CEDERJ-Biologia Celular II - Aula
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AULA
A célula apoptóptica
objetivos
Pré-requisito
Para acompanhar melhor esta aula,
você deverá rever as Aulas 13 e 14
de Biologia Celular I (Receptores de
membrana e princípios de sinalização
celular I e II) e também a Aula 1 de
Biologia Celular II
(O ciclo celular).
Biologia Celular II | A célula apoptóptica
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evitar que a infecção se alastre para o restante da população. De uma
maneira altruísta ou defensiva, os microorganismos foram os primeiros
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a utilizar mecanismos de morte celular programada.
Historicamente, a morte celular programada foi descrita no século
XIX por CARL VOGT. Ele observou “destruição celular” no desaparecimento
da notocorda e no surgimento das vértebras em uma espécie de anuro.
Hoje sabemos que esta “destruição celular” é fruto de mecanismos de
morte celular programada. Em 1863, AUGUST WEISMANN, pesquisando CARL VOGT
o desenvolvimento embrionário de moscas, descreveu o processo de (1817-1895)
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permite que ocorra uma abrupta e brutal entrada de água no interior
da célula, resultando em um inchaço da célula e de suas organelas. Com
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a continuidade deste processo, as organelas rompem-se e extravasam
no interior do citoplasma seus constituintes. Como resultado, a célula
começa a sofrer um processo de autodigestão, no qual enzimas estocadas
em organelas específicas como endossomas e lisossomas começam a
degradar os constituintes citoplasmáticos. Esta degradação, somada
à contínua entrada de água, acarreta a ruptura total da membrana
plasmática e o posterior extravasamento dos constituintes citoplasmáticos
no meio extracelular (Figura 13.2). Estes conteúdos internos da célula
RESPOSTA
(que normalmente nunca estão no meio extracelular) induzem a invasão
INFLAMATÓRIA
de células fagocíticas (macrófagos) que irão ativar uma forte RESPOSTA
Resposta imune local de
INFLAMATÓRIA do organismo. um tecido a um dano
ou infecção, causada
Diferentemente da necrose, a apoptose é um tipo de morte geralmente por leucócitos
ou macrófagos, ao
celular altamente organizado, tanto no núcleo quanto no citoplasma. lançarem no local
É também uma morte silenciosa, já que não induz resposta mediadores (como a
histamina) que causam
inflamatória do organismo. Geralmente acomete células isoladas e dor no organismo.
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Imagem: Fernando Real
!
O parasita esperto - a translocação de fosfatidilserina do folheto interno para o folheto
externo da membrana é um importante passo para a eliminação dos corpos apoptóticos,
já que este fosfolipídio no folheto externo “chama a atenção” de macrófagos, que logo
fagocitarão estes corpos. Parasitas do gênero Leishmania, que necessitam viver dentro
de macrófagos para sobreviver e dividir-se, expressam fosfatidilserina na sua superfície
para estimular a sua internalização pelos macrófagos.
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São um tipo de (Figura 13.4.b). A apoptose induzida por estímulo externo ocorre
leucócito responsável principal-mente na interação destes linfócitos com células infectadas
pela resposta imune
adaptativa capaz por vírus. Estas células infectadas expressam em alta quantidade o
de interagir com
células infectadas receptor Fas e, ao serem reconhecidos pelo Fas ligante da superfície
por vírus,
dos linfócitos, entram em apoptose, o que bloqueia o prosseguimento
protozoários ou
bactérias, da infecção viral (Figura 13.4.b).
destruindo-as.
A apoptose também pode ser induzida por estímulos internos.
Nesta via de apoptose, a mitocôndria desempenha um papel essencial,
como veremos adiante. São estímulos internos, além de certas condições
de estresse e dano celular; aqueles que resultam do efeito de radiações,
toxinas e drogas.
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b
a
Ligante de Fas
Fas
Propagação
Modulação por
outros fatores
Ampliação
Divergência para
alvos múltiplos
Apoptose
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Figura 13.5: Na via externa, a proteína adaptadora FADD se liga, por um lado, à
proteína Fas; pelo outro, a uma pró-caspase.
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literalmente irão destruir a célula por dentro. Estas são as caspases,
CASPASES
uma classe de enzimas fundamentais para a apoptose. As caspases são
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E eu tenho isso? Tem
proteases (mais de 12 já foram identificadas) que possuem duas formas: sim, e ao contrário do
que o nome sugere,
uma ativa (caspase) e uma inativa (procaspase). O que diferencia estas elas não são proteínas
“cabeludas”.
formas é a presença de uma região regulatória que precisa ser retirada
O nome caspase vem
para a enzima ficar ativa. Quem retira? Uma outra caspase ativa! Nesta de cysteine-protease
with aspartate
região regulatória estão contidos os domínios que vão se ligar às proteínas specificity, ou seja,
é uma protease que
adaptadoras, como o DED. Veja na Figura 13.6.a como as caspases se possui o aminoácido
ativam. Além de se ativarem umas as outras, as caspases são responsáveis cisteína em seu sítio
ativo, e apresenta a
pela clivagem das proteínas dos componentes do citoplasma e do núcleo capacidade de clivar
proteínas nas regiões
(Figura 13.6.b). que o aminoácido
ácido aspártico.
As caspases atuam
na degradação de
a proteínas, como as
laminas nucleares,
na ativação da
DNAse, (ativando
a degradação do
DNA), de proteínas
citoplasmáticas
e outros eventos
relacionados à morte
celular programada.
Figura 13.6: (a) Ativação das caspases: cada enzima é fabricada como uma proenzima inativa (procaspase) que
será ativada por clivagem feita por outra caspase. Uma caspase ativa é composta por dois fragmentos clivados
da procaspase. (b) Cascata das caspases: uma caspase ativa é capaz de ativar diversas outras caspases, que por
sua vez podem ativar muito mais caspases. Além disso, estas enzimas estarão degradando substratos celulares.
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Figura 13.7: O estímulo externo ativa, via FADD, a caspase 8 que, por sua vez, ativará a caspase 3, ou caspase
efetora. A partir daí, cada caspase é capaz de ativar diversas outras, gerando uma reação em cascata que
se amplifica rapidamente. Além disso, estas enzimas estarão degradando substratos celulares.
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moléculas pró-apoptose – como as proteínas Bax e Bid – que irão
ligar-se às mitocôndrias, inibindo especificamente a Bcl-2, uma
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proteína antiapoptose. Este processo resulta na formação de um poro
na membrana mitocondrial, liberando, no citoplasma, citocromo c e
outras moléculas (Figura 13.8). O citocromo c, um dos transportadores
de elétrons da cadeia respiratória (Aula 27 de Biologia Celular I) irá
se associar a uma proteína adaptadora (Apaf-1) que permitirá sua
ligação a uma procaspase, formando um complexo molecular chamado
apoptossomo, que levará a célula ao fenótipo apoptótico.
Resumimos, em um esquema simplificado (Figura 13.9), as duas
vias possíveis de apoptose.
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Linfócito assassino
Fas ligante
Agregação
Proteína e clivagem de Caspase-8
fas moléculas de ativada
procaspase-8
Proteína
adaptadora
Célula-alvo
Procaspase-8 Cascata de apoptótica
Célula-alvo inativa caspases
Citocromo c no
espaço intermembranas
Proteína
adaptadora (APaf-1)
Caspase-9
Agregação de Apaf-1 ativada
e ligação procaspase-9
Cascata de
caspases
Liberação de Ativação do
citocromo c procaspase-9
e ligação a
Apaf-1
Mitocôndria Procaspase-9
rompida inativa
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• fragmentação nuclear (devido à degradação das laminas
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nucleares)
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• degradação do DNA genômico (resultado da ação de
DNAase)
• fragmentação de pedaços celulares envoltos por membrana
(blebbing), devido à despolimerização de proteínas do
citoesqueleto
• externalização de fosfatidilserina na membrana plasmática
(pela inativação de enzimas que as mantém viradas para o
folheto interno da membrana).
Figura 13.10: A via externa de indução de apoptose converge para ativação da proteína Bid, um dos componentes
da via interna de estimulação.
!
Listamos abaixo algumas das proteínas clivadas na cascata apoptótica:
- GELSOLINA: proteína que se liga a microfilamentos, responsável pela estabilização
destes filamentos.
- FODRINA: proteína que também se liga a microfilamentos, responsável por manter
os feixes de actina paralelos entre si.
- PARP (Poli ADP Ribose Polimerase): enzima responsável por reparar danos causados
no DNA.
- ICAD (inibidor da DNAse ativada por caspases): proteína que inibe o funcionamento
de uma enzima que quebra DNA (a CAD). A fragmentação de DNA causada por esta
enzima é específica, fragmentando DNA em múltiplos de 200 pares de bases.
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No indivíduo adulto, uma grande variedade de tipos celulares sofre
processos de morte celular programada (Figura 13.11).
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•Morte celular no desenvolvimento embrionário.
Dois eventos da vida embrionária estão claramente relacionados
à morte celular: a eliminação de tecidos e órgãos transitórios e o
remodelamento tecidual.
São exemplos clássicos de eliminação de tecidos transitórios por
apoptose a retração da cauda de girinos e a eliminação da membrana
interdigital das patas de mamíferos (Figura 13.11).
No desenvolvimento do sistema nervoso também ocorre morte
celular programada. No cérebro embrionário existe um número
desnecessariamente maior de neurônios. Este excesso é uma maneira
de garantir o sucesso das conexões neuronais. Logo, neurônios que não
se conectarem de maneira apropriada entrarão em apoptose e serão
eliminados. Em certas regiões do cérebro, mais de 80% dos neurônios
morrem desta maneira durante o desenvolvimento embrionário.
Um outro exemplo interessante ocorre nas células fibrosas,
que darão origem ao cristalino dos nossos olhos. Estas células sofrem
apoptose nuclear (apenas o núcleo é destruído), enquanto o citoplasma
permanece intacto. Estas células anucleadas (conhecidas por células
fantasmas) formam o cristalino.
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Em alguns gânglios,
Células epiteliais cerca de 80% dos
precisam morrer para neurônios morrem
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que ocorra a fusão
do palato
Células morrendo
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Mais de 95%
(sombra clara)o
das células
Ao fim da T imaturas
lactação, células morrem ainda
do epitélio no timo
mamário morrem
quando privadas
de hormônio
No homem,
células dos dutos
mullerianos
morrem
Células das
Quando privadas membranas
de hormônio, interdigitais
células da morrem por
próstata morrem apoptose
Figura 13.11: Tipos de células que podem sofrer processos de morte celular programada (à esquerda). Ao centro,
micrografias eletrônicas de varredura da formação dos dedos em uma pata de camundongo. À direita, microscopia
de fluorescência marcando as células apoptóticas.
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RESUMO
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- As enzimas efetoras do fenótipo apoptótico pertencem à família das caspases.
- A renovação dos epitélios, o desaparecimento da cauda dos girinos, a morte
de neurônios que não se conectam corretamente e a eliminação de células
contaminadas por vírus ocorrem por apoptose.
- Outros tipos de morte celular programada são a autofagia, a parapoptose e a
morte celular negra.
EXERCÍCIOS
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8. Qual é a importância das proteínas adaptadoras nas vias de apoptose?
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Nesta aula você viu o quanto é importante para o organismo a morte programada
de suas células. A célula cancerosa, assunto da próxima aula, é um tipo celular
que ignora as vias de morte celular programada. As conseqüências disso, você
bem sabe, são desastrosas.
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