História Da Israel
História Da Israel
História Da Israel
FIISTORIA
DE,
ISRAEL
7^ edição, revista e ampliada
a partir da 4 edição original.
Introdução e apêndice
\ürr-lIev P. Bnov¡l
1,: I
ISBN 85_349_2088_5
Título original
A History of Israel
@ Westminster John Knox lress, 2000
rsBN 0-6(4-22068-1
Direção editorial
Paulo Bazaglia
Tradução
Luiz Alexandre Solano Rossi
Eliane Cøualhere Solano Rossi
Editoração
PAULUS
Impressão e acabamento
PAULUS
O PAULUS - 2OO3
.
Rua Francisco Cruz,229 04117-091. São paulo (Brasil)
Fax (11) 5579-3627. Tel (11) 50g4_3066
www.paulus.com.br . [email protected]
ISBN 85-349-2088_.'
=-
264 2. A atiuidade comercial de Salomão 338 B. A LUTA PELA TNDEPENDÊNCrA: EZEQUT AS (71.s-68716)
267 3. A ldade de Ouro de Israel 338 1,. A política de Ezequias e seu significado
483 CAPÍTULO 11
O FIM DO PERÍODO DO ANTIGO TESTAMENTO
Da reforma de Esdras ao início da revolta dos Macabeus
510 CAPÍTULO 12
o JUDAÍSMO NO FrM DO PERÍODO DO ANTTGO TESTAMENTO
510 A. A NATUREZA E O DESENVOLVIMENTO DO JUDAÍSMO
PRIMITIVO
O JUDAíSMO NO FIM DO PERíODO DO ANTIGO TESTAMENTO 521
520 PERíODO DE FORMAçÃO JUDAICA
38,1-15 e Or. Azar), juntamente com o louvor de Deus pelas suas obras de (Ml 2, 4ss.
lei.30 A literatura posterior conhece igualmente as alianças com Levi
criação e providência (Eclo 39,12-35). Característico da piedade pós-exílica 8), com Aarão (Eclo 45,6ss), com Finéias (1,Mc2,54) e, naturalmente, com
era o ideal de mansidão e humildade. O homem piedoso é aquele que, com Abraão e Noé (Eclo 44,1,7-21.).É, pois, evidente uma atenuação do conceito de
submissão e confiança perfeita, aceita a provação que Deus lhe impõe. Tal- aliança.
vez o conceito do "Servo Sofredor" tenha contribuído em muito para for- A própria lei, embora se acreditasse que tinha sido dada por meio de
mar esse ideal.27 Ele é muito forte nos últimos salmos, onde o adorador Moisés, era considerada como algo absoluto e que existia eternamente. Po-
piedoso é "pobre", "necessitado", "humilde", "manso" (Sl 911B; 10r17;2519; dem-se ver alusões a esse modo de pensar na literatura bíblica tardia (por exem-
34,2e 6;37,11;40,1,7;69,32ss etc.), e também na literatura não canônica do plo, Sl 1,1,9,89.1,60) e em Ben Sirac (Eclo 16,26 a17,24); mas o clímax é em
período (Eclo 1,22-30;2,1-11; 3,17-20). Enrreranro, apesar de tudo isso, a Jubileus, onde muitas instituições ordenadas pela lei são colocadas nos tempos
piedade judaica não consistia em última análise em atitudes inrernas, em primitivos. Assim, o Sábado era celebrado pelos anjos e a eleição de Israel
obras de caridade ou no rigoroso cumprimento de deveres religiosos, mas na anunciada na Criação (Jub 2,15-33); a lei levítica da purificação era aplicada
observância da lei; a piedade, as boas obras e o dever religioso se baseavam no caso de Eva (3,8-14); a Festa das Semanas foi celebrada por Noé (6,17ss) e
na lei. A essência da religião era amar a lei e prestar-lhe obediência (Sl 1; a dos Tabernáculos por Abraão (1,6,20-31,), enquanto o ritual sacrifical foi
19,7-14;119; Eclo 2,1,6;39,1-11); a pessoa que assim procedia era chamada ensinado a Isaac por este último (21,1-20) e assim por diante. A lei, assim,
" religiosa ".28
-
aparece como uma coisa eterna, absoluta em autoridade, existindo ântes do
Sinai e antes de Israel. Toda ela escrita em placas celestes (3,1,0;4,5;5,13 etc.).
e. A absolutização da lei.
A elevação da lei que acabamos de descrever
Tudo isso, como aludimos, indica um desligamento da religião do con-
não representavâ, como tentamos esclarecer, nenhurn rompimento com a
texto da história. Não que Israel tenha-se esquecido dos acontecimentos his-
antiga religião de Israel, mas um reagrupamento em torno de uma das suas
tóricos que lhe tinham dado origem! Pelo contrário, ele se lembrava deles e
principais características. À medida que esta característica recebia maior ên-
reafirmava-os ritualmente, como o faz atê. hoje. Mas a lei, separada do seu
fase, dava-se uma diminuição na ênfase às outras e certa mudança na estrutura
contexto original e tornada supra-histórica e absolutamente válida, tornou-
do conjunto. Nota-se, particulârmente, a tendência a libertar a lei do contex-
se menos a definição da obrigação da comunidade com base na aliança histó-
to da forma da aliança na qual ela foi originalmente exarada, e encará-la
rica e mais a base da obrigação e da definição de seu conteúdo. A lei virtual-
como algo que existe eternamente, imutável. Isso representava certo enfraque-
mente usurpou o lugar da aliança histórica como base de fé, ou, antes,
cimento daquele senso vivo de história, tão característico do antigo Israel.2e
tornou-se quase sinônimo dela (2Cr 6,1.1.;F,clo 28,7;1.Mc 2,27.50). Trans-
Na literatura tardia, percebe-se acentuada atenuação da noção de alian-
gredir a lei era quebrar a aliança (por exemplo, 1Mc 1,14ss; Jub 1.5,26);
ça e uma tendência a separá-la da ligação específica com os acontecimentos
conservar a aliança era guardar a lei. Encontra-se até passagens em que a lei
do Êxodo e do Sinai. Já no fundamento sacerdotal do Pentateuco, o rermo
precede à aliança; por exemplo, em Eclo 44,19-21, em que Abraão recebe a
"aliança" não mais se limita a esse acontecimento constitutivo da história de
aliança porque cumpriu a leie lhe foi fiel (cf. 1Mc 2,51,-60). Aqui, a lei dei-
Israel, em cuja base foi dada a lei, sendo usado também com referência a
xou de ser a definição da resposta exigida aos atos misericordiosos de Deus,
vários modos de Deus trâtar com os homens. Para muitos, a aliança é vir-
i tornando-se o meio pelo qual o homem pode conseguir o favor divino e tor-
I tualmente sinônimo das eternas e imutáveis promessas de Deus. Assim,
l
nar-se digno de suas promessas.
I
lemos sobre as alianças eternas com Noé (Gn9,1-17),com Abraão (Gn 17)e
ì Desse fato, resultavam uma profunda seriedade moral e um profundo
com Finéias (Nm 25,11-13). Na narração sacerdotal dos aconrecimentos
I
senso de responsabilidade individual, que ilustram muito bem a fftmeza e o
i do Sinai, a ênfase não está absolutamente na aliança, mas no ato de dar a
I
heroísmo com que os judeus fiéis enfrentaraÌn Antíoco. Cada judeu sentia-se
lr
na obrigação de manter a aliança por sua fidelidade pessoal à lei. Mas daí
I 27Cf
I AIbright, F5ÁÇ pp. 332s. O ideal de humildade não é peculiar a lsrael nem de origem posterior. Mas o seu impacto sobre
I
lsrael parece ser do período pós-exílico.
28Por
exemplq Judite (l '1,'l 7) é "religiosa " claramente porque ela guarda as festaq os jejuns e as regras sobre a alimentaçãq
como a lei exige.
- 30Em
B a aliança deAbraão recebe ênfase; os acontecimentos do sinai representam a renovação e a extensão dela; veja, por
2eCfNoth,op.cl¿,(nora2),pp.85-107;vejatambémG.E.tVtendenhail,
lDB,t,pp.721ss. exemplq W Eichrodt, "lheology of 0ld Testament", Vol. l, 0Il (1961), pp. 56-58.
526 PERíODO DE FORMAçAO JUDATCA O JUDAÍSMO NO FIM DO PERfODO DO ANTIGO TESTAMENTO 527
também resultava grande ênfase na obrigação do homem, com o inevitável a. Fontes de tensão. Tal tensão estava emaizada na estrutura da religião
desvio de atenção da graça divina. Embora jamais tivessem esquecido a glaça de Israel e não era, em essência, nova. De fato, ela se dava entre a fé monoteísta
de Deus e recorressem continuamente à sua misericórdia, na prâtica a reli- e a noção de eleição. Israel sempre acreditou que era um povo peculiar, esco-
gião consistia no cumprimento das exigências da lei. Isso significou que o lhido por lahweh. Ao mesmo tempo, ele tinha concedido a seu Deus por
judaísmo ficou peculiarmente sujeito ao perigo do legalismo: isto é, ao pe- menos sistematicamente que isso se tenha dado um domínio supranacional,
-
rigo de tornar-se uma religião em que a condição do homem diante de Deus -
realmente universal. Além disso, acreditava que essa finalidade era, em últi-
é determinada inteiramente por suas obras. Apesar de ser improvável que ma análise, o estabelecimento triunfal de seu domínio sobre a terra. O fato de
um judeu cordato se vangloriasse de cumprir a lei perfeitamente (cf. Eclo ser esse triunfo concebido como envolvendo a submissão de outras nações
8,5), a retidão por meio da lei (acreditava-se) era uma finalidade atingível (por exemplo, Sl 2,1,0ss; 72,8-1,9) significava que a questão da relação de
e, para conquistá-la, o homem tinha de se empenhar. Também era senti- Israel com o mundo na economia divina teria sido levantada mesmo que a
mento geral que Deus premiaria com seus favores os que eram fiéis nesse religião monoteísta não a tivesse tornado inevitável. Entretanto, apesar de
ponto (crença essa que deveria levantar muitas dúvidas, mais tarde, como ser muito antiga a noção de que a vocação de Israel afetava os povos do
veremos). Acreditava-se até que as boas ações aumentavam o crédito do mundo (Gn 1,2,1,-3 etc.) e embora alguns entendessem que Iahweh guiasse os
homem diante de Deus e constituíam um tesouro de méritos. Embora tam- destinos das outras nações, além de Israel (por exemplo, Am 9,7), e muitos
bém possamos ver alusões a essa crença na literatura bíblica tardia (por até esperassem ainda a conversão dos estrangeiros para a sua religião (1Rs
exemplo, Ne 13,L4. 22.31,), elas são especialmente freqüentes nos escritos 8,41-43),3r na verdade, eles pouco se ocupavam do problema na idade pré-
não canônicos (por exemplo, Tb 4,9; Eclo 3,3ss.14;29,11-1,3;T. Levi 13,5ss). exílica. Israel era uma nação com culto nacional; embora os estrangeiros
Não nos cabe discutir aqui se isso indica uma visão muito otimista das residentes em sua pátria pudessem ser absorvidos (e o foram), não havia ne-
capacidades do homem ou uma compreensão insuficiente da natureza do nhum impulso ativo para fazer proselitismo.
pecado e das exigências da própria lei. Mas certamente indica uma tendên- O exílio, como já dissemos, forçou uma reinterpretação da religião de
cia a externâr a retidão, que o judaísmo, apesar da espiritualidade de seus Israel e uma explicação de sua situação diante das nações do mundo e de seus
grandes mestres, nunca examinou eficientemente. Foi precisamente nesse deuses. Já descrevemos como o Segundo Isaías aclamava o triunfo iminente do
ponto, incidentalmente, que Paulo rompeu radicalmente com a religião de domínio divino, conyidava as nações a aceitá-lo e incitava Israel a ser o teste-
seus pais. munho diante do mundo de que Iahweh era Deus. Embora de rnodo algum ele
tivesse imaginado que Israel fosse perder sua posição eleita, sua mensagem
propagou-se entre os gentios que se encontravam entre o povo de Iahweh, e
B. CARACTERíSTICAS DA TEOLOGIA DO JUDAíSMO PRIMITIVO
assumiu um caráter decisivamente missionário. Esse ideal nobre e sublime,
1. A comunidade judaica e o mundo apesar de ter recebido a aceitação universal, não morreu, mas foi perpetuado
pelos discípulos do grande profeta, como veremos. Mas a restauração não for-
A situação em que os judeus encontraram-se causou inevitavelmente neceu o clima próprio para que ele florescesse. A situação era demasiado de-
problemas que eles nunca tinham sentido antes tão agudamente. E o que salentadora e demasiado terrível para admitir tais larguezas de visão. A comu-
dizia respeito à relação da comunidade com o mundo gentio não era o nidade tinha de lutar por sua identidade como "Israel", contra os povos da
menor deles. Por outro lado, o judaísmo tendia a separar-se do mundo e Samaria e outros residentes na terra cuja pureza religiosa era duvidosa. Um mar
ensimesmar-se, mostrando muitas vezes uma atitude estreita e até intole- de povos pagãos ou semipagãos a circundava, de todos os lados. Tinha-se de se
rante. Contudo, observam-se provas de interesse sincero e profundo pela traçar uma nítida linha divisória para que a pequenina comunidade simplesmen-
salvação das nações, algo parecido com o espírito verdadeiramente missio- te não se dissolvesse no seu ambiente, perdendo seu caráter distintivo, como já
nário tal como o procuraremos em vão no Israel pré-exílico, em que estas
noções estavam, quando muito, latentes. Essa tensão nunca se resolveu sa-
sfEstes
versículos podem pertencer à edição do exílio da obra do Deuteronômio, embora não seja certo. C[ também |s2,2-4 ll
tisfatoriamente. Mq 4,1-4, que não precisam, na minha opiniãq ser considerados como pós-exilicos.
548 PERíODO DE FORMAçÃO JUDATCA EM DrREçÃO À plerurruoe Dos TEMPoS 549
muito agradável a muitos dos melhores judeus, e para muitos positivamente Opostos a estes, estavam sobretudo os fariseus.2 Eles continu aram a tra-
repugnante. Além disso, ela não durou. Loego depois, vieram as legiões ro- dição dos Hasidim dos dias dos macabeus, aquele grupo cujo zelo pela lei não
manas e, com elas, o fim da independência dos judeus. A história conrinuou, admitia compromisso com o helenismo. Embora não fossem de modo algum
mas não para o seu esperado /e/os. nacionalistas militantes, os Hasidim foram levados pelas perseguições selêucidas
a se juntarem na luta pela liberdade religiosa; e quando esta foi alcançada, e a
2. Para onde vai lsrael? Seitas e partidos no judaísmo lutâ tornou-se também uma luta pela independência política, eles perderam o
interesse. Os fariseus, que surgiram como um partido durante o século segun-
Com a luta dos macabeus servindo de catalisador, o judaísmo começou do, foram, como os Hasidim, minuciosos na sua observância da lei. Suas rela-
a firmar-se no século dois e a assumir a forma que teria nos tempos do Novo ções com os reis asmoneus seculares, cuja política eles não podiam aprovar,
Testamento. Contudo, a situação era tal, que levantava com nova intensida- foram quase sempre tensas. Nem grupo aristocrático nem sacerdotal, sua seve-
de a questão sobre qual seria o futuro do judaísmo. Embora essa quesrão ridade moral lhes conquistou respeito geral entre o povo. Com efeito, eles tor-
tivesse sido apenas proposta e discutida de modo abstrato, foi, porém, um naram-se os verdadeiros mentores espirituais do judaísmo, e eram eles que
assunto vital sobre o qual não houve acordo absoluto. O judaísmo não su- davam o seu tom. Embora religiosamente mais severos que os saduceus, eles
portaria ser transformado em outro culto helênico isso era claro. Os ju- eram, em outro sentido, menos conservadores. Não somente aceitavam outras
-
deus permaneceriam um povo à parte, vivendo de acordo com sua lei, confi- partes da Escritura como oficiais, juntamente com a Torá, como também con-
ando em que Deus o vingaria. E como essa vingança viria a concretizar-se e sideravam a lei oral totalmente obrigatória para interpretar a escrita. Foi por
que atitude o judaísmo tomaria nesse intervalo foram questões sobre as quais meio deles que a lei oral foi transmitida e ampliada, até ser finalmente codifica-
as opiniões divergiam. As seitas e os partidos que se estabeleceram nos últi- da no Mishnah (aproximadamente 200 d.C.), e em seguida completada no
mos séculos antes do cristianismo são sintomas desse desacordo. Talmude. Os fariseus aceitaram prontamente a ressurreição e outras novas
Havia, naturalmente, os saduceus. Eles tiravam sua força da aristo- doutrinas semelhantes. Eles acreditavam que o futuro do judaísmo era ser o
cracia sacerdotal e da nobreza secular a eles associadas povo santo de Deus, por meio da observância da lei, escrita e orâ1, até os
- exatamente as
classes que, nos dias selêucidas, foram mais atingidas pelo helenismo. Em mínimos detalhes; os judeus podiam, assim, esperar o cumprimento das pro-
certo sentido, podiam afirmar que eram conservadores, porque só conce- messas, que viria no tempo de Deus. Embora sofressem sob o domínio roma-
diam autoridade à Torá, e nenhuma ao corpo da lei oral explicada pelos no, os fariseus eram em geral contrários a atividades revolucionárias, como
escribas. Eles também rejeitavam noções novas, como a crença na ressur- eram as fantasias excêntricas dos apocalípticos.
reição, as recompensas e castigos depois da morte, a demonologia e a an- Havia, naturalmente, aqueles que achavam que o futuro do judaísmo
geologia e as especulações apocalípticâs em geral. É provável que sua maior estava num nacionalismo agressivo. As pessoas desta opinião foram a espi-
preocupação fosse que o culto do templo e a lei continuassem, especialmen- nha dorsal da revolta dos Macabeus, aqueles que levaram mais longe uma
te que seus rituais e características sacrificais fossem observados sob a su- mera luta pela liberdade religiosa, transformando-a em uma guerra em gran-
pervisão do sacerdócio constituído. Como quer que eles pensassem que fos- de escala pela independência nacional. O estabelecimento e a ampliação do
sem os desígnios de Deus sobre Israel, a sua finalidade no presente era que Estado asmoneu sob João Hircano e seus sucessores, sem dúvida, satisfize-
este status quo fosse mantido. Sendo homens práticos do mundo, eles não ram suas ambições e fizeram com que se acalmasse no momento o naciona-
recuavam diante de compromissos para consegui-lo, prontos a cooperar lismo militante. Mas a chegada da ocupação romanâ, que foi uma coisa ter-
com soberanos seculares, fossem eles os reis-sacerdotes asmoneus, a divi- rível e humilhante para os judeus patriotas, transformou'as centelhas, uma
são mundana, fossem os procuradores romanos, temendo acima de todas vez mais, em chamas. Na época do Novo Testamento, surgiu um partido de
as coisas qualquer distúrbio que pudesse alterar o equilíbrio por isso é zelotas, fanaticamente zelosos e cruéis, que estavam preparados para comba-
-
que julgaram Jesus perigoso. Com efeito, para eles, o futuro do judaísmo
era continuar como uma comunidade de culto hierocrático, sob a lei do
2Cf especialmente L. Finkelstein, The Pharisees,Ihe Jewish Publication Society of America, 2 vols., 2." ed. 1 940; veja também as
Pentateuco. obras citadas no cap, 1 2, nota l.
550 PERÍODO DE FORMAçÃO JUDATCA ptrrulruor Dos TEMPOS
EM DrREçÃO À
551
ter pela independência contra tudo e contra todos, esperando que Deus vies-
sões dentro da estrutura de uma religião seguida em comum, e as linhas divisó-
se em seu socorro.3 Flomens como estes precipitaram as revoltas de 66-70 e
rias entre elas não eram sempre nítidas e firmes. Tirando os negligentes e os
132-135 d.C., que puseram fim à comunidade judaica. Em sua atirude para
apóstâtas, todos os judeus prestavam obediência à lei. E, à exceção dos saduceus,
com a lei, os zelotâs provavelmente pouco diferiam dos fariseus; mas não
que eram mais mundanos, todos tinham esperanças escatológicas e aspirações
estavam dispostos a ver o futuro de sua nação como um futuro de mera
nacionalistas. As diferenças estavam na interpretação da lei, no grau de ênfase
obediência à lei e de esperança.
dada à escatologia e na maneira em que se pensava que a esperança futura da
Finalmente, havia grupos sectários, como os essênios, que viviam em ten-
nação viria a se concretizar.Por exemplo, os essênios, embora entendendo a lei
são escatológica, esperando uma consumação iminente. A seita de Qumran, da
diferentemente, eram tão severos na sua observância quanto os fariseus. E es-
qual vieram os manuscritos do mar Morto, era quase certamente essênia. Não é
tavam sempre preparados, como os zelotas, para combater pelo Deus de Israel
nossa intenção discutir esse assunto aqui.a Como os fariseus, os essênios prova-
quando soasse a hora e realmente combateram em 66-70 d.C. Embora ge-
velmente continuaram a tradição hassídica. A sua oposição aos reis-sacerdotes -
râlmente fossem cautelosos em fantasias apocalípticas e entusiasmos messiânicos,
asmoneus, contudo, era irreconciliável. Parece que eles tiraram sua força dos
os fariseus também esperavam a restauração nacional; alguns deles estavam
membros do sacerdócio saduceu, e atraíram os elementos das tendências
preparados para combater por essa restaurâção como o grande Akiba, quando
apocalípticas a eles associadas, que consideravam o sacerdócio asmoneu como
(em 132-135) aclamou Bar-Cochba como Messias. Entretanto, as divisões aci-
ilegítimo e apóstata. Provavelmente no último terço do século segundo, eles se
ma, embora não devam ser exageradas' uma vez que se davam dentro da estru-
retiram da oposição a Jerusalém e da participação no culto do templo, refugian-
tura de uma comunidade religiosa bem definida, são um indício de que os
do-se no deserto da Judéia, onde levaram uma existência quase monástica, em
judeus não estavam de acordo com respeito ao que Israel deveria ser e qual
preparação para o fim iminente. Foi naturalmente entre os essênios que a tradi-
seria a direção que tomaria o seu futuro.
ção apocalÍptica judaica foi levada adianre, sendo produzida grande parre de sua
literatura. Eles se consideravam como o povo da Nova Aliança. Tinham a sua
própria interpretação da lei, seu calendário próprio e se comprometiam a uma 3. O destin o da história de lsrael: a resposta do iudaísmo
disciplina rigorosa, que prâticavam com toda severidade. Esperavam o fim imi- e a af¡rmação crístã
nente do drama da história, o começo da luta final entre a luz e as trevas, Deus e
Para onde então se encaminha a história de Israel? Finalmente, o juda-
o mal que envolveria
- participar. também uma guerrâ santa sobre a terra, da qual eles ísmo deu a única resposta possível a esta pergunta, e as outras respostas
esperavam Convencidos de que todas as profecias estavam sendo cum-
mostraram-se insustentáveis. Quanto à resposta dos saduceus, não era real-
pridas nos seus dias, eles começaram a mostrar que isso era verdade com alguns
mente uma resposta, porque não dava ao judaísmo nenhum futuro. Era uma
livros da Bíblia. A importância da crença essênia para a compreensão do pensa-
tentativa de preservar um status quo; com o firn daquele status quo, os
mento do Novo Testamento é assunto que tem valor em si mesmo.s
saduceus deixaram de existir, e sua resposta de ter qualquer importância.
Não se deve imaginar naturalmente,que o judaísmo estava em processo
Tampouco o nacionalismo militante trouxe uma resposta. Pelo contrário' ele
de divisão em grupos de apocalípticos, nacionalistas e legalistas. Havia divi-
produziu a destruição nacional e foi forçosamente desprezado, pâssando a
existir somente como um sonho. E o apocalipticismo também não abriu ca-
rsobre os zelotas
como perpetuadores do espírito dos macabeul cf W R. Farme¡ Maccabees, Zealots and losephus, Columbia minho para o futuro. A esperança apocalíptica simplesmente não chegou a se
realizar;um drama tão estranho nunca seria representado no palco da histó-
University Prest 1956.
4A
lileratura importante é vaslíssima; cf C. Burchard, Bibliographie zu den Handschriften vom f oten Meer (Yol.l, 1957; Vol. ll,
I 965 IBZAW 76, 891) para uma lisla até a data da publicação desta obra. Especialmente útil é J. A. F¡tzmyer, fhe Dead Sea Scrolls: ria do mundo. O judaísmo não encontrou o seu futuro como uma comunida-
Maior Publications and fools for Study(Missoula, [/ont.: Scholars Prest 1975). Sobre a arqueologia de Qumran, cf R. de Vaux,
Archaeology and the Dead iea Scrolls (trad. ingl. Londres: Oxford University Prest 1 973). Talvez a melhor fonte para o leitor seja F. de escatológica. O único caminho realmente tomado foi o único que sobrou:
o apontado pelos fariseus, o único que leva ao judaísmo normativo, a Mishnah
M. Cross, The Ancient Library of Qunran (ed. ver., Doubleda¡ I 96 1 ). Para uma breve história dos essênio1 cf. L. Murphy-0'Connor,
"The Essenes in Palestine' (8,4, XL, 1 977, pp. 1 00- i 24). Dos muitos manua is disponíveis, G. Vermel The Dead Sea Scròlls
Qumran
in Perspective(Londres: Collint 1977), é altamente recomendável.
s(l inter alia Cross, op. c/t, cap. V; K. Ste ndahl, e ao Talmude. A história de Israel continuaria na história do povo judeu, um
ed., The Scrolls and the New Testanen¿ Harper & Erotherl New York, I 957; SCM
Press, Londrel 1958; M. Black, lhe Scrolls and Ch¡istian Orþins, Nelson, 1961; iden, ed.,lhe Scrolls and Christianrty, SPCK, Londreg povo escolhido pelo Deus de Israel para viver sob sua lei até a última geração
da humanidade. Para os judeus, portanto, a teologia do Antigo Testamento
1969.