Fisiologia Do Estresse e Sua Influencia

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FISIOLOGIA DO ESTRESSE E SUA INFLUÊNCIA NA SAÚDE

Antonio Waldo Zuardi

Introdução

A primeira evidência experimental do estresse foi conduzida na Universidade


McGill, no Canadá, por Hans Selye, um endocrinologista, nascido na antiga Áustria-
Hungria. Procurando novos hormônios na placenta, injetou um extrato da mesma, por
via intraperitoneal em ratos, verificando uma série de alterações. Estas, no entanto,
não puderam ser atribuídas aos efeitos desse extrato, uma vez que os animais
controles, injetados com placebo, tiveram as mesmas alterações. Selye sugeriu a
hipótese de que a manipulação e/ou a injeção pudesse ser responsável pelas
alterações encontradas. Para testar essa hipótese expôs os animais a uma série de
estímulos diversos, que incluíam: frio, injuria tecidual, excesso de exercícios e
intoxicações, observando os mesmos achados, independente do estímulo utilizado.
Concluiu que se tratava de uma “reação geral de alarme” a situações críticas e que
representava um esforço do organismo para adaptar-se à nova condição passando a
chamá-la então de “síndrome de adaptação geral”. Esta síndrome caracterizava-se por:
hipertrofia das glândulas adrenais, úlceras gástricas e uma diminuição no tamanho do
timo, baço e gânglios linfáticos.

Esses resultados foram publicados em 1936 na revista Nature1. Na carta inicial ao


editor da revista, Selye usou o termo “stress”, mas foi solicitado a substituir, na
publicação, esse termo por “reação de alarme”. O termo “stress” já era usado pela
física desde 1658, referindo-se à força que produz uma deformação num material. Este
termo acabou sendo consagrado e se manteve, basicamente, o mesmo nas mais
diversas línguas, pela ausência de uma tradução adequada2.

O estresse pode ser definido como um estado antecipado ou real de ameaça ao


equilíbrio do organismo e a reação do mesmo, que visa restabelecer o equilíbrio
através de um complexo conjunto de respostas fisiológicas e comportamentais. A
manutenção deste estado de equilíbrio, homeostase, é essencial para a vida e é
constantemente desafiado por forças internas ou externas. Esses desafios ativam os

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sistemas sensoriais, através de estímulos interoceptivos, como os produzidos, por
exemplo, por mudanças no volume ou osmolaridade do sangue, ou por estímulos
exteroceptivos, tais como o cheiro de um predador, desencadeando uma cadeia de
respostas que objetivam minimizar os danos para o organismo3.

Agudamente a resposta ao estresse é adaptativa e prepara o organismo para


enfrentar o desafio. O objetivo da resposta aguda ao estresse é essencialmente o de
induzir uma rápida mobilização de energia nos locais apropriados. Nesse sentido, o
aumento da freqüência cardíaca, da pressão arterial, da freqüência respiratória e a
mobilização de glicose dos depósitos, contribuem para a disponibilização de energia.
Por outro lado, a inibição da digestão, do crescimento e da reprodução, leva a uma
economia de energia. Outras respostas, como analgesia e melhora na memória e
percepções, facilitam as respostas de luta e fuga4.

Fisiologia do estresse

As respostas ao estresse são mediadas pelo sistema nervoso autônomo (SNA) e


pelo eixo hipotálamo-hipófise-adrenal (HHA), com ações complementares através de
todo o organismo.
O SNA é o responsável pela resposta mais imediata à exposição ao estressor.
Suas duas partes, simpático e parassimpático, provocam alterações rápidas nos
estados fisiológicos através da inervação dos órgãos alvos. Por exemplo, a inervação
simpática pode rapidamente (em segundos) aumentar a freqüência cardíaca e a
pressão arterial através da liberação de noradrenalina, primariamente nas terminações
dos nervos simpáticos e adrenalina pela estimulação simpática das células da medula
da glândula adrenal (Figura 1). Essa excitação do SNA diminui rapidamente em razão
do reflexo parassimpático, resultando em respostas de curta duração3.
Por outro lado, o estresse ativa, também, o eixo HHA, que resulta na elevação
dos níveis de glicocorticóides circulantes. A exposição ao estressor ativa os neurônios
do núcleo paraventricular do hipotálamo que secretam hormônios liberadores, como o
hormônio liberador de corticotrofina (corticotropin-releasing hormone – CRH),
secretado nos terminais de neurônios hipotalâmicos próximos da circulação porta da

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eminência média da hipófise, mas podendo, também, exercer seus efeitos em várias
áreas cerebrais, como amígdala, hipocampo e locus ceruleous. Esse hormônio vai agir
na hipófise anterior promovendo a liberação do hormônio adrenocorticotrófico
(adrenocorticotropic hormone - ACTH), que por sua vez vai atuar no córtex da glândula
adrenal iniciando a síntese e liberação de glicocorticóides, como, por exemplo, do
cortisol em humanos (Figura 1). O pico dos níveis plasmáticos de glicocorticóides
ocorre dezenas de minutos após o início do stress. O mecanismo, com vários níveis de
secreção hormonal do eixo HHA, é lento em relação à latência dos mecanismos de
transmissão sináptica que ocorrem no SNA3. Os glicocorticóides são secretados de uma
forma pulsátil, seguindo um ritmo circadiano, sobre o qual se sobrepõe uma explosão
secretória por ocasião do estresse. Esses hormônios atuam primariamente em dois
tipos de receptores: mineralocorticóides (ReMC) e glicocorticóides (ReGC). Os
primeiros têm grande afinidade pelos corticosteróides, sendo ocupados mesmo
quando os níveis são baixos e os segundos, com uma afinidade dez vezes menor, que
são ocupados em situações de grande aumento, por exemplo, durante o estresse. A
ligação dos corticosteróides com seu receptor promove seu transporte para o núcleo
das células, onde atuam na transcrição gênica. Assim, influenciam a taxa de secreção
de proteínas específicas, que diferem dependendo do tipo de célula5, 6. Os
glicocorticóides circulantes promovem a mobilização da energia armazenada e
potencializam numerosos efeitos mediados pelo simpático. Desempenham, também,
um papel chave no controle da atividade do eixo HHA e na finalização da resposta ao
estresse, através de uma realimentação inibitória em áreas cerebrais extra-
hipotalâmicas, hipotálamo e hipófise6.

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A resposta ao estresse desenvolve-se numa escala temporal que vai de
milissegundos a dias. Como visto anteriormente, os diferentes moduladores agem com
perfis temporais diversos. A primeira onda de efeitos deve-se à liberação de
monoaminas, pelo SNA e pelos peptídeos (CRH), começando alguns segundos após o
estressor. A segunda onda compreende efeitos moleculares, principalmente pela
secreção de glicocorticóides, que ativam os fatores de transcrição, produzindo efeitos
genômicos e estruturais. Essa onda começa entre uma e duas horas após o início do
estresse. Sabe-se hoje que essa é uma representação esquemática que está
relacionada com os efeitos principais dos mediadores, porém eles podem,
simultaneamente, produzir outros efeitos com perfis temporais diversos. Por exemplo,
os corticosteróides (classicamente considerados de ação lenta) também podem mudar
rapidamente o funcionamento cerebral, através de vias não genômicas, como a
ativação de receptores ReMR no hipotálamo e hipocampo, aumentando a
excitabilidade neuronal, pelo aumento da liberação de glutamato5. A sinalização não
genômica dos glicocorticóides é responsável, também, pela rápida retroalimentação
inibitória do eixo HHA, que ocorre em minutos após seu aumento na circulação3.

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Influência do estresse na saúde
A intensidade da resposta aguda ao estresse deve ser proporcional à ameaça do
estressor, tanto em intensidade como em duração. Assim a mobilização de energia
induzida pelo estresse deve se adequar às necessidades para a restauração do
equilíbrio orgânico e deve persistir por um tempo limitado, que não comprometa o
organismo, em razão, por exemplo, de seus efeitos inibitórios sobre a digestão,
crescimento, reprodução e resposta imune.

Dessa forma, o estresse freqüente ou mantido por longo tempo pode


comprometer o organismo gerando doenças. Vários estudos neuroquímicos sugerem
que o estresse crônico aumenta a excitabilidade do eixo HHA e do sistema simpático-
adrenomedular. Com o estresse crônico, novos estressores passam a ter as respostas
de ACTH e cortisol facilitadas, além de induzirem sensibilização na freqüência de
descargas do lócus cerúleo e maior liberação de noradrenalina3.

A relação entre estresse e problemas de saúde tem sido comprovada por


inúmeros estudos. Num desses estudos 75 casais foram acompanhados por seis
meses, com registros diários de aborrecimentos, humor e condições de saúde,
encontrando uma relação significativa entre a ocorrência de estresse e dificuldades
com a saúde7.

O estresse mantido é relativamente recente na escala evolutiva, sendo


observado apenas nos primatas sociais e no homem4. Isso se deve provavelmente ao
fato do homem pensar e, dessa forma, poder antecipar situações de estresse ou
manter suas preocupações por longo tempo.

Efeitos do estresse em sistemas específicos

Sistema Cardiovascular

Uma das respostas mais rápidas do estresse é a do SNA, que pela inervação
simpática vai liberar noradrenalina em seus terminais e ativar a medula da glândula
supra-renal, liberando adrenalina na circulação. Essas ações sobre o coração vão
produzir um aumento na freqüência, contratilidade e velocidade de condução. Sobre
os vasos, essas ações vão produzir uma redistribuição no fluxo sanguíneo. A
estimulação α adrenérgica pelas fibras simpáticas, predominante no sistema digestivo
e pele, vai produzir uma vasoconstricção nesse território. Por outro lado, a estimulação
β adrenérgica, predominante nos músculos, vai produzir uma vasodilatação. Dessa
forma o fluxo vai ser direcionado para os músculos.

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Essas respostas são adaptativas numa situação de estresse agudo, uma vez que
aumenta a disponibilidade de energia nos territórios necessários para a luta ou fuga. A
persistência do estresse, no entanto, propicia alterações no funcionamento do sistema
cardiovascular, gerando doenças.

A hipertensão arterial, ainda que não tenha causa única, resultando da interação
de inúmeros fatores, tem entre eles o estresse crônico. Num estudo longitudinal
pessoas com níveis normais de pressão arterial foram avaliadas quanto a sua
propensão à ansiedade e seguidas por 18 a 20 anos, observando-se que aquelas com
alto nível de ansiedade tiveram um risco duas vezes maior de desenvolverem
hipertensão arterial8. A hipertensão arterial pode favorecer a hipertrofia do ventrículo
esquerdo, além de facilitar a ocorrência de fissuras nas paredes internas das artérias,
especialmente em suas bifurcações, contribuindo para a ocorrência de outros
processos patológicos.

Durante o estresse a ativação do sistema nervoso simpático desencadeia uma


cascata de citocinas pró-inflamatórias, que durante o estresse crônico pode sobrepujar
os efeitos imunosupressores da ativação do eixo HHA favorecendo os processos
inflamatórios, entre eles os que ocorrem no interior das artérias 9. As fissuras nas
artérias geralmente cicatrizam sem complicações, porém o reparo contínuo, com a
penetração de lipoproteínas, especialmente do LDL colesterol, e acúmulo de
macrófagos, que já não consegue digeri-las adequadamente, resulta em placas
ateroscleróticas. Essas placas restringem o fluxo de sangue, com conseqüências
perigosas quando ocorrem em territórios críticos como o coração e o sistema nervoso.
Intimamente relacionada com a aterosclerose, ocorre uma perda da elasticidade das
artérias, chamada de arteriosclerose, que complica ainda mais o transporte de grandes
quantidades de sangue exigidas pelo aumento do esforço físico ou do estresse.

A resposta aguda ao estresse pode ter conseqüências diversas dependendo se


ocorre em indivíduos expostos ou não ao estresse crônico. A liberação aguda de
adrenalina e noradrenalina no tecido cardíaco, durante o estresse, estimula os
receptores β- adrenérgicos aumentando o influxo de cálcio nas células do miocárdio,
resultando num aumento da força de contração e da freqüência cardíaca, com o
aumento da contratilidade, da condutividade e da excitação10. Simultaneamente,
ocorre uma liberação de óxido nítrico pelo endotélio das coronárias, produzindo uma
vasodilatação nas artérias coronárias, suprindo a necessidade aumentada de
oxigenação10. A disfunção do endotélio aterosclerótico reduz a liberação de oxido
nítrico predispondo a um espasmo coronário e juntamente com a estimulação β-
adrenérgica media a formação de fatores pró-coagulantes, aumentando o risco de
formação de trombos9. A liberação de glicocorticóides pela estimulação do eixo HHA,
pelo estresse potencia a resposta simpática, inibindo a captação extra-neuronal de

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catecolaminas, influindo em sua síntese e degradação, bem como facilitando o dano
do miocárdio favorecendo a contratilidade e a apoptose (morte) celular10.

Este conjunto de mecanismos fisiopatológicos justificam a associação do estresse


com o aumento no risco de infarto do miocárdio e morte súbita por arritmia
ventricular. Inúmeros estudos epidemiológicos encontram maior risco de doença
coronariana com alto estresse profissional (trabalhos com alta demanda e baixo
controle ou com desproporção entre a intensidade do trabalho e o reforço) e/ou
conjugal11.

Metabolismo

A liberação de glicocorticóides, pelo estresse, tem ações bem conhecidas sobre o


metabolismo de carboidratos. Os efeitos dos glicocorticóides são opostos aos da
insulina, produzindo o que é conhecido como resistência à insulina, através de dois
mecanismos: a) diminuindo a supressão que a insulina provoca na produção hepática
de glicose (favorecendo a gliconeogênese); b) prejudicando a entrada de glicose para o
interior das células, que é mediada pela insulina. Além disso, os glicocorticóides atuam
diretamente nas células β do pâncreas inibindo a secreção de insulina12. A ativação do
SNA atua no mesmo sentido através da inibição parassimpática, que resulta numa
diminuição de secreção de insulina pelas células β do pâncreas. Agudamente essas
respostas ao estresse têm um sentido adaptativo no sentido de aumentar a
disponibilidade de glicose circulante. A persistência, por longo prazo, de níveis
elevados de estresse pode contribuir para desencadear a diabetes, pelos mecanismos
revistos acima em interação com os múltiplos fatores envolvidos nesta doença.

Os efeitos do estresse sobre o metabolismo de lipídeos e mais complexo. A


estimulação do SNA, durante o estresse agudo produz uma lipólise com a
transformação dos triglicerídeos em ácidos graxos livres e glicerol. Os glicocorticóides
interferem no balanço entre ácidos graxos e triglicerídeos, tanto no sentido da lipólise
quanto na reesterificação (formação de triglicérides a partir de ácidos graxos). O
sentido dessa interferência parece depender do predomínio de catecolaminas ou de
insulina. Assim, durante o estresse agudo, a liberação de glicocorticóides com o
estímulo adicional de catecolaminas elevadas, favorece a lipólise 13. Os ácidos graxos
livres são uma fonte importante para a geração de energia, necessária nas respostas
de luta ou fuga. Na recuperação da resposta aguda ao estresse, os níveis elevados de
glicocorticóides mantêm-se por mais tempo que os de catecolaminas e, dessa forma,
acabam favorecendo a reesterificação com o armazenamento de triglicérides.
Adicionalmente, o efeito agudo do CRH inibindo o apetite é sobrepujado pelo dos
glicocorticóides, que estimulam o apetite, possibilitando assim um suprimento maior
de triglicérides pela alimentação. Esses mecanismos podem ser interpretados como

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uma forma de recompor as reservas de energia. Assim, novamente as alterações
geradas pelo estresse agudo mostram seu papel adaptativo.

Com o estresse crônico, no entanto, o excesso continuado de glicocorticóides


pode levar a um acúmulo no depósito de gordura, que ocorre de forma diferenciada
dependendo do tecido adiposo. Durante a recuperação do estresse o acúmulo de
gordura ocorre predominantemente no tecido adiposo visceral do abdômen, que
possui mais células por unidade de massa, maior irrigação e maior expressão de
receptores glicocorticóides, gerando uma distribuição de gordura centrípeta. Por sua
vez a maior obesidade visceral representa um fator de risco para a aterosclerose, já
que o tecido adiposo intra-abdominal é uma fonte importante da citocina pró-
inflamatória interleucina 6, que participa desse processo. No mesmo sentido a
cortisolemia crônica contribui para a elevação dos níveis de LDL colesterol 9.

Esse conjunto de alterações relacionadas constitui a chamada Síndrome


Metabólica, que se caracteriza por:

- obesidade abdominal;
- hiperglicemia;
- dislipidemia (níveis elevados de triglicérides, níveis elevados de LDL colesterol e
baixos de HDL colesterol);
- hipertensão arterial.

Alguns estudos demonstram que a Síndrome Metabólica está relacionada com


um risco aumentado para doenças cardiovasculares e acidentes vasculares cerebrais.
Uma amostra de mais de 5.000 homens, com 40 a 59 anos, sem história de doença
cardiovascular, acidente vascular cerebral ou diabetes, foi acompanhada por 20 anos,
observando-se que os que apresentaram Síndrome Metabólica tiveram um risco
relativo para doença coronária, acidente vascular cerebral e diabetes maior do que os
que não apresentaram (1,64; 1,61 e 3,57, respectivamente)14.

Sistema Gastrointestinal

Muitas evidências sugerem que o estresse agudo altera as funções


gastrointestinais, através do sistema nervoso autônomo. A ativação do sistema
nervoso simpático e inibição da atividade vagal resultam numa inibição seletiva da
motilidade gástrica e do intestino delgado, bem como, da secreção de ácido e de
enzimas digestivos6. A ativação simpática inibe as contrações da musculatura lisa
gastrointestinal, através da estimulação de β receptores e intensifica essas contrações
via estimulação de α receptores. O predomínio de β receptores no estomago e
intestino delgado resulta na diminuição de motilidade nessas regiões, porém o
predomínio de α receptores no cólon produz um aumento em sua motilidade4. Esse

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aumento de motilidade no cólon decorre, também, de uma estimulação do sistema
parassimpático sacral6. As respostas gastrointestinais ao estresse agudo são
consideradas adaptativas, uma vez que economizam a energia dos processos
digestivos para serem utilizados nas reações de defesa e aumentam a eliminação de
resíduos desnecessários ao organismo, diminuindo seu peso4.

A cronicidade do estresse, no entanto, pode resultar num distúrbio, conhecido


como síndrome do cólon irritável, que é uma doença funcional caracterizada por
cólicas, distensão abdominal e diarréia.

O estresse pode contribuir também na fisiopatologia da úlcera péptica, em


conjunto com uma série de outros fatores, como, por exemplo, a presença do
“Helicobacter pylori”, a insuficiência de prostaglandinas e a imunossupressão. A
diminuição da irrigação gástrica e da secreção de acido, produzida pelo estresse, é
acompanhada da diminuição do muco que protege a parede do estomago, de seu
próprio acido. Assim, quando o acido volta ser secretado vai encontrar uma parede
mais vulnerável.

Sistema Imunológico

A influência do estresse sobre o sistema imune é conhecida desde o trabalho de


Selye em 1930, que observou atrofia do timo em animais submetidos a vários tipos de
estressores. A imunossupressão associada ao estresse tem sido atribuída ao aumento
na secreção de cortisol, resultante da ativação do eixo HHA. O cortisol diminui a
proliferação de linfócitos, interfere na comunicação entre eles, inibe a migração de
granulócitos, inibe a produção de anticorpos, entre outros efeitos15. Essa resposta
pode parecer incompatível com as necessidades do organismo num momento de luta
ou fuga. Porém, deve-se ressaltar que o aumento na secreção de cortisol, em resposta
ao estresse, tem uma latência de dezenas de minutos e que a resposta imediata ao
estresse á dada pela ativação do SNA simpático.
A ativação simpática pelo estresse produz uma resposta muito rápida na
contagem de glóbulos brancos, com elevação do número de neutrófilos e manutenção
no de linfócitos que, no entanto, muda a proporção relativa de seus vários tipos, com
aumento nas células NK (natural killer) e diminuição das células CD3+ e CD4+16. Essas
alterações apresentam correlação com as alterações cardíacas, que são induzidas pela
ativação simpática, além de ocorrem nos primeiros 14 minutos, quando os níveis de
cortisol ainda não se elevaram. Esse aumento agudo de neutrófilos e linfócitos NK
poderia atender à necessidade de aumentar a defesa imunológica numa situação
aguda de estresse4. O aumento posterior na secreção do glicocorticóide cumpriria a
função de trazer novamente o sistema ao seu funcionamento habitual 4, promovendo
uma redução na contagem de glóbulos brancos17.

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A persistência do estresse mantém os níveis de glicocorticóides elevados,
resultando em imunossupressão, que facilita a ocorrência de doenças infecciosas,
podendo contribuir, também, para o surgimento e disseminação do câncer, pela
redução da destruição de células tumorais. Um dos modelos de estresse crônico utiliza
as pessoas responsáveis pelos cuidados de cônjuges portadores de doença de
Alzheimer (caregivers). Verificou-se que os caregivers apresentam níveis elevados de
estresse e de cortisol, acompanhados de uma diminuição na proliferação de linfócitos,
associada a uma redução na produção de interleucina 2 (IL-2)18. Nessa mesma
população verificou-se uma baixa resposta na produção de anticorpos (IgG) contra a
vacinação para a influenza19.
A interação entre o estresse e a resposta imunológica, no entanto, é muito mais
complexa, não se limitando à imunossupressão. É bem conhecida a associação entre o
estresse e doenças alérgicas e auto-imunes. Esses efeitos aparentemente
contraditórios começam a ser mais bem entendidos com o avanço no conhecimento
dessa interação.
As respostas imunes são reguladas por componentes da imunidade inata
(monócitos/macrófagos e outros fagócitos) e por componentes da imunidade
adquirida (entre eles os linfócitos T helper, com suas subclasses Th1 e Th2). Essas duas
subclasses de T helper, têm uma origem comum e a diferenciação ocorre
principalmente pela ação de citocinas (grupo extenso de moléculas envolvidas na
emissão de sinais entre as células durante o desencadeamento de respostas imunes).
Uma dessas citocinas, a interleucina 12 (IL-12), produzida pela ativação de
monócitos/macrófagos é a principal indutora da diferenciação no sentido dos linfócitos
Th1. Os linfócitos Th1 secretam o interferon-γ (IFN- γ), que em conjunto com outras
citocinas chamadas do tipo Th1 (IL-12, IL-2 e fator de necrose tumoral [TNF-α])
estimulam a atividade funcional das células citotóxicas (Tc), NK e macrófagos,
principais componentes da imunidade celular. As respostas Th1 e Th2 são mutuamente
inibitórias. Assim, a IL-12 e o IFN- γ inibem a diferenciação no sentido do Th2. Os
linfócitos Th2 liberam citocinas (IL-4, IL-10, IL-13), que estimulam a atividade imune
humoral, estimulando os mastócitos, eusinófilos e imunoglobulinas IgE20.
Durante o estresse, tanto pela ação dos glicocorticóides como das
catecolaminas, ocorre uma inibição na produção de IL-12, desencadeando uma cascata
de conseqüências, que resultam numa mudança do equilíbrio entre respostas Th 1/Th2,
com a diminuição das atividades Th1 e conseqüente aumento das Th2. A resultante
desse desequilíbrio é uma diminuição da imunidade celular e um aumento da
imunidade humoral. Uma síntese esquemática dessas reações é apresentada na Figura
2.
O aumento na susceptibilidade às infecções ou agravamento no curso das
mesmas, pelo estresse, pode ser entendido pela diminuição da imunidade celular,
decorrente da diminuição das atividades Th1. Já a associação do estresse com as
doenças auto-imunes é mais complexa. Em algumas doenças auto-imunes, como o

10
lúpus eritematoso sistêmico, o aumento da imunidade humoral, resultante do
predomínio das atividades Th2 induzidas pelo estresse, participa da fisiopatologia da
doença. O mesmo não ocorre com outras doenças auto-imunes, como a artrite
reumatóide, que cursam com excesso de IL-12 e TNF-α, mostrando a importância da
imunidade celular nessas patologias. A associação entre o estresse e a progressão de
tumores e o aumento de mortes relacionadas ao câncer, pode ser explicado pela
diminuição da atividade de células NK e Tc, componentes da imunidade celular, em
razão da diminuição das funções Th120.

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Outros Sistemas

A ativação do SNA e do eixo HHA, pelo stress, interfere numa série de outros
sistemas com repercussões sobre a reprodução, crescimento, memória, sono,
envelhecimento, osteoporose e outros4, 6. O detalhamento dessas interações foge ao
escopo dessa revisão, que focalizou apenas a interação entre o estresse e alguns
sistemas, com o objetivo de exemplificar como aspectos do contexto de vida, que
resultam numa resposta de estresse, podem interferir no funcionamento orgânico
tanto como um fator de adaptação quanto como facilitador de distúrbios.

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