Direito Penal III
Direito Penal III
Direito Penal III
Tema I
Teoria da pena. 1) Conceitos e fins da pena: teorias, os sistemas penais. 2) A individualização da pena:
importância. Individualizações legislativa, judicial e executória. 3) As elementares do crime: definição e
importância. 4) Circunstâncias: circunstância judicial, agravantes e atenuantes, causas especiais de aumento
e de diminuição. 5) A qualificadora: a) Crimes qualificados pelo resultado; b) Diferenças entre qualificadora
e causa especial de aumento de pena. 6) A forma privilegiada.
Notas de Aula1
1. Principiologia
Para ser crime, não é preciso que haja pena privativa de liberdade, ao contrário do
que apregoa parcela minoritária da doutrina (leia-se Luis Flávio Gomes, quando este
sustenta que o uso de entorpecentes não é mais crime). Mesmo que pareça que a Lei de
Introdução ao Código Penal, no artigo 1º, suporte a tese de que só há crime se há
aprisionamento, o conceito de crime não se mede pela natureza da pena. Veja o dispositivo:
“Art 1º Considera-se crime a infração penal que a lei comina pena de reclusão ou
de detenção, quer isoladamente, quer alternativa ou cumulativamente com a pena
de multa; contravenção, a infração penal a que a lei comina, isoladamente, pena de
prisão simples ou de multa, ou ambas. alternativa ou cumulativamente.”
1
Aula ministrada pela professora Cláudia das Graças Mattos de Oliveira Barros, em 15/4/2009.
“(...)
XLVI - a lei regulará a individualização da pena e adotará, entre outras, as
seguintes:
a) privação ou restrição da liberdade;
b) perda de bens;
c) multa;
d) prestação social alternativa;
e) suspensão ou interdição de direitos;
(...)”
“(...)
XLVII - não haverá penas:
a) de morte, salvo em caso de guerra declarada, nos termos do art. 84, XIX;
b) de caráter perpétuo;
c) de trabalhos forçados;
d) de banimento;
e) cruéis;
(...)”
Não sendo possível a aplicação da pena desumana, lato sensu, há que se questionar
sobre a constitucionalidade de alguns institutos modernos, como o regime disciplinar
diferenciado – RDD –, constante do artigo 52 da Lei de Execuções Penais, Lei 7.210/84:
“Art. 52. A prática de fato previsto como crime doloso constitui falta grave e,
quando ocasione subversão da ordem ou disciplina internas, sujeita o preso
provisório, ou condenado, sem prejuízo da sanção penal, ao regime disciplinar
diferenciado, com as seguintes características: (Redação dada pela Lei nº 10.792,
de 1º.12.2003)
I - duração máxima de trezentos e sessenta dias, sem prejuízo de repetição da
sanção por nova falta grave de mesma espécie, até o limite de um sexto da pena
aplicada; (Incluído pela Lei nº 10.792, de 1º.12.2003)
II - recolhimento em cela individual; (Incluído pela Lei nº 10.792, de 1º.12.2003)
III - visitas semanais de duas pessoas, sem contar as crianças, com duração de duas
horas; (Incluído pela Lei nº 10.792, de 1º.12.2003)
IV - o preso terá direito à saída da cela por 2 horas diárias para banho de sol.
(Incluído pela Lei nº 10.792, de 1º.12.2003)
§ 1o O regime disciplinar diferenciado também poderá abrigar presos provisórios
ou condenados, nacionais ou estrangeiros, que apresentem alto risco para a ordem
e a segurança do estabelecimento penal ou da sociedade. (Incluído pela Lei nº
10.792, de 1º.12.2003)
§ 2o Estará igualmente sujeito ao regime disciplinar diferenciado o preso
provisório ou o condenado sob o qual recaiam fundadas suspeitas de envolvimento
ou participação, a qualquer título, em organizações criminosas, quadrilha ou
bando. (Incluído pela Lei nº 10.792, de 1º.12.2003)”
O RDD impõe severas restrições à dignidade da pessoa humana, e por isso só pode
recair sobre presos que causem, enquanto encarcerados, graves desestabilizações do sistema
prisional, colocando em risco a própria dinâmica do seu cumprimento de pena, ou de outros
presos.
Veja: só pode receber imposição de RDD quem tenha cometido, no curso da pena,
fato tipificado como crime doloso e que subverta a ordem ou disciplina interna do sistema
prisional; ou aqueles presos que sejam de altíssimo grau de periculosidade, sobre os quais
hajam fundadas suspeitas de envolvimento com o crime organizado.
O RDD tem sua origem na preocupação em repressão a rebeliões em presídios. A
administração penitenciária já se viu diante de situações tais que, sem as restrições do
regime, seria impossível o controle sobre o sistema, tendo sido emblemática a ocorrência da
rebelião desencadeada por Fernando Beira-Mar, em 2002 – sendo este evento o motivo
“Art. 88. O condenado será alojado em cela individual que conterá dormitório,
aparelho sanitário e lavatório.
Parágrafo único. São requisitos básicos da unidade celular:
a) salubridade do ambiente pela concorrência dos fatores de aeração, insolação e
condicionamento térmico adequado à existência humana;
b) área mínima de 6,00m2 (seis metros quadrados).”
“Trabalho do preso
Art. 39 - O trabalho do preso será sempre remunerado, sendo-lhe garantidos os
benefícios da Previdência Social. (Redação dada pela Lei nº 7.209, de 11.7.1984)”
“Art. 50. Comete falta grave o condenado à pena privativa de liberdade que:
(...)
VI - inobservar os deveres previstos nos incisos II e V, do artigo 39, desta Lei.
(...)”
Mas, como dito, o trabalho é também um direito do preso, eis que é condição da sua
dignidade humana. Inclusive, o trabalho do preso merece remuneração, não inferior a três
quartos de um salário-mínimo vigente, o qual será destinado ao preso ou sua família. E
mais: o trabalho dá direito à remição da pena, como diz o artigo 126 da LEP:
“Artigo 6º
Proibição da escravidão e da servidão
(...)
3. Não constituem trabalhos forçados ou obrigatórios para os efeitos deste artigo:
a) Os trabalhos ou serviços normalmente exigidos de pessoa reclusa em
cumprimento de sentença ou resolução formal expedida pela autoridade judiciária
competente. Tais trabalhos ou serviços devem ser executados sob a vigilância e
“Art. 9º As penas fixadas no art. 6º para os crimes capitulados nos arts. 157, § 3º,
158, § 2º, 159, caput e seus §§ 1º, 2º e 3º, 213, caput e sua combinação com o art.
223, caput e parágrafo único, 214 e sua combinação com o art. 223, caput e
parágrafo único, todos do Código Penal, são acrescidas de metade, respeitado o
limite superior de trinta anos de reclusão, estando a vítima em qualquer das
hipóteses referidas no art. 224 também do Código Penal.”
Este artigo, que tem natureza jurídica de causa de aumento de pena dos crimes ali
apontados, se for aplicado na extorsão mediante seqüestro com resultado morte, por
exemplo, com a vítima se amoldando às circunstâncias do artigo 224 do CP – fazendo
aplicável este artigo 9º, portanto –, aumentará a pena da metade, sendo que a pena deste
crime já é a maior do CP (de vinte e quatro a trinta anos de reclusão). Veja os dispositivos:
“Presunção de violência
Art. 224 - Presume-se a violência, se a vítima: Vide Lei nº 8.072, de 25.7.90
a) não é maior de catorze anos;
b) é alienada ou débil mental, e o agente conhecia esta circunstância;
c) não pode, por qualquer outra causa, oferecer resistência.”
quarenta e cinco anos (limitadas a trinta, pelo patamar máximo global da pena em nosso
sistema). Sendo assim, a escala penal do crime em questão passa a ser de trinta anos, a
mínima, e de trinta anos, a máxima, ou seja, tratar-se-á de uma pena única, tornando
irrelevantes todos os aspectos particulares do caso e do criminoso, na quantificação de sua
pena – e por isso seria inconstitucional, por violar o princípio da individualização da pena
em seu momento legislativo. Assim sinaliza, por exemplo, Alberto Silva Franco.
Na fase judicial da pena, a individualização se manifesta na necessidade de que o
juiz siga, na quantificação da pena, as diretrizes do artigo 59 do CP:
“Fixação da pena
Art. 59 - O juiz, atendendo à culpabilidade, aos antecedentes, à conduta social, à
personalidade do agente, aos motivos, às circunstâncias e conseqüências do crime,
bem como ao comportamento da vítima, estabelecerá, conforme seja necessário e
suficiente para reprovação e prevenção do crime: (Redação dada pela Lei nº 7.209,
de 11.7.1984)
I - as penas aplicáveis dentre as cominadas;(Redação dada pela Lei nº 7.209, de
11.7.1984)
II - a quantidade de pena aplicável, dentro dos limites previstos;(Redação dada
pela Lei nº 7.209, de 11.7.1984)
III - o regime inicial de cumprimento da pena privativa de liberdade;(Redação dada
pela Lei nº 7.209, de 11.7.1984)
IV - a substituição da pena privativa da liberdade aplicada, por outra espécie de
pena, se cabível. (Redação dada pela Lei nº 7.209, de 11.7.1984)”
“Cálculo da pena
Art. 68 - A pena-base será fixada atendendo-se ao critério do art. 59 deste Código;
em seguida serão consideradas as circunstâncias atenuantes e agravantes; por
último, as causas de diminuição e de aumento. (Redação dada pela Lei nº 7.209, de
11.7.1984)
Parágrafo único - No concurso de causas de aumento ou de diminuição previstas
na parte especial, pode o juiz limitar-se a um só aumento ou a uma só diminuição,
prevalecendo, todavia, a causa que mais aumente ou diminua.(Redação dada pela
Lei nº 7.209, de 11.7.1984)”
O sistema trifásico será estudado amiúde adiante, bastando por agora mencionar que
é a mais pura aplicação do princípio da individualização da pena, na fase judicial. É
importante ressaltar, porém, que a pena não pode suplantar a máxima ou ficar abaixo da
mínima, até a segunda fase, a não ser que o legislador assim o queira expressamente,
conforme diz o STJ, na sua súmula 231:
No momento executivo, híbrido, da pena, cada condenado terá a sua pena executada
de acordo com suas características pessoais, especialmente no que tange ao regime de
cumprimento da pena. Esta é a razão fundamental da declaração de inconstitucionalidade
do artigo 2º da Lei de Crimes Hediondos, dispositivo posteriormente alterado para extirpar
A pena não pode suplantar a figura do condenado: apenas ele poderá cumprir seu
ônus criminal. Não se admite que ninguém possa assumir a responsabilidade pelo
cumprimento de pena em nome do condenado, tampouco que se possa cominar pena a
quem não tenha sido o autor da infração.
Na pena de multa, se percebe bem a reverberação da personalidade da pena. A pena
de multa se transforma em dívida de valor, a ser executada como crédito da Fazenda
Pública, mas esta conversão não permite jamais que a família do condenado possa ser
responsabilizada pelo seu pagamento, pois se isso ocorresse seria exatamente a subversão
do princípio da personalidade da pena.
Casos Concretos
Questão 1
Resposta à Questão 1
um sexto, alcançando o patamar de quatro anos e dois meses de reclusão, além de 15 dias-
multa.
Ingressando na terceira fase, deverá a reprimenda ser novamente aumentada em um
terço, em razão da causa especial de aumento acima aludida, de forma a concretizar a
reprimenda em cinco anos, seis meses e vinte dias, além de quinze dias-multa.
O regime inicial para o cumprimento da pena deverá ser o semi-aberto, eis que
incabível o fechado, em se tratando de delitos apenados com detenção.
Para o crime de resistência, pelas mesmas razões acima apontadas, a pena-base deve
ser situada acima do mínimo legal, qual seja, seis meses de detenção. Diante da atenuante,
reduz-se em um sexto, de forma a concretizar a reprimenda final em cinco meses de
detenção.
De acordo com o comando estatuído na parte final do artigo 69 do Código Penal, a
pena reclusiva deverá ser executada antes das penas detentivas.
Não poderá o acusado apelar da sentença em liberdade porque deverão ser
considerados como mais evidentes os motivos cautelares que autorizaram a custódia dele
até este momento, e que se tornam ainda mais fortes diante da prolação de um édito
condenatório.
Por derradeiro, após o trânsito em julgado da sentença condenatória, o nome do réu
precisará ser lançado no rol dos culpados, e o réu deve ser condenado ao pagamento das
custas do processo.
Publique-se, registre-se e intimem-se.
Tema II
Dosimetria I. 1) A dosimetria da pena: a) O processo trifásico previsto no artigo 68 do CP; b) Exame das
circunstâncias judiciais; c) A forma de individualização em caso de concurso de pessoas; d) Questões
controvertidas na doutrina e na jurisprudência.
Notas de Aula2
1. Dosimetria da pena
“Peculato
Art. 312 - Apropriar-se o funcionário público de dinheiro, valor ou qualquer outro
bem móvel, público ou particular, de que tem a posse em razão do cargo, ou
desviá-lo, em proveito próprio ou alheio:
Pena - reclusão, de dois a doze anos, e multa.
(...)”
“Infanticídio
Art. 123 - Matar, sob a influência do estado puerperal, o próprio filho, durante o
parto ou logo após:
Pena - detenção, de dois a seis anos.”
2
Aula ministrada pelo professor Marcus Henrique Pinto Basílio, em 16/4/2009.
“O próprio filho” é elementar do crime, vez que se substituir esta expressão por
“alguém”, nada mais se terá do que uma variante de homicídio.
Circunstâncias, por sua vez, são termos que, se suprimidos, não alteram a natureza
do delito. Veja o furto em repouso noturno, do artigo 155, § 1º, do CP:
“Furto
Art. 155 - Subtrair, para si ou para outrem, coisa alheia móvel:
Pena - reclusão, de um a quatro anos, e multa.
§ 1º - A pena aumenta-se de um terço, se o crime é praticado durante o repouso
noturno.
(...)”
Se não há a prática em repouso noturno, ainda há o mesmo crime de furto, mas sem
o aumento da pena.
Em suma, elementares são componentes do tipo penal, sem as quais o tipo
desaparece, enquanto as circunstâncias são moduladoras da aplicação da pena, servindo
apenas para reduzir ou aumentar a pena, não interferindo na tipificação da conduta.
A relevância desta diferenciação é justamente na aplicação da pena, porque há
circunstâncias que, por vezes, funcionam como elementares do crime, e se assim o forem,
não poderão ser computadas na segunda etapa, sob pena de controverter a vedação ao bis in
idem. Exemplo claro vem no já abordado infanticídio: matar o próprio filho em estado
puerperal é o próprio crime, pelo que a agravante geral que vem prevista no artigo 61, II,
“e”, do CP – cometer o crime contra descendente – não pode ser computada.
“Art. 61 - São circunstâncias que sempre agravam a pena, quando não constituem
ou) qualificam o crime:(Redação dada pela Lei nº 7.209, de 11.7.1984)
(...
II - ter o agente cometido o crime: (Redação dada pela Lei nº 7.209, de 11.7.1984)
(...)
e) contra ascendente, descendente, irmão ou cônjuge;
(...)”
“(...)
h) contra criança, maior de 60 (sessenta) anos, enfermo ou mulher grávida;
(Redação dada pela Lei nº 10.741, de 2003)
(...)”
“Art. 9º As penas fixadas no art. 6º para os crimes capitulados nos arts. 157, § 3º,
158, § 2º, 159, caput e seus §§ 1º, 2º e 3º, 213, caput e sua combinação com o art.
223, caput e parágrafo único, 214 e sua combinação com o art. 223, caput e
parágrafo único, todos do Código Penal, são acrescidas de metade, respeitado o
limite superior de trinta anos de reclusão, estando a vítima em qualquer das
hipóteses referidas no art. 224 também do Código Penal.”
O STJ já tem reiteradas decisões entendendo que no estupro por meio de violência
presumida não se aplica este artigo 9º, pelo mesmo motivo: se o artigo 224 do CP já foi
usado para tipificar o crime, sendo elementar deste o fato de ser vítima menor de quatorze
anos, não pode ser, a mesma norma, causadora de aumento da pena, pois seria novamente
bis in idem.
Veja que, havendo violência real ou grave ameaça no cometimento do ato sexual,
sendo vítima menor de quatorze anos, há incidência da agravante do artigo 61 do CP ou da
causa de aumento de pena do artigo 9º da Lei 8.072/90, não se configurando bis in idem,
porque a idade não mais é elementar do crime: há o estupro independentemente da idade,
pois foi usada força ou ameaça, e por isso a idade da vítima será considerada na pena. A
idade da vítima, neste caso, será utilizada na segunda fase (artigo 61 do CP) ou na terceira
(artigo 9º da Lei 8.072/90), naquela em que pesará mais na conta final. De fato, sempre que
a mesma condição se fizer sentir na segunda e na terceira fase, esta é a regra, como
exemplifica a súmula 241 do STJ, sobre a reincidência:
“Súmula 241, STJ: A reincidência penal não pode ser considerada como
circunstância agravante e, simultaneamente, como circunstância judicial.”
“Furto
Art. 155 - Subtrair, para si ou para outrem, coisa alheia móvel:
Pena - reclusão, de um a quatro anos, e multa.
§ 1º - A pena aumenta-se de um terço, se o crime é praticado durante o repouso
noturno.
§ 2º - Se o criminoso é primário, e é de pequeno valor a coisa furtada, o juiz pode
substituir a pena de reclusão pela de detenção, diminuí-la de um a dois terços, ou
aplicar somente a pena de multa.
§ 3º - Equipara-se à coisa móvel a energia elétrica ou qualquer outra que tenha
valor econômico.
Furto qualificado
§ 4º - A pena é de reclusão de dois a oito anos, e multa, se o crime é cometido:
I - com destruição ou rompimento de obstáculo à subtração da coisa;
II - com abuso de confiança, ou mediante fraude, escalada ou destreza;
III - com emprego de chave falsa;
IV - mediante concurso de duas ou mais pessoas.
“Violação de domicílio
Art. 150 - Entrar ou permanecer, clandestina ou astuciosamente, ou contra a
vontade expressa ou tácita de quem de direito, em casa alheia ou em suas
dependências:
Pena - detenção, de um a três meses, ou multa.
(...)”
Feita a opção, o juiz perpassa as três fases, fixando a pena final. O juiz deverá
fundamentar plenamente a aplicação da pena, tal como fundamenta a incriminação do
condenado: deverá explicar a adução de cada aspecto na pena, ou seja, a cada passo, cada
agravante ou atenuante reconhecida, a cada aumento ou diminuição de pena, deverá
explicar o porquê da sua decisão. A falta de fundamentação da pena é causa de nulidade,
para o STJ e para o STF, que entendem parcialmente 4 nula a sentença, apenas na parte do
cálculo penal, sendo que há jurisprudência que opta pela redução ao mínimo cominado, ao
invés de nulificar a decisão.
Ressalte-se que a jurisprudência tem entendido que quando o juiz fixa a pena final
no mínimo possível, significa que todas as circunstâncias das três fases foram favoráveis ao
réu, e por isso a fundamentação da pena seria dispensável. O fundamento, implicitamente, é
todo favorável ao réu.
3
A recomendação geral da doutrina é que o juiz opte pela pena não carcerária, sempre que possível, dada a
sua melhor adequação a um dos precípuos fins da pena, que é a ressocialização, e dada a verdadeira falência
do sistema prisional brasileiro.
4
As Cortes superiores não nulificam toda a sentença por um motivo pragmático: se o fizessem, desapareceria
a sentença como causa de interrupção da prescrição, causando a extinção da punibilidade em muitos casos.
O erro material no cálculo da pena pode ser reformado pelo órgão superior, quando
o recurso for exclusivo da defesa? O Ministro Marco Aurélio tinha entendimento que sim,
porque o erro material poderia ser corrigido a qualquer tempo e por qualquer meio, ao
contrário da maior parte da doutrina e jurisprudência, que sempre entenderam que se trata
de reformatio in pejus indevida, eis que é o recurso exclusivo da defesa que está a
prejudicar o réu. O STF, no HC 83.545, no entanto, com relatoria do Ministro César Peluso,
demonstrou-se afeito à tese majoritária, e inclusive o Ministro Marco Aurélio mudou seu
entendimento, acompanhando a maioria. Hoje, portanto, não se pode corrigir erro material
para prejudicar o réu, quando o recurso for exclusivo da defesa. Veja a ementa do julgado
mencionado:
Passemos, agora, à análise de cada uma das etapas do sistema trifásico da aplicação
da pena.
“Fixação da pena
Art. 59 - O juiz, atendendo à culpabilidade, aos antecedentes, à conduta social, à
personalidade do agente, aos motivos, às circunstâncias e conseqüências do crime,
bem como ao comportamento da vítima, estabelecerá, conforme seja necessário e
suficiente para reprovação e prevenção do crime: (Redação dada pela Lei nº 7.209,
de 11.7.1984)
I - as penas aplicáveis dentre as cominadas;(Redação dada pela Lei nº 7.209, de
11.7.1984)
II - a quantidade de pena aplicável, dentro dos limites previstos;(Redação dada
pela Lei nº 7.209, de 11.7.1984)
III - o regime inicial de cumprimento da pena privativa de liberdade;(Redação dada
pela Lei nº 7.209, de 11.7.1984)
IV - a substituição da pena privativa da liberdade aplicada, por outra espécie de
pena, se cabível. (Redação dada pela Lei nº 7.209, de 11.7.1984)”
No caput deste artigo se percebe desde logo a dupla função da pena, a reprovação
(retribuição) e a prevenção. Diz também que a pena deve se ater ao que for suficiente e
necessário para suas funções. Daí surge uma questão: se o juiz entender que nenhuma pena
é necessária, pode deixar de aplicá-la? Isto ocorre quando a lei prevê cabível o perdão
judicial, mas há quem defenda, como Luis Flávio Gomes, que o juiz pode fazer esta análise
em qualquer caso. Majoritariamente, porém, o termo “necessário” é limitado ao mínimo da
escala penal de cada crime, ou seja, o legislador entende que o mínimo cominado é
necessário para que a pena atinja seus fins, não podendo deixar de ser aplicada a pena,
portanto.
Em tempos em que o funcionalismo penal vem tomando contornos e ganhando
força, a corrente minoritária ganha força, tendo amparo em uma teoria moderna sobre a
culpabilidade, no critério analítico do crime: a teoria da culpabilidade voltada para os fins
da pena, em que se entende ausente a culpabilidade quando a pena não tiver mais sentido,
por não se demonstrar servível ao implemento das suas funções. Como exemplo, um
condenado que se demonstra absolutamente regenerado: a pena é desnecessária, pois que o
agente já está ressocializado, e por isso a sua infração se transforma em uma infração
bagatelar imprópria, que difere da bagatelar própria, consabida, pois que enquanto esta é
insignificante para o direito penal desde sua origem, a imprópria é significante para o
direito penal no nascedouro, mas na aplicação da pena se demonstra insignificante.
Na fixação da pena-base, o juiz deve analisar as oito circunstâncias judiciais
presentes no caput deste artigo 59: culpabilidade, antecedentes, conduta social,
personalidade, motivos, circunstâncias do crime, conseqüências e comportamento da
vítima. Não há preponderância de uma circunstância sobre outra, todas tendo igual peso,
em regra, mas a Lei 11.343/06, Nova Lei de Drogas, no artigo 42, criou uma situação de
preponderância de uma circunstância: a natureza e quantidade da droga, a personalidade e a
conduta social do agente, têm maior peso na fixação da pena-base.
“Art. 42. O juiz, na fixação das penas, considerará, com preponderância sobre o
previsto no art. 59 do Código Penal, a natureza e a quantidade da substância ou do
produto, a personalidade e a conduta social do agente.”
2.1. Culpabilidade
demonstrando adesão ao direito penal do autor, e não do fato, como deve ser. É tese
incipiente, porém, vez que a culpabilidade é apenas um dos elementos de análise
obrigatória.
2.2. Antecedentes
O STF vê esta condição afetada ao julgamento pelo seu pleno, ainda pendente. O
conceito de maus antecedentes, por enquanto, não admite que sejam assim considerados os
inquéritos ou processos em curso, quando da sentença, mesmo que nestes haja sentença
condenatória sem trânsito em julgado. Isto assim o é pela presunção de inocência, trazida
pelo Pacto de São José da Costa Rica.
Ocorre que o STF vem demonstrando sinais de que alterará este entendimento,
sinais estes revelados, ao menos, em voto do Ministro Ricardo Lewandowski, de que a
existência de processo ou inquérito, de fato, não é mau antecedente, mas revela outra
condição negativa, que será vista adiante: a má conduta social, ou mesmo outra, a
personalidade desviada.
Há um projeto de lei que pretende fazer com que as condutas praticadas quando
menor, ou seja, os atos infracionais, em que se alcança a condenação, sejam considerados
maus antecedentes para condenações na vida adulta. É altamente questionável esta
providência, mas está em vias de surgir no ordenamento.
2.3. Personalidade
Não existe crime sem motivo. Todo crime é praticado por alguma motivação
interna. Contudo, esta condição deve ser analisada com cautela, porque na segunda fase da
fixação da pena há uma agravante expressa referente ao motivo, que assevera a pena
intermediária quando este for torpe ou fútil. Por isso, em regra, quando o motivo for fútil ou
torpe, e não qualificar o crime, será observado como agravante genérica na segunda fase, e
não na fixação da pena-base. Vale dizer, isto é o que ocorre com maior freqüência.
Veja que o fato de o motivo não ter sido descoberto não torna o crime sem motivo,
tampouco revela torpeza ou futilidade. O motivo existe, e se não foi descoberto, não pode
ser computado a favor nem contra o réu.
Há que se abordar que há uma diferença entre motivo próximo e motivo remoto,
nesta fase inicial, ou quando qualifica o crime, ou mesmo na segunda, na agravante
genérica. O motivo remoto, aquele que tenha dado início a uma eventual cogitação
criminosa, não se confunde com o motivo próximo, que ensejou a execução do crime. E
somente este último pode ser tomado para incidência em qualquer cômputo, em qualquer
fase da pena.
Este critério é dos mais relevantes, tal como a culpabilidade. É por conta destes dois
elementos que a pena base precisa da escala penal, porque os tipos penais, idênticos em
abstrato, são absurdamente diferentes em sua prática. Tomemos o roubo, por exemplo: é
claro que o roubo de um relógio por um desempregado não é nem de longe grave como o
roubo a banco por um “meliante profissional”, como se costuma chamar. E por isso as
circunstâncias do delito têm que incidir na pena-base, a fim de revelar esta diferença.
A vítima, por vezes, colabora para a ocorrência do crime. É claro que não se está
tratando de uma causa justificante da conduta criminosa, ou não seria crime, não seria
injusto penal. Contudo, por haver uma certa cooperação da vítima para que o delito ocorra,
e se assim ocorrer, será minorada a pena-base.
Exemplos são problemáticos, mas pode-se apontar como comportamento minorante
da pena-base a provocação lasciva feita por uma mulher ao seu futuro estuprador – em que
pese este exemplo ser alvo de violentas críticas.
processos ou inquéritos, que não são maus antecedentes, podem ser considerados má
conduta social.
Casos Concretos
Questão 1
PAULO (20 anos, responde a diversos inquéritos e processos ainda não decididos),
FLÁVIO (reincidente) e MÁRCIO (acadêmico de Direito), mediante grave ameaça
exercida com o emprego de armas de fogo, subtraíram de diversos passageiros (quatro) de
um coletivo coisas alheias móveis, sendo presos logo que saíram do ônibus, destacando-se
que as coisas roubadas e as armas utilizadas no "assalto" foram devidamente apreendidas
e periciadas. Denunciados nas penas do artigo 157, § 2º, I e II, c/c 14, II, por quatro vezes,
na forma do artigo 70, todos do Código Penal, restaram os fatos comprovados ao final da
instrução criminal, sendo que MÁRCIO foi o único que admitiu a infração ao ser ouvido
em juízo. Aplique as penas respectivas, observado o critério trifásico estatuído no artigo
68 do Código Penal.
Resposta à Questão 1
qualquer prejuízo patrimonial final. Atento a tais considerações, fixo a pena-base para cada
um dos roubos em quatro anos de reclusão e multa de 10 dias, à razão unitária mínima.
Segunda fase: o acusado é menor de 21 anos. Considerando, porém, que a pena na
etapa anterior não saiu do mínimo legal, deixo de aplicar a redução respectiva, eis que
vedada pelo que dispõe a súmula 231 do STJ (“a incidência da circunstância atenuante não
pode conduzir à redução da pena abaixo do mínimo legal”).
Terceira fase: considerando que os roubos restaram duplamente majorados, elevo a
pena pela metade, totalizando seis anos de reclusão e multa de 15 dias. Justifico tal
exasperação analisando as próprias majorantes no caso concreto, sendo diversos os agentes
e várias as armas utilizadas na empreitada criminosa, circunstâncias que autorizam a
adoção daquele percentual máximo, já tendo o STF decidido que o número de agravantes,
por si só, não autoriza que o acréscimo se afaste do mínimo previsto, devendo ocorrer o
exame pelo Magistrado no caso concreto. Outrossim, não tendo o delito saído da esfera da
tentativa e observado o iter criminis percorrido, em sua razão inversa, ficando os roubos
próximos da consumação (o próprio STF tem jurisprudência no sentido de que o roubo se
consuma com a subtração, independente de posse mansa e pacífica), reduzo as penas no
mínimo previsto na norma de extensão respectiva, ou seja, 1/3, resultando na sanção de
quatro anos de reclusão e multa de 10 dias. Reconhecido, por último, que os roubos foram
praticados através de uma única ação, desdobrada em vários atos, na forma do artigo 70 do
Código Penal e adotado o princípio da exasperação, aplico a pena de um dos crimes com o
aumento de 1/4 (foi levado em consideração o número de infrações), totalizando cinco anos
de reclusão. A pena de multa, nos termos do artigo 72 do Código Penal, possui regra
própria, devendo ser aplicado o princípio do cúmulo material, totalizando quarenta dias-
multa, mantida a razão unitária mínima.
Quanto ao regime de pena: inobstante a jurisprudência do STF vir decidindo que a
gravidade em abstrato do delito, por si só, não autoriza a escolha do regime mais gravoso
quando possível outro mais benéfico, devendo ser observado o que dispõe o artigo 59 do
Código Penal, dois motivos autorizam a escolha do regime fechado. Primeiro, aquelas
anotações que não autorizam que a pena-base se afaste do mínimo em seu quantitativo, mas
devem ser levadas em consideração na escolha da qualidade da pena. Segundo, o fato dos
roubos terem sido praticados com o emprego de arma, circunstância que não pode ser
considerada quando do exame do artigo 59, eis que configurava causa de aumento a ser
observada na terceira etapa, mas que não impede que os roubos nestas circunstâncias sejam
considerados mais graves. O emprego de arma, caso não fosse considerado na terceira
etapa, inquestionavelmente poderia ser observado como circunstância desfavorável na
primeira etapa, o que possibilitaria que a pena base se afastasse do mínimo legal,
autorizando, assim, o regime mais gravoso.
Com relação a Flávio:
Primeira fase: a culpabilidade não excedeu a normal do tipo majorado, sendo certo
que o fato dele já ter sido condenado anteriormente, sendo reincidente, não pode ser
observado nesta etapa, na forma do que dispõe a Súmula 241 do STJ (“a reincidência penal
não pode ser considerada como circunstância agravante e, simultaneamente, como
circunstância judicial”). As conseqüências da infração não desfavorecem os agentes, eis que
as vítimas não sofreram qualquer prejuízo patrimonial final. Atento a tais considerações,
fixo a pena-base para cada um dos roubos em quatro anos de reclusão e multa de 10 dias, à
razão unitária mínima.
Segunda fase: o acusado é reincidente, devendo incidir o que dispõe o artigo 61, 1,
do Código Penal. A lei não estabelece o quantitativo de aumento, deixando para o Juiz, com
equilíbrio, estabelecer o acréscimo respectivo, recomendando a doutrina o percentual de
1/6, daí porque elevo a pena nesta etapa intermediária para quatro anos e oito meses de
reclusão e multa de 11 dias.
Terceira fase: considerando que os roubos restaram duplamente majorados, elevo a
pena pela metade, totalizando sete anos de reclusão e multa de 16 dias. Justifico tal
exasperação analisando as próprias majorantes no caso concreto, sendo diversos os agentes
e várias as armas utilizadas na empreitada criminosa, circunstâncias que autorizam a
adoção daquele percentual máximo, já tendo o STF decidido que o número de agravantes,
por si só, não autoriza que o acréscimo se afaste do mínimo previsto, devendo ocorrer o
exame pelo Magistrado no caso concreto. Outrossim, não tendo o delito saído da esfera da
tentativa e observado o iter criminis percorrido, em sua razão inversa, ficando os roubos
próximos da consumação (o próprio STF tem jurisprudência no sentido de que o roubo se
consuma com a subtração, independente de posse mansa e pacífica), reduzo as penas no
mínimo previsto na norma de extensão respectiva, ou seja, 1/3, resultando na sanção de
quatro anos e oito meses de reclusão e multa de 10 dias. Reconhecido, por último, que os
roubos foram praticados através de uma única ação, desdobrada em vários atos, na forma
do artigo 70 do Código Penal e adotado o princípio da exasperação, aplico a pena de um
dos crimes com o aumento de 1/4 (foi levado em consideração o número de infrações),
totalizando cinco anos e dez meses de reclusão. A pena de multa, nos termos do artigo 72
do Código Penal, possui regra própria, devendo ser aplicado o princípio do cúmulo
material, totalizando quarenta dias-multa, mantida a razão unitária mínima.
Quanto ao regime de pena: inobstante a jurisprudência do STF vir decidindo que a
gravidade em abstrato do delito, por si só, não autoriza a escolha do regime mais gravoso
quando possível outro mais benéfico, devendo ser observado o que dispõe o artigo 59 do
Código Penal, dois motivos autorizam a escolha do regime fechado. Primeiro, a
reincidência do acusado. Segundo, o fato dos roubos terem sido praticados com o emprego
de arma, circunstância que não pode ser considerada quando do exame do artigo 59, eis que
configurava causa de aumento a ser observada na terceira etapa, mas que não impede que
os roubos nestas circunstâncias sejam considerados mais graves. O emprego de arma, caso
não fosse considerado na terceira etapa, inquestionavelmente poderia ser observado como
circunstância desfavorável na primeira etapa, o que possibilitaria que a pena-base se
afastasse do mínimo legal, autorizando, assim, o regime mais gravoso.
Com relação a Márcio:
Primeira fase: a culpabilidade excedeu a normal do tipo majorado, eis que o acusado
é bacharel em Direito, sendo maior a sua consciência do ilícito e, por isto, deveria se
comportar de acordo com o preceito proibitivo contido no tipo praticado, sendo maior,
assim, a reprovabilidade do seu agir e mais censurável o seu comportamento. As
conseqüências da infração não desfavorecem os agentes, eis que as vítimas não sofreram
qualquer prejuízo patrimonial final. Atento a tais considerações, fixo a pena-base para cada
um dos roubos em quatro anos e seis meses de reclusão e multa de 10 dias, à razão unitária
mínima.
Segunda fase: o acusado confessou os fatos quando ouvido em Juízo, devendo
incidir a atenuante do artigo 65, III, “d”, do Código Penal, pelo que reduzo a pena para
quatro anos de reclusão e multa de dez dias.
Tema III
Dosimetria II. 1) As circunstâncias agravantes e atenuantes: análise de cada uma delas e estudo das
controvérsias doutrinárias e jurisprudenciais. 2) O concurso de circunstâncias agravantes e atenuantes: as
circunstâncias preponderantes. Controvérsias.
Notas de Aula5
Esta segunda etapa é calcada nos artigos 61 a 66 do CP, mas aqui devemos atermo-
nos apenas àquelas questões de mais relevo, que podem oferecer problemas interpretativos.
Vejamos, porém, todos os dispositivos:
“Circunstâncias agravantes
Art. 61 - São circunstâncias que sempre agravam a pena, quando não constituem
ou qualificam o crime:(Redação dada pela Lei nº 7.209, de 11.7.1984)
I - a reincidência; (Redação dada pela Lei nº 7.209, de 11.7.1984)
II - ter o agente cometido o crime: (Redação dada pela Lei nº 7.209, de 11.7.1984)
a) por motivo fútil ou torpe;
b) para facilitar ou assegurar a execução, a ocultação, a impunidade ou vantagem
de outro crime;
c) à traição, de emboscada, ou mediante dissimulação, ou outro recurso que
dificultou ou tornou impossível a defesa do ofendido;
d) com emprego de veneno, fogo, explosivo, tortura ou outro meio insidioso ou
cruel, ou de que podia resultar perigo comum;
e) contra ascendente, descendente, irmão ou cônjuge;
f) com abuso de autoridade ou prevalecendo-se de relações domésticas, de
coabitação ou de hospitalidade, ou com violência contra a mulher na forma da lei
específica; (Incluído pela Lei nº 11.340, de 2006)
g) com abuso de poder ou violação de dever inerente a cargo, ofício, ministério ou
profissão;
h) contra criança, maior de 60 (sessenta) anos, enfermo ou mulher grávida;
(Redação dada pela Lei nº 10.741, de 2003)
i) quando o ofendido estava sob a imediata proteção da autoridade;
j) em ocasião de incêndio, naufrágio, inundação ou qualquer calamidade pública,
ou de desgraça particular do ofendido;
l) em estado de embriaguez preordenada.”
“Reincidência
Art. 63 - Verifica-se a reincidência quando o agente comete novo crime, depois de
transitar em julgado a sentença que, no País ou no estrangeiro, o tenha condenado
por crime anterior. (Redação dada pela Lei nº 7.209, de 11.7.1984)”
“Circunstâncias atenuantes
Art. 65 - São circunstâncias que sempre atenuam a pena: (Redação dada pela Lei nº
7.209, de 11.7.1984)
I - ser o agente menor de 21 (vinte e um), na data do fato, ou maior de 70 (setenta)
anos, na data da sentença; (Redação dada pela Lei nº 7.209, de 11.7.1984)
II - o desconhecimento da lei; (Redação dada pela Lei nº 7.209, de 11.7.1984)
III - ter o agente:(Redação dada pela Lei nº 7.209, de 11.7.1984)
a) cometido o crime por motivo de relevante valor social ou moral;
b) procurado, por sua espontânea vontade e com eficiência, logo após o crime,
evitar-lhe ou minorar-lhe as conseqüências, ou ter, antes do julgamento, reparado o
dano;
c) cometido o crime sob coação a que podia resistir, ou em cumprimento de ordem
de autoridade superior, ou sob a influência de violenta emoção, provocada por ato
injusto da vítima;
d) confessado espontaneamente, perante a autoridade, a autoria do crime;
e) cometido o crime sob a influência de multidão em tumulto, se não o provocou.”
Primeiro ponto que deve ser reiterado, eis que já abordado, é a cautela extrema que
se deve ter com a dupla valoração, sob pena de incidir em bis in idem. Se determinada
circunstância já serviu para tipificar a conduta, por exemplo, não pode esta mesma
circunstância ser usada como agravante – como no exemplo dado da vítima menor de
quatorze anos, no estupro com mera violência presumida.
Outro ponto de relevo diz respeito à reincidência: se o réu é reincidente, significa
que tem também maus antecedentes, e, sendo assim, só se pode considerar a reincidência na
segunda etapa, e não na pena-base. Havendo dupla reincidência, assim como na dupla
qualificadora, uma será considerada como mau antecedente, na pena-base, e a outra como
efeito agravante, na segunda fase, sem constituir bis in idem – posição esta que é altamente
controvertida.
Na segunda fase, na pena intermediária, também não há parametrização para a
valoração de cada atenuante ou agravante, sendo novamente o critério dado ao prudente
arbítrio do juiz. O que há é uma orientação geral no sentido de que cada aumento ou
redução não seja superior a um sexto da pena cominada na pena-base – podendo ser
inferior, porém. Esta regra doutrinária, entretanto, pode ser relativizada no caso concreto, e
por vezes é preciso que o seja. Veja um exemplo: o revogado artigo 12 da Lei de Tóxicos
cominava pena de três a quinze anos; o réu ali incidente tinha maus antecedentes, mas não
reincidência. O juiz, na primeira fase, estabeleceu pena de quatro anos e seis meses, pelo
mau antecedente (realizando o critério objetivo que já se abordou anteriormente), e
manteve esta pena nas segunda e terceira fases. Ocorre que se este réu fosse reincidente,
caso em que esta não seria computável como mau antecedente, a agravante da segunda fase,
se limitada a seis meses, seria menos severa do que o mau antecedente da primeira fase, o
que não se pode admitir, por absoluta desproporção: o réu reincidente seria menos punido
do que o réu com maus antecedentes, enquanto é bem óbvio que a reincidência é mais
grave do que o mau antecedente.
Há também que se abordar o artigo 67 do CP, a fim de esclarecer o que são as
“circunstâncias preponderantes” ali prevista:
caso. Tendo em conta, contudo, não ser esta a situação do caso analisado, concluiu
que, se a Corte decidisse rever sua jurisprudência, teria de tomar certas cautelas,
em face do risco de deixar a cada juiz a definição da pena para cada crime. Em
seguida, o Tribunal, por maioria, resolveu outra questão de ordem, no sentido de,
nos habeas corpus que tratem do assunto ora analisado, autorizar o relator a decidir
o pedido monocraticamente (RISTF, art. 21). Vencido, no ponto, o Min. Marco
Aurélio, que entendia não caber essa autorização. Alguns precedentes citados: HC
93187/RS (DJE de 19.9.2008); HC 93141/RS (DJE de 22.8.2008); HC 94365/RS
(DJE de 29.8.2008); HC 92203/RS (DJE de 12.9.2008); HC 93821/RS (DJE de
11.4.2008). RE 597270 QO/RS, rel. Min. Cezar Peluso, 26.3.2009. (RE-597270)”
As agravantes do artigo 61, II, do CP, não se aplicam aos crimes culposos. Isto
porque são todas elas circunstâncias que denotam desabono ao dolo do agente, sendo
incompatíveis com a culpa. Mesmo por isso, a do inciso I do mesmo artigo – reincidência –
se aplica perfeitamente ao crime culposo, eis que é quesito objetivo, alheio ao dolo.
Feitas estas notas, analisemos melhor a reincidência, com base no artigo 63 do CP,
já transcrito. A reincidência só ocorre quando se pratica novo crime após a condenação
definitiva em crime anterior. Não basta a condenação anterior sem trânsito em julgado para
ser considerado reincidente. Sendo assim, é possível que um réu com diversas condenações
ainda seja primário quando da sentença, eis que todas as condenações anteriores ainda se
encontram sem trânsito em julgado.
Sobre o uso de entorpecentes, há que se atentar para o princípio básico da Lei
11.343/06, que é a descarcerização do usuário. Esta concepção repercute na reincidência: se
se reconhecer que a condenação anterior pelo uso de drogas gera reincidência,
indiretamente se estará fazendo com que o réu cumpra pena privativa de liberdade por
aquela condenação em uso, porque o tempo que será adicionado à pena será decorrência
apenas da sua reincidência, que proveio da condenação em uso. Por conta deste raciocínio,
há corrente que defende que o uso de entorpecentes não geraria reincidência, mas a questão
é controvertida.
A prova da reincidência é feita por meio de documento que traga a data do trânsito
em julgado da condenação pretérita. A prova natural da reincidência se faz por meio de uma
certidão cartorária, mas a folha de antecedentes criminais é aceita também como
documento hábil para tanto, pois como é documento público, presume-se a veracidade de
seus termos. É claro que a defesa, querendo, pode impugnar os fatos constantes da folha de
antecedentes, mas a princípio o que ali consta é veraz.
Não se discute, mais, a constitucionalidade da reincidência, por suposta violação ao
bis in idem: em diversas decisões em que se analisou tal constitucionalidade, posicionaram-
se as cortes no sentido de que não há qualquer ofensa ao princípio. Aqueles juízos que
entendem que há, sim, tal ofensa, não mais declaram a reincidência inconstitucional, mas
valem-se de uma solução que atende ao seu intento, frustrado, de não aplicá-la: computam a
reincidência, mas em seguida atenuam a pena, em mesma quantidade, pela incidência da
atenuante da co-culpabilidade, ao argumento de que se o réu cumpriu pena, e ainda assim
voltou a delinqüir, é porque o Estado falhou em sua função ressocializadora, e por isso deve
“ratear” a culpabilidade com o agente.
Há prazo de cinco anos de “vigência” da reincidência, previsto no artigo 64, I, do
CP, após o qual esta deixa de incidir. Este prazo conta-se da data da extinção da pena. Findo
o prazo, não há mais reincidência, mas pode-se considerar que aquela condenação implique
em mau antecedente, sendo que é questão bem controvertida, porque representaria violação
à vedação da pena perpétua. Veja que este dispositivo traz a seguinte menção: no prazo de
cinco anos, computa-se o período de prova da suspensão ou do livramento condicional, se
não for revogado. Isto significa que se o réu ficar solto sem delinqüir, a reincidência será
contada desde quando posto em liberdade, e não desde o fim do período de provas sem
revogação, quando então se dará a extinção, por mera lógica finalística: se o réu ficou
aquele período solto, e não delinqüiu, não reincidiu, não há porque ignorar este tempo fora
do cárcere para fazê-o reincidente, após o fim efetivo da pena.
O crime militar próprio, aquele previsto unicamente no CPM – como a deserção ou
a pederastia –, não gera reincidência para julgamento de crime comum. É claro que se se
tratar de outro crime militar próprio, o CPM considera reincidente. O que não se mistura
são os diplomas diversos, neste caso. O mesmo raciocínio se aplica aos crimes políticos.
Por fim, quanto à reincidência, vale repetir o enunciado da súmula 241 do STJ:
“Súmula 241, STJ: A reincidência penal não pode ser considerada como
circunstância agravante e, simultaneamente, como circunstância judicial.”
Casos Concretos
Questão 1
Verificando que ambos eram correntistas do Banco do Brasil pelos cartões bancários
subtraídos, ato contínuo - tendo ADONIAS assumido a direção do veículo - constrangeram
o casal, sob a mira de armas de fogo portadas por BENEVIDES e CAPITÓLIO, a se
dirigirem ao caixa eletrônico do B.B. localizado na Penha, obrigando-os a sacar,
sucessivamente, R$ 500,00 cada qual, valores estes entregues a ADONIAS. Quando as
vítimas ainda se encontravam junto ao caixa eletrônico, em companhia da "trinca", surgiu
uma patrulha da P.M., que os prendeu em flagrante. O processo teve curso regular, sendo
os acusados denunciados, e interrogados, apresentando versões próprias, vindo as
alegações preliminares firmadas por seus defensores, seguindo-se a instrução criminal,
com a audiência das vítimas e testemunhas arroladas, sendo providenciada a vinda das
folhas de antecedentes e dos documentos indispensáveis para o julgamento do feito,
manifestando-se as partes em alegações finais. O Magistrado, após relatar e fundamentar
a decisão considerando as provas e alegações, reconheceu estarem provadas e
demonstradas a autoria, a materialidade e a culpabilidade dos acusados. Como Juiz do
feito, dispensados o relatório e a fundamentação, capitule os fatos, dizendo quais os
artigos da lei penal infringidos, procedendo apenas à elaboração do dispositivo da
sentença com a necessária dosimetria das penas. A questão deve ser iniciada com - "Isto
posto", e finalizada com "P.R. e I.".O candidato deve considerar o seguinte:1. ADONIAS
tem 26 anos de idade, é solteiro, afirmou-se biscateiro, e foi quem dirigiu as atividades dos
demais agentes. Confirmou ter várias passagens pelo Juizado da Infância e da Juventude,
mas nunca foi preso ou processado; confessou a imputação em juízo;2. BENEVIDES tem
20 anos de idade, trabalha como pintor de paredes, registra antecedentes, consignando sua
folha três feitos em andamento, sendo que dois ainda não julgados, registrando, contudo
uma condenação por crime anterior, transitada em julgado, encontrando-se quando da
prisão em flagrante dos três, em livramento condicional. 3. CAPITÓLIO tem 24 anos de
idade, não tem atividade ou profissão, foi submetido a exame de sanidade mental ante a
afirmação de ser dependente de cocaína, reconhecendo os srs. Peritos que quando dos
fatos não tinha a plena capacidade de compreensão da ilicitude de seu comportamento, em
razão de sua dependência.
Resposta à Questão 1
Questão 2
TERTULIANO, após ter matado sua primeira mulher e escapado de uma punição
mais severa, casa-se novamente, desta feita com MARTIFINÉLIA, portadora de grave
doença mental, com quem se muda para a cobertura de um prédio de dez andares, situado
na rua das Hortênsias, nº 24, centro da cidade de Sucupira. Numa noite de lua cheia,
TERTULIANO convence sua esposa a saltar do referido prédio, segurando uma raquete de
tênis em cada mão e com várias penas de pavão presas às costas, dizendo para ela que,
deste modo, conseguiria voar. TERTULIANO queria a morte de MARTIFINÉLIA com o
objetivo de herdar seus bens, já que se tratava de uma mulher muito rica. O fato ocorreu
no dia 1º de abril de 2008, à meia-noite. MARTIFINÉLIA salta da cobertura e,
obviamente, é projetada em parafuso até o chão, vindo a falecer. Realize a dosimetria da
pena.
Resposta à Questão 2
Tema IV
Notas de Aula6
6
Aula ministrada pelo professor Marcus Henrique Pinto Basílio, em 27/4/2009.
“Aumento de pena
Art. 226. A pena é aumentada:(Redação dada pela Lei nº 11.106, de 2005)
I – de quarta parte, se o crime é cometido com o concurso de 2 (duas) ou mais
pessoas; (Redação dada pela Lei nº 11.106, de 2005)
II – de metade, se o agente é ascendente, padrasto ou madrasta, tio, irmão, cônjuge,
companheiro, tutor, curador, preceptor ou empregador da vítima ou por qualquer
outro título tem autoridade sobre ela; (Redação dada pela Lei nº 11.106, de 2005)
III - (Revogado pela Lei nº 11.106, de 2005)”
“Concurso formal
Art. 70 - Quando o agente, mediante uma só ação ou omissão, pratica dois ou mais
crimes, idênticos ou não, aplica-se-lhe a mais grave das penas cabíveis ou, se
iguais, somente uma delas, mas aumentada, em qualquer caso, de um sexto até
metade. As penas aplicam-se, entretanto, cumulativamente, se a ação ou omissão é
dolosa e os crimes concorrentes resultam de desígnios autônomos, consoante o
disposto no artigo anterior.(Redação dada pela Lei nº 7.209, de 11.7.1984)
Parágrafo único - Não poderá a pena exceder a que seria cabível pela regra do art.
69 deste Código. (Redação dada pela Lei nº 7.209, de 11.7.1984)”
“Crime continuado
Art. 71 - Quando o agente, mediante mais de uma ação ou omissão, pratica dois ou
mais crimes da mesma espécie e, pelas condições de tempo, lugar, maneira de
execução e outras semelhantes, devem os subseqüentes ser havidos como
continuação do primeiro, aplica-se-lhe a pena de um só dos crimes, se idênticas, ou
a mais grave, se diversas, aumentada, em qualquer caso, de um sexto a dois terços.
(Redação dada pela Lei nº 7.209, de 11.7.1984)
Parágrafo único - Nos crimes dolosos, contra vítimas diferentes, cometidos com
violência ou grave ameaça à pessoa, poderá o juiz, considerando a culpabilidade,
os antecedentes, a conduta social e a personalidade do agente, bem como os
motivos e as circunstâncias, aumentar a pena de um só dos crimes, se idênticas, ou
a mais grave, se diversas, até o triplo, observadas as regras do parágrafo único do
art. 70 e do art. 75 deste Código.(Redação dada pela Lei nº 7.209, de 11.7.1984)”
“Cálculo da pena
Art. 68 - A pena-base será fixada atendendo-se ao critério do art. 59 deste Código;
em seguida serão consideradas as circunstâncias atenuantes e agravantes; por
último, as causas de diminuição e de aumento. (Redação dada pela Lei nº 7.209, de
11.7.1984)
Parágrafo único - No concurso de causas de aumento ou de diminuição previstas
na parte especial, pode o juiz limitar-se a um só aumento ou a uma só diminuição,
prevalecendo, todavia, a causa que mais aumente ou diminua.(Redação dada pela
Lei nº 7.209, de 11.7.1984)”
“Aumento de pena
Art. 226. A pena é aumentada:(Redação dada pela Lei nº 11.106, de 2005)
I – de quarta parte, se o crime é cometido com o concurso de 2 (duas) ou mais
pessoas; (Redação dada pela Lei nº 11.106, de 2005)
II – de metade, se o agente é ascendente, padrasto ou madrasta, tio, irmão, cônjuge,
companheiro, tutor, curador, preceptor ou empregador da vítima ou por qualquer
outro título tem autoridade sobre ela; (Redação dada pela Lei nº 11.106, de 2005)
III - (Revogado pela Lei nº 11.106, de 2005)”
Supondo-se que duas pessoas cometam estupro, sendo uma delas o pai da vítima, a
ele se imporiam duas das causas deste artigo – a referente ao concurso de pessoas e a
referente à condição de ascendente. Neste caso, aplica-se-lhe a mais grave, qual seja, a do
inciso II.
Veja que há quem entenda que se a causa de aumento que foi desprezada também se
amoldar a alguma hipótese de agravante ou atenuante, ela poderá lá ser considerada, na
segunda fase, ou mesmo na primeira, como circunstância judicial desfavorável.
A ordem em que se computam as causas de aumento, na conta matemática, não tem
relevância, eis que não produzirá diferença a alteração da ordem dos fatores. O que não
pode ser feito, jamais, é a compensação entre uma majorante e uma minorante de iguais
frações, porque isto sim influencia na conta final.
Suponha-se que ocorra o roubo duplamente majorado, na forma do artigo 157, § 2º,
I e II, por exemplo, do CP:
“Roubo
Art. 157 - Subtrair coisa móvel alheia, para si ou para outrem, mediante grave
ameaça ou violência a pessoa, ou depois de havê-la, por qualquer meio, reduzido à
impossibilidade de resistência:
Pena - reclusão, de quatro a dez anos, e multa.
(...)
§ 2º - A pena aumenta-se de um terço até metade:
I - se a violência ou ameaça é exercida com emprego de arma;
II - se há o concurso de duas ou mais pessoas;
(...)”
Não se admite, de forma alguma, que se aplique dois aumentos de pena, neste caso,
devendo ser aplicada apenas uma vez a majorante – de um terço até a metade, in casu. A
duplicidade de circunstâncias majorantes, isto sim, pode ou não influenciar na estipulação
do juiz de qual fração aplicará, mas esta correlação não é objetiva. Entenda: se o juiz
encontrar caso em que haja duas majorantes, mas a situação fática as demonstre brandas,
nada o impede de majorar em apenas um terço; e, ao contrário, se encontrar apenas uma
majorante, mas a considerar severa, pode majorar de metade a pena, sem qualquer óbice. A
análise é casuística e subjetiva, cada juiz mensurando por sua própria convicção.
Esta é a corrente majoritária, mas Rogério Greco, por exemplo, traça uma
correlação entre o número de majorantes encontrado e a quantidade de aumento da pena.
Para tanto, propõe-se até mesmo uma tabela numérica: uma majorante corresponde a
aumento de 8/24 avos da pena; duas, 9/24, ou 3/8; três majorantes, 10/24; quatro, 11/24; e
cinco majorantes, 12/24, ou 1/2 – estando, então, bem dividida a escala de um terço à
metade, no roubo.
Há critérios outros para definir qual a fração mais adequada, em cada tipo de
majorante ou minorante. Por exemplo, na tentativa, do artigo 14 do CP, pode-se adotar
como critério de diminuição a proximidade da consumação: quanto mais perto de
consumar-se o delito, menor a redução da pena. No arrependimento posterior, do artigo 16
do CP, quanto antes o agente reparar o dano, maior será a redução. Veja os dispositivos:
voluntário do agente, a pena será reduzida de um a dois terços. (Redação dada pela
Lei nº 7.209, de 11.7.1984)”
Há uma tese de que o reincidente, inobstante esta súmula, poderia até mesmo iniciar
o cumprimento em regime aberto. Isto porque há que se atentar para a proporcionalidade:
se o réu reincidente pode até mesmo receber a substituição da pena, na forma do artigo 44,
§ 3º, do CP, poderia receber o regime aberto, que é mais gravoso do que a substituição.
Seria incongruente, assistemático, entender que é passível da medida mais branda e não da
mais grave – pois regime aberto ainda é prisão. Veja o artigo:
providencia inicial, o que não é verdade: somente após o cálculo trifásico é que o juiz
adentrará na substituição da pena.
Quanto ao regime, além da súmula 269 do STJ, supra, há ainda duas outras, do STF,
que merecem comentários: as súmulas 718 e 719. Veja-as:
O que estas súmulas intentam definir é que o regime fechado, por exemplo, em
crimes a que se comina o semi-aberto como regra, só poderá ser imposto se o juiz trouxer
fundamentos suficientes na sua decisão que demonstrem esta necessidade, e não a mera
gravidade do crime, em tese, na normal do tipo.
2. Pena de multa
Casos Concretos
Questão 1
quando ouvidos em juízo. ROMARIO responde a processo por crime de lesão corporal
grave sem resultado final. É casado e possui dois filhos menores. Praticou o delito porque
estava em dificuldade financeira. Submetido a exame de sanidade mental no curso do
processo, ficou constatado que ele se encontra nas condições do parágrafo único do artigo
26 do Código Penal. RONALDO é reincidente, sendo preso quando estava no gozo de
livramento condicional. É solteiro e trabalhava fazendo biscate. Foi quem convidou
ROMARIO para praticar o crime e foi quem dirigiu e liderou a ação criminosa. Aplique a
pena para cada um dos réus, fixando o regime de pena compatível.
Resposta à Questão 1
Questão 2
TÍCIO, reincidente, está sendo condenado por abandonar em lugar ermo o incapaz
CAIO, seu filho, que veio a falecer. Realize a dosimetria da pena.
Resposta à Questão 2
“Art. 133 - Abandonar pessoa que está sob seu cuidado, guarda, vigilância ou
autoridade, e, por qualquer motivo, incapaz de defender-se dos riscos resultantes
do abandono:
Pena - detenção, de seis meses a três anos.
§ 1º - Se do abandono resulta lesão corporal de natureza grave:
Pena - reclusão, de um a cinco anos.
§ 2º - Se resulta a morte:
Pena - reclusão, de quatro a doze anos.
Aumento de pena
§ 3º - As penas cominadas neste artigo aumentam-se de um terço:
I - se o abandono ocorre em lugar ermo;
II - se o agente é ascendente ou descendente, cônjuge, irmão, tutor ou curador da
vítima.
III – se a vítima é maior de 60 (sessenta) anos (Incluído pela Lei nº 10.741, de
2003)”
A pena-base deve ficar em quatro anos, eis que não há nada que indique aumento,
aqui, pois tudo que há enunciado será considerado em outras etapas. Na pena intermediária,
aumenta-se a pena pela reincidência, na forma do artigo 61, I, do CP, que não deve superar
um sexto – fixo-a em mais seis meses, portanto, culminando em quatro anos e seis meses.
Na terceira etapa, há duas causas de aumento a serem consideradas, sendo que só se aplica
a majorante uma vez, ou seja, mais um terço, o que trará a pena ao patamar de seis anos.
Quanto ao regime, por ser reincidente, estabeleço-o fechado.
Há que se considerar tese alternativa que entende que, por razão de justiça penal,
não pode uma pessoa que incide nas duas majorantes do § 3º tenha pena idêntica a quem
incide em uma só. Se se fizer esta interpretação, a majorante correspondente à ascendência
deixará de ser considerada nesta terceira fase, para oferecer agravamento na segunda fase,
conforme o artigo 61, II, “e”, o que aumentaria a pena intermediária em até um sexto. Neste
sentido, o STJ emitiu o julgado do HC 10.042, cuja ementa se transcreve:
Esta tese é considerada uma burla à lei, porque a aplicação de majorantes reduz a
uma só delas. Porém, é tese que encontra até mesmo amparo jurisprudencial, como se vê.
Questão 3
CAIO, primário e de bons antecedentes, está sendo condenado por duas tentativas
de roubo agravado pela restrição da liberdade da vítima e pelo emprego de arma,
praticados no mesmo momento. CAIO foi preso em flagrante, próximo ao local da prática
do crime. Realize a dosimetria da pena.
Resposta à Questão 3
Há dois crimes, mesmo que em concurso formal, e por isso há duas penas a serem
calculadas. Vejamos.
Quanto ao primeiro roubo, por ser primário e de bons antecedentes, a pena-base fica
em quatro anos. Não há agravantes ou atenuantes a serem consideradas na segunda fase,
pelo que a pena intermediária se mantém em quatro anos. Na terceira fase, há dupla
majoração – emprego de arma e restrição da liberdade da vítima – ensejando a incidência
de aumento de um terço à metade. Por considerar muito graves ambas as majorantes,
aplico aumento superior ao mínimo, estipulando em três oitavos da pena, o que culminará
em cinco anos e seis meses, como pena final. Aplicando-se a diminuição de pena referente
à tentativa, reduzo-a de um terço, porque próximo à consumação, estabelecendo a pena em
três anos e oito meses.
Para o segundo roubo, repete-se a pena-base, e repete-se a pena intermediária,
fixando em quatro anos. Na terceira fase, diante da dupla majoração encontrada, aumento
de três oitavos, culminando também em cinco anos e seis meses. Aplicada a redução da
tentativa, cai o quantum a três anos e oito meses.
Tratando-se de concurso formal, como se trata, concentro a pena em uma só das
fixadas, e a exaspero, aumentando-a de um sexto, porque apenas dois são os crimes,
culminando em pena final de quatro anos e quatro meses (aproximadamente).
Quanto ao regime, estabeleço-o fechado, e em razão da quantidade de pena aplicada
e do delito ter sido praticado com violência contra pessoa, o réu não tem direito à suspensão
condicional da pena, nem à substituição da pena por restritiva de direitos.
Tema V
Penas Restritivas de Direito I. 1) Aplicação das penas restritivas de direitos (Lei 9.714/98): a) Requisitos e
pressupostos; b) Aspectos controvertidos na doutrina e na jurisprudência.
Notas de Aula7
7
Aula ministrada pelo professor Ricardo Ribeiro Martins, em 29/4/2009.
A partir de 1998, com a Lei 9.714, o espaço de aplicação das penas restritivas de
direito foi muito ampliado. Até então, seu cabimento era limitado a crimes cuja pena
máxima não superasse um ano de prisão. Na verdade, a lei seguia a seguinte escala: até seis
meses, substituía-se por multa; até um ano, por pena restritiva de direito; até dois anos,
cabia sursis. Com a reforma de 1998, ampliou-se enormemente o alcance desta norma, ou
seja, a Lei 9.714/98 é lex mitior, aplicando-se retroativamente, desde então. E, diga-se, esta
8
A suspensão condicional da pena é uma alternativa à prisão. O condenado que tem a benesse do sursis não
está liberto do cumprimento da pena: está em plena execução de pena, mas não está encarcerado. O sursis é,
portanto, pena, substitutiva à prisão.
“Art. 13. A aplicação da lei nova a fato julgado por sentença condenatória
irrecorrivel, nos casos previstos no art. 2º e seu parágrafo, do Código Penal, far-se-
á mediante despacho do juiz, de ofício, ou a requerimento do condenado ou do
Ministério Público.
§ 1º Do despacho caberá recurso, em sentido estrito.
§ 2º O recurso interposto pelo Ministério Público terá efeito suspensivo, no caso de
condenação por crime a que a lei anterior comine, no máximo, pena privativa de
liberdade, por tempo igual ou superior a oito anos.”
Passemos, então, à análise dos artigos do CP referentes ao tema, iniciando pelo 44:
Estes requisitos do inciso I trazem algumas polêmicas. Por exemplo, se o roubo for
praticado por meio de sedação da vítima – o vulgar “boa noite Cinderela” –, ou seja, roubo
com violência imprópria, mereceria a aplicação da pena restritiva de direitos? Por não haver
violência real, mas apenas violência imprópria, por equiparação, há que se aplicar a
substituição, preenchendo-se este requisito do inciso I, pois se o legislador quisesse a
inclusão da violência imprópria no campo de abrangência da norma, teria ali mencionado
expressamente a sua inclusão, como o fez no tipo penal do roubo, ao escrever que é roubo
“subtrair coisa móvel alheia, para si ou para outrem, mediante grave ameaça ou violência a
pessoa, ou depois de havê-la, por qualquer meio, reduzido à impossibilidade de
resistência”. Se não o fez, não pretendia que a violência imprópria excluísse a aplicação da
substituição. No silêncio do legislador, leia-se apenas violência real, pois norma restritiva
deve ter interpretação igualmente restritiva.
Assim entendeu o STJ, no RHC 9.135, tratando não da violência imprópria, mas
sim da violência presumida – para a qual se repetem os mesmos argumentos, à exatidão.
Veja:
É tão controvertida a questão que o próprio STJ apresenta as duas correntes, como
se viu.
Os crimes culposos, como dito, passam neste primeiro quesito da substituição da
pena. Mas e quanto aos crimes punidos pela culpa imprópria, do artigo 20, § 1º, do CP?
Veja:
“Erro sobre elementos do tipo (Redação dada pela Lei nº 7.209, de 11.7.1984)
Art. 20 - O erro sobre elemento constitutivo do tipo legal de crime exclui o dolo,
mas permite a punição por crime culposo, se previsto em lei. (Redação dada pela
Lei nº 7.209, de 11.7.1984)
Descriminantes putativas (Incluído pela Lei nº 7.209, de 11.7.1984)
§ 1º - É isento de pena quem, por erro plenamente justificado pelas circunstâncias,
supõe situação de fato que, se existisse, tornaria a ação legítima. Não há isenção de
pena quando o erro deriva de culpa e o fato é punível como crime culposo.
(Redação dada pela Lei nº 7.209, de 11.7.1984)
(...)”
“Art. 44. Os crimes previstos nos arts. 33, caput e § 1o, e 34 a 37 desta Lei são
inafiançáveis e insuscetíveis de sursis, graça, indulto, anistia e liberdade provisória,
vedada a conversão de suas penas em restritivas de direitos.
Parágrafo único. Nos crimes previstos no caput deste artigo, dar-se-á o livramento
condicional após o cumprimento de dois terços da pena, vedada sua concessão ao
reincidente específico.”
Quanto aos demais crimes desta lei, apenas o caráter hediondo do crime não é óbice
à substituição, se esta se mostrar devida ante o preenchimento de todos os requisitos
objetivos e subjetivos, porque não há qualquer vedação expressa à substituição, na lei. Vale
dizer que, a rigor, poderia ser feita interpretação sistemática deste diploma, da mesma
forma que se fez nas infrações de menor potencial ofensivo, culminando em resultado
oposto: se a lei traz o caráter de infrações mais reprováveis do ordenamento aos crimes
hediondos, mesmo não havendo expressa vedação, a própria lógica da substituição – que,
lembre-se, é recomendável em função da prevenção especial negativa, quando a
neutralização não precisa de prisão – cai por terra. A incompatibilidade entre a Lei dos
Crimes Hediondos e a pena restritiva de direitos é por demais flagrante, mas não tem sido
esta a interpretação jurisprudencial, que admite a substituição da pena aos crimes
hediondos, quando cabível.
O limite de quatro anos da pena aplicada é objetivo, mesmo se há concurso de
crimes: se a pena final, qualquer que seja a forma do concurso, for superior a quatro anos,
não há como substituí-la por restritiva de direitos. Veja o artigo 69 do CP:
“Concurso material
Art. 69 - Quando o agente, mediante mais de uma ação ou omissão, pratica dois ou
mais crimes, idênticos ou não, aplicam-se cumulativamente as penas privativas de
liberdade em que haja incorrido. No caso de aplicação cumulativa de penas de
reclusão e de detenção, executa-se primeiro aquela. (Redação dada pela Lei nº
7.209, de 11.7.1984)
§ 1º - Na hipótese deste artigo, quando ao agente tiver sido aplicada pena privativa
de liberdade, não suspensa, por um dos crimes, para os demais será incabível a
substituição de que trata o art. 44 deste Código. (Redação dada pela Lei nº 7.209,
de 11.7.1984)
§ 2º - Quando forem aplicadas penas restritivas de direitos, o condenado cumprirá
simultaneamente as que forem compatíveis entre si e sucessivamente as demais.
(Redação dada pela Lei nº 7.209, de 11.7.1984)”
“Art. 17. É vedada a aplicação, nos casos de violência doméstica e familiar contra
a mulher, de penas de cesta básica ou outras de prestação pecuniária, bem como a
substituição de pena que implique o pagamento isolado de multa.”
Veja que não se veda as penas restritivas em geral, mas apenas aquelas
representadas por prestações de valores, quaisquer que sejam. A interpretação literal é
bastante, aqui.
Caminhando ao inciso II do artigo 44 do CP, temos como requisito da substituição
da pena a não reincidência do réu em crime doloso, requisito bem óbvio e literal. Contudo,
há que se atentar para o § 3º deste artigo 44, que estabelece que, desde que não seja a
reincidência específica (no mesmo delito), pode o juiz entender que seja socialmente
recomendável a substituição da pena, e, segundo critérios subjetivos, operá-la. Por
exemplo, se o crime anterior, gerador da reincidência, for muito leve – uma injúria, por
exemplo –, pode o juiz mitigar o peso da reincidência, e assim aplicar a pena alternativa.
O inciso III deste artigo 44 traz o requisito atinente ao que se chama de sistema da
relativa determinação na fixação da pena: significa que a pena é imposta pelo juiz, nos
limites da opção legislativa, ou seja, o juiz tem liberdade para individualizar a pena,
respeitando a individualização legislativa que precede a sua atuação. Segundo este inciso
III, é dado ao juiz entender que determinado réu não é merecedor da pena alternativa,
porque a sua culpabilidade, seus antecedentes, sua conduta social e personalidade, bem
como os motivos e as circunstâncias do crime, não indicam ser capaz de neutralizá-lo a
mera pena restritiva de direitos.
Vê-se, então, que na estipulação dos requisitos para a substituição da pena há tanto
critérios legislativos quanto judiciais, traçando um bom meio termo entre liberdade judicial,
manifesta no inciso III, e as exigências da política criminal legislativa, nos incisos I e II.
O limite de seis meses aqui previsto não mais prevalece, ante o limite maior de um
ano previsto no § 2º do artigo 44 do CP. Mas há uma segunda corrente que entende
diversamente, ao argumento de ser uma quebra do sistema, porque segundo este artigo
supra, é possível a aplicação da pena de multa a crimes com violência ou grave ameaça,
apenas observando-se o limite de seis meses e os incisos II e III do artigo 44 do CP, e por
isso é previsão que deveria permanecer vigente, para os improbabilíssimos, mas possíveis,
casos em que haja crime com violência ou grave ameaça com pena final fixada em seis
meses ou menos.
A multa a que se alude é a do artigo 49 do CP, que não gera conversão em outra
pena, se descumprida, mas sim a execução da dívida que representa.
“Multa
Art. 49 - A pena de multa consiste no pagamento ao fundo penitenciário da quantia
fixada na sentença e calculada em dias-multa. Será, no mínimo, de 10 (dez) e, no
máximo, de 360 (trezentos e sessenta) dias-multa. (Redação dada pela Lei nº
7.209, de 11.7.1984)
§ 1º - O valor do dia-multa será fixado pelo juiz não podendo ser inferior a um
trigésimo do maior salário mínimo mensal vigente ao tempo do fato, nem superior
a 5 (cinco) vezes esse salário. (Redação dada pela Lei nº 7.209, de 11.7.1984)
§ 2º - O valor da multa será atualizado, quando da execução, pelos índices de
correção monetária. (Redação dada pela Lei nº 7.209, de 11.7.1984)”
1.3. Conversão
prescreve que "ninguém será processado nem sentenciado senão pela autoridade
competente".”
Casos Concretos
Questão 1
ALBERTO foi denunciado pela prática do crime previsto no art. 180, caput, do CP.
Ao prolatar a sentença condenatória, o juiz aplicou as penas acima do mínimo legal, tendo
considerado a reincidência existente - em razão de condenação anterior transitada em
julgado pelo crime previsto no art. 33, caput, Lei 11.343/06 - como maus antecedentes na
fixação das penas-base. Por essa razão, a reincidência não foi usada na 2ª fase da
dosimetria, para que não houvesse bis in idem. ALBERTO restou, assim, condenado a 2
Resposta à Questão 1
Não poderia, porque o réu é reincidente, e a condenação anterior não lhe recomenda
a pena restritiva de direitos. Assim entendeu o STJ, no HC 32.491:
Questão 2
Responda:
a) Se no caso concreto é cabível tanto o sursis quanto a substituição para pena
restritiva, qual deve o juiz aplicar?
b) Cabe substituição para pena restritiva com relação aos crimes de
constrangimento ilegal, ameaça e lesão corporal leve?
c) Como deve ser feita a sentença se o juiz já percebe ser cabível a substituição
para pena restritiva?
Resposta à Questão 2
a) O artigo 77, III, do CP, determina que seja aplicada a pena restritiva
preferencialmente ao sursis. É uma opção legislativa. Veja:
Questão 3
Resposta à Questão 3
Com relação ao abrandamento do regime, o apelo não deve ser provido, porque a lei
veda explicitamente o regime aberto ao reincidente, neste caso, cabendo apenas o semi-
aberto. Outrossim, quanto à substituição da pena pela alternativa, o apelo é procedente,
porque a condenação anterior não parece ser suficiente para impedir tal substituição.
A respeito, veja o Agravo Regimental no HC 62.637, do STJ:
Tema VI
Penas Restritivas de Direito II. 1) Espécies de penas restritivas de direitos: a) A prestação pecuniária; b) O
perdimento de bens e valores; c) A prestação de serviços à comunidade ou às entidades de caráter público;
d) A interdição temporária de direitos; e) A limitação de fim de semana. 2) A conversão: a) Importância: a
coercibilidade da pena; b) Causas gerais e especiais de conversão.
Notas de Aula9
A prestação pecuniária, do inciso I deste artigo, gera discussão sobre a sua própria
natureza de pena: alguns autores entendem que quando se aplica esta “pena”, há de fato
uma despenalização da conduta, porque impor a indenização pecuniária pelo réu à vítima
nada mais é do que impor algo que já é um efeito da condenação, um efeito cível da prática
do crime, segundo o artigo 91, I, do próprio CP:
Mas há uma só diferença que define a prestação pecuniária como pena, deveras: a
possibilidade de conversão em pena privativa de liberdade. Mesmo por isso, há que se ter
bastante cuidado na aplicação desta pena, porque se o réu não tiver condições de pagar a
prestação imposta, não poderá esta ser convertida, pois a conversão só é devida quando o
descumprimento for injustificado. Se assim for, a sentença ficará sem efeitos,
inviabilizando o cumprimento da pena. Por isso, quando o juiz da execução verificar esta
ineficácia da sentença, poderá modificar a pena restritiva imposta, na forma do artigo 148
da LEP:
O não cumprimento da pena pecuniária pode ensejar a busca, no juízo cível, pelo
condenado ou sua família, do valor devido, sendo a sentença criminal um título executivo
fortíssimo, eis que o juízo criminal poderá converter a pena em privação de liberdade, se o
descumprimento se demonstrar injustificado. E, diga-se, o valor que a vítima entenda
devido a si e que exceda a condenação criminal, pode por ela ser buscado no juízo cível,
descontando-se, por óbvio, aquilo que já houver recebido com base na condenação
criminal.
O artigo 45, § 1º, do CP, define a pena de prestação pecuniária:
Esta pena não pode ser cobrada dos herdeiros, porque não pode transcender a pessoa
do condenado, como impõe o princípio da personalidade, ou intranscendência da pena.
Falecido o réu, extingue-se a pena.
O § 2º do artigo 45 do CP é altamente combatido, reputado como inconstitucional
pela ampla maioria da doutrina. Isto porque se trata, a expressão “prestação de outra
natureza”, de uma pena indeterminada, o que viola o princípio da taxatividade, lex stricta.
Contudo, o dispositivo tem vigência, e o acordo entre as partes pode ser levado à
homologação pelo juiz, que terá controle sobre eventuais abusos.
“(...)
XLVI - a lei regulará a individualização da pena e adotará, entre outras, as
seguintes:
(...)
b) perda de bens;
(...)”
Nenhuma pena abaixo de seis meses pode ser substituída por prestação de serviços,
como determina o artigo 46 do CP:
O § 1º deste artigo supra define a prestação de serviços que pode ser imposta como
pena, deixando clara uma condição: o serviço passível de remuneração pelo beneficiário
não poderá ser estabelecido como pena. Entenda: não pode haver prestação de serviços a
entidades que possam pagar por tais serviços, a não ser para entidades públicas, eis que o
serviço reverterá, neste sentido, para a coletividade.
O serviço imposto não pode prejudicar a rotina de trabalho do condenado, porque
seria empecilho à sua subsistência ou de sua família. Se a pena for superior a um ano,
poderá cumprir em menor tempo, mas nunca inferior à metade.
Toda a pena desta modalidade é regrada e fiscalizada pelo juiz da execução.
Não podendo cumprir, justificadamente, a pena de prestação de serviços, o juiz da
execução pode modificar, com base no já mencionado artigo 148 da LEP, as condições de
cumprimento da pena, ou mesmo a sua natureza, para outra pena restritiva de direitos.
O agente não perde o cargo ou função, quando sofre a incidência dos incisos I e II
do artigo supra: apenas o tem suspenso. Pode haver a perda como efeito da condenação,
mas não por conta desta pena restritiva, que só suspende o exercício. É claro eu esta pena
só tem sentido quando o crime importar em violação pertinente ao exercício da função
profissional do condenado, na forma do artigo 56 do CP:
Luis Flávio Gomes diz que a CRFB não fala em suspensão de mandato eletivo, mas
apenas da perda. Sendo assim, entende esta parte do artigo inconstitucional, por contrariar o
artigo 55, VI, e § 2º, da CRFB:
O inciso III do artigo 47 do CP não tem mais aplicação, eis que o artigo 57 do CP
encaminha tal pena aos crimes culposos de trânsito, que hoje são regulados extenuadamente
no CTB, diploma que prepondera.
Esta pena não tem aplicação prática, porque nenhum Estado da Federação tem
estrutura para o seu cumprimento. Além disso, há uma forte crítica a esta pena: ela é
cumprida em estabelecimento prisional, e por isso consiste em indevido contato do
condenado com criminosos presos, o que foge à lógica da pena substitutiva da privação da
liberdade, que é a descarcerização.
O artigo 180 da LEP traz ainda uma hipótese peculiar, em que o próprio juiz da
execução impõe a substituição:
“Art. 180. A pena privativa de liberdade, não superior a 2 (dois) anos, poderá ser
convertida em restritiva de direitos, desde que:
I - o condenado a esteja cumprindo em regime aberto;
II - tenha sido cumprido pelo menos 1/4 (um quarto) da pena;
III - os antecedentes e a personalidade do condenado indiquem ser a conversão
recomendável.”
Mesmo que o juiz da condenação não tenha dado a substituição, preenchidos estes
requisitos, no curso da execução, o juiz da execução pode converter a pena.
Casos Concretos
Questão 1
Resposta à Questão 1
Questão 2
RENATO foi condenado a uma pena reclusiva que foi substituída pela pena
restritiva de prestação de serviços à comunidade. Posteriormente, adveio outra
condenação: a pena privativa de liberdade em regime semi-aberto, ainda não transitada
em julgado. O juiz da VEP, ao argumento da impossibilidade de cumprimento
concomitante das penas, converteu a pena restritiva de direitos em privativa de liberdade.
Agiu corretamente o Magistrado? Justifique.
Resposta à Questão 2
JOEL foi condenado pela prática do art. 33 da Lei 11.343/06, por guardar
maconha - cerca de 290g, que se achava dividida em 21 invólucros e 5 tabletes, enterrada
no quintal de sua casa, a cinco anos de reclusão em regime fechado e multa de 500 dias,
sendo a pena reclusiva substituída pela restritiva de direito de prestação de serviços à
comunidade. Tanto a defesa como o Ministério Público apelaram. Aquela pugnou pela
desclassificação para o modelo legal do art. 28 da Lei 11.343/06; este criticou a
substituição da pena reclusiva por restritiva de direitos. Se você fosse o Juiz da causa,
como teria decidido?
Resposta à Questão 3
É certo que não há procedência no pedido da defesa, pois o uso está absolutamente
desconfigurado. Quanto à pretensão do parquet, há expressa vedação à substituição, in
casu, no artigo 44, e além disso, a pena é de cinco anos, suplantando o teto permissivo da
pena alternativa – tem razão o MP.
Tema VII
A Execução Penal e seus Incidentes I. 1) Considerações gerais: objetivos da Lei 7.210/84. O trabalho
prisional. A detração penal. 2) A suspensão condicional da pena e o livramento condicional. A reabilitação.
(Natureza jurídica. Requisitos. Espécies. Revogação e Prorrogação. A extinção da pena).
Notas de Aula10
1. Execução penal
10
Aula ministrada pelo professor Álvaro Mayrink da Costa, em 17/4/2009.
Von Liszt sustentava que a pena é necessária para a manutenção da ordem jurídica e,
conseqüentemente, a própria manutenção do Estado de direito. Na execução da pena, o
Estado deve conclamar a comunidade, que deve participar do processo executório. Na
aplicação da pena, veja, apenas o juiz tem um atuar; na sua execução, também toma parte a
comunidade.
Por isso, três são as figuras que têm interesses e expectativas legítimos na execução
penal: a vítima do crime, qualquer que seja, que espera a reparação do seu dano; o
transgressor, o delinqüente, que tem expectativa de sua reinserção social; e a comunidade,
que objetiva a ordem e paz social.
Para que a resposta penal do Estado à lesão ao bem jurídico seja satisfatória, surgem
alguns paradigmas a serem observados, formando alguns modelos para esta resposta. O
primeiro é o dissuasório: o Estado atua antes da necessidade de executar a pena, porque
atua prevenindo a criminalidade. O segundo é o ressocializador, que visa a inserção e
reabilitação do condenado – inserção, e não reinserção, porque a grande massa criminosa
jamais se inseriu regularmente na sociedade, por falta de oportunidade. E o terceiro é o
modelo integrador, que busca a conciliação, a composição dos danos sociais causados.
Estes três paradigmas coexistem na execução da pena.
Aquelas pessoas que não têm um comportamento compatível com as normas
sociais, vigentes no macrossistema social, da sociedade aberta, são postos, pelo sistema
executivo da pena, em um microssistema social baseado nos paradigmas mencionados.
A pena é uma medida traumática, mas ainda é imprescindível, pois diante dos
conflitos intoleráveis, eleitos pelo direito penal, a paz social deve ser mantida, e assim a
pena assume sua função pacificadora. É uma amarga necessidade, diante de uma sociedade
de seres imperfeitos.
A pena existe em três momentos: a cominação, dada ao Legislativo; a aplicação,
dada ao Judiciário; e a execução, dada ao Judiciário e ao Executivo.
A prospecção do sistema penal, para o próximo século, certamente é mudança de
sua concepção fulcral: a reprimenda tenderá a ser uma sanção pedagógica, mais do que uma
pena formal privativa de liberdade. Assim, as penas de prestação de serviços à comunidade,
a advertência, a participação em programas sociais, serão o caminho da pena moderna, sem
dúvidas. Luigi Ferrajoli neste sentido, entende que a prisão é ao mesmo tempo uma medida
lesiva e antisocial, promotora da desigualdade, e inutilmente aflitiva.
Definir o que seja uma pena justa é tarefa difícil. Pode-se começar dizendo que é
justa a pena que é necessária, obrigatória e proporcional. E um norte geral da medida de
justeza da pena é que a privação da liberdade, o cárcere, seja reservado aos criminosos cujo
grau de isolamento provocava não a melhora, mas sim a deterioração mental dos
encarcerados.
Veio, então, o sistema alburniano, para substituir o pensilvânico, no qual os presos
passam a trabalhar durante o dia, recolhendo-se ao isolamento somente à noite, mas ainda
sendo-lhes imposto o silêncio absoluto.
Passa-se, então, ao terceiro regime prisional na escalada histórica, o modelo
progressivo irlandês, que é o hoje adotado no Brasil, dada a progressão do regime de
cumprimento de pena. Neste, não há imposição de silêncio; há meios de integração social,
como o trabalho diurno na semi-liberdade; e não há as penas corporais pelas faltas
cometidas, como havia anteriormente.
Uma outra evolução deste sistema irlandês é a formação do pecúlio: o preso que
trabalha tem direito a perceber salário, hoje equivalente a três quartos do salário-mínimo,
numerário este que se acumula e é destinado ao intento que o preso pretender.
A execução progressiva é regida pelo mérito do condenado: é de seu bom
comportamento que vem o direito a progredir no regime de cumprimento da pena. Da
mesma forma, havendo falta grave que o desabone, impõe-se a regressão do regime, do
menos grave para o mais grave.
Com a nova redação do artigo 112 da LEP, houve um verdadeiro retrocesso na
execução penal. Veja as redações anterior e atual:
“Art. 112. A pena privativa de liberdade será executada em forma progressiva, com
a transferência para regime menos rigoroso, a ser determinada pelo Juiz, quando o
preso tiver cumprido ao menos 1/6 (um sexto) da pena no regime anterior e seu
mérito indicar a progressão.
Parágrafo único. A decisão será motivada e precedida de parecer da Comissão
Técnica de Classificação e do exame criminológico, quando necessário.”
“Art. 112. A pena privativa de liberdade será executada em forma progressiva com
a transferência para regime menos rigoroso, a ser determinada pelo juiz, quando o
preso tiver cumprido ao menos um sexto da pena no regime anterior e ostentar bom
comportamento carcerário, comprovado pelo diretor do estabelecimento,
respeitadas as normas que vedam a progressão. (Redação dada pela Lei nº 10.792,
de 1º.12.2003)
§ 1o A decisão será sempre motivada e precedida de manifestação do Ministério
Público e do defensor. (Redação dada pela Lei nº 10.792, de 1º.12.2003)
§ 2o Idêntico procedimento será adotado na concessão de livramento condicional,
indulto e comutação de penas, respeitados os prazos previstos nas normas vigentes.
(Incluído pela Lei nº 10.792, de 1º.12.2003)”
“Art. 127. O condenado que for punido por falta grave perderá o direito ao tempo
remido, começando o novo período a partir da data da infração disciplinar.”
Destarte, se o preso comete falta grave, perderá todo o tempo de remição de pena
até então amealhado com o trabalho.
Vale dizer que o trabalho artístico é servível à remição, e assim também o é o tempo
dedicado ao estudo. Para tais trabalhos e estudo, forma-se planilha com as horas a serem
computadas, que se homologada, proporciona remição.
1.3. Detração
1.4. Sursis
Questão 1
renúncia tácita - bem como o caráter secundário da reparação do dano para o fim de
concessão da reabilitação criminal - o que a torna prescindível; aduziu, também, que nada
impede que a parte interessada pleiteie indenização cível após a concessão da
reabilitação, a qualquer tempo. Diante de tais argumentos, a reabilitação deve ser
concedida? Fundamente.
Resposta à Questão 1
“Reabilitação
Art. 93 - A reabilitação alcança quaisquer penas aplicadas em sentença definitiva,
assegurando ao condenado o sigilo dos registros sobre o seu processo e
condenação. (Redação dada pela Lei nº 7.209, de 11.7.1984)
Parágrafo único - A reabilitação poderá, também, atingir os efeitos da condenação,
previstos no art. 92 deste Código, vedada reintegração na situação anterior, nos
casos dos incisos I e II do mesmo artigo. (Redação dada pela Lei nº 7.209, de
11.7.1984)”
“Art. 202. Cumprida ou extinta a pena, não constarão da folha corrida, atestados ou
certidões fornecidas por autoridade policial ou por auxiliares da Justiça, qualquer
notícia ou referência à condenação, salvo para instruir processo pela prática de
nova infração penal ou outros casos expressos em lei.”
Vale dizer que somente com a reabilitação se consegue o efeito purificador da folha
criminal, inclusive para nomeação em cargos públicos concursados e até mesmo na OAB.
No caso concreto, o fato de o agente não ter sido acionado para pagamento dos
danos causados à vítima não é suficiente para elidir o preenchimento do requisito do inciso
III do artigo 94 do CP. É preciso que o próprio agente demonstre que buscou eficazmente a
composição do dano, e que por impossibilidade de localizar a vítima, ou por renúncia desta,
não pôde fazê-lo. Não bastam as alegações de que a vítima não buscou cobrar a reparação:
é preciso que haja comprovação da intentada sanatória do dano pelo pretendente à
reabilitação.
Tema VIII
A Execução Penal e seus Incidentes II. 1) As medidas de segurança: diferenças para a pena. Requisitos e
espécies. Verificação de cessação de periculosidade. 2) Das conversões. Do excesso ou desvio.
Características.
Notas de Aula11
1. Medidas de segurança
11
Aula ministrada pelo professor Álvaro Mayrink da Costa, em 17/4/2009.
“Inimputáveis
Art. 26 - É isento de pena o agente que, por doença mental ou desenvolvimento
mental incompleto ou retardado, era, ao tempo da ação ou da omissão,
inteiramente incapaz de entender o caráter ilícito do fato ou de determinar-se de
acordo com esse entendimento. (Redação dada pela Lei nº 7.209, de 11.7.1984)
Redução de pena
Parágrafo único - A pena pode ser reduzida de um a dois terços, se o agente, em
virtude de perturbação de saúde mental ou por desenvolvimento mental incompleto
ou retardado não era inteiramente capaz de entender o caráter ilícito do fato ou de
determinar-se de acordo com esse entendimento.(Redação dada pela Lei nº 7.209,
de 11.7.1984)”
regime de tratamento ambulatorial. Ocorre que esta equivalência não guarda coerência com
a sistemática das medidas de segurança pela seguinte razão: ao se aplicar uma ou outra
medida, não se deve observar o fato praticado, mas sim a condição mental do inimputável.
E este juízo é psiquiátrico, e não legislativo.
Outro aspecto que deve ser abordado diz respeito às saídas terapêuticas. É
altamente recomendável, a qualquer paciente internado, que haja a sua saída temporária do
nosocômio, a fim de que ele mantenha um mínimo contato com a realidade, melhorando
suas chances de reinserção social.
A progressão também é devida ao inimputável, bem como a regressão. Mas os
parâmetros para tal progressão ou regressão são totalmente diversos dos que se impõem
para o condenado a pena privativa de liberdade: aqui, se observa a melhora ou piora do
estado clínico do agente, e não o cumprimento de requisitos diversos, como na progressão
da pena.
A pena, de fato, difere da medida de segurança em muitos aspectos, mas sem
dúvidas a mais relevante diferenciação é quanto à determinação do período: a pena perdura
pelo tempo fixado em sentença, enquanto a medida de segurança perdura indefinidamente,
pelo tempo que se entender necessário. Há que se observar que realmente a pena tem tempo
determinado, e a medida de segurança parte de um prazo máximo de três anos, mas
renovável pelo tempo que se fizer necessário.
Entenda: a pena está ligada à culpabilidade, e só são apenados aqueles que são
culpáveis. A medida de segurança, por seu turno, é ligada à periculosidade do agente, e
como já se pôde ver, esta periculosidade não pode contar com prazo fixo para terminar,
porque é uma condição imanente ao estado mental do agente. Daí a indeterminação, de
fato, da medida de segurança.
Outra diferenciação é quanto ao escopo: a medida de segurança tem natureza
precipuamente preventiva, enquanto o caráter predominante da pena é, sem dúvida, o
repressivo.
Vale trazer aqui, pelo ensejo, a discussão que ainda se trava quanto à
indeterminação do prazo da medida de segurança, e pode-se fazer um estudo indutivo
partindo-se de um caso emblemático nos anais penais brasileiros, o caso Febrônio Índio do
Brasil. Este indivíduo permaneceu em manicômios judiciais por quarenta e seis anos,
tornando-se um exemplo do absurdo que pode alcançar a indeterminação da medida de
segurança.
Tentando evitar este risco do absurdo, a doutrina propõe, de um lado, que seja
limitada a medida de segurança ao período máximo de pena privativa de liberdade
existente, hoje em trinta anos. Uma segunda corrente defende que seja teto da medida de
segurança o máximo da pena que, em abstrato, se comina ao injusto penal por ele praticado
– fosse roubo, o prazo máximo seria de dez anos.
Sendo o caso de se aplicar um ou outro limite temporal, o agente ainda com o
transtorno mental presente que alcançar o tempo limítrofe será submetido a um processo
cível de interdição, e, interditado, será posto em um hospital psiquiátrico, que pode até ser
um nosocômio privado, mas não será mais tratado em hospital de custódia, eis que não
estará mais sob medida de segurança. E veja que esta internação será regida pelas normas
civis, em que a curatela será mandante da sua internação, sem ingerência do Estado penal –
esta internação não é obrigatória.
Outra problemática diz respeito ao agente que vinha cumprindo pena privativa de
liberdade, oriunda de condenação quando era imputável, mas no curso do cumprimento,
padece de surto, é acometido por um transtorno mental – há uma inimputabilidade
superveniente, por assim dizer. Neste caso, o preso será transferido para o hospital de
custódia, como os internados em medida de segurança, até que se cure. Se recuperar-se
satisfatoriamente, retornará para a unidade prisional para cumprir o restante da pena, sem
que tenha qualquer dificuldade na solução do tempo, eis que não há qualquer interrupção –
apenas cumpriu parte do tempo de pena em tratamento, nada mais.
O problema surge é quando o agente não se recupera antes que termine o seu tempo
de pena privativa de liberdade, como quando o quadro de transtorno mental se demonstra
irreversível. A solução é que converter-se-á a pena privativa de liberdade em medida de
segurança, e haverá a revisão anual da situação mental do agente, até o fim do prazo que
lhe fora fixado como pena privativa de liberdade. Esta é a posição majoritária dos tribunais,
hoje. Destarte, se o agente sucumbe a doença mental quando lhe faltavam cumprir dois
anos de pena privativa de liberdade, permanecerá no hospital de custódia por apenas mais
dois anos, sendo liberto em seguida.
A regra geral da extinção da medida de segurança, que é dedutível, mas que precisa
ser mencionada, é de que esta se extingue quando cessada a periculosidade do agente.
Casos Concretos
Questão 1
Resposta à Questão 1
Sim, a ordem deve ser concedida. A medida tomada pelo juiz da execução estava
correta, tendo errado o Tribunal. Isto porque a conversão da execução da pena em medida
de segurança não pode estender o prazo além do que restava-lhe cumprir como pena
privativa de liberdade. É, de fato, uma violação à coisa julgada, que fixou a pena privativa.
O STJ, no HC 26.733, assim se manifestou:
Questão 2
CAIO, inimputável, tendo praticado injusto penal punido com detenção, foi
absolvido no Juízo Criminal, que aplicou medida de segurança de internação por um
período mínimo de três anos. Dois anos após o início da execução da medida de
segurança, seu advogado ingressou no Juízo da Execução, pretendendo o seguinte:-
Extinção da punibilidade, tendo em vista que a pena máxima cominada ao injusto penal
praticado era de dois anos, já tendo ele, portanto, cumprido o tempo da pena;- Caso
indeferido o primeiro requerimento, que fosse antecipada a perícia para verificar a
periculosidade do agente. Pergunta-se:
a) Merecem ser acolhidas tais pretensões?
b) A situação seria diferente se ele fosse semi-imputável?
c) Poderia o Juiz converter a internação em tratamento ambulatorial?
d) Se tivesse cumprido mais tempo de medida de segurança do que a pena máxima
cominada haveria excesso ou desvio na execução?
e) Se CAIO fosse semi-imputável e o juiz tivesse aplicado pena privativa de
liberdade, na fase de execução, poderia haver conversão de pena privativa de
liberdade em restritiva de direitos?
Resposta à Questão 2
“Art. 185. Haverá excesso ou desvio de execução sempre que algum ato for
praticado além dos limites fixados na sentença, em normas legais ou
regulamentares.”
deste artigo, chega-se à conclusão de que este dispositivo ficou praticamente sem
aplicação com a nova redação dada ao CP no que toca às penas restritivas de direito,
tendo em vista a ampliação de sua aplicação. É importante também lembrar que a
conversão da pena restritiva de direitos em privativa de liberdade da LEP sofreu
alteração com a Lei 9.714/98. Que a conversão da pena em medida de segurança
(artigo 183 da LEP) é extremamente prejudicial ao réu, uma vez que havendo
superveniência de doença mental, é possível simplesmente a transferência para
hospital de tratamento, aplicando-se a detração (artigo 108 da LEP e 41 do CP).
“Art. 180. A pena privativa de liberdade, não superior a 2 (dois) anos, poderá ser
convertida em restritiva de direitos, desde que:
I - o condenado a esteja cumprindo em regime aberto;
II - tenha sido cumprido pelo menos 1/4 (um quarto) da pena;
III - os antecedentes e a personalidade do condenado indiquem ser a conversão
recomendável.”
Tema IX
Notas de Aula12
1. Extinção da punibilidade
12
Aula ministrada pelo professor Marcus Henrique Pinto Basílio, em 27/4/2009.
“Extinção da punibilidade
Art. 107 - Extingue-se a punibilidade: (Redação dada pela Lei nº 7.209, de
11.7.1984)
I - pela morte do agente;
II - pela anistia, graça ou indulto;
III - pela retroatividade de lei que não mais considera o fato como criminoso;
IV - pela prescrição, decadência ou perempção;
V - pela renúncia do direito de queixa ou pelo perdão aceito, nos crimes de ação
privada;
VI - pela retratação do agente, nos casos em que a lei a admite;
VII - (Revogado pela Lei nº 11.106, de 2005)
VIII - (Revogado pela Lei nº 11.106, de 2005)
IX - pelo perdão judicial, nos casos previstos em lei.”
Vejamos cada um dos casos em separado, sendo que o inciso da prescrição terá
análise em tema próprio, adiante.
A morte do agente é causa óbvia de extinção de sua punibilidade, eis que ele não
está mais entre nós, e seus herdeiros nada podem padecer, por conta da intranscendência da
pena.
A morte se comprova pela certidão de óbito. Apresentado este documento, o juiz
abre vistas ao MP, que oficia ao cartório de registro civil, e, confirmada a veracidade do
óbito, extingue-se a punibilidade.
Surge uma questão: se a certidão de óbito for falsa, e o juiz extingue a punibilidade
do agente indevidamente, há duas soluções contrárias a disputar o tema. A primeira tese,
doutrinária entende que nada há a fazer, porque não há reformatio pro societatis na revisão
criminal, e o Estado estaria impedido de agir contra aquele acusado, a não ser a própria
persecução do crime de uso de documento falso. Esta é a posição majoritária na doutrina. A
outra corrente, que é do STF e do STJ, defende que a certidão falsa não gera nenhuma
conseqüência, porque o que extingue a punibilidade, em verdade, é a própria morte, e não a
notícia da morte feita pela certidão – é como se a punibilidade jamais houvesse sido extinta,
e o agente pode ser normalmente processado. Neste sentido, veja o HC 84.525, do STF
(que foi impetrado contra a decisão do STJ no mesmo sentido):
A graça e o indulto, como dito, têm efeitos diversos: extinguem a punibilidade, mas
não elidem os efeitos penais do crime, ou seja, o réu agraciado ou indultado não é primário,
por exemplo. A diferença é que a graça é pessoal, individualmente concedida a um
condenado, enquanto o indulto é coletivo, concedido a uma determinada gama de pessoas.
A CRFB não veda, expressamente, a concessão de indulto para crimes hediondos.
Surge a questão: este ato, que é discricionário do Presidente da República, e só pode ser
efetivado após a condenação, poderia ser praticado em favor de criminosos incidentes em
crime hediondo? A Lei dos Crimes hediondos, no artigo 2º, I, veda expressamente, mas a
questão persiste: poderia uma lei infraconstitucional limitar o poder dado ao Presidente da
República pela CRFB, no artigo 84, XII? Veja:
Tal como a anistia, a abolitio criminis faz desaparecer o delito e seus efeitos penais,
persistindo apenas os efeitos civis. Se a lei deixa de considerar criminosa uma conduta, o
agente simplesmente é tratado como se nunca houvesse cometido o crime.
Em regra, uma lei penal não entra em vigor imediatamente após sua publicação,
havendo uma vaccatio entre sua publicação e seu vigor. A exceção é justamente a abolitio
criminis: ela tem aplicação imediata em favor dos que dela se favorecem, extinguindo a
punibilidade e libertando-os imediatamente dos efeitos penais.
O juízo competente para aplicação da lei mais favorável, se já há trânsito em
julgado da sentença condenatória, é o juízo da execução.
Veja um exemplo: a Lei 6.368/76 trazia o artigo 12, § 2º, III, que tipificava de forma
absolutamente aberta a conduta ali punida (sendo claramente inconstitucional, portanto). O
novo diploma de drogas, a Lei 11.343/06, não repetiu esta cominação, mas trouxe outras
previsões que definiram melhor as condutas que se pretendia imputar. Sendo abolida esta
previsão da lei anterior, a súmula 611 do STF diz que é o juiz da execução quem aplicará a
nova lei mais favorável, se já há trânsito em julgado. Veja os dispositivos:
A renúncia ocorre antes de ser iniciada a ação penal, e pode ser expressa ou tácita.
Renunciado o direito de queixa em relação a um dos autores do crime, esta se estende aos
demais co-autores e partícipes.
O perdão aceito pelo querelado, nos crimes de ação penal privada, ocorre no curso
da ação, quando a vítima, ofendido, perdoa o ofensor, com a aceitação deste. Caso não
aceite o perdão oferecido, a ação processar-se-á normalmente, até o julgamento.
Veja um caso peculiar: imagine-se que a mulher, vítima pobre, é estuprada pelo
marido, e, mediante representação (porque a vítima é pobre), o marido é acionado pelo MP
e condenado. No curso da execução, a vítima perdoa o condenado. Sendo a ação penal
pública condicionada à representação, este perdão é cabível? Veja que, na lei, só é possível
perdão em ação penal privada, mas se o perdão, neste caso, for negado ao autor do fato,
estar-se-á prejudicando-o – e à vítima que quer perdoar, diga-se – pelo fato de a vítima ser
pobre. Por isso, entende-se cabível o perdão, neste caso, em atenção ao princípio da
isonomia. É claro que, fosse estupro com lesão corporal grave, a ação seria pública por
natureza, e não se falaria em perdão.
A lei pode estabelecer que o juiz perdoe o infrator, mas deve fazê-lo expressamente,
em regra. A natureza jurídica da sentença que concede o perdão judicial é questão
polêmica; o STJ, na súmula 18, entende-a declaratória:
Questão 1
Resposta à Questão 1
a) A punibilidade do agente restou extinta pela sua morte, por óbvio, e o pedido do
MP, de extração da carta de sentença para cobrança da multa dos herdeiros, deve ser
indeferido, porque esta, como pena que é, deve acompanhar a extinção da
punibilidade da pena principal. Do contrário, a pena estaria transcendendo a figura
do apenado, o que não se tolera. O que os herdeiros terão que suportar é a perda de
bens adquiridos com produto do crime, bem como os efeitos civis (indenizações
eventualmente exigidas pela vítima), mas não a pena criminal.
Questão 2
MARIA, na véspera de completar catorze anos, iniciou sua vida sexual com JOÃO,
por quem era apaixonada. JOSÉ, que sempre fora apaixonado por MARIA, ao encontrar-
se com JOÃO num bar, e querendo desonrá-lo, o xinga de estuprador. Dois anos depois,
JOÃO e MARIA casaram-se. Pergunta-se:
a) Houve, realmente, o estupro?
b) Se surgisse uma lei posterior que deixasse de considerar como relevante os casos
de violência presumida, haveria alteração?
c) Se JOÃO processasse JOSÉ por crime contra a honra, e este se retratasse antes
da sentença, esta conduta seria relevante?
d) Na hipótese anterior, seria possível o perdão judicial?
e) No mesmo caso, poderia haver perempção por parte de JOSÉ?
Resposta à Questão 2
d) O artigo 140, § 1º, do CP, até permite o perdão, mas não é aplicável, in casu,
porque a situação escapa às hipóteses lá traçadas.
e) Não, pois que José é o réu, e a perempção atinge o autor da ação penal privada,
o querelante.
Questão 3
Resposta à Questão 3
“Art. 18. As penas dos crimes definidos nesta Lei serão aumentadas de 1/3 (um
terço) a 2/3 (dois terços):
(...)
III - se qualquer deles decorrer de associação ou visar a menores de 21 (vinte e um)
anos ou a quem tenha, por qualquer causa, diminuída ou suprimida a capacidade de
discernimento ou de autodeterminação;
(...)”
Quanto ao regime, sequer há mais previsão de não progressão do regime, pelo que é
claro que a merece, não havendo mais discussão.
O artigo 33, § 4º, da Lei 11.343/06, traz uma redução da pena inovativa no sistema,
e é claro que deve retroagir. O problema reside apenas quanto a que pena será aplicado: à
pena da lei anterior ou sobre a lei atual, com pena maior. E há ainda uma terceira corrente,
que entende que deve ser aplicado à lei anterior, mas com a limitação ao mínimo de um ano
e oito meses, porque é o mínimo possível na nova lei, revelando o mínimo de reprovação
esperado pelo legislador.
“Art. 33. Importar, exportar, remeter, preparar, produzir, fabricar, adquirir, vender,
expor à venda, oferecer, ter em depósito, transportar, trazer consigo, guardar,
prescrever, ministrar, entregar a consumo ou fornecer drogas, ainda que
gratuitamente, sem autorização ou em desacordo com determinação legal ou
regulamentar:
Pena - reclusão de 5 (cinco) a 15 (quinze) anos e pagamento de 500 (quinhentos) a
1.500 (mil e quinhentos) dias-multa.
(...)
§ 4º Nos delitos definidos no caput e no § 1o deste artigo, as penas poderão ser
reduzidas de um sexto a dois terços, vedada a conversão em penas restritivas de
direitos, desde que o agente seja primário, de bons antecedentes, não se dedique às
atividades criminosas nem integre organização criminosa.”
Parece mais justo, porém, que se aplique o redutor à pena anterior, sem limitação de
mínimo, porque é uma construção não muito técnica aplicar-se este mínimo.
Tema X
Extinção da Punibilidade II. A Prescrição (primeira parte). 1) Introdução: definição e importância do tema.
Diferença entre prescrição penal e civil. Diferença entre prescrição, decadência e perempção. Hipóteses de
imprescritibilidade. 2) Espécies de prescrição: a) A prescrição da pretensão punitiva: prescrição em abstrato
e prescrição intercorrente (exame das questões teóricas controvertidas).
Notas de Aula13
1.Prescrição
13
Aula ministrada pelo professor Marcus Henrique Pinto Basílio, em 27/4/2009.
“(...)
XLII - a prática do racismo constitui crime inafiançável e imprescritível, sujeito à
pena de reclusão, nos termos da lei;
(...)
XLIV - constitui crime inafiançável e imprescritível a ação de grupos armados,
civis ou militares, contra a ordem constitucional e o Estado Democrático;
(...)”
“Art. 60. Nos casos em que somente se procede mediante queixa, considerar-se-á
perempta a ação penal:
I - quando, iniciada esta, o querelante deixar de promover o andamento do
processo durante 30 dias seguidos;
II - quando, falecendo o querelante, ou sobrevindo sua incapacidade, não
comparecer em juízo, para prosseguir no processo, dentro do prazo de 60
(sessenta) dias, qualquer das pessoas a quem couber fazê-lo, ressalvado o disposto
no art. 36;
III - quando o querelante deixar de comparecer, sem motivo justificado, a qualquer
ato do processo a que deva estar presente, ou deixar de formular o pedido de
condenação nas alegações finais;
IV - quando, sendo o querelante pessoa jurídica, esta se extinguir sem deixar
sucessor.”
Veja que se o querelante deixar de comparecer a atos do processo com justificativa
plausível, não se opera a perempção, por óbvio.
Como dito, a prescrição afeta o direito de punir ou o de executar a pena. A perda do
direito de punir é a prescrição da pretensão punitiva; a perda do direito de executar a pena
se trata da prescrição da pretensão executória. A diferenciação de uma e outra é
determinada por um evento único: a existência da condenação transitada em julgado. Antes
do trânsito, há curso de prescrição da pretensão punitiva; após o trânsito, há prescrição da
pretensão executória. Simples assim.
A importância em se diferenciar a prescrição da pretensão punitiva da executória é a
diferença que há nos efeitos de uma e outra. Quando há perda do direito de punir, a
prescrição corresponde a uma absolvição do réu, amplamente elisiva dos efeitos negativos
do processamento criminal sobre o réu. A prescrição executória, por sua vez, afasta a
possibilidade de que haja cumprimento de pena, mas todos os efeitos da condenação que foi
Casos Concretos
Questão 1
CARLOS, conhecido meliante, veio a ser condenado, após um ano e seis meses da
data do recebimento da denúncia, a uma pena de nove meses de detenção, transitando em
julgado a sentença para a acusação. CARLOS apelou, pugnando pelo reconhecimento da
negativa de autoria, sendo que o Tribunal verificou a existência de uma nulidade absoluta
e anulou o processo do qual resultou a sentença condenatória a ele imposta, e determinou
a devolução dos autos à primeira instância para novo processo e julgamento. Assim sendo,
o juiz da causa, em 24/10/2007, dois anos e meio depois da data do recebimento da
denúncia, entregou em cartório o processo, através do qual condenou CARLOS a uma
pena de um ano e dois meses de detenção. A defesa novamente apelou, sendo que a sessão
de julgamento foi designada para o dia 24/10/2008. Pergunta-se: ocorreu prescrição?
Resposta à Questão 1
Tendo em vista que o processo foi anulado em razão do recurso exclusivo da defesa,
a nova pena não poderia ser maior do que a anteriormente aplicada, sob pena de violação da
reformatio in pejus indireta. Assim, o Tribunal deve anular a nova sentença, reconhecendo
que o máximo de pena a ele aplicada seria de nove meses de detenção. A anulação demanda
que se volte a verificar a prescrição pela pena máxima em abstrato, mas esta pena máxima
abstrata, neste caso concreto, passou a ser de nove meses, porque qualquer superação deste
máximo é violação ao ne reformatio in pejus.
Em razão disso, deve o Tribunal, em seguida, reconhecer a prescrição da pretensão
punitiva, na modalidade da prescrição retroativa, entre a data do recebimento da denúncia e
a data da segunda sentença.
Vale dizer que, caso se entenda que é possível a reformatio in pejus, porque a
sentença foi desconstituída do mundo jurídico, o prazo prescricional será de quatro anos, e
o delito não terá prescrito.
Questão 2
Resposta à Questão 2
A prescrição da lesão corporal leve ocorre em quatro anos, pois a pena máxima é de
um ano. Contudo, pelo artigo 115 do CP, reduz-se o prazo pela metade, pois o réu é menor
de vinte e um anos. Logo, o crime prescreveu, pois se passaram mais de dois anos entre
dois marcos interruptivos.
Questão 3
Resposta à Questão 3
a) A pena, em abstrato, se limita a quatro anos, eis que é o quantum posto como
teto pelo parquet. Sendo assim, com base na pena máxima de quatro anos, o
Tribunal poderá reconhecer esta prescrição, caso entre a sentença condenatória e
o trânsito em julgado do acórdão confirmatório passem-se oito anos.
Tema XI
Notas de Aula14
14
Aula ministrada pelo professor Marcus Henrique Pinto Basílio, em 27/4/2009.
1ª causa de interrupção da
prescrição: recebimento da 2ª causa de interrupção da Trânsito em
Fato criminal denúncia ou queixa prescrição: sentença julgado da
condenatória condenação
Prescrição intercorrente
“Furto
Art. 155 - Subtrair, para si ou para outrem, coisa alheia móvel:
Pena - reclusão, de um a quatro anos, e multa.
(...)”
Imagine-se que desde o fato criminoso até o recebimento da denúncia correm seis
anos: o crime não está prescrito, quando deste ato de recebimento, e o juiz deverá dar
prosseguimento ao feito. Entre o recebimento da denúncia e a sentença condenatória,
correm dois anos, não havendo, novamente, a prescrição, porque neste interregno contava o
juiz com novos oito anos. Mas suponha-se que a sentença condena o furtador em pena de
um ano: o artigo 110 do CP determina que se faça uma reanálise do iter temporal desde
quando cometido o crime, a fim de verificar se, com base agora na pena aplicada, há
prescrição. Sendo a pena aplicada de um ano, prescreve em quatro anos; observando-se o
período mais imediato entre causas de interrupção – termo compreendido entre o
recebimento da denúncia e a sentença condenatória –, verifica-se, no exemplo, que há
apenas dois anos corridos, não havendo prescrição, ali. Ao observar-se o outro interregno,
entre o fato criminoso e o recebimento da denúncia, verifica-se que este período conta com
seis anos; sendo assim, há, ali, prescrição a ser declarada, porque os quatro anos da
prescrição do crime pela pena aplicada foram ultrapassados: há prescrição retroativa da
pretensão punitiva, no exemplo em análise.
Veja que o legislador determina esta dupla análise da pretensão punitiva, uma
inicial, com base na pena máxima cominada, e uma após a sentença, com base na pena
aplicada em concreto, pela simples e óbvia razão de que, antes da sentença, não há como o
legislador saber qual a pena em concreto que parametrizará a prescrição. E esta primeira
análise, com base na pena abstrata, tem sua função, porque o crime pode se demonstrar
prescrito já na fase de recebimento da denúncia, impedindo o processamento de feito inútil.
Outro detalhe relevante diz respeito à condicionante da pena aplicada ter transitado
em julgado apenas para a acusação: assim o é porque, uma vez que a acusação não recorra
da pena, não poderá esta ser majorada, se houver recurso da defesa (pela consabida
vedação à reformatio in pejus), estabelecendo-se como pena máxima possível para aquele
réu, desde então. Mesmo por isso, se a acusação recorre, mas não para aumentar a pena
(impugna apenas o regime estabelecido, por exemplo), a prescrição pela pena aplicada
poderá ter efeitos, eis que se fixou a pena máxima possível.
Há que se comentar, aqui, sobre a prescrição pela pena ideal. Este instituto não
existe no ordenamento, mas tem aplicação prática, na seguinte forma: quando a acusação se
vê diante de um fato criminoso, ela tem que calcular a pena máxima cominada para o
crime, a fim de vê-lo prescrito ou não, mas deve se precaver em relação à pena que
provavelmente será aplicada na sentença, a fim de não deixar que, na análise retroativa do
período compreendido entre o fato criminoso e o recebimento da denúncia, haja a
prescrição retroativa pela pena aplicada. Entenda: se na lesão corporal simples a prescrição
é em quatro anos, porque a pena máxima é de um ano, o parquet deverá avaliar a situação
do crime, porque qualquer coisa que leve à fixação da pena em limite inferior fará com que
a prescrição retroativa seja calculada em dois anos, porque a pena será inferior a um ano.
Sendo o caso, deverá diligenciar para denunciar em menos de dois anos, ou estará o crime
fadado à prescrição pela pena aplicada.
Este cálculo da prescrição pela pena que futuramente será aplicada, prescrição pela
pena ideal (ainda no campo das idéias, eis e a sentença ainda não existe), não existe no
ordenamento, mas a seguinte construção deve ser feita: quando o juiz encontrar esta
situação – no exemplo da lesão corporal simples, se a denúncia vier em três anos, por
exemplo, sendo clara a presença de atenuantes –, ele rejeitará a denúncia, com base não na
prescrição pela pena ideal, pois esta causa de extinção da punibilidade não existe: rejeitará
a denúncia por falta de uma das condições da ação penal, qual seja, o interesse na
persecução. Se o crime está fadado à prescrição pela pena aplicada, não há qualquer
interesse-utilidade na deflagração da ação penal15. E, diga-se, este argumento é servível a
embasar até mesmo a promoção de arquivamento do inquérito pelo MP.
Ainda sobre a prescrição da pretensão punitiva, há alguns detalhes a serem
esclarecidos. Primeiro: o que importa ao juiz, na análise da pena em abstrato para fixação
do prazo prescricional originário, é a narrativa dos fatos, e não a capitulação feita pela
acusação, que pode estar errada. É o crime que o juiz depreender da narrativa que terá sua
pena máxima observada como parâmetro para lançamento na tabela do artigo 109 do CP.
Outro detalhe: as causas de aumento ou de diminuição da pena interferem no
cálculo do prazo prescricional inicial, ou seja, a prescrição pela pena máxima em abstrato
será medida pela pena cominada computando o acréscimo oriundo de causas de aumento ou
de diminuição da pena. Como exemplo, se o fato criminoso for roubo com emprego de
arma, a pena máxima deste crime não é a do caput do artigo 157 do CP, de dez anos; a pena
máxima é a do § 2º, I, e pela maior majorante, ou seja, a pena máxima chega a quinze anos,
porque se considera o maior aumento, de metade. É esta a pena que será lançada na tabela
do artigo 109 do CP, e a prescrição será em vinte anos.
“Roubo
Art. 157 - Subtrair coisa móvel alheia, para si ou para outrem, mediante grave
ameaça ou violência a pessoa, ou depois de havê-la, por qualquer meio, reduzido à
impossibilidade de resistência:
Pena - reclusão, de quatro a dez anos, e multa.
(...)
§ 2º - A pena aumenta-se de um terço até metade:
I - se a violência ou ameaça é exercida com emprego de arma;
(...)”
15
Há que se tratar, aqui, da prescrição funcionalista: Roxin e Jakobs não trataram da prescrição, em suas
respectivas obras sobre o funcionalismo. Todavia, há estudos atuais que pretendem justificar a prescrição pela
pena ideal, já abordada, como forma de prescrição adequada ao funcionalismo, porque não é funcional
instaurar um processo persecutório contra o réu que, ao final, estará fadado ao improvimento pela ocorrência
da prescrição pela pena aplicada. Em verdade, esta tese é de muito pouca relevância, eis que os próprios
autores do funcionalismo penal não a formularam, ou sequer versaram sobre o tema.
A prescrição da pretensão punitiva elide todos os efeitos do crime, eis que acarreta
absolvição material do acusado. Contudo, o artigo 160 do CTB traz a seguinte previsão
excepcional, em que a absolvição por prescrição ainda mantém uma repercussão:
“Art. 160. O condutor condenado por delito de trânsito deverá ser submetido a
novos exames para que possa voltar a dirigir, de acordo com as normas
estabelecidas pelo CONTRAN, independentemente do reconhecimento da
prescrição, em face da pena concretizada na sentença.
§ 1º Em caso de acidente grave, o condutor nele envolvido poderá ser submetido
aos exames exigidos neste artigo, a juízo da autoridade executiva estadual de
trânsito, assegurada ampla defesa ao condutor.
§ 2º No caso do parágrafo anterior, a autoridade executiva estadual de trânsito
poderá apreender o documento de habilitação do condutor até a sua aprovação nos
exames realizados.”
Casos Concretos
Questão 1
Resposta à Questão 1
a) Não há prescrição para Vólia, pela seguinte razão: conquanto tenham decorrido
mais de quatro anos entre a data de recebimento da denúncia e o trânsito em
julgado da sentença condenatória, em segunda instância, não poderia o Tribunal
reconhecer a prescrição retroativa porque a condenação do co-autor, Fernando,
pelo juiz de primeiro grau, interrompeu o curso do prazo prescricional também
para Vólia, de acordo com o artigo 117, § 1°, do CP. Mas vale dizer que, se se
entender que a única conexão a que alude o dispositivo em questão é a material,
se não for o caso não haverá interrupção da prescrição para Vólia, o que fará
com que seu crime esteja prescrito, retroativamente. O CP, contudo, não limita à
conexão material, como faz esta corrente, que é minoritária.
c) Não produziria qualquer efeito, uma vez que o artigo 108, primeira parte, do
Código Penal, é taxativo ao dizer que:
Questão 2
Resposta à Questão 2
A questão da prescrição pela pena ideal ainda não foi tratada com a devida atenção
pela doutrina e pela jurisprudência, devendo ser apreciada de forma distinta de acordo com
o momento em que ela é colocada diante do Juiz. Apesar de tratar-se de instituto não
reconhecido no nosso sistema penal, não deve a questão ser inteiramente afastada, podendo
o Juiz, quando do recebimento da denúncia, analisar a viabilidade ou utilidade na
instauração da ação penal, sendo possível a rejeição daquela peça por falta de interesse
processual, uma das condições da ação, sempre que verificar que, ao final, certamente, será
reconhecida a prescrição pela pena aplicada. Todavia, não feita tal consideração naquele
momento processual, sendo a vestibular acusatória recebida, não mais se pode declarar
extinta a punibilidade pela prescrição pela pena ideal, devendo o feito tramitar
normalmente até a sentença final. Nesta hipótese, aplicada a pena respectiva e não tendo o
Ministério Público dela recorrido, o Juiz, se for o caso, deverá reconhecer a extinção da
punibilidade pela pena aplicada. No curso da instrução, porém, não deve ser proferida
decisão extintiva de punibilidade com tal fundamento.
A hipótese em exame é outra. De efeito, há que se destacar que em casos
semelhantes o próprio parquet, em regra, tem pugnado pelo arquivamento, sempre na linha
da ausência de uma das condições da ação, ou seja, o interesse, este considerado de acordo
com o binômio necessidade e utilidade. Como é sabido, apesar de até este momento o prazo
prescricional ter como marco o máximo da pena em abstrato, o que é fato é que no caso de
ser a pretensão punitiva acolhida, a pena não poderá se afastar muito do mínimo legal, até
porque o denunciado é primário e de bons antecedentes, ocorrendo a prescrição se ela for
fixada em até quase o máximo previsto no tipo, ou seja, onze meses e vinte e nove dias.
Faltando uma das condições da ação, a rejeição da denúncia se impõe.
Questão 3
Em 07/02/00, CAIO foi preso em flagrante delito pela prática de roubo agravado e
TÍCIO pela receptação da coisa subtraída. Ambos foram processados na mesma ação
penal em razão da conexão formal. A denúncia foi recebida no dia 04/03/00.Através de
sentença prolatada em 18/03/04, CAIO foi condenado a seis anos de reclusão e TÍCIO a
quatro anos de reclusão. As defesas recorreram. No dia 09/04/08 foi publicado acórdão,
confirmando a sentença quanto ao crime de roubo e anulando o processo desde o início,
com relação ao crime atribuído a TÍCIO. A decisão do Egrégio Tribunal restou
irrecorrida. Retornando os autos à Vara de origem, a defesa sustenta a extinção da
punibilidade de TÍCIO, em razão da prescrição da pretensão punitiva. Na qualidade de
Juiz da causa, qual será sua decisão?
Resposta à Questão 3
Tema XII
Notas de Aula16
Vale estabelecer, desde já, uma premissa geral: sempre que o condenado estiver
cumprindo a pena, não estará correndo o prazo prescricional da pretensão executória,
justamente porque esta pretensão está se implementando pela execução da pena. Mesmo
que a prisão seja por outro crime, em outro processo, o prazo prescricional ficará suspenso,
como se verá.
O prazo aumentado pela reincidência não se aplica se a multa for a única pena
aplicada na sentença. Pelo ensejo, tratemos da pena de multa. Esta pena prescreve, quando
há cumulação com outra privativa de liberdade, no mesmo prazo que esta. Quando a multa
for a única pena aplicada, isoladamente, a prescrição da sua pretensão executória ocorre em
dois anos, pela aplicação plana do artigo 114 do CP:
“Prescrição da multa
Art. 114 - A prescrição da pena de multa ocorrerá: (Redação dada pela Lei nº
9.268, de 1º.4.1996)
I - em 2 (dois) anos, quando a multa for a única cominada ou aplicada; (Incluído
pela Lei nº 9.268, de 1º.4.1996)
II - no mesmo prazo estabelecido para prescrição da pena privativa de liberdade,
quando a multa for alternativa ou cumulativamente cominada ou cumulativamente
aplicada. (Incluído pela Lei nº 9.268, de 1º.4.1996)”
Há, porém, uma outra corrente interpretativa que entende que a multa isolada se
transforma em uma dívida de valor, e, assim sendo, aplicar-se-ia o prazo prescricional dos
créditos fazendários, que é de cinco anos.
De uma ou de outra forma, em dois ou cinco anos, quando a multa for a única pena
aplicada, não se dilatará o prazo pela reincidência constatada na sentença. Isto se dá porque
se interpreta literalmente o artigo 110 do CP, que remete aos prazos fixados no artigo 109
do CP, e como a multa vem prevista no artigo 114 do CP, escapa à previsão de aumento de
um terço.
Voltando à prescrição da pretensão executória, o início da contagem dos prazos
prescricionais desta fase é o trânsito em julgado da sentença condenatória para a
acusação, na forma do artigo 112, I, primeira parte, do CP:
Ainda que não se possa falar em trânsito em julgado genericamente, porque a defesa
pode ter recorrido, é dali que se conta o prazo. Mesmo que a defesa recorra, o prazo já
havia se iniciado antes. A forma de se evitar o início do prazo prescricional é evitando o
trânsito em julgado da decisão para a acusação, ou seja, a acusação deve recorrer, se estiver
preocupada com a prescrição executória – pois o manejo de recursos pela defesa pode
conseguir esta prescrição, até com certa facilidade, a depender da quantidade de pena
aplicada.
Mas veja que há um outro dies a quo possível para a prescrição da pretensão
executória, na parte final do próprio inciso I do artigo supra: da data da revogação do sursis
ou do livramento condicional. Entenda-se com um exemplo: o juiz condena a um ano, e
aplicou o sursis; há o trânsito em julgado, e realiza-se a audiência admonitória, três anos e
nove meses depois do trânsito em julgado para a acusação. Desde esta audiência, o réu
passa a cumprir o sursis, que, lembre-se, é a execução da pena suspensa, e, como se disse,
com pena em cumprimento não corre prescrição. Ocorre que, no curso do sursis, o réu
descumpre alguma condição, e o sursis é revogado. No momento do trânsito em julgado da
decisão que opera esta revogação, a pena deixa de estar sendo cumprida, e o Estado tem
que prender o condenado; desde então, se restabelece a pena de um ano originariamente
imposta, o que significa que o prazo de quatro anos, da prescrição executória, tem início
desde então. Passados quatro anos, sem prisão, opera-se a prescrição.
Ocorre que se na audiência admonitória o réu não comparece, o juiz torna sem
efeito o sursis concedido. Tornar sem efeito não é o mesmo que revogar: é como se não
houvesse jamais sido concedido sursis. Sendo assim, a pena de um ano, do exemplo, que
prescreve em quatro anos, teve a prescrição iniciada do trânsito em julgado para a acusação,
seguindo a regra geral, e não da decisão que tornou sem efeito o sursis, pois esta decisão
não é revogação. No exemplo dado, como já havia corrido três anos e nove meses desde o
trânsito em julgado para a acusação, se mais três meses se passassem sem que o réu fosse
preso, estaria prescrita a pretensão executória do Estado.
O que este artigo diz, quanto à evasão, é que, uma vez que o réu empreende fuga
quando cumpria regime prisional, a prescrição será contada não pelo prazo aplicado na
sentença, mas sim pelo prazo restante, porque é este restante que corresponde à pretensão
executória do Estado: este não tem mais o direito de executar a pena integral, pois já
executou parte dela; terá direito a executar apenas o restante não cumprido, e é este restante
que se submete à prescrição.
Já quanto à revogação do livramento condicional, a questão apresenta maior
complexidade. Isto porque a definição do que seja tempo restante da pena, neste caso, vai
depender da causa de revogação do livramento. Entenda: suponha-se que o livramento foi
revogado quando o condenado a nove anos já havia cumprido três em prisão, e cinco em
liberdade condicional. Tendo sido causa da revogação o descumprimento de condições do
livramento, significa que o réu violou a confiança que o Estado nele depositou, e, por isso,
todo o tempo que cumpriu da pena em liberdade será desconsiderado. Sendo este o caso, o
tempo restante da prescrição é referente aos seis anos, correspondentes ao que faltava desde
quando posto em liberdade condicional – doze anos. “Ao traidor, nada”, como diz Fernando
Capez.
Mas veja que se a causa da revogação da liberdade condicional não for um
descumprimento de condições, não significará a traição da confiança do Estado. E isto pode
acontecer, por exemplo, quando o liberto cometera um crime anterior ao crime pelo qual
está em liberdade condicional, mas só houve a sua condenação agora. O réu não
descumpriu nada que lhe foi imposto como condição para estar liberto, pois a sua conduta é
pretérita, mas mesmo assim terá a liberdade revogada. Só que, como não houve a traição ao
Estado, a pena que ele cumpriu em liberdade será computada, não podendo ser
desconsiderada. No exemplo dado, do condenado a nove anos, os cinco anos cumpridos em
liberdade condicional, somados aos três anos cumpridos em prisão, fazem com que a pena
restante seja de apenas um ano, e, portanto, a prescrição da pretensão executória será
correspondente a esta pena restante – quatro anos.
Em síntese: a pena restante é toda ela, desde a postura em liberdade, quando a
revogação é causada pelo descumprimento de condições durante o período de prova; ou é a
pena restante desde a revogação, quando esta é causada por condenação oriunda de fato
pretérito.
Repare que o artigo 113 do CP não fala do sursis, ao contrário do que o faz o artigo
112, I. Assim o é porque a revogação do sursis não implica em cumprimento de restante de
pena alguma: a pena jamais foi cumprida em prisão, o que significa que, revogado, tem a
pena inteira por ser cumprida, integralmente.
O inciso II do artigo 112 do CP fala que é termo a quo da prescrição da pretensão
executiva, também, o dia em que se interrompe a execução da pena. A execução da pena é
interrompida, em regra, quando o réu se evade, mas há um caso em que a interrupção não
se dá por fuga, e em que seu prazo deve ser computado na pena: quando o condenado é
acometido de doença mental superveniente. Neste caso, a execução da pena é interrompida,
e o réu é encaminhado ao nosocômio psiquiátrico de custódia, mas o tempo em que
permanecer por lá será contado como tempo de pena cumprida.
Pelo ensejo, vale abordar a questão da prescrição da medida de segurança. Quando
o réu é inimputável, a sua sentença é absolutória imprópria, sendo-lhe aplicada medida de
segurança. Sendo absolutória, não há pena, e por isso muito se discutiu esta questão, sendo
que o STJ consignava entendimento de que não se poderia falar em prescrição porque
simplesmente não há pretensão executória a ser implementada. Recentemente, porém, o
STJ alterou este seu entendimento, como se pode ver na ementa do HC 48.993, abaixo,
decidindo que deve haver prescrição, calculada com base na pena máxima cominada para o
injusto penal pelo qual o réu foi responsabilizado. Veja:
Pode ser abatido o tempo cumprido em prisão cautelar da pena aplicada, para fins
de contabilização do prazo prescricional da pretensão executória do Estado?
O STF entende que não. Aplica-se, à plenitude, a letra fria da lei, contando-se a
prescrição pela pena aplicada, sem ressalvas. Contudo, há entendimento de que pode haver
este desconto, com base no artigo 113 do CP: se há detração, o cumprimento da pena
restante é que deve ser observado para fins de prescrição, afinal, a pretensão executória do
Estado é somente sobre este prazo restante. Reveja o dispositivo:
O STF, contra este argumento, entende que este artigo só é aplicável quando o
agente já iniciou o cumprimento da pena, o que não ocorre na prisão cautelar, que não é
cumprimento de pena (o que seria, fosse execução provisória da pena) – há detração, mas a
pena aplicada na íntegra é que é medida da prescrição. Sendo assim, não haveria que se
falar de pena restante. A questão é pacificada no STF, mas a tese contrária é bem coerente.
Casos Concretos
Questão 1
Resposta à Questão 1
Questão 2
Resposta à Questão 2
Questão 3
RENATO DAS DORES foi condenado pela prática do delito previsto no art. 155,
caput do CP, por decisão transitada em julgado na data de 11/08/2003, devidamente
cumprida. Foi novamente processado sob a alegação de ter praticado, em 28/09/2005, a
conduta delituosa disposta no art. 129, § 2º, II do CP. Foi sentenciado e condenado
definitivamente à pena privativa de liberdade de 5 (cinco) meses de detenção por violação
do art. 129, caput, do mesmo diploma legal. Pergunta-se:
a) Qual o prazo, na hipótese, de prescrição da pretensão punitiva?
b) Qual o prazo, na mesma hipótese, de prescrição da pretensão executória?
c) São iguais os efeitos desses dois tipos de prescrição?
Resposta à Questão 3
b) O prazo é de dois anos e oito meses, porque se calcula pela pena em concreto –
cinco meses –, chegando em dois anos, aumentado o prazo prescricional de um
terço, vez que o enunciado diz que o agente é reincidente.
Tema XIII
Notas de Aula17
17
Aula ministrada pelo professor Marcus Henrique Pinto Basílio, em 30/4/2009.
“Art. 366. Se o acusado, citado por edital, não comparecer, nem constituir
advogado, ficarão suspensos o processo e o curso do prazo prescricional, podendo
o juiz determinar a produção antecipada das provas consideradas urgentes e, se for
o caso, decretar prisão preventiva, nos termos do disposto no art. 312. (Redação
dada pela Lei nº 9.271, de 17.4.1996)”
Mas veja que esta previsão é um tanto problemática, ante a nova previsão do artigo
396, parágrafo único, do CPP:
Debalde qualquer discussão sobre esta parte reformada do CPP, é certo que a citação
por edital é causa suspensiva da prescrição.
Outra causa suspensiva da prescrição vem no artigo 89, § 6º, da Lei 9.099/95:
“Art. 89. Nos crimes em que a pena mínima cominada for igual ou inferior a um
ano, abrangidas ou não por esta Lei, o Ministério Público, ao oferecer a denúncia,
poderá propor a suspensão do processo, por dois a quatro anos, desde que o
acusado não esteja sendo processado ou não tenha sido condenado por outro crime,
presentes os demais requisitos que autorizariam a suspensão condicional da pena
(art. 77 do Código Penal).
(...)
§ 6º Não correrá a prescrição durante o prazo de suspensão do processo.
(...)”
condenatória, mas não houve sucesso, a todo ver, pela forma com que redigiu o teor do
inciso IV do artigo 117: a única interpretação possível é de que este acórdão seja apenas o
que reforma a sentença absolutória, sobremaneira porque a conjunção “ou” dá a entender
que, interrompido pela sentença condenatória, não mais se interromperá pelo acórdão
confirmador. Todavia, o STF já decidiu entendendo que se trata, sim, de nova causa
interruptiva, qual seja, o acórdão confirmador da sentença condenatória.
Casos Concretos
Questão 1
Em 15/01/99, dois anos após atingir a maioridade penal, EUSTÁQUIO foi preso
em flagrante delito pela prática de extorsão agravada. Permaneceu preso durante todo o
desenvolvimento da ação penal. A denúncia foi recebida no dia 04/02/99 e, através de
sentença condenatória, publicada em 06/07/99, foi EUSTÁQUIO condenado, em razão da
reincidência, à pena privativa de liberdade de oito anos de reclusão. A sentença transitou
em julgado em 18/08/99. O condenado fugiu da penitenciária em 15/07/03.Em
cumprimento de Mandado de Captura, expedido pelo Juízo da Execução Penal,
EUSTÁQUIO foi preso em 08/11/08.A defesa impetrou Habeas Corpus em favor de
EUSTÁQUIO, alegando a ilegalidade da privação da liberdade, pois a punibilidade está
extinta, por força do disposto no art. 107, IV do CP, tendo ocorrido o fenômeno da
Resposta à Questão 1
Questão 2
Resposta à Questão 2
A interrupção opera efeitos para ambos, eis que a pena será cumprida em conjunto,
e a pretensão executiva se confundirá em uma só. Não pode a prescrição de uma pena, que
faticamente é uma só, ser bipartida. Sendo a conexão, in casu, formal, porém, há quem
entenda que não se aplica esta comunicação, mas é tese minoritária.