Canto Na Liturgia

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ESCOLA SUPERIOR DE TEOLOGIA


PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO

RENE ANTONIO ZANANDRÉA

O CANTO E A MÚSICA NO CONTEXTO RITUAL


DA LITURGIA NA IGREJA CATÓLICA:
DESAFIOS PARA A FORMAÇÃO DE AGENTES NA
DIOCESE DE VACARIA/RS

São Leopoldo
2009
1

RENE ANTONIO ZANANDRÉA

O CANTO E A MÚSICA NO CONTEXTO RITUAL


DA LITURGIA NA IGREJA CATÓLICA:
DESAFIOS PARA A FORMAÇÃO DE AGENTES NA
DIOCESE DE VACARIA/RS

Dissertação de Mestrado
Para obtenção do grau de Mestre em
Teologia
Escola Superior de Teologia
Programa de Pós-Graduação
Teologia Prática

Orientador: Dr. Júlio Cézar Adam

São Leopoldo
2009
2

DEDICATÓRIA

Para que este trabalho dissertativo esteja impresso precisou da participação de


muitas pessoas que fazem parte da minha rede de relacionamentos. Agradeço a
todos(as)!
Dedico esta conquista especialmente:

 a Deus, o artista do universo que nos inventou, constantemente nos


reinventa e a todos cumula de dons e inspirações;
 à minha família que tem apoiado minha existência e acreditado na
liberdade;
 aos companheiros de caminhada cotidiana que têm compreendido a
necessidade da ausência na casa onde partilhamos a vida e a alegria
de seguir e anunciar Jesus Cristo;
 aos colegas presbíteros, bispos e comunidade diocesana –
especialmente os entrevistados e os membros do CCLP – pelo
incentivo à pesquisa;
 à Adveniat pela generosidade para com a evangelização no Brasil;
 aos irmãos de caminhada e fazer teológico do Itepa pela indicação
para os estudos, apoio e compreensão das ausências mais que
excepcionais;
 ao professor Júlio Cézar Adam, mais que orientador, um irmão, um
bom pastor que conduziu e apontou a direção para as “verdes
pastagens”;
 à Marianela, Susana, Clélia, Valburga, Lothar, Rosangela, Andréia,
Mauro pelas provocações e desafios à ousadia;
 à professora Sissi e grupo de pesquisa “Culto Cristão na América
Latina” pelos auxílios nos primeiros ensaios;
 à toda comunidade EST pela especial acolhida e diálogo desde 2006;
 à Ione Buyst pelas inspirações e sugestões bastante pertinentes;
 ao Grupo de reflexão de liturgia do Regional Sul III da CNBB pelo
incentivo e sugestões;
 à Juliane pela leitura atenta e correções;
 à Beatriz pelo auxílio na língua estrangeira.
3

RESUMO
O canto e a música no contexto ritual da liturgia na Igreja Católica: desafios para a formação
de agentes na Diocese de Vacaria/RS. Os sons da natureza, selecionados e combinados,
originaram a arte musical. A música faz parte da cultura humana; é constitutiva de sua própria
existência. Na abordagem desse assunto, o capítulo primeiro deste trabalho busca uma
aproximação histórica da música; investiga a antropologia da música e sua relação ritual com
o sagrado, fazendo parte, inclusive, dos ritos cristãos. O Concílio Vaticano II resgatou, na
Igreja Católica, o valor da arte musical e ampliou suas possibilidades. A arte musical passa a
se inscrever dentre os ritos sacramentais. Mais que cantar na liturgia se nos impõe a
necessidade de cantar a própria liturgia. A música passa a ser entendida como veio de
participação favorecendo que os fiéis expressem sua fé, seu agradecimento e suas
necessidades. Na segunda parte se busca uma aproximação com a realidade litúrgico musical
da Diocese de Vacaria/RS. Além da localização histórico-geográfica, apresentam-se
significativos elementos obtidos através de uma pesquisa de campo. Tendo-se como ponto
referencial o Curso de Canto Litúrgico e Pastoral (CCLP), em execução há três anos, procura-
se entender a compreensão que as pessoas têm de música e a forma que esta incide em suas
vidas. Depois, a pesquisa procura captar a função que a música ritual tem na liturgia, na
opinião dos entrevistados. De modo geral os entrevistados demonstram entender que uma
celebração bem cantada anima a caminhada e torna viva a Igreja cristã. Há, portanto, a
necessidade de preparar os agentes da arte musical para que contribuam na realização de
celebrações vivas através de um adequado uso da música e do canto nas celebrações
litúrgicas. O terceiro capítulo deste trabalho procura apontar indicativos práticos para a
formação dos ministros do canto e da música bem como para a sua atuação nos ritos
litúrgicos. Tais indicativos tomam em consideração os passos que já se tornaram realidade a
partir da renovação conciliar e, especialmente, as reflexões e exigências que se impõem para a
ação evangelizadora sob a ótica da Teologia da Libertação. Esse jeito de refletir e fazer
teologia inspirou passos significativos na reinterpretação bíblica e continua a oferecer
métodos de análise e reflexão pastoral, inclusive litúrgicos. Aos agentes do canto e da música
ritual da Diocese de Vacaria/RS sugere-se agirem considerando-se os fiéis como sujeitos da
ação litúrgica, proporcionando-lhes participação ativa e momentos de verdadeira
comunicação com seu Criador, através de liturgias bem cantadas. Propõe-se a formação
continuada e progressiva em diversos níveis, contando com a colaboração dos sujeitos desse
processo, os próprios agentes.

Palavras-chave: liturgia, música, canto litúrgico, Diocese de Vacaria/RS.


4

ABSTRACT
Song and music in the ritual context of the liturgy in the Catholic Church: challenges for the
formation of agents in the Diocese of Vacaria/RS. The sounds of nature, selected and
combined, gave origin to the musical art. Music belongs to human culture; it is constitutive of
its own existence. In the approach of this topic, the first chapter of this work looks for a
historical approach to music. It investigates the anthropology of music and its ritual relation to
the sacred, also as a part of Christian rites. The II Vatican Council has restored, in the
Catholic Church, the value of musical art and increased its possibilities. The musical art
begins to be inserted into the sacramental rites. More than singing in the liturgy, there is the
need to sing liturgy itself. Music begins to be understood as a means of participation, helping
the faithful to express their faith, their gratitude and their needs. In the second part, one looks
for an approach to the liturgical-musical reality of the Diocese of Vacaria/RS. Besides the
historical-geographical localization, there appear significant elements obtained through a field
research. Having as a referencial point the Course of Liturgical and Pastoral Singing (Curso
de Canto Litúrgico e Pastoral =CCLP), since three years in function, one tries to perceive
what understanding persons have of music and the form by which it influences their lives.
Afterwards, the research tries to capture the function of ritual music in liturgy in the opinion
of the persons interviewed. In a general way, the persons interviewed show their
understanding that a well-song celebration animates the journey and makes the Christian
Church to be alive. There is, therefore, the need to prepare the agents of musical art, in order
that they contribute to perform living celebrations through an appropriate use of music and
song in the liturgical celebrations. The third chapter of the present work tries to point out
practical indications for the formation of ministers of song and music, as well as for acting in
liturgical rites. Such indications take into consideration the steps which already became reality
since the conciliar renewal, especially the reflections and requirements necessary for the
evangelizing action from the point of view of the Theology of Liberation. This way of
reflecting and making theology has inspired significant steps in the biblical reinterpretation
and continues to offer methods of pastoral analysis and reflection, including liturgical ones.
To the agents of song and musical ritual of the Diocese of Vacaria/RS, it is suggested to act
by taking into consideration the faithful as subjects of the liturgical action, offering them
active participation and moments of true communication with their Creator, through well-
song liturgies. The suggestion is the continued and progressive formation on various levels,
counting on the collaboration of the subjects of this process, namely, the agents themselves.

Keywords: liturgy, music, chant liturgical, Diocese of Vacaria.


5

ABREVIATURAS
a. C. – antes de Cristo
Ap. – Livro do Apocalipse
Can. – cânone
CCLP – Curso de Canto Litúrgico e Pastoral
Cl. – Carta aos Colossenses
CNBB – Conferência Nacional dos Bispos do Brasil
DGAE – Diretrizes Gerais da Ação Evangelizadora
Doc. – Documento
Ed. – edição; edições
Ef. – Carta aos Efésios
Etc. – et cetera
IGMR – Instrução Geral do Missal Romano
Imp. – impressão
Ispal – Instituto de Pastoral Litúrgica
Itepa – Instituto de Teologia e Pastoral
Jr. – Livro do Profeta Jeremias
km – quilômetro(s)
Lc. – Evangelho segundo Lucas
Ltda – limitada
MHE – Metodologia Histórico Evangelizadora
Nº – número
Orgs. – organizadores
p. – página
Pe. – padre
Pr. – pastor
RS – Rio Grande do Sul
SC – Santa Catarina (Estado)
SC – Sacrossanctun Concilium
ss – seguintes
TdL – Teologia da Libertação
Tg – Carta de São Tiago
Trad. – tradução
6

SUMÁRIO
INTRODUÇÃO ………………………………………………………………………. 07

I – MÚSICA E LITURGIA ……………………………………….. 11


1.1 – A Música na História ……………………………………………………………... 11
1.1.1 – História da Música entre os povos antigos …………………………………. 12
1.1.2 – História da Música na era Cristã …………………………………………….... 13
1.1.3 – A era da Indústria Cultural …………………………………………………. 18

1.2 – Antropologia da Música ………………………………………………………….. 20


1.2.1 – Antropologia Litúrgica …………………………………………………….. 21
1.2.2 – O Poder comunicativo da Música ………………………………………….. 24

1.3. A música inscrita na ritualidade litúrgica …………………………………….... 25


1.3.1 – Em busca do conceito de Liturgia …………………………………………..... 26
1.3.2 – A Assembléia litúrgica ……………………………………………………... 29
1.3.3 – Ação de diálogo entre Deus e a Assembléia ……………………………….. 32
1.3.4 – O caráter ritual da Liturgia ………………………………………………….... 34
1.3.5 – A relação música e rito …………………………………………………...... 39
1.3.6 – Compreensão litúrgica do canto e da música hoje ………………………….... 41

II – PRÁTICA LITÚRGICO-MUSICAL NA
DIOCESE DE VACARIA/RS ……………………………….... 44
2.1 – A Diocese de Vacaria/RS: elementos históricos e geográficos ……………….. 44

2.2 – Elementos históricos da caminhada litúrgico-musical diocesana …………… 46

2.3 – A prática litúrgico musical das comunidades católicas na atualidade ……… 49


2.3.1 – O Curso de Canto Litúrgico e Pastoral …………………………………........ 49
2.3.1.1 – Um processo em construção ………………………………………………. 49
2.3.1.2 – Conteúdo e Método ………………………………………………………... 50
2.3.1.3 – Os participantes dos CCLPs ………………………………………………. 53
2.3.1.4 – Avaliação dos participantes ……………………………………………... 53
2.3.1.5 – Ganhos e desafios …………………………………………………………. 54
2.3.2 – A música na vida: uma tentativa de leitura a partir da pesquisa de campo .... 56
2.3.2.1 – Perfil dos entrevistados …………………………………………………… 57
2.3.2.2 – Formação litúrgica e musical ……………………………………………... 57
7

2.3.2.3 – O que é essa arte chamada música? ………………………………………. 58


2.3.2.4 – Gosto musical e elementos atrativos na música …………………………... 59
2.3.2.5 – A música na liturgia cristã ……………………………………………….... 60
2.3.2.6 – O papel dos ministros do canto e da música …………………………….... 61
2.3.2.7 – A música no horizonte da esperança …………………………………….... 62
2.3.2.8 – Conclusões da pesquisa …………………………………………………… 64

III - CANTAI AO SENHOR UM CÂNTICO


NOVO – INDICATIVOS LITÚRGICO-
MUSICAIS PARA A DIOCESE DE
VACARIA/RS ……………………………………………………………... 68
3.1 – Uma caminhada iniciada há muito tempo e por muitas mãos ………………. 68

3.2 – A Teologia da Libertação ………………………………………………………. 71

3.3 – Missão da Ciência Litúrgica à luz da TdL: em busca de um método de 73


formação ……………………………………………………………………………….

3.4 – Objeto de estudos da ciência litúrgica ………………………………………… 75

3.5 – Tese-antítese-síntese: experimentos pastorais no Itepa ………………………. 77

3.6 – Sugestões acerca da música e do canto litúrgicos …………………………….. 80


3.6.1 – Os grupos de animação …………………………………………………..... 86
3.6.2 – Os animadores ou regentes ……………………………………………….... 88
3.6.3 – Os instrumentos e os instrumentistas …………………………………….... 89
3.6.4 – Os ensaios de cantos ……………………………………………….……… 90
3.6.5 – Desafios à ação litúrgica …………………………………………………... 91

CONCLUSÃO …………………………………………………………………………... 93

REFERÊNCIAS ……………………………………………………………………....... 98

ANEXO A – entrevistas ……………………………………………………………… 101

ANEXO B – fotos ……………………………………………………………………... 114

ANEXO C – mapas ……………………………………………………………………... 116


8

INTRODUÇÃO

Ao completar onze anos minha família presenteou-me um violão. Foi um sonho


realizado! O desafio era, então, saber tocar o tão desejado instrumento musical. Ali mesmo,
no interior de Sananduva/RS, um bom professor ajudou-me nos primeiros contatos com uma
arte que já não me contentava expectador. A situação existencial de um adolescente comum
me fez abandonar o curso alguns meses depois. E o violão permaneceu guardado por alguns
anos.
Com quase vinte anos, o reencantamento. Dessa vez era irreversível. Contando com
algumas noções básicas e alguns meses de instrução profissional, comecei a arriscar o
acompanhamento de algumas músicas cantando com outros jovens. Mais adiante foi possível
contribuir nas celebrações da Igreja, de pequeno e grande porte, em reuniões, cursos,
assembléias. O que se costuma denominar talento musical não continuou sendo cultivado o
bastante nos anos que se seguiram, os últimos dez anos. Tampouco pude atingir um nível
profissional, como músico.
O que cresceu, isto sim, foi o encantamento pela música. Jamais tornei a ser mero
expectador dela. Um processo de interação com a arte musical tem sido uma constante. Ela é,
então, companhia, relacionamento, diálogo, interação. Com muita freqüência desencadeia
percepções e intuições para inúmeras situações onde me encontro envolvido. Muitas vezes,
tais idéias – e as respectivas composições inspiradoras – transformam-se em vivências por
ocasião de reuniões e celebrações.
Interatividade. Esse pode ser o nome da relação que se dá entre a arte musical e o
ouvinte ou aquele que a executa. Quem não tem na memória alguma ou várias melodias e
trechos de canções que lhe marcaram por algum motivo? E ao escutá-lo não se reporta para
aquele momento, aquele lugar, aquela situação existencial? E por um instante não revive tudo
novamente? Interagem porque ambos – arte e indivíduo – têm algo que recebe e algo que
oferece.
Os primeiros ensaios desta elaboração dissertativa versavam sobre os ritos e símbolos
da liturgia cristã. A necessidade de delimitar melhor o foco do projeto levou a escolher a
música e o canto litúrgicos. Claro que para acontecer o “estalo” foi oportuno que alguém
9

mostrasse: “não é este um assunto que te encanta e tem te ocupado?”. De fato estava bastante
envolvido no processo de preparação dos Cursos de Canto Litúrgico e Pastoral na Diocese de
Vacaria/RS.
A partir de então, e com nova e significativa orientação, a pesquisa avançou de forma
empolgante. Tinha à frente um assunto palpável, cativante, além de estar inserido numa
experiência diocesana acerca do assunto.
A hipótese de a música conter em si certa ritualidade e – talvez por isso mesmo –
prestar-se para as ações rituais da Igreja animaram as investigações. O texto que segue, fruto
dessas investigações, tem como pano de fundo uma pergunta central: qual o melhor jeito de
aproveitar as possibilidades da arte musical a fim de que as liturgias sejam excelentes
oportunidades de encontro das pessoas consigo, com seu círculo de relações e, especialmente
com Deus?
Se a música possui caráter de interatividade, não se constitui espaço privilegiado de
participação dos fiéis nas celebrações cristãs? Isso aponta para a necessidade de alguns
cuidados, o que resulta na definição por uma opção metodológica. Tal opção define alguns
critérios para o canto celebrativo, tais como: o papel da arte musical na liturgia; a escolha dos
conteúdos e melodias; a espiritualidade dos agentes; a didática e as estratégias que favorecem
à participação da Assembléia.
O objeto desta pesquisa é o canto e a música no contexto litúrgico da Igreja Católica,
em vista do processo de formação dos agentes da Diocese de Vacaria/RS. Este trabalho tem o
desejo de visualizar caminhos para uma adequada formação dos ministros do canto e da
música litúrgica naquela diocese.
Um processo mais consistente de formação para os ministros do canto e da música na
Diocese de Vacaria/RS começou há poucos anos objetivando auxiliar as comunidades
eclesiais católicas na tarefa de cantar a liturgia. O Curso de Canto Litúrgico e Pastoral brotou
de um clamor sentido entre os agentes comunitários encarregados do canto e da música que
vinham enfrentando dificuldades de levar adiante sua missão. Como está esse processo de
formação? O que é importante enfocar na preparação dos agentes litúrgicos, em se tratando da
arte musical?
A preocupação com o canto e a música – e, mais especificamente, com a opção
metodológica acerca do canto e da música litúrgica – visa favorecer as celebrações para que
sejam potencializadas pelo recurso da arte musical. Daí a necessidade de compreender o
alcance e os efeitos produzidos pela música no campo religioso por ocasião dos atos
litúrgicos.
10

As ciências do homem tentam explicar a gênese do universo: através de um ato de


criação onde Deus é o grande inventor ou através de um processo evolutivo, iniciado com
uma seqüência de explosões e que está em contínua transformação. Em ambos se teriam
efeitos sonoros: quer na verbalização do Criador (conforme os relatos bíblicos), quer na
seqüência de explosões.
Depois, a civilização consegue selecionar os ruídos. Seleciona e organiza de forma
harmônica. A combinação de sons tocam o ser humano e nele produzem efeitos. Então não é
difícil constatar que a música é um dado universal: faz parte da vida de toda pessoa humana.
A música está tão presente em nossa cultura que somos tentados a pensar que ela existe desde
que existe a humanidade.
O texto partirá de uma abordagem teórica da música apresentando elementos
históricos e antropológicos que podem ajudar a entender o sentido da música para a existência
humana. Também pesquisa elementos que localizam a música e o canto litúrgicos no campo
celebrativo cristão. Busca compreender a liturgia e sua relação com a música ritual
investigando as possibilidades de a música ser canal de comunicação humana e divina.
Portanto, o capítulo primeiro deste trabalho pretende uma aproximação com a história
e com a antropologia da música e sua relação ritual com o sagrado, a ponto de fazer parte,
inclusive, dos ritos cristãos.
O Concílio Vaticano II resgatou, na Igreja Católica, o valor da arte musical e ampliou
suas possibilidades. Mais que cantar na liturgia se nos impõe a necessidade de cantar a própria
liturgia. A música passa a ser entendida como veio de participação favorecendo que os fiéis
expressem sua fé, seu agradecimento e suas necessidades.
Nesse mesmo horizonte se esboça o segundo capítulo. Ali se tentará apreender a
prática litúrgico-musical na Diocese de Vacaria/RS. Além da localização histórico-geográfica,
apresentam-se significativos elementos obtidos através de uma pesquisa de campo que busca
perceber como as pessoas experimentam essa realidade em suas vidas. Tendo-se como ponto
referencial o Curso de Canto Litúrgico e Pastoral (CCLP), em execução há três anos, procura-
se entender a compreensão que se têm de música e a forma que esta incide na vida das
pessoas. Intenta-se localizar essa prática litúrgica perguntando-se: como e o que se canta nos
atos litúrgicos desse contexto? Há uma ação orientada, pensada ou isso se dá
espontaneamente? Quais são as lacunas que essa realidade tem? Como os agentes do canto e
da música participam? Eles são sujeitos protagonistas do serviço que prestam? Desse modo, a
pesquisa procura captar a função que a música ritual tem na liturgia, na opinião dos
entrevistados.
11

Ademais, se procurará contemplar a formação em andamento em nível diocesano, mas


procurando sentir como isso se dá em nível comunitário. Também serão apresentados alguns
dados coletados – nos arquivos da Cúria Diocesana ou disponíveis nas comunidades de base –
acerca do canto litúrgico: livros ou cancioneiros e trajetória formativa para agentes.
Em vista de descobrir caminhos para a promoção de liturgias eficazes através da boa
interação com a música, se procura vislumbrar indicativos de ação. Os elementos teóricos e a
leitura da realidade se cruzam e, no terceiro capítulo, procura-se projetar um zeloso processo
formativo. Possibilidades metodológicas podem surgir a partir de um processo dialético
constante onde dialogam a realidade eclesial e a Revelação divina.
Alguns indicativos práticos para a formação dos ministros do canto e da música bem
como para a sua atuação nos ritos litúrgicos podem nascer. Tais indicativos tomam em
consideração os passos que já se tornaram realidade a partir da renovação conciliar e,
especialmente, as reflexões e exigências que nascem de uma ação evangelizadora eficaz sob a
ótica da Teologia da Libertação contemplada neste trabalho. Esse jeito de refletir e fazer
teologia inspirou passos significativos na reinterpretação bíblica e continua a oferecer
métodos de análise e reflexão pastoral, inclusive litúrgicos.
Ao final deste texto encontram-se três anexos que possivelmente ilustram algumas
informações disponíveis nesta elaboração dissertativa e que podem ser conferidos a qualquer
tempo.
12

I – MÚSICA E LITURGIA

Neste primeiro capítulo será abordado – a partir da investigação basicamente teórica –


a música em si: sua história, antropologia e sua presença na liturgia cristã.
A música está diretamente ligada à vida humana. Expressa os mais profundos brados
da alma de cada pessoa. Conhecer a música de um povo é também conhecer a sua cultura, o
seu jeito de ser e de viver. Cantar é deixar falar a vida em sua mais sublime expressão de
verdade, de transparência e de transcendência.
Um dos sentimentos mais profundos do ser humano é o sentimento religioso. É, por
assim dizer, a expressão do desejo profundo de comunhão com o ser transcendente, Deus. A
liturgia constitui-se num jeito especial de entrar em comunhão com Ele; nela, o canto e a
música exercem papel fundamental para que o Mistério Pascal torne-se mais vivo na
comunidade que celebra. É o povo cantando a vida e as maravilhas da presença de Deus em
sua história.
Inicialmente buscar-se-á reunir alguns elementos que localizam, historicamente, o
desenvolvimento da música entre os povos. A seguir passaremos a compreender a
antropologia da música, sobremodo, da música litúrgica. Já adentrando no campo da
ritualidade, convêm, então, abordar o caráter ritual-simbólico da liturgia dos cristãos,
destacando o canto e a música litúrgicos, sua finalidade e seu caráter nos atos de culto.

1.1 – A Música na História


A música parece ser um dado universal: faz parte da vida de toda pessoa humana.
Ione Buyst lembra que há vários tipos de música, conforme a finalidade a que se
destina: “música ambiente, música para relaxamento, para acompanhar o trabalho, para
brincadeira de crianças, cantigas de ninar, música para tirar leite de vaca, para estimular as
compras no supermercado, para marchar, dançar, etc” 1. Há um tipo de música que expressa a
relação do indivíduo ou de um grupo de pessoas com o transcendente: é a música considerada
religiosa, ou a música sacra.

1
BUYST, Ione. O mistério celebrado: memória e compromisso I, Editoras Siquem/Paulinas, 2002, p. p. 142-
148.
13

1.1.1 – História da Música entre os povos antigos


A música está tão presente em nossa cultura que somos tentados a pensar que ela
existe desde que existe a humanidade. De fato, ao se investigar a história da música constata-
se que a música acompanha o homem desde tempos muito remotos. Tanto tempo que fica até
difícil precisar muitos elementos, dentre eles a origem de sua aproximação aos ritos
religiosos.
A partir de agora buscaremos reunir elementos que proporcionem uma visão histórica
da música entre os povos, sobretudo, a música que visa o encontro do homem com Deus, ou
seja, a música sacra.
Da antiguidade não temos nenhuma partitura que possa ilustrar o que se tocava e
ouvia. Tudo o que se tem é a informação de que ela existia. O que parece inegável – segundo
T. Ellingson, citado por Terrini – é que “os textos religiosos foram cantados, não escritos,
através de toda a história mais antiga da humanidade” 2. A partir do século III a. C., começam
a aparecer algumas transcrições que revelam as primeiras teorias musicais.
A afinidade entre rito e música parece algo bastante aceito desde muito tempo, sendo
difícil situar a origem de tal aproximação, como se acenou acima. Aliás, seguindo Terrini, “se
nós partirmos da palavra “rito”, tal como é entendida nas origens […], dificilmente podemos
dissociar o sentido próprio dessa palavra de um certo conteúdo musical” 3. Até porque,
segundo o mesmo autor, no ambiente oriental a etimologia da palavra rito significa “ordem
cósmica”, o que o faria verdadeiramente próximo da concepção de música, cuja principal
característica é a harmonia.
A teoria acima mencionada parece ser originária da Mesopotâmia. Há quem reconheça
que a Mesopotâmia seria a mãe da música, em todos os aspectos. Vejamos, então, um pouco
dessa história da antiguidade.
1) Mesopotâmia: quatro milênios antes da era Cristã a Mesopotâmia já contava com
seus templos que, além de serem o lugar da oração e do canto, eram verdadeiros centros da
vida cultural e intelectual da época. O canto no templo contava com alguns serviços, como os
precentores (dirigentes do coro) e que cantavam salmos com acompanhamento de flauta,
tambor, tímpano, tamborim, harpa. Indica-se, também, a existência de elementos que
conhecemos na liturgia cristã, na atualidade, tais como o interlúdio (interrompia ladainhas
muito prolixas) e a antífona (de resposta). Havia uma “oração ao Deus da Lua” – que visava a

2
T. Ellingson apud TERRIN, Aldo Natale. O Rito: antropologia e fenomenologia da ritualidade. S. Paulo:
Paulus, 2004. p. 268.
3
TERRINI, 2004, p. 270.
14

proteção do rebanho e das colheitas – cujos refrões são semelhantes aos nossos responsórios.
Deduzimos disso que “a música ingressou no culto já nos tempos mais remotos e sempre teve
um papel importante dentro do culto, a ponto de ser expressão integrante do próprio ritual” 4.
2) Egito: além de aparecerem os precentores ou leitores e sacerdotes, segundo
testemunho de Heródoto, outra pista dada por Clemente de Alexandria é de que existiam dez
livros, no mundo egípcio, dedicados aos hinos. Aparece uma concepção, dentre os egípcios,
de que “os próprios deuses são ‘cantores’, gostam da música e ensinaram aos homens as
melhores melodias” 5. Pelo ano 1570 a. C. aparecem as mulheres musicistas, em boa parte,
esposas ou filhas de sacerdotes. Elas participavam dos ofícios de culto e seus instrumentos
eram o sistro, a flauta e a harpa.
3) Índia: possivelmente a Índia antiga seja o país que, mais que qualquer outro,
apreciava a música. Parece não ser possível viver sem música assim como não o é possível
sem alimento. Identificou a música com as concepções filosóficas, religiosa, cosmológica e
musical. Mais que se identificar com o ritual e a religião, a música é portadora de salvação. E
os deuses não só gostam de música, como, também, fazem música, são músicos. Os
instrumentos usados: tambores tocados com as mãos, flauta, harpa curva. Data do ano 200
a.C. a primeira teoria verdadeiramente musical, composta de 36 capítulos. Estudos deduziram
que haviam músicas mais flexíveis e articuladas para se executar durante o dia e, “nas outras
horas apresentavam-se músicas mais sóbrias e contidas” 6.
4) China: no complexo mundo chinês, onde a música está relacionada com os ritos e
com a vida religiosa, há uma atenção especial à harmonia de todas as atividades humanas. Na
concepção da China antiga, toda a ordem do mundo modula-se pela escala pentatônica,
conhecida na época. Em sua teoria, “a música não é outra coisa que a substância das relações
harmônicas que devem reinar entre céu e terra” 7. Essa teoria da harmonia universal assumia,
também, o sentido religioso de forma plena.

1.1.2 – História da Música na era Cristã


Qual era a atitude dos primeiros cristãos em relação à música? Os relatos históricos
que respondem a essa indagação podem surpreender.
O Apóstolo Paulo, em suas cartas às comunidades cristãs, exorta aos cristãos para que
prestem culto a Deus com canções. Na Carta aos Efésios recomenda que “juntos recitem

4
TERRINI, 2004, p. 275.
5
TERRINI, 2004, p. 275.
6
TERRINI, 2004, p. 279.
7
TERRINI, 2004, p. 280.
15

salmos, hinos e cânticos inspirados, cantando e louvando ao Senhor de todo o coração” (Ef 5,
19). E na Carta aos Colossenses: “inspirados pela graça, cantem a Deus, de todo o coração,
salmos, hinos e cânticos espirituais” (Cl 3,16). Esta atitude deveria ser expressão de uma
convicção interior.
Mas logo surge uma oposição ao uso da música nas ações litúrgicas cristãs por causa
da relação com os não-cristãos ou com os pertencentes às religiões mistéricas. Os Padres da
Igreja, irritados, tentam impedir a invasão de instrumentos em todos os tipos de ritos
religiosos cristãos. Terrin cita, por exemplo, Clemente de Alexandria que assume uma batalha
pessoal contra a música dos ídolos; Gregório Nazianzeno convida os cristãos a “não usarem
os instrumentos musicais dos pagãos, porque o que conta é a cordialidade espiritual e a pureza
da alma dos que participam do verdadeiro serviço divino” 8. Fica evidente que, entre os
Padres da Igreja, há rejeição ao uso de instrumentos musicais. Isso a tal ponto de falarem dos
instrumentos musicais citados no Antigo Testamento como metáforas, a fim de evitar o uso
desses instrumentos entre os cristãos.
Para justificar o uso desses instrumentos entre os judeus, se afirmava que “tratava-se
de instrumentos que no passado tinham sido permitidos pela fraqueza mental dos judeus, que
precisavam libertar-se dos seus ídolos” 9.
Essa fobia dos Padres da Igreja tinha em sua base a intenção de evitar o culto aos
deuses, que existia fora do âmbito cristão, onde havia justamente a música. Existia a idéia de
que a música “poderia levar longe demais e muito facilmente à adoração de ídolos e de
divindades fora da esfera do único Deus, pai de Jesus Cristo”, assim como no Egito e outros
lugares, onde se colocavam juntas muitas divindades. O culto às divindades, nesse caso, eram
“evocadas e convocadas através de instrumentos musicais, variados e sedutores” 10.
De acordo com o autor citado, historicamente seguiram-se várias proibições no campo
litúrgico-musical, nos séculos seguintes. Exemplo disso é a proibição de as mulheres
cantarem na liturgia. Ainda havia restrições para o uso da música a fim de evitar semelhanças
com os cultos dos outros povos. Portando, aos cristãos “convinha rezar e cantar mais com o
coração, interiormente, do que com a voz e/ou os instrumentos musicais” 11.
Pelo ano 400, procurando “bloquear um fenômeno que podia ser traumático”,
aparecem textos que esclarecem as finalidades do canto nas assembléias litúrgicas. O “Cânon

8
TERRIN, 2004, p. 306.
9
TERRIN, 2004, p. 307.
10
TERRIN, 2004, p. 307.
11
TERRIN, 2004, p. 308.
16

de Basílio” orienta: “aqueles que cantam os salmos no altar não devem cantar com alegria,
mas com sabedoria; e só devem cantar os salmos” 12.
13
A seguir se abordará a história da música segundo a classificação : modal, tonal e
pós-tonal. Tal classificação está relacionada também às concepções de mundo em cada tempo
histórico. Por isso são denominados “mundo”.
a) Mundo Modal:
Compreende todo o período da antiguidade até a Idade Média. Um dos marcos
musicais do mundo modal é a presença do pulso fortemente definido; o outro é a presença de
uma tônica fixa, que permanece como um fundo imóvel, explícito ou implícito, sob a dança
das melodias. Possui caráter circular das estruturas rítmicas e melódico-harmônicas o que
confere uma experiência de tempo repetitiva e produz uma visão de mundo imutável. O pulso
é um mecanismo bastante eficiente para hipnotizar, levar ao estado de transe. Prova evidente
disso é o carnaval e o candomblé. Portanto a música é portadora de uma ordem sacrifical
(ritualística). Nela não há temas: a música sempre supõe uma significação externa, encontrada
numa outra totalidade e o som é instrumento de contato com essa outra totalidade. Está em
uso a escala pentatônica (apenas cinco notas). Elas possuem encaixe perfeito já que cada nota
se encaixa com outras duas notas e bate de frente com mais duas. Isso lhe permite eliminar
14
toda dissonância sonora, produzindo um som suave a exemplo dos sons orientais . Assim
concebida, a música é força contra qualquer inovação; vincula-se a uma ordem eterna e
imutável que tem importantes implicações sociais.
Na Idade Média temos o Canto Gregoriano (ou cantochão), o canto oficial da Idade
Média, embora houvesse outros. Este é caracterizado, não mais pelo transe do corpo, mas do
cérebro. Há uma recusa ao pulso. Não há percussão: são vozes em polifonia, ou seja, várias
vozes cantando a mesma melodia. Também não há tonalidades dissonantes.
O Canto Gregoriano é um herdeiro da harmonia das esferas. Assim como na visão
platônica, na Idade Medieval o corpo é abominável, representa algo decadente, pecaminoso.
Então o pulso, que se refere ao corpo, é inadmissível. A música se desenvolve, então, no
plano das alturas (freqüência), negando o ritmo recorrente e as estruturas simétricas da canção

12
TERRIN, 2004, p. 308.
13
Para esta abordagem se utilizou das memórias de aula da disciplina de Estética e Filosofia da Arte no Curso de
Filosofia da Universidade de Passo Fundo, em outubro de 2003 e das seguintes obras bibliográficas: 1)
TROMBETTA, Gerson Luís. A Pedagogia da experiência estética no contexto da indústria cultural. In:
DALBOSCO, Cláudio Almir. Filosofia Prática e pedagogia. Passo Fundo: UPF, 2003. p. 159-170. 2) WISNIK,
José Miguel. O som e o sentido. São Paulo: Companhia das Letras, 1989.
14
Com a ajuda de um teclado é possível experimentar isso que foi exposto: basta acionar as cinco teclas pretas
de uma oitava. O som produzido retrata essa suavidade de que se está falando.
17
15
popular para fluir estaticamente sobre as sílabas sonoras. Não é possível bater o pé num
ritmo cadenciado durante a execução do Canto Gregoriano. “O transe é dinâmico, constituído
a partir do movimento do corpo e da anulação do cérebro; o êxtase, por sua vez, é estático,
deixando o corpo imóvel e cooptando a energia mental” 16.
No canto gregoriano, então, a música é o território de luta entre a elevação ascética e a
sedução sensível do ouvido. O êxtase não pertence ao corpo, mas ao cérebro. Tudo está sob
controle, expresso na harmonia polifônica.
Estão negados (proibidos) os “acidentes” dissonantes. Na arte musical há um elemento
denominado trítono, que corresponde à quarta aumentada – intervalo de três sons que temos,
por exemplo, entre o FÁ e o SI ou o DÓ e o Fá#. O trítono é a figura da dissonância em meio
à harmonia da polifonia medieval.
A dissonância, na cosmovisão medieval constitui “falha cósmica”, é a figura do mal,
do imperfeito, do diabo (o diabolus in musica); não há nada a fazer com o trítono a não ser
evitá-lo a todo custo. Nas outras tradições modais, o trítono era “afogado” no caldo do ritmo.
Na Idade Média, a música também é modal – inclusive o sentido é o mesmo –, porém,
o caminho é diferente. Se antes o caminho para a totalidade, para o divino, era o corpo, agora
é o cérebro. O trítono (ou dissonância), é compreendido como algo diabólico (dia+bolus =
separação; contrário de syn+bállein = junção). A música com tons dissonantes seria, assim,
uma afronta ao cosmos harmonizado e, portanto, uma afronta ao seu Criador, Deus.
Por isso, a negação do pulso na música gregoriana, prepara o substrato para o mundo
tonal.

b) Mundo Tonal: o momento da racionalização


A polifonia que se desenvolve na Idade Média ao longo dos séculos IX a XV, marcada
pela trama simultaneizada das vozes modais, vai suscitar um problema concreto e bem
terreno: a questão da dissonância e sua resolução. É este o elemento desencadeador de uma
nova época musical: o mundo tonal. É o mundo da “vingança do trítono”. Aquilo que era
negado ressurgirá como o elemento gerador de um novo sistema baseado nas trocas entre
tensão e repouso 17.

15
O seu caráter é estático, em oposição às músicas do transe. O transe é dinâmico, um zero mental que se
transforma em movimento do corpo, dança. O êxtase é estático: o corpo não se move.
16
TROMBETTA, Gerson Luís. A Pedagogia da experiência estética no contexto da indústria cultural. In:
DALBOSCO, Cláudio Almir. Filosofia Prática e pedagogia. Passo Fundo: UPF, 2003. p. 164.
17
TROMBETTA, 2003, p. 165.
18

Na Idade Moderna, Bach é o mais religioso dos compositores. Ele compõe aliviando a
tensão tritônica, colocando notas musicais em suas composições, a que se denomina resolução
– “dominando o diabo” na Idade Média. Várias composições dessa época (Bach e outros)
utilizam a polifonia sem harmonia, ou, jogos de intensa separação, que de vez em quando se
18
encontram. As faixas nº 15 e 16 do roteiro O som e o sentido demonstram exemplos de
19
trítono puro; já nas faixas nº 17 e 18 do mesmo roteiro são demonstrações de tensão e
resolução. A diferença de sensações, ao ouvir os sons, é de alto desconforto no primeiro caso
20
e, de satisfação no segundo . Muitas composições de Mozart e Beetoven são marcadas por
esse estilo: aparecem, constantemente, tensão e resolução; tensão e resolução. É o mundo
tonal marcando o Renascimento.

É o mundo em que as possibilidades sonoras são amplamente racionalizadas. Os


jogos de tensão-resolução (repouso) compõem todo o tecido musical. Com a
presença dos momentos de tensão, a música ganha uma dinâmica narrativa e
incorpora a idéia de progresso. A presença da tensão e sua imediata resolução é o
21
que cria elementos intensamente sedutores no interior das músicas.

O mundo tonal, em síntese, se caracteriza por: 1) uso da escala heptatônica (sete


notas); 2) hierarquização e matematização dos sons (som racionalizado); 3) a diacronia, ou
seja, noção evolutiva do tempo e idéia de progresso; 4) a música ganha dinâmica dialética: a
tese (repouso) movimenta-se para a antítese (tensão) buscando, a seguir, a síntese (resolução).
É possível perceber, portanto, um período da música em transição, que passa da
influência sobre o corpo para a influência sobre o cérebro, e que vai gerar – pela negação à
dissonância – um novo sistema de tensão e repouso (mundo tonal), enriquecendo a história da
música. Isso representa um ganho à autonomia humana que passa a negociar com as forças
sobrenaturais que o ameaçavam. O homem moderno tende a se livrar dos medos mitológicos e
tende a confiar na razão. Uma vez que a razão pode levá-lo ao progresso, a música poderá
satisfazer essa necessidade.

18
WISNIK, José Miguel. O som e o sentido. São Paulo: Companhia das Letras, 1989, p. 266.
19
WISNIK, 1989, p. 267.
20
Parece interessante fazer aqui, uma ligação dessa sensação provocada pelo som, com o sentimento gerado pela
Indústria Cultural que abordaremos modestamente mais adiante. Se, na música, temos a resolução da tensão
provocada pela dissonância das notas, no contexto de Indústria Cultural “o que se resolve é a tensão que o
produto mesmo criou, proporcionando um prazer fugaz” (TROMBETTA, 2003, p. 161).
21
TROMBETTA, 2003, p.165.
19

c) Mundo Pós-Tonal:
O mundo pós-tonal é o mundo baseado na crítica à idéia de progresso, à idéia de
evolução, à composição como narrativa e uma crítica à idéia de domínio. Aqui o movimento
de tensão e repouso é rejeitado. Há, isto sim, constante tensão, não havendo, assim, aquele
efeito de beleza como no movimento anterior. Isso se constitui oposição à idéia de progresso,
ou seja, a barbárie nunca é superada; a razão, quando dorme, produz a barbárie.
Dentre as características dessa música (atonal) temos que tal arte torna-se enigmática;
a memória não consegue repetir o que ouve (ao contrário das músicas tonais onde a dinâmica
da narrativa podia ser ouvida e repetida). Ademais, não há mais hierarquia rígida dos sons
completamente dominada pelo compositor. No mundo atonal, a escala é dodecatrônica (doze
tons) e todas as notas têm o mesmo valor. Não é mais o homem que está em evidência e sim a
exposição das possibilidades da própria música; não mais um conteúdo racional ou uma
estória a ser contada mas a tentativa de explorar as potencialidades carregadas na matéria
sonora.
A tensão não é mais propedêutica, preparatória para a resolução, mas sim o princípio
fundamental. A resolução sai de cena por um princípio técnico pois uma nota só ocorre depois
das outras onze serem executadas. O único progresso que há é a expansão de possibilidades
da arte, porque no mundo não há progresso: a barbárie está sempre retornando. A arte se torna
refratária e a indústria cultural oferece produtos para o simples deleite.

1.1.3 – A era da Indústria Cultural


A arte verdadeira parece ter morrido. Ela evoluiu tanto – devido à aplicação das
fórmulas matemáticas – que já não realizam a auto-reflexibilidade da razão. No século XX, os
padrões de valores da arte foram apropriados pela indústria cultural.
Ao contrário, as músicas verdadeiramente artísticas são aquelas que apresentam
enigmas; que possuem um alto potencial questionador e que provocam para a reflexão. Estas,
além disso, possuem alto potencial pedagógico.
Numa abordagem breve se pode dizer que a indústria cultural se caracteriza pela
aplicação da razão instrumental às obras de arte e às músicas, transformando-as em meios
para o lucro, em mercadorias produzidas em série com a finalidade da comercialização.

O nosso gosto musical foi formado pelo que pode ser mais corretamente
denominado como uma música popular industrializada, ou seja, uma música que se
tornou produto fonográfico e, a partir desse fato, encontrou as condições para sua
divulgação e distribuição. O processo de escolhas que levou a essas decisões de
20

investimento por parte de diferentes empresas não é evidentemente, inocente. Passa


por questões econômicas, culturais, étnicas, religiosas e políticas. 22

Disso se deduz que as condições contextuais da música, na atualidade, são


marcadamente alienantes. Além de serem produzidas em série, inspiradas num padrão de
necessidade intencionalmente criado, delas se ausenta o potencial questionador, de modo
geral. Elas produzem a sensação de resolução e as tensões praticamente inexistem. A indústria
cultural preza pelo não esforço do consumidor.
A cultura produzida pelo fenômeno da industrialização parece conseguir convencer de
que a boa música é a que é reconhecida. Para isso identifica o gosto popular musical, produz
para atender essa demanda e vende a idéia de que isso é o melhor que já se produziu. A
música popular, vista de forma simplificada – na opinião de Eduardo Vicente – é tema que
desperta saudáveis paixões. Mas ele identifica uma oposição que marca o presente histórico
dessa expressão de arte e que, de certa forma, vive um impasse: as “oposições entre artistas
reais e fabricados, grandes corporações e produtores independentes, executivos e camelôs,
alienação e engajamento” 23.
Para onde vai a música popular? Vive-se a sensação de que a verdadeira arte musical
deixa espaço para uma produção industrializada, fabricada, senão no terreno da existência,
nos laboratórios tecnológicos cada vez mais sofisticados. E a arte de raiz? E seus criadores?
Nas reflexões de Vicente, já citado, na era do MP3 24 vive-se o fantástico fenômeno da
massificação musical. Mas, segundo ele, isso não é de todo ruim. Acontece que o acesso aos
25
meios de produção de áudio e sua divulgação facilitada pela internet , têm aumentado,
possibilitando o acesso até mesmo aos artistas de classes menos elevadas.
Esse novo cenário parece apontar uma nova lógica e novas tendências. Dado o
insucesso das grandes empresas em tentar impedir a “pirataria” e disseminação de novos
artistas e suas produções através da internet – o que acarretava a diminuição das vendas de
discos – usa-se desse meio como uma estratégia de inversão do processo que lhes prejudicava.
Ou seja, a distribuição on-line e a respectiva contabilização de downloads oferece uma
hierarquia de preferências numa nova parada musical em curtos espaços de tempo. Assim
sendo a distribuição de CDs promocionais torna-se verdadeiro cartão de visitas que, associada
22
VICENTE, Eduardo. Por onde anda a canção?: os impasses da indústria na era do MP3. In.: SANTOS,
Roberto Elisio dos et al (Orgs.). Mutações da cultura midiatica. São Paulo: Paulinas, 2009. p. 148-149.
23
VICENTE, 2009, p. 143-144.
24
O formato de áudio MP3 surgiu em 1992 como conseqüência da necessidade de tornar mais compactos os
discos, desenvolvendo-se o disco ótico, o DVD (cfe. VICENTE, 2009, p. 157).
25
A rede mundial de computadores foi desenvolvida dentro do meio acadêmico visando responder a uma
demanda militar norte-americana: “a difusão de seu uso se deu a partir da lógica acadêmica de partilha de
informações” (VICENTE, 2009, p. 157). Posteriormente é que adquiriu caráter comercial.
21

à internet, trabalham para induzir o publico consumidor aos shows, às festas, que são o novo
negócio. Portanto os grandes shows e a veiculação radiofônica são as novas fontes de lucro da
indústria musical 26.
Na opinião de Vicente, tal estratégia “não serve para todos os artistas, mas apenas aos
27
que realizam shows capazes de atrair um significativo público pagante” . O show dos
cantores de renome nacional, Vitor & Léo, no dia 17 de outubro de 2009 em Passo Fundo
reuniu mais de quinze mil pessoas. O preço dos ingressos variou entre R$15,00 e R$60,00, o
que permite dizer que o público pagante entregou à “G8 Produções” não menos que trezentos
mil reais. Isso pode ilustrar o que se está afirmando.

1.2 – Antropologia da Música


28
A antropologia, de maneira geral, estuda o homem em seu mundo de relações .
Ocupa-se com a totalidade da vida do homem a fim de entender as origens, as relações, os
significados da cultura social: “se concentra pois nas culturas humanas, sua história, sua
26
Cfe. VICENTE, 2009, p. 159-163.
27
VICENTE, 2009, p. 163.
28
Acerca da antropologia conferir a obra de Julián López MARTÍN. No Espírito e na verdade: introdução
antropológica à liturgia. Trad.: Lúcia M. Orth. Petrópolis: Vozes, 1997. Segundo ele identificam-se várias
correntes e tendências da antropologia cultural. Algumas incidem no mundo religioso e litúrgico. a) Na corrente
Sociocultural, é possível identificar o rito cristão como resultado final dos ritos do mundo antigo; aqui se estuda
o parentesco das práticas religiosas, mágicas e outras atividades sociais; há quem identifique a origem dos ritos
religiosos e da magia como “tensão emocional experimentada pelo homem por não poder controlar a natureza
[ou] a religião se explica rigorosamente por motivos de caráter social e funcional” (MARTÍN, 1997, p. 25); outra
contribuição importante desta corrente é o estudo de temas mais concretos como a religiosidade popular, a arte,
etc. b) Na corrente Psicológica temos a psicanálise freudiana que identificou a religião como sendo a projeção da
vida interior do homem. Bem mais além do que evidenciar as deficiências do comportamento religioso, tal teoria
ajudou a perceber a influência mútua entre indivíduo e sociedade. Uma vez que não se separam os aspectos
humanos dos aspectos divinos e salvíficos da liturgia, a psicologia contribui na compreensão do campo do
simbolismo. Embora seja bastante difícil determinar o entendimento antropológico da dimensão simbólica, sabe-
se que “o símbolo incide na experiência e afeta o homem na totalidade de seu ser, inclusive sua corporeidade”
(MARTÍN, 1997, p. 30). c) A corrente Lingüística se ocupa dos processos comunicativos de conceitos e
realidades. A semiologia – um de seus ramos – se destaca como a ciência dos significantes de expressão
simbólica. Exemplo disso são os mitos, também considerados uma forma de comunicação de cultura. Eles
contêm, em sua estrutura, uma tal repetição que permite conhecer o alcance desse mito e a lógica que nele se
encerra. Para os liturgistas esse dado não é só antropológico: os mitos e os ritos possuem significado teológico.
d) Corrente Ritualista: no estudo dos símbolos, a antropologia concentrou-se mais na análise da função social
dos ritos. Portanto pôs em evidência o grupo social que os realiza. Percebe-se o símbolo não como um objeto que
está no lugar do outro, mas a relação entre objetos ou idéias que estão implicados um no outro. Não será
finalidade da liturgia, portanto, “transmitir mensagens doutrinais codificadas num suporte simbólico”, mas, antes
disso, ela “torna presente um acontecimento salvífico, mediante um ritual simbólico”. Então os ritos “são vividos
enquanto se realizam e não nos textos ou nas descrições que deles se fazem”. Eles “só adquirem seu verdadeiro
significado quando são postos em prática na celebração e quando se alcança um elevado nível de participação”
(MARTÍN, 1997, p. 33-34). e) A corrente Fenomenológica interessa-se pelas manifestações da religião. O
interesse da liturgia pela fenomenologia do fato religioso se dá pela importância que tais fenômenos dão ao
conceito e à experiência do sagrado. Portanto a experiência mais profunda e inefável do homem dentro do tempo
e do espaço “se situa no terreno do tremendo e fascinante”. Isso que é chamado de sagrado cristão é um sagrado
de fé: “reconhece a transcendência de Deus e […] admite as mediações humanas das pessoas, dos ritos, sinais,
lugares, tempos e coisas” (MARTÍN, 1997, p. 34-36). Tais mediações ganham importância pelo fato de serem
expressão da santidade original que está em Cristo.
22

estrutura e suas funções”. A antropologia oferece significativa contribuição para compreender


o homem, já que este não permanece isento em estado de natureza pura, mas é marcado pelo
que recebe ou adquire; “o homem possui um poder criador e o que cria é a cultura. […] Ao
adaptar-se reconhece seus limites e ao adaptar manifesta sua transcendência” 29.
É curioso como a música – com os elementos que a constituem – assume uma analogia
com o corpo humano. Temos o pulso e a freqüência, como já se apontou acima. O pulso tem a
ver com o coração; é ritmo, cadência. São espaços de tempo que se repetem – ciclos. Já a
freqüência relaciona-se com o cérebro. Freqüência são picos altos e baixos. É o movimento
ondular que faz o som se propagar e dá a harmonia, a melodia, o tema. Por isso é aceitável
que música é coração e cérebro.
A música é formada por sons ordenados e periódicos. Não se trata de um bloco
maciço. Antes é a alternância de som e não-som; ruído e silêncio. Possui uma estrutura interna
reveladora de costumes e valores tornando possível conceituar seu sentido para o homem.
Uma vez produzido, o som chega ao tímpano e, dali, enviado para o cérebro é
interpretado. Os sons são alguns dos ruídos escolhidos por cada povo, uma espécie de opção
cultural. Podemos dizer que na fronteira entre os sons e os ruídos há uma opção cultural.

1.2.1 – Antropologia Litúrgica


A liturgia cristã é entendida como obra divina e humana, ou teantrópica (theos, Deus,
e anthropos, homem). Por causa da economia da salvação, revelada por Jesus Cristo, há a
necessidade da mediação humana “dentro das coordenadas espaço-temporais e históricas nas
quais transcorre a vida dos homens” 30.
A antropologia litúrgica situa-se entre as demais ciências do homem: entre a
antropologia filosófica e a antropologia teológica. A primeira “estuda o homem nos aspectos
fundamentais do seu ser e de sua natureza como espírito encarnado e como sujeito pessoal que
toma consciência de si mesmo e de sua relação com os outros e com o mundo que o cerca,
inclusive de sua relação com o transcendente”. Já a (também chamada) “antropologia
sobrenatural é a compreensão do homem à luz da revelação divina” 31.
Entendida assim, a antropologia litúrgica assume as conclusões das ciências do
homem. Ela tem, como objeto, o homem em sua relação com a liturgia, entendendo ser, ele
mesmo, o sujeito da ação litúrgica. Porém ela procura não fazê-lo “à margem da visão

29
MARTÍN, 1997, p. 24.
30
MARTÍN, 1997, p. 23.
31
MARTÍN, 1997, p. 37.
23

‘sobrenatural’ que procede da revelação, pois deixaria de levar em conta a verdadeira natureza
divino-humana da liturgia” 32.
A antropologia litúrgica deve considerar dois grandes aspectos do homem, segundo J.
Martín. 1) visão ôntico-estática é a visão do homem em si mesmo, sua unidade, sua dimensão
corporal. A constatação da corporeidade humana é de grande expressão para a liturgia já que
o homem, este ser espiritual-corporal, atua na liturgia com a linguagem do corpo e dos gestos
litúrgicos. 2) visão funcional-dinâmica é a visão mais completa do ser humano enquanto ser
de relações: com os demais seres com os quais realiza sua existência, com Deus, com o
universo e o planeta onde habita. Aqui nota-se que o homem é um ser que se realiza no tempo
e no espaço, “utilizando sua liberdade e contribuindo conscientemente para a realização
histórica do desígnio divino de salvação” 33.
Se a antropologia cristã auxilia o homem a dar-se conta de sua vocação dinâmica no
mundo, a antropologia litúrgica deverá manifestar claramente um vasto leque de relações
humanas e cósmico-naturais onde se encontra inserido o homem. Portanto, a participação na
liturgia “com todo seu universo de símbolos e expressões socioculturais, é um momento
privilegiado para que o homem tome consciência de si mesmo e de sua função na história” 34.
A antropologia litúrgica tem, diante de si e como seu objeto de estudo, o homem: uma
pessoa encarnada, um ser de relações, um produto da mentalidade cultural e da sensibilidade
religiosa. Inserido na história, ele vai construindo sua felicidade não sem que essa história
afete, inclusive, suas relações com Deus. Logicamente as relações do homem com Deus se
baseiam também nas estruturas mentais, expressivas, comunicativas, rituais, místicas, etc. do
ser humano. Logicamente, também, tudo o que compõe o universo tocado pelo homem (onde
exerce seu domínio, criatividade, auto-realização) está refletido e incorporado na liturgia.
Tudo isso sem esquecer “a dimensão gratuita e de dom de Deus que é sempre a ação litúrgica”
o que também é chamado sinergia. “A liturgia é essencialmente sinergia do Espírito e da
Igreja” 35.
Ao se considerar a antropologia da liturgia – o homem relacionando-se com a liturgia
–, brotam algumas conseqüências, segundo o autor já citado. São conseqüências que os
estudiosos classificam como antropologia a partir da globalidade litúrgica e a partir do fator
globalidade antropológica.

32
MARTÍN, 1997, p. 39.
33
MARTÍN, 1997, p. 41.
34
MARTÍN, 1997, p. 41.
35
MARTÍN, 1997, p. 44.
24

No primeiro caso, considera-se a liturgia no conjunto de todas as suas dimensões e


elementos e “compreendendo todos os sinais e meios de que dispõe para realizar sua função
de santificar o homem e de prestar culto a Deus” 36. Vejamos a conseqüências deste enfoque.
1) há necessidade de um equilíbrio dos aspectos integrantes da liturgia: “a liturgia é obra de
Cristo como ator principal e da Igreja como ator associado”. 2) há que se reconhecer a
sacralidade das mediações humanas da liturgia, expressas na própria Igreja, na Assembléia,
nos sinais, nos símbolos, etc. 3) se faz necessário valorizar todo o simbólico “tanto em sua
dimensão psicológica como em suas dimensões sociocultural e religiosa”, respeitando a
estabilidade das formas litúrgicas. 4) no sentido de relativizar os ritos como expressões da
experiência religiosa, é necessário a identificação dos ritos cristãos que se configuram mais
em sintonia com os acontecimentos salvíficos e não com os mitos ou referencias imprecisos.
5) integração do aspecto sacral-religioso dos sinais universais utilizados pela liturgia, evitando
a sacralidade absoluta ou de separação das realidades deste mundo.
Entende-se por globalidade antropológica o levar em conta o homem em sua
integridade: humano mas, também, configurado e co-herdeiro de Cristo. Isso também traz
algumas conseqüências. 1) a liturgia deve dar atenção especial à pessoa humana e a seu
mundo de relações e ser um canal de comunicação da comunidade humana com Deus. 2) há
que se valorizar a expressividade e a comunicação humana fazendo circular os sentimentos
humanos, os impulsos do espírito e os compromissos de vida. Aqui se sobressaem o canto, a
oração comum, as atitudes corporais, os gestos litúrgicos, alguns símbolos, etc. 3) é
importante a preocupação com a inteligibilidade e a compreensão do todo realizado nas ações
litúrgicas. É oportuna a catequese litúrgica a fim de possibilitar a participação consciente na
liturgia, como prevê SC 35,3. 4) Se faz necessário reconhecer a inserção do homem e da
comunidade concreta que celebra, os acontecimentos da vida e o desenvolvimento dos
povos… na história e no universo criado. 5) se faz exigente uma criatividade responsável a
fim de adaptar a liturgia a modo de inculturação ao gênio espiritual e à mentalidade dos
povos.
Notemos que a antropologia litúrgica é uma tarefa árdua. Talvez o principal motivo
seja o fato de que a liturgia seja uma das atividades humanas mais significativas “pertencente
à religião mas com um substrato humano muito mais amplo, tanto na dimensão pessoal e
psicológica como na dimensão sociocultural e etnográfica” 37.

36
MARTÍN, 1997, p. 47.
37
MARTÍN, 1997, p. 49.
25

Uma vez que a ciência litúrgica pode estudar as demais ciências humanas, a recíproca
também é válida. Porém, parece que não basta à antropologia litúrgica simplesmente dar
atenção aos “resultados da antropologia cultural, da psicologia, da sociologia, da lingüística e
38
semiologia, e da fenomenologia religiosa” . Pois elas permanecem no seu objetivo próprio.
Também não se pode pretender que a liturgia seja expressão da vida social e cultural do
mundo: não é esta a sua finalidade. Porém, a liturgia cumpre papel fundamental ao tentar
“adaptar-se às condições dos homens e dos povos para realizar sua missão com maior
eficácia: […] continua sendo um desafio para a Igreja a inculturação da fé e de sua expressão
litúrgica” 39.
Desafio ainda maior se apresenta à música litúrgica. Com proceder para se chegar
àquela música que seja expressão do mistério celebrado, ao mesmo tempo em que é
inculturada, ou seja, fala a linguagem de quem celebra tal mistério?

1.2.2 – O poder comunicativo da Música


A música tem grande poder comunicativo. Ione Buyst 40 lembra que, na Liturgia, todo
esse potencial é colocado a serviço da comunicação de Deus com o seu povo, de Jesus Cristo
com a sua Igreja. Isso porque, como se viu, a ação litúrgica é uma ação humana e divina.
Segundo ela, o Verbo encarna-se no texto poético e o sopro do Espírito apodera-se do
ritmo, da melodia, do som para nos encantar, para apoderar-se de nós, arrancando-nos do
egocentrismo, da desesperança, da acomodação para arrastar-nos no dinamismo do
seguimento de Jesus, para nos embriagar com o vinho do seu amor.
Nessa dinâmica, o som, o ritmo, a melodia unem-se ao texto e penetram o corpo, a
mente, o coração. Evocam coisas do passado: a criação da qual somos parte, a história do
Povo de Deus que é ainda hoje a nossa caminhada. Geram forças esperançosas para enfrentar
o dia de hoje. Despertam sonhos, realidades de amanhã: novo céu e nova terra, mundo
renovado.
Cantando, nos deixamos en-cantar 41. Entrando no uníssono dos irmãos que cantam, se
é incorporado à comunhão dos santos. Fazemos coro com os milhões e milhares do
Apocalipse que, com seus cânticos espirituais, en-cantam Aquele que está no trono e o
Cordeiro, por todo o sempre!

38
MARTÍN, 1997, p. 50.
39
MARTÍN, 1997, p. 50.
40
Ione Buyst. Música Ritual. In.: Revista de Liturgia, n.91, ano 1989.
41
O uso do hífen pretende acentuar que a música tem o poder sedutor, capaz de provocar grande prazer, de
revelar o invisível e ocultar ou aliviar realidades de sofrimento.
26

Em outro texto, Ione fala do esforço sentido nas últimas décadas, de renovação da
música usada na liturgia cristã. Tal empenho visa não mais contentar-se com qualquer música
sacra ou religiosa, nem mesmo de teor catequético, evangelizador ou conscientizador. Em seu
dizer,

houve (e está havendo) um esforço de redescobrir e valorizar a música ritual, no


caso, uma música ritual para a liturgia cristã. Trata-se de não mais cantar na liturgia
(qualquer coisa..., ainda que bonito ou edificante), mas cantar a própria liturgia (os
próprios textos rituais musicados, ou os próprios ritos acompanhados de música,
levando em conta a natureza da liturgia e de cada momento ritual). Daí surge a
necessidade de conhecermos profundamente a liturgia, e a função ritual de cada
42
canto ou peça musical.

Convém, agora, trazer à tona alguns elementos constitutivos da liturgia. Talvez assim,
a partir da compreensão da ritualidade litúrgica tenha-se explicada mais claramente a função
da música e do canto nos atos de culto cristão.

1.3. A música inscrita na ritualidade litúrgica


Parece não haver dúvidas quanto à importância da música para a liturgia cristã. Já os
textos bíblicos apontam para essa importância. O próprio apóstolo Paulo incentivou a fazer do
canto um modo normal de oração quando orienta a cantar a Deus de todo o coração, por
exemplo em Cl 3,16; Ef 5,19; Tg 5,13.
O canto adquiriu um caráter de alegria, de ação de graças, de reconhecimento a Deus.
Ademais, é ele um meio de manifestar “a unanimidade dos sentimentos, porque provoca, pelo
ritmo e pela melodia, uma tal fusão de vozes que dá a impressão de não existir mais do que
uma” 43. Segundo os Santos Padres, o canto consegue dar às palavras uma maior força e mais
profunda inteligibilidade permitindo maior adesão à Palavra de Deus.
O canto possui uma magia de criar clima festivo, de triunfo. Basta recordar os grandes
momentos de triunfo de Israel, como a passagem pelo Mar Vermelho (Ex 15,1-20) e a entrada
da Arca em Jerusalém (2Sm 6,5). Aliás, talvez seja por causa disso que a hierarquia e alguns
teólogos têm insistido no cuidado com a “tentação que espreita o fiel em se fixar na emoção
estética sem chegar ao âmago do texto que a música deveria fazer saborear” 44.
Se buscará, agora, alguns elementos que ajudem a localizar o lugar do canto e da
música litúrgica. É importante começar com uma definição de liturgia e, a seguir, a

42
BUYST, 2002, p. 142-148.
43
MARTIMORT, Aimé Georges. A Igreja em oração. Vol. I – Princípios da Liturgia. Trad.: Fr. Almir Ribeiro
Guimarães. Petrópolis: Vozes, 1988. p. 134.
44
MARTIMORT, 1988, p. 134.
27

localização do elemento intrínseco, o conceito imprescindível para a compreensão do que seja


liturgia: o seu caráter ritual simbólico.
O canto e a música encontram-se mais identificados ao rito. Porém, atuam na realidade
litúrgica, a qual compreende a ação ritual que por sua vez dinamiza o símbolo, ou dito de
outra forma, possui caráter simbólico.

1.3.1 – Em busca do conceito de Liturgia


Ao longo do Séc. XX muitos estudos acerca da liturgia cristã foram realizados com
inúmeros colaboradores de diversos lugares. Tais estudos geraram uma riqueza que contribuiu
significativamente na renovação conciliar e dilataram as perspectivas litúrgicas. Hoje não é
mais possível desconsiderar tal dilatação; não há como não perceber o problema da adaptação
nem como não valorizar as experiências das igrejas locais. Se impõe, certamente, a
necessidade de desenvolver “o conhecimento das diferentes expressões que a Igreja teve de
sua oração segundo as circunstâncias históricas e geográficas” 45.
Em sua obra A Igreja em Oração, Aimé Martimort afirma que o termo liturgia tem uso
relativamente recente no Ocidente. Ganhou popularidade no séc. XIX e só a partir daí começa
a aparecer nos documentos oficiais da Igreja. “A partir de 1832 […] encontra-se a expressão
libri liturgici que rapidamente torna-se clássica. […] O Código de 1917 assumiu
definitivamente o termo liturgia, can. 447, § 1, 4º, 1257, etc” 46.
“O adjetivo liturgicus e o substantivo liturgia foram introduzidos, sem dúvida, pela
primeira vez sob a sua forma latina, em 1588 por Georges Cassandre”. O sentido atual, que
designa o conjunto dos atos do culto na Igreja foi alcançado somente no séc. XVIII 47.
Na Igreja Grega, liturgia tinha a ver estritamente com a celebração eucarística. Já “os
autores eclesiásticos da Antiguidade, no seguimento dos escritos do Novo Testamento,
empregavam o termo […] no significado de serviço de Deus, de culto, sem excluir […]
sacrifício espiritual ou serviço de caridade”. Em textos da Antiguidade tardia “sua

45
MARTIMORT, 1988, p. 12.
46
MARTIMORT, 1988. p. 31.
47
As primeiras tentativas de definição do termo liturgia apresentam-se bastante limitadas. Tanto que o Papa Pio
XII na encíclica Mediator Dei, de 1947, rejeitou as tentativas de definição como sendo: 1) apenas a parte externa
e sensível do culto divino, fazendo-a consistir no aparato decorativo das cerimônias; 2) o simples conjunto de
leis e regras que ordenam a execução dos ritos sagrados. “Sublinhando a realidade sobrenatural que a liturgia
encerra, insinuou que sua definição fosse buscada na compreensão do sacerdócio de Cristo e numa justa noção
da Igreja, Corpo Místico de Cristo, como já tinham sugerido os pioneiros do movimento litúrgico”
(MARTIMORT, 1988, p. 33-4).
28

significação normal é a de serviço público, isto é, uma função exercida no interesse de todo o
povo, seja no campo da ordem política, técnica ou religiosa” 48.
Leitourgía (laós {povo} + ergon {trabalho}). Liturgia é compreendida como um
trabalho executado pelas pessoas em benefício de outras, de modo que todas tomem parte
ativa, não como espectadores.
49
No primeiro capítulo do livro Introdução ao culto cristão , James White traça
algumas definições do termo “culto cristão” 50, ou seja, da liturgia.
Entre os pensadores protestantes, ortodoxos e católicos, há muitas definições para o
termo “culto cristão”. Frequentemente elas se sobrepõem, mas cada uso acrescenta novas
percepções complementares. Vejamos.
Para Paul W. Hoon, de tradição metodista, o núcleo do culto é Deus agindo para dar
sua vida ao ser humano e para levar o ser humano a participar dessa vida. É uma relação
recíproca: Deus toma a iniciativa dirigindo-se a nós e nós respondemos usando uma variedade
de emoções, palavras e ações. Peter Brunner, de tradição luterana, diz que essa “dualidade” do
culto é encoberta por um foco único, que é a atividade de Deus tanto em se nos auto-doar
quanto em instigar nossa resposta às suas dádivas.
Jean-Jacques von Allmen, de tradição luterana, afirma que o culto cristão é “epifania
da igreja” que ganha sua identidade na medida em que revela sua natureza e confessa sua
própria essência. Para Evelyn Underhill, de tradição anglo-católica, o culto é condicionado
pela crença cristã – encarnação, trindade – e possui caráter social e orgânico: não é
empreendimento solitário.
Em Georg Florovsky, de tradição ortodoxa, ser cristão significa estar na comunidade,
na igreja. É nesta comunidade que Deus atua no culto, tanto quanto os próprios cultuadores.
Nikos A. Nissiotis, de tradição ortodoxa, diz ser o Espírito Santo quem possibilita à
igreja oferecer o culto que é agradável como ato, tanto proveniente da trindade quanto
direcionado a ela.
Em círculos católicos, glorificação e santificação formam uma unidade pois, como diz
Irineu, a glória de Deus é um ser plenamente vivo. Glorificação e santificação caracterizam o
culto cristão. Outra maneira de falar do culto cristão é o Mistério Pascal, conforme escritos de
Odo Casel (monge beneditino alemão): ao celebrar o culto, a comunidade cristã compartilha

48
MARTIMORT, 1988. p. 32.
49
WHITE, James F. Introdução ao culto cristão. Tradução de Walter Schlupp. São Leopoldo: Sinodal, 1997. p.
11ss.
50
Culto: vem do latim, cultus, colere: “honrar”, “venerar”. É a expressão concreta da virtude da religião,
enquanto manifestação da relação fundamental que une o ser humano a Deus. O culto compreende atos internos
e externos nos quais se realiza essa relação.
29

os atos redentores de Cristo; o que Cristo realizou no passado pode ser experienciado e
apropriado para a própria salvação no tempo atual.
Os estudiosos de várias tradições cristãs acima citados ajudam a definir liturgia com
enfoques que se complementam e evidenciam o sentido da mesma. Várias dessas concepções
51
aproximam-se do pensamento assumido no Concílio Vaticano II que, em resumo é o
seguinte: a função da liturgia é estabelecer uma comunicação entre Deus e a humanidade:
ação de movimento do primeiro e ação de memorial do segundo.
O canto e a música litúrgica colaboram nessa ação quando oferecem aos fiéis o texto
bíblico e, em contrapartida, lhes possibilitam responder a Deus com hinos de preces e
louvores. E isso se refaz de maneira simbólico-ritual.
Martimort postula que a compreensão assumida pelo Concílio Vaticano II tem na sua
base a encíclica Mediator Dei de 1947 do Papa Pio XII 52 situada no contexto do movimento
litúrgico. Porém incrementa vários aspectos importantes, tais como: 1) a liturgia é toda ela um
sinal sagrado. “O elemento visível é sinal eficaz de uma realidade sobrenatural”. Tal
compreensão rejeita a concepção veiculada na década anterior de que o elemento material,
sensível, seria somente “integrante ou assessório”. 2) na compreensão implícita ao sacerdócio
de Cristo, a ação litúrgica cumpre duplo movimento: fazer chegar até Deus a oração da
comunidade e permitir “que desça, sobre a Igreja e seus membros, as graças da Redenção”. 3)
“O lugar e a natureza da liturgia ficam bem evidenciados a partir do momento em que ela é
assumida na economia da salvação”. Isso porque, através dos sinais, ela realiza e atualiza as
promessas do Antigo Testamento e o que se realizou na Páscoa de Jesus Cristo. 4) “A liturgia
pertence ao povo cristão”. Por força do batismo, todos são convidados a tomar parte dela sob
a direção do sacerdócio ministerial 53.

51
Em 1963, a Constituição sobre a Sagrada Liturgia Sacrosanctum Concilium é promulgada. As explicações
iniciais dão conta dos princípios da reforma e do incremento da liturgia, fazendo um “ensinamento sobre ‘a
natureza da liturgia e sua importância na vida da Igreja’”. Há uma tentativa de reaproximação da linguagem das
categorias da Bíblia e dos Santos Padres (MARTIMORT, 1988, p. 34).
52
As primeiras tentativas de definição de liturgia propostas pelo Movimento Litúrgico eram três: 1) Estéticas: é a
forma exterior e sensível do culto, isto é, o conjunto de cerimônias e ritos. Seu objeto formal era buscado nos
aspectos externos e estéticos do culto religioso. Liturgia era a manifestação sensível e decorativa das verdades da
fé. É uma definição incompleta e insuficiente do ponto de vista da natureza da liturgia (o Papa Pio XII rejeitou
esse conceito de forma explícita na Encíclica Mediator Dei). 2) Jurídicas: liturgia era apresentada como culto
público da Igreja enquanto regulado pela autoridade. Aqui a liturgia é identificada como cumprimento de
normas, regras e rubricas. Mediator Dei considerou esse conceito insuficiente. 3) Teológicas: apontavam liturgia
como culto da Igreja, mas limitavam o caráter eclesial do culto à ação dos ministros ordenados. A partir dessa
idéia, algumas definições procuraram chegar ao núcleo da liturgia cristã, isto é, ao mistério de Cristo e da Igreja.
A liturgia é um mistério ou ação ritual que torna presente e operante a obra redentora de Cristo nos símbolos
cultuais da Igreja.
53
Cfe. MARTIMORT, 1988. p. 34.
30

Certamente as noções estabelecidas racionalmente podem satisfazer algumas


expectativas humanas de conceituação da liturgia. Mas, certamente “são pouco aptas para
exprimir a riqueza sobrenatural da oração da Igreja; […] a liturgia, em sua essência, vai além
daquilo que dela espera o homem” 54.
As concepções de liturgia, já vimos, apontam para a ação relacional que se dá entre o
Criador e suas criaturas, e das criaturas entre si. Liturgia, acima de tudo é ação de um povo.
Esse povo constitui uma assembléia 55: a Assembléia do povo de Deus. É assembléia porque
reúne pessoas com objetivos comuns; é litúrgica porque é uma reunião feita em nome da fé,
para festejar a presença e a ação de Deus na vida e na comunidade.

1.3.2 – A Assembléia litúrgica


A idéia de assembléia está presente entre os cristãos desde suas origens. Os discípulos
de Jesus tornaram a se reunir ao perceberem que o encontro os ajudava a manterem viva a
memória do Senhor que lhes confiou a missão de levar adiante sua obra. Nos períodos que se
sucederam, muitos tratados ascéticos e canônicos indicam para a obrigação dos cristãos de se
reunirem.
A noção de assembléia litúrgica permaneceu até mesmo na Idade Média, embora um
pouco obscurecida. A renovação litúrgica sancionada pelo Vaticano II visava, também, sua
revalorização. Em decorrência disso temos, hoje, as orações litúrgicas “sempre formuladas no
plural, o celebrante falando em nome de todos e dialogando com o povo”. Ao se reunir em
assembléia, as pessoas manifestam a ação congregadora operada por Cristo. “Sem ser em si
mesma um sacramento, a assembléia é um sinal” 56.
Martimort recorda que a assembléia do povo de Deus no Antigo Testamento é
inaugurada com a caravana dos hebreus que chega ao pé do Monte Sinai. Até ali, esses que
testemunharam as maravilhas de Deus no Egito e no Mar Vermelho, não passava de uma
multidão de fugitivos. Não constituíam um povo. O livro do Êxodo relata que, ao pé do Sinai,
um acontecimento primordial marca a constituição do povo do Senhor: “vocês serão para mim
um reino de sacerdotes e uma nação santa” (Ex 19,6). Uma nota característica de tal
assembléia é que foi o próprio Deus quem a convocou. Muito tempo depois, realizados muitos
outros encontros convocados pelo próprio Deus, segundo os relatos bíblicos, “após o retorno

54
MARTIMORT, 1988. p. 35.
55
Assembléia é uma reunião de pessoas que tem algum interesse em comum; reunião de pessoas especialmente
convocadas (HOUAISS, Instituto Antonio. Dicionário Eletrônico HOUAISS da Língua Portuguesa. Versão
1.0.7. Editora Objetiva Ltda, 2004).
56
MARTIMORT, 1988. p. 96-7.
31

do exílio, há uma assembléia que dura oito dias seguidos e que inaugura o judaísmo”
conforme relata o livro de Neemias, capítulos 8 e 9. A partir daqui, “a convocação não é mais
feita por Deus, mas em seu nome. Sua presença, no entanto, é certa através de sinais […] ou
simplesmente o livro da bíblia” cuja leitura se reveste de solenidade já que é verdadeiramente
Deus quem fala 57.
Após o exílio os fiéis de todas as regiões peregrinarão sistematicamente a Jerusalém,
marcando o tempo pela celebração dos aniversários destas grandes assembléias do passado.
Isso irá até o surgimento de uma nova assembléia, a de Jesus, pela vinda do Espírito Santo
sobre os apóstolos.
O livro dos Atos dos Apóstolos relata os discípulos perseverando na oração. Com isso
o mistério da salvação em Cristo é a constituição de um novo Povo de Deus, a reunião
daqueles que andavam dispersos. Esta nova aliança é selada no sangue do sacrifício de Cristo,
mas a assembléia é convocada a oferecer sacrifícios espirituais. Os que se reúnem, o fazem
convocados pelos que Cristo envia. É o próprio Deus quem convida para a assembléia –
58
apesar de todos os esforços de pastores e fiéis –; “sua iniciativa é anterior e preveniente” .
Aliás, sua presença é garantida na afirmação de Jesus em Mt 18,20: “onde dois ou três
estiverem reunidos em meu nome, estarei no meio deles”. Mais ainda que no Sinai, é um povo
real e sacerdotal. Estão ali incorporados à assembléia que é a Igreja, por força de seu batismo,
tendo recebido um caráter que os incumbe de serem morada do Espírito Santo e sacerdócio
santo.
A assembléia litúrgica é a expressão da Igreja. Ali a Igreja se mostra, se revela. É, por
assim dizer, o corpo místico de Cristo, cuja noção fundamenta a teologia da liturgia. O termo
forte é re-unir-se, re-união. E celebração é um ato comunitário e eclesial. Ausentar-se da
assembléia é diminuir o corpo de Cristo, ou seja, a Igreja. Na assembléia litúrgica, o sacrifício
que é oferecido pelos cristãos “é a missa, memorial e presença do sacrifício da cruz” 59.
Na Idade Média, a compreensão da participação da assembléia, praticamente deixou
de ser ativa. A partir de 1903, com S. Pio X, e em 1928 com Pio XI, iniciam-se reflexões e
estudos e o próprio movimento litúrgico que resultam na encíclica Mediator Dei de Pio XII
em 1947. Queriam aquilo que o Concilio Vaticano II acabou por legitimar: a participação
ativa dos fiéis na liturgia por força de seu batismo e por força da própria natureza da Igreja.
Povo real e sacerdotal, a Igreja caminha para a unidade que, na liturgia é “experimentada e

57
MARTIMORT, 1988. p. 97-8.
58
Graça; que nos induz à prática do bem.
59
MARTIMORT, 1988. p. 98.
32

manifestada na escuta comum da Palavra de Deus, em união com a oração do celebrante,


participando do diálogo e do canto, através de gestos e atitudes corporais, […] pela
participação na oferta e na comunhão eucarística” 60.
Claro que para isso a ação litúrgica necessita ser inteligível: a comunicação verbal
deve ser na língua dos fiéis; exige atenção e consonância entre o espírito e aquilo que o corpo
faz, diz e canta; há necessidade de uma catequese que oriente os fiéis para os ritos; há
necessidade de eventuais intervenções de um comentarista orientando para as ações rituais.
Arriscamos dizer que o grande diferencial marcado pela renovação conciliar da liturgia foi o
de recuperar a inteligibilidade da fé. Ou seja, perceber que há a necessidade de os fiéis
poderem compreender os atos do culto e não executá-los mecanicamente. O comportamento
dos fiéis é, então, de alegria, festa, já que estão reunidos face-a-face com seus irmãos e pelo
fato de o fazerem em nome do Senhor que Ressuscitou, está vivo junto deles.
Numa assembléia litúrgica, nem tudo pode ser feito por todos. Há diferentes funções,
de acordo com os diferentes carismas, que fazem da assembléia “um corpo orgânico,
61
expressão e manifestação do Corpo místico de Cristo” . As ações litúrgicas realizadas por
esse povo de Deus comportam um processo sempre crescente de ministerialidade, de serviços,
dons e carismas.
A celebração é presidida. Um ministro dirige a celebração em nome de Cristo, ao
mesmo tempo em que é, também, celebrante, isto é, reza e realiza ações sagradas. O faz não
por designação da assembléia ou por suas qualidades humanas, mas, pelo caráter sacerdotal já
que exerce o papel de Cristo.
Destacam-se, ainda, outras funções litúrgicas: dos ministros da leitura (inclui-se, aqui,
o salmista), já que a Palavra de Deus ocupa lugar importante na celebração; dos diáconos, que
são ministros do altar e do celebrante; dos comentaristas, que são ministros a serviço do povo
a lhes dar breves explicações ou orientações para introduzi-los e ajudá-los para que tenham
melhor compreensão. Para que a assembléia litúrgica seja, de fato, expressão do ser profundo
da Igreja, todos os ministérios deverão atuar em comunhão, em equipe, como membros de um
corpo, em sintonia.
Merece ainda mais destaque, nesta pesquisa, o serviço do grupo de cantores e
instrumentistas. Estes, com maior facilidade na arte musical, ajudam o povo a executar cantos

60
MARTIMORT, 1988. p. 102-3.
61
MARTIMORT, 1988. p. 104ss.
33

destinados a acompanhar as ações celebrativas. “Na sua constituição dever-se-á cuidar não
somente da competência técnica, mas também da qualidade espiritual” 62.
Ione Buyst adverte que

Grande parte da participação na liturgia é assegurada pela música, pelo menos nos
domingos e dias festivos. A música atrai, facilita a participação; porém, pode causar
também enormes estragos espirituais se não for bem compreendida a relação entre
música e liturgia. [Se a liturgia se tornar] “palco” para a “criatividade” de muita
gente, sem que se leve em conta a natureza da liturgia, […] em vez de se tornar uma
63
aliada, acaba impedindo a verdadeira participação.

O grupo dos cantores e instrumentistas exerce um papel importante e deve contribuir


na participação ativa dos fiéis. Este autêntico serviço ministerial coletivo deve ser exercido
junto da assembléia celebrante, como parte integrante dela.

1.3.3 – Ação de diálogo entre Deus e a Assembléia


O grupo de pessoas que se reúne para celebrar – a assembléia litúrgica – o faz, não por
iniciativa exclusivamente sua. Em primeiro lugar é uma resposta ao convite de Deus, como se
afirmou anteriormente. Ora, Deus, que convida para a reunião tem algo a dizer. E o seu povo,
por sua vez, lhe responde a seu modo; à Palavra que o Senhor dirige, os fiéis respondem de
forma diversa.
O agente visível da liturgia é o povo reunido num determinado tempo e lugar. O
agente invisível é Deus, a Santíssima Trindade. Deus e o povo atuam em conjunto. A teologia
e a prática litúrgica indicam para a compreensão que temos da liturgia: um diálogo entre Deus
e o seu povo. Deus fala a seu povo e este lhe responde com cantos, orações, gestos, através do
silêncio, das aclamações. Sua salvação chega até nós por meio da Palavra que toca os
corações e estes emitem como que um eco de um canto.
Desde a sinagoga há o costume de ler algumas passagens dos livros sagrados nas
reuniões de oração. O próprio Jesus o fez para sua comunidade, conforme relata Lc 4, 14ss.
Simetricamente à Liturgia Eucarística, a Liturgia da Palavra é essencial para o domingo
64
cristão, aparecendo como algo necessário em todos os lugares . O Concilio Vaticano II
manifestou-se imensamente favorável à prática da leitura da Sagrada Escritura de forma

62
MARTIMORT, 1988. p. 104-110.
63
BUYST, 2002. p. 142-148.
64
O Documento da CNBB de nº 52 diz: “a Palavra conduz à Eucaristia. Se, por um lado, a Palavra encontra sua
realização na Eucaristia, por outro a Eucaristia tem, de certo modo, seu fundamento na Palavra”. E, no nº 30, o
mesmo documento afirma: “Palavra de Deus e Eucaristia são duas formas diferentes da presença de Jesus Cristo
no meio do povo da nova aliança” (CNBB. Orientações para a celebração da Palavra de Deus: Documento nº
52. São Paulo: Paulinas, 1994).
34

abundante, variada e apropriada. Desejou, também, que se incentivasse aquilo que chamamos
de Celebração da Palavra, “comportando leituras, cantos, uma homilia, oração dos fiéis e a
recitação do Pai-Nosso” 65.
O significado da escuta da Palavra na liturgia contém o valor de uma palavra
atualizada para o hoje da história, como uma novidade inesperada, onde o próprio Deus fala
quando se lêem as Escrituras na Igreja. Este caráter é potencializado pela homilia 66. Ela é a
adaptação – através do comentário – às circunstâncias concretas e às necessidades do povo.
67
Recebemos a homilia como herança da sinagoga, tendo passado pela Antiguidade e sendo
incentivado pelo Vaticano II.
Por fim, convém sublinhar que a própria Escritura fornece ricos elementos que
resultam na prática litúrgica: sinais, compreensões dos sacramentos, visão de mundo,
interpretação da história. Certamente não pode haver vida litúrgica sem iniciação à Bíblia.
“As épocas que perderam esse senso bíblico não produziram criações litúrgicas duradouras e
se perderam em alegorias artificiais ou interpretações acomodatícias cuja sobrevivência
provoca mal-estar ainda hoje” 68.
Certamente a sensibilidade aguçada dos cristãos aos sinais de Deus e aos sinais dos
tempos concorrem favoravelmente para uma aproximação entre Criador e criaturas que
anseiam por encontrar-se, conhecer-se, alegrar-se mutuamente.
No que se refere ao canto desta ação ritual, Ione Buyst postula que se deve favorecer
para que a música cumpra seu papel de servir ao diálogo entre as partes que se encontram
celebrando. “É preciso que a música, na liturgia, seja vivida como um diálogo, uma
comunhão, com Deus, de altíssima qualidade, uma participação no ‘mistério’ do próprio
Deus” 69.

65
A esse respeito ver: SC 35.
66
Etimologia: o termo vem da palavra grega HE HOMILIA. O verbo HOMILEIN significa “relacionar-se,
conversar”. HE HOMILIA designa, no NT, “o estar juntos, o relacionar-se, e, nos primeiros séculos da era cristã,
o termo passa a ser usado para denominar a prédica (KIRST, 2004. p. 9). Como vemos, a homilia (ou prédica)
tem a ver com algo de conviver, de valorizar a situação presente dos participantes na ação ritual. Uma
espécie de diálogo familiar onde as situações humanas são “postas à mesa”, discutidas, esclarecidas… à
luz da Palavra de Deus. Homilética é a “ciência que se ocupa com a pregação cristã” (KIRST, Nelson.
Rudimentos de Homilética. 4.ed. São Leopoldo: Sinodal/IEPG, 2004, p. 9), especialmente aquela feita
dentro da liturgia, ou seja, a homilia ou prédica. A homilética tem a tarefa – não apenas no campo
teórico, mas, sobretudo no campo prático – de refletir metodologicamente a pregação que acontece na
Igreja.
67
A prática da homilia dominical na Antiguidade nos valeu a maioria dos comentários bíblicos que temos dos
Santos Padres. Vale à pena conferir as pregações de Santo Agostinho e de São João Crisóstomo (o boca de ouro),
ambos do século IV.
68
MARTIMORT, 1988. p. 132.
69
BUYST, Ione; FONSECA, Joaquim. Música Ritual e mistagogia. São Paulo: Paulus, 2008. p. 7.
35

1.3.4 – O caráter ritual da Liturgia


Tal como os símbolos, alguns ritos são adotados pela liturgia para melhor canalizar a
expressão da ação salvífica de Deus e a ação humana que busca por seu Deus.

a) Conceito de Rito
Em As linguagens da experiência religiosa, Severino Croatto nos ajuda a entender os
ritos. Etimologicamente, “a palavra latina ritus é próxima da palavra sânscrito-védica rta
(rita). Significa a força da ordem cósmica sobre a qual velam divindades”. Vê-se, com isso,
que o rito não é uma ação puramente humana ou inventada por uma pessoa qualquer. Ele é, de
alguma forma, “uma ação divina, uma imitação do que fizeram os deuses. Por isso, deve ser
repetido como uma ação divina” 70.
Nesse sentido, rito é o conjunto das cerimônias e das regras cerimoniais que
usualmente se pratica numa religião, numa seita, etc. Mas o rito não é somente uma ordem
cósmica, que é necessário respeitar e realizar. Croatto explica que “a imitatio das ações
divinas é a contrapartida da intenção do rito: participar do divino, possibilitar a comunhão
71
com o transcendente”. Ou seja, o que os ritos buscam é o contato com o sagrado . Neles, a
inclinação humana para o transcendente encontra certo gozo de realização. O desejo humano
de se aproximar de Deus realiza-se – ao menos em parte – pela imitação daquilo que
corresponde aos seus anseios.
Mais adiante o autor afirma que

o rito participa do símbolo e do mito. Se o símbolo é uma coisa que transignifica


outra, o rito é um gesto que também significa outra realidade. Como ação, aponta
para um determinado efeito. Se o símbolo é dictico (isto é, manifesta, expressa), o
rito é performativo, “faz”. A respeito do mito, o rito é seu equivalente. O mito recita
o que o rito converte, encena, teatraliza. Ao discurso, que é o mito, corresponde o
72
rito, como ação.

Dentre as facetas do rito, percebemos que ele nos traz à mente a idéia de repetição, a
idéia de rubricas que normatizam os atos, e sua capacidade de representar simbolicamente
(mito). Vejamos. Numa primeira aproximação, o rito “aparece como uma norma que guia o
desenvolvimento de uma ação sacra. O rito é uma prática periódica, de caráter social,

70
CROATTO, José Severino. As linguagens da experiência religiosa. [Trad.: Carlos M. Gutiérrez]. – São
Paulo: Paulinas, 2001. p. 330.
71
CROATTO, 2001. p. 330-1.
72
CROATTO, 2001. p. 331.
36

submetida a regras precisas”. Em sua exterioridade, porém, a norma é uma “rubrica” e não
define realmente o que é o mito 73.
Na obra de literatura infantil (?) “O Pequeno Príncipe”, Saint-Exupéry aborda essa
temática da seguinte forma:

Teria sido melhor se voltasses à mesma hora – disse a raposa. – Se tu vens, por
exemplo, às quatro da tarde, desde as três eu começarei a ser feliz! Quanto mais a
hora for chegando, mais eu me sentirei feliz. Às quatro horas, então, estarei inquieta
e agitada: descobrirei o preço da felicidade! Mas se tu vens a qualquer momento,
nunca saberei a hora de preparar o coração... É preciso ritos. - Que é um rito?
perguntou o principezinho. - É uma coisa muito esquecida também, disse a raposa. É
o que faz com que um dia seja diferente dos outros dias; uma hora, das outras horas.
Os meus caçadores, por exemplo, possuem um rito. Dançam na quinta-feira com as
moças da aldeia. A quinta-feira então é o dia maravilhoso! Vou passear até a vinha.
Se os caçadores dançassem qualquer dia, os dias seriam todos iguais, e eu não teria
74
férias!

A idéia de repetitividade nos parece estar expressa aqui. Os atos que tornam a
acontecer com certa freqüência, certa duração, em determinado lugar, inscrevem-se como
ações rituais.
O texto deixa entrever – nos atos que assumem certa ritualidade pela sua
repetitividade – uma sensação de segurança aos implicados nessa ação. Sem esta segurança
oferecida pela repetitividade, “nunca saberei a hora de preparar o coração”. Significa que, sem
que haja certa constância de ações, é difícil prever algo. É nesse sentido, parece, que o autor
afirma que o rito “faz com que um dia seja diferente dos outros dias; uma hora, das outras
horas”; e, acrescente-se, uma celebração de outra.
Pode-se dizer que a repetitividade contida na métrica, no compasso, no ritmo musical
acabam por produzir – além de segurança e estabilidade – a possibilidade da novidade.
Exemplo disso, parece, é a necessidade de, a cada ano, recriar o espírito natalino mediante a
escuta de determinadas músicas que impregnaram-se em nossa cultura caracterizando o Natal.
Por fim, outras facetas da palavra rito: ritual também é usado para descrever a
Liturgia; liturgos usam para designar um livro de ritos (determinam as ações executadas num
culto por meio das rubricas (instruções impressas em vermelho, rubro); antropólogos usam-no
para designar atos repetidos que são socialmente aprovados; são as palavras pronunciadas ou
cantadas num culto.
Os ritos, portanto, possibilitam comunicação.

73
CROATTO, 2001. p. 330.
74
SAINT-EXUPERY, Antonie de. O Pequeno Príncipe. Com aquarelas do autor; tradução de Dom Marcos
Barbosa. 48ª ed., 8ª imp. Rio de Janeiro: Agir, 2003. p. 70.
37

b) Ações que ultrapassam o meramente visível: os ritos litúrgicos


No pensamento conciliar, a sagrada liturgia é constituída por muitos sinais e ritos que
intentam estabelecer uma relação entre o divino e o humano. Isso, parece, é bastante aceito
entre as pessoas que se reúnem para celebrar. Já é possível perceber certa compreensão do
significado deste “fazer memória”, ou seja, do celebrar comunitariamente. Mas, como se
processa isso internamente? De que forma as pessoas vivenciam os ritos celebrativos, a ponto
de verem, nessa ação, sentido para continuarem vivendo?
O culto é profundamente encarnacional e o seu centro é cristológico. O núcleo do culto
é Deus agindo para dar sua vida ao ser humano e para levar o ser humano a participar dessa
vida. É uma relação recíproca: Deus toma a iniciativa dirigindo-se a nós e nós respondemos
usando uma variedade de emoções, palavras e ações.
Daí a compreensão de culto como uma resposta da criatura ao Eterno, cujo ritual
emerge como uma emoção religiosa estilizada. O culto é uma resposta bem definida e
concreta, do ser humano, ao movimento de Deus em direção a sua criatura. É a resposta dos
seres humanos ao chamado divino, de forma comunitária. Ser cristão significa estar na
comunidade, na Igreja. É nesta comunidade que Deus atua no culto, tanto quanto os próprios
cultuadores.
Fica explícita a função da liturgia de possibilitar uma comunicação entre Deus e a
humanidade. E isso se refaz constantemente de maneira RITUAL. Na liturgia os sinais
sensíveis têm significado. Reunir-se em assembléia, por exemplo, louvar a Deus na Igreja e
comer a Ceia do Senhor é o que define a ação litúrgica na Igreja, segundo a Sacrosanctum
Concilium.
Ao definir liturgia, Vaticano II vai além de expressões usadas até então, como, por
exemplo: ritos, cerimônias, funções. É adotada a expressão “ações litúrgicas”, para designar o
conjunto que constitui a liturgia. O uso da expressão “ações” – além de ser familiar à
75
Antiguidade e simpática ao movimento litúrgico – “chama atenção para o fato de que a

75
Aquilo que se convencionou chamar “movimento litúrgico” ou, como também era chamado na Alemanha, o
“esforço litúrgico”, se deu no século XIX e pode ser dividido em duas fases. A primeira compreende o período
entre os anos de 1903 a 1914. Pio X com o motu próprio incentiva o povo a participar ativamente da celebração
dos mistérios já que são fonte indispensável do espírito cristão. Ali o canto da assembléia está sendo concebido
como “um primeiro passo na participação do mistério litúrgico”. Tal participação atingirá sua plenitude somente
com a comunhão na mesa do Senhor. A segunda fase do movimento litúrgico compreende o período que
antecede o Concílio Vaticano II: 1940 a 1962. Se no período anterior havia a preocupação de colocar a liturgia
existente ao alcance do povo e de promover o canto gregoriano, agora percebe-se a necessidade de “uma reforma
dos ritos feita em profundidade e a introdução parcial da língua vernácula na celebração”. Nesse período –
segunda fase – perceberam-se algumas medidas que contribuíram para se chegar aos alcances da Sacrossantun
Concilium, como por exemplo: redução da lei do jejum; a água natural já não quebra o jejum eucarístico; o
movimento de volta à Bíblia quer valorizar, também, o seu uso litúrgico e isso requer que ela seja proclamada na
língua do cotidiano; nesse sentido, também, o canto ganha espaço para ser mais vivo na liturgia solene; permite-
38

liturgia mobiliza; […] ‘faz-se’ alguma coisa. A liturgia tem um movimento, um ritmo próprio,
uma dinâmica. […] A liturgia existe somente no momento em que sua ação se desenrola”, na
medida em que se insere em seu movimento. “A eucaristia é a ação por excelência” 76.

c) Função simbólica dos ritos litúrgicos


À procura de uma comunicação eficiente, Deus e a humanidade “trabalham” em vista
da satisfação desse interesse que têm em comum. Por força da inteligibilidade da fé, nascem
os símbolos. Ou seja, pela capacidade criativa dos homens e pela inspiração divina cresce o
diálogo homem-Deus.
Símbolo é uma palavra de origem grega (Symbállein) que denota juntar, lançar junto,
77
assumir, aproximar, comunicar . É correto afirmar que símbolo sempre junta algo concreto
com algo espiritual. Significa dizer que, a forma dá acesso ao mistério.
Para o pensamento conciliar há uma espécie de via de mão dupla, onde Deus fala ao
seu povo e este lhe responde. Essa inter-relação se dá de múltiplas formas – na sagrada
liturgia e, inclusive, fora dela. “Os próprios sinais sensíveis que a liturgia usa para simbolizar
as realidades divinas invisíveis foram escolhidas por Cristo ou pela Igreja” 78. Essa idéia será
reafirmada no documento final da Conferência Episcopal Latino-americana realizada mais
tarde, em Puebla (1979): “o ser humano […] expressa suas relações com Deus num conjunto
de sinais e símbolos” 79.
“Deus poderia comunicar-se conosco de um modo puramente espiritual; entretanto,
80
seu modo habitual de comunicar-se com o homem é de um modo visível e sensível” .A
comunicação por excelência entre Deus e o povo é Jesus Cristo. Nele todas as demais formas
de comunicação ganham significado: a criação, a libertação, os profetas.

Para se comunicar com os humanos, para salvar a humanidade e propor e possibilitar


uma vida de intimidade, de comunhão, Deus teve que se tornar audível, visível,
palpável…, ao alcance de nossos ouvidos, de nossos olhos, de nossas mãos! Deus
teve que nos tocar e se deixar tocar em Jesus. 81

se a publicação de rituais bilíngües e a simplificação das rubricas do breviário e da Dedicação das igrejas e dos
altares (MARTIMORT, 1988, p. 83ss).
76
MARTIMORT, 1988, p. 35-6.
77
TABORDA, Francisco. Sacramentos, práxis e festa: para uma teologia latino-americana dos sacramentos.
Petrópolis: Vozes, 1994. p. 67.
78
SC 33.
79
DP 920.
80
FERNANDEZ, Conrado. A Sacramentalidade da Liturgia. In.: Manual de Liturgia 2 – a celebração do
Mistério Pascal: fundamentos teológicos e elementos constitutivos/ CELAM; [Trad.: Maria Stela Gonçalves]. –
São Paulo: Paulus, 2005. p. 85-110. p. 89.
81
BUYST, Ione. Alguém me tocou!: sacramentalidade da liturgia na Sacrossanctum Concilium (SC),
Constituição conciliar sobre a Sagrada Liturgia. In: Revista de Liturgia nº 176 . Junho de 2003. p. 05.
39

No pensamento teológico cristão, a economia da salvação está organizada assim: Jesus


Cristo é o sinal visível, presente, o sacramento do Pai, já que, aos homens, o Pai se torna
visível através do Filho. Ora, Cristo age na Igreja e através dela. Então pode-se dizer que a
Igreja é o sacramento d’Ele. E qual é a forma da Igreja tornar visível sua ação em nome de
82
Cristo? São os Sacramentos . Portanto, “quando a Igreja reza, canta ou age, a fé dos
presentes é alimentada” 83 e estes recebem com mais abundância a sua graça.
Portanto, há que se concordar com Ione Buyst, que diz que “os símbolos não são
coisas, mas relações. Eles dependem de um processo de comunicação: da intenção e da
intensidade de quem realiza o gesto, e do olhar de quem o vê, recebe, interpreta, entra em
sintonia e vive” 84.
Partindo-se dessa concepção, note como se dá o simbolismo dos passos ou momentos
rituais comuns de uma celebração. Nos mecanismos da comunicação, a transmissão entre o
emissor e o receptor visa, pelo menos, quatro funções: advertir, informar, suscitar união, e
determinar uma resposta. No caso da liturgia, notam-se os sinais agindo, vinculados aos
quatro grandes elementos de uma celebração.
A função de advertir é aplicada aos ritos iniciais da celebração. Tais ritos (gestos,
símbolos) advertem para uma comunicação possível, para um contato, para sintonizar mesmo
que o conteúdo da comunicação ainda não esteja tão claro. “Daí a importância desse momento
do rito de entrada para criar a assembléia” 85.
Estabelecido o contato e a harmonia, há possibilidade de uma real comunicação, com
conteúdos mais explícitos e mensagens um pouco mais definidas. É o que pretensamente
acontece na liturgia da Palavra: Deus fala à assembléia reunida, através dos textos bíblicos e
de sua respectiva explicação; esta lhe responde com louvores, preces, renovação da fé,
interiorização, etc. “Daí a importância da audição correta das leituras bíblicas, da homilia, dos
momentos de silêncio, da dignidade do livro litúrgico […], leitor” 86.
Tal mensagem suscita a união íntima entre o emissor e o receptor, entre Deus e o
homem. Eis a função por excelência do rito litúrgico: produzir a comunhão entre ambos. Este
é o terceiro elemento da celebração sob a ótica da comunicação.

82
Rito sagrado instituído para dar, confirmar ou aumentar a Graça. São sete: Batismo, Confirmação, Eucaristia,
Penitência, Unção dos Enfermos, Ordem e Matrimônio.
83
SC 33.
84
BUYST, 2005, p. 233.
85
FERNANDEZ, 2005, p. 94.
86
FERNANDEZ, 2005, p. 94.
40

Como seria de se esperar, a quarta função do sinal corresponde aos ritos finais da
celebração litúrgica. Estes tendem a orientar para uma direção de acordo com o indicado na
mensagem 87. Tais ritos impulsionam cada fiel presente na assembléia litúrgica a assumir seu
compromisso como co-responsável na construção do Reino de Deus.
88
“A celebração não pode ser algo separado da vida, ou paralelo a esta” . Como um
estilingue, a celebração litúrgica há de impulsionar para frente, na direção da utopia, do Reino
de Deus que é construído pelas mãos dos que acreditam serem responsáveis por continuar a
obra do Criador.
Cada vez mais, no mundo das comunicações é possível compreender o que seja a
transmissão do sinal de TV, a sintonia das ondas de rádio, da conexão virtual em informática,
dos serviços de rede em telefonia celular. E, em todo tipo de comunicação há uma terrível luta
por preservar a qualidade da transmissão a fim de manter a fidelidade da mensagem
transmitida.
Chama-se a atenção para o risco de perturbação na comunicação, independentemente
da posição onde ela ocorre ao longo do canal: se localiza-se na fonte ou no destinatário, bem
como nos meios. É certo que esses ‘ruídos’ são “capazes de incomodar, distorcer e até anular
89
a mensagem” . Como exemplo disso, poderia-se citar o dedilhar de instrumentos musicais
em momento inadequado, por simples desatenção do instrumentista; ou, ainda, o desvio da
comunicação essencial na proclamação de um texto bíblico por causa de um cacoete do leitor,
ou por sua postura, veste; imagens projetadas em datashow ou mesmo sua localização
inadequada no espaço litúrgico; etc. Assim como se faz necessária certa familiaridade da
linguagem articulada para a compreensão da ação simbólica, há que se cuidar para que tal
comunicação não fique prejudicada por causa dos ruídos da “transmissão”.

1.3.5 – A relação música e rito


Convive-se com a música e o canto no desenrolar dos atos litúrgicos. Seria possível
pensar uma liturgia sem música? Nessa inter-relação, em qual dos elementos está a primazia:
a música serve o rito ou o rito serve a música?
Para Aldo Terrin, há três premissas na relação entre o rito e a música: 1) entre música
e rito há um parentesco muito antigo. Talvez nem seja possível pensar um rito sem um fato

87
FERNANDEZ, 2005, p. 94-5.
88
FERNANDEZ, 2005, p. 95.
89
ARANDA, Alberto. Como celebramos? In.: Manual de Liturgia 1 – a celebração do Mistério Pascal:
Introdução à celebração litúrgica/ CELAM; [tradução: Maria Stela Gonçalves]. – São Paulo: Paulus,
2004. p. 155.
41

musical. 2) o significado original da música, em todas as culturas, é bastante semelhante. É


grande a sua contribuição na ritualidade antiga no sentido de “elaborar modelos simbólicos de
90
clarificação da vida e da morte em sentido religioso” . 3) há afinidades semânticas “e não
apenas fatores arbitrários e subjetivos que agem na determinação do sentido musical” 91.
Há que se reconhecer, segundo Terrin, que rito e música são duas realidades que se
ajudam, mas que, com facilidade, entram em conflito. Ajudam-se pelo fato de que todo rito
está ligado – quase indissoluvelmente – à música. Podem entrar em conflito já que, “para
92
certos ritos só podem ser previstos certos modos musicais” . Ou seja, à natureza do rito
corresponde uma determinada qualidade musical.

Não se pode empregar indiscriminadamente um modo musical para qualquer tipo de


rito; há especificidades e qualidades do rito e modos musicais que precisam ser
93
respeitados, pois o tipo de música condiciona o tipo de ritual.

Por sua natureza, o rito parece, em geral, imodificável. Terrin recorda que ele possui
uma função quase fisiológica, como uma estilização de sentimentos: “ele ordena, acalma e
sublima os sentimentos, ou então os exalta e os transforma radicalmente” 94. Por conta dessa
quase imutabilidade, a cultura não lhe afeta na essência, mas apenas marginalmente. Os
historiadores, continua Terrin, constatam que os ritos são sempre os últimos a se modificar,
depois de mudar a língua; depois de mudarem os costumes. Já os antropólogos da religião,
“sublinhando a funcionalidade dos ritos, evidenciam o seu contexto e pragmática, com função
essencialmente ‘indessicale’ 95, onde o contexto é decisivo e inalterável” 96. Nesse caso, o rito
não pode desvirtuar a sua verdadeira contextualidade.
Indo adiante, o autor supracitado afirma que, uma vez que o rito é do tipo fixista, então
“se há uma música que seja capaz de ‘transformar’ o rito, tal música deve deixar-se guiar pelo
rito, a fim de não alterar o originário onde nasce o rito, e deve atentar para a natureza do rito,
97
e não vice-versa” . Portanto é a música que acompanha, comenta o rito e não o rito que
busca pelos modos musicais. Em nosso caso, é a tradição cristã que revela a natureza do rito
litúrgico e, por conseguinte, o tipo de música para cada tempo litúrgico ou caráter de
celebração.

90
TERRIN, Aldo Natale. O Rito: antropologia e fenomenologia da ritualidade. S. Paulo: Paulus, 2004. p. 281.
91
TERRIN, 2004, p. 282.
92
TERRIN, 2004, p. 301.
93
TERRIN, 2004, p. 301.
94
TERRIN, 2004, p. 302.
95
Indessicale: refere-se à expressão que só pode ser interpretada pelo contexto no qual é pronunciada.
96
TERRIN, 2004, p. 303.
97
TERRIN, 2004, p. 303.
42

Ainda a respeito do rito e da música se faz oportuno sinalizar para essa relação que
existe desde muito tempo e, para sua importância. A percepção dessa importância há de nos
ajudar a evitar uma tendência da atualidade de exaltar o valor das artes em detrimento do fato
religioso, alerta Terrin. É a música que deve adequar-se à estrutura simbólica do rito para
funcionar como seu apoio e seu comentário. “Os ritos nunca são acompanhados por músicas
arbitrárias ou autônomas, mas por músicas que servem para a melhor realização do rito” 98. E,
segundo Ione Buyst,

substituir a música ritual por uma música religiosa qualquer (de cunho sentimental,
devocional, catequético, querigmático ou ‘conscientizador’) é lesar o direito da
comunidade de ‘cantar a liturgia’, deixando-se moldar por ela. […] somos muitas
vezes ‘roubados(as)’ em nosso direito de cantar a música litúrgica: muitas vezes, os
cantos não acompanham a liturgia do dia, não são adequados para uma celebração
99
litúrgica.

A música pode ser propedêutica à experiência religiosa, afirma Terrin, citando R. Otto.
Ambos, música e religião/ritual, por sua natureza procuram criar uma “simpatia universal com
o mundo, ao mesmo tempo em que é uma ‘ultrapassagem’ do mundo”. Nesse sentido a
música surge como um expressivo e eficaz meio de dizer o indizível religioso – concordando
com Wittgenstein que diz que “o sentido do mundo está fora do mundo”. Ora, essa simpatia
universal das realidades do mundo evocadas e conectadas reciprocamente, tendem à unidade;
uma é som da outra; uma é eco da outra. Ela, então, “recolhe o sentido do mundo num
contexto onde transcendência e imanência formam um ‘solo’ estupendo e impensável,
impossível de ser traduzido pela linguagem ordinária” 100.
Por fim, indagando-se pelo que deve ser expressado pela a música – se conteúdos ou
emoções –, Terrin diz estar convencido de que “a função dela é comunicar através de
101
emoções e não tanto de palavras; das palavras o rito já se serve amplamente” . Mas,
segundo ele, as emoções precisam ser orientadas já que há um conhecimento no sentimento.

1.3.6 – Compreensão litúrgica do canto e da música hoje


A já citada constituição sobre a sagrada liturgia, Sacrosanctum Concilium, diz que
graças a seu caráter simbólico, a liturgia pode manifestar aquilo que nela se realiza muito
melhor do que o poderiam as palavras. Ora, é feliz quem descobriu esta verdade e a pratica

98
TERRIN, 2004, p. 312.
99
BUYST; FONSECA, 2008, p. 8.
100
Todas as citações deste parágrafo: TERRIN, 2004, p. 310-311.
101
TERRIN, 2004, p. 312.
43

em seu culto a Deus. Toda espécie de arte produz uma inumerável quantidade de efeitos a
cada um que a encontra. Dentre as formas artísticas, encontra-se a arte musical. A amizade
entre a Igreja e a arte só tem aumentado. Vê-se, nela, um caminho livre de expressão também
do sentimento religioso.
Historicamente vemos os povos – desde os antigos, os do Egito, gregos – associando-
se à arte de cantar. A própria natureza nos oferece seus sons, de maneira que não há como não
admitir esse elemento natural em nossas vidas. Quando falamos emitimos sons com ritmo
próprio. Ademais, hoje a música é encontrada em todos os momentos e espaços da vida. A
música parece ser um dado universal. Ora, se a música faz parte da vida humana, é oportuno
que faça parte, também, das celebrações litúrgicas.
O ser humano faz uso da arte para expressar seus sentimentos mais profundos. No
caso da música litúrgica, à palavra se aliam a melodia e o ritmo. Assim, o canto ajuda o ser
humano a expressar sua religiosidade, sua relação com Deus.
Tome-se como exemplo os Salmos bíblicos. Os Salmos são uma escola de oração e
ensinam a juntar, na oração, o louvor, a intercessão e a confiança, aliados à expressão poética.
Com os Salmos se aprende a rezar, ligados, não só à história pessoal, mas à história do povo
de Deus de ontem e de hoje, iluminados pela Páscoa de Jesus. Cantando os Salmos se reza,
não só com os lábios, mas com o coração e em espírito de solidariedade com toda a
humanidade.
Como se disse, o canto é um sinal; um sinal simbólico, sensível e significativo. Por
isso se lhe dedicaram muitos pronunciamentos eclesiásticos a fim de ressaltar a dignidade que
o canto litúrgico merece.
Muitas vezes se tem a impressão de que toda a música que “fala de Deus” serve para a
liturgia. Isso é um equívoco. Hoje se pode fazer uma distinção entre música religiosa, música
sacra e música litúrgica 102. A primeira é a que serve para a expressão do sentimento religioso,
porém, sem estar comprometida com nenhum credo religioso. A segunda – música sacra – é
toda a música que tem por objetivo a expressão da fé, endereçada a Deus, no templo ou fora
dele, mas sempre a serviço da fé. Já a música litúrgica é aquela que está a serviço da ação
litúrgica. Ou melhor, é aquela que se torna, ela mesma, ação sacramental. Ela será tanto mais
litúrgica quando mais se liga ao culto e dele se torna parte integrante. É, também, denominada

102
Classificação encontrada em: CARDOSO, Custódia. Música Litúrgica e Música na Liturgia. Mímeo.
44
103
música ritual , já que acompanha as ações sagradas e é considerada parte integrante delas,
tendo a mesma eficácia e o mesmo objetivo 104.
Esse tipo de música tem algumas características que lhe são próprias: sua adequação
ao tempo litúrgico; sua adequação à celebração litúrgica; adequação ao momento da
celebração litúrgica e sua adequação à índole cultural dos fiéis 105. Vê-se que ela é serva; está
a serviço do culto divino.
O canto na liturgia não tem um fim em si mesmo, mas é parte integrante da ação
litúrgica. Ele não pretende ser palavra, linguagem em si mesmo, mas sua intenção é
aprofundar e prolongar a Palavra. Assim, a serviço, o canto é gesto social e pastoral, pois
aprofunda e complementa o significado da Palavra; promove e realiza a união de todos os que
celebram juntos; une as inteligências e pensamentos; e, enfim, realiza uma ação comunitária.
A respeito disso, ainda, vale dizer que no canto litúrgico, a união das vozes acaba por
exprimir a união de pessoas numa verdadeira comunidade. É uma ação plenamente pessoal,
porque brota do íntimo e vem carregando vida, pensamentos, emoções. E é ação plenamente
social porque toda essa carga pessoal que a pessoa exterioriza através do canto, vai unir-se à
bagagem das outras pessoas. Na união das vozes, cada um se encontra pessoalmente, mas
percebe-se envolvido comunitariamente aos outros irmãos presentes.
Os elementos históricos e antropológicos e alguns conceitos trazidos nessa primeira
parte, embora tratados insuficientemente, servirão de referência para as observações da prática
corrente que vem a seguir. Possivelmente ajudarão, também, a apontar indicativos de ação
litúrgico-musical, tarefa do terceiro capítulo.

103
Música ritual é um termo antropológico que, segundo Ione Buyst, indica um tipo de música presente em todas
as tradições religiosas, “própria para acompanhar as ações sagradas; é considerada parte integrante destas, tendo
a mesma força e eficácia. Assim, na liturgia cristã, a música ritual vem carregada de ‘sacramentalidade’: é
atuação transformadora de Deus em nós, que nos faz participantes de sua vida divina” (BUYST; FONSECA,
2008, p. 8).
104
CARDOSO, S.d.
105
CARDOSO, S.d.
45

II – PRÁTICA LITÚRGICO-MUSICAL NA
DIOCESE DE VACARIA/RS
Esta investigação, ora empreendida, orienta-se para um referencial concreto: a Diocese
de Vacaria/RS. Neste segundo capítulo procura-se fazer uma aproximação deste referencial
contextual através de alguns elementos históricos e da coleta de informações. Tal construção
possibilitará, acredita-se, a objetivação de elementos litúrgico-musicais significativos desse
lugar. A visualização de indicativos práticos para a ação pastoral, no capítulo terceiro, será
tanto mais eficiente e proporcional à fidelidade e profundidade desta leitura da realidade.
Após breve contextualização histórica e geográfica, intenta-se uma descrição da
vivência contemporânea do âmbito litúrgico-musical na Diocese de Vacaria/RS. Para alcançá-
lo, se lançará mão de observações das práticas litúrgico-musicais e de uma pesquisa de
opinião escrita.

2.1 – A Diocese de Vacaria/RS: elementos históricos e geográficos


A Diocese 106 Nossa Senhora da Oliveira de Vacaria está localizada na Região Nordeste
do Estado do Rio Grande do Sul (RS). Faz fronteira: ao Norte, com as Dioceses de Lages e
Joaçaba – Santa Catarina (SC); ao Sul, com a Diocese de Caxias do Sul/RS; ao Leste, com a
Diocese de Criciúma/SC; ao Oeste, com as Dioceses de Passo Fundo e Erechim/RS.
Segundo o historiador Fidélis Dalcin Barbosa, a 7 de maio de 1848, pela Bula “Ad vos
Dominicas”, do Papa Pio IX, foi criada a Diocese de São Pedro do Rio Grande do Sul,
desmembrando-se da Diocese de São Sebastião do Rio de Janeiro. De 1848 a 1910, o Estado
constituía uma única Diocese, com sérios problemas, devido a sua grande extensão territorial.
Em 15 de agosto de 1910, o Papa Pio X, com a Bula “Praedecessorum Nostrorum”, criava as
Dioceses sufragâneas de Santa Maria, Pelotas e Uruguaiana. O Norte e parte do Nordeste,
isto é, todo o atual território da Diocese de Vacaria/RS, passou a pertencer à nova Diocese de
Santa Maria, cujo primeiro Bispo, Dom Miguel de Lima Valverde, visitou várias vezes as
paróquias ali existentes. Em maio de 1921, o Nordeste do Estado do RS passou à jurisdição

106
Segundo o Concílio Vaticano II, a “Diocese é a porção do Povo de Deus confiada a um Bispo para que a
pastoreie em cooperação com o presbitério, de tal modo que, unida a seu Pastor e por ele congregada no Espírito
Santo mediante o Evangelho e a Eucaristia, constitua uma Igreja particular” (Decreto Christus Dominus, 11).
46

eclesiástica da Arquidiocese de Porto Alegre. Dom João Becker, que visitara várias vezes as
paróquias do Planalto Nordeste, tão distante de Porto Alegre/RS, influenciado pelos padres
capuchinhos e pelas lideranças católicas de Vacaria/RS, levou adiante a idéia da criação de
uma Prelazia 107.
No dia 08 de setembro de 1934, o Papa Pio XI, com a Bula “Dominici Gregis
108
Dominici”, criava a Prelazia de Nossa Senhora da Oliveira de Vacaria . A Prelazia Nossa
Senhora da Oliveira, foi elevada à categoria de Diocese, pelo Papa Pio XII, em 18 de janeiro
de 1957. Hoje, 2009, 75 anos depois, a Diocese de Vacaria/RS é formada por 28 paróquias e
aproximadamente 500 comunidades, sendo que estas, para uma melhor articulação pastoral,
são divididas em foranias 109 ou áreas de pastoral 110.
111
A Diocese de Vacaria/RS abrange e serve a um total de 25 municípios , numa área
geográfica de 15.844 Km2 (aproximadamente 300 km por 70 km). É constituída por 28
112
paróquias , com uma população, conforme pesquisas publicadas recentemente, de 203.322
113
habitantes , sendo atendidos por 34 padres diocesanos e 15 religiosos padres 114.
Muitas famílias ou seus filhos jovens migraram do interior para a cidade, sobretudo os
centros maiores, fora do território diocesano, em busca de melhores condições de vida. Há
uma parcela que vive no campo, em sua maioria, pequenos agricultores. A população
diocesana é composta, etnicamente, por descendentes de imigrantes italianos, alemães e afro-
descendentes; em minoria, poloneses e índios. Está entre as de menor renda per capita do
Estado, sinalizando para o baixo poder aquisitivo da população. Contudo, é um povo de
cultura religiosa. Há uma considerável participação nas celebrações, bem como aos encontros
formativos. Conta-se com uma grande força pastoral de religiosas (os) e sacerdotes provindos
de Institutos Religiosos. As lideranças leigas são presenças marcantes nas comunidades. A
Igreja nessa região é um vasto e desafiante campo de Missão.

107
BARBOSA, Fidélis Dalcin. A Diocese de Vacaria. Porto Alegre: EST, 1984. p. 45-46.
108
BARBOSA, 1984. p. 71.
109
Denominação jurídica para um grupo de Paróquias geograficamente próximas, tendo o vigário forâneo como
figura referencial. A Diocese de Vacaria/RS está sub-dividida em quatro Foranias.
110
DIOCESE DE VACARIA. Plano de ação evangelizadora 2008. Marau: Marka, 2008. p. 75.
111
Confira mapa no Anexo C.
112
Do grego, o verbo “paroquiar” significa: “habitar junto a”. (GIUSTINA, Elias Della. A Paróquia Renovada.
São Paulo: Paulinas, 1986. p. 34). Paróquia designa delimitação territorial sob jurisdição espiritual de um pároco.
113
POPULAÇÃO de nossa Diocese, Novos caminhos. p. 5.
114
Padre diocesano é aquele que pertence a uma Igreja particular e nela se incardina, para, em comunhão com o
bispo e o Presbitério, pastorear a porção do Povo de Deus, que denominamos Igreja particular ou Diocese. O
religioso padre é, ao contrário, religioso, adscrito a um Instituto religioso que, além de religioso, torna-se
também padre” (LORSCHEIDER, Dom Aloísio. Identidade e espiritualidade do padre diocesano. Petrópolis:
Vozes, 2007. p. 17-18).
47

O trabalho Pastoral diocesano é encaminhado através das Assembléias Diocesanas de


Pastoral, das Foranias, do Conselho de Presbíteros e da Coordenação Diocesana de Pastoral.
Da mesma forma as Comunidades Paroquiais organizam sua ação pastoral através de seus
Conselhos Paroquiais de Pastoral (CPP).
A Diocese de Vacaria/RS participa do sub-regional intitulado “Inter-Norte”. Trata-se
115
do Interdiocesano localizado na região norte do Estado do Rio Grande do Sul , composto
pelas Dioceses de Erexim, Frederico Westphalen, Passo Fundo, Vacaria e Chapecó do Estado
de Santa Catarina/SC. Estas fundaram, em 1982, o Instituto de Teologia e Pastoral – Itepa,
com sede em Passo Fundo/RS. O Itepa se constitui em um espaço referencial para os estudos
teológicos para as dioceses da região. Se voltará a falar do Itepa no capítulo terceiro, quando
abordaremos a reflexão metodológico-pastoral ali desenvolvida.

2.2 – Elementos históricos da caminhada litúrgico-musical diocesana


As buscas aos arquivos da Cúria Diocesana de Vacaria/RS mostraram-se restritos ao
oferecer elementos que ajudassem a reconstituir a caminhada litúrgica da Diocese de
Vacaria/RS. Isso tornou difícil nossa busca pelos elementos históricos. Daquilo que se coletou
arquivado e dos elementos colhidos verbalmente através de pessoas com presença marcante –
autorizadas, portanto, a informar dados pertinentes –, seguem-se as linhas a seguir.
Os arquivos acerca da caminhada litúrgica na Diocese de Vacaria/RS encontrados na
Cúria Diocesana estão guardados em pastas. Dali se obtêm informações de que houve alguns
cursos de formação litúrgica, ora oferecidos para leigos(as), ora para o clero. Dos temas
abordados, segundo os arquivos, estão: Celebração Dominical da Palavra de Deus e Prece
Eucarística com assessoria do Pe. Marcelino Sivinski, em 1997; O Mistério Pascal de Jesus
Cristo com assessoria do Pe. Marcelino Sivinski, em 2004; Ministérios Litúrgicos com
assessoria do Pe. Gustavo Haas, em 2005; Homilética com assessoria do Pr. Mauro B. de
Souza, em 2008; Mistagogia do espaço de celebração com assessoria da Ir. Laíde Sonda, em
2009. Em nenhum momento – nem nos arquivos nem nas informações verbais – se faz alusão
a cursos voltados ao canto litúrgico e seus animadores.
Em tais arquivos encontram-se, ainda, roteiros de celebrações que, em algum
momento foram produzidos para serem distribuídos Diocese afora, ou produzidos para
encontros em nível diocesano. Nesse sentido são encontrados roteiros de celebrações para:
Lava-pés (quinta-feira santa); Ação de Graças pelas colheitas; Dia do agricultor(a); Encontro
de catequistas; encontro de ministros, dentre outros.
115
Confira mapa no Anexo C.
48

Também estão reunidas algumas apostilas que possivelmente serviram para estudos
em alguns dos encontros supracitados ou trazidos de outros eventos. Os temas contidos
abordam: a oração eucarística; equipes de liturgia e pastoral litúrgica; renovação litúrgica a
partir do Concílio Vaticano II; Ministérios na Igreja; participação ativa na celebração
litúrgica.
São encontrados vários convites, folders, cartas e anúncios de encontros de formação
litúrgica oferecidos no Regional da CNBB (RS) ou em nível nacional. Não há registros de
participação de representações diocesanas nesses encontros. Porém, sabe-se que em vários
desses a Diocese fez-se representar.
Por fim, registram-se arquivos que indicam a existência de uma Equipe Diocesana de
Liturgia no final dos anos 90. Constam alguns relatos de reuniões realizadas, relatos de
avaliações acerca de cursos oferecidos e um projeto de atuação dessa equipe. Embora sem
registros documentais, sabe-se que essa equipe se desfez em seguida, não havendo, até o
presente, a constituição de uma equipe encarregada dessa dimensão, em nível diocesano. Há,
isto sim, uma equipe que, desde o ano 2006 se encarrega de pensar a dimensão do canto
litúrgico, como se abordará a seguir.
Foram objetos de pesquisa, nessa investigação, os livros de cantos produzidos na
Diocese de Vacaria/RS, nos últimos trinta anos. Colheram-se as seguintes informações.
No início da década de 80 foi produzido um livro de cantos destinado às celebrações
litúrgicas. Recebeu o título “Aleluia!”. Consta de 450 cantos e 17 orações. Contém, ainda, as
principais Orações Eucarísticas para ser acompanhado pelo povo dos fiéis. Seu formato é de
10X15 cm.
Em meados daquela mesma década o livro é reeditado conjuntamente com a Diocese
116
de Passo Fundo, recebendo correções e ampliações. Em 1990, a 3ª edição revisada tem o
título “Aleluia! Cantando a caminhada”. Desta vez o livro, com o mesmo formato dos
anteriores, tem o número de cantos ampliado para 899 e de orações para 73. Na apresentação,
os organizadores Pe. Ignácio Dalcim e a Ir. Gema Bernardi, informam ter recebido sugestões
e ajuda de paróquias para a revisão e oferecem orientações ao manuseio dessa edição
ampliada.
No período correspondente – 1987 – um outro livro de cantos foi produzido. Na
verdade não possuía cunho litúrgico propriamente. Foi pensado e organizado pelo grupo
coordenador da Escola de Formação de Agentes de Pastoral (Efap) e visava dispor cantos

116
Também a Diocese de Passo Fundo reeditou o livro outras vezes. As reedições foram independentes.
49

pastorais voltados à animação e aos temas estudados naquela escola. Mesmo assim era
utilizado em celebrações litúrgicas. Continha 260 cantos e seu formato era de 10X20 cm.
Durante toda a década de 90 não são registradas outras edições de livros de cantos.
Ganham força, então, as fichas de cantos. Na Paróquia Nossa Senhora da Conceição de
Caseiros/RS, por exemplo, foram produzidas aproximadamente uma dezena de fichas, nesse
período. Essa e outras paróquias ofereciam encontros anuais onde se ensaiavam os cantos
novos com as lideranças das comunidades.
Suprindo a carência desse material litúrgico, várias paróquias adquiriram livros
produzidos fora da Diocese. Por exemplo: “Cantos para Missões Saletinas” da Congregação
dos Missionários Saletinos; “Canções da vida” da Paróquia Imaculada Conceição de Caxias
do Sul; “Louvai o Senhor” da Associação do Senhor Jesus de São Paulo; “Ao redor da mesa”
da Diocese de Erexim.
Em 2004, de volta às produções locais, a Paróquia Santuário Nossa Senhora
Consoladora de Ibiaçá/RS organizou o livro “Vem cantar”, contendo 792 cantos e duas
dezenas de orações, em formato de 15X21 cm. Na apresentação do livro, à página 03, se diz:
“há muito tempo sentíamos a necessidade de se ter um livro de uso amplo que atendesse ao
mesmo tempo às celebrações litúrgicas, romarias, encontros de formação […] e outros
momentos iluminados pelo ideal cristão de Louvar a Deus, viver e partilhar a alegria nos
grupos e comunidades”.
No mesmo ano, a Paróquia São João Batista – e, em 2005, a Paróquia São José
Operário – ambas de Sananduva/RS reeditaram o livro de Ibiaçá/RS. Manteve-se o formato e
o número de cantos ficou em 680 e de orações em 59. Ali, na apresentação, página 03, se diz:
“há muito tempo sentíamos a necessidade de se ter um livro de cantos da Paróquia São João
Batista que expressasse a UNIDADE PAROQUIAL, para que todo o povo pudesse participar
com alegria e empolgação”.
A seqüência dessa caminhada litúrgico-musical será escrita através do Curso de Canto
Litúrgico e Pastoral, que abordaremos a seguir. Em suas três edições, nos anos 2007 a 2009,
foram produzidos três livrinhos de cantos de cunho litúrgico, com formato 21X15 cm. O
número de cantos contidos são de 22, 31 e 31, respectivamente.
50

2.3 – A prática litúrgico musical das comunidades católicas na atualidade


2.3.1 – O Curso de Canto Litúrgico e Pastoral
O Curso de Canto Litúrgico e Pastoral (CCLP) é uma atividade pastoral assumida em
117
Assembléia na Diocese de Vacaria/RS. Nos Planos de Ação Evangelizadora dos anos de
2007, 2008 e 2009 consta como prioridade.
O que é apresentado a seguir resulta da releitura das anotações e reflexões pessoais de
membros da coordenação. Numa espécie de “diário de bordo”, as observações do processo
realizado foram sendo registradas e, aqui, oferecem elementos que possibilitam uma
localização aproximada da prática corrente dessa tentativa de alavancar um processo de
formação litúrgico-musical em nível diocesano.

2.3.1.1 – Um processo em construção


Em 2003, por ocasião de um curso de formação litúrgica com lideranças em Ibiaçá/RS
nasceu a sugestão de se pensar um curso para auxiliar lideranças das comunidades eclesiais na
dimensão do Canto Litúrgico. Tal sugestão permaneceu inativa até meados de 2006, quando a
idéia renasce dentre as lideranças do meio litúrgico daquela mesma Paróquia.
Desta vez havia mais segurança para levar adiante a proposta. Outras pessoas
interessaram-se, levantaram várias questões a se considerar, além de darem grande estímulo
para que isso se concretizasse. Isso ganhou proporções diocesanas.
A Assembléia Diocesana de Pastoral, em outubro de 2006, acolheu o projeto, aprovou
como uma das prioridades para o ano seguinte e indicou os nomes das pessoas para compor a
equipe de coordenação desse curso.
A partir de março de 2007 aconteceu a preparação da primeira edição do curso. As
pessoas que se reuniram para prepará-lo não eram somente os quatro indicados para
coordenadores, mas, uma equipe ampliada, com mais de dez pessoas.
Com o objetivo de preparar animadores que pudessem contribuir nas celebrações
litúrgicas através de um adequado uso da música e do canto litúrgico, aconteceu o primeiro
Curso de Canto Litúrgico e Pastoral. Os participantes foram, em maioria absoluta, pessoas
que auxiliam nas celebrações das comunidades: instrumentistas, padres, religiosas,
catequistas, coordenadores de liturgia, ministros da Eucaristia e da Palavra, seminaristas.
O 2º CCLP para o ano 2008 era inevitável, parecia. Havia até quem sugerisse duas
edições por ano; sugeria-se, ainda, realizá-lo nas Foranias. A Assembléia Diocesana de

117
Assembléia Diocesana de Pastoral é a instância máxima de tomada de decisões no campo da evangelização
em uma Diocese.
51

novembro de 2007 aprovou a realização de mais uma edição em dois locais, no mês de junho
do ano seguinte.
Em março de 2008 iniciaram-se as conversas e encontros em preparação dessa
segunda edição. Desta vez contava-se com a experiência de um encontro já realizado. Parecia
não haver mais a necessidade de definir tarefas. Tratava-se de selecionar os cantos e
estabelecer um cronograma de trabalho. Novamente a confecção do material caberia ao grupo
do Seminário Diocesano, residentes em Passo Fundo/RS, a partir das definições da equipe de
coordenação. A preparação, desta vez foi mais setorizada e as reuniões visavam definir os
pormenores e realizar os ensaios dos cantos.
Mesmo com um trabalho setorizado o curso aconteceu, em sua segunda edição,
mantendo e até elevando o nível de qualidade. Cada uma das partes fez muito bem o que lhe
cabia. Pensou-se alguns subsídios e conteúdos que agradaram aos cursistas e às duas equipes
de trabalho; a equipe de coordenação e execução se dedicou muito, realizou vários ensaios de
forma que estavam muito mais seguros, se comparado ao ano anterior – mesmo tendo um
número maior de cantos; os seminaristas organizaram o material previamente, manipularam
os equipamentos de informática e coordenaram as inscrições e economia nos dias do curso
com a eficiência que lhes é característico. Enfim, o Curso aconteceu e parece ter agradado.
Este projeto diocesano de cunho pastoral parecia consolidado. Ganhou
reconhecimento e acenava-se para a realização de uma nova edição no ano seguinte.
Reapresentado em Assembléia Diocesana, foi aprovado para o ano 2009. O processo de
construção e a execução aconteceu à semelhança dos anteriores.

2.3.1.2 – Conteúdo e Método


As reuniões do grupo de coordenação concentraram-se em Ibiaçá/RS, por uma
afinidade geográfica: poucos membros não residiam nessa cidade. Isso, por um lado, facilitou
os encontros. De outro lado parecia não valorizar a representatividade da diocese como um
todo. Da reflexão surge uma nova compreensão: somos uma equipe, com status diocesano; a
necessidade de representatividade é de interesse e não pode depender do número de pessoas
representantes. Ou seja: essa equipe precisava preparar um curso que atendesse às
necessidades e interesses diocesanos, sem, necessariamente contar com pessoas de todas as
regiões da Diocese.
Inicialmente, a equipe precisou decidir a metodologia do curso e definir a seleção dos
cantos a serem ensaiados. Gradualmente ia-se definindo o tipo de relação entre os membros
da equipe, marcadamente descontraída, amistosa. As reuniões visavam a confecção do
52

material e o ensaio dos próprios cantos. Sempre longas, tais reuniões não pareciam cansativas
já que sempre mesclaram trabalho e lazer; o ofício de coordenação e o prazer proporcionado
pela música.
Há, sempre, a necessidade da ajuda de outras pessoas como os seminaristas da
Diocese, residentes em Passo Fundo/RS, para a confecção do material. O material impresso
foi confeccionado quase artesanalmente na primeira edição. Já na segunda e terceira edições
foram impressos em gráfica. Também o material de áudio disponibilizado aos cursistas é
confeccionado artesanalmente. Após vários ensaios realizados, ora somente com
instrumentistas, ora com todo o grupo de cantores e tocadores, utilizando-se os equipamentos
de som do Santuário de Ibiaçá/RS, de equipamentos de informática com gravador de áudio
acontece a gravação dos cantos. Outras pessoas, ainda, auxiliam nos trabalhos de
ornamentação, sonorização, infra-estrutura e alimentação. Todos os trabalhos contam com a
generosidade individual, já que são gratuitos.
Os encontros costumam ser bastante dinâmicos, descontraídos, participativos. Se, por
um lado, a equipe coordenadora apresenta-se bem preparada para conduzir os trabalhos, por
outro lado, as pessoas que participam dos encontros são portadoras de muitas experiências e
carregam uma grande paixão por música e liturgia
Uma vez que há opção pelo perfil de um curso que não seja meramente encontro para
ensinar cantos novos, a equipe de coordenação não tem a preocupação de repassar todos os
cantos naquele dia. Pensando assim, procura trabalhar intercalando os ensaios de cantos com
pequenas palestras de explicações e dicas litúrgicas, realizando brincadeiras e até dança.
Dado à extensão geográfica da Diocese, cada edição do CCLP é oferecido em dois
locais: em Vacaria/RS e em Sananduva/RS ou Ibiaçá/RS. Isso também proporciona à equipe
de coordenação maior entrosamento entre si e com a dinâmica do curso.
O CCLP ganhou credibilidade e o desejo de continuidade, graças a alguns fatores que
passamos a comentar. Um deles, o trabalho coletivo da equipe coordenadora: entrosada e
sintonizada. Com seriedade e qualidade profissional, proporciona encontros descontraídos,
leves, animadores e carregados de esperança cristã. É notável a qualidade da equipe que
dispôs de seus talentos em favor do canto litúrgico. Outro fator é a possibilidade que o curso
abriu de as pessoas manifestarem os problemas que enfrentam, suas angústias e dificuldades
no campo litúrgico. Para algumas apontaram-se possibilidades, alternativas e saídas. Ademais,
são oferecidos exercícios físicos – especialmente vocais – para uma melhor impostação de
voz, bem como dicas para postura corporal e hábitos alimentares e bebidas.
53

Como é de se imaginar, o grande contributo do curso é a seleção de novos cantos.


Estes são escolhidos visando oferecer uma variedade que subsidie os vários momentos
celebrativos. São ensaiados durante alguns meses e gravados pela equipe coordenadora.
Assim, além de serem ensaiados ao longo do dia do encontro, os cursistas levam para suas
casas um livreto com a letra destes cantos já cifrados e um CD com as gravações destes e de
outros cantos e melodias.
No dia do curso, em meio aos ensaios dos cantos novos, são oferecidos estudos e dicas
litúrgicas. Para isso a equipe utiliza-se de vídeos, power point e outros instrumentos que
proporcionam o estudo das orientações litúrgicas da Igreja para o canto litúrgico, bem como a
incidência da música na vida humana.
Um dos recursos muito usados pela equipe coordenadora para a troca de informações e
preparação do material foi a internet (e-mail, msn). Se, por um lado, ela facilita o trabalho da
equipe devido às distâncias (dispensando a realização de outros encontros pessoais), de outro
isso acaba por distanciar, fazendo com que trabalhemos isoladamente, setorizado. Tal situação
é bem contemporânea. É preciso atentar para não permitir o mecanicismo pastoral. Será
necessária constante avaliação dos ganhos e dos limites no uso dos recursos técnicos e
eletrônicos.
O curso procura acentuar a dimensão comunitária do canto litúrgico. Ora, o canto se
apresenta como forma privilegiada de participação. Ele pertence à assembléia que celebra.
Além disso, o canto se torna sacramento daquilo que se celebra. Mas, para isso, não pode ser
tomado como acessório a embelezar a celebração. Portanto, canta-se a liturgia e não na
liturgia.
Os CCLPs procuram acentuar a dimensão da espiritualidade contida em cada canto e
no grupo de cantores e instrumentistas. É acentuada a largueza dos conteúdos do texto e,
também, da melodia e ritmo. Ganhou relevância a expressão “Ministros do canto”, já que
valoriza o trabalho generoso, “elevado” à categoria de ministério.
A partir da segunda edição abriu-se, aos cursistas, a oportunidade de apresentarem
composições inéditas, de sua própria autoria. Isso para atender ao apelo conciliar de fazer com
que a liturgia assuma as culturas locais (inculturação). As composições inéditas são
apreciadas previamente pela coordenação. A seguir, também os cursistas, tendo conhecido o
texto e a melodia, dão sugestões às composições.
O curso tem tornada explícita sua opção e recomenda a adoção de um método para
ensaiar cantos novos. O método assumido compreende três passos: ler o texto do canto para
conhecer seu conteúdo textual; a seguir escutar a execução do áudio duas ou mais vezes,
54

procurando identificar as particularidades dos versos e do refrão; por fim, começar a cantar
junto até saber cantar sozinho. No centro desse método está a intenção de dar destaque à
palavra escrita que, somente num momento posterior, será potencializada pelo ritmo e
melodia, pensados para produzir emoções e alargar o alcance dessa palavra.
Ressalta-se, ainda, o acento que o CCCL dá à beleza 118 da liturgia e do canto litúrgico.
Inscrita dentre as artes, a música ajuda a que os fiéis ultrapassem o meramente usual, o
meramente humano, carregando de dinamismo, emoção e potencialidade e levando o ser
humano ao mais profundo de sua existência, até o seu transcendente.

2.3.1.3 – Os participantes dos CCLPs


Na primeira edição, dias 02 e 16 de junho de 2007, o curso aconteceu em Ibiaçá/RS e
em Vacaria/RS, com 280 participantes no total. Já a segunda edição, realizada nos dias 07 e
28 de junho de 2008, ocorreu em Vacaria/RS e Sananduva/RS. Foram 241 pessoas
participantes. A terceira edição aconteceu nos dias 13 e 28 de junho de 2009, tendo como
locais Vacaria/RS e Ibiaçá/RS, totalizando 269 cursistas.
O perfil dos participantes têm sido de pessoas diretamente ligadas às equipes de
celebrações das comunidades. São pessoas que integram as equipes de liturgia das
119
comunidades e, em geral, atuam como entoadores e instrumentistas musicais . Observa-se
significativo aumento de pessoas que portam consigo instrumentos musicais (principalmente
violão) na evolução dos encontros. Além de leigos, nota-se pequena presença de religiosos(as)
e ausência de padres (além dos integrantes da coordenação).

2.3.1.4 – Avaliação dos participantes


Ao final de cada encontro os cursistas podem manifestar suas avaliações por escrito e
de forma coletiva. Manifestam-se quanto à importância, acertos e erros, dão algumas
sugestões e apontam possibilidades em vista da continuidade do CCLP.
Os participantes continuamente acentuam a importância de tratar da espiritualidade
dos ministros do canto. Ganhou importância o fato de se estar enfocando – na liturgia – a arte
e os gestos poéticos, um pouco esquecidos no cotidiano. “Levaremos esta beleza para que
brilhe no rosto de nossos irmãos”, disse um grupo. “Sentimos que os jovens estão despertando

118
Do Sânscrito, beleza significa “a casa onde Deus brilha” (KOLLING, Miria T. A beleza do canto litúrgico.
Revista Vida Pastoral. Ano 50, n. 267, julho-agosto de 2009. pág. 26).
119
Confira mais elementos do perfil dos participantes no Anexo A.
55

para a parte musical, canto, alegria; e assim a Igreja vai mudando”, afirmaram. “A música
cativa as pessoas” 120.
Há entusiasmo pela oportunidade de partilhar composições musicais (músicas
regionais) e pelo surgimento de novos talentos. Sugere-se continuar valorizando os talentos
diocesanos e incentivando os jovens a participarem.
Em encontro onde não se distribuiu material didático acerca da liturgia, os mesmos são
solicitados, já que “não conseguimos copiar as mensagens que foram apresentadas” e “os
conteúdos a cada ano vem melhorando”. Também reclamam o pouco tempo destinado às
perguntas e esclarecimento de dúvidas. Ainda: “faltou a especificação dos cantos; alguns
cantos com pouca animação: as palavras dizem muito mas a melodia não anima” foram
alguns comentários feitos.
Ressaltamos, ainda, a solicitação de mais cantos em homenagem aos santos; “mais
encontros para que nossa fé seja sempre renovada”; promover curso para instrumentistas;
trabalhar os cantos próprios da Quaresma e Advento; realizar algumas oficinas (laboratórios)
para desenvolver técnicas de desinibição dos animadores do canto.

2.3.1.5 – Ganhos e desafios


Aparecem várias inquietações, queixas, angústias que permeiam a fala e o cotidiano
dos cursistas. Dentre elas destaca-se o baixo número de instrumentistas de que as
comunidades dispõem. Além disso, constatou-se que muitas comunidades celebram com
baixa qualidade musical, vozes pouco trabalhadas e desafinadas, desarmonia de vozes
cantoras, tonalidade baixa, ritmo lento.
Tudo isso leva a pensar que as celebrações se tornam pouco atraentes e, inclusive,
deprimentes. Falam das dificuldades que enfrentam com seus comunitários, com seus padres,
com as dificuldades econômicas, etc. Apesar dessas constatações a respeito das comunidades,
as pessoas presentes no curso, ao contrário, possuem um diferencial próprio de maior
qualificação. A maioria concorda quanto à importância da continuidade desse trabalho a fim
de intensificar, nas celebrações, o ardor celebrativo através da arte musical.
Aparece um elemento, necessidade de uma minoria, porém, de grande relevância e,
por isso, causa de angústia (ao menos inicialmente). Alguns cursistas pedem pela confecção
de partituras dos cantos e, outros, pela confecção do material em linguagem de libras. Foram
poucos que pediram por isso. Mas deve-se considerá-los.

120
Todas as citações deste parágrafo e dos seguintes, cfe. Avaliação dos cursistas, arquivos dos CCLPs.
56

Foi necessário, então, rever a identidade e a opção do curso: contribuir para as


comunidades que enfrentam dificuldades bem básicas com o canto litúrgico. De outro lado,
forçou a perceber a necessidade de oferecer novos encontros com ainda maior qualidade.
Outros dois elementos emergiram. Quanto aos destinatários: a quem pode interessar
um Curso de Cantos Litúrgicos? Conclui-se que deveria interessar a toda a comunidade dos
fiéis que se reúnem para celebrar. Mas isso não é consenso. Um número expressivo de padres
demonstrou pouco interesse pela dimensão do canto e da liturgia como um todo. Isso se
evidencia pelo pouco investimento financeiro nessa área. Acontece que no estilo de
organização que a maioria das comunidades paroquiais adotam, os padres são responsáveis
pela administração paroquial. Muitos dos cursistas e a maioria das lideranças cristãs-católicas
– não só na área da liturgia – necessitam investir também financeiramente no trabalho que
realizam.
Ora, se nas celebrações não acontecem inovações, a monotonia e a mesmice tomam
conta. A conseqüência disso são comunidades que perdem o gosto pela participação, não só
nas celebrações, mas pela própria vida comunitária. Constatamos tal desinteresse dos líderes
religiosos, também, pela não divulgação e não envio de lideranças para esse curso.
Participantes do curso relataram verbalmente que, desde a primeira edição do CCLP,
surgiram novos grupos de cantos que passaram a atuar nas celebrações dominicais. Outros
informaram que um grupo que há anos não exercia seu ministério litúrgico, fora reativado.
Algumas pessoas se animaram a aprender a tocar instrumentos musicais (violão,
principalmente). Muitos dos cantos ensinados no curso estão sendo cantados nas celebrações
pela Diocese afora.
Tem seqüência uma preocupação em relação às paróquias que não participam do
CCLP. Não somente no sentido de se fazer representar, mas pela ausência que é sintomática,
em muitas atividades diocesanas. Questiona-se pelo direito das lideranças litúrgicas poderem
ter decidido participar ou não. Hipoteticamente muitos não tiveram acesso à informação e/ou
o incentivo moral e econômico para participar do curso.
121
Aqui se faz oportuna a lembrança do “evento Aparecida” que aponta para uma
efetiva participação dos leigos. Urge, em boa parte da Igreja de Jesus Cristo, a necessidade de
se organizar de um tal jeito em que o povo implicado possa tomar parte da ação. Nesse caso
aumentam as chances de uma caminhada fecunda de evangelização. “Aparecida” é proposta.
Portanto não é só passado. É presente e futuro, se assim se o fizer. Não pode ficar só na

121
Maior que o alcance do documento final do episcopado latino-americano em Aparecida/São Paulo, é o
alcance dos debates que tal evento propiciou.
57

lembrança. Há de gerar a crise do novo na Igreja (evangelização interna) e na cultura.


Primeiro uma conversão eclesial, depois, da sociedade.
O segundo elemento diz respeito ao espírito que motivou o trabalho em equipe da
coordenação. Já se disse anteriormente que a Assembléia Diocesana apontou apenas alguns
nomes para uma coordenação central. E que essa equipe se ampliou, como que por ação do
Espírito Santo. Doutro lado, registra-se a saída de membros do grupo de coordenação. A
motivação para tal atitude era o desejo de que o curso fosse diferente, ao estilo próprio destes
membros, um curso marcado mais pela animação e pelo espetáculo.
Sobressaem-se algumas preocupações em relação ao futuro deste curso. Será que se se
trabalhar dessa forma setorizada, não corre-se o risco da fragmentação? E a possibilidade do
“estrelismo”, onde uma pessoa se destaca mantendo “sob seu comando” equipes de execução?
Nesse caso não estaríamos traindo as tão oportunas aspirações do movimento conciliar da
Igreja (Vaticano II) de se promover maior participação (tomar parte da ação) na vida eclesial e
celebrativa? Até que ponto tais pessoas e equipes são protagonistas deste curso para poder
trazer vida nova à dimensão celebrativa na Diocese de Vacaria/RS? E, perdendo-se o espaço
do diálogo e da comunitariedade, haverá lugar para o Espírito Santo e, em conseqüência, para
a criatividade? O Curso não corre o risco de se esvaziar de boas idéias e de pessoas? Ou seja:
o que está em questão é a metodologia usada para fazer acontecer o curso.

2.3.2 – A música na vida: uma tentativa de leitura a partir da pesquisa de campo


Uma vez que essa pesquisa volta-se para um contexto determinado – a Diocese de
Vacaria/RS – percebeu-se a necessidade da obtenção de alguns dados elementares para a
compreensão dele. E o método adquirido foi o da pesquisa de campo, com duas modalidades:
observações registradas a partir de celebrações litúrgicas no período de junho de 2008 a julho
de 2009 e entrevistas realizadas através de um questionário aplicado em junho de 2009. O
questionário e as respectivas respostas concedidas pelos entrevistados encontram-se anexadas
ao final desse texto de dissertação (Anexo A). As respostas foram agrupadas por perguntas,
estando, os entrevistados, enumerados e identificados em ordem alfabética de “a” até “u”.
Para indicar a fonte e oferecer segurança ao que está sendo dito, o texto usará um
código remissivo como neste exemplo: Anexo A, 5-C. Para checar tal fonte, o leitor buscará,
no exemplo supracitado, as respostas ao questionário disponibilizadas no Anexo A,
conferindo, na questão “5”, a resposta do entrevistado “C”.
Apresentam-se, a seguir, os resultados dessa pesquisa de campo: uma pesquisa
qualitativa que procura perceber os elementos que aparecem sem demasiada preocupação com
58

a freqüência com que isso acontece. Talvez seja possível afirmar que procurou-se atentar às
manifestações fenomenológicas, percebidas por causa da intensidade e contextualização em
que aparecem, ou mesmo pela reincidência.
As entrevistas foram realizadas, em sua maioria, por ocasião do terceiro Curso de
Canto Litúrgico e Pastoral da Diocese de Vacaria/RS, realizado em junho de 2009. Os
questionários foram entregues no início e recolhidos no final do dia, ao encerrar o curso.
Apenas seis entrevistados tiveram alguns dias para responder ao questionário. Estes últimos
não necessariamente participaram do curso.
Entrevistou-se pessoas que atuam em comunidades eclesiais de base. Seu grau de
escolaridade é, em geral, de ensino fundamental e médio. Algumas entrevistas continham
erros de escrita ou de ortografia. Optou-se por transcrever na ortografia correta mantendo-se
ao máximo a fidelidade à idéia de seu autor.

2.3.2.1 – Perfil dos entrevistados


Foram vinte e uma pessoas que responderam ao questionário. Dez do sexo masculino e
onze do feminino. Três têm idade inferior a vinte anos; três entre vinte e trinta anos; doze
entre trinta e cinqüenta anos; e três entre cinqüenta e sessenta anos. Portanto, mais da metade
dos entrevistados estão nas faixas consideradas jovem e jovem-adulto. Suas profissões são:
comerciante, costureira, do lar, pedreiro e eletricista, agricultor(a), estudante, secretária,
técnica em contabilidade, agente comunitário, gerente de vendas, professora, agente
nutricional, sacerdote.

2.3.2.2 – Formação litúrgica e musical


As repostas ao questionário indicam que poucos participaram de cursos de formação
litúrgica ou musical. Assim, a maioria tem apenas noções de liturgia e de música. Exemplo
disso um entrevistado afirma não ter “nenhum tipo de formação; canto porque gosto muito”
(Anexo A, 4-C).
As entrevistas revelam que os agentes de pastoral oferecem de seus talentos
generosamente. Além disso, desenvolvê-los é uma decisão que conta com investimentos
financeiros próprios. Muitas vezes, percebe-se que a formação está muito aquém de uma
qualidade desejável para um nível razoável desses serviços prestados nas celebrações. Uma
entrevistada disse: “aprendi observando e interagindo com pessoas mais experientes” (Anexo
A, 4-R). Há alguns que associam momentos vivenciais celebrativos mais intensos, fora de sua
comunidade vivencial, à formação litúrgica. Relatam tais momentos como sendo de
59

aprendizado: “formação litúrgica só tive na época em que trabalhei nas Missões Diocesanas”
(Anexo A, 4-N).
As respostas a essa questão indicam um vasto campo que inspira cuidados. Os
entrevistados dizem de seu gosto pela arte musical e pelo que fazem no campo litúrgico, mas
dão a entender que carecem de mais orientação e formação para atuarem com maior
segurança.

2.3.2.3 – O que é essa arte chamada música?


“A maior de todas as artes” (Anexo A, 5-R). Segundo os participantes da pesquisa, a
música é parte constitutiva da vida e é a própria vida. Várias respostas afirmaram isso, mas,
há que se convir que isso diz tudo e, ao mesmo tempo, pouco. Convém, então, olhar respostas
que derivam dessa concepção geral.
A música sustenta e alimenta enquanto ser humano. Através dela se sente realizado,
sem pecado e sem sofrimento (Anexo A, 5-E). A música é a alma da própria vida (Anexo A,
5-L), ou seja, dá vida à própria vida. É um momento, afirmou alguém, parecendo destoar das
afirmações gerais (Anexo A, 5-O). É saúde (Anexo A, 5-T). É alegria, prazer, oração, vida
(Anexo A, 5-U).
Houveram entrevistados que afirmaram que a música alivia os pensamentos e dá paz,
tranqüiliza, descontrai e tira o stress. A música ajuda a alegrar.
Noutro bloco de respostas há quem a perceba como uma forma de expressar e de
elevar o estado de espírito: “pura expressão de sentimentos” (Anexo A, 5-K). Afirmam ter
“gravado na memória momentos especiais em que a música fez toda a diferença” e, hoje,
quando escuta aquela música se reporta àquele momento. A entrevistada diz que a música
“Oração pela família” de autoria do Pe. Zezinho “machucava ouvir quando estava em
processo de separação” (Anexo A, 5-K). Ainda como veículo de expressão, um entrevistado
afirma que a música presta-se tanto para momentos de diversão como nas horas de luto, já que
ela é capaz de “transportar nossos pensamentos para lugares fabulosos” (Anexo A, 5-L). A
música é linguagem da emoção, resume outra (Anexo A, 5-R).
Há quem perceba a música como veículo para chegar às pessoas, quando se tem o
desejo de estabelecer um contato, como a evangelização, por exemplo. “Tenho certeza que
através da música estou levando o amor de Jesus Cristo a cada ser humano que busca o
caminho verdadeiro […]; como se aquelas pessoas que ali estão, foram privilegiadas de
estarem fazendo parte do amor do Senhor” (Anexo A, 5-E). A música entoada conjuntamente
60

confere um caráter de sermos da família de Deus (Anexo A, 5-F) com amplo poder
transformador (Anexo A, 5-L).
Assim como as demais formas de expressão artística, a música remete o ser humano
ao encontro consigo e com o transcendente, Deus. Através dela “voamos através dos nossos
sonhos e desejos; é através dela que chegamos diretamente ao coração. […] Muitas vezes me
amparo nela; fujo; serve de refúgio para determinados momentos; ela desencadeia minha
sensibilidade, romantismo” (Anexo A, 5-K). A música ajuda a identificar os problemas e as
superações. É Deus quem alegra, purifica e fortifica (Anexo A, 5-T). Por isso a música “é o
reflexo de Deus e sua perfeição, seu amor, sua bondade!” (Anexo A, 5-R).

2.3.2.4 – Gosto musical e elementos atrativos na música


Parcialmente os entrevistados dão conta do adágio que diz que “gostos, cores e amores
não se discutem”. Parcialmente porque revelaram um amplo leque de gêneros musicais que
apreciam. Porém soa quase uníssono o gosto pelo equilíbrio constitutivo de músicas bem
animadas, bem marcadas pelo ritmo e pela melodia, porém, imbuídas de conteúdo existencial.
Música alegre faz sentir-se bem e dá uma nova visão da vida, afirmam (Anexo A, 6-B
e 6-C). Outra aprecia o “poder que a música tem de nos fazer sonhar, de nos levar a
dimensões até então nunca alcançadas” (Anexo A, 6-J). É expressiva a opinião de vários
entrevistados que compreendem que se faz necessária uma harmonia entre texto, ritmo e
melodia.
Assim, os entrevistados não descuidam do conteúdo textual. Os Cds de músicas com
boas mensagens “nunca faltam no meu carro” (Anexo A, 6-A). Ganham destaque as músicas
que falam “da família de Deus, da natureza e nos ensina a caminhar” (Anexo A, 6-F). “O que
mais gosto na música é a mensagem que ela traz para nossa vivência” (Anexo A, 6-M). Nesse
sentido alguns citaram as músicas “de raiz”, sertanejas e gaúchas, por falarem das raízes e dos
princípios da vida (Anexo A, 6-N, 6-U, 7-L).
Não descuidam, sequer, do ritmo e da melodia. Os entrevistados entendem que o texto
poético é potencializado pela música ampliando seu alcance. “Uma boa melodia enriquece o
texto e vice-versa” (Anexo A, 7-I). “Com ritmo e música é mais fácil chegar às pessoas do
que só com palavras; ocorre maior sensibilidade” (Anexo A, 7-P). Há textos, disse uma
professora, que “são verdadeiras orações, poesias que, através de suas letras trazem
mensagem de vida […]. É fundamental que as letras tenham uma melodia ideal […]. Por isso
cantar tendo letra e melodia em harmonia é tudo de bom” (Anexo A, 7-T). E, “não adianta o
61

texto ser bom se o ritmo não contagia” afirma o padre entrevistado (Anexo A, 7-U). “Quando
se juntam então nem se fala; chega arrepiar e sobe a adrenalina” (Anexo A, 7-F).
Os entrevistados revelam buscar na música aqueles “ingredientes” que contemplem o
momento existencial e/ou produzam vivências. Por exemplo: “gosto de música que de alguma
forma faça com que nossos sentimentos aflorem, que sua letra nos traga algum tipo de
aprendizado, e que no seu conjunto harmonia, melodia e ritmo toque nosso coração e desperte
alguma reação: entusiasmo, alegria, reflexão, admiração, melancolia, festa, saudade, emoção,
euforia” (Anexo A, 6-R).
Por fim, merece registro um dado oferecido por vários entrevistados. Muitos entendem
que para cada momento, cabe um estilo de música diferente. “Algumas eu medito; outras eu
relaxo e outras danço para descontrair um pouco; outras lembro o tempo de criança” (Anexo
A, 6-M). “Música sacra me deixa serena, alegre e feliz e me acalma” (Anexo A, 6-S).

2.3.2.5 – A música na liturgia cristã


Perguntados sobre a importância do canto e da música nos momentos celebrativos, os
entrevistados posicionaram-se a favor de uma acertada conjugação entre as partes.
Para a maioria absoluta, a música ajuda a rezar e, assim, chegar até Deus, “re-ligar”
(Anexo A, 8-L) estar em comunicação com o transcendente. Ela favorece para se entrar em
sintonia com “Deus e automaticamente com os irmãos” (Anexo A, 8-L). Cumpre, assim, o
papel de uma ponte, ajudando os fiéis a se aproximarem “compreendendo o sentido do
mistério” (Anexo A, 8-J).
Para alguns, a música litúrgica tem o poder de promover transformações no coração
humano. Criando o clima favorável, a Palavra de Deus a quem serve a música litúrgica,
penetra eficaz e produz aquele estado de transformação desejável aos olhos de Deus. Ao
contrário das celebrações frias e mecânicas, a música cumpre seu papel já que “traz vida e
espiritualidade” (Anexo A, 8-A). Dessa forma, há maior probabilidade da liturgia incidir no
cotidiano: “precisam tocar as pessoas para os problemas do dia-a-dia [e ajudar a ver] tudo de
bom que podemos ser” (Anexo A, 8-K).
Animar a celebração é outra função importante da música, segundo vários
entrevistados. O dinamismo do canto promove alegria, propicia maior atenção ao que é
celebrado e dá motivações para viver (Anexo A, 8-H e 8-O). Uma vez que anima os fiéis,
acaba por facilitar e promover participação; “trabalha a nossa sensibilidade, expressa o que
sentimos, desejamos” (Anexo A, 8-Q e 8-R). Tamanha é a importância da animação que o
canto promove na liturgia, que chega a ser comparado ao bolo no aniversário (Anexo A, 8-U).
62

O canto e a música litúrgica não são meros enfeites, para a maioria dos entrevistados.
Entende-se que constituem o próprio rito, ou seja, ajudam a expressar o agradecimento, o
louvor, o pedido de perdão (Anexo A, 8-L, 9-A, 9-I, 9-O, 9-R). Ademais, contribuem para
formar opinião e tornar “clara a nossa fé, nosso comprometimento com Deus e com o
próximo” (Anexo A, 9-R). Alguns entrevistados citam o adágio popular: “quem canta reza
dobrado”. Ou, como expressa um slogan do CCLP, “Cantando, rezamos. Rezando,
cantamos!”.
Os entrevistados postulam que é muito importante que os cantos e músicas litúrgicos
sejam bem escolhidos e executados. Necessitam estar sintonizados com a celebração em que
são cantados (os textos bíblicos, o tempo presente, o lugar); assim torna-se possível “dizer
tudo o que só com a leitura não se pode alcançar; a música junto com a palavra tem um poder
muito maior” (Anexo A, 8-K, 8-L, 8-S, 9-H). Os cantos apropriados ajudam a melhor
perceber a realidade da comunidade (Anexo A, 9-J).
O canto e a música ajudam a rezar, afirmam. “Cantar aproxima a nossa alma e o nosso
coração a Deus” (Anexo A, 11-D). “Eu rezo cantando. A minha oração é a música. Eu vivo o
que eu canto e não poderia ser de outra forma” (Anexo A, 11-E). “É a maneira de soltar da
garganta o que você tem a dizer; quase como gritando para desabafar” (Anexo A, 11-F). “O
canto e a música são as mais belas orações que podemos fazer a Deus” (Anexo A, 11-I). “Me
ajudam a rezar e compreender o amor de Deus, […] ajuda-me a compreender o real sentido da
vida […], amar sem reservas” (Anexo A, 11-L). Os cantos são oração porque permitem
“entender o que Deus pede de nós” (Anexo A, 11-P), mostram que “Deus está sempre ao
nosso lado, mesmo nos momentos mais difíceis” (Anexo A, 11-Q). Ora, “a música é a
linguagem da emoção, da comunicação do amor, e Deus é tudo isso” (Anexo A, 11-P). Por
fim, afirmam: “rezo muito mais quando eu canto [pois] rezar e cantar caminham juntos
(Anexo A, 11-T); “São eles que me fazem verdadeiramente rezar” (Anexo A, 11-U).

2.3.2.6 – O papel dos ministros do canto e da música


Animar. Os entrevistados estão convictos de que os ministros do canto e da música
cumprem esse verdadeiro ministério feito serviço à comunidade.
Não devem atrair as atenções para si, segundo algumas opiniões (Anexo A, 10-P). “A
equipe de canto deve ter o cuidado para não cair na tentação de fazer show (cantarem
sozinhos), mas ajudar a assembléia a cantar a vida” (Anexo A, 8-L). “Ninguém vai a Igreja
para assistir a um show, mas para rezar. Caso eu quiser assistir a um show, não irei à Igreja,
mas ao clube, até porque lá poderei dançar” (Anexo A, 10-L).
63

Nisso um cuidado especial com o volume dos equipamentos e a tonalidade dos


instrumentos musicais é fundamental: “os cantores não podem cantar para eles, não podem se
sobressair, mas sim tem que animar a assembléia a cantar e a celebrar; […] ter o cuidado de
não elevar muito o volume do instrumento para não cobrir as vozes e também escolher o tom
adequado para que todos possam cantar” (Anexo A, 10-O).
Um verdadeiro ministério litúrgico no campo musical buscará, na opinião dos
entrevistados, “convidar, animar, dar firmeza ao que se vai cantar, fazer a assembléia
participar nas celebrações” (Anexo A, 10-B); “levar a emoção da fé; cativar as pessoas e não
permitir que nossas celebrações sejam frias e monótonas” (Anexo A, 10-A); “incentivar as
pessoas a soltarem a voz […], a participarem” (Anexo A, 10-C).
Num tempo em que as pessoas se encontram, cada vez mais “abandonado em um
mundo de superficialidades” (Anexo A, 10-D), missão importante cumpre o grupo, “com
simplicidade e muito amor” (Anexo A, 10-I), de ajudar o povo – através de seu serviço – a
“viver intensamente o mistério celebrado” (Anexo A, 10-J).
No cumprimento de tão nobre missão, requer-se desses agentes algumas atitudes:
alegria, simplicidade, harmonia, dedicação, humildade, concentração, sintonia na equipe e
com a comunidade (Anexo A, 10-H, 10-I, 10-M, 10-N, 10-R, 10-T). Enfim, como resume a
professora de música e agente da pastoral litúrgica: é missão dos ministros do canto e da
música “contribuir para o embelezamento das celebrações litúrgicas, fazendo-se parte
integrante da assembléia, de forma humilde e bela, trazendo encantamento e uma forma
expressiva de comunicar-se com Deus” (Anexo A, 10-R).

2.3.2.7 – A música no horizonte da esperança


A pesquisa procurou saber como as pessoas projetam o futuro do ponto de vista da
esperança por dias melhores. Uma pergunta provocativa com alusão ao sonho de um mundo
transformado pela música obteve respostas variadas. Para alguns parece que esse sonho é
sonho mesmo, ou seja, dependeria de uma intervenção supra-humana para acontecer. Doutro
lado há os que se sentem comprometidos com a construção desse mundo renovado.
Para descrever como imaginam, os entrevistados disseram que esse mundo seria:
alegre, com muito amor e harmonia, todos seriam iguais, com o mesmo objetivo de vida
plena, um jardim de flores, campos floridos, um mundo movido pelos sentimentos, sem
ganância, sem inveja, sem calúnia, não haveria tristeza, mais alegre, mais irmão, teria mais
união entre os povos, mais humano, mais igualitário, sem violência nem pobreza.
64

Provocados a indicar qual música teria feito essa transformação, os entrevistados


“revelaram o ouro”. Aparecem respostas que indicam a passividade humana cuja ação bastaria
ser de acolhida ao amor de Deus que faz tudo pela humanidade. “Ninguém te ama como eu”,
música indicada, é exemplo do que se está dizendo (Anexo A, 12-E).
Felizmente um número maior de entrevistados dá-se conta de que o mundo melhor
vislumbrado no horizonte da esperança conta com a colaboração humana, além da Graça e da
Providência Divina. É oportuno citar alguns pensamentos e alguns trechos de músicas
oferecidos pelos entrevistados.
Alguns indicaram a música “certas coisas prá dizer”, de Jorge Trevisol, porque “leva a
pensar sobre nossa vida, de que maneira nós a levamos” (Anexo A, 12-A). Teve reincidência,
também a música “Epitáfio”, de autoria de Sérgio Brito e interpretada por Titãs. O texto da
referida música lamenta não ter agido mais ativamente quando era oportuno, em vida. Um
entrevistado – estudante – que indicou essa música diz que nesse mundo transformado, além
de as pessoas reconhecerem as maravilhas de Deus, “viveriam em paz, acabariam as drogas,
teria mais saúde e recursos públicos para ter a saúde. […] Saberiam aproveitar as
oportunidades, viver melhor, saber perdoar” (Anexo A, 12-H). Com o empenho humano e a
motivação musical, no mundo transformado as pessoas se dariam “as mãos para superar
dificuldades” (Anexo A, 12-I); “tirariam um tempo para sentar em rodas, para cantar, brincar,
sorrir, certamente um mundo com um grande calor humano” (Anexo A, 12-J); haveria, de
maneira incondicional, “amor como bem maior, apesar das perdas e sofrimentos” (Anexo A,
12-K). “Neste mundo não haverá desigualdades, pois o egoísmo, o individualismo, a inveja, a
injustiça... teriam dado lugar ao amor” (Anexo A, 12-L).
Aproveitando a fineza poética dos entrevistados, descrevemos seus sonhos: “tudo seria
música. Um canto só. As pessoas se cumprimentariam com um canto. Se trabalharia cantando.
O próprio sofrimento se expressaria por cantos” (Anexo A, 12-U). Outro estudante
entrevistado, citando a música “meu catecismo”, de Pe. Zezinho, associa a construção desse
novo mundo à fé em Deus. A ação transformadora acontece se, acreditando em Deus, o ser
humano é capaz de esperar, de apostar, alimentando a esperança. Note como isso aparece na
canção indicada textualmente pelo entrevistado: “se acreditar em Deus for esperar um mundo
diferente; lá onde não há ricos por demais e onde não há mendigos; lá onde ninguém pisa no
irmão e todo irmão se sente gente; lá onde o cidadão vai onde quer e sem correr perigos. Se
acreditar em Deus for apostar que o mundo tem conserto, que o ser humano é bom e, mesmo
se ele errar, ainda vale a pena; se crer em Deus é crer num Pai que nos criou e apostou em
65

nós, então pode escrever que eu assino. Eu creio em Deus porque eu tenho esperança, este é o
catecismo que eu ensino” (Anexo A, 12-L).

2.3.2.8 – Conclusões da pesquisa


Neste momento ímpar das elaborações, alguns elementos sobressaem-se e parece
importante apresentá-los. Possivelmente elementos importantes ficarão imersos e passarão
despercebidos neste momento.
Primeiramente convêm destacar que o grupo de entrevistados revela cultivar, em
grande medida, o apreço por música. Ela parece estar presente em muitos momentos de suas
vidas e, com presença marcante. Por ser assim, importante, desejam que a música cumpra
papel semelhante quando da realização dos atos de culto em memória de Jesus Cristo. Fica
clara a necessidade de intensificar seu uso e de fazê-lo com bom gosto, apreço e o cuidado
que requer.
Fica evidente que a música alimenta o sonho do novo céu e nova terra. Ou seja, os
entrevistados dão testemunho de que a arte musical alimenta a esperança de maneira a
encorajar o ser humano para a vida. É como se a música lhe revelasse conteúdos conhecidos,
porém, velados pelos mistérios da existência. E, ditos harmoniosamente, cria ambiente
favorável à ação corajosa.
Vários disseram que a música é a sua vida; é tudo; sem ela não viveriam. Não há
dúvidas de que a poesia – conteúdo previamente elaborado – é capaz de manifestar de
maneira sábia o que as pessoas, sem muito requinte, seriam incapazes de dizê-lo. Ela, então,
potencializada pela melodia e pelo ritmo, diz, e diz de forma tão plena que os indivíduos têm
a certeza de que aquilo que está sendo cantado é seu; é como se tivesse sido elaborado
exclusivamente para si.
As pessoas entrevistadas foram selecionadas por estarem participando de um Curso de
Cantos da Diocese. Naturalmente são pessoas que apreciam a música ou, bem além disso, são
“apaixonadas” por música. Em suas respostas demonstram clara convicção de que o canto
litúrgico é condição sine qua non da liturgia. Parecem dizer que não há verdadeira oração se
não se contar com a riqueza e a beleza artístico-musical. Isso há de nos servir de indicativo:
mesmo que não consideremos os gostos de boa parte da comunidade dos fiéis, há uma parcela
que aprecia tal arte e dizendo que, com ela manifesta melhor sua fé, sua oração.
Constata-se que são oferecidas poucas oportunidades de formação litúrgico-musical.
Disso se deduz que as pessoas atuam com muito boa vontade, porém, sem muita orientação
66

mais consistente, sistematizada. Isso, não poucas vezes, as deixa inseguras para uma atuação
inovadora, criativa e até, mais ousada.
Por fim, embora se esteja tratando de uma pesquisa qualitativa, é possível arriscar
algumas leituras quantitativas, a partir da reincidência de algumas manifestações. Tal leitura
pode oferecer novos elementos à prática litúrgico-musical na Diocese de Vacaria/RS.
Convêm explicar, porém, que os elementos serão contabilizados pelo número de vezes
que aparecem nas respostas. Isso significa dizer que não indica necessariamente o número de
entrevistados que o disseram.
Na questão de número quatro, a respeito da formação litúrgico-musical, tem-se:
Formação litúrgica Formação musical
Nenhuma 03 Instrumentos 05
Cursos paroquiais; na catequese 08 Vocal 05
Cursos de cantos 06
Noções básicas 02
De família 02

Lê-se, portanto, dentre os vinte e um entrevistados, um baixo número de respostas que


indiquem para uma boa formação litúrgica e musical.
Já na questão de número seis, tem-se:
Tipo de música que mais ouve O que mais gosta na música
Animadas, alegres 02 Mensagem 04
Religiosas, litúrgicas 08 Ritmo 05
Sertanejas 07 Letra 06
Todas 04 Poder de fazer sonhar 02
Instrumentais, relaxantes 03 Melodia 03
Gaúchas, de raiz 02 Solos instrumentais 01
Bandinhas 02
MPB 01

Não são mencionadas músicas internacionais. Aponta-se a preferência para as músicas


religiosas e sertanejas. Talvez seja possível dizer que a incidência maior sobre esse tipo de
música se dê por influência do ambiente da pesquisa no primeiro caso e, no segundo caso, por
influência da cultura nacional.
Note que o que as pessoas mais buscam na música, segundo as reincidências na
pesquisa, diz respeito ao conteúdo textual. Ou seja, buscam conteúdo que subsidiem suas
vidas dando-lhes suporte existencial. Mas é notável, também, um número considerável de
entrevistados que valorizam o ritmo – que deve ser animado, que empolgue a vida.
67

Considerando-se o público eminentemente jovem de entrevistados, esse é um importante dado


a se considerar nas celebrações litúrgicas na Igreja diocesana de Vacaria/RS.
A questão oito:
Importância da música nas celebrações
Superar a frieza, trazer vida 06
Alegrar, animar, motivar, embelezar 08
Tocar as pessoas, despertar para a participação 07
Sintonizar com Deus, ligar com o transcendente 05
Expressar sentimentos 02
Ser o próprio rito 04
Necessidade de ser bem qualificado (equipe, cantos) 04

Parece evidente que o canto e a música são constitutivos da liturgia, oferecendo-lhe


beleza, sendo parte intrínseca do rito, promovendo comunhão entre as pessoas e destas com
Deus. E isso se dará através de um serviço qualificado e coletivo. Perceba as respostas à
questão dez.
Função dos cantores e instrumentistas
Emocionar, empolgar, embelezar, animar 17
Sustentar, dar firmeza 04
Promover participação, convidar 11
A serviço, com amor, com humildade, aprendendo 06
Não fazer show 04
Ensaiar antes 02

Ser cantor e instrumentista litúrgico é, na opinião de boa parte dos entrevistados, um


serviço que se presta com alegria, despojamento e sem a pretensão de autopromoção.
Ademais, exercem função de verdadeiros líderes – Ministros – quando incentivam a
comunidade dos fiéis a participarem da liturgia ativamente.
Por fim, um destaque ao conteúdo, tema da questão nove da entrevista.
Conteúdo dos cantos
Acompanhar e ser o próprio rito 07
Ser expressão do indizível 04
Consolar, promover transformação, animar a esperança 04
Revelar Deus, transmitir sua Palavra, alimentar a fé, ajudar a rezar 13
Expressar sentimentos, agradecimento, arrependimento 04

As respostas reafirmam o que se salientou anteriormente, de que o conteúdo textual


tem grande importância para as pessoas. Note que os conteúdos que evidenciam os mistérios
da fé têm o mais alto índice, alcançando a cifra de vinte e uma respostas. A seguir temos sete
respostas que compreendem que o canto precisa estar associado ao rito. Estes sete somam-se
68

aos quatro que indicam que o canto ajuda a dar expressão aos elementos existenciais, fazendo-
se gesto ritual, portanto.

Esta dissertação visa o reconhecimento da importância e da dignidade da arte musical,


sobretudo do canto e música litúrgicos. V. Para além de ser profana ou sacra, a entendemos
como veículo para os sentimentos e os impulsos humanos em busca de respostas e do sentido
da própria existência. Nos atos de culto ela empresta-se à Palavra para ser “ponte” entre o
Criador e as criaturas; o transcendente e o imanente; entre Deus e a humanidade.
Constata-se, também, que, embora informem quase não terem participado de
momentos de formação litúrgico-musical, os entrevistados demonstraram ter admirável
compreensão da função da música litúrgica e dos ministérios ligados a ela.
Outra conclusão que chegamos é que a música é a porta para terrenos interiores; chega
a lugares fora de nosso alcance. Por seu caráter ritual-simbólico remete aos sentimentos e
produz sensações que ultrapassam o meramente sensível. E, talvez justamente por isso, nos
remete ao transcendente.
Ademais, a arte musical favorece à criatividade e expressão pessoal, facilitando o
aprendizado. Inclusive o aprendizado da fé.
69

III – CANTAI AO SENHOR UM CÂNTICO NOVO


– INDICATIVOS LITÚRGICO-MUSICAIS PARA
A DIOCESE DE VACARIA/RS
Esta terceira parte se propõe alavancar indicativos para a ação litúrgica na Diocese de
Vacaria/RS. Seria presunção demasiada criar e oferecer receitas. Tampouco se desejaria
transcrevê-las dos manuais. Então, o que motiva tal empreendimento é a possibilidade de, a
partir da fundamentação apontada no capítulo primeiro, dos elementos constitutivos do
panorama diocesano levantados no segundo capítulo, e, ajudados por pensadores da liturgia e
da ação pastoral pensar uma metodologia para a formação litúrgica, sobretudo no que diz
respeito ao canto e à música.
Parece ter ficado claro nas exposições anteriores e parece haver consenso popular de
que o canto é uma privilegiada forma de expressão da alma de um povo. Para Ione Buyst não
há dúvida de que um dos maiores “atrativos” da liturgia é a música: “uma liturgia sem música
122
‘des-encanta’” . Além disso, o canto é um autêntico modo de participação celebrativa com
possibilidade de envolvimento afetivo, corporal. É canal de expressão da alegria e da dor; das
vitórias e do protesto.
Como fazer, então, para que se cumpra essa função verdadeiramente ministerial, na
liturgia cristã? Que estratégias adotar para que o culto seja enriquecido desse privilegiado
meio de comunicação e expressão? Que critérios e orientações os ministros da música e do
canto deveriam observar a fim de contribuir nesse espaço? Que tipo de formação deveria ser
desenvolvida?
Estas questões instigadoras desafiam para algumas reflexões. Também apontam para a
busca de caminhos para o que se pode nomear metodologia litúrgica.

3.1 – Uma caminhada iniciada há muito tempo e por muitas mãos


Faz bem recordar que o Concílio Vaticano II tornou-se divisor de águas no jeito de ser,
de se organizar e celebrar, da Igreja Católica. A constituição da liturgia Sacrosanctum

122
BUYST; FONSECA, 2008, p. 11.
70

Concilium – a primeira a ser estudada e aprovada – é resultante, também, do movimento


litúrgico que vinha forçando uma mudança que se fazia necessária.
De 1963 até os tempos atuais, muita coisa mudou no novo jeito de celebrar. E há
muitos desafios a pautar a eclesialidade do presente e do futuro. O concílio favoreceu para o
início de uma caminhada onde todo um fardo histórico de regras litúrgicas fosse superado.
Antes, o presidente da celebração estava de costas para a assembléia; os ritos eram
pronunciados em latim; ao povo restava fazer suas rezas particulares sendo interrompidos pela
sineta na hora da consagração da Eucaristia; havia poucos ministérios litúrgicos e o povo
permanecia bastante afastado do Mistério Pascal de Jesus Cristo que era celebrado 123. Agora,
um salto qualitativo: os fiéis podem compreender o que crêem e celebram; ganha espaço a
inteligibilidade da fé e, assim como Maria quer entender o anúncio do anjo no Evangelho
segundo Lucas, capítulo 1, a comunidade busca entender para dar crédito, acreditar.
Dom Clemente Isnard 124 – em depoimento 125 – diz que o documento preparatório que
tratava da liturgia para o Concílio Vaticano II – e que originou a constituição Sacrosanctum
Concilium – estava muito bom: abrangente e tocava todos os pontos da liturgia. “Lutamos, no
Concílio, pela idéia da participação ativa”. Então o primeiro passo seria traduzir a liturgia;
deixar a língua latina e pensar na participação do povo. Segundo ele, o papa Paulo VI, para
“trazer” a constituição litúrgica para a América Latina criou um conselho, que durou cinco
anos, para efetivar a reforma litúrgica. Depois criou a Congregação para o culto divino que
teve a tarefa de completar a reforma litúrgica.
Dom Clemente e um grupo de bispos foram encarregados da Comissão Nacional de
Liturgia, em vista da reforma litúrgica no Brasil. Criou-se, em seguida, o Instituto de Pastoral
Litúrgica – Ispal. Esse instituto formou muitos agentes que foram espalhando, nas paróquias e
dioceses, essa nova compreensão de liturgia que transformava uma visão de Igreja. Sobretudo
a liturgia trouxe ao Brasil uma nova visão de Igreja, que a enriqueceu. Foi necessário ir

123
Sobre as práticas litúrgicas pré-conciliares, ainda, o padre José Weber conta que “o povo quase não cantava;
dominava o coral, que cantava em latim as partes fixas da Missa […]. Igreja que se prezasse, tinha um coral que
cantava no coro da igreja (nos fundos), nos domingos e festas” (WEBER, José. A CNBB e a renovação do
canto litúrgico no Brasil: recuperação da memória histórica. In.: MOLINARI, Paula (org.). Música Brasileira
Na Liturgia 2. São Paulo: Paulus, 2008. p. 11).
124
Dom Clemente Isnard nasceu em 1917 e tornou-se monge beneditino. Em 1960 foi ordenado bispo para a
Diocese de Nova Friburgo/RJ. Participou do Concilio Vaticano II, sobretudo, todas as sessões que discutiram e
aprovaram a SC. Após o Concílio, foi nomeado para a comissão de aplicação da reforma litúrgica no Brasil. Foi
responsável pelo setor de liturgia da CNBB por 23 anos.
125
SACROSANCTUM Concilium: memória – avanços e desafios. In: CANTO e música na liturgia. Roteiro de
Frei Joaquim Fonseca e direção de Cireneu Kuhn. São Paulo: Verbo Filmes-Paulus, 2006. 1 DVD (28 min.),
color. Extra.
71

traduzindo todos os documentos que iam sendo aprovados em Roma: os rituais, o missal e a
liturgia das horas.
Nasce um trabalho sério de liturgia que vai sendo feito aos poucos. A CNBB realizou
vários encontros nacionais de liturgia. Nasceu a ASLI – Associação de Liturgistas. Nasceram
documentos a respeito dos sacramentos: eram estudos que se submetiam à aprovação nas
assembléias da CNBB. Preparou-se o documento nº 43 da CNBB, sobre a animação da vida
litúrgica no Brasil: ele é fundamento básico sobre a prática litúrgica no Brasil. Fez-se o
diretório para missas com grupos populares (Doc. nº 11 da CNBB), que “foi proibido por
Roma e, apesar de não ter nada errado, foi tirado de circulação. Mas o melhor é que ele está
aplicado em todo o país” afirma Dom Clemente 126.
Um pensamento corrente, relatado por Dom Clemente, dizia respeito à preocupação
com a inculturação, na reforma litúrgica. A liturgia impregna a cultura popular e, com isso,
recebe elementos dela. Não se pode negar que a liturgia mais antiga integra elementos da
cultura grega e latina. Então, por que não terá elementos da cultura africana, oriental, japonesa
ou de qualquer lugar, onde quer que se celebre? Mesmo assim, afirma, várias iniciativas
foram barradas 127.
Nos pouco mais de quarenta anos que se sucederam à promulgação conciliar acerca da
liturgia, muitas comunidades passaram a celebrar com freqüência periódica mais intensa.
Inúmeras comunidades passaram a se reunir para escutar a Palavra de Deus e iluminar suas
vidas com as reflexões e orações dela brotadas.
Para Ione Buyst, “a descentralização dos locais de celebração trouxe consigo a
diminuição do tamanho da assembléia litúrgica [permitindo] relacionamento fraternal e
128
personalizado” , onde as pessoas se cumprimentam, contam os acontecimentos cotidianos,
partilham o que entenderam dos textos bíblicos. Ali se multiplicam os ministérios, diminui o
formalismo e a comunicação é informal. Aumenta, assim, a possibilidade de se exercer a
liberdade criativa. Soma-se a isso o desenvolvimento de um jeito próprio de se fazer teologia
na América Latina.
Esses antecedentes ajudam a perceber a necessidade da fidelidade ao espírito fundante
do seguimento de Jesus, experimentado nas primeiras comunidades e relatados no Novo
Testamento. Tal resgate remete a uma espécie de adesão ao pensamento conciliar e à
valorização do movimento litúrgico.

126
SACROSANCTUM CONCILIUM, 2006.
127
SACROSANCTUM CONCILIUM, 2006.
128
BUYST, Ione. Como estudar liturgia: princípios de ciência litúrgica. 3ª ed. São Paulo: Paulus, 1990. p. 72.
72

3.2 – A Teologia da Libertação


Optou-se por localizar a Teologia da Libertação (TdL) na América Latina já que ela
influencia, em larga escala, o entendimento da própria ação litúrgica. É oportuno recordar as
proposições metodológicas da TdL. Possivelmente elas ajudem a melhor situar os rumos da
formação litúrgico-musical a ser empreendida. O que será exposto a seguir prepara o chão de
uma metodologia litúrgica com rosto local.
A temática da libertação aflorou no Brasil, nos primeiros anos da década de 60, no
contexto da análise do fenômeno do subdesenvolvimento. Ensinava-se que o
subdesenvolvimento, era um problema de atraso técnico, pois éramos países em
desenvolvimento e que mais tarde, se resolveria com a modernização tecnológica. Causou-se,
assim, uma interdependência entre os países ricos de tecnologia avançada, e os países pobres
que dependiam dessa tecnologia para desenvolverem-se – era necessário ter um país rico, para
dar esses suportes.
Em oposição a essa “teoria do desenvolvimento”, no âmbito das ciências sociais na
América Latina, elabora-se a “teoria da dependência”. Segundo Rosino Gibellini, a TdL
assumirá uma reflexão crítica de tudo isso, interpretando o subdesenvolvimento como efeito
129
da má organização do mundo . Os teólogos deste período, católicos e protestantes,
assumiram a libertação como paradigma de todo fazer teológico, sobremodo, na América
Latina.
130
Gibellini distingue três etapas nesse “fenômeno teológico e eclesial” : a fase da
preparação (1962-68: do Concílio Vaticano II à Conferência do Episcopado Latino-
Americano de Medellín); da formulação (1968-75: da Conferência de Medellín a 1975, em
que os teólogos expõem a experiência de “aborto” da empolgação inicial); da sistematização
(a partir de 1976: a TdL reflete seu próprio método e repensa sistematicamente seus principais
temas, especialmente cristologia e eclesiologia).
Enquanto proposta metodológica é importante olhar a TdL como “teologia em
movimento” na definição de Juan L. Segundo – mais que um movimento ou setor da teologia,
pressupõe uma releitura da teologia. Metodologicamente, há uma aproximação do método da
Ação Católica (Ver-Julgar-Agir) com a TdL. O Ver corresponde à dimensão sócio-analítica,
de partir do contexto onde se faz teologia; o Julgar corresponde à dimensão hermenêutica; e o
Agir pressupõe a mediação prático-pastoral.

129
GIBELLINI, Rosino. A teologia do século XX. São Paulo: Loyola, 2002. p. 352-3.
130
GIBELLINI, 2002. p. 347-8.
73
131
Para Libânio e Murad , o que diferencia a TdL das demais teologias é que esta se
refere à Revelação a partir da tensão da dominação e da libertação experimentadas em nosso
continente cristão. Não perde o referencial da Revelação, pois se tornaria bandeira ideológica
ou política. Contemplar Deus no pobre e em sua luta é, para a TdL, sinônimo de renovação e
purificação contínuas.
Esses mesmos teólogos da Libertação propõem três momentos do fazer teológico na
metodologia da TdL: a) no momento pré-teológico, o teólogo procura conhecer o contexto de
luta do empobrecido. É uma experiência de fé contextualizada pelo compromisso com o
outro. Precisa cuidar para não se enganar com as informações imediatas, circulantes,
produzidas mas colocá-las em confronto com a Revelação de Deus cientificamente, com
mediações sócio-analíticas. b) o momento teológico consiste na produção da novidade que
surge do confronto entre a situação gritante, socioanalisada, à luz da Revelação divina. c) o
momento da práxis se dá porque toda teologia é sabedoria, saber racional e reflexão crítica.
Ora, a TdL quer ser uma reflexão crítica em nível intrateológico, intraeclesial e sóciopolítico
132
.
Possivelmente já esteja evidente que o método da TdL prima pela realidade contextual
onde se dá a ação teológico-pastoral. O que motiva essa abordagem é o desejo de obter uma
base para a proposição de um método que parta da prática e a ela retorne. Mas isso se dará de
forma enriquecida e iluminada pela Revelação, pela tradição e pelos conceitos oferecidos
pelas ciências, sobretudo as humanas.
Ademais, uma liturgia inculturada prima – sem esquecer a catolicidade ou
universalidade – pela contextualidade. Não descuida, portanto, da realidade sofrida,
desafiadora mas, também, carregada de esperança deste imenso Brasil e América Latina.
Neste sentido cabe a pergunta: para onde vai a Teologia da Libertação? Teólogos
apontam para uma realidade que migrou de opressiva para excludente. Ou seja, o pobre, a que
se refere a TdL, e que era visto como oprimido pelo sistema vigente, agora se encontra
excluído. E a TdL continua sendo a única voz teológica que grita. Se, inicialmente, sua
metodologia trabalhava o binômio opressão-libertação, agora esse binômio será exclusão-
solidariedade, já que a situação social é pior. Maior, também, o produto da práxis teológica
que se requer: uma solidariedade que ultrapasse os países pobres, formando uma cadeia
mundial, e que imponha modificações radicais aos rumos do sistema capitalista neoliberal.

131
LIBÂNIO, João Batista; MURAD, Afonso. Introdução à Teologia: perfil, enfoques, tarefas. S.Paulo:
Loyola, 1996. p.172ss.
132
LIBÂNIO e MURAD, 1996. p.180ss.
74

Libânio e Murad falam de “chances e tarefas da TdL” e, assim apontam para muitas
133
possibilidades e os desafios : acento à dimensão pneumática numa eclesiologia mais
criativa, participativa e crítica; eclesiogênese: uma Igreja feita de rede de comunidade;
compreensão mais ampla do plano salvífico de Deus englobando a natureza e a humanidade
numa crítica à mística cósmica da Nova Era; busca de uma espiritualidade para a teologia da
práxis; nova terra e novos céus numa perspectiva ecológica social; teologia aberta às culturas
em vista da inculturação e inserção; martírio de Cristo nos pobres como oposição ao
descomprometimento da pós-modernidade; valorização da religiosidade popular em oposição
à sua folclorização; ampla e clara presença da mulher na teologia e na pastoral; estudo maduro
nos currículos normais dos institutos e faculdades; aprofundamento corajoso das temáticas da
subjetividade e da sexualidade na perspectiva libertadora; elaboração mais ampla de uma
teologia da liturgia que afete toda a vida da Igreja; compreensão abrangente de todo o
processo da catequese em nível teológico e prático.
Para estes pensadores, cabe à nova geração de teólogos latino-americanos manter viva
a TdL “para iluminar a noite dos pobres com a esperança de Deus” 134.

3.3 – Missão da Ciência Litúrgica à luz da TdL: em busca de um método de formação


Para a liturgista Ione Buyst, a Teologia da Libertação oferece à Ciência Litúrgica
(CL), um método e um ângulo ótico que não pode ficar indiferente, ao processo formativo em
liturgia. Trata-se de uma inversão: ao invés de se partir da teoria – como sempre se fez – é
necessário partir da prática e a ela retornar. “A TdL usa o método crítico que vincula
dialeticamente teoria e prática […]: a teologia parte da práxis e volta a ela” 135.
Funciona assim: o teólogo orgânico – parafraseando Gramsci – procura conhecer a
sabedoria do povo para lhe ajudar a pensar autônoma e criticamente. A formação litúrgica que
se requer não há de ser aquela que dá treinamentos para se agir corretamente na liturgia e
cujas orientações movem-se entre o que é “certo” e o que é “errado” nas ações rituais. Antes,
a formação litúrgica será instrutiva e reflexiva. Ou seja, oferecerá elementos que tornem
possível, aos agentes de pastoral, uma autonomia tal que possam eles mesmos exercer a
criatividade e promover momentos rituais originais, em cujas ações se experimentem a
presença do Senhor que se lhes revela naquela ação memorial. Já não dissemos anteriormente

133
LIBÂNIO e MURAD, 1996. p.192-3.
134
LIBÂNIO e MURAD, 1996, p.193.
135
BUYST, 1990, p. 88-89.
75

que um dos grandes alcances do Concilio Vaticano II é a inteligibilidade da fé, ou seja a


compreensão daquilo que se crê?
Considere-se um dado importante: a liturgia situa-se na área da teologia pastoral ou
teologia prática. Nem sempre é tarefa fácil apreender racionalmente o objeto de estudos.
Experiências litúrgicas não são facilmente objetiváveis pois localizam-se no campo da
subjetividade.
Ademais, a CL há que considerar a religiosidade popular – expressão religiosa mais
significativa da América Latina – já que é importante expressão de fé popular. Ione Buyst
aponta perguntas que deverão ser feitas pela CL: “Como se relacionam celebração litúrgica e
prática libertadora dos pobres? […] Até que ponto a salvação celebrada nas liturgias neste
continente se relaciona com as lutas de libertação do povo pobre, com suas esperanças,
conquistas e fracassos?” 136.
Para a liturgista, a CL tem algumas tarefas se quiser dar continuidade à “tradição viva
137
da Igreja [dando] sentido à prática libertadora do povo pobre e oprimido” : participar das
celebrações litúrgicas; acompanhar a reflexão teológico-litúrgica das Igrejas e comunidades;
acompanhar a pastoral litúrgica nos vários níveis da Igreja; realizar e acompanhar pesquisas
das várias ciências humanas para dar embasamento a novas expressões litúrgicas; analisar
criticamente o momento litúrgico da práxis libertadora; detectar as condições contextuais para
a celebração da fé.
Terá, também, que defrontar-se com questões antropológicas, sociais, político-
econômicas. As liturgias levam a mudanças ou mantêm o “status quo”? A salvação anunciada
é para quando? Reproduzem a ideologia e as estruturas de poder? A linguagem visual,
auditiva, simbólica expressa a fé com os códigos da cultura dominante ou com os da cultura
do povo pobre?
Então, em se tratando de método para a Ciência Litúrgica, a prática litúrgica é o ponto
de partida e, também, o ponto de chegada. Já a tradição – Sagrada Escritura e Magistério – é o
ponto de referência. À luz da tradição e do contexto atual, a CL deverá procurar pelo sentido
da liturgia, contando com a ajuda, inclusive, das ciências humanas e sociais. Poderíamos
exemplificar da seguinte forma: o que tem a dizer a ciência psicológica ao entrevistado que
138
diz entender que os animadores de música litúrgica devem emocionar ? Dessa forma a CL
não fecha-se em si, mas, abre-se para a transversalidade das ciências. Possivelmente se possa

136
BUYST, 1990, p. 104-106.
137
BUYST, 1990, p. 106.
138
Anexo A, 10-H.
76

arriscar que, embora a música esteja a serviço da Palavra, prolongando o seu efeito, a própria
arte musical seja referência para esse diálogo da liturgia, apontado por Ione. Certamente nesse
diálogo a música dirá à liturgia em que momentos da ação ritual sua contribuição enriquecerá
ainda mais o encontro dos fiéis com o Senhor.

3.4 – Objeto de estudos da ciência litúrgica


Postulamos que a dimensão litúrgico-musical precisa enriquecer e provocar para a
ação. Para tanto não poderá se limitar a promover emoções meramente subjetivas e intimistas.
Há de produzir aquele despertar, aquela inquietação que conduza ao serviço, para a ação
promotora de justiça e de dignidade das criaturas de Deus.
Tal como se requer da homilia, o canto ritual há de colocar em prontidão: mesmo
sentados, que se esteja sentado na “beira” do acento, ao invés de confortavelmente
acomodados, tranqüilos. Não se deveria deixar passar muito tempo sem cantar a composição
intitulada “O profeta”, inspirado no texto bíblico que narra o chamado de Deus ao profeta
Jeremias (Jr,1), ou outra semelhante. O refrão dessa música diz: “tenho que gritar, tenho que
139
arriscar, ai de mim se não o faço!” . Como não cantá-la frequentemente, uma vez que a
muitos inquieta e faz arder o coração como em Lc,24? E, como cantá-la tranquilamente, se,
mesmo sem agredir, ela encurrala justamente pela sua inspiração bíblica e recorda a missão
comum de ser profetas? Antes, ela precisa mexer com as entranhas, o sistema emocional, o
coração – que é o lugar onde residem os projetos.
Bem, para que a CL mobilize a comunidade, ela deverá ajudar essa comunidade a
tomar consciência de sua localização geográfica, histórica. Deverá ajudar a comunidade a
perceber-se sujeito de sua caminhada, com clara percepção de suas potencialidades e suas
carências.
A liturgia tem ampla missão nesse campo, na opinião da liturgista Ione Buyst. Mas
não será pelo caminho da imposição que se conduzirá a caminhada de transformação. Ao
contrário. Será oferecendo às pessoas a oportunidade de refletirem – perguntarem e elas
mesmas responderem – que se possibilitará tal tarefa. Propõe, como método de formação, a
pesquisa de campo aliada ao estudo teórico. A primeira para tomar conhecimento do objeto
material; o segundo para obter o objeto formal 140.

139
OFÍCIO Divino das Comunidades. 7ª ed. São Paulo: Paulus, 1994. p. 226.
140
Citamos, em ordem cronológica de publicação, obras literárias onde Ione manifesta esse pensamento:
BUYST, Ione. Como estudar liturgia: princípios de ciência litúrgica. 3ª ed. São Paulo: Paulus, 1990. BUYST,
Ione. Pesquisa em liturgia: relato e análise de uma experiência. São Paulo: Paulus, 1994. BUYST, Ione.
Teologia e liturgia na perspectiva da América Latina: avanços e desafios. In.: FAVRETO, Clair &
77

Por objeto material se entende a vida litúrgica da Igreja. Nisso se inclui, segundo
Buyst, as celebrações que podem ser analisadas sob o aspecto externo, daquilo que é visível –
os gestos, cores, símbolos – e interno, da experiência subjetiva, das vivências. Há que se
considerar que entre os dois aspectos há uma relação que é simbólica, ou seja, há significantes
que remetem aos significados.
À ciência litúrgica interessa pesquisar a celebração em si, bem como o todo, ou o
conjunto de celebrações de determinada comunidade, além de observar o contexto eclesial e
social.
Ademais, fazem parte do objeto material da ciência litúrgica a formação litúrgica e a
organização da pastoral litúrgica. Na primeira é importante observar “a catequese litúrgica, a
mistagogia, a formação dada às equipes de liturgia […] nos seminários e casas religiosas até a
formação acadêmica” 141. Há que se cuidar da acessibilidade dessa formação – para todos – e
se em seu método e conteúdos contribui para uma liturgia renovada e inserida. Como outras
coisas na vida “é preciso que se aprenda isso num caminho pedagógico. Um dos caminhos
possíveis é a mistagogia 142: o método mistagógico ajuda-nos a adentrar nesse mistério” 143.
Já, no que diz respeito à organização pastoral, é interessante perceber o funcionamento
da equipe de liturgia, de seus membros, de seus relacionamentos intra-comunitários e em
nível paroquial, diocesano e assim por diante.
O objeto material mais precioso é coletado na observação da própria celebração, ao
vivo. É insuficiente analisar os textos e livros litúrgicos. As observações “in loco” podem ser
complementadas por entrevistas, questionários e formulários.
Note que o questionário realizado – apresentado no capítulo segundo – embora não o
tivesse como objetivo primeiro, acabou por coletar pontos de vista, percepções para, a longo
prazo, ajudar a melhorar qualitativamente as liturgias na Diocese de Vacaria/RS, de modo
especial na dimensão musical. Nas avaliações do último CCLP, inclusive, se elogia o fato de
estarmos realizando uma pesquisa. Terão se sentido valorizados por terem sido escutados?
Aspirariam que se empreendesse um processo (mais) participativo e interativo de
encaminhamentos litúrgico-pastorais? E que tal pensar um grupo de pesquisa acerca da
música litúrgica dentro daquele contexto? Talvez uma iniciativa nesse sentido possibilitaria a

RAMPON, Ivanir (Orgs.). Eu sou aquele que sou: uma homenagem aos 25 anos do Instituto de Teologia e
Pastoral. Passo Fundo: Berthier, 2008.
141
BUYST, 1990, p. 124.
142
O termo “mistagogia” vem da língua grega e é composto por outros dois que significam, respectivamente,
“mistério” e “guiar, conduzir”. Assim, “mistagogo” quer dizer “quem conduz para dentro do mistério” (BUYST;
FONSECA, 2008, p. 7 – rodapé).
143
BUYST; FONSECA, 2008, p. 7.
78

percepção dos gostos nessa área; ajudaria a perceber o que se está comunicando com as ações
rituais e com a música ritual; perceber as falhas ou desvios de foco ou, ainda, os acertos dos
atos celebrativos.
No livro em que faz o relato e análise de uma experiência, Ione Buyst sugere com
muita ênfase a observação participante. Nesse tipo de levantamento da realidade as próprias
pessoas pesquisadas podem relatar as suas experiências. Ademais, o próprio pesquisador-
liturgo é objeto de investigação. Segundo ela, “a observação participante permite aproximar
teoria e prática. É instrumento fecundo e indispensável para pensar a prática” 144.
O objeto formal é, para o liturgista que faz ciência litúrgica, “seu instrumento de
trabalho, a sua maneira de abordar o objeto material, o ângulo sob o qual irá trabalhar” 145.
Compõem esse ponto de referência, a Sagrada Escritura e a tradição. Além desses
dois, que são os principais, inclui-se os pronunciamentos do magistério, cuja função é, em
geral, a reinterpretação dos dois primeiros em atitude de adaptação e atualização para os
novos contextos e novos tempos.
Haverá, portanto, de cuidar de forma intencionada, pensada: caminhos para a
realização da liturgia – tanto no aspecto do conteúdo como da forma; caminhos para a
formação, sobretudo dos líderes; caminhos para uma liturgia organizada – tanto internamente
como em sua relação com outras áreas da pastoral.
Desse cuidado resultará, provavelmente, um apurado repertório musical que leve em
consideração as ações rituais e os contextos onde elas acontecem.

3.5 – Tese-antítese-síntese: experimentos pastorais no Itepa


Neste aparte pretende-se demonstrar a gênese e desenvolvimento de uma metodologia
pastoral em processo constante de ressignificação experimentado no Itepa. Tal metodologia
está inserida e influencia em grande escala a ação evangelizadora em várias dioceses do norte
gaúcho e oeste catarinense. Sem dúvida o CCLP foi pensado e organizado sob a influência
das reflexões realizadas nesse Instituto.
Em meio ao contexto de efervescência política e eclesial dos anos oitenta e, em meio
ao processo crescente de reflexões acerca da TdL, nasceu o Instituto de Teologia e Pastoral
(Itepa). Nasce, acima de tudo, com a insatisfação de uma teologia ministrada
tradicionalmente, ligada ao grande Seminário de Viamão/RS que formava os padres para todo
o Rio Grande do Sul. Também nasce dentro de um contexto regional bem localizado, com a

144
BUYST, Ione. Pesquisa em liturgia: relato e análise de uma experiência. São Paulo: Paulus, 1994. p. 108.
145
BUYST, 1990, p. 127.
79

gênese de várias organizações sociais populares, no norte gaúcho. Foi criado em 1982, tendo
como principal objetivo preparar os agentes de pastoral de forma mais inserida no contexto
geográfico regional, compreendendo as Dioceses de Erexim, Frederico Westphalen, Passo
Fundo e Vacaria – incluindo-se, desde 1996, a Diocese de Chapecó/SC.
Com dez anos de funcionamento, começa-se a constatar nas ações dos agentes
formados pelo Instituto, uma prática que não condizia com a leitura crítica feita em tempos de
estudante. A prática pastoral, muitas vezes, não se regia pela teologia refletida em sala de
aula, mas pela teologia do senso comum, que exalta a submissão e a resignação. “Havia,
portanto, um impasse epistemológico: em princípio, falava-se de teologia libertadora, mas a
epistemologia que fundamentava a prática pedagógica e a prática pastoral era opressora” 146.
Inicia-se a busca por uma metodologia capaz de fazer da pastoral uma ciência, ou seja,
uma pedagogia pastoral. Aos poucos foi e vai sendo construída a chamada Metodologia
Histórico-Evangelizadora (MHE).
Para Elli Benincá – padre e primeiro diretor do Itepa e um dos mentores dessa
metodologia – o projeto central da MHE prevê:

…transformar as disciplinas específicas de pastoral num espaço de reflexão e


aprofundamento teológico, a partir da experiência sistematizada da prática pastoral;
buscar na pastoral sistematizada e refletida, motivações mais profundas para o
estudo e o projeto vocacional; iniciar metodologicamente alunos e professores na
ciência pastoral; fazer da teologia sistemática e da prática pastoral refletida e
avaliada, o eixo condutor da formação dos agentes de pastoral; construir uma nova
experiência de ‘fazer pastoral’ aproveitando os avanços metodológicos das ciências
humanas; transformar o Itepa num verdadeiro centro de reflexão teológico-pastoral.
147

O desafio permanente é de estreitar a relação entre teoria e prática: no exercício da


autoridade, no desempenho dos papéis instituídos, no uso dos bens, etc. Como superar tal
dicotomia foi o desafio de ontem, é o conflito de hoje e será a provocação para o amanhã.
Essa metodologia nunca esteve e nunca estará pronta. Ela se constrói a partir da prática
pastoral, que, uma vez estudada, a ela retorna. O planejamento da ação evangelizadora é um
processo dinâmico, constante, onde o ponto de chegada é sempre um recomeçar, seguindo o
sentido da dialética como processo de ação.

146
ZANANDRÉA, Rene; BALBINOT, Rodinei. Prática pastoral e fazer teológico na perspectiva histórico-
evangelizadora. In.: MEZADRI, Néri; BALBINOT, Rodinei. Metodologia da ação evangelizadora: uma
experiência no fazer teológico-pastoral. Passo Fundo: Berthier, 2008. p. 36.
147
BENINCÁ, Elli. Pedagogia pastoral: Metodologia Histórico-Evangelizadora. In.: BALBINOT, Rodinei e
FAVRETO, Clair. ITEPA: história e prospectivas. Passo Fundo: Pallotti, 2005. p. 110-111.
80

Também o processo de formação litúrgico-musical pode ser um processo crescente ou


– só para citar uma inspiração musical – uma “metamorfose ambulante”.
A MHE compreende quatro elementos ou passos metodológicos para o fazer pastoral.
Eles se inspiram na opção metodológica assumida pela TdL.
1) A observação da prática: a ação evangelizadora passa pelo ouvir e o praticar
cotidiano. Inicialmente tem-se a sensação de que o cotidiano já é bem conhecido. Mas as
ciências ensinam que seu elemento de rigor está na observação. Se, por um lado, as ciências
experimentais não envolvem o observador no ato de observar, de outro, uma metodologia
pastoral não será pastoral se o agente não perceber-se implicado no processo. Então será
objeto de observação, na MHE, o tripé: agente 148 – contexto 149 – comunidade 150. Interessa, à
MHE, a relação que se estabelece entre estes elementos. Em geral, a resistência à observação
da própria ação, não é meramente uma atitude de preguiça, mas uma atitude de autodefesa e
de preservação da consciência.
2) O registro das observações: há necessidade do registro para que haja uma ciência
pastoral. A observação não registrada não interessa ao método científico. O registro é uma
tentativa de objetivação da ação evangelizadora enquanto consciência. O registro das
observações da própria prática é periódico, e tem como critério de elaboração a relação do
agente com seu meio e seus sujeitos.
3) Sessões de estudo: procura-se partilhar os registros usando o mesmo critério: da
relação que se estabelece entre os implicados. As sessões são uma tentativa de interpretar
coletivamente as práticas pastorais à luz de uma determinada teologia; uma tentativa de
fundamentar a ação ou fazer os ajustes necessários. Dessa partilha, seguem-se destaques e
nucleações dos elementos que emergirem – sobretudo dos desafios – por temática. Poderá
haver a necessidade de novas sessões de estudos para o aprofundamento, teorização dos
principais desafios destacados.
4) Relatórios e reencaminhamentos: as sessões de estudos são registradas em
forma de relatórios. Estes expressam a consciência coletiva e reencaminham para novas
práticas e observações. Num processo dialético: a observação individual registrada
(tese), em confronto com outros registros ou teorias (anti-tese) possibilitam novas
compreensões (sínteses). Estas últimas, por sua vez, novamente se submetem à prática

148
O agente procura inserir-se na comunidade olhando e atuando desde o contexto e não de “fora para dentro”,
tornando-se sujeito em transformação com a comunidade.
149
Situação geográfica, etnias presentes, história, grupos sociais…
150
Os valores, o modelo de Igreja, as correntes teológicas, as devoções, a organização, as relações de poder e
práticas existentes.
81

pastoral onde será observada em sua incidência e, assim, sucessivamente. É necessário,


porém, produzir textos a fim de socializar o conhecimento produzido. Eles são a
expressão do conhecimento em construção. Sua publicação, embora em caráter de
provisoriedade, é importante em função de estar sendo submetido à avaliação de outros
agentes, podendo-se retomar e refazer.
No horizonte dos desafios, se constata no cotidiano que a Metodologia Histórico-
Evangelizadora não é uma ação mecânica. Não basta simplesmente estudá-la e compreendê-
la. É preciso que se transforme em opção e mística ou espiritualidade. Além disso, tal
metodologia não pode ficar restrita ao ambiente acadêmico. Precisará ter continuidade na ação
pastoral dos agentes após o término dos estudos.
Parece estar evidente a necessidade de uma postura de constante ação e reflexão da
prática pastoral, no caso desta pesquisa, do canto litúrgico. Sobremodo a partir dos
encaminhamentos do Concílio Vaticano II, dos compromissos assumidos na América Latina –
nas Conferências Episcopais e com a evolução reflexiva da TdL –, e com as indicações acima
explicitadas, postulamos a importância de um processo continuado de formação planejada e
avaliada.
Há que se assumir um processo metodológico onde os próprios cantores e
instrumentistas possam participar da ação-reflexão, sentindo-se sujeitos e partícipes de seu
próprio ministério. As sugestões que se encontram a seguir, explanarão possibilidades de se
empreender esse processo desejável onde ação e teorização confluem constantemente.

3.6 – Sugestões acerca da música e do canto litúrgicos


Definida a postura metodológica – que é uma atitude primeira e que precisa encontrar
caminhos de adaptação para cada situação específica – pode-se, então vislumbrar outros
encaminhamentos, à luz desse principal.
Os documentos da Igreja que se referem ao canto litúrgico insistem para que se dê
valor ao canto nas celebrações. Afirmam que a música apropriada à liturgia é aquela que está
intimamente integrada à ação litúrgica e ao momento ritual ao qual se destina. Os bispos do
Brasil repetiram isso recentemente: “a música litúrgica é parte integrante e significativa da
ação ritual. Ela tem a especial capacidade de atingir os corações e, como rito, grande eficácia
151
pedagógica para levá-los a penetrar no mistério celebrado” . Além disso, insistem na
participação ativa e plena de todo o povo reunido.

151
CNBB. Diretrizes Gerais da Ação Evangelizadora da Igreja no Brasil – 2008-2009 – Documento nº 87.
São Paulo: Paulinas, 2008. n. 76.
82

Recorde que os entrevistados postulam a necessidade do uso de cantos bem


escolhidos, ensaiados, e executados a fim de se experienciar a comunicação com o
transcendente; a fim de que as liturgias proporcionem experiência de Deus. Falaram, também,
da potencialidade que os cantos têm de produzir conhecimento e aproximar o conhecimento
de Deus.
Dentre tantos documentos e estudos já realizados, alguns se destacam por oferecer
expressivas orientações para o uso da música litúrgica. Primeiramente se destaca a
Constituição Sacrosanctum Concilium – primeiro documento aprovado no Concílio Vaticano
II – que dedica os números 112 a 121 à música sacra. A seguir a Instrução Geral sobre o
Missal Romano (IGMR) também oferece indicações. Da série de Documentos da CNBB
(azul), o Documento número 7, de 1976, tratava da pastoral da música litúrgica no Brasil. Este
documento que, em alguns aspectos, já não respondia aos novos tempos, foi atualizado,
enriquecido e ampliado através do subsídio de número 79 da coleção de estudos da CNBB
(verde).
A celebração toda (todas as partes) pode ser cantada. Porém, não é recomendável nem
estratégico cantá-la toda, cotidianamente. Alguns textos costumam ser cantados, conferindo
destaque ao ato celebrativo, sobretudo, dominical: 1) de forma ordinária: cantos processionais
(durante procissão de entrada, de ofertório, de comunhão), penitenciais, de glória, aclamações,
em louvor aos Santos ou a Nossa Senhora, em homenagem a pessoas ou grupos; 2) e,
extraordinariamente, as orações, proclamação de textos bíblicos, sinal da cruz, bênção, oração
152
eucarística. A IGMR afirma ser importante que os ministros cantem aquilo que o fazem
com respostas do povo – quer respondam rezando ou cantando.
A constituição conciliar Sacrosanctum Concilium afirma que a “tradição musical de
toda a Igreja é um tesouro de inestimável valor, que se sobressai entre todas as outras
153
expressões de arte” , e que sua finalidade é favorecer, por sua suavidade e solenidade, à
glória de Deus e a santificação dos fiéis. Insiste na participação de todos através do canto,
154
especialmente o canto popular religioso . Insiste na formação musical para uma melhor
155
atuação de artistas e compositores, ajudando a cumprir a finalidade da música litúrgica .
Alerta para os perigos de a música ser tomada como enfeite, ou um aparte ou, ainda, ser usada
por si mesma. Incentiva para que as composições sejam numerosas, se adaptem à cultura dos
povos, e que seus conteúdos estejam de acordo com a doutrina católica, inspirem-se na

152
IGMR 19.
153
SC 112.
154
SC 118.
155
SC 115.
83

Sagrada Escritura e nas fontes litúrgicas. Tal indicativo deve servir de reforço ao processo de
formação em curso na Diocese de Vacaria/RS. Incentivo ainda maior se faz oportuno às
produções musicais com caráter regional.
156
O subsídio de Estudos da CNBB sobre A música litúrgica no Brasil é uma
iniciativa louvável que busca pôr em prática as orientações universais para o canto litúrgico
em nossos dias. Desde 1999, quando foi publicada sua primeira edição, tem sido um
referencial importante para o estudo e a orientação dos que se ocupam da música litúrgica na
Igreja que está no Brasil. Em seus números 347 a 354, fala das Razões do nosso cantar. A
partir deste subsídio tentaremos desenvolver reflexões e vislumbrar algumas intuições
experimentáveis.
Uma vez que se tem afirmado a importância de os agentes do canto não serem meros
executores de rubricas predefinidas e insistido na importância de se compreender o rito para
vivenciá-lo de verdade, parece oportuno olhar para o que dispõe o citado subsídio da CNBB.
A compreensão do sentido desse cantar litúrgico resulta, necessariamente, em indicativo para
a ação criativa nas ações rituais.
157
1) Razão Teológica : celebrar a ação de Deus em nossa vida. O canto litúrgico
expressa a natureza própria da ação sacramental da Igreja. A expressão litúrgica é encarregada
de introduzir no mistério de Deus e desvelar as experiências mais profundas e inefáveis do
coração humano: necessidade de transcendência, comunhão, fé e alegria, e a superação dos
limites. Essas experiências necessitam de ritos, gestos e símbolos. Neste contexto, a expressão
artística é a mais apropriada forma de expressão, e a música e o canto ocupam lugar
privilegiado, senão ímpar, porque a arte carrega capacidade expressiva e mobilizadora muito
acima do "logos" (palavra).
A liturgia faz sonhar. A liturgia remete para o horizonte da utopia, do reino. Por causa
disso um desafio é transformar as liturgias sérias, carrancudas em momento de festa, de
alegria. É um desafio bastante pertinente proporcionar momentos celebrativos que sejam
expressão daquilo que a pesquisa sintetizada no capítulo dois acerca da esperança, do mundo
transformado. Celebrações alegre e vibrantes podem possibilitar a antecipação escatológica da
plenitude da vida. “Não se trata de alegria fácil, barata [já que] o confronto é difícil e o
caminho longo e perigoso. […] Daí a autenticidade e veracidade das liturgias” 158.

156
CNBB. A música Litúrgica no Brasil. Estudos nº 79. 6.ed. São Paulo: Paulus, 2004.
157
CNBB, 2004, nº 347-349.
158
BUYST, 2008, p. 62.
84

O canto, a música e a dança são meios extraordinários de estabelecer uma comunhão


com Deus. O texto poético de prece, súplica, ação de graças e louvor, aliado a uma melodia
que ressoa na profundidade do coração humano, eleva os corações e produz por si mesmo um
encontro que vai além da mera emoção estética. Daí o seu caráter particularmente simbólico e
sacramental.
O grande desafio que reside aqui é o de propiciar que se amplie o leque de
possibilidades de utilização de símbolos e ações simbólicas introduzidos a partir da vivências
e espiritualidade litúrgicas. Como valorizar mais as expressões corporais valorizando, assim, a
unidade entre corpo, mente e coração?
159
Convém uma atenção especial à estética e à beleza já que influenciam
decisivamente para a conotação teológica:

Não é qualquer tipo de música que vale na liturgia. Daí a importância da escolha de
música: que seja música ritual, em linguagem poética e musical da comunidade, de
qualidade estética e teológica. Daí também a importância da maneira espiritual de
cantar e tocar os instrumentos, da atitude dos ministros (participantes a serviço do
canto da assembléia e não artistas diante de uma platéia) e da maneira de usar o
microfone (sem abafar a voz do povo). 160

2) Razão Cristológica 161: celebrar o Mistério Pascal do Senhor. O canto litúrgico brota
do fato fundante da fé cristã: o Mistério Pascal do Senhor. É, portanto, um canto
marcadamente esperançoso. A tônica principal do canto litúrgico é e será sempre a alegria
escatológica. A festa no Senhor Ressuscitado produz a essência do nosso cantar.
Jesus Cristo, fundamento teológico da liturgia, com seu Espírito transformador,
convida “o povo a passar da morte para a vida, de condições menos humanas para condições
162
mais humanas” . Desta forma desafia a revisar os repertórios musicais litúrgicos. Não será
possível, no contexto de exclusão, evitar de se cantar composições que exaltem as atitudes
proféticas de tantos(as) mártires deste continente latino-americano solidários com o próprio
Jesus: “prova de amor maior não há, que doar a vida pelo irmão”, diz a canção litúrgica.
3) Razão Pneumatológica 163: cantar no Espírito. A oração cristã não é somente oração
para Deus, mas em Deus. O cantar em Deus qualifica o nosso canto. A assembléia que canta
no Espírito faz ressoar um canto que é verdadeiro clamor que brota do fundo da alma, cheio
de fervor, de alegria no Espírito, como diz o Apóstolo. Desta forma, provoca-se conversão e

159
A esse respeito, conferir também: KOLLING, 2009. p. 20-26.
160
BUYST, 2008, p. 63.
161
CNBB, 2004, nº 350-351.
162
BUYST, 2008, p. 60.
163
CNBB, 2004, nº 352-353.
85

mudança de vida nos membros da assembléia orante, e ela se torna sinal fecundo e eficaz da
graça de Deus para o mundo. Há casos famosos na história do cristianismo em que, pelo
testemunho de entusiasmo e de alegria dos fiéis que cantam, homens e mulheres são
despertados vivamente para a vida eclesial. Santo Agostinho é exemplo disso.
164
Pode ocorrer o inverso disso. Um dos entrevistados diz ter começado a cantar na
Igreja justamente por sentir que as liturgias de sua comunidade estavam frias, mecânicas. Sua
intenção, portanto, é oferecer seus dons a fim de possibilitar beleza aos atos litúrgicos. Ora, na
beleza, Deus se revela, fala e age.
Da dimensão pneumatológica derivam com força algumas ações dos movimentos
carismáticos e pentecostais. A música nas Igrejas tem assumido algumas características que
são peculiares a esses movimentos. O desafio, diante disso, é justamente estar atentos para
ajudar que essa emoção conduza ao compromisso de fé com Jesus Cristo, e que se traduz em
compromisso social e eclesial, para não permanecer no ornamento litúrgico estético e
individual, subjetivo.
A ação transformadora do Espírito Santo, cuja ação permeia toda celebração, desafia à
comunidade dos fiéis a abrir espaço para sua ação. Dentre as possibilidades de sua ação se
crê, hoje, que o Espírito Santificador age através das palavras e da participação das pessoas.
Isso requer uma atitude consciente, segundo Ione Buyst, de quem exerce a presidência e
demais ministérios: é o sopro do Espírito que orienta as mentes na escuta da palavra e na
interpretação da realidade. Aparece aí, também, a importância do silêncio litúrgico, espaço de
inspiração divina.
4) Razão Eclesiológica 165: cantar em comunidade. O canto é atividade essencialmente
comunitária. A Igreja expressa, maravilhosamente bem, a sua realidade de comunhão e
participação através do canto comunitário. A participação comunitária não se dá só
diretamente cantando, mas ouvindo e apreciando: deixando-se envolver pela beleza da
música. No caso da Igreja, o canto não possui só uma função catártica (de alívio, purificação),
catalisadora (de estímulo, de dinamismo, de incentivo) e motivadora, mas é sacramento, é
simbolismo, isto é: o canto é um dos elementos que compõem a visibilidade, a corporeidade
sacramental. Através deste sinal sensível, a Palavra cantada é veículo do encontro de Deus
conosco e dos fiéis entre si.
A genuína música ritual expressa e possibilita a participação ao Mistério Pascal. Para
que seja, de fato, tomar parte da ação, necessariamente, a “participação existencial, vital,

164
Anexo A.
165
CNBB, 2004, nº 354-355.
86

mística passa pela participação ritual. Esta inclui e levará a um compromisso com a pessoa de
Jesus Cristo e com o Reino por ele inaugurado, que irá se estender a todas as áreas da vida
pessoal e social” 166.
Para Ione Buyst “não há liturgia sem comunidade que a realize” 167. Parece dizer que o
lugar onde se realiza a liturgia mais completa é a comunidade, lugar onde se procura imitar a
trinitariedade de Deus. Mas, e o que hoje se pode dizer da tendência intimista de viver a
religião? Os organizadores do CCLP da Diocese de Vacaria/RS depararam-se com
composições elaboradas na primeira pessoa do singular. Poderia-se classificar como
intimismo religioso? Agiram tomando por base o pensamento de um compositor do Nordeste.
Numa ocasião o compositor e cantor Zé Vicente verbalizou 168 que, quem produz uma canção
e a distribui para as comunidades cristãs deve admitir que as comunidades vão adaptar essa
obra para a sua realidade cultural. Mas devem manter fidelidade à idéia original. Isso aplica-
se tanto para o texto quanto para o ritmo.
No âmbito da eclesialidade Ione Buyst postula, em seu recente trabalho, a necessidade
de se cuidar para não perder de vista o sujeito da liturgia, que é a comunidade. Ela, e somente
ela, é que pode trazer para dentro da liturgia a referência à sua vida. Se valorizarmos as
respostas dos entrevistados 169, haveremos de requerer uma seleção de cantos que falem à vida
das pessoas e que as canções escolhidas sejam munidas de ritmo e melodia que animem e
encham de esperança suas vidas. Mas não esquecer que elas precisam ser genuinamente
músicas rituais. O desafio é – nas comunidades eclesiais – proporcionar aquele clima que
permita a “espontaneidade, simplicidade, informalidade, partilha, fervor religioso, com
participação de todos/as” 170.
Têm surgido muitos cantos marianos. E os fiéis parecem se identificar com eles já que
falam de Maria, a mãe de Jesus. Em nossa cultura, todo filho normalmente é muito apegado à
mãe. Maria é popularmente aceita e vista como “lutadora ao lado de seu povo sofrido; seu
171
cântico é redescoberto e relido como profecia a partir da realidade atual” . Talvez seja por
isso que para alguns católicos os cantos marianos adquiriram cunho eclesiológico,
identificando um modo de ser Igreja.

166
BUYST, 2008, p. 13.
167
BUYST, 1990, p. 29.
168
Oficina de música organizada pela Área Missionária da Ponta Negra. Manaus/AM, 2002.
169
Anexo A.
170
BUYST, 2008, p. 60.
171
BUYST, 2008, p. 59.
87

3.6.1 – Os grupos de animação


Com relação aos animadores do canto, o subsídio de estudos n. 79 da CNBB recorda
172
que a função do cantor é tão antiga quanto à sinagoga, onde ele (Chazzam) cumpre a dupla
tarefa de cantar e proclamar as Escrituras, sendo assim presidente do culto. Com a
compreensão que se tem hoje de que a celebração dos mistérios da fé é função de todo o povo
de Deus e se processa num rico diálogo entre os ministros e a assembléia – diálogo que tem
no canto o seu momento mais expressivo – vê-se como é expressivo esse ministério.
173
As respostas ao questionário falam dessa segurança que o grupo de animadores
precisa passar à comunidade. Cabe à equipe de cantores, orientados por seu líder, animar o
canto da assembléia, de modo que a faça vibrar em uníssono ao cantar estribilhos e refrões ou
hinos, ao responder, ou aclamar, com prazer à proclamação das Escrituras, e ainda levá-la a
sintonizar profundamente com a oração eucarística, dela participando mediante as
aclamações, sobretudo o "Santo". Para dar cabo do pensamento principal da renovação
litúrgica, é importante que o grupo cuide de sua missão principal: sustentar o canto do povo e
alternar com ele. Nunca substituí-lo.
“Toda a equipe de canto tem uma grande responsabilidade: ajudar o povo a rezar
cantando. Ela deverá estar participando profundamente da celebração. […] O canto litúrgico
174
não é um monólogo. É um diálogo [que se dirige a alguém]: Deus” . A equipe há de
encontrar, com a sua sensibilidade e criatividade, a expressão corporal mais adequada a cada
tipo de canto, a cada ritmo, provocando pouco a pouco a assembléia, com naturalidade e
simplicidade, a expressar-se em gestos, aplausos e dança, em certos momentos da celebração.
Quanto ao lugar da equipe no espaço de celebração, convém, como sugere Ione às
175
equipes de liturgia , que esteja próxima da assembléia; não esteja de costas para ela nem
para o altar. É bom que veja e seja vista por quem preside, por quem anima e por todo o povo
a fim de que a comunicação seja facilitada.
Recomenda-se um processo progressivo, planejado de formação fazendo interagir a
prática litúrgica e as concepções teológicas da liturgia. O trabalho de Ione Buyst oferece uma
rica lista de sugestões práticas que precisam ser adaptadas para cada realidade. Destacam-se
algumas bem elementares.
É recomendável um processo permanente de formação para equipes de liturgia,
inclusive o grupo de cantores e músicos. O desafio é, além de se reunir para preparar e avaliar

172
CNBB, 2004. nºs 245-247.
173
Anexo A, 10.
174
BUYST, 2000, p. 32.
175
BUYST, Ione. Equipe de liturgia. 15ª ed., Petrópolis: Vozes, 2000. p. 32.
88

celebrações, desenvolver vivências, ensaios e laboratórios onde seja possível fazer reflexões e
encaminhar ações rituais musicais. Sugere-se, inclusive – e, certamente, com grande proveito
–, um retiro anual desses grupos.
Portanto, além de uma formação inicial que visa “capacitar as pessoas para assumirem
176
o ministério com conhecimento de causa, com segurança e alegria” é importante um
acompanhamento de sua ação. A primeira poderia ser em nível paroquial, enquanto que a
segunda em nível diocesano. Em ambas é importante escutar a opinião dos participantes. Na
formação inicial uma sugestão pode ser “partir dos conhecimentos dos participantes e, em
seguida, estudar a ação ritual a ser realizada com seu sentido teológico e sua espiritualidade”.
Já na linha da formação permanente, pode-se “partir dos relatos e das experiências do grupo
dos ministros/as: o que têm feito, o que tem dado certo, quais as dificuldades encontradas” 177.
Talvez o questionário do Anexo A seja um bom instrumento para início de conversa.
Parece estar claro que já “não basta ter boa vontade, ou uma boa voz, ou saber
arranhar um violão”. As pessoas que se dispõem a oferecer do seu serviço e de seus dons têm
o direito de receber aquela formação capaz de lhes ajudar a “vivenciar o mistério celebrado, e
desta forma, ajudar a comunidade a entrar no mistério e ser transformada por ele” 178.
A formação dos ministros(as) da música ritual será mais eficaz, na opinião de Ione
Buyst e Joaquim Fonseca, se o fizer através de um método mistagógico, que conduz para
dentro do mistério. Tal formação será, portanto, vivencial, pois “para ser cristão ou cristã, não
basta ter um conhecimento intelectual de Cristo e de sua proposta”. Ela será um processo de
participação mística, espiritual, vital, existencial 179.
É conveniente oferecer formação litúrgica aos ministros(as) da música ritual
aproveitando bem o recurso dos ensaios de cantos. Sugere introduzi-los aos tempos litúrgicos
através de um prévio encontro ou retiro litúrgico-musical através do método mistagógico.
Tendo como pano de fundo o método ver-julga-agir, propõe três momentos. “Partimos de uma
descrição e de uma análise ritual do canto em questão; em seguida aprofundamos o sentido
teológico do acontecimento de salvação, expresso no canto […]; por fim, focalizamos e
180
assumimos a atitude que o canto, como ação ritual, propõe e requer” . A partir dessa
significativa proposta metodológica, é possível pensar alguns indicativos de ação.

176
BUYST, 2008, p. 68.
177
BUYST, 2008, p. 68.
178
BUYST; FONSECA, 2008, p. 12.
179
BUYST; FONSECA, 2008, p. 12.
180
BUYST; FONSECA, 2008, p. 13.
89

Para começar a compreender a ação ritual, olhe-se para os sinais sensíveis da música
litúrgica. Olhe-se primeiro para o texto (letra), já que este possui a primazia. O texto poético é
sempre rico por seu conteúdo, forma literária, pelas imagens simbólicas. A seguir olhe-se a
música com seus sons, melodias, ritmos, tempo. Associada à letra haverão de “expressar o
sentido teológico e a espiritualidade própria a cada celebração, a cada tempo litúrgico,
levando em conta o momento ritual do canto”. Por fim olhe-se para o contexto litúrgico
procurando perceber a interação dessa música “com os outros elementos rituais da
celebração” tais como a assembléia e seus ministérios, leituras bíblicas, símbolos, atitudes e
movimentos, estrutura da celebração 181.
No segundo momento propõe-se prestar atenção ao sentido teológico a fim de se
cantar com inteligência e expressar esse sentido na maneira de cantar. Será fundamental
inspirar-se em algumas passagens das Sagradas Escrituras para compreender a ação ritual em
questão. Ajudando a mente a compreender e a acompanhar aquilo que a voz canta “nosso
canto tornar-se-á um ato de fé em Deus” 182.
O terceiro momento será uma decorrência natural dos anteriores. Trata-se de
experimentar e vivenciar aquilo que é anunciado no próprio canto. Então, para além de cantar
bem tecnicamente e de acompanhar o canto como algo fora de si, é necessário que o ensaio
proporcione uma experiência como se fosse na própria celebração. Assim se poderá
experimentar a “atuação do Espírito de Deus em nós, na e por meio da ação ritual […]; trata-
se de cantar espiritualmente, com devoção, ‘de coração’, além de cantar bem e com
inteligência” 183.

3.6.2 – Os animadores ou regentes


O método mistagógico de formação de agentes através dos ensaios de cantos terá tanto
mais êxito se o coordenador (ou regente) tiver uma razoável formação musical. Para isso é
importante que as comunidades (paróquias, diocese) invistam em pessoas que têm
disponibilidade e talento nessa área. Mas isto também não é suficiente. É importante
oportunizar a essas pessoas que exercem a coordenação litúrgico-musical uma adequada
formação bíblica, teológica, espiritual. Além disso, um trabalho conjunto com outra pessoa
certamente complementará seu ministério.

181
BUYST; FONSECA, 2008, p. 14.
182
BUYST; FONSECA, 2008, p. 15.
183
BUYST; FONSECA, 2008, p. 16.
90

Cabe, então, ao animador ou animadora de canto, orientar a escolha dos cantos a ser
cantados na celebração em comunhão com sua equipe. Devem dosar o repertório,
promovendo o equilíbrio entre tradição e novidade, repetição e variedade, de modo que
mantenha a assembléia, ao mesmo tempo, segura ao cantar os cantos da sua tradição e
contente em poder renovar o seu repertório. “Todo escriba versado nas coisas do Reino de
Deus sabe tirar do seu tesouro coisas novas e velhas” (Mt 13,52).
Isso contempla o conceito de rito oferecido por Terrini, no primeiro capítulo. Ali se
afirmou que os ritos oferecem a idéia de imitação dos deuses. Talvez seja por isso que
algumas celebrações parecem não estarem completas se não se cantar determinados cantos.
Significa, por exemplo, que o Natal só será Natal se a comunidade cantar – à imitação dos
anos anteriores – a canção “Noite Feliz”. A execução de determinadas músicas produzem a
sensação de que este ritual reproduz aquela comunicação alcançada anteriormente.
Gestos de regência certamente auxiliam ao grupo de animadores do canto para
manterem-se cantando em unidade. É recomendável, porém, que sejam discretos e que o
animador posicione-se em um lugar onde possa ser visto pelo grupo, mas, sem prejudicar a
atenção de todos à ação ritual. Também os instrumentistas devem observar suas orientações.
Cabe ao animador preparar com bastante cuidado os ensaios com seu grupo,
oferecendo-lhes elementos que ajudem a compreender o sentido daquele canto em
determinada ação ritual. Também motivará e coordenará ensaios com toda a assembléia no
início da celebração, ajudando-a a introduzir-se no espírito da celebração.

3.6.3 – Os instrumentos e os instrumentistas


“É bom que cada comunidade procure ter pelo menos um(a) instrumentista para
sustentar o canto, e também para com sua música criar um clima de oração e meditação” 184.
Os instrumentistas são, também eles, membros da assembléia e, portanto, destinatários da
ação salvífica de Deus agindo nas ações rituais. Sua grande contribuição será, sempre,
garantir a afinação e o ritmo do canto da assembléia. Um cuidado sempre oportuno vai no
sentido de fazer com que o som dos instrumentos nunca abafe as vozes da assembléia.
Todo instrumento musical pode ser utilizado na liturgia, desde que venha a contribuir
na ação que se realiza. A partir da renovação conciliar deixa-se de classificar os instrumentos
como sacros ou profanos.
Neste sentido é importante que os instrumentistas assumam seus trabalhos com essa
compreensão, cientes de que através de seu serviço oferecem “carona” à mensagem do
184
BUYST, 2000, p. 31.
91

Criador – o grande Artista – às suas criaturas. Bons ensaios os ajudarão a ter segurança na
execução das músicas. Ademais, os ensaios com o grupo de animadores e com a comunidade
favorecerá para uma melhor harmonização na execução ritual da música, o que há de resultar
numa melhor comunicação com o transcendente.
É oportuno comentar um serviço que vem ganhando espaço por causa de sua
importante função na qualidade das ações litúrgicas. Trata-se do serviço de sonoplastia. Um
“verdadeiro ministério” 185. Seu serviço sempre será de regular e equalizar os sons, de modo a
favorecer a audição das vozes e instrumentos, evitando sobreposições e exageros. “O que
ouvidos deve ser algo prazerozo, em harmonia com o clima da celebração” 186.
O uso de microfones deve acontecer quando e somente se fizer necessário. No canto
deve-se cuidar para que ele favoreça aos cantores a ajudar a assembléia no momento de
começar a cantar. Mas nunca se deve cantar o tempo todo. É importante que os animadores do
canto tenham a sensibilidade de perceber quando a assembléia já está segura da melodia e
“saem” do microfone a fim de que a unanimidade das vozes se sobressaia.
O serviço qualificado dos instrumentistas – sonoplastas e musicistas – haverá de
proporcionar à comunidade celebrante um ambiente agradável de celebração e evitarão
situações indesejáveis como nesta descrição: às vezes

somos submetidos(as) a uma carga insuportável de decibéis vinda de guitarras


elétricas, violões, baterias e outros instrumentos em volume excessivo, de microfone
em número e volume também excessivos, muitas vezes manipulados por pessoas
[…] que usam o momento e o espaço litúrgico para dar seu show, para derramar seus
187
sentimentos.

Sua melhor localização será junto ao grupo de cantores, em posição favorável à


execução dos instrumentos e favorável à percepção da assembléia, da presidência e demais
serviços litúrgicos.

3.6.4 – Os ensaios de cantos


188
Ensaiar os cantos, além de possibilitar que a comunidade conheça a canção,
provavelmente a predispõe para o que se sucederá na celebração. O ensaio cria o ambiente da
celebração já que antecipa o que se viverá nela. Convêm nunca dizer que um canto é difícil, já

185
CANTO E MÚSICA NA LITURGIA. Roteiro de Frei Joaquim Fonseca e direção de Cireneu Kuhn. São
Paulo: Verbo Filmes-Paulus, 2006. 1 DVD (58 min.), color.
186
CANTO E MÚSICA NA LITURGIA, 2006, DVD.
187
BUYST; FONSECA, 2008, p. 8.
188
CNBB, 2004. n º 248.
92

predispondo negativamente a assembléia. É sempre oportuno fazer breve introdução, antes de


iniciar o canto, destacando o que há de mais importante em sua letra, sua função litúrgica,
cuidados que talvez se deva ter.
Atento à necessidade da primazia da palavra, o CCLP adotou e recomenda o uso de
um método para ensaiar cantos novos. Compreende quatro passos: 1) conhecer o texto; 2)
escutar a execução da música; 3) ensaiar cantando baixinho, a começar pelo refrão; 4) saber
cantar sozinho. Ao iniciar o ensaio, pedir à assembléia que acompanhe silenciosamente,
escutando bem a melodia e lendo o texto. Quando estiver cantando, o coordenador(a) não
deverá dar muito volume à voz. No ensaio deve pedir que a assembléia o acompanhe – quer
cante, quer utilize aparelho de som. Quando a comunidade já o estiver acompanhando, é hora
de elogiá-la. Aos que têm dificuldades de afinação, com cuidado pode convidar a escutar bem
os que cantam a seu lado. A sabedoria popular diz que para se ter boa voz tem, primeiro, que
ter bom ouvido.
É pedagogicamente bom que o animador faça pequenos gestos de regência durante o
canto. É muito importante que sua expressão facial seja sempre alegre, incentivadora.
Convém cuidar e orientar o bom uso da respiração: a base para cantar bem.
Os ensaios visam capacitar a comunidade para a participação ativa da celebração. Não
se canta apenas com a boca, mas com todo o ser 189.

3.6.5 – Desafios à ação litúrgica


190
Na opinião de Dom Clemente Isnard se deveria seguir mais de perto os livros
litúrgicos. Não para ser rubricistas, mas para respeitar as tradições que vinham dos
antepassados; seguir para frente com uma rota bem definida. Para ele a liturgia está numa
encruzilhada. Essa encruzilhada é de mentalidade; é cultural. E está em jogo a renovação
litúrgica. Deseja que a Igreja seja capaz de desenvolver as linhas da renovação litúrgica do
Concílio Vaticano II.

A liturgia é a vida cristã. Uma e outra não se distinguem. A liturgia não é uma
perfumaria que vem dar um bom cheiro à Igreja. Ela é o feijão com arroz da vida da
Igreja. A liturgia é a espiritualidade da Igreja. Sejam fiéis à Sacrosanctum
Concilium. Desenvolvam o que já está na Sacrosanctum Concilium, mas não fiquem
presos às palavras, à letra. Desenvolvam, para chegarmos a um crescimento da vida
litúrgica. 191

189
CNBB, 2004. n º 248.
190
SACROSANCTUM CONCILIUM, 2006.
191
SACROSANCTUM CONCILIUM, 2006.
93

Para Dom Clemente, se não há formação litúrgica, não há, também, vivência litúrgica.
Para isso as comunidades podem servir-se do vasto e rico material que a CNBB publicou e
que se constitui num verdadeiro roteiro para a formação nas bases.
Uma vez que canto e música são elementos integrantes da liturgia, deve-se levá-los a
sério, não deixando-os a critério de qualquer um. É de suma importância formar pessoas para
“compor músicas adequadas, orientar as equipes de liturgia, formar e dirigir os grupos de
canto e instrumentistas, ajudar na formação de um repertório de cantos próprios para cada
ocasião, dirigir o canto da assembléia litúrgica” 192.
Provavelmente a música e o canto litúrgico têm muito a contribuir para reverter a
experiência negativa que muitos têm em relação ao rito. Tal expressão causa repulsa para
muitos justamente porque suas experiências nunca estiveram muito próximas de ser uma
vivência do mandato de Jesus: “façam isso em memória de mim”.

Resgatar a graça de celebrar […], de sentir o prazer de cantar, dançar, nos reunir,
ouvir a Palavra, sentir o gosto do pão e do vinho partilhados. É preciso rever a nossa
capacidade de ver o invisível através do visível, de tocar o mistério através da
participação na ação ritual e deixar-se tocar pelo Outro, o Transcendente, mediante
os gestos rituais. Portanto, é urgente a sensibilização simbólico-ritual, a formação
para a ritualidade. 193

Eis um grande contributo da arte musical na liturgia. Nisso consiste cantar ao Senhor
um cântico novo (Ap 5, 9a), imbuídos do Espírito do Ressuscitado que a todos convida para,
na alegria, segui-lo e anunciá-lo.
Reafirmando o que se disse, da fidelidade à leitura da realidade dependerá o alcance
das propostas práticas. Assim reflete também a MHE. Daí a importância de desenvolver uma
ação conjunta com a colaboração de todos os agentes da liturgia para compreender o gosto
musical da comunidade e aproximar-lhes as práticas litúrgicas. Tal proposta parece
contemplar a opinião dos entrevistados e as avaliações do último CCLP que se pronunciaram
felizes pela coleta de suas opiniões. Ione – citada no item 3.4 a respeito do objeto de estudos
da CL – já apontava para a diferença de uma formação de agentes pela imposição e da
formação que conta com os sujeitos participantes.
Constante atenção às práticas e às sugestões que vêm da Tradição e do Magistério
parecem ser elementos autênticos à composição de uma metodologia de formação litúrgico-
musical. Então, a exemplo do relacionamento interativo que estabelecemos com a arte
musical se apresenta uma proposta de postura metodológica para a prática litúrgica.
192
BUYST, 2008, p. 71.
193
BUYST, 2008, p. 74.
94

CONCLUSÃO

Neste trabalho parece ter ficado claro que a música tem o potencial de elevar o espírito
humano e proporcionar vivências inesquecíveis. E parece não haver dúvidas de que, além de
produzir emoção, pode provocar para a ação. Isso aponta para o poder catártico da música e,
consequentemente, seu poder de transformação, pessoal e comunitário.
A música na liturgia potencializa a incidência da mensagem evangélica na vida das
pessoas porque cria o clima, prepara o terreno do coração para que acolha, se transforme,
vibre e se comprometa com a causa.
Logicamente a música genuinamente ritual contribui para liturgias autênticas. E
liturgias autênticas às vezes confirmam os fiéis na caminhada; às vezes provocam conversões
e mudança de posturas; às vezes disparam “estalos” e percepções ainda não vistas. Disso não
se duvida. A dúvida parece permanecer na definição da fronteira daquela música que se
considera litúrgica e a não litúrgica.
Vimos no capítulo primeiro que, no início da era cristã, se orientava para evitar a
utilização de instrumentos musicais para não confundir com o culto aos ídolos do mundo
pagão. Também hoje se percebe resistência de alguns segmentos eclesiais ao uso de algumas
composições da música popular. Não correm o risco de serem também equivocadas? Seria
totalmente arbitrário proporcionar momentos litúrgicos aproveitando algumas composições
que são verdadeira expressão da “alma” de um povo? Ou, ainda: seria possível pensar que
naquele momento ritual o fiel transportou-se desde a celebração da fé, em seu culto, até a
“vida real” e que essa “mixagem” lhe oportunizou ressignificar aquela situação despertada por
tal música?
Ora, as respostas dos entrevistados estão repletas de afirmações acerca de experiências
vivenciais, cujo significado vê-se respaldado em músicas que falam de um jeito e de assuntos
que só com palavras não conseguiria dizer. Então a música expressa o indizível.
Note que não se está pondo dúvida à orientação para o uso da música cujo conteúdo é
o próprio rito. A provocação é posta no sentido de explorar mais o vasto campo de
possibilidades que a música oferece para momentos orantes, para espaços de reflexão, de
pregação, de pedidos e de ação de graças.
95

Uma vez que a música prolonga e aprofunda a ação da Palavra, ficou evidente o vasto
campo de possibilidades dos solos musicais, dos refrões repetitivos, das mantras e,
especialmente os silêncios contemplativos, meditativos. A pesquisa reafirmou que uma
grande contribuição da música à liturgia é o de produzir sentimentos que, claro, precisam ser
intencionados e orientados para não se tornarem mero sentimentalismo. Talvez a música
possa contribuir para se produzir menos palavras. Há conhecimento nas palavras, mas há
também no sentimento. Daí a importância da boa qualidade musical, da beleza na liturgia.
Esse cuidado é oportuno porque o homem é marcado pelo que recebe e adquire, como
se viu na abordagem antropológica. Faz-se necessária uma constante revisão daquilo que se
produz na área da música litúrgica. Usadas nas celebrações elas sempre produzem, indicam,
moldam a fé e a consciência. Por exemplo: se no mundo modal a melodia agradável e nada
inovadora pretendia produzir a idéia de imutabilidade, o cuidado com esse tipo de produção
também é necessário.
A música litúrgica cumpre papel fundamental na educação e no engajamento solidário.
O enfoque antropológico da liturgia sugeriu considerar a visão que o homem tem de si e a sua
relação com os demais seres do universo. Uma vez que as estruturas mentais são expressas
nos gestos, na criatividade da liturgia como confirmou a pesquisa de campo, então, que a
música favoreça para que o homem possa expressar e cultivar esse relacionamento universal.
Que a música ajude-o a dar-se conta de sua responsabilidade com o planeta, a descobrir o
sentido de sua existência, a perceber-se co-criador.
Uma das “pérolas” encontradas é de que a poesia é capaz de manifestar, de maneira
sábia, o que não se diria facilmente. Ela, então, potencializada pela melodia e pelo ritmo, diz
de forma que os indivíduos têm a certeza de que aquilo que está sendo cantado é seu; é como
se tivesse sido elaborado exclusivamente para si.
A investigação da relação rito-música mostrou suas semelhanças, especialmente no
aspecto da harmonia. A música pode ser propedêutica à experiência religiosa. Nesse sentido a
música contribui para dizer o indizível, como visto: recolhe o sentido do mundo num contexto
onde transcendência e imanência formam um ‘solo’ estupendo e impensável, impossível de
ser traduzido pela linguagem ordinária.
Assim, o ser humano faz uso da arte para expressar seus sentimentos mais profundos;
o canto ajuda o ser humano a expressar sua religiosidade, sua relação com Deus.
Constatamos que no canto litúrgico, a união das vozes acaba por exprimir a união de
pessoas numa verdadeira comunidade. Na união das vozes, cada um se encontra
pessoalmente, mas percebe-se envolvido comunitariamente aos outros irmãos presentes.
96

O 2º capítulo da dissertação procurou investigar a prática litúrgico-musical na Diocese


de Vacaria/RS. Reuniu elementos históricos e percepções correntes entre lideranças eclesiais
acerca do canto litúrgico. Apresentou o Curso de Canto Litúrgico e Pastoral que já executou
sua terceira edição. Dele apresentou as motivações, método, valores, estatísticas, avaliações e
o relato de alguns fatores que dão conta da importância de sua incidência litúrgica.
A preocupação com a fidelidade à leitura contextual, forjou uma pesquisa de campo
com caráter qualitativo. As respostas do questionário e sua respectiva síntese no capítulo
segundo mostraram uma seleção de agentes litúrgicos empenhados e comprometidos com um
processo de qualificação litúrgico-musical. Parecem cientes de sua responsabilidade. E
sabiamente apontam para as possíveis causas de algumas situações de esvaziamento das
celebrações: se os cantos não animam por serem desafinados, “arrastados”, as celebrações
ficam deprimentes. Assim, entendemos que um cuidado carinhoso nesse aspecto pode
contribuir significativamente para que as celebrações sejam agradáveis de se participar.
Contar com jovens para a tarefa da animação do canto litúrgico pode ser um bom indicativo,
se afirmou.
De modo geral os entrevistados demonstram entender que uma celebração bem
cantada anima a caminhada e torna viva a Igreja cristã. Há, portanto, a necessidade de
preparar os agentes da arte musical para que contribuam na realização de celebrações vivas
através de um adequado uso da música e do canto nas celebrações litúrgicas.
Talvez seja oportuno que a música “trabalhe” mais, seja-lhe privilegiado espaço na
liturgia. Se disse que as reuniões da equipe coordenadora dos CCLPs, embora longas não são
cansativas. Isso porque mesclam trabalho e lazer. São encontros descontraídos, contam com o
prazer proporcionado pela música. É evidente que a vida se torna mais prazerosa com música.
Pois bem. Que a música proporcione prazer também na liturgia. Que ao cantar a comunidade
experimente e expresse seus sentimentos: que ela vibre de alegria e esperança ou, quando for
o caso, possa “lavar a alma” com a melancolia do canto que é expressão do sofrimento
experimentado.
Os entrevistados manifestaram seu gosto pela música, manifestaram seu apreço pelo
canto litúrgico, propuseram funções para ele e delimitaram o papel do animador do canto
litúrgico. Ficou evidente que a arte musical alimenta a esperança de maneira a encorajar o ser
humano para a vida.
Outra conclusão que chegamos é que a música é a porta para terrenos interiores; chega
a lugares fora de nosso alcance. Por seu caráter ritual-simbólico remete aos sentimentos e
produz sensações que ultrapassam o meramente sensível. E, talvez justamente por isso, nos
97

remete ao transcendente. Ademais, a arte musical favorece à criatividade e expressão pessoal,


facilitando o aprendizado. Inclusive o aprendizado da fé.
Constatou-se que são oferecidas poucas oportunidades de formação litúrgico-musical.
Disso se deduz que as pessoas atuam com muito boa vontade, porém, sem muita orientação
mais consistente, sistematizada. Isso, não poucas vezes, as deixa inseguras para uma atuação
inovadora, criativa e até, mais ousada.
A partir das constatações contextuais, e iluminados pela fundamentação teórica do
primeiro capítulo, a parte final da dissertação se propôs alavancar indicativos para a ação
litúrgica na Diocese de Vacaria/RS.
Constatamos que em pouco mais de 40 anos do evento Vaticano II se avançou
bastante, mas há muito que se fazer. Para nós, latino-americanos, soma-se à necessidade de
inculturação das orientações litúrgicas – ainda tímidas – o fato de situar-nos em meio às
reflexões e proposições da Teologia da Libertação.
À luz da TdL, uma liturgia inculturada não pode descuidar da realidade sofrida,
desafiadora mas, também, carregada de esperança deste imenso Brasil e América Latina. A
Ciência Litúrgica tem por missão propor um método, em sintonia com a TdL: parte da práxis
e volta a ela. A formação litúrgica oferecerá elementos instrutivos e reflexivos que tornem
possível, aos agentes de pastoral, autonomia para exercer a criatividade e promover momentos
originais de encontro com o Senhor.
Para a prática litúrgico-musical na Diocese de Vacaria/RS a dissertação sugeriu, ainda,
a inspiração da Metodologia Histórico-Evangelizadora em desenvolvimento no Instituto de
Teologia e Pastora – Itepa. Desenrola-se no cotidiano com a possibilidade de ser transformada
pelos seus sujeitos; ser evangelizadora fazendo-se no caminho. Sintoniza com a TdL uma vez
que pretende conhecer a realidade, entendê-la e tentar interagir com ela. No caso do canto
litúrgico, há que se assumir um processo metodológico onde os próprios cantores e
instrumentistas possam participar da ação-reflexão, sentindo-se sujeitos e partícipes de seu
próprio ministério.
Aos agentes do canto e da música ritual da Diocese de Vacaria/RS se sugeriu agirem
considerando-se os fiéis como sujeitos da ação litúrgica, proporcionando-lhes participação
ativa e momentos de verdadeira comunicação com seu Criador, através de liturgias bem
cantadas. Se propôs a formação continuada e progressiva em diversos níveis, contando com a
colaboração dos sujeitos desse processo, os próprios agentes.
98

Por fim, uma constante atenção às práticas litúrgicas e às sugestões que vêm da
Tradição e do Magistério parecem ser elementos autênticos de uma metodologia de formação
litúrgico-musical.
Ao final deste texto dissertativo reafirmamos o que julgamos ter ficado claro: a
música, à serviço da liturgia, possibilita interatividade. Interativo, também, é o
relacionamento que estabelecemos com a arte musical. Desse modo, parece, se apresenta uma
proposta de postura metodológica para a prática litúrgica: interativo, onde os implicados na
ação litúrgica são seus próprios sujeitos.
99

REFERÊNCIAS
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100

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Fundo: Berthier, 2008. p. 32-93.
102

ANEXO A
Pesquisa de opinião:
Canto e música na liturgia Católica da Diocese de Vacaria/RS

Por ocasião do Curso de cantos


1. Identificação (guardaremos sigilo):
→ Nome: X
→ Sexo: (a, d, e, f, j, l, n, o, q, u) M (b, c, g, h, i, k, m, p, r, s, t) F
→ Idade: (d, h, j) até 20 anos; (l, o, r) de 20 a 30 anos; (a, b, c, e, f, i, k, m, n, p, q, t) de
30 a 50 anos; (g, s, u) de 50 a 60 anos;
→ Profissão: a) comerciante; b) costureira; c) do lar; d) estudante estagiário; e)
pedreiro+carpinteiro+encanador+eletricista; f) agricultor; g) do lar; h) estudante; i)
agricultora; j) estudante; k) secretária; l) estudante; m) técnica em contabilidade; n) agricultor;
o) agente comunitário; p) agricultora; q) gerente de vendas; r) professora de música; s)
costureira; t) agente educacional – alimentação; u) sacerdote.
2. Por que veio participar do Curso? Como soube? De quem recebeu apoio?
a) Já participei dos anteriores; nosso pároco nos incentiva muito.
b) Porque gosto; soube na paróquia onde atuo; apoio do pároco e dos amigos de equipe.
c) Vim participar do curso a convite do padre […], e junto com o grupo vim participar.
d) Quem me convidou foi o […] (amigo da equipe que coordena o curso) e foi ele quem me
incentivou a estar presente hoje.
e) Porque é muito importante estarmos renovando a nossa liturgia cantada. (soube) Através da
Radio […] nos programas de sábado da Igreja. (apoio) do padre […] pároco da […].
f) Através do Padre […]. Vim através da Paróquia de […]. Vim porque gosto e me faz bem
cantar nas celebrações e aprender nunca é demais. Sei o quanto é importante o canto nas missas.
g) Porque gosto muito de cantos litúrgicos, eu ouvi pela rádio, recebi apoio do […] (pároco).
h) Me interesso por música; minha tia me falou que ela iria vir, então ela me convidou para vir
com ela.
i) Vim para o curso porque gosto de cantar e participar das celebrações litúrgicas. Soube do
curso pelo padre, o qual nos deu apoio e incentivo.
j) Vim participar, primeiro porque gosto desta arte que é o canto/música; segundo, pelo fato de
que também na música precisamos constantemente ir-nos renovando, adquirindo mais conhecimentos,
para que possamos cada vez mais fazer com que o canto transmita o que de fato é necessário, pois
muitas vezes vemos (ouvimos) uma “matação” com o canto, fazendo que ao invés do canto ajudar
acabam atrapalhando, tornando-se assim uma poluição auditiva. Soube por meio do […] (padre) e
recebi apoio do mesmo para participar.
k) (não respondeu).
l) Por ter sido convidado, pelo Pe. […], para auxiliar na acolhida e recepção dos participantes do
3º Curso de Canto Litúrgico e Pastoral (CCLP) da Diocese de Vacaria; por entender que, a acolhida e
a recepção, também são serviços necessários e importantes para o bom andamento do curso. Ainda,
outra motivação e talvez a mais importante: por, além de servir, ter a possibilidade de participar do
curso.
m) Porque é importante aprender cantos novos. Através do Cursilho Jovem. O apoio é por conta
própria e outras vezes a paróquia dá sua contribuição.
n) Porque sempre há necessidade de aprender novos cantos e passar para as comunidades em que
trabalho. Soube na EFAP em Sananduva e recebi apoio da família e dos amigos.
103

o) Vim participar do curso porque gosto de cantar nas celebrações e porque esse é um momento
importante para aprender cantos novos.. soube através do padre […] e foi quem me convidou a
participar.
p) Para saber mais sobre liturgia e aprender cantos novos. Através do pároco, comunidade e
equipe de liturgia.
q) Porque quando recebi o convite, além de achar o conteúdo interessante, também encarei como
um desafio pois teria a oportunidade de ensinar o pouco que sei e também aprender muito com a
equipe e participantes, recebendo apoio da equipe coordenadora e paróquia.
r) Faço parte da equipe que organiza os cantos. Fui convidada pelo Pe. […], na primeira edição
do curso.
s) Porque adoro cantar e aprender cantos novos. Pela Paróquia […], através do Pe. […]. Apoio
do Movimento Lareira e Pastoral Vocacional.
t) Para aprender mais, me aperfeiçoar e poder participar nas liturgias através do canto mais
corretamente, sabendo os momentos apropriados para o canto e também saber melhor qual a hora certa
de cantar os cantos. Soube através de reuniões que participei, em Assembléia Diocesana, Foranias.
(Infelizmente) só hoje e neste pude participar; os anteriores aconteceram erros de dados de
informações e por isso faltei. Tive apoio do pároco, Pe. […] e também de toda nossa equipe de cantos.
No geral somos em 10 pessoas. Chamamos de Coral Nossa Senhora da […], que nos abençoou com o
dom do canto.
u) Fazia parte da equipe que “coordenava” e também porque gosto de cantar.

3. Quanto tempo faz que participa da Igreja? O que faz? Quanto tempo faz que participa da Liturgia?
O que faz?
a) Sempre participei como fiel. Nos serviços iniciei na Pastoral da Juventude, no grupo de jovens
em […]. Mas foi em […] no ano 2000 que realmente me integrei participando do grupo de animação
da paróquia.
b) Desde sempre, ou depois da crisma. Primeiro como catequista e um coral de 35 crianças,
grupo de jovens. No momento estou mais na liturgia, na animação da paróquia, bairros e interior – há
uns 15 anos.
c) No grupo de cantos estou há 2 anos cantando. Na liturgia estou a mais ou menos 23 anos
participando.
d) Participo desde criança em tudo relacionado à Igreja; por incentivo de minha família, ajudo
desde leituras até cantos.
e) Há 10 anos. Faço parte da equipe do canto do grupo de oração […] da Igreja […] e da equipe
de canto. Participo ativamente a 8 anos. Tocamos violão e cantamos a liturgia.
f) Com doze anos dava catequese. Com … cantava na Igreja. Participava dos encontros de
famílias.
g) Participo desde criança; fazem 30 anos que participo da liturgia, sou ministra da Palavra.
h) Sempre participei; somente participo.
i) Desde pequena. Hoje sou coordenadora da liturgia, coord. da Infância Missionária e ajudo a
equipe de canto.
j) Mais ou menos há 10 anos; ajudo na catequese, na liturgia, na música, entre outros. Da liturgia
propriamente dita há 4 anos, desde que […]. Na questão da liturgia auxilio na proclamação das leituras
bíblicas, na escolha de cantos, etc.
k) (não respondeu).
l) Desde que me compreendo por gente, sempre participei da Igreja (comunidade […]). Mais
direta e assiduamente a partir dos 8 ou 9 anos quando comecei a participar da catequese. Minha
família sempre esteve ligada à vida da comunidade. Se ainda hoje, a família […], possui envolvimento
comunitário/eclesial, isso se deve a nossa querida e saudosa mãe […]. Desde aos 15 anos, […] não
exerço nenhum papel específico (ex.: ministro, catequista, músico...). Contudo, creio que estou
envolvido, mesmo que modestamente, numa série de ministérios.
m) Mais ou menos 18 anos. Sou catequista e trabalho na liturgia (Cursilho Jovem).
n) 25 anos de participação na liturgia tocando violão, cantando e animando as celebrações . na
Igreja sempre participei.
104

o) Participo da Igreja desde que me conheço por gente. Desde os 12 anos, quando aprendi tocar
violão, participo das celebrações sempre que possível e/ou quando recebo convite. Alem de cantar e
tocar violão também faço parte da equipe de liturgia.
p) Desde que comecei a saber e a entender sempre participei da Igreja. No momento estou
desenvolvendo o cargo de coordenadora da equipe de liturgia. Organizar os encontros e reuniões da
equipe.
q) Sempre participei da Igreja; faço parte do Movimento de Cursilho, colaborando com o coral
nas celebrações. Há 12 anos faço parte da liturgia através do canto e da música.
r) Desde pequena com oito anos cantava e tocava teclado no grupo […] de minha cidade […]; e
desde então sempre contribuí cantando , tocando e auxiliando na organização da liturgia. Faço parte do
Apostolado da Oração e do grupo de Cursilho. Portanto, mais ou menos 18 anos que participo da
Igreja, em algum trabalho.
s) Desde quando fia a 1ª Eucaristia com 7 anos. Fico mais na frente dos cantos e às vezes nas
leituras e na parte vocações. Fazem uns 16 anos que participo da liturgia. Canto, canto, canto.
t) Participo da Igreja desde pequena pois os meus pais são católicos participantes e me levaram a
participar desde cedo. Sou catequista coordenadora da catequese em minha paróquia. Sou liturgista e
atuante com canto, leituras, como comentarista. Atuo nestas atividades a muitos anos.
u) Sempre participei da Igreja, da liturgia, motivado pelos meus pais.

4. Que tipo de formação litúrgica e musical recebeu?


a) Formação litúrgica propriamente dita nenhuma. Musical: aulas de teclado e vocal.
b) Cursos de cantos pastorais em Porto Alegre e com vocês.
c) Nunca recebi nenhum tipo de formação. Canto porque gosto muito.
d) Estudei em um colégio marista, por isso acabei fazendo muitos cursos formadores pessoais.
e) Nós já tínhamos conhecimento da liturgia desde os 10 anos quando estávamos nos preparando,
dentro da catequese. Depois comecei a buscar Jesus Cristo na minha vida e fui convidado a tocar no
grupo de oração e após começar a tocar na liturgia da […] fui recapitulando toda a minha vida na
Igreja. Depois começaram os cursos de cantos . fiz o 1º, 2º, e fomos fazer em Santa Cruz do Sul mais
um curso de formação. No curso aprendemos dar mais valor à liturgia. Não há canto sem liturgia e
também não há liturgia sem canto. Mas acima de tudo saber trabalhar cada momento da celebração. E
estamos em mais um curso litúrgico, este que hoje participo. A Igreja se fortalece e nós também.
Música: estudei 1º ano, o mais aprendi tocando, ensaiando, buscando sempre ser um músico ungido do
Espírito Santo para levar às pessoas a paz e a certeza que só Jesus Cristo é o nosso Salvador, e assim
fazer a efusão do Espírito Santo através da música de Deus a todas as pessoas que virem buscar Jesus
através da (Missa) Eucaristia, Jesus vivo dentro de cada um. Não sou Ministro da Palavra, mas me
sinto, hoje, Ministro da Música. Sei da minha responsabilidade. Por isso a cada dia aprendemos um
pouquinho de que forma levar Jesus Cristo a cada coração através do canto litúrgico. Esta é a minha
missão como cristão.
f) Três meses de curso de violão. Depois aprendi só cantar os cantos, e agora com os cursos
litúrgicos estou desenvolvendo cada vez mais.
g) Teologia na Paróquia […], reuniões, palestras.
h) Catequese e esse curso de canto.
i) Procurei participar de encontros desde nova, mas o que mais me ajudou foi um curso de
Teologia à distancia através da Estef e o Correio Riograndense que venho participando e o curso de
canto litúrgico da diocese.
j) Tive noções básicas na questão música enquanto residia em […]. Pude ter a oportunidade de
receber aulas ministradas pelo […] e […]. Foram em torno de três anos.
k) (não respondeu).
l) Sem faltar com a humildade, posso afirmar que recebi uma boa formação litúrgica. Dentre os
muitos, cito, aqui, três espaços que os considero importantes: estudos formativos, assessorados pelo
Pe. […]; faculdade de Teologia, mais especificamente, a disciplina Fundamentos de Liturgia; a
participação e análise das liturgias em nossas comunidades. Em relação a formação musical, não posso
dizer o mesmo. […], tive e tenho a possibilidade de fazer cursos de canto, de violão e outros
instrumentos musicais. Mas, após uma tentativa sem êxito […], perdi o encanto pelo violão. E daí para
cá, nunca mais fiz cursos na área da música. Foge à regra, um singelo curso vocal que, nós […] (2003
105

ou 2004), realizamos com o Pe. […]. Creio que o “curso” mais eficiente, em relação à formação
musical, que já fiz e venho fazendo é o gosto pela música e a prática de cantar (mesmo que, muitas
vezes, fora do tom).
m) Fiz alguns cursos de liturgia (na catequese), participação do 1º curso de cantos litúrgicos; e
canto com o grupo do Cursilho da Paróquia.
n) Formação litúrgica só tive na época em que trabalhei nas Missões Diocesanas, participando
como leigo.
o) Em 2008 participei de um curso de Mistagogia e espaço litúrgico em Santa Maria. Além disso
fiz parte de um coral de cantos orientados pelo […] que me ajudou bastante a cantar, inclusive fazendo
a 2ª voz em alguns cantos.
p) Escolas paroquiais e cursos litúrgicos.
q) Não tenho formação litúrgica. Na música aprendi com minha família por ouvido, e mais tarde
a teoria em livros.
r) Quanto a formação litúrgica, aprendi observando e interagindo com pessoas mais experientes
que eu, e muitas dúvidas minhas foram esclarecidas nos cursos de canto litúrgico e pastoral. Quanto a
formação musical, desde os oito anos estudo música, toco teclado, acordeon, violão e flauta-doce, e
cursei a faculdade de música na Universidade de Passo Fundo tendo concluído a mesma no ano de
2003. trabalho com música diariamente, aulas de instrumento, técnica vocal, canto coral e educação
musical na pré-escola.
s) Formação litúrgica: de ministro da Eucaristia; participação de 3 Lareiras; participação em
encontros vocacionais. Música: toco violão e acordeon; cantei em coral.
t) Cursos específicos de liturgia não fiz, mas participei muito de todos os encontros que pudesse
ir, ligados à catequese, pastorais, foranias, assembléia. Tudo começou nas escolas paroquiais. Procuro
ler muito. Quanto à formação musical acho que é familiar: tenho irmãos que tocam instrumentos,
ajudam na liturgia e por gostar de cantar, hoje por exemplo, trouxe minha filha, dois sobrinhos que
atuam no CLJ e já nos ajudam. Está no sangue, no espírito.
u) Vários cursos já fiz.
A música na vida pessoal
5. O que significa a música para você?
a) Por ser empresário e viver no corre-corre do dia-a-dia, a música alivia os meus pensamentos e
me dá paz;
b) A música para mim é cantar a vida, enfim é a vida.
c) Música para mim é tudo. Sem música não saberia viver.
d) A música para mim é uma forma de expressar o estado de espírito em que estamos.
e) A música da Igreja para mim é a minha vida, é o que me sustenta, me alimenta como ser
humano, é tudo. Tenho certeza que através da música estou levando o amor de Jesus Cristo a cada ser
humano que busca o caminho verdadeiro. E como eu gostaria que todos sentissem o que eu sinto
quando eu canto. Me sinto realizado; me sinto no mundo sem pecado, sem sofrimento. Me sinto na
celebração cantando como se aquelas pessoas que ali estão, foram privilegiadas de estarem fazendo
parte do amor do Senhor.
f) Não vivo da música mas sem ela não vivo. Gosto. É meu esporte. Principalmente cantos
religiosos que fale da família de Deus.
g) Significa alegria, oração, louvação, contato com Deus porque me faz ficar em paz. Gosto das
letras.
h) Adoro ouvir música. Quando posso sempre estou ouvindo. Ela me tranqüiliza quando preciso.
Quando estou feliz ela me alegra mais ainda.
i) Para mim, música significa “vida”. Cantar é viver. A melodia em si nos faz meditar e nos
encontrar com o nosso interior e com Deus.
j) A música para mim significa tudo, pois tudo é música; os sentimentos humanos são música, o
choro, riso, bocejo, tudo é música! A natureza é sem dúvida uma melodia embalada pelo ritmo do
vento. E como dizer que o canto dos pássaros, o grito gorila e o singelo miado do gato não é música.
Tarefa essa impossível, porque tudo que nos cerca e nós, somos música.
k) Música para mim é a mais pura expressão de sentimentos. Através dela nos comunicamos,
refletimos, voamos através dos nossos sonhos e desejos; é através dela que chegamos diretamente ao
coração. Além de gostar muito de música, muitas vezes me amparo nela; fujo; serve de refúgio para
106

determinados momentos; ela desencadeia minha sensibilidade, romantismo e dependendo da melodia


entendo que naquele momento entendo que era tudo o que precisava ouvir, me identificando nos
problemas e nas superações. Acredito que a escolha certa faz toda a diferença. Tenho gravado na
memória momentos especiais em que a música fez toda a diferença. Quando ouço a música (volto) me
transporto para aquele momento ou para aquela pessoa, e também cada música marca um momento da
vida. A música “família” me machucava ouvir quando estava em processo de separação.
l) Já pensou o que seria de nós, seres humanos, se não houvesse a música? Não só nas horas de
diversão, mas também, no luto, a música exerce papel fundamental. Pois, tem o poder de elevar o
nosso estado de espírito. A música tem o poder de nos transformar; de transportar nossos pensamentos
para lugares fabulosos. Se estiver plagiando alguém, desculpem-me, pois não lembro se já afirmaram
aquilo que irei dizer agora: para mim, a música é a alma da vida.
m) A música significa alegria, descontração, relaxamento; é a verdadeira expressão dos
sentimentos.
n) Música significa dar vida à própria vida.
o) A música pra mim representa a alegria, me anima, tira o stress e é um momento de muita
importância na minha vida.
p) A sonoridade que damos para as palavras, a melodia que nós compomos para dar ritmo às
palavras.
q) Música significa o poder da transformação.
r) A maior de todas as artes, a linguagem da emoção, é o coração da vida, é o reflexo de Deus e
sua perfeição, seu amor, sua bondade!
s) Para mim música é vida, tanto cantos litúrgicos como outros cantos profanos (sertanejos,
gauchescas, etc).
t) A música é vida, alegria, é saúde. É Deus que alegra, purifica fortifica a vida, é luz.
u) A música é: alegrias, prazer, oração, vida.

6. Que tipo de música você mais ouve? Por que? O que mais gosta na música?
a) Gosto muito das músicas e mensagens de Fabio de Melo e Jorge Trevisol. Os CDs deles nunca
faltam no meu carro;
b) Vários, bem animada e alegre. Porque dá uma nova visão da vida, de Deus e de nossas
culturas e de nós mesmos. O que mais gosto da mensagem que traz num todo e do ritmo adequado
com o momento.
c) Gosto de todo tipo de música; músicas alegres para me sentir bem. O que eu mais gosto é das
letras que falam de amor.
d) Tenho escutado muito “Rosa de Saron” e outros grupos americanos, com ritmo musical
saudável pois o que mais aprecio nas músicas são as letras.
e) A mais de 12 anos eu só procuro escutar músicas católicas, músicas litúrgicas, músicas que me
passem paz, amor e harmonia para com Deus. Porque a partir do momento que Jesus Cristo entrou em
minha vida mostrando esse caminho maravilhoso de o seguir, comecei a separar o que é de Deus e o
que é do Encardido, e comecei a viver apenas o que é do caminho do Senhor. Gosto na música católica
a paz, o amor, a vida, a partilha, o perdão que impera em cada ser humano, mas acima de tudo a
grandeza do amor de Jesus Cristo a cada um de nós, isto é, maravilhoso!!!
f) Músicas religiosas porque fala da família de Deus, da natureza e nos ensina a caminhar e
seguir a Cristo.
g) Gosto de ouvir músicas católicas, sertanejas. Me faz bem.
h) Ouço todas. Cada uma tem um significado só dela, cada uma para um momento, do
significado que ela tem e do que ela representa.
i) Músicas que falem uma linguagem com um bom sentido; músicas vocacionais, instrumentais,
que expressam a vida do povo.
j) O belo poder que a música tem de nos fazer sonhar, de nos levar a dimensões até então nunca
alcançadas. A música é um poder que Deus concedeu a cada um de nós ou melhor para todas as suas
criaturas. Ouço mais músicas sacras.
k) …
107

l) Aprecio muito a letra da música e o seu ritmo. Quanto ao gênero musical que costumo ouvir,
varia bastante. Porém, minha preferência, recai sobre as músicas religiosas, sertanejas, gaúchas raízes
e bandinhas (estas, de tempos para cá, tenho ouvido pouco).
m) Músicas litúrgicas, cantos gregorianos, músicas para relaxar, sertanejas e moda de viola.
Algumas eu medito; outras eu relaxo e outras danço para descontrair um pouco; outras lembro o tempo
de criança. O que mais gosto na música é a mensagem que ela traz para nossa vivência.
n) Sertaneja. Porque fala das raízes e os princípios da vida. Mais gosto na música é a melodia
bem traçada.
o) Gosto de música sertaneja e bandinhas. São as que mais ouço normalmente. Gosto de aprender
os “solos” principalmente de violão e aprender novas melodias.
p) Música que além do ritmo traga mensagens de paz e de amor.
q) Todo tipo, desde que seja bem executada. Gosto mais melodia e texto.
r) Ouço um pouco de tudo, mas gosto de música que de alguma forma faça com que nossos
sentimentos aflorem, que sua letra nos traga algum tipo de aprendizado, e que no seu conjunto
harmonia, melodia e ritmo toque nosso coração e desperte alguma reação: entusiasmo, alegria,
reflexão, admiração, melancolia, festa, saudade, emoção, euforia, aquela que nos faz bem, que nos faz
sentir humanos.
s) Ouço mais música sacra e sertaneja. Música sacra me deixa serena, alegre e feliz e me acalma.
Gosto na música o ritmo que seja alegre e não muito lento, mais animado.
t) Eu gosto de vários tipos de música: religiosa, música popular, gauchescas. Eu gosto de ouvir e
cantar. Em minha casa uso muito som religioso, acompanho as missas através da TV.
u) Gosto de todo o tipo, mas prefiro sertaneja (música raiz). A letra da música é o que mais
chama a atenção.

7. Você se apega mais ao texto ou ao ritmo e à melodia? Fale sobre isso.


a) Na maioria das vezes tem que haver o conjunto: letra que traz algo para as nossas vidas com
música agradável. Ali sim emociona.
b) Letra e melodia
c) Se o ritmo não for bom, a letra também não tem graça. O bom é quando os dois se encaixam.
d) Quando uma música é saudável, tudo compõe para o sucesso. Tento me apegar mais ao texto
(letra) para após “entrar na melodia”.
e) Aos dois. Tem que ter harmonia e sempre em sintonia com a celebração, a missa,a o tempo
litúrgico, e ao momento da oração. Tudo é um conjunto, tem que andar junto. Porque a música e a
liturgia cantada e a Palavra de Deus sendo transmitida, colocada dentro do coração de cada pessoa que
a vem buscar e levá-la para dentro de sua casa, da sua família, para seus filhos o valor da palavra de
Jesus Cristo, para não cair nas ciladas do Encardido, encardido que eu falo se ainda não entenderam é
o Demônio, que este (mundo) ou é as pessoas que não perceberam que tem músicas com letras
horríveis, e melodias lindas, iludindo assim, levando os nossos jovens , a nossa família para os
caminhos da perdição. Não podemos dar brechas para o mal. Precisamos tocar o coração de cada
católico, fazer com que assuma a sua posição como católico, cristão e em seguida dos ensinamentos de
Jesus Cristo.
f) Acho que as duas são magníficas. E quando se juntam então nem se fala; chega arrepiar e sobe
a adrenalina.
g) Nas duas coisas.
h) Dos dois. Minhas músicas preferidas junta os dois que eu gosto. Para ser boa a música ela tem
que ser completa, não adianta ter o ritmo e a melodia boa se não tem letra boa e vice-versa.
i) O texto e a melodia devem ser interessantes e andar juntos. Uma boa melodia enriquece o
texto e vice-versa.
j) Penso que ao conjunto para tentar compreender seu sentido por completo e não fragmentar em
partes senão corremos o risco de fazer de uma música de glorificação uma música triste, sem “vida”
fazendo com que a mesma perca o seu verdadeiro intuito.
k) …
l) Não tenho muita clareza sobre essa questão. Creio que aprecio tanto o texto como a música
em si. Recuperar a resposta da questão anterior, talvez ajuda-nos: religiosa (texto); sertanejas (ritmo);
gaúchas raízes (texto); bandinhas (ritmo).
108

m) No texto; é preciso que tenha sentido a sua mensagem (que eu aprenda com sua mensagem).
n) No ritmo e na melodia, depois de aprender o texto, pois a música será perfeita se as três coisas
andarem juntas.
o) Acredito que a música para ser considerada “boa” tem que ser um conjunto. Tem que haver
um texto bem produzido, um ritmo agradável e uma melodia atrativa para que possa expressar o
sentimento que o autor está tentando transmitir.
p) No texto pois quero que o texto transmita uma mensagem e toque o coração das pessoas e que
através da melodia as palavras digam o que elas tem pra dizer. E com ritmo e música é mais fácil
chegar às pessoas do que só com palavras. Ocorre maior sensibilidade com a sonoridade das palavras e
músicas.
q) São dois momentos: a escuta da melodia e a avaliação do texto.
r) Pra mim deve ser um conjunto, a letra deve conter em determinados casos, espiritualidade; em
outros criatividade, senso crítico, sabedoria, deve nos interessar e fazer pensar. Já o ritmo e melodia
devem sintonizados, pois eles é que vão dar o colorido, e nos entusiasmar, emocionar, sem eles não
existiria a música.
s) Me apego ao ritmo e à melodia, e o texto pois este precisa nos trazer uma mensagem e que nos
toque o coração deixando o nosso dia-a-dia melhor.
t) Sou muito ligada ao texto das músicas pois muitas são verdadeiras orações, poesias que,
através de suas letras trazem mensagem de vida espiritual, de paz, amor, doação, perdão. Quanto à
melodia é importante e fundamental que as letras tenham uma melodia ideal, alegre e de acordo com o
momento. Quem canta reza duas vezes. Por isso cantar tendo letra e melodia em harmonia é tudo de
bom e só eleva nosso coração.
u) O texto ajuda, mas o ritmo e a melodia é o que faz o sucesso. Não adianta o texto ser bom se o
ritmo não contagia.

Música e canto na liturgia cristã


8. Na tua opinião, qual a importância do canto e da música nos momentos celebrativos?
a) Justamente foi o que me levou ao grupo de cantos, por achar nossas celebrações frias e
mecânicas. Essa é a importância da música nas celebrações: ela traz vida e espiritualidade.
b) Complementa de um modo alegre e expressivo o assunto em si.
c) Na liturgia os cantos têm o seu lugar. Sem canto não há liturgia e também os cantos animam
muito as missas.
d) A música é de suma importância para as celebrações, uma vez que “todas” as pessoas (sem
exceção) precisam ser dinamicamente “resgatadas” para Deus; o canto na celebração motiva para tal.
e) Importantíssimo; é onde conseguimos fazer a transformação do coração de pedra de cada
pessoa para um coração mais humano e fraterno, tornando assim a vida das pessoas mais felizes, para
terem força para unir sua família e a amar cada vez mais o seu irmão que tanto precisa.
f) Ele preenche o espaço vazio nas celebrações e traz alegrias e anima aos participantes.
g) O canto é muito importante nas celebrações, desde que tenha uma ligação certa.
h) Deixa a missa mais alegre. Anima e até a gente presta mais atenção à música quase do que as
leituras.
i) Na celebração o canto e a música nos fazem entrar em sintonia com Deus, expressar o que
sentimos através do canto é abrir o coração para Deus e automaticamente para os irmãos.
j) A importância da música nos momentos celebrativos é que ela possa fazer com que nos
“liguemos” mais facilmente ao transcendente. Podemos dizer que a importância da música é a mesma
que a de uma ponte; uma ponte onde nós e o mistério; ela precisa fazer com que aos poucos vamos
entendendo, compreendendo o sentido do mistério e assim ir revelando-nos o próprio mistério.
Todavia não o mistério por completo para que tenhamos sempre um “gosto de quero mais”.
k) Os cantos litúrgicos precisam tocar as pessoas para os problemas do dia a dia; eles são
instrumentos que (agem) ajudam a expressar tudo de bom que podemos ser. Então bem escolhidos e
apropriado ao tema da celebração são de grande valia.
l) Como disse anteriormente, a música/canto é a alma da vida; é aquilo que nos move, que nos
impulsiona. Creio que a música/canto, se preparados bem (cantos adequados), possuem a mesma
importância do rito. A música/canto na liturgia tem a função de ajudar a assembléia a tomar parte da
celebração e ainda, tem o poder de nos re-ligar com o transcendente. Para tanto, a equipe de canto
109

deve ter o cuidado para não cair na tentação de fazer show (cantarem sozinhos), mas ajudar a
assembléia a cantar a vida.
m) A música é a motivação e faz com que este momento seja mais vivido e participado; é sentir-
se mais próximo de Deus e em sintonia com as pessoas que interagimos.
n) O canto é que dá vida em qualquer ambiente celebrativo, com isso fazemos coma mais
animação, tornando as celebrações mais alegres.
o) Quando os cantos são bons, bem escolhidos e bem cantados a celebração fica mais bonita e
agradável. Os cantos representam a alegria e a motivação para muitas pessoas. Por isso a importância
de qualificar cada vez mais os cantos litúrgicos.
p) A celebração se torna mais viva, valoriza o silêncio onde a pessoa se concentra mais na oração
pessoal. Enquanto se canta se reza.
q) A música faz parte da liturgia. Também é uma forma de rezar tornando a celebração mais
animada e participativa.
r) Como diz o ditado “quem canta reza duas vezes”, e a música através do canto ou mesmo
instrumentalmente trabalha a nossa sensibilidade, expressa o que sentimos, desejamos. Acredito que
seja uma ligação direta com Deus.
s) Nos momentos celebrativos, a música e o canto são importantes mas precisam também fechar
um pouco com as leituras, Evangelho e salmo.
t) O canto é fundamental nas celebrações, é necessário e que bom que sempre tem nas
comunidades pessoas que nos ajudam a melhorar e adaptar os cantos certos nos momentos certos. A
música ajuda na nossa participação e oração.
u) É de suma importância. É a mesma coisa de ir numa festa de aniversario e esquecer o bolo.

9. O que os cantos litúrgicos precisam dizer? Que conteúdo devem expressar?


a) A maioria dos cantos litúrgicos devem sempre respeitar a evolução do ritual da celebração,
mas que levem aos fiéis a emoção da fé, a emoção de crermos no Cristo, a emoção do amor.
b) Aquilo que às vezes não entendemos em palavras. Porque nos servem de um consolo, ânimo.
Deve expressar Deus e a vida; alegria e desejo de transformação. O Espírito Santo em sintonia
conosco cantando em nós.
c) Os cantos litúrgicos devem falar mais da união entre as famílias.
d) Devem, de acordo com o momento da celebração, expressar o real sentimento do povo, como
pequenez, alegria, esperança ou amor.
e) Eu não me preocupo com isso, porque o Espírito Santo vai transmitindo as pessoas que fazem
parte do Ministério da música o que nós devemos tocar a cada momento da liturgia, para a pessoa que
se sente perdida, sem direção, se sinta chamada a voltar para o caminho do Senhor.
f) Direcionadas a Palavra de Deus e do mundo das famílias religiosas não fugindo das palavras
que Deus nos ensina.
g) Que fale em Deus, que expresse paz, coisas boas, para tocar o coração.
h) Falar de Deus; dizer tudo o que só com a leitura não se pode alcançar. Que a música junto com
a palavra tem um poder muito maior.
i) Precisam acima de tudo louvar o criador, agradecer pela vida. Neste ponto deve-se insistir
muito pois pede-se mais do que se agradece.
j) O canto litúrgico deve dizer: 1º) o sentimento que a comunidade sente por aquilo que se está
vivendo (alegria, tristeza). 2º) precisa passar também um “resumo” da liturgia para que não fique fora
de nexo. 3º) o momento que se está; Ex.: se é a tardinha, não cantar cantos que enfoquem o
amanhecer… 4º) que o canto transmita a realidade da comunidade.
k) …
l) No meu entender, há uma infinidade de cantos religiosos. Contudo, nem todos cumprem com
a função de ajudar o povo a rezar; a dialogar com Deus. Há cantos que possuem uma letra bonita, até
mesmo, teológica, mas com melodias deprimentes; há, também, aqueles cantos bem animados, com
melodia agradável, mas sua letra não nos conduz a viver o mistério celebrado. Esses últimos, talvez,
sejam produzidos por pessoas que não possuem conhecimento teológico ou então, se possuem, não a
escreveram com o objetivo de ajudar o povo a rezar, mas de comercializar a sua música (“cantar Deus
dá dinheiro”). Para mim, a letra e a melodia devem ser adequadas (ex.: se o canto for de pedido de
perdão, a melodia deve ser mais reflexiva; se for de glória, mais animada...).
110

m) Precisam fazer com que ao cantar as pessoas se harmonizem e motivem-se a participar da


celebração.
n) Penso que os cantos litúrgicos precisam ajudar a entender a mensagem da liturgia,
expressando conteúdos que venham de encontro à mesma.
o) Os cantos litúrgicos devem expressar o sentimento de cada rito litúrgico; deve conduzir a
pessoa ao encontro pessoal e comunitário com Deus e com os irmãos.
p) Caminho que parte da beleza das coisas criadas por Deus Trindade, origem e fonte de toda
beleza.
q) Expressar o verdadeiro sentimento vindo de cada ser humano cantando a vida e as maravilhas
da presença de Deus.
r) Acredito que seu conteúdo deve conter a verdade. Trazer uma mensagem para cada
circunstância, como entusiasmo, se necessário, reflexão, arrependimento, alegria, agradecimento,
perdão, devem mostrar idéias e objetivos que tornem clara a nossa fé, nosso comprometimento com
Deus e com o próximo.
s) Tocar o nosso coração e a nossa alma e do povo presente, e expressar alegria e que os
presentes possam cantar junto e ter participação.
t) Os cantos devem estar de acordo com a liturgia diária, acompanhar os temas a serem
celebrados. Por ex.: cantos marianos quando festa de N. Senhora.
u) Os cantos devem dizer aquilo que a gente está celebrando. Eles devem ser “a celebração”.

10. Qual é, na tua opinião, a principal função dos cantores e instrumentistas nas celebrações
litúrgicas? Como devem desempenhar isso?
a) Já frisei no parágrafo anterior, levar a emoção da fé; cativar as pessoas e não permitir que
nossas celebrações sejam frias e monótonas.
b) Convidar, animar, dar firmeza ao que se vai cantar, fazer a assembléia participar nas
celebrações, estar unido com o assunto. Ex.: Evangelho, leituras, etc. Devem desempenhar
aprendendo, ensaiando e pondo em prática.
c) A função de quem canta e de quem toca é de animar a celebração deixando mais bonita e
incentivar as pessoas a soltarem a voz e cantar muito. Devemos convidar as pessoas a participarem
mais.
d) A principal função dos “músicos” nas celebrações é animar o povo que se encontra, em
termos, abandonado em um mundo de superficialidades. Portanto, devem desempenhar um papel de
“cordeiros no meio de lobos”.
e) Passar a vida. Jesus disse: eu vim para que todos tenham vida e vida em abundância.
Investindo, trabalhando cada momento da celebração, do grupo de oração e na oração do Santo terço.
f) Animar os participantes, agradar a todos e passando a palavra de Deus, através do canto.
g) Tem que ter uma ligação entre todos os que participam das celebrações.
h) Devem animar a todos e também emocionar, com muita alegria.
i) Os cantores e instrumentistas devem animar as celebrações de modo que a assembléia possa
acompanhar, devem fazer com simplicidade e muito amor.
j) Penso que seja a função dos animadores, pessoas que fazem o povo viver intensamente o
mistério celebrado. O papel desempenhado por eles deve ser que eles estejam a serviço do
canto/liturgia e não o canto/liturgia estejam a seu serviço assim conseguindo passar a mensagem
contida no canto.
k) Acredito que a “animação” seria de tentar sensibilizar as pessoas e não fazer o show. A música
tocada com sentimento da alma, passando para as pessoas energia, vontade de cantar, se expressar ou
mesmo só ouvir e refletir. Isso ajuda a fortalecer a fé.
l) Ajudar a assembléia a cantar. Ninguém vai a Igreja para assistir a um show, mas para rezar.
Caso eu quiser assistir a um show, não irei à Igreja, mas ao clube, até porque lá poderei dançar. Ao ir
à Igreja meu objetivo é rezar e espero que os cantos me ajudem a realizar tal objetivo. Para tanto, os
cantos, além de serem ensaiados no início da celebração, devem ser conhecidos. Caso algum seja
novo, o que é bom, o povo deve ter a letra em mãos (folha de cantos, projeção).
m) Animação (sem a música a vida não flui e a fé também não). Devem desempenhar com
simplicidade e harmonia.
111

n) Ajudar com o instrumento e o canto fazer as celebrações mais bonitas e animadas. Assim me
sinto feliz porque posso passar um pouco do que eu sei para outras pessoas. Para desempenhar essa
função é preciso muita alegria, disponibilidade e dedicação.
o) Penso que os cantores não podem cantar para eles, não podem se sobressair , mas sim tem que
animar a assembléia a cantar e a celebrar esse momento importante. Além disso, quando há
instrumentista, tem que ter o cuidado de não elevar muito o volume do instrumento para não cobrir as
vozes e também escolher o tom adequado para que todos possam cantar.
p) Venha contribuir para o entendimento da mensagem; valoriza mais a celebração, dá mais vida,
se torna mais atrativa, transporta os sentimentos da pessoa, se relacionar com o tema do dia
promovendo a participação, o engajamento, a sensibilidade.
q) Fazer com que o canto e a música fiquem em harmonia passando assim uma verdadeira
animação.
r) Contribuir para o embelezamento das celebrações litúrgicas, fazendo-se parte integrante da
assembléia, de forma humilde e bela, trazendo encantamento e uma forma expressiva de comunicar-se
com Deus.
s) Trazer animação às celebrações e ter a colaboração de todos e com alegria e humildade estar
sempre feliz diante dos presentes.
t) Acho que tem a função de concentração, meditação, orientação nas celebrações e através do
canto fazer com que todos os participantes celebrem, pois os instrumentos “falam sobre a motivação
da interiorização encontro com Deus e comigo mesmo”, faz despertar para um encontro e estar em
sintonia com o outro e com Deus.
u) A função dos cantores e instrumentistas na celebração é animar. Fazer com que todos possam
participar alegres na celebração. Devem fazer isso com bons cantos, ensaios muitos, organização. Não
devem chamar a atenção na celebração, mas fazer com que todos prestem atenção.

11. O canto e a música te ajudam a rezar? Fale de um canto que te ajudou a compreender Deus ou te
fez experimentar o jeito de ser d´Ele.
a) … (juntou à resposta da próxima questão).
b) Sim, e como! Às vezes, quando estou cantando, sinto algo diferente, uma emoção muito forte.
É como se cantasse com o coração. Às vezes as pessoas me falam que aquela canção as tocou tão
profundamente, que precisavam escutar a mesma. Foi a música: não sei como aconteceu, quando
acordei eu já era eu. Não sei se foi por encanto, nem sei se mereço tanto, ao meu Pai eu agradeço, o
começo da minha vida, etc… Eu me apaixonei por Jesus e senti vontade de aprender a tocar um
instrumento. Foi aí que aprendi tocar violão. Quando um rapaz do grupo de jovens da comunidade
onde eu morava cantou a canção de que escrevi antes. A canção que me fez experimentar Deus é
aquela: “Deus cantor” (Pe. Zezinho). Eu sinto ele igual a mim e quando canto creio que ele canta
comigo. E a canção é: “eu acredito que Deus existe, fez o mundo e tem amor. Eu acredito que Deus
faz versos e canções que os anjos cantam lá no céu. Se Deus existe ele é amor. Se Deus existe ele é
cantor”. Etc. Ele é o grande maestro. Se olharmos, tudo inspira Deus. E Deus é alegria, amor, vida.
c) Sim, os cantos me ajudam a rezar muito. Quando canto me sinto em paz. Um canto que me
ajudou a conhecer Deus foi “Um coração para amar”. Me sinto em paz quando canto.
d) Acredito que rezar é uma coisa, e cantar outra. Entretanto cantar aproxima a nossa alma e o
nosso coração a Deus. O canto que mais me marcou até hoje foram dois: “Sacramento da comunhão”
(Diácono Nelsinho Correa) e “Quem me segurou foi Deus”.
e) O canto que mais me chamou a seguir e a viver me dando força para superar minhas fraquezas
foi “ninguém te ama como eu”. Este canto revela o tamanho do amor que Jesus Cristo tem para com
cada um de nós: isto é inexplicável; é quase impossível descrever. Eu rezo cantando. A minha oração é
a música. Eu vivo o que eu canto e não poderia ser de outra forma.
f) Ajuda muito. É a maneira de soltar da garganta o que você tem a dizer; quase como gritando
para desabafar. Canto: “Seu nome é Jesus Cristo e passa fome, e passa pela boca dos famintos. Entre
nós está e não o conhecemos. Entre nós está e nós o desprezamos”. Este canto me marcou muito pela
letra e pelo momento que o ouvi dentro do Cursilho. Foi para mim um ensinamento muito forte, que
agora me inspira e me faz levar a Palavra de Deus a todos os irmãos necessitados de pão e fé: através
dos cantos e outras maneiras.
g) Ajudam muito. O canto “Maria de Nazaré” é muito importante.
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h) Ajuda. Ele emociona e te faz compreender melhor. Agora não me lembro de nenhum.
i) O canto e a música são as mais belas orações que podemos fazer a Deus. Várias vezes ao
cantar me senti leve; é como se Deus estivesse cantando junto comigo.
j) Quando bem preparados, sim. Um canto que me fez compreender a Deus foi escrito pelo Pe.
Zezinho, que diz: “um dia uma criança me parou, olhou-me nos meus olhos a sorrir, caneta e papel em
sua mão, tarefa escolar para cumprir… o que é preciso para ser feliz?” E na resposta o canto diz:
“amar como Jesus amou, sonhar como Jesus sonhou…”. A mesma pergunta ecoa em pleno século
XXI, porém muitas vezes o problema não está na pergunta, mas sim na resposta que damos a ela.
k) O canto me ajuda a rezar, conversar com Deus. “Pescador de homens” é uma música que me
emociona e fortalece a minha fé, me dá amparo, segurança, me faz sentir que não estou só.
l) Sim. Um dos muitos cantos que me ajudam a rezar e compreender o amor de Deus é a canção
de Jorge Trevisol, intitulada “certas coisas prá dizer”. “Tenho, enfim, outra coisa, que eu não posso
esquecer, mesmo sem ter certeza, mas eu prefiro dizer: o que eu penso a respeito da vida, é que um dia
ela vai perguntar, o que é que eu fiz com meus sonhos; e qual foi o meu jeito de amar; o que é que eu
deixei pras pessoas que no mundo vão continuar, prá que eu não tenha vivido à toa e que não seja tarde
de mais”. Toda a canção, mas especialmente, o trecho supracitado, ajuda-me a compreender o real
sentido da vida. Para mim, o sentido da vida está na capacidade de, assim como Jesus Cristo, amar
sem reservas.
m) Sim. “Quando quero falar com Deus” (Roberto Carlos).
n) Com certeza o canto e a música me ajudam a rezar. “Ide anunciar minha paz; ide sem olhar
para trás. Estarei contigo e serei vossa luz na missão”. Sendo filho de Deus, chamado e escolhido, fui
tocado a seguir e trabalhar na missão a mim confiada.
o) O canto e a música me ajudam a rezar. Lembro-me de um canto que marcou muito na minha
vida. É uma canção do Jorge Trevisol – “O mesmo rosto”.
p) Ajudam, pois todos os dias deveríamos ouvir um pouco de música ou ler uma boa poesia.
Todos, quando transmitem algo que te faça feliz, que possa entender o que Deus pede de nós.
q) Sim. Rastros na areia. Esse canto ensina que Deus está sempre ao nosso lado, mesmo nos
momentos mais difíceis.
r) Com certeza. Deus é a música da existência e sempre que canto penso em Deus. A música é
feita de sons e o universo, a natureza criada por Deus é repleta deles. A música é a linguagem da
emoção, da comunicação do amor, e Deus é tudo isso. São infinitas as músicas que nos comunicam
com Deus, mas uma em especial para mim é a versão cantada da Oração de São Francisco, pois é um
desejo que tenho em minha vida e gostaria que todos pensassem da forma em que é colocada a letra da
música e oração.
s) Me ajudam a rezar e a pensar na vida e nos problemas. Adoro ouvir e cantar “Águia pequena”.
Me toca fundo a letra, o que diz e a mensagem que traz. Outra é a “Oração da Família” que diz tudo e
mais um pouco; faz bem à mente e ao coração.
t) Eu rezo muito mais quando eu canto. Participar da liturgia sem cantar não tem sentido para
mim. Rezar e cantar caminham juntos. Tantas as músicas que me ajudam a compreender Deus que eu
não saberia nomeá-las, mas, “Amar como Jesus amou” – Pe. Zezinho; “Deus está aqui neste
momento” e tantas, tantas. Deus está em todas as orações, canções. Aprendi a ver Deus no irmão
através da canção “Deus é Pai, Bondade, Vida” – conheci melhor Deus na alegria do amor na canção.
u) São eles que me fazem verdadeiramente rezar. O canto que me faz compreender Deus, um
deles é “Águia Pequena”.

No horizonte da esperança
12. Se você tivesse um sonho onde o mundo foi transformado pela música: como seria esse mundo?
Qual música teria feito essa transformação?
a) “Certas coisas pra dizer” (Jorge Trevisol): não é uma música litúrgica , mas a mensagem dela
é muito profunda; nos leva a pensar sobre nossa vida, de que maneira nós a levamos. “O que é que eu
deixei pras pessoas que no mundo vão continuar, para que eu não tenha vivido à toa”. Este canto
poderia transformar o mundo!! Com certeza se as pessoas ouvissem mais música elas não matariam
umas às outras.
b) Alegre, com muito amor e harmonia entre as pessoas, onde todos seriam iguais, e caminhariam
no mesmo objetivo: vida plena, “Jesus”. A música que faria a transformação seria a do Roberto
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Carlos: “Guerra de meninos”. Parece estranho falar da guerra mas é uma guerra de paz e Jesus seria
luz em tudo e em todos.
c) O mundo seria um jardim de flores lindas e coloridas; e a música seriam todas as que falam da
vida, do amor, da humanidade, dos animais e de todos os seres.
d) Seria um mundo que viveria mais através (movido) pelos sentimentos. A música que teria feito
essa transformação seria: “andei por onde não poderia andar, e vi o que não queria ver, desprezei o
bem que aprendi, não lembrei o que senti quando Cristo segurou as minhas mãos. A tristeza foi o
prêmio pela fuga da vitória reservada para mim. Hoje sei o que sofri, por amor me arrependi e dando
graças volto a olhar para o Pai! Te amo, me amas, te louvo, me curas, te chamo, me escutas, me
entrego, me acolhes”.
e) Maravilhoso. A música seria com certeza “ninguém te ama como eu”.
f) “Utopia”: onde os pais e os filhos cantam juntos ao entardecer. É um mundo que falta muita
coisa, mas o principal não faltava, que era o sorriso no olhar, e a união entre as famílias. “Oração da
Família”: se todas as famílias seguissem e vivessem esta letra não teria desunião entre elas e este
mundo transformado seria de paz e amor e canções.
g) Seria um mundo sem ganância, inveja, calúnia. O canto seria “Cristo é a felicidade” (andar
sem temor pelo mundo).
h) Todos acreditavam em Deus e conheciam ele, as maravilhas que ele fez, todos viveriam em
paz, acabariam as drogas, teria mais saúde e recursos públicos para ter a saúde. Teria saúde pública,
saberiam aproveitar as oportunidades, viver melhor, saber perdoar. “Epitáfio” – Titãs: Devia ter amado
mais, até chorado mais, ter visto o sol nascer…
i) Em meu sonho, não haveria tristeza. Haveria pessoas vivendo como Cristo viveu. Pessoas se
dando as mãos para superar dificuldades. A música “Pai que criastes o céu” é uma entre tantas que me
emocionam quando escuto ou ajudo a cantar e me anima nesta caminhada me renova.
j) Certamente um mundo mais alegre, mais irmão, um mundo que por meio da música tirariam
um tempo para sentar em rodas, para cantar, brincar, sorrir, certamente um mundo com um grande
calor humano; um mundo de coração sempre aberto e disponível, um mundo de paz, um lugar de uma
só família, família essa formada por pessoas que se amam, se ajudam, se respeitam. Seria um mundo
onde não haveria diferenças mas sim igualdades, ajuda mútua, solidariedade. Um local justo para
todos onde cada um se sentisse em casa, mesmo fora dela, pois o mundo seria de todos e todos seriam
do mundo. Um mundo as pessoas conseguissem entrar no tempo do outro para caminhar juntos,
crianças e idosos, pais e filhos. A música transformadora penso que poderia ser “um jovem galileu”.
k) É difícil responder, se tratando de música porque cada uma marca determinada fase da vida.
Acho que a música “pais e filhos” – Renato Russo trata de um tema forte e me toca, porque trata do
amor como bem maior, apesar das perdas e sofrimentos; o amor pelo outro de maneira incondicional.
E também como boa romântica que sou, gosto da música de Roberto Carlos “é preciso saber viver”.
l) Seria um mundo de irmãos, onde a vivência dos princípios evangélicos fosse o primeiro e
único objetivo de todo ser humano. Neste mundo não haverá desigualdades, pois o egoísmo, o
individualismo, a inveja, a injustiça... teriam dado lugar ao amor. A música responsável por essa
transformação é a canção “meu catecismo”, do Pe. Zezinho: “se acreditar em Deus for esperar um
mundo diferente; lá onde não há ricos por demais e onde não há mendigos; lá onde ninguém pisa no
irmão e todo irmão se sente gente; lá onde o cidadão vai onde quer e sem correr perigos. Se acreditar
em Deus for apostar que o mundo tem conserto, que o ser humano é bom e, mesmo se ele errar, ainda
vale a pena; se crer em Deus é crer num Pai que nos criou e apostou em nós, então pode escrever que
eu assino. Eu creio em Deus porque eu tenho esperança, este é o catecismo que eu ensino”.
m) Este sonho onde o mundo seria transformado pela música, (alegria, amor, paz, igualdade,
compreensão) tudo seria lindo, transformador e harmônico. A música expressa a alegria que está em
nosso coração; ela dá vida aos ambientes. “Quando a gente encontra Deus” (Pe. Zezinho) e outras
muitas que nos trazem mensagens lindas e transformadoras.
n) Se fosse transformado pela música o mundo seria com mais alegria e com a união entre todos
os povos. A música que faria essa transformação seria: “Quando o dia da paz renascer”.
o) Seria um mundo mais humano, igualitário e fraterno, onde as pessoas viveriam em paz e
harmonia. O canto que representa isso é “Utopia” (Quando o dia da paz renascer).
p) (não respondeu)
q) Um mundo de paz, muito amor no coração e um só líder: “Deus”. Epitáfio – Titãs.
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r) Gostaria que as pessoas vivessem felizes, em paz, que houvesse respeito, muita fé e amor a
Deus e ao próximo. Também são muitas músicas que transmitem esse pensamento, uma delas é a
versão em português da canção “Imagine” de John Lennon, interpretada por Fabio Junior. “Imaginar
que o mundo/ Possa viver em paz/ Não há inferno, não há céu/ É só tentar imaginar/ Somente o
firmamento/ Feito apenas pra sonhar. / Pessoas sem fronteiras/ Vivendo pra viver/ Nenhuma dor nem
guerras/ Nada por que morrer/ Haver um deus apenas/ Como é bom imaginar/ Não é loucura nem
sonho/ Além de mim há mais alguém/ Se junte a quem pensa assim também/ Que esse mundo vai ser
um só./ Imaginar que a terra/ Possa ser bem melhor/ Pra permitir sementes/ Sem dividir o chão/
Imaginar a fome/ Dando lugar ao pão./ Não é loucura nem sonho/ Além de mim há mais alguém/ Se
junte a quem pensa assim também/ Que esse mundo vai ser um só”.
s) Um mundo transformado pela música seria só alegria, campos floridos, sem violência, sem
pobreza, todos vivendo com igualdade, sem ódio, rancor, falsidade. Um mundo só de amor. A música
seria “Soleado”: De muito longe vem uma canção. Suavemente como uma oração. E um anjo azul
sobre bruma e véu, vem abrir prá nós os portões do céu.
t) (não respondeu)
u) Meu sonho: tudo seria música. Um canto só. As pessoas se cumprimentariam com um canto.
Se trabalharia cantando. O próprio sofrimento se expressaria por cantos. Não tem uma só, mas várias.
Muitas músicas do Pe. Zezinho. Algumas do Jorge Trevisol. Também não podia faltar aquelas músicas
raiz (Poder de Deus; Sete Palavras; …).
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ANEXO B
Fotos dos Cursos de Canto Litúrgico e Pastoral da Diocese de Vacaria/RS
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ANEXO C
Mapas: Interdiocesanos do RS; Diocese de Vacaria/RS

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