Inadmissibilidade de Provas Ilicitas
Inadmissibilidade de Provas Ilicitas
Inadmissibilidade de Provas Ilicitas
Coimbra, 2015
Aos meus pais, Ernesto e Rosa, pelas pessoas
extraordinárias que são, por me darem o Mundo e por me apoiarem
incondicionalmente,
Ao João e ao Rui, pelos momentos em que me conseguiram
fazer sorrir e por serem os melhores irmãos que poderia ter,
Aos meus avós, tios e primos, por serem uma família
fantástica,
Ao Rúben, por tudo o que é para mim, pela paciência
inesgotável e por nunca me deixar desistir,
À Sara, por ser a melhor pessoa que Coimbra me deu a
conhecer e por percorrer todo este caminho ao meu lado,
Ao Rafa, à Flávia, ao Jer e à Raquel, pela amizade de
sempre,
Ao Doutor Mário, à Doutora Elisabete e à Doutora Magda,
pelas palavras de apoio, pela atenção e por me ajudarem a
enfrentar as adversidades que surgiram no caminho,
À memória do meu avô, José Rodrigues,
Ao meu Orientador, Professor Doutor Luís Miguel
Mesquita, pela preciosa orientação e total disponibilidade,
imprescindíveis para a realização da presente investigação.
2|Página
“O problema não é tanto ver aquilo que
ninguém viu, mas pensar o que ainda ninguém
pensou, sobre aquilo que toda a gente vê.”
Arthur Schopenhauer
3|Página
ÍNDICE
ABREVIATURAS ............................................................................................................... 7
CAPÍTULO I
A PROVA ILÍCITA NO ORDENAMENTO JURÍDICO PORTUGUÊS
1. A PROVA ...................................................................................................................... 10
CAPÍTULO II
A PROVA ILÍCITA NO DIREITO PROCESSUAL
4|Página
1.2.1. PRINCÍPIO DA INVESTIGAÇÃO DA VERDADE............................................................ 27
CAPÍTULO III
TESES DE ADMISSIBILIDADE DA PROVA ILÍCITA
5|Página
2.4.1. O PRINCÍPIO DA BOA-FÉ ......................................................................................... 47
CAPÍTULO IV
POSIÇÃO ADOTADA
BIBLIOGRAFIA ..................................................................................................................... 64
JURISPRUDÊNCIA ................................................................................................................. 68
6|Página
ABREVIATURAS
Ac. – Acórdão
Al. – Alínea
Art. – Art.
Arts. – Art.s
Cfr.- Confira
CP – Código Penal
Ed. – Edição
Pág. – Página
Págs. – Páginas
Proc. - Processo
TR – Tribunal da Relação
Vol. - Volume
7|Página
NOTA INTRODUTÓRIA
1
“(…) nota-se uma forte interferência do direito constitucional, na medida em que a ilícita obtenção de um
meio de prova consubstancia, não raro, uma violação de direitos fundamentais, a que o julgador não pode
ficar indiferente”. ALEXANDRE, Isabel, Provas Ilícitas em Processo Civil, Almedina, Coimbra, 1998,
página 14.
8|Página
De seguida, debruçar-nos-emos sobre o quesito primordial da nossa exposição,
analisando o tratamento das provas ilícitas no processo civil e no processo penal –
destacando os princípios inerentes à investigação da verdade, o papel do juiz enquanto
sujeito processual no direito português e no direito comparado e analisando as normas que
sustentam, ou não, uma possível analogia entre ambos os ramos processuais.
A terceira parte incidirá fundamentalmente na discussão, ainda que com maior
incidência prática, das teorias que melhor se adequam aos fins do processo e à proteção dos
direitos fundamentais dos cidadãos, tendo por base um princípio da proporcionalidade que
tem como objetivo encontrar um equilíbrio entre os interesses da sociedade e a defesa dos
direitos fundamentais do indivíduo. Essencial será ainda estudar os casos, bastante
recorrentes na jurisprudência, relativos à prova ilícita por derivação – teoria dos frutos da
árvore envenenada – isto é, se uma prova lícita que é extraída de uma prova ilícita poderá
ser admitida no processo.
Por fim, a quarta parte será respeitante ao direito português, partindo da análise do
direito comparado, apontando algumas vias possíveis de abordagem do tema das provas
ilícitas à luz de uma “nova cultura judiciária (…) para a qual deverá contribuir
decisivamente um novo modelo de processo civil, simples e flexível, despojado de
injustificados formalismos e floreados adjetivos” o que “contribuirá decisivamente para
inviabilizar e desvalorizar comportamentos processuais arcaicos, assentes na velha praxis
de que as formalidades devem prevalecer sobre a substância do litígio e dificultar,
condicionar ou distorcer a decisão de mérito”.2
2
MESQUITA, Miguel, Código de Processo Civil, Almedina, Coimbra, 2014, pág. 13.
9|Página
CAPÍTULO I
ASPETOS TEÓRICOS
1. A PROVA
3
MINGARRO, Luis Martí, Prólogo da obra La Prueba Ilícita Pena de Eduardo Castrillo e Miguel Morato,
5.º Ed., Aranzadi, 2010, pág. 19.
10 | P á g i n a
estrito naquele segundo ramo de direito, por existirem determinados limites – a dignidade
da pessoa e a presunção de inocência45.
Assim, a prova, entendida como meio, encontra a sua definição no art. 341.º CC,
ao referir que “as provas têm por função a demonstração da realidade dos fatos”, ou seja,
são elementos objetivos de natureza diversa que se introduzem no processo e que
contribuem para a formação da convicção do juiz a respeito da existência de determinado
facto, afigurando-se fundamentais para a descoberta da verdade e para atingir uma decisão
que se quer correta e justa. Deve, assim, ser criada no espírito do julgador uma convicção
psicológica, assente num “alto grau de probabilidade”6 de que determinado facto alegado
pela parte terá acontecido.
De acordo com MANUEL DE ANDRADE7, o conceito de prova pode ser
apresentado mediante diversas definições doutrinárias: i) como atividade probatória
dirigida aos fins próprios da investigação; ii) como resultado probatório, consistindo na
demonstração efetiva da realidade de um facto e da veracidade da correspondente
afirmação; iii) como argumento probatório, representando qualquer elemento que tenha
produzido a convicção do juiz; iv) como meio de prova, sendo todo o elemento sensível
através do qual, mediante atividade percetiva ou simplesmente indutiva, o juiz pode,
segundo a lei, formar a sua convicção acerca dos fatos da causa.
Segundo RUI RANGEL, a prova define-se como “a atividade ou o conjunto de
operações destinadas à formação da convicção do juiz, sobre a veracidade dos fatos
controvertidos que foram carreados para o processo pelas partes e que se encontram
selecionados na base instrutória”8
4
“O princípio da presunção de inocência é um princípio fundamental num Estado de Direito democrático,
cuja função é, sobretudo (mas não só), a de reger a valoração da prova pela autoridade judiciária”, Ac. do
TR do Porto, de 28-05-2014, proc. 471/10.7GDGDM.P1, Relator Neto de Moura.
5
Neste sentido, MINGARRO refere que a prova penal pode ser comparada a um diamante: limpa e dura
como uma joia pura, para que sua nitidez garanta o respeito pela dignidade e a dureza para ser capaz de
cruzar o limiar da presunção de inocência sem alterar os valores da mesma – ibidem, pág. 20.
6
Referimo-nos tão-só a uma certeza relativa, dado que a certeza absoluta, própria das ciências matemáticas, é
impossível de atingir pelo facto de que os factos sobre os quais versa a prova são ocorrências da vida real
dificilmente reconstituídos na sua plenitude. ANDRADE, Manuel de, Noções Elementares de Processo Civil,
Coimbra Editora, 1976, pág. 191.
7
Ibidem, págs. 189 e 190.
8
RANGEL, Rui, O Ónus da Prova no Processo Civil, 3.º ed. rev. e ampliada, Almedina, Coimbra, 2006,
pág. 22
11 | P á g i n a
ALBERTO DOS REIS, por sua vez e na aceção que, a nosso ver, mais sucinta e
claramente define a prova, refere que esta “é o conjunto de operações ou atos destinados a
formar a convicção do juiz sobre a verdade das afirmações feitas pelas partes”.9
Posto isto, será seguro concluir que a prova incide sobre matéria de facto e não
sobre matéria de direito, ou seja, o que forma a convicção do juiz são as ocorrências
concretas da vida real, os juízos periciais de facto e os acontecimentos do foro interno da
vida das pessoas e não a indagação, interpretação e aplicação das regras jurídicas10, tal
como refere o art. 5.º n.º3 CPC.
2. DIREITO À PROVA
9
REIS, José Alberto dos, Código de Processo Civil Anotado, Vol. III, 3.º ed. Coimbra Editora, Coimbra,
2012, pág. 239
10
VARELA, Antunes; BEZERRA, J. Miguel; NORA, Sampaio e, Manual de Processo Civil, 2.º ed.,
Coimbra Editora, Coimbra, 1985, págs. 408 e 409.
11
De acordo com GOMES CANOTILHO E VITAL MOREIRA, apesar de se encontrar inserido tal preceito
no capítulo relativo aos direitos fundamentais, aquela garantia de acesso ao direito e aos tribunais não se
esgota na defesa daqueles mesmos direitos, estando o direito à proteção jurídica e quaisquer direitos ou
interesses legalmente protegidos abrangidos, naturalmente, por tal disposição. CANOTILHO, J. J. Gomes;
MOREIRA, Vital, Constituição da República Portuguesa Anotada, Vol. I, 4.º Ed. Revista, Coimbra,
Coimbra Editora, 2007.anotação ao art. 20.º, pág. 410.
12
Neste sentido, o Ac. do TR de Lisboa, de 30-06-2011, proc. 439/10.3TTCSC-A.L1-4, Relatora Isabel
Tapadinhas, refere que “a restrição incomportável da faculdade de apresentação de prova em juízo
impossibilitaria a parte de fazer valer o direito de acesso aos tribunais e a uma tutela jurisdicional efetiva”.
13
Op. cit., pág. 69.
14
TARUFFO, M., Il diritto alla prova nel processo civile, Riv. Di. Dir. proc. 1984, A. XXXIX – N. 1, pág.
92
12 | P á g i n a
valeria existir o direito de apresentação de provas nos termos supramencionados, se o juiz
tivesse livre arbítrio quanto à aceitação das mesmas.
Caberá agora questionar se o direito à prova pode ser concebido como absoluto ou
se, ao invés disso, existirão limites intrínsecos ao mesmo, isto é, trataremos essencialmente
neste ponto da questão da existência de proibições de prova.
O estudo desta temática, sobretudo no que ao processo penal diz respeito, iniciou-
se em 1903 por BELING15, que considerava tais proibições autênticos limites à descoberta
da verdade e, por essa razão, concebia-as como figuras distintas das provas legais
negativas, inseridas no sistema da prova legal, pelo facto de, ao contrário destas, as
proibições de prova não incidirem sobre o momento da apreciação das provas mas sobre
um momento anterior. Superadas antigas conceções ligadas a critérios dogmáticos de
verdade preestabelecidos, como a Inquisição e a Justiça Hitleriana, que propiciavam a
descoberta da verdade a todo o custo, impunha-se reduzir esta busca à “escala humana” e
aquela, que até então era considerada um valor absoluto, necessitava de ser limitada por
“valores éticos e jurídicos16” do Estado de Direito.
Seguindo a linha de I. ALEXANDRE17 adotamos o conceito de proibição de
prova entendido, ora como uma limitação legal à produção da prova, ora como uma
limitação legal à valoração da prova18.
A proibição de produção de prova, estabelece apenas a inadmissibilidade de certos
temas (proibição de demonstração de certo facto, independentemente do meio de prova
utilizado, v.g. art. 454.º n.º 2.º CPC), meios (quando determinado meio de prova colide
com interesses dignos de proteção, v.g. art.s 497.º CPC e 167.º CPP) e métodos de prova
(nas situações em que a prova é obtida mediante ofensa da integridade física ou moral das
pessoas, v.g. art. 126.º CPP e 516.º n.º 3 CPC).
15
ALEXANDRE, Isabel, op. cit., pág. 46.
16
CASTRILLO, Eduardo, MORATO, Miguel, La Prueba Ilícita Penal, 5.º Ed. Aranzadi, 2010, pág. 33.
17
Ibidem, págs. 51 e 52.
18
De acordo com a autora, as relações entre as proibições de produção e as proibições de valoração de prova
poderão ser de quatro tipos: i) proibições de produção que, quando violadas, não implicam uma proibição de
valoração; ii) proibições de produção que, quando violadas, impedem a valoração do resultado probatório; iii)
proibições de valoração que não assentam na proibição de uma proibição de prova; iv) proibições de
valoração com efeito-à-distância (conceito que analisaremos no ponto 2.2.5.), Ibidem, pág. 52.
13 | P á g i n a
As proibições de valoração, por sua vez, indagam do aproveitamento ou utilização
da prova para efeitos de decisão, e não da sua admissibilidade, o mesmo será dizer que se
pretende avaliar se o resultado obtido através de um meio de prova poderá ser valorado em
juízo. Poderão dividir-se em proibições de valoração dependentes, quando têm a sua
origem na violação de uma proibição de produção de prova (ainda que a doutrina não
aceite, de forma pacífica, que a uma proibição de produção se siga sempre uma proibição
de valoração19) e proibições de valoração independentes, quando surgem de modo
autónomo.
Entendemos que seria errado considerar o direito à prova como absoluto e,
tomando por base a recusa de um meio de prova, demonstramos que tal pode suceder sem
que haja violação do direito de ação. Poderá existir uma proibição de produção de prova
se, por exemplo, não for respeitado o limite máximo de dez testemunhas plasmado no art.
511.º CPC20, todos os nomes que ultrapassem este número legal consideram-se não
escritos, de acordo com o n.º 3 do mesmo preceito. Assim, nas palavras de TARUFFO, “a
relevância da prova define e circunscreve exatamente o objeto do direito à prova, que se
considera assim como um direito à prova relevante”21, ou seja, o direito à prova poderá ser
alvo de certos limites intrínsecos, sempre que o objeto daquele não seja pertinente.
No entanto, outros limites poderão ser apontados ao direito de ação, que cede
perante direitos fundamentais22, como é o caso do art. 32.º n.º 8 CRP ao referir que “são
nulas todas as provas obtidas mediante tortura, coação, ofensa da integridade física e
moral da pessoa, abusiva intromissão na vida privada, no domicílio, na correspondência
ou nas telecomunicações”. Urge descortinar se os mesmos restringem ou violam o direito à
prova. Ainda que entendamos que as partes poderão fazer uso de outros meios de prova
para fundamentar a sua pretensão, é certo que, como alerta TARUFFO23, as limitações que
à partida seriam relativas poderão tornar-se absolutas se a parte que está impedida de usar a
prova pretendida, não dispuser de nenhuma outra24. E. F. RICCI25 segue a mesma linha de
19
Para maior desenvolvimento do tema Vide ibidem, págs. 58 e 59.
20
Na anterior redação, o art. 632.º CPC estabelecia um limite máximo de 20 testemunhas.
21
Ibidem, pág. 78.
22
Neste sentido, Ac. TR Coimbra, de 03-07-2014, proc. 1162/11.7TTCBR.C1, Relator Ramalho Pinto.
23
Ibidem, pág. 80.
24
No âmbito do processo penal, ISABEL ALEXANDRE refere a obra de TRANCHINA, G., Il divieto di
perizia psicológica sull’imputato: una limitazione sicuramente anticostituzionale, Riv. It. Di dir. e proc. Pen.
1971, págs. 1325 e ss., na qual este autor refere que “é inconstitucional, por ser contrária à norma
constitucional que consagra o direito de defesa, toda a norma de grau inferior que “negue ou restrinja à
parte o direito de exibir ao juiz os meios representativos de uma realidade a si favorável (…)””, in
ALEXANDRE, Isabel, op. cit. nota de rodapé, pág. 74.
25
RICCI, E. F., Su alcuni aspetti problematici del diritto alla prova, Riv. Di dir. proc. 1984, pág. 159.
14 | P á g i n a
raciocínio e considera que as regras que limitam o uso de determinadas provas poderão
constituir, por si só, violações do direito à prova de forma injustificável.
É no âmbito das limitações ao direito à prova que surge o quesito primordial do
presente ensaio, as provas ilícitas. SCHÖNKE26, no nosso entender, expõe o tema de forma
exemplar: poderá o Tribunal tomar em consideração documentos obtidos mediante
violação do segredo de correspondência que, ainda que tenha sido realizada com um fim
utilitário, é considerada uma conduta antijurídica? O mesmo será dizer: perante uma prova
que se afigura ilícita, conceito que trataremos adiante, o juiz será obrigado a optar pela sua
inadmissibilidade?
Para encontrarmos a resposta a esta questão, não podemos deixar de ter como
pedra basilar a ideia retirada do exposto anteriormente: “qualquer restrição à
admissibilidade de meios de prova há de seguir um interesse juridicamente relevante e ser
proporcionada”27.
Assim, entre as diversas discussões possíveis sobre o instituto da prova, o estudo
estará restrito à análise das provas ilícitas, a fim de investigar se o nosso ordenamento
vedou de forma perentória a sua admissão no processo ou se, pelo contrário, será possível
afastar a proibição genérica prevista na Constituição em casos excecionais.
26
SCHÖNKE, Adolf, Limites de la prueba en el derecho procesal (trad. De Ernesto Rohrbach Rojí), Rev. de
der. proc. 1955, Año XI, Num. 3, págs. 373 e 374.
27
ALEXANDRE, Isabel, op. cit. pág. 79
28
Ibidem, pág. 28.
15 | P á g i n a
A Constituição de 1976 trata pela primeira vez e de forma inquestionável, no
ordenamento jurídico português, do conceito e regime das proibições de prova29, nas quais
se incluem as provas ilícitas30, ao determinar no seu art. 32.º n.º8 a nulidade de “todas as
provas obtidas mediante tortura, coação, ofensa da integridade física ou moral da pessoa,
abusiva intromissão na vida privada, no domicílio, na correspondência ou nas
telecomunicações”.
COSTA ANDRADE31, perante a autonomia que assim foi concedida pelo
legislador à figura da prova proibida, refere que “a definição das proibições de prova como
um sistema normativo próprio” reconduzir-se-á a uma “equacionação e superação dos
problemas doutrinais e normativos”. O mesmo autor, citado por I. ALEXANDRE32, refere
que os limites impostos à produção de prova visam “assegurar a inviolabilidade do núcleo
irredutível dos direitos fundamentais dos cidadãos” e “preservar a estrutura fundamental
do próprio modelo processual”, fundamentos estes que, apesar de terem sido referidos no
contexto do processo penal, estão presentes também no processo civil.
Apesar de não ser possível encontrar uma definição clara de prova ilícita na lei,
JOSÉ JOÃO ABRANTES define-a como aquela “que se encontra afetada por ilicitude33,
no que diz respeito ao seu modo de obtenção”, ao passo que ELENA BURGOA entende
que aquela é “a prova que ao ser recolhida infringe normas e princípios estabelecidos na
29
A razão de ser destas proibições de prova assenta, na ótica de COSTA ANDRADE, em dois objetivos:
“assegurar a inviolabilidade do núcleo irredutível dos direitos fundamentais dos cidadãos (…) e preservar a
estrutura fundamental do próprio modelo processual”, ANDRADE, Costa, Parecer, CJ 1981, Tomo I, pág. 8.
30
Existe uma enorme dificuldade em obter uma uniformidade terminológica quanto ao estudo das proibições
de prova o que, naturalmente, em nada contribui para a segurança do tema. Neste sentido LÓPEZ BARJA
DE QUIROGA (Las intervenciones telefónicas y La Prueba Ilegalmente Obtenida, AKAL, 1989) refere que
“alguns autores referem-se à prova proibida, outros à ilícita, outros à ilegitimamente obtida e outros, enfim,
às proibições probatórias” e, apesar de considerar que não há inconveniente em usar qualquer um destes
termos, refere que o termo prova proibida é preferível por ser o “mais geral” e o que “abarca todas as
hipóteses”. ISABEL ALEXANDRE, não considera a opção do autor correta pois enquanto os termos “prova
ilícita” ou “prova ilegal” aludem a um meio de prova obtido mediante violação das normas de direito
material, se se falar em “prova proibida” ou “proibição probatória” o que se pretende é acentuar a
inadmissibilidade da prova em juízo e a sua utilização, ou não, como fonte de convicção do julgador, ou seja,
fazem referência à inadmissibilidade e não à ilicitude, pelo que os termos supramencionados não poderão ser
usados de forma equivalente. Ibidem, págs. 49 e 50.
31
ANDRADE, Manuel Costa, Sobre as proibições de prova em processo penal, Coimbra Editora, 1992, pág.
193.
32
Op. cit. pág. 48.
33
Os atos jurídicos podem ser lícitos, se estão de acordo com a ordem jurídica, ou ilícitos, quando a conduta
que lhes dá origem é reprovada pela lei (ex. com o objetivo de fazer valer tal prova em juízo contra o réu, o
autor grava uma conversa mantida entre si e aquele de modo sub-reptício). ANDRADE, Manuel de, Teoria
Geral da Relação Jurídica, Vol. II, Coimbra, Almedina, 1960, pág. 2.
16 | P á g i n a
Constituição, destinados à proteção dos direitos de personalidade e a sua manifestação
como direito à intimidade”34.
Para G. F. RICCI35, a ilicitude da prova pode manifestar-se em relação a três
casos: provas constituendas (implicando a violação de normas processuais), provas pré-
constituídas (levando à violação do direito material) e provas constituendas e pré-
constituídas (a irregularidade afeta a formação do meio de prova). I. ALEXANDRE 36 não
concorda com a distinção feita por aquele autor e apresenta um conceito mais restrito,
afirmando que haverá prova será ilícita quando o seu modo de obtenção for reprovado pelo
direito material, quer a ilicitude se verifique dentro da órbita processual (casos em que os
atos são praticados pelo juiz e dão origem a ilicitude em sentido estrito) ou fora da órbita
processual37 (os atos são praticados pelas partes ou terceiros e originam ilegitimidade, ou
ilegitimidade e ilicitude simultaneamente).
Atendendo às causas que originam a ilicitude e seguindo de perto MANUEL
ESTRAMPES38, que mantém uma conceção ampla da prova ilícita, podemos distinguir: i)
provas expressamente proibidas pela lei (a sua inadmissibilidade está prevista por uma
norma legal de caráter proibitivo, podendo subdividir-se em poibições legais de caráter
geral e proibições legais de caráter singular39); ii) provas ilegais (aquela cuja obtenção
infringiu a legalidade ordinária e foi obtida sem as formalidades e o procedimento
estabelecidos na lei); iii) provas obtidas ou praticados mediante violação dos direitos
fundamentais (também designadas de provas inconstitucionais, podem ser provas cuja
34
Tradução nossa. BURGOA, Elena, La prueba ilícita en el Proceso Penal Portugués, Estudos
comemorativos dos 10 anos da FDUNL, coord. Diogo Freitas do Amaral, Carlos Ferreira de Almeida, Marta
Tavares de Almeida, Coimbra, Almedina, 2008. pág. 602.
35
RICCI, G. F., Le Prove Illecite nel Processo Civile, Riv. Trim. Di dir. e proc. Civ. Anno XLI, Milano –
Dott. A, Giuffrè Editore,1987, pág. 35.
36
A autora refere que a distinção efetuada por G. F. RICCI não se afigura correta, pelo facto de que poderão
existir hipóteses de violação de normas materiais quanto às provas constituendas, do mesmo modo que
também normas processuais poderão ser violadas por normas pré-constituídas (exemplos destas situações
são, respetivamente, a ilícita obtenção de conhecimentos pela testemunha e desvios ao principio do
contraditório). Quanto à terceira figura apontada por RICCI, caracterizada por não consubstanciar uma
violação de regras materiais nem de normas processuais, ISABEL ALEXANDRE refere que não deveria ser
autonomizada face às restantes, pelo simples fato de que “certos meios de prova obtidos mediante violação
do direito material (…) parecerem configurar situações de ilicitude na formação da prova”, como é o caso
das gravações secretas. Op. cit. págs. 18 e 19.
37
Considera-se que estas duas formas de ilegalidade deverão ser estudadas em simultâneo, apesar do perigo
de dispersão inerente a tal abordagem, porque há uma ligação forte entre ambos e nenhum poderá ser
compreendido sem que seja feita referência ao outro. Para uma melhor compreensão desta ligação, Vide
ibidem, pág. 24.
38
ESTRAMPES, Miranda Manuel, El concepto de prueba ilícita y su tratamento en el processo penal, José
María Bosh Editor, Barcelona, 1999, pág. 29 e 30.
39
De acordo com SERRA DOMÍNGUEZ, não existem, na realidade, proibições genéricas de determinados
meios de prova, v.g. prova documental, testemunhal, pelo contrário, pois as proibições previstas legalmente
apresentam um caráter singular, com alcance limitado. DOMÍNGUEZ, M. Serra, Comentários al Código
Civil y Compilaciones Forales, Tomo XVI, vol. 2.º, Madrid, 1981.pág. 96.
17 | P á g i n a
realização é, por si só, ilícita, ou provas obtidas ilicitamente mas incorporadas no processo
de forma lícita40), devendo comportar, todas elas, as mesmas consequências ao nível da sua
inutilidade processual.
Cabe ainda fazer uma breve alusão ao conceito de provas ilícitas em si mesmas41
que, apesar de serem pré-constituídas, não foram abordadas por RICCI na sua
esquematização. Estas provas suscitam dúvidas quanto à possibilidade da sua utilização
processual dada a sua natureza pois, independentemente de terem sido obtidas de forma
42
legal , atentam contra direitos fundamentais se exibidas em juízo. No entanto, estas
provas não podem ser consideradas uma terceira categoria de ilicitude porque o problema
que se pode levantar ao nível delas é o mesmo que é suscitado pela ilicitude fora da órbita
processual.
Como fora referido no ponto anterior, uma prova é ilícita quando resulta da
prática de um ato ilícito, praticado dentro ou fora da órbita processual, distinguindo-se,
assim, da prova inadmissível que, independentemente do ato através do qual ela foi obtida
e por qualquer motivo43, não pode ter ingresso no processo. A prova inadmissível
distingue-se das provas irrelevantes ou desnecessárias que, apesar de serem válidas e
lícitas, também não deverão ser admitidas pelo juiz, ao abrigo do princípio da proibição da
prática de atos inúteis (art.s 6.º n.º 1 e 130.º CPC) por não terem qualquer relação com o
objeto em causa.
Do mesmo modo, se a invalidade afetar os atos processuais de admissão ou de
produção de prova, e não a prova em si, não se deverão designar de provas inadmissíveis
mas sim de provas invalidamente constituídas 44(cfr. art. 415.º CPC).
40
Ibidem, pág. 48.
41
No entanto, estas provas não podem ser consideradas uma terceira categoria de ilicitude porque o problema
que se pode levantar ao nível delas é o mesmo que é suscitado pela ilicitude fora da órbita processual:
relevância da ilicitude material ao nível do processo.
42
Um diário íntimo que é obtido através de sucessão, por exemplo, se for lido em audiência poderá lesar
direitos constitucionalmente protegidos.
43
ISABEL ALEXANDRE refere quatro possíveis motivos para a prova inadmissível não poder ser praticada
no processo, de entre os quais o facto de o legislador poder subtraí-la à apreciação do juiz por suspeitar do
contributo por ela prestado para a descoberta da verdade material,. Op.cit., pág. 29.
44
Poderíamos ser levados a crer que este problema apenas se coloca face a provas constituendas, uma vez
que as pré-constituídas, como o próprio nome indica, já se encontram constituídas antes de serem admitidas
no processo mas, de acordo com ISABEL ALEXANDRE, se o juiz admitir uma prova pré-constituída sem
que a parte contrária tenha tido a possibilidade de impugnar a respetiva admissibilidade, ainda poderão
aquelas ser consideradas invalidamente “constituídas”, ibidem, pág. 32.
18 | P á g i n a
2.2.2. PROVA ILÍCITA E PROVA IMORAL
45
Ibidem, citando ZEISS, pág.33.
46
Op. cit.,Pág. 12
47
Op. cit., págs. 34 e 35.
48
ALEXANDRA, Isabel, op. cit., pág. 34.
19 | P á g i n a
possível verificar uma homogeneidade lógica dos vários elementos que compõem aquele49,
tese esta que é possível transpor para o Direito Português. Não obstante o nosso Código
Civil estabelecer um elenco de provas no seu art. 349.º e ss, este não corresponde a uma
tipologia, representando, pelo contrário, um conjunto de realidades com natureza diversa,
sendo ainda possível encontrar normas relativas a meios de prova fora daquele código (cfr.
art. 416.º CPC, relativo a prova por apresentação de coisas móveis). No nosso
ordenamento, a questão da admissibilidade de provas atípicas não recebe uma resposta
unitária50, no entanto, partilhamos a opinião de I. ALEXANDRE51, que refere que estas
provas apenas deverão ser rejeitadas quando seja necessário defender outros direitos ou
interesses.
Pelo exposto, parece ser possível concluir pela impossibilidade de fundamentar a
admissibilidade da prova ilícita, através do recurso à figura da prova atípica, o mesmo será
dizer que se quanto a esta o ponto de partida deverá ser o da admissibilidade, só se
impondo solução diversa nos termos expostos anteriormente, o mesmo não se aplicará
quanto às provas ilícitas, que beneficiam de um regime diferente, o qual será melhor
analisado no capítulo IV.
49
Ao invés disso, a técnica adotada nos modernos catálogos legais, como sucede com o Código Civil
Italiano, consistiu em “alinhar, à guisa de entidades homogéneas, elementos que evidentemente pertencem a
áreas lógicas e semânticas diversas”. Ibidem, citando o autor, pág. 36.
50
Citados por ISABEL ALEXANDRE, LEBRE DE FREITAS defende a inadmissibilidade dos meios de
prova não previstos na lei, enquanto ANTUNES VARELA – J. M. BEZERRA – SAMPAIO E NORA,
defendem a sua admissibilidade. Idêntica é a posição de CASTRO MENDES, ainda que com algumas
reservas dado que, para o autor, o art. 345.º n.º 2 do CC veda às partes a possibilidade de ampliar o elenco
legal dos meios de prova, estando tal faculdade apenas do lado do juiz, usando os poderes que lhe são
conferidos pelo art. 265 n.º 3 do CPC. No entanto, ISABEL ALEXANDRE não concorda com esta posição
ao considerar que se as partes estiverem impossibilitadas de usar provas inominadas, tal representa uma
restrição ao direito fundamental à prova, consagrado no art. 20.º n.º 1 e 4 da CRP, o que contraria o disposto
no art. 18.º n.º 2 da CRP – Op. cit., pág. 44.
51
Op. cit., pág. 46.
52
ANDRADE, Costa, op. cit., pág. 61.
20 | P á g i n a
Não obstante a Constituição determinar a nulidade das provas proibidas no seu art.
32.º n.º 853, como referimos anteriormente54, não encontramos qualquer referência
específica à temática agora em análise, tendo o legislador deixado a solução relativa a estes
casos a cargo da doutrina e da jurisprudência.
O facto de não existir, assim, qualquer norma que imponha às autoridades
incumbidas da investigação que ignorem a prova obtida na sequência de uma prova ilícita
poderá ser utilizado como argumento para aqueles que defendem a tese contrária ao efeito-
à-distância, a acrescentar ao facto de que meras irregularidades poderiam criar “obstáculos
insuperáveis” à descoberta da verdade, seja em processo penal como em processo civil. No
entanto, vozes contrárias, como TROCKER55, referem que se seguíssemos aquele
raciocínio tornar-se-ia fácil contornar a questão da proibição de prova ilícita pois a eficácia
desta seria recuperada através da utilização da prova que através dela foi possível
descobrir. Para este autor, a resposta residiria na descoberta da ratio das normas violadas
com o comportamento contrário à Constituição, ou seja, apenas haverá efeito-à-distância se
as normas violadas tutelam valores como a integridade moral e física ou a esfera da
reserva.
COSTA ANDRADE, que antes da entrada em vigor do anterior Código Penal
defendia o efeito-à-distância, mesmo em caso de violação de princípios processuais, refere
que o regime das nulidades, estabelecido no art. 122.º n.º 1 CPP56 – que à semelhança do
art. 195.º n.º 2 CPC determina a extensão da nulidade do ato processual aos atos que deste
dependam57 – por estar associado às proibições de prova, “indicia uma propensão para
reconhecer o efeito-à-distância, sem as hesitações sentidas na doutrina e jurisprudência
alemãs”, mas não de forma ilimitada, como sucede com o princípio da fruit of the
poisonous tree doctrine, pois o intérprete e o aplicador de direito devem estar atentos a
cada caso concreto – tendo em conta, nomeadamente, o tipo de proibição de prova, a
53
Alguma doutrina considera que o elemento literal do art. 32.º n.º8 da CRP e o art. 126.º do CPP, podem
conter base suficiente para a proibição de valoração de todas as provas “contaminadas pelo veneno do
método proibido”, não circunscrevendo a proibição àquelas provas obtidas de forma direta. Por outro lado,
também há quem refira que tendo em conta a associação existente entre as proibições de prova e o regime das
nulidades processuais, deveria existir um equilíbrio entre ambas. BURGOA, Elena, op. cit. pág. 605.
54
Vide Capítulo I, ponto 2.2.
55
ALEXANDRE, Isabel, citando o autor, op. cit. pág. 150.
56
“As nulidades tornam inválido o ato em que se verificarem, bem como os que dele dependerem e aquelas
puderem afetar.”
57
ISABEL ALEXANDRE adota a solução de que para averiguar a extensão das nulidades no âmbito dos atos
de aquisição probatória, temos de distinguir entre “os atos que se inserem no âmbito do mesmo procedimento
probatório e os atos que, tendo embora lugar na fase da instrução, se regem por procedimentos probatórios
distintos: só em relação aos primeiros se vislumbra aquela dependência que permite dizer que um ato é
pressuposto do outro”. Op. cit., pág. 156.
21 | P á g i n a
natureza e importância do direito, o interesse sacrificado e ao sujeito passivo de tal
violação. Não será arriscado referir que no direito português, não encontramos uma
resposta generalizada, um princípio cerrado e válido para todas as situações dado que,
acrescenta aquele autor, em concreto, o efeito-à-distância apenas não será aplicado por
razões relativas ao nexo de causalidade e imputação objetiva entre a prova primária e a
prova secundária58, afirmando ainda GUEDES VALENTE 59que para escolher o caminho a
seguir deverá haver sempre uma ponderação de determinados fatores, como a perigosidade
do “veneno”, a importância do “fruto” no contexto global da prova e a vinculação
normativa deste à “árvore envenenada”.
O Acórdão do STJ de 6 de maio de 200460, relativo à discussão da nulidade de
uma escuta telefónica que fora efetuada sob infração dos requisitos procedimentais,
considera que haverá contaminação das provas ilícitas por derivação “quando está em jogo
a garantia da dignidade da pessoa humana”, casos em que “não se poderá invocar a
necessidade de ponderação dos interesses em conflito e a validade das provas
consequentes”, enquanto que perante “interesses individuais que não contendem
diretamente com a garantia da dignidade da pessoa humana, e deverá aceitar-se (…) que
tais interesses, ainda que emanem de direitos fundamentais podem ser limitados atendendo
a interesses conflituantes”, opção jurisprudencial que recebe apoio do direito comparado,
como veremos no ponto seguinte. Esta sentença ratifica, de forma geral, a doutrina dos
frutos da árvore envenenada61, pois ainda que se assista a uma tímida relativização da
prova ilícita, esta apenas se verifica porque a ofensa em causa teve origem num defeito
meramente formal62 e, para evitar situações de formalismo estéril, considerou-se que
apenas a prova obtida mediante violação do direito fundamental seria ilícita e nula, não se
estendendo tal nulidade à confissão dos sujeitos, prova secundária.
58
ANDRADE, Costa, op. cit., pág. 316.
59
VALENTE, Manuel Guedes, Processo Penal, Tomo I, Almedina, Coimbra, 2004, pág. 423.
60
Proc. 04P908, Rel. Cons. Santos Carvalho.
61
Também no sentido da aceitação do efeito-à-distância, o Ac. do TR do Porto, de 17-02-2014, proc.
231/14.6TTVNG.P1, Relator António José Ramos. Neste acórdão é referido que “sendo esta
uma prova reflexa, secundária, mediata, derivada ou indireta, obtida através da primeira, a mesma não pode
ser usada contra o trabalhador, na medida em que esta só teve lugar através de um conhecimento derivado
da utilização de um meio de prova ilícito, sendo tal proibição abrangida pelo art. 32º, são, assim,
uma prova ilícita por derivação.”
62
Esta sentença clarifica que, no caso de provas ilícitas obtidas mediante violação de direitos fundamentais
que contendem diretamente com a dignidade da pessoa humana, não haverá espaço para as admitir, ainda que
por via de exceção. BURGOA, Elena, op. cit. pág. 611.
22 | P á g i n a
Já o Ac. do TR de Guimarães, de 30-04-200963, refere que “não pode a prova
testemunhal servir para “branquear” prova obtida através de um ato ilícito, sob pena de,
doravante, se tornar, por essa via, lícita toda a prova que não o é. Sendo nula tal prova,
não deverá ser admitida qualquer prova, nomeadamente testemunhal, que se estribe na
mesma, sob pena de, como sói dizer-se, se fazer entrar pela janela o que não pôde entrar
pela porta” e, continua, “verificado que uma testemunha adquiriu o seu conhecimento a
partir de prova obtida ilicitamente, deverá o seu depoimento ser recusado ou, se prestado,
tido como nulo”.
Concluindo, apesar de haver uma tendência generalizada para a adoção da tese da
admissibilidade do efeito-à-distância, algumas vozes apontam para a ponderação dos
interesses em conflito como a melhor resposta a tal controvérsia, sobretudo quando estão
em causa meros formalismos que deverão decair perante o interesse da busca da verdade,
algo que não sucederá, à partida, quando se trate da violação de direitos fundamentais
ligados à dignidade da pessoa humana.
63
Proc. 595/07.8TMBRG, Relator Manso Rainho. De modo a provar que a ré mantinha um relacionamento
afetuoso e carnal com terceira pessoa, de quem recebia mensagens no telemóvel, o autor coloca um gravador
no interior do veículo automóvel da ré, de modo a provar a infidelidade. Determinada testemunha adquire
conhecimento dos factos a partir da audição das gravações conseguidas pelo autor e pretende depor em
tribunal. – www.dgsi.pt
64
Expressão “cunhada pelo Justice Frankfurter”, nas palavras de COSTA ANDRADE, Ibidem, pág. 170.
65
ANDRADE, Costa, citando este autor, op. cit. pág. 171.
23 | P á g i n a
A experiência alemã, por sua vez, caracteriza-se por uma enorme complexidade,
“legando um panorama marcado pela dispersão e desencontro de respostas”66. Por um
lado, aqueles que propendem para a negação radical do efeito-à-distância alegam que “o
processo penal não pode desenvolver-se como se os meios de prova mediatos pura e
simplesmente não existissem”.67 Por outro lado, é possível encontrar no direito alemão uma
Makel-Theorie, réplica do princípio americano, seguida por OTTO68 que sustenta que “não
pode estabelecer-se nenhuma diferença entre a valoração duma declaração como
declaração e a valoração dos conhecimentos resultantes da mesma declaração” e por
HELKEL69 que defende que o reconhecimento Fernwirkung pode “purificar o processo da
nódoa (Makel) da ilegalidade, consumada com a violação da proibição de prova” e tal só
poderá ser conseguido “se o processo seguir o seu curso como se a ilegalidade não tivesse,
pura e simplesmente, acontecido”.
Uma outra perspetiva, perfilhada por ROGALL e WOLTER, ainda que com
algumas diferenças, assenta na ideia de que não haverá uma solução estanque para este
problema e só a doutrina da ponderação dos interesses poderá oferecer a resposta mais
adequada às questões emergentes, relativamente a cada caso concreto, excetuando dois
casos nos quais haverá desde logo efeito-à-distância – quando a valoração da prova
secundária se revele necessária e quando a proibição de valoração se deva a violação
grosseira da lei e do direito. Resumidamente, ainda que à partida parecesse unívoca a
admissibilidade70 por parte do Tribunal Federal de casos de efeito-à-distância, a recente
jurisprudência alemã revela que está à procura um modelo que dê “expressão e corpo a um
paradigma normativo assente na admissibilidade do princípio do efeito-à-distância, mas
reconduzido a limiares político-criminalmente sustentáveis e dogmaticamente
legitimáveis71”.
No direito espanhol, o art. 11.1 L.O.P.J, de acordo com MANUEL
ESTRAMPES72, supõe o reconhecimento e a admissão do efeito-à-distância das provas
obtidas de forma ilícita e a incorporação da doutrina norte-americana dos frutos da árvore
66
ANDRADE, Costa, op. cit. pág. 173.
67
Para mais desenvolvimentos, vide ANDRADE, Costa, op. cit. págs. 173 e 174.
68
Ibidem, pág. 175.
69
Ibidem, pág. 176.
70
BGH de 18.4.1980, sobre o “caso Traube”, no qual o tribunal se pronunciou a favor do efeito-à-distância
das proibições de valoração da prova, por ser indiferente, àluz da Constituição, saber se a pessoa cujo direito
fundamental foi violado foi criminalmente perseguida em virtude de provas direta ou indiretamente obtidas
na sequência de escuta ilegal . ALEXANDRE, Isabel, op. cit. nota de rodapé da pág. 149.
71
Ibidem, pág. 182.
72
ESTRAMPES, Manuel Miranda, op. cit., pág. 109
24 | P á g i n a
envenenada ao referir “No surtirán efecto las pruebas obtenidas, direta o indiretamente,
violentando los derechos o libertades fundamentales”73, isto é, a ineficácia da prova ilícita
contemplará, do mesmo modo, todos aqueles elementos probatórios obtidos de forma lícita
mas que tiveram origem em informações provenientes daquela, dado que, para este autor,
pensar o contrário seria reconhecer uma mera ineficácia formal à prova ilícita74.
Para tal, não deixam de considerar que é necessário que exista uma relação de
causalidade entre a prova ilícita e a prova lícita que deriva da anterior, o mesmo será dizer
que para que se possa imputar objetivamente a primeira prova à segunda, para que esta seja
uma consequência daquela, será necessário que exista entre ambas uma causa-efeito75,
ainda que se reconheça que na prática tal seja muito difícil de demonstrar.
73
No mesmo sentido QUIROGA, López Barja de, op. cit., Pág. 89
74
A jurisprudência espanhola tem seguido esta linha em diversas decisões, das quais podemos citar o Auto
T.S. de 18 de junho de 1992 (R. Ar. 6102), relativo ao “Caso Naseiro”, S.T.S de 17 de junho de 1994 (R. Ar.
5176) e S.T.S. de 13 de Marco de 1995 (R.Ar. 1838). Para mais desenvolvimentos acerca do conteúdo das
mesmas Vide ESTRAMPES, Manuel Miranda, op. cit. pág. 112.
75
QUIROGA, López Barja de, op. cit. pág. 118.
25 | P á g i n a
CAPÍTULO II
1. PROCESSO CIVIL
76
Atualmente é o art. 417.º n.º 1 CPC.
26 | P á g i n a
da parte quanto ao modo da sua obtenção (v.g., se uma testemunha prestar o seu
depoimento em estado de hipnose, não será capaz de recusar o modo de obtenção daquela
prova e, ainda assim, será considerada ilícita).
Os princípios relativos à prova no processo civil são, não raras vezes, apontados
como possíveis argumentos para a tese da admissibilidade das provas obtidas de forma
ilícita e, no nosso entender, será essencial descortinar os contornos daqueles que se
afiguram de maior importância e destaque, entre os quais os princípios da investigação da
verdade, da boa fé e da livre apreciação de provas, de uma forma mais pormenorizada e,
com alguma brevidade, citaremos igualmente os princípios da aquisição processual, do
dispositivo e da cooperação, na medida em que caracterizam a estrutura processual que a
nova reforma CPC pretendeu alcançar.
77
SOUSA, Teixeira, Sobre a Teoria do Processo Declarativo, Coimbra Editora, Coimbra ,1980, págs. 50 e
51.
78
Op. cit., pág. 57.
27 | P á g i n a
De acordo com esta linha de pensamento, poderíamos pensar que o processo civil
não vai tão longe quanto o processo penal na averiguação da verdade, contentando-se
apenas com uma mera verdade formal, o que não estaria longe da realidade pois, sendo um
processo essencialmente de partes, desenrolar-se-ia atendendo ao princípio do dispositivo,
decidindo o juiz, como sujeito passivo, apenas com base no que aquelas levassem para o
processo.
Atualmente, seguindo a tese daquele autor, cremos que não haja uma verdade
formal absoluta para o processo civil ou uma verdade material absoluta para o processo
penal dada, sobretudo, a mudança ao nível de princípios estruturantes destes ramos de
direito. Este raciocínio tem a seu favor o surgimento do princípio do inquisitório, que
permite ao juiz desempenhar um papel ativo no processo, não estando limitado àquilo que
as partes oferecem, contrariando a ideia inicial de que a existência de certas normas
constitucionais (cfr. art. 34.º n.º 4 CRP) conferiam maiores poderes de investigação ao juiz
penal79. Acrescentamos também o facto de, não raras vezes, no próprio processo penal a
verdade formal estar sobreposta à verdade material, v.g., perante a possibilidade de realizar
uma escuta telefónica, bastará falhar algum dos requisitos exigidos pelo art. 167.º CPP para
que se conclua pela ilicitude da prova, deixando que meras formalidades limitem a
descoberta da verdade material.
Ultrapassada aquela ideia de distinção entre verdade formal e material, julgamos
que será a verdade real aquela que deverá ser alcançada, ideia que é reafirmada pelo
princípio da cooperação80 que, de acordo com o art. 417.º n.º 1 CPC, se desdobra em
múltiplas sujeições e deveres81 (v.g., sujeição às inspeções necessárias, dever de resposta e
de prestação de esclarecimentos, dever de entrega de documentos e de objetos requisitados,
dever de praticar certos atos).
Assim, será que o mero interesse processual de procura da verdade constituirá
razão suficiente para que se aceite a violação de direitos individuais, ou poderão existir
outros interesses envolvidos no caso que, em concreto, nos façam tolerar ilegalidades
79
ISABEL ALEXANDRE, na sua obra, referia que o processo civil seria menos condescendente do que o
processo penal em matéria de provas porque o juiz penal dispunha de poderes mais amplos mas que, este
facto, seria “compensado” pelo dever geral de colaboração na descoberta da verdade que impendia sobre as
partes e terceiros em processo civil. Op. cit., pág. 83.
80
Antes era designado por “dever geral de colaboração na descoberta da verdade”, imposto às partes e a
terceiros mas, atualmente, devido ao princípio do inquisitório, que analisaremos adiante, o art. 7.º n.º 1 do
CPC inclui no leque de pessoas sujeitas a este dever de cooperação os magistrados e os mandatários judiciais,
além das partes.
81
Para um maior desenvolvimento vide Capítulo II, ponto 1.2.
28 | P á g i n a
deliberadamente cometidas? A esta questão daremos resposta posteriormente, no ponto
1.2.1. do Capítulo III.
Plasmado nos art.s 8.º, 9.º e 542.º CPC, o princípio da boa-fé é considerado basilar
do processo civil, o primeiro ramo de direito a ser atingido por aquele dado que “a sua
natureza instrumental perante o Direito Civil e uma certa tradição literária de escrita
sobre a boa fé em Processo terão facilitado a transposição”82.
Como refere I. ALEXANDRE, o estudo das manifestações deste princípio é
essencial para a problemática das provas ilícitas, uma vez que a inadmissibilidade destas
poderá fundar-se na violação do dever de lealdade daquele que as pretende utilizar, do
mesmo modo que a sua admissibilidade poderá radicar no dever de veracidade da parte
contrária, deveres estes que se consideram decorrentes daquele princípio.
Para BAUR, “o sentido do dever de dizer a verdade é precisamente o de impedir
os depoimentos conscientemente falsos e incompletos” 83 e, de acordo com esta linha de
pensamento, consideramos que este dever impõe-se sempre, excetuando os casos relativos
ao depoimento de parte e à articulação de factos ou prestação de informações relativamente
a factos criminosos ou torpes, de que a parte seja arguida84.
O recurso ao princípio da boa-fé para fundamentar teses mistas quanto à
admissibilidade da prova ilicitamente obtida foi tentada por alguns autores, mas este não
será o momento oportuno para analisar as vantagens e desvantagens de tal argumentos,
veremos tal questão no Capítulo III, ponto 1.4.1.
82
CORDEIRO, Menezes, Da boa-fé no Direito Civil, I, 1984, pág. 371.
83
BAUR, F., Les garanties fondamentales des parties dans le procès civil en République Fédérale
d’Allemagne, in Fundamental Guarantees of the Parties in Civil Litigation/Les garanties Fondamentales des
Parties dans le Procès Civil, Giuffrè, Milano, 1973, pág. 29.
84
Enquanto se, relativamente àqueles factos, a parte não for arguida, o dever de veracidade manter-se-á,
ressalvando a possibilidade de recusa de colaboração, nas circunstâncias a que o art. 417.º n.º 3 do CPC se
refere.
29 | P á g i n a
prudente convicção acerca de cada facto”, é, não raras vezes, articulado com a
problemática das provas ilícitas.
Tal como o próprio preceito indica, o princípio da livre apreciação de provas 85
parece implicar a liberdade de utilização das mesmas na última etapa do procedimento
probatório86, a valoração da prova, o mesmo será dizer que poderíamos ser levados a
aceitar a admissibilidade das provas ilícitas com base neste poder do juiz para valorar. No
entanto, tal entendimento não se afigura, de todo, correto.
Nas palavras de ALBERTO DOS REIS87, este princípio indica que a prova “é
apreciada em inteira liberdade pelo julgador, sem obediência a uma tabela ditada
externamente, mas em perfeita conformidade (…) com as regras da experiência e as leis
que regulam a atividade mental” mas, tendo por base o entendimento de WALTER88 e
NOBILI89, aquela apreciação apenas compreende a liberdade de apreciação das provas, não
se estendendo à possibilidade de decidir da admissão e utilização das mesmas, ou seja, para
que o juiz analise os elementos probatórios, tem de estar já positivamente afirmada a
possibilidade de utilização dos mesmos e, por esta razão, no nosso entender, deverá ser
feito o raciocínio inverso àquele que, à partida, seria de afirmar: não será o poder do juiz
para valorar que fundamentará a admissibilidade de determinada prova ilícita, mas sim a
resposta que se dá à questão da admissibilidade desta que tornará possível a valoração por
parte do juiz.
Independentemente de se vir a concluir pela admissibilidade das provas ilícitas,
parece-nos que este argumento não será plausível, ainda que possa ser fundamental no que
à força probatória atribuída a cada facto diz respeito, isto é, sendo aquelas provas admitidas
85
Não obstante a regra em processo civil ser a da livre apreciação pelo juiz, o legislador poderá impor-lhe
uma determinada conclusão e, neste caso, estaremos perante a prova legal ou tarifada, ou seja, é atribuída
uma certa força probatória aos meios de prova, um “vínculo imposto à decisão e consequente repúdio de um
qualquer controlo de veracidade”, ainda que seja, igualmente, considerada uma “verdadeira prova, na
medida em que, «quando uma regra legislativa (…) impõe que se decida com base num facto, o resultado é o
mesmo que se obteria, se a conclusão fosse construída de acordo com as máximas da experiência»
”ALEXANDRE, Isabel, citando o autor F. CORDERO, op. cit., pág. 102.
86
O procedimento probatório é definido como “o esquema metodicamente ordenado dos atos processuais
destinados a permitir a utilização dos diferentes meios de prova” e apresenta quatro fases (normais): i)
proposição, oferecimento ou requerimento da prova (a parte requer a admissão ou a produção da prova, no
caso das provas pré-constituídas e provas constituendas, respetivamente); ii) admissão da prova (consiste no
deferimento da proposição, oferecimento ou requerimento da prova, cfr. arts. 543.º e 637.º n.º 2 do CPC); iii)
produção da prova (é a fase essencial do procedimento probatório das provas constituendas – as pré-
constituídas formam-se fora do processo – pois é neste momento que se extrai da fonte oferecida o material
probatório por ela fornecido); iv) assunção da prova (incorporação do meio de prova no processo),
VARELA, A. – BEZERRA, J. M. – NORA, S., op. cit., pág. 495.
87
Código de Processo Civil Anotado, Vol. III, pág. 245.
88
WALTER, G., Freie Beweiswürdigung, 1979, pág. 285.
89
NOBILI, M., Letture testimoniali consentite al dibattimento e libero convencimento del giudice, Riv. It. Di
dir. e proc. Pen. 1971, págs. 275 e 278.
30 | P á g i n a
em juízo, caberá ao juiz formular a sua convicção, com a prudência necessária, conferindo
maior ou menor valor às mesmas.
90
MARQUES, Remédio, Ação declarativa à luz do código Revisto, Coimbra Editora, Coimbra, 2007., pág.
161.
91
Relativamente a este princípio, questiona-se em que medida ele colocará em causa a imparcialidade do juiz
e se, por outro lado, se trata de um poder-dever ou, ao invés disso, de um poder discricionário. Quanto à
primeira questão, MONTERO AROCA (Processo Civil e Ideología: un prefacio, una sentencia, dos cartas y
quince ensayos, Valencia, 2006 págs. 240 a 248) refere que o poder inquisitório do juiz coloca em causa o
princípio da igualdade de armas, alicerçado pelos deveres de imparcialidade e independência a que o juiz se
encontra adstrito e que, por essa razão, este deve “abster-se de realizar a qualquer título obrigações que são
próprias das partes litigantes”. Em sentido diverso, TARUFFO (Poteri Probatori delle Parti e del Guidice in
Europa, in Riv. Trim. Di dir. e proc. Civ., n.º 2, Milano, 2006, pág. 451 e ss.) defende que o papel ativo do
julgado não significa autoritarismo da sua parte, inclusive porque outros poderes similares são atribuídos
aquele, como a possibilidade de admissão de uma prova, não deixando de fazer uma avaliação objetiva e
imparcial e tendo sempre como objetivo atingir a justa composição do litígio.
92
Cfr. arts. 6.º e 411.º do CPC.
31 | P á g i n a
É neste ponto, relativo ao âmbito da prova e ao papel cada vez mais ativo do
julgador, que, no nosso entender, se torna imperioso abordar quais as consequências
decorrentes de tais mudanças para o estudo da admissibilidade das provas ilícitas.
Não devemos olvidar que a reforma de 2013 pretende que o processo civil
português se abra à modernidade e se liberte de amarras perfeitamente desajustadas e
desfasadas, que impedem a justa composição do litígio.
Neste sentido, sendo, cada vez mais, o processo o arauto da busca da verdade
material, para se obter a justa composição do litígio, bem distante do ultrapassado processo
de partes, arbitrado por um julgador passivo, não estaremos perante o abrir de uma porta ao
metamorfismo dos ideais enraizados e formalismos inférteis que levará à admissibilidade
em juízo da prova ilícita? É uma questão da qual nos ocuparemos, detalhadamente, no
capítulo IV.
2. PROCESSO PENAL
93
ANDRADE, Costa, op. cit., pág.11.
32 | P á g i n a
de forma expressa, acerca da admissibilidade das provas ilícitas, a lei processual penal, no
seu art. 126.º n.º 1 CPP, reproduzir de forma similar a ideia estabelecida naquele preceito
constitucional ao referir que “são nulas, não podendo ser utilizadas, as provas obtidas
mediante tortura, coação ou, em geral, ofensa da integridade física ou moral das
pessoas”, clarificando o n.º 2 os termos em que aquelas provas são ofensivas da
integridade física e moral das pessoas.
Do mesmo modo, também o art. 118.º n.º 3 CPP que, de acordo com COSTA
ANDRADE, “deverá ser interpretado como expressão positivada da intencionalidade do
legislador de consagrar as proibições de prova, adscrevendo-lhe uma disciplina que
transcende o regime das nulidades processuais”, revela que as proibições de prova estão
hoje legalmente consagradas com autonomia, generalidade e consistência que permitem
perspetiva-las como uma das construções basilares da dogmática processual penal.
Questionar-se-á, tão-só, e uma vez que, ao contrário do que sucede no processo
civil, não se duvida da intenção do legislador relativamente a esta matéria, se esta
consagração da proibição de provas é absoluta ou se, em determinadas circunstâncias,
poderá admitir exceções.
33 | P á g i n a
seriam recolhidos94. Não obstante, os direitos fundamentais do indivíduo não são
considerados absolutos quando colocados em confronto com o interesse estadual de
repressão criminal, pelo que o legislador possibilitou que, em determinadas circunstâncias
e quando seja imperioso o apuramento da verdade (v.g., através de escutas telefónicas),
aqueles direitos sejam restringidos.
Relativamente à verdade procurada pelo processo penal, parece-nos, do que ficou
exposto, que a relação verdade formal vs verdade material, caraterística do antigo modelo
processual, não deverá ser utilizada nos dias de hoje, tentando, dessa forma, justificar uma
maior liberdade de admissão de provas neste ramo de direito, comparativamente ao
processo civil, por naquele ramo estarem em causa verdadeiros direitos indisponíveis dos
sujeitos. A única verdade que deverá ser procurada é a verdade real, aquela que possibilita
o alcance de uma decisão justa e conforme a realidade, independentemente de estarmos no
âmbito do processo civil ou do processo penal, não obstante tal procura não dever ser feita
mediante qualquer preço.
94
Acerca da extensão do preceito às provas ilicitamente obtidas por particulares, vide Capítulo II, ponto 3.
95
CASTRILLO, Eduardo, op. cit., pág.31.
96
Op. cit., pág. 48.
34 | P á g i n a
A procura da verdade, ultrapassadas antigas conceções que defendiam a ideia de
poderia ser feita a todo o custo e propiciavam violações contra a dignidade e os direitos
humanos, deixou de ser um valor absoluto, ou seja, nas palavras de LÓPEZ BARJA DE
QUIROGA, “hoje em dia está superada a ideia de verdade material e fala-se de obtenção
formalizada da verdade”, verdade esta que significa a recusa da verdade a qualquer preço,
com respeito pelos direitos constitucionalmente protegidos dos cidadãos97.
97
O Acórdão do Tribunal Supremo de 18 de junho de 1992, citado anteriormente, conhecido como “Caso
Naseiro”, refere-se às limitações dos direitos fundamentais ao referir que “não se pode obter a verdade real
a qualquer preço”. EDUARDO CASTRILLO, seguindo esta linha, afirma que “apenas haverá um lícito
descobrimento da verdade quando este seja compatível com a defesa do elemento nuclear dos direitos
fundamentais”, a dignidade e a intimidade da pessoa humana. No caso em apreço – continuou o T.S. –
apenas são permitidas escutas telefónicas, pelo tempo considerado indispensável, se se tratar de um delito
grave e se existir uma relação de proporcionalidade entre o direito violado e a intromissão efetuada. No
entanto, como veremos posteriormente, esta não é a posição da nossa doutrina – op. cit., pág. 35 e 36.
98
Apenas se permitindo a sua aplicação subsidiária a outros processos não sancionatórios, nos termos do art.
38.º n.º 10 da CRP, ALEXANDRE, Isabel, op. cit., pág 233.
99
Neste sentido, o Ac. do TR de Lisboa, de 28-11.2013, proc. 618/11.6TMLSB-A.L1-6, Relatora Fátima
Galante.
100
Ibidem, pág. 234.
35 | P á g i n a
I. ALEXANDRE, o art. 34.º n.º 4 CRP, ao referir que “é proibida a ingerência das
autoridades públicas (…) salvos os casos previstos na lei em matéria de processo
criminal”, pretende, tão-só, “reafirmar a inviolabilidade daqueles direitos por parte de
autoridades públicas e autorizar (às entidades públicas e não aos particulares) aquela
ingerência apenas ao nível do processo penal”101, afigurando-se de rejeitar o entendimento
segundo o qual apenas os comportamentos ilícitos das autoridades públicas estariam
abrangidas pelo disposto na Constituição.
Não devemos olvidar o facto de o art. 32.º n.º 8 CRP estar inserido no capítulo
dedicado aos direitos, liberdades e garantias que, de acordo com o art. 18.º n.º 1 CRP,
vincula entidades públicas e privadas. Além disso, de acordo com COSTA ANDRADE102,
o próprio elemento sistemático do art. 126.º CPP facilita a aplicação da proibição de prova
aos particulares, uma vez que tal preceito encontra-se no livro Da prova, que articula
normas também destinadas aos particulares. O autor acrescenta ainda um argumento
racional teleológico ao referir que “mal se compreenderia que, por um lado, o legislador
português precludisse sem mais a valoração dos meios de prova obtidos por particulares
através de atentado ao direito à palavra ou à imagem (art. 167.º CPP); e, por outro lado e
ao mesmo tempo, admitisse as provas logradas por particulares à custa de atentados tão
intoleráveis a eminentes bens jurídicos pessoais como os previstos no art. 126.º CPP”.103
GOMES CANOTILHO – VITAL MOREIRA 104consideram que os arts. 32.º n.º 8 e
34.º n.º 4 CRP visam limitar os interesses do processo criminal pela dignidade humana e
pelos princípios fundamentais do Estado de Direito, o que demonstra a estreita ligação
entre aqueles preceitos e estes direitos e, de acordo com o art. 9.º n.º 3 do CC, o intérprete
deverá presumir que o legislador soube exprimir o seu pensamento em termos adequados,
pelo que, cremos, o facto de apenas haver referência às autoridades públicas é fruto da
intenção daquele, que se justifica essencialmente por razões históricas ligadas à prática de
abusos por estas entidades.105
101
Ibidem, pág. 236.
102
Op. cit., pág. 197.
103
Ibidem, pág. 198.
104
CANOTILHO, G., MOREIRA, V., Constituição da República Portuguesa Anotada, 1.º Vol., 2.º ed.
Revista e ampliada, Coimbra Editora, Coimbra, 1984, pág. 218.
105
No mesmo sentido, ISABEL ALEXANDRE, considera que “tal restrição só teria fundamento num
sistema em que não se concebesse a possibilidade de ofensa, pelos particulares, dos direitos
constitucionalmente consagrados (como o norte-americano) ou em que partisse do princípio de que essa
ofensa seria forçosamente menos grave pelo facto de provir dos particulares”, op. cit. pág. 239.
36 | P á g i n a
A finalidade do processo penal, enquanto salvaguarda da ordem social e proteção
de bens jurídicos comunitários106, obriga a que o art. 32.º n.º 8 CRP deva ser interpretado
em conformidade, proporcionando a máxima eficácia dos direitos fundamentais e, ainda
que o direito à prova dos particulares seja, por si só, um direito fundamental, consagrado
no art. 20.º CRP, não se estará a criar, aprioristicamente, uma hierarquia entre direitos
constitucionalmente protegidos – direito à prova e outros direitos – pelo facto de, numa
última análise, se ter presente um importante fator de relativização107 que leva a
“danosidade social mediatizada pela valoração (sem consentimento) do meio de prova a
uma balança de ponderação de interesses que tem no outro prato o interesse da repressão
penal”.108109
Cumpre agora analisar a questão relativa à possibilidade de as disposições
constitucionais poderem ser aplicadas, de forma analógica, ao processo civil. I.
ALEXANDRE recorre ao argumento a contrario, referindo que só se poderia considerar
que a Constituição apenas diz respeito ao processo penal se fosse possível demonstrar o
caráter excecional do art. 32.º n.º 8 CRP.
Ora, no nosso entender, há uma consagração, apesar de implícita, da
excecionalidade formal do preceito e, ainda que a consideração das provas como nulas,
quando obtidas mediante violação de determinados direitos fundamentais, pareça não
contrariar nenhum princípio geral de direito, julgamos que, não raras vezes, os princípios
decorrentes do direito à prova poderão ser limitados de forma irreversível, retirando a
única possibilidade de defesa do sujeito.
Do exposto, cremos que haverá uma clara diferenciação de regimes, o mesmo será
dizer que enquanto no processo penal estamos perante a proteção de valores comunitários e
a salvaguarda da ordem social que, pela sua natureza, carecem de uma maior proteção ao
nível de possíveis abusos, no processo civil visa-se a proteção de direitos privados e, de
acordo com o princípio do dispositivo, são as próprias partes que, efetivamente, produzirão
a prova em posição de igualdade.
106
Tendo o legislador plena consciência de que o Estado, com vista a assegurar a imagem de superioridade
que lhe permite salvaguardar a ordem social, poderá ser levado, ainda que inconscientemente, a usar a força
de que dispõe para cometer abusos de poder, impôs limites à atuação das entidades públicas mas, pelo facto
de estarem em causa direitos de ordem pública, que colocam em causa a segurança jurídica da comunidade, a
ofensa das normas constitucionais, por parte dos particulares, não será menos grave e estes deverão, de igual
modo, estar abrangidos por tais disposições.
107
Para um maior desenvolvimento do tema, vide Capítulo IV, ponto 1.3.
108
ANDRADE, Costa, op. cit., pág. 157.
109
No mesmo sentido da solução da ponderação de interesses, ANDRADE, J. C. Vieira de, Os Direitos
Fundamentais na Constituição Portuguesa de 1976, 2.º ed., Coimbra, Almedina, 2002, pág. 277 e ss.
37 | P á g i n a
No mesmo sentido, o Ac. do TR de Lisboa, de 03-06-2004110, estabelece que “No
processo civil a regra continua a ser a afirmação do princípio dispositivo, pelo que (…)
uma proteção sem limites de certos direitos fundamentais (…) seria vista como uma
desproteção dos meios de prova mais valiosos a favor dos mais falíveis.
Por isso, mesmo quando estão em causa certos direitos fundamentais, não pode pretender-
se uma transposição automática do disposto no art. 32º da Constituição, respeitante às
garantias do processo criminal, para o processo civil”.
O facto de o processo penal ser considerado o “lugar privilegiado” para a prática
de abusos não poderá ser razão justificativa para a particular atenção dispensada pela
Constituição a certas provas ilícitas neste ramo pois, para SALAZAR CASANOVA 111, o
legislador teve diversas oportunidades para se manifestar e sanar um provável
“esquecimento” mas ficou inerte, o que o leva a crer que terá sido um ato intencional
daquele criar uma norma apenas referente ao processo criminal.
Ainda que o art. 10.º n.º 2 do CC refira que “no caso omisso procedem as razões
justificativas da regulamentação do caso previsto na lei”, deverá ser criado um regime
para o processo civil, capaz de responder a todas as suas especificidades, ao invés de se
aplicarem normas desajustadas da realidade e dos objetivos que se pretendem prosseguir
no seu âmbito, bastante distintos dos do processo penal. É inequívoco que a ausência de
preceitos relativos à proibição de ingresso de provas ilícitas no processo no âmbito deste
ramo de direito, não pode servir de fundamento para a admissibilidade de todo e qualquer
meio de prova, pelo contrário, deverá subsistir o conceito de ilicitude.
110
Proc. 1107/2004-6, Relatora Fátima Galante, disponível em www.dgsi.pt.
111
CASANOVA, J. F. Salazar, Provas Ilícitas em Processo Civil, Sobre a Admissibilidade e Valoração de
Meios de Prova Obtidos pelos Particulares, Revista Direito e Justiça, Vol. XVIII, Tomo I, 2004, pág. 116 e
120.
38 | P á g i n a
CAPÍTULO III
TESES DE ADMISSIBILIDADE
1. DIREITO COMPARADO
Como referimos supra, a inexistência de interesse pela questão das provas ilícitas
por parte da doutrina portuguesa, compeliu-nos, não raras vezes, a recorrer ao direito
comparado e às obras existentes em ordenamentos jurídicos que não o nosso, para
fundamentar determinadas perspetivas e conclusões.
Assim, fará todo o sentido fazer uma breve análise das posições doutrinárias que se
afiguram de maior relevância, para que possamos enquadrar a nossa posição de uma forma
mais clara e objetiva.
Em alguns países da Common Law, como a Inglaterra e o Canadá, prevalece a regra
da admissibilidade das provas ilícitas, mas apenas no âmbito do processo penal112, dado
que é considerado que o critério de validade da prova é a sua relevância,
independentemente da ilicitude da conduta através da qual foi, eventualmente, obtida.
Prevalece, assim, a busca da verdade como fim primário do processo, não obstante o ilícito
ser punido nos termos e segundo o tipo de responsabilidade em causa, como veremos mais
detalhadamente no 2.2.1. do presente Capítulo.113
Situação diversa é a que sucede nos Estados Unidos, razão pela qual
CAPPELLETTI refere que “os americanos afirmam-se de há muito dispostos a pagar um
preço elevado no altar dos valores consagrados pela sua Constituição”114. O mesmo será
dizer que, afastando o princípio tradicional da Common Law, que estabelece a
admissibilidade das provas ilícitas no processo penal, o ordenamento norte-americano
considera que os atos ilícitos cometidos pelos poderes estaduais no processo criminal são
inadmissíveis, sempre que haja violação dos direitos fundamentais. No entanto, quando
sejam os particulares a levar tais elementos probatórios para o processo, consideram que
112
Referindo J.J.ABRANTES que a regra em processo civil parece ser também a da
admissibilidade. Op. cit., pág. 20.
113
MONTON REDONDO, apud ABRANTES, J.J., ibidem., pág. 18.
114
Apud ABRANTES, J.J., ibidem, pág. 21.
39 | P á g i n a
tais atos apenas podem violar a lei civil ou penal e nunca preceitos constitucionais,115 pelo
que, sendo quase sempre as partes envolvidas em litígio que apresentam as provas,
podemos concluir que no processo civil a regra será a da admissibilidade.
Por fim, alguns sistemas admitem a prova ilícita mas em certas condições, uma vez
que privilegiam a concreta avaliação dos interesses em jogo, ou seja, em determinadas
circunstâncias, “o valor social que o acusado pôs em causa é tão importante e a situação
tão urgente que até mesmo ilegalidades cometidas deliberadamente devem ser toleradas;
igualmente, pode haver casos em que não seria razoável anular a prova só por causa de
alguma pequena invasão não intencional aos direitos do acusado”116.
O mesmo entendimento é seguido na Alemanha, ainda que com diferentes
contornos uma vez que, neste ordenamento, os tribunais têm defendido a inadmissibilidade
dos meios probatórios cuja obtenção tenha implicado a violação de direitos individuais
constitucionais, quer tenham sido obtidos por particulares, quer por autoridades públicas.
Configura-se, assim, um confronto entre a busca da verdade e a proteção dos direitos
individuais, ou seja, ainda que o juiz deva, em princípio, servir-se de todos os meios de
prova importantes para formar a sua convicção, de acordo com o princípio da aquisição
processual, tal fim não deverá ser atingido a qualquer preço, devendo aquele salvaguardar
os interesses das partes, decidindo pela inadmissibilidade das provas ilícitas sempre que se
afigurar necessário. No entanto, admite-se o ingresso de tais provas em juízo em casos
excecionais, se se mostrar serem a única via possível e razoável para proteger outros
direitos ou valores.
No mesmo sentido segue o direito espanhol e o direito brasileiro. Naquele primeiro,
a Constituição estabelece no seu artigo 11.º n.º 1 LOPJ o sistema da inadmissibilidade da
prova ilícita, ao impor o respeito pelas regras da boa-fé em qualquer procedimento e
considera que as provas obtidas direta ou indiretamente mediante violação de direitos ou
liberdades fundamentais são ineficazes, excetuando assim os casos em que os elementos
probatórios trazidos a juízo tenham implicado a violação de direitos infraconstitucionais;
no segundo, o artigo 5.º LVI consagra que “são inadmissíveis no processo as provas
obtidas por meios ilícitos”. Apesar do exposto, com a adoção de um sistema baseado no
princípio da proporcionalidade, as jurisprudências espanhola e brasileira têm considerado
existirem duas exceções: o princípio da boa-fé e a admissibilidade da prova pro reo,
115
De acordo com este entendimento, a prova obtida mediante investigação de um detetive
privado, mesmo que ilícita, é considerada admissível, tal como demonstra a decisão do Supremo Tribunal,
em 1964, no caso Sackler v. Sackler.
116
ABRANTES, J.J., ibidem, pág. 26.
40 | P á g i n a
confirmando que apesar de uma regra geral de exclusão, presente na maioria dos
ordenamentos jurídicos, pode ser conferida uma maior discricionariedade ao juiz na
aplicação daquela, segundo as peculiaridades do caso concreto, através da ponderação dos
interesses envolvidos.
Em Itália, a jurisprudência também faz alusão aos preceitos constitucionais para
colocar em causa a admissibilidade de determinados meios de prova, determinando a
própria constituição no seu artigo 13.º n.º 3 que aquelas não têm “qualquer efeito”. Mas
este entendimento apenas se considera correto quanto às autoridades públicas, uma vez que
a utilização da prova ilicitamente obtida por particulares não é proibida (nestes casos, o
117
ilícito apenas seria reprimido pela obtenção de uma indemnização pelo lesado). Neste
sentido, G. F. RICCI e CORDERO
Para alguns autores, a prova ilícita é passível de ser sempre admitida em juízo,
sem quaisquer limites, como qualquer outro meio de prova; para outros, no extremo
oposto, aquela é absolutamente inadmissível; uma terceira posição, aponta para a
possibilidade de, em casos excecionais e com determinados limites, a prova ilícita poder
ser admitida.
117
Neste sentido, G. F. RICCI e F. CORDERO, vide ponto 2.2.2., do presente Capítulo.
118
ABRANTES, J. J., op. cit., pág. 14.
41 | P á g i n a
admitir provas ilícitas pois, se estas são relevantes119, abdicar das mesmas seria estar a
desprezar elementos essenciais para a convicção do juiz, o que impossibilitaria a obtenção
de uma solução justa.120
MUÑOZ SABATÉ121, mostrando que o fim primário do processo é a busca da
verdade, refere que “a justiça deve velar pela honestidade dos meios, mas isso não
significa que não possa aproveitar-se do resultado produzido por certos meios ilícitos”.
Um dos autores mais importantes na defesa desta tese é SCHÖNKE122, ao
sustentar que a resposta à questão da admissibilidade das provas ilícitas, em processo civil,
deve ser encontrada em determinados princípios fundamentais, entre eles o princípio da
investigação da verdade, dado que, perante um conflito entre o interesse na apresentação
de uma prova ilícita e o interesse na proteção contra a obtenção ilegal de provas, ambos
interesses públicos, deverá ser dada prevalência à investigação da verdade pois, para o
autor, o segundo interesse poderá ser satisfeito mediante sanções civis e criminais a aplicar
ao autor da lesão.
No mesmo sentido STALEV123 ao referir que “o valor violado (…) deve ser
defendido, não através de um julgamento falso, mas através de sanções previstas na lei
para essa ilicitude.”
No entanto, estes argumentos não deverão prosseguir, desde logo pela existência
de determinados preceitos no CPC, v.g. arts. 417.º n.º 3 e 453.º, que estabelecem limites à
atividade probatória quando haja, por exemplo, ofensa a direitos de personalidade,
radicando, neste ponto, a vulnerabilidade da tese: por mais relevante que se mostre
determinada prova para atingir a verdade e uma solução justa no processo, tal não pode ser
feito mediante qualquer preço. Seguindo a tese de JOSÉ JOÃO ABRANTES124, julgamos
que o mero interesse processual de procura da verdade não constituirá razão suficiente para
que se aceite a violação de direitos individuais, sem que haja ponderação dos mesmos no
caso concreto pois, no fundo, “o processo não pode ser visto como um campo de batalha
em que os fins justificam os meios”125
119
Também na conceção tradicional da Common Law, a prova, se relevante, será válida independentemente
da sua origem e do seu modo de obtenção.
120
BARBOSA, José Carlos, A Constituição e as Provas Obtidas Ilicitamente, 2011, pág. 939.
121
Apud, ABRANTES, J. J., op. cit., pág. 14.
122
Op. cit., pág. 374.
123
Apud, ABRANTES, J.J., op. cit., pág. 19.
124
Op. cit.,pág. 36.
125
DEVIS ECHANDIA, apud ABRANTES, J.J., op. cit.,pág. 16.
42 | P á g i n a
2.2.2. IRRELEVÂNCIA PROCESSUAL DA ILICITUDE MATERIAL
126
Op. cit., págs. 70 a 74.
127
Apud ALEXANDRE, Isabel, pág. 173.
128
Ibidem, pág. 175.
129
Apud, ALEXANDRE, Isabel, op. cit., pág. 177.
43 | P á g i n a
inadmissível, tendo em conta o artigo 517.º CPC que estabelece, como regra geral, a
proibição de admissão ou produção de quaisquer provas sem audiência contraditória da
parte a quem sejam opostas.
130
A razão da proibição destes meios de prova reside na “violação de certos direitos inalienáveis da pessoa
humana, como a integridade psíquica” e não na sua falta de credibilidade. Ibidem, pág. 188.
131
Ibidem, págs. 187 e 188.
44 | P á g i n a
2.3.2. UNIDADE DO SISTEMA JURÍDICO
132
COSTA, Susana H., Os Poderes do Juiz na Admissibilidade das Provas Ilícitas, 2006, pág. 87.
133
MELERO, Silva, La Prueba Procesal, Tomo I, Editorial Rev. de Derecho Privado, Madrid, 1963, pág. 69.
134
BASTOS, Celso, As Provas obtidas por meios ilícitos e a Constituição Federal, 1994, pág. 45.
135
Op. cit., pág. 190.
136
De acordo com esta tese, se determinada prova é obtida mediante violação de um preceito constitucional,
é o suficiente para considera-la inadmissível no processo, mesmo que o diploma processual seja omisso. No
entanto, esta tese não prospera pelo facto de, por vezes, a própria vedação da prova ilícita ser uma ofensa
constitucional maior do que aquela que ocorreria se fosse a prova fosse admitida, razão pela qual a melhor
solução passará pela análise das circunstâncias e dos direitos envolvidos no caso concreto.
45 | P á g i n a
2.3.3. O DOLO NÃO DEVE APROVEITAR O SEU AUTOR
137
Razão pela qual a posição de CARNELUTTI é criticada por TROCKER, CAPPELLETTI E VIGORITI,
como refere ALEXANDRE, Isabel, op. cit., págs. 199 e 200.
138
Apud, ABRANTES, J.J., op. cit., pág, 15.
139
Op. cit., pág. 67.
140
ALEXANDRE, Isabel, op. cit., pág. 202.
46 | P á g i n a
2.3.4. DISSUASÃO DE COMPORTAMENTOS ILÍCITOS
Com base na experiência da vida, que nos leva a crer que as pessoas só fazem
aquilo que lhes traz alguma vantagem, após ponderarem os prós e os contras da sua
atuação, alguns autores defendem que apenas a inadmissibilidade da prova ilícita em juízo
terá um efeito dissuasor pois, o contrário, equivaleria a estimular a prática de condutas
ilícitas. No entanto, esta ideia de dissuasão, acolhida nos Estados Unidos relativamente ao
processo penal, se por um lado é usada como fundamento de inadmissibilidade, por outro
conduziu ao reconhecimento de exceções daquela, como sucede com os casos de boa-fé141.
Esta tese norte-americana não poderá ser transposta para o nosso direito
processual, em virtude da inexistência de dados que comprovem uma possível
correspondência entre a vedação das provas ilícitas e a quantidade de atos contrários à lei
tendentes a obter aquelas. Acresce o facto de, como refere I. ALEXANDRE142, ser ao
direito material (civil ou penal) que compete desincentivar as condutas ilícitas,
sancionando-as, e não ao direito processual através de proibições de prova que, ao
contrário daquelas sanções, não podem ser “agravadas” ou “atenuadas” em função do caso
concreto, razões pelas quais julgamos improcedente a ideia de dissuasão para fundamentar
a inadmissibilidade processual da prova ilícita.
141
Significa que a “prova ilícita não será excluída quando tenha sido obtida pelos agentes de polícia no
decurso de operações realizadas de boa fé, e com base numa convicção razoável, embora errónea, de que
dispunham de autorização judicial para as mesmas”. Ibidem, pág. 168.
142
Ibidem, págs. 207 e 208.
47 | P á g i n a
infraconstitucional, só existindo neste segundo caso necessidade de recorrer à boa-fé, uma
vez que naquele primeiro tais provas são rejeitadas pela simples interpretação da
Constituição.143
Assim, se a obtenção ilícita da prova contrariar o direito material, atendendo ao
âmbito de proteção da norma violada, deverá proceder-se a uma ponderação dos interesses
das partes, orientada pelo princípio da proporcionalidade, para se indagar da admissão e
valoração do elemento probatório: caso a resposta seja negativa, a prova será proibida por
considerar-se que contraria o princípio da boa-fé144.
Como verificámos no ponto anterior, se, por um lado, o princípio da boa-fé é
invocado para rejeitar a admissão processual de certos meios de prova145, por outro lado,
poderá conduzir ao ingresso dos mesmos em juízo, o que demonstra, a nosso ver, que não
constitui argumento suficiente para justificar a admissibilidade de provas ilícitas.
DE OUTROS DIREITOS
143
Apud, ALEXANDRE, Isabel, op. cit., pág. 218.
144
BAUMGÄRTEL clarifica o seu raciocínio com alguns exemplos, dos quais destacamos dois: i) num caso
de furto de fotografias, os preceitos §823 e §858 do BGB determinam a impossibilidade de serem valoradas
pelo tribunal, no entanto, o autor considera que as considerações de prevenção geral não são suficientes para
solucionar a questão em apreço e, portanto, deverá ser realizada uma ponderação de interesses que,
eventualmente, pode apontar no sentido da admissão de tais provas; ii) quando esteja em causa a violação do
segredo de correspondência, haverá que distinguir quando o conteúdo da carta/documento é neutro ou
quando é confidencial: para o autor, apenas na primeira hipótese poderá prevalecer o interesse que se adeque
à verdadeira situação jurídica pois no segundo caso uma possível admissão da prova atentará contra o
princípio da boa fé. Apud, ibidem, págs.221 e 222.
145
É o caso da Cour de Cassation, em França, que, a propósito do caso Mme. Neocel c/ Spaeter, invocou este
princípio na execução dos contratos, para fundamentar a inadmissibilidade processual de uma gravação de
vídeo efetuada pelo dono de um estabelecimento que suspeitava de uma das suas empregadas por furto, o que
se veio a comprovar com aquela prova. No entanto, o tribunal rejeitou a possibilidade de admissão da mesma,
invocando a violação do dever de lealdade, inerente ao contrato de trabalho. Apud, op. cit., pág. 224.
48 | P á g i n a
da mera concretização de preceitos constitucionais pela lei processual não decorrem,
automaticamente, proibições de prova da Constituição, tal só sucede quando a lei ordinária
não faz qualquer referência à admissibilidade de provas ilícitas ou quando há uma
regulação incompleta da matéria. Acresce o facto de a existência de preceitos normativos,
como o art. 32.º n.º 8 CRP ou o art. 126.º CPP, demonstrar que a admissibilidade
processual dos elementos probatórios obtidos de forma ilícita não está condicionada por
direitos fundamentais, caso contrário tais normas seriam desnecessárias.
Além do exposto, e como verificamos anteriormente, mesmo os direitos
fundamentais não poderão ser considerados absolutos, podendo ser sacrificados em prol da
verdade, sobretudo quando todos os direitos em conflito são fundamentais (v.g. quando o
direito à prova se encontra em conflito com o direito à reserva da vida privada, após ser
realizada a devida ponderação de interesses, um deles irá, à partida, prevalecer perante o
outro), razão pela qual esta tese não deverá proceder.
49 | P á g i n a
CAPÍTULO IV
POSIÇÃO ADOTADA
1. CONSIDERAÇÕES FINAIS
146
BARBOSA, J. C., op. cit., pág. 943.
147
COWEN-CARTER, apud ABRANTES, J.J., op. cit., pág. 25.
50 | P á g i n a
envolvidos prevalecerá, por se considerar ser de maior relevância, sem descurar o facto de
que, nas palavras de STERN, citado por ANTÓNIO STEINMETZ, “os bens jurídicos
constitucionalmente protegidos devem ser coordenados de tal modo que na solução do
problema, todos eles conservem a sua identidade (…) a fixação de limites deve responder
em cada caso concreto ao princípio da proporcionalidade”.148
De acordo com esta tese, a prova ilícita será sempre admitida em juízo quando
configure a única forma possível de demonstrar determinado facto.
REMÉDIO MARQUES149 perfilha tal ideia, dando como exemplo as ações de
divórcio litigioso, fundadas na violação de deveres conjugais, admitindo que será legítimo
o cônjuge autor proceder, por exemplo, à captação audiovisual sem consentimento do outro
cônjuge, de modo a provar que este violou o dever conjugal de respeito e/ou de
fidelidade150.
JOSÉ JOÃO ABRANTES, por sua vez, refere que a prova ilícita será admitida no
processo civil sempre que represente a “única via possível e razoável de proteger outros
valores que, no caso concreto, devam ser tidos por prioritários”. Admitindo que os
direitos fundamentais poderão ser, em determinados casos, restringidos para salvaguarda
de outros direitos constitucionalmente protegidos, conclui, que “a admissibilidade de
provas obtidas através de atos violadores de preceitos constitucionais apenas poderá ter
por base serem o único e proporcionado (em relação à importância do fim que se pretende
obter) meio de o seu utilizador se proteger contra a violação de outros direitos de valor
constitucional”.
Para o autor, o problema radica num conflito de interesses, direitos ou valores que
deverão ser analisados de acordo com as circunstâncias em que se inserem, remetendo-nos,
assim, para aquele que é considerado, a nosso ver, o grande fundamento de admissibilidade
da prova ilícita em casos excecionais: o princípio da proporcionalidade.
148
STEINMETZ, W. A., Colisão de direitos fundamentais e princípio da proporcionalidade, Porto Alegre,
Livraria do Advogado, 2001, pág. 95.
149
Op. cit., pág. 371.
150
No entanto, este argumento não constitui razão suficiente para admissão de provas ilícitas, ainda que parta
de uma premissa correta: o direito à prova não terá de ser sempre sacrificado em prol da proteção de outros
direitos fundamentais.
51 | P á g i n a
1.1.2. PRINCÍPIO DA PROPORCIONALIDADE
151
Em 2002, uma cantora mexicana engravidou na prisão, enquanto estava sob custódia da polícia, tendo
acusado os guardas prisionais de violação. Estes, quando a criança nasceu, solicitaram que fosse realizado um
exame de ADN, de modo a demonstrarem que nenhum deles era o pai e que as acusações de que eram alvo
eram falsas. O STF deferiu o pedido, entendendo que perante um conflito entre o direito à honra dos guardas
prisionais e os direitos à intimidade e à integridade física da criança, no caso concreto e com base no
princípio da proporcionalidade, aquele deveria prevalecer perante estes. Caso relatado em BARROSO, Luís
Roberto, A nova interpretação constitucional: ponderação, direitos fundamentais e relações privadas. Rio de
Janeiro, Renovar, 2003, p. 54.
152
Apud, POLITANO, Ricardo, Provas ilícitas, Jus Navigandi, Teresina, Ano 19, n.º 4113, 5 Out. 2014,
Disponível em: http://jus.com.br/artigos/29726
52 | P á g i n a
relevantes valores e interesses transprocessual-penais…como sucederá…quando a escuta
telefónica, a coação, mesmo a tortura153154, configure o único meio de localizar o engenho
explosivo com que um perigoso agrupamento terrorista155 ameaça consumar um massacre
156157
de inocentes” ou, por outro lado, quando o acusado utiliza aquela prova obtida de
forma ilícita para provar a sua inocência158.
Os defensores da inadmissibilidade das provas ilícitas referem que a proibição
constitucional relativa às provas ilícitas não poderá admitir flexibilização, no entanto,
julgamos, sem embargo de entendimentos contrários, que tal crítica não poderá proceder,
na medida em que existem na Constituição princípios, como sucede com o princípio da
proporcionalidade que, a nosso ver, além de expressamente consagrado no art. 19.º n.º 4
CRP, ao referir que “(…) devem respeitar o princípio da proporcionalidade”, e no art.
266.º n.º 2 CRP, ao determinar que “os órgãos e agentes administrativos estão
153
A nosso ver, a admissibilidade da tortura extrapolaria o campo do razoável, ainda que em casos
excecionais. Tomando por base o recente massacre em França, ao jornal Charlie Hebdo, levado a cabo por
um grupo terrorista, se, eventualmente, houvesse a possibilidade de um dos envolvidos dar informações
relevantes acerca do que iria acontecer, evitando assim todas aquelas mortes, poderíamos considerar a tortura
um meio idóneo para obrigar o sujeito a falar? Seria correto optar pelo direito à vida dos reféns, em
detrimento do direito à integridade física do terrorista? À partida, a resposta seria afirmativa. No entanto,
cremos que mais do que o direito à integridade física, estava em causa o direito à dignidade humana que, por
mais grave que seja o crime cometido, é comum a todos os seres humanos. A partir do momento em que
deixássemos que a dignidade humana seja relativizada, sobretudo mediante tortura que, por si só, é
considerada uma expressão da dignidade do Estado, estaríamos a abrir portas que dificilmente
conseguiríamos fechar e, a partir de então, tudo seria permitido. Se desejamos que se mantenha o caráter de
Estado de Direito por que tanto lutámos, o Estado não se pode servir dos mesmos métodos do criminoso, não
podemos submeter o respeito da dignidade humana a uma reserva de cálculos de vantagens e desvantagens
pois, aquela, não é um bem passível de ser maximizado ou otimizado, mas antes uma limitação deontológica
à maximização ou otimização de qualquer bem (Neste sentido, ROXIN, Claus, Strafecht: Allgemeiner Teil,
Vol. I, 4.º ed., München, 2006, pág. 771, refere que “a violação contra a dignidade humana coloca um limite
a toda e qualquer ponderação”).
154
No Ac. do TR de Lisboa, de 26-09-2013, proc. 1130/10.6YXLSB.L1-2, Relatora Teresa Albuquerque, foi
estabelecida a existência de dois segmentos extraídos das provas ilícitas: o primeiro inclui as provas obtidas
mediante tortura, coação, ofensa à integridade física ou moral das pessoas, que, pela gravidade das mesmas,
devem ser consideradas absolutamente inadmissíveis; o segundo refere-se às provas obtidas mediante
intromissão da vida privada ou familiar, no domicílio, na correspondência e nas telecomunicações que
deverão ser relativamente inadmissíveis, devendo ser avaliadas de acordo com o caso concreto. Apesar deste
entendimento, julgamos que, daquele primeiro segmento, apenas as provas obtidas mediante tortura e coação
serão absolutamente inadmissíveis, podendo as restantes, de acordo com o princípio da proporcionalidade,
ser admitidas em juízo (v.g. o caso citado na nota de rodapé 113).
155
Para um maior desenvolvimento acerca dos casos denominados “bomba-relógio”, relativos ao terrorismo,
vide MOURA, Bruno, A propósito da chamada “tortura salvadora”: outras “quebra de tabu”, agora
relativamente à proibição de valoração da prova?”, Revista Brasileira de Ciências Criminais, Ano 21, Vol.
101, São Paulo, 2013, págs. 229 a 282.
156
Segundo BRUGGER, ao contrário do que sucede com a vítima, o torturado está em condições de evitar a
intervenção na sua própria esfera jurídica, pois somente a ele cabe tomar a decisão de regressar ao terreno da
conduta conforme o direito, razão pela qual crê que o autor da tortura não será obrigado a satisfazer eventuais
exigências do torturado (v.g., a garantia de meios de fuga ou a entrega de outros reféns) e poderão ser usados
métodos ilícitos para conseguir provas essenciais. Assim, BRUGGER, Winfried, Vom unbedingten Verbot
der Folter zum bedingten Recht auf Folter, pág. 172, citado por MOURA, Bruno, op. cit., pág. 243.
157
ANDRADE, Costa, op. cit., págs. 81 e 82.
158
Ibidem, pág. 45.
53 | P á g i n a
subordinados à Constituição (…) com respeito pelos princípios da igualdade, da
proporcionalidade, da justiça, da imparcialidade e da boa fé”, deverá ser inferido a partir
do Estado de Direito Democrático, consagrado no art. 2.º CRP.
Duas outras objeções feitas ao princípio da proporcionalidade prendem-se com uma
hipotética violação dos princípios da igualdade e da segurança jurídica, uma vez que, por
um lado, perante a análise que deverá ser feita ao caso concreto, poderão surgir situações
semelhantes com tratamentos distintos e, por outro lado, a ponderação de interesses induz
as ideias de subjetivismo e irracionalidade. No que diz respeito àquela primeira e de acordo
com GONZALEZ-CUELLAR SERRANO, “en cualquier caso, aceptando que en algunas
circunstancias la aplicación poco meditada del princípio de proporcionalidad pudiera
provocar injustícias, más injusta es la aplicación automática e indiscriminada de la ley, si
se prescinde de los necesarios critérios orientadores de la discrecionalidad judicial y los
médios para controlarla”159, ou seja, ainda que possam surgir diferentes decisões face a
casos semelhantes, tal não terá de significar uma violação daqueles princípios: a
ponderação de interesses deverá ser realizada atendendo às peculiaridades e às
circunstâncias do caso concreto e, assim sendo, será natural que a decisão que se julga ser a
mais justa numa situação, poderá já não o ser numa outra160. Quanto à segunda objeção, se
negassemos a racionalidade à ponderação de interesses por esta radicar em valoração,
implicaria, necessariamente, que a negássemos à tarefa da atividade jurídica, uma vez que
a própria fundamentação do juiz terá de envolver valorações.
Por fim, uma outra crítica que, não raras vezes, é apontada à aplicação deste
princípio radica no facto de que aquela poderia originar abusos e traria um “risco de
esvaziamento dos direitos fundamentais”161 ao criar a possibilidade de o juiz recorrer a
ponderações, de ordem puramente lógica e, desta forma, poder contornar as garantias
instituídas pelas normas constitucionais. No entanto, cremos que tais normas constituem
verdadeiros princípios e não regras, não comportando uma operação de subsunção direta
aos factos concretos sendo, portanto, a mediação concretizadora do intérprete que atribuirá
159
Autor citado por STEINMETZ, ibidem, pág. 198.
160
A título de ilustração, citamos os Ac. do TR de Guimarães, de 16-02-2012, proc. 435234/09.8YIPRT-
A.G1, Relator José Raínho, que decidiu pela inadmissibilidade de uma gravação telefónica por não
considerar tratar-se de uma prova insubstituível e imperiosa, além de o caso não apresentar razões que
justificassem a admissão da mesma, após realizar a ponderação entre os direitos envolvidos; e em sentido
contrário, o Ac. do TR de Lisboa, de 03-06-2004, citado anteriormente, afirmou que “(…)a orientação que
admite a prova com algumas restrições, consoante o caso concreto e os interesses em conflito (…) é a mais
razoável e a que melhor se justa aos princípios e normas em vigor” e “Conclui-se desta forma (…) à luz da
valoração da prova em causa e da ponderação de interesses justifica-se a divulgação em tribunal dos relatos
feitos (…) e que constam da gravação.
161
BARBOSA, José Carlos, REDP, Vol. VI, Rio de Janeiro, 2010, pág. 19.
54 | P á g i n a
eficácia ao conteúdo vinculado naquelas e, partindo da ideia de que não existe qualquer
hierarquização162 entre duas normas constitucionais, pelo menos em termos puramente
normativos, não seria correto colocar limites desmedidos a outros direitos, também eles
protegidos constitucionalmente, como sucede com o direito à prova previsto no art. 20.º
CRP.
Nestes casos excecionais, ainda que paradoxalmente, será a própria ponderação de
interesses163 que poderá garantir a proteção dos direitos fundamentais previstos na
Constituição desde que, naturalmente, aquela seja realizada de acordo com critérios
racionais, isto é, tendo em conta os designados subprincípios da proporcionalidade:
adequação (a decisão normativa deverá ser apta e idónea para a realização do interesse
público e deve ser apropriada à prossecução do fim a ela subjacentes 164), necessidade (seja
o menos gravosa possível para atingir a sua finalidade165) e proporcionalidade em sentido
estrito (traga maiores benefícios do que desvantagens).166
Apesar dos conceitos e ideais enraizados no nosso ordenamento jurídico, relativos
à inadmissibilidade da prova ilícita, alguma jurisprudência, sobretudo nos últimos anos,
tem demonstrado abertura para a aplicação do princípio da proporcionalidade como
solução para dirimir possíveis conflitos entre direitos constitucionalmente protegidos.
Neste sentido, o Ac. TR de Lisboa167, de 25-11-2014 refere que
55 | P á g i n a
conflituante entre estes dois direitos
constitucionalmente garantidos (isto é, o direito de
liberdade de informação e o direito à honra e ao bom
nome) leva à necessidade de dirimir o conflito de
direitos daí decorrente através (…) do “princípio da
concordância prática” ou a “ideia do melhor
equilíbrio possível entre os direitos colidentes”, por
forma a atribuir a cada um desses direitos a máxima
eficácia possível”
168
Proc. 187/10.4ZRLSB.E1, Relator Gilberto Cunha. Resumidamente, a arguida contactou telefonicamente
a autora, Inspetora-Adjunta dos SEF, enquanto esta estava no exercício das suas funções, ofendendo a sua
honra e dignidade mediante uma troca acesa de palavras. Esta, colocou a chamada em “alta-voz” para que os
seus colegas de trabalho escutassem a conversa e pudessem prestar prova testemunhal em julgamento.
56 | P á g i n a
Também o Ac. do TR do Porto, de 25-05-2009169, opta pela interpretação relativa
das normas fundamentais e, implicitamente, por uma posição intermédia acerca da
admissibilidade das provas ilícitas ao concluir que:
169
Proc. 159/07.6TVPRT-D.P1, Relatora Maria José Morgado. No mesmo sentido, ver Ac. do TR de Lisboa,
de 09-06-2009, proc. 321/05.6TMFUN-C.L1-7, Relatora Maria do Rosário Morgado.
170
Op. cit., pág. 45.
171
GRINOVER, Ada Pellegrini, Teoria Geral do Processo, 23º ed., Malheiros Editores, São Paulo, 2007,
pág. 383.
57 | P á g i n a
destinando-se a absolver o acusado, é de ser admitida, tendo em vista que o erro
judiciário precisa ser a todo custo, evitado.” 172
JOSÉ BARBOSA173, tendo por base o conceito de estado de necessidade relativo
ao direito penal, previsto no art. 34.º do CP174, adequou os seus requisitos à realidade
processual, de modo a estabelecer as condições necessárias para a ocorrência do designado
“estado de necessidade processual”.175
Assim, transpondo em certa medida a tese daquele autor para o direito processual
português, cremos que, em casos excecionais, a prova ilícita deveria ser admitida em juízo
por não se tratar, em rigor, de uma ilicitude se estivessem cumpridos os seguintes
requisitos: i) possibilidade real e efetiva de formação de uma convicção do juiz, contrária
aos interesses da parte interessada na admissão da prova e desde que não haja outro meio
de prova lícito que possa conduzir ao mesmo resultado; ii) inexistência de conduta
voluntária da parte que tenha impossibilitado a produção de outras provas lícitas e
decisivas em seu favor; iii) a prova permitir o resguardo do bem jurídico de maior
relevância, considerando a ponderação dos direitos envolvidos176.
172
No Brasil, apesar de ser defensora da inadmissibilidade das provas ilícitas, ADA PELLEGRINI
GRINOVER refere que o princípio “in dubio pro reo” poderá constituir fundamento de admissibilidade, por
estarmos perante a “aplicação do princípio da proporcionalidade sob a ótica do direito de defesa, também
garantido constitucionalmente, e de forma prioritária no processo penal, tudo informado pelo princípio do
favor rei. Além disso, quando a prova, aparentemente ilícita, for colhida pelo próprio acusado, tem-se
entendido que a ilicitude é eliminada por causas legais, como a legitima defesa, que exclui a
antijuridicidade”, apud POLITANO, Ricardo. Op. cit.
173
Op. cit., pág. 22.
174
Este preceito refere que há exclusão de ilicitude quando se verifiquem os seguintes requisitos: i) não ter
sido voluntariamente criada pelo agente a situação de perigo, salvo tratando-se de proteger o interesse de
terceiro; ii) haver sensível superioridade do interesse a salvaguardar relativamente ao interesse sacrificado;
iii) ser razoável impor ao lesado o sacrifício do seu interesse em atenção à natureza ou ao valor do interesse
ameaçado.
175
À semelhança desta ideia, o Ac. do TR de Évora, de 25-11-2014, citado anteriormente, no que diz respeito
à possibilidade de valoração de provas ilícitas, refere que estas podem ser admitidas se “ocorrer causa de
justificação, consistente numa legítima defesa – obter testemunho do crime praticado pelo arguido para o
enfrentar e obstar a que prossiga na agressão – ou num direito de necessidade (probatório) – agir para
obter prova para o perseguir criminalmente”.
176
Para JOSÉ BARBOSA, no que ao processo penal diz respeito, este estado de necessidade processual
poderia servir de fundamento à admissibilidade de provas ilícitas nos casos em que o direito de liberdade do
réu está em causa, mas já não seria possível a produção de provas ilícitas contra aquele, pois não seria
compatível com a existência de um Estado de Direito, que a pretensão punitiva do Estado ocorresse mediante
violação de normas jurídicas. Op. cit., pág. 24.
58 | P á g i n a
1.1.4. O PROJETO-LEI BRASILEIRO
Não obstante não ter sido aprovado tal preceito, esta tentativa já poderá ser vista
como uma inovação que fortalece a sedimentação da corrente intermédia, acentuando, do
mesmo modo, a capacidade de o juiz interpretar e aplicar a norma da forma que considerar
mais adequada. Acresce o facto de a atuação do juiz dever ser direcionada para o alcance
de justiça, para o qual é imprescindível que aquele esteja munido de informações que lhe
forneçam o conhecimento necessário dos fatos e estando adstrito a um princípio de
proporcionalidade, que o obriga a ponderar todos os direitos e interesses envolvidos,
conseguirá estar mais próximo e informado da realidade, o que lhe permitirá aplicar a lei
de forma mais justa.
Poderá questionar-se se, eventualmente, o subjetivismo empregue pelo juiz nestas
situações de ponderação não poderá colocar em causa toda a conjuntura normativa e a
interpretação correta do caso concreto. No pensamento de JOSÉ CARLOS BARBOSA177,
o juiz não pode ser visto como uma pessoa pouco preparada ou desprovida de boa-fé, pelo
contrário, deverá ser encarado como um elo de comunicação que interliga os ditames legais
aos anseios e valores sociais 178 que, ao assumir as suas funções, presume-se ser dotado de
idoneidade moral, caráter ilibado e provido de valores éticos e legais, direcionados para a
realização da justiça.
177
Op, cit., pág. 941.
178
CALAMANDREI, Piero, Estudos de Direito Processual na Itália, 2003, págs. 87 e 88.
59 | P á g i n a
Sobretudo no direito processual moderno, no qual o juiz deixou de ser um sujeito
passivo para, ele próprio, tornar-se um sujeito processual, negar a racionalidade implícita
na ponderação de interesses do juiz, seria colocar em causa o ofício deste, de interpretar e
aplicar as regras e princípios jurídicos a fim de gerar decisões justas e adequadas, uma vez
que a própria fundamentação jurídica reveste-se de valorações. Cremos que os
subprincípios do princípio da proporcionalidade, referidos supra, representam, por si só,
racionalidade, ao constituírem verdadeiros limites e medidas de controlo à atuação do juiz,
para evitar a prática de abusos e decisões desproporcionais.
Defendemos uma possível transposição daquele preceito para o ordenamento
jurídico português, especialmente tendo em conta que os tribunais portugueses, como
verificámos supra, ao considerarem a técnica da ponderação de interesses perante casos de
colisão de direitos, por apresentação de provas ilícitas, ainda que, não raras vezes, se
decida pela inadmissão, indiretamente estão a admitir que é possível existir, em
determinados litígios, direitos que poderão ser sopesados, afastando a ideia de direitos
absolutos.
60 | P á g i n a
NOTAS CONCLUSIVAS
61 | P á g i n a
13. De acordo com o princípio da cooperação, é dever de todos, no âmbito do processo
civil, cooperar no sentido da descoberta da verdade dos factos, ideia reforçada pelo
art. 417.º n.º 1 CPC, o que indicia a inaplicabilidade do regime processual penal das
proibições de prova a este ramo.
14. A lei processual penal, no seu art. 126.º n.º 1 CPP, reproduz de forma similar a
ideia estabelecida no artigo 32.º n.º 8 CRP.
15. A finalidade do processo penal, obriga a que o art. 32.º n.º 8 CRP deva ser
interpretado em conformidade.
16. Os direitos fundamentais do indivíduo não são considerados absolutos.
17. Enquanto no processo penal estamos perante a proteção de valores comunitários e a
salvaguarda da ordem social, no processo civil visa-se a proteção de direitos
privados.
18. Nega-se, assim, a possibilidade de aplicação analógica do art. 32.º n.º 8 CRP ao
processo civil.
19. Existem três diferentes posições relativamente à questão da admissibilidade das
provas ilícitas.
20. O interesse na descoberta da verdade não constitui razão suficiente para
fundamentar a valoração da prova proibida, nem o contrário.
21. Por não existir a obrigatoriedade de ligação entre a ilicitude e a inadmissibilidade, o
argumento da irrelevância processual da ilicitude material não poderá vingar.
22. O interesse na celeridade processual, ainda que seja corolário do direito à tutela
jurisdicional, não é exigência prioritária do processo.
23. Da ilicitude na obtenção da prova não decorre a sua inadmissibilidade processual e,
por essa razão, rejeitamos a solução baseada na ideia de unidade do ordenamento
jurídico.
24. Por a conduta ilícita poder não trazer uma vantagem e por da vantagem,
eventualmente obtida, não decorrer necessariamente uma sanção processual, não
poderemos radicar a inadmissibilidade das provas ilícitas no argumento de que o
dolo não deve aproveitar ao seu autor.
25. É ao direito material que compete a função dissuasora pois se esta for
desempenhada pela exclusão da prova ilícita, constitui uma segunda sanção para o
mesmo facto.
26. O princípio da boa-fé é invocado para rejeitar a admissão processual de certos
meios de prova ou para conduzir ao ingresso dos mesmos em juízo, o que
62 | P á g i n a
demonstra que não constitui argumento suficiente para justificar a admissibilidade
de provas ilícitas.
27. A violação de direitos fundamentais, aquando da obtenção da prova, não é
fundamento de que dependa a admissibilidade da prova ilícita, uma vez que o
próprio direito à prova constitui um direito constitucionalmente protegido.
28. A adoção de teses radicais e extremistas tem tido consequências indesejadas.
29. A lei deve procurar o equilíbrio entre o interesse do cidadão em ser protegido nas
suas liberdades contra invasões ilegais dos poderes públicos e o interesse do
Estado em punir os criminosos.179
30. Adotamos uma posição intermédia, segundo a qual a prova ilícita poderá ser
admitida em juízo em casos excecionais: ser o único meio possível e razoável para
apurar a verdade, do mesmo modo que nas situações que envolvem direitos
fundamentais em colisão, se considere, após a devida ponderação de interesses, que
um adquire maior relevância perante o outro.
31. Esta ponderação é efetuada de acordo com o princípio da proporcionalidade.
32. Tal princípio subdivide-se em três subprincípios: da adequação, da necessidade e da
proporcionalidade em sentido estrito.
33. Apesar da diferenciação de regimes, cremos que em determinados casos também no
processo penal deverá haver ponderação de interesses envolvidos.
34. Neste sentido, alguma jurisprudência tem demonstrado abertura para a aplicação do
princípio da proporcionalidade, como solução para dirimir possíveis conflitos entre
direitos constitucionalmente protegidos.
35. A nível mundial, a tendência é no sentido da adoção deste mesmo critério.
36. Não obstante, é inadmissível o meio de prova obtido mediante tortura ou coação.
37. Concluindo, devendo a atuação do juiz ser direcionada para o alcance de justiça, ao
estar adstrito a um princípio de proporcionalidade, que o obriga a ponderar todos os
direitos e interesses envolvidos, conseguirá estar mais próximo e informado da
realidade, o que lhe permitirá aplicar a lei de forma mais justa e alcançar a justa
composição do litígio.
179
COWEN-CARTER, apud ABRANTES, J.J., op. cit., pág. 19.
63 | P á g i n a
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