Sociologia Da Educacao - FINAL
Sociologia Da Educacao - FINAL
Sociologia Da Educacao - FINAL
Edir Mello
Gilberto Aparecido Angelozzi
Vassia Alexandre Pouchain
Sociologia da educação
1ª Edição
Brasília/DF - 2018
Autores
Clara Brum
Edir Mello
Gilberto Aparecido Angelozzi
Vassia Alexandre Pouchain
Produção
Equipe Técnica de Avaliação, Revisão Linguística e
Editoração
Sumário
Organização do Caderno de Estudos e Pesquisa.......................................................................................................4
Introdução...............................................................................................................................................................................6
Aula 1
A Questão do Conhecimento......................................................................................................................................9
Aula 2
A Sociologia como Ciência: uma Perspectiva Histórico-Crítica................................................................... 20
Aula 3
A Educação como Fenômeno Social e Objeto de Estudo da Sociologia.................................................. 36
Aula 4
As Matrizes do Pensamento Sociológico e as Diferentes Análises do Fenômeno Educacional...... 43
Aula 5
Diferença, Exclusão Social e Desigualdade Social........................................................................................... 80
Aula 6
Processos Educacionais no Brasil e as Teorias Contemporâneas da Sociologia da Educação......... 94
Referências.........................................................................................................................................................................102
Organização do Caderno de
Estudos e Pesquisa
Para facilitar seu estudo, os conteúdos são organizados em unidades, subdivididas em capítulos,
de forma didática, objetiva e coerente. Eles serão abordados por meio de textos básicos, com
questões para reflexão, entre outros recursos editoriais que visam tornar sua leitura mais agradável.
Ao final, serão indicadas, também, fontes de consulta para aprofundar seus estudos com leituras
e pesquisas complementares.
A seguir, apresentamos uma breve descrição dos ícones utilizados na organização dos Cadernos de
Estudos e Pesquisa.
Atenção
Cuidado
Importante para diferenciar ideias e/ou conceitos, assim como ressaltar para o
aluno noções que usualmente são objeto de dúvida ou entendimento equivocado.
Importante
Observe a Lei
Conjunto de normas que dispõem sobre determinada matéria, ou seja, ela é origem,
a fonte primária sobre um determinado assunto.
4
Organização do Caderno de Estudos e Pesquisa
Para refletir
Questões inseridas no decorrer do estudo a fim de que o aluno faça uma pausa
e reflita sobre o conteúdo estudado ou temas que o ajudem em seu raciocínio.
É importante que ele verifique seus conhecimentos, suas experiências e seus
sentimentos. As reflexões são o ponto de partida para a construção de suas
conclusões.
Provocação
Textos que buscam instigar o aluno a refletir sobre determinado assunto antes
mesmo de iniciar sua leitura ou após algum trecho pertinente para o autor
conteudista.
Saiba mais
Sintetizando
Posicionamento do autor
Importante para diferenciar ideias e/ou conceitos, assim como ressaltar para o
aluno noções que usualmente são objeto de dúvida ou entendimento equivocado.
5
Introdução
Seja bem-vindo ao curso de Sociologia da Educação. É com grande alegria que iniciamos esta
jornada junto com você. Nosso objetivo central aqui é examinar algumas das principais propostas
relativas às teorias sociais sobre Educação, refletindo sobre a problemática que informa cada
análise, contrastando-as e destacando os esforços de síntese.
Nosso propósito, por meio da comparação de algumas correntes teóricas, será o de colocar em
perspectiva as concepções sobre educação vigentes em diferentes contextos histórico-sociais.
Para tanto, faremos uso da literatura clássica publicada na área de Ciências Sociais sobre os
processos educacionais e materiais de pesquisas em andamento na atualidade.
Um dos pontos básicos da discussão será a relação entre educação e sociedade e os processos
de produção e reprodução do fenômeno educacional na sociedade capitalista.
De certo teremos um olhar voltado para as especificidades da relação entre Sociologia e o campo
educacional e, tanto quanto possível, buscaremos contemplar demandas específicas da escola
reconhecida como instituição formal, responsável pela aprendizagem.
Objetivos
6
»» Diferenciar os dois critérios de cientificidade que se encontram por trás das Ciências
Naturais e das Ciências Sociais, alargando, com isso, a própria noção de ciência.
7
8
A Questão do Conhecimento
Aula
1
Apresentação
Assim sendo, esta aula tem como objetivo refletir sobre as diferenças existentes entre o conhecimento
de senso comum e o conhecimento científico, no que diz respeito aos três elementos básicos
para a existência de um conhecimento científico, a saber: sujeito, objeto e método.
Objetivos
Esperamos que, após o estudo do conteúdo desta aula, você seja capaz de:
»» Localizar no conhecimento científico uma condição essencial para se romper com uma
visão superficial dos acontecimentos sociais.
A questão do conhecimento
A organização da Sociologia como ciência se deu no século XIX, após muitos séculos, nos quais
primeiramente os filósofos – e os cientistas depois – procuraram desvendar as relações entre
homem e meio social. Conceber o comportamento social como decorrente de leis próprias à vida
em sociedade e não da vontade divina ou das características pessoais dos agentes em questão,
9
AULA 1 • A Questão do Conhecimento
como até então se fazia, representou uma profunda ruptura nas formas de interpretação da
sociedade.
Saiba mais
Édipo Rei é uma peça de Sófocles – filósofo grego – e se trata da tragédia que se abate sobre a família de Édipo.
Segundo a lenda grega, Laio, o rei de Tebas havia sido alertado pelo Oráculo de
Delfos de que uma maldição iria se concretizar: seu próprio filho o mataria e que
este filho se casaria com a própria mãe.
Por tal motivo, ao nascer Édipo, Laio abandonou-o no Monte Citerão pregando um
prego em cada pé para tentar matá-lo. O menino foi recolhido mais tarde por um
pastor e batizado como “Edipodos”, o de “pés-furados”, que foi adotado depois pelo
rei de Corinto e voltou a Delfos.
Édipo consulta o Oráculo que lhe dá a mesma previsão dada a Laio, que mataria seu
pai e desposaria sua mãe. Achando se tratar de seus pais adotivos, foge de Corinto.
No caminho, Édipo encontrou um homem e sem saber que era seu pai o matou,
pois Laio o mandou sair de sua frente.
Depois de derrotar um homem casa-se com a sua mãe, não sabendo que era também a sua mãe biológica.
Após derrotar a Esfinge que aterrorizava Tebas, que lançara um desafio (“Qual é o animal que tem quatro patas de
manhã, duas ao meio-dia e três à noite?”), Édipo conseguiu desvendar, dizendo que era ele mesmo. “O amanhecer é
a criança engatinhando, entardecer é a fase adulta, em que usamos ambas as pernas, e o anoitecer é a velhice em que
se usa a bengala.”
Conseguindo derrotar o monstro, ele seguiu a sua cidade natural e casou-se, “por acaso”, (já que ele pensava que
aqueles que o haviam criado eram seus pais biológicos) com sua mãe, com quem teve quatro filhos. Quando da
consulta do oráculo, por ocasião de uma peste, Jocasta e Édipo descobrem que são mãe e filho, ela comete suicídio e
ele fura os próprios olhos por ter estado cego e não ter reconhecido a própria mãe.
Fonte https://pt.wikipedia.org/wiki/edipo_Rei
Sobre a imagem Édipo e a esfinge (Oedipus et Sphinx), 1808, pintura de Jean Auguste Dominique Ingres; Paris, França
Até esse momento em que se constitui o pensamento sociológico, como veremos, as interpretações
míticas e transcendentais tinham pleno sucesso, uma vez que viam nos fenômenos sociais e nas
calamidades públicas formas de castigo divino. Mesmo os gregos – que já buscavam analisar as
possíveis causas e relações entre as coisas – tendiam a interpretar questões sociais, ao menos em
suas tragédias, como resultantes dos desígnios dos deuses. Quem não se lembra de Édipo Rei,
Sófocles, o autor da tragédia atribui a peste de Tebas ao desonroso casamento de Jocasta com
seu próprio filho, Édipo. Na idade Média, as pestes também eram atribuídas ao pecado humano.
10
A Questão do Conhecimento • AULA 1
essa regularidade, empiricamente constatável, e até mensurável, pode ser expressa sob forma
de uma tendência que se manifesta no tempo e no espaço.
Esse tipo de conhecimento, também chamado de vulgar, é assistemático e ametódico, pois não
existe rigor ou critérios para observação de um fato, não se produz crítica sobre aquilo que se
vê ou se sente. O conhecimento de senso comum se contenta com as evidências imediatas, ele
parte do empirismo, isto é, da observação imediata de um fenômeno.
Por esse motivo o conhecimento de senso comum, muitas vezes é presa das aparências.
ARRUDA (2000)
Exemplo: Quando uma pessoa faz um bolo, segue a receita e incorpora uma série de informações
para o melhor sucesso do seu trabalho. Sabe que, ao bater as claras em neve, elas crescem e se
tornam esbranquiçadas; que não convém abrir o forno quando o bolo começa a assar, senão
ele murcha; que a medida adequada de fermento faz o bolo crescer. Se estiver fazendo pudim
em banho-maria, sabe que uma fatia de limão na água evita o escurecimento da vasilha, o que
facilitará seu trabalho posterior de limpeza. Essa pessoa sabe tudo isso, mas não conhece as
causas, não consegue explicar por que e como ocorrem esses fenômenos. (ARRUDA ARANHA;
PIRES, 2001)
11
AULA 1 • A Questão do Conhecimento
Sugestão de estudo
Sociologia no cinema
Uma ilustração interessante sobre a questão de ciência e senso comum pode ser vista no
filme O nome da Rosa, 1986, do diretor Jean-Jacques Annaud.
Veja também o filme Erin Brockovich – uma mulher de talento, de 2000, dirigido por
Steven Soderbergh e escrito por Susannah Grant.
Saiba mais
A revolução científica
No século XVII, uma parte da Europa, especialmente a Itália, foi palco de mudanças significativas
no modo de pensar. Isso naturalmente influenciou as questões da ciência e vice-versa. A gradativa
substituição de uma visão de mundo centrada nas doutrinas teológicas e religiosas pelo estudo
sistemático da natureza, que tivera origem no Renascimento, consolidava-se cada vez mais. Um
representante dessa atitude renascentista foi Leonardo da Vinci (1452-1519), que exerceu, ao
mesmo tempo, a engenharia, a arquitetura e a pintura, dentre outras atividades.
12
A Questão do Conhecimento • AULA 1
Da Vinci afirmava que “aqueles que se entregam à prática sem ciência são como o navegador que
embarca em um navio sem leme nem bússola”. Sempre a prática deve se fundamentar na boa
teoria. Antes de fazer de um caso uma regra geral, experimente-o duas ou três vezes e verifique
se as experiências produzem os mesmos efeitos. Não se pode considerar verdadeira ciência
nenhuma investigação humana se não passar por demonstrações matemáticas.
A semente dessa nova forma de conhecimento germinou e deu seus maiores frutos no século
XVII, quando explodiu a grande revolução galileana. Da vasta obra deixada pelo italiano Galileu
Galilei (1564-1642), o primeiro aspecto a destacar é a sua adesão ao modelo heliocêntrico.
Galileu seguiu o caminho que havia sido aberto pelo polonês Nicolau Copérnico (1473-1543),
acrescentando, porém, novos e decisivos argumentos a favor de um modelo cosmológico em que
o Sol se encontra no centro do sistema – em vez do modelo geocêntrico da doutrina aristotélica.
Pela primeira vez, na história da nossa civilização, foi usado um instrumento óptico para olhar
os céus: a luneta, que acabara de ser inventada pelos holandeses. Com esse instrumento, Galileu
descobriu que existiam corpos celestes girando em torno do planeta Júpiter.
Essa constatação contrariava o modelo geocêntrico, pois esse afirmava que todos os corpos
celestes giravam em torno da Terra. Galileu descobriu também que a Lua tinha crateras e relevo
análogos aos da Terra, também contrariando a tese de que haveria uma diferença essencial entre
os elementos da Terra e os celestes, presente na doutrina aristotélica.
O conhecimento científico
Embora desde a antiga Grécia, homens como Sócrates se preocupassem com a definição de
conceitos, na busca pela essência das coisas e Platão com seu empenho em mostrar o caminho
a ser seguido para ir da doxa (opinião) à episteme (ciência) tenham buscado um saber mais
rigoroso, o conhecimento científico é relativamente recente. Somente ao procurar o seu próprio
caminho, ou melhor, o seu método (já na Idade Moderna), a ciência se desvincula da Filosofia e
passa a determinar objetos específicos a serem apreendidos e controlados por meio do método
científico. Em vez de uma ciência, surgem, gradativamente, ciências particulares, com campos
mais ou menos delimitados de pesquisa. Esse avanço ocorreu a partir do século XVII e tem a
revolução galileana como um dos seus marcos.
13
AULA 1 • A Questão do Conhecimento
Cada ciência se torna, então, uma ciência particular, no sentido de ter um campo delimitado
de pesquisa e um método próprio. As ciências são particulares na medida em que cada uma
privilegia setores distintos da realidade; a física trata do movimento dos corpos; a química, da
sua transformação; a biologia, do ser vivo etc.
Saiba mais
Há especialistas que consideram além da Sociologia, da Antropologia e da Ciência Política outras áreas do
conhecimento, tais como Psicologia, a Etnologia, a Geografia Humana, a Economia, a Administração e as Ciências
Jurídicas.
Todavia, a designação usualmente mais aceita é aquela que reconhece apenas três disciplinas como parte
constitutiva desse campo científico.
Por outro lado, as ciências são também gerais, no sentido de que as conclusões não valem apenas
para os casos observados, e, sim, para todos os que a eles se assemelham. Ao afirmarmos que o
“peso de qualquer objeto depende do campo de gravitação” ou que “a cor de um objeto depende da
luz que ele reflete” ou, ainda, que “a água é uma substância composta de hidrogênio e oxigênio”,
fazemos afirmações que são válidas para todos os corpos, todos os objetos coloridos ou qualquer
porção de água, e não apenas para aqueles que foram objeto da experiência.
Enquanto o saber comum observa um fato a partir do conjunto dos dados sensíveis que
formam a nossa percepção imediata, pessoal e efêmera do mundo, o fato científico é um fato
abstrato, isolado do conjunto em que se encontra normalmente inserido e elevado a um grau
de generalidade: quando nos referimos à dilatação ou ao aquecimento como fatos científicos,
estamos muito distantes dos dados sensíveis de certo corpo em determinado momento. Além
disso, estabelecemos entre tais fatos uma relação de variação do tipo “função” (na qual o volume
é, em dado momento, função da temperatura). Isso supõe a capacidade de racionalização dos
dados recolhidos, e nunca aparecem como dados brutos, mas sempre passíveis de interpretação.
(COSTA, 1997).
14
A Questão do Conhecimento • AULA 1
Saiba mais
A bem da verdade, esta pergunta não é propriamente original ou exclusiva aos sociólogos. A novidade que a
Sociologia traz, no século XIX, é a tentativa de entender o social de maneira científica, segundo o modelo das ciências
da natureza e com igual objetivo: a partir do conhecimento científico da sociedade, os homens poderiam prever
e controlar os rumos da vida social, assim como a física e a química lhes havia permitido controlar as forças da
natureza.
(COSTA, 1997).
A Sociologia é uma das disciplinas constitutivas das assim chamadas Ciências Sociais. Dentro
deste campo científico podemos destacar ainda a Antropologia e a Ciência Política*.
Atenção
Antropologia: estuda as diferentes culturas do homem, os diversos grupos sociais, culturais ou étnicos e as
transformações ocorridas em função da interação entre os grupos.
Ciência política: estuda os sistemas de poder, as instituições e os partidos políticos de um país, o comportamento e
as políticas públicas em suas diversas fases (elaboração, implantação e avaliação).
Sociologia: investiga as relações sociais, as estruturas e a dinâmica das sociedades modernas, analisando os
processos históricos de transformação das organizações sociais.
Quanto à análise sociológica, pode-se dizer que esta envolve a tentativa de compreensão dos
processos de estruturação e relacionamento dos indivíduos entre si e com as sociedades.
Para isso, parte, geralmente, do conhecimento de coletividades com o objetivo de entender o
comportamento grupal e/ou individual. Seu foco está, em regra, na investigação das estruturas
da sociedade procurando compreender como estas influenciam os grupos ou indivíduos no que
se refere a seu comportamento, seus costumes e sua cultura.
15
AULA 1 • A Questão do Conhecimento
As Ciências Históricas e Humanas não são, portanto, como as Ciências Naturais. A diferença nas
condições de trabalho dos físicos e químicos e a dos sociólogos não é de grau, mas de natureza:
enquanto os primeiros trabalham em um ambiente em que há unanimidade nos juízos de valor
sobre a pesquisa e o conhecimento, os sociólogos enfrentam divergências de todo tipo.
Semelhanças e diferenças
Ciências Naturais: estudam fatos simples, eventos que presumivelmente têm causas simples e
são facilmente isoláveis. São fenômenos recorrentes e sincrônicos.
»» Tais fatos podem ser vistos, isolados e reproduzidos dentro de condições de controle
razoáveis, num laboratório.
Para refletir
Elabore uma lista de palavras e imagens que vêm à sua cabeça quando você pensa em Natural e no Social. Estipule
um período de 30 segundos para este brainstorm ou tempestade de ideias.
Ciências Sociais: estudam fenômenos complexos. Não será fácil investigar sua matéria-prima
por ser difícil isolar causas e motivações.
»» No âmbito das Ciências Sociais torna-se difícil desenvolver uma teoria capaz de transmitir
com precisão uma causa única ou motivação exclusiva;
16
A Questão do Conhecimento • AULA 1
»» Muitas vezes atitudes semelhantes têm significados diferentes. Cada cultura constrói
seu significado social. Os fatos estudados pelo cientista social podem ser reproduzidos
em situações muito distintas. Não podem ser reproduzidos em condições controladas.
Para refletir
Não será fácil isolar as causas ou motivos das ações! Vejamos um exemplo simples do nosso cotidiano:
Compare
Ciências Naturais Ciências Sociais
»» Os fenômenos podem ser percebidos, divididos, »» Os fenômenos são complexos.
classificados e explicados dentro de condições de
»» As percepções são variadas, porquanto históricas.
relativo controle e em condições de laboratório.
»» Corre-se o risco de simplificar demais as situações.
»» Alcança-se a objetividade científica.
»» O resultado prático é visto em livros, romances, arte, teatro,
»» As descobertas possibilitam o desenvolvimento
novelas, em que tais ideias podem ser aplicadas para produzir
de novas tecnologias.
modificações no comportamento das pessoas – nos sistemas
de valores.
Reproduzível Irreproduzível
»» Os fatos naturais são reproduzíveis em condições »» Os fatos sociais são irreproduzíveis em condições controladas
controladas. e, por isso, quase sempre fazem parte do passado. São eventos,
a rigor, históricos e apresentados de modo descritivo e
narrativo, nunca na forma de uma experiência.
»» As reproduções dos fatos sociais são sempre parciais!
Atenção
Uma mesma experiência poderá ser repetida e observada por dois cientistas em locais distintos
Nas Ciências Sociais trabalhamos com fenômenos que estão bem perto de nós. Nas Ciências
Naturais há uma distância irremediável. Um exemplo claro disso é o fato de que o cientista não
sabe o que sentem as baleias ou as aves, quando realiza seus estudos.
As teorias descobertas poderão ser usadas para alterar a vida das baleias, mas nunca usadas
diretamente pelas baleias. Por isso são considerados conhecimentos objetivos, externos,
independentes de baleias, aves e investigadores.
17
AULA 1 • A Questão do Conhecimento
Nas Ciências Sociais temos um tipo de interação complexa entre o investigador e o investigado.
Ambos compartilham de um mesmo universo de experiências humanas, ainda que seus
significados possam vir a ser diferentes para ambos.
Os homens se separam pela organização de suas experiências, sua história, pelo modo como
classificam suas realidades internas e externas.
Nesse âmbito, percebemos que podemos adotar costumes de outros povos, aprender seus credos,
modificar nossas leis inspiradas. Podemos assimilar um costume diferente do nosso, ou, até
mesmo, perceber o melhor de nossas tradições quando estamos em contato com outras culturas.
Para refletir
Podemos reproduzir: época da Proclamação da República, a época dos descobrimentos, o nosso último aniversário?
Não será possível reproduzir o clima daquele momento, a atmosfera da época. Estaremos criando outro significado.
Como observar funerais, aniversários, rituais de iniciação, trocas comerciais, proclamações de leis, revoluções,
perseguições etc.?
Ao observar tais fenômenos temos que enfrentar nossa própria posição, nossos valores, nossa visão de mundo que
interfere na nossa pesquisa. Nossa fala, nossos gestos, nosso modo de ser e de agir revela o tipo de socialização que
tivemos e influencia em nossa visão de mundo.
Saiba mais
Quando investigo um objeto das Ciências Sociais, abro o meu ser para uma relativização dos meus parâmetros
epistemológicos. Nasce um debate inovador, numa relação dialética entre investigador e investigado. Trata-se de uma
avenida de mão dupla.
Sintetizando
»» Senso comum: chama-se senso comum o conhecimento espontâneo, o saber resultante das experiências
cotidianas do homem no enfrentamento dos obstáculos do dia a dia. Fazem parte desse conhecimento, o acúmulo
de experiências dos homens, suas tradições, crenças, o aprendizado espontâneo.
18
A Questão do Conhecimento • AULA 1
»» Conhecimento científico: o conhecimento científico é relativamente recente. Somente ao procurar o seu próprio
caminho, o seu método (já na Idade Moderna), a ciência se desvincula da Filosofia e passa a determinar objetos
específicos a serem apreendidos e controlados com esse método.
»» Senso comum é o conhecimento de todos nós, homens comuns, não especialistas. Trata-se de um conhecimento
espontâneo, um saber resultante das experiências de vida. Suas principais características são: ametódico,
assistemático, fragmentação e empirismo.
»» O conhecimento científico é conquista recente da humanidade, surgiu no século XVII, com a revolução de Galileu
Galilei. Utiliza métodos rigorosos para a produção de um saber sistemático, preciso e objetivo. Busca-se um saber
que possa descobrir as relações necessárias e universais entre os fenômenos.
»» As ciências são gerais apenas no sentido de que suas conclusões valem para todos os casos similares.
»» O conhecimento científico precisa do processo de racionalização dos dados recolhidos. Suas conclusões aspiram à
objetividade. Isso significa dizer que podem ser observadas por qualquer outro cientista.
»» Os fenômenos podem ser percebidos, divididos, classificados e explicados dentro de condições de relativo controle
e em condições de laboratório.
»» O resultado prático é visto em livros, romances, arte, teatro, novelas, em que tais ideias podem ser aplicadas para
produzir modificações no comportamento das pessoas – nos sistemas de valores.
»» Os fatos sociais são irreproduzíveis em condições controladas e, por isso, quase sempre fazem parte do passado.
São eventos, a rigor, históricos e apresentados de modo descritivo e narrativo, nunca na forma de uma experiência.
19
Aula
A Sociologia como Ciência: uma
Perspectiva Histórico - Crítica 2
Apresentação
Na aula anterior vimos as diferenças que marcam o campo das Ciências Naturais e das Ciências
Sociais. Salientamos, sobretudo a especificidade da ciência que tem por objetivo estudar a
sociedade. Agora, apresentaremos o contexto histórico da Europa, na segunda metade do século
XIX – época na qual se deu o surgimento da Sociologia como ciência independente. Pretende-
se, assim, que possamos compreender os processos que conduziram à formação da corrente
positivista: a primeira forma de pensamento social.
Objetivos
Esperamos que, após o estudo do conteúdo desta aula, você seja capaz de:
20
A Sociologia como Ciência: uma Perspectiva Histórico-Crítica • AULA 2
De fato, as revoluções trazem grandes transformações e com a Revolução Industrial não poderia
ter sido diferente. Tais transformações já se fizeram presentes na transição do feudalismo para
o capitalismo.
Sugestão de estudo
McNeill,
William H.
In: Oliveira, Nilson Vieira (Organizador). Insegurança pública. São Paulo: Nova Alexandria, 2002, pp. 11-31.
Zaluar, Alba. Violência: questão social ou institucional? In: Ibid., pp. 75-85.
Por meio dos cercamentos, os proprietários reuniam lotes de campos abertos ou de terras
comunais em unidades compactas, separadas por cercas vivas ou estacas, surgindo, assim, a
exploração capitalista da terra. As terras cercadas foram transformadas em pastos de ovelhas,
que passaram a atender à demanda da manufatura têxtil. Os camponeses foram expulsos das
suas terras, formando um grande número de desempregados que nada possuía de seu além da
força de trabalho.
Os cercamentos foram acompanhados por várias leis visando, antes de tudo, controlar a mão
de obra, o número de desempregados ou desocupados e, na visão inglesa, evitar a desordem.
Atenção
»» 1601 – Lei dos Pobres: segundo essa lei, o aumento de desocupados e mendigos resultava de uma indisposição
para o trabalho. Por isso, punia a vagabundagem com o chicote e a marca de ferro em brasa. Caso o indivíduo
reincidisse, seria aplicada a pena capital.
»» 1662 – Lei de Domicílio: visava impedir que os pobres se transferissem de uma paróquia para outra e autorizava a
expulsão dos não residentes naquela paróquia. Isso confinou os trabalhadores e evitou a locomoção. Somente em
1795 uma nova lei retirou das autoridades locais o direito de expulsar os não domiciliados na paróquia.
»» 1795 – Lei Speehamland: estabelecia que todos os homens tinham o direito a uma renda mínima. Caso o
trabalhador obtivesse pelo seu trabalho uma renda inferior à mínima, cabia à sociedade pagar a diferença. Essa lei
favorecia manufatureiros e fazendeiros, que lucravam pagando salários inferiores à renda mínima estabelecida,
enquanto os contribuintes arcavam com o prejuízo.
»» 1760 a 1840: os cercamentos passaram a ser regulamentados por leis instituídas pelo Parlamento inglês.
21
AULA 2 • A Sociologia como Ciência: uma Perspectiva Histórico-Crítica
»» Em 1801, a Inglaterra possuía apenas 15 cidades com mais de 20.000 habitantes. Esse
número praticamente dobrou em 1851, passando para 28 o número de cidades com
população superior a 20.000, e em 1891 esse número cresceu para 63 (BRIGS, 1998, p. 204).
»» Oxford cresceu de 12.000 habitantes, em 1801, para 28.000, em 1851 (BRIGS, 1998, p. 204).
»» York, grande centro ferroviário, cresceu de 17.000 habitantes, em 1801, para 36.000, em
1851 (BRIGS, 1998, p. 204).
Sugestão de estudo
BRESCIANI, Maria Stella Martins. Londres e Paris no século XIX. São Paulo: Brasiliense, 1989, p. 25.
O inchamento das cidades transformou o cenário urbano e, como vimos anteriormente, pobreza
e riqueza passaram a conviver lado a lado.
22
A Sociologia como Ciência: uma Perspectiva Histórico-Crítica • AULA 2
Londres e outros centros urbanos da Europa cresceram em função da indústria. Paris, por
exemplo, na metade do século XIX, era formada por uma multidão de trabalhadores que desde
a madrugada circulava pela cidade esfregando os olhos e empurrando suas ferramentas. À
noite saíam as prostitutas, os jogadores, os ladrões e todas as pessoas de passos abafados que
fervilhavam pelos becos e ruas de Paris (BRESCIANI, 1989, pp. 12-13).
Como consequência dessa alteração urbana, a literatura registrou grandes crimes, como Os
crimes da rua Morgue, de Edgar Alan Poe, ou os famosos casos do detetive Sherlock Holmes, de
Conan Doyle. Também nessa época surgem nomes como o de Jack, o estripador, e casos que se
tornaram lendários, como o do barbeiro de Londres. A criminalidade estava diretamente ligada
ao aumento populacional, à pobreza, à busca de vida melhor, à cobrança do direito de cidadania,
enfim, a diversos fatores combinados.
O desenvolvimento industrial se fez acompanhar pelo desenvolvimento científico, que, por sua
vez, impulsionou ainda mais a indústria em função de descobertas e invenções. Nos centros
urbanos europeus respirava-se desenvolvimento e acreditava-se que a tecnologia e a máquina
resolveriam todos os problemas do homem. A indústria cresceu e, com esse crescimento, vieram
as crises de produção porque a superprodução não era acompanhada pelo consumo. A solução
para a crise de consumo foi encontrada no neocolonialismo, ou imperialismo do século XIX.
O período entre 1875 e 1914 pode ser identificado como Saiba mais
a Era dos Impérios, não só porque criou um novo tipo
de imperialismo, mas também pelo grande número de HOBSBAWM, Eric. A era dos impérios: 1875-
1914. Rio de Janeiro: Paz e Terra, 1988.
governantes que se intitulavam imperadores.
23
AULA 2 • A Sociologia como Ciência: uma Perspectiva Histórico-Crítica
Escondendo os interesses econômicos das nações europeias ou, se preferirmos, como justificativa
humanitária para o colonialismo, estava a missão civilizadora do homem branco, por meio da
qual ele deveria levar a civilização aos povos não civilizados. Sobre isso, Rudyard Kipling, o poeta
inglês do colonialismo, escreveu:
A África e a Ásia foram o cenário onde atuaram uma infinidade de cientistas e religiosos que
assumiram o fardo do homem branco. Na Índia, por exemplo, qualquer membro da raça branca
era tido como membro da classe dos amos e senhores, respeitado e reverenciado. Situações
semelhantes fizeram o fundador da República do Quênia, na segunda metade do século XX,
referir-se, assim, à dominação imperialista:
Quando os brancos chegaram, nós tínhamos as terras e eles a Bíblia; depois eles
nos ensinaram a rezar; quando abrimos os olhos, nós tínhamos a Bíblia e eles
as terras.
Todas as tentativas de reação por parte das nações dominadas pelos impérios europeus foram
enfrentadas com o uso das armas por parte das nações europeias.
Nem a China ficou de fora da corrida imperialista: foi dominada economicamente e teve territórios
ocupados pelos japoneses.
A literatura também participou do processo, assaltada pelo cientificismo. Mais uma vez, a figura
de Sherlock Holmes se destaca. Porém, por outro lado, viu-se inundada de histórias de meninos
24
A Sociologia como Ciência: uma Perspectiva Histórico-Crítica • AULA 2
lobos, como Greystoke, a lenda de Tarzan. Outras obras características da época são as de Júlio
Verne (Vinte mil léguas submarinas, Viagem ao centro da terra, 80 dias em um balão), ou, ainda,
Frankenstein, de Mary Shelley, ou Dr. Jekyll & Mr. Hyde, um clássico dos clássicos de horror e
mistério, de Robert Louis Stevenson.
O cientificismo esteve presente em tudo. Foi também nessa época que se desenvolveu a teoria de
Charles Darwin sobre a evolução e adaptação das espécies. O autor colocou em xeque as ideias da
imutabilidade das espécies. Assim, a formação dos sistemas vivos começou a ser entendida não
como criação simultânea, mas como decorrência de etapas sucessivas. Na sua obra A origem das
espécies, publicada em 1859, em consonância com o espírito da época, Darwin defendeu a noção
de variação gradual dos seres vivos graças ao acúmulo de modificações pequenas, sucessivas e
favoráveis, e não por modificações extraordinárias, surgidas repentinamente. Nessa obra Darwin
apresentou o núcleo da sua concepção evolutiva: a seleção natural, ou a persistência do mais
capaz; com o passar dos séculos, a seleção natural eliminaria as espécies antigas e produziria
novas espécies.
Logo as teses de Darwin estavam sendo discutidas em todo o meio científico e o próprio liberalismo
econômico adotou o pressuposto da competição. Ao defender a propriedade privada, o liberalismo
postula que todo homem compete em igualdade no acesso à propriedade privada. Aquele que
não a conquista, não o faz porque é vicioso ou preguiçoso. É claro que essa tese, presente em
nossas mentes até hoje, interessava e interessa à manutenção do domínio da classe burguesa.
Isso será discutido mais adiante.
Saiba mais
Segundo o Darwinismo Social, as sociedades se modificam e se desenvolvem como os seres vivos. As transformações
nas sociedades representam a passagem de um estágio inferior para outro superior, em que o organismo social
se mostra mais evoluído, adaptado e complexo. Se na natureza a competição gera a sobrevivência do mais forte,
também na sociedade favorece a sobrevivência de sociedades e indivíduos mais fortes e evoluídos. A expressões: luta
pela existência e sobrevivência do mais capaz, tomadas de Darwin, apoiaram o individualismo liberal e justificaram o
lugar ocupado pelos bem-sucedidos nos negócios. Por outro lado, as sociedades foram divididas em raças superiores
e inferiores, cabendo aos mais fortes dominar os mais fracos e, consequentemente, aos mais desenvolvidos levar
o desenvolvimento aos não desenvolvidos. A civilização deveria ser levada a todos os homens. É claro que o
Darwinismo Social serviu para justificar a ação imperialista das nações europeias.
Foi nesse cenário de constantes conflitos sociais, políticos, econômicos e religiosos, cenário
marcado pela industrialização, pelo cientificismo e pela luta de classes, que nasceu a Sociologia.
25
AULA 2 • A Sociologia como Ciência: uma Perspectiva Histórico-Crítica
este o primeiro a usar o termo Sociologia e a identificá-la como ciência independente e, mais
do que isso, como a mais importante das ciências.
Observemos que Comte nasceu apenas um ano antes da ascensão de Napoleão ao Consulado e
a primeira etapa da sua trajetória educacional foi feita durante o Período Napoleônico, fase em
que se deu o grande desenvolvimento social e industrial da França. Em 1816 – quando Napoleão
já estava exilado definitivamente em Santa Helena, os ventos do Congresso de Viena queriam
trazer a Europa à condição que possuía antes da Revolução Francesa e os levantes liberais se
espalharam pela Europa – é que Comte se transferiu para Paris onde, sem sombra de dúvidas,
foi influenciado por todo esse processo, tanto que foi afastado da Escola Politécnica, juntamente
com alguns amigos, acusado de agitação. A seguir, tornou-se assistente de Casimir Périer e depois,
entre 1817-1824, de Saint-Simon, com quem declarou ter aprendido uma multidão de coisas que
em vão procurara nos livros.
Sugestão de estudo
LALLEMENT,
Michel. História das idéias sociológicas. Das origens a Max Weber. Petrópolis: Vozes, 2003.
Em 1824 veio o rompimento com Saint-Simon, motivado por questões de autoria legítima de
ensaios que Comte devia publicar. A solução, que Comte considerou injusta, foi que cem cópias
do trabalho saíram sob o nome de Comte, enquanto mil cópias, intituladas Catéchisme des
industriels, indicavam a autoria de Henri de Saint-Simon. Outra causa do rompimento foi o
fato de Comte desdenhar a ideia de um paradigma religioso no projeto de Saint-Simon. Mesmo
assim, posteriormente, ao criar a Religião Positiva, o próprio Comte adotou para si essa ideia,
proclamando-se Sumo Sacerdote da Humanidade.
26
A Sociologia como Ciência: uma Perspectiva Histórico-Crítica • AULA 2
Comte cunhou o termo Sociologia. A princípio, quis chamar essa disciplina de física social, a
fim de enfatizar que ela estudaria a natureza fundamental do universo social; porém, por não
acreditar na aplicação das probabilidades no campo dos fenômenos sociais, cunhou o termo
Sociologia a partir de dois termos: Socio, do latim socius, que significa associado ou sócio, e
logia, do grego log+ia, significando discurso científico. O termo apareceu pela primeira vez na
lição número 47 do Curso de Filosofia Positiva.
Na visão de Comte, a Sociologia devia ser uma disciplina dedicada ao estudo da sociedade, por
isso as velhas disciplinas acadêmicas, como a Teologia, a Ética e o Direito, sentiram-se ameaçadas.
Por isso Comte preocupou-se em demonstrar a importância da Sociologia e o seu direito de ser
reconhecida como ciência.
Comte estabeleceu uma hierarquia das ciências, ordenando-as de acordo com a sua complexidade
e o seu movimento no Estado Positivo; assim, partindo da menos complexa para a mais complexa,
estabeleceu a seguinte classificação (2000, pp. 206-208):
»» Biologia: ocupa-se dos fenômenos vitais, nos quais a matéria bruta é enriquecida pela
organização;
Isto porque:
»» A Sociologia é entendida por Comte incluindo uma parte essencial da Psicologia, toda
a Economia Política, a Ética e a Filosofia da História.
27
AULA 2 • A Sociologia como Ciência: uma Perspectiva Histórico-Crítica
Naquele momento histórico, o problema central da Sociologia era o que fora articulado pelos
pensadores no Iluminismo, ou seja, como a sociedade deve ser mantida unida, mesmo quando
se torna maior, mais complexa, mais variada e mais diferenciada.
Comte acreditava necessário estabelecer consensus universalis para dar à sociedade moralidade
universal. Por isso, para resolver a crise social – que, como vimos, se fazia presente na França e
em toda a Europa do seu tempo – Comte não propunha a atividade revolucionária, mas, sim,
uma nova ordem social, com base na Filosofia Positiva. No seu pensar, combinando Ordem e
Progresso o Positivismo superaria a teologia e a revolução. Por isso identificou dois movimentos
na sociedade: a Estática Social e Dinâmica Social.
Estática social
»» As condições constantes da Sociedade. Esta corresponde à Ordem. É responsável pela
preservação dos elementos permanentes da ordem social: religião, família, linguagem,
acordo entre o poder espiritual e o temporal etc.;
Dinâmica social
»» Corresponde às leis do progressivo desenvolvimento social: ao Progresso;
28
A Sociologia como Ciência: uma Perspectiva Histórico-Crítica • AULA 2
Para refletir
Um exemplo da aplicação desses conceitos pode ser encontrado na destruição do Arraial do Bom Jesus – Canudos –
no sertão da Bahia.
Canudos era visto como um movimento que tirava dos coronéis a mão de obra quase gratuita do sertanejo.
O movimento não pagava impostos à República e interferia na vida religiosa, já que o arraial não precisava de padres,
mas possuía uma igreja. Alguns religiosos visitaram Canudos e nada encontraram que atacasse a Igreja Católica;
mesmo assim, esta se sentia afetada. Logo, Canudos interferia na Ordem da República e, por isso, visando garantir
o progresso na chamada República Velha, durante o governo de Prudente de Morais, cinco mil soldados atacaram e
destruíram o Arraial.
Outro elemento essencial do pensamento de Auguste Comte é a Lei dos Três Estados.
O estado teológico
»» Fetichismo: uma vida espiritual semelhante à do homem é atribuída aos seres naturais.
Esta fase corresponde à etapa em que o homem constrói totens, cultua a lua, o sol, as
estrelas, as árvores, os seres da natureza em geral;
29
AULA 2 • A Sociologia como Ciência: uma Perspectiva Histórico-Crítica
»» Politeísmo: esvazia os seres naturais de suas vidas anímicas e atribui a animação desses
seres a outros seres, invisíveis e habitantes de um mundo superior. Neste estado, o deus
sol – por exemplo – ganha personalidade distinta, como no Egito, e se torna Amon-Rá,
Aton etc.
Saiba mais
Para Augusto Comte existem o Politeísmo Conservador ou Sacerdotal, de característica intelectual, que se manifestou
principalmente na elaboração grega entre os séculos XIII a.C. e I d.C., e o Politeísmo Progressivo ou Militar, de
característica social, que se apresentou na Civilização Romana entre os séculos VIII a.C. e III d.C. (COMTE, 1957, pp.
76-77)
Augusto Comte acreditava que “a maioria da nossa espécie não saiu ainda de semelhante estado, que persiste hoje na
mais numerosa das três raças humanas, no escore da raça negra e na parte menos avançada da branca.” (COMTE)
Sugestão de estudo
COMTE, Augusto. Discurso sobre o espírito positivo. Edição eletrônica: Ed. Ridendo Castigat Mores. Disponível em:
www.jahr.org. Acesso em: 6/1/2005.
Pode-se, assim, desde logo, demonstrar em toda a sua plenitude como o espírito
teológico foi por muito tempo indispensável à constante combinação das ideias morais
e políticas, ainda mais especialmente do que a de todas as outras, não só em virtude
de sua complicação superior, mas, também, porque os fenômenos correspondentes,
primitivamente muito pouco pronunciados, só podiam adquirir um desenvolvimento
característico após o avanço muito prolongado da civilização humana.
(COMTE, 2005)
Saiba mais
Surge um deus apresentado acima de todos os deuses e criador de todas as coisas, porém distante no homem, no
mais alto dos céus.
Segundo Augusto Comte a etapa Monoteísta corresponde à civilização católica feudal, situada entre os séculos V e
XIII d.C., quando se dá a transição para o Pensamento Metafísico.
O estado metafísico
»» Caracteriza-se pela dissolução do Estado Teológico;
»» Nele a argumentação, penetrando nos domínios das ideias teológicas, traz à luz as suas
contradições inerentes;
30
A Sociologia como Ciência: uma Perspectiva Histórico-Crítica • AULA 2
Saiba mais
Para Augusto Comte esta é a fase da transição ocidental, estendendo-se desde o século XIV, ou seja, da fase de
transição feudo-capitalista, e passando pelos descobrimentos e pela Revolução Científica dos séculos XVII e XVIII
(COMTE, 1957, pp. 76-77).
Por isso, na esfera política, o espírito metafísico corresponde à substituição dos reis pelos juristas; supondo-se a
sociedade como originária de um contrato, a tendência é basear o Estado na soberania do povo.
O estado positivo
»» Caracteriza-se pela subordinação da imaginação e da argumentação à observação;
»» A visão positiva dos fatos abandona a consideração das causas dos fenômenos
(procedimento teológico ou metafísico) e torna-se pesquisa de suas leis, entendidas
como relações constantes entre fenômenos observáveis;
Saiba mais
Para Comte, a sociedade só poderia ser reorganizada por meio da completa reforma intelectual do homem. Para
tanto, era necessário fornecer aos homens novos hábitos, de acordo com as ciências do seu tempo.
31
AULA 2 • A Sociologia como Ciência: uma Perspectiva Histórico-Crítica
dos fenômenos realizados não poderia bastar para nos permitir modificar a sua
realização, se não nos levasse a podê-lo convenientemente. Assim, o verdadeiro
espírito positivo consiste sobretudo a ver para prever, a estudar o que é, a fim
de concluir daí o que será, segundo o dogma geral da invariabilidade das leis
naturais. (COMTE, 1972, p. 237, apud LALLEMENT, 2003, p. 74)
O Positivismo procurava resolver os conflitos sociais por meio da exaltação à coesão, à harmonia
natural entre os indivíduos e ao bem-estar do todo social. Por isso representou uma ação política
conservadora que justificava as relações desiguais entre as sociedades. Por outro lado, o Positivismo
também representou um esforço concreto de análise científica da sociedade, partindo dele as
primeiras formulações objetivas sobre a sociabilidade humana, abrindo as portas para uma nova
concepção da realidade social com suas especificidades e regras.
Por fim, devemos verificar que para Comte a história não é pensada como um vir a ser, mas
como uma sequência congelada de Estados definitivos; e a evolução é a realização, no tempo,
daquilo que já existia em forma embrionária e que se desenvolve até alcançar o seu ponto final.
O seu conceito de ciência é o saber acabado, que se mostra sob a forma de resultados e receitas.
Saiba mais
Por darwinismo social entende-se a transposição das ideias de Darwin, em especial a da “sobrevivência dos mais
aptos” do campo das Ciências Naturais para o das explicações acerca da vida social e da História da Humanidade.
Esse conceito é muito usado no contexto da competição entre os indivíduos no capitalismo, mas motivou, de
forma similar, o racismo, o imperialismo, o nazismo etc., etnias nacionais. O termo foi popularizado em 1944 pelo
historiador americano Richard Hofstadter.
As ideias positivistas justificaram o avanço imperialista europeu sobre a África e a Ásia, porém o
Positivismo não foi capaz de resolver a crise daquela sociedade europeia, na qual nem todas as
32
A Sociologia como Ciência: uma Perspectiva Histórico-Crítica • AULA 2
pessoas participavam da sociedade positiva nem usufruíam dos seus benefícios, já que a riqueza
de poucos convivia com a pobreza de muitos e essa maioria também não tinha acesso aos bens
culturais, educacionais etc.
O pensamento positivista não se resumiu a Augusto Comte. O seu desenvolvimento teve variantes
como a de Émile Durkheim, também na França. E o ideal positivista de ciência permeou todo
o pensamento social, político, jurídico, econômico, educacional, histórico e literário do século
XIX e de uma boa parcela do século XX.
A Filosofia positivista de Comte tornou-se uma das mais importantes influências na intelectualidade
brasileira. A doutrina comtiana foi introduzida aqui por volta de 1850, trazida por estudantes
brasileiros que tinham tido contato com as ideias positivistas na França e foi facilmente absorvida
por intelectuais daqui que buscavam reagir à inscrição confessional católica, vigente no país
daquela época. (SÊGA, 2004)
Sugestão de estudo
Faça a leitura do texto Positivismo: uma primeira forma de pensamento social, de Cristina Costa, que está na
página 155.
A doutrina positivista, em sua fase científica ganha relevo no Brasil a partir dos debates realizados
no Colégio Militar e depois se dissemina pelos ambientes de outras escolas, dentre elas o Colégio
Pedro II.
Essas reflexões, feitas no interior das escolas militares da cidade do Rio de Janeiro possibilita
que se comece a pensar a educação brasileira como um projeto para alcançar grande parte da
população brasileira.
33
AULA 2 • A Sociologia como Ciência: uma Perspectiva Histórico-Crítica
Benjamim Constant promoveu a adoção do pensamento positivista como base para o programa
de estudo das escolas oficiais. Em 1880, foi fundado um Instituto do Apostolado, e no ano seguinte
era inaugurado no Rio de Janeiro um templo positivista para celebrar o culto da humanidade.
A divisa “Ordem e Progresso” figura no pavilhão brasileiro, cujo verde é, também, a cor das
bandeiras positivas.
Sintetizando
»» Vários pensadores sociais irão procurar refletir sobre as alterações na realidade social, entre eles Saint-Simon e
Auguste Comte.
»» Auguste Comte (1748-1857) foi um desses filósofos sociais, sistematizando a primeira corrente teórica do
pensamento sociológico: o Positivismo. Essa corrente teórica foi a primeira a definir precisamente o objeto, a
estabelecer conceitos e uma metodologia de investigação.
»» O Positivismo caracteriza-se pela suposição de que o saber passa por três estágios: teológico, metafísico, positivo.
»» A visão que Comte tinha da Sociologia correspondia ao modelo da física. Por isso as características de uma ciência
assim compreendida a fundamentação na pesquisa empírica e a formulação e leis universalmente válidas.
»» Para reformar a sociedade, Comte propôs: (a) Reconhecer a existência de princípios reguladores; (b) Estudar os
processos e estrutura social; (c) Reconhecer a existência de dois movimentos: estático (fator de permanência e
harmonia) e dinâmico (fator de progresso).
34
A Sociologia como Ciência: uma Perspectiva Histórico-Crítica • AULA 2
»» O Positivismo foi uma diretriz filosófica criada por Augusto Comte na segunda metade do século XIX, que refletiu o
entusiasmo burguês pela consolidação capitalista, por meio do desenvolvimento industrial e científico.
»» O tema central da obra de Augusto Comte é a Lei dos Três Estados, em que ele divide a evolução histórica e cultural
da humanidade em três fases, de acordo com seu desenvolvimento; a classificação e a hierarquização das ciências,
da mais simples à mais complexa, já que para ele a ordem é necessária ao progresso; e a reforma da sociedade,
com mudanças intelectuais, morais e políticas destinadas principalmente a restabelecer a ordem na sociedade
capitalista industrial; (COTRIM, 1997).
»» Os traços mais marcantes do Positivismo são certamente a excessiva valorização das ciências e dos métodos
científicos, a exaltação do homem e suas capacidades e o otimismo em relação ao desenvolvimento e progresso da
humanidade; (THE NEW GROLIER MULTIMEDIA ENCYCLOPEDIA, 2000).
»» Essa corrente filosófica foi muito influente no pensamento da época. Prova disso é o lema da bandeira brasileira
– Ordem e Progresso –, um dos principais preceitos do Positivismo, que afirma que, para que haja progresso, é
preciso que a sociedade esteja organizada.
Saiba mais
Para relação com darwinismo social, veja Gattaca – Título Nacional: Gattaca – Experiência
Genética.
Elenco Principal: Ethan Hawke, Uma Thurman e Jude Law, Gênero: Ficção –
35
Aula
A Educação como Fenômeno
Social e Objeto de Estudo da
Sociologia 3
Apresentação
Objetivos
Esperamos que, após o estudo do conteúdo desta aula, você seja capaz de:
A Escola como instituição sempre mereceu atenção especial dos estudos sociológicos. Nesse
sentido, tem-se como pressuposto fundamental que ela seja um espaço de sociabilidade, no qual
as relações sociais se caracterizam por práticas que afirmam valores educacionais e constroem
identidades, em que, sobretudo, também se elaboram e (re)elaboram-se papéis sociais.
O ser humano, ao nascer, necessita de outras pessoas para a sua sobrevivência, no mínimo de
mais uma pessoa, o que já faz dele membro de um grupo. Por isso, podemos dizer que desde o
primeiro momento de vida o indivíduo está inserido em um contexto histórico, pois as relações
entre o adulto e a criança recém-nascida seguem um modelo ou padrão de cada sociedade,
modelo que ela veio desenvolvendo com o passar dos tempos e que considera correta.
36
A Educação como Fenômeno Social e Objeto de Estudo da Sociologia • AULA 3
Diversos autores (TURA, 2001; SILVA, 2003; SOUZA, 2003) discutem o papel da Sociologia da
Educação para uma compreensão crítica da realidade social, política, econômica e cultura na
qual a escola e a educação estão inseridas e contribui para uma formação de educadores com
uma visão crítica que possa formar indivíduos para compreenderem e transformarem a realidade
em que vivem.
A educação entendida como uma prática social que busca formar indivíduos para a vida em
sociedade deve proporcionar uma visão que lhes permita uma compreensão da sociedade em
todas as suas dimensões. Para tanto, se torna necessário um currículo que em seus conteúdos e
em suas práticas possibilite uma problematização e reflexão crítica das relações sociais, relações
de poder existentes na sociedade, pois, como discute Bernstein, citado por Forquin (1993, p.
85): o modo como uma sociedade seleciona, classifica, distribui, transmite e avalia os saberes
destinados ao ensino reflete a distribuição do poder em seu interior e a maneira pela qual aí se
encontra assegurado o controle social dos comportamentos individuais, pois, como nos ensina
Foucault:
Saiba mais
Michel Foucault – França – (1926-1984) foi um filósofo, historiador das ideias, teórico social, filólogo
e crítico literário. Suas teorias abordam a relação entre poder e conhecimento e como eles são usados
como uma forma de controle social por meio de instituições sociais. Embora muitas vezes seja citado
como um pós-estruturalista e pós-modernista, Foucault acabou rejeitando essas etiquetas,
preferindo classificar seu pensamento como uma história crítica da modernidade. Seu pensamento
foi muito influente tanto para grupos acadêmicos, quanto para ativistas.
Fonte: https://pt.wikipedia.org/wiki/Michel_Foucault
37
AULA 3 • A Educação como Fenômeno Social e Objeto de Estudo da Sociologia
Nesse arcabouço explicativo a Educação ocupa lugar central como um fato social, que contribui
para a “socialização metódica das novas gerações” (DURKHEIM, 1987, p. 41) e para integrar os
indivíduos na sociedade em que estão inseridos, disseminando a consciência coletiva. Vendo a
Educação com duplo aspecto, uno e múltiplo, como seus constituintes básicos Durkheim (1967,
p. 40) aponta suas principais funções:
Suscitar na criança: 1) certo número de estados físicos e mentais, que a sociedade a que pertença
considere como indispensáveis a todos os seus membros; 2) certos estados físicos e mentais, que
o grupo social particular (casta, classe família, profissão) considere igualmente indispensáveis
a todos quantos o formem.
38
A Educação como Fenômeno Social e Objeto de Estudo da Sociologia • AULA 3
Ao tratar das relações entre o educador e a criança submetida à sua influência, Durkheim (1967, p.
5.354) defende que a criança fique “por condição natural, em estado de passividade” e o educador
assume uma posição de superioridade advinda da sua experiência, sua cultura e da moral que
ele encarna. Assim, a ação educativa é entendida como um trabalho de autoridade. A autoridade
é o meio essencial da ação educativa. “A autoridade moral é a qualidade essencial do educador”.
Saiba mais
Considerado o principal idealizador das grandes mudanças que marcaram a educação brasileira no
século XX, Anísio Teixeira (1900-1971) foi pioneiro na implantação de escolas públicas de todos os
níveis, que refletiam seu objetivo de oferecer educação gratuita para todos. Como teórico da
Educação, Anísio não se preocupava em defender apenas suas ideias. Muitas delas eram inspiradas na
filosofia de John Dewey (1852-1952), de quem foi aluno ao fazer um curso de pós-graduação nos Estados Unidos.
Fonte: http://revistaescola.abril.com.br/formacao/anisio-teixeira
Prática docente denominada de bancária e enfaticamente criticada por Paulo Freire. As ideias
de Durkheim influenciaram vários autores destacando-se Fernando Azevedo e Anísio Teixeira
influentes educadores da Escola Nova.
Para Marx, a sociedade se estrutura por uma base constituída das forças produtivas e das relações de
produção, donde se originam as ideias, a política, a religião, o Direito e a Filosofia, que constituem
a superestrutura. As relações de produção classistas são conflitivas e contraditórias provocando
constantemente crises que não encontram solução nos marcos da sociedade burguesa. Assim, ele
defende uma revolução liderada pelas classes trabalhadoras para superar essa sociedade classista
39
AULA 3 • A Educação como Fenômeno Social e Objeto de Estudo da Sociologia
e a criação de uma sociedade em que não mais existiria a exploração do homem pelo homem,
culminando numa sociedade comunista, na qual os meios de produção seriam coletivizados.
Marx não se deteve numa discussão sobre a Educação, sua teoria se concentrou na análise
econômica, sociológica, histórica e filosófica, da sociedade capitalista, mas o desdobramento
de suas análises das relações de poder inerentes às relações classistas produziu contribuições
importantes para a compreensão da escola e da ação educativa.
Antonio Gramsci, outro autor que bebeu da fonte sociológica marxista e desenvolveu sua
análise social e educacional, partindo do pressuposto da existência de uma sociedade
conflituosa e contraditória, baseada em princípios capitalistas de exploração e submissão,
vincula a educação a uma estrutura de combate ideológico hegemônico e contra-hegemônico
e a considera um espaço pedagógico que funciona tanto como instrumento de dissimulação,
a serviço da classe dominante, quanto revela à classe dominada as contradições existentes,
permitindo a esta última reagir. A defesa de Gramsci define-se na utilização da escola como
centro de formação da consciência crítica e política para realizar uma mudança real da
estrutura social vigente.
40
A Educação como Fenômeno Social e Objeto de Estudo da Sociologia • AULA 3
Sintetizando
»» A escola como instituição sempre mereceu atenção especial dos estudos sociológicos.
»» O pressuposto fundamental é de que a escola seja um espaço de sociabilidade, no qual as relações sociais se
caracterizam por práticas que afirmam valores educacionais e constroem identidades, em que, sobretudo,
elaboram-se e reelaboram-se papéis sociais.
»» O ser humano, ao nascer, necessita de outras pessoas para a sua sobrevivência, no mínimo de mais uma pessoa, o
que já faz dele membro de um grupo.
»» Desde o primeiro momento de vida o indivíduo está inserido em um contexto histórico, pois as relações entre
o adulto e a criança recém-nascida seguem um modelo ou padrão de cada sociedade, modelo este que ela veio
desenvolvendo com o passar dos tempos e que considera correta.
»» As normas são o que basicamente caracterizam os papéis sociais e que determinam as relações sociais. Ou
seja, os papéis de pai e de mãe se caracterizam por normas que dizem como um homem e uma mulher se
relacionam quando eles têm um filho, e como ambos se relacionam com o filho e este no desempenho de seu
papel com os pais.
»» Ao tratar das relações entre o educador e a criança submetida à sua influência, Durkheim (1967, pp. 5.354)
defende que a criança fique “por condição natural, em estado de passividade” e o educador assume uma posição
de superioridade advinda da sua experiência, sua cultura e da moral que ele encarna. Assim, a ação educativa é
entendida como um trabalho de autoridade. A autoridade é o meio essencial da ação educativa. “A autoridade
moral é a qualidade essencial do educador”. Essa concepção de Educação e do papel do professor influenciou as
práticas pedagógicas adotadas no Brasil ao longo da história da Educação e a atividade docente que nela se realiza.
»» Karl Marx, que influenciou todo o pensamento crítico em Educação, começando pelas ideias reprodutivistas de
Althusser, Establet e Baudelot, que ressaltaram a contribuição da Educação na reprodução das relações sociais
de produção. A análise materialista histórica de Marx vê a sociedade capitalista sob a perspectiva do conflito
resultante das contradições produzidas pela divisão da sociedade em classes sociais, definidas pela apropriação
dos meios de produção, demarcando uma classe detentora dos meios de produção e da riqueza que advém do
trabalho da classe trabalhadora.
»» Para Marx, a sociedade se estrutura por uma base constituída das forças produtivas e das relações de produção,
donde se originam as ideias, a política, a religião, o Direito e a Filosofia, que constituem a superestrutura. As
relações de produção classistas são conflitivas e contraditórias, provocando constantemente crises que não
encontram solução nos marcos da sociedade burguesa. Assim, ele defende uma revolução liderada pelas classes
trabalhadoras para superar essa sociedade classista e a criação de uma sociedade em que não mais existiria a
exploração do homem pelo homem, culminando numa sociedade comunista, na qual os meios de produção
seriam coletivizados.
41
AULA 3 • A Educação como Fenômeno Social e Objeto de Estudo da Sociologia
Saiba mais
Veja também A sociedade dos poetas mortos (Dead Poets Society) é um filme estadunidense
de 1989, do gênero drama, dirigido por Peter Weir.
Duração: 2h9min.
42
Aula
As Matrizes do Pensamento
Sociológico e as Diferentes
Análises do Fenômeno
Educacional 4
Apresentação
Nesta parte de nosso estudo tomaremos contato com três dos mais ilustres teóricos do pensamento
sociológico. São eles: Émile Durkheim, Max Weber e Karl Marx. Tamanha é a importância desses
pensadores que são eles considerados os clássicos da Sociologia, isto é, seus pilares de sustentação,
os fundadores desta ciência que estamos aprendendo.
Chamamos a atenção para o fato de que, de uma forma ou de outra, cada um deles contribuiu
profundamente para o pensamento crítico sobre a escola e os processos educacionais.
Objetivos
Esperamos que, após o estudo do conteúdo desta aula, você seja capaz de:
43
AULA 4 • As Matrizes do Pensamento Sociológico e as Diferentes Análises do Fenômeno Educacional
Saiba mais
c. O Suicídio (1897);
e. Fundou também a revista L’Anné sociologique, que afirmou a preeminência durkheimiana no mundo inteiro.
Dizemos que são Externos porque são fatos coletivos, como a religião ou o sistema econômico,
por exemplo, independentes dos indivíduos, que já os encontram prontos quando nascem e que
morrerão antes que esses deixem de existir.
Ou seja, existem fora dos indivíduos e são internalizados por meio do processo de socialização.
Essas maneiras de agir e pensar são, além de externas, capazes, pelo seu poder coercitivo, de
obrigar um indivíduo a adotar um comportamento qualquer. A coerção pode se manifestar
direta ou indiretamente.
É direta, por exemplo, quando o professor estabelece seus critérios de avaliação, aos quais o
aluno é coagido a se adaptar para se sair bem na prova. Mas é indireta quando um empresário
passa a utilizar computadores para administrar os seus negócios, pois ele faz isso pressionado
pela concorrência, embora não exista nenhuma lei que o obrigue explicitamente.
A coerção pode também ser formal ou informal. É formal, como o próprio nome já diz, quando
a obrigação e a punição pela transgressão estão estabelecidas formalmente. O Código Penal, por
exemplo, apresenta um grande número de coerções formais para diversos atos predefinidos.
44
As Matrizes do Pensamento Sociológico e as Diferentes Análises do Fenômeno Educacional • AULA 4
É informal quando é exercida espontaneamente pelas pessoas no seu dia a dia. Quando, por
exemplo, uma pessoa chama a atenção de outra por tentar furar uma fila.
Finalmente, a coerção pode estar oculta. A pessoa que cumpre de bom grado e com satisfação
as suas obrigações sociais não sente o peso da coerção sobre o seu comportamento. Uma pessoa
que gosta de sua profissão, por exemplo, geralmente cumpre seus deveres com prazer, sem a
necessidade de imposições. Mas a coerção nunca deixa de existir. Está sempre à espreita.
Quando se diz que são fatos sociais fixos ou não fixos significa que podem se apresentar de duas
maneiras diferentes: como maneiras de agir ou como maneiras de ser.
As maneiras de agir são formas de atuar e pensar coletivas, que determinam o comportamento
dos indivíduos, que os obrigam a agir de determinada forma, mas não têm uma longa duração
no tempo, ou seja, são efêmeras e instáveis.
As maneiras de ser também são fenômenos de ordem coletiva que determinam o comportamento
dos indivíduos, mas, nesse caso, há uma durabilidade no tempo, uma permanência ou estabilidade.
Um sistema religioso ou econômico estabelecido pode ser um bom exemplo desse tipo de fato
social. Os dogmas de uma religião, que não foram criados por nenhum dos fiéis, se impõem de
maneira estável e contínua no tempo, coagindo as pessoas a os aceitarem.
Há uma relação importante entre esses dois tipos de fenômenos. Muitas vezes um movimento
social se inicia como maneira de agir e pode vir a se fixar e estabelecer (se institucionalizar) e
daí se tornar uma maneira de ser.
Por exemplo, um movimento religioso de caráter momentâneo (um grupo de pessoas que se
reúne para ouvir um líder carismático, por exemplo) pode vir a se estabelecer como uma nova
religião organizada, estável e permanente.
Teríamos bons exemplos também no caso da língua que falamos. A língua portuguesa, em sua
versão formal, apresenta uma série de padrões e regras fixos, estáveis e, até mesmo, codificados.
Nesse aspecto, seria uma maneira de ser.
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AULA 4 • As Matrizes do Pensamento Sociológico e as Diferentes Análises do Fenômeno Educacional
Por outro lado, a língua usada no dia a dia é viva e está em constante processo de transformação.
Novas palavras, gírias, novas sintaxes, novas formas verbais surgem o tempo todo. Nesse aspecto,
a língua estaria recheada de maneiras de agir passageiras e efêmeras.
É interessante observar que muitas dessas, digamos, maneiras de agir linguísticas se transformam
em maneiras de ser à medida que vão sendo incorporadas à língua padrão, à gramática e ao
dicionário. Basta lembrar-se da história da forma de tratamento Vossa Mercê, que se transformou
em Vosmecê, depois em Você (já incorporado) e que hoje, pelo menos em Minas Gerais, é CÊ.
Como vimos, em primeiro lugar Durkheim procura demonstrar que existe toda uma ordem de
fenômenos que devem ser explicados por meio do que ele denomina fato social. É porque esses
tais “fatos sociais” existem que a Sociologia existe. Do contrário, poderíamos explicar a ação
humana e a ordem social por meio de outras disciplinas.
É fato social toda maneira de agir, fixa ou não, suscetível de exercer sobre o
indivíduo uma coerção exterior; ou então ainda, que é geral na extensão de
uma sociedade dada, apresentando uma existência própria, independente das
manifestações individuais que possa ter.
A primeira observação importante é que a Sociologia deve explicar apenas os fatos sociais e
não todo e qualquer fenômeno que tenha “algum interesse social”. Assim Durkheim enumerará
fatos de importância social, mas que não fazem parte da província explicativa sociológica, como
comer, dormir e beber.
É bastante óbvio que os seres humanos precisam comer, beber e dormir, e que uma sociedade
não perdurará se eles pararem de fazer isso (apesar de que Durkheim, nos seus momentos
mais exaltados, chega a afirmar que a sociedade continuará existindo mesmo se todos os seus
integrantes morrerem. Obviamente, não podemos tomar isso ao pé da letra.) Mas isso deve ser
explicado pela Biologia e pela Sociologia.
E como nós sabemos, era preciso distinguir a Sociologia não só da Biologia e Psicologia, mas,
também, da História, da Economia e da Filosofia.
Consoante Durkheim afirma: “Na verdade, porém, há em toda a sociedade um grupo determinado
de fenômenos com caracteres nítidos, que se distingue daqueles estudados pelas outras ciências
da natureza.” (p. 1)
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As Matrizes do Pensamento Sociológico e as Diferentes Análises do Fenômeno Educacional • AULA 4
O que nos chama a atenção é a frase “pelas outras ciências da natureza”. Não sei se se trata de
um lapso, mas Durkheim deveria ter escrito “pelas ciências da natureza”, pois a Sociologia é uma
Ciência Social, e não Natural. Esta frase, aliás, pode ser um “lapso” de escrita, referindo-se às
preocupações metodológicas do autor.
Quando lemos esses trechos nunca podemos nos esquecer de que os escritos de Durkheim
continham um forte conteúdo programático, no sentido de estabelecer um “lugar ao sol” para
a Sociologia no mundo acadêmico.
Quando nascemos nos deparamos com uma infinidade de instituições que nós não criamos, por
exemplo, “os sistemas de sinais de que sirvo para exprimir meus pensamentos, o sistema de moedas
que emprego para pagar as dívidas, os instrumentos de crédito..., as práticas seguidas na profissão”.
Mais uma vez, a consciência individual é aquela que é apenas do indivíduo tomado
isoladamente e outras ciências da profusão de instituições previamente existentes faz com
que a sua consciência se torne social.
Toda a educação consiste num esforço contínuo para impor às crianças maneiras
de ver, de sentir e de agir às quais não chegariam espontaneamente – observação
que salta aos olhos todas as vezes que os fatos são encarados tais quais são e tais
quais sempre foram. Desde os primeiros anos de vida, são as crianças forçadas
a comer, beber, dormir em horas regulares; são constrangidas a terem hábitos
higiênicos, a serem calmas e obedientes; mais tarde, obrigamo-las a aprender a
pensar nos demais, a respeitar usos e conveniências, forçamo-las ao trabalho,
etc. Se, com o tempo, esta coerção deixa de ser sentida, é porque pouco a pouco
dá lugar a hábitos, a tendências internas que a tornam inútil, mas que não a
substituem senão porque dela derivam. (pp. 5-6)
Vários pontos devem ser comentados nessa passagem. Em primeiro lugar, é de se ressaltar que,
para Durkheim, a Educação é o mecanismo por meio do qual deixamos de ser “individuais”
e nos tornamos “sociais”, ou seja, como uma sociedade não perdura se os atores forem
puramente individuais, conclui-se que o papel da Educação é fundamental para nos tornarmos
agentes sociais.
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Saiba mais
Émile Durkheim é considerado o fundador da cadeira de Sociologia e tem na Educação uma importante obra
chamada Educação e Sociologia. Sua ligação com a Educação é forte não só por ter sido titular da cadeira de Ciência
da Educação na renomada instituição Sorbonne, como ainda por ter lecionado no curso de Normal Superior. Em sua
vida acadêmica, Durkheim foi privilegiado por chegar à universidade no momento de expansão do ensino francês.
À época, impera a Terceira República francesa que derruba as universidades antigas, datadas da Idade Média, para
transformá-las para algo grandioso: a universalização do ensino público. As novas universidades possuem o triplo
do tamanho das anteriores. É nesse momento que nosso autor vai adentrar na vida acadêmica. Terá em sua vida
acadêmica, como um todo, a preocupação com o ensino, e sua função para a constituição da vida social.
Durkheim pode ser enquadrado como o principal teórico funcionalista da Sociologia da Educação.
Em sua concepção, a Educação cumpre a função de preparar as crianças para a sociedade. Assim,
seu papel principal é gerar os indivíduos que a sociedade deseja ter no futuro. E, ainda, que essa
educação se estabelece socialmente. Não cabe aos pais a escolha do tipo de educação que querem
dar ao seu filho, mas, sim, adequá-la aos padrões estabelecidos pela sociedade.
Vimos que a Educação nos obriga a nos adequar a determinadas situações. Todavia, faz-se mister
definir, afinal, o que é Educação. Segundo Durkheim, a Educação é quando uma geração de
adultos impõe às crianças determinada forma de conduta. A Pedagogia – teoria educacional –,
para isso é diversa, pois diversos são os caminhos para um indivíduo se realizar na vida social.
A Educação não é única, pois a sociedade exige várias aptidões para realizá-la. Com isso, essa
diversidade social produzida pela diversidade educacional será benéfica para a sociedade
como um todo. Essa visão é contrária, por exemplo, a visão kantiana de que a Educação deveria
ser única; desenvolver ao máximo as habilidades do indivíduo. Nosso autor acredita que uma
educação única só poderia existir em uma sociedade simples, como na existente no passado,
pois a Educação única seria reflexo de uma sociedade pouco desenvolvida. A sociedade atual
produz indivíduos diversos para cargos diversos. O nosso sentimento de igualdade, de pertencer
a um mesmo grupo, ocorrerá pela religião, nacionalismo e certos valores morais apreendidos
durante a vida.
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As Matrizes do Pensamento Sociológico e as Diferentes Análises do Fenômeno Educacional • AULA 4
A sociedade não poderia existir sem que houvesse em seus membros certa
homogeneidade: a educação a perpetua e reforça, fixando de antemão na alma
da criança certas similitudes essenciais, reclamadas pela vida coletiva.
(DURKHEIM, 1967)
O homem, na concepção durkheimiana, é um ser que nasce individualista e insocial. Sua mente
nesse momento está vazia, em estado de uma tábula rasa. Apesar de o homem possuir herança
genética, ela é insuficiente para realizá-lo em sociedade. A Educação, dessa forma, prepara o
indivíduo para esse novo momento social, já que as condições que ele encontrará serão diferentes
da do seu pai, assim como o prepara para a vida social.
»» Aptidão que ele não possui. A sociedade, dessa forma, obriga o indivíduo egoísta a aceitar,
em seu interior, o social. Depois de formado, o homem terá dentro de si dois elementos
que o constituem como Homem. O lado privado, individual; e o lado coletivo, social.
O homem só aceita esse domínio do social pela necessidade de aceitação coletiva e,
ademais, ele só é considerado Homem quando realizado em sociedade.
Saiba mais
Digno de nota é que posteriormente essa ênfase na Educação foi substituída pelos mecanismos
de introjeção da psicanálise, mais conhecidos como processos de internalização e socialização.
Em outras palavras, trata-se de especificar como tornamos internos os elementos sociais, e daí
deriva o nome socialização.
Mas, seja lá qual for o suposto mecanismo, o relevante é que as normas, convenções e hábitos
sociais tornam-se parte da personalidade individual, elas passam a constituir as pessoas. De
regulativas tornam-se constitutivas. Evidentemente esses dois tipos de normas irão coexistir
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sempre, pois os processos de socialização nunca são perfeitos e sempre são realizados sobre um
substrato biológico e psicológico individual.
Assim, para retomarmos nossas discussões sobre a inter-relação entre fatores genéticos e
sociológicos, é bastante plausível pensar que dois atores diferentes respondam de maneiras
diferentes a processos de socialização semelhantes devido a diferenças de cunho genético. E as
diferenças resultantes podem levar esses atores a contatar diferentes grupos de referência que,
por sua vez, levam a diferentes influências sociais que reforçam essas diferenças individuais.
...a educação tem justamente por objeto formar o ser social... A pressão de todos
os instantes que sofre a criança é a própria pressão do meio social tendendo
moldá-la à sua imagem, pressão de que tanto os pais quanto os mestres não são
senão representantes e intermediários. (p. 6)
Mais uma vez essa frase pode sugerir a existência de uma entidade sociológica superior quando diz
que os responsáveis pelos processos de socialização, os pais e mestres, são meros intermediários.
Mas Durkheim está querendo dizer que eles também não inventaram as instituições sociais,
que eles também foram formados sob a sua influência e que agora estão repassando esse
conhecimento, esse conteúdo social.
A Educação, assim, é uma forma de coerção. Os fatos sociais são externos e coercitivos, mas
Durkheim afirma que “com o tempo, esta coerção deixa de ser sentida, é porque pouco a pouco
dá lugar a hábitos, a tendências internas que a tornam inútil, mas que não a substituem senão
porque dela derivam”.
O ponto a ser destacado é que, com a internalização dos conteúdos sociais, nós nos tornamos
sociais e que há – parafraseando Parsons – uma mudança no significado do termo coerção. Mas
isso não quer dizer que deixamos de ser “sociais”.
Se “coerção” é concebida como algo puramente externo ela se torna parte das condições para a
ação. Se as ações devem ser analisadas como o encontro da volição subjetiva com as condições
objetivas, então a coerção – concebida como elemento externo – deve ser vista como mais uma
condição objetiva que deve ser levada em conta, da mesma maneira que uma montanha ou
determinada disponibilidade de recursos.
Mas as normas sociais coercitivas deixam de ser externas por meio da Educação. O que acontece,
segundo Parsons, é que:
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As Matrizes do Pensamento Sociológico e as Diferentes Análises do Fenômeno Educacional • AULA 4
O resultado é que Durkheim deixa de conceber a conformidade com as normas (ou seja, a
operação dos fatos sociais) como fruto de um desejo de não sofrer as prováveis consequências
externas desse ato.
Durkheim afirma que é “... incontestável que a maioria de nossas ideias e tendências não são
elaboradas por nós, mas nos vêm de fora, conclui-se que não podem penetrar em nós senão através
de uma imposição”.
É digno de nota que Durkheim utiliza a palavra penetrar, há uma transferência de elementos
externos para o interior (superego?) do ator.
Durkheim afirma que, para sentirmos o jugo da sociedade, basta tentarmos violar as normas sociais.
É possível e muitas pessoas violam as normas sociais, mas sempre sofrem as consequências, da
resistência das estruturas sociais (se você é empresário e teima em utilizar técnicas ultrapassadas)
e das outras pessoas (vingança, ostracismo, reprimendas e fofocas etc.)
Uma das maneiras de sentir o jugo das forças sociais são os efeitos que os grupos e massas
exercem sobre a consciência individual. Durkheim afirma:
É exatamente isso que Durkheim denomina elementos sui generis, pois eles não estão nas partes
que o compõem, mas são propriedades emergentes das interações.
Saiba mais
No dia 20 de abril de 1997, cinco rapazes de classe média de Brasília atearam fogo no índio pataxó
Galdino Jesus dos Santos, de 44 anos, que dormia em uma parada de ônibus na Asa Sul, bairro
nobre da capital Federal.
Fonte: Carolina Jardon, do G1, em Brasília.
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AULA 4 • As Matrizes do Pensamento Sociológico e as Diferentes Análises do Fenômeno Educacional
Ao ler sobre a biografia dos cinco garotos que incendiaram e mataram o índio Pataxó, não podemos
deixar de pensar que talvez eles nunca fizessem isso se estivessem sozinhos; que houve certo
“efeito-gangue”, que os tornou capazes de cometer aquela atrocidade. Muito provavelmente
nenhum deles se reconhece no ato que cometeu, e daí o espanto das famílias, que conhecem,
na maior parte das vezes, seus filhos enquanto atores isolados.
Um exemplo óbvio é a violência nos estádios de futebol. Cidadãos pacatos podem se transformar
em pessoas violentas, prontas para massacrar seu oponente. Esses “efeitos-gangue” podem ser
muito importantes para compreendermos certas facetas de movimentos sociais, quais sejam,
aquelas caracterizadas por ações violentas. Pois é muito mais fácil a emergência de violência
e agressividade se o efeito-gangue se faz presente. Evidentemente a pré-condição para um
movimento social e para o efeito-gangue é a multiplicidade dos atores, a convivência grupal.
Durkheim afirma que os fatos sociais são gerais devido à sua obrigatoriedade, ou seja, a relação de
causalidade é inversa. Saímos de uma instância coletiva (“Os fatos sociais são crenças, tendências,
práticas de grupo tomadas coletivamente”) e passamos à incorporação individual (“... quanto às
formas que os estados coletivos revestem ao refratar nos indivíduos, são coisas de outra espécie.”),
e não que fatos individuais são generalizados até se tornarem coletivos.
Para corroborar a sua tese, Durkheim argumenta que a natureza coletiva das determinações
sociais fica evidente nos sentimentos coletivos que “explodem” numa reunião, é a existência de
uma energia especial, cuja fonte é coletiva.
Fatos morais ou sociais são externos em relação aos indivíduos e, portanto, são estranhos a eles
em alguma medida. No mínimo, são coisas que não foram criadas pela pessoa e, assim, podem
diferir mais ou menos de seu pensamento. Além disso, esses fatos externos e estranhos têm a
capacidade de exercer coerção, isto é, podem se impor aos indivíduos como uma obrigação.
Desse ponto de vista, a sociedade, as regras e a moral aparecem como realidades que constrangem
o indivíduo, que limitam a sua ação e a possibilidade de realização de suas vontades. Viver em
sociedade representaria, assim, um sacrifício ou, no mínimo, um incômodo.
Mas esse é apenas um dos lados dessa questão. Se a sociedade e a moral só tivessem esse lado
negativo e coercitivo, seria muito difícil explicar a existência da ordem social.
É sabido que nenhum grupo ou sociedade pode sobreviver por muito tempo com base apenas
na coerção. Pessoas muito insatisfeitas são capazes de enfrentar qualquer tipo de perigo para
encontrarem uma saída. Basta observar que mesmo nos regimes políticos muito fechados,
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As Matrizes do Pensamento Sociológico e as Diferentes Análises do Fenômeno Educacional • AULA 4
mantidos pela violência, a resistência não deixa de existir e, na maioria das vezes, leva o sistema
à ruína.
Os fatos sociais ou morais não são apenas obrigações desagradáveis que temos que seguir
independentemente de nossa vontade. São também coisas que queremos e necessitamos. Nesse
caso, a coerção deixa de se fazer sentir, transforma-se em respeito. Aquilo que antes era uma
obrigação se transforma em um dever. Algo que poderia ser visto como um sacrifício passa a ser
visto como um prazer.
Isso acontece porque o indivíduo não se realiza fora da sociedade ou do grupo. Só entre outras
pessoas, num meio em que exista ordem e um conjunto de instituições morais reguladoras do
comportamento coletivo, o indivíduo pode encontrar segurança (tanto física como psicológica)
e tranquilidade para levar a sua vida.
Por isso, ou seja, em retribuição a essa segurança, o indivíduo passa a ver a sociedade não como
um conjunto de obrigações estranhas a ele, mas como um conjunto de direitos e deveres que
ele precisa e, acima de tudo, quer respeitar.
A sociedade é nosso cárcere, se dela nós não nos sentimos prisioneiros é porque
a ela nos conformamos.
(DURKHEIM, Émile, 1967, pp. 41-65)
Para Durkheim, a sociedade, como todo organismo vivo, apresenta estados normais e patológicos
(saudáveis e doentes). Émile Durkheim desenvolveu o caráter normal e patológico dos fatos.
Normalidade social
»» Sua generalidade (comum aos membros de uma sociedade) na “espécie” social a que
pertencem (“são normais suas formas que se repetem em todos os casos observados.”);
»» Sua correspondência às condições de vida social (pois existem fenômenos que persistem
em toda a extensão da espécie, embora não correspondam mais às exigências da situação);
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AULA 4 • As Matrizes do Pensamento Sociológico e as Diferentes Análises do Fenômeno Educacional
Assim, é normal o fato que não extrapola os limites dos acontecimentos mais gerais de determinada
sociedade que refletem as condutas mais aceitas pela maior parte da população.
Diante disso, afirma que: assim, uma instituição, uma prática costumeira, uma conduta, uma
regra moral, serão considerados normais ou patológicas conforme se aproximam ou se afastem,
respectivamente, do tipo “médio” da sociedade.
A distinção entre normal e patológico passa pela fuga do mediano. Dessa forma, o que é normal
varia de sociedade para sociedade.
Patologia social
Crime
...os atos qualificados de crime não são os mesmos em toda a parte; mas sempre
e em todo lugar existiram homens que se conduziram de maneira a chamar sobre
si a repressão penal.
Para Durkheim (1985, pp. 41-65), ele deve ser avaliado como um fato social normal nas espécies
sociais:
2. O crime pode ser entendido como necessário (útil) para uma sociedade, pois se a
consciência coletiva (moral) fosse excessiva, se cristalizaria, e a consciência individual
inovadora não se manifestaria. Desse modo, onde o crime existe é porque os sentimentos
coletivos estão no estado de maleabilidade necessária para tomar nova forma;
3. Representa um fato social que integra as pessoas em torno de uma conduta valorativa,
que pune o comportamento considerado nocivo, que fere a consciência coletiva.
...o crime se liga às condições fundamentais de toda a vida social e, por isso mesmo
tem sua utilidade; pois estas condições de que é solidário, são elas próprias,
indispensáveis à evolução normal da moral e do direito.
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As Matrizes do Pensamento Sociológico e as Diferentes Análises do Fenômeno Educacional • AULA 4
Importante para a evolução e adaptação das instituições sociais cujo papel é moldar e
controlar padrões perduráveis de comportamento.
4. O crime é normal porque seria inteiramente impossível uma sociedade que se mostrasse
isenta dele.
...é impossível que a consciência moral da sociedade seja encontrada por inteiro
em todos os indivíduos e com suficiente vitalidade para impedir qualquer ato
que a ofendesse, fosse esta falta puramente moral ou propriamente um crime.
6. É por essa lógica que ele irá avaliar o castigo imposto, não como forma de acabar com
o crime, mas, sim, para mantê-lo na taxa social “média” (principalmente na sociedade
orgânica).
Anomia
»» Seu aparecimento ocorreria quando diversas funções sociais se tornassem muito tênues
ou intermitentes.
Como as sociedades mais complexas são baseadas na diferenciação, é necessário que as tarefas
individuais correspondam a seus desejos e aptidões; como isso nem sempre acontece, os valores
ficam enfraquecidos e a sociedade é ameaçada pela desintegração – essa desintegração que é
resultante da divisão social do trabalho, é solucionada com formas cooperativistas de produção
econômicas, com grupos profissionais, associações de grupos que socializam o indivíduo e
despertam valores comunitários e disciplina moral.
As forças litigantes se desenvolvem sem limites e acabam se chocando umas contra as outras
para se recalcarem e se reduzirem mutuamente.
As paixões humanas só cessam diante de uma potência moral que respeitem. Não
são sancionadas senão pela opinião, não pela lei, e sabe-se quanto a opinião se
mostra indulgente com a maneira pela qual essas vagas obrigações são realizadas.
Os atos mais censuráveis são frequentemente absolvidos pelo sucesso, que o
limite entre o que é proibido e o que é permitido, o que é justo e o que não é,
não tem mais nada fixo.
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AULA 4 • As Matrizes do Pensamento Sociológico e as Diferentes Análises do Fenômeno Educacional
A Solidariedade Social, para Durkheim, é formada pelos laços que ligam os indivíduos, membros
de uma sociedade, uns aos outros, formando a coesão social.
Há dois tipos diferentes de solidariedade social. Esses tipos têm relação com o espaço ocupado
na mentalidade dos membros da sociedade pela consciência coletiva e pela consciência
individual.
A Consciência Coletiva é representada pelo “conjunto das crenças e dos sentimentos comuns
à média dos membros de uma mesma sociedade que forma um sistema determinado que tem
vida própria”. São as crenças, os costumes, as ideias que todos que vivem em um mesmo grupo
compartilham uns com os outros.
A Consciência Individual é aquilo que é próprio do indivíduo, que o faz diferente dos demais.
São crenças, hábitos, pensamentos, vontades, que não são compartilhados pela coletividade,
mas que são especificamente individuais.
A consciência coletiva recobre espaços de distintos tamanhos na consciência total das pessoas
de acordo com o tipo de sociedade onde elas vivem. Assim, quanto maior for o espaço ocupado
pela consciência coletiva em relação à consciência total das pessoas em uma sociedade, mais a
coesão, nessa mesma sociedade, origina-se da conformidade e da semelhança existente entre
seus membros. Nesse caso, segundo Durkheim, a ordem social se fundamenta na solidariedade
mecânica.
Isto é, quanto maior a consciência coletiva, mais os indivíduos se parecem uns com os outros
e, portanto, se ligam, se aproximam pelo que têm em comum. Pelo fato de terem os mesmos
pensamentos, os mesmos costumes, acreditarem nas mesmas coisas etc. A coesão, ou solidariedade
resulta das semelhanças.
Quanto menor for o espaço ocupado pela consciência coletiva em relação à consciência total
das pessoas em uma sociedade, ou quanto maior for a área ocupada pela consciência individual,
mais a coesão se fundamenta nas diferenças existentes entre os indivíduos.
Se a consciência individual é maior numa sociedade, os indivíduos são diferentes uns dos outros
e a solidariedade só pode surgir da percepção geral de que cada um, com suas especialidades,
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As Matrizes do Pensamento Sociológico e as Diferentes Análises do Fenômeno Educacional • AULA 4
Durkheim não podia visualizar a olho nu qual tipo de solidariedade seria predominante em
uma dada sociedade. A solidariedade, como um fenômeno moral, só seria identificada a partir
de algum indicador que a fizesse visível.
Os tipos de normas do direito indicam, para Durkheim, o tipo de solidariedade que predomina
em uma sociedade.
»» Direito Repressivo: a preocupação principal desse tipo de direito é punir aquele que
não cumpre determinada norma social por meio da imposição de dor, humilhação
ou privação de liberdade. A questão é que o criminoso agride uma regra social
importante para a coletividade e, portanto, merece um castigo de intensidade
equivalente a seu erro.
Assim, quanto mais o Direito tende a essa forma repressiva (Direito Penal), mais forte e
abrangente é a consciência coletiva em uma sociedade. É assim porque todo erro que é punido
repressivamente representa uma agressão contra a sociedade como um todo e não contra uma
parte dela apenas.
»» Direito Restitutivo: a preocupação principal nesse tipo de direito é fazer com que as
situações perturbadas sejam restabelecidas e retornem a seu estado original. Ao infrator
cabe, simplesmente, reparar o dano causado.
Isso acontece porque o dano causado não afeta a sociedade como um todo, mas apenas uma
função específica desempenhada nela. Quanto maior é a participação do direito restitutivo em
uma sociedade, menor é a força e a abrangência da consciência coletiva, maior é a diferenciação
individual.
Portanto, ao identificar o tipo de direito que predomina em uma sociedade, estamos identificando
o tipo de solidariedade existente. Predomina o direito repressivo, uma maior quantidade
de normas é mantida pela consciência coletiva (solidariedade mecânica). Se predomina o
direito restitutivo, uma menor quantidade de normas diz respeito à sociedade como um todo
(solidariedade orgânica).
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AULA 4 • As Matrizes do Pensamento Sociológico e as Diferentes Análises do Fenômeno Educacional
Teoria da história
SOCIEDADE INDUSTRIAL
SOCIEDADE SEGMENTAR
MODERNA
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As Matrizes do Pensamento Sociológico e as Diferentes Análises do Fenômeno Educacional • AULA 4
Sintetizando
Émile Durkheim
»» Criador da Escola Sociológica francesa, Durkheim inaugura o uso da estatística em Sociologia. Acreditava que
métodos científicos deveriam ser aplicados no estudo da sociedade:
»» É preciso delinear com certeza os fatos que podem e devem ser objeto de estudo da Sociologia.
»» Não se confundem com fenômenos orgânicos, pois consistem em representações e ações coletivas, nem com os
fenômenos psíquicos que têm por substrato o indivíduo.
»» Crenças, tendências, práticas do grupo tomadas coletivamente é que constituem os fatos sociais.
»» Fatos sociais são maneiras de agir, pensar e sentir exteriores aos indivíduos, dotados de um poder de coerção que
são imperativos.
»» Para Durkheim, a solidariedade social é formada pelos laços que ligam os indivíduos, membros de uma sociedade,
uns aos outros formando a coesão social. São dois os tipos de solidariedade para este autor: solidariedade
mecânica e solidariedade orgânica.
»» São dois os tipos de consciências na Sociologia de Durkheim: a consciência coletiva define-se pelo conjunto
de crenças, costumes e ideias que todos que vivem em um mesmo grupo compartilham uns com os outros. A
consciência individual é aquilo que é próprio do indivíduo, que o faz diferente dos demais.
Saiba mais
Marx foi um grande homem e um gênio, quer da Filosofia, quer da Sociologia, quer da Economia
Política, e isso poucos ousam questionar. Não podendo abarcar todo o alcance e extensão da obra
de Marx, que é um dos pais da Sociologia e presença obrigatória em diversos cursos acadêmicos,
podemos começar dizendo que o pensamento de Marx é, fundamentalmente, uma tentativa de
compreensão da sociedade capitalista.
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AULA 4 • As Matrizes do Pensamento Sociológico e as Diferentes Análises do Fenômeno Educacional
e equipamentos vários, e a terra (meios de produção) e os que nada têm a não ser sua força de
trabalho (os assalariados, empregados e operários), constituindo duas classes básicas e cada
vez mais polarizadas.
O conflito humano resultante das desigualdades econômicas intrínsecas a essas duas classes
são, para Marx, o ponto-chave das sociedades industriais modernas, juntamente com o modo,
a forma ideológica de manipular as ideias para que o grande povo não perceba o vínculo entre
poder econômico e poder político e sua influência na qualidade de vida de todos (alienação
política e cultural).
Portanto, para Marx, o que vemos constantemente na história humana é uma luta entre setores
opostos, classes antagônicas, que, em seu processo de interação, buscam uma solução para as
tensões econômicas resultantes de suas diferenças. E a sociedade atual capitalista, a sociedade
da globalização econômica, não é diferente, ou é até ainda mais explicitamente antagônica do
que a de outros tempos.
Segundo Catani (1992), a abordagem que Marx faz do capitalismo é a-histórica, pois o “... capitalismo
é definido como um determinado modo de produção de mercadorias, gerado historicamente desde
o início da idade moderna e que encontrou plenitude no processo de desenvolvimento inglês, ao
qual se chamou revolução industrial”.
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As Matrizes do Pensamento Sociológico e as Diferentes Análises do Fenômeno Educacional • AULA 4
A proposta Marxista
Os filósofos se limitaram a interpretar o mundo de diferentes maneiras; o que
importa é transformá-lo.
(MARX, 1987)
A partir de uma discussão com Hegel, Marx pôde expor uma de suas teses fundamentais. Hegel
dizia que a razão-abstrata (as ideias) é autogeradora e, além disso, geradora dos homens. Marx
rebate, defendendo a tese de que é o mundo concreto e, portanto, as pessoas em seu processo
real de vida que determinam a superestrutura ideológica; esta nada mais é do que o reflexo das
relações que se processam na base econômica.
(...) Hegel completou o idealismo positivo. Para ele, não apenas todo o mundo
material tinha se transformado num mundo dos pensamentos e toda a história
numa história dos pensamentos. Ele não se limita a registrar as coisas do
pensamento, mas procura também expor o ato de produção (...)
Todos os críticos filosóficos alemães afirmam que os homens reais têm sido até
aqui dominados e determinados por ideias, representações e conceitos, que o
mundo real é um produto do mundo ideal. Isso, que tem acontecido até o presente
instante, deve, entretanto, modificar-se (...)
Para Marx as ideias são criadas pelos homens e não existem independente deles. Logo, a
superestrutura, enquanto sistema articulado de ideias que vem a constituir a consciência coletiva,
também não existe independente dos homens e estes se definem pelo modo que se inserem na
produção.
Nesse sentido são os homens realmente ativos, condicionados pelo modo de produção de sua
vida material, que produzem suas representações e ideias. Essas não se modificam ou evoluem
por si mesmas, mas, sim, em consequência de transformações que ocorrem na base material,
que mudam a realidade e, gradativamente, também mudam o pensamento e os produtos do
pensamento.
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AULA 4 • As Matrizes do Pensamento Sociológico e as Diferentes Análises do Fenômeno Educacional
Daí resulta a concepção materialista da História, não mais como uma coleção de fatos mortos
ou como uma ação imaginada de sujeitos imaginados, trata-se, agora, de uma história real,
resultante do estudo do processo real da vida e da ação dos indivíduos em cada época determinada.
»» Não é a consciência que determina a vida material, mas a vida material que determina
a consciência;
»» Na história, podemos distinguir pelo menos cinco grandes modos de produção: primitivo;
o regime asiático; escravatura; servidão (feudal) e a capitalista;
Vejamos alguns conceitos elaborados por Marx a fim de explicar a sociedade capitalista.
Para chegarmos a esta concepção de Estado, é preciso, antes de tudo, compreendermos o seguinte
processo:
Saiba mais
A divisão do trabalho é iniciada com a apropriação dos bens de produção por determinada classe e não por outra.
A divisão do trabalho acarreta, também, a divisão desigual dos produtos do trabalho; com isso, é inevitável o
aparecimento de interesses antagônicos e, consequentemente, a luta de classes.
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As Matrizes do Pensamento Sociológico e as Diferentes Análises do Fenômeno Educacional • AULA 4
Nesse sentido, é simplesmente impossível que em uma sociedade de classes existam interesses
que possam ser considerados coletivos. “A história dos homens tem sido a história da luta de
classes” (Marx, K. O 18 de brumário de Luís Bonaparte.) O que realmente pode existir (e existe)
são interesses específicos da classe dominante passados à população como interesses de toda
a coletividade.
É nesse momento que se pode perceber o papel desempenhado pelo Estado enquanto mediador
das tensões sociais e, acima de tudo, enquanto elemento que expressa as relações de dominação
(dominantes x dominados), à medida que encarna um suposto interesse coletivo, na realidade,
ditado pela classe dominante.
O Estado nada mais faz do que transformar o particular em coletivo por duas vias: ideológica
e repressiva. Coletivo este que nunca existirá realmente, sendo, portanto uma mera ilusão
alimentada por diversos interesses, dadas as condições anteriormente explicitadas.
Saiba mais
O estado e a sociedade
»» O Estado não está descolado da sociedade;
»» O monopólio do aparelho estatal, diretamente ou por meio de grupos interpostos, é a condição básica do exercício
da dominação;
»» O poder político é, na verdade, o poder organizado de uma classe para a opressão das outras.
Práxis
Para Marx, práxis seria a “atividade livre, universal, criativa e autocriativa, por meio da qual
o cria (faz, produz), e transforma (conforma) seu mundo humano e histórico e a si mesmo”
(BOTTOMORE, 1979).
A práxis é um conceito central no pensamento de Marx. A práxis não se confunde com a prática.
A práxis é a união da interpretação da realidade (teoria – conhecimento científico) à prática
(realização efetiva, atividade), em outras palavras, é a ação consciente do sujeito na transformação
de si mesmo e do mundo que o cerca;
Para Marx:
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AULA 4 • As Matrizes do Pensamento Sociológico e as Diferentes Análises do Fenômeno Educacional
deve ser educado. Ela deve, por isso, separar a sociedade em duas partes – uma
das quais é colocada acima da sociedade. A coincidência da modificação das
circunstâncias com a atividade humana ou alteração de si próprio só pode se
apreendida e compreendida racionalmente como práxis revolucionária.
(MARX, 1987)
Não é a consciência que determina a vida, mas a vida que determina a consciência
idealista.
(MARX, 1987)
Dialética
O que é Dialética?
A aplicação das teses fundamentais do materialismo dialético à realidade social deu origem à
concepção materialista da história. Segundo essa concepção, o entendimento da realidade da vida
só é possível à medida que conhecemos o modo de produção da sociedade – modo de produção é
aqui entendido como a maneira pela qual os homens obtêm seus meios de existência material. É
pelo modo de produção que conhecemos uma sociedade em sua especificidade histórica e social.
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As Matrizes do Pensamento Sociológico e as Diferentes Análises do Fenômeno Educacional • AULA 4
História
O que distingue as diversas épocas econômicas não é o que produzem, mas sim
como produzem, com que instrumentos o fazem. Os instrumentos de trabalho
não são apenas o marco indicador do desenvolvimento da força de trabalho do
homem; são também o expoente das condições sociais em que trabalha. E, entre
os instrumentos de trabalho, os instrumentos mecânicos, cujo conjunto forma
o que podemos denominar sistema ósseo e muscular da produção, apresentam
as características essenciais de uma época social de produção de um modo
muito mais definido que os instrumentos que se limitam a servir de receptáculos
aos objetos de trabalho e aos quais em conjunto poderíamos designar, de um
modo bastante genérico, como sistema vascular de produção, isto é os tubos,
os barris, as canastras, os jarros, etc. A indústria química é a única na qual estes
instrumentos adquirem uma importância considerável.
(MARX, 1959)
Ideologia
As ideias da classe dominante são as ideias dominantes em cada época; em outros
termos, a classe que exerce o poder material dominante na sociedade é, ao mesmo
tempo, seu poder espiritual dominante. A classe que tem à sua disposição os
meios para a produção material dispõe com isso, ao mesmo tempo, dos meios
de produção espiritual, o que faz com que submetam a si, no tempo devido, em
termos médios, as ideias dos que carecem dos meios necessários para produzir
espiritualmente. As ideias dominantes não são outra coisa que a expressão ideal
das relações materiais dominantes, as mesmas relações materiais dominantes
concebidas como ideias; portanto, as relações que fazem de uma determinada
classe a classe dominante são também aquelas de conferem o papel dominante
às suas ideias (...)
Com efeito, cada nova classe que passa a ocupar o posto da que dominou antes
dela se vê obrigada, para poder levar adiante as finalidades que persegue, a
apresentar seu próprio interesse comum de todos os membros da sociedade, ou
seja, expressando isso em termos ideais, a imprimir às suas ideias a forma geral, a
apresentar suas ideias como as únicas racionais e dotadas de vigência absoluta (...)
(MARX; ENGELS, 1970)
Marx e a escola
Karl Marx, mesmo sem se aprofundar ou escrever uma obra específica sobre educação, abordou
este tema. Segundo ele, como as condições materiais determinam a consciência do indivíduo,
seria necessário modificá-las para alterarmos a escola burguesa. Entramos, aí, em uma situação
dialética em relação à escola. A sociedade precisa ser modificada para alterar a escola. Mas,
sem alterar a escola, a sociedade não pode ser modificada. Ademais, a escola que é designada
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AULA 4 • As Matrizes do Pensamento Sociológico e as Diferentes Análises do Fenômeno Educacional
aos pobres é a escola técnica. Alienadora, incompleta, ensinando à criança não a produção por
inteiro, desenvolvendo, dessa maneira, todo o seu potencial, mas apenas uma parte dela. Agindo
assim, como a mola propulsora da diferenciação social e da determinação das classes sociais.
Para modificar tal situação seria mister modificar o modo de construção do conhecimento da
criança. O trabalho infantil seria unicamente a semente da transformação individual. A criança
trabalharia apenas o suficiente para compreender a realidade da produção, mas o foco seria,
então, a escola transformadora socialista.
Marx, àquela época, tinha uma visão que ainda é hoje revolucionária. Importante lembrar que
no momento em que nosso autor vive, as crianças trabalhavam nas fábricas como se fossem
adultas. Marx estipula que não mais do que duas horas seriam necessárias para ensinarmos à
criança aquilo que ela deveria aprender no trabalho. Vemos aqui algo de surpreendente. O trabalho
infantil seria “um dos mais poderosos meios de transformação da sociedade” pelo reconhecimento
das condições materiais dadas – do seu tempo.
Sugestão de estudo
MARX, Karl.
Glosse
Marginali al Programma del Partito Operaio Tedesco. In: MARX, Karl e ENGELS, Friedrich, Il Partito e L’Internazionale;
p. 244. In: MANACORDA, 2000, p. 93.
Perceba que ocorre aqui uma diferenciação do conceito de criança. Se no século XXI cabe à criança
apenas o mundo da diversão, do prazer, do consumo, em suma, o mundo lúdico; no mundo
socialista a igualdade entre os homens romperia a questão temporal de adulto e criança. Não
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As Matrizes do Pensamento Sociológico e as Diferentes Análises do Fenômeno Educacional • AULA 4
Existe, na concepção marxista, a noção de que o Estado é um aparelho desenvolvido para garantir
as relações de produção capitalista. Sua divisão entre infraestrutura e superestrutura é, para
tanto, fundamental. Ainda dentro dessa clássica concepção marxista, o Estado, quando se faz
valer, utiliza-se de seus aparelhos repressivos – polícia, exército etc. Louis Althusser argumenta que
nem só do aparelho repressivo vive o Estado. Ele precisa de outros mecanismos que garantam a
criação de valores, ideias ou a ideologia capitalista de aceitação quanto a condição de submissão
à lógica capitalista; da divisão social do trabalho e da divisão de classes. Dessa forma, existem,
na verdade, dois aparelhos fundamentais no Estado: os Aparelhos Repressivos do Estado (ARE)
e os Aparelhos Ideológicos do Estado (AIE). É exatamente nesse último elemento que entra a
escola, objeto de nosso estudo.
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AULA 4 • As Matrizes do Pensamento Sociológico e as Diferentes Análises do Fenômeno Educacional
A escola, assim, é um locus privilegiado, pois as crianças estão ali no momento de maior fragilidade,
já que não possuem capacidade crítica ou opinião própria. São obrigadas a se adequarem às
regras institucionais, aos seus professores – que muitas vezes não percebem qual é o seu papel
dentro dessa instituição. Assim, os anos de estudo de uma criança significam anos que a sociedade
possui para inculcar determinada ideologia sobre ela. A escola não se caracteriza, como citado
anteriormente, de uma violência física – como polícia ou exército, mas sua violência é sutil,
dissimulada ou simbólica. Esse recurso garante a eficiência daquilo que se quer ensinar, modela
os alunos a sua maneira.
Assim, temos uma situação semelhante à figura anterior, só que agora o grande produtor da ação
é o professor. Vejamos, então, o ciclo completo da ação do Estado sobre os indivíduos.
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As Matrizes do Pensamento Sociológico e as Diferentes Análises do Fenômeno Educacional • AULA 4
Saiba mais
Pierre Félix Bourdieu (França, 1930-2002), sociólogo francês. De origem campesina, filósofo de
formação, foi docente na École de Sociologie du Collège de France. Desenvolveu, ao longo de sua
vida, diversos trabalhos abordando a questão da dominação e é um dos autores mais lidos, em todo
o mundo, nos campos da Antropologia e Sociologia, cuja contribuição alcança as mais variadas áreas
do conhecimento humano, discutindo em sua obra temas como educação, cultura, literatura, arte,
mídia, lingüística e política. Também escreveu muito sobre a Sociologia da Sociologia.
Fonte: http://www.gestaoescolar.diaadia.pr.gov.br/.
Pierre Bourdieu segue essa linha de raciocínio ao publicar, anos depois, o livro A Reprodução.
Nele argumenta que o processo educacional é uma violência simbólica no indivíduo. Essa
violência ocorre, pois o indivíduo é coagido de várias maneiras a reproduzir determinado
comportamento de classe, isto é, a classe à qual pertence. Assim, toda forma de educar é arbitrária
“na medida em que a estrutura e as funções dessa cultura não podem ser deduzidas de nenhum
princípio universal, físico, biológico ou espiritual, não estando unidas por nenhuma espécie de
relação interna à natureza das coisas ou a uma natureza humana” (BOURDIEU, 1974). A cada ser
socializado significa que determinada maneira de pensar, agir ou falar, foi imposta pela família,
escola ou meio de comunicação. Na verdade, essas várias formas agem em conjunto, cada qual
inculcando, ou tentando inculcar, um pouco de si no indivíduo. Vejamos um pouco da teoria
para ficar mais claro.
Sugestão de estudo
BOURDIEU, Pierre & PASSERON, Jean-Claude. A Reprodução: elementos para uma teoria do sistema de ensino. Rio
de Janeiro: Francisco Alves. 1974.
A teoria começa supondo que violência simbólica significa que determinada forma de pensar
pode ser inculcada em um indivíduo. O agente que possui essa força é o agente capaz de exercer
a violência simbólica. Há Instituições-Estado, escola, família etc., capazes de inculcar sua
violência simbólica em um indivíduo. Assim, se pensarmos no todo da estrutura social, vemos
que o Estado pode ser a primeira instância da violência simbólica, pois ele é capaz de criar leis
que imponham determinada forma de pensar e agir e, ainda, pode criar leis que legitimem suas
proposições. As instituições que obedecem ao Estado, de uma forma ou de outra, acabam não
só por inculcar como por legitimar essas determinações. Esse domínio não deve ser explícito e,
às vezes, nem quem o exerce percebe sua força de imposição. Assim, o homem social é o homem
em quem foi inculcada uma forma de pensar que pode ser da classe dominante ou não. Há uma
vantagem da classe dominante em termos de domínio do poder, pois, ao controlar o Estado, pode
usá-lo como instrumento de imposição de suas ideias, valores, moral etc., e, em muitos casos,
excluindo por meio de concurso e de artifícios relativos ao capital cultural educacional. Ou seja,
apenas os indivíduos que sejam capazes de articular as palavras, ideias de determinada maneira
serão capazes de ter acesso a determinado cargo social. Esse concurso que visivelmente não tem
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AULA 4 • As Matrizes do Pensamento Sociológico e as Diferentes Análises do Fenômeno Educacional
preferência social, no fundo esconde as determinações de classe que pela origem do indivíduo
acabam por limitar sua vida profissional a algo pré-condicionado, reproduzindo, assim, sua classe.
Apesar de mostrar uma perversidade social, quando pensamos em termos de classes sociais,
Bourdieu explicita no prefácio de seu texto que esse mecanismo não é uma ação consciente de todos
os agentes sociais; muitos são levados a reproduzi-lo. Apenas alguns possuem plena consciência
do seu papel na sociedade. Outro ponto que merece destaque, que é uma consequência desse
primeiro, é que um grupo qualquer que seja ele, produz violência simbólica. Não importa, assim,
a ideologia para reproduzir esse fenômeno. Se alguém, ou alguma instituição desejar renunciar
ao papel de inculcador, estará se autoaniquilando, pois não existe a possibilidade de se produzir
a vida social sem que o substrato social se imponha ao indivíduo. Aquele que diz não o fazer, na
verdade, não tem consciência de sua ação social.
Algumas correntes teóricas, como veremos a seguir, consideram a escola como um microcosmo
da sociedade onde as crianças são socializadas, ou seja, aprendem os valores morais da sociedade
e a se comportar como um membro dela. Para Marx, o papel principal da escola é a manutenção
do status quo. O aluno recebe a educação adequada à sua situação de classe. Assim, teríamos
diferentes tipos de escola para diferentes tipos de pessoas. A escola seria membro fundamental da
imposição das classes sociais. Isso significa que o indivíduo que passa por determinada escola terá
o seu destino traçado por ela. Ao receber uma forma de informação, ele estaria automaticamente
adentrando em uma classe posta. Daí a necessidade de transformação da escola.
Saiba mais
Louis Althusser (Birmandreis, Argélia, 16 de outubro de 1918 – Paris, 22 de outubro de 1990) foi um
filósofo francês de origem argelina. Diversas posições teóricas de Althusser permaneceram muito
influentes na filosofia marxista. O ensaio Sur le jeune Marx, constante de Pour Marx, faz uso de um
termo do filósofo da ciência, Gaston Bachelard, ao propor uma “corte epistemológico” entre os
escritos do jovem Marx, inspirados em Hegel e Feuerbach, e seus textos posteriores, propriamente
marxistas.
Fonte: https://pt.wikipedia.org/wiki/Louis_Althusser
Bourdieu e Althusser seguem uma linha bem próxima de análise da escola. Para eles, a escola seria
um agente que busca reproduzir as situações de classe. O fato mais marcante dessa análise é o
papel do professor, pois ele é um agente do Estado, mesmo contra a sua vontade. Essa capacidade
de Estado de inculcar às crianças determinada forma de pensamento e de comportamento
social exterioriza o fato de que somente uma alteração no grupo dominante possa fazer uma
mudança social. Entretanto, cabe a observação de que as forças inculcadoras não são únicas e
não convivem sem conflito. Essas disputas ocorrem entre as instituições do Estado e até entre
os membros de uma mesma sociedade.
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As Matrizes do Pensamento Sociológico e as Diferentes Análises do Fenômeno Educacional • AULA 4
Nesse sentido, emerge, por um lado, a função política do Estado de manter o controle social,
e, por outro, a questão da função política da escola de manutenção de um sistema social dado.
Faz-se necessário salientar, nessa relação Estado-Escola, a importância da escola como elemento
integrador da vida social. É pela escola que o indivíduo, para o bem ou para o mal, adquire
determinada formação social. Aprende valores e normas morais, uma profissão e a se socializar
com outros indivíduos. Caso ele não passasse por esse processo, seria um marginal, não
seria apto à vida social. Ademais, com seu conhecimento adquirido, torna-se agente ativo das
transformações que são vividas pela sociedade. Pode ajudar a fazê-las ou não. Não é apenas um
ser que observa a vida passar. Dessa forma, o Estado e a Educação são elementos centrais na
aquisição de cidadania pelo indivíduo.
Sintetizando
Karl Marx
»» Para Marx, não basta interpretar o mundo, é preciso transformá-lo → instaura-se, assim, o tribunal da Práxis.
»» Partindo dessa visão, Marx estabelece o conceito de dialética materialista: no conceito marxista, o termo
materialismo refere-se à teoria filosófica preocupada em destacar a importância dos seres objetivos (os homens)
como elementos constitutivos da realidade do mundo.
»» Função política do Estado de manter o controle social, e, por outro, a questão da função política da escola de
manutenção de um sistema social dado.
»» Relação Estado-Escola: a importância da escola como elemento integrador da vida social. É pela escola que o
indivíduo, para o bem ou para o mal, adquire determinada formação social. Aprende valores e normas morais.
»» Formulação marxista identifica o Estado como um coletivo ilusório. O Estado, nessa visão, transforma o particular
em geral.
Influenciado na mocidade pelo filósofo Wilhelm Dilthey, manteve, depois, contato permanente
com Alfred Weber (seu irmão), com o historiador Eberhard Gotheim, com o filósofo Wilhelm
Windelband, com o historiador literário Friedrich Gundolf, com Werner Sombart, Ferdinand
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AULA 4 • As Matrizes do Pensamento Sociológico e as Diferentes Análises do Fenômeno Educacional
Tönn ies, Robert Michels, Georg Simmel e Georg Lukács. Três gerações da elite intelectual alemã
participavam das reuniões em casa de Max e Marianne Weber, em Heidelberg.
Da multiplicidade desses contatos nasceu o grande trabalho Die Protestantisch Ethik um der
Gesit des Kapitalismus (“A Ética Protestante e o Espírito do Capitalismo”). Seus trabalhos, nessa
época, têm, muitas vezes, veemente tendência política: combateu o latifúndio na Alemanha
oriental dos Junkers, predizendo-lhes catástrofe parecida com a do império romano; também
combateu a burocracia prussiana e o semiabsolutismo do imperador Guilherme II. Durante
a guerra de 1914/1918, fez apaixonada oposição jornalística ao governo imperial, citando as
advertências dos profetas do Velho Testamento.
Saiba mais
Posição teórica
Segundo Weber, a Sociedade não pode ser vista como uma realidade material independente dos
indivíduos. Ao negar essa tese positivista, Weber procura compreender a sociedade como um
agregado de indivíduos que possuem suas motivações próprias. Ao mesmo tempo, o estatuto de
realidade objetiva é mudado para uma concepção menos determinista de sociedade, segundo
a qual a realidade é um fenômeno compósito; por isso, o cientista não conhece a sociedade de
antemão, nem consegue abarcá-la totalmente.
Portanto, o objeto da Sociologia, para Weber, é o sentido da ação social, que deve ser buscado
pela apreensão da totalidade de significados e valores atribuídos pelos indivíduos. Nesse sentido,
72
As Matrizes do Pensamento Sociológico e as Diferentes Análises do Fenômeno Educacional • AULA 4
ele procura mostrar que não há apenas uma causa dos fenômenos sociais; por meio da ideia
de “adequação de sentido”, Weber mostra a convergência da ação em duas ou mais esferas que
compõem o todo social (a economia, a política, a religiosa etc.), ou seja, a ação social é determinada
por mais de uma causa, tendo cada causa importância variada sobre determinada ação.
Weber, preocupado com o valor que cada indivíduo atribui à sua ação, procurou elaborar uma
tipologia para compreender as características particulares, definindo quatro tipos de ação:
É aquela ditada pelo estado de consciência ou humor do sujeito, é definida por uma
reação emocional do ator em determinadas circunstâncias e não em relação a um
objetivo ou a um sistema de valor, por exemplo, a mãe quando bate em seu filho por se
comportar mal.
»» Ação Tradicional
É aquela ditada pelos hábitos, costumes, crenças transformadas numa segunda natureza,
para agir conforme a tradição. O ator não precisa conceber um objeto, ou um valor nem
ser impelido por uma emoção, obedece a reflexos adquiridos pela prática.
Tanto a ação afetiva quanto a tradicional produzem relação entre pessoas (relações
pessoais), são coletivas, comunitárias, nos dão noção de comunhão e conceito de
comunidade.
É aquela definida pela crença consciente no valor – interpretável como ético, estético,
religioso ou qualquer outra forma – absoluto de determinada conduta. O ator age
racionalmente aceitando todos os riscos, não para obter um resultado exterior, mas para
permanecer fiel a sua honra, qual seja, a sua crença consciente no valor. O que importa
é a própria ação.
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AULA 4 • As Matrizes do Pensamento Sociológico e as Diferentes Análises do Fenômeno Educacional
O método weberiano
Weber chamou seu método de construção de tipos ideais. Partindo da ação social, categoria
construída como unidade analítica básica, constrói unidades lógicas mais abrangentes, sempre
apontando tipologias similares, implícita ou explicitamente, em cada unidade. Mostra que a ação
social é mutuamente referida por significados comuns e compõe o conceito de relação social,
tratando, a seguir, do conceito de associação. Nas associações, destaca o caráter ordenado, um
contexto organizado que serve como referência para os agentes individuais dele participantes.
De modo análogo à ação social, as associações desempenham atividades sociais orientadas no
sentido dos fins determinados pela ordem em que têm existência.
Refinando o conceito de ordem, elabora mais dois outros com ele relacionados: o de validez
e o de legitimidade, com vistas a demonstrar o caráter de dominação de todas as associações
humanas. Desse modo, explicita uma tipologia de autoridade, sua mais divulgada contribuição
para a Sociologia e a Ciência Política.
Weber considera que uma progressiva tendência à racionalização se constitui no princípio mais
geral da transformação social. Tal tendência se expressa em uma reorganização dos significados
internalizados nos agentes sociais, permitindo a implantação de ordens sucessivas. Desse modo, a
realidade histórica é pontilhada de descontinuidades. Nessa perspectiva, a história apresenta ciclos
totais, interrompidos por movimentos de caráter excepcional, chamado por ele de carismáticos.
Em torno de uma oscilação entre o cotidiano e o extracotidiano – a rotina e o carisma –, compõe
um padrão de transformação multilinear, conforme demonstra a vinculação sistemática de todos
os seus estudos sobre a religião e sobre a burocratização que chega a substituí-la.
O método em Ciências Sociais, isto é, nas disciplinas que aspiram a conhecer os fenômenos da
vida segundo a sua significação cultural, possui uma peculiaridade decisiva, não podendo ser
reduzido ao estabelecimento de leis gerais.
»» Partir do que é específico em cada cultura para o que é geral, e deduzir daí o que é
significativo do ponto de vista científico;
»» O tipo ideal: no que se refere à investigação, o conceito de tipo ideal propõe-se a formar
o juízo de atribuição, não é uma hipótese, mas pretende apontar o caminho para a
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As Matrizes do Pensamento Sociológico e as Diferentes Análises do Fenômeno Educacional • AULA 4
Originalidade
Sua contribuição transcende escolas e correntes de pensamento filosófico e social porque a
singularidade de suas ideias não permite identificação com as existentes em sua época. Todos
os que tentam interpretá-lo fora de suas premissas esbarram em equívocos paradoxais. Como
político, usava o partido liberal para combater o kaiser; ao negar Marx, concede-lhe a dignidade que
nenhum outro membro da elite intelectual alemã lhe quis dar; como ateu, valoriza extremamente
o papel das crenças religiosas; como nominalista, pratica a construção sistemática de conceitos
científicos para a Sociologia; como racionalista, teoriza sobre tipos de ação emocional, concedendo
papel importante a esta tanto quanto às ações racionais; como herdeiro de hegelianismo, nega
o absoluto e utiliza a dialética de modo autônomo.
utros traços apresentados em sua contribuição não são suficientes para defini-lo de modo claro.
Muitas vezes, sua teoria é vista como subjetivista, quando sua posição quanto à objetividade é
claramente manifesta. Outras vezes á chamado de psicologista, quando suas opiniões a respeito
das descobertas de Freud são muito cépticas. No entanto, sua teoria oferece importante paralelo
entre a Sociologia e a Psicologia, como respeito ao fato de a ação de um ego estar referida a um
alter, conforme mostra Talcott Parsons, ao associá-lo a Freud.
Como filósofo, Weber foi político e, como político, foi cientista. Mas não teve filosofia sistemática:
seu espírito era filosófico. A empresa intelectual de Weber, antes de tudo, foi surpreender a
sociedade tal como é pensada pelos agentes individuais, e acompanhar a maneira como seus
significados mentalizados se modificavam no tempo. Realizou seu empreendimento, criando
uma crítica da razão sociológica.
Contribuições teóricas
Relação social
Uma conduta plural (de vários), reciprocamente orientada, dotada de conteúdo significativos
que descansam na probabilidade de que se agirá socialmente de certo modo, constitui o que
Weber denomina de relação social. Podemos dizer que relação social é a probabilidade de que
uma forma determinada de conduta social tenha, em algum momento, seu sentido partilhado
pelos diversos agentes numa sociedade qualquer.
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AULA 4 • As Matrizes do Pensamento Sociológico e as Diferentes Análises do Fenômeno Educacional
Quando, ao agir, cada um de dois ou mais indivíduos orienta sua conduta levando em conta
a probabilidade de que o outro ou os outros agirão socialmente de modo que corresponde às
expectativas do primeiro agente, estamos diante de uma relação social. Como exemplo de relação
social, as trocas comerciais, a concorrência econômica, as relações políticas.
Estratificação social
A concepção de sociedade construída por Weber implica uma separação de esferas – como a
econômica, a religiosa, a política, a jurídica, a social, a cultural – cada uma delas com lógicas
particulares de funcionamento.
Partindo, portanto, do princípio geral de que só as consciências individuais são capazes de dar
sentido à ação social e que tal sentido pode ser partilhado por uma multiplicidade de indivíduos,
Weber estabeleceu conceitos referentes ao plano coletivo – a) classes; b) estamentos ou grupos de
status, e c) partidos – que nos permitem entender os mecanismos diferenciados de distribuição
de poder, o qual pode assumir a forma de riqueza, de distinção ou do próprio poder político,
num sentido estrito.
Poder e dominação
O conceito de poder é amorfo já que significa a probabilidade de impor a própria vontade dentro
de uma relação social, mesmo contra toda a resistência e qualquer que seja o fundamento dessa
probabilidade.
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As Matrizes do Pensamento Sociológico e as Diferentes Análises do Fenômeno Educacional • AULA 4
Desencantamento do mundo
A humanidade partiu de um universo habitado pelo sagrado, pelo mágico, excepcional e chegou a
um mundo racionalizado, material, manipulado pela técnica e pela ciência. O mundo de deuses e
mitos foi despovoado, sua magia substituída pelo conhecimento científico e pelo desenvolvimento
de formas de organização racionais e burocratizadas.
Para estarem seguros quanto à sua salvação, ricos e pobres deveriam trabalhar sem descanso,
o dia todo em favor do que lhes foi destinado pela vontade de Deus, e glorificá-lo por meio de
suas atividades produtivas.
A essa dedicação verdadeiramente religiosa ao trabalho, Weber chamou de vocação. Essa ética
teve consequências marcantes sobre a vida econômica e, ao combinar a restrição do consumo
com essa liberação da procura da riqueza, é obvio o resultado que daí decorre: a acumulação
capitalista por meio da compulsão ascética da poupança. Mas esse foi apenas um impulso inicial.
A partir dele o capitalismo libertou-se do abrigo de um espírito religioso.
Saiba mais
a. Die Protestantisch Ethik um der Gesit des Kapitalismus (A Ética Protestante e o Espírito do Capitalismo), 1904;
77
AULA 4 • As Matrizes do Pensamento Sociológico e as Diferentes Análises do Fenômeno Educacional
Estado
O Estado é um instrumento de dominação do homem pelo homem, para ele só o Estado pode
fazer uso da força da violência, e essa violência é legítima (monopólio do uso legítimo da força
física), pois se apóia num conjunto de normas (Constituição).
Sintetizando
Max Weber
O Método
O método em Ciências Sociais, isto é, nas disciplinas que aspiram a conhecer os fenômenos da vida segundo a sua
significação cultural, possui uma peculiaridade decisiva, não podendo ser reduzido ao estabelecimento de leis gerais.
A Objetividade do Conhecimento
Como é possível, apesar da existência dos valores, alcançar a objetividade nas Ciências Sociais?
É preciso distinguir entre os julgamentos de valor e o saber empírico. Os valores devem ser incorporados
conscientemente à pesquisa e controlados por meio de procedimentos rigorosos de análise, caracterizados como
esquemas de explicação condicional.
Os Tipos Ideais
Um conceito típico-ideal é um modelo simplificado do real, elaborado com base em traços considerados essenciais
para a determinação da causalidade, segundo os critérios de quem pretende explicar um fenômeno.
O tipo ideal é utilizado como instrumento para conduzir o autor numa realidade complexa.
Ação Social
Toda conduta humana dotada de um significado subjetivo (sentido) dado por quem a executa e que orienta essa
ação.
A explicação sociológica busca compreender e interpretar o sentido da ação social, não se propondo a julgar a
validez de tais atos nem a compreender o agente enquanto pessoa. Compreender uma ação é captar e interpretar
sua conexão de sentido, somente a ação com sentido pode ser compreendida pela Sociologia. Em suma: ação
compreensível e ação com sentido.
78
As Matrizes do Pensamento Sociológico e as Diferentes Análises do Fenômeno Educacional • AULA 4
Saiba mais
Ficha Técnica
Ano: 1989
Filme de 1982
Pink Floyd The Wall é um filme produzido em 1982 pelo diretor britânico Alan Parker,
baseado no álbum The Wall, da banda Pink Floyd.
Especificações Técnicas: Mídia: DVD, Ano de produção: 2006, Duração: 132 min., Estúdio:
Warner Bros. / Silver Pictures / Anarchos Productions Inc. / Virtual Studios.
79
Aula
Diferença, Exclusão Social e
Desigualdade Social 5
Apresentação
Na aula anterior vimos algumas abordagens que enfatizam a questão da estrutura social e sua
relação com o fenômeno educacional. Salientamos, sobretudo, a visão marxista da relação entre
Estado e Educação, fonte de inspiração de muitos estudiosos sobre a Educação.
Objetivos
Esperamos que, após o estudo do conteúdo desta aula, você seja capaz de:
»» Construir uma visão crítica sobre a realidade brasileira no que diz respeito à população
não branca.
80
Diferença, Exclusão Social e Desigualdade Social • AULA 5
Raça e etnia
A discussão em torno do tema raça e etnia é um dos debates mais constantes na sociedade
contemporânea. Sobretudo porque essa questão está no cerne dos conflitos que o mundo vem
atravessando, seja por causa das guerras entre os povos, os constantes conflitos étnicos, por
exemplo, no Oriente Médio, seja por causa da exclusão social pela qual alguns grupos raciais
passam em diversos países, aqui no Brasil, negros e índios; nos EUA; os latinos dentre outros.
Contudo, esses conceitos precisam ser bem compreendidos antes de adentrarmos nas principais
pautas de discussão relacionadas a esse tema.
Saiba mais
Para aprofundamento de estudo leia o livro Raça e História (no original em francês, Race et histoire)
é um ensaio de Antropologia, escrito pelo antropólogo, etnólogo e filósofo francês Claude Lévi-
Strauss, publicado em 1952 na França, pela Unesco.
Porém, esses conceitos não são suficientes para que se possa compreender a realidade dos
grupos sociais que sofrem com essas questões. Como afirmou Octavio Ianni (1988), “a questão
racial parece um desafio do presente, mas tem sido permanente. Transforma-se ao acaso das
situações, das formas de sociabilidade, dos interesses políticos, sociais e econômicos, mas reitera-
se continuamente, modificada, mas persistente”. Nesse sentido, a questão racial revela, de forma
particularmente evidente, um jogo de forças sociais que compreende identidade e alteridade,
diversidade e desigualdade, cooperação e hierarquização, dominação e subjugação.
Ainda segundo Ianni (1985), “em perspectiva ampla, a história do mundo moderno é também a
história da questão racial, um dos dilemas da modernidade”. A questão racial revela-se um desafio
permanente, ao lado de outros dilemas, também fundamentais, como as guerras religiosas, as
81
AULA 5 • Diferença, Exclusão Social e Desigualdade Social
Conceituando
Preconceito
É um julgamento prévio negativo sobre uma pessoa, um grupo, uma cultura etc. Quem age com
preconceito costuma estar fundamentado em estereótipos negativos, indicando desconhecimento
ou ausência de informações suficientes a respeito de quem está sendo julgado. O preconceito
pode levar à discriminação.
Discriminação
A palavra vem do latim discriminis, que significa separar. É o nome que se dá ao ato de restringir
certos indivíduos de oportunidades ou privilégios que estão disponíveis para outros indivíduos.
Discriminar é, portanto, atuar de forma a fazer uma distinção de certas pessoas, podendo levá-
las à exclusão ou à marginalização.
Segregação
É uma ação política, pautada em leis ou normas, que tem como objetivo manter a distância, em
espaços próprios que lhes são reservados, determinados indivíduos ou grupos considerados
indesejados ou inferiores. Para isso, são estabelecidas fronteiras espaciais ou sociais, que aumentam
as desvantagens entre grupos discriminados. Essa prática é baseada na ideia de superioridade
étnica, de gênero, de nacionalidade etc. Podemos citar como exemplos de práticas segregacionistas
o regime do Apartheid, na África do Sul; o regime de segregação racial, nos Estados Unidos, e o
Nazismo, na Alemanha.
Agora que já firmamos a base conceitual, fica mais evidente como o preconceito pode ser
bastante perigoso para os indivíduos e para a sociedade? Ele é transmitido muitas vezes sem que
percebamos e tende a misturar-se ao contexto cultural, de modo que fica mais difícil de superá-
lo. Desse modo, o preconceito pode levar à discriminação e à segregação de outros indivíduos.
82
Diferença, Exclusão Social e Desigualdade Social • AULA 5
Preconceito racial
O preconceito racial, também chamado racismo, é uma violação aos direitos humanos. Desde o
tempo da escravidão, o domínio de brancos sobre negros tem escrito uma história de violência
e desigualdade. Mas esse processo não aconteceu apenas no Brasil. O preconceito racial é uma
forma de exclusão comum no mundo todo.
Tal fenômeno, cujas origens são complexas, ocorre com maior ou menor intensidade em todas
as etnias, em todos os países e continentes, e suas origens são muito complexas. Quando o Japão,
por exemplo, conseguiu, na primeira metade do século XX, um desenvolvimento econômico
comparável ao da Europa, surgiu no seio do povo japonês uma ideologia racista muito semelhante
à que justificava o colonialismo europeu.
Saiba mais
»» A exaltação do nacionalismo: ideologia que romantiza e deforma o ideal de nação – potencializada pela Primeira
Guerra Mundial e suas consequências, notadamente os revanchismos que marcaram os tratados entre vencedores
e vencidos após o conflito, visto que o peso “humilhante” dos tratados, tidos como impagáveis pelos vencidos,
teriam estimulado tal exaltação;
»» O misticismo irracionalista: que contaminou a visão política das massas populares após 1918. Com efeito, ao
contrário da ilusão liberal-iluminista de que os povos – enquanto partícipes da política – levariam à vitória a
democracia, ocorreu, isto sim, a militarização da ação política, acompanhada pelo fanatismo nacionalista que ge
rou soluções totalitárias como o fascismo e o comunismo soviético.
83
AULA 5 • Diferença, Exclusão Social e Desigualdade Social
No Brasil, a história de seus conflitos e problemas envolveu bem mais do que a formação de
classes sociais distintas por sua condição material. Nas origens da sociedade colonial, o nosso
país ficou marcado pela questão do racismo e, especificamente, pela exclusão dos negros. Mais
que uma simples herança de nosso passado essa problemática racial ainda toca o nosso dia a
dia de diferentes formas.
84
Diferença, Exclusão Social e Desigualdade Social • AULA 5
Esse acontecimento inicial parece ter, de algum modo, subsistido, contribuindo para o quadro
situacional do negro. O seu cotidiano coloca-o frente à vivência de circunstâncias como
preconceito, descrédito, marginalização, evidenciando a sua difícil inclusão social.
Essa manifestação de desigualdade de poderes e direitos não possui uma origem natural, como
defendido por muitos teóricos no passado (Refiro-me à elaboração no século XIX de teorias
que pregavam diferenças inatas e permanentes entre bancos e não brancos. Essas elaborações
influenciaram de modo marcante a compreensão das Ciências Sociais sobre a questão racial.
Essa prática, que utiliza critérios de raça para segregar, humilhar, discriminar, foi denominada
racismo), mas partiu de uma construção social sem base objetiva decorrente de representações
ideológicas que englobam crenças e valores de um grupo dominante que busca manter a ordem
social ou o ideal do ethos branco. Seu objetivo é sustentar as relações assimétricas e monopolizar
as ideias e ações de determinado grupo, mantendo-o preso e dominado por esses conceitos,
falseando a realidade, ocultando contradições reais, construindo no plano imaginário um discurso
aparentemente coerente e a favor da unidade social. Parece haver interesse na transmissão de uma
ideologia inferiorizadora, que objetiva dominar, dividir, eliminar, desculturalizar, embranquecer,
perpetuando mitos e estereótipos negativos referentes à população negra.
A condição acima citada parece estar resumida em uma afirmação enfática do sociólogo Berger
(1991): “A dignidade humana é uma questão de permissão social”. A princípio, ela nos causa
certo impacto, mas, ao analisarmos as consequências do preconceito racial, percebemos que
se encontra coerente com a afirmação citada, pois o preconceito inviabiliza o reconhecimento
da dignidade do sujeito, comprometendo a sua inclusão social.
85
AULA 5 • Diferença, Exclusão Social e Desigualdade Social
O preconceito afeta não apenas o destino externo das vítimas, mas a sua própria consciência, já
que o sujeito passa a se ver refletido na imagem preconceituosa apresentada. Muitos negros são
induzidos a acreditar que sua condição inferior é decorrente de suas características pessoais,
deixando de perceber os fatores externos, isto é, assumem a discriminação exercida pelo grupo
dominante. Nesse momento, surge a idealização do mundo branco e a desvalorização do negro,
construindo-se a seguinte associação: o que é branco é bonito e certo, o que é negro é feio e errado.
O preconceito racial cria uma ação perversa que desencadeia estímulos dolorosos e retira
do sujeito toda possibilidade de reconhecimento e mérito, levando-o a utilizar mecanismos
defensivos das mais diversas ordens, contra a identidade ou o pensamento persecutório que o
despersonaliza e o enlouquece. Nessa perspectiva, é fortalecida a ideia de dominação de grupos
que se julgam mais adiantados, legitimando os desequilíbrios e desintegrando a dignidade dos
grupos dominados.
Essas elaborações preconceituosas parecem estar, assim, a serviço de um grupo dominante que
objetiva manter sob coerção grupos considerados subordinados. A sua forma de consolidação e
constante atualização ocorre nos espaços microssociais, representados pelas diversas instituições,
como escola, família, igreja, meios de comunicação. A sua forma de manifestação, em geral, é
feita de modo sutil, com toda a legitimação social no que se refere aos métodos e à garantia da
sua consequente eficácia.
86
Diferença, Exclusão Social e Desigualdade Social • AULA 5
Enfrentar a segregação social e a discriminação racial deve ser um combate sistemático do Estado,
da sociedade civil, de cada um de nós e de todas as instituições públicas e privadas comprometidas
com a igualdade de oportunidade e de direitos, com a equidade e a democracia, ao combate do
racismo e seus efeitos. A pessoa não precisa viver a situação de ser discriminada para defender essa
causa, mas deve buscar compreender o mal que uma sociedade faz a si própria quando fecha os
olhos para a segregação e a exclusão de determinado grupo ou pessoas e as consequências para
a humanidade, daí a ação prática depende da vontade política de buscar alternativas possíveis,
inteligentes e viáveis a partir do lugar onde nós estejamos.
É muito comum confundirmos conceitos estruturantes do tema das iniquidades sociais – exclusão,
desigualdade e diferenças sociais. Daí a necessidade de clarearmos um pouco mais o que tais
termos significam. Vejamos:
Desigualdade Social
A desigualdade social é um dos principais desafios do mundo atual e sua concepção perpassa
por várias esferas da composição das sociedades.
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AULA 5 • Diferença, Exclusão Social e Desigualdade Social
A desigualdade, seja ela social, econômica ou sob qualquer outra forma, materializa-se no espaço
social, ou seja, torna-se visível na composição estrutural das sociedades, sejam elas rurais ou
urbanas. As cidades e os lugares expressam a diferenciação econômica entre as pessoas, que é
resultante, muitas vezes, de questões históricas que submetem cidadãos e até grupos étnicos a
contextos de subalternidade. Um exemplo foi o processo de escravidão que até hoje deixa suas
marcas no sentido de manter a maior parte da população negra com baixos níveis de renda e
educação.
Exclusão social
O conceito de exclusão social está mais próximo, como oposição, do de coesão social ou, como
sinal de ruptura, do de vínculo social.
A condição de excluído lhe é imputada do exterior, pura e simplesmente, sem que para isso ele
tenha praticado qualquer ação ou mesmo tenha contribuído direta ou indiretamente para o
processo.
A exclusão social pode ocorrer como resultado de uma rede de rupturas dos vínculos sociais, sejam
eles econômicos, familiares, afetivos, religiosos ou trabalhistas. O termo exclusão pressupõe um
não reconhecimento como igual, seja de um indivíduo, seja de um grupo.
Na Europa, por exemplo, uma de suas manifestações pode ser representada pela forte xenofobia
que se abate, sobretudo, sobre os imigrantes africanos e árabes; já no mundo árabe são bastante
difundidas as exclusões de grupos étnicos ou religiosos, às vezes dentro do mesmo país. Ainda
hoje temos viva a lembrança dos ataques violentos ocorridos na Grã Bretanha entre irlandeses
e ingleses, por conta de uma fortíssima exclusão religiosa.
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Diferença, Exclusão Social e Desigualdade Social • AULA 5
Diferenças Sociais
Todas as culturas produzem realidades distintas, mas em todas elas existe um conjunto de
práticas regulares, que se repetem ao longo do tempo. Na medida em que essas práticas se
reproduzem, acabam criando o que chamamos de padrões culturais. Conforme esses padrões
vão sendo passados de geração em geração, tendemos a naturalizar os tipos de comportamento,
de vestimentas, de linguagem etc., que estão associados a eles. Sendo assim, quando nos
deparamos com outros costumes, a tendência é pensar no que é diferente não a partir daquilo
que o torna distinto, mas, sim, pelo que o distancia daquilo que nosso grupo social considera
como “normal”, “puro”, “certo” etc.
Considerando tal conceituação, podemos verificar que esses termos, embora guardem uma
estreita conexão entre si, são muito distintos. Por exemplo, em todas as sociedades verifica-se a
existência de grupos sociais diferentes, mas não necessariamente tais grupos sofrem desigualdade
social. Infelizmente, essa não é uma realidade corrente.
Desigualdade econômica
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AULA 5 • Diferença, Exclusão Social e Desigualdade Social
A intensificação desse processo tende a agravar ainda mais os problemas socioeconômicos das
pessoas menos favorecidas.
Desigualdade de gênero
Fonte: http://educarparacrescer.abril.com.br/comportamento/coisa-menino-coisa-menina
A sociedade salarial não é uma sociedade de igualdade, há uma grande diferença entre o
rendimento gerado pelo homem em comparação à mulher e até mesmo o acesso aos bens sociais,
por exemplo, acesso à educação e cultura.
Desigualdade Racial
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Diferença, Exclusão Social e Desigualdade Social • AULA 5
Parte desses tipos de práticas discriminatórias resultam de estereótipos, que é quando as pessoas
fazem suposições sobre as tendências e características de determinados grupos sociais, muitas
vezes incluindo grupos étnicos, normalmente enraizadas em suposições sobre a biologia,
capacidades cognitivas, ou mesmo falhas morais inerentes.
Essas atribuições negativas são, então, divulgadas na da sociedade por diferentes meios, incluindo
a televisão, jornais e internet, os quais desempenham papel na promoção de preconceitos de
raça e, assim, marginalizando grupos de pessoas. Infelizmente, isto, juntamente com a xenofobia
e outras formas de discriminação, continua a ocorrer nas sociedades contemporaneamente.
(Fonte: http://www.mundoeducacao.com/geografia/desigualdade-social.)
Você notou como o tema da desigualdade social é fundamental para compreendermos a dinâmica
da vida social no tocante às diferenças entre os indivíduos e grupos no interior de uma sociedade?
Primeiramente, a desigualdade pode ser definida, de maneira simples, como a condição na qual
os membros de uma sociedade possuem bens ou propriedade, prestígio e poder. As desigualdades
também podem ocorrer em função das diferenças de gênero, raça, idade, afiliação religiosa,
dentre outras. A consequência está no acesso diferenciado (desigual) dos indivíduos e grupos
à educação, aos postos mais qualificados de trabalho, às melhores remunerações, à saúde, à
participação política, aos bens de consumo, à justiça etc.
Qual a origem das desigualdades, como superá-las e, ainda mais importante, quais os mecanismos
de reprodução que permitem sua manutenção e a continuidade? Essas são questões que
desafiam a promessa burguesa de igualdade, liberdade e fraternidade, considerados os pilares
da equidade e da justiça na sociedade moderna. Somos todos iguais ou somos todos iguais em
nossas diferenças?
A diferença não se relaciona necessariamente com a ética, pois uma pessoa pode ser diferente
da outra e não ser desigual. Diversidade também não representa a mesma coisa que diferença
ou desigualdade. O princípio da diversidade consiste em admitir que as pessoas podem ser
iguais e, ainda, ter atitudes e práticas diferentes. Por exemplo, no seu grupo de amigos existem
pessoas que gostam de se vestir de formas distintas, o que as torna diferentes, mas não desiguais
entre si.
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AULA 5 • Diferença, Exclusão Social e Desigualdade Social
Basicamente, é a tentativa de se respeitar o outro, ou seja, aceitar nossos diferentes como iguais.
É a possibilidade de invertermos a lógica de funcionamento de atitudes que servem para tornar
legítima a desigualdade.
Quando esquecemos preceitos básicos para vida em sociedade, agimos sem perceber o outro
em sua individualidade.
Essas atitudes estão presentes em pequenos atos e frases que reproduzimos e não paramos para
interpretar. Como exemplo, podemos citar: “os índios são uns selvagens”.
Diante desse estado de miséria, exclusão, apartação, diferença e falta de perspectiva de muitos
indivíduos ao redor do mundo, você certamente já ouviu a frase: “o mundo não tem jeito...”
Mas saiba que existem muitas pessoas preocupadas com a condição em que nos encontramos
atualmente. Organizadas em diversas entidades, procuram, por meio do seu trabalho, alternativas
para que as sociedades possam se tornar territórios de iguais, onde as diferenças sejam respeitadas,
e a exclusão, superada.
Sintetizando
»» O conceito de raça está intimamente relacionado com o âmbito biológico, as diferenças de características físicas
que fazem daquele grupo social um grupo particular.
»» O conceito de etnia está relacionado ao âmbito da cultura, os modos de viver, costumes, afinidades linguísticas de
determinado povo criam as condições de pertencimento em determinada etnia.
»» A sociedade brasileira caracteriza-se por uma pluralidade étnica, sendo esta produto de um processo histórico
que inseriu num mesmo cenário três grupos distintos: portugueses, índios e negros de origem africana. Esse
contato favoreceu o intercurso dessas culturas, levando à construção de um país inegavelmente miscigenado,
multifacetado, ou seja, uma “unicidade” marcada por conflitos e antagonismos.
»» Desigualdade deriva de um tipo de privação social, como, por exemplo, quando existem em uma sociedade
pessoas ricas e pobres. Isso não significa que elas sejam diferentes essencialmente, mas que a condição de estar
pobre ou rico é o que as posiciona em lugares sociais distintos, tornando-as desiguais.
»» A exclusão social pode ocorrer como resultado de uma rede de rupturas dos vínculos sociais, sejam eles
econômicos, familiares, afetivos, religiosos ou trabalhistas. O termo exclusão pressupõe um não reconhecimento
como igual, seja de um indivíduo, seja de um grupo.
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Diferença, Exclusão Social e Desigualdade Social • AULA 5
Saiba mais
O filme faz uma analogia entre o antigo comércio de escravos e a atual exploração da miséria pelo
marketing social, que formam uma solidariedade de fachada. O filme critica ONGs e suas captações
de recursos junto ao governo e empresas privadas.
Crash
Filme de 2004
Crash é um filme estadunidense e alemão de 2004, um drama dirigido por Paul Haggis. Estreou no
Festival de Cinema de Toronto em setembro de 2004 e foi lançado internacionalmente em 2005.
93
Aula
Processos Educacionais no Brasil
e as Teorias Contemporâneas da
Sociologia da Educação 6
Apresentação
Na aula anterior vimos algumas abordagens que enfatizam a questão da relação entre raça e segregação
social. Salientamos, sobretudo os processos históricos e sociais que contribuíram para a realidade
de exclusão em que vive grande parte da população negra no Brasil contemporaneamente. Fizemos
ainda uma análise crítica sobre o papel da escola na difusão e/ou supressão do preconceito étnico.
Nesta aula, vislumbraremos algumas das principais contribuições da Sociologia para a Educação.
Abordaremos ainda os processos educacionais no Brasil e mostraremos a visão de alguns
dos teóricos mais importantes. Ao final, faremos um esforço de compreensão no sentido de
entendermos a escola como espaço da formação de identidade.
Objetivos
Esperamos que, após o estudo do conteúdo desta aula, você seja capaz de:
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Processos Educacionais no Brasil e as Teorias Contemporâneas da Sociologia da Educação • AULA 6
No Brasil podemos dizer que a preocupação com a Educação começou no início do século passado.
Nesse momento surge a escola científica, instalada em São Paulo para aplicar seu método ao
nosso sistema educacional. Vindo da Itália, da Escola Normal de Modena, Ugo Pizzoli deseja
implantar aqui uma escola que pudesse adequar o conteúdo ao tipo de aluno especificado.
Dentre essas opções, temos os normais, os anormais e os degenerados. A Educação correta
deveria ser aplicada após as diferenciações dos alunos segundo os diagnósticos fornecidos pela
Psicologia. Assim, a Psicologia e a Pedagogia andariam de mãos dadas para a melhor gestão dos
esforços educacionais.
»» Anormais: indivíduos que fogem aos parâmetros normais, mas ainda podem ser
recuperados pela sociedade.
A Educação, então, poderia ser normal ou emendatória, vai depender da análise do indivíduo.
Para os dementes, degenerados ou imorais, a educação emendatória tinha o objetivo de corrigi-
los. Dessa maneira, a seleção de quem receberia que tipo de educação é uma maneira de decidir
quem vai ser incluído no rol dos cidadãos ou no dos excluídos. Assim, não se gastariam recursos
com seres que não possuem a capacidade de aprender e se desenvolver socialmente.
Em 1930 surge a Escola Nova. Apresentada por Lourenço Filho, havia nela a percepção de um
novo tempo e de uma escola que pudesse adequar-se a ele. A percepção da criança como um
universo em si que seria capaz de ser modelada, dispensando-se, assim, os preceitos deterministas
anteriores. A escola, então, assumia o papel de implementar os desejos da sociedade. Deveria
produzir os indivíduos que a sociedade precisa no futuro.
A Escola Nova foi um movimento de renovação do ensino que foi especialmente forte na Europa,
na América e no Brasil, na primeira metade do século XX. O escolanovismo desenvolveu-se no
95
AULA 6 • Processos Educacionais no Brasil e as Teorias Contemporâneas da Sociologia da Educação
Sugestão de estudo
Editado do site que apresenta uma síntese da obra de Lourenço Filho. Visitado em 25/3/2005.
A Escola Nova recebeu muitas críticas. Foi acusada principalmente de não exigir nada, de abrir
mão dos conteúdos tradicionais e de acreditar ingenuamente na espontaneidade dos alunos. A
leitura das obras e a análise das poucas experiências em que, de fato, as ideias dos escolanovistas
foram experimentadas com rigor mostram que essas críticas são válidas apenas para interpretações
distorcidas do espírito do movimento.
Apesar de todo o seu sucesso, a Escola Nova não conseguiu modificar de maneira significativa
o modo de operar das redes de escolas e perdeu força sem chegar a alterar o cotidiano escolar.
Saiba mais
Manoel Bergström Lourenço Filho nasceu em 1897 em Porto Ferreira, no interior de São Paulo.
Cursou duas vezes a escola Normal e formou-se em Direito. Foi indicado, aos 24 anos, para diretor
da Instrução Pública do Ceará, com a incumbência de reorganizar o ensino do estado. O trabalho,
que durou dois anos e meio, foi uma das primeiras realizações da Escola Nova e obteve grande
repercussão. Até o fim da vida, Lourenço Filho escreveu e publicou grande número de artigos e
livros de Psicologia, Pedagogia, Gestão Educacional e Literatura Infantil, além de obras didáticas.
Traduziu títulos importantes de autores como Émile Durkheim (1858-1917) e Édouard Claparède
(1873-1940). Morreu em 1970, no Rio de Janeiro.
A partir da década de 1960 temos o grande marco na Educação brasileira, com Paulo Freire. Seu
método utilizado no Nordeste revolucionou o modo de pensar a Educação. Se até este momento
a Educação é vista como modeladora do indivíduo, esse método visa utilizar as experiências do
aluno como elemento-base para sua Educação.
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Processos Educacionais no Brasil e as Teorias Contemporâneas da Sociologia da Educação • AULA 6
O educador, em contínua interação com o estudante, leva-o a descobrir que seu mundo, sua
cultura é tão importante quanto a dele. Esse diálogo entre iguais desperta um sentimento positivo
entre os interlocutores de modo a facilitar o processo de alfabetização. O grande salto dessa
perspectiva é que a educação se adequa ao aluno, não mais se impõe a ele. Assim, o aluno, de
mero recebedor, espectador do conteúdo lecionado e colocado em posição verticalmente inferior
ao seu professor, passa a ser peça importante no jogo educacional. Essa experiência teve muito
sucesso na educação de adultos no Rio Grande do Norte e em Pernambuco. A coragem de pôr
em prática um autêntico trabalho de educação que identifica a alfabetização com um processo
de conscientização, capacitando o oprimido tanto para a aquisição dos instrumentos de leitura
e escrita quanto para a sua libertação fez dele um dos primeiros brasileiros a serem exilados.
Em 1969, trabalhou como professor na Universidade de Harvard, em estreita colaboração com
numerosos grupos engajados em novas experiências educacionais, tanto em zonas rurais quanto
urbanas. Durante os 10 anos seguintes, foi Consultor Especial do Departamento de Educação
do Conselho Mundial das Igrejas, em Genebra (Suíça). Em 1980, depois de 16 anos de exílio,
retornou ao Brasil para “reaprender” seu país. Lecionou na Universidade Estadual de Campinas
(Unicamp) e na Pontifícia Universidade Católica de São Paulo (PUC-SP) (Fonte: Editado a partir
do site: www.paulofreire.org, visitado em 25/3/2005).
Saiba mais
Paulo Reglus Neves Freire (Recife, 19 de setembro de 1921 – São Paulo, 2 de maio de 1997), foi um
educador, pedagogista e filósofo brasileiro. É Patrono da Educação brasileira.
Paulo Freire é considerado um dos pensadores mais notáveis na história da Pedagogia mundial,1
tendo influenciado o movimento chamado Pedagogia Crítica.
Autor de Pedagogia do Oprimido, livro que propõe um método de alfabetização dialético, se diferenciou do
“vanguardismo” dos intelectuais de esquerda tradicionais e sempre defendeu o diálogo com as pessoas simples, não
só como método, mas como um modo de ser realmente democrático.
Em 13 de abril de 2012 foi sancionada a Lei nº 12.612 que declara o educador Paulo Freire Patrono da Educação
Brasileira.2 Foi o brasileiro mais homenageado da história: ganhou 41 títulos de Doutor Honoris Causa de
universidades como Harvard, Cambridge e Oxford.
(Fonte: https://pt.wikipedia.org/wiki/Paulo_Freire)
A partir da década de 1970 a Escola Tecnicista ganhou força no Brasil. Ela parte do pressuposto
de que a melhor forma de adaptar o indivíduo à sociedade é treiná-lo para uma profissão no
mercado de trabalho. Ela é muito útil na formação de mão de obra especializada. Ali, aluno e
instrutor interagem de modo predeterminado, não há espaço para divagações ou divergências.
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AULA 6 • Processos Educacionais no Brasil e as Teorias Contemporâneas da Sociologia da Educação
Gagné sugere que tarefas de aprendizado para habilidades intelectuais podem ser organizadas
em uma hierarquia, de acordo com a complexidade: reconhecimento de estímulo, geração de
resposta, seguir procedimentos, uso da terminologia, discriminações, formação de conceito,
aplicação de regras e resolução de problemas. A importância primária da hierarquia é identificar
os pré-requisitos que devem ser completados para facilitar o aprendizado em cada nível. Os pré-
requisitos são identificados por meio de uma análise da tarefa de um trabalho de aprendizado/
treinamento. As hierarquias de aprendizado fornecem uma base para a sequência de instrução.
Além disso, a teoria esboça nove eventos de instrução e processos cognitivos correspondentes:
Já Benjamin Bloom construiu um modelo que ficou conhecido como a Taxonomia de Bloom.
Nela, o autor argumenta que as operações cognitivas podem ser classificadas em seis níveis
hierárquicos de complexidade. Os níveis seguem o seguinte parâmetro:
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Processos Educacionais no Brasil e as Teorias Contemporâneas da Sociologia da Educação • AULA 6
Podemos pensar a escola como um microcosmo social. Ali, a criança aprende a conviver em grupo,
a ter sucesso ou fracasso e a obedecer a regras. Todas essas ações, quando atingem ao indivíduo,
transformam-se naquilo que entendemos por identidade. Dessa forma, a identidade não é algo
que vem pronto, mas, sim, constitui-se com o tempo por meio de idas e vindas, assim como a
maré. A escola ou o grupo escolar, nesse momento único na vida da criança, pode interferir na
construção da autoestima infantil.
Numa abordagem socioantropológica, a identidade é uma construção que se faz com atributos
culturais, isto é, ela se caracteriza pelo conjunto de elementos culturais adquiridos pelo indivíduo
por meio da herança cultural. A identidade confere diferenças aos grupos humanos, ao mesmo
tempo em que os torna únicos. Ela se evidencia em termos da consciência da diferença e do
contraste do outro.
A Educação tem relação direta com a produção de identidade. A escola, independente de ser
reprodutora ou socializadora, é um elemento que constrói a identidade do indivíduo ao longo
dos anos. Como verifica Sposito, que é Professora da Faculdade de Educação da USP:
O tema da identidade aparece, assim, como importante, porque esta fase, ao ser
caracterizada como de transição, pois nela se gesta um vir-a-ser, é, ao mesmo
tempo, uma construção do presente. (...). a questão do autorreconhecimento e de
ser reconhecido. Assim, a identidade, individual ou coletiva, sempre pressupõe a
dimensão da alteridade, ao ser uma categoria social e relacional. (MELUCCI, 1992).
Ela se constrói a partir de experiências comuns que se defrontam e confrontam.
Como afirma Paula Montero (1987), um dos elementos que faz evidenciar a
questão da identidade situa-se nos grupos emergentes que passam a competir
pela conquista de um mesmo espaço social.
Mas é preciso, também, levar em conta esse movimento que constitui a identidade
em sua dupla dimensão: trata-se de se perceber semelhante aos outros (ser
reconhecido e reconhecer) e, ao mesmo tempo, afirmar a diferença enquanto
indivíduo ou grupo. Esta diferença, paradoxalmente, só pode ser afirmada e
vivida como tal, ao supor certa igualdade e certa reciprocidade.
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AULA 6 • Processos Educacionais no Brasil e as Teorias Contemporâneas da Sociologia da Educação
O exemplo disso, atualmente o que tem chamado mais atenção na mídia é o fato de que a escola
está em meio ao debate religioso. Uns querem a completa separação da escola e da religião ou
o Estado Laico, enquanto outros optam pelo convívio apenas com seus pares.
No Brasil, não só a escola está deixando de ser laica. O estado do Rio de Janeiro, por exemplo,
passou a ensinar religião nas escolas públicas. Temos em oposição diametral o caso francês em
que as meninas muçulmanas são impedidas de usarem o véu na escola. Esse conflito tem sido
a tônica deste século. O grupo versus a sociedade; o local versus o universal.
Sintetizando
»» Para Louis Althusser, a escola foi a grande novidade do sistema capitalista na divulgação de sua ideologia. Se no
mundo feudal tínhamos o par Igreja-Família, hoje em dia temos Escola-Família.
»» Pierre Bourdieu publica o livro A Reprodução. Nele argumenta que o processo educacional é uma violência
simbólica no indivíduo. Essa violência ocorre, pois, o indivíduo é coagido de várias maneiras a reproduzir
determinado comportamento de classe, isto é, a classe à qual pertence. Assim, toda forma de educar é arbitrária.
»» No Brasil, a preocupação com a Educação começou no início do século passado com a Escola Científica, instalada
em São Paulo.
»» A Educação deveria ser aplicada após as diferenciações dos alunos segundo os diagnósticos fornecidos pela
Psicologia. Assim, a Psicologia e a Pedagogia andariam de mãos dadas para a melhor gestão dos esforços
educacionais.
»» Hoje, no século XXI, essa escola ainda tem seu lastro na proliferação desse tipo de escola profissionalizante.
Possuem o nome de politécnico e profissionalizante em geral.
»» Benjamin Bloom construiu um modelo que ficou conhecido como a taxonomia de Bloom. Nela o autor argumenta
que as operações cognitivas podem ser classificadas em seis níveis hierárquicos de complexidade.
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Processos Educacionais no Brasil e as Teorias Contemporâneas da Sociologia da Educação • AULA 6
»» A escola é como um microcosmo social; nela nos relacionamos e realizamos múltiplas tarefas.
»» A identidade é uma construção que se faz com atributos culturais, isto é, ela se caracteriza pelo conjunto de
elementos culturais adquiridos pelo indivíduo por meio da herança cultural.
»» Tema clássico da Sociologia, a construção da identidade articulada ao processo de socialização não é novidade nas
múltiplas abordagens das Ciências Sociais.
101
Referências
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_______. Discurso sobre o espírito positivo. Edição eletrônica: Ed. Ridendo Castigat Mores, www.jahr.org., em: 6/1/2005.
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