Infecção Do Trato Urinário (ITU) : Epidemiologia
Infecção Do Trato Urinário (ITU) : Epidemiologia
Infecção Do Trato Urinário (ITU) : Epidemiologia
TRATO URINÁRIO
(ITU)
A infecção do trato urinário (ITU) é uma das causas mais comuns de infecção na população geral. Sendo mais
prevalente no sexo feminino, mas também acomete pacientes do sexo masculino principalmente quando associada à
manipulação do trato urinário e na doença prostática. A ITU pode ser classificada quanto à localização em ITU baixa (cistite)
e ITU alta (pielonefrite) e quanto a complicação em ITU não complicada e ITU complicada (quando há alterações estruturais
ou funcionais do trato urinário ou quando se desenvolve em ambiente hospitalar). Na ITU não complicada a E.coli é a
bactéria responsável pela maioria das infecções, enquanto nas ITUS complicadas o espectro de bactérias é mais amplo e
envolve bactérias gram-positivas e gram-negativas e, com frequência, organismos multirresistentes. ITU é definida pela
presença de 100.000 ufc/mL (unidade de formação de colônia). Os sinais e sintomas incluem polaciúria, urgência miccional,
disúria, hematúria e piúria. A terapia varia de acordo com a apresentação da infecção, hospedeiro e agente. Estratégias
envolvendo diferentes esquemas terapêuticos de acordo com grupos específicos de pacientes maximizam os benefícios
terapêuticos, além de reduzir custos, a incidência e feitos adversos e o surgimento de microrganismos resistentes.
EPIDEMIOLOGIA
ITU representa um sítio frequente de infecção tanto em pacientes da comunidade como em pacientes internados em
unidades hospitalares. Nos EUA corresponde ao segundo sitio mais comum de infecção na população geral e entre indivíduos
institucionalizados, a ITU é a infecção bacteriana mais comum. A infecção urinária é responsável por cerca de 40% do total
de infecções hospitalares reportadas ao Center of Diseases Control and Prevention (CDC).
O sexo feminino é mais vulnerável do que o sexo masculino. Mulheres adultas tem 50 vezes mais chance de adquirir
ITU do que homens e a incidência anual autorreferida de infecção do trato urinário em mulheres é de 12%, e aos 32 anos de
idade, metade de todas as mulheres relataram ter tido pelo menos uma infecção do trato urinário. Como a principal rota de
contaminação do trato urinário é por via ascendente, atribui-se esse fato à menor extensão anatômica da uretra feminina e
à maior proximidade entre a vagina e o ânus.
Embora mais comum em mulheres, a incidência de ITU aumenta entre homens acima de 50 anos. A instrumentação
das vias urinárias (incluindo-se o cateterismo vesical) e a ocorrência de doença prostática são os fatores mais implicados
no aumento da incidência no sexo masculino. Entre idosos e em indivíduos hospitalizados, as taxas de ITU també m sã o
elevadas pelos fatores citados e pela presenç a de comorbidades que aumentam a susceptibilidade à s infecç ões. As taxas de
ITU sã o bem maiores nos homossexuais masculinos (estando relacionadas com a prá tica mais frequente de sexo anal nã o
protegido), nos indivíduos com prepú cio intacto e em portadores de infecç ão pelo vírus HIV.
DEFINIÇÃO E CLASSIFICAÇÃO
A ITU é definida pela presença de bactéria na urina tendo como limite mínimo definido a existência de 100.000
unidades formadoras de colônias bacterianas por mililitro de urina (ufc/mL).
A infecção urinária pode ser sintomática ou assintomática (bacteriúria assintomática). Quanto a localização, é
classificada como baixa ou alta. A ITU pode comprometer somente o trato urinário baixo (bexiga e uretra), caracterizando
o diagnóstico de cistite, ou afetar simultaneamente o trato inferior e superior (rins), configurando infecção urinária alta,
também denominada pielonefrite.
As infecções do trato urinário podem ser complicadas e não complicadas. Essa distinção tem sido usada para orientar
a escolha e a duração do tratamento antimicrobiano, com agentes de espectro mais amplo e cursos de tratamento mais
longos, frequentemente recomendados para pessoas com infecções complicadas do trato urinário. No entanto, este esquema
de classificação não leva em consideração a diversidade de síndromes complicadas de infecção do trato urinário e classifica
incorretamente como complicadas muitas infecções do trato urinário que podem ser tratadas com regimes de tratamento
de curta duração
Os episódios de cistite aguda e pielonefrite que ocorrem em mulheres saudáveis pré-menopáusicas, não grávidas,
sem história sugestiva de trato urinário anormal, são geralmente classificados como não complicados.
As complicadas tem maior risco de falha terapêutica e são associadas a fatores que favorecem a ocorrência da
infecção. A infecção urinaria é complicada quando ocorre em um aparelho urinário com alterações estruturais ou funcionais
ou quando se desenvolvem em um ambiente hospitalar. Habitualmente, as cistites são infecções não complicadas enquanto
as pielonefrites, ao contrario, são mais frequentemente complicadas, pois em geral resultam da ascensão de microrganismos
do trato urinário inferior e estao frequentemente associadas à presença de fatores complicadores:
Um paciente é considerado portador de ITU de repetição quando acometido por 3 ou mais episódios de ITU no
período de 12 meses.
SINAIS E SINTOMAS
As manifestaç ões em crianç as dependem da idade do paciente. Em recé m-nascidos e crianç as com menos de 2 anos
eles sã o inespecíficos, podendo cursar com retardo de crescimento, vô mitos e febre. Crianç as maiores que 2 anos geralmente
apresentam sintomas clá ssicos de cistite ou pielonefrite. Refluxo é encontrado em 30 a 50% das crianç as com bacteriú ria
sintomá tica ou assintomá tica. O refluxo é causado pelo aumento da pressã o na bexiga, originado pelo retardo do
desenvolvimento da junç ão uretrovesical, ureter intravesical curto ou inflamaç ão da junç ão vesicoureteral. Em geral, as
infecç ões do trato uriná rio em crianç as que nã o apresentam obstruç ões tê m um bom prognó stico. As crianç as com
obstruç ões podem evoluir com um dano importante do parê nquima renal.
Os pacientes idosos apresentam os mesmos sintomas dos adultos jovens, sendo frequente a queixa de incontinê ncia.
Em muitos, poré m, a infecç ão uriná ria tende a ser oligo ou assintomá tica visto que muitos pacientes idosos já apresentam
polaciú ria e incontinê ncia mesmo sem infecç ão.
AGENTE ETIOLÓGICO
Os agentes etioló gicos mais frequentemente envolvidos com ITU adquirida na comunidade sã o, em ordem de
frequê ncia: a Escherichia coli, o Staphylococcus saprophyticus, espé cies de Proteus e de Klebsiella e o Enterococcus faecalis.
A E. coli, sozinha, responsabiliza-se por 70% a 85% das infecç ões do trato uriná rio adquiridas na comunidade e por 50% a
60% em pacientes idosos admitidos em instituiç ões.
Quando a ITU é adquirida no ambiente hospitalar, em paciente internado, os agentes etioló gicos sã o bastante
diversificados, predominando as enterobacté rias, com reduç ão na frequê ncia de E. coli (embora ainda permaneç a
habitualmente como a primeira causa), e um crescimento de Proteus sp, Pseudomonas aeruginosa, Klebsiella sp.,
Enterobacter sp., Enterococcus faecalis e de fungos, com destaque para Candida sp.
Entre os pacientes com ITU complicada e de repetiç ão tem crescido a incidê ncia de microrganismos produtores de β-
lactamase de espectro estendido (ESBL) incluindo a pró pria E. coli multirresistente o que dificulta o tratamento da infecç ão
uriná ria e exige a utilizaç ão de antibió ticos de largo espectro com frequê ncia cada vez maior.
FISIOPATOLOGIA
O trato uriná rio é esté ril, com exceç ão do meato e uretra distal.
Essas regiõ es sã o colonizadas por estafilococos, difteroides e outros
microrganismos comensais. A urina é um meio de cultura que sofre
grandes variaç ões; sabe-se que concentraç ões altas de ureia, pH baixo,
hipertonicidade e presenç a de á cidos orgâ nicos sã o desfavorá veis ao
crescimento de bacté rias. Os mecanismos de defesa incluem a
dinâ mica do fluxo uriná rio e as propriedades antibacterianas do
epité lio trato uriná rio. As infecç ões do trato uriná rio ocorrem como
resultado da interaç ão entre a virulê ncia do microrganismo e fatores
bioló gicos e comportamentais do hospedeiro em oposiç ão a esses
mecanismos de defesa.
A infecç ão via hematogê nica é menos comum. Ê mbolos sé pticos, particularmente nas endocardites infecciosas, podem
ser causa de infecç ão renal. As bacteriemias estafilocó cicas podem causar mú ltiplos microabscessos nos rins, podendo
estender-se à fá scia perinefré tica e causar abscessos. Um processo semelhante, poré m mais insidioso, ocorre na tuberculose
renal. Infecç ões disseminadas por Candida albicans em pacientes imunossuprimidos ou leucopê nicos podem envolver os
rins. A infecç ão hematogê nica por bacilos gram-negativos é imprová vel, visto que em modelos animais de infecç ão renal
hematogê nica por gram-negativo é necessá rio dano estrutural ascendente dos rins para que a infecç ão ocorra.
As evidê ncias da via linfogê nica sã o pequenas e consistem apenas na demonstraç ão em animais de conexõ es linfá ticas
dos ureteres e dos rins e no fato de que o aumento da pressã o na bexiga durante a micç ão pode causar fluxo de linfa em
direç ão aos rins.
Embora as infecç ões do trato uriná rio possam ser cau- sadas por vá rias espé cies de bacté rias, a grande maioria delas
é causada pela E. coli, sendo os sorogrupos 01, 02, 04, 05, 07, 075, 0150 os principais envolvidos levando-nos ao conceito de
E. coli uropatogê nica (UPEC).
Todos os uropató genos sã o capazes de usar a urina como meio de cultura, embora ela seja um meio incompleto;
portanto, a síntese de fatores nutricionais é essencial, a síntese bacteriana de guanina, arginina e glutamina sã o necessá rias
para um ó timo crescimento na urina.
Há mú ltiplas evidê ncias de que as UPECs diferem das outras cepas de E. coli no que diz respeito à presenç a da fímbria
P e outras adesinas (incluindo S, F1C, DR adesina e pili tipo 1). As adesinas tê m um papel importante na caracterizaç ão de
uma UPEC. As adesinas das UPECs ocorrem na forma de organelas filamentosas na superfície da bacté ria e sã o conhecidas
como pili ou fímbrias ou como proteínas nã o filamentosas, na membrana externa. Tem sido demonstrado que a fímbria P
aumenta a virulê ncia das UPECs em diferentes está gios da patogê nese da infecç ão uriná ria.
Outras características das bacté rias parecem ser importantes para produç ão de infecç ão. Bacté rias mó veis podem
ascender pelo ureter contra o fluxo de urina, e endotoxinas de bacilos gram-negativos tem sido demonstrado que reduzem
a peristalse ureteral. Muitos uropató genos produzem hemolisina, que facilita a invasã o tecidual e causa dano celular. Fatores
reconhecidos de virulê ncia incluem maior capacidade de aderê ncia à mucosa vaginal e à s cé lulas uroepiteliais, resistê ncia à
atividade sé rica bactericida, grande quantidade de antígeno K, presenç a de aerobactina, fator de necrose citotó xico tipo1 e
produç ão de hemolisina.
Fatores relacionados ao hospedeiro sã o determinantes no estabelecimento das infecç ões uriná rias; entre eles o fluxo
de urina, os fatores físico-químicos, como a osmolaridade, o pH e a presenç a de á cidos orgâ nicos, as glicoproteínas que
bloqueiam a aderê ncia das bacté rias à mucosa (proteína de Tamm Horsfall – THO) e a resposta imune, incluindo
imunoglobulinas, leucó citos e citoquinas e a aç ão antibacteriana das secreç ões prostá ticas.
Um pequeno inó culo de bacté rias provavelmente é incapaz de aderir à mucosa, permanecendo suspenso na urina e
sendo removido pela micç ão. Na presenç a de grandes inó culos, o mecanismo de defesa primá rio de antiadesã o é
ultrapassado com subsequente infecç ão, o que ativa os mecanismos secundá rios de defesa, como a mobilizaç ão de leucó citos
e fagó citos, chamados para remover as bacté rias. A presenç a de neutró filos é determinante para o clearence de bacté rias no
trato uriná rio. As cé lulas epiteliais do trato uriná rio secretam interleucina-8 (IL-8), que atrai os neutró filos e aumenta a
fagocitose.
A resposta específica de anticorpos sé rica e uriná ria acompanha a pielonefrite. Esses anticorpos sã o sintetizados
localmente e aumentam a opsonizaç ão e a fagocitose bacteriana, impedindo a aderê ncia das bacté rias. O receptor de IL-8
(CXCR1) é outro fator gené tico que pode influenciar o desenvolvimento de infecç ões do trato uriná rio. Foi recente- mente
demonstrado que ratos que nã o tinham esses receptores eram incapazes de realizar o clearence de bacté rias dos rins. Nã o
há evidê ncia de que a imunidade celular tenha um papel importante na defesa contra as infecç ões uriná rias, vis- to que os
pacientes com supressã o das cé lulas T nã o apresen- tam maior incidê ncia ou curso diferente das infecç ões.
Estudos in vitro tê m demonstrado que os estrogê nios facilitam a adesã o dos uropató genos à s cé lulas mucosas vagi-
nais e do epité lio uroló gico. Alé m disso, estudos com mode- los animais tê m demonstrado que o tratamento com estrogê -
nios facilita a infecç ão uriná ria experimental. Por outro lado, a deficiê ncia de estrogê nio em mulheres menopausadas pare-
ce aumentar o risco de ITU, sendo que esse risco diminui com a aplicaç ão de estrogê nio tó pico aparentemente devido à
normalizaç ão da flora vaginal.
Mulheres cujas mã es tê m histó ria de ITU apresentam um risco de duas a quatro vezes maior de desenvolver infecç ões
de repetiç ão. Esses achados sugerem que fatores intrínsecos podem ser importantes para algumas mulheres. Kallenius e
Winberg demonstraram que as cé lulas periuretrais de pacientes com infecç ão de repetiç ão eram mais suscetíveis à adesã o
bacteriana. Estudos sobre esse tipo de pacientes demonstraram um aumento na frequê ncia do fenó tipo recessivo e nã o
secretor do grupo sanguíneo de Lewis.
Avaliaç ão de isolados em pacientes com anormalidades estruturais, como refluxo, geralmente falham em demons-
trar os fatores de virulê ncia bacterianos típicos. Portanto, em infecç ões complicadas, os fatores de virulê ncia geralmente
estã o ausentes, da mesma forma isolados obtidos de sepse pó s-instrumentaç ão vesical també m demonstraram ausê ncia de
fatores de virulê ncia. Nã o foram encontradas diferenç as na prevalê ncia de fatores determinantes de virulê ncia entre
indivíduos com primeira infecç ão e infecç ão recorrente, sugerindo que fatores relacionados ao hospedeiro sã o mais
importantes para determinar o risco de infecç ão recorrente.
PRINCIPAIS CAUSAS
Fatores de risco para casos esporádicos e recorrentes não complicados de cistite e pielonefrite incluem relação sexual,
uso de espermicidas, infecção prévia do trato urinário, novo
parceiro sexual (no último ano) e história de infecção do trato
urinário em parente de primeiro grau do sexo feminino. Estudos de
caso-controle não mostraram associações significativas entre
infecção recorrente do trato urinário e padrões de esvaziamento
pré ou pós-coito, consumo diário de bebidas, frequência de micção,
hábitos de micção retardados, limpeza padrões, uso de tampão,
ducha, uso de banheiras de hidromassagem, tipo de roupa íntima
ou índice de massa corporal, mas pelo menos alguns desses
achados nulos podem refletir uma classificação errônea de
comportamentos (particularmente se mudanças comportamentais
foram feitas após o diagnóstico de infecção recorrente do trato
urinário). A predisposição genética à recorrência da infecção do
trato urinário é sugerida pela forte associação entre história de
infecção do trato urinário em um ou mais parentes do sexo
feminino de primeiro grau e aumento do risco de cistite e
pielonefrite recorrentes; agregação familial acentuada de casos de
pielonefrite aguda entre os familiares de pielonefrite crianças
propensas a essa doença, associadas à expressão
significativamente menor de CXCR1, um receptor de interleucina-
818; e a super-representação do fenótipo não secretor do antígeno
do grupo sanguíneo e do fenótipo P1 entre meninas e mulheres
com infecção recorrente do trato urinário.
DIAGNÓSTICO
O exame microscó pico da urina é o primeiro passo para o diagnó stico laboratorial das infecç ões do trato uriná rio. O
exame dos elementos e sedimentos da urina (ou sumá rio de urina ou parcial de urina ou urina I com sedimento) irá fornecer
informaç ões que, associadas à clínica, auxiliam no diagnó stico.
O exame é realizado com urina coletada de jato mé dio de forma assé ptica. Nessas condiç ões, considera-se que a
presenç a de 10 ou mais leucó citos (pió citos) por campo de grande aumento indicativo de piú ria. A presenç a de piú ria é
altamente sensível (95%), poré m apresenta uma especificidade relativamente baixa (71%) para infecç ão. Outro dado
importante do exame de urina é a presenç a de hematú ria que frequentemente está presente. É importante lembrar, todavia,
que a hematú ria macro ou microscó pica també m pode ocorrer na presenç a de cá lculos, tumores, glomerulonefrite,
vasculites ou tuberculose renal. A presenç a de cilindros també m pode ocorrer na pielonefrite. A observaç ão de pelo menos
uma bacté ria ao exame microscó pico geralmente indica a presenç a de pelo menos 105 UFC/mL (sensibilidade de 40 a 70%
e especificidade de 85 a 95%).
Existem vá rios mé todos indiretos para detecç ão de bacteriú ria para diagnó stico presuntivo. O teste mais comum é de
detecç ão de nitritos que é formado quando a bacté ria reduz o nitrato que normalmente está presente na urina. Esses testes
tê m uma sensibilidade de 75% e especificidade de 82%.
A cultura de urina trará informaç ões importantes quanto à etiologia da infecç ão. Embora a urina presente na bexiga
seja normalmente esté ril, a uretra e as á reas periuretrais sã o colonizadas; assim, mesmo amostras coletadas com té cnica
assé ptica frequentemente estã o contaminadas. A cultura quantitativa da urina separa estatisticamente a contami- naç ão da
infecç ão uriná ria. Pacientes com infecç ão geralmente tem urina na bexiga com pelo menos 10 5 UFC/mL, portanto a urina
coletada terá també m pelo menos 105 UFC/mL. Entretanto, é importante lembrar que cerca de 25% das mulheres jovens
com infecç ão uriná ria tem menos de 105 UFC/mL. É importante frisar que isso també m pode ocorrer quando a infecç ão é
causada por bacté rias que nã o as enterobacteriá cias, como cocos gram-positivos, bacté rias de crescimento lento e fungos.
Embora o crité rio de 105 UFC/mL seja um crité rio clá ssico e ainda amplamente aceito como definidor de infecç ão, a
Sociedade Americana de Doenç as Infecciosas (IDSA) define como cistite a contagem de colô nias acima de 103 UFC/mL
(sensibilidade de 80% e especificidade de 90%) e para pielonefrite acima de 10 4 UFC/mL (sensibilidade de 90%
especificidade de 95%). Adicionalmente, é importante obter o antibiograma, principalmente para o manejo das infecç ões
complicadas, recorrentes ou de origem hospitalar.
TRATAMENTO
A escolha da terapia antimicrobiana para a ITU varia de acordo com a apresentação da infecção, hospedeiro e o agente.
Estratégia envolvendo diferentes esquemas terapêuticos de acordo com grupos específicos de pacientes maximizam os
benefícios terapêuticos, além de reduzir os custos, as incidências de efeitos adversos e o surgimento de microrganismos
resistentes.
O tratamento de ITU baixa (cistite) de origem comunitária em jovens imunocompetentes e sem fatores associados a
ocorrência de ITU complicada pode ser instituído empiricamente sem a solicitação de urocultura. Para isto deve existir dois
ou mais sintomas como disúria, urgência miccional, polaciúria, nictúria e dor suprapúbica, associado ao encontro de
leucocitúria na urina tipo 1. Já em mulheres idosas ou diabéticas, a investigação com urocultura é necessária, o tempo de
uso dos agentes deve ser prolongado (10 a 14 dias) e a ciprofloxacina 500 mg VO de 12/12h passa a fazer parte das opções
terapêuticas.
Em gestantes com cistite de origem comunitária, algumas contraindicações relativas a determinados antimicrobianos
promovem uma redução significativa com relação as drogas potencialmente utilizáveis. As possibilidades terapêuticas
disponíveis para a gestante são antibióticos beta-lactâmicos, nitrofurantoína e fosfomicina.
Quando a cistite ocorre em pacientes do sexo masculino a ciprofloxacina é uma opção terapêutica e o tempo de
tratamento se prolonga para 10 a 14 dias. Caso o paciente possua mais de 60 anos, justifica-se a realização do exame de
próstata e a solicitação da urocultura e teste de sensibilidade a antimicrobianos deve ser realizada em todos os casos.
O uso de Sulfametoxazol+Trimetoprin, amplamente difundido em guias internacionais, poderá ser utilizado baseado
em testes de sensibilidade a antimicrobianos e não em tratamento empírico, devido ao aumento de resistência desta droga
em isolados de E.coli.
Os antimicrobianos da classe dos aminoglicosídeos, apesar de possuírem excelente ação sobre enterobacteriácias no
trato urinário, tem seu uso restringido devido ao potencial de nefrotoxicidade e a existência de drogas com excelente ação
e com perfil de segurança maior em relação aos efeitos colaterais. Entretanto são opções validas nos casos de
contraindicações de outros agentes ou guiado por testes de sensibilidade a antimicrobianos, não sendo, portanto, indicado
entre as primeiras opções para tratamento. As drogas e doses utilizadas são: Gentamicina 3mg/Kg/dia dividido em 3 doses
diárias e Amicacina 15 mg/Kg/dia em dose única com infusão de 1h.
Cistite Recorrente: sintomas urinários que persistem ou recorrem dentro de uma semana ou duas de tratamento para
cistite não complicada sugerem infecção com uma cepa resistente aos antimicrobianos ou, raramente, recaída. Em tais
mulheres, uma cultura de urina deve ser realizada e o tratamento deve ser iniciado com um agente antimicrobiano de
espectro mais amplo, como uma fluoroquinolona. Episódios de cistite que ocorre pelo menos 1 mês após o tratamento bem-
sucedido de uma infecção do trato urinário deve ser tratada com um regime de curta duração de primeira linha. Se a
recorrência ocorrer dentro de 6 meses, deve-se considerar um medicamento de primeira linha diferente do que foi usado
originalmente.
A ITU alta (pielonefrite) de origem comunitária e não complicada inicialmente pode ser tratada em regime
ambulatorial, com reavaliação a cada 48h para determinar a efetividade do tratamento. Em pacientes com sinais de
instabilidade ou com fatores associados a ocorrência de ITU complicada, devem preferencialmente ser internados. Nesses
pacientes o uso de antimicrobianos endovenosos deverá ser instituído até que se encontrem sem febre por um período de
48 a 72h, quando a terapia pode ser completada por via oral. Em caso de internação hospitalar, recomenda-se a coleta de
hemoculturas e a realização de ultrassonografia.
O tratamento de ITU hospitalar baixa ou alta, considerando a variedade de microrganismos infectantes no ambiente
hospitalar e a variação em sua sensibilidade, deve fundamentar-se no isolamento da bactéria na urocultura e na
sensibilidade demonstrada ao antibiograma.
A bacteriúria assintomática definida pela presença de bactérias na urocultura (>100.000 ufc/mL) e ausência de sinais
e sintomas clínicos de infecção, não deve ser tratada em mulheres jovens não gravidas. Em gestantes, pacientes submetidos
a transplantes de órgãos sólidos, granulocitopenia, pré-operatório de cirurgias urológicas e pré-operatório de colocação de
próteses, devemos instituir tratamento para bacteriúria assintomática guiados pelo teste de sensibilidade a
antimicrobianos.
Nos casos em que a ITU é causada por fungos, a Candida albicans predomina entre os agentes isolados. A abordagem
nos casos de candidúria é semelhante aos agentes bacterianos: candidúria assintomática (ausência de sintomas clínicos,
ausência de piúria e presença de urocultura positiva com >100.000 ufc/mL) em pacientes sem fatores de risco, estes não
deverão receber tratamento. Na presença de fatores de risco (transplante de órgãos sólidos, granulocitopenia, pré-
operatório de cirurgias urológicas) e sondagem vesical de demora, deve-se retirar a sonda e colher nova amostra de
urocultura em 48h. Caso persistir a positividade, está indicado o tratamento.
Candidúria sintomática: sempre retirar ou trocar a sonda vesical de demora quando presentes e instituir tratamento,
principalmente, para pacientes que tenham sido submetidos previamente a múltiplos agentes antimicrobianos, transplante
de órgão sólido, granulocitopenia e indicação ou manipulação invasiva ou cirúrgica de vias urinarias.
O tratamento da ITU fú ngica deve ser dirigido pela cultura, pois existem câ ndidas resistentes aos agentes mais
comumente utilizados na abordagem empírica. Entretanto, quando esta abordagem se faz necessá ria, o uso de Fluconazol
200 mg ao dia por 7 a 14 dias deve ser instituído. Em casos onde o agente é resistente a este azó lico, deve-se utilizar
Anfotericina B na dose de 0,3 - 1 mg/Kg
Após o tratamento para cistite não complicada ou pielonefrite, uma cultura de urina é desnecessária se os sintomas
forem resolvidos, exceto em mulheres grávidas (para quem é recomendado o tratamento de bacteriúria assintomática
persistente). Em mulheres com cistite não complicada ou pielonefrite, a avaliação urológica de rotina (com o uso de
ultrassonografia ou tomografia computadorizada) tem um baixo rendimento diagnóstico e não é recomendada. Entretanto,
deve ser considerada em mulheres que apresentam hematúria persistente ou múltiplas recidivas precoces de cistite
envolvendo a mesma cepa de bactérias. Em mulheres com pielonefrite que apresentam doença grave ou agravante, febre
persistente 48 a 72 horas após o início do tratamento antimicrobiano apropriado, ou sintomas sugestivos de cálculos,
abscesso ou obstrução, a avaliação urológica deve ser realizada para descartar estes últimos anormalidades. Também é
razoável realizar estudos de imagem em mulheres que apresentam duas ou mais recidivas de pielonefrite.
O manejo atual das infecç ões recorrentes do trato uriná rio envolve o uso de antibió ticos, tanto em repetidos cursos,
quanto de maneira profilá tica em longo prazo com baixas doses. Entretanto, uma crescente relutâ ncia com relaç ão ao uso
de antibió ticos vem surgindo em virtude das preocupaç ões referentes à resistê ncia antimicrobiana e dos efeitos adversos
sobre a flora bacteriana normal.
O Cranberry (Vaccinum macrocarpon) é uma fruta vermelha, de sabor azedo, cultivada em alguns países da Amé rica
do Norte. No início da dé cada de 1980, estudos in vitro mostraram que o Cranberry era capaz de inibir cerca de 80% da
aderê ncia bacteriana no uroté lio. O Cranberry tem uma substâ ncia chamada protoacinidina tipo A, com poder antioxidante
20 vezes mais potente que a vitamina C e 50 vezes mais potente que a vitamina E. No Brasil, o Cranberry pode ser encontrado
na forma de suco, comprimidos manipulados ou em cá psulas gelatinosas (400 mg de extrato de Cranberry/cá psula).
Avaliando-se mulheres com idade mé dia de 62 anos, com dois ou mais episó dios confirmados de infecç ão do trato
uriná rio nos ú ltimos 12 meses, submetidas à terapê utica com uso do extrato de Cranberry na dose de 500 mg/dia ou
trimetroprima 100 mg/dia pelo período de 6 meses, observa-se que o tempo mé dio de recorrê ncia de infecç ão uriná ria
apresenta-se em torno de 84 dias mediante uso do extrato de Cranberry e 91 dias com uso do trimetoprima (p=0,479). Com
relaç ão ao risco de desenvolver ITU sintomá tica tratada com antibió tico, nã o se observa diferenç a significativa entre os dois
tratamentos. Por outro lado, demonstraram uma efetiva aç ão profilá tica do extrato de Cranberry em infecç ões uriná rias de
crianç as.
Relatos indicam uma possível associaç ão entre o Cranberry e anticoagulantes derivados da 4-hidroxicumarina
(varfarina), com aumento do INR, podendo levar a risco de sangramento. Assim, deve-se evitar este fitoterá pico em
pacientes que fazem uso destes medicamentos.
Um elemento que diminui a importâ ncia do Cranberry na profilaxia das infecç ões uriná rias é sua tolerabilidade por
longo tempo, considerando que muitos pacientes abandonam ou interrompem o tratamento.
Recomendaç ão
O extrato de Cranberry na dose de 500 mg/ dia pelo período de 6 meses nã o demonstra eficá cia significativa com
relaç ão ao risco de desenvolvimento ITU. Contudo, seu emprego por longo tempo pode nã o ser aceitá vel pelo paciente. Dessa
maneira, a opç ão sobre o uso do extrato de Cranberry deve ser tomada em consenso entre o paciente e o mé dico, levando-
se em consideraç ão o fato de ser produto natural, eficaz, barato e de nã o estar relacionado ao risco de resistê ncia
antimicrobiana.
BIBLIOGRAFIA
HOOTON, Thomas. Uncomplicated Urinary Tract Infection. The new England journal of medicine, 2012.
Cistite recorrente: tratamento e prevenção. Sociedade brasileira de infectologia, nefrologia, ginecologia e obstetrícia e
urologia, 2011.