Alain Badiou RESUMO DO Pequeno Manual de Inestetica

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Pontifícia Universidade Católica / RS

Pós-Graduação em Comunicação Social


Isabel de Castro

Pequeno Manual de Inestética

Alain Badiou

BADIOU, A. Pequeno manual de inestética. São Paulo: Estação Liberdade, 2002.


Por inestética entendo uma relação da filosofia com a
arte, que, colocando que a arte é, por si mesma, produtora
da verdades, não pretende de maneira alguma torná-la,
para a filosofia, um objeto seu. Contra a especulação
estética, a inestética descreve os efeitos estritamente
intrafilosóficos produzidos pela existência independente
de algumas obras de arte.

Alain Badiou, abril de 1998


Capítulo 1: ARTE E FILOSOFIA
Platão X devoção piedosa à arte.
Protágoras: aprendizado artístico como chave da educação.
Filosofia e Arte.
Ex: LACAN – Mestre e Histérica
• Arte não se define, escapa.
• Idolatria e censura.
Entrelaçamento da arte e filosofia, pelos seguintes modos:

1. DIDÁTICO (incapaz de verdade / toda verdade lhe é exterior / puro encanto do verdadeiro.
Mimeses: não como imitação das coisas e sim, como efeito de verdade.

Poder de seu caráter imediato. (Mito da Pintura - Plínio, o Velho)


Arte : ser o encanto de uma aparência de verdade.
a arte aceitável deve ser submetida à vigilância filosófica das verdades.
a norma da arte deveria ser a educação.
a norma da educação é a filosofia.
o essencial é o controle da arte; a essência “boa” da arte virá não na
obra de arte, mas em seus efeitos públicos. Ex: ROUSSEAU.
X
2. ROMÂNTICO (unicamente a arte está apta à verdade / ela realiza o que a filosofia pode
apenas indicar).
Arte: é o absoluto como sujeito, é a encarnação.

+
3. CLÁSSICO: des-histeriza a arte.
ARISTÓTELES: a) a arte é mimética e sua ordem é a da aparência.
b) isso não é grave, porque o destino da arte não é a verdade / a
arte é diferente do conhecimento – é catarse (deposição das
paixões numa transferência sobre a aparência / função
terapêutica, não é cognitiva ou reveladora / não depende do
teórico, mas do ético.
Regras:
1. O critério da arte é agradar, como uma regra da maioria, porque assinala a
efetividade da catarse.
2. A “semelhança” com o real para agradar, envolve identificação, a qual
organiza uma transferência, uma verdade que coage no imaginário –
“imaginarização” de uma verdade, “verossimilhança”.
A paz entre arte e filosofia repousa na delimitação entre verdade e
verossimilhança.
Ex: “o verdadeiro pode não ser verossímil”
definição de filosofia: a inverossímil verdade.
A arte é registrada no imaginário, mas não é um pensamento, está inteira
em sua operação pública, “agradar” dispõe a arte como um serviço público,
assim que o Estado a entende.
Recapitulando:

Entrelaçamento entre arte , filosofia e educação dos sujeitos:

Didatismo – filosofia exerce uma vigilância educativa do destino extrínseco da arte ao


verdadeiro.
Romantismo – a arte realiza na finitude toda educação subjetiva da qual a infinidade filosófica
da Ideia é capaz.
Classicismo – capta o desejo e educa sua transferência pela proposta de uma aparência de seu
objeto, filosofia como estética das regras do “agradar”.
No séc. XX, não foi introduzido um novo esquema.
Século dos “fins” X um século conservador e eclético / saturação das doutrinas

MARXISMO – Ex: BRECHT (existe uma verdade geral e extrínseca, uma verdade de caráter
DIDÁTICO científico – Materialismo Dialético – personagem-guia é o filósofo,
que vigia a arte pela suposição latente da verdade dialética.
Regras imanentes de uma arte platônica: Um teatro “não
aristotélico”, não clássico. Épico é o que exibe a coragem da
verdade. A arte não produz a verdade, mas é uma elucidação das
condições da sua verdade. Terapêutica da covardia diante da
verdade. Ex: Galileu).
CRÍTICA: arte a serviço do povo.
PSICANÁLISE - Ex: FREUD e LACAN (a arte é pensada como aquilo que organiza apenas o
CLÁSSICA /Aristotélica objeto do desejo, insimbolizável. A obra encadeia uma
transferência, o encetamento do símbólico pelo real, a
extemidade do objeto, causa do desejo, ao Outro,
tesouro do simbólico. Efeito: permanecer no imaginário.
CRÍTICA: a serviço da própria psicanálise, serviço
gratuito à arte .
HERMENÊUTICA ALEMÃ – Ex: HEIDEGGER (figura do poeta-pensador / é a mesma verdade
ROMÂNTICO que circula / a interpretação só faz entregar o
poema ao tremor da finitude).
CRÍTICA: promessa do retorno dos deuses.
Desrelacionamento entre arte e filosofia e queda do tema educativo.
Ex: VANGUARDAS - do Dadaísmo ao Situacionismo:
Representações e não entrelaçamentos.
Foram experiências de escolta da arte contemporânea.
Didáticas pelo desejo de dar fim à arte.
Românticas pela convicção de que a arte renasceria como absolutez.
Anticlássicas.
Ex: BRETON / MARINETTI – comunismo – alegórico.

Hoje, desapareceram.
Quarta alternativa –
Método negativo:
O que didático, romântico e clássico tem em comum para se desfazer?
A relação da arte com a verdade.
Categorias da relação: Imanência e singularidade.
DIDATISMO – a relação é singular (só a arte pode expor uma verdade sob a forma da
aparência), mas não é imanente, porque a posição da verdade é
extrínseca.
ROMÂNTICO – a relação da arte com a verdade é imanente (expõe a descida finita da
Ideia), mas não singular (pois se trata da verdade, não é o que o poeta
desvela).
CLASSICISMO – é uma verdade que coage no imaginário, sob a forma do verossímil.
Nos esquemas herdados jamais a relação das obras com a verdade será ao
mesmo tempo singular e imanente.
Na 4ª alternativa, será afirmada a simultaneidade.
+
A própria arte é um procedimento de verdade.
A arte é um pensamento cujas obras são o real (e não o efeito).
Imanência – a arte é coextensiva às verdades que prodigaliza.
Singularidade – essas verdades não são dadas em outro lugar, só na arte.
O que ocorre com o 3º termo, a função educativa da arte?
A arte educa pela sua simples existência, pensar um pensamento e a filosofia mostrá-la
como tal. A alcoviteira do verdadeiro.
O problema é a singularidade do procedimento artístico.

A arte é um procedimento de verdade sui generis, imanente e singular.


Vê-se um sintoma:
Ex: DELEUZE – conduz a arte para o lado do sensível como tal (afeto e objeto de
percepção), em continuidade paradoxal com o motivo hegeliano da
arte como “forma sensível da Ideia”. Separa arte da filosofia. Não
estabelece o plano da imanência, para diferenciar arte, ciência e
filosofia.
Qual é a unidade pertinente do que é denominado “arte”?
DIFICULDADES: O problema da relação entre finito e infinito.
Uma verdade é uma multiplicidade de infinitos.

Uma obra de arte é essencialmente finita.


1. Se expõe com objetividade finita no tempo/espaço.
2. É normatizada por um princípio grego de finalização.
3. Instrui por si mesma a questão de seu próprio fim, é o procedimento convincente de
sua finitude. É insubstituível, qualquer retoque é destrutivo
Que a arte é uma criação de finitude.
Criação de um múltiplo intrinsecamente finito, que expõe sua organização no e pelo
recorte finito de sua apresentação, e aposta em sua delimitação.
A obra de arte é verdade.
Sustenta-se que ela desce do infinito-verdadeiro para o finitude – esquema Romântico.
Ex: DELEUZE
Toda verdade origina-se de um acontecimento.
Que é impossível de dizer da obra que ela é ao mesmo tempo uma verdade e o
acontecimento que gera esta verdade.
Proposições:

• Uma obra não é um acontecimento. É um feito da arte, procedimento.


• Uma obra não é uma verdade. A obra é a instância local, o ponto diferencial de uma
verdade.
• Uma obra de arte é um ponto-sujeito de uma verdade artística.
• Uma verdade não tem nenhum outro ser que não obras, é um múltiplo (infinito)
genérico de obras.
• Uma obra é uma investigação situada sobre a verdade que ela atualiza localmente ou
da qual é um fragmento finito.
• A obra está sujeita a um princípio de novidade. É uma investigação que não teve lugar,
um ponto-sujeito inédito da trama de uma verdade.
• As obras compõem uma verdade na dimensão pós-acontecimento, que institui a
imposição de uma configuração artística.

A unidade não é a obra, nem o autor, mas a configuração artística iniciada por
uma ruptura relativa ao acontecimento, é um múltiplo genérico, é uma verdade
artística, é designada por conceitos abstratos ( representação, tonalidade,
tragédia, etc...).
“Configuração artística”

Não uma arte, nem um gênero, nem um período, nem uma técnica.

É uma sequência identificável, iniciada por uma acontecimento.


Uma verdade dessa arte, uma verdade-arte.

Ex: TRAGÉDIA GREGA como configuração (Platão ou Aristóteles a Nietzsche.


inicia em “Ésquilo”, Eurípedes).
MÚSICA CLÁSSICA de Haydn e Beethoven.
ROMANCE de Cervantes a Joyce.

Nada no interior dela própria, delimita-a ou expõe o princípio de seu fim.

Não se deve concluir que cabe à filosofia pensar a arte.

Uma configuração pensa-se a si mesma nas obras que a compõem.

Arte, configuração “em verdade” das obras, é em cada ponto pensamento do


pensamento que ela é.
Filosofia em relação à arte:
Uma filosofia é sempre a elaboração de uma categoria de verdade.
Apreende as verdades, mostra-as, expõe-nas, enuncia que existem.

E o tema da educação?
Só há educação pelas verdades.
+
Indica uma co-responsabilidade da arte, q/produz verdades e da filosofia que as mostra.

Devemos distingui-las da opinião.

Há algo além da opinião, há outra coisa além de nossas “democracias”?

Nosso tempo vale mais que a “democracia” da qual ele se vangloria.


Capítulo 8: OS FALSOS MOVIMENTOS DO CINEMA
O cinema é visitação: do que eu teria visto ou ouvido, a ideia permanece enquanto passa.
Movimento no cinema:
1. MOVIMENTO GLOBAL - Ideia paradoxal de passagem, de uma visitação.
2. MOVIMENTO LOCAL - Que subtrai a imagem de si mesma. Encarna os efeitos de corte.
Diferente do que ela é, de sua imagem.
Ex: MURNAU (bonde/subúrbio).
3. MOVIMENTO IMPURO - Ideia da alusão contrastante, subtrativa. Suposições artísticas
abandonadas.
Cinema como 7ª arte, é um mais-um das outras seis. (p.104)
Age sobre elas, a partir delas, por um movimento que as subtrai a elas mesmas.
Ex: WENDERS, Falso Movimento.
Narrativa + personagens – passagens.
Romance + Teatro = Cinema.
e
Ex: VISCONTI, Morte em Veneza.
MANN, Morte em Veneza.
Música + Lugar = Cinema
“POÉTICA DO CINEMA” : entrelaçamento dos 3 movimentos, em que todo o efeito é que a
Ideia visite o sensível.
A Ideia não é separável, só existe no cinema em
sua passagem.
A própria Ideia é visitação.
Ex: Falso movimento (personagem gordo lê o poema, cuja existência
ele diversas vezes anunciou).

MOV. GLOBAL – A leitura como corte, efeito de margem, interrupção.


Falso: porque há um espaço de composição e que há passagem pq
este espaço se entrega em tempo global.
MOV. LOCAL – Poema e poeta suprimem-se reciprocamente.
Falso: pq é efeito de uma situação da imagem.
Ex: WELLES, A marca da maldade.
MOV. IMPURO – O poético no filme é arrancar de si do poético suposto do cinema.
Espanto de existir. Elemento solipsista, que um alemão não pode
ligar-se a outros alemães.
Falso: as artes são fechadas. Pintura não vira música.
Arranca delas o que é necessário e só o cinema autoriza a sua
visitação.
Essa leitura do poema passa a ideia de um elo de ideias: existe um elo alemão, entre o que é
poema, o espanto de existir e a incerteza nacional.
São falsos movimentos.
O cinema é uma arte impura, é o mais-um das artes, parasitário e
inconsistente.

JUÍZO INDISTINTO - A regra do “agradar” esconde a sua norma. Considera indispensável


intercâmbio de opiniões. “Gostei”, “Não gostei”. Cita atores, trama.
“Diz é bom.”
X
JUÍZO DIACRÍTICO – Filme como estilo. Designa uma singularidade da qual o autor é símbolo.
Constitui o cinema de qualidade. Cita autor do filme. Surpreende a crítica
e a crítica denomina a qualidade. A qualidade não designa arte de uma
época e sim, a sua ideologia artística, em que na arte verdadeira é uma
abertura. “Diz é superior.”

JUÍZO AXIOMÁTICO – Filme é o que expõe a passagem da ideia de acordo com a tomada e a
montagem. Como a ideia chega à sua tomada e até à sua surpresa. De
ser tomada e montada na mais-uma heteróclita da artes revela-nos o
que tem de singular e que nunca foi visto ou pensado.
Pergunta quais são os efeitos do filme para o pensamento /
consequências do modo como uma ideia é tratada no filme.
O juízo lhe é indiferente, tanto o indistinto como o diacrítico.
Ex: MURNAU, Nosferatu.
Falar de um filme como filme:
- Quando o filme organiza realmente a visitação de uma Ideia (didatismo) é uma relação
subtrativa ou defectiva com uma ou muitas artes.
(o inverso deveria ser verdadeiro – pinturas que remetem a movimentos temporais X estáticas)
- Formalismo : pretensas operações fílmicas “puras” – impasse.

- Ex: VISCONTI,
Morte em Veneza: - convergência / ampliação e corrosão por excesso:
a) rosto de DIRK BOGARDE (opaco e interrogatório)/ATOR.
b) ecos dos estilos venezianos (pinturas de GUARDI e CANALETTO/
literatura de ROUSSEAU, PROUST e HENRY JAMES/ música
de MAHLER).
c) duração excessiva/ Veneza vazia/ adágio de Mahler/ ator imóvel,
só rosto – ideia de um homem suspenso em seu ser e seu
desejo – imóvel.
Ex: TATI, Tempo de Diversão.
Platão – O impuro da Ideia é sempre que uma imobilidade passe ou que uma passagem
seja imóvel. Esquecemos as ideias.
Contra o esquecimento: uma reminiscência.

Ligações do impuro:
Do movimento ao repouso/ do esquecimento e da reminiscência.
Não é o que sabemos e sim, do que não podemos saber.

Cinema: como a impurificação do puro abre caminho a outras purezas.

Imperativo literário:
Fazer de modo que a purificação da língua impura abra caminho a impurezas inéditas.

Ex: BECKETT, o livro chamado Filme.

Balizar as verdades, mais que produzi-las.


Fim

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