Enc11 PD Maias A Toca Cap Xiii

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Os Maias Eça de Queirós

1. Lê o texto abaixo.

A Toca (Capítulo XIII)


Junto do peitoril crescia um pé de margaridas, e ao lado outro de baunilha que
perfumavao ar. Adiante estendia-se um tapete de relva, mal aparada, um pouco amarelada já
pelo calorde julho; e entre duas grandes árvores que lhe faziam sombra, havia ali, para os
vagares dasesta, um largo banco de cortiça. Um renque de arbustos cerrados parecia fechar a
5 quinta,daquele lado, como uma sebe. Depois a colina descia, com outras quintarolas, casas
que senão viam, e uma chaminé de fábrica; e lá no fundo o rio rebrilhava, vidrado de azul,
mudo echeio de sol, até às montanhas de além-Tejo, azuladas também, na faiscação clara do
céu deverão.

10 – Isto é encantador! – repetia ela.


– É um paraíso! Pois não lhe dizia eu? É necessário pôr um nome a esta casa…Como se
háde chamar? Vila Marie? Não. Château Rose… Também não, credo! Parece o nome de um
vinho.O melhor é batizá-la definitivamente com o nome que nós lhe dávamos. Nós
chamávamos-lhea Toca.
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Maria Eduarda achou originalíssimo o nome de Toca. Devia-se até pintar em letras verme-
lhassobre o portão.
– Justamente, e com uma divisa de bicho – disse Carlos rindo. – Uma divisa de bicho
egoístana sua felicidade e no seu buraco: Não me mexam!
Mas ela parara, com um lindo riso de surpresa, diante da mesa posta, cheia de fruta, comas
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duas cadeiras já chegadas, e os cristais brilhando entre as flores.
– São as bodas de Caná!
Os olhos de Carlos resplandeceram.
– São as nossas!
Maria Eduarda fez-se muito vermelha; e baixou o rosto a escolher um morango, depois
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aescolher uma rosa.
– Quer uma gota de champanhe? – exclamou Carlos. – Com um pouco de gelo? Nós
temosgelo, temos tudo! Não nos falta nada, nem a bênção de Deus… Uma gotinha de
champanhe,vá!
Ela aceitou: beberam pelo mesmo copo; outra vez os seus lábios se encontraram, apaixo-
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nadamente.
Carlos acendeu uma cigarette, continuaram a percorrer a casa. […]
Mas depois o quarto que devia ser o seu, quando Carlos lho foi mostrar, desagradou-lhecom
o seu luxo estridente e sensual. Era uma alcova recebendo a claridade de uma sala for- radade
tapeçarias, onde desmaiavam, na trama de lã, os amores de Vénus e Marte: da porta
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decomunicação, arredondada em arco de capela, pendia uma pesada lâmpada da Renascença,de
ferro forjado: e, àquela hora, batida por uma larga faixa de sol, a alcova resplandecia comoo
interior de um tabernáculo profanado, convertido em retiro lascivo de serralho… Era
todaforrada, paredes e tetos, de um brocado amarelo, cor de botão-de-ouro; um tapete de
veludo,do mesmo tom rico, fazia um pavimento de ouro vivo sobre que poderiam correr nus os
pésardentes de uma deusa amorosa – e o leito de dossel, alçado sobre um estrado, coberto com

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Os Maias Eça de Queirós
uma colcha de cetim amarelo, bordada a flores de ouro, envolto em solenes cortinas também
40 amarelas de velho brocatel, enchia a alcova, esplêndido e severo, e como erguido para as vo-
luptuosidadesgrandiosas de uma paixão trágica do tempo de Lucrécia ou de Romeu. E era ali
que o bom Craft, com um lenço de seda da Índia amarrado na cabeça, ressonava as suas
setehoras, pacata e solitariamente.
Mas Maria Eduarda não gostou destes amarelos excessivos. Depois impressionou-se,
45 aoreparar num painel antigo, defumado, ressaltando em negro do fundo de todo aquele ouro –
onde apenas se distinguia uma cabeça degolada, lívida, gelada no seu sangue, dentro de
umprato de cobre. E para maior excentricidade, a um canto, de cima de uma coluna de
carvalho,uma enorme coruja empalhada fixava no leito de amor, com um ar de meditação
sinistra, os seusdois olhos redondos e agourentos… Maria Eduarda achava impossível ter ali
50 sonhos suaves.
Carlos agarrou logo na coluna e no mocho, atirou-os para um canto do corredor; e propôs-
-lhe mudar aqueles brocados, forrar a alcova de um cetim cor-de-rosa e risonho.
– Não, venho-me a acostumar a todos esses ouros… Somente aquele quadro, com a ca-
beça,e com o sangue… Jesus, que horror!
– Reparando bem – disse Carlos –, creio que é o nosso velho amigo S. João Baptista.
QUEIRÓS, Eça de, 2016. Os Maias. Porto: Porto Editora [pp. 444-447, com supressões]

2. Na Quinta dos Olivais, Carlos e Maria Eduarda observam o que os rodeia.


2.1. Recolhe do texto um exemplo de sensação visual e outro de sensação olfativa.
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3. Assinala a opção correta.


3.1. A casa adquire o nome Toca
a. porque tinha sido habitada por bichos.
b.pelas emoções sentidas e pelo valor afetivo.
c.pela decoração de mau gosto.
3.2. Maria Eduarda gostou do espaço exterior, mas desagradou-lhe
a.a sala, por ser pequena e mal decorada.
b.o corredor, por ser estreito e pobremente decorado.
c.o quarto, por ser desagradavelmente luxuoso.
3.3. A própria casa parece indicar a presença do pecado
a.pela estranha decoração do quarto.
b.pelas histórias lá vividas.
c.por não valorizar os elementos religiosos.
3.4. As personagens deixam-se afetar pelo espaço, pois
a.Carlos deixa-se abater e Maria Eduarda sente-se feliz.
b.Carlos mostra-se preocupado com presságios e Maria Eduarda também.
c.Carlos mostra-se indiferente e Maria Eduarda tem receio dos presságios.

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