Ho - A Dinâmica Da Personalidade - Carl Rogers

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A dinâmica da personalidade: Carl Rogers

Verena Augustin Hoch

O pressuposto que fundamenta toda a teoria de Rogers é a crença nas


possibilidades e potencialidades da pessoa. Ao formular uma teoria da personalidade e do
comportamento, em forma de vinte e duas proposições, afirma que todo o organismo tem
uma tendência básica à auto-realização, automanutenção e aperfeiçoamento – a tendência
atualizante que está presente em todas as ações da pessoa, pois representa o fluxo natural da
vida. Isto significa que a tendência atualizante pode ser frustrada, impedida ou desvirtuada,
mas jamais poderá ser destruída sem que se destrua também o organismo – podemos dizer
com isto que enquanto há vida, existe a possibilidade de mudança.

O organismo realiza-se seguindo uma tendência inata. Ele se torna mais


diferenciado, mais desenvolvido, mais autônomo e mais socializado à medida que
amadurece. Para explicar o desenvolvimento da personalidade, Rogers utiliza dois
construtos de importância fundamental para a compreensão da teoria: organismo e self.

O organismo é o local onde se dá toda experiência, esta totalidade da experiência


constitui o campo fenomenal. A experiência refere-se a tudo o que constitui o psiquismo
nos seus elementos tanto conscientes como inconscientes a cada momento determinado. Os
elementos conscientes são designados percepções ou experiências simbolizadas: é tudo o
que o indivíduo se dá conta no momento, assim como todas as experiências passadas e
periféricas capazes de estar no campo da percepção sob a influência de estímulos internos
ou externos.

As experiências não simbolizadas são compostas de elementos da experiência que


não estão disponíveis à consciência. Estas experiências se compõem de duas espécies:
potencialmente simbolizáveis e não simbolizáveis.

As experiências potencialmente simbolizáveis são os elementos da experiência


cuja simbolização é impedida por ter um significado ameaçador em relação ao conceito do
eu. As experiências não simbolizáveis são inacessíveis à consciência, seja por terem sido
percebidas pelo indivíduo como sem importância em relação ao eu, seja por ser de uma
intensidade muito reduzida para ultrapassar o limiar da percepção.
O campo fenomenológico não é idêntico ao campo da consciência. A consciência
diz respeito a toda experiência que foi representada ou simbolizada. Quando uma
experiência é simbolizada sem nenhuma dificuldade, é potencialmente disponível à
consciência. Certas experiências potencialmente simbolizáveis, no entanto, são distorcidas
ou excluídas do campo fenomenológico.

A tendência atualizante rege todo o organismo e tem relação direta com a estrutura
do self - estrutura que se desenvolve à medida que o organismo se diferencia. No campo
experiencial surge um conjunto de percepções que se referem ao próprio indivíduo e são
reconhecidas como fazendo parte da ideia ou imagem do eu. O self resulta, então, da
diferenciação da experiência total do indivíduo e encontra-se num fluxo contínuo,
organizado e coerente e é disponível à consciência.

A tendência atualizante e o self são significativos no desenvolvimento da


personalidade. A tendência atualizante é o fator dinâmico é quem impulsiona, tem relação
com o organismo total; o self ou autoconceito é o elemento regulador, orientador, é uma
parte do campo fenomenal que gradualmente torna-se diferenciada.

A aceitação e simbolização das experiências são reguladas pelo self. As


experiências que estão em harmonia com o conceito de self ou com o self ideal são
simbolizadas e incorporadas ao autoconceito. As ameaçadoras são negadas, outras,
impossíveis de serem negadas, são distorcidas pelo self.

Quando as experiências são negadas ou distorcidas, há um estado de desacordo


entre o eu e a experiência – incongruência. Leva a pessoa a um estado de tensão e à
confusão. Neste desacordo a pessoa fica vulnerável à angústia, à ameaça e à
desorganização.

O organismo passa a se defender da ameaça para manter a estrutura do self através


da deformação da percepção ou interceptação da experiência. A defesa impede a percepção
ou a correta percepção da realidade – rigidez perceptual.

Por outro lado, quando há acordo entre o self e a experiência, o organismo está
congruente, as experiências significativas são simbolizadas e integradas ao autoconceito e
tem livre acesso à consciência. Quando ocorre esta integração, a tendência atualizante
expande-se em direção ao crescimento. A pessoa está num processo, é capaz de viver
plenamente cada um dos sentimentos e reações, está aberta aos dados da experiência interna
e aos dados do mundo externo - está mais próxima ao funcionamento ótimo da
personalidade.

Embora possuam uma tendência inerente para se realizar, o organismo e o self


estão sujeitos a fortes influências do ambiente, especialmente do ambiente social. O
autoconceito ou self começa a ser formado desde as primeiras experiências do bebê, à
medida que vai interagindo com outras pessoas. A criança tem necessidade de aceitação
positiva. À medida que vai se relacionando com pessoas significativas, vai estruturando sua
percepção de si mesma e do mundo a fim de conseguir a satisfação desta necessidade.
Assim, o autoconceito ou self vai se formando de acordo com as condições com que o amor
e a aceitação lhe são oferecidos.

Ao propor uma teoria da personalidade, Rogers não estabelece um conjunto de


estágios significativos pelos quais a pessoa passa ao evoluir da infância para a maturidade.
Focaliza as maneiras pelas quais as avaliações que os outros fazem de uma pessoa,
particularmente durante a infância, tendem a aumentar a distância entre as experiências do
organismo e as do self.

Se a pessoa é avaliada positivamente (consideração positiva incondicional) então


não ocorre um distanciamento ou incongruência entre o organismo e o self. Para Rogers, se
uma pessoa experimentasse apenas consideração positiva incondicional, não se
desenvolveriam condições para a atribuição de valor, a auto-estima seria incondicional, as
necessidades de consideração positiva e auto-estima jamais divergiriam da avaliação
organísmica e a pessoa continuaria a ser psicologicamente ajustada e funcionando
plenamente.

Porém, como as avaliações do comportamento da criança são algumas vezes


positivas e outras negativas, a criança aprende a diferenciar entre comportamentos e
sentimentos aceitos e valorizados e aqueles desvalorizados ou não aceitos. Estes últimos
tendem a ser excluídos do autoconceito mesmo que tenham um valor organísmico,
resultando num autoconceito que não acompanha a experiência organísmica. A criança
tenta ser o que os outros querem que ela seja, ao invés de tentar ser o que realmente é.
Gradualmente, através da infância, o autoconceito torna-se mais e mais distorcido ou
incongruente devido às avaliações dos outros.

Assim, para satisfazer a sua necessidade de aceitação e valorização, a pessoa acaba


incorporando ao seu autoconceito percepções, atitudes, crenças e valores que estão em
desacordo com a sua experiência sensorial direta. Se as novas experiências que vão
ocorrendo ao longo da vida da pessoa forem coerentes com este autoconceito, serão
percebidas e simbolizadas, mas se forem contraditórias, serão percebidas como ameaças ao
eu e terão seu acesso negado à consciência ou serão simbolizadas de uma maneira
distorcida. A pessoa selecionará, entre suas muitas experiências sensórias, aquelas que
estão de acordo com seu autoconceito e só reconhece e simboliza estas experiências. Ou
seja, a negação e a distorção são as defesas utilizadas pela pessoa para preservar o seu self
da ameaça representada pela experiência da incongruência.

As experiências que são negadas ou distorcidas na sua simbolização são aquelas


que estão em desacordo com o autoconceito, não são necessariamente experiências
negativas ou depreciativas da pessoa. Até mesmo as experiências valorizadoras e positivas
podem ser excluídas do campo perceptual da pessoa, se não estiverem de acordo com o
autoconceito.

Referência Bibliográficas

Hall, C.S. & Lindzey, G. (1984). Teorias da personalidade. São Paulo: E.P.U.

Justo, H. (2000). Cresça e Faça Crescer: Lições de Carl Rogers. Canoas: La Salle.

Rogers, C.R. & Kinget, M. (1977). Psicoterapia e Relações Humanas: teoria e prática
da terapia não-diretiva. Belo Horizonte: Interlivros.

Rogers, C.R. (1983). Um jeito de ser. São Paulo: E.P.U.

Rogers, C.R. (1991). Tornar-se pessoa. São Paulo: Martins Fontes.

Rogers, C.R. (1992). Terapia Centrada no Cliente. São Paulo: Martins Fontes.

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