Fundamentos Da Educação III PDF
Fundamentos Da Educação III PDF
Fundamentos Da Educação III PDF
Fundamentos da Educação 3
Fundamentos da Educação 3
Volume 1 - Módulo 1 Claudio de Carvalho Silveira
Helena Maria M. Araújo
Jonaedson Carino Moreira
Marcia Souto Maior Mourão Sá
Miguel Angel de Barrenechea
Sueli Barbosa Thomaz
Apoio:
Fundação Cecierj / Consórcio Cederj
Rua Visconde de Niterói, 1364 – Mangueira – Rio de Janeiro, RJ – CEP 20943-001
Tel.: (21) 2299-4565 Fax: (21) 2568-0725
Presidente
Masako Oya Masuda
Vice-presidente
Mirian Crapez
Material Didático
ELABORAÇÃO DE CONTEÚDO Departamento de Produção
Claudio de Carvalho Silveira
Helena Maria M. Araújo EDITORA PROGRAMAÇÃO VISUAL
Jonaedson Carino Moreira Tereza Queiroz André Freitas de Oliveira
Marcia Souto Maior Mourão Sá COORDENAÇÃO EDITORIAL ILUSTRAÇÃO
Miguel Angel de Barrenechea Jane Castellani Sami Souza da Silva
Sueli Barbosa Thomaz
COPIDESQUE CAPA
COORDENAÇÃO DE DESENVOLVIMENTO Nilce Rangel Del Rio Sami Souza da Silva
INSTRUCIONAL
Cristine Costa Barreto REVISÃO TIPOGRÁFICA PRODUÇÃO GRÁFICA
Kátia Ferreira dos Santos Andréa Dias Fiães
DESENVOLVIMENTO INSTRUCIONAL Fábio Rapello Alencar
Patrícia Paula
E REVISÃO
Alexandre Rodrigues Alves COORDENAÇÃO DE
Nilce Rangel Del Rio PRODUÇÃO
Jorge Moura
COORDENAÇÃO DE LINGUAGEM
Maria Angélica Alves
Copyright © 2005, Fundação Cecierj / Consórcio Cederj
Nenhuma parte deste material poderá ser reproduzida, transmitida e gravada, por qualquer meio
eletrônico, mecânico, por fotocópia e outros, sem a prévia autorização, por escrito, da Fundação.
S587f
Silveira, Claudio de Carvalho
Fundamentos da Educação 3. v. 1 / Claudio de Carvalho
Silveira. 3a. reimp. – Rio de Janeiro: Fundação CECIERJ, 2008.
164p.; 19 x 26,5 cm
ISBN: 85-7648-071-9
1. Educação. 2. Multiculturalismo. 3. Formação de
professores. 4. Escola. I. Araújo, Helena Maria M.
II. Moreira, Jonaedson Carino. III. Sá, Marcia Souto
Maior Mourão. IV. Barrenechea, Miguel Angel de. V.
Thomaz, Sueli Barbosa. VI. Título.
CDD: 370.1
2008/2
Referências Bibliográficas e catalogação na fonte, de acordo com as normas da ABNT.
Governo do Estado do Rio de Janeiro
Governador
Sérgio Cabral Filho
Universidades Consorciadas
UENF - UNIVERSIDADE ESTADUAL DO UFRJ - UNIVERSIDADE FEDERAL DO
NORTE FLUMINENSE DARCY RIBEIRO RIO DE JANEIRO
Reitor: Almy Junior Cordeiro de Carvalho Reitor: Aloísio Teixeira
SUMÁRIO
AULA
Exclusão social e Educação
no Brasil colonial e imperial
objetivos
INTRODUÇÃO
O nosso trem continua sua viagem, e estamos chegando a uma outra estação.
A Educação Infantil,
embora não seja obri- Vamos saltar numa plataforma muito importante, que é a da Exclusão social
gatória, proporciona
melhor rendimento e Educação no Brasil colonial e imperial.
nos primeiros anos
O Brasil é o país de menor escolaridade média em toda a América do Sul. Somos
do Ensino Funda-
mental. Relatório do o povo que passa menos tempo na escola. Mesmo após 500 anos de “desco-
Banco Mundial, de
1999, demonstra que brimento”, ainda temos índices alarmantes como: o déficit de 14,8 milhões de
as crianças que têm
acesso à Educação
vagas em creches e pré-escolas, segundo pesquisa feita pelo Unicef em 1999;
Infantil têm índice de apenas 32% dos adolescentes entre 15 e 17 anos estão matriculados no Ensino
repetência cinco vezes
menor. No Brasil, Médio (segundo dados do MEC); ainda temos um grande número de adultos
a Educação Infantil
se tornou parte da analfabetos; metade dos que começam qualquer curso, inclusive universitário,
Educação Básica, não o completam; além de sermos campeões da evasão e repetência escolar,
com a LDBEN (Lei de
Diretrizes e Bases da são estes os problemas mais graves do Ensino Fundamental, segundo o INEP
Educação Nacional)
de 1996, que atribui (Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais, órgão do MEC).
a responsabilidade
desse nível de ensino
exclusivamente aos
municípios.
8 CEDERJ
MÓDULO 1
Pessoas brasileiras, buscamos febrilmente nossa realização com a
1
ansiedade de quem suporta cinco séculos de escravidão, patriar-
AULA
calismo, mandonismo oligárquico e exclusão. Procuramos em
rezas, passes, mandingas, gingas e gritos de gol (tantas vezes
mal anulados) a consciência, a justiça, a solidariedade e a Repú-
blica. Dentro das salas de aula e dos currículos, ontem e hoje?
Antes fosse, assim seja.
CEDERJ 9
Fundamentos da Educação 3 | Exclusão social e Educação no Brasil colonial e imperial
10 CEDERJ
MÓDULO 1
Com a vinda de D. João VI em 1808, o Brasil transforma-se em Reino
1
Unido a Portugal e Algarves; portanto, passa a ser a capital da monarquia
AULA
portuguesa. Há uma reformulação urbana do Rio de Janeiro devido a essa
função de capital do reino português. Daqui se administrava a África, a
Ásia, a América e inclusive Portugal.
D. João VI estabelece diversas mudanças no Rio de Janeiro, como: a
criação da Biblioteca Nacional, do Jardim Botânico, da Imprensa Régia etc.
Nessa época, na área educacional, criaram-se as primeiras escolas de
ensino superior no Brasil, no âmbito militar.
Com relação ao ensino secundário, deu-se uma expansão das Aulas
Régias. Continuou-se sem nenhuma preocupação com a educação popular.
O Ensino Secundário se expandiu bastante devido a iniciativas privadas.
Várias congregações religiosas se instalaram no país voltadas
especificamente para as atividades de ensino. Chegaram aqui as primeiras
congregações femininas, que assumiram a educação das meninas de elite.
Na REGÊNCIA houve duas iniciativas importantes: a criação do Ato REGÊNCIA
Período que vai da
Adicional de 1834 e a criação do Colégio Pedro II, em 1836. Um dos efeitos abdicação de D. Pedro
do Ato Adicional de 1834 foi que, através dele, delegou-se às províncias I, em 1831, ao Golpe
da Maioridade, em
a constituição do sistema de educação elementar brasileiro. Deram-se as 1840, quando D.
primeiras iniciativas concretas no campo do ensino normal. Pedro II assume o
Império brasileiro
Houve, então, um adestramento da elite brasileira para a reprodução com quinze anos
incompletos.
da injusta ordem social. Exemplo disso vemos no Império, como nos mostra
ainda Chico Alencar, no seguinte trecho:
CEDERJ 11
Fundamentos da Educação 3 | Exclusão social e Educação no Brasil colonial e imperial
RESUMO
Nesta aula você pôde entender como se deu a conquista dos direitos políticos, civis
e sociais no Brasil e como ainda falta, na prática, a conquista de diversos direitos
sociais. Você pôde analisar o contexto histórico da Educação brasileira no período
colonial e imperial. Você pôde também perceber problemas sociais de longa duração
na sociedade brasileira, como o analfabetismo e a exclusão social na escola.
EXERCÍCIOS
AUTO-AVALIAÇÃO
Você deve ter conseguido entender a diferença entre os direitos sociais, políticos
e civis. O mais importante desta aula é que você tenha entendido as raízes da
exclusão social na escola brasileira. É fundamental que tenha percebido como se
deu a manutenção do analfabetismo e dos altos índices de evasão escolar pelas
elites dominantes brasileiras durante o Brasil-Colônia e Império. É importante
também que você tenha relacionado a situação da escola a esses períodos
históricos da sociedade brasileira. Caso tenha conseguido entender e relacionar
essas questões aos seus contextos históricos, parabéns! Você pode seguir viagem.
Caso contrário, fique um pouco mais de tempo nesta estação, releia os textos,
reflita um pouco mais sobre isso e, então, boa viagem!
12 CEDERJ
2
AULA
Exclusão social e Educação
no Brasil republicano
INTRODUÇÃO Nosso trem continua sua viagem, e estamos chegando a uma outra estação,
a da Exclusão social e Educação no Brasil republicano.
Nesta aula, vamos dar continuidade à análise do processo histórico de exclusão
social na escola brasileira. Só que agora estaremos analisando o período que
vai desde a Proclamação da República até os dias atuais. Na aula anterior já
vimos que há índices alarmantes de repetência e evasão escolar; assim, superar
essa situação é o desafio da Educação brasileira hoje.
Como já foi na dito na Aula 1, a Proclamação da República não se caracteri-
zou como um movimento popular. Foi um golpe militar que ocorreu em 15
de novembro de 1889. Após a Proclamação, pouco mudou a condição de
escolaridade do povo brasileiro.
A Constituição republicana de 1891 é bastante omissa em relação aos direitos
sociais, especialmente, à Educação. Não faz qualquer referência ao direito à
Educação. Essa mesma Constituição exigia que o cidadão pleno fosse aquele
que tivesse a capacidade de ler e escrever, e não se referia à Educação como
um dever do Estado.
Com a vinda dos imigrantes, ingressaram no país as idéias socialistas, par-
ticularmente os anarquistas, que se tornaram dominantes no pensamento
do movimento operário. Este foi responsável por algumas das experiên-
cias pedagógicas mais significativas que ocorreram no início da República.
Constituíram um sistema educacional completo, paralelo, de escolas elemen-
tares, além de centros culturais, tendo havido, inclusive, a tentativa de criação
de uma universidade do povo.
Na República foi se horizontalizando o ensino, devido ao clamor do crescimento
urbano-capitalista, principalmente em função da demanda desse operariado
(citado anteriormente), particulamente na região Sudeste. Mesmo assim, a
maioria da população em idade escolar ainda ficava fora da escola, havendo
enorme exclusão social.
14 CEDERJ
MÓDULO 1
A classe dominante branca ou branca-por-autodefinição desta
2
população majoritariamente mestiça, tendo como preocupação
AULA
maior, no plano racial, salientar sua branquitude, no plano cul-
tural sua europeidade, só aspirava a ser lusitana, depois inglesa e
francesa, como agora só quer ser norte-americana. (...) A imitação
do estrangeiro que era inevitável não seria um mal em si, (...)
O mal residia e ainda reside na rejeição de tudo o que era nacional
e principalmente popular, como sendo ruim, porque impregnado
de subalternidade da terra e da inferioridade dos povos de cor.
16 CEDERJ
MÓDULO 1
O Golpe Militar de 1964 gerou os
2
acordos MEC-USAID e a militarização
AULA
do Ministério da Educação.
Havia uma articulação da política
educacional brasileira com a política
norte-americana. Com relação
ao movimento de alfabetização,
houve um redirecionamento que
terminou fundando o Mobral
(Movimento Brasileiro de
Alfabetização).
Em 1968, ano de maior
ímpeto contestador, o sistema de repressão
passou a ser ampliado, com a decretação do AI-5 Desde os anos 80,
as funções sociais
(Ato Institucional nº 5). Deu-se a reformulação do Ensino Superior pelos da escola mudaram
muito. A escola deve
militares, acabando com o último reduto de oposição ao regime militar. também formar para
Antes de 1964, o problema dos excedentes no Ensino a cidadania, a saúde,
facilitar a expressão
Superior era muito sério. Depois de 1964, deu-se a vulgarização do da sexualidade,
a preparação
Ensino Superior, o alargamento do número de vagas e houve descontrole profissional, a
no incentivo à criação das universidades privadas. Essa desorgani- conscientização
política etc.
zação perdura até hoje. É só olharmos para perceber a quantidade
de universidades privadas que foram criadas em tempo recorde.
De acordo com a
De 1960 para cá, surgiram muitas universidades sem a qualidade que PNAD (Pesquisa
Nacional por Amos-
deveriam ter. tras de Domicílio),
Nos anos 80, destacaram-se a luta pela anistia e a democratização realizada pelo IBGE
em 1999, estavam
do país, com o fim dos governos militares. Na luta pela constituinte, vimos matriculadas em
escolas do Ensino
um debate educacional acirrado; o capítulo da Educação e Cultura recebeu Fundamental 95,7%
muitas propostas e emendas populares e pensava o ensino numa perspectiva das crianças entre 7 e
14 anos. Essa marca
mais democratizante. é considerada exce-
lente pela Unesco,
Inaugurou-se no Rio de Janeiro o primeiro CIEP (Centro Inte- porém há defasagens
regionais. Segundo
grado de Educação Pública) em 1984. Darcy Ribeiro foi extremamente
o Almanaque Abril
influenciado por Anísio Teixeira e pela escola-parque que ele desenvolveu de 2001, apenas 3%
das crianças não fre-
na Bahia. Os CIEPs passaram a ser vistos como um direito à Educação, qüentam a escola nas
regiões Sul, Sudeste e
como todos os países desenvolvidos já ofereciam. Neles se concentram Centro-Oeste; porém,
três políticas sociais básicas integradas: Educação, Saúde e Cultura, para esse índice chega a
10% no Norte e
que a população venha a ser bem educada. Nordeste.
CEDERJ 17
Fundamentos da Educação 3 | Exclusão social e Educação no Brasil republicano
18 CEDERJ
MÓDULO 1
2
RESUMO
AULA
Nesta aula você pôde analisar o contexto histórico da Educação brasileira, da
Proclamação da República até os dias de hoje. Você também pode perceber
problemas sociais de longa duração na sociedade brasileira, como o analfabetismo
e a exclusão social na escola. Além disso, analisamos a importância do Movimento
dos Pioneiros da Educação na luta pela escola pública, laica e de qualidade.
Percebemos como os anos 80 foram importantes na redemocratização do país
e no debate dos temas educacionais na Constituinte. Analisamos as conquistas
dos anos 90, como a quase universalização do acesso à escola no Brasil, mas a
permanência dos altos índices de repetência e de evasão escolar na sociedade
brasileira dura até hoje. Discutimos os desafios da escola brasileira atualmente, ou
seja, garantir a universalização do Ensino Fundamental, rever currículos e métodos
e a própria instituição escola frente à sociedade da tecnologia e informática
em que vivemos.
EXERCÍCIOS
CEDERJ 19
Fundamentos da Educação 3 | Exclusão social e Educação no Brasil republicano
AUTO-AVALIAÇÃO
O mais importante desta aula é que você tenha entendido as raízes da exclusão
social na escola brasileira. É fundamental que você tenha percebido como se deu
a manutenção do analfabetismo e dos altos índices de evasão escolar pelas elites
dominantes brasileiras durante o período republicano. Também é importante que
você tenha relacionado a situação da escola brasileira aos momentos históricos
importantes daquele período. Dê atenção aos anos mais recentes, como os anos
80, de redemocratização do país e de acirrados debates educacionais em torno
da Constituinte. Além disso, você deve ter percebido a importância dos anos 90
na universalização do acesso à Educação no Brasil e na permanência de graves
problemas, como a repetência e a evasão escolar nas escolas brasileiras até os
dias de hoje. Também cabe entender os desafios colocados para a nossa escola
e a sociedade hoje. Caso você tenha conseguido entender e relacionar essas
questões aos seus contextos históricos, parabéns! Você pode seguir viagem.
Caso contrário, fique um pouco mais de tempo nesta estação, releia os textos e,
então, siga em frente!
20 CEDERJ
3
AULA
Multiculturalismo e
políticas afirmativas
objetivos
22 CEDERJ
MÓDULO 1
1. A questão indígena – após séculos de extermínio físico e da imple-
3
mentação de uma política de assimilação e de desenraizamento cultural
AULA
dos nativos, a década de 1930 trouxe alterações. Uma geração de antro-
pólogos (Lowie, Krober, Herskovits) defendeu o abandono da atuação de
eliminação de identidade, contribuindo para que, nos anos 60, a luta pelo
reconhecimento das nações indígenas, sensibilizando a opinião pública e a
classe política, ganhasse impulso.
“Em 1790, a população dos Estados Unidos era de quatro milhões, sendo setecen-
tos mil escravos. Às vésperas da Guerra de Secessão (1860-1865),
os escravos eram 3.500.000, ou seja, 11% da população total,
e quase 40% da população dos 11 estados secessionistas”
(SEMPRINI, 1999, p. 15).
Os estados secessionistas eram os estados rebelados predominantemente
do Sul dos Estados Unidos, que devido à estrutura agrária escravista colonial
apresentavam forte ideologia racista.
CEDERJ 23
Fundamentos da Educação 3 | Multiculturalismo e políticas afirmativas
A política de imi-
5. A questão do imigrante – a formação da sociedade norte-america-
gração para os EUA na se confunde com a história da imigração. Originariamente, o imigrante
só apresentou leis
restritivas no século é branco e europeu, mas após a Segunda Guerra Mundial (1939-1945) sua
XX. Entre 1860 e
1920, cerca de 25 feição se altera, com a entrada em massa de asiáticos e latinos. O declínio do
milhões de imigrantes percentual de americanos brancos é visto com temor pelo segmento anglo-
chegaram aos EUA,
sendo que perto de 8 saxão e protestante dominante, estimulando, inclusive, políticas de restrição
milhões imigraram na
primeira década do imigratória e alimentando posicionamentos discriminatórios, assim como
século XX
a organização desses novos grupos exigindo demandas sociais e políticas.
(SEMPRINI,
1999, p. 27). O movimento pelos direitos civis, surgido nos anos 60, foi, portanto, o
marco histórico desse debate, reunindo forças para a renovação da sociedade
norte-americana, visando à reelaboração do pacto social existente. Aquele
movimento destruiu, com resistência, por exemplo, as bases legais da segre-
gação racial, mas não foi capaz, de imediato, de garantir o acesso dos
negros à educação (especialmente a universitária) e ao voto.
A crise dos anos 70, a política liberal e a desintegração do
bloco comunista nos anos 80 vieram interferir, fortemente, na dis-
cussão multicultural nos Estados Unidos. Esses processos históricos
contribuíram para ampliar a desigualdade econômica, fragilizar a crença na
igualdade de oportunidades e no mito da mobilidade social, além de ter privado
o país de um importante elemento de constituição de sua unidade e identidade
Em 1993, nos EUA, – a luta contra o comunismo.
os 20% mais ricos
Houve, portanto, como conseqüência do agravamento das desigual-
ficavam com 48,2%
da renda total, 4,6% dades, o aumento do embate de diferentes grupos formadores da sociedade
a mais do que em
1973. Os 20% mais americana. Foi nesse contexto que se desenvolveram as reivindicações étnicas
pobres ficavam com
apenas 3,6% das
e de identidades no espaço público norte-americano, traduzidas, em alguns
rendas totais, 0,6% a casos, em políticas afirmativas.
menos que em 1973
(SEMPRINI,
1999, pp. 34-35).
24 CEDERJ
MÓDULO 1
AS BASES FILOSÓFICAS DO MULTICULTURALISMO:
3
A CRISE DA MODERNIDADE
AULA
O movimento multicultural não teve sua origem restrita a sua
vertente militante, notadamente norte-americana. Stuart Hall identifica
cinco grandes avanços na teoria social e nas ciências humanas no século
XX; tais avanços contribuíram para o avanço de uma outra percepção do
sujeito e da identidade, à qual o multiculturalismo se associou: as novas
correntes marxistas, a psicanálise, a Lingüística de Saussure, o pensamento
de Foucault e o movimento feminista.
Nesse sentido, pode-se identificar, segundo Semprini, quatro aspectos
principais do pensamento multicultural: a realidade é uma construção; as
interpretações são subjetivas; os valores são relativos; o conhecimento é
um fato político.
Segundo o autor,
CEDERJ 25
Fundamentos da Educação 3 | Multiculturalismo e políticas afirmativas
RESUMO
26 CEDERJ
MÓDULO 1
EXERCÍCIOS
3
AULA
1. Identifique as principais características do multiculturalismo.
2. Relacione o contexto dos anos 60, nos EUA, com o crescimento dos estudos
multiculturais.
AUTO-AVALIAÇÃO
CEDERJ 27
4
AULA
Ações afirmativas
na Educação
objetivos
Nosso trem retoma sua viagem, e estamos prestes a fazer outra parada.
Deixamos a estação Multiculturalismo e políticas afirmativas e estamos
nos encaminhando para a plataforma das ações afirmativas na Educação.
Como vimos na última estação, as políticas afirmativas, políticas de discrimina-
ção positiva ou políticas sociais compensatórias são ações do Estado voltadas
para grupos específicos, historicamente discriminados. Lembrou?
Vamos recordar também sua função? O objetivo dessas ações é ser
"um programa de políticas públicas ordenado pelo Executivo ou pelo Legislativo,
ou implementado por empresas privadas para garantir a ascensão de minorias
étnicas, raciais e sexuais" (GUIMARÃES, 1999, p. 154).
30 CEDERJ
MÓDULO 1
As ações afirmativas, entretanto, não foram unicamente desen-
4
volvidas nos Estados Unidos. No contexto pós-independências,
AULA
em 1947, o governo indiano – visando corrigir as desigualdades
geradas pelo SISTEMA DE CASTAS – adotou um sistema de cotas que
destinava 22,5% das vagas na administração e no ensino público
aos chamados “intocáveis” (d’ADESKY, 1998, mimeo).
SISTEMA DE CASTAS
Forma de organização social encontrada na Índia, baseada em crenças religiosas
que sustentam a superioridade dos brâmanes sobre os demais grupos. Estabelece
uma ordem social rígida, hierarquizada, sem mobilidade. A condição social dada
pelo nascimento é determinante, definindo possibilidades de ocupação e casamento
(cf. CASTA. Dicionário de ciências sociais. 2ª ed.
Rio de Janeiro: FGV, 1987).
!
A OIT foi criada pela Conferência de Paz após a Primeira Guerra Mundial (...).
A idéia de uma legislação trabalhista internacional surgiu como resultado das
reflexões éticas e econômicas sobre o custo humano da Revolução Industrial.
As raízes da OIT estão no início do século XIX, quando os líderes industriais Robert
Owen e Daniel le Grand apoiaram o desenvolvimento e a harmonização da legis-
lação trabalhista e melhorias nas relações de trabalho. Em 1944, à luz dos efeitos
da Grande Depressão e da Segunda Guerra Mundial, a OIT adotou a Declaração
da Filadélfia, [que] antecipou e serviu de modelo para a Carta das Nações Unidas e
para a Declaração Universal dos Direitos Humanos (...). Desde 1999, a OIT trabalha
pela manutenção de seus valores e objetivos em prol de uma agenda social que
viabilize a continuidade do processo de globalização através de um equilíbrio
entre objetivos de eficiência econômica e de eqüidade social, (Texto adaptado de
http://www.oit.org/public/portugue/region/ampro/brasilia/inst/hist/
index.htm.)
CEDERJ 31
Fundamentos da Educação 3 | Ações afirmativas na Educação
32 CEDERJ
MÓDULO 1
Essa percepção da escola como instituição difusora de um conjunto
4
de valores universais ou dominantes foi uma importante contribuição das
AULA
obras de DURKHEIM, ALTHUSSER e Bourdieu, que outros estudiosos aprofun-
daram e reformularam.
CEDERJ 33
Fundamentos da Educação 3 | Ações afirmativas na Educação
34 CEDERJ
MÓDULO 1
Com a crítica crescente ao sistema educativo – especialmente o
4
escolar – e o desenvolvimento das correntes críticas e pós-críticas da Teoria
AULA
do Currículo e dos Estudos Culturais, os movimentos sociais de afirmação
tiveram subsídios para reivindicar a inclusão de suas temáticas nos currículos
escolares, o direito de organizar sistemas escolares especiais e o acesso aos
níveis mais elevados da escolarização institucionalizada.
Exemplos dessas demandas são fáceis de recordar! De muitos deles,
inclusive, você teve conhecimento através da mídia. Vamos nos lembrar de
alguns casos clássicos de reivindicação no contexto da Educação?
O movimento negro pressionou fortemente para que os currículos
escolares incorporassem sua história e suas heranças culturais. No Brasil,
recentemente, a História da África, caracterizando-se como uma ação
afirmativa, passou a ser conteúdo obrigatório no ensino de História na
Educação Básica.
Não é menos significativa a pressão que os movimentos de feministas
e de homossexuais fazem, buscando eliminar das escolas as práticas que
reforçam a visão deturpada do lugar do homem e da mulher na sociedade,
assim como do exercício da sexualidade. No final do século XX, parte dessas
demandas refletiu, por exemplo, as necessidades geradas pela própria reor-
ganização da concepção de família; isso gerou um confronto com a escola,
divulgadora de uma visão clássica, incompatível com a multiplicidade de
vivências familiares do mundo contemporâneo.
As comunidades indígenas também deram sua contribuição para
o debate das políticas sociais compensatórias, reivindicando o direito a
uma educação indígena que não afastasse as comunidades do conjunto
da sociedade mas que garantisse a consolidação de sua identidade num
contexto multifacetado. Nessa demanda, especial relevância teve a luta pelo
ensino de suas línguas, ensino esse entendido como mecanismo essencial de
afirmação de identidade.
Outros exemplos, ainda, podem ser lembrados, como a luta
dos portadores de deficiências por uma educação inclusiva, que não os
separasse da coletividade, permitindo a freqüência em escolas regulares,
CEDERJ 35
Fundamentos da Educação 3 | Ações afirmativas na Educação
CONCLUSÃO
Vera Maria Candau, numa perspectiva dos Estudos Culturais, indica o desafio
que a escola tem pela frente: ser um espaço de diálogo entre diferentes saberes
e linguagens, questionando o seu caráter monocultural.
36 CEDERJ
MÓDULO 1
4
RESUMO
AULA
Nesta aula, retomamos o conceito de política afirmativa e sua função para explicar
a ocorrência das políticas sociais compensatórias no contexto da Educação.
Exemplificamos, no âmbito da Educação, algumas ações de discriminação
positiva, ressaltando sua relação com as contribuições de alguns estudiosos para
a compreensão do papel da escola e sua ação no processo de reprodução social,
sem esquecer de mencionar a revisão por que passam esses estudos.
A partir da percepção do papel da Educação e, em especial, da escola na
formação social do cidadão, fomos capazes de analisar a importância das políticas
afirmativas nesse contexto e compreender por que a Educação foi e é um espaço
privilegiado de embate dos movimentos questionadores das diferentes formas
de discriminação.
EXERCÍCIOS
CEDERJ 37
Fundamentos da Educação 3 | Ações afirmativas na Educação
AUTO-AVALIAÇÃO
Depois desta nossa nova parada, você deve ser capaz de conceituar as chamadas
ações afirmativas e de relacioná-las com a Educação.
38 CEDERJ
5
AULA
Espaços educativos
não-formais
objetivos
40 CEDERJ
MÓDULO 1
Tal como a Educação, as outras instâncias culturais também são
5
pedagógicas, também têm uma “pedagogia”, também ensinam
AULA
alguma coisa. Tanto a Educação quanto a cultura em geral estão
envolvidas em processos de transformação da identidade e da
subjetividade (SILVA, 1999, p. 139).
CEDERJ 41
Fundamentos da Educação 3 | Espaços educativos não-formais
42 CEDERJ
MÓDULO 1
ESPAÇOS EDUCATIVOS NÃO-FORMAIS
5
Como exemplo de
um espaço educativo
AULA
Como já foi dito, faz-se necessário desvelar o horizonte universitário não-formal, temos o
Espaço da Ciência de
e pedagógico para a utilização dos espaços educativos não-formais Olinda, em Pernam-
na educação de nossos alunos. Assim sendo, é necessária uma atenção buco, criado em 1994,
que desenvolve capa-
especial à formação inicial dos professores. citação de professores
através de centros de
É nesse sentido que entendemos que se deva aproveitar o preconi- referência criados em
21 escolas da rede
zado pelas novas Diretrizes Curriculares para Formação de Professores,
pública. Também há o
particularmente a ampliação da carga horária das práticas de ensino e de MAST/CNP, que em
1997 estabeleceu um
estágio; também deve-se levar em consideração a diversificação dos campos projeto denominado
Formação continua-
de estágio curricular para a necessidade de utilizar tais espaços educativos da de professores de
não-formais como locais de estágio. É claro que a escola continua sendo o ciências e os espaços
não-formais de Edu-
cerne do estágio, unindo teoria e prática na formação docente; porém, o cação para produzir
material didático
aprendizado de como utilizar outros espaços educativos – além da escola – junto às escolas públi-
é fundamental na formação desse futuro professor (como você) na socie- cas municipais.
dade contemporânea.
No caso específico dos museus, Marandino (2000) alerta para a neces-
sidade da construção de uma pedagogia de museus, levando em consideração
sua especificidade pedagógica para otimizar as visitas escolares. Não se trata,
É essencial, cada
segundo a autora, de opor o museu à escola, mas de definir as especificidades vez mais, a parceria
dos museus com
relacionadas ao lugar, ao tempo e aos objetos no espaço do museu; estabelecer as universidades,
secretarias municipais
o que é essencial e deve ser incluído na formação de educadores numa didática
e estaduais para a
de museu. Nesse sentido, poderíamos ampliar esse entendimento para museus realização de cursos
de formação de
e para outros espaços educativos como exposições, arquivos públicos, centros professores em todos
os níveis. Além disso,
culturais, sindicatos etc. é muito importante
Dessa forma, em tais visitas pedagógicas seriam oferecidas a nossos a implantação de
pesquisas nos museus
alunos diferentes leituras da ciência e do mundo. e investigações
sobre a relação
museus/espaços
culturais e escola.
Esses estudos dariam
subsídios maiores
aos programas
educativos e culturais
desenvolvidos nessas
instituições.
CEDERJ 43
Fundamentos da Educação 3 | Espaços educativos não-formais
CONCLUSÃO
Vera Candau, na perspectiva dos Estudos Culturais, indica o desafio que a escola
tem pela frente: "ser um espaço de diálogo entre diferentes saberes e linguagens",
questionando o seu caráter monocultural.
Cabe então, a nós, educadores, a utilização cada vez mais freqüente desses espaços
alternativos de aprendizagem que, em geral, tanto encantam os alunos, trazendo-
lhes prazer e uma aprendizagem significativa.
44 CEDERJ
MÓDULO 1
5
RESUMO
AULA
Nesta aula, tentamos mostrar a importância dos espaços educativos não-formais
nos processos de Educação. Você deve ter percebido o quão significativo é levar
os alunos a museus, exposições, arquivos etc. tendo em vista que esses lugares
também educam, já que se configuram como espaços alternativos de aprendizagem.
Além disso, Marandino nos chamou atenção para a importância de construir uma
pedagogia de museus, por eles possuírem códigos e rituais específicos. Paralelamente
a isso, fazem-se urgentes mudanças nos currículos de formação de professores para
que eles valorizem tais espaços educativos não-formais nos processos de ensino-
aprendizagem com seus alunos. Por fim, você pôde perceber a diferença e a relação
entre a cultura que é pedagógica e a pedagogia que é cultural.
EXERCÍCIOS
CEDERJ 45
Fundamentos da Educação 3 | Espaços educativos não-formais
AUTO-AVALIAÇÃO
Depois desta nossa parada, você deve ser capaz de analisar a importância do
uso dos espaços educativos não-formais nos processos educacionais. Além disso,
você deve ter conseguido entender por que a pedagogia é cultural e a cultura
é pedagógica. Além disso, é importante conceituar pedagogia de museus e
identificar os fatores que levam os professores a querer utilizar os espaços
alternativos de aprendizagem. Por fim, você deve ter percebido a importância
desses espaços educativos alternativos como campos de estágio curricular
na formação de professores. Então, se você entendeu tudo isso e conseguiu
responder a todas essas questões, parabéns e boa viagem! Caso contrário,
releia a aula ou consulte seu tutor no pólo.
46 CEDERJ
6
AULA
O livro didático
na Educação brasileira
Estamos chegando a mais uma estação! Vamos agora parar para discutir a
importância e as transformações sofridas pelo livro didático; vamos analisar
também a ação governamental de avaliação e distribuição desse recurso didático.
Estamos, portanto, nos encaminhando para a plataforma do Livro didático na
Educação brasileira.
Os estudos sobre o livro didático se fazem, em geral, no contexto de uma
disciplina. A bibliografia sobre o tema, fora do âmbito das especialidades, é,
portanto, reduzida. Contudo, há nesse debate sempre interseções. Nesse senti-
do, é necessário buscar o aprofundamento da questão na produção específica
de uma disciplina, na qual se percebem preocupações, críticas e proposições
possíveis de serem generalizadas.
BREVE HISTÓRICO
48 CEDERJ
MÓDULO 1
Em 1937, o Ministério da Educação e Cultura, chefiado por Gustavo
6
Capanema, criou o Instituto Nacional do Livro (INL), com a função de
AULA
divulgar e distribuir obras de interesse educacional e cultural.
É interessante perceber que a primeira definição de livro didático
de que se tem conhecimento no Brasil é do período do Estado Novo. O CNLD, na verdade,
atuou como órgão
O decreto de 1938 – que criou a Comissão Nacional do Livro Didático
central de controle
(CNLD), responsável pela política do livro didático – definia os compêndios político-ideológico
da produção e dis-
como "livros que exponham total ou parcialmente a matéria das disciplinas tribuição dos livros
didáticos no contexto
constantes dos programas escolares". Podendo ser chamados também de da ditadura do Estado
"texto, livro texto, livro escolar, livro de classe, manual, livro didático". Novo, exercendo,
inclusive, o controle
(Freitag, Bárbara, Costa, Wanderley da e Motta, Valéria Rodrigues. sobre as Comissões
Estaduais do Livro
O livro didático em questão. 2ª ed. São Paulo: Cortez, 1993, pp. 12-13). Didático (CELD).
Um novo período de controle intenso sobre a produção do livro
didático veio acontecer em outra ditadura: a militar, iniciada em 1964.
A influência européia, notadamente a francesa, de educação humanística
foi sendo substituída, nesse período, pelo modelo de ensino tecnicista norte-
americano. Vários acordos foram assinados entre 1964 e 1969, entre Brasil
e Estados Unidos, consolidando essa aproximação no campo da Educação.
Um novo órgão de gerenciamento do livro didático foi criado: Comissão
do Livro Técnico e do Livro Didático (Colted).
A partir da Lei 5.692/71, houve uma regionalização dos currí-
culos; contudo, cabia ao Conselho Federal de Educação (CFE) fixar o
núcleo comum de cada disciplina para cada nível e série. Na prática,
esse núcleo comum passou a constituir um roteiro, que foi seguido pelas
editoras para a produção de seus livros didáticos, o que gerou uma
O Guia de Livros
extrema padronização das obras. Didáticos é enviado
A partir de 1985, instituiu-se o Programa Nacional do Livro Didático pelo MEC às escolas
públicas para que os
(PNLD), através do qual, a partir de uma listagem fornecida pela Fun- docentes processem
as escolhas dos
dação de Assistência ao Educando (FAE), o docente, a cada dois ou três livros didáticos;
anos, escolhe os livros a serem fornecidos pelo governo para seus alunos. também é possível
consultar acessando
É importante, entretanto, destacarmos que só em 1993 foi instituída uma a página do MEC
(www.mec.gov.br).
comissão de avaliação dessas obras, a fim de fornecer subsídios para a
construção do Guia de Livros Didáticos.
CEDERJ 49
Fundamentos da Educação 3 | O livro didático na Educação brasileira
50 CEDERJ
MÓDULO 1
4°) É um importante veículo portador de um sistema de valores, de
6
uma ideologia, de uma cultura; como não podia deixar de ser, o livro didá-
AULA
tico é, por si, uma produção cultural; logo, sua elaboração é historicamente
determinada. A neutralidade da obra didática, assim como de qualquer
produção de conhecimento, é uma falácia.
Flávia Eloísa Caime destaca três pressupostos básicos que devem
estar em nossa mente quando falamos em livro didático e que interagem
e reforçam a caracterização de Circe Bittencourt. Para a autora, o livro
didático corporifica um projeto pedagógico específico, sendo seu autor um
selecionador de conteúdos, que é histórica e ideologicamente situada, não
havendo neutralidade (CAIME, MACHADO e DIEHL, 1999, p. 78).
Nesse sentido, torna-se decisivo ter consciência de que o livro didático
traz com ele, para além da informação, uma abordagem dos saberes que comu-
nica uma metodologia de ensino desses saberes e uma inserção desses saberes
numa visão de mundo específica. Por isso, como produção cultural, o livro
didático tem seu tempo histórico próprio. Não é nem pode ser estático.
Podemos dizer que essas constatações, explicitadas pelos estudiosos
do tema em diversas áreas, justificam, em parte, o abandono de certas deno-
minações – como compêndio e manual – para designar o produto editorial
voltado para o ensino, e que lhe davam ênfase, numa visão de obra síntese,
pronta e definitiva.
CEDERJ 51
Fundamentos da Educação 3 | O livro didático na Educação brasileira
CONCLUSÃO
É indiscutível que o livro didático precisa possuir rigor teórico, clareza metodológica
e ideológica. Precisa, acima de tudo, divulgar um saber escolar que esteja
em constante interação com o saber científico academicamente produzido.
A constituição de sistemas de avaliação da produção didática precisa ser
desenvolvida e aperfeiçoada, levando em conta que o centralismo, quer dizer, o
dirigismo estatal, é perigoso nesse caso. Esses sistemas não podem se furtar a criar
barreiras para a pressão, para o lobby, das grandes editoras/empresas.
52 CEDERJ
MÓDULO 1
É indiscutível, também, que um professor valorizado profissionalmente e
6
capacitado teoricamente será capaz de ser sujeito de seu fazer pedagógico,
AULA
tornando o livro um instrumento de apoio didático, como muitos outros.
Assim como qualquer outro instrumento pedagógico – como, por exemplo, o cinema –,
um dos maiores problemas no uso do livro didático vem da dificuldade de o docente
ter autonomia em produzir o processo pedagógico, isto é, de ele ser capaz de ir
além, de transformar, de criticar, de recriar.
Por fim, é importante destacar que, mesmo não adotando o livro didático, o
docente não fica isento dos vícios do mau uso dele, pois a questão está para além
do objeto, do instrumento. Será que as apostilas e os materiais escritos selecionados
pelos professores não podem estar contaminados com os mesmos problemas?
Trata-se, antes de tudo, de investir na formação acadêmica e pedagógica do
professor, pois o bom uso de qualquer instrumento didático está condicionado à
consistência do profissional que o utiliza.
RESUMO
CEDERJ 53
Fundamentos da Educação 3 | O livro didático na Educação brasileira
EXERCÍCIOS
AUTO-AVALIAÇÃO
Ao final desta aula, você deve ser capaz de sintetizar a trajetória histórica
do livro didático no Brasil, ressaltando o papel desempenhado pelo Estado.
Deve ter elaborado uma definição de livro didático que permita entendê-
lo como mercadoria, depositário dos conteúdos escolares, instrumento
pedagógico e veículo portador de um sistema de valores, de uma ideologia,
de uma cultura. Conseqüentemente, para analisar um livro didático, você deve
ter consciência de que esse instrumento pedagógico corporifica um projeto
pedagógico específico, que seu autor é um selecionador de conteúdos e que
essa seleção é histórica e ideologicamente situada, inexistindo neutralidade.
Por fim, deve identificar os problemas no uso do livro didático, assim como os
caminhos a seguir para o desenvolvimento qualitativo desse uso.
54 CEDERJ
7
AULA
História da profissionalização
docente no Brasil
objetivos
Vamos continuar nossa viagem de trem. Partimos para outra estação; portanto,
deixamos a estação do Livro didático na Educação brasileira, para visitarmos a
História da profissionalização docente no Brasil.
56 CEDERJ
MÓDULO 1
Embora o corpo docente tenha mudado, os modelos escolares foram
7
mantidos. Com o tempo, principalmente os jesuítas e oratorianos confi-
AULA
guraram um corpo de saberes e técnicas específicos da profissão docente.
O trabalho docente torna-se atribuição de especialistas.
Tivemos então, no século XVIII, grupos nos quais o ensino era
uma ocupação principal. Os professores aderiram à funcionarização,
já que esta lhes garantia autonomia em relação aos párocos, autori-
dades locais e às populações, cuja vontade era partilhada pelo Estado
e corpo docente.
Ao final do século XVIII, não se pode mais lecionar sem uma
licença ou autorização do Estado. A licença é instrumento fundamental
na profissionalização docente.
Como a escola se transforma em instrumento privilegiado de
ascensão social, os professores tornam-se agentes culturais além de
agentes políticos.
CEDERJ 57
Fundamentos da Educação 3 | História da profissionalização docente no Brasil
58 CEDERJ
MÓDULO 1
O exemplo do Instituto de Educação é fundamental para se entender
7
o processo de profissionalização do magistério no Brasil. Período em que
AULA
a formação do professor foi rigorosa e extremamente cuidada, já que os
professores primários eram considerados, por Anísio Teixeira e Lourenço
Filho, instrumentos de transformação social.
Segundo Nóvoa, profissionalização passa a ter relação com funciona-
rização, pois as professoras ali formadas eram automaticamente investidas
no cargo de professoras primárias da rede pública oficial.
A Educação Nova, segundo Monteiro,
CEDERJ 59
Fundamentos da Educação 3 | História da profissionalização docente no Brasil
60 CEDERJ
MÓDULO 1
Assim sendo, houve o crescimento dos sistemas escolares estatais,
7
estruturas mais complexas, com grande concentração de escolas. Isso
AULA
gerou o surgimento das funções especializadas na Educação. Já a atividade
docente foi simplificada e controlada por um modelo técnico-burocrático
com procedimentos padronizados e que eram ensinados e divulgados na
formação inicial e continuada.
Os docentes atuavam entre a profissionalização e a proletarização.
Ainda possuíam bastante autonomia no seu processo de trabalho.
CEDERJ 61
Fundamentos da Educação 3 | História da profissionalização docente no Brasil
62 CEDERJ
MÓDULO 1
O reconhecimento do professorado como profissional pela Cons-
7
tituição Federal de 1988 constitui um marco no debate sobre a
AULA
educação básica de qualidade, representando o princípio constitu-
cional – valorização dos profissionais do ensino (art. 206, item v),
uma conquista dos professores, no âmbito da luta em favor da
democracia (WEBER, 2000).
CEDERJ 63
Fundamentos da Educação 3 | História da profissionalização docente no Brasil
CONCLUSÃO
64 CEDERJ
MÓDULO 1
Para Demo (2000), é fundamental o resgate do professor, pois é impossível ampliar a
7
cidadania com professores excluídos. Muito antes de utilizar ou se preocupar com
AULA
a parabólica, o computador, os livros didáticos, os parâmetros curriculares nacionais e
outros fatores, é necessário resgatar o professor.
RESUMO
CEDERJ 65
Fundamentos da Educação 3 | História da profissionalização docente no Brasil
EXERCÍCIOS
66 CEDERJ
MÓDULO 1
AUTO-AVALIAÇÃO
7
AULA
Depois dessa nossa nova parada, você deve ser capaz de entender o processo
de profissionalização docente no Brasil. É importante que, após a leitura do texto
e de responder os exercícios acima, você consiga identificar que só a partir dos
anos 20 e 30 deu-se de fato uma preocupação com a formação de professores
no Brasil. Nesse contexto, você deve identificar a importância do Manifesto
dos Pioneiros ao valorizar a formação docente, tendo em vista que tinham uma
visão salvacionista da Educação. Em seguida, deve compreender como o Estado
Novo vai tentar normatizar a formação docente. Além disso, é importante que
você caracterize a LDBEN de 1961, a Lei 5.692/71 e a atual LDBEN, de 1996, no que
tange à formação de professores. Também é fundamental caracterizar os anos
80 e 90 como décadas de desvalorização profissional e salarial dos professores,
num contexto de recessão e desemprego vivido pela sociedade brasileira e mesmo
mundial até os dias de hoje. Por fim, é importante entender que é preciso aproveitar
as brechas nas Resoluções CNE/CP 1 e CNE/CP 2 de 2002 para melhorar a formação
docente atualmente. Caso você tenha conseguido entender todas essas questões
e articulá-las, parabéns! Siga viagem! Em caso de dúvida, volte e releia os textos,
refaça os exercícios e procure articular esta aula com as anteriores, principalmente
com as Aulas 1 e 2; isto tornará mais fácil o seu entendimento.
CEDERJ 67
8
AULA
O espelho da Educação brasileira:
um estudo côncavo e convexo
objetivos
Pré-requisito
• Esta aula contém uma síntese das sete
aulas anteriores deste módulo. Retê-las é,
pois, pré-requisito para que você compre-
enda o que vai ser revisto a seguir.
Fundamentos da Educação 3 | O espelho da Educação brasileira: um estudo côncavo e convexo
70 CEDERJ
MÓDULO 1
A nosso pedido, Sr. Waldomiro falou com entusiasmo sobre seu
8
trabalho, o orgulho que tem dele, e explicou que aqueles impressos con-
AULA
têm uma síntese de tudo que acontece na viagem: quantidade de lenha
apanhada e consumida; as centenas de litros de água utilizadas; carga
recebida e entregue etc.
Esses formulários fazem uma síntese – frisou Sr. Waldomiro.
Encaminhados à sede da companhia, os papéis permitirão uma análise
e um registro perfeito de tudo o que acontecer durante nossa viagem,
determinando todas as providências necessárias.
Pois bem, caro aluno, assim também são nossas aulas-síntese,
como esta que se inicia agora. Nela você tem registradas, sinteticamente,
as principais informações relativas ao conteúdo das aulas estudadas até
aqui no presente módulo.
A exemplo do pessoal da companhia ferroviária, aproveite tudo o
que vai ler agora sintetizado, reunido, condensado, e reveja tudo o que
aprendeu e aquilo sobre o que ainda tem dúvidas.
A primeira das aulas foi intitulada Exclusão social e Educação no
Brasil colonial e imperial.
Começou-se por assinalar, e ilustrar com estatísticas, o fato de que o
Brasil é o país com menor índice de escolaridade em toda a América do Sul.
Em seguida, associando-os à noção de cidadania, a aula discorreu
sobre os direitos:
CEDERJ 71
Fundamentos da Educação 3 | O espelho da Educação brasileira: um estudo côncavo e convexo
72 CEDERJ
MÓDULO 1
Após a Primeira Guerra Mundial, durante os anos 20, crescem
8
as idéias nacionalistas, traduzidas inclusive pela tentativa de resgatar a
AULA
nacionalidade e salvar o Brasil por intermédio da Educação. Surgem os
denominados “intelectuais da Educação”, educadores comprometidos
com essas novas idéias, que constituíram primeiro grupo de pensadores
genuinamente comprometidos com a renovação do ensino no Brasil.
A aula sublinhou a importância de movimentos que representa-
ram um novo olhar sobre nosso país, como a Semana de Arte Moderna.
Deu-se, também, uma articulação entre partidos de esquerda e pensadores
modernistas, o que resultou em novas abordagens do significado e da
importância da Educação.
Essa fase resultou na criação de instituições importantes, como
a Universidade Federal do Rio de Janeiro e a Associação Brasileira de
Educação; esta última que tanta importância teria para o debate e as
articulações em favor da Educação brasileira, sobretudo com a promoção
de congressos nacionais, possibilitando visões e ações conjuntas sobre
os problemas educacionais de todo o país.
Em seguida, a aula mencionou um movimento muito importante a
respeito do qual você já pôde estudar em várias aulas neste nosso curso:
a Revolução de 30.
Nessa época é criado o Ministério da Educação e Saúde, represen-
tando a primeira expressão de uma política educativa nacional.
O avanço da industrialização requer, entre outras necessidades, a da
implantação de um ensino técnico e profissional, levando também os inte-
lectuais à defesa de que o Estado assuma integralmente a responsabilidade
pelo ensino e garanta uma Educação pública, laica e de qualidade.
Um marco importante, já mencionado em outras aulas, foi o Leia o Manifesto
lançamento, em 1932, por esses intelectuais e educadores, do Manifesto dos pioneiros da
Educação Nova na
dos Pioneiros da Educação Nova. página da internet
http://infoutil.org/
A aula prosseguiu registrando o caráter liberal da nova Constituição, novaescola/pages/
manifesto.htm
promulgada em 1934, mas de vida curta, em virtude do advento do golpe
que resultou na criação do denominado Estado Novo.
CEDERJ 73
Fundamentos da Educação 3 | O espelho da Educação brasileira: um estudo côncavo e convexo
74 CEDERJ
MÓDULO 1
A aula relembrou a questão do famoso Acordo MEC-Usaid, que
8
resultou no atrelamento da Educação brasileira a diretrizes emanadas pelos
AULA
Estados Unidos.
Mencionou-se, ainda, o movimento de alfabetização de adultos
promovido pelos integrantes do poder, intitulado Movimento Brasileiro
de Alfabetização, o Mobral.
Em seguida, a aula relembrou a escalada de transformações
decorrentes do Golpe Militar. No âmbito político, surgiu o AI-5, com o
recrudescimento da linha-dura, as cassações de mandatos, a tortura etc.
na Educação, destacou-se a reforma do ensino universitário. Todos
esses eventos você pôde rever nessa aula, bem como numa aula anterior
dedicada à análise pormenorizada do regime militar.
Outra conseqüência destacada pela aula foi a vulgarização do
ensino superior, ocorrida após 1964, conduzindo a uma imensa expansão
dos estabelecimentos de ensino particulares, com aumento da quantidade
e redução da qualidade.
A democratização e a anistia, nos anos 80, trazem novos tempos e, com
eles, fica possibilitada a ampliação do debate sobre a Educação, com a apresen-
tação de propostas no sentido de uma maior democratização do ensino.
Nos anos 90, alcançado um índice bem maior de crianças na
escola, a questão central passa a ser como mantê-las aí oferecendo melhor
qualidade na Educação e combatendo a repetência e a evasão.
A aula se encerrou constatando que ainda há muito por fazer em
nosso país, em termos educacionais, tendo em conta que a maioria das
crianças brasileiras ainda não adquiriu as competências básicas para
aprender a ler, escrever e contar.
A aula seguinte recebeu o título Multiculturalismo e políticas
afirmativas.
Você viu nessa aula, logo de saída, o significado de dois termos
muito utilizados atualmente e que não se deve confundir. São eles:
CEDERJ 75
Fundamentos da Educação 3 | O espelho da Educação brasileira: um estudo côncavo e convexo
76 CEDERJ
MÓDULO 1
A aula sublinhou que o multiculturalismo se insere no contexto
8
das polêmicas discussões sobre a contemporaneidade e da denominada
AULA
crise do paradigma da Modernidade. A globalização e o neoliberalismo
alimentam essa problematização da diferença, observada num panorama
de desigualdade e de discriminação.
Em seu término, a aula lembrou que os problemas discutidos pelo
multiculturalismo têm tudo a ver com o que enfrentamos na sociedade
brasileira e apontou as três principais zonas de conflitos na discussão
da questão multicultural: a Educação, a identidade sexual e as relações
interpessoais com as reivindicações de identidade.
Prosseguindo, caro aluno, nesta nossa viagem imaginária pela Terra
dos Fundamentos da Educação, cá estamos nós em mais uma parada do
trem, numa estação que corresponde a uma aula-síntese. Aproveite-a para
reestudar os conteúdos das aulas anteriores, aqui resumidos.
A aula seguinte recebeu o título Ações afirmativas na Educação.
Essa aula começou retomando uma análise histórica do surgimento
das ações afirmativas. Além de voltar à descrição do que aconteceu nos
Estados Unidos, lembrando que, desde 1937, com a legislação trabalhista
exemplificada pelo The 1935 National Labor Relations Act, numa ação
que proibiu a discriminação de sindicalistas e de operários sindicalizados
e obrigou à recondução vítimas de discriminação aos seus postos de
trabalho, citou-se o caso da Índia, que, em 1947, implementou ações
visando, com um sistema de cotas, a reduzir as desigualdades impostas
pelo sistema de castas.
Nesse universo do trabalho, aliás, a aula sublinhou que, entre
1982 e 1996, 25 países adotaram políticas objetivando eliminar a
discriminação sexual e racial nas relações de trabalho.
Em seguida, a aula tratou da Educação como um espaço privilegia-
do para o combate à discriminação social e cultural e para a construção
das identidades.
Os pensamentos de Durkheim, de Althusser e de Bourdieu foram
utilizados para demonstrar um outro aspecto da escola: seu papel de
difusora de valores universais ou dominantes.
Para Durkheim, a escola apresenta-se como um fato social, impon-
do-se aos indivíduos por meio da socialização metódica.
CEDERJ 77
Fundamentos da Educação 3 | O espelho da Educação brasileira: um estudo côncavo e convexo
78 CEDERJ
MÓDULO 1
Para estudar os espaços educativos não-formais, a aula procurou:
8
a) relacionar o uso dos espaços educativos não-formais com o
AULA
processo de escolarização regular;
b) exemplificar espaços educativos não-formais;
c) analisar a importância de usar os espaços educativos não-
formais como campos de estágio na formação de professores;
d) explicar o que seria a Pedagogia de Museus.
CEDERJ 79
Fundamentos da Educação 3 | O espelho da Educação brasileira: um estudo côncavo e convexo
80 CEDERJ
MÓDULO 1
Depois de se debruçar sobre essas discussões, caro aluno, é
8
importante que você faça uma releitura sobre o uso e o abuso do livro
AULA
didático. Afinal, você será um educador, e deve estar informado e
preparado para fazer uso dos livros didáticos que estarão ao seu dispor,
oferecidos pelo governo brasileiro.
Como você deve ter observado, essa parte do mapa de viagem levou
aos mais diferentes lugares: alguns amplos, abertos – a educação não-formal;
outros mais fechados – o livro didático no Brasil; e agora a um tema voltado
especificamente para a história da formação docente no Brasil.
Veja que é um leque que se abre e se fecha, no intuito de trazer
para você os “ares” necessários para fazê-lo “respirar” como professor.
Portanto, tenha um pouquinho mais de paciência e continue conosco
nesta viagem. A nossa sala de revisão é, como você observou no início
da aula, semelhante à do Sr. Waldomiro.
Finalizando, portanto, esta parte da viagem, ou alcançando as
cidades estabelecidas no mapa de viagem, a aula sobre a profissionali-
zação docente no Brasil apresentou os seguintes objetivos:
a) historicizar a profissão docente no Brasil;
b) caracterizar o tipo de professor atuante desde o Brasil Colônia
até o século XIX;
c) identificar os principais momentos da profissionalização
docente, da Proclamação da República até os dias de hoje;
d) analisar a importância do ideário escolanovista na profissionalização;
e) analisar o processo de feminização do magistério;
f) identificar os principais aspectos da formação do professor na
LDB de 1961 e na Lei 5.692/71;
g) relacionar os anos 80 ao desenrolar da profissionalização
docente no Brasil;
h) analisar os principais aspectos da LDBEN/96 no que diz respeito
à formação dos professores.
Temos que convir que não é pouca coisa. Mas como você pode ser
um profissional desconhecendo a própria história da sua atividade?
Vamos à revisão!
Essa é uma aula rica em fatos históricos, cuja transcrição acredita-
mos não ser necessária neste momento.
CEDERJ 81
Fundamentos da Educação 3 | O espelho da Educação brasileira: um estudo côncavo e convexo
Importa, porém, que algumas idéias sejam retomadas. Eis algumas delas:
• durante o Brasil Colônia, o magistério era exercido pelos padres
jesuítas, que deixaram grande legado educacional;
• no século XIX, a profissionalização docente ainda é muito
precária;
• no período republicano, não houve nenhum incentivo à formação
dos educadores;
• nos anos 30, com o advento da Escola Nova, houve valorização
da formação docente e a Educação passou a ser concebida como fator
necessário à reconstrução da sociedade;
• durante o Estado Novo, em 1937, e com a criação do Ministério
da Educação e Saúde, houve uma tentativa de normatização da profissão
docente, tomando como modelo, para todo o Brasil, o Instituto de
Educação, situado no Rio de Janeiro;
• com o advento da Lei 4.024/61, foi instituído o Curso Normal,
com duração de três séries, cujo objetivo era preparar o profissional para
atuar nas quatro primeiras séries do Ensino Primário;
• em 1971, durante o período militarista, uma nova lei surge,
trazendo no seu bojo a preocupação com a formação dos profissionais
da Educação. O curso Normal se tornou uma habilitação específica de
2º Grau, para o ensino da 1ª à 4ª séries do 1º Grau;
• com relação às demais séries e graus, a Lei 5.692/71 estabeleceu:
habilitação específica de grau superior, em nível de graduação, representada
pela licenciatura de 1º Grau, em curso de curta duração, para o ensino
de 1ª série à 8ª série do 1º Grau; habilitação específica obtida em curso
superior de graduação correspondente à licenciatura plena para o ensino
de 1º e 2º Graus;
• a partir de 1996, com a promulgação da Lei 9.394/96,
a nova LDBEN – que você já conhece porque foi tema de uma das aulas
anteriores – com relação à profissionalização do magistério, nos artigos
62 e 63, estabelece os Institutos Superiores de Educação. O artigo 62 diz:
A formação dos docentes para atuar na educação básica far-se-á em nível
superior, em curso de licenciatura de graduação plena, em universidades e
institutos superiores de educação, admitindo como formação mínima para
o exercício do magistério na educação infantil e nas primeiras séries do ensi-
no fundamental, a oferecida em nível médio, na modalidade Normal.
82 CEDERJ
MÓDULO 1
Essa aula, tratando da profissionalização docente no Brasil, lem-
8
brou ainda o aviltamento das condições de remuneração e de trabalho
AULA
dos professores.
Esperamos que tenha gostado desta síntese que oferecemos a você.
Assim como no trabalho que desenvolve o Sr. Waldomiro, lá naquele
seu escritoriozinho no vagão do final do nosso trem, esta revisão preten-
deu efetuar uma análise e um registro dos principais tópicos que foram
desenvolvidos durante este trajeto da viagem. Aproveite bem o que foi
revisado e resumido!
Caso algo não tenha ficado claro, retome as aulas e faça uma
releitura, visitando cada uma das cidades que compõem este nosso mapa
que nos conduz pela Terra dos Fundamentos da Educação, revendo as
atividades propostas.
Nossa viagem vai continuar. Lá está o Sr. Waldomiro, pronto para
fazer soar seu apito autorizando a partida do trem.
CEDERJ 83
9
AULA
Escola: inclusão e exclusão
objetivos
Pré-requisito
Para a melhor compreensão desta aula,
sugerimos que você reveja a Aula 8,
Pensando o homem, em Fundamentos
da Educação 1.
Fundamentos da Educação 3 | Escola: inclusão e exclusão
Caro companheiro de viagem, agora vamos nos deter em uma estação muito
significativa, de muita importância coletiva, profundamente vinculada ao
nosso papel social de educadores. Nesta passagem do nosso percurso, vamos
analisar uma questão de grande relevância: a inclusão e a exclusão sociais e
na escola, suas repercussões comunitárias e seu impacto na nossa tarefa em
sala de aula.
Começamos o trajeto com a leitura de um parágrafo da Declaração de Salaman-
ca que manifesta o direito de todas as crianças poderem estudar e freqüentar
a escola. Dizer que todas as crianças devem estudar parece algo óbvio, justo,
necessário; trata-se de um direito irrevogável de todo ser humano. Porém, não
ocorre assim na nossa realidade social: algumas crianças estudam e outras não
têm acesso à escola; muitas devem trabalhar sem poder freqüentar a sala de
aula; outras são impedidas, ou por terem dificuldades de aprendizagem ou
por necessidades especiais, decorrentes de diversas circunstâncias: físicas,
emocionais, sociais etc.
Então, que fazer? Caro professor, eis um problema fundamental. É preciso
refletir sobre essas circunstâncias: como é possível integrar e incluir todas as
crianças na sociedade e na escola? Eis uma questão relevante na nossa sociedade
e no nosso ensino. Para entender essa questão, teremos de esclarecer o que
significa inclusão e exclusão, integração e necessidades especiais.
86 CEDERJ
MÓDULO 1
Antes de aprofundar esses conceitos, companheiro de viagem, reflita sobre
9
esse trecho da Declaração de Salamanca e também observe as imagens a
AULA
seguir, nas quais aparecem situações da vida cotidiana: a primeira imagem
mostra uma moça com síndrome de Down, dançando e sorrindo. Essa imagem
apareceu numa campanha publicitária desenvolvida pela agência Giovanni,
FCB para o Instituto MetaSocial (www.metasocial.org.br. ), em que essa jovem
ouvia música, dançava e brincava, como qualquer outra jovem. A publicidade
finalizava com a frase:
CEDERJ 87
Fundamentos da Educação 3 | Escola: inclusão e exclusão
Da exclusão à segregação
88 CEDERJ
MÓDULO 1
Em sociedades mais avançadas da Antigüidade, na Grécia
9
A sociedade esparta-
por exemplo, vemos que existia ainda mecanismos de exclusão. na, na Antigüidade,
AULA
EXCLUÍA e ELIMINAVA
Particularmente em Esparta, sociedade que valorizou nitidamente as aqueles considerados
“anormais”; as crian-
virtudes guerreiras e os atributos físicos para o combate, aqueles que
ças com deficiências
tinham deficiências físicas de nascença não só eram EXCLUÍDOS, mas tam- eram jogadas do alto
de um morro, numa
bém literalmente ELIMINADOS: eram jogados do alto de uma montanha, tão forma brutal de
segregação.
logo nascidos, para que não chegassem a se tornar peso morto para essa
sociedade. Em Atenas, por sua vez, que cultuava tanto
as virtudes físicas quanto as espirituais, os mecanis-
mos de exclusão não eram tão categóricos e terríveis.
Contudo, a exclusão social era muito
acentuada. A concepção ateniense discri-
minava claramente os cidadãos e os não-
cidadãos. Os que não eram considerados
cidadãos, como os escravos, as mulheres e
os estrangeiros, não tinham direitos, não tinham aces-
so à educação, apenas ficavam reduzidos à reali-
zação de tarefas corporais, julgadas “inferiores”.
Nesse ponto, como assinala Gadotti, há uma nítida
distinção entre corpo e alma, entre tarefas “nobres” e “baixas”.
Só mereciam participar das decisões democráticas da cidade os cidadãos;
só eles podiam, portanto, ser educados. Como decorrência da exclusão
social, surge a exclusão na escola: os segmentos “baixos” não tinham
acesso à educação.
CEDERJ 89
Fundamentos da Educação 3 | Escola: inclusão e exclusão
90 CEDERJ
MÓDULO 1
também contrários a Deus; portanto, devem ser punidos, purificados e,
9
na maioria das vezes, eliminados.
AULA
Como vimos, nessa fase, que se estende desde a Antigüidade até
a Idade Média, existem processos de exclusão social. A partir do século
XVI, particularmente nos séculos XVII e XVIII, há uma mudança na
consideração dos diferentes. Aparece uma outra ótica para lidar com os
diferentes, que é a de SEGREGAÇÃO SOCIAL. Os que se afastam do padrão dito SEGREGAÇÃO SOCIAL
Trata-se de uma nova
normal, com problemas físicos ou psíquicos, são considerados doentes. Há forma de lidar com
uma patologização ou medicalização dos chamados “anormais”. Aqueles os diferentes, surgida
após o século. XVI.
que não podem se integrar não são eliminados, porém ficam confinados Os ditos “anormais”
são considerados
a instituições de “cura” e “guarda”, de “tratamento” das deficiências. “doentes” que devem
receber atenção espe-
Assim, surgem os manicômios, os leprosários, os asilos de deficientes e
cial, em instituições
velhos. A sociedade cria lugares, segregados e afastados do convívio “nor- fechadas: manicô-
mios, asilos etc. Eles
mal”, onde são depositados e “tratados” os “doentes” e “deficientes”. A ficam segregados do
convívio social, em
reclusão social pretende a “cura” do indivíduo julgado fora dos padrões prol da “cura”.
“normais” da sociedade. Eles devem ser internados, para que o processo
terapêutico seja intensivo. Na realidade, essas instituições são, geralmente,
“depósitos” de indesejáveis. Erguem-se muros para conter os diferentes; a
cura, na grande maioria dos casos, nunca acontece. A internação torna-se
uma reclusão para toda a vida. Evidentemente, nesse modelo hospitalar e
asilar, os diferentes nunca chegam à sala de aula. Aliás, a intenção é que
fiquem longe dela para não perturbar os “normais”.
No século XX, existem tendências para superar
o modelo de segregação baseado na internação, na
reclusão em espaços fechados, asilares ou hospitala-
res, calcados numa matriz carcerá-
ria, de detenção dos diferentes.
Os avanços psicológicos levam
à aparição de novos paradig-
mas sociais e educativos.
CEDERJ 91
Fundamentos da Educação 3 | Escola: inclusão e exclusão
Integração e inclusão
ESCOLA
INTEGRADORA Conforme manifestam Lisita e Sousa, depois de 1960 há uma
A partir da década de
1960 surge uma nova mudança para lidar com aqueles que apresentam dificuldades físicas
forma de lidar com
aqueles que têm difi- ou psíquicas no aprendizado. Criam-se categorias psicológicas para
culdades físicas e/ou
interpretar esses indivíduos diferentes. Aparecem termos como “anormal,
psíquicas; trata-se da
tendência que visa a retardado, deficiente mental, irregular, inadaptado, difícil, desajustado”
integrar os diferentes
à escola, realizando para explicar o insucesso escolar. Há uma “medicalização do processo
um processo de prepa-
ração prévia, antes de
de aprendizagem” (idem). Decorrente dessa nova ótica, surge a tentativa
recebê-los no ensino de integrar esses sujeitos com problemas de aprendizagem. Cria-se o
convencional. Surge
a educação especial, “ensino especial”, nova modalidade com a missão de acompanhar,
direcionada aos porta-
dores de necessidades com tratamento médico, com atendimento individualizado, os que têm
especiais. Há profes- dificuldades no aprendizado: “O ensino especial, uma modalidade de
sores com especiali-
zação no tratamento educação destinada ao atendimento escolar de crianças que apresentavam
desses alunos espe-
ciais. Num momento dificuldades na aprendizagem, ou seja, aquelas que fracassavam na escola,
posterior, uma vez que
ganhou ampla divulgação no período” (p. 201).
esses alunos recebe-
ram tratamento dife- O ensino especial está baseado na tentativa de preparar o aluno
renciado, poderiam
integrar-se na sala de com dificuldades para ajudá-lo a atingir, após um processo gradual, o
aula com a turma dita
“normal”.
ensino dito "normal":
92 CEDERJ
MÓDULO 1
médica, deixa em segundo plano os problemas sociais que determinam
9
as dificuldades de aprendizado. A imagem que sintetiza o processo
AULA
integrador é a de cascata: o aluno vai pulando diversos patamares
— como galgando diversos degraus de uma cascata — até chegar a
estar “apto” para assistir às aulas ditas “normais”.
Qual o principal pressuposto dessa concepção integradora? O
aluno deve ser treinado, iniciado, para chegar ao âmbito da escola
“normal”. O ensino especial seria um passo prévio, preliminar, até
atingir a escola convencional.
Esse modelo integrador foi questionado por deixar em segundo
plano a origem social da maior parte das dificuldades dos alunos julgados
“especiais”. Também foi questionado o lugar da escola integradora.
Os críticos da escola integradora se perguntam: não seria necessário
que a escola, ela mesma como instituição, se preparasse para receber todos
os alunos, com suas diversas dificuldades físicas, psíquicas, econômicas,
étnicas, sociais? Não deveriam ser transformados os professores, os dire-
tores, os funcionários, as instalações escolares e todo o âmbito docente ESCOLA INCLUSIVA
Deve acolher todos
para acolher todos os alunos na escola? os alunos com
suas diferenças e
Surge o paradigma da ESCOLA INCLUSIVA: “Nesta, não é o aluno dificuldades, sejam
que deve se adaptar à escola, mas o processo inverso: as instituições psíquicas, físicas,
sociais, étnicas etc.
educacionais é que têm de se modificar para atender à demanda da Todos os alunos
têm “necessidades
diversidade humana” (idem). especiais”, já que
Esta nova escola deve ser pensada não com a imagem da cascata todos são sujeitos
únicos e singulares.
— em que o aluno “deficiente” galga degraus rumo à “normalidade”–, mas
sim com a do caleidoscópio, em que o âmbito escolar acolhe a riqueza das
diferenças. Trata-se de um espaço multiforme, em que todos são diferentes
— todos têm “necessidades especiais”, conforme suas peculiaridades, sua
singularidade, sua história pessoal — e a figura desse encontro escolar
é imprevisível e riquíssima, mutável, como mutáveis são todos os seres
humanos. Daí que a sala de aula inclusiva desenhe uma bela imagem
multifacética: caleidoscópio humano em permanente mudança.
CEDERJ 93
Fundamentos da Educação 3 | Escola: inclusão e exclusão
94 CEDERJ
MÓDULO 1
dificuldades. A mais marcante é a nova relação de forças existente no
9
mundo globalizado, guiado fundamentalmente pelas necessidades do
AULA
mercado, em que o lucro é colocado no primeiro lugar. Nesse sentido,
Gentili assinala que “podemos dizer que esse conjunto de discursos,
idéias e propostas sintetiza o que poderia ser definido como a forma
neoliberal de pensar e delinear a reforma educacional na América Latina
dos anos 1990” (1998, p. 16). O interesse público de oferecer educação
para todas as crianças é postergado pelo ensejo de criar um universo de
clientes, de consumidores educacionais. Não importa, portanto, incluir
os educandos, mas ampliar a clientela: “Trata-se, enfim, de transferir a
educação da esfera da política para a esfera do mercado, negando sua
condição de direito social e transformando-a em uma possibilidade de
consumo individual” (idem).
Caro colega de viagem, você percebe que, na Educação atual,
neste momento neoliberal por que passam nosso país e o mundo, criar
uma escola inclusiva para todos é um sonho difícil de se realizar. Não é
através desta aula que poderemos equacionar essas sérias dificuldades
sociais e educacionais. Porém, algo menor — contudo muito importante
— podemos fazer: tomar consciência da situação. Esclarecer o panorama
de exclusão, inserção e inclusão escolar na atualidade. Tentamos refletir
com você sobre esses mecanismos. Por um lado, há um fenômeno mundial
econômico — a globalização e a glorificação dos mercados e do consumo
individual — que acentua a exclusão; por outro, existem tendências à
inclusão e à inserção social e escolar. Talvez você possa participar e
trabalhar em prol desta segunda alternativa.
Na atualidade, existe uma grande reflexão sobre a inserção e
a inclusão. Inclusive, há alguns autores que as consideram processos
opostos, contraditórios. Outros pensam que a inclusão não pode
eliminar a integração, já que, mesmo numa escola para todos e com
todos, é necessário atender às necessidades dos que têm deficiências
específicas. Assim, será necessário, por exemplo, que os surdos e mudos
sejam contemplados no processo de inclusão. O professor deve conhecer
as técnicas específicas para integrar esses portadores de necessidades
especiais. Em tal panorama, para incluir é preciso integrar.
Neste trajeto da nossa viagem, colocamos apenas os alicerces dessa
problemática teórico-prática da nossa sociedade e da nossa escola. Nas
paradas seguintes, 10, 11 e 12, você continuará aprofundando a questão
da inclusão e da exclusão na escola.
CEDERJ 95
Fundamentos da Educação 3 | Escola: inclusão e exclusão
RESUMO
96 CEDERJ
MÓDULO 1
EXERCÍCIOS
9
AULA
1. Reflita sobre o papel dos considerados “anormais” nos primórdios da História
e na Grécia Antiga. Qual a sua opinião sobre a segregação e, até, a eliminação
dos considerados incapazes?
4. Analise o papel da escola inclusiva nos nossos dias. Discuta com seus colegas o
papel do professor, dos diretores, funcionários e alunos nessa escola.
AUTO–AVALIAÇÃO
CEDERJ 97
Mecanismos e dispositivos
de exclusão / inclusão –
10
AULA
em uma perspectiva da
Psicologia da Educação
objetivos
100 C E D E R J
MÓDULO 1
Nos séculos XVII e XVIII, as francesas enviavam os recém-nascidos
10
para o campo, onde eram criados por negligentes amas mercenárias até os
AULA
quatro anos de idade. As mães não se preocupavam com o alto índice de
mortalidade dos bebês enquanto eles estavam sob a guarda dessas mulheres,
desde que fossem aliviadas do peso da maternagem (BADINTER, 1985).
Durante o período colonial e o Império, as sinhás brasileiras usa-
vam os serviços de leais mucamas e mães-pretas, que realizavam diligente-
mente todos os desejos dos sinhozinhos e sinhazinhas. As crianças ficavam
confortavelmente instaladas na casa-grande, beneficiando-se do trabalho
escravo, principalmente em relação aos seus problemas pessoais.
Essa ascendência dos brancos manteve-se ainda após a Lei Áurea,
de 1888, através de diversos artifícios. Como as mulheres das elites
rejeitam as tarefas domésticas, elas contratam uma estranha para cuidar,
especialmente, das crianças e da alimentação da família, pagando salá-
rio abaixo do custo de subsistência. Mães de classe média são também
dependentes dessa mão-de-obra, porque não conseguem conciliar suas Esses procedimentos
atribuições profissionais com os encargos da maternagem, por causa caracterizariam a ter-
ceirização da mater-
da pequena participação dos maridos em atividades classificadas como nidade.
Ver Castro (1996).
femininas e da precariedade da rede de apoio familiar ou social para
suprir eficientemente a ausência materna.
Conseqüentemente, as babás criam os filhos dos que pertencem
às classes privilegiadas e se transformam em importante referência para
o comportamento dessas crianças, visto que convivem com elas por
muito mais tempo que os próprios pais. Não podem, entretanto, exercer
influência plena, nem pela autoridade nem pelo exemplo, porque tais
intervenções lhes são subalternas na relação de trabalho e não integram
o universo simbólico de seus patrões. Isso significa que há um impasse
estrutural, porque o agente socializador é submisso ao imaturo, não Vale lembrar que
lhe cabendo negar qualquer desejo ao (à) patrãozinho (patroazinha). empregada doméstica,
nos moldes de
Dessa forma, a criança brasileira não aprende que existem deveres subordinação
próprios do Brasil,
em oposição a seus direitos e, de maneira arrogante, impõe normas, não existe em países
métodos, conteúdo e cronograma de sua conduta ao responsável pela sua desenvolvidos.
integridade física e mental durante a maior parte do dia. Isso fomenta seu
egocentrismo, tornando-se avessa àquela autoridade e, em conseqüência,
à realização de qualquer esforço físico ou mental para solução de seus
problemas cotidianos.
C E D E R J 101
Fundamentos da Educação 3 | Mecanismos e dispositivos de exclusão / inclusão –
em uma perspectiva da Psicologia da Educação
102 C E D E R J
MÓDULO 1
Assim, os mecanismos e dispositivos de inclusão nas escolas
10
particulares, criadas para atender as camadas privilegiadas, acentuam
AULA
seus privilégios sociais historicamente adquiridos, mas pagam o preço
de terem de suportar constantes conflitos, que decorrem de três causas O reprodutivismo
e a educação
básicas: os alunos chegam imbuídos de valores absurdos, existência de transformadora são
maneiras distintas
graves distorções teóricas para a educação e o fato de a elite brasileira de apresentar as
avilta sistematicamente o professor. Esses três problemas comprometem conseqüências da
Educação para a
ainda mais a principal instituição das sociedades urbanas – a escola –, população menos
privilegiada.
porque essa organização, com alta concentração de imaturos, não confere
autoridade ao profissional responsável pelo processo de socialização.
Em conseqüência, a escola torna-se permissiva demais para quem não
admite os limites indispensáveis à convivência com muitas pessoas, para
escamotear sua ineficiência e agradar seus usuários insatisfeitos, em sua
ambígua condição de alunos-consumidores.
Antigamente, os alunos pertencentes às elites não agiam
dessa maneira, porque o professor tinha status correspondente
ao de seus pais; isto é, pertencia também às classes privilegiadas.
Era tratado com muito respeito por toda a sociedade e pelos colégios onde
trabalhava. Apresentava-se para o trabalho usando os signos próprios de
sua condição social e não tinha participado da contestação à autoridade
para repelir o governo militar que reprimiu severamente os brasileiros entre
1964 e 1985.
Nessa época, as transformações socioeconômicas permitiram que
uma parcela considerável da força de trabalho com alta qualificação
buscasse novas profissões. Ao mesmo tempo, as proposições perversas
para subjugar a rede pública de ensino encaminharam, ao abandono do
magistério, os professores oriundos das classes privilegiadas. O exercício
do magistério tornou-se, pois, uma ocupação mal remunerada e avilta-
da por considerações desabonadoras das elites, das autoridades e dos
empresários da Educação.
Essa situação adversa – ou seja, esse conjunto de mecanismos
e dispositivos histórico-sociais de exclusão de uma profissão digna –
permitiu, então, que aqueles alunos enquadrassem os docentes na
categoria de empregados; eles acreditaram que poderiam manifestar
desprezo, porque um professor já não pode ostentar, atualmente, signos
de riqueza, como roupas elegantes, carros de luxo e endereços nobres.
C E D E R J 103
Fundamentos da Educação 3 | Mecanismos e dispositivos de exclusão / inclusão –
em uma perspectiva da Psicologia da Educação
104 C E D E R J
MÓDULO 1
Talvez tenha sido proposital a erosão do prestígio dos professores,
10
Tais problemas são
pois empresários da Educação e governantes têm-se beneficiado bastan- encontrados também
AULA
no Ensino Superior
te com esse processo de demolição do trabalho docente. Os primeiros e, sem querer des-
merecer os outros
conseguem administrar bem seus negócios: vender ensino com satisfação
segmentos, mostram-
plena de sua freguesia, enquanto atemorizam os professores com ameaça se ainda mais graves,
pois adultos relapsos
de demissão, caso não satisfaçam às exigências do alunado, independen- querem determinar as
normas e o professor
temente da aprendizagem. Enquanto isso, as autoridades educacionais do sente-se mais amea-
governo anterior (Fernando Henrique Cardoso) gestaram em território çado, principalmente
quando se trata de
brasileiro políticas sociais definidas pelos credores internacionais, que uma professora em
relação a um aluno.
almejam mão-de-obra qualificada que atenda às exigências do mercado Aliás, não é raro que
de trabalho, mas não desejam produção de conhecimento no país, para surjam agressões físi-
cas e/ou morais nesse
que não haja criação de tecnologia e, como conseqüência, continuarmos segmento do sistema
educacional, incluin-
dependentes das nações soberanas no contexto mundial. do as universidades
públicas.
Os professores não têm recebido orientação adequada para
cativar os alunos (tanto os mais ricos quanto os mais pobres), pois isso
implicaria despesas extras e, sobretudo, formação de líderes eficientes e
temidos pela classe dominante. Além do mais, profissionais competentes
estariam aptos a receber salários elevados e rejeitariam apadrinhamento
político, ao se darem conta de sua nova sintonia com a modernidade.
Autoridades e empresários da Educação preferem, dessa forma, que
os docentes se mantenham como figuras inexpressivas, ou até mesmo
grotescas, por transgredir princípios elementares de apresentação diante
de seu público. Tudo isso junto justifica a fórmula: remuneração insigni-
ficante para quem tem formação universitária mais tratamento inferior
conferido à corporação com o estereótipo: os professores antigos sabiam
ensinar; os atuais não têm berço e assumiram o magistério porque não
têm competência suficiente para seguir outras profissões.
Vimos como os mecanismos e dispositivos de exclusão social
agiram de fora para dentro da escola e de fora para dentro das pessoas,
em seus eus. Pois é... apesar das contestações das teorias educacionais
que criticam certo psicologismo que molda as teorias e as práticas da
Pedagogia moderna e contemporânea, na verdade as pedagogias de todos
os matizes políticos não conseguem existir sem a Psicologia.
C E D E R J 105
Fundamentos da Educação 3 | Mecanismos e dispositivos de exclusão / inclusão –
em uma perspectiva da Psicologia da Educação
106 C E D E R J
MÓDULO 1
10
Eu quero uma escola
AULA
Moaci Carneiro
Eu quero
Uma escola-relicário
Com jóias do Imaginário
Eu quero
Uma escola-alegria
Com sentido de harmonia
Eu quero
Uma escola com enredo
Cheia de sonho e aconchego.
Eu quero
Uma escola-expressão
Da vida, sem restrição.
C E D E R J 107
Fundamentos da Educação 3 | Mecanismos e dispositivos de exclusão / inclusão –
em uma perspectiva da Psicologia da Educação
RESUMO
AUTO-AVALIAÇÃO
Que mecanismos e dispositivos você usa em sua sala de aula para administrar
problemas disciplinares?
Na sua sala, você presencia episódios de exclusão entre os alunos no que se refere
às tarefas escolares e/ou às brincadeiras na hora do recreio? Como você lida com
esses episódios?
Você tem se sentido menos profissional por ser professor(a)? O que você pode
fazer para mudar essa situação de desprestígio profissional?
108 C E D E R J
11
AULA
Mecanismos e dispositivos
de exclusão social
objetivos
Pré-requisitos
Aulas 1 e 2, sobre o Banco Mundial.
Fundamentos da Educação 3 | Mecanismos e dispositivos de exclusão social
(Gilberto Gil)
110 C E D E R J
MÓDULO 1
Ao longo das últimas décadas, os mecanismos de proteção do
11
bem-estar social, propiciados pelo Estado de Bem-Estar Social, começaram
AULA
a ser desmantelados por causa dos programas econômicos neoliberais
implementados em vários países do mundo, inclusive nos subdesenvolvidos.
Isso pôs as classes média e baixa em posição de maior vulnerabilidade,
porque não puderam mais contar com a qualidade dos serviços públicos de
alcance social: educação, saúde, transporte etc. Se esse fenômeno provocou
uma tragédia na vida de milhões de pessoas nos países desenvolvidos,
pode-se dizer que o estrago foi muito maior para aqueles que vivem em
países subdesenvolvidos. Com o declínio de tais condições, não somente
ocorreu uma perda do padrão de vida das classes média e baixa, como
também aumentou muitíssimo o número de pessoas que sequer poderiam
sonhar com algum tipo de sobrevivência material razoavelmente digna.
Desse modo, elevou-se bastante o percentual de excluídos no Terceiro
Mundo, afetando a região da América Latina e, obviamente, o Brasil.
Então, conforme dissemos, é muito comum vermos pessoas que
estão do lado de fora do trem ou da estação; não participam da viagem
como os demais. Temos aqui uma metáfora, simbolizando que elas são
excluídas do sistema social. No entanto, isso pode e deve ser relativizado.
Justamente porque entre a inclusão e a exclusão total há várias nuanças,
com zonas intermediárias e tonalidades diferentes. E, ainda, as pessoas
podem contar com a ajuda de algumas entidades que trabalham para
amenizar a sua situação. Por exemplo: dizemos que um catador de lixo
está excluído da vida social porque ele não tem emprego, acesso à educação,
saúde etc. Não podemos, todavia, esquecer que existe a possibilidade de
ele pertencer a uma cooperativa de catadores de latinhas de alumínio.
Se ele arrecadar pelo menos um salário mínimo por mês, certamente poderá
comprar alimentos básicos, participando, ainda que minimamente, da vida
social como consumidor. Porém, não podemos dizer que tal pessoa participe
satisfatoriamente da sociedade. Por essa razão, diz-se que ela está excluída
dos benefícios e das responsabilidades, expressos nos direitos e deveres
supostamente estabelecidos para todos (CASTEL, 2000).
C E D E R J 111
Fundamentos da Educação 3 | Mecanismos e dispositivos de exclusão social
112 C E D E R J
MÓDULO 1
Sabemos que a maioria das vagas nos cursos de maior prestígio das melhores
11
universidades, principalmente as públicas, vai para aqueles alunos que são
AULA
oriundos do setor de ensino privado. Esta é uma maneira de excluir a maioria
da população que cursa a escola pública, cujo destino, quando muito, O reprodutivismo
e a educação
são as vagas das instituições superiores privadas, geralmente de baixa transformadora são
maneiras distintas
qualidade educacional. de apresentar as
Em resumo, o próprio funcionamento do sistema de ensino é um conseqüências da
Educação para a
mecanismo de exclusão por causa da lógica que o organiza e pelos resultados população menos
privilegiada.
apresentados. Isso quer dizer o seguinte: ainda que todos os alunos pudessem
ter acesso razoavelmente igualitário às mesmas condições de ensino nas
escolas, isso não eliminaria totalmente a exclusão, por causa da desigualdade
entre as classes sociais. Ou seja, um aluno de classe baixa que estuda no
mesmo sistema de ensino que um de classe média tem poucas possibilidades
de receber e utilizar a carga de conhecimentos de maneira igual à do outro.
Se quisermos aprofundar esse exemplo, podemos dizer que isso pode ocorrer
até mesmo no caso de pertencerem à mesma escola e turma. O chamado
“capital cultural” é distinto um do outro, por causa das diferentes posições
que eles ocupam dentro do sistema social. Eles possuem diferentes condições
sociais de aprender e processar as informações, os saberes e as práticas do
conhecimento escolar (BOURDIEU,1974). Esse argumento, fundamentado
na concepção educacional reprodutivista, opõe-se às idéias que afirmam
poder haver uma unificação real dos princípios, meios e fins do sistema de
ensino (normas, currículos, instalações, material didático, qualificação de
pessoal etc.). Isso ocorre para tentar resolver o problema da desigualdade
social e seus reflexos na Educação, conforme afirmam os defensores da
chamada concepção crítico-transformadora da Educação. Assim, a suposta
unidade do sistema de ensino é apenas uma ilusão, ainda que todos possam
contar com as mesmas condições oferecidas por ele. Então, quando se fala
em “educação para todos” ou “democratização do ensino”, vê-se que é algo
impossível de acontecer efetivamente, apesar das boas intenções de muitos
analistas, planejadores, políticos e professores.
C E D E R J 113
Fundamentos da Educação 3 | Mecanismos e dispositivos de exclusão social
114 C E D E R J
MÓDULO 1
A escola impõe determinado tipo de padronização cultural a todos,
11
com o saber que o Estado estabelece ser adequado à população. Desse
AULA
modo, esse saber nem sempre considera a pluralidade da sociedade, não
atentando, portanto, para a realidade das pessoas que formam a escola.
Conforme já foi dito, a escola, algumas vezes, parece uma nave espacial
pousada em um planeta desconhecido (SILVA, 1996). Como resultado, ela
elege, seleciona e promove um determinado grupo de pessoas, que vai gal-
gando os degraus do sucesso, deixando de lado um outro que evade/repete
de modo continuado e permanente. Essa realidade vale não somente para
quem é mais pobre, como também para algumas etnias (por exemplo, negros
e indígenas). No caso do Brasil, por exemplo, tal situação até que não é tão
desconhecida porque a maioria dos pobres brasileiros pertence a essas etnias;
portanto, quem obtém as melhores oportunidades no mercado de trabalho
são os menos pobres que, não por coincidência, são considerados brancos.
Sabemos que é bastante comum afirmar-se que não há racismo no Brasil,
que vivemos em um país simpático e harmonioso, sem conflitos, numa situação
conhecida pelo nome de “democracia racial”. Porém, há várias contestações a
esse respeito, se de fato não temos enfrentamento racial aberto como em outros
países, a “democracia racial” esconde o pernicioso preconceito que existe entre
nós. As minorias étnico-raciais ainda são freqüentemente retratadas de modo
estereotipado nos materiais didáticos e nos meios de comunicação, influenciando
aquela mentalidade que tenta justificar a superioridade dos brancos.
A contribuição de negros e indígenas fica quase sempre registrada em
aspectos folclóricos (como o samba, o Carnaval, o futebol e a culinária)
e históricos (como o Descobrimento, a Abolição da Escravatura etc.)
sem falar na representação da negra como objeto sexual – caso das mulatas,
ou como serviçais – a empregada doméstica.
Podemos entender a situação da discriminação racial através do
A LDB e os PCNs
funcionamento do sistema de ensino. Por exemplo: se temos uma quantidade estabelecem os obje-
de aproximadamente 45% de negros no Brasil, apenas 2,5% deles chegam tivos da Educação no
Brasil; deve buscar a
ao nível superior completo, público ou privado. Em contraposição, os integração dos alunos
ao mundo da cidada-
brancos concluintes são 12%. No Ensino Médio, os concluintes brancos nia e do trabalho.
são 26%, os negros são 15%. O número de negros analfabetos é quase
três vezes maior que os brancos em igual condição (GONÇALVES, 1999).
C E D E R J 115
Fundamentos da Educação 3 | Mecanismos e dispositivos de exclusão social
RESUMO
116 C E D E R J
MÓDULO 1
EXERCÍCIOS
11
AULA
1.·Procure em material impresso e/ou eletrônico informações que demonstrem casos
em que haja relato da situação do ensino no Brasil, em especial da comparação entre
o ensino público e o privado.
2. Comente a frase “No Brasil não há racismo, pois todos somos filhos de Deus”.
C E D E R J 117
12
AULA
Mecanismos e dispositivos
de exclusão/inclusão
objetivos
Pré-requisito
Caro colega de viagem pela Terra dos
Fundamentos da Educação, para um
melhor entendimento desta aula, sugeri-
mos que você releia as Aulas: 9 (Escola:
inclusão e exclusão); 10 (Mecanismos e
dispositivos de exclusão/inclusão — em
uma perspectiva da Psicologia
da Educação) e 11. (Mecanismos e
dispositivos de exclusão social).
Fundamentos da Educação 3 | Mecanismos e dispositivos de exclusão/inclusão
120 C E D E R J
MÓDULO 1
Os processos de exclusão que provêm da globalização, de um mundo capitalista
12
que procura quase que exclusivamente a multiplicação dos lucros, motivam a
AULA
reflexão e ação dos diversos representantes da sociedade organizada. Desde as
instâncias do governo até os diversos grupos de pressão: sindicatos, corpora-
ções, ONG etc. Trata-se do âmbito de políticas públicas que exigem ações
mais amplas das instituições e dos setores socialmente organizados diante de
entidades internacionais que impõem orientações socioeconômicas excludentes,
como o Fundo Monetário Internacional, o Banco Mundial, grandes empresas
multinacionais etc. Nesse plano, o professor pode manifestar-se como cidadão,
agindo em diversas instâncias coletivas: sindicatos, faculdades e outros espaços
públicos (jornais, diversos meios de comunicação etc.)
Com relação aos processos de discriminação próprios da sociedade brasileira,
o professor pode adotar diversas atitudes: desde fomentar a tomada de
consciência até escolher diversas práticas integradoras a serem empre-
gadas em sala de aula. Aos efeitos de implementar essas atitudes surge
uma pergunta fundamental:
C E D E R J 121
Fundamentos da Educação 3 | Mecanismos e dispositivos de exclusão/inclusão
Caro colega de viagem, você que vive no Brasil, que leciona numa
escola no Rio de Janeiro, deve conhecer histórias parecidas: negros que
são desvalorizados; nordestinos que são humilhados e chamados com
um rótulo geral depreciativo de “paraíbas”. Paraíba é o habitante de
Paraíba do Norte, mas esse termo é aplicado a todo nordestino,
ignorando as diferenças locais — há cearenses, pernambucanos,
sergipanos, maranhenses etc. —; nessa ótica pejorativa contra todos
os nordestinos, “paraíba” não só alude ao habitante do Nordeste,
mas significa também ignorante, grosso, pobre etc. Você deve ter
percebido que, numa sociedade preconceituosa, os
que fogem ao padrão dito “normal” são excluídos.
Os que moram na zona oeste da cidade do Rio de Janei-
ro são depreciados, os mais velhos são denegridos com o apeli-
do “coroa”, os que têm deficiências físicas são ridicularizados, os homos-
sexuais são agredidos, considerados “tarados”. A religião é outra questão
que gera práticas de exclusão: os que acreditam em religiões diferentes são
Sociedades diferentes preteridos. Um preconceito recente está ligado aos que praticam religiões
Oriente e Ocidente
têm costumes e valo- vinculadas ao Islã. Os muçulmanos, particularmente após os conflitos que
res muito diversos.
envolvem o Oriente Médio, têm sido caracterizados como fanáticos, irra-
cionais etc. Mas, será que as religiões diferentes daquelas praticadas pela
maioria dos brasileiros não merecem o nosso respeito? É claro que sim.
122 C E D E R J
MÓDULO 1
Ao contrário da tendência que condena e simplifica as culturas diversas
12
da nossa, é importante entender e respeitar as diferenças.
AULA
Que significa DIFERENÇA? Significa que há diversas formas de ver DIFERENÇA
o mundo, a vida, os costumes, os valores; há múltiplas formas de estar Aquilo que determina
a condição de alteri-
no mundo. A nossa forma de viver e pensar não é a única, não invalida dade ou de ser outro;
aquilo que se afasta
as outras. Há diferentes culturas, cada uma com seus valores, com seus
do que nos caracteri-
parâmetros e convicções. A nossa cultura não é única nem privilegiada za: o dia é diferente da
noite, o feminino do
e as outras são as exceções. Assim, por exemplo, para nós, brasileiros, masculino, o pequeno
do grande. Assim, os
pertencentes ao mundo ocidental, é comum comer carne, matar bois para jovens são diferentes
nos alimentarmos. Já os indianos não comem carne porque as vacas são dos velhos; se somos
homens percebemos a
consideradas entidades sagradas. Mas, ao mesmo tempo, muitos deles alteridade da mulher;
ela é um outro sujeito
morrem de fome, não obstante nunca seriam capazes de ousar sacrificar que se diferencia de
essas vacas para alimentar-se. Para nós, isso pode parecer absurdo. Por nossa condição
masculina.
que os indianos preferem morrer a comer vacas? Devemos entender as
diferenças culturais. Para eles, as vacas não são animais, mas divindades.
Estão equivocados? Não, são diferentes. A vaca, para eles, possui um
significado totalmente diverso do que tem para nós.
Caro companheiro de viagem, para entender melhor a questão da diferença, e da aceitação da diferença que deve ser
praticada na sociedade e na escola, podemos lembrar uma novela que foi muito famosa, muito comentada há pouco
tempo atrás: O clone. Lembre que a história se desenrolava, simultaneamente, em dois lugares: Brasil e Marrocos.
Os personagens transitavam continuamente entre duas culturas: uma ocidental e outra oriental. Havia um choque
de valores entre sociedades diferentes. Por exemplo, ficava claro, no comportamento da protagonista, que o lugar
da mulher é muito diferente no Oriente e no Ocidente. O Marrocos é um país com a sociedade patriarcal, em que o
domínio do homem é decisivo, e o lugar da mulher depende totalmente do marido. Ele pode ter mais de uma esposa,
sem que essa conduta seja considerada infidelidade. Já a mulher deve total obediência ao esposo e a traição é uma
transgressão gravíssima. Então, a mulher deve ter um comportamento monogâmico (deve ter um único parceiro)
defendido à risca com pesados castigos, e o homem está liberado para ser poligâmico (pode ter mais de uma par-
ceira). Dois pesos e duas medidas? Sim, mais isso provém dos valores da religião oriental que diferencia os lugares
dos dois sexos. No Ocidente, embora a tradição patriarcal aqui também seja forte, homem e mulher devem ter um
comportamento monogâmico. A protagonista de O clone vive o drama dessa diversidade cultural. Ela se apaixona
por um brasileiro, mas está casada no Marrocos, onde o divórcio é impossível. Entre a sua paixão e o seu dever ela
vive um drama peculiar. Terá direito a se separar e começar outra vida? Conforme os padrões orientais, isso não
é possível, já desde nosso olhar ocidental, ela deveria ter a possibilidade de escolher conforme seus sentimentos.
Há um comportamento verdadeiro? Não. Há valores e sociedades diferentes.
C E D E R J 123
Fundamentos da Educação 3 | Mecanismos e dispositivos de exclusão/inclusão
124 C E D E R J
MÓDULO 1
tem um dialeto ou língua diferente do português — ou outros valores e
12
costumes — as comunidades indígenas, por exemplo. A escola torna-se,
AULA
assim, um “caleidoscópio” onde brilham as diferenças, onde é possível
comungar diferentes visões de mundo:
C E D E R J 125
Fundamentos da Educação 3 | Mecanismos e dispositivos de exclusão/inclusão
126 C E D E R J
MÓDULO 1
Portanto, o modelo de escola inclusiva ainda está sendo concretizado, a for-
12
mação dos professores que possam acolher as diferenças ainda não está ple-
AULA
namente consagrada nos currículos. Trata-se de iniciativas que, aos poucos,
serão incorporadas na mentalidade, no planejamento e na ação das escolas
e dos professores. É uma tarefa a ser construída. É uma proposta digna de
ser adotada pelos docentes: construir uma educação para todos.
RESUMO
C E D E R J 127
Fundamentos da Educação 3 | Mecanismos e dispositivos de exclusão/inclusão
EXERCÍCIOS
1. Tente lembrar os adjetivos, termos e apelidos que são dados aos seus colegas
considerados diferentes: negros, nordestinos, pobres, gordos, de outras religiões,
com deficiências físicas e psíquicas. Reflita sobre o sentido excludente e pejorativo
dessas palavras.
2. Comente com seus colegas a novela O clone. Tente lembrar as diferenças culturais
entre Brasil e Marrocos. Analise especificamente o papel da mulher nessas duas
sociedades.
3. Analise as formas e estratégias que poderiam ser seguidas numa escola inclusiva.
Comente com seus colegas aquelas que foram apresentadas nesta aula. Sugira
outras possibilidades de inclusão.
AUTO–AVALIAÇÃO
Você conseguiu entender o que significa exclusão social e escolar? Você pode
detectar, na sua vivência escolar, práticas de exclusão? Você pode comentar quais
são essas práticas? Você entendeu o que significam diferenças culturais? Você
compreendeu por que há sociedades que têm costumes e valores muito diversos,
até contrários? Se conseguiu entender que as sociedades diferentes não estão
certas nem erradas, você assimilou um princípio básico das sociedades e escolas
inclusivas: não há valores nem crenças verdadeiras ou certas, mas uma diversidade
de visões de mundo.
128 C E D E R J
Implementando ações
13
AULA
afirmativas na Educação
brasileira
objetivos
Pré-requisito
Vale a pena reler as Aulas 3 e 4 para
melhor compreensão desta.
Fundamentos da Educação 3 | Implementando ações afirmativas na Educação brasileira
Estamos chegando a mais uma estação que nos encaminha para a plataforma
Implementando ações afirmativas na Educação brasileira.
A EDUCAÇÃO ESPECIAL
130 C E D E R J
MÓDULO 1
Essa definição foi reforçada pela Resolução CNE/CEB nº 2,
13
de 11 de setembro de 2001, que instituiu as Diretrizes Nacionais para a
AULA
Educação Especial na Educação Básica:
C E D E R J 131
Fundamentos da Educação 3 | Implementando ações afirmativas na Educação brasileira
Rede Municipal 29.591 14,7% 48.164 14,4% 62.962 18,7% 75.505 20,2% 115,2%
Rede Estadual 90.688 45,1% 123.461 36,9% 115.424 34,2% 119.946 32,1% 32,3%
Rede Federal 938 0,5% 1.157 0,3% 898 0,3% 840 0,2% -10,4%
Rede Particular 79.925 39,7% 161.725 48,3% 158.042 46,9% 117.838 47,5% 122,5%
132 C E D E R J
MÓDULO 1
13
Tabela 13.2: Evolução da matrícula de alunos com
necessidades especiais por tipo de deficiência
AULA
1996 1997 1998 1999 (*) 96-98
% de
Tipo de necessidade Quant. Distr. Quant. Distr. Quant. Distr. Quant. Distr.
Evol.
Alunos % Alunos % Alunos % Alunos %
Total Brasil 201.142 100% 334.507 100% 337.326 100% 374.129 100% 89,0%
Deficiência Visual 8.081 4,0% 13.875 4,1% 15.473 4,6% 18.629 5,0% 130,5%
Deficiência Auditiva 30.578 15,2% 43.241 12,9% 42.584 12,6% 47.810 12,8% 56,4%
Deficiência Física 7.921 3,9% 13.135 3,9% 16.463 4,9% 17.333 4,6% 118,8%
Deficiência Mental 121.021 60,2% 189.370 56,6% 181.377 53,8% 197.996 52,9% 63,6%
Deficiência Múltipla 23.522 11,7% 47.481 14,2% 45.582 12,6% 46.745 12,5% 98%
Problemas de conduta 9.529 4,7% 26.681 7,7% 8.994 2,7% 9.223 2,5% -3,2%
Superdotação 490 0,2% 1.724 0,5% 1.187 0,4% 1.228 0,3% 150,6%
Outras 28.666 8,5% 35.165 9,4% 22,7%
EDUCAÇÃO INDÍGENA
C E D E R J 133
Fundamentos da Educação 3 | Implementando ações afirmativas na Educação brasileira
Leia também o Art. Censo da Educação Indígena começou a ser realizado pelo Instituto
26 e o Art. 78, que de Estudos e Pesquisas Educacionais (INEP) em parceria com a
tratam da questão.
O Plano Nacional da Secretaria de Educação Fundamental, em 1999. Naquele ano teve
Educação (PNE), no início a coleta de dados. O levantamento revelou que, naquele
seu item 9, analisa a
período, o Brasil possuía 93.037 alunos matriculados na Educação
Educação Indígena,
sendo importante Indígena no País, a maior parte concentrada no Ensino Fundamen-
sua leitura para tal. Havia também 74.931 estudantes índios. Nas 1.392 escolas
aprofundamento da
análise. indígenas então existentes no País trabalhavam 3.998 professores
e, desse total, 76,5% eram de origem indígena.
(texto extraído de
http://www.mec.gov.br/sef/indigena/censo.shtm)
134 C E D E R J
MÓDULO 1
13
Tabela 13.3: Número de matrículas por dependência
administrativa, segundo a região geográfica
AULA
Matrículas por Dependência Administrativa
Região Geográfica
Total Federal Estadual Municipal Privada
Fonte: MEC/INEP/SEEC.
C E D E R J 135
Fundamentos da Educação 3 | Implementando ações afirmativas na Educação brasileira
A POLÍTICA DE COTAS
136 C E D E R J
MÓDULO 1
13
Ciências Biológicas, Desenho Industrial, Direito, Enfermagem, Engenharia Elétrica,
Engenharia Química, Informática, Jornalismo, Medicina, Nutrição e Odontologia
AULA
foram os cursos que mais receberam alunos beneficiados pelas cotas, sendo, portanto,
as carreiras nas quais houve maior discrepância entre as notas dos classificados com e
sem reserva. Conseqüentemente, foi nesses cursos que um maior número de candida-
tos não ligados a nenhum sistema de reserva legal foi eliminado.
CONCLUSÃO
Seria possível dizer, talvez, que o maior mérito das políticas de discriminação
positiva é desmascarar a discriminação surda, tocar nas feridas da nossa sociedade,
gerar polêmicas que nos fazem repensar o passado, o presente e o futuro.
C E D E R J 137
Fundamentos da Educação 3 | Implementando ações afirmativas na Educação brasileira
RESUMO
Nesta aula fizemos um breve e genérico estudo de casos das ações afirmativas na
Educação brasileira. Selecionamos três exemplos fundamentais: o da Educação
Especial, o da Educação Indígena e o da política de cotas.
Identificamos avanços, problemas e dificuldades nos três exemplos, mas ressaltamos
a importância do debate gerado em torno da implementação dessas políticas
afirmativas pelo Estado.
Se as ações afirmativas não são um fim em si mesmas, podemos dizer que são um
começo...
EXERCÍCIOS
AUTO-AVALIAÇÃO
Ao final desta aula, você deve ser capaz de fazer uma breve e genérica análise
das ações afirmativas na Educação brasileira.
138 C E D E R J
Diário da vida escolar
14
AULA
brasileira: na busca do ideal
democrático
Pré-requisito
Esta aula contém uma síntese das cinco
aulas que a antecedem. Você necessita
reestudá-las para compreender o que vai
ser revisto a seguir.
Fundamentos da Educação 3 | Diário da vida escolar brasileira: na busca do ideal democrático
140 C E D E R J
MÓDULO 1
Esse é exatamente o nosso caso, caro aluno, quando construí-
14
mos estas aulas-síntese. Ao estudá-las, lembrem-se das mocinhas
AULA
e de seus diários.
Vamos, então, a mais uma aula-síntese.
A primeira das aulas aqui sintetizadas foi intitulada Escola:
inclusão e exclusão.
Que significam as palavras, “inclusão”, “exclusão”,
“integração” e “necessidades especiais” em relação à escola
e à educação das crianças? A aula, depois de citar um trecho
da Declaração de Salamanca, nos convidou à reflexão. Faça
isso novamente agora, prezado aluno, e procure lembrar-se das situações
reais de exclusão envolvendo crianças e jovens que você conheça. Por
que isso acontece? E o que fazer para evitar essa situação?
Em seguida, acompanhando a aula, procure rever o comercial de
TV ali indicado, estrelado por uma menina portadora da síndrome de
Down. E medite sobre a frase “Ser diferente é normal”. Você já tinha
pensado nisso?
A aula prosseguiu fazendo um apanhado histórico da trajetória
que vai da exclusão à segregação. Vimos aí que as sociedades têm clas-
sificado os indivíduos, do ponto de vista da inclusão e da exclusão, nas
seguintes categorias:
• normais: aqueles que têm condições para se encaixar nos
parâmetros coletivos;
• excluídos: os destituídos dos direitos ou deveres atribuídos aos
normais;
• eliminados: os que são excluídos literalmente pela sociedade
através da morte;
• discriminados: por exemplo, os que são considerados cidadãos
e os classificados como não-cidadãos.
A aula citou exemplos na Grécia Antiga e na Idade Média, subli-
nhando a questão da exclusão pela falta de acesso à Educação.
Retome a aula, caro aluno, e reveja o terrível significado de “estig-
ma”, palavra que originariamente queria dizer “marcado a fogo”.
A aula lembrou também a odiosa discriminação, perseguição e
por vezes a pura eliminação dos portadores de necessidades especiais.
Os então chamados “anormais” com freqüência eram considerados
diabólicos, justificando-se, assim, sua eliminação.
C E D E R J 141
Fundamentos da Educação 3 | Diário da vida escolar brasileira: na busca do ideal democrático
142 C E D E R J
MÓDULO 1
A aula seguinte recebeu o título de “Mecanismos de inclusão/
14
exclusão – numa perspectiva da Psicologia da Educação”. Essa aula teve
AULA
como objetivo principal examinar a relação professor/aluno, observando-a
a partir do que acontece na escola.
Inicialmente, foi analisada a relação das mulheres com a socialização
de seus filhos, relatando-se a entrega dessa tarefa, por muitas mulheres, a
pessoas e entidades a esse fim destinadas, como, por exemplo, às escravas,
na Antigüidade, e a mercenárias, nos séculos XVII e XVIII.
No Brasil, isso foi praticado pelas sinhás, as mulheres da
classe dominante, que entregavam o cuidado dos filhos – desde
a amamentação, com as famosas amas-de-leite, e durante toda
a criação – às escravas.
Os reflexos dessa situação, como mostrou a aula,
vêem-se ainda hoje, com as mães de classe média confiando
os filhos às babás e às empregadas domésticas.
Mandonismo, egocentrismo e desrespeito por regras e nor-
mas acabam por caracterizar muitas das crianças educadas desse modo.
Como a escola é definida pela sociedade como uma instituição
destinada à aprendizagem, seja de habilidades, técnicas, conhecimentos
ou atitudes, isso acaba por criar, mesmo nas crianças das classes
privilegiadas, limitações das vontades e direitos e o estabelecimento de
obrigações.
Porém, o que ilustra de forma perfeita os mecanismos de exclusão
é a situação dos filhos das próprias babás e empregadas domésticas em
geral: freqüentam uma escola pública que foi instituída e se mantém
seguindo um modelo burguês, ou simplesmente ficam fora da instituição
escolar. Quando conseguem escola, acabam inadaptados e quase sempre
reprovados devido à inadaptação e à falta de estímulo. De um modo ou
de outro, terminam fora da escola, engrossando as estatísticas de um
sistema educativo excludente.
Relativamente à escola particular, a aula apontou três causas para
a existência de conflitos:
• alunos imbuídos de valores absurdos;
• existência de graves distorções teóricas para a educação;
• aviltamento sistemático do professor.
C E D E R J 143
Fundamentos da Educação 3 | Diário da vida escolar brasileira: na busca do ideal democrático
144 C E D E R J
MÓDULO 1
Releia a interessante passagem, logo no início desta aula, em que
14
se fez uma comparação entre as classes sociais – alta, média e baixa –,
AULA
com seus respectivos direitos econômicos e sociais, e três tipos de pas-
sageiros em nossa viagem de trem. Além disso, destaca-se a situação
daqueles que sequer podem embarcar em viagens como a nossa: estes
últimos são os excluídos, agravando-se a situação no caso de negros,
indígenas, crianças, jovens e mulheres.
A seguir, a aula tratou da relação entre a desmontagem dos
programas de bem-estar social implementados pelos Estados e a ascensão
do neoliberalismo. Tal situação levou ao declínio da classe média e à
maior miséria das classes já desfavorecidas, aprofundando o fenômeno
da exclusão social.
A relação entre a exclusão social e a Educação foi examinada
tendo em conta o papel desempenhado pela escola como instância neces-
sária para a inclusão socioeconômica dos indivíduos.
Seguindo com o estudo da aula, caro aluno, você recebeu
informações sobre a denominada “pirâmide social”, tal como se apresenta
em nosso país. Releia, na parte intitulada “Mecanismos econômicos de
exclusão”, essas informações, que demonstram como se apresenta o
quadro, que favorece e aprofunda, no Brasil e em países subdesenvolvidos
como o nosso, a exclusão. Veja, inclusive, a análise que se faz do papel
do sistema de ensino nesse processo excludente.
Você teve, nesse ponto da aula, novas referências à concepção
denominada “reprodutivista”, que já foi objeto de estudo em aulas
anteriores de nosso curso. Volte a essas aulas para relembrar o que
aprendeu sobre essa visão do papel da escola e da Educação.
Em seguida, a aula examinou os denominados “mecanismos
culturais de exclusão”, que agem na discriminação étnico-racial e de
gênero, bem como na existência e permanência do preconceito contra as
minorias sociais, como negros, indígenas, mulheres, homossexuais etc.
A escola, acentuou-se nessa aula, acaba por não contemplar a
diversidade cultural e reflete a discriminação em relação às oportunida-
des, que deixam de ser propiciadas às minorias sociais.
Outro problema apontado na aula é o da padronização cultural
imposta pela escola, homogeneizando e erradicando manifestações cul-
turais das diversas etnias e dos grupos minoritários.
C E D E R J 145
Fundamentos da Educação 3 | Diário da vida escolar brasileira: na busca do ideal democrático
146 C E D E R J
MÓDULO 1
Atrelando o macroestrutural ao microestrutural, pode-se perce-
14
ber que, além de uma política de exclusão mais ampla, existem, dentro
AULA
do sistema educacional brasileiro, significativas ações que favorecem o
processo de exclusão.
Nessa aula, o que foi apresentado denota um olhar científico
sobre uma realidade que pode ser vista a olho nu: a exclusão do negro,
do pobre, da mulher, do índio, do homossexual, do nordestino, dos
seguidores de diferentes seitas, religiões, doutrinas, em síntese, de
todos aqueles que não representam os modelos instituídos
pelos donos do poder, pela burguesia.
Relendo-a agora, você poderá refletir sobre um ponto
fundamental dessa aula: a questão da diferença, que, segundo
o texto, significa as diversas formas de ver o mundo, a vida,
os costumes, os valores, uma vez que há múltiplas formas de
se estar no mundo.
É preciso lembrar que não existe apenas uma cultura
brasileira; existem várias culturas dentro deste imenso Brasil.
Cultura, definida em aula anterior, que significa a teia de significados
construída pelo homem.
Se desejamos banir a exclusão e favorecer a inclusão, é importante
compreender as diferentes culturas, respeitá-las, sem impor nossa visão
de mundo como a ideal.
Cada grupo social, cada comunidade, cada escola tem suas histó-
rias, suas lembranças afetivas, seu modo de pensar, de sentir e de agir, e
adentrar esse mundo sem compreendê-lo seria como tentar ler os diários
das nossas duas meninas. Certamente não compreenderíamos nada, ou
então faríamos uma leitura distorcida e até preconceituosa, podendo
chegar até rotular a personalidade de cada uma.
Aprofundando-se um pouco mais no tema, a aula tratou de outro
ponto importante: a inclusão dos alunos portadores de necessidades
especiais, exigida pela Lei 9.394/96, que você já estudou.
A aula ressaltou ainda a preocupação com o cotidiano escolar,
fazendo uso da imagem de um “caleidoscópio” onde brilham as dife-
renças, onde é possível comungar diferentes visões de mundo.
C E D E R J 147
Fundamentos da Educação 3 | Diário da vida escolar brasileira: na busca do ideal democrático
148 C E D E R J
MÓDULO 1
Indo além da fundamentação legal, o texto da aula apresentou
14
a distribuição da matrícula dos alunos com necessidades especiais por
AULA
rede de ensino, tendo por base o censo escolar.
Os dados apresentados demonstram o avanço quantitativo dessa
inserção dos estudantes portadores de necessidades especiais nas redes
de ensino regular do país, embora na rede federal se registre um decrés-
cimo das matrículas.
A aula apresentou, também, dados estatísticos relativos à evolução
da matrícula de alunos com necessidades especiais por tipo de deficiência,
demonstrando que há dificuldades de efetivar uma política de inclusão na
educação especial, que exige, paralelamente, um grande investimento na
capacitação docente, já que a formação de professores não contempla,
generalizadamente, essa demanda crescente.
Com relação à Educação Indígena, a aula abordou tanto os
aspectos legais contidos na Constituição Federal quanto na LDBEN.
Esta dispõe, em seu artigo 79:
C E D E R J 149
Fundamentos da Educação 3 | Diário da vida escolar brasileira: na busca do ideal democrático
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15
AULA
Espaço-tempo
de avaliar os saberes
Fundamentos da Educação 3 | Espaço-tempo de avaliar os saberes
Como você sabe, prezado aluno, nos últimos dois dias não temos
Você já aprendeu em podido contemplar a beleza da paisagem nesta nossa viagem imaginária
outra aula que gare
é outro nome para
pela Terra dos Fundamentos da Educação. Os campos verdejantes e o céu
estação de estrada de azul têm dado lugar ao cinzento da chuva inclemente, que transforma os
ferro.
pequenos riachos num curso volumoso de água e os grandes rios numa
impressionante quantidade de água barrenta.
Quando nosso trem foi entrando na cidade, pudemos ver os
estragos causados pela chuva intensa: ruas alagadas, muros derrubados
e até construções existentes nas encostas ameaçadas e interditadas.
Ao chegarmos a esta grande estação, onde faremos nova para-
da mais demorada, nossa atenção foi despertada pelo estado da gare.
Grande parte do imenso galpão foi destelhada e, num dos cantos,
oposto à sala de avaliação, a água invadiu o depósito, estragan-
do quase toda a grande quantidade de mercadorias ali armaze-
nadas, constituída de sacos e mais sacos de cereais.
Vamos ouvir um pouco o diálogo travado entre o
chefe da estação, um outro homem com o uniforme da
companhia e um senhor de terno e gravata:
– Mas nós já fizemos várias reclamações com relação
ao estado da estação – diz o chefe da estação. Depois que
insistimos muito, vieram aqui fazer a avaliação das condições
e nos disseram que haveria necessidade apenas de pequenos reparos.
152 C E D E R J
MÓDULO 1
– Acontece que essas avaliações foram feitas por uma comissão da
15
qual participaram seus próprios funcionários – falou o outro homem uni-
AULA
formizado, que tudo indicava ser um funcionário da administração central
da companhia ferroviária. – Se a avaliação foi malfeita, é outra história...
– Malfeita nada – respondeu o chefe da estação. O pessoal da
comissão fez um relatório completo, indicando tudo o que necessitava
ser consertado e substituído, como as vigas de sustentação da cobertu-
ra, por exemplo. Só que, com toda aquela burocracia, as obras nunca
foram começadas...
– ...porque a coisa ficou enrolada lá na Prefeitura, com a tal
autorização para as obras – interrompeu o funcionário da administração
central.
– Não foi bem assim – disse o homem de
terno, funcionário da Secretaria de Obras da
cidade. – Nós despachamos logo o processo.
Acontece que, quando avaliamos o que precisava
ser feito, vimos uma porção de falhas do projeto de
reforma, inclusive aquele problema da parte elétri-
ca. Mandamos o processo de volta para a compa-
nhia e até hoje ele não voltou para que a gente possa fazer
nova avaliação e providenciar a autorização.
– Não concordo – disse o chefe da estação.
– O relatório de avaliação foi muito bem-feito.
Quem não soube avaliar foram os funcionários
da Divisão de Obras da Prefeitura...
Bem, pelo visto essa discussão vai demo-
rar muito. Ainda mais agora, que chegou outro
homem dizendo ser o representante da companhia
de seguros.
Mas a conversa já nos auxiliou bastante, ajudando a nos aproximar,
mais uma vez, do tema desta nova aula.
Você reparou que, no diálogo acima, foi mencionada várias vezes
a palavra “avaliação”. Tudo indica que esse processo de avaliação foi
malfeito, da parte de todos os setores envolvidos na discussão: a adminis-
tração da estação, a companhia e a Prefeitura. E o que é pior: a avaliação
também não levou a efetivas providências, isto é, acabou não servindo
para nada, não ajudou, somente atrapalhou, fazendo com que a chuva
chegasse antes e fizesse todo esse estrago.
C E D E R J 153
Fundamentos da Educação 3 | Espaço-tempo de avaliar os saberes
Nessa estação, você irá mais uma vez até a sala de avaliação.
Lembre-se de que a avaliação é não somente parte integrante, mas uma
das fases mais importantes do processo de ensino-aprendizagem. Com
ela, você pode saber o que de fato aprendeu e em que momentos não
assimilou muito bem os conhecimentos; os professores podem verificar
o porquê desses problemas de aprendizagem e, se for o caso, mudar o
método de ensino ou alterar passagens do conteúdo, introduzir infor-
mações mais esclarecedoras ou adotar novas formas de abordagem dos
temas. Em suma, a partir da avaliação haverá melhores condições de
seguir, com mais eficiência, segurança e proveito, esta nossa viagem pela
Terra dos Fundamentos da Educação.
Vamos agora apresentar as questões preparadas para esta ava-
liação.
I. Questão: Explique
a) A importância das políticas afirmativas nos contextos sociais
de exclusão.
b) Os espaços educativos não-formais.
c) A Educação Especial entendida como uma ação afirmativa.
d) A importância da Constituição de 1988 para a profissionalização
docente.
e) Os conceitos de exclusão e segregação social e escolar.
f) As principais razões do processo de exclusão social na realidade
brasileira.
g) Como a escola ajuda na manutenção da condição de exclusão
em nossa sociedade.
154 C E D E R J
MÓDULO 1
e) Por que, numa concepção inclusiva, afirmamos que “todos
15
os alunos têm necessidades especiais”? Comente o que tem a ver essa
AULA
afirmação com a questão das diferenças culturais.
f) Qual a relação entre a Pedagogia de Paulo Freire e a exclusão
social?
V. Questão: Cite
a) DOIS elementos de permanência em nossa Educação atual
oriundos da educação jesuítica.
b) Diferentes ações, governamentais ou não, que podem ser reco-
nhecidas como política afirmativa.
c) DOIS argumentos favoráveis e DOIS desfavoráveis à política
de cotas, posicionando-se criticamente em relação a eles.
d) Um dos principais problemas do uso do livro didático em sala
de aula pelo professor.
C E D E R J 155
Fundamentos da Educação 3 | Espaço-tempo de avaliar os saberes
156 C E D E R J
Fundamentos da Educação 3
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