Luiza Mader Paladino PDF
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Modigliani, De Chirico etc. O encargo de gerir público e que rompe com as noções artísticas
uma instituição com um acervo de obras-primas usuais. A expressão “MAC do Zanini”,
comparáveis aos grandes museus da Europa e amplamente utilizada pelos artistas e
EUA, atribuía estabilidade e prestígio ao MAC colaboradores que frequentavam o museu,
USP, ratificando a sua função tradicional de tornou-se “reveladora dessa museologia
salvaguardar obras de renome. Contudo, essa revolucionária e compartilhada com os
noção convencional do Museu como depositário artistas”.13
de obras consagradas foi redimensionada ao
longo da gestão de Zanini. Se uma das frentes do Lembremos que a mais importante instituição
Museu era amparar a organização do inventário, artística brasileira daquele momento, a Bienal de
da pesquisa e da apresentação do acervo São Paulo, passava por um período de crise,
moderno, o outro projeto paralelo baseava-se no alavancada por uma série de boicotes.14 Após a
estímulo da produção contemporânea. crise institucional da Bienal, o papel do MAC
USP como lugar de encontro e agregador de
Junto aos artistas, o diretor organizou exposições ideias e reflexões artísticas, tornou-se ainda mais
que buscavam incentivar o uso do local para o fundamental, aproximando-o da experiência do
desenvolvimento de projetos, cursos, palestras e museu como um laboratório.15 Embora abrigasse
como fórum de debates.10 Desde o seu ano de as suas exposições no mesmo pavilhão da Bienal,
inauguração, o Museu criou uma mostra anual o Museu foi gradualmente construindo um papel
para jovens artistas de até 33 anos.11 Dentro cada vez mais distante do circuito oficial, como
dessa programação, vale destacar a importância espaço de resistência e acolhimento de práticas
da Jovem Arte Contemporânea – JAC (1967- experimentais. Embora o MAC tenha aumentado
1974), que desde as primeiras edições procurava a sua coleção de obras internacionais,
se distanciar dos formatos tradicionais dos salões principalmente adquiridas nas Bienais, quando a
e seus mecanismos de premiação. A I JAC, de Reitoria da Universidade acendeu em propiciar
1967, já evidenciava o caráter experimental do verbas para esse fim,16 foi a partir de outro tipo
MAC USP, envolvendo a inclusão de novos de colecionismo que a entidade se ajustou nesse
suportes de arte para além das categorias período. O Museu estava ligado a uma ampla
convencionais como pintura e escultura. rede de artistas e instituições estrangeiras, das
quais buscou estreitar laços durante toda a sua
Porém, é na sexta edição da mostra que se gestão.
observa uma maior radicalização dessas
propostas: a começar pela eliminação do corpo Dessa rede de contatos, a instituição pôde
de jurados que selecionava e legitimava um organizar grandes mostras internacionais como
determinado grupo de obras. Essas decisões Prospectiva 74, de 1974, e Poéticas Visuais, de
foram fruto de um amplo debate entre artistas, 1977. Para além do circuito hegemônico, essa
jurados e o próprio museu, que ocorreu desde o rede estimulou intercâmbios com artistas e
ano anterior à inauguração da VI JAC,12 intelectuais que viviam em países sob regimes
evidenciando o papel de diálogo e construção ditatoriais na América Latina e no Leste
mútua entre museu e artista. A inscrição foi Europeu. Para essas duas exposições
irrestrita a qualquer interessado, ocasionando a mencionadas, os artistas enviaram pela rede
participação de artistas consagrados junto aos postal uma centena de obras experimentais
pouco conhecidos. Mas esta mostra tornou-se resultantes nos novos media, como postais,
emblemática, especialmente, por transformar o mapas, fotografias, textos impressos, fotocópias,
espaço expositivo do museu em lotes, que seriam publicações, filmes, audiovisual etc. Grande
sorteados entre os interessados. Os 210 artistas parte desses trabalhos foi incorporada ao acervo
inscritos tiveram que sortear 84 lotes dentro do do Museu.
MAC, e no decorrer dos 14 dias de processo, esses
espaços poderiam ser negociados, trocados e até Essas redes auxiliam no entendimento dos
vendidos. A proposta da VI JAC, idealizada pelo pontos de convergência institucionais que
artista Donato Ferrari, era dar espaço às envolviam a organização de exposições, a
experiências efêmeras, para além da obra de arte proximidade teórica por certos tipos de debate e
como sentido único e imutável. E, sobretudo, reflexões da época e, especialmente, as
localizar o museu dentro desse eixo de atividade possibilidades de trocas artísticas. Esse
criadora, que incentiva a troca entre o artista e o intercâmbio nos permite observar os micro-
relatos por trás das distintas gestões apoio do Ministério das Relações Exteriores da
institucionais. Seus inúmeros percursos são Argentina.
narrados por meio de correspondências que nos
mostram eixos de afinidades, relações de
amizade e confiança, a reciprocidade de
interesses e a busca pelo diálogo.
O pensamento de Duchamp e sua contra- Desse modo, uma teoria das ideologias artísticas
operação pictórica convergiam com as ideias que deveria se ajustar às reais condições sociais e
Zanini e Romero Brest desenvolveram, cada um econômicas locais, criando uma dialética entre
a seu modo, em suas gestões. Especialmente, no “simbologías importadas y simbologías propias”
distanciamento dos critérios pautados em capazes de desenvolver a reprodução de
categorias estéticas tradicionais, recriando suas ideologias artísticas nas comunidades locais.23
práticas institucionais e abrindo espaço para o Para a mostra Art Systems in Latinamerica,24
questionamento dos artistas em relação ao fruto dessa ambiciosa campanha de
sistema de arte. A lógica do ready-made, ao internacionalização, Glusberg escreveu:
transformar um objeto do cotidiano em obra de
arte, acabava por deflagrar uma série de Podemos señalar, sin embargo, una
questionamentos nos espaços expositivos. Essa diferencia fundamental: los europeus
interferência possibilitou uma redefinição dos hacen una discusión teórica de los
valores do sistema artístico e dos seus ambientes problemas políticos, y los
latinoamericanos los incluyen
institucionais, provocando nesses espaços novas
obligadamente en sus obras, por vivir
potencialidades de criação e um processo esos problemas políticos a nivel
contínuo de reavaliação, confrontação e cotidiano. En esta etapa podríamos
desenvolvimento desses novos procedimentos de decir que más que obras, los
produção. operadores de arte latinoamericano
producen documentos comprometidos
A rede internacional de contatos agenciada por con su realidad, constancias de lo que
Zanini, desde o início de sua gestão, deu está ocurriendo en sus respectivos
continuidade ao longo da década de 1970. países.25
Focaremos nosso recorte no intercâmbio
promovido entre o MAC USP e o CAYC. O CAYC também privilegiou os novos meios de
comunicação como a televisão e o vídeo como
Diálogos entre Glusberg e Zanini ferramentas artísticas alinhadas às práticas
conceituais. Glusberg encarava os mass media
Jorge Glusberg e Walter Zanini contribuíram não como meios técnicos, mas como operadores
para sedimentar a expansão de “um território ideológicos, como lugares privilegiados das
dialógico transnacional”, gerando diferentes manifestações de significação social. Seguindo a
experiências como o intercâmbio de artistas, mesma lógica discursiva ajustada a um recorte
exposições, convites para colóquios e, local, o vídeo também seria a materialização das
especialmente, a busca pelo diálogo “sensível ao relações sociais e uma fonte de implicações
problema cultural latino-americano”.20 ideológicas. Desde 1973, o CAYC explorou o
terreno do cinema experimental, por meio da
No período em que estabeleceram contato, Cooperativa Ediciones del Tercer Mundo,
Glusberg buscava aprimorar as estratégias de integrada por Danilo Galasse, Pedro Roth e o
divulgação e consolidação das correntes teóricas próprio Glusberg. A programação incluía desde a
e artísticas desenvolvidas no CAYC. Sua linha de realização de filmes e videotapes à formação de
interesse, focada nas práticas interdisciplinares, uma videoteca de artistas de diversos países
tinha como objetivo a criação de circuitos de latino-americanos.
visibilidade local e internacional para a
promoção de artistas argentinos No contexto paulistano, Zanini criou um
contemporâneos. Com base na cibernética e nas
21 convênio com a Associação dos Amigos da
teorias da informação, foi delineando o conceito Cinemateca com o intuito de organizar
de sistema que amparou as primeiras mostras programações de cinema e exposições
organizadas pelo Centro, como a antológica Arte relacionadas ao tema. Mas o mais relevante foi o
de Sistemas,22 de 1971, que reuniu mais de uma impulso que o MAC deu à difusão da videoarte. O
centena de artistas nacionais e estrangeiros na aparelho portátil Sony Portapak de vídeo tinha
capital portenha. Como vimos, o Centro se sido recentemente lançado no mercado e Zanini
integrou às práticas conceituais em voga nos buscou recursos para adquirir o equipamento,
circuitos internacionais hegemônicos, inserindo que foi colocado à disposição dos artistas, em
os conceitualismos a uma retórica latino- 1976. Sempre atento à ampliação do papel dos
americanista. museus, o diretor do MAC refletia sobre o vídeo
em “termos de expressão e em seus potenciais
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das despesas. A vinda do francês, assim como dos actividades en Sudamérica. O interesse
outros membros do Coletivo de Arte Sociológica despertado pelas práticas artistas latino-
ao MAC e ao CAYC, atesta o elo de afinidades americanas se deu por sua posição marginal e
propositivas das duas instituições, além da fora do circuito hegemônico, além de o artista
conexão de ambas com o que era produzido de partilhar a mesma realidade de viver sob um
mais atual e potente no terreno das artes e do regime ditatorial.
pensamento em circulação em distintos canais
na Europa. No processo de sua vinda, Zanini escrevera:
“Caro Glusberg, em primeiro lugar, muito
obrigada a você pela incessante remessa de
páginas amarelas, diapositivos, comunicados etc.
[...] Válcarcel quer vir a São Paulo. Estamos
tentando achar um jeito”.31 Em resposta, o
argentino confirmou: “Válcarcel Medina vendrá
a Buenos Aires. No tenemos ningún problema si
ud. realiza alguna exposición con él antes o
después de su trabajo aquí. Le hemos dicho que
se ponga en contacto con él pues nos parece una
persona interesante”.32 O artista espanhol, por
meio da rede de arte postal, havia passado pelo
MAC USP, na ocasião da mostra Prospectiva 74
e posteriormente iria participar, enviando
trabalhos para as exposições Década de 70,
organizada por Glusberg.
mesma, tendo como eixo de articulação as práticas e teóricas da Fundação Bienal, propondo
produções ligadas à arte de sistemas (Fig. 4). Os um novo espaço para experimentação ao invés da
artistas enviavam pelo correio as obras em um consagração. Contudo, os mecanismos de
papel de 60 por 90 cm e em Buenos Aires elas premiação tiveram continuidade, gerando uma
eram reproduzidas por meio da técnica série de polêmicas, como analisaremos adiante.
heliográfica.44 Esse ponto de partida
metodológico facilitava a circulação das mostras, O Conselho constituiu a mostra em três eixos:
que podiam ser montadas facilmente em Exposição Antológica, Grandes Confrontos e
qualquer espaço. Proposições Contemporâneas. Além dos núcleos
temáticos, o Conselho apresentava a
reformulação das salas especiais por meio de
exposições antológicas, cujo homenageado seria
o pintor mexicano Rufino Tamayo. A
programação geral incluía, também, a realização
de um simpósio internacional denominado O
Contemporâneo na Arte, com a participação de
vários críticos e intelectuais, como Gregory
Battcock, Vilém Flusser, Jorge Glusberg, entre
outros.
arte argentina ao mundo. Além disso, o discurso decisión nos parece fundamental,
político que demarcava a categoria arte de porque puede servir de vehículo a una
sistemas já não era mais central, notando uma idea esbozada por el CAYC en su
aproximação com as novas vertentes semióticas primer catálogo, que data de 1969: la
de establecer, como los europeos y los
que começavam a circular na fortuna crítica
norteamericanos, un circuito de
daqueles anos.52 De acordo com Glusberg, a diálogo y difusión para el arte
instalação se vinculava não apenas às latinoamericano.55
experiências da arte de sistemas, mas às
tipologias urbanas da cidade, oferecendo uma Um segundo ponto que deve ser levado em conta
visão sincrônica das construções humanas.53 E se relaciona com a fácil mobilidade de Glusberg
para abordar essa problemática, incluiu a pelas instituições de seu país e no estrangeiro, e
dimensão ecológica ligada à construção dos a coincidência do enrijecimento da ditadura
“habitats humanos”, propondo o conjunto de militar com o êxito de seu Centro. O CAYC havia
obras a partir dos polos natural – artificial. recusado participar das edições anteriores da
Bienal, em consonância com a rede de artistas
Esta análise procura não focar na obra individual que estava formando os boicotes desde 1969.
de cada integrante do Grupo de los Trece, mas Todavia, a adesão de Glusberg à XIV Bienal soou
refletir sobre o que estava em jogo nessa contraditória, especialmente, em um momento
premiação, principalmente, a postura política de que a Argentina era governada por um regime
Jorge Glusberg. Um primeiro ponto importante ditatorial. A imprensa brasileira também
que pode ampliar a compreensão desse contexto apontou as possíveis motivações políticas por
se associa ao interesse crescente pela temática trás da premiação, que poderiam favorecer o
regionalista e latino-americanista, debatida em “país de regime amigo”.56
várias conferências e simpósios desse período.
Nesse sentido, a postura regional conduzida pelo Não restam dúvidas de que o CAYC e o Grupo de
CAYC, desde os primórdios da instituição, los Trece, direcionados para uma única figura,
entraria em compasso com essas discussões que Jorge Glusberg, alcançaram o máximo
envolveram intelectuais e críticos como Juan reconhecimento e prestígio com o prêmio de um
Acha, Marta Traba, Néstor García Canclini, dos mais importantes eventos mundiais de arte,
Damian Bayón, Aracy Amaral, Frederico Morais, a Bienal Internacional de São Paulo. Com o êxito,
entre outros.54 A I Bienal Latino-americana, de a Argentina pretendia retomar a sua liderança
1978, é fruto dessas novas formulações teóricas continental depois de quase uma década de
sobre a produção cultural do continente. E como peregrinações pela América Latina e, sobretudo,
Jorge Glusberg estava sempre atento às pelo circuito internacional, promovendo o perfil
oportunidades, não perdeu a chance de da arte latino-americana. Na perspectiva de
relacionar esse contexto com a produção ligada Glusberg, o que era válido para a Argentina era
ao CAYC, conforme escrevera em um jornal válido para todo o continente.57 A agilidade e a
portenho: locomoção por diversos circuitos eram
impulsionadas pelo objetivo de abrir as portas
“Signos en ecossistemas artificiales” y para a difusão da arte argentina pelo mundo.
otras propuestas latino-americanas
Entretanto, essa trajetória bem-sucedida do
exhibidas en la XIV Bienal nos
permitieron deducir la certeza de una CAYC pode ser analisada sob outro ponto de
tesis que venimos esgrimiendo hace vista. O perfil interdisciplinar do CAYC garantia
tempo: no existe un arte certa versatilidade para inserir-se em diferentes
latinoamericano pero sí una áreas do conhecimento, assim como para
problemática común. La nueva vincular-se a entidades internacionais de ponta.
filosofía que inspiro la apertura de esta Gradualmente, Glusberg desenvolveu uma
muestra paulista ha derivado en otra atuação crítica múltipla, que abrangia toda a
reforma esencial: entre cada Bienal produção escrita dos catálogos e livros ligados ao
Internacional se desarrollaba una CAYC, a direção de páginas de arquitetura e arte
Bienal Nacional; ahora, esta última
dos principais jornais do país (La Opinión e
será sustituida por Bienales
Latinoamericanas, la primera de las Clarín) e artigos em publicações internacionais,
cuales tendrá lugar en octubre de 1978. divulgando o trabalho experimental do Centro e
Como argentinos en particular, y como propondo uma leitura da arte inclinada com as
latinoamericanos en general, esta propostas de suas exposições.58 Após arrebatar o
Intercâmbios institucionais…/Luiza Mader Paladino 91
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Mediante esse domínio de vários Fig. 5. “Felicitó Videla a los premiados en San Pablo”, La
campos culturais (arte, arquitetura, Nación, Arquivo Multimeios do Centro Cultural São Paulo.
imprensa, instituições associativas), e
seus vínculos com forças econômicas e Sobre esse ponto controverso, Frederico Morais
políticas, o CAYC conseguiu durante levantou a seguinte pergunta: como conciliar
vinte anos uma assombrosa criação e repressão? Se a arte argentina
continuidade em um país onde um
recuperou o seu prestígio, parte dessa guinada foi
único governo constitucional
conseguiu terminar seu mandato nas tributária da inteligência e agilidade de Jorge
últimas quatro décadas. Também Glusberg, que soube aproveitar o talento dos
parece uma consequência de seu artistas ligados ao Grupo de los Trece, assim
controle sobre tantas instâncias da como estes se valeram da máquina promocional
produção e da circulação artística que do CAYC para divulgar seus trabalhos. Até certo
esse centro não tenha recebido mais do ponto, todos poderiam ganhar nessa cooperação.
que críticas confidenciais, nenhuma Todavia, segundo o crítico brasileiro, “todo o
que o questionasse seriamente a ponto organismo que cresce muito, e rapidamente, cria
de diminuir seu reconhecimento no o seu próprio câncer”, levando a outro
país.59
questionamento: “Por que a Argentina entregou
a Glusberg, momentaneamente, o comando de
Mas o ponto mais controverso da personalidade um de seus setores culturais, as artes
de Glusberg foi a relação estreita que manteve plásticas?”.63
com a ditadura militar. Sabemos que o Centro era
uma instituição privada, cujo financiamento Essas perguntas nos levam à reflexão sobre como
vinha de uma das maiores empresas de artigos de conciliar os processos de criação artística em
iluminação da Argentina, a Modulador, da qual países nos quais o regime político é de exceção,
Glusberg era herdeiro. Parte da verba gerada pela que nesse momento era vigente em quase toda a
corporação era de contratos com o governo região do cone sul. E, sobretudo, refletir sobre o
militar, um dos seus principais clientes. A papel dessa figura controversa que fora Jorge
Modulador, por exemplo, iluminou os estádios Glusberg. O paradoxal dessa questão é relacionar
da Copa do Mundo de Futebol, de 1978, quando o estímulo que Glusberg deu à produção de
a Argentina foi anfitriã do evento. Nessa época, o caráter conceitualista e de forte acento político
general Rafael Videla divulgava uma campanha que muitas vezes bateu de frente com os regimes
política que nomeava os argentinos de “direitos” ditatoriais latino-americanos, bem como com a
e “humanos”, procurando responder às condição subalterna e econômica dos países do
denúncias internacionais por sua violação aos cone sul. E, concomitantemente, apontar que
direitos humanos.60 Na ocasião do grande essa mesma produção crítica foi abastecida
prêmio da XIV Bienal Internacional de São indiretamente com a verba gerada de contratos
Paulo, o Grupo de los Trece recebeu um com o governo militar.
telegrama do presidente Videla parabenizando-o
pela enorme conquista. A imprensa local noticiou Para finalizar, dentro de um espectro maior, é
alguns trechos da carta enviada ao Grupo, nos válida a associação do diretor do CAYC com a
quais o general mandava as mais “calorosas imagem contraditória dos caudilhos latino-
felicitações” pela premiação, reiterando o mais americanos. Se tratavam de lideranças políticas
alto nível da arte argentina e a variedade que ancoravam seus poderes em relações de
enriquecedora de suas propostas estéticas (Fig. carisma e fidelidade, em uma mistura de
5).61 Glusberg, por sua vez, respondeu ao paternalismo e violência; populismo e
presidente, comprometendo-se com ele a dependência, sendo comum a tendência de se
perpetuarem no poder. Esses caudilhismos
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61 “Felicitó Videla
a los premiados en San Pablo”, La Nación,
comunal. Social”, en Aracy Amaral, Textos do Trópico de 15-10-1977. Arquivo Multimeios do Centro Cultural São
Capricórnio. Artigos e ensaios (1980-2005). Vol. 2: Paulo.
Circuitos de Arte na América Latina, São Paulo, Editora 34, 62 Néstor García Canclini, Culturas híbridas..., op. cit., p. 95.
2006, pp. 268-270.
63Frederico Morais, Artes plásticas na América Latina...,
48 Wagner Carelli, “Premiação da Bienal recebida com op. cit., p. 177.
protestos”, O Estado de São Paulo, 12-10-1977. Arquivo
Multimeios do Centro Cultural São Paulo.
49 FredericoMorais, “Krajcberg errou duas vezes”, O Globo, ¿Cómo citar correctamente el
15-10-1977. Arquivo Multimeios do Centro Cultural São presente artículo?
Paulo.
50 Idem.
51Jacob Klintowitz, “A volta de Mário Pedrosa: ‘Afinal, Mader Paladino, Luiza; “Intercâmbios
quem Krajcberg julga que é? Um Deus?’ ”, Jornal da Tarde, institucionais: a trajetória de Jorge Glusberg
13-10-1977. Arquivo Multimeios do Centro Cultural São
Paulo. no Brasil”. En caiana. Revista de Historia
52Mariana Marchesi, “El CAYC y el arte de sistemas como
del Arte y Cultura Visual del Centro
estrategia institucional”, en María J. Herrera y Mariana Argentino de Investigadores de Arte (CAIA).
Marchesi, op. cit., p. 81. No 9 | Segundo semestre 2016, pp. 80-95.
53Jorge Glusberg, Del pop-art a la nueva imagen, op. cit.,
p.221.
URL:
http://caiana.caia.org.ar/template/caiana.p
54Sobre os simpósios e conferências sobre arte latino-
americana desse período, ver Aracy Amaral, Arte e meio hp?pag=articles/article_2.php&obj=247&vo
artístico..., op. cit. l=9
55Jorge Glusberg, “Bienal de San Pablo”, El Comercio, 13-
11-1977. Arquivo Multimeios do Centro Cultural São Paulo.
56 Wagner Carelli, “Premiação da Bienal recebida com
protestos”, op. cit.
57 Frederico Morais, Artes plásticas na América Latina: do
transe ao transitório, Rio de Janeiro, Editora Civilização
Brasileira, 1979, p. 175. Recibido: 20/07/2016
58 Néstor García Canclini, Culturas híbridas..., op. cit., p. 94.
Aceptado: 28/10/2016
59 Idem.