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PLANO DE GESTÃO TERRITORIAL MŸKY

PLANO DE GESTÃO TERRITORIAL MŸKY

Mÿky. Vale do rio Juruena. Mato Grosso. Brasil.


2012
Autoria Revisão Fotografias
POVO Mÿky Andreia Fanzeres Artema Lima
Elizabeth Aracy Rodon Amarante Luciana Ferraz
Organização, edição e concepção Ivar Luiz V. Busatto Alan Cesar Bortoleto
gráfica Elizabeth Aracy Rodon Amarante
Andrea Jakubaszko Execução técnica Tarcísio da Silva Santos Junior
Artema Lima Juliana Almeida Flávio André Souza
Artema Lima Laércio Miranda
Consultoria antropológica Andreia Fanzeres Rodolfo Ferraz
Andrea Jakubaszko Fabiano da Matta Lucas Trevisan
Lucas Trevisan
Consultoria ambiental Renata GuerreiroDebora Duran Fotos da capa
Luciana Ferraz Marcos Ramires Flávio André Souza
Debora Duran Laércio Miranda
Elaboração dos mapas
Luciana Ferraz Coordenação executiva da OPAN Diagramação
Amintas Nazareth Rossete (LANA/UNEMAT) Ivar Luiz V. Busatto IrisDesign
Suzy Mara Klemp Lola Campos Rebollar www.irisdesign.com.br
Rochele Fiorini
Colaboradores
Elizabeth Aracy Rodon Amarante Administração e logística
Amintas Nazareth Rossete Antonio Tadeu M. Escame
Fernanda de Oliveira Silva
Lucirlene Silveira
ÍNDICE
Apresentação . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 7
Projeto Berço das Águas . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 9
Mapa de localização do território tradicional Mÿky . . . . . . . . . . . . . . . . 10
Os Mÿky . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 12

1ª Parte - História e Paisagens


Nossa história Mÿky . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 16
Paisagens do entorno . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 20
Paisagens Mÿky . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 30

2ª Parte - Gestão Territorial Mÿky


Objetivo . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 42
Diretriz . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 44
Jeito de viver . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 46
• Roça . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 50
• Acampamentos . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 60
• Festas . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 70
Planos de ação . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 78
• Cenário atual . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 82
• Cenário médio prazo . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 84
• Cenário de futuro . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 86
E, para terminar, a gente vai falar de novo . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 90
APRESENTAÇÃO

Plano de Gestão Territorial Mÿky

Hoje, muita reunião com branco: mesa, cadei-


daço. O mapa é importante para mostrar que o que a
ra, relógio. Antigamente: ritual, cultura, comunidade,
gente usa. Festa, escola, artesanato. Dependemos da
família. Trabalho de madrugada. Reunir para pensar.
terra, taquara, panela de barro. Queremos fortalecer a
Plantar mandioca, caçar, buscar macaco, fazer festa.
nossa cultura, para Jetá ficar mais forte.
A preocupação é grande. Tem que pensar: se fi-
Com o desmatamento, não tem como respeitar
car só do jeito do branco não vai mais saber, não vai
o lugar dos espíritos. Nossa caça está fora, em terra de
mais conhecer cultura Mÿky. Os brancos não conhecem
fazendeiro que tranca estrada, não deixa mais passar.
nossos costumes, falam que temos muita terra e que
Isso atrapalha. A gente tem dificuldade, mas luta. A luta
somos preguiçosos. Não é verdade.
une a gente.
Para falar com eles, eles precisam saber como é o
Por isso estamos montando o plano de gestão.
nosso tempo, a nossa hora. Eles têm que nos conhecer.
Branco tem hora, cumpre horário olhando no relógio... A união do povo depende da gente mesmo, de
antes não tinha branco... como vamos organizar nossas agendas de fora, parti-
cipar das reuniões e conversar mais entre a gente para
O branco não é dono das matas porque nós
sempre continuar pensando junto. Temos que ter cora-
nascemos aqui. É nosso. Nós vivíamos com machado
gem e buscar esse caminho para o Estado reconhecer
de pedra lascada e panela de barro, fogo de urucum.
nosso jeito de fazer, de respeitar nossa cultura.
Primeiro, este mato era nosso. Agora só temos um pe-
PROJETO BERÇO DAS ÁGUAS

A Petrobras investe em iniciativas que visam à ruena, em Mato Grosso, numa área de transição entre
proteção ambiental e à difusão da consciência ecológica o Cerrado e a Amazônia. Nesta região, as terras indí-
em sua política de patrocínio através do Programa Pe- genas desempenham papel fundamental não só para
trobras Ambiental. O Programa prevê um investimento proteger ativos florestais e hídricos essenciais aos dois
de R$ 500 milhões em projetos voltados para a gestão biomas mas, sobretudo, para garantir o fortalecimento
de corpos hídricos superficiais e subterrâneos, a recu- das culturas de povos originários.
peração e conservação de espécies e ambientes costei-
ros, marinhos e de água doce e a fixação de carbono e O Projeto Berço das Águas tem mostrado que
emissões evitadas no período entre 2008 e 2012. um novo modelo socioeconômico para regiões pressio-
nadas pelo desmatamento no Mato Grosso é possível a
Ao apostar em ideias com potencial transfor- partir das referências e modos de vida dos povos indí-
mador, o Programa Petrobras Ambiental contribui para genas. Seus desejos, sua história e suas propostas estão
o desenvolvimento sustentável, considerando o equilí- expressos em planos de gestão territorial.
brio entre gerações, necessidades humanas e integrida-
de da natureza. Essas relevantes iniciativas ambientais O Plano de Gestão Territorial do Povo M�ky foi
oferecem alternativas econômicas, sociais e ambientais construído no âmbito do Projeto Berço das Águas pe-
em sinergia com políticas públicas. Acreditando nisso, a los indígenas e em parceria com a Operação Amazônia
Petrobras patrocina o Projeto Berço das Águas. Nativa (OPAN), organização da sociedade civil que há
mais de 40 anos atua visando o fortalecimento do pro-
O projeto, iniciado em 2011, abrange o apoio tagonismo indígena no cenário regional, valorizando
à gestão territorial indígena através de ações como o seus modos de organização social através da qualifica-
suporte técnico ao manejo e a estruturação cadeias de ção das práticas de gestão de seus territórios e recursos
produtos florestais não madeireiros na bacia do rio Ju- naturais, com autonomia e de forma sustentável.
TERRITÓRIO TRADICIONAL DO POVO MŸKY
OS MŸKY

Os Mÿky cultivam e manejam recursos naturais,


Os Mÿky integram imemorialmente o mosaico de
além das paisagens culturais de domínio de entidades
povos do Vale do rio Juruena (MT) e falam uma língua iso-
ancestrais. Elas configuram referenciais centrais na no-
lada, compartilhada com seus parentes Manoki (Irantxe).
ção de pertencimento, orientação espacial e de uso e
Habitam ecossistemas que compõem as áre- manejo adequado no território.
as de floresta onde estabeleceram ao longo de gera-
O manejo realizado pelos Mÿky é considerado
ções vários aldeamentos permanentes, assim como
de baixo impacto ambiental, pois garante a regenera-
acampamentos para exploração sazonal de recursos
ção da paisagem e a manutenção dos recursos naturais,
naturais próximos às áreas de cabeceiras ou nascen-
conservando os serviços ecossistêmicos de produção,
tes dos rios pertencentes às microbacias dos córre-
regulação e suporte cultural.
gos Rico (Tanãmje’y), Norato (Waijakanãi), Escondi-
do (Iru’umje’y), Noronha (Tjukamje’y), Capitão Hélio
Contudo, as áreas utilizadas pelos Mÿky para
(Amje’y), Águas Claras (Aytukamje’y), localizados nas
ocupação e manejo estão em situação de risco e
sub-bacias dos rios do Sangue (Mãkanaí), Membeca
ameaça permanentes devido à pressão dos mode-
(Aome’y), Juruena (Manãpakama’y) e Papagaio (Paka-
los de ocupação do entorno: monocultura e utiliza-
naiã). Os Mÿky reconhecem como terras de ocupação tra-
ção de insumos, pecuária extensiva, assoreamento
dicional essas regiões das nascentes dos rios formadores
das cabeceiras, desmatamentos, caça e pesca ile-
do Tapajós, tributário substancial da bacia amazônica.
gal, e queimadas. Essas atividades provocam alte-
O ritual de Jetá corresponde à expressão do elo
rações ambientais, paisagísticas e funcionais de entre os Mÿky e o seu território. Este ritual dinamiza e
difícil reversão. coordena a produção da vida social e rege os modos de
uso, troca e distribuição, fabricando corpos (sejam eles
É neste contexto que os Mÿky problematizam de pessoas, espíritos, objetos ou paisagens). Isso gera
em seu Plano de Gestão Territorial os diferentes usos ordem para a sociedade e para o cosmos, mantendo o
e modelos de manejo que incidem sobre as paisagens, equilíbrio e harmonia necessários à vida.
expressando diferentes concepções sobre a territoriali-
dade, no contraste entre a conservação da floresta nas A roça de Jetá corresponde a uma roça coleti-
terras da União de uso fruto deles e as áreas devastadas va destinada ao abastecimento do ritual onde tudo é
no entorno. plantado, com predominância simbólica para o cultivo
de milho e algodão, devendo ser manejada apenas por
Tanto a roça quanto os rituais realizados pelos homens iniciados.
Mÿky dependem diretamente do resultado dos acam-
pamentos, sobretudo, os de caça (e castanha). Nesses A partir dessas referências, os Mÿky definiram
momentos, ocorre não apenas a coleta de diversos pro- como eixos de seu Plano de Gestão Territorial: a roça,
dutos vitais aos Mÿky, como também estratégias e téc- os acampamentos e a festa. Esses são os pilares da vida
nicas de manejo, pedagógicas e de vigilância territorial. e da organização social Mÿky e determinam as suas ló-
gicas de ordenamento e gestão territorial.
PARTE I
HISTÓRIA E PAISAGENS

Meu pai era um guerreiro,

minha irmã também.

E, porque eles lutaram,

não podemos parar de lutar nunca

pela nossa terra,

pela vida da gente.


NOSSA HISTÓRIA MŸKY
Tudo era muito diferente antes. Antigamen- Não tinha Campo Novo, não tinha cidade nenhuma, jo-
te, mato fechado. Hoje, nós preocupados demais. De gava bola com cabeça, não com o pé. Não tinha açúcar,
como vamos viver, nosso trabalho, pesca, roça, impor- meu pai me criou com mel.
tante área, mato, caçar, buscar mel, frutas. Fazendeiros
não respeitam, madeireiros não respeitam. Mulherada Hoje, tudo tomado. Branco vê diferente. Para
precisa de tucum. Agora Mÿky está escrevendo. Vamos nós, comprar na cidade não sustenta. Tem que ter cará,
falar da nossa cultura, mostrar. porco, anta, tudo para nós comer. Pacotinho da cidade
não dá, acaba.
Antigamente, meu pai contava, jogava bola de ca-
beça aí. Mÿky, Manoki apostavam batata, cará, pena… Na economia indígena você produz na própria
terra, troca com os parentes e vende para a meren-
da da escola. O bem-viver na aldeia, ao contrário do
não-índio que desmata tudo. Para nós viver tem que
ter tudo, nosso trabalho. Os jovens têm que levar para
frente o nosso modo de vida. A gente também vai ficar
velho e os novos têm que seguir adiante.

Vocês vieram para cá e estão vendo essa tristeza


de tanto esperar e toda essa destruição. Eu morei no
grupo que estava lá perto das terras onde hoje é Juína.
Lá não tinha nada não, era aldeia nossa. Foi muito de-
pois que veio estrada e trancou nossas passagens. Foi
tudo ficando cercado. Tinha caça, peixe, tudo. Hoje em
dia não tem nada, tem fazendeiro.
Hoje, tudo limpo. Tudo ocupado e ainda tocam
fogo! E aqui a gente foi sendo empurrado pro Cerrado.
Muita tristeza na nossa história. Agora é só lembrança,
acabou tudo. Por causa de dinheiro tiraram tudo. E a
terra não sai nunca, aí é que não vai sobrar nada mes-
mo. Um dia eu vou morrer, nós, velhos. O que vai ficar
para os novos? Já tô velho e tô esperando. Continuo
lutando!

Eu era novo e fazia muita roça, casa, festa…Não


preocupava com coisas de branco. Hoje tem que pre-
ocupar. A gente vivia de mel, biju, caça. Meu pai, meu
avô, todos viviam bem na aldeia. Com nossos filhos é
diferente. Antes, muita festa, muita tranquilidade, mui-
ta fartura. Nossos filhos não sabem o que é isso. Hoje
está muito diferente.

Dói mesmo se sentir assim, sem conseguir ver


como vai ser daqui para frente. Os mais novos devem
se engajar mesmo. Aqui é tudo diferente, isso é nossa
cultura. Mas a gente também quer ficar forte, não es-
quecer nossas tradições, isso é a saúde para nós.

Nossos velhos falam muito, a gente aprende com


eles e eles estão vivos e fortes aí. Não desistem e assim
aprendemos e falamos para nossas crianças, essa é a
nossa identidade. Quando a gente fala isso a gente tá
falando do que os nossos antepassados falaram, ensi-
naram e fim.
PAISAGENS
DO ENTORNO
O manejo do não-índio é pasto e boi na beira do rio.

Kewanỹ já’a utamtjai tasotu, axa’a manãnkjapy

Figura: Paisagens do entorno representadas pelos solteiros.


Figura: Paisagens do entorno representadas pelas solteiras.

Desmatamento (próximo do rio) ameaçando a vida do rio.

Tasotunamaju manãkjapy xaãkujeri


Figura: Paisagens do entorno representadas pelos homens casados.

Primeiro tiram madeira para fazer pasto e criar gado.


Depois fazem os bebedouros para o gado nos córregos.
Tem também a figura dos madeireiros que saem carregados
e os que fazem o desmate do Cerrado para plantar soja.
Não há bem-viver, o branco não pensa na natureza.
Índio pensa em cuidar diferente dos não-índios.
Não há bem-viver, desmata, não conserva,
acaba com tudo. Derruba para plantar,
desmata cabeceira para fazer lavoura. Estamos
cercados de lavouras contaminadas por
veneno. Nós cuidamos do nosso ambiente.

Branco fala que não cuidamos, mas todos nós


cuidamos da natureza, conservamos. Fazemos
roça sim, mas de toco, machado. Nosso desenho
mostra isso: trator, motosserra, caminhão de
madeira, gado. Por isso tanto calor, tanta poluição.
Ficamos preocupados com isso. Desenhamos esse
córrego seco, escuro, sem vida, sem peixe.

Figura: Paisagens do entorno


representadas pelas mulheres casadas.
Desmata para pasto, não cresce mais o mato,
acaba a caça. Macaco sofrendo sem árvores
para eles e sempre madeireiro tirando tudo.
Primeiro não tinha fazenda, agora tudo cercado.
As pessoas adoecem desse jeito, com água suja,
poluição, fumaça, calor, falta de comida.

Figura: Paisagens do entorno


representadas pelas mulheres/avós.
Figura: Paisagens do entorno representadas pelos homens/avôs.

Muita máquina. Lavoura, muita coisa. Trator, máquina. Mas não tem nada!
Não tem árvores, só maquinário.

Makina jepte’y. Okika jepte. Jeptekao. Tratornỹ, maki-


na, a’akjepu. Nĩkjuwy makinanỹ
Carro levando madeira. Boi.

Jãtai utatonémjũ a’a. Axa’a.

Figura: Paisagens do entorno representadas pelas crianças.


PAISAGENS MŸKY
Nosso manejo é
o contrário dos não-índios

A gente planta muito. Cará, milho, não precisa


desmatar tudo para plantar. Eu planto muito e não cor-
to quase nada para isso.

Antes, não tinha branco por aqui não, tinha só


nossos parentes. Hoje nossa terra é pouca, pequena.
Isso não tá certo não, acabar tudo, tudo desmatado.

Nós plantamos tudo o que tem aqui. O meu pai


e minha mãe colhiam frutos do mato e tantas coisas.
Como pode ser certo? Entrar, tirar a gente e desmatar
tudo! Quero como meu pai tinha: caititu, muita coisa.
Hoje, tudo pasto.
Figura: Paisagens Mÿky
representadas pelas mulheres casadas.

Mỹky mjehy ipikje’y mâkjunkjehy. Inĩ mokoowy


Manãnkjehy miatjapa jepte’y, pa’i.
Pa’i opakao. Mopa’i. Ãkakje’y.
Mójamã, mauwa,a’a jepte’y.

Mÿky, bem-viver na aldeia. Casa tradicional.


Rio com peixe e mata.
Floresta, roça e alimentação.
Porco, tatu e árvores.

Figura: Paisagens Mÿky


representadas pelos homens casados.
Os rios devem ter bastante peixe assim,
para sobrevivermos. E muita caça,
macaquinho, floresta, mata, roça de milho...

Manãnpjaha miatjapa jeptekao


jãi ikanamapi. Ãkanamapi jawa,
patãka, pa’i opakao, kuratu mopa’i.

Figura: Paisagens Mÿky


representadas pelos solteiros.
Mjehy ikanamapi mâkjunkjehy.
Mỹkynỹ jariky wâtanaáranamapi pa’i.
Wâtanamapi mopa’inkinã.
Mjehy ikanamapi mâkjunkjehy.
Ipikje’y mỹky jotapy ipikje’y kewankinã
Wâtanaáranamapi pa’i. manai, mã’ã...
Ajumãnamapi mỹky pjehi, jã mju’u.

Figura: Paisagens Mÿky representadas pelas solteiras.


Machado de pedra, rede, peixe, lago, xire, caminhão...

Awypjatápa, papy, miatjapa, manãmawy, pyri, jãtai.

Figura: Paisagens Mÿky representadas pelas crianças.


Cará, batata, mandioca, feijão. Tem alimento.
As casas, a aldeia.
Primeiro não tinha branco, a gente vivendo bem.

Ona’a, onã, mỹ’ỹ, kumãta’a.


Inĩ jepte, mâkju’u
Mjeky kewa akjepu, Mỹky ikanamapjatinĩ mjekaou.

Figura: Paisagens Mÿky representadas pelas avós.


Anta, porco.
Nosso trabalho na roça. Machado de pedra,
cará, feijão.

Opyri, mójamã.
Manãnũnamapi mapa’inpjha. Ao’tápja, awypjatápa.
Ona’a, kumãta.

Figura: Paisagens Mÿky representadas pelos avôs.


PARTE II
GESTÃO TERRITORIAL MŸKY
Ipikje’y Mÿky pypkjanã

Pa’i Namy’i Jetá

Pasekje’y Waakje’y mỹky Wátuhowy

Inĩ mokoowy Jéta kju’u Ajumãpjukje’y Mamũ jepte

Jawa Mopa’i Kuratu Jawanã Awykje’y

Tjukai Wawa Kakje’y Xikijawai

Watakakje’y Ãkakje’y Irekapa Jãmpa ãkakje’y

Manãnukje’y Ka’a Papy Xipkjuhu

Amahy Pa pinỹ I’i

A’a Manãpapa Muhu

Tâkju’u Ajawai Waytumakjepu

Wátuho manãnũkje’y

Mije’i Ajumã Ajumã mjaroára

Paihi Paihikanã
Na vida de Mÿky não pode faltar

Terra Mulher Ritual (Jetá)

Festa Língua União do povo

Casa tradicional Casa dos homens Respeitar os espíritos

Caça Roça Milho Animais Pesca

Castanha Tucum Taquara Palha

Ensinar os filhos Alimentação Partilha Oferecer comida

Artesanato Flecha Rede Panela de barro

Fruta Remédio do mato Mel

Árvores Água Chuva

Escola Dinheiro Respeito dos brancos

Trabalho na comunidade

Pensar Cuidar Preservar

Riso Alegria
OBJETIVOS

TERRA

Ritual JETÁ
TERRA Ritual JETÁ

É preciso parar de destruir. Qual é o nosso poder para nós, para os nossos filhos ficarem nessa terra tam-
de fazer parar? Nossa população é pequena, mas está bém, porque essa terra é nossa.
crescendo. Nós não precisamos desmatar e destruir
tudo para plantar, para ter alimento. Um dia nós não vamos estar nessa terra, mas nos-
sas crianças vão continuar aí, vivendo, fazendo caçada,
Branco vê diferente. Os brancos não conhecem, aprendendo com os velhos que vão estar aí também e
pensam no passado que índio só vive no mato. Não co- ensinar como viver nessa terra, plantar roça, mandioca,
nhecem nosso costume, festa. Quem conhece sabe que milho, cará, batata, amendoim. Tudo se planta na nossa
tem que respeitar. roça.

Os homens vão caçar com Jetá, que é o espíri- Quando a gente faz oferecimento não é para a
to. Assim se faz boa caçada na aldeia para ter festa, gente, é para espírito. Esses que nasceram e viveram
neste espaço, que enterraram a placenta nesta terra,
oferecer, ter saúde. Mas nossa caça tá indo embora.
que marcaram qual é o nosso lugar. Eles morreram,
Como podemos fazer festa e respeitar os espíritos sem
mas estão aqui junto com nós, a gente não vê, mas eles
resolver nosso problema da terra? A roça da família é
estão junto, velhos, comendo carne, bebendo chicha,
diferente, não busca caminho lá fora, depende da gen-
fazendo festa. Eles estão junto, isso faz nossa saúde, a
te mesmo, aqui dentro, da nossa união e de mais nin-
gente tá se alimentando e eles também.
guém. Mas sem a caça fica difícil a roça de Jetá, o ritual.
Artesanato também é difícil o caminho: tucum, barro e Como voltar a ter o mato bonito e ter terra de
taquara - tá tudo fora da terra demarcada. volta? Com quem vamos nos unir para voltar a ter a ter-
ra nossa e bonita, para ficar mais forte o nosso ritual da
Queremos terra porque é nossa, para viver nessa Jetá? Para isso, fazer a cultura ficar forte.
terra onde nossos bisavós nasceram, cortou umbigo e
foram enterrados aí. Quando morria, era na casca de Vamos mostrar que continuamos com a nossa
piúva. Agora no caixote. Por isso, queremos essa terra língua, costume, tradição, nosso jeito de viver.
DIRETRIZ

Takarakanamapi kewankinã wanamapi numãku takarokje’y.


Are waa mỹkynkinã: numãku kewankinã takaroopa.
Kewa takarokika jepte’y tapaáraopa mopa’i,
kareoárapa panpjaha.
Numãku kewa takaraopa , mjehy.
Aprender do branco só a metade, só metade.
Já falei pro povo, só metade aprender.
Se aprender o tempo todo, não vive vida de índio.
Não faz roça, não caça...
Então, só metade tá bom.
JEITO DE VIVER
O TEMPO PARA O POVO MŸKY

Nosso estudo não é papel.


É o nosso pensamento.
Sabemos pelas flores e pelas estrelas
que o tempo tá chegando.
É como os antigos ensinaram,
a gente também aprendeu.
Branco usa escrita para contar o tempo.
A gente marcava na corda.
Na escola também a gente aprende.
Mas a gente sabe mesmo é no nosso pensamento.
ROÇA
Tem o tempo da derrubada, da queimada, o para continuar comendo produto orgânico como man-
tempo de plantar, o tempo de nascer, o tempo de co- dioca, milho, arroz, feijão, batata e também vender
lher e de apanhar, de caçar e de pescar... para a merenda escolar. Para que serve um plano de
manejo sustentável Mÿky? Para ter autonomia econô-
Não podemos perder nossas sementes. mica indígena.

Podemos criar associação, estudar fora na cida- Ficar unido para fazer a roça grande. Se não se
de, mas não podemos deixar de fazer nossas roças faz a roça comunitária, se perde o saber do ritual.

Na nossa Roça de Jetá, só quem pode


entrar são os homens iniciados.

*Dos aproximadamente 64 cultivares agrícolas myky, apenas alguns estão aqui retratados.
Milho

Não podemos perder nossa semente de milho, semente de qualidade. Continuar com a
nossa semente para replantar na roça, para sobreviver, e para não comprar de fora.
Algodão

“Antigamente, a nambuzinha deu algodão


para a mulherada. Ela deu algodão para nós.
Se ela não tivesse dado, hoje a gente não tinha
algodão. Os antigos plantavam algodão e nós
não esquecemos, nós também plantamos. (...).
Nunca aconteceu uma mulher não saber fiar!

Desde pequenas as meninas


aprendiam e fiavam.
Hoje também, aqui na aldeia Japuíra,
a mulherada sempre está fiando e tecendo.
As meninas bem pequenas vão aprendendo
a fiar e ajudam as mães a tecerem as
redes e tecerem as tipoias.” *

* Jaapátau & Jamaxi Mÿky. In: História do algodão. (Org. ) Elizabeth Amarante. Escola Estadual Indígena Xinui Mÿky/Livro didático, 2010.
Origem da roça

...Quando estavam perto do lugar onde a mãe enterrou o filho,


viram uma grande clareira na mata e a mãe disse:
- No lugar dessa clareira era mato, quando eu vim
aqui naquele dia. Como é que é isso?
Chegaram à beira da clareira e viram plantada
uma roça com tudo que era plantação.
A mãe disse:
- Nosso filho não está aqui, mas foi dele que nasceu esta roça! Agora é que estou entendendo o que ele falou:
Eu só morro se você se esquecer de mim, não me atender e cuidar de
mim no tempo certo, não me plantar e me limpar...

Imagens do preparo da massa de mandioca para fazer o biju.


Do braço do menino
nasceu a mandioca-mansa,
da canela a mandioca-brava,
da cabeça a cabaça,
do coração o cará-branco,
do fígado o cará-roxo,
A colheita e o preparo do feijão

da unha o amendoim-vermelho,
da costela o feijão-pampa,
da ponta de esterno o feijão-de-vara,
da tripa a batata-doce,
do testículo a ararutinha-redonda,
do pênis a araruta,
da rótula a cabaça pequena.

Estava tudo no ponto de colher.


Encheram o xire de mandioca-brava,
mandioca-mansa, batata-doce,
e muito mais e levaram para casa. *

* Trechos extraídos do mito de origem da roça, transcrito por Adalberto Holanda Pereira In: O Pensamento Mítico Irantxe, 1985.
ACAMPAMENTOS
Castanha-do-Brasil

Está difícil porque tem pouca


castanha para apanhar. Nós vamos
até o Castanhal para pegar castanha,
mas não pegamos porque estão
derrubando. Os brancos estão
cortando os pés de castanha.

Queremos a nossa terra de volta,


o Castanhal. Assim vai ser bom
para nós, pegar a castanha,
fazer acampamento de novo
e buscar renda também.
Taquara

Por causa da destruição do taquaral que ficou fora da


Aprender e continuar a fazer flecha. nossa terra, está se perdendo o saber fazer flecha.
Os jovens não sabem fazer mais, só os mais velhos.
Os recursos da floresta

Madeireiros cortam as árvores, cortam o pé de remédio e as


árvores grandes estão acabando na floresta. Muita queimada e
desmatamento. Tudo isso pode causar o desaparecimento dos
remédios do mato e queremos continuar a usar o remédio do mato
para não usar o remédio dos brancos, que pode fazer mal à saúde.

Fazer muda de remédio e plantar, preservar os remédios do mato para


fazer bem para a nossa saúde. Buscar mel, ter mel de qualidade.
Tucum

Hoje, quase não pegamos tucum. Porque para pegar é muito difícil. Temos conflito com os fazendeiros porque
derrubam tudo. Imaginamos a perda total do tucum e, assim, não vai ter mais para fazer muita corda de tucum.
Fazemos as cordas para nossa rede, não precisamos comprar as cordas dos
brancos. Podemos vender e trocar as cordas com os parentes e brancos.
Para nós é importante mostrar a falta que o tucum tem para nós para fazer
a corda da rede (e anéis, colares, arcos...). A rede junta as pessoas, o casal
dorme junto. Tendo o tucum, não precisa comprar as redes de fora, dos
brancos, e assim podemos continuar produzindo e vendendo as redes.
Buriti

Com o desmatamento,
estão acabando as frutas na floresta.
Tem que parar de cortar as
árvores para ter frutas,
replantar as sementes na floresta.
Há também a diminuição e
extinção dos pássaros.
Caça e pesca

Muita dificuldade de ter caça para


dividir com a comunidade. Diminui
a caça, diminui a quantidade de
festa. Fazendeiro põe placa: “não
pode pescar, não pode caçar”.

Mas tem que ter comida para oferecer


sempre. Temos comida na roça,
temos comida saudável, mas para o
ritual de Jetá precisamos da caça.

A destruição e a poluição ameaçam


alimento nosso tradicional. Hoje, poucos
animais, difícil encontrar por perto,
estão cada vez diminuindo mais. Existe
muito desmatamento e queimada.

Os levantamentos referentes ao uso e manejo da fauna, caça, pesca, coleta, agricultura e produção da cultura material resultaram
na identificação de 437 itens utilizados da biodiversidade existente em suas terras de ocupação tradicional no Vale do Juruena.
FESTA
O ritual une o povo. É igual festa, dá força!
O ritual de Jetá une os homens do lado de fora da casa
e as mulheres dentro da casa. Todos participam.
Caçamos para comer. Nos alimentamos da carne dos animais e oferecemos tudo no nosso
ritual. Com a caça é que nós sobrevivemos. Mas para caçar os animais temos todos que
cuidar das florestas para que eles continuem vivendo e a gente também.
O ritual é saúde e é para não
acontecer coisas ruins.

Quando fazemos o ritual, temos saúde.


Mas precisa continuar fazendo. É preciso
saber o que é importante e o que é para
cancelar. Não é para colocar o que é de fora
como mais importante do que o ritual.
Olhar os jovens para voltar
a se envolver, fazer roça comunitária,
acampamentos, senão não vão
conhecer, reconhecer que a
festa é mais importante.
Ajumãpjukje’y Jétankinã. Jéjohu. Pypkjanã pukukje’y.
Respeitar o ritual, alegria. Fazer acontecer o ritual e continuar sempre fazendo.
PLANO DE AÇÃO
MAPA DE USO E MANEJO DO TERRITÓRIO MŸKY

Estas coisas têm dono - comida e terra têm. Se não tiver os espíritos, seca tudo, acaba tudo.

Jepte jãkamỹ’ỹ. Ãkakje’y, pa’i jãkamỹ’ỹ Ãkjepukika Nahi, iwuoky,mjaroky.


CENÁRIO ATUAL

Figura: Cenário atual do Plano de Gestão Territorial Mÿky.

Nós desenhamos esse mapa que mostra toda estrada que leva até Brasnorte é onde estão os planos
a linha do limite do rio Papagaio, fazendo divisa com de manejo dos fazendeiros, desmatando tudo. Do ou-
Terra Indígena Enawene Nawe. Lá embaixo na linha do tro lado, tem o Castanhal e o Tucunzal: tudo terra im-
outro limite que passa pelo córrego do Águas Claras, portante para nós, para buscar frutos, castanhas. Os
na beira do rio, é tudo bonito. Mas, do lado de fora animais também dependem de água, de frutas, assim
desse limite está tudo desmatado. No limite junto à como nós, senão não sobrevivemos.
Queremos de volta nossa terra para preservar, Esses órgãos que trabalham com a gente é que
proteger e recuperar o mato, as águas, dar espaço autorizam. Só que, além de tudo, os madeireiros vão
para caçar de novo. Deixar crescer primeiro tudo, re- além do que foi acordado, eles passam, tiram muito
cuperar, crescer árvore. No início não dará para beber mais. E esses que deveriam fiscalizar deixam livres
a água suja. Primeiro é preciso recuperar, ocupar com para tirar madeira. Desmatamento é crime! Usam
a caça, proteger as cabeceiras que hoje estão de fora e a madeira para tudo e não controlam. Vai acabar. E
queremos de volta. sabemos que são os próprios órgãos ambientais que
autorizam. Temos que nos unir, vocês que estudam:
Sempre andamos por todos os lugares e tudo OPAN, FUNAI, IBAMA, temos que fazer frente a isso,
em volta é plano de manejo, onde antes era mato. se unir, lutar.
Quem tem plano de manejo derruba tudo. O que é
isso? Não sei quem autoriza isso! Lá no córrego Águas É comum também quando a gente vai buscar
Claras tem um monte agora, tá tudo desmatado. Pelo solução para os problemas de escola, saúde, terra,
jeito que vai…olha, se a gente é pra fazer plano de ma- desmatamento. Fazer muito documento. Mas parece
nejo, deve ser então para recuperar o que o plano de que empurram a responsabilidade de um para o ou-
manejo deles está fazendo. tro. Aí o jeito é fazer chegar em Brasília ou Ministério
Público quando vê que não dá mais jeito de conversar
SEMA, IBAMA, FUNAI, são eles que autorizam e resolver. Não adianta ter chefes de órgãos que não
esses planos de manejo. Cerejeira, itaúba, tudo saindo gostam de índio. Fala, fala e não faz nada. Fala que vai
de lá do Águas Claras. A gente está ligando toda vida. fazer, mas depois não faz nada mesmo! O desmata-
Eu fico muito triste com cada madeira que sai daqui, mento é exemplo muito bom disso.
madeira de muito mais de 50 anos, se extinguindo, tá
acabando. Retiraram 500 mil m³ de madeira fazendo Assim está tudo ficando devastado. A gente con-
plano de manejo aqui perto de nós. O taquaral que versa, pede, faz denúncia e não para de sair licença de
nós utilizamos já foi retirado. plano de manejo na nossa terra. Fora os casos ilegais
que ninguém toma nenhuma providência. Com quem
vamos contar, em quem podemos confiar?
CENÁRIO DE MÉDIO PRAZO

Figura: Cenário atual do Plano de Gestão Territorial Mÿky.


Fizemos o mapa da terra demarcada e a terra Nossas crianças é que vão sobreviver nessa
que estamos lutando, os limites da nossa terra toda. terra que vamos recuperar. Onde não tem fazenda é
Marcamos o lugar do Castanhal em vermelho, mas lá tudo verde. Isso tudo aí, Tucunzal, Castanhal, são as
tem as fazendas. Tem também o Taquaral, o Jenipapal, nossas crianças que vão ocupar. No mapa, em laranja
a cabeceira do Norato, onde dava muito cará. Então, marcamos os locais de desmatamento e queimadas.
marcamos esses nossos lugares: Castanhal, Tucunzal e Primeiro vamos lá cuidar, pegar e usar. Cuidar e prepa-
a aldeia. A maioria das aldeias antigas estavam próxi- rar para as crianças terem essa terra bonita no futuro.
mas do Castanhal. Se a gente consegue nossa terra de Local de remédio que tinha aqui dentro (áreas próxi-
novo, a primeira coisa que devemos fazer é recupe- mas ao Castanhal e Tucunzal), fazendeiro desmatou.
rar dentro desses vermelhos que marcamos no mapa. Ele não conhece remédio de febre, dor de cabeça, de
Nas áreas de fazenda, devemos replantar, reflorestar. criança para não adoecer. Sobrou pouca coisa de pé.
Aí cuidar, né. O Castanhal está cercado de fazendas.
Não é só buscar terra e deixar sem usar. É fazer roça, Nós queremos cuidar das árvores, dos bichos,
colher, usar, buscar, plantar onde é bom de fazer roça, macaco. Se não tiver mato, bicho também não tem. Lá
com cuidado para não pegar fogo onde eram as fazen- tem macaco, terra boa para buscar e fazer festa.
das. O tucano e o morcego ajudam a reflorestar. Eles
vão lá no lugar desmatado e começam a reflorestar,
espalhando as sementes.
CENÁRIO FUTURO
Figura: Cenário futuro do Plano de Gestão Territorial Mÿky.
CENÁRIO FUTURO

Com a nossa terra de volta, teremos acampa- cano comendo sumaneira, porco comendo. Faltou de-
mento de castanha, passaremos semanas com a famí- senhar o morcego.
lia para coletar castanha, caçar. Lá tem roça também,
capoeira boa no Castanhal para plantar milho, batata, Com nossa terra de volta, liberdade de pescar, pe-
cará, feijão. gar castanha. Temos que ter fé de conseguir essa terra.

Marcamos também as piúvas e o cambará do Quando não tiver mais fazenda, Mÿky voltará a
Cerrado. No canto esquerdo estão as áreas de caça. Lá morar lá também, não terá mais perigo. Aí não preocu-
os homens vão caçar para a gente fazer festa. pa com fazendeiro e faz festa grande.

Aqui está a aldeia atual. No Castanhal pretende- Aqui tá tudo de pé (canto esquerdo superior),
mos ter uma casa para as festas, para acampar. O Ta- tem remédio do mato. Onde foi desmatado vamos re-
quaral tem que crescer de novo, a gente tem que fazer plantar cambará, cerejeira, mato de novo.
casa e futuramente vir até a ter aldeia aqui (canto direi-
to inferior). Lá já teve muita aldeia, tem capoeira boa Assusta primeiro ver pasto e depois tudo lavoura.
para fazer roça. Hoje só pescamos na divisa. Com a ter- Tó vendo papagaio passando, arara, anta, caititu, porco,
ra toda de volta, vamos pescar, regular e manejar o pei- tudo vindo prá cá porque tá tudo desmatado. Cerejeira,
xe em toda essa extensão (nos limites ao norte e ao sul casa de japuíra... não vemos mais a japuíra.
do mapa). Áreas de caça (no canto esquerdo superior),
fazer festa lá, caçada aqui na grande casa tradicional. Trabalhar junto para fazer esse mapa, os novos
vão levar para frente, preparar tudo para os filhos. Essa
Aqui na área homologada, tudo tá preservado, terra não é de uma pessoa, é de todo mundo, para co-
cheio de biodiversidade. O sol tá alegre, tem a chuva lher. O sonho é que ela venha logo para a gente recupe-
que a semente precisa, tem arara comendo bacaba, tu- rar o que não tá bom.
Foi muito bom todas as etapas, as oficinas.
Muito trabalho, muita conversa, pensar junto.
Temos que voltar a ter o nosso tempo.
Isso sim é o nosso trabalho.
Os jovens têm que trabalhar
mais na nossa cultura, não só na escola,
e levar os velhos para a sala de aula também.
E PARA TERMINAR, A GENTE VAI FALAR DE NOVO...

Precisamos reflorestar a beiras do rios e produzir piúva, taquara, roça. Dinheiro é passageiro, como pode
mudas para plantar ou reflorestar. Manter a floresta alimentar nossas crianças? Dinheiro acaba e criança vai
em volta da terra e reflorestar as áreas desmatadas. chorar de fome. Antes não faltava nada – cará, amen-
doim, mandioca, araruta, pequi, água, peixe... terra
Hoje as águas de muitos rios e cabeceiras estão grande que ia até Juína. Agora a terra é pequena, mes-
poluídas. Temos que diminuir a poluição dos rios. Não mo com o dinheiro, terra é que não pode faltar.
podemos deixar acabar os rios. Nosso trabalho é man-
ter a água limpa e a natureza preservada. Temos que Claro que quando olho um machucado vejo que
cuidar da natureza para o futuro, respeitar as leis. Os precisamos de atendimento, de uma pomada. Isso é
brancos não deveriam desmatar, nem destruir as árvo- uma coisa. Mas, remédio vai ficar precisando mesmo
res grandes como a peroba. Há os espíritos que moram se não tiver alimento, se não tiver terra, água, árvore,
dentro das árvores, tem que respeitar. Nas nascentes animais. Se não tiver roça, aí sim precisa do branco, pre-
tem a mãe da água e nas cachoeiras também. Com as cisa de remédio do branco.
PCH os espíritos vão embora. Temos que preservar as
águas para o futuro. Temos tudo. Caminhão, carro, micro-ônibus...
não para! Apesar da pressão e agenda externa deve-
Primeiro não existia doenças como hoje. Vivía- mos manter nossa união, nossa luta nos une, somos
mos felizes. Roça, caçar, não tinha doenças como atu- unidos. Não adianta só os brancos respeitarem, tam-
almente. Tinha muito jogo de bola de cabeça, que é da bém nós temos que respeitar primeiro nossa própria
nossa tradição. Nunca deixava faltar mel. Tinha muita cultura. Não deixar acontecer a desunião

Nahi, nosso povo lá de cima, cuida terra, mata, caça, rio, alimento, cará, criança, planeta, sol.

Nahi, jãi Mjamũ , mjehy wapaky pa’i, jawa, manã ma’i, ãkakje’y, ona’a, wapasi, ápjamã ikanamapi, irehy.
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