Transição Do Feudalismo para o Capitalismo

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TRANSIÇÃO DO FEUDALISMO PARA O CAPITALISMO

DO TÍTULO ORIGINAL:

A EVOLUÇÃO

DO CAPITALISMO
MAURICE HEBERT DOBB

(1900-1976)

ZAHAR, 1983. 9ª EDIÇÃO. 284 P.

RESUMO:

HERISSON BARBOSA PEREIRA

Palmeira dos Índios,

21 de julho de 2011.
Transição do feudalismo para o capitalismo.

Ao se empreender uma análise que tencione tratar da


transição do feudalismo para o capitalismo, é imprescindível
apoiar-se numa descrição de termos que norteiem o curso da
discussão e estabeleçam os limites e objetivos a se alcançar. No
entanto, se por um lado, há relativo consenso no uso do termo
feudalismo, por outro lado, o mesmo não pode ser dito do
capitalismo. Alguns os economistas tem usado o termo num sentido
puramente técnico, se referindo ao uso de métodos de produção
indiretos que encurtam o tempo. Outros identificam o capitalismo
com um sistema de empresa individual sem obstáculos, tornando-o
comum sinônimo o de livre concorrência. Contudo, tal tipo de
consideração não confere historicidade alguma ao capitalismo e
muito menos o reconhece como uma categoria histórica.

É possível elencar, a despeito disso, três significados


distintos atribuídos à noção de capitalismo que tem exercido forte
influência na questão. Em primeiro lugar, o significado apontado
por Werner Sombart ao buscar a essência do capitalismo. Segundo
ele, esta essência estaria representada no "Gueist" ou espírito de
empreendimento que inspirou toda uma época. Assim, tais estados
de espírito e de comportamentos humanos conduziriam a existência
das formas e relações econômicas características do mundo
moderno. Em segundo lugar há o significado encontrado
implicitamente no tratamento material histórico empregado pela
Escola Histórica Alemã. Esta identifica o capitalismo com a
organização da produção para um mercado distante. Numa
concepção mais ampla, esta noção define capitalismo como um
"sistema de economia de trocas no qual é o principio orientador da
atividade econômica é o lucro irrestrito" (Nussbaum). Por fim, há o
significado inicialmente conferido por Marx. Para ele, a essência
do capitalismo é um determinado modo de produção. Por modo de
produção, ele não se referia apenas ao estado da técnica, mas a
maneira pela qual se definia a propriedade dos meios de produção e
as relações sociais resultantes dos processos de produção. Em
suma, o capitalismo seria um sistema no qual a concentração dos
meios de produção nas mãos de uma parcela pequena da sociedade
culmina no aparecimento consequente de uma classe destituída de
propriedade, para a qual a venda de sua força de trabalho torna-se
a única fonte de subsistência.

O que diferencia o uso dessa última definição em relação às


demais é que a existência do comércio, empréstimo de dinheiro ou
a existência de uma classe especializada de comerciantes não basta
para constituir uma sociedade capitalista. Ademais, as outras
noções compartilham o defeito de serem insuficientemente
restritivas para confinar termo a qualquer época da História além
de levar a inexorável conclusão de que todos os períodos da
História foram capitalistas, ao menos em certo grau.

Apesar desta primeira observação, é preciso salientar que é


impossível encontrar em quaisquer períodos da história um sistema
em sua forma pura. E no intento de analisar tal transição, deve-se
perceber que o processo de modificação histórica é em sua maior
parte gradual e contínuo. Desta forma ao buscar os estágios iniciais
de desenvolvimento do capitalismo, deve-se considerar apenas o
período em que ocorrem mudanças do modo de produção, no
sentido de uma subordinação direta do produto a um capitalista.
Maurice Dobb sugere, então, dois momentos decisivos na década
finais da era dos Tudor. Um deles está nas transformações sócio-
políticas do século XVI, cujo ápice é a Revolução Cromwelliana,
enquanto o segundo é o da Revolução Industrial no final do século
XVIII e a primeira metade do século XIX. Também é verdade, e de
importância excepcional para a compreensão dessa transição, que a
desintegração modo de produção feudal já alcançara um estágio
adiantado antes do modo de produção capitalista se desenvolver, e
que tal desintegração não prosseguiu em nenhuma ligação íntima
com crescimento do novo modo de produção. Uma burguesia
mercantil cresceu em riqueza e influência, surgindo mais em
parceria do que em antagonismo com a nobreza; a pequena
produção do trabalhador-proprietário conquistou independência
com relação ao feudalismo, mas continuou a ser um elemento
subordinado na sociedade. Assim, os pouco mais de duzentos anos
entre Eduardo III e Elisabete foram certamente de caráter
transitório.

Em conformidade com a noção de capitalismo já admita, é


possível estabelecer o feudalismo como um sistema de produção
onde uma obrigação é imposta ao produtor pela força coercitiva,
seja militar, jurídica ou consuetudinária, para satisfazer certas
exigências econômicas de um senhor. O auge deste sistema foi
caracterizado pelo cultivo da propriedade senhorial, por prestação
de serviços compulsória e a descentralização política. Entretanto, o
modo de produção feudal não se restringia a essa forma clássica. A
posse da terra sob a forma de feudo é uma característica comum,
mas não inviável deste sistema.

Existe pouca ou nenhuma base para suposição de que o


renascimento do comércio tenha ocasionado sozinho à
desintegração do sistema feudal. O crescimento do comércio e dos
mercados urbanos foi a característica do século XIII, quando
ocorria a reação feudal, e não do século XII, quando se encontra a
tendência a comutação pela monetarização. A evidência indica que
a ineficácia do feudalismo modo de produção, somada às
necessidades crescentes de renda por parte da classe dominante foi
fundamental para seu declínio, uma vez que essa necessidade de
renda aumentou a pressão sobre o produtor, chegando a um nível
insuportável. O resultado disto foi a exaustão da produtividade da
terra e à deserção dos vilões das propriedades.

Tendo por certo que o crescimento do mercado exerceu


influência desintegradora sobre a estrutura do feudalismo, além de
preparar caminho para outras que iriam suplanta-lo, a história
dessa influência pode ser identificada com o surgimento das
cidades. Agindo como um imã sobre a população rural,
desempenhou papel poderoso na fase de declínio do sistema feudal.
Todavia, seria errôneo encara-las nesse estágio com microcosmos
do capitalismo, visto que muitas cidades achavam-se subordinadas
à autoridade feudal, devendo certas obrigações a um senhor.

Existem várias teorias sobre a origem dessas comunidades


urbanas. Há quem sustente que as cidades medievais eram
sobrevivências de antigas cidades romanas, mais uma teoria de
continuidade parece manifestadamente inadequada. Há quem
argumente que tiveram origem puramente rural, desenvolvendo-se a
partir do aumento da população. Contudo, não se pode explicar
porque uma comunidade agrícola em sua origem deveria em algum
momento posterior adotar o comércio. Perene, por sua vez, sustenta
que as cidades se originaram de acampamentos das caravanas de
mercadores. Formando inicialmente acampamentos para proteção, o
povoado comercial erigiria mais tarde um muro, e adquirindo
cercas dimensões e influência, receberiam privilégios e proteção
especiais por parte do rei e, por pagamento, até liberdade quanto a
autoridade senhorial e suas imposições, que culminou no agudo
conflito. Outra teoria concebe a cidade como criação da própria
inciativa feudal para seus próprios fins. Assim, ligam-na ao direito
de refúgio, através do qual eram criados abrigos para peregrinos e
fugitivos, onde de logo se formava o mercado. Por fim, há a teoria
da guarnição, que sustenta que cidades eram consideradas bastiões
para ocasiões de emergência, onde senhores mantinham casas e os
habitantes da vizinhança poderiam recolher-se. Em vista do
conhecimento limitado que dispomos, é melhor adotar uma
explicação é eclética.

É preciso evitar o engano de conceber a época feudal como


período em que o comércio houvesse desaparecido por completo e o
uso de dinheiro fosse inteiramente estranho. A maioria das cidades
se originou da iniciativa de alguma instituição feudal, ou de algum
modo, como elemento da sociedade feudal. Daí ser natural que o
controle das cidades e sua fundação fossem tomados como fonte
valiosa de renda feudal adicional. Além disso, fato de os próprios
estabelecimentos feudais se empenharem no comércio e até
alimentarem um mercado local para se surgirem de fonte barata de
provisões foi, evidentemente, um dos motivos pelos quais os
clamores dos burgueses pela autonomia encontraram uma
resistência tão vigorosa.

Já sobre o surgimento da burguesia não é fácil determinar.


Obviamente, nas maiores cidades continentais, além dos burgueses
propriamente ditos, residiam em seu interior algumas das mais
antigas famílias aristocráticas, que representavam um elemento da
sociedade feudal que continuou a existir na nova sociedade urbana.
Estas famílias parecem não apenas ter dominado o governo urbano,
como também ter usado seus privilégios feudais para adquirir
direitos exclusivos no comércio de longa distância. Ao que tudo
indica, os primeiros donos da terra urbana enriquecer vendendo-as
ou arrendando-as por alta taxa, o que constituiu importante fonte
de acumulação de capital nos séculos XIII e XIV. Logo surgiria
uma classe privilegiada de burgueses que, separando-se da
produção, começaram a se empenhar exclusivamente no comércio
atacadista.

Quanto aos motivos da riqueza da burguesia, Maurice Dobb


levanta dois. Primeiro, que boa parte do comércio daquele tempo,
sobretudo o exterior, consistia na exploração de alguma vantagem
política ou em pilhagem declarada, constituindo a acumulação
primitiva. Segundo, que a classe de mercadores adquiriu poderes de
monopólio que lhes protegiam da concorrência e transformávamos
as relações de troca em vantagem própria. O mesmo pode ser dito
das cidades, que possuíam considerável poder de troca em seu
próprio benefício, como as diversas regulamentações das guildas,
destinadas a restringir a concorrência entre os próprios artesãos da
cidade, ou a política do empório, o direito de possuir um mercado
sem temer rival em certa região. Assim, o fomento da burguesia
como classe dominante pode ser ligado à separação de artesãos
mais prósperos da produção e à formação de organizações
exclusivamente comerciais que começaram a monopolizar o começo
atacadista. Consequentemente, essas novas organizações comerciais
passaram a dominar o governo das cidades e a usar seu poder para
aumentar seus próprios privilégios e subordinar os artesãos. Da,
segue-se a formação de uma oligarquia mercantil que controlava as
Guildas artesanais. Com tempo, tornou-se cada vez mais difícil
para qualquer um que não pertencesse a certo círculo de famílias e
se não fosse bastante rico para comprar uma posição na guilda,
estabelecer-se como mestre. Uma característica dessa nova
burguesia mercantil foi a presteza com quem entrou em acordo com
a sociedade feudal, assim que seus privilégios foram conquistados,
sendo muito mais uma força conservadora que revolucionária.

Com o crescente domínio de um elemento puramente


mercantil sobre a massa subordinada de artesãos, a também o
domínio crescente do capital sobre a produção. Surge uma série de
novas indústrias, cuja técnica de produção foi bastante
transformada por inovações. Estas exigiam um capital inicial muito
além da capacidade do artesão comum. Consequentemente, as
empresas eram formadas por homens e iniciativas que se
associavam, começando a empregar trabalho assalariado em escala
considerável. Daí em diante, cresce o interesse no controle da
produção. Surge então um elemento capitalista, meio fabricante,
meio mercador, que começa a subordinar e organizar aquelas
próprias fileiras das quais saíra recentemente. Inicia-se um
processo de elitização das Guildas até que, no final do século XV,
a organização de guildas e a da cidade tina se fundido numa só.
Além disso, é neste período que se inicia também a comutação da
produção doméstica para a fabril. E apesar da manufatura ainda ser
predominante neste período, a posição do artesão já começava a se
aproximar da de um simples assalariado. Portanto, esta
subordinação da produção ao capital e o aparecimento dessa
relação de classe entre o capitalista e o produtor devem ser vistas
como a linha divisória decisiva e o artigo modo de produção e o
novo, mesmo considerando-se a necessidade e influência que
exerceram as alterações técnicas da Revolução Industrial na
transição. Ademais, a produção numa única oficina e a divisão do
trabalho foram a principal vantagem técnica do período e
prepararam terreno para a inserção da maquinaria na fábrica. No
dizer de Hauser: "com o século XVI, a era do capitalismo teve seu
verdadeiro início".

Como condições para o crescimento da produção capitalista


estavam a derrubada do localismo urbano e o enfraquecimento dos
monopólios das guildas artesanais, a necessidade de emancipação
dos monopólios do comércio por parte do capital industrial
nascente e o investimento de capital na agricultura.

A acumulação de capital foi certamente uma etapa essencial


na gênese do capitalismo, e constitui-se em uma concentração, bem
como uma transferência da propriedade dos títulos de riqueza.
Existem duas categorias principais de aumento de propriedade. A
primeira era comprar a propriedade de seus donos anteriores em
troca dois meios de consumo ou desfrute imediato, ou seja,
dinheiro ou bens não duráveis. A segunda era adquirir uma
propriedade quando esta se tornava excepcionalmente barata e
trocá-la mais tarde, quando o valor de mercado de tal propriedade
estivesse relativamente alto, por outras coisas, como força de
trabalho ou equipamento industrial, que estejam num valor
relativamente inferior.

Uma circunstância especial na história da acumulação foi o


aumento rápido de suprimento de metais preciosos, ocorridos no
século XVI, e a inflação de preços dele resultante. Além disso, não
se pode desconsiderar a influência da coleta de impostos e da
usura. O mercantilismo, neste contexto, serviu de meio favorável à
obtenção de vantagens de comércio. O objetivo principal era
expandir as exportações, criando um mercado suplementar para as
mercadorias, no qual os metais constituíam apenas os meios. O
sucesso desta política dependia principalmente do sistema de
comércio colonial, no qual se podia usar a influência política para
garantir ao país metropolitano certo elemento de monopólio.

Tornou-se claro para os que desejavam reproduzir as relações


capitalistas de produção que a pedra fundamental de seus esforços
devia ser a restrição da propriedade da terra à uma minoria e a
exclusão da maioria quanto a qualquer participação na propriedade.
Desta maneira, o surgimento de uma classe proletária dependeu de
um determinado conjunto de circunstâncias históricas peculiares. A
"acumulação primitiva" mostrou-se, dessa feita, como concentração
de propriedade pela ação da pressão econômica e monopólio, usura
ou expropriação real, constituindo um verdadeiro processo
histórico de divorciar o produtor dos meios de produção, e não
produto da frugalidade e abstinência. Não há, portanto, motivo para
falar do proletariado como uma criação natural, se não que
institucional.

Dentre os meios pelos quais surgiu o proletariado, dois se


destacam como principais. O primeiro era o desapossamento de
terras (cercamentos) e o consequente aumento das fazendas com
terras cultiváveis, que criou enorme massa de expropriados, que
através de forte legislação que tornava compulsório o trabalho aos
desempregados e tornava o desemprego uma infração duramente
punível, convertia tal massa em mão de obra reserva. O segundo foi
a crescente diferenciação econômica existente entre produtores,
visto que faltava capital suficiente ao pequeno produtor para
financiar suas operações. Assim, o desaparecimento da terra livre
não é o fato único e não precisa ser tomado como o principal na
criação de uma classe assalariada dependente, pois mesmo onde
existisse terra livre, a dívida e o monopólio roubavam ao pequeno
produtor a sua independência e causavam-lhe finalmente o
desapossamento.

A transformação na estrutura da indústria a que se conferiu o


título de Revolução Industrial foi, em essência, uma mudança do
caráter da produção, na adaptação de uma ferramenta, antes
empunhadas pelo homem a um mecanismo. Tal transformação
mudou radicalmente o processo de produção, exigindo que os
trabalhadores se concentrassem num só lugar de trabalho, impondo
um caráter coletivo ao processo de produção e conformando a
atividade produtiva humana aos ritmos e movimentos do processo
mecânico. Contudo, a rapidez com que a revolução conquistou o
terreno principal da indústria é menor do que geralmente se supõe.

A época da máquina a vapor abriu todo um campo que


investimentos na "diminuição do trabalho humano". O efeito do
aperfeiçoamento técnico foi a tendência a baratear não apenas os
produtos da indústria, mas a própria força de trabalho, pois o
trabalhador absorveria uma proporção menor daquele valor
produzido (o mesmo produto). Bem assim, a construção ferroviária
dominou o século XIX e representou a vantagem inestimável para o
capitalismo de absorver enorme volume de capital.

A Grande Depressão, iniciada em 1873, pode ser encarada


como um divisor de águas entre dois estágios do capitalismo: um
inicial e rigoroso e outro posterior e mais embaçado. O que se
comprovou foi o fato de, embora tiver sido introduzida a
maquinaria poupadora de trabalho, seus resultados para a indústria
não se mostrar o suficientemente grandes para reduzir a demanda
de trabalho de modo a permitir uma redação dos salários
monetários. Cada vez maior foi a simpatia por medidas pelas quais
a concorrência pudesse se restringida. Surgiram os trustes. O
neocolonialismo aparece como alternativa. No fim do século XIX, o
"Novo Sindicalismo" inaugura um momento em que o movimento
sindicalista iria sofrer uma expansão tanto em número como em
poder, se estendendo a operários não qualificados, alcançando o
reconhecimento do Estado e obtendo os primeiros sinais modestos
de um salário mínimo legal.

REFERÊNCIA BIBLIOGRÁFICA
DOBB, Maurice H. A Evolução do Capitalismo. Rio de
J a n e i r o : Z a h a r, 1 9 8 3 . 9 ª e d . 2 8 4 p .

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