho psíquico, três..., ele tem uma divisão ternária do seu aparelho
psíquico, falando do Id, Ego e SuperEgo, ele fala de outras coisas que não são estruturais. A Psicanálise é ótima
para algumas coisas, mas é insuficiente para muitas outras.
❖ Muito do que estou apresentando aqui para vocês, esse sistema, esse modelo simbólico, abarca, isto é, cabem
as diferentes linhas de psicologia aqui dentro.
❖ Por exemplo, quando estou falando de Terapia Cognitiva Comportamental ou Behaviorismo, ficam localizadas
na Razão, está desenvolvendo esta faculdade.
❖ Quando estou falando da Psicanálise Freudiana, ela está focada com o aspecto do Apetite mais baixo,
Concupiscível , que é onde se dá a energia da libido . Ela aparece em toda esta dimensão (Ítalo aponta para a
linha horizontal - Apetite Concupiscível no modelo simbólico), mas não em toda a dimensão do homem (Ítalo
faz um tracejado vertical no modelo simbólico).
❖ Quando o sujeito fala de Logoterapia, ela está no Intelecto Ativo.
❖ O Coach está na fronteira entre o Apetite Concupiscível e o Apetite Irascível.
❖ As abordagens quânticas, as abordagens astrológicas, por exemplos, estão aqui.... (a filmagem não mostrou)
❖ Um dos grandes problemas da Psicologia Contemporânea é a sua epistemologia. A dificuldade de conversa
entre o Junguiano e Freudiano, o esotérico quântico, o logoterapeuta, o espiritualista, eles ignoram toda a
horizontalizado e verticalidade do ser humano (Ítalo apontando para o Esquema Simbólico).
450
❖ O médico, está trabalhando numa dimensão sublunar e abaixo das estações.
O conteúdo apresentado nesta aula se une a ele, de algum modo. O método simbólico abarca diferentes linhas
de psicologia.

451
SEMANA 12.2 – A PERSPECTIVA SIMBÓLICA DAS ESTAÇÕES DO ANO
Esta aula apresenta os aspectos simbólicos das estações do ano e um itinerário de amadurecimento a partir de
suas etapas.

AS ETAPAS DAS ESTAÇÕES

O que acontece debaixo do céu sublunar é importante para que nós possamos entender a evolução cíclica da
história material do homem.

❖ Existem as faculdades humanas, cuja Lua e depois Mercúrio, Vênus, Sol, Marte, Júpiter e Saturno, e por
baixo deste céu sublunar, existe uma ciclicidade, que tem a ver com a realidade material e portanto total
do homem.
Temos, simbolicamente falando, as estações do ano: Primavera, Verão, Outono e Inverno. Podemos tomá-las
como símbolo da ciclicidade humana.

❖ Isto será um símbolo da ciclicidade do homem. Como vimos o exemplo do relacionamento do homem,
começa com um polo frio e a ‘coisa’ vai aquecendo e o calor entrega para o Verão uma secura e ‘as coisas’
continuam assim neste sentido.
O ciclo do homem pode ser entendido desde o início primaveril, passando pela maturidade do Verão, o confronto
do Outono e a cristalização do Inverno.

❖ Isto de algum modo é Símbolo da vida do homem.


Cada estação tem início, meio e fim, e cada uma das etapas tem uma característica.

❖ Simbolicamente falando porque isto acontece por


baixo do céu sublunar, isto também é um símbolo da
progressão do homem. Isto é uma das formas de ver
o ser humano e faz parte do nosso método.
❖ No início da Primavera..., o que acontece.... ouve a
história, vamos ver de um modo simbólico, de modo
narrativo e simbólico. A realidade material é assim,
Ítalo? É evidente que não. A realidade material não
é assim. Tudo que é material evoca um verbo e este
verbo está em conexão com outros verbos e isto
participa da grande cadeia do ser. Então
materialmente falando, existe uma mudança no que
está por baixo do céu sublunar e o homem está por
baixo do céu sublunar também.

452
❖ No início da Primavera, existe uma primeira manifestação do nascimento, então simbolicamente falando,
o Inverno ele é a morte. O Inverno cobre as possibilidades, o Inverno ressaca, ele faz com que todas as
vegetações estejam contraídas e na Primavera aparecem os primeiros brotos.
No início da Primavera, há uma primeira manifestação de nascimento, em que aparecem os brotos. O início da
Primavera é um convite a sair.

❖ A Primavera retoma o início do ciclo. A Primavera é como uma ignição. O início da Primavera é a
ignição do que vai acontecer daqui para adiante.
❖ No início da Primavera, aqueles que estavam dentro de suas casas no Inverno, saem pela primeira
vez quando o sol brilha e o sol brilha de uma maneira específica na Primavera.
❖ Quem já passou pela Primavera sobretudo no Hemisfério Norte onde as estações do ano são mais
bem marcadas, o início da Primavera é sentido fisicamente. Então num certo dia parece que você
tem um convite para ficar dentro de casa e no outro dia, no início da Primavera, o sol brilha de
um certo modo e ele te convida para sair.
❖ Ele te convida para sair para limpar o terreno, tirar os gravetos que ficaram jogados ao longo do
Inverno, que você não pode cuidar da vegetação, pois estava muito frio, o gelo derretendo.
❖ O início da Primavera é um início de convite a saída, um convite a aparecer. E dependendo de
como a Primavera comece, vai se dar todo o restante das estações do ano e dos ciclos.
❖ O início da Primavera é uma ignição. O início da Primavera é uma esperança. O início da
Primavera ainda não determinou o que vai acontecer, mas ele te dá uma energia de início, uma
energia frágil ainda. Frágil, por quê? Sobretudo porque você está desgastado pela desesperança
que veio do Inverno, mas você age porque o sol brilhou.
❖ Entenda que isto é a relação simbólica do itinerário do que acontece, do que pode acontecer
simbolicamente com o homem.
No segundo momento da Primavera, o terreno está quase limpo, passasse a cuidar da terra e plantar sementes;
é um momento de cuidado material.

❖ O terreno está cuidado com o que você fez no início da Primavera e você vai cuidar do terreno,
materialmente falando. Você vai pegar seu campo, você vai começar a arar o campo , você vai
cuidar da terra, vai plantar as sementes. É o cuidado material, o cuidado com o corpo do terreno.
O terceiro momento da Primavera é aquele em que já se trabalhou, então vai-se à rua para falar sobre o que
aconteceu, o Inverno, as sementes plantadas. É um falar baseado na realidade, mas de projetos e projeções.

❖ É um dos momentos mais gostosos do ano. Então você já cuidou, já teve a primeira ignição da
Primavera, você trabalhou, você olhou para o solo, olhou para o corpo, olhou para as sementes,
enterrou as sementes, cuidou do que está no terreno e está um clima delicioso. Não está aquele
clima seco do Verão, um calor extenuante do Verão, o seu trabalho está feito e o que você vai
fazer? Você vai se encontrar com as pessoas que também estavam nas suas casas.
❖ Estou contando uma história simbólica do homem tradicional com as estações do ano. O Homem
sai a rua, ele sai para falar o que aconteceu, ele conta as coisas, ele fala como foi o inverno para
ele, ele fala como foram as sementes que ele plantou, ele fala como estava a qualidade do solo,
453
ele começa inclusive a projetar sobre a colheita, porque consegui plantar tantas sementes, parece
que o solo está bom....
❖ Ele já começa fazer algumas negociações, por assim dizer, conversa sobre a família. Ele fala. É
um falar baseado realmente na realidade, mas é uma coisa que ainda não apareceu como
realidade, são projetos, projeções.
O Verão começa e existe uma precipitação das chuvas; o sujeito volta para casa para cuidar de seu terreno.

❖ O que acontece, aquela limpeza no terreno, aquela ignição inicial, um plantar as sementes no
terreno , as negociações feitas, as projeções feitas, o que a pessoa contou para os amigos, precisa
agora ser cuidado, porque podem vir os bichos, podem vir as chuvas.
❖ Então o sujeito volta para casa, sai da ‘praça’ e volta para seu terreno para cuidar, para espantar
os bichos. Começam a nascer os primeiros brotos, espantam os bichos, cuida das chuvas, ele fica
cuidando do terreno, como se criasse uma carapaça no terreno e cuida de uma parte mole, de
uma parte frágil que está ali dentro.
No segundo momento do Verão, começam a aparecer os brotos do que foi plantado.

❖ A semente é tudo meio parecido, então se eu plantei milho é somente no meio do Verão que o
milho se exibe. Se plantei figo, é somente no meio do Verão que o figo será exibido. Se plantei
uva, é no meio do Verão que vão surgir os primeiros brotos da uva.
❖ É pelo fruto que a gente reconhece as árvores. As folhas até podemos reconhecer, mas é o fruto
que dá a qualidade mesma do que foi plantado.
❖ Então no meio do verão existe um princípio de exibição de demonstrar aquilo que foi plantado.
No final, os grãos são contados, organizados, ensacados.

❖ No final você pega aquelas plantas, aqueles grãos, você colhe e você ensaca, você organiza aquilo
tudo. Você ensaca, organizando aquilo tudo dentro dos sacos, do paiol, você conta e depois você
já tem os sacos prontos e vai negociar.
❖ Então o início do Outono é o seguinte: agora preciso começar a recolher dinheiro....
O início do Outono é o momento em que é o momento em que se percebe que é necessário recolher dinheiro,
negociar, porque o Inverno de aproxima.

❖ Você vai ter que pesar, que medir, você vai tentar negociar o preço justo das coisas.
Depois, o sujeito pega o dinheiro e o guarda, cuida do que veio da troca.

❖ Depois que negocia, você pega o dinheiro e guarda, aquilo é teu. Guarda com um certa...., não
como um egoísmo, você guarda e cuida daquilo. Você não deixa que as pessoas cheguem perto
daquilo.
❖ O Inverno está chegando, o Outono é sempre uma expectativa da vinda do Inverno. É no Outono
que você vai negociar e depois que você negociou, você vai guardar não mais o fruto, guarda o
dinheiro, aquilo que veio da troca. Aquilo é teu, não é mais de ninguém.

454
No fim do Outono, planeja-se o aquecimento para o frio do Inverno; o dinheiro é gasto com coisas úteis.

❖ Você precisa aquecer para o que está vindo, aquele aquecimento é importante. Você precisa
comprar e organizar tua casa, não de modo egoísta, de modo que tua família, apontando,
projetando um calor que vai tentar vencer o que acontece no inverno.
No início do Inverno, o sujeito se fecha em casa; sempre que precisa fazer algo, é rapidamente, por causa do frio.

❖ Você se fecha como se fosse dentro de uma pedra, da tua casa. Sempre que você tenta sair, para
fazer alguma coisa, você precisa voltar, porque está frio.
❖ Depois que leva essas ‘pancadas’ do frio do inverno, as coisas começam a acabar, vai ficar uma
carestia. Você começa a ficar preocupado, pois não sabe quanto tempo este inverno irá durar.
Não sabe se este inverno será mais robusto ou não que o anterior. Tento sair para fazer alguma
coisa, eu projeto, eu calculo, eu preocupo, mas preciso voltar porque o frio é implacável.
No meio do Inverno, o frio é implacável, não adianta tentar sair; porém, começa-se a lembrar que os Invernos
acabam, o elemento de ar (conversa) volta a aparecer entre as pessoas da casa, em uma conversa de sabedoria.

❖ Você tentou sair, mas não conseguiu. Você começa a voltar a conversar com as pessoas, uma
conversa de sabedoria, dizendo, ‘o inverno vai acabar, precisamos estar unidos pela conversa,
porque a ação não deu certo, não adiantou, não adianta eu querer colher no inverno.
❖ O Inverno não é tempo de colher, o Inverno é tempo de voltar. Simbolicamente podemos pensar
que, estas conversas são orações, é uma conversa de esperança, de sabedoria.
❖ E acontece uma coisa, no final do Inverno que é muito bonito.
No final do Inverno, o gelo começa a derreter; há aí uma dualidade de mistério, a morte e vida ao mesmo tempo.

❖ Eu tive, na última viagem possível, dia 10 de março de 2020, no início da pandemia, eu estava lá
em Portugal, era final de Inverno, no Hemisfério Norte, e eu passei pelo Porto, subi para ‘Liseu’,
que é a terra de minha família, foi a última vez que vi minha tia, que não a via há 34 anos, irmã
de minha mãe que mora em Portugal, minha mãe estava lá, minha irmã estava lá e achei que
precisava ir, peguei o avião e fui e sem planejar fui. Peguei o carro no Porto e subi para ‘Liseu’
passando pelo Douro e no alto do Douro tem uma série de vinícolas que foi uma das visões mais
belas que vi, e eu também estava bastante emocionado porque estava revendo minha família de
sangue, minhas tias, meus tios de Portugal que não via há tantos anos. Eu estava com olhar
poético para aquilo tudo. Parei o carro no acostamento, entrei naquelas vinícolas e as videiras
estavam negras, mortas no final do Inverno. Mas quando você chega perto delas, muito perto
delas, você percebe que elas não estão mortas. Que pequenos brotos verdes começam a aparecer
ali.
❖ Então o final do Inverno ele encerra uma dualidade do mistério que é a morte e a vida no mesmo
tempo.
❖ Você vê aquela vinícola, que distante parece que morreu porque não tem mais espírito e quando
você chega perto, você precisa ter um olhar poético, você olha para aqueles brotos pequeninos

455
eles estão puxando do âmago da terra com toda a esperança que aparece depois, plenamente no
início da Primavera.
❖ Esta é a conversa simbólica das mudanças das Estações e se você perceber os antigos deram
nomes para estas etapas aqui. Eles deram nome para marcar as mudanças de estações.
Os antigos deram nomes a essas etapas, à mudança das estações: Áries, Touro, Gêmeos, Câncer, Leão, Virgo,
Libra, Escorpião, Sagitário, Capricórnio, Aquário e Peixes.

Não se trata de astrologia, mas da evolução simbólica de um ciclo, um modo simbólico de ver os ciclos humanos.

❖ Isto não é astrologia, mas a conversa simbólica de um ciclo, que começa com a esperança, passa
pelo cuidado com a terra , vai para a conversa, cuidado com os frutos, exibição dos frutos,
separação meticulosa destes frutos, negociação, apego material, aquecimento para o inverno,
tentativa material que vai para fora escorrega e volta, retorno da palavra com sabedoria,
dualidade entre morte e ressureição e volta para Áries.

Tudo, desde construir uma casa ao projeto de uma vida, passa por aqui.

❖ Isto é um modo simbólico de ver um ciclo humano. Todos os ciclos humanos, projetos, deste um
pequeno projeto, a concepção de construir uma casa, um projeto pontual no seu trabalho, até o
seu projeto, ‘História Pessoa da sua Vida’ passa por este ciclo.
❖ Um terapeuta que não visualize que isto aqui Isto é uma história de amadurecimento dos ciclos,
é uma história de amadurecimento vital, este terapeuta terá uma visão bastante diminuída do
que é um homem. Ele não consegue entender o que é um ciclo vital.

456
AS ESTAÇÕES E O AMADURECIMENTO

❖ Lá atrás, na aula 2 ou aula 3 eu falei dos quatros tipos de intelecto, quais eram as quatro camadas
que eu estava falando ali. Estava falando das camadas destacadas com azul.

❖ Lembram daquele esquema das bolinhas azuis e vermelhas, o que eu estava falando ali? Eu
estava falando ?
Na quarta camada, ou quarta etapa de desenvolvimento, ainda existe uma imaturidade completa; o sujeito ainda
não sabe, porque não apareceu fruto.

❖ Na 4ª. camada só tem bolinhas vermelhas .

457
Quando o fruto aparece, a sensação é de que se sabe (quinta).

❖ Lembram que falei que o fruto aparece na quinta etapa? Quando o fruto aparece, EU SEI!
❖ Na 5ª. camada, tem duas bolinhas vermelhas e uma azul. Então eu sei qual é o fruto.
Depois, aprende-se qual é o fruto e deseja comercializá-lo, ter seu resultado (sexta).

❖ Na 6ª. camada, tem duas bolinhas vermelhas e uma azul. Eu sei qual é o fruto e eu desejo
comercializá-lo, eu desejo ter o resultado.
Na sétima, já se sabe qual é o fruto, ele já está ensacado e é vendido.

❖ Na 7ª. camada, eu já sei qual é o fruto, eu ensaquei e agora eu vendo. As bolinhas são todas
azuis.
❖ As primeiras etapas (1, 2 e 3) são uma preparação, para que ele possa contornar, ele está
tentando contornar o terreno dele, que é o início do contorno do terreno dele.
As três primeiras etapas são a preparação para que o sujeito possa ter um retorno. Ele está tentando contornar
o terreno, e o primeiro contorno advém da sabedoria acerca das sementes que vingaram ou não vingaram; é a
primeira experiência de força.

❖ Como posso contornar direito um terreno, se não sei o que é Joio e o que é Trigo. É somente na
5ª. etapa é que aparece o joio e o trigo, eu sei quais são as plantas que vingaram e as que não
vingaram. Está aqui o primeiro contorno. Estou tentando, é aqui, eu acho que... Tem a primeira
experiência de força. Aqui eu acho que vou conseguir vender. Eu acho que vou ter recursos para
enfrentar o que será o final do Outono e o início do Inverno.
A depender da negociação da sétima etapa, haverá vida ou morte.

❖ Dependendo da negociação que eu faça na 7ª etapa, eu vou ter vida ou morte. A experiência de vida ou morte
só aparece na 8ª. etapa, porque se eu negociei mal e vendi mal, eu vou morrer, não terei recursos para passar
o inverno.
A experiência de vida e morte aparece apenas na oitava, porque se o sujeito negociou e vendeu mal, vai morrer
de frio, sem lenha para iluminar, aquecer, agir no calor e na luz; vai, enfim, perecer. Sem tudo isso, é impossível
visualizar a dualidade entre ressurreição e morte, o retorno do ciclo.

❖ É na 8ª. etapa que aparece o homem diante da morte. Depois que aparece a morte, se negociei e vendi mal, eu
posso morrer, vou morrer de frio. Não terei lenha para iluminar a 9ª. etapa.
❖ E se eu não ilumino, eu não aqueço, não consegui agir (10ª. etapa) no calor e na luz.
❖ E se eu não ajo no calor e na luz, eu vou morrer, vou perecer (11ª. etapa), não vou deixar uma ação histórica.
❖ E se eu não consigo fazer isto tudo, não consigo visualizar aquela dualidade (12ª. etapa), entre a aparência de
morte e ressureição.
❖ Em regra, pegamos pacientes nas etapas 4 e 5 . Talvez vocês peguem pacientes na 6 e 7 e alguns vão chegar
na 8ª., mas é mais raro.

458
❖ Quero que vocês prestem bem atenção nesta explicação dos ciclos novamente. Vocês perceberam que deixei
as etapas 1, 2 e 3 em aberto. Falaremos disso tudo nas sessões clínicas, nas sessões acadêmicas, ou no PBL
(Program Based Learning105).
❖ Quando vocês colocarem as questões para mim, quando vocês colocarem os casos clínicos para mim, irei
transformar tudo em exercícios. Vamos ter muitos encontros, com muita periocidade, muito intensos e muito
práticos.
❖ Nesses encontros, iremos retomar tudo o que a gente aprendeu nas primeiras semanas, iremos ver as questões
biológicas, as questões das crenças, a questão do ato, a questão do figurino. Vocês aprenderão como fazer
súmula direito, mostrar como faz súmula, tudo que foi visto.
❖ Aí iniciaremos no método, o que o sujeito precisa saber, o que ele precisa desejar, como vai agir, vamos localizá-
lo dentro do ‘Ciclo de Maturidade’. Entenda que isto aqui, não é algo que fecha, não é um rótulo, nem uma
imposição , isto aqui no fundo é de abertura de um esquema total.
Esse é um esquema total, o doze é símbolo da totalidade, de tudo o que é completo, tanto no mundo concreto,
quanto no transcendente.

❖ Vou ver os pacientes com vocês nas sessões clínicas e uma das primeiras coisas que iremos fazer, para podermos
nos habituar com nosso método é chegar aonde este paciente está no ‘Ciclo de Maturidade, ou no Ciclo de
Evolução, ou no Ciclo de Motivação’.
❖ O que agora apresentei de modo simbólico e bastante compacto, iremos expandir ao longo das sessões e dos
encontros.
❖ Vou expandir de que modo, vamos imaginar que o sujeito está na 4ª. etapa da evolução, que tenha tudo
vermelhinho, o que este sujeito precisa saber para ir para a 5ª. camada, o que ele precisará saber e desejar
para ir para a 6ª. etapa e depois o que ele precisa desejar e fazer para ir para a 7ª. etapa, e como ele confronta
com isso tudo com essa realidade de poder perecer (8ª. etapa) diante do frio que irá aparecer lá na frente .
❖ Estas etapas de amadurecimento são fundamentais para entender o método. E uma coisa que é muito
interessante: cada uma das escolas de psicologia que você aprendeu na faculdade, elas tratam de um desses
aspectos do Ciclo da Maturidade.
Cada escola de psicologia trata de um desses aspectos.

❖ Para os místicos, Astrologia, ele fala da entrada no mundo. 1ª Etapa.


A Astrologia fala da entrada no mundo.

Os sujeitos que fazem Constelação Familiar falam sobre o cuidado com a terra.

105
PBL: é a construção do conhecimento a partir da discussão em grupo de um problema. Essa metodologia ativa de ensino
vem ganhando muito espaço entre os educadores nos últimos tempos – principalmente em faculdades de medicina. A
Universidade McMaster, no Canadá, e a de Maastricht, na Holanda, foram as primeiras a adotá-lo, lá em 1969. Desde então,
ele vem sendo implantado em importantes escolas de diversas áreas mundo afora.

459
❖ Constelação Familiar usam o método Lipot Szondi 106, estão falando da 2ª. etapa, do cuidado da terra, da
separação genética, por assim dizer, da separação em famílias das sementes e como você planta essas
sementes em famílias nos solos adequados para aquela família de semente se desenvolva. O cultivo de
morango é diferente do cultivo de figo que é diferente do cultivo de tangerina. Preciso estar de fato atento a
genética, ou a hereditariedade daquela semente para poder relacioná-la com um solo mais perfeito de
desenvolvimento.
Na terceira etapa, começamos a falar; há uma série de dificuldades de aprendizado e fala, que fazem com que
as pessoas não consigam conhecer as coisas.

❖ Existem uma série de dificuldades do ser humano, aqui nesta terceira etapa e vai carregando, que faz com que
não consiga conhecer as coisas. Talvez eu investigue durante as sessões clínicas o problema deste paciente que
você está me apresentando, é problema de aprendizado, de fala , de negociação anterior.
Depois, o sujeito volta para dentro da terra, cuida daquilo, criar uma carapaça, mas pode ser que ele tenha
dificuldades (quarta etapa).

Na quinta etapa, o sujeito sabe de alguma coisa, mas está tentando descobrir a potência.

❖ Ele está tentando descobrir se de fato aquela manga, aquele figo, aquele fruto que plantou (simbolicamente
falando), vai ter a força mesmo para crescer.
Se tiver a força para crescer, ele vai perceber que aquilo é útil (sexta) e as pessoas vão reconhecê-lo como alguém
que vende tal fruto (sétima).

❖ Se eu colher mesmo, vou poder ir à praça e as pessoas vão me reconhecer como aquele que vende, trigo, como
aquele que vende batatas, como aquele que vende .... É aquele que reconhece, já separou e agora entrega algo,
entrega de maneira reconhecida, ‘chegou o negociante de trigo’. Ele agora não é só o sujeito que volta para
tentar proteger (4); ou que está com dúvidas (5) ainda da qualidade da sua plantação; ou que não sabe se
conseguiu (6), ele colheu..., tem uma força, não é reconhecido socialmente como um sujeito que tem esta força.
Depois este sujeito pode estar diante da morte, pode ter feito isto tudo e perguntar assim ‘Tudo isto que fiz, de
fato dar conta de me livrar da morte?’
❖ Estas são as grandes questões do homem, as que os homens põem diante da morte. Não diante de Deus, é
diante da morte. ‘Se eu morrer, as coisas que eu fiz, elas valem?’
Mas ele pode ter feito tudo isso e perguntar-se se tudo o que foi feito será capaz de livrá-lo da morte (oitava).

Quando ele adquire estabilidade para recolher lenha, usa o conhecimento, a estabilidade interior para iluminar
e conhecer (nona).

❖ Este momento da entrada do Outono para o Inverno (9 para a 10), é um momento muito pertinente, muito
adequado para o sujeito conhecer, ele não pode mais sair para a rua, está ficando frio. Já não sai mais para a

106
Lipot Szondi: O teste de Szondi se propõe a revelar a angústia mais profunda da alma de quem se submete a ele.
O diagnóstico permite ao indivíduo a descoberta de seu principal problema psicológico, libertando-o para buscar
uma solução eficaz.
460
rua, porque não tem ninguém mais comprando, agora já estão se recolhendo novamente. Então é neste
momento que ele começa a conhecer o seu interior, a conhecer os outros . É uma etapa importantíssima (9) no
conhecimento humano também e que muitas pessoas nunca não chegam lá, muitas pessoas jamais se
confrontaram com a morte, jamais conseguiram colher e vender.
Muitas pessoas nunca chegam aqui porque sequer conseguiram colher e vender; a maior parte está insegura
quanto ao que foi plantado, à qualidade da semente. Uma vez o que o sujeito está com o ambiente iluminado,
passa a agir interiormente.

Os atos recolhidos na solidão é que dão consistência real para uma alma (décima).

❖ Ele já não está mais agindo diante da ágora, da cidade, já não está mais agindo com medo de perder o que ele
plantou. Já não está mais agindo com dúvidas e inseguranças de ter que se autoafirmar.
❖ Ele já está agindo diante da segurança da morte, de quem ele é, porque ele está vendo.
Depois ele percebe que os troncos estão negros, principalmente com as reflexões que fez sozinho, diante do
silêncio, da luz, do centro de seu coração; começa a agir para cima (décima primeira).

❖ Ele já começa a agir de outro modo, já não é uma ação física, uma ação com projeção na realidade, mas é
uma ação para cima.
No final da jornada, ele olha para o tronco negro, que se assemelha à morte, mas se aventura à ressurreição; aqui
está a transcendência (décima segunda). Existe uma aparência de morte nesse mundo, e um comunicado vital,
de força, de graça, de luz, querendo reiniciar um novo ciclo, cheio de esperança.

Esse é o itinerário de amadurecimento do homem. Para que possamos agir, amparar as pessoas localizando-as
onde estão, ajudando-as a progredir e encontrar uma vida cheia de sentido, utilizaremos as ferramentas
apresentadas até agora.

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Anexo Rosita - Ciclo de Estações em Planilhas

Para uma melhor memorização do Ciclo de Estações associados ao Ciclo Humano / Projetos e os Tipos de
Intelectos e Camadas, eu, Rosita Fedrigo, elaborei as duas planilhas nas páginas subsequentes, conforme meu
entendimento e quis compartilhar com vocês. Esta disposição não foi apresentada em aula.

Rosita Fedrigo, em 31/03/2022

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Símbolo Etapa Ciclo Humano / Projetos SIMBÓLICO
No início da Primavera, há uma primeira manifestação de nascimento, em que
Áries 1 Esperança aparecem os brotos. O início da Primavera é um convite a sair.

Primavera
No segundo momento da Primavera, o terreno está quase limpo, passasse a
Touro 2 Cuidado com a terra cuidar da terra e plantar sementes; é um momento de cuidado material.
O terceiro momento é aquele em que já se trabalhou, então vai-se à rua para
Gêmeos 3 Conversa falar sobre o que aconteceu, o Inverno, as sementes plantadas. É um falar
baseado na realidade, mas de projetos e projeções.
O Verão começa e existe uma precipitação das chuvas; o sujeito volta para casa
Câncer 4 Cuidado com os frutos para cuidar de seu terreno.
Verão

No segundo momento do Verão, começam a aparecer os brotos do que foi


Leão 5 Exibição dos frutos plantado.

Virgem 6 Separação meticulosa dos frutos No final, os grãos são contados, organizados, ensacados.

O início do Outono é o momento em que é o momento em que se percebe que


Libra 7 Negociação é necessário recolher dinheiro, negociar, porque o Inverno de aproxima.
Outono

Depois, o sujeito pega o dinheiro e o guarda, cuida do que veio da troca.


Escorpião 8 Apego material

No fim do Outono, planeja-se o aquecimento para o frio do Inverno; o dinheiro


Sagitário 9 Aquecimento para o inverno é gasto com coisas úteis.

Tentativa material para fora No início do Inverno, o sujeito se fecha em casa; sempre que precisa fazer algo,
Capricórnio 10 escorrega e volta é rapidamente, por causa do frio.
Inverno

No meio do Inverno, o frio é implacável, não adianta tentar sair; porém,


Aquário 11 Retorno da palavra com sabedoria começa-se a lembrar que os Invernos acabam, o elemento de ar (conversa)
volta a aparecer entre as pessoas da casa, em uma conversa de sabedoria.

Dualidade entre morte e No final do Inverno, o gelo começa a derreter; há aí uma dualidade de mistério,
Peixes 12 ressureição. a morte e vida ao mesmo tempo.
Símbolo Etapa Tipos Intelectos SIMBÓLICO
Camadas
1

Primavera
Áries
As três primeiras etapas são a preparação para que o sujeito possa ter um retorno. Ele
está tentando contornar o terreno, e o primeiro contorno advém da sabedoria acerca
Touro 2
das sementes que vingaram ou não vingaram; é a primeira experiência de força.
Gêmeos 3
Ainda existe uma imaturidade completa; o sujeito ainda não sabe, porque não
Câncer 4 apareceu o fruto.
Verão
Quando o fruto aparece, a sensação é de que se sabe Então eu sei qual é o fruto. É
Leão 5 somente na 5ª. etapa é que aparece o joio e o trigo, eu sei quais são as plantas que
vingaram e as que não vingaram.

Virgem 6 Aprende-se qual é o fruto e deseja comercializá-lo, ter seu resultado.

Já se sabe qual é o fruto, ele já está ensacado e é vendido. A depender da negociação


Libra 7 da sétima etapa, haverá vida ou morte.

A experiência de vida e morte aparece apenas na oitava, porque se o sujeito negociou


Outono

e vendeu mal, vai morrer de frio, sem lenha para iluminar, aquecer, agir no calor e na
Escorpião 8 luz; vai, enfim, perecer. Sem tudo isso, é impossível visualizar a dualidade entre
ressurreição e morte, o retorno do ciclo.
É na 8ª. etapa que aparece o homem diante da morte. Depois que aparece a morte, se
Sagitário 9 negociei e vendi mal, eu posso morrer, vou morrer de frio. Não terei lenha para iluminar
a 9ª. etapa.
E se eu não ilumino, eu não aqueço, não consegui agir (10ª. etapa) no calor e na luz.
Capricórnio 10
Inverno

E se eu não ajo no calor e na luz, eu vou morrer, vou perecer (11ª. etapa), não vou deixar
Aquário 11 uma ação histórica.

E se eu não consigo fazer isto tudo, não consigo visualizar aquela dualidade (12ª.
Peixes 12 etapa), entre a aparência de morte e ressureição.

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