03 - Direito Sistêmico - Cap. 01
03 - Direito Sistêmico - Cap. 01
03 - Direito Sistêmico - Cap. 01
A Constelação Familiar pode ser definida como um método criado por Bert
Hellinger (psicoterapeuta alemão), no qual se criam "esculturas vivas”,
reconstruindo a árvore genealógica de um determinado indivíduo,
permitindo localizar e remover bloqueios do fluxo amoroso de qualquer
geração ou membro da família.
Essa técnica, há muito utilizada para tornar visível o conflito que se oculta
nas relações familiares, vem sendo aplicada, com bastante êxito, na
pacificação das demandas judiciais.
A Constelação Familiar, pode-se afirmar, possui sua base na terapia
sistêmico-fenomenológica, a partir das três Leis Sistêmicas ou Ordens do
Amor de Bert Hellinger, assim conhecidas; Pertencimento, Equilíbrio e
Ordem.
O movimento que abraçou as Leis Sistêmicas no Poder Judiciário, e que
passou a ser conhecido como Direito Sistêmico, é um novo paradigma para
a ciência jurídica, trazendo uma nova forma de perceber os vínculos entre os
indivíduos e grupos tutelados pelo Direito.
Fabiano Oldoni é doutorando pela Universidade do Minho-Portugal, com
linha de pesquisa nos Métodos Alternativos de Solução e Prevenção de
Conflitos Penais, Professor e Advogado.
Prefácio
Jaqueline Cherulli
DIREITO
SISTÊMICO
Aplicação das Leis Sistêmicas de Bert Hellinger ao
Direito de Família e ao Direito Penal
1ª Edição
2017
Copyright ©2017
Fabiano Oldoni, Márcia Sarubbi Lippmann e Maria Fernanda Gugelmin
Girardi.
CDD 340
0144d Oldoni, Fabiano
Direito Sistêmico: aplicação das leis sistêmicas de Bert Hellinger ao Direito de Família e
ao Direito Penal / Fabiano Oldoni, Márcia Sarubbi Lippmann , Maria Fernanda Gugelmin
Girardi. Joinville, SC : Manuscritos Editora, 2017.
152 p.; 21 cm
ISBN: 978-85-92791-11-7
1. Direito Sistêmico - Legislação. 2. Direito Sistêmico - Constelação familiar. 3. Direito de
Família. 4. Direito Penal. 5. Bert Hellinger -Leis sistêmicas. I. Lippmann, Márcia Sarubbi.
ll. Girardi, Maria Fernanda Gugelmin. III. Título.
www.manuscritoseditora.com
Por trás de mim estão todos os meus ancestrais, me dando força.
A vida passou através deles até chegar a mim.
E em sua honra a viverei plenamente.
(Bert Hellinger)
APRESENTAÇÃO
O Direito Sistêmico, por ser um tema bastante atual e muito abordado nos
meios jurídicos e fora dele, tem despertado sentimentos diversos, como
curiosidade e crítica, aceitação como modo de vida ou nova postura
jurídica e desprezo por seus preceitos teóricos.
Tradicionalmente o novo assusta e fascina, porém também nos tira de uma
posição de conforto, nos fazendo dar um passo à frente, além de motivar
inúmeros questionamentos, tais como: O que é o Direito Sistêmico? Para
que ele serve? Qual é a relação do Direito Sistêmico com as Constelações
Familiares? O Direito Sistêmico é eficaz na prevenção ou transformação
de conflitos judiciais e extrajudiciais?
Esta obra jurídica, pioneira no tema, procura apresentar respostas
preliminares às indagações acima, permitindo que o leitor, ao término de
sua leitura, reúna um mínimo de informações hábeis a lhe proporcionar
uma noção preliminar sobre o Direito Sistêmico.
Relacionamentos e conflitos são eventos que sempre acompanharam a
vivência humana, ou seja, pessoas se relacionam e, naturalmente,
conflitos surgem, seja na esfera familiar, pessoal, profissional, dentre
inúmeras outras.
Nos tempos atuais - onde a tecnologia, a informação e a imagem circulam
no mundo inteiro, tão rápido quanto uma faísca, tornando as relações cada
vez mais impessoais - nos deparamos com um cenário voltado à formação
de conflitos e um evidente despreparo em se lidar com eles.
Porém, mais importante do que identificá-los é analisar e navegar pelo
fecundo mar dos métodos de transformação de conflitos, de modo a
empoderar o indivíduo, que deixa de ser um mero espectador do teatro da
vida - e de seu conflito - e passa a ter um papel de protagonista nesse
processo.
O Direito Sistêmico, assim, se consubstancia em um dos vários métodos
eficazes a serem utilizados para a prevenção e transformação conflitual,
aplicável no âmbito judicial e extrajudicial.
Baseia-se, fundamentalmente, nas Ordens do Amor de Bert Hellinger,
cuja teoria aduz, em síntese, ser o amor o sentimento mais nobre e
construtivo das relações humanas.
Entretanto, a existência de amor nos relacionamentos (pessoais, paterno -
filiais, conjugais, profissionais, etc.) não significa ausência de conflitos,
a não ser que, além do amor, sejam obedecidas algumas regras ou leis que
lhe são inerentes, como a Lei do Pertencimento, a Lei da Hierarquia e a
Lei do Equilíbrio.
A utilização das Constelações Familiares e de todo o arcabouço teórico
do Direito Sistêmico, extrapola a esfera do Direito de Família e perpassa,
eficazmente, o Direito Penal, Empresarial, Trabalhista, Sucessório,
dentre outros, pois é uma ciência da vida, aplicável a todas às suas
facetas.
Uma vez que o Construtor do Direito compreenda e interiorize as Leis do
Amor de Bert Hellinger, enxergará o antigo Direito, o direito “de
sempre”, com novos matizes e, encantado com esta nova visão, encontrará
inspiração e terreno fértil para semear paz onde há discórdia, esperança
onde só existe desespero, atuando, assim, de forma eficaz para a
transformação social.
PREFÁCIO
O convite que recebi de Fabiano Oldoni, Márcia Sarubbi Lippmann e Maria
Fernanda Gugelmin Girardi encheu-me de contentamento ao saber que agora
temos uma obra que traduz o primeiro olhar dos construtores do Direito, a
partir da inusitada apropriação e aplicação que Sami Storch, pioneiramente,
fez no mundo e pelo mundo jurídico, acerca do tema Direito Sistêmico.
Os autores respondem a muitos questionamentos que surgem na incursão
pela nova ciência apresentada. Acolher o Direito e as leis positivadas é a
proposta inicial para que o leitor possa dar um lugar ao Direito Sistêmico e
suas leis e princípios. Aceitar o modelo brasileiro de Justiça e Poder
Judiciário possibilitará o trabalho com o novo, que não se arroga no direito
de ocupar o que veio antes, mas sim, complementar e mostrar soluções a
gargalos que frustram e, por vezes, desacreditam o Poder e a instituição.
O cuidado com a pesquisa e relato histórico é outra importante característica
da obra que socorre o meio acadêmico ávido pela catalogação aqui
disponível. O enfoque da aplicação das leis sistêmicas no Direito de Família,
no Direito Penal e juvenil é alento para a comunidade jurídica que
diuturnamente se movimenta na busca de caminhos que possam trazer
respostas “pacificadoras”. Isso se reflete em quebra de repetições de padrões
comportamentais e índices de reincidências, além da aceitação das decisões
e sentenças judiciais, pois repito, o Direito Sistêmico não veio para excluir
o modelo preexistente de Direito, tampouco para enfraquecê-lo. O Sistêmico
busca humanização, pacificação, inclusão e solução.
O conteúdo aqui disponibilizado ainda traz “cases” que convidam a reflexões
inspiradoras de profissionais que já atravessaram os mesmos caminhos que
trilhamos em nossa rotineira solidão, quer seja prolatando sentenças,
decisões, pareceres, petições, laudos, relatórios, atestados ou informações -
são luzes encorajadoras para um novo tempo que chegou e já tem histórias
positivas para contar!
O sábio concorda com o mundo tal como é,
sem temor e sem intenção.
Está reconciliado com e efemeridade
e não almeja além daquilo que se dissipa com a morte.
Conserva a orientação, porque está em harmonia,
e somente interfere o quanto a corrente da vida o exige.
Pode diferenciar entre:
é possível ou não, porque não tem intenções.
A sabedoria é o fruto de uma longa disciplina e exercício,
mas aquele que a possui, possui sem esforço.
Ela está sempre no caminho e chega à meta,
não porque procura.
Mas porque cresce.
(Bert Hellinger, Sabedoria)
Caros leitores, que a leitura e o uso deste livro seja resposta e solução,
proporcionando paz e leveza.
JAQUELINE CHERULLI
(AGOSTO DE 2017)
Sumário
DIREITO SISTÊMICO .......................................................................................................4
Aplicação das Leis Sistêmicas de Bert Hellinger ao Direito de Família e ao Direito Penal 4
APRESENTAÇÃO ............................................................................................................6
PREFÁCIO .........................................................................................................................7
CAPÍTULO 1 ...................................................................................................................11
FUNDAMENTO DAS CONSTELAÇÕES FAMILIARES OU SISTÊMICAS .......11
1.1 DEFINIÇÃO ......................................................................................11
1.2 CIÊNCIA OU MÉTODO .................................................................12
1.3 BERT HELLINGER, O CRIADOR DAS CONSTELAÇÕES FAMILIARES ..13
1.4 AS BASES DA CONSTELAÇÃO FAMILIAR ............................16
1.4.1 A Perspectiva Sistêmica ..................................................................17
1.4.2 Perspectiva Fenomenológica ...........................................................18
1.5 O MÉTODO DA CONSTELAÇÃO FAMILIAR ..................................................19
1.6 ORDENS OU LEIS SISTÊMICAS DE BERT HELLINGER .....23
1.7 DIREITO SISTÊMICO ....................................................................26
1.7.1 Definição ............................................................................................27
1.7.2 Resolução n° 125 do Conselho Nacional de Justiça - A Construção
de um Cenário Pacificador e Humanizado pelo Poder Judiciário .............................28
1.8 DIREITO SISTÊMICO E O CONSTRUTOR JURÍDICO ...................................29
1.8.1 Advocacia Sistêmica ........................................................................30
1.8.2 A OAB e as Comissões de Direito Sistêmico ............................... 32
1.8.3 As Constelações Familiares e o Poder Judiciário .........................34
1.8.4 Projetos de Constelação Familiar Implementados pelo Poder
Judiciário 37
CAPÍTULO 2 ...................................................................................................................41
APLICAÇÃO DAS LEIS SISTÊMICAS AO DIREITO DE FAMÍLIA ...................41
2.1 A TEORIA DE BERT HELLINGER NA CONSTRUÇÃO DE UM
DIREITO SISTÊMICO ...................................................................................................41
2.2 APLICAÇÃO DAS ORDENS DO AMOR NO DIREITO DE FAMÍLIA .........44
2.3 INSTITUTOS DO DIREITO DE FAMÍLIA SOB A ÓTICA DO
DIREITO SISTÊMICO ...................................................................................................48
2.3.1 A União Conjugal .............................................................................48
2.3.2 A Dissolução Conjugal ....................................................................51
2.3.3 A Situação dos Filhos Menores após a Dissolução Conjugal ..........................54
2.3.4 A Alienação Parental ........................................................................57
2.3.5 A Adoção ................................................................................................................61
2.4 DIREITO SISTÊMICO E A ATUAÇÃO DO CONSTRUTOR
JURÍDICO 66
CAPÍTULO 3 ...................................................................................................................69
DIREITO PENAL SISTÊMICO ....................................................................................69
3.1 FUNCIONAMENTO DA JUSTIÇA PENAL ................................ 71
3.2 LEIS SISTÊMICAS APLICADAS À JUSTIÇA PENAL ............74
3.2.1 Precedência (Hierarquia) ......................................................................................74
3.2.2 Pertencimento ....................................................................................76
3.2.3 Equilíbrio ...........................................................................................79
3.3 CONSTELAÇÃO FAMILIAR NO PROCESSO PENAL ............82
3.4 APLICAÇÃO DA CONSTELAÇÃO FAMILIAR NA
EXECUÇÃO PENAL ......................................................................................................87
BIBLIOGRAFIA .............................................................................................................96
CURSO OFERECIDO PELO NÚCLEO DE DIREITO SISTÊMICO - NDS ........102
CAPÍTULO 1
FUNDAMENTO DAS CONSTELAÇÕES FAMILIARES OU
SISTÊMICAS
1.1 DEFINIÇÃO
As constelações familiares podem ser definidas como um método
criado por Bert Hellinger (psicoterapeuta alemão), no qual se cria
"esculturas vias”, reconstruindo a árvore genealógica de um
determinado indivíduo, o que permite localizar e remover bloqueios
do fluxo amoroso de qualquer geração ou membro da família.
Trotta e Bezerra definem a Constelação Familiar como sendo:
Uma abordagem terapêutica criada pelo alemão Bert Hellinger a
partir de muitos anos de observação de fenômenos que ocorriam em
grupos terapêuticos que ele coordenava. O trabalho não se baseia em
alguma teoria psicológica previamente estabelecida. Foram as
observações e experimentações práticas que geraram a teoria e não o
inverso. Por isto, Hellinger o define como um trabalho de cunho
fenomenológico e sua fundamentação é principalmente antropológica,
filosófica e humanística. 1
Lima e Mendes concebem a Constelação Familiar como um método
psicoterápico que tem a função de estudar as emoções e energias do
plano consciente e inconsciente, por meio de uma abordagem
sistêmica, nesse aspecto:
A terapia criada por Bert Hellinger é um método psicoterápico que
estuda as emoções e energias que, consciente e inconscientemente,
acumulamos, com uma abordagem sistêmica, ou seja, compreendendo
todos os fatores que pertencem ao nosso sistema familiar ou campo
1
TROTTA, Ernani Eduardo; BEZERRA, Juliana Lima. Constelações Familiares e seu emprego em
psicoterapia corporal. In: ENCONTRO PARANAENSE, CONGRESSO BRASILEIRO DE
PSICOTERAPIAS CORPORAIS, XIV. IX,2009. Anais. Curitiba; Centro Reichiano, 2009. p. 2.
Disponível em http://www.centroreichia-
no.com.br/artigos/Anais%202009/TROTTA,%20Ernani%20Eduardo;%20BEZER-
RA,%20Juliana%20-%20Constelações%20familiares.pdf.
familiar. 2
Já Amilton Plácido da Rosa define as constelações familiares como
uma maneira de acessar o campo morfogenético de um indivíduo:
A Constelação Familiar na melhor tentativa de explicá -la
cientificamente, é uma das formas de acessar o campo energético -
informacional familiar de uma pessoa, campo esse que Rupert
Sheldrake chamou de campo morfogenético, onde estão, no caso, todas
informações daquela família. 3
As constelações familiares podem, então, ser definidas como sendo um
método baseado na terapia sistêmica que indaga sobre as relações não
aparentes que vinculam umas pessoas à própria família.
1.2 CIÊNCIA OU MÉTODO
O Hellinger Institute posiciona a Constelação Familiar como uma
ciência universal, Hellinger sciencia®, trazendo sua cientificidade da
ciência universal das ordens - e até mesmo das leis - que são
encontradas em todas as conexões e interações humanas. Assim, em
primeiro lugar, as ordens se aplicam aos relacionamentos dentro da
família, o que significa a relação entre homem e mulher, entre pais e
filhos, incluindo sua educação. E essa ciência abrange as ordens em
nossa vida profissional, em organizações e instituições, e se estende às
ordens entre grupos maiores, como povos e culturas.
Concomitantemente, é uma ciência universal dos descompassos, os
quais geram os conflitos nas relações humanas e que separam as
pessoas em vez de reuni-las. Essas ordens e distúrbios também são
transmitidos ao corpo, desempenhando um papel importante nas
doenças e na saúde do corpo, da alma e da mente.
Abordam-se, no presente livro, as constelações familiares, segundo
Bert Hellinger, como método, adotando a definição colhida da lição de
2
MENDES, Ana Tarna dos Santos e LIMA, Gabriela Nascimento. O que vem a ser Direito Sistêmico.
Disponível em http://emporiododireito.com.br/tag/direito-siste- mico/. Acesso em 18 de julho de
2017.
3
ROSA, Amilton Plácido da. Direito Sistêmico: AJustiça Curativa de soluções profundas e
duradouras. Revista MPE Especial, ano 2, edição I I, janeiro/2014, p. 50-57.
Cervo e Bervian, 4 segundo os quais, método é o "conjunto de processos
que o espírito humano deve empregar na investigação e demonstração
da verdade”. Eis que, nesse compasso, as constelações nos mostram a
verdade, a verdade que vem da alma.
Nesse mesmo sentido, Guedes se posiciona: "Bert Hellinger, ao
desenvolver o método das Constelações Familiares, despertou para
uma visão inédita da realidade humana, enquanto indivíduo e enquanto
coletividade".
Diferente não é o posicionamento de Schneider:
O que há de extraordinário nas constelações familiares é
primeiramente o próprio método. É singular e fascinante observar
quando um cliente coloca em cena pessoas estranhas para representar
seus familiares em suas relações recíprocas, como essas pessoas, sem
prévias informações, vivenciam sentimentos e usam palavras
semelhantes às deles e, eventualmente, até mesmo reproduzem os seus
sintomas. 5
Salienta-se que não se está aqui, refutando o posicionamento adotado
por Hellinger, mas apenas trazendo uma delimitação teórico-científica
para o leitor da presente obra.
1.3 BERT HELLINGER, O CRIADOR DAS CONSTELAÇÕES
FAMILIARES
Para se compreender adequadamente as constelações familiares é
necessário que se conheça um pouco o perfil de seu criador:
Inicialmente, a própria pessoa de Bert Hellinger nos fascina. Muitos
experimentaram pessoalmente a sua ajuda em suas necessidades.
Vivenciam nele força e sabedoria, uma profunda sensibilidade para as
dinâmicas e leis dos relacionamentos, bem como para os efeitos
anímicos da ação, seu desassombro na investigação dos destinos
humanos e sua coragem em expor-se, com as possibilidades e os
4
CERVO, A.L. e BERVIAN, P.A. Metodologia Científica: para uso dos estudantes universitários.
3a Edição. São Paulo: McGraw Hill do Brasil, 1983. p. 125.
5
SCHNEIDER, Jakob Robert. A prática das constelações familiares. Patos de Minas: Atman, 2007.
p. 10.
limites de sua atuação. 6
Anton "Suitbert” Hellinger, nascido na Alemanha, em 18 de dezembro
de 1925, é um ex-sacerdote e missionário dos Zulus, que atuou na
África do Sul por 16 anos, exercendo as funções de educador ,
psicanalista, terapeuta corporal, terapeuta de dinâmica de grupo e
também como terapeuta familiar Seu método é fruto de sua vida e da
sabedoria conquistada na realização de seu trabalho.
As constelações familiares, que se tornaram a marca registrada da
abordagem de Hellinger bem como suas observações sobre o
emaranhamento sistêmico e a resolução, tocaram a vida de milhares de
pessoas e transformaram muitos profissionais, desde psicólogos a
terapeutas holísticos, pois as constelações não se encontram apenas
circunscritas no campo da psicologia, sendo um caminho a ser seguido
por aqueles que se sentirem chamados.
Bert Hellinger escreveu 83 livros, que foram traduzidos para 30
idiomas, frutos de uma longa jornada que ainda está em construção.
Seu trabalho está documentado em muitos CDs, DVD’s, e-books e
inúmeros vídeos disponíveis na internet.
Hellinger diz que seus pais e sua casa de infância foram uma grande
influência em seu trabalho posterior Sua forma particular de fé
imunizava a família contra a crença nas distorções do nacional -
socialismo. Por causa das repetidas ausências de Hellinger nas
reuniões da Organização da Juventude Hitlerista e sua participação em
uma organização juvenil católica ilegal, fez com que fosse
classificado, pela Gestapo, como “Suspeitado de Ser um Inimigo do
Povo”. Ciente do destino que lhe aguardava, com apenas 17 anos se
tornou um soldado, experimentou as realidades de combate, captura,
derrota e vida em um campo de prisioneiros de guerra na Bélgica com
os aliados.
A segunda grande influência foi certamente o sacerdócio. Aos 20 anos
ingressou em uma ordem religiosa católica e começou o longo
processo de purificação do corpo, mente e espírito em silêncio, estudo,
6
SCHNEIDER, Jakob Robert. A prática das constelações familiares. Patos de Minas: Atman, 2007.
p. 9.
contemplação e meditação. Passou 16 anos na África do Sul como
missionário junto a tribos Zulus, uma experiência que teve efeito
profundo em seu trabalho posterior Lá dirigiu uma grande escola,
ensinou e foi pároco simultaneamente. O processo de deixar uma
cultura para viver em outra, agudizou sua consciência da relatividade
de muitos valores culturais.
A participação de Hellinger em treinamentos inter-racial, ecumênico e
em dinâmicas de grupo, lideradas pelo clero anglicano, também foi
extremamente importante para a construção de seu método, pois
percebeu uma maneira de trabalhar com grupos que valorizava o
diálogo, a fenomenologia e a experiência humana individual. Sua
decisão de deixar a ordem religiosa, após 25 anos, veio com a
constatação de que ser padre não era mais uma expressão apropriada
para seu crescimento interno.
A psicanálise e a psicoterapia foram sua terceira grande influência.
Várias escolas terapêuticas deixaram marcas em seu trabalho, além da
orientação fenomenológica- dialógica, da dinâmica de grupo dos
anglicanos, a necessidade fundamental do ser humano estar alinhado
com as forças da natureza que ele aprendeu com os anglicanos e os
zulus no sul da África, a psicanálise que aprendeu em Viena e o
trabalho corporal que aprendeu na América.
Estudou terapia familiar com Ruth McCIedon e Leslie Kadis, e passou
a trabalhar com Milton H. Erickson e outros. Hellinger traz algo
completamente novo na reunião de abordagens poderosas da
psicoterapia, bem como de outros paradigmas, criando assim uma
abordagem de cura única, pois ele aprendeu ferramentas específicas de
uma variedade de fontes, mas a força abrangente de seu trabalho vem
da habilidade refinada de ouvir a autoridade da própria alma.
Hellinger nos propõe “uma visão além do aparente’’, assim não nos
traz uma técnica “garantida”, mas nos abre a possibilidade de
enxergarmos o "real’’ ao invés de aceitarmos cegamente o que se está
sendo dito - não importa por quem -, sendo este o norte deste método,
muitas vezes de difícil aceitação para indivíduos, grupos, comunidades
e culturas.
As influências de maior peso que Hellinger sofreu foram ricas e
variadas. A experiência da sua primeira infância cobre o período que
antecede a guerra na Alemanha: o nazismo - ao qual ele se opõe- assim
como a guerra e suas consequências. Na qualidade de sacerdote, vê-
se diante dos costumes, dos rituais e da música zulus. Uma formação
ecumênica somada a dinâmica de grupo fundada no diálogo, na
fenomenologia e na experiência humana marca para ele uma etapa
decisiva. Depois de 25 anos como padre, ele deixa sua congregação
religiosa, volta à Alemanha, parte para uma formação em psicanálise
e se casa. 7
Por derradeiro, antes de se dirigir à psicoterapia, estudou filosofia e
teologia na Alemanha. Posteriormente, obteve o Diploma de Educação
Universitária na África do Sul, onde, durante vários anos, trabalhou
como professor e diretor de uma faculdade de treinamento de
professores para africanos.
1.4 AS BASES DA CONSTELAÇÃO FAMILIAR
A Constelação Familiar possui sua base na terapia sistêmica, que
indaga sobre as relações não aparentes que vinculam uma pessoa à
própria família.
Bert Hellinger foi inovador e original, ao unir em sua técnica vários
tipos de psicoterapia, aprofundando-se em múltiplos campos do saber
tais como: Terapia Primal, Gestalt Terapia, Análises Transacionais de
Eric Berne, Dinâmicas de Grupo, Terapias Familiares, Programação
Neurolinguística (PNL) de Richard Bandler e John Grinder, Hipnose
Eriksoniana, Psicodrama de Jacobs Levi Moreno, Escultura Familiar
de Virginia Satir e a “Terapia do Abraço” de Jirina Prekop.
Com uma sólida base psicológica, tem-se o sustentáculo do método
proposto por Bert Hellinger, e seu pioneirismo ao uni-las de forma
sistêmica:
Bert Hellinger organizou, de maneira ímpar todo conhecimento
sistêmico e o tornou disponível para o caminho da cura, do bem-estar
e do desenvolvimento humano. A técnica das Constelações Familiares
7
MANNÉ, Joy. As Constelações familiares em vida diária. São Paulo: Cultrix. 2008, p. 1.
pode ser compreendida por meio dos conhecimentos da Biologia,
pesquisados por Maturana, Varela, Rupert Sheldrake, notáveis
cientistas contemporâneos. 8
Mas as constelações não se baseiam apenas nas várias técnicas
psicológicas acima mencionadas, cabendo ressaltar todo o
conhecimento adquirido em seus estudos de filosofia, teologia,
pedagogia e seu trabalho como missionário na África do Sul, junto aos
Zulus, pois foi durante esta experiência profunda, que durou 16 anos,
que conheceu novas formas de relacionamento interpessoal, haja vista
as relações tribais serem baseadas no profundo e natural respeito
recíproco da dignidade e do papel de autoridade de cada um.
Foi justamente nesse período em que conheceu e aplicou as dinâmicas
de grupo, que posteriormente estimularam seus estudos e pesquisas
futuras.
Pode-se, assim, compreender o método das constelações familiares sob
uma perspectiva psicanalítica, mas sistêmico-fenomenológica.
1.4.1 A Perspectiva Sistêmica
Quando se aborda o termo sistemas, é comum sermos remetidos à
Niklas Luhmann, Parson e Capra. Contudo, não é sob esse prisma que
a abordagem sistêmica de Hellinger deve ser lida.
Na visão sistêmica, adotada por Hellinger, cada indivíduo é visto, não
de maneira individual, mas sim como parte de um sistema,
compreendido como sendo o grupo de pessoas ligadas entre si por um
destino comum e relações recíprocas, onde cada membro do sistema
impacta e exerce influência sobre os demais membros.
A Família é vista como um sistema, uma entidade que possui
características, regras e normas próprias, que faz com que se
“movimente” de determinado modo, onde cada membro contribui para
seu desenvolvimento.
Na visão sistêmica de Hellinger, o indivíduo não deve ser visto de
forma isolada, mas como alguém que está a serviço e é orientado pelas
8
GUEDES, Olinda, Além do Aparente: um livro sobre constelações familiares. I ed. Curitiba:
Appris. 2015, p. 12.
forças de seu próprio sistema, todavia essas forças não são visíveis a
olho nu, assim como a radiação solar, o wi-fi, os movimentos de uma
célula etc.
O que o método das constelações familiares faz é tornar aparente,
visível as formas que norteiam os sistemas, através da representação
do sistema de cada um.
Mais adiante, abordar-se-á de que maneira o método é executado.
1.4.2 Perspectiva Fenomenológica
A perspectiva fenomenológica, que norteia Hellinger, é a de Edmund
Husserl, aplicada ao conhecimento de mundo, que afirma a
importância inicial de restituir aos fatos e à sua observação, o papel
central para a teoria do conhecimento.
Essa abordagem, que define a importância do conhecimento intuitivo,
que verte das experiências vivenciadas, das características essenciais
e profundas, foi fundamental para Bert Hellinger edificar as
constelações familiares, pois os eventos que vem à tona por meio dos
representantes, durante a prática das constelações, adquirem valor de
verdade.
Ao deter-se na análise da consciência, Husserl irá propor seu método
radical para "vasculhar” o fenômeno, a saber, a redução
fenomenológica (epoché). Tomando emprestado da filosofia antiga o
termo grego epoché, que os antigos céticos traduziam por "suspensão”
do juízo a respeito das coisas, Husserl o adota sob outra perspectiva.
A epoché husserliana consiste em pôr "entre parênteses” o mundo,
quando da apreensão do fenômeno.
A epoché de Husserl consiste numa suspensão momentânea da “atitude
natural” (natürliche Einstellung), com a qual nos relacionamos com as
coisas do mundo. Isso significa deixar provisoriamente de lado todos
os preconceitos, teorias e definições, das quais nos valemos para
conferir sentido às coisas. Tal suspensão da nossa atitude natural
diante do mundo, tem como objetivo apreender na consciência as
coisas como elas realmente são.
O fenômeno, que se mostra durante as constelações, prevalece sobre
as tentativas de leitura dos fatos, tendo como base uma lógica
previamente estabelecida.
A abordagem fenomenológica, nas constelações familiares, revela a
percepção de uma ampla gama de fenômenos, que somente se
manifesta e pode ser compreendida ao se observar com olhos livres de
julgamentos.
A representação, nesse caso, é como se fosse um quadro em
movimento, onde se pode ver através da interação dos representantes
de uma constelação os movimentos das peças de um intrincado jogo de
xadrez, onde cada movimento é delicado e essencial para a harmonia
de seu sistema.
1.5 O MÉTODO DA CONSTELAÇÃO FAMILIAR
Pode-se dizer que uma das principais características das constelações
familiares é ter reconhecido que todos estamos ligados aos destinos da
nossa família e cada família está conectada por uma consciência
coletiva.
O método da constelação pode ser considerado simples, onde o
terapeuta pede ao cliente, num grupo terapêutico ou de
desenvolvimento pessoal, que posicione, em conformidade com suas
mútuas relações, indivíduos que tenham papel significante no tocante
à questão ou necessidade por ele trazida:
Na maioria das vezes, as constelações familiares são conduzidas no
seio de um grupo de trabalho, mas certos terapeutas as praticam em
sessões individuais. De um modo ou de outro, elas seguem um
determinado número de etapas. Num primeiro momento, o terapeuta
esclarece o problema ou a questão do cliente. São então escolhidos
representantes entre os membros do grupo: a constelação é montada
e se desenrola progressivamente até a sua solução, ou até o momento
em que fica evidente que sua solução é impossível - que é, de certo
modo, uma solução à parte. Podemos introduzir um ritual de
encerramento de sessão, assim como conselhos sobre a maneira de
integrar aquilo que a constelação revela. 99
9
MANNÉ, Joy. As Constelações familiares em sua vida diária. São Paulo: Cultrix. 2008.
As constelações podem ser em grupo ou na modalidade individual, a
qual também considera-se um excelente recurso para ser usado na
esfera dos conflitos judiciais ou extrajudiciais, quando a parte não quer
se expor
Na dinâmica da constelação familiar, o participante escolhe pessoas
que terão a função de representar os membros de sua família, os quais
se tornam "modelos vivos” do sistema do sujeito que tem sua questão
constelada:
Ao estabelecer uma constelação familiar o participante escolhe outros
integrantes do grupo para representar os membros de sua família,
colocando-os no recinto de modo que as posições relativas de cada um
reproduzam as da família verdadeira. Os representantes passam a ser
modelos vivos do sistema original de relações familiares. O mais
incrível é que, se a pessoa coloca a sua "família" com toda
autenticidade, os representantes passam a sentir e a pensar de modo
muito parecido com o dos membros verdadeiros — sem conhecimento
prévio. 10
Schneider, ao abordar a questão da escolha dos representantes, assim
se posiciona:
São, por exemplo, pessoas mais íntimas de sua família de origem, a
saber, ele próprio, seus pais e irmãos, às vezes apenas ele e seus pais
ou ele e um sintoma que o incomoda. Para representar os personagens,
o cliente escolhe certos participantes do grupo e os posiciona no
recinto, de acordo com suas mútuas relações, sem fazer comentários.
Ele deve fazer isso a partir de seu sentimento ou do “coração”,
portanto, sem buscar justificativas, sem escolher um determinado
período de sua vida, e sem imaginar determinadas cenas que vivenciou
em sua família. Simplesmente se deixa conduzir por um impulso
interno indiferenciado e por uma atitude amorosa. Normalmente é
preciso haver clareza sobre quem representa uma determinada pessoa
da família ou algum sintoma, como o “medo" ou alguma entidade
p, 5.
10
HELLINGER, Bert. A Simetria Oculta do Amor. São Paulo: Cultrix, 2008. p. 11.
abstrata, como o “segredo" ou a “morte”. 11
O terapeuta pede ao cliente breves informações sobre o histórico de
sua família, com o escopo de perceber seu “peso anímico” e saber com
que personagens poderá começar a constelação. Todavia, quanto
menos souberem os representantes, mais convincente será para o
constelado o que emergirá da constelação.
Porém, é apenas através de informações essenciais que uma
constelação recebe o impulso para sua condução, cabendo ao
constelador tão somente descrever o que se mostra no campo
morfogenético.
Uma vez posicionados os representantes, o cliente se senta. Após
algum tempo de concentração, o terapeuta pede aos representantes que
comuniquem seus sentimentos, eventuais percepções e sintomas
corporais, podendo algumas vezes, pedir aos representantes que
compartilhem seus sentimentos, mas essa partilha deve ser feita sem
vinculação a crenças pessoais dos próprios representantes e do
constelador.
É desse modo que o conhecimento anímico vem à tona e as forças, que
nela atuam, tomam-se visíveis e experimentáveis para o próprio
constelado, o terapeuta e todos os participantes do grupo. Cabe
ressaltar que o movimento dos representantes, seja ele autônomo ou
conduzido pelo terapeuta, revela a dinâmica anímica da família,
trazendo, ao final, liberação, alívio e uma “imagem de solução”.
Não sabemos como é possível aos participantes da constelação sentir
sintomas que lhe são alheios, e Bert Hellinger recusa -se a especular
sobre o assunto: “Não estou capacitado a explicar esse fenômeno, mas
ele existe e eu o utilizo". Aos céticos, custa acreditar que uma pessoa
investida do papel de alguém que não conhece possa sentir na própria
carne o que ele padece, aquilo de que precisa e o que pode ajudar . 12
Quando se encontra o equilíbrio em uma constelação, pode-se
encontrar a paz e isso ocorre quando, ultrapassando a dinâmica do
11
SCHNEIDER, Jakob Robert. A prática das constelações familiares. Patos de Minas: Atman,
2007, p. 15.
12
HELLINGER, Bert. A Simetria Oculta do Amor. São Paulo: Cultrix, 2008, p. 11.
destino, os membros da família ali representados se reencontram com
respeito e amor e aqueles que foram excluídos são reintegrados e cada
um toma seu lugar dentro do sistema familiar.
Para uma compreensão sistematizada do método das constelações
familiares, apresentamos um quadro com os seis passos realizados em
uma constelação:
1) A definição do
O terapeuta pergunta ao cliente qual é o problema, ou
problema
seja, ele quer saber o que o leva a uma constelação
familiar Ele não está interessado na história "habitual”,
em Interpretações, julgamentos e explicações que a
acompanham.
13
HELLINGER, Bert. A Simetria Oculta do Amor. São Paulo: Cultrix, 2008, p. 15-16.
14
HELLINGER, Bert. A Simetria Oculta do Amor. São Paulo: Cultrix, 2008, p. 17.
pertencemos, nossa consciência fica tranquila. Por isso muitas vezes
fazemos algo que perante os outros parece totalmente mau, totalmente
errado. Entretanto, isso foi feito de "consciência tranquila”, porque
quando agimos "igual", tendo as mesmas atitudes, vivenciando os
mesmos valores, nos sentimentos pertencentes e seguros. 15
É importante ressaltar que a alma do grupo não tolera exclusões e todos
os membros do sistema tem igual direito ao pertencimento. Quando
algum membro é excluído do grupo, outro membro da família toma seu
lugar de modo inconsciente, vindo a repetir seu padrão.
Assim, a lei do pertencimento diz respeito à vinculação e
reconhecimento estabelecidos para cada pessoa que nasce em um
sistema. Isto é, cada um de nós necessita do reconhecimento como
membro que pertence a um lugar e exerce um papel dentro de uma
dinâmica familiar.
A segunda é a Lei da Precedência, onde aqueles que chegaram antes,
cronologicamente, prevalecem sobre os que chegaram depois. Nessa
lei os mais velhos são hierarquicamente superiores aos mais novos.
Esta lei define que aquele que entra primeiro em um sistema, tem a
prevalência e exerce direitos sobre os que entraram depois, pois dentro
de um sistema existe uma hierarquia, uma ordem a ser respeitada e
cada um tem o seu lugar, contribuindo para a evolução do mesmo, se
estiver no lugar que lhe cabe:
A terceira exigência para o êxito no amor em relacionamentos íntimos,
é a ordem. Em primeiro lugar entendemos por “ordem” o conjunto de
regras e convenções sociais que regem a vida comunitária de um
grupo social. Todo relacionamento duradouro cria normas, regras,
crenças e tabus que se tomam obrigatórios para seus membros. Desse
modo, os relacionamentos transformam-se em sistemas de relações
providos de ordem e estrutura. As convenções sociais representam o
modelo superficial que todos os membros aceitam, mas varia
amplamente de grupo para grupo. 16
Todavia, quando a hierarquia não é respeitada e a Lei da Precedência
15
HELLINGER, Bert. A Simetria Oculta do Amor. São Paulo: Cultrix, 2008, p. 18.
16
HELLINGER, Bert. A Simetria Oculta do Amor. São Paulo: Cultrix, 2008, p. 28.
é violada, o sistema sofre disfunções graves. Caso alguém não ocupe
seu lugar, isso implicará em desordem na sua própria vida e na vida
dos outros membros do sistema, e para restabelecer o equilíbrio é
preciso que cada um respeite e tome o seu lugar:
A Ordem é estabelecida pela hierarquia. Descrevemos essa lei da
seguinte forma: “Quem chegou primeiro, chegou primeiro, quem
chegou depois, chegou depois. E nada que venha depois desse ponto
final, altera a ordem.
Quando há ruptura da ordem, os posteriores se sentem compelidos a
atuar como se fossem melhores que os anteriores, como se diante de
situações vivenciadas por esses últimos, houvessem eles mesmos
tomado decisões e atitudes "melhores” ou “mais acertadas”.
Hellinger também viu que aqueles que estão mais abaixo na ordem
hierárquica, por exemplo, os filhos, não devem se meter nos assuntos
dos antecessores. 17
A terceira é a Lei do Equilíbrio. Trata-se do equilíbrio entre o DAR e
o RECEBER e está a serviço da troca nas relações. É necessário manter
esse equilíbrio em nossas relações, pois é no equilíbrio entre o DAR e
o RECEBER que uma relação encontra harmonia:
Nossos relacionamentos, bem como nossas experiências de culpa e
inocência, começam com o dar e o receber. Nós nos sentimos credores
quando damos e devedores quando recebemos. O equilíbrio entre
crédito e débito é a segunda dinâmica fundamental de culpa e
inocência nos relacionamentos. Favorece todos os relacionamentos,
pois tanto o que dá quanto o que recebe conhecem a paz se o dar e o
receber forem iguais. 18
As “contas familiares e sociais” precisam estar equilibradas, estando
aí incluídas as partilhas, heranças, dotes, os favorecidos e
desfavorecidos, as injustiças etc. Também pertencem à família aqueles
que tomam o lugar dos que morreram e partiram. Ao se pensar em uma
espécie de ‘livro de contas familiar’, é necessário que se mantenha em
17
HELLINGER, Bert. A Simetria Oculta do Amor. São Paulo: Cultrix, 2008, p. 19.
18
HELLINGER, Bert, A Simetria Oculta do Amor. São Paulo:Cultrix, 2008, p. 21.
dia os créditos e os débitos, as obrigações e os méritos dos membros
pois, caso contrário, pode aduzir uma série de problemas nas gerações
futuras:
Resumidamente podemos explanar que a primeira Lei consiste que os
entes mais velhos preferem aos mais novos e deve haver uma
hierarquia entre os membros da família, um respeito aos ascendentes,
já a segunda lei trata que todos devem fazer parte do sistema familiar
sem haver qualquer tipo de exclusão, seja falecido, doente, pobre,
deficiente, idoso, etc. Todos devem ser incluídos, reconhecidos e
amados e a terceira ordem do amor significa que deve haver um
equilíbrio entre o dar e o receber para que não haja um sentimento de
dívida com o outro, mas de amor pois à medida que dou amor recebo
também, havendo um movimento nesse sentido, em que todos os
membros da família se beneficiam. 19
A necessidade de pertinência, o equilíbrio entre o dar e o receber e a
convenção social trabalham juntos para preservar os grupos sociais a
que pertencemos. Assim, toda alma deseja retribuir aquilo que lhe é
ofertado e quando o faz, sempre dá um pouco mais, pois o desejo de
retribuir é uma constante em nossa vida. Sentir-se em débito ou sentir-
se credor são movimentos naturais de nossa alma, fazendo com que
haja vínculos ao sistema.
Uma vez abordadas as constelações familiares e as Ordens ou Leis
Sistêmicas, passa-se a tratar da aplicação destas leis no campo do
Direito, que recebe a denominação de Direito Sistêmico.
1.7 DIREITO SISTÊMICO
O Direito Sistêmico, concebido como a aplicação das leis ou ordens
do amor de Bert Hellinger ao campo do Direito, se constitui em um
novo paradigma para a ciência jurídica, trazendo uma nova forma de
perceber os vínculos entre os indivíduos e grupos tutelados pelo
Direito.
Surge, então, um inovador olhar sobre as respostas apresentadas até
19
MENDES, Ana Tarna dos Santos e LIMA, Gabriela Nascimento. O que vem a ser Direito
Sistêmico. Disponível em http://emporiododireito.com.br/o-que-vem-a- -ser-direíto-
sistemico/. Acesso em 18 de julho de 2017.
então pelo arcabouço normativo e pela estrutura judicial até agora
dominante, nos fazendo pensar e refletir, a partir de uma nova
perspectiva, sobre os rumos de nossos conflitos.
É nesse novo caminho que se convida o leitor a seguir conosco.
1.7.1 Definição
Pode-se definir por Direito Sistêmico a aplicação das Leis ou Ordens
do Amor, de Bert Hellinger, no campo jurídico.
Para Sami Storch 20 o Direito Sistêmico é “uma visão sistêmica do
direito, pela qual só há direito quando a solução traz paz e equilíbrio
para todo sistema”, pois em “um sistema, o desequilíbrio de qualquer
pessoa se reflete nos outros”, assim a solução deve ser integral,
levando em consideração todos aqueles que compõem o sistema.
Assim, o Direito Sistêmico nos propõe a busca de uma solução, não
mais focada apenas na ótica competitiva, mas sim cooperativa e
pacífica, o que vem perfeitamente ao encontro da necessidade de
pacificação social e se distancia salutarmente da visão opositiva, até
então perpetrada pelos construtores do Direito.
Ainda segundo Sami Storch: 21
A expressão “direito sistêmico”, no contexto aqui abordado, surgiu
da análise do direito sob uma ótica baseada nas ordens superiores que
regem as relações humanas, segundo a ciência das constelações
familiares sistêmicas desenvolvida pelo terapeuta e filósofo alemão
Bert Hellinger.
Na visão de Amilton Plácido da Rosa, o Direito Sistêmico é definido
como um método sistêmico- fenomenológico de solução de conflitos,
trazendo à tona o conhecimento e compreensão das causas ocultas de
uma desavença:
O Direito Sistêmico, em termos técnico-científico, é um método
sistêmico-fenomenológico de solução de conflitos, com viés
20
STORCH, Sami. O que é direito sistêmico. Disponível em <http://direitosistemi- co.com.br/pt-
services/o-que-e-direito-sistemico/>Acesso em 17 de julho de 2017.
21
STORCH, Sami. O que é Direito Sistêmico. Disponível em <https://direitosis-
temico.wordpress.com/2010/11 /29/o-que-e-direito-sistemico/>. Acesso em 20 de julho de 2017.
terapêutico, que tem por escopo conciliar, profunda e definitivamente,
as partes, em nível anímico, mediante o conhecimento e a
compreensão das causas ocultas geradoras das desavenças,
resultando daí paz e equilíbrio para os sistemas envolvidos. 22
1.7.2 Resolução n° 125 do Conselho Nacional de Justiça - A
Construção de um Cenário Pacificador e Humanizado pelo Poder
Judiciário
A sociedade há muito clama por uma resposta mais humanizada, célere
e que realmente promova justiça, o que vem motivando várias
iniciativas no sentido de pacificar e humanizar o poder Judiciário.
Sob essa perspectiva é que se deve tratar a Resolução n° 125 do
Conselho Nacional de Justiça, que dispõe sobre a conciliação e a
mediação, a qual partiu da premissa de que cabe ao Judiciário
estabelecer a política pública de tratamento adequado dos conflitos de
interesses resolvidos no seu âmbito - seja por meios
heterocompositivos ou autocompositivos.
Este norte foi adotado de maneira a organizar, em todo território
nacional, não somente os serviços prestados no curso da relação
processual (atividades processuais), como também os que possam
incentivar a atividade do Poder Judiciário de prevenção de demandas,
com as chamadas atividades pré-processuais de conciliação e
mediação.
Os objetivos da Resolução n° 125 do CNJ são: i) disseminar a cultura
da pacificação social e estimular a prestação de serviços
autocompositivos de qualidade (art. 2 o ); ii) incentivar os tribunais a se
organizarem e planejarem programas amplos de autocomposição
(art.4 o ); iii) reafirmar a função de agente apoiador da implantação de
políticas públicas do CNJ (art. 3 o ).
Referida resolução reflete os esforços para mudar o perfil com que o
Poder Judiciário se apresenta. Não apenas de forma mais ágil e como
solucionador de conflitos, mas principalmente como um centro de
22
ROSA, Amilton de Plácido. Direito Sistêmico e Constelação Familiar. Disponível em
<http://www.cartaforense.com.br/conteudo/entrevistas/direito-sistemico- -e-constelacao-
familiar/16914>. Acesso em 16 de julho de 2017.
soluções efetivas do ponto de vista do jurisdicionado.
Nesse novo modelo, o operador do direito deve ter uma postura
pacificadora - mesmo em processos heterocompositivos, pois passa a
existir a preocupação com o meio mais eficiente de compor certa
disputa, na medida em que essa escolha reflete a própria efetividade
do sistema de resolução de conflitos:
O acesso à justiça deve, sob o prisma da autocomposição, estimular,
difundir e educar seu usuário a melhor resolver conflitos por meio de
ações comunicativas. Passa-se a compreender o usuário do Poder
Judiciário como não apenas aquele que, por um motivo ou outro,
encontra- se em um dos polos de uma relação jurídica processual - o
usuário do poder judiciário é também todo e qualquer ser humano que
possa aprender a melhor resolver seus conflitos, por meio de
comunicações eficientes - estimuladas por terceiros, como na
mediação ou diretamente, como na negociação. O verdadeiro acesso
à Justiça abrange não apenas a prevenção e reparação de direitos,
mas a realização de soluções negociadas e o fomento da mobilização
da sociedade para que possa participar ativamente dos procedimentos
de resolução de disputas como de seus resultados. 23
Aborda-se, nesse sentido, a Resolução n° 125, do Conselho Nacional
de Justiça, por tratar-se literalmente de uma abertura, por onde a
postura sistêmica do construtor do direito pode ingressar, aplicando-
se as leis sistêmicas de Bert Hellinger tanto em seu escritório, gabinete
ou mesmo em audiência. Todos, juízes, advogados, promotores e
clientes devem ser vistos como membros de um sistema, que JUNTOS
buscam a melhor solução para o conflito social.
1.8 DIREITO SISTÊMICO E O CONSTRUTOR 24 JURÍDICO
É necessário esclarecer que a aplicação do Direito Sistêmico pode
23
GENRO,Tarso. AZEVEDO, André Gomma (Org.) Manual de Mediação Judicial, Brasília/DF:
Ministério da Justiça e Programa das Nações Unidas para o Desenvolvimento - PNUD, p. 13.
24
Entendemos que o termo construtor jurídico é mais adequado que o termo operador
jurídico. Operador remete à ideia de máquina, serviço braç al, estafante e sem participação
viva. Já criador sugere que todos estão criando alternativas, dentro dos limites legais, para
alcançar uma solução ao conflito jurídico, nos colocando como atores ativos e criativos no
sistema judicial.
ocorrer de três formas distintas: mediante uma postura sistêmica -
fenomenológica; realizando intervenções com frases de solução,
exercícios e dinâmicas sistêmicas e através da aplicação das
constelações familiares.
Sami Storch diz que:
(...) a aplicação do Direito Sistêmico para e pelos profissionais do
direito pode se dar de diversas formas. Trata-se de uma ciência dos
relacionamentos, válida para relações humanas, organizacionais e
relações jurídicas em geral, uma vez que toda relação constitui um
sistema ou se constitui dentro de um (...). O estudo dessa ciência
amplia a compreensão sobre as dinâmicas ocultas nos conflitos. Cada
parte no conflito tem motivos para ter se envolvido nele do modo como
fez (seja como agressor, vítima, reivindicador ou devedor), e esses
motivos podem ter raízes profundas, que não dizem respeito à outra
parte no processo, mas sim a passado familiar de cada um, inclusive
de gerações anteriores. 25
Portanto, o Direito Sistêmico pode ser implementado de várias formas
pelos construtores do direito, através de uma abordagem sistêmica por
parte do advogado, mediador, conciliador e também do magistrado.
Inicia-se pela aplicação do Direito Sistêmico pelo advogado, que
denominar-se-á Advocacia Sistêmica.
1.8.1 Advocacia Sistêmica
A advocacia sistêmica é uma nova forma de posicionamento do
advogado em relação ao mercado, constituída através de quatro
perspectivas: proposta de valor sistêmica; relacionamento com foco no
cliente; modelo estratégico consensual; sistema operacional
multiportas.
A proposta de valor sistêmica pode ser compreendida pela adoção de
uma advocacia humanizada e estratégica, possuindo um perfil
pacificador, fazendo uso das várias formas de transformação de
25
STORCH, Sami. Direito sistêmico. Disponível em:
<https://direitosisternico.wordpress.com/2017/04/10/por-que-aprender-direito-sistemico/>.
Acesso em 19 julho de 2017.
conflitos e pensando no conflito de forma positiva e transformadora:
O advogado sistêmico possui um propósito de vida bem definido: ele
acredita e tem paixão por uma advocacia humanizada e estratégica.
Não possui perfil litigante e busca construir seu legado promovendo o
uso das diversas formas de composição de conflitos de interesse como
via principal de acesso à justiça. Dessa forma sua advocacia é única e
se destaca de todas as demais, pois o ser humano é o grande
diferencial. 26
O relacionamento com o cliente é baseado em empatia, escuta ativa,
com o uso de técnicas de comunicação não violenta. É um
relacionamento baseado na igualdade, em que cliente e advogado
assumem suas responsabilidades de forma equilibrada, guiados pelas
Ordens da Ajuda de Bert Hellinger:
Todo ponto de vista é a vista de um ponto, com esse modelo mental o
advogado sistêmico desenvolve habilidades como empatia, apoio,
escuta ativa e comunicação eficaz. Ele atua com o foco do cliente e o
foco nos sistemas. Esse movimento é repetido também com os outros
interessados, ampliando a consciência e visualização do todo. O
advogado sistêmico não se sente maior que seu cliente, ele é um
técnico e um facilitador Ele guia-se pelas Ordens da Ajuda de Bert
Hellinger. 27
Já, o modelo estratégico traduz ao mercado os valores basilares da
Advocacia Sistêmica, que são: advogar de forma estratégica,
humanizada e consensual, ampliando o acesso à justiça com foco nos
novos caminhos para a resolução dos conflitos; ser referência em
Modelo de Negócios dos escritórios que estão transformando a cultura
adversarial em cultura de paz e seguir as Leis Sistêmicas de Bert
Hellinger: Pertencimento, Ordem e Equilíbrio.
O modelo estratégico comunica ao mercado a missão, a visão e os
valores primordiais à Advocacia Sistêmica.
26
ADVOCACIA SISTÊMICA. Disponível em https://www.advocaciasistemica.com.br/. Acesso em
15 de julho de 2017.
27
ADVOCACIA SISTÊMICA. Disponível em https://www.advocaciasistemica.com.br/.
Acesso em 15 de julho de 2017.
Missão: Advogar de forma estratégica, humanizada e consensual
ampliando o acesso à justiça com foco nos novos caminhos para a
resolução dos conflitos.
Visão: Ser referência em Modelo de Negócios dos escritórios que
estão transformando a cultura adversarial em cultura de paz.
Valores: Seguimos as Leis Sistêmicas de Bert Hellinger
Pertencimento, Ordem e Equilíbrio. 28
O sistema operacional multiportas conduz o direcionamento aos
métodos adequados de resolução de conflitos, economizando tempo e
dinheiro, tanto para os tribunais, quanto para os participantes ou
litigantes:
O modo, as etapas e a viabilização do Sistema Multiportas na
advocacia. Como, quando e onde incluir as constelações sistêmicas, a
mediação e a negociação no atendimento ao cliente. A consultoria
jurídica e a observação de contextos, padrões e conexões
apresentadas sob a perspectiva do cliente e interessados. O advogado
como técnico e sua atuação diante do conflito e as possibilidades
jurídicas e principalmente preventivas. O Sistema Operacional define
os diversos modos de conduzir a Advocacia Sistêmica. 29
Munido dessa nova forma de perceber seu papel no sistema, o
advogado, não mais como um fomentador do conflito, mas sim como
um pacificador-empático, adota uma postura respeitosa, sistêmica e
fenomenológica, levando em conta as três leis inconscientes que regem
todos os sistemas vivos, no exercício da advocacia.
1.8.2 A OAB e as Comissões de Direito Sistêmico
Com o objetivo de difundir o uso das constelações sistêmicas para
reduzir a judicialização, foi criada em abril de 2017, pela Ordem dos
Advogados Seccional de Santa Catarina, a primeira Comissão de
Direito Sistêmico do Brasil.
28
ADVOCACIA SISTÊMICA. Disponível em https://www.advocadasistemica.com.br/, Acesso em
15 de julho de 2017.
29
ADVOCACIA SISTÊMICA. Disponível em https://www.advocaciasistemica.com.br/. Acesso em
15 de julho de 2017.
A Comissão fomenta o uso das constelações familiares no campo do
Direito e tem como Presidente a advogada Eunice Schlieck,
vanguardista no uso da postura sistêmica no exercício da advocacia.
O método de Bert Hellinger é uma nova forma de atuação do advogado,
pois ao olharmos para a demanda judicial sob a perspectiva sistêmica,
possibilita-se ao advogado desenvolver melhores acordos e contratos,
além de atender demandas de forma mais efetiva e evitar a
judicialização dos casos, promovendo acordos que preservem as
relações humanas.
A Comissão de Direito Sistêmico atua promovendo eventos de forma
multidisciplinar e apoiando os escritórios que tenham interesse em
desenvolver a prática da advocacia sistêmica, de forma dinâmica e
fenomenológica, como é o caso do Simpósio de Direito Sistêmico,
ocorrido em 2 de agosto de 2017.
O evento proporcionará a todos, conhecimento sobre o movimento que
acontece no universo jurídico, desde que o magistrado Sami Storch
passou a aplicar as constelações sistêmicas para solucionar os
conflitos. Bem como buscará expor e abrir para debate a inserção das
leis sistêmicas na prática da advocacia nos seus mais diversos ramos.
“Vamos apresentar esse novo olhar ao Direito, a partir da apreciação
das leis sistêmicas que, segundo o alemão Bert Hellinger, quando
respeitadas promovem a paz nos relacionamentos. Além disso, será
demonstrada a prática das constelações sistêmicas no universo
jurídico. 30
Trata-se de um movimento em expansão e, conscientes da importância
da aplicação das leis sistêmicas enquanto método de prevenção e
solução de conflitos, a OAB - Subseção de Balneário Camboriú e de
Itajaí, municípios catarinenses, criaram a Comissão de Direito
Sistêmico, sendo a da Subseção de Itajaí presidida pela Advogada
Maria Fernanda G. Girardi, a qual também já atua na difusão do uso
do Direito Sistêmico na região do Vale do Itajaí, através da promoção
30
OAB NOTÍCIAS. Comissão de Direito Sistêmico promove simpósio no dia 2 de agosto.
http://www.oab-sc.org.br/noticias/comissao-direito-sistemico-promove-simposio-no-dia-2-
agosto/14304. Acesso em 20 de julho de 2017.
de eventos.
Outras subseções estão se movimentando para a criação de comissões
e difusão do movimento sistêmico, o que é de suma importância.
1.8.3 As Constelações Familiares e o Poder Judiciário
As constelações familiares entraram no campo do Direito, através do
juiz Sami Storch, que iniciou seus estudos nessa área no ano de 2004,
quando teve seu primeiro contato com a terapia das constelações
familiares e percebeu que, além de ser uma terapia altamente eficaz na
solução de questões pessoais, o conhecimento desse método
apresentava um potencial imenso para utilização na área jurídica:
Juiz de Direito do Tribunal de Justiça do Estado da Bahia, vislumbrou
na constelação um instrumento a mais para auxiliá-lo nos julgamentos
dos seus processos e na condução de suas audiências, passando a
verificar que as partes quando confrontadas com a verdade, com o que
está oculto e com o que veio antes do conflito, passavam de uma
postura litigante a uma posição consensual, com isso, o Juiz atuava
como um conciliador e mediador em suas demandas judiciais, gerando
sentenças pacificadoras. 31
Quando se tornou juiz, Sami Storch já fazia formação em constelações
familiares e como as leis sistêmicas se aplicam as nossas relações,
percebeu que poderia fazer uso das mesmas, para auxiliá-lo em seu
mister de juiz:
Quando me tornei juiz, já estava fazendo a formação em constelações
e logo percebi como na prática o conhecimento das leis sistêmicas
auxilia na condução dos processos, a se posicionar de maneira a
produzir mais conciliações. Por isso, passei a aplicar alguns
princípios nas audiências. Dizendo algumas frases, pedindo que as
pessoas fechassem os olhos e se imaginassem olhando para a outra
pessoa e dizendo frases de reconhecimento. 32
31
MENDES, Ana Tarna dos Santos, e LIMA, Gabriela Nascimento. O que vem a ser Direito
Sistêmico, https://jus.com.br/artigos/54930/o-que-vem-a-ser-direito-sistemico. Acesso em
16 de julho de 2017.
32
RIBEIRO, Mariana. Como o juiz Sami Storch conseguiu transformar seu interesse pessoal no
método da constelação familiar para conseguir mais acordos na Vara da Família em Castro
A primeira vez, que utilizou as constelações familiares, foi durante a
disputa pela guarda de uma menina de quatro anos, isso em 2010,
quando trabalhava em Palmeiras (a 450 km de Salvador). No caso em
questão, mãe e avó queriam a responsabilidade e trocavam acusações
sérias. Sami Storch percebeu que o caso não poderia ser solucionado
apenas com uma decisão sobre a guarda da menina, já que qualquer
que fosse a decisão, permaneceria o drama e o sofrimento da menor ,
causado pela disputa entre mãe e avó.
No dia da audiência, levou consigo um kit de bonecos, que utiliza para
a prática da terapia de constelações familiares, no atendimento
individual e, quando chamou a menina para ser ouvida, colocou os
bonecos em cima da mesa, pedindo para que ela posicionasse os
brinquedos e montasse a história da família, mostrando quais bonecos
representava cada membro familiar.
Perguntou, então, onde a menina se sentia melhor, o que acontecia
quando se aproximava da mãe ou da avó e outros personagens da
família. E ela pôde expressar que se sentia melhor com a mãe, ainda
que apresentasse um carinho grande pela avó e que ficasse bem com
as duas.
Desta forma, a mãe, a avó e os advogados viram a verdade dos fatos
naquela dinâmica. Anteriormente, outro juiz tinha tirado a guarda da
mãe, mas quando a menina se expressou pela constelação, o desejo da
infante ficou muito claro para todos, colaborando para a resolução do
caso.
A Constelação Familiar tem o poder de revelar o que está oculto ou
aquilo que não se quer ver ou perceber Dessa forma é possível a
sensibilização das partes envolvidas em um conflito, da dimensão
anímica da questão, o que possibilita, na maioria dos casos, a obtenção
de uma decisão justa e verdadeira:
O direito sistêmico se propõe a encontrar a verdadeira solução. Essa
solução não poderá ser nunca para apenas uma das partes. Ela sempre
33
STORCH, Sami. O que é Direito Sistêmico. Disponível em
<http://direitosistemico.com.br/pt-services/o-que-e-direito-sistemico/>. Acesso em 16 de
julho de 2017.
pais. Assim, mesmo que o filho manifeste uma rejeição ao pai - porque
este abandonou a família ou porque não paga pensão, por exemplo -
toda essa rejeição se volta contra ele mesmo, inconscientemente.
Qualquer ofensa ou julgamento de um dos pais contra o outro alimenta
essa dinâmica, prejudicial sobretudo aos filhos. O mesmo ocorre
quando o juiz toma o partido de um dos pais contra o outro, reforçando
o conflito interno na criança.
Para que se possa ter uma solução sistêmica e consequentemente paz
para este núcleo familiar, é necessário excluir os filhos de qualquer
conflito existente entre os pais, para que os filhos possam sentir a
presença harmônica do pai e da mãe em suas vidas.
Cabe ao magistrado, antes de sentenciar, considerar essa realidade e
ter um olhar terno e isento de julgamentos pessoais em relação a todos
que compõem esse sistema em desequilíbrio. Esta postura do juiz já
estará contribuindo para o equilíbrio do sistema e no caso d a
necessidade de uma decisão impositiva ser tomada, será ela mais bem
recebida pelos envolvidos, pois todos sentirão que foram vistos e
considerados pelo juiz.
Esta aproximação entre o Direito e as constelações é feita com ambos
os litigantes de um processo ou com apenas uma das partes, onde a
constelação é utilizada para verificar a verdadeira razão de seu
comportamento ou da parte adversa e qual a melhor solução para o
caso, ou seja, em que momento e qual destas leis descritas acima foram
quebradas, gerando um desequilíbrio de difícil solução para todo o
sistema.
O uso pode ainda ser feito em uma dinâmica individual ou em grupo.
Sami Storch ficou conhecido pelo uso das representações em grupos,
mas nada impede ou afeta a eficácia do método, se aplicada
individualmente.
1.8.4 Projetos de Constelação Familiar Implementados pelo Poder
Judiciário
Pode-se afirmar com segurança que o método das constelações
familiares está se expandido pelo Brasil, pois atualmente pelo menos
12 estados brasileiros (Goiás, São Paulo, Rondônia, Bahia, Mato
Grosso, Mato Grosso do Sul, Pará, Paraná, Rio Grande do Sul, Santa
Catarina, Alagoas e Amapá) e o Distrito Federal já fazem uso da
dinâmica da “Constelação Familiar’’ para ajudar a solucionar conflitos
no judiciário brasileiro, medida esta em conformidade com a
Resolução n° 125 do Conselho Nacional de Justiça, que estimula
práticas que proporcionam tratamento adequado dos conflitos de
interesse do Poder Judiciário, sendo utilizada como reforço antes das
tentativas de conciliação em vários estados:
A intenção da utilização da técnica criada pelo psicólogo alemão Bert
Hellinger no Judiciário é buscar esclarecer para as partes o que há
por trás do conflito que gerou o processo judicial. Os conflitos levados
para uma sessão de constelação, em geral, versam sobre questões de
origem familiar como violência doméstica, endividamento, guarda de
filhos, divórcios litigiosos, inventário, adoção e abandono. Um
terapeuta especializado comanda a sessão de constelação. Na capital
federal, a técnica vem sendo aplicada dias antes das tentativas de
acordo em seis unidades do Tribunal de Justiça do Distrito Federal e
dos Territórios (TJDFT), como no Centro de Conciliação e Solução de
Conflitos (Cejusc) Superendividados, onde a servidora aposentada
Heloísa (nome fictício), 65 anos, foi encaminhada há um ano, para
saldar uma dívida que superava seu patrimônio. 34
Alguns projetos merecem destaque, como o do precursor juiz Sami
Storch, junto à 2 a Vara de Família de Itabuna/BA, chegando a atingir
100% de acordos em conflitos familiares ao utilizar a técnica antes das
audiências de conciliação:
Um dos primeiros a trazer a prática para o Judiciário, o juiz Sami
Storch, da 2 a Vara de Família de Itabuna/ BA, afirmou ter conseguido
um índice de 100% de acordos em conflitos familiares ao utilizar a
técnica antes das audiências de conciliação. Na época, em 2012, a
técnica foi aplicada aos cidadãos do município de Castro Alves, a 191
quilômetros de Salvador Das 90 audiências nas quais pelo menos uma
34
PORTAL CNJ. Constelação Familiar ajuda a humanizar práticas de conciliação no Judiciário.
Disponível em < http://www.cnj.jus.br/noticias/cnj/83766-constelacao-familiar-ajuda-humanizar-
praticas-de-conciliacao-no-judiciario-2>. Acesso em 19 de julho de 2017.
das partes participou da vivência de constelações, o índice de
conciliação foi de 91%. Nos processos em que ambas as partes
participaram da vivência de constelações, o resultado foi 100%
positivo. “Já nas simples audiências de conciliação, sem constelação,
o índice foi de 73%”, comparou. Segundo ele, o próximo passo, em
Itabuna, será a constelação em processos de inventário, "Eles
costumam ser processos demorados, que têm carga emocional
envolvida de vários entes familiares. A técnica já foi aplicada em
alguns processos e conseguiu reaproximar herdeiros. Deveremos
incluir mais esse tema”, afirmou o magistrado. 35
Na comarca de Goiânia, merece destaque o Projeto Mediação Familiar
do 3 o Centro Judiciário de Soluções de Conflitos e Cidadania, que
rendeu para o Tribunal de Justiça de Goiás (TJGO) o primeiro lugar
no V Prêmio Conciliar é Legal, promovido pelo CNJ:
Em Goiás, o Projeto Mediação Familiar, do 3 o Centro judiciário de
Soluções de Conflitos e Cidadania da comarca de Goiânia, rendeu
para o Tribunal de Justiça de Goiás (TJGO) o primei ro lugar no V
Prêmio Conciliar é Legal, promovido pelo CNJ. A novidade
apresentada no projeto era exatamente a utilização da técnica da
constelação nas sessões de mediação. De acordo com o juiz Paulo
César Alves das Neves, coordenador do Núcleo Permanente de
Métodos Consensuais de Solução de Conflitos do tribunal e
idealizador do projeto, o índice de solução de conflitos com auxílio da
técnica é de aproximadamente 94% das demandas. 36
No Estado do Mato Grosso, Jaqueline Cherulli, juíza da 3 a Vara
Especializada de Família de Várzea Grande, já implementa o uso das
constelações familiares em questões envolvendo direito de família.
No Estado de Santa Catarina, a juíza Vânia Pertemann, junto ao Fórum
da UFSC, na Comarca de Florianópolis, é precursora no uso das
35
PORTAL CNJ. Constelação Familiar ajuda a humanizar práticas de conciliação no Judiciário.
Disponível em < http://www.cnj.jus.br/noticias/cnj/83766-constela- cao-familiar-ajuda-humanizar-
praticas-de-conciliacao-no-judiciario-2>. Acesso em 19 de julho de 2017.
36
ANDREOLA, Neolisa. Constelação familiar é utilizada como mediação no Judiciário de MT.
Disponível em <http://circuitomt.com.br/editorias/cidades/ 72834-constelacao-familiar-e-utilizada-
como-mediacao-no-judiciario-de-m.html>. Acesso em 21 de julho de 2017.
constelações familiares no projeto “Conversas de Família, onde são
utilizadas ferramentas de mediação, psicologia, filosofia, constelações
familiares e comunicação não-violenta para propiciar a pacificação das
relações pessoais, interpessoais, familiares, conjugais, e parentais,
assim como para estimular a restauração dos vínculos familiares com
a resolução dos conflitos.
Nesse projeto, os jurisdicionados são convidados a participar e, se
assim o quiserem, constelar seus temas nas oficinas que são
ministradas por pessoal altamente qualificado. Os resultados destas
oficinas são relevantes: 90% de conciliação e a satisfação dos
jurisdicionados com a solução que eles próprios encontraram para o
conflito. 37
No Distrito Federal, através do Projeto Constelar e Concili ar, o
Tribunal de Justiça do Distrito Federal e dos Territórios -TJDFT
implementou a técnica das constelações familiares para a resolução de
conflitos:
Por meio do Projeto Constelar e Conciliar, o Tribunal de Justiça do
Distrito Federal e dos Territórios - TJDFT começa a usar a técnica
das Constelações Familiares para a resolução de conflitos. Já
participam do projeto a 1 a Vara Criminal de Brasília; a Vara Cível,
de Família, Órfãos e Sucessões do Núcleo Bandeirante; os Centros
Judiciários de Solução de Conflitos e Cidadania - CEJUSCs de
Brasília e de Taguatinga, e o CEJUSC/Superendividados. O projeto é
supervisionado pelas juízas Luciana Yuki, Magáli Gomes, Rachel
Adjunto e Ana Claudia Loiola. 38
Fica evidente a permeabilidade do método das constelações famil iares
no Judiciário pátrio. Mesmo que ainda se esteja no início de um longo
processo de construção de uma cultura pacífica de solução de conflitos,
37
SALA DE IMPRENSA DO TJSC. Disponível em http://portal.tjsc.jus. br/web/sala-de-
imprensa/noticias/visualizar/-/asset_publisher/l22DU7e-
vsBM8/content/multidisciplinaridade-faz-projeto-%60conversa-de-familia%C2%BF-ter-
baixa-recidiva-em-acoes;jsessionid=A954CB5BE9 I F7D- 6F6B3CB488C347007C.
Acessado em 26 de julho de 2017.
38
TJDFT NUPECON. TJDFT começa a usar constelações familiares na resolução de conflitos.
http://www.tjdft.jus.br/institucional/imprensa/notidas/2016/fevereiro/tjdft-comeca-a-usar-
constelacoes-familiares-na-resolucao-de-conflitos. Acesso em 20 de julho de 2017.
cada passo é um passo sagrado e no campo das constelações,
vislumbra- se um belo movimento de abertura e recepção a essa nova
forma de perceber os conflitos.
Sempre, faz-se necessário ver além do aparente, buscar soluções
construtivas e trabalhar como uma grande equipe, pois todos nós,
construtores do Direito, compomos um sistema, e cada um de nós é
peça chave para que o movimento que promove a JUSTIÇA, ocorra
com respeito à ordem, à hierarquia e ao equilíbrio, enfim, de forma
harmoniosa.
CAPÍTULO 2
APLICAÇÃO DAS LEIS SISTÊMICAS AO DIREITO DE
FAMÍLIA