Neto Milição PTEA 20 08 2021

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Faculdade de Letras e Ciências Sociais

Departamento de Arqueologia e Antropologia

Licenciatura em Antropologia

Problemáticas Teórico-Epistemológica da Antropologia

Docente: Hélder Nhamaze

Discente: Neto Raul Milição

3ᵒ Ano, 1ᵒ semestre,

Fichas de leitura

Referência bibliográfica

Caldeira, Teresa, 1988. A presença do Autor e a Pós-Modernidade em Antropologia.Novos


Estudos.(21): 133-157.

O artigo de Caldeira (1988) tem como principal objectivo esclarecer o lugar do texto
etnográfico com o objectivo de abordar alguns aspectos de mudança das condições de
produção do trabalho antropológico, e ver a que novas alternativas as críticas estão levando.
A autora diz que a presença ambígua do autor no texto etnográfico diz respeito as descrições
por si produzidas que comprovam e revelam a experiência pessoal no campo com o nativo de
modo a garantir sua objectividade.

Segundo a autora, a crítica a ambiguidade está no facto de apagar parcialmente as vozes do


nativo, por conta das interpretações, os enunciados daqueles sobre quem fala, e o outro só
existe pela voz do antropólogo que esteve lá, viu e reconstruiu a cultura enquanto totalidade
em seu texto. A experiência do campo não deve permanecer em estado bruto, o antropólogo
tem de se transformar ao entrar em uma cultura, deve reelaborar sua experiência ao sair dela
para transformá-la em uma descrição objectiva da cultura como um todo.

A autora diz que as alternativas pós-modernas reinventaram dois aspectos em relação aos
textos e a crítica cultural. Todavia, oposto da etnografia clássica, o etnógrafo não se esconde
para afirmar sua autoridade científica. Apenas analisa, sugere e provoca. Assim, o leitor não é
mais aquele que se informa, mas participante activo na construção do sentido do texto, que
apenas sugere conexões do sentido. Este modelo foi criticado por Robinow ao afirmar que a
discussão textual nunca vai se sustentar por si só.

A autora conclui que não é apenas pensar que tipo de representação é possível criar sobre os
outros e quais os nossos procedimentos ao construir interpretações, mas que tipo de crítica e
de política nós queremos fazer. E sugere que faz parte do novo papel do antropólogo a busca
do estilo que melhor se adapte aos seus objectivos.

Referência bibliográfica

De Moura, Mariana; Machado, Milena; Machado, Renata, 2016, Trabalho de campo, teoria e
construçãoda Etnografia
(http://actacientifica.servicioit.cl/biblioteca/gt/GT16/GT16_MendesdeMoura_FreitasMachad
o.pdf) 22 de Fevereiro de 2016

O artigo de De Moura et al (2016) tem como principal objectivo de discutir a teoria e a


construção da etnografia com base no trabalho de Márcio Goldman e FavretSaada a partir do
diálogo entre o conhecimento do pesquisador (emic) com o conhecimento do pesquisado
(etic). Como argumento as autoras dizem que foram as incursões de Malinowski que
ganharam visibilidade modificando o fazer antropológico, centrado agora no ponto de vista
do nativo e que desde então, a etnografia tem sido alvo de críticas que parecem ter forte
ressonância no passado.

As autoras dizem que até no século 20 os trabalhos realizados usam o método conhecido por
antropologia da varanda. Após o trabalho do campo feito por Malinowski nas ilhas
trobriandesa, mudou a forma de fazer antropologia, mostrando que um bom trabalho de
campo é aquele em que o antropólogo deve estar em contacto directo e mais estreito com os
nativos, isolar os nativos dos supostos homens brancos, acompanhar as práticas sociais e
culturais do nativo.

Segundo as autoras, foi a partir do diálogo entre o conhecimento nativo e o conhecimento do


pesquisador que se compõe o trabalho do antropólogo fazendo com que as impressões de
campo sejam recebidas pelo intelecto e exerçam impacto na personalidade total do etnógrafo,
fazendo com que diferentes culturas se comuniquem na experiência singular de uma única
pessoa através da etnografia.

As autoras dizem que o trabalho de Márcio Goldman trouce outra forma de compreender o
trabalho de campo que leva em consideração a experiência. Neste sentido, a teoria
etnográfica está ancoradana concepçãode que não são apenas culturas diversas o objecto da
antropologia, mas sim mundos diferentes. A partir do relato da sua experiência pessoal, como
antropólogo, frente à alteridade faz parte do trabalho do antropólogo, por meio da etnografia
e do trabalho de campo ser afectado por algo que também afecta o nativo.

Segundo as autoras a expressão “ser afectado” que inicialmente apareceu, no trabalho de


campo realizado pela Jeanne Favret Saada fez a repensar a antropologia e colocar em
suspensão o método da observação participante colocando em suspensão a observação
participante iniciada por Malinowski. No entanto, dizem as autoras que o ser afectado
possibilita estar no lugar acessível a uma comunicação involuntária e desprovida de
intencionalidade e que o afecto não é o mesmo no antropólogo e nos nativos, mas por estarem
todos afectados cria-se uma situação de comunicação interactiva.

Em conclusão as autoras dizem que a aproximação pesquisador/informante através da


experiênciade ser afectado contribui significativamente para o trabalho de campo. Neste
sentido as considerações de Favret-Saadae Goldman contribuem de maneira muito
significativa para o trabalho de campo. E que o ser afectado é uma forma de compreender o
trabalho de campo através da experiência que permite diminuir a distância entre o
pesquisador e o interlocutor.

Referência bibliográfica

Nagami, Isis. 2014. “Do trabalho de campo à escrita etnográfica: breves reminiscências sobre
o fazer antropológico”. XXV Semana de Ciências Sociais, Londrina.
O artigo de Nagami (2014) tem como principal objectivo de analisar a relação que é
estabelecida entre o antropólogo e o nativo no trabalho de campo como prática antropológica.
A autora argumenta que a ascensão do trabalho de campo como forma de pesquisa
antropológica trouxe o debate sobre a relação estabelecida entre antropólogo e nativo, entre o
"eu" e o "outro".

Segundo a autora, o uso da imagem em pesquisas antropológicas continua a ser problemática


à medida que é vista como uma invasão de outras áreas. Assim, a mudança perceptiva sobre
os conceitos e modos discursivos do fazer antropológico trazem questionamentos sobre a
autoridade do antropólogo em interpretar a "cultura do outro".

A autora diz que entre 1900 e 1960 a observação participante tornou-se um dos meios
legítimos, institucionalizado e concretizado através da produção textual. Porem, tais
elementos sugeriam a legitimidade da pesquisa antropológica que, através de seus métodos de
coleta de dados, permitia que a observação do "outro" se desse de forma cientificamente
validada, culminando na tradução de tal experiência através da forma textual.

Segundo a autora, A observação participante efetuada entre sociedades exóticas, intensiva e


temporalmente extensa contrapõe lógicas, hábitos, valores e costumes diferentes. Assim, o
exercício auto-reflexivo do fazer antropológico sempre esteve no cerne da própria teoria.
Pensar o outro como espelho para a compreensão de sua própria sociedade esteve presente no
pensamento antropológico, portanto, não existe receita de como deve ser o "ir a campo", as
monografias são transmitidas e narradas em um momento posterior a própria experiência. Os
recursos narrativos, as ênfases em determinados eventos e o meio fio que conectam teoria e
experiência possuem, até certa medida, liberdade criativa por parte de quem a produz.

A autora diz que os insights dos antropólogos passam a permear a tensa relação entre teoria e
prática. E que o "Ser afectado" passa a contemplar parte do processo de alteridade do
exercício antropológico. Os imponderáveis do trabalho de campo e a interpretação passam a
fazer parte das narrativas etnográficas. Pois, ao levar os conceitos a campo confrontando-o
com a interpretação nativa, os antropólogos também acabam por confrontar seus próprios
conceitos. Neste sentido, a cultura enquanto conceito, é construída pelos antropólogos e cada
antropólogo possui diferentes racionalidades.

Segundo a autora, é importante levar em consideração "o local de que fala o antropólogo", é
necessário pensar quem é o "nativo que ao empoderar-se responde por um todo", mas que,
muitas vezes, não é a fala de todos. Pois, as pessoas, relações e coisas que povoam a
existência humana manifestam-se essencialmente como valores e significados.

A autora em conclusão diz que é a experiência de campo que desconstrói e constrói o


conhecimento antropológico e que não há como determinar o modo que deve transcorrer a
pesquisa de campo. Os recursos narrativos, as ênfases em determinados eventos e o meio fio
que conectam teoria e experiência possuem, até certa medida, liberdade criativa por parte de
quem a produz.

Referência bibliográfica: Rubim, Christina de Rezende.  A constituição e o ser da


antropologia: problema e método. Estudos de Sociologia, v. 4, n. 7, p.1-28, 1999.

O artigo de Rubim (1999) tem como principal objectivo de mostrar como foi constituídoo
conhecimento antropológico e mostrar qual era ou é a problemática e método.

Segundo Rubim (1999), a consciência da identidade de um grupo diante de outros sempre


esteve presente na história dos povos do mundo. No desenvolvimento do mundo ocidental
estas diferenças foram construídas a partir das mais variadas respostas dadas pelos diferentes
momentos desta história. No entanto, a alteridade dos grupos humanos é uma atitude que
relega à natureza todo aquele que é diferente e a consequente constatação das diferenças cuja
antropologia torna-se um marco fundamental porque rompe com esta ideia.

A autora considera que o renascimento com a intensificação das rotas de comércio entre
Europa, Ásia e África, a alteridade foi acelerada que culminou com o colonialismo europeu, o
marco da formulação de respostas mais elaboradas que justificassem, tanto teoricamente estas
diferenças baseadas em preconceitos e descriminação.

Esta realidade contribuiu no século XIX para a formação da antropologia enquanto uma
disciplina autónoma que tomando a vida humana como objecto de estudo, rompe com as
especulações teológicas sobre o homem e com a ideia de uma ciência que exclui o que não é
físico e natural porque não pode ser objectivo. A descoberta do novo mundo privilegiou a
construção posterior de noções tais como a de unidade da espécie humana, cultura e
relativismo cultural entre outras. O conceito moderno de cultura, por exemplo, está ligado ao
conceito de relativismo cultural que por sua vez foi construído a partir de uma crítica a noção
de desenvolvimento unilinear da espécie humana. Entretanto, o que fundamenta a
problemática da relatividade cultural, é uma discussão sobre o relativismo do conhecimento
Ocidental e até mesmo da própria ciência enquanto verdade absoluta.

Nas ciências modernas, sujeito e objecto se interpenetram, sendo o conhecimento o produto


da construção do objecto através de um sujeito historicamente determinado e, seus conceitos,
suas teorias e verdades são parte da história e possuem os seus limites nela, porque entre
outros motivos, não podem ser pensadas independentemente dos sujeitos cognoscentes. Para
Thomas Khun (1991 [1960]) citado por Rubim, a ciência se desenvolve por revoluções
paradigmáticas porque a apreensão da realidade constantemente se modifica, transformando-
se em algo novo que anteriormente era impensável, pois, o que faz a ciência como ciência são
as suas rupturas, os seus conflitos, os inconformismos, a criatividade humana e os debates de
ideias.

A autora afirma que as ciências sociais o tema gira em torno dos limites e possibilidades de
cientificidade do que é humano e da problemática de um método específico para as suas
disciplinas. Émile Durkheim (1987) é um marco para as disciplinas que compõem as ciências
sociais quando afirma que devemos trabalhar os fatos sociais como coisas, ou seja, como
exteriores e independentes do sujeito cognoscente, propondo regras rigorosas e específicas ao
método propriamente sociológico. Na antropologia esta discussão aparece na literatura dos
anos 50/60 com a chamada crise do objecto quando Lévi-Strauss (1962) faz um alerta sobre a
possibilidade do desaparecimento das sociedades tribais, o objecto de estudo antropológico.
Historicamente o objecto de estudo da sociologia foi o ocidente; o da antropologia o outro. A
autora considera que a antropologia encontra-se na actualidade frente a uma nova
problemática e começa a questionar a si mesma enquanto ciência, aos seus sujeitos de
pesquisa, os seus objectivos, enfim, o seu projecto de compreensão da realidade.

A problemática metodológica

Enquanto as ciências naturais estudam a essência do homem, as ciências sociais procuram


compreender o seu ser vivo na relação com os outros. O seu estudo é subjectivo, pois, o
sujeito e o objecto são seres ambos cognoscentes e impregnados de paixões e valores que
entram em choque. A valorização/resgate da subjectividade do pesquisador é um momento
fundamental na busca da objectivação nas ciências sociais porque o que é peculiar na relação
do conhecimento social é que o sujeito cognoscente e o objecto cognoscível são vicissitudes
que se transformam mutuamente.
A relação sujeito-objecto

Primeiro, o relacionamento do pesquisador com seu objecto no campo e deste enquanto


indivíduo e ser social com o resto do mundo é antes de tudo um relacionamento político. A
história da disciplina está marcada, de um lado, por este aproximar-se do “outro” e até
mesmo colocar-se no seu lugar através da pesquisa participante. De outro lado porém, o texto
antropológico tornou-se o divisor de águas entre pesquisador e pesquisado que devem ser
apresentados como distantes e diferenciados uns dos outros. O critério de verdade na
antropologia fica garantido pela combinação destes dois momentos.

A questão da relatividade cultural que surgiu como resposta ao etnocentrismo colonial, possui
seus limites, que também devem ser pensados frente a natureza universal do homem e na
história dos encontros dos diferentes povos. Esta é uma questão da antropologia que deve ser
melhor discutida no campo da problemática moderna. O relativismo proposto pelo
pensamento antropológico é aquele que nos faz questionar as nossas próprias premissas como
verdades únicas e absolutas, entendendo que existem outras verdades. Acontecimento que se
repete tanto internamente ao nosso mundo como entre mundos diferentes.

Referência bibliográfica

Wielewicki, Vera. 2001. A pesquisa etnográfica como construção discursiva. Acta


Scientiarum. 23(1): 27-32.

O artigo de Wielewicki (2001) tem como objectivo principal de discutir de que modo a
pesquisa etnográfica pode ser vista como uma construção discursiva, procurando defini- lá e
discutir os seus princípios e as formas de avaliação de seus resultados.

A autora apresenta as seguintes questões em relação a etnografia: a questão da representação


– em que medida os achados de pesquisa correspondem a realidade do grupo pesquisado –
revolve as discussões epistemológicas acerca do binómio do verdadeiro/falso. Como provar
que as escavações revelam um templo sagrado? Essas são questões que levaram a severas
críticas da etnografia como: a falta de confiabilidade e que é conduzida irresponsavelmente
por pessoas não treinadas.

A autora explica que a acusação de falta de rigor científico pode ser refutada considerando
que um método não pode descreditar outro só por diferir de suas regras de conduta, que,
entretanto, devem ser conhecidas por quem propõe segui-las. Pois, parece que essas críticas
exigem da etnografia que possa ser mensurada, quantificada e que possa provar a veracidade
dos seus achados a fim de um conhecimento totalizante.

A autora diz que para além dos princípios emic e etic outro princípio da pesquisa etnográfica
é o papel da teoria relativa a preconcepções. Ela ajuda ao pesquisador a decidir que tipos de
evidências poderão responder suas perguntas de pesquisa. Embora guiada pela teoria, a
pesquisa etnográfica não é determinada por ela. Cada situação investigada deve ser
compreendida em seus próprios termos e da perspectiva de seus participantes, segundo o
princípio émic. Neste sentido, o etnógrafo procura primeiro construir uma teoria do local
estudado, e depois, procura generalizar para outras situações, por meio de comparações.

Em conclusão a autora diz que a pesquisa etnográfica pós-moderna se preocupa com o


discurso, verdadeiro em um contexto que não deixa de ser uma versão construída do outro,
mesclada com a visão de si mesmo. Não se pode saber verdadeiramente, mas ficar ciente com
as imagens que são construídas e atribuídas.

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