T. de Freiberg - O Ente e A Essência
T. de Freiberg - O Ente e A Essência
T. de Freiberg - O Ente e A Essência
Teodorico de Freiberg
II, capítulo 1
1. Há muitos que dizem e ensinam o contrário do que acabámos de apresentar.
Fazem-no apoiados em argumentos sofísticos que não só os enganam como também
não estão isentos de perigo e constituem uma grave ameaça à verdadeira doutrina.
Na verdade, sustentam que a essência de cada ente criado difere do seu ser por uma
diferença real e que a identidade da essência e do ser é apenas possível na causa
primeira que é Deus.
2. Contudo, os argumentos com que procuram prová-lo não são difíceis de refutar.
O primeiro funda-se no modo de pensar. É o seguinte: “Tudo o que não é da essência
ou da quididade do intelecto, provém de fora da essência e entra em composição com
ela, porque nenhuma essência ou quididade pode ser pensada sem o que constitui
as partes da essência. Ora, toda a essência pode ser pensada sem se pensar nada
do seu ser actual. De fato, posso pensar o que é o Homem ou a Fénix e, todavia,
ignorar se existem na natureza”. Logo, é evidente que, nestes casos, uma coisa é o
ser e outra coisa a essência.
3. Mas este argumento falha no seu fundamento, porque assume que “toda essência
pode ser pensada sem se pensar nada do seu ser actual. De facto, posso pensar o
que é o Homem” etc. Esta suposição é a causa do erro no referido raciocínio.
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mesma coisa, embora pelo modo de um complexo no qual se encontra a verdade
e a falsidade. De onde, não ser inconveniente pensar em algo pelo modo de um
incomplexo sem o pensar pelo modo de um complexo.
7. Contudo, acerca disto, convém notar que um verbo inclui uma certa composição,
que não podemos pensar sem os compostos, conforme diz o Filósofo em A Interpre-
tação. Esta composição, chamada “cópula verbal”, pode-se dar numa locução de
duas maneiras. A primeira, quando tem uma posição absolutamente intermediária
seja pelo fonema seja pela significação. Neste caso, aparece sempre explicitamente
na locução, como em “o Homem é Homem”. É assim que o mesmo enquanto mesmo
é predicado de si mesmo. Neste modo nenhuma proposição é mais verdadeira do
que aquela na qual o mesmo é predicado de si mesmo.
9. Mas tu objectas: não posso pensar Deus sem pensar que Ele tem um ser na
natureza. Respondo: isso não acontece pela força do termo “Deus”, que significa
o seu significado absolutamente, sem implicar cópula verbal na sua significação,
conforme se disse acima.
10. E se achares necessário pensar que Ele tem um ser na natureza, isso acontece
ou em virtude de uma dada experiência ou de algum hábito, como por exemplo o
hábito da fé, ou também o de uma certa conclusão formulada demonstrativamente.
Por causa disso, não podes duvidar de tal verdade e deténs uma certeza infalível.