Jogador de Futebol
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II - A partir dos 35 anos o jogador profissional tem direito a pensão anual calculada, já
não pela IPATH, mas em função da IPP agravada pela referida tabela específica e pelo
factor de bonificação 1.5 da al. a) do nº 5 da TNI, porque continua a estar afectado na
sua capacidade residual para outras actividades e a ter um esforço acrescido na
adaptação a outras funções.
III - O princípio da igualdade (13º CRP) proclama tratamento igual para o que é
essencialmente igual e tratamento diferenciado para o que é substancialmente diferente,
sendo um travão a arbitrariedades, não vedando, contudo, distinções fundadas em
motivos objectivos e racionais, tal como acontece no regime dos praticantes desportivos
profissionais, ofício de desgaste rápido, retribuído de modo muito superior à média, o que
justifica distintos limites etários e económicos, bem como diferentes compensações em
caso de sinistro laboral.
VII - O mesmo acontece com o prémio devido em caso de participação em, pelo menos,
20 jogos oficiais durante o período mínimo de 45 minutos, quando se prova este facto
virtual e a ré se vinculou ao seu pagamento por via negocial.
Decisão Texto Integral:
I. RELATÓRIO
AUTOR- M. S.
RÉS: I) X - COMPANHIA DE SEGUROS, SA;
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em consequência:
II. A Recorrente entende, com o devido respeito, que este “facto” não
deveria ter sido incluído na matéria assente por conter uma
conclusão/decisão de direito. Sem prejuízo do exposto, impõe-se que,
cautelarmente, caso porventura se entenda que o facto assente sob o
n.º 14 não contém matéria de direito ou não resulta da aplicação do
direito aos factos ‒ no que não se concede e se refere por mero dever
de patrocínio ‒, o mesmo seja impugnado por não ter sido produzida
prova que permitisse demonstrá-lo, devendo, assim, ser alterado,
passando a ter a seguinte redacção: “Como consequência directa e
necessária do acidente, o autor ficou a padecer de incapacidade
permanente parcial para o trabalho de 19%”.
JJ. Com efeito, do “Auto de Exame por Junta Médica” que faz parte do
referido apenso (com a Referência 162558009) o único entendimento
unânime quanto à incapacidade permanente a atribuir ao Recorrido
respeita à IPP de 19% com IPATH, comutada em 39,154% por aplicação
da Lei n.º 27/2011…..
KK. No final do auto, apenas consta que “De seguida pelo Senhor Perito
Médico do sinistrado foi dito que entende que deve ser aplicado o factor
de bonificação 1,5 em virtude de o sinistrado ter ficado totalmente
incapaz para o exercício da sua profissão de jogador profissional de
futebol”. O carácter genérico da afirmação do perito revela, com o
devido respeito, um carácter tendencioso, tendo em conta aqueles que
eram e são os interesses do Recorrido.
LL. Certo é que não ficou a constar da matéria assente se o Recorrido é
ou não reconvertível em relação ao posto de trabalho de praticante
desportivo profissional de futebol, pelo que, salvo melhor opinião, o
Tribunal a quo não poderia tirar tal conclusão sem que desse como
provado essa alegada factualidade.
MM. …”.
NN. O Tribunal a quo não incluiu qualquer facto no elenco dos “Factos
não provados”, referindo apenas que “Com relevância para a decisão da
causa, não resultaram provados quaisquer outros factos.”
OO. No nosso entender, não foi dado como provado que, conforme
resulta dos Docs. 6, 9 e 13 da PI ‒ onde, entre recibos de outros meses
que aqui não relevam, se podem encontrar os recibos de Novembro de
2016 a Dezembro de 2017, que coincidem com o período de ITA, a
Recorrente não só suportou sozinha o valor dos primeiros 60 dias de ITA
(devido à franquia prevista na apólice junta como Doc. n.º 1 da
Contestação da Ré Seguradora), como ainda continuou a pagar (e sem
que a tal estivesse obrigada) os valores que excediam a retribuição
transferida para a Seguradora (€ 140.000,00 por ano), ou seja,
continuou a suportar o valor das viagens feitas pelo Recorrido e
transferiu ainda os valores relativos ao subsídio de renda e aos prémios
de jogos, sempre que se verificavam as respectivas condições de
atribuição, tendo pago, assim, os seguintes valores durante o período de
ITA e que se encontram discriminados nos referidos documentos (de
salientar que a Recorrente está, em seu prejuízo, a desconsiderar os
dois dias de ITA de Novembro de 2016, mês em que suportou todos os
encargos referentes ao período de um mês completo): - Dezembro de
2016: € 11.666,67 + € 400,00 + € 2.000,00 + € 2.120,00 (cfr. Doc. 6 da
PI); - Janeiro de 2017: € 11.666,67 + € 400,00 + € 553,84 (cfr. Doc. 6 da
PI); - Fevereiro de 2017: € 11.666,67 + € 400,00 + € 763,84 (cfr. Doc. 6
da PI); - Março de 2017: € 11.666,67 + € 400,00 + € 553,84 (cfr. Doc. 6
da PI); - Abril de 2017: € 11.666,67 + € 400,00 + € 973,84 (cfr. Doc. 9 da
PI); - Maio de 2017: € 11.666,67 + € 400,00 + € 373,84 (cfr. Doc. 9 da
PI); - Junho de 2017: € 11.666,67 + € 400,00 (cfr. Doc. 9 da PI); - Julho
de 2017: € 12.500,00 + € 400,00 (cfr. Doc. 9 da PI); - Agosto de 2017: €
12.500,00 + € 400,00 (cfr. Doc. 13 da PI); - Setembro de 2017: €
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maiores fragilidades.
UUU. Interpretar os artigos 48.º, n.º 3, alínea c) da LAT e o artigo 5.º da
Lei n.º 27/2011, de 16 de Junho, no sentido de a pensão anual e vitalícia
devida após completar 35 anos ter em consideração a comutação
especial pela incapacidade específica do praticante desportivo é
inconstitucional por violação dos artigos 13.º e 59.º da Constituição da
República Portuguesa, na medida em que conduz a um tratamento
desigual injustificado ao favorecer os praticantes desportivos, após o
termo das suas carreiras, em relação aos demais sinistrados.
VVV. Face ao exposto, deve a sentença ser alterada de modo a não ter
em consideração a aplicação da bonificação de 1.5, para efeitos de
cálculos das pensões, em concreto, da pensão anual até aos 35 anos,
devendo, assim, considerar como valor da pensão anual a quantia de €
32.847,89 ….
WWW. O Tribunal a quo vem condenar a Ré Empregadora “a pagar ao
autor a pensão anual e vitalícia de € 23.351,45, até completar trinta e
cinco anos de idade, acrescida de juros de mora a calcular à taxa legal
supletiva desde o dia seguinte ao da alta até integral pagamento” (cfr.
ponto 4. da sentença).
XXX. A Recorrente entende que, salvo melhor opinião, não se deve
manter a taxa de incapacidade agravada prevista para os praticantes
desportivos na Lei n.º 27/2011, de 16 de Junho, e ainda a bonificação de
1,5 associada à não reconversão no posto de trabalho.
YYY. A Lei n.º 27/2011, de 16 de Junho, no seu artigo 3.º, n.º 2, refere
expressamente que, quando dos danos emergentes de acidentes de
trabalho resulte uma incapacidade permanente absoluta para o trabalho
habitual – incapacidade essa discutida nos presentes autos –, as
pensões anuais calculadas só são devidas até à data em que o
praticante complete 35 anos de idade, pelo que a pensão por
incapacidade permanente absoluta para o trabalho habitual discutida
nos presentes autos apenas seria devida até à referida data e, nestes
termos, deve o presente recurso ser julgado procedente e essa parte da
sentença ser revogada, absolvendo-se a Recorrente do pedido.
ZZZ. No entanto, caso assim não se entenda e, nessa medida, se
considere que, pese embora tenha sido atingida a idade de 35 anos, o
Recorrido ficaria afectado por uma incapacidade permanente parcial e
seria devida a respectiva pensão, sempre se dirá que a pensão anual e
vitalícia a calcular não poderia ter em conta uma IPP comutada nos
termos da lei n.º 27/2011, de 16 de Junho, a acrescer a bonificação de
1.5 associada à não reconversão do posto de trabalho.
AAAA. ..a partir dos 35 anos, a pensão deveria ser calculada com base
na IPP genérica (i.e. sem comutação especial) fixada em 19%, nos
termos as disposições do artigo 48.º, n.º 3, alínea c) da Lei n.º 98/2009,
de 4 de Setembro.
BBBB. Com efeito, de acordo com o aludido parecer do IEFP as
condições do sinistrado “não lhe permitem desempenhar as funções
essenciais à profissão de jogador profissional de futebol”, não se
fazendo qualquer menção a uma eventual limitação ao desempenho de
outras funções desportivas ou relacionadas com as mesmas, não sendo,
por isso, certo que haja uma eventual redução do ganho, na medida em
que o acidente de trabalho não o limitou para a prestação de outras
funções relacionadas com a actividade desportiva….
CCCC. ….
DDDD. …
EEEE. Nessa medida, e para todos os efeitos, importa deixar invocada
essa inconstitucionalidade, desde já se expondo que as normas
resultantes dos artigos 48.º, n.º 3, alínea c) da LAT e 5.º da Lei n.º
27/2011, de 16 de Junho, bem como na respectiva tabela anexa, e da
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CONCLUSÕES:
RECURSO DA RÉ SEGURADORA:
RECURSO DO AUTOR:
RECURSO DA RÉ EMPREGADORA:
I.I. FUNDAMENTAÇÃO
A- FACTOS PROVADOS
B - NULIDADE DA SENTENÇA
Perante todos estes elementos, o tribunal não podia senão concluir que,
de acordo com a normalidade, tudo indicava que na época de
2016/2017 o autor iria completar mais de vinte jogos oficiais, com um
mínimo de quarenta e cinco minutos por jogo, e receber a quantia
ilíquida de € 50.000,00, tal como havia acontecido na época anterior.”
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E - ENQUADRAMENTO JURÍDICO
E- 1 RECURSO DO AUTOR
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vimos referindo):
Vejamos.
Precisamente no artigo 5º, al. a), das instruções gerais da TNI, prevê-se
que na determinação do valor da incapacidade a atribuir devem ser
observadas normas, para além e sem prejuízo das que são específicas
de cada capítulo ou número, designadamente bonificando pelo factor 1.5
( segundo a fórmula:IG + (IG × 0.5), se a vítima não for reconvertível em
relação ao posto de trabalho.
Assim, deste mapa legal resulta, em primeiro lugar, que é aplicável ao
autor, jogador profissional, toda a TNI e não somente parte. Segundo,
somente não será aplicável o que vem especificamente regulado no
regime especial de praticantes desportivos profissionais. Terceiro e
consequentemente, nada na lei autoriza a não aplicação do regime
referente ao factor de bonificação de 1.5.
Mais, de acordo com o acórdão uniformizador do STJ nº 10/2014,
publicado no DR nº 123, 1ªS, de 30-06-2014 (10), a expressão “se a
vítima não for reconvertível em relação ao posto de trabalho contida na
alínea a) do n.º 5 das Instruções Gerais da Tabela Nacional de
Incapacidades por Acidente de Trabalho ou Doenças Profissionais,
aprovada pelo Decreto-Lei n.º 352/2007, de 23 de Outubro, refere-se às
situações em que o sinistrado, por virtude das lesões sofridas, não pode
retomar o exercício das funções correspondentes ao concreto posto de
trabalho que ocupava antes do acidente”.
Não sendo esse o caso quando a um/a sinistrado/a é atribuído “…o fator
de bonificação da forma como deve ser conferido a todos os sinistrados
que se encontrem, como aquela, afetados com uma IPATH e sem
possibilidades, em consequência das lesões, de retomarem o exercício
das funções correspondentes ao concreto posto de trabalho que
ocupavam antes do acidente, não se concede à sinistrada um
tratamento diferenciado relativamente aos demais cidadãos na mesma
situação, nem de favor relativamente aos sinistrados afetados de IPATH,
mas que puderam reassumir funções no concreto posto de trabalho
anteriormente ocupado.” (13)
Do mesmo modo não se alcança como possa ter sido violado o preceito
constitucional que estabelece o principio da justa reparação do
trabalhador vítima de acidente de trabalho (59º/1/f, CRP), quando o
factor de bonificação 1.5 atribuiu precisamente ao trabalhador maior
pensão por força da sua diminuição da capacidade de trabalho/ganho ao
não poder voltar a assumir as funções que antes desempenhava. Trata-
se, pois, de opção legislativa e interpretação jurisprudencial que
cumprem o princípio constitucional da justa reparação do dano sofrido
pelo sinistrado, ao invés de o violar.
desportivo profissional.
Ou seja, a pensão é menor a partir dos 35 anos devido a duas causas: i)
deixa de se aferir a pensão com base na IPATH e passa-se a aferi-la
pela IPP, o que significa que a pensão é calculada com base em 70% da
redução da capacidade geral de ganho (retribuiçãoX70%x58,731%) e
não com base em 50% a 70% da retribuição que daria sempre um
montante superior; ii) a pensão passa a ter o limite inferior de 14x
(5xSMN) em vez de 14x (15xSMN).
Feito o enquadramento da sentença, discordam as partes do facto de se
ter mantido o grau de IPP comutado/agravado pela tabela específica dos
praticantes desportivos e, ainda, da aplicação do factor de bonificação
de 1.5% da al. a) do nº 5 da TNI. Invocando, mais uma vez, as rés a
inconstitucionalidade de outra interpretação da lei por violação do
princípio da igualdade e da justa reparação do trabalhador quando
vítima de acidente de trabalho. A ré empregadora chega a alegar que a
partir dos 35 anos não há lugar a atribuição de pensão.
A questão não é nova, aderindo-se sem reservas ao entendimento
expresso na sentença recorrida.
Na verdade, o regime de reparação de acidentes de trabalho dos
praticantes desportivos profissionais somente previu a reparação por
IPATH até aos 35 anos, por se ter entendido ser esta a média da idade
activa dos atletas, tratando-se de uma profissão que, requerendo
capacidade e esforço físico muito acima da média, é uma profissão de
desgaste rápido, que justifica regulamentação própria.
Contudo, a partir de tal idade o ex-atleta continua a estar afectado de
uma incapacidade permanente parcial de igual modo como acontece a
qualquer outro sinistrado, não se encontrando qualquer justificação para
que não lhe seja atribuída uma pensão para compensar a redução geral
na capacidade de trabalho e de ganho relativamente a qualquer
actividade. Entender o contrário, isso sim, seria violador do principio da
igualdade e da justa reparação de acidente de trabalho, pois significaria
que a lei passaria a desconsiderar, e a não compensar, a redução da
capacidade geral de ganho e de trabalho do jogador a partir dos 35
anos, pese embora subsistisse a IPP.
No que se refere à aplicação da tabela de comutação agravada, a
jurisprudência tem vindo a entender que na situação de IPATH a partir
dos 35 anos, existindo uma lacuna, porquanto o regime específico só
prevê expressamente a IPA, a IPATH e a IPP, deverá ser aplicado o
regime da IPP prevista no diploma e com os limites aí previstos em
conformidade com o artigo 4º/b, Lei 27/2011, de 16-06. Uma vez que,
continuando a perdurar as sequelas de incapacidade de um acidente
ocorrido quando o sinistrado era praticante desportivo, tal deve
repercutir-se no seu regime de reparação. Este entendimento foi
acolhido na sentença recorrida
“Transpondo estes princípios para o caso dos autos, temos que estamos
perante um dano futuro previsível. A quantia ilíquida de € 50.000,00 que
foi acordada para a participação do autor em vinte jogos oficiais com um
mínimo de quarenta e cinco minutos por jogo tinha uma componente de
imprevisibilidade, uma vez que não dependia apenas do autor. Todavia,
esta componente é típica dos danos futuros e não afasta a sua
indemnização. O que interessa é saber se, pese embora esta
componente de imprevisibilidade, o recebimento pelo autor da quantia
ilíquida de € 50.000,00 se aproximava mais de um dano futuro previsível
ou de um dano futuro imprevisível, consistindo numa mera possibilidade
ou hipótese. Tendo o autor completado vinte jogos oficiais com um
mínimo de quarenta e cinco minutos por jogo na época anterior e
recebido esta quantia e já tendo completado treze jogos na época em
que ocorreu o acidente, numa altura em que a época ainda estava no
início, cremos que tinha uma legítima expectativa de ganho
relativamente a esta quantia. Com efeito, de acordo com a normalidade,
tudo indicava que o autor iria receber esta quantia, tal como havia
acontecido na época anterior.
I.I.I. DECISÃO
Pelo exposto, de acordo com o disposto nos artigos 87º do CPT e 663º
do CPC, acorda-se em:
31-03-2020
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