Robert Graves - Eu Cláudio

Fazer download em pdf ou txt
Fazer download em pdf ou txt
Você está na página 1de 389

Robert 

Graves
Eu, Cláudio 
COM BASE NA AUTOBIOGRAFIA DE TIBÉRIO CLÁUDIO
IMPERADOR DOS ROMANOS
NASCIDO EM 10 A.C.
ASSASSINADO E DEIFICADO
EM 54 D.C.

LYON EDIÇÕES
Título original: Claudius
Tradução de Maria de Lourdes Medeiros
Revisão de Sérgio Coelho
© Penguin Books
Direitos reservados por Lyon Multimédia Edições, Lda.
Nenhuma parte desta publicação pode ser reproduzida ou transmitida por qualquer forma ou por qualquer processo, 
sem autorização prévia e escrita do editor. Exceptua­se naturalmente a transcrição de pequenos textos ou passagens 
para apresentação ou crítica do livro. Esta excepção não deve de modo nenhum ser interpretada como sendo 
extensiva à transcrição de textos
em recolhas antológicas ou similares donde resulte prejuízo para o interesse pela obra. Os transgressores são 
passíveis de procedimento judicial.
Execução técnica: Gráfica Europam Lda., Mem Martins
Editores: Francisco Pedro Lyon de Castro e Nuno Lyon de Castro
LYON MULTIMÉDIA EDIÇÕES, LDA.
Apartado 7
2726 Mem Martins Codex Portugal
Depósito Legal n° 203728/03 Edição publicada em Dezembro de 2003 
Ao Sr. A. K. Smith, do I.C.S., agradeço a versão latina dos versos sibilinos mencionados no 
primeiro capítulo. Foram aqui impressos pela primeira vez:
Púnica centenas durabit poena per annos:
Rés Romana viro parebit caesariato:
Calvus caesarie dominus dominabitur urbi:
Omnibus ille viris mulier mas ille puellis:
Rex equitabit equo bifidis equus unguibus ibit:
Filius imbelli fictus mactaverit ictu.
Imperium hinc alterfido patre caesariato
Caesariae crinitus habet, qui mármore Romae
Mutabit lateres. Nin visis vinciet Urbem
Compedibus. Fictae secreto coniugis astu
Occidet ut fictus bonafilius occupet heres.
Tertius hinc sumetficto patre caesariato
Calvus caesarie regnum cui sanguine limus
Commixtus. Victrix penes ilium et vicia vicissim
Roma erit. Ille instar gladii pulvinar habebit,
Filius et fictus regni potietur iniqui.
Quartus habet soliumficto patre caesariato
Calvus caesarie invenis, cui Roma ministrae est.
Feta venefiáis Urbs ímpia serviet uni.
Quo puer ibat equo vectus calcatus eodem
Se iuvenem ferro cecidisse fatetur equino
Caesariatus ad hoc quintus numerabitur hirtus
Caesarie, toti genti contemptus avitae.
Imbecillus iners, aestivas addere Romae
Aptus aquas populo frumenta hiemalia praebet.
Ille tamenfictae secreto coniugis astu
Occidet ut fictus bonafilius occupet heres.
Sextus habet regnum fido patre caesariato.
Flamma pavor citharoedus eunt tria monstra per urbem.
Sanguine dextra rubet materno. Septimus heres
Nemo erit, ai sexti busto cruor ibit ab imo.
R.G.
Galmpton, Brixham
1941
A versão original destes versos, em inglês, poderá ser consultada na nota de rodapé da pg. 18 (N. do T.)
”... Uma história que originou toda a espécie de ideias falsas, tanto por parte daqueles que  
viveram na altura como em tempos subsequentes: tão verdadeira que todas as transacções de  
maior importância estão envoltas em dúvida e obscuridade; enquanto alguns tomam como factos  
seguros os rumores mais precários, outros transformam os factos em falsidade; e ambos são  
exagerados pela posteridade.”
TÁCITO
Nota Biográfica
Robert Graves nasceu em 1895 em Wimbledon, sendo filho de Alfred Percival Graves, escritor irlandês, e 
de Amália von Ranke. Saiu da escola para a primeira Guerra Mundial, onde se tornou capitão dos Reais 
Fuzileiros Galeses. A sua principal vocação era a poesia e os seus Selected Poems foram publicados pela 
Penguin. Aparte o ano em que foi professor de Literatura Inglesa na Universidade do Cairo, em 1926, 
ganhou a vida a escrever, sobretudo romances históricos. Entre eles, contam­se: Claudius (Eu, Cláudio);  
Claudius the God (Cláudio o Deus); Sergeant Lamb ofthe Ninth (O Sargento Lamb da Nona); Count  
Belisarius (O Conde Belisário); Wife to Mr. Milton (Uma Esposa para o Sr. Milton); Proceed, Sergeant  
Lamb (Continue, Sargento Lamb); The Golden Fleece (O Veio de Ouro); They HangedMy Saintly Billy  
(Enforcaram o Meu Santo Billy); The Isles of Unwisdom (As Ilhas da Insensatez). Escreveu a sua 
autobiografia, Goodbye To Ali That (Adeus a Tudo Isto), em 1929, que rapidamente se afirmou como um 
clássico moderno. O suplemento literário do Times aclamou­o como ”um dos mais cândidos auto­retratos  
de um poeta, com verrugas e tudo, que alguma vez foi pintado”, além de ser de um valor excepcional 
como documento de guerra. Os seus dois livros de não­ficção mais discutidos são The White Goddess (A  
Deusa Branca), que apresenta uma visão nova do impulso poético, e The Nazarine Gospel Restored (O  
Evangelho do Nazareno Recuperado) com Joshua Podro, que consiste numa análise renovada da 
cristandade primitiva. Traduziu Apuleio, Lucan e Suetónio para os Clássicos da Penguin e compilou o 
primeiro dicionário moderno da mitologia grega, The GreekMyths (Os Mitos Gregos). A sua tradução de 
The Rubáiyát of Ornar Khayyám (com Ornar Ali­Shah) foi também publicada pela Penguin. Foi eleito 
professor de Poesia em Oxford em 1961 e tornou­se Membro Honorário do St. John’s College, Oxford, 
em 1971.
Robert Graves morreu a 7 de Dezembro de 1985, em Maiorca, onde vivia desde 1929. Por altura da sua 
morte, o Times escreveu a seu respeito: ”Ele será lembrado pelos seus sucessos como prosador, autor de 
romances históricos e de memórias, mas, acima de tudo, como o grande paradigma do poeta dedicado, o 
maior poeta do amor em língua inglesa desde Dorme.”
Nota do Autor
A moeda de ouro usada aqui como unidade monetária corrente é o aureus latino, que vale 100 
sestércios ou vinte e cinco denários (moedas de prata): pode atribuir­se­lhe o valor aproximado 
de uma libra esterlina ou cinco dólares americanos, ao valor de antes da guerra. 
A milha é a milha romana, cerca de trinta passos mais curta que a milha inglesa. Por uma questão 
de conveniência, as datas foram indicadas de acordo com o cálculo cristão: o cálculo grego usado 
por Cláudio contava os anos a partir da primeira Olimpíada, que teve lugar em 776 AC. Também 
por uma questão de conveniência, foram usados os nomes geográficos mais familiares: assim 
França e não Gália Transalpina, porque a França cobre mais ou menos a mesma área territorial e 
seria inconsistente chamar cidades como Nimes, Bologne e Lyon pelos seus nomes modernos os 
clássicos não seriam reconhecidos pela generalidade dos leitores ao mesmo tempo que eram 
colocadas na Gália Transalpina ou, como era designada pelos gregos, a Galatia (a terminologia 
geográfica grega é muito confusa: a Germânia era o país dos celtas). Da mesma forma, foram 
usadas as formas mais familiares dos nomes próprios Lívio para Titus Lívius, Cimbelino para 
Cunobelinus, Marco António para Marcus Antonius.
Foi difícil por vezes encontrar correspondentes adequados para termos técnicos militares, legais e 
outros. Para dar um único exemplo, temos a palavra azagaia. O aviador T. E. Shaw (a quem 
aproveito a oportunidade para agradecer a leitura cuidadosa destas provas) põe em causa o meu 
uso de azagaia para o germânico framea ou pfreim. Sugere antes javelina. Mas eu não adoptei a 
sugestão, como adoptei com gratidão outras que me fez, porque precisava de javelina para pilum,  
a arma de arremesso utilizada pela disciplinada infantaria romana; e azagaia tem uma 
ressonância mais violenta. A palavra azagaia é usada há 300 anos e adquiriu um vigor renovado 
no século xix, com as guerras contra os Zulus. A framea de haste longa e cabeça de ferro era 
usada, segundo Tácito, como arma de arremesso e como arma branca. O mesmo acontecia com as 
azagaias
dos guerreiros Ama­Zulu, com quem os germanos do tempo de Cláudio tinham muito em comum 
culturalmente. Para conciliar as afirmações de Tácito, primeiro quanto ao fácil manejo daframea  
na luta corpo a corpo e depois quanto à sua inutilidade no meio das árvores, o mais provável é 
que os germanos tenham feito o mesmo que os Zulus partiam a ponta da longa haste daframea  
quando entravam na luta corpo a corpo. Mas isso raramente acontecia, porque os germanos 
preferiam sempre uma táctica de ataque e fuga quando se defrontavam com a infantaria romana, 
que dispunha de armas melhores.
Suetónio, nos seus Doze Césares, refere­se às histórias de Cláudio como tendo sido escritas com 
inépcia, mais do que com deselegância. No entanto, se certas passagens do presente trabalho 
estão escritas não apenas com inépcia mas também com uma certa falta de elegância, isso não 
entra em desacordo com o estilo literário de Cláudio, tal como o podemos encontrar no seu 
discurso em latim sobre a Aeduan, do qual ainda nos restam fragmentos. Na verdade, o discurso 
abunda em deselegâncias deste tipo, mas também não esqueçamos que se trata provavelmente de 
uma transcrição do registo estenografado oficial das palavras exactas de Cláudio ao Senado o 
discurso de um homem cansado, numa oratória conscenciosamente improvisada a partir de 
algumas notas simples.
Eu, Cláudio é uma escrita de tom coloquial; tal como o grego é, na verdade, uma língua muito 
mais coloquial que o latim. A recém­descoberta carta de Cláudio aos Alexandrinos, em grego, 
que pode no entanto ser em parte obra de um secretário imperial, é de leitura muito mais fácil que 
o citado discurso.
Tenho a agradecer a Miss Eirlys Roberts a sua ajuda na exactidão clássica e a Miss Laura Riding 
a sua crítica quanto à congruência do inglês.
RG. 1934
10
CAPÍTULO I
Eu, Tibério Cláudio Druso Nero Germânico, Isto­aquilo­e­aqueloutro (pois não pretendo 
aborrecer­vos para já com todos os meus títulos), que fui em tempos, e não há muito, conhecido 
pelos meus amigos, parentes e associados como Cláudio o Idiota, ou Esse Cláudio ou Cláudio o 
Gago ou Clau­Clau­Cláudio, ou ainda, na melhor das hipóteses, como Pobre Tio Cláudio, estou 
agora a escrever esta estranha história da minha vida; começando com a minha primeira infância 
e continuando, ano após ano, até atingir o fatal ponto de mudança em que, há cerca de oito anos, 
com cinquenta e um de idade, me encontrei repentinamente apanhado por aquilo a que posso 
chamar de predestinação dourada, da qual nunca mais consegui libertar­me.
Este não é de forma alguma o meu primeiro livro: na verdade, a literatura, e em especial a escrita 
sobre a história que em jovem estudei aqui em Roma, com os melhores mestres contemporâneos, 
foi, até que se deu a mudança, a minha única profissão e interesse ao longo de mais de vinte e 
cinco anos. Os meus leitores não devem portanto ficar surpreendidos com o meu estilo 
trabalhado: é realmente o próprio Cláudio que está a escrever este livro e não um mero secretário 
seu, nem um desses analistas oficiais a quem os homens públicos têm o hábito de comunicar as 
suas lembranças, na esperança de que uma escrita elegante disfarce a escassez do assunto e de 
que a lisonja atenue os vícios. Na presente obra, juro por todos os Deuses que sou o meu único 
secretário e o meu próprio analista oficial: escrevo pelo meu próprio punho. E que favores 
poderia esperar alcançar de mim mesmo através da lisonja? Posso acrescentar que esta não é a 
primeira história da minha vida que escrevo. Em tempos escrevi outra, em oito volumes, como 
contribuição para os arquivos da Cidade. Foi uma tarefa monótona, à qual dei pouco valor, e 
apenas o fiz para corresponder a um pedido público. Para ser franco, durante a sua composição, 
que teve lugar há dois anos, encontrava­me extremamente ocupado com outras questões. Ditei a 
maior parte dos primeiros quatro volumes a um secretário grego e disse­lhe que não alterasse 
nada enquanto escrevia (excepto, quando necessário, para melhorar o equilíbrio das frases ou 
para evitar contradições ou repetições). Mas admito que quase toda a segunda metade do 
trabalho, e pelo menos alguns capítulos da primeira,
11
foram compostos por este mesmo indivíduo, Políbio (a quem eu próprio baptizara, sendo ele 
ainda rapaz e escravo, pensando no famoso historiador), a partir de material fornecido por mim. 
Ele modelou com tanta exactidão o seu estilo pelo meu que, na realidade, quando terminou, 
ninguém teria conseguido distinguir a parte que fora feita por mim da que tinha sido feita por ele.
Repito que era um livro monótono. Eu não estava em posição de criticar o Imperador Augusto, 
que era meu tio­avô pelo lado materno, ou a sua terceira e última esposa, Lívia Augusta, que era 
minha avó, porque ambos tinham sido deificados e, na qualidade de sacerdote, encontrava­me 
ligado aos seus cultos; embora pudesse ter criticado acerbamente os dois imprestáveis sucessores 
imperiais de Augusto, não o fiz por uma questão de decência. Teria sido injusto absolver Lívia, e 
mesmo o próprio Augusto, na medida em que ele se submeteu a essa mulher notável e deixai­me 
que o diga de imediato abominável, ao mesmo tempo que dizia a verdade sobre os outros dois, 
cujas memórias não estavam protegidas da mesma forma pelo respeito religioso.
Deixei que fosse um livro monótono, registando apenas factos incontroversos, tais como, por 
exemplo, Fulano­de­Tal casou com Fulana­de­Tal, filha Daquele e da Outra que tinha este ou 
aquele número de honras públicas a seu favor, mas sem falar nas razões políticas por trás do 
casamento ou das negociações secretas entre as famílias. Ou então, escrevia que Fulano­de­Tal 
morrera de repente, depois de comer um prato de figos africanos, mas sem falar em veneno, ou a 
quem a morte aproveitava, a menos que os factos estivessem apoiados por um veredicto do 
Tribunal Criminal. Não contei mentiras, mas também não disse a verdade no sentido em que 
tenciono fazê­lo aqui. Quando hoje consultei esse livro, que está na Biblioteca de Apolo, no 
Monte Palatino, para refrescar a minha memória sobre alguns detalhes quanto a datas, senti­me 
interessado ao depararem­se­me passagens nos capítulos públicos que teria jurado não ter escrito 
ou ditado. Se eram da autoria de Políbio, constituíam uma peça de mímica extremamente hábil 
(ele tinha as minhas outras histórias para estudar, admito), mas se eram realmente da minha 
autoria, então a minha memória está ainda pior do que o afirmam os meus inimigos. Relendo 
aquilo que acabei de escrever, vejo que devo estar a suscitar e não a desarmar a suspeita, em 
primeiro lugar quanto à minha autoria exclusiva daquilo que se segue, depois, quanto à minha 
integridade enquanto historiador, e finalmente, quanto à minha memória dos factos. Mas vou 
deixar que fique assim: sou eu próprio a escrever aquilo que sinto e, à medida que a história 
avançar, o leitor estará mais preparado para constatar que nada escondo por mais que isso 
contribua para o meu descrédito.
Esta é uma história confidencial. Mas quem, poderão perguntar, são os meus confidentes? A minha 
resposta é: aqueles que hão de vir, a posteridade.
12
Não me refiro aos meus bisnetos, nem aos meus tetranetos. Falo de uma posteridade 
extremamente remota. No entanto, a minha esperança é que vós, os meus leitores eventuais, 
daqui a uma centena de gerações ou mais, sintais que vos falo directamente, como um 
contemporâneo: como muitas vezes Heródoto e Tucídides, mortos há muito, parecem falar 
comigo. E porque especifico uma posteridade tão remota como essa? Passo a explicar.
Fui a Cumas, na Campânia, há pouco menos de dezoito anos e visitei a Sibila na sua gruta 
rochosa no Monte Gauro. Há sempre uma Sibila em Cumas, porque, assim que morre uma, 
sucede­lhe a sua noviça­assistente; mas nem todas são igualmente famosas. A algumas delas, em 
todos os seus longos anos de serviço, nunca Apolo concede a profecia. Outras profetizam de 
facto, mas parecem mais inspiradas por Baco do que por Apolo, a julgar pelos despropósitos 
ébrios que debitam. E tudo isto tem trazido descrédito ao oráculo. Antes da sucessão de Deífobe, 
que Augusto consultava com frequência, e de Amalteia, que ainda está viva e é muito famosa, 
tinha havido uma série de Sibilas muito fracas durante quase
300 anos. A gruta fica por trás de um pequeno templo grego de grande beleza, consagrado a 
Apolo e a Artémis Cumas era uma colónia grega eólica. Há um frizo antigo dourado sobre o 
pórtico, atribuído a Dédalo, embora isto seja nitidamente absurdo, dado que não tem mais de 500 
anos e, mesmo que os tenha, Dédalo viveu pelo menos há 1.100 anos. O frizo representa a 
história de Teseu e do Minotauro, que ele matou no Labirinto de Creta. Antes de ser autorizado a 
visitar a Sibila, tive que sacrificar ali um boi e uma ovelha, respectivamente, a Apolo e a Artémis. 
Fazia um tempo frio de Dezembro. A gruta era um lugar aterrador, cavado na rocha maciça; o 
acesso era íngreme, tortuoso, escuro como breu e cheio de morcegos. Fui disfarçado, mas a Sibila 
reconheceu­me. Deve ter sido a gaguez que me traiu. Em criança eu gaguejava muito, embora, 
seguindo os conselhos de especialistas da fala, tivesse aprendido gradualmente a controlar esse 
defeito em ocasiões públicas determinadas; mesmo assim, em privado e em situações não 
premeditadas, ainda me acontece, embora em menor escala, enrolar­se­me a língua 
nervosamente. E foi exactamente o que se passou em Cumas.
Cheguei à caverna interior depois de ter tacteado penosamente o meu caminho escada acima, a 
quatro; vi a Sibila, mais parecida com um macaco do que com uma mulher, sentada numa cadeira 
dentro de uma gaiola suspensa do tecto. Estava vestida de vermelho; por entre um único raio de 
luz vermelha, que descia não sei bem de onde, vislumbravam­se os seus olhos fixos e brilhantes. 
A boca sem dentes sorria. À minha volta havia um cheiro a morte. Mas consegui arrancar de mim 
mesmo a saudação que tinha preparado. Ela não me respondeu. Só algum tempo depois fiquei a 
saber que aquele era o corpo mumificado de Deífobe, a Sibila anterior, que morrera recentemente 
com a idade de 110 anos; as pálpebras
13
eram sustidas por bolas de vidro, prateadas na parte de trás para as fazer brilhar. A Sibila reinante 
sempre vivera com a sua predecessora. Bom, eu devo ter ficado alguns minutos diante de 
Deífobe, a tremer e a fazer caretas propiciatórias. Pareceu­me uma eternidade. Finalmente, a 
Sibila viva, cujo nome era Amalteia, uma mulher bastante jovem, fez a sua aparição. O raio de 
luz vermelha deixou de ser visível e Deífobe desapareceu, alguém, provavelmente a noviça, tinha 
tapado a minúscula janela de vidro vermelho e um novo raio, branco, desceu e iluminou 
Amalteia, sentada sobre um trono de marfim, no meio das sombras do fundo da gruta. Tinha um 
rosto belo e de aspecto louco, com a testa alta, e estava sentada tão imóvel como Deífobe. Mas 
tinha os olhos fechados. Os joelhos tremiam­me e pus­me a gaguejar, sem conseguir parar.
Oh Sib... Sib... Sib... Sib... Sib... Comecei. Ela abriu os olhos, franziu a testa e imitou­me.
OhClau...Clau... Clau...
Aquilo deixou­me envergonhado e lá consegui lembrar­me do que tinha vindo perguntar. Com 
grande esforço, disse­lhe:
Oh, Sibila: vim interrogar­te sobre o destino de Roma e sobre o meu.
Gradualmente o seu rosto modificou­se; o poder profético apoderou­se dela, debateu­se, 
arquejou. Ouviu­se um ruído, precipitando­se em todas as galerias; as portas batiam, asas 
roçavam­me a face, a luz desapareceu e ela pronunciou um verso grego na voz do Deus:
Quem sob a Maldição Púnica geme
E da bolsa os cordões sufoca
Antes de recuperar, muito terá de piorar.
A sua boca viva, moscas azuis gerará,
E em volta dos seus olhos as larvas rastejarão
Nenhum homem poderá prever o dia em que ela morrerá.
Depois, lançando os braços por cima da cabeça, recomeçou:
Dez dias, cinquenta dias e três,
Clau­Clau­Clau receberá
Uma dádiva que todos desejam menos ele.
14
Perante companhia bajuladora Há­de gaguejar, cacarejar, engasgar­se, Com a baba do lábio a  
pingar­lhe.
Mas quando emudecer e aqui não mais estiver, Dentro de mil e novecentos anos ou perto, Clau­
Clau­Cláudio com clareza falará.
O Deus riu­se de novo pela boca dela; um som magnífico mas terrível Ho! ho! ho!
Eu obedeci; voltei­me rapidamente e saí aos tropeções, estatelando­me ao comprido no primeiro 
lanço de escadas partido, ferindo a cabeça e os joelhos. Foi uma saída penosa, com aquele riso 
tremendo a perseguir­me.
Falando agora como adivinho experimentado, historiador profissional e sacerdote que teve 
oportunidades de estudar os livros sibilinos tal como foram regularizados por Augusto, posso 
interpretar os versos com alguma confiança. Ao falar na Maldição Púnica, a Sibila referia­se 
nitidamente à destruição de Cartago por nós, os romanos. Há muito que estamos sob uma 
maldição divina por causa disso. Jurámos amizade e protecção a Cartago em nome dos nossos 
Deuses mais importantes, incluindo Apolo; e depois, invejosos da sua rápida recuperação dos 
estragos da Segunda Guerra Púnica, levámo­la a entrar na Terceira Guerra Púnica e destruímo­la 
completamente, massacrando os seus habitantes e cobrindo­lhe os campos de sal. Os cordões da 
bolsa são os principais instrumentos desta maldição uma loucura pelo dinheiro que sufocou Roma 
desde que ela destruiu o seu principal rival no comércio, tornando­se senhora de todas as riquezas 
do Mediterrâneo. Com a riqueza veio o desleixo, a cobiça, a crueldade, a desonestidade, a 
cobardia, o efeminamento e todos os outros vícios impróprios dos romanos. Qual era a dádiva 
que todos desejavam excepto eu e ela, chegou exactamente dez anos e cinquenta e três dias mais 
tarde é o que haveis de ler na devida altura. As linhas que se referiam a Cláudio, falando com 
clareza, intrigaram­me durante anos, mas finalmente acho que as entendo. São, estou convencido, 
uma recomendação para que escreva o presente trabalho. Quando estiver terminado, vou tratá­lo 
com um fluído de preservação, selá­lo num cofre de chumbo e enterrá­lo bem fundo, algures, 
para que a posteridade o encontre e leia. Se a minha interpretação estiver correcta, ele virá a ser 
encontrado daqui a uns 1900 anos. Nessa altura, quando todos os outros autores deste tempo 
cujas obras tiverem sobrevivido parecerem estar a arrastar os pés e a gaguejar, por terem escrito 
com cautelas e apenas para o momento presente,
15
a minha história soará com clareza e ousadia. Talvez, pensando melhor, não me dê ao trabalho de 
a selar num cofre. Vou deixá­la por aí. Na realidade, a minha experiência como historiador diz­
me sobretudo que os documentos sobrevivem devido ao acaso e não tanto à intenção. Apolo fez a 
profecia; portanto, deixarei que Apolo tome conta do manuscrito. Como vedes, decidi escrever 
em grego, porque essa língua, estou convencido, há­de ser sempre a principal língua literária do 
mundo. E se Roma entrar em decomposição, como a Sibila indicou, não se decomporá com ela a 
sua língua? Além disso, o grego é a língua do próprio Apolo.
Serei cuidadoso com as datas (que, como vedes, ponho à margem) e com os nomes próprios. Ao 
compilar as minhas histórias da Etrúria e de Cartago passei mais horas conturbadas do que me é 
grato recordar, tentando descobrir em que ano este ou aquele acontecimento tiveram lugar e se 
Fulano­de­Tal era realmente Fulano­de­Tal e se era filho ou neto ou bisneto ou se não tinha 
qualquer parentesco. Tenciono poupar os meus sucessores a esta espécie de irritação. Assim, por 
exemplo, os vários personagens desta história que têm o nome de Druso o meu pai, eu próprio, 
um filho meu, o meu primo em primeiro grau, o meu sobrinho, cada um deles será 
cuidadosamente identificado sempre que referido. E, ainda como exemplo, ao falar do meu tutor, 
Marco Pórcio Catão, é necessário esclarecer que não se tratava de Marco Pórcio Catão, o Censor, 
instigador da terceira Guerra Púnica; nem do seu filho com o mesmo nome, o famoso jurista; nem 
do seu neto, o Cônsul do mesmo nome; nem do bisneto com o mesmo nome, inimigo de Júlio 
César; nem do quadrineto do mesmo nome, que morreu na batalha de Filipos; mas de um 
tetraneto totalmente obscuro, também com o mesmo nome, mas que nunca teve qualquer cargo 
público nem mereceu tê­lo. Augusto fez dele meu tutor e depois mestre­escola de outros jovens 
nobres romanos e filhos de reis estrangeiros. Porque, embora o seu nome lhe pudesse dar acesso a 
uma posição da mais alta dignidade, a sua natureza severa, estúpida e pedante não lhe permitia 
ser mais do que um elementar mestre­escola.
Para fixar a data à qual pertencem estes acontecimentos, penso que o melhor que posso fazer é 
mencionar que o meu nascimento ocorreu no
744° ano após a fundação de Roma por Rómulo, e no 767° ano
10 a.C. depois da primeira Olimpíada; e que o Imperador Augusto, cujo
nome é pouco provável que se apague mesmo passados 1900 anos de história, governava então 
havia vinte anos.
Antes de concluir este capítulo introdutório, tenho ainda alguma coisa a acrescentar sobre a Sibila 
e as suas profecias. Já referi que, em Cumas, quando uma Sibila morre outra lhe sucede. Contudo, 
há algumas que se
16
tornam mais famosas que outras. Houve uma muito famosa, Demófila, que Eneias consultou 
antes da sua descida ao Inferno. E houve uma outra mais tarde, Herófila, que procurou o rei 
Tarquínio e lhe ofereceu uma colecção de profecias por um preço mais alto do que ele desejava 
pagar. Como ele recusasse, diz a história, ela queimou uma parte e ofereceu­lhe o restante pelo 
mesmo preço, o que ele voltou a recusar. Depois, queimou outra parte e ofereceu­lhe o que 
restava, sempre pelo mesmo preço que ele, por curiosidade, pagou. Os oráculos de Herófila eram 
de dois tipos: avisos ou profecias esperançosas para o futuro e indicações quanto aos sacrifícios 
propiciatórios adequados que deviam ser feitos quando tais portentos ocorressem. A estes foram 
acrescentados, com o tempo, todos os oráculos notáveis e comprovados anunciados a pessoas 
privadas. Assim, sempre que Roma parece estar sendo ameaçada por estranhos presságios ou por 
desastres, o Senado ordena que os livros sejam consultados pelos sacerdotes encarregados dos 
mesmos, encontrando­se sempre um remédio. Duas vezes os livros foram parcialmente destruídos 
pelo fogo e as profecias perdidas reconstituídas a partir das memórias conjuntas dos sacerdotes 
encarregados. Em muitos casos, as memórias parecem ter sido extremamente deficientes: essa é a 
razão porque Augusto decidiu criar um cânon fiável das profecias, rejeitando aditamentos ou 
reconstituições nitidamente não inspiradas. Também recolheu e destruiu todas as colecções 
particulares não autorizadas de oráculos sibilinos, bem como todos os outros livros de profecias 
públicas a que conseguiu deitar mão e cujo número total ascendeu a mais de 2000. Quanto aos 
livros sibilinos revistos, colocou­os numa arrecadação fechada à chave, situada sob o pedestal da 
estátua de Apolo, no templo que ele construiu para o Deus perto do seu palácio do Monte 
Palatino. Um único livro da biblioteca histórica privada de Augusto veio parar ás minhas mãos, 
algum tempo após a sua morte. Chamava­se: Curiosidades Sibilinas: profecias que foram  
encontradas incorporadas no cânon original e rejeitadas como apócrifas pelos sacerdotes de  
Apoio. Os versos foram copiados na bela caligrafia do próprio Augusto, com os erros de 
ortografia característicos que, originariamente nascidos da ignorância, ele posteriormente adoptou 
por uma questão de orgulho. Era evidente que a maior parte destes versos nunca foram 
pronunciados pela Sibila, quer durante o êxtase quer fora dele, mas sim compostos por pessoas 
irresponsáveis que desejavam glorificar­se a si próprios ou às suas casas ou amaldiçoar as casas 
de rivais, proclamando a autoria divina das fantasiosas previsões contra eles. A família Claudiana 
tinha estado particularmente activa, segundo me apercebi, nestas falsificações. No entanto, 
encontrei uma ou duas peças cuja linguagem comprovou serem respeitavelmente arcaicas, cuja 
inspiração parecia divina e cujo sentido, claro e alarmante, fizera evidentemente com que
17
Augusto ­ a palavra dele era lei entre os sacerdotes de Apolo ­ não as incluísse no seu cânon. Este pequeno 
livro já não está na minha posse. Mas recordo praticamente cada palavra da mais memorável destas 
profecias, aparentemente genuína, que foi registada no grego original e também (como a maior parte das 
peças mais antigas do cânone) em ásperos versos latinos. Dizia assim: Cem anos após a Maldição Púnica
Roma será escrava de um homem cabeludo, Um homem cabeludo com falta de cabelo,
A mulher de todos os homens e o homem de todas as mulheres. O garanhão que ele monta terá pés em vez  
de cascos.
Ele morrera pela mão do seu filho­não filho, E não no campo de batalha.
O cabeludo seguinte que há­de escravizar o Estado Será filho­não filho, deste último cabeludo,
O seu cabelo será uma esfregona generosa. Ele dará a Roma mármore em vez de argila E acorrentá­la­á  
com correntes invisíveis, E morrerá à mão de sua esposa­não esposa, Para benefício do seu filho­não  
filho.
Optámos por apresentar aqui uma tradução literal (não poética), no sentido de não desvirtuarmos o sentido 
original destes versos. Exceptuamos aqui a expressão son, no son, que resolvemos equivaler a filho­não  
filho, na medida em que o autor pretende insinuar, no estilo irónico que percorre todos estes versos, que 
aquele que era designado por filho do imperador em causa não o seria efectivamente ou, em outros casos, 
pelos seus actos e atitudes, não parecia sê­lo. 
18
O terceiro cabeludo a escravizar o Estado
Seráfilho­não filho deste último cabeludo.
Será lama bem misturada com sangue,
Um homem cabeludo com falta de cabelo.
Ele dará a Roma vitórias e derrotas
E morrerá para benefício do seu filho­não filho
Uma almofada será a sua espada.
O quarto cabeludo a escravizar o Estado Será filho­não filho, deste último cabeludo. Um homem  
cabeludo que tem falta de cabelo, Ele dará a Roma venenos e blasfémias E morrerá de um coice  
do velho cavalo Que o transportou em criança.
O quinto cabeludo a escravizar o Estado,
A escravizar o Estado, embora contra sua vontade,
Será aquele idiota que todos desprezavam.
Ele terá cabelo, qual esfregona generosa.
Ele dará a Roma água e pão para o Inverno
E morrerá à mão de sua esposa­não esposa,
Para benefício de seu filho­não filho.
O sexto cabeludo a escravizar o Estado
Será filho­não filho, deste último cabeludo.
Ele dará a Roma músicos, medo e fogo.
A sua mão estará vermelha do sangue de um parente.
Nenhum sétimo cabeludo lhe sucederá
E o sangue jorrará do seu túmulo.
Ora bem, deve ter sido evidente para Augusto que o primeiro dos cabeludos, isto é, dos Césares 
(porque César significa cabeça de cabelo), era o seu tio­avô Júlio, que o adoptou. Júlio era careca 
e famoso pelos seus deboches com ambos os sexos; e o seu cavalo de guerra, como consta dos 
registos públicos, era um monstro que tinha dedos nos pés em vez de cascos. Júlio escapou vivo 
de muitas batalhas renhidas para acabar por ser assassinado, no Senado, por Brutus. E Brutus, 
embora filho de outro, era, dizia­se, filho natural de Júlio. ”Também tu, meu filho!”, disse Júlio, 
quando Brutus foi direito a ele com um punhal. Sobre a maldição Púnica já eu escrevi. Augusto 
deve ter reconhecido em si próprio o segundo dos Césares. Na verdade, ele próprio no fim da 
vida se gabou, olhando para os templos e edifícios públicos que reedificara de forma esplêndida, 
e pensando também no esforço da sua vida para fortalecer e
19
glorificar o Império, que tinha encontrado uma Roma de argila e a deixara em mármore. Mas no que diz 
respeito à forma como morreu, ele deve ter achado a profecia ininteligível ou incrível: no entanto, o 
escrúpulo impediu­o de a destruir. Quem eram o terceiro, o quarto e o quinto cabeludos, esta história o 
mostrará claramente; e eu sou na realidade um idiota se, dada a infalível exactidão do oráculo em todos os  
aspectos, até ao presente, não reconhecer o sexto cabeludo, regozijando­me em nome de Roma por não 
haver nenhum sétimo cabeludo que lhe suceda.
20
CAPíTULO 1
Não me recordo do meu pai, que morreu quando eu era criança. Contudo, em jovem, nunca perdi a 
oportunidade de reunir informações, o mais detalhadas possível, sobre a sua vida e personalidade junto de 
todas as pessoas ­ senadores, soldados ou escravos ­ que o tivessem conhecido. Comecei a escrever a sua 
biografia, enquanto trabalho de aprendiz de historiador. E, embora tivesse sido interrompido pela minha 
avó, Lívia, continuei a reunir material, na esperança de um dia vir a conseguir acabá­lo. Acabei­o na 
realidade, mas apenas há pouco tempo. Mesmo agora, não faz sentido tentar pô­lo em circulação. O 
sentimento que dele emana é tão republicano que, no momento em que Agripina ­ minha presente esposa ­ 
viesse a saber da sua publicação, todos os exemplares seriam suprimidos e os meus pobres escribas­
copistas sofreriam pelas minhas indiscrições. Teriam sorte se escapassem sem os braços partidos e os 
polegares e indicadores cortados, o que seria uma indicação típica da satisfação de Agripina. Como essa 
mulher me detesta!
O exemplo do meu pai guiou­me ao longo da vida mais fortemente que o de qualquer outra pessoa, à 
excepção do meu irmão Germânico. E Germânico era, todos concordam, a imagem viva do meu pai nas 
feições, no corpo (à excepção das pernas finas), na coragem, intelecto e nobreza; assim, combino­os 
facilmente no meu espírito como uma figura única. Se eu pudesse com justiça começar esta história com 
um relato da minha infância, sem retroceder mais atrás do que a meus pais, certamente o faria, porque as 
genealogias e as histórias de família são entediantes. Mas não posso deixar de escrever com certo detalhe 
sobre a minha avó Lívia (a única dos meus quatro avós que estava viva quando nasci) porque, 
infelizmente, ela é uma figura principal na primeira parte da minha história e, a menos que eu faça um 
bom relato dos primeiros anos da sua vida, as suas acções posteriores não serão inteligíveis. Referi que ela 
foi casada com o Imperador Augusto: este foi o seu segundo casamento, depois de se ter divorciado do 
meu avô. Após a morte do meu pai, tornou­se a chefe virtual da família, suplantando a minha mãe 
Antónia, o meu tio Tibério (o chefe legal) e o próprio Augusto ­ sob cuja custódia poderosa o meu pai nos 
colocara no seu testamento.
Lívia, tal como meu avô, pertencia à família Claudiana, uma das mais antigas de Roma. Há uma balada 
popular, que por vezes ainda é cantada
21
pelas pessoas mais antigas, cujo refrão diz que a árvore Claudiana produz dois tipos de frutos: a maçã 
doce e a azeda; mas diz também que as maçãs azedas são em maior número. Dentro do tipo azedo, o autor 
da balada coloca: Ápio Cláudio o Altivo, que pôs Roma inteira em tumulto por ter tentado escravizar e 
seduzir uma rapariga nascida livre chamada Virgínia; Cláudio Druso, que nos tempos da República se 
tentou proclamar a si próprio Rei de toda a Itália; e Cláudio o Formoso que, quando as galinhas sagradas 
se recusaram a comer, as atirou ao mar, gritando ”Pois então que bebam”, perdendo assim uma importante 
batalha naval. Entre a primeira espécie, o autor da balada menciona; Ápio o Cego, que dissuadiu Roma de 
formar uma aliança perigosa com o Rei Pirro; Cláudio o Tronco, que expulsou os cartagineses da Sicília; 
Cláudio Nero (que, no dialecto sabino significa O Forte), que derrotou Asdrúbal quando ele deixou a 
Espanha para se juntar ao irmão, o grande Aníbal. Estes três eram todos eles homens virtuosos, além de 
ousados e sensatos. O autor diz ainda que também as mulheres Claudianas são, algumas delas, pêras  
doces, havendo outras que são mais to tipos azedo. Contudo, uma vez mais, as azedas são mais numerosas 
que as doces.
O meu avô era um dos melhores entre os Claudianos. Acreditando que Júlio César era um homem 
suficientemente poderoso para dar a Roma paz e segurança naqueles tempos difíceis, juntou­se à sua causa 
e lutou com bravura do lado de Júlio na Guerra do Egipto. Quando suspeitou que Júlio tinha em mira a 
tirania pessoal, o meu avô não esteve disposto a apoiar as suas ambições em Roma, embora não pudesse 
arriscar­se a uma ruptura declarada. Consequentemente, pediu e obteve a dignidade de pontífice e, como 
tal, foi enviado para França para fundar ali colónias de soldados veteranos. Quando regressou, depois do 
assassinato de Júlio conquistou a inimizade do jovem Augusto, filho adoptivo de Júlio, então conhecido 
como Octaviano, e do seu aliado, o grande Marco António, propondo arrojadamente honras para os 
tiranicidas. Foi obrigado a fugir de Roma. Nos tempos conturbados que se seguiram, aliou­se ora com um 
partido ora com outro, conforme a razão parecia estar de um ou de outro lado. Tão depressa estava com o 
jovem Pompeu, como com
o irmão de Marco António lutando contra Augusto, em Perúsia, na Etrúria. Mas, convencendo­se 
finalmente de que Augusto,
ainda que obrigado por uma questão de lealdade a vingar o assassinato de Júlio, seu pai adoptivo ­ dever 
que ele executou implacavelmente ­, não tinha alma de tirano e pretendia restabelecer as antigas 
liberdades do povo, colocou­se do seu lado e instalou­se em Roma com a minha avó Lívia e o meu tio 
Tibério, ao tempo apenas com dois anos de idade. Deixou de tomar parte das Guerras Civis, contentando­
se com os seus deveres pontificais.
A minha avó Lívia era uma das piores Claudianas. É bem possível, que tenha sido uma reencarnação 
daquela outra Cláudia, irmã de Cláudio
22
o Formoso, que foi acusada de alta traição porque, certa vez em que a carruagem dela foi detida pela 
multidão na rua, terá gritado:
­ Ah, se o meu irmão estivesse vivo! Ele saberia como afastar as multidões usando o chicote.
Quando um dos tribunos da plebe se aproximou e lhe ordenou irado que se calasse, recordando­lhe que o 
irmão, com a sua desumanidade, perdera uma frota romana, replicou:
­ Mais uma razão para desejar que estivesse vivo. Assim, poderia perder mais uma frota e depois outra, 
com a vontade dos Deuses, diminuindo um pouco esta malfadada multidão. ­ E acrescentou. ­ Vejo que 
sois um Protector do Povo e que a vossa pessoa é legalmente inviolável, mas não esqueçais que nós, 
Claudianos, já demos boas tareias em alguns de vós, sem nos ralarmos com a vossa inviolabilidade.
Era exactamente assim que, naquela altura, a minha avó Lívia falava do povo romano.
­ Ralé e escravos! A República sempre foi um embuste. Do que Roma precisa realmente é de ter 
novamente um rei.
Pelo menos, foi assim que ela falou com o meu avô, insistindo que Marco António e Augusto (ou 
Octaviano, deveria dizer) e Lépido (um nobre rico mas frouxo), que entre si governavam agora o mundo 
romano, acabariam por cair; e que, se ele fizesse bem o seu jogo, poderia usar a dignidade de pontífice e a 
reputação de integridade que lhe era atribuída por todas as facções para se tornar ele próprio rei. O meu 
avô replicou com severidade que, se ela voltasse a falar daquela maneira, se divorciaria dela; pois, 
segundo os moldes antigos do casamento romano, o marido poderia afastar a mulher sem qualquer 
explicação pública, devolvendo­lhe o dote mas conservando os filhos. Ao ouvir isto, a minha avó ficou 
silenciosa e fingiu submissão, mas todo o amor entre ambos morreu naquele momento. Sem que o meu 
avô soubesse, ela começou imediatamente a trabalhar para despertar as paixões de Augusto.
Não era coisa difícil, pois Augusto era jovem e impressionável e ela fizera um estudo cuidadoso dos 
gostos dele: além disso, ela era por veredicto popular uma das três mulheres mais belas do seu tempo. 
Escolhera Augusto por o achar melhor instrumento para as suas ambições do que António ­ Lépido não 
contava ­ e que nada o deteria na obtenção dos seus fins e proscrições; tinha­o demonstrado dois anos 
antes, quando
2.000 cavaleiros e 300 senadores pertencentes à facção oposta tinham sido sumariamente executados, de 
longe o maior número que caíra às mãos de Augusto. Quando se sentiu segura de Augusto, instigou­o a 
repudiar Escribónia ­ uma mulher mais velha do que ele, com quem se casara por razões políticas ­ 
dizendo­lhe que tinha conhecimento do adultério de Escribónia com um amigo próximo do meu avô. 
Augusto apressou­se a acreditar, sem pedir que lhe fossem fornecidas provas. Divorciou­se de
23
Escribónia, embora ela estivesse inocente, no próprio dia em que deu à luz a filha dele, Júlia, que ele 
retirou imediatamente do quarto sem que
Escribónia tivesse sequer olhado a pequena criatura, entregando­a à mulher de um dos seus escravos 
libertos para a criar. A minha avó ­ então apenas com dezassete anos, sendo nove anos mais nova que 
Augusto ­ foi ter com o meu avô e disse:
­ Agora divorcia­te de mim. Estou grávida de cinco meses e não és tu o pai da criança. Fiz a promessa de 
não voltar a gerar mais nenhum filho de um cobarde e tenciono cumpri­la.
O meu avô, independentemente do que possa ter sentido quando ouviu tal confissão, limitou­se a dizer:
­ Chama aqui o adúltero, para discutirmos a questão em privado. O filho na realidade era dele, mas isso 
não o podia saber e, quando a minha avó lhe disse que era de outro, ele acreditou.
O meu avô ficou espantado ao descobrir que fora o seu suposto amigo Augusto que o traíra, mas concluiu 
que Lívia o tentara e que ele não tinha resistido à beleza dela; e que talvez Augusto ainda sentisse algum 
ressentimento por causa da infeliz moção que ele em tempos apresentara no Senado, em que recompensou 
os assassinos de Júlio César. Fosse como fosse, não censurou Augusto. Limitou­se a dizer:
­ Se amas esta mulher e tencionas desposá­la honradamente, fica com ela; respeita apenas as 
conveniências.
Augusto jurou que casaria imediatamente com ela e nunca a repudiaria enquanto ela lhe fosse fiel; 
comprometeu­se com os mais terríveis juramentos. E o meu avô divorciou­se dela. Foi­me dito que ele 
considerou que esta paixão de Lívia era um castigo divino contra ele próprio por, uma vez na Sicília e 
instigado pela minha avó, ter armado escravos para lutarem contra cidadãos romanos; além disso, ela era 
uma Claudiana, pertencente à sua própria família. Por estas duas razões, ele não desejava que incorresse 
em desonra pública. Não foi certamente por medo de Augusto que ele assistiu pessoalmente ao casamento 
de minha avó algumas semanas mais tarde, levando­a ao altar como um pai faria à própria filha e 
acompanhando o hino do seu casamento. Quando penso que ele a amava profundamente e que através da 
sua generosidade se arriscou a ser chamado cobarde e perverso, encho­me de admiração pelo seu 
comportamento.
Mas Lívia era ingrata ­ ficou furiosa e envergonhada por ele parecer aceitar a situação com tanta calma, 
deixando­a ir como se se tratasse de uma coisa de pouco valor. E quando o filho dela, meu pai, nasceu, 
três meses mais tarde, ficou profundamente vexada com a irmã de Augusto, Octávia, mulher de Marco 
António ­ estes eram os meus outros dois avós ­, por causa de um epigrama em grego dizendo que felizes 
eram os pais que tinham filhos de três meses: uma gestação tão curta fora até
24
ali apanágio das gatas e das cadelas. Ignoro se Octávia foi realmente a autora do epigrama, mas, se o foi, 
Lívia fê­la pagar caro por isso. Era pouco provável que o fosse, pois ela própria se casara com Marco 
António estando grávida do filho de um marido que tinha morrido; e, como diz o provérbio, os coxos não 
troçam dos coxos. No entanto, o casamento de Octávia era assumidamente político, legalizado por um 
decreto especial do Senado: não fora provocado pela paixão por um lado e pela ambição por outro. Se 
perguntarem como foi que o Colégio dos Altos Pontífices consentiu em admitir a validade do casamento 
de Augusto com Lívia, a resposta é que o meu avô e Augusto eram ambos pontífices e que o Alto 
Pontífice era Lépido, que fazia exactamente o que Augusto lhe dizia.
Logo que o meu pai foi desmamado, Augusto mandou­o de volta para casa do meu avô, onde foi criado 
com meu tio Tibério, quatro anos mais velho. O meu avô, logo que as crianças chegaram à idade do 
entendimento, passou ele próprio a ocupar­se da sua educação, em vez de a confiar a um tutor, como era já 
o costume generalizado. Nunca deixou de lhes instilar o ódio à tirania e a devoção aos velhos ideais de 
justiça, liberdade e virtude. A minha avó queixava­se havia muito por os dois rapazes não estarem a seu 
cargo ­ embora na realidade a visitassem diariamente no palácio de Augusto, muito próximo da sua casa 
no Monte Palatino ­; quando descobriu os moldes em que estavam a ser educados ficou muito contrariada. 
O meu avô morreu de repente enquanto
jantava com alguns amigos e suspeitou­se que tivesse sido envenenado, mas a questão foi abafada porque 
Augusto e Lívia encontravam­se entre os convidados. Segundo o seu testamento, os rapazes ficaram à 
guarda de Augusto. O meu tio Tibério, apenas com nove anos, fez a oração fúnebre no funeral do meu avô.
Augusto amava ternamente a irmã Octávia e ficara muito desgostoso por ela quando, pouco depois de ela 
casar, soube que António, tendo partido para Leste por causa de uma guerra na Pártia, parara no caminho 
para reatar a sua intimidade com Cleópatra, rainha do Egipto; e ainda mais desgostoso ficou com a carta 
cheia de desprezo que Octávia recebera de António quando ela se pôs a caminho para o ajudar no ano 
seguinte com homens e dinheiro para a campanha. A carta que lhe chegou às mãos, quando já ia a meio 
caminho, ordenava­lhe friamente que voltasse para casa e se ocupasse dos assuntos domésticos; no 
entanto, aceitava o dinheiro e os homens. Lívia ficou secretamente encantada com o incidente, pois há 
muito que se dedicava insistentemente a criar malentendidos e invejas entre Augusto e António, situações 
que por sua vez Octávia era igualmente insistente em minimizar. Quando Octávia regressou a Roma, Lívia 
pediu a Augusto que a convidasse a deixar a casa de António e ir viver com eles. Ela recusou­se a fazê­lo, 
em parte porque não confiava em Lívia e também porque não queria tornar­se na causa da guerra 
iminente. Finalmente
25
António, incitado por Cleópatra, enviou a Octávia um pedido de divórcio e declarou guerra a Augusto. 
Esta foi a última das guerras civis, um duelo de morte entre os dois únicos homens que continuavam de pé
­ se é que posso usar tal metáfora ­ depois de um duelo sem tréguas no anfiteatro universal. Lépido 
continuava vivo, claro, mas prisioneiro em tudo excepto no nome e totalmente inofensivo ­ tinha sido 
obrigado a lançar­se aos pés de Augusto e suplicar que lhe poupasse a vida. Também o jovem Pompeu, a 
única outra pessoa com importância, cuja frota havia muito tempo comandava o Mediterrâneo, tinha 
entretanto sido capturado por Augusto e morto por António. O duelo entre Augusto e António foi breve. 
António foi totalmente derrotado na batalha naval em frente da costa de Áccio, na Grécia. Fugiu para 
Alexandria e aí pôs fim à
própria vida ­ como o fez também Cleópatra. Augusto assumiu como suas as conquistas de António no 
Leste e tornou­se, tal como Lívia planeara, o único governante do mundo romano. Octávia permaneceu 
fiel aos interesses dos filhos de António ­ não apenas do filho dele por uma esposa anterior mas, na 
verdade, dos seus três filhos com Cleópatra: uma rapariga e dois rapazes ­ educando­os com as suas duas 
filhas. A mais nova delas, Antónia, viria a ser minha mãe. Esta nobreza de espírito suscitou a admiração 
geral de Roma.
Augusto dirigiu o mundo, mas Lívia dirigiu Augusto. E eu tenho que explicar aqui a influência notável 
que teve sobre ele. Foi sempre causa de espanto não haver filhos do casamento, uma vez que a minha avó 
não se tinha revelado estéril e que Augusto era pai de quatro filhos naturais, além da filha Júlia, que não 
há razões para duvidar que fosse filha dele. Além disso, sabia­se que era apaixonadamente dedicado à 
minha avó. A verdade não é fácil de acreditar. A verdade é que o casamento nunca foi consumado. 
Augusto, embora suficientemente apto com outras mulheres, ficava impotente como uma criança quando 
tentava ter relações com a minha avó. A única explicação razoável é que Augusto era, no fundo, um 
homem piedoso, embora a crueldade e mesmo a má fé lhe tivessem sido impostas pelos perigos que se 
seguiram ao assassinato do tio­avô Júlio César. Ele sabia que o casamento era ímpio: este pensamento, ao 
que parece, afectava­o, deixando­o nervoso e pondo­lhe na carne uma contenção interior.
A minha avó, que quisera Augusto como um instrumento da sua ambição mais do que como amante, 
estava mais satisfeita do que triste com a impotência dele. Achava que podia usá­la como uma arma para 
submeter a vontade dele à sua. A atitude dela consistia em censurá­lo constantemente por a ter seduzido, 
afastando­a do meu avô, a quem afirmava ter amado, com protestos de paixão profunda e com ameaças 
secretas dirigidas a ele de que, se não a libertasse, ela o faria deter como inimigo público (esta última parte 
era totalmente falsa). E agora bastava ver, dizia
26
ela, como tinha sido enganada! O amante apaixonado não era homem nenhum; qualquer pobre 
carvoeiro ou escravo era mais homem do que ele! Até mesmo Júlia não era sua filha verdadeira e ele 
sabia­o. Tudo aquilo para que ele servia, dizia, era para acariciar, tocar, beijar e fazer olhinhos como 
qualquer eunuco cantor. Augusto protestava em vão que, com outras mulheres, era um verdadeiro 
Hércules. Ela ou se recusava a acreditar ou o acusava de esbanjar com essas outras mulheres aquilo que 
lhe negava a ela. Mas para que não viesse a público nenhum escândalo relacionado com tudo isto, ela 
fingiu a dada altura que estava grávida dele e, depois, que tinha abortado. A vergonha e a paixão insaciada 
ligavam Augusto mais fortemente a ela do que se os seus anseios mútuos tivessem sido satisfeitos todas as 
noites ou se ela lhe tivesse dado uma dúzia de filhos sãos e escorreitos. Como Lívia se ocupava bem da 
sua saúde e conforto e lhe era fiel, pois a sua concupiscência apenas almejava o poder, sentia­se de tal 
forma grato que a deixava guiá­lo e dirigi­lo em todos os actos públicos e privados. Ouvi afirmar com 
segurança pelos velhos funcionários do palácio que, depois de casar com a minha avó, Augusto nunca 
mais olhou para outra mulher. No entanto, corriam em Roma toda a espécie de histórias sobre as suas 
aventuras com mulheres e filhas de notáveis; e depois da sua morte, ao explicar como era possível que 
tivesse tido um domínio tão completo sobre as afeições dele, Lívia costumava dizer que não era apenas 
por lhe ter sido fiel, mas também por nunca ter interferido com as suas aventuras amorosas passageiras. 
Estou convencido de que ela punha todos estes escândalos à sua volta para ter alguma coisa a censurar­
lhe.
Caso seja interrogado sobre as minhas fontes para esta curiosa história, citá­las­ei. A primeira parte, 
relativa ao divórcio, soube­a pela própria Lívia no ano em que ela morreu, O restante, sobre a impotência 
de Augusto, ouvi­o a uma mulher chamada Brises, camareira da minha mãe, que servira anteriormente 
como aia de minha avó e que, tendo então apenas sete anos de idade, era autorizada a ouvir conversas que 
todos pensavam que ela era demasiado jovem para entender. Acredito que o meu relato é verdadeiro e 
continuarei a acreditar nele até que seja suplantado por outro que se ajuste igualmente bem aos factos. 
Segundo a minha maneira de pensar, o verso da Sibila que refere esposa, não­esposa confirma a questão. 
Não posso concluir aqui este assunto. Ao escrever esta passagem, com a ideia, suponho, de proteger o 
bom­nome de Augusto, tenho estado a esconder uma coisa que afinal vou revelar agora. É que, como diz o 
provérbio, a verdade ajuda a consolidar a história. É o seguinte. A minha avó Lívia consolidou 
engenhosamente o seu ascendente sobre Augusto dando­lhe em segredo, por sua iniciativa, belas jovens 
para dormirem com ele sempre que notava que a paixão o deixava inquieto. O facto de ela lhe 
proporcionar tal coisa, e sem dizer uma palavra antes ou depois,
27
refreando o ciúme que, como esposa, estava convencido que ela devia sentir; tudo feito com muita 
decência e discrição, as jovens (escolhidas pela própria Lívia no mercado de escravos sírio ­ ele preferia as 
sírias) eram introduzidas no quarto de Augusto durante a noite com uma pancada e um tilintar de corrente 
como sinal, e chamadas para se irem embora de manhã com uma pancada e um tilintar iguais; o facto 
delas se manterem silenciosas na sua presença como se fossem súcubos que aparecessem em sonhos ­ o 
facto dela executar tudo isto com tanto cuidado ao mesmo tempo que lhe permanecia fiel apesar da sua 
impotência em relação a ela, deve ter­lhe surgido como a prova perfeita do amor mais sincero. Podeis 
contrapor que Augusto, na posição que ocupava, podia ter tido as mulheres mais belas do mundo, escravas 
ou livres, casadas ou solteiras, para satisfazer o seu apetite, sem a assistência de Lívia como alcoviteira. 
Isso é verdade, mas também é verdade que depois do seu casamento com Lívia ele não tocava em carnes 
como ele próprio disse uma vez embora talvez noutro contexto; que ela não tivesse declarado adequadas 
para serem consumidas.
Das mulheres, portanto, Lívia não tinha razões para sentir ciúme, à excepção da cunhada, a minha outra 
avó, Octávia, cuja beleza suscitava tanta admiração como a sua virtude. Lívia sentira um prazer malicioso 
em lhe manifestar a sua simpatia por causa da infidelidade de António. Tinha chegado ao ponto de sugerir 
que fora em grande parte culpa da própria Octávia, por se vestir com tanta modéstia e se comportar com 
tanto decoro. Marco António, fez­lhe notar, era um homem de paixões fortes e, para uma mulher o reter 
com êxito, tinha que temperar a castidade de matrona romana com as artes e extravagâncias de uma 
cortesã oriental. Octávia devia ter retirado uma folha do livro de Cleópatra, pois a egípcia, embora inferior 
a Octávia no aspecto físico e mais velha oito ou nove anos, sabia bem como alimentar o apetite sexual de 
António.
­ Os homens como ele, os verdadeiros homens, preferem o estranho ao saudável, ­ concluiu Lívia com ar 
sentencioso. ­ Para eles, o queijo verde com lagarta é mais saboroso que a coalhada fresca.
­ Guardai para vós as vossas lagartas, ­ ripostou Octávia furiosa. Lívia vestia­se ricamente e usava os mais 
dispendiosos perfumes asiáticos; mas não permitia a menor extravagância na sua casa, que se gabava de 
dirigir à velha moda romana. As suas regras eram: comida simples mas abundante, devoções familiares 
com regularidade, nada de banhos quentes depois das refeições, trabalho constante para todos e nada de 
desperdícios. Todos não se referia apenas aos escravos e libertos, mas a todos os membros da família. 
Sobre a infeliz Júlia recaíam as expectativas de um exemplo de diligência. Levava uma vida muito 
cansativa. Tinha uma tarefa diária de cardar lã e fiar, tecer e coser, era obrigada a levantar­se da cama dura 
ao amanhecer e mesmo antes do
28
amanhecer nos meses de Inverno, para dar conta do recado. E como a madrasta acreditava numa educação 
liberal para as raparigas, cabia­lhe, entre outras tarefas, aprender de cor toda a Ilíada e a Odísseia de 
Homero.
Júlia tinha ainda que manter um diário pormenorizado, para benefício de Lívia, do trabalho que fazia, dos 
livros que lia, das conversações que tinha e assim por diante; o que era um fardo enorme para ela. Não lhe 
eram permitidas amizades com homens, embora a sua beleza fosse muito celebrada. Um jovem de uma 
família antiga e de moral irrepreensível, filho de um Cônsul, foi suficientemente ousado para se lhe 
apresentar um dia em Baiae sob um pretexto cortês, quando ela dava o passeio de meia hora à beira mar 
que lhe era permitido, acompanhada apenas pela sua aia. Lívia, que sentia inveja da beleza de Júlia e da 
afeição de Augusto por ela, mandou que enviassem ao jovem uma carta muito ríspida, dizendo­lhe que 
nunca poderia aspirar a um cargo público sob os auspícios do pai da rapariga cujo bom nome ele tentara 
manchar com esta insuportável familiaridade. A própria Júlia foi punida com a proibição de dar os seus 
passeios fora dos terrenos da villa. Por esta altura Júlia ficou careca. Não sei se Lívia teve alguma coisa a 
ver com isso: não me parece impossível, embora sem dúvida a calvície fosse uma característica da família 
César. De qualquer forma, Augusto arranjou um fabricante de perucas egípcio que lhe fez uma das mais 
esplêndidas cabeleiras louras que alguma vez foi vista e os encantos da jovem foram desta forma 
aumentados e não diminuídos por aquele infortúnio; o seu cabelo natural nada tinha de notável. Diz­se que 
a cabeleira não foi armada, à maneira habitual, sobre uma rede de cabelo, mas que se tratava do escalpe 
completo da filha de um chefe germânico que foi encolhido para tomar a dimensão exacta da cabeça de 
Júlia e que era mantido vivo e flexível com a aplicação ocasional de um unguento especial. No entanto, 
devo dizer que não acredito nisso.
Todos sabiam que Lívia mantinha Augusto sob uma disciplina estrita e que, embora não se pudesse dizer 
que tivesse realmente medo dela, tomava de qualquer forma o maior cuidado em não a ofender. Um dia, 
na sua qualidade de Censor, fazia uma prelecção a alguns homens ricos por deixarem as respectivas 
mulheres encherem­se de jóias.
­ O adorno excessivo não é apropriado para uma mulher, ­ disse.
­ É dever do marido afastá­la da luxúria. ­ Deixando­se transportar pela própria eloquência, acrescentou 
infelizmente, ­ Por vezes, tenho a oportunidade de admoestar a minha própria esposa neste sentido.
Ouviu­se uma exclamação de deleite vinda dos culpados.
­ Oh, Augusto, ­ disseram, ­ conta­nos por favor com que palavras admoestas Lívia. Isso servir­nos­á de 
modelo.
Augusto ficou alarmado e sobressaltado.
­ Ouvistes mal, ­ atalhou, ­ eu não disse que alguma vez tivesse tido ocasião de repreender Lívia. Como 
bem sabeis, ela é um modelo de
29
modéstia feminina. Mas eu certamente não teria qualquer hesitação em a admoestar caso ela esquecesse a 
sua dignidade no vestir, como acontece com algumas das vossas esposas, como uma dançarina de 
Alexandria que por alguma estranha reviravolta da sorte se tornasse rainha­mãe da Arménia.
Nessa mesma noite, Lívia tentou amesquinhar Augusto aparecendo à mesa do jantar com os atavios mais 
fantasticamente espampanantes que conseguiu arranjar, baseados num dos trajos de cerimónia de 
Cleópatra. Mas ele saiu­se bem da situação embaraçosa, elogiando­a pela sua humorística e oportuna 
caricatura do exacto defeito que ele tinha estado a condenar.
Lívia tornara­se mais sensata desde o tempo em que aconselhara o meu avô a pôr um diadema na cabeça e 
proclamar­se a si mesmo rei. O título de rei continuava a ser execrado em Roma por causa da impopular 
dinastia de Tarquínio à qual, segundo a lenda, o primeiro Brutus (chamo­lhe assim para o distinguir do 
segundo Brutus, que assassinou Júlio César) tinha posto fim ­ expulsando a família real da Cidade e 
tornando­se um dos primeiros dois Cônsules da República Romana. Lívia compreendia agora que o título 
de rei podia ser adiado desde que Augusto conseguisse controlar os poderes substanciais da realeza. 
Seguindo o conselho dela, ele concentrou gradualmente na sua pessoa todas as dignidades republicanas 
importantes. Foi Cônsul em Roma e, quando passou o cargo para um amigo de confiança, assumiu em 
troca o Alto Comando ­ que, embora nominalmente estivesse ao nível do consulado, na prática estava 
acima deste ou de qualquer outra magistratura. Tinha também controlo absoluto sobre as províncias e 
poder para designar os governadores­gerais das mesmas, além do comando de todos os exércitos e o 
direito de reunir tropas e fazer a guerra ou a paz. Em Roma votaram­lhe o cargo vitalício de Protector do 
Povo, que lhe servia de garantia contra toda e qualquer interferência na sua autoridade, lhe dava o poder 
de vetar as decisões de outros dignitários, e tinha implícita a inviolabilidade da sua pessoa. O título de 
Imperador, que anteriormente significava apenas marechal de campo, mas que acabou por adquirir 
recentemente o significado de monarca supremo, partilhava­o com outros generais de sucesso. Tinha 
também o cargo de Censor, que lhe dava autoridade sobre duas das principais ordens sociais: a dos 
Senadores e a dos Cavaleiros; sob o pretexto de falhas de ordem moral, ele podia destituir qualquer 
membro de uma dessas ordens das suas dignidades e privilégios ­ uma desgraça que se fazia sentir com 
agudeza. Tinha controlo do Tesouro Público: era seu dever apresentar contas periodicamente, mas nunca 
ninguém ousou pedir uma auditoria, embora se soubesse que havia malabarismos constantes entre o 
Tesouro e o Erário Privado.
Desta forma, ele tinha o comando dos exércitos, o controlo das leis a sua influência no Senado era de tal 
ordem que votavam o que quer que
30
fosse que ele sugerisse ­, o controlo das finanças públicas, o controlo do comportamento social e a 
inviolabilidade pessoal. Tinha mesmo o direito de condenar sumariamente qualquer cidadão romano, 
desde o camponês ao senador, à morte ou ao desterro perpétuo. A última dignidade que assumiu foi a de 
Alto Pontífice, que lhe deu o controlo de todo o sistema religioso. O Senado estava ansioso por lhe votar 
qualquer cargo que ele quisesse aceitar, excepto o de Rei: receavam votar­lhe a realeza, com medo do  
povo. O seu verdadeiro desejo era ser chamado Rómulo, mas Lívia desaconselhou­o de promover tal 
coisa. O argumento dela era que Rómulo tinha sido rei e que o nome era portanto perigoso; além disso, ele 
era uma das divindades tutelares romanas e, portanto, tomar­lhe o nome poderia parecer blasfémia. Mas o 
que ela sentia no fundo era que esse título não seria suficientemente grandioso. Rómulo fora um simples 
chefe de bandidos e não se encontrava entre os deuses de primeira grandeza. A conselho dela, deu a 
entender ao Senado que o título de Augusto lhe seria agradável. E o Senado votou­lho. Augusto tinha uma 
conotação semi­divina e o vulgar título de Rei não era nada em comparação.
Quantos simples reis pagaram tributo a Augusto! Quantos foram feitos desfilar acorrentados nos triunfos 
romanos! Não tinha o próprio Alto Rei da remota índia, ao ouvir falar da fama de Augusto, enviado 
embaixadores a Roma, pedindo a protecção da sua amizade, com presentes propiciatórios de sedas e 
especiarias notáveis; e rubis, esmeraldas e sardonix; e tigres, então a serem vistos pela primeira vez na 
Europa; e o Hermes indiano, o famoso rapaz sem braços que conseguia fazer as coisas mais 
extraordinárias com os pés? Não tinha Augusto posto fim àquela linhagem de reis no Egipto, que datava 
de pelo menos 5.000 anos antes da fundação de Roma? E nessa fatal interrupção da história, que 
monstruosos portentos não tinham sido vistos? Não tinha havido faiscar de armaduras nas nuvens e queda 
de chuva ensanguentada? Não tinha aparecido na rua principal de Alexandria uma serpente gigantesca que 
produzia um sibilar incrivelmente forte? Não tinham também aparecido os fantasmas de faraós mortos? 
As suas estátuas não tinham franzido as testas com severidade? Ápis, o boi sagrado de Mênfis, não tinha 
soltado um mugido lamentoso e choroso? Era assim que a minha avó raciocinava para consigo mesma.
A maior parte das mulheres tem tendência para estabelecer limites modestos para as suas ambições: 
algumas, raras, estabelecem limites ousados. Mas Lívia era única em não pôr qualquer limite à sua, ao 
mesmo tempo que permanecia perfeitamente lúcida e controlada naquilo que seria considerado em 
qualquer outra mulher como loucura furiosa. Só gradualmente, com todas as excelentes oportunidades que 
tinha de a observar, acabei por descobrir de uma maneira geral quais as intenções dela. Mas mesmo assim, 
quando chegou o momento da revelação final,
31
ela veio como um choque de surpresa. Talvez seja melhor registar aqui vários actos na sua sequência 
histórica, em vez de me alongar sobre os seus motivos escondidos.
A conselho seu, Augusto convenceu o senado a criar duas novas divindades, designadamente, a Deusa 
Roma, que representava a alma feminina do Império Romano, e o Semi­deus Júlio, o herói guerreiro que 
era Júlio César em apoteose (honras divinas tinham sido oferecidas a Júlio, no Oriente, quando ainda 
estava vivo; o facto de não as ter recusado fora uma das razões do seu assassinato). Augusto conhecia o 
valor de um laço religioso para unir a província à Cidade, um laço muito mais forte que aquele que se 
baseava apenas no medo ou na gratidão. Acontecia por vezes que, depois de um longo período de 
residência no Egipto ou na Ásia Menor, mesmo os romanos da melhor água passavam a adorar os deuses 
que encontravam por lá e esqueciam os seus, tornando­se assim estrangeiros, em tudo excepto no nome. 
Por outro lado, Roma tinha importado tantas religiões das cidades que conquistara, dando às divindades 
estrangeiras, tais como ísis e Cibele, templos nobres na cidade ­ e não apenas para conveniência dos 
visitantes ­, que era razoável que resolvesse agora, numa troca justa, implantar deuses seus nessas cidades. 
Roma e Júlio, portanto, deviam ser adorados pelos provincianos, que eram cidadãos romanos e desejavam 
ser recordados da sua herança nacional.
O passo que Lívia tomou a seguir foi arranjar delegações de provincianos, não suficientemente 
afortunados para terem a cidadania completa, que visitassem Roma para pedir que lhes fosse dado um 
Deus romano, a quem pudessem adorar com lealdade e sem presunção. A conselho de Lívia, Augusto 
disse ao Senado, meio a brincar, que a estes pobres diabos, embora não fosse possível permitír­lhes que 
adorassem as divindades superiores, Roma e Júlio, não devia ser­lhes negada uma qualquer espécie de 
Deus, por mais humilde que fosse. Neste ponto, Mecenas, um dos ministros de Augusto, com quem este já 
discutira se seria ou não aconselhável adoptar o nome de Rómulo, disse:
­ Dêmos­lhes um Deus que tomará bem conta deles. Demos­lhes o próprio Augusto.
Augusto mostrou­se um tanto embaraçado, mas admitiu que a sugestão de Mecenas era razoável. Era um 
costume enraizado entre os orientais, e que podia muito bem ser aproveitado a favor dos romanos, prestar 
honras divinas aos seus governantes; mas visto que era nitidamente impraticável para as cidades orientais 
adorar todo o Senado de uma vez, pondo 600 estátuas em cada um dos seus santuários, uma maneira de 
sair dessa dificuldade era certamente que eles adorassem o chefe do executivo do senado, que, por 
coincidência, era ele próprio. Assim o Senado, sentindo­se gratificado, na medida em que cada um dos 
seus
32
membros tinha em si pelo menos uma seiscentésima parte de divindade, votou com agrado a moção de 
Mecenas e, na Ásia Menor, imediatamente foram erigidos santuários dedicados a Augusto. O culto 
espalhou­se mas, de início, apenas nas províncias fronteíríças, que estavam sob o controlo directo de 
Augusto, não nas províncias do próprio país, que estavam nominalmente sob o controlo do Senado, nem 
na Cidade em si.
Augusto aprovava os métodos educativos de Lívia em relação a júlia e as suas disposições e economias 
domésticas. Ele, pessoalmente, tinha gostos simples. O seu palato era tão insensível que não notava a 
diferença entre o azeite virgem e o produto de qualidade inferior obtido depois da pasta de azeitona ter 
passado na prensa pela terceira vez. Usava roupas de tecido grosseiro. Dizia­se com razão que, embora 
Lívia fosse uma megera, se não fosse a sua incansável actividade, Augusto nunca teria conseguido 
empreender a imensa tarefa que impôs a si próprio: a de devolver a Roma a paz e a segurança depois dos 
estragos prolongados das Guerras Civis ­ nas quais ele próprio, claro, tivera um papel tão destrutivo. O 
trabalho de Augusto ocupava­o catorze horas por dia, mas o de Lívia, dizia­se, ocupava vinte e quatro. 
Não só dirigia da maneira eficiente que descrevi a sua enorme casa, mas suportava com ele, em partes 
iguais, os negócios públicos. Um relato completo de todas as reformas legais, sociais, administrativas, 
religiosas e militares que levaram a cabo entre ambos, para não falar das obras públicas que 
empreenderam, dos templos que reedificaram, das colónias que implementaram, encheria muitos volumes. 
No entanto, havia muitos romanos distintos da geração mais antiga que não conseguiam esquecer que esta 
reconstituição aparentemente admirável do Estado só tinha sido viabilizada pela derrota militar, pelo 
assassínio secreto ou pela execução pública de praticamente todas as pessoas que tinham desafiado o 
poder daquele casal enérgico. Se o seu poderio único e arbitrário não tivesse aparecido disfarçado sob as 
formas da liberdade antiga, eles nunca o teriam conseguido manter por muito tempo. Mesmo assim, houve 
nada menos de quatro conspirações contra a vida de Augusto por aspirantes a Brutus.
33
CAPíTULO III
O nome Lívia está relacionado com a palavra latina que significa Malignidade. A minha avó era uma 
actriz consumada e a pureza exterior da sua conduta, a agudeza do seu espírito e a graciosidade dos seus 
modos enganavam praticamente todos. Mas, na realidade, ninguém gostava dela: a malignidade suscita 
respeito, mas não afeição. Ela tinha a capacidade de fazer com que pessoas vulgares e despreocupadas se 
sentissem, na sua presença, fortemente conscientes das suas falhas intelectuais e morais. Sinto­me na 
obrigação de pedir desculpa por continuar a escrever sobre Lívia, mas é inevitável: como todas as histórias 
romanas honestas, esta é escrita de fio a pavio. Prefiro a meticulosidade romana ao método de Homero e 
dos gregos em geral, que adoram saltar para o meio das coisas e depois recuar ou avançar, conforme a 
inclinação do momento. Sim, tive muitas vezes a ideia de reescrever a história de Tróia em prosa latina, 
para benefício dos nossos cidadãos mais pobres, que não sabem ler grego; começando com o nascimento 
de Helena e continuando, capítulo após capítulo, seguindo o fio dos acontecimentos, até que os pavios se 
acendessem para iluminar a grande festa em celebração do regresso de Ulisses e da sua vitória sobre os 
pretendentes da própria esposa. Nos pontos em que Homero é obscuro ou silencioso sobre qualquer 
aspecto, eu consultaria naturalmente os poetas posteriores ou do anterior Dares, cujo relato, embora cheio 
de divagações poéticas, me parece mais fiável que o de Homero, pois ele participou realmente na guerra, 
primeiro com os troianos, depois com os gregos.
Vi uma vez uma estranha pintura no interior de uma velha arca de cedro, vinda, julgo, de algum lugar no 
norte da Síria. A inscrição, em grego, era Veneno é Rainha e o rosto de Veneno, embora executado mais 
de cem anos antes do nascimento de Lívia, era, sem sombra de dúvida o da própria Lívia. Neste contexto, 
tenho que escrever acerca de Marcelo, filho de Octávia com um marido anterior. Augusto, que sentia 
grande estima por Marcelo, adoptara­o como filho, confiando­lhe tarefas administrativas muito para além 
da sua idade; e casara­o com Júlia. A opinião corrente em Roma era que ele tencionava fazer de Marcelo 
seu herdeiro. Lívia não se opôs à adopção e, na realidade, pareceu aceitá­la como uma maneira mais fácil 
de conquistar a afeição e a confiança de Marcelo. A
35
sua afeição por ele parecia inquestionável. Foi a conselho seu que Augusto lhe proporcionou um progresso 
tão rápido; e Marcelo, que sabia disto, sentia para com ela uma forte gratidão.
O motivo de Lívia em favorecer Marcelo era visto por alguns observadores astutos como sendo o de 
provocar o ciúme de Agripa. Agripa era o homem mais importante de Roma a seguir a Augusto: um 
homem de baixa condição, mas o mais antigo amigo de Augusto e o general e almirante de maior sucesso. 
Até então, Lívia fizera tudo para manter a amizade de Agripa por Augusto. Ele era um homem ambicioso, 
mas só até certo ponto. Nunca teria a presunção de disputar a soberania de Augusto, a quem admirava 
excessivamente e não desejava maior glória que a de ser o ministro em quem ele mais confiava. Tinha, 
além disso, uma forte consciência das suas origens humildes e Lívia, no seu papel de grande dama 
patrícia, sempre o dominou. A importância dele para Lívia e Augusto não residia, no entanto, apenas nos 
seus serviços, lealdade e popularidade junto do povo e do Senado. Era assim: por uma ficção que a própria 
Lívia criara originariamente, incumbia­lhe manter uma posição de vigilância, em nome da nação, sobre a 
conduta política de Augusto. No famoso debate simulado ocorrido no Senado, após a queda de António, 
entre Augusto e os seus dois amigos, Agripa e Mecenas, o papel de Agripa consistira em aconselhá­lo 
contra a tomada do poder de soberania; apenas para permitir que as suas objecções fossem contrariadas 
pelos argumentos de Mecenas e pelos pedidos entusiásticos do senado. Agripa declarara então que serviria 
fielmente Augusto enquanto a soberania fosse benéfica e não se tratasse de uma tirania arbitrária. A partir 
daí, ganhou o respeito e a confiança populares, como um baluarte contra possíveis infiltrações da tirania; e 
aquilo que Agripa deixava passar, a nação deixava passar. Pensavam agora os mesmos observadores 
argutos que Lívia estava a jogar um jogo muito perigoso, ao suscitar em Agripa sentimentos de inveja em 
relação a Marcelo. Os acontecimentos eram observados com grande interesse. Talvez a devoção dela para 
com Marcelo fosse falsa e a sua verdadeira intenção fosse levar Agripa a afastá­lo do caminho. Havia 
rumores em como um membro dedicado da família de Agripa se teria oferecido para provocar uma 
desavença com Marcelo e matá­lo: mas que Agripa, embora não sentisse menos inveja do que Lívia 
desejava, era demasiado nobre para aceitar uma sugestão tão baixa.
Era ponto assente, de uma maneira geral, que Augusto tinha feito Marcelo seu herdeiro principal e que 
Marcelo herdaria não apenas a sua imensa riqueza, mas a monarquia, tudo no mesmo pacote ­ pois de que 
outra forma posso eu escrever sobre isso a não ser assim? Agripa, portanto, fez saber que, embora fosse 
dedicado a Augusto e nunca tivesse lamentado a decisão de apoiar a sua autoridade, havia uma coisa que 
nunca iria permitir: designadamente, que a monarquia se tornasse hereditária.
36
Mas Marcelo era agora quase tão popular como Agripa e muitos jovens de posição e de família, a quem a 
pergunta Monarquia ou República? parecia já uma questão acadêmica, tentavam ganhar­lhe as boas 
graças, esperando alcançar dele honras importantes quando sucedesse a Augusto. Esta prontidão 
generalizada para acolher a continuação da monarquia parecia agradar a Lívia, mas ela anunciou em 
privado que, na eventualidade lamentável da morte ou incapacidade de Augusto, a condução imediata dos 
negócios do Estado, enquanto outras disposições não fossem tomadas por decreto do senado, devia ser 
confiada a mãos mais experientes que as de Marcelo. No entanto, Marcelo gozava de tal favoritismo junto 
de Augusto que, embora as declarações de Lívia em privado acabassem geralmente como éditos públicos, 
ninguém lhe prestou muita atenção naquele momento: e cada vez mais pessoas cortejavam Marcelo.
os observadores argutos perguntavam a si mesmos como é que Lívia encararia esta nova situação; mas a 
sorte parecia estar do lado dela. Augusto apanhou uma ligeira constipação, que teve uma evolução 
inesperada, com febres e vómitos: Lívia preparava­lhe a comida com as suas próprias mãos enquanto 
esteve doente, mas o estômago dele estava tão delicado que não conseguia guardar a comida. Ele foi 
ficando cada vez mais fraco e sentiu, por fim, que estava à beira da morte. Muitas vezes lhe tinha sido 
pedido que nomeasse o seu sucessor,
mas não o fizera com medo das consequências políticas e também porque o pensamento da própria morte 
lhe era extremamente desagradável. Agora, sentia que era seu dever nomear alguém e pediu a Lívia que o 
aconselhasse. Disse que a doença lhe tinha roubado toda a capacidade de raciocínio; escolheria qualquer 
sucessor que, dentro dos limites do razoável, lhe fosse sugerido por ela. Assim, Lívia tomou a decisão por 
ele e Augusto aceitou. chamou então à cabeceira do doente o seu colega Cônsul, os magistrados da cidade 
e certos senadores e cavaleiros representativos. Ele estava demasiado fraco para dizer o que quer que 
fosse, mas entregou ao Cônsul um registo das forças militares e navais e uma declaração dos rendimentos 
públicos; depois, chamou Agripa com um aceno e deu­lhe o seu anel de sinete; o que equivalia a dizer que 
Agripa lhe sucederia, embora com a co­operação estreita dos Cônsules. Isto surgiu como uma grande 
surpresa. Todos esperavam que Marcelo fosse o escolhido.
A partir daquele momento, Augusto começou a melhorar misteriosamente: a febre baixou e o estômago 
passou a aceitar a comida. No entanto, o crédito pela sua cura não foi para Lívia, que continuava a ocupar­
se dele pessoalmente, mas para um certo médico chamado Musa, que tinha a mania inofensiva de recorrer 
às loções e poções frias. Augusto ficou tão grato a Musa pelos seus supostos serviços, que lhe ofertou o 
seu próprio peso em moedas de ouro, o que o Senado duplicou. Musa, embora fosse um escravo liberto, 
recebeu o grau de cavaleiro, o que lhe dava o direito
37
de usar um anel de ouro e de se candidatar ao serviço público; e um decreto ainda mais extravagante foi 
promulgado pelo Senado, concedendo isenção de impostos a toda a classe médica.
Marcelo ficou nitidamente mortificado por não ter sido declarado herdeiro de Augusto. Com os seus 20 
anos, era ainda muito jovem. Os favores anteriores de Augusto tinham­lhe dado uma noção exagerada, 
tanto dos seus talentos como da sua importância política. Tentou enfrentar a situação sendo abertamente 
mal­educado para com Augusto, num banquete público. Agripa controlou com dificuldade a irritação, mas 
o facto do incidente não ter tido consequências levou os apoiantes de Marcelo a convencerem­se que 
Agripa tinha medo dele. Disseram mesmo uns aos outros que, se Augusto não mudasse de opinião dentro 
de um ou dois anos, Marcelo usurparia o poder Imperial. Tornaram­se tão desordeiros e fanfarrões, sem 
que Marcelo fizesse grande coisa para os controlar, que houve conflitos frequentes entre eles e o partido 
de Agripa. Agripa estava profundamente incomodado com a insolência daquele cachorrinho, como lhe 
chamava ­ ele, que detivera a maior parte dos principais cargos públicos e ganhara uma série de 
campanhas. Mas a sua decepção estava misturada com alarme. A impressão criada por estes incidentes era 
de que Marcelo e ele estavam disputando de maneira indecente quem deveria usar o anel de sinete de 
Augusto depois da morte deste.
Ele estava pronto a fazer praticamente qualquer sacrifício para evitar parecer que fazia tal papel. Marcelo 
era o ofensor e Agripa desejava pôr o fardo completo nos ombros dele. Decidiu retirar­se de Roma. Foi 
procurar Augusto e pediu para ser nomeado Governador da Síria. Quando Augusto lhe perguntou as 
razões daquele pedido inesperado, ele explicou que pensava poder, uma vez detentor daquele cargo, fazer 
um acordo valioso com o rei da Pártia. Poderia persuadir o Rei a devolver as Águias regimentais e os 
prisioneiros capturados aos romanos trinta anos antes, em troca pelo filho do rei, que Augusto detinha 
cativo em Roma. Não disse nada sobre o desentendimento com Marcelo. Augusto, que ficara ele próprio 
bastante incomodado com o caso, dividido entre uma amizade antiga por Agripa e um indulgente amor 
paternal por Marcelo, não se permitiu reconhecer até que ponto o comportamento de Agripa era generoso, 
pois isso teria sido uma confissão de fraqueza; por conseguinte, também não fez qualquer referência a essa 
questão. Acedeu com entusiasmo ao pedido de Agripa, afirmando como era importante recuperar as 
Águias e os cativos ­ se é que alguns ainda continuavam vivos, ao fim de tanto tempo ­ e perguntou 
quando é que ele estaria pronto para começar. Agripa ficou magoado, interpretando mal a atitude de 
Augusto. Pensou que este se queria ver livre dele, acreditando de facto que estava em disputa com  
Marcelo por causa da sucessão. Agradeceu­lhe ter acedido
38
ao pedido, protestando friamente a sua lealdade e amizade, e disse que estava pronto para embarcar no dia 
seguinte.
Não foi para a Síria. Não passou da ilha de Lesbos, mandando à frente o seu lugar­tenente para 
administrar a província por ele. Sabia que a sua estada em Lesbos seria interpretada como uma espécie de 
desterro, em que incorrera por causa de Marcelo, Não visitou a província, porque, se o tivesse feito, isso 
teria dado aos partidários de Marcelo um pretexto contra ele: certamente teriam dito que ele fora para o 
Oriente a fim de reunir um exército para marchar contra Roma. Mas lisonjeava­o saber que Augusto não 
tardaria a precisar dos seus serviços; e estava totalmente convencido de que Marcelo planeava usurpar a 
monarquia. Lesbos gozava de uma proximidade de Roma bastante conveniente. Nao esqueceu a sua 
incumbência e abriu as negociações, através de intermediários, com o rei da Pártia, mas não esperava 
conclui­las tão depressa. É preciso bastante tempo e paciência para conseguir um acordo vantajoso com 
um monarca oriental.
Marcelo foi eleito magistrado da cidade, o seu primeiro cargo público, e fez disso a ocasião para uma 
demonstração magnífica de jogos Públicos. Não só ergueu tendas nos próprios teatros, contra o sol e a 
chuva, decorando­os com tapeçarias esplêndidas, como transformou toda a Praça do Mercado num 
gigantesco pavilhão em várias cores. O efeito era deslumbrante, particularmente no interior, quando 
atravessado pelo sol. Para fazer as tendas, usou uma quantidade fabulosa de tecido vermelho, amarelo e 
verde que, uma vez os jogos terminados, foi cortado em pedaços e distribuído pelos cidadãos para fazerem 
vestuário e roupa de cama. Um grande número de animais selvagens fora importado de África para os 
combates no anfiteatro, incluindo numerosos leões, e houve uma luta entre cinquenta cativos germanos e 
igual número de guerreiros negros de Marrocos. O próprio Augusto contribuiu largamente para as 
despesas; assim como Octávia, como mãe de Marcelo. Quando Octávia apareceu na procissão cerimonial, 
foi saudada com um aplauso tão vibrante que Lívia mal conseguiu conter as lágrimas de raiva e inveja. 
Dois dias mais tarde, Marcelo adoeceu. Os sintomas eram precisamente os mesmos que Augusto revelara 
durante a sua doença recente e, como é natural, Musa foi novamente requisitado. O médico tinha­se 
tornado imensamente rico e famoso, cobrando 1.000 moedas de ouro por uma simples visita profissional; 
e tudo como se fosse um favor. Em todos os casos em que a doença não se apoderara dos doentes com 
demasiada força, a simples menção do seu nome era o suficiente para provocar a cura imediata. O crédito 
ia para as loções e poções frias, as prescrições secretas que recusava comunicar a quem quer que fosse. A 
confiança de Augusto nos poderes de Musa era tão grande que não prestou muita atenção à doença de 
Marcelo e os Jogos continuaram. Mas, de alguma forma, apesar
39
da atenção constante de Lívia e das loções e poções mais frias que Musa podia receitar, Marcelo morreu. 
O desgosto, tanto de Octávia como de Augusto, foi imenso, e a morte foi considerada uma calamidade 
pública. Havia, no entanto, numerosas pessoas de bom­senso que não lamentaram o desaparecimento de 
Marcelo. Teria certamente havido uma nova guerra civil entre ele e Agripa, se Augusto morresse e ele 
tentasse tomar o seu lugar: agora, Agripa era o único sucessor possível. Mas isto era um cálculo feito sem 
Lívia, cuja ideia fixa era, quando Augusto morresse ­ Cláudio, Cláudio, disseste que não referirias os 
motivos de Lívia, mas apenas os seus actos ­ continuar a governar o Império através do meu tio Tibério, 
com o apoio do meu pai. Arranjaria maneira de eles serem adoptados como herdeiros de Augusto.
A morte de Marcelo deixou Júlia livre para casar com Tibério e tudo teria corrido bem para os planos de 
Lívia, se não tivesse havido um surto perigoso de desassossego político em Roma, enquanto as multidões 
clamavam pela restauração da República. Quando Lívia tentou dirigir­lhes a palavra das escadas do 
Palácio, bombardearam­na com ovos podres e lixo. Augusto estava ausente, de visita às províncias 
orientais, na companhia de Mecenas, e tinha chegado a Atenas quando recebeu a notícia. Lívia escreveu­
lhe numa nota breve e apressada que a situação na Cidade não podia ser pior e que era preciso conseguir a 
ajuda de Agripa por qualquer preço. Augusto fê­lo vir imediatamente de Lesbos e suplicou­lhe, em nome 
da amizade, que voltasse com ele para Roma e restabelecesse a confiança pública. Mas Agripa nutria a sua 
mágoa havia tempo demais para que pudesse agora ficar agradecido por este chamamento. Ficou­se na sua 
dignidade. Em três anos, Augusto sescrevera­lhe apenas três cartas, qualquer delas num rígido tom oficial. 
Depois da morte de Marcelo, sem dúvida, era seu dever tê­lo chamado. Porque havia de ir agora em seu 
auxílio? Era Lívia, na realidade, a responsável por este afastamento; calculara mal a situação política ao 
deixar cair Agripa cedo demais. Tinha mesmo sugerido a Augusto que Agripa, embora ausente em 
Lesbos, sabia mais do que a maior parte das pessoas acerca da misteriosa e fatal doença de Marcelo; 
alguém, disse ela, tinha­lhe dito que Agripa, ao ouvir a notícia, não mostrara qualquer surpresa e sim uma 
forte complacência. Agripa informou Augusto que ficara longe de Roma havia tanto tempo que não estava 
ao corrente da política da Cidade e não se sentia capaz de empreender a tarefa que lhe era pedida. 
Augusto, receando que Agripa, se fosse para Roma naquele estado de espírito, se sentisse mais inclinado a 
apresentar­se como campeão das liberdades populares do que a apoiar o governo Imperial, deixou­o ficar 
de fora, com palavras que exprimiam graciosamente o seu pesar. Apressadamente, convocou Mecenas, 
para lhe pedir conselho. Mecenas desejava permissão para falar livremente com Agripa em nome de 
Augusto e procurou saber por ele exactamente
40
em que termos estaria disposto a fazer o que lhe era pedido. Augusto suplicou a Mecenas que, pelo amor 
aos Deuses, o fizesse ”tão rapidamente como espargos cozidos” (uma das suas expressões favoritas). 
Assim, Mecenas chamou Agripa à parte e disse:
­ Ora bem, meu velho amigo, o que é que tu queres? Compreendo que sentes que te trataram mal, mas 
garanto­te que Augusto tem o direito de se sentir igualmente injuriado por ti. Não consegues entender até 
que ponto te portaste mal para com ele por não teres sido franco? Foi um insulto, tanto para a sua justiça 
como para a sua amizade para contigo. Se tivesses explicado que a facção de Marcelo te colocou numa 
posição muito desconfortável, e que o próprio Marcelo te tinha insultado ­ garanto­te que Augusto nunca 
soube disso até há pouco tempo ­, ele teria feito tudo o que estivesse no seu poder para remediar as coisas. 
A minha opinião sincera é que te portaste como uma criança amuada; e ele tratou­te como um pai, que 
não se deixa dominar por esse tipo de comportamento. Dizes que ele te escreveu cartas muito frias? E as 
tuas, nessa altura, foram escritas em termos afectuosos? E que espécie de despedida lhe tinhas feito? 
Agora, quero ser o mediador entre ambos, porque, se esta ruptura se mantiver, será a ruína de todos nós. 
Qualquer dos dois tem uma profunda estima pelo outro, como seria de esperar dos dois maiores romanos 
vivos. Augusto dísse­me que está pronto, logo que lhe mostres a abertura de antigamente, a renovar a 
amizade nos mesmos termos de então, ou mesmo ainda mais íntimos.
­ Ele disse isso?
­ As palavras são dele. Posso dizer­lhe como estás desgostoso por o ter ofendido e posso explicar que se 
tratou de um malentendido; que saíste de Roma pensando que ele estava ao corrente do insulto de Marcelo 
para contigo no banquete? E que agora estás ansioso, pelo teu lado, por compensar as falhas de amizade 
do passado e que confias nele para vir ao teu encontro?
Agripa disse:
­ Mecenas, tu és um indivíduo como deve ser e um verdadeiro amigo. Diz a Augusto que estou às suas 
ordens como sempre.
Mecenas replicou:
­ Dir­lho­ei com o maior prazer. Acrescentarei, como opinião minha, que não seria seguro mandar­te 
agora de volta à Cidade, para restabelecer a ordem, sem uma marca notória de confiança pessoal.
Então, Mecenas foi procurar Augusto.
­ Consegui acalmá­lo. Fará tudo o que desejares. Mas quer estar certo de que o amas realmente, como um 
filho que sente ciúme do amor do pai por outro filho. Acho que a única coisa que o satisfaria realmente 
seria que o deixasses casar­se com Júlia.
41
Augusto teve que pensar rapidamente. Lembrava­se de que o relacionamento de Agripa com a mulher, 
que era irmã de Marcelo, não estava lá muito bem desde a disputa com Marcelo e que Agripa, ao que 
parecia, estava apaixonado por Júlia. Desejou que Lívia estivesse presente para o aconselhar, mas não 
tinha como escapar a uma decisão imediata: se ofendesse Agripa agora, nunca mais poderia contar com o 
seu apoio. Lívia tinha escrito por qualquer preço: portanto, estava livre de tomar as disposições que lhe 
aprouvessem. Mandou de novo chamar Agripa e Mecenas encenou uma cena de reconciliação cheia de 
dignidade. Augusto disse que, se Agripa consentisse em casar com a filha, isso seria para ele a prova de 
que a amizade, que prezava acima de qualquer outra no mundo, estava firmada numa base segura. Agripa 
chorou lágrimas de alegria e pediu perdão pelas suas faltas. Tentaria ser digno da amorosa generosidade 
de Augusto.
Agripa regressou a Roma com Augusto e imediatamente se divorciou da mulher, para casar com Júlia. O 
casamento foi tão popular e a celebração tão magnífica e pródiga, que os distúrbios políticos 
imediatamente se apagaram. Agripa conquistou também grande crédito para
Augusto, levando a cabo as negociações para o regresso dos estandartes com a Águia, que foram 
formalmente entregues a Tibério,
como representante pessoal de Augusto. As Águias eram objectos sagrados; mais genuinamente sagrados 
para os corações romanos do que quaisquer estátuas de mármore dos Deuses. Alguns cativos regressaram 
também, mas, depois de trinta e dois anos de ausência, não estavam em estado de receber grandes 
manifestações. A maior parte deles preferiram ficar na Pártia, onde se tinham instalado e casado com 
mulheres nativas.
A minha avó Lívia ficou tudo menos satisfeita com o acordo feito com Agripa ­ o único aspecto que lhe 
agradava era a desonra que representava para Octávia o divórcio da filha. Mas disfarçou os seus 
sentimentos. Passaram nove anos antes que os serviços de Agripa
pudessem ser dispensados. Depois, ele morreu de repente, na sua casa de campo. Augusto estava na 
Grécia na altura; por isso,
não houve qualquer inspecção ao cadáver. Agripa deixou um grande número de filhos, três rapazes e duas 
raparigas, como herdeiros de Augusto, por afinidade. Seria difícil para Lívia pôr de lado as suas 
pretensões a favor dos próprios filhos.
No entanto, Tibério casou com Júlia, que tinha tornado as coisas mais fáceis para Lívia ao apaixonar­se 
por ele e ao pedir a Augusto que usasse a sua influência junto de Tibério, a favor dela. Augusto consentiu 
apenas porque Júlia ameaçou suicidar­se se ele se recusasse ajudá­la. O próprio Tibério detestava ter que 
se casar com Júlia, mas não ousou recusar. Foi obrigado a divorciar­se da mulher, Vipsânia, filha de 
Agripa por um casamento anterior, que ele amava apaixonadamente. Mais tarde, encontrou­a
42
acidentalmente uma vez na rua e seguiu­a com os olhos com uma expressão de tal forma 
desesperada que Augusto, quando ouviu falar nisso, deu ordens para que, por uma questão de 
decência, aquilo não voltasse a acontecer. Uma vigilância especial devia ser exercida pelos 
funcionários de ambas as casas, para evitar um encontro. Vipsânia casou, não muito tempo 
depois, com um nobre jovem e ambicioso de nome Caio. E antes que me esqueça, tenho que 
referir o casamento de meu pai com minha mãe, Antónia, a filha mais nova de Marco António e 
Octávia. Teve lugar no ano da doença de Augusto e da morte de Marcelo.
o meu tio Tibério era um dos maus claudianos. Era taciturno, reservado e cruel, mas tinha havido 
três pessoas que controlavam estes elementos na sua natureza. Primeiro havia o meu pai, um dos 
melhores claudianos, alegre, aberto e generoso; em seguida, havia Augusto, um homem muito 
honesto, alegre, bondoso, que não gostava de Tibério mas que o tratava generosamente por causa 
da mãe; e por fim, havia Vipsânia. A influência do meu pai foi afastada, ou diminuída, quando 
ambos atingiram a idade de fazer o serviço militar e foram enviados em campanha para diferentes 
pontos do Império. Depois, veio a separação de Vipsânia e, a esta, seguiu­se uma frieza com 
Augusto, que se sentia ofendido com o desagrado, mal disfarçado, do meu tio em relação a Júlia. 
Uma vez perdidas estas três influências, passou­se gradualmente para o lado mau.
Creio que devia, neste ponto, descrever o seu aspecto físico. Era um homem alto, de cabelos 
escuros e pele clara, bem constituído, com um magnífico par de omoplatas e umas mãos tão 
fortes que conseguia partir uma noz ou perfurar uma maçã de casca verde e rija entre o polegar e 
o indicador. Se não fosse tão lento nos seus movimentos, teria dado um campeão de boxe: uma 
vez, matou um camarada numa luta amigável com as mãos livres, sem as habituais luvas em 
metal ­, dando­lhe um golpe num dos lados da cabeça que lhe fez estalar o crânio. Caminhava 
com o pescoço ligeiramente atirado para a frente e com os olhos virados para o chão. O seu rosto 
teria sido belo, se não estivesse desfigurado por tantas borbulhas, se não tivesse os olhos tão 
salientes e se não andasse sempre de testa franzida. As suas estátuas fazem­no parecer 
extremamente belo, porque deixam de fora estes defeitos. Falava pouco e muito devagar, de 
forma que, ao conversar com ele, as pessoas sempre se sentiam tentadas a terminar as suas frases 
e a responder­lhes de seguida. Mas, quando queria, era um brilhante orador público. Ficou careca 
muito novo, excepto na parte de trás da cabeça, onde deixou o cabelo crescer e ficar comprido, à 
maneira da antiga nobreza. Nunca estava doente.
Tibério, apesar da sua pouca popularidade na sociedade romana, era, mesmo assim, um general 
de grande sucesso. Fez reviver vários rigores disciplinares antigos, mas, como não se poupava a 
si próprio em campanha,
43
r
aramente dormindo numa tenda, comendo e bebendo o mesmo que os seus homens e atacando sempre na 
frente de batalha, eles preferiam servir sob as suas ordens do que com outro comandante bem­humorado e 
descontraído, em cuja capacidade de chefia não tivessem a mesma confiança. Tibério nunca dirigia aos 
homens um sorriso ou uma palavra de louvor e, muitas vezes, obrigava­os a marchas exageradas e a 
trabalhos excessivos.
­ Não faz mal que me odeiem, ­ disse uma vez, ­ desde que me obedeçam.
Mantinha os coronéis e oficiais do regimento numa ordem tão estrita como os soldados; por isso, não 
havia queixas quanto à sua parcialidade. Servir sob as ordens de Tibério não deixava de ter vantagens; 
normalmente, conseguia capturar e saquear os acampamentos e cidades do inimigo. Fez a guerra com 
êxito na Arménia, Pártia, Germânia, Hispânia, Dalmácia, Alpes e França.
O meu pai era, como disse, um dos melhores claudianos. Era tão forte como o irmão, muito mais bem­
parecido, mais rápido no falar e nos movimentos e de maneira alguma com menos êxito como general. 
Tratava todos os soldados como cidadãos romanos e, portanto, como seus iguais, excepto na patente e na 
educação. Detestava ter que lhes infligir castigos. Dava ordens para que, na medida do possível, todas as 
ofensas contra a disciplina fossem tratadas pelos próprios camaradas do ofensor, que partia do princípio 
serem zelosos do bom­nome da sua secção ou companhia. Deu a saber que, se achassem que qualquer 
ofensa estava além dos seus poderes de correcção, ­ pois não permitia que matassem um culpado ou que o 
incapacitassem para os seus deveres militares diários
­ deviam submeter o caso ao coronel dos respectivos regimentos, mas, na medida do possível desejava que 
os seus homens fossem juízes de si próprios. Os capitães podiam chicotear, com autorização dos coronéis 
dos regimentos, mas apenas nos casos em que o delito, tal como cobardia em batalha ou o roubo a um 
camarada, mostrasse uma baixeza de carácter que tornasse o açoitamento apropriado; mas também 
ordenava que um homem, uma vez açoitado, nunca mais servisse como combatente; tinha que ser 
despromovido para os transportes ou serviço administrativo. Qualquer soldado que considerasse que tinha 
sido injustamente condenado pelos camaradas ou pelo seu capitão podia apelar para ele; mas parecia­lhe 
pouco provável que tais sentenças necessitassem de ser revistas. Este sistema funcionava admiravelmente, 
porque o meu pai era tão bom soldado que inspirava as tropas a agirem dentro de um padrão de virtude, da 
qual os outros comandantes não os julgavam capazes. Mas é fácil de compreender até que ponto era 
perigoso para soldados que tinham sido tratados desta forma serem depois comandados por um general 
vulgar. A dádiva da independência, uma vez concedida, não pode
44
ser retirada de ânimo leve. Havia sempre problemas quando os soldados que tinham servido sob as ordens 
do meu pai acabavam por ser recrutados para serem comandados pelo meu tio. O contrário era também 
verdade: os soldados que tinham servido sob o meu tio reagiam com desprezo e suspeita ao sistema de 
disciplina do meu pai. Tinha sido seu hábito ocultarem os crimes uns dos outros e orgulharem­se da sua 
astúcia em evitar a detecção e, uma vez que, sob o comando do meu tio, um homem podia ser chicoteado, 
por exemplo, por se dirigir a um oficial sem que ele se dirigisse a ele primeiro, ou por falar com excessiva 
franqueza, ou por se comportar com independência em qualquer situação, era uma honra e não uma 
desgraça para um soldado poder mostrar as marcas do chicote nas costas.
As maiores vitórias do meu pai foram nos Alpes, em França, nos Países Baixos, mas especialmente na 
Germânia, onde o seu nome, creio, nunca será esquecido. Ele estava sempre no ponto mais renhido da 
batalha. A sua ambição era realizar um feito que só tivesse sido realizado duas vezes na história de Roma: 
designadamente, como general, matar o general inimigo com as suas próprias mãos e despojá­lo das 
armas. Esteve muitas vezes à beira do sucesso, mas a sua presa sempre lhe escapou. Ou o indivíduo 
galopava para fora do campo, ou se rendia em vez de lutar, ou um qualquer soldado raso se intrometia e 
recebia o golpe primeiro. Os veteranos, ao contarem­me histórias do meu pai, muitas vezes soltaram 
risadas de admiração:
­ Fazia­nos bem ao coração ver o vosso pai no seu cavalo negro, a jogar às escondidas no campo de 
batalha com um desses chefes germânicos. Às vezes, era obrigado a abater nove ou dez dos seus guarda­
costas, homens valentes também, antes de conseguir chegar junto do estandarte e, nessa altura, já o 
pássaro manhoso tinha voado.
O maior orgulho dos homens que tinham servido sob as ordens de meu pai era o facto dele ter sido o 
primeiro general romano a marchar de uma ponta à outra do Reno, desde a Suiça ao Mar do Norte.
45
CAPíTULO IV
O meu pai nunca esquecera os ensinamentos do meu avô sobre a liberdade. Ainda rapazinho, tinha­se 
atirado a Marcelo, cinco anos mais velho que ele, a quem Augusto deu o título de Chefe de Cadetes. Tinha 
dito a Marcelo que o título lhe fora concedido apenas para uma ocasião específica (uma luta simulada 
chamada Gregos e Troianos, realizada no Campo de Marte entre duas forças de cadetes de cavalaria, 
filhos de cavaleiros e senadores) e que o mesmo não implicava nenhum dos poderes judiciais gerais que 
Marcelo assumira desde então; e que ele, pela sua parte, romano nascido livre, não iria submeter­se a tal 
tirania. Recordou a Marcelo que o grupo adversário da luta simulada tinha sido chefiado por Tibério e que 
este tinha ganho as honras do recontro. Por fim, desafiou Marcelo para um duelo. Augusto ficou muito 
divertido quando soube da história e, durante muito tempo, não se referia ao meu pai a não ser, brincando, 
como o romano nascido livre.
Sempre que se encontrava em Roma, o meu pai irritava­se com o crescente espírito de subserviência em 
relação a Augusto que encontrava por toda a parte, ansiando sempre por voltar para a vida militar. 
Enquanto desempenhou o cargo de um dos magistrados principais da Cidade, durante a ausência em 
França de Augusto e de Tibério, desagradou­lhe profundamente a preponderância da caça ao posto e dos 
favoritismos políticos. Disse em privado a um amigo, por quem vim a sabê­lo anos mais tarde, que se 
podia encontrar mais do velho espírito romano de liberdade numa só companhia dos seus soldados do que 
em toda a classe dos senadores. Pouco antes de morrer, escreveu a Tibério, de um acampamento no 
interior da Germânia, uma carta amarga nesse sentido. Dizia que desejava, por tudo o que havia de mais 
alto, que Augusto seguisse o exemplo glorioso do Ditador Sula que, senhor absoluto de Roma depois das 
primeiras Guerras Civis, quando todos os seus inimigos estavam pacificados ou subjugados, só se detivera 
para resolver a seu gosto alguns assuntos de Estado, antes de depor as insígnias do ofício e tornar­se de 
novo um cidadão comum. Se Augusto não fizesse o mesmo muito em breve, ­ e ele sempre dera a 
entender que essa era a sua finalidade última
­ seria tarde demais. As fileiras da velha nobreza estavam tristemente enfraquecidas: as proscrições e as 
guerras civis tinham levado os mais
47
ousados e os melhores; os sobreviventes, perdidos no meio da nova nobreza, mostravam­se inclinados a 
comportar­se cada vez mais como escravos de família de Augusto e Lívia. Em breve, Roma teria 
esquecido o que significava a liberdade e cairia finalmente sob uma tirania tão bárbara e arbitrária como as 
do leste. Não era para promover uma calamidade dessas que ele fizera tantas campanhas esgotantes sob o 
comando supremo de Augusto. Mesmo o seu amor e profunda admiração pessoal por Augusto, que fora 
para ele um segundo pai, não o impediam de expressar estes sentimentos. Pediu a opinião de Tibério: não 
poderiam os dois, em conjunto, persuadir, mesmo obrigar, Augusto a retirar­se?
­ Se ele consentir, o meu amor e admiração por ele tornar­se­ão mil vezes superiores ao que antes eram; 
mas lamento dizer que o orgulho secreto e ilegítimo que a nossa mãe Lívia retira do seu exercício de poder 
supremo através de Augusto será o maior empecilho que iremos provavelmente encontrar nesta questão.
Por infelicidade, a carta foi entregue a Tibério enquanto ele estava na presença de Augusto e Lívia.
­ Uma missiva do vosso nobre irmão! ­ gritou o correio imperial, entregando­lha.
Tibério, não suspeitando que houvesse alguma coisa na carta que não devesse ser comunicada a Lívia e a 
Augusto, pediu permissão para a abrir e ler de imediato. Augusto disse:
­ Claro que sim, Tibério, mas na condição que a leias em voz alta para nós.
Fez sinal aos criados para que saíssem da sala: ­ Vamos, não percamos tempo. Quais foram as suas 
últimas vitórias? Estou impaciente por saber. As cartas dele são sempre bem escritas e interessantes, muito 
mais que as tuas, meu caro, se me desculpas a comparação.
Tibério leu em voz alta as primeiras palavras e, depois, pôs­se muito vermelho, Tentou saltar a parte 
perigosa, mas descobriu que havia pouco mais que perigo por toda a carta, excepto mesmo no fim, quando 
meu pai se queixava de vertigens por causa de um ferimento na cabeça e falava da sua marcha difícil até 
ao Elba. Curiosos portentos tinham ocorrido ultimamente, escrevia. Um espectáculo extraordinário de 
estrelas cadentes, noite após noite; sons semelhantes a um lamento de mulheres vindos da floresta; e dois 
jovens divinais montados em cavalos brancos e vestindo trajos gregos, não germânicos, tinham 
atravessado de repente o acampamento ao alvorecer. Finalmente, uma mulher germânica, de uma estatura 
superior à dos mortais, tinha aparecido à porta da sua tenda e falado com ele em grego, dizendo­lhe que 
não fosse mais longe, porque o destino era contra isso. Tibério lia uma palavra aqui, outra ali, tropeçava, 
dizia que a escrita estava ilegível, recomeçava, tropeçava de novo e, finalmente, pediu para parar.
48
­ O que é isto? ­ disse Augusto. Com certeza consegues decifrar mais do que isso.
Tibério controlou­se
­ Para falar verdade, senhor, consigo, mas a carta não merece ser lida. É evidente que o meu irmão não 
estava bem quando a escreveu. Augusto ficou alarmado.
­ Não está gravemente doente, espero? ­ Mas a minha avó Lívia, como se a sua ansiedade de mãe, por uma 
vez, se sobrepusesse às boas maneiras, ­ embora, claro, tivesse compreendido imediatamente que havia 
alguma coisa na carta que Tibério receava ler, porque se reflectia quer em Augusto, quer nela própria ­ 
arrancou­lha da mão. Leu­a do princípio ao fim, franzindo a testa sombriamente e passou­a a Augusto, 
dizendo:
­ Esta é uma questão que só vos diz respeito a vós. Não me compete a mim punir um filho, por mais 
natural que isso seja; isso compete­vos a vós, como seu tutor e chefe do Estado.
Augusto ficou alarmado, perguntando a si mesmo o que poderia estar a acontecer? Leu a carta, mas ela 
parecia merecer reprovação, mais por ter escandalizado a minha avó do que por qualquer coisa escrita 
contra ele. Na realidade, à parte a chocante palavra forçar, ele concordava secretamente com os 
sentimentos expressos na carta, embora o insulto à minha avó se reflectisse nele, por se ter deixado 
persuadir mesmo contra as suas convicções. O Senado estava, sem dúvida, a tornar­se vergonhosamente 
obsequioso nos seus modos para com ele, a sua família e o seu pessoal. A situação desagradava­lhe tanto 
como ao meu pai e era verdade que, havia bastante tempo, antes da derrota e morte de António, ele tinha 
prometido publicamente retirar­se quando já não houvesse nenhum inimigo público em campo contra ele. 
Depois disso, referira­se várias vezes nos seus discursos ao dia feliz em que a sua tarefa estaria concluída. 
Estava fatigado dos constantes negócios do estado e das honras constantes; desejava repouso e anonimato. 
Mas a minha avó nunca lhe permitiria que desistisse; havia de dizer sempre que a tarefa dele ainda nem 
chegara a meio, que não havia outra coisa a esperar, a não ser a desordem civil, se ele se retirasse agora. 
Sim, ele trabalhava muito, admitia, mas ela trabalhava ainda mais e sem qualquer recompensa pública 
directa. E ele não podia ser simplista: logo que deixasse as suas funções e se tornasse um mero cidadão 
privado, ficava sujeito a ser acusado por traição e mesmo exilado, ou pior ainda; para não falar nas raivas 
secretas dos parentes dos homens que ele tinha morto ou desonrado. Como cidadão privado, teria que 
abdicar dos guarda­costas, assim como dos seus exércitos. Seria melhor continuar por mais dez anos e, ao 
fim desse tempo, talvez as coisas tivessem mudado para melhor. Assim, ele cedia sempre e continuava a 
governar. Aceitou os privilégios monárquicos em prestações.
49
Foi votado para mais cinco anos ou dez, mas mais provavelmente dez.
A minha avó olhou com dureza para Augusto quando ele acabou de ler a malfadada carta:
­ Então? ­ perguntou.
­ Concordo com Tibério, ­ disse ele brandamente. ­ O jovem deve estar doente. É uma perturbação 
causada pelo excessivo estado de tensão. Vê­se no parágrafo final, quando fala nos resultados do 
ferimento que tem na cabeça e das visões que está a ter; bom, isso prova­o. Ele precisa descansar. A 
generosidade natural do seu espírito foi pervertida pelas ansiedades da campanha. Essas florestas 
germânicas não são o lugar indicado para um homem doente de espírito, pois não, Tibério? O uivar dos 
lobos deve ser o pior que há para os nervos: o lamento das mulheres de que ele fala eram certamente 
lobos. Que tal mandá­lo regressar, agora que já deu a esses germânicos uma sacudidela que eles nunca 
hão­de esquecer? Seria bom para mim tê­lo de volta aqui a Roma. Sim, temos que o mandar vir. Vós 
ficareis feliz, minha querida Lívia, por terdes de novo o vosso menino, não é verdade?
A minha avó não respondeu directamente. Disse, ainda com a testa franzida:
­ E vós, Tibério?
O meu tio era mais político que Augusto. Conhecia melhor a natureza da mãe. Replicou:
­ O meu irmão sem dúvida parece doente, mas mesmo a doença não consegue explicar um comportamento 
tão indigno de um filho e uma loucura tão grosseira. Concordo que ele devia ser chamado para lhe ser 
recordada a infâmia de ter acalentado pensamentos tão baixos sobre a mais dedicada e incansável das 
mães e da enormidade de os ter posto no papel e enviado pelo correio através de um país hostil. Além 
disso, o argumento sobre o caso de Sula é infantil. Logo que Sula deixou o poder, as Guerras Civis 
começaram de novo e a nova constituição foi derrubada.
Assim, Tibério saiu­se bastante bem do incidente, mas uma boa parte da sua severidade contra o meu pai 
foi genuína, por o ter colocado numa posição bastante embaraçosa,
Lívia estava sufocada de raiva contra Augusto, por permitir que insultos à sua pessoa fossem deixados 
passar com tanta ligeireza e, ainda por cima, na presença do filho. A sua raiva contra o meu pai era 
igualmente violenta. Sabia que, quando ele voltasse, era muito provável que pusesse em prática o seu 
plano para forçar Augusto a retirar­se. Também compreendeu que, agora, nunca conseguiria governar 
através de Tibério
­ mesmo que conseguisse garantir­lhe a sucessão ­, enquanto meu pai, um homem com uma enorme 
popularidade em Roma e com todos os regimentos ocidentais a apoiá­lo, estivesse à espera para forçar o 
restabelecimento
50
das liberdades populares. E o poder supremo acabara por se tornar para ela mais importante que a vida ou 
a honra; já lhe tinha sacrificado muita coisa. No entanto, conseguia disfarçar os seus sentimentos. Fingiu 
aceitar o ponto de vista de Augusto (que o meu pai estava apenas doente) e disse a Tibério que achava a 
censura dele demasiado severa. Concordou, no entanto, que o meu pai devia ser chamado imediatamente. 
Agradeceu mesmo a Augusto a generosidade com que atenuou a falha do pobre filho e disse que lhe 
enviaria o seu próprio médico confidencial com uma porção de heléboro, de Anticira, na Tessália, que era 
um famoso medicamento específico para casos de fraqueza mental.
O médico pÔs­se a caminho no dia seguinte, na companhia do correio que levou a carta de Augusto. A 
carta continha as suas felicitações calorosas pelas vitórias que alcançara e lamentava o ferimento na 
cabeça; permitia­lhe também que regressasse a Roma, mas numa linguagem que dava a entender que tinha 
que regressar, quer quisesse quer não.
O meu pai respondeu alguns dias mais tarde, expressando o seu agradecimento pela generosidade de 
Augusto. Disse que regressaria logo que a saúde lho permitisse, mas que a carta lhe chegara às mãos no 
dia a seguir a um ligeiro acidente: o cavalo que montava caíra debaixo dele em pleno galope, rolara­lhe  
sobre a perna e comprimira­a de encontro a uma pedra afiada. Agradecia à mãe a sua solicitude, a oferta 
do heléboro e o facto de lhe ter enviado o seu médico, de cujos serviços se servira imediatamente. Mas 
receava que mesmo a sua reconhecida habilidade não tivesse impedido que a ferida se tivesse tornado 
grave. Dizia por fim que teria preferido continuar no seu posto, mas que os desejos de Augusto eram 
ordens para ele; e repetia que, logo que estivesse novamente bem, regressaria à Cidade. Estava 
presentemente acampado perto do Saal Turíngeo.
Ao ouvir tais notícias, Tibério, que estava com Augusto e Lívia em Pavia, pediu de imediato permissão 
para ir dar assistência ao irmão no leito da doença. Augusto concedeu­lha e ele montou no seu cavalo e 
galopou em direcção ao norte, com uma pequena escolta, procurando o caminho mais rápido para 
atravessar os Alpes. Tinha diante dele uma viagem de 500 milhas, mas podia contar com mudanças 
frequentes de cavalos nos postos da mala­posta e, quando se sentisse demasiado cansado para continuar 
em cima da sela, poderia sempre pedir um carro de duas rodas e dormir nele algumas horas, sem retardar a 
marcha. O tempo favoreceu­o. Atravessou os Alpes e desceu para a Helvécia; depois, seguiu a rota 
principal do Reno e chegou a um lugar chamado Manheim, sem ter sequer parado para tomar uma refeição 
quente. Aí, atravessou o rio e rumou a nordeste por estradas inóspitas, através de um país agreste. Estava 
sozinho, quando chegou ao seu destino na noite do terceiro dia, quando a sua escolta original há muito 
desistira e a nova escolta, que
51
reunira em Manheim, também não conseguira acompanhá­lo. Afirma­se que, no segundo dia e noite, 
viajou quase 200 milhas entre o meio­dia de um dia e o meio­dia do seguinte. Chegou a tempo de saudar o 
meu pai, mas não a tempo de lhe salvar a vida, porque, entretanto, a perna gangrenara até à coxa. O meu 
pai, embora às portas da morte, ainda teve a presença de espírito necessária para ordenar ao acampamento 
que prestasse a meu tio Tibério as honras devidas a um comandante do exército. Os irmãos abraçaram­se e 
o meu pai sussurrou: ­Ela leu a minha carta?
­ Antes que eu próprio a lesse, ­ gemeu o meu tio Tibério. Nada mais foi dito a não ser pelo meu pai, que 
suspirou:
­ Roma tem uma mãe severa: Lúcio e Caio têm uma madrasta perigosa. ­ Estas foram as suas últimas 
palavras e o meu tio Tibério não tardou a fechar­lhe os olhos.
Ouvi este relato a Xenofonte, um grego da ilha de Cos, que era na altura um homem ainda jovem. Era o 
médico do meu pai e ficara muito desgostoso por o médico do meu avô lhe ter tirado o caso das mãos. 
Caio e Lúcio, devo explicar, eram os netos de Augusto, filhos de Júlio e Agripa. Adoptara­os como seus 
próprios filhos quando ainda eram crianças. Havia um terceiro rapaz, Póstumo, assim chamado por ter 
nascido após a morte do pai; Augusto não o adoptou como aos outros, mas deixou que ele adoptasse o 
nome de Agripa.
O acampamento onde morreu meu pai foi baptizado de Amaldiçoado e o seu corpo foi levado em 
procissão militar para o quartel de Inverno do exército, em Mairiz, sobre o Reno, acompanhado por meu 
tio Tibério durante todo o caminho como principal lamentador. O exército desejava enterrar ali o corpo, 
mas ele levou­o de volta a Roma para aí fazer o funeral, tendo sido queimado sobre uma pira monstruosa 
nos Campos de Marte. O próprio Augusto pronunciou a oração fúnebre, no decorrer da qual disse:
­ Peço aos Deuses que façam meus filhos Caio e Lúcio homens tão nobres e virtuosos como este Druso, e 
que me concedam a mim uma morte tão honrosa como a sua.
Lívia não estava certa até que ponto podia confiar em Tibério. Quando ele regressou com o corpo de meu 
pai, a simpatia dele parecera­lhe forçada e pouco sincera e, quando Augusto formulou o desejo de ter uma 
morte tão honrosa como a de meu pai, ela viu um breve meio­sorriso atravessar­lhe o rosto.
Tibério que, ao que parece, há muito suspeitava que o meu avô não morrera de morte natural, estava 
decidido agora a não contrariar de forma alguma a vontade da mãe. Jantando tantas vezes à mesa dela, 
sentia­se completamente à sua mercê. Esforçou­se muito para ganhar o seu favor. Lívia compreendia o 
que se passava no espírito dele e isso não lhe desagradava.
52
Ele era o único que suspeitava da sua ligação com venenos e, certamente, iria guardar para si essas 
suspeitas. Ela tinha sobrevivido ao escândalo do casamento com Augusto e era agora citada na Cidade 
como um exemplo de virtude, na sua forma mais estrita e desagradável. O Senado votou que quatro 
estátuas suas fossem erigidas em vários locais públicos; isto era uma forma de a consolar pela sua perda. 
Também a inscreveram por uma ficção legal entre as Mães de Três Filhos (segundo a legislação de 
Augusto, as mães de três ou mais filhos tinham privilégios especiais, especialmente como legatárias ­ as 
solteironas e as mulheres estéreis não eram autorizadas a beneficiar de testamentos e a sua perda era o 
ganho das suas irmãs fecundas).
Cláudio, meu velho maçador, aqui estás, a poucos centímetros do final do quarto rolo da tua autobiografia, 
e ainda nem sequer chegaste ao sítio onde nasceste. Escreve­o de imediato ou nunca chegarás sequer a 
meio da tua história. Escreve: ”O meu nascimento ocorreu em Lião, na França, no dia 1 de Agosto, um 
ano antes da morte de meu pai.” Pronto. Os meus pais tinham tido seis filhos antes de mim, mas, como a 
minha mãe acompanhava sempre o meu pai nas suas campanhas, uma criança tinha que ser muito 
resistente para sobreviver. Apenas o meu irmão Germânico, cinco anos mais velho que eu, e a minha irmã 
Livila, um ano mais velha, estavam vivos: ambos herdaram a magnífica constituição de meu pai. Eu não. 
Quase morri em três ocasiões antes do meu segundo ano e, se a morte do meu pai não tivesse trazido a 
família de regresso a Roma, é pouco provável que esta história alguma vez tivesse sido escrita.
53
CAPíTULO V
Em Roma, vivíamos na grande casa que pertencera ao meu avô e que ele deixara em testamento a minha 
avó. Ficava no Monte Palatino, perto do palácio de Augusto e do templo de Apolo construído por 
Augusto, onde se encontrava a biblioteca. O Monte Palatino ficava sobranceiro à Praça do Mercado. Sob a 
parte mais íngreme do penhasco havia o Templo dos Deuses Gémeos, Castor e Pólux (este era o templo 
antigo, construído com madeira e blocos de terra, que dezasseis anos mais tarde Tibério substituiu, às suas 
custas, por uma magnífica estrutura de mármore, com o interior pintado e dourado e tão sumptuosamente 
mobilado como o boudoir de uma dama nobre e rica. A minha avó Lívia obrigou­o a fazer isto para 
agradar a Augusto, posso dizer. Tibério não tinha um espírito religioso e era muito parcimonioso com o 
dinheiro). O ambiente era mais saudável na colina do que cá em baixo, na cova junto ao rio; a maior parte 
das casas que lá havia pertenciam a senadores. Eu era uma criança enfermiça ­ ”um verdadeiro campo de 
batalha de doenças”, diziam os médicos ­ e talvez só tivesse vivido porque as doenças não conseguiam 
pôr­se de acordo sobre qual deveria ter a honra de me levar. Para começar, nasci prematuramente, apenas 
de sete meses e, ainda por cima, o leite da minha ama de criação não me caía bem, de forma que a minha 
pele cobriu­se com uma erupção grave, acrescida depois de malária e sarampo, que me deixou 
ligeiramente surdo de um ouvido; sofri ainda de erisipela, colite e, finalmente, paralisia infantil, que me 
encurtou a perna, condenando­me a um coxear permanente. Devido a uma ou outra destas doenças, tenho 
tido durante toda a minha vida uma tal fraqueza nas pernas que nunca me foi possível correr ou caminhar 
longas distâncias: uma grande parte das minhas viagens teve que ser feita numa liteira. E há ainda a dor 
insuportável, que me ataca frequentemente o estômago depois de comer. É algo de tão doloroso que, em 
duas ou três ocasiões, se não fosse a intervenção dos meus amigos, eu teria enterrado uma faca de cortar 
carne (que agarrei desvairado) no sítio do tormento. já ouvi dizer que esta dor, a que chamam paixão 
cardíaca, é pior do que qualquer
1 Boudoir: Palavra de origem francesa, que se poderá traduzir por sala­de­estar. (N. do R.)
55
outra dor conhecida do homem, se exceptuarmos a estrangúria. Bom, acho que devo sentir­me grato por 
nunca ter tido estrangúria.
Hão­de pensar que minha mãe Antónia, uma nobre e bela mulher criada na mais estrita virtude por sua 
mãe Octávia, a paixão da vida do meu pai, se teria ocupado de mim com todo o amor, sendo eu o seu filho 
mais velho, e que teria mesmo tido grande preferência por mim, com pena dos meus infortúnios. Mas não 
foi isso que aconteceu. Fez por mim tudo o que se podia esperar dela como um dever; nada mais. Não me 
tinha amor. Não, tinha mesmo uma grande aversão por mim, não só por causa do meu estado enfermiço, 
mas também por ter tido comigo uma gravidez extremamente difícil, seguida de um parto doloroso, do 
qual mal escapou com vida e que a deixou mais ou menos inválida durante anos. O meu nascimento 
prematuro foi devido a um choque que ela recebeu na festa dada em honra de Augusto, quando ele visitou 
o meu pai em Lyon, para inaugurar ali o Altar de Roma e Augusto: o meu pai era Governador das Três 
Províncias de França e Lyon era o seu quartel­general. Um escravo siciliano louco, que estava a trabalhar 
como criado na festa, puxou repentinamente de um punhal e brandiu­o no ar atrás do pescoço do meu pai. 
Só a minha mãe viu o que aconteceu. Cruzou o olhar com o do escravo e teve a presença de espírito 
suficiente para lhe sorrir e sacudir a cabeça num gesto de reprovação, fazendo­lhe sinal para que guardasse 
o punhal. Enquanto ele hesitava, dois outros criados seguiram o olhar da minha mãe e chegaram a tempo 
para o dominar e desarmar. Então, ela desmaiou e começou imediatamente com as dores. Pode muito bem 
ser por causa disto que eu sempre tive um receio mórbido do assassinato; diz­se que um choque pré­natal 
pode ser herdado. Mas claro que não há qualquer razão séria para se falar de uma influência pré­natal. 
Quantos membros da família imperial morreram de morte natural?
Como eu era uma criança afectuosa, a atitude da minha mãe causava­me muito desgosto. Soube por minha 
irmã Livila, uma rapariga bela mas cruel, fútil e ambiciosa ­ numa palavra, uma Claudiana típica da 
variedade má ­, que a minha mãe me tinha chamado ”um mau presságio humano”, dizendo que, quando eu 
nasci, os livros sibilinos deveriam ter sido consultados. Disse também que a natureza me tinha começado, 
mas nunca me acabara, atirando­me para o lado como uma inutilidade. E ainda que os antigos eram mais 
sensatos e mais nobres que nos: expunham as crianças débeis numa colina inóspita, para o bem da raça. 
Lívila pode ter empolado alguns comentários menos severos ­ pois as crianças de sete meses são objectos 
horríveis ­, mas eu sei que, uma vez, quando a
1 Doença originada por uma inflamação da uretra, traduzindo­se em dificuldade de urinar. (N. do R.)
56
minha mãe se zangou ao saber que um senador qualquer tinha introduzido uma moção tola no Senado, 
exclamou:
­ Esse homem devia ser afastado! É estúpido que nem um burro! O que estou eu a dizer?! Em 
comparação, os burros são animais sensíveis; ele é tão estúpido como... como ... Céus, ele é tão estúpido 
como o meu filho Cláudio!
Germânico era o seu favorito, tal como era o favorito de toda a gente, mas, longe de o invejar pelo amor e 
admiração que conquistava para onde quer que fosse, regozijava­me por ele. Germânico tinha pena de 
mim e fazia o máximo que lhe era possível para tornar a minha vida mais feliz, recomendando­me aos 
mais velhos como uma criança de bom coração, que recompensaria um tratamento generoso e cuidado. A 
severidade apenas servia para me assustar, dizia, e tornar­me mais nervoso do que eu normalmente era. 
Ele estava certo. O tique nervoso das minhas mãos, as sacudidelas nervosas da cabeça, a gaguez, os 
problemas de enjoo e má digestão, a baba que me escorria constantemente da boca, deviam­se sobretudo 
aos terrores a que era submetido, em nome da disciplina. Quando Germânico se erguia em minha defesa, a 
minha mãe costumava rir­se com indulgência e dizer:
­ Nobre coração, arranja um sujeito melhor para os teus transportes! Mas a maneira de falar da minha avó 
Lívia era:
­ Não sejas pateta, Germânico. Se ele reagir favoravelmente à disciplina, tratá­lo­emos com a gentileza 
que merece. Estás a pÔr o carro diante dos bois.
A minha avó raramente falava comigo e, quando falava, fazía­o com ar de desprezo e sem olhar para mim; 
na maior parte dos casos, para dizer:
­ Sai desta sala, pequeno, que eu quero ficar aqui.
Quando tinha a oportunidade de me repreender, nunca o fazia por palavras, mas enviando­me uma nota 
breve e fria. Por exemplo: ”Chegou ao conhecimento de Dona Lívia que o rapaz Cláudio tem andado a 
esbanjar o seu tempo a deambular na Biblioteca de Apolo. Até que consiga tirar partido dos manuais 
elementares que lhe foram fornecidos pelos seus professores, é absurdo que ele se intrometa com as obras 
mais sérias que se encontram nas prateleiras da biblioteca. Além do mais, as suas andanças perturbam os 
verdadeiros estudantes. Essa prática tem que acabar.”
Quanto a Augusto, embora nunca me tratasse com uma crueldade calculada, detestava estar na mesma sala 
comigo, tal como acontecia com a minha avó. Ele gostava imenso de rapazitos pequenos (tendo sido ele 
próprio, até ao fim da vida, um rapaz crescido), mas apenas do género que ele designava como 
”rapazinhos varonis e impecáveis”, como o meu irmão Germânico e os seus netos, Gaio e Lúcio, todos 
eles extremamente
57
bem parecidos. Havia vários filhos de reis ou de chefes confederados mantidos como reféns, para 
assegurar o bom comportamento dos pais
­ havia­os de França, da Germânia, da Pártia, Norte de África e Síria ­, que eram educados com os netos 
dele e com os filhos dos senadores principais no Colégio dos Rapazes. Ele aparecia muitas vezes nos 
claustros para jogar com bolinhas, ossinhos ou à apanhada. Os seus grandes favoritos eram os rapazinhos 
escuros, mouros, partos e sírios: e aqueles que conseguiam falar descontraidamente com ele, na sua 
linguagem infantil, tratando­o como se fosse um deles. Uma única vez, ele tentou dominar a enorme 
repugnância que sentia por mim e deixou­me participar num jogo de bolinhas com os seus favoritos: mas 
foi um esforço tão antinatural, que me deixou mais nervoso do que de costume ­ e pus­me a gaguejar e a 
tremer como um louco. Ele não voltou a tentar. Detestava anões, aleijados e deformidades de uma maneira 
geral, dizendo que davam azar e deviam ser mantidos fora das vistas. No entanto, no fundo do meu 
coração, nunca consegui odiar Augusto como acabei por odiar a minha avó, pois o desagrado que sentia 
por mim não continha malícia e ele fazia os possíveis por o dominar. Na verdade, eu devia ser uma 
coisinha estranha e miserável; uma calamidade para um pai tão forte e magnífico e uma mãe tão bela e 
majestosa. O próprio Augusto era um indivíduo bem­parecido, ainda que um pouco baixo, com cabelos 
claros e encaracolados (que só se tornaram grisalhos numa fase adiantada da sua vida), olhos vivos, um 
rosto alegre e um carácter gracioso e recto.
Recordo­me de ter ouvido uma vez um epigrama elegíaco que ele fez sobre mim, em grego, para 
apresentar a Atenodoro, um filósofo estóico de Tarso na Cilícia, cujos conselhos simples e sérios ele 
procurava muitas vezes. Eu tinha cerca de sete anos e eles chegaram perto de mim, junto ao lago das 
carpas, no jardim da casa de minha mãe. Não me recordo exactamente de como era o epigrama, mas o 
sentido era o seguinte: ”Antónia é uma pessoa antiquada: não compra um sagui de estimação por alto 
preço a um negociante oriental. E porquê? Ela própria faz criação deles.” Atenodoro ficou um momento a 
pensar e respondeu com severidade na mesma métrica: ”Antónia, que está longe de comprar um sagüi de 
estimação aos negociantes orientais, nem sequer mima e alimenta com ameixas e compota o pobre filho, 
que teve com o seu nobre marido.” Augusto ficou um tanto desconcertado. Devo esclarecer que nem ele 
nem Atenodoro, a quem eu sempre fora apresentado como um tonto, suspeitavam de que eu pudesse 
entender aquilo que diziam. Assim, Atenodoro puxou­me para ele e disse em tom de brincadeira, em 
latim:
­ E o que é que o jovem Tibério Cláudio pensa desta questão?
1 género de pequeno macaco, de cauda longa e fina e comum no oriente e em algumas regiões tropicais. 
(N. do R.)
58
Eu estava escondido de Augusto pelo corpo volumoso de Atenodoro e, de alguma forma, esqueci a 
minha gaguez. Disse­lhe de imediato, em grego:
­ A minha mãe Antónia não me dá mimos, mas fez­me aprender grego com alguém que o aprendeu 
directamente com Apolo.
O que eu queria dar a entender era que compreendia o que eles diziam. A pessoa que me tinha ensinado 
grego era uma mulher que fora sacerdotisa de Apolo numa das ilhas gregas, mas fora capturada por piratas 
e vendida ao dono de um bordel em Tiro. Tinha conseguido escapar, mas não lhe era permitido voltar a 
ser sacerdotisa, por ter sido prostituta. Minha mãe Antónia, reconhecendo­lhe os dons, aceitou­a na 
família como preceptora. Esta mulher costumava dizer­me que aprendera directamente de Apolo, e eu 
estava apenas a repetir­lhe as palavras. Mas como Apolo era o Deus do conhecimento e da poesia, o meu 
comentário apresentou­se mais inteligente que a minha intenção. Augusto teve um sobressalto e 
Atenodoro disse:
­ Falaste bem, pequeno Cláudio: os saguis não entendem uma palavra de grego, pois não?
Eu respondi:
­ Não, e têm longas caudas e roubam maçãs da mesa,
No entanto, quando Augusto começou a interrogar­me ansiosamente, afastando­me de Atenodoro, senti­
me de novo intimidado e a gaguez voltou, mais forte que nunca. Mas a partir daí, Atenodoro tornou­se 
meu amigo.
Há uma história acerca de Atenodoro e de Augusto que é muito lisonjeira para ambos. Um dia, Atenodoro 
disse a Augusto que ele não tomava a mínima precaução ao admitir visitantes à sua presença; um dia, seria 
trespassado por algum punhal. Augusto replicou que ele estava a dizer disparates. No dia seguinte, dia do 
aniversário da morte do pai, Augusto foi informado de que a irmã, Octávia, estava lá fora e desejava 
saudá­lo. Ele deu ordens para que a fizessem entrar imediatamente. Ela era uma inválida crónica quando 
isto aconteceu ­ foi no ano da sua morte ­ e era sempre transportada de um lado para o outro numa liteira 
fechada. Quando a liteira foi trazida, as cortinas afastaram­se e do seu interior saltou Atenodoro, 
empunhando uma espada, que apontou ao coração de Augusto. Este, longe de ficar zangado, agradeceu a 
Atenodoro, e confessou que tinha sido um grande erro tratar com tanta ligeireza a advertência que lhe 
tinha feito.
Há um acontecimento extraordinário da minha infância que não posso esquecer­me de registar. Um Verão, 
quando eu tinha apenas oito anos de idade, o meu irmão Germânico, minha irmã Livila e eu estávamos de 
visita a minha tia Júlia, numa bela casa de campo perto do mar, em Âncio.
59
Eram cerca das seis horas da tarde e nós estávamos no exterior, saboreando a brisa numa vinha. Júlia não 
estava connosco, mas o filho de Tibério esse Tibério Druso a quem mais tarde chamávamos sempre 
deCastor
­ e Póstumo e Agripina, filhos de Júlia, faziam parte do grupo. De repente, ouvimos um barulho de 
guinchos por cima de nós. Olhámos para o ar e vimos várias águias a lutar. Penas caíam flutuando no ar. 
Tentámos apanhá­las. Germânico e Castor apanharam uma cada um, antes delas caírem, e enfiaram­nas no 
cabelo, Castor tinha uma pena pequena, da asa, mas Germânico apanhou uma esplêndida, da cauda. 
Ambas estavam manchadas de sangue. Salpicos de sangue caíram no rosto de Póstumo, voltado para 
cima, e nos vestidos de Livila e Agripina. Depois, uma coisa escura caiu dos ares. Não sei porque o fiz, 
mas estendi uma dobra da minha túnica e apanhei­a. Era uma pequena cria de lobo, ferida e aterrorizada. 
As águias desceram em voo picado para recuperar o animal, mas eu tinha­o bem escondido e, quando 
gritámos e atirámos paus, as águias levantaram voo assustadas e afastaram­se aos guinchos, Eu sentia­me 
embaraçado. Não queria o pequeno lobo. Livila agarrou­o, mas a minha mãe, com um ar muito sério, 
obrigou­a a devolver­mo.
­ Caiu nas mãos do Cláudio, ­ disse. ­ Ele tem que ficar com ele. Perguntou a um velho nobre, membro do 
Colégio dos Augures, que estava connosco: ­ Dizei­me qual é o presságio,
O velho nobre respondeu:
­ Como posso dizê­lo? Pode ter um grande significado ou nenhum.
­ Não receeis. Dizei o que parece significar para vós.
­ Primeiro, afastai as crianças ­ disse ele.
Não sei se ele lhe deu a interpretação que, depois de lerdes a minha história, vos há­de aparecer como a 
única possível. Tudo O que sei é que, enquanto nos mantínhamos à distância ­ o meu querido Germânico 
tinha encontrado outra pena da cauda para mim, enterrada num espinheiro, e eu punha­a orgulhoso no 
cabelo ­, Livila trepou curiosa por trás de uma roseira alta e escutou qualquer coisa. Largou a rir, 
ruidosamente:
­ Pobre Roma, tendo­o a ele como protector! Pelos Deuses, espero morrer antes disso!
O Augure voltou­se para ela e apontou­lhe o dedo...
­ Rapariga insensata, ­ disse, ­ Deus vai sem dúvida conceder­te o que desejas, e de uma forma que não 
vais gostar!
­ Vais ser fechada num quarto sem teres que comer, ­ disse a minha mãe. Agora que as recordo, essas 
palavras também foram agourentas. Livila passou o resto das férias na região fronteiriça. Vingava­se em 
mim de variadas maneiras, engenhosas e malévolas. Mas não podia dizer­nos
60
o que ouvira ao Augure, porque fizera um juramento a Vestal e aos Lares, que nunca se referiria ao 
presságio, quer directa quer indirectamente, durante a vida de qualquer dos presentes. Fomos todos 
obrigados a fazer esse juramento. Uma vez que há muitos anos sou o único sobrevivente daquele grupo ­ a 
minha mãe e o Augure, embora muito mais velhos, sobreviveram a todos os outros ­, já não estou ligado 
ao voto de silêncio. Durante algum tempo depois do sucedido, dei muitas vezes com a minha mãe a olhar­
me curiosa, quase com respeito, mas não me tratava melhor do que antes.
Não me foi permitido ir para o Colégio dos Rapazes, porque a fraqueza das pernas não me deixaria 
participar nos exercícios de ginástica, que eram uma parte importante da educação, além de que as 
doenças me tinham atrasado muito nas lições e a minha surdez e gaguez eram um obstáculo. Assim, estava 
raramente na companhia dos rapazes da minha idade e classe e os filhos dos escravos da casa é que eram 
chamados para brincar comigo: dois destes, Calon e Palas, ambos gregos, viriam a ser mais tarde meus 
secretários, sendo­lhes confiados assuntos da mais alta importância. Calon foi pai de dois outros 
secretários meus, Narciso e Políbio. Passei também grande parte do meu tempo com as mulheres de minha 
mãe, escutando­lhes as conversas enquanto fiavam, cardavam ou teciam. Muitas delas, tal como a minha 
preceptora, eram mulheres com uma educação liberal e devo confessar que tinha mais prazer na sua 
companhia do que na de qualquer grupo de homens, entre os quais me colocaram desde então: elas tinham 
espíritos abertos, eram astutas, modestas e generosas.
O meu preceptor já o mencionei, Marco Pórcio Catão, que era, pelo menos segundo os seus próprios 
cálculos, a encarnação viva da antiga virtude romana que os seus antepassados tinham demonstrado, um a 
seguir ao outro. Estava sempre a gabar­se dos seus antepassados, como é hábito das pessoas estúpidas que 
têm consciência de que não têm nada de pessoal para se gabarem. Gabava­se principalmente de Catão o  
Censor, que, de todas as figuras da história romana, é talvez o mais odioso para mim, por
1 Divindade adorada pelos romanos, considerada protectora das mulheres. As vestais eram as suas 
sacerdotisas, normalmente, gozavam de grande prestígio social Contudo, para poderem ambicionar a essa 
posição, tinham de ser, à partida, formosas e castas (N do R)
2 culto aos Lares remonta aos primeiros tempos de Roma Entidades consideradas menos poderosas que os 

Deuses, garantiam contudo a protecção do lar e das zonas habitacionais (por exemplo, contra incêndios, 
inundações ou outras calamidades). Por essa mesma razão, em muitos cruzamentos da antiga Roma, 
apareciam pequenas estátuas a eles referentes Para além dos Lares, existiam outras divindades da mesma 
categoria, destinadas à protecção de outros aspectos sociais, como sejam os Manes (almas dos 
antepassados, que Supervisionavam pelo destino e boa fortuna dos familiares vivos) ou os Penates  
(assistência na morte). (N do R)
61
ter defendido persistentemente a causa da antiga virtude, tornando­a idêntica no espírito do povo a 
grosseria, pedantismo e rudeza. Fui obrigado a ler as obras auto­glorificadoras de Catão o Censor, à guisa 
de livros de texto, e o relato que ele fez numa delas da sua campanha na Hispânia, onde destruiu mais 
cidades do que os dias que passou naquele país, causou­me mais repulsa pela sua desumanidade do que 
admiração pelas artes militares ou pelo patriotismo que desejava transmitir. O poeta Virgílio disse que a 
missão dos romanos é governar: ”Poupar os conquistados e, pela guerra, dominar os orgulhosos.” Catão 
dominou os orgulhosos, sem dúvida, mas menos pela guerra verdadeira do que através da gestão 
inteligente das invejas inter­tribais na Hispânia: chegou mesmo a empregar assassinos para afastar 
inimigos temíveis. Quanto a poupar os vencidos, passou à espada multidões de homens desarmados, 
mesmo quando rendiam incondicionalmente as suas cidades; regista orgulhosamente que muitas centenas 
de iberos preferiam cometer suicídio, com todas as suas famílias, de preferência a conhecerem a vingança 
romana. Seria para admirar que as tribos se rebelassem de novo logo que conseguiam reunir algumas 
armas e que continuassem a ser, desde então, um espinho constantemente cravado na nossa carne? Tudo o 
que Catão queria era saque e um triunfo: um triunfo não era concedido, a menos que se pudessem contar 
uns tantos cadáveres ­ acho que nessa altura eram
5.000 ­, e ele estava a certificar­se de que ninguém o pudesse contestar, tal como ele contestara por inveja 
vários rivais por terem fingido um triunfo sobre uma colheita insuficiente de cadáveres.
Os triunfos, a propósito, têm sido uma praga para Roma, Quantas guerras desnecessárias foram travadas 
porque os generais queriam a glória de serem transportados, coroados, pelas ruas de Roma, com cativos 
inimigos acorrentados atrás deles e os despojos de guerra amontoados em carros de desfile? Augusto 
compreendeu isto: a conselho de Agripa, decretou que, a partir dali, nenhum general, a menos que se 
tratasse de um membro da família imperial, teria direito ao triunfo público. Este decreto, publicado no ano 
em que nasci, dava a impressão de que Augusto sentia inveja dos seus generais, pois nessa altura já ele 
pessoalmente acabara com a vida activa de campanha e nenhum membro da sua família tinha idade 
suficiente para conquistar triunfos. Mas o que o decreto realmente significava era que ele não desejava 
que alargassem mais os limites do Império e que compreendia que os seus generais não levariam as tribos 
da fronteira a cometer actos de guerra, se não pudessem alimentar esperanças de lhes serem concedidos 
triunfos por causa da sua vitória sobre eles, Mesmo assim, permitia que ornamentos triunfais ­ uma túnica 
bordada, uma estátua, uma grinalda e assim por diante ­ fossem concedidos àqueles que, de outra forma, 
teriam ganho um triunfo; isto devia ser incentivo suficiente para que qualquer bom soldado fizesse
62
uma guerra necessária. Além disso, os triunfos são muito maus para a disciplina militar. Os soldados 
embebedam­se e ficam incontroláveis e, geralmente, acabam o dia a destruir tabernas, a lançar fogo às 
lojas dos azeiteiros e a insultar as mulheres, comportando­se, de uma maneira geral, como se Roma fosse 
a cidade que tinham conquistado, não um qualquer miserável acampamento de cabanas de madeira na 
Germânia ou uma aldeia marroquina enterrada na areia. Após um triunfo celebrado por um sobrinho meu, 
de quem vos falarei em breve, 400 soldados e perto de
4.000 simples cidadãos perderam a vida, de uma maneira ou de outra cinco grandes blocos de habitações 
no bairro das prostitutas da cidade foram totalmente destruídos pelo fogo e trezentas tabernas foram 
saqueadas, além de muitos outros estragos.
Mas eu estava a falar de Catão o Censor. O seu manual de economia doméstica foi transformado no meu 
livro de leitura obrigatório e, cada vez que me enganava numa palavra, costumava receber dois tabefes: 
um na orelha esquerda, pela minha estupidez; outro na direita, por ter insultado o nobre Catão. Recordo­
me de uma passagem no livro, que retratava muito bem a mesquínhês do indivíduo: ”O senhor de uma 
casa deve vender os seus bois velhos e todo o gado com cornos que seja de constituição delicada; todos os 
seus carneiros que não sejam robustos, a sua lã e até mesmo a sua pele; deve vender os carros velhos e os 
seus velhos instrumentos de lavoura; deve vender os escravos que estejam velhos e enfermos e tudo o 
mais que esteja gasto ou que seja inútil,” Pela minha parte, quando vivia como um senhor da terra na 
minha pequena propriedade de Cápua, fazia questão de pôr os meus animais mais enfraquecidos em 
trabalhos ligeiros e, depois, apenas na pastagem, até que a idade parecia tornar­se um fardo demasiado 
pesado para eles; nessa altura, mandava dar­lhes uma pancada na cabeça. Nunca me rebaixei a vendê­los 
por uma ninharia a um qualquer camponês, que os obrigasse a trabalhar cruelmente até ao último alento. 
Quanto aos meus escravos, sempre os tratei generosamente, tanto na doença como na saúde, tanto na 
juventude como na idade avançada. Em troca, esperava deles o mais alto grau de devoção. Raras vezes me 
decepcionei, embora, quando abusaram da minha generosidade, não tenha tido piedade deles. Não tenho 
dúvidas que os velhos escravos de Catão estavam sempre a cair doentes, na esperança de serem vendidos 
para um senhor mais humano e também me parece provável que, de uma maneira geral, ele recebesse 
deles trabalho e serviços menos honestos que eu dos meus. É loucura tratar os escravos como gado. Eles 
são mais inteligentes que o gado; além disso são capazes de causar numa semana mais estragos numa 
propriedade com o seu descuido voluntário e a sua estupidez, do que o preço que a mesma custou. Catão 
gaba­se de nunca gastar mais do que algumas libras num escravo: qualquer indivíduo com mau aspecto e 
olhos tortos
63
que parecesse ter bons músculos e bons dentes lhe servia. Como é que ele conseguia arranjar 
compradores para essas belezas, quando já não as queria, não sei dizer. Por aquilo que conheço do carácter 
do seu descendente, que se diz ser muito parecido com ele no aspecto físico cabelos de um louro 
desbotado, olhos verdes, voz áspera e corpulento e no carácter, acho que ele obrigava os pobres dos 
vizinhos a aceitar, pelo preço de novo, tudo o que ele rejeitava.
O meu querido amigo Póstumo, que era um pouco menos de dois anos mais velho que eu ­ o amigo mais 
verdadeiro, à excepção de Germânico, que alguma vez tive ­ disse­me que tinha lido num livro 
contemporâneo que o velho Catão era um verdadeiro escroque, além de sovina: era responsável por 
algumas manobras desonestas no comércio de navegação, mas evitou cair publicamente em desgraça 
fazendo de um dos seus ex­escravos comerciante nominal. Como Censor, encarregado da moral pública, 
fez algumas coisas bastante estranhas: alegou que agia em nome da decência pública mas, na realidade, ao 
que parece, satisfazia os seus rancores pessoais. Por iniciativa própria, expulsou um homem da ordem dos 
senadores por que demonstrara ”falta de seriedade romana” ­ tinha beijado a mulher à luz do dia na 
presença da filha! Quando questionado por um amigo do homem expulso, outro senador, quanto à justiça 
da sua decisão e interrogado sobre se ele próprio e a mulher nunca se abraçavam a não ser durante o acto 
marital, Catão respondeu, acalorado:
­ Nunca! O quê, nunca? Bom, há uns dois anos, para ser franco, a minha mulher pôs­me os braços em 
volta do corpo durante uma trovoada que estava a assustá­la, mas, felizmente não havia ninguém por perto 
e eu garanto­vos que há­de passar muito tempo antes que ela volte a fazê­lo.
­ Ah, ­ disse o senador, fingindo não o compreender, pois Catão queria dizer, suponho, que fizera à mulher 
uma prelecção terrível sobre a sua falta de seriedade. ­ Lamento ouvir isso. Algumas mulheres não são 
muito carinhosas com os maridos menos belos, por mais rectos e virtuosos que eles sejam. Mas deixai, 
talvez Júpiter seja suficientemente bondoso para mandar em breve outra trovoada.
Catão não perdoou a esse senador, que era um parente distante. Um ano mais tarde, passava em revista as 
actas dos senadores, o que era seu dever como Censor, perguntando a cada um por sua vez se era casado. 
Havia uma lei, que entretanto foi revogada, segundo a qual todos os senadores deviam ser honrosamente 
casados. Chegou a vez do tal parente ser examinado e Catão perguntou, usando a fórmula habitual, que 
exortava o senador a responderna sua confiança e honestidade:
­ Se tens uma esposa, na tua confiança e honestidade, responde!” entoou Catão, na sua voz rouca.
64
O homem sentiu­se um tanto ridículo, porque, depois de ter gracejado sobre a afeição da mulher de Catão 
pelo mesmo, descobrira que a sua própria mulher perdera a tal ponto a afeição por ele, que se via agora 
forçado a divorciar­se. Assim, para mostrar boa vontade e voltar o gracejo decentemente contra si próprio, 
replicou:
­ Sim, na verdade, tenho uma esposa, mas ela já não está na minha confiança e também não dou grande 
coisa pela sua honestidade. ­ Catão expulsou­o da ordem por irreverência,
E quem fez cair a Maldição Púnica sobre Roma? Esse mesmo velho Catão que, sempre que lhe 
perguntavam a opinião no Senado sobre um dado assunto, fosse ele qual fosse, terminava o seu discurso 
dizendo: ”Esta é a minha opinião; além disso, é minha opinião que Cartago devia ser destruída, pois 
constitui uma ameaça para Roma.” Insistindo sempre nessa mesma nota da ameaça de Cartago, provocou 
um tal nervosismo público que, como eu já disse, os romanos acabaram por violar os seus compromissos 
mais solenes e arrasaram Cartago, não deixando pedra sobre pedra.
Escrevi mais do que tencionava sobre o velho Catão, mas não o fiz de ânimo leve. No meu espírito, ele 
está associado tanto com a ruína de Roma, pela qual é tão responsável como os homens cuja ”luxúria 
efeminada”, como ele dizia, ”enervavam o Estado”, como com a recordação da minha infância infeliz, em 
que era dominado por aquele almocreve, o seu tetraneto. Agora sou um velho, e o meu preceptor está 
morto há cinquenta anos. No entanto, o meu coração ainda se enche de indignação e ódio quando penso 
nele.
Cermânico defendia­me perante os mais velhos de uma forma amável e persuasiva, mas Póstumo era um 
campeão com garras leoninas. Parecia não ligar a ninguém. Ousava mesmo falar sem rodeios à minha avó 
Lívia. Augusto fez de Póstumo o seu favorito; por isso, durante algum tempo, Lívia fingiu ficar divertida 
com aquilo a que chamava a sua impulsividade juvenil. A princípio, Póstumo confiava nela, sendo ele 
próprio incapaz de fingimento. Um dia, quando eu tinha doze anos e ele catorze, calhou passar em frente 
da sala onde Catão me estava a dar as lições. Ouviu o som de pancadas e os meus pedidos de compaixão e 
irrompeu pela sala, furioso.
­ Pára imediatamente de lhe bater! ­ gritou.
Catão olhou­o com ar surpreendido e cheio de desprezo e desferiu­me novo golpe, que me fez cair do 
banco.
Póstumo disse:
­ Aqueles que não conseguem bater no asno batem na sela ­ é um provérbio romano.
­ Descaramento. O que queres dizer com isso? ­ berrou Catão,
65
­ Quero dizer, ­ replicou Póstumo ­ que te estás a vingar em Cláudio daquilo que consideras ser uma conspiração 
generalizada para não te deixar subir. Tu és na verdade bom demais para estares aqui a ensiná­lo, não é? ­ Póstumo 
era inteligente: sabia que isto iria enfurecer Catão, a ponto de o deixar fora de si. E Catão mordeu a isca, gritando no 
meio de uma enfiada de velhos impropérios que, nos tempos do seu antepassado, para cuja memória aquele fedelho 
gago era um insulto, ai da criança que se mostrasse irreverente para com os mais velhos; pois nesse tempo a 
disciplina era imposta com mão pesada. Enquanto que nestes tempos degenerados os chefes de Roma dão todas as 
liberdades a qualquer imbecil (esta era para Póstumo) ou a qualquer criaturinha insignificante, débil de espírito e 
com um corpo decrépito (esta era para mim)...
Póstumo interrompeu­o com um sorriso de advertência:
­ Quer dizer que eu tinha razão. O degenerado Augusto insulta o grande Censor ao dar­lhe emprego na sua família de 
degenerados. Imagino que tenhas dito a Dona Lívia como te sentes em relação a isso?
Catão teria arrancado a língua, de tal forma se sentiu vexado e inquieto. Se Lívia viesse a saber o que ele tinha dito, 
seria o fim; até ali, sempre expressara a sua mais profunda gratidão pela honra de lhe ter confiado a educação do 
neto, para não falar na devolução gratuita dos bens da família
­ confiscados na batalha de Filipos, onde o pai morrera a lutar contra Augusto. Catão era suficientemente prudente ou 
suficientemente cobarde para captar a mensagem e, a partir daí, os meus tormentos diários foram consideravelmente 
reduzidos. Três ou quatro meses mais tarde, para meu grande deleite, ele deixou de ser meu preceptor, por ter sido 
nomeado director do Colégio dos Rapazes. Póstumo foi seu educando aí.
Póstumo era muito forte. Ainda com menos de catorze anos conseguia dobrar uma vara de ferro da grossura do meu  
polegar de encontro aos joelhos e, além disso, vi­o passear­se no recreio com dois rapazes sobre os ombros, um nas 
costas e outro apoiando um pé em cada uma das mãos de Póstumo. Não era estudioso, mas tinha um intelecto muito 
superior ao de Catão, o que é o mínimo que se pode dizer e, nos dois últimos anos em que frequentou o Colégio, os 
rapazes elegeram­no seu chefe. Em todos os jogos da escola, ele era O Rei ­ é estranho como a palavra rei 
sobreviveu entre os estudantes ­ e mantinha uma disciplina rígida entre os colegas. Catão tinha que ser muito 
delicado com Póstumo, se queria que os outros rapazes fizessem o que ele queria; todos eles seguiam as indicações 
de Póstumo.
Catão tinha agora que apresentar a Lívia relatórios semestrais sobre os seus alunos; entretanto, ela comunicou­lhe 
que, se achasse que eles eram de interesse para Augusto, lho daria a saber. Catão compreendeu por esse comentário 
que os seus relatórios deviam ser isentos de opiniões pessoais, a menos que recebesse alguma indicação dela para 
que louvasse
66
ou censurasse alguém em especial. Muitos casamentos eram arranjados enquanto os rapazes ainda 
estavam no Colégio e um relatório podia ser útil para Lívia, como argumento a favor ou contra alguma 
ligação em vista. Os casamentos da nobreza em Roma tinham que ser aprovados por Augusto como Alto 
Pontífice e eram, na maior parte dos casos, ditados por Lívia. Aconteceu um dia que Lívia visitou os 
claustros do Colégio e encontrou Póstumo sentado numa cadeira a ditar decretos como Rei. Catão notou 
que ela franziu o sobrolho ao ver a cena. Isso deu­lhe coragem para escrever no relatório seguinte: ”Muito 
contra vontade, mas no interesse da virtude e da justiça, sou obrigado a registar que o jovem Agripa 
póstumo tende a revelar um carácter selvático, dominador e intratável.” Depois disto, Lívia tratou­o com 
tal amabilidade que o relatório seguinte foi ainda mais forte. Lívia não mostrou os relatórios a Augusto, 
mas guardou­os de reserva e o próprio Póstumo não teve conhecimento de nada.
Sob o reinado de Póstumo, tive os dois anos mais felizes da minha juventude; posso mesmo dizer da 
minha vida. Ele deu ordens aos outros rapazes para que eu fosse admitido sem reservas nos jogos dos 
claustros, embora não fosse membro do colégio, e fez saber que consideraria qualquer indelicadeza ou 
insulto para com a minha pessoa como uma indelicadeza ou insulto à sua pessoa. Assim, tomava parte em 
todos os desportos quando a minha saúde o permitia e só quando Augusto ou Lívia apareciam é que eu 
desaparecia. Em lugar de Catão, tinha agora o bom velho Atenodoro como preceptor. Aprendi mais com 
ele em seis meses do que aprendera com Catão em seis anos. Atenodoro nunca me batia e usava da maior 
paciência. Costumava encorajar­me, dizendo que o facto de eu ser coxo devia ser um incentivo para a 
minha inteligência. Vulcano, o Deus de todos os artífices inteligentes, também era coxo. Quanto à minha 
gaguez, Demóstenes, o mais nobre orador de todos os tempos, nascera gago, mas tinha­se corrigido com 
paciência e concentração. Demóstenes utilizara precisamente o mesmo método que ele agora me estava a 
ensinar. Na verdade, Atenodoro fazia­me declamar com a boca cheia de seixos: ao tentar ultrapassar a 
obstrução dos seixos, esqueci a gaguez e, depois, os seixos foram sendo retirados um de cada vez, até não 
restar nenhum; e eu descobri, para minha surpresa, que conseguia falar tão bem como qualquer pessoa. 
Mas apenas quando declamava. Numa conversa normal gaguejava fortemente. Atenodoro fez do facto de 
eu conseguir declamar tão bem um segredo entre ele e mim.
­ Um dia, Cercopithecion, havemos de surpreender Augusto, dizia. ­ mas espera um pouco mais.
Quando me chamava Cercopithecion (pequeno sagüi) fazia­o com afeição e não por desprezo e eu sentia­
me orgulhoso do nome. Quando eu me portava mal, ele despejava:
67
­ Tibério Cláudio Druso Nero Germânico, lembrai­vos de quem sois e do que estais fazendo.
Com Póstumo, Atenodoro e Germânico como amigos, comecei gradualmente a ganhar auto­confiança.
Atenodoro disse­me, logo no primeiro dia a seguir a ter­se tornado meu preceptor, que se propunha ensinar­me não 
os factos, que eu podia recolher por mim mesmo em qualquer lado, mas a apresentação correcta dos factos. E foi o 
que ele fez. Um dia, por exemplo, perguntou­me, com simpatia, porque é que eu estava tão excitado; parecia incapaz 
de me concentrar na minha tarefa. Eu disse­lhe que acabava de ver um grande destacamento de recrutas em parada 
nos Campos de Marte, a serem inspeccionados por Augusto antes de serem enviados para a Germânia, onde a guerra 
recomeçara havia pouco,
­ Bom, ­ disse Atenodoro, sempre no mesmo tom de simpatia,
­ uma vez que estás tão preocupado com isso que não consegues apreciar as belezas de Hesíodo, Hesíodo pode 
esperar até amanhã. Afinal, ele já esperou setecentos anos ou mais; portanto, não nos vai levar a mal mais um dia. E 
entretanto, se te sentasses, pegasses nas tuas tabuinhas e me escrevesses uma carta, um breve relato de tudo o que 
viste nos Campos de Marte; como se eu estivesse ausente de Roma há cinco anos e tu me mandasses uma carta para 
o outro lado do mar, digamos para a minha cidade de Tarso. Isso ocuparia as tuas mãos inquietas e seria bom para 
praticares.
Assim, pus­me a escrever alegremente sobre a cera e, seguidamente, lemos a carta, para corrigir os erros de 
ortografia e de sintaxe. Fui forçado a admitir que relatara ao mesmo tempo coisas a mais e coisas a menos e que 
pusera os factos pela ordem errada. A passagem que descrevia as lamentações das mães e das namoradas dos jovens 
soldados, e como a multidão se precipitara para a cabeça da ponte para dirigir uma saudação final à coluna que 
partia, devia ter aparecido em último lugar, não em primeiro. E não precisava ter mencionado que a cavalaria tinha 
cavalos: as pessoas partiam do princípio que sim. E tinha mencionado duas vezes o incidente em que o cavalo de 
Augusto tropeçava: uma vez era o bastante, se o cavalo só tinha tropeçado uma vez. E o que Póstumo me contara, 
quando íamos a caminho de casa, sobre as práticas religiosas dos judeus, era interessante mas não tinha cabimento 
ali, porque os recrutas eram italianos e não judeus. Além disso, em Tarso, ele teria provavelmente mais 
oportunidades de estudar os costumes judeus do que Póstumo tinha em Roma. Por outro lado, eu não mencionara 
várias coisas que ele estaria interessado em saber ­ quantos recrutas havia na parada, até que ponto estavam 
adiantados no seu treino militar, para que cidade estavam a ser enviados, se pareciam satisfeitos ou desgostosos por 
irem, o que Augusto lhes dissera no seu discurso.
68
Três dias mais tarde, Atenodoro fez­me escrever uma descrição de uma rixa entre um marinheiro e um 
negociante de roupas que tínhamos presenciado juntos naquele dia, quando caminhávamos no mercado de 
roupa; e eu saí­me muito melhor. Ele aplicou primeiro esta disciplina à minha escrita, depois à 
declamação e, finalmente, de uma maneira geral, às minhas conversas com ele. Trabalhava 
incansavelmente comigo e, pouco a pouco, tornei­me menos distraído, pois ele nunca deixava passar sem 
um comentário qualquer frase minha que fosse descuidada, irrelevante ou inexacta.
Ele tinha tentado interessar­me na filosofia especulativa, mas, quando viu que eu não tinha inclinação para 
isso, não me forçou a exceder os limites habituais de uma boa educação sobre o assunto. Foi ele o 
primeiro a despertar o meu interesse pela história. Possuia os primeiros vinte volumes da história de Roma 
de Lívio, que me deu a ler como exemplo de uma escrita lúcida e agradável. As histórias de Lívio 
encantavam­me e Atenodoro prometeu­me que, logo que eu tivesse dominado a minha gaguez, me seria 
dado conhecer Lívio, que era seu amigo pessoal. E cumpriu o prometido. Seis meses mais tarde, levou­me 
à biblioteca de Apolo e apresentou­me a um homem encurvado e de barba, com cerca de sessenta anos, 
um rosto amarelado, olhar feliz e uma maneira precisa de falar, que me saudou cordialmente como o filho 
de um homem que ele admirara tanto. Lívio ia nessa altura ainda não exactamente a meio da sua história, 
que viria a ser completada em cento e cinquenta volumes, indo dos mais recuados tempos lendários, até à 
morte do meu pai, havia cerca de doze anos. Era nesta data que ele tinha começado a publicar a sua obra, 
ao ritmo de cinco volumes por ano, tendo chegado agora à data em que Júlio César nascera. Lívio 
felicitou­me por ter Atenodoro como preceptor. Atenodoro disse que eu o compensava bem do trabalho 
que tinha comigo. Depois, transmiti a Lívio todo o prazer que sentia com a leitura dos seus livros, desde 
que Atenodoro mos recomendara como modelo de escrita. Assim, toda a gente ficou satisfeita, 
especialmente Lívio.
­ O quê! Também vais ser historiador, meu caro jovem? ­ perguntou.
­ Bem gostaria de ser merecedor desse nome honroso, ­ repliquei
­ embora na verdade nunca tivesse considerado seriamente tal possibilidade. Depois, sugeriu que eu 
escrevesse uma biografia do meu pai e ofereceu­se para me ajudar, pondo­me em contacto com as fontes 
históricas mais confiáveis. Senti­me muito lisonjeado e decidido a começar o livro no dia seguinte. Mas 
Lívio disse que a escrita era a última tarefa do historiador: primeiro, ele tinha que reunir o seu material e 
aguçar a pena. Atenodoro emprestar­me­ia o seu pequeno canivete bem afiado, gracejou.
Atenodoro era um ancião majestoso, com uns meigos olhos escuros, nariz aquilino e a barba mais 
maravilhosa que alguma vez cresceu num queixo humano. Espalhava­se­lhe em ondas até à cintura e era 
branca como as asas de um cisne. Havia alguns cisnes domesticados num lago artificial nos Jardins de 
Salusto, onde Atenodoro e eu uma vez lhes atirámos
69
pão de um barco; recordo­me de ter reparado que a barba dele e as asas daquelas aves, enquanto ele se 
debruçava da amurada, eram exactamente da mesma cor. Atenodoro costumava cofiar a barba lenta e 
ritmicamente enquanto falava; uma vez, disse­me que era isso que a fazia crescer tão luxuriante. Disse que 
sementes de fogo invisíveis brotavam dos seus dedos e eram um alimento para os cabelos. Esta era uma 
piada estóica típica, às custas da filosofia especulativa epicúrea.
Por falar na barba de Atenodoro, lembrei­me agora de Sulpício que, quando eu tinha treze anos, foi 
escolhido por Lívia para meu preceptor especial de história. Sulpício tinha, penso eu, a barba mais 
miserável que eu alguma vez vi: era branca, mas do branco da neve nas ruas de Roma, depois de um 
degelo ­ de um cinzento encarniçado e muito irregular. Costumava enrolá­la nos dedos quando estava 
preocupado e chegava mesmo a pôr as pontas na boca, que mascava. Lívia escolhera­o, penso, porque o 
achava o homem mais aborrecido de Roma e esperava, tornando­o, meu preceptor, desencorajar as minhas 
ambições históricas, pois não tardou a ouvir falar delas. Lívia tinha razão: Sulpício era um génio em fazer 
as coisas mais interessantes parecerem totalmente insípidas e mortas. Mas mesmo a falta de interesse de 
Sulpício não conseguiu desviar­me do meu trabalho e havia nele uma vantagem: a de ter a memória mais 
excepcionalmente exacta para as datas. Se eu alguma vez precisava da informação mais remota, como por 
exemplo as leis da sucessão à chefia entre uma das tribos alpinas contra as quais o meu pai tinha lutado, 
ou o significado e etimologia do seu estranho grito de batalha, Sulpício sabia qual a autoridade que tratara 
essas questões, em que livro e qual a prateleira de que estante e em que sala de qual biblioteca se podiam 
encontrar. Não tinha qualquer sentido crítico e escrevia pessimamente, com os factos a abafarem­se uns 
aos outros como flores num viveiro que não foi desbastado. Mas mostrou­se um assistente valioso quando, 
mais tarde, aprendi a usá­lo como tal, e não como preceptor; e assim trabalhou para mim até morrer, com 
a idade de oitenta e sete anos, quase trinta anos depois, com uma memória que se manteve intacta até ao 
fim e com uma barba tão desbotada, fraca e desarranjada como sempre.
1 estoicismo é uma corrente filosófica que remonta à Grécia antiga, cuja criação é normalmente atribuída 
ao sofista Zenão. Caracteriza­se pela austeridade de comportamentos dos seus seguidores e pela defesa do 
relativismo com que todas as coisas deverão ser encaradas. Por outro lado, esta filosofia aconselha 
também a indiferença e o desprezo pelos males físicos e morais, procurando aniquilar os nossos desejos e 
paixões, no sentido destes darem lugar à razão e à virtude. Em Roma, o imperador­filósofo Marco 
Aurélio revelar­se ia como um dos mais acérrimos defensores do estoicismo.
2 O epicurismo, introduzido no universo da filosofia por Epicuro, defende que o indivíduo deverá guiar a 

sua vida pela procura do prazer, dando predominância ao de cariz intelectual ou moral.
70
CAPíTULO VI
Tenho agora que recuar alguns anos para escrever sobre meu tio Tibério, cuja sorte não é de forma alguma 
irrelevante para esta história. Ele encontrava­se numa posição infeliz, forçado contra sua vontade a 
manter­se continuamente sob os olhares públicos, ora como
general nalguma campanha de fronteira, ora como Cônsul em 6 a.C. Roma ou comissário especial nas 
províncias, quando tudo o que
ele queria era um descanso prolongado e privacidade. Honrarias públicas pouco significavam para ele, 
quanto mais não fosse porque lhe eram concedidas, como ele uma vez se queixou a meu pai, mais por ser 
o principal moço de recados de Augusto e Lívia, do que por actuar por direito próprio e à sua própria 
responsabilidade. Além disso, com a dignidade da família imperial a manter e Lívia a espiá­lo 
constantemente, tinha que tomar o maior cuidado com a sua moral privada. Tinha poucos amigos, pois 
era, como creio que já disse, de temperamento desconfiado, ciumento, reservado e melancólico; aos que 
eram mais interesseiros do que realmente amigos, tratava­os com o desprezo cínico que mereciam. E, por 
fim, as coisas tinham ido de mal a pior entre ele e Júlia, desde que a desposara havia cinco anos. Tinham 
tido um filho que morrera e, a parti daí, Tibério recusara­se a voltar a dormir com ela; por três razões. A 
primeira era que Júlia estava agora a entrar na meia­idade e a perder a figura esbelta ­ Tibério preferia 
mulheres imaturas, quanto mais arrapazadas melhor, e Vipsânia era uma criaturinha minúscula. A segunda 
era que Júlia lhe fazia exigências apaixonadas, às quais ele era incapaz de corresponder, ficando histérica 
quando ele a repelia. A terceira foi que ele descobriu, depois de a ter repelido, que ela se vingava 
arranjando galanteadores que lhe davam o que ele negava.
Infelizmente, ele não conseguiu arranjar provas das infidelidades de Júlia, aparte as declarações dos 
escravos, pois ela fazia as coisas com todo o cuidado; e as declarações dos escravos não eram suficientes 
para apresentar a Augusto como motivo para ele fazer o divórcio da sua única filha bem­amada. Contudo, 
de preferência a falar no caso a Lívia, pois na realidade odiava­a tanto quanto desconfiava dela, preferiu 
sofrer em silêncio. Ocorreu­lhe que, se conseguisse afastar­se de Roma e de Júlia, era bem provável que 
ela baixasse as defesas e que Augusto viesse a descobrir
71
por si próprio qual o comportamento dela. A sua única possibilidade de fuga seria que outra guerra 
estalasse algures, numa das fronteiras que eram suficientemente importantes para que o mandassem para 
lá como comandante de operações. Mas não havia sinais de guerra em qualquer dos quadrantes e, além  
disso, ele estava farto de lutar. Sucedera ao meu pai no comando dos exércitos da Germânia (júlia insistira 
em o acompanhar ao Reno) e havia agora alguns meses que estava de regresso a Roma. Mas Augusto 
fizera­o trabalhar como um escravo desde o seu regresso, dando­lhe a tarefa, difícil e desagradável, de 
investigar a administração das casas de trabalho e, de uma maneira geral, as condições de trabalho nos 
bairros mais pobres de Roma. Um dia, num momento de descontracção, dissera de repente para Lívia:
­ Oh mãe, gostaria de estar livre, nem que fosse por alguns meses, desta vida intolerável.
Ela assustou­o, não lhe dando resposta e saindo da sala com ar altivo. Mais tarde, no mesmo dia, chamou­
o à sua presença e surpreendeu­o dizendo que decidira conceder­lhe o seu desejo e conseguir­lhe uma 
licença temporária junto de Augusto. Ela tomou essa decisão, em parte porque desejava criar­lhe uma 
dívida de gratidão para com ela e porque sabia agora dos casos amorosos de Júlia, partilhando a mesma 
ideia de Tibério quanto a dar­lhe a corda com que se enforcaria a si própria. Mas a sua razão principal era 
que os irmãos mais velhos de Póstumo, Caio e Lúcio, estavam a crescer, e as relações entre eles e o 
padrasto Tibério eram tensas. Caio, que no fundo não era mau tipo (tal como Lúcio também não o era), 
acabara por preencher, até certo ponto, o lugar que Marcelo ocupara nas afeições de Augusto. Mas ele 
estragava­os a ambos de forma tão descarada, apesar das advertências de Lívia, que era de admirar não se 
terem tornado piores do que eram. Tinham o hábito de tratar com insolência os mais velhos, 
particularmente aqueles para com quem sabiam que Augusto desejaria secretamente que se comportassem 
dessa forma, e viviam com grande extravagância. Quando Lívia viu que era inútil tentar controlar o 
nepotismo de Augusto, mudou de atitude e passou a encorajá­lo e a favorecê­los mais do que nunca. Ao 
fazê­lo e ao deixá­los a eles saber que ela o fazia, esperava ganhar­lhes a confiança. Calculava também 
que, se a sua presunção aumentasse um pouco mais, eles acabariam por perder a cabeça e tentar apoderar­
se da monarquia. O seu sistema de espionagem era excelente e ela não deixaria de ser informada de um tal 
plano a tempo de os mandar prender. Encorajou Augusto a mandar eleger Caio para Cônsul durante quatro 
anos, quando ele tinha apenas quinze (embora a idade mínima com que um homem se podia tornar Cônsul 
tivesse sido fixada por Sula nos quarenta e três anos e, para além disso, com a condição de ter 
anteriormente preenchido três cargos de magistratura diferentes e de importância ascendente). Mais tarde, 
Lúcio recebeu a mesma honra.
72
Lívia sugeriu também que Augusto os apresentasse ao Senado como Chefes dos Cadetes. O título não lhes 
era concedido, como acontecera com Marcelo, apenas para uma ocasião específica, mas deixava­os numa 
posição de permanente autoridade sobre todos os seus iguais em idade e posição. Parecia agora 
perfeitamente claro que Augusto tencionava fazer de Caio seu sucessor; por isso, não era de admirar que o 
mesmo tipo de jovens nobres que tinham alardeado as capacidades ainda não experimentadas do jovem 
Marcelo contra a reputação ministerial e militar do veterano Agripa, fizessem agora o mesmo pelo filho de 
Agripa, Caio, contra a reputação de veterano de Tibério, que submetiam a muitas injúrias. Lívia 
tencionava que Tibério seguisse o exemplo de Agripa. Se ele se retirasse agora, com tantas vitórias e 
honras públicas a seu favor, para qualquer ilha grega próxima e deixasse a arena política livre para Caio e 
Lúcio, isto causaria melhor impressão e ganhar­lhe­ia de longe maior simpatia popular do que se se 
deixasse ficar para a disputar (o paralelismo histórico tornar­se­ia ainda mais próximo, se Caio e Lúcio 
morressem durante o afastamento de Tibério e se Augusto sentisse de novo necessidade dos serviços 
dele). Assim, ela prometeu instar com Augusto para que lhe concedesse permissão para se ausentar 
indefinidamente de Roma e demitir­se de todos os seus cargos oficiais, mas dando­lhe o cargo honorífico 
de Protector do Povo ­ que o garantiria contra a eventualidade de vir a ser assassinado por Caio, caso este 
viesse a pensar em se desembaraçar dele.
Lívia teve grande dificuldade em manter a sua promessa, pois Tibério era o mais útil e experiente dos 
ministros de Augusto, bem como o seu general com maior sucesso; durante muito tempo, Augusto 
recusou­se a tomar o pedido a sério. Mas Tibério invocou Problemas de saúde e insistiu em que a sua 
ausência pouparia a Caio e a Lúcio grande constrangimento, admitindo que não se dava muito bem com 
eles. Mesmo assim, Augusto não lhe deu ouvidos. Caio e Lúcio não passavam de dois rapazes, ainda 
totalmente inexperientes na guerra ou nos assuntos de estado, e não lhe serviriam de nada se surgisse 
algum problema sério na cidade, nas províncias ou na fronteira. Compreendia, talvez pela primeira vez, 
que Tibério era agora o seu único apoio numa emergência desse tipo. Mas irritava­o que essa compreensão 
tivesse sido forçada. Recusou o pedido de Tibério e disse que não ia escutar quaisquer argumentos. 
Portanto, como não havia nada a fazer, Tibério foi ter com Júlia e disse­lhe com uma brutalidade estudada 
que o seu casamento se tinha tornado uma farsa tal que já não conseguia ficar na mesma casa com ela um 
dia mais que fosse. Sugeria­lhe que fosse procurar Augusto e se queixasse de ter sido maltratada pelo seu 
rufião de marido e que não se sentiria feliz enquanto não tivesse o divórcio. Augusto, disse ele, era pouco 
provável, por razões familiares, que concedesse o divórcio, mas, provavelmente, bani­lo­ia de
73
Roma. Estava preparado até para suportar o exílio, de preferência a continuar a viver com ela.
Júlia decidiu esquecer que alguma vez tivesse amado Tibério. Sofrera muito com ele. Tibério não só a 
tratava com o maior desprezo sempre que estavam a sós, como começara ultimamente a experimentar 
cautelosamente essas práticas ridiculamente imundas que mais tarde tornaram o seu nome tão detestável a 
todas as pessoas decentes; e ela já descobrira isso. Assim, tomou­o à letra e queixou­se a Augusto em 
termos bem mais violentos do que Tibério (que era suficientemente vaidoso para acreditar que, apesar de 
tudo, ela ainda o amava) poderia ter imaginado. Augusto sempre tivera grande dificuldade em esconder a 
sua antipatia por Tibério como Genro ­ o que, como é evidente, encorajara a facção de Caio ­ e agora 
caminhava furioso de um lado para o outro no seu gabinete, chamando a Tibério todos os nomes que lhe 
vinham à cabeça. Mesmo assim, ainda recordou a Júlia que só se podia queixar de si própria pela 
decepção sofrida com um marido sobre cujo carácter ele nunca deixara de a prevenir. E, por muito que a 
amasse e sentisse pena dela, não podia dissolver o casamento. Era impensável que a filha e o enteado se 
separassem depois de uma união à qual tinha sido dada tanta importância política e, estava certo, Lívia 
veria a questão da mesma forma que ele. Assim, Júlia suplicou que Tibério fosse enviado para qualquer 
lugar durante um ano ou dois, porque de momento ela não podia suportar a sua presença a menos de cem 
milhas dela. Ele acabou por concordar com isto e, alguns dias mais tarde, ia a caminho da ilha de Rodes, 
que ele próprio escolhera, muito antes disto, como o sítio ideal para se retirar. Mas Augusto, embora lhe 
concedesse o posto de Protector, sob a insistência premente de Lívia, deixou bem claro que não sentiria 
qualquer desgosto se nunca mais o visse na sua frente.
Ninguém, a não ser os principais implicados neste curioso drama, sabiam a razão por que Tibério estava 
deixando Roma e Lívia usou a má vontade de Augusto em discutir o assunto publicamente a favor de 
Tibério. Disse às suas amigas, em confidência, que Tibério tinha decidido retirar­se como protesto contra 
o comportamento escandaloso do partido de Caio e Lúcio. Disse também que Augusto tinha mostrado 
uma enorme compreensão para com ele e que, de início, recusara a sua demissão, prometendo silenciar os 
ofensores; Tibério insistira então que não desejava criar maior desentendimento entre ele próprio e os 
filhos da mulher, e demonstrara firmeza do seu propósito, ficando sem comer durante quatro dias. Lívia 
manteve a farsa acompanhando Tibério ao seu navio em óstia, o porto de Roma, e suplicando­lhe, em 
nome de Augusto e no seu próprio, que reconsiderasse aquela decisão. Fez também com que todos os 
membros da sua família mais chegada ­ o filho mais novo de Tibério, Castor, a minha mãe, Germânico, 
Livila e eu próprio ­ fôssemos com
74
ela e tornássemos a ocasião mais comovente, juntando às dela as nossas súplicas. Júlia não apareceu e a 
sua ausência encaixava bem na impressão que Lívia estava a tentar criar ­ que ela tomara o partido dos 
filhos contra o marido. Foi uma cena ridícula mas bem encenada. A minha mãe fez bem a sua parte e as 
três crianças, que tinham sido cuidadosamente ensinadas, representaram realmente os seus papéis como se 
os sentissem. Eu fiquei estupefacto e mudo até que Livila me deu um beliscão que me fez largar a chorar, 
saindo­me assim ainda melhor do que eles. Tinha eu quatro anos de idade quando tudo isto aconteceu, mas 
já tinha feito doze, antes de Augusto ter sido forçado, apesar de relutante, a chamar meu tio de regresso a 
Roma, pois a situação política tinha­se alterado profundamente. Mas Júlia merece muito mais simpatia do 
que aquele que conquistou junto do público, Estou convencido de que era, naturalmente, uma mulher 
decente e de bom coração, ainda que amante dos prazeres e da excitação e a única entre as minhas 
parentes femininas que tinha uma palavra bondosa para me dizer. Também estava convencido de que não 
havia fundamento para as acusações feitas contra ela muitos anos mais tarde, de infidelidade para com 
Agripa, quando estava casada com ele. Sem dúvida, todos os seus filhos se pareciam muito com ele. A 
verdadeira história é como se segue. Na sua viuvez, como relatei, apaixonou­se por Tibério e persuadiu 
Augusto a deixá­la casar com ele. Tibério, furioso por ter que se divorciar da mulher por causa dela, 
tratou­a com grande frieza. Ela foi então suficientemente imprudente para ir falar com Lívia, a quem 
receava mas em quem confiava, pedindo­lhe conselho. Lívia deu­lhe um filtro de amor, que ela devia 
beber, dizendo que, no espaço de um ano, isso a tornaria irresistível para o marido, mas que teria que o 
tomar uma vez por mês, com a lua cheia e fazer certas orações a Vénus, sem dizer nada a esse respeito a 
quem quer que fosse; senão, a droga perdia o efeito e faria muito mal. O que Lívia lhe deu, com toda a 
crueldade, foi uma destilação dos corpos esmagados de umas certas pequenas moscas verdes vindas da 
Hispânia, que lhe estimulavam de tal forma o apetite sexual que ela se tornou como que demente 
(explicarei mais adiante como vim a saber de tudo isto). Na realidade, durante algum tempo, ela conseguiu 
incendiar o apetite de Tibério com o abandono lascivo que a droga lhe provocou, ao contrário da sua 
modéstia natural; mas em breve o cansou e ele recusou­se a continuar a ter relações com ela. Assim, foi 
obrigada, sob o efeito da droga, que suponho se tenha tornado num hábito para ela, a satisfazer os seus 
desejos sexuais através de ligações adúlteras com qualquer cortesão em quem pudesse confiar para se 
comportar com discrição. Quero dizer que procedeu assim em Roma, na Germânia e em França, 
seduzindo soldados rasos da guarda pessoal de Tibério e mesmo escravos germanos, ameaçando, se eles 
hesitavam, acusá­los de lhe oferecerem
75
familiaridades e mandá­los chicotear até à morte. Como ela ainda era uma mulher bonita, eles, ao que 
parecia, não hesitavam muito.
Depois do afastamento de Tibério, Júlia tornou­se descuidada e toda Roma não tardou a saber das suas 
infidelidades. Lívia nunca disse uma palavra a Augusto, confiante que, a seu tempo, ele viria a saber por 
qualquer outra fonte. Mas o amor cego de Augusto por Júlia era proverbial e ninguém ousava dizer­lhe 
nada. Passado algum tempo, era do consenso geral que ele não podia continuar na ignorância e que o seu 
perdão tácito perante o comportamento dela era mais uma advertência a favor do silêncio. As orgias 
nocturnas de Júlia na Praça do Mercado e na própria Plataforma de Oratória tinham­se tornado causa de 
um grave escândalo público. No entanto, passaram­se quatro anos antes que um leve rumor chegasse aos 
ouvidos de Augusto. Depois, viria a ouvir a história completa, justamente pela boca dos filhos, Caio e 
Lúcio, que se apresentaram juntos diante dele e lhe perguntaram com irritação durante quanto tempo ia 
permitir que ele próprio e os seus netos fossem envergonhados. Compreendiam, disseram, que a 
preocupação com o bom­nome da família o tivesse tornado muito paciente em relação à mãe, mas 
certamente havia um limite para aquele sofrimento prolongado. Seria que deviam esperar até que ela os 
presenteasse com uma ninhada de irmãos bastardos, filhos de diversos pais, antes que tomasse 
conhecimento oficial das proezas dela? Augusto escutou­os com horror e espanto, e durante um bom 
bocado, não conseguiu fazer outra coisa senão ficar de boca aberta e mexer os lábios. Quando conseguiu 
recuperar a voz, foi para chamar por Lívia, num tom meio estrangulado. Eles repetiram a história na 
presença da mãe e ela fingiu soluçar, dizendo que aqueles três anos em que Augusto deliberadamente 
fechara os ouvidos à verdade tinham sido o seu maior desgosto. Por várias vezes, disse, arranjara coragem 
para falar com ele, mas tinha­se­lhe tornado evidente que ele não queria escutar uma palavra do que ela 
tinha para dizer.
­ Estava confiante de que sabíeis tudo sobre o assunto, mas que era uma questão demasiado dolorosa para 
que a pudésseis discutir mesmo comigo.
Augusto, chorando, com a cabeça entre as mãos, murmurava que nunca tinha ouvido o mais ligeiro rumor 
ou alimentado a mais leve suspeita de que a filha não fosse a mulher mais casta de Roma. Lívia 
perguntou­lhe então porque achava que o filho Tibério tinha ido para o exílio. Por amor ao exílio? Não; 
era por não ter conseguido controlar os excessos da mulher, sentindo­se ao mesmo tempo magoado por 
Augusto os acobertar, pois era isso que pensava; e, como não desejava entrar em conflito com Caio e 
Lúcio, os filhos dela, pedindo a Augusto permissão para se divorciar, não lhe restava outra solução a não 
ser desaparecer de cena com toda a decência.
76
A conversa relativamente a Tibério não teve qualquer efeito em Augusto, que lançou uma das dobras da 
túnica sobre a cabeça e saíu a tatear em direcção à passagem que levava ao seu quarto, onde se fechou; 
não foi visto por ninguém, nem mesmo por Lívia, durante quatro dias, no decorrer dos quais não comeu 
nem bebeu nada, não dormiu e, o que seria uma prova ainda mais forte ­ caso ela fosse necessária ­ da 
violência do seu desgosto, ficou todo esse tempo sem se barbear. Finalmente, puxou o fio que atravessava 
um orifício na parede e fez soar uma pequena campainha de prata no quarto de Lívia. Lívia apareceu a 
correr, com um ar de preocupação amorosa e Augusto, ainda não muito seguro da própria voz, escreveu 
numa tabuinha de argila uma só frase em grego: ”Que ela seja banida para sempre, mas digam­me para 
onde.” Entregou a Lívia o seu anel de sinete, para ela poder escrever cartas ao Senado em seu nome, 
recomendando a expulsão (a propósito, este sinete era a grande esmeralda talhada com a cabeça de 
Alexandre o Grande, de elmo, de cujo túmulo tinha sido roubada, juntamente com uma espada, um 
peitoral e outros ornamentos pessoais do herói. Lívia insistiu em que ele a usasse, apesar dos seus 
escrúpulos ­ ele tinha a noção do que isso tinha de presunçoso ­, até que uma noite teve um sonho no qual 
Alexandre, com uma expressão zangada, cortou com a sua espada o dedo que a usava. Nessa altura, 
Augusto mandou fazer o seu próprio sinete, um rubi da índia, cortado pelo famoso ourives Dioscurides; 
desde aí, todos os seus sucessores o têm usado, como sinal de soberania).
Lívia escreveu a recomendação de exílio em termos muito fortes. Foi composta no estilo literário de 
Augusto, que era fácil de imitar, porque sacrificava sempre a elegância à clareza ­ por exemplo, através da 
repetição voluntária da mesma palavra, quando ela ocorria várias vezes numa dada passagem, em vez de 
procurar um sinónimo ou uma paráfrase (o que é a prática literária corrente). Tinha também uma tendência 
para exagerar o uso de preposições. Lívia não mostrou a carta a Augusto e enviou­a directamente para o 
Senado, que votou de imediato um decreto de exílio perpétuo. Ela fizera uma lista dos crimes de Júlia de 
tal forma detalhada e atribuíra a Augusto expressões de repúdio de tal forma calmas que lhe tornava 
impossível vir a mudar de opinião e pedir ao Senado que cancelasse a decisão. Fez ainda um bom trabalho 
por acréscimo, escolhendo para uma referência especial como parceiros de Júlia nos seus actos de 
adultério três ou quatro homens que estava interessada em destruir. Entre eles, encontrava­se um tio meu, 
lulo, filho de António, a quem Augusto mostrara grande benevolência por causa de Octávia, fazendo­o 
ascender ao Consulado. Lívia, ao nomeá­lo na sua carta para o Senado, acentuou fortemente a ingratidão 
que mostrara para com o seu benfeitor e sugeriu que ele e Júlia estariam a conspirar em conjunto para 
lançar mão do poder supremo. lulo suicidou­se. Creio que a acusação de conspirador não tinha
77
fundamento mas, como único filho vivo de António, por parte da mulher Fúlvia ­ Augusto mandara matar 
Antilo, o mais velho, logo após o suicídio do pai, os outros dois, Ptolomeu e Alexandre, filhos de 
Cleópatra, tinham morrido novos ­ e, como ex­Cônsul e marido da irmã de Marcelo, de quem Agripa se 
divorciara, ele parecia perigoso. O descontentamento popular em relação a Augusto exprimia­se muitas 
vezes por um desejo de que tivesse sido António a ganhar a batalha de Áccío. Os outros homens que Lívia 
acusou de adultério foram banidos.
Uma semana depois, Augusto perguntou a Lívia se um certo decreto tinha sido devidamente promulgado ­ 
pois nunca mais voltou a pronunciar o nome de Júlia e raramente se referia a ela, mesmo indirectamente, 
embora fosse evidente que a tinha bem presente nos seus pensamentos. Lívia disse­lhe que uma certa 
pessoa tinha sido sentenciada à reclusão perpétua numa ilha e que ia a caminho. Perante isto, ele pareceu 
ficar ainda mais abatido por Júlia não ter tomado a única atitude honrosa que ainda lhe restava: 
designadamente, pôr fim à própria vida. Lívia mencionou que Phoebe, aia de Júlia e sua principal 
confidente, se enforcara logo que o decreto do exílio tinha sido publicado. Augusto disse:
­ Prouvera a Deus que eu fosse o pai de Phoebe.
Retardou a sua aparição em público por mais quinze dias; recordo­me bem desse mês horrível. Nós, as 
crianças, fomos obrigadas, por ordem de Lívia, a usar luto, não nos sendo permitido brincar, fazer 
qualquer ruído ou mesmo sorrir. Quando voltámos a ver Augusto, ele parecia dez anos mais velho; 
passaram­se meses antes que ele tivesse coragem para visitar o recreio no Colégio dos Rapazes ou mesmo 
retomar o seu exercício matinal diário, que consistia num passeio em passo vivo à volta dos terrenos do 
palácio, com uma corrida final sobre alguns obstáculos baixos.
Tibério soube de imediato por Lívia a notícia relativa a Júlia. Instado por ela, escreveu duas ou três cartas 
a Augusto, suplicando­lhe que perdoasse a Júlia, como ele próprio perdoava e dizendo que, por pior que 
ela se tivesse portado como esposa, desejava que ela guardasse todas as propriedades que alguma vez 
transferira para ela. Augusto não respondeu. Estava firmemente convencido de que a frieza inicial de 
Tibério e a sua crueldade para com Júlia, além dos exemplos de imoralidade que lhe dera, eram 
responsáveis pela sua degradação moral. Longe de o chamar de regresso a Roma, recusou­se mesmo a 
renovar o seu Protectorado, quando este chegou ao fim no ano seguinte.
Há uma balada de marcha de soldados chamada Os Três Desgostos de Augusto, composta no estilo 
tragicómico primitivo de acampamento e que foi cantada muitos anos mais tarde pelos regimentos 
estacionados na Germânia. O tema afirma que Augusto sofreu primeiro por causa de Marcelo, depois por 
causa de Júlia e uma terceira vez por causa das Águias perdidas de Varo. Sofreu profundamente com a 
morte de Marcelo, mais
78
profundamente com a desgraça de Júlia, mas mais profundamente ainda por causa das Águias, porque, 
com cada uma das Águias, tinha desaparecido um regimento inteiro dos homens mais valorosos de Roma. 
A balada lamenta em alguns versos o malogrado destino do Décimo Sétimo, Décimo Oitavo e Décimo 
Nono Regimentos que, quando eu tinha dezanove anos, foram vítimas de uma emboscada e massacrados 
pelos germanos numa floresta pantanosa distante; conta como, depois das notícias deste desastre sem igual 
lhe terem chegado, Augusto não parava de bater com a cabeça na parede:
O Grande Augusto não parava de gritar Enquanto partia a própria cabeça,
Varo, Varo, General Varo,
Dá­me de volta as minhas três dguias!
O Grande Augusto rasgou as roupas da cama, Cobertores, lençol e colcha,
Varo, Varo, general Varo,
Dá­me de volta os meus Regimentos!
Os versos seguintes dizem que, após esse incidente, ele nunca mais formou novos regimentos com os 
números dos três que tinham sido destruídos, mantendo­os em aberto na Lista do Exército. É obrigado a 
jurar que a vida de Marcelo e a honra de Júlia nada tinham sido para ele em comparação com a vida e a 
honra dos seus soldados, e que o seu espírito ”não teria mais descanso que uma pulga numa fogueira”, até 
as três Aguias serem recuperadas e postas em segurança no Capitólio. Mas, embora depois disso os 
germanos tenham sido batidos uma vez e outra em batalha, ninguém tinha conseguido descobrir onde as 
Águias perdidas tinham feito o ninho ­ os cobardes mantinham­nas bem escondidas. Foi desta maneira que 
os soldados desvalorizaram o sofrimento de Augusto por Júlia; mas, na minha opinião, por cada hora que 
ele sofreu pelas Águias, deve ter sofrido um mês inteiro por ela.
Não quis saber para onde a tinham mandado, porque isso teria significado que o seu espírito estaria 
continuamente a voltar­se para lá e ele mal conseguiria controlar­se para não apanhar um barco e ir visitá­
la. Por isso, foi fácil para Lívia tratar Júlia da forma mais vingativa. Não lhe era permitido o acesso a 
vinho, cosméticos, roupas elegantes ou qualquer espécie de luxos e a sua guarda era composta por 
eunucos e homens muito idosos. Não tinha autorização de receber visitas e era mesmo obrigada a trabalhar 
diariamente numa roca de fiar, como nos seus tempos de escola. A ilha ficava em frente da costa da 
Campânia. Era muito pequena e Lívia aumentava­lhe deliberadamente o sofrimento, mantendo lá os 
mesmos
79
guardas ano após ano sem serem rendidos e eles, naturalmente, culpavam­na a ela pelo seu exílio naquele 
lugar apertado e insalubre. A única pessoa que se sai bem desta história desagradável é a mãe de Júlia, 
Escribónia, de quem, estarão recordados, Augusto se divorciara para poder casar com Lívia. Agora uma 
mulher já idosa, que tinha vivido retirada por vários anos, apresentou­se ousadamente diante de Augusto e 
pediu permissão para partilhar o exílio da filha. Disse­lhe na presença de Lívia que a filha lhe tinha sido 
roubada logo que nasceu, mas que ela sempre a adorara à distância e, agora que o mundo inteiro estava 
contra a sua querida filha, desejava mostrar o que era o verdadeiro amor de mãe. Na sua opinião, a 
pobrezita não tinha culpa de nada: tinham­lhe tornado as coisas muito difíceis. Lívia riu­se com desprezo, 
mas deve ter­se sentido bastante desconfortável. Augusto, controlando a própria emoção, assinou em 
como o pedido estava concedido.
Cinco anos mais tarde, no dia do aniversário de Júlia, Augusto perguntou repentinamente a Lívia:
­ De que tamanho é a ilha?
­ Qual ilha? ­ inquiriu Lívia.
­ A ilha... onde está vivendo uma infeliz.
­ Oh, chega­se de uma ponta à outra em poucos minutos, creio,
­ disse Lívia com uma indiferença afectada.
­ Alguns minutos! Estás a brincar? ­ Imaginara­a no exílio numa ilha grande, como Chipre, Lesbos ou 
Corfu. Passado um bocado, perguntou: ­ Como é que se chama?
­ Chama­se Pandatária!
­ O quê? Oh, Deuses, esse lugar desolado? Oh, crueldade! Cinco anos em Pandatária!
Lívia olhou­o com severidade e disse:
­ Suponho que a queirais de volta a Roma?
Augusto pôs­se então a estudar o mapa de Itália, gravado numa fina folha de ouro com pequenas jóias 
cravadas a marcarem as cidades, que estava suspenso na parede do quarto onde se encontravam. Ele foi 
incapaz de falar, mas apontou para Reggio, uma agradável cidade grega no estreito de Messina.
Assim Júlia foi enviada para Reggio, onde lhe foi concedido um pouco mais de liberdade, sendo­lhe 
mesmo permitido receber visitas ­ mas qualquer visitante tinha que solicitar primeiro a permissão de 
Lívia. Tinha que explicar a razão porque queria avistar­se com Júlia e preencher um passaporte detalhado 
para Lívia assinar, indicando a cor do cabelo e dos olhos e enumerando os sinais e marcas particulares, 
para que só ele o pudesse usar. Poucos estavam interessados em se submeter a esses preliminares. A filha 
de Júlia, Agripina, pediu autorização para ir, mas Lívia recusou, por uma questão de consideração, disse 
ela, pela moral de
80
Agripina. Júlia continuava sob uma disciplina severa e não tinha nenhuma pessoa amiga a viver com 
ela, uma vez que a mãe morrera de febre na ilha.
Uma ou duas vezes, quando Augusto caminhava pelas ruas de Roma, ouviram­se gritos dos cidadãos: 
”Traz a tua filha de volta! Ela já sofreu bastante! Traz a tua filha de volta!” Isso era muito doloroso para 
Augusto. Um dia, mandou a sua guarda policial apanhar no meio da multidão dois homens que gritavam 
estas palavras a plenos pulmões e disse­lhes, com o seu ar mais grave, que Júpiter certamente puniria a sua 
loucura, fazendo com que fossem enganados e desgraçados pelas suas mulheres e filhas. Estas 
demonstrações não tinham tanto a ver com um sentimento de piedade por Júlia, como de hostilidade por 
Lívia, a quem todos, com justiça, culpavam pela severidade do exílio de Júlia e por ter mexido de tal 
forma com o orgulho de Augusto, que ele não se podia permitir um sentimento de piedade.
Quanto a Tibério, na sua ilha confortavelmente espaçosa, sentiu­se bem durante um ano ou dois. O clima 
era excelente, a comida era boa e tinha bastante tempo livre para retomar os seus estudos literários. O seu 
estilo de prosa grega não era de todo mau e escreveu vários poemas elegíacos gregos, elegantes e tolos, 
imitando poetas como Euphorion e Parténio. Tenho um livro deles algures. Tibério passava uma boa parte 
do seu tempo a discutir com os professores na universidade. O estudo da mitologia clássica divertia­o e 
fez uma enorme carta genealógica, em forma circular, com os braços irradiando do nosso mais antigo 
antepassado Caos, o pai do Pai Tempo, e espalhando­se num perímetro confuso, densamente povoado de 
ninfas, reis e heróis. Ele costumava deleitar­se a confundir os peritos em mitologia, enquanto construía a 
sua carta, fazendo­lhes perguntas como: ”Qual era o nome da avó materna de Heitor?” e ”A Quimera teve 
alguma descendência masculina?”: depois, desafiava­os a recitarem o verso dos poetas antigos que 
confirmava a sua resposta. Foi, a propósito, pensando nesta tabela, agora em meu poder, que muitos anos 
mais tarde o meu sobrinho Calígula disse a sua famosa piada contra Augusto: ”Ah, sim, ele era meu tio­
avô. Tinha precisamente a mesma relação para comigo que o Cão Cerebero tinha com Apolo.” De facto, 
agora que penso nisso, Calígula cometeu um erro aqui, não foi? O tio­avô de Apolo era certamente o 
monstro Tifon que, segundo algumas autoridades, era o pai e, segundo outras, o avô de Cerebero. Mas a 
única árvore genealógica dos Deuses é tão confusa e cheia de ligações incestuosas ­ filho com mãe, irmão 
com irmã ­, que é possível que Calígula tivesse conseguido provar o seu caso.
Como Protector do Povo, Tibério era tido com muito respeito pelos habitantes de Rodes; e os funcionários 
provinciais que partiam para ocupar os seus postos no Leste ou que regressavam de lá, faziam sempre
81
questão de se desviarem da sua rota para lhe apresentar os seus respeitos. Mas ele insistia em que não 
passava de um mero cidadão privado e protestava contra as honras públicas que lhe dirigiam. Em geral, 
dispensava a sua escolta oficial de criados. Só uma vez exerceu os poderes judiciais inerentes ao seu 
Protectorado: prendeu e condenou sumariamente a um mês de prisão um jovem grego que, num debate 
gramatical ao qual ele presidia, tentou desafiar a sua autoridade para o cargo. Mantinha­se em boa forma 
montando a cavalo e tomando parte nos desportos no ginásio, e estava ao corrente do que se passava em 
Roma ­ recebia mensalmente boletins informativos de Lívia. Além da sua casa na capital da ilha, possuía 
uma pequenavilla a uma certa distância, construída num alto promontório com vista para o mar. Havia um 
caminho secreto que subia o rochedo até à casa, pelo qual um liberto da sua confiança, um homem com 
grande força física, conduzia as figuras menos respeitáveis ­ prostitutas, adivinhos e mágicos ­, com quem 
costumava passar os serões. Diz­se que muitas vezes essas criaturas, se acaso tinham desagradado a 
Tibério, de alguma forma escorregavam no caminho da volta e caíam no mar, muitos metros mais abaixo.
Já referi que Augusto se recusou a renovar o Protectorado de Tibério quando expiraram os cinco anos. É 
fácil imaginar que isto o colocou numa posição muito ingrata em Rodes, onde a sua pessoa era muito 
impopular: os rodienses, ao vê­lo destituído da sua escolta de criados, dos poderes magisteriais e da 
inviolabilidade da sua pessoa, começaram a tratá­lo primeiro com familiaridade, depois com insolência. 
Por exemplo, um famoso professor de filosofia grego a quem solicitou permissão para assistir às suas 
aulas, disse­lhe que não tinha vagas, mas que podia voltar daí a uma semana para ver se já havia alguma. 
Depois, vieram notícias de Lívia, informando que Caio tinha sido enviado para o Leste como Governador 
da Ásia Menor. Mas, embora não se encontrasse longe, em Quios, Caio não fez a Tibério a visita esperada. 
Tibério soube por um amigo que Caio acreditava nos falsos relatos que circulavam em Roma, que ele e 
Lívia estavam a planear uma revolta militar e que um membro da comitiva de Caio se tinha mesmo 
oferecido, num banquete público em que toda a gente estava um bocado bebida, para tomar um barco até 
Rodes e trazer a cabeça do Exilado. Caio dissera ao indivíduo que não tinha medo do Exilado. Ele que 
conservasse a cabeça inútil em cima dos ombros inúteis. Tibério engoliu o seu orgulho e, uma vez, tomou 
o barco para Quios, para fazer as pazes com o enteado, a quem tratou com uma humildade que foi muito 
comentada. Tibério, o romano vivo mais distinto depois de Augusto, a adular um rapaz, ainda na 
adolescência, e filho da sua própria mulher caída em desgraça! Caio recebeu­o com frieza, mas ficou 
muito lisonjeado. Tibério pedíu­lhe que não tivesse receios, pois os rumores que tinham chegado até ele 
eram tão infundados quanto
82
maliciosos. Disse que não tencionava retomar a carreira política que interrompera por consideração para 
com o próprio Caio e seu irmão Lúcio; tudo o que queria agora era que lhe fosse permitido passar o resto 
da sua vida na paz e privacidade que aprendera a valorizar acima de todas as honrarias públicas.
Caio, lisonjeado com a possibilidade de ser magnânimo, encarregou­se de mandar uma carta para Roma, 
pedindo a permissão de Augusto para o regresso de Tibério, carta que ele endossou com a sua própria 
recomendação pessoal. Nesta carta, Tibério dizia que deixara Roma apenas para não embaraçar os jovens 
príncipes, seus enteados, mas que agora, como eles tinham crescido e estavam firmemente estabelecidos, 
os obstáculos para que ele vivesse tranquilamente em Roma já não existiam; acrescentou que estava 
cansado de Rodes e ansiava por voltar a ver os seus amigos e parentes. Caio enviou a carta com o endosso 
prometido. Augusto respondeu, a Caio e não a Tibério, que Tibério se tinha afastado, apesar das súplicas 
veementes dos seus amigos e parentes, quando o Estado mais precisava dele; não podia agora criar as 
condições para o seu próprio regresso. O conteúdo desta carta tornou­se do conhecimento público e a 
ansiedade de Tibério aumentou. Ouvira dizer que o povo de Nímes, em França, tinha derrubado as 
estátuas ali erigidas em memória das suas vitórias e que Lúcio também recebera agora informações falsas 
contra ele, que estava inclinado a acreditar, Retirou­se da cidade e passou a viver numa pequena casa 
numa parte remota da ilha, visitando apenas ocasionalmente a villa do promontório. Deixou de se 
preocupar com a sua condição física e mesmo com o seu aspecto pessoal; raramente se barbeava e andava 
de um lado para o outro em camisa de dormir e pantufas. Finalmente, escreveu uma carta particular a 
Lívia, explicando­lhe a situação perigosa em que se encontrava. Comprometia­se, se ela conseguisse 
arranjar­lhe autorização para voltar, a ser guiado unicamente por ela em todas as situações, enquanto os 
dois vivessem. Disse que se dirigia a ela não tanto como sua mãe dedicada, mas como verdadeira, embora 
até então não reconhecida, timoneira do Barco do Estado.
Isto era precisamente o que Lívia desejava; abstivera­se propositadamente até ali de persuadir Augusto a 
fazer regressar Tibério. Pretendia que este ficasse tão cansado da inacção e dos insultos públicos, como o  
estava anteriormente da acção e das honras públicas. Ela respondeu­lhe com uma mensagem breve, 
dizendo que tinha a carta em segurança
e que o assunto se resolveria sem dificuldade. Alguns meses mais tarde, Lúcio morreu misteriosamente em 
Marselha, quando se dirigia para a Híspânia. Enquanto Augusto estava ainda sob o efeito do choque, Lívia 
começou a trabalhar­lhe os sentimentos, dizendo quanto tinha sentido durante todos aqueles anos a falta 
do apoio do seu querido filho Tibério, por cujo regresso não ousara até ali suplicar. Ele sem dúvida
83
procedera mal, mas certamente já aprendera a sua lição e, de todas as cartas pessoais que ele lhe escrevia, 
transpirava a maior devoção e lealdade para com Augusto. Gaio, que endossara a petição pelo seu 
regresso, insistiu, iria precisar, agora que o irmão estava morto, de um colega em quem pudesse confiar.
Uma noite, um adivinho chamado Trasilo, árabe de nascimento, visitou Tibério na sua casa do 
promontório. já aí tinha estado duas ou três vezes antes e fizera algumas previsões muito encorajadoras, 
mas nenhuma delas se tinha ainda realizado. Tibério, que começava a ficar céptico, disse ao seu liberto 
que, se Trasilo não o satisfizesse inteiramente desta vez, iria perder o equilíbrio ao descer a escarpa no 
caminho de volta. Quando Trasilo chegou, a primeira coisa que Tibério disse foi:
­ Qual o aspecto das minhas estrelas hoje?
Trasilo sentou­se e fez cálculos astrológicos muito complicados com um pedaço de carvão sobre uma 
mesa de pedra. Finalmente, declarou:
­ Estão numa conjuntura invulgarmente favorável. A difícil crise da tua vida está agora finalmente a 
chegar ao fim. A partir daqui, não gozarás senão de boa sorte.
­ Excelente, ­ disse Tibério com secura. ­ E agora vejamos a tua. Trasilo fez mais uma série de cálculos e, 
depois, levantou os olhos, acometido de um terror verdadeiro ou fingido.
­ Céus! ­ exclamou. 
­ Ameaça­me um perigo terrível, vindo do ar e das águas.
­ Alguma probabilidade de o evitar? ­ perguntou Tibério.
­ Não sei dizê­lo. Se conseguir sobreviver nas próximas doze horas, a minha sorte será, à sua medida, tão 
feliz como a vossa; mas quase todos os planetas maléficos estão em conjunção contra mim e o perigo 
parece realmente inevitável. Só Vénus me pode salvar.
­ O que foi que acabaste de dizer acerca dela? Esqueci­me.
­ Que ela está a entrar em Escorpião, que é o teu signo, pressagiando uma mudança maravilhosamente 
propícia nos teus destinos. Deixa­me tentar mais uma dedução deste importantíssimo movimento: em 
breve entrarás na casa Juliana que, não preciso de to recordar, descende directamente de Vénus, a mãe de 
Eneias. Tibério, o meu humilde destino está curiosamente ligado ao teu destino ilustre. Se te chegarem 
boas notícias antes do amanhecer, é sinal de que eu tenho quase tantos anos de felicidade diante de mim 
como tu próprio.
Estavam sentados na varanda e, de repente, uma carriça ou outra pequena ave parecida saltou para o 
joelho de Trasilo e, inclinando a cabeça para um lado, pôs­se a pipilar para ele. Trasilo disse para a ave:
­ Obrigado irmã! Foi mesmo a tempo. ­ Depois, voltou­se para Tibério, ­ O céu seja louvado! O pássaro 
disse que aquele navio traz boas notícias para ti e eu estou salvo. O perigo foi evitado.
84
Tibério levantou­se de um salto e abraçou Trasilo, confessando quais eram as suas intenções. E, claro, o 
navio trazia despachos imperiais de Augusto, informando Tibério da morte de Lúcio e dizendo que, dadas 
as circunstâncias, lhe era graciosamente permitido que regressasse a Roma, embora de momento apenas 
como cidadão privado.
Quanto a Caio, Augusto teve o maior cuidado em garantir que não lhe fosse atribuída nenhuma tarefa para 
a qual não tivesse aptidão e que o Leste se mantivesse tranquilo enquanto ele fosse governador. 
Infelizmente, o Rei da Arménia revoltou­se e o rei de Pártia ameaçou unir as suas forças às dele, o que 
deixou Augusto num dilema. Embora Caio se tivesse mostrado um governador competente em tempos de 
paz, Augusto não o julgava capaz de conduzir uma guerra como aquela; e ele próprio estava demasiado 
velho para ir combater, além de que tinha numerosas questões a que atender em Roma. No entanto, não 
podia enviar mais ninguém para tomar a Caio os regimentos de Leste, porque Caio era Cônsul e nunca lhe 
deveria ter sido permitido tomar conta do cargo sendo incapaz de assumir o alto comando militar. Não 
havia nada a fazer, a não ser deixar ficar Caio e esperar que tudo corresse pelo melhor.
A princípio, Caio teve sorte. O perigo por parte dos Arménios foi afastado pela invasão da sua fronteira 
oriental por uma tribo de bárbaros. O Rei da Arménia foi morto enquanto tentava expulsá­los. O Rei da 
Pártia, ao saber disto e também do grande exército que Caio estava a reunir, entrou em negociações com 
ele, para grande alívio de Augusto. Mas Augusto acabava de nomear um Medo para o trono da Arménia, o 
que não era aceitável para a nobreza arménia; quando Caio já tinha reenviado para Roma as tropas extra, 
por as considerar desnecessárias, eles acabaram por lhe declarar a guerra. Caio reuniu de novo o exército e 
marchou sobre a Arménia, onde, alguns meses mais tarde, foi ferido à traição por um dos generais 
inimigos, que o convidara para conferenciarem. Não foi um ferimento grave. Na altura, pouca atenção lhe 
deu e concluiu a campanha com êxito. Mas, de alguma forma, deram­lhe o tratamento errado e a sua 
saúde, que, sem que se percebesse porquê, lhe tinha dado problemas nos últimos dois anos, foi seriamente 
afectada: perdeu todo o poder de concentração mental. Por fim, escreveu a Augusto, pedindo­lhe 
permissão para se retirar para a vida privada. Augusto ficou desgostoso,
mas acedeu ao seu pedido, Caio morreu no caminho para casa. Assim, dos filhos de Júlia, só restava agora 
Póstumo, de quinze anos de idade, e Augusto estava de tal forma reconciliado com Tibério que, tal como 
Trasilo previra, o fez entrar na casa Juliana adoptando­o, juntamente com Póstumo, como seu filho e 
herdeiro.
O oriente ficou tranquilo por algum tempo, mas quando a guerra, que voltara a estalar na Germânia ­ 
mencionei o facto em ligação com a minha composição escolar para Atenodoro ­, tomou uma feição 
grave.
85
Augusto elegeu Tibério comandante do exército e mostrou a sua confiança renovada, concedendo­lhe o 
Protectorado por dez anos. A campanha foi séria e Tibério conduziu­a com a sua antiga força e habilidade. 
Lívia, no entanto, insistiu que ele fizesse visitas frequentes a Roma, para não perder o contacto com os 
acontecimentos políticos que decorriam ali. Tibério mantinha a sua parte do acordo que fizera com ela e  
permitia­lhe que o orientasse em tudo.
86
CAPíTULO VII
Recuei alguns anos no tempo para falar de meu Tio Tibério, mas, ao seguir essa história até à sua adopção 
por Augusto, acabei por avançar em relação à minha própria história. Tentarei dedicar os próximos 
capítulos exclusivamente aos acontecimentos que ocorreram entre os meus nove e dezasseis anos. Trata­se 
na sua maior parte do registo dos noivados e casamentos dos jovens nobres como eu. O primeiro a atingir 
a idade foi Germânico ­ o seu décimo quarto aniversário foi a trinta de Dezembro, mas as celebrações 
davam­se sempre em Março. Como era costume, ele saíu da nossa casa no Palatino de manhã cedo, 
engrinaldado e vestindo pela última vez o seu traje de rapaz orlado a púrpura. Multidões de crianças 
corriam à frente, cantando e espalhando flores; uma escolta dos amigos nobres caminhava com ele e uma 
onda imensa de cidadãos seguia atrás, alinhados conforme a sua condição. A procissão desceu lentamente 
a encosta do Monte e atravessou a Praça do Mercado, onde Germânico foi saudado ruidosamente. 
Retribuiu a saudação com um discurso breve. Por fim, a procissão começou a subir a encosta do Monte 
Capitolino. No Capitólio, Augusto e Lívia aguardavam para o saudar e ele sacrificou um touro branco no 
templo ali existente, dedicado a Júpiter Capitolino, o Que­Faz­Trovejar, vestindo pela primeira vez a sua 
túnica branca de homem adulto. Com grande desapontamento da minha parte, não me foi permitido ir 
também. A caminhada teria sido demasiado árdua para mim e teria causado má impressão se fosse 
transportado numa liteira. Tudo o que presenciei das cerimónias foi a oferenda que ele fez aos deuses do 
lar do seu traje e ornamentos de rapaz, quando regressou; e a distribuição de bolos e dinheiro à multidão, 
dos degraus da casa.
Germânico casou um ano depois. Augusto fazia tudo o que lhe era permitido pela legislação para 
encorajar os casamentos entre homens de família. O Império era muito grande e precisava de mais 
funcionários e oficiais superiores do exército do que a nobreza e a plebe conseguiam arranjar, apesar do 
recrutamento constante entre a populaça para as suas fileiras. Quando havia queixas por parte de homens 
de família sobre a rudeza desses recém­chegados, Augusto costumava responder secamente que escolhia 
os menos rudes que conseguia encontrar, O remédio estava nas mãos deles, disse: todos os homens e 
mulheres de posição deviam
87
casar novos e iniciar uma família tão grande quanto possível. A diminuição regular do número de 
nascimentos e casamentos nas classes governantes tornou­se uma obsessão para Augusto.
Numa ocasião em que a Nobre Ordem dos Cavaleiros, no seio da qual os senadores eram escolhidos, se 
queixou da severidade das suas regras contra os celibatários, convocou toda a ordem a comparecer na 
Praça do Mercado para uma prelecção. Quando já ali estavam reunidos, dividiu­os em dois grupos, os 
casados e os solteiros. Os solteiros formavam um grupo muito maior que o dos casados e ele dirigiu 
discursos diferentes a cada grupo. Entrou numa grande excitação enquanto falava para os solteiros, 
chamando­lhes animais e rufiões e, usando de uma estranha metáfora, assassinos da sua posteridade. 
Nessa altura, Augusto era já um homem idoso, com toda a petulância e mau humor de um velho que, 
durante toda a vida, esteve à frente dos acontecimentos. Perguntou­lhes se tinham tido alguma alucinação 
de que eram Virgens Vestais. Pelo menos uma Virgem Vestal dormia sozinha, o que era mais do que 
qualquer deles fazia. Seria que lhe podiam explicar por que razão, em vez de partilharem as suas camas 
com mulheres decentes da sua classe, gerando nelas filhos saudáveis, desperdiçavam toda a sua energia 
viril com escravas sebosas e prostitutas sórdidas asiático­gregas? E, a acreditar naquilo que ouvia, a 
companhia que levavam para a cama para as suas diversões nocturnas era, na maior parte dos casos, uma 
dessas criaturas com uma profissão repelente que ele nem iria nomear, para que o facto de admitir a sua 
existência na Cidade não pudesse ser tomado como aceitação. Por sua vontade, um homem que se 
esquivasse às suas obrigações sociais e, simultaneamente, vivesse uma vida de deboche sexual, deveria ser 
submetido às mesmas severas punições que uma Vestal que esquecia os seus votos ser enterrado vivo.
Em relação aos homens casados, na altura eu fazia parte desse número, fez­nos o mais esplêndido elogio, 
abrindo os braços como se nos quisesse abraçar.
Sois muito poucos, em comparação com o número de habitantes da Cidade. Sois bem menos numerosos 
do que os vossos companheiros daquele lado, que não se mostram dispostos a cumprir os seus deveres 
sociais naturais. No entanto, por esta mesma razão, o meu louvor para vós é ainda maior e estou­vos 
duplamente grato por vos terdes mostrado obedientes aos meus desejos e por terdes feito tudo o que 
podíeis para dar homens a esta Cidade. É através de vidas vividas desta maneira que os romanos do futuro 
se tornarão uma grande nação. A princípio, éramos um mero punhado, como sabeis, mas quando 
começámos a casar­nos e a gerar filhos, conseguimos rivalizar com os estados vizinhos, não apenas na 
masculinidade dos nossos cidadãos, mas na quantidade da nossa população. Temos que nos lembrar 
sempre disto. Temos que consolar a parte
88
mortal da nossa natureza com uma interminável sucessão de gerações, como portadores de archotes numa 
corrida, para que, através uns dos outros, possamos imortalizar o lado da nossa natureza em que não 
alcançamos a felicidade divina. Foi principalmente por esta razão que o primeiro Deus que nos criou 
dividiu a raça humana em duas partes: Fez uma das metades masculina e a outra feminina, implantando 
nessas metades o desejo uma pela outra, tornando as suas relações frutíferas para que, através da 
procriação contínua, ele possa, de certa forma, tornar a própria mortalidade imortal. Na verdade, a tradição 
diz que alguns dos próprios Deuses são machos e outros fêmeas e que estão todos ligados por laços 
sexuais de parentesco. Portanto, como vedes, mesmo entre esses seres, que na realidade não necessitam de 
tal estratagema, o casamento e a gestação de filhos foram aprovados como um costume nobre.
Eu tinha vontade de rir, não só porque estava a ser elogiado por aquilo que me tinha sido imposto bem 
contra minha vontade ­ em breve vos falarei de Urgulanila, com quem estava casado na altura ­, mas 
porque toda aquela questão era uma farsa total. De que servia Augusto dirigir­se a nós daquela forma, 
quando ele sabia muito bem que não eram os homens que estavam a esquivar­se, como ele dizia, mas as 
mulheres? Se ele tivesse convocado as mulheres, talvez tivesse conseguido alguma coisa, falando com 
elas da maneira certa.
Lembro­me de ter ouvido uma vez duas das libertas de minha mãe discutirem o casamento moderno do 
ponto de vista de uma mãe de família. O que é que a mulher ganhava com isso? ­ perguntavam. A moral  
era agora tão permissiva que já ninguém tomava o casamento a sério. É certo que alguns homens 
antiquados respeitavam­no o suficiente para terem preconceitos contra o facto dos seus amigos ou criados 
fazerem filhos nas mulheres deles; é também certo que algumas mulheres antiquadas respeitavam 
suficientemente os sentimentos dos maridos e tinham o maior cuidado em não se deixar engravidar por 
nenhum dos amantes. Mas, em regra, qualquer mulher bonita hoje em dia podia dormir com qualquer 
homem que quisesse. Se se casasse e depois se cansasse do marido, como geralmente acontecia, e quisesse 
outra pessoa com quem se pudesse divertir, podia vir a ter que enfrentar o orgulho ou o ciúme do marido. 
E, de uma maneira geral, também não ficava em melhor situação financeira depois de casar. O seu dote 
passava para as mãos do marido, ou do sogro como chefe da família, caso ainda estivesse vivo; e um 
marido, ou sogro, era habitualmente uma pessoa mais difícil de manobrar do que um pai ou um irmão 
mais velho, cujos pontos fracos ela já conhecia há muito. Estar casada, apenas representava o assumir de 
tremendas responsabilidades. Quanto aos filhos, quem é que queria tê­los? Interferiam com a saúde e os 
divertimentos da mulher durante vários meses antes do nascimento e, mesmo que arranjasse uma ama para 
eles logo a seguir,
89
precisava de tempo para recuperar da situação desgraçada do parto; acontecia muitas vezes, depois de ter 
tido mais de dois filhos, que isso lhe arruinava a figura. Basta ver como a bela Júlia tinha mudado depois 
de satisfazer obedientemente o desejo de Augusto de ter descendentes. E o marido de uma dama, caso ela 
gostasse dele, não podia comprometer­se a manter à distância as outras mulheres durante todo o período 
de gravidez dela e, de qualquer forma, ele pouco ligava à criança depois dela nascer. Ainda por cima, 
como se isso não bastasse, as amas eram terrivelmente descuidadas e era frequente o bebé morrer. Era 
uma bênção os médicos gregos serem tão habilidosos, se a coisa não tivesse ido longe demais ­ eles eram 
capazes de desembaraçar uma dama de uma criança não desejada em dois ou três dias, e ninguém tinha 
que se preocupar ou que saber. Claro que algumas mulheres, mesmo as mais modernas, ansiavam por 
crianças de uma forma antiquada, mas podiam sempre comprar uma criança para adopção para entrar na 
família do marido, de alguém com um nascimento decente mas a quem os credores faziam a vida negra...
Augusto deu à Nobre Ordem dos Cavaleiros a permissão de casar com mulheres do povo, mesmo com 
libertas, mas isto não melhorou muito as coisas. Os cavaleiros, mesmo que se casassem, casavam por 
causa dos dotes, não pelos filhos ou por amor, e uma liberta não era um grande partido; além disso, os 
cavaleiros, especialmente aqueles que tinham ascendido recentemente à ordem, tinham fortes objecções a 
casar com alguém de condição inferior. Nas famílias da antiga nobreza a dificuldade era ainda maior. Não 
só havia menos mulheres entre as quais escolher dentro do grau de parentesco correcto, como a cerimónia 
do casamento era mais estrita. A mulher ficava de forma mais absoluta sob o poder do chefe da família 
para a qual entrava. Qualquer mulher sensata pensava duas vezes antes de se comprometer com tal 
contrato, para o qual não havia outra saída além do divórcio; e, depois do divórcio, tornava­se difícil 
recuperar a propriedade que tinha trazido como dote. Nas famílias que não eram propriamente as antigas 
famílias nobres, no entanto, uma mulher podia casar legalmente com um homem e, mesmo assim, manter­
se independente e ter o controlo das suas propriedades ­ se ela desejasse, poderia estipular que dormiria 
três noites do ano fora da casa do marido, pois esta condição interrompia o direito do marido sobre ela 
como um bem permanente. As mulheres gostavam desta forma de casamento por razões óbvias, as 
mesmas pelas quais ela desagradava aos maridos. A prática começou entre as famílias mais baixas da 
Cidade, mas foi subindo gradualmente e, em breve, tornou­se regra em todas as famílias, com excepção 
das da antiga nobreza. Aqui, havia uma razão religiosa que se lhe opunha. Os sacerdotes do Estado eram 
escolhidos nestas famílias e, pela lei religiosa, um sacerdote tinha que ser um homem casado, da forma
90
mais rigorosa, e filho igualmente de um casamento que obedecesse aos mais rigorosos preceitos. Com o 
passar do tempo, candidatos adequados para o sacerdócio tornaram­se cada vez mais difíceis de encontrar. 
Por fim, havia vagas nos colégios de sacerdotes que não se conseguiam preencher e era preciso fazer 
alguma coisa; portanto, os legistas arranjaram uma solução. As mulheres de posição foram autorizadas, ao 
contrair casamentos na forma antiga, a estipular que a entrega completa delas próprias e da sua 
propriedade ”era coisa sagrada” e que, de outra forma, gozavam de todos os benefícios do casamento 
livre.
Mas isso foi mais tarde. Entretanto, o melhor que Augusto podia fazer, além da penalização legal dos 
celibatários e homens casados sem filhos, era pressionar os chefes de família para casarem os seus jovens 
(com instruções para que crescessem e se multiplicassem) enquanto eram ainda demasiado jovens para 
compreender aquilo a que se comprometiam ou para fazer qualquer coisa além de obedecer. Portanto, para 
dar um bom exemplo, todos nós, os membros mais jovens das famílias de Augusto e Lívia, ficámos noivos 
e casámos o mais cedo possível. Pode parecer estranho, mas Augusto foi bisavô com a idade de cinquenta 
e quatro anos e foi trisavô antes de morrer, com a idade de setenta e seis; Júlia, também em consequência 
do seu segundo casamento, teve uma neta com idade casadoira antes dela própria ultrapassar a idade em 
que podia ter filhos. As gerações sobrepunham­se um tanto desta forma e a árvore genealógica da família 
imperial rivalizava em complexidade com a do Olimpo. Isto não apenas por causa das adopções 
frequentes e do casamento de membros com um grau de parentesco mais próximo do que o costume 
religioso na verdade permitia ­ na verdade, a família Imperial estava entretanto a tornar­se superior à lei ­, 
mas porque, logo que um homem morria, a sua viúva era levada a casar de novo, sempre no mesmo 
pequeno círculo de relações. Farei agora os possíveis para aclarar as coisas neste ponto, sem me alongar 
demasiado.
Mencionei os filhos de Júlia (os principais herdeiros de Augusto, agora que a própria Júlia tinha sido 
exilada e cortada do seu testamento), designadamente, Caio, Lúcio e Póstumo, e as duas filhas, Júlia e 
Agripina. Os membros mais jovens da família de Lívia eram o filho de Tibério, Castor, e os seus três 
primos directos, a saber, o meu irmão Germânico, a minha irmã Livila e eu próprio. Mas não posso 
esquecer a neta de Júlia
­ na ausência de qualquer marido possível saído da família de Lívia, Julila casou com um senador 
abastado chamado Emílio (seu primo em primeiro grau por um casamento anterior de Escribónia) e tinha­
lhe dado uma filha chamada Emília. O casamento de Julila foi infeliz, pois Lívia levava a mal que uma 
neta de Augusto casasse com alguém que não fosse seu neto; mas, como não tardareis a ver, isso não a 
incomodou por muito tempo. Entretanto, Germânico casou com Agripina, uma rapariga
91
séria e bonita de quem ele aliás já gostava havia muito. Caio casou com a minha irmã Livila, mas morreu 
pouco depois, sem deixar filhos. Lúcio, que estivera noivo de Emília sem ter chegado a casar, já tinha 
morrido.
Com a morte de Lúcio, pôs­se a questão de encontrar um casamento adequado para Emília. Augusto tinha 
a noção perspicaz de que Lívia tencionava escolher como marido para Emília nem mais nem menos do 
que eu próprio, mas ele tinha uma grande ternura pela pequena e não podia suportar a ideia de a casar com 
uma criatura enfermiça como eu. Resolveu opor­se a essa ligação: por uma vez, prometeu a si mesmo que 
Lívia não levaria a sua avante. Aconteceu pouco depois da morte de Lúcio que Augusto estava a jantar 
com Medulino, um dos seus generais mais idosos, cuja descendência datava do ditador Camilo. Medulino 
disse­lhe, sorrindo, depois das taças de vinho terem sido cheias várias vezes, que tinha uma jovem neta de 
quem gostava muito. Ela mostrara de repente um progresso surpreendente nos seus estudos literários e 
tinha conhecimento de que devia agradecer esse facto a um jovem parente do seu muito ilustre conviva. 
Augusto ficou admirado.
­ Quem poderá ser? Não ouvi falar em nada. O que é que se passa? Trata­se de um caso amoroso com 
tempero de literatura?
­Sim, uma coisa desse género. ­ disse Medulino, sorrindo ­ Falei com o jovem e, apesar dos seus 
infortúnios e incapacidades de ordem física, não posso deixar de gostar dele. É de uma natureza franca e 
nobre e, como jovem estudante, causou­me uma impressão profunda.
Augusto perguntou, incrédulo:
­ O quê, não estás a falar do jovem Tibério Cláudio?
­ Sim, esse mesmo, ­ disse Medulino.
O rosto de Augusto iluminou­se com uma resolução repentina e ele perguntou de forma mais apressada do 
que era permitido pela decência:
­ Escuta, Medulino, meu velho amigo, terias alguma objecção a que
ele se tornasse marido da tua neta? Se concordares com essa união, terei todo o prazer em a proporcionar. 
O jovem Germânico é agora nominalmente o chefe da família, mas, em questões como esta, ele recebe o 
conselho dos mais velhos. Bom, não é qualquer rapariga que consegue ultrapassar a repugnância física por 
esse pobre aleijado, surdo e gago, e Lívia e eu próprio temos um sentimento de delicadeza natural em o 
tornar noivo de qualquer jovem. Mas se a tua neta, de sua própria vontade... Medulino disse:
­ Foi ela própria que me falou deste casamento e pesou a questão muito cuidadosamente. Ela diz­me que o 
jovem Tibério Cláudio é modesto, sincero e bondoso; e que o facto de ser coxo nunca lhe permitirá ir para 
a guerra e ser morto...
­ Ou correr atrás de outras mulheres, ­ acrescentou Augusto, rindo.
92
­ E que a surdez é apenas de um lado e, quanto à sua saúde, de uma maneira geral...
­ Suponho que a pequena atrevida já percebeu que ele não é aleijado naquela parte do corpo pela qual as 
esposas honestas mostram a maior solicitude? Sim; porque não seria ele capaz de lhe dar filhos 
perfeitamente saudáveis?! O meu velho garanhão coxo e sibilante, Bucéfalo, foi pai de mais triunfadores 
de corridas de carros do que qualquer outro cavalo de Roma. Mas, brincadeiras aparte, Medulino, a tua é 
uma casa muito ilustre e a família de minha mulher terá todo o orgulho em se ligar a ela pelo casamento. 
Falas sério ao dizer que aprovas essa união?
Medulino disse que a rapariga podia fazer um casamento muito pior; mesmo pondo de parte a honraria 
inesperada de se ligar dessa forma ao Pai da Pátria.
Ora Medulina, a neta, foi o meu primeiro amor, e nunca, juro, se viu uma criança tão bela no mundo 
inteiro. Conheci­a numa tarde de Verão no Jardim de Salusto, onde fui levado por Sulpício na ausência de 
Atenodoro, que não estava a sentir­se bem. A filha de Sulpício era casada com o tio de Medulina, Fúrio 
Camilo, um soldado distinto que foi Cônsul seis anos mais tarde. Quando a vi pela primeira vez, senti um 
choque de surpresa, não apenas pela sua beleza, mas pela aparição repentina, pois ela surgiu do lado em 
que eu era surdo, enquanto lia um livro; quando levantei os olhos, ela estava ali inclinada sobre mim, 
rindo da minha preocupação. Era esbelta, com cabelos negros e abundantes, pele branca e os olhos de um 
azul muito escuro. Todos os seus movimentos eram rápidos como os de um pássaro.
­ Como te chamas? ­ perguntou em tom cordial.
­ Tibério Cláudio Druso Nero Germânico.
­Deuses, tudo isso! O meu é Medulina Camila. Que idade tens?
­ Treze, ­ respondi, dominando bem a minha gaguez.
­ Eu só tenho onze, mas aposto que sou capaz de correr mais depressa que tu até àquele cedro e voltar.
­ Então és campeã de corridas?
­ Corro mais que qualquer rapariga em Roma e até mesmo que os meus irmãos mais velhos.
­ Bom, aqui acho que vais ganhar por defeito. Eu não posso correr, sou COXO.
­ Oh, coitado. Mas como foi que vieste até aqui? A coxear todo o caminho?
­ Não, Camila, vim numa liteira, como um velho preguiçoso.
­ Porque me chamas pelo meu segundo nome?
­ Porque é o mais apropriado.
­ Como é que chegaste a essa ideia, espertinho?
93
­ Porque, entre os etruscos, Camila é o nome que eles dão às jovens sacerdotisas caçadoras dedicadas a 
Diana. Com um nome como Camila, só se pode ser campeã de corridas.
­ É interessante. Nunca tinha ouvido isso. A partir de agora, vou fazer com que todos os meus amigos me 
tratem por Camila.
­ E a mim, trata­me por Cláudio, está bem? Esse é o nome indicado para mim. Significa aleijado. A minha 
família geralmente trata­me por Tibério e isso não está certo, porque o Tibre corre muito rápido.
Ela riu­se.
­ Está bem, Cláudio. Agora, diz­me o que fazes durante todo o dia, se não podes andar por aí a correr com 
os outros rapazes?
­ Passo a maior parte do tempo a ler e a escrever. já li dezenas de livros este ano e só estamos em junho. 
Este é em grego.
­ Ainda não sei ler grego. Apenas conheço o alfabeto. O meu avô está aborrecido comigo ­ eu não tenho 
pai, sabes ­, diz que sou preguiçosa. Claro que compreendo o grego quando ouço alguém falar: temos 
sempre que falar grego às refeições e quando temos visitas. Que livro é esse?
­ É parte da história de Túcídides. Esta passagem conta como um político, um espirituoso chamado Cléon, 
começou a criticar os generais que estavam a bloquear OS espartanos numa ilha. Disse que não estavam a 
dar tudo por tudo e que, se ele fosse general, traria consigo toda a força espartana, como cativos, em vinte 
dias. Os atenienses estavam tão fartos de o ouvir que o nomearam para comandar as tropas.
­ Que ideia tão engraçada. E o que aconteceu?
­ Ele manteve a sua promessa. Escolheu um bom oficial do estado­maior e disse­lhe que lutasse da 
maneira que quisesse, desde que ganhasse a batalha; o homem sabia o que estava a fazer e, por isso, no 
espaço de vinte dias, Cléon trouxe de volta para Atenas cento e vinte espartanos da mais alta posição.
Camila disse:
­ Ouvi o meu tio Fúrio dizer que o chefe mais inteligente é aquele que escolhe pessoas inteligentes para 
pensarem por ele. ­ Depois, acrescentou, ­ Tu deves ser muito sensato, Cláudio.
­ A opinião geral é que eu sou um perfeito tolo e, quanto mais leio, mais tolo eles pensam que sou.
­ Eu acho que és muito ajuizado. Contas as coisas de uma maneira tão interessante!
­ Mas gaguejo. A minha língua também é claudiana.
­ Talvez seja só uma questão nervosa. Tu não conheces muitas raparigas, pois não?
­ Não, ­ disse eu, ­ e tu és a primeira que conheço que não se riu de mim. Não poderíamos encontrar­nos 
de vez em quando, Camila? Tu
94
não podes ensinar­me a correr, mas eu posso ensinar­te a ler grego. Gostavas?
­ Sim, gostava muito. Mas ensinas­me a ler em livros interessantes?
­ Em qualquer livro que tu queiras. Gostas de história?
­ Acho que o que eu gosto mais é de poesia; na história, há muitas datas e nomes para recordar. A minha 
irmã mais velha adora os poemas de amor de Parténio. já leste alguns?
­Alguns, mas não gosto. É tudo muito artificial. Eu gosto de livros reais.
­ Eu também. Mas há algum livro grego de poemas de amor que não seja artificial?
­ Há Teócrito. Gosto muito dele. Pede à tua tia que te traga aqui amanhã à mesma hora, que eu trago o 
Teócrito e podemos começar imediatamente.
­ Garantes que não é aborrecido?
­ Não, é muito bom.
Depois disto, passámos a encontrar­nos no jardim quase todos os dias, sentávamo­nos juntos à sombra, 
líamos Teócrito e conversávamos. Obriguei Sulpício a prometer­me que não falaria naquilo a ninguém, 
com medo que Lívia viesse a saber e me impedisse de continuar a ir. Camila disse um dia que eu era o 
rapaz mais gentil que ela conhecia e que gostava mais de mim do que de todos os amigos do irmão. Então, 
eu disse­lhe que gostava muito dela; tendo ficado muito satisfeita, beijou­me timidamente. Perguntou­me 
se haveria alguma possibilidade de virmos a casar um com o outro. Disse­me que o avô faria qualquer 
coisa por ela e que, um dia, o ia trazer aos jardins para nos apresentar; mas estaria Augusto de acordo? 
Quando lhe disse que não tinha pai e que tudo dependia de Augusto e Lívia, ela ficou deprimida. Até aí, 
não tínhamos falado muito sobre famílias. Ela nunca ouvira nada de bom acerca de Lívia, mas eu dísse­lhe 
que era possível que ela consentisse, porque a minha pessoa lhe era de tal modo desagradável que não me  
parecia que se importasse muito com o que eu pudesse fazer, desde que não a envergonhasse,
Medulino era um homem directo e digno e tinha qualquer coisa de historiador, o que tornava a 
conversação entre nós muito fácil. Ele fora oficial superior do meu pai na sua primeira campanha e sabia 
muitas histórias sobre ele, muitas das quais anotei, agradecido, para a minha biografia. Um dia, 
começámos a falar do antepassado de Camila, Camilo, e, quando me perguntou qual a acção de Camilo 
que eu mais admirava, disse­lhe:
­ Quando o mestre­escola traiçoeiro de Faléria atraiu as crianças que tinha à sua guarda para os muros de 
Roma, dizendo que os Falerienses aceitariam quaisquer condições para as ter de volta, Camilo desdenhou 
a oferta. Mandou que o despissem e lhe amarrassem as mãos atrás das costas e deu aos rapazes varas e 
açoites para fustigarem o traidor e obrigá­lo a regressar. Não foi magnífico?
95
Ao ler esta história, eu tinha imaginado o mestre­escola como Catão, os rapazes como Póstumo e eu 
próprio e, por isso, o meu entusiasmo por Camilo era um pouco confuso. Mas Medulino ficou satisfeito.
Quando foi pedida a Germânico a sua aprovação para o nosso casamento, ele deu­a com satisfação, pois 
eu tinha­lhe contado do meu amor por Camila; e o meu tio Tibério não levantou objecções; a minha avó 
Lívia escondeu a irritação, como de costume, e felicitou Augusto por ter sido tão rápido a pegar na palavra 
de Medulino ­ ele devia estar bêbedo, disse, para ter aprovado tal ligação, embora o dote fosse pequeno e a 
aliança grande para um homem da sua família. A casa de Camilo não tinha gerado homens com 
capacidades ou reputação notáveis havia muitas gerações.
Germânico disse­me que tudo tinha sido arranjado e que a cerimónia do noivado teria lugar no próximo 
dia fasto. Nós, os romanos, somos muito supersticiosos quanto aos dias; ninguém nem sequer sonharia, 
por exemplo, fazer uma batalha, casar ou comprar uma casa no dia 16 de Julho, o dia do desastre de Ália, 
no tempo de Camilo. Mal conseguia acreditar na minha boa sorte. Também eu receara que me obrigassem 
a casar com Emília, uma rapariguinha mal­humorada e afectada, que imitava a minha irmã Livila a 
arreliar­me e a fazer de mim parvo sempre que vinha a nossa casa de visita, o que acontecia muitas vezes. 
A cerimónia do noivado, insistiu Lívia, devia ser tão discreta quanto possível, porque não podia ter 
confiança em que eu não fizesse figuras tristes se me encontrasse perante uma multidão. Eu também 
preferia que assim fosse: odiava cerimónias. Apenas as necessárias testemunhas estariam presentes e não 
haveria festa; unicamente, seria efectuado o sacrifício ritual habitual de um carneiro, cujas entranhas 
seriam depois examinadas, para averiguar se os auspícios eram favoráveis. Claro que iam ser; Augusto, 
oficiando como sacerdote, em honra de Lívia, ocupar­se­ia disso. Depois, seria assinado um contrato para 
a segunda cerimónia, que teria lugar logo que eu atingisse a idade, com estipulações para o dote. Camila e 
eu daríamos as mãos, beijar­nos­íamos e, depois, eu dar­lhe­ia um anel de ouro e ela regressaria à casa do 
avô ­ tranquilamente, como tinha vindo, sem qualquer séquito de acompanhantes a cantar.
Ainda agora me dói escrever sobre esse dia. Eu estava muito nervoso, com a minha grinalda e uma túnica 
limpa, ao lado de Germânico, junto do altar da família, esperando que Camila aparecesse. Ela estava 
atrasada. Estava muito atrasada. As testemunhas começavam a impacientar­se e a criticar a falta de 
cortesia do velho Medulino, deixando­os à espera numa ocasião cerimonial como aquela. Finalmente, o 
porteiro anunciou o tio de Camila, Fúrio, e este entrou, com o rosto lívido e vestido de luto. Após um 
breve discurso de saudação e desculpas, dirigido a Augusto e ao resto da companhia pelo seu atraso e 
aparição agourenta, disse:
96
Aconteceu uma grande calamidade. A minha sobrinha está morta. Morta! ­ exclamou Augusto. ­ Que 
brincadeira é esta? Recebemos uma mensagem há apenas meia hora que ela já vinha a caminho.
­ Morreu envenenada. Uma multidão reuniu­se em frente da porta, como acontece com as multidões, 
quando ouviram dizer que a filha da casa ia sair para o seu noivado. Quando a minha sobrinha apareceu, 
todas as mulheres se comprimiram cheias de admiração à volta dela. A dada altura, soltou um pequeno 
grito, como se alguém a tivesse pisado, mas ninguém ligou importância e ela entrou para a liteira. Ainda 
não tínhamos chegado ao fim da rua quando minha mulher, Sulpícia, que a acompanhava, a viu 
empalidecer e lhe perguntou se estava assustada, ao que respondeu: ”Oh, tia, aquela mulher espetou­me 
uma agulha no braço e eu sinto­me fraca.” Essas foram as suas últimas palavras, meus amigos. Morreu 
poucos minutos depois, Apressei­me a vir para cá logo que mudei de fato. Desculpar­me­ão.
Eu larguei a chorar e comecei a soluçar histericamente. A minha mãe, furiosa com a minha conduta 
deselegante, disse a um dos libertos que me levasse para o meu quarto, onde fiquei dias a fio, com uma 
febre nervosa e incapaz de comer ou dormir. Se não fosse o conforto que esse querido Póstumo me deu, 
acho que teria enlouquecido. A assassina nunca foi encontrada e ninguém conseguia explicar que motivo 
ela podia ter tido. Lívia informou Augusto alguns dias mais tarde que, segundo relatos que pareciam 
fiáveis, uma das mulheres que se encontravam na multidão era uma rapariga grega que considerava, sem 
dúvida infundadamente, ter sido lesada pelo tio da jovem e que, provavelmente, teria decidido vingar­se 
daquela forma monstruosa.
Quando já me encontrava de novo bem, ou não mais doente que o habitual, Lívia queixou­se a Augusto 
que a morte da jovem Medulina Camila tinha sido um acontecimento muito infeliz. Apesar do perdoável 
sentimento de Augusto contra tal casamento, ela receava que a jovem Emília tivesse agora que acabar por 
ficar noiva daquele seu impossível neto: toda a gente, disse, tinha ficado surpreendida por essa ligação não 
ter sido efectivada antes. Assim, como de costume, Lívia levou a sua avante. Algumas semanas mais 
tarde, fiquei noivo de Emília e vivi a cerimónia sem desonra, porque o desgosto da morte de Camila me 
tornara completamente indiferente. Os olhos de Emília estavam vermelhos quando ela chegou, mas as 
lágrimas eram de raiva, não de desgosto.
Agora, falando de Póstumo, pobre criatura, ele estava apaixonado por minha irmã Livila, que via com 
frequência porque ela tinha ido viver para o palácio quando casara com seu irmão Caio, continuando por 
lá. Era ideia corrente, de uma maneira geral, que acabariam por casar, para reatar a ligação entre as 
famílias, rompida pela morte do irmão. Livila sentia­se lisonjeada com a devoção apaixonada que ele lhe 
mostrava.
97
Desafiava­o constantemente, mas não sentia amor por ele. A sua escolha era Castor ­ um indivíduo cruel, 
dissoluto, bem parecido, que parecia feito para ela. Eu sabia do entendimento entre Livila e Castor, que 
tinha descoberto por acidente; e isto deixava­me muito infeliz por causa de Póstumo, tanto mais que este 
não tinha suspeitas sobre o carácter dela e eu não ousava dizer­lhe nada. Sempre que Livila, eu e ele 
estávamos juntos, ela costumava mostrar­me uma afeição fingida, que parecia tão tocante a Póstumo, 
quanto me irritava a mim. Sabia bem que, logo que ele se afastasse, ela retomaria as suas brincadeiras 
malévolas. Lívia teve conhecimento da intriga entre Livila e Castor e passou a vigiá­los cuidadosamente: 
uma noite, foi recompensada com uma mensagem de um criado de confiança, segundo a qual Castor 
acabava de trepar a janela de Livila pela varanda. Ela pôs um guarda armado na varanda e, depois, bateu à 
porta de Livila, chamando­a pelo nome. Passado um minuto, mais ou menos, Livila abriu a porta, fingindo 
que estava a dormir profundamente; mas Lívia entrou e foi encontrar Castor atrás do reposteiro. Falou­
lhes abertamente e parece ter­lhes dado a entender que o assunto não seria transmitido aAugusto, que 
certamente os enviaria para o exílio, mas apenas sob certas condições; e, se essas condições fossem 
estritamente observadas, ela arranjaria mesmo com que eles se casassem. Não muito tempo depois do meu 
noivado com Emília, Lívia arranjou as coisas de tal forma com Augusto que Póstumo ficou noivo, com 
grande desgosto seu, de uma rapariga chamada Domícia, minha prima em primeiro grau pelo
lado de minha mãe; e Castor casou com Livila. Este foi o ano em que Tibério e Póstumo foram adoptados 
como filhos por Augusto.
Lívia considerava Julila e o marido Emílio como um possível obstáculo aos seus desígnios. Entretanto, 
teve a sorte de arranjar provas de que Emílio e Cornélio, neto de Pompeu o Grande, estavam a conspirar 
para retirar o poder a Augusto e dividir os seus cargos entre eles próprios e alguns ex­Cônsules, entre eles 
Tibério, embora este ainda não tivesse sido consultado. A conspiração não foi muito longe, porque o 
primeiro ex­CÔnsul que Emílio e Cornélio contactaram recusou­se a ter que ver com o assunto. Augusto 
não puniu Emílio nem Cornélio com a morte ou o exílio. O facto deles terem conseguido tão pouco apoio 
para a conspiração fora uma boa prova da força dele e, ao poupá­los, mostrou­se ainda mais forte. 
Limitou­se a chamá­los à sua presença e a repreendê­los pela sua loucura e ingratidão. Cornélio caíu­lhe 
aos pés e agradeceu­lhe de forma abjecta a clemência que demonstrara, o que levara Augusto a pedír­lhe 
que não continuasse a fazer de tolo. Ele não era nenhum tirano, disse, para que conspirassem contra ele ou 
para que o adorassem por mostrar a clemência de um tirano; era simplesmente um funcionário estatal da 
República Romana, a quem tinham sido temporariamente concedidos amplos poderes para a melhor 
manutenção da ordem. Era evidente que Emílio o tinha
98
desencaminhado com ideias erróneas. A melhor cura para tal disparate seria que Cornélio se tornasse 
Cônsul no ano seguinte, satisfazendo assim a sua ambição de alcançar um poder igual ao seu; pois não 
havia posto mais elevado que o de Cônsul em Roma (teoricamente, isso era verdade). Emílio era 
orgulhoso e manteve­se de pé; Augusto disse­lhe que, como seu parente pelo casamento, devia ter 
mostrado mais decência, e que, como ex­Cônsul, devia ter mostrado maior sensatez. Por isso lhe retirava 
todas as honras.
O lado divertido deste caso foi Lívia ter alcançado todos os créditos pela clemência de Augusto, 
afirmando que tinha suplicado, com ternura de mulher, pelas vidas dos dois conspiradores, os quais, disse, 
Augusto decidira praticamente transformar num exemplo. Obteve o consentimento dele para a publicação 
de um pequeno livro que escrevera chamado Debate de Almofada sobre a Força e a Gentileza, cheio de 
toques íntimos. Augusto é apresentado como inquieto e preocupado e incapaz de dormir. Lívia pede­lhe 
com doçura que fale abertamente e, juntos, analisam a questão do tratamento adequado para Emílio e 
Cornélio.
Augusto explica que não deseja condená­los à morte; no entanto, receia ter que o fazer, porque, se os 
deixar impunes, irão pensar que tem medo deles e outros se sentirão tentados a conspirar contra ele.
­ Encontrar­se permanentemente sob a necessidade de exercer vingança e infligir castigos é uma posição 
muito dolorosa para qualquer homem de honra, minha querida esposa.
Lívia responde:
­ Estais absolutamente certo e eu tenho um conselho para vos dar; isto é, se estíverdes disposto a aceitá­lo 
e se não levardes a mal que ouse, embora seja mulher, sugerir­vos qualquer coisa que mais ninguém, nem 
mesmo os vossos amigos mais íntimos, ousariam sugerir.
­ Falai, seja o que for. Lívia responde:
­ Dir­vos­ei sem hesitação, pois tenho igual quinhão da vossa boa ou má sorte e, enquanto estiverdes em 
segurança, também tenho a minha parte no vosso reinado; enquanto que, se algo de mal vos acontecer, o 
que Deus não permita, isso será igualmente o meu fim... ­ E aconselha o perdão. ­ Palavras brandas 
afastam a ira, da mesma forma que palavras ásperas excitam a raiva, mesmo num espírito bondoso. O 
perdão fará derreter o coração mais arrogante, como o castigo fará endurecer mesmo o mais humilde... 
Não quero dizer com isto que tenhamos que poupar todos os criminosos sem distinção, pois existe aquilo 
que se chama depravação incurável e persistente, perante a qual a bondade é desperdício. Um homem que 
ofende desta forma deve ser retirado imediatamente, como um cancro no corpo político. Mas no caso dos 
restantes, cujos erros, cometidos, intencionalmente ou não, são devidos à juventude, à
99
ignorância ou a ideias erróneas, devemos, na minha opinião, limitar­nos a repreendê­los ou 
castigá­los da forma mais branda possível. Portanto, façamos essa experiência começando com 
estes mesmos homens.
Augusto aplaude a sensatez dela e confessa­se persuadido. Mas notem o comentário 
tranquilizador para o mundo que, com a morte de Augusto, terminará o governo de Lívia; e 
notem também, e não esqueçam, a expressão ”depravação incurável e persistente.” A minha avó 
Lívia era astuta.
Depois, Lívia disse a Augusto que o casamento proposto entre Emília e a minha pessoa tinha que 
ser cancelado, como sinal de desagrado Imperial com os pais dela. Augusto ficou encantado em 
concordar com isto, porque Emília tinha­se­lhe queixado amargamente da sua pouca sorte em ter 
que casar comigo. Lívia não tinha agora grande coisa a recear de Julila, que Augusto suspeitava 
de ser cúmplice nos esquemas do marido. Mas, antes de terminar, tinha também que se certificar 
em relação a ela. Entretanto, tinha que pagar uma dívida de honra à sua amiga Urgulanila, uma 
mulher que ainda não mencionei, mas que é uma das figuras mais desagradáveis da minha 
história.
100
CAPíTULO VIII
Urgulanila era a única confidente de Lívia e estava ligada a ela pelos mais fortes laços de interesse e 
gratidão. Tinha perdido o marido, partidário do Jovem Pompeu, nas Guerras Civis e, com o filho ainda 
criança, fora abrigada por Lívia, então casada com o meu avô, da brutalidade dos soldados de Augusto. 
Lívia, ao casar com Augusto, insistira em que ele restituísse a Urgulanila as propriedades do marido que 
tinham sido confiscadas e a convidasse a ir viver com eles, como um membro da família. Por influência de 
Lívia ­ porque, em nome de Augusto, Lívia podia forçar Lépido, o Alto Pontífice, a fazer as nomeações 
que desejasse ­, ela foi colocada numa posição de autoridade espiritual sobre todas as mulheres nobres 
casadas de Roma, Tenho que explicar isto. Todos os anos, nos princípios de Dezembro, estas mulheres 
tinham que estar presentes num importante sacrifício à Boa Deusa, presidido pelas Virgens Vestais, e de 
cuja boa execução dependeria a riqueza e segurança de Roma nos doze meses seguintes. Nenhum homem 
estava autorizado a profanar estes mistérios, sob pena de morte. Lívia, que se pusera nas boas graças das 
Vestais ao reconstruir o seu Convento, decorando­o num estilo luxuoso e conseguindo­lhes, através de 
Augusto, muitos privilégios do Senado, sugeriu à Vestal principal que a castidade de algumas das 
mulheres que assistiam aos sacrifícios não estava acima de suspeitas. Ela disse que os problemas de Roma 
durante as Guerras Civis podiam muito bem dever­se à ira da Boa Deusa, perante a lascívia daqueles que 
assistiam aos seus mistérios. Sugeriu ainda que, se fosse feito um juramento solene a qualquer mulher que 
confessasse ter cometido um lapso contra a austeridade moral, que a sua confissão não seria repetida a 
qualquer ouvido humano, não sendo ela assim envolvida em desgraça pública; haveria assim uma maior 
probabilidade da Deusa ser servida apenas por mulheres castas, apaziguando assim a sua ira.
A Chefe das Vestais, uma mulher de espírito religioso, aprovou a ideia, mas inquiriu da autoridade de 
Lívia para esta inovação. Lívia disse­lhe que vira a Deusa num sonho na noite anterior e que ela lhe pedira 
que, uma vez que as próprias Vestais não tinham qualquer experiência em questões de sexo, uma viúva de 
boa família devia ser nomeada Madre Confessora para esse mesmo efeito. A Chefe das Vestais perguntou 
se os
101
pecados confessados deviam ficar Impunes. Lívia replicou que não poderia ter exprimido uma opinião se, 
por sorte, a Deusa não tivesse feito uma declaração sobre este ponto no mesmo sonho: que à Madre 
Confessora devia ser conferido o poder de prescrever castigos expiatórios e que os castigos deviam ser 
uma questão de confiança sagrada entre a acusada e a Madre Confessora. A Chefe das Vestais, disse ela, 
seria informada apenas de que tal mulher não estava em condições de tomar parte nos mistérios daquele 
ano; ou que tal mulher acabava de cumprir o seu castigo. Isto convinha perfeitamente à Chefe das Vestais, 
mas ela receava sugerir um nome, com medo que Lívia o recusasse. Lívia disse então que o Alto Pontífice 
era, evidentemente, o homem que devia fazer a nomeação e que, se a Chefe das Vestais autorizasse, ela 
lhe explicaria a questão e lhe pediria que nomeasse uma pessoa adequada, depois de realizar as cerimónias 
necessárias para garantir uma escolha favorável à Deusa. Assim, Urgulanila foi escolhida e, claro, Lívia 
não contou a Lépido ou a Augusto os poderes inerentes à nomeação. Falou no assunto ocasionalmente, 
como de um lugar de conselheira assistente da Chefe das Vestais em questões morais, pois ”a Chefe das 
Vestais, pobrezita, conhecia tão pouco do mundo.”
O sacrifício realizava­se em geral na casa de um Cônsul, mas nem sempre no palácio de Augusto, porque 
ele tinha uma posição superior à dos Cônsules. Isto era conveniente para Urgulanila, que fazia as mulheres 
irem ao quarto dela no palácio (que estava arranjado de maneira a inspirar receio e lealdade), obrigava­as 
a dizer a verdade por meio de juramentos assustadores e, quando elas tinham confessado, mandava­as 
embora, enquanto pensava no castigo apropriado. Lívia, que estava no quarto escondida atrás de um 
reposteiro, sugeria­lhe um. As duas divertiam­se bastante com este jogo, que proporcionava a Lívia muitas 
informações úteis e que muito a ajudava nos seus planos.
Como Madre Confessora ao serviço da Boa Deusa, Urgulanila considerava­se acima da lei. Mais adiante, 
contarei como uma vez, quando intimada por um senador a quem devia uma grande soma de dinheiro a 
comparecer perante o magistrado no Tribunal dos Devedores, ela recusou obedecer à intimação; e como, 
para evitar o escândalo, Lívia pagou a dívida. Noutra ocasião, foi citada como testemunha num inquérito 
senatorial; não tendo qualquer intenção de ser interrogada, desculpou­se de comparecer e um magistrado 
foi­lhe enviado para receber por escrito o depoimento dela. Era uma velha horrenda, com o queixo fendido 
e o cabelo pintado de negro com fuligem de candeeiro (o cinzento era bem visível nas raízes), e viveu até 
uma idade avançada. O filho, Silvano, fora cônsul havia pouco tempo e era um daqueles que Emílio 
contactara na altura da conspiração. Silvano foi direito a Urgulanila e informou­a das intenções de Emílio. 
Ela passou a notícia para Lívia e esta prometeu recompensá­los
102
por esta valiosa informação, casando a filha de Silvano, Urgulanila, comigo, e aliando­os dessa forma à 
família imperial. Urgulanila gozava da confiança de Lívia e tinha a certeza de que meu tio Tibério ­ não 
Póstumo, embora este fosse o herdeiro mais próximo de Augusto ­, seria o Imperador seguinte: portanto, 
este casamento era ainda mais honroso do que parecia.
Eu nunca tinha visto Urgulanila. Ninguém a vira. Sabíamos que vivia com uma tia em Herculano, uma 
cidade nas encostas do Vesúvio, onde a velha Urgulanila tinha propriedades, mas nunca ia a Roma, nem 
mesmo de visita. Concluíamos que devia ser delicada. Mas, quando Lívia me escreveu uma das suas notas 
secas e cruéis, dando­me a conhecer que tinha sido decidido num conselho de Família que eu devia casar 
com a filha de Silvano Pláucio e que esta era uma união mais apropriada para mim, considerando as 
minhas enfermidades, do que as duas anteriormente projectadas, suspeitei de que havia alguma coisa mais 
seriamente errada com esta Urgulanila do que a simples falta de saúde. O palato fendido, talvez, ou uma 
mancha cor de vinho que lhe cobria metade do rosto? Fosse como fosse, uma coisa que a tornava 
inapresentável. Talvez fosse aleijada como eu. Não me importaria com isso. Talvez fosse mesmo uma boa 
rapariga, mas incompreendida. Podia até ser que tivéssemos muita coisa em comum. Claro que não seria a 
mesma coisa que casar com Camila, mas podia, pelo menos, ser melhor do que casar com Emília.
Foi escolhido o dia para o noivado. Interroguei Germânico sobre Urgulanila, mas ele estava tão às escuras 
como eu e parecia um tanto envergonhado por ter consentido no casamento sem fazer uma cuidadosa 
investigação prévia. Ele estava muito feliz com Agripina e desejava que eu fosse igualmente feliz. Bom, 
chegou o dia, um diafasto, e ali estava eu de novo com a minha grinalda e a túnica limpa, aguardando 
junto do altar da família que a noiva chegasse.
­ A terceira vez é a da sorte, ­ disse Germânico. ­ Tenho a certeza que ela é uma beleza, a sério, e bondosa 
e sensível; mesmo a pessoa certa para ti.
Mas seria que o era? Bom, na minha vida já tive que suportar muitos gracejos cruéis e de mau gosto, mas 
este acho que foi o mais cruel e o pior de todos. Urgulanila era... bom, resumindo, ela estava à altura do 
nome que lhe tinham dado e que é a forma latina de Herculanila. Ela era, na verdade, uma jovem Hércules 
feminina. Embora apenas com quinze anos de idade, tinha mais de um metro e oitenta e cinco de altura e 
ainda estava a crescer, sendo proporcionalmente larga e forte, com os maiores pés e mãos que alguma vez 
vi num ser humano em toda a minha vida, com uma única excepção: o gigantesco refém parto que desfilou 
num cortejo triunfal, muitos anos mais tarde. As feições dela eram regulares mas pesadas e apresentava 
permanentemente uma expressão carrancuda.
103
Tinha o corpo inclinado para a frente, Falava tão lentamente como o meu tio Tibério (com quem, a 
propósito, ela se parecia muito ­ falava­se mesmo que talvez fosse sua filha). Urgulanila não tinha 
conhecimentos, espírito, dotes ou quaisquer qualidades atraentes. E é estranho, mas os primeiros 
pensamentos que me ocorreram quando a vi foram: ”Esta mulher é capaz de me matar num acesso de 
violência” e ”Vou ter muito cuidado desde o início em esconder a minha repugnância por ela e não lhe dar 
motivos para que sinta qualquer ressentimento contra mim. Porque, se alguma vez ela chegar a odiar­me, a 
minha vida não estará segura.” Sou bastante bom como actor e, embora a solenidade da cerimónia fosse 
quebrada por risos maliciosos, piadas sussurradas e expressões trocistas por parte da assistência, 
Urgulanila não teve qualquer razão para me culpar por aquela falta de decoro. Depois de terminada a 
cerimónia, fomos ambos chamados à presença de Lívia e Urgulanila. Quando a porta se fechou e ficámos 
os dois diante delas ­ eu próprio nervoso e desassossegado, Urgulanila maciça e inexpressiva, abrindo e 
fechando os punhos enormes ­, a solenidade daquelas duas velhas avós maléficas evaporou­se e ambas 
largaram num riso incontrolável. Eu nunca tinha ouvido qualquer das duas rir daquela forma e o efeito era 
assustador. Não se tratava de um riso decente e saudável, mas de um soluçar e guinchar demoníaco, como 
o de duas velhas prostitutas ébrias, a assistirem a uma tortura ou crucificação.
­ Oh, minhas duas belezas! ­ soluçou Lívia por fim, limpando os olhos. ­ O que eu não daria para ver os 
dois na cama juntos na vossa noite de núpcias! Seria a cena mais cómica depois do Dilúvio de Deucalion!
­ E o que aconteceu de particularmente engraçado nessa famosa ocasião, minha cara? ­ perguntou 
Urgulanila.
­ O quê, não sabes? Deus destruiu o mundo inteiro com um dilúvio, excepto Deucalion e a família e 
alguns animais, que se refugiaram no cimo das montanhas. Não leste O Dilúvio, de Aristófanes? É a 
minha preferida entre as peças dele. A cena tem lugar no Monte Parnasso. Vários animais estão reunidos; 
infelizmente, apenas um de cada espécie e cada um deles se considera o único sobrevivente da sua 
espécie. Por isso, para de alguma forma repovoar a terra com animais, eles têm que acasalar uns com os 
outros e, apesar dos escrúpulos morais e das dificuldades óbvias, o Camelo é prometido, por Deucalion, à 
Elefanta.
­ Camelo e Elefanta! Essa é boa! ­ exclamou Urgulanila com uma risada. ­ Olha para o pescoço comprido 
de Tibério Cláudio, o corpo magro e a cara idiota e alongada. E os pés grandes da minha Urgulanila e as 
enormes orelhas de abano e os olhos pequeninos, como os de um porco! Ha, Ha, Ha, Ha! E qual foi a 
descendência deles? Uma girafa? Ha, Ha, Ha, Ha!
104
­ A peça não vai tão longe. Iris aparece no palco para fazer o discurso do mensageiro e informa que existe 
outro refúgio de animais no Monte Atlas. Iris interrompe o noivado mesmo a tempo.
­ E o Camelo ficou decepcionado?
­ Muito!
­ E a Elefanta?
­ A Elefanta limitou­se a fazer cara feia.
­ Beijaram­se quando se separaram?
­ Aristófanes não o diz. Mas tenho a certeza que sim. Vamos, Animais. Beijai­vos!
Eu fiz um sorriso idiota. Urgulanila fez cara feia.
­ Beijai­vos, já disse, ­ insistiu Lívia, num tom que deixava claro que tínhamos que obedecer.
Portanto beijámo­nos, e pusemos as duas velhas outras vez a rir histericamente. Quando já estávamos de 
novo fora do quarto, sussurrei para Urgulanila:
­ Desculpa. Não é culpa minha.
Mas ela não respondeu; apenas me deitou um olhar mais furioso do que antes.
Ainda faltava um ano para que o casamento se realizasse, porque a família decidira que eu só atingiria a 
idade aos quinze anos e meio e muita coisa podia acontecer entretanto. Se ao menos Iris entrasse em cena!
Mas não entrou. Póstumo também estava com problemas: já atingira a idade e, agora, só faltavam alguns 
meses para que Domícia tivesse também idade para casar. Meu pobre Póstumo... continuava apaixonado 
por Livila, embora ela estivesse casada. Mas, antes de continuar com a história de Póstumo, tenho que 
contar o meu encontro com o último dos Romanos.
105
CAPÍTULO IX
O nome dele era Pólio e vou recordar exactamente as circunstâncias em que nos conhecemos, o que 
aconteceu precisamente uma semana depois do meu noivado com Urgulanila. Eu estava a ler na Biblioteca 
de Apolo, quando apareceram Lívio e um homenzinho idoso todo despachado, com uma túnica de 
senador. Lívio dizia:
­ Parece portanto que mais vale abandonarmos todas as esperanças de o encontrar, a menos talvez... Bom, 
ali está Sulpício! Se alguém sabe, é ele! Bom dia, Sulpício! Preciso que faças um favor a Asínio Pólio e a 
mim. Há um livro em que queremos dar uma vista de olhos, um comentário de um grego chamado 
Polemocles às Tácticas Militares de Políbio. Acho que me lembro de o ter encontrado aqui uma vez, mas 
não está mencionado no catálogo e os bibliotecários são verdadeiramente incapazes.
Sulpício ficou um momento a mordiscar a barba e depois disse:
­ Tendes o nome errado. Polemócrates é o nome e ele não era grego, apesar do nome, mas judeu. Há uns 
quinze anos, recordo­me de o ter visto ali em cima, naquela prateleira, o quarto a contar da janela, atrás, e 
na etiqueta do título lia­se apenas Dissertação sobre Táctica. Eu vou buscá­lo. Não creio que, entretanto, 
o tenham mudado.
Nessa altura, Lívio viu­me.
­ Olá, meu amigo, como vai isso? Conheces o famoso Asínio Pólio? Saudei­os e Pólio disse:
­ O que estás a ler rapaz? Lixo, com certeza, pelo ar envergonhado com que o escondes. Hoje em dia, os 
jovens só lêem porcarias. ­ Voltou­se para Lívio, ­ Aposto dez moedas em como é uma porcaria do género 
A Arte do Amor, ou qualquer patetice pastoral arcádica ou outra coisa do género.
­ Aceito a aposta, ­ disse Lívio. ­ O jovem Cláudio não é de todo esse tipo de jovem. Bom, Cláudio, qual 
de nós dois é que ganha? Respondi, gaguejando, e dirigindo­me a Pólio:
­ Alegra­me dizer, senhor, que sois vós a perder. Pólio olhou­me de testa franzida, furioso:
­ O que é que dizes? Alegra­te que seja eu a perder? Isso é maneira de falar a um velho como eu e, ainda 
por cima, senador?
107
­ Bom, eu disse­o com todo o respeito, senhor. Alegra­me que sejais vós a perder. Não gostaria de ouvir 
chamar lixo a este livro. É a vossa própria história das Guerras Civis e, se posso permitir­me elogiá­lo, é 
um belo livro.
A expressão de Pólio mudou. Abriu­se num grande sorriso, soltou uma risada e puxou da bolsa, 
empurrando as moedas para Lívio. Lívio, com quem parecia manter uma animosidade amistosa ­ se é que 
sabeis o que quero dizer ­, recusou­as com uma insistência cheia de falsa gravidade.
­ Meu caro Pólio, não posso aceitar esse dinheiro. Tu estavas absolutamente certo: estes jovens hoje em 
dia lêem as coisas mais vis. Nem mais uma palavra, por favor: eu concordo que perdi a aposta. Aqui estão 
as minhas dez moedas de ouro e pago­as com todo o prazer.
Pólio apelou para mim.
­ Vamos senhor, eu não sei quem sois, mas pareceis­me um rapaz com bom senso; já lestes as obras do 
nosso amigo Lívio?
Sorri.
­ Bom, pelo menos são mais fáceis de ler.
­ Mais fáceis, einh? Como é isso?
­ Ele faz o povo da Antiga Roma comportar­se e falar como se estivessem vivos agora.
Pólio estava deliciado.
­ Ele apanhou­te, Lívio, no teu ponto mais fraco. Tu atribuis aos romanos de há sete séculos, motivos, 
hábitos e falas impossivelmente modernos. Sim, é muito fácil de ler, mas não é história.
Antes de continuar a registar a sequência desta conversa, tenho que dizer algumas palavras sobre o velho 
Pólio, talvez o homem mais dotado do seu tempo, mesmo mais do que Augusto. Tinha agora quase oitenta 
anos, mas estava na posse plena das suas faculdades mentais e, aparentemente, com melhor saúde física 
que muitos homens de sessenta. Tinha atravessado o Rubicão com Júlio César e lutado com ele contra 
Pompeu; servira sob o comando do meu avô António, antes da sua disputa com Augusto, tendo sido 
Cônsul e Governador da Hispânia Ocidental e da Lombardia e tendo ganho um triunfo por uma vitória nos 
Balcãs. Fora amigo pessoal de Cícero, até que se decepcionou com ele, e patrono dos poetas Virgílio e 
Horácio. Além de tudo isto, era um orador distinto e escritor de tragédias. Mas era melhor historiador do 
que autor de tragédias ou orador, porque tinha o amor da verdade literal, chegando mesmo ao campo do 
pedantismo, o que não conseguia conciliar dentro das convenções destas outras formas literárias. Com os 
despojos da campanha dos Balcãs tinha fundado uma biblioteca pública, a primeira biblioteca pública de 
Roma. Havia agora mais duas: aquela onde nos encontrávamos e outra denominada de Octávia, em 
honra da minha avó; mas a de Pólio
108
estava muito melhor organizada para fins de leitura do que qualquer das outras.
Entretanto, Sulpício tinha encontrado o livro e, depois de lhe agradecerem, eles retomaram a discussão.
Lívio disse:
­ O problema de Pólio é que, quando ele escreve história, se sente obrigado a suprimir todos os 
sentimentos mais belos e mais poéticos e fazer os seus personagens agirem com uma insipidez 
conscienciosa e, quando põe palavras na sua boca, nega­lhes a mínima habilidade oratória. Pólio disse:
­ Sim, Poesia é Poesia, Oratória é Oratória e História é História; não se pode misturá­las.
­ Não pode? Na verdade eu posso, ­ atalhou Lívio. ­ Pretendes dizer­me que eu não posso escrever 
História com um tema épico, porque isso é uma prerrogativa da Poesia, ou pôr belos discursos de vésperas 
de campanha na boca dos meus generais, porque compor tais discursos é prerrogativa da Oratória?
­ É precisamente isso que quero dizer. A história é o registo verdadeiro daquilo que aconteceu, como as 
pessoas viveram e morreram, aquilo que fizeram e disseram; um tema épico apenas serve para distorcer 
esse registo. Quanto aos discursos dos generais, eles são admiráveis como oratória, mas terrivelmente 
dissociados da história: não só não há neles nada de factual, como são inadequados. Ouvi mais discursos 
de véspera de campanha do que a maior parte dos homens e, embora os generais que os faziam, 
especialmente César e António, fossem notáveis oradores públicos, eram também demasiadamente bons 
soldados para tentarem fazer jogos de oratória com as tropas. Falavam com eles num tom coloquial, não 
oratório. Que espécie de discurso fez César antes da Batalha de Farsália? Acaso nos pediu para pensarmos 
nas nossas mulheres e filhos e nos templos sagrados de Roma, nas glórias das nossas campanhas 
anteriores? Céus, não! Trepou ao tronco cortado de um pinheiro, com um desses rabanetes gigantes numa 
mão e um naco de pão duro na outra, gracejando entre duas mastigadelas. Nada de gracejos delicados, mas 
a realidade, dita da forma mais directa: sobre quão casta era a vida de Pompeu comparada com a sua 
própria vida de réprobo. As coisas que ele fez com aquele rabanete teriam feito rir um boi. Lembro­me de 
uma anedota licenciosa sobre como Pompeu ganhou o seu cognome de O Grande Ah, aquele rabanete! ­, e 
outra ainda pior, sobre como ele próprio perdera o cabelo no Bazar de Alexandria. Contava­te agora 
qualquer delas, se não estivesse aqui este rapaz, e também porque estou certo que não entenderias bem a 
intenção, já que não foste educado no acampamento de César. Nem uma palavra sobre a batalha que se 
avizinhava, a não ser
109
no fim: ”Pobre velho Pompeu! Tomar armas contra Júlio César e os seus homens! Que oportunidade pode 
ter!”
­ Não puseste nada disso na tua história, ­ disse Lívio.
­Não nas edições para o público, ­ disse Pólio. ­ Não sou doido. Mesmo assim, se quiseres consultar o  
Suplemento particular que acabei de escrever, encontrarás tudo isso lá. Mas talvez não te dês a esse 
trabalho. Eu conto­te o resto: César era um mimo espantoso e reproduziu­lhes o discurso de Pompeu à 
hora da morte, quando se preparava para cair sobre a sua espada (o rabanete de novo ­ com a extremidade 
arrancada com os dentes). Invectivou os Deuses Imortais, em nome de Pompeu, por sempre permitirem 
que o vício triunfasse sobre a virtude. Como eles se riam! E depois berrou: ”E não é verdade, embora 
Pompeu o diga? Negai se sois capazes, malditos cães fornicadores!” E atirou­lhes o meio rabanete. O riso 
redobrou! Nunca houve soldados como os de César. Lembras­te da canção que eles cantaram no seu 
triunfo sobre os gauleses?
Trazemos de volta o careca aproveitador de putas,
Romanos, trancai em casa as vossas mulheres.
Lívio disse:
­ Pólio, meu caro, não estávamos a discutir a moral de César, mas a maneira correcta de escrever a 
história.
Pólio replicou:
­ Sim, é verdade. O nosso jovem amigo inteligente estava a criticar o teu método, sob o disfarce respeitoso 
de louvar a tua clareza. Rapaz, tens mais algumas acusações a fazer a este nobre Lívio?
Eu disse:
­ Por favor, senhor, não me façais corar. Admiro enormemente a obra de Lívio.
­ A verdade, rapaz! lá alguma vez o apanhaste em algumas inexactidões históricas? Pareces­me um 
indivíduo que lê bastante.
­ Prefiro não tentar...
­ Vamos, deita isso cá para fora. Tem que haver alguma coisa, Então eu disse:
­ Há uma coisa que me confunde, confesso. É a história de Porsena. Segundo Lívio, Portela não conseguiu 
capturar Roma, tendo sido impedido, em primeiro lugar, pelo comportamento heróico de Horácio na ponte 
e, depois, desencorajado pela espantosa ousadia de Sabela; Lívio relata que Sabela, capturado depois de 
uma tentativa para assassinar
110 
Porsena, enfiou a mão nas chamas do altar e jurou que trezentos romanos como ele se tinham unido por 
um juramento para tirar a vida a Portela. E assim Lars Porsena fez a paz. Mas eu vi o túmulo labiríntico de 
Lars Porsena em Oclusivo e há nele um friso de romanos a emergirem dos portões da Cidade, sendo 
conduzidos sob um jugo. Há um sacerdote etrusco com uma tesoura a cortar as barbas dos Senadores. E 
mesmo Dióniso de Halicarnasso, cuja disposição nos era muito favorável, afirma que o Senado votou para 
Porsena um trono de marfim, um ceptro, uma coroa de ouro e uma túnica triunfal; o que só pode querer 
dizer que lhe prestavam honras de soberano. Assim, talvez Lars Porsena tenha capturado Roma, apesar de 
Horácio e Scaevola. E Aruns, o sacerdote de Cápua (diz­se que ele é o último homem que sabe ler 
inscrições etruscas), disse­me no Verão passado que, segundo os registos etruscos, o homem que expulsou 
os Tarquínios de Roma não foi Brutus, mas Porsena, e que Brutus e Colatino, os primeiros dois Cônsules 
de Roma, eram apenas funcionários da cidade nomeados para receber os impostos.
Lívio ficou muito zangado.
­ Estou surpreendido contigo, Cláudio. Não tens respeito pela tradição romana, para dares ouvidos dessa 
maneira às mentiras contadas pelos nossos inimigos antigos, para diminuir a nossa grandeza?
­ Eu só perguntei, ­ respondi humildemente, ­ o que foi que aconteceu na realidade.
­ Vamos, Lívio, ­ disse Pólio, ­ responde ao jovem estudante. O que aconteceu na realidade?
Lívio respondeu:
­ Noutra altura. Agora, não nos afastemos do assunto em causa, que é uma discussão sobre a maneira 
correcta de escrever a história. Cláudio, meu amigo, tu tens ambições nesse sentido. Qual de nós dois, 
velhos consagrados, escolherás como modelo?
­ Estão a tornar a situação muito difícil para o rapaz, seus invejosos,
­ entrepôs Sulpício. ­ O que esperais que ele vos responda?
­ A verdade não ofenderá nenhum de nós, ­ replicou Pólio. Olhei de um para o outro. Finalmente, disse:
­Acho que escolheria Pólio. Como tenho a certeza que não posso ter esperanças de atingir a inspirada 
elegância literária de Lívio, farei tudo o que puder para imitar a exactidão e diligência de Pólio.
Lívio soltou um grunhido e preparava­se para se ir embora, mas Pólio deteve­o. Contendo a alegria, tanto 
quanto lhe era possível, disse:
­ Vamos, Lívio, não me vais regatear um pequeno discípulo, pois não, quando tu os tens em regimentos 
por todo o mundo? Olha rapaz, já alguma vez ouviste falar no velho de Cádiz? Não, não é uma história 
porca. Aliás, é um bocado triste. Ele veio a pé até Roma, para ver o quê? Não os templos ou os teatros, 
nem as multidões, as lojas ou o edifício do
111
Senado. Mas um homem. Que homem? O homem cuja cabeça está nas moedas? Não, não. Um maior que 
ele. Ele veio ver nem mais nem menos que o nosso amigo Lívio, cujos trabalhos, ao que parece, ele 
conhecia de cor. Viu­o, saudou­o e voltou directamente para Cádiz ­ onde morreu imediatamente; a 
desilusão e a longa caminhada tinham sido demais para ele.
Lívio disse:
­ De qualquer forma, os meus leitores são leitores genuínos. Rapaz, sabes como foi que Pólio construiu a 
sua reputação? Bom, ele é rico e tem uma casa muito grande e bonita e um cozinheiro espantosamente 
bom. Convida uma grande multidão de gente de letras para jantar, dá­lhes uma refeição perfeita e, depois, 
com toda a naturalidade, pega no seu último volume de história. Diz humildemente: ”Meus Senhores, há 
algumas passagens aqui das quais não estou muito seguro. Já as trabalhei muito a sério, mas ainda 
precisam do polimento final para o qual conto convosco. Com vossa licença...” Depois, começa a ler. 
Ninguém escuta com muita atenção. Todos estão de barriga cheia. ”O cozinheiro é UM génio”, pensam  
todos eles. ”A mugem com molho picante, aqueles tordos gordos recheados e o javali selvagem com 
trufas... quando foi a última vez em que eu comi assim tão bem? Não desde a última leitura de Pólio, 
parece­me. Ah, aqui vem outra vez o escravo com o vinho. Esse excelente vinho de Chipre. Pólio tem 
razão: é melhor do que qualquer vinho grego que há no mercado.” Entretanto, a voz de Pólio ­ uma voz 
muito agradável de ouvir, como a de um sacerdote no sacrifício da tarde durante o Verão ­, continua com 
suavidade e, de vez em quando, pergunta humildemente: ”Isto está bem, acham?” E todos respondem, 
pensando outra vez nos tordos ou, talvez, nos pequenos bolinhos com fruta: ”Admirável. Admirável, 
Pólio.” De vez em quando, faz uma pausa e pergunta: ”Bom, qual é a palavra certa para usar aqui? Devo 
dizer que os enviados que regressavam persuadiram ou excitaram esta tribo à revolta? Ou devo antes 
dizer que o relato que fizeram da situação influenciou a tribo na sua decisão de ir para a revolta? Na 
verdade, penso, eles fizeram um relato imparcial daquilo que tinham visto.” Depois, um murmúrio ergue­
se dos leitos de repouso: ”Influenciou, Pólio. Usa influenciou!”. ”Obrigado, meus amigos”, diz ele, ”sois 
muito amáveis. Escravo, a minha faca e a pena! Se me desculpam, vou alterar imediatamente a frase.” 
Depois, publica o livro e envia a cada um dos convivas um exemplar gratuito. Eles dizem para os seus 
amigos, enquanto conversam nos Banhos Públicos: ”Livro admirável, este. já o leste? Pólio é o maior 
historiador da nossa época, o que não o impede de pedir conselho em pequenas questões de estilo a 
homens de bom gosto. Esta palavra influenciou fui eu mesmo que lha indiquei.” Pólio retorquiu:
112
­ Isso é verdade. O meu cozinheiro é excelente. Da próxima vez, peço­te que me emprestes o teu e 
algumas garrafas do chamado vinho de Falerno, e então terei algumas críticas sinceras.
Sulpício fez um gesto de súplica:
­ Meus senhores, meus senhores, isto está a tornar­se pessoal. Lívio ia já a afastar­se. Mas Pólio sorriu em 
direcção a ele e disse em voz alta, para que o ouvisse:
­ Um tipo decente, esse Lívio, mas tem uma coisa má. Uma doença chamada Paduanidade.
Isto fez com que Lívio estacasse e desse meia volta.
­ O que é que há de mal em Pádua? Não vou permitir que digam mal desse lugar.
Pólio explicou­me.
­ Foi onde ele nasceu, sabes. Algures nas Províncias do Norte. Têm lá uma nascente de águas termais com 
propriedades extraordinárias. Consegue­se sempre distinguir um paduano. Banhando­se na água da 
nascente ou bebendo­a ­ e, segundo me dizem, fazem ambas as coisas ao mesmo tempo ­, os paduanos são 
capazes de acreditar naquilo que lhes apetece e fazem­no com tal força que obrigam qualquer outra pessoa 
a acreditar também. É por isso que a cidade tem uma tão maravilhosa reputação comercial. Os cobertores 
e tapetes que eles fazem não são na realidade melhores do que os de qualquer outro lado; de facto, são até 
inferiores, porque os carneiros locais são amarelos e têm uma lã grosseira, mas, para o paduano, são 
macios e brancos como penas de pato. E persuadiram o resto do mundo de que assim é.
Eu disse, entrando no jogo dele:
­ Carneiros amarelos! Isso é uma raridade. Como é que eles tomam essa cor?
­ Ora, bebendo a água da nascente. Tem enxofre. Todos os paduanos são amarelos. Olha para Lívio.
Lívio encaminhou­se lentamente em direcção a nós.
­ Uma graça é uma graça, Pólio, e eu sei aceitar uma graça. Mas está também em causa uma questão séria, 
que é a maneira adequada de escrever história. Pode ser que eu tenha cometido erros. Qual o historiador 
que está livre disso? Pelo menos, não contei falsidades deliberadamente: não me acusareis disso. Qualquer 
episódio lendário contido em escritos históricos antigos e que tenha a ver com o meu tema da antiga 
grandeza de Roma, terei todo o prazer em o incorporar na história. Embora possa não ser verdadeiro 
quanto aos detalhes factuais, é verdadeiro no seu espírito. Se se me deparam duas versões do mesmo 
episódio, escolho a que estiver mais próxima do meu tema e não me encontrareis a fossar nos cemitérios 
etruscos à procura de um terceiro relato que possa contradizer os outros dois. De que serviria isso?
113
­ Serviria a causa da verdade, ­ disse Pólio suavemente. ­ Isso não seria importante?
­ E se, ao servir a causa da verdade, admitirmos que os nossos veneráveis antepassados foram cobardes, 
mentirosos e traidores? Como é então?
­ Vou deixar que seja este rapaz a responder a essa pergunta. Ele está a dar os primeiros passos. Vamos, 
rapaz, responde!
Eu disse ao acaso:
­ Lívio começa a sua história lamentando a maldade moderna e prometendo acompanhar o declínio 
gradual da antiga virtude, à medida que as conquistas proporcionavam riqueza a Roma. Ele diz que terá o 
maior prazer em escrever os capítulos iniciais porque, ao fazê­lo, conseguirá fechar os olhos à maldade 
dos tempos modernos. Mas, ao fechar os olhos à maldade dos tempos modernos, não terá ele por vezes 
fechado igualmente os olhos à maldade antiga?
­ Então? ­ perguntou Lívio, semicerrando os olhos.
­ Então, ­ fiquei à procura. ­ Talvez não haja muita diferença realmente entre a maldade deles e a nossa. 
Pode ser apenas uma questão de lugar e oportunidade.
Pólio disse:
­ Na realidade, rapaz, o paduano não conseguiu fazer­te ver as suas peles cor de enxofre como brancas de 
neve?
Eu sentía­me muito constrangido.
­ Tenho mais prazer na leitura de Lívio do que na de qualquer outro autor, ­ repeti.
­ Sim, claro, ­ Pólio sorriu, ­ foi precisamente isso que disse o velho de Cádiz. Mas, tal como o homem de 
Cádiz, sentes­te agora um pouco decepcionado, não é? Lars Porsena, Scaevola, Brutus e companhia estão­
te entalados na garganta?
­ Não é decepção, senhor. Vejo agora, embora não tivesse pensado nisso antes, que há duas maneiras 
distintas de escrever a história: uma, é levar os homens à virtude pela persuasão; a outra, consiste em 
forçá­los a ver a verdade. A primeira é a maneira de Lívio; a outra é a vossa: e talvez as duas não sejam 
irreconciliáveis.
­ Bom, meu rapaz, tu és um orador, ­ disse Pólio maravilhado. Sulpício que estava apoiado numa perna, 
segurando o pé com a mão, como era seu hábito quando estava excitado ou impaciente, e a retorcer a 
barba formando nós, entrepôs:
­ Sim, Lívio nunca terá falta de leitores. As pessoas adoram ser levadas à antiga virtude pela persuasão e 
por um escritor cheio de encanto, particularmente quando lhes dizem ao mesmo tempo que a civilização 
moderna tornou essa virtude inatingível. Mas os meros contadores de verdades ­ ”cangalheiros que 
expõem o cadáver da história”, para citar
114
o epigrama do pobre Catulo sobre o nobre Pólio ­, pessoas que não registam nada além daquilo que 
realmente aconteceu, tais homens só conseguem ter quem os escute enquanto dispuserem de um bom 
cozinheiro e de uma garrafeira de vinho cipriota
Isto deixou Lívio realmente furioso Declarou
­ Pólio, esta conversa é inútil. Aqui o jovem Cláudio sempre foi considerado imbecil pela família e pelos 
amigos, mas, até hoje, eu não tinha concordado com o veredicto geral. Podes ficar com o teu discípulo E 
Sulpício pode aperfeiçoar­lhe a imbecilidade não há melhor professor para a imbecilidade em Roma. ­ E 
deu­nos o seu golpe de parto: Et apud Apollinem istum Polhonis Pollinctorem diutissime polleat O que 
quer dizer, embora o jogo de palavras se perca em grego: ”E possa ele brilhar por muito tempo no 
santuário daquele Cangalheiro Apolo de Pólio.” Depois, afastou­se com uma risada
Pólio gritou­lhe, alegremente
­ Quod certe pollicitur Pollio. Pollucibiliter pollebit puer (”Pólio promete que o fará. O rapaz há­de 
brilhar a grande altura”).
Quando ficámos sozinhos os dois, depois de Sulpício se ter afastado para procurar um livro, Pólio 
começou a interrogar­me
­ Quem és tu, rapaz? O teu nome é Cláudio, não é? É óbvio que vens de uma boa família, mas eu não te 
conheço
­ Sou Tibério Cláudio Druso Nero Germânico
­ Meu Deus! Mas Lívio está certo A opinião geral é que és um imbecil
­ Sim A minha família tem vergonha de mim porque gaguejo e sou coxo e estou muitas vezes doente, por 
isso apareço pouco em sociedade
­ Mas imbecil? És um dos jovens mais inteligentes que conheci de há muitos anos a esta parte
­ Sois muito amável, senhor
­ De maneira nenhuma Pelos Deuses, foi um grande golpe para o velho Lívio, aquela do Lars Porsena. 
Lívio não tem consciência, essa é que é a verdade. Estou sempre a apanhá­lo. Perguntei­lhe uma vez se 
tinha sempre a mesma dificuldade em encontrar as placas de latão que queria no meio do lixo do Gabinete 
dos Registos Públicos. Ele respondeu ”Não, não tenho qualquer dificuldade” E veio­se a saber que ele 
nunca tinha lá estado uma única vez, a confirmar o que quer que fosse. Diz­me, porque estavas a ler a 
minha história?
­ Estava a ler a vossa narrativa do cerco de Perúsia. O meu avô primeiro marido de Lívia, como sabeis ­ 
esteve lá. Estou interessado naquela época e estou a reunir material para escrever a vida do meu pai. O 
meu tutor, Atenodoro, indicou­me o vosso livro, disse que era verdadeiro. O meu antigo tutor, Marco 
Pórcio Catão, dissera­me uma vez que era uma colecção de mentiras Por isso, senti­me mais inclinado a 
acreditar em Atenodoro
115
­ Sim, Catão não havia de gostar do livro. Os da família dele lutaram do lado errado. Eu ajudei a expulsar 
o avô dele da Sicília. Mas penso que és o primeiro historiador jovem que alguma vez conheci. A história é 
um jogo de velhos. Quando vais ganhar batalhas como o teu pai e o teu avô?
­ Talvez na minha velhice.
Ele riu­se.
­ Não vejo razão para que um historiador que passou a vida a estudar tácticas militares não seja invencível 
como comandante, se dispuser de boas tropas e de coragem...
­ E de bons oficiais, ­ acrescentei, recordando Cléon.
­ E de bons oficiais, sem dúvida, mesmo que ele nunca tenha realmente manejado uma espada ou um 
escudo em toda a sua vida.
Tive a ousadia suficiente para perguntar a Pólio porque lhe chamavam frequentemente O último dos 
Romanos. Ele pareceu satisfeito com a pergunta e replicou:
­ Augusto deu­me esse nome. Foi na altura em que me convidou para me juntar a ele na sua guerra contra 
o teu avô António. Perguntou­me por que espécie de homem ele me tomava: António fora um dos meus 
melhores amigos. ”Asínio Pólio”, disse ele, ”acredito que és o último dos romanos. O título não tem nada 
a ver com aquele assassino do Cássio.” ”E se eu sou o último dos romanos,” repliquei, ”quem tem culpa 
disso? E de quem será a culpa quando tiverdes destruído António, se ninguém a não ser eu jamais ousara 
ficar de cabeça erguida na vossa presença ou falar quando lhe apetece?” ”Minha não, Asínio”, disse, como 
que a desculpar­se: ”foi António que declarou a guerra, não eu. E, logo que António tiver sido derrotado, 
vou evidentemente reinstaurar um governo republicano.” (se Dona Lívia não interpuser o seu veto, 
poderia acrescentar­se). Nesta altura, o velho homem tomou­me pelos ombros.
­ A propósito, vou dizer­te uma coisa, Cláudio. Eu já tenho muita idade e, embora o meu espírito esteja 
lúcido, já cheguei ao fim. Dentro de três dias estarei morto, eu sei. Pouco antes de uma pessoa morrer, 
vem­lhe uma estranha lucidez. Diz palavras proféticas. Agora ouve! Queres viver uma longa vida activa, 
com honra no final?
­ Sim.
­ Então, exagera o teu coxear, gagueja deliberadamente, finge­te doente com frequência, deixa o teu 
espírito vaguear, sacode a cabeça e faz movimentos bruscos com as mãos em todas as ocasiões públicas e 
semi­públicas. Se pudesses ver aquilo que eu vejo, saberias que esta é a tua única esperança de salvação e, 
eventualmente, de glória.
Eu disse:
­ A história de Lívio sobre Brutus ­ refiro­me ao primeiro Brutus pode não ser histórica, mas é adequada. 
Brutus também fingiu ser um imbecil, para melhor poder restabelecer a liberdade popular.
116
­ O que é isso? Liberdade popular? Acreditas nisso? Julgava que a frase tinha morrido para a geração mais 
jovem.
­ Meu pai e meu avô ambos acreditavam nela...
­ Sim, ­ interrompeu Pólio com aspereza, ­ foi por isso que morreram.
­ O que quereis dizer?
­ Quero dizer que foi por isso que foram envenenados.
­ Envenenados! Por quem?
­ Hmm! Não tão alto, rapaz. Não, não vou falar em nomes. Mas vou dar­te uma indicação segura de que 
não estou apenas a repetir escândalos sem fundamento. Estás a escrever uma biografia do teu pai, 
disseste?
­ Sim.
­ Bom, verás que não te vai ser permitido ir além de um certo ponto nesse trabalho. E a pessoa que te 
impedir...
Sulpício voltou a arrastar os pés e nada mais de interesse foi dito, excepto quando me despedi de Pólio e 
ele me puxou para o lado e murmurou:
­ Pequeno Cláudio, adeus! Mas não sejas tolo sobre essa questão da liberdade popular. Isso não pode vir 
ainda. As coisas têm que se tornar muito piores antes de poderem melhorar. ­ Depois, levantou a voz, ­ 
Mais uma coisa. Se, depois de eu morrer, encontrares algum ponto importante nas minhas obras que te 
pareça menos histórico, dou­te permissão e vou estipular que tens autoridade, para por as correcções num 
suplemento. Mantém­nas em dia. Os livros, quando perdem a actualidade, só servem para embrulhar o 
peixe.
Respondi que esse seria um dever honroso.
Três dias depois, Pólio morreu. Deixou­me no seu testamento uma colecção de histórias latinas primitivas, 
mas as mesmas não me foram entregues. Meu tio Tibério disse que era engano: que a intenção era deixar­
lhas a ele, os nossos nomes é que eram muito semelhantes. Quanto à sua determinação sobre a minha 
autoridade para fazer correcções, toda a gente achou que se tratava de uma brincadeira; mas eu cumpri a 
promessa que fizera a Pólio, uns vinte anos mais tarde. Descobri que ele escrevera com muita severidade 
sobre o carácter de Cícero ­ um indivíduo vaidoso, vacilante, timorato ­ e, embora não discordasse deste 
veredicto, senti a necessidade de assinalar que ele não era também um traidor, como Pólio o retratara. 
Pólio baseara­se em alguma correspondência de Cícero que eu consegui provar ter sido forjada por Clódio 
Pulcro. Cícero conquistara a inimizade de Clódio, ao servir de testemunha contra ele quando o acusaram 
de ter assistido ao sacrifício da Boa Deusa disfarçado de mulher­música. Este Clódio era outro dos maus 
Claudianos.
117
CAPíTULO X
Quando atingiu a idade, Tibério recebera recentemente ordens de Augusto no sentido de adoptar 
Germânico como filho, embora já tivesse Castor como herdeiro, transferindo­o assim da família Claudiana 
para a Juliana. Assim me encontrei como chefe do ramo mais velho dos Claudianos e na posse 
indisputável do dinheiro e das propriedades herdadas do meu pai. Tornei­me tutor da minha mãe ­ 
entretanto, ela tinha voltado a casar ­, o que ela encarou como uma humilhação. Tratava­me com bastante 
mais severidade do que antigamente, embora todos os seus documentos de negócios tivessem que passar 
por mim primeiro para serem assinados e eu fosse o sacerdote da família. A cerimónia da minha 
maioridade contrastou curiosamente com a de Germânico. Vesti a minha túnica de homem à meia­noite e, 
sem quaisquer assistentes ou procissão, fui levado para o Capitólio numa liteira, onde executei o 
sacrifício, tendo sido levado de volta para a cama, Germânico e Póstumo teriam comparecido, mas, para 
chamar o menos possível as atenções sobre mim, Lívia tinha arranjado nessa noite um banquete no 
Palácio, ao qual eles não podiam ser dispensados de assistir.
Quando casei com Urgulanila, aconteceu a mesma coisa. Muito poucas pessoas tiveram conhecimento do 
nosso casamento até ao dia seguinte à celebração. Não houve nada de irregular na cerimónia. Os sapatos 
cor de açafrão de Urgulanila e o véu cor de fogo, a observação dos auspícios, a ingestão do bolo sagrado, 
os dois banquinhos cobertos com pele de carneiro, a libação que eu servi, o unguento que apliquei nela à 
entrada da porta, as três moedas, o presente que lhe dei de fogo e água ­ tudo em boa ordem, excepto a 
procissão dos archotes, que foi omitida, e o facto de todo o cerimonial ter sido levado a cabo sem 
empenhamento, à pressa e sem graça. Para que não tropece no limiar da casa do noivo, a primeira vez que 
lá entra, uma noiva romana é sempre erguida ao passá­lo. Os dois Claudianos encarregados de o fazer 
eram ambos idosos e não estavam à altura do peso dela. Um deles escorregou no mármore e Urgulanila 
caiu com uma pancada seca, arrastando­os com ela e ficando os três estatelados uns por cima dos outros. 
Não há pior presságio para um casamento que uma coisa dessas. No entanto, seria falso se disséssemos 
que foi um casamento infeliz; não havia tensão suficiente
119
entre nós para justificar o termo infeliz. A princípio, dormíamos juntos, porque parecia ser isso que 
esperavam de nós; e tivemos mesmo, ocasionalmente, relações sexuais ­ a minha primeira 
experiência de sexo ­, porque isso também parecia fazer parte do casamento e não por luxúria ou 
afeição. Fui sempre tão atencioso e delicado com ela quanto possível e ela recompensava­me com 
indiferença, que era o melhor que eu podia esperar de uma mulher com o seu carácter. Ficou 
grávida três meses depois do casamento e deu­me um filho chamado Drusilo, em relação a quem me 
foi impossível nutrir qualquer sentimento paternal. Saíu a minha irmã Livila na malevolência e ao 
irmão de Urgulanila, Pláucio, no resto do seu carácter. Em breve vos falarei de Pláucio, que era o 
meu exemplo e modelo moral, nomeado por Augusto.
Augusto e Lívia tinham o hábito metódico de nunca chegarem a qualquer decisão sobre um assunto 
importante relacionado com a família ou com o Estado sem a registarem por escrito, tanto no que 
dizia respeito a uma decisão como às deliberações que conduziam a ela, geralmente sob a forma de 
cartas trocadas entre ambos. Do conjunto da correspondência que deixaram para trás ao morrer, fiz  
várias transcrições, que ilustram a atitude de Augusto em relação a mim nesta altura. O primeiro 
extracto data de três anos antes do meu casamento.
Minha querida Lívia,
É meu desejo registar algo de estranho que aconteceu hoje. Nem sei como interpretar tal coisa. Estava a 
falar com Atenodoro e calhou dizer­lhe: ”Receio que o papel de tutor do jovem Tibério Cláudio seja uma 
tarefa muito cansativa. Parece­me que ele toma dia após dia um ar mais infeliz, nervoso e incapaz.” 
Atenodoro disse: ”Não julgueis o rapaz com demasiada severidade. Ele sente profundamente a decepção  
da família em relação à sua pessoa e as humilhações que encontra por toda a parte. Mas está muito longe 
de ser um incapaz e, quer acrediteis quer não, tenho muito prazer na sua companhia. Nunca o ouvistes 
declamar, pois não?” ”Declamar!”, exclamei, rindo. ”Sim, declamar”, repetiu Atenodoro. ”Deixai que vos 
faça uma sugestão. Escolhei um tema para ele declamar e, dentro de meia hora, vinde ouvir o que ele fez 
daí. Mas escondei­vos atrás de uma cortina, ou não ouvireis nada que valha a pena.” Escolhi o tema 
Conquistas Romanas na Germânia e, quando me pus à escuta meia hora mais tarde atrás daquela cortina, 
nunca me senti tão admirado em toda a minha vida. Ele tinha os factos na ponta dos dedos, os tópicos  
principais eram bem escolhidos e os pormenores colocados na relação correcta e na proporção devida; 
mais do que isso, a voz estava sob controlo e ele não gaguejava. Deus me faça cair morto se não foi 
verdadeiramente agradável e instrutivo ouvi­lo! Mas como é que um indivíduo cuja conversa diária é tão 
desesperadamente tola, consegue fazer um discurso
120
organizado, e em pouco tempo, num estilo tão perfeitamente racional e mesmo erudito, é uma coisa que eu não 
entendo. Afastei­me silenciosamente, pedindo a Atenodoro que não mencionasse o facto de eu ter estado ali ou como 
ficara surpreendido; mas sinto­me na obrigação de vos contar o sucedido e mesmo de sugerir que, a partir de agora, 
lhe permitíssemos ocasionalmente que jantasse connosco à noite, quando houver poucos convidados presentes, com 
a condição dele ficar de boca calada e com os ouvidos bem abertos. Se houver, como me sinto inclinado a acreditar, 
alguma esperança de que ele se venha a tornar um membro responsável da família, devia habituar­se gradualmente a 
misturar­se com os seus iguais do ponto de vista social. Não podemos mantê­lo eternamente aferrolhado com os seus 
professores e libertos. Existe, claro está, uma grande disparidade de opiniões sobre a questão das suas capacidades 
mentais. Seu tio Tibério, a mãe Antónia e a irmã Livila são unânimes em o considerar um idiota. Por outro lado, 
Atenodoro, Sulpício, Póstumo e Germânico juram que ele é tão sensato, quando quer, como qualquer homem, mas 
que é facilmente desestabilizado pelo nervosismo. Eu, pela minha parte, não consigo ainda chegar a uma conclusão a 
esse respeito.
Ao que Lívia respondeu:
Meu querido Augusto,
A surpresa que tivestes atrás daquela cortina não foi maior nem inferior à surpresa que tivemos em tempos quando 
o Embaixador Indiano tirou o pano de seda que cobria a gaiola dourada que o seu senhor o Grande Rei nos tinha 
enviado, e nós vimos a ave Papagaio pela primeira vez, com as suas penas cor de esmeralda e o colar cor de rubi e o 
ouvimos dizer ”Avé, César, Pai da Pátria!” Não foi a importância da frase, porque qualquer criança balbuciante é 
capaz de a dizer, mas o facto de ser um pássaro a pronunciá­la. E ninguém, a não ser um tolo, louvaria o Papagaio 
pela sua esperteza em ter pronunciado as palavras certas, porque ele não sabia o significado de nenhuma delas. O 
crédito vai para o homem que treinou a ave, com uma paciência incrível, a repetir a frase, porque, como sabeis, para 
outras ocasiões ele está treinado a dizer outras coisas; e, numa conversa geral, ele diz os disparates mais arrogantes e 
nós temos que lhe tapar a gaiola para o calar. Assim acontece com Cláudio, embora não seja muito lisonjeira para o 
Papagaio, uma ave inegavelmente bela, compará­lo com o meu neto: aquilo que ouvistes foi, sem sombra de dúvida, 
um discurso que, por coincidência, ele tinha aprendido de cor. Afinal, As Conquistas Romanas da Germânia é um 
assunto muito óbvio e Atenodoro pode muito bem tê­lo treinado a pronunciar com perfeição meia dúzia ou mais 
declamações modelo do mesmo tipo. Mas atenção, eu não estou a dizer que não fiquei satisfeita em saber que ele é 
tão permeável ao
121
treino: estou extremamente satisfeita. Isso quer dizer, por exemplo, que poderemos treiná­lo para a cerimónia do seu 
casamento. Mas a sugestão de o deixarmos jantar connosco é ridícula. Recuso­me a comer na mesma sala que esse 
indivíduo: teria uma indigestão.
Quanto ao testemunho a favor da sua sanidade mental, examinai­o. Germânico, ainda criança, jurou ao pai 
moribundo amar e proteger o irmão mais novo. Conheceis a nobreza de alma de Germânico e sabeis que, para não 
trair essa incumbência sagrada, seria capaz de apresentar sob a melhor luz possível a inteligência do irmão, na 
esperança de que um dia ela pudesse melhorar. É igualmente óbvio por que razão Atenodoro e Sulpício fingem 
considerá­lo susceptível de melhorar: são bem pagos para isso e as suas funções dão­lhes uma desculpa para 
andarem pelo Palácio e darem­se ares de conselheiros privados. Quanto a Póstumo, há meses que me queixo; é 
verdade que não consigo de todo entender esse jovem. Considero que a Morte foi extremamente injusta ao levar os 
seus dois talentosos irmãos, deixando­o apenas a ele. Ele adora entrar em discussão com os mais velhos, em 
situações em que a discussão é desnecessária, pois os factos estão para além de qualquer discussão, apenas para nos 
exasperar e mostrar a sua importância como vosso único neto vivo. A sua defesa da inteligência de Cláudio é um 
caso agudo. Ele foi absolutamente insolente comigo no outro dia, quando eu fiz um comentário no sentido de que 
Sulpício estava a perder o seu tempo a ensinar o rapaz: disse mesmo que, na sua opinião, Cláudio tinha uma 
inteligência mais penetrante do que a maior parte dos seus parentes mais próximos
­ o que, suponho, tinha a intenção de me incluir! Mas Póstumo é outro problema. De momento, a questão gira em 
volta de Cláudio: não posso, repito, aceitar que jante na minha companhia, por razões de ordem física que espero 
compreendais.
Lívia
Augusto escreveu a Lívia um ano mais tarde, quando ela estava ausente por alguns dias no campo:
Quanto ao jovem Cláudio, vou aproveitar a vossa ausência para o convidar para cear comigo todas as noites. Admito 
que a presença dele ainda me constrange, mas não acho que seja bom para ele jantar sempre sozinho com Sulpício e 
Atenodoro. A conversa que tem com eles é exclusivamente centrada nos livros e, ainda que ambos sejam pessoas 
excelentes, não são os companheiros ideais para um rapaz com a idade e posição dele. Desejaria sinceramente que 
escolhesse um jovem de posição em cuja postura, maneira de vestir e comportamento se pudesse inspirar. Mas a sua 
timidez e falta de confiança em si próprio impedem­no. Adora o nosso querido Germânico como um herói, mas sente 
tão profundamente
122
as suas próprias limitações que nunca ousaria imitá­lo, da mesma forma que eu próprio não ousaria andar por aí 
vestido com uma pele de leão e uma clava e chamar a mim mesmo Hércules. A pobre criatura é infeliz; pois em 
questões importantes (quando o seu espírito não está a divagar) a sua nobreza de coração torna­se bem evidente...
Uma terceira carta, escrita pouco depois do meu casamento, quando eu acabava de ser nomeado sacerdote de Marte, 
é também interessante:
Minha querida Lívia,
Tal como me aconselhastes, discuti com o nosso Tibério o que havemos de fazer em relação ao jovem Cláudio, 
quando estes Jogos em honra de Marte se realizarem. Agora que ele atingiu a maioridade e foi nomeado para o lugar 
vago no Colégio dos Sacerdotes de Marte, não podemos adiar muito mais a nossa decisão quanto ao seu futuro. 
Estamos de acordo neste ponto, não é verdade? Se ele é suficientemente são de espírito e de corpo para ser 
eventualmente reconhecido como membro respeitável da família ­ como estou convencido que é, senão não teria 
adoptado Tibério e Germânico, deixando­o a ele como chefe do ramo principal da casa Claudiana ­, então é evidente 
que ele deve ser acompanhado, recebendo as mesmas oportunidades de progresso que Germânico. Admito que posso 
continuar enganado ­ as suas melhorias recentes não foram espectaculares. Mas, se decidirmos que, afinal, as 
enfermidades do seu corpo estão ligadas a uma enfermidade crónica do espírito, não devemos dar às pessoas 
maliciosas a oportunidade de troçarem dele e de nós. Repito, temos que decidir rapidamente e de uma vez por todas 
como encarar o rapaz, quanto mais não seja porque seria um incómodo e um constrangimento constantes se 
tivéssemos que decidir de novo em cada ocasião que se apresentasse se o considerávamos ou não capaz de 
empreender os deveres de Estado para os quais o seu nascimento o recomenda.
Bom, a questão imediata é o que fazer com ele nestes Jogos. Eu não teria qualquer objecção a que o encarregassem 
da messe dos sacerdotes, mas com a condição dele deixar tudo nas mãos do cunhado, o jovem Pláucio Silvano, 
fazendo apenas o que lhe disserem. Ele pode aprender muito desta forma e não há razão para que caia em desgraça se 
aprender bem a lição. Mas claro que está fora de questão que ele se sente comigo no camarote Presidencial, 
juntamente com a estátua Sagrada, porque toda a gente no teatro estará constantemente a olhar nessa direcção e 
qualquer singularidade no seu comportamento seria logo comentada.
Outro problema é o que fazer com ele no Festival Latino. Germânico vai para o Monte Albano com os Cônsules, 
para tomar parte no sacrifício, e Cláudio deseja, segundo ouvi dizer, ir com ele. Mas, mais uma vez, não
123
tenho a certeza se podemos confiar em que não faça papel de tolo. Germânico vai estar ocupado com os 
seus deveres e será incapaz de tomar conta dele durante todo o tempo. E se ele realmente for, as pessoas 
vão querer saber o que está lá a fazer, vão perguntar porque não o nomeámos Guardião da Cidade em 
Roma enquanto durar o festival, na ausência dos magistrados ­ uma honra que, deveis estar lembrada, 
atribuímos sucessivamente a Caio, Lúcio, Germânico, ao jovem Tibério e a Póstumo, logo que atingiram a 
maioridade, como estreia nas funções oficiais. A melhor maneira de sair desta dificuldade é anunciar que 
ele está doente, porque, claro está, nomeá­lo Guardião da Cidade está fora de questão.
Se desejardes mostrar esta carta a Antónia, não tenho qualquer objecção: garanti­lhe que não tardaremos a 
tomar uma decisão sobre o filho, de uma forma ou de outra. É uma posição incongruente para ela estar 
legalmente sob a sua tutoria.
Augusto
À parte ter sido o meu primeiro cargo público, não há nada de notável a registar sobre a minha gestão da 
messe dos sacerdotes. Pláucio, um homenzinho vaidoso, elegante e presumido, fez todo o trabalho por 
mim e nem sequer se deu ao trabalho de me explicar o sistema de aprovisionamento e as regras de 
precedência sacerdotal; recusou­se mesmo a responder às minhas perguntas sobre tais assuntos. Tudo o 
que fez foi treinar­me em certos gestos e frases formais que eu devia usar ao receber os sacerdotes e em 
várias fases da refeição, proibindo­me de voltar a abrir a boca. Isto foi extremamente desagradável para 
mim porque, em muitas ocasiões, poderia ter participado na conversa de forma útil e o meu silêncio e 
subserviência a Pláucio causaram má impressão. Os jogos em si não cheguei a vê­los.
Haveis de ter notado os comentários depreciativos de Lívia sobre Póstumo. A partir desta altura, eles 
tornaram­se cada vez mais frequentes nas cartas dela e Augusto, embora a princípio tentasse defender o 
neto, vem a admitir gradualmente que está decepcionado com ele. Acho que Lívia deve ter dito a Augusto 
muito mais do que consta na sua correspondência, para que Póstumo tivesse perdido tão facilmente a sua 
protecção, mas certas coisas são notórias. Primeiro, Tibério ter­se­ia queixado; segundo, as palavras de 
Lívia, acerca de um comentário atrevido de Póstumo sobre a Universidade de Rodes. Depois Catão, ainda 
segundo relato de Lívia, queixa­se das más influências de Póstumo sobre os estudantes mais novos, 
desafiando a sua disciplina; depois, Lívia apresenta os relatórios confidenciais de Catão, dizendo que os 
reteve todo esse tempo na esperança de que houvesse uma mudança. A seguir, vêm as referências cheias 
de preocupação à sua melancolia e mau humor, esta foi a época em que Póstumo se decepcionou com 
Livila e sofreu o
124
desgosto da morte do irmão Caio. Segue­se uma recomendação, quando ele atinge a maioridade, para 
que toda a herança que lhe vem do pai, Agripa, não seja posta em seu nome nos anos mais próximos, pois 
isso ”poderia dar­lhe a oportunidade de uma libertinagem ainda maior que aquela a que já se entrega!” 
Quando é alistado juntamente com os outros jovens em idade militar, vai para a Guarda como simples 
tenente e não recebe qualquer das honras extraordinárias concedidas a Caio e Lúcio. O próprio Augusto é 
de opinião que este é o caminho mais seguro, pois Póstumo é ambicioso: não deve criar­se o mesmo tipo 
de situação constrangedora ocorrida quando os jovens nobres apoiaram Marcelo contra Agripa ou Caio 
contra Tibério. Em breve, Póstumo reagirá mal a isto, dizendo a Augusto que não deseja as honras pelas 
honras em si, mas porque o facto de não lhe terem sido conferidas foi mal interpretado pelos seus amigos, 
que acreditam que ele está mal visto no Palácio.
Depois vêm alguns sinais mais graves. Póstumo perdeu a calma com Pláucio ­ mas nenhum dos dois dirá a 
Lívia, mais tarde, quais as circunstâncias que envolveram o desentendimento ­, que levantou e atirou para 
uma fonte, na presença de vários homens de posição e dos seus lacaios. E então chamado a prestar contas 
a Augusto e não mostra arrependimento, insistindo que Pláucio merecia o mergulho por ter falado comigo 
de forma insultuosa; simultaneamente, queixa­se a Augusto de que a sua herança está a ser injustamente 
retida. Não tarda a ser repreendido por Lívia pela mudança nas suas maneiras e pelo mau humor contra 
ela. ”O que foi que te envenenou?”, pergunta. Ele responde com um sorriso: ”Talvez andeis a pôr alguma 
coisa na minha sopa.” Quando ela lhe pede uma explicação para esta brincadeira extraordinária, ele 
replica, com um sorriso ainda mais dúbio: ”Pôr coisas na sopa é um velho truque das madrastas.” Pouco 
depois disto, Augusto recebe uma queixa do general de Póstumo, pelo facto dele não se misturar com os 
outros jovens oficiais e passar todo o tempo livre no mar a pescar. Isso fez­lhe ganhar a alcunha de 
Neptuno.
Os meus deveres como sacerdote de Marte não eram árduos e Pláucio, que era sacerdote no mesmo 
colégio, foi informado de que devia vigiar­me sempre que houvesse alguma cerimónia. Eu começava a 
odiar Pláucio. A observação insultuosa pela qual Póstumo o atirara para a fonte era apenas uma de muitas. 
Tinha­me chamado lémure e dissera que só a lealdade para com Augusto e Lívia o impedia de cuspir 
para cima de mim cada vez que eu lhe fazia perguntas tolas e supérfluas.
125
CAPÍTULO XI
O ano anterior a eu atingir a maioridade e casar, tinha, sido um ano mau para Roma. Houve uma 
série de terramotos no sul de Itália, que destruíram várias cidades. Na primavera, pouca chuva 
caiu e as culturas tinham um ar miserável por todo o país. Depois, pouco antes das colheitas, 
houve chuvas torrenciais que dobraram e estragaram os poucos pés de milho que chegaram a dar 
maçarocas. As chuvadas foram tão violentas que o Tibre levou a ponte e tornou a parte baixa da 
Cidade navegável por barco durante sete dias. A fome era uma ameaça e Augusto enviou 
emissários ao Egipto e a outros lados para comprar grandes quantidades de trigo. Os celeiros 
públicos tinham sido esvaziados por causa de uma má colheita no ano anterior embora não tão 
má como esta. Os enviados conseguiram comprar algum trigo, mas por um preço muito alto e não 
em quantidade suficiente. Houve muita aflição nesse Inverno, tanto mais que Roma estava 
superpovoada a população da Cidade dobrara nos últimos vinte anos; e Óstia, o porto, era de 
navegação insegura durante o Inverno, o que fazia com que os comboios marítimos de grão 
apenas pudessem livrar a sua carga passado semanas. Augusto fez o possível para restringir a 
fome. Temporariamente, baniu de Roma várias famílias, obrigando­as a ir viver para a província, 
nunca a menos de 100 milhas de Roma, apontando uma comissão de supervisão composta por ex­
cônsules. Proibiu também os banquetes públicos, incluindo no dia do aniversário do próprio. 
Muito do grão era importado às suas próprias custas, sendo distribuído sem encargos aos mais 
necessitados. Como de costume, a fome trouxe consigo tumultos que, por sua vez, trouxeram 
consigo incêndios: ruas inteiras de lojas eram incendiadas à noite por magotes meio­esfomeados, 
provenientes dos bairros operários. Augusto organizou uma brigada de vigilantes nocturnos, 
composta por sete divisões, no sentido de evitar este tipo de ocorrências. Essa brigada provou ser 
tão útil, que nunca seria extinta. Mas foram enormes os danos provocados pelos tumultuosos. Por 
esta altura, foi criado um novo imposto, no sentido de reunir dinheiro para as guerras 
Germânicas; deste modo, com a fome, os
127
incêndios e os impostos, os cidadãos comuns começaram a impacientar­se e a discutir 
abertamente a necessidade de uma revolução. Vários manifestos eram pregados à noite na porta 
de edifícios públicos. Dizia­se que estava em curso uma grande conspiração. O senado ofereceu 
uma recompensa por informações que levassem à captura dos cabecilhas, e foram muitos os que a 
tentaram merecer, dando informações contra os seus vizinhos; mas isto apenas serviu para 
aumentar a confusão. Ao que parece, não existia nenhuma conspiração; apenas se falava com 
esperanças de que houvesse uma. Por fim, o trigo começou a vir do Egipto, onde a colheita se faz 
muito mais cedo do que aqui, e a tensão abrandou.
Entre as pessoas afastadas de Roma durante a fome, estavam os gladiadores. Não eram 
numerosos, mas Augusto pensou que, se houvesse distúrbios civis, o mais provável seria que eles 
assumissem um papel perigoso. Formavam um bando de desesperados, pois alguns eram homens 
de posição que tinham sido vendidos como escravos por causa de dívidas a compradores que 
tinham concordado em os deixar ganhar o preço da sua liberdade lutando enquanto gladiadores. 
Se um jovem cavalheiro contraía dívidas, como algumas vezes acontecia, sem que fosse por sua 
culpa ou por actos impensados da juventude, os parentes distantes salvavam­no da escravatura; 
ou então, era o próprio Augusto a intervir. Por isso, esses cavalheiros lutadores eram homens que 
ninguém considerara que valessem ser salvos do seu destino e que, tornando­se os chefes naturais 
da Guilda do Gladiadores, tinham o perfil indicado para chefiar uma rebelião armada.
Quando as coisas melhoraram foram chamados de volta e foi decidido pôr toda a gente de bom 
humor, exibindo uma grande luta pública de gladiadores e uma caçada aos animais selvagens nos 
nomes de Germano e no meu próprio, em memória do nosso pai. Lívia desejava fazer recordar a 
Roma os seus grandes feitos, com a intenção de chamar as atenções para Germano, que se parecia 
tanto com ele e que, em breve, esperava­se, seria enviado para a Germânia para ajudar seu tio 
Tibério, outro soldado famoso, a ganhar ali novas vitórias. A minha mãe e Lívia contribuíram 
para as despesas do espectáculo, mas o fardo maior recaiu sobre mim e Germano. No entanto, 
considerou­se que Germano, na sua posição, precisava de mais dinheiro do que eu; por isso, 
minha mãe explicou­me que seria normal eu contribuir com o dobro do que ele contribuía. Fiquei 
muito contente em fazer tudo o que podia por Germano. Mas quando descobri, depois de tudo 
terminar, aquilo que se tinha gasto, fiquei estupefacto; o espectáculo foi planeado sem olhar a 
custos e, além das despesas habituais da luta de gladiadores e da caçada aos animais selvagens, 
lançámos chuvas de moedas de prata à populaça.
Na procissão até ao anfiteatro, Germano e eu viajámos, por decreto do Senado, no velho carro de 
guerra do nosso pai. Acabávamos de oferecer
128
um sacrifício em sua memória, no grande túmulo que Augusto construíra para si próprio quando 
viesse a morrere onde tinha enterrado as cinzas do nosso pai, juntamente com as de Marcelo. 
Descemos a Via Ápia e passámos por baixo do arco dedicado ao nosso pai, sobre o qual se via a 
colossal figura equestre que o representava e que fora decorada com ramos de loureiro em honra 
da ocasião. Soprava um vento nordeste e os médicos não me permitiam que saísse sem uma capa; 
por isso, com uma só excepção, eu era a única pessoa presente na luta de gladiadores (onde, 
enquanto co­Presidente, me sentei ao lado de Germano) que usava capa. A excepção era o 
próprio Augusto, que se sentava do outro lado de Germano. Ele era muito sensível ao calor e ao 
frio extremos e, no Inverno, usava nada menos que quatro casacos, além duma túnica muito 
espessa e de um casaco comprido. Alguns dos presentes viram um augúrio nesta semelhança 
entre as minhas roupas e as de Augusto, comentando ainda que eu nascera no primeiro dia do 
mês que tinha o nome dele e também na cidade de Lião, no mesmo dia em que ele dedicara ali 
um altar a si próprio. De qualquer forma, foi isso que eles disseram que tinham dito, muitos anos 
depois. Lívia também estava no camarote uma honra especial que lhe era conferida como mãe de 
meu pai. Normalmente, sentava­se com as Virgens Vestais. A regra era que as mulheres e os 
homens se sentassem separadamente.
Foi a primeira luta de gladiadores a que me foi permitido assistir e, por essa razão, era ainda mais 
embaraçoso para mim encontrar­me no Camarote do Presidente. Germano fez todo o trabalho, 
embora fingisse consultar­me quando era preciso tomar alguma decisão, e levou a tarefa por 
diante com muita segurança e dignidade. Por sorte minha, esta luta foi a melhor que alguma vez 
se exibiu no anfiteatro. No entanto, sendo a primeira para mim, não consegui apreciar a sua 
excelência, por não ter outras demonstrações prévias às quais recorrer para fins comparativos. 
Mas certamente que nunca vi outra melhor depois e devo ter visto cerca de um milhar de lutas 
importantes. Lívia queria que Germano ganhasse popularidade como filho de seu pai e não se 
poupara a despesas para contratar os melhores lutadores de Roma para darem tudo por tudo. 
Habitualmente, os gladiadores profissionais eram muito cuidadosos em não se magoarem a si 
próprios nem aos outros e gastavam a maior parte das sua energia em ataques simulados, paradas 
e arremetidas que pareciam e soavam homéricas mas que, na realidade, eram perfeitamente 
inofensivas, como os golpes que os escravos davam uns aos outros com os cacetes de palco em 
espectáculos de baixa comédia. Só ocasionalmente, quando se enraiveciam uns com os outros ou 
se tinham algumas velhas contas a ajustar, é que valia a pena observá­los. Desta vez, Lívia tinha 
reunido os chefes da Guilda dos Gladiadores e disse­lhes que queria ser compensada pelo 
dinheiro que gastara. A menos que cada luta fosse real,
129
ela faria dissolver a guilda: tinha havido demasiadas lutas combinadas no Verão anterior. Assim, 
os lutadores foram prevenidos pelos mestres da guilda que, desta vez, não poderia haver moleza, 
ou seriam despedidos.
Nos primeiros seis combates um homem foi morto, outro tão gravemente ferido que morreu nesse 
mesmo dia e um terceiro ficou com o braço que envergava o escudo decepado pelo ombro, o que 
causou trovoadas de riso. Em cada um dos outros três combates, um dos homens foi desarmado 
pelo seu contendor, mas não antes de ter dado tão boa conta de si próprio que Germano e eu, 
quando chamados a pronunciar­nos, pudemos confirmar a aprovação da assistência, erguendo os 
polegares em sinal de que a sua vida devia ser poupada. Um dos vencedores tinha sido um 
cavaleiro rico, um ou dois anos antes. Em todos estes combates, a regra era que os antagonistas 
não deviam lutar com o mesmo tipo de arma. Era espada contra lança, ou espada contra machado, 
ou lança contra clava. O sétimo combate foi entre um homem armado com uma espada normal do 
exército e um escudo redondo antigo com tiras de latão e um homem armado com uma lança de 
apanhar trutas, com três pontas, e uma rede curta. O homem da espada, ou perseguidor, era um 
soldado da Guarda que tinha sido recentemente condenado à morte por se ter embriagado e batido 
no seu capitão. A pena tinha sido convertida numa luta contra aquele homem de rede e tridente 
um profissional da Tessália, muitíssimo bem pago, que tinha morto mais de vinte opositores nos 
cinco anos anteriores, segundo me contou Germano.
As minhas simpatias estavam com o soldado, que entrou na arena muito pálido e a tremer tinha 
passado vários dias na prisão e a luz forte incomodava­o. Mas toda a sua companhia, que ao que 
parece simpatizava muito com ele, porque o capitão era um tirano e um animal, gritou­lhe em 
uníssono que ganhasse coragem e defendesse a honra da companhia. Ele endireitou­se e gritou: 
”Farei tudo o que puder, rapazes!” Acontecia que a alcunha dele no acampamento era Barata e 
isso bastava para pôr a maior parte da assistência do lado dele, embora os Guardas não fossem 
muito populares na Cidade. Se uma barata conseguisse matar um pescador, seria uma boa piada. 
Ter o anfiteatro do seu lado é meia batalha ganha, para um homem que luta pela própria vida. O 
tessaliano, um indivíduo magro, de pernas e braços compridos, aproximou­se em passo balançado 
por trás dele, vestindo apenas uma túnica e um boné de couro, redondo e duro. Estava de bom 
humor, trocando piadas com a bancada da frente, pois o seu adversário era um amador e Lívia 
pagava­lhe 1.000 moedas de ouro pela tarde e mais 500 se ele matasse o homem depois de uma 
boa luta. Apresentaram­se juntos diante do Camarote e saudaram primeiro Augusto e Lívia e 
depois Germano e eu próprio, como presidentes conjuntos, usando a fórmula habitual: 
”Saudações, senhores.
130
Nós vos saudamos na sombra da Morte!” Nós retribuímos a saudação com um gesto formal, mas 
Germano disse para Augusto:
Mas, senhor, aquele perseguidor é um dos veteranos de meu pai. Conheço­o bem. Usou uma 
coroa na Alemanha por ter sido o primeiro a saltar uma paliçada inimiga.
Augusto ficou interessado.
Óptimo, disse isso quer dizer que esta será uma boa luta. Mas, nesse caso, o homem da rede deve 
ser dez anos mais novo e os anos contam neste jogo.
Nesta altura, Germano fez sinal para que soassem as trombetas e a luta começou.
O Barata manteve­se firme, enquanto o tessaliano dançava em volta dele. O Barata não era tão 
tolo que fosse desperdiçar as forças correndo em volta do adversário com as suas armas leves ou 
então deixar­se ficar paralisado. O tessaliano tentou fazê­lo perder a calma escarnecendo dele, 
mas o Barata não se deixou levar. Apenas uma vez, quando o tessaliano chegou à distância de 
uma estocada, é que ele mostrou disposição para tomar a ofensiva e a rapidez do seu golpe 
arrancou um brado de satisfação das bancadas. Mas o tessaliano afastou­se a tempo. Em breve, a 
luta tornou­se mais animada; o tessaliano desferia golpes, altos e baixos, com o tridente 
comprido, que o Barata aparava facilmente, mas com um olho na rede, carregada com pequenas 
bolas de chumbo, que o tessaliano manobrava com a mão esquerda.
Belo trabalho! ouvi Lívia dizer para Augusto. O homem que melhor maneja a rede em Roma. Ele 
está a brincar com o soldado. Reparaste? Podia tê­lo enredado e desferido então o seu golpe, se 
quisesse. Mas está a fazer durar a luta.
Sim, disse Augusto. Receio que o soldado esteja arrumado. Devia ter­se mantido longe da bebida.
Augusto mal acabara de falar, quando o Barata deu uma pancada no tridente e saltou em direcção 
ao adversário, rasgando a túnica de couro do tessaliano entre o braço e o corpo. Este afastou­se 
como um relâmpago e, ao mesmo tempo que corria, fez girar a rede de encontro ao rosto do 
Barata. Por má sorte deste, uma bola de chumbo bateu­lhe no olho, cegando­o 
momentaneamente. Ele vacilou e o tessaliano, vendo que estava em vantagem, voltou­se e fez 
saltar­lhe a espada da mão. De um salto, o Barata tentou recuperá­la, mas o tessaliano chegou lá 
primeiro, correu com ela para a barreira e atirou­a para o outro lado, para um rico patrono que 
estava sentado na primeira fila, reservada aos Cavaleiros. Depois, voltou para a tarefa agradável 
de espicaçar e arrumar um homem desarmado. A rede assobiava em volta da cabeça do Barata e o 
tridente picava aqui e além; mas o Barata ainda não desanimara e, num gesto
131
rápido, quase agarrou o tridente. O tessaliano tinha­o empurrado em direcção ao nosso Camarote 
para fazer uma morte espectacular.
Basta! disse Lívia, num tom casual Já chega desta brincadeira. É tempo de acabar com ele.O 
tessaliano não precisava que o encorajassem. Ao mesmo tempo que fazia girar a rede em volta da 
cabeça do Barata, arremeteu com o tridente de encontro à barriga. E então, que brado subiu no ar! 
O Barata tinha agarrado a rede com a mão direita e, atirando o corpo para trás, deu um pontapé 
com toda a força no cabo do tridente, a uns cinquenta centímetros da mão do seu inimigo. A arma 
voou para cima, passou sobre a cabeça do tessaliano, deu uma volta no ar e foi enterrar­se, 
vibrante, na barreira de madeira. O tessaliano deteve­se um momento, surpreso; depois, deixou a 
rede nas mãos do Barata e lançou­se em corrida para ir buscar o tridente. O Barata deu um salto 
em frente e para o lado e embateu­lhe nas costelas, em plena corrida, com os espigões que lhe 
revestiam o escudo. O tessaliano caiu de gatas, arquejante. O Barata recompôs­se rapidamente e, 
com um golpe brusco do escudo, de cima para baixo, apanhou­o pela parte de trás do pescoço.
O golpe­do­coelho! disse Augusto. Nunca o tinha visto aplicado numa arena. E vós, querida 
Lívia? Einh? Deve tê­lo morto, aposto.
O tessaliano estava morto. Eu esperava que Lívia ficasse muito aborrecida, mas a única coisa que 
disse foi:
Bem feito para ele. É o que acontece quando se subestima o adversário. Estou decepcionada com 
esse lutador da rede. Mesmo assim, poupou­me quinhentas moedas de ouro; portanto, acho que 
não me posso queixar.
Para coroar o divertimento daquela tarde, houve uma luta entre dois reféns germanos que calhou 
pertencerem a dois clãs rivais e que se tinham envolvido voluntariamente num duelo de morte. 
Não foi uma luta bonita, mas sim um ataque selvagem com espada comprida e alabarda; cada um 
deles usava um pequeno escudo profusamente ornamentado, preso com correias ao antebraço 
esquerdo. Era uma maneira invulgar de lutar, porque o soldado germano normal faz todo o seu 
trabalho com a azagaia de cabo fino e cabeça estreita: a alabarda de cabeça larga e a espada 
comprida são marcas de uma posição elevada. Um dos combatentes, um homem de cabelos 
louros com mais de um metro e oitenta, não tardou a arrumar o outro, fazendo­lhe cortes terríveis 
antes de desferir um último golpe esmagador na parte lateral do pescoço. A multidão fez ouvir 
um aplauso sonoro que lhe subiu à cabeça, pois começou a fazer um discurso numa mistura de 
germano e latim de acampamento militar, dizendo que era um guerreiro famoso no seu país e 
tinha morto seis romanos em batalha, incluindo um oficial, antes de ter sido entregue como refém 
por um tio invejoso, o chefe tribal. Agora, desafiava qualquer romano de posição para se 
defrontar com ele, espada contra espada, e proporcionar­lhe a sorte de matar o sétimo.
132
O primeiro campeão que saltou para o ringue foi um jovem oficial do estado­maior de uma 
família antiga mas arruinada, chamado Cássio Chaerea. Aproximou­se do Camarote a correr, 
pedindo permissão para aceitar o desafio. O pai, disse ele, tinha sido morto na Germânia sob 
aquele glorioso general, em cuja memória estava a ser feita aquela demonstração: ser­lhe­ia 
permitido sacrificar aquele gabarola ao espírito do seu pai? Cássio era melhor espadachim. Eu 
tinha­o visto muitas vezes nos Campos de Marte. Germano aconselhou­se com Augusto e depois 
comigo; quando Augusto deu o seu consentimento e eu murmurei o meu, Cássio recebeu ordens 
para se armar. Foi aos vestiários e pediu emprestados a espada, o escudo e a armadura do Barata, 
para lhe darem sorte e em homenagem a este.
Não tardou a que começasse uma luta bem mais grandiosa do que qualquer das que tinham sido 
mostradas pelos outros lutadores, com o germano a fazer rodar a grande espada e Cássio a aparar 
com o escudo e a tentar sempre penetrar na guarda do adversário mas este era tão ágil como era 
forte, e por duas vezes obrigou Cássio a ajoelhar. A multidão guardava no mais perfeito silêncio, 
como se estivessem a observar uma cerimónia religiosa; não se ouvia outra coisa além do 
entrechocar do aço contra aço e do matraquear dos escudos. Augusto disse:
Receio que o germano seja forte demais para ele. Não devíamos ter permitido isto. Se Cássio for 
morto, gerar­se­á uma má impressão na fronteira, quando lá chegar a notícia.
Depois, o pé de Cássio escorregou numa poça de sangue e ele caiu de costas. O germano pôs­se 
sobre ele com uma perna de cada lado e um sorriso triunfante no rosto e nessa altura... nessa 
altura houve um rugido nos meus ouvidos e um negrume diante dos meus olhos e eu desmaiei. A 
emoção de ver homens serem mortos pela primeira vez na minha vida, o combate entre o Barata e 
o tessaliano, no qual todas as minhas simpatias iam para o Barata, e agora esta luta, em que 
parecia ser eu próprio a lutar desesperadamente pela vida com o germano tudo isso foi demais 
para mim. Por isso, não presenciei a maravilhosa recuperação de Cássio, quando o germano 
ergueu aquela espada horrível para lhe esmagar o crânio, o impulso repentino de baixo para cima 
atirando a orla do escudo às virilhas do germano, o rolar para o lado e o golpe rápido e decisivo 
por baixo da axila. Sim, Cássio matou o seu homem. Não esqueçais este Cássio, pois duas vezes, 
três vezes, desempenha um papel importante nesta história. Quanto a mim, durante algum tempo, 
ninguém reparou que eu tinha desmaiado e, quando repararam, já estava a voltar a mim. 
Puseram­me de novo direito no meu lugar até o espectáculo terminar formalmente. Eu ser levado 
em braços para fora teria sido uma vergonha para todos.
No dia seguinte os Jogos continuaram, mas eu não estive presente. Foi anunciado que me encontrava 
doente. Perdi um dos combates mais
133
espectaculares a que jamais se assistiu no anfiteatro, entre um elefante indiano muito maior do 
que a espécie africana e um rinoceronte. Os conhecedores apostaram no rinoceronte, pois embora 
fosse de longe o animal mais pequeno, a sua pele era muito mais espessa que a do elefante e era 
esperado que desse cabo do elefante com aquele seu longo corno afiado. Em África, diziam, os 
elefantes tinham aprendido a evitar as paragens onde havia rinocerontes, que detêm um domínio 
incontestado no seu próprio território. Este elefante indiano, no entanto, tal como Póstumo me 
descreveu posteriormente, não mostrou qualquer ansiedade ou medo quando o rinoceronte entrou 
à carga na arena, recebendo­o todas as vezes com as suas presas e avançando pesadamente atrás 
dele com uma velocidade desajeitada quando se retirava confuso. Mas achando­se incapaz de 
penetrar a espessa armadura do pescoço do animal quando atacava, esta criatura fantástica 
recorreu à astúcia. Apanhou com a tromba uma vassoura grosseira, feita de espinheiro, que um 
varredor tinha deixado sobre a areia e enfiou­a na cara do inimigo quando ele voltou a atacar: 
conseguiu cegar­lhe primeiro um dos olhos e depois o outro. O rinoceronte, tomado pela fúria e 
pela dor, precipitou­se para um lado e para o outro, perseguindo o elefante, e acabou por se enfiar 
em cheio de encontro à barreira de madeira, atravessando­a e esmigalhando o corno, indo 
atordoar­se depois na barreira de mármore, do outro lado. Então surgiu o elefante, com a boca 
aberta como se estivesse a rir­se e, alargando primeiro a brecha na madeira, começou a pisar o 
crânio do inimigo caído, que esmagou. Depois pôs­se a abanar a cabeça, como que a seguir um 
ritmo musical, e não tardou a afastar­se tranquilamente. O seu condutor indiano apareceu a correr 
com uma enorme taça cheia de doces, que o elefante despejou para a boca enquanto a assistência 
rugia o seu aplauso. Depois, o animal ajudou o guarda a subir­lhe para o pescoço, oferecendo­lhe 
a tromba como escadote e aproximou­se de Augusto: aí, fez ouvir a saudação real que estes 
elefantes são ensinados a dirigir apenas a monarcas e ajoelhou em homenagem. Mas como, já 
disse, perdi esta actuação.
Nessa noite, Lívia escreveu a Augusto:
Meu querido Augusto,
O comportamento nada viril de Cláudio no dia de ontem, desmaiando perante a visão de dois homens em 
luta, para não falar nos estremecimentos grotescos das mãos e da cabeça, que num festival solene em 
comemoração das vitórias do pai foram ainda mais vergonhosos e infelizes, teve pelo menos uma 
vantagem, a de podermos finalmente decidir de uma vez por todas que, excepto na dignidade de sacerdote 
uma vez que as vagas dos colégios têm que ser preenchidas de alguma forma e Pláucio conseguiu treiná­lo 
o suficiente nos seus deveres, Cláudio está
134
perfeitamente incapaz de aparecer em público. Temos que nos contentar em pô­lo de lado como uma 
oportunidade perdida, excepto talvez para procriação, pois ouvi dizer que ele cumpriu a sua obrigação 
com Urgulanila mas não posso ter a certeza disso enquanto não vir a criança, que pode muito bem ser um 
monstro como ele.
Antónia surripiou hoje do estúdio dele aquilo que parece ser um livro de notas de material histórico, que 
ele tem estado a reunir para uma biografia do pai; com ele, encontrou ainda uma introdução 
laboriosamente composta para o trabalho projectado, que junto vos envio. Notareis que Cláudio escolheu 
para objecto de louvor a conhecida falha intelectual do seu querido pai aquela cegueira obstinada perante a 
marcha do tempo, a ilusão política de que as formas políticas que convinham a Roma quando não passava 
de uma pequena cidade em guerra com as pequenas cidades vizinhas podiam ser restabelecidas depois de 
Roma se ter tornado o maior reino conhecido desde os tempos de Alexandre. Veja­se o que aconteceu 
quando Alexandre morreu e não foi possível encontrar ninguém que fosse suficientemente forte para lhe 
suceder como supremo monarca bom, o Império pura e simplesmente desmembrou­se. Mas não quero 
desperdiçar o meu tempo e o vosso com trivialidades políticas.
Atenodoro e Sulpício, com quem acabo de conferenciar, dizem que não tinham visto esta introdução até 
que eu lha mostrei e concordam que não é nada recomendável. Juram que nunca puseram quaisquer ideias 
subversivas na cabeça dele e sugerem que as deve ter colhido em livros antigos. Pessoalmente, acho que 
as herdou o avô tinha a mesma curiosa enfermidade, como estais lembrado e é mesmo típico de Cláudio 
ter escolhido essa fraqueza como herança e ter recusado qualquer legado de saúde física ou moral! Graças 
a Deus por Tibério e Germano! Esses não defendem tolices republicanas, tanto quanto sei.
Naturalmente estou a dar instruções a Cláudio no sentido de o fazer desistir das suas tarefas biográficas, 
dizendo que, se ele envergonha a memória do pai ao desmaiar durante os Jogos solenes feitos em sua 
honra, é evidente que não está preparado para escrever a vida dele: será bom que arranje outra ocupação 
para a pena.
Lívia
Desde que Fólio me contara acerca do envenenamento do meu pai e do meu avô, que eu me 
sentia fortemente perplexo. Não conseguia chegar a uma conclusão se o velho estaria a dizer 
disparates devido à senilidade ou a alguma brincadeira, ou se ele sabia realmente alguma coisa. 
Quem, a não ser o próprio Augusto, estaria suficientemente interessado na monarquia para ter 
envenenado um nobre apenas porque acreditava num governo republicano? No entanto, eu não 
podia acreditar que Augusto fosse um assassino: o veneno era um modo mesquinho de matar, o 
modo
135
de um escravo, e Augusto nunca teria descido a isso. Além disso, ele não era nenhum hipócrita e, quando 
falava do meu pai, era sempre com admiração e afecto. Consultei duas ou três histórias recentes, mas elas 
não me disseram nada que eu não tivesse já ouvido a Germano sobre as circunstâncias da morte do meu 
pai.
Foi apenas uns dois dias antes dos jogos que calhou estar a conversar com o nosso porteiro, que tinha sido 
ordenança de meu pai ao longo das suas campanhas. O honesto homem tinha andado a beber um pouco 
demais, porque o nome do meu pai andava nos lábios de todos nessa altura e os seus veteranos tinham 
vindo receber o reflexo da sua glória.
­ Conta­me o que sabes da morte de meu pai, ­ disse­lhe abertamente, ­ Corriam algumas histórias no 
acampamento que a morte dele tivesse sido causada por outros meios que não um acidente?
Ele replicou:
­ Eu não o diria a ninguém, senhor, a não ser a vós, mas eu posso confiar em vós, senhor. Sois filho do 
vosso pai e eu nunca conheci nenhum homem que não confiasse nele. Sim, senhor, corria um rumor e 
havia mais alguma coisa por trás dele do que na maior parte dos rumores de acampamento. Vosso 
corajoso e nobre pai, senhor, foi envenenado, estou convencido disso. Uma certa pessoa, cujo nome não 
vou mencionar, porque já o sabeis mesmo sem que eu o diga, sentia inveja das vitórias de vosso pai e 
envíou­lhe uma ordem para que regressasse. Isso não é nenhuma historieta, nem um boato, mas sim 
história. A ordem veio quando vosso pai tinha partido uma perna; nada de grave e estava a correr tudo 
bem, até que um tal doutor chegou de Roma, ao mesmo tempo que a mensagem, com o seu saquinho de 
venenos na mão. Quem enviou esse médico? A mesma pessoa que enviou a mensagem. Dois e dois são 
quatro, não é verdade, senhor? Nós, os ordenanças, queríamos matar o tal doutor, mas ele regressou a 
Roma são e salvo com uma escolta especial.
Quando li o bilhete de minha avó Lívia dizendo­me que desistisse de escrever a vida de meu pai, a minha 
perplexidade aumentou. Pólio não podia ter tido a intenção de apontar a minha avó como a assassina do 
antigo marido e do filho? Era impensável. E qual seria o motivo dela? No entanto, quando considerava a 
questão, era­me mais fácil acreditar que tivesse sido Lívia do que Augusto.
Nesse Verão, Tibério precisava de homens para a guerra na Germânia do Leste e foram chamados recrutas 
da Dalmácia, uma província que ultimamente tinha estado muito tranquila e dócil. Mas quando o 
contingente se reuniu, calhou o cobrador de impostos andar a fazer a sua visita anual àquelas regiões e 
exigir à província nada mais que a soma fixada por Augusto, mas que era mais do que eles podiam 
facilmente pagar. Houve sonoros protestos de miséria. O cobrador de impostos exerceu o seu direito de se 
apoderar das crianças bonitas da aldeia e levá­las para
136
serem vendidas como escravas. Os pais de algumas das crianças assim apanhadas eram membros do 
contingente e, naturalmente, fizeram grande clamor. Toda a força se revoltou. Uma tribo bósnia sublevou­
se por simpatia e, em breve, todas as nossas províncias da fronteira entre a Macedónia e os Alpes estavam 
em fogo. Felizmente, Tibério conseguiu fazer a paz com os germanos ­ a instâncias deles, não suas ­ e 
marchar contra os rebeldes. Os dálmatas recusaram enfrentá­lo numa luta declarada e dividiram­se em 
pequenas colunas, levando a cabo uma hábil luta de guerrilha. Tinham armas leves e conheciam bem o 
país e, quando chegou o Inverno, ousaram mesmo fazer incursões na Macedónia.
Augusto, em Roma, não podia compreender as dificuldades que Tibério tinha que enfrentar e suspeitava 
que ele atrasasse deliberadamente as operações por razões secretas e privadas, que lhe escapavam 
inteiramente. Decidiu enviar Germano com um exército seu, para incitar Tibério à acção.
Germano, que ia agora nos vinte e três anos, acabava de assumir, cinco anos antes da idade habitual, a sua 
primeira magistratura na Cidade. A sua missão militar causou surpresa: todos esperavam que fosse 
Póstumo o escolhido. Póstumo não tinha cargos de magistratura, mas estava ocupado nos Campos de 
Marte a treinar os recrutas para este novo exército: ele tinha agora o posto de comandante dos regimentos. 
Era três anos mais novo que Germano, mas o seu irmão Caio tinha sido enviado para governar a Ásia com 
a idade de dezanove anos e tinha­se tornado Cônsul no ano seguinte. Póstumo não era de forma alguma 
menos capaz que Caio, isso era ponto assente, e, afinal de contas, era o único neto vivo de Augusto.
Os meus próprios sentimentos ao ouvir a notícia, que ainda não fora tornada pública, ficaram divididos 
entre a alegria por causa de Germano e a tristeza por causa de Póstumo. Fui procurar Póstumo e cheguei 
aos seus aposentos no Palácio ao mesmo tempo que Germano. Póstumo saudou­nos a ambos 
afectuosamente e felicitou Germano pelo seu posto de comando.
Germano disse:
­ Foi por causa disto que vim, caro Póstumo. Sabes muito bem que me sinto orgulhoso e satisfeito por ter 
sido escolhido, mas a reputação militar não representa nada para mim, se com isso te fizer mal. És um 
soldado tão capaz como eu e, como herdeiro de Augusto, devias evidentemente ter sido escolhido. Com o 
teu consentimento, proponho ir procurá­lo agora e oferecer­me para abdicar a teu favor. Far­lhe­ei notar a 
má interpretação que a Cidade não deixará de fazer da sua preferência pela minha pessoa em relação a ti. 
Ainda não é tarde para fazer a alteração. Póstumo respondeu:
­ Caro Germano, és muito generoso e nobre e, por essa razão, vou falar francamente. Tens razão quando 
dizes que a Cidade tratará isto como menosprezo pela minha pessoa. O facto dos teus deveres como
137
magistrado estarem a ser interrompidos pela nomeação, enquanto eu estou perfeitamente livre para partir, 
agrava a questão. Mas, acredita­me, a decepção que sinto é amplamente recompensada por mais esta 
prova que me deste da tua amizade; e desejo­te rápido restabelecimento e todos os êxitos possíveis.
Depois disse:
­ Se me desculpardes ambos por expressar uma opinião, acho que Augusto analisou o caso com mais 
cuidado do que aquele que lhe atribuis. A julgar pelo que ouvi a minha mãe esta manhã, presumo que ele 
desconfia que Tibério esteja propositadamente a prolongar a guerra. Se ele enviasse Póstumo com as 
novas forças, depois dessa velha história do desentendimento entre meu tio e os irmãos de Póstumo, o meu 
tio poderia ficar desconfiado e ofendido. Póstumo aparecer­lhe­ia como um espião e um rival. Mas 
Germano é seu filho adoptivo e pareceria ter sido enviado meramente como reforço. Parece­me que não há 
mais nada a dizer, a não ser que Póstumo terá a sua oportunidade noutro lugar, sem dúvida, e que isso não 
tardará.
Ficaram ambos muito satisfeitos com esta nova visão do caso, que fazia crédito a ambos e todos nos 
separámos na mais amigável das disposições.
Nessa mesma noite, ou antes, às primeiras horas da manhã seguinte, eu estava a trabalhar tarde no meu 
quarto no andar superior da nossa casa, quando ouvi gritos distantes e, daí a pouco, ruídos abafados na 
varanda. Fui à porta e vi aparecer uma cabeça na parte superior da varanda e depois um braço. Era um 
homem em trajo militar, que atirou uma perna por cima da varanda, impelindo o corpo para cima. Fiquei 
paralisado por um momento e o primeiro pensamento desvairado que me ocorreu foi: ”É um assassino 
enviado por Lívia.” Preparava­me para gritar por socorro quando ele disse em voz baixa:
­ Shh! Está tudo bem! Sou Póstumo.”
­ Oh, Póstumo! Que susto me pregaste. Porque entras assim a esta hora da noite como um assaltante? E o 
que é que tens? O teu rosto está a sangrar e tens o casaco rasgado.
­ Vim despedir­me, Cláudio.
­Não entendo. Augusto mudou de ideias? julgava que a nomeação já tinha sido tornada pública.
­ Dá­me de beber, estou com sede. Não, não vou para as guerras. Longe disso. Mandaram­me ir pescar.
­ Não fales em enigmas. Aqui está o vinho. Bebe depressa e diz­me qual é o problema. Onde vais pescar?
­ Ah, para qualquer pequena ilha. Não creio que já tenham escolhido.
­ Queres dizer...? ­ O meu coração bateu mais forte e senti a cabeça andar à roda.
138
­ Sim, estou a ser exilado, como a minha pobre mãe.
­ Mas porquê? Que crime cometeste?
­ Nenhum crime que possa ser oficialmente referido ao Senado. Calculo que a frase seja depravação 
incurável e persistente. Lembras­te daquele Debate de Almofada?
­ Oh Póstumo! A minha avó...?
­ Ouve com atenção, Cláudio, porque o tempo urge. Estou sob prisão apertada, mas agora mesmo 
consegui derrubar dois dos meus acompanhantes e fugir. A guarda do Palácio foi chamada e todos os 
possíveis meios de fuga estão bloqueados. Eles sabem que estou algures nestes edifícios e vão revistar 
cada quarto. Senti que precisava falar­te, porque quero que saibas a verdade e não acredites nas acusações 
que eles inventaram a meu respeito. E quero que contes tudo a Germano. Envia­lhe as minhas mais 
carinhosas saudações e conta­lhe tudo, exactamente como to estou a dizer agora. Não me interessa o que 
os outros pensam de mim, mas quero que Germano e tu saibam a verdade e pensem bem de mim.
­ Não esquecerei uma palavra, Póstumo. Depressa, conta­me tudo desde o princípio.
­ Bom, tu sabes que, ultimamente, não tenho estado nas boas graças de Augusto. A princípio não entendia 
porquê, mas em breve se tornou evidente que Lívia lhe estava a envenenar o espírito contra mim. Augusto 
é extraordinariamente fraco em relação a ela. Imagina viver com ela há quase cinquenta anos e continuar a 
acreditar em cada palavra que diz! Mas Lívia não foi a única nesta conspiração. Livila esteve envolvida 
também.
­ Livila! Oh, lamento muito!
­ Sim. Sabes como eu a amava e quanto sofri por causa dela. Uma vez referiste, há cerca de um ano, que 
Livila não merecia que me preocupasse com ela e lembras­te de como fiquei zangado contigo. Não te falei 
durante vários dias. Lamento agora ter­me zangado, Cláudio. Mas tu sabes como é quando alguém está 
desesperadamente apaixonado por uma pessoa. Não te expliquei nessa altura que, pouco antes de se casar 
com Castor, ela me disse que Lívia lhe impusera esse casamento e que, na realidade, ela só me amava a 
mim. Acreditei nela. Porque não havia de ter acreditado? Tinha esperança que algum dia alguma coisa 
acontecesse a Castor e ela e eu pudéssemos ficar livres para nos casarmos. Desde então, essa ideia tem­me 
acompanhado noite e dia. Hoje à tarde, logo após ter falado contigo, estava sentado com ela e Castor 
debaixo da latada junto do grande lago das carpas. Ele começou a zombar de mim. Compreendo agora que 
tudo tinha sido cuidadosamente ensaiado de antemão entre eles. A primeira coisa que ele disse foi: ”Então, 
preferiram Germano a ti, einh?” Eu disse­lhe que considerava a nomeação sensata e que acabava de 
felicitar Germano. Então, ele acrescentou num tom irónico: ”Quer dizer que
139
a nomeação foi aprovada por ti como príncipe? A propósito, ainda esperas suceder ao teu avô como 
Imperador?” Mantive a calma em atenção a Livila, mas disse que não me parecia decente discutir a 
sucessão enquanto Augusto estava ainda em vida e de posse de todas as suas faculdades. Depois, 
perguntei­lhe ironicamente se estava a oferecer­se como candidato rival. Ele retorquiu, com um sorriso 
desagradável: ”Bom, se o fizesse, acho que teria mais possibilidades de sucesso do que tu, Geralmente, 
consigo o que quero. Uso a cabeça. Conquistei Livila usando a cabeça. Sinto vontade de rir quando penso 
na facilidade com que convenci Augusto de que tu não eras o marido indicado para ela, Talvez dessa 
maneira eu consiga também outras coisas que quero. Quem sabe?” Isto deixou­me realmente a ferver. 
Perguntei­lhe se queria dizer que tinha andado a contar mentiras a meu respeito. Ele disse: ”Porque não? 
Eu queria Livila e foi assim que a consegui.” Voltei­me para Lívíla e perguntei­lhe se sabia disto. Ela 
fingiu que estava indignada e disse que não sabia absolutamente nada, mas que acreditava que Castor era 
capaz de qualquer atitude desonesta. Obrigou­se a verter uma ou duas lágrimas e disse que Castor não 
prestava e que ninguém podia imaginar como tinha sofrido com ele e que desejaria estar morta.
­ Sim, esse é um dos velhos truques dela. Chora quando lhe convém. Leva todos à certa. Se eu te tivesse 
contado tudo o que sei dela, talvez me tivesses odiado durante algum tempo, mas ter­te­ia poupado tudo 
isto. E depois, o que aconteceu?
­ Esta noite, ela mandou­me uma mensagem verbal por uma aia, dizendo que Castor estaria provavelmente 
fora toda a noite numa das suas orgias habituais e que, quando eu visse uma luz na janela, pouco depois da 
meia­noite, fosse ter com ela. Uma janela seria deixada aberta mesmo por baixo da luz e eu podia entrar 
tranquilamente. Queria dizer­me uma coisa muito importante. Claro que isso só podia significar uma coisa 
e o meu coração bateu mais forte. Esperei no jardim durante horas, até que vi a luz aparecer por momentos 
na janela dela. Depois, encontrei a janela aberta em baixo e entrei. A criada de Livila estava lá e 
encaminhou­me para o andar de cima. Indicou­me como podia entrar no quarto de Livila, saltando de 
uma janela para outra até alcançar a janela certa; isto para evitar o guarda que estava colocado no 
corredor, junto à porta do quarto. Bom, encontrei Lívíla à minha espera em camisa de noite, com os 
cabelos soltos, de uma beleza infernal. Disse­me como Castor se comportara para com ela de forma cruel. 
Que não lhe devia nada como esposa porque, como ele próprio confessara, se casara com ela por meio de 
fraude e a tratara com a maior brutalidade. Atirou os braços à minha volta, eu peguei­lhe e levei­a até à 
cama. Estava louco de desejo por ela. Depois, repentinamente, ela começou a gritar e a socar­me. Por 
momentos, pensei que tivesse endoidecido e pus­lhe a mão sobre a boca para a acalmar. Ela
140
lutou para se libertar, derrubando uma pequena mesa que tinha em cima um candeeiro e um jarro de 
vidro. Depois, pôs­se a gritar ”Estupro! Estupro!”; a porta foi arrombada e a guarda do Palácio entrou por 
ali dentro com archotes. Adivinhas quem se encontrava à frente deles?
­ Castor?
­ Lívia. Levou­nos, tal como estávamos, à presença de Augusto. Castor estava com ele, embora Livila me 
tivesse dito que tinha ido jantar do outro lado da cidade. Augusto mandou sair a Guarda e Lívia, que até aí 
mal tinha pronunciado uma palavra, começou o seu ataque contra mim. Disse­lhe que, por sugestão dele, 
tinha ido aos meus aposentos para me informar em privado das acusações de Emília e perguntar­me que 
explicação eu podia dar.
­ Emília! Qual Emília?
­ A minha sobrinha.
­ Não sabia que ela tinha alguma coisa contra ti.
­ E não tem. Ela também estava implicada no esquema. Assim, Lívia disse que, não me tendo encontrado 
nos meus aposentos, se tinha informado e lhe disseram que a patrulha me tinha visto sentado no jardim 
debaixo de uma pereira do lado sul. Ela mandou um soldado procurar­me, mas ele voltou e disse que eu 
não estava lá e que tinha uma coisa suspeita a relatar: tinha visto um homem a trepar de uma das varandas 
superiores para outra mesmo por cima do relógio solar. Ela sabia de quem eram aqueles quartos e ficou 
muito alarmada. Por sorte, chegou mesmo a tempo. Tinha ouvido os gritos de Livila a pedir socorro: eu 
introduzira­me no quarto dela através da varanda e estava a tentar violá­la. Os guardas tinham arrombado 
a porta e afastaram­me à força ”da jovem mulher aterrorizada e semi­nua”. Tinha­me levado para lá 
imediatamente, assim como Livila, para servir de testemunha. Enquanto Lívia contava a sua história, 
aquela prostituta da Livila soluçava e escondia a cara. Tinha a camisa de noite rasgada ­ deve tê­la rasgado 
ela mesma de propósito. Augusto chamou­me besta e sátiro e perguntou­me se tinha endoidecido. Claro 
que eu não podia negar que tivesse estado no quarto dela ou mesmo que tivesse feito amor com ela. Disse 
que tinha lá ido por convite e tentei explicar tudo desde o princípio, mas Livila pôs­se a gritar: ”É mentira. 
É mentira. Eu estava a dormir e ele entrou pela janela e tentou violar­me.” Então, Lívia disse: ”E suponho 
que a tua sobrinha Emília te tenha convidado para a violares a ela também? Pareces ser muito popular 
junto das mulheres jovens.” Lívia foi muito esperta. Tive que me justificar em relação a Emília e deixar a 
história de Livila. Disse a Augusto que tinha jantado com minha irmã Julila na noite anterior e que Emília 
estava presente, mas aquela era a primeira vez que eu via a rapariga nos últimos seis meses. Perguntei em 
que ocasião é que poderia tê­la violado e Augusto respondeu que eu sabia muito bem quando ­ depois do 
jantar,
141
durante a ausência temporária dos pais dela, que foram chamados por um alarme de assalto ­, e que só 
tinha sido impedido de o fazer pelo regresso dos pais da jovem. A história era tão ridícula que, embora 
estivesse furioso, não consegui deixar de me rir; mas isso aumentou a fúria de Augusto. Esteve quase a 
levantar­se da cadeira de marfim e a bater­me. Eu interroguei­o:
­ Não entendo. Houve realmente algum alarme de assalto?
­ Sim, e Emília e eu ficámos sozinhos por minutos, mas a conversa foi inofensiva e a governanta dela 
estava presente! Estivemos a discutir árvores de fruto e pestes das plantas até que Julila e Emílio voltaram 
e disseram que tinha sido um falso alarme. Julila e Emílio não recebem ordens de Lívia, podes ter a 
certeza ­ eles odeiam­na ­, portanto, deve ter sido tudo arranjado por Emília. Pus­me a pensar rapidamente 
qual o rancor que poderia ter contra mim, mas não consegui lembrar­me de nada. De repente, ocorreu­me 
a explicação. Julila dissera­me em segredo que Emília estava finalmente a conseguir o que queria: ia 
casar­se com Ápio Silano. Conheces aquele jovem afectado, não conheces?
­ Sim. Mas não estou a perceber.
­ É muito simples. Eu disse para Lívia: ”A recompensa de Emília por esta mentira vai ser o casamento 
com Silano, não vai? E o que é que recebe, Lívia? Prometestes­lhe envenenar o actual marido e arranjar­
lhe um mais atraente?” Logo que pronunciei a palavra envenenar, percebi que estava condenado. Por isso, 
decidi dizer tudo o que podia enquanto tinha essa oportunidade. Perguntei a Lívia como é que tinha 
arranjado o envenenamento de meu pai e irmãos e se preferia os venenos lentos ou os rápidos. Cláudio, 
achas que ela os matou? Eu tenho a certeza que sim.
­ Ousaste perguntar­lhe isso? É muito provável. Eu também acho que ela envenenou o meu pai e o meu 
avô ­ repliquei, ­ e não creio que tenham sido as suas únicas vítimas. Mas não tenho provas.
­ Nem eu, mas gostei de a acusar. Gritei com todas as minhas forças, de forma que metade do Palácio deve 
ter ouvido. Lívia saíu apressada e foi chamar a Guarda. Vi Livila sorrir. Deitei­lhe as mãos ao pescoço, 
mas Castor meteu­se de permeio e ela fugiu. Lutei com Castor, parti­lhe o braço e dois dentes da frente, 
que caíram sobre o chão de mármore. Mas não lutei com os soldados. Teria sido aviltante. Além disso, 
eles estavam armados. Dois deles seguravam cada um dos meus braços, enquanto Augusto me lançava 
insultos e ameaças. Disse que serei exilado para o resto dos meus dias na ilha mais desolada dos seus 
domínios e que apenas a sua filha desnaturada podia ter­lhe dado um neto tão desnaturado. Disse­lhe que, 
de nome, ele era Imperador dos Romanos, mas que, na realidade, era menos livre que qualquer escrava de 
um dono de bordel ébrio e que, um dia, os seus olhos haveriam de se abrir para os crimes e
142
embustes desnaturados da sua abominável esposa. Mas entretanto, disse, o meu amor e lealdade para com 
ele permaneciam inalterados.
O alarido ressoava agora no andar inferior da nossa casa. Póstumo disse:
­ Não quero comprometer­te, meu caro Cláudio. Não devo ser encontrado no teu quarto. Se tivesse uma 
espada usava­a agora. É melhor morrer lutando do que apodrecer numa ilha.
­ Paciência, Póstumo. Cede agora e a tua oportunidade virá mais tarde. Prometo­te que virá. Quando 
Germano souber a verdade, não vai descansar enquanto não estiveres livre de novo e eu também não. Se 
fizeres com que te matem, isso será apenas um triunfo barato para Lívia,
­ Nem tu nem Germano podem explicar todas as provas reunidas contra mim. Só te metias em problemas 
se tentasses.
­A oportunidade há­de chegar, digo­te eu. Lívia tem tido tudo a seu jeito tempo demais e há­de acabar por 
se tornar descuidada. Não pode deixar de ter alguma falha em breve. Não seria humana se isso não 
acontecesse.
­ Não creio que ela seja humana, ­ disse Póstumo.
­ E quando Augusto de repente perceber como tem sido enganado, não achas que vai ser tão impiedoso 
para com ela como foi com a tua mãe?
­ Ela envenena­o primeiro.
­ Germânico e eu velaremos para que não o faça. Preveni­lo­emos. Não desesperes, Póstumo. Tudo estará 
bem no fim. Hei­de escrever­te cartas sempre que puder e enviar­te livros para leres. Não tenho medo de 
Lívia. Se não receberes as minhas cartas, saberás que estão a ser retidas. Olha cuidadosamente para a 
sétima página de qualquer livro cosido que te chegue vindo de mim. Se tiver alguma mensagem particular 
para ti, escrevo­a aí com leite. É um truque usado pelos egípcios. A escrita é invisível, até que a aqueças 
diante do lume. Ouve as portas a bater. Agora tens que ir. Estão ao fundo do próximo corredor.
Ele tinha lágrimas nos olhos. Abraçou­me ternamente sem mais uma palavra e encaminhou­se rápido para 
a varanda. Trepou para o parapeito, acenou com a mão num gesto de despedida e deslizou pela velha 
trepadeira por onde tinha subido. Ouvi­o afastar­se correndo pelo meio do jardim e, um instante depois, 
ouvi gritos e brados da guarda.
Não tenho qualquer memória daquilo que aconteceu no mês seguinte ou mesmo mais. Fiquei doente de 
novo: tão doente que eles falavam de mim como se já estivesse morto. Quando comecei a recuperar, 
Germano
143
já andava nas guerras e Póstumo tinha sido deserdado e exilado para o resto da vida. A ilha escolhida para 
ele foi Planásia. Ficava a cerca de doze milhas de Elba na direcção da Córsega e nenhum humano
guardava memória dela ter sido habitada. Mas havia lá algumas cabanas de pedra pré­históricas que foram 
convertidas em habitação
para Póstumo e quartel para a guarda. Planásia tinha uma forma aproximadamente triangular, tendo o 
lado mais comprido cerca de cinco milhas. Era desprovida de árvores e rochosa e apenas visitada pelos 
barqueiros de Elba no Verão, quando vinham preparar as armadilhas para as lagostas. Por ordem de 
Augusto, esta prática foi interrompida, com medo de que Póstumo subornasse alguém e fugisse.
Tibério era agora o único herdeiro de Augusto, com Germano e Castor para continuar a linhagem depois 
dele ­ a linhagem de Lívia.
144
CAPíTULO XII
Se limitasse o meu relato dos acontecimentos dos próximos vinte e cinco anos ou mais às minhas próprias 
intervenções, não gastaria muito papel e a leitura resultaria bem monótona; mas a parte final desta autobiografia, na 
qual figuro com maior proeminência, só será inteligível se continuar aqui com as histórias pessoais de Lívia, Tibério, 
Germano, Póstumo, Castor, Livila e o resto, que estão longe de ser monótonas, isso vos prometo eu.
Póstumo estava no exílio e Germano na guerra; dos meus verdadeiros amigos, apenas restava Atenodoro. Também 
ele não tardou a deixar­me para regressar à sua Tarso nativa. Não lhe dificultei a partida, porque ele foi atender ao 
chamamento urgente de dois sobrinhos que lá tinha e que lhe suplicaram que os ajudasse a libertar a cidade da tirania 
do seu governador. Escreveram­lhe que este governador se insinuara com tanta esperteza nas boas graças do seu 
Deus Augusto, que seria necessário o testemunho de um homem como Atenodoro, em cuja integridade o seu Deus 
Augusto tinha total confiança, para o persuadir de que a expulsão daquele indivíduo era justificada. Atenodoro 
conseguiu libertar a cidade daquele parasita, mas depois descobriu que lhe era impossível regressar a Roma, como 
era sua intenção. Os sobrinhos precisavam dele para os ajudar a reconstruir a administração da cidade em alicerces 
sólidos. Augusto, a quem escreveu um relato detalhado dos seus actos, mostrou a sua gratidão e confiança 
concedendo a Tarso, como um favor pessoal para ele, uma remissão de cinco anos do tributo imperial. Correspondi­
me regularmente com o bom velho até ao momento da sua morte, dois anos mais tarde, com a idade de oitenta e dois 
anos. Tarso honrou a sua memória com um festival e sacrifício anuais, no qual os cidadãos mais proeminentes liam à 
vez a sua História Breve de Tarso, de fio a pavio, começando ao nascer do sol e terminando depois do sol­posto.
Germânico escrevia­me ocasionalmente, mas as suas cartas tinham tanto de breve como de afectuosas: o comandante 
de verdade não tem tempo para escrever cartas para a família; todo o tempo de que dispõe entre duas campanhas é 
dedicado a conhecer os seus homens e os seus oficiais, a estudar o seu conforto, aumentar­lhes a eficiência militar e 
reunir informações sobre a disposição e planos do inimigo. Germânico era um
145
dos comandantes mais conscienciosos que alguma vez serviram no exército romano ­ e mais amado ainda 
que o nosso pai. Eu sentia­me muito orgulhoso quando ele escrevia a pedir­me que elaborasse para ele, tão 
depressa e tão meticulosamente como me fosse possível, um resumo de todos os relatos confiáveis que 
conseguisse encontrar nas bibliotecas sobre os hábitos domésticos das várias tribos balcânicas contra as 
quais lutava, a força e situação geográfica das suas cidades, as suas tácticas e artimanhas militares 
tradicionais, particularmente na guerra de guerrilha. Dizia que não conseguia reunir localmente um 
número suficiente de informações confiáveis: Tibério tinha sido pouco comunicativo. Com a ajuda de 
Sulpício e de um pequeno grupo de pesquisadores e copistas, trabalhando dia e noite, consegui reunir 
exactamente o que ele precisava e enviar­lhe uma cópia apenas um mês depois do seu pedido. Senti­me 
mais orgulhoso do que nunca quando ele me escreveu pouco tempo depois, pedindo uma edição de vinte 
exemplares do livro para fazer circular entre os seus oficiais superiores, pois o mesmo já provara ser da 
maior utilidade para ele. Disse que cada parágrafo era claro e relevante, sendo as secções mais úteis 
aquelas que davam pormenores da irmandade militar secreta extra­tribal contra a qual, e não propriamente 
contra as próprias tribos, a guerra estava a ser feita; e também sobre as diversas árvores e arbustos
­ uma espécie diferente era venerada por cada tribo ­, sob cuja sombra protectora os homens da tribo 
costumavam enterrar as suas reservas de trigo, dinheiro e armas, quando tinham que abandonar 
precipitadamente as suas aldeias. Prometia falar a Tibério e a Augusto dos meus valiosos serviços.
Não houve qualquer menção pública deste livro, talvez porque, se o inimigo tivesse sabido da sua 
existência, teriam alterado as suas tácticas e disposições. Assim, convenceram­se de que estavam a ser 
constantemente traídos por informadores. Augusto recompensou­me, sem carácter oficial, nomeando­me 
para uma vaga no Colégio dos Augures, mas era evidente que atribuía todo o crédito da compilação a 
Sulpício, embora este não tivesse escrito uma só palavra ­ ele limitou­se a arranjar­me alguns dos livros. 
Uma das minhas fontes principais foi Pólio, cuja campanha na Dalmácia tinha sido um modelo de 
exactidão militar, combinada com um brilhante trabalho de recolha secreta de informações. Embora o seu 
relato dos costumes e condições locais parecesse estar uns cinquenta anos atrasado, Germânico achou os 
meus extractos do mesmo bem mais úteis do que qualquer história de campanhas mais recente. Gostaria 
que Pólio pudesse estar vivo para ouvir aquilo. No entanto, contei­o a Lívio, que disse com alguma 
irritação que nunca negara a Pólio o crédito de ter escrito manuais militares competentes; apenas lhe 
negara o título de historiador, no sentido mais elevado.
146
A isto devo acrescentar que, se eu tivesse tido mais tacto, estou certo que Augusto me teria louvado no seu 
discurso ao Senado no final da guerra. Mas as minhas referências às suas próprias campanhas nos Balcãs tinham sido 
mais reduzidas do que poderiam ter sido no caso dele escrever um relato detalhado das mesmas, como Pólio fez em 
relação às suas; ou se os historiadores oficiais estivessem menos preocupados em lisonjear o seu Imperador e mais 
em registar os seus sucessos e revezes de uma forma imparcial, técnica. Destes panegíricos, pouco ou nenhum 
material útil consegui extrair e Augusto, ao ler o meu livro, deve ter­se sentido ofendido. Ele identificava­se a tal 
ponto com o sucesso da guerra que, durante as duas últimas épocas de combates, se mudou de Roma para uma 
cidade junto à fronteira nordeste de Itália, para estar o mais perto possível da luta; e, como Comandante­em­Chefe 
dos Exércitos Romanos, enviava constantemente a Tibério conselhos militares que de pouco serviam.
Eu estava agora a trabalhar num relato da participação do meu avô nas Guerras Civis; mas ainda não tinha ido longe 
quando, uma vez mais, fui detido por Lívia. Apenas conseguira completar dois volumes. Ela disse­me que eu era tão 
incapaz de escrever uma biografia do meu avô como do meu pai e que me comportara de forma desonesta ao fazê­lo 
nas suas costas. Se queria um emprego útil para a minha pena, faria melhor em escolher um assunto que não 
envolvesse tantas ideias erróneas. E ela oferecia­me um: a reorganização da religião por Augusto, depois da 
Pacificação. Não era um assunto que suscitasse grande entusiasmo, mas não tinha sido tratado anteriormente de 
forma detalhada e eu estava disposto a empreender essa tarefa. As reformas religiosas de Augusto tinham sido, quase 
sem excepção, excelentes: ele tinha feito reviver várias sociedades antigas de sacerdotes, construído e mantido com 
as suas doações oitenta e dois novos templos em Roma e arredores, reconstruido vários templos antigos que estavam 
a cair em ruínas, introduzido cultos estrangeiros para benefício dos visitantes das províncias e reinstituído numerosos 
festivais públicos, antigos e interessantes, que se tinham perdido uns a seguir aos outros durante os distúrbios civis 
do meio século anterior. Mergulhei no assunto com o maior cuidado e completei o meu estudo poucos dias depois da 
morte de Augusto, seis anos mais tarde. Fí­lo em quarenta e um volumes, com uma média de cinco mil palavras 
cada, mas uma boa parte disto consistia de transcrições de decretos religiosos, listas nominais de sacerdotes, 
catálogos de ofertas feitas aos tesouros dos templos, e assim por diante. O volume mais valioso era o da introdução, 
que tratava do ritual primitivo em Roma. Aqui, encontrei­me em dificuldades, porque as reformas de Augusto no 
campo dos rituais se basearam nas conclusões de uma comissão religiosa que não executara devidamente o seu 
trabalho. Ao que parece, não havia nenhum perito em antiguidade entre os
147
membros da comissão, de forma que uma série de interpretações grosseiramente erróneas das antigas 
fórmulas religiosas tinham sido íncorporadas nas novas liturgia oficiais. Nenhuma pessoa que não tenha 
feito um estudo das línguas etrusca e sabina é capaz de interpretar os nossos encantamentos religiosos 
mais antigos; e eu dediquei uma boa parte do meu tempo a dominar os rudimentos de ambas. Nesta altura, 
havia alguns camponeses que em casa ainda falavam exclusivamente o sabino e persuadi dois deles a vir a 
Roma e a fornecer a Palas, que me servia agora de secretário, o material necessário para um breve 
dicionário de sabino. Paguei­lhes bem por isso. Enviei a Cápua o melhor dos meus secretários, Calon, para 
recolher material para um dicionário semelhante da língua etrusca junto de Aruns, o sacerdote que me dera 
a informação sobre Lars Porsena, que tanto agradara a Pólio e aborrecera Lívio. Estes dois dicionários, 
que mais tarde alarguei e publiquei, permitiram­me esclarecer, para minha satisfação, uma série de 
problemas importantes dos antigos cultos religiosos; mas eu tinha aprendido a ser cuidadoso e nada do que 
escrevi envolvia qualquer crítica aos conhecimentos e opiniões de Augusto.
Não gastarei tempo algum a relatar a Guerra dos Balcãs, para além de dizer que, apesar da inteligente 
actuação do meu tio Tibério como general, da competente assistência que lhe deu meu avô Silvano e dos 
feitos ousados de Germânico, ela se arrastou ao longo de três anos. No final, todo o país ficou reduzido e 
praticamente transformado num deserto, porque estas tribos, homens e mulheres, lutavam com um 
desespero extraordinário e só reconheciam a derrota quando o fogo, a fome e a doença tinham dizimado 
mais de metade da população. Quando os chefes rebeldes foram procurar Tibério para tratarem da paz, ele 
fez­lhes um interrogatório cerrado. Em primeiro lugar, queria saber porque se lhes metera na cabeça 
revoltarem­se e, depois, porque se entregaram a uma resistência tão desesperada. O chefe dos rebeldes, um 
homem chamado Bato, respondeu:
­ A culpa é unicamente vossa. Mandastes para guardiães dos vossos rebanhos nem pastores nem cães de 
guarda, mas sim lobos.
Isto não era exactamente verdade. Augusto escolhia pessoalmente os governadores das suas províncias 
fronteíríças, pagava­lhes um salário substancial e vigiava para que não desviassem nenhuma parte dos 
rendimentos imperiais para o seu próprio bolso. Os impostos eram­lhes pagos directamente a eles, não 
mais a empresas de cobrança de impostos sem princípios. Os governadores de Augusto nunca foram 
lobos, como tinham sido a maior parte dos governadores republicanos, cujo único interesse nas províncias 
era ver aquilo que conseguiam arrancar­lhes. Muitos deles eram bons cães de guarda e alguns eram 
mesmo pastores honestos. Mas acontecia muitas vezes que Augusto fixava inadvertidamente um imposto 
num valor demasiado alto, não considerando o prejuízo causado por uma
148
má colheita, uma epidemia no gado ou um terramoto; e, em vez de se queixarem a ele que o cálculo 
fora demasiado alto, os governadores recolhiam até ao último tostão, mesmo com risco de provocar uma 
revolta. Poucos deles sentiam algum interesse pessoal pelo povo que tinham que governar. O governador 
instalava­se na capital romanizada onde havia belas casas e teatros, templos, banhos públicos e mercados e 
nem sequer pensava em visitar os distritos mais afastados da sua província. A verdadeira governação era 
feita por representantes e por representantes dos representantes e deve ter havido bastante opressão por 
parte dos pequenos burocratas. E foi talvez a esses que Bato chamou lobos, embora pulgas tivesse sido 
uma palavra mais adequada. Não pode haver dúvidas que, sob a governação de Augusto, as províncias 
eram infinitamente mais prósperas do que durante a República; diga­se também que as províncias pátrias, 
que eram governadas por indivíduos nomeados pelo Senado, tinham uma situação muito inferior à das 
províncias de fronteira, governadas por indivíduos nomeados por Augusto. Esta comparação forneceu um 
dos raros argumentos plausíveis que alguma vez ouvi proferir contra o governo republicano, ainda que 
baseado na hipótese insustentável de que os padrões de moral pessoal entre as principais figuras de uma 
república vulgar tendem a ser inferiores aos da moral pessoal de um monarca absoluto vulgar e dos 
subordinados por ele escolhidos; baseia­se também na ideia errónea de que a questão de como as 
províncias são governadas é mais importante do que a questão do que acontece na Cidade. Recomendar 
uma monarquia por causa da prosperidade que ela dá às províncias parece­me o mesmo que recomendar 
que um homem deve ter a liberdade de tratar os filhos como escravos, se ao mesmo tempo tratar os 
escravos com razoável consideração.
Por esta guerra dispendiosa e fútil, foi decretado pelo Senado um grande triunfo para Augusto e Tibério. 
Deveis estar recordados que, por esta altura, apenas ao próprio Augusto ou a membros da sua família era 
permitido um verdadeiro triunfo, enquanto aos outros generais era concedido aquilo a que chamavam 
ornamentos triunfais. Germânico,
embora fosse um César, apenas recebeu esses ornamentos por razões técnicas. Augusto podia ter alargado 
o âmbito, mas sentia­se tão grato a Tibério pela forma cheia de sucesso como conduzira a guerra, que não 
desejava antagonizá­lo dando a Germânico honras iguais às suas. Germânico subiu também um ponto na 
escala de magistrado e foi­lhe ainda permitido tornar­se Cônsul vários anos antes da idade habitual. 
Castor, embora não tivesse tomado parte na guerra, recebeu o privilégio de assistir às sessões do Senado 
antes de se tornar seu membro e subiu também um ponto na escala de magistrado.
Em Roma, a populaça aguardava o triunfo com o maior entusiasmo, pois ele significaria trigo e dinheiro 
com abundância e toda a espécie de
149
coisas boas: mas uma grande decepção os aguardava. Um mês antes da data fixada para o triunfo, foi 
observado um terrível presságio ­ nos Campos de Marte, o templo do Deus da Guerra foi atingido por um 
raio e quase ficou destruído ­ e, alguns dias mais tarde, chegaram notícias da Germânia do mais violento 
revês militar sofrido pelos exércitos romanos desde Carros, eu diria mesmo desde Ália, não havia ainda 
exactamente 400 anos. Três regimentos tinham sido chacinados e todas as conquistas a leste do Reno se 
tinham perdido de um só golpe; parecia que nada iria impedir os germanos de atravessarem o rio e 
arrasarem as três províncias de França, colonizadas e prósperas.
já falei do efeito esmagador que esta notícia teve sobre Augusto. Sentiu­a tanto mais fortemente quanto ele 
não era apenas oficialmente responsável pelo desastre, como era o homem encarregado pelo Senado 
romano e pelo povo da segurança de todas as fronteiras, mas também moralmente responsável. O desastre 
devera­se à sua imprudência, ao tentar forçar a civilização sobre os bárbaros com demasiada rapidez. Os 
germanos conquistados pelo meu pai tinham­se adaptado gradualmente à maneira dos romanos, 
aprendendo o uso da cunhagem de moeda, organizando mercados regulares, construindo e mobilando 
casas num estilo civilizado e reunindo­se mesmo em assembleias que não terminavam, como era costume 
com as suas assembleias anteriores, em batalhas campais. Eram aliados de nome e, se lhes tivesse sido 
permitido esquecer gradualmente as suas velhas maneiras bárbaras e confiar na guarnição romana, para 
que os protegesse dos seus vizinhos ainda incivilizados enquanto eles gozavam os luxos da paz provincial, 
poderiam talvez, dentro de duas gerações ou mesmo menos, terem­se tornado tão pacíficos e dóceis como 
os gauleses da Provença. Mas Varo, um parente meu, a quem Augusto nomeou Governador da Germânia 
do Outro Lado do Reno, começou a tratá­los não como aliados, mas como uma raça subjugada: era um 
homem com mau carácter e mostrava pouco respeito pelas convicções extremamente fortes dos Germanos 
sobre a castidade das suas mulheres. Depois, Augusto precisava de dinheiro para o tesouro militar, que a 
Guerra dos Balcãs tinha esvaziado. Impôs uma série de novos impostos, dos quais os germanos do Outro­
lado­do­Reno não estavam isentos. Varo aconselhou­o quanto à capacidade de pagamento da província e, 
com todo o seu zelo, sobrestimou essa capacidade.
Havia no acampamento de Varo dois chefes germanos, Hérmann e Siegmyrgth, que falavam latim 
fluentemente e pareciam estar completamente romanizados. Hérmann tinha comandado tropas auxiliares 
germânicas na guerra anterior e a sua lealdade era inquestionável. Passara algum tempo em Roma e fora  
mesmo incluído entre os nobres cavaleiros. Estes dois tinham muitas vezes comido à mesa de Varo e 
encontravam­se nos termos da amizade mais íntima com ele. Encorajaram­no a admitir que
150
os seus compatriotas não eram menos leais e gratos a Roma pelos benefícios da civilização do que eles 
próprios. Mas estavam em comunicação constante e secreta com outros chefes descontentes, que 
persuadiram a, nos tempos mais próximos, não oferecerem resistência armada ao poder romano e a pagar 
os seus impostos com a maior demonstração possível de boa vontade. Em breve receberiam o sinal para a 
rebelião em massa. Hermann, cujo nome significa guerreiro, e Siegmyrgth ­ ou chamemos­lhe antes 
Segímero ­, cujo nome significa alegre vitória, eram demasiado espertos para Varo. Membros do seu 
estado­maior estavam constantemente a preveni­lo de que os germanos andavam anormalmente bem 
comportados nos últimos meses e que estavam a tentar desarmar as suas suspeitas antes de fazerem uma 
sublevação repentina; mas ele ria­se da sugestão. Disse que os germanos eram uma raça muito estúpida e 
incapazes quer de conceber tal plano, quer de o executar sem traírem o segredo muito antes dele estar 
maduro. A sua docilidade era mera cobardia; com quanto mais força se batia num germano, mais ele vos 
respeitava. Ele era arrogante na prosperidade e na independência, mas, uma vez derrotado, vinha 
rastejando até aos vossos pés como um cão e aí se conservava a partir dessa altura. Recusou­se mesmo a 
escutar os avisos que lhe foram feitos por outro chefe germano que tinha rancor a Hermann e via 
claramente os seus desígnios. Em vez de manter as tropas concentradas, como deveria ter feito num país 
apenas parcialmente subjugado, fraccionou­as.
Seguindo instruções secretas de Hermann e Segímero, comunidades afastadas enviaram a Varo pedidos de 
protecção militar contra bandidos e escoltas para transporte de mercadorias de França. A seguir, veio uma 
rebelião armada na extremidade leste da província. Um cobrador de impostos e o seu pessoal foram 
mortos. Quando Varo reuniu as forças que tinha disponíveis para uma expedição punitiva, Hermann e 
Segímero escoltaram­no durante uma parte do caminho e, depois, escusaram­se a continuar a acompanhá­
lo, prometendo reunir as suas tropas auxiliares e vir em sua ajuda, se necessário, logo que os mandasse 
chamar. Estas tropas auxiliares já estavam armadas e colocadas para uma emboscada a alguns dias de 
viagem à frente de Varo e na sua linha de marcha. Os dois chefes preveniram então as comunidades 
afastadas para que caíssem sobre os destacamentos romanos enviados para as proteger e que não 
deixassem escapar um só homem.
Não chegou qualquer informação de Varo sobre este massacre, porque não houve sobreviventes. De 
qualquer forma, ele não estava em contacto com o seu quartel­general. O caminho que seguia era um mero 
trilho da floresta. Mas ele não tomou a precaução de mandar à frente uma guarda avançada de batedores 
ou guardas de flanco e, em vez disso, deixou que toda a força ­ que continha grande número de não­
combatentes desfilasse numa coluna desordenada, com tão pouca precaução como se
151
estivesse a umas cinquenta milhas de Roma. A marcha era muito lenta, porque era constantemente 
necessário derrubar árvores e arranjar pontes sobre os cursos de água para permitir a travessia aos carros 
com abastecimentos; e isto deu tempo a que um grande número de membros da tribo se juntassem às 
tropas que formavam a emboscada. O tempo mudou de repente; uma forte chuvada, que durou vinte e 
quatro horas ou mais, ensopou os escudos de couro, tornando­os demasiado pesados para a luta e pondo os 
arcos dos arqueiros fora de combate. O trilho barrento tornou­se de tal forma escorregadio que era difícil 
para os homens manter o equilíbrio e os carros estavam constantemente a atolar­se. A distância entre a 
frente e a retaguarda da coluna aumentou. Então, um sinal de fumo elevou­se de uma colina vizinha e os 
germanos atacaram de repente pela frente, pela retaguarda e pelos dois flancos.
Eles não se podiam comparar com os romanos numa luta leal e Varo não exagerara muito a sua cobardia. 
A princípio, apenas ousaram atacar indivíduos isolados e condutores de transportes, evitando a luta corpo­
a­corpo, mas atirando saraivadas de azagaias e dardos, mantendo­se a coberto e correndo de volta para a 
floresta mal um romano se punha a sacudir a espada e a gritar. Mas causaram muitas baixas com esta 
táctica. Grupos conduzidos por Hermann, Segímero e outros chefes bloquearam o caminho juntando 
carros capturados, aos quais quebravam as rodas, e derrubando árvores que lhes atravessavam por cima. 
Fizeram vários destes bloqueios e deixaram membros das tribos atrás deles para importunar os soldados 
quando eles tentavam abrir caminho. Isto atrasou de tal forma os homens na cauda da coluna que, receosos 
de perderem o contacto, abandonaram todos os carros que estavam ainda na sua posse e precipitaram­se 
para a dianteira, esperando que os germânicos estivessem tão ocupados com a pilhagem que não 
voltassem a atacar tão depressa.
O regimento que seguia à frente tinha alcançado uma colina onde não havia muitas árvores por causa de 
um incêndio recente na floresta e ali formaram em segurança e aguardaram os outros dois. Eles ainda 
conservavam o seu transporte e só tinham perdido algumas centenas de homens. Os outros dois 
regimentos estavam em muito pior situação. Os homens ficaram separados das suas companhias e novas 
unidades foram formadas, tendo entre cinquenta a 200 homens, cada uma com uma guarda traseira, uma 
guarda avançada e guardas de flanco. Os guardas de flanco apenas podiam avançar muito lentamente, 
porque a floresta era densa e pantanosa e, frequentemente, perdiam o contacto com as suas pequenas 
unidades; as guardas avançadas sofriam fortes perdas nas barricadas e a retaguarda estava constantemente 
a ser atacada por trás com azagaias. Quando se fez a chamada nessa noite, Varo descobriu que quase um 
terço dos seus homens estava morto ou desaparecido. No dia seguinte, abriu
152
caminho até sair da floresta para campo aberto, mas tinha sido obrigado a abandonar o que restava do 
seu transporte. A comida era escassa e, no terceiro dia, teve que se embrenhar de novo na floresta. As 
baixas no segundo dia não tinham sido numerosas, pois uma grande parte do inimigo estava ocupada a 
pilhar os carros e a levar o saque, mas quando foi feita a chamada, ao fim do terceiro dia, só um quarto da 
força original estava presente para responder ao chamamento. No quarto dia, Varo continuava a avançar, 
pois era demasiado casmurro para admitir a derrota e abandonar o objectivo inicial, mas o tempo, que 
tinha melhorado um pouco, tornava­se agora pior que nunca e os germanos, acostumados a violentas 
chuvadas, tornavam­se cada vez mais ousados ao verem a resistência enfraquecer. Aproximaram­se então 
do adversário.
Por volta do meio­dia, Varo percebeu que tudo estava acabado e matou­se, de preferência a cair vivo nas 
mãos do inimigo. A maior parte dos oficiais superiores que tinham sobrevivido seguiram o seu exemplo, 
assim como muitos dos soldados. Apenas um oficial manteve a calma o mesmo Cássio Chaerea que lutou 
naquele dia no anfiteatro. Ele comandava a retaguarda, composta por montanheses da Sabóia, que se 
sentiam mais à vontade na floresta que a maioria; e quando veio a notícia, por um fugitivo, de que Varo 
estava morto, as Águias capturadas e que não mais de 300 homens do corpo principal estavam ainda de 
pé, ele decidiu salvar o que pudesse da carnificina. Deu meia volta e investiu contra o inimigo num ataque 
repentino. A grande coragem de Cássio, da qual conseguiu transmitir um pouco aos seus homens, 
espantou os germanos. Deixaram sozinho aquele pequeno corpo de homens resolutos e correram em frente 
para fazer conquistas mais fáceis. É talvez um dos maiores feitos de guerra dos tempos modernos que, dos 
120 homens que Cássio tinha com ele quando fez meia volta, tenha conseguido, após uma marcha de oito 
dias através de um país hostil, trazer oitenta de volta em segurança, sob o estandarte da companhia, até à 
fortaleza de onde tinham partido vinte dias antes.
É difícil transmitir a sensação de pânico que reinava em Roma quando os rumores do desastre foram 
confirmados. As pessoas começaram a empacotar os seus pertences e a carregá­los em carroças, como se 
os germanos já estivessem às portas da cidade. Na realidade, havia boas razões para essa ansiedade. As 
baixas na Guerra dos Balcãs tinham sido tão pesadas que quase todas as reservas de combatentes 
disponíveis na Itália tinham sido utilizadas. Augusto estava aflito para arranjar um exército que pudesse 
enviar sob o comando de Tibério, para garantir as pontes do Reno que, ao que parecia, os germanos ainda 
não tinham ocupado. Dos cidadãos romanos capazes para o serviço, poucos se apresentaram 
voluntariamente ao ser publicada a ordem de chamamento; marchar contra os germanos parecia ser 
sinónimo de ir ao encontro de uma morte
153
certa. Então, Augusto fez sair uma segunda ordem, pela qual, entre aqueles que não se oferecessem no 
espaço de três dias, cada quinto homem perderia os direitos civis e seria privado de tudo o que lhe 
pertencesse. Muitos ficaram quietos mesmo depois disto; então, mandou executar alguns como exemplo e 
obrigou os restantes a irem para as fileiras, onde alguns deles, de facto, se tornaram bons soldados. 
Também chamou um grupo de homens com mais de trinta e cinco anos e realistou vários veteranos que 
tinham completado os seus dezasseis anos de serviço. Com estes e um regimento ou dois compostos de 
libertos, que normalmente não estavam sujeitos a serviço militar (embora os reforços de Germânico na 
Guerra dos Balcãs contassem com eles em grande número), reuniu um exército imponente e enviou cada 
companhia sozinha para o Norte, logo que ficou armada e equipada.
Foi para mim a maior das vergonhas e dos desgostos que nesta hora de suprema necessidade de Roma eu 
fosse incapaz de servir como soldado em sua defesa. Fui ter com Augusto e supliquei­lhe que me enviasse 
numa qualquer missão em que a minha fraqueza física não fosse um impedimento: sugeri­lhe ir para junto 
de Tibério como oficial dos serviços secretos e ocupar­me de tarefas tão úteis como reunir e analisar 
informações sobre os movimentos do inimigo, interrogar prisioneiros, fazer mapas e dar instruções 
especiais a espiões. Tendo falhado esta nomeação (para a qual me considerava qualificado, porque tinha 
feito um estudo cuidadoso das campanhas na Germânia e tinha aprendido a pensar de maneira ordenada e 
a dirigir o pessoal), apresentei­me como voluntário para servir de Mestre Quarteleíro Geral a Tibério: 
pediria a Roma os fornecimentos militares necessários e, à sua chegada à base, encarregar­me­ia de os 
verificar e distribuir. Augusto pareceu satisfeito por eu me ter apresentado de minha livre vontade e disse 
que falaria a Tibério da minha oferta. Mas não deu em nada. Talvez Tibério me achasse incapaz de 
qualquer serviço útil; talvez ficasse simplesmente aborrecido por eu ter feito aquele pedido, quando o seu 
filho Castor se deixara ficar para trás e persuadira Augusto a enviá­lo para o sul de Itália para reunir e 
treinar soldados. No entanto, Germânico estava na mesma situação que eu, o que sempre me dava algum 
conforto. Oferecera­se como voluntário para servir na Germânia, mas Augusto precisava dele em Roma, 
onde era muito popular, para o ajudar a dominar os distúrbios civis que, receava, não tardassem a rebentar 
logo que as tropas saíssem da cidade.
Entretanto, os germanos perseguiram todos os fugitivos do exército de Varo e sacrificaram dezenas deles 
aos seus deuses da floresta, queimando­os vivos em gaiolas de verga. Aos restantes, conservaram­nos 
como cativos (alguns deles foram mais tarde resgatados pelos seus parentes por um preço 
extravagantemente elevado, mas Augusto proibiu­os de alguma vez voltarem a por os pés em Itália). Os 
germanos também
154
estiveram sujeitos a uma longa série de tremendas crises e bebedeira com o vinho capturado e lutaram de 
forma sangrenta pela glória e pelo saque. Passou muito tempo até que voltassem a estar activos e 
compreendessem a fraca oposição que encontrariam se marchassem sobre o Reno. Mas logo que o vinho 
começou a desaparecer, atacaram as fortalezas fronteiriças com a sua fraca guarnição e, uma a seguir a 
outra, capturaram­nas e saquearam­nas. Uma única fortaleza ofereceu uma resistência decente: a que 
estava nas mãos de Cássio. Os germanos tê­la­iam ocupado tão facilmente como as outras, porque a 
guarnição era pequena, mas Hermann e Segimero estavam noutro lado e nenhum dos restantes entendia a 
arte romana do cerco com catapultas, a tartaruga e a escavação de túneis. Cássio tinha na fortaleza um 
bom fornecimento de arcos e flechas e ensinou toda a gente, mesmo mulheres e escravos, a usá­los. 
Derrotou com êxito vários ataques selváticos às suas portas e tinha sempre grandes caldeirões com água a 
ferver prontos para despejar sobre quaisquer germanos que tentassem escalar os muros com escadas. Os 
germanos estavam tão ocupados a tentar capturar aquele lugar, onde esperavam encontrar um saque 
valioso, que não avançaram para as pontes do Reno, inadequadamente guardadas.
Chegaram notícias da aproximação rápida de Tibério à frente do seu novo exército. Hermann reuniu 
imediatamente as suas tropas, decidido a capturar as pontes antes de Tibério lá chegar. Foi deixado um 
destacamento para cercar a fortaleza, que se sabia estar mal fornecida de provisões. Cássio, que teve 
conhecimento dos planos de Hermann, decidiu fugir enquanto era tempo. Numa noite de tempestade, 
conseguiu sair com toda a guarnição e logrou ultrapassar os dois primeiros postos avançados do inimigo 
antes que o choro de algumas das crianças que estavam com ele desse o alarme. No terceiro posto 
avançado houve uma luta corpo a corpo e, se os germanos não estivessem tão ansiosos por entrar na 
cidade e saqueá­la, Cássio e a sua gente não teriam tido hipótese de sobreviver. Mas, de alguma forma, ele 
conseguiu safar­se e, meia hora mais tarde, disse aos seus trombeteiros que fizessem ouvir o toque de 
avançar em marcha acelerada levando os germanos a acreditar que estavam a chegar reforços; por isso, 
não os seguiram. As tropas que estavam na ponte mais próxima ouviram o som distante das trombetas 
romanas, pois o vento soprava de leste, e, adivinhando o que estava a acontecer, enviaram um 
destacamento para escoltar a guarnição a porto seguro. Dois dias depois, Cássio defendeu a ponte com 
êxito contra um ataque em massa dos homens de Segimero; depois disso, chegou a vanguarda de Tibério e 
a situação foi salva.
O fim do ano foi marcado pelo exílio de Julila, sob acusação de adultério promíscuo ­ tal como sua mãe 
Júlia ­, para Tremero, uma pequena ilha na costa da Apúlia. A verdadeira razão do exílio foi que ela estava
155
quase a ter outro filho que, se fosse rapaz, seria bisneto de Augusto e não aparentado com Lívia; Lívia não 
queria correr riscos. Julila já tinha um filho, mas tratava­se de um indivíduo delicado, timorato e incapaz, 
que podia ser ignorado, O próprio Emílio forneceu a Lívia motivos para a acusação. Tinha discutido com 
Julila e, agora, acusava­a na presença da filha de ambos, Emília, de tentar fazê­lo passar por pai do filho 
de outro homem. Citou Décimo, um nobre da Família Silano, como sendo o adúltero. Emília, que era 
suficientemente esperta para compreender que a sua própria vida e segurança dependiam de se manter nas 
boas graças de Lívia, foi procurá­la e contou­lhe o que tinha ouvido. Lívia fê­la repetir a história na 
presença de Augusto. Depois, Augusto convocou Emílio e perguntou­lhe se era verdade não ser ele o pai 
do filho de Júlia. Não ocorreu a Emílio que Emília pudesse tê­lo traído a ele e à mãe e partiu do princípio 
que a intimidade de que ele suspeitava entre Júlia e Décimo fosse um escândalo corrente. Manteve 
portanto a sua acusação, embora fosse fundada mais no ciúme que no conhecimento. Augusto tomou a 
criança logo que ela nasceu e mandou expô­la na montanha. Décimo exilou­se voluntariamente e vários 
outros homens acusados de terem sido amantes de Julila, numa altura ou noutra, seguiram­no: entre eles, 
estava o poeta Ovídio, de quem Augusto, por mais estranho que pareça, fez o principal bode expiatório, 
por ter também escrito (muitos anos antes) A Arte do Amor. Fora este poema, afirmou Augusto, que tinha 
debochado o espírito da neta. Ordenou que todos os exemplares fossem procurados para serem queimados.
156
CAPíTULO XIII
Augusto tinha mais de setenta anos de idade. Até há pouco tempo, ninguém pensava nele como um velho. 
Mas estas novas calamidades públicas e privadas operaram uma grande mudança nele. O seu humor 
tornou­se instável e era­lhe cada vez mais difícil receber visitantes ocasionais com a sua afabilidade 
habitual, ou não perder a paciência em banquetes públicos. Tinha mesmo tendência a mostrar­se irritadiço 
com Lívia. No entanto, continuava o seu trabalho conscienciosamente como sempre e aceitou mesmo um 
novo período de dez anos de monarquia. Tibério e Germânico, quando estavam na cidade, ocupavam­se 
de muitas tarefas que normalmente teria sido ele a executar e Lívia trabalhava mais do que nunca. Durante 
a Guerra dos Balcãs, ela ficara em Roma enquanto Augusto estava ausente e, armada com um duplicado 
do selo dele e em contacto permanente com ele através de estafetas, tratara ela própria de tudo. Augusto 
estava cada vez menos favorável à perspectiva da sucessão por Tibério. Achava­o capaz de governar 
razoavelmente bem, com a ajuda de Lívia, e de levar por diante as medidas por ele decretadas, mas 
também se sentia lisonjeado com a ideia de que todos sentiriam a falta do Pai da Pátria quando ele 
morresse e falariam da Era de Augusto como falavam da Época de Ouro do Rei Numa. Apesar dos 
serviços notáveis prestados a Roma, Tibério era pessoalmente impopular e, certamente, não ganharia 
maior popularidade quando fosse Imperador. Era uma satisfação para Augusto que Germânico, sendo mais 
velho que Castor, seu irmão adoptivo, fosse o sucessor natural de Tibério e que os filhos pequenos de 
Germânico, Nero e Druso, fossem seus bisnetos. Embora o Destino decretasse que os seus netos não lhe 
sucederiam, ele havia de voltar a reinar um dia, nas pessoas dos bisnetos. Nesta altura, Augusto já tinha 
esquecido a República, como quase toda a gente, e aceitado a ideia de que os seus quarenta anos de 
serviço duro e cheio de ansiedade em prol de Roma lhe tinham proporcionado o direito de nomear os seus 
sucessores imperiais, mesmo até à terceira geração, se lhe aprouvesse.
Quando Germânico estava na Dalmácia, não lhe escrevi a falar de Póstumo com medo que algum agente 
de Lívia interceptasse a minha carta, mas contei­lhe tudo logo que ele voltou da guerra. Ficou muito 
perturbado e disse que não sabia o que pensar. Tenho que explicar que está na natureza
157
de Germânico recusar­se sempre a pensar mal de alguém até que uma prova positiva desse mal lhe seja 
imposta e, caso contrário, a atribuir a isso todos os motivos mais elevados. Esta extrema simplicidade era­
lhe geralmente útil. A maior parte das pessoas com quem entrava em contacto sentiam­se lisonjeadas com 
a elevada opinião por ele formada do seu carácter moral e, ao tratar com ele, tentavam estar à altura dessa 
reputação. Se alguma vez se encontrasse à mercê de uma criatura verdadeiramente maléfica, esta 
generosidade de coração seria sem dúvida a sua perda; mas, por outro lado, se alguém tinha qualquer coisa 
de bom dentro de si, Germânico parecia sempre conseguir trazê­la à superfície. Por isso, naquele momento 
disse­me que não podia espontaneamente acreditar que quer Livila quer Emília fossem capazes de uma tal 
baixeza criminosa, embora ultimamente, admitiu, se sentisse decepcionado com Livila. Também disse que 
eu não deixara bem claros os possíveis motivos delas, excepto arrastando para o assunto nossa avó Lívia, 
o que era francamente ridículo. Quem no seu juízo perfeito, perguntava, repentinamente indignado, podia 
suspeitar que Lívia as incitasse a uma tão grande maldade? Era o mesmo que suspeitar que a Boa Deusa 
envenenara os poços da cidade. Mas quando lhe perguntei por minha vez se ele realmente acreditava que 
Póstumo fosse culpado de duas tentativas de estupro em noites sucessivas, ambas extremamente 
imprudentes, ou que ele fosse capaz de mentir a Augusto e a nós dois sobre esse assunto, mesmo que fosse 
culpado, ele ficou silencioso. Sempre amara e confiara em Póstumo. Aproveitando a minha vantagem, fi­
lo jurar pela alma de nosso defunto pai que, se alguma vez se lhe deparasse a mais ligeira prova de que 
Póstumo tinha sido injustamente condenado, ele contaria a Augusto tudo o que sabia sobre o caso e forçá­
lo­ia a trazer Póstumo de volta e punir os mentirosos como eles mereciam.
Na Germânia, não se passava grande coisa. Tibério dominava as pontes mas não tentou atravessar o Reno, 
pois ainda não tinha confiança nas suas tropas, que andava ocupado a pôr em forma. Os germanos também 
não tentaram atravessar. Augusto impacientou­se de novo com Tibério e insistiu com ele para que 
vingasse Varo sem mais demoras e reconquistasse as Águias. Tibério respondeu que nada estava mais 
próximo do seu coração, mas que as tropas ainda não estavam preparadas para tentar esse feito, Augusto 
enviou Germânico logo que ele terminou o seu mandato na magistratura e Tibério, então, teve que mostrar 
alguma actividade; na verdade, ele não era preguiçoso nem cobarde, mas apenas extremamente cauteloso. 
Atravessou o Reno e percorreu veloz algumas partes da província perdida, mas os germanos evitaram 
entrar em luta; e Tibério e Germânico, ambos muito cuidadosos para não caírem em nenhuma emboscada, 
não fizeram muito mais do que queimar alguns acampamentos 
158
inimigos perto do Reno e exibir a sua força militar. Houve algumas escaramuças das quais se saíram bem ­ 
e fizeram algumas centenas de prisioneiros. Ficaram naquela região até ao Outono, quando voltaram a 
atravessar o Reno; na Primavera seguinte, o muito esperado triunfo sobre os dálmatas foi celebrado em 
Roma, ao qual acrescentaram um outro por esta expedição à Germânia, apenas para restabelecer a 
confiança. Não posso deixar de dar crédito a Tibério por um acto generoso ao qual Germânico o 
persuadiu: depois de exibir Bato, o rebelde dálmata capturado, no seu triunfo, deu­lhe a liberdade e um 
grande presente em dinheiro, instalando­o confortavelmente em Ravena. Bato merecia tudo isso: Tivera 
em tempos um acto cavalheiresco, deixando Tibério escapar de um vale onde estava encurralado com o 
seu exército.
Germânico era cônsul agora e Augusto escreveu uma carta especial recomendando­o ao Senado e o 
Senado a Tibério (recomendando assim o Senado a Tibério, e não o contrário, Augusto mostrava ao 
mesmo tempo que tencionava ter Tibério como seu sucessor imperial, com autoridade sobre o Senado, e 
que não desejava pronunciar um discurso elogioso sobre ele, como fizera com Germânico). Agripina 
acompanhava sempre Germânico quando ele ia para as guerras, como minha mãe tinha acompanhado o 
meu pai. Fazia­o sobretudo por amor por ele, mas também porque não queria ficar sozinha em Roma e ser 
chamada à presença de Augusto por causa de alguma falsa acusação de adultério, Não tinha a certeza de 
como era vista por Lívia. Ela era a típica matrona dos tempos antigos ­ forte, corajosa, modesta, 
espirituosa, piedosa, fértil e casta. já dera quatro filhos a Germânico e ainda havia de lhe dar mais cinco.
Germânico, embora a regra de Lívia contra a minha presença à sua mesa continuasse de pé, e embora a 
minha mãe também não evidenciasse qualquer mudança nos seus sentimentos para comigo, levava­me 
para junto dos seus nobres amigos sempre que a ocasião se apresentava. Por causa dele, eu era tratado com 
um certo respeito, mas a opinião da família sobre as minhas capacidades era conhecida e sabia­se que 
Tibério a partilhava; por isso, ninguém se dava ao trabalho de cultivar uma relação comigo. A conselho de 
Germânico, fiz saber que iria fazer uma leitura do meu recente trabalho histórico e convidei um número de 
figuras literárias proeminentes para assistirem. O livro que tinha escolhido para ler era um em que 
trabalhara arduamente e que deveria ter sido muito interessante para o meu público ­ por causa das 
fórmulas usadas durante as abluções rituais pelos sacerdotes etruscos, em cada caso com uma tradução 
latina que lançava uma luz sobre muitos dos nossos ritos lustrais, cujo significado exacto tinha sido 
obscurecido pelo tempo. Germânico leu­o de antemão de uma ponta à outra e mostrou­o à minha mãe e a 
Lívia, que o aprovaram; depois, foi suficientemente generoso para se sentar a meu lado durante o ensaio 
da leitura. Felicitou­me tanto pelo trabalho
159
como pela apresentação e acho que deve ter falado muito no assunto, porque a sala na qual eu iria fazer a 
leitura estava cheia. Lívia não estava presente, nem Augusto, mas a minha mãe assistiu, tal como 
Germânico e Livila.
Eu estava muito bem disposto e nada nervoso. Germânico sugerira que me fortalecesse antes com uma 
taça de vinho e achei que era uma boa ideia. Foi posta uma cadeira para Augusto, caso ele aparecesse, e 
outra para Lívia, ambas verdadeiramente esplêndidas ­ as cadeiras que eram sempre reservadas para eles 
quando visitavam a nossa casa. Depois de todos terem chegado e se terem sentado, as portas foram 
fechadas e comecei a ler, Estava a sair­me lindamente, consciente de que não estava a ler depressa demais 
nem com demasiada lentidão, ou demasiado alto ou muito baixo, mas sim no tom certo, e que a 
assistência, que não viera com grandes expectativas a meu respeito, não podia deixar de se sentir 
interessada, quando ocorreu um incidente muito infeliz. Ouviu­se uma pancada forte na porta e depois, 
como ninguém fosse abrir, uma outra. Então, o puxador foi sacudido violentamente e irrompeu na sala o 
homem mais gordo que alguma vez vi na minha vida, em trajo de cavaleiro e trazendo na mão uma grande 
almofada bordada. Parei de ler porque, entretanto, tinha chegado a uma passagem difícil e importante e 
ninguém estava a ouvir ­ todos os olhos estavam postos no cavaleiro. Ele reconheceu Lívio e saudou­o 
numa espécie de cantilena, que vim a saber mais tarde ser o sotaque característico de Pádua; depois, fez 
uma saudação geral ao resto da companhia, o que provocou risos escondidos. Não prestou nenhuma 
atenção especial a Germânico como Cônsul, nem à minha mãe ou a mim mesmo, como anfitriões, Depois, 
olhou em volta à procura de assento e viu o de Augusto, mas parecia demasiado apertado para ele; por 
isso, apoderou­se do de Lívia. Pôs­lhe a almofada em cima, serrou a túnica em volta dos joelhos e sentou­
se com um grunhido. E claro está, a cadeira, que era uma peça antiga vinda do Egipto, parte do espólio do 
palácio de Cleópatra, e um trabalho muito delicado, foi­se abaixo com grande estrondo.
Todos excepto Germânico, Lívio, a minha mãe e os membros mais sérios da assistência riram 
ruidosamente; mas depois do cavaleiro se ter levantado gemido, praguejado e de ter sido escoltado para 
fora da sala por um liberto, enquanto se esfregava, fez­se um silêncio atento e eu tentei continuar. Mas fui 
acometido de um riso quase histérico. Talvez fosse o vinho que tinha bebido ou talvez fosse porque tinha 
visto a expressão na cara do indivíduo quando a cadeira começara a ceder debaixo dele, o que mais 
ninguém vira porque ele estava na primeira fila e eu era o único que me encontrava de frente para ele; mas 
fosse como fosse, a concentração nos ritos lustrais dos etruscos tornou­se­me impossível. A princípio, o 
público mostrou­se compreensivo com o meu divertimento
160
e chegou mesmo a rir comigo, mas quando, lutando para chegar ao fim de outro parágrafo, com grande 
dificuldade, calhou eu ver pelo canto do olho a cadeira que o cavaleiro partira e que estava equilibrada e 
insegura sobre as pernas estilhaçadas, fui­me novamente abaixo e a assistência começou a impacientar­se. 
Para piorar ainda mais as coisas, depois de ter lutado comigo mesmo e retomado o fio à meada, com alívio 
notório por parte de Germânico, as portas abriram­se num ímpeto e quem havia de entrar senão Augusto e 
Lívia! Emcaminharam­se com ar grandioso pelo meio das filas de cadeiras e Augusto sentou­se. Lívia 
preparava­se para fazer o mesmo quando reparou que alguma coisa não estava bem. Ela perguntou numa 
voz bem sonora e vibrante:
­ Quem é que esteve sentado na minha cadeira?
Germânico fez o possível por explicar a situação, mas ela decidiu que estava a ser insultada. Foi­se 
embora. Augusto, com ar constrangido, seguiu­a. Alguém me pode culpar por ter feito uma autêntica 
confusão do resto da minha leitura? O cruel Deus Momo deve ter estado naquela cadeira porque, cinco 
minutos depois, as pernas da mesma voltaram a cair e, mais uma vez, ela desmoronou; uma pequena 
cabeça de leão em ouro partiu­se de um dos braços, deslizou pelo chão e foi parar debaixo do meu pé 
direito, que estava ligeiramente levantado. Descontrolei­me de novo, engasgando­me, ofegante e soltando 
gargalhadas.
Germânico veio ter comigo e implorou­me que me controlasse, mas eu apenas consegui apanhar a cabeça 
do leão e apontar desesperadamente para a cadeira. Se é que alguma vez vi Germânico aborrecido comigo 
foi nessa ocasião. Perturbou­me muito vê­lo aborrecido e acalmei imediatamente. Mas perdera a confiança 
em mim mesmo e comecei a gaguejar tão fortemente que a leitura terminou de forma desastrosa. 
Germânico fez o possível por conseguir um voto de agradecimento pelo meu interessante trabalho ­ 
lamentando que um acidente inesperado me tivesse perturbado a meio e que, em consequência desse 
mesmo acidente, o Pai da Pátria e Dona Lívia sua esposa se tivessem retirado da nossa presença, 
esperando que num dia mais auspicioso no futuro próximo eu pudesse fazer nova leitura. Nunca houve um 
irmão tão atencioso como Germânico, nem homem tão nobre. Mas desde então, não voltei a fazer 
qualquer leitura pública dos meus trabalhos.
Germânico veio procurar­me um dia com um ar muito sério. Levou bastante tempo a decidir­se a falar, 
mas finalmente disse:
­ Falei com Emílio esta manhã e calhou abordarmos o assunto do pobre Póstumo. Foi ele o primeiro a 
abordá­lo, perguntando­me quais tinham sido exactamente as acusações contra Póstumo, e disse, 
aparentemente com toda a ingenuidade, que, tanto quanto sabia, Póstumo tinha tentado violar duas 
mulheres nobres, mas que ninguém parecia saber quem elas eram. Olhei­o com dureza quando ele disse 
isto, mas vi que
161
estava a falar verdade. Por isso, ofereci­me para trocar o que eu sabia pelos conhecimentos dele, mas 
apenas se prometesse guardar só para ele aquilo que lhe dissesse. Quando lhe disse que fora a própria filha 
dele que acusara Póstumo de ter tentado violá­la e na sua própria casa, ele ficou admirado e recusou­se a 
acreditar, Ficou muito zangado. Disse que a governanta de Emília certamente estivera com eles o tempo 
todo. Queria ir ter com Emília e perguntar­lhe se a história era verdadeira e, se fosse, porque é que era 
aquela a primeira vez que ele ouvia falar disso? Detive­o, recordando­lhe a promessa que me fizera. Eu 
não tinha confiança em Emília. Em vez disso, sugeri que devíamos interrogar a governanta, mas não de 
forma a alarmá­la. Assim, mandámos chamá­la e perguntámos­lhe qual fora a conversa entre Emília e 
Póstumo, durante aquele alarme de assalto, da última vez que jantara com eles. A princípio, ela pareceu 
vaga, mas quando lhe perguntei: ”Não foi sobre árvores de fruto?”, ela disse: ”Sim, claro, sobre pragas das 
árvores de fruto.” Em seguida, Emílio quis saber se tinha havido alguma outra conversa na sua ausência e 
ela disse que achava que não. Lembrava­se que Póstumo tinha estado a explicar novos métodos gregos 
para tratar a peste designada por manchas negras e que ela ficara extremamente interessada, porque 
percebia de jardins. Disse que não tinha deixado a sala nem por um momento. Assim, fui procurar Castor 
em seguida e mencionei Póstumo com toda a naturalidade. Estais lembrados que as propriedades de 
Póstumo foram confiscadas e vendidas enquanto eu estava na Dalmácia e que o produto foi colocado no 
tesouro militar? Bom, eu perguntei­lhe o que tinha acontecido a umas certas peças de baixela que me 
pertenciam e que Póstumo me pedira emprestadas para um banquete; ele disse­me como podia recuperá­
las. Depois, discutimos o seu exílio. Castor falou abertamente e satisfaz­me dizer que estou agora 
plenamente convencido no meu íntimo de que ele não fez parte da maquinação.
­ Admites agora que foi uma maquinação? ­ perguntei ansioso.
­ Receio que, ao fim e ao cabo, essa seja a única explicação. Mas o próprio Castor estava inocente, tenho a 
certeza. Ele disse­me, sem ser forçado a isso, que, por sugestão de Livila, tinha arreliado Póstumo no 
jardim, tal como Póstumo te disse que ele tinha feito. Explicou que o fizera apenas porque Póstumo 
andava a dirigir olhares a Livila e ele, como marido, não gostava disso. Mas disse que não lamentava tê­lo 
feito
­ embora talvez não fosse um gracejo de muito bom gosto ­, porque a tentativa de Póstumo para violar 
Livila e os danos graves que ele próprio sofrera às mãos daquele louco tornavam qualquer arrependimento 
despropositado.
­ Ele acreditava que Póstumo tinha tentado violar Lívia?
­ Sim. E eu não desfiz o engano. Não quis que Livila soubesse aquilo de que tu e eu suspeitamos. Porque, 
se ela soubesse, isso chegaria aos ouvidos de Lívia.
162
­ Germânico, acreditas agora que Lívia planeou tudo? Ele não respondeu.
­ Vais falar com Augusto?
­ Dei­te a minha palavra. Eu respeito sempre a minha palavra.
­ Quando é que vais?
­ Agora.
O que aconteceu na entrevista não sei e nunca o saberei. Mas Germânico parecia muito mais feliz nessa 
noite ao jantar e a maneira como evitou as minhas perguntas mais tarde, sugeria que Augusto acreditara 
nele e lhe jurara segredo de momento. Passou muito tempo antes que eu soubesse da sequência dos 
acontecimentos, aquilo que vos posso contar agora. Augusto escreveu aos corsos, que havia anos se 
queixavam de incursões dos piratas nas suas costas, que em breve iria em pessoa investigar o caso; no 
caminho, iria parar em Marselha, onde tencionava consagrar um templo. Pouco depois fez­se ao mar, mas 
interrompeu a viagem em Elba por dois dias. No primeiro dia, ordenou que os guardas de Póstumo em 
Planásia fossem substituídos imediatamente por um grupo totalmente novo. Assim se fez. Na mesma 
noite, ele navegou em segredo para o outro lado da ilha num pequeno barco de pesca, acompanhado 
apenas por Fábio Máximo, um amigo próximo, e um tal Clement, que em tempos fora escravo de Póstumo 
e tinha uma forte semelhança com o seu antigo senhor. Ouvi dizer que Clement era filho natural de 
Agripa. Tiveram a sorte de encontrar Póstumo logo que desembarcaram. Ele tinha andado a armar as 
linhas de pesca para a noite e vira a vela do barco à distância, à luz de uma lua forte: estava sozinho. 
Augusto mostrou­se e estendeu a mão, gritando:
­ Perdoa­me, meu filho! ­ Póstumo tomou­lhe a mão e beijou­a. Depois os dois afastaram­se, enquanto 
Fábio e Clement vigiavam. O que foi falado entre eles ninguém sabe; mas Augusto chorava quando 
voltaram juntos. Depois, Fábio e Clement trocaram as roupas e os nomes e Póstumo voltou a Elba com 
Augusto e Fábio; Clement tomou o lugar de Póstumo em Planásia, até chegar a ordem para a sua 
libertação, que Augusto disse que não demoraria muito. A Clement foi prometida a liberdade e uma 
grande quantia em dinheiro se fizesse bem o seu papel. Devia fingir­se doente nos dias mais próximos e 
deixar crescer o cabelo e a barba, para que ninguém notasse o embuste, especialmente porque nessa tarde 
ele não tinha sido visto pela nova guarda durante mais de alguns minutos.
Lívia suspeitava que Augusto estivesse a fazer alguma coisa nas suas costas. Conhecia o seu desagrado 
pelo mar e sabia que nunca viajava de barco quando podia ir por terra, mesmo que isso significasse perder 
um tempo precioso. Era verdade que ele não poderia ter ido até à Córsega a não ser por mar, mas os 
piratas não eram uma ameaça séria e ele podia
163
facilmente ter enviado Castor ou qualquer um de vários outros subordinados para investigar o assunto da 
sua parte. Assim, ela começou a investigar e acabou por saber que, quando Augusto parou em Elba, tinha 
ordenado que a guarda de Póstumo fosse trocada e que ele e Fábio tinham saído a apanhar chocos na 
mesma noite num barco pequeno, acompanhados apenas por um escravo.
Fábio tinha uma mulher chamada Márcia que partilhava todos os seus segredos, e Lívia, que nunca lhe 
dera muita atenção, começou agora a cultivar esse relacionamento. Márcia era uma mulher simples e fácil 
de enganar. Quando Lívia ficou com a certeza de ter conquistado totalmente a confiança de Márcia, 
chamou­a à parte um dia e perguntou:
­ Vamos, minha querida, dizei­me, Augusto ficou muito afectado quando voltou a encontrar Póstumo, ao 
cabo de tantos anos? Ele é muito mais sentimental do que aparenta. ­ Fábio tinha dito a Márcia que a 
história da viagem a Planásia era um segredo que ela não podia contar a ninguém neste mundo, ou as 
consequências poderiam ser fatais para ele. Por isso, a princípio, ela não quis responder. Lívia riu­se e 
disse:
­Ali, vós sois cuidadosa. Sois como a sentinela de Tibério na Dalmácia, que não queria deixar o próprio 
Tibério entrar no acampamento uma noite, quando ele voltou de uma cavalgada, porque não sabia a senha: 
”Ordens são ordens, meu General”, disse o idiota. Minha querida Márcia, Augusto não tem segredos para 
mim, nem eu para Augusto. Mas louvo a vossa prudência.
Assim, Márcia pediu desculpa e disse:
­ Fábio diz que ele se fartou de chorar. Lívia replicou:
­ Claro que sim. Mas talvez seja mais sensato não dizer a Fábio que falámos disto ­ Augusto não gosta que 
as pessoas saibam quanto ele confia em mim. Calculo que Fábio vos tenha falado do escravo?
Isto era um tiro no escuro. O escravo podia não ter tido qualquer importância, mas era uma pergunta que 
valia a pena fazer. Márcia respondeu:
­ Sim, Fábio disse que ele era extraordinariamente parecido com Póstumo, apenas um pouco mais baixo.
­ Não vos parece que os guardas vão notar a diferença?
­ Fábio disse que acha que não. Clement fazia parte do pessoal da casa de Póstumo; portanto, se for 
cuidadoso, não se vai trair pela ignorância; e, como sabeis, a guarda foi mudada.
Portanto, agora, Lívia só tinha que descobrir onde estava Póstumo, que calculava estivesse escondido 
algures sob o nome de Clement. Pensava que Augusto estivesse a planear restituir­lhe o seu favor e podia 
mesmo passar por cima de Tibério e nomeá­lo seu sucessor imediato à monarquia, à guisa de 
compensação. Fez Tibério seu confidente, e
164
preveniu­o das suas suspeitas. Os problemas tinham recomeçado nos Balcãs e Augusto pensava enviar 
Tibério para os reprimir antes que as coisas se tornassem sérias. Germânico estava em França a recolher 
impostos. Augusto falava em enviar Castor para fora também, para a Germânia; e tinha andado a ter 
conversas frequentes com Fábio, que Lívia concluiu estar a servir de seu intermediário junto de Póstumo. 
Logo que o caminho estivesse livre, Augusto sem dúvida enviaria Póstumo repentinamente para o Senado, 
faria revogar o decreto contra ele e nomeá­lo­ia seu colega no lugar de Tibério. Com Póstumo reabilitado, 
a via dela já não estaria segura: Póstumo tinha­a acusado de envenenar o pai e os irmãos e Augusto não 
teria voltado a dar­lhe o seu favor se não estivesse convencido de que as acusações eram bem fundadas. 
Pôs os seus agentes de maior confiança a espiar os movimentos de Fábio com a finalidade de localizar um 
escravo chamado Clement, mas eles não conseguiram descobrir nada. De qualquer forma, ela decidiu não 
perder tempo e desembaraçar­se de Fábio. Foi assaltado na rua uma noite a caminho do Palácio e recebeu 
doze punhaladas: os assaltantes mascarados fugiram. No funeral, aconteceu uma coisa escandalosa. 
Márcia atirou­se sobre o corpo do marido e suplicou­lhe que a perdoasse, dizendo que só ela tinha sido 
responsável pela sua morte, com o seu próprio descuido e desobediência. No entanto, ninguém 
compreendeu do que ela estava a falar e pensaram que o desgosto a tinha enlouquecido.
Lívia disse a Tibério que se mantivesse em comunicação constante com ela no seu caminho para os Balcãs 
e que viajasse o mais lentamente possível, pois podia ser mandado chamar a qualquer momento.
Augusto, que o acompanhara até Nápoles, viajando serenamente ao longo da costa, sentiu­se doente: tinha 
o estômago desarranjado. Lívia preparava­se para o tratar, mas ele agradeceu­lhe e disse­lhe que não era 
nada; que podia tratar­se a si mesmo. Foi ao seu armário de medicamentos e escolheu uma purga forte; 
depois, fez jejum durante um dia. Proibiu­a claramente de se preocupar com a saúde dele; já tinha bastante 
com que se preocupar. Rindo, recusou­se a comer outra coisa do que estava em cima da mesa a não ser 
pão, beber água de um jarro que ela própria usava e ingerir uns figos verdes que ele tinha apanhado da 
árvore com as próprias mãos. Nada nos seus modos para com Lívia parecia ter mudado, tal como ela não 
mudara em relação a ele, mas cada um lia o pensamento do outro.
Apesar de todas as precauções, o estômago dele voltou a piorar. Teve que interromper a viagem em Nola; 
daí, Lívia enviou uma mensagem chamando Tibério. Quando este chegou, recebeu a notícia de que 
Augusto estava em franco declínio e chamando por ele muito seriamente. já se despedira de certos ex­
cônsules, que tinham vindo apressados de Roma ao saber a notícia da sua doença. Perguntara­lhes com um 
sorriso se
165
achavam que ele tinha representado bem a farsa; que é a pergunta que os actores de comédia fazem ao 
público no final da peça. Retribuindo­lhe o sorriso, embora muitos deles tivessem lágrimas nos olhos, eles 
responderam: ”Nunca houve melhor, Augusto.” ”Então, deixai­me ir com o vosso aplauso”, disse ele. 
Tibério acorreu à sua cabeceira, onde ficou umas três horas, e depois apareceu para anunciar cheio de 
tristeza que o Pai da Pátria acabava de morrer nos braços de Lívia, com uma última saudação carinhosa 
para ele próprio, para o Senado e para o povo de Roma. Agradecia aos deuses ter chegado a tempo para 
fechar os olhos do seu pai e benfeitor. Na realidade, Augusto já estava morto havia um dia, mas Lívia 
escondera esse facto apresentando relatórios tranquilizadores ou desencorajantes com intervalos de poucas 
horas. Por uma estranha coincidência, ele morreu no mesmo quarto em que morrera o pai, setenta e cinco 
anos antes. Recordo­me bem de como a notícia me chegou. Foi no dia 20 de Agosto. Eu estava a dormir 
até mais tarde depois de ter trabalhado quase toda a noite na minha história; no Verão, era­me mais fácil 
trabalhar de noite e dormir durante o dia. Fui acordado pela chegada de dois velhos cavaleiros, que se 
desculparam por me incomodarem, mas disseram que o assunto era urgente. Augusto estava morto e a 
Nobre Ordem dos Cavaleiros reunira apressadamente e elegeram­me seu representante junto do Senado. 
Eu devia pedir que lhes fosse concedida a honra de trazer o corpo de Augusto aos ombros de volta para a 
Cidade. Ainda estava meio a dormir e não pensava no que dizia. Gritei:
­ Veneno é Rainha! Veneno é Rainha!
Eles entreolharam­se ansiosos e constrangidos e eu recompus­me e pedi desculpa, dizendo que tivera um 
sonho terrível e estava a repetir as palavras que ouvira nele. Pedi­lhes que repetissem a sua mensagem; 
depois de o terem feito, agradeci­lhes a honra que me davam e apressei­me a fazer o que me pediam. Não 
era propriamente uma honra, claro, ser escolhido como um cavaleiro distinto. Todos os que tinham 
nascido livres, não tinham de forma nenhuma caído em desgraça e possuíam propriedades acima de um 
dado valor, poderiam tornar­se cavaleiros; com as minhas ligações de família, se eu tivesse mostrado 
capacidades mesmo médias, já seria nesta altura um membro respeitado do Senado, como o meu 
contemporâneo Castor. Fui escolhido de facto por ser o único membro da família imperial que ainda 
pertencia a uma ordem inferior e para evitar invejas entre os outros cavaleiros. Esta foi a primeira vez que 
visitei o Senado durante uma sessão. Fiz o pedido sem gaguejar ou esquecer as palavras e sem cair em 
desgraça por qualquer outra razão.
166
CAPíTULO XIV
Embora se tivesse tornado claro que os poderes de Augusto estavam a falhar e que ele não tinha muitos 
mais anos de vida, Roma não conseguia habituar­se à ideia da sua morte. Não é uma comparação gratuita 
dizer que a Cidade se sentia como um rapazinho que perdeu o pai. Que o pai tenha sido um homem 
corajoso ou um cobarde, justo ou injusto, generoso ou mesquinho, pouco significa: ele era o pai desse 
rapaz e nenhum tio ou irmão mais velho poderá alguma vez ocupar o seu lugar. A verdade é que a 
governação de Augusto tinha sido muito longa e um homem tinha que ter já passado da meia­idade para se 
lembrar de como fora para trás. Não era portanto totalmente anti­natural que o Senado reunisse para 
deliberar se as honras divinas que lhe tinham sido prestadas, mesmo em vida, pelas províncias, lhe deviam 
ser prestadas agora pela própria Cidade. O filho de Pólio, Caio ­ odiado por Tibério por ter casado com 
Vipsânia (primeira mulher de Tibério, como deveis estar lembrados, de quem ele tinha sido obrigado a 
divorciar­se por causa de Júlia) e por ele ter uma língua mordaz e nunca ter feito um desmentido público 
do boato que fazia dele o verdadeiro pai de Castor ­, foi o único senador que ousou pôr em causa a 
propriedade da moção. Levantou­se para perguntar que prodígio divino ocorrera para sugerir que Augusto 
seria bem recebido nas Mansões Celestiais ­ apenas mediante recomendação dos seus amigos e 
admiradores mortais?
Seguiu­se um silêncio desconfortável, mas, finalmente, Tibério levantou­se devagar e disse:
­ Há cem dias, estareis lembrados, o frontão da estátua de meu pai Augusto foi atingido por um raio. A 
primeira letra do seu nome foi apagada, o que deixou as palavras AESAR AUGUSTUS. Qual é o 
significado da letra C? É o símbolo de cem. O que significa AESAR? Eu digo­vos. Significa Deus, na 
língua etrusca. Nitidamente, cem dias após a queda do raio, Augusto deverá tornar­se um Deus em Roma. 
Que prodígio mais evidente que este podereis desejar?
Embora Tibério assumisse sozinho o crédito por esta interpretação, fora eu o primeiro a dar sentido a 
AESAR (a estranha palavra tinha sido muito discutida), sendo a única pessoa em Roma que estava 
familiarizada com a língua etrusca. Falei nisso a minha mãe e ela chamou­me louco
167
fantasista, mas deve ter ficado suficientemente impressionada para repetir a Tibério o que eu dissera, uma 
vez que não falei no caso a ninguém a não ser a ela.
Caio perguntou por que é que Júpiter havia de transmitir as suas mensagens em etrusco e não em grego ou 
em latim? Alguém podia jurar ter observado qualquer outro augúrio mais conclusivo? Era muito fácil 
decretar novos deuses a ignorantes provincianos asiáticos, mas a Ilustre Casa devia fazer uma pausa antes 
de ordenar a cidadão educados que adorassem um dos seus próprios membros, ainda que distinto. É 
possível que Caio tivesse conseguido bloquear o decreto através deste apelo ao orgulho e sanidade de 
Roma, se não fosse um homem chamado Ático, um magistrado superior. Ele ergueu­se solenemente para 
dizer que, quando o corpo de Augusto tinha sido queimado nos Campos de Marte, ele vira uma nuvem 
descer do céu e o espírito do morto subir para ela, precisamente da mesma maneira que a tradição relata 
que os espíritos de Rómulo e Hércules ascenderam. Ele juraria por todos os Deuses que estava a 
testemunhar a verdade.
Este discurso foi acolhido com retumbantes aplausos e Tibério, triunfante, perguntou se Caio tinha mais 
algum comentário a fazer. Caio disse que sim. Recordava­se, disse, de outra tradição primitiva sobre a 
morte repentina e desaparecimento de Rómulo, que aparecia nas obras, mesmo dos historiadores mais 
sérios, como uma alternativa à citada pelo seu respeitável e verídico amigo Ático: designadamente, que 
Rómulo era de tal forma odiado pela sua tirania sobre um povo livre que um dia, aproveitando um 
nevoeiro repentino, o Senado o assassinou, cortou em pedaços e levou esses mesmos pedaços sob as 
túnicas.
­ E Hércules? ­ perguntou alguém apressadamente. Caio disse:
­ O próprio Tibério, na sua eloquente oração durante o funeral, repudiou a comparação entre Augusto e 
Hércules. As suas palavras foram: ”Hércules, na sua infância, só enfrentou serpentes, e em adulto, apenas 
um veado ou dois, um javali selvagem que matou e um leão; e mesmo isto fê­lo com relutância e por 
ordem de outra pessoa, enquanto que Augusto lutou não apenas com animais, mas com homens e por sua 
livre vontade” ­ e assim por diante. Mas a mínha razão para repudiar a comparação reside nas 
circunstâncias da morte de Hércules.
Em seguida, sentou­se. A referência era perfeitamente clara para qualquer pessoa que analisasse a questão; 
na verdade, segundo a lenda, Hércules morreu por causa do veneno que lhe foi ministrado pela própria 
mulher.
Mas a moção que visava a deificação de Augusto foi levada por diante. Santuários dedicados à sua pessoa 
foram construídos em Roma e nas cidades vizinhas. Uma ordem de sacerdotes foi formada para 
administrar os seus rituais e Lívia, que ao mesmo tempo recebera os títulos de Júlia e
168
Augusta, foi nomeada Sacerdotisa Suprema. Ático foi recompensado por Lívia com uma oferta de dez mil 
moedas de ouro e foi nomeado um dos novos sacerdotes de Augusto, tendo­lhe sido mesmo perdoado o 
pesado ónus de iniciação. Fui também nomeado sacerdote, mas tive que fazer um pagamento mais elevado 
que qualquer um pela iniciação, por ser neto de Lívia. Ninguém ousou perguntar o motivo porque aquela 
visão da ascensão de Augusto só fora presenciada por Ático. E o mais divertido era que, na noite anterior 
ao funeral, Lívia tinha escondido uma águia numa gaiola no topo da pira, gaiola que deveria ser aberta 
logo que a pira estivesse acesa, por alguém que puxaria um cordão pela parte de baixo. Então, a águia 
levantaria voo e a ideia era que fosse tomada pelo espírito de Augusto. Infelizmente, o milagre não se 
produzira. A porta da gaiola não se abriu. Em vez de ficar calado e deixar que a águia ardesse, o 
funcionário encarregado trepou pela pira e abriu a porta da gaiola por suas próprias mãos. Lívia teve que 
dizer que a águia tinha sido solta por ordem sua como um acto simbólico.
Não vou escrever mais nada sobre o funeral de Augusto, embora nunca se tivesse visto nenhum tão 
magnífico em Roma, pois tenho que começar agora a omitir todos os pormenores na minha história, 
excepto os de primeira importância. já enchi mais de treze rolos do melhor papel ­ da nova fábrica que 
equipei recentemente ­ e ainda não cheguei a um terço do caminho. Mas não posso deixar de falar do 
conteúdo do testamento de Augusto, cuja leitura era aguardada com interesse e impaciência gerais. 
Ninguém estava mais ansioso para saber o que ele continha do que eu, e vou explicar porquê.
Um mês antes da sua morte, Augusto aparecera de repente à porta do meu estúdio ­ acabava de visitar a 
minha mãe, que estava a convalescer de uma longa doença ­ e, depois de mandar sair os seus 
acompanhantes, começara a falar comigo de uma forma desconexa, sem me olhar directamente, mas 
comportando­se de um modo tão tímido como se ele fosse Cláudio e eu Augusto. Pegou num livro da sua 
história e leu uma passagem.
­ Excelente escrita! ­ disse. ­ E quando é que o trabalho ficará terminado?
Eu respondi:
­ Dentro de um mês ou menos. ­ Ele felicitou­me e disse que, nessa altura, daria ordens para que houvesse 
uma leitura pública às suas custas, convidando os seus amigos para assistirem. Fiquei perfeitamente 
espantado com isto, mas ele continuou de uma forma amigável, perguntando­me se não preferia um 
declamador profissional para fazer justiça ao trabalho, em vez de ser eu a ler: disse que a leitura em 
público do próprio trabalho devia ser muito embaraçosa ­ embora o velho Pólio tivesse confessado que 
ficava sempre nervoso nessas ocasiões. Agradeci­lhe com
169
toda a sinceridade e afeição e disse que um profissional seria evidentemente mais adequado, se o meu 
trabalho na verdade merecia essa honra. Depois, ele estendeu­me repentinamente a mão:
­ Cláudio, tens algum ressentimento contra mim?
Que podia eu responder? As lágrimas inundaram­me os olhos e murmurei que o venerava e que ele nunca 
fizera nada para merecer o meu ressentimento. Ele disse com um suspiro:
­Não mas, por outro lado, fiz pouco para ganhar o teu amor. Aguarda mais alguns meses, Cláudio, e 
espero ser capaz de ganhar tanto o teu amor como a tua gratidão. Germânico falou­me de ti. Diz que és  
leal a três coisas: aos teus amigos, a Roma e à verdade. Eu sentir­me­ia muito orgulhoso se Germânico 
pensasse o mesmo de mim.
­ O amor de Germânico por vós não está longe de uma verdadeira adoração, ­ repliquei. ­Disse­mo ele 
muitas vezes.
O rosto dele iluminou­se.
­Juras? Sinto­me muito feliz. Portanto agora, Cláudio, há um laço forte entre nós, que é a boa opinião de 
Germânico. E o que eu vim dizerte é o seguinte: tratei­te muito mal durante todos estes anos e lamento­o 
sinceramente e, a partir de agora, verás que as coisas vão mudar. ­ Fez uma citação em grego. ­ Aquele 
que te feriu é que te há­de curar. ­ E, dizendo isto, abraçou­me. Quando se voltou para se ir embora, disse 
por cima do ombro, ­ Acabo de fazer uma visita às Virgens Vestais e fiz algumas importantes alterações 
num documento meu que lhes foi entregue; visto que tu próprio és parcialmente responsável por estas 
alterações, dei maior proeminência ao teu nome do que ele tinha antes. Mas nem uma palavra! Nem uma 
palavra!
­ Podeis confiar em mim, ­ disse.
Ele só podia querer dizer uma coisa com aquilo: que tinha acreditado na história de Póstumo tal como eu a 
contara a Germânico e estava agora a repô­lo no seu testamento (que estava à guarda das Vestais) como 
seu herdeiro; e que eu iria beneficiar também, como recompensa pela minha lealdade para com ele. Nessa 
altura, claro, eu não sabia da visita de Augusto a Planásia, mas esperava confiante que Póstumo havia de 
ser trazido de volta e tratado com honra. Bom, fiquei decepcionado. Como Augusto tinha sido tão discreto 
quanto ao novo testamento, ao qual Fábio Máximo e alguns velhos sacerdotes decrépitos tinham servido 
de testemunhas, era fácil suprimi­lo a favor de um que tinha sido feito seis anos antes, na altura em que 
Póstumo fora deserdado. A frase de abertura era: ”Na medida em que um destino sinistro me fez perder 
Caio e Lúcio, meus filhos, é agora meu desejo que Tibério Cláudio Nero César se torne herdeiro, em 
primeiro lugar, de dois terços dos meus bens; e que do terço que resta e também em primeiro lugar, é 
agora meu desejo que minha amada esposa Lívia se torne minha herdeira, caso o Senado tenha a
170
benevolência de permitir que ela herde tudo isso (pois ultrapassa o que está determinado por estatuto 
como legado para uma viúva), fazendo uma excepção no seu caso por se ter tornado tão merecedora da 
benevolência do Estado.” Em segundo lugar ­ isto é, no caso dos beneficiários mencionados em primeiro 
lugar morrerem ou ficarem de qualquer outra forma incapacitados de herdar ­, ele pôs aqueles dos seus 
netos e bisnetos que fossem membros da casa juliana e não tivessem caído publicamente em desgraça; 
mas Póstumo tinha sido deserdado. Portanto, isto referia­se a Germânico, como filho adoptivo de Tibério e 
marido de Agripina, e à própria Agripina e aos filhos desta; e a Castor, Livila e seus filhos. Neste segundo 
lugar, o testamento nomeava diversos senadores e parentes distantes, mais como uma marca de favor do 
que como uma probabilidade de benefício. Augusto não podia ter esperado sobreviver a tantos herdeiros 
da primeira e segunda posição. Os herdeiros da terceira posição foram agrupados em três categorias: os 
dez mais favorecidos foram inscritos como herdeiros conjuntos de metade dos bens; os cinquenta que 
vinham a seguir foram inscritos para partilhar um terço dos bens e o terceiro grupo continha os nomes de 
outros cinquenta, que deviam herdar o restante sexto. O último nome nessa lista da última posição era 
Tibério Cláudio Druso Nero Germânico, o que queria dizer Clau­Clau­Cláudio, ou Cláudio o Idiota, ou, 
como os filhos pequenos de Germânico estavam já aprendendo a chamar­lhe, O pobre tio Cláudio ­ na 
realidade, eu próprio. Não havia qualquer referência a Júlia ou a Julila, excepto uma cláusula que proibia 
as suas cinzas de serem enterradas no mausoléu ao lado do seu próprio corpo, quando viessem a morrer.
Embora Augusto tivesse nos vinte anos anteriores beneficiado dos testamentos dos velhos amigos a quem 
sobrevivera, no montante de nada menos que 140 milhões de moedas de ouro, e tivesse vivido uma vida 
extremamente frugal, gastara tanto em templos e obras públicas, em donativos e entretenimentos para a 
populaça, em guerras de fronteira (quando já não restava dinheiro algum no tesouro militar) e em despesas 
oficiais do mesmo género, que daqueles 140 milhões e de um considerável volume de tesouro privado, 
proveniente de várias origens, apenas quinze milhões restavam para o legado, uma boa parte dos quais não 
era facilmente realizável em dinheiro. No entanto, isto não incluía certas somas importantes de dinheiro, 
não incluídas no espólio e prontas e amarradas em sacos nos cofres do Capitólio; dinheiro esse que tinha 
sido posto de lado para legados especiais a reis confederados, aos senadores e cavaleiros, aos seus 
soldados e aos cidadãos de Roma. Este, perfazia mais dois milhões. Havia ainda uma soma posta de lado 
para as despesas do funeral. Toda a gente ficou surpreendida com a exiguidade do património e toda a 
espécie de rumores desagradáveis foram postos a correr, até que as contas de Augusto foram apresentadas 
e ficou claro que não havia fraude por parte dos
171
executores. Os cidadãos ficaram muito descontentes com os seus magros legados e, quando uma peça 
comemorativa foi exibida em honra de Augusto à custa do erário público, houve uma desordem no teatro: 
o Senado tinha restringido a tal ponto a doação, que um dos actores da peça se recusou a aparecer para 
receber o pagamento que lhe era oferecido. Do descontentamento do Exército falarei em breve. Mas 
primeiro vamos a Tibério,
Augusto tinha feito Tibério seu colega e herdeiro, mas não podia legar­lhe a monarquia ou, pelo menos, 
não abertamente. Apenas podia recomendá­lo ao Senado, para quem todos os poderes que ele exercera 
revertiam agora. O Senado não gostava de Tibério e não desejava que ele fosse Imperador, mas 
Germânico, a quem eles teriam escolhido se tivessem tido essa oportunidade, estava longe. E os direitos 
de Tibério não podiam ser ignorados.
Assim, ninguém ousou mencionar qualquer nome a não ser o de Tibério e não houve desacordo quanto à 
moção, apresentada pelos Cônsules, que o convidava a tomar o trabalho de Augusto no ponto em que ele o 
deixara. Ele deu uma resposta evasiva, acentuando a imensa responsabilidade que estavam a tentar pôr 
sobre ele e a sua própria ausência de ambição. Disse que só o Deus Augusto tinha sido capaz daquela 
poderosa tarefa e que, na sua opinião, seria melhor dividir os encargos de Augusto em três partes, 
dividindo assim também a responsabilidade.
Senadores ansiosos por captar as suas boas graças alegaram que o triunvirato, ou a governação de três 
homens, já tinha sido tentada mais de uma vez no século precedente e que a monarquia se apresentara 
como o único remédio para as consequentes guerras civis. Seguiu­se uma cena infeliz. Senadores fingiram 
chorar e lamentar­se e abraçaram os joelhos de Tibério, implorando­lhe que fizesse o que eles pediam. 
Tibério, para pôr fim àquilo, disse que não desejava esquivar­se a qualquer encargo que fosse posto nos 
seus ombros, mas mantinha a sua afirmação de que não estava à altura de suportar todo o fardo. Já não era 
nenhum jovem: tinha cinquenta e seis anos e a sua vista não estava boa. Mas encarregar­se­ia de qualquer 
parcela que lhe confiassem, Tudo isto foi feito para que ninguém pudesse acusá­lo de agarrar o poder com 
excessiva ansiedade: e especialmente para que Germânico e Póstumo (onde quer que estivessem) 
pudessem ficar impressionados com a força da sua posição na Cidade. Na verdade, ele tinha medo de 
Germânico, cuja popularidade junto do exército era infinitamente maior que a sua. Não acreditava que 
Germânico fosse capaz de tomar o poder pelos seus próprios objectivos egoístas, mas pensava que, se ele 
soubesse do testamento suprimido, podia tentar restituir a Póstumo a herança que lhe cabia de direito e 
mesmo fazer dele a terceira figura ­ Tibério, Germânico e Póstumo no novo triunvirato. Agripina era 
muito dedicada a Póstumo e Germânico
172
seguia os seus conselhos tão consistentemente como Augusto seguira os de Lívia. Se Germânico 
marchasse sobre Roma, o Senado acorreria num só corpo para lhe dar as boas vindas. Tibério sabia­o. E, 
na pior das hipóteses, comportando­se agora com modéstia, poderia escapar com vida e viver tranquila e 
honradamente.
O Senado compreendeu que Tibério desejava realmente aquilo que recusava com tanta modéstia e 
preparavam­se para renovar os seus apelos quando Caio interveio num tom prático:
­ Muito bem, Tibério, qual a parte do governo que desejas que te seja atribuída?
Tibério ficou confundido com aquela pergunta incómoda e inesperada. Manteve­se algum tempo em 
silêncio e finalmente disse:
­ O mesmo homem não pode simultaneamente fazer a divisão e escolher; mesmo que isto fosse possível, 
seria falta de modéstia da minha parte escolher ou rejeitar um dado ramo da administração quando, tal 
como expliquei, o que realmente desejo é que me dispensem de todos eles.
Caio insistiu de novo:
­ A única divisão possível do Império seria: primeiro, Roma e toda a Itália; segundo, os exércitos; e 
terceiro, as províncias. Qual escolherias? Como Tibério ficasse silencioso, Caio continuou:
­ Bom. Eu sei que não há resposta. Foi por isso que fiz a pergunta. Queria que admitisses com o teu 
silêncio que era uma insensatez falar em dividir em três partes um sistema administrativo que foi 
construído e coordenado de forma centralizada por um único indivíduo. Ou temos que retomar a forma de 
governo republicana, ou continuar com a monarquia. É desperdiçar o tempo da Casa, que parece ter­se 
decidido a favor da monarquia, continuar a falar em triunviratos. Foi­te oferecida a monarquia. É pegar ou 
largar.
Outro senador, um amigo de Caio, disse:
­ Como Protector do Povo, tens o poder de vetar a moção dos Cônsules oferecendo­te a monarquia. Se 
realmente não a queres, devias ter usado o teu veto meia hora atrás.
Assim, Tibério foi obrigado a pedir desculpa ao Senado e a dizer que a rapidez e o inesperado de tal honra 
o tinham subjugado: pedia permissão para considerar um pouco mais longamente a sua resposta.
O Senado então suspendeu os trabalhos e, em sessões posteriores, Tibério gradualmente aceitou ser 
votado, um por um, para todos os cargos de Augusto. Mas nunca usou o nome de Augusto, que lhe tinha 
sido transmitido, excepto quando escrevia cartas a reis estrangeiros; e tinha o cuidado de desencorajar 
qualquer tendência para lhe prestarem honras divinas. Havia outra explicação para este seu 
comportamento cauteloso, designadamente o facto de Lívia se ter gabado em público de que ele
173
estava a receber a monarquia como presente das mãos dela. Fez essa afirmação não só para fortalecer a 
sua posição como viúva de Augusto, mas para prevenir Tibério de que, se os seus crimes alguma vez 
viessem a ser conhecidos, ele seria olhado como seu cúmplice, sendo a pessoa que mais beneficiava com 
eles. Naturalmente, ele desejava aparecer como não tendo qualquer obrigação para com ela e sim como 
tendo sido obrigado pelo Senado a aceitar a monarquia, mesmo contra vontade.
O Senado era prolífico em lisonjas a Lívia e queria conferir­lhe honras em que nunca se ouvira falar, Mas 
Lívia, como mulher, não podia assistir aos debates do Senado e estava agora legalmente sob a tutela de 
Tibério
­ ele tornara­se o chefe da casa Juliana. Assim, depois de ter recusado para si próprio o título de Pai da 
Pátria, recusara em nome dela o título de Mãe da Pátria que lhe tinha sido oferecido, alegando que a 
modéstia não lhe permitia que o aceitasse. No entanto, ele estava imensamente receoso de Lívia e, a 
princípio, totalmente dependente dela para aprender os segredos internos do sistema imperial. Não se 
tratava apenas de entender a rotina. Os processos criminais de cada homem com alguma importância nas 
duas Ordens e da maioria das mulheres importantes, relatórios dos serviços secretos de naturezas diversas, 
a correspondência particular de Augusto com reis confederados e os seus parentes, cópias de cartas 
traiçoeiras interceptadas mas devidamente remetidas ­ tudo isto estava à guarda de Lívia e escrito em 
código e Tibério não podia ler nada sem a ajuda dela. Mas, ao mesmo tempo, sabia que Lívia era 
extremamente dependente dele. Havia entre ambos um entendimento de cooperação cautelosa. Ela 
agradeceu­lhe mesmo ter recusado o título que lhe era oferecido, dizendo que tivera razão em fazê­lo; em 
troca, ele prometeu que faria com que lhe votassem todos os títulos que ela desejasse, logo que as suas 
posições parecessem asseguradas. Como prova de boa fé, pôs o nome dela ao lado do seu em todas as 
cartas oficiais. Lívia, como prova da sua, deu­lhe a chave da cifra comum, embora não a da cifra 
extraordinária, o segredo da qual, alegou, tinha morrido com Augusto. Era na cifra extraordinária que os 
processos estavam escritos.
Falemos agora de Germânico. Quando, em Lião, soube da morte de Augusto, dos termos do seu 
testamento e da sucessão de Tibério, sentiu que era seu dever acatar lealmente o novo regime. Era 
sobrinho e filho adoptivo de Tibério e, embora não houvesse uma verdadeira afeição entre ambos, tinham 
conseguido trabalhar juntos e sem fricção, tanto em Roma como em campanha. Não suspeitava que 
Tibério tivesse tido qualquer cumplicidade na intriga que resultara no afastamento de Póstumo e estava 
convencido de que este continuava em Planásia ­ Augusto não falara a ninguém excepto a Fábio, quer da 
visita quer da substituição. Decidiu, no entanto, regressar a Roma logo que pudesse e discutir francamente 
o caso de Póstumo com Tibério. Explicar­lhe­ia que Augusto lhe dissera
174
particularmente que tencionava restabelecer Póstumo em situação de favor, logo que tivesse provas 
da sua inocência para oferecer ao Senado; e que, embora a morte o tivesse impedido de pôr em prática as 
suas intenções, elas deviam ser respeitadas. Iria insistir no regresso imediato de Póstumo, na devolução 
dos bens que lhe tinham sido confiscados e na sua elevação a um cargo honroso; e por fim, no afastamento 
compulsivo de Lívia dos negócios do Estado, por ter injustamente engendrado o exílio dele. Mas, antes 
que pudesse fazer qualquer coisa nesse sentido chegaram notícias de Mainz de um motim do exército do 
Reno. Depois, quando se apressava para ir debelá­lo, veio a notícia da morte de Póstumo. Póstumo, tal era 
a informação, tinha sido morto pelo capitão da guarda, que tinha ordens de Augusto para não deixar que o 
neto lhe sobrevivesse. Germânico ficou chocado e desgostoso com a execução de Póstumo mas, no 
momento, não tinha tempo para pensar noutra coisa que não fosse o motim. Podeis ter a certeza, no 
entanto, de que a notícia causou o mais profundo desgosto ao pobre Cláudio, pois, nesta altura, não lhe 
faltava tempo livre. Pelo contrário, o pobre Cláudio tinha muitas vezes dificuldade em encontrar ocupação 
para o seu espírito. Ninguém consegue escrever história durante mais de cinco ou seis horas por dia, 
especialmente quando há poucas esperanças de que alguém venha alguma vez a lê­la. Assim, entreguei­
me ao meu desespero. Como é que podia saber que a vítima tinha sido Clement e não Póstumo e que o 
assassinato não só não fora ordenado por Augusto, mas que Lívia e Tibério também estavam inocentes 
neste caso?
O verdadeiro responsável pelo assassinato de Clement tinha sido um velho cavaleiro chamado Crispo, 
proprietário dos Jardins de Salusto e amigo íntimo de Augusto. Em Roma, logo que soube da morte de 
Augusto, não esperara para consultar Lívia e Tibério em Nola e enviara de imediato a ordem para a 
execução de Póstumo, dirigida ao capitão da guarda em Planásia, apondo­lhe o selo de Tibério. Tibério 
tinha­lhe confiado um duplicado do selo para que assinasse alguns papéis de negócios que ele não tinha 
conseguido arrumar antes de ser enviado para os Balcãs. Crispo sabia que Tibério ia ficar zangado, ou 
fingir que o estava, mas explicou a Lívia, cuja protecção reclamou imediatamente, que se desembaraçara 
de Póstumo ao ser informado de uma conspiração por parte de alguns oficiais da Guarda para mandar um 
navio libertar Júlia e Póstumo e conduzi­los até aos regimentos de Colónia; aí, Germânico e Agripina não 
poderiam deixar de os receber e abrigar e os oficiais forçariam então Germânico e Póstumo a marchar 
sobre Roma. Tibério ficou furioso por o seu nome ter sido usado daquela forma, mas Lívia resolveu 
encaminhar as coisas para o lado melhor e fingiu que realmente era Póstumo que tinha morrido. Crispo 
não foi processado e o Senado foi informado particularmente de que Póstumo morrera por ordem do
175
seu avô divinizado, que previra sensatamente que o jovem de temperamento fugaz havia de tentar usurpar 
o poder supremo logo que recebesse a notícia da sua morte; como ele realmente fizera. O motivo de 
Crispo para mandar matar Póstumo não era o desejo de ganhar favor aos olhos de Tibério e Lívia, ou de 
impedir a guerra civil. Estava sim a vingar um insulto. Na verdade, Crispo, que tinha tanto de preguiçoso 
como de rico, gabara­se uma vez de nunca ter tido qualquer cargo, contentando­se em ser um simples 
cavaleiro romano. Póstumo replicara:
­ Um simples cavaleiro romano, Crispo? Então faríeis melhor em receber algumas lições simples de 
equitação romana.
Tibério ainda não ouvira falar no motim. Escreveu a Germânico uma carta amistosa, dando­lhe os 
pêsames pela perda de Augusto e dizendo que Roma agora contava com ele e com o irmão adoptivo 
Castor para a defesa das fronteiras, sendo ele agora demasiado idoso para o serviço no estrangeiro e 
solicitado pelo Senado para dirigir os assuntos em Roma. Referindo­se à morte de Póstumo, disse que 
deplorava a violência a ela associada, mas que não podia pôr em causa a sensatez de Augusto quanto a 
essa questão. Não disse nada sobre Crispo. Germânico só podia concluir que Augusto tinha uma vez mais 
mudado de opinião em relação a Póstumo, com base em alguma informação da qual ele próprio nada 
sabia; durante algum tempo, contentou­se em deixar o assunto por aí.
176
CAPíTULO XV
O motim no Reno tinha estalado por simpatia com um motim entre as forças dos Balcãs. A decepção dos 
soldados com os legados previstos no testamento de Augusto ­ uns meros quatro meses de soldo como 
prêmio, três moedas de ouro por cada homem ­, agravou algumas queixas antigas; e eles acharam que a 
insegurança da posição de Tibério o forçaria a satisfazer quaisquer pretensões razoáveis que lhe 
apresentassem para lhes conquistar a boa vontade. Estas pretensões incluíam um aumento do soldo, tempo 
de serviço limitado a dezasseis anos, abrandamento da disciplina no acampamento. O pagamento era sem 
dúvida insuficiente: os soldados tinham que se armar e equipar com ele e os preços tinham subido. E, sem 
dúvida, a exaustão das reservas militares tinha mantido sob os estandartes de Roma milhares de soldados 
que deviam ter sido desmobilizados havia anos e tinham mesmo sido chamados para o serviço veteranos 
que já não estavam em condições de combater. Para além disso, os destacamentos formados por escravos 
recém­libertos eram uma força de combate de tão má qualidade, que Tibério achara necessário apertar a 
disciplina, escolhendo para capitães os militares mais exigentes e dando­lhes instruções para que 
mantivessem os homens constantemente ocupados em trabalho duro, mantendo eles por sua vez as varas 
de videira nova ­ distintivas da sua posição ­ constantemente ocupadas nas costas deles.
Quando a notícia da morte de Augusto chegou às tropas dos Balcãs, três regimentos encontravam­se 
juntos num acampamento de Verão e o General deu­lhes alguns dias de férias das revistas e das faxinas. 
Esta experiência de descontracção e ociosidade desestabilizou­os e eles recusaram­se a obedecer aos seus 
capitães, quando chamados de novo à parada. Formularam certas exigências. O General disse­lhes que não 
tinha autoridade para satisfazer tais pedidos e preveniu­os do perigo de uma atitude de rebeldia. Eles não 
lhe ofereceram violência, mas recusaram­se a ser forçados a obedecer e, finalmente, obrigaram­no a enviar 
o filho a Roma para transmitir as suas exigências a Tibério. Depois do enviado ter deixado o 
acampamento para cumprir essa missão, a desordem cresceu. Os homens menos disciplinados começaram 
a pilhar o acampamento e as aldeias vizinhas e, quando o General prendeu os cabecilhas, os outros 
invadiram
177
a sala da guarda e libertaram­nos, acabando por matar um capitão que tentou fazer­lhes frente. Este 
capitão tinha a alcunha de Velho dá­cá­Outra porque, depois de quebrar as vergastas nas costas de um 
homem, pedia logo outras e outras e outras. Quando o filho do General chegou a Roma, Tibério enviou 
Castor para apoiar o General à frente de dois batalhões de Guardas, um esquadrão de cavalaria da Guarda 
e quase todo o Batalhão Interno, formado por germanos; um oficial do estado­maior chamado Sejano, 
filho do Comandante dos Guardas e um dos poucos amigos íntimos de Tibério, foi com Castor como seu 
tenente. Sobre este Sejano, terei outras coisas para escrever mais tarde. À chegada, Castor dirigiu­se à 
multidão dos soldados num tom destemido e cheio de dignidade e leu­lhes uma carta do pai, prometendo 
tomar conta dos invencíveis regimentos com quem partilhara os rigores de tantas guerras e negociar com o 
Senado sobre as suas reivindicações logo que se tivesse refeito do desgosto pela morte de Augusto. 
Entretanto, escrevera, o filho vinha ao encontro deles para fazer quaisquer concessões imediatas que 
fossem praticáveis ­ o resto, tinha que ser reservado ao Senado.
Os amotinados fizeram um dos capitães agir como porta­voz e apresentar as suas exigências, pois nenhum 
soldado se arriscaria a fazê­lo com medo de ser apontado mais tarde como agitador. Castor disse que 
lamentava muito, mas que o limite de dezasseis anos para o serviço, a desmobilização dos veteranos e o 
aumento do soldo para uma moeda de prata por dia eram solicitações que ele não tinha autoridade para 
conceder. Só o pai ou o Senado podiam fazer tais concessões.
Isto deixou os homens com uma disposição terrível. Perguntaram­lhe por que diabo viera até ali, se não 
tinha poder para fazer nada por eles. O pai, Tibério, disseram, costumava sempre pregar­lhes a mesma 
partida quando apresentavam as suas queixas: costumava esconder­se atrás de Augusto e do Senado. O 
que era o Senado, afinal? Um bando de preguiçosos ricos e inúteis, a maior parte dos quais morreria de 
medo se alguma vez avistasse um escudo inimigo ou se visse uma espada desembainhada com fúria! 
Começaram a atirar pedras aos homens de Castor e a situação tornou­se perigosa. Mas foi salva nessa 
noite por um acaso feliz. A lua estava em eclipse, o que afectou o exército ­ todos os soldados são 
supersticiosos ­ de uma forma surpreendente. Tomaram o eclipse por um sinal de que o Céu estava 
zangado com eles por terem assassinado o Velho Dá­cá­Outra e por desafiarem a autoridade. Havia um 
número de lealistas secretos entre os amotinados e um deles foi procurar Castor, sugerindo­lhe que se 
servisse de outros como ele próprio e os enviasse pelas tendas em grupos de dois ou três, para tentar 
chamar à razão os descontentes. Isso foi feito. De manhã, o ambiente no acampamento era muito diferente 
e Castor, embora consentisse em enviar de novo o filho do General a Tibério com as mesmas solicitações 
endossadas por ele
178
próprio, prendeu os dois homens que pareciam ter começado o motim e executou­os em público. Os 
outros não protestaram e entregaram mesmo voluntariamente os cinco assassinos do capitão, como prova 
da sua fidelidade. Mas havia ainda uma recusa firme às revistas e a quaisquer faxinas, a não ser as mais 
necessárias, até que viesse uma resposta de Roma. O tempo sofreu um agravamento e a chuva inundou o 
acampamento, impossibilitando os homens de se manterem em comunicação de tenda para tenda. Isso foi 
tomado como um novo aviso do Céu e, antes que o mensageiro tivesse tempo de regressar, o motim estava 
acabado, com os regimentos a marcharem obedientemente para os quartéis de Inverno, sob o comando dos 
seus oficiais.
Mas o motim no Reno foi uma coisa muito mais séria. A Germânia romana era agora limitada a leste pelo 
Reno e dividida em duas províncias, a Superior e a Inferior. A capital da Província Superior, que se 
estendia até à Helvécia, era Mainz, e a da Província Inferior, que chegava a norte ao Scheldt e a Sambre, 
era Colónia. Um exército de quatro regimentos guarnecia cada uma das províncias e Germânico era 
Comandante­emChefe. As desordens irromperam num acampamento de Verão do Exército Inferior. Aqui, 
as queixas eram as mesmas que no exército dos Balcãs mas a conduta dos amotinados foi mais violenta 
por causa da maior proporção de libertos da Cidade recém­recrutados nas suas fileiras. Estes libertos eram 
ainda escravos por natureza e acostumados a uma vida muito mais ociosa e envolta em luxos do que os 
cidadãos nascidos livres, na sua maioria camponeses pobres, que formavam o grosso do exército. Esses 
libertos davam soldados verdadeiramente maus e o que tinham de mau não era controlado por qualquer 
esprit­de­corp do regimento. Estes, na realidade, não eram os regimentos que tinham estado sob o 
comando de Germânico na recente campanha; eram homens de Tibério.
O General perdeu a cabeça e não conseguiu controlar a insolência dos amotinados, que se apinharam à 
volta dele com queixas e ameaças. O seu nervosismo encorajou­os a cair sobre os capitães mais odiados, 
cerca de vinte dos quais mataram à vergastada com as suas próprias varas de videira, atirando os corpos ao 
Reno. Os restantes foram escarnecidos e insultados e expulsos do acampamento. Cássio Chaerea foi o 
único oficial superior que fez alguma tentativa para se opor àquele comportamento monstruoso e nunca 
visto. Foi assaltado por um grande grupo, mas, em vez de fugir ou suplicar misericórdia, correu direito 
para o meio deles com a espada desembainhada, acutilando à direita e à esquerda, e abriu caminho até à 
plataforma sagrada do tribunal, onde sabia que nenhum soldado ousaria tocar­lhe.
Germânico não tinha batalhões de Guardas para o apoiarem, mas dirigiu­se imediatamente para o 
acampamento amotinado, levando
179
apenas uma pequena escolta atrás. Ainda não estava ao corrente do massacre. Os homens reuniram­se à 
sua volta numa multidão desordenada, tal como tinham feito com o seu General, mas Germânico recusou 
calmamente dizer­lhes o que quer que fosse, enquanto não tivessem formado decentemente em 
companhias e batalhões sob os respectivos estandartes, para saber a quem se dirigia. Parecia uma pequena 
concessão à autoridade e eles queriam ouvir o que tinha para lhes dizer. Logo que retomaram a formação 
militar voltou­lhes o sentido de disciplina e, embora através do assassinato dos seus oficiais se tivessem 
colocado para além de qualquer esperança de confiança ou de perdão, os seus corações, de repente, 
puseram­se do lado dele como um homem corajoso, humano e respeitável. Um antigo veterano ­ havia 
muitos ali que tinham estado a servir na Germânia vinte e cinco e trinta anos antes ­ exclamou: ”Como ele 
se parece com o pai!” E outro: ”Tem que ser tremendamente bom, para ser tão tremendamente bom como 
ele.” Germânico começou, no tom de quem conduzia uma conversa normal, para atrair mais a atenção. 
Primeiro, falou da morte de Augusto e do grande desgosto que ela inspirara, mas garantiu­lhes que 
Augusto deixara para trás uma obra indestrutível e um sucessor capaz de levar por diante o governo e 
comandar os exércitos da maneira que ele próprio teria desejado.
­ Vós não desconheceis as gloriosas vitórias de meu pai na Germânia. Muitos de vós partilharam delas.
­ Nunca houve um melhor general nem um homem melhor, ­ gritou um veterano. ­ Um bravo por 
Germânico, pai e filho!
Serve para ilustrar a extrema simplicidade do meu irmão o facto dele não ter compreendido o efeito que as 
suas palavras estavam produzindo. Ao falar em pai
ele queria dizer Tibério (que era também muitas vezes chamado Germânico), mas os veteranos pensaram 
que se referia ao seu verdadeiro pai; e ao dizer sucessor de Augusto, ele referia­se de novo a Tibério, mas  
os veteranos pensaram que estava a falar de si próprio. Sem se aperceber destes malentendidos, continuou 
referindo a harmonia que prevalecia em Itália e a fidelidade dos gauleses, de cujo território acabava de 
chegar, e disse que não podia compreender o sentimento repentino de pessimismo que se apoderara deles. 
O que os afligia? O que tinham feito com os seus capitães, os seus coronéis e os seus generais? Porque não 
estavam esses oficiais na parada? Tinham realmente sido expulsos do acampamento, como lhe haviam 
dito?
­ Alguns de nós estamos ainda vivos e presentes, César, ­ disse alguém; Cássio atravessou as fileiras a 
coxear e fez a continência a Germânico. ­ Não muitos! Arrancaram­me da plataforma do tribunal e 
puseram­me amarrado na sala da guarda, sem comida há quatro dias. Um velho soldado acaba de ter a 
bondade de me libertar.
180
­ A ti, Cássio! Eles fizeram­te isso a ti! O homem que trouxe os oitenta de volta da Floresta de 
Teutoburger? O homem que salvou a ponte do Reno?
­ Bom, pelo menos pouparam­me a vida, ­ disse Cássio. Com horror na voz, Germânico perguntou:
­ Homens, isto é verdade?
­ Eles é que tiveram a culpa, ­ gritou alguém e depois ergueu­se um burburinho terrível. Alguns homens 
despiram­se completamente para mostrar as cicatrizes reluzentes das feridas honrosas que tinham no peito 
e as marcas irregulares e descoradas dos açoites sobre as costas. Um velho decrépito destacou­se das 
fileiras e, correndo em frente, abriu a boca com os dedos, para mostrar as gengivas sem dentes. Depois, 
gritou:
­ Sem dentes não posso comer comida sólida, General, e não posso marchar e lutar alimentando­me de 
levedura. Servi sob as ordens de vosso pai na sua primeira campanha nos Alpes e, nessa altura, já tinha 
completado seis anos de serviço. Tenho dois netos a servir na mesma companhia que eu. Deixai­me ir 
embora, meu General; fiz­vos saltar nos meus joelhos quando éreis criança! Olhai, meu General, tenho 
uma ruptura e eles esperam que eu marche vinte milhas com cinquenta quilos de peso às costas.
­ Volta para as fileiras, Pompónio ­ ordenou Germânico, que reconhecera o velho e ficara chocado por o 
encontrar ainda no activo.
­ Estás fora de ti. Depois vou ver o teu caso. Pelo amor de Deus, dá um bom exemplo aos soldados jovens!
Pompónio fez a continência e voltou para as fileiras. Germânico levantou a mão a pedir silêncio, mas os 
homens continuaram a gritar sobre o seu soldo e as faxinas desnecessárias a que os obrigavam, de tal 
forma que não tinham um momento para eles desde a alvorada ao recolher e que a única maneira que um 
homem tinha agora de ser dispensado do exército era cair morto de velhice. Germânico não fez qualquer 
tentativa para falar até ficarem todos de novo em silêncio. Nessa altura, disse:
­ Em nome de meu pai Tibério prometo­vos justiça. Ele tem o vosso bem­estar no coração, tal como eu, e 
tudo o que puder ser feito por vós sem perigo para o Império, ele fá­lo­á. Eu respondo por isso.
­ Oh, Tibério que vá para o diabo! ­ gritou alguém, e o brado foi repetido por todos os lados com gemidos 
e gritos. De repente, todos começaram a gritar:
­ Viva Germânico! Tu és o nosso Imperador! Atirem Tibério ao Tibre! Viva Germânico! Germânico a 
Imperador! Tibério que vá para o inferno! Aquela cabra da Lívia que vá para o inferno! Viva Germânico! 
Marchemos sobre Roma! Somos os teus homens! Viva Germânico, filho de Germânico! Germânico a 
Imperador!
Germânico estava fulminado. Gritou:
181
­ Homens, deveis estar loucos para falardes dessa maneira. O que pensais que eu sou? Um traidor?
Um veterano gritou:
­ Nada disso, meu General! Dissestes agora mesmo que iríeis assumir o trabalho de Augusto. Não recueis!
Germânico compreendeu então o seu erro e, quando as aclamações de Viva Germânico continuaram, 
saltou da plataforma do tribunal e encaminhou­se apressadamente para o sítio onde deixara o cavalo 
amarrado a um poste, com a intenção de montar e galopar a toda a velocidade para longe daquele 
acampamento maldito. Mas os homens puxaram das espadas e barraram­lhe o caminho.
Germânico, fora de si, gritou:
­ Deixai­me passar ou, pelos Deuses, eu mato­me.
­ Para nós, vós sois o Imperador, ­ responderam.
Germânico desembainhou a espada, mas alguém lhe agarrou o braço. Era evidente para qualquer homem 
decente que Germânico estava a falar a sério, mas muitos dos ex­escravos pensavam que ele estivesse 
apenas a fazer um gesto hipócrita de modéstia e virtude. Um deles, riu­se e gritou­lhe:
­Aqui, tomai a minha espada. Está mais afiada!
O velho Pompónio, que estava ao lado deste indivíduo, ergueu­se numa fúria e atingiu­o na boca. 
Germânico foi levado à pressa pelos amigos para a tenda do General. O General estava estendido na cama, 
meio morto de pavor, com a cabeça escondida debaixo da coberta. Passou­se bastante tempo antes que ele 
conseguisse levantar­se e apresentar os seus respeitos a Germânico. A sua vida e a dos seus oficiais tinha 
sido salva pela sua guarda pessoal, mercenários da fronteira Helvética.
Um conselho foi convocado à pressa. Cássio disse a Germânico que, por uma conversa que tinha escutado 
enquanto estava estendido na casa da guarda, os amotinados preparavam­se para enviar uma delegação aos 
regimentos da Província Superior, para assegurar a sua cooperação numa revolta militar geral. Falava­se 
em deixar o Reno sem guarda e marchar para França, saqueando cidades, raptando as mulheres e 
instaurando um reino militar independente no sudoeste, protegido na retaguarda pelos Pirinéus. Roma 
ficaria paralisada com este movimento e eles ficariam à sua vontade o tempo suficiente para conseguirem 
tornar o seu reino inexpugnável.
Germânico decidiu ir imediatamente para a Província Superior e fazer os regimentos que lá se 
encontravam jurar aliança a Tibério. Estas eram as tropas que tinham havia pouco servido directamente 
sob o seu comando e ele acreditava que permaneceriam leais se ele chegasse antes da delegação dos 
amotinados. Sabia que tinham as mesmas queixas quanto a pagamento e tempo de serviço, mas os seus 
capitães eram gente melhor,
182
escolhidos por ele próprio pela sua paciência e qualidades militares, e não pela reputação. Mas primeiro, 
alguma coisa tinha que ser feita para acalmar os regimentos amotinados. Havia apenas um caminho a 
seguir. E ele cometeu o primeiro e único crime da sua vida: forjou uma carta que pretensamente vinha de 
Tibério e fez que lha entregassem à porta da tenda na manhã seguinte. O correio tinha sido enviado para 
fora do acampamento em segredo durante a noite, com instruções para que roubasse um cavalo do próprio 
acampamento, cavalgasse vinte milhas para sudoeste e depois regressasse, galopando a toda a velocidade 
por uma outra estrada.
A carta dizia que Tibério tivera conhecimento de que os regimentos da Germânia tinham feito ouvir 
algumas queixas legítimas e que ele estava ansioso por as satisfazer rapidamente. Faria com que o legado 
de Augusto lhes fosse pago sem demora e, como penhor da sua confiança na lealdade deles, dobrá­lo­ia, 
às suas próprias custas. Iria negociar com o Senado o aumento do soldo. Daria dispensa imediata e sem 
restrições a todos os homens com vinte anos de serviço e dispensaria com uma condição aqueles que 
tinham completado dezasseis anos ­ estes, não seriam chamados para qualquer serviço militar, excepto 
para o de guarnição.
Germânico não era um mentiroso tão astuto como seu tio Tibério, sua avó Lívia ou a irmã Livila. O cavalo 
do correio foi reconhecido pelo seu proprietário, tal como o correio, um dos moços do próprio Germânico. 
Correu o rumor de que a carta era forjada. Mas os veteranos foram a favor de a tratar como autêntica e 
reclamar imediatamente a dispensa prometida e o legado. Fizeram­no e Germânico replicou que o 
Imperador era um homem de palavra e que as dispensas seriam concedidas nesse mesmo dia. Mas pediu­
lhes que tivessem paciência quanto ao legado, que só poderia ser pago por inteiro quando eles 
regressassem aos seus quartéis de Inverno. Não havia dinheiro suficiente no acampamento, disse, para que 
todos os homens recebessem as suas seis moedas de ouro, mas ele faria com que o General entregasse o 
que havia. Isto acalmou­os, embora as opiniões se tivessem voltado um pouco contra GermâniCO, que 
não era aquilo que eles tinham julgado que fosse: tinha medo de Tibério, disseram, e não estava acima de 
fazer uma falsificação. Enviaram grupos à procura dos seus capitães e voltaram a obedecer às ordens do 
seu General. Germânico dissera ao General que faria com que o Senado o desacreditasse por cobardia, se 
ele não se controlasse imediatamente.
Assim, depois de ver que as desmobilizações eram feitas na devida forma e que todo o dinheiro disponível 
era distribuído, Germânico dirigiu­se à Província Superior. Encontrou os regimentos à espera de notícias 
do que estava a acontecer na Província Inferior; mas ainda não estavam declaradamente amotinados, pois 
Sílio, o seu General, era um
183
homem de espírito forte. Germânico leu­lhes a carta forjada e fê­los jurar aliança a Tibério, o que eles 
fizeram de imediato.
Houve grande emoção em Roma quando chegou a notícia do motim do Reno. Tibério, que tinha sido 
fortemente criticado por enviar Castor para o motim dos Balcãs ­ que ainda não fora debelado ­, em vez de 
ter ido ele próprio, era agora vaiado nas ruas enquanto lhe perguntavam por que razão as tropas que se 
amotinavam eram as que ele comandara pessoalmente, enquanto as outras permaneciam leais (o regimento 
que Germânico tinha comandado na Dalmácia também ainda não se tinha amotinado). Foi chamado para 
ir imediatamente para a Germânia e resolver a sua própria embrulhada no Reno, em vez de deixar tudo por 
conta de Germânico. Portanto, disse ao Senado que iria para a Germânia e começou lentamente a fazer os 
preparativos, escolhendo os seus oficiais e preparando uma pequena frota. Mas quando tudo ficou pronto, 
a aproximação do Inverno tornava a navegação perigosa e as notícias da Germânia eram mais 
esperançosas. Por isso, não chegou a ir. Também não tencionava fazê­lo.
Entretanto, eu recebera uma carta apressada de Germânico, pedindo­me que retirasse imediatamente 
200.000 moedas de ouro do seu espólio, mas debaixo do maior segredo; elas eram necessárias para a 
segurança de Roma. Não disse mais nada, mas enviou­me uma autorização assinada que me permitia agir 
em seu nome. Fui procurar o administrador principal de Germânico, que disse que apenas conseguia 
realizar metade daquela quantia sem vender nenhuma propriedade e que a venda de alguma propriedade 
iria causar falatório, que era o que Germânico nitidamente desejava evitar. Portanto, tive que arranjar eu 
próprio o resto, 50.000 do meu cofre­forte, o que me deixou apenas 10.000, depois de ter pago a despesa 
da minha iniciação ao novo sacerdócio ­ e mais 50.000 da venda de uma propriedade na Cidade, que o 
meu pai me deixara ­ felizmente, já tinha uma oferta para ela ­, e da venda de alguns escravos que podia 
dispensar, mas apenas os homens e mulheres que eu considerava como particularmente dedicados ao meu 
serviço. Enviei­lhe o dinheiro dois dias depois de ter recebido a carta a pedi­lo. A minha mãe ficou 
extremamente zangada quando soube que a propriedade tinha sido vendida, mas eu comprometera­me a 
não dizer as razões que me tinham levado a precisar do dinheiro. Por isso, disse que, ultimamente, tinha 
andado a jogar dados com apostas excessivamente altas e que, ao tentar recuperar as minhas pesadas 
perdas, perdera duas vezes mais. Ela acreditou­me e jogador passou a ser mais um pau para me bater. Mas 
a ideia de que não tinha deixado ficar mal nem Germânico nem Roma era compensação suficiente para os 
insultos dela.
Devo dizer que, nesta altura, eu jogava bastante, mas nunca ganhava nem perdia muito. Costumava jogar 
para me descontrair do meu trabalho.
184
Depois de terminar a minha história das reformas religiosas de Augusto, escrevi um pequeno livro 
humorístico sobre dados, dedicado à divindade de Augusto, e que serviu para arreliar a minha mãe. Citava 
uma carta que Augusto, que gostava muito de dados, escrevera em tempos a meu pai: nela dizia como lhe 
tinha agradado o seu jogo da noite anterior, porque o meu pai era o melhor perdedor que ele alguma vez 
conhecera. O meu pai, escrevia ele, soltava sempre um brado misturado com uma gargalhada contra o 
destino sempre que lhe saía Cão, mas, se outro companheiro de jogo tirava Vénus, ele parecia tão contente 
como se a jogada tivesse sido sua.
”É na verdade um prazer ganhar­te, meu caro, e dizer que este é o mais alto elogio que posso dedicar a um 
homem, pois geralmente detesto ganhar, por causa da visão que isso me permite do íntimo dos 
supostamente meus amigos mais dedicados. Todos, excepto os melhores, têm aversão a perder para mim 
porque sou o Imperador e, segundo pensam, imensamente rico e, obviamente, os deuses não deviam dar 
mais a um homem quejá tem demais. A minha política, portanto, ­ talvez já o tenhas notado, ­ é fazer 
sempre um erro nas contas depois de uma ou duas jogadas. Anuncio menos do que ganhei, como que por 
engano, ou pago mais do que devo e, praticamente, ninguém a não seres tu, essa é a minha experiência, é 
suficientemente honesto para me corrigir (teria gostado de citar uma outra passagem, na qual havia uma 
referência à falta de desportivismo de Tibério, mas claro que não podia).
Nesse livro, comecei com uma investigação pretensamente séria sobre a antiguidade dos dados, citando 
um número de autores não existentes e descrevendo várias maneiras fantasiosas de sacudir o copo de 
dados. Mas o assunto principal era naturalmente perder e ganhar, e o título era Como Ganhar aos Dados.  
Augusto tinha escrito noutra carta que, quanto mais tentava perder, mais parecia que ganhava e, mesmo 
fazendo batota contra si próprio nas contas, era raro levantar­se da mesa mais pobre do que quando se 
sentava. Citei uma declaração oposta atribuída por Pólio a meu avô António, no sentido de que, quanto 
mais tentava ganhar aos dados, mais parecia perder. juntando as duas afirmações, deduzi que a lei 
fundamental dos dados era que os deuses, a menos que tivessem alguma coisa contra ele por outras razões, 
sempre deixavam ganhar o homem que menos desejava o lucro. A única maneira de ganhar aos dados, 
portanto, era cultivar um desejo genuíno de perder. Escrito num estilo pesado que parodiava o do meu 
atormentador Catão, esse era, gabo­me disso, um livro muito engraçado, cujo argumento era tão 
perfeitamente paradoxal. Citei o velho provérbio que promete a um homem 1.000 moedas de ouro cada 
vez que ele encontrar um desconhecido montado numa mula malhada, mas com a condição dele não 
pensar na cauda da mula até receber o dinheiro. Esperava que esta sátira agradasse às pessoas que
185
achavam as minhas histórias indigestas. Mas não agradou. Ela não foi lida como uma obra de humor. 
Devia ter compreendido que leitores antiquados, que tinham crescido a ler Catão, não eram propriamente 
o tipo de pessoas que se iriam divertir com uma paródia do seu herói. Portanto, o livro foi tratado como 
uma produção fantasticamente monótona e estúpida, escrita com uma seriedade lamentável e provando, 
para além de qualquer dúvida, a minha tão falada incapacidade mental.
Mas isto foi uma digressão mal calculada, em que deixei Germânico esperando ansiosamente o seu 
dinheiro, enquanto escrevia um livro sobre dados. O velho Atenodoro criticar­me­ia com bastante 
severidade, acho eu, se ainda estivesse vivo.
186
CAPíTULO XVI
Uma delegação de senadores enviada por Tibério foi ao encontro de Germânico em Bona. Na realidade, 
foram ver se Germânico estivera a exagerar ou a minimizar a gravidade do motim. Levavam também uma 
carta particular de Tibério aprovando as promessas feitas aos homens em seu nome, com excepção da 
duplicação do legado, que teria agora que ser prometida ao exército inteiro e não apenas aos regimentos da 
Germânia. Tibério felicitava Germânico pelo aparente sucesso da artimanha, mas deplorava a necessidade 
da falsificação. Acrescentava que, se ele ia ou não cumprir as promessas, dependia do comportamento dos 
homens (com isto, ele não queria dizer, como Germânico supos, que, se os homens regressassem à 
obediência, ele cumpriria as promessas, mas exactamente o contrário). Germânico escreveu­lhe 
imediatamente em resposta, pedindo desculpa pela despesa envolvida na duplicação do legado, mas 
explicava que o dinheiro estava a ser pago as suas próprias custas e que os homens não saberiam que não 
era Tibério o seu benfeitor; e que, na carta forjada, ele tornara claro que apenas os regimentos da 
Germânia beneficiariam, tornando o pagamento uma recompensa pelo êxito da sua recente campanha do 
outro lado do Reno. Quanto às outras promessas específicas, os veteranos com vinte anos de serviço já 
tinham sido dispensados e aguardavam apenas a chegada do dinheiro do prêmio.
Cermânico mal podia suportar este pesado ónus sobre o seu património e escreveu a pedir­me que lhe 
desse algum tempo para pagar os meus 50.000. Respondi­lhe que não tinha sido um empréstimo, mas uma 
oferta que tinha orgulho em ter podido fazer. Mas voltemos à ordem dos acontecimentos. Dois dos 
regimentos estavam nos seus quartéis de Inverno, em Bona, quando chegou a delegação. A sua marcha de 
regresso, sob as ordens do seu General, tinha sido um triste espectáculo: os sacos que tinham contido o 
dinheiro foram amarrados a compridas varas e transportados com a boca para baixo, entre dois 
estandartes. Os outros dois regimentos tinham­se recusado a deixar o acampamento de Verão até que todo 
o legado lhes fosse pago. Os regimentos de Bona, o Primeiro e o Vigésimo, suspeitaram que a delegação 
tivesse sido enviada para cancelar as concessões e começaram de novo os distúrbios. Alguns, eram a favor 
de marcharem de imediato para o seu novo reino e, à meia­noite, um grupo
187
irrompeu pelo aquartelamento de Germânico, onde a Águia do Vigésimo regimento estava guardada 
num santuário fechado e, arrancando­o da cama, arrancaram a chave do santuário da fina corrente de ouro 
que ele usava ao pescoço, abriram o santuário e lançaram mão da Águia. Quando marchavam aos brados 
pelas ruas, chamando os seus camaradas para seguirem a Águia, encontraram os senadores da delegação, 
que tinham ouvido o barulho e vieram a correr para proteger Germânico. Os soldados praguejavam e 
desembainhavam as espadas. Os senadores mudaram de direcção e precipitaram­se para o quartel­general 
do Primeiro Regimento, onde se puseram a guardar a Águia. Mas os seus perseguidores estavam 
enlouquecidos com a raiva e a bebida e, se o Porta­Águia não fosse um homem corajoso e, ao mesmo 
tempo, um bom espadachim, o chefe da delegação teria ficado com o crânio rachado a meio ­ um crime 
que teria inculpado o regimento para além de qualquer perdão e que teria sido o sinal para a guerra civil 
em todo o país.
As desordens continuaram ao longo da noite, mas felizmente sem derramamento de sangue, excepto em 
resultado de brigas de bêbedos entre soldados de companhias rivais. Quando nasceu o dia, Germânico 
disse ao trombeteiro para tocar a reunir e dirigiu­se ao tribunal, deixando o chefe da delegação senatorial 
atrás dele. Os homens estavam nervosos e irritáveis e sentiam­se culpados, mas a coragem de Germânico 
fascinava­os. Ele pôs­se de pé, ordenou silêncio e depois soltou um grande bocejo. Cobriu a boca com a 
mão e pediu desculpa, dizendo que não dormira bem por causa das corridas dos ratos no seu 
aquartelamento. Os homens apreciaram a piada e riram­se. Germânico não se riu com eles.
­ O céu seja louvado por ter chegado a aurora. Nunca conheci noite pior. Num dado momento, sonhei que 
a Águia do Vigésimo tinha voado para longe. Que alívio vê­la na parada esta manhã! Havia espíritos 
destruidores pairando sobre o acampamento, enviados sem dúvida por algum Deus a quem ofendemos. 
Todos haveis sentido a loucura e só por milagre fostes impedidos de cometer um crime sem paralelo na 
história de Roma: o assassinato gratuito de um embaixador da vossa própria cidade, que se abrigara das 
vossas espadas junto das vossas próprias Divindades regimentais! Explicou então que os delegados tinham 
vindo apenas para confirmar as promessas originais em nome do Senado e para verificar se estavam a ser 
fielmente executadas por ele.
­ Bom, e então? Onde está o resto do prêmio? ­ gritou alguém e o grito foi repetido. ­Queremos o nosso  
prêmio!
Mas, por um acaso feliz, os carros com o dinheiro foram avistados nesse momento, entrando no campo 
acompanhados por um destacamento de auxiliares de cavalaria. Germânico aproveitou a situação para 
enviar rapidamente os senadores de regresso a Roma escoltados por esses mesmos auxiliares; depois, 
supervisionou a distribuição do dinheiro,
188
tendo­lhe sido difícil impedir que alguns dos homens pilhassem a parte que se destinava a outros 
regimentos.
Nessa tarde, a desordem aumentou; tanto dinheiro nas bolsas dos homens significava que bebiam 
desregradamente e se entregavam desenfreados ao jogo. Germânico decidiu que não era seguro para 
Agripina, que estava agora com ele, permanecer no acampamento. Ela encontrava­se de novo grávida; e 
embora os seus jovens filhos, os meus sobrinhos Nero e Druso, estivessem aqui em Roma com a minha 
mãe e comigo, Agripina tinha com ela o pequeno Caio. Esta bela criança tinha­se tornado a mascote do 
exército e alguém lhe fizera, em miniatura, um fardamento militar completo, com peitoral metálico, 
espada, elmo e escudo. Todos o mimavam. Quando a mãe o vestia com roupas normais e sandálias, ele 
chorava e reclamava a sua espada e as pequenas botas para ir visitar as tendas. Por isso lhe puseram a 
alcunha de Calígula, ou Bota Pequena.
Germânico insistiu na partida de Agripina, embora ela jurasse que não tinha medo de nada e que preferia, 
de longe, morrer com ele ali, do que receber a notícia de que se livrara de ser assassinada com ele pelos 
amotinados. Mas ele perguntou­lhe se achava que Lívia daria uma boa mãe para os filhos órfãos e isso 
decidiu­a a fazer o que ele lhe pedia. Com ela foram algumas mulheres de oficiais com os filhos, todas em 
pranto e vestidas de luto. Atravessaram lentamente o acampamento a pé, como fugitivas de uma cidade 
amaldiçoada. Uma mera carruagem grosseira, puxada por uma mula, era todo o seu transporte. Cássio 
Chaerea acompanhou­as como guia e seu único protector. Calígula ia às costas de Cássio, como se 
montasse um cavalo de batalha, gritando e desferindo no ar os golpes de espada e fazendo as paradas da 
praxe, tal como os soldados de cavalaria lhe tinham ensinado. Deixaram o acampamento de manhã muito 
cedo e praticamente ninguém os viu partir; não havia guardas no portão e ninguém se deu ao trabalho de 
tocar a despertar, pois a maior parte dos homens dormiram como porcos até às dez ou onze horas. Alguns 
velhos soldados, que acordaram cedo por uma questão de hábito de longa data, andavam fora do 
acampamento a apanhar lenha para fazer o pequeno­almoço e gritaram­lhes, perguntando onde iam as 
senhoras.
­ A Treves, ­ gritou Cássio, ­ O Comandante­em­Chefe está colocando a mulher e o filho sob a protecção 
dos aliados franceses de Treves incivilizados mas leais, de preferência a arriscar que sejam assassinados 
pelo famoso primeiro Regimento. Dizei isso aos vossos camaradas.
Os velhos soldados regressaram apressadamente ao acampamento e um deles, o velho Pompónio, pegou 
numa trombeta e fez soar o alarme. Os homens saíram das tendas aos tombos, ainda meio adormecidos, 
com as espadas na mão.
­ O que é que se passa? O que foi que aconteceu?
189
­Ele foi mandado para longe de nós. Acabou­se a nossa boa sorte e nunca mais o voltaremos a ver.
­ Quem é esse? Quem é que foi mandado para longe?
­ O nosso menino. Bota Pequena. O pai diz que não confia no Primeiro Regimento; por isso o mandou 
para os malditos aliados franceses. Só os Deuses sabem o que lhe vai acontecer por lá. Sabeis como são os 
franceses. A mãe também foi mandada embora. Grávida de sete meses e a caminhar a pé, como uma 
escrava, pobre senhora. Oh, rapaziada! A mulher de Germânico é filha do velho Agripa, a quem 
chamávamos de Amigo dos Soldados! E o nosso Bota Pequena!
Os soldados são realmente uma raça extraordinária de homens: rijos como o couro dos seus escudos, 
supersticiosos que nem egípcios e sentimentais como avós sabinas. Dez minutos mais tarde, havia cerca de
2.000 homens em volta da tenda de Germânico, num êxtase ébrio de desgosto e arrependimento, 
implorando­lhe que deixasse a mulher voltar com o seu querido menino.
Germânico apareceu­lhes com um rosto pálido e zangado e disse­lhes que não o incomodassem mais. 
Tinham­se desgraçado a si próprios e a ele, assim como ao nome de Roma; por isso, não poderia confiar 
neles enquanto vivesse; não lhe tinham feito nenhuma gentileza ao arrancar­lhe a espada da mão, quando 
estava à beira de a enterrar no peito.
­ Diz­nos o que temos a fazer, General. Faremos qualquer coisa que nos digas. Juramos que não 
voltaremos a amotinar­nos. Perdoa­nos. Seguir­te­emos até ao fim do mundo. Mas devolve­nos o nosso 
pequeno companheiro.
Germânico disse:
­ Estas são as minhas condições. Jurai aliança a meu pai Tibério e destacai de entre vós os homens 
responsáveis pela morte dos vossos capitães, pelo insulto à delegação e pelo roubo da Águia. Se fizerdes 
isto tereis o meu perdão, a ponto de vos deixar ter de volta o vosso pequeno companheiro. A minha 
mulher, no entanto, não será trazida de novo para se deitar neste acampamento, enquanto ele não tiver sido 
purgado do mal. A hora dela está a chegar e eu não quero que qualquer má influência possa ensombrar a 
vida da criança. Mas posso enviá­la para Colónia em vez de Treves, se não quereis que se diga que a 
confiei à protecção dos bárbaros. O meu perdão completo só será concedido quando tiverdes apagado a 
recordação dos vossos crimes sangrentos com uma vitória ainda mais sangrenta sobre os inimigos do 
vosso país, os germanos.
Juraram respeitar as condições dele. Assim, Germânico enviou um mensageiro para alcançar Agripina e 
Cássio; ele devia explicar a situação e trazer Calígula de volta. Os homens correram para as tendas e 
chamaram todos os camaradas leais para se juntarem a eles e prenderem os instigadores do motim. Cerca 
de 100 homens foram apanhados e arrastados até
190
ao tribunal, em volta do qual o que restava dos dois regimentos formou um quadrado côncavo com as 
espadas desembainhadas. Um coronel fez cada um dos prisioneiros subirem à vez a uma plataforma 
grosseira montada ao lado do tribunal e, se os homens da sua companhia o julgavam culpado, era atirado 
para baixo e decapitado por eles. Germânico não disse nada ao longo das duas horas deste julgamento 
sumário, permanecendo sentado de braços cruzados e rosto impassível. Todos, à excepção de alguns raros 
prisioneiros, foram considerados culpados.
Depois de ter rolado a última cabeça e dos corpos terem sido levados para fora do acampamento para 
serem queimados, Germânico chamou todos os capitães à vez ao tribunal e pediu pormenores dos 
respectivos serviços. Se o indivíduo tinha uma boa folha e era evidente que não fora nomeado por 
favoritismo, Germânico apelava para os veteranos da companhia para que lhe dessem a sua opinião sobre 
ele. Se lhe dessem um bom­nome e se o coronel do batalhão não tivesse nada contra ele, o homem era 
confirmado no seu posto. Mas se a folha fosse má e se houvesse queixas da companhia, ele era 
despromovido e Germânico recorria à companhia para que escolhessem o melhor homem que tivessem 
entre eles para lhe suceder. Seguidamente, Germânico agradeceu aos homens a sua colaboração e 
solicitou­lhes que fizessem o juramento de aliança a Tibério. Fizeram­no com solenidade e, momentos 
depois, ouviu­se uma ruidosa aclamação. Viram o mensageiro de Germânico aproximar­se a galopar; 
sentado à sua frente vinha Calígula, gritando na sua vozita aguda e acenando com a espada de brinquedo.
Germânico abraçou o filho e disse que tinha mais uma coisa a acrescentar, Mil e quinhentos veteranos que 
já tinham ultrapassado o seu tempo de serviço tinham sido dispensados dos dois regimentos, segundo as 
instruções de Tibério. Mas se alguns deles, disse, desejavam o seu perdão por inteiro, que os 
companheiros em breve alcançariam atravessando o Reno e vingando a derrota de Varo, ainda podiam 
consegui­lo. Ele permitiria aos homens mais activos que voltassem a alistar­se nas suas antigas 
companhias; enquanto que aqueles que apenas estavam em condições de fazer trabalho auxiliar se podiam 
alistar numa força especial para serviço no Tirol, onde se tinham registado ultimamente perigosas 
incursões por parte dos germanos. Custa a acreditar! ­ todos os homens deram um passo em frente e mais 
de metade ofereceu­se para o serviço activo do outro lado do Reno. Entre estes voluntários activos estava 
Porapónio, que proclamou que estava em tão boa forma como qualquer soldado do exército, apesar das 
gengivas sem dentes e da hérnia. Germânico, fê­lo sua ordenança e colocou os netos dele na sua guarda 
pessoal. Assim, tudo ficou de novo em ordem em Bona e os homens disseram a Calígula que ele tinha 
debelado o motim sozinho e que, um dia, haveria de ser
191
um grande imperador e de alcançar vitórias maravilhosas; o que foi muito mau para a criança, que já era, 
como eu disse, terrivelmente mimada.
Mas ainda restavam os outros dois regimentos, que estavam num local chamado Xanten, para serem 
chamados à razão. Tinham continuado a comportar­se como amotinados, mesmo depois do pagamento do 
prêmio, e o seu General não conseguia fazer nada deles. Quando veio a notícia da mudança de atitude dos 
regimentos de Bona, os chefes do motim ficaram seriamente alarmados quanto à sua própria segurança e 
agitaram os seus camaradas a novos actos de violência e devastação. Germânico mandou informar o seu 
General de que seguia imediatamente para o Reno à frente de um poderoso destacamento e que, se os 
homens leais que ainda continuavam sob o seu comando não seguissem rapidamente o exemplo dos 
regimentos de Bona, executando os agitadores, ele próprio mandaria passar todos à espada, 
indiscriminadamente. O General leu a carta em privado aos porta­estandartes, todos eles sargentos, e a 
alguns velhos soldados dignos de confiança, dizendo­lhes que não havia tempo a perder, pois Germânico 
podia cair­lhes em cima a qualquer momento. Eles prometeram fazer o que pudessem e, partilhando o 
segredo, que ficou bem guardado, com mais alguns homens leais, precipitaram­se para as tendas à meia­
noite, a um sinal combinado, e começaram a massacrar os amotinados. Estes defenderam­se o melhor que 
puderam e mataram alguns dos homens leais, mas em breve foram subjugados. Quinhentos homens foram 
mortos ou feridos nessa noite. Os restantes, deixando apenas sentinelas no acampamento, marcharam ao 
encontro de Germânico, suplicando­lhe que os conduzisse imediatamente para o outro lado do Reno, para 
enfrentar o inimigo.
Embora a época das campanhas estivesse a chegar ao fim, o tempo continuava favorável e Germânico 
prometeu fazer o que eles pediam. Lançou uma ponte flutuante sobre o rio e atravessou­o à frente de 
12.000 soldados da infantaria romana, vinte e seis batalhões de aliados e oito esquadrões de cavalaria. 
Pelos seus agentes no território inimigo ficou a saber de uma vasta concentração de tropas inimigas nas 
aldeias de Münster, onde estava a realizar­se um festival anual de Outono em honra do Hércules germano. 
As notícias do motim tinham chegado aos germanos ­ os amotinados tinham mesmo feito um tratado com 
Hermann e trocado presentes com ele ­ e estavam apenas a aguardar que os regimentos partissem para o 
seu novo reino no sudoeste, para atravessarem o Reno e marcharem directamente para Itália. Germânico 
seguiu um caminho da floresta que raramente era usado e surpreendeu completamente os germanos, 
apanhando­os a beber cerveja (cerveja é uma bebida fermentada feita com cereal em infusão; nas suas 
celebrações, bebem­na de forma excessiva). Germânico dividiu as tropas em quatro colunas e devastou a 
região numa frente de cinquenta milhas, queimando as aldeias e chacinando
192
os habitantes, sem respeitar a idade ou o sexo. Ao regressar, encontrou destacamentos de várias tribos 
vizinhas preparados para disputar a sua passagem através da floresta; mas ele avançou em ordem de peleja 
e estava a conseguir fazer recuar o inimigo, quando houve um alarme repentino por parte do Vigésimo 
Regimento, que estava servindo de retaguarda. Germânico descobriu que um grande destacamento de 
germanos, sob o comando pessoal de Hermann, estava prestes a cair sobre eles. Felizmente, as árvores 
naquele ponto não eram densas e deixavam espaço de manobra. Germânico recuou até à posição onde o 
perigo era maior e gritou: ”Rompei a linha deles, Vigésimo, e tudo será perdoado e esquecido.” Os 
homens do Vigésimo lutaram como possessos e fizeram recuar os germanos no meio de grande 
mortandade, perseguindo­os até ao campo aberto ao fundo do bosque. Germânico avistou Hermann e 
desafiou­o para combater, mas os seus homens tinham­se posto em fuga; podia ter sido a morte dele 
aceitar o desafio. Afastou­se galopando. Germânico foi tão desafortunado como o fora nosso pai na 
perseguição dos chefes inimigos; mas alcançou as suas vitórias com o mesmo estilo e o nome de 
Germânico, que herdara, usava­o agora por direito. Fez marchar o exército exultante em segurança até aos 
seus acampamentos, do outro lado do Reno.
Tibério nunca compreendeu Germânico, nem Germânico compreendeu Tibério, Tibério, como já disse, 
era um dos maus claudianos. No entanto, era por vezes facilmente tentado pela virtude e, numa época 
nobre, podia facilmente ter passado por um espírito nobre: na verdade, era um homem de não poucas 
capacidades. Mas a época não era nobre e o seu coração tinha­se endurecido e a principal culpa desse 
endurecimento, haveis de concordar, cabia a Lívia. Germânico, por outro lado, era totalmente inclinado 
para a virtude e, por mais maléfica que fosse a época em que nasceu, nunca poderia ter agido de maneira 
diferente daquela como agiu. De tal forma era assim que, quando recusou a monarquia que lhe foi 
oferecida pelos regimentos germanos e os fez jurar aliança a Tibério, este não conseguiu compreender 
porque ele teria feito tal coisa. Concluiu que Germânico devia ser ainda mais subtil que ele próprio e estar 
a jogar um jogo bem profundo. A simples explicação que Germânico punha a honra acima de todos os 
outros considerandos e estava ligado a Tibério por uma aliança militar e por ter sido adoptado como seu 
filho, nunca lhe ocorreu. Mas Germânico, tendo em conta que Tibério nunca o insultara ou injuriara (pelo 
contrário, elogiou­o fortemente pela maneira como tratou o motim e decretou­lhe um triunfo completo 
pela sua campanha em Münster), e uma vez que não suspeitava da sua cumplicidade nos desígnios de 
Lívia, considerava as intenções dele tão honrosas como as suas próprias, achando­o apenas um pouco 
ingénuo por ainda não se ter apercebido das intenções de Lívia. Decidiu ter uma conversa franca
193
com Tibério logo que regressasse do triunfo. Mas a morte de Varo ainda não tinha sido vingada; 
passaram­se três anos até que Germânico regressasse. O tom das cartas trocadas entre Germânico e 
Tibério durante este período foi fixado por Germânico, que escrevia sempre com a afeição devida. Tibério 
respondia­lhe no mesmo tom afectuoso, porque pensava que, ao fazê­lo, estava a derrotar Germânico no 
seu próprio jogo de astúcia. Encarregou­se de o reembolsar pela quantia do legado dobrado e de estender 
também o prémio aos regimentos dos Balcãs. Por uma questão de estratégia, pagou aos regimentos dos 
Balcãs o extra de três moedas de ouro por homem ­ havia ameaças de novo motim ­, mas adiou o 
reembolso a Germânico por alguns meses, com base em dificuldades financeiras. Naturalmente, 
Germânico não o pressionou por causa do dinheiro e, claro, Tibério nunca lho restituiu. Germânico 
escreveu de novo para me perguntar se podia esperar para me pagar até que Tibério lhe pagasse a ele, e eu 
escrevi­lhe dizendo que estava a falar a sério quando disse que o dinheiro era uma oferta.
Pouco depois da tomada de posse de Tibério, escrevi­lhe dizendo que havia algum tempo que andava a 
estudar lei e administração ­ o que era verdade ­, na esperança de que me fosse dada finalmente uma 
oportunidade de servir o meu país numa posição de alguma responsabilidade. Ele respondeu dizendo que, 
sem dúvida, era uma anomalia que um homem que era irmão de Germânico e seu próprio sobrinho se 
apresentasse como um simples cavaleiro e que, uma vez que me estava a tornar agora sacerdote de 
Augusto, certamente me seria permitido usar a túnica de senador; na verdade, se eu conseguisse não fazer 
figuras tristes nessa roupagem, ele pediria autorização para que eu usasse a túnica de brocado, que era 
agora usada pelos Cônsules e ex­Cônsules. Escrevi­lhe imediatamente para dizer que preferiria um cargo 
sem indumentária a uma indumentária sem cargo; mas a sua única resposta a isto foi enviar­me um 
presente de quarenta moedas de ouro ”para comprar brinquedos no próximo Dia dos Bobos”. O Senado 
votou­me a túnica de brocado e, em sinal de deferência para com Germânico, que estava agora no meio de 
uma nova campanha bem sucedida na Germânia, propôs consagrar­me um lugar na Casa entre os ex­
Cônsules. Mas aqui Tibério entrepôs o seu veto, dizendo que, na sua opinião, eu era incapaz de fazer um 
discurso sobre assuntos de estado que não se tornasse num suplício para a paciência dos outros membros.
Outro decreto foi proposto ao mesmo tempo e igualmente vetado por ele. As circunstâncias eram as 
seguintes: Agripina tinha dado à luz, em Colónia, uma rapariga chamada Agripinila; e devo dizer para já 
que esta Agripinila veio a ser o pior elemento da família claudiana ­ na verdade, posso dizer que ela 
mostra indícios de ultrapassar todos os seus antepassados, homens ou Mulheres, em arrogância e vício. 
Agripina ficou
194
alguns meses doente depois do parto e incapaz de controlar devidamente Calígula; por isso, ele foi 
enviado de visita a Roma logo que Germânico começou a sua campanha da Primavera. A criança tornou­
se uma espécie de herói nacional. Sempre que saía a passear com os irmãos era aclamado, admirado e 
mimado. Ainda não tinha três anos de idade e já era de uma precocidade maravilhosa, o que o tornava 
extremamente difícil, apenas agradável quando lisonjeado e somente dócil se tratado com firmeza. Foi 
instalado em casa da bisavó Lívia, mas ela não tinha tempo para se ocupar devidamente dele e, como 
Calígula estava sempre a meter­se em sarilhos e a guerrear com os irmãos mais velhos, o pequeno acabou 
por ir viver com a minha mãe e comigo. A minha mãe nunca o lisonjeava, mas também não o tratava com 
a firmeza necessária, até que um dia ele lhe cuspiu em cima num acesso de raiva e ela lhe deu uma boa 
tareia.
­ Sua germana velha e horrenda, ­ disse ele, ­ Hei­de queimar a tua casa germana!
Usava a palavra germano como o pior insulto que conhecia. Nessa tarde, esgueirou­se até uma 
arrecadação que ficava ao lado do sótão dos escravos e que estava cheia de velhos móveis e de lixo, 
pegando fogo a uma pilha de velhos colchões de palha. O fogo não tardou a alastrar a todo o piso superior 
e, como se tratava de uma casa velha, com os madeiramentos podres e respiradouros de chaminés por toda 
a parte, não houve maneira de o apagar, mesmo com uma interminável cadeia de baldes até ao tanque das 
carpas. Consegui salvar todos os meus papéis e outras coisas de valor e parte da mobília, não se tendo 
registado perda de vidas, à excepção de dois velhos escravos que estavam na cama doentes; mas nada 
restou da casa, a não serem as paredes nuas e as caves. Calígula não foi punido, por causa do susto que 
apanhou com o incêndio. Quase foi apanhado pelo fogo, escondido com a sua culpa debaixo da cama até 
que o fumo o fez sair de lá aos gritos.
O Senado queria decretar que a minha casa fosse reconstruída a expensas do Estado, dado que tinha sido a 
residência de tantos membros distintos da minha família: mas Tibério não permitiu tal coisa. Disse que o 
fogo tinha sido causado por negligência da minha parte e que os estragos podiam facilmente ter sido 
confinados às águas­furtadas, se eu não tivesse agido de forma irresponsável; e que, em vez de deixar o 
Estado pagar, ele mesmo se encarregaria de reconstruir e voltar a mobilar a casa. Fortes aplausos do 
Senado. Isto era totalmente injusto e desonesto, especialmente porque ele não tinha qualquer intenção de 
levar por diante esse empreendimento. Fui obrigado a vender a minha última propriedade importante em 
Roma, um quarteirão de casas perto do Mercado de Gado e um grande lote de terreno para construção que 
lhe ficava ao lado, para reconstruir a casa às minhas custas. Nunca disse a Germânico que tinha sido 
Calígula o incendiário, porque ele se teria sentido obrigado a reparar ele próprio
195
o estrago; e estou convencido de que, de certa forma, foi um acidente, porque uma criança tão pequena 
não podia ser considerada responsável.
Quando os homens de Germânico partiram a combater de novo, os germanos tinham uma nova adenda 
para a balada dos Três Desgostos de Augusto, da qual me recordo de dois ou três versos e de umas linhas 
soltas, na sua maioria ridículas:
Seis moedas por homem ele nos deixou Para comprarmos porco efeijões,
Para comprarmos queijo e biscoitos Nas cantinas secas dos germanos.
O Deus Augusto caminha no Céu,
O Fantasma Marcelo nada no Estige,1 Júlia estd morta efoi ter com ele ­
É ofim das artimanhas de Júlia.
Mas as nossas Águias continuam perdidas E movidos pela vergonha e pelo desgosto Para o túmulo do  
Deus Augusto
Traremos de volta cada ave perdida.
Havia outro que começava:
O germano Hermann perdeu a namorada E a sua canequinha de cerveja...
Mas não me lembro do fim e o verso não é importante, a não ser para me lembrar de falar da namorada de 
Hermann. Ela era filha de um chefe chamado, em germano, Siegstoss ou qualquer coisa parecida; mas o  
seu nome romano era Segestes. Tinha estado em Roma, tal como Hermann, e alistara­se entre os  
cavaleiros, mas, ao contrário de Hermann, sentira­se moralmente ligado pelo juramento de amizade que 
fizera a Augusto. Foi este Segestes que preveniu Varo quanto a Hermann e Segímero e sugeriu que Varo 
os prendesse durante o banquete para o qual os convidara antes de começar a sua desastrosa expedição. 
Segestes tinha uma filha preferida, que Hermann levara consigo e desposara. Segestes nunca lhe perdoou 
tal injúria. Não podia, no entanto, sair abertamente ao lado dos romanos contra Hermann, que era um herói
Nota: Do grego Styx, rio mitológico que conduzia as almas ao reino dos mortos. (N. do T.)
196
nacional; tudo o que tinha podido fazer até ali era manter uma correspondência secreta com Germânico, 
dando­lhe informações sobre movimentos militares e assegurando­lhe constantemente que a sua lealdade a 
Roma continuava inalterável, aguardando apenas uma oportunidade para o provar. Mas agora escreveu a 
Germânico que estava a ser cercado por Hermann na sua aldeia fortificada, que aquele jurara não lhe dar 
quartel e que não poderia aguentar muito mais. Germânico fez uma marcha forçada, derrotou os sitiantes, 
que não eram numerosos ­ o próprio Hermann estava ausente, ferido ­ e libertou Segestes: foi quando 
descobriu que tinha um prêmio valioso à sua espera ­ a mulher de Hermann, que estava de visita ao pai 
quando a disputa estalou entre eles e o marido e que estava em adiantado estado de gravidez. Germânico 
tratou Segestes, bem como os membros da sua casa, com toda a gentileza, dando­lhes uma propriedade do 
lado ocidental do Reno. Hermann, que estava furioso com a captura da mulher, receava que a clemência 
de Germânico pudesse induzir outros chefes germanos a fazer aberturas de paz. Construiu uma nova 
confederação de tribos, tornando­a forte e incluindo algumas que até então tinham sido favoráveis a 
Roma. Germânico não se deixou intimidar. Quantos mais germanos se mostrassem declaradamente contra 
ele, mais satisfeito se sentia. Nunca confiara neles como aliados.
Antes de terminar o Verão, tinha­os derrotado numa série de batalhas, forçara Segímero a render­se e 
recuperara a primeira das três Águias perdidas, a do décimo Nono Regimento. Visitou também o local da 
derrota de Varo e deu aos ossos dos seus camaradas de armas um enterro decente, colocando com as suas 
próprias mãos o primeiro punhado de terra no seu túmulo. O General, que se comportara com tanta moleza 
por ocasião do motim, lutou com bravura à frente do seu destacamento e, a dada altura, transformou 
aquilo que parecia uma derrota inevitável numa vitória confirmada. Notícias prematuras de que a batalha 
estava perdida e que os conquistadores germanos marchavam em direcção ao Reno causaram tal 
consternação na ponte mais próxima, que o capitão da guarda deu ordens aos seus homens para que 
retirassem para o outro lado e depois a destruíssem: o que teria significado abandonar à sua sorte todos os 
que estavam do outro lado. Mas Agripina estava lá e contrariou a ordem. Disse aos homens que, agora, o 
capitão da guarda era ela, e continuaria a sê­lo até que o marido regressasse para tomar dela o posto. 
Quando finalmente as tropas vitoriosas regressaram, ela estava no seu posto para lhes dar as boas vindas. 
A sua popularidade era agora quase comparável à do marido. Tinha organizado um hospital para os 
feridos, à medida que Germânico os ia mandando de volta depois de cada batalha, e dera­lhes o melhor 
tratamento médico possível. Normalmente, os soldados feridos ficavam junto das suas unidades até 
morrerem ou se restabelecerem. O hospital foi pago por ela às suas próprias custas.
197
Mas, entretanto, mencionei a morte de Júlia. Quando Tibério se tornou Imperador, o abastecimento diário 
de comida fornecido a Júlia em Régio foi reduzido para quatro onças de pão por dia e uma onça de queijo. 
Ela já sofria de tuberculose devido à insalubridade do seu alojamento e esta dieta de fome não tardou a 
acabar com ela. Mas continuava a não haver notícias de Póstumo, e Lívia, até ter a certeza de que ele tinha 
morrido, não conseguia ter sossego.
198
CAPíTULO XVII
Tibério continuava a governar com moderação e consultava o Senado antes de tomar qualquer medida da 
mais ínfima importância política. Mas o Senado votava havia tanto tempo segundo as instruções que 
recebía, que parecia ter perdido o poder de decidir independentemente; e Tibério nunca tornava claro em 
que sentido queria que eles votassem, mesmo quando estava ansioso por que votassem de uma forma ou 
de outra. Desejava evitar qualquer aparência de tirania e, ao mesmo tempo, manter a sua posição de chefe 
dos acontecimentos. O Senado, em breve descobriu que, se ele falava com uma elegância estudada a favor 
de uma moção, isso queria dizer que desejava que votassem contra ela; e se falasse com uma elegância 
estudada contra ela, era porque queria que a moção passasse; e que, nas raras ocasiões em que falava 
sucintamente e sem qualquer retórica, desejava ser tomado literalmente. Caio e um velho gracejador, 
chamado Hatério, costumavam deleitar­se a fazer discursos em calorosa concordância com Tibério, 
desenvolvendo os seus argumentos a um ponto que roçavam o absurdo e, depois, votando da maneira que 
ele realmente queria que votassem, mostrando assim que compreendiam perfeitamente os seus truques. No 
debate sobre a tomada de posse de Tibério, este Hatério tinha gritado:
­ Oh, Tibério, por quanto tempo vais deixar que a infeliz Roma fique sem cabeça? ­ o que o ofendera, 
porque ele sabia que Hatério via através dos seus desígnios. No dia seguinte, Hatério continuou com a sua 
piada caindo aos pés de Tibério e pedindo­lhe perdão por não ter sido suficientemente caloroso. Tibério 
recuou com repulsa, mas Hatério agarrou­o pelos joelhos e Tibério caiu, batendo com a parte de trás da 
cabeça no chão de mármore. A guarda germana de Tibério não entendeu o que se estava a passar e 
saltaram em frente para matar o atacante do seu amo; Tibério conseguiu detê­los no último momento.
Hatério era um cómico excelente. Tinha uma voz potente, uma cara cómica e uma grande fertilidade de 
invenção. Sempre que Tibério introduzia nos seus discursos alguma frase mais rebuscada ou arcaica, 
Hatério pegava nela e tornava­a a chave da sua resposta (Augusto sempre dissera que as rodas da 
eloquência de Hatério necessitavam de uma corrente que as travasse, mesmo quando subia uma encosta). 
Tibério,
199
com o seu espírito lento, não chegava para Hatério. O dom de Caio ia no sentido de um zelo fingido. 
Tibério era extremamente cuidadoso em não parecer candidatar­se a quaisquer honras divinas e recusava­
se a permitir que falassem dele como tendo atributos sobre humanos: nem sequer permitia aos 
representantes das províncias que lhe construíssem templos. Caio gostava portanto de se referir a Tibério, 
como que por acidente, chamando­lhe Sua Sagrada Majestade. Quando Hatério, que estava sempre pronto 
a levar por diante a brincadeira, se levantava para o repreender por esta maneira incorrecta de falar, ele 
desculpava­se profusamente e afirmava que nada estava mais longe do seu espírito do que fazer o que quer 
que fosse em desobediência às ordens de Sua Sagrada... oh, Deuses, era tão fácil cair nessa maneira errada 
de falar, mais uma vez mil desculpas... o que ele queria dizer era contrariamente aos desejos dos seu 
ilustre amigo e colega­senador Tibério Nero César Augusto.
­ Augusto não, idiota, ­ dizia Hatério, num sussurro de palco.
­ Ele já recusou esse título dúzias de vezes. Só o utiliza quando escreve cartas a outros monarcas.
Tinham ainda um hábito que aborrecia Tibério mais do que qualquer outro. Se ele fazia alguma 
demonstração de modéstia quando o Senado lhe prestava agradecimentos por ter executado algum serviço 
de interesse nacional ­ tal como encarregar­se de completar os templos que Augusto deixara inacabados ­, 
eles elogiavam a sua honestidade em não aceitar os créditos pelo trabalho da mãe e felicitavam Lívia por 
ter um filho tão cumpridor. Quando perceberam que não havia nada que Tibério detestasse tanto como 
ouvir elogiar Lívia, não pararam mais de o fazer. Hatério sugeriu mesmo que, tal como os gregos eram 
chamados pelo nome do pai, Tibério deveria ser chamado pelo nome da mãe, e que seria um crime 
chamar­lhe outra coisa que não Tibério Livíades ­ ou talvez Livigena fosse a forma latina mais correcta. 
Caio descobriu outro ponto fraco na armadura de Tibério, designadamente a maneira como odiava 
qualquer referência à sua estada em Rodes. A coisa mais ousada que ele fez foi elogiar Tibério um dia 
pela sua clemência ­ precisamente no dia em que chegou à cidade a notícia da morte de Júlia ­ e contar a 
história do professor de retórica em Rodes, que recusara o pedido modesto de Tibério para assistir às suas 
aulas, alegando que, de momento não havia vagas, e dizendo­lhe que devia voltar daí a sete dias. Caio 
acrescentou:
­ E o que pensais que Sua Sagrada... peço desculpa, o que eu devia dizer era, o que pensais que o meu 
ilustre amigo e colega­senador Tibério Nero César fez quando da sua recente ascensão a monarquia, 
quando o mesmo indivíduo impertinente chegou para apresentar os seus respeitos à nova divindade? Será 
que lhe decepou a cabeça sem vergonha e a deu à sua guarda germana, para com ela jogarem? De maneira 
nenhuma: com um espírito apenas igualado pela sua clemência, disse­lhe que, de
200
momento, não tinha vagas no seu corpo de bajuladores e que ele tinha que voltar dentro de sete anos.
Creio que isto foi uma invenção, mas o senado não tinha razões para duvidar e aplaudiu­o tão 
entusiasticamente que Tibério teve que deixar passar a história como verdadeira.
Um dia, Tibério conseguiu finalmente fazer calar Hatério, dizendo muito devagar:
­ Peço­te que me desculpes, Hatério, se te falo com maior franqueza do que é habitual de um senador para 
outro, mas tenho que dizer que te acho terrivelmente enfadonho e nada espirituoso. ­ Depois, voltou­se 
para a Casa, ­ Peço que me desculpeis, meus senhores, mas sempre disse e hei­de continuar a dizer que, 
visto que tivestes a gentileza de me investir de um tal poder absoluto, não devo envergonhar­me de o usar 
para o bem comum. Usando­o agora para silenciar os bufões que vos insultam, a vós e à minha pessoa, 
com as suas ridículas encenações, tenho confiança de que conseguirei a vossa aprovação. Sempre haveis 
sido generosos e pacientes comigo. ­ Sem Hatério, Caio ficava limitado a jogar sozinho.
Embora Tibério odiasse a mãe mais do que nunca, continuou a deixar que ela o dirigisse. Todas as 
nomeações que fez para Cônsules ou governadores de província vinham realmente dela; e eram muito 
sensatas, na medida em que todos os homens eram escolhidos por mérito, não por influência familiar ou 
porque a tivessem lisonjeado ou lhe tivessem prestado algum serviço particular. Na verdade, tenho que 
deixar bem claro, embora nem sempre o tenha feito, que, por mais criminosos que tenham sido os meios 
usados por Lívia para chamar a si a direcção dos acontecimentos, primeiro através de Augusto e depois 
através de Tibério, ela era sem dúvida uma governante excepcionalmente capaz e justa, e só quando ela 
deixou de dirigir o sistema que construíra é que as coisas deram para o torto.
lá falei de Sejano, o filho do Comandante da Guarda. Ele sucedera agora ao pai no comando e era um dos 
únicos três homens com quem Tibério, de alguma forma, se abria, Trasílio era outro; tinha vindo para 
Roma com Tibério e nunca perdera a sua influência sobre ele. O terceiro era um senador chamado Nerva. 
Trasílio nunca discutia assuntos de estado com Tibério e nunca lhe pediu qualquer posto oficial; e quando 
Tibério lhe dava grandes somas de dinheiro, aceitava­as com naturalidade, como se o dinheiro fosse uma 
coisa com pouca importância para ele. Tinha um grande observatório numa sala abobadada do Palácio, 
que dispunha de janelas de vidro tão límpidas e transparentes que praticamente não se dava por elas. 
Tibério costumava passar uma boa parte do seu tempo ali com Trasílo, que lhe ensinava os rudimentos da 
astrologia e muitas outras artes mágicas, incluindo a da interpretação de sonhos ao estilo caldaico.
201
Tibério parecia ter escolhido Sejano e Nerva pelas suas personalidades totalmente opostas. Nerva nunca 
fazia um inimigo e nunca perdia um amigo. O seu único defeito, se é que se pode chamar assim, era o de 
se manter silencioso na presença do mal quando a palavra não poderia remediá­lo. Tinha um 
temperamento suave, generoso e dotado de coragem; era absolutamente verdadeiro e nunca se lhe 
conheceu qualquer inclinação para a mais ligeira fraude, mesmo que isso prometesse bons resultados. Se 
tivesse estado na posição de Germânico, por exemplo, nunca teria forjado aquela carta, embora a sua 
própria segurança e a do Império dependessem dela. Tibério nomeou Nerva superintendente dos 
aquedutos da Cidade e mantinha­o constantemente junto dele; suponho que era uma forma de se prover a 
si próprio com um conveniente padrão de virtude ­ tal como Sejano servia, sem dúvida, como um 
conveniente padrão de maldade. Quando jovem, Sejano fora amigo de Caio, tendo servido sob as suas 
ordens no Leste e tendo sido suficientemente esperto para prever que Tibério recuperaria a situação de 
favor; ele próprio contribuíra para isso, garantindo a Caio que Tibério era sincero quando afirmava não ter 
qualquer ambição de governar e incitando­o a escrever essa carta de recomendação a Augusto. Na altura, 
deu a conhecer a Tibério que fizera isso e este escreveu­lhe uma carta, que ele ainda guarda, prometendo 
nunca esquecer os seus serviços. Sejano era um mentiroso, mas era tão bom comandante das suas mentiras 
que sabia organizá­las numa formação vigilante e disciplinada ­ este foi um comentário inteligente de 
Caio, não meu ­, que levaria sempre a melhor em qualquer recontro com desconfianças ou num embate 
geral com a verdade. Tibério invejava­lhe este talento, tal como invejava a honestidade de Nerva; porque, 
embora tivesse progredido bastante no sentido do mal, ainda se sentia constrangido por inúmeros impulsos 
na direcção do bem.
Foi Sejano quem começou a envenenar­lhe o espírito contra Germânico, dizendo­lhe que um homem que 
era capaz de forjar uma carta do pai, fossem quais fossem as circunstâncias, não merecia confiança, e que 
Germânico tinha realmente em mira a monarquia mas agia com precaução
­ conquistando primeiro a afeição dos homens através do suborno e certificando­se depois das suas 
capacidades para a luta e da sua própria posição de chefia, através desta campanha desnecessária do outro 
lado do Reno. Quanto a Agripina, Sejano disse que ela era uma mulher perigosamente ambiciosa: bastava 
ver como se tinha comportado ­ fez­se a si própria capitão da ponte e deu as boas vindas ao regimento no 
seu regresso, como se fosse sabem os Deuses quem! Que a ponte estivesse em perigo de ser destruída, era 
provavelmente uma invenção sua. Sejano disse também que sabia por um dos seus libertos, que em 
tempos fora escravo em casa de Germânico, que Agripina, de alguma forma, estava convencida que Lívia 
e Tibério eram responsáveis pela morte dos seus
202
três irmãos e pelo exílio da irmã e jurara que se vingaria. Sejano começou também a descobrir toda a 
espécie de conspirações contra Tibério e mantinha­o num receio constante de vir a ser assassinado, ao 
mesmo tempo que lhe assegurava que não precisava ter o mais leve traço de ansiedade, estando ele de 
guarda. Encorajava Tibério a contrariar Lívia em coisas insignificantes, para lhe mostrar que ela 
sobrestimava a solidez da sua posição. Foi ele que, alguns anos mais tarde, organizou a Guarda, 
transformando­a num corpo disciplinado. Até ali, os três batalhões estacionados em Roma tinham estado 
aquartelados por secções em diferentes partes da cidade, em estalagens e lugares semelhantes, e eram 
difíceis de reunir em parada com rapidez, mostrando desleixo no vestuário e movimentos. Sugeriu a 
Tibério que se lhes construísse um único acampamento permanente fora da Cidade: isso dar­lhes­ia um 
forte sentimento de união, impedindo­os ao mesmo tempo de serem influenciados pelos boatos e ondas de 
sentimentos políticos que atravessavam constantemente a Cidade e ligando­os mais estreitamente à pessoa 
de Tibério, como seu Imperador. Tibério aperfeiçoou esta sugestão, chamando os seis batalhões restantes 
dos pontos onde se encontravam estacionados em várias partes de Itália e fazendo o novo acampamento 
suficientemente grande para os receber a todos 9.000 soldados de infantaria e 2.000 de cavalaria. Aparte 
os quatro batalhões da Cidade, um dos quais ele enviou para Lião, e várias colónias de veteranos 
desmobilizados, estes eram os únicos soldados em Itália. A guarda germana não contava como soldados, 
pois eram tecnicamente escravos. Mas eram homens escolhidos e mais fanaticamente leais ao seu 
Imperador do que qualquer verdadeiro romano. Não havia nenhum de entre eles que desejasse realmente 
regressar à sua terra fria, rude e bárbara, embora estivessem sempre a cantar baladas tristes sobre ela; mas 
sentiam­se bem demais aqui.
Quanto aos processos criminais aos quais Tibério, por causa do receio de conspirações contra a sua vida, 
estava agora extremamente ansioso por ter acesso, Lívia continuava a fingir que a chave do código se 
tinha perdido. Tibério, por sugestão de Sejano, disse­lhe uma vez que eles não tinham interesse para 
ninguém e que se encarregaria de os queimar. Ela respondeu que podia fazê­lo se quisesse, mas não seria 
melhor guardálos para o caso da chave aparecer? Talvez até ela pudesse de repente lembrar­se da chave.
­ Muito bem, mãe, ­ replicou. ­ Até que isso aconteça, eu tomo conta deles; entretanto, vou passar os meus 
serões a tentar descobrir a cifra sozinho.
Assim, levou­os para o seu quarto e fechou­os num armário. Tentou com todas as suas forças encontrar a 
chave da cifra, mas em vão. A cifra comum estava escrita de forma simples: E latino para Alpha grego, 
latino para beta grego, G para Gama, H para Delta e assim por diante.
203
A chave da cifra superior era praticamente impossível de descobrir. Estava contida nas primeiras cem 
linhas do primeiro livro da Ilíada, que tinham que ser lidas simultaneamente com a escrita da cifra, em 
que cada letra que se escrevia era representada pelo número de letras do alfabeto situadas entre ela e a 
letra correspondente em Homero. Assim, a primeira letra da primeira palavra da primeira linha do 
primeiro livro da Ilíada é 
Mu; supondo que a primeira letra da primeira palavra de uma anotação no processo é Upsilon, e que há 
sete letras no alfabeto grego entre Mu e Upsilon, portanto, Upsilon seria escrito como 7. Neste plano, o  
alfabeto seria considerado circular: Omega, a última letra, precedia Alfa, a primeira, de forma que a 
distância entre Upsilon e Alfa seria 4, mas a distância entre Alfa e Upsilon seria 18. Foi uma invenção de 
Augusto e deve ter levado bastante tempo a escrever e a descodificar, mas creio que, com a prática, 
acabaram por conhecer a distância entre duas letras quaisquer do alfabeto sem terem que contar, o que era 
uma grande economia de tempo. E como é que eu sei tudo isto? Porque muitos, muitos anos mais tarde, 
quando os processos me chegaram às mãos, eu próprio descodifiquei a cifra. Encontrei por acaso um rolo 
do primeiro livro de Homero, escrito numa pele de carneiro e guardado no meio dos outros rolos. Era 
evidente que só as primeiras cem linhas tinham sido estudadas, porque a pele de carneiro estava muito 
suja e marcada com tinta no princípio e perfeitamente limpa no fim. Quando olhei com mais atenção e vi 
algarismos minúsculos 6, 23, 12 ­ numa escrita fina por baixo das letras da primeira linha, não foi difícil 
relacioná­los com a cifra. Fiquei surpreendido por Tibério ter ignorado esta pista.
Falando do alfabeto, eu estava interessado nesta altura num plano simples para tornar o latim 
verdadeiramente fonético. Parecia­me que faltavam três letras. Estas três eram: o U consoante (distinto do 
U vogal); uma letra que correspondesse ao Upsilon grego (que é uma vogal entre o
1 e o U latinos), para ser usado em palavras gregas que foram latinizadas; e uma letra que simbolizasse a 
consoante dupla que agora escrevemos em latim como BS, mas que pronunciamos como o grego Psi. Era 
importante, escrevi, para as províncias que aprendiam o latim, aprendê­lo correctamente; se as letras não 
correspondessem ao som, como poderiam evitar erros de pronúncia? Por isso, sugeri para o U consoante o 
F invertido (que é usado para esse fim em etrusco): assim, LAFINIA em vez de LAUINIA; e um H 
quebrado para o Upsilon grego: assim BHBLIOTHECA em vez de BIBLIOTHECA; e um C invertido 
para BS: assim ACQUE para ABSQUE. A última letra não era assim tão importante, mas as outras duas 
pareciam­me essenciais. Sugeri o H quebrado e o F e o C invertidos, porque essa seria a maneira de causar 
menos incómodo aos indivíduos que usam os moldes das letra para metal ou argila: não teriam que fazer 
moldes novos. Publiquei o livro e uma ou duas pessoas disseram que a
204
minha sugestão era sensata; mas claro que isso não deu qualquer resultado. A minha mãe disse­me que 
havia três coisas impossíveis no mundo: que as lojas se pudessem estender atravessando a baía de Baiae 
para Puteoli, que eu dominasse a ilha da Grã­Bretanha e que qualquer uma destas novas letras absurdas 
aparecesse alguma vez em inscrições públicas em Roma. Nunca esqueci este comentário dela, pois teve 
uma sequência.
A minha mãe andava muito irritadiça comigo nos últimos tempos, porque a reconstrução da nossa casa 
estava demorada, porque a mobília nova que eu comprei não era igual à antiga e porque os seus 
rendimentos tinham sofrido uma redução significativa por causa da sua participação nestas despesas ­ eu 
não teria conseguido arranjar todo o dinheiro sozinho. Vivemos dois anos nuns aposentos do Palácio (que 
não eram muito bons) e ela descarregou a sua irritação sobre mim com uma tal constância que, por fim, eu 
já não podia suportá­la mais e saí de Roma para ir viver na minha villa perto de Cápua, limitando­me a 
visitar a cidade quando as minhas funções sacerdotais o exigiam, o que não acontecia muitas vezes. 
Deveis interrogar­vos sobre Urgulanila. Ela nunca foi a Cápua; em Roma, tínhamos pouco em comum. 
Ela mal me saudava quando nos encontrávamos e não me dava qualquer atenção, excepto quando havia 
visitas, para salvar as aparências; e dormíamos sempre separados. Ela parecia gostar bastante do nosso 
filho, Drusilo, mas, na prática, não fazia grande coisa por ele. A sua educação era deixada à minha mãe, 
que governava a casa e nunca pedia qualquer ajuda a Urgulanila. A minha mãe tratava Drusilo como se 
fosse seu próprio filho e, de alguma forma, conseguia esquecer quem eram os pais dele. Eu próprio nunca 
aprendi a gostar de Drusilo; era uma criança mal­humorada, pouco viva e insolente e a minha mãe 
repreendia­me com tanta frequência na sua presença que ele aprendeu a não sentir qualquer respeito por 
mim.
Não sei como é que Urgulanila passava os dias. Mas nunca parecia entediada, comia imenso e, tanto 
quanto sei, não tinha amantes secretos. No entanto, esta estranha criatura tinha uma paixão ­ Numantina, a 
mulher do meu cunhado Silvano, uma criaturinha minúscula, loura, semelhante a um elfo, que um dia 
fizera ou dissera qualquer coisa (não sei o quê) que atravessara aquela pele grossa e o corpo volumoso e 
musculado e tocara aquilo que servia de coração a Urgulanila. Urgulanila tinha na sua sala de estar um 
retrato de Numantina em tamanho natural. Acho que costumava ficar sentada a contemplá­lo durante 
horas sempre que não tinha a oportunidade de contemplar a própria Numantina. Quando me mudei para 
Cápua, Urgulanila ficou em Roma com a minha mãe e Drusilo.
O único inconveniente de Cápua como local de residência, era a ausência de uma boa biblioteca. No 
entanto, comecei um livro para o
205
qual não precisava de biblioteca ­ uma história da Etrúria. Entretanto, fizera grandes progressos em 
Etrusco; Aruns, com quem passava algumas horas todos os dias, foi muito prestável, facultando­me o 
acesso aos arquivos do seu templo meio arruinado. Dísse­me que tinha nascido no dia em que apareceu o 
cometa que anunciara o começo do décimo e último ciclo da raça etrusca. Um ciclo é um período 
calculado pela vida mais longa: quer dizer, não se encerra até à morte de todos os que estavam vivos na 
altura do festival que celebrou o encerramento do ciclo anterior. Os etruscos calculavam­no em 110 anos. 
O ciclo actual, segundo os etruscos, corresponderia ao último dos ciclos, prevendo eles que terminaria 
com o desaparecimento total do etrusco como língua falada. A profecia estava praticamente realizada, 
porque ele não tinha sucessores no seu ofício sacerdotal e porque, agora, as pessoas da região falavam 
latim mesmo nas suas casas; por isso ele se sentia feliz em me ajudar a escrever a minha história, dizia, 
como um mausoléu para as tradições de uma raça outrora grandiosa. Comecei­a no segundo ano do 
reinado de Tibério e terminei­a vinte e um anos mais tarde. Considero­a o meu melhor trabalho: 
certamente, foi aquele em que trabalhei mais arduamente. Tanto quanto sei, não há nenhum outro livro 
sobre os etruscos e eles foram na realidade uma raça muito interessante. Acho que os historiadores do 
futuro me ficarão gratos.
Tinha Calon e Palas comigo e vivia uma vida regrada e tranquila. Interessei­me pelo terreno agrícola 
ligado à villa e saboreei as visitas ocasionais de amigos de Roma, que vinham passar umas férias. Havia 
uma mulher que vivia permanentemente comigo: chamava­se Actê, era prostituta profissional e uma 
mulher muito decente. Nunca tive qualquer aborrecimento com ela nos quinze anos que esteve comigo. A 
nossa relação era estritamente de negócios. Ela escolhera deliberadamente a profissão de prostituta e eu 
pagava­lhe bem; era uma pessoa absolutamente razoável. De certa forma, gostávamos bastante um do 
outro. Finalmente, ela disse­me que desejava reformar­se, com aquilo que já ganhara. Havia de se casar 
com um homem decente, de preferência um velho soldado, instalar­se numa das colónias e ter filhos, antes 
que fosse tarde demais. Ela sempre quisera ter uma casa cheia de filhos. Beijei­a, disse­lhe adeus e dei­lhe 
um dote suficiente para lhe tornar a vida bem fácil. No entanto, ela não se foi embora enquanto não 
arranjou uma sucessora em quem pudesse confiar para tratar de mim como devia ser. Arranjou­me 
Calpúrnia, que era tão parecida com ela que muitas vezes pensei que devia ser sua filha. Actê mencionou 
uma vez que tinha tido uma filha que entregara a uma ama, porque não se podia ser ao mesmo tempo 
prostituta e mãe. Bom, Actê casou com um ex­soldado da Guarda que a tratava muito bem e teve cinco 
filhos com ela. Sempre acompanhei a vida daquela família. Falei nela apenas porque os meus leitores 
deviam
206
interrogar­se sobre o tipo de vida sexual que eu levava quando separado de Urgulanila. Não creio que seja 
natural para um homem normal viver muito tempo sem uma mulher e, uma vez que Urgulanila era 
impossível como esposa, não creio que me possam levar a mal ter vivido com Actê. Ela e eu tínhamos um 
tal entendimento que, enquanto estivéssemos juntos, nenhum de nós teria nada com mais ninguém. Isto 
não era sentimento, mas uma precaução médica: havia um grande surto de doenças venéreas em Roma ­ a 
propósito, esse foi mais um dos legados fatais das Guerras Púnicas.
Quero deixar aqui registado que nunca, em qualquer altura da minha vida, tive práticas homossexuais. 
Não me sirvo do argumento de Augusto, de que isso impede os homens de terem filhos para apoiar o 
Estado, mas sempre pensei que era ao mesmo tempo patético e repulsivo ver um homem adulto, um 
magistrado talvez, com uma família, a babar­se de luxúria para cima de um rapazinho gorducho com a 
cara pintada e cheio de pulseiras; ou um antigo senador a fazer de Rainha Vénus diante de um jovem 
Adónis alto da cavalaria da Guarda, que tolera o velho tolo apenas porque ele tem dinheiro.
Quando tive que ir a Roma, fiquei lá o menos tempo possível. Sentia qualquer coisa de desagradável no ar 
no Monte Palatino, que pode muito bem ter sido a tensão crescente entre Tibério e Lívia.
Tibério tinha começado a construir um imenso palácio para ele a noroeste da colina e agora mudara­se 
para o piso inferior antes da parte de cima estar terminada, deixando­a a ela sozinha de posse do palácio 
de Augusto. Lívia, como que para mostrar que a nova construção de Tibério, embora três vezes maior, 
nunca teria o prestígio da antiga, colocou uma magnífica estátua de Augusto em ouro na sua entrada e 
propos, como Sacerdotisa Suprema do seu culto, convidar todos os senadores e suas esposas para o 
banquete inaugural. Mas Tibério fez­lhe notar que, primeiro, ele teria que pedir ao Senado que votasse 
sobre isso: era uma ocasião de Estado, não um entretenimento privado. Conduziu assim o debate de que o 
banquete tivesse lugar simultaneamente em duas partes: os senadores na entrada, com ele como anfitrião; 
as esposas numa grande sala adjacente, com Lívia como anfitriã. Ela engoliu o insulto não o tratando 
como tal, mas apenas como se de uma disposição sensata se tratasse, mais de acordo com o que o próprio 
Augusto desejaria; mas deu ordens aos cozinheiros do Palácio para que as mulheres fossem servidas 
primeiro, com as melhores peças de carne, doces e vinho. Também reservou os pratos e taças mais 
valiosos para a sua festa. Levou­o à certa nessa ocasião e todas as mulheres dos senadores riram bastante à 
custa de Tibério e dos maridos.
Outro aspecto desagradável das vindas a Roma era que nunca conseguia deixar de me encontrar com 
Sejano. Desagradava­me ter que lidar
207
com ele, embora fosse sempre deliberadamente delicado comigo e nunca me dirigisse qualquer injúria 
directa. Espantava­me que um homem com uma cara e uns modos como os dele, e que não era nem bem 
nascido nem um lutador afamado ou mesmo especialmente rico, tivesse conseguido um tal sucesso na 
Cidade: ele era agora o homem mais importante a seguir a Tibério, sendo extremamente popular junto da 
Guarda. Tinha uma cara que não inspirava a mínima confiança ­ dissimulado, cruel e de feições 
irregulares ­ e aquilo que lhe dava alguma unidade era uma certa força e resolução animal. O que me 
parecia ainda mais estranho era dizer­se que algumas mulheres de boas famílias rivalizavam pelo seu 
amor. Ele e Castor não se entendiam bem, o que era natural, pois havia rumores de que Livila e Sejano 
tinham uma espécie de entendimento. Mas Tibério parecia confiar totalmente nele.
Mencionei Briseis, a velha liberta de minha mãe. Quando lhe disse que ia deixar Roma e instalar­me em 
Cápua, ela disse que sentiria muito a minha falta, mas que eu fazia bem em ir.
­ Tive um sonho estranho a vosso respeito a noite passada, menino Cláudio, se me perdoais. Éreis um 
rapazinho coxo e os ladrões entraram­lhe em casa e mataram­lhe o pai e muitos parentes e amigos; mas 
ele conseguiu escapar­se pela janela da dispensa e foi a coxear para o bosque vizinho. Trepou a uma 
árvore e esperou. Os ladrões saíram da casa e sentaram­se debaixo da árvore onde ele estava escondido, 
para dividirem o roubo. Em breve, começaram a discutir sobre quem devia ter o quê e um dos ladrões foi 
morto e depois mais dois; então, os restantes começaram a beber vinho e a fingir que eram grandes 
amigos; mas o vinho tinha sido envenenado por um dos ladrões mortos e todos morreram em grande 
agonia. O rapaz coxo desceu da árvore e apanhou as coisas roubadas, encontrando também no meio delas 
muito ouro e jóias que tinham sido roubados a outras famílias; mas levou tudo para casa com ele e ficou 
muito rico,
Eu sorri.
­ Esse é um sonho estranho, Briseis. Mas ele continuou tão coxo como sempre e toda essa riqueza não 
conseguiu restituir a vida ao pai e à restante família, pois não?
­ Não, meu querido menino, mas talvez ele tenha casado e arranjado uma família. Portanto escolhei uma 
boa árvore e não desçais dela enquanto o último dos ladrões não estiver morto. Era isso que o meu sonho 
queria dizer.
­ Se eu puder evitar, nem nessa altura desço da árvore. Não quero ser o consignatário de artigos roubados.
­ Podeis sempre devolvê­los, menino Cláudio.
Tudo isto foi bastante notável à luz do que aconteceu posteriormente. Não tenho grande fé nos sonhos. 
Certa vez, Atenodoro sonhou que havia
208
um tesouro na toca de um texugo, num bosque perto de Roma. Encontrou o caminho para o local 
preciso, que ele nunca visitara antes, e ali, num declive, estava a abertura que conduzia à toca. Chamou 
alguns camponeses para escavar o declive até alcançarem a toca ao fundo do buraco, onde encontraram 
uma velha bolsa apodrecida contendo seis moedas de cobre bolorentas e uma moeda falsa, o que nem 
chegou para pagar aos camponeses pelo trabalho que tinham feito. E um dos meus inquilinos, um 
comerciante, sonhou uma vez que um bando de águias voava em volta da sua cabeça e uma lhe pousava 
no ombro. Tomou isso como um sinal de que um dia havia de ser Imperador, mas tudo o que aconteceu foi 
que um piquete da Guarda o visitou na manhã seguinte (eles tinham águias nos escudos) e o cabo o 
prendeu por uma transgressão que o colocou sob jurisdição militar.
209
CAPíTULO XVIII
Numa tarde de Verão em Cápua, eu estava sentado num banco de pedra atrás dos estábulos da minha villa, 
pensando em qualquer problema da história etrusca e lançando os dados ociosamente, da mão esquerda 
para a direita, sobre a rude mesa de madeira que tinha diante de mim. Um homem andrajosamente vestido 
aproximou­se e perguntou se eu era Tibério Cláudio Druso Nero Germânico: em Roma, tinham­no 
dirigido para ali, disse.
­ Tenho uma mensagem para vós, senhor. Não sei se vale a pena entregá­la, mas eu sou um velho soldado 
vagabundo, um dos veteranos de vosso pai, senhor e vós sabeis como é; fico contente por ter uma 
desculpa para tomar um caminho e não outro.
­ Quem te deu a mensagem?
­ Um indivíduo que encontrei nos bosques, perto do Cabo Cosa. Um indivíduo curioso. Estava vestido 
como um escravo, mas falava como um César. Um indivíduo grande e forte que parecia meio morto de 
fome.
­ Que nome é que ele deu?
­Não deu nome nenhum. Disse que vós saberíeis quem ele era pela mensagem e que ficaríeis surpreendido 
por ter notícias suas. Fez­me repetir a mensagem duas vezes para ter a certeza de que eu a tinha percebido 
bem. O que eu tinha que dizer é que ele continua a pescar, mas que um homem não podia viver 
exclusivamente de peixe e que vós devíeis passar a palavra ao cunhado e que, se o leite foi enviado, nunca 
lhe chegou às mãos; e que gostava de ter um livrito para ler, com sete páginas pelo menos. E que vós não 
devíeis fazer nada até voltar a ter notícias dele. Isso faz sentido, senhor, ou seria que o homem estava 
maluco?
Enquanto ele dizia aquilo, eu nem podia acreditar no que ouvia. Póstumo! Mas Póstumo estava morto.
­ Ele tem o queixo largo, olhos azuis e uma maneira de inclinar a cabeça para um lado quando faz alguma 
pergunta?
­ É isso mesmo, senhor.
Servi­lhe uma bebida, com a mão a tremer de tal forma que entornei metade. Depois, fazendo­lhe sinal 
para que esperasse ali por mim, entrei em casa. Arranjei duas boas túnicas simples e alguma roupa 
interior, umas sandálias, um par de navalhas de barbear e sabão. Depois, peguei no
211
primeiro livro de folhas cosidas que me veio à mão ­ calhou ser uma cópia de alguns discursos recentes de 
Tibério ao Senado ­ e, na sétima página, escrevi com leite: Que alegria! Vou escrever imediatamente a G.  
Tem cuidado, Manda buscar tudo o que precisares. Onde posso ver­te? Envio­te os meus mais afectuosos  
sentimentos. Aqui vão vinte moedas de ouro, tudo o que tenho de momento, mas as ofertas rápidas são  
ofertas dobradas, espero.
Aguardei que a página secasse e, depois, dei ao homem uma trouxa com o livro e as roupas e uma bolsa 
com as moedas. Disse­lhe:
­ Toma estas trinta moedas de ouro. Dez são para ti. Vinte são para o homem dos bosques. Traz­me de 
volta uma mensagem dele e receberás mais dez. Mas fica de boca calada e volta depressa.
­ Está bem, senhor, ­ disse. ­ Não vos vou deixar ficar mal. Mas o que é que me impede de desaparecer 
com esta trouxa e o dinheiro todo? Respondi:
­ Se fosses um homem desonesto, não fazias essa pergunta. Portanto, vamos lá tomar mais uma bebida 
juntos e depois faz­te ao caminho. Resumindo, ele foi­se embora com a trouxa e o dinheiro e, alguns dias 
mais tarde, trouxe­me de volta uma resposta verbal de Póstumo, pela qual agradecia o dinheiro e a roupa, 
dizendo também que eu não deveria procurá­lo, que a mãe do Crocodilo saberia onde ele estava, que o seu 
nome agora era Pantero e pedindo que lhe mandasse a resposta do cunhado logo que possível. Paguei ao 
velho soldado as dez moedas que lhe prometera e mais dez pela sua lealdade. Compreendi a quem 
Póstumo se referia ao falar na mãe do Crocodilo. O Crocodilo era um velho liberto de Agripa, a quem 
tratávamos assim por causa da sua inércia e voracidade e por ter umas mandíbulas enormes. Tinha a mãe a 
viver em Perúsia, onde mantinha uma estalagem. Eu conhecia bem esse lugar. Enviei imediatamente uma 
carta a Germânico para lhe contar a novidade; enviei­a para Roma por Palas, dizendo­lhe que a fizesse 
seguir com o primeiro correio para a Germânia. Na carta, dizia simplesmente que Póstumo estava vivo e 
escondido ­ não dizia onde ­ e pedia a Germânico que acusasse de imediato a recepção da carta. Depois, 
esperei e tornei a esperar uma resposta, mas não obtive nenhuma. Escrevi de novo, de forma um tanto 
mais detalhada; mas continuei a não ter resposta. Enviei uma mensagem à mãe do Crocodilo por um 
carreteiro do campo, informando que ainda não tinha chegado nenhuma mensagem para o Pantero da parte 
do cunhado.
Não voltei a receber notícias de Póstumo. Ele não desejava comprometer­me mais e, agora que tinha 
dinheiro e podia andar de um lado para o outro sem ser preso por suspeita de se tratar de algum escravo 
fujão, já não dependia da minha ajuda. Alguém na estalagem o reconheceu e ele teve que sair de lá por 
uma questão de segurança. Em breve, o rumor de que ele estava vivo se espalhou por toda a Itália. Em 
Roma, toda a
212
gente falava nisso. Uma dúzia de pessoas, incluindo três senadores, deixaram a Cidade para me vir 
procurar e perguntar­me em privado se era verdade. Disse­lhes que não o tinha visto, mas que tinha 
conhecido alguém que o vira e que não havia qualquer dúvida que se tratava de Póstumo. Na volta, 
perguntei­lhes o que tencionavam fazer se ele aparecesse em Roma e ganhasse o apoio da populaça. Mas a 
franqueza da minha pergunta embaraçou­os e magoou­os, não tendo obtido resposta.
Dizia­se que Póstumo tinha visitado várias cidades nas vizinhanças de Roma, mas, aparentemente, ele 
tomava a precaução de não entrar nelas antes do cair da noite e de sair sempre, disfarçado, antes do nascer 
do dia. Nunca era visto em público, mas alojava­se numa estalagem qualquer e deixava para trás uma 
mensagem de agradecimento pela amabilidade que lhe tinham mostrado ­ assinada com o seu nome 
verdadeiro. Finalmente, um dia, desembarcou em óstia de uma pequena embarcação costeira. O porto 
sabia, algumas horas antes, que ele vinha, tendo recebido uma tremenda ovação no cais assim que pôs os 
pés em terra. Escolheu desembarcar em óstia porque era o quartel de Verão da Frota, da qual seu pai 
Agripa tinha sido Almirante. O seu navio arvorava um galhardete verde que Augusto dera a Agripa o 
direito de usar sempre que estava no mar (e aos seus filhos depois dele), em memória da sua vitória 
marítima em frente de Áccio. A memória de Agripa era respeitada em óstia quase mais ainda que a de 
Augusto.
Por causa da sua reaparição pública em Itália, Póstumo encontrava­se em grande perigo de vida, estando 
ainda sob sentença de exílio e, portanto, fora­da­lei. Fez um breve discurso de agradecimento à multidão 
pelas boas vindas. Disse que, se a Fortuna fosse generosa para com ele e se recuperasse a estima do 
Senado e do povo de Roma, que tinha perdido por causa de certas acusações mentirosas que os seus 
inimigos tinham feito contra ele ­ acusações que o avô, o Deus Augusto, compreendera demasiado tarde 
que não eram verdadeiras ­, recompensaria os homens e mulheres de óstia e sem qualquer mesquinhês. 
Uma companhia de Guardas estava presente com ordens para o prender, pois, de alguma forma, Lívia e 
Tibério também tinham sabido da notícia. Mas os homens não teriam tido qualquer hipótese contra aquela 
multidão de marinheiros. Sensatamente, o capitão não fez qualquer tentativa para cumprir a sua missão; 
ordenou a dois homens que se vestissem de marinheiros e não perdessem Póstumo de vista. Mas quando 
acabaram de mudar de roupa, já ele tinha desaparecido e não conseguiram encontrar­lhe o rasto.
No dia seguinte, Roma estava cheia de marinheiros que faziam piquete nas ruas principais: sempre que 
encontravam um cavaleiro, um senador ou um funcionário público, perguntavam­lhe a senha. A senha era 
Neptuno e, se ele não a soubesse já, diziam­lha e faziam­no repeti­la três vezes, se não quisesse levar uma 
tareia. Ninguém queria uma tareia
213
e os sentimentos populares estavam de tal forma imbuídos de simpatia por Póstumo e contra Tibério e 
Lívia que, se tivesse chegado uma simples palavra favorável de Germânico, a Cidade inteira, incluindo a 
Guarda e os batalhões da Cidade, teriam passado imediatamente para o lado dele. Mas, sem o apoio de 
Germânico, qualquer movimentação a favor de Póstumo teria significado uma guerra civil; e ninguém 
tinha muita confiança nas hipóteses de Póstumo, se chegasse a haver uma luta com Germânico.
Nesta crise, o mesmo Crispo que tinha antagonizado Tibério dois anos antes, dando a morte a Clement na 
ilha (mas tinha sido perdoado), veio oferecer­se para redimir a sua falta, não errando desta vez em relação 
a Póstumo. Tibério deu­lhe pulso livre. Ele descobriu de alguma forma onde era o quartel general de 
Póstumo e, indo procurá­lo com uma avultada soma em dinheiro que disse ser para o pagamento dos seus 
marinheiros, que já tinham perdido dois dias de trabalho por causa dos piquetes, tratou de levar a guarda 
pessoal germânica para junto de Póstumo logo que deu o sinal. já lhes tinha pago, disse, avultados 
subornos. Póstumo acreditou nele. Combinaram um encontro para duas horas depois da meia­noite, à 
esquina de uma certa rua onde os marinheiros de Póstumo também se deviam reunir em força. Depois, 
marchariam para o Palácio de Tibério. Crispo daria ordens à guarda para que deixassem entrar Póstumo. 
Tibério, Castor e Lívia seriam presos e Crispo disse que Sejano, embora não participasse activamente da 
conspiração, se tinha encarregado de trazer a Guarda para apoiar o novo regime logo que o primeiro golpe 
tivesse sido desferido com êxito: com a condição de manter o comando.
Os marinheiros compareceram pontualmente ao encontro, mas Póstumo não apareceu. A essa hora, não 
havia nenhum cidadão nas ruas; por isso quando uma força combinada de Germanos da guarda pessoal e 
homens escolhidos por Sejano caíram de repente sobre os marinheiros
­ que estavam na sua maioria embriagados e não mantinham qualquer espécie de formação regular ­ a 
senha Neptuno perdeu o seu poder. Muitos deles foram mortos ali mesmo, um número ainda maior morreu 
ao tentar fugir e os restantes, diz­se, não pararam enquanto não chegaram de novo a Ostia. Crispo e mais 
dois soldados tinham armado uma cilada a Póstumo numa ruela estreita entre o seu quartel general e o 
ponto de encontro, atordoaram­no com um saco de areia, amordaçaram­no e amarraram­no, puseram­no 
numa liteira coberta e transportaram­no até ao Palácio. No dia seguinte, Tibério fez uma declaração ao 
Senado. Um certo escravo de Póstumo Agripa, chamado Clement, disse, tinha causado um forte e 
desnecessário alarme na Cidade, fazendo­se passar pelo seu falecido amo. Aquele indivíduo ousado tinha 
fugido ao cavaleiro da província que o comprara quando o espólio de Póstumo foi vendido e
214
tinha­se escondido num bosque na costa da Toscana até a barba lhe crescer o suficiente para esconder o 
queixo recuado ­ ponto principal da dissemelhança entre ele e Póstumo. Alguns marinheiros turbulentos 
em óstia tinham fingido acreditar nele, mas apenas como uma desculpa para marcharem até Roma e lá 
criarem desordem. Tinham­se reunido nos subúrbios nessa manhã um pouco antes da alvorada, 
comandados por ele com o objectivo de marcharem até ao centro da Cidade e saquearem lojas e casas 
particulares. Quando se defrontaram com um destacamento de Vigilantes tinham dispersado e desertado 
do seu chefe, que acabara por ser executado: portanto, a Casa não precisava albergar qualquer ansiedade 
quanto a esse assunto.
Ouvi contar mais tarde que Tibério fingira não reconhecer Póstumo quando este foi levado perante ele no 
Palácio e lhe perguntou em ar de troça: ”Como foi que conseguiste tornar­te um dos Césares?” Ao que 
Póstumo respondeu: ”Da mesma maneira e no mesmo dia que tu. já te esqueceste?” Tibério mandou um 
escravo bater na boca de Póstumo por causa da sua insolência e, de seguida, foi posto na roda e convidado 
a revelar os nomes dos outros conspiradores. Mas ele limitava­se a contar anedotas escandalosas sobre a 
vida privada de Tibério, que eram tão repelentes e tão circunstanciais que este perdeu o controlo e lhe 
amassou a cara com os enormes punhos ossudos. Os soldados acabaram a tarefa sangrenta, decapitando­o 
e cortando­o em pedaços nas caves do Palácio.
Que maior desgosto pode haver do que carpir um amigo estimado por ter sido morto ­ no final de um 
longo e imerecido exílio ­ e depois, a seguir à alegria breve e espantosa, de ouvir que ele de alguma forma 
ludibriou os seus executores, ter que o carpir pela segunda vez ­ agora sem esperança de erro e sem 
mesmo o ter visto no intervalo ­ por ter sido traiçoeiramente recapturado e vergonhosamente torturado e 
morto? A minha única consolação era que, quando Germânico soubesse do que se tinha passado ­ e eu iria 
escrever­lhe imediatamente a contar tudo o que sabia daquela história ­, ele deixaria as suas campanhas na 
Germânia e marcharia de volta a Roma à frente de todos os regimentos que pudessem ser dispensados do 
Reno, para vingar a morte de Póstumo em Lívia e Tibério. Escrevi, mas ele não respondeu; voltei a 
escrever e continuei a não obter resposta. Mas finalmente veio uma carta longa e afectuosa, na qual havia 
uma referência perplexa ao êxito que Clement tivera ao fazer­se passar por Póstumo ­ como é que ele 
tinha conseguido uma coisa dessas? Esta frase deixava bem claro que nenhuma das minhas importantes 
cartas tinha chegado: a única a chegar tinha sido enviada pelo mesmo correio que a segunda. Nesta, eu 
dera­lhe apenas detalhes de um assunto de negócios que ele me pedira para tratar em seu nome: agora, 
agradecia­me a informação, dizendo ser exactamente aquilo que
215
ele queria. Compreendi com um sentimento de medo súbito que Lívia ou Tibério deviam ter interceptado 
todas as outras cartas.
A minha digestão sempre tinha sido má e o receio do veneno em cada prato nada fez para a melhorar. 
Voltei a gaguejar e a ter ataques de afasia
­ brancas repentinas no espírito que me expunham ao ridículo: se me apanhavam no meio de uma frase, 
acabava­a de qualquer forma. O resultado mais lamentável desta fraqueza foi ter baralhado os meus 
deveres como sacerdote de Augusto, função que até ali tinha desempenhado sem dar razões para que 
ninguém se queixasse. Há um costume antigo em Roma que, se algum erro é praticado no ritual de um 
sacrifício ou de outro serviço, todo o processo tem que ser repetido desde o princípio. Agora, acontecía­
me frequentemente, quando estava oficiando, perder­me no meio de uma oração ou repetir a mesma 
sequência de frases duas ou três vezes, antes de me aperceber do que estava a fazer; ou então pegava na 
faca de pederneira para cortar o pescoço da vítima, antes de lhe polvilhar a cabeça com a farinha e o sal 
rituais ­ e esta espécie de coisa significava voltar de novo ao princípio. Era entediante fazer três ou quatro 
tentativas para levar por diante um serviço antes de conseguir executá­lo com perfeição e a congregação 
costumava impacientar­se. Finalmente, escrevi a Tibério como Sumo Pontífice e pedi­lhe que me liberasse 
por um ano de todas as minhas obrigações religiosas, alegando falta de saúde. Ele concedeu­me o pedido 
sem comentários.
216
CAPÍTULO XIX
O terceiro ano da guerra de Germânico contra os germanos foi ainda mais cheio de êxito que os dois  
primeiros. Ele tinha concebido um novo plano de campanha, através do qual apanharia os germanos de 
surpresa e pouparia os seus homens a longas marchas perigosas e cansativas. Este plano consistia em 
construir no Reno uma frota com perto de mil transportes, embarcar com a maior parte das suas tropas e 
navegar rio abaixo, pelo canal que o nosso pai em tempos abrira, através dos lagos holandeses, seguindo 
depois por mar até à foz do Ems. Aqui, ele tencionava ancorar os seus transportes na margem mais 
próxima, à excepção de alguns poucos que serviriam para construir um pontão. Então, atacaria as tribos do 
outro lado do Véser, um rio que se podia passar a vau nalguns sítios e que corre paralelo ao Ems, 
cinquenta milhas para lá. O plano resultou em todos os detalhes.
Quando a guarda­avançada chegou ao Véser, encontraram Hermann e alguns chefes aliados aguardando 
na outra margem. Hermann gritou para o outro lado para perguntar se Germânico estava no comando. 
Quando lhe responderam que sim, ele perguntou se lhe entregavam uma mensagem, A mensagem era: 
”Corteses saudações de Hermann a Germânico”; perguntava também se lhe seria permitido chegar à fala 
com o irmão. Este chamava­se, em germano, qualquer coisa como Goldkopf, ou, de qualquer forma, um 
nome tão bárbaro que era de tradução impossível para latim ­ tal como Hermann tinha sido transformado 
em Arminius ou Siegmyrgth em Segímero, o dele foi traduzido como Flávio, o que significa com a cabeça 
dourada. Flávio estava há anos no Exército Romano e, como se encontrava em Lião na altura do desastre 
de Varo, fizera aí uma declaração da sua lealdade continuada para com Roma, repudiando todos os laços 
de família que o ligavam ao irmão traidor Hermann. Na campanha de Tibério e Germânico, no ano 
seguinte, ele tinha lutado corajosamente e perdido um olho.
Germânico perguntou a Flávio se desejava dirigir­se ao irmão. Flávio disse que não estava muito 
interessado, mas que poderia tratar­se de uma proposta de rendição. Assim, os dois irmãos começaram a 
gritar um para o outro de lados opostos do rio. Hermann começou a falar em germano, mas Flávio disse 
que, a menos que ele falasse em latim, a conversa
217
terminava ali. Hermann não queria falar latim, que os outros chefes não entendiam, com receio que 
pensassem que ele era um traidor e Flávio não queria ser considerado traidor pelos romanos, que não 
compreendiam o germano. Por outro lado, Hermann queria causar uma impressão sobre os romanos e 
Flávio sobre os germanos. Hermann tentou continuar com o germano e Flávio com o latim, mas, à medida 
que a discussão se tornava mais acalorada, caíram numa mistura de tal maneira horrível de ambas as 
línguas que, tal como Germânico me escreveu, ouvi­los, era tão bom como assistir a uma comédia. Cito o 
relato do diálogo, tal como foi feito por Germânico:
Hermann ­ Olá, irmão. O que aconteceu à tua cara? Essa cicatriz é uma deformidade horrível. Perdeste um 
olho?
Flávio ­ Sim, irmão. Por acaso apanhaste algum? Perdi­o naquele dia em que fugiste do bosque a galope, 
com o escudo coberto de lama, para que Germânico não te reconhecesse.
Hermann ­ Estás enganado, irmão. Não era eu. Deves ter andado de novo a beber. Eras sempre assim 
antes de uma batalha: um bocado nervoso, a menos que tivesses bebido pelo menos meio litro de cerveja; 
e tinhas que ser amarrado à sela quando soavam as trombetas de guerra.
Flávio ­ Isso é mentira, claro, que bebida bárbara de fazer apodrecer os intestinos é a vossa cerveja 
germana. Agora já não a bebo, nem mesmo quando chega ao acampamento alguma grande remessa vinda 
de uma das vossas aldeias capturadas. Os homens só a bebem quando tem que ser: dizem que é melhor 
que a água dos pântanos estragada pelos cadáveres germanos.
Hermann ­ Sim, eu também gosto do vinho romano. Ainda me restam algumas centenas de jarros dos que 
capturei a Varo. Este Verão vou arranjar outro bom fornecimento, se Germânico não tiver cuidado. A 
propósito, que recompensa é que ele te deu por perderes o olho?
Flávio (com grande dignidade) ­ Os agradecimentos pessoais do Comandante­em­Chefe e três 
condecorações, incluindo a Coroa e a Corrente.
Hermann ­ Oh, Oh! A Corrente! Usa­la em volta dos tornozelos, escravo romano?
Flávio ­ Prefiro ser escravo dos romanos, a traí­los. A propósito, a tua querida Thrusnelda está muito bem, 
assim como o teu filho. Quando vens a Roma para os visitar?
Hermann ­ No final desta campanha, irmão. Oh, Oh!
Flávio ­ Queres dizer, quando caminhares atrás do carro de Germânico no triunfo dele e a multidão te 
atirar ovos podres? Como me vou rir! Hermann ­ Será melhor que te rias tudo antes, porque, se dentro de 
três dias ainda tiveres garganta para te poderes rir eu deixarei de me
218
chamar Hermann. Mas chega desta conversa. Tenho uma mensagem da nossa mãe para ti.
Flávio (sério de repente e soltando um profundo suspiro) ­ Ah, minha querida, querida mãe! Que 
mensagem é que a minha mãe me envia? Ainda tenho a sua santa bênção, irmão?
Hermann ­ Irmão, feriste a alma da nossa sensata, nobre e prolífica mãe. Ela diz que transformará a sua 
bênção numa maldição, se continuares a ser um traidor para a tua família, a tua tribo e a tua raça e se não 
voltares imediatamente para nós e servires como General, juntamente comigo.
Flávio (em germano, largando a chorar de raiva) ­ Oh, ela nunca disse isso, Hermann. Ela não podia ter 
dito isso. É uma mentira que tu próprio inventaste só para me tornares infeliz. Confessa que é uma 
mentira, Hermann.
Hermann ­ Ela deu­te dois dias para te decidires.
Flávio (para o seu moço) ­ Eh, tu, oh cara de porco feio, dá­me o meu cavalo e as minhas armas! Vou para 
o outro lado do rio lutar com o meu irmão. Hermann, meu velhaco, vou lutar contigo!
Hermann ­ Então vem, escravo zarolho comedor de feijões!
Flávio saltou para o cavalo e preparava­se para o fazer nadar para o outro lado, quando um coronel 
romano o agarrou pela perna e o puxou para fora da sela: ele sabia germano e conhecia a veneração 
absurda que os germanos têm pelas suas mulheres e mães. E se Flávio realmente tencionasse desertar? Por 
isso, disse­lhe que não se importasse com Hermann nem acreditasse nas suas mentiras. Mas Flávio não 
podia resistir a dizer a última palavra. Secou os olhos e gritou para o outro lado:
­Vi o teu sogro a semana passada. Tem uma bela propriedade perto de Lião. Ele disse­me que Thrusnelda 
veio para o pé dele porque não podia suportar a desgraça de estar casada com um homem que quebrou o 
seu juramento solene como aliado de Roma e traiu um amigo a cuja mesa tinha comido. Disse que a única 
maneira como poderás alguma vez recuperar a sua estima é não usando as armas que te deu no dia do 
casamento contra aqueles a quem juraste lealdade. Ainda não te foi infiel, mas isso não vai durar muito se 
não caíres em ti imediatamente.
Depois, foi a vez de Hermann chorar, invectivar e acusar Flávio de contar mentiras. Germânico destacou 
em segredo um capitão para vigiar cuidadosamente Flávio durante a próxima batalha, com instruções para 
o trespassar ao menor sinal de traição.
Germânico raramente escrevia, mas, quando o fazia, as suas cartas eram longas e punha nelas, dizia, todas 
as coisas interessantes e divertidas que não lhe pareciam indicadas para a sua correspondência oficial com 
Tibério: eu vivia para essas cartas. Nunca me sentia ansioso pela segurança de Germânico quando ele 
andava a lutar com os germanos: quando os
219
enfrentava, tinha a mesma espécie de confiança com eles que um apicultor experiente tem com as abelhas, 
o apicultor consegue entrar ousadamente na colmeia e tirar o mel sem que as abelhas de alguma forma o 
piquem, como aconteceria convosco ou comigo se tentássemos fazer o mesmo. Dois dias depois de ter 
atravessado o Véser, travou uma batalha decisiva com Hermann. Sempre me interessei pelos discursos 
feitos antes de uma batalha: não há nada que seja mais esclarecedor do carácter de um general. Germânico 
não saturava os seus homens com um estilo oratório nem gracejava com eles de forma obscena, como 
Júlio César. Era sempre muito sério, muito preciso e muito prático. Nessa ocasião, o seu discurso foi sobre 
o que ele realmente pensava dos germanos. Disse que eles não eram soldados. Tinham uma certa coragem 
e lutavam bem em grupo, como acontece com o gado selvagem, e tinham também uma certa astúcia 
animal, que tornava imprudente negligenciar as precauções normais quando se lutava com eles. Mas, 
depois do primeiro ataque furioso, em breve se cansavam e não tinham disciplina no verdadeiro sentido 
militar, mas apenas um espírito de rivalidade mútua. Os seus chefes não podiam contar com eles para 
fazer aquilo que se desejava: ou faziam demais ou de menos,
­ Os germanos, ­ disse, ­ são a nação mais insolente e gabarola do mundo quando as coisas lhes correm 
bem, mas, quando são derrotados, tornam­se extremamente cobardes e abjectos. Nunca confieis num 
germano perdendo­o de vista, mas nunca o receeis quando o tiverdes frente a frente. E isso é tudo o que é 
necessário dizer, à excepção de que: a maior parte da luta de amanhã será no meio destes bosques, onde, 
tanto quanto se sabe, o inimigo ficará tão apertado que não irá ter espaço de manobra. Ide direitos a eles 
sem vos importardes com as suas azagaias e aproximai­vos bem. Acutilai­os na cara: é a coisa que mais 
detestam.
Hermann tinha escolhido cuidadosamente o seu campo de batalha: uma planície que estreitava entre o 
Véser e uma cordilheira de colinas arborizadas. Ele lutaria na parte estreita da planície, com um grande 
carvalho e uma floresta de faias atrás, o rio à direita e as colinas à esquerda. Os germanos apresentavam­se 
em três destacamentos. O primeiro deles, constituído por jovens das tribos locais armados com azagaias, 
devia avançar para a planície para se defrontar com os regimentos romanos da frente, que provavelmente 
seriam auxiliares franceses, e obrígá­los a recuar. Depois, quando aparecessem os reforços romanos, 
deviam abandonar a luta e fingir que fugiam em pânico. Os romanos então avançariam na direcção da 
floresta e, neste ponto, o segundo destacamento, formado pela própria tribo de Hermann, atacaria de um 
ponto de emboscada na colina, apanhando­os pelo flanco. Isto iria causar grande confusão e o primeiro 
destacamento devia então regressar, apoiado de perto pelo terceiro ­ os homens mais velhos e experientes 
das tribos locais,
220
empurrando os romanos para o rio. A cavalaria germana, nesta altura, teria avançado vinda do 
outro lado da colina, apanhando os romanos pela retaguarda.
Teria sido um bom plano, se Hermann estivesse à frente de tropas disciplinadas. Mas as coisas 
correram ridiculamente mal. A ordem de batalha de Germânico era como se segue: primeiro, dois 
regimentos de infantaria pesada francesa no flanco do rio, e dois de auxiliares germanos, no 
flanco da montanha; depois, os arqueiros a pé e quatro regimentos regulares, seguidos de 
Germânico, com dois batalhões da Guarda e com a cavalaria regular. Apareciam seguidamente 
mais quatro regimentos regulares, arqueiros montados franceses e infantaria ligeira francesa. 
Quando os auxiliares germanos avançaram pelos contrafortes da montanha, Hermann, que 
observava os acontecimentos do cimo de um pinheiro, gritou excitado para o sobrinho que se 
encontrava em baixo à espera de ordens: ”Ali vai o traidor do meu irmão! Não deve sair com vida 
desta batalha.” O sobrinho estúpido saltou em frente, gritando: ”Ordens de Hermann para atacar 
imediatamente!” Precipitou­se para baixo para a planície com cerca de metade da tribo. Hermann 
conseguiu com dificuldade conter os restantes. Germânico fez sair de imediato a cavalaria regular 
para atacar o bando de loucos no flanco antes que conseguissem alcançar os homens de Flávio; os 
arqueiros montados franceses cortaram­lhes a retirada.
O destacamento germano de tropas de escaramuça tinha entretanto saído da floresta, mas a carga 
da cavalaria romana fez recuar para cima deles os homens comandados pelo sobrinho de 
Hermann e os primeiros entraram em pânico e recuaram também. O terceiro destacamento dos 
germanos, o corpo principal, saiu então da floresta, esperando que as tropas de escaramuça 
parassem e voltassem para trás com eles, como estava combinado. Mas a única coisa em que os 
tropas de escaramuça pensavam era em fugir da cavalaria: fugiram para trás pelo meio do 
destacamento principal. Neste momento, surgiu o presságio mais encorajador para os romanos 
oito águias que se tinham assustado com a movimentação, afastando­se da montanha e voando 
em círculos pela planície, soltando gritos agudos, voaram agora todas juntas na direcção da 
floresta. Germânico gritou: ”Segui as Águias! Segui as Águias Romanas!” Todo o exército 
repetiu o grito: ”Segui as Águias!” Entretanto, Hermann tinha atacado com o resto dos seus 
homens e apanhado de surpresa os arqueiros a pé, matando alguns; mas o regimento da 
retaguarda de infantaria pesada francesa deu meia volta para ir em auxílio dos arqueiros. O 
exército de Hermann, formado por uns 15.000 homens, ainda podia ter salvo a batalha 
esmagando a infantaria francesa e, desta forma, conseguindo uma penetração formidável entre a 
guarda avançada romana e o corpo principal. Mas o sol brilhou­lhes nas caras, reflectido pelas 
armas, peitorais, escudos
221
e elmos das longas fileiras de infantaria regular que avançavam para eles; isso fez com que os germanos 
perdessem a coragem. A maior parte deles correu a refugiar­se na colina. Hermann reuniu um ou dois 
milhares de homens, mas não os suficientes e, entretanto, já dois esquadrões da cavalaria regular tinham 
voltado ao ataque pelo meio dos fugitivos, cortando­lhes a retirada para a colina. Como é que ele 
conseguiu fugir é um mistério, mas é convicção generalizada que tenha esporeado o cavalo em direcção ao 
bosque e alcançado os auxiliares germanos que avançavam para o atacar. Então gritou:
­ Abram passagem, suas bestas! Eu sou Hermann!
Ninguém ousou matá­lo porque era o irmão de Flávio e Flávio sentir­se­ia obrigado, em nome da honra de 
família, a vingar a sua morte.
já não era uma batalha, mas sim uma chacina. A principal força germana foi dominada e obrigada a recuar 
até ao rio, que muitos conseguiram atravessar a nado, mas não todos. Germânico arrastou a sua segunda 
linha de infantaria regular para o bosque e expulsou de lá as tropas de escaramuça que aguardavam ali, na 
vaga esperança de que a batalha pudesse de repente virar a seu favor (os arqueiros ocuparam­se em fazer 
descer das árvores os germanos que tinham trepado a elas e que estavam escondidos no cimo, por entre a 
folhagem). Acabara toda a resistência. Desde as nove da manhã até às sete da tarde, quando começou a 
escurecer, a mortandade continuou. Num raio de dez milhas para lá do campo de batalha, os bosques e as 
planícies estavam juncados de corpos germanos. Entre os cativos, encontrava­se a mãe de Hermann e 
Flávio. Ela suplicou pela própria vida, dizendo que sempre tentara persuadir Hermann a abandonar a sua 
resistência fútil aos conquistadores romanos. Assim, a lealdade de Flávio estava agora assegurada.
Um mês mais tarde travou­se nova batalha, numa floresta densa nas margens do Elba. Herman tinha 
escolhido uma emboscada e tomou disposições que podiam ter sido altamente eficazes se Germânico não 
tivesse sabido de tudo algumas horas antes, por alguns desertores. Assim, em vez dos romanos terem sido 
encaminhados para o rio, os germanos foram obrigados a recuar através da floresta, na qual se 
encontraram demasiado apertados para usar a sua táctica habitual de ataque e fuga alguns milhares foram 
empurrados para um pântano fervilhante, onde se afundaram e desapareceram lentamente, gritando de 
raiva e desespero. Hermann, que tinha ficado incapacitado com o ferimento de uma seta na batalha 
anterior, não apareceu muito desta vez. Mas conduziu a luta no bosque o mais obstinadamente que 
conseguiu e, encontrando­se por acaso com o irmão Flávio, trespassou­o com uma azagaia. Ele escapou 
atravessando o pântano, saltando de moita em moita com extraordinária destreza e muita sorte.
222
Germânico ergueu uma enorme pilha de troféus com armas germanas e pôs sobre ela a seguinte inscrição: 
As forças de Tibério César, tendo subjugado as tribos entre o Reno e o Elba, consagram este memorial da 
sua vitória a Júpiter, a Marte e a Augusto. Sem qualquer menção a ele próprio. As baixas que sofreu no 
total das suas batalhas não ultrapassaram os 2.500 homens, entre mortos e feridos graves. Os germanos 
devem ter perdido, pelo menos, 25.000.
Germânico considerou que tinha feito o suficiente naquele ano e enviou alguns dos seus homens de 
regresso ao Reno por terra, embarcando os outros em transportes. Mas depois veio a desgraça; uma 
tempestade repentina vinda de sudoeste apanhou a frota pouco depois dos barcos terem levantado âncora, 
espalhando­os em todas as direcções. Muitos navios foram ao fundo e apenas o navio do próprio 
Germânico conseguiu alcançar a foz do Véser, onde se culpou a si mesmo, qual segundo Varo, pela perda 
de todo um exército romano. Só com dificuldade foi impedido pelos seus amigos de saltar para o mar para 
se juntar aos mortos. No entanto, alguns dias mais tarde, o vento mudou para norte e, um por um, os 
navios dispersos voltaram, quase todos sem remos e alguns com capas esticadas a fazer de velas, enquanto 
os menos afectados se revezavam para rebocar aqueles que mal conseguiam flutuar.
Germânico apressou­se a lançar mãos ao trabalho para reparar os cascos danificados e enviou todos os 
navios que se encontravam em bom estado para procurarem os sobreviventes nas desoladas ilhas vizinhas. 
Muitos foram encontrados aí, mas meio mortos de fome, tendo­se mantido vivos à custa de crustáceos e 
das carcaças de cavalos que foram atiradas para a praia. Muitos mais apareceram vindos de outros pontos 
mais longínquos da costa; tinham sido tratados com respeito pelos habitantes, que ultimamente se tinham 
visto forçados a jurar aliança a Roma. O carregamento de cerca de vinte navios regressou de sítios tão 
distantes como a Britânia, que vinha pagando um tributo nominal desde a sua conquista setenta anos antes 
por Júlio César, enviado pelos reis menores do Kent e do Sussex. No final, só se perdeu um quarto dos 
homens desaparecidos e quase 200 foram encontrados anos mais tarde, na Britânia Central. Foram 
retirados das minas de chumbo, onde os tinham posto a fazer trabalhos forçados.
Os germanos do interior, quando souberam deste desastre, pensaram que os seus deuses os tinham 
vingado. Derrubaram o troféu do campo de batalha e começaram mesmo a falar de uma marcha até ao 
Reno. Mas, repentinamente, Germânico atacou de novo, enviando uma expedição de sessenta batalhões de 
infantaria e 100 esquadrões de cavalaria contra as tribos do Véser superior, enquanto ele próprio marchava 
com mais oitenta batalhões de infantaria e cem esquadrões de cavalaria contra as tribos de entre o baixo 
Reno e o Ems. Ambas as expedições foram totalmente
223
coroadas de êxito e, o que foi melhor do que matar milhares de germanos, a Águia do Décimo Oitavo 
Regimento foi encontrada num templo subterrâneo na floresta, tendo sido levada em triunfo. Apenas 
faltava resgatar a Águia do Décimo Sétimo e Germano prometeu aos seus homens que, no ano seguinte, se 
ainda detivesse o comando, resgataríam essa também, Entretanto, conduziu­os de regresso ao quartel de 
Inverno.
Nessa altura, Tibério escreveu­lhe pressionando­o a voltar a Roma para o triunfo que lhe tinha sido 
decretado, pois ele sem dúvida já fizera o suficiente. Germânico escreveu em resposta que não se daria por 
satisfeito enquanto não tivesse derrotado completamente o poder dos germanos, para o qe não eram 
necessárias muitas mais batalhas, e recuperado a terceira Águia. Tibério escreveu­lhe de novo, dizendo 
que Roma não podia suportar baixas tão numerosas, mesmo com a recompensa de tão esplêndidas 
vitórias: ele não estava a criticar as capacidades de Germânico como general, pois as suas batalhas tinham 
sido muito económicas em vidas, mas entre as baixas em combate e o desastre marítimo tinha­se perdido o 
equivalente a dois regimentos completos, que era mais do que Roma se podia permitir. Recordou a 
Germânico que ele próprio tinha sido enviado nove vezes para a Germânia por Augusto e, portanto, não 
falava por falta de experiência. A sua opinião era que a vida de um único romano não era compensada 
pela morte de dez germanos que fosse. A Germânia era como uma Hidra: quanto mais cabeças se 
cortavam, mais cresciam. A melhor maneira de controlar os germanos era jogar com as suas rivalidades 
intertribais e fomentar a guerra entre os chefes vizinhos: encorajá­los a matarem­se uns aos outros sem 
ajuda externa. Germânico escreveu uma vez mais pedindo apenas um outro ano para completar o seu 
trabalho de subjugação. Mas Tibério disse­lhe que ele era necessário novamente em Roma como Cônsul e 
tocou­lhe no ponto mais sensível, dizendo que devia pensar no irmão Castor. A Germânia era agora o 
único país onde se travava uma guerra de alguma importância e, se ele insistisse em ser ele a terminá­la, 
Castor não teria qualquer oportunidade de ganhar um triunfo ou o título de marechal de campo. 
Germânico não insistiu mais, mas disse que os desejos de Tibério eram a sua lei e que regressaria logo que 
fosse substituído.
Voltou no princípio da Primavera e celebrou o seu triunfo. Toda a população de Roma se deslocou a uma 
distância de vinte milhas da cidade para lhe dar as boas vindas. Um grande arco em comemoração das 
Águias recuperadas foi consagrado perto do templo de Saturno. A procissão triunfal passou por baixo 
dele. Havia carros empilhados com os despojos dos templos germanos e com escudos e armas inimigos; 
outros, carregavam quadros representando batalhas ou deuses germanos dos rios ou das montanhas 
dominados pelos soldados
224
romanos. Thrusnelda e o filho iam num carro com cordas em volta do pescoço, seguidos por um enorme 
cortejo de prisioneiros germanos com os punhos amarrados. Germânico, coroado, ia no seu carro, com 
Agripina sentada a seu lado; sentados atrás, iam os seus cinco filhos ­ Nero, Druso, Calígula, Agripinila e 
Drusila. Ele recebeu mais aplausos que qualquer outro general triunfante alguma vez recebera, desde o 
triunfo de Augusto em Accio.
Mas eu não estive presente. De todos os lugares do mundo, encontrava­me em Cartago! Apenas um mês 
antes do regresso de Germânico, tinha recebido uma nota de Lívia com instruções para que me preparasse 
para uma viagem a África. Era necessário um representante da família imperial para consagrar um novo 
templo a Augusto em Cartago, e eu era o único que estava disponível para essa tarefa. Ser­me­iam 
fornecidos todos os conselhos sobre como me conduzir e como realizar a cerimónia, e era de esperar que 
eu não fizesse, uma vez mais, figura de tolo, mesmo perante os representantes de África. Compreendi 
imediatamente porque me estavam a mandar para lá. Não havia qualquer razão para uma partida imediata, 
pois o templo só estaria concluído daí a uns três meses. Estavam a desembaraçar­se de mim. Enquanto 
Germânico estivesse na Cidade não me seria permitido regressar e todas as cartas que enviasse para Roma 
seriam abertas. Assim, nunca tive a oportunidade de dizer a Germânico o que tinha estado a guardar para 
ele durante tanto tempo. Por outro lado, Germânico teve a sua conversa com Tibério. Disse­lhe que sabia 
que o exílio de Póstumo se tinha devido a uma maquinação cruel por parte de Lívia ­ tinha provas 
concludentes disso. Lívia devia, sem dúvida, ser afastada dos negócios públicos. Os seus actos não podiam 
ser justificados por qualquer subsequente mau comportamento por parte de Póstumo. Era apenas natural 
que ele tentasse escapar de um exílio indevido. Tibério declarou­se chocado com a revelação de 
Germânico; mas disse que não podia criar um escândalo público destituindo repentinamente a mãe: acusá­
la­ia particularmente do crime e, pouco a pouco, retirar­lhe­ia os poderes.
O que ele realmente fez foi ir ter com Lívia e contar­lhe exactamente o que Germânico lhe tinha dito, 
acrescentando que Germânico era um tolo crédulo, mas parecia estar a falar sério; e era de tal forma 
popular em Roma e no Exército, que talvez fosse aconselhável para Lívia convencê­lo que não era culpada 
daquilo de que ele a acusava, a menos que achasse tal atitude demasiado indigna para ela. Acrescentou 
que ia afastar Germânico para qualquer lado logo que possível, provavelmente para o Leste, e que iria pôr 
de novo ao Senado a questão dela ser chamada Mãe da Pátria, um título que bem merecia. Tinha tomado 
exactamente a atitude certa. Lívia ficou satisfeita por ele ainda a recear o suficiente para lhe contar tudo 
aquilo e chamou­lhe filho respeitador. jurou que não tinha arranjado acusações falsas contra Póstumo: esta 
história tinha provavelmente
225
sido inventada por Agripina, a quem Germânico seguia cegamente e que estava a tentar persuadi­lo a 
usurpar a monarquia. O plano de Agripina, disse, era sem dúvida provocar o desentendimento entre 
Tibério e a sua extremosa mãe. Tibério, abraçando­a, disse que, apesar dos pequenos desentendimentos 
que pudessem ocorrer ocasionalmente, nada quebraria os laços que os unia. Lívia suspirou; agora estava a  
ficar velha
­ já avançara na casa dos setenta ­ e começava a achar o seu trabalho demasiado: talvez ele arranjasse 
maneira de a libertar da parte mais aborrecida e consultá­la apenas sobre questões importantes de 
nomeações e decretos? Nem sequer ficaria ofendida se ele pusesse de lado a sua prática de pôr o nome 
dela acima do seu em todos os documentos oficiais: não queria que se dissesse que ele estava sob a sua 
tutela. Mas, disse, quanto mais depressa convencesse o Senado a dar­lhe aquele título, mais satisfeita 
ficaria. Portanto, houve mostras de reconciliação: mas nenhum dos dois confiava no outro.
Tibério nomeou Germânico seu colega no Consulado e dísse­lhe que persuadira Lívia a retirar­se dos 
assuntos públicos, embora, para manter as aparências, continuasse a fingir que a consultava. Isto pareceu 
satisfazer Germânico. Mas Tibério não se sentia de forma alguma confortável. Agripina mal lhe falava e, 
sabendo que Germânico e ela eram uma alma só, não conseguia acreditar na sua lealdade duradoura. Além 
disso, passavam­se coisas em Roma que um homem com o carácter de Germânico naturalmente detestava. 
Em primeiro lugar, os informadores. Uma vez que Lívia não lhe dava acesso aos processos criminais e não 
o deixava partilhar do seu eficientíssimo sistema de espionagem ­ ela dispunha de um agente pago em 
quase todas as casas ou instituições importantes ­ ele tinha que adoptar outros métodos. Promulgara um 
decreto pelo qual, se alguém fosse considerado culpado de conspirar contra o Estado ou de blasfemar 
contra o Deus Augusto, os seus bens seriam confiscados e divididos entre os seus leais acusadores. 
Conspirações contra o Estado eram menos fáceis de provar que as blasfémias contra Augusto. O primeiro 
caso de blasfémia contra Augusto foi o de um gracejador, um jovem lojista, que calhou estar ao lado de 
Tibério na Praça do Mercado quando passava um funeral. Saltou em frente e sussurrou qualquer coisa ao 
ouvido do cadáver. Tibério ficou curioso de saber do que se tratava. O homem explicou que estava a pedir 
ao morto para dizer a Augusto, quando o encontrasse lá em baixo, que os seus legados ao povo de Roma 
ainda não tinham sido pagos. Tibério mandou prender e executar o homem por falar de Augusto como se 
ele fosse um simples fantasma, não um Deus imortal, e disse que ia enviá­lo lá para baixo para o 
convencer do seu erro. Um mês ou dois mais tarde, a propósito, pagou os legados por inteiro. Num caso 
como este, Tibério tinha uma certa justificação; mas,
226
mais tarde, os mais inofensivos abusos do nome de Augusto eram suficientes para que um homem fosse 
condenado à morte.
Surgiu entretanto uma classe de informadores profissionais, com quem se podia contar para criar um caso 
contra qualquer homem que lhes fosse indicado, como tendo incorrido no desagrado de Tibério. Assim,
os processos criminais baseados no registo de uma verdadeira delinquência eram supérfluos. Sejano era o 
intermediário de Tibério junto destes patifes. No ano que antecedeu o regresso de Germânico, Tibério 
tinha posto os informadores a trabalhar no caso de um jovem que era bisneto de Pompeu e primo de 
Agripina, através da avó Escribónia. Sejano tinha prevenido Tibério de que Libo era perigoso e tinha 
andado a fazer comentários desrespeitosos sobre ele: mas Tibério teve o cuidado, naquela fase, de não 
tomar o desrespeito para com ele próprio uma ofensa imputável; portanto, teve que inventar outras 
acusações. Para disfarçar a sua associação com Trasilo, Tibério expulsara de Roma todos os astrólogos, 
mágicos, adivinhos e intérpretes de sonhos, proibindo toda e qualquer pessoa de consultar algum deles que 
se tivesse deixado ficar em segredo. Alguns permaneceram com a conivência de Tibério, na condição de 
apenas realizarem sessões com um agente imperial escondido na sala. Libo foi persuadido por um senador, 
que se tinha tornado informador profissional, a visitar uma destas armadilhas e a deixar que lhe lessem as 
sortes. As perguntas que fez foram anotadas pelo agente escondido. Em si mesmas, elas não tinham nada 
de traiçoeiro, sendo apenas tolas: queria saber até que ponto iria ficar rico e se alguma vez seria o homem 
mais proeminente de Roma, e assim por diante. Mas no seu julgamento foi apresentado um documento 
forjado, que se dizia ter sido descoberto por escravos no quarto dele ­ uma lista, que parecia ter sido feita 
na caligrafia dele, com os nomes de todos os membros da família imperial e dos principais senadores, com 
curiosos caracteres caldaicos e egípcios em frente de cada um, a margem. O castigo por consultar um 
mágico era o exílio, mas o castigo pela prática pessoal de magia era a morte. Libo negou a autoria do 
documento e o depoimento de escravos, mesmo sob tortura, não seria suficiente para o condenar: o 
testemunho de escravos só era aceite quando a acusação era de incesto. Não havia o depoimento de 
nenhum liberto, porque o liberto de Libo não se deixou persuadir a testemunhar contra ele; por outro lado, 
não era possível torturar um liberto para o obrigar à confissão. No entanto, a conselho de Sejano, Tibério 
criou uma nova disposição legal: quando um homem era acusado de um crime grave, os seus escravos 
podiam ser comprados por um preço justo pelo Procurador Público, sendo­lhes assim permitido prestar 
declarações sob tortura. Libo, que não conseguira arranjar um advogado suficientemente corajoso para o 
defender, viu que estava perdido e pediu que o julgamento fosse adiado para o dia seguinte. Quando o 
adiamento foi concedido, foi para casa e
227
matou­se. Ainda assim, a acusação contra ele foi levada por diante pelo Senado com a mesma formalidade 
como se ele estivesse vivo, tendo sido declarado culpado de todas as acusações. Tibério disse que era 
lamentável que aquele jovem tolo se tivesse suicidado, porque teria intercedido pela sua vida. O espólio de 
Libo foi dividido entre os seus acusadores, entre os quais se contavam quatro membros do senado. Uma 
farsa ignominiosa como esta nunca teria tido lugar quando Augusto era Imperador, mas, no tempo de 
Tibério, isso aconteceu mais que uma vez, com variantes. Apenas um homem fez um protesto público, um 
certo Calpúrnio Piso, que se ergueu no Senado para dizer que estava tão enojado com o ambiente de 
intriga política na Cidade, a corrupção da justiça e o espectáculo degradante dos seus colegas senadores 
que actuavam como informadores pagos, que ia abandonar Roma de vez e retirar­se para uma aldeia, 
numa parte remota de Itália. Tendo dito isto, saiu. O discurso causou uma forte impressão na Casa. 
Tibério mandou alguém chamar Calpúrnio de volta e, quando ele estava de novo no seu lugar, disse­lhe 
que, se havia má administração da justiça, qualquer senador era livre de chamar a atenção para o facto na 
hora das perguntas. Disse também que um certo volume de intriga política era inevitável na capital do 
maior Império que o mundo alguma vez conhecera. Estaria Calpúrnio a sugerir que os Senadores não 
apresentariam as suas acusações se não tivessem a esperança de uma recompensa? Disse que admirava a 
seriedade e a independência de Calpúrnio, e invejava os seus talentos; mas não seria melhor ele empregar 
estas nobres qualidades na melhoria da moralidade social e política em Roma, do que enterrá­las em 
qualquer lugarejo miserável dos Apeninos, no meio de pastores e bandidos? Assim, Calpúrnio teve que 
ficar. Mas, pouco tempo depois, mostrou a sua seriedade e independência citando a velha Urgulanila para 
comparecer em tribunal pelo não pagamento de uma avultada soma em dinheiro, que lhe devia por alguns 
quadros e estatuária: a irmã de Calpúrnio morrera e tinha havido uma venda. Quando Urgulanila leu a 
citação, que pedia a sua comparência imediata no Tribunal de devedores, disse aos seus transportadores 
que a levassem directamente ao Palácio de Lívia. Calpúrnio seguiu­a e foi recebido no vestíbulo por Lívia, 
que o mandou ir­se embora. Calpúrnio desculpou­se com cortesia, mas, firmemente, disse que Urgulanila 
tinha que obedecer sem falta à citação, a menos que estivesse demasiado doente para o fazer, o que 
evidentemente não era o caso. Mesmo as Virgens Vestais não estavam isentas de comparecer em tribunal 
quando convocadas. Lívia disse que o comportamento dele era um insulto pessoal para ela e que o filho, o 
Imperador, saberia como vingá­la. Tibério foi mandado chamar e tentou acalmar as coisas, dizendo a 
Calpúrnio que Urgulanila certamente tencionava comparecer logo que se tivesse recomposto do choque 
repentino da convocatória, dizendo a Lívia que, sem dúvida, se tratava de um erro;
228
que Calpúrnio certamente não tencionava faltar­lhe ao respeito e que ele próprio assistiria ao 
julgamento e faria com que Urgulanila tivesse um advogado competente e um julgamento justo. Saíu do 
Palácio caminhando ao lado de Calpúrnio na direcção do tribunal e falando com ele de uma coisa e outra. 
Os amigos de Calpúrnio tentaram persuadi­lo a desistir da acusação, mas ele replicou que era um homem 
antiquado: gostava que lhe pagassem o dinheiro que lhe deviam. O julgamento nunca se deu. Lívia enviou 
um mensageiro a cavalo atrás deles com a soma total da dívida em ouro nos alforges: o homem alcançou 
Calpúrnio e Tibério antes deles chegarem à porta do Tribunal.
Mas eu estou a escrever sobre informadores e o efeito desmoralizador que eles tiveram na vida de Roma, e 
também sobre a corrupção judicial. Preparava­me para registar que, enquanto Germânico esteve em 
Roma, não se ouviu uma única acusação nos tribunais de blasfémia contra Augusto e de conspiração 
contra o Estado e os informadores foram avisados para que permanecessem absolutamente inactivos. 
Tibério arvorou o seu melhor comportamento e os seus discursos ao Senado eram modelos de franqueza. 
Sejano retirou­se do primeiro plano, Trasilo foi deslocado de Roma para se ir recolher na aldeia de Tibério 
na ilha de Capri e Tibério parecia não ter outro amigo íntimo a não ser o honesto Nerva, cujo conselho 
pedia constantemente.
De Castor, nunca consegui aprender a gostar. Era um indivíduo desbocado, sanguinário, de temperamento 
violento, dissoluto. O seu carácter evidenciava­se com a maior clareza numa luta de espada, em que ele 
tinha maior prazer em ver o sangue jorrar de uma ferida do que em qualquer acto de destreza ou de 
coragem por parte dos combatentes. Mas devo dizer que se comportou muito bem para com Germânico e 
parecia sofrer uma verdadeira mudança de atitude na sua companhia. Facções da Cidade tentaram forçar 
os dois à desafortunada posição de rivais à sucessão na monarquia, mas nunca, em qualquer ocasião, eles 
encorajaram este ponto de vista. Castor tratava Germânico com a mesma consideração fraterna que 
Germânico lhe testemunhava. Castor não era exactamente um cobarde, mas era mais um político que um 
soldado. Quando foi enviado para o outro lado do Danúbio, em resposta a um pedido de ajuda por parte 
das tribos da Germânia do Leste, que estavam a travar uma luta defensiva e sangrenta contra a 
confederação ocidental de Hermann, conseguiu, através de uma intriga astuta, chamar para a guerra as 
tribos da Boémia e da Bavária. Ele estava a concretizar a política de Tibério de encorajar os germanos a 
exterminarem­se uns aos outros. Marobodo (Aquele que caminha sobre o fundo do lago), o rei­sacerdote 
dos Germanos orientais, fugiu para procurar protecção no acampamento de Castor. Foi concedido a 
Marobodo um retiro seguro em Itália; e, uma vez que os germanos de leste tinham feito um juramento de 
perpétua
229
aliança, ficou dezoito anos como refém pelo bom comportamento deles. Estes germanos de leste eram 
uma raça mais feroz e poderosa do que os do oeste e Germânico teve sorte em não os ter tido em guerra 
com ele também. Mas Hermann tornara­se um herói nacional por causa da derrota de Varo e Marobodo 
invejava­lhe o sucesso. Para que Hermann não se tornasse Rei supremo de todas as nações germanas, o 
que era a sua ambição, Marobodo recusara dar­lhe qualquer ajuda na sua campanha contra Germânico, até 
mesmo criando uma diversão noutra fronteira.
Tenho pensado muitas vezes em Hermann. À sua maneira, foi um homem notável; e, embora seja difícil 
esquecer­lhe a traição contra Varo, este tinha feito muito para provocar a revolta e Hermann e os seus 
homens estavam, sem dúvida, a lutar pela liberdade. Tinham um desprezo genuíno pelos romanos. Não 
conseguiam entender em que medida a disciplina extremamente severa do exército romano sob o comando 
de Varo, Tibério e quase todos os generais à excepção do meu pai e do meu irmão, era diferente de uma 
verdadeira escravatura. Ficavam chocados com os açoites disciplinares e consideravam o sistema de pagar 
aos soldados um tanto por dia, em vez de os contratar com promessas de glória e saque, como 
extremamente baixo. Os germanos sempre foram castos na sua moral e os oficiais romanos praticavam 
abertamente vícios que, na Germânia, se os mesmos viessem à luz do dia ­ o que era muito raro ­, seriam 
punidos afogando os dois culpados em lama. Quanto à cobardia germana, todos os povos bárbaros são 
cobardes. Se os germanos alguma vez se tornarem civilizados, então será a altura de ajuizar se eles são 
cobardes ou não. Parecem, no entanto, ser um povo excepcionalmente nervoso e brigão e não consigo 
decidir se haverá alguma probabilidade deles se tornarem verdadeiramente civilizados. Germânico 
pensava que não havia nenhuma. Se a sua política de exterminação era justificada ou não (certamente não 
era a política romana habitual com as tribos da fronteira), isso depende da resposta à primeira pergunta. 
Claro que as Águias capturadas tinham que ser reconquistadas e Hermann não se mostrara misericordioso 
depois da derrota de Varo, quando tinha assolado a província; e Germânico, que era o mais gentil e 
humano dos homens, detestava tanto o massacre geral, que deve ter tido muito boas razões para o ordenar.
Hermann não morreu em combate. Quando Marobodo foi forçado a fugir do país, Hermann pensou que o 
seu caminho estava agora aberto para uma monarquia sobre todas as nações da Germânia. Mas estava 
errado: não conseguiu sequer tornar­se monarca da sua própria tribo, que era uma tribo livre, pois o chefe 
não tinha poder para comandar, apenas para guiar, aconselhar e persuadir. Um dia, um ano ou dois mais 
tarde, tentou promulgar ordens como um rei. A família, que até ali lhe
230
era altamente dedicada, ficou de tal forma escandalizada que, sem primeiro discutirem a questão em 
conjunto, se precipitaram todos sobre ele com as suas armas e fizeram­no em pedaços. Tinha trinta e sete 
anos quando morreu, tendo nascido um ano antes de meu irmão Germânico, o seu maior inimigo.
231
CAPÍTULO XX
Fiquei quase um ano em Cartago (foi no ano em que Lívio morreu, em Pádua, onde o seu coração sempre 
estivera). A Velha Cartago tinha sido completamente arrasada e esta era uma nova cidade, construída por 
Augusto no sudeste da península e destinada a tornar­se a primeira cidade de África. Desde os meus 
tempos de bebé, era a primeira vez que estava fora de Itália. Achei o clima muito duro, os nativos 
africanos selvagens, doentes e esgotados pelo trabalho; os residentes romanos insípidos, brigões, 
mercenários e fora do tempo; os enxames de insectos desconhecidos rastejantes e voadores eram 
absolutamente horríveis. Aquilo de que mais sentia a falta era da floresta. Em Trípoli não há nada de 
intermédio entre a terra normalmente plantada
­ pomares de figueiras e oliveiras ou campos de trigo ­ e o deserto nu, pedregoso, espinhoso. Estava 
alojado em casa do Governador, que era aquele Fúrio Camilo, tio da minha querida Camila, sobre quem já 
escrevi; era muito bondoso comigo. Quase que a primeira coisa que me disse foi como o meu Sumário dos  
Balcãs lhe tinha sido útil nessa campanha e que eu devia certamente ter sido publicamente recompensado 
por o ter compilado tão bem. Fez tudo o que podia para tornar a minha cerimónia de consagração um 
sucesso e conseguir das figuras locais o respeito devido à minha posição. Foi também muito assíduo em 
me fazer conhecer os sítios mais interessantes. A cidade mantinha um comércio florescente com Roma, 
exportando não apenas vastas quantidades de trigo e azeite, mas escravos, tintas púrpura, esponjas, ouro, 
marfim, ébano e animais selvagens para os Jogos. Mas eu tinha pouco com que me ocupar e Fúrio sugeriu 
que seria bom para mim, enquanto lá estava, reunir materiais para uma história completa de Cartago. Esse 
livro não existia nas bibliotecas de Roma. Os arquivos da velha cidade tinham­lhe chegado recentemente 
às mãos, descobertos por nativos que andavam a escavar as ruínas à procura de tesouros escondidos; se eu 
quisesse usá­los, seriam meus. Disse­lhe que não tinha qualquer conhecimento da língua fenícia, mas ele 
respondeu que se encarregava, se eu estivesse suficientemente interessado, de entregar a um dos seus 
libertos a tarefa de traduzir os manuscritos mais importantes para grego.
233
A ideia de escrever a história agradou­me muito: sentia que nunca tinha sido feita justiça histórica aos 
Cartagineses. Passei o meu tempo livre a fazer um estudo das ruínas da Velha Cidade, com a ajuda de uma 
planta contemporânea e, de uma maneira geral, familiarizando­me com a geografia do país. Também 
aprendi suficientemente bem os rudimentos da língua para conseguir ler inscrições simples e compreender 
as poucas palavras fenícias usadas pelos autores que escreveram sobre as Guerras Púnicas do lado dos 
romanos. Quando regressei a Itália, simultaneamente com a minha história etrusca, comecei a escrever o 
livro. Gosto de ter duas tarefas a decorrer ao mesmo tempo: quando me canso de uma volto­me para a 
outra. Mas talvez seja um autor demasiado cuidadoso. Não me satisfaço apenas em copiar das autoridades 
antigas enquanto existe algum meio possível de verificar as suas afirmações consultando outras fontes de 
informação sobre o mesmo assunto, particularmente relatos de escritores de partidos políticos rivais. 
Assim, estas duas histórias, cada uma das quais eu podia ter escrito num ano ou dois se tivesse sido menos 
consciencioso, mantiveram­me ocupado durante cerca de vinte e cinco anos. Por cada palavra que escrevi, 
devo ter lido muitas centenas; no final, tornei­me um bom estudioso, tanto do etrusco como do fenício, 
tendo adquirido um conhecimento de trabalho de várias outras linguas e dialectos, tais como o númida, o 
egípcio, o oscense e o falisco. Conclui primeiro a História de Cartago.
Pouco depois de ter feito a consagração do templo, que decorreu sem incidentes, Fúrio teve 
repentinamente que partir para a guerra contra Tacfarinas com os únicos exércitos disponíveis na 
província ­ um regimento regular, o Terceiro, juntamente com alguns batalhões de auxiliares e dois 
esquadrões de cavalaria. Tacfarinas era um chefe númida, originariamente um desertor das fileiras dos 
auxiliares romanos e um bandido com um êxito notável. Nos últimos tempos, tinha reunido uma espécie 
de exército segundo o modelo romano no interior do seu próprio país e aliara­se aos sarracenos para uma 
evasão da província pelo Oeste. Os dois exércitos juntos eram mais numerosos que o destacamento de 
Fúrio, numa proporção de, pelo menos, cinco para um. Encontraram­se em campo aberto a cerca de 
cinquenta milhas da Cidade e Fúrio teve que decidir se iria atacar os dois regimentos semi­disciplinados 
de Tacfarinas que estavam no centro das indisciplinadas forças Árabes do flanco. Enviou a cavalaria e os 
auxiliares, na sua maioria arqueiros, para entreter os Árabes e, com o seu regimento regular, marchou ao 
encontro dos númidas de Tacfarinas. Eu observava a batalha de uma colina à distância de cerca de 350 
metros ­ tinha cavalgado até lá de mula ­ e nunca antes ou depois, acho eu, me senti tão orgulhoso de ser 
romano. O Terceiro mantinha uma formação perfeita: podia tratar­se de uma parada cerimonial nos 
Campos de Marte. Avançaram em três fileiras com trinta e cinco
234
metros de distância. Cada uma era constituída por 150 filas, com oito homens de profundidade. Os númidas 
detiveram­se numa posição defensiva. Estavam dispostos em seis filas, com uma frente igual à nossa. O Terceiro não 
parou e marchou direito a eles sem se deter um momento e só quando estavam a setenta metros de distância é que a 
fila da frente descarregou os seus dardos, qual aguaceiro reluzente. Depois, puxaram das espadas e atacaram, escudo 
contra escudo. Fizeram recuar a primeira linha do inimigo, constituída por homens armados com lanças, de encontro 
à segunda. Depois, romperam a nova linha com outra saraivada de dardos ­ cada soldado estava armado com dois. 
Então, a linha de apoio romana passou pelo meio deles, dando­lhes uma oportunidade para se reorganizarem. Não 
tardei a ver nova chuva de dardos, lançados ao mesmo tempo e voando a brilhar sobre a terceira linha númida. Os 
sarracenos dos flancos, que estavam a ser fortemente atacados pelas setas dos auxiliares, viram os romanos abrindo 
caminho até ao centro. Começaram aos uivos como se a batalha estivesse perdida e dispersaram em todas as 
direcções. Tacfarinas teve que entrar numa luta difícil de retaguarda para regressar ao acampamento. A única 
recordação desagradável que guardei desta vitória foi o banquete com que ela foi celebrada: no seu decorrer, o filho 
de Fúrio, que se chamava Escriboniano, fez referências satíricas ao apoio moral que eu tinha dado aos soldados. Fez 
isto sobretudo para chamar a atenção para a própria bravura que, na sua opinião, não tinha sido suficientemente 
elogiada. Depois, Fúrio fê­lo pedir­me desculpa. O Senado votou a Fúrio ornamentos triunfais ­ ele foi o primeiro 
membro da família a receber uma distinção militar, desde que o seu antepassado Camilo salvou Roma, mais de 400 
anos antes.
Quando fui finalmente chamado de novo a Roma, Germânico já tinha partido para Leste, onde o Senado lhe votara o 
comando supremo de todas as províncias. Com ele foram Agripina e Calígula, agora com oito anos de idade. Os 
filhos mais velhos ficaram em Roma com a minha mãe. Embora Germânico ficasse muito decepcionado por ter que 
deixar a Guerra da Germânia inacabada, decidiu tirar o melhor proveito possível daquela oportunidade e melhorar a 
sua educação visitando lugares famosos na história ou na literatura. Visitou a Baía de Áccio e viu aí o templo 
comemorativo dedicado a Apolo por Augusto, e o acampamento de António.
Como neto de António, aquele lugar tinha uma fascinação melancólica para ele. Estava a explicar o plano da batalha 
ao jovem Calígula, quando a criança o interrompeu com uma risada tola:
­ Sim, pai, o meu avô Agripa e o meu bisavô Augusto deram ao vosso avô António uma boa tareia. Pergunto a mim 
mesmo se não vos envergonhais de me contar a história.
Esta foi apenas uma de muitas ocasiões recentes em que Calígula tinha falado insolentemente com Germânico; este, 
decidiu que não valia a pena
235
tratá­lo da mesma maneira gentil e amigável com que tratava os outros filhos que o único 
caminho a seguir com Calígula era a disciplina estrita e os castigos severos.
Visitou Tebas Beócia, para ver o quarto onde nascera Píndaro, e a ilha de Lesbos, para ver o 
túmulo de Safo. Aqui nasceu outra das minhas sobrinhas, que recebeu o nome infeliz de Júlia. No 
entanto, sempre a tratámos por Lésbia. Depois visitou Bizâncio, Tróia e as famosas cidades 
gregas da Ásia Menor. De Mileto, escreveu­me uma longa carta descrevendo a viagem em termos 
de um interesse tão maravilhado, que tornava nítido que já não lamentava muito ter sido afastado 
da Germânia.
Entretanto, as coisas em Roma voltaram ao estado em que se encontravam antes do Consulado de 
Germânico; e Sejano reavivou os antigos receios de Tibério em relação a Germânico. Relatou um 
comentário de Germânico feito num jantar privado, no qual um dos seus agentes estivera 
presente, no sentido de que os regimentos de Leste, provavelmente, precisavam do mesmo tipo de 
revisão que ele dera aos do Reno. Este comentário tinha na realidade sido feito, mas não 
significava mais do que a ideia de que estas tropas estavam possivelmente a ser mal conduzidas 
por oficiais inferiores, de maneira muito semelhante ao que acontecera com as outras: e que ele 
passaria em revista todas as nomeações na primeira oportunidade. Sejano fez com que Tibério 
compreendesse essa observação como querendo dizer que a razão porque Germânico demorara 
tanto a sua usurpação do poder, era o facto de não poder contar com a afeição dos regimentos de 
Leste: afeição essa que ele ia agora conquistar deixando os homens escolher os seus próprios 
capitães, dando­lhes presentes e abrandando a severidade da sua disciplina tal como fizera no 
Reno.
Tibério ficou alarmado e achou mais prudente consultar Lívia: contava com a colaboração dela. 
Ela soube imediatamente o que fazer. Nomearam um homem chamado Gneo Piso para 
governador da província da Síria uma nomeação que lhe daria o comando, sob as ordens de 
Germânico, da maior parte dos regimentos orientais e disseram­lhe em privado que podia contar 
com o apoio de ambos se Germânico tentasse interferir com algumas das suas decisões políticas 
ou militares. Foi uma escolha inteligente. Gneo Piso, um tio daquele Lúcio Piso que tinha 
ofendido Lívia, era um velho altivo que, vinte e cinco anos antes, tinha conquistado o ódio 
amargo dos iberos, quando enviado para eles por Augusto como Governador, pela sua crueldade 
e avareza. Ele estava profundamente endividado e a sugestão de que podia comportar­se como 
lhe aprouvesse na Síria, desde que provocasse Germânico, parecia um convite para que fizesse 
uma nova fortuna para substituir aquela que fizera na Hispânia e que há muito delapidara. 
Detestava Germânico pela sua seriedade e
236
piedade e costumava chamar­lhe velha supersticiosa; ao mesmo tempo, sentia­se extremamente 
invejoso dele.
Germânico, quando visitara Atenas, tinha mostrado o seu respeito pelas antigas glórias, 
aparecendo aos portões da cidade apenas com um criado como escolta. Fizera também um 
discurso longo e sério a elogiar os poetas, soldados e filósofos atenienses, num festival 
organizado em sua honra. Piso passou igualmente por Atenas a caminho da Síria e, como não 
fazia parte da sua província e ele não fez qualquer esforço para ser delicado, os atenienses 
também não fizeram qualquer esforço para serem delicados com ele. Um homem chamado 
Teófilo, o irmão de um dos credores de Piso, acabava de ser condenado por falsificação por um 
voto da Assembleia da Cidade. Piso pediu como um favor pessoal que o homem fosse perdoado, 
mas recusaram o seu pedido, o que deixou Piso muito zangado: se Teófilo tivesse sido perdoado, 
o irmão teria certamente cancelado o débito. Fez um discurso violento, no qual disse que os 
atenienses dos tempos modernos não tinham o direito de se identificar com os grandes atenienses 
dos tempos de Péricles, Demóstenes, Esquilo, Platão. Os antigos atenienses tinham sido 
exterminados por guerras e massacres repetidos e estes eram mestiços, degenerados e 
descendentes de escravos. Disse que qualquer romano que os elogiasse, como se eles fossem os 
herdeiros legítimos desses antigos heróis, estava a rebaixar a dignidade do nome romano, e que, 
pela sua parte, não podia esquecer que, na última Guerra Civil, se tinham declarado contra o 
grande Augusto e apoiado esse cobarde traidor de António.
Então, Piso deixou Atenas e navegou para Rodes, a caminho da Síria. Germânico estava também 
em Rodes, visitando a Universidade, e a notícia do discurso, que lhe era nitidamente dirigido, 
chegou até ele um pouco antes de se avistarem os navios de Piso. Entretanto, levantou­se uma 
tempestade repentina com vento e chuva e viu­se que os navios de Piso estavam em dificuldades. 
Duas embarcações mais pequenas afundaram­se diante dos olhos de Germânico e a terceira, que 
era a de Piso, perdeu os mastros e estava a ser arrastada para as rochas do promontório a norte. 
Quem, a não ser Germânico, não teria abandonado Piso à sua sorte? Mas Germânico enviou duas 
galeras bem providas de homens que, remando desesperadamente, conseguiram alcançar o barco 
antes do embate e rebocá­lo em segurança para o porto. Ou quem, a não ser um homem tão 
depravado como Piso, não teria recompensado o seu salvador com gratidão e devoção para o 
resto da vida? Mas a verdade é que Piso ainda se queixou que Germânico tinha atrasado o 
salvamento até ao último momento, na esperança de chegar tarde demais; sem parar um dia em 
Rodes, afastou­se de novo enquanto o mar ainda estava tempestuoso, para chegar à Síria antes de 
Germânico.
257
Logo que chegou a Antióquia, começou a revisão dos regimentos exactamente no sentido oposto 
ao que Germânico tencionava. Em vez de afastar os capitães descuidados e tirânicos, deslocou 
para as fileiras todos os oficiais que tinham boas folhas de serviços e nomeou para o lugar deles 
malandrins seus favoritos mediante acordo de que uma comissão correspondente a metade 
daquilo que conseguissem ganhar com essas nomeações lhe seria paga a ele e sem perguntas. 
Assim começou um ano mau para os sírios. Os negociantes nas cidades e os agricultores no 
campo tinham que pagar secretamente o dinheiro de protecção aos capitães locais: se recusassem 
pagar, haveria uma incursão nocturna de homens mascarados, as suas casas seriam queimadas e 
as respectivas famílias assassinadas. A princípio, foram feitos a Piso numerosos apelos contra 
este terrorismo pelas guildas da cidade, associações de agricultores e outras entidades. Ele 
prometia sempre fazer um inquérito imediato, mas isso nunca acontecia; e os queixosos eram 
geralmente encontrados mortos por espancamento no caminho de casa. Uma delegação foi 
enviada a Roma, para se informar em privado junto de Sejano se Tibério estava ao corrente do 
que se passava e, na afirmativa, se ele o aprovava. Sejano disse aos emissários que Tibério não 
sabia de nada oficialmente e que, embora ele lhes prometesse sem dúvida proceder a um 
inquérito, Piso já fizera o mesmo, ou não? Talvez que o melhor caminho a tomar, disse, seria 
pagarem o dinheiro de protecção que lhes era exigido sem fazer muito alarido. Entretanto, o 
padrão de disciplina de acampamento nos regimentos da Síria tinha descido tão baixo, que o 
exército de bandidos de Tacfarinas, em comparação, pareceria um modelo de eficiência e 
dedicação ao dever. Uma delegação foi também procurar Germânico em Rodes e ele ficou 
revoltado e espantado com as revelações. Na sua recente digressão pela Ásia Menor, fizera 
questão de se inteirar pessoalmente de todas as queixas de má administração e afastar os 
magistrados que tivessem agido de forma ilegal ou opressiva. Depois, escreveu a Tibério, 
falando­lhe dos relatos que tinham chegado até ele sobre o comportamento de Piso, dizendo que 
ia partir imediatamente para a Síria, pedindo permissão para afastá­lo e para pôr um indivíduo 
melhor no lugar dele, mesmo que apenas algumas das queixas fossem justificadas. Tibério 
respondeu que também ouvira algumas queixas, mas que pareciam ser infundadas e maliciosas; 
ele tinha confiança em Piso como um Governador capaz e justo. Germânico não suspeitava da 
desonestidade das palavras de Tibério; por isso, sentiu confirmada a opinião que já fazia dele, 
como sendo uma pessoa simples e facilmente influenciável. Lamentou ter escrito a pedir 
permissão para fazer aquilo que devia ter feito de imediato sob sua própria responsabilidade. 
Entretanto, ouviu outra acusação grave contra Piso, designadamente, que ele estava a conspirar 
com Vonones, o rei deposto da Arménia, que estava refugiado na Síria, para
238
reconquistar o trono. Vonones era imensamente rico, tendo fugido para a Síria com a maior parte 
do conteúdo do tesouro arménio; portanto, Piso esperava dar­se bem com o negócio. Germânico 
partiu imediatamente para a Arménia, convocou uma conferência de nobres e, com as suas 
próprias mãos, mas em nome de Tibério, pôs o diadema na cabeça do homem que eles tinham 
escolhido para rei. Depois, ordenou a Piso que visitasse a Arménia à frente de dois regimentos 
para cumprimentar como vizinho o novo monarca. Ou, se fosse retido por algum assunto de 
maior importância, que enviasse o filho. Piso não enviou o filho nem foi pessoalmente. 
Germânico, tendo visitado outras províncias distantes e alguns reinos aliados e tendo resolvido aí 
todos os assuntos a contento, dirigiu­se à Síria e foi procurar Piso no quartel de Inverno do 
Décimo Regimento.
Estiveram vários oficiais presentes como testemunhas deste encontro, porque Germânico não 
queria que Tibério fosse mal informado sobre aquilo que se disse. Começou, na voz mais gentil 
que conseguiu, por pedir a Piso que explicasse a desobediência às ordens. Disse que, se não 
houvesse qualquer explicação, a não ser a mesma animosidade pessoal e falta de cortesia que 
mostrara no seu discurso em Atenas, nos seus comentários cheios de ingratidão em Rodes e em 
várias ocasiões posteriores, um relatório violento teria que ser enviado ao Imperador. Prosseguiu 
queixando­se que, para tropas que viviam em condições de paz num aquartelamento saudável e 
popular, encontrava o Décimo Regimento numa situação de indisciplina e sujidade chocantes.
Piso disse, sorrindo:
Sim, eles estão bem sujos, não estão? O que teria pensado o povo da Arménia se eu os tivesse 
enviado para lá como representantes do poder e majestade de Roma? (O poder e majestade de 
Roma era uma das frases favoritas do meu irmão.)
Germânico, controlando­se com dificuldade, disse que a deterioração parecia datar apenas da 
chegada de Piso à província e que iria escrever a Tibério nesse sentido.
Piso fez um pedido irónico de perdão, aliado a um comentário insultuoso sobre os altos ideais da 
juventude, que muitas vezes têm que ceder, neste mundo duro, a políticas menos exaltadas mas 
mais práticas.
Com o olhar faiscante, Germânico interrompeu­o:
Muitas vezes, Piso, mas nem sempre. Amanhã, por exemplo, vou sentar­me contigo no tribunal 
de apelação e veremos se os altos ideais da juventude são controlados por algum obstáculo; e se a 
justiça devida aos habitantes das províncias lhes pode ser negada por qualquer debochado 
sexagenário incompetente, avarento e sanguinário.
Assim terminou a entrevista. Piso escreveu imediatamente a Tibério e a Lívia, contando o sucedido. Citou 
de tal forma a última frase de
259
Germânico, que Tibério acreditou que o debochado sexagenário incompetente, avarento e 
sanguinário era ele próprio. Tibério respondeu que tinha a maior confiança em Piso e que se uma 
certa pessoa influente continuasse a falar e a agir daquela forma desleal, quaisquer medidas, por 
mais ousadas, tomadas por um subordinado para controlar tal deslealdade, seriam sem dúvida 
agradáveis ao Senado e ao povo de Roma. Entretanto, Germânico sentou­se no tribunal e ouviu 
os apelos das gentes da província contra sentenças injustas dos tribunais. A princípio, Piso fez 
tudo o que podia para o embaraçar com obstrucionismo legal, mas como Germânico manteve a 
paciência e continuou a ouvir os casos sem qualquer interrupção para comer ou descansar, 
desistiu dessa política e pretextou não poder continuar a assistir por razões de saúde.
A mulher de Piso, Plancina, tinha inveja de Agripina, porque, como mulher de Germânico, esta 
tinha precedência sobre ela em todas as funções oficiais. Engendrou vários insultos mesquinhos 
para a aborrecer, principalmente faltas de cortesia por parte de subordinados, que podiam ser 
explicadas como tendo sido causadas por acidente ou ignorância. Quando Agripina retaliou, 
ignorando­a em público, ela foi ainda mais longe. Uma manhã, na ausência de Piso e Germânico, 
apareceu na parada com a cavalaria e fê­la realizar uma série de movimentos burlescos diante do 
quartel­general de Germânico. Fê­los rodopiar pelo meio de um campo de trigo, atacou uma fila 
de tendas vazias, que foram feitas às tiras, fez soar todos os toques, desde o Recolher ao alarme 
de incêndio, e provocou embates entre esquadrões. Finalmente, fez galopar todo o regimento em 
círculos cada vez mais apertados e depois, quando o espaço central não tinha mais de uns 
escassos metros, deu ordem de Rodar para a direita, como que para inverter o movimento. Muitos 
cavalos caíram, atirando ao chão os seus cavaleiros. Nunca se vira tal confusão em toda a história 
das manobras de cavalaria. Os indivíduos mais desordeiros aumentaram­na, espetando punhais 
nos cavalos dos vizinhos para os fazer empinar ou pondo­se a lutar em cima da sela. Vários 
homens receberam coices violentos ou partiram as pernas, por os cavalos terem caído em cima 
deles. Um homem foi levantado já morto. Agripina enviou um jovem oficial do estado­maior 
para pedir a Plancina que parasse de fazer figuras ridículas à custa dela própria e do Exército. 
Plancina ripostou, parodiando as palavras corajosas da própria Agripina na ponte do Reno: ”Até 
que o meu marido regresse, eu assumo o comando da cavalaria. Estou a prepará­los para a 
próxima invasão da Partia.” Alguns embaixadores partos acabavam na realidade de chegar ao 
acampamento e observavam este espectáculo com espanto e desprezo.
Vonones, antes de ser rei da Arménia, tinha sido rei da Partia, de onde fora expulso rapidamente. 
O seu sucessor tinha enviado aqueles embaixadores a Germânico para propor que a aliança entre 
Roma e a Partia fosse
240
renovada e para dizer que, em honra de Germânico, ele iria até ao Rio Eufrates (a fronteira entre 
a Síria e a Partia) para o saudar. Entretanto, solicitava que não fosse permitido a Vonones 
continuar na Síria, onde lhe seria fácil manter uma correspondência traiçoeira com certos nobres 
partos. Germânico replicou que, como representante de seu pai, o Imperador, teria o maior prazer 
em se encontrar com o rei e renovar a aliança e que afastaria Vonones para qualquer outra 
província. Assim, Vonones foi enviado para a Cilícia e as esperanças de Piso de fazer fortuna 
desvaneceram­se. Plancina estava tão furiosa como o marido; Vonones vinha­a presenteando 
quase diariamente com belas jóias.
No início do ano seguinte, Germânico recebeu notícias de grande escassez no Egipto. A última 
colheita não tinha sido boa, mas ainda havia bastante trigo de dois anos antes armazenado nos 
celeiros. Os grandes corretores de trigo mantinham o preço alto, pondo apenas quantidades muito 
pequenas no mercado. Germânico navegou de imediato para Alexandria e obrigou os corretores a 
vender por um preço razoável todo o trigo que era necessário. Sentia­se satisfeito por ter aquela 
desculpa para visitar o Egipto, que o interessava ainda mais que a Grécia. A cidade de Alexandria 
era então, tal como agora, o verdadeiro centro cultural do mundo e ele mostrou o respeito que 
nutria pelas suas tradições entrando na cidade com um trajo grego simples, descalço e sem guarda 
pessoal. De Alexandria navegou Nilo acima, visitando as pirâmides e a Esfinge, as ruínas 
gigantescas da Tebas egípcia, uma antiga capital, e a enorme estátua de Mémnon em pedra (cujo 
peito é oco e que, pouco depois do sol nascer, começa a cantar, porque o ar nessa concavidade 
aquece e sobe pela garganta em forma de tubo). Chegou até às ruínas de Elefantina, mantendo um 
diário cuidadoso de todas as suas viagens. Em Mênfis, visitou a área de recreio do grande Deus 
Ápis, encarnado como um touro com marcas peculiares; mas Ápis não lhe deu qualquer sinal 
encorajador e afastou­se dele logo que se encontraram frente a frente, entrando para o estábulo 
maléfico. Agripina estava com ele, mas Calígula tinha sido deixado em Antióquia ao cuidado de 
um tutor, como castigo pela sua contínua desobediência.
Germânico não podia agora fazer nada que não encorajasse as suspeitas de Tibério a seu respeito; 
mas a ida ao Egipto foi o pior erro que alguma vez cometeu. Vou explicar porquê. Augusto, 
compreendendo logo no início do seu reinado que Roma dependia agora sobretudo do Egipto 
para o seu abastecimento de trigo e que o Egipto, se caísse nas mãos de um aventureiro, podia ser 
defendido com êxito por um exército bem pequeno, tinha decretado como um preceito do 
governo que nenhum cavaleiro ou senador romano podia, a partir daí, ser autorizado a visitar a 
província sem uma autorização expressa dele próprio. Era aceite, de uma maneira geral, que a 
mesma regra se mantinha sob a governação de
241
Tibério. Mas Germânico, alarmado com os relatos da escassez de trigo no Egipto, não perdera 
tempo à espera de obter permissão para ir até lá. Tibério tinha agora a certeza de que Germânico 
se preparava para desferir o golpe que adiara por tanto tempo: certamente, fora para o Egipto para 
conquistar a guarnição local para o seu lado; o passeio Nilo acima tinha sido apenas uma 
desculpa para visitar a guarda da fronteira; de uma maneira geral tinha sido um grande erro 
mandá­lo para Leste. Apresentou uma queixa pública no Senado por aquela infracção tão ousada 
das recomendações estritas de Augusto.
Quando Germânico regressou à Síria, sentindo­se muito magoado com a reprimenda de Tibério, 
descobriu que todas as ordens que dera aos regimentos e às cidades tinham sido ou ignoradas ou 
ultrapassadas por outras, contraditórias, vindas de Piso. Repetiu as ordens iniciais e agora, pela 
primeira vez, deu a conhecer publicamente o seu desagrado
Imediatamente executou uma proclamação, segundo a qual todas as ordens emanadas de Piso 
durante a sua ausência no Egipto eram por aquele meio canceladas e que, até informação em 
contrário, nenhuma ordem assinada por Piso seria válida na província, a menos que endossada 
por ele próprio. Mal acabara de assinar esta proclamação, caía doente. Tinha o estômago de tal 
forma desarranjado, que não conseguia conservar nada nele. Suspeitou que a sua comida 
estivesse a ser envenenada e tomou todas as precauções possíveis contra isso. Agripina 
preparava­lhe ela própria as refeições e ninguém do pessoal da casa tinha qualquer possibilidade 
de manipular a comida antes ou depois de cozinhada. Mas demorou algum tempo antes que 
estivesse suficientemente restabelecido para sair da cama e sentar­se recostado numa cadeira. A 
fome tornou­lhe o sentido do olfacto anormalmente agudo e ele disse que havia um cheiro a 
morte na casa. Ninguém mais o sentia e Agripina, a princípio, considerou a queixa como uma 
fantasia de doente. Mas ele insistiu. Dizia que o cheiro se tornava pior de dia para dia. 
Finalmente, a própria Agripina apercebeu­se dele. Parecia estar em todos os quartos. Queimou 
incenso para limpar o ar, mas o cheiro persistiu. O pessoal de casa ficou alarmado e sussurrava 
que havia bruxas em acção.
Germânico sempre fora extremamente supersticioso, como todos os membros da nossa família, 
excepto eu: sou só um pouco supersticioso. Germânico não só acreditava que certos dias ou 
presságios traziam sorte ou azar, mas criara ele próprio uma rede completa de superstições só 
suas. O número dezassete e o cantar dos galos à meia­noite eram as duas coisas que mais o 
perturbavam. Considerava como um sinal altamente desafortunado o facto de, tendo conseguido 
recuperar as Águias perdidas do Décimo Oitavo e Décimo Nono Regimentos, o terem feito 
regressar da Germânia antes de conseguir recuperar a do Décimo Sétimo. Aterrorizava­o a magia 
negra do tipo usado pelas bruxas tessalianas e dormia
242
sempre com um 
talismã, que delas o protegia, debaixo da almofada: uma figura de jaspe verde da deusa Hécate (a 
única que tem poder sobre bruxas e fantasmas), representada com uma tocha numa das mãos e as 
chaves do inferno na outra.
Suspeitando que Plancina estivesse a praticar bruxaria contra ele ela tinha fama de bruxa, fez um 
sacrifício propiciatório de nove cachorrinhos negros a Hécate; essa era a atitude a seguir, quando 
se era vítima de tais situações. No dia seguinte, um escravo relatou, com o terror estampado na 
face, que, quando estava a lavar o chão no vestíbulo, tinha reparado que havia um ladrilho solto e, 
ao levantá­lo, tinha encontrado por baixo o que parecia ser o cadáver nu e em decomposição de 
um bebé, com a barriga pintada de vermelho e cornos atados à testa. Foi feita uma busca imediata 
em todos os quartos, de onde resultou uma dúzia de achados igualmente sinistros debaixo de 
ladrilhos ou em nichos escavados nas paredes atrás das cortinas. Incluíam o cadáver de um gato 
com asas rudimentares a crescerem­lhe nas costas e a cabeça de um negro com a mão de uma 
criança a sair­lhe da boca. Com cada uma destas relíquias horrendas havia uma pequena placa de 
chumbo com o nome de Germânico. A casa sofreu uma limpeza ritual e Germânico começou a 
recuperar a alegria, embora o estômago continuasse a dar­lhe problemas.
Pouco tempo depois, começaram as assombrações na casa. Penas de galo sujas de sangue foram 
encontradas no meio das almofadas e símbolos nefastos foram rabiscados a carvão nas paredes, 
por vezes tão baixos que pareciam ter sido escritos por um anão, outras vezes tão altos como se 
um gigante os tivesse escrito um homem enforcado, a palavra Roma de pernas para o ar, uma 
doninha; e, embora só Agripina soubesse da sua superstição pessoal com o número dezassete, 
este número aparecia constantemente. Depois, apareceu o nome de Germânico de pernas para o 
ar, cada dia com uma letra a menos. Teria sido possível a Plancina esconder amuletos na casa 
durante a sua ausência no Egipto, mas para estas assombrações continuadas não havia explicação. 
Os criados não eram suspeitos, porque as palavras e os sinais apareciam escritos em quartos aos 
quais eles não tinham acesso, e num quarto fechado com uma janela demasiado pequena para que 
um homem conseguisse passar por ele, cobriam as paredes desde o chão até ao tecto. A única 
consolação de Germânico era a coragem com que Agripina e o pequeno Calígula se 
comportavam. Agripina fazia todos os possíveis por aligeirar as assombrações e Calígula dizia 
que se sentia seguro, porque um bisneto do Deus Augusto não podia ser afectado por bruxas, e 
que, se se encontrasse com uma bruxa, a atravessaria com a sua espada. Mas Germânico viu­se 
forçado a ficar novamente de cama. A meio da noite que se seguiu ao dia em que apenas 
restavam três letras do seu nome, Germânico foi acordado pelo barulho do cantar de um galo. 
Fraco como estava, saltou
243
da cama, pegou na espada e correu para o quarto ao lado, onde Calígula e Lésbia dormiam. Aí, viu um 
grande galo negro com um anel dourado em volta do pescoço, cantando como se quisesse acordar os 
mortos. Tentou cortar­lhe a cabeça, mas ele saíu voando pela janela. Germânico desmaiou. Agripina, de 
alguma forma, conseguiu levá­lo de volta para a cama, mas, quando recuperou a consciência, ele disse­lhe 
que estava condenado.
­ Não enquanto tiveres a tua Hécate contigo, ­ disse ela. Tacteou a figura debaixo da almofada e a sua 
coragem voltou.
Quando chegou a manhã, escreveu uma carta a Piso, à velha maneira romana, declarando uma guerra 
privada entre ambos; ordenando­lhe que abandonasse a província e desafiando­o a fazer o pior que 
conseguisse. Piso, no entanto, já se tinha feito ao mar e estava agora em Quios, aguardando notícias da 
morte de Germânico e pronto para regressar e governar a província logo que a notícia chegasse até ele. O 
meu pobre irmão estava a ficar mais fraco de uma hora para a outra. No dia seguinte, enquanto Agripina 
estava ausente do quarto e ele jazia meio insensível, sentiu um movimento debaixo da almofada. Voltou­
se e procurou o amuleto, aterrorizado. Tinha desaparecido e não havia ninguém no quarto.
No dia seguinte, reuniu os seus amigos e disse­lhes que estava a morrer e que Piso e Plancina eram os seus 
assassinos. Encarregou­os de dizer a Tibério e a Castor o que lhe tinham feito e implorou­lhes que 
vingassem a sua morte cruel.
­ E dizei ao povo de Roma, ­ acrescentou, ­ que confio à sua guarda a minha querida esposa e os meus seis 
filhos e que não devem acreditar em Piso nem em Plancina, se eles fingirem que receberam instruções 
para me matarem; ou, se nisso acreditarem, não devem por essa razão perdoar­lhes.
Morreu no dia nove de Outubro, o dia em que apenas a letra C era visível na parede do quarto em frente 
da cama, e ao décimo sétimo dia de doença. O seu corpo devastado foi exposto na praça do mercado em 
Antióquia, para que toda a gente pudesse ver a borbulhagem vermelha na barriga e as unhas azuladas. Os 
seus escravos foram submetidos a tortura. Também os libertos foram interrogados à vez, cada um durante 
vinte e quatro horas seguidas e sempre por inquiridores diferentes; no final, estavam de tal forma 
destruídos espiritualmente que, se soubessem alguma coisa, certamente a teriam revelado, só para serem 
deixados em paz. O máximo que foi possível descobrir, no entanto, quer pelos libertos quer pelos 
escravos, foi que uma bruxa notória, uma tal Martina, tinha sido vista com frequência na companhia de 
Plancina e que tinha mesmo estado na casa um dia com Plancina, quando ninguém lá estava a não ser 
Calígula. E que uma tarde, pouco antes do regresso de Germânico, a casa
244
tinha ficado guardada apenas por um velho porteiro surdo, porque todo o restante pessoal tinha ido ver 
uma luta de gladiadores exibida por Piso no anfiteatro local. No entanto, não havia qualquer explicação 
natural para o galo, para a escrita nas paredes ou para o desaparecimento do talismã.
Houve um encontro de comandantes de regimento e de todos os outros romanos de posição na Província, 
para designar um Governador temporário. Foi escolhido o Comandante do Sexto Regimento. Ele prendeu 
imediatamente Martina e mandou­a sob escolta para Roma. Se Piso fosse levado a julgamento, ela seria 
uma das testemunhas mais importantes.
Quando soube que Germânico estava morto, Piso, em vez de esconder a sua alegria, ofereceu sacrifícios 
de acção de graças nos templos. Plancina, que perdera recentemente uma irmã, foi ao ponto de tirar o luto 
e voltar a pôr as suas roupas mais alegres. Piso escreveu a Tibério dizendo que só tinha sido afastado do 
seu posto de Governador, para o qual fora pessoalmente designado por Tibério, por causa da sua oposição 
destemida aos desígnios traiçoeiros de Germânico contra o Estado; ia regressar agora à Síria para 
reassumir o comando. Também se referiu à luxúria e insolência de Germânico. Na realidade, ele tentou 
regressar à Síria e conseguiu mesmo algumas tropas que o apoiassem, mas o novo governador cercou a 
fortaleza na Cilícia, que ele tinha transformado no seu baluarte, forçando­o a render­se e enviando­o para 
Roma para responder às acusações que, certamente, ali seriam apresentadas contra ele.
Entretanto, Agripina navegara para Itália com os dois filhos e as cinzas do marido numa urna. Em Roma, a 
notícia da sua morte causara um tal desgosto que era como se cada casa na cidade tivesse perdido o seu 
membro mais amado. Três dias completos, embora não houvesse decreto do Senado ou ordem dos 
magistrados nesse sentido, foram consagrados ao luto público: lojas fechadas, tribunais desertos, não se 
realizou qualquer espécie de negócio, todos estavam de luto. Ouvi um homem na rua dizer que era como 
se o sol se tivesse posto para não voltar a nascer. Sobre a minha própria dor, não consigo escrever.
245
CAPíTULO XXI
Lívia e Tibério fecharam­se nos seus palácios e fingiram estar tão abalados com o desgosto que não 
podiam mostrar os rostos em público. Agripina deveria ter vindo por terra, porque o Inverno já tinha 
começado e a época da navegação terminara. Mas, apesar das tempestades, fez­se ao mar; alguns dias 
mais tarde alcançou Corfu, de onde se demora
apenas um dia, com uma brisa favorável, para alcançar o porto de Brindisi. Aqui ela descansou um pouco, 
enviando mensageiros à frente para avisar que vinha colocar­se sob a protecção do povo de Itália. Castor, 
que estava agora de regresso a Roma, os seus outros quatro filhos e eu próprio, saímos de Roma para ir ao 
encontro dela. Tibério tinha enviado imediatamente dois batalhões da Guarda para o porto, com instruções 
para que os magistrados dos distritos da província por onde as cinzas passassem prestassem ao seu filho 
morto os últimos respeitos. Quando Agripina desembarcou, recebida com um silêncio respeitoso por uma 
enorme multidão, a urna foi posta sobre um carro fúnebre e transportada para Roma aos ombros dos 
oficiais da Guarda. Os estandartes do batalhão não apresentavam condecorações, como sinal de 
calamidade pública, e os machados e bastões eram transportados em posição invertida. Quando a 
procissão, composta por muitos milhares, passou pela Calábria, Apúlia e Campânia, todos vieram em 
bando, a gente do campo vestida de negro, os cavaleiros com mantos púrpura, com lágrimas e lamentos 
sonoros, queimando ofertas de perfumes para o fantasma do seu herói morto.
Encontrámo­nos com a procissão em Terracina, cerca de sessenta milhas a sudeste de Roma, onde 
Agripina, que tinha caminhado de olhos secos e rosto de mármore, sem dirigir palavra a ninguém todo o 
caminho desde Brindisi, deixou que o seu desgosto jorrasse livremente ao ver os quatro filhos sem pai. 
Gritou para Castor:
­ Pelo amor que tinhas pelo meu querido marido, jura que defenderás as vidas dos seus filhos com a tua 
própria e que vingarás a sua morte! Foi a sua última recomendação para ti.
Castor, chorando, talvez pela primeira vez desde a infância, jurou que aceitaria o encargo.
Se perguntardes porque razão Livila não nos acompanhou, a resposta é que ela acabava de dar à luz 
gémeos: dos quais, a propósito, Sejano
247
parece ter sido o pai. Se perguntardes porque razão a minha mãe não foi, a resposta é que Tibério 
e Lívia não lhe permitiram sequer assistir ao funeral. Se o desgosto avassalador os impedia a eles 
próprios de estarem presentes, como avó e pai adoptivo do falecido, era nitidamente impossível 
para ela, como sua mãe, comparecer. E foram sensatos em não se ter mostrado. Se o tivessem 
feito, mesmo fingindo­se desgostosos, teriam certamente sido atacados pela populaça, e eu penso 
que a Guarda se teria deixado ficar, sem levantar um dedo para os proteger. Tibério não se tinha 
dado ao trabalho de fazer sequer os preparativos que eram habituais nos funerais de pessoas 
muito menos distintas: as máscaras de família dos Claudianos e dos Julianos não apareceram, 
nem a habitual efígie do próprio morto, deitado numa cama; não foi feito o discurso fúnebre da 
Plataforma de Oratória; não se cantaram hinos fúnebres. A desculpa de Tibério foi que o funeral 
já tinha sido celebrado na Síria e que os Deuses ficariam ofendidos se os rituais fossem repetidos. 
Mas nunca em Roma houve uma demonstração de desgosto de tal forma unânime e sincera como 
nessa noite. Os Campos de Marte estavam iluminados com todas as tochas e a multidão reunia­se 
em volta do túmulo de Augusto, sobre o qual a urna foi reverentemente colocada por Castor; era 
tão densa que muitas pessoas morreram esmagadas. Por toda a parte as pessoas diziam que Roma 
estava perdida, que não restava mais esperança, pois Germânico fora o seu último baluarte contra 
a opressão. Agora, tinha sido vilmente assassinado. Por toda a parte Agripina foi louvada e 
lamentada, tendo sido feitas oferendas pela segurança dos seus filhos.
Tibério fez uma proclamação alguns dias mais tarde, dizendo que, embora muitos romanos 
ilustres tivessem morrido pelo bem comum, nenhum tinha sido tão universalmente e 
veementemente lamentado como o seu querido filho. Mas era agora tempo do povo se recompor 
e regressar aos seus trabalhos diários: os príncipes eram mortais, mas a pátria era imortal. Apesar 
disso, o Festival do Dia dos Bobos, em finais de Dezembro, passou sem os gracejos e as alegrias 
habituais e só por altura do Festival da Grande Mãe, em Abril, é que o luto terminou e os 
assuntos públicos normais foram retomados. As suspeitas de Tibério estavam agora concentradas 
em Agripina. Ela visitou­o no Palácio na manhã a seguir ao funeral e disse­lhe, sem medo, que o 
consideraria responsável pela morte do marido até que ele provasse a sua inocência e se vingasse 
em Piso e Plancina. Ele interrompeu bruscamente a entrevista, citando­lhe versos gregos:
­ se não fores rainha, minha querida, Sentir­te­ás injustiçada?
248
Piso não regressou a Roma durante algum tempo. Enviou o filho à frente para interceder por ele junto 
de Tibério, enquanto ele próprio foi visitar Castor, que estava agora de novo com as legiões do Danúbio. 
Esperava que Castor se mostrasse grato para com ele por ter afastado um herdeiro rival à monarquia e 
pronto a acreditar na história da traição de Germânico. Castor recusou­se a recebê­lo e disse publicamente 
ao mensageiro de Piso que, se os rumores correntes fossem verdadeiros, era sobre Piso que ele teria que 
infligir a vingança que jurara pela morte do seu querido irmão e que seria aconselhável que Piso se 
mantivesse longe até ter estabelecido plenamente a sua inocência. Tibério recebeu o filho de Piso sem 
nenhuma gentileza particular, mas também sem qualquer desfavor, como que para mostrar que continuaria 
numa posição de imparcialidade até que tivesse sido feito um inquérito público sobre a morte de 
Germânico. Por fim, Piso apareceu em Roma com Plancina. Vieram navegando pelo Tibre e 
desembarcaram com uma série de apoiantes junto do túmulo de Augusto, onde quase provocaram um 
motim, pavoneando­se com grandes sorrisos pelo meio da multidão hostil que não tardou a reunir­se e 
instalando­se numa carruagem enfeitada puxada por uma parelha de belos cavalos brancos franceses, que 
os aguardava na estrada Flamínia. Piso tinha uma casa que dava para a Praça do Mercado e esta também 
estava enfeitada. Convidou todos os seus amigos e parentes para um banquete celebrando o seu regresso e 
causou bastante confusão: simplesmente para mostrar ao povo de Roma que não tinha medo e que contava 
com o apoio de Tibério e Lívia. Tibério tinha planeado que Piso fosse acusado no tribunal Criminal 
Ordinário por um certo senador em quem se podia confiar, para o fazer de um modo tão desajeitado, 
contradizendo­se a si próprio e negligenciando a apresentação de provas consistentes para apoiar as 
acusações, que o processo só podia terminar com a absolvição. Mas os amigos de Germânico, 
especialmente os três senadores que o tinham acompanhado na Síria e regressado com Agripina, 
opuseram­se à escolha de Tibério. Este, acabou por ser obrigado a julgar ele próprio o caso, e ainda por 
cima no Senado, onde os amigos de Germânico podiam contar com todo o apoio de que precisavam. O 
Senado tinha votado uma série de honras excepcionais à memória de Germânico ­ cenotáfios, arcos 
memoriais, rituais semi­divinos ­, que Tibério não tinha ousado vetar.
Castor regressara uma vez mais do Danúbio e, embora uma ovação (ou um triunfo menor) lhe tivesse sido 
decretada pela forma como tratara do caso Marobodo, entrou na Cidade a pé como qualquer cidadão 
privado e não a cavalo e com uma coroa na cabeça. Depois de visitar o pai, foi directamente procurar 
Agripina e jurou­lhe que podia contar com ele para que se fizesse justiça.
249
Piso pediu a quatro senadores que o defendessem; três deles desculparam­se, pretextando doença ou 
incapacidade; o quarto, Caio, disse que nunca defendia ninguém de uma acusação de assassinato, a menos 
que houvesse pelo menos uma probabilidade de agradar à família imperial. Calpúrnio Piso, embora não 
tivesse estado presente no banquete do tio, ofereceu­se para o defender pela honra da família e três outros 
juntaram­se posteriormente a ele, porque tinham a certeza que Tibério absolveria Piso, fossem quais 
fossem as provas, e que seriam recompensados mais tarde pela sua participação no julgamento. Piso 
sentiu­se satisfeito por ser julgado pelo próprio Tibério, porque Sejano lhe garantira que seria tudo 
devidamente controlado; Tibério ia fingir ser muito severo mas, no fim, adiaria o julgamento sine die, para 
aguardar novas provas. Martina, a principal testemunha, já tinha sido afastada ­ estrangulada por agentes 
de Sejano ­ e a acusação tinha agora um caso pouco consistente.
A acusação apenas dispôs de dois dias e o homem que tinha sido originariamente encarregado de baralhar 
as coisas para bem de Piso adiantou­se e fez todos os possíveis para usar todo esse tempo apresentando 
acusações vazias contra ele de mau governo e corrupção na Hispânia, no tempo de Augusto. Tibério 
deixou­o continuar com aquelas acusações irrelevantes durante horas, até que os elementos do Senado, 
arrastando os pés, tossindo e fazendo chocar as tabuinhas de escrever, o preveniram de que as principais 
testemunhas tinham que ser ouvidas, senão haveria problemas. Os quatro amigos de Germânico tinham o 
seu caso bem preparado e, cada um por sua vez, ergueram­se e testemunharam sobre a corrupção que Piso 
imprimira à disciplina militar na Síria, o seu comportamento insultuoso com Germânico, e com eles 
próprios, a sua desobediência às ordens, as intrigas com Vonones, a opressão das gentes da província. 
Acusaram­no de assassinar Germânico com veneno e bruxaria, de oferecer sacrifícios de acção de graças 
pela sua morte e, finalmente, de ter feito um ataque armado à Província com tropas privadas ilegalmente 
recrutadas.
Piso não negou as acusações de corrupção da disciplina militar, de insultar e desobedecer a Germânico ou 
de oprimir a população da província; disse apenas que elas eram exageradas. Mas negou com indignação a 
acusação de usar venenos e bruxaria. Os acusadores não mencionaram os acontecimentos sobrenaturais de 
Antióquia, com medo de encorajarem risos cépticos, como também não podiam acusar Piso de interferir 
com os criados e escravos da casa de Germânico, porque já tinha sido provado que eles não tinham nada a 
ver com o assassinato. Assim, Piso foi acusado de envenenar a comida de Germânico enquanto estava 
sentado ao lado dele num banquete na casa do próprio Germânico. Piso ridicularizou esta acusação: como 
podia ter feito uma coisa dessas sem que alguém o
250
notasse, quando todos os presentes, para não falar nos criados, observavam cada um dos seus 
movimentos? Por meio de magia, talvez?
Ele tinha um maço de cartas na mão que todos sabiam, pelo tamanho, pela cor e pela maneira como 
estavam atadas, que eram de Tibério. Os amigos de Germânico lançaram uma moção que quaisquer 
instruções que Piso tivesse recebido de Roma deviam ser lidas. Piso recusou­se a ler as cartas, alegando 
que estavam seladas com o selo da Esfinge (originariamente de Augusto), o que as tornava secretas e 
confidenciais: lê­las seria uma traição. Tibério pronunciou­se contra a moção, dizendo que seria perda de 
tempo ler as cartas, que nada continham de importância. O Senado não conseguiu levar a sua avante. Piso 
entregou as cartas a Tibério, como sinal de que confiava nele para lhe salvar a vida.
Lá fora, ouviram­se sons irados vindos da multidão, que ia sendo informada do progresso do julgamento; 
um homem, com uma voz potente e roufenha, gritou através de uma janela:
­ Ele pode escapar­vos a vós, senhores, mas a nós não escapará! Um mensageiro veio dizer a Tibério que 
algumas estátuas de Piso tinham sido agarradas pela multidão e estavam a ser arrastadas para a Escada das 
Lamentações, para serem feitas em pedaços. A Escada das Lamentações era um lanço de escadas na base 
do Monte Capitolino, onde os cadáveres dos criminosos eram normalmente expostos antes de serem 
arrastados por um gancho espetado na garganta até ao Tibre, para onde eram atirados. Tibério ordenou que 
as estátuas fossem recolhidas e postas de novo nos seus pedestais. Mas queixou­se que não podia 
continuar a julgar um caso em tais condições e adiou­o para o fim da tarde. Piso foi levado dali sob 
escolta.
Plancina, que até então se gabava de que partilharia o destino do marido fosse ele qual fosse, e se 
necessário morreria com ele, começou a ficar alarmada. Decidiu fazer a sua defesa separadamente e 
contou com Lívia, com quem tivera uma relação estreita, para a livrar. Piso não sabia nada desta traição. 
Quando o julgamento recomeçou, Tibério não lhe deu qualquer mostra de simpatia e, embora dissesse aos 
acusadores que deviam ter apresentado provas de envenenamento mais conclusivas, preveniu Piso de que 
a tentativa armada para recuperar a sua província nunca poderia ser perdoada. Em casa, nessa noite, Piso 
fechou­se no quarto e foi encontrado na manhã seguinte ferido de morte e com a espada ao lado. Não foi, 
na realidade, um suicídio.
Piso tinha guardado a carta mais incriminatória de todas, uma que lhe tinha sido escrita por Lívia mas em 
nome de Tibério e dela própria, e sem estar selada com o selo da Esfinge (que Tibério reservava para seu 
uso pessoal). Ele disse a Plancina que negociasse as suas vidas com essa carta. Plancina foi procurar Lívia. 
Lívia disse­lhe que esperasse enquanto consultava Tibério. Lívia e Tibério tiveram nessa altura o seu 
primeiro
251
desentendimento declarado. Tibério ficou furioso com Lívia por ter escrito a carta e Lívia disse que era 
culpa dele, por não a autorizar a usar o selo da Esfinge, queixando­se de que se vinha comportando de 
forma muito insolente para com ela. Tibério perguntou quem era o Imperador, ele ou ela? Lívia disse que, 
se era ele, era com a conivência dela e que era insensato tratá­la dessa forma porque, da mesma forma que 
arranjara maneira de o fazer subir, também saberia arranjar maneira de lhe causar a destruição. Tirou uma 
carta da bolsa e começou a lê­la: era uma velha carta que Augusto lhe escrevera durante a ausência de 
Tibério em Rodes, acusando­o de traição, crueldade e bestialidade e dizendo que, se não fosse filho dela, 
não teria nem mais um dia de vida.
­ Isto é apenas uma cópia, ­ disse ­ tenho o original bem guardado. É apenas uma de muitas cartas do 
mesmo teor. Não gostarias que circulassem pelo senado, pois não?
Tibério controlou­se e pediu desculpas pelo seu mau humor: disse que era claro que ela e ele eram 
capazes de se arruinar um ao outro e que, portanto, era absurdo discutirem. Mas como poderia poupar a 
vida de Piso, especialmente depois de ter dito que, se a acusação de organizar um exército privado e tentar 
reconquistar a Síria com elas fosse provada, isso significaria pena de morte, sem qualquer esperança de 
perdão?
­ Plancina não organizou nenhum exército, pois não?
­ Não vejo o que é que isso tem a ver com o caso. Não consigo recuperar a carta das mãos de Piso apenas 
com a promessa de poupar Plancina.
­ Se prometeres poupar Plancina, eu consigo tirar a carta a Piso; deixa isso comigo. Se Piso for morto, isso 
irá satisfazer a opinião pública. E se tens medo de poupar Plancina à tua responsabilidade, podes dizer que 
fui eu que intercedi por ela. É justo, porque admito que foi uma carta que eu escrevi que provocou toda 
esta confusão.
Assim, Lívia foi ter com Plancina e disse­lhe que Tibério se recusava a dar ouvidos à razão e que preferia 
sacrificar a própria mãe ao ódio popular, do que arriscar a pele ficando do lado dos amigos. Tudo o que 
tinha conseguido dele, ainda que contrariado, disse, era uma promessa de perdão para ela, se a carta lhe 
fosse entregue. Assim, Plancina foi ter com Piso com uma carta em nome de Tibério, forjada por Lívia, 
dizendo que tinha arranjado tudo da melhor maneira e que ali estava a promessa de absolvição. Quando 
Piso lhe entregou a outra carta, em troca, ela esfaqueou­o de repente na garganta com um punhal. 
Enquanto ele jazia agonizante, mergulhou a ponta da espada do marido no sangue, cerrou­lhe a mão em 
volta do punho e deixou­o. Levou a carta e a promessa forjada de novo a Lívia, como combinado.
No Senado, no dia seguinte, Tibério leu uma declaração que disse ter sido feita por Piso antes de se 
suicidar, proclamando a sua completa inocência dos crimes de que era acusado, protestando a sua lealdade 
a
252
Lívia e a ele próprio e implorando a sua protecção para os filhos, que não tinham de forma alguma tomado 
parte nos acontecimentos que levaram à sua depreciação. Começou então o julgamento de Plancina. Ficou 
provado que ela tinha sido vista na companhia de Martina, e a reputação de Martina como envenenadora 
era facto jurado, tendo­se verificado, quando o corpo de Martina estava a ser preparado para o funeral, que 
um frasco de veneno fora encontrado atado aos seus cabelos. O velho Pompónio, ordenança de 
Germânico, testemunhou quanto às horríveis relíquias pútridas espalhadas pela casa e quanto à visita de 
Plancina, acompanhada de Martina, na ausência de Germânico; e, quando interrogado por Tibério, deu 
provas detalhadas dos assombramentos. Ninguém apareceu a defender Plancina. Ela protestou inocência 
com lágrimas e juramentos e disse que não sabia da reputação de Martina como envenenadora e que a sua 
única ligação com ela fora a compra de perfumes. Disse que a mulher que tinha ido com ela a casa de 
Germânico não era Martina, mas sim a mulher de um dos coronéis. E que certamente era um acto inocente 
ir fazer uma visita e não encontrar ninguém em casa, a não ser um rapazinho. Quanto aos seus insultos a 
Agripina, estava profundamente arrependida e pedia­lhe humildemente perdão, mas estava a obedecer a 
ordens do marido, como é o dever de uma esposa. Ainda por cima, o marido dissera­lhe que Agripina 
andava a conspirar com Germânico contra o Senado; por isso, fizera ainda com mais vontade aquilo que 
era esperado dela.
Tibério fez o ponto de situação. Disse que parecia haver certas dúvidas quanto à culpabilidade de 
Plancina. A sua ligação com Martina parecia provada e o mesmo acontecia com a reputação de Martina 
como envenenadora. Mas, se se tratava de uma ligação culposa, era uma pergunta em aberto. A acusação 
nem sequer apresentara em tribunal o frasco encontrado no cabelo de Martina ou qualquer prova de que o 
conteúdo do mesmo era venenoso: podia ter sido uma poção sonífera ou afrodisíaca. Sua mãe Lívia tinha 
boa opinião do carácter de Plancina e desejava que o Senado lhe desse o benefício da dúvida, caso a prova 
de culpa não fosse conclusiva; o fantasma do seu amado neto tinha­lhe aparecido num sonho, pedindo­lhe 
que não permitisse que os inocentes sofressem pelos crimes de um marido ou pai.
Assim, Plancina foi absolvida e, dos filhos de Piso, um foi autorizado a herdar o espólio do pai e o outro, 
que participara da luta na Cilícia, foi simplesmente exilado por alguns anos. Um senador propôs que 
fossem apresentados agradecimentos públicos à família do herói morto ­ Tibério, Lívia, minha mãe 
Antónia, Agripina e Castor ­, por terem vingado a sua morte. Esta moção estava prestes a ser votada 
quando um amigo meu, um ex­cônsul que tinha sido Governador de África antes de Fúrio, se levantou 
para fazer uma correcção. A moção, objectou, não estava em
253
ordem: tinha sido omitido um nome importante, o do irmão do herói morto, Cláudio, que tinha feito mais 
do que qualquer outra pessoa para preparar o caso para a acusação e para proteger as testemunhas de 
serem molestadas. Tibério encolheu os ombros e disse que estava surpreendido por saber que me tinham 
pedido qualquer colaboração e que talvez, se isso não tivesse acontecido, as acusações contra Piso 
tivessem sido apresentadas com maior clareza (era verdade que eu tinha presidido a uma reunião dos 
amigos do meu irmão e decidido quais as provas que cada testemunha deveria apresentar; tinha­os de 
facto aconselhado a não acusar Piso de ministrar veneno no banquete com as suas próprias mãos, mas eles 
tinham recusado. E tinha mantido Pompónio, o neto deste e três dos libertos do meu irmão escondidos em 
segurança numa herdade perto da minha villa em Cápua, até ao dia do julgamento. Tinha tentado também 
esconder Martina na casa de um mercador meu conhecido, em Brindisi, mas Sejano descobriu­a). Bom, 
Tibério deixou que o meu nome fosse incluído no voto de agradecimento; mas isso pouco significou para 
mim, comparado com os agradecimentos de Agripina: ela disse que agora compreendia o que Germânico 
queria dizer quando declarou, pouco antes de morrer, que o amigo mais verdadeiro que alguma vez tivera 
era o seu pobre irmão Cláudio.
Os sentimentos contra Lívia eram tão fortes, que Tibério fez disso uma desculpa perante ela para mais 
uma vez, não pedir ao Senado que lhe votasse o título que lhe tinha prometido tantas vezes. Todos 
queriam saber qual era o significado de uma avó conceder entrevistas benevolentes à assassina do neto e 
salvá­la da vingança do Senado. A resposta só podia ser que a avó tinha instigado ela mesma o assassinato 
e que estava de tal forma envergonhada de si mesma, que a mulher e os filhos da vítima não lhe 
sobreviveriam por muito tempo.
254
CAPÍTULO XXII
Germânico estava morto, mas Tibério não se sentia muito mais seguro do que antes. Sejano veio 
procurá­lo com histórias sobre o que este ou aquele homem proeminente tinha sussurrado contra 
ele durante o julgamento de Piso. Em vez de dizer, como dissera uma vez dos seus soldados, ”que 
importa que tenham medo de mim, desde que me obedeçam”, disse agora a Sejano: ”que me 
importa que me odeiem, desde que tenham medo de mim.” A três cavaleiros e dois senadores, 
que tinham sido absolutamente sinceros nas suas críticas recentes a seu respeito, condenou­os à 
morte sob a acusação absurda de terem mostrado prazer ao ouvir dizer que Germânico estava 
morto.
Por esta altura, o filho mais velho de Germânico, Nero, atingiu a maioridade e, embora mostrasse 
poucas promessas de vir a ser um soldado tão capaz ou um administrador tão talentoso como o 
pai, tinha muito da sua beleza física e doçura de carácter e a Cidade esperava muito dele. Houve 
grande regozijo popular quando ele casou com a filha de Castor e Livila, a quem a princípio 
chamávamos Helena por causa da sua surpreendente beleza (o seu nome verdadeiro era Júlia), 
mas depois Heluo, o que significa Glutona, porque ela estragou a sua beleza comendo 
excessivamente. Nero era o favorito de Agripina. A família estava dividida, sendo de origem 
claudiana, em bons e maus; ou, usando as palavras da balada maçãs azedas e doces, as maçãs 
azedas eram mais numerosas que as doces. Dos nove filhos que Agripina deu a Germânico, três 
morreram novos duas raparigas e um rapaz e, por aquilo que vi deles, este rapaz e a rapariga mais 
velha eram os melhores dos nove. O rapaz, que morreu no dia do seu oitavo aniversário, era de 
tal forma um favorito de Augusto que o velho guardava um retrato dele, vestido de Cupido, no 
seu quarto e costumava beijá­lo todas as manhãs logo que saía da cama. Mas dos filhos 
sobreviventes só Nero tinha um carácter genuinamente bom. Druso era taciturno e nervoso e  
facilmente inclinado para o mal. Drusila era como ele. Calígula, Agripinila e a mais nova, a quem 
chamávamos Lésbia, eram totalmente maus, como a mais nova das raparigas que tinham morrido 
também parecia ser. Mas a cidade julgava toda a família por Nero porque,
Nota: Este Nero não deve ser confundido com o Nero que se tornou Imperador. (N da T)
255
até ali, ele era o único com idade suficiente para causar uma impressão pública forte. Calígula ainda tinha 
apenas nove anos de idade.
Agripina visitou­me um dia numa grande aflição, quando eu me encontrava em Roma, e pediu­me 
conselho. Disse que, para onde quer que fosse, sentia que estava a ser seguida e espiada, é que isso 
começava a deixá­la doente. Perguntou­me se conhecia alguém, além de Sejano, que tivesse alguma 
influência sobre Tibério. Tinha a certeza de que ele decidira matá­la ou exilá­la, se conseguisse encontrar 
o mais leve pretexto. Disse­lhe que só conhecia duas pessoas que tinham alguma influência no bom 
sentido sobre Tibério. Uma era Cocceio Nerva e a outra era Vipsânia. Tibério nunca conseguira arrancar 
do seu coração o amor por Vipsânia. Quando ela e Caio tiveram uma neta, que com a idade de quinze anos 
se assemelhava exactamente a Vipsânia tal como ela era quando esposa de Tibério, este não podia suportar 
a ideia de alguém a desposar a não ser ele próprio; e a única coisa que o impediu de o fazer foi o facto dela 
ser sobrinha de Castor, o que tornaria o casamento tecnicamente incestuoso, Por isso, nomeou­a Chefe das 
Vestais, sucedendo à velha Occia, que acabara de morrer. Disse a Agripina que, se estabelecesse relações 
de amizade com Cocceio e Vipsânia faria tudo o que estivesse ao seu alcance para a ajudar, assim como 
aos seus filhos. Ela seguiu o meu conselho. Vipsânia e Caio, que sentiam muita pena dela, permitiram­lhe 
que usasse livremente a sua casa e as três villas que tinham no campo e preocuparam­se bastante com as 
crianças. Caio, por exemplo, escolheu novos tutores para os rapazes, porque Agripina suspeitava que os 
antigos fossem agentes de Sejano. Nerva não lhe serviu de grande coisa. Era um jurista e a maior 
autoridade viva em leis do contrato, sobre as quais escrevera vários livros; mas, em todos os outros 
assuntos, era tão distraído e negligente que quase parecia um simplório. Foi gentil para com ela, como era 
para todos, mas não compreendeu aquilo que esperava dele.
Infelizmente, Vipsânia morreu pouco depois e o efeito sobre Tibério foi imediatamente visível. Não fez 
mais qualquer esforço para disfarçar a sua depravação sexual, cujos rumores todos tinham evitado tomar à 
letra. Na verdade, algumas das suas perversidades eram tão chocantes e horríveis que ninguém podia com 
seriedade associá­las à dignidade de um Imperador de Roma, o sucessor escolhido por Augusto. Nenhuma 
mulher e nenhum rapaz estava agora em segurança diante dele, nem mesmo as mulheres e os filhos dos 
senadores; e, se prezavam as próprias vidas e as dos maridos e pais, faziam de boa vontade o que era 
esperado deles. Mas uma mulher, esposa de um Cônsul, suicidou­se depois na presença dos amigos, 
dizendo­lhes que tinha sido obrigada a salvar a jovem filha da concupiscência de Tibério, consentindo em 
se prostituir ela própria, o que era vergonha suficiente; mas nessa altura o Bode Velho aproveitara­se da
256
sua complacência para com ele, obrigando­a a actos de tal forma abomináveis e sujos que ela preferia 
morrer a continuar vivendo com tais recordações.
Nesta altura, puseram a circular uma canção popular que começava com as palavras: ”Porquê, oh, porquê 
o Bode Velho...?” Eu teria vergonha de citar o resto da canção, mas ela tinha tanto de espirituosa como de 
obscena e pensava­se que tivesse sido escrita pela própria Lívia. Lívia foi a autora de várias sátiras 
semelhantes contra Tibério, que fazia circular anonimamente através de Urgulanila. Sabia que, mais tarde 
ou mais cedo, chegariam até ele, que era extremamente sensível a sátiras; pensava que, enquanto sentisse a 
sua posição insegura por causa disso, não ousaria romper com ela. Fazia agora também todos os esforços 
para ser agradável a Agripina e disse­lhe mesmo em confidência que Tibério sozinho é que tinha dado a 
Piso as instruções para apanhar Germânico. Agripina não confiava nela, mas era evidente que Lívia e 
Tibério se tinham tornado inimigos e sentia, disse­me, que, se tivesse que escolher entre a protecção de 
um ou de outro, preferiria estar sob a protecção de Lívia. Eu, por mim, sentia­me inclinado a concordar 
com Agripina. Tinha observado que nenhum favorito de Lívia tinha ainda sido feito vítima dos 
informadores de Tibério. Mas tinha grandes apreensões sobre o que poderia acontecer quando Lívia 
morresse.
O que começara a impressionar­me como particularmente agourento, embora não soubesse explicar 
totalmente os meus sentimentos, era o laço forte entre Lívia e Calígula. Calígula tinha em geral apenas 
duas maneiras de se comportar: ou era insolente ou servil. Para Agripina, para minha mãe e para mim, 
assim como para os irmãos e para Castor, por exemplo, era insolente. Para Sejano, Tibério e Lívia era 
servil. Mas para Lívia ele era qualquer coisa mais, difícil de exprimir. Era quase como seu amante. Não 
era o habitual laço de ternura que liga os rapazinhos às avós ou bisavós indulgentes, embora seja verdade 
que ele, certa vez, se deu a grandes trabalhos para copiar uns versos afectuosos para o seu septuagésimo 
quinto aniversário e que ela lhe estava sempre a dar presentes. O que quero dizer é que se tinha a 
impressão forte de existir um segredo desagradável entre ambos ­ não, não pretendo sugerir que houvesse 
qualquer relação indecente entre eles. Agripina sentia isto também, disse­mo, mas não conseguia descobrir 
nada de definido.
Um dia, comecei a compreender porque Sejano tinha sido tão delicado comigo. Sugeriu­me o noivado 
entre a filha dele e o meu filho Drusilo. O meu sentimento pessoal contra esse casamento era que, para a 
rapariga, que me parecia uma jovem bastante agradável, seria uma infelicidade estar ligada a Drusilo, que 
cada vez que via mais labrego me parecia. Mas não podia dizê­lo. Ainda menos podia dizer que detestava 
a ideia de estar, ainda que remotamente, ligado por um casamento a um patife
257
como Sejano. Ele notou a minha hesitação em responder e quis saber se eu achava a ligação abaixo da 
dignidade da minha família. Gaguejei e disse que não, certamente que não: o seu ramo da família Aeliana 
era muito honroso. Sejano, ainda que filho de um simples cavaleiro da província, tinha sido adoptado 
ainda jovem por um rico senador da família Aeliana, um Cônsul, que lhe deixara todo o seu dinheiro; 
havia um escândalo ligado a esta adopção, mas o facto era que Sejano era um Aeliano. Ele insistiu 
ansiosamente para que eu explicasse a minha hesitação e perguntou se tinha algum sentimento contra essa 
união; pedia desculpa por ter falado nisso, mas que o fizera apenas por sugestão de Tibério. Assim, disse­
lhe que, se Tibério Propunha o casamento, eu teria muito prazer em dar o meu consentimento:
que o meu sentimento principal era que a idade de quatro anos era demasiado prematura para uma rapariga 
ficar noiva de um rapaz de treze, que teria vinte e um anos antes de poder consumar legalmente o 
casamento e que, nessa altura, já poderia ter criado outras ligações. Sejano sorriu e disse que confiava em 
mim para manter o rapaz fora de complicações graves. Houve grande alarme na Cidade quando se soube 
que Sejano se iria ligar à família Imperial, mas todos se apressaram a felicitá­lo, incluindo eu próprio. 
Alguns dias mais tarde, Drusilo estava morto. Foi encontrado atrás de um arbusto no jardim de uma casa 
em Pompeia, para onde tinha sido convidado, de Herculano, por alguns amigos de Urgulanila. Uma 
pequena pêra foi encontrada entalada na garganta dele. Foi dito no inquérito que o tinham visto a atirar 
fruta ao ar e a tentar apanhá­la com a boca: a sua morte fora, indubitavelmente, devida a um acidente. Mas 
ninguém acreditou nisto. Era evidente que Lívia, não tendo sido consultada sobre o casamento de um dos  
seus bisnetos, arranjara maneira de ele ser estrangulado e a pêra enfiada depois pela garganta abaixo. 
Como era costume em tais casos, a pereira foi acusada de assassinato e sentenciada a ser arrancada e 
queimada.
Tibério pediu ao Senado que decretasse Castor Protector do Povo, o que equivalia a indicá­lo como 
herdeiro da monarquia. O pedido causou alívio geral. Foi tomado como um sinal de que Tibério estava 
consciente das ambições de Sejano e que tencionava controlá­las. Quando o decreto foi promulgado, 
alguém propôs que ele fosse gravado nas paredes da Casa a letras de ouro. Ninguém compreendeu que foi 
por sugestão do próprio Sejano que Castor foi honrado dessa forma: ele sugerira a Tibério que Castor, 
Agripina, Lívia e Caio tinham formado uma aliança e propôs esta como a melhor maneira de ver quem 
mais pertencia ao partido. Foi um amigo dele que fez a proposta sobre a inscrição a ouro e os nomes dos 
senadores que apoiaram a extravagante moção foram cuidadosamente anotados. Castor era mais popular 
agora entre os melhores cidadãos do que fora antes. Abandonara os seus hábitos de bebida ­ a morte de 
Germânico parecia tê­lo chamado à razão ­ e, embora tivesse uma
258
paixão excessiva pelo derramamento de sangue nas lutas de gladiadores, era um magistrado consciente e 
um amigo leal. Eu tinha pouca ligação com ele, mas, quando nos encontrávamos, tratava­me com muito 
mais consideração do que antes da morte de Germânico.
O ódio amargo entre ele e Sejano ameaçava sempre deflagrar numa contenda, mas Sejano teve sempre o 
cuidado de não provocar Castor enquanto não pudesse tirar proveito disso. A ocasião chegara. Sejano foi 
ao Palácio felicitar Castor pelo seu protectorado e encontrou­o no estúdio com Livila. Não havia nenhum 
escravo ou liberto presente; portanto, Sejano podia dizer o que lhe apetecesse. Entretanto, Livila estava tão 
apaixonada por ele que podia contar com ela para trair Castor da mesma forma que em tempos traíra 
Póstumo ­ de alguma forma, ele conhecia essa história ­ e tinha mesmo havido uma conversa entre ambos, 
na qual tinham lamentado não serem Imperador e Imperatriz para fazerem o que lhes apetecesse. Sejano 
disse:
­ Bom, Castor, eu preparei­te bem as coisas! Parabéns?
Castor olhou­o irado. Só era Castor para alguns mais íntimos. Ganhara o nome, como penso que já 
expliquei, por causa da sua semelhança com um gladiador bem conhecido, mas o nome ficara­lhe porque 
um dia se tinha enfurecido numa discussão com um cavaleiro. O cavaleiro dissera­lhe sem rodeios num 
banquete que ele estava bêbedo e incapaz, e Castor (gritando ”Estou bêbedo e incapaz, estou? Eu mostro­
te se estou bêbedo e incapaz”) inclinou­se no seu leito e deu um tal golpe na barriga do cavaleiro que ele 
vomitou tudo o que comera. Agora, Castor disse para Sejano:
­ Não permito a ninguém que se me dirija com uma alcunha, a não ser um amigo ou um igual, e tu não és  
uma coisa nem outra. Para ti sou Tibério Druso César. E não sei o que pretendes ter preparado para mim. 
Também não quero as tuas felicitações, seja pelo que for. Portanto sai. Livila disse:
­ Se me permites, acho uma cobardia insultares Sejano desta forma, para não falar da ingratidão de o 
enxotares como um cão quando ele vem felicitar­te pelo teu protectorado. Sabes bem que teu pai nunca to 
teria concedido, a não ser por recomendação de Sejano.
Castor respondeu:
­ Estás a dizer disparates, Livila. Este espião sujo não teve mais a ver com a minha nomeação do que o 
meu eunuco, Lygdus. Está só a fazer­se de importante. E diz­me, Sejano, que história é esta de cobardia? 
Sejano disse:
­ A tua mulher está certíssima. Tu és um cobarde. Não terias ousado falar comigo desta forma antes de eu 
te ter feito nomear Protector, tornando­te uma pessoa sacrossanta. Sabes perfeitamente que te teria dado 
uma sova.
259
­ E teria sido bem feito, ­ disse Livila.
Castor olhou de um para o outro e disse lentamente:
­ Quer dizer que há qualquer coisa entre ambos, não é verdade? Livila sorriu desdenhosa:
­ E se houver? Quem é o melhor dos dois? Castor gritou:
­ Muito bem, minha menina, vamos ver. Esquece por um momento que eu sou o Protector do Povo, 
Sejano, e levanta os punhos.
Sejano cruzou os braços.
­ Eu disse que levantasses os punhos, cobarde.
Sejano não disse nada e Castor, abrindo a mão, bateu­lhe com força.
­ Agora sai!
Sejano saíu com uma obediência irónica e Livila foi atrás dele.
Esta bofetada decidiu o destino de Castor. O relato que Tibério ouviu de Sejano, que foi procurá­lo ainda 
com a marca da mão de Castor na face, foi que Castor estava embriagado quando Sejano o felicitara pela 
nomeação e lhe batera na cara dizendo:
­ Sim, é bom sentir que posso fazer isto sem receio de que me batas também. E podes dizer ao meu pai 
que farei o mesmo a cada um dos seus espiões sujos.
Livila confirmou isto no dia seguinte, quando foi queixar­se de que Castor lhe tinha batido; disse que ele 
lhe batera por ela ter afirmado que estava decepcionada com ele por ter batido num homem que não podia 
ripostar e por ter insultado o pai. Tibério acreditou neles. Não disse nada a Castor, mas colocou uma 
estátua de Sejano em bronze no teatro de Pompeia, uma honra extraordinária para ser feita a um homem 
ainda em vida. Isto foi interpretado como querendo dizer que Castor não estava nas boas graças de 
Tibério, apesar do protectorado (Sejano e Lívia tinham feito circular a sua versão do confronto) e que 
Sejano era agora a única pessoa cujas boas graças valia a pena conquistar. Foram portanto feitas 
numerosas réplicas da estátua, que os seus partidários puseram em lugar de honra nas suas entradas, à 
direita da estátua de Tibério; estátuas de Castor raramente se viam. O rosto de Castor mostrava agora tão 
claramente o seu ressentimento sempre que se encontrava com o pai, que a tarefa de Sejano foi facilitada. 
Disse a Tibério que Castor andava a sondar vários senadores quanto à sua disposição de o apoiarem se ele 
usurpasse a monarquia e que alguns deles lhe tinham prometido ajuda. Aqueles que pareciam mais 
perigosos a Tibério foram portanto detidos, sob a acusação familiar de blasfemarem contra Augusto. Um 
homem foi condenado à morte por ter entrado numa latrina com uma moeda de ouro de Augusto na mão. 
Outro, foi acusado de ter incluído uma estátua de Augusto numa lista de móveis para venda numa villa no  
campo. Teria sido condenado à morte, se o Cônsul que estava a julgar o caso não tivesse
260
pedido a Tibério que desse primeiro o seu voto. Tibério teve vergonha de votar a pena de morte e o 
homem foi absolvido, mas condenado logo em seguida por outra razão.
Castor começou a ficar alarmado e pediu ajuda a Lívia contra Sejano. Lívia disse­lhe que não tivesse 
medo: ela em breve chamaria Tibério à razão. Mas Lívia não tinha confiança em Castor como aliado. Foi 
ter com Tibério e disse­lhe que Castor acusara Sejano de debochar Livila, de abusar da sua posição de 
confiança chantageando homens ricos em nome de Tibério e de almejar à monarquia, que ele dissera que, 
a menos que Tibério afastasse o patife, em breve tomaria o assunto nas suas próprias mãos, tendo pedido a 
colaboração dela. Pondo o caso desta forma a Tibério, esperava fazê­lo sentir tanta desconfiança de Sejano 
quanto de Castor e, assim, retomar o velho hábito de dependência em relação a ela. Pelo menos durante 
algum tempo, conseguiu­o. Mas depois, um acidente repentino convenceu Tibério de que Sejano lhe era 
tão dedicadamente leal como afirmava e como todos os seus actos até ali tinham demonstrado. Estavam 
um dia juntos num piquenique com três ou quatro amigos numa gruta natural à beira mar, quando se ouviu 
de repente um chocalhar; num ápice, parte do tecto desabou, matando alguns dos presentes e enterrando 
outros, ao mesmo tempo que bloqueava a entrada. Sejano agachou­se com as costas arqueadas por cima de 
Tibério ­ nenhum dos dois se magoou ­, para o proteger de outro possível desmoronamento. Quando os 
soldados os retiraram, uma hora mais tarde, ele foi encontrado ainda na mesma posição. Trasilo também 
fez subir a sua reputação nesse dia: ele tinha dito a Tibério que, por volta do meio­dia haveria uma hora de 
escuridão. Tibério tinha a garantia de Trasilo de que sobreviveria a Trajano por muitos anos e que Sejano 
não era perigoso para ele. Penso que Sejano tenha arranjado isto com Trasilo, mas não tenho provas: 
Trasilo não era totalmente incorruptível, mas, quando fazia profecias para satisfazer os desejos dos seus 
clientes, elas pareciam sair tão bem como as profecias normais. Tibério sobreviveu a Sejano, na realidade, 
por vários anos.
Tibério deu mais um sinal público de que Castor perdera as boas graças, censurando­o no Senado por 
causa de uma carta que escrevera. Castor escusara­se de atender o sacrifício quando a Casa abriu depois 
da pausa do Verão, explicando que um outro assunto público o impedia de regressar à Cidade a tempo. 
Tibério disse, desdenhoso, que qualquer pessoa pensaria que o jovem estava em campanha na Germânia 
ou numa visita diplomática à Arménia: quando o único assunto público que o detinha era andar de barco e 
tomar banho em Terracina. Disse que ele próprio, agora no declínio da vida, poderia ser desculpado por 
uma ausência ocasional da cidade: poderia alegar que a sua energia ficara exausta devido ao prolongado 
serviço público com a espada e com a pena. Mas que outra coisa, a não ser a insolência, poderia deter o 
filho?
261
Isto era extremamente injusto: Castor tinha sido encarregado de fazer um relatório sobre a defesa costeira 
durante essa pausa e não conseguira ainda reunir todos os elementos. Em vez de perder tempo numa 
viagem a Roma para depois voltar a Terracina, estava a terminar a sua tarefa.
Quando Castor regressou, adoeceu quase imediatamente. Os sintomas eram os de uma tuberculose 
galopante. Perdeu a cor e o peso e começou a cuspir sangue. Escreveu ao pai e pediu­lhe que viesse visitá­
lo no seu ­ acreditava que quarto ­ ele vivia na outra extremidade do Palácio­,
estava a morrer e pedia­lhe que o perdoasse por qualquer ofensa que tivesse cometido. Sejano advertiu 
Tibério contra essa visita: a doença podia ser real, mas, por outro lado, podia facilmente tratar­se de uma 
armadilha para o assassinar. Assim, Tibério não o visitou e, poucos dias depois, Castor morreu.
A morte de Castor não causou muita pena. A violência do seu temperamento e a reputação de crueldade 
tinham deixado a Cidade muito apreensiva sobre o que aconteceria se sucedesse ao pai. Poucos 
acreditavam na sua modificação recente. A maioria pensava que fora apenas um truque para ganhar a 
afeição popular e que teria sido tão mau como o pai logo que se encontrasse no lugar deste. Agora, os três 
filhos de Germânico estavam a crescer ­ Druso também
acabava de atingir a maioridade ­ e eram indubitavelmente os herdeiros de Tibério. Mas o Senado, por 
respeito para Tibério, carpiu a morte de Castor o mais ruidosamente possível e votou as mesmas honras 
em sua memória que tinha votado por Germânico. Tibério não fingiu qualquer desgosto nesta ocasião e 
pronunciou o panegírico que tinha preparado para Castor numa voz firme e soante. Quando viu lágrimas 
rolando pela face de alguns senadores, fez ouvir, num aparte sonoro para Sejano, que estava a seu lado:
­ Pffi! Isto aqui cheira a cebola!
Seguidamente, Caio levantou­se para cumprimentar Tibério pela forma como conseguira dominar o 
desgosto. Recordou que mesmo o Deus Augusto, durante sua presença entre eles em forma mortal, dera 
largas aos seus sentimentos quando da morte de Marcelo, seu filho adoptivo (nem mesmo filho 
verdadeiro), que, quando estava a agradecer à Casa a sua simpatia, tivera que fazer uma pausa a meio, 
incapaz de continuar com a emoção. Enquanto que o discurso que acabavam de ouvir era uma obra­prima 
de contenção. Posso dizer aqui que, quando quatro ou cinco meses mais tarde delegados chegaram de 
Tróia para dar a Tibério as condolências pela morte do seu filho único, Tibério agradeceu­lhes desta 
forma:
­ E eu dou­vos as minhas condolências, senhores, pela morte de Heitor.
Então, Tibério mandou chamar Nero e Druso e, quando estes chegaram à Casa, tomou­os pela mão e 
apresentou­os:
262
­ Meus senhores, há três anos, entreguei estas crianças sem pai ao tio, meu querido filho, que 
hoje todos nós choramos amargamente, desejando que ele os adoptasse como filhos, embora já 
tivesse filhos dele e os criasse como dignos herdeiros da tradição familiar. ­ ”Ouçam, ouçam!”, 
Gritou Caio, seguindo­se um aplauso geral ­ Mas agora, que ele foi arrancado do meio de nós 
pelo destino cruel ­ gemidos e lamentos
­ faço­vos o mesmo pedido. Na presença dos Deuses, diante do vosso amado País, suplico­vos, 
recebei­os sob a vossa protecção, tomai­os sob a vossa orientação, a estes nobres bisnetos de 
Augusto, descendentes de antepassados cujos nomes ressoam na história romana: fazei com que o 
vosso dever e o meu para com eles sejam honrosamente cumpridos. Netos, estes senadores estão 
agora no lugar de vossos pais, e o vosso nascimento é tal que, seja qual for o bem ou mal que 
recaia sobre vós, ele significará o bem ou o mal de todo o Estado ­ Aplausos ribombantes, 
lágrimas, bênçãos, brados de lealdade.
Mas, em vez de ficar por ali, estragou todo o efeito terminando no tom já familiar com as velhas 
frases gastas sobre como se iria retirar em breve e restaurar a república ­ quando ”os Cônsules ou 
qualquer outra pessoa tirassem o fardo do governo dos seus ombros idosos.” Se não tencionava 
que Nero e Druso (ou um deles) fossem seus sucessores imperiais, o que pretendia ao identificar 
o seu destino tão de perto com o do Estado?
O funeral de Castor foi menos impressionante que o de Germânico, tendo sido marcado por 
muito poucas expressões de genuíno desgosto; por outro lado, foi muito mais magnífico. Todas 
as máscaras de família dos Césares e Claudianos foram usadas na procissão, começando com as 
de Eneias, o fundador da Família Juliana, e Rómulo, o fundador de Roma, e terminando com as 
de Caio, Lúcio e Germânico. A máscara de Júlio César apareceu porque, como Rómulo, ele era 
apenas um semi­deus, mas a de Augusto não, porque ele era uma divindade maior.
Sejano e Livila tinham que considerar agora a maneira de concretizarem a sua ambição de se 
tornarem Imperador e Imperatriz. Nero, Druso e Calígula eram empecilhos e teriam que ser 
removidos. Três parecia um número demasiado elevado para fazer desaparecer com segurança, 
mas, como Livila fez notar, a avó parecia ter conseguido livrar­se de Caio, Lúcio e Póstumo 
quando quisera colocar Tibério no poder. E Sejano estava nitidamente em muito melhor posição 
do que Lívia para levar por diante os seus planos. Para mostrar a Livilla que tencionava realmente 
casar com ela, como prometera, Sejano divorciou­se da mulher Apicata, com quem tivera três 
filhos. Acusou­a de adultério e afirmou que estava prestes a tornar­se mãe de um filho que não 
era seu. Não nomeou publicamente o nome do amante dela, mas disse particularmente a Tibério 
que suspeitava de Nero. Nero, disse, estava a ficar com má reputação por causa das
263
suas aventuras com as esposas de homens proeminentes e parecia pensar que, como presumível herdeiro 
da monarquia, podia comportar­se agora como lhe aprouvesse. Livila, entretanto, fazia todos os possíveis 
para afastar Agripina da protecção de Lívia, advertindo­a de que Lívia estava apenas a usá­la como arma 
no seu conflito com Tibério ­ o que por acaso era verdade ­ e prevenindo Lívia, por intermédio de uma das 
suas aias, de que Agripina estava apenas a usá­la pelas mesmas razões
­ o que também era verdade. Fez com que cada uma delas acreditasse que a outra jurara matá­la logo que 
deixasse de lhe ser útil.
Os doze pontífices passaram agora a incluir Nero e Druso nas preces habituais que ofereciam pela saúde e 
prosperidade do Imperador e os outros sacerdotes seguiram o seu exemplo. Tibério, como Sumo Pontífice, 
enviou­lhes uma carta a queixar­se, dizendo que eles não tinham feito diferença entre aqueles rapazes e a 
sua pessoa, um homem que detivera honrosamente a maior parte dos mais altos cargos do Estado vinte 
anos antes deles nascerem, e tudo o resto depois disso: não era decente. Chamou­os à sua presença e 
perguntou­lhes se Agripina os tinha pura e simplesmente convencido a fazer esse acrescento à oração, ou 
se ela os coagira a fazê­lo por meio de ameaças. Eles negaram, claro, que ela tivesse feito qualquer das 
coisas, mas ele não se convenceu; quatro dos doze, incluindo Caio, estavam de alguma forma ligados a 
ela pelo casamento e cinco outros mantinham relações de amizade com ela e com os filhos. Tibério 
repreendeu­os severamente. No seu discurso seguinte, preveniu o Senado para ”não conceder mais 
distinções prematuras que possam encorajar os espíritos estonteados de indivíduos jovens a entrever 
aspirações presunçosas.”
Agripina encontrou um aliado inesperado em Calpúrnio Piso. Ele disse­lhe que defendia o tio Gneo Piso 
apenas por respeito para com as honras da família e que não devia ser considerado como seu inimigo; 
faria tudo o que pudesse para a proteger e aos seus filhos. Mas Calpúrnio não viveu muito tempo depois 
disto. Foi acusado no Senado de ”palavras traiçoeiras ditas em privado”, de guardar veneno em casa e de 
ter ido ao Senado armado com um punhal. Estes dois últimos artigos eram tão absurdos que foram 
abandonados, mas foi fixada uma data para julgamento sob a acusação de palavras traiçoeiras. Suicidou­se 
antes de se realizar o julgamento,
Tibério acreditou na história de Sejano de que havia um partido secreto, chamado de Verde Claro, que 
estava a ser formado por Agripina, a marca do qual era uma extravagante parceria com a facção do Verde 
Claro das corridas de carros no Circo. Nestas corridas havia quatro cores escarlate, branco, azul marinho e 
verde claro. A facção do Verde Claro era nessa altura a que gozava de maior preferência e a escarlate a 
menos
264
popular. Por isso, quando Tibério ia ver as corridas nos feriados públicos, como era obrigado a fazer dada 
a sua posição oficial ­ embora até aí não estivesse de todo interessado nelas e desencorajasse conversas 
vazias sobre corridas no Palácio ou nos banquetes para os quais era convidado ­, começou pela primeira 
vez a notar o tipo de apoio que as diferentes cores recebiam e ficou altamente perturbado ao ouvir o Verde 
Claro ser tão aclamado. Fora­lhe igualmente dito por Sejano que Escarlate era o símbolo secreto usado 
pelos Verdes Claros quando desejavam referir­se aos seus próprios apoiantes e notou que, sempre que um 
carro Escarlate ganhava, o que era raro, ouviam­se fortes gemidos e assobios. Sejano era esperto: sabia 
que Germânico sempre apoiara o Verde Claro e que Agripina, Nero e Druso, por razões sentimentais, 
continuavam a preferir essa cor.
Havia um nobre chamado Sílio que fora durante muitos anos comandante de uma unidade no Reno. Acho 
que já falei dele como sendo o General dos quatro Regimentos da Germânia que não tomou parte no 
grande motim. Tinha sido o comandante mais capaz do meu irmão e foram­lhe concedidos ornamentos 
triunfais pelos seus sucessos contra Hermann. Recentemente, à frente de tropas combinadas das Províncias 
Superior e Inferior, debelara uma perigosa rebelião das tribos francesas nas vizinhanças do lugar onde 
nasci, Lião. Ele não era um homem modesto, mas também não era particularmente gabarola e talvez tenha 
realmente dito em público, como foi referido, que, se não fosse a sua judiciosa orientação desses quatro 
regimentos durante o motim, eles se teriam juntado aos amotinados e que, portanto, se não fosse ele, 
Tibério não teria qualquer Império para governar ­ bom, o que não estava longe da verdade. Mas 
naturalmente Tibério não gostava da ideia, quanto mais não fosse porque os regimentos amotinados eram, 
tal como expliquei, aqueles com os quais ele próprio tinha maior ligação. A mulher de Sílio, Sósia, era a 
melhor amiga de Agripina. Aconteceu que Sílio, nos grandes Jogos Romanos que tiveram lugar nos 
princípios de Setembro, estava a apostar fortemente na cor Verde Claro. Sejano gritou­lhe:
­ Aposto contigo o que quiseres. O meu dinheiro está no Escarlate. Sílio respondeu­lhe:
­ Estás a apoiar a cor errada, meu caro. O condutor Escarlate não faz a menor ideia de como usar as 
rédeas. Tenta fazer tudo com o chicote. Aposto mil contigo em como o Verde Claro vai ganhar. Aqui o 
jovem Nero diz que vai até quinze mil; ele é um entusiasta do Verde Claro.
Sejano olhou de maneira significativa para Tibério, que ouvira toda a conversa e estava espantado com a 
ousadia de Sílio. Pareceu­lhe um bom presságio que o condutor do carro Verde Claro tivesse caído perto 
da marca na última volta e que o Escarlate tivesse ganhado sem dificuldade.
Dez dias mais tarde, Sílio foi acusado perante o Senado. A acusação era alta traição. Foi acusado de ter 
conspirado na revolta francesa na sua
265
fase inicial e de ter tomado um terço do saque como pagamento da sua não­intervenção, de ter tornado a 
sua vitória numa desculpa para novo saque das províncias leais e de ter imposto depois taxas de 
emergência excessivas sobre a província para pagar as despesas da campanha. Sósia foi acusada de 
cumplicidade nos mesmos crimes. Sílio tornara­se impopular no Palácio depois da rebelião francesa. 
Tibério incorrera em pesadas críticas por não ter entrado em campo contra os rebeldes e por ter mostrado 
mais interesse nos julgamentos por traição que estavam a decorrer ao tempo, do que na campanha. 
Desculpara­se perante o Senado invocando a sua idade ­ e Castor estava ocupado com assuntos 
importantes
­ e explicou que se mantivera durante todo o tempo em contacto com o quartel­general de Sílio, dando­lhe 
conselhos valiosos. Tibério era muito sensível a toda a questão da revolta francesa. Quando os franceses 
foram derrotados, ele tinha sido coberto de ridículo pela moção de um senador jocoso, um imitador dos 
truques de Caio, defendendo que devia ser­lhe concedido um triunfo como o homem realmente 
responsável pela vitória. Ficou tão descontente com isto ­ concluindo que, de qualquer forma a vitória não 
merecia ser falada ­, que ninguém ousou votar a Sílio os ornamentos triunfais que ele bem merecia. Sílio 
ficara decepcionado e aquilo que dissera sobe o motim do Reno fora devido ao ressentimento pela 
ingratidão de Tibério.
Sílio não se deu ao trabalho de responder às acusações de traição. Não era culpado de qualquer 
entendimento com os rebeldes e se os soldados sob o seu comando tinham, em alguns casos, ignorado a 
diferença entre os bens dos rebeldes e os bens dos partidários, isso já era de esperar: muitos falsos 
partidários estavam a financiar secretamente a rebelião. Quanto aos impostos, a verdade era que Tibério 
lhe prometera uma doação especial, do Tesouro, para cobrir as despesas da campanha e para indemnizar 
os cidadãos romanos pela perda das suas casas, colheitas e gado. Antecipando o pagamento desta doação, 
Sílio impusera uma taxa a certas tribos do norte, prometendo reembolsar o dinheiro quando ele lhe fosse 
pago por Tibério: o que nunca aconteceu. Sílio era mais pobre em 20.000 moedas de ouro depois da 
revolta do que antes, porque tinha reunido um destacamento de voluntários a cavalo, que armou e pagou 
às suas custas. O seu principal acusador, que era um dos Cônsules do ano, apresentou as acusações de 
extorsão com grande malícia. Ele era amigo de Sejano e era também filho do governador militar da 
Província Inferior, que desejara tomar o comando supremo das hostes romanas contra os franceses, tendo 
sido forçado a afastar­se a favor de Sílio. Este não podia sequer apresentar prova da doação prometida por 
Tibério, porque a carta na qual ela era referida estava selada com a Esfinge. E as acusações de extorsão 
eram de qualquer forma irrelevantes, porque o julgamento dizia respeito a traição e não a extorsão.
266
Por fim, ele falou:
­ Meus senhores, eu podia dizer muita coisa em minha defesa, mas não vou dizer nada, porque este 
julgamento não está a ser conduzido de uma forma constitucional e o veredicto há muito que foi decidido. 
Compreendi que o meu verdadeiro crime foi ter dito que, se não fosse pela minha actuação em relação a 
eles, os regimentos da Germânia Superior ter­se­iam amotinado. Ponho agora a minha culpabilidade nesta 
questão fora de qualquer dúvida. Direi que, se não fosse pela forma como Tibério lidou com eles 
anteriormente, os soldados da Germânia Inferior não se teriam amotinado. Meus senhores, eu sou vítima 
da avareza, inveja, crueldade, tirania de um...
O resto do discurso foi afogado por um brado de protesto horrorizado saído da Casa. Sílio saudou Tibério 
e saíu com a cabeça erguida. Quando chegou a casa, abraçou Sósia e os filhos, transmitiu uma afectuosa 
mensagem de despedida a Agripina, Nero, Caio e aos seus outros amigos e, retirando­se para o seu quarto, 
atravessou a garganta com a espada.
A sua culpabilidade foi considerada como provada pelos insultos a Tibério. Todos os seus bens foram 
confiscados, com a promessa de que os habitantes das província seriam reembolsados dos impostos 
injustos através desses bens, e que os seus acusadores receberiam um quarto do que ficasse, como a lei 
requeria, e que o dinheiro que lhe fora deixado segundo o testamento de Augusto como penhor de lealdade 
devia ser restituído ao Tesouro como tendo sido pago por engano. Os habitantes das províncias não 
ousaram insistir no reembolso do imposto e, assim, Tibério guardou três quartos do espólio: na realidade, 
já não havia uma distinção nítida entre o Tesouro Militar, o Tesouro Público e o Tesouro Privado. Esta foi 
a primeira vez que ele beneficiou directamente da confiscação de um espólio ou que permitiu que um 
insulto proferido contra ele fosse transformado em prova de traição.
Sósia tinha bens pessoais e, para lhe salvar a vida e impedir que os filhos ficassem na miséria, Caio 
apresentou uma moção para que ela fosse exilada e metade dos bens entregues aos seus acusadores e a 
outra metade deixada aos filhos. Mas um primo de Agripina pelo casamento, que era confederado de Caio, 
propôs que os acusadores recebessem apenas um quarto, que era o mínimo legal, dizendo que Caio era 
mais leal ao Imperador do que a Sósia; esta, era sabido, pelo menos tinha censurado o marido, quando ele 
jazia moribundo, pelas suas declarações traiçoeiras e cheias de ingratidão. Assim, Sósia foi apenas exilada 
­ foi viver em Marselha; e como Sílio, logo que soube que o julgamento lhe custaria a vida, dera em 
segredo a Caio e a alguns outros amigos a maior parte do seu dinheiro para que o guardassem para os 
filhos, a família ficou em boa situação. O filho mais velho viveu o tempo suficiente para me causar 
grandes aborrecimentos.
267
A partir de agora, Tibério, que até ali fizera as suas acusações de traição ligadas a supostas blasfémias 
contra Augusto, deu cada vez maior ênfase ao édito promulgado no primeiro ano da sua monarquia, 
segundo o qual era traição da parte de quem quer que fosse atacar de alguma forma a sua honra e 
reputação. Acusou um senador, que suspeitava de pertencer ao partido de Agripina, de ter recitado um 
epigrama grosseiro visando a sua pessoa. O facto era que a mulher do senador uma manhã reparou numa 
folha de papel que estava pregada a uma certa altura no portão da casa. Pediu ao marido que lesse o que 
dizia o papel ­ ele era mais alto. O senador decifrou­o devagar:
Agora já não se embriaga com vinho Como se embriagava então: Aquece­se com uma taça mais rica O  
sangue de homens assassinados.
Inocentemente, ela perguntou o que queriam dizer os versos, ao que ele respondeu:
­ Não é seguro explicá­lo em público, minha querida.
Um informador profissional estava junto ao portão para a hipótese de, quando o senador lesse o epigrama, 
que era obra de Lívia, dizer alguma coisa que valesse a pena relatar. O informador foi direito a Sejano. O 
próprio Tibério interrogou o senador, perguntando­lhe o que queria dizer com ”não ser seguro”, e a quem, 
na sua opinião, se dirigia o epigrama. O senador procurou esquivar­se e não deu nenhuma resposta directa. 
Tibério disse então que muitos libelos tinham sido postos a circular quando era mais jovem, todos eles 
acusando­o de beberrão e que, nos últimos anos, os médicos lhe tinham ordenado que se abstivesse de 
beber vinho por causa de uma tendência para a gota, e que outros libelos tinham sido publicados 
ultimamente acusando­o de sanguinário. Perguntou ao acusado se não tinha conhecimento destes factos e 
se pensava que o epigrama se pudesse referir a alguém que não fosse o seu Imperador. O pobre homem 
concordou que tinha ouvido os libelos sobre a embriaguez de Tibério, mas que sabia que, na verdade, não 
tinham fundamento, e que não estabelecera qualquer ligação no seu espírito entre eles e o que estava 
pregado no seu portão. Foi­lhe depois perguntado porque não informara o Senado sobre os primeiros 
libelos, como era seu dever. Ele respondeu que, quando os ouvira, ainda não era crime punível escutar ou 
repetir um epigrama, por mais grosseiro, escrito contra quem quer que fosse, mesmo uma pessoa virtuosa; 
não era traição pronunciar ou repetir grosserias dirigidas mesmo contra o próprio Augusto, desde que não 
fossem publicadas por escrito. Tibério perguntou a que tempos ele se referia, pois
268
Augusto, no fim da vida, também proclamara um édito contra as grosserias faladas. O senador 
respondeu:
­ Foi durante o teu terceiro ano em Rodes. Tibério gritou:
­ Meus senhores, como permitis que este indivíduo me insulte desta forma?
Assim, o Senado condenou­o a ser atirado da rocha Tarpeia, um castigo geralmente reservado aos piores 
traidores ­ generais que vendiam batalhas ao inimigo e coisas semelhantes.
Outro homem, um cavaleiro, foi condenado à morte por escrever uma tragédia sobre o Rei Agamémnon, 
na qual a rainha de Agamémnon, que o matou no banho, gritava enquanto erguia o machado:
Fica sabendo, tirano sanguinário, que não é crime Vingar assim o mal que mefoifeito.
Tibério disse que a figura de Agamémnon o visava a ele e que os versos citados eram um incitamento para 
que o assassinassem. Assim, a tragédia, da qual todos se tinham rido por ter sido composta de forma tão 
desajeitada e pobre, ganhou uma espécie de dignidade por ter tido todas as suas cópias reunidas e 
queimadas e o seu autor executado. Este processo foi seguido, dois anos mais tarde ­ mas estou a escrevê­
lo agora porque a história de Agamémnon. me faz recordar ­, por um outro contra Cremúcio Cordo, um 
velho que entrara em colisão com Sejano algum tempo antes, por uma ninharia. Sejano, ao entrar na Casa 
num dia de chuva, tinha pendurado a capa num cabide que sempre fora o de Cremúcio e este, quando 
entrou, não sabendo que a capa pertencia a Sejano, tinha­a mudado para outro cabide para pendurar a sua. 
A capa de Sejano tinha caído do novo cabide e alguém com as sandálias enlameadas tinha­a pisado. 
Sejano retaliou de diversas maneiras cheias de malícia e Cremúcio acabou por detestar a tal ponto a cara 
dele e o som do seu nome que, quando ouviu dizer que a estátua de Sejano tinha sido colocada no Teatro  
de Pompeia, exclamou:
­ Isso dá cabo do teatro.
Por isso, foi nomeado perante Tibério como um dos principais simpatizantes de Agripina. Mas como ele 
era um velho venerável e brando, sem um inimigo no mundo além de Sejano e nunca dizia uma palavra 
além do necessário, era difícil apoiar qualquer acusação contra ele com provas que mesmo um Senado 
amedrontado pudesse aceitar decentemente. No final, Cremúcio foi acusado de ter escrito em louvor de 
Brutus e Cássio, os assassinos de Júlio César. A prova apresentada era um trabalho histórico que ele 
escrevera trinta anos antes e que se sabia que o próprio
269
Augusto, filho adoptivo de Júlio, incluíra na sua biblioteca particular e consultava ocasionalmente.
Cremúcio fez uma defesa fogosa contra esta acusação absurda, dizendo que Brutus e Cássio estavam 
mortos há tanto tempo e tinham sido louvados tantas vezes pelo seu feito por historiadores subsequentes, 
que ele não podia acreditar que o julgamento não fosse uma brincadeira uma brincadeira como a que um 
jovem viajante sofrera recentemente na cidade de Larissa. Este jovem foi publicamente acusado de ter 
assassinado três homens, embora eles não passassem de odres com vinho, suspensos no exterior de uma 
loja, que ele esquartejara na escuridão por os ter confundido com ladrões. Mas este julgamento de Larissa 
tivera lugar no festival anual do Riso, o que deu certa força aos acontecimentos e o jovem era um ébrio, 
demasiado pronto com a espada e que talvez merecesse uma lição. Mas ele, Cremúcio Cordo, era 
demasiado velho e sóbrio para que o fizessem de parvo daquela forma e aquele não era nenhum festival do 
Riso mas, pelo contrário, o quadricentésimo septuagésimo sexto aniversário da promulgação solene das 
Leis das Doze Tábuas, esse glorioso monumento ao génio legislativo e à rectidão moral dos nossos 
antepassados. Cremúcio foi para casa e deixou­se morrer à fome. Todos os exemplares do seu livro foram 
recolhidos e queimados, excepto dois ou três que a filha escondeu algures e voltou a publicar muitos anos 
mais tarde, quando Tibério já estava morto. A escrita não era grande coisa: o livro teve mais fama do que 
realmente merecia.
Durante todo este tempo, eu dizia para mim mesmo: ”Cláudio, tu és um pobre diabo e não serves de 
grande coisa neste mundo; tens vivido uma vida bastante desgraçada, ora por uma coisa ora por outra, 
mas, pelo menos, a tua vida está segura.” Assim, quando o velho Cremúcio, que eu conhecia muito bem ­ 
tínhamo­nos encontrado e cavaqueado muitas vezes na Biblioteca ­, perdeu a vida por uma acusação como 
esta, o facto foi um grande choque para mim. Senti­me como um homem que vivesse na encosta de um 
vulcão, quando este repentinamente vomita uma torrente avisadora de cinzas e pedras incandescentes. Eu 
próprio tinha escrito coisas muito mais susceptíveis de serem apodadas de traição do que Cremúcio. A 
minha história das reformas religiosas de Augusto continha várias frases que podiam facilmente 
transformar­se na base de uma acusação. E embora o meu património fosse tão diminuto que mal valia o 
trabalho do acusador em me denunciar por causa de um quarto do mesmo, eu compreendia bem que todas 
as vítimas recentes dos julgamentos por traição eram amigos de Agripina, a quem eu continuava a visitar 
sempre que ia a Roma. E não tinha a certeza até que ponto o facto de ser cunhado de Sejano seria 
protecção suficiente para mim.
Sim; ultimamente, tornara­me cunhado de Sejano. Agora, vou contar­vos como isso aconteceu.
270
CAPíTULO XXIII
Um dia, Sejano dissera­me que eu devia voltar a casar, pois parecia que não me entendia muito bem com a 
minha esposa. Eu disse que Urgulanila tinha sido a escolha de minha avó Lívia e que não podia divorciar­
me dela sem a sua permissão.
­ Oh não, claro que não, ­ disse ele ­, eu compreendo isso, mas deve ser uma situação muito infeliz para ti, 
sem uma mulher.
­ Obrigado, ­ repliquei, ­ tenho passado muito bem.
Ele fingiu achar isto uma boa piada e soltou uma risada sonora, dizendo que eu era um homem muito 
sensato, mas depois acrescentou que, se por algum acaso eu encontrasse uma possibilidade de me 
divorciar, o procurasse. Tinha na ideia a mulher certa para mim ­ bem nascida, jovem e inteligente. 
Agradeci­lhe, mas senti­me constrangido. Quando já me ia embora, ele disse:
­ Meu amigo Cláudio, tenho um conselho a dar­te. Apoia o escarlate amanhã em todas as corridas e não te 
importes de perder algum dinheiro a princípio; ao fim e ao cabo não perderás. E não apoies o Verde Claro: 
hoje em dia é uma cor malfadada. Não digas a ninguém que te dei este conselho.
Senti­me muito aliviado por Sejano pensar que ainda valia a pena cultivar o relacionamento comigo, mas 
não consegui encontrar qualquer sentido naquilo que me disse. No entanto, na corrida de carros do dia 
seguinte ­ era o festival de Augusto ­, Tibério víu­me ocupar o meu lugar no Circo e, encontrando­se num 
estado de espírito afável, mandou­me chamar e perguntou­me:
­ O que tens feito, meu sobrinho?
Gaguejei que estava a escrever uma história dos antigos etruscos, com sua licença.
Ele disse:
­ Ah sim? Isso faz jus ao teu discernimento. Não resta nenhum etrusco antigo para protestar, nem etruscos 
modernos para se preocuparem: portanto, podes escrever como te apetecer. Que mais estás a fazer?
­ Esc­c­c­crevo uma história dos antigos C­C­C­C­C­Cartigineses, com vossa licença.
271
­ Esplêndido! E que mais? Despacha­te com essa gaguez. Eu sou um homem ocupado.
­ De momento estou a­a­a­a­a...
­ A começar uma história do M­M­M­Mundo da F­F­F­Fantasia?
­ N­não senhor, a a­a­apoiar o Escarlate.
Ele deitou­me um olhar perspicaz:
­ Estou a ver, meu sobrinho, que não sois um tolo completo. O que te faz apoiar o Escarlate?
Fiquei em apuros, porque não podia dizer que Sejano me dera essa sugestão. Por isso disse:
­ Sonhei que o Verde Claro era desclassificado por usar o chicote nos ad­ad­adversários e que o Escarlate  
f­f­ficava em primeiro lugar. Ele deu­me uma bolsa com dinheiro e murmurou­me ao ouvido:
­ Não digas a ninguém que te dei dinheiro, mas põe isto no Escarlate e vejamos o que acontece.
Acabou por ser o dia do Escarlate e, apostando com o jovem Nero em todas as corridas, ganhei perto de 
2.000 moedas de ouro. Nessa noite, pareceu­me sensato visitar Tibério no Palácio e dizer­lhe:
­ Aqui está a bolsa da sorte, senhor, com uma família de pequenas bolsas que nasceram ao longo do dia.
­ Tudo meu? ­ exclamou. ­ Bom, estou com sorte. O Escarlate é a cor, einh?
Isto era típico do meu tio Tibério. Não deixara claro quem devia guardar os ganhos e eu tinha pensado que 
seriam para mim. Mas se eu tivesse perdido todo o dinheiro, ele teria dito alguma coisa para me fazer 
sentir em dívida para com ele por essa quantia. Podia pelo menos ter­me dado uma comissão.
Na vez seguinte em que fui a Roma, encontrei a minha mãe de tal forma abstracta que a princípio, não 
ousei dizer o que quer que fosse na sua presença, com medo que se irritasse e me batesse. Soube que o seu 
desassossego estava relacionado com Calígula, então com doze anos, e Drusila, então com treze, que 
estavam em casa dela. Drusila estava fechada no quarto sem comida e Calígula andava em liberdade, mas 
parecia completamente apavorado. Ele visitou­me nessa noite e disse:
­ Tio Cláudio. Pedi a vossa mãe que não conte ao Imperador. Nós não estávamos a fazer mal nenhum, 
juro. Era apenas um jogo. Não podeis acreditar numa coisa vinda de nós. Dizei que não.
Quando ele explicou o que não queria que contassem ao Imperador, e jurou pela honra do pai que ele e 
Drusila estavam completamente inocentes, senti­me obrigado a fazer o que pudesse pelos pequenos. Fui 
procurar minha mãe e disse­lhe:
­ Calígula jura que estais enganada. Jura pela honra do pai; se existe a mínima dúvida no vosso espírito 
quanto à culpabilidade dele, devíeis
272
respeitar esse juramento. Pela minha parte, não consigo acreditar que um rapaz de doze anos...
­ Calígula é um monstro e Drusila não lhe fica atrás; e tu és um cabeça dura. Acredito mais nos meus 
olhos do que nos juramentos deles ou nos teus disparates. Amanhã cedo vou procurar Tibério.
­Mas, Mãe, se disserdes ao Imperador, não são só esses dois que vão sofrer. Por uma vez, falemos 
francamente e ao diabo os informadores! Eu posso ser um cabeça dura, mas sabeis tão bem como eu que 
Tibério suspeita que Agripina tenha envenenado Castor para que os filhos mais velhos se tornassem 
herdeiros da monarquia e que ele vive no terror de uma sublevação repentina a seu favor. Se vós, como 
sua avó, acusardes estas crianças de incesto, achais que ele não irá arranjar uma maneira de envolver os 
membros mais idosos da família nessa acusação?
­ És um cabeça dura, é o que eu digo. Não posso suportar a maneira como a tua cabeça estremece e a tua 
maçã­de­adão anda para cima e para baixo.
Mas compreendi que tinha causado alguma impressão nela e decidi que, se me mantivesse fora da sua 
vista durante o resto da minha visita a Roma, para que a minha presença não lhe fizesse lembrar o meu 
conselho, era provável que Tibério não tivesse notícias dela sobre o caso. Empacotei algumas coisas e fui 
para casa de meu cunhado Pláucio, para lhe pedir que me arranjasse alojamento (nesta altura, já Pláucio 
avançara bastante na sua carreira e, dentro de quatro anos, seria Cônsul). O jantar já tinha acabado havia 
muito quando eu cheguei e ele estava a ler documentos legais no seu estúdio. A mulher já tinha ido para a 
cama, disse. Perguntei­lhe:
­ Como é que ela está? Pareceu­me bastante preocupada a última vez que a vi.
Ele riu­se.
­ O quê, meu campónio, não soubeste de nada? Há um mês ou mais que me divorciei de Numantina. 
Quando eu disse a minha mulher referia­me à minha nova esposa, Aprónia, filha do homem que deu 
recentemente aquela tareia monumental a Tacfarinas.
Pedi desculpa e disse que me parecia que era o momento de lhe apresentar as minhas felicitações.
­ Mas porque te divorciaste de Numantina? Julgava que ambos se entendiam muito bem.
­ É verdade, não nos dávamos nada mal. Mas para dizer a verdade, ultimamente, tenho andado com 
problemas por causa de dívidas. Tive pouca sorte há alguns anos como jovem magistrado. Sabes quanto se 
espera que gastemos do nosso próprio bolso com os Jogos. Bom, para começar, gastei mais do que podia 
e, além disso, tive muito pouca sorte, deves estar lembrado. Por duas vezes ocorreu um erro nos 
procedimentos
273
a meio dos Jogos e eu tive que recomeçar do princípio no dia seguinte. A primeira vez foi culpa minha: 
usei uma forma de oração que tinha sido alterada por estatuto dois anos antes. Da vez seguinte, um 
trombeteiro que estava a fazer ouvir um som prolongado não tinha enchido suficientemente o peito de ar: 
interrompeu o toque e isso foi suficiente para fazer parar tudo pela segunda vez. Assim, tive que pagar aos 
gladiadores e aos aurigas por três vezes. A partir daí, nunca mais me vi livre das dívidas. Acabei por ter 
que fazer qualquer coisa quanto a isso, porque os meus credores estavam a tornar­se difíceis. O dote de 
Numantina já fora gasto há muito, mas consegui chegar a um acordo com o tio dela. Ele recebeu­a de 
volta sem o dote, com a condição de eu o deixar adoptar o nosso filho mais novo. Deseja ter um herdeiro e 
engraçou com o rapaz. Aprónia, por sua vez, é muito rica; por isso, agora estou bem. Claro que Numantina 
não gostou nada de me deixar. Tive que lhe dizer que estava só a fazer isto porque recebera uma indicação 
de um Certo Amigo de um Certo Personagem que, se não casasse com Aprónia, que está apaixonada por 
mim e tem influência no Tribunal, seria acusado de blasfémia contra Augusto. No outro dia, um dos meus 
escravos tropeçou e deixou cair no meio do vestíbulo uma taça de alabastro cheia de vinho. Tinha comigo 
um chicote de montar e, quando ouvi o estrondo, corri para o escravo e comecei a bater­lhe. Estava cego 
de fúria. Ele gritou:
­ Parai, Senhor, vede onde estamos!
E o bruto tinha um pé dentro daquele quadrado sagrado de mármore branco que rodeava a estátua de 
Augusto. Deixei cair imediatamente o chicote, mas devo ter sido visto por meia dúzia de libertos. Estou 
confiante que eles não irão depor contra mim, mas Numantina ficou preocupada com o incidente; por isso, 
usei­o para a reconciliar com a ideia do divórcio. A propósito, isto é inteiramente confidencial. Confio que 
não irás falar disto a Urgulanila. Posso dizer­te que ela está bastante aborrecida com a história de 
Numantina.
­ Actualmente nunca a vejo.
­ Bom, se a vires, não lhe vais contar que eu te disse? jura que não.
­ Juro pela Cabeça Divina de Augusto.
­ Assim está bem. Lembras­te do quarto onde ficaste da última vez que aqui estiveste?
­ Sim, obrigado. Se estás ocupado, eu vou já para a cama. Foi um dia longo e também tenho problemas em 
casa. A minha mãe pôs­me praticamente fora de casa.
Despedimo­nos e eu fui para cima. Um liberto deu­me um candeeiro, com um olhar um tanto estranho, e 
eu fui para o quarto que ficava no corredor, quase em frente do de Pláucio. Depois de fechar a porta, 
comecei a despir­me. A cama ficava atrás de uma cortina. Tirei a roupa e lavei as mãos e os pés no 
pequeno lavatório do outro lado do quarto. De repente,
274
ouvi um andar pesado atrás de mim e o meu candeeiro apagou­se. Disse para mim mesmo: ”Estás perdido, 
Cláudio. Há aqui alguém com um punhal.” Mas disse em voz alta e o mais calmamente que consegui:
­ Por favor, acendei o candeeiro, quem quer que sois, e vede se podemos conversar tranquilamente. Se 
decidirdes matar­me, vereis melhor com o candeeiro aceso.
Uma voz funda respondeu:
­ Ficai onde estais.
Houve um arrastar de pés, um grunhido e o som de alguém a vestir­se e depois uma pederneira a raspar no 
aço; finalmente, o candeeiro acendeu­se. Era Urgulanila. Não a via desde o funeral de Drusilo e ela não 
tinha ficado minimamente mais bela nesses cinco anos. Estava mais espadaúda que nunca, colossalmente 
espadaúda, e com a cara inchada; havia força suficiente naquele Hércules feminino para dominar uma 
centena de Cláudios. Eu tenho bastante força nos braços; mas bastava que ela se atirasse para cima de mim 
para me matar por esmagamento. Ela avançou para mim e disse lentamente:
­ O que estás a fazer no meu quarto?
Expliquei­me como pude e disse que era uma fraca piada de Pláucio ter­me mandado para ali sem me 
dizer que ela estava lá. Eu tinha o maior respeito por ela, disse, e apresentei­lhe as minhas desculpas 
sinceras pela intrusão, dizendo­lhe que a deixaria imediatamente e que dormiria num leito nos Banhos.
­ Não, meu querido, agora estás aqui para ficar! Não é muitas vezes que tenho o prazer da companhia do 
meu marido. Por favor, compreende que, uma vez aqui, já não podes escapar. Mete­te na cama e dorme; 
juntar­me­ei a ti mais tarde. Vou ler um livro até sentir sono. Há várias noites que não consigo dormir  
como deve ser.
­ Lamento muito ter­te acordado...
­ Mete­te na cama.
­ Lamento muito o divórcio de Numantina. Não sabia de nada até que o liberto me contou há pouco.
­ Mete­te na cama e pára de falar,
­ Boa noite, Urgulanila. Estou na verdade muito...
­ Cala­te. ­ Ela aproximou­se e fechou a cortina.
Embora estivesse morto de cansaço e mal pudesse ter os olhos abertos, fiz todos os possíveis por ficar 
acordado. Estava convencido que Urgulanila iria esperar até eu adormecer para me estrangular. 
Entretanto, ela pusera­se a ler muito devagar um livro muito aborrecido, uma história de amor grega das 
mais idiotas, virando ruidosamente as folhas e soletrando cada sílaba lentamente para si própria num 
sussurro meio rouco.
Oh sá­bio, dizia ela, pro­vas­te a­go­ra o mel e ofel, Tem cui­da­do não vá a do­çu­ra do teu pra­zer tor­
nar­se a­ma­nhã na a­mar­gu­ra do a­rre­pen­di­men­to!
275
Pfff, repliquei, Mi­nha Que­ri­da, es­tou pron­to, se me de­res ou­tro bei­jo co­mo o an­te­ri­or, pa­ra ser  
to­rra­do em fo­go len­to co­mo um fran­go ou um pa­to.
Ela soltou uma risada ao ler isto e depois disse em voz alta:
­ Dorme, marido. Estou à espera que comeces a ressonar. Protestei:
­ Então, não devias ler histórias tão excitantes. Passado um bocado, ouvi Pláucio ir para a cama.
­ Oh céus, ­ pensei ­ Ele vai adormecer dentro de alguns minutos e, com duas portas a separar­nos, não vai 
ouvir os meus gritos quando Urgulanila me estrangular.
Urgulanila parou de ler e deixei de ter o seu murmúrio e o roçar do papel para me ajudar a lutar contra o 
sono. Senti­me adormecer, Adormeci. Sabia que estava a dormir e que tinha que acordar. Lutei 
freneticamente para ficar acordado. Finalmente acordei. Houve uma pancada seca e um restolhar de papel. 
O livro devia ter sido soprado de cima da mesa para o chão. A porta parecia estar aberta. Escutei 
atentamente durante cerca de três minutos. Seguramente, Urgulanila não estava no quarto.
Enquanto estava a tentar decidir­me sobre o que havia de fazer, ouvi o grito mais pavoroso ­ parecia muito 
próximo. Uma mulher gritava:
­ Não me façam mal! Não me façam mal! Isto é coisa de Numantina! Oh! Oh!
Depois ouviu­se o embate de um objecto de metal pesado a cair, seguido do estalar de vidros partidos, 
outro grito, uma pancada distante, seguida de passos apressados no corredor. Alguém estava de novo no 
meu quarto. A porta foi fechada devagar e trancada. Reconheci a respiração ofegante de Urgulanila. 
Ouvia­a tirar a roupa e pô­la numa cadeira. Logo que a senti deitada a meu lado, fingi que dormia. Ela 
tateou­me a garganta na escuridão. Eu disse, como se estivesse a acordar:
­ Não faças isso, querida. Faz­me cócegas. E eu tenho que ir a Roma amanhã e comprar­te uns cosméticos. 
­ Depois, numa voz mais desperta,
­ Oh Urgulanila! És tu? O que é todo este barulho? Que horas são? já estamos a dormir há muito tempo?
Ela disse:
­ Não sei. Devo ter dormido umas três horas. Está quase a amanhecer. Parece que aconteceu alguma coisa 
de terrível. Vamos ver.
Assim, levantámo­nos, vestimo­nos à pressa e abrimos a porta. Pláucio nu, apenas com uma coberta 
enrolada à pressa em volta do corpo, encontrava­se no meio de uma multidão excitada, munida de 
archotes. Ele mostrava­se perturbado e dizia repetidamente:
­ Não fui eu que fiz isto. Eu estava a dormir. Senti que ma arrancavam dos braços e ouvi­a ser levada 
pelos ares a gritar por socorro; depois, ouvi o barulho de qualquer coisa a cair e outro estrondo, quando ela 
saíu
276
pela janela. Estava escuro como breu. Ela gritava: ”Não me façam mal! Isto é coisa de Numantina.”
­ Diz isso aos juízes, ­ atalhou a voz do irmão de Aprónia, aproximando­se, ­ e vais ver se eles te 
acreditam. Foste tu que a mataste. Ela tem o crânio esmagado.
­ Não fui eu, ­ disse Pláucio. ­ Como é que eu podia ter feito isso? Estava a dormir. Foi bruxaria. 
Numantina é bruxa.
Ao romper do dia, ele foi levado diante do Imperador pelo pai de Aprónia. Tibério interrogou­o 
severamente. Disse agora que, enquanto ele dormia profundamente, ela se arrancara dos seus braços e se 
pusera aos saltos pelo quarto e aos gritos, atirando­se pela janela e estatelando­se no pátio. Tibério obrigou 
Pláucio a acompanhá­lo imediatamente ao local do crime. A primeira coisa que ele notou no quarto foi o 
seu presente de casamento a Pláucio, um belo candelabro egípcio em bronze e ouro retirado do túmulo de 
uma rainha e que jazia agora quebrado no chão. Levantou os olhos e viu que tinha sido arrancado do tecto. 
Disse:
­ Ela agarrou­se a ele e fê­lo cair. Estava a ser transportada para a janela aos ombros de alguém. Reparai 
como o buraco da janela está alto. Ela foi atirada, não saltou sozinha.
­ Foi bruxaria, ­ disse Pláucio. ­ Ela foi arrastada pelos ares por um poder invisível. Gritou e culpou a 
minha primeira mulher, Numantina, Tibério fez um riso de troça. Os amigos de Pláucio compreenderam 
que ele ia ser acusado de assassinato e executado e os seus bens confiscados. A avó Urgulanila enviou­lhe 
portanto um punhal, dizendo­lhe que pensasse nos seus herdeiros, que seriam autorizados a conservar­lhe 
os bens caso ele se antecipasse ao veredicto com o suicídio imediato. Ele era um cobarde e não conseguiu 
enterrar o punhal. Por fim, meteu­se num banho quente e ordenou a um médico que lhe cortasse as veias; 
lentamente e sem dor esvaiu­se em sangue. Senti­me muito mal com a morte dele, Não tinha acusado 
imediatamente Urgulanila do assassinato, porque me teriam perguntado porque não tinha saltado da cama 
e salvado Aprónia quando ouvi os primeiros gritos. Decidira esperar pelo julgamento e só me apresentar a 
depor se houvesse indicações de que Pláucio ia ser condenado. Não soube nada sobre o punhal até ser 
tarde demais. Consolei­me com o pensamento de que ele tinha tratado Numantina com grande crueldade e, 
além do mais, tinha sido um mau amigo para mim. Para aclarar a memória de Pláucio, o irmão dele 
acusou Numantina de ter perturbado o espírito de Pláucio com bruxarias. Mas Tibério interveio e disse 
que constatara que Pláucio estava em pleno poder das suas faculdades na altura. Numantina foi absolvida.
Não houve qualquer outra troca de palavras entre Urgulanila e eu próprio. Mas, um mês mais tarde, 
quando passava por Cápua, Sejano visitou­me de surpresa. Estava na companhia de Tibério, a caminho de
277
Capri, uma ilha perto de Nápoles onde Tibério tinha doze villas e onde ia frequentemente para se 
divertir. Sejano disse:
­Agora poderás divorciar­te de Urgulanila. Ela vai ter um filho dentro de cinco meses, segundo me 
informaram os meus agentes. E é a mim que tens que agradecer. Eu sabia da obsessão de Urgulanila por 
Numantina. Calhou eu ver um jovem escravo, um grego, que podia ter sido gémeo de Numantina. Ofereci­
o a Urgulanila e ela apaixonou­se imediatamente por ele. O seu nome é Boter.
O que podia eu fazer, a não ser agradecer­lhe?! Depois, perguntei:
­ E quem vai ser a minha nova esposa?
­ Quer dizer que te lembras da nossa conversa? Bom, a dama que tenho na ideia é a minha irmã adoptiva: 
Élia. Conhece­la, claro. Conhecia, mas escondi o desapontamento e limitei­me a perguntar se
alguém tão jovem, bela e inteligente, se contentaria em casar com um velho tolo, coxo, doente e gago 
como eu.
­ Ah, ­ respondeu ele brutalmente, ­ não se vai importar minimamente. Vai casar com o sobrinho de 
Tibério e tio de Nero e é só nisso que ela pensa. Não imagines que está apaixonada por ti. Pode mesmo 
chegar a ter um filho contigo por causa da sua linhagem, mas quanto a sentimentos...
­ Na verdade, aparte a honra de me tornar teu cunhado, não valia a pena divorciar­me de Urgulanila, pois 
não haverá grande melhoria na minha vida.
­ Ah, tu arranjas­te bem, ­ riu. ­ Não levas uma vida muito solitária aqui, a julgar pelo que vejo neste 
quarto. Dá para perceber que há por aí uma bela mulher. Luvas, um espelho de mão, um bastidor, essa 
caixa de guloseimas, flores cuidadosamente arranjadas. E Élia não irá sentir ciúmes. Provavelmente, 
também tem as suas amizades com homens, embora eu não me imiscua na sua vida.
­ Está bem, ­ disse. ­Eu caso,
­ Não me pareces muito agradecido.
­ Não se trata de ingratidão. Tiveste bastante incómodo por minha causa e não sei como agradecer­te 
devidamente. Estava apenas a sentir­me um bocado nervoso. Por aquilo que sei de Élia, ela é um tanto 
crítica, se percebes o que quero dizer.
Ele largou a rir.
­ Ela tem uma língua que é como uma agulha de coser sacas. Mas certamente já estás couraçado contra 
simples descomposturas. A tua mãe deu­te um bom treino, não é verdade?
­ Ainda tenho a pele um bocado sensível, ­ repliquei, em certas áreas.
­ Bom, não posso ficar aqui mais tempo, meu caro Cláudio. Tibério deve estar a pensar onde terei ido. 
Está então combinado?
278
­ Sim, e agradeço­te muito.
­ Oh, a propósito, foi Urgulanila quem matou a pobre Aprónia, não foi? Eu estava mais ou menos à espera 
de uma tragédia. Urgulanila recebeu uma carta de Numantina, pedindo­lhe que a vingasse. Numantina não 
foi propriamente quem escreveu a carta, entendes?
­ Não sei de nada. Estava a dormir profundamente na altura.
­ Como Pláucio?
­ Ainda mais profundamente que Pláucio.
­ Muito sensato! Bom, adeus, Cláudio. ­Adeus, Élio Sejano.
Ele foi­se embora.
Divorciei­me de Urgulanila, depois de ter escrito primeiro à minha avó a pedir autorização. Lívia escreveu 
que a criança devia ser abandonada logo que nascesse; era este o desejo dela, assim como de Urgulanila.
Enviei um liberto de confiança a Urgulanila em Herculano, para a informar das ordens que eu recebera, 
prevenindo­a que, se queria que a criança vivesse, a devia trocar, logo que nascesse, por um bebé morto; 
eu tinha que ter um bebé qualquer para abandonar e, desde que não estivesse morto há muito tempo, 
qualquer um servia. Assim, a criança foi salva dessa forma e, mais tarde, Urgulanila retirou­a aos pais 
adoptivos, de quem recebera o bebé morto. Não sei o que aconteceu a Boter, mas a criança, uma rapariga, 
cresceu, tornando­se o vivo retrato de Numantina, segundo dizem. Urgulanila já morreu há vários anos. 
Quando ela morreu, tiveram que derrubar uma parede para retirar da casa o corpo enorme e era todo ele 
maciço, nada de hidropisia. No seu testamento, rendeu­me um curioso tributo: ”Não me interessa o que as 
pessoas dizem, mas Cláudio não é nenhum tolo.” Deixou­me uma colecção de jóias gregas, alguns 
bordados persas e o seu retrato de Numantina.
279
CAPÍTULO XXIV
Actualmente, Tibério e Lívia nunca se encontravam. Lívia tinha ofendido Tibério ao consagrar uma 
estátua a Augusto em nome de ambos pondo primeiro o nome dela. Ele retaliou fazendo a única coisa que 
ela não podia sequer fingir que perdoava ­ quando embaixadores
da Hispânia o foram procurar, perguntando­lhe se podiam erigir um templo a ele e à mãe, Tibério recusou 
em nome de ambos.
Disse ao Senado que tinha, talvez num momento de fraqueza, permitido a consagração de um templo na 
Ásia ao senado e ao seu Chefe (ou seja, ele próprio) ­ simbolizando no seu conjunto o governo paternal de 
Roma. O nome da mãe também apareceu na inscrição da dedicatória, como Suma Sacerdotisa do culto de 
Augusto. Mas dar o seu assentimento à divinização dele próprio e da mãe seria levar a indulgência 
demasiado longe.
­ Pela minha parte, meus senhores, o facto de ser um homem mortal, de estar preso aos obstáculos da 
natureza humana e de preencher a vosso contento o lugar principal entre vós, se é que o faço, garanto­vos 
solenemente que é o bastante para mim: é assim que prefiro ser lembrado pela posteridade. Se a 
posteridade considerar que fui digno da minha ancestralidade, vigilante dos vossos interesses, inabalável 
no perigo e na defesa do bem comum, destemido perante os inimigos privados, serei suficientemente 
lembrado. A gratitude carinhosa do Senado, do povo de Roma e dos nossos aliados é o mais belo templo 
que eu poderia erigir; um templo não de mármore, mas mais duradouro que o mármore, um templo do 
coração. Os templos de mármore, quando os seres consagrados a quem são erigidos caem em desgraça, 
são desprezados como meros sepulcros. Invoco portanto os Céus para que me concedam até ao fim da 
minha vida um espírito sereno e uma capacidade de discernimento clara em todos os deveres humanos e 
sagrados. Portanto, imploro também a todos os nossos cidadãos e aliados que, quando quer que a 
decomposição se apoderar deste meu corpo mortal, eles celebrem a minha vida e os meus feitos (se disso 
forem merecedores), com gratidão e louvores interiores, de preferência a pompas exteriores, à construção 
de templos ou à execução de sacrifícios anuais. O verdadeiro amor que Roma sentia por meu pai Augusto 
quando ele estava entre nós como homem já foi obscurecido, tanto pelo temor que a sua divindade excita 
nas pessoas de
281
espírito religioso, como pelo uso indiscriminado do seu nome como imprecação na praça do mercado. Enquanto 
estamos a falar deste assunto, meus Senhores, proponho que, a partir de agora, tornemos uma ofensiva criminosa o 
uso do nome sagrado de Augusto sem ser na mais solene das ocasiões e que implementemos esta lei com todo o 
vigor.
Não houve qualquer referência aos sentimentos de Lívia a esse respeito. Na véspera, ele tinha­se recusado a nomear 
um dos nomes indicados por ela para um juizado vago, a menos que lhe fosse permitido acrescentar à nomeação: 
”Esta pessoa é escolha de minha mãe, Lívia Augusta, a cuja insistência a favor da mesma fui obrigado a ceder, 
contra tudo o que sei sobre o seu carácter e capacidades.”
Pouco depois, Lívia convidou todos os nobres de Roma para um espectáculo que iria durar todo o dia. Havia 
malabaristas e acrobatas, declamação de poemas, bolos maravilhosos, doces e bebidas e uma bela jóia para cada um 
dos convidados como lembrança da ocasião. A concluir a sessão, Lívia fez uma leitura das cartas de Augusto. Estava 
agora com oitenta e três anos, a sua voz era fraca e fazia sibilar fortemente os ”s”, mas, durante uma hora e meia, 
manteve a assistência fascinada. As primeiras cartas que leu continham proclamações sobre a política de Estado e 
todas elas pareciam ter sido especialmente escritas contra o presente estado de coisas em Roma. Havia alguns 
comentários muito adequados sobre julgamentos por traição, incluindo o seguinte parágrafo:
Embora tenha sido obrigado a proteger­me legalmente contra toda a espécie de libelos, empenhar­me­ei ao máximo, 
minha querida Lívia, para evitar pôr em andamento um espectáculo tão desagradável como um julgamento por 
traição para benefício de qualquer historiador tolo, caricaturista ou autor de epigramas que tenha feito de mim o alvo 
do seu humor ou eloquência. Meu pai Júlio César perdoou ao poeta Catulo os mais vis libelos difamatórios que 
podeis imaginar: ele escreveu a Catulo que, se estava a tentar mostrar que não era nenhum bajulador servil como a 
maior parte dos outros poetas, já tinha provado bem o que pretendia e podia retomar outros assuntos mais poéticos, 
em vez das anormalidades sexuais de um estadista de meia idade; e aceitaria um convite para jantar no dia seguinte, 
acompanhado por qualquer amigo que desejasse! Catulo veio e, a partir daí, os dois foram grandes amigos. Usar a 
majestade da lei para vingar qualquer acto mesquinho de raiva pessoal é fazer uma confissão pública de fraqueza e 
cobardia e revelar um espírito ignóbil.
Havia um parágrafo notável sobre informadores:
Excepto nos casos em que estou convencido de que um informador não espera beneficiar directa ou indirectamente 
das suas acusações, mas
282
que as mesmas se devem a um sentimento de verdadeiro patriotismo e decência pública, não só recuso a sua 
importância como prova, como aponho uma marca negra ao nome desse informador e não volto a empregá­lo em 
qualquer posição de confiança...
Para terminar, leu uma série de cartas muito esclarecedoras. Lívia tinha dezenas de milhar de cartas de Augusto, 
escritas ao longo de cinquenta e dois anos, cuidadosamente cosidas em forma de livro e indexadas. Escolheu entre 
estes milhares as quinze mais devastadoras que encontrou. A série começou com queixas contra o comportamento 
inaceitável de Tibério quando rapazinho, a sua falta de popularidade entre os colegas quando estudante, a sua 
avareza e altivez na juventude, e assim por diante, com sinais de irritação crescente e a frase, muitas vezes repetida, 
”e se não fosse por ele ser vosso filho, minha querida Lívia, eu diria... Depois, vinham as queixas da sua severidade 
brutal com os soldados que estavam sob o seu comando ­ ”quase um convite ao motim” ­ e a sua lentidão em atacar o 
inimigo, com comparações desfavoráveis entre os seus métodos e os de meu pai. Depois, uma recusa irada em o 
considerar como genro e uma lista detalhada dos seus defeitos morais. Seguiam­se mais cartas relacionadas com a 
triste história de Júlia, escritas na sua maior parte em termos de uma aversão e uma repulsa quase doentias por 
Tibério. Lívia leu uma carta importante, escrita na ocasião em que Tibério, foi chamado de Rodes:
Queridíssima Lívia,
Aproveito este quadragésimo segundo aniversário do nosso casamento para vos agradecer de todo o meu coração os 
serviços extraordinários que prestastes ao Estado desde que unimos as nossas forças. Se eu sou chamado o Pai da 
Pátria, parece­me absurdo que vós não sejais chamada a Mãe da Pátria: juro que fizestes duas vezes aquilo que eu fiz 
durante a nossa grande obra de reconstrução pública. Porque me pedis para esperar mais alguns anos, antes de pedir 
ao Senado para vos votar essa honra? A única forma que tenho de mostrar a minha absoluta confiança na vossa 
lealdade desinteressada e julgamento profundo é aceder finalmente às vossas súplicas repetidas para que faça 
regressar Tibério, um homem em relação a cujo carácter confesso que continuo a sentir a maior repugnância e peço 
aos céus que, ao ceder­vos neste ponto, não esteja a infligir danos duradouros no bem público.
A última escolha de Lívia foi uma carta escrita cerca de um ano antes da morte de Augusto:
Experimentei um sentimento repentino do mais profundo pesar e desespero, minha querida esposa, ao discutir 
política estatal com Tibério
283
ontem, ao pensar que o povo de Roma estava destinado a ser olhado com dureza por aqueles seus olhos 
salientes, batido por aquele punho ossudo, mascado por aqueles maxilares terrivelmente lentos e pisado 
por aqueles pés enormes. Mas, de momento, não estava a pensar em vós nem no nosso querido 
Germânico. Se não acreditasse que, quando eu morrer, ele será guiado tanto por vós em todas as questões 
de estado como envergonhado pelo exemplo de Germânico, seguindo algo que se assemelhe pelo menos a 
uma vida decente, eu era capaz, mesmo agora, de o deserdar e pedir ao Senado que lhe retirasse todos os 
títulos honoríficos. O homem é um animal e precisa que tomem conta dele.
Quando terminou, levantou­se e disse:
Talvez, minhas senhoras, seja melhor não dizerdes nada aos vossos maridos sobre estas cartas tão 
peculiares. Não me apercebi na realidade, quando comecei a ler, quão peculiares elas eram. Não 
vos faço este pedido por causa de mim própria, mas pelo Império.
Tibério soube toda a história por Trajano, quando se preparava para ocupar o seu lugar no 
Senado, tendo ficado cheio de vergonha, raiva e preocupação. Era o caso que o seu trabalho nessa 
tarde consistia em ouvir uma acusação de traição levantada contra Lêntulo, um dos pontífices 
sobre quem tinham recaído suspeitas na questão da prece por Nero e Druso e também por ter 
votado a favor da mitigação da sentença de Sósia. Quando Lêntulo, um velho simples, que se 
distinguia igualmente pelo nascimento, pelas suas vitórias em África sob o comando de Augusto 
e pela sua brandura despretensiosa a alcunha dele era O Carneiro Guia soube que era acusado de 
conspirar contra o Estado, largou a rir. Tibério, já perturbado, perdeu completamente o controlo e 
disse, quase a chorar, para a Casa:
Se também Lêntulo me odeia, sou indigno de viver. Caio replicou:
Alegrai­vos, majestade peço perdão, tinha­me esquecido que odiais o título ­, devia ter dito 
Alegra­te, Tibério César! Lêntulo não estava a rir­se de ti, mas contigo. Estava a regozijar­se 
contigo por finalmente ter aparecido perante o Senado uma acusação de traição absolutamente 
infundada.
E assim a acusação contra Lêntulo foi posta de lado. Mas Tibério já tinha causado a morte ao pai 
de Lêntulo. Ele era imensamente rico e tinha ficado de tal forma assustado com as suspeitas de 
Tibério a seu respeito, que se suicidara; como prova de lealdade deixara toda a sua fortuna a 
Tibério que, depois disso, não podia acreditar que Lêntulo, que entretanto ficara pobre, não lhe 
guardasse ressentimento.
Tibério não voltou a entrar no Senado durante dois meses completos: não conseguia olhar de 
frente para os senadores, sabendo que as mulheres
284
deles tinham ouvido as cartas de Augusto a seu respeito. Sejano sugeriu que lhe faria bem à saúde deixar 
Roma por algum tempo e ficar a algumas milhas de distância numa das suas villas, onde escaparia à 
multidão diária de visitantes do Palácio e ao barulho e agitação da Cidade. Ele seguiu­lhe o conselho. A 
atitude que tomou contra a mãe foi aposentá­la, omitir o seu nome de todos os documentos públicos e 
acabar com as habituais honras de aniversário, deixando bem claro que qualquer associação do nome dela 
com o seu ou qualquer louvor que lhe fosse dirigido no Senado seria considerado como muito próximo da 
traição. Mas não ousou assumir uma vingança mais activa, Sabia que ela ainda tinha a carta que ele 
escrevera de Rodes prometendo­lhe obediência para toda a vida e também a sabia capaz de a ler, embora 
isso a pudesse incriminar como assassina de Caio e Lúcio.
Mas esta velhinha maravilhosa ainda não estava derrotada, como ireis ler. Um dia, recebi um bilhete dela: 
”Dona Lívia Augusta espera a visita do seu querido neto Tibério Cláudio por ocasião do seu aniversário 
para jantar com ela; espera também que ele esteja de boa saúde.” Não conseguia perceber. Eu, o seu 
querido neto! Um interesse carinhoso pela minha saúde! Não sabia se devia rir­me ou ter medo. Nunca em 
toda a minha vida eu fora autorizado a visitá­la no dia do seu aniversário. Nunca tinha sequer jantado com 
ela. Havia dez anos que não falávamos, a não ser no contexto cerimonial do festival Augustano. Qual 
podia ser o motivo do convite? Bom, dentro de três dias saberia e, entretanto, tinha que lhe comprar um 
presente verdadeiramente magnífico. Finalmente, comprei­lhe uma coisa que tinha a certeza que ela ia 
apreciar ­ um vaso para vinho, em bronze, de forma graciosa, com cabeças de serpente no lugar das asas e 
um desenho complicado embutido a ouro e prata. Era, na minha opinião, um trabalho muito mais 
requintado que qualquer dos vasos coríntios pelos quais os coleccionadores pagam preços tão absurdos 
hoje em dia. Este tinha vindo da China! No centro do desenho tinham incrustado um medalhão de 
Augusto em ouro que, de alguma forma, fora parar àquela terra maravilhosamente distante. Aquele vaso 
custou­me 500 moedas de ouro, embora não tivesse mais de cinquenta e cinco centímetros de altura.
Mas antes de falar da minha visita e da minha longa entrevista com ela, tenho que esclarecer um ponto 
sobre o qual talvez vos tenha criado uma ideia errónea. Das minhas descrições dos julgamentos por traição 
e outras atrocidades semelhantes, poder­se­á talvez deduzir que, durante a governação de Tibério, o 
Império foi intoleravelmente mal governado em todos os aspectos. Isto está longe da verdade. Embora ele 
não tivesse realizado trabalhos públicos novos de que valha a pena falar, contentando­se apenas em 
completar aqueles que tinham sido começados por Augusto, manteve a Marinha e o Exército eficientes e 
com a força necessária, pagava
285
regularmente aos seus funcionários e fazia­os apresentar relatórios detalhados quatro vezes por ano; 
encorajou o comércio, garantiu à Itália um fornecimento regular de trigo, manteve as estradas e os  
aquedutos em bom estado de conservação, limitou a extravagância pública e privada de diversas maneiras, 
estabilizou os preços dos alimentos, fez diminuir a pirataria e o banditismo e constituiu uma considerável 
reserva de dinheiro público para o caso de alguma emergência nacional.
Manteve ao serviço durante muitos anos os seus governadores provinciais, caso fossem bons, para não 
criar insegurança, mantendo­os no entanto sob apertada vigilância. Um governador, para mostrar a sua 
eficiência e lealdade, enviou a Tibério mais tributo que o que lhe era devido. Tibério deu­lhe uma 
reprimenda: ”Eu quero os meus carneiros tosquiados, não rapados.” Como resultado, houve poucas 
guerras de fronteira depois de resolvido o problema da Germânia, com o bom acolhimento dado a 
Marobodo em Roma e com a morte de Hermann. Tacfarinas era o inimigo principal. Foi conhecido 
durante muito tempo como o distribuidor de louros, porque três generais ­ o meu amigo Fúrio, Aprónio 
(pai de Aprónia) e um terceiro, Blaeso, tio materno de Sejano ­ o tinham derrotado, cada um por sua vez, 
recebendo por isso ornamentos triunfais. Blaeso, que desbaratou o exército de Tacfarinas e capturou o 
irmão dele, recebeu a honra invulgar de ser feito marechal de campo, uma honra geralmente reservada 
apenas à família imperial. Tibério disse ao Senado que estava satisfeito por homenagear Blaeso daquela 
forma por causa do seu parentesco com o seu fiel amigo Sejano; e quando, três anos mais tarde, um quarto 
general, Dolabela, pôs um ponto final na Guerra Africana, que estalara de novo com força redobrada, não 
apenas derrotando Tacfarinas, mas matando­o, apenas recebeu triunfos ornamentais, ”não fossem os 
louros de Blaeso, tio do meu fiel amigo Sejano, perder o seu brilho.”
Mas eu estava a falar dos bons feitos de Tibério, não das suas fraquezas; e na verdade, do ponto de vista 
do Império, de uma maneira geral, ele fora ao longo dos últimos doze anos um governante sensato e justo. 
Isso ninguém pode negar. O cancro no âmago da maçã ­ se me perdoam a metáfora ­ não era visível na 
pele nem prejudicava a saúde da pele. Dos 5.000.000 de cidadãos romanos, apenas 200 ou 300 sofreram 
pelos
receios invejosos de Tibério. E eu não sei quantas dezenas de milhar de escravos, gentes da província e 
aliados que eram súbditos
em tudo menos no nome, beneficiavam substancialmente com o sistema Imperial, tal como foi 
aperfeiçoado por Augusto e Lívia e continuado dentro da mesma tradição por Tibério. Mas eu estava a 
viver no âmago da maçã, por assim dizer, e posso ser perdoado se escrevo mais sobre esse cancro central 
do que sobre a parte exterior, ainda intacta e perfumada.
Sempre que abres caminho a uma metáfora, Cláudio, o que é raro, leva­la longe demais. Deves certamente 
lembrar­te das exortações de
286
Atenodoro contra este tipo de coisa? Bom, chama a Sejano o verme e acaba com isso; depois, volta ao teu 
estilo habitual, sem ornatos.
Sejano decidiu usar o sentido de vergonha de Tibério como meio para o manter afastado da cidade por  
mais do que apenas dois meses. Encorajou um dos oficiais da Guarda a acusar um brincalhão consagrado 
chamado Montano de denegrir o carácter privado de Tibério. Enquanto que até aí os acusadores tinham 
sido impedidos de relatar outros abusos de Tibério, a não ser os de carácter mais geral ­ como altivo, cruel 
ou dominador ­, este soldado apresentou­se a acusar Montano de libelos de um tipo muito particular e 
substancial. Sejano encarregou­se de que os libelos tivessem tanto de verdadeiros como de repelentes; 
embora Montano, não tendo o conhecimento de Sejano sobre o que se passava no Palácio, não os tivesse 
pronunciado. A testemunha, que era o melhor instrutor de treinos da Guarda, apregoou em voz bem alta as 
alegadas obscenidades de Montano, não hesitando nas palavras ou frases mais obscenas e não deixando 
que os protestos chocados dos senadores lhe abafassem a voz.
­ Jurei dizer toda a verdade, ­ berrou, ­ e, pela honra de Tibério César, não omitirei um único artigo da 
repulsiva conversação do acusado, ouvido por mim na data indicada e nas circunstâncias relatadas. O 
acusado declarou ainda que o nosso gracioso Imperador se está rapidamente a tornar impotente por causa 
dos ditos alegados deboches e pelo abuso de medicamentos afrodisíacos, e que, para revigorar os seus 
enfraquecidos poderes sexuais, organiza exibições privadas mais ou menos de três em três dias, numa sala 
subterrânea do Palácio especialmente decorada. O acusado declarou que os que actuavam nestas 
exibições, são chamados ”Spintrianos” e entram aos saltos, três de cada vez, completamente nus ...”
Continuou daquela forma durante meia hora e Tibério não ousou fazê­lo parar ­ ou talvez quisesse 
descobrir até onde a situação era conhecida ­, até que a testemunha disse uma coisa mais (não interessa o 
quê). Tibério, perdendo a cabeça, levantou­se num salto repentino, com a face vermelha, e declarou que ia 
de imediato ilibar­se daquelas acusações monstruosas ou instaurar uma investigação judicial. Sejano 
tentou acalmá­lo, mas ele continuou de pé, olhando em volta, furioso, até que Caio se levantou e lhe fez 
lembrar que era Montano e não ele o acusado; que o seu carácter privado estava fora de suspeita; e que, se 
a notícia de que tal investigação estava a ter lugar chegasse às províncias fronteiriças e aos estados 
aliados, ela seria completamente pervertida.
Pouco depois, Tibério foi prevenido por Trasilo ­ se isto foi arranjado por Sejano não sei ­ de que devia 
em breve deixar a Cidade e que, se voltasse a entrar nela, isso significaria a sua morte. Tibério disse a 
Sejano que ia mudar­se para Capri e deixá­lo a tomar conta de tudo em Roma. Ainda assistiu a mais um 
julgamento por traição ­ o da minha prima Cláudia Pulcra, viúva de Varo, que, agora que Sósia tinha sido 
exilada,
287
era a amiga mais íntima de Agripina. Foi acusada de adultério, de prostituir as filhas e de feitiçaria contra 
Tibério. Estava, creio eu, totalmente inocente de todas estas acusações. Logo que Agripina soube do que 
se estava a passar, acorreu ao Palácio e, por acaso, encontrou Tibério oferecendo um sacrifício a Augusto. 
Pouco antes da cerimónia estar terminada, aproximou­se dele e disse:
­ Tibério, este comportamento é ilógico. Sacrificas flamingos e pavões a Augusto e persegues os seus 
netos.
Ele disse lentamente:
­ Não entendo. Quais são os netos de Augusto que eu persigo que não tenham sido perseguidos por ele 
próprio?
­ Não estou a falar de Póstumo e Julila. Falo de mim própria. Exilaste Sósia porque era minha amiga. 
Obrigaste Sílio a suicidar­se porque era meu amigo. E Calpúrnio porque era meu amigo. E agora a minha 
querida Pulcra também está condenada, embora o seu único crime seja a sua tola estima por mim. As 
pessoas estão a começar a evitar­me, dizendo que lhes trago má sorte.
Tibério agarrou­a pelos ombros e disse uma vez mais:
E se nãofores rainha, minha querida, Sentir­te­ás injustiçada?
Pulcra foi condenada e executada. O Promotor da Coroa era um homem chamado Afer, escolhido por 
causa da sua eloquência. Alguns dias mais tarde, Agripina encontrou­o por acaso fora do teatro. Parecia 
envergonhado de si próprio e evitava cruzar o olhar com o dela. Agripina aproximou­se e disse­lhe:
­ Não vale a pena esconderes­te de mim, Afer.
Depois citou Homero, mas com alterações adaptadas ao contexto, a resposta tranquilizadora de Aquiles 
aos embaraçados arautos que foram procurá­lo com uma mensagem humilhante de Agamérrmon. Disse­
lhe:
Ele obrigou­te a isso. Emborafosses bem pago
A acção nãofoi tua, mas de Agamémnon.
Isto foi relatado a Tibério, (embora não por Afer); a palavra Agamémnon provocou­lhe novo sobressalto.
Agripina adoeceu e pensou que estaria a ser envenenada. Fui na sua liteira ao Palácio para fazer um último 
apelo de misericórdia a Tibério. Estava tão magra e pálida que Tibério ficou encantado: talvez ela 
morresse em breve. Comentou:
­ Minha pobre Agripina, pareces gravemente doente. O que se passa contigo?
288
Ela respondeu com voz fraca:
­ Pode ser que tenha sido injusta contigo ao pensar que persegues os meus amigos só por eles serem meus 
amigos. Pode ser que eu seja pouco feliz na minha escolha ou que as minhas opiniões estejam muitas 
vezes erradas. Mas juro que te enganaste igualmente a meu respeito ao pensar que tenho o mais leve 
sentimento de deslealdade para contigo, ou que tenho qualquer ambição de governar, quer directa quer 
indirectamente. Tudo aquilo que peço é que me deixem em paz e peço o teu perdão por qualquer injúria 
que possa ter­te feito inadvertidamente e... e...
Terminou a soluçar.
­ E que mais?
­ Oh Tibério, sê bom para os meus filhos! E sê bom para mim! Deixa­me voltar a casar. Estou tão só. 
Desde que Germânico morreu que não consigo esquecer os meus problemas. à noite, não consigo dormir. 
Se me deixares casar eu assento e perco esta minha inquietação; serei uma pessoa diferente. Talvez então 
deixes de suspeitar que conspiro contra ti. Tenho a certeza que é só por eu parecer tão infeliz que pensas 
que tenho maus sentimentos a teu respeito.
­ Quem é o homem com quem queres casar?
­ Um homem bom, generoso, ambicioso, que já passou da meia­idade e que é um dos teus ministros mais 
leais.
­ Qual o nome dele?
­ Caio. Ele diz que está pronto para casar comigo imediatamente. Tibério deu meia volta e saíu do quarto 
sem dizer mais nada. Alguns dias mais tarde, convidou­a para um banquete. Era costume seu convidar 
para jantar com ele as pessoas de quem desconfiava particularmente e ficar a olhá­las durante a refeição, 
como se tentasse ler­lhes os pensamentos, o que abalava a presença de espírito de todos, com raras 
excepções. Se eles se mostravam alarmados, ele interpretava isso como prova da sua culpa. Se o 
encaravam sem vacilar, tomava­o como prova de culpa ainda mais forte, acrescentando­lhe a insolência. 
Nesta ocasião, Agripina, ainda doente e incapaz de comer a não ser os alimentos mais ligeiros sem uma 
sensação de náusea, ficou todo o tempo a olhar para Tibério e sentiu­se profundamente infeliz. Ela não era 
uma pessoa faladora e a conversa, que era acerca dos méritos relativos da música e da filosofia, não a 
interessava minimamente, deixando­a impossibilitada de contribuir para a mesma. Fingiu que comia, mas 
Tibério, que a obser vava com atenção, viu que ela deixava os pratos intactos, um a seguir ao outro. 
Pensou que suspeitava que a estivessem a tentar envenenar e, para ter a certeza, pegou cuidadosamente 
numa maçã que tirou da travessa que tinha diante dele e disse:
289
­ Minha querida Agripina, não comeste praticamente nada. Pelo menos, prova esta maçã. é excelente. Tive 
um presente de árvores novas do Rei da Pártia há três anos e esta é a primeira vez que dão fruto.
A verdade é que todas as pessoas têm um inimigo natural ­ se é que posso chamar­lhe assim. Para algumas 
pessoas, o mel é um veneno poderoso. Outros, ficam doentes só por tocarem num cavalo, entrarem num 
estábulo ou mesmo por se deitarem num canapé com crina de cavalo. Outros ainda são desagradavelmente 
afectados pela presença de um gato e, quando entram numa sala, dizem por vezes: ”Esteve aqui um gato, 
desculpem que me retire.” Eu próprio sinto uma repugnância insuportável pelo cheiro do espinheiro em 
flor. O inimigo natural de Agripina era a maçã. Ela recebeu a oferta da mão de Tibério e agradeceu­lhe, 
mas com um estremecimento mal disfarçado, e disse que ia guardá­la, se ele lho permitia, para comer 
quando chegasse a casa.
­ Só uma dentada agora, para veres como é boa.
­ Desculpa­me, por favor, mas não consigo. ­ Entregou a maçã a um criado e disse­lhe que lha 
embrulhasse cuidadosamente num guardanapo.
Porque é que Tibério não a julgou imediatamente sob acusação de traição, como Sejano insistia que 
fizesse? Porque Agripina ainda estava sob a protecção de Lívia.
290
CAPÍTULO XXV
E assim cheguei ao relato do meu jantar com Lívia. Ela saudou­me muito afavelmente, parecendo 
genuinamente encantada com a minha oferta. Durante a refeição, à qual mais ninguém esteve presente a 
não ser a velha Urgulanila e Calígula, agora com catorze anos de idade ­ um rapaz alto e pálido, com os 
olhos encovados e o rosto manchado de pústulas ­, ela surpreendeu­me com a sua agudeza de espírito e 
clareza de memória. Perguntou­me sobre o meu trabalho e, quando comecei a falar sobre a Primeira 
Guerra Púnica, depreciando certos pormenores apresentados pelo poeta Névio (que tinha servido nesta 
guerra), ela concordou com as minhas conclusões, mas apanhou­me numa citação errada. Disse:
­ Agora estás­me grato, não estás, meu neto, por não te ter deixado escrever aquela biografia de teu pai? 
Achas que estarias a jantar aqui hoje, se eu não tivesse intervido?
Cada vez que o escravo enchia a minha taça eu tinha­a despejado imediatamente e agora, à décima ou 
décima segunda dose, sentia­me que nem um leão. Respondi desafrontadamente:
­ Extremamente grato, minha Avó, por me encontrar em segurança entre os cartaginenses e os etruscos. 
Mas quereríeis explicar­me porque estou eu a jantar hoje aqui?
Ela sorriu:
­ Bom, admito que a tua presença à mesa ainda me causa uma certa dose de... Mas deixemos isso. Se 
quebrei uma das minhas regras mais antigas, isso é problema meu, não teu. Tu detestas­me, Cláudio? Sê 
franco.
­ Provavelmente tanto como vós me detestais a mim, minha Avó.
­ Seria possível que aquela fosse a minha própria voz que falava? Calígula fez um trejeito de troça, 
Urgulanila riu em silêncio e Lívia riu­se abertamente:
­ Suficientemente franco! A propósito, reparaste naquele monstro ali? Tem estado invulgarmente 
sossegado durante a refeição.
­ Quem, Avó?
­ Aquele teu sobrinho.
­ E ele é um monstro?
­ Não finjas que não sabes. Tu és um monstro, não és, Calígula?
291
­Se vós o dízeis, minha bisavó, ­ replicou Calígula, com os olhos baixos,
­Bom, Cláudio, aquele monstro ali, o teu sobrinho ­ vou falar­te dele. Vai ser o próximo Imperador.
Pensei que era uma brincadeira, Disse sorridente:
­ Se o dizeis, minha Avó, é porque assim é. Mas quais são as suas recomendações? Ele é o mais novo da 
família e, embora tenha dado provas de grande talento natural...
­ Queres dizer que nenhum deles tem qualquer hipótese contra Sejano e a tua irmã Livila?
Fiquei espantado com a liberdade da conversa.
­ Não queria dizer nada disso. Nunca me preocupo com altas políticas. Apenas queria dizer que ele ainda é 
jovem, demasiado jovem para ser Imperador e que, como profecia, me parece um tanto remota.
­ Nada disso. Tibério vai fazê­lo seu sucessor. Quanto a isso não restam dúvidas. Porquê? Porque Tibério 
é assim mesmo. Ele tem a mesma vaidade que tinha o pobre Augusto: não pode suportar a ideia de um 
sucessor que seja mais popular do que ele. Mas, ao mesmo tempo, faz tudo o que pode para se fazer odiar 
e temer. Assim, quando sentir que o seu tempo está a terminar, irá procurar alguém que seja um pouco 
pior que ele para lhe suceder. E vai encontrar Calígula. Há um feito que Calígula já realizou, que o coloca 
num nível de criminalidade superior ao que Tibério alguma vez alcançará.
­ Por favor, Bisavó... ­ suplicou Calígula.
­ Muito bem, monstro, o teu segredo estará em segurança comigo desde que te portes bem.
­ Urgulanila está ao corrente do segredo? ­ perguntei.
­ Não. Ele está apenas entre mim e o monstro.
­ Ele confessou voluntariamente?
­ Claro que não. Não é do tipo de confessar. Eu é que o descobri por acaso. Estava a revistar o quarto dele 
uma noite, para ver se estava a tentar alguma partídinha de estudante contra mim ­ se andava a fazer magia 
negra como amador, por exemplo, a destilar venenos ou alguma coisa assim. Então encontrei...
­Por favor, Bisavó.
­ Um objecto verde que me contou uma história notável. Mas depois dei­lho de volta.
Urgulanila disse com um riso irónico:
­ Trasilo diz que eu vou morrer este ano, portanto não terei o prazer de viver sob o teu reinado, Calígula, a 
menos que te despaches a matar Tibério!
Voltei­me para Lívia,
­ Ele vai fazer isso, Avó?
292
Calígula disse:
­ É seguro contar coisas ao Tio Cláudio? Ou ides envenená­lo? Ela respondeu:
­ Oh, ele é perfeitamente seguro, mesmo sem veneno. Quero que os dois se conheçam melhor. Há uma 
razão para este jantar. Ouve, Calígula. O teu tio Cláudio é um fenómeno. É tão antiquado que, como fez o 
juramento de amar e proteger os filhos do irmão, enquanto viveres, poderás sempre aproveitar­te dele, 
Escuta Cláudio. O teu sobrinho Calígula é um fenómeno. É traiçoeiro, cobarde, lascivo, vaidoso, falso e 
há­de pregar­te algumas partidas muito sujas antes de chegar ao fim. Mas lembra­te de uma coisa: ele 
nunca te há­de matar.
­ Porquê isso? ­ perguntei, esvaziando de novo a minha taça. A conversa era do tipo daquelas que se têm 
nos sonhos: louca mas interessante.
­ Porque tu és o homem que irá vingar a sua morte.
­ Eu? Quem o disse?
­ Trasilo.
­ Trasilo nunca comete erros?
­ Não. Nunca. Calígula vai ser assassinado e tu vingarás a sua morte. Fez­se de repente um silêncio 
sombrio que se estendeu até à sobremesa, quando Lívia declarou:
­ Vem, Cláudio, o resto da nossa conversa será em privado. ­ Os outros dois levantaram­se e deixaram­nos 
sós.
Eu disse:
­ A conversa pareceu­me muito estranha, minha Avó. Seria culpa minha? Terei bebido demais? O que 
quero dizer é que algumas piadas não são seguras hoje em dia. É perigoso fazer certas brincadeiras. 
Espero que os criados...
­ Ah, eles são surdos­mudos. Não, não ponhas as culpas no vinho; e, no que me diz respeito, a conversa 
foi absolutamente séria.
­ Mas... mas se o achais realmente um monstro, porque o encorajais? Porque não dais o vosso apoio a 
Nero? Ele é um indivíduo como deve ser.
­ Porque Calígula, e não Nero, é que vai ser o próximo Imperador.
­ Mas, segundo aquilo que dizeis, ele vai ser maravilhosamente mau. E vós, que devotastes toda a vossa 
vida ao serviço de Roma...
­ Sim. Mas não se pode lutar contra o Destino. E agora que Roma foi suficientemente ingrata e louca para 
permitir que o patife do meu filho me pusesse na prateleira e me insultasse... a mim, consegues imaginar 
uma coisa dessas, talvez a maior governante que o mundo alguma vez conheceu e ainda por cima, sua mãe 
­ A voz dela tornou­se esganiçada.
Eu estava ansioso por mudar de assunto. Disse­lhe:
293
­ Por favor, acalmai­vos, Avó. Como dizeis, não se pode lutar contra o Destino. Mas não há alguma coisa 
de especial que queirais dizer­me, ligada a tudo isto?
­ Sim, é por causa de Trasilo. Consulto­o com frequência. Tibério não sabe que o faço e que ele já esteve 
aqui muitas vezes. Há alguns anos atrás, disse­me o que iria acontecer entre Tibério e eu: que ele acabaria 
por se rebelar contra a minha autoridade e tomar o Império inteiramente nas suas mãos. Nessa altura não 
acreditei. Também me disse outra coisa: que, embora eu morresse como uma mulher velha e 
decepcionada, seria reconhecida como Deusa muitos anos depois da minha morte. E anteriormente ele 
tinha dito que alguém que tinha que morrer no ano que eu sei agora que é o ano em que eu tenho que 
morrer, se tornará a maior Divindade que o mundo alguma vez conheceu e que, finalmente, nenhum 
templo em Roma ou em qualquer outro lugar do Império será dedicado a outro Deus. Nem mesmo a 
Augusto.
­ Quando ides morrer?
­ Daqui a três anos, na primavera. Sei exactamente em que dia,
­ Mas estais assim tão ansiosa por vos tornardes uma Deusa? O meu tio Tibério não está nada ansioso, ao 
que parece.
­ É a única coisa em que penso, agora que o meu trabalho está terminado. E porque não? Se Augusto é um 
Deus, é absurdo para mim ser unicamente sua sacerdotisa. Eu fiz todo o trabalho, ou não fiz? Augusto 
também não tinha dentro dele a capacidade de se tornar um grande governante, tal como Tibério.
­ Sim, Avó. Mas não basta para vós saberdes o que fizestes, sem desejar ser adorada pela ralé ignorante?
­ Cláudio, deixa­me explicar. Concordo plenamente com a ralé ignorante. Não é tanto na minha fama 
sobre a terra que eu penso, mas sim na posição que vou ocupar nos Céus. Fiz muitas coisas ímpias; 
nenhum grande governante pode deixar de as fazer. Pus o bem do Império à frente de todas as 
considerações humanas. Para manter o Império livre de facções tive que cometer muitos crimes. Augusto 
fez todos os possíveis por destruir o Império com o seu ridículo favoritismo: Marcelo contra Agripa, Caio 
contra Tibério. Quem salvou Roma de uma nova Guerra Civil? Eu. A tarefa desagradável e difícil de 
afastar Marcelo e Caio caiu sobre mim. Sim, não finjas que nunca desconfiaste que eu os tivesse 
envenenado. E qual é a recompensa adequada para um governante que comete tais crimes para o bem dos 
seus súbditos? É evidente que a recompensa adequada é ser deificado. Acreditas que as almas dos 
criminosos são eternamente atormentadas?
­ Sempre me ensinaram a acreditar que sim.
­ Mas os Deuses Imortais estão livres de qualquer receio do castigo, por mais crimes que cometam?
294
­ Bom, Júpiter depôs o pai e matou um dos seus netos, casando incestuosamente com a irmã e... sim, 
concordo... Nenhum deles tem boa reputação moral. E certamente que os juízes dos Mortos Mortais não 
têm jurisdição sobre eles.
­ Exactamente. Agora vês porque é tão importante para mim tornar­me uma Deusa. E esta, se queres 
saber, é a razão porque tolero Calígula. Ele jurou que, se eu guardar o seu segredo, ele me fará uma Deusa 
logo que se tornar Imperador. E eu quero que tu jures que farás tudo o que puderes para que eu me torne 
uma Deusa o mais depressa possível, porque... não estás a ver? Até ele fazer de mim uma Deusa eu estarei 
no Inferno, sofrendo os tormentos mais horríveis, os mais extraordinários e inevitáveis tormentos.
A mudança repentina na voz dela, da fria arrogância Imperial à súplica aterrorizada, surpreendeu­me mais 
do que qualquer outra coisa que tivesse ouvido até aí. Tinha que dizer alguma coisa. Por isso, disse:
­ Não vejo qual a influência que o pobre Tio Cláudio poderá vir a ter, quer sobre o Imperador, quer sobre 
o Senado.
­ Não te preocupes com o que vês e o que não vês, idiota! Juras fazer o que te peço? Juras pela tua cabeça?
Respondi:
­ Avó, jurarei pela minha cabeça e por aquilo que ela vale, com uma condição.
­ Ousas pôr­me condições, a mim?
­ Sim, depois da vigésima taça; e é uma condição bem simples. Depois de trinta e seis anos de abandono e 
aversão, certamente não esperais que eu faça alguma coisa sem pôr condições, pois não?
Ela sorriu:
­ E qual é essa condição simples?
­ Há uma série de coisas que gostava de saber. Em primeiro lugar, quero saber quem matou o meu pai, 
quem matou Agripa, quem matou o meu irmão Germânico e quem matou meu filho Drusilo...
­ Porque queres saber tudo isso? Alguma esperança imbecil de vingares em mim essas mortes?
­ Não, nem mesmo que fôsseis vós a assassina. Nunca me vingo, a menos que seja obrigado a fazê­lo por 
algum juramento ou em auto­defesa. Acredito que o mal tem o seu próprio castigo. Tudo o que quero 
agora é apenas saber a verdade. Sou um historiador profissional e a única coisa que realmente me interessa 
é descobrir como as coisas aconteceram e porquê. Por exemplo, escrevo histórias mais para me informar a 
mim mesmo do que para informar os meus leitores,
­ Vejo que o velho Atenodoro teve uma grande influência sobre ti.
­ Ele foi bondoso para comigo e eu fiquei­lhe grato; por isso me tornei um Estóico. Nunca me misturo em 
discussões filosóficas e isso
295
nunca me atraiu; mas adoptei a maneira Estóica de olhar as coisas. Podeis confiar que não repetirei uma 
palavra do que me disserdes.
Convenci­a da veracidade das minhas palavras e, assim, durante quatro horas ou mais, fiz­lhe as perguntas 
mais minuciosas. A todas ela respondeu sem evasão e tão calmamente como se fosse o administrador de 
uma propriedade rústica a relatar acontecimentos sem importância ao proprietário que tivesse vindo de 
visita. Sim, ela tinha envenenado o meu avô, mas não envenenara o meu pai, apesar das suspeitas de 
Tibério; tinha­se efectivamente tratado de uma gangrena natural. E sim, tinha envenenado Augusto, 
espalhando veneno sobre os figos enquanto eles ainda estavam na árvore; contou­me toda a história de 
Júlia tal como a relatei e toda a história de Póstumo, cujos detalhes pude verificar; e sim, ela tinha 
envenenado Agripa e Lúcio, assim como Marcelo e Caio; e sim, tinha interceptado as minhas cartas para 
Germânico; mas não o tinha envenenado; Plancina fizera­o por iniciativa própria. Mas Lívia tinha­o, 
marcado para ser morto, tal como marcara o meu pai, e pela mesma razão.
­ Que razão era essa, Avó?
­ Ele tinha decidido restabelecer a República. Não me interpretes mal: não de uma forma que violasse o 
seu juramento de aliança com Tibério, embora isso significasse afastar­me. Ele ia fazer com que Tibério 
desse ele mesmo esse passo voluntariamente, dando­lhe todo o crédito por isso e mantendo­se na sombra. 
Quase persuadiu Tibério. Sabes como ele é cobarde. Tive que trabalhar muito, forjar muitos documentos e 
contar muitas mentiras para impedir Tibério de fazer Sejano de tolo. Este Republicanismo é uma mancha 
persistente nele. Tive mesmo que chegar a um acordo com a família. O teu avô tinha­a.
­ Eu tenho­a.
­ Ainda. É engraçado. Nero também a tem, tanto quanto sei. Não lhe vai trazer muita sorte. E não vale a 
pena discutir convosco, republicanos. Recusais­vos a ver que não é possível restabelecer um governo 
republicano nesta altura, como também não se podem impor os primitivos sentimentos de castidade nas 
esposas e maridos modernos. É como tentar fazer recuar a sombra num relógio de sol: não há maneira de o 
conseguir.
Confessou ter mandado estrangular Drusilo. Disse­me como eu tinha estado perto da morte quando escrevi 
pela primeira vez a Germânico sobre Póstumo. A única razão porque me tinha poupado era por causa da 
possibilidade de eu lhe escrever dando informações sobre o paradeiro de Póstumo. O relato mais 
interessante que me fez foi sobre os seus métodos de envenenamento. Fiz­lhe a pergunta de Póstumo ­ se 
preferia os venenos lentos ou os rápidos ­ e ela respondeu sem o mais ligeiro constrangimento que preferia 
doses repetidas de venenos lentos e sem sabor, que produziam um efeito de tuberculose, Perguntei­lhe 
como conseguia disfarçar tão bem todos os vestígios e como conseguia actuar a
296
distâncias tão grandes, pois Caio tinha sido assassinado na Ásia Menor e Lúcio em Marselha.
Recordou­me que nunca perpetrara um assassinato que pudesse ser considerado como benefício directo e 
imediato para ela. Não tinha, por exemplo, envenenado o meu avô senão algum tempo depois de se ter 
divorciado dele, como também não envenenara nenhuma das suas rivais femininas ­ Octávia, Júlia ou 
Escribónia. As suas vítimas eram, na maioria, pessoas através de cujo afastamento os filhos e netos 
ficavam mais próximos da sucessão. Urgulanila tinha sido a sua única confidente e era tão discreta, 
habilidosa e dedicada que, não só era altamente improvável que os crimes que planeavam juntas viessem 
alguma vez a ser detectados, como, mesmo que o fossem, nunca permitiriam que chegassem até ela. As 
confissões anuais feitas a Urgulanila, em preparação para o festival da Boa Deusa, tinham sido uma 
maneira útil de afastar várias pessoas que obstruíam o caminho dos seus planos. Explicou isto em detalhe. 
Acontecia por vezes que a confissão era feita não apenas por adultério, mas por incesto com um irmão ou 
um filho. Urgulanila declarava então que a única penitência possível era a morte do homem. A mulher 
suplicava. Haveria outra penitência possível? Nessa altura, Urgulanila dizia que talvez houvesse uma 
alternativa, que seria permitida pela Deusa. A mulher podia purificar­se ajudando a Deusa na sua vingança
­ com a ajuda do homem que causara a vergonha. Urgulanila contava­lhe então que uma confissão 
igualmente deplorável tinha sido feita algum tempo antes por outra mulher que, no entanto, se abstivera de 
matar o seu violador e, portanto, o desgraçado continuava vivo, embora a mulher tivesse sofrido. O 
desgraçado foi sucessivamente Agripa, Lúcio, Caio. Agripa foi acusado de incesto com a filha Marcelina ­ 
cujo suicídio inexplicável deu cor à história; Caio e Lúcio de incesto com a mãe, antes dela ser exilada ­ e 
a reputação de Júlia também emprestou cor a esta história. Em cada um dos casos, a mulher ficava 
satisfeitíssima por planear o assassinato e o homem por o executar. Urgulanila dava a sua assistência com 
aconselhamento e os venenos adequados. A segurança de Lívia residia na distância a que se encontrava o 
agente, que, se se viesse a tornar suspeito ou mesmo se fosse apanhado no acto, não poderia explicar o seu 
motivo naquele assassinato sem se incriminar ainda mais a si próprio. Perguntei­lhe se ela não tinha tido 
escrúpulos em assassinar Augusto e em assassinar ou exilar tantos dos seus descendentes. Ela disse:
­ Nunca, nem por um momento, me esqueci de quem eu era filha.
­ E isso explicava muita coisa. O pai de Lívia, um Claudiano, tinha sido proscrito por Augusto depois da 
Batalha de Filipos e tinha cometido suicídio, de preferência a cair­lhe nas mãos.
Resumindo, ela contou­me tudo o que eu queria saber, excepto no que dizia respeito às assombrações na 
casa de Germânico em Antióquia.
297
Repetiu que não tinham sido ordens suas e que nem Plancina nem Piso lhe tinham dito nada sobre o 
assunto e que eu estava em tão boa posição para esclarecer o mistério como ela própria. Vi que era inútil 
insistir mais; por isso, agradeci­lhe a paciência que tivera comigo e, finalmente, jurei pela minha cabeça 
recorrer a tudo o que estivesse no meu poder para fazer dela uma Deusa.
Quando me ia embora, entregou­me um pequeno volume e disse­me que o lesse quando estivesse em 
Cápua. Era a colecção dos versos Sibilinos rejeitados sobre os quais escrevi nas primeiras páginas desta 
história; quando cheguei à profecia chamada A Sucessão dos Cabeludos pensei que sabia porque razão 
Lívia me tinha convidado para jantar e me obrigou a fazer aquele juramento. Se é que o tinha feito. Tudo 
aquilo parecia um sonho de embriaguez.
298
CAPíTULO XXVI
Sejano escreveu uma petição a Tibério, solicitando que se lembrasse dele se pensassem procurar um 
marido para Livila; dizendo que não passava de um cavaleiro, tinha consciência disso, mas Augusto falara 
uma vez em casar a sua única filha com um cavaleiro e, pelo menos, Tibério não tinha súbdito mais leal 
que ele próprio. Não tinha ambições de ascender à posição de senador e contentava­se em continuar na 
situação actual, como sentinela vigilante da segurança do seu nobre Imperador. Acrescentava que esse 
casamento seria um golpe sério no partido de Agripina, que o reconhecia como o seu mais activo opositor. 
Eles teriam receio de oferecer violência ao filho sobrevivente de Castor e Livila ­ o jovem Tibério 
Gemelo. A morte recente do outro gémeo recaía sobre Agripina. Tibério respondeu gentilmente que não 
podia ainda dar uma resposta favorável ao pedido, apesar do seu forte sentido de obrigação para com 
Sejano. Parecia­lhe pouco provável que Livila, cujos dois maridos anteriores tinham sido homens do mais 
alto nascimento, se contentasse que ele continuasse cavaleiro; mas se ele subisse de posição e, ao mesmo 
tempo, casasse com um membro da família imperial, isto causaria grandes invejas e serviria para 
fortalecer o partido de Agripina. Disse que era precisamente para evitar essas invejas que Augusto tinha 
pensado em casar a filha com um cavaleiro, um homem reformado que não estivesse de nenhuma maneira 
envolvido com a política.
Mas concluiu com uma nota de esperança: ”Abstenho­me de te revelar por agora quais os planos que 
tenho para te aproximar de mim por afinidade. Mas sempre te digo uma coisa: que nenhuma recompensa 
que te pudesse pagar pela tua devoção seria demasiado alta e que, quando a oportunidade se apresentar, 
terei o maior prazer em fazer o que pretendo.”
Sejano conhecia demasiado bem Tibério para não compreender que o pedido tinha sido prematuro ­ ele só 
tinha escrito porque Livila insistira para que o fizesse ­ e que causara uma ofensa considerável. Decidiu 
que Tibério tinha que ser persuadido a deixar Roma imediatamente, nomeando­o Guardião da Cidade ­ um 
magistrado de cujas decisões só era possível apelar para o Imperador. Como Comandante dos Guardas, era 
também encarregado do Corpo de Ordenanças e dos correios imperiais; portanto, seria ele a encaminhar 
toda a correspondência de Tibério.
299
Tibério dependeria também dele para decidir quais as pessoas que admitiria à sua presença; e quanto 
menos pessoas ele tivesse que ver, melhor seria. Pouco a pouco, o Guardião da Cidade tornar­se­ia o 
detentor de todo o poder real e poderia agir como lhe apetecesse, sem perigo de interferência por parte do 
Imperador.
Finalmente, Tibério deixou Roma. O pretexto foi a consagração de um templo a Júpiter em Cápua e outro 
a Augusto, em Nola. Mas ele não tencionava voltar nunca mais. Sabía­se que tomara esta decisão por 
causa de uma advertência de Trasílo; e aquilo que Trasílo profetizava era aceite sem ser questionado, 
como coisa que teria que acontecer. Era ponto assente que Tibério, agora com sessenta e sete anos de 
idade ­ e um aspecto pouco agradável, magro, alquebrado, careca, entorpecido, com o rosto ulcerado 
salpicado de emplastros ­ devia morrer dentro de muito pouco tempo. Ninguém poderia ter adivinhado que 
ele estava destinado a viver mais onze anos. Isto pode ter sido porque, a partir daí, ele nunca chegou mais 
perto da cidade que os subúrbios. De qualquer forma, foi assim que aconteceu.
Tibério levou com ele para Capri: um grupo de doutos professores gregos; um destacamento de soldados 
escolhidos, incluindo a sua guarda pessoal germana; Trasilo; umas quantas criaturas pintadas de aspecto 
estranho e sexo duvidoso; e a escolha mais curiosa de todas, Cocceio Nerva. Capri é uma ilha na Baía de 
Nápoles a cerca de três milhas da costa. O seu clima é brando no Inverno e fresco no Verão. Há apenas 
um local possível para o desembarque e o resto da ilha é protegido por penhascos em declive e matas 
impenetráveis. A forma como Tibério passava ali o seu tempo livre ­ quando não estava a discutir poesia e 
mitologia com os gregos ou lei e política com Nerva ­ é uma descrição demasiado revoltante, mesmo para 
a história. Não direi mais, a não ser que ele trouxera consigo um conjunto completo dos famosos livros de 
Elefantina, a mais copiosa enciclopédia de pornografia alguma vez compilada. Em Capri, ele podia fazer o 
que não conseguia fazer em Roma ­ praticar obscenidades ao ar livre, no meio das árvores e das flores ou 
à beira de água, e fazer todo o barulho que lhe apetecia. Como alguns dos seus desportos de ar livre eram 
extremamente cruéis, sendo o sofrimento dos companheiros uma boa parte do seu prazer, era sua opinião 
que as vantagens resultantes da distância a que se encontrava Caprí eram bem superiores às desvantagens. 
Não vivia permanentemente ali: costumava sair a visitar Cápua, Baiae e Antium. Mas Capri era o seu 
quartel­general.
Passado algum tempo, deu a Sejano autoridade para afastar
os chefes do partido de Agripina pelos meios que lhe parecessem mais convenientes. Estava em contacto 
diário com Sejano e aprovava todos os seus actos em cartas ao Senado. Celebrou em Cápua um Festival 
de Ano Novo pronunciando a habitual oração de benção, como
300
Sumo Pontífice; depois, voltando­se de repente para um cavaleiro chamado Sabino, que estava perto dele, 
acusou­o de tentar seduzir a lealdade dos seus libertos. Um dos homens de Sejano puxou imediatamente 
para cima a túnica de Sabino, enrolou­lhe a cabeça nela e passou­lhe uma corda em volta do pescoço, 
arrastando­o dali para fora. Sabino gritava numa voz sufocada: ”Socorro, amigos, socorro!” Mas ninguém 
se mexeu e Sabino, cujo único crime era ter sido amigo de Germânico e que tinha sido levado por um testa 
de ferro de Sejano a exprimir em privado a sua simpatia por Agripina, foi sumariamente executado. Uma 
carta de Tibério foi lida no dia seguinte no Senado, relatando a morte de Sabino e mencionando a 
descoberta de Sejano de uma perigosa conspiração: ”Meus senhores, tende piedade de um infeliz velho 
que leva uma existência de constante apreensão, com membros da própria família a conspirarem vilmente 
contra a sua vida.” Era evidente que estas palavras visavam Agripina e Nero. Caio levantou­se e 
apresentou uma moção, no sentido de que o Imperador fosse convidado a explicar os seus receios ao 
Senado e a permitir que os mesmos fossem tranquilizados: como, sem dúvida, seria fácil que fossem. Mas 
Tibério ainda não se sentia suficientemente forte para se vingar de Caio.
No Verão daquele ano houve um encontro ocasional entre Lívia, numa liteira, e Tibério, a cavalo, na rua 
principal de Nápoles. Tibério acabava de desembarcar de Capri e Lívia regressava de uma visita a 
Herculano. Tibério tinha vontade de passar sem a saudar, mas a força do hábito obrigou­o a puxar as 
rédeas e a dirigir­lhe algumas perguntas formais sobre a sua saúde. Ela replicou:
­Ainda me sinto melhor depois do teu amável interesse, meu rapaz. E como mãe, o conselho que te dou é 
o seguinte: toma muito cuidado com o barbo que comes na tua ilha. Alguns dos que se apanham por lá são 
altamente venenosos.
­ Obrigado, Mãe, ­ disse ele. ­ Uma vez que a advertência vem da vossa parte, a partir de agora, limitar­
me­ei religiosamente ao atum e à mugem.
Lívia soltou uma risada e, voltando­se para Calígula, que estava com ela, disse em voz alta:
­ Bom, como eu dizia, o meu marido (teu bisavô, meu querido) e eu viemos a toda a pressa por esta rua 
numa noite escura há sessenta e cinco anos, creio, a caminho das docas, onde o nosso navio aguardava em 
segredo. Esperávamos a qualquer momento ser detidos e mortos pelos homens de Augusto... Como isso 
parece estranho! O meu filho mais velho (tínhamos tido só um filho até ali) ia às costas do pai. De repente, 
o que é que aquele pequeno animal havia de fazer, a não ser soltar um berro terrível: ”Oh pai, quero voltar 
para Perú­ú­ú­ú­sia.” Isso revelou a nossa presença. Dois soldados saíram de uma taberna e interpelaram­
nos. Metemo­nos num portal escuro para os deixar passar. Mas Tibério continuava
301
a berrar. ”Eu quero voltar para Perú­ú­ú­sia.” Eu disse: ”Mata­o! Mata o miúdo! É a nossa única 
esperança.” Mas o meu marido era um tolo sentimental e recusou. Foi por um verdadeiro acaso que 
escapámos.
Tibério, que parara para ouvir o final da história, enterrou as esporas na barriga do cavalo e afastou­se 
num repente furioso. Não voltaram a ver­se.
A advertência de Lívia quanto ao peixe destinava­se apenas a deixá­lo desassossegado, a fazê­lo pensar 
que ela tinha os seus pescadores ou os seus cozinheiros a soldo. Ela conhecia o apreço de Tibério pelo 
barbo e sabia portanto que ele iria ter, a partir dali, um conflito constante entre o apetite e o receio de 
envenenamento. Houve uma sequência dolorosa. Um dia, Tibério estava sentado debaixo de uma árvore 
na vertente oeste da ilha, gozando a brisa e planeando um diálogo versejado em grego entre a lebre e o 
faisão, no qual, cada um por sua vez, reclamava a proeminência gastronómica. Não era uma ideia original: 
ele próprio tinha premiado recentemente um dos poetas da sua corte com 2.000 moedas de ouro por um 
poema semelhante, no qual os rivais eram um cogumelo, uma cotovia, uma ostra e um tordo. Na sua 
introdução, tinha afastado todas estas pretensões como vãs, declarando que só a lebre e o faisão tinham 
direito a disputar a coroa de salsa ­ só a carne de ambos tinha dignidade sem ser pesada, delicadeza sem 
ser insípida.
Procurava um adjectivo desagradável para qualificar a ostra, quando ouviu um restolhar repentino vindo 
dos espinheiros que ficavam mais abaixo e um indivíduo de olhar feroz, desgrenhado, apareceu. Tinha o 
fato molhado e em farrapos, o rosto a sangrar e uma navalha aberta na mão. Avançou pelo maciço, 
gritando:
­ Toma, César; não é uma beleza?
Do saco que trazia ao ombro tirou um barbo monstruoso e atirou­o, ainda a debater­se, para cima da erva, 
aos pés de Tibério. Ele não passava de um pescador que acabava de fazer aquela pescaria notável e, ao ver 
Tibério no alto da escarpa, decidira presenteá­lo. Tinha amarrado o barco a um rochedo, nadara para o 
penhasco, subira com esforço por um caminho à beira do precipício até à cintura de espinheiros e abrira 
caminho pelo meio deles com a sua navalha.
Mas Tibério ficara quase louco de pavor. Soprou num apito e gritou em germânico:
­ Socorro, socorro! Venham imediatamente! Wolfgang! Siegfried! AdeIstn! Um assassino! Schnell!
­ Aqui vamos, altíssimo Chefe, o de mais alto nascimento, o doador,
­ replicaram de imediato os germanos. Estavam de sentinela à direita, à esquerda e atrás dele, mas não 
havia ninguém à frente, como era natural. Vieram aos saltos, brandindo as suas azagaias.
302
O homem não percebia germano e, fechando a navalha, disse alegremente:
­ Apanhei­o ao pé daquela gruta, ali adiante. Fazes ideia de quanto pesa? Uma verdadeira baleia, einh? 
Quase me arrastou para fora do barco. Tibério, relativamente tranquilizado mas com a imaginação cheia 
de peixes envenenados, gritou para os germanos:
­ Não, não o ataquem. Cortem essa coisa ao meio e esfreguem­lho na cara.
O possante Wolfgang agarrou o pescador por trás em volta da cintura, de maneira que ele não pudesse 
mexer os braços, enquanto os outros dois lhe esfregavam a cara com o peixe cru. O infeliz gritava:
­ Eh, parai com isso! Isto não é brincadeira! Que sorte eu não ter oferecido primeiro ao Imperador a outra 
coisa que tenho no saco.
­ Vede do que se trata, ­ ordenou Tibério.
Edelstein abriu o saco e encontrou nele uma enorme lagosta.
­ Esfrega­lhe a cara com isso, ­ disse Tibério. ­ Esfrega­lha bem. O desgraçado perdeu os dois olhos. 
Depois, Tibério disse:
­ já chega. Deixai­o ir!
O pescador ficou para ali aos tombos, a gritar e a delirar com a dor e não havia mais nada a fazer a não ser 
atirá­lo ao mar do penhasco mais próximo.
Alegra­me dizer que nunca fui convidado a visitar Tibério na sua ilha; tenho cuidadosamente evitado 
cuidadosamente lá voltar, embora todos os vestígios das suas práticas vis tenham sido retirados há muito e 
as suas doze villas sejam tidas como muito belas.
Tinha pedido permissão a Lívia para desposar Élia e ela dera­ma, com votos maliciosos de felicidade. Foi 
mesmo assistir ao casamento. Foi uma cerimónia esplêndida ­ Sejano encarregou­se disso ­ e um dos 
efeitos desse acto foi afastar­me de Agripina e Nero e dos seus amigos. Pensava­se que eu não conseguiria 
guardar segredos de Élia e que esta contaria a Sejano tudo o que conseguisse saber. Isto entristeceu­me 
bastante, mas compreendi que era inútil tentar tranquilizar Agripina (que estava agora de luto pela irmã 
Julila, que acabava de morrer após um exílio de vinte anos naquela maldita pequena ilha de Tremero). 
Assim, gradualmente, deixei de a visitar, para evitar constrangimentos. Eu e Élia éramos marido e mulher 
apenas de nome. Assim que entrámos no quarto nupcial, a primeira coisa que ela me disse foi:
­ Tens que compreender, Cláudio, que não quero que me toques e que, se alguma vez tivermos que voltar 
a dormir juntos na mesma cama, como esta noite, haverá uma coberta entre nós e, ao mais ligeiro 
movimento que faças, empurro­te para fora. Mais uma coisa: trata da tua vida que eu trato da minha...
Respondi:
303
­ Obrigado: tiraste­me um grande peso de cima.
Ela era uma mulher horrível. Tinha a eloquência sonora e persistente de um leiloeiro no mercado de 
escravos. Em breve, desisti de tentar ripostar. Claro que eu continuava a viver em Cápua e Élia nunca me 
foi lá visitar, mas Sejano insistia que, quando eu visitasse Roma, devia ser visto o mais possível na sua 
companhia.
Nero não tinha qualquer hipótese contra Sejano e Livila. Embora Agripina o avisasse constantemente de 
que devia pesar todas as palavras que dizia, ele era de uma natureza demasiado aberta para esconder os 
seus pensamentos. Entre os jovens nobres em quem confiava como amigos, havia vários agentes secretos 
de Sejano e estes mantinham um registo das opiniões que exprimia em todas as ocasiões públicas. Pior 
ainda, a mulher, a quem chamávamos Helena ou Heluo, era filha de Lívíla e contava a esta todas as 
confidências dele. Mas o pior de tudo era o próprio irmão, Druso, a quem fazia ainda mais confidências do 
que à mulher e que tinha ciúmes por Nero ser o filho mais velho e o favorito de Agripina. Druso foi 
procurar Sejano e disse que Nero lhe tinha pedido que navegasse secretamente com ele para a Germânia 
na primeira noite escura e que aí se colocariam sob a protecção dos regimentos, como filhos de 
Germânico, organizando depois uma marcha sobre Roma; o que ele, claro, recusara com indignação. 
Sejano disse­lhe que esperasse um pouco mais, até ser chamado a contar a história a Tibério: o momento 
certo ainda não chegara.
Entretanto, Sejano fez circular o boato de que Tibério estava prestes a acusar Nero de traição. Os amigos 
de Nero começaram a abandoná­lo. Logo que dois ou três começaram a escusar­se de participar nos seus 
jantares e a retribuir friamente as suas saudações quando o encontravam em público, os restantes 
seguiram­lhes o exemplo. Passados poucos meses, apenas lhe restavam os amigos verdadeiros. Entre eles 
estava Caio que, agora que o próprio Tibério já não visitava o Senado, se concentrava em arreliar Sejano. 
O seu método com Sejano era propor constantemente votos de agradecimento pelos seus serviços e a 
concessão de honras especiais ­ estátuas, arcos, títulos, orações e a celebração pública do seu aniversário, 
O Senado não ousava opor­se a estas moções e Sejano, não sendo Senador, não tinha voto na matéria; e 
Tibério não queria ir contra o Senado vetando o seu voto, com receio de antagonizar Sejano e de parecer 
ter perdido toda a confiança nele. Sempre que o Senado agora queria alguma coisa feita, mandava 
primeiro representantes a Sejano, pedindo permissão para se dirigirem a Tibério sobre a questão. Se 
Sejano os desencorajava, o assunto era abandonado. Um dia, Caio propôs que, tal como os descendentes 
de Torquato tinham um torque (colar antigo) de ouro e os de Cincinato um caracol de cabelo, concedidos 
pelo Senado como emblemas de família em comemoração dos serviços prestados pelos seus antepassados 
ao Estado, também Sejano e os seus descendentes
304
deviam receber como emblema uma chave de ouro, em reconhecimento dos seus fiéis serviços como 
porteiro do Imperador. O Senado votou unanimemente esta moção e Sejano, começando a ficar alarmado, 
escreveu a Tibério e queixou­se de que Caio propusera maliciosamente todas as honras anteriores, na 
esperança de fazer com que o Senado sentisse ciúmes dele; talvez mesmo para levar o Imperador a 
suspeitar de que tivesse ambições insolentes. A presente moção tinha sido ainda mais maliciosa ­ uma 
sugestão para o Imperador de que o acesso à presença imperial estava nas mãos de alguém que fizera uso 
disso para o seu enriquecimento pessoal. Pedia ao Imperador que encontrasse uma razão técnica para vetar 
o decreto e uma forma de silenciar Caio. Tibério respondeu que não podia vetar o decreto sem afectar a 
credibilidade de Sejano, mas que, em breve, tomaria medidas para silenciar Caio: Sejano não precisava 
ficar ansioso com o assunto e a sua carta mostrava verdadeira lealdade e um fino e delicado 
discernimento. Mas a sugestão de Caio produzira o seu efeito. Repentinamente, Tibério apercebeu­se de 
que, enquanto as idas e vindas em Capri fossem conhecidas de Sejano e pudessem em grande medida ser 
controladas pelo mesmo, ele próprio só saberia aquilo que Sejano se dava ao trabalho de lhe contar.
E agora cheguei a um momento crucial da minha história ­ a morte de minha avó Lívia, com a idade de 
oitenta e seis anos. Ela podia ter vivido muito mais, pois mantinha intactos a vista e o ouvido, assim como 
o uso dos membros, para não falar do seu espírito e memória. Mas, recentemente, tinha sofrido de 
resfriados repetidos por causa de uma infecção no nariz; por fim, um desses resfriados atacou­lhe os 
pulmões. Chamou­me à sua cabeceira no Palácio. Calhou eu estar em Roma e fui de imediato. Via­se que 
estava a morrer. Recordou­me novamente o meu juramento.
­ Não descansarei enquanto ele não tiver sido cumprido, Avó,
­ disse­lhe. Quando uma mulher muito velha está a morrer e ainda por cima é nossa avó, uma pessoa diz 
tudo o que pode para lhe agradar.
­ Mas eu julgava que Calígula ia tratar disso para vós!
Ela demorou algum tempo a responder. Depois disse, com uma raiva debilitada:
­ Ele esteve aqui há dez minutos! Ficou a rir­se para mim. Disse que eu podia ir para o Inferno e arder lá 
para sempre, que tanto lhe fazia. Disse que, agora que eu estava a morrer, já não precisava de mim para 
nada e que não se considerava preso a nenhum juramento, porque fora coagido a fazê­lo. Disse que ele é 
que ia ser o Deus Todo Poderoso que tinha sido profetizado, e não eu. Disse...
­ Não faz mal, Avó. Ainda haveis de vos rir dele no fim. Quando fordes a Rainha do Céu e ele estiver a ser 
lentamente desfeito na roda eterna pelos homens de Minos, no Inferno...
305
­ E pensar que te chamei tolo, ­ disse ela. ­ Agora vou partir, Cláudio. Fecha­me os olhos e põe­me na 
boca a moeda que hás­de encontrar debaixo da almofada. O Barqueiro vai reconhecê­la e mostrar­me o 
devido respeito ...
Depois, ela morreu e eu fechei­lhe os olhos, pondo­lhe a moeda na boca. Era uma moeda de ouro como eu 
nunca vira antes, com a cabeça de Augusto e a dela de frente uma para a outra na parte de cima e um carro 
triunfal no reverso.
Nada fora dito entre nós sobre Tibério. Em breve fiquei a saber que ele tinha sido prevenido quanto ao seu 
estado com tempo suficiente para lhe prestar as últimas homenagens. Mas ele escreveu ao Senado 
desculpando­se por não a ter visitado, dizendo que estivera extremamente ocupado e que, sem falta, iria a 
Roma para o funeral. Entretanto, o Senado decretara várias honras extraordinárias em sua memória, 
incluindo o título de Mãe da Pátria, e tinha mesmo proposto fazê­la semideusa. Mas Tibério reverteu 
quase todos estes decretos, explicando numa carta que Lívia era uma mulher de uma modéstia singular, 
avessa a todo o reconhecimento público dos seus serviços e com um sentimento peculiar contra qualquer 
veneração religiosa que lhe fosse prestada depois de morta. A carta terminava com reflexões sobre a 
inoportunidade das mulheres se intrometerem na política, ”para a qual não estavam preparadas e que 
suscitavam nelas todos esses piores sentimentos de arrogância e petulância para os quais o sexo feminino 
tem uma inclinação natural.”
Claro que ele não foi à Cidade para o funeral, embora, unicamente com o objectivo de limitar a sua 
magnificência, tivesse tomado todas as disposições necessárias. E levou tanto tempo a fazê­lo que o 
Corpo, velho e mirrado como estava, atingira um adiantado estado de putrefacção antes de ser colocado 
sobre a pira. Para surpresa de todos, Calígula fez a oração fúnebre, que devia ter sido feita pelo próprio 
Tibério; e se não por Tibério, então por Nero, como seu herdeiro. O Senado decretara um arco em 
memória de Lívia ­ a primeira vez na história de Roma que uma mulher recebia tal honra. Tibério deixou 
passar o decreto, mas prometeu construir o arco às suas custas: e nunca chegou a fazê­lo. Quanto ao 
testamento de Lívia, ele herdou a maior parte da fortuna, como seu herdeiro natural, mas ela deixara tudo 
o que lhe era legalmente permitido a membros da sua casa e a outros dependentes de confiança. Tibério 
não pagou a ninguém um único destes legados. Eu próprio deveria ter beneficiado da importância de 
20.000 moedas de ouro.
306
CAPíTULO XXVII
Nunca teria pensado que seria possível sentir a falta de Lívia quando ela morresse. Em criança, noite após 
noite, costumava rezar em segredo aos Deuses dos Infernos para que a levassem. E agora teria oferecido 
os mais ricos sacrifícios que pudesse encontrar ­ touros brancos sem mancha, antílopes do deserto e ibis e 
flamingos às dúzias ­ para voltar a tê­la de volta. Pois era claro que havia muito tempo que só o medo da 
mãe fizera com que Tibério se mantivesse dentro dos limites. Alguns dias após a morte dela, Tibério 
atacou Agripina e Nero. Entretanto, Agripina tinha recuperado da sua doença. Ele não os acusou de 
traição. Escreveu ao Senado queixando­se da total depravação sexual de Nero, do ”porte desdenhoso e 
língua maléfica” de Agripina, e sugeriu que fossem tomadas medidas severas para os manter a ambos na 
ordem.
Quando a carta foi lida no Senado, ninguém disse palavra durante bastante tempo. Todos perguntavam a si 
próprios até que ponto a família de Germânico podia contar com o apoio popular, agora que Tibério se 
preparava para os sacrificar; e se não seria mais seguro ir contra Tibério do que contra a populaça. 
Finalmente, um amigo de Sejano ergueu­se para sugerir que os desejos do Imperador deviam ser 
respeitados e que algum decreto devia ser passado contra as pessoas mencionadas. Havia um Senador que 
funcionava como escrivão oficial dos procedimentos do Senado e o que ele dizia tinha muito peso. Até ali, 
ele tinha votado sem questionar tudo o que era sugerido nas cartas de Tibério e Sejano afirmara que 
sempre se podia contar com ele para fazer o que lhe diziam. No entanto, foi este indivíduo que se levantou 
para se opor à moção. Disse que a questão da moral de Nero e da postura de Agripina não devia ser 
levantada naquele momento. Era sua opinião que o Imperador tinha sido mal informado e tinha escrito 
precipitadamente e que, portanto, no seu próprio interesse, assim como no de Nero e Agripina, não devia 
ser passado nenhum decreto até que lhe tivesse sido dado tempo para reconsiderar acusações tão graves 
contra os seus parentes próximos. As notícias da carta tinham­se entretanto espalhado por toda a Cidade, 
embora os procedimentos do Senado devessem ser considerados secretos até serem oficialmente 
publicados por ordem do Imperador; multidões imensas
307
reuniram­se à volta da Casa do Senado, fazendo demonstrações a favor de Agripina e Nero e gritando:
­ Viva Tibério! A carta é forjada! Viva Tibério! Isto é coisa de Sejano! Sejano enviou um mensageiro a 
toda a velocidade a Tibério, que nessa ocasião se deslocara para uma villa a poucas milhas da Cidade, para 
o caso de haver problemas. O mensageiro relatou­lhe que o Senado recusara, seguindo uma moção do 
Escrivão, tomar em conta a carta; que o povo estava à beira da revolta, chamando a Agripina a verdadeira 
Mãe da Pátria e a Nero o seu Salvador; e que, a menos que Tibério agisse com firmeza e decisão, haveria 
derramamento de sangue antes que o dia chegasse ao fim.
Tibério ficou assustado, mas aceitou o conselho de Sejano e escreveu uma carta ameaçadora ao Senado, 
pondo as culpas no Escrivão por aquele insulto sem paralelo à dignidade imperial, pedindo também que a 
questão fosse deixada inteiramente nas suas mãos, uma vez que mostravam tão pouco entusiasmo em 
defender os seus interesses. O Senado cedeu. Tibério, depois de ter feito marchar a Guarda pela Cidade, 
com as espadas desembainhadas e fazendo soar as suas trombetas, ameaçou reduzir para metade a 
distribuição gratuita de trigo se tivessem lugar novas demonstrações sediciosas. Depois, exilou Agripina 
em Pandatária, a mesma ilha onde a mãe, júlia, ficara detida no início, e Nero em Ponza, outra ilha 
minúscula e rochosa, a meio caminho entre Capri e Roma, mas longe das vistas da costa. Disse ao Senado 
que os dois prisioneiros tinham estado à beira de fugir da Cidade, na esperança de conquistarem a lealdade 
dos regimentos de Reno. Antes de Agripina ir para a sua ilha, fê­la vir à sua presença e fez­lhe perguntas 
irónicas sobre a maneira como se propunha governar o poderoso reino que acabava de herdar da mãe (a 
sua virtuosa falecida esposa) e se tencionava enviar embaixadores ao filho, Nero, no seu novo reino, de 
modo a encetar uma poderosa aliança militar com ele. Agripina não disse uma palavra. Ele irritou­se e 
berrou­lhe que respondesse e, como ela continuasse em silêncio, disse a um capitão da guarda que lhe 
desse um golpe nos ombros. Finalmente, ela falou:
­ Lama Ensopada em Sangue é o teu nome. Foi isso que Teodoro de Gadarene te chamou, segundo dizem, 
quando frequentaste as suas aulas de retórica em Rodes.
Tibério tirou a vergasta das mãos do capitão e fustigou­a no corpo e na cabeça, até a deixar insensível. 
Como consequência desta terrível tareia, ela perdeu a visão de um dos olhos.
Em breve, Druso foi também acusado de conspirar com os regimentos do Reno. Sejano apresentou cartas 
comprovativas (que disse que tinha interceptado, mas que eram realmente forjadas) e também o 
testemunho escrito de Lépida, mulher de Druso (com quem ele tivera uma ligação secreta), em como este 
lhe pedira que entrasse em contacto com os
308
marinheiros de óstia que, segundo esperava, se lembrariam de que Nero e ele eram netos de Agripa. Druso 
foi entregue pelo Senado a Tibério para que dispusesse dele e Tibério mandou­o encarcerar numa água­
furtada remota do Palácio, sob a vigilância de Sejano.
Caio foi a vítima seguinte. Tibério escreveu ao Senado que Caio tinha ciúmes de Sejano e fizera tudo o 
que podia para o levar a cair em desgraça com o seu Imperador, através de louvores irónicos e outros 
métodos cheios de malícia. Os membros do Senado ficaram tão desolados com a notícia do suicídio do 
Escrivão, que receberam no mesmo dia, que enviaram imediatamente um magistrado para prender Caio. 
Quando o magistrado chegou a casa de Caio, disseram­lhe que ele estava fora da Cidade, em Baiae. Aí, 
encaminharam­no para a villa de Tibério, onde ambos foram encontrados a jantar. Tibério brindava Caio 
com um copo de vinho e Caio respondia lealmente. Parecia haver uma tal atmosfera de bom humor e 
alegria na sala de jantar, que o magistrado ficou embaraçado e sem saber o que dizer. Tibério perguntou­
lhe porque tinha vindo.
­ Para prender um dos teus convivas, César, por ordem do Senado.
­ Que conviva? ­ perguntou Tibério.
­ Asínio Caio, ­ replicou o magistrado, ­ mas parece tratar­se de um erro.
Tibério tomou um ar grave.
­ Se o Senado tem alguma coisa contra ti, Caio, e enviaram este magistrado para te prender, receio que a 
nossa agradável sessão tenha que ser interrompida. Não posso ir contra o Senado, como sabes. Mas digo­
te o que vou fazer, agora que chegámos a um entendimento cordial: vou escrever ao Senado a pedir, como 
um favor pessoal, que não tomem qualquer atitude sobre o teu caso até receberem notícias minhas. Isso 
significa que estarás apenas detido, à guarda dos Cônsules ­ nada de algemas ou qualquer coisa 
degradante. Tratarei de garantir a tua libertação logo que possa.
Caio sentiu­se obrigado a agradecer a Tibério a sua magnanimidade, mas tinha a certeza de que havia uma 
armadilha em qualquer lado, que Tibério estava a retribuir ironia com ironia; e estava certo. Foi levado 
para Roma e posto numa sala subterrânea do Senado. Não foi autorizado a ver ninguém, nem mesmo um 
criado, ou a enviar quaisquer mensagens aos amigos ou à família. A comida era­lhe dada todos os dias 
através das grades. A sala estava escura, recebendo apenas a luz fraca que vinha através das grades e tendo 
como única mobília um colchão. Disseram­lhe que aquelas instalações eram apenas temporárias e que 
Tibério, em breve, viria resolver o seu caso. Mas os dias transformaram­se em meses, os meses em anos e 
ele continuava lá. A comida era escassa ­ cuidadosamente calculada por Tibério para o manter sempre 
com fome, mas sem o deixar morrer. Não lhe era permitido usar uma faca para a cortar, com
309
medo que a usasse para se suicidar, nem qualquer outra arma afiada ou alguma coisa com que se pudesse 
distrair, tal como material para escrever, livros ou dados. Davam­lhe muito pouca água para beber e 
nenhuma para se lavar. Se alguma vez se falava dele na presença de Tibério, o velho dizia sorrindo:
­ Ainda não fiz as pazes com Caio.
Quando soube da detenção de Caio, lamentei ter tido recentemente um desentendimento com ele. Foi 
apenas um desentendimento literário. Ele tinha escrito um livro tolo chamado: Comparação entre meu  
Pai, Asínio Pólio, e o seu Amigo Marco Túlio Cícero, como Oradores. Se a base da comparação fosse o 
carácter moral ou a habilidade política ou mesmo a sabedoria, Pólio teria facilmente saído com a melhor 
posição. Mas Caio estava a tentar provar que o pai era o orador mais polido. Isso era absurdo e eu escrevi 
um pequeno livro para dizer isso mesmo; livro esse que, surgindo pouco depois da minha crítica aos 
comentários do próprio Pólio a respeito de Cícero, aborreceu enormemente Caio. Teria de boa vontade 
impedido o meu livro de ser publicado, se com isso pudesse ter aliviado a miserável vida de prisioneiro de 
Caio, por muito pouco que fosse. Acho que foi tolice minha pensar desta forma.
Sejano conseguiu finalmente informar Tibério de que o poder do Partido Verde Claro estava destruído e 
que ele não precisava de continuar a sentir qualquer ansiedade. Tibério recompensou­o dizendo que tinha 
decidido casá­lo com a neta Helena (cujo casamento com Nero ele tinha dissolvido) e insinuando ainda 
maiores favores. Foi nesta altura que minha mãe, que, como deveis estar lembrados, era também mãe de 
Livila, interveio. Desde a morte de Castor que Livila estava a viver com ela e tinha sido suficientemente 
descuidada para a deixar descobrir que andava a manter uma correspondência secreta com Sejano. A 
minha mãe sempre fora muito poupada e, agora na velhice, o seu maior prazer era guardar os coutos das 
velas e derretê­los para fazer velas novas, vender os restos da cozinha aos criadores de porcos e misturar 
pó de carvão com um líquido qualquer, para o amassar e fazer bolas que, depois de secas, ardiam quase 
tão bem como o carvão. Livila, por outro lado, era muito extravagante e a minha mãe estava sempre a 
repreendê­la por isso. Um dia, a minha mãe calhou passar pelo quarto de Livila e viu um escravo sair de lá 
com um cesto de papéis velhos.
Onde vais, rapaz? ­ perguntou.
À fornalha, Senhora; ordens de Dona Livila. A minha mãe disse:
­ É um enorme desperdício alimentar a fornalha com bocados de papel em perfeito estado; sabes quanto 
custa o papel? Bom, três vezes o preço do pergaminho. Alguns destes papéis parece que nem foram 
escritos.
310
­ Dona Livila ordenou expressamente...
­ Dona Livila devia estar muito preocupada quando mandou destruir papel valioso. Dá­me o cesto. As 
partes não utilizadas podem ser úteis para fazer listas para a casa, além de outras coisas. Se não 
estragarmos, nada nos vai faltar.
Levou os papéis para o quarto dela e preparava­se para cortar as partes boas, quando lhe surgiu a ideia de 
tentar tirar a tinta da folha toda. Até ali, abstivera­se honrosamente de ler o que estava escrito; mas quando 
começou a esfregar a tinta, a leitura tornou­se impossível de evitar. De repente, compreendeu que se 
tratavam de rascunhos ou começos não satisfatórios de uma carta para Sejano; depois de começar a ler já 
não conseguiu parar e, antes de ter acabado, já sabia a história toda. Livila estava nitidamente zangada e 
ciumenta por Sejano ter consentido em casar com outra pessoa ­ ainda por cima, a sua própria filha! Mas 
estava a tentar esconder os seus sentimentos. ­ Cada rascunho da carta era um pouco mais contido. 
Escrevia­lhe que tinha que agir rapidamente antes que Tibério suspeitasse de que ele não tinha a intenção 
de se casar com Helena; e se ele ainda não estava preparado para assassinar Tibério e usurpar a 
monarquia, não seria melhor que ela própria envenenasse Helena?
A minha mãe mandou chamar Palas, que estava a trabalhar para mim na Biblioteca, à procura de algum 
facto histórico relacionado com os etruscos, e disse­lhe que fosse ter com Sejano e, em meu nome, como 
se tivesse sido enviado por mim, pedisse permissão para falar com Tibério em Capri, a fim de o presentear 
com a minha História de Cartago. Eu acabara recentemente esta obra e enviara uma cópia à minha mãe 
antes de o mandar publicar). Em Capri, ele devia pedir ao Imperador, uma vez mais em meu nome, que 
aceitasse que lhe dedicasse a obra. Sejano deu prontamente a sua permissão; sabia que Palas era um dos 
escravos da nossa família e não suspeitou de nada. Mas no décimo segundo volume da História a minha 
mãe tinha colado as cartas de Livila e uma carta dela a explicar, e disse a Palas que não deixasse ninguém 
mexer nos volumes (que estavam todos selados) e que os desse a Tibério com as suas próprias mãos. Ele 
devia acrescentar às minhas supostas saudações e ao meu pedido de permissão para dedicatória do livro a 
seguinte mensagem: ”Dona Antónia também vos envia as suas saudações amistosas, mas é de opinião que 
estes livros do filho não têm qualquer interesse para o Imperador, excepto o décimo segundo volume, que 
contém uma digressão muito curiosa que, está confiante, vos interessará imediatamente.”
Palas parou em Cápua para me informar para onde ia. Disse que era estritamente contra as ordens da 
minha mãe que me estava a pôr ao corrente daquela incumbência, mas, afinal, eu era o seu verdadeiro 
senhor, não a minha mãe, embora ela agisse como se ele lhe pertencesse; e que
311
ele não faria nada voluntariamente que me criasse problemas; e que tinha a certeza que eu, 
pessoalmente, não tinha qualquer intenção de oferecer a dedicatória ao Imperador. A princípio fiquei 
confuso, especialmente quando mencionou o décimo segundo volume; por isso, enquanto ele se estava a 
lavar e a mudar de roupa, quebrei o selo. Quando vi o que tinha sido inserido fiquei tão assustado que, por 
momentos, pensei em queimar tudo. Mas isso era tão perigoso como deixar que a mensagem chegasse ao 
seu destino; por isso, acabei por selar de novo o livro. A minha mãe tinha usado um duplicado do meu 
selo, que eu lhe dera para usar em questões de negócios; portanto, ninguém saberia que eu tinha aberto 
aquele volume, nem mesmo Palas. Este apressou­se a tomar o caminho de Capri e, na volta, disse­me que 
Tibério tinha pegado no décimo segundo volume e o levara para fora, indo passear para a floresta. Se 
quisesse, dissera, mas devia abster­me de usar frases extravagantes ao fazê­lo. Isto tranquilizou­me um 
pouco, mas nunca se podia confiar em Tibério quando ele se mostrava cordial. Naturalmente eu estava na 
mais profunda ansiedade quanto ao que iria acontecer e sentia uma grande amargura contra a minha mãe 
por ter posto a minha vida em tão grande risco, ao misturar­me numa discórdia entre Tibério e Sejano. 
Pensei em fugir, mas não tinha para onde.
A primeira coisa que aconteceu foi que Helena ficou inválida sabemos agora que não havia nada de errado 
com ela, mas Livila dera­lhe a escolher entre ficar de cama como se estivesse doente ou ficar de cama por 
estar doente. Foi levada de Roma para Nápoles, onde o clima era considerado mais saudável. Tibério deu 
licença para que o casamento fosse adiado indefinidamente, mas dirigia­se a Sejano como genro, como
se o casamento já tivesse tido lugar. Elevou­o à posição de
Senador e fê­lo seu colega no Consulado, além de pontífice. Mas depois fez alguma coisa que cancelou 
estes favores: convidou Calígula para Capri por alguns dias e, em seguida, enviou­o de volta armado com 
uma carta da maior importância para o Senado. Na carta, dizia que tinha examinado o jovem, que era 
agora seu herdeiro, e achado que ele era de um temperamento e carácter muito diferentes dos irmãos e que 
se recusaria a acreditar em quaisquer acusações que pudessem ser apresentadas contra a sua moral ou 
lealdade. Agora punha Calígula sob os cuidados de Élio Sejano, seu companheiro no Consulado, pedindo­
lhe que guardasse o jovem de todo o mal. Nomeava­o também pontífice e sacerdote de Augusto.
Quando a Cidade soube desta carta houve grande júbilo. Ao tornar Sejano responsável pela segurança de 
Calígula, Tibério dava a entender que estava a preveni­lo de que a sua contenda com a família de 
Germânico já tinha sido levada suficientemente longe. O Consulado de Sejano era considerado como um 
mau augúrio para ele. Era a quinta vez que Tibério exercia o cargo e todos os seus anteriores colegas 
tinham morrido em
312
circunstâncias pouco afortunadas: Varo, Gneo Piso, Germânico, Castor. Por isso, novas esperanças 
nasceram de que os problemas da nação não tardariam a ter fim: um filho de Germânico iria governá­los. 
Tibério podia talvez matar Nero, e Druso, mas era evidente que decidira salvar Calígula: Sejano não seria 
o próximo Imperador. Todas as pessoas que Tibério auscultava sobre o assunto pareciam tão 
genuinamente aliviadas com a sua escolha de um sucessor ­ de alguma forma, eles tinham­se persuadido 
de que Calígula herdara todas as virtudes do pai ­, que Tibério (que reconhecia o verdadeiro mal quando 
ele se lhe deparava e tinha dito a Calígula, francamente, que sabia que ele era uma cobra venenosa e que o 
tinha poupado por essa mesma razão) se sentia muito divertido e inteiramente satisfeito. Podia usar a 
popularidade crescente de Calígula para controlar Sejano e Livila.
Entretanto, abriu­se um pouco com Calígula e encarregou­o de uma missão: descobrir, através de 
conversas íntimas com homens da Guarda, qual dos seus capitães tinha maior influência pessoal no 
acampamento da Guarda, a seguir a Sejano. Depois, certificar­se de que ele era igualmente sanguinário e 
destemido. Calígula envergou uma cabeleira e fato de mulher e, juntando­se a duas jovens prostitutas, 
começou a frequentar as tabernas suburbanas onde os soldados bebiam à noite. Com o rosto pesadamente 
maquilhado e o corpo enchumaçado, ele passava por mulher, uma mulher alta e não muito atraente, mas 
ainda assim uma mulher. A descrição que fazia de si mesmo nas tabernas era que estava a ser mantido por 
um rico comerciante que lhe dava bastante dinheiro ­ com base no que costumava pagar rodadas de 
bebidas. Esta generosidade tornou­o muito popular. Em breve, ficou por dentro de grande parte dos 
mexericos do acampamento e o nome que surgia sempre no meio das conversas era o de um capitão 
chamado Macro. Macro era filho de um dos libertos de Tibério e, segundo a opinião geral, era o indivíduo 
mais duro de Roma. Os soldados falavam todos eles com admiração das suas festas com bebida e 
mulheres, do seu domínio sobre os outros capitães e da sua presença de espírito em situações difíceis. O 
próprio Sejano tinha medo dele, diziam; Macro era o único homem que alguma vez lhe fizera frente. 
Assim, uma noite, Calígula aproximou­se de Macro e apresentou­se secretamente: foram dar um passeio 
juntos e tiveram uma longa conversa.
Tibério começou então a escrever uma estranha série de cartas ao Senado: tão depressa dizia que estava 
num péssimo estado de saúde e quase a morrer, como anunciava que se restabelecera de repente e chegaria 
a Roma a qualquer instante. Escrevia de uma forma muito estranha sobre Sejano, misturando elogios 
extravagantes com reprimendas cheias de petulância; e a impressão geral que isto criava era que ele tinha 
ficado senil e estava a perder o juízo. Sejano ficou tão espantado com estas cartas que não conseguia 
chegar a uma decisão quanto a tentar de imediato
313
uma revolta ou manter a sua posição, que ainda era muito forte, até que Tibério morresse ou pudesse ser 
afastado do poder com base na imbecilidade. Queria visitar Capri e verificar por si mesmo como estavam 
as coisas com Tibério. Escreveu a pedir permissão para o visitar no seu aniversário, mas Tibério 
respondeu que, como Cônsul, ele devia ficar em Roma; já era suficientemente irregular ele próprio estar 
permanentemente ausente. Sejano escreveu então a informar que Helena estava gravemente doente em 
Nápoles e lhe pedira que a visitasse: não seria possível dar­lhe permissão para isso, apenas por um dia? 
Além disso, Nápoles distava de Capri apenas uma hora, em barco a remos. Tibério respondeu que Helena 
tinha os melhores médicos e devia ser paciente; e que ele próprio iria agora a Roma e desejava que Sejano 
lá estivesse para o receber. Mais ou menos pela mesma altura, anulou uma acusação contra um ex­
governador da Hispânia, que Sejano estava a acusar de extorsão, baseando­se no facto das provas serem 
contraditórias. Nunca antes ele deixara de apoiar Sejano num caso daqueles. Sejano começou a ficar 
alarmado. O seu mandato como Cônsul expirou.
No dia fixado por Tibério para a sua chegada a Roma, Sejano estava à espera, à frente de um batalhão de 
Guardas, no exterior do templo de Apolo, onde o Senado, por coincidência, estava reunido por causa das 
reparações que nessa altura estavam em curso na Casa do Senado. De repente, Macro adiantou­se e 
saudou­o. Sejano perguntou­lhe porque deixara o acampamento. Macro replicou que Tibério lhe enviara 
uma carta para entregar ao Senado.
­ Porquê vós? ­ inquiriu Sejano, desconfiado.
­ Porque não?
­ Mas porque não eu?
­ Porque a carta é sobre vós! ­ Depois, Macro sussurrou­lhe ao ouvido. ­ As minhas mais calorosas 
felicitações, General. Há uma surpresa para vós na carta. Ides ser nomeado Protector do Povo. Isso quer 
dizer que sereis o próximo Imperador.
Na realidade, Sejano não esperava que Tibério aparecesse, mas tinha ficado muito ansioso com o recente 
silêncio dele. Agora precipitou­se, exultante, para o interior do Senado.
Nessa altura, Macro mandou pôr os Guardas em sentido. Disse­lhes:
­ O Imperador acaba de me nomear vosso General no lugar de Sejano. Estas são as minhas ordens. Deveis 
regressar imediatamente ao acampamento, livres dos vossos deveres de guarda. Quando ali chegardes, 
dizei aos outros indivíduos que Macro é quem manda agora e que haverá trinta moedas de ouro para cada 
homem que saiba obedecer às ordens. Quem é o capitão mais antigo? TU? Leva os homens. Mas não 
façam muito alarde da questão.
314
Os Guardas partiram e Macro contactou o comandante dos Vigias, que já tinha sido alertado, para que 
fornecesse uma guarda para o lugar deles. Depois, entrou atrás de Sejano, entregou a carta aos Cônsules e 
saíu de imediato, antes que tivessem lido uma só palavra. Verificou se os Vigias estavam devidamente 
posicionados e depois seguiu apressadamente os Guardas que regressavam ao acampamento, para se 
certificar de que não haveria distúrbios.
Entretanto, a notícia do Protectorado de Sejano correra o Senado e todos começaram a aclamá­lo e a 
apresentar­lhe as suas felicitações. O Cônsul mais velho fez uma chamada à ordem e passou a ler a carta. 
Começava com as desculpas habituais de Tibério por não assistir à sessão ­ pressão de trabalho e falta de 
saúde ­ e continuava discutindo tópicos de interesse geral, queixando­se depois ligeiramente da pressa de 
Sejano em preparar a acusação do ex­Governador sem as necessárias provas. Aqui, Sejano sorriu, porque 
esta petulância de Tibério fora sempre até ali um prelúdio à concessão de uma nova honraria. Mas a carta 
continuava no mesmo tom de reprimenda, parágrafo a seguir a parágrafo, com uma severidade que 
crescia gradualmente e o sorriso apagou­se lentamente da cara de Sejano. Os senadores que o aclamavam 
ficaram silenciosos e perplexos e um ou dois, que estavam sentados perto dele, apresentaram uma 
desculpa qualquer e dirigiram­se para o outro lado da Casa. A carta terminava dizendo que Sejano tinha 
sido culpado de graves irregularidades, que dois dos seus amigos, o seu tio Júnio Bleso que triunfara de 
Tacfarinas, e outro, deviam, na sua opinião, ser punidos, e que o próprio Sejano devia ser detido, O 
Cônsul, que tinha sido prevenido por Macro na noite anterior do que Tibério desejava que ele fizesse, 
gritou: ”Sejano, vem aqui!”. Sejano não podia acreditar no que ouvia. Estava à espera do final da carta e 
da sua nomeação para o Protectorado. O Cônsul teve que o chamar duas vezes antes que ele 
compreendesse. Disse:
­ Eu? Estás a falar para mim?
Logo que os seus inimigos compreenderam que Sejano caíra finalmente, começaram a vaiá­lo e a assobiá­
lo bem alto; e os seus amigos e parentes, preocupados com a própria segurança, juntaram­se a eles. De 
repente, encontrou­se sem um único apoiante. O Cônsul perguntou se o conselho do imperador devia ser 
seguido. ”Sim, sim!”, gritaram todos em coro. O Comandante dos Vigias foi chamado e, quando Sejano 
viu que os seus próprios Guardas tinham desaparecido e que os Vigias tinham tomado os seus lugares, 
percebeu que estava derrotado. Foi levado para a prisão e a populaça, que soubera do que estava a 
acontecer, apinhou­se em volta dele e gritou, gemeu e bombardeou­o com porcaria. Tapou a cara com a 
túnica, mas eles ameaçaram matá­lo se não a descobrisse; quando ele obedeceu, alvejaram­no ainda mais. 
Nessa mesma tarde, o Senado, vendo que não havia Guardas por ali e que a multidão ameaçava
315
invadir a prisão para linchar Sejano, decidiram guardar o crédito para eles e condenaram­no à morte.
Calígula enviou imediatamente a Tibério a notícia com sinais de farol. Tibério tinha uma frota pronta 
preparada para o levar para o Egipto se os seus planos falhassem. Sejano foi executado e o seu corpo 
atirado pela Escada das Lamentações, onde a populaça abusou dele durante três dias. Quando chegou a 
altura de ser arrastado com um gancho atravessado na garganta até ao Tibre, o crânio tinha sido levado 
para os Banhos Públicos e usado como bola e só restava metade do tronco. As ruas de Roma estavam 
juncadas com os estilhaços dos membros partidos das suas numerosas estátuas.
Os filhos que tivera com Apicata foram condenados à morte por decreto. Havia um rapaz que já atingira a 
maioridade, outro menor, e a jovem que tinha estado noiva de meu filho Drusilo ­ ela tinha agora catorze 
anos. O rapaz menor não podia legalmente ser executado; por isso, seguindo um precedente da Guerra 
Civil, fizeram­no vestir a túnica varonil para a ocasião. A rapariga, sendo virgem, era ainda mais 
fortemente protegida pela lei. Não havia precedente de se executar uma virgem só por ser filha de quem 
era. Quando a levaram para a prisão, ela não entendeu o que estava a acontecer e gritou: ”Não me leveis 
para a prisão! Chicoteai­me se quiserdes que eu não volto a fazer o mesmo!” Ao que parecia, ela tinha 
uma qualquer maldade de rapariguinha na consciência. Macro deu ordens para que, no sentido de evitar a 
má sorte que cairia sobre a Cidade se a executassem enquanto virgem, o executor público a violasse. Logo 
que soube disto, disse para mim próprio: ”Roma, estás perdida; não pode haver expiação para um crime 
tão horrível”. Invoquei os Deuses para que testemunhassem que, embora parente do Imperador, eu não 
participara no governo do meu país e detestava o crime tanto quanto eles, embora fosse impotente para o 
vingar.
Quando Apicata soube o que tinha acontecido aos filhos e viu a multidão insultando os corpos deles na 
Escada, suicidou­se. Mas primeiro escreveu uma carta a Tibério dizendo­lhe que Castor tinha sido 
envenenado por Livila e que esta e Sejano tinham a intenção de usurpar a monarquia. Culpava Livila por 
tudo. A minha mãe não soubera do assassinato de Castor. Tibério chamou a minha mãe a Capri, 
agradeceu­lhe os seus bons serviços e mostrou­lhe a carta de Apicata. Disse­lhe que qualquer recompensa, 
dentro do razoável, estava à sua disposição. A minha mãe disse que a única recompensa que pedia era que 
o nome da família não caísse em desgraça: que a filha não fosse executada e o seu corpo atirado pela 
Escada.
­ Então, como sugeris que ela seja punida? ­ perguntou Tibério com aspereza.
­ Entrega­ma a mim, ­ disse a minha mãe. ­ Eu a punirei.
316
Assim, Livila não sofreu qualquer procedimento público. A minha mãe fechou­a num quarto ao lado do 
dela e deixou­a morrer à fome. Ouvia­lhe os gritos de desespero e as maldições, dia após dia, noite após 
noite, enquanto enfraquecia gradualmente; mas conservou­a ali, não numa cave qualquer onde não 
pudesse ouvi­la, até morrer. Fê­lo não por sentir prazer com a tortura, pois aquilo foi um sofrimento 
inenarrável para ela, mas como castigo contra si própria por ter criado uma filha tão abominável.
Seguiu­se toda uma série de execuções em resultado da morte de Sejano ­ todos os seus amigos, que não 
tinham sido suficientemente rápidos a fazer a mudança, e muitos daqueles que a tinham feito. Aqueles que 
não anteciparam a morte com o suicídio foram atirados da Rocha Tarpeia, no Monte Capitolino. Os seus 
bens foram confiscados. Tibério pagou pouco aos acusadores; estava a tornar­se económico. A conselho 
de Calígula, apresentou queixas contra os acusadores que tinham direito a benefícios mais elevados e, 
assim, conseguiu confiscar também os seus bens. Cerca de sessenta senadores, 200 cavaleiros e 1.000 ou 
mais cidadãos comuns morreram nesta altura. A minha aliança pelo casamento com a família de Sejano 
podia facilmente ter­me custado a vida, se eu não fosse filho de Antónia. Foi­me agora permitido 
divorciar­me de Élia e guardar um oitavo do seu dote. Na realidade, devolvi­lho todo. Deve ter achado que 
eu era um tolo. Mas fi­lo como compensação por ter afastado dela a nossa filha Antónia, logo que esta 
nasceu. Na verdade, Élia tinha aceitado engravidar de mim logo que sentiu que a posição de Sejano se 
estava a tornar insegura. Pensou que isto lhe traria alguma protecção se ele caísse do poder; Tibério não 
podia propriamente mandá­la executar, estando grávida do sobrinho. Aceitei com prazer o divórcio de 
Élia, mas nunca lhe teria roubado a criança se não fosse a insistência de minha mãe: ela queria Antónia 
para si, como coisa sua e para tratar como mãe ­ chama­se a isso fome de avó.
O único membro da família de Sejano que escapou foi o irmão, pela estranha razão de ter publicamente 
troçado da calvície de Tibério. No último festival anual em honra de Flora, ao qual ele calhou presidir, 
utilizou apenas homens carecas para realizar as cerimónias, que se prolongaram até à noite, e os 
espectadores foram iluminados à saída do teatro por 5.000 archotes, sustentados por crianças cujas 
cabeças tinham sido rapadas. Tibério foi informado disto na presença de Nerva por um senador que o 
visitou e, para criar boa impressão em Nerva, disse:
­ Eu perdoo­lhe. Se Júlio César não levou a mal piadas à sua calvície, porque o faria eu?
Suponho que, após a queda de Sejano, Tibério decidiu, por um capricho semelhante, renovar a sua 
magnanimidade.
317
Mas Helena foi punida, unicamente por ter fingido estar doente, através do casamento com Blando, um 
indivíduo ordinário cujo avô, um cavaleiro da província, tinha vindo para Roma como professor de 
retórica. Este foi considerado um comportamento muito baixo por parte de Tibério, porque Helena era sua 
neta e, com esta aliança, ele estava a desonrar a sua própria casa. Dizia­se que não era preciso recuar 
muito na linhagem de Blando para chegar aos escravos.
Tibério compreendia agora que os Guardas, a quem pagou um bónus de cinquenta moedas de ouro por 
cabeça (e não trinta, como Macro prometera), eram a sua única defesa certa contra o povo e o Senado. 
Disse a Calígula:
­ Não há um único homem em Roma que não gostasse de comer a minha carne.
Os Guardas, para mostrarem a sua lealdade a Tibério, queixaram­se de que tinham sido injustiçados ao 
serem preteridos a favor dos Vigias para escoltar Sejano até à prisão; como protesto, marcharam para fora 
do acampamento para saquear os subúrbios. Macro deixou­os gozar bem a noite, mas, quando o toque de 
reunir soou na madrugada do dia seguinte, os homens que não estavam de regresso ao fim de duas horas 
foram chicoteados quase até à morte.
Passado algum tempo, Tibério declarou uma amnistia. Mais ninguém podia ser julgado por ter estado 
politicamente ligado a Sejano e, se alguém quisesse pôr luto por ele, recordando os seus feitos nobres, 
agora que os maus tinham sido totalmente punidos, não seriam levantadas objecções. Bastantes homens o 
fizeram, pensando que era isso que Tibério desejava, mas estavam enganados. Em breve as suas vidas 
estavam em julgamento, sob acusações perfeitamente infundadas, sendo a mais comum o incesto. Foram 
todos executados. Poderá perguntar­se como foi que ainda sobraram senadores e cavaleiros, depois de 
toda esta mortandade: mas a resposta é que Tibério mantinha as Ordens em força através de promoções 
constantes. Nascimento livre, um registo limpo e alguns milhares de moedas de ouro eram as únicas 
qualificações necessárias para admissão na Nobre Ordem dos Cavaleiros; e havia sempre bastantes 
candidatos, embora o pagamento da iniciação fosse pesado. Tibério estava a tornar­se mais ávido que 
nunca; esperava que os homens ricos lhe deixassem pelo menos metade dos seus bens em testamento e, se 
se descobria que não o tinham feito, declarava os testamentos tecnicamente inválidos por causa de uma 
qualquer falha legal. Ele próprio chamava a si todos os bens, enquanto os herdeiros nada recebiam. 
Praticamente, não gastava dinheiro nenhum em obras públicas, nem mesmo para completar o Templo de 
Augusto, e limitava os donativos de trigo e as verbas destinadas aos divertimentos públicos. Pagava 
regularmente aos exércitos e era tudo. Quanto às províncias, já não fazia o que quer que fosse por elas, 
desde que os impostos
318
e os tributos chegassem regularmente; já nem sequer se incomodava em nomear novos governadores, 
quando os anteriores morriam. Uma delegação da Hispânia veio uma vez queixar­se de que havia quatro 
anos que estavam sem governador e que o pessoal que trabalhara com o último deles andava a pilhar a 
província de maneira vergonhosa. Tibério disse:
­ Não estais a pedir um novo governador, pois não? Mas um novo governador só traria pessoal novo e 
ficaríeis ainda pior que antes. Vou contar­vos uma história. Houve em tempos um homem gravemente 
ferido que estava estendido no campo de batalha, à espera que o médico viesse tratar­lhe da ferida, que 
estava coberta de moscas. Um camarada, que estava ligeiramente ferido, viu as moscas e ia enxotá­las. 
”Oh não,” gritou o ferido, ”não faças isso. Estas moscas agora estão quase empanturradas com o meu 
sangue e já não me magoam tanto como no início; se as enxotares, o seu lugar será imediatamente 
ocupado por outras, esfomeadas, e isso acabará comigo.”
Deixou que os partos ocupassem a Arménia, que as tribos do Transélanúbio invadissem os Balcãs e que os 
germanos fizessem incursões do outro lado do Reno, entrando em França. Confiscou os bens de uma série 
de chefes aliados e pequenos reis de França, Hispânia, Síria e Grécia, usando os pretextos mais triviais. 
Retirou a Vortones o seu tesouro ­ deveis estar recordados que Vonones era o antigo rei da Arménia, por 
causa de quem o meu irmão Germânico teve um desentendimento com Gneo Piso ­, enviando agentes que 
o ajudaram a fugir da Cilícia (onde Germânico o pusera sob guarda), mandando­o depois perseguir e 
matar.
Nesta altura, os informadores começaram a acusar os homens ricos de cobrarem mais do que o juro legal 
nos empréstimos ­ um e meio por cento era tudo o que estavam autorizados a cobrar. O estatuto que o 
regulamentava há muito que estava suspenso e, praticamente, nenhum senador estava inocente de o ter 
infringido. Mas Tibério confirmou­lhe a validade. Uma delegação foi procurá­lo e pediu que fosse 
concedido a todos o período de um ano e meio para ajustarem as suas finanças à letra da lei e Tibério, 
como grande favor, acedeu ao pedido. O resultado foi que todas as dívidas foram imediatamente 
reclamadas e isto provocou uma grande falta de liquidez. Para começar, as imensas e inúteis quantidades 
de ouro e prata que Tibério guardava no Tesouro tinham sido responsáveis pela subida das taxas de juro, o 
que gerou o pânico financeiro. Os valores da terra baixaram para zero. Tibério acabou por ser forçado a 
minorar a situação emprestando aos banqueiros 1.000.000 de moedas de ouro do dinheiro público, sem 
juros, para pagar a quem pedia empréstimos, em troca por garantias em terras. Ele nem teria feito tudo 
isto, se não fossem os conselhos de Cocceio Nerva. Por vezes, Tibério ainda consultava Nerva, que, 
vivendo em Capri, onde era cuidadosamente mantido à distância da cena dos deboches de Tibério e a 
quem eram permitidas poucas notícias
319
de Roma, era talvez o único homem no mundo que ainda acreditava na bondade de Tibério. Perante Nerva 
(foi Calígula quem mo disse, alguns anos mais tarde), Tibério explicava os seus favoritos pintados como 
pobres órfãos de quem ele se apiedara, a maior parte deles um pouco tontos da cabeça, o que justificava a 
maneira estranha como se vestiam e se comportavam. Mas seria que Nerva era realmente tão simples e tão 
curto de vista, a ponto de ter acreditado nisto?
320
CAPíTULO XXVIII
Dos últimos cinco anos do reinado de Tibério, quanto menos se falar melhor. Não suporto escrever 
detalhadamente sobre Nero, morto à fome, lentamente; ou sobre Agripina, que se alegrou com a notícia da 
queda de Sejano, mas, quando viu que isso em nada melhorava as coisas, se recusou a comer e foi 
alimentada à força durante algum tempo (depois, finalmente, deixaram­na morrer, como ela desejava); ou 
sobre Caio, que morreu de tuberculose; ou sobre Druso que, afastado por algum tempo da água­furtada do 
Palácio para uma cave escura, foi encontrado morto com a boca cheia de lã do colchão, que se pusera a 
mastigar por causa da fome. Mas, pelo menos, tenho que registar que Tibério escreveu cartas ao Senado 
regozijando­se com a morte de Agripina e de Nero ­ acusava­a agora de traição e adultério com Caio ­ e 
lamentando, no caso de Caio, que ”a pressão dos assuntos públicos tivesse feito adiar constantemente o 
seu julgamento, de forma que ele tinha morrido antes que se pudesse provar a sua culpa.” Quanto a Druso, 
escreveu que este jovem era o patife mais lascivo e traiçoeiro que alguma vez encontrara. Ordenou que 
fosse feita a leitura pública, pelo capitão da Guarda que estava encarregado dele, de todos os comentários 
traiçoeiros que Druso proferira na prisão, Nunca antes um documento tão penoso tinha sido lido na Casa. 
Era nítido, pelos comentários de Druso, que ele tinha sido espancado, torturado e insultado pelo próprio 
capitão, pelos soldados comuns e mesmo por escravos e que recebera, de forma muito cruel, cada vez 
menos alimento e bebida, migalha a migalha, gota a gota. Tibério ordenou mesmo ao capitão que lesse a 
maldição de Druso moribundo. Era uma imprecação selvática mas bem construída, acusando Tibério de 
avareza, traição, sordidez obscena, deleite na tortura, de ter assassinado Germânico e Póstumo e de toda 
uma série de outros crimes (a maior parte dos quais ele cometera, mas nenhum deles tinha sido 
publicamente mencionado antes); pedia a Deus que todo o incomensurável sofrimento e desgosto que 
Tibério causara aos outros pesasse sobre ele com uma força cada vez maior, na vigília ou no sono, noite e 
dia, enquanto vivesse, que o oprimisse na hora da sua morte e o obrigasse a eterna tortura no dia do 
Julgamento infernal. Os senadores interromperam a leitura com exclamações de pretenso horror perante a 
traição de Druso, mas estes ah’s e oh’s e gemidos
321
encobriam o seu espanto por Tibério ter voluntariamente fornecido uma tal revelação da sua própria 
maldade. Tibério sentiu muita pena de si mesmo na altura (soube­o depois por Calígula), sendo 
atormentado por insónias e receios supersticiosos; e contava realmente com a simpatia do Senado. Com as 
lágrimas nos olhos, disse a Calígula que o assassinato dos seus parentes lhe tinha sido imposto pelas 
ambições deles e pela política que herdara de Augusto (ele disse Augusto, não Lívia), de pôr a 
tranquilidade do reino acima do sentimento pessoal. Calígula, que nunca mostrara o mais leve sinal de 
desgosto pelo tratamento dispensado por Tibério à mãe e aos irmãos, compadeceu­se com o homem mais 
velho; depois, rapidamente, começou a falar­lhe de um novo tipo de vício de que ouvira falar 
recentemente a uns sírios. Uma conversa desse tipo era a única forma de alegrar Tibério, quando ele tinha 
crises de remorso. Lépida, que traíra Druso, não lhe sobreviveu muito tempo. Foi acusada de adultério 
com um escravo e, não tendo como negar a acusação (uma vez que foi encontrada na cama com ele), 
suicidou­se.
Calígula passava a maior parte do tempo em Capri, mas ocasionalmente ia a Roma por incumbência de 
Tibério, para vigiar Macro. Macro fazia agora todo o trabalho de Sejano, e com muita eficiência, mas era 
suficientemente sensato para dar a saber ao Senado que não queria que lhe votassem quaisquer honrarias e 
que qualquer senador que as propusesse em breve seria julgado pela sua vida, com base numa qualquer 
acusação de traição, incesto ou falsificação. Tibério indicara Calígula como seu sucessor por diversas 
razões. A primeira, era que a popularidade de Calígula como filho de Germânico obrigava as pessoas a 
comportar­se o melhor possível, com medo de que qualquer perturbação da sua parte fosse punida com a 
morte dele. A seguinte, era que Calígula era um excelente criado e um dos poucos que era suficientemente 
mau para fazer com que Tibério se sentisse, por comparação, um homem virtuoso. A terceira, era que ele 
não acreditava que Calígula viesse na realidade a ser Imperador. E que Trasilo, em quem confiava 
totalmente (uma vez que nenhum acontecimento jamais sucedera contrariamente às suas predições) lhe 
dissera: ­ Calígula não tem mais possibilidades de se tornar Imperador do que de atravessar a cavalo 
aquela baía, de Baiae a Puteoli.
­ Trasilo disse ainda, ­ Daqui a dez anos, Tibério César ainda será Imperador. ­ Isto era verdade, como se 
veio a verificar, mas tratava­se de outro Tibério César.
Tibério sabia muita coisa, mas algumas Trasilo não lhas revelava. Ele conhecia, por exemplo, o destino do 
neto Gemelo, que não era realmente seu neto, porque o pai não era Castor e sim Sejano. Um dia, disse a 
Calígula:
­ Vou fazer­te meu herdeiro principal. Farei Gemelo meu segundo herdeiro, caso tu morras antes dele, mas 
isto é apenas uma formalidade. Sei que tu matarás Gemelo; mas também outros te matarão a ti. ­ Disse
322
isto na esperança de sobreviver a ambos. Depois, acrescentou, citando uma qualquer tragédia grega: ­ 
Quando eu estiver morto, que o Fogo destrua a Terra,
Mas Tibério ainda não estava morto. Os informadores continuavam em actividade e todos os anos cada 
vez mais pessoas eram executadas. Praticamente, não restava nenhum senador que tivesse mantido o seu 
lugar desde os tempos de Augusto. Macro tinha muito maior apetite pelo sangue e muito menos 
escrúpulos em o derramar do que Sejano. Sejano era, de qualquer forma, filho de um cavaleiro; o pai de 
Macro nascera escravo. Entre as novas vítimas contava­se Plancina, que, agora que Lívia morrera, não 
tinha quem a protegesse. Foi acusada uma vez mais de ter envenenado Germânico; a verdade é que ela era 
uma mulher bastante rica. Tibério não permitira que a acusassem até Agripina morrer, porque, se Agripina 
tivesse sabido a novidade, isso ter­lhe­ia agradado enormemente. Não senti pena quando ouvi dizer que o 
corpo de Plancina fora atirado da Escada, embora ela tivesse antecipado a execução com o suicídio.
Um dia, num jantar com Tibério, Nerva pediu perdão a este, explicando que não sentia fome e que não 
queria qualquer alimento. Nerva tinha­se mantido de perfeita saúde e bom humor durante todo aquele 
tempo, mostrando­se aparentemente satisfeito com a sua vida protegida em Capri. A princípio, Tibério 
pensou que Nerva tivesse tomado algum purgante na noite anterior e estivesse a deixar descansar o 
estômago, mas, quando ele prolongou o jejum pelo segundo e depois pelo terceiro dia, Tibério começou a 
recear que ele tivesse decidido deixar­se morrer à fome. Sentou­se ao lado de Nerva e pediu­lhe que lhe 
dissesse porque não estava a comer. Mas Nerva não fez mais do que voltar a pedir desculpa e dizer que 
não tinha fome. Tibério pensou que talvez Nerva estivesse aborrecido com ele, por não ter seguido mais 
cedo o seu conselho para evitar a crise financeira. Perguntou:
­ Comerias com mais apetite se eu revogasse todas as leis que limitam o juro sobre os empréstimos a um 
valor que consideras demasiado baixo? Nerva disse:
­ Não, não é isso. Simplesmente não tenho fome. No dia seguinte, Tibério disse para Nerva:
­ Escrevi ao Senado. Alguém me disse que dois ou três homens ganham a vida actuando como 
informadores profissionais contra aqueles que procedem mal. Nunca me ocorreu que, ao recompensar a 
lealdade para com o Estado, estivesse a encorajar alguns homens a tentar os seus amigos ao crime e a traí­
los em seguida, mas isso parece ter acontecido em mais do que um caso. Dei instruções ao Senado para 
executar imediatamente qualquer pessoa de quem se prove que ganhou a vida com essa conduta infame. 
Talvez agora comas alguma coisa?
323
Quando Nerva lhe agradeceu e louvou a sua decisão, mas disse que continuava sem qualquer apetite, 
Tibério ficou muito deprimido.
­ Se não comeres vais morrer, Nerva, e eu o que faço? Sabes como aprecio a tua amizade e os teus 
conselhos políticos. Por favor, por favor, come, suplico­te. Se morresses, o mundo pensaria que eu era o 
culpado ou, pelo menos, que te deixaste morrer à fome por me odiares. Oh, não morras, Nerva! És o único 
amigo verdadeiro que me resta.
Nerva disse:
­ Não adianta pedires­me que coma, César. O meu estômago recusaria qualquer coisa que lhe desse. 
Certamente, ninguém poderia dizer essas coisas mal intencionadas que sugeres. Eles sabem que és um 
governante sensato e um homem bondoso e tenho a certeza que não têm razões para supor que eu seja 
ingrato, pois não? Se eu tiver que morrer, é porque tenho que morrer, mais nada. A morte é o destino 
comum de todos e, pelo menos, terei a satisfação de não te sobreviver.
Tibério não se queria deixar convencer, mas, em breve, Nerva ficou demasiado fraco para poder responder 
às suas perguntas: morreu ao nono dia.
Trasilo morreu. A sua morte foi anunciada por um lagarto. Era um lagarto muito pequeno e atravessou 
correndo a mesa de pedra onde tomava o pequeno­almoço com Tibério ao sol, indo estender­se­lhe sobre 
o indicador. Trasilo perguntou:
­ Vieste chamar­me, irmão? Estava à tua espera a esta mesma hora.
Depois, voltando­se para Tibério, disse:
­A minha vida chegou ao fim, César. Adeus! Nunca te disse nenhuma mentira. Tu disseste­me muitas. 
Mas toma cuidado, quando o teu lagarto te fizer um aviso.
Fechou os olhos e, momentos depois, estava morto.
Entretanto, Tibério escolhera para animal de estimação o bicho mais extraordinário que alguma vez se viu 
em Roma. As girafas suscitaram grande admiração quando foram vistas pela primeira vez e o mesmo 
aconteceu com o rinoceronte, mas este, embora não fosse tão grande, era muito mais fabuloso. Veio de 
uma ilha para além da índia chamada Java, e era como um lagarto escamudo com quase três metros de 
comprimento, uma cabeça feia e uma língua comprida e afiada. Quando Tibério olhou para ele, pela 
primeira vez, disse que nunca mais se mostraria céptico acerca dos monstros que se dizia terem sido 
feridos por Hércules e Teseu. Era chamado de Dragão sem Asas e Tibério alimentava­o ele próprio todos 
os dias com baratas, ratos mortos e outros animais semelhantes. Tinha um cheiro horrível, hábitos 
nojentos e temperamento agressivo. O dragão e Tibério entendiam­se perfeitamente. Ele pensava que 
Trasilo tinha querido dizer que o dragão havia de o morder um dia, por isso,
324
meteu­o numa jaula com grades suficientemente pequenas para que ele não pudesse passar a cabeça 
horrenda entre elas.
Tibério tinha agora setenta e oito anos e o uso constante da mirra e de afrodisíacos semelhantes tornara­o 
extremamente fraco; mas vestia­se com elegância e tentava comportar­se como um homem que ainda não 
tivesse passado da meia­idade. Sentia­se cansado de Capri, agora que Nerva e Trasilo tinham 
desaparecido, e, no princípio de Março do ano seguinte, determinou desafiar o Destino e visitar Roma. Fez 
a viagem por etapas e a última paragem foi numa villa na Via Ápia, de onde se avistavam os muros da 
Cidade. Mas, no dia a seguir à sua chegada, o dragão fez­lhe o aviso profetizado. Tibério foi dar­lhe de 
comer ao meio­dia e encontrou­o estendido na jaula, morto, com um enorme enxame de grandes formigas 
negras a correrem­lhe por cima do corpo, tentando arrancar­lhe pedaços de carne macia. Tomou isto como 
um sinal de que, se se aproximasse mais da Cidade, morreria como o dragão e a populaça desfazer­lhe­ia o 
corpo em pedaços. Por isso, regressou apressadamente. Apanhou um resfriado ao viajar contra o vento 
leste, que ele ainda fez piorar assistindo a uns jogos exibidos pelos soldados de guarnição de uma cidade 
que atravessou. Um javali selvagem foi solto na arena e Tibério convidado a atirar­lhe uma lança do seu 
camarote. Atirou uma e falhou; ficou irritado consigo próprio por ter falhado e pediu outra. Sempre se 
orgulhara da sua habilidade no lançamento de dardos e não queria que os soldados pensassem que a idade 
o derrotara. Por isso levantou­se, excitado, lançando dardo a seguir a dardo, tentando acertar no javali a 
uma distância impossível e, finalmente, teve que parar, exausto. O javali estava incólume e Tibério 
ordenou que o libertassem, como recompensa pela sua destreza em evitar os ataques.
O resfriado tomou­lhe conta do fígado, mas ele continuou a viagem de regresso a Capri. Chegou a 
Míseno, que fica no extremo mais próximo da baía de Nápoles. A frota ocidental tem aqui o seu quartel­
general. Tibério estava arreliado por encontrar o mar tão bravio, que não lhe permitia atravessar. No 
entanto, tinha uma villa esplêndida no promontório de Míseno ­ ela pertencera em tempos ao famoso 
epicurista Iticulo. Instalou­se lá com o seu séquito. Calígula tinha­o acompanhado, tal como Macro; e, 
para mostrar que não havia nada de errado com ele, Tibério deu um grande banquete para todos os 
funcionários locais. A festa ja estava a decorrer havia algum tempo, quando o médico particular de Tibério 
pediu permissão para deixar a mesa e ir tratar de uns assuntos profissionais: certas ervas, como sabeis, têm 
maior virtude quando apanhadas à meia­noite ou quando a lua está em determinada posição. Tibério 
estava acostumado a que o médico se levantasse durante a refeição para atender a questões desse tipo. 
Pegou na mão de Tibério para a beijar, mas segurou­a mais tempo que o necessário. Tibério pensou, e com 
razão,
325
que o médico estava a tomar­lhe o pulso para ver como estava fraco; por isso, mandou­o sentar de novo 
como castigo e fez com que o banquete durasse toda a noite, para provar que não estava doente. No dia 
seguinte, Tibério estava num estado de prostração e a notícia de que ele estava a morrer correu Míseno, 
espalhando­se dali até Roma.
Ora, Tibério tinha ordenado a Macro que fossem encontradas provas de traição contra certos senadores 
proeminentes de quem ele não gostava e dera­lhe ordens para garantir a condenação dos mesmos, fosse 
por que meios fosse. Macro anotou­os como cúmplices numa acusação que estava a preparar contra uma 
mulher de quem tinha uma queixa, esposa de um antigo agente de Sejano: essa mulher tinha repelido os 
seus avanços. Todos foram acusados de adultério com ela e de usarem o nome de Tibério em vão. 
Intimidando libertos e torturando escravos, Macro conseguiu a prova necessária ­ libertos e escravos já 
tinham entretanto perdido a tradição de fidelidade para com os seus senhores. O julgamento começou. 
Mas os amigos do acusado notaram que, embora o próprio Macro tivesse conduzido o exame das 
testemunhas e a tortura dos escravos, a habitual carta Imperial aprovando os seus actos não estava em 
cima da mesa; portanto, concluíram que talvez Macro tivesse juntado um ou dois inimigos pessoais à lista 
que lhe fora dada por Tibério. A vítima principal destas acusações obviamente absurdas foi Arrúncio, o 
membro mais antigo e mais digno do senado. Augusto, um ano antes de morrer, dissera que ele era a única 
escolha possível para Imperador, na falta de Tibério; Tibério já uma vez tinha tentado acusá­lo de traição, 
mas sem êxito. O velho Arrúncio era o único elo de ligação que ainda restava com a era de Augusto. Na 
ocasião anterior, o sentimento contra os seus acusadores tinha sido tão forte, embora se acreditasse que 
eles estavam a agir instigados por Tibério, que foram eles próprios julgados, acusados de perjúrio e 
condenados à morte. Sabia­se agora que Macro tivera recentemente uma disputa com Arrúncio por causa 
de dinheiro; por isso, o julgamento foi adiado até que Tibério tivesse confirmado a incumbência de Macro. 
Tibério descuidou­se a responder à consulta do Senado e, assim, Arrúncio permaneceu na prisão durante 
algum tempo. Finalmente, Tibério enviou a confirmação necessária e foi fixado o dia para o novo 
julgamento. Arrúncio tinha decidido matar­se antes que se desse o julgamento, para que os seus bens não 
fossem confiscados e os seus filhos não ficassem na miséria. Estava a despedir­se de alguns velhos 
amigos, quando chegou a notícia do grave estado de saúde de Tibério. Os amigos pediram­lhe que adiasse 
o suicídio até ao último momento, porque, se a notícia fosse verdadeira, ele tinha boas hipóteses de 
sobreviver a Tibério e de ser perdoado pelo seu sucessor. Arrúncio disse:
­ Não, eu já vivi tempo demais. A minha vida já foi bastante difícil quando Tibério partilhava o poder com 
Lívia. Tornou­se quase intolerável
326
quando ele o partilhava com Sejano. Mas Macro mostrou ser um vilão ainda pior do que o próprio Sejano 
e, ouvi o que vos digo, Calígula, com a sua educação de Capri, será um Imperador ainda pior que Tibério. 
Não posso, com a minha avançada idade, tornar­me escravo de um novo senhor como ele.
Pegou num canivete e cortou uma artéria no pulso. Todos ficaram muito chocados, porque Calígula era 
um herói popular, e esperava­se que se tornasse num segundo Augusto, ainda melhor que o primeiro. 
Ninguém pensava em culpá­lo pela sua pretensa lealdade a Tibério; pelo contrário, era muito admirado 
pela sua esperteza em sobreviver aos irmãos e por esconder tão bem aquilo que julgavam serem os seus 
verdadeiros sentimentos.
Entretanto, o pulso de Tibério quase parou e ele entrou em coma. O médico disse a Macro que dois dias 
mais, externamente, era tudo o que ele tinha para viver. Portanto, toda a corte ficou em grande alvoroço. 
Macro e Calígula estavam de perfeito acordo. De uma maneira geral, Calígula respeitava a popularidade 
de Macro junto dos Guardas e Macro respeitava a popularidade de Calígula junto da nação: contavam com 
o apoio um do outro. Além disso, Macro estava em dívida para com Calígula pela sua subida ao poder e 
Calígula estava a ter um caso com a mulher de Macro, que este tinha sido suficientemente generoso para 
ignorar. Tibério já comentara amargamente a maneira como Macro adulava Calígula, dizendo:
­ Fazes bem em abandonar o sol poente pelo nascente.
Macro e Calígula começaram a enviar mensagens para os comandantes de diferentes regimentos e 
exércitos, dizendo­lhes que o Imperador se estava a afundar rapidamente e nomeara Calígula seu sucessor: 
tinha­lhe dado o seu anel de sinete. Era verdade que Tibério, num intervalo de lucidez, tinha chamado 
Calígula e tirado o anel do dedo. Mas tinha mudado de opinião e voltara a pô­lo, enclavinhando as mãos 
uma na outra, como que para impedir que lho tirassem. Quando mergulhou de novo na inconsciência, não 
dando mais sinais de vida, Calígula tirara­lhe suavemente o anel e andava agora a pavonear­se, 
ostentando­o na cara de quem quer que encontrava e aceitando felicitações e homenagens.
Mas, mesmo agora, Tibério ainda não estava morto. Gemeu, mexeu­se, sentou­se e chamou os criados. 
Estava fraco por causa do jejum prolongado, mas, quanto ao resto, estava lúcido. Era uma partida que já 
pregara antes, fazer­se de morto e depois voltar à vida. Chamou uma vez mais. Ninguém o ouviu. Os 
criados estavam todos na adega, a beber à saúde de Calígula. Mas não tardou que um escravo mais 
empreendedor aparecesse, para ver o que podia roubar no quarto do morto na ausência dos outros. O 
quarto estava escuro e Tibério quase o matou de susto, ao gritar de repente:
327
­ Onde diabo estão os criados? Não me ouviram chamar? Quero pão e queijo, uma omeleta, duas 
costeletas de vaca e vinho de Chian... imediatamente! E mil Fúrias! Quem roubou o meu anel?
O escravo precipitou­se para fora do quarto e quase chocou com Macro, que ia a passar.
­ O Imperador está vivo, senhor, e pede comida e o anel.
A notícia correu o Palácio e seguiu­se uma cena cómica. A multidão que rodeava Calígula dispersou em 
todas as direcções. Ouvíram­se gritos.
­ Graças a Deus, a notícia era falsa. Viva Tibério!
Calígula estava num estado desgraçado de vergonha e terror. Arrancou anel do dedo e olhou em volta, à 
procura de um sítio para o esconder. Apenas Macro manteve a calma.
­ É uma mentira sem sentido, ­ gritou. ­ O escravo deve ter perdido o juízo. Manda­o crucificar, César! 
Deixámos o velho Imperador morto, uma hora atrás. ­ Sussurrou qualquer coisa a Calígula, que foi visto a 
acenar com a cabeça num gesto de alívio e gratidão. Depois, acorreu ao quarto de Tibério. Este estava de 
pé, praguejando, gemendo e cambaleando debilmente em direcção à porta. Macro tomou­o nos braços, 
atirou­o de novo para a cama e sufocou­o com uma almofada. Calígula estava ao lado dele.
Assim, os que tinham estado presos com Arrúncio foram soltos, embora a maior parte deles desejassem 
mais tarde ter seguido o exemplo deste. Havia, além disso, cerca de cinquenta homens e mulheres que 
tinham sido acusados de traição, separadamente destes. Não tinham qualquer influência no Senado, sendo 
na sua maioria comerciantes que não tinham pago o dinheiro de protecção que os capitães de Macro agora 
impunham a todos os tutelados da Cidade. Foram julgados e condenados e deviam ser executados no dia 
16 de Março. Este foi precisamente o dia em que chegou a notícia da morte de Tibério e eles e os seus 
amigos quase enlouqueceram de alegria, pensando que agora seriam salvos. Mas Calígula estava ausente 
em Míseno e ­não foi possível apelar para ele a tempo e o director da prisão teve medo de perder o lugar 
se tomasse a responsabilidade de adiar as execuções. Assim, foram mortos, e os seus corpos lançados nas 
escadas da maneira habitual.
Este foi o sinal para um surto de ira popular contra Tibério. ”Ele pica como uma vespa morta”, gritou 
alguém. Multidões juntaram­se às esquinas das ruas em solenes cerimónias de denúncia, vigiadas por 
chefes da guarda, suplicando à Terra Mãe e ao Juízes dos Mortos que não dessem sossego ou paz ao 
cadáver e ao fantasma daquele monstro até ao dia da dissolução universal. O corpo de Tibério foi levado 
para Roma sob uma forte escolta de Guardas. Calígula caminhava na procissão para carpir o morto e toda 
a gente da região veio em bando ao seu encontro, não para carpir Tibério, mas vestidos de festa, chorando 
de gratidão por os céus
328
terem preservado um filho de Germânico para os governar. Velhas mulheres do campo gritavam:
­ Oh, doce e querido Calígula! Nosso pintainho! Nosso menino! A nossa estrela!
A poucas milhas de Roma, ele adiantou­se para ir fazer os preparativos para a entrada solene do corpo na 
Cidade. Mas, depois de passar, juntou­se uma grande multidão que barricou a Via Ápia com tábuas e 
blocos de pedra. Quando os batedores da escolta apareceram, ouviram­se vaias, gemidos e gritos: ”Para o 
Tibre, Tibério para o Tibre!”; ”Atirai­o pelas Escadas!”; ”Condenação Eterna para Tibério!”. O chefe 
gritou: ”Soldados, nós romanos não permitiremos que esse corpo maléfico entre na Cidade. Ele vai trazer­
nos má sorte. Levai­o de volta para Ateia e semi­queimai­o no anfiteatro!”. Semi­queimar, devo explicar, 
era o destino habitual dos miseráveis e dos infelizes e Ateia era uma cidade famosa por uma espécie de 
rude mascarada ou farsa campesina que costumava ser representada ali todos os anos, durante o festival 
das colheitas, desde os tempos mais antigos. Tibério tinha uma villa em Ateia e costumava assistir ao 
festival quase todos os anos. Tinha convertido a inocente brejeirice rural da mascarada em sofisticada 
baixeza. Fez os homens de Ateia construir um anfiteatro para apresentar o novo espectáculo, produzido 
por ele próprio. Macro ordenou aos seus homens que investissem contra a barricada e vários cidadãos 
foram mortos e feridos; três ou quatro soldados caíram inconscientes depois de terem sido agredidos com 
pedras da calçada. Calígula impediu a continuação da desordem e o corpo de Tibério foi devidamente 
queimado nos Campos de Marte. Calígula fez a oração fúnebre. Foi muito formal, irónica e muito 
apreciada, porque havia nela muita coisa acerca de Augusto e Germânico, mas muito pouco sobre Tibério.
Num banquete nessa noite, Calígula contou uma história que fez todos chorar e que lhe permitiu 
conquistar grande crédito. Ele disse que uma vez de manhã cedo, em Míseno, estando como de costume 
sem conseguir dormir com o desgosto pelo destino da mãe e dos irmãos, tinha decidido, acontecesse o que 
acontecesse, vingar­se finalmente do seu assassino. Agarrou num punhal que tinha pertencido ao pai e 
entrou destemidamente no quarto de Tibério. O Imperador jazia, gemendo e revolvendo­se na cama, no 
meio de um pesadelo. Calígula ergueu lentamente o punhal para atacar, mas uma Voz Divina soou­lhe 
aos ouvidos:
­ Bisneto, detém o teu gesto! Matá­lo, seria ímpio. Calígula respondeu:
­ Oh, Deus Augusto, ele matou a minha mãe e os meus irmãos, teus descendentes. Será que não devo 
vingá­los, mesmo à custa de ser desprezado por todos os homens como um parricida?
Augusto retorquiu:
329
­ Filho magnânimo, que hás­de tornar­te Imperador, não há necessidade de fazer o que pensaste fazer. Por 
minha ordem, as Fúrias vingam todas as noites os teus entes queridos enquanto ele sonha.
Assim, ele tinha pousado o punhal em cima da mesa ao lado da cama e tinha saído. Calígula não explicou 
o que tinha acontecido na manhã seguinte, quando Tibério acordou e viu o punhal em cima da mesa; 
supunha­se que Tibério não ousara mencionar o incidente.
330
CAPíTULO XXIX
Calígula tinha vinte e cinco anos quando se tornou Imperador. Raramente, se é que alguma vez, na história 
do mundo um príncipe foi mais entusiasticamente aclamado na sua tomada de posse ou teve diante dele 
uma tarefa mais fácil em satisfazer os modestos desejos do seu povo, que eram apenas de paz e segurança. 
Com um tesouro a abarrotar, exércitos bem treinados, um excelente sistema administrativo, que precisava 
apenas um pouco de cuidado para entrar de novo em perfeita ordem ­ pois, apesar da negligência de 
Tibério, o Império continuava a singrar bastante bem, sob o ímpeto que lhe fora dado por Lívia ­, com 
todas estas vantagens, acrescidas do legado de amor e confiança de que gozava como filho de Germânico, 
e com o imenso alívio resultante do afastamento de Tibério, que esplêndida oportunidade ele teve de ser 
lembrado na história como Calígula o Bom, ou Calígula o Sábio ou Calígula o Salvador! Mas é perda de 
tempo escrever desta forma. Porque, se ele fosse o tipo de homem por quem as pessoas o tomavam, nunca 
teria sobrevivido aos irmãos ou sido escolhido por Tibério como seu sucessor. Cláudio, lembra­te do 
desprezo que o velho Atenodoro sentia por essas contingências impossíveis. Ele costumava dizer: ”Se o 
cavalo de Madeira de Tróia tivesse tido crias, hoje em dia, os cavalos custariam menos a alimentar.”
A princípio, Calígula divertia­se a encorajar a concepção absurdamente errada que todos, à excepção de 
mim, da minha mãe, de Macro e de mais uma ou duas pessoas, tinham do seu carácter e mesmo a realizar 
uma série de actos a condizer. Queria também certificar­se da sua posição. Havia dois obstáculos para a 
sua completa liberdade de acção. Um era Macro, cujo poder o tornava perigoso. O outro era Gemelo. 
Quando o testamento de Tibério foi lido (o que, para manter o secretismo, ele fez testemunhar por alguns 
libertos e pescadores analfabetos), descobriu­se que o velho, apenas para criar problemas, não designara 
Calígula como seu primeiro herdeiro, com Gemelo como segunda escolha em caso de acidente: fizera­os 
co­herdeiros, para governarem em anos alternados. No entanto, Gemelo ainda não atingira a idade e, por 
isso, não podia sequer entrar no Senado, enquanto Calígula já era um magistrado de segunda categoria 
alguns anos antes de ter idade para isso, sendo também pontífice. O Senado estava portanto absolutamente 
preparado para aceitar
331
o ponto de vista de Calígula de que Tibério não estava no seu juízo perfeito quando fez o testamento e, 
sem objecções, deu todo o poder a Calígula. A não ser nesta questão de Gemelo, cuja parte na Bolsa 
Privada ele também reteve, baseando­se no facto da Bolsa Privada ser parte integrante da soberania, 
Calígula respeitou todas as cláusulas do testamento e pagou prontamente todos os legados.
Os Guardas deviam receber um prêmio de cinquenta moedas de ouro cada; Calígula, para garantir a sua 
lealdade quando chegasse a altura do afastamento de Macro, dobrou essa quantia. Pagou ao povo de Roma 
as
450.000 moedas de ouro que lhes foram deixadas e acrescentou três moedas por cabeça; disse que 
tencionava dar­lhes aquela importância quando atingisse a maioridade, mas o velho Imperador tinha­o 
proibido. Aos exércitos, foi concedido o mesmo bónus que no testamento de Augusto, mas desta vez ele 
foi pago prontamente. Mais ainda, pagou todas as importâncias que estavam em dívida segundo o 
testamento de Lívia e que os legatários há muito tinham riscado como dívidas incobráveis. Para mim, as 
duas cláusulas mais importantes do testamento de Tibério eram: a doação específica à minha pessoa dos 
livros históricos que Pólio me deixara, mas que me tinham sido subtraídos, juntamente com uma série de 
outros volumes valiosos, e a soma de 20.000 moedas de ouro; e uma doação à Chefe das Vestais, neta de 
Vipsânia, de 100.000 moedas de ouro para ela gastar como lhe parecesse, com ela própria ou com o 
Colégio. A Chefe das Vestais, na qualidade de neta do assassinado Caio, derreteu as moedas e fez com 
elas uma urna para as cinzas dele.
Com estes legados de Lívia e Tibério, eu estava agora em boa situação financeira. Calígula espantou­me 
ao tomar ainda a iniciativa de me reembolsar das 50.000 moedas que eu arranjara para Germânico na 
altura do motim: ele tinha sabido da história pela mãe. Não me permitiu que recusasse e disse que, se 
continuasse a protestar, insistiria em me pagar também o juro acumulado: era uma dívida que ele tinha 
para com a memória do pai. Quando falei a Calpúrnia da minha nova riqueza, ela pareceu mais 
descontente do que satisfeita.
­ Não te vai trazer sorte alguma, ­ disse. ­ Mais vale estar modestamente desafogado, como tem sido o teu 
caso, do que correr o risco de ver a fortuna ser­te arrancada por informadores sob acusação de traição.
­ Calpúrnia era a sucessora de Actê, como deveis estar lembrados. Era muito perspicaz para a idade ­ tinha 
dezassete anos.
Eu disse:
­ De que estás a falar, Calpúrnia? Informadores? Agora não há disso em Roma nem julgamentos por 
traição.
Ela ripostou:
­ Não ouvi dizer que os informadores tenham sido despachados no mesmo barco que os Spintrianos. ­ (Os 
órfãos pintados de Tibério
332
tinham sido exilados por Calígula. Como um gesto público de pureza de sentimentos, tinha enviado todo 
o bando para a Sardenha, uma ilha muito insalubre, e dissera­lhes que trabalhassem honestamente para 
ganhar a vida como construtores de estradas. Alguns deles, limitaram­se a deitar­se e a morrer quando lhes 
meteram nas mãos as picaretas e as pás, mas os restantes foram chicoteados até começarem a trabalhar, 
mesmo os mais amaneirados. Em breve, tiveram um golpe de sorte. Um navio pirata fez uma incursão 
repentina, capturou­os e levou­os para Tiro, onde foram vendidos como escravos a ricos libertinos de 
leste).
­Mas eles não ousariam repetir as suas velhas artimanhas, Calpúrnia! Ela pousou o bordado.
­ Cláudio, eu não sou política nem intelectual, mas posso pelo menos usar o meu espírito de prostituta e 
fazer umas contas simples. Quanto dinheiro deixou o Imperador?
­ Cerca de vinte e sete milhões de moedas de ouro.
­ E quanto é que o novo Imperador pagou em legados e prêmios?
­ Cerca de três milhões e meio. Sim, pelo menos, isso.
­ E, desde que ele é Imperador, quantas panteras, ursos, leões, tigres, touros selvagens e coisas assim já 
foram importadas, para os caçadores matarem nos anfiteatros e no Circo?
­ Cerca de vinte mil, talvez. Provavelmente mais.
­ E quantos outros animais foram sacrificados nos templos?
­ Não sei. Creio que uns cem a duzentos mil.
­ Esses flamingos, antílopes do deserto, zebras e castores britânicos devem ter­lhe custado bom dinheiro! 
Portanto, com a compra de todos esses animais, o pagamento aos caçadores nos anfiteatros... e depois os 
gladiadores, claro, que recebem quatro vezes o que recebiam no tempo de Augusto, segundo me dizem; 
sem esquecer todos os banquetes do Estado, os carros decorados e os espectáculos de teatro. Dizem que, 
quando ele chamou os actores que o velho Imperador tinha expulso, lhes pagou por todos os anos que eles 
tinham ficado sem trabalho; nada mau, einh? E, pelos deuses, o dinheiro que ele gastou em corridas de 
cavalos! Bom, com tudo isto, não lhe deve restar grande coisa dos vinte milhões, pois não?
­ Acho que tens razão, Calpúrnia.
­ Bom, sete milhões em três meses! Como é que o dinheiro vai durar a um ritmo destes, mesmo que todos 
os homens ricos que morrerem lhe deixem todo o seu dinheiro? O rendimento Imperial é inferior agora ao 
que costumava ser quando a tua velha avó dirigia e verificava as contas.
­ Talvez ele se torne mais económico, depois da primeira excitação de ter dinheiro para gastar. Ele tem 
uma boa desculpa para gastar. Diz que a estagnação do dinheiro no Tesouro, no tempo de Tibério, teve um
333
efeito totalmente desastroso no comércio. Quer pôr novamente alguns milhões em circulação.
­ Tu conhece­lo melhor do que eu. Talvez ele saiba quando deve parar. Mas, se continuar com este ritmo, dentro de 
dois anos não lhe restará um tostão e, nessa altura, quem irá pagar? É por isso que falo de informadores e 
julgamentos por traição.
Eu disse:
­ Calpúrnia, Calpúrnia... vou comprar­te um colar de pérolas enquanto ainda tenho dinheiro. Tu és tão inteligente 
como bonita. Só espero que sejas igualmente discreta.
­ Preferia dinheiro, ­ disse ela. ­ Se não te importares.
Dei­lhe quinhentas moedas de ouro no dia seguinte. Calpúrnia, uma prostituta e filha de prostituta, era mais 
inteligente, leal, bondosa e honesta do que qualquer das quatro mulheres nobres com quem casei. Em breve, comecei 
a confiar­lhe os meus assuntos privados e posso dizer que nem uma só vez me arrependi de o fazer.
No momento em que o funeral de Tibério terminou, Calígula tinha embarcado, apesar do mau tempo, para as ilhas 
onde a mãe e o irmão Nero estavam enterrados; juntou­lhes os restos, meio queimados, e trouxe­os de volta; 
queimou­os como deve ser e enterrou­os piedosamente no túmulo de Augusto. Instituiu um novo festival anual, com 
lutas de gladiadores e corridas de cavalos, em memória da mãe, e sacrifícios anuais ao seu espírito e ao dos irmãos. 
Chamou ao mês de Setembro Germânico, pois o anterior tinha sido dedicado a Augusto. Também cumulou a minha 
mãe por meio de um único decreto, com tantas honras como as que Lívia recebera em toda a sua vida, nomeando­a 
Suprema Sacerdotisa de Augusto.
Em seguida, proclamou uma amnistia geral, chamando de volta todos os homens e mulheres exilados e soltando 
todos os prisioneiros políticos. Reuniu mesmo um grande número de registos criminais que cobriam os casos da mãe 
e dos irmãos e queimou­os publicamente na Praça do Mercado, jurando que não os lera e que qualquer um que 
tivesse agido como informador ou contribuído de alguma forma para o destino deplorável dos seus entes queridos, 
não precisaria ter medo: todos os registos desses dias maléficos tinham sido destruídos. Na realidade, aquilo que ele 
queimou eram apenas cópias: os originais guardou­os. Seguiu o exemplo de Augusto, fazendo um escrutínio 
cuidadoso das Ordens e rejeitando todos os membros indignos de qualquer delas, e o exemplo de Tibério, ao recusar 
todos os títulos honoríficos excepto os de Imperador e Protector do Povo, proibindo igualmente que lhe erigissem 
estátuas. Perguntei a mim mesmo quanto tempo iria durar aquele estado de espírito e por quanto tempo iria manter a 
promessa que fizera ao Senado, na ocasião em que lhe tinham votado o poder Imperial, de o partilhar com eles e ser 
seu fiel servidor.
334
Passados seis meses da sua monarquia, em Setembro, os Cônsules em exercício terminaram o seu 
mandato e ele assumiu por algum tempo o cargo. E quem supõem que escolheu como colega? Escolheu­
me a mim! E eu, que vinte e três anos antes pedira a Tibério que me dessem títulos reais e não títulos 
vazios, teria agora de boa vontade abdicado do meu cargo a favor de qualquer outro. Não era que eu 
quisesse voltar para a minha escrita (na verdade, acabava de completar e rever a minha história etrusca e 
não tinha começado qualquer trabalho novo), mas tinha esquecido completamente todas as regras de 
procedimento e as fórmulas e precedentes legais que em tempos estudara tão cuidadosamente, sentindo­
me absolutamente constrangido no Senado. Além disso, por ter passado tão pouco tempo em Roma, não 
sabia de todo como puxar os cordelinhos e conseguir com que as coisas andassem depressa, 
desconhecendo quem eram os homens que realmente detinham o poder. Arranjei quase de imediato 
grandes problemas com Calígula. Ele confiou­me a tarefa de mandar fazer estátuas de Nero e Druso que 
deviam ser colocadas e consagradas na Praça do Mercado; a firma grega a quem as encomendei prometeu 
fielmente tê­las prontas no dia fixado para a cerimónia, em princípios de Dezembro. Três dias antes, fui 
ver como estavam as estátuas. Os patifes não as tinham sequer começado. Apresentaram uma desculpa 
qualquer sobre o mármore com a cor certa, que só agora tinham conseguido. Eu fiquei furioso (como me 
acontece frequentemente em ocasiões como esta, mas a minha irritação não dura muito) e disse­lhes que, 
se não pusessem homens a trabalhar nas pedras dia e noite, eu mandaria que a firma inteira ­ proprietário, 
encarregados e operários ­ fossem expulsos da Cidade. Talvez os tenha deixado nervosos, porque, embora 
a estátua de Nero tivesse ficado pronta na tarde que antecedeu a cerimónia
­ e ficou um bom trabalho ­, um escultor mais descuidado acabou por partir a mão de Druso à altura do 
pulso. Há formas de reparar um acidente deste tipo, mas vê­se sempre o sítio da emenda, e eu não podia 
apresentar a Calígula uma peça remendada numa ocasião tão importante. A única coisa que consegui fazer 
foi ir de imediato ter com ele e dizer­lhe que Druso não ia estar pronto. Céus, como ele ficou zangado! 
Ameaçou demitir­me de Cônsul e recusou­se ouvir qualquer explicação. Felizmente, já tinha decidido 
demitir­se ele próprio no dia seguinte e pedir­me que fizesse o mesmo, a favor dos homens que tinham 
originariamente sido escolhidos para isso; portanto, a ameaça não resultou em nada e eu fui mesmo 
escolhido de novo para Cônsul, juntamente com ele, para os quatro anos seguintes.
Competia­me ocupar uns dados aposentos no Palácio e, por causa dos discursos severos de Calígula contra 
toda a espécie de imoralidade (à maneira de Augusto), não me foi possível ter Calpúrnia comigo, embora 
não estivesse casado. Ela teve que ficar em Cápua, muito contra minha
335
vontade, e só ocasionalmente conseguia deslocar­me ali para a visitar. No entanto, a moral dele parecia  
não cair sob a alçada da sua severidade. Estava a ficar cansado da mulher de Macro, Énia, de quem 
Macro se divorciara a pedido dele e com quem prometera casar­se, mas costumava sair à noite à procura 
de aventuras galantes, com um grupo de foliões a quem chamava Os Batedores. O grupo era geralmente 
constituído por três jovens oficiais do estado­maior, dois famosos gladiadores, o actor Apeles, e Eutico, o 
melhor carreteiro de Roma, que ganhava quase todas as corridas em que competia. Calígula tornara­se um 
forte partidário dos Verdes Claro e enviou os seus homens por toda a parte à procura dos cavalos mais 
rápidos. Encontrou um pretexto religioso para as corridas de carros públicas, com vinte partidas diárias, 
praticamente de sol a sol. Fez bastante dinheiro desafiando os homens ricos a acompanharem as suas 
apostas contra as outras cores, o que eles faziam por uma questão de delicadeza. Mas o que ele ganhava 
com isto não passava de uma gota, como é costume dizer­se, no oceano das suas despesas. De qualquer 
forma, costumava sair à noite com os seus Batedores foliões, disfarçado, visitando os locais mais 
degradantes da Cidade e acabando, em geral, por entrar em conflito com os guardas da noite, fazendo 
escapadelas tumultuosas que o Comandante dos Vigias tinha o cuidado de abafar.
As três irmãs de Calígula, Drusila, Agripinila e Lésbia, todas estavam casadas com nobres; mas ele 
insistiu em que viessem para o Palácio e ficassem a viver lá. Agripinila e Lésbia foram convidadas a levar 
os maridos com elas, mas Drusila teve que deixar o seu para trás; o nome dele era Cássio Longino e foi 
enviado como governador para a Ásia Menor. Calígula exigia que as três fossem tratadas com o maior 
respeito e deu­lhes todos os privilégios de que gozavam as Virgens Vestais. Mandou juntar os nomes delas 
ao seu nas orações públicas pela sua saúde e segurança e mesmo no juramento público que os funcionários 
e os sacerdotes faziam em seu nome por altura da sua consagração: ”Nem eu darei maior valor à minha 
própria vida ou às vidas dos meus filhos, do que à sua vida ou às vidas das suas irmãs.” Calígula 
comportava­se para com elas de uma forma que espantava as pessoas ­ mais como se fossem suas esposas 
do que suas irmãs.
Drusila era a favorita. Embora estivesse livre do marido, agora parecia sempre infeliz; e, quanto mais 
infeliz ela ficava, mais solícito era Calígula nas suas atenções. Casou­a, para salvar as aparências, com um 
primo seu, Emílio Lépido, de quem já falei como sendo um desleixado, irmão mais novo dessa Emília, 
filha de Julila, com quem, em rapaz, quase casei. Este Emílio Lépido, que era conhecido como Ganimedes 
por causa do seu aspecto efeminado e da sua servilidade para com Calígula, era um membro valioso do 
grupo dos Batedores. Era sete anos mais velho que Calígula, mas este tratava­o como um rapazito de treze 
e ele parecia gostar
336
disso. Dru sila não o suportava. Mas Agripinila e Lésbia estavam constantemente a entrar e a sair do 
quarto dele, rindo, gracejando e pregando partidas. Os respectivos maridos não pareciam importar­se. Eu, 
por mim, achava a vida no Palácio extremamente desorganizada. Não quero dizer que não me 
proporcionassem bastante conforto ou que os criados não fossem bem treinados ou que não se 
observassem as formalidades e cortesias normais para com os visitantes. Mas nunca percebi muito bem 
quais eram as relações de ternura existentes entre uns e outros: Agripinila e Lésbia, a certa altura, 
pareciam ter trocado de maridos; noutra ocasião, Apeles parecia ter uma certa intimidade com Lésbia e o 
carreteiro com Agripinila. Quanto a Calígula e Ganimedes... ­ acho que já referi o bastante para mostrar o 
que quero dizer com desorganizado. Eu era o único entre eles que já passara da meia­idade e não 
compreendia, de todo, as maneiras da nova geração, Gemelo também vivia no Palácio: era um rapaz 
assustadiço, delicado, que roía as unhas até ao sabugo e passava geralmente o tempo sentado num canto, a 
fazer desenhos de ninfas, sátiros e essa espécie de coisas usadas nos vasos. Não sei dizer­vos muito mais 
acerca de Gemelo, a não ser que cheguei à fala com ele uma ou duas vezes, sentindo pena do rapaz, 
porque, tal como eu, realmente não pertencia àquele grupo; mas talvez ele pensasse que eu estava a tentar 
forçá­lo a abrir­se e a dizer alguma coisa contra Calígula, pois só me respondia em monossílabos. No dia 
em que envergou a sua túnica varonil, Calígula adoptou­o como seu filho e herdeiro e nomeou­o Chefe 
dos Cadetes; mas isso não era de forma alguma o mesmo que partilhar a monarquia com ele.
Calígula adoeceu e, durante um mês, todos desesperaram da sua vida. A consternação popular em Roma 
foi tão grande, que uma multidão de nunca menos de 10.000 pessoas se manteve noite e dia à volta do 
Palácio, aguardando um boletim favorável. Mantinham um sussurrar e murmurar tranquilo e o som, ao 
chegar à minha janela, era como o de um rio distante correndo sobre pedras. Houve diversas 
manifestações de ansiedade bastante notáveis. Alguns homens colaram mesmo cartazes nas portas de suas 
casas, dizendo que, se a Morte detivesse o seu gesto e poupasse o Imperador, prometiam dar­lhe as suas 
próprias vidas como compensação. Por consenso geral, todos os ruídos de trânsito, pregões de rua e 
música foram suspensos num raio de meia milha ou mais do Palácio. Isso nunca acontecera antes, nem 
mesmo durante a doença de Augusto, aquela da qual se disse que a Musa o curou. O boletim dizia sempre: 
”Sem alteração.”
Uma noite, Drusila bateu à minha porta e disse:
­ Tio Cláudio! O Imperador quer ver­vos urgentemente. Vinde já. Não pareis para nada.
­ Para que é que ele me quer?
337
­ Não sei. Mas, pelo amor aos Deuses, fazei­lhe a vontade. Ele tem uma espada. Mata­vos se não disserdes 
o que ele quer. Esta manhã, encostou a ponta à minha garganta. Disse­me que eu não o amava. Tive que 
jurar e tornar a jurar que sim, que o amava. Disse­lhe: ”Mata­me se quiseres, meu querido.” Oh, tio 
Cláudio, porque é que eu nasci? Ele é louco. Sempre foi. Mas agora está pior do que louco. Está possuído.
Fui até ao quarto de Calígula, com as suas cortinas pesadas e tapetes espessos. Ao lado da cama, ardia a 
luz fraca de um candeeiro a óleo. O ar cheirava a bafio. Fui saudado pela sua voz lamentosa.
­ Outra vez atrasado? Disse­te que te despachasses. ­ Não parecia doente, apenas pouco saudável. Dois 
possantes surdos­mudos, empunhando machados, encontravam­se de guarda, um de cada lado da cama.
Respondi, saudando­o:
­ Oh, como me apressei! Se não tivesse uma perna coxa, teria aqui chegado quase antes de ter saído. Que 
alegria encontrar­vos vivo e ouvir de novo a vossa voz, César! Posso ousar esperar que estejas melhor?
­ Não estive propriamente doente. Estive apenas a descansar. E a passar por uma metamorfose. É o 
acontecimento religioso mais importante da história. Não admira que a Cidade se mantenha tão silenciosa.
Senti que ele esperava que eu me mostrasse compreensivo, apesar de tudo.
­ E a metamorfose foi dolorosa, Imperador? Espero que não.
­ Tão dolorosa como se eu fosse mãe de mim mesmo. Tive um parto muito difícil. Felizmente, já esqueci 
tudo. Ou quase tudo. É que fui uma criança muito precoce e lembro­me nitidamente das caras de 
admiração das parteiras quando me lavaram, depois de ter emergido para este mundo, e do gosto do vinho 
que me puseram entre os lábios para me refrescar, depois do esforço.
­ Uma memória espantosa, Imperador. Mas posso perguntar, com toda a humildade, qual é precisamente o 
carácter desta mudança gloriosa que desceu sobre vós?
­ Isso não se vê imediatamente? ­ perguntou irritado.
A palavra possuído usada por Drusila e a conversa que eu tivera com a minha avó Lívia no seu leito de 
morte deu­me a resposta. Caí com o rosto no chão e adorei­o como a um Deus.
Passado um minuto ou dois, perguntei­lhe do chão se eu era o primeiro homem a ter o privilégio de o 
adorar. Ele disse que sim e eu desfiz­me em gratidão. Ele cutucava­me com a ponta da espada na parte de 
trás do pescoço, com ar pensativo. Convenci­me de que estava perdido.
Ele disse:
­ Admito que ainda estou no meu disfarce mortal; portanto, entende­se que não tenhas notado de 
imediato a minha Divindade.
338
­ Não sei como foi possível eu ser tão cego. O teu rosto brilha como uma lanterna nesta luz fraca.
­ É verdade? ­ perguntou ele interessado. ­ Levanta­te e dá­me aquele espelho.
Passei­lhe o espelho de aço polido e ele concordou que o seu rosto brilhava intensamente. No meio daquele acesso 
de bom humor, começou a contar­me várias coisas a seu respeito.
­ Eu sempre soube que isto ia acontecer, ­ disse. ­ Nunca me senti outra coisa a não ser divino. Pensa nisso. Com dois 
anos de idade desfiz um motim no exército do meu pai e salvei Roma. Foi uma coisa prodigiosa, como as histórias 
que se contam sobre o Deus Mercúrio em criança, ou sobre Hércules, que estrangulou as víboras no seu próprio 
berço.
­ E Mercúrio apenas roubou algumas vacas, ­ disse eu, ­ e tangeu uma ou duas notas na lira. Isso não foi nada em 
comparação.
­ E o que é mais, com a idade de oito anos eu já tinha morto o meu pai. O próprio Júpiter nunca fez isso. Apenas 
exilou o velho.
Tomei aquilo como uma continuação do delírio, mas perguntei­lhe num tom natural.
­ Porque foi que fizestes isso?
­ Ele atrapalhava­me. Tentou disciplinar­me ­ a mim, um jovem Deus, imagina só! Por isso matei­o de susto. 
Introduzi às escondidas coisas mortas na nossa casa de Antióquia e escondi­as debaixo de ladrilhos soltos; rabisquei 
fórmulas encantatórias nas paredes e meti um galo no meu quarto, para lhe dar ordem de marcha. E roubei­lhe a sua 
Hécate. Olha, tenho­a aqui. Tenbo­a sempre debaixo da almofada. ­ Ergueu no ar a estatueta de jaspe verde.
Quando a reconheci, o meu coração ficou frio como gelo. Numa voz horrorizada, disse:
­Então éreis vós? E fostes vós que trepastes para aquele quarto trancado por aquela janela minúscula e fizestes lá os 
vossos desenhos? Acenou com a cabeça cheio de orgulho e continuou a falar:
­ Não só matei o meu pai natural, como o meu pai de adopção: Tibério. E enquanto Júpiter apenas foi para a cama 
com uma das suas irmãs, Juno, eu fui com as minhas três. Martina disse­me que era o que eu tinha que fazer, caso 
quisesse ser como Júpiter.
­ Quer dizer que conhecíeis bem Martina?
­ Conhecia, sim. Quando os meus pais estavam no Egipto, costumava visitá­la todas as noites. Ela era uma mulher 
muito sábia. Digo­te mais uma coisa. Drusila também é divina. Vou anunciá­lo ao mesmo tempo que fizer o anúncio 
sobre mim próprio. Como eu amo Drusila! Quase tanto como ela me ama a mim.
339
­ Posso perguntar quais são as vossas sagradas intenções? Esta metamorfose vai com certeza afectar Roma 
profundamente.
­ Com certeza. Primeiro, vou pôr todo o mundo a venerar­me. Não vou permitir que um bando de velhos 
metediços continue a governar­me. Vou mostrar... mas tu lembras­te da tua velha avó, Lívia? Isso é que 
era uma piada. De alguma forma, tinha­se­lhe metido na cabeça que era ela que ia ser o Deus eterno sobre 
quem todos têm profetizado no Leste nos últimos mil anos. Julgo que foi Trasilo que a levou a acreditar 
que se referiam a ela. Trasilo nunca mentiu, mas gostava de enganar as pessoas. Estás a ver, Lívia não 
conhecia os termos precisos da profecia. O Deus será um homem e não uma mulher e não é nascido em 
Roma, embora deva reinar em Roma (eu nasci em Antium); nascerá num tempo de profunda paz (como eu 
nasci), mas estará destinado a ser a causa de inúmeras guerras depois da sua morte. Há­de morrer novo e, 
a princípio, será amado pelo seu povo, sendo depois odiado; finalmente, morrerá miserável, abandonado 
por todos: ”Os seus criados beber­lhe­ão o sangue”, diz a profecia. Depois da sua morte, há­de reinar 
sobre todos os outros Deuses do mundo, em terras que ainda não conhecemos. Só posso ser eu. Martina 
disse­me que muitos prodígios tinham sido vistos nos últimos tempos no próximo oriente, o que provava 
de forma conclusiva que o Deus tinha finalmente nascido. Os judeus eram os mais excitados; de alguma 
forma, sentiam­se particularmente envolvidos. Suponho que seja porque uma vez visitei a sua cidade de 
Jerusalém com o meu pai e dei aí a minha primeira manifestação divina. ­ Fez uma pausa.
­ Interessar­me­ia muito saber mais sobre isso, ­ comentei.
­ Ah, não foi nada demais. Por brincadeira, entrei numa casa onde alguns dos seus sacerdotes e doutores 
estavam a falar de teologia e, de repente, gritei: ”Sois um bando de velhos embusteiros ignorantes! Não 
sabeis nada disso.” Isto causou grande sensação e um dos velhos de barba branca disse: ”Oh! E quem és 
tu, meu filho? És aquele que os profetas anunciam?”; ”Sim”, respondi ousadamente. Ele disse, chorando 
de emoção: ”Então ensina­nos!” Eu respondi: ”Nem pensar! Isso está abaixo da minha dignidade”; e corri 
de novo dali para fora. Devias ter visto as caras deles! Não; Lívia era uma mulher inteligente, à sua 
maneira, bastante capaz ­ um Ulisses feminino, como eu lhe chamei uma vez directamente ­; um dia, 
como prometi, talvez a díviníze. Mas não há pressa quanto a isso. Ela nunca será uma divindade 
importante. Talvez a façamos patrona dos escriturários e contabilistas, porque ela tinha boa cabeça para os 
números. Sim, e acrescentaremos os envenenadores, tal como Mercúrio tem os ladrões sob a sua 
protecção, ao mesmo tempo que os mercadores e viajantes.
­ Isso será apenas justo, ­ retorqui. ­ Mas o que estou ansioso por saber imediatamente é o seguinte: Sob 
que nome vos deverei adorar?
340
Será incorrecto, por exemplo, chamar­vos Júpiter? Não sois vós maior que Júpiter?
Ele disse:
­ Oh, maior que Júpiter, sem dúvida, mas por enquanto anónimo. De momento, no entanto, acho que me 
chamarei a mim mesmo de Júpiter: o Júpiter latino, para me distinguir do outro indivíduo grego. Vou ter 
que ajustar contas com ele um destes dias. Há tempo demais que ele faz o que quer.
Perguntei­lhe:
­ Como se explica que vosso pai não fosse também um Deus? Nunca ouvi falar de um Deus que não 
tivesse um pai divino.
­ Isso é simples. O Deus Augusto foi o meu pai.
­ Mas ele nunca vos adoptou, pois não? Só adoptou os vossos irmãos mais velhos e deixou­vos a vós para 
continuardes a linhagem do vosso pai.
­ Não quero dizer que ele foi meu pai por adopção. O que eu quero dizer é que sou seu filho por incesto 
com Júlia. Tenho que ser. É a única solução possível. Filho de Agripina não sou, com certeza: o pai dela 
era um Zé ninguém. É ridículo.
Não fui tolo ao ponto de lhe fazer notar que, nesse caso, Germânico também não era seu pai e, portanto, as 
irmãs eram apenas suas sobrinhas. Tentei agradar­lhe como Drusila aconselhara e disse:
­ Este é o momento mais glorioso da minha vida. Permita­me que me retire e vá imediatamente sacrificar 
em vossa honra, com as forças que me restam. O ar divino que exalais é forte demais para as minhas 
narinas mortais. Estou quase a desmaiar. ­ O quarto estava horrivelmente abafado. Desde que tinha ficado 
de cama, Calígula não permitira que se abrissem as janelas.
Disse:
­ Vai em paz. Pensei matar­te, mas agora não o farei. Diz aos Batedores sobre a minha Divindade e o 
brilho do meu rosto, mas não lhes digas mais nada. Quanto ao resto, imponho­te o mais sagrado silêncio.
Baixei­me novamente até ao chão e retirei­me, recuando. Ganímedes parou­me no corredor e pediu 
notícias. Disse­lhe:
­ Ele acaba de se tornar um Deus... e um Deus muito importante, segundo diz. O seu rosto brilha.
­ Isso são más notícias para nós mortais, ­ disse Ganimedes. Mas eu já sabia que ia acontecer. Vou passar 
a notícia aos outros. Drusila já sabe? Não? Eu digo­lhe.
­ Diz­lhe que ela também é uma Deusa, ­ acrescentei ­ caso ela não tenha dado por isso,
Nota: Referência a Zeus. (N. do T.) 
341
Voltei para o meu quarto e pensei para comigo:
­ É bom que isto tenha acontecido. Em breve, todos compreenderão que ele está louco e fecham­no a sete 
chaves. E agora já não há outros descendentes de Augusto com idade para se tornarem Imperadores, à 
excepção de Ganimedes, e esse não tem a popularidade ou a força de carácter necessárias. A República 
será restaurada. O sogro de Calígula é o homem indicado. Ele tem mais influência no Senado que qualquer 
outro homem. Eu apoiá­lo­ei. Se ao menos conseguíssemos desembaraçar­nos de Macro e arranjar um 
comandante da Guarda decente para o lugar dele, tudo seria fácil. Os Guardas são o maior obstáculo. 
Sabem muito bem que nunca teriam um bónus de cento e cinquenta moedas de ouro por cabeça votados a 
seu favor por um Senado Republicano. Sim; foi ideia de Sejano transformá­los numa espécie de exército 
particular para meu tio Tibério, que deu à monarquia o seu absolutismo oriental. Devíamos acabar com o  
acampamento e aquartelar os homens de novo em casas particulares, como costumávamos fazer.
Mas ­ isto dá para acreditar? ­ a divindade de Calígula foi aceite por todos sem questionar. Durante algum 
tempo, contentou­se em deixar a notícia circular num âmbito privado e continuar oficialmente como 
mortal. Isso teria estragado as suas relações livres e fáceis com os Batedores e interrompido grande parte 
do seu prazer, caso todos tivessem que se deitar com a cara no chão sempre que ele aparecesse. Mas, no 
espaço de dez dias após o seu restabelecimento, que foi acolhido com um júbilo inenarrável, já tinha 
chamado a si todas as honras mortais que Augusto aceitara ao longo da vida e mais uma ou duas 
adicionais. Ele era César o Bom César o Pai dos Exércitos, o mais Gracioso e Poderoso César e até mesmo 
Pai da Pátria, um título que Tibério recusara firmemente ao longo de toda a sua vida.
Gemelo foi a primeira vítima do terror. Calígula mandou chamar um Coronel da Guarda e disse­lhe:
­ Mata esse traidor, meu filho, imediatamente.
O coronel foi direito aos aposentos de Gemelo e cortou­lhe a cabeça. A vítima seguinte foi o sogro de 
Calígula. Pertencia à família de Silano
­ Calígula casara com sua filha, Junia, mas ela morrera de parto um ano antes de ele se tornar Imperador. 
Silano gozava da distinção de ser o único Senador que Tibério nunca suspeitara de deslealdade: Tibério 
sempre recusara ouvir qualquer recurso das suas sentenças judiciais. Calígula enviou­lhe agora uma 
mensagem:
­ Ao nascer do dia de amanhã, tens que estar morto.
Depois disto, o infeliz disse adeus à família e cortou o pescoço com uma navalha. Calígula explicou numa 
carta ao Senado que Gemelo morrera a morte de um traidor; durante a sua grave doença, não oferecera 
quaisquer orações pelo seu restabelecimento, mas tinha tentado insinuar­se junto
342
dos oficiais da guarda pessoal. Além disso, tomava antídotos contra veneno sempre que ia jantar ao 
Palácio, de forma que toda a sua pessoa cheirava a isso. A esta atitude, respondia: ”Mas existe algum 
antídoto contra César?”. O sogro, escreveu Calígula, era outro traidor: recusara­se a ir para o mar com ele 
naquele dia de temporal em que navegara para Pandatária e Ponza, para ir buscar os restos da mãe e do 
irmão, e ficara para trás na esperança de se apoderar da monarquia, caso as tempestades afundassem o 
navio.
Estas explicações foram aceites pelo Senado. A verdade de tudo isto é que Silano era tão mau marinheiro 
que quase morria de enjoo cada vez que punha os pés num barco, mesmo com bom tempo, e foi o próprio 
Calígula a recusar amavelmente a sua oferta de o acompanhar nessa viagem. Quanto a Gemelo, sofria de 
uma tosse obstinada e cheirava ao remédio que tomava para suavizar a garganta, de forma a não se tornar 
incómodo à mesa.
343
CAPíTULO XXX
Quando a minha mãe soube do assassinato de Gemelo, ficou muito desgostosa e veio ao Palácio pedindo 
para falar com Calígula, que a recebeu de mau humor, pois sentia que ia ser censurado. Ela disse:
­ Neto, posso falar contigo em privado? É sobre a morte de Gemelo.
­ Não, de maneira nenhuma em privado, ­ respondeu ele. ­ Dizei o que tendes a dizer na presença de 
Macro. Preciso ter uma testemunha comigo, se aquilo que tendes a dizer é assim tão importante.
­ Então, prefiro guardar silêncio. É um assunto de família, e não para os ouvidos de filhos de escravos. O 
pai desse indivíduo era filho de um dos meus podadores. Vendi­o ao meu cunhado por quarenta e cinco 
moedas de ouro.
­ Fazei o favor de me dizer imediatamente aquilo que tínheis para dizer, sem insultar os meus ministros. 
Não sabeis que tenho o poder de obrigar qualquer pessoa neste mundo a fazer exactamente o que eu 
quiser?
­ Não é nada que te seja agradável ouvir.
­ Dizei.
­ Como queiras. Vim dizer que o facto de teres assassinado o meu pobre Gemelo foi um crime malvado e 
que desejo abdicar de todas as honras que recebi das tuas mãos maléficas.
Calígula riu­se e disse para Macro:
­ Acho que a melhor coisa que esta velha senhora tem a fazer agora é ir para casa e pedir emprestada uma 
tesoura de podar aos seus podadores, para cortar as próprias cordas vocais.
Macro disse:
­ Dei sempre o mesmo tipo de conselho à minha avó, mas a velha bruxa recusou­se a aceitá­lo.
A minha mãe veio procurar­me.
­ Vou suicidar­me, Cláudio, ­ disse. ­ Encontrarás todos os meus assuntos em ordem. Há umas pequenas 
dívidas a regularizar: paga­as pontualmente. Sê bondoso para o meu pessoal; todos eles foram fiéis 
servidores. Lamento que a tua filhita não tenha agora ninguém para tomar conta dela: acho que devias 
voltar a casar para lhe dar uma mãe. Ela é uma boa menina.
345
Exclamei:
­ O quê, Mãe! O suicídio? Porquê? Oh, não façais uma coisa dessas! Ela teve um sorriso amargo:
­ A vida é minha, não é verdade? Porque havias de me dissuadir de lhe pôr fim? Certamente, não vais 
sentir a minha falta, pois não?
­ Sois a minha mãe, ­ disse. ­ Um homem tem só uma mãe.
­ Estou surpreendida por me falares com tanta submissão. Não fui uma mãe muito carinhosa para ti. Como 
é que se podia esperar que o fosse? Sempre foste uma grande decepção para mim: uma coisinha 
enfermiça, fraca, timorata, apatetada. Bom, fui bem punida pelos Deuses pela forma como te negligenciei. 
O meu esplêndido filho Germânico assassinado, os meus pobres netos Nero, Druso e Gemelo 
assassinados, e a minha filha Livila castigada pela sua maldade, pela sua abominável maldade, por minhas 
próprias mãos; esse foi o maior sofrimento que alguma vez tive, pois nunca uma mãe sofreu outro pior.. e 
as minhas quatro netas, todas passadas para o lado do mal... e este Calígula nojento, ímpio... Mas tu hás­de 
sobreviver­lhe. Acho que sobreviverias a um Dilúvio Universal. ­ A voz dela, calma a princípio, subira 
para o tom habitual de irritação e censura.
Disse­lhe:
­ Mãe, não tendes uma palavra bondosa a dizer­me, nem mesmo numa ocasião como esta? Em que foi que 
eu alguma vez, intencionalmente, vos prejudiquei ou desobedeci?
Mas ela nem pareceu ouvir.
­ Já fui bem punida, ­ repetiu. ­ Quero que venhas a minha casa daqui a cinco horas. Nessa altura, já terei 
tomado todas as minhas disposições. Conto contigo para me proporcionares os últimos rituais. Não quero 
que assistas ao meu último suspiro. Se ainda não estiver morta quando chegares, espera na antecâmara até 
que a minha criada Briseis te chame. Não te baralhes no discurso de despedida: eras bem capaz disso. 
Encontrarás escritas todas as instruções para o funeral. Serás o principal representante. Não quero 
nenhuma oração fúnebre. Não te esqueças de decepar a minha mão, para ser enterrada em separado; trata­
se de um suicídio. Não quero perfumes na pira; faz­se isso muitas vezes, mas é estritamente ilegal e 
sempre o considerei como autêntico esbanjamento. Vou dar a liberdade a Palas; portanto, não te esqueças 
disso, ele irá usar o barrete de liberto na procissão. Ao menos uma vez na vida, tenta levar até ao fim uma 
cerimónia sem te enganares.
Foi tudo, excepto um Adeus bem formal. Nem beijo, nem lágrimas, nem bênção. Como filho submisso, 
respeitei as suas últimas vontades, ao pormenor. Era estranho ela ter dado ao meu escravo pessoal a 
liberdade. Fez o mesmo com Briseís.
346
Ao vê­la arder na pira, da janela da sua sala de jantar, alguns dias mais tarde, Calígula disse para Macro:
­ Apoiaste­me bem contra essa mulher. Vou recompensar­te. Vou dar­te a posição mais honrosa de todo o 
Império. É uma posição que, segundo Augusto anotou como um princípio do Estado, não deve de forma 
alguma cair nas mãos de um aventureiro. Vou fazer­te governador do Egipto.
Macro ficou encantado; actualmente, não sabia lá muito bem em que pé estava com Calígula e, se fosse 
para o Egipto, ficaria em segurança. Tal como Calígula dissera, era uma nomeação importante: o 
Governador do Egipto tinha o poder de deixar Roma morrer à fome se lhe cortasse o fornecimento de trigo 
e a guarnição podia ser fortalecida com recrutamentos locais até ser suficientemente grande para defender 
a província contra qualquer exército invasor que avançasse contra ela.
Assim, Macro foi liberto do comando dos Guardas. Durante algum tempo, Calígula não nomeou ninguém 
para o seu lugar e deixou os nove coronéis dos batalhões comandarem à vez, cada um durante um mês. 
Deu a saber que, ao fim desse tempo, o mais leal e eficiente assumiria o cargo permanentemente. Mas o 
homem a quem ele prometeu secretamente o cargo era o Coronel do batalhão que apoia a Guarda do 
Palácio
­ nem mais nem menos que o mesmo bravo Cássio Chaerea, cujo nome não podeis ter esquecido se lestes 
esta história com alguma atenção ­; o homem que matou o germano no anfiteatro, o homem que regressou 
com a sua companhia do massacre do exército de Varo e que depois salvou a ponte; o homem também que 
abriu caminho pelo meio dos amotinados no acampamento de Bona e que levou Calígula às costas naquela 
manhã em que Agripina e os amigos tiveram que sair do acampamento a pé, sob a sua protecção. Cássio 
tinha agora os cabelos brancos, embora ainda não tivesse sessenta anos; andava um pouco inclinado e as 
mãos tremiam­lhe, por causa de uma febre que quase o matara na Germânia, mas era ainda um belo 
espadachim e, reputadamente, o homem mais corajoso de Roma. Um dia, um velho soldado da Guarda 
enlouqueceu e pôs­se a correr desvairadamente de lança em riste no pátio do Palácio. Pensava que estava a 
matar rebeldes franceses. Todos fugiram à excepção de Cássio, que, embora desarmado, ficou firme até 
que o louco investiu contra ele, altura em que lhe deu calmamente uma ordem de parada:
­ Alto, Companhia! Armas no chão! ­ E o indivíduo louco, para quem a obediência às ordens se tornara 
uma segunda natureza, parou e estendeu a lança ao comprido no chão. ­ Companhia, meia volta, ­ ordenou 
novamente Cássio. ­ Ordinário, marcha! ­ E assim o desarmou. Nessa altura, Cássio era o primeiro 
comandante temporário da Guarda e manteve­os a todos em ordem, enquanto Macro estava a ser julgado 
pela sua vida.
347
Na verdade, a nomeação de Macro para Governador do Egipto não passou de um truque de Calígula, o 
mesmo tipo de truque que Tibério usara com Sejano. Macro foi preso quando embarcava em óstia e 
trazido novamente para Roma a ferros. Foi acusado de ter provocado as mortes de Arrúncio e de vários 
homens e mulheres inocentes. A esta acusação, Calígula acrescentou uma outra; designadamente, que 
Macro fizera o papel de alcoviteiro, tentando levá­lo a apaixonar­se por sua mulher Énia
­ uma tentação à qual ele, na sua inexperiência juvenil, admitia, quase tinha sucumbido. Macro e Énia 
foram ambos forçados a suicidarem­se. Fiquei surpreendido com a facilidade com que ele se 
desembaraçou de Macro.
Um dia, Calígula, como Sumo Pontífice, foi celebrar um casamento entre um membro da família de Piso e 
uma mulher chamada Orestila. Sentia um fraquinho por Orestila e, quando a cerimónia terminou e a maior 
parte da alta nobreza de Roma estava reunida na festa nupcial, divertindo­se bastante, como é uso nessas 
ocasiões, gritou de repente para o noivo:
­ Eh, parai de beijar essa mulher! Ela é minha esposa!
Levantou­se e, no meio do silêncio de surpresa que se seguiu, ordenou aos guardas que agarrassem 
Orestila e a conduzissem ao Palácio. Ninguém ousou protestar. No dia seguinte, ele casou com Orestila: o 
marido foi obrigado a assistir à cerimónia, para lha entregar. Depois, enviou uma carta ao Senado, para 
informar os magistrados de que celebrara um casamento ao estilo de Rómulo e Augusto ­ referindo­se, 
suponho, ao rapto das mulheres sabinas por Rómulo e ao casamento de Augusto com minha avó (com a 
presença do meu avô). No espaço de dois meses, já se tinha divorciado de Orestila, que enviou para o 
exílio, assim como ao primeiro marido, afirmando que andavam a cometer adultério nas suas costas. Ela 
foi enviada para a Hispânia e ele para Rodes. Só lhe foi permitido levar dez escravos com ele, Quando 
pediu como um favor que lhe fosse permitido duplicar esse número, Calígula disse:
­ Tantos quantos quiseres. Mas, por cada escravo a mais, terás que levar também um soldado a mais para 
te guardar.
Drusila morreu. Tenho a certeza dentro de mim de que Calígula a matou, mas não tenho provas. 
Contaram­me que agora, sempre que beijava uma mulher, costumava dizer:
­ Branco e adorável como é esse teu pescoço, basta eu dizer uma palavra e... pronto, ele será cortado.
Se o pescoço fosse particularmente branco e adorável, às vezes, ele não conseguia resistir à tentação de 
dizer essa palavra e ver a sua fanfarronada tornar­se realidade. No caso de Drusila, acho que foi ele 
próprio a dar o golpe, De qualquer forma, ninguém teve autorização de ver o corpo dela. Fez constar que 
ela tinha morrido de tuberculose e fez­lhe o
348
funeral mais extraordinariamente rico. Foi divinizada sob o nome de Pantea e foram­lhe construídos 
templos; homens e mulheres da nobreza foram nomeados seus sacerdotes e instituiu­se um grandioso 
festival anual em sua honra, mais esplêndido que qualquer outro no Calendário. Um homem ganhou 
10.000 moedas de ouro por ter visto o espírito dela sendo recebido no céu por Augusto. Durante os dias de 
luto público ordenados por Calígula em sua honra, era crime capital para qualquer cidadão rir­se, cantar, 
fazer a barba, ir aos banhos ou mesmo jantar com a família. Os tribunais estiveram fechados, não se 
celebraram casamentos, os soldados não fizeram exercícios militares. Calígula mandou matar um homem 
por ter vendido água quente nas ruas e outro por ter exposto navalhas de barbear para venda. A tristeza era 
tão profunda e generalizada que ele próprio não conseguiu suportá­la (ou também podia ser o remorso); 
assim, uma noite, deixou a Cidade e viajou para Siracusa, sozinho, à excepção de uma guarda de honra. 
Não tinha nada a fazer lá, mas a viagem era uma distracção. Não foi mais longe do que Messina, onde 
calhou encontrar o Etna numa ligeira erupção. A visão aterrorizou­o de tal forma que regressou 
imediatamente. Quando chegou de novo a Roma, não tardou a pôr as coisas em movimento como era 
habitual, particularmente as lutas de gladiadores, as corridas de carros e a caça aos animais selvagens. De 
repente, lembrou­se que os homens que tinham oferecido as próprias vidas em troca pela sua quando 
estava doente ainda não se tinham suicidado; obrigou­os a fazê­lo, não apenas por uma questão de 
princípio, para os livrar do pecado de perjúrio, mas mais especialmente para impedir a Morte de voltar 
atrás com o acordo que tinha sido feito.
Alguns dias mais tarde, ao jantar, eu enunciava, um tanto embriagado, a lei sobre a herança da beleza 
feminina, citando exemplos, na minha argumentação, de que ela geralmente falhava numa geração, indo 
da avó para a neta. Infelizmente, acabei por afirmar:
­ A mulher mais bonita de Roma quando eu era rapaz, reapareceu, feição por feição, membro por membro, 
na pessoa da sua neta e homónima Lólia, mulher do actual governador da Grécia. Com a única excepção 
de uma certa senhora que não vou nomear, porque ela está presente nesta sala, Lólia é, na minha opinião a 
mais bela mulher viva actualmente.
Fiz esta excepção apenas por uma questão de tacto. Lólia era de longe mais bela que qualquer das minhas 
sobrinhas, Agripinila ou Lésbia, ou do que qualquer outro membro do grupo. Posso dizer que não estava 
apaixonado por ela, apenas reparara um dia que ela era perfeita e recordava­me de ter feito exactamente a 
mesma observação em relação à avó, quando era rapaz. Calígula ficou interessado e escreveu ao marido 
de Lólia dizendo­lhe que regressasse a Roma e aceitasse um sinal de honra. O sinal de honra acabou por 
ser divorciar­se de Lólia e casá­la com o Imperador.
349
Outro comentário ocasional que fiz ao jantar por esta altura teve um efeito inesperado sobre Calígula. 
Alguém mencionou a epilepsia e eu disse que os registos cartagineses mostravam que Aníbal era um 
epiléptico e que Alexandre e Júlio César eram ambos sujeitos a esta doença misteriosa, que parecia ser 
uma acompanhante quase inevitável de um génio militar superior. Calígula apurou o ouvido e, alguns dias 
mais tarde, fez uma boa imitação de um ataque epiléptico, caindo no chão na Casa do Senado e gritando 
com todas as suas forças e com os lábios brancos de espuma ­ provavelmente, espuma de sabão.
O povo de Roma parecia bastante feliz. Calígula continuava a dar­lhes boas diversões com espectáculos 
teatrais, lutas de gladiadores e caçadas a animais selvagens, corridas de carros e dádivas lançadas da 
Plataforma de Oratória e das janelas superiores do Palácio. Os casamentos que ele contraía ou desfazia, os 
cortesãos que assassinava, nada disso os interessava grandemente. Nunca ficava satisfeito, a menos que 
todos os lugares do teatro ou do Circo estivessem ocupados e todas as passagens apinhadas; por isso, 
sempre que havia um espectáculo, adiava todos os julgamentos e suspendia todo o luto, para não dar a 
ninguém uma desculpa para não comparecer. Fez várias outras inovações. Permitiu às pessoas que 
levassem almofadas para se sentarem e, no tempo quente, que usassem chapéus de palha e que fossem 
descalços ­ mesmo os senadores, que deviam dar um exemplo de austeridade.
Quando finalmente consegui visitar Cápua por alguns dias, pela primeira vez em quase um ano, quase que 
a primeira coisa que Calpúrnia me perguntou foi:
­ Quanto é que resta na Bolsa Privada desses vinte milhões, Cláudio?
­ Menos de cinco milhões, creio eu. Mas ele tem andado a construir barcaças de recreio em madeira de 
cedro, forrando­as a ouro, cravejando­as de jóias e instalando nelas banhos e jardins floridos, tendo 
começado a trabalhar em sessenta novos templos. Fala em abrir um canal através do istmo de Corinto. 
Toma banhos em óleo de nardo e de violeta. Há dois dias, deu a Eutico, o auriga do Verde Claro, um 
presente de vinte mil em ouro, por ter ganho uma corrida renhida.
­ O Verde Claro ganha sempre?
­ Sempre. Ou quase sempre. O Escarlate ficou em primeiro lugar no outro dia e foi muito aclamado pelo 
povo. Estavam a ficar cansados da monotonia do Verde Claro. O Imperador ficou furioso. No dia 
seguinte, o auriga Escarlate e a sua equipa vitoriosa estavam todos mortos. Envenenados. A mesma coisa 
já tinha acontecido antes.
­ Por esta altura, no ano que vem, as coisas vão correr mal para ti, meu pobre Cláudio. A propósito, queres 
ver as tuas contas? Foi um ano de pouca sorte, como eu te escrevi. O gado valioso a morrer, os escravos a 
roubarem à direita e à esquerda e as medas de trigo queimadas.
350
Perdestes duas mil moedas de ouro, se não mais. A culpa também não é do administrador. Ele faz tudo o 
que pode e, pelo menos, é honesto. É por não estares aqui para vigiar que estas coisas acontecem.
­ Não há nada a fazer, ­ disse. ­ Para ser franco, actualmente, estou mais ansioso pela minha vida do que 
pelo dinheiro.
­ És mal tratado?
­ Sim. Estão constantemente a fazer de mim parvo. Não gosto disso. O Imperador é quem mais me 
atormenta.
­ O que te fazem?
­ Ora, pregam­me partidas. Armadilhas com baldes de água suspensos por cima das portas. E rãs dentro da 
cama. Ou horríveis amuletos a cheirar a mirra: sabes como detesto rãs e amuletos. Se calha eu dormir um 
pouco depois de comer, atiram­me pedrinhas, amarram­me sapatos nas mãos ou fazem soar o alarme de 
incêndio nos meus ouvidos. Nunca tenho tempo para trabalhar. Se chego a começar, despejam­me o 
tinteiro em cima do trabalho. E nada do que digo é alguma vez tomado a sério.
­ Mas tu és o único alvo que eles têm?
­ Sou o preferido. O alvo oficial.
­ Cláudio, tens mais sorte do que imaginas. Conserva bem essa tua posição. Não deixes ninguém usurpá­
la.
­ O que é que queres dizer, pequena?
­ Quero dizer que as pessoas não matam os seus objectos de zombaria. São cruéis para eles, assustam­nos 
e roubam­nos: mas não os matam.
Disse­lhe:
­ Calpúrnia, tu és muito inteligente. Escuta­me agora. Eu ainda tenho dinheiro. Vou comprar­te um belo 
vestido de seda, uma caixa de cosméticos em ouro, um sagüi e um pacote de paus de canela.
Ela sorriu.
­ Preferia o presente em dinheiro. Quanto é que ias gastar?
­ Cerca de setecentas moedas.
­ óptimo. Vai fazer­me jeito um destes dias. Obrigada, meu bom Cláudio.
Quando voltei para Roma, soube que tinha havido problemas. Calígula tinha sido perturbado uma noite 
pelo barulho distante de pessoas a reunirem­se no anfiteatro, pouco antes da alvorada, empurrando­se e 
debatendo­se para se aproximarem dos portões e poderem apanhar as filas da frente dos lugares livres, 
logo que os mesmos se abrissem. Calígula enviou uma companhia de Guardas com bastões, para 
restabelecer a ordem. Os Guardas ficaram de mau­humor por os fazerem sair da cama para aquela tarefa e 
puseram­se a bater à direita e à esquerda, matando uma quantidade de pessoas, incluindo alguns cidadãos 
com uma certa posição. Para mostrar o seu desagrado por lhe terem perturbado o sono
351
com a confusão inicial e com o barulho muito maior que as pessoas fizeram quando dispersaram aos gritos diante 
dos bastões dos Guardas, Calígula não apareceu no anfiteatro senão já pela tarde dentro, quando todos estavam 
cansados de esperar e também com fome. Quando os Verdes Claro fizeram uma demonstração equestre, foram 
assobiados e vaiados. Calígula saltou do seu lugar, irado:
­ Gostaria que tivésseis um único pescoço. Cortava­o de um só golpe! No dia seguinte, devia haver uma luta e uma 
caçada aos animais selvagens. Calígula cancelou tudo o que combinara antes e apresentou a mais miserável colecção 
de animais, que se podiam comprar por atacado no mercado de vendas ­ leões e panteras sarnentos, ursos doentes e 
touros velhos e gastos, o tipo de animais que eram enviados para cidades de guarnição distantes, nas províncias, onde 
o público não é exigente e os caçadores amadores não apreciam animais de boa qualidade. Os caçadores pelos quais 
Calígula substituiu os que estavam anunciados eram condizentes com os animais: veteranos gordos, com as 
articulações emperradas e a respiração difícil. Alguns deles, talvez tivessem sido homens hábeis no seu tempo ­ na 
época de ouro de Augusto. A multidão troçou deles e vaiou­os. Era o que Calígula esperava. Mandou os seus 
funcionários prender os homens que estavam a fazer mais barulho e pô­los na arena, para ver se conseguiam fazer 
melhor. Os leões e as panteras sarnentos, os ursos doentes e os touros cansados deram cabo deles num instante.
Ele estava a tornar­se impopular. Que a multidão sempre gosta de feriados, é do conhecimento comum. Mas quando 
o ano inteiro se transforma num feriado prolongado e ninguém tem tempo para tratar da sua vida, quando o prazer se 
torna compulsivo, então as coisas são diferentes. As corridas de carros tornaram­se cansativas. Estava tudo muito 
bem para Calígula, que tinha um interesse pessoal nas equipas e nos condutores e costumava, por vezes, conduzir ele 
próprio um carro. Não era mau com as rédeas e o chicote e os aurigas em competição tinham o cuidado de não lhe 
ganhar. Os espectáculos teatrais em breve se tornaram igualmente cansativos. Todas as peças de teatro se parecem 
demasiado, excepto para os entendidos: ou, de qualquer forma, são­no para mim. Calígula imaginava­se um 
conhecedor e estava também sentimentalmente ligado a Apeles, o actor trágico filistino, que escreveu muitas das 
peças em que actuava. Uma que Calígula admirava particularmente porque tinha feito sugestões que Apeles 
introduzira no seu papel ­, era representada constantemente, até que todos começaram a odiar vê­la e ouvi­la. Ele 
tinha uma afeição ainda mais forte por Mnester, o dançarino principal dos bailados mitológicos, então muito na 
moda. Costumava beijar Mnester à vista de toda a assistência sempre que ele fazia uma coisa particularmente bem 
feita. Um cavaleiro começou a tossir uma vez
352
durante um espectáculo, sem conseguir parar, acabando por ter que sair. O barulho que fez ao tentar passar 
entre os joelhos das pessoas, os pedidos de desculpas, a tosse, o abrir caminho nas passagens apinhadas, 
perturbaram Mnester, que parou no meio de uma das suas danças mais requintadas ao som brando de uma 
flauta e esperou que todos se aquietassem de novo. Calígula ficou furioso com o cavaleiro, mandou que o 
levassem à sua presença e deu­lhe uma boa tareia com as suas próprias mãos. Depois, despachou­o a toda 
a velocidade numa viagem a Tanger, com uma mensagem selada para o Rei de Marrocos (o Rei, um 
parente meu
­ a mãe dele era a minha Tia Selena, filha de António e Cleópatra ­, ficou muito espantado com a 
mensagem. Dizia apenas: ”Por gentileza, enviai o portador de regresso a Roma”). Os outros cavaleiros 
levaram muito a mal este incidente. Mnester era apenas um liberto e dava­se ares de general triunfante. 
Calígula recebia lições particulares de dicção e dança de Apeles e Mnester e, passado algum tempo, 
aparecia frequentemente no palco nos seus papéis. Depois de fazer um discurso numa tragédia qualquer, 
voltava­se por vezes e gritava para Apeles, que estava fora de cena: ”Foi perfeito, não foi? Tu próprio não 
podias ter feito melhor.” Depois de um gracioso salto e de uma pirueta ou duas, mandava parar a 
orquestra, erguia as mãos a pedir silêncio absoluto e repetia os movimentos sem acompanhamento.
Tal como Tibério tinha um dragão de estimação, Calígula tinha um garanhão preferido. O nome original 
deste cavalo era Porcelo (o que significa porco pequeno), mas Calígula não o achava suficientemente 
grandioso e mudou­lhe o nome para incitatus, que significa Veloz. Incitatus nunca perdia uma corrida e 
Calígula estimava­o de uma maneira tão extravagante, que o tornou primeiro cidadão e depois senador; 
finalmente, pô­lo na lista dos seus eleitos para o Consulado, com quatro anos de antecedência. Incitatus 
passou a ter uma casa e criados. Tinha um quarto de mármore com um grande tapete de palha a servir de 
cama, que era substituído todos os dias, assim como uma manjedoura de ouro, um balde de ouro para 
beber água e retratos de artistas famosos nas paredes. Era convidado para jantar connosco sempre que 
ganhava uma corrida, mas preferia uma tigela de aveia à carne e ao peixe que Calígula sempre lhe 
oferecia. Tínhamos que beber à saúde dele mais de vinte vezes.
O dinheiro desaparecia cada vez mais depressa e, por fim, Calígula, decidiu fazer economias. Como 
exemplo, certo dia, disse:
­ De que serve pôr homens na prisão por falsificação, roubo e por romperem a paz? Eles não se divertem 
lá dentro e são uma grande despesa para mim, que tenho que os alimentar e guardar. No entanto, se os 
deixasse sair, eles iriam recomeçar a sua carreira de crime. Vou visitar as prisões hoje e analisar a questão.
353
E fê­lo. Separou os homens que considerava como os criminosos mais empedernidos e mandou­os 
executar. Os seus corpos foram cortados aos bocados e usados como carne para os animais selvagens que 
esperavam para ser mortos no anfiteatro: o que resultou numa dupla economia. Passou a fazer a ronda das 
prisões todos os meses. O crime diminuiu ligeiramente. Um dia, o seu Tesoureiro, Calisto, informou­o que 
havia apenas um milhão de moedas de ouro no Tesouro e apenas meio milhão na Bolsa Privada. 
Compreendeu que fazer economias não bastava: era preciso aumentar o rendimento. A princípio, começou 
a vender sacerdócios, magistraturas e monopólios, e isso trouxe­lhe bastante dinheiro, mas não o 
suficiente; depois, tal como Calpúrnia previra, começou a usar informadores para condenar os homens 
ricos de crimes reais ou imaginários, para ficar com os seus bens. Abolira a pena capital por traição logo 
que se tornou Imperador, mas ainda havia bastantes outros crimes puníveis com a morte.
Celebrou a sua primeira série de condenações com uma caçada aos animais selvagens particularmente 
esplêndida. Mas a multidão estava de mau humor. Vaiaram e gemeram, recusaram­se a prestar atenção ao 
que estava a acontecer. Depois, um grito levantou­se do lado oposto ao do Camarote Presidencial, 
ocupado por Calígula: ”Desiste dos informadores! Desiste dos informadores!”. Calígula levantou­se para 
ordenar silêncio, mas eles vaiaram­no. Enviou os Guardas com bastões para o lado onde o barulho era 
mais forte e eles atingiram alguns homens na cabeça, mas o barulho recomeçou ainda mais violento noutro 
sítio. Calígula ficou alarmado. Deixou o anfiteatro à pressa, gritando­me que tomasse a presidência por 
ele. Isto não me agradou nada e fiquei muito aliviado, quando me levantei para falar, por a multidão me 
escutar atenta e terem mesmo gritado ”Feliciter”, o que significa ”Boa sorte para ti!”. A minha voz não é 
forte. A de Calígula era muito forte: conseguia fazer­se ouvir de uma ponta à outra dos Campos de Marte. 
Eu tive que arranjar alguém para repetir o meu discurso à medida que falava. Mnester ofereceu­se, e fê­lo 
soar muito melhor do que realmente era.
Anunciei que o Imperador, infelizmente, tinha tido que se ausentar por causa de um importante negócio de 
Estado. Isso pôs todos a rir; Mnester fez alguns belos gestos ilustratívos da importância e da urgência 
daquele negócio de Estado. Depois, disse que os deveres da Presidência tinham sido transferidos para a 
minha infeliz e indigna pessoa. O encolher de ombros desesperado de Ninester e o leve agitar do indicador 
junto às têmporas exprimiu de forma excelente o que queria dizer. Depois, acrescentei:
­ Continuemos com os Jogos, meus amigos. Mas o brado ergueu­se de novo:
­ Desiste dos informadores!
354
Mas eu perguntei e Mnester repetiu a pergunta de boa vontade:
­ E se o Imperador consentir em desistir deles, o que acontece? Alguém irá informar contra eles?
Não houve resposta para isto, a não ser um zumbido confuso. Fiz­lhes ainda outra pergunta. Perguntei­
lhes qual era a pior espécie de criminoso ­ um informador? Ou um informador contra um informador? Ou 
um informador contra um informador contra um informador? Disse que, quanto mais longe se levasse a 
ofensa, mais infame ela se tornava e mais pessoas prejudicava. A melhor política era não fazer nada que 
pudesse dar aos informadores qualquer razão para agirem. Se todas as pessoas, disse­lhes, vivessem uma 
vida da mais estrita virtude, a raça maldita morreria por falta de alimento, como ratos na cozinha de um 
avarento. Não podeis imaginar a tempestade de gargalhadas que este argumento provocou. Quanto mais 
simples e tola for a piada, mais o grande público a aprecia (o maior aplauso que alguma vez alcancei com 
um gracejo foi uma vez no Circo, quando calhou estar eu a presidir, na ausência de Calígula. As pessoas 
clamavam iradas por um espadachim chamado Pigeon ­ Pombo ­, que tinha sido anunciado mas não 
apareceu. Por isso, disse: ”Paciência, amigos! Primeiro, apanhai o vosso Pombo; depois, depenai­o!” No 
entanto, piadas minhas realmente espirituosas têm­se perdido completamente).
­ Continuemos com os jogos, meus amigos! ­ repeti; desta vez, os gritos pararam. Os jogos acabaram por 
ser muito bons. Dois espadachins mataram­se um ao outro, com estocadas simultâneas na barriga; isto é 
um acontecimento muito raro. Ordenei que as armas me fossem trazidas e mandei fazer pequenos 
canivetes com elas; esses pequenos canivetes são os amuletos mais eficazes que se conhecem, para usar 
em casos de epilepsia. Calígula apreciaria a oferta ­ caso me perdoasse por ter acalmado a multidão onde 
ele tinha falhado. A verdade é que ele estava de tal forma assustado, que saíra de Roma a toda a 
velocidade na direcção de Antium; e não voltou a ser visto durante vários dias.
Tudo acabou bem. Ele ficou satisfeito com as pequenas facas, que lhe deram a oportunidade de alargar o 
esplendor da sua doença; e, quando perguntou o que tinha acontecido no anfiteatro, disse­lhe que 
prevenira a multidão do que ele faria se eles não se arrependessem da sua deslealdade e ingratidão. Disse 
que tinham trocado os gritos de rebelião por uivos de medo e culpa e súplicas de perdão.
­ Sim, ­ disse ele, ­ fui demasiado generoso com eles. Estou decidido agora a não ceder nem uma 
polegada. Rigor inamovível é a palavra de ordem a partir de agora. ­ E, para não correr o risco de esquecer 
esta decisão, passou a praticar todas as manhãs caras assustadoras diante do espelho do quarto e gritos 
terríveis na sua casa de banho privativa, que tinha um belo eco.
355
Perguntei­lhe:
­ Porque não anuncias publicamente a tua divindade? Isso provocar­lhes­ia um respeito como nenhuma 
outra coisa poderia fazer! Ele respondeu:
­ Tenho ainda alguns actos a realizar sob o meu disfarce humano. O primeiro desses actos foi ordenar aos 
directores dos portos de Itália e da Sicília que detivessem todos os navios que tivessem acima de uma 
certa tonelagem, que pusessem as suas cargas em retenção e os enviassem vazios sob escolta de navios de 
guerra para a Baía de Nápoles. Ninguém compreendeu o que significava esta ordem. Calculou­se que ele 
estivesse a pensar numa invasão da Britânia e quisesse os navios para usar como transportes. Mas não era 
nada disso. Estava simplesmente a justificar a afirmação de Trasilo, que ele podia tanto tornar­se 
Imperador como atravessar a cavalo a baía de Baiae. Reuniu cerca de 4.000 navios, incluindo
1.000 que foram construídos especialmente para a ocasião, e ancorou­os de um lado ao outro da baía, 
bancada contra bancada, numa linha dupla desde as docas de Puteoli até à sua villa de Bauli. As proas 
estavam voltadas para fora e as popas enganchadas umas nas outras. As popas estavam demasiado altas 
para o que ele pretendia; por isso, mandou­as cortar rentes, serrando o assento do timoneiro e a figura de 
popa de todos eles, o que deixou as tripulações muito infelizes, porque a figura de popa era a divindade 
que guardava o navio. Seguidamente, fez pregar tábuas de um lado ao outro da dupla fieira, espalhou terra 
sobre as tábuas e mandou molhar e calcar a terra. O resultado foi uma estrada firme e ampla, com cerca 
de 4.500 metros de comprimento, de uma ponta à outra. Quando mais navios chegaram, vindos de viagens 
ao leste, atou­os uns aos outros formando cinco ilhas que ligou à estrada, cada uma a cerca de
750 metros. Mandou construir uma fileira de lojas de um lado ao outro e ordenou aos chefes das 
guarnições de Roma que as abastecessem com mercadorias e pessoal em dez dias. Instalou um sistema de 
água potável e plantou jardins. Às ilhas, transformou­as em aldeias.
Felizmente, o tempo esteve bom enquanto duraram estes preparativos e o mar tranquilo como um espelho. 
Quando tudo ficou pronto, pôs o peito de armas de Alexandre (Augusto não era digno de usar o anel de 
Alexandre, mas Calígula usou o seu peito de armas) e, por cima dele, uma capa de seda púrpura com 
bordados a ouro incrustados de jóias, que a mantinham rígida; depois, tomou a espada de Júlio César, o 
famoso machado de guerra de Rómulo e o famoso escudo de Eneias, que estavam guardados no Capitólio 
(ambos falsos, na minha opinião, mas falsificações tão antigas que eram quase genuínas), e coroou­se com 
uma grinalda de folhas de carvalho. Depois de um sacrifício propiciatório a Neptu­no uma foca, por ser 
um animal anfíbio ­ e outro, um pavão, à Inveja (caso, como ele disse, algum Deus sentisse inveja dele), 
montou Incitatus e
356
começou a trotar sobre a ponte, partindo do lado de Bauli. Toda a cavalaria da Guarda seguia atrás dele e, 
mais atrás, uma grande força de cavalaria trazida de França, seguida por 20.000 soldados de infantaria. 
Quando alcançou a última ilha, perto de Puteoli, ordenou aos seus trombeteiros que tocassem à carga e 
lançou­se tão ferozmente em direcção à cidade, como se estivesse a perseguir um inimigo em debandada.
Ficou em Puteoli nessa noite e a maior parte do dia seguinte, como se estivesse a descansar de uma 
batalha. A noite, regressou num carro triunfal com as rodas e os lados chapeados a ouro. Incitatus e a égua 
Penélope, com a qual Calígula o casara ritualmente, estavam atrelados ao carro. Calígula usava as mesmas 
roupas esplêndidas que anteriormente, exceptuando­se o facto da sua grinalda ser concebida com folhas de 
louro, em vez de folhas de carvalho. Um longo cortejo de vagões seguia­o, apinhados com aquilo que 
pretendia serem os despojos da batalha
­ mobiliário, estátuas e ornamentos roubados das casas de ricos mercadores de Puteoli. Como prisioneiros, 
usou os reféns que os pequenos reis do leste tinham que enviar para Roma como penhor de bom 
comportamento e todos os escravos estrangeiros a que conseguiu deitar a mão, vestidos com os seus trajos 
nacionais e carregados de correntes. Os seus amigos seguiam em carros decorados, usando túnicas 
bordadas e cantando os seus louvores. Depois vinha o exército e, por fim, uma procissão de cerca de 
200.000, pessoas em trajo de festa. Inúmeras fogueiras estavam acesas em todo o círculo de colinas que 
rodeavam a baía e todos os soldados e cidadãos que seguiam na procissão levavam um archote. Foi o mais 
impressionante espectáculo teatral, penso eu, que o mundo alguma vez viu; e tenho a certeza que foi o 
mais inútil. Mas como agradou a todos! Um pinhal pegou fogo no Cabo Míseno, a sudoeste, envolvendo­
se em labaredas magníficas. Logo que Calígula chegou de novo a Bauli, desmontou e pediu o seu tridente 
com os dentes de ouro e a outra capa de púrpura, trabalhada com peixes e golfinhos de prata. Com estes, 
entrou na maior das cinco barcaças de recreio construídas em cedro que estavam à espera do lado de terra 
e foi levado a remos até à ilha que estava no meio das cinco, que era de longe a maior, seguido pela maior 
parte do seus soldados em barcos de guerra.
Aqui desembarcou, subiu para uma plataforma forrada de seda e arengou as multidões à medida que 
passavam na ponte. Havia guardas que os mantinham em movimento; por isso, ninguém ouvia mais de 
algumas frases, excepto os amigos que estavam em volta da plataforma
­ entre os quais eu me encontrava ­ e os soldados nos barcos de guerra mais próximos, que não tinham 
sido autorizados a desembarcar. Entre outras coisas, chamou cobarde a Neptuno por se ter deixado pôr a 
ferros sem lutar e prometeu, em breve, ensinar ao velho Zeus uma lição ainda mais violenta, (parecia 
esquecer o sacrifício propiciatório que tinha feito).
357
Quanto ao Imperador Xerxes, que em tempos construíra uma ponte no Helesponto no decorrer da 
sua malfadada expedição contra a Grécia, Calígula riu­se dele perdidamente. Disse que a famosa 
ponte de Xerxes tinha apenas metade do comprimento daquela e não tinha metade da solidez. 
Depois, anunciou que ia dar duas moedas de ouro a cada soldado para beberem à sua saúde e a 
cada membro da multidão cinco moedas de prata.
As aclamações duraram meia hora, o que pareceu satisfazê­lo. Interrompeu­os e mandou pagar ali 
mesmo o dinheiro. Toda a procissão teve que desfilar de novo diante dele e saco após saco de 
moedas foi trazido e esvaziado. Ao cabo de umas duas horas, o fornecimento de dinheiro falhou e 
Calígula disse aos que chegaram depois, que ficaram decepcionados, que se vingassem nos que 
tinham chegado primeiro, cheios de sofreguidão. Isto, claro, gerou uma luta desenfreada.
Seguiu­se uma das mais memoráveis noites de bebida e cantoria, jogos a cavalo, violência e folia 
que alguma vez se conheceu. O efeito da bebida em Calígula era sempre o de o tornar um tanto 
maléfico. À frente dos Batedores e da guarda germana, andou à carga pela ilha e pela frente das 
lojas, empurrando as pessoas para o mar. As águas estavam tão calmas que só os que estavam a 
cair de bêbedos, os decrépitos, os idosos e as crianças é que não conseguiram salvar­se. Não 
foram mais de 200 ou 300 os que se afogaram.
Cerca da meia­noite, fez um ataque naval a uma das ilhas mais pequenas, destruindo a ponte de 
um e de outro lado, abalroando depois, um a seguir ao outro, os navios da ilha, até que os 
habitantes que ele tinha isolado se encontraram apinhados num espaço muito pequeno, a meio. O 
ataque final estava reservado para o navio almirante de Calígula. Postou­se no cimo do castelo de 
popa, acenando com o seu tridente, lançou­se sobre os sobreviventes aterrorizados e afundou­os a 
todos. Entre as vítimas desta batalha naval estava a peça mais notável exibida no cortejo triunfal 
de Calígula ­ Eleazar, o refém parto, que era o homem mais alto do mundo. Tinha mais de onze 
pés de altura. A sua força, no entanto, não era proporcional à altura: a sua voz era como o balido 
de um camelo e tinha as costas fracas, sendo ainda considerado como tendo um intelecto débil. 
Era judeu de nascimento. Calígula mandou empalhar o corpo, vestido com uma armadura, e 
colocou Eleazar do lado de fora da porta do seu quarto, para assustar possíveis assassinos.
358
CAPíTULO XXXI
Os custos destes dois dias de divertimento esgotaram completamente o Tesouro e a Bolsa Privada. Para 
tornar as coisas ainda piores, Calígula, em vez de devolver os navios aos seus mestres e às tripulações, 
ordenou que a ruptura da ponte fosse reparada e depois, regressando a Roma, ocupou­se com outros 
assuntos. Neptuno, para provar que não era nenhum cobarde, enviou uma forte tempestade sobre a ponte, 
vinda de oeste, e afundou cerca de 1.000 navios. A maior parte dos restantes arrastaram as suas âncoras e 
foram levados para a costa. Cerca de 2.000 enfrentaram a tempestade e foram puxados para a praia por 
uma questão de segurança, mas a perda dos restantes causou grande falta de embarcações para o transporte 
de trigo do Egipto e de África e, consequentemente, originou uma grave escassez de alimento na Cidade. 
Calígula jurou vingar­se de Neptuno. As suas novas maneiras de angariar fundos eram muito engenhosas e 
divertiam toda a gente, excepto as vítimas e os seus amigos ou dependentes. Por exemplo, a quaisquer 
jovens que ele deixasse tão fortemente endividados para com ele através de multas e confiscações, 
tornava­os seus escravos e enviava­os para as escolas de gladiadores. Quando estavam treinados, punha­os 
no anfiteatro para lutarem pela própria vida. A sua única despesa com eles era comida e casa: sendo 
escravos, não recebiam remuneração. Se fossem mortos, era o fim deles. Se saíssem vitoriosos, leiloava­os 
aos magistrados, cujo dever era organizar lutas semelhantes ­ muitos eram atraídos por esta distinção ­, ou 
a qualquer outra pessoa que quisesse fazer uma oferta. Fazia subir os preços a montantes absurdos, 
fingindo que as pessoas tinham feito ofertas quando se tinham limitado a coçar a cabeça ou a esfregar o 
nariz. O meu sacudir de cabeça nervoso arranjou­me um grande problema: vi­me com três gladiadores, a 
uma média de 2.000 moedas de ouro cada. Mas tive mais sorte que o magistrado de nome Apónio, que 
adormeceu durante o leilão. Calígula vendeu­lhe lutadores que não pareciam interessar a mais ninguém, 
subindo a parada cada vez que a cabeça lhe descaía sobre o peito: quando acordou, descobriu que tinha 
nada menos de 90.000 moedas de ouro a pagar por treze lutadores, nos quais não tinha o menor interesse. 
Um dos que eu comprei era um excelente lutador, mas Calígula apostou fortemente contra ele. Quando 
chegou o dia de ele lutar, quase não se
359
aguentava de pé e foi facilmente derrotado. Parece que Calígula lhe tinha drogado a comida. Muitos 
homens ricos vinham a estes leilões e ofereciam de boa vontade grandes somas, não porque quisessem 
lutadores, mas porque, se abrissem agora os cordões à bolsa, seria menos provável que Calígula viesse a 
fazer alguma acusação contra eles mais tarde ou a roubar­lhes a vida e o dinheiro.
No dia em que o meu lutador foi derrotado, aconteceu uma coisa divertida. Calígula tinha apostado forte 
comigo contra cinco homens de rede e tridente escolhidos para lutar contra igual número de caçadores 
armados com espada e escudo. Eu estava resignado a perder as 1.000 moedas de ouro que ele me fez 
apostar, contra 5.000 suas; logo que a luta começou, percebi que os homens das redes tinham sido 
subornados para perder a luta. Eu estava sentado ao lado de Calígula e disse:
­ Bom, parece­me que vais ganhar, mas, na minha opinião, esses homens das redes não estão a dar o seu 
melhor.
Um por um, os caçadores começaram a cercar os homens das redes, que se renderam, e, por fim, os cinco 
ficaram deitados com a cara na areia, cada um com um caçador de pé por cima dele, com a espada 
erguida. A assistência voltou os polegares para baixo, como sinal de que deviam ser mortos. Calígula, na 
qualidade de Presidente, tinha o direito de aceitar este conselho ou não, conforme lhe apetecesse. Aceitou.
­ Matai­os! ­ gritou. ­ Não tentaram ganhar!
Isto era duro para os homens das redes, a quem ele prometera secretamente poupar a vida se eles se 
deixassem vencer; pois eu não era de forma alguma o único homem que tinha sido forçado a apostar neles 
Calígula ganharia 80.000 moedas se eles perdessem. Bom, um deles ficou tão furioso por estar a ser 
enganado, que se atirou repentinamente ao seu caçador, o virou e conseguiu agarrar um tridente, que 
estava no chão não muito longe dele, bem como uma rede, afastando­se a correr. É difícil de acreditar, 
mas acabei por ganhar 5.000 moedas! Primeiro, aquele homem da rede irado matou dois caçadores que se 
encontravam de costas para ele e estavam ocupados a receber os aplausos da assistência, depois de terem 
despachado as suas vítimas; depois, matou os outros três, um a seguir ao outro, à medida que avançavam a 
correr direitos a ele, poucos metros atrás uns dos outros. Calígula chorou de raiva e exclamou:
­ Oh, o monstro! Vede, matou cinco espadachins prometedores com aquele seu horrível tridente!
Quando digo que ganhei os meus 5.000, quero dizer que os teria ganho, se não tivesse tido o tacto 
suficiente para desistir da aposta.
­ Um homem matar cinco não é uma luta leal, ­ afirmei.
Até esta altura, Calígula sempre falara de Tibério como um perfeito malandro e encorajava todos a 
fazerem o mesmo. Mas um dia entrou no Senado e fez um longo discurso laudatório a seu respeito, 
dizendo que
360
tinha sido um homem incompreendido e que ninguém devia dizer o que quer que fosse contra ele.
­ Na minha qualidade de Imperador, tenho o direito de o criticar se me apetecer, mas vós não tendes esse 
direito. Na verdade, sois culpados de traição. No outro dia, um senador disse num discurso que os meus 
irmãos Nero e Druso tinham sido assassinados por Tibério depois de terem sido detidos sob falsas 
acusações. Que coisa espantosa de se dizer!
Em seguida, apresentou os registos que fingira ter queimado e leu longos extractos. Mostrou que o Senado 
não tinha questionado as provas reunidas contra os irmãos por Tibério, votando unanimemente para que 
fossem entregues para o castigo. Alguns, tinham­se mesmo oferecido para testemunhar contra eles. 
Calígula disse:
­ Se sabíeis que as provas que Tibério apresentara diante de vós (com toda a boa fé) eram falsas, então os 
assassinos sois vós, não ele; e só depois de ele ter morrido é que ousastes lançar sobre ele as culpas pela 
vossa crueldade e traição. Ou, se pensastes na altura que as provas eram verdadeiras, então ele não foi 
nenhum assassino e vós estais traiçoeiramente a difamar o seu carácter. Ou, se pensastes que eram falsas e 
que ele sabia que o eram, então fostes tão culpados do assassinato como ele; e, ainda por cima, cobardes. ­ 
Franziu a testa com força imitando Tibério, agitou a mão à maneira de Tibério, num gesto brusco de quem 
corta alguma coisa, o que fez reviver recordações assustadoras de julgamentos por traição. Com a voz 
áspera de Tibério, disse:
­ Falaste bem, meu Filho! A tua confiança nestes malandros não pode ir mais longe que um pontapé. Vede 
como fizeram de Sejano um pequeno Deus, antes de se voltarem e o desfazerem em pedaços! Far­te­ão o 
mesmo a ti, se tiverem uma oportunidade. Todos te odeiam e rezam pela tua morte. O conselho que te dou 
é que não te ocupes de nenhum interesse, a não ser o teu próprio, e põe o prazer acima de tudo. Ninguém 
gosta de ser governado e a única maneira como consegui conservar o meu lugar foi fazer esta escumalha 
ter medo de mim. Faz o mesmo. Quanto pior os tratares, mais te honrarão.
Depois, Calígula reintroduziu a pena capital para o crime de traição, ordenou que o seu discurso fosse 
imediatamente gravado numa placa de bronze e colocado na parede da Casa, por cima dos assentos dos 
Cônsules. Depois, saíu apressado. Nesse dia, não se tratou de mais nada: estávamos todos demasiado 
abatidos. Mas no dia seguinte despejámos louvores sobre Calígula como um governante sincero e piedoso 
e votámos sacrifícios à sua Clemência. Que outra coisa podíamos fazer? Ele tinha o Exército por trás dele 
e poder de vida e de morte sobre nós e, até que alguém fosse suficientemente ousado e esperto para fazer 
uma conspiração bem sucedida contra a vida dele, a única coisa que podíamos fazer era agradar­lhe e 
esperar o melhor. Algumas noites depois, num banquete,
361
foi de repente apanhado pelo mais extraordinário ataque de riso. Ninguém sabia qual era a piada. Os dois 
Cônsules, que estavam sentados ao lado dele, perguntaram se lhes seria graciosamente permitido 
participar dela. Isto fez Calígula rir ainda com mais força, com as lágrimas a caírem­lhe dos olhos.
­ Não, ­ disse meio sufocado, ­ a questão é mesmo essa. Trata­se de uma piada a que não acharíeis graça 
nenhuma. Estava a rir­me só de pensar que, com um aceno de cabeça, podia mandar cortar o pescoço a 
ambos aqui mesmo.
Acusações de traição foram apresentadas contra os vinte homens reconhecidos como os mais ricos de 
Roma. Não lhes foi dada a oportunidade de cometerem suicídio antes do julgamento e todos foram 
condenados à morte. Um deles, um magistrado superior, acabou por se revelar como um homem bastante 
pobre.
Calígula disse:
­ O idiota! Porque fingiu que tinha dinheiro? Fui levado. Ele não precisava ter morrido.
Apenas me lembro de um único homem que escapou com vida de uma acusação de traição. Foi Afer, o 
homem que tinha processado a minha prima Pulcra, um advogado famoso pela sua eloquência. O seu 
crime foi ter posto uma inscrição numa estátua de Calígula no vestíbulo da sua casa, dizendo que o 
Imperador, no seu vigésimo sétimo anos de idade, já era cônsul pela segunda vez. Calígula achou que isto 
era uma traição um riso de desprezo pela sua juventude e uma censura contra ele, por ter mantido o cargo 
por mais tempo do que era legalmente permitido. Compôs um longo e muito cuidado discurso contra Afer 
e apresentou­o no Senado, pondo ao seu serviço toda a força da oratória, com cada gesto e entoação 
cuidadosamente ensaiados antes. Calígula costumava gabar­se de ser o melhor advogado e orador do 
mundo e estava ainda mais ansioso por ofuscar Afer com a sua eloquência do que em assegurar a sua 
condenação e confiscar­lhe o dinheiro. Afer compreendeu isto e fingiu­se espantado e subjugado pelo 
génio de Calígula como promotor público. Repetiu as acusações contra ele próprio, ponto por ponto, 
elogiando­as com um distanciamento profissional e murmurando: ”Sim, isso é irrefutável”; ”Ele 
conseguiu dar todo o peso a esse argumento”; ”Um verdadeiro dilema”; ”Que extraordinário domínio da 
linguagem!”. Quando Calígula chegou ao fim e se sentou com um sorriso triunfante, perguntaram a Afer 
se tinha alguma coisa a dizer. Ele replicou:
­ Nada, a não ser que considero que tenho muito pouca sorte. Tinha contado usar os meus dotes oratórios 
como uma leve compensação perante a ira do Imperador contra a minha indesculpável leviandade no que 
diz respeito a essa malfadada inscrição. Mas o Destino viciou os dados contra mim. O Imperador tem todo 
o peso, um caso indiscutível contra
362
mim e mil vezes mais eloquência do que eu alguma vez podia esperar atingir, mesmo que escapasse à 
condenação e estudasse até me tornar centenário.
Foi condenado à morte, mas a sentença foi suspensa no dia seguinte. Falando de dados viciados: quando 
os cidadãos ricos da província vinham à cidade, eram sempre convidados a jantar no Palácio e a participar 
depois num jogo amigável. Ficavam espantados e deslumbrados com a sorte do Imperador: saía­lhe Vénus 
a cada lançamento e tirava­lhes tudo o que tinham. Sim, Calígula jogava sempre com dados viciados. Por 
exemplo, demitiu os Cônsules do seu cargo e aplicou­lhes pesadas multas com base em terem celebrado o 
habitual festival em honra da vitória de Augusto sobre António em Áccio. Disse que se tratava de um 
insulto ao seu antepassado António (a propósito, nomeou Afer para um dos lugares vagos de Cônsul). 
Tinha­nos dito ao jantar, alguns dias antes do festival, que, fizessem os Cônsules o que fizessem, os 
puniria, porque, se não tivessem celebrado o festival, estariam a insultar o seu antepassado Augusto. Foi 
nesta ocasião que Ganimedes cometeu um erro fatal. Gritou:
­ Tu és astuto, meu querido! Apanha­los de qualquer maneira. Mas os pobres idiotas hão­de celebrar o 
festival, se é que têm algum senso; porque Agripa fez a maior parte do trabalho em Accio e ele também 
foi teu antepassado; portanto, eles estarão a honrar pelo menos dois de três dos teus antepassados.
Calígula disse:
­ Ganimedes, já não somos amigos.
­ Oh, ­ disse Ganimedes, ­ Não me digas isso, meu querido! Eu não disse nada que te ofendesse pois não?
­ Sai da mesa, ­ ordenou Calígula.
Percebi imediatamente qual tinha sido o erro. Ganimedes, como primo de Calígula pelo lado materno, era 
descendente de Augusto e de Agripa, mas não de António. Todos os seus antepassados tinham sido do 
partido de Augusto. Portanto, devia ter tido o cuidado de evitar o assunto. E Calígula detestava que lhe 
lembrassem que descendia de Agripa, um homem proveniente de uma família sem distinção. Mas, de 
momento, não tomou qualquer atitude contra Ganimedes.
Divorciou­se de Lólia, dizendo que ela era estéril, e casou­se com uma mulher chamada Cesónia. Esta não 
era jovem nem bonita e era filha de um capitão da Guarda, casada com um padeiro, ou alguém assim, de 
quem já tinha três filhos. Mas havia qualquer coisa nela que atraiu Calígula, de uma forma que ninguém 
conseguia explicar, ele menos que ninguém. Calígula costumava dizer muitas vezes que havia de tirar 
dela o segredo, mesmo que tivesse que o fazer com a tortura da corda de violino, para saber porque a 
amava tão completamente. Dizia­se que ela o conquistara com um filtro de amor e que este o enlouquecia. 
Mas o filtro de amor era
363
apenas uma desconfiança e ele já tinha começado a enlouquecer muito antes de conhecer Cesónia. De 
qualquer forma, ela estava grávida dele e Calígula ficou tão excitado com a ideia de ser pai que, como já 
disse, casou com ela. Foi pouco depois deste casamento com Cesónia que, pela primeira vez, declarou 
publicamente a sua Divindade. Visitou o Templo de Júpiter no Monte Capitolino. Apeles estava com ele. 
Calígula perguntou a Apeles:
­ Quem é o Deus maior: Júpiter ou eu próprio?
Apeles hesitou, pensando que Calígula estivesse a gracejar e não querendo blasfemar contra Júpiter no 
próprio templo dele.
Calígula assobiou para dois germanos e mandou despir e chicotear Apeles à vista da estátua de Júpiter.
­ Mais devagar, ­ disse Calígula para os germanos. ­ Bem devagar, para ele sentir melhor.
Chicotearam­no até ele desmaiar e, depois, reanimaram­no com água sagrada, chicoteando­o novamente 
até à morte. Depois, Calígula enviou cartas ao Senado anunciando a sua divindade e ordenou a construção 
imediata de um grande santuário ao lado do templo de Júpiter, ”para eu poder habitar com o meu irmão 
Júpiter”. Aí, mandou colocar uma imagem de si próprio com três vezes o tamanho natural, feita de ouro 
maciço e onde aparecia vestido todos os dias com um trajo novo.
Mas em breve se zangou com Júpiter e ouviram­no ameaçá­lo, irado:
­ Se não consegues perceber quem é o senhor aqui, mando­te para a Grécia.
Júpiter deve ter pedido desculpas e Calígula disse:
­ Oh, fica lá com o teu maldito Monte Capitolino. Eu vou para o Palatino. Tem muito melhor situação, 
Vou construir aí um templo digno de mim mesmo, velho aldrabão maltrapilho e cheio de ruídos 
intestinais.
Outra coisa curiosa aconteceu quando visitou o templo de Diana, acompanhado por um antigo governador 
da Síria chamado Vitélio. Vitélio tinha sido muito bem sucedido por lá, tendo surpreendido o Rei da 
Pártia, que se preparava para invadir a província, atravessando o Eufrates numa marcha forçada. 
Apanhado num terreno desfavorável para a batalha, o rei parto foi obrigado a assinar uma paz humilhante 
e a entregar os filhos como reféns. Eu devia ter mencionado que Calígula levava o filho mais velho com 
ele no seu carro, como prisioneiro, quando atravessou a ponte. Bom, Calígula tinha inveja de Vitélio e tê­
lo­ia mandado matar se este não tivesse sido prevenido por mim (ele era meu amigo) do que devia fazer. 
Uma carta minha aguardava­o em Brindisi quando lá chegou e, logo que alcançou Roma e foi admitido à 
presença de Calígula, caiu prostrado e adorou­o como a um Deus. Isto foi antes da notícia da divindade de 
Calígula ser oficialmente conhecida; portanto, Calígula pensou que se tratava de um tributo genuíno. 
Vitélio tornou­se seu amigo íntimo
364
e mostrou de muitas formas a sua gratidão para comigo. Como eu dizia, Calígula estava no templo de 
Diana falando com a Deusa ­ não a estátua, mas uma presença invisível. Perguntou a Vitélio se também a 
via, ou se apenas via o luar. Vitélio tremeu violentamente, como que tomado de assombro e, sempre com 
os olhos fixados no chão, disse:
­ Só a vós os Deuses, meu Senhor, é dado o privilégio de vos olhardes uns aos outros.
Calígula ficou satisfeito.
­ Ela é muito bela, Vitélio, e vem muitas vezes dormir comigo no Palácio.
Foi mais ou menos por esta altura que arranjei de novo complicações. A princípio, pensei que se tratava de 
uma conspiração de Calígula para se desembaraçar de mim. Ainda não tenho a certeza que não fosse. Um 
conhecido meu, um homem com quem jogava dados muitas vezes, forjou um testamento e deu­se ao 
trabalho de forjar o meu selo a testemunhálo. Felizmente para mim, ele não tinha notado uma pequena 
falha na orla de ágata do selo, que sempre deixava uma marca na cera. Quando fui repentinamente detido 
por conspiração e fraude e levado a tribunal, subornei um soldado para que levasse um pedido secreto ao 
meu amigo Vitélio, suplicando­lhe que me salvasse a vida, tal como eu salvara a dele. Pedi­lhe que falasse 
na falha da pedra a Calígula, que estava a julgar o caso, e para ter um selo dos meus, genuíno, a postos, 
para Calígula comparar com o falso. Mas Calígula devia ser encorajado a encontrar a diferença por si 
próprio e a receber todo o crédito. Vitélio tratou do assunto com o maior tacto. Calígula notou a falha, 
gabou­se da acuidade da sua visão e absolveu­me com uma advertência severa, para que no futuro fosse 
mais cuidadoso com as pessoas a quem me associava. O falsificador teve as mãos amputadas e penduradas 
ao pescoço, como advertência. Se se tivesse concluído que eu era culpado, teria ficado sem cabeça. 
Calígula disse­mo nessa noite, ao jantar.
Repliquei:
­ Deus misericordioso, não compreendo por que te incomodas tanto com a minha vida.
Faz parte da natureza dos sobrinhos deleitarem­se com a lisonja de um tio. Ele descontraiu­se um pouco e 
perguntou­me, com um piscar de olhos para o resto da mesa:
­ E qual o valor exacto que porias na tua vida esta noite, posso perguntar?
­ já fiz o cálculo: um ceitil.
­ E como foi que chegaste a um número tão modesto?
­ Todas as vidas têm um valor que se pode calcular. O resgate que a família de Júlio César pagou aos 
piratas que o tinham capturado e ameaçavam matá­lo ­ embora a princípio eles pedissem bastante mais do 
que
365
isso ­, não passou de vinte mil moedas de ouro. Assim, a vida de Júlio César não valia mais de vinte mil 
moedas. A minha mulher Élia foi assaltada uma vez por ladrões, mas persuadiu­os a poupar­lhe a vida 
entregando­lhes um broche de ametista que apenas valia cinquenta moedas. Por isso, Élia não valia mais 
de cinquenta. A minha vida acaba de ser salva por uma falha de ágata que pesará, segundo os meus 
cálculos, não mais que a quadragésima parte de uma grama. Esse tipo de ágata vale talvez uma moeda de 
prata por grama. A falha, se fosse possível encontrá­la, o que seria difícil, ou encontrar um comprador, o 
que seria ainda mais difícil, valeria portanto a quadragésima parte de uma moeda de prata, ou seja, 
exactamente um ceitil. Por isso, a minha vida vale exactamente um ceitil...
­ Se eu conseguisse arranjar um comprador, ­ rugiu ele, encantado com a sua própria piada. Como todos o 
aclamaram, incluindo eu próprio! A partir daí, durante muito tempo, fui tratado por Terúncio Cláudio no 
Palácio, em vez de Tibério Cláudio. Terúncio é o nome latino para ceitil
Para ser venerado, Calígula precisava de sacerdotes. Ele era o seu próprio Sumo­sacerdote e os seus 
subordinados eram a minha pessoa, Cesónia, Vitélio, Ganimedes, catorze ex­Cônsules e o seu nobre 
amigo, o cavalo Incitatus. Cada um destes subordinados tinha que pagar 80.000 moedas de ouro pela 
honra. Ele ajudava Incitatus a arranjar o dinheiro, impondo um tributo anual em seu nome a todos os 
cavalos de Itália: se eles não pagassem, seriam enviados para o abate. Ajudava Cesónia a arranjar o 
dinheiro obrigando ao pagamento de um imposto em seu nome a todos os homens casados, pelo privilégio 
de dormirem com as suas esposas. Ganimedes, Vitélio e os outros eram homens ricos; embora, em 
algumas ocasiões, eles tivessem que vender alguma propriedade com prejuízo para arranjar as 80.000 
moedas de um momento para o outro. Mesmo assim, a sua situação era confortável. O mesmo não 
acontecia com o pobre Cláudio. As artimanhas anteriores de Calígula ao vender­me lutadores à espada e 
cobrando­me pesadamente o privilégio de comer e dormir no Palácio, tinham­me deixado com umas 
meras 30.000 moedas em dinheiro e sem nenhuma propriedade para vender, excepto a minha pequena 
propriedade de Cápua e a casa que me fora deixada por minha mãe. Paguei a Calígula os 30.000 e disse­
lhe nessa mesma noite, ao jantar, que ia pÔr imediatamente à venda todas as minhas propriedades para 
conseguir pagar o que faltava, logo que arranjasse um comprador.
­ Não tenho mais nada para vender, ­ disse. Calígula achou aquilo uma boa piada.
­ Mais nada para vender? O quê, então e a roupa que tens no corpo?
Entretanto, eu já descobrira que o mais sensato era fazer­me de completamente idiota.
366
­ Em nome dos céus, ­ disse, ­ tinha­me esquecido disso. Não quererias ter a bondade de a leiloar por mim a toda esta 
gente? Tu és o mais maravilhoso leiloeiro do mundo. ­ Comecei a despir toda a roupa que trazia até ficar sem nada 
em cima do corpo, a não ser um guardanapo que ele amarrou apressadamente à volta dos meus rins. Vendeu as 
minhas sandálias a alguém por 100 moedas de ouro cada, e a minha túnica por
1.000 e assim por diante; de cada vez, eu exprimia um entusiasmo efusivo. Depois, quis leiloar o guardanapo. Eu 
disse:
­ A minha modéstia natural não me impediria de sacrificar o meu último trapo, se o dinheiro que ele pudesse trazer 
me ajudasse a pagar o resto do que te devo. Mas neste caso, infelizmente, alguma coisa ainda mais forte que a 
modéstia impede­me de o vender.
Calígula franziu a testa.
­ E o que é isso? O que é mais forte que a modéstia?
­ A minha veneração por ti próprio, César. O guardanapo é teu. Um que tu graciosamente colocaste para meu uso 
durante esta excelente refeição.
Esta pequena farsa apenas reduziu a minha dívida em 3.000 moedas. Mas serviu para convencer Calígula da minha 
pobreza.
Tive que desistir dos meus aposentos e do meu lugar à mesa e alojei­me por algum tempo com a velha Briseis, a 
antiga criada de minha mãe que tomava conta da casa enquanto não arranjávamos um comprador. Calpúrnia veio 
viver comigo ali, e quase não dá para acreditar que aquela criaturinha excelente ainda tinha o dinheiro que eu lhe 
dera, em vez dos colares, dos sagüis e dos vestidos de seda, oferecendo­se para mo emprestar. Ainda por cima, o 
meu gado não tinha realmente morrido, como ela fingira, nem as medas tinham ardido. Fora apenas um truque para 
vender tudo secretamente por bom preço e pôr o dinheiro de lado para uma emergência. Entregou­mo todo 2.000 
moedas de ouro ­ juntamente com uma explicação detalhada das transacções, assinada pelo meu administrador. E 
assim nos arranjámos bastante bem. Mas, para manter a fachada de pobreza absoluta, eu saía todas as noites com um 
jarro, usando uma muleta em vez da liteira, para ir comprar vinho às tabernas.
A velha Briseis costumava dizer:
­ Menino Cláudio, todos pensam que eu era uma liberta de vossa mãe. Não é verdade. Tornei­me vossa escrava 
quando crescestes e fostes vós que me destes a liberdade, não ela, não é verdade?
Eu respondia:
­ Claro, Briseis. Um dia, hei­de afixar essa mentira em público.
­ Ela era uma boa velhinha e era­me inteiramente devotada. Vivíamos juntos em quatro quartos, com um velho 
escravo a servir de porteiro e, de uma maneira geral, fomos muito felizes.
367
O bebé de Cesónia, uma menina, nasceu um mês depois de Calígula ter casado com ela. Calígula disse que 
se tratava de um prodígio. Pegou na criança e deitou­a sobre os joelhos de uma estátua de Júpiter ­ isto foi  
antes do seu desentendimento com Júpiter ­, como que para fazer dele seu colega honorário na 
paternidade. Depois, pô­la nos braços da estátua de Minerva e deixou­a sugar por algum tempo os seios de 
mármore da deusa. Chamou­lhe Drusila, o nome que a irmã morta tinha posto de lado quando se tornou a 
deusa Pantea. Esta criança foi também feita sacerdotisa. Arranjou o dinheiro para pagar a iniciação, 
fazendo um apelo patético ao público, lamentando­se do seu estado de pobreza e das enormes despesas da 
paternidade e abrindo um fundo, chamado Fundo Drusila. Pôs caixas de esmolas em todas as ruas 
assinaladas com as palavras Comida para Drusila, Bebida para Drusila e Dote de Drusila e ninguém 
ousava passar diante dos Guardas ali estacionados sem colocar uma ou duas moedas.
Calígula amava ternamente a sua pequena Drusila, que se revelou uma criança tão precoce como o fora  
ele próprio. Deliciava­se a ensinar­lhe o seu próprio rigor inabalável, começando as lições quando ela 
ainda mal sabia andar e falar. Encorajava­a a torturar gatinhos e cachorros e a atacar com as unhas afiadas 
os olhos dos seus pequenos companheiros de folguedos.
­ Não pode haver qualquer dúvida quanto à tua paternidade, minha bela, ­ costumava dizer com uma 
risada, quando ela mostrava alguma promessa particular. E uma vez, na minha presença, inclinou­se e 
disse­lhe em segredo, ­ E ao primeiro crime verdadeiro que cometas, nem que se trate apenas do teu pobre 
e velho tio­avô Cláudio, faço de ti uma Deusa.
­ Fazes de mim uma Deusa se eu matar a Mamã? ­ sussurrou o pequeno demónio, ­ Odeio a mamã.
A estátua de ouro para o seu templo foi outra despesa. Pagou­a publicando um édito em como receberia 
prendas de Ano Novo ao portão principal do Palácio. Quando chegou o dia, enviou grupos de Guardas 
para encaminhar as multidões da Cidade com a ponta da espada para o Monte Palatino e aí fazê­los 
despejar toda as moedas que tinham com eles em grandes tinas espalhadas para o efeito. Foram avisados 
de que, se tentassem fugir aos Guardas ou esconder uma só moeda, incorriam em morte imediata. Ao fim 
do dia, duas mil enormes tinas tinham sido enchidas.
Foi por esta altura que ele disse a Ganimedes, Agripina e Lésbia:
­ Devíeis ter vergonha de vós próprios, zangãos inúteis. O que fazeis pelo vosso sustento? Sois uns meros 
parasitas. Tendes consciência de que todos os homens e mulheres de Roma trabalham duramente para me 
manter? Cada miserável bagageiro paga­me alegremente um oitavo do seu salário e todas as pobres 
prostitutas fazem o mesmo.
368
Agripinila disse:
­ Bom, irmão, já nos despojastes de todo o nosso dinheiro sob um pretexto ou outro. Isso não é o 
suficiente?
­ Suficiente? Não, realmente não é. O dinheiro herdado não é o mesmo que o dinheiro ganho 
honestamente. Vou pô­los a trabalhar. Assim, deu a saber no Senado, distribuindo folhetos, que em tal e 
tal
noite um bordel requintado e exclusivo seria aberto no Palácio, com entretenimento adequado a todos os 
gostos, proporcionado por pessoas do mais ilustre nascimento. A entrada custava apenas 1.000 moedas de 
ouro, As bebidas eram gratuitas. Agripinila e Lésbia, lamento dizê­lo, não protestaram muito 
violentamente contra a infeliz proposta de Calígula, e pensaram mesmo que seria muito divertido. Mas 
insistiram em que deviam ter o direito de escolher os seus próprios clientes e que Calígula não devia 
retirar uma comissão demasiado alta do dinheiro ganho. Com grande desgosto da minha parte, fui 
arrastado para este negócio ao ser vestido como porteiro cómico. Calígula, de máscara e disfarçando a 
voz, era o senhor do bordel e fazia todos os truques característicos para privar os clientes do prazer e do 
dinheiro. Quando eles protestavam, chamavam­me para servir de segurança. Eu tenho bastante força nos 
braços, mais do que a maior parte dos homens, posso dizê­lo, embora as minhas pernas não me sirvam de 
muito: por isso, as pessoas divertiam­se muito com o meu andar desajeitado e com as valentes surras que 
eu dava aos clientes quando conseguia agarrá­los. Calígula declamava numa voz teatral os versos de 
Homero:
Vulcano, com desajeitada graça o seu ofício domina E com um riso ininterrupto os céus abana e ilumina.
Esta era a passagem do Primeiro Livro da Ilíada, em que o Deus coxo vai mancando pelo Olimpo e os 
outros Deuses todos se riem dele. Eu estava deitado no chão a socar o marido de Lésbia com os punhos ­ 
não era muitas vezes que tinha a oportunidade de ajustar velhas contas Erguendo­me, disse:
Então da sua bigorna o artesão coxo se levantou,
Aos tombos, com as distorcidas pernas, obliquamente caminhou.
E aos tombos aproximei­me da mesa dos refrescos. Calígula estava deliciado e recitou duas novas linhas, 
que precedem a passagem do riso ininterrupto:
Se te submeteres, o Trovejador deixa­se apaziguar, O Gracioso Deus aceita que lhe queiras agradar.
369
Foi assim que me passou a chamar Vulcano, um título que eu tive prazer em ganhar, porque me dava uma 
certa protecção contra os seus caprichos.
Depois, Calígula deixava­nos tranquilamente, retirava o disfarce e voltava com o seu aspecto normal, 
vindo do lado do pátio do Palácio pela porta onde me colocara. Fingia­se totalmente surpreendido e 
chocado com o que se estava a passar e punha­se a declamar novamente Homero
­ a vergonha e a ira de Ulisses perante o comportamento das mulheres do palácio:
E assim resguardado ele jazia na varanda
Cenas de amores lúbricos seus olhos despertos observam Enquanto para as impuras alegrias nocturnas  
se dirigem Com maléfica alegria as belas prostituídas.
Seu coração com raiva esta nova desonra feria,
Hesitantes, seus pensamentos se quedam suspensos em dúbio equilíbrio. Ou no instante saciar a culpada  
chama
Com o sangue das próprias e interceptar a vergonha, Ou à sua luxúria permitir um último abraço
E deixar os seus pares consumar a desgraça, No seu coração alvoroçado a fúria contida ruge, Qual  
mastimfêmea rosnando sobre a sua ninhada
E põe à distância o estranho: assim a ira comprimida, Recuando, murmurava tempestades no seu peito.  
”Pobre coração sofredor”, gritou, ”suporta a dor
da honraferida e reprime a tua ira!
Nãoforam mais agudas as dores que destroçaram a tuaforça Quando os bravos companheiros dos teus  
labores de dez anos O medonho Polífemo devorou: Então eu fui libertado
Pela prudência paciente da morte decretada. 
Em vez de Polífemo leia­se Tibério, explicou. Depois, bateu palmas para chamar a Guarda, que veio a 
toda a velocidade.
­ Manda vir aqui imediatamente Cássio Chaerea! Cássio foi mandado chamar e Calígula disse:
­ Cássio, velho herói, serviste­me de cavalo de guerra quando era criança, meu mais antigo e mais fiel 
amigo de família; alguma vez viste uma cena tão triste e degradante como esta? As minhas duas irmãs a 
prostituírem os corpos para os senadores no meu próprio Palácio, o meu tio Cláudio à porta a vender os 
bilhetes de entrada! Oh, o que diriam os meus pobres pais se tivessem vivido para ver este dia!
370
­ Queres que os prenda a todos, César? ­ perguntou Cássio ansiosamente,
Não, à sua luxúria concede um último abraço E que os nobres consumem a desgraça,
Replicou Calígula em tom resignado, ao mesmo tempo que continha uma espécie de ronco na 
garganta. Cássio recebeu ordens para se ir de novo embora com a Guarda.
Esta não foi a última orgia do género no Palácio e, a partir daí, Calígula obrigava os senadores 
que compareciam a trazer as mulheres e as filhas para ajudarem Agripinila e Lésbia. Mas o 
problema de como arranjar dinheiro estava de novo a tornar­se premente e Calígula decidiu 
visitar a França e ver o que podia fazer por lá.
Primeiro, reuniu um grande número de soldados, mandando vir destacamentos de todos os 
regimentos regulares, formando novos regimentos e recrutando soldados em todos os sítios  
possíveis. Saíu de Itália à frente de 150.000 homens e aumentou o seu número, em França, para 
250.000. A despesa de armar e equipar esta força imensa recaiu sobre as cidades por onde 
passava: e encomendava­lhes também os abastecimentos necessários. Ás vezes, avançava a 
galope e fazia o exército marchar quarenta e oito horas seguidas, ou mais, para conseguir apanhá­
lo; outras vezes, ia em frente a uma média de uma milha ou duas por dia, admirando a paisagem 
de uma liteira transportada aos ombros de oito homens e detendo­se frequentemente para apanhar 
flores.
Enviou cartas à sua frente, em que ordenava a presença em Lião, onde tencionava concentrar as 
suas forças, de todos os oficiais de França e das províncias do Reno cujas patentes fossem acima 
de capitão. Entre aqueles que obedeceram à convocatória estava Caetúlico, um dos mais 
valorosos oficiais do meu querido irmão Germânico, que, nos últimos anos, estivera a comandar 
os quatro regimentos da Província Superior. Era muito popular entre os soldados, porque 
mantinha a tradição dos castigos brandos e da disciplina baseada no amor e não no medo. Era 
popular também entre os regimentos da Província Inferior, comandados pelo seu sogro Aprónío ­ 
é que Caetúlico tinha casado com uma irmã dessa mesma Aprónia que o meu cunhado Pláucio 
era acusado de ter atirado pela janela. Com a queda de Sejano, ele teria sido condenado à morte 
por Tibério, porque tinha prometido a filha em casamento ao filho de Sejano, mas escapou 
escrevendo ao Imperador uma carta ousada. Dizia que, ”enquanto mantivesse o comando”, 
podiam contar com a sua aliança, assim como com a dos seus soldados. Sensatamente, Tibério 
deixou­o sossegado. Mas Calígula invejava­lhe a popularidade e, assim que chegou, mandou­o 
prender.
371
Calígula não me tinha convidado para esta expedição; por isso não assisti ao que se seguiu e não posso 
descrevê­lo em pormenor. Tudo o que sei é que Ganimedes e Caetúlico foram acusados de conspiração 
Ganimedes por ter pretensões à monarquia, Caetúlico por o apoiar. Ambos foram executados sem 
julgamento. Lésbia e Agripinila (o marido da última tinha morrido recentemente de hidropisia) também 
eram suspeitas de participar na conspiração. Foram exiladas para uma ilha na costa de África, perto de 
Cartago. Era uma ilha muito quente e árida, onde a única indústria era a pesca de esponjas; Calígula 
ordenou­lhes que aprendessem a mergulhar para ir recolher as esponjas, pois, disse, já não tinha maneira 
de continuar a mantê­las. Mas, antes de partirem para a sua ilha, foi­lhes confiada uma tarefa: tinham que 
ir a pé até Roma, partindo de Lião, sob uma escolta armada, e carregarem à vez nos braços a urna onde 
tinham sido colocadas as cinzas de Ganimedes. Isto era um castigo pelo seu persistente adultério com 
Ganimedes, como Calígula explicou numa carta bastante arrogante que enviou ao Senado. Engrandecia a 
sua própria clemência em não as ter condenado à morte. A verdade é que elas se tinham revelado piores 
do que as prostitutas comuns: nenhuma prostituta honesta teria tido o descaramento de pedir os preços que 
elas pediam, e recebiam, pelos seus deboches!
Eu não tinha razões para sentir pena das minhas sobrinhas. Eram tão más como Calígula, à sua maneira, e 
tratavam­me com desprezo. Quando o filho de Agripinila nasceu, três anos antes, ela pedira a Calígula que 
lhe sugerisse um nome. Calígula disse:
­ Chama­lhe Cláudio e ele certamente vai ser uma beleza. Agripinila ficou tão furiosa que quase lhe bateu, 
mas, em vez disso, deu uma volta rápida e cuspiu na minha direcção. Seguidamente, largou a chorar. A 
criança foi baptizada de Lúcio Domício. Lésbia era demasiado orgulhosa para me prestar atenção ou, de 
alguma forma, reconhecer a minha presença. Se calhava cruzarmo­nos nalguma passagem estreita, ela 
costumava seguir em frente, pelo meio, sem abrandar o passo, obrigando­me a apertar­me de encontro à 
parede. Era­me difícil lembrar­me que eram as filhas do meu querido irmão e que eu tinha prometido a 
Agripina fazer tudo o que pudesse para as proteger.
Fui incumbido da tarefa embaraçosa de ir a França, à frente de uma embaixada de quatro ex­Cônsules, 
para felicitar Calígula por ter anulado a conspiração. Esta era a primeira visita que fazia a França desde a 
minha infância e só desejava não ter tido que a fazer. Tive que pedir dinheiro a Calpúrnia para as despesas 
da viagem, porque a minha propriedade e a casa ainda não tinham comprador e eu não podia contar que 
Calígula ficasse satisfeito por me ver. Fui por mar, de Óstia, desembarcando em
Nota: Que se viria a tornar imperador, sob o nome de Nero. (N. do T.)
372
Marselha. Parece que, depois de exilar as minhas sobrinhas, Calígula leiloara as jóias, ornamentos e 
vestidos que tinham levado com elas. Os preços que conseguiu foram tão altos que também lhes vendeu os 
escravos e depois os libertos, fingindo que eram igualmente escravos. As ofertas foram feitas por homens 
ricos das províncias, que desejavam a glória de poder dizer: ”Sim, este e este pertenceram à irmã do 
Imperador. Comprei­lhos a ele pessoalmente!” Isto deu a Calígula uma nova ideia. O velho Palácio onde 
Lívia tinha vivido estava agora fechado. Estava cheio de mobiliário, de quadros valiosos e de relíquias de 
Augusto. Calígula mandou buscar todas essas coisas a Roma e tornou­me responsável pela sua rápida 
chegada a Lião, em boas condições. Escreveu: ”Envia tudo por terra, não por mar. Tenho um contencioso 
com Neptuno.” A carta só chegou no dia anterior à minha partida; por isso, encarreguei Palas de tratar de 
tudo. A dificuldade era que todos os cavalos e carros disponíveis já tinham sido requisitados para o 
transporte do exército de Calígula. Mas Calígula tinha dado a ordem e os cavalos e veículos tinham que 
ser arranjados de alguma forma. Palas foi procurar os Cônsules e mostrou­lhes as ordens do Imperador. 
Eles foram obrigados a requisitar carruagens públicas da mala­posta e carros de padeiro e ainda os cavalos 
que faziam girar os moinhos de trigo, o que causava grandes inconvenientes ao público.
Aconteceu que, numa noite de Maio, pouco antes do pôr­do­sol, Calígula, sentado na ponte em Lião e 
embrenhado numa conversa imaginária com o deus do rio local, me viu aproximar ao longe, estrada fora. 
Ele reconheceu a minha liteira pela prancha de dados que mandei instalar nela: entretenho­me nas longas 
viagens lançando dados comigo próprio. Gritou em tom zangado:
­ Então onde estão os carros? Porque não trouxeste os carros? espondi:
­ Que o Céu vos abençoe, Majestade! Os carros ainda vão demorar alguns dias, receio bem. Vêm por terra, 
atravessando Génova. Os meus colegas e eu viemos por mar.
­ Então podes voltar por mar também, ­ disse ele. ­ Chega aqui! Quando cheguei à ponte, fui puxado para 
fora da liteira por dois soldados germanos e levado para o parapeito por cima do arco central, onde me 
sentaram de costas para o rio. Calígula avançou num ímpeto e empurrou­me. Fiz dois mortais para trás e 
caí de uma altura que me pareceu ser de 300 metros antes de tocar na água. Lembro­me de dizer para mim 
mesmo: ”Nascido em Lião, morto em Lião!” O rio Ródano, é muito frio, muito profundo e muito rápido. 
A túnica pesada manietava­me os braços e as pernas, mas, de alguma forma, consegui manter­me à 
superfície e trepar para terra atrás de alguns barcos, cerca de meia milha mais abaixo, onde não podia ser 
visto da ponte. Sou bem melhor a nadar
373
do que a caminhar: tenho bastante força nos braços e, sendo um bocado gordo por não poder fazer 
exercício e por gostar de comer, flutuo como uma rolha. A propósito, Calígula não sabia nadar.
Ficou surpreendido, alguns minutos mais tarde, ao ver­me chegar a mancar pela estrada e riu­se imenso do 
meu estado lamacento e mal cheiroso.
­ Onde estiveste, meu querido Vulcano? ­ gritou. Eu tinha a resposta certa:
Senti o poder do Trovejador,
Atirado de cabeça das alturas etéreas.
Lançado todo o dia às voltas em círculos rápidos Só quando o sol desceu toquei o solo,
Semfôlego caí, perdido em movimentos estonteantes; Os Sintianos me ergueram para a costa Lemniana.
Em vez de Lemniana ler Lionesa, ­ acrescentei.
Ele estava sentado no parapeito com os meus três companheiros deitados no chão, em fila diante dele. 
Tinha os pés nos pescoços de dois e a ponta da espada em equilíbrio entre as omoplatas do terceiro, o 
marido de Lésbia, que soluçava por misericórdia.
­ Cláudio, ­ gemeu ele, ao ouvir a minha voz, ­ suplica ao Imperador que nos ponha em liberdade: nós 
apenas viemos para lhe apresentar as nossas carinhosas felicitações.
­ Eu quero os carros, não as felicitações, ­ disse Calígula.
Parecia que Homero tinha escrito a passagem que eu acabava de citar de propósito para esta ocasião. 
Dirigi­me ao marido de Lésbia:
Sê paciente e obedece,
Querido como és, se Júpiter o braço estender, Só posso lamentar, ser incapaz de te defender. Que alma  
tão ousada se moveria em teu auxílio Ou levantaria a mão contra o poder de Júpiter?
Calígula estava deliciado. Disse aos três suplicantes:
­ Quanto valem para vós as vossas vidas? Cinquenta mil moedas de ouro cada?
­Tu é que sabes, César, ­ responderam com voz fraca.
­ Então pagai ao pobre Cláudio essa importância logo que voltardes a Roma. Ele salvou­vos a vida com a 
prontidão da sua língua. ­ Depois, foi­lhes permitido levantarem­se e Calígula fê­los assinar uma 
promessa, ali mesmo, em como me pagariam 150.000 moedas de ouro dentro de três meses. Eu disse para 
Calígula:
374
­ Graciosíssimo César, as tuas necessidades são muito superiores às minhas. Aceitarás cem mil moedas de 
ouro da minha mão, quando eles me pagarem, em agradecimento pela minha própria salvação? Se 
condescenderes em aceitar essa oferta, ainda me vão sobrar cinquenta mil, o que me permitirá pagar a 
totalidade do preço da minha iniciação. Tenho andado muito preocupado com essa dívida.
Ele respondeu:
­ Qualquer coisa que eu possa fazer para contribuir para a tua paz de espírito, ­ e chamou­me o seu Ceitil 
de Ouro.
E foi assim que Homero, me salvou. Mas alguns dias mais tarde Calígula preveniu­me que não devia 
voltar a citar Homero.
­ É um autor excessivamente valorizado. Vou mandar recolher os poemas dele e queimá­los. Porque não 
hei­de pôr em prática as recomendações filosóficas de Platão? Conheces A República? Uma 
argumentação admirável. Platão era a favor de manter todos os poetas, fossem eles quais fossem, fora do 
seu estado ideal. Ele disse que eram todos uns mentirosos e é o que eles são.
Perguntei:
­ E vossa Sagrada Majestade vai queimar mais alguns poetas, além de Homero?
­ Ah, sim, claro. Todos os que estão excessivamente valorizados. Virgílio para começar, É um sensaborão, 
Tenta ser um Homero e não consegue.
­ E alguns historiadores?
­ Sim, Lívio. Ainda mais sensaborão. Tenta ser um Virgílio e não consegue.
375
CAPíTULO XXXII
Calígula pediu o mais recente senso oficial das propriedades e, depois de o examinar, chamou a Lião os 
homens mais ricos de França, para que, quando os objectos do Palácio chegassem de Roma, pudesse ter a 
certeza de conseguir bons preços. Pouco antes de começar o leilão, fez um discurso. Disse que era um 
pobre falido com enormes responsabilidades, mas confiava que, pelo bem do Império, os seus dedicados 
amigos da província e os aliados agradecidos não se aproveitariam da sua situação. Suplicou­lhes que não 
oferecessem menos do que o verdadeiro valor da herança familiar que, com grande desgosto seu, estava a 
ser obrigado a pôr à venda.
Não havia nenhum truque dos leiloeiros normais que ele não tivesse aprendido e ainda inventou muitos 
truques novos que estavam para além das capacidades dos bufarinheiros do mercado, em quem ele se 
inspirara largamente para uma boa parte do seu arrazoado. Por exemplo, vendia o mesmo artigo várias 
vezes a diferentes compradores, fazendo de cada uma das vezes um relato diferente das suas qualidades, 
utilidade e história. E por verdadeiro valor esperava que os compradores entendessem valor sentimental, 
que sempre se revelava cem vezes superior ao valor intrínseco. Por exemplo, ele dizia: ”Esta era a cadeira 
de repouso favorita do meu bisavô Marco António”; ”O Deus Augusto bebeu por esta taça na sua festa de 
casamento”; ”Este vestido foi usado pela minha irmã, a Deusa Pantea, numa recepção dada ao Rei Herodo 
Agripa para celebrar a sua libertação do cativeiro”; e assim por diante. E vendeu aquilo que designou 
como pechinchas cegas, pequenos artigos embrulhados num pano. Depois de ter instigado um homem a 
comprar uma velha sandália ou um pedaço de queijo por 2.000 moedas de ouro, ficava tremendamente 
satisfeito consigo próprio.
As ofertas começavam sempre com o preço mínimo; então, ele acenava para algum francês rico e dizia: 
”Oferecestes quarenta mil moedas de ouro por aquela caixinha de alabastro? Obrigado. Mas vejamos se 
conseguimos melhor. Quem dá quarenta e cinco mil?” ­ Podeis imaginar como o medo tornava as ofertas 
prontas. Esfolava cada um deles de tudo o que tinha e celebrava o feito com um magnífico festival de dez 
dias.
Depois, continuou a sua avançada para as Províncias do Reno. jurava que estava à beira de fazer uma 
guerra contra os germanos, que só
377
terminaria com o seu extermínio total. Iria completar piedosamente a tarefa começada pelo avô e pelo 
pai. Enviou dois regimentos para o outro lado do rio, para localizar o inimigo mais próximo. Cerca de 
1.000 prisioneiros foram trazidos de volta. Calígula passou­os em revista e, depois de ter escolhido 300 
belos jovens para a sua guarda pessoal, fez alinhar os restantes de encontro a um penhasco. Calígula deu a 
ordem a Cássio:
­ Mata­os, de uma ponta à outra, para vingar a morte de Varo.
A notícia deste massacre chegou aos germanos, que se retiraram para as suas florestas mais densas. Então, 
Calígula atravessou o rio com o exército inteiro e encontrou toda a região deserta. No primeiro dia de 
marcha, só para tornar as coisas mais excitantes, ordenou a alguns dos seus guardas germanos que 
entrassem num bosque vizinho e, ao jantar, foi­lhe trazida a notícia de que o inimigo estava próximo. À 
frente dos seus Batedores e de um destacamento de cavalaria da Guarda, lançou­se ao ataque. Voltou com 
os homens como prisioneiros, carregados de correntes, e anunciou uma vitória esmagadora contra uma 
desigualdade espantosa. Recompensou os seus camaradas de armas com uma nova condecoração militar 
chamada A Coroa dos Batedores, uma pequena coroa de ouro decorada com o Sol, a Lua e estrelas, 
simbolizados por pedras preciosas.
No terceiro dia, a estrada passava por uma garganta estreita. O exército tinha que avançar em coluna e não 
em formação de luta. Cássio disse para Calígula:
­ Foi num lugar como este, César, que Varo sofreu a emboscada. Enquanto for vivo, nunca esquecerei esse 
dia. Eu marchava à frente da minha companhia e acabava de alcançar uma curva da estrada, como poderia 
ser esta da qual nos aproximamos, quando de repente soou um terrível grito de guerra, como poderia vir 
daquele maciço de abetos além, e trezentas ou quatrocentas azagaias abateram­se a assobiar sobre nós...
­ Depressa, a minha égua, ­ gritou Calígula em pânico, ­ desimpedi o caminho.
Saltou da liteira, montou Penélope (Incitatus estava em Roma a ganhar corridas) e galopou para trás, ao 
longo da coluna. Quatro horas depois estava de novo na ponte, mas encontrou­a tão entupida com 
transportes de bagagem e estava com tanta pressa de atravessar, que desmontou e fez os soldados passá­lo 
de mão em mão numa cadeira de um carro para outro, até se encontrar em segurança do outro lado. Pediu 
de novo as suas armas, anunciando que o inimigo era demasiado cobarde para o enfrentar em batalha e 
que iria portanto procurar novas conquistas noutras paragens. Quando todo o exército se tinha reunido de 
novo em Colónia, marchou ao longo do Reno e depois atravessou para Bolonha, o porto mais próximo da 
Britânia. Aconteceu que o herdeiro de Cimbelino, o Rei da Britânia, se tinha desentendido com o pai e, ao 
saber que Calígula se
378
aproximava, fugiu para o outro lado do Canal com alguns seguidores e colocou­se sob a protecção de 
Roma. Calígula, que já tinha informado o Senado da sua total vitória sobre a Germânia, escreveu agora 
dizendo que o Rei Cimbelino tinha enviado o filho para reconhecer a suserania Romana sobre todo o 
arquipélago Britânico, das Ilhas Scilly às Orkneys.
Estive com Calígula durante esta expedição e tive grande dificuldade em tentar alegrá­lo. Queixava­se de 
insónia e dizia que o seu inimigo Neptuno, o estava a importunar constantemente, fazendo­lhe soar aos 
ouvidos ruídos marinhos e costumando aparecer­lhe de noite, ameaçando­o com um tridente. Retorqui:
­ Neptuno? No vosso lugar, não me deixaria abater por esse insolente. Porque não o punis, como punistes 
os germanos? Já anteriormente o ameaçastes, lembro­me disso; e, se ele continuar a importunar­vos, seria 
errado levar mais longe a vossa clemência.
Ele olhou­me, pouco à vontade, com os olhos semicerrados.
­ Achas que estou louco? ­ perguntou, passado algum tempo. Tive um riso nervoso.
­ Louco, César? Perguntais­me se acho que estais louco? Bom, vós estabeleceis o padrão de sanidade 
mental para todo o mundo habitável.
­ Sabes, Cláudio, é muito difícil, ­ disse em tom confidencial, ­ é
muito difícil ser um Deus sob disfarce humano. Pensei muitas vezes que ia enlouquecer. Dizem que a cura 
de heléboro em Anticira é muito boa. O que pensas disso?
Respondi:
­ Um dos maiores filósofos gregos, mas não me lembro exactamente qual, fez a cura de heléboro só para 
ficar com o espírito já claro ainda mais claro. Mas, se me pedis que vos aconselhe, direi: ”Não o façais. O 
vosso cérebro é límpido como uma nascente de água da rocha.”
­ Sim, ­ disse ele, ­ mas gostaria de conseguir dormir mais de três horas por noite.
­ Essas três horas são por causa do vosso disfarce mortal, ­ repliquei.
­ Os Deuses que não andam disfarçados não dormem de todo.
Assim ele ficou reconfortado e, no dia seguinte, reuniu o exército em ordem de batalha junto ao mar: 
arqueiros e fundibulários à frente; depois, as tropas auxiliares germanas; armadas com azagaias; seguiam­
se as principais forças romanas, com os franceses na retaguarda. A cavalaria encontrava­se nos flancos e 
as máquinas de cerco, as catapultas, estavam plantadas sobre dunas de areia. Ninguém sabia o que se iria 
passar. Ele avançou para o mar, até Penélope ter a água pelos joelhos, e gritou:
­ Neptuno, velho inimigo, defende­te. Desafio­te para uma luta de mortais. Traiçoeiramente fizeste ir ao 
fundo a frota de meu pai, não foi? Tenta o teu poder contra mim, se ousas.
379
Depois, fez uma citação do combate de Ajax e Ulisses, em Homero:
Deixa­me levantar­te, Chefe, ou levanta­me tu a mim.
Provemos nós a nossaforça...
Uma pequena onda veio rolando até junto de nós. Ele cortou­a com a espada e riu­se com desprezo. 
Depois, retirou­se calmamente e ordenou que tocassem para o ataque geral. Os arqueiros dispararam, os 
fundibulários usaram as suas fundas, os lançadores de dardos soltaram os dardos, a infantaria regular 
entrou pela água até às axilas e esquartejaram pequenas ondas, a cavalaria atacou pelos dois flancos e 
nadou até uma certa distância, dando golpes com os sabres, as máquinas de cerco lançaram pedras e as 
catapultas enormes azagaias e hastes com pontas de ferro. Calígula embarcou então num navio de guerra e 
ancorou fora do alcance dos mísseis, proferindo desafios absurdos contra Neptuno, cuspindo para longe 
por cima da amurada. Neptuno não fez qualquer tentativa para se defender ou para ripostar, exceptuando o 
facto de um homem ter sido mordido por uma lagosta e outro picado por uma alforreca.
Finalmente, Calígula mandou tocar a reunir e disse aos seus homens que limpassem o sangue das espadas 
e reunissem os despojos. Os despojos eram as conchas que havia na praia. Cada homem devia encher o 
elmo e despejá­lo num amontoado comum. As conchas foram depois escolhidas e embaladas em caixas 
para serem enviadas para Roma como prova desta vitória nunca vista. Os soldados acharam aquilo muito 
divertido e, quando ele os recompensou com quatro moedas de ouro por cabeça, aclamaram­no 
estrondosamente. Como troféu da vitória, construiu um farol muito alto, segundo o modelo do famoso 
farol de Alexandria, que tem sido desde então uma verdadeira bênção para os marinheiros naquelas águas 
perigosas.
Seguidamente, marchou de novo Reno acima. Quando chegou a Bona, Calígula chamou­me à parte e 
sussurrou com voz sombria:
­ Os regimentos nunca foram punidos pelo insulto que uma vez fizeram ao amotinar­se contra meu pai, 
durante a minha ausência deste acampamento. Lembras­te, eu tive que voltar e restabelecer a ordem para 
ele.
­ Lembro­me perfeitamente, ­ ripostei, ­ Mas isso foi há bastante tempo, não foi? Ao cabo de vinte e seis 
anos, não pode haver homens que ainda sirvam nas fileiras que estivessem lá nessa altura. Vós mesmo e 
Cássio Chaerea sois provavelmente os dois únicos veteranos sobreviventes desse dia terrível.
­ Então, talvez me limite a dizimá­los, ­ disse ele.
Os homens do Primeiro e do Vigésimo Regimentos receberam ordens para comparecer a uma assembleia 
especial e foi­lhes dito que podiam
380
deixar as armas para trás, por causa do calor. A cavalaria da Guarda recebeu igualmente ordens para 
comparecer, mas trazendo as suas lanças, bem como as espadas. Descobri um sargento que tinha o ar de 
quem podia ter lutado em Filipos, de tal maneira era velho e cheio de cicatrizes. Disse­lhe:
­ Sargento, sabeis quem sou?
­ Não senhor. Não posso dizer que saiba, senhor. Pareceis um ex­Cônsul.
­ Sou o irmão de Germânico.
­ Na verdade, senhor, nunca soube que existisse tal pessoa.
­ Não, não sou soldado nem ninguém importante. Mas tenho uma importante mensagem para todos vós: 
Não deixeis as vossas espadas muito longe quando fordes à assembleia de hoje à tarde!
­ Porquê, senhor, se me é permitido perguntar?
­ Porque podeis precisar delas. Talvez haja um ataque dos germanos. Talvez de outros.
Olhou­me fixamente e viu que eu estava a falar sério.
­ Muito agradecido, senhor, eu passo a palavra aos outros, ­ respondeu.
A infantaria estava reunida em frente da plataforma do tribunal e Calígula falava­lhes com uma expressão 
zangada e reprovadora, batendo com os pés e agitando as mãos. Começou por lhes recordar uma certa 
noite no princípio do Outono, havia muitos anos, quando, debaixo de um céu sem estrelas e ameaçador... 
Aqui, alguns dos homens começaram a escapar­se por uma abertura entre dois destacamentos de cavalaria. 
Iam buscar as suas espadas. Outros, arrojadamente, retiraram as deles de baixo das capas militares onde as 
tinham escondidas. Calígula deve ter­se apercebido do que estava a acontecer, porque, de repente, mudou 
de tom a meio de uma frase. Começou a estabelecer um contraste feliz entre esses dias maus, felizmente 
esquecidos, e o presente reinado de glória, riqueza e vitória.
­ O vosso pequeno companheiro de brincadeiras tornou­se um homem, ­ disse, ­ e tornou­se o mais 
poderoso Imperador que este mundo alguma vez conheceu. Não existe nenhum inimigo, por mais feroz 
que seja, que ouse desafiar as suas armas invencíveis.
O meu velho sargento correu em frente.
­ Está tudo perdido, César, ­ gritou. ­ O inimigo atravessou o rio em Colónia ­ uma força de trezentos mil. 
Vão a caminho para saquear Lião ­ depois vão atravessar os Alpes e saquear Roma.
Ninguém acreditou naquela história mirabolante, a não ser Calígula. Voltou­se, amarelo de medo, atirou­
se da plataforma abaixo, deitou a mão a um cavalo, saltou para a sela e desapareceu do acampamento 
como uma flecha. Um tratador galopou atrás dele e Calígula gritou­lhe:
381
­ Graças a Deus ainda tenho o Egipto. Pelo menos, aí estarei em segurança. Os germanos não são 
marinheiros.
Como todos se riram! Mas um coronel foi atrás dele num bom cavalo e em breve o alcançou. Garantiu a 
Calígula que a notícia era exagerada. Apenas um pequeno destacamento, disse, tinha atravessado o rio e 
fora posto em debandada: as margens romanas estavam completamente livres do inimigo. Calígula parou 
na cidade mais próxima e escreveu um despacho para o Senado, informando­os de que todas as suas 
guerras estavam agora terminadas com êxito e que ia regressar imediatamente com os seus soldados 
coroados de louros. Acusava severamente os cobardes que tinham ficado em casa, vivendo, segundo tudo 
indicava, a vida habitual da Cidade ­ teatros, banhos, grandes ceias ­, enquanto ele passara as mais 
rigorosas dificuldades da batalha. Tinha comido, bebido e dormido como qualquer soldado raso.
O Senado estava sem saber como pacificá­lo, uma vez que tinham as ordens mais severas para não lhe 
votarem quaisquer honras por sua própria iniciativa. Enviaram­lhe no entanto uma embaixada, felicitando­
o pelas suas magníficas vitórias e suplicando­lhe que se apressasse a regressar a Roma, onde a sua falta 
era sentida com tristeza. Ele ficou terrivelmente zangado por não lhe terem decretado nenhum triunfo, 
apesar das suas ordens em contrário, e por não se referirem a ele na mensagem como Júpiter, mas apenas 
como o Imperador Caio César. Bateu com a mão no punho da espada e gritou:
­ Apressar­me a regressar? É o que vou fazer e com esta na mão. Tinha feito preparativos para um triplo 
triunfo: sobre a Germânia, sobre a Britânia e sobre Neptuno. Como cativos britânicos, tinha o filho de 
Cimbelino e os seus seguidores, aos quais acrescentou as tripulações de alguns navios mercantes 
britânicos que detivera em Bolonha. Como cativos germanos, tinha 300 germanos verdadeiros e todos os 
homens mais altos que conseguira encontrar em França, com cabeleiras amarelas e fatos germanos, que 
falavam entre si num Jargão que era tomado como sendo germano. Mas, como digo, o Senado receara 
votar­lhe um triunfo formal; por isso, teve que se contentar com uma cerimónia informal. Entrou na 
cidade arvorando o mesmo estilo de quando tinha atravessado a ponte em Baiae, e foi apenas por 
intercessão de Cesónia, que era uma mulher sensata, que não passou todo o Senado à espada. 
Recompensou o povo pela generosidade das dádivas que lhe tinham feito no passado, fazendo chover ouro 
e prata do telhado do Palácio. Mas misturou a esta dádiva discos de ferro incandescentes, para lhes 
recordar que ainda não lhes perdoara o seu comportamento no anfiteatro. Os seus soldados foram 
informados de que podiam causar toda a perturbação que lhes apetecesse e embriagar­se como lhes 
aprouvesse, à custa do erário público. Eles aproveitaram bem esta autorização, saqueando as lojas de ruas 
inteiras e
382
pegando fogo ao bairro das prostitutas. Durante dez dias, não foi restabelecida a ordem.
Era o mês de Setembro. Enquanto ele estava fora, os trabalhadores tinham estado ocupados com o novo 
templo do Monte Palatino, do outro lado do Templo de Castor e Pólux, do Palácio Novo. Uma extensão 
tinha sido feita até à Praça do Mercado. Agora, Calígula transformou o Templo de Castor e Pólux num 
vestíbulo para o novo templo, abrindo uma passagem entre as estátuas dos Deuses. ”Os Gémeos Celestiais 
são os meus porteiros”, gabou­se. Depois, enviou uma mensagem ao Governador da Grécia para que 
mandasse que todas as estátuas de Deuses mais famosas fossem retiradas dos seus templos e enviadas para 
Roma. Propunha­se tirar­lhes as cabeças e substitui­las pela sua. A que mais cobiçava era a estátua 
colossal de Júpiter Olimpiano. Mandou construir um navio especial para a transportar para Roma. Mas o 
navio foi atingido por um raio antes mesmo de ser lançado ao mar. Ou esta foi pelo menos a versão oficial 
­ na realidade, estou convencido de que a tripulação supersticiosa o queimou de propósito. No entanto, 
nessa altura, Júpiter Capitolino arrependeu­se da sua contenda com Calígula (ou, pelo menos, foi o que ele 
nos disse) e pediu­lhe que voltasse a viver de novo a seu lado. Calígula replicou que já terminara 
praticamente um novo templo; mas, uma vez que Júpiter Capitolino se desculpara tão humildemente, ele 
arranjaria uma solução de compromisso ­ construiria uma ponte sobre o vale e juntaria as duas colinas. Fê­
lo: a ponte passou por cima do Templo de Augusto.
Calígula era agora publicamente Júpiter. Era não apenas o Júpiter Latino, mas também o Júpiter do 
Olimpo; e não apenas esse, mas também todos os outros Deuses e Deusas que ele decapitara e a quem 
substituíra as cabeças. Por vezes era Apolo e por vezes Mercúrio; outras vezes era Plutão, usando sempre 
em cada caso o trajo apropriado e exigindo sacrifícios específicos. Vi­o ir de um lado para o outro 
apresentando­se como Vénus, com uma longa túnica de seda leve, o rosto pintado, uma cabeleira ruiva, o 
peito almofadado e sapatos de salto alto. Esteve presente como a Boa Deusa no festival de Dezembro: isso 
foi um escândalo. Marte era também um dos seus favoritos. Mas a maior parte das vezes ele era Júpiter: 
usava uma coroa de oliveira, uma barba de finos fios de ouro e uma capa de seda de um azul vivo; levava 
ainda na mão um pedaço de electro, com entalhes para representar o raio. Certo dia, estava na Plataforma 
Oratória na Praça do Mercado vestido de Júpiter e fazendo um discurso:
Nota: Liga constituída por ouro e prata, usada modernamente na condução de electricidade. Existe 
também um género de âmbar que porta esse nome, também pelo facto de, quando friccionado, se revelar 
bom condutor de electricidade. (N. do T.)
383
­ Em breve tenciono, ­ declarou, ­ construir uma cidade para mim no cimo dos Alpes. Nós os Deuses 
preferimos o cume das montanhas aos insalubres vales dos rios. Dos Alpes, terei uma ampla visão do meu 
Império: França, Itália, o Tirol e a Germânia. Se vir alguma traição a preparar­se nalgum lado cá em 
baixo, soltarei um rugido de trovão como advertência, assim! (Fez um rugido com a garganta.) Se a 
advertência for ignorada, destruirei o traidor com o meu raio, assim! (Atirou a sua peça de metal para a 
multidão. Ela bateu numa estátua e caiu sem fazer estragos). Um estranho que estava no meio da multidão, 
um sapateiro de Marselha de visita a Roma, largou a rir, Calígula mandou que o prendessem e trouxessem 
para junto da plataforma; depois, inclinando­se, perguntou­lhe com severidade:
­ Quem te parece que eu sou?
­ Um grande impostor, ­ disse o sapateiro. Calígula ficou espantado.
­ Impostor? ­ repetiu. ­ Eu um impostor!?
­ Sim, ­ disse o francês. ­ Eu sou apenas um pobre sapateiro francês e esta é a minha primeira visita a 
Roma. Sou um ignorante. Se alguém na minha terra fizesse o que vós fazeis, seria um grande impostor. 
Calígula pôs­se a rir também.
­ Pobre tolo, ­ disse, ­ claro que seria. É exactamente essa a diferença.
A multidão ria como louca, mas se estavam a rir de Calígula ou do sapateiro não se sabia. Pouco depois 
disto, mandou fazer uma máquina de trovões e relâmpagos. Acendia­se um rastilho e a máquina produzia 
um rugido e um relâmpago e catapultava pedras em qualquer direcção. Mas sei de fonte segura que 
sempre que havia uma trovoada a sério durante a noite, ele rastejava para baixo da cama. Há uma boa 
história a esse respeito. Um dia, rebentou uma trovoada quando ele se andava a pavonear vestido de 
Vénus. Pôs­se aos gritos:
­ Pai, pai, poupa a tua bela filha!
Não tardou a gastar o dinheiro que tinha ganho em França, inventando então novas maneiras de aumentar 
os seus rendimentos. A sua favorita era examinar judicialmente os testamentos dos homens que acabavam 
de morrer e não lhe tinham deixado dinheiro: Apresentava então provas dos benefícios que os testadores 
tinham recebido dele e declarava que ou tinham sido ingratos ou não estavam no seu Juízo perfeito na 
hora de fazer o testamento; preferia pensar que não estavam no seu juízo perfeito. Cancelava os 
testamentos e nomeava­se a si próprio o herdeiro principal. Costumava aparecer no Tribunal de manhã 
cedo e escrever, num quadro preto, a soma de dinheiro que tencionava ganhar nesse dia, geralmente
200.000 moedas de ouro. Quando já as tinha ganho, fechava o Tribunal. Uma manhã, fez um novo édito 
sobre as horas de funcionamento permitidas nos diferentes tipos de loja. Fê­lo escrever em letras muito
384
pequenas num cartaz minúsculo que, mandou afixar bem alto num pilar da Praça do Mercado, onde 
ninguém se desse ao trabalho de o ler, por não se aperceberem da sua importância. Nessa tarde, os seus 
funcionários anotaram os nomes de algumas centenas de negociantes que tinham involuntariamente 
infringido o édito. Quando foram levados a julgamento; permitiu àqueles que podiam fazê­lo que 
alegassem para mitigar a sentença, que o tinham nomeado co­herdeiro, juntamente com os filhos. Poucos 
podiam. Tornou­se então habitual para os homens com dinheiro notificar o Tesoureiro Imperial de que 
Calígula figurava nos seus testamentos como herdeiro principal. Mas em vários casos isto revelou­se 
pouco prudente. É que Calígula utilizava a caixa de medicamentos que herdara de minha avó Lívia. Um 
dia, enviou presentes de frutos com mel a alguns dos recentes testadores. Todos morreram de imediato. 
Convocou também o meu primo, o Rei de Marrocos, para vir a Roma e condenou­o à morte, dizendo 
simplesmente:
­ Preciso da tua fortuna, Ptolomeu.
Durante a sua ausência em França, tinha havido comparativamente poucas condenações em Roma e as 
prisões estavam quase vazias: isso significava uma escassez de vítimas para atirar aos animais ferozes. Ele 
compensou a escassez usando membros da assistência, cortando­lhes primeiro a língua, para que não 
pudessem chamar os amigos para os salvarem. Estava a tornar­se cada vez mais caprichoso. Um dia, um 
sacerdote preparava­se para lhe sacrificar um jovem touro no seu aspecto de Apolo. O procedimento 
habitual para o sacrifício era que um diácono atordoasse o touro com um machado de pedra e, depois, o 
sacerdote lhe cortasse a garganta. Calígula apareceu vestido de diácono e fez a pergunta habitual: 
”Posso?”. Quando o sacerdote respondeu ”Fazei­o”, ele deixou cair o machado com toda a força na cabeça 
do sacerdote.
Eu continuava a viver pobremente com Briseis e Calpúrnia porque, embora não tivesse dívidas, também 
não dispunha de dinheiro, além do pequeno rendimento que me vinha da propriedade. Tinha o cuidado de 
dar a saber a Calígula como estava pobre e ele, graciosamente, permitia­me que continuasse na Ordem 
Senatorial, embora eu já não tivesse as necessárias qualificações financeiras. Mas sentia a minha posição 
cada dia mais insegura. Uma vez, no princípio de Outubro, à meia­noite, fui acordado por fortes pancadas 
na porta de entrada. Pus a cabeça de fora da janela.
­ Quem está aí? ­ perguntei.
­ Deveis comparecer imediatamente no Palácio. Disse:
­ Sois vós, Cássio Chaerea? Sabeis se vou ser morto?
­ A ordem que tenho é de vos levar imediatamente.
Calpúrnia e Briseis choraram; ambas se despediram beijando­me ternamente. Enquanto me ajudavam a 
vestir, disse­lhes apressadamente
385
como deviam dispor das poucas posses que me restavam, o que fazer com a pequena Antónia, quais as 
disposições para o meu funeral e assim por diante. Foi uma cena muito penosa para todos nós e eu não 
ousei prolongá­la. Em breve, segui mancando ao lado de Cássio em direcção ao Palácio. Ele disse com 
voz áspera: ”Dois ex­Cônsules foram igualmente chamados.” Disse­me os seus nomes e eu fiquei ainda 
mais alarmado. Os outros eram homens ricos, exactamente do tipo que Calígula acusaria de conspirarem 
contra ele. Mas porquê eu? Fui o primeiro a chegar. Os outros dois apareceram a toda a pressa, logo a 
seguir a mim, ofegantes com o medo e a precipitação. Fomos levados para a Sala da Justiça e fizeram­nos 
sentar em cadeiras numa espécie de palanque sobranceiro à plataforma do tribunal. Uma guarda de 
soldados germanos encontrava­se atrás de nós, murmurando entre si na sua própria língua. A sala estava 
completamente às escuras, a excepção de duas lâmpadas de azeite sobre o tribunal. Notámos que as 
janelas atrás estavam cobertas com panos negros, bordados com estrelas de prata. Os meus companheiros 
e eu serrámo­nos as mãos, silenciosamente, em sinal de despedida. Eram homens de quem eu recebera 
muitos insultos numa altura ou noutra, mas, sob a sombra da morte, essas ninharias são esquecidas. 
Ficámos sentados à espera de que acontecesse alguma coisa, até pouco antes do romper do dia.
De repente, ouvimos um vibrar de pratos e a música alegre de oboés e violinos. Escravos desfilaram para 
o interior vindos de uma porta ao lado do tribunal, cada um deles trazendo duas lanternas que puseram em 
cima de mesas a um lado; depois, a voz potente de um eunuco começou a cantar a bem conhecida canção 
Quando as longas vigias da noite. Os escravos retiraram­se. Ouviu­se um roçar de tecido e, pouco depois, 
entrou dançando a figura desajeitada de uma mulher num vestido de seda rosa, com uma coroa de rosas 
falsas na cabeça. Era Calígula.
A deusa com os seus dedos rosados Desfiará a noite estrelada...
Aqui, ele afastou os panos da janela e fez aparecer os primeiros laivos da aurora. Depois, quando o eunuco 
chegou à parte em que falava da Deusa de dedos rosados, soprando as luzes uma por uma, introduziu este 
incidente na dança: Puff... Puff... Puff...
E onde os amantes jazem
Envoltos nas doces tarefas da paixão...
De uma cama que ele não tinha notado, porque ficava numa alcova, a Deusa Aurora fez então aparecer 
uma jovem e um homem, nenhum deles
386
com quaisquer roupas vestidas e, numa demonstração silenciosa, indicou que era tempo de se separarem. 
A jovem era muito bela. O homem era o eunuco que cantava. Separaram­se indo em direcções opostas, 
como se se sentissem profundamente abatidos. Quando veio o último verso:
Oh Aurora, das Deusas a maís bela, Que com o teu passo lento e adordvel Sanas qualquer querela...
Tive a sensatez de me prostrar no chão. Os meus companheiros não foram lestos a seguir­me o exemplo. 
Calígula saltou do palco e, pouco depois, fomos chamados para tomar o pequeno­almoço com ele. Eu 
disse:
­ Oh, Deus dos Deuses, nunca na minha vida assisti a uma dança que me desse uma alegria espiritual tão 
profunda como a que acabo de presenciar. Não tenho palavras para descrever a sua beleza.
Os meus companheiros concordaram comigo e disseram que lamentavam infinitamente que uma actuação 
tão incomparável tivesse sido apresentada a uma audiência tão pequena. Ele disse, complacentemente, que 
era apenas um ensaio. Em breve, no anfiteatro, apresentá­la­ia perante toda a Cidade. Não percebi como é 
que ele conseguiria arranjar o efeito do afastar das cortinas num anfiteatro ao ar livre com centenas de 
metros de comprimento, mas não disse nada sobre isso. Tivemos um pequeno­almoço muito saboroso, 
com o ex­Cônsul mais velho sentado no chão e, alternadamente, comendo empada de tordo e beijando o 
pé de Calígula. Eu estava apenas a pensar em como Calpúrnia e Briseis iam ficar satisfeitas ao ver­me de 
volta quando Calígula, que estava de muito bom humor, disse de repente:
­ Ela era uma bonita rapariga, não era, Cláudio, meu velho devasso?
­ Muito bonita na verdade, Deus.
­ E ainda virgem, tanto quanto sei. Gostavas de te casar com ela? Podes, se quiseres. Entusiasmei­me por 
um momento, mas é engraçado; na verdade, já não gosto de mulheres imaturas. ...Ou de mulheres 
maduras, aliás, à excepção de Cesónia. Reconheceste a rapariga?
­ Não, senhor; para falar verdade, só olhava para vós.
­ É a tua prima Messalina, filha de Barbato. O velho alcoviteiro não proferiu uma única palavra de 
protesto quando pedi que ela me fosse enviada. Afinal, que cobardes que eles são, Cláudio!
­ Sim, Senhor Deus.
­ Está bem, vou casá­los aos dois amanhã. Agora vou para a cama, acho eu.
­ Mil agradecimentos e homenagens, Senhor.
Deu­me o outro pé a beijar. No dia seguinte, cumpriu a promessa e casou­nos. Aceitou um décimo do dote 
de Messalina como pagamento,
387
mas, à parte isso, comportou­se com toda a cortesia. Calpúrnia tinha ficado encantada por me ver de 
novo com vida e fingira não se importar com o meu casamento. Disse num tom natural:
­ Muito bem, meu querido. Eu volto para a fazenda e vou de novo tomar conta das coisas para ti. Não vais 
sentir a minha falta tendo essa bela esposa. E, agora que tens dinheiro, terás que viver de novo no Palácio.
Disse­lhe que o casamento me tinha sido imposto e que, na verdade, sentiria muito a falta dela. Mas 
Calpúrnia não me tomou a sério: Messalina tinha o dobro da beleza dela, três vezes a sua inteligência e 
nascimento e, ainda por cima, tinha dinheiro. Eu já estava apaixonado por ela, disse Calpúrnia.
Senti­me constrangido. Calpúrnia tinha sido a minha única amiga verdadeira ao longo daqueles quatro 
anos de miséria. O que é que ela não tinha feito por mim? No entanto, ela tinha razão: eu estava 
apaixonado por Messalina; e agora, Messalina ia ser a minha esposa. Não haveria lugar para Calpúrnia, 
estando eu com Messalina.
Foi em pranto que ela partiu. E também eu fiquei em pranto. Não estava apaixonado por Calpúrnia, mas 
ela era a minha amiga mais sincera e sabia que, se alguma vez precisasse dela, a encontraria pronta a 
ajudar­me. Não preciso dizer que, quando recebi o dinheiro do dote, não a esqueci.
388
CAPíTULO XXXIII
Messalina era uma jovem extremamente bela, esbelta e de movimentos ágeis, com os olhos negros como 
azeviche e abundantes cabelos negros e encaracolados. Pouco falava e tinha um sorriso misterioso, que 
quase me enlouquecia de amor por ela. Ficou tão contente por ter escapado a Calígula e foi tão rápida a 
compreender as vantagens que lhe dava o casamento comigo, que se comportou de uma forma que me 
deixou absolutamente convencido de que me amava tanto como eu a amava a ela. Esta era praticamente a 
primeira vez que eu estava apaixonado por alguém desde os meus tempos de rapaz; e quando um homem 
de cinquenta anos, nem muito inteligente nem muito atraente, se apaixona por uma jovem de quinze muito 
atraente e muito inteligente, as perspectivas não são muito boas para ele. Casámos em Outubro. Em 
Dezembro, ela estava grávida de mim. Mostrava­se muito carinhosa com a minha pequena Antónia, que ia 
então nos dez anos, e era um alívio para mim a pequena ter agora alguém a quem pudesse chamar mãe, 
alguém cuja idade era suficientemente próxima da sua para se tornar uma amiga e que lhe podia explicar 
as maneiras da sociedade e levá­la a determinados sítios, como Calpúrnia não pudera fazer.
Messalina e eu fomos convidados a ir viver de novo para o Palácio. Chegámos numa má altura. Um 
negociante chamado Basso tinha andado a fazer perguntas a um capitão da Guarda do Palácio sobre os 
hábitos diários de Calígula ­ se era verdade que ele deambulava pelos claustros de noite, porque não 
conseguia dormir? A que horas fazia isso? Quais os claustros que habitualmente escolhia? Que Guardas 
tinha com ele? O capitão relatou o incidente a Cássio e este relatou­o a Calígula. Basso foi preso e 
interrogado. Foi forçado a admitir que tencionara matar Calígula, mas negou, mesmo sob tortura, que 
tivesse quaisquer cúmplices. Então, Calígula enviou uma mensagem ao velho pai de Basso, ordenando­lhe 
que assistisse à execução do filho. O velho, que não fazia ideia que Basso andara a planear assassinar 
Calígula ou mesmo que ele tivesse sido preso, ficou muito chocado quando encontrou o filho a gemer no 
chão do Palácio, com o corpo destroçado pela tortura. Mas conseguiu controlar­se e agradeceu a Calígula 
a sua gentileza em o ter chamado para fechar os olhos ao filho. Calígula riu­se.
389
­ Fechar­lhe os olhos na verdade! Ele não vai ter olhos para fechar, o assassino! Vou arrancar­lhos dentro de 
momentos. E os teus também. O pai de Basso disse:
­ Poupai as nossas vidas. Nós somos meros instrumentos nas mãos de homens poderosos. Eu dou­vos todos os 
nomes.
Isto impressionou Calígula e, quando o velho mencionou o Comandante da Guarda, o Comandante dos Germanos, o 
Tesoureiro Calisto, Cesónia, Mnester e mais três ou quatro, ele empalideceu de medo.
­ E quem é que eles fariam Imperador no meu lugar? ­ perguntou.
­ Vosso tio Cláudio.
­ Ele também entrou na conspiração?
­ Não; eles iam apenas usá­lo como figura representativa.
Calígula afastou­se apressadamente e mandou chamar o Comandante da Guarda, o Comandante dos Germanos, o 
Tesoureiro e eu próprio, a uma sala particular. Perguntou aos outros, apontando para mim:
­ Essa criatura serve para ser Imperador? Eles responderam em tom de surpresa:
­ Não, a menos que vós o digais, Júpiter.
Depois, dirigiu­lhes um sorriso patético e exclamou.
­ Eu sou um e vós sois três. Dois de vós estais armados e eu estou indefeso. Se me odiais e quereis matar­me, fazei­o 
imediatamente e colocai esse pobre idiota como Imperador no meu lugar.
Todos caímos de rosto no chão e os dois soldados entregaram­lhe as espadas, dizendo:
­ Nós estamos inocentes de tais pensamentos de traição, Senhor. Se não acreditais em nós, matai­nos!
Sabeis uma coisa: ele esteve quase a matar­nos! Mas, enquanto hesitava, eu disse:
­ Deus Todo­poderoso, o coronel que me chamou para vir aqui contou­me da acusação feita contra estes homens 
leais pelo pai de Basso. A sua falsidade é evidente. Se Basso tivesse sido realmente empregado por eles, porque teria 
precisado de interrogar o capitão sobre os vossos movimentos? Não teria antes conseguido destes generais toda a 
informação necessária? Não; o pai de Basso tentou salvar a própria vida e a de Basso com uma mentira desajeitada.
Calígula pareceu ficar convencido com o meu argumento. Deu­me a mão a beijar, fez­nos levantar a todos e deu as 
espadas de volta. Basso e o pai foram seguidamente cortados em pedaços pelos germanos. Mas Calígula não 
conseguiu afastar do seu espírito o medo do assassinato, que, em breve, foi aumentado por uma série de presságios 
infelizes. Primeiro, a casa do porteiro no Palácio foi atingida por um raio. Depois Incitatus, quando foi trazido para o 
jantar uma noite, empinou­se e deixou cair uma ferradura, que quebrou um vaso de alabastro que pertencera a
390
Júlio César, espalhando o vinho no chão. O pior de todos os presságios foi o que aconteceu em Olimpo 
quando, de acordo com as ordens de Calígula, os trabalhadores do templo começaram a desmontar a 
estátua de Júpiter para ser levada para Roma. A cabeça era a primeira peça a retirar, para servir de medida 
para a nova cabeça de Calígula, que substituiria a de Júpiter quando a estátua fosse de novo montada. 
Tinham fixado a roldana ao tecto do templo e atado uma corda em volta do pescoço; preparavam­se para 
içar a cabeça, quando de repente se ouviu uma gargalhada atroadora que ressoou por todo o edifício. Os 
trabalhadores afastaram­se em pânico. Não foi possível encontrar ninguém com a coragem suficiente para 
os substituir.
Nesta altura, Cesónia aconselhou­o uma vez que, com o seu inabalável rigor, ele fizera com que todos 
tremessem só de lhe ouvir o nome) a governar com brandura e conquistar o amor do povo, em vez do seu 
receio. Cesónia compreendia a posição perigosa em que ele se encontrava e que, se alguma coisa lhe 
acontecesse, ela certamente perderia também a vida, a menos que se soubesse que tinha feito tudo para o 
dissuadir das suas crueldades. Calígula comportava­se agora da maneira mais imprudente. Foi procurar, 
cada um por sua vez, o Comandante da Guarda, o Tesoureiro e o Comandante dos Germanos e fingiu que 
os tomava na sua confiança, dizendo: ”Eu confio em ti, mas os outros estão a conspirar contra mim e 
quero que os olhes como os meus mais mortais inimigos.” Os três compararam as suas informações e foi 
por isso que, quando uma verdadeira conspiração se formou, eles fecharam os olhos. Calígula disse que 
concordava com o conselho de Cesónia e agradeceu­lhe; iria certamente segui­lo quando fizesse as pazes 
com os seus inimigos. Mandou reunir o Senado e dirigiu­se­lhe nestes termos:
­ Em breve vos concederei a todos uma amnistia, meus inimigos, e reinarei com amor e paz um milhar de 
anos. Essa é a profecia. Mas, antes que cheguem esses tempos dourados têm que rolar cabeças pelo chão 
desta Casa e o sangue jorrará até ao tecto. Vão ser cinco minutos de loucura.
Se os 1.000 anos de paz tivessem chegado primeiro e depois os cinco minutos de loucura, nós teríamos 
preferido.
A conspiração foi formada por Cássio Chaerea. Ele era um soldado à moda antiga, acostumado a uma 
obediência cega as ordens dos seus superiores. As coisas têm que estar extraordinariamente más para que 
um homem desta têmpera pense em conspirar contra a vida do seu Comandante­em­Chefe, a quem ele 
jurou aliança nos termos mais solenes que se possam imaginar. Calígula tratara Cássio extremamente mal. 
Prometera­lhe definitivamente o comando da Guarda e, depois, sem uma palavra de explicação ou de 
desculpas, dera­o a um capitão com pouco tempo de serviço e sem qualquer distinção militar, como 
recompensa
391
por um notável feito de bebida no Palácio: oferecera­se como voluntário para despejar um jarro com litro e 
meio de vinho sem o tirar dos lábios, e fizera­o realmente ­ eu vi ­; ainda por cima, ficou com o vinho no 
estômago. Calígula também o tinha feito senador. E Calígula empregava Cássio em todas as incumbências 
e tarefas mais desagradáveis ­ recebimento de impostos que na realidade não eram devidos, confiscação de 
propriedades por ofensas nunca cometidas, execução de homens inocentes. Recentemente, fizera­o 
torturar uma bela rapariga bem nascida, chamada Quintília. A história era a seguinte. Vários jovens 
tinham querido casar com ela, mas aquele que o tutor de Quintília tinha proposto, um membro dos 
Batedores, não era de todo do agrado dela. Ajovem suplicou­lhe que a deixasse escolher um dos outros; 
ele consentiu e o dia do casamento foi fixado. O Batedor rejeitado foi procurar Calígula e apresentou­lhe 
uma acusação contra o seu rival, dizendo que ele blasfemara, falando do seu Augusto Soberano como 
”aquela dama careca.” E citou Quintília como testemunha. Esta, juntamente com o noivo, foi levada 
perante Calígula. Ambos negaram a acusação, mas ambos foram condenados à roda. O rosto de Cássio 
revelou a sua repulsa, pois só os escravos podiam legalmente ser submetidos a tortura. Por isso, Calígula 
ordenou­lhe que se ocupasse da roda de Quintília e que fizesse girar os parafusos com as suas próprias 
mãos. Quintília não disse uma palavra nem soltou um grito durante toda a sua provação. Depois, disse 
para Cássio que, de tão abalado, chorava:
­ Pobre Coronel, eu não tenho nada contra vós. Às vezes deve ser difícil obedecer ás ordens.
Cássio disse com amargura:
­ Quem me dera ter morrido naquele dia com Varo, na Floresta de Teutoburger.
Ela foi levada de novo à presença de Calígula e Cássio relatou que não fizera qualquer confissão nem 
permitira que lhe escapasse um único grito. Cesónia disse para Calígula.
­ Isso foi porque ela estava apaixonada pelo homem. O amor conquista tudo. Podias cortá­la em pedaços 
que ela nunca o trairia. Calígula disse:
­ E serias tu assim tão gloriosamente corajosa por minha causa, Cesónia?
­ Sabes que sim, ­ replicou.
Assim, o noivo de Quintília não foi torturado e recebeu o perdão; Quintília teve direito a um dote de 8.000 
moedas de ouro do espólio do Batedor, que foi executado por perjúrio. Mas Calígula soube que Cássio 
tinha chorado durante a tortura de Quintília e troçou dele, chamando­lhe velho bebé­chorão. Este não foi o 
pior nome que encontrou. Afirmava que Cássio era um velho efeminado e estava sempre a dizer piadas 
porcas
392
sobre ele aos outros oficiais da Guarda, que eram obrigados a rir entusiasticamente ao ouvi­lo. Cássio 
costumava comparecer perante Calígula todos os dias ao meio­dia, para receber a senha. Costumava 
sempre ser Roma, Augusto, Júpiter, vitória ou coisa parecida; mas agora, para arreliar Cássio, Calígula 
dava­lhe palavras absurdas tais como Laços de Espartilho, Muito Amor, ferros de Encaracolar ou Beija­
me, Sargento. E Cássio tinha que as levar aos outros oficiais e aguentar a sua zombaria. Decidiu matar 
Calígula.
Calígula estava cada vez mais louco. Entrou no meu quarto um dia e disse, sem qualquer palavra de 
introdução:
­ Hei­de ter três cidades imperiais e Roma não será uma delas. Hei­de ter a minha cidade nos Alpes e hei­
de reconstruir Roma em Antium, porque foi aí que nasci e o lugar merece essa honra, porque é junto ao 
mar; e hei­de ter Alexandria, caso os germanos capturem as outras duas. Alexandria é um lugar muito 
culto.
­ Sim, Deus, ­ respondi humildemente. Ele lembrou­se então que tinha sido chamado de dama careca. 
Consciente de que o cabelo dele estava sem dúvida muito ralo no alto da cabeça, gritou:
­ Como ousas andar por aí com esse enorme e horrendo matagal de cabelos na minha presença? Isso é uma 
blasfémia! ­ Voltou­se para o guarda germano. ­ Corta­lhe a cabeça.
Uma vez mais, pensei que estava perdido. Mas tive a presença de espírito para dizer asperamente para o 
Guarda, que corria em direcção a mim com a espada:
­ O que estás a fazer, idiota? O Deus não disse cabeça! disse cabelo! Corre e vai imediatamente buscar 
uma tesoura!
Calígula ficou estupefacto e talvez tenha mesmo pensado que tinha dito cabelo. Permitiu que o germano 
fosse buscar a tesoura. E assim fiquei de cabeça rapada. Pedi permissão para dedicar as madeixas cortadas 
a sua Divindade e ele graciosamente deu o seu consentimento. Depois, mandou rapar o cabelo a toda a 
gente no Palácio, excepto aos germanos. Quando chegou a vez de Cássio, Calígula disse:
­ Oh, que pena! Esses lindos caracolinhos que o Sargento tanto ama!
Nessa noite, Cássio encontrou o marido de Lésbia. Ele tinha sido o melhor amigo de Ganimedes e, por 
alguma coisa que Calígula dissera nessa manhã, não era provável que vivesse muito mais tempo. Ele 
disse:
­ Boa noite, Cássio Chaerea, meu amigo. Qual é a senha hoje? Cássio respondeu:
­ Esta noite a senha é Caracolinhos. Mas, meu amigo Marco Vinício, se é que vos posso chamar amigo, 
dai­me a senha Liberdade e a minha espada ficará ao vosso serviço.
Vinício abraçou­o.
393
­ Não somos os únicos que estão prontos a dar o golpe pela Liberdade. O Tigre também está comigo.
O Tigre ­ o verdadeiro nome dele era Cornélio Sabino ­ era outro coronel da Guarda, que tomava o lugar de Cássio quando ele 
largava o serviço. O grande Festival Palatino começava no dia seguinte. Este festival em honra de Augusto tinha sido instituído 
por Lívia no princípio da monarquia de Tibério e realizava­se anualmente no Pátio Sul do Palácio Velho. Começava com 
sacrifícios a Augusto e uma procissão simbólica, continuando durante três dias com peças teatrais, dança, canto, malabarismo e 
coisas do género. Erguiam­se bancadas de madeira com assentos para as pessoas. Quando o festival terminava, as bancadas eram 
desmontadas e guardadas até ao ano seguinte. Naquele ano, Calígula tinha prolongado os três dias para oito, intercalando as 
representações com corridas de carros no circo e batalhas navais fingidas na Doca. Queria estar ininterruptamente entretido até ao 
dia em que navegasse para Alexandria, o que sucederia a vinte e cinco de Janeiro. Porque ele ia mesmo para o Egipto para visitar 
o país, para arranjar dinheiro com um rigor inabalável e com o mesmo tipo de truques que usara em França, para fazer planos para 
a reconstrução de Alexandria e, por fim, como costumava gabar­se, para pôr uma cabeça nova na Esfinge.
O Festival começou. Calígula fez sacrifícios a Augusto, mas de uma forma um tanto indiferente e desdenhosa, como um senhor 
que, numa emergência, tem que prestar algum pequeno serviço a um dos seus escravos. Quando essa parte terminou, proclamou 
que, se algum cidadão presente pedisse um favor que estivesse no seu poder conceder, fá­lo­ia graciosamente. Ultimamente, tinha 
estado zangado com o povo pela sua falta de entusiasmo no último espectáculo de animais selvagens e tinha­os punido fechando 
os celeiros da Cidade por dez dias; mas talvez já os tivesse perdoado agora, pois acabava de largar donativos do telhado do 
Palácio. Assim, um brado alegre subiu no ar:
­ Mais pão, menos impostos, César! Mais pão, menos impostos! Calígula ficou muito zangado. Enviou um pelotão de germanos 
ao longo das bancadas e 100 cabeças foram decepadas. Este incidente perturbou os conspiradores; era um recordar da  
barbaridade dos germanos e da maravilhosa devoção que dedicavam a Calígula. Naquela altura, não devia haver praticamente um 
cidadão em Roma que não ansiasse pela morte de Calígula, que não lhe tivesse de bom grado comido a carne, como costuma 
dizer­se; mas, para estes germanos, ele era o herói mais glorioso que o mundo alguma vez conhecera. E se ele se vestia de mulher; 
ou se se afastava de repente a galopar do seu exército durante a marcha, ou fazia Cesónia aparecer nua diante deles e gabava a sua 
beleza; ou se queimava a sua villa mais bela em Herculano, invocando que sua mãe Agripina estivera prisioneira ali durante dois 
dias a caminho da ilha onde
394
morrera: estes comportamentos inexplicáveis apenas serviam para o tornar mais digno da sua adoração 
como um ser divino. Costumavam acenar uns para os outros com ar avisado e dizer:
­ Sim, os Deuses são assim. Nunca se sabe o que vão fazer em seguida. Tuisco e Mann, lá na terra, na 
nossa querida Pátria, são exactamente o mesmo.
Cássio era destemido e não se importava com o que lhe acontecesse a ele pessoalmente, desde que 
Calígula fosse assassinado. Mas os outros conspiradores, cujo sentimento não era tão forte, começaram a 
perguntar a si mesmos qual a vingança que os germanos tomariam sobre os assassinos do seu maravilhoso 
herói. Começaram a apresentar desculpas e Cássio não conseguia levá­los a concordar com um verdadeiro 
plano de acção. Sugeriam deixar tudo ao acaso. Cássio começou a ficar ansioso. Chamou­lhes cobardes e 
acusou­os de estarem a ganhar tempo. Disse que o que eles queriam era que Calígula chegasse são e salvo 
ao Egipto. Chegou o último dia do festival e Cássio conseguira com grande dificuldade fazê­los concordar 
com um plano exequível, quando Calígula, de repente, deu a saber que o festival iria continuar por mais 
três dias. Disse que queria actuar e cantar num divertimento que ele próprio tinha composto para os 
alexandrinos, mas que achava que seria justo mostrar aos seus compatriotas em primeiro lugar.
Esta mudança de planos deu aos mais timoratos dos conspiradores uma nova oportunidade para se 
esquivarem.
­ Oh, mas Cássio, isto altera tudo. Torna tudo muito mais fácil para nós. Podemos matá­lo no último dia, 
no momento em que ele sair do palco. É um plano muito melhor. Ou durante a representação. Como 
preferires.
Cássio respondeu:
­ Fizemos um plano e jurámos segui­lo e é o que temos que fazer. Trata­se de um bom plano. Não tem 
qualquer falha.
­ Mas agora temos muito tempo. Porque não esperar mais três dias? Cássio disse:
­ Se não executarmos o plano hoje, como todos haveis jurado fazer, terei que trabalhar sozinho. Não vou 
ter muitas hipótese contra os germanos, mas farei o melhor que puder. Se eles forem demasiado fortes 
para mim, gritarei: ”Vinício, Asprenas, Bubo, Aquila, Tigre, porque não estais aqui como prometestes?”
Assim, eles concordaram em levar por diante o plano original. Calígula devia ser persuadido por Vinício e 
Asprenas a deixar o teatro ao meio­dia para dar um mergulho na piscina e comer um almoço rápido. 
Momentos antes, Cássio o Tigre e os outros capitães que estavam dentro da conjura, deviam escapar­se 
disfarçadamente pela porta do palco. Dariam a volta até à entrada para a passagem coberta, que dava 
directamente do
395
teatro para o Palácio Novo. Asprenas e Vinício tinham que persuadir Calígula a ir por aí.
A peça anunciada para esse dia era Ulisses e Circe e Calígula tinha prometido espalhar fruta, bolos e 
dinheiro no fim. Fá­lo­ia naturalmente da extremidade mais próxima do portão, onde era o seu lugar. 
Portanto, todos foram o mais cedo possível para o teatro, para arranjar lugares desse lado. Quando os 
portões se abriram, a multidão precipitou­se para o interior e correu para os lugares mais próximos. 
Habitualmente, todas as mulheres se sentavam juntas a um lado e havia lugares reservados para cavaleiros 
e senadores, para estrangeiros ilustres e assim por diante. Mas, naquele dia, todos estavam misturados. Vi 
um senador que chegara atrasado ser obrigado a sentar­se entre um escravo africano e uma mulher com 
cabelos pintados cor de açafrão e envergando a túnica escura que as prostitutas vulgares usam como trajo 
profissional.
­ Tanto melhor, ­ disse Cássio para o Tigre. ­ Quanto maior for a confusão, mais hipótese nós temos.
Aparte os germanos e o próprio Calígula, quase que a única pessoa no Palácio que ainda não ouvira falar 
na conspiração era o pobre Cláudio. Isto porque o pobre Cláudio ia ser morto também, como tio de 
Calígula. Toda a família de Calígula devia ser morta. Os conspiradores receavam, suponho, que eu me 
fizesse a mim mesmo Imperador e vingasse a morte dele. Eles tinham decidido restaurar a República. Se 
ao menos os idiotas tivessem confiado em mim, esta história teria tido um final muito diferente. Porque eu 
era melhor republicano do que qualquer deles. Mas eles interpretaram­me mal e, com toda a crueldade, 
condenaram­me à morte. De certa maneira, até Calígula sabia mais sobre a conspiração do que eu, pois 
acabavam de lhe enviar um oráculo de advertência do Templo da Fortuna, em Antium: ”Cuidado com 
Cássio.” Ele interpretou­o mal e mandou regressar o primeiro marido de Drusila, Cássio Longino, da Ásia 
Menor, onde era Governador. Pensava que Longino estivesse zangado com ele por ter assassinado Drusila 
e lembrou­se que ele era descendente daquele Cássio que ajudou a assassinar Júlio César.
Entrei no teatro nessa manhã às oito horas e descobri que os arrumadores me tinham reservado um lugar. 
Fiquei entre o Comandante da Guarda e o Comandante dos Germanos.
O Comandante da Guarda inclinou­se pela minha frente e perguntou:
­ Sabes a notícia?
­ Que notícia? ­ perguntou o Comandante dos germanos.
­ Vão representar uma peça nova.
­ Qual?
­ A Morte do Tirano.
396
O Comandante dos germanos deitou­lhe um olhar rápido e citou franzindo a testa:
Valente camarada, guarda o teu silêncio
Não vá alguém ouvir­te, dos homens da Grécia.
Eu disse:
­ Sim, houve uma alteração no programa. Mnester vai dar­nos A Morte do Tirano. Há anos que não é 
representada. É sobre o Rei Ciniras, que não quis entrar em guerra contra Tróia e foi morto pela sua 
cobardia.
A peça começou e Mnester esteve na sua melhor forma. Quando morreu às mãos de Apolo, sujou a roupa 
toda de sangue de uma pequena bolsa que tinha escondido na boca. Calígula mandou chamá­lo e beijou­o 
nas duas faces. Cássio e o Tigre escoltaram­no até ao camarim, como se o quisessem proteger dos seus 
admiradores. Depois, saíram pela porta dos artistas. Os capitães seguiram­nos durante a confusão da 
dádiva dos brindes. Asprenas disse para Calígula:
­ Foi maravilhoso. Que tal agora um mergulho e um almoço ligeiro?
­ Não, ­ disse Calígula. ­ Quero ver essas raparigas acrobatas. Diz­se que são muito boas. Acho que vou 
ver o espectáculo todo. É o último dia. ­ Estava com uma disposição muito afável.
Vinício levantou­se. Ia dizer a Cássio, ao Tigre e ao resto que não esperassem. Calígula puxou­o pela 
capa.
­ Meu caro, não te vás embora. Tens que ver essas raparigas. Uma delas executa uma dança chamada a 
dança do peixe, que nos faz sentir como se estivéssemos debaixo de água.
Vinício sentou­se e viu a dança do peixe. Mas primeiro ainda teve que assistir a um breve interlúdio 
melodramático chamado Laureolus ou O Chefe dos Ladrões. Havia nele muita mortandade e os actores, 
um elenco de segunda categoria, tinham todos arranjado pequenas bolsas com sangue para porem na boca, 
a imitar Mnester. Nunca se viu porcaria mais agourenta que o que eles fizeram no palco! Quando a dança 
do peixe terminou, Vinício levantou­se de novo:
­ Para dizer a Verdade, Senhor, gostaria de ficar, mas Cloacina chama­me. Qualquer coisa que comi.
Suaves mas coesas brotam as minhas oferendas,
Nem duramente rápidas, nem impudicamente lentas...
Calígula riu­se:
­ Não me culpes, meu caro. Tu és um dos meus melhores amigos. Eu não ia adulterar a tua comida por 
nada neste mundo.
397
Vinício saíu pela porta dos artistas e encontrou Cássio e o Tigre no pátio.
­ É melhor voltardes, ­ disse. ­ Ele vai assistir até ao fim.
Cássio disse:
­ Muito bem. Voltemos então. Vou matá­lo no lugar onde está sentado. Espero que me apoies.
Nessa altura, um Guarda aproximou­se de Cássio e disse:
­ Os rapazes estão finalmente aqui, Senhor.
Bom, ultimamente, Calígula tinha enviado cartas às cidades gregas da Ásia Menor, ordenando a cada uma 
delas que lhe enviasse dez rapazes da mais pura nobreza para dançarem a dança nacional das espadas no 
festival e cantarem um hino em sua honra. Isto era apenas uma desculpa para conseguir ter os rapazes sob 
o seu domínio: eles dariam reféns muito úteis quando voltasse a sua fúria contra a Ásia Menor. Já deviam 
ter chegado há vários dias, mas o mau tempo no Adriático tinha­os detido em Corfu. O Tigre disse: 
”Informem imediatamente o Imperador.” E o Guarda dirigiu­se apressado para o teatro.
Entretanto, eu estava a ficar com muita fome. Sussurrei para Vitélio, que estava sentado atrás de mim:
­ Bem gostaria que o Imperador desse o exemplo de sair para comer qualquer coisa.
Nessa altura, o Guarda chegou com a mensagem sobre a chegada dos rapazes e Calígula disse para 
Asprenas:
­ Esplêndido! Vão poder actuar esta tarde. Tenho que falar imediatamente com eles e fazer um breve 
ensaio do hino. Vamos, amigos! O ensaio primeiro, depois um banho, o almoço e voltamos!
Saímos. Calígula parou ao portão para dar ordens sobre a representação da tarde. Eu ia à frente com 
Vitélio, um senador chamado Sêncio e os dois generais. Seguimos pela passagem coberta. Reparei que 
Cássio e o Tigre estavam à entrada. Não me saudaram, o que achei estranho, pois saudaram os outros. 
Chegámos ao Palácio. Eu disse:
­ Estou com fome. Sinto o cheiro de caça a ser cozinhada. Espero que o ensaio não demore muito. ­ 
Estávamos na antecâmara da sala de banquetes. ­ É estranho, ­ pensei, ­ Não há aqui nenhum capitão, mas 
apenas sargentos. ­ Voltei­me com ar interrogador para os meus companheiros mas, outra coisa estranha, 
descobri que todos eles tinham desaparecido em silêncio. Nessa altura, ouvi um som distante de brados e 
gritos, depois mais brados. Perguntei a mim mesmo o que estaria a acontecer. Alguém correu diante da 
janela gritando: ”Acabou­se tudo. Ele está morto!” Dois minutos mais tarde, ouviu­se a maior barulheira 
vinda dos lados do teatro, como se toda a assistência estivesse a ser massacrada. Continuou por algum 
tempo até que abrandou e, então, seguiram­se aclamações vibrantes. Subi aos tombos até à minha sala de 
leitura, onde me deixei cair, tremendo, para cima de uma cadeira.
398
Sobre os seus pedestais, os bustos de Heródoto, Políbio, Tucidides e Asínio Pólio olhavam­me de frente. 
Os seus rostos impassíveis pareciam dizer: ”Um verdadeiro historiador estará sempre acima dos distúrbios 
políticos do seu tempo.” Decidi comportar­me como um verdadeiro historiador.
399
CAPíTULO XXXIV
O que tinha acontecido era o seguinte. Calígula saíra do teatro. Uma liteira aguardava para o levar pelo 
caminho mais longo em volta do Novo Palácio, entre duas filas de Guardas. Mas Vinício disse:
­ Vamos pelo caminho mais curto. Penso que os rapazes gregos estão à espera lá à entrada.
­ Bom, vamos então, ­ disse Calígula.
As pessoas tentaram segui­lo, mas Asprenas ficou para trás e obrigou­as a recuar.
­ O Imperador não quer ser incomodado por vós, ­ disse. ­ Voltai para trás! ­ E disse aos porteiros que 
fechassem os portões.
Calígula encaminhou­se para a passagem coberta. Cássio avançou e saudou­o.
­ A senha, César? Calígula disse:
­ Einh? Ah, sim, a senha, Cássio. Vou arranjar­te uma boa senha para hoje: Saiote de Velho.
O Tigre gritou por trás de Calígula:
­ Agora? ­ Era o sinal combinado.
­ Sim, agora! ­ berrou Cássio, puxando da espada e abatendo­a sobre Calígula com todas as suas forças.
Tencionava rachar­lhe o crânio até ao queixo, mas, no seu acesso de raiva, falhou a pontaria e acertou­lhe 
entre o pescoço e a omoplata. A maior força do golpe recaíu sobre a parte superior do esterno. Calígula 
cambaleou de dor e espanto. Olhou desesperadamente em volta, voltou­se e largou a correr. Quando se 
voltou, Cássio atacou­o de novo e rachou­lhe a queixada. Então, o Tigre derrubou­o com um golpe mal 
controlado, que lhe apanhou o lado da cabeça. Lentamente, ele conseguiu por­se de joelhos.
­ Ataca outra vez! ­ gritou Cássio.
Calígula levantou os olhos ao Céu com uma expressão de agonia:
­ Oh, Júpiter, ­ suplicou.
­ De acordo, ­ bradou o Tigre, e cortou­lhe uma das mãos.
Um capitão chamado Auila deu­lhe o golpe final, uma estocada profunda na virilha, mas outras dez 
espadas foram­lhe enterradas depois
401
no peito e na barriga, só para terem a certeza. Um capitão chamado Bubo mergulhou a mão numa ferida 
no lado de Calígula e depois lambeu os dedos, gritando: ”Jurei que lhe bebia o sangue!”
Tinha­se juntado uma multidão e o alarme espalhou­se.
­ Vêm aí os germanos.
Os assassinos não tinham qualquer hipótese contra um batalhão de germanos. Correram para o edifício 
mais próximo, que, por acaso, era a minha antiga casa, que Calígula ultimamente me pedira emprestada 
para servir de acomodação aos embaixadores estrangeiros que ele não queria ter dentro do Palácio. 
Entraram pela porta da frente e saíram pela das traseiras. Todos conseguiram escapar a tempo, excepto o 
Tigre e Asprenas. O Tigre teve que fingir que não era um dos assassinos e juntou­se aos germanos nos 
seus gritos de vingança. Asprenas correu para a passagem coberta, onde os germanos o apanharam e 
mataram. Mataram dois outros senadores que lhe apareceram pela frente. Tratava­se de um pequeno grupo 
de germanos. O resto do batalhão marchou para o interior do teatro e fechou o portão. Iam vingar o seu 
herói assassinado com um massacre em grande escala. Esses foram os brados e gritos que ouvi. Ninguém 
no teatro sabia que Calígula estava morto ou que qualquer tentativa tinha sido feita contra a sua vida. Mas 
as intenções dos germanos eram claras, porque eles estavam a pôr em prática o seu estranho cerimonial de 
tocar e afagar as suas azagaias, falando­lhes como se fossem seres humanos, como é seu costume 
invariável antes de derramarem sangue com essas armas terríveis. Não havia saída. De repente, uma 
trombeta tocou a Sentido de cima do palco, seguindo­se as seis notas que queriam dizer Ordens Imperiais. 
Mnester entrou e ergueu a mão. Imediatamente a terrível barulheira acalmou, transformando­se em meros 
soluços e gemidos abafados, porque, quando Mnester subia ao palco, era regra que ninguém podia fazer 
ouvir o mais leve som, sob pena de morte imediata. Os germanos também pararam o toque, o afagar e os 
encantamentos. As Ordens Imperiais deixaram­nos como estátuas.
Mnester gritou:
­ Ele não está morto, Cidadãos. Longe disso. Os seus assassinos atacaram­no e bateram­lhe, deixando­o de 
joelhos, sim! Mas ele não tardou a levantar­se de novo, sim! As espadas nada podem contra o nosso 
Divino César. Ferido e ensanguentado como estava, ele levantou­se, sim! Levantou a augusta cabeça e 
caminhou, sim! Com uma passada divina por entre as fileiras dos seus assassinos cobardes e perplexos. As 
suas feridas sararam, um milagre! Ele está agora na Praça do Mercado, falando aos seus súbditos da 
Plataforma Oratória em voz bem alta e eloquente.
Uma forte aclamação subiu no ar e os germanos embainharam as espadas e marcharam para fora do teatro. 
A mentira atempada de Mnester (sugerida aliás por uma mensagem de Herodo Agrípa, Rei dos Judeus, o
402
o único homem em Roma que manteve a calma nessa tarde fatídica) tinha salvo 60.000 vidas ou mais.
Mas a verdadeira notícia tinha entretanto chegado ao Palácio, onde causou a maior confusão. Alguns 
velhos soldados pensaram que a oportunidade de saquear era boa demais para ser desperdiçada. Fingiriam 
que andavam à procura dos assassinos. Todos os quartos do Palácio tinham uma maçaneta de ouro na 
porta, valendo cada uma delas seis meses de soldo, bastante fáceis de cortar com uma espada afiada. Ouvi 
os gritos de ”Matai­os, matai­os! Vingai César!” E escondi­me atrás de uma cortina. Dois soldados 
entraram. Viram os meus pés por baixo da cortina.
­ Sai daí, assassino. Não vale a pena esconderes­te de nós. Eu saí e prostrei­me no chão.
­ Não m­m­m­me m­m­m­m­m­m­ma­t­tem, senhores, ­ disse eu.
­ N­não t­t­t­t­ive n­nada a ver c­c­c­c­com isso!
­ Quem é este velho? ­ perguntou um dos soldados que era novo no Palácio. ­ Não parece perigoso.
­ O quê? Não o conheces? É o irmão inválido de Germânico. Um velhote decente. Não faz mal a ninguém. 
Levantai­vos, senhor. Não vos faremos mal. ­ O nome deste soldado era Grato.
Fizeram­me descer de novo a escada com eles até à sala de banquetes, onde os sargentos e cabos estavam 
reunidos em conselho de guerra. Um jovem sargento estava em cima de uma mesa a agitar os braços e a 
gritar:
­ A República que se dane! Um novo Imperador é a nossa única esperança. Qualquer Imperador, desde 
que possamos convencer os germanos a aceitá­lo.
­ Incitatus, ­ sugeriu alguém com uma gargalhada.
­ Sim, por Deus. Mais vale o velho rocinante do que ficarmos sem Imperador. Precisamos de alguém 
imediatamente para manter os germanos sossegados. De outra forma, eles tornam­se incontroláveis.
Os meus dois captores abriram caminho por entre a multidão, arrastando­me atrás deles. Grato chamou:
­ Eh, Sargento, veja só o que temos aqui! Uma sorte, acho eu. É o velho Cláudio. Porque não o velho 
Cláudio para Imperador? É o homem mais indicado para isso que temos em Roma, embora coxeie e 
gagueje um bocado.
Seguiram­se aclamações ruidosas, risos e gritos de Viva o Imperador Cláudio!. O sargento desculpou­se:
­ Bom, senhor, todos pensávamos que tivésseis morrido. Mas sois o nosso homem, sem dúvida. 
Levantem­no no ar, rapazes, para que todos possam vê­lo!
Dois cabos corpulentos pegaram­me pelas pernas e puseram­me aos ombros.
­Viva o Imperador Cláudio!
403
­ Ponham­me no chão! ­ gritei furioso. ­ Ponham­me no chão! Não quero ser Imperador. Recuso­me a ser 
Imperador. Viva a República! Mas eles limitaram­se a rir.
­ Essa é boa. Não quer ser Imperador, diz ele. Modesto, einh?
­ Dêem­me uma espada, ­ gritei. ­ Prefiro matar­me. Messalina veio a correr direita a nós.
­ Por mim, Cláudio, faz o que eles te pedem. Pelo nosso filho. Vamos todos ser chacinados se recusares. 
Eles já mataram Cesónia. Pegaram na pequenita pelos pés e fizeram­lhe saltar os miolos de encontro a 
uma parede.
­ Sentir­vos­eis bem, senhor, quando vos habituardes, ­ disse Grato sorrindo. ­ A vida de Imperador não é 
assim tão má, pois não?
Não protestei mais. De que servia lutar contra o Destino? Levaram­me à pressa para o Grande Pátio, 
cantando o fantasioso hino de esperança composto para a tomada de posse de Calígula: Germânico está  
aqui de novo, para libertar a Cidade e o seu Povo. E que eu também tinha o sobrenome de Germânico, 
Obrigaram­me a pôr a coroa dourada de folhas de carvalho que fora de Calígula e que tiraram a um dos 
saqueadores. Para não me desequilibrar, tive que me agarrar com força aos ombros dos cabos, A coroa 
deslizava­me constantemente para o lado. Sentia­me um idiota chapado. Dizem que mais parecia um 
criminoso a ser levado para a execução. Bandos de trombeteiros faziam ouvir a Saudação Imperial.
Os germanos vieram aos gritos em direcção a nós. Acabavam de ter a confirmação da morte de Calígula 
por um senador, que veio ao seu encontro todo vestido de luto. Ficaram furiosos por terem sido enganados 
e queriam voltar para o teatro, mas agora este estava vazio; por isso, ficaram sem saber o que fazer em 
seguida. Não havia ninguém por ali em quem se vingarem, excepto a Guarda, e esta estava armada. A 
Saudação Imperial fê­los tomar uma decisão. Precipitaram­se em frente gritando: ”Hoch! Hoch! Viva o 
Imperador Cláudio!”; e começaram a dedicar freneticamente as suas azagaias ao meu serviço e a 
esforçarem­se por atravessar a multidão dos guardas para me beijar os pés. Gritei­lhes que ficassem 
quietos e eles obedeceram, prostrando­se diante de mim. Fui levado várias vezes à volta do Pátio.
E que pensamentos ou recordações achais que me atravessavam o espírito nesta ocasião extraordinária? 
Pensaria na profecia da Sibila, no presságio do filhote de lobo, no conselho de Pólio ou no sonho de 
Briseis? No meu avô e na liberdade? No meu pai? Nos meus três predecessores imperiais, Augusto, 
Tibério, Calígula, nas suas vidas e nas suas mortes? No grande perigo em que ainda me encontrava por 
parte dos conspiradores, do Senado e dos batalhões de Guardas do Acampamento? Em Messalina e no 
nosso filho ainda por nascer? Na minha avó Lívia e na minha promessa de a deificar se alguma vez me 
tornasse Imperador?
404
Em Póstumo e Germânico? Em Agripina e Nero? Em Camila? Não, nunca seríeis capazes de adivinhar o 
que me passava pelo espírito. Mas eu vou ser franco e dizer­vos o que era, embora a confissão seja  
vergonhosa. O que eu estava a pensar era:
­ Muito bem, eu sou Imperador, não sou? Que disparate! Mas, pelo menos, agora vou fazer as pessoas ler 
os meus livros. Recitais públicos a audiências numerosas. E bons livros também, que representam trinta e 
cinco anos de trabalho árduo. Não vai ser imerecido. Pólio costumava arranjar audiências atentas 
oferecendo jantares dispendiosos. Ele era um historiador muito bom e o último dos romanos. A minha 
História de Cartago está cheia de episódios divertidos. Tenho a certeza que lhes vai agradar.
Era isso que eu pensava. Pensava também nas oportunidades que teria como Imperador de consultar os 
arquivos secretos e descobrir exactamente o que aconteceu numa altura ou noutra. Quantas histórias 
distorcidas ainda faltava esclarecer! Que sorte miraculosa para um historiador! E como já deveis ter visto, 
aproveitei plenamente as minhas oportunidades. Posso mesmo dizer que praticamente não utilizei o 
privilégio do historiador maduro, de engendrar conversas das quais apenas conhece a essência.
405

Você também pode gostar